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O TERRITÓRIO: SOBRE ESPAÇO E PODER,

AU TO N O M IA E DESENVOLVIM ENTO

Marcelo José Lopes de Souza


P rofessor do Departamento de Geografia, UFRJ

IN T R O D U Ç Ã O : U M A P R IM E IR A A P R O X IM A Ç Ã O
C O N C E PTU A L

“A conform ação do terreno é de gran­


de importância nas batalhas. Assim sendo,
apreciar a situação do inimigo, calcular as
distâncias e o grau de dificuldades do terre­
no, quanto à form a de se poder controlar a
vitória, são virtudes do general de categoria.
Quem com bate com inteiro conhecim ento
destes factores vence, de certeza; quem o
não faz é, certamente, derrotado.”

Sun Tzu, A arte da guerra


78 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

A epígrafe acima, extraída do décim o capítulo do livro A arte


da guerra, escrito cin co séculos antes de Cristo pelo chinês Sun
Tzu, nos m ostra que o reconhecim ento, não apenas intuitivo, mas
até m esm o teórico, da importância capital do espaço enquanto
instrumento de manutenção, conquista e exercício de poder, é
algo muitíssimo antigo. A guerra, enquanto “prolongam ento da
política p or outros m eios”, para usar a célebre fórm ula de outro
estudioso que reconheceu plenamente a im portância essencial do
espaço para a atividade guerreira, o general prussiano Cari von
Clausewitz,' constitui, ela própria, enquanto uma ferramenta da
política, todavia apenas uma situação-limite; o seu valor instru­
mental para a guerra, para esse “ato de força para im por a nossa
vontade ao adversário” ( c l a u s e w it z , 1983:9), não esgota o signifi­
cado político do espaço. Na verdade, consoante o pensam ento de
Hannah Arendt, parece mesmo que a guerra, ou a violência em
geral, é inclusive várias vezes um sintom a de perda de poder. “(...)
toda diminuição de poder é um convite à violência — quando
p ou co porque aqueles que detêm o poder e o sentem escorregar
por entre as mãos, sejam eles o governo ou os governados, encon­
traram sempre dificuldade em resistir à tentação de substituí-lo
pela violência" (a r e n d t, 1985:49).
O território, objeto deste ensaio, é fundamentalmente um
espaço definido e delim itado p o r e a p a rtir de relações de poder.
A questão primordial, aqui, não é, na realidade, quais são as ca­
racterística s geoecológicas e os recu rsos naturais de um a certa
área, o que se prod u z ou quem prod u z em um dado espaço, ou
ainda quais as ligações afetivas e de identidade en tre um grupo
social e seu espaço. Estes aspectos podem ser de crucial im por­
tância para a com preensão da gênese de um território ou do inte­
resse p or tom á-lo ou mantê-lo, com o exem plificam as palavras de 1

1 “( . .. ) a guerra n ão é sim plesm ente um ato p o lítico , mas sim um verdadeiro


instrumento político, uma continuação da atividade política, uma realização da
mesma p o r outros m eios” (CLAUSEWITZ, 1983:24).
O TERRITÓRIO 79

Sun Tzu a propósito da conform ação do terreno, mas o verdadei­


ro L eitm otiv é o seguinte: quem dom ina ou in flu en cia e com o
dom ina ou in flu en cia esse espaço? Este L eitm otiv traz embutida,
ao m enos de um pon to de vista não interessado em escam otear
con flitos e contradições sociais, a seguinte questão inseparável,
uma vez que o território é essencialm ente um instrum ento de
e x e rcício de poder: quem d om in a ou in flu en cia quem n esse
espaço, e com o? Detenhamo-nos, assim, um p ou co no con ceito de
pod er em si, antes de voltarm os a discorrer sobre o território.
Tanto na linguagem cotidiana quanto m esm o nas teorias polí­
ticas é possível constatar superposições entre as n oções ou os con ­
ceitos de poder, violência, dom inação, autoridade e com petência
(MALUSCHKE, 1991:354). Tais su p erp osições — e con fu sões —
foram profundamente lamentadas p or Hannah ARENDT (1985:23).
Segundo Arendt, há,

“p or trás da confusão aparente e a cqja luz todas as dis­


tin ções seriam, na m elhor das hipóteses, de pequena
importância, a con vicção de que a questão política mais
cru cial é, e sem pre fo i, a questão de: Quem governa
quem? Poder, força, autoridade, violên cia— nada mais
são do que palavras a indicar os m eios p elos quais o
hom em governa o homem; são elas consideradas sinô­
nim os p or terem a mesma função. É apenas depois que
se cessa de reduzir as questões públicas ao problem a da
dom inação, que as inform ações originais na esfera dos
problem as humanos deverão aparecer, ou antes reapa­
recer, em sua genuína diversidade” (ARENDT, 1985:23-4).

Sobre o poder, assim sintetizou Hannah Arendt o seu conceito:


80 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

“O “poder’ corresponde à habilidade humana de


não apenas agir, mas de agir em uníssono, em comum
acordo. O poder jamais é propriedade de um indivíduo;
pertence ele a um grupo e existe apenas enquanto o
grupo se mantiver unido. Quando dizem os que alguém
está ‘no poder’ estam os na realidade nos referindo ao
fato de encontrar-se esta pessoa investida de poder,
p or um certo número de pessoas, para atuar em seu
nome. No momento em que o grupo, de onde originara-
se o poder (potestas in populo, sem um p ovo ou um
grupo não há poder), desaparece, ‘o seu poder’ também
desaparece” (ARENDT, 1985:24).

A conceituação acima resumida é, com o se verá mais adiante


na seção 2, de um interesse especial para o presente artigo, por
ampliar a idéia de poder e simultaneamente libertá-la da confusão
com a violência e da restrição à dominação, permitindo assim con­
jugar as idéias de p o d er— e, por extensão, território — e autono­
m ia. No que diz respeito à violência, ela se distinguiria, segundo
Hannah Arendt, p or seu “caráter instrumental”. “D o ponto de vista
fenom enológico”, esclarece a autora (ARENDT, 1985:25), a violên­
cia estaria próxim a do vigor (que designa uma qualidade inerente
a uma pessoa ou um objeto e que independe de sua m anifestação
em relação a outras pessoas ou objetos), “uma vez que os instru­
m entos da violência, com o todos os demais, são con cebidos e usa­
dos para o propósito da m ultiplicação do vigor natural até que, no
último estágio de desenvolvimento, possam substituí-lo”. Para
Arendt, o poder não carece de justificativas, já que seria inerente à
existência de qualquer com unidade política; no entanto, demanda
legitim idade. Já “o dom ínio através da violência pura vem à baila
quando o poder está em vias de ser perdido” (ARENDT, 1985:29).
Por isso é que Hannah Arendt é categórica ao afirmar:
O TERRITÓRIO 81

“(...) politicam ente falando, é insuficiente dizer não se­


rem o poder e a violência a mesma co isa O poder e a
violência se opõem : onde um dom ina de form a absolu­
ta, o outro está ausente” (ARENDT, 1985:30)."

R etom ando ao con ceito de território, é im perioso que saiba­


m os despi-lo do manto de im ponência com o qual se encontra, via
de regra, adornado. A palavra território normalmente evoca o “ter­
ritório nacional” e faz pensar no Estado — gestor por excelência
do território nacional — , em grandes espaços, em sentimentos
patrióticos (ou m esm o chauvinistas), em governo, em dom inação,
era “d efesa d o território pátrio”, em guerras... A bem da verdade, o
ten itório pode ser entendido também à escala nacional e em asso­
ciação com o Estado com o grande gestor (se bem que, na era da
globalização, um gestor cada vez m enos privilegiado). No entanto,
ele não p recisa e nem deve ser reduzido a essa escala ou à associa­
ção com a figura do Estado. Territórios existem e são construídos
(e desconstruídos) nas mais diversas escalas, da mais acanhada
(p. ex., uma rua) à internacional (p. ex., a área form ada pelo con­
junto d os territórios dos países-m em bros da Organização do
Tratado do Atlântico Norte — OTAN); territórios são construídos
(e desconstruídos) dentro de escalas tem porais as mais diferentes:
séculos, décadas, anos, m eses ou dias; territórios podem ter um
caráter permanente, mas também podem ter uma existência perió­
dica, cíclica. Não obstante essa riqueza de situações, não apenas o
senso com um , mas também a maior parte da literatura científica,
tradicionalm ente restringiu o con ceito de território à sua forma
mais grandiloqüente e carregada de carga ideológica: o “território
nacional”.2

2 Vale a pena chamar a atenção para o fato de que essa diferença ou m esm o esse
antagonismo entre poder e violência nem sempre é percebido pelos estudiosos.
Um exem plo dentre muitos é o d o geógrafo Claude Raffestin, ao designar a vio­
lência c o m o “a forma extrema e brutal do poder” (RAFFESTIN, 1993:163).
82 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

O presente trabalho com põe-se fundamentalmente de duas


partes. Na primeira seção tentar-se-á desfazer o reducionism o aci­
ma m encionado e apresentar mais pormenorizadamente a riqueza
potencial do termo, buscando-se uma conceituação mais arejada
A esta seção, despida de com prom issos de aplicação do conheci­
m ento conceituai adquirido a contextos mais amplos, segue-se
uma outra, cujo escop o é ilustrar o alcance socialm ente crítico da
análise conceituai sobre o território no âmbito de um repensamen-
to da questão do desenvolvimento.

Dos grandes territórios hipostasiados pela ideologia às ter­


ritorialidades complexas do quotidiano metropolitano

A n oção de território embutida no discurso cien tífico con ­


fundia-se e amiúde continua a confundir-se, segundo se afirmou
há pou co, com uma percepção bastante rígida do que seja a reali­
dade em tela. Entre as disciplinas científicas uma exceção tem
sido a Antropologia, e particularmente o seu ramo mais recente, a
Antropologia Urbana; estudos sobre “tribos urbanas” e grupos
sociais diversos (m inorias étnicas, prostitutas, hom ossexuais etc.)
e seus territórios se têm m ostrado com o importantes contribui­
ções para uma am pliação dos horizontes conceituais e teóricos.3
Infelizmente, contudo, a Antropologia, com seus con h ecidos ví­
cios disciplinares (predileção p elo “desviante”, despolitização do
discurso, desapreço para com o aprofundamento da análise do
Estado...), tem dificuldades para alcançar uma interpretação
“estratégica” dos problem as de sociedades com plexas (con flitos
sociais objetivos e suas causas, papel da produção do espaço

3 No Brasil, o s anos 80 trouxeram vários exem plares bastante respeitáveis de con ­


tribuições ao estudo da territorialidade oriundos da pena de antropólogos urba­
nos, tendência que prossegue na década de 90: GASPAR, 1985; ZALUAR, 1985
(especialmente pp. 174 e segs.); PERLONGHER, 1987; ZALUAR, 1994.
O TERRITÓRIO 83

enquanto variável essencial da reprodução do status quo), restrin-


gindo-se quase sempre, assim, a chamar a atenção, ainda que mui­
tas vezes apenas indiretamente, para o s lim ites do discurso objeti-
vista e pasteurizador das demais disciplinas. Outras contribuições
a uma am pliação dos horizontes conceituais, da parte de autores
que, com o GUATTARI (1985), não se deixam facilm ente enquadrar
em uma das gavetas disciplinares sustentadas pela Epistem ologia
positivista, podem também ser m encionadas; são elas, contudo,
contribuições esparsas, isoladas e p ou co sistemáticas.
A s disciplinas mais diretamente ligadas, inclusive epistem o-
logicam ente, com a análise do território, a saber: a C iência P o­
lítica, pela via do con ceito para ela epistem ologicam ente fundante
de poder, e a Geografia, que normalmente se arroga o privilégio de
ser a disciplina do espaço social — estas duas disciplinas estive­
ram quase sem pre dominadas por uma orientação em direção ao
Estado enquanto o poder por excelência, e inclusive estiveram his­
toricam ente com prom etidas com a elaboração de discursos legiti-
m adores do Estado em geral ou até dos interesses imperiais de um
determ inado E stado em particular (a G eop olítica do T erceiro
Reich representa meramente um exem plo extrem ado desse tipo
de com prom etim ento entre ciência e interesses dom inantes). Não
é de se admirar, portanto, que estas duas disciplinas, e particular­
m ente a Geografia, justam ente aquela que em prin cípio deveria
dispor de conceituações bastante ricas da territorialidade e de um
arsenal variado de tipologias territoriais, tenham estado excessiva­
mente fixadas na escala do “território nacional”.4 Ventos de reno­
vação têm soprado também na direção da geografia, inclusive no
Brasil: vide, p o r exem plo, MATTOS & RIBEIRO (1994), sobre o s terri­
tórios da prostituição no Rio de Janeiro, e MACHADO (1992), acer­

4 O primeiro capítulo d o livro P or uma Geografia do Poder, de Claude Raffestin


(RAFFESTIN, 1993), cuja primeira edição francesa é de 1980, oferece uma crítica
e ao m esm o tem po um breve mas interessante histórico da Geografia Política
clássica, corretamente identificada p or Raffestin co m o uma “Geografia do
Estado”.
84 GEOGRAFIA; CONCEITOS E TEMAS

ca da territorialidade pentecostal. Estes trabalhos assinados por


geógrafos, em boa m edida inspirados p or aportes da Antropologia
e S ociologia, ainda constituem , porém , ex ceções, confinadas a
uma área de fronteira entre a Geografia Urbana (m ais arejada) e a
G eografia Política.
O território surge, na tradicional Geografia Política, com o o
espaço concreto em si (com seus atributos naturais e socialm ente
construídos), que é apropriado, ocupado por um grupo social. A
ocupação do território é vista com o algo gerador de raízes e identi­
dade: um grupo não pode mais ser com preendido sem o seu terri­
tório, no sentido de que a identidade sócio-cultural das pessoas
estaria inarredavelmente ligada aos atributos do espaço concreto
(natureza, patrim ônio arquitetônico, “paisagem”). E mais: os limi­
tes do território não seriam, é bem verdade, imutáveis — pois as
fronteiras podem ser alteradas, com um ente pela força bruta — ,
mas cada espaço seria, enquanto território, território durante todo
o tem po, pois apenas a durabilidade poderia, é claro, ser geradora
de identidade sócio-espacial, identidade na verdade não apenas
com o espaço físico, concreto, mas com o território e, p or tabela,
com o poder controlador desse território... Não é de se surpreen­
der, diante de tal rigidez, que essa visão tenha muitas vezes usado
os term os território e espaço indistintamente, obscurecendo o ca­
ráter especificam ente p olítico do prim eiro. Conform e já se anteci­
pou, esse tipo de território sempre fo i associado, n o âm bito de um
discurso evidentemente ideológico, em prim eiro lugar ao recorte
do “território nacional”, ou seja, do Estado-Nação. Outro recorte
im portante foi, muitas vezes, a “região”, entidade espacial algo
m istificada pela Geografia Regional lablacheana no interior de um
discurso ideológico que via o “território nacional” com o um mosai­
co orgânico e harm ônico de “regiões” singulares.5

s Vide, p.ex., a já clássica crítica de LACOSTE (1988). Quanto à região co m o uma


espacialidade ideologicamente funcional nos m arcos de uma reflexão conserva-
O TERRITÓRIO 85

O prim eiro grande autor da Geografia Política, o alemão


Friedrich Ratzel, nos oferece, por m eio de sua obra Politische
G eographie (ratzel, 1974), um exem plo espetacular e seminal
desse tipo de discurso sobre o território essencialm ente fixado no
referencial político do Estado. Duas passagens lapidares com o as
seguintes ilustram perfeitam ente o espírito de suas investigações:

“O Estado não é, para nós, um organismo mera­


mente porque ele representa uma união do p ovo vivo
com o solo [Boden] im óvel, mas porque essa união se
consolida tão intensamente através de interação que
am bos se tom am um só e não podem mais ser pensa­
dos separadamente sem que a vida venha a se evadir”
(RATZEL, 1974:4).

E ainda, por exem plo:

“Exclusivamente o solo [Boden] dá coerência


material a um Estado, vindo daí a forte inclinação
sobretudo da organização política de naquele se apoiar,
com o se ele pudesse forçar os homens, que de toda
sorte perm anecem separados, a uma coesão. Quanto
m aior for a possibilidade de fragmentação, tanto mais
importante se tom a o solo [Boden], que significa tanto
o fundamento coerente do Estado quanto o único teste­
munho palpável e indestrutível de sua unidade” (RAT­

ZEL, 1974:11).

Através das citações precedentes é possível notar que Ratzel


não apenas trata de um tipo específico de territorialidade, prenhe

dora sobre o território do Estado-Naçâo — ou enquanto uma “prefiguração da


pátria”, para usar as palavras de Daniel FOUCHEIi (1982:283) a p ropósito d o
“p a ys" — con su lte-se, além d e F oucher, naturalm ente o p róprio Vidal de la
Blache (La BLACHE, 1982).
GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

de história, tradição e ideologia — a territorialidade do Estado-


Nação — , mas a trata de um m odo, p or assim dizer, naturalizado.
A ideologia não é ideologia, ou seja, um coryunto de idéias e valo­
res relativos conform e a classe ou o grupo; é cultura nacional,
am or à pátria etc., e a identificação se daria entre todo um “p ov o”
(visto com o se não houvessem classes, grupos e contradições
internas) e “seu” Estado. A territorialidade do Estado-Nação, tão
densa de história, onde afetividade e identificação (reais ou hiper-
bolizadas ideologicam ente) possuem enorm e dim ensão telúrica
— paisagem, “regiões de um país”, belezas e recursos naturais da
“pátria” — , é naturalizada p or Ratzel também na m edida em que
este não discute o con ceito de território* desvinculando-o d o seu
enraizamento quase perene nos atributos do solo pátrio. Sin­
tomaticamente, a palavra que Ratzel comumente utiliza não é ter­
ritório ( T erritorium ), e sim solo (Boden), com o se território
fosse sempre sinônim o de território de um Estado, e com o se esse
território fosse algo vazio sem referência aos atributos materiais,
inclusive ou sobretudo naturais (dados pelo sítio e pela posição),
que de fato são designados de m odo mais direto pela expressão
Boden.
Outra form a de se abordar a tem ática da territorialidade,
mais abrangente e crítica, pressupõe não propriam ente um desco­
lamento entre as dim ensões política e cultural da sociedade, mas
uma flexibilização da visão do que seja o território. Aqui, o territó­
rio será um cam po de força s, uma teia ou rede de relações sociais
que, a par de sua com plexidade interna, define, ao m esm o tempo,
um lim ite, uma alteridade: a diferença entre “n ós” (o grupo, os
m em bros da coletividade ou “com unidade”, os in sid ers) e os “ou­
tros” (o s de fora, os estranhos, os outsiders').
Vários tipos de organização espaço-tem poral, de redes de
relações, podem surgir diante de nossos olhos, sem que h^ja uma
superposição tão absoluta entre o espaço concreto com os seus
atributos materiais e o território enquanto cam po de forças. Um
O TERRITÓRIO 87

enraizamento tão forte com o aquele focalizado por Ratzel (e a


m aior parte da tradição da Geografia Política, além, é lógico, da
G eopolítica)6 não precisa existir para que se tenha territórios.
Territórios, que são n o fundo antes relações socia is projetadas no
espaço que espaços con cretos (o s quais são apenas os substratos
m a teriais das territorialidades — voltar-se-á a isso mais adiante),
podem , conform e já se indicara na introdução, formar-se e dissol­
ver-se, constituir-se e dissipar-se de m odo relativamente rápido
(ao invés de uma escala tem poral de sécu los ou décadas, podem
ser simplesmente anos ou m esm o m eses, semanas ou dias), ser
antes instáveis que estáveis ou, m esm o, ter existência regular mas
apenas periódica, ou seja, em alguns m om entos — e isto apesar de
que o substrato espacial perm anece ou pode perm anecer o
m esm o.
As grandes m etrópoles modernas, do “Primeiro” com o do
“Terceiro Mundo”, com toda a sua com plexidade, parecem conter
os exem plos mais interessantes e variados de tais “territorialida-
des flexíveis”. Debrucem o-nos sobre alguns desses exem plos.

• Os territórios da prostituição fem inina ou masculina (prostitu­


tas, travestis, m ichês), onde os “outros” tanto podem estar no
m undo exterior em geral (de onde vêm o s clientes em potencial)
quanto, em m uitos casos, em um grupo concorrente (prostitutas
versu s travestis), com os quais se pode entrar em conflito. Esses
territórios, com um ente encontrados naqueles locais próxim os ao
Central B usiness D istrict (CBD), que se convencionou chamar de
blighted areas, áreas de obsolescên cia ou “espaços deteriorados”,
muitas vezes (a não ser n o caso de um bas fo n d com o a decadente
Vila Mimosa, na cidade do Rio de Janeiro, que foi o que restou da
antiga e fam osa “Zona do Mangue”) são “apropriados” pelo respec­

,l É ce rto que nem todas as análises político-espaciais “estadocêntricas” “naturali­


zaram” o território e as relações entre espaço e poder; é o caso dos marxistas,
bem representados pelo cientista político N icos POULANTZAS (1985:113 e segs.).
GEOGRAFIA; CONCEITOS E TEMAS

tivo grupo apenas à noite. Durante o dia as ruas são tom adas por
outro tipo de paisagem humana, típico do m ovim ento diurno das
áreas de obsolescência: pessoas trabalhando ou fazendo com pras
em estabelecim entos com erciais, escritórios de ba ix o sta tu s e
pequenas oficinas, além de m oradores das im ediações. Quando a
noite chega, porém , as lojas, com exceção dos bares e night clubs,
estão fechadas, e o s transeuntes diurnos, com o trabalhadores
“normais”, pessoas fazendo com pras e os residentes d o tipo que a
m oral dom inante costum a identificar com o “decen tes”, cedem
lugar a outra categoria de freqüentadores, com o prostitutas (ou
travestis, ou ainda rapazes de programa) fazendo trottoir nas cal­
çadas e entretendo seus clientes em hotéis de alta rotatividade. O
caráter c íc lic o deste tipo de territorialização, com um a alter­
nância habitual dos usos diurno e noturno dos m esm os espaços,
está representado pelo exem plo fictício da Figura 1.
Os territórios da prostituição são bastante “flutuantes” ou
“m óveis”.7 Os lim ites tendem a ser instáveis, com as áreas de
influência deslizando p or sobre o espaço concreto das ruas, becos
e praças; a criação de identidade territorial é apenas relativa, diga­
m os, mais propriamente funcional que afetiva. O que não significa,
em absoluto, que “pontos” não sejam às vezes intensamenté dispu­
tados, podendo a disputa desem bocar em choques entre grupos
rivais — p or exem plo, entre prostitutas e travestis, com estes ex­
pulsando aquelas de certas áreas, conform e relatado p or GASPAR

(1985:18), que exem plifica com locais do Rio de Janeiro e de São


Paulo. Esta característica de serem os territórios da prostituição
bastante m óveis, com limites às vezes muito instáveis, se encontra
ilustrada pelo m odelo da Figura 2. Outros grupos sociais, com o
gangues de rua constituídas p o r adolescentes e jov en s, podem
apresentar territorialidades similares à da prostituição, ao m enos

i A expressão “território móvel” (movable territory ) é retirada d e SACK (1986:20),


o qual corretamente já discernira que “m ost territories tend to b e fixed in geogra­
phical space, but som e can m ove”.
O TERRITÓRIO

P A R T E D A Á R E A D E O B S O L E S C Ê N C IA D E U M A
C ID A D E E M D O IS M O M E N T O S D IS T IN T O S

EXEMPLO DE TERRITORIALIDADE CÍCLICA

ÜHZZZD Pessoas trabalhando no com ércio e em pequenas oficinas: pessoas


fazendo com pras ou indo fazer com pras

Aposentados joga n d o cartas; mães com crianças

fTili.'iliTTTtliliTi Prostitutas fazendo tnoííoír,- prostitutas e seus clientes em


hotéis d e alta rotatividade.

Limite d o território das prostitutas


M. J. Lopes de Souza

F ig u r a i
90 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

P A R T E D A Á R E A D E O B S O L E S C Ê N C IA D E U M A
C ID A D E E M D O IS M O M E N T O S D IS T IN T O S

EXEMPLO DE TERRITORIALIDADE MÓVEL

À BM äzt
V S i !M .
n n !í!i l í i L .

in Q U Ü
: m _ X

lilOXilililiül Prostitutas fazentp trottoir e entretendo seus clientes

_ Limite territorial

Travestis fazento trottoir e entretendo seus clientes

— __ — Limite territorial

M. J. Lopes de Souza

F ig u ra 2
O TERRITÓRIO 91

n o que diz respeito ao caráter de grande m obilidade d os lim ites


territoriais.

• Outras situações onde se dá a form ação de territórios com uma


tem poralidade bem definida podem igualmente ser encontradas
nas grandes cidades. Por exem plo, a “apropriação” de certos espa­
ço s pú blicos p or grupos específicos, com o os nordestinos n os fins
de semana na Praça Saens Pena (n o bairro da Tyuca), na cidade
do Rio de Janeiro, e a ocupação das calçadas de certos logradou­
ros públicos por cam elôs. Am bos os casos são interessantes p or se
revestirem de uma dimensão de conflitualidade entre esses usuár
rios do espaço, que o territorializam em m om entos definidos, e um
ambiente que os discrimina: n o caso dos nordestinos, em grande
parte m oradores de favelas próxim as, tem os a apropriação de uma
praça p or um grupo que tenta, por algumas horas, reproduzindo
um espaço de convívio em um m eio estranho e não raro hostil e
segregador — a grande cidade para a qual migraram em busca de
m elhores oportunidades de vida — , manter um p ou co de sua iden­
tidade, o que m uitas vezes é visto com o uma “invasão” p elos
demais m oradores do bairro, o s quais se vêem assim “expulsos” de
“sua” p ra ça N o caso dos cam elôs estam os diante d o con flito de
interesses entre o s cham ados setores form al e inform al, ciya
explosividadejá se m anifestou no Rio de Janeiro em diversos inci­
dentes violentos envolvendo, de um lado, lojistas e a polícia, e, de
outro, o s cam elôs.•

• Outra territorialidade sumamente interessante é a d o tráfico de


drogas n o R io de Janeiro. Altamente pulverizada, ela contrasta
vivamente com a estrutura territorial característica de organiza­
ções m afiosas ou m esm o do jo g o do bicho. No caso d o tráfico de
drogas, territórios-enclave (favelas) acham -se dissem inados pelo
tecid o urbano, com territórios am igos (perten cen tes à m esm a
organização ou ao m esm o com ando — no caso do R io de Janeiro,
92 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

Com ando Verm elho, T erceiro Com ando e, ainda, bandos inde­
pendentes) dispersos e separados p elo “asfalto”, para empregar a
gíria carioca usual, ou seja, p or bairros com uns, ou, para usar a
expressão empregada certa vez p or um entrevistado, “áreas neu­
tras”.8 Entre dois territórios amigos, quer dizer, duas favelas terri-
torializadas pela m esm a organização, existe, porém , não apenas
“a sfa lto”; p od e haver igualm ente territórios inim igos, perten­
cen tes a ou tro com ando. A territorialidade de cada fa cçã o ou
organização do tráfico de drogas é, assim, uma red e com plexa,
unindo nós irmanados pelo pertencim ento a um m esm o com ando,
sendo que, no espaço concreto, esses nós de uma rede se inter­
calam com nós de outras redes, todas elas superpostas ao mesmo
espaço e disputando a mesma área de influência econ ôm ica (mer­
cado consum idor), form ando uma malha significativam ente com ­
plexa. Cada uma das redes representará, durante tod o o tem po em
que existirem essas superposições, o que se poderia chamar uma
territorialid ad e de baixa definição. Uma alta definição só será
alcançada se uma das organizações lograr eliminar as rivais den­
tro da área de influência, m onopolizando a oferta de tóxicos, ou se
as organizações chegarem a um acordo, estabelecendo um pacto
territorial.
N o ca so da estrutura espacial m afiosa (ou , para dar um
exem plo brasileiro, do jo g o do bich o), o que há são áreas antes que
pontos, onde salta aos olhos a contiguidade espacial dos dom ínios
ou áreas de influência de cada fam ília m afiosa (ou bich eiro). A
relativa estabilidade deste tipo de estrutura, fruto de um processo
de cartelização, com uma espécie de pacto p olítico coiporifican -

8 Entrevista de 12/07/1994 do autor com uma liderança da favela Morro do Céu, na


Zona Norte do município do Rio de Janeiro. As “áreas neutras”, para o entrevista­
do, são aquelas que, não sendo diretamente territorializadas por nenhuma organi­
zação de traficantes — os quais se encarregam de garantir uma certa ordem inter­
na ao território pelo bem dos negócios (por exemplo, punindo exemplarmente
crimes comuns como estupros e furtos) —, se apresentam como locais particular-
mente inseguros, desprotegidos, expostos. Ver, sobre esse tema, SOUZA (1994a).
O TERRITÓRIO 93

do-se em um pacto territorial ou divisão do espaço em zonas de


influência — p or exem plo, n o Rio de Janeiro a partir dos anos 70
— , contrasta nitidamente com a extrema instabilidade sócio-polí-
tico-territorial do tráfico de drogas. A presumida relação entre o
tráfico de drogas e o jo g o do bicho, que ganhou as manchetes de
jornal do R io de Janeiro em 1994, não p od e ser refletida sem que se
considere o fato perturbador de que se trata de duas territorialida­
des muito diferentes, sendo que interiormente a cada área de
influência do jo g o do bich o existem favelas controladas por
com andos rivais.
O processo de constituição de redes de organizações crimi­
nosas no Rio de Janeiro (p or exem plo) remete à necessidade de se
construir uma ponte conceituai entre o território em sentido usual
(que pressupõe contigüidade espacial) e a rede (onde não há con-
tigüidade espacial: o que há é, em term os abstratos e para efeito de
representação gráfica, um conjunto de pontos — nós — conecta­
dos entre si por segm entos — arcos — que correspondem aos flu­
x os que interligam, “costuram ” os nós — fluxos de bens, pessoas
ou inform ações — , sendo que os arcos podem ainda indicar ele­
m entos infra-estruturais presentes no substrato espacial — p. ex.,
estradas — que viabilizam fisicam ente o deslocam ento dos flu­
x os). A esse território em rede ou território-rede propõe o autor do
presente artigo chamar de território descontínuo. Trata-se, essa
ponte conceituai, ao m esm o tem po de uma ponte entre escalas ou
níveis de análise: o território descontínuo associa-se a um nível de
tratamento onde, aparecendo os nós com o pontos adimensionais,
não se co lo ca evidentemente a questão de investigar a estrutura
interna desses nós, ao passo que, à escala do território contínuo,
que é uma superfície e não um ponto, a estrutura espacial interna
precisa ser considerada O corre que, com o cada nó de um territó­
rio descontínuo é, concretam ente e à luz de outra escala de análi­
se, uma figura bidimensional, um espaço, ele mesmo um território
(um a favela territorializada por uma organização crim inosa),
94 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

tem os que cada território descontinuo é, na realidade, um a rede


a articu lar dois ou m ais territórios contínuos .9O m odelo gráfico
da Figura 3 procura ilustrar este raciocínio.
A com plexidade dos territórios-rede, articulando, interior­
mente a um território descontínuo, vários territórios contínuos,
recorda a necessidade de se superar uma outra lim itação embuti­
da na con cepção clássica de território: a exclusividade de um
poder em relação a um dado território. Do ponto de vista empíri­
co, isto é, indubitavelmente, banal; onde residiria a dificuldade em
aceitar que, superposto ao território nacional e com o um subcon­
junto dele, encontra-se, por exem plo, a área de exercício da com ­
petência do poder estadual e, dentro desta, aquela do poder muni­
cipal? No entanto, a fixação da Geografia Política clássica no
Estado, conduzindo à percepção do território nacional com o o
território p or excelência, redundou na cristalização do sentimen­
to, im plícito nos discursos, de que territórios são entidades que se
justapõem contiguamente, mas não se superpõem , uma vez que
para cada território nacional só hám n Estado-Nação. Sem dúvida,
isto é uma hipersim plificação, im bricada na pobreza conceituai
longo tem po imperante. Não apenas o que existe, quase sempre, é
uma superposição de diversos territórios, com form as variadas e
lim ites não-coincidentes, com o, ainda p or cima, podem existir
contradições entre as diversas territorialidades, p or conta dos
atritos e contradições existentes entre os respectivos poderes: o
cam elô carioca, ator-sím bolo da “econom ia inform al”, que defen-

9 PIOLLE (1990-1991) também enfatiza a importância de se refletir sobre as terri­


torialidades caracterizadas por estruturas em rede; ele emprega, contudo, uma
expressão a nosso ver p o u co feliz: “território deslocalizado” ( territoire délocali-
sé). Ora, falar de “território deslocalizado” significa com eter uma contradictio in
adiecto na esteira de uma charm osa pirueta verbal; o fato de o território-rede
estar apenas m icrolocalm ente enraizado d e m od o mais claro (n os p on tos de
apoio logístico que são as favelas), com “áreas neutras” e m esm o territórios inimi­
g os interpostos entre dois territórios pertencentes à mesma rede, não nos autori­
za a falar de deslocalização, mas sim de articular dois tipos distintos de territo­
rialidade.
O TERRITÓRIO 95

D U A S E S C A L A S D O T R Á F IC O D E D R O G A S
EM U M A M ETRÓPOLE

EXEMPLO DE TERRITORIALIDADE EM REDE1

M. J. Lopes de Souza

1 Territórios descontínuos (organizações do tráfico de drogas disputando o


mesmo mercado)
------- Área de influência (mercado consumidor) em disputa

2 Território contínuo (favela territorializada por uma organização do tráfico


de drogas)

F ig u ra 3
96 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

de o seu “pon to” contra concorrentes e m esm o o seu direito de


perm anecer no local contra a Guarda Municipal, o faz dentro dos
lim ites territoriais do m unicípio, do estado e do país — e tanto a
prefeitura quanto o s governos estadual e federal representam o
poder formal, o Poder, o Estado.
Agora que já foram examinadas várias facetas dessa realida­
de social que é o território, fica mais fácil retom ar à lacônica defi­
nição fornecida na introdução — território com o um espaço d efi­
nido e delim itado p o r e a p a rtir de relações de p o d er— para com ­
plementá-la e precisá-la, aparar-lhe as arestas.
Naturalmente que se con corda aqui com RAFFESTTN (1993:
143) em que o espaço é anterior ao território. Mas acreditam os que
este autor incorre no equívoco de “coisificar”, “reificar” o territó­
rio, ao incorporar ao con ceito o próprio substrato material — vale
dizer, o espaço social.10 Sem dúvida, sempre que houver hom ens
em interação com um espaço, prim eiram ente transform ando a
natureza (espaço natural) através do trabalho, e depois criando
continuamente valor ao m odificar e retrabaJhar o espaço social,
estar-se-á também diante de um território, e não só de um espaço
econ ôm ico: é inconcebível que um espaço que tenha sido alvo de
valorização pelo trabalho possa deixar de estar territorializado
p o r alguém . A ssim com o o p od er é onipresente nas rela ções
sociais, o território está, outrossim, presente em toda a espaciali-
dade social — ao m enos enquanto o hom em também estiver p re­
sente. Esta última restrição admite ser ilustrada p or uma imagem
que m ostra bem que, se tod o território pressu põe um esp a ço

i° “A o se apropriar de um espaço, con creta ou abstratamente (p or exem plo, pela


representação), o ator ‘territorializa’ o espaço. [Henri] Lefèbvre m ostra m uito
bem com o é o m ecanism o para passar do espaço ao território: ‘A produção de um
espaço, o território nacional, espaço físico, balizado, m odificado, transform ado
pelas redes, circuitos e fluxos que aí se instalam: rodovias, canais, estradas de
ferro, circuitos com erciais e bancários, auto-estradas e rotas aéreas etc.’ O terri­
tório, nessa perspectiva, é um espaço onde se projetou um trabalho, seja energia
e inform ação, e que, p or consequência, revela relações m arcadas p elo poder.”
(RAFFESTIN, 1993:1434)
O TERRITÓRIO 97

social, nem tod o espaço social é um território: pense-se n o caso


extrem o de uma cidade-fantasma, testemunho de uma antiga civi­
lização, outrora fervilhante de vida e m esm o esplendorosa, e hoje
reduzida a ruínas esquecidas e cobertas pela selva; essa cidade
hipotética, abandonada, não retrocedeu, ló g ico , à co n d içã o de
objeto natural, mas ao m esm o tempo “morreu” em term os de dinâ­
m ica social, não sendo mais diretamente território de quem quer
que seja.
Além disso, RAFFESTTN (1993:144) praticamente reduz espaço
ao espaço natural, enquanto que território de fato tom a-se, auto­
maticamente, quase que sinônim o de espaço social. Isto em pobre­
ce o arsenal conceituai à nossa disposição. Em que pese a sua crí­
tica à unidimensionalidade do poder na Geografia Política clássi­
ca, Raffestin não chega a rom per com a velha identificação d o ter­
ritório com o seu substrato material, ou seja, com aquela espécie
de “hipostasiam ento” a que se fez alusão n o título desta seção. A
diferen ça é que R affestin não se restringe ao “so lo pátrio”, ao
Boden ratzeliano. Essa materialização do território é tanto mais
lam entável quando se tem em m ente que R affestin pretendeu
desenvolver uma abordagem relacional adequada à sua Geografia
do poder, entendida de m odo frutiferamente mais abrangente do
que com o uma Geografia do Estado. A o que parece, Raffestin não
explorou suficientem ente o veio oferecid o p or uma abordagem
relacional, pois não discerniu que o território não é o substrato, o
espaço social em si, mas sim um cam po de forças, as relações de
pod er espacialm ente delim itadas e operando, destarte, sobre um
substrato referencial. (Sem som bra de dúvida pode o ex ercício do
poder depender muito diretamente da organização espacial, das
form as espaciais; mas aí falam os dos trunfos espaciais da defesa
do território, e não do con ceito de território em si.)
Além do exem plo anterior sobre uma cidade-fantasm a fictí­
cia, também os territórios cham ados mais acim a de flutuantes ou
m óveis, p or serem os seus limites tão instáveis, mostram perfeita-
98 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

m ente o quanto o território, enquanto cam po de forças, logicam en­


te existe sobre um espaço, na conta de uma capa invisível deste,
m as n ão devendo, só p or isso, ser confundido com o substrato
material. (Na verdade, o substrato material a ser territorializado
sequer precisa ser o solo, o Boden; ele pode sem dúvida ser uma
superfície líquida, um m ar territorial. Em algumas áreas do globo
terrestre, com o n o Caribe, o dom ínio sobre “territórios marítim os”
assume im portância vital, dos pontos de vista geopolítico e geoe-
con ôm ico.) Uma outra situação, oposta à da cidade-fantasm a do
exem plo hipotético (“desterritorialização* p or conta da extinção
do grupo social, com o ambiente construído sobrevivendo a este),
m as nem p o r isso m enos ilustrativa da diferença objetiva entre
substrato espacial e território, é aquela da perpetuação de repre­
sentações espaciais territorializantes m esm o após a organização
espacial original ter se m odificado sensivelm ente ou entrado em
decadência — isto é, aquilo que Guy Di MÉO (1993) qualifica de
id eologia territorial e m itos do território-
Por fim, optou-se por concluir esta seção com uma discussão
sobre o significado da palavra territorialidade. Há autores que a
vêem com o alguma coisa parecida com o com portam ento espeço-
territorial de um grupo social (p.ex., RAFFESTIN, 1993:158-63; SACK,
1986:1986:19 e segs). Tal atitude parece, sob o ângulo do rigor ter­
m inológico, p ou co justificável, uma vez que já existem expressões
e con ceitos em número suficiente que apontam para o tipo de rela­
çã o material ou cognitiva hom em úneio, natureza/sociedade — do
am plo con ceito lefebvriano de produ ção d o esp aço (LEFÈBVRE,

1981) até n oções escalarm ente específicas com o identidade regio­


nal e regionalism o, passando pelas idéias de “con sciên cia espa­
cia l” d os geógrafos alem ães (R au m bew iisstsein ) e de “to p o fi-
lia” de Yi-Fu Tuan (TU AN , 1980). Querendo-se, porém , destacar o
conteúdo de “(im perativo de) controle territorial” usualmente pre­
sen te na palavra territorialidade, é p referível em pregar, para
1

O TERRITÓRIO 99

designar esse controle, o term o territoria lism o.11 Mais produtivo


seria, p or conseguinte, encarar a territorialidade à sem elhança de
outros substantivos com o brasilidade, sexualidade e tantos mais.
A territorialidade, n o singular, remeteria a algo extremamente abs­
trato: aquilo que faz de qualquer território um território, isto é, de
acordo com o que se disse há pou co, relações de p od er espacial-
m ente. delim itadas e operando sobre um substrato referen cial. As
territorialidades, no plural, significam os tipos gerais em que p o­
dem ser classificados os territórios conform e suas propriedades,
dinâm ica etc.: para exem plificar, territórios contínuos e territórios
descontínuos singulares são representantes de duas territorialida­
des distintas, contínua e descontínua. Seja com o for, é óbvio que,
ao falar de territorialidade, o que o autor deste artigo tem em
mente é um certo tipo de interação entre hom em e espaço, a qual
é, aliás, sem pre uma interação entre seres humanos m ediatizada
pelo esp aço.12

Da autonomia à territorialidade autônoma: revendo e “ ter-


ritorializando” o conceito de desenvolvimento

D o m esm o m odo com o a idéia de território tem perm aneci­


do, n o discurso científico, salvo algumas exceções, prisioneira de
um certo “estadocentrism o”, de uma fixação em pobrecedora e
direta ou indiretam ente legitim atória da figura do E stado, tem
igualmente a idéia de desenvolvim ento sido condenada pelas mais
diversas escolas de pensam ento e disciplinas (especialm ente a
E conom ia e a Sociologia do Desenvolvim ento) a endossar o m ode-*

11 N o que con cern e a o fato de o territorialism o evoca r em m uitos autores parale­


los entre o com portam ento hum ano e o de ou tros animais, o autor d o presente
artigo (aproxim ando-se de SACK, 1986:24, 216) se recu sa a eclip sar o esp eciflca -
m ente hum ano-social, grifando que o territorialism o, lon ge de ser um a sim ples
questão de instinto, é tam bém um a estratégia
*2 Isto é m uito apropriadam ente salientado p or RAFFESTIN (1993:160 e segs.).
100 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

lo civilizatório ocidental, capitalístico, enquanto paradigma uni­


versal.
As idéias de “território” e “desenvolvim ento” têm estado, es­
pecialm ente em um país com o o Brasil, em relação de proximida­
de e mesmo sim biose dentro da matriz comum de valores conser­
vadora, não im portando o fato de que grupos diferentes de espe­
cialistas se ocupam preferencialm ente com um e com outro con ­
ceito (geógrafos e geopolíticos, de um lado, e econom istas e soció­
logos, de outro). Isto é fácil de com preender, pois, assim com o o
discurso sobre o Estado, a soberania e o “território nacional” se
pretende, pela via das idéias-força de “segurança nacional” e
“objetivos nacionais permanentes” — para empregar a term inolo­
gia consagrada pelo geopolítico G olbery do Couto e s il v a (1981)
— , a encarnação máxima da própria filosofia do desenvolvimento
nacional, o discurso dos econom istas e sociólogos advogados da
m odernização capitalista não prescinde de uma reflexão (normal­
mente despolitizada) sobre o “território” (ou, antes, espaço), ainda
que reduzido a atributos materiais ou locacionais do substrato
espacial: recursos naturais, posição geográfica relativamente a
b locos econôm icos etc. O Regime de 64 representou um exem plo
cabal de complementariedade entre uma con cepção tecnocrático-
econom icista e uma visão geopolítico-m ilitar do desenvolvim ento
nacional e, nesse contexto, do papel do território. A existência de
militares refletindo sobre “desenvolvim ento” a partir de uma pers­
pectiva geopolítica, onde a questão da territorialidade fo i explici­
tada, não sendo subsumida por uma análise do espaço enquanto
espaço econôm ico, apenas faz do Regime de 64, todavia, um caso
particularmente didático. Na verdade, o território não é simples­
mente uma variável estratégica em sentido político-m ilitar; o uso e
o controle do território, da mesma maneira que a repartição real
de poder, devem ser elevados a um plano de grande relevância
também quando da form ulação de estratégias de desenvolvim ento
sócio-espacial em sentido amplo, não meramente econôm ico-
O TERRITÓRIO 101

capitalístico, isto é, que contribuam para uma m aior ju stiça social


e não se limitem a clamar p or crescim ento econ ôm ico e m oderni­
zação tecn ológica
Expandir conceitualm ente a idéia de território e libertá-la de
seu ranço ideológico e conservador é, com efeito, uma tarefa que,
do ponto de vista do autor do presente escrito, encontra em uma
releitura da problem ática do “desenvolvim ento” um a aplicação
das mais meritórias. Tentar-se-á fazer isto a seguir, esboçando-se
uma con cep ção bastante alternativa de desenvolvim ento onde a
questão de uma territorialidade autônom a assume im portância
capital. Com isto estar-se-á, ao se transcender e criticar o e co -
n om icism o da já há m uitos anos decaden te E con om ia d o
Desenvolvim ento,13 de m odo pertinente realçando as dim ensões
política e espacial do projeto/processo de desenvolvim ento.
Para com eçar, é altamente significativo — e lamentável —
que um a n oção tão fundam ental quanto a de desenvolvim ento
tenha sido reduzida, ao ser transformada em con ceito cien tifico
pelas diversas disciplinas marcadas pela Epistem ologia positivis­
ta, esquartejadora da sociedade em partes pretensamente autôno­
mas (econom ia, política, cultura, espaço, história), em uma idéia
tão distante das necessidades mais elementares e do quotidiano
d os hom ens e m ulheres com uns. Principie-se p e lo “desen volvi-
m ento econ ôm ico”, para m uitos ainda sinônim o de desenvolvi­
m ento tou t cou rt: tendo com eçado seu pontificado log o após a
Segunda Guerra Mundial, nos anos 50, não é senão na década de
70, após o im pacto de experiências com o a do “milagre brasileiro”
de fins dos anos 60 e com eço dos anos 70, que os “econom istas do
desenvolvim ento” perceberão que o crescim ento não traz, auto­
maticamente, justiça social (expressa, p o r exem plo, pela diminui­
ção gradual dos valores do índice de Gini relativo à distribuição da
renda pessoal). Sem querer responsabilizar um luminar tão sensí-

13Vide, a respeito dessa decadência, a análise d e HIRSCHMAN, 1986a.


102 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

vel com o Albert Hirschman pelo aumento das disparidades sociais


em um país com o o Brasil, fato é que, “deform ação” ou não, a
m etáfora do “b olo” (“é preciso prim eiro esperar o bolo crescer,
para só então reparti-lo”), atribuída ao ex-ministro da fazenda
Antônio Delfim Netto, se apropria de um núcleo concepcional pre­
sente na estratégia hirschmaniana do unbalanced growth.'* A
estratégia de “redistribuição com crescim ento” — redistribution
w ith growth (CHENERY et a l, 1974) — com eteu, porém , ela mesma
um “lapso”, só descoberto a p osteriori p or especialistas mais uma
vez decepcionados: a saber, o de não notar que não basta identifi­
car grupos-alvo específicos e tentar ulteriormente implementar
programas de redistribuição de renda conduzidos de cim a para
baixo; é necessário com preender que a satisfação das necessida­
des humanas, dos pobres com o de quaisquer seres humanos,
inclui também a liberdade, a participação, o acesso à cultura etc.,
para não m encionar todas as necessidades básicas de tipo mais
material (alim entação, vestuário, infra-estrutura de serviços públi­
cos, habitação etc.). Estavam postas, assim, as con dições ideológi­
co-culturais no interior da guilda dos econom istas para a supera­
ção da estratégia redistribution w ith growth p or uma outra, pre-
sumidamente mais com pleta, chamada de satisfação de necessida­
des básicas, incorporada por Walter STOHR (1981) em sua concep­
çã o de um desenvolvim ento de baixo para cim a ( bottom -up and
periph ery-in w ard developm ent paradigm ).
Tão interessante quanto possa ser a análise de Stõhr, sem
dúvida muito mais rica que as análises típicas das teorias da
m odernização e do crescim ento dos decênios 50 e 60, ela esbarra,
contudo, nos lim ites ideológicos do autor (liberalism o “de esquer­
da”), para não falar, também, das constrições epistem ológicas
que, m esm o neste caso, de rejeição de um econom icism o mais1

11Vale a pena, aliás, tornar conhecim ento da autocrítica feita m uitos anos depois
por Hirschm an (HIRSCHMAN, 1986b).
O TERRITÓRIO 103

tacanho, continuam a se fazer presentes. Clamar p or “participa­


çã o”, p o r “liberdade” etc., n o con texto d o m odelo civilizatório
capitalista,15 m arcado por contradições de classe, p or uma funda­
mental assimetria a separar dominantes e dom inados, equivale, no
essencial, das duas uma: ou a fazer dem agogia política, ou a apon­
tar, na prática, para m elhorias cosm éticas, sem atentar o suficien­
te para as barreiras existentes no b o jo da sociedade instituída. A
con sideração da estrutura e da dinâm ica essenciais d o m odelo
civilizatório capitalista perm ite ao analista que ele, sem rodeios, se
remeta à questão das con dições efetivas do exercício da liberdade
e da p a rticip a çã o em um a socied a d e capitalista, seja ela d o
“T erceiro” ou do “Primeiro Mundo”. A questão inicial é, portanto,
uma questão p olítica , o que não significa substituir o prim ado da
econ om ia (o u da E con om ia) p elo da p o lítica (o u da C iên cia
Política): significa, apenas, que, sem que se aborde preliminarmen­
te essa questão, que é a questão do exercício do pod er de decidir
em uma sociedade (e não apenas no âm bito amesquinhado de um
“projeto de desenvolvim ento”), o discurso da em ancipação cultu­
ral, da tecnologia adaptada etc. cairá n o vazio, f
Abram -se, agora, parênteses, para que se faça referência a
uma outra linha id eológica , que não perten ce à m esm a árvore
genealógica da Econom ia (ou da Sociologia) do Desenvolvimento.
Também o s analistas de esquerda, mzyoritariamente m arxistas,
fracassaram ao não vislum brar um horizon te m aterial/técnico
substancialmente distinto daquele do Ocidente capitalista Não se

15Trata-se de um con ceito m ais am plo que o co n ce ito m arxista d e m od o d e p ro­


du ção, con form e já assinalam os rapidam ente em SOUZA (1994b). Um m odelo
civilizatório não se restringe à econ om ia, às con d ições m ateriais de (re)p rod u çã o
em /de um a sociedade, com o um m od o de prod u ção (deixan do d e lado, aqui, a
tentativa de neom arxistas estruturalistas de in cluir n o con ceito d e m od o d e p ro­
du ção m esm o as duas “instâncias” da “superestrutura”, a cultura, vista com o
“id eologia ”, e a política, entendida com o Estado, o que d e resto n ão d eixa d e ser
uma postura econ om icista); ele engloba um con ju n to da sociedad e instituída, e
sobretu do o seu im aginário instituído, para usar as exp ressões d e C om elius CAS-
TORIADIS (1975).
104 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

trata, somente, da pressuposição de Marx de que a m odernização


capitalista seria em s i positiva para a periferia do sistema, por
criar as pré-condições materiais do advento, algum dia, do “socia­
lism o” (vide as suas sempre citadas análises sobre a penetração do
capitalism o na índia); em verdade, Rosa Luxemburgo e Lênin, os
dois fundadores da teoria marxista do imperialismo, não só assi­
milaram essa prem issa teórico-ideológica de Marx, com o também
apontaram para uma tendência de industrialização na periferia
com o conseqüência da necessária exportação de capitais oriun­
d os dos países centrais na fase do capitalism o m onopolista.
Tam pouco uma posição com o a de Andrew Gunder Frank, repre­
sentante da ala marxista da “Teoria da Dependência”, expressa
pela célebre (e simplista) fórm ula do “desenvolvim ento do subde­
senvolvim ento”, a qual atrita com a teoria clássica d o imperialis­
m o, renegará a cega fé marxista na positividade das forças produ­
tivas do capitalismo. Na realidade, nenhum marxismo coerente
irá rom per com o com prom etim ento de sua matriz teórica para
com a idéia de m odernidade herdada do Iluminismo e exacerbada
pela dinâmica do capitalism o histórico (produtivism o, dom inação
da natureza). Isto não significaria “atualizar” Marx, mas sim aban­
donar uma parte absolutamente essencial e fundante de seu pen­
sam ento (CASTORIADIS, 1975; 1978). Não fo i apenas culpa de Stálin
o fato de as forças produtivas (e, em boa medida, as próprias rela­
çõ e s de produção) na URSS terem sido tão siupreendentemente
semelhantes às suas equivalentes ocidentais (apenas normalmen-
te m enos avançadas), o que fo i ressaltado pela crítica dos pensa­
dores da “E cologia Política” e, mais aprofundadamente, por c a s t o
r ia d is (1978). Não foram também som ente os stalinistas que deno­
minaram de socialistas (ao m enos quanto à “base econôm ica”, no
caso dos trotskistas) os países do falecido “socialism o real”, devi­
do ao fato de que, em tendo, na esteira de uma revolução, extingui­
do as classes sociais capitalistas e reorganizado as relações de tra­
balho e poder, eles só poderiam ser socialistas. O com prom eti-
O TERRITÓRIO 105

m e n t o d o “s o c ia lis m o ” c o m o m o d e lo c iv iliz a t ó r io c a p it a lis ta —


c o m s e u s v a lo r e s , c o m o o p r o d u t iv is m o — n ã o f o i, p e l o s m a r x is ­
ta s q u e m e r e c e r ia m e s s a q u a lific a ç ã o , s u fic ie n te m e n te c o m p r e e n ­

d id o , a s s im c o m o ta m b é m n ã o s e p e r c e b e u q u e, s e o q u e a c a b o u

n ão fo i a d o m in a ç ã o , m a s s im um tipo de dom inação, ta m b ém a

e x p lo r a ç ã o n ã o te r ia c e s s a d o , m a s a p e n a s c a m b ia d o d e fo r m a , e o

“s o c i a l i s m o ” n ã o p a s s a r i a d e u m a f a r s a g r o t e s c a ( c a s t o r i a d i s ,
1983).
Diante de tudo isso, eis por que se considera, aqui, com o
aliás o autor das presentes linhas já havia sublinhado alhures
(SOUZA, 1994b), que a idéia de autonomia, discutida de maneira
particularmente contundente e fecunda p elo filósofo Com elius
Castoriadis, tem um valor central para uma reconceituação do
desenvolvim ento. Autonorriia: esta palavra oriunda do grego, e
que designa uma realidade político-social concretizada pela pri­
meira vez através da p ólis grega, significa, singelamente, o poder
de uma coletividade se reger p or si própria, p or leis próprias:

“A liberdade muna sociedade autônoma exprime-


se p or estas duas leis fundamentais: sem participação
igualitária na tom ada de decisões não haverá execu­
ção; sem participação igualitária no estabelecim ento
da lei, não haverá lei. Uma coletividade autônoma tem
p or divisa e p or autodefinição: nós som os aqueles cuja
lei é dar a nós m esm os as nossas próprias leis” (CASTO-

RIADIS, 1983:22).

A autonom ia constitui, no entender do autor do presente


artigo, a base do desenvolvimento,- este encarado com o o processo
de auto-instituição da sociedade rumo a mais liberdade e menos
desigualdade; um processo, não raro doloroso, mas fértil, de dis­
cussão livre e “racional” por parte de cada um dos m em bros da
coletividade acerca do sentido e dos fins do viver em sociedade,
106 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

dos erros e acertos do passado, das metas materiais e espirituais,


da verdade e da ju stiça
Uma sociedade autônoma é aquela que logra defender e gerir
livremente seu território, catalisador de uma identidade cultural e
ao m esm o tem po continente de recursos, recursos cqja acessibili­
dade se dá, potencialm ente, de maneira igual para todos. Uma
sociedade autônoma não é uma sociedade “sem poder”, o que aliás
seria im possível (daí, aliás, a dimensão de absurdo do anarquismo
clássico). No entanto, indubitavelmente, a plena autonom ia é in­
com patível com a existência de um “Estado” enquanto instância
de poder centralizadora e separada do restante da sociedade (C A S-

t o r ia d is , 1990). Sobre os alicerces da idéia de autonom ia e da


com preensão da História com o um processo de luta e negociação,
aberto à contingência, é possível retirar do term o desenvolvim en­
to não só a sua carga teleológica, historicista (em butida tanto na
visão m odem izante “burguesa”, sim bolizada p or W. W. R ostow e
seus stages o f econom ic growth, quanto na escatologia marxista
vulgar da sucessão de m odos de produção), mas também o seu
eurocentrism o (em butido, mais uma vez, tanto nas teorias “bur­
guesas” do desenvolvim ento quanto em suas concorrentes marxis­
tas). Afinal, o projeto de autonomia pressupõe também a liberdade
para colocar-se a questão do desenvolvim ento, ou seja, da trans­
form ação e da autocrítica na direção de uma justiça social cada
vez maior, de m odo próprio, singular — ou mesmo para sequer
tematizá-la, caso das sociedades indígenas ou “sem história” (ver,
sobre esses pontos, SOUZA, 1994b).16
Quanto ao território, já se viu que este se define a partir de
dois ingredientes, o espaço e o poder. O autor do presente ensaio
não crê, p or outro lado, que o poder — qualquer pod er — possa

10 Está im plícito acim a que o “desenvolvim ento”, com o p rocesso historicam ente
aberto d e au tocrítica ten do p or m eta a autonom ia, a auto-instituição livre da
s o cie d a d e , é um d e s a fio igu alm en te p a ra as p o p u la çõ e s d o s p a íse s d ito s
“desen volvidos”, ch eios de problem as e prenhes de heteronom ia (e, p or exten­
são, nada m odelares). Isto, sem dúvida, não equivale a negar a im ensidão d os
O TERRITÓRIO 107

prescindir de uma base ou de um referencial territorial, p or mais


rarefeita que seja essa base, p or m ais indireto ou distante que
pareça ser esse referencial. Em se tratando do território e de seu
substrato espacial com o instrumentos de dom inação e m esm o ele­
m entos fundamentais de uma estratégia belicosa a serviço de fins
políticos, tem os, de Sun Tzu até os geopolíticos do sécu lo XX —
bem com o a M ichel Foucault, Paul Claval e tantos mais — , passan­
do p or Clausewitz e Katzel, toda uma tradição de perscrutação da
“dim ensão espacial do pod er”.*17 Seria, com efeito, p o r dem ais
repetitivo insistir aqui sobre a relevância instrumental do territó­
rio, entendendo-se o p od er acim a de tu do com o dom in ação e
Estado — com o heteronom ia. Mas, se se mudar de perspectiva,
poder-se-á verificar que também em uma coletividade autônoma,
radicalm ente dem ocrática, o exercício do poder não é concebível
sem territorialidade — sejam os lim ites externos, as fronteiras
espaciais do p od er dessa coletividade, sejam as diferen ciações
internas da sociedàde (d os indivíduos às in stitu ições), que im­

desafios p ostos para as sociedad es d os países cham ados de subdesenvolvidos,


entendido aqui o “subdesenvolvim ento” essencialm ente com o uma caricatura
historicam ente gerada em últim a análise no b o jo d o p rocesso de form ação d o sis­
tem a m undial capitalista. O utro a specto é o verdadeiro dilem a que o p rojeto de
autonom ia c o lo c a aquelas coletividades, herdeiras d o im aginário grego e que
coloca m ou podem co lo ca r para si este p rojeto — o “O cidente”, in cluin do-se aí a
Am érica Latina — , devem saber respeitar o d ireito de autodeterm inação e o
universo cultural próprio de outras sociedad es, e não apenas das socied a d es tri­
bais, sem Estado, m as tam bém daquelas m arcadas p or uma inegável heteronom ia
Cp. ex., o Islã, com sua brutal dissim etria entre o s papéis d os hom ens e das
m ulheres).
17 Nas palavras lapidares de CLAVAL (1979:23), descon tan do-se o fato de que o
que ele cham a de “pod er pu ro” é, na verdade, a dom inação baseada n o u so da
força: “O p od er puro só é efetivo quando acom panhado de um con trole perm a­
nente, ou quando força um receio que aúm enta a eficiên cia desse con trole. De
in ício, nenhum a preparação p sicológ ica é necessária para exercê-lo: o ch efe não
tem n ecessidade de se fazer con h ecer, de se fazer am ar e de persuadir o s dom ina­
d os de que sua p osiçã o é bem fundam entada. ( ...) O ex ercício d o p od er puro
supõe, portanto, um a organização particular d o espaço: s ó é p ossível n os lim ites
de círcu los on de todas as partes são igualm ente acessíveis àquele que in specion a
e on de as aberturas estão guardadas, de tal m od o que o s m ovim entos d e entrada
e saída sã o con trolad os e, se necessário, interditados.”
108 GEOGRAFIA: CONCEITOS E TEMAS

põem territorialidades específicas. Em qualquer circunstância, o


território encerra a materialidade que constitui o fundamento mais
im ediato de sustento econ ôm ico e de identificação cultural de um
grupo, descontadas as trocas com o exterior. O espaço social, deli­
m itado e apropriado politicam ente enquanto território de um
grupo, é suporte material da existência e, mais ou m enos forte­
mente, catalisador cultural-sim bólico — e, nessa qualidade, indis­
pensável fator de autonom ia Já o geógrafo e anarquista Piotr KRO-
POTKIN (1904; 1987), contem porâneo de Friedrich Ratzel, focaliza­
ra a organização espacial e a territorialidade, contidas em um pro­
je to anti-heterônom o, enfatizando a importância da descentraliza­
çã o espacial com o fazendo par com uma superação da divisão
entre trabalho manual e intelectual e entre setores econ ôm iços —
apanágio de toda uma linha liberal do pensamento econ ôm ico, de
Smith e Ricardo até as teorias de desenvolvim ento regional pós-
Segunda Guerra Mundial, onde sem pre se grifou a im portância da
divisão setorial e espacial do trabalho com o indicador e fundamen­
to do progresso. (N ão vem a pêlo propriamente exumar Kropotkin,
filosoficam ente em bebido no positivism o e no historicism o, em bo­
ra de resto um personagem bastante sim pático; n o entanto, cabe
lem brar a existência dessa outra linhagem, ideologicam ente um
antípoda da “linhagem ratzeliana” no que toca à questão da terri­
torialidade e de suas relações com o “desenvolvim ento”.)
C om o é possível, hoje, em m eio a uma coryuntura política e
ideológica internacional tão avessa a utopias de liberdade, e em
um mundo que assiste a uma avassaladora globalização da econ o­
mia e da cultura, com seu corolário de fortalecim ento das grandes
em presas e desenraizam ento cultural (O R TIZ, 1994), redefinir a
questão do desenvolvimento a partir das idéias de autonom ia e ter­
ritorialidade autônom a de maneira, para dizê-lo de form a incisiva,
que não seja patética ou qu ixotesca? Com preender (o u tentar
com preender) os lim ites da liberdade e da justiça social efetivas,
enfim, do desenvolvim ento social e espacial efetivo em uma socie­
O TERRITÓRIO 109

dade heterônom a, e procurar delinear uma alternativa essencial a


essa sociedade, são tarefas necessárias, p ois esboçam um projeto,
um h orizon te de pensam ento/ação. Sem um projeto “radical” (isto
é, que vá à raiz das coisas), o que resta é a capitulação ou o cinis­
m o pseudopragm áticos. A dimensão utópica cessa, todavia, de ser
lúcida, para tom ar-se m ero exercício de saber livresco, se, ao des­
cortinar as lim itações essenciais do status quo e divisar uma alter­
nativa despida de con cessões, deixar paralisar o pensam ento p or
um: “nada, afora a plena autonomia, é relevante ou representa
avanço dem ocrático e desenvolvim ento”. A mudança social não
deve ser confundida com o assalto ao Palácio de Inverno. Se é
certo que as forças de mudança devem contar, cedo ou tarde, com
a reação, inclusive violenta, da ordem vigente, autênticos m ovi­
m entos sociais (referenciados não som ente à esfera da produção,
mas às questões de gênero e racial, da humanização do espaço
urbano etc.) podem , de toda sorte, a longo prazo e p o r efeito
cum ulativo com plexq, provocar alterações dignas de nota, ruptu­
ras. Assim, uma luta pontual e, em si, tem ática e socialm ente limi­
tada — o ativismo de bairro, o m ovim ento regionalista que traz
contradições de classe em seu interior ou a organização das pros­
titutas para defenderem seu território e se defenderem contra a
truculência de uma polícia corrupta — , pode polinizar outras lutas
e qjudar a instaurar uma sinergia transformadora; ademais, ela
pod e permitir aos atores uma ampliação de sua margem de mano­
bra contra os efeitos mais alienantes do processo de globalização
h oje em curso — o que, dialeticamente, pode vir a ser um fator sus-
tentador de um avanço da consciência crítica dos atores e do seu
potencial de com bate. Portanto: a questão do desenvolvim ento,
m esm o quando balizada pela plena autonom ia com o horizonte
essencial (e longínquo), se apresenta, sob a form a de pequenos e
grandes desafios, quotidianamente e nas mais diferentes escalas,
das mais m odestas às m enos acanhadas. Em todos os casos os ato­
res se verão confrontados com necessidades que passam pela
HO GEOGRAFIA; CONCEITOS E TEMAS

defesa de um território, enquanto expressão da m anutenção de


um m od o de vid a, de recu rsos vitais para a sobrevivên cia do
grupo, de uma identidade ou de liberdade de ação.
V ejam os, para ilustrar, um exem plo retirado da realidade
atual das favelas do Rio de Janeiro: a diminuição do espaço de ma­
nobra para a conquista da autonomia (e, p or extensão, do desen­
volvim ento) das com unidades faveladas p or conta da asfixia polí­
tica a elas im posta pelas organizações d o tráfico de drogas. É claro
que antes dessa situação não se podia também falar de autonomia;
as favelas eram o que sem pre foram : viveiros de m ão-de-obra bara­
ta espacialm ente segregados e culturalmente discrim inados pelos
privilegiados da sociedade. No entanto, o próprio pacto clientelis-
ta revelava muitas vezes a astúcia dos favelados em tirar partido
dos oferecim entos dos políticos (vide, a propósito, p or exem plo,
ZALUAR, 1985). A asfixia das associações de m oradores p elo tráfico
de drogas representa, apesar do (relativamente m odesto) trictde
dow n proporcionado pelos lucros do n egócio das drogas, muito
desigualmente repartidos com o em qualquer em preendim ento ca­
pitalista, um retrocesso para os favelados em term os do espaço de
m anobra para a conquista da autonom ia “Seu” território não é,
atualmente, mais “seu” território, m esm o se carregarm os nas as­
pas; “seu” território fo i usurpado p or um grupo e sp ecífico, que
m escla poder (consentim ento) e violência para dom inar com m ão
de ferro uma dada coletividade.
É interessante notar que até a própria paisagem pod e denun­
ciar a involução determinada p or essa territorialização das favelas
p elo tráfico de drogas: uma das lideranças comunitárias inform ais
do M orro da Mangueira (mais especificam ente da parte chamada
Candelária), na cidade do Rio de Janeiro, inform ou ao autor em
entrevista de 23/11/1994 que, desde que o Com ando V erm elho
assumiu o controle do m orro (em fevereiro de 1994), tom an dop
lugar de um bando independente com raízes n o loca l e de tim o
mais fácil, a “com unidade”, amedrontada e desmotivada, fo i ces­
O TERRITÓRIO 111

sando de realizar m utirões e de cuidar dos espaços de uso coleti­


vo. O resultado é que a Mangueira, antes bastante limpa, ficou,
para em pregar as palavras da entrevistada, suja e triste, com apa­
rência de abandonada.18
No caso das favelas, com o nos demais, a possibilidade de se
deter um con trole significativo sobre o seu espaço vivido é, para
uma coletividade, decisivo. Esse “significativo controle” pode não
ser tudo, se se considerá-lo à luz de escalas e exigências mais
abrangentes, nem garante ele a plena autonom ia e uma efetiva ju s­
tiça social. Sem ele, porém , falta um requisito indispensável à
transform ação dos indivíduos em cidadãos e à m obilização p or um
genuíno desenvolvim ento.

A TÍTULO DE CONCLUSÃO

Da introdução e da prim eira seção deste trabalho extraiu-se


que, assim com o o poder não se circunscreve ao Estado nem se
confunde com a violência e a dom inação (vale dizer, com a hetero­
nom ia), da m esm a form a o con ceito de território deve abarcar infi­
nitamente mais que o território do Estado-Nação. T odo espaço
definido e delim itado por e a partir de relações de poder é um ter­
ritório, do quarteirão aterrorizado por uma gangue de jovens até o
b loco constituído pelos países-m em bros da OTAN.
O retrabalhamento do con ceito de território aplainou o terre­
no para a retomada, na segunda seção do trabalho, de uma discus­
são sobre o con ceito de desenvolvim ento. A intenção com isso fo i
a de, na esteira tanto de uma crítica dos critérios usuais de avalia­

18Vale a pena, de passagem , atentar para uma diferen ciação im plícita n esse exem ­
plo: não apenas a territorialização p elo tráfico de drogas em geral, mas sobretu do
a territorialização p or organizações crim inosas cada vez m ais poderosas, com o o
Com ando V erm elho (m aior organização d o tráfico de drogas ca rioca ), que dom i­
na m uitas favelas e im põe ch efes loca is estranhos à “com unidade”, acarreta difi­
culdades para o s m oradores, que tendem a ser m enos respeitados.
112 GEOGRAFIA; CONCEITOS E TEMAS

çã o do desenvolvim ento, substituindo parâmetros excessivam ente


estreitos e disciplinares (p.ex., puramente econ ôm icos) ou atrela­
d os a um universo cultural particular (notadam ente à m oder­
nidade do O cidente capitalista) p elo prin cíp io da au ton om ia,
quanto de uma aceitação do caráter essencial do controle e da ges­
tão territoriais para qualquer organização social (na proporção em
que o poder, uma das dim ensões sociais fundamentais, não pres­
cin de de referen ciais espaciais, seja direta ou indiretam ente),
argumentar acerca da importância da territorialidade para o pro-
cesso de desenvoIvim ento-A territorialidade não é um epifenôm e-
no n o contexto da luta p or uma m aior justiça social e, com o hori­
zonte “utópico”, pela plena autonomia. Para uma dada coletividar
de, gerir autonomamente o seu território e autogerir-se são ape­
nas os dois lados de uma m esm a m oeda, e representam am bos
uma con d itio sin e qua non para uma gestão socialm ente justa dos
recursos contidos no território.
A o focalizar o controle territorial de m odo a ressaltar a sua
im portância não para o poder heterônom o — servindo o território,
inclusive, enquanto construção ou instrumento id eológico ( “pá­
tria”, “região” etc.), para escam otear conflitos sociais internos a
ele — , mas para a autonomia, fugiu-se do padrão corrente de abor­
dagem, que é o de deter-se nos “usos m aquiavélicos” do espaço
(p or m eio de reestruturações do ambiente natural ou construído)
e do território propriamente dito (através de reestruturações dos
lim ites territoriais e da manipulação ideológica de identidades ter­
ritoriais). (Aliás, sobre o papel m ascarador de con tradições de­
sempenhado pelo território e pelas metáforas espaço-territoriais
— “país pobre”, “interesses brasileiros” etc. — , cum pre chamar a
atenção no sentido de que esse é um problem a de adequação da
escala de análise, e não um defeito intrínseco à dim ensão territo­
rial: basta que se encontre uma malha analítica suficientem ente
fina para se visualizar, dentro de um território envolvente, os gru­
p os sociais específicos, as relações que mantêm entre si e os terri­
O TERRITÓRIO 113

tórios e territorialidades próprios aos diversos gru pos.) Com o


breve exam e da dimensão territorial do desenvolvim ento contido
na seçã o 2 o autor pretendeu, ainda, trazer o s aportes propria­
mente conceituais para um terreno onde se revelasse fortem ente a
possível utilidade mais profunda de se gastar tanto papel e tinta
com o con ceito de território. Deveras, a reflexão teórica (e estraté­
gica) sobre o desenvolvim ento, que é um dos mais com plexos,
apaixonantes e polêm icos cam pos da teoria social lato sen su , é
simultaneamente uma das áreas onde se m ostra com mais nitidez
a contribuição do con ceito de território para a ciência social.

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