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Psicologia do Desenvolvimento

da Infância e da Adolescência
3º Semestre
Psicologia do desenvolvimento
A psicologia do desenvolvimento pretende descrever e explicar as mudanças
psicológicas, comportamentais e de funcionamento que ocorrem no ser humano ao
longo do tempo. Como tal, trata-se de uma ciência com objeto de estudo, teorias e
métodos característicos.

Definições:

O termo desenvolvimento surge sempre referido como processo, não sendo


assim um facto ou um acontecimento. Aparece também relacionado com a ideia de
mudança ou de transformação e com a dimensão de tempo e de espaço. Devido a isto, é
um processo que se refere às mudanças e continuidades sistemáticas que os indivíduos
evidenciam ao longo da vida, e que refletem a influência da aprendizagem e da
maturação biológica.

Em termos do indivíduo, o desenvolvimento compreende todo o seu ciclo de


vida, este processo relacionando-se com o mundo (visão holística). Acontece desde a
conceção até à morte e diz respeito às mudanças que ocorrem ao longo da vida,
nomeadamente a nível físico, emocional, intelectual, social, percetivo e da
personalidade.

Dada a importância da agenda geneticamente determinada, o processo de


desenvolvimento segue, em grande parte, um curso com características similares em
todos os indivíduos da espécie. A regularidade e a variabilidade são dois atributos
fundamentais dos processos de desenvolvimento, já que existem variações interpessoais
decorrentes das características especificas do mundo com que cada sujeito se relaciona.

Os fatores endógenos/biológicos mantêm interações dinâmicas continuas com os


fatores exógenos/ambientais. Tal facto determina que o processo do desenvolvimento se
configure como fenómeno complexo no qual os atributos da regularidade coexistem
com os da singularidade.

Segundo Bronfenbrenner, a psicologia do desenvolvimento é o estudo científico


da acomodação progressiva e mútua ao longo do curso de vida, entre um organismo
biopsicológico muito complexo, ativo e em crescimento e as propriedades em mudança
dos cenários imediatos que envolvem a pessoa em questão, na medida em que esse
processo é afetado pelas relações entre cenários e pelos contextos mais vastos em que
estes cenários estão inseridos.

Notas sobre esta definição:

Ciência porque tem objeto de estudo, teoria e métodos próprios;

Mútua porque tem um papel ativo, tanto do indivíduo, como do meio;

Biopsicológico pois não podemos esquecer-nos de que somos seres orgânicos, e que
olhamos muito para o nosso comportamento social, mas muito desse comportamento é
explicado pela biologia.

Acomodação:

Uma criança possui um esquema mental sobre como é um gato. Se ela for ao
jardim zoológico e vir um tigre, irá achar que ele é um gato, pois tem duas orelhas,
quatro patas e bigodes. Assim, terá de transformar o seu esquema mental num novo para
o que é um tigre.

Assimilação:

Perante um estímulo, como um gato branco a passar à minha frente, acedo a um


esquema mental sobre gatos que já tenho criado na mente. Então, posso até nunca ter
visto um gato completamente branco, mas sei o que é um gato, e a cor é a única
diferença. Assimilo a nova informação ao meu esquema mental pré-concebido.

Locomoção autónoma dos bebés como organizador desenvolvimental:

Os organizadores desenvolvimentais são sistemas de comportamentos ou de


habilidades centrais em domínios específicos da funcionalidade humana, que estão
fortemente relacionados com a emergência de outras aquisições desenvolvimentais. A
locomoção é um exemplo de um organizador.

Quando o bebé evidencia as primeiras formas de locomoção autónoma,


desencadeia-se toda uma série de processos de reorganização psicológica. O
aparecimento da simples capacidade de gatinhar dá origem a um grande conjunto de
modificações no âmbito do desenvolvimento percetivo, cognitivo e socioemocional.
Este início da locomoção proporciona novas experiências que alteram
radicalmente os modos de interação da criança com o mundo físico e social em volta.
Desse ponto de vista, a locomoção não constitui, no entanto, em si um agente causal, já
que as mudanças desenvolvimentais relacionadas com esta aquisição não decorrem
diretamente dessa aquisição, mas sim das alterações da experiência que surgem com o
exercício de uma mobilidade mais independente.

Nota: Recém-nascidos são os bebés desde que nascem até aos 28 dias.

Organizadores da interação:

 Atenção social: qualidade da atenção social focalizada, partilhada e dividida pela


criança em relação às atividades que ocorrem durante a interação.

 Persistência e envolvimento: grau de intensidade e persistência com que a criança se


mantém em interação e se envolve enquanto participante ativo nas atividades que
ocorrem durante as interações.

 Cooperação: grau com que a criança colabora nas atividades que ocorrem na
interação, aceitando os pedidos e as sugestões do adulto e cooperando com ele.

 Iniciação: até que ponto a criança inicia diferentes atividades durante o curso da
interação e procura envolver nelas o adulto.

 Afeto: estado emocional geral da criança e nível de afeto durante o tempo de


interação.

Metáfora da teia construtiva


O nome desta metáfora surge do facto de que a aranha tece os fios da teia
seguindo padrões de ação organizados instintivamente. Porém, existe uma relação entre
a atividade da aranha e os contextos onde ela é construída. Usando esta metáfora,
podemos perceber que, dependendo das condições em que a pessoa se encontra, o
desenvolvimento será diferente e poderá ter resultados distintos.

Por outras palavras, obedecendo a leis e princípios, em grande medida


determinados pelo programa genético, haverá uma regularidade no desenvolvimento
que coexiste com uma variabilidade ditada pelas circunstâncias nas quais este se
desenrola.
Interligação pessoa-meio
O desenvolvimento decorre através de processos de interação dinâmica e
recíproca, cada vez mais complexos, entre um organismo que evolui
biopsicologicamente em determinado contexto ecológico. É influenciado por outras
componentes, formando-se assim quatro dimensões do desenvolvimento: pessoa,
processo, contexto e tempo.

Pessoa:

Visualizámos um vídeo que retrata um homem com Síndrome de Down.


Podemos pensar, à primeira vista, que a sua vida seria limitada devido à doença, no
entanto, ele faz o seu dia a dia, realiza as suas tarefas e constitui os seus objetivos como
as pessoas que têm um desenvolvimento normativo. As possíveis limitações e
obstáculos são anuladas pela sua independência.

Processo:

O desenvolvimento ocorre através de processos de interação, interação essa que


deve ser dinâmica e recíproca.
Contexto:

O contexto podem ser objetos ou símbolos, como cruzes católicas ou uma


tatuagem, mas também é geralmente a família, a comunidade, a escola ou o trabalho.

A qualidade das interações também é importante, pois permite um ajustamento


entre o apoio e o desafio, ou seja, podemos intervir apenas até determinado nível, caso
contrário, não damos oportunidades de crescimento.

A tecnologia é facilitadora da automatização do dia a dia e permite ao homem do


vídeo apanhar o autocarro, fazer uma receita ou receber alertas de segurança.

Também existem macrossistemas, que são mais abrangentes, mas que


influenciam indiretamente o sujeito e que são padrões de organização institucional da
cultura. Estes regulam o funcionamento dos microssistemas, dos mesossistemas e dos
exossistemas. Exemplos: leis e comunicação social.

Os cronossistemas estão relacionados com o tempo, como o século no qual a


pessoa vive e com o momento sociohistórico. Exemplo: a experiência de
desenvolvimento será diferente se o sujeito for do século XVIII ou do século XXI.

Podemos dividir o contexto em variáveis de estrutura (características físicas e


ambientais dos contextos, das pessoas e das suas atitudes e crenças) e em variáveis de
processo (interação entre criança-criança, criança-adulto, adulto-grupo, …). É de notar
que as relações podem ser mais verticais ou mais horizontais, em termos de hierarquia.

Estes dois tipos de características não podem ser vistos de forma isolada, pois
interagem dinamicamente. Crianças em espaços seguros, ordenados e com
equipamentos e brinquedos estimulantes (estrutura) são mais autónomas nas atividades
(processo).

Tempo:

Quanto mais cedo conseguimos intervir, mais cedo conseguimos moldar o


desenvolvimento e estabelecer hábitos benéficos para o individuo.

Linhas de orientação sobre as teorias


I. Todos os domínios do desenvolvimento estão interrelacionados.
II. O desenvolvimento normativo inclui uma vasta gama de diferenças individuais.
Exemplo: nem todas as crianças começam a andar aos 13 meses.

III. A hereditariedade também influencia o desenvolvimento humano.

IV. As interações são fundamentais no processo desenvolvimental.

V. Os contextos históricos e culturais influenciam fortemente o desenvolvimento.


Exemplo: o nível socioeconómico.

VI. As crianças ajudam a moldar o seu próprio desenvolvimento e influenciam as


respostas que recebem dos outros.

VII. As experiências precoces são importantes, porém, as crianças podem ser


notavelmente resilientes.

VIII. O desenvolvimento na infância está relacionado com o desenvolvimento ao longo


do resto do ciclo de vida.

Configurações epistémicas do desenvolvimento psicológico:

I. Configuração normativa: formas de comportamento que emergem em obediência ao


plano partilhado pela totalidade dos membros da espécie.

II. Configuração individual/normativa: ritmos com que cada indivíduo vai realizando
esse plano.

III. Configuração contextual/específica: formas de comportamento emergente que


caracterizam as particularidades psicológicas de um grupo.

IV. Configuração individual/específica: formas de comportamento emergente que ditam


a particularidade psicológica de cada indivíduo.

Fatores de desenvolvimento e teorias:


Modelos das teorias:

Algumas teorias centram-se mais num modelo mecanicista e outras no modelo


organísmico:

 Modelo mecanicista:

Este é um modelo baseado na máquina como metáfora. Vê o desenvolvimento


como uma resposta passiva, previsível a estímulos internos e externos, que realça os
aspetos quantitativos do desenvolvimento e que estuda os fenómenos através da análise
do funcionamento das partes que o constituem.

 Modelo organísmico:

Modelo que considera o desenvolvimento como um processo iniciado


internamente por um individuo ou por um organismo ativo, que ocorre segundo uma
sequência universal de estádios de maturação, qualitativamente diferenciados.

Teoria da vinculação de Bowlby e de Ainsworth


Perspetiva etológica: Os seres humanos têm mecanismos adaptativos para
sobreviver, nomeadamente em contextos críticos ou sensíveis. As bases biológicas e
evolucionistas do comportamento e a predisposição para a aprendizagem são
importantes para que isso aconteça, dando-se assim uma interação entre fatores inatos e
da experiência.
Quando nascemos, somos muito dependentes dos nossos progenitores, e, por
isso, criamos também um vínculo afetivo com eles.

Teoria sociocultural de Vygotsky


Perspetiva contextual: Esta teoria diz-nos que o contexto sociocultural onde o
individuo se insere tem um impacto importante no seu desenvolvimento, que acontece
através da experiência. Como técnicas, usamos a investigação transcultural e a
observação de crianças com pessoas mais experientes.

Como procura estudar de que forma é que as práticas culturais especificas, em


particular a interação social com os adultos, afetam o desenvolvimento das crianças,
recorre a dois princípios:

Zona de desenvolvimento proximal:

Refere-se à distância entre o nível de desenvolvimento atual, determinado a


partir da resolução independente de problemas, e o nível mais elevado de
desenvolvimento potencial, determinado pela resolução de problemas sob a orientação
de adultos ou em colaboração com iguais mais capacitados.

Se perguntarmos 20x2 a um estudante universitário, não estamos perante


desenvolvimento, porque, à partida, o estudante saberá facilmente a resposta. No
entanto, uma criança pequena, poderá ter dificuldade a resolver este problema.

A este processo, os investigadores aplicaram a metáfora do andaime, que está


relacionada com o suporte temporário que os pais, professores ou outros adultos
fornecem a uma criança para ela realizar uma tarefa, até a conseguir realizar sozinha.
Quanto mais dificuldade a criança tiver, de mais apoio necessitará. Isto leva-nos a
questionar como podemos ajudar alguém a resolver um problema de forma adequada, já
que não podemos fazer, nem demasiado, nem muito pouco.

Internalização:

A internalização permite a transformação de fenómenos sociais em fenómenos


psicológicos, e que implica a exposição da criança a formas culturais mais maduras de
comportamento. É um processo de aquisição desenvolvimental e de domínio sobre os
signos e sobre os instrumentos socioculturais, e permite a elaboração das representações
acerca do mundo envolvente.
Perspetiva transacional
Assim como há uma organização biológica, que contribui para regular a
expressão fenotípica do individuo, há também uma organização social que regula o
modo como os indivíduos se integram na sociedade. Esta organização opera através da
família e dos padrões de socialização cultural, podendo ser designada de mesótipo, e
pode ser organizado em:

 Microssistema:

O microssistema diz respeito aos cenários imediatos de participação do


indivíduo, que representam funções ou características particulares. Por ser tão próximo,
é mais impactante. Exemplos: escola e família.

 Mesossistema:

Compreende o sistema de relações existente entre os vários cenários de


participação do individuo. Exemplo: relação escola-família.

 Exossistema:

Inclui os cenários dos quais o indivíduo não faz parte, mas que afetam os
cenários nos quais ele ativamente participa. Exemplo: horário de trabalho dos pais.

 Macrossistema:

O macrossistema refere-se aos padrões de organização institucional da cultura,


incluindo os sistemas económico, político e social, que regulam o funcionamento de
todos os outros sistemas micro, meso e exossistemas.
Métodos e planos de investigação
Pressupostos:

 A definição da metodologia de investigação deve ser feita em função do objetivo da


investigação. Ou seja, o melhor método é aquele que se ajusta ao que queremos estudar,
mediante um contexto deontológico.

 É fundamental que os factos observados e os dados recolhidos possam ser


enquadrados num eixo teórico ou conceptual.

 As opções metodológicas realizadas devem ser devidamente explicitadas e


fundamentadas.

Recolha de dados:
 Autorrelato:

Os participantes são questionados acerca de determinado aspeto das suas vidas,


sendo que esse questionamento pode ser altamente estruturado ou mais flexível. Pode,
assim, fornecer informação em primeira mão acerca da vida, das atitudes ou das
opiniões do individuo, mas também tem desvantagens.

Um dos pontos negativos é que o participante pode não se recordar da


informação de uma forma precisa, ou pode distorcer as respostas de uma forma
socialmente desejável. Também, a forma como a questão é colocada ou por quem é
colocada pode afetar a resposta.

 Medidas comportamentais:

Os participantes são testados em capacidades, competências, conhecimentos ou


respostas físicas. Este método é vantajoso porque fornece informação objetivamente
mensurável e evita distorções subjetivas. No entanto, não pode medir atitudes ou outros
fenómenos não comportamentais, e os resultados podem na mesma ser alterados por
fatores externos.

 Observação naturalista:

As pessoas são observadas no seu ambiente ou contexto, sem nenhuma tentativa


de manipular ou condicionar o comportamento, o que fornece uma boa descrição das
suas ações. Também não submete as pessoas a ambientes não-naturais que possam
distorcer o comportamento.

Por outro lado, há falta de controlo, e pode ocorrer um enviesamento do


observador. Exemplo: Perguntar a uma educadora acerca do comportamento de uma
criança é diferente de a observarmos nós mesmos, de forma a ver se tem ou não reforço,
entre outros. Cada pessoa tem uma perceção diferente.

 Observação laboratorial:

Os participantes são observados num laboratório, sem haver uma tentativa de os


manipular ou condicionar. O comportamento de todos os participantes é anotado e
registado na mesma situação e sob condições controladas. Isto fornece boas descrições e
maior controlo do que na observação naturalista, mas ainda existe possibilidade de
enviesamento do observador, agora num ambiente artificializado.
 Estudo de caso:

O estudo de um individuo único em profundidade fornece flexibilidade e uma


imagem detalhada do comportamento e do desenvolvimento. Podem utilizar materiais
biográficos, autobiográficos, registos de observadores e outros documentos e até mesmo
gerar hipóteses. Exemplo: Estudos de Piaget com os seus filhos.

Em termos de desvantagens, pode não ser generalizável a outros casos, e as


conclusões podem não ser diretamente testáveis. Como consequência, não é possível
estabelecer relações de causa-efeito.

 Estudo correlacional:

Prende-se com a tentativa de encontrar uma correlação ou uma relação estatística


entre variáveis. As correlações são expressas em termos de direção – positiva ou
negativa – e magnitude/grau. Permitem a predição de uma variável com base noutra e
podem surgir até hipóteses acerca das relações causais. No entanto, não é possível
estabelecer relações de causa-efeito.

 Estudo experimental:

É um procedimento controlado, no qual o experimentador manipula a VI com o


objetivo de determinar o seu efeito na VD, e pode ser conduzido em laboratório ou em
campo. O experimentador divide os participantes em dois tipos de grupos –
experimental e controlo – e é necessário que haja objetividade, fidelidade, validade,
representatividade e replicabilidade.

São vantajosos porque estabelecem relações de causa-efeito, são alta e


rigorosamente controlados e podem ser repetidos por outro investigador. No entanto, os
resultados podem não ser generalizáveis a situações fora do laboratório.

Planos de investigação desenvolvimental


Plano transversal:

Observação, num único momento temporal, de diferentes grupos


correspondentes a diferentes idades ou níveis de desenvolvimento, mas com
características semelhantes. É menos dispendioso a vários níveis, sendo mais barato,
mais fácil em termos logísticos e não sensível a problemas como a perda de
participantes.

No entanto, é inconveniente no sentido de não permitir obter uma imagem de


trajetórias desenvolvimentais, a não ser por um exercício de inferência, e por ter a
possibilidade da existência de um efeito de geração. Também, há dificuldade de
generalização dos resultados.

Plano longitudinal:

Plano de excelência da psicologia do desenvolvimento, no qual se recolhem


dados sobre o mesmo grupo de pessoas, durante um período de tempo, de forma a
avaliar as mudanças de desenvolvimento que ocorrem com a idade ou com a passagem
desse tempo.

Como vantagem, permite perceber as mudanças nas trajetórias


desenvolvimentais, bem como os fatores que lhes estão associados. No entanto, é
bastante dispendioso e pode ocorrer a perda de participantes.

Nota: transversal vs. longitudinal:

Podemos perceber que há vantagens no estudo longitudinal, pois ocupa menos


tempo e é tão eficiente quando o plano transversal.

Plano sequencial:

Plano de estudo que combina as técnicas transversal e longitudinal ao avaliar


indivíduos de uma amostra transversal (diferentes grupos correspondentes a diferentes
idades ou níveis de desenvolvimento) em mais do que um momento temporal. Este
plano permite aos investigadores separar as mudanças ligadas à idade dos efeitos de
geração, e indica até que ponto as mudanças observadas numa geração são similares às
verificadas noutra geração.

Apesar de serem menos dispendiosos que os estudos longitudinais, envolvem


tempo, esforço e complexidade, e requerem um vasto número de participantes. A
recolha e a analise é de uma enorme quantidade de dados ao longo dos anos, e tem que
ser feita com um elevado grau de sofisticação. Também há o risco de mortalidade da
amostra.

Plano microgenético:

Plano de estudo que pretende fornecer informação acerca dos processos que
promovem as mudanças desenvolvimentais, no qual expõem repetidamente crianças a
experiências que supostamente produzem mudanças desenvolvimentais. É monitorizado
o comportamento à medida que a mudança vai ocorrendo, fazendo com que, dentro
desse período, a densidade de observações seja elevada.

Apesar de ser vantajoso que a observação seja detalhada, e que possamos saber
como e porque é que essas mudanças ocorrem, a experiência proporcionada para
estimular a mudança pode ser atípica e os resultados podem não perdurar no tempo.

Questões éticas na avaliação


Direito ao consentimento informado:

O consentimento informado existe quando os participantes concordam


voluntariamente em participar num estudo, são competentes para dar esse
consentimento, estão completamente cientes dos riscos que ocorrem e dos potenciais
benefícios e não estão a ser explorados.

Direito ao bem-estar físico e psicológico:

Salvaguarda das questões de segurança e de bem-estar dos participantes. Temos


de ter particular atenção a aspetos que podem afetar a autoestima e o autoconceito das
crianças. Os investigadores devem estar bem conscientes das implicações sociais,
políticas e humanas da sua investigação e devem ser especialmente cuidadosos na
apresentação dos seus resultados.

Direito à privacidade e à confidencialidade:


O investigador deve manter confidenciais as informações relativas aos
participantes, e, sempre que os valores científicos ou humanos justifiquem a partilha de
informação, tal deve ser analisado criteriosamente.

É de notar que estes são apenas alguns exemplos de práticas éticas na


investigação, e que não podemos forcar ou convencer alguém a continuar um estudo.
Mesmo que essa pessoa já tenha assinado o consentimento informado, se quiser desistir
ou não estiver disposta a participar naquele momento, essa decisão deve ser respeitada.

Adaptação
Na psicologia do desenvolvimento, a adaptação prende-se com a capacidade de
os indivíduos lidarem com as tarefas de sobrevivência e com o sucesso alcançado pelos
mesmos em transmitirem os seus genes às gerações seguintes.

Outras aceções consideram que a adaptação está intrinsecamente associada à


ideia de ajustamento do individuo ao seu meio, físico e social, estando ligada à
autonomia, à autodeterminação, à regulação emocional e à satisfação das necessidades
próprias.

Au
to-
rea
liz

ão
Necessidade
de estima

Necessidade de pertença
e de amor

Necessidade de segurança

Necessidades biológicas e fisiológicas

Primeiras adaptações
O repertório inicial de competências adaptativas pode ser olhado à luz de um
modelo que reconhece quatro níveis hierárquicos de regulação:
1. Regulação autonómica:

Depois de o bebé nascer, entre as 30 e as 32 semanas, conseguimos identificar se


o bebé está preparado para sobreviver em termos respiratórios e da atividade cardíaca.

Quando nasce, é até mesmo feita uma análise clínica chamada Índice de Apgar,
que permite verificar em que medida o bebé tem certos reflexos. Isto porque existe uma
relação entre os reflexos e o bem-estar cerebral. Também são analisadas as suas
características físicas e comportamentais.

Sinal clínico 0 1 2
Frequência cardíaca Ausente < 100 > 100
Respiração Ausente Lenta Normal
Tónus Flácido Flexão das extremidades Movimentos ativos
Choro Ausente Caretas Vigoroso
Cor da pele Azulado Corpo rosado Todo rosado

2. Regulação motórica:

Acontece entre as 32 e as 34 semanas e está relacionado com o controlo da


tonicidade muscular, da postura e dos reflexos. A atividade reflexa está dividida em
algumas fases, e corresponde à resposta organizada e automática do bebé face a um
estímulo, resposta essa independente da aprendizagem.

A sucção é um exemplo de atividade reflexa. Está relacionada com o instinto de


sobrevivência, nomeadamente com a alimentação. Em seguida, também no mesmo
campo, estão os pontos cardeais ou a procura. Quando a mãe vai amamentar o bebé e o
mamilo toca na região próxima da boca, ele vira a cabeça em direção ao seio para poder
mamar. Este reflexo inicia-se no nascimento e diminui a partir do 4º mês, visto que aí já
não precisa dessa orientação.

Outros reflexos são o de preensão palmar, ligado à vinculação, e o de babinski,


que diz respeito ao facto de que, quando estimulamos a planta dos pés, o recém-nascido
abre os dedos. Ainda na parte motora, temos a marcha automática: quando colocamos o
bebé em posição de caminhar, ele flete os joelhos. Embora não saiba andar, e só comece
a fazê-lo um ano depois, acontece este reflexo.
Por fim, o reflexo de moro, que está ligado mais uma vez à sobrevivência, é
avaliado pelo seguinte teste, ainda na maternidade: colocamos o recém-nascido nos
braços e “deixamo-lo cair”, ou melhor, fingimos esse movimento, para notar os seus
reflexos. Se for um bebé com um comportamento normativo, deverá levantar os braços.

3. Regulação dos estados:

Os estados do recém-nascido são um conjunto de comportamentos que refletem


as condições do mesmo, e que se estendem desde o sono mais profundo ao choro mais
vigoroso. As investigações sugerem que estes estados assinalam, de alguma maneira, os
níveis de ativação dos processos neuronais.

Apesar de, aparentemente, refletirem fases de um contínuo de variação, eles


diferem qualitativamente entre si, revelando modalidades distintas de organização e de
regulação da atividade cerebral.

Estado
Regularidade da respiração Abertura dos olhos Movimentos Gritos
s
I 1 -1 -1 -1
II -1 -1 0 -1
III -1 0 0 -1
IV 1 1 -1 -1
V -1 0 1 -1
VI -1 -1 1 1

Estes estados são avaliados durante todo o dia, sendo -1: não, 0: sim ou não e 1:
sim. A tabela seguinte mostra os estados ótimos para avaliar os diferentes reflexos:

Estados
Reflexos I II III IV V VI
Preensão palmar X
Babinski X X X X
Moro X
Pontos cardeais X X
Sucção X X
Marcha automática X X

4. Regulação da intencionalidade:

Nascemos preparados para aprender e para absorver experiências. Então, a


regulação da intencionalidade está exatamente relacionada com o controlo dos
processos de extração da informação, dos processos de retenção e de utilização dessa
informação, e com o controlo da atividade orientada para objetivos.

Existe uma série de competências sensório-percetivas e de aprendizagem que


regulam a intencionalidade e que, geralmente, são avaliados em contexto experimental:

 Visão:

Conseguimos perceber que o tamanho da pupila aumenta com pouca luz e que
diminui com mais luminosidade, que o bebé é capaz de orientar ambos os olhos em
direção de um só estímulo, quer fixo, quer em movimento, e que consegue focar numa
pessoa ou num objeto a cerca de 25cm da face, o que significa que a sua acuidade visual
é cerca de 30x inferior à de um adulto.

Também sabemos que os bebés com 3 dias distinguem o vermelho, o amarelo, o


verde, o azul e o cinzento. Tem preferência pelo contraste entre o preto e o branco e por
objetos com padrão figurativo da face humana, e reage à sensação de profundidade.
Consegue ainda discriminar estímulos como um círculo vs. um triângulo.

 Audição:

Um bebé consegue discriminar a voz humana em relação a outros sons, e


também sons semelhantes como ba vs. pa. Deteta alterações da dimensão prosódica do
discurso, localiza a fonte sonora (isto ainda dentro da sala de partos) e tem reações
diferenciadas a sons de diferentes frequências e durações.

Sabemos ainda que tem preferência pelos estímulos cujas características


acústicas se assemelhem às características da voz humana, em particular da feminina, no
entanto, existem estudos que dizem que essa reação positiva pode acontecer em relação
à voz do pai caso este comunique bastante com o bebé ainda em fase intrauterina.

 Gosto:

O feto bebe líquido amniótico, então, as suas papilas gustativas são estimuladas.
Conseguimos perceber que apresenta reações mais positivas a alimentos doces e
negativas a alimentos azedos, ácidos e salgados, através da sua expressão facial, do seu
ritmo cardíaco e da velocidade de sucção. Isto acontece por motivos adaptativos e de
sobrevivência, já que os venenos da natureza têm um sabor amargo.

 Olfato:

A nível olfativo, são capazes de discriminar cheiros agradáveis e desagradáveis,


e preferem cheiros de banana, baunilha, chocolate e mel. Mais uma vez, por questões
adaptativas, já que cheiros desagradáveis estão associados a alimentos estragados. Têm
maior sensibilidade ao cheiro da mãe, e a própria mãe também consegue distinguir o
cheiro do seu bebé.

 Tato:

Os bebés são sensíveis à dor, ao contrário do que se achava anteriormente


devido à ausência de mielina nos axónios. São sensíveis às variações de temperatura,
apesar do sistema de controlo de temperatura ainda ser imaturo, e aos ritmos, daí
embalarmos os bebés. Massajar as suas costas é uma boa forma de estimular sinapses e
de os acalmar.

 Articulação intersensorial:

Existem relações entre os sentidos, nomeadamente entre a visão e a audição e


entre o tato e a visão.

Rosto da mãe Rosto feminino


Sem voz X
Voz da mãe X
Voz feminina

O bebé olha mais tempo para o rosto da mãe, com e sem voz. No entanto, se
estiver a olhar para outro rosto e ouvir a voz da mãe, ou se olhar para o rosto da mãe e
ouvir outra voz, isso causa-lhe expressões de aversão, como o evitamento ou o choro.

Aprendizagem:

Foram feitos diversos estudos, com recurso a diferentes processos:

 Condicionamento clássico: Estimulação de comportamentos reflexos através de


estímulos incondicionados, que mostraram que os bebés recém-nascidos aprendem até a
dormir.

 Condicionamento operante: Aprendizagem de respostas através das consequências,


que revelaram que um bebé pode sugar mais uma chupeta para ouvir sons e falas.

 Habituação: Os bebés recém-nascidos têm a capacidade de se habituar a estímulos, ou


seja, dá-se uma diminuição da resposta a um estímulo (visual, auditivo ou tátil) quando
ele é apresentado de forma repetida. Isto revela uma capacidade de defesa perante
estímulos excessivos ou desinteressantes e evita um gasto inútil de energia.

Também pode ser útil na aprendizagem, pois se o bebé está a mostrar sinais de
habituação, está a demonstrar que aquilo não é novo, e que o experienciaram antes.
Exemplo: Se um bebé mora perto de um aeroporto, não se vai sobressaltar cada vez que
um avião passar.

 Imitação: Têm capacidade de observar os adultos e de os imitar, nomeadamente em


termos de expressões faciais.

Teoria da vinculação
Contributos históricos e conceptuais:

 Abordagem psicanalítica;

 Perspetiva etológica;

 Trabalhos de autores como Harlow, Bowlby, Ainsworth e Crittenden.


A vinculação pode ser definida como um elo afetivo durável que se estabelece
entre a criança e os seus regulares prestadores de cuidados. No seu estudo, podem ser
consideradas duas dimensões: a dimensão subjetiva (experiência interna do indivíduo) e
a dimensão funcional (expressão comportamental). Tem ainda como base a
sobrevivência da espécie.

Em termos da expressão comportamental, concebe-se que todo e qualquer


comportamento de vinculação tem como resultado previsível instaurar ou aumentar
situações de proximidade espacial entre a criança e a figura à qual está vinculada.

Estabelece-se uma diferenciação fundamental entre os comportamentos:

 Comportamentos de sinalização: comportamentos que suscitam a aproximação da


figura de vinculação ou que mostrem prolongar o contacto, como chorar, chamar ou
sorrir.

 Comportamentos de procura e de manutenção: comportamentos da criança que lhe


permitem alcançar ou manter a proximidade com a figura de vinculação, como seguir,
aproximar-se ou agarrar-se à pessoa.

O sistema comportamental de vinculação é despertado por:

 Condições externas ou ambientais: ausência ou distância da figura de vinculação,


alarme materno, partida ou chegada da figura após um período de ausência, rejeição ou
ausência de resposta por parte da figura ou eventos alarmantes, como situações não
familiares ou a aproximação de estranhos.

 Condições internas à criança: doença, fome, dor, frio, cansaço, sono…

Figura de vinculação:

Esta figura assegura a relação entre o sistema comportamental de vinculação e o


sistema comportamental exploratório. Podemos estar vinculados a mais do que uma
pessoa, mas não a muitas, e essas pessoas são as responsáveis pelo sentimento de
segurança, dando resposta às suas necessidades de proteção. Podem funcionar como:

 Base segura: quando o sistema de vinculação está ativado a um nível baixo, a criança
explora o meio.
 Refúgio de segurança: quando o sistema de vinculação é ativado a um nível de
intensidade superior, a criança refugia-se na sua figura de vinculação.

Modelos maternos de arame e de pano:

Foram feitas algumas experiências com macacos, nas quais colocavam um


macaco bebé num ambiente com duas bonecas que agiam como figura materna: uma de
pano e outra de arame. Apesar de serem amamentados através da boneca de arame, os
bebés preferiam o conforto da boneca de pano, o que demonstrou que a alimentação não
é o elemento mais importante para a relação mãe e filho.

Quando era introduzido um estímulo assustador, como um som, o macaco


refugiava-se na mãe de pano, procurando conforto e segurança. Na falta dela, encolhia-
se no chão, com medo. Na presença da mãe de pano, também explorava o ambiente.

Situação estranha, modelo experimental de Mary Ainsworth:

Este é um estudo que tem por base a observação da relação entre mães e bebés
de 12 a 18 meses, composto por vários episódios de separação e de reunião. Permite
observar se a figura de vinculação é utilizada como base segura e como refúgio de
segurança.

Episódio Pessoas presentes Duração Descrição


1 M, B e E 30 seg E mostra sala a M e B e sai
2 MeB 3 min M não participa e B explora
3 E, M e B 3 min E entra, conversa com M, e M sai
4 EeB 3 min ou - E conforta B, se necessário
M entra, E sai, M conforta B e
5 MeB 3 min
depois diz adeus e sai
6 B 3 min ou - B está sozinho
7 EeB 3 min ou - E entra e interage com B
8 MeB 3 min M entra, saúda B e E sai

Sendo M: mãe, B: bebé e E: estranho. Os comportamentos específicos mais


comuns são locomoção, movimentos corporais e das mãos, choro, vocalizações, entre
outros. Em termos da interação entre a mãe e o bebé, pode ocorrer a proximidade e a
procura de contacto, a manutenção desse contacto, o evitamento ou a resistência.
Classificação dos bebés de acordo com os padrões de vinculação:

 A – evitante: Explora imediatamente, sem clara manifestação de afeto ou aparente


comportamento do tipo base segura. Quando se dá a separação, não parece ficar
perturbada, e quando se reúne com a mãe, não a olha e parece até evitá-la ativamente.
Foca-se frequentemente nos brinquedos, exatamente porque não sente necessidade de
conforto, e, se é pegada, mexe-se e procura a distância.

Crianças com este padrão de vinculação não confiam na sua figura de vinculação
como fonte de apoio, não a vendo com expectativa de conforto face à perturbação, e
tendem para a autossuficiência emocional.

 B – seguro: Usa a mãe como base segura de exploração, sendo que, quando se separa
dela, assinala sentir a sua ausência e pode até mesmo chorar. Quando a reencontra,
saúda-a ativamente com um sorriso, uma vocalização ou um gesto, e procura
proximidade e contacto. Apenas quando for confortada retorna à exploração.

Este padrão de vinculação revela confiança na figura de vinculação, na sua


disponibilidade e no seu apoio prestado em situações adversas. Crianças neste padrão
tendem a procurar os outros quando necessário.

 C – resistente: Sente-se pouco à vontade quando entra na sala, estando por vezes
assustada, e não se envolve na exploração. Quando se separa da mãe, mostra-se
perturbada, mas quando a mãe volta, a criança mostra um comportamento alternativo
entre o desejo e a rejeição. Não encontrando conforto imediato com a proximidade ou o
contacto, tanto se deixa aproximar quanto se torna agressiva.

Crianças com este padrão de vinculação mostram incerteza face à


disponibilidade, responsividade e apoio da figura de vinculação e oscilam entre a
procura intensa e a manifestação de hostilidade.

 D – inseguro desorganizado ou desorientado: Mais ligado à psicopatologia, não


estudamos.

Notas: O padrão de vinculação exibido pode mudar de acordo com a figura. Crianças
“demasiado perfeitas” ou “demasiado adultas” podem encaixar-se no padrão A.

0 aos 3 anos
Desenvolvimento cognitivo
Definição de cognitivo:

Apesar de não existir consenso entre os autores acerca do significado do termo


“cognitivo”, aplica-se a todas as atividades que implicam a interpretação da informação
recebida e aos processos de aprendizagem.

Uma informação é interpretada quando o indivíduo a relaciona com outras


informações provenientes de experiências anteriores e que permanecem, de uma
maneira ou de outra, codificadas na memória.

A atividade cognitiva assume uma grande complexidade de formas que incluem


processos mentais superiores, como o pensamento, a aprendizagem e o raciocínio
abstrato. Contudo, impregna todos os processos, e está presente em fenómenos
aparentemente menos complexos, como a perceção e os padrões de comportamento.

Em suma, o termo cognitivo aplica-se a toda a atividade de interpretação da


experiência mediante o recurso a processos que a relacionam com experiências
anteriores codificadas sob a forma de representações mentais.

Vários autores consideram que o sistema cognitivo opera segundo três modos de
funcionamento:

 Modo de funcionamento imediato:

As representações relacionam-se com a informação de forma direta, e podem


interagir entre si de maneira a originarem novas representações. Suportam atividades de
reconhecimento e permitem expectativas e atos de resolução de problemas mediante
procedimentos de tentativa e erro.

 Modo de funcionamento simbólico:

Sendo caracterizado pela existência de representações de outras representações,


como imagens mentais, institui o espaço mental para a emergência e desenvolvimento
da linguagem.

Possibilita também a realização de atos interiorizados, operações mentais,


nomeadamente de ensaios mentais de tentativa e erro. Exemplo: quando os bebés atiram
comida ao chão, e, passado certo tempo, já sabem o que resulta dessa ação, logo, não
precisam de a realizar.

 Modo de funcionamento meta-representacional:

É caracterizado pela possibilidade de efetuar operações mentais sobre operações


mentais, sendo os seres humanos os únicos que o conseguem fazer. Nota: “meta”
significa “para além de”.

O que está aqui impresso?

Dizer que se trata de uma lâmpada implica uma atividade de interpretação que se
baseia no estabelecimento de relações entre a informação apresentada e outras
informações provenientes de experiências anteriores. Isto porque, na verdade, o desenho
não passa de linhas curvas, horizontais e verticais, mas nós atribuímos um significado.

Jean Piaget e a perspetiva piagetiana:

Não obstante as críticas e a proliferação de vários programas de investigação, a


abordagem de Piaget funciona ainda como a referência principal no estudo do
desenvolvimento humano. Tem como conceitos fundamentais:

 Epistemologia genética, no sentido de estudar o modo de construção do conhecimento


na criança para melhor entender o processo de construção do mesmo;

 Construtivismo genético, que defende que temos um papel ativo no nosso próprio
desenvolvimento e que absorvemos o que já existe, mas da nossa forma própria;

 Cognição como sistema adaptativo, que seleciona e interpreta ativamente a


informação à medida que constrói o seu próprio conhecimento acerca do meio
envolvente complexo;

 Invariantes funcionais: assimilação e acomodação:


 Assimilação: implica aplicar ao objeto aquilo que o indivíduo conhece. Assim,
refere-se ao processo através do qual o sujeito adapta os estímulos externos às suas
próprias estruturas mentais internas. Por outras palavras, parte do conhecimento prévio
e dos esquemas mentais que temos internamente semelhantes ao novo estímulo.

 Acomodação: consiste em adaptar as estruturas mentais internas à estrutura


dos estímulos externos de forma a que estes possam ser assimilados. Ou seja,
acomodamos a informação em função do conhecimento prévio e criamos um novo
esquema mental dela.

 Desequilíbrio cognitivo: sabemos agora que a acomodação, de certa forma, dá


origem à assimilação, acontecendo antes. No entanto, quando nos deparamos com algo
desconhecido, passamos por um período de desequilíbrio cognitivo.

 Equilibração: assim que criamos um esquema mental para o novo estímulo,


através da acomodação, o desequilíbrio cognitivo dá lugar ao equilíbrio.

Os seus estudos foram baseados na observação dos seus três filhos, e apenas
mais tarde, com a extensa investigação de muitos outros autores, permitiram fixar
melhor os parâmetros etários dos diferentes estádios e confirmar a reprodutibilidade dos
dados descritos por Piaget.

Assim, percebeu-se mais tarde que a coordenação sensorial é observável no


recém-nascido e que a permanência de pessoas significativas é feita mais precocemente.
Também se fez uma distinção entre a competência cognitiva e as competências
executivas. Para Piaget, a criança não procura o objeto desaparecido por falta de uma
representação interna do mesmo. Mas outros autores perceberam que essa falta de
procura se deve, na verdade, à carência de habilidades de execução para o fazer.

Paradigma da violação das expectativas:

Em termos de apreciações críticas ao autor, percebeu-se a existência de um


paradigma relativamente às expectativas do bebé. Num primeiro momento, está
habituado a ver um acontecimento como sendo normal. Depois, quando esse
acontecimento é alterado, isso colide com as expectativas do bebé.

Ainda, o bebé apresenta uma tendência para olhar durante mais tempo para
fenómenos diferentes do habitual do que para os fenómenos familiares, reconhecendo a
mudança. Na imagem abaixo, foi notado que o bebé olha com mais atenção para o
acontecimento de baixo, por ser impossível.

Estádios de desenvolvimento de Piaget:

 Sensório-motor:

Ocorrendo desde o nascimento até aos dois anos de idade, é aqui que acontece a
construção do real na criança, do seu ponto de vista e do conhecimento que esta vai
construindo acerca do mundo e de si própria. É ainda um período caracterizado pelo
predomínio da ação sobre a representação simbólica dessa ação.

No primeiro mês de vida, o bebé recorre aos exercícios reflexos e à repetição


funcional dos esquemas para produzir conhecimento. Há, assim, uma preponderância da
assimilação, mas também se inicia a acomodação. Exemplo: esquema de sucção.

A vida entre o primeiro e os 4 meses é marcada pelo aparecimento de reações


circulares, sequência na qual o comportamento produz um evento interessante, sendo
depois repetido. São reações circulares primárias porque envolvem apenas o corpo do
bebé. Exemplo: pôr os pés ou as mãos na boca.

Daí até aos 8 meses, surgem as reações circulares secundárias, que já envolvem
objetos externos no qual o comportamento produz, acidentalmente, um evento
interessante e que é repetido com o objetivo de ser prolongado. Exemplo: carregar num
botão de um brinquedo que produz uma música.
O terceiro estádio acontecem entre os 9 e os 12 meses e está marcado pela
coordenação de esquemas secundários, que remetem para a utilização de objetos como
intermediários para obter algo desejado. Exemplo: afastar uma almofada para chegar ao
brinquedo.

A partir do primeiro ano de vida e até aos 18 meses, surgem as reações


circulares terciárias, associadas a uma sequência que envolve a criança e um ou mais
objetos. É produzido um efeito e o bebé experimenta reproduzi-lo com variações do
comportamento efetuado. Exemplo: a criança aperta um pato de borracha e produz um
som, então, começa a mandá-lo à parede, a bater com ele no chão, entre outros
comportamentos, na expectativa de voltar a produzir o som.

Podemos dizer então que começa a exploração ativa e por tentativa e erro das
propriedades e potencialidades dos objetos, através da procura de novas formas de atuar
sobre eles. A tentativa e erro também é usada para a resolução de problemas.

No sexto e último estádio, a resolução de problemas práticos passa a fazer-se


mais rapidamente, quase sem recurso à tentativa e erro, mas por dedução mental
(pensamento representacional). Ou seja, os esquemas de ação são interiorizados e
passam a ser esquemas mentais, dando-se uma emergência da atividade simbólica.

É também no período das reações circulares secundárias que surge,


naturalmente, a noção de objeto, que não é inata, mas adquirida através da experiência,
e que passa igualmente por diferentes estádios.

O primeiro estádio é o adualismo inicial e ocorre desde o nascimento até ao


primeiro mês de vida. A criança encontra-se num estado de indiferenciação face ao
mundo que a rodeia e demonstra egocentrismo inicial, ou seja, não tem conhecimento
do próprio Eu ou dos objetos à sua volta.

O segundo estádio acontece entre o primeiro e os 4 meses de vida e chama-se


seguimento visual dos objetos. A criança segue visualmente os objetos, de forma cada
vez mais competente, até que eles saiam do seu campo de visão, pois, nessa altura,
perde o interesse. Ainda perceciona o objeto sob diversas formas, incluindo tátil,
principalmente gustativa e visual, mas não as coordena entre si.

O início da procura ativa do objeto aparecido apenas começa nos 4 meses,


constituindo assim o terceiro estádio, que tem o seu fim aos 8 meses. Dão-se reações
circulares secundárias relativas à reconstituição de um todo invisível a partir de uma
fração visível, ou seja, se a criança consegue ver metade de um brinquedo, tem noção de
como é a outra metade, ainda que esteja escondida.

O quarto estádio chama-se busca ativa do objeto desaparecido sem consideração


dos deslocamentos visíveis e acontece entre os 8 e os 12 meses. A criança procura o
objeto onde o viu a desaparecer e acredita que o objeto só volta a existir quando volta a
aparecer.

Uma reação típica deste estádio é o erro A-não B. Este é caracterizado pelo que
foi dito anteriormente, no sentido em que a criança vê o objeto a desaparecer em A, e
encontra-o em A; depois, desaparece novamente em A, e a criança encontra-o em A. No
entanto, quando o objeto desaparece em B, a criança tenta encontrá-lo novamente em A.

O quinto estádio é caracterizado pela procura do objeto no local onde o viu


desaparecer, mesmo que este lugar vá sendo alterado, pois a criança considera os
deslocamentos que o objeto pode sofrer no espaço. Chama-se, então, busca ativa do
objeto desaparecido após consideração dos deslocamentos visíveis e ocorre entre os 12 e
os 18 meses de vida do bebé.

O sexto e último estádio, busca ativa do objeto desaparecido após consideração


dos deslocamentos invisíveis ocorre entre os 18 meses e os 2 anos de vida. A criança
utiliza a evidência visual como base para imaginar ou representar o itinerário do objeto
por diversos locais, fazendo essa procura de forma sistemática e, por vezes, na ordem
inversa.

Então, a criança representa mentalmente o objeto durante os seus deslocamentos


invisíveis e percebe-o como uma entidade externa que existe e se move,
independentemente do contacto percetivo e motor que possa ter com esse objeto.

Por fim, no período sensório-motor, ainda se constitui a noção de causalidade.


No primeiro e segundo estádios, há uma indiferenciação das categorias de causa-efeito,
ou seja, uma ausência de distinção entre a ação e os seus efeitos ou resultados.

No terceiro estádio, há a causalidade mágico-fenomenista como modalidade que


indica uma primeira diferenciação entre a ação e o resultado. Mas o bebé ainda acha que
o objeto apareceu quase que por magia, sem lhe atribuir uma causa.
No quarto estádio, surge a consideração do papel dos intermediários no âmbito
do sistema de causalidade mágico-fenomenista; no quinto, a descentração da posição de
egocentrismo epistemológico e o abandono do sistema de causalidade mágico-
fenomenista; então, no último estádio, a representação interiorizada das ações e os
raciocínios de inferência causal.

Desenvolvimento físico e motor


Princípios fundamentais para o desenvolvimento motor:

 Princípio céfalo-caudal:

Segundo este princípio, o crescimento ocorre de cima para baixo, ou seja, da


cabeça para os pés. Isto pode ser provado pelo facto de que, inicialmente, a cabeça é a
parte mais desenvolvida do corpo dos bebés, e estes só aprendem a usar os membros
inferiores depois dos membros superiores.

 Princípio próximo-distal:

Segundo este princípio, o crescimento ocorre de dentro para fora, e isto verifica-
se pelo facto de que os bebés aprendem a usar primeiro os braços e as coxas, que estão
mais próximos do centro do corpo, e só depois os antebraços, as pernas, as mãos e os
pés, e, por último, os dedos. A boca é o local central que primeiro é usado. Exemplo:
Começar a gatinhar com o peito e com os antebraços apoiados no chão.

Crescimento do corpo e do cérebro:

Durante os três primeiros anos de vida, e sobretudo nos primeiros meses, o


crescimento da criança é mais acentuado do que em qualquer outro período.

 Peso:

Aos 5 meses, o peso médio do bebé terá duplicado de 3.5kg para cerca de 7kg, e,
por volta dos 12 meses, triplica para cerca de 10kg. Este ritmo de crescimento abranda
durante o segundo ano de vida, e ainda mais no terceiro ano (3 anos = 14/15kg).

 Altura:

Geralmente, a altura do bebé aumenta cerca de 25 a 30cm durante o primeiro


ano de vida, sendo que estes nascem com cerca de 50cm. Durante o segundo ano, o
bebé terá cerca de 90cm e, com 3 anos, cerca de 1m de altura. Verificam-se ligeiras
diferenças entre meninos e meninas, sendo os primeiros mais altos e mais pesados.

 Cérebro:

O cérebro cresce muito rapidamente antes do crescimento, sendo que a cabeça


do recém-nascido é desproporcionalmente grande. Com 1 ano de idade, o cérebro do
bebé tem 70% do seu peso adulto, mas o resto do corpo tem apenas 10 a 20% do peso
adulto. No entanto, a partir do segundo ano, à medida que a criança cresce, a cabeça vai-
se tornando proporcionalmente mais pequena.

 Dentição:

A dentição do bebé tem início, geralmente, por volta dos 3/4 meses, quando
começam a agarrar e a levar à boca tudo o que estiver ao seu alcance. Na altura do
primeiro aniversário, têm de 6 a 8 dentes, e 20 com 2 anos e meio.

Marcas do desenvolvimento motor:

 Motricidade grossa ou global:

Postura Saltar Correr e andar

Sentar e ficar em Decúbito dorsal e


Subir e descer
pé (equilíbrio) ventral

 Motricidade fina:

Coordenar e
Alcançar Preensão e largar
manipular

A partir dos 4 meses, o bebé possui competência bimanual, ou seja, segura os


objetos com ambas as mãos e na linha média do corpo, e preensão, com as mãos
geralmente abertas, agarrando nos objetos, mas não os manipulando. Consegue sentar-
se sem apoio, suportando o peso por breves instantes.

A partir dos 5 meses, toca e mexe nos objetos em resposta a um estímulo tátil,
levando-os à boca. Em termos de preensão radial palmar, agarra mais firmemente os
objetos, pressionando-os entre os dedos e a palma da mão. Pode segurar num brinquedo
pequeno, chocalhando-o ou batendo com ele. Consegue sentar-se por longos períodos
de tempo se tiver as costas apoiadas.

A partir dos 6 meses, faz a rotação do pulso, manipula os objetos de forma


grosseira e leva-os à boca. Ajusta a mão ao objeto utilizando informação tátil e visual, e
pode segurar numa bola grande com ambas as mãos. Sente necessidade de se sentar.

A partir dos 7 meses, possui competência bimanual, fazendo movimentos


associados e coordenados com ambas as mãos e explorando os brinquedos. Tem ainda a
capacidade de transferir os objetos de uma mão para a outra e de os atirar contra uma
superfície. Em termos de motricidade grossa, o controlo da cabeça já é excelente.

A partir dos 8 meses, a competência bimanual passa por tentar alcançar os


objetos com os dedos esticados e dá-se um aumento na destreza dos dedos para
manipular brinquedos ou os atirar para cima de uma superfície. Já tem um bom
equilíbrio, podendo ser deixado sentar-se sozinho, e muda frequentemente de posição.

A partir dos 9 meses, já rasteja e senta-se sem qualquer ajuda, e procura manter-
se em pé, apoiando-se no mobiliário. Consegue brincar com dois brinquedos, um em
cada mão, batendo um no outro, e aponta para as coisas com o dedo indicador.

A partir dos 10 e dos 11 meses, agarra os objetos com maior precisão (preensão
em pinça) e atira-os para cima de superfícies, trepa coisas, gatinha, consegue brincar
enquanto está sentado… É muito ativo e explorador, o que o leva a ajoelhar-se numa
tentativa de se colocar em pé.

A partir dos 12 meses, consegue agarrar num brinquedo com uma mão e
explorar com a outra, e identificar formas, encaixando-as nos buracos corretos. Já
consegue ficar em pé sozinho por curtos períodos de tempo, mas ainda não tem tanto
equilíbrio. Empurra a bola contra o adulto, apoia-se num braço para alcançar algo com o
outro e dá alguns passos de forma independente ou segurando a mão.
A partir dos 15 aos 18 meses, a sua preensão é hábil e precisa, podendo segurar
dois objetos simultaneamente, segurar num lápis e fazer rabiscos e empilhar objetos. Em
termos de motricidade grossa, caminha lentamente, trepa os degraus das escadas,
mantém-se em pé, agacha-se, inclina-se, anda bem e rápido e senta-se em cadeiras
pequenas.

A partir dos 24 meses, equilibra-se quando está parado e consegue apoiar-se


num só pé, chuta uma bola, sobe e desce escadas com apoio e salta. Tem um maior
controlo da mão, ajustando a abertura da mesma em função da forma e do tamanho do
objeto, segura com maior precisão num lápis, vira as páginas de um livro e usa
ferramentas simples, como um martelo de brincar.

A partir dos 30 aos 36 meses, consegue cortar com uma tesoura, alinhar objetos,
usar uma colher corretamente, empilhar mais objetos e faz tarefas de rotação simples,
como formar uma pequena bola com plasticina. Sobe e desce escadas alternando os pés,
pedala no triciclo e sobe e desce escadas sem ajuda.

Desenvolvimento da linguagem

Pragmática Oralidade,
Linguagem Expressão
(adequada fonologia e
compreensiva linguistica
ao contexto) articulação

Discurso pré-linguístico:

Antes de os bebés pronunciarem as suas primeiras palavras, produzem sons


denominados como discurso pré-linguístico, sons esses que são ricos em expressão
emocional. Começando com o choro e depois com o arrulhar e o tagarelar, passando
para a imitação acidental e depois para a imitação deliberada, por perceber que certos
sons são reforçados, ainda que não compreenda o significado dessas palavras.

A partir dos 4 meses, o bebé chora de o jogo for interrompido e produz


vocalizações como resposta aos sons dos outros. Percebe a fonte sonora, virando a
cabeça em direção a ela, consegue diferenciar sons de vozes e responde de forma
diferenciada a sons e a vozes diferentes. Se pretender iniciar uma interação, vocaliza e
sorri.
A partir dos 5 meses, chora quando lhe tiram um objeto ou o deixam sozinho,
mas para de chorar quando falam com ele. Balbucia aleatoriamente, faz barulhos para
chamar à atenção, mostra zanga ou protesto quando está frustrado e faz jogos de sons.
Ainda, tem medo de sons intensos ou inesperados, mostra preferência por rostos
familiares, sorrindo para eles, responde de forma diferenciada a estranhos e recorda-se
de músicas, histórias…

A partir dos 8 meses, o bebé chora se o cuidador se afasta ou de um estranho se


aproxima, em forma de protesto. Produz gestos e vocalizações que os pais interpretam
como tendo uma intencionalidade comunicativa, ouve seletivamente sons e palavras,
responde ao seu próprio nome, segue quando alguém aponta e ele próprio também
aponta e aumenta a imitação dos sons do outro. Ainda, usa intencionalmente o turn-
taking.

A partir dos 9 meses, repete sons, diz de forma mais clara palavras como
“mama” e “dada”, segue pedidos simples quando emparelhados com gestos, dança ao
ouvir música, percebe algumas palavras (nomeadamente o próprio nome e “não”, por
serem as palavras que mais ouvem, ou palavras com um significado especial, como
“urso” ou “papa”), produz sequências de balbucios, faz um maior controlo da saliva
(baba-se menos) e inicia intencionalmente interações.

A partir dos 10 aos 14 meses, inicia o seu discurso linguístico, dizendo a sua
primeira palavra (holófrase), isto é, diz uma palavra para expressar uma ideia completa.
Exemplo: “Da” pode significar “eu quero aquilo” ou “eu quero sair”.

A partir dos 12 meses, consegue pedir ajuda a um adulto, começa a conversar


com os outros, identifica objetos familiares, usa gestos para responder às palavras
(Exemplo: dizer adeus), gosta de jogos de turn-taking, produz palavras aproximadas de
palavras familiares e responde ao jogo “Onde está (algo/alguém)?”. Compreende ~ 50
palavras.

A partir dos 13 meses, consegue dizer frases telegráficas (discurso telegráfico)


com duas palavras (Exemplo: “urso cair”), e entre os 16 e os 24 meses ocorre uma
explosão de conhecimentos, podendo compreender ~ 400 palavras.

A partir dos 20 aos 30 meses, as crianças começam a fazer uso da sintaxe,


através do uso de artigos, preposições, conjunções, terminações de verbos e plurais.
A partir dos 24 meses, produz mais palavras do que gestos, gosta de falar,
comunica as suas necessidades, desejos e sentimentos, usa os primeiros pronomes (eu,
meu…), deixa de apontar para as coisas e, em vez disso, nomeia-as, compreende
palavras que descrevem ação, começa a narrar acontecimentos passados e ouve
pequenas histórias. O seu discurso é apenas 50% inteligível para os desconhecidos, mas
os familiares ou as pessoas que convivem com ele entendem o que ele quer dizer.

A partir dos 36 meses (3 anos), o discurso é fluente, mais extenso e complexo, e


o bebé entende e diz até 1000 palavras. Pede ajuda aos adultos para lidar com as
emoções, diz o primeiro e último nome, nomeia pequenas partes do corpo, produz
rimas, coloca questões como “Onde está (algo/alguém)?”, verbaliza as suas
necessidades fisiológicas e pede clarificações (“Ahn? O quê?”). O seu discurso é 75%
inteligível para desconhecidos.

Desenvolvimento psicossocial

Expressão Regulação Regulação


emocional emocional comportamental

Temáticas
Sentido do self Interações sociais emocionais no
jogo

Os bebés revelam personalidades diferentes, as quais refletem influências inatas


e ambientais e assumem diversas expressões emocionais. As emoções são sentimentos
subjetivos que emergem em resposta a situações e experiências, e são expressos através
de manifestações comportamentais.

Logo após o nascimento, os bebés revelam sinais de perturbação (através do


choro), de interesse e de repugnância (Exemplo: a alimentos amargos). Nos meses
seguintes, estas emoções primárias diferenciam-se em alegria, raiva, surpresa, tristeza,
vergonha e medo. A emergência destas parece ser guiada pela maturação do cérebro e
ter um valor de sobrevivência e de interação social. Exemplo: Chorar para ser
amamentado. Este calendário emocional pode ser ainda alterado por experiências
emocionais extremas. Exemplo: Crianças que são maltratadas demonstram medo muito
antes dos outros bebés.

As emoções relativas à consciência do self, como empatia, ciúmes, vergonha,


culpa e orgulho, não emergem até aos 2/3 anos de vida, ou seja, depois de as crianças
terem desenvolvido a autoconsciência: compreensão de que somos entidades separadas
das outras pessoas e objetos. As últimas três emoções (culpa, vergonha e orgulho)
surgem a partir do momento em que a criança inicia as interações sociais.

A partir dos 4 meses, o bebé sorri socialmente, para rostos familiares e para si
mesmo ao espelho, chora quando algo lhe é negado, mostra ser capaz de controlar os
seus próprios comportamentos e de se acalmar através da sucção, responde de forma
diferente a pessoas diferentes e mostra interesse pelo outro, reagindo à sua presença.
Além disso, os seus períodos de sono e de alerta tornam-se mais regulares.

A partir dos 5 meses, mostra medo de sons fortes ou inesperados e sorri quando
o rosto aparece num jogo (Exemplo: jogo do cucu), fica acordado durante 2h, para de
chorar quando lhe falam, consegue recuperar de situações de stress ao ser tranquilizado
pelos seus cuidadores, mostra zanga e frustração e discrimina a sua imagem da da mãe
quando projetadas no espelho, além de discriminar os pais e familiares dos estranhos.

A partir dos 7 meses, distingue conversas amistosas de zangadas, revela uma


rotina mais estável, chora ou grita para chamar à atenção, entende as consequências dos
seus atos, percebe o significado de “não” pelo tom da voz, reage à imagem no espelho,
tem prazer em atingir objetivos, pode ter medo de estranhos, chora quando a outra
criança chora e faz jogo social.

A partir dos 8 meses, manifesta zanga e desconfiança de forma mais intensa, faz
pequenos sonos regularmente, responde às expressões faciais dos pais como
moderadores das suas próprias emoções, bate palmas quando vê algo que gosta, tenta
beijar a imagem refletida no espelho por achar que é outro bebé, responde com emoções
negativas quando uma pessoa não familiar se aproxima e explora partes da face e do
corpo do cuidador.

A partir dos 12 meses, manifesta expressões de surpresa ou vergonha, demonstra


medo de pessoas e espaços estranhos, sorri perante incongruências e novidade, tem
acessos de raiva mas é capaz de se acalmar a si mesmo, joga às escondidas, mostra
sinais de empatia, mostra prazer ao jogar com brinquedos, começa a ter consciência de
si, precisa de estar junto dos pais durante as brincadeiras, pode solicitar a ajuda do
adulto mesmo quando não precisa, mas nem sempre é cooperativo, e inicia o jogo
paralelo (brinca ao lado de outras crianças mas não com elas).

A partir dos 24 meses, dorme cerca de 12/13h e 30 minutos na sesta, os acessos


de raiva são cada vez mais frequentes, associa as ações às consequências, pode ter medo
de comboios, do escuro, de barulhos de animais e de trovões, quer controlar quem e o
que está ao seu redor, mostra interesse pelo funcionamento das partes do corpo,
pronuncia muito o “meu, eu, a mim”, chama-se a si mesmo quando se vê ao espelho,
esforça-se para realizar tarefas sozinho, consegue bater ou magoar os outros, sabendo
que os seus comportamentos podem ser bons ou maus para os outros, alterna entre
querer estar sozinho ou muito próximo do adulto e gosta de jogo paralelo. As raparigas
ainda tendem a reagir com retraimento ao jogo mais físico dos rapazes.

A partir dos 36 meses, expressa muitos medos, manifesta uma diversidade de


emoções, nomeia as suas necessidades, emoções e estados mentais, mostra zanga e
afeto, pede ajuda para lidar com as emoções, consegue autorregular as suas emoções,
internaliza regras e segue-as durante algum tempo, começa a entender no que pode ou
não mexer, fala acerca das coisas que consegue fazer e mostra vergonha quando não
consegue, prefere tarefas mais desafiantes, identifica o seu género, começa a formar
amizades e precisa que os adultos sugiram ações ou alternativas durante o jogo.

Padrões de temperamento:

Os bebés podem ser mais calmos ou mais agitados (nível de atividade), ter ciclos
biológicos mais ou menos regulares, aproximarem-se ou afastarem-se de estímulos
novos, mostrar níveis diferentes de adaptabilidade a situações novas, serem agradáveis
ou desagradáveis, mais ou menos aptos a distraírem-se e mais ou menos persistentes na
realização de tarefas, mostrando também mais ou menos atenção na mesma.

Tendo em conta todos estes componentes, podemos considerar três padrões de


temperamento, mas há que ter em conta que também funciona como um espectro:

 Criança difícil: manifesta frequentemente humor intenso negativo, chora e ri alto,


responde mal à novidade e à mudança, dorme e come de forma irregular, aceita
lentamente novos alimentos, é desconfiada com estranhos, reage às frustrações com
birras e ajusta-se lentamente a novas situações ou rotinas.

 Criança de aquecimento lento: tem reações de intensidade moderada, quer positivas


quer negativas, responde lentamente à novidade e à mudança, come e dorme de forma
moderada, revela uma resposta inicial moderadamente negativa a novos estímulos e
desenvolve gradualmente prazer pelos mesmos após exposições repetidas.

 Criança fácil: tem um humor de intensidade ligeira a moderada, mas geralmente


positivo, responde adequadamente à novidade e à mudança, desenvolve rapidamente
horários de sono e alimentação regulares, aceitando facilmente novos alimentos, sorri a
estranhos, adapta-se facilmente a novas situações, rotinas e regras e aceita a maioria das
frustrações com pouca rabugice.

Primeiras fases psicossociais/crises propostas por Erickson:

 Confiança vs. desconfiança:

Nos seus primeiros meses de vida, o bebé estabelece um sentimento de


confiança nas pessoas e nos objetos do seu mundo, mas precisa de haver um equilíbrio
entre a confiança, que lhe vai permitir estabelecer relações íntimas, e a desconfiança,
que lhe vai possibilitar a autoproteção.

Se a confiança predominar, como é desejado que aconteça, as crianças


desenvolvem a virtude da esperança, ou seja, a crença de que as suas necessidades
podem ser satisfeitas e que podem obter o que desejam. Pelo contrário, se a
desconfiança predominar, as crianças verão o mundo como um lugar hostil e
imprevisível e terão problemas em estabelecer relações.

O elemento crítico do desenvolvimento da confiança é a prestação de cuidados


sensíveis, responsivos e consistentes, o que significa que esta fase está muito associada
ao estabelecimento de padrões de vinculação.

 Autonomia vs. vergonha e dúvida:

A segunda crise com que a criança se depara entre os 18 meses e os 3 anos diz
respeito à autonomia, à vergonha e à dúvida. Nesta fase, devido a novas competências
no seu desenvolvimento físico, motor, cognitivo, psicossocial e de linguagem, a criança
pretende explorar o que a rodeia e experimentar coisas novas de forma autónoma.
Aqui, ela precisa de desenvolver um equilíbrio entre ser encorajada e perceber as
suas limitações: no primeiro caso, desenvolve um sentimento de autonomia e de
controlo sobre si mesma, complementado pela noção dos seus limites. No entanto, se for
demasiado controlada pelos pais, pode criar um sentimento de vergonha por se expor e
de dúvida por não conseguir fazer as coisas sozinha ou tomar decisões.

A resolução bem-sucedida resulta na virtude da vontade, ou seja, num equilíbrio


entre o que a criança quer e é capaz de fazer, e o que os outros exigem ou pretendem
dela. Exemplo: O bebé diz que quer comer sozinho. Se a mãe responder “Não podes
porque te sujas todo”, isto vai criar um sentimento de culpa e de pouca capacidade no
bebé.

3 aos 6 anos
Desenvolvimento físico e saúde
Crescimento do corpo:

Por volta dos 3 anos de idade, as crianças tornam-se mais compridas, e começam
a perder a face redonda, característica dos bebés, apresentando uma aparência mais
atlética de criança. À medida que os músculos abdominais se desenvolvem, a barriga
diminui, e o tronco, os braços e as pernas tornam-se mais compridos. A cabeça ainda é
relativamente grande, mas as outras partes do corpo continuam a crescer até que as
proporções corporais se tornem mais semelhantes às do adulto.

 Peso:

Ao longo do período pré-escolar, as crianças ganham 2 a 3kg por ano,


começando aos 3 anos com sensivelmente 15kg, e, por volta dos 6 anos, já têm cerca de
20kg.

 Altura:

Geralmente, entre os 3 e os 6 anos de idade, a altura das crianças aumenta cerca


de 20cm, tanto em rapazes como raparigas. Por volta dos 3 anos, medem cerca de 95cm,
sendo que chegam aos 6 anos com mais ou menos 1,15m. Notam-se ligeiras diferenças
entre meninos e meninas, sendo os primeiros mais altos e mais pesados.
 Saúde:

No período pré-escolar, começam a surgir um conjunto de preocupações


associadas ao bem-estar e à saúde das crianças, nomeadamente em termos alimentares,
visto que cada vez mais há crianças com problemas de obesidade, em termos do sono e
na questão da enurese.

As crianças dormem cerca de 9 ou 10h por dia, e esse período de sono vai
diminuindo ao longo da infância. Mas muitas crianças apresentam dificuldades em
adormecer, situação que pode ser ultrapassada utilizando objetos transicionais, como o
urso de peluche. Podem acontecer os pesadelos, as perturbações do sono, ou até mesmo
a influência do tempo passado nas telas, aos quais têm acesso cada vez mais cedo.

A enurese prende-se com o urinar na cama, e pode acontecer nesta faixa etária,
afetando 7% dos rapazes e 3% das raparigas. Porém, a maior parte das crianças começa
a fazer o controlo diurno e noturno entre os 3 e os 5 anos.

Marcos do desenvolvimento motor:

A partir dos 42 meses, atira uma bola a uma distância de 2m, usa tesouras e
consegue coordenar os movimentos para cortar.

A partir dos 48 meses, 4 anos, consegue apanhar uma bola colocando os


cotovelos m frente do corpo, anda como um adulto, consegue conduzir um triciclo por
entre obstáculos, segura um lápis com destreza, desenhando a face humana e pintando
dentro dos contornos. Também apresenta a lateralidade, ou seja, a preferência por um
lado do corpo. Exemplo: Destro vs. esquerdino.

A partir dos 54 meses, desloca o peso do corpo para frente para atirar a bola
mais longe, jogando com alguma destreza e precisão, algumas crianças são capazes de
saltar ao pé-coxinho, e consegue manter vários objetos pequenos na mão, manipulando-
os.

A partir dos 60 meses, joga bem, tem uma melhor coordenação, pode saltar ao
pé-coxinho durante vários segundos, salta de pontos mais altos e em comprimento,
sobre escadotes, desenha com maior destreza, consegue cortar com a tesoura, copia o
próprio nome, manipula objetos minúsculos sem os deixar cair e completa puzzles com
10 peças.
A partir dos 66 meses, desenha formas com adequada orientação espacial e
desenvolve a corrida, e a partir dos 72 meses, atira a um alvo, conduz a bola nos pés,
anda sobre linha reta e manipula o papel quando usa a tesoura.

À medida que a idade avança, as aquisições desenvolvimentais nas áreas física e


motora relevam uma progressiva maior complexidade e destreza nos movimentos
motores, sendo essa diferença acentuada relativamente ao género: as raparigas são
superiores na exatidão dos movimentos e os rapazes superiores em força e rapidez.

Desenvolvimento cognitivo
Uso de símbolos:

As crianças podem pensar em qualquer coisa sem ter de a ver à sua frente.
Exemplo: A criança sabe que o nome “Pantufa” se refere ao seu cão. E então, ele pode
falar ou ouvir falar dele sem o ter à sua frente. O mesmo acontece com pessoas, objetos
e acontecimentos.

Compreensão das entidades:

O mundo está ordenado e é previsível, então, as crianças têm consciência de que


as alterações superficiais não mudam a natureza das coisas. Por outras palavras, a
criança sabe que aquilo continua a ser aquilo, mesmo com algumas alterações.
Exemplo: O pai continua a ser o pai mesmo que se tenha vestido de Pai Natal.

Compreensão de causa e efeito:

Torna-se mais evidente que o mundo está mais organizado quando as crianças
percebem que podem provocar os acontecimentos. Exemplo: A criança sabe que, se
saltar para uma poça de lama, vai ficar com os sapatos sujos. Pode escolher saltar na
mesma, saltar com os pés descalços ou resistir à tentação. Também tem noção das
consequências de ter os sapatos sujos, por exemplo.

Capacidade para classificar:

Torna-se possível, para a criança, organizar objetos, pessoas ou acontecimentos


em categorias com significado. Exemplo: Organizar em “animais” ou em “comida”.

Compreensão do número:
As crianças conseguem contar e lidar com as quantidades, apercebendo-se se
falta algo ou se algo está a mais. Exemplo: A criança sabe que tem duas cenouras no
prato. Se sair da mesa e, quando regressar, só encontrar uma, ela vai saber que alguém a
tirou.

Empatia vs. teoria da mente:

A criança torna-se capaz de imaginar como é que os outros se poderão sentir


(empatia) e de explicar e prever as ações das outras pessoas, imaginando as suas
crenças, sentimentos e pensamentos (teoria da mente). Exemplo: A criança pede para
fazer algo à mãe, que diz que não. Então, ele pergunta ao pai, não informando que já
pediu à mãe, pois sabe que, se o fizesse, o pai diria que não também.

Função simbólica:

A criança evoca e representa objetos, pessoas e acontecimentos ausentes através


de um significante diferenciado, sabendo a diferença entre significado e significante
(palavras, gestos, objetos e imagens).

A partir do segundo ano de vida, emergem um conjunto de atividades e de


possibilidades que supõem a existência desta diferenciação: imitação deferida, jogo
simbólico, imagem gráfica, linguagem e imagem mental.

 Imitação diferida:

Gesto imitativo realizado na ausência do modelo, ao contrário do que acontece


na imitação sensoriomotora. Exemplo: A criança via a avó a beber chá com as amigas,
então, começou a repetir esta ação com as suas bonecas, quando a avó não estava
presente.

 Jogo simbólico:

Atividade através da qual a criança reconfigura a realidade através do recurso à


fantasia, utilizando a ficção para fazer de conta, o que mostra um desenvolvimento na
maturidade. Para que essa atividade seja qualificada como jogo simbólico, importa que
nela esteja, claramente, plasmada uma componente lúdica. Exemplos: Fechar os olhos
para fazer de conta que dorme ou levar a chávena de brincar à boca para fingir que bebe.
As manifestações do jogo simbólico são predominantes entre os 2 e os 6 anos, e
não são exclusivamente observadas no ser humano. Há relatos de atividades de jogo
simbólico em alguns primatas, como gorilas e babuínos.

O jogo simbólico pode envolver identidade ou características de pessoas,


objetos, eventos ou situações. Exemplos: “Eu sou um monstro” (identidade pessoal),
“Tu és um monstro” (identidade do outro) ou “O copo tem sumo” (característica do
objeto).

Como foi dito anteriormente, revela uma evolução desenvolvimental a vários


níveis, pois a criança mostra uma maior flexibilidade na utilização do self e do outro
como agentes e já não depende tanto de objetos que suportam o jogo, substituindo-os
por outros ou mesmo sem recorrer a eles. Exemplos: Pôr a boneca a dormir, fazer com
que a boneca vá “dormir por si própria”, usar uma mola de roupa como carro…

Ainda permite a socialização crescente das características de jogo, dando origem


ao jogo sociodramático, no qual a criança adota papeis que, na vida real, não lhe
pertencem, e articula-os uns com os outros. Exemplo: O “pai” vai trabalhar, enquanto a
“mãe” cozinha, e o “médico” trata do “paciente”. Através deste jogo, a criança explora
papeis e assume as regras típicas a eles associadas, fornecendo-lhe ferramentas para a
ajuda a distanciar o self dos outros, a adotar pontos de vista alheios, a aprender papeis
sociais e a interagir socialmente com os outros.

 Imagem gráfica ou desenho por Luquet:

A partir dos 3 anos, põe fim ao período dos rabiscos. A criança que começou por
traçar rabiscos sem intenção de representação descobre, por acaso, uma analogia com
um objeto e passa a nomear o seu desenho: realismo fortuito.

A partir dos 4 anos, procura reproduzir objetos de forma gráfica. É frequente ir


modificando a intenção inicial à medida que vai desenhando, querendo ser realista, mas
depara-se com obstáculos de ordem física que a impedem de atingir o seu objetivo:
realismo falhado.

A partir dos 6 anos, o desenho é realista. A criança reproduz aquilo que sabe dos
objetos, mas parece ignorar a perspetiva visual. Desenha casas transparentes (com a
mobília), mistura pontos de vista, atribui destaque excessivo a pormenores, comete erros
na planificação…: realismo intelectual.
A partir dos 9 anos, desenha apenas aquilo que vê, tendo maior consideração das
distâncias, da perspetiva…: realismo visual.

 Linguagem ou evocação verbal:

As primeiras palavras não correspondem a uma atividade simbólica, na medida


em que surgem na presença do referente, mas, a partir dos 3 anos, começa a haver a
utilização da expressão verbal na ausência do objeto, da pessoa ou do acontecimento aos
quais se refere.

 Imagem mental:

A criança consegue fazer uma representação interna dos objetos, das pessoas ou
de acontecimentos reais, que resulta de uma imitação interiorizada, apesar de o
resultado não consistir numa cópia perfeita do modelo. As imagens mentais sofrem uma
evolução ao longo do estádio pré-operatório, ou seja, de estáticas, passam a integrar as
transformações entre estados.

Pensamento pré-operatório:

Para Piaget, o pensamento da criança entre os 2 e os 6 anos revela certas


limitações quando comparado com o do adulto. Definiu-o, então, como sendo um
pensamento indutivo pré-lógico, que se baseia na observação direta da realidade com
poucos referenciais a conceitos que poderiam dar outros sentidos ao observado.
Trata-se, assim, de um pensamento organizado a partir de certas características
ou tendências para processar cognitivamente a informação. As suas principais
características são:

 Justaposição e sincretismo:

Expressa-se no modo como a criança explica o comportamento das coisas,


atendendo às partes ou detalhes salientes de uma experiência sem as relacionar dentro
de um todo. Por outras palavras, a explicação parte do visível sem conhecimento das
partes operantes. Exemplo: “A locomotiva anda por causa do fumo”.

 Distinção entre aparência e realidade:

A criança tem dificuldade em coordenar a aparência e a realidade, fazendo com


que tenda a considerar que as aparências superficiais correspondem à realidade. Para
Flavell, isto acontece por dificuldades ao nível físico (percetual) e da compreensão dos
sinais de expressão afetiva. Exemplo: “A lua anda comigo”.

 Egocentrismo:

O egocentrismo é a confusão entre o pensamento próprio, o pensamento dos


outros e os fenómenos exteriores, fazendo com que a criança tenha dificuldade em ter
consciência do seu próprio pensamento e não faça diferenciação entre o Eu e o mundo
exterior. Também acreditam que os outros partilham dos seus desejos, vontades e
preferências.

A criança tem tendência a centrar-se no seu ponto de vista e dificuldade em


distingui-lo do ponto de vista dos outros, tendendo a assimilar os fenómenos exteriores
à ação própria. Exemplos: Ao falar com os seus pais ao telemóvel, diz “A piscina é
muito funda! Dá-me por aqui!”, assumindo que os pais conseguem ver onde a sua mão
aponta. A criança considera que o outro vê o que ele é capaz de ver (teste das três
montanhas):
 Ausência da teoria da mente dos outros:

A posição de egocentrismo cognitivo constitui uma barreira a que a criança


funcione segundo os princípios de uma teoria da mente dos outros. Como tal, a criança
terá dificuldades em reconhecer e compreender que os outros podem ter crenças,
desejos e intenções diferentes das suas.

 Centração, irreversibilidade e noções de conservação:

A criança centra-se nos estados e não nas transformações dos estados dos
objetos. Então, é incapaz de considerar as transformações e de se distanciar dos estados,
não estabelecendo uma relação entre os estados iniciais e os estados finais dos processos
de transformação (irreversibilidade). Isto leva-nos à questão das noções de conservação.
Exemplo: A criança vê dois bolos iguais, e, depois, um deles é cortado em fatias. A
criança desta idade já tem noção de que ambos os bolos têm a mesma quantidade, ainda
que um deles esteja cortado em fatias.

Da intuição à operação:

A intuição é uma ação interiorizada, mas ainda isolada (as novas representações
não se integram nas anteriores) e dependente dos indícios percetivos, sendo irreversível.
Já a operação é uma ação interiorizada, reversível e integrada nos sistemas de
operações, com equilíbrio estável, não estando dependente dos aspetos mutantes da
realidade.

Desenvolvimento da linguagem
Vocabulário:

Por volta dos 6 anos, a criança entende, em média, 14000 palavras, tendo
aprendido cerca de 9 palavras por dia. Aparentemente, as crianças conseguem isto
devido ao mapeamento rápido, processo através do qual absorvem o significado de uma
nova palavra após a terem ouvido apenas uma ou duas vezes numa conversa.

Os nomes dos objetos parecem ser mais fáceis de mapear rapidamente do que os
nomes das ações/verbos. No entanto, crianças mais novas nem sempre utilizam
corretamente as palavras, mas começam a usar expressões com sentido figurado ou
metáforas. Exemplos: Usar a palavra “amanhã” para qualquer evento futuro ou dizer “A
minha mãe é uma flor!”.

Gramática e sintaxe:

Aos 3/4 anos de idade, as crianças produzem frases com 3 ou 4 palavras. Por
volta dos 4/5 anos, o comprimento médio da frase é também de 4 ou 5 palavras. Já aos
5/6 anos, as frases são compostas, genericamente, por 6 a 8 palavras.

Apesar de as crianças mais novas falarem fluentemente, de forma compreensível


e gramaticamente aceitável, ainda cometem vários erros e não utilizam determinadas
formas ou expressões na sua linguagem, e têm dificuldade na utilização de exceções às
regras. Exemplo: Dizem “eu fazi” em vez de “eu fiz”.

Pragmática e discurso social:

O discurso social tem como intenção ser compreendido por um ouvinte e


desenvolve-se de forma marcante durante o período pré-escolar. Por volta dos 30 meses,
as crianças começam a envolver-se em conversas verdadeiras, nas quais reconhecem a
necessidade de tornar o seu próprio discurso claro e relevante em relação ao que o outro
está a dizer.

Aos 3 anos, as pronúncia e a gramática das crianças, em geral, melhoram


rapidamente, tornando o seu discurso mais compreensível. Prestam ainda mais atenção
ao efeito do seu discurso nos outros, tentando explicar de forma mais clara caso
percebam que o outro não os entendeu.

Por volta dos 5 anos, as crianças compreendem e usam os fundamentos da


conversação, tal como ajustar o que estão a dizer ao que o ouvinte sabe sobre o assunto.
Utilizam a linguagem como mediador da interação social, conseguindo até resolver
disputas com palavras.

Por fim, têm cada vez maior noção da pragmática, sendo este conhecimento
necessário para o uso da linguagem com objetivos comunicativos, para pedir coisas,
contar histórias ou anedotas… Crianças entre os 3 e os 5 anos são capazes de comunicar
de forma diferente com uma pessoa cega e com uma que consegue ver, apontando para
os objetos no caso da segunda e descrevendo-os à pessoa cega.

Discurso interno:

O discurso interno – falar “alto” para si mesmo – é normal e comum na infância.


As crianças mais novas repetem sons ritmados, e as mais velhas pensam em voz alta ou
murmuram em tons dificilmente audíveis. Piaget encarava este processo como
manifestação do egocentrismo da criança, no entanto, Vygotsky, acreditava que o
discurso interno ajudava a criança a integrar a linguagem com o pensamento.

Tipos de discurso interno Atividades da criança


Repetir palavras e sons, frequentemente de forma
Jogo de palavras e repetição
ritmada e brincalhona
Falar para os objetos, fazendo de conta que eles são
Jogo de faz de conta solitário
alguém, e produzir efeitos sonoros para os mesmos
Exprimir emoções e sentimentos dirigidos para si
Expressão emocional
próprio e não para um ouvinte
Comunicar com outra pessoa, mas exprimindo a
Comunicação egocêntrica informação de forma incompleta, dificultando a
comunicação
Narrar ou descrever as próprias ações e pensar em
Descrever a própria atividade
voz alta
Ler e soletrar em voz alta Ler em voz alta e soletrar as palavras enquanto as lê
Falar tão baixo que as palavras não podem ser
Murmúrios inaudíveis
compreendidas pelo observador

Desenvolvimento psicossocial
Desenvolvimento do self:
Esta fase do desenvolvimento pode ser analisada segundo duas vertentes: o
autoconceito e a autodefinição. Apesar de parecerem a mesma coisa, não o são:

 Autoconceito:

Por volta dos 4 anos, verifica-se uma mudança no autoconhecimento das


crianças, à medida que a memória autobiográfica e uma teoria da mente mais sofisticada
se desenvolvem. Aprimora-se, assim, o sentido de self e a imagem mental descritiva e a
avaliativa das capacidades e dos traços de cada um;

 Autodefinição:

Por volta da mesma idade, as tentativas de autodefinição também se tornam mais


evidentes, à medida que a criança começa a identificar um conjunto de características
para se descrever a próprio.

Nesta idade, a autodefinição baseia-se essencialmente em comportamentos


concretos e observáveis, em características externas como os aspetos físicos, de
preferências, de posses e de membros da família. Basicamente, o que a criança pensa
acerca de si própria é quase inseparável do que ela faz. Exemplo:

Os autores neo-piagetianos descrevem três etapas no processo de autodefinição:

 Representações simples (4 anos): pensamento transdutivo, na base do tudo ou nada,


sem conexões lógicas, e não consegue reconhecer que a pessoa que ele é não é a mesma
que ele gostaria de ser;

 Mapeamentos representacionais (5/6 anos): conexões lógicas entre as partes da sua


própria imagem, mas não percebe que pode ser muito bons numas coisas e não noutras,
ainda pensando na base do tudo ou nada;

 Sistemas representacionais: começa a integrar aspetos específicos do self num


conceito mais geral e equilibrado, reconhecendo os seus fortes e as suas fraquezas.
Autoestima:

A autoestima é o julgamento que cada pessoa faz do seu próprio valor, e esta
continua a desenvolver-se ao longo do período pré-escolar.

Nesta fase, dos 4 aos 7 anos, a autoestima não se baseia numa avaliação realista
das capacidades ou dos traços de personalidade, visto que, habitualmente, as crianças
sobrestimam as suas capacidades, pois ainda não possuem as competências cognitivas e
sociais necessárias para se compararem corretamente com os outros.

Posto isto, a sua noção de autoestima nestas idades tende a ser global, e as
diferenças neste construto exprimem-se, principalmente, através da confiança, da
curiosidade, do desejo de explorar e da adaptabilidade às situações. Esta visão do self
depende, muitas vezes, dos pais e dos adultos. De facto, os comportamentos parentais
de apoio e desafio são fundamentais.

Identidade de género:

A identidade de género e a consciência do seu próprio género e de tudo o que


nele está implicado é um aspeto importante no desenvolvimento do autoconceito no
período pré-escolar. Para analisar esta parte do desenvolvimento, é importante
distinguir…

 Diferenças de sexo: diferenças físicas entre os indivíduos do sexo masculino e do sexo


feminino;

 Diferenças de género: diferenças psicológicas ou comportamentais entre indivíduos


do sexo masculino e do sexo feminino, como as diferenças cognitivas;

 Papeis sexuais: comportamentos, interesses, atitudes, competências e traços que


determinada cultura considera apropriados para cada um dos sexos;

 Tipificação do género: processo de socialização através do qual as crianças aprendem


o comportamento considerado culturalmente apropriado para cada um dos sexos;

 Estereótipos sexuais: generalizações exageradas acerca dos comportamentos


característicos masculinos e femininos. Exemplo: “as mulheres não sabem conduzir”.

Esta questão ainda pode ser analisada segundo algumas perspetivas teóricas:
 Psicanalítica de Sigmund Freud: “a identidade de género ocorre quando a criança se
identifica com a figura parental do mesmo sexo”;

 Aprendizagem social de Albert Bandura: “a identidade de género é o resultado da


observação e da imitação de modelos e do reforço pelo comportamento adequado em
função do género”;

 Cognitivo-desenvolvimental de Lawrence Kohlberg: “uma vez aprendido que se é


uma rapariga ou um rapaz, a criança seleciona ativamente a informação em função
daquilo que as raparigas e os rapazes fazem, e atua de acordo com isso”;

 Esquema de género de Sandra Bem: “a criança organiza a informação em função do


que é considerado culturalmente apropriado para um rapaz e para uma rapariga e
comporta-se de acordo com isso, ajustando o seu comportamento em função do género,
porque a cultura dita que ele é um esquema/padrão de comportamento importante”.

Jogo enquanto ocupação do período pré-escolar:

O jogo é fundamental no processo de desenvolvimento, já que brincar é o


“trabalho” dos mais novos. Através do jogo, estimulam os seus sentidos e aprendem a
usar e a coordenar o seu corpo, além de descobrirem coisas acerca do mundo e de si
próprias, adquirirem competências, lidarem com emoções complexas, tornarem-se mais
proficientes no uso da linguagem e experimentarem diferentes papeis.

As crianças do período pré-escolar envolvem-se em diferentes tipos de


brincadeiras em diferentes idades e têm diferentes estilos de brincar e formas de
expressão diversas através do jogo. Jogar é bastante importante em termos de interação
social e reflete o nível de desenvolvimento mental da criança. Pode ainda ser
caracterizado por:

 Comportamento não ocupado: a criança parece não estar a brincar, mas olha para algo
de interesse momentâneo;

 Comportamento de espectador: a criança despende a maior parte do seu tempo a olhar


para a brincadeira das outras crianças, e faz-lhes até perguntas ou sugestões, mas não
entra na brincadeira;
 Jogo solitário independente: a criança brinca sozinha com brinquedos que são
diferentes daqueles que as crianças do lado brincam, e não faz qualquer esforço para se
aproximar delas;

 Jogo paralelo: a criança brinca de forma independente, mas no meio das outras
crianças, utilizando os mesmos brinquedos, mas não necessariamente da mesma
maneira, o que significa que está a brincar perto de mas não com;

 Jogo associativo: a criança brinca com as outras crianças, fala acerca da brincadeira,
empresta e pede brinquedos emprestados, segue as outras e tenta controlar quem pode
brincar no grupo, o que significa que não há uma divisão de tarefas nem uma
organização em função de um objetivo, fazendo com que todas brinquem de forma
semelhante, mas cada uma de acordo com o seu desejo;

 Jogo cooperativo ou organizado: a criança brinca integrada num grupo organizado em


função de um objetivo, como um jogo formal ou de dramatização de uma situação, no
qual há uma divisão de tarefas e as crianças assumem diferentes papeis.

Amizade (Selman):

 Estádio 0 (grupo momentâneo de brincadeira):

Dos 3 aos 7 anos, as crianças são egocêntricas e têm dificuldades em considerar


a perspetiva de outra pessoa, tendendo a pensar apenas no que pretendem daquela
relação e valorizando os amigos por atributos físicos ou materiais. Exemplo: “ele é meu
amigo porque anda na minha escola”;

 Estádio 1 (apoio unidirecional):

Dos 4 aos 9 anos, um “bom amigo” faz o que a criança quer que ele faça.
Exemplo: “ela já não é minha amiga porque não foi comigo à rua”.

Iniciativa vs. culpa:

Esta é a terceira crise proposta por Erickson, com a qual a criança se depara
entre os 3 e os 6 anos, e diz respeito à iniciativa e à culpa. A necessidade de lidar com
sentimentos conflituosos acerca do self é o aspeto central desta fase, na qual o conflito
emerge a partir do sentido crescente de finalidade, que permite à criança planear e
realizar atividades, e dos problemas crescentes da consciência que a criança pode ter
acerca desses planos.

As crianças do período pré-escolar conseguem e querem fazer mais e mais. Ao


mesmo tempo, elas estão a aprender que algumas das coisas que querem fazer são
socialmente aprovadas, enquanto que, com outras, tal não acontece. Exemplo: cantar
uma canção (aceitável) vs. roubar o relógio da mãe (não aceitável).

As crianças que aprendem a regular estes impulsos opostos desenvolvem a


virtude da finalidade, a coragem para realizar o que pretendem de forma autónoma sem
ficar indevidamente inibido pela culpa ou pelo medo da punição.

36 meses/3anos de idade:

 A criança expressa muitos medos (escuro, máscaras e animais) e manifesta uma


diversidade de emoções, nomeadamente a culpa e a raiva, mostrando-as fisicamente;

 Nomeia as suas necessidades, emoções e estados mentais, sendo capaz de pedir ajuda
aos adultos para lidar com elas, e é ainda capaz de se autorregular depois de uma zanga;

 Começa a internalizar regras e segue-as durante algum tempo, mas tem dificuldade
em transferi-las entre diferentes atividades e contextos;

 Começa a generalizar o que pode ou não ser tocado e envolve-se em situações que
estão certas e erradas, por vezes, tentando corrigir as últimas;

 Fala acerca das coisas que consegue fazer, e pode mostrar vergonha quando não
consegue fazer algo;

 Apresenta descrições concretas de si e identifica o seu género;

 Prefere tarefas desafiantes e entende oque está incorreto, manifestando compreensão


durante as brincadeiras;

 Envolve bonecas no seu jogo e atribui-lhes emoções de forma variada;

 O jogo simbólico pode ser dividido entre “bons” e “maus” e pode manifestar
separações, relações entre fratrias e outros familiares ou situações de maus-tratos;
 Envolve-se no jogo associativo e com outras crianças e adultos numa sequência de
brincadeiras, mas precisa que sejam os adultos a sugerir ações ou sequências
alternativas.

48 meses/4 anos de idade:

 Mostra ciúmes e zanga verbal e acentua-se o sentimento de culpa e de vergonha, mas


tem um comportamento social cada vez mais adequado;

 Tem medo da noite, de perder os pais e de diferenças extremas, como pessoas muito
idosas, de outras nacionalidades ou de outras etnias;

 Agressão ocasional aos pares e pode demonstrar emoções extremas, porque gosta de
ter controlo;

 Fala com os outros acerca do que sente e do que o pode fazer sentir melhor;

 Gosta de fingir que é outras pessoas no jogo, é capaz de trocar papeis, de discutir
hipóteses e gosta de usar fantasias e acessórios;

 Gosta de se envolver em jogos que envolvam sustos e gritos e de assumir o controlo


nessas situações;

 Tem dificuldade em seguir as indicações que lhe são dadas, mas internaliza e
discrimina as regras acerca do que pode ou não fazer, podendo até exibir um mau
comportamento propositadamente ou argumentar com o seu cuidador;

 Descreve as causas e as consequências das emoções e exprime quando tem medo;

 Toma iniciativa, planifica e organiza as resoluções de problemas sem assistência,


acreditando que é capaz de fazer tudo e mostrando-se orgulhosa da sua realização;

 Consegue fazer distinções entre o real e o desejado;

 Revela preferência pela cooperação com pares do mesmo género e forma vínculos
com eles, criando amizades;

 Usa muito o humor, dizendo tolices no seio das interações com os pares;

 Tenta resolver os conflitos interpessoais de forma independente.

60 meses/5 anos de idade:


 Sente-se magoado com facilidade e tem medo de se perder e de adormecer sozinho;

 É capaz de pensar sobre as emoções e usar a discussão e o discurso interno para se


acalmar e para controlar as suas emoções;

 Julga o que está certo ou errado pela punição, compreende bem as regras e observa os
comportamentos desadequados dos outros, podendo até recomendar punições;

 Sabe os comportamentos necessários para fazer amigos;

 Reconhece as suas características e consegue modificar as suas ações em diferentes


situações;

 Revela ansiedade para aprender coisas novas e apresenta expectativas muito elevadas,
para além de comparar a sua prestação com a dos outros;

 Quer agradar aos pais de forma a mantê-los por perto;

 Começa a achar graça a piadas, mesmo quando não as percebe;

 Partilha uma variedade de brincadeiras e conversas sobre diferentes temáticas;

 Consegue elaborar jogos de faz de conta que refletem sentimentos, medos, cuidados,
entre outros, e pode manifestar poder, controlo, bem-estar…

72 meses/6anos:

 Ressente-se quando é repreendido e tem medo de morte, ferimentos, sangue, fogo,


eventos climáticos (trovões, vento), insetos e figuras paranormais (bruxas, fantasmas);

 É capaz de moderar de forma adequada as suas emoções em diferentes situações e


contextos. Exemplo: não manifesta alegria da mesma forma no recreio e numa igreja;

 Pensa sobre as suas emoções e muda conscientemente as suas respostas


comportamentais, para além de estar consciente de que pode sentir mais do que uma
emoção em simultâneo;

 Deseja ser aceite e pode modificar as suas ações de forma a ser mais aceite pelos
pares;

 Desenvolve o sentimento de competência tendo como referência os outros em muitos


domínios (social, académico…);
 Tem valores acerca do que está correto e vê a justiça e as regras como princípios
alteráveis, podendo até mesmo ser bastante rígido na avaliação do comportamento dos
outros quanto ao cumprimento das regras;

 Demonstra respeito pelos outros, compreende o conceito da distribuição equitativa,


compreende e aceita ser punido quando não cumpre as regras e pode negociar ações e
consequências;

 Revela curiosidade sobre a sexualidade, nomeadamente quando brinca aos médicos;

 É capaz de identificar as causas das emoções das personagens das históricas, fazendo
um jogo simbólico muito detalhado e elaborado, cheio de regras e de ação;

 As suas brincadeiras revelam um aumento da consciência dos pensamentos e dos


sentimentos dos outros;

 Brinca com os pares do outro género em papeis discretos, participando em atividades


de grupo e até mesmo organizando-as;

 Entende que deve esperar pela sua vez para brincar;

 Recorda e conta piadas aos outros.

Desenvolvimento da moral
Cada cultura vai construindo a sua própria moralidade, e aprendemos a ser mais
morais internalizando os seus valores, muitas vezes associados à religião
(etnocentrismo). As avaliações morais interculturais tendem a avaliar as ações de uma
determinada cultura contra os valores de uma outra cultura.

Podemos analisar a moralidade segundo três perspetivas teóricas:

 Perspetiva psicanalítica: considera que a pessoa moralmente mais desenvolvida é


aquela que mais se identificou e interiorizou os valores e os padrões parentais, a que
mais resiste ao princípio do prazer e a que mais sente culpa após determinadas
transgressões;

 Teoria da aprendizagem social: considera que a pessoa moralmente mais desenvolvida


é aquela que exibe, com maior frequência e em maior quantidade, aquelas condutas que
são classificadas como morais. Exemplos: não roubar ou não mentir;
 Abordagem estrutural-construtivista: considera que a pessoa moralmente mais
desenvolvida é aquela que constrói a ideia de princípios éticos prescritivos e universais
e que regula a sua ação moral por intermédio desses princípios.

Piaget:

Segundo Piaget, a moral consiste num sistema de regras, e a moralidade procura


estudar o respeito que o indivíduo vai adquirindo por essas regras e pelo seu
cumprimento. Estabeleceu dois critérios de avaliação do desenvolvimento moral:

 Cognição moral: raciocínio ou juízo moral e consciência da obrigação imposta pela


regra;

 Ação moral: cumprimento ou não das regras.

E dois tipos de moral:

 Moral heterónoma:

Caracterizada pela obediência e respeito unilateral e baseada no medo do castigo


e na obediência estrita à autoridade, sendo imperante nas crianças até aos 8/9 anos.

Podemos dizer que está associada com o egocentrismo, na medida em que há


uma incapacidade ou dificuldade de sair do ponto de vista próprio e adotar o ponto de
vista do outro, revelando um pensamento pré-operatório.

Ainda podemos perceber que este tipo de moral revela um sentido de justiça
retributivo, pois está mais preocupado com a administração de castigos, penas e
sanções. O justo confunde-se com a autoridade e, em caso de conflito, a escolha da
criança é feita com base na obediência;

 Moral autónoma:

Caracterizada pela cooperação e pelo respeito mútuo e baseada na igualdade, na


reciprocidade e no acordo, sendo típico das crianças a partir dos 10/11 anos, fase na
qual já foram interiorizadas as normas e as convenções sociais.

Podemos dizer que está associada ao perspetivismo, na medida em que há mais


facilidade e capacidade para assumir a perspetiva do outro e obter soluções mais justas
ou ações mais morais, revelando um pensamento operatório concreto e formal.
Ainda podemos perceber que este tipo de moral revela um sentido de justiça
retributivo, pois está preocupado com a distribuição de bens, honras e recompensas. A
criança compreende que, por vezes, é necessário atender aos condicionalismos e
conferir um tratamento diferenciado para obter uma solução mais justa.

Em síntese, as crianças tendem a usar mais elementos de heteronomia em termos


da sua postura moral, mas, com a idade, estes tendem a ser transformados e dão lugar à
autonomia moral.

Pontos fortes Críticas


Primeira abordagem construtivista da Adequação/desadequação deste modelo à
moralidade (pioneiro) realidade social atual
Criminalidade cada vez mais precoce
Desenvolvimento de um método
Confronto mais frequente e mais precoce
reconhecido como excelente na
com ambientes que veiculam outros
exploração e promoção do
modelos de justiça, como a televisão e os
desenvolvimento moral das crianças
jogos

Kohlberg:

As normas e convenções sociais referidas anteriormente, típicas de uma


moralidade mais autónoma, foram distinguidas por Kohlberg:

 Normas morais: relacionadas com a justiça, com o bem-estar do outro e com a


obrigatoriedade e regulação social. Exemplo: uma criança roubar o lanche a outra
porque perdeu a carteira;

 Convenções sociais: relacionadas com uniformidades comportamentais não


obrigatórias. Exemplo: uma criança não querer usar o bibe na pré-escola.

Este autor considera que os princípios morais são construções racionais do


sujeito em integração social, sendo essencialmente um assunto da razão. Para ele, ser
moralmente bom está relacionado com um sentido de justiça, de igualdade e de
reciprocidade nas relações humanas, e não tanto com o respeito das normas sociais.

Kohlberg identificou três níveis de desenvolvimento moral, e, no interior de cada


um, distinguiu dois estádios:
 Moral pré-convencional:

Esta é típica da maioria das crianças até aos 9 anos, mas também de alguns
adolescentes e adultos. A criança sabe que existem normas sociais, coisas que se podem
ou não fazer, mas estas normas parecem externas, e só são obedecidas para evitar os
castigos ou para satisfazer desejos e interesses que podem trazer recompensas.

O seu primeiro estádio, moral do castigo, tem como orientação dominante a


obediência e o castigo, fazendo com que as crianças possam até pensar “posso fazer isto
e está tudo bem caso não seja apanhado”. Consequentemente, uma ação é vista como
tanto mais incorreta quanto maior for o dano causado.

O segundo estádio, moral do interesse, está associado com as ações serem justas
e corretas quando são um instrumento que permite satisfazer desejos, interesses e
necessidades próprias e, porventura, de um outro, partindo de um ponto de vista
individualista e concreto. Assim, a justiça e a moralidade são questões de pura troca.

 Moral convencional:

Esta é típica da maioria dos adolescentes e adultos. As normas e as expectativas


sociais já foram interiorizadas e o justo e o injusto não se confundem com o que leva à
recompensa ou ao castigo, mas definem-se com as normas estabelecidas pela sociedade.

Este nível de moralidade implica, então, cumprir os deveres e respeitar a lei e a


ordem estabelecidas, que se impõem sobre as necessidades individuais.

No terceiro estádio, moral do coração, o sujeito está preocupado com as normas


e com as convenções sociais, mas mais do ponto de vista de uma terceira pessoa, como
um bom amigo, do que de um ponto de vista social e legal. Pretende-se manter a
confiança interpessoal e a aprovação social.

Já no quarto estádio, moral da lei, a orientação dominante é o predomínio da lei,


das normas e dos códigos socialmente aceites, e os comportamentos são tidos como
bons se se conformam a um conjunto rígido de regras que o sujeito deve cumprir, de
modo a respeitar a autoridade e a manter a ordem social. É assumido um ponto de vista
de um “nós, membros de uma sociedade”.

 Moral pós-convencional:
Esta é típica dos adultos, mas apenas depois dos 20/25 anos. O valor moral
depende menos da conformidade às normas morais e sociais vigentes, e mais da sua
orientação em função de princípios éticos universais, como o direito à vida e à
liberdade.

As normas sociais devem ter subjacentes princípios éticos universais e, por


vezes, pode haver contradição, impondo-se a necessidade de hierarquizar os princípios e
as normas. Exemplo: roubar um medicamento para salvar uma pessoa.

No estádio cinco, moral do relativismo da lei, as leis são obedecidas porque


representam uma estrutura necessária de acordo social, no entanto, a relatividade das
normas é reconhecida, porque estas podem entrar em conflito com a moral. Há uma
orientação para o contrato social e para o bem comum para o maior número de pessoas.

Por fim, no último e sexto estádio, moral da razão universal, é constituído o ideal
supremo do desenvolvimento moral e não uma realidade empírica. Os ideais
interiorizados representam a crença do sujeito no valor da vida e está marcado pelo
respeito para com os outros indivíduos, estando associado a princípios universais de
justiça, de reciprocidade, de igualdade…

6 aos 10 anos
Desenvolvimento físico e saúde
Crescimento do corpo:

Comparado com o ritmo acelerado anterior, o crescimento em peso e em altura,


durante este período, é consideravelmente mais lento. Embora as mudanças diárias
possam não ser óbvias, produzem uma surpreendente diferença entre as crianças de 6 e
as de 10 anos, muitas das quais já começam a parecer adultas.

Por volta dos 9/10 anos, as meninas iniciam um surto de crescimento, estando,
de repente, mais altas e mais pesadas do que os rapazes da sua turma, e continuarão
assim até, aproximadamente, aos 12/13 anos, quando os rapazes iniciam o seu próprio
surto de crescimento.

 Dentição:
A maioria dos dentes definitivos chega no início desta fase, sendo também
quando os dentes de leite começam a cair e são substituídos por dentes permanentes.
Um aspeto positivo é que tem havido melhorias muito significativas nos cuidados
dentários, quer nas rotinas de escovagem dos dentes, quer no acompanhamento
odontológico.

 Saúde:

No período escolar, começam a surgir um conjunto de preocupações associadas


ao bem-estar e à saúde das crianças, como a obesidade, e outras perturbações
alimentares, associadas à imagem corporal.

Em Portugal, cada vez mais crianças possuem excesso de peso, ou até mesmo
obesidade, com o rácio de 1 em cada 3. Está, inclusive, entre os países da Europa com
uma maior taxa de obesidade.

Por volta dos 9/10 anos, as crianças, especialmente as raparigas, começam a


evidenciar preocupação com a sua imagem corporal. Muitas delas esforçam-se,
inclusivamente, por perder peso, e estes comportamentos podem evoluir para
perturbações alimentares como a anorexia e a bulimia. Já nos rapazes, a maior
preocupação associada à imagem corporal prende-se com as variações de crescimento.

Marcos do desenvolvimento motor:

A partir dos 6 anos, a criança é capaz de atirar a um alvo, manipular a tesoura


com movimentos complexos, rodar o lápis para usar a borracha, conduzir a bola com os
pés, andar sobre linha reta, fazer um laço na roupa e é mais autónoma a comer.

À medida que a idade avança, as aquisições desenvolvimentais nas áreas física e


motora revelam uma progressiva maior complexidade e destreza nos movimentos
motores. Na idade escolar, verificam-se as diferenças de género, pois as raparigas são
superiores na exatidão dos movimentos, e os rapazes em força, rapidez e factos menos
complexos.

A partir dos 7 anos, consegue equilibrar-se num só pé, andar numa barra com
5cm de largura, saltar ao pé-coxinho, realizar corretamente o salto ao eixo, saltar a pés
juntos 25cm de altura, lançar uma bola ao ar e apanhá-la, descer as escadas a correr e
saltar à corda três vezes seguidas, alternando os pés.
A partir dos 8 anos, consegue apertar os atacadores e fazer um laço, dar saltos
rítmicos alternados segundo um padrão, saltar bem à corda alternando os pés ou a pés
juntos, andar de bicicleta com duas rodas, manter-se num só pé durante 20 ou mais
segundos e saltar quatro degraus a pés juntos. As raparigas podem ainda lançar uma
bola a 12 metros de distância.

A partir dos 9 anos, os rapazes podem correr 5 metros por segundo, enquanto
que as raparigas só o conseguem fazer a partir dos 10 anos. Os rapazes podem ainda
lançar uma bola a 21 metros de distância e fazer salto em comprimento de 1,5 metros,
enquanto que as raparigas só saltam 1,35 metros. Ambos podem avaliar e intercetar
percursos de bolas que foram atiradas à distância.

Desenvolvimento cognitivo
Fantasia vs. realidade:

As crianças distinguem o que é real do que é imaginário.

Classificação:

A classificação passa a incluir habilidades sofisticadas como a seriação


(capacidade de ordenar itens segundo uma dimensão), a inferência transitiva
(compreensão da relação entre dois objetos, conhecendo a relação de cada um deles com
um terceiro) e a inclusão de classes (capacidade para compreender a relação entre o todo
e as partes).

Raciocínio indutivo e dedutivo:

A capacidade para classificar torna possível o pensamento lógico da criança. Os


dois tipos de raciocínio lógico, dedução e indução, partem de premissas para
conclusões. O raciocínio indutivo é um tipo de raciocínio lógico que parte de
determinadas observações sobre membros de uma classe para uma conclusão geral
sobre essa classe, enquanto que o raciocínio dedutivo, por seu turno, parte de uma
premissa geral sobre uma classe para uma conclusão sobre um determinado membro ou
membros da classe.
Causa e efeito:

Os julgamentos sobre causa e efeito aperfeiçoam-se durante o estágio operatório


concreto. Exemplo: Numa experiência, foi pedido a crianças de 5 a 12 anos que
predissessem como os pratos de uma balança se comportariam sob diversas condições.

Crianças com mais idade compreendiam a influência dos atributos físicos, como
o número de objetos de cada lado da balança, e produziam respostas mais corretas.
Também conseguiam perceber quais características não iriam influenciar o
comportamento da balança, como a cor dos objetos.

Pensamento espacial:

As crianças no estágio de operações concretas sabem compreender melhor as


relações espaciais, pois possuem uma ideia mais clara da distância entre um lugar e
outro, e de quanto tempo leva para chegar lá, além de terem mais facilidade em se
lembrar do trajeto e de pontos de referência.

Conservação:

Na terminologia de Piaget, a conservação diz respeito à capacidade para


compreender que dois objetos, que são iguais numa determinada medida, continuam a
sê-lo, apesar de haver alterações ao nível percetivo, desde que nada tenha sido
adicionado ou retirado a qualquer um dos objetos. Exemplo: uma criança de 7 anos sabe
que uma bola de plasticina, que é transformada num rolinho, tem a mesma quantidade
de plasticina de antes, e a partir dos 9 anos até percebe que têm o mesmo peso.

O desfasamento horizontal é uma expressão utilizada por Piaget para designar o


facto de que problemas logicamente isomorfos, mas aplicados a conteúdos diferentes,
não são resolvidos no mesmo momento do desenvolvimento intelectual.

Piaget fala em desfasamento horizontal para explicar a inconsistência no


desenvolvimento de diferentes tipos de conservação, e diz respeito à incapacidade da
criança para transferir a aprendizagem acerca de um tipo de conservação para outros
tipos. Consequentemente, a criança realiza com mestria diferentes tipos de conservação
em diferentes idades.

Números e matemática:

As crianças intuitivamente criam estratégias para somar, contanto com os dedos


ou utilizando outros objetos, e, a partir dos 6/7 anos, muitas crianças já sabem fazer
contas mentalmente.

No entanto, pode levar mais 2/3 anos até que consigam realizar uma operação de
subtração, mas, a partir dos 9 anos, a maioria das crianças sabe contar partindo do
número menor para cima ou do número maior para baixo para obter a resposta.

As crianças também se tornam mais aptas a resolver problemas em situações


específicas. Exemplo: “O Pedro foi ao supermercado com 5€, e gastou 2€ em gomas.
Com quanto dinheiro ficou?”

Memória, atenção e processamento da informação:

Durante a idade escolar, as crianças fazem progressos constantes nas suas


competências de processamento e de retenção da informação, e compreendem mais
sobre como funciona a memória, o que lhes permite utilizar estratégias para as ajudar a
recordar.

Além disso, à medida que o seu conhecimento se expande, tornam-se mais


conscientes dos tipos de informação aos quais é importante atentar e os quais devem
guardar na memória.
O tempo de reação também melhora, e a velocidade de processamento para
tarefas como correspondência de figuras e somas mentais aumenta com rapidez. Isto
permite um aumento da quantidade de informação que uma criança pode manter na
memória operatória, possibilitando melhor memorização e pensamento mais complexo.

As estratégias para auxiliar a memória são denominadas estratégias


mnemónicas. A estratégia mnemónica mais comum entre crianças e adultos é o uso de
recursos mnemónicos externos, mas outras estratégias comuns incluem a repetição, a
organização e a elaboração. Exemplos: repetir um número de telemóvel ou associar
informações a uma história ou a uma imagem.

As crianças em idade escolar são capazes de se concentrar por mais tempo do


que as crianças mais jovens, e sabem focalizar a informação de que necessitam e
desejam, desconsiderando as que são irrelevantes. Esta capacidade pode ajudar a
explicar porque é que as crianças mais velhas cometem menos erros de recordação do
que as mais jovens, visto que podem selecionar o que querem lembrar e o que querem
esquecer.

Desenvolvimento da linguagem
A entrada na escola marca, indubitavelmente, uma nova etapa nas competências
desenvolvimentais associadas à linguagem. Nesta fase, as novas aquisições curriculares
e o desempenho da criança revelam-se fundamentais, com consequência, não só ao nível
das suas competências específicas de linguagem, mas com impacto direto e indireto em
todas as áreas do desenvolvimento.

Oralidade:

Numa primeira fase, mais ou menos no 1º ano, a criança aprende a:

 Respeitar o princípio de cortesia e esperar pela sua vez de falar (pragmática);

 Escutar discursos breves para aprender e construir conhecimentos;

 Cumprir instruções;

 Assinar palavras desconhecidas;

 Referir o essencial de um pequeno texto ouvido;


 Produzir um discurso oral de forma audível e articulada;

 Usar vocabulário adequado ao tema e à situação e com diferentes finalidades;

 Construir frases com graus de complexidade crescente;

 Formular perguntas e pedidos, bem como responder adequadamente a perguntas;

 Partilhar ideias e sentimentos;

 Desempenhar papeis específicos em atividades de expressão orientada, como jogos e


dramatizações, respeitando o tema e a sua vez de intervir.

Já a partir do 4º ano de escolaridade, a criança consegue:

 Distinguir informação essencial de acessória;

 Diferenciar facto de opinião;

 Identificar ideias-chave de um texto ouvido e diferentes graus de formalidade;

 Utilizar técnicas para registar e reter a informação;

 Usar as palavras de forma audível, com boa articulação, entonação e ritmo adequados
e olhando para o interlocutor;

 Mobilizar vocabulário cada vez mais variado e preciso e formar frases mais
complexas;

 Fazer perguntas sobre a apresentação de um trabalho dos colegas, bem como


apresentar ela mesma um trabalho previamente planificado;

 Fazer um pequeno discurso com intenção persuasiva;

 Assumir diferentes papeis e interpretar diferentes pontos de vista;

 Justificar opiniões, atitudes e opções;

 Resumir ideias ou acrescentar informação pertinente.

Leitura e escrita:

Alguns exemplos de metas curriculares para esta idade são:

 Desenvolver a consciência fonológica e operar com os fonemas;


 Conhecer o alfabeto e apropriar-se de novos vocábulos;

 Ler em voz alta palavras, pseudopalavras e textos diversos;

 Organizar a informação de um texto lido e relacioná-lo com conhecimentos


anteriores;

 Desenvolver o conhecimento da ortografia;

 Transcrever, escrever, rever e planificar textos corretamente.

Gramática:

É esperado que as crianças consigam:

 Identificar nomes, determinante artigo definido e indefinido, verbos e adjetivos;

 Verificar que há palavras que têm significado semelhante e outras que têm significado
oposto, a partir de atividades de oralidade e de leitura;

 Classificar palavras, distinguir sílabas tónicas de átonas e classificá-las;

 Identificar nomes próprios e comuns, três conjugações verbais, pronomes pessoais e


determinantes possessivos e demonstrativos;

 Identificar frases declarativas, interrogativas e exclamativas, distinguir frases


negativas de afirmativas, identificar marcas de discurso direto e expandir e reduzir
frases;

 Formar o plural e o género dos nomes e dos adjetivos e identificar os seus graus;

 Integrar as palavras nas classes a que pertencem;

 Identificar sujeitos e predicados e frases imperativas;

 Distinguir discurso direto de discurso indireto.

Desenvolvimento psicossocial
Desenvolvimento do self:

Mantém-se a distinção entre autoconceito e autodefinição. Por volta dos 7/8


anos, as crianças têm capacidade cognitiva para formar sistemas representacionais, que
resultam numa autodefinição mais ampla, abrangente e realista, que incorpora diferentes
aspetos da sua identidade.

Também se verifica a influência de novos contextos e sistemas sociais para o


desenvolvimento do self. Alguns desses fatores são a monoparentalidade, os divórcios e
as separações dos pais, a relação com os avós, a relação com os pares, as rotinas, o
stress, a infância “apressada” …

Autoestima:

Um fator muito significativo da definição de autoestima é o suporte social,


primeiro dos pais e dos colegas, e depois dos amigos e dos professores. Isto significa
que, mesmo que a criança se sinta bonita e inteligente, a sua autoestima será afetada se
ela não se sentir valorizada pelas pessoas importantes da sua vida. Por outro lado, o
suporte ou o apoio emocional geralmente tem dificuldade em desmanchar a
autoavaliação negativa.

Para Erickson, um importante determinante da autoestima é a ideia que a criança


tem da sua capacidade para o trabalho produtivo, ou seja, a ideia de si mesmo como
sendo capaz de dominar habilidades e de concluir tarefas socioculturalmente esperadas
ou valorizadas em determinada sociedade. Exemplo: contar e escrever.

Emoções:

A vida emocional na escola é particularmente complexa. Aos 7/8 anos, as


crianças costumam ter internalizado o orgulho e a vergonha, associados à implicação
das suas ações e ao tipo de socialização que as crianças receberam. A entrada na escola
é muito importante para o desenvolvimento destas sensações de vergonha, culpa,
orgulho… pois elas surgem, naturalmente, em contextos sociais.

As crianças desta idade também se tornam capazes de verbalizar emoções


conflituantes, reconhecer as emoções nos outros e consciencializar-se das suas próprias
emoções. Os pais adquirem importância neste caso, na medida em que permitir uma
expressão genuína dos sentimentos dos filhos ajuda-os a controlar melhor a sua
expressão emocional em situações sociais.

Outro aspeto do crescimento emocional é o controlo de emoções negativas. As


crianças aprendem o que as enfurece, amedronta ou entristece e como as pessoas
reagem à demonstração dessas emoções, aprendendo a adaptar o seu comportamento de
acordo com a situação.

As crianças cujos pais encorajam a expressar os sentimentos de maneira


construtiva e as ajudam a concentrar-se na raiz do problema tendem a enfrentar melhor
as situações e a possuir melhores competências sociais do que as crianças cujos pais
desvalorizam os seus sentimentos e minimizam a seriedade das situações.

É também nesta fase que aprendem a diferença entre ter uma emoção e expressá-
la. Alunos do pré-escolar acreditam que os pais podem diminuir a sua tristeza dizendo-
lhes para pararem de chorar, ou diminuir o seu medo dizendo que não há nada a temer.
No entanto, crianças de 7/8 anos sabem que uma emoção “ocultada” continua a existir.

Algumas crianças continuam a esconder as emoções, sendo o motivo mais


comum a autoproteção – elas querem evitar o gozo e a rejeição. Outro motivo é não
perturbar as outras pessoas, principalmente quando se trata de crianças de 10 anos que
são mais conscientes das “regras” sociais relativas à expressão emocional.

Também se verificam diferenças de género, e as meninas são mais propensas a


demonstrar emoções de tristeza e de sofrimento do que os meninos. Além disso,
também se mostram mais dispostas a esperar apoio emocional.

Por fim, as crianças em idade escolar tornam-se mais empáticas e mais


inclinadas a um comportamento pró-social. Na realidade, o comportamento pró-social é
um sinal de adaptação positiva. Crianças pró-sociais tendem a agir adequadamente em
situações sociais, a ser livres de emoções negativas e a enfrentar os problemas de
maneira construtiva.

Amizade:

As crianças podem passar boa parte do seu tempo livre em grupos, mas é
somente como indivíduos que elas formam amizades. A popularidade é a opinião do
grupo de amigos sobre uma criança, mas amizade é uma via de dois sentidos. As
amizades mais sólidas envolvem igual comprometimento e cooperação mútua.

A amizade entre crianças em idade escolar é mais profunda e estável, visto que
as crianças não podem ser ou ter amigos verdadeiros antes de adquirirem maturidade
cognitiva para considerar as opiniões e as necessidades das outras pessoas, bem como as
suas.
Segundo Selman, a maioria das crianças em idade escolar está na segunda etapa
(amizade recíproca baseada em interesse próprio, cooperação leal e bidirecional), mas,
crianças com mais idade, a partir dos 9 anos, podem encontrar-se na terceira etapa
(relacionamentos íntimos mutuamente compartilhados).

Conseguem ainda distinguir “melhores amigos”, “bons amigos” e “amigos


ocasionais” com base na intimidade que possuem com esses amigos e em quanto tempo
passam efetivamente juntos.

As crianças nesta idade, geralmente, possuem de 3 a 5 “melhores amigos” com


os quais passam a maior parte do tempo livre, mas costumam brincar apenas com um ou
dois amigos por vez. Os amigos conhecem-se bem, confiam um no outro, têm um
sentimento de comprometimento um para com o outro e tratam-se como semelhantes,
podendo até mesmo ajudar-se mutuamente a passar por transições desafiantes.
Exemplo: mudar de escola ou adaptar-se ao divórcio dos pais.

Meninas em idade escolar preocupam-se menos em ter muitas amizades, e mais


em ter algumas amizades íntimas com as quais possam contar. Em contrapartida, os
meninos têm mais amizades, mas elas tendem a ser menos íntimas e carinhosas.

A amizade, no geral, parece ajudar as crianças a sentirem-se bem consigo


mesmas, embora também seja provável que as crianças que se sentem bem a seu próprio
respeito tenham mais facilidade para fazer amigos. Além disso, os laços de amizade
necessitam de ser fortes o suficiente para que se possam resolver os inevitáveis
momentos de conflito.

Indústria vs. inferioridade:

A quarta crise proposta por Erickson, com a qual a criança se depara entre os 6 e
os 13 anos, diz respeito à indústria, trabalho vs. inferioridade. Resolvidos de forma
satisfatória os desafios anteriores, a confiança, a autonomia e a iniciativa desenvolvem-
se ainda mais nesta fase, o que permite às crianças estarem atentas e serem diligentes,
perseverantes, esforçadas e responsáveis.

O mundo da criança estende-se agora, também, à escola, e ela vai reconhecendo


progressivamente a sua competência através do elogio, da recompensa e da realização.
Vale lembrar que, quanto mais socialmente valorizado é o desempenho, nomeadamente
o escolar, mais competente a criança se vai sentir.
Pelo contrário, se a criança não conseguir essa realização, as ajudas não forem
adequadas e/ou as exigências forem desajustadas, naturalmente, a criança pode criar um
sentimento de inferioridade acerca de si própria. Tal pode levá-la a regredir ou a
assumir comportamentos de inércia, de modo a não se confrontar com situações que
possam reforçar um sentimento de incompetência ou de inferioridade.

Moralidade: igual à faixa etária anterior.

Adolescência
Tradicionalmente, a adolescência pode ser definida como uma etapa da vida que
se estende, de grosso modo, desde os 12/13 anos (puberdade) até, aproximadamente, ao
final da segunda década de vida, constituindo uma etapa de transição entre a infância e a
idade adulta. No entanto, há dificuldade em dizer com precisão quando termina.

É também um período do ciclo vital que começa a maturação biológica, durante


o qual o indivíduo deve realizar certas tarefas desenvolvimentais, e que acaba quando
individuo consegue um estado de autossuficiência, tal como a sociedade o exige.

Resumidamente, podemos dizer que adolescentes são aqueles que se encontram


ainda na escola ou em qualquer outro contexto de formação. A escolaridade obrigatória
é muito importante enquanto mecanismo de proteção contra o trabalho infantil.

Estão ainda dependentes dos pais ou a viver com eles. Isto significa que estão a
realizar a transição de um sistema de vinculação centrado na família, a um sistema de
vinculação centrado no grupo de pares e, depois, a um sistema centrado numa pessoa
com relação de intimidade.

São também pessoas que se sentem membros de uma cultura de idade,


caracterizada por ter as suas próprias modas, hábitos, estilo de vida, valores e
linguagem, e têm preocupações e inquietudes que já não são da infância, mas que
também ainda não coincidem com as dos adultos.

Existem algumas componentes que devem ser tidas em conta:

 Biológica: puberdade;

 Psicológica: características psicológicas, tarefas desenvolvimentais e fases;


 Sociológica: especificidades culturais nas exigências colocadas pela sociedade e
adolescência como “invenção social”. Exemplo: microculturas como os ciganos.

Adolescência na cultura ocidental:

As alterações na organização da sociedade, como a Revolução Industrial,


marcaram o alargamento da escolaridade obrigatória, o que causou um atraso na
incorporação dos adolescentes na cultura adulta e o consequente alargamento da
adolescência.

Em culturas com outras características, a passagem à idade adulta é marcada por


rituais de iniciação mais marcados, traduzindo uma descontinuidade do
desenvolvimento. Exemplo: em algumas tribos, crianças são obrigadas a sobreviver
sozinhas durante uma semana, e, ao conseguirem, são vistas como adultas. Mas vale
lembrar que as culturas ocidentais também têm alguns rituais de iniciação. Exemplo:
primeiro cigarro, primeira relação sexual ou primeira saída à noite.

Adolescência no século XXI:

Segundo Arnett, a adolescência é cada vez mais definida pelas competências


exibidas em diferentes áreas de existência, e cada vez menos em termos de imaturidade
e preparação para a vida adulta.

Por outro lado, algumas das tarefas desenvolvimentais tradicionalmente


atribuídas à adolescência, como a construção da identidade, são cada vez mais
resolvidas em idades posteriores, dando origem à definição de um novo estádio de
desenvolvimento: a adultez emergente.

Puberdade
A adolescência e a puberdade não são coincidentes, visto que a adolescência se
prolonga durante mais alguns anos. A puberdade em si refere-se ao conjunto de
características que, no decurso da segunda década de vida, transformam o corpo infantil
no corpo adulto, com capacidade de reprodução.

Esta é uma fase que tem fortes implicações a nível da aparência física e da
imagem corporal, e do funcionamento psicológico em geral, por ser marcada por
mudanças psicológicas e físicas. É importante ter em conta que parte da puberdade é
também como lidamos com essas mudanças, com a comparação social e com a pressão
grupal.

Em resumo, as mudanças pubertárias envolvem:

 Mecanismos endócrinos do desenvolvimento pubertário;

 Alterações morfológicas associadas à puberdade;

 Maturação da função reprodutora.

E as implicações psicológicas envolvem:

 Ajustamento às mudanças corporais;

 Sentimentos desencadeados por essas mudanças;

 Significado atribuído às mudanças;

 Confronto com as respostas dos outros às mudanças pessoais.

A puberdade é determinada por fatores genéticos, nutricionais, hormonais e


contextuais, e nessa fase é possível detetar as diferenças associadas ao género.

Características sexuais secundárias:

Nas raparigas, o crescimento dos seios é mais significativo do que a pilosidade


púbica, por estarem mais visíveis aos outros e por serem um objeto de troça por parte
dos rapazes. Isto faz com que aumentem os níveis de ansiedade e de depressão, também
associado ao facto de que o peito está muito ligado à amamentação e à feminilidade.

Quando falamos em rapazes, infelizmente, não há muita evidência científica de


como estes lidam com as mudanças pubertárias associadas às características sexuais
secundárias. No entanto, existem indicadores de alguma ansiedade.

Menarca e espermarca:

Na rapariga, a menarca (primeira menstruação) desperta reações muito


ambivalentes, mas sabemos que, inicialmente, há muito secretismo. Apenas após 6
meses, há uma maior partilha de informações e de experiências com as amigas, mas
muito pouco à-vontade para abordar o assunto com o pai.
Nos rapazes, novamente, há pouca evidência científica acerca das reações à
primeira espermarca (primeira ejaculação), mas as reações tendem a ser mais positivas.
Também existe um grande tabu em volta do assunto por estar muito associado à
masturbação, embora façam piadas.

Também ocorre o despoletar dos afetos negativos muito característicos da


adolescência: os rapazes tornam-se mais impulsivos por terem mais testosterona, e as
raparigas, igualmente, também se tornam mais impulsivas, mas possuem mecanismos
que regulam essa impulsividade.

Crescimento corporal e forma do corpo:

Nas raparigas, a experiência de aumento de peso e gordura é levada com muita


negatividade, o que causa grande preocupação com a aparência física, visto que a
imagem de magreza é muito veiculada pelos media.

Nos rapazes, as mudanças normativas de peso e de estatura são encaradas


positivamente, sendo que os rapazes em pós-puberdade até reportam mais satisfação
com a imagem corporal do que na pré-puberdade. Também sabemos que, cada vez mais,
os adolescentes rapazes cuidam da sua imagem. Exemplo: depilação.

Timing da puberdade:

A puberdade pode ocorrer a tempo ou de forma precoce ou tardia. Quer a


precocidade, quer o atraso, são fatores de risco para o ajustamento psicológico, dada a
dessincronização com os pares. Nas raparigas, a puberdade tardia parece ser de menor
risco, assim como a puberdade precoce nos rapazes.

Quando há uma dessincronização com os pares, entram os desafios. Nos rapazes,


os possíveis sinais psicopatológicas são menos evidentes, o consumo de tabaco e de
álcool acentua-se, e o rendimento escolar é mais baixo.

Já as raparigas são mais propensas a sinais depressivos, perturbações


comportamentais, tentativas de suicídio, abuso de substâncias, perturbações alimentares
e início precoce da atividade sexual. Assim como os rapazes, baixo rendimento escolar.

Em termos gerais, esta dessincronização pode resultar em falta de referências


junto dos pares. Além disso, algumas variáveis de contexto podem ser causadoras desta
situação, como as transições de escola ou as características da própria escola. Exemplo:
escolas mistas vs. segregadas por sexo.

Tarefas desenvolvimentais
 Aceitação do próprio corpo;

 Consolidação do papel associado ao género;

 Estabelecimento de relações mais maduras e diferenciadas com os pares de ambos os


sexos (acentuação dos afetos por oposição à sexualidade, nos mais velhos);

 Independência emocional dos pais (separação da relação de afeição e da relação de


dependência) e aquisição do sentimento de controlo sobre a própria vida;

 Desenvolvimento de novas competências cognitivas;

 Construção da identidade psicológica;

 Preparação para a carreira profissional e para o ingresso na vida ativa (independência


económica e realização profissional);

 Preparação para a vida conjugal, vida sexualmente ativa e vida afetiva estável;

 Preparação para a formação de família;

 Desenvolvimento de um sistema de valores éticos e morais para a vida;

 Ser capaz de participar na sociedade de forma cívica (votar).

Tensão e conflito
Conflitos com os pais:

A adolescência é um período da vida particularmente difícil para o adolescente e


para as pessoas que com ele se relacionam, sendo a tensão e o conflito fenómenos
universais e inevitáveis na adolescência.

Os conflitos com os pais aumentam de frequência na primeira fase da


adolescência, mas de intensidade na fase intermédia, e acontecem mais frequentemente
quando existem outros problemas, como a depressão e o abuso de substâncias.
Apesar de estes conflitos se reportarem a aspetos menos essenciais, como a
aparência física e saídas, têm uma função importante: a de promover o desenvolvimento
da individuação e a autonomia dentro de um contexto relacional afetivo.

Oscilações de humor:

Os adolescentes relatam uma maior oscilação do humor, quando comparados


com pré-adolescentes e adultos. O humor negativo aumenta na transição da infância
para a adolescência, o que resulta numa maior sensação e expressão de embaraço,
solidão, nervosismo e rejeição por parte dos outros.

Isto acontece por mudanças biológicas, como a puberdade, mudanças cognitivas,


novas exigências desenvolvimentais por parte dos pais e da sociedade e, por fim, por
fatores idiossincráticos, como as dificuldades de relação com os pares, o baixo
rendimento escolar…

Comportamentos de risco:

Os comportamentos de risco podem ser entendidos por abuso de substâncias,


condução perigosa e comportamento sexual de risco, e, para além de característicos da
adolescência, também podem surgir devido a diferenças individuais, como as próprias
características de personalidade e problemas de comportamento na infância.

David Elkind estabeleceu quatro processos cognitivos que parecem estar na


origem deste tipo de comportamentos:

 Audiência imaginária: excessiva autoconsciência que leva o adolescente a pensar que


as outras pessoas estão tão interessadas nas suas preocupações e comportamentos
quanto ele próprio;

 Fábula pessoal: crença de que as suas experiências são únicas e não se regem pelas
mesmas regras que governam a vida de outras pessoas, de modo a que ninguém
experimentou as mesmas sensações;

 Pseudo-estupidez: capacidade para pensar acerca de múltiplas possibilidades, procurar


motivos complexos para o comportamento e intelectualizar situações triviais;

 Hipocrisia aparente: o adolescente considera que não tem de respeitar as mesmas


regras que considera absolutamente essenciais para os outros.
Desenvolvimento cognitivo
Perceção:

Com o desenvolvimento, a perceção torna-se mais flexível e rápida.

Atenção seletiva:

Na adolescência, assiste-se a uma melhoria considerável no controlo e na seleção


da atenção, nomeadamente comparando com a idade escolar. A investigação salienta
que os adolescentes se distinguem das crianças por uma maior capacidade de
aprendizagem da tarefa central vs. da tarefa acidental, secundária.

Sujeitos com alta atenção seletiva deverão recordar melhor coleções de animais
(nos testes) do que a de ferramentas, sendo este o padrão típico de resultados nos
adolescentes, por oposição às crianças que, pela baixa atenção seletiva, obtêm o mesmo
nível de sucesso em ambos.

Memória:

Assiste-se a um progresso na memória a curto prazo, na memória de longo


prazo, na memória facial e nas estratégias de memorização. A memória a curto prazo
refere-se à memória que só é requerida por um período curto de tempo, necessário para
a resolução de uma tarefa.

A memória a longo prazo refere-se a representações de pessoas que encontramos


no passado, a acontecimentos que experimentamos e a aprendizagens escolares, por
exemplo. Embora seja relativamente estável ao longo do desenvolvimento, a
investigação salienta algumas diferenças entre a infância e a adolescência,
nomeadamente a nível da rapidez de processamento.

A memória facial prende-se com o reconhecimento facial, que progridem


notoriamente na adolescência. Enquanto que as crianças recorrem a características
individuais, os adolescentes e os adultos recorrem a elementos de configuração.

Por fim, as estratégias de memorização dependem da idade:

 Idade escolar: repetição;

 Adolescência: recurso espontâneo à elaboração e a estratégias mais sofisticadas.


Raciocínio:

Há um progresso na capacidade de proceder a raciocínios dedutivos entre a


infância e a adolescência.

Desenvolvimento sociocognitivo
O desenvolvimento sociocognitivo refere-se às mudanças ocorridas a nível do
processo de pensamento sobre a realidade social, incluindo o desenvolvimento moral, o
desenvolvimento interpessoal e o desenvolvimento do self. O nível de desenvolvimento
sociocognitivo é determinado pelo nível de desenvolvimento cognitivo.

Desenvolvimento moral
Nesta faixa etária, a moral passa de ser entre o bem e o mal, para ser relacionada
com a justiça e os princípios universais, como a liberdade, a igualdade, a fraternidade, a
saúde, a educação, a expressão e a possibilidade de fazer escolhas.

Para Lawrence Kohlberg, a pessoa mais desenvolvida do ponto de vista moral é


a que constrói a ideia de princípios éticos prescritivos e universais, por um lado, e, por
outro, regula o seu comportamento moral por intermedio desses princípios.

Os três estádios (pré-convencional, convencional e pós-convencional) mantêm-


se, mas podem ser resumidos da seguinte forma. Porque não se deve roubar?

 Pré-convencional: alguém pode ver e chamar a polícia;

 Convencional: é uma questão de lei, visto que há leis que protegem as pessoas e leis
que protegem as propriedades;

 Pós-convencional: é uma violação dos direitos humanos, neste caso, do direito à


propriedade.

Nesta fase da adolescência, há princípios que se sobrepõem à lei, pelo que não
importa apenas cumpri-la. Exemplo: roubar para comer é mais moral do que não roubar,
porque o direito à vida sobrepõe-se ao direito à propriedade.

Desenvolvimento social
Grupo de pares:
Assistimos a uma mudança na natureza das relações que o adolescente
estabelece com os iguais, passando de um pequeno grupo de amigos, para um grupo
maior, e, em seguida, para uma relação de intimidade com uma pessoa.

Os grupos de pares agem como facilitadores do processo de ajuste às mudanças


típicas da adolescência e da resposta à questão “quem sou eu” através da resposta à
questão “a quem pertenço”. No entanto, a adesão a um grupo pode ou não ser simples e
linear, devido à não aceitação por parte do grupo ou à não satisfação de necessidades no
seio do grupo.

Tipos de grupos na adolescência:

 Grupos de 2 a 9 elementos: mais íntimos e coesos, com uma hierarquia bem


estabelecida, proporcionam experiências de intimidade e proximidade e são mais
exclusivos;

 Grande grupo: constituído pela associação de 2 ou 3 grupos, podendo integrar


algumas dezenas de membros, o que facilita a participação e a organização de atividades
sociais.

Aceitação social e popularidade:

A aceitação social relaciona-se com a atração física e com as competências


cognitivas e sociais. Já a popularidade manifesta-se no grau em que alguém é valorizado
e ativamente desejado.

A popularidade é uma característica que se tem, mas que é atribuída pelos


outros, sendo contextual. As características mais associadas à pessoa popular são a
jovialidade, a simpatia, o entusiasmo, o aspeto físico, a capacidade desportiva…

Em suma, os grupos de pares têm influências ao nível da informação, já que


servem como fonte de conhecimento sobre os padrões de comportamento, as atitudes e
os valores, e têm influência normativa.

Conformismo:

O conformismo prende-se com a adoção do mesmo comportamento ou atitude


dos outros, sendo os adolescentes especialmente vulneráveis ao mesmo. Exemplo: não
gostar de sair à noite, mas fazê-lo porque todos os amigos o fazem.
Desenvolvimento da identidade
A grande tarefa da adolescência é construir a nossa identidade em confronto com
o outro ou com o grupo, respondendo às questões “como sou como pessoa”, “quem sou
realmente”, “como eu era no passado e como serei no futuro”, entre outras.

Identidade vs. difusão, Erikson:

A identidade consiste em saber quem se é e como se enquadra nos contextos


sociais. Implica considerar tudo o que se sabe acerca da vida e acerca de si próprio, e
construir uma imagem de si unificada e com significado.

A construção da identidade requer exploração pessoal e experimentação de


papeis, para isso, é necessário que o adolescente disponha de bons modelos de papel
adulto. Se não for claro o que os outros esperam do adolescente, haverá uma confusão
de papeis e uma consequente difusão de identidade.

Isto pode resultar numa crise de identidade relacionada com as características


pessoais, a perspetiva acerca de si próprio, a preocupação de como os outros o vêm e as
dúvidas sobre o significado e o sentido da vida.

Esta crise pode ser resolvida de três formas:

 Positiva: construção da identidade baseada em lealdade e capacidade para viver de


acordo com os padrões sociais, apesar das suas imperfeições e inconsistências;

 Negativa: difusão da identidade, baseada no fanatismo e no repúdio da pertença a uma


sociedade de adultos e da necessidade de possuir uma identidade;

 Mista: orientação em certas áreas da existência, mas não em todas.

Estudos da identidade por James Marcia:

Marcia considera que os adolescentes passam por duas dimensões:

 Capacidade de exploração: questionar ativo, tendo em vista a tomada de decisão e o


atingir de objetivos, e análise de várias alternativas possíveis para tomar uma decisão;

 Capacidade de investimento: realização de escolhas firmes e realização das ações para


as implementar, o que implica um mecanismo de integração do passado com o presente
e com o futuro.
Desenvolvimento da linguagem
A imagem que construímos acerca de nós mesmos, a forma como os outros nos
vêm, os nossos próprios pensamentos, a memória dos outros sobre nós… Tudo isso é
expresso pela linguagem. Quando deixam de falar de nós, deixamos de existir.

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