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INSTITUTO TEOLÓGICO MARIA MATER ECCLESIAE

BACHARELADO EM FILOSOFIA

OS TRÊS ESTÁGIOS DA EXISTÊNCIA HUMANA, SEGUNDO


KIERKEGAARD, NA OBRA O REI LEÃO

AERLON VESTEMBERG SILVA

ITAPECERICA DA SERRA
2022
AERLON VESTEMBERG SILVA

OS TRÊS ESTÁGIOS DA EXISTÊNCIA HUMANA, SEGUNDO


KIERKEGAARD, NA OBRA O REI LEÃO

Monografia apresentada como requisito parcial à


obtenção do título de Bacharel em Filosofia pelo
Instituto Teológico Maria Mater Ecclesiae do Brasil.
Orientador: Prof. MS. Gilberto Lombardo Junior.

ITAPECERICA DA SERRA
2022
Para todos aqueles que, por amor a Jesus e ao
Reino, ousam pensar fora da caixa, a fim de
conduzir as almas à Verdade.
AGRADECIMENTOS

“A minha firmeza é a força de Cristo; o meu fundamento é a Pedra angular”.

Agradeço ao Nosso Senhor Jesus Cristo e a Santíssima Virgem, pela graça de poder concluir
esse trabalho, e acima de tudo pela sua infinita misericórdia para comigo. Aos meus
familiares, modo especialíssimo minha avó paterna Lidia Pereira da Silva (in memorian). Ao
meu bispo D. Romualdo Matias Kujawski, por acreditar em minha vocação e me acolher em
terras portuenses. Ao meu amigo Edivar Silva Sales Junior (Edinho), grande incentivador de
minha vida intelectual. Ao meu pai espiritual padre Claudinei Francisco, SCJ, que nunca
mediu esforços para que eu permanecesse firme na fé. Ao padre Edmilson Costa Benício,
Diocese de Porto Nacional- TO, por sua escuta e bons conselhos, obrigado por ter me
apresentado Sören Kierkegaard. Ao meu assistente padre Jefferson LC e ao padre Daniel LC,
pela amizade sincera. Ao meu diretor espiritual padre Ediclei Araújo LC, Sua presença
sempre me trouxe segurança e sua vida me aponta o Cristo. Aos meus amigos e intercessores,
por vossas orações e afetos. Ao Prof. Ms. Carlos Alberto, Deus lhe conserve em espírito de
Caridade. Agradeço, com máxima vênia, meu orientador Padre Gilberto Lombardo Júnior, o
“Giba”, pela disposição em ajudar nessa etapa da minha formação, obrigado por acreditar na
proposta temática deste Elaboratum.
“O desespero mais comum é não escolhermos
ou não podermos ser nós mesmos, mas a
forma mais profunda de desespero é
escolhermos ser outra pessoa ao invés de nós
mesmos” (Sören Aabye Kierkegaard, O
Desespero Humano).
RESUMO

O presente trabalho tem por finalidade apresentar uma análise teórica e comparativa
entre os estágios da existência humana, segundo Kierkegaard, na obra O Rei Leão. Ele
objetou a afirmação de que é possível encontrar elementos próprios do existencialismo de
Sören na obra cinematográfica supracitada, como angústia, desespero, relação de finito e
infinito, principalmente a respeito de elementos referentes aos estágios estético, ético e
religioso. Na análise comparativa, foi possível constatar a veracidade da filosofia dos estágios
em relação a vida humana universal. Além de conceber que é possível incentivar o pensar
filosófico, abordando temas profundos, por meio do entretenimento.

Palavras-chave: Estágios da Existência Humana, O Rei Leão, Desespero, Angústia,


Existencialismo.
RIASSUNTO

Il presente lavoro si propone di presentare un’analisi teorica e comparativa tra le fasi


dell’esistenza umana, secondo Kierkegaard, in nel Re Leone. Qui si afferma che è possibile
trovare elementi dell’esistenzialismo di Sören nella suddetta opera cinematografica, come
l’angoscia, la disperazione, il rapporto tra finito e infinito, soprattutto per quanto riguarda
degli elementi riferiti alle fasi estetica, etica e religiosa. Nell’analisi comparativa è stato
possibile verificare la corrispondenza della filosofia delle fasi con la vita umana universale.
Inoltre, si rileva che è possibile incoraggiare il pensiero filosofico, avvicinandosi a temi
profondi, attraverso l’intrattenimento.

Parole chiave: Fasi dell'esistenza umana, Il Re Leone, Disperazione, Angoscia,


Esistenzialismo.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 8
CAPÍTULO I: SÖREN KIERKEGAARD ............................................................................................ 10
1.1. Obras .......................................................................................................................................... 12
1.2. Angústia ..................................................................................................................................... 13
1.3. O desespero ................................................................................................................................ 14
1.4. Finito e infinito ........................................................................................................................... 15
1.5. A existência como possibilidade ................................................................................................ 15
CAPÍTULO II: ESTÁGIOS DA EXISTÊNCIA HUMANA ................................................................ 17
2.1. Estágio Estético ......................................................................................................................... 17
2.2. Estágio Ético .............................................................................................................................. 19
2.3. Humor ....................................................................................................................................... 20
2.4. Estágio Religioso ...................................................................................................................... 21
2.5. Os símbolos e a linguagem simbólica ....................................................................................... 22
CAPÍTULO III: O REI LEÃO .............................................................................................................. 25
3.1. Os três estágios da existência humana, segundo Kierkegard, na obra O Rei Leão ................... 27
3.2. O ciclo da vida .......................................................................................................................... 28
3.3. Mufasa, estágio ético ................................................................................................................. 29
3.4. Timão e Pumba, estágio estético ................................................................................................ 31
3.5. Scar, estágio estético .................................................................................................................. 33
3.6. Simba e os estágios da existência humana ................................................................................ 35
3.7. Simba, estágio estético ............................................................................................................... 36
3.8. Simba, estágio ético ................................................................................................................... 38
3.9. O desespero de Simba ................................................................................................................ 40
3.10. Simba, estágio religioso ........................................................................................................... 41
CONCLUSÃO ..................................................................................................................................... 44
REFERÊNCIAS ................................................................................................................................... 45
INTRODUÇÃO

Segundo o filósofo dinamarquês Sören Aabye Kierkegaard, os Estágios da Existência


Humana são três momentos vivenciados pelos indivíduos, conforme as possibilidades de
nutrir relações: seja consigo mesmo (Estágio Estético), seja com o mundo/sociedade (Estágio
Ético) ou relação com Deus/Absoluto (Estágio Religioso). Todo ser humano está diretamente
inserido em um dos estágios, experimentando características que são próprias de cada estágio,
como egoísmo, fidelidade, paixão e confiança no infinito.
A obra o Rei Leão é, até então, a animação de maior bilheteria dos Studios Disney
alcançada entre sua versão clássica de 1994 e a versão remake de 2019. O filme conta a
trajetória de Simba, um leãozinho descendente do Rei Mufasa, destinado a se tornar o
monarca das Terras do Reino. Nesta aventura, ele passa por diversas situações, como exílio e
retorno a sua pátria, e conhece novos amigos e estilos de vida.
Tendo em vista que narrativas cinematográficas trazem em si, muitas vezes, valores e
ensinamentos que tocam à existência humana, é possível fazer uma analogia com elementos
que são cotidianamente vividos pelos indivíduos, como o senso de responsabilidade, a
liberdade, a angústia, o desespero, superação, amizade etc. Isto faz com que se abra um leque
de possibilidades quanto a análise da obra em questão, levando a uma análise filosófica que
está para além do enredo tal qual é contado na trama. Diante da possibilidade de uma análise
filosófica, o seguinte trabalho busca comparar elementos encontrados em personagens do
filme O Rei Leão com Os Três Estágios da Existência Humana, segundo Kierkegaard.
Para nos auxiliar nesse processo de construção, foram analisados os dois filmes de O
Rei Leão, o clássico de 1994 e a versão remake de 2019, além da adaptação em livro do
roteiro do remake por Elizabeth Rudnick. Com mesmo esmero, foram utilizadas como fontes
as obras de Kierkegaard: Diário de um Sedutor, O Conceito de Angústia, Temor e Tremor,
Migalhas Filosóficas, Pós Migalhas Filosóficas e O Desespero Humano, além de
comentadores como France Farago, Patrick Gardiner e Charles Le Blanc. No tocante aos
símbolos e linguagem simbólica, recorremos à obra O que dizem os símbolos, de Maria
Celina de Queiroz Carrera Nasser.
Quanto à estruturação do trabalho, há no primeiro capítulo, vida, obra e temas
importantes para a filosofia dos estágios proposta por Kierkegaard (angústia, desespero, finito
e infinito e existência como possibilidade). No segundo capítulo teremos de fato os Estágios
da Existência Humana propriamente ditos, o Estético, o Ético e o Religioso; além de abordar
8
também o uso dos símbolos e da linguagem simbólica, de modo que sirva como ponte
conectiva entre os estágios da existência humana e a obra O Rei Leão, possibilitando a análise
filosófica a que se propõe.
Por fim, no capítulo terceiro, é apresentada a obra O Rei Leão, suas versões do cinema
e livros, assim como os personagens de importância para esta análise; adentrando assim, nos
três estágios da existência humana, segundo Kierkegaard, na obra O Rei Leão, onde é falado
brevemente sobre o Ciclo da Vida, alguns personagens e os estágios que eles representam na
trama: Mufasa (estágio ético), Timão e Pumba (estágio estético), Scar (estágio estético), e
Simba que ao longo de sua trajetória apresenta, em dados contextos, elementos de todos os
estágios.

9
CAPÍTULO I: SÖREN KIERKEGAARD

Sören Aabye Kierkegaard1 nasceu em 5 de maio de 1813 em Copenhague. Nascido de


uma família Pietista (corrente religiosa dentro do Luteranismo que tinha como primeiro plano
a experiência religiosa pessoal e a reforma interior). Seu pai, Michael Pedersen Kierkegaard,
era comerciante de roupas íntimas. Homem muito religioso que conduzia a criação dos filhos
em uma rigidez moral muito obsessiva. Kierkegaard em um de seus diários faz memória desta
parte sombria do pai: “O terror com que meu pai preenchia minha alma; sua própria
melancolia assustadora e tudo o mais relacionado a isso que não chego a escrever”2. Sua mãe
fora empregada do seu pai no primeiro casamento, casando-se com o Michael quase que
imediatamente após a morte da primeira esposa, dando-lhe sete filhos, sendo Sören o sétimo.
A maior parte dos acontecimentos, que marcaram a vida de Kierkegaard, estão
atrelados a pessoa de seu pai3, este no início de sua juventude fora pastor de ovelhas e em
determinado momento ao sentir o peso da vida, ergue a mão para o céu amaldiçoando Deus
pela injustiça e crueldade de tê-lo posto em tal situação. Pensando na possibilidade de o filho
cometer erro semelhante4, dá então ao jovem uma formação religiosa severa, ao ponto de o
rapaz ter que aprender de cor e copiar os sermões de Mynster (pastor luterano, amigo e
conselheiro espiritual de Michael), fazendo-o assim carregar o peso de seu antigo crime.
Uma influência paterna importante a ser mencionada é o fato de seu pai fazer passeios
e jogos que estimulavam a imaginação do rapaz, isto refletirá em sua formação literária: “Já
comecei pela reflexão. Não adquiri um pouco de reflexão com a idade. Sou, na verdade,
reflexão do começo a o fim”.5
Certa vez estando o pai embriagado6, Kierkegaard descobre seu segredo mais terrível,
que veio a representar um “terremoto” decisivo na vida do rapaz: a tomada de conhecimento
de que Michael Kierkegaard violentou a criada (mãe de Sören), quando sua primeira esposa
ainda estava viva. Após este fato, o jovem universitário altera seu modo de vida, lançando-se
em um estilo desregrado, passa a vestir-se com elegância e requinte. Conhece o Don

1
Cf. GARDINER, Patrick. Mestres do Saber. Trad. Antônio Carlos Vilela. São Paulo: Edições Loyola, 2013. p.
11.
2
Cf. Ibidem. p. 11.
3
LE BLANC, Charles. Figuras do Saber. Trad. Marina Appenzeller. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p.
30.
4
Cf. Ibidem. p. 31.
5
Cf. Ibidem. p. 32.
6
Cf. Ibidem. p. 30. p. 33.
10
Giovanni, de Mozart7, este lhe abre todo um universo de sensibilidade e alimenta suas
descobertas físicas e intelectuais, assumindo postura de boêmio, aparentemente superficial e
sem seriedade. “A experiência de terremoto” vivido por Kierkegaard o levou a vivenciar a
angustia8, o desespero, mas também o mergulhou na meditação interior que o lhe abriu a
respeito da possibilidade da graça.
Nesta época, a Dinamarca era filha intelectual da Alemanha, vivia-se o Iluminismo,
uma confiança exagerada na razão e no conhecimento. No século XIX surge um movimento
de reação ao Iluminismo, chamado Romantismo. Este movimento propõe outros caminhos
além da razão: a emoção, o amor à natureza, os sentimentos, valorização das crianças e
mulheres etc. Caminhos que transcendem a razão. A razão como potencial infinito, força que
domina o mundo e que vai além do mundo, a razão se torna assim uma Força Absoluta. Os
românticos enfatizavam o conceito de infinito, infinito como sentimento. A arte e a religião
exprimem este sentimento de infinito, expressam aquilo que está além do mundo fenomênico.
Além do conceito de infinito, que os românticos introduzem na intelectualidade da época,
outro conceito muito caro para o Romantismo e que aparece na obra de mestrado de
Kierkegaard, é o de ironia:

O século XIX filosófico abre-se pelo confronto e pelo diálogo do racionalismo das luzes
com o idealismo da cultura romântica. [...] Um entende por infinito a razão absoluta, isto é,
um movimento do espírito que avança com rigor e necessidade a partir de uma ideia, de tal
forma que cada uma segue a anterior e pode dela ser deduzida a priori; [...] o outro
compreende o infinito como um sentimento, a própria expressão de uma liberdade sem
fronteiras, sem determinação, além de qualquer forma. Esse infinito exprime-se por meio
das atividades humanas que estão mais próximas do sentimento: a arte e a religião.9

Michael Kierkegaard morre em 1855. Em 1840 Sören fica noivo de Regine Olsen,
uma das principais personagens que além de acompanhá-lo na provação do luto e durante os
estudos, marcaria profundamente sua existência e sua obra literária. Em nota10 do Diário de
1839 (2 de fevereiro), Kierkegaard escreve: “Você que é rainha (Regine) de meu coração,
escondida no meu âmago mais secreto...” (II A 347).

7
Personagem principal da “Opera Don Giovanni”, de Mozart. Personagem inspirado na lenda de Don Juan, de
origem espanhola. Don Giovanni é um conquistador, sedutor de donzelas com falsa promessa de casamento.
Fonte: http://radios.ebc.com.br/opera-completa/2017/08/opera-completa-traz-don-giovanni-de-mozart. Acessado
em 22 de fevereiro de 2022.
8
LE BLANC, Charles. Figuras do Saber. Trad. Marina Appenzeller. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p.
34.
9
Ibidem. p. 23. p. 24. p. 25.
10
Ibidem, p. 34.
11
Em 1841 Sören Kierkegaard defende sua dissertação, “O Conceito de Ironia”, para
obter o grau de Magister Artium; no mesmo ano no dia 11 de outubro viria a romper o
noivado com sua amada. Estando noivo de Regine Olsen, nas vésperas de fazer o pedido de
casamento, ele não consegue dar continuidade ao mesmo decidindo-se por não mais casar
com a jovem.
Kierkegaard claramente a amava, porém, tendo consciência da seriedade do
Matrimonio, apenas não queria que Regine adentrasse no “seu mundo espiritual pleno de
desolação”. O Comentador Charles Le Blanc cita um trecho do diário de Kierkegaard, onde
diz: “Deveria iniciá-la em coisas pavorosas, minha relação com meu pai, sua melancolia, a
noite eterna ali alimentada, meu desvario, meus desejos e meus excessos”.11
As ideias de Kierkegaard contrapõem diretamente as de Hegel e sua “teologia
especulativa”. Hegel propõe um sistema completo com três dimensões: lógica, natureza e o
Espírito. O primeiro tem objetivo de fazer a análise e o relacionamento das outras dimensões
com a ideia absoluta. A segunda tem uma relação com todas as disciplinas especializadas, e o
Espírito inclui toda camada de nossa consciência e em relação com o que somos. Hegel vai
afirmar que Jesus Cristo, o qual ele chama de o Encarnado, não tem o devido poder para fazer
reconciliação com Deus e o homem, ele aponta que essa reconciliação sempre existiu antes de
o Encarnado vir ao mundo, uma unidade subjacente. Nesse pensamento, Kierkegaard ataca
Hegel dizendo que a reconciliação que Jesus faz entre o Pai e o homem é de suma
importância, somente pela graça de Deus que é possível a comunhão de Deus com o homem.
Sören ainda afirma que a Palavra de Deus, ou seja, Jesus, ele sim é o intermediário dessa
comunhão12.

1.1. Obras.

Em 1843, sob o pseudônimo de Victor Eremita, escreve a obra Enten- Eller (ou isso
ou aquilo), o primeiro de uma série de livros que trata de temas filosóficos; “Ou... Ou...” foi
publicado em dois grandes volumes, oito meses depois apareceram as obras A repetição e
Temor e tremor, seguidos da publicação de Migalhas filosóficas e O Conceito de Angústia,
em 1844. Em 1849 escreve a obra Doença até a morte, trata-se de um estudo sobre a
patologia espiritual que, era de certa forma uma continuação da obra Conceito de Angústia.

11
Le Blanc, APUD Kierkegaard Ibidem, p. 36.
12
ALLEN,D. SPRINGSTED, E. O. Filosofia para entender teologia. Trad. Daniel da Costa. 3ª ed. Santo André
(SP): Academia Cristã; São Paulo: Paulus, 2010. p. 260.
12
O filósofo dinamarquês demonstrou que temas como a angústia, ironia e o desespero,
são condições próprias da existência humana, auxiliando o indivíduo a se tornar quem ele
realmente deve ser.
Durante sua curta passagem pelo mundo produziu algumas obras, que retratavam – por
vezes indiretamente – muito do que ele mesmo experimentou em sua vida. E se utilizou de
pseudônimos como Johannes Clímacus, Nicolaus Notabene, entre outros.
Entre suas obras, estão:
 O Conceito de Ironia constantemente Referido a Sócrates (1840)

 Enten – Eller (Ou isso, ou aquilo: um fragmento de vida) (1843)

 Diário de um Sedutor (1843)

 Temor e Tremor (1843)

 Migalhas Filosóficas (1844)

 Conceito de Angústia (1844)

 Post Scriptum Final Não – Cientifico às Migalhas Filosóficas v1 (1846)

 Post Scriptum Final Não – Cientifico às Migalhas Filosóficas v2 (1846)

 As Obras do Amor (1847)

 Desespero Humano (1849)

1.2. Angústia.

A angústia é um dos temas filosóficos que fazem parte da existência concreta do ser
humano. Vários filósofos abordam essa temática, como Heidegger que a tem como a

13
insegurança do ser diante do Dasein13; Sartre, para quem a angústia é a consciência da
responsabilidade radical na qual cada um dos atos humanos se engaja14. Já para Kierkegaard,
a angústia é a vertigem da liberdade.
Sören diz que o Absoluto é transcendência. A verdade absoluta está fora do alcance
humano, faça ele o que fizer e a isto está condicionado. A fé que não é certeza objetiva da
verdade, mas uma certeza subjetiva do verdadeiro é um recurso do homem entregue ao
possível. “A filosofia dos estágios colocou: o mundo oferece uma infinidade de possibilidades
ao homem. A angústia é precisamente o que o possível gera no homem”15.
Em Kierkegaard, a angústia é um estado que manifesta a relação do indivíduo com o
mundo, determinada pela liberdade. A angústia é identificada em dois tipos: a Objetiva e a
Subjetiva. A primeira diz respeito a possibilidade de poder, ou seja, de sua liberdade. Já a
segunda, diz respeito a consciência de pecado, onde o indivíduo se depara com a hipótese de
salvação. Quando a hipótese de salvação é posta como realidade, é que esta angústia é
superada. A respeito da angústia, segundo o pensar kierkegaardiano, Charles Le Blanc diz: “A
originalidade da reflexão de Kierkegaard, reconhecidas pelas filosofias existenciais
contemporâneas, é sustentar energicamente que a angústia é a condição fundamental do
homem diante do mundo, diante do possível, fruto de sua liberdade”.16

1.3. O desespero.

Para entender a ideia Kiekegaardiana de Desespero, deve-se levar em conta que o “eu”
tem aspecto finito e infinito. O “eu” sempre estará em evolução na existência, não tem
existência real, e não é senão o que será. Enquanto não consegue tornar-se ele próprio, o eu
não é ele próprio. Mas não ser ele próprio é desespero. Ao mergulhar em uma orientação eu é
Deus, o “eu” acaba sendo infinito, o eu será devorado pelo imaginário, colocando o homem
em uma embriaguez. Por vezes, pode-se achar algo sem sentido no que se refere existir para
Deus, nesse sentido o homem quando não consegue regressar ao seu eu, acaba sendo ele
próprio:

13
Segundo ABBAGNANO, no seu Dicionário de Filosofia, no sentido Heideggeriano: Dasein, ser-aí e
presença. Ele significa, na origem, existência real, tanto das coisas finitas quanto de Deus.
14
LE BLANC, Charles. Figuras do Saber. Trad. Marina Appenzeller. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p.
80.
15
Ibidem, p. 80.
16
Ibidem, p. 83.
14
O homem é espírito. Mas o que é o espírito? É o eu. Mas, então. E o eu? O eu é uma
relação que se relaciona consigo mesma; em outras palavras, é, na relação, a orientação
interior dessa relação; o eu não é a relação, mas a volta sobre si mesma da relação. O
homem é uma síntese de infinito e de finito, de temporal e de eterno, de liberdade e de
necessidade, em suma, uma síntese. Uma síntese é a relação de dois termos.17

Kierkegaard diz que o desespero é a doença até a morte, o que não significa um mal;
mas sim que o desesperado anseia pela morte do seu Eu, a morte de um eu que não pode
morrer.

1.4. Finito e infinito.

Kierkegaard afirma que pode haver diversas personificações do desespero que tem
como meio o eu. Sendo o eu formado pelo finito e infinito, tendo como paralelo a liberdade.
Mas é a consciência que determinará. Um ou outro aspecto ajudará nessa formação que será à
vontade, quanto maior for à vontade, assim vai ser a consciência de si mesmo. Nessa junção
se tem o contato com Deus, sem Ele não se pode fazer nada.18
Colocando como paralelo o infinito, percebe-se que o desespero é imaginário, e
mergulha até Deus. A impossibilidade de vencer o desespero só é uma impossibilidade para
aquele que não acredita em Deus, para aquele que não tem fé.
Assim o único remédio para o desespero é a fé, pois isto significa crer que para Deus
tudo é possível:

Frente a um desmaio grita-se: Água! Água de Colônia! Gotas de Hofmann! No entanto,


quando alguém se desespera, grita-se: Possível, possível! Somente o possível o pode salvar!
Uma possibilidade: e o nosso desesperado recomeça a respirar, revive, porque sem
“possível”, por assim dizer, não se respira. Algumas vezes para arranjá-lo o engenho
humano, mas ao termo, quando se trata de crer, um único remédio existe: a Deus tudo é
possível.19

1.5. A existência como possibilidade.

O conceito de possibilidade é a pedra angular da construção filosófica de


Kierkegaard20. Para ele, o possível não remete a juízo sobre o advir das coisas ou sobrevir de
um estado de coisas, mas caracteriza o existir do homem. A vida não se trata somente de um

17
KIERKEGAARD, Sören. O Desespero Humano. São Paulo: Martin Claret, 2011. p. 19.
18
Ibidem, p. 34.
19
Ibidem, p. 41.
20
LE BLANC, Charles. Figuras do Saber. Trad. Marina Appenzeller. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p.
46.
15
bios, que tem movimento. A vida do Homem é existência, é a relação com o mundo e com os
demais a sua volta. O existir é contingencia absoluta (Aquilo que pode não ser, ou cujo ser
não implica qualquer contradição )21: o existir não conhece outra necessidade a não ser a das
escolhas exigidas por um existir livre sem determinação.22 Sören diz que entre a Humanidade,
prevalece o individuo: a espécie não decide por ele. É no confronto com os possíveis que ele
dá forma a sua singularidade. A hesitação em escolher, o sentimento de mal estar diante do
desconhecido, é a angustia. Le Blanc a esse respeito comenta: “Se a existência é
possibilidade, a existência individual é a angústia. Se a individualidade é o modo de ser
fundamental do homem diante da existência, sua dimensão principal é, portanto a angústia”.23
O desespero, no ato que nos faz escolher o possível, enfatiza que “o homem é uma
potencia de escolha” e mostra o quanto a vida é feita de possibilidades. Kierkegaard toma
como ponto de partida o desespero e chega à existência, isto é, à possibilidade:

Frente ao infinito a afinidade limita: da mesma forma a necessidade exerce no campo do


possível, a função de reter. O eu, inicialmente, como síntese de finito e de infinito, é dado,
existe katà dynamin; em seguida, para se transformar, projeta-se sobre a tela da imaginação
e é assim se lhe revela o infinito do possível. O eu katà dynamin contém tanto de possível
quanto de necessidade, já que é ele mesmo, mas deve realizá-lo. O eu é necessidade por ser
ele mesmo, e é possível porque deve realizar-se.24

21
Leibniz, Conversation sur la liberte et destin, in Principes de la Nature et de la Grâce, Monadologie et autres
textes, Paris, Garnier- Flammarion, 1996, p. 47.
22
LE BLANC, C. Figuras do Saber. Trad. Marina Appenzeller. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p. 48.
23
Ibidem. p. 51.
24
KIERKEGAARD, Sören. O Desespero Humano. São Paulo: Martin Claret, 2011. p. 19.
16
CAPÍTULO II: ESTÁGIOS DA EXISTÊNCIA HUMANA

O indivíduo se constrói como Ser Humano ao lidar com diversos fatores e


acontecimentos que acabam por gerar uma sensação de Angústia. Angústia esta que é gerada
pelas possibilidades de escolha frente ao desconhecido, relacionando-se consigo mesmo, com
as outras pessoas e com Deus. Estas três esferas relacionais representam as possiblidades
fundamentais da existência humana, segundo Kierkegaard. A respeito destas esferas básicas
da existência, chamadas estágios – ou estágios – Sören faz alusões em várias de suas obras,
dentre elas estão Either/Or, onde aparecem de forma mais clara, assim como em Pós –
Escritos Às Migalhas Filosóficas e Temor e Tremor, além de obras que abrem margem para
um maior entendimento a respeito dos pormenores envolvendo estes estágios da existência,
como é o caso da obra O Desespero Humano.
“Existem três esferas de existência: a estética, a ética e a religiosa. A essas esferas
correspondem duas zonas-limites: a ironia é a zona- limite entre a estética e a ética; o humor,
a zona- limite entre a ética e a religiosa”.25 Sobre os estágios, é importante frisar que não são
eles que se transformam evoluindo de um ao outro, mas sim é o individuo quem muda,
experimentando, avançando ou recuando a cada uma das esferas, assim o faz sem necessidade
de lógica ou dialética, mas com a opção de romper ou não com aquilo ao qual está envolvido.

2.1. Estágio Estético.

O Estágio Estético é o estágio do poeta, do artista, do músico: do sedutor. O sujeito


que se abandona na busca pelo prazer, e é representado pela figura do Don Juan, abandonado
no imediato. Neste estágio o sujeito deixa-se levar pelo sentimento, não aceitando a realidade
como ela, de fato é. O esteta é conduzido pelos impulsos, não pela racionalidade, ligado ao
belo, tendo o prazer como meta. Esta busca o leva a ter em vista mais a possibilidade de
realização do que a própria realização, satisfazendo-se com a conquista mais do que com o
objeto conquistado: o que lhe satisfaz é o instante da conquista.
Para Kierkegaard, este individuo acaba sofrendo por viver no sofrimento da busca sem
realização. É um individuo que não se satisfaz, vive a perpetua busca por conquistas, por isso
sofre:

25
Kierkegaard. Sören, apud Le Blanc, Charles. Figuras do Saber. São Paulo: Estação liberdade, 2003. p. 53.
17
Don Juan é uma imagem do jogo de múltiplos acasos como essas ondas encapeladas
na superfície do mar que compõe por um breve momento uma forma mal e mal
esboçada: uma pessoa sem personalidade que se reduz a aflorar a existência. O
movimento variável do mar é aqui uma metáfora para a vida estética, carente de
reflexão, toda fluência e turbulência. A sensualidade indeterminada é a esfera da
mobilidade inapreensível que nenhuma imagem ou conceito algum podem fixar
adequadamente, mas somente a música pode exprimir, porque ela é, para lá da esfera
da representação, aquilo em que se recolhe a essência a-histórica do desejo destinado
a repetição.26

O esteta é uma pessoa que está em constante fuga de si. Nada lhe satisfaz porque nada
que ele tem está ligado à sua alma, tudo o distancia dele mesmo, vive um eterno conflito entre
o eu e o Eu mesmo. Busca fugir do seu desespero de não se realizar. O esteta não tem
maturidade para escolher, como se o fato de o não escolher o deixasse numa condição
existencial única. Ele vive o instante e está preso ao instante. O esteta acompanha o seu bel-
prazer, o prazer é breve, o pesar é longo; o prazer é breve a alma é longa, por isso ele nunca se
satisfaz, pois, a alma é longa. O importante não é o objeto, mas o caminho. France Farago,
em sua obra Compreender Kierkegaard diz: “Trata-se realmente de um homem insensível,
desorientado, que esconde o desespero em uma figa incessante, uma negação assassina. O
esteta, que tudo sacrifica à busca do prazer imediato, vive de fato na dor”.27
Ainda que o esteta use a outra pessoa, sua intenção final não é a de meramente usar o
outro em si, mas sua realização está muito mais no ato da conquista do que no objeto
conquistado. Ao conquistar, ele abandona. Seu prazer não está em abandonar, mas em
conquistar; porém, ele precisa abandonar para efetuar sua conquista, consequentemente
alcançando seu prazer. Ele é um escravo do prazer:

O esteta limita-se ao interessante, a passar sem repouso de uma situação interessante


a outra. E quem nada procura na vida além de sua satisfação logo sofre com a
brevidade dos dias diante da infinidade dos desejos. E ei-lo precipitado na angústia,
que é no que se resume, definitivamente, a vida do esteta.28

26
FARAGO, France. Compreender Kierkegaard. Petrópólis, RJ: Editora Vozes, 2011. p. 121.
27
Ibdem. p. 122.
28
LE BLANC, Charles. Figuras do Saber. Trad. Marina Appenzeller. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p.
57.
18
2.2. Estágio Ético.

No estágio ético o Homem submete-se ao bem moral e por si mesmo, passando a viver
sob a moralidade. Trata-se não mais do indivíduo que busca o prazer, mas do indivíduo que
ordena sua vida em cumprimento do dever.
No estágio estético a meta era o prazer, nesta agora a meta é o dever. É um homem
sério, de decisões consistentes. O ético refugia-se na consideração, tem forças para
permanecer no dever porque ele tem uma alta consideração na sociedade. O ético não vive
conflito entre o dever e o seu desejo, ele consegue compatibilizar bem o dever estabelecido
pela sociedade e o seu desejo. Ele abandona a si mesmo pelo outro:

Na vida ética, o homem submete-se a uma forma, conforma-se ao universal;


renuncia ao instante, renuncia a ser excepcional. Da mesma maneira que a vida
estética é dominada pela figura do sedutor, a vida ética é dominada pelo esposo
(Fidelidade).29

Sacrifica sua interioridade pelo apreço da sociedade refugiando-se no papel social, por
exemplo: certo homem estudante em seminário católico e que tem por objetivo ser sacerdote,
ao se apresentar dirá: “sou seminarista X”. Porém, ser seminarista não é exatamente quem o
“individuo X” é, mas sim quem ele está sendo em dada realidade social (no caso o seminário).
O ético, ainda que sinta prazer em ser padronizado, corre o risco de se perder na aprovação
social, omitindo assim o uso de sua subjetividade. Deixa de ser um Eu para ser um Nós. Sua
interioridade, sua subjetividade, não percebe que ele é movido pelos outros e não pelo Eu. É
conciliando sua vida social com o dever que ele exerce sua liberdade:

Por isso a questão: “O que sou eu?”, o ético pode responder: “A liberdade!”. O ético
é aquele que quer livremente o que quer e que consegue conciliar sua vontade com a
vida social sob a forma de dever... É aquele que, cumprindo sua tarefa faz a
liberdade triunfar. É um herói, pois o herói jamais abandona sua guarita mesmo que
sitiada. O ético realiza o geral e passando a ideia de um homem comum, é o
verdadeiro homem extraordinário.30

29
Ibdem. p. 61.
30
Ibdem. p. 64.
19
2.3. Humor.

Quando o indivíduo toma consciência entre a finitude e a eternidade, percebe os


limites de sua condição humana; percebe que a vida é marcada pelo erro e que o cumprimento
dos deveres não lava sua consciência do erro.
A lei só existe por haver um erro a ser evitado. Ainda que o ético argumente que sua
vida está ligada ao dever e não ao erro, ele percebe que ainda sim as vezes ele erra e que as
coisas boas feitas, o dever cumprido, não são capazes de apagar os erros cometidos. O ético
começa então a desenvolver sua subjetividade ao perceber essa ligação estrita entre a
existência e o erro:

O ético que segue as normas morais e que compreendeu que possui uma história
pessoal vê que esta inclui o bem e o mal, o justo e o injusto, etc. o ético reconhece
em sua história pessoal as próprias falhas da condição humana e chega a conceber
que está em nossa natureza fazer o mal, ser injusto, em suma, pecar, ideia que não
poderia aflorar na mente do esteta, ocupado demais em perseguir prazeres, ou na do
ironista, desapegado do mundo.31

O ético percebe que o cumprimento do dever não basta para lavar a vida interior do
pecado, dos erros que nela carrega. Neste último momento do estágio ético o indivíduo
percebe que só o arrependimento é capaz de lavar o pecado. Reconhecendo a necessidade do
arrependimento, percebe que o erro é pecado, e não simplesmente descumprimento do dever.
Ao tomar consciência de que existência e erro são indissociáveis, ele adentra na zona
existencial chamada de Humor.
O Humor é a zona escura entre o ético e o religioso. É um “rir de si mesmo”, de sua
condição finita ante o infinito”. É a percepção do engano em que vivia. Questiona a si mesmo,
toma consciência do seu nada. Para Kierkegaard, “o humor exprime-se em seu mais alto nível
no cristianismo, porque o ‘homem religioso’ sente que seus esforços não são absolutamente
nada” (Jean Wahl, Études Kierkegaardiennes). Por isso, assume certo desinteresse a respeito
de sua situação existencial. Ao interiorizar o distanciamento entende a Fé como resposta,
adentrando no Estágio Religioso.
O Humor prepara o que Kierkegaard chama de Salto na Fé. A figura apresentada como
modelo deste salto, é Abraão. Abraão é o cavaleiro da fé que, apesar do insólito pedido de
Deus (sacrificar seu filho Isaac), não tem a fé abalada. Para cumprir seu dever para com o
31
Ibdem. p. 66.
20
divino, ele não pensa na opinião dos homens, assim como também não se atém a um desejo
pessoal, egoísta. Abraão, assim como o humorista, dá então um salto no escuro, sem
interferência de outros na decisão, sem necessidade de guia. O humorista consciente de que a
vida finita é menos importante que o dever para com o infinito, salta então em direção ao
eterno:

Mas aquele que ama Deus não tem necessidade de lágrimas nem de admiração;
esquece o sofrimento no amor, e tão completamente que não deixará atrás de si o
mínimo traço de dor, se não fosse o próprio Deus a recordar-lhe; porque vive no
secreto, conhece a angústia, conta as lágrimas e nada esquece. Por tanto, ou se
verifica o paradoxo de forma que o indivíduo se encontra como tal em relação com o
absoluto, ou então Abraão está perdido.32

2.4. Estágio Religioso.

O estágio religioso é o “encontro dos sós”. A vida do só com o Só. É Abraão que
caminha solitário, levando o filho para o sacrifício, obediente ao querer de Deus. A fé é a
experiência mais profunda do homem interior, de sua individualidade, nela o indivíduo se
encontra ao encontrar o Outro. A fé é a síntese que possibilita o encontro do finito com o
infinito, entre o temporal e o eterno. Para Kierkegaard a fé a única saída para toda a
desarmonia vivida anteriormente:

Mas aquele que chegou até à fé, e pouco importa que tenha dons eminentes ou que
seja uma alma simples, esse não detém na fé; indignar-se-ia até lhe lho disséssemos,
tal como um amante se irritaria a ouvir dizer que detinha no amor: não, me fixo,
responderia, porque toda minha vida se encontra jogada ali. Não vai, contudo, mais
além, não passa a outro estágio, porque logo que o descobre nova relação o solicita.
É preciso ir mais além, é preciso ir mais além.33

É no estágio religioso que ocorre a liberdade. Pois neste estágio o individuo não é
escravo dos seus instintos, desejos ou exigências morais sociais. Ele é livre, pois encontra a
Verdade, e é na Verdade que a liberdade acontece, quando ele encontra consigo mesmo,
Naquele que o criou. A fé suprime o raciocínio, mas não suprime a razão: ela suprime a
lógica, mas põe o pensamento no paradoxo:

32
KIERKEGAARD, Sören. Temor e Tremor. São Paulo: Abril Cultural, 1979
33
Ibdem
21
O Paradoxo da fé consiste, portanto, em que o indivíduo é superior ao geral, de
maneira que, para recordar uma distinção dogmática hoje raramente é usada, o
Indivíduo determina a sua relação com o geral tomando como referência o absoluto,
e não a relação ao absoluto em referência ao geral... há um dever absoluto para com
Deus; porque, nesse dever, o Indivíduo se refere como tal absolutamente ao
absoluto.34

2.5. Os símbolos e a linguagem simbólica.

O Ser Humano é transcendente e um ser de relações. Por meio da linguagem estas


relações se estabelecem, considerando que esta é uma expressão do pensamento. Desde os
primórdios da História, os símbolos funcionam muitas vezes como pontes do entendimento
entre aquele que envia a mensagem e aquele que a recebe. Para isso se faz necessário que haja
um código comum para que seja entendido o que está sendo dito e proposto. É, ainda,
necessário que haja a relação entre os sujeitos, para que por meio da linguagem haja o
conhecimento de “quem sou” e de “quem é o outro”:

A linguagem é matéria do pensamento, da experiência e elemento próprio da


comunicação social. Não sendo estática, imóvel, ela se transforma durante as
diferentes épocas e toma diferentes formas nos diversos povos. A língua é a parte
social da linguagem, exterior ao indivíduo; não é modificável pelo falante e parece
obedecer às leis (código linguístico) de um contrato social que seria reconhecido por
todos os membros da comunidade.35

Desse modo, nessa relação com o outro e com o mundo, é que o Homem dá nome e
descreve o mundo, ainda que nem sempre se consiga expressar com certeza a respeito do fato
vivido ou observado. A transcendência é uma categoria essencial do Homem que se dá nas
estruturas fundamentais do espirito humano, onde estão abarcados os símbolos e conceitos
que exprimem seu conhecimento a respeito de si, dos outros e do mundo:

Para que aconteça a relação intersubjetiva, é necessário que os dois sujeitos se


reconheçam como sujeitos, na infinitude de cada um dos dois sujeitos (tudo aquilo
que cada um pode ser) e na finitude da linguagem (os limites que as palavras e os

34
Ibdem
35
NASSER, Maria Celina de Queiroz Carrera. O que dizem os símbolos?. São Paulo: Paulus, 2003. p. 31.
22
gestos possuem)... A transcendência como experiência humana revela uma das
dimensões mais profundas e intensas do existir humano. Aquela que revela o que
mais de humano mora em nós: o transcendente.36

O uso de símbolos em histórias, narrações poéticas, música, quadros, e outros meios


de transmissão de uma mensagem, se dá pelo fato de o símbolo ser vivo e trazer dentro de si a
afirmação e a negação daquilo que ele representa. A linguagem simbólica traz em si a
capacidade de ampliar a compreensão da mensagem por ela enviada, a própria história
humana apresenta em todos os seus aspectos, o uso dos símbolos e da linguagem simbólica
para representar realidades mais profundas, proporcionando conhecimento e
autoconhecimento37; acontece quando ao invés de conter um sentido objetivo, contém um
sentido oculto, que não é diretamente apresentado. Nesse caso, o uso da linguagem simbólica
tem atribuição explicativa de um novo significado, ampliando o sentido da mensagem:

A linguagem simbólica, considerada enquanto um ato de amor, promove um


lançamento e uma entrega de cada um de nós para o que não se consegue nomear,
para o que não se consegue resposta e explicação imediata, buscando o
conhecimento que é, ao mesmo tempo, autoconhecimento. Compreendendo alguns
símbolos, compreende-se algo mais de si mesmo.38

Para entender melhor o uso da linguagem, é importante conhecer dois conceitos


importantes: Linguagem Denotativa39 e Linguagem Conotativa40. Linguagem Denotativa é
aquela na qual a palavra enquanto um signo (qualquer objeto ou evento, usado com menção a
outro objeto ou evento) contém somente o significado aceito pelos códigos linguísticos e com
sentido estrito ao do dicionário, não havendo abertura para ambiguidades (podendo as vezes,
depender do contexto ao qual está inserida, caso haja mais de um significado para
determinado termo). Já a Linguagem Conotativa é o uso do sentido figurado, sentido
simbólico, quando o termo vai além do seu significado natural, já que muitas palavras

36
Ibdem
37
Ibdem
38
Ibdem
39
Adj. Indicativo; literal. BUENO, Silveira, 1898-1989. Silveira Bueno: minidicionário da língua portuguesa.
2.ed. São Paulo:FTD, 2007. p. 223.
40
Ibdem. p. 189. Que tem Conotação;Conotação: substantivo feminino. Conexão, relação mútua entre duas
coisas; sentido secundário que se soma aos significados das palavras.
23
apresentam uma forte carga de sensações e sentimentos. Linguagem Denotativa e Conotativa
são sinônimos de Sentido Literal e Metáfora.41
Tendo em vista a necessidade de se conceber um significado que esteja para além do
literal, o símbolo trás em si esta capacidade de dialogar com o real e o imaginário do emissor
e do remetente da mensagem, provocando uma reflexão sempre diferente de acordo com a
época ou contexto no qual ele é apresentado:

O símbolo contém o oculto e o revelado; o conhecido e o desconhecido; o imanente


e o transcendente, enquanto está vivo... como em tudo que há energia, o símbolo
também possui uma energia que é capaz de transformar e modificar as emoções e as
coisas... A metáfora é uma relação que ocorre dentro da linguagem denotativa
elevando o significado além dos limites semânticos impostos.42

41
Ibdem. p. 509. Figura que consiste na substituição de uma palavra ou termo por outra em virtude de certa
relação de semelhança.
42
NASSER, Maria Celina de Queiroz Carrera. O que dizem os símbolos?. São Paulo: Paulus, 2003. p. 38.
24
CAPÍTULO III: O REI LEÃO

O Rei Leão é um clássico cinematográfico, produzido pela Disney em 1994 e dirigido


por Roger Aller e Minkoff, com roteiro de Linda Woolverton e Lorna Cook. É o filme com
maior arrecadação em bilheteria, somando mais de 1,084 bilhão de dólares, dentre as obras
produzidas pela empresa, ganhando também uma adaptação em livro, escrito por Lily Murray,
além de receber uma versão para teatro na Brodway. Em 2019, ano em que a obra original
completou vinte e cinco anos, foi lançado um remake fotorrealista que foi tão bem sucedido
que tornou-se, entre as obras de remake de clássicos da Disney, o primeiro lugar com mais de
US$ 1,3 bilhão no mundo43, sendo dirigido por Jon Favreau e com roteiro de Jeff Nathanson;
O remake do clássico, ganhou uma versão adaptada em livro, desta vez escrito por Elizabeth
Rudnick, responsável por outras adaptações em livros de filmes da Disney.
O filme, O Rei Leão, narra a história de Simba, um filhote de leão, filho de Mufasa,
sendo, portanto, herdeiro do trono, e de Sarabi, a rainha das Terras do Reino. Todos os
animais, plantas e demais elementos que compõe a trama fazem parte de um mover
existencial chamado “Ciclo da Vida”, que fica evidente em certos momentos da historia e em
outros de forma subentendida.
Dentre os personagens que possuem destaque está Scar, irmão de Mufasa, que procura
de todas as formas tornar-se o rei, inclusive arquiteta como assassinar Simba e seu pai,
primeiro atiçando o sobrinho para ir em um cemitério de elefantes onde foi atacado por hienas
– sendo salvo por Mufasa – e em outro fatídico momento, armou uma emboscada para Simba,
que se vê alvo de uma debandada de gnus. Mufasa se sacrifica para salvar o filho e Simba
torna-se suspeito da morte do pai, sendo aconselhado pelo tio a fugir para longe e não mais
regressar. Com a fuga do sobrinho e a morte do irmão, Scar por ser o próximo na linha de
sucessão, torna-se o rei.
Existem ainda outros personagens que poderiam ser mencionados, como Rafiki, um
macaco que se assemelha a um mandril, mas com aspectos próprios do personagem, Nala,
melhor amiga de Simba e um calau chamado Zazu; porém, destaco os anteriormente
mencionados, pois serão objetos da nossa analogia com os Estágios da Existência Humana, de
Kierkegaard.
Timão e Pumba encontram Simba desacordado em meio ao deserto, após fuga devido
a morte de seu pai. O leãozinho está envolto de abutres, que são afastados por Pumba. Quando

43
http://www.omelete.com.br/walt-disney/o-rei-leao-supera-pantera-negra-e-se-torna-a-10a-maior-bilheteria-da-
historia
25
o filhote se recompõe demonstrando estar triste e sem rumo a seguir, é quando lhe é
apresentado um modo de vida chamado Hakuna Matata. Este termo “Hakuna Matata” é o
lema do grupo ao qual Simba passa a integrar, e diz respeito a viver a vida sem preocupações,
de forma descontraída, e isto leva o novo amigo a mudar seus hábitos alimentares, sociais e
consequentemente, tornando-se um comedor de vermes e pequenos insetos “viscosos, mas
gostosos”.
Anos depois, devida a má administração das Terras do Reino por parte do – então – rei
Scar, que deixa o reino praticamente inabitável, Nala foge a procura de alimento para
sobreviver, e após um ataque a Timão se depara com Simba, agora crescido, quase
irreconhecível.
Após o reencontro a leoa insiste para que o amigo retorne às Terras do Reino,
recebendo uma negativa como resposta. Simba ainda traz em si a culpa por acreditar ter sido o
responsável pela morte de seu pai. Confuso e em crise de identidade, o leão foge para longe
de todos, encontrando assim Rafiki. O babuíno, que ao longo da trama aparece em momentos
solenes e representa visivelmente uma liderança religiosa com grande prestigio entre os
animais.
Simba retorna junto com seus amigos às Terras do Reino, após enfrentar as hienas que
formavam um exercito de guarda do rei atual, reencontra sua mãe e enfrenta o tio em uma
batalha colossal. O exercito dos leões enfrenta os das hienas, enquanto isso Simba e Scar
estão no alto da pedra do reino, quando em um golpe Simba é arremessado ao alto, ficando
pendurado pelas garras na beira do precipício. Scar, olhando para o sobrinho revela que foi
exatamente daquele jeito que ele havia matado Mufasa, Simba então percebe que não foi o
culpado pela morte de seu pai, de um salto Simba pula em cima de Scar, derrotando-o. Scar
cai do alto da pedra e morre devorado pelas hienas, que se sentiram traídas por ele. Simba
torna-se assim aquele quem realmente é: o Rei Leão, e é aclamado pelos animais que ali ainda
estavam, enquanto as hienas fugiam, exiladas mais uma vez, para as terras escuras, onde o sol
não toca.
A obra o Rei Leão, seja em suas versões para o cinema, para o teatro ou nos livros, é
sempre rica em detalhes que apontam diretamente a uma característica própria de cada
personagem, ou que pode apresentar uma inspiração ou referencia maior por detrás daquilo
que é apresentado, como no caso da música “Se prepare”, cantada pelo Leão Scar, cuja
referencia da cena é de um ditador, quem sabe Hitler, e seus súditos que o seguem fielmente,
movidos por uma paixão ou necessidade latente. No quadro abaixo estão contidos a origem e

26
o significado dos nomes44 de alguns personagens do filme, é possível notar referencias e fazer
analogias com seus papéis na trama.

PORTUGUÊS SUAÍLI GREGO INGLÊS


(BR)
Mufasa Rei
Scar Cicatriz
Simba Leão
Timão Respeito
Pumba Alguém de
raciocínio lento

3.1. Os três estágios da existência humana, segundo Kierkegaard, na obra O Rei Leão.

Há milênios, os mitos e lendas, assim como histórias, são contadas entre gerações com
o uso de símbolos, e permitem aos ouvintes repensarem suas vidas, comportamentos, cultura
etc. Muitas destas histórias eram comparadas metaforicamente com a vida cotidiana das
pessoas. Por vezes as obras cinematográficas abrem possibilidade para este mesmo exercício,
dando margem para interpretações que estão além do enredo apresentado nas tramas, tirando
o espectador do papel de mero receptor passivo de uma história, para uma interação mais
ativa quando este passa a identificar elementos da ficção que se relacionam com a vida real:

Não perdendo de vista o homem na sua totalidade, isto é, no conjunto de suas


possibilidades, a linguagem, como uma forma de expressão, destaca-se como um
campo no qual podem ocorrer problemas que interferem no desenvolvimento e
crescimento das pessoas, isto porque a linguagem expressa o pensamento das
pessoas e tudo que lhes vai à alma e no espirito. Quando há uma interferência na
linguagem, há um reflexo direto no pensamento, na alma e no espírito.45

A obra O Rei Leão pode ser tratada como uma fábula, e ser analisada
metaforicamente, relacionando o desenvolvimento de alguns personagens ao longo da história
com os três estágios da existência humana, do filósofo dinamarquês Sören Aabye

44
http://onomeperfeito.blogspot.com/2019/07/nomes-das-personagens-do-filme-o-rei.html?m=1
45
NASSER, Maria Celina de Queiroz Carrera. O que dizem os símbolos?. São Paulo: Paulus, 2003. p. 6.
27
Kierkegaard, que apresenta três estágios de existência possíveis de serem vividos por um
indivíduo, sendo estes o estágio Estético, o estágio Ético e o estágio Religioso, além de duas
zonas de transição chamadas de Ironia e Humor.
Kierkegaard é existencialista, corrente que entende o Ser Humano como um ser
diferente das outras criaturas, já que não é condicionado a seguir cegamente seus instintos,
sendo, por tanto, livre e passível de mudanças ao longo de sua vida. O existencialismo é um
pensar filosófico voltado para questões relacionadas a existência humana. No caso de Aabye,
seus estudos partem do conceito de possibilidade, do uso da liberdade na escolha e da
angústia presente quando se está frente ao desconhecido. O existir do Homem é possibilidade
de realização, e frente aos limites encontrados, vivendo e superando o desespero, esta
existência o coloca em relação consigo mesmo, com o mundo e com Deus; estes e outros
termos do existencialismo de Kierkegaard como Angústia e Desespero, assim como, sua
teoria dos estágios podem ser observadas na obra O Rei Leão, seja no filme de mil novecentos
e noventa e quatro, no livro da mesma época, assim como também no remake de dois mil e
dezenove, e no livro baseado nele.

3.2. O ciclo da vida.

No início do filme durante a abertura, pode-se contemplar a savana africana passando


por um processo de transformação, saindo da escuridão da noite, momentos antes do sol
nascer, onde fica claro as mudanças de cores e do cenário como um todo, passando do
silencio para o romper da vida selvagem que se manifesta desde os primeiros raios de sol, e
que perduram durante o dia. Essa mudança na paisagem, o movimentar dos animais, seus
comportamentos, é prenuncio da temática central do filme: a mudança, o encontrar e ocupar o
seu lugar no Ciclo da Vida:

Momentos antes do sol nascer no horizonte, a planície africana estava quieta.


Nenhum pássaro cantava. Nenhum animal gritava. Os únicos sons eram os sussurros
suaves da brisa soprando entre a grama alta, ainda verde naquele início de
primavera. (...) Mas foi quando a luz do sol rompeu pela savana, a vida começou a
se agitar. Foi devagar quase imperceptível... e então, rapidamente, os sons ficaram
mais altos, fundindo-se para formar a canção da savana. 46

46
O Rei Leão. Adaptado por Elizabeth Rudnick; Tradução: Raquel Nakasone. São Paulo: Universo dos
Livros, 2019.
28
3.3. Mufasa, estágio ético.

Mufasa é a figura do homem ético, um pai amoroso e dedicado no zelar por sua
família e em cumprir com suas atribuições para com, a sociedade, seus súditos da Pedra do
Reino, mesmo que isso lhe custasse precioso tempo, descanso ou, em último caso, a vida:

Descendo pela juba de Mufasa, Simba se jogou na ponta dela e ficou pendurado,
agarrado nos pelos grossos com suas garrinhas. – Está acordado? – perguntou, dessa
vez sem choramingar. Estava sorrindo. Porque podia ver que, mesmo que seu pai
não tivesse gostado, estava bem e desperto.47

A preocupação do pai de Simba, a respeito dos deveres de um rei para com seus
súditos, para com tudo e todos, que o cercam é marcada por uma grande lição a respeito da
importância do papel de cada indivíduo no meio em que estão inseridos, revelando
indiretamente a dignidade presente em cada ser. Todos são importantes e tem seu papel,
mesmo o leão – tido como o rei dos animais - é apenas mais um, porém de igual importância,
no Ciclo da Vida:

Tudo que você vê coexiste em um equilíbrio delicado. Como rei, você precisa
entender esse equilíbrio e respeitar todas as criaturas, desde uma formiguinha que se
rasteja até um antílope saltitante. – Mas, pai, a gente não come antílopes? – Sim,
Simba, deixei-me explicar. Quando morremos, nossos corpos se tornam grama, e o
antílope come grama. Nós estamos todos conectados no grande Ciclo da Vida.48

Durante a trama, fica evidente que Mufasa é um rei justo e fiel para com suas
obrigações. Não pensa duas vezes antes de agir conforme as atribuições que lhes são próprias
do cargo, abrindo mão de qualquer diversão e partindo o quanto antes para cumprir seu dever:

– Pronto para a diversão? – sussurrou (Mufasa), indicando Zazu com os olhos. –


Fique abaixado, perto do chão. (...) enquanto Zazu continuava, Simba se aproximou
um pouco. O vento estava ao seu lado, ele esperou, deixando Zazu terminar. O
pássaro foi interrompido ao ser atacado por trás. Mufasa soltou uma sonora
gargalhada enquanto Simba orgulhosamente erguia sua “caça”. (...) – Alteza, Hienas

47
Ibidem.
48
Ibdem.
29
nas Terras do Reino! Elas estão caçando! – gritou o calau. No mesmo instante,
Mufasa ficou alerta. A gargalhada morreu e sua expressão ficou feroz.49

O homem ético é marcado por vários fatores, entre eles se sobressai a fidelidade a si
mesmo, conformando-se ao universal, tendo sua personalidade sobre bases sólidas, com ações
legitimadas pelas regras e pelo dever do agir conforme lhe foi incumbido. Isto, em Mufasa é
nítido e inegável que seja metaforicamente uma imagem perfeita para representar alguém que
vive no estágio ético.
Como pai exemplar ele vive sua liberdade, conciliando sua vontade com a vida social,
cumprindo sua obrigação para com o filho, sendo misericordioso para com ele após a
desventura no cemitério de elefantes, quando Simba pôs sua vida e de Nala em perigo, sendo
salvo pelo pai. Em um dos diálogos mais fortes do filme, o rei que muitas vezes é apresentado
como, poderoso e invencível, demostra sua fragilidade ao ensinar ao seu sucessor sobre a
importância do uso da liberdade e do perigo do viver de forma inconsequente:

Simba! – diz Mufasa com voz firme, enquanto o leãozinho se aproxima de orelha
caída e com semblante triste, colocando-se ao lado do pai que fita o horizonte sem
demonstrar sentimento algum. Simba, estou decepcionado com você! – Diz Mufasa
olhando para o filho. – sim, eu sei. Responde Simba, - visivelmente arrasado após o
ocorrido. – Você poderia ter morrido. Acabou me desobedecendo, e o pior: pôs Nala
em perigo! – Simba então responde: Eu só quis ser valente como você! – Só sou
valente quando é preciso ser. – responde de pronto, o rei. Depois continuou: -
Simba, ser valente não quer dizer se meter em apuros. – Mas você nunca tem medo
de nada! – interrompeu o filho. – Eu tive hoje... – disse Mufasa com voz cansada. –
Teve? – Simba pergunta surpreso, com a fala do pai. – Sim... – respondeu Mufasa
encarando o filho. -... Achei que ia perder você! – Simba então diz, entendendo a
mensagem: - Então, até os reis tem medo, não é? 50

Mufasa faz uso de sua liberdade, até as últimas consequências, sendo capaz de dar a
própria vida para salvar Simba de um estouro de gnus. Ao ser avisado por Scar que Simba
está em perigo, o leão se lança ao seu encontro, e ao avistar o filho pendurado em um galho
seco de arvore caída, mergulha ao seu encontro. Pondo seu dever como pai acima de si

49
Ibidem.
50
O REI leão. Direção de Roger Allers e, Rober Minkoff. EUA: Wall Disney Pictures. 1994. (89 min).

30
mesmo, Mufasa resgata o filho, mas é assassinado pelo irmão, que o lança do alto do
desfiladeiro.

3.4. Timão e Pumba, estágio estético.

Timão é um suricato, e tem como característica principal seu egocentrismo. Faz dupla
com Pumba, seu melhor amigo e são responsáveis por salvar Simba e lhe apresentarem um
novo estilo de vida chamado Hakuna Matata. É uma figura ideal, assim como Pumba, para
representar o estilo de vida estético, pois são indivíduos que levam a vida pautada na busca do
prazer imediato. Timão, sempre quer ter a última palavra em tudo e ser o responsável por dar
ideias apropriando-se destas, mesmo quando estas não partem dele, o que gera alívio cômico
na trama:

Ah, não, é um leãozinho! – diz Pumba com empolgação. – Aquilo não é um leão! –
responde timão de pronto. – Então vai lá olhar, o que é! – diz Pumba ainda
empolgado com a recém descoberta. – Aquilo não é um leão, é um pássaro peludo! –
diz Timão partindo pra cima do corpo do animal desmaiado. – Parece um leão! – diz
Pumba intrigado. – não é um leão, deixa eu ver de pertinho! – Timão diz, enquanto
analisa o corpo de Simba, quando se depara com as presas do felino. – É um leão!
Corram pelas suas vidas! – Timão corre apavorado. (...) – Espera aí, Timão, é só um
leãozinho! – diz pumba compadecendo-se do filhote. –Ele vai te comer e usar meu
corpo como palito de dentes! – Timão está apavorado atrás de uma pedra. –Mas um
dia, quando ele for grande e forte, vai ficar do nosso lado! – Timão fica pensativo ao
ouvir este argumento de Pumba e diz com ar de filosofo: -Já sei! – e continua. –E se
ele ficar do nosso lado? Calma... escuta! Ter um leão feroz por perto, pode não ser
uma má ideia. – Pumba fica empolgado com a noticia de que terão um leãozinho
para cuidar: - Deixa ficar com a gente? – Timão responde: - Sim, ele pode ficar com
a gente, se a ideia foi minha então ela é boa!51

Pumba é um javali, e faz parceria com Timão, sendo este último o cérebro da equipe e
Pumba responsável pela força bruta, na hora dos embates. Parte de sua história de vida é
contada durante a música tema de Hakuna Matata, do quanto sofria preconceito por soltar
flatulências, sendo deixado sozinho por todos os demais animais. Timão tem personalidade
mais narcisista, enquanto Pumba é mais dócil e inocente, sendo ele inclusive, o grande
responsável pelo resgate de Simba, e pela percepção de que seria interessante ter um leão com

51
O REI leão. Direção de Jon Fraveau. EUA: Wall Disney Pictures, 2019. (118min).

31
amigos para os protegerem de eventuais predadores. O que de fato se confirma, quando Simba
salva Pumba do ataque de Nala, quando esta sai das Terras do Reino atrás de comida:
Timão, vem dar uma olhada, acho que está vivo ainda. – diz Pumba se referindo ao
animalzinho desmaiado no deserto. Timão após cheirar a analisar o animal solta um
grito: - É um leão! Corra Pumba! – Pumba fica parado e fala, se compadecendo do
pobre animal: - Ah, Timão é só um leãozinho... olha pra ele, tão bonitinho e sozinho.
Ficamos com ele? – Timão eufórico diz: - Pumba, tá maluco? Leões comem caras
como nós! – Pumba: Mas é tão pequeno! – Timão: Mas vai ficar grande! –Pumba:
Mas vai ficar do nosso lado! Ficamos com ele? – Então decidem que ficarão com o
leão, não sem antes timão repetir a ideia de Pumba como se fosse uma ideia
originalmente sua, e concluir: - É claro! Quem é que decide por aqui?52

Ele, assim como o seu parceiro suricato, pode ser comparado ao indivíduo que vive no
estágio estético, pois procura viver o tempo presente, conquistando o prazer - de comer
insetos e vermes – sem se importar com futuro, muito menos no pós- vida:

Passaram por um cupinzeiro. Todos os seus outros amigos estavam em cima dele,
tentando entrar desesperadamente. Timão seguiu o olhar de Simba e acenou com a
cabeça. – sabe – disse, continuando a conversa que teve mais cedo-, na natureza há
uma harmonia delicada. – Simba estreitou os olhos: - sei tudo sobre o Ciclo da Vida.
– Timão inclinou a cabeça: - Ciclo? – Disse enfiando os cupins na boca. – Que
ciclo? Estou falando da Insignificante Linha da Indiferença. – Pu mba explicou: -
Veja, tem essa linha. E todos nós corremos pra ela com um medo paralisante. –
Timão continuou: - E não chegamos a lugar algum. – Pumba completou: Porque é a
linha insignificante... – Timão concluiu: - da indiferença. (...) Simba questionou:
Vocês tem certeza que não é um ciclo?53

Hakuna Matata, na língua suaíle, significa literalmente “sem problemas” ou “não se


preocupe”, e demonstra a não preocupação com o futuro e a vivencia do presente, no universo
de O Rei Leão. Indo mais além, pode ser interpretado como deixar o passado para trás, sendo
assim um meio de recomeçar a vida, já que não há como evitar coisas ruins, mas há como
lidar com elas tirando aprendizado, neste caso, seguindo em frente, como diz o próprio
Timão: “Para mudar o futuro é só deixar o passado para trás!”54.

52
Ibidem.
53
O Rei Leão. Adaptado por Elizabeth Rudnick; Tradução: Raquel Nakasone. São Paulo: Universo dos
Livros, 2019.
54
O REI leão. Direção de Jon Fraveau. EUA: Wall Disney Pictures, 2019. (118min).
32
Ao aceitar a proposta de vida do Hakuna Matata, Simba vive uma alternância entre o
estágio estético e o estágio ético: No estético, pela filosofia de vida do grupo em que está
inserido: vivem o hoje, sem preocupações, buscam o prazer imediato; porém, apresenta
também elementos do estágio ético, ao abrir mão de sua individualidade – de animal
mamífero, carnívoro, predador, animal que está no topo da cadeia alimentar- para se alimentar
de vermes, animais viscosos, agindo de forma contrária a sua natureza, usando de sua
liberdade – assim com o homem ético – Simba conforma a sua vontade com a vida social,
essa alternância entre os estágios é visível no remake:

A gente mora onde quer e faz o que quiser. – Timão mostra, do alto de uma
montanha, um magnífico vale, ao leãozinho que observa tudo encantado- Pessoal
esse é o Simba! – Timão apresentando- o aos demais animais. Ao ver a nova
criatura, uma Galinha D’angola responde de imediato: - Isso, meu amigo, é um
Leão! – outro animal fala, ao observar a cena: -E comida? Como você vai alimentar
essa coisa? – Ao ouvir a palavra comida, Simba diz de imediato: - É, eu estou com
fome... comeria uma zebra inteira, ou quem sabe um antílope! – os animais olham
assustados. Timão então conclui:- Não, não garoto, se vai viver com gente, vai
comer como a gente, e o mais importante não coma a gente!”. – Os animais estão em
volta de um tronco podre aberto, cheio de vermes, larvas e insetos, deliciando-se.
Timão pegando um verme diz: - Isso, garoto, é que é boa vida: sem regras, sem
responsabilidades.- olha para Simba e entregando um verme suculento para o
leãozinho provar questiona: - e ai, Simba? – Simba responde: - Hakuna Matata. – e
engole o verme, que no primeiro momento apresenta gosto não tão agradável, em
um primeiro momento, mas em seguida fala após engoli-lo – Viscoso, mas,
gostoso!55

3.5. Scar, estágio estético.

Scar é o leão irmão de Mufasa e, até antes do nascimento de Simba, o próximo na


sucessão real das Terras do Reino. Na trama ele apresenta um comportamento metódico,
egoísta e até mesmo cruel ao ponto de tramar a morte do sobrinho e assassinar o próprio
irmão, a fim de alcançar seu objetivo: se tornar o Rei.
Durante toda a narrativa Scar mente, manipula e arquiteta meios de alcançar seus
objetivos. Ainda que o indivíduo esteta não seja um vilão, neste caso, o comportamento
análogo ao do estágio estético se manifesta em atos de vilania deste personagem. A começar

55
O REI leão. Direção de Roger Allers e, Rober Minkoff. EUA: Wall Disney Pictures. 1994. (89 min).
33
por incitar a curiosidade de Simba a respeito do cemitério de elefantes, com a evidente
intenção de que o leãozinho viesse a óbito:

Simba: - Meu pai me mostrou todo o reino! Eu vou mandar nisso tudo! – Scar com
ar de desprezo diz: - Sei... perdoe, eu não pular de alegria, mas minhas costas doem.
– Simba pulando no tio, sem perceber o tom de deboche na fala e comportamento do
tio continua: - Tio Scar, quando eu for rei, o senhor vai ser o que? – Scar responde
pronto: - Tio do Macaco! - Simba rir. Scar continua:- Então seu pai lhe mostrou todo
o reino, não é? Ele te mostrou o que está além do planalto, na fronteira norte? –
Simba murcha as orelhas e diz: - Ah, não... disse que eu não podia ir para lá... – Scar
o interrompe dizendo:- E ele está absolutamente certo! Lá é muito perigoso, só os
leões mais corajosos vão lá. – Simba retruca: - Sou corajoso! O que há lá?- Scar
responde:- Lamento Simba, não posso lhe dizer... só estou cuidando do meu
sobrinho favorito. – Simba diz sorrindo: - Eu sou seu único sobrinho! – Scar
responde: - Mais um motivo para eu lhe proteger... – depois conclui como que sem
querer:- Um cemitério de elefantes não é um lugar para um príncipe! Ops. – Scar
tampa a boca, depois pede segredo ao leãozinho, mas já era tarde, Simba já estava
fascinado com a ideia de ir ao lugar mencionado.56

No decorrer da trama, vemos a confirmação de que Scar, realmente, seduziu Simba


com a ideia de ir ao Cemitério de Elefantes, para ser devorado pelas hienas:

Ah, Scar, você é um de nós! – diz uma das hienas, ao que Scar responde
ironicamente: - Encantado. – Outra hiena questiona, você trouxe algo para a gente
comer? – Scar, segurando uma coxa de zebra diz: - Eu acho que vocês não merecem
isso. Mandei de presente aqueles filhotes par vocês, e vocês nem souberam acabar
com eles.57

No remake de 2019 o diálogo de Scar com as hienas, embora mais curto, deixa claro a
intenção pela qual ele instigou Simba a ir àquele local. Tal como o Sedutor, apresentado por
Kierkegaard na obra Diário de um Sedutor, Scar usa avidamente de seu poder de
convencimento para alcançar – com a ajuda das hienas- a maior de todas as suas ambições:
tornar-se rei. Mesmo que para isso tenham de assassinar Mufasa, e Simba:

A fome desenfreada esgotou a vida nestas terras, então eu envio dois filhotes pra
vocês e eles voltam com vida... – Diz Scar visivelmente chateado com a situação. –

56
Ibdem.
57
Ibdem.
34
uma das hienas responde: - Acho que a gente vai comer você no lugar deles. – Scar
responde se aproximando do grupo: - Querem uma refeição, ou um banquete pelo
resto de suas vidas? – Shenzi, a líder das hienas intervém. – O que você poderia nos
oferecer? – Scar responde de pronto: - Um lugar onde enxeriam as barrigas, onde
tudo que a luz toca seja seu... para matar! – A líder das hienas responde: - As Terras
do Reino não são suas. O rei controla aqueles campos de caça. – Scar se aproxima
da hiena, ficando frente a frente com ela e diz: - É por isso que ele tem que morrer!58

Tal como o homem esteta que “pode construir-se segundo sua vontade, segundo sua
imaginação”59, Scar ao longo dos acontecimentos do filme, vai demonstrando-se esteta, pelo
apetite insaciável pelo prazer, ignorando completamente as consequências daquilo que ele
busca. Poderia ter a mesma atitude que teve Simba, frente ao infortúnio da morte do pai,
assumindo uma nova postura da vida, o que Scar não faz: alcançando o objetivo de ser rei, as
custas do sangue do irmão, ele permanece no estágio estético, o que resulta na total
decadência das Terras do Reino. Sobre essa possibilidade de saída do estágio estético para a
zona do humor, e consequentemente a do ético, o que é esperado de um rei:

O esteta só segue os caprichos de sua sensibilidade, a existência, para ele, é o acaso.


Ignora a qual prazer seus caprichos o levarão. (...) Todavia o esteta não é condenado
apenas a experimentar essa angústia, pode usá-la como guia, tentar pensá-la e
perceber que ela acompanha uma maneira determinada de ser no mundo, que uma
outra relação com o mundo é concebível sem se sentir angústia: uma relação em que
não se trata mais de se colocar como predador, mas como construtor.60

3.6. Simba e os estágios da existência humana.

Simba é o, protagonista da história narrada em O Rei Leão. Assim, como na obra


Hamlet (1603) ao qual foi inspirada, a obra traça sobre a vida de seu protagonista um caminho
de escolhas, de decisões a serem tomadas, e principalmente, o impasse, porque não dizer, a
Angústia – tal como é apresentada por Kierkegaard – frente ao assumir, ou não assumir, seu
papel como o monarca das Terras do Reino.
Entre todos os personagens, Simba é aquele a quem podemos comparar
analogicamente ao indivíduo que passa em dados momentos de sua existência por todos os

58
O REI leão. Direção de Jon Fraveau. EUA: Wall Disney Pictures, 2019. (118min).
59
LE BLANC, C. Figuras do Saber. Trad. Marina Appenzeller. São Paulo: Estação Liberdade, 2003. p. 57.
60
Ibidem. p. 57.
35
estágios, inclusive sendo possível perceber a operacionalidade em conjunto destes estágios,
ainda que algumas vezes apresente somente alguns elementos que tornam possível a analogia.
Para melhor elencar alguns momentos em que é possível perceber os elementos dos três
estágios da existência humana, conforme o filosofo dinamarquês, irei apontar tais momentos
separando-os em pontos específicos conforme cada estágio e zonas de transição.

3.7. Simba, estágio estético.

Durante toda sua infância, até por ser uma criança, Simba está a todo instante
buscando situações que lhe tragam prazeres imediatos, muitas vezes sem levar em conta o
sentimento dos outros personagens. Sua meta é ser grande, reconhecido, quer provar a todo
custo que é superior ao que realmente é, crendo que pode fazer tudo o que quiser, sem medir
as consequências, atitude marcante do indivíduo esteta que busca o prazer pelo prazer. France
Farago (2012) diz algo a respeito da dor do esteta carrega, que em Simba se manifesta na sua
busca de ser visado, quisto pelo pai e pelos demais habitantes do reino: “o esteta, que tudo
sacrifica à buscado prazer imediato, vive de fato na dor”. No caso de Simba, “a dor que
carrega” é a de não se sentir bom o suficiente, por isso sempre busca meios de se destacar.
Nos primeiros momentos da trama, vemos Simba acordando seu pai, que o levaria
consigo no passeio pelas Terras do Reino, sem se importar com o cansaço do pai, o leãozinho
não se contenta até ter alcançado seu primeiro objetivo do dia: acordar o Rei:

- Pai, está acordado? Pai... – Em resposta, Mufasa soltou um ronco sonoro. – Então
você acha que esse ronco me engana? – Simba pensou. Seus olhos se estreitaram,
travessos. – Bem, vamos ver- Inclinando-se mais, de modo a deixar sua boca
diretamente na orelha de Mufasa, gritou: -Papai! Acorda, pai! Papai! Paiêêêêê! (...)
Está acordado? – Perguntou, dessa vez sem choramingar. Estava sorrindo. Porque
podia ver que, mesmo que seu pai não tivesse gostado, estava bem e desperto.61

Outro momento em que é possível perceber elementos do estágio estético, ocorre


pouco antes e durante a canção “Quando eu for rei”. O senso de liberdade para o esteta está
em viver cada instante do tempo presente como se este se equiparasse a eternidade. Em O Rei
Leão este sentido aparece quando Simba diz para Nala segui-lo, mesmo quando ela chama
atenção sobre o perigo de continuar tal aventura:
61
O Rei Leão. Adaptado por Elizabeth Rudnick; Tradução: Raquel Nakasone. São Paulo: Universo dos
Livros, 2019.
36
Nala olhando para o amigo diz: - Aonde vamos de verdade? – Simba responde
empolgado: - A um cemitério de elefantes! – É longe daqui? – Diz Nala curiosa, mas
pensativa. – Não muito, fica nas Terras Sombrias. – Simba responde sem demonstrar
qualquer temor, frente a possibilidade de perigo. – Mas Simba, e se a gente se
perder? Eu nunca fui tão longe! – Simba diz com tom de superioridade: - Relaxa,
Nala. Eu patrulhei o reino todo hoje de manhã, com meu Pai. Não precisa se
preocupar... me segue até a liberdade!62

Ainda na primeira fase do filme, ainda que esteja na fase da infância, Simba durante a
música “O que eu quero mais é ser rei”, demonstra que sua motivação em ser rei está em se
ver livre de regras, tradições e que seu prazer maior é estar em “estar em foco”, atitudes
próprias do indivíduo esteta; de forma analógica, Simba apresenta – de certo modo – as
mesmas motivações de Scar, dada as devidas proporções nesta comparação, neste caso, o tio
representando o extremo das motivações tidas pelo sobrinho na infância: ser rei, viver sem
leis e caçar desordenadamente:

- Um monarca que ignora tradições. – diz Zazu – com uma atitude dessas receio que
acabe se tornando um rei ,de veras, patético. – Simba então responde: - Eu não vou
deixar ninguém me dizer aonde ir, o que fazer e com quem casar. Nunca vai existir
um rei como eu! (...) Livre pra poder viver, pra fazer o que quiser. (...) pra que lado
olhe, eu estou em foco! E o que eu quero mais, é ser rei!63

Simba, tal qual o esteta, se guia pelo prazer gerado pelos interesses. Simba quer ser rei
para ter poder e ser reconhecido pelo poder, não para servir. Como diz Lauro Ericksen em seu
artigo sobre a transição dos estágios: “No estágio estético, dada a própria gama ampla e quase
infindável de possibilidades já levantadas anteriormente, o individuo em sua singularidade
deixa-la levar por momentos e circunstancias aleatórias de sua vida”.64

62
O REI leão. Direção de Jon Fraveau. EUA: Wall Disney Pictures, 2019. (118min).
63
Ibdem.
64
ERICKSEN, Lauro. TRANSIÇÕES DOS ESTÁGIOS DA VIDA EM KIERKEGAARD E SUAS
PERSPECTIVAS TEOLÓGICAS. Revista Veritas : Porto Alegre - RS, 2019.
37
3.8. Simba, estágio ético.

Simba, após fugir das terras do reino e passar a morar com Timão e Pumba, vive o que
o doutor Lauro Ericksen65 trata em um artigo intitulado Transições dos Estágios da Vida em
Kierkegaard e Suas Perspectivas teológicas, a respeito da Operacionalidade em conjunto
entre os estágios, principalmente entre as voltas existenciais no estágio ético e estético em
coexistência simultânea. Na trama, ao aderir ao Hakuna Matata, Simba abre mão do seu eu
pessoal para abraçar o nós, da vida social, o que lhe enquadraria no estágio ético; ao mesmo
tempo que vive, tanto quanto antes, o prazer do dia a dia sem ter plenos futuros, o que é
evidentemente uma característica do indivíduo esteta:

É possível sugerir que o estágio estético não é abolido pela ética, sendo por ele
incorporado na cotidianidade. Ou seja, o elemento estético permanece de forma
relativa no interior de cada escolha historicamente dada no seio da liberdade do
individuo singular.66

Diante da morte do pai, tendo de fugir de sua casa a mando do tio, após ser perseguido
pelas hienas, Simba – em ambos os filmes e no livro – encontra-se não somente deprimido ou
abatido, mas em algo, além disso, angustiado, angustiado até a morte. Como diria
Kierkegaard:

Portanto, é superficial o dizer que dum desesperado, como se fosse o seu castigo,
que ele destrói o seu eu. Porque é justamente aquilo que, para seu desespero, para
seu suplício, ele é incapaz, porque o desesperado lançou a fogo àquilo que nele é
refratário, indestrutível: o eu.67

Simba vai pouco a pouco, abrindo mão de sua identidade de leão, futuro rei das Terras
do Reino, para abraçar o estilo de vida, alimentação e comportamentos dos seguidores do
Hakuna Matata. Simba chega algumas a fazer memória de coisas que aprendeu com seu pai,
mas, ao ser questionado, abre mão de suas tradições, adequando-se com a opinião dos demais,
como no diálogo com Timão e Pumba, a respeito sobre o que são – e do que são - feitas as
estrelas:

65
Doutor, mestre e bacharel em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
66
ERICKSEN, Lauro. TRANSIÇÕES DOS ESTÁGIOS DA VIDA EM KIERKEGAARD E SUAS
PERSPECTIVAS TEOLÓGICAS. Revista Veritas: Porto Alegre – RS, 2019.
67
KIERKEGAARD, Sören. O Desespero Humano. São Paulo: Martin Claret, 2011. p. 24. p. 25.
38
Ei, Timão! Já imaginou o que são aquelas coisas brilhantes, lá no alto? – Pumba
pergunta olhando pra o céu, ao que o suricate responde de pronto: -Ah, pumba, eu
não tenho que imaginar, eu sei! –Sério? O que são? Diz Pumba surpreso.- São
vagalumes. É que eles estão voando lá no alto, com o bumbum piscando... –
responde Timão, em seguida questiona Simba: - O que você acha, Simba? – Ah, eu
não sei... mas, uma vez me disseram que os grandes reis do passado estão lá, e estão
olhando por nós! – após um tempo de silencio, Timão e Pumba riem da fala do
jovem leão.- Pensa só Simba, por qual motivo um bando de reis iriam olhar por nós?
Somos excluídos! – É... – Simba meio triste, e tentando se convencer de que estava
ele errado conclui. - ... é besteira.68

Com o tempo, Simba vai se adaptando e incorporando os elementos da rotina (do não
ter rotina) que são próprios do Hakuna Matata. Já não caça outros animais, não entende a vida
como parte de um grande ciclo, e tal qual o homem ético, ele assume responsabilidades por si
mesmo. Simba, por ser leão representa um ser de respeito, que gera uma sensação de
segurança contra outros animais ferozes, por parte dos demais animais que normalmente lhes
seriam presas, ainda que estes animais tenham a consciência que embora calmo e amigo,
Simba ainda continua sendo em seu eu, um potencial predador:

A floresta estava calma. Acima, o sol brilhava através das nuvens, que amenizavam
os fortes raios e tornavam a temperatura agradável. Na terra, os animais
aproveitavam o dia e serpenteavam para fora de suas tocas para comer. Adentrando
uma pequena clareira, um impala levantou a cabeça e mordiscou algumas folhas.
Seus longos chifres farfalhavam os galhos, e, conforme as nuvens se moviam, o sol
reluziu no pelo dourado do animal. De repente, a paz se quebrou. Em um lugar
próximo um galho se partiu. No mesmo instante o impala congelou. Seus olhos
castanhos se arregalaram enquanto ele examinava as árvores em volta e a grama alta
ao redor. Como não viu nada, estava voltando-se de novo para a comida quando um
enorme leão saltou da grama bem ao seu lado. O impala gritou e se jogou em um
largo. O leão parou. Então sorriu. – Ei – disse Simba – viu isso? Quase peguei a
borboleta. – Ele não percebia que, para o impala, ele era um predador real e não
simpático leão que todo mundo na floresta passou a amar.69

68
O REI leão. Direção de Jon Fraveau. EUA: Wall Disney Pictures, 2019. (118min).
69
O Rei Leão. Adaptado por Elizabeth Rudnick; Tradução: Raquel Nakasone. São Paulo: Universo dos
Livros, 2019.
39
Ainda que sejam atitudes responsáveis perante o seu grupo de amigos, o
comportamento de Simba não manifesta o seu verdadeiro eu, com suas reais
responsabilidades; no fundo, o Hakuna Matata proporciona uma pseudo responsabilidade, que
em nada agrega no ser – enquanto leão- neste caso, os elementos que o identificam no estágio
ético, podem ser encontrados no fato dele se “identificar” com o projeto de vida adotado pelos
amigos, neste caso o “nada fazer”.

3.9. O desespero de Simba.

No encontro com Nala, ele se defronta com um grande dilema: ou assume sua antiga
vida como herdeiro das Terras do Reino, enfrenta o tio e assume o trono, tomando enfim seu
lugar no ciclo da vida, ou permanece com os novos amigos, em uma vida de prazeres sem
grandes responsabilidades, na “linha sem sentido da indiferença”.
Eis então, mais um momento em que o conceito de angústia e de desespero, se fazem
presentes, ao ser confrontado a respeito de quem era e quem está sendo, ele entra em crise
refugiando-se na solidão vazia; não encontra apoio em si mesmo, não sente prazer em mais
nada, (esteta) e nem em ser útil aos demais (ético). Desesperado, ele vaga sem rumo,
angustiado frente às possibilidades, e por optar em não ser ele mesmo: o filho de Mufasa, o rei
leão:

Caminhando sozinho, de cabeça baixa, Simba sentia sua garganta se fechar e seus
olhos se encherem de lagrimas. Por que Nala tinha aparecido? Que bem isso tinha
feito? Tudo que sentia agora era tristeza que tinha tentado manter longe durante
tanto tempo. Ele ouvira tudo o que ela tinha dito e, mesmo que tentasse não
demonstrar, ouvir que eles estavam sofrendo, que as Terras do Reino estavam
destruídas, que sua mãe estava angustiada partiu cada pedacinho de seu coração que
sobrara para ser partido. (...) Raivoso, balançou a cabeça, esperando afastar os
pensamentos que o agitavam violentamente por dentro. Esse não era o jeito que
Timão e Pumba o ensinaram a viver. O passado estava no passado. Ele só precisava
mantê-lo lá. Só que Nala apareceu e trouxe tudo de volta.70

Kierkegaard ao elucidar sua tese a respeito do Desespero Temporal apresenta


argumentos que, dada as devidas proporções, podem ser analogamente comparadas com o que
ocorre na trama de O Rei Leão; ainda que Simba sofra por uma situação temporal: retornar as

70
Ibdem
40
Terras do Reino ou não, o que está em jogo –na realidade – é o cumprimento do seu papel no
grande Ciclo da Vida, mais do que retornar ao seu lar, deve pois assumir o posto do monarca,
dando continuidade à linhagem e deveres já assumidos em outras épocas por seus
antepassados:

Desespera então, ou melhor, por uma estranha miragem e como que ludibriado a seu
respeito, diz que desespera. No entanto o desespero está em perder a eternidade – e
dessa perda não diz ele uma palavra, nem em sonho a suspeita. (...) Desespera e o
seu desespero consiste em não querer ser ele mesmo. Não que se lhe meta na cabeça
o ridículo de querer ser um outro. (...) Enquanto a dificuldade persiste, não ousa,
segundo a expressão literal, regressar a si mesmo, não quer ser ele próprio.71

3.10. Simba, estágio religioso.

A passagem de Simba para o que podemos considerar analogamente, o estágio


religioso se dá nos momentos finais do enredo contado em O Rei Leão. Após superar seus
atos egoístas, aderir a um estilo de vida social que não valorizava quem ele era, mas sim o que
ele fazia, reflete sobre tudo que passou e conclui que deve retornar a sua pátria e reclamar o
trono que lhe é por direito. Arrependido, se lança ao desconhecido, reencontrando-se enfim
com seu verdadeiro eu, entrando então no processo que resultará mais a frente no que pode ser
assemelhar-se com o salto de fé:

Por um longo momento, Simba só ficou parado ali, contemplando as estrelas. Muito
tempo atrás, seu pai lhe dissera que ele nunca estaria sozinho, que ele era parte de
algo maior que ele mesmo. Talvez houvesse uma razão para tudo isso. Talvez, Nala,
Rafiki e seu pai estivessem certos. Talvez fosse a hora de tomar seu lugar no Ciclo
da Vida. Ele balançou a cabeça. Mas como? O que deveria fazer depois desse tempo
todo? Como poderia voltar para uma vida que tinha renegado? (...) Simba não tinha
a resposta – não para todas as perguntas. Mas já estava cansado de fingir que não
sabia a resposta para a pergunta de Rafiki. Caminhando, parou na frente do macaco.
Então levantou a cabeça e assentiu. – Eu sou Simba, o filho de Mufasa!.72

71
KIERKEGAARD, Sören. O Desespero Humano. São Paulo: Martin Claret, 2011.
72
O Rei Leão. Adaptado por Elizabeth Rudnick; Tradução: Raquel Nakasone. São Paulo: Universo dos
Livros, 2019.
41
Chegando às Terras do Reino, Simba precisa ainda passar pelo desafio de revisitar seu
passado, estando frente a frente com aquele que o instigou a fugir e que de certo modo sabe
“de sua culpa” pela morte do pai; junto a ele, estão aqueles que representam o estilo de vida
que o afastou de suas raízes, mas que o sustentaram, permitindo-lhe ser útil e não o excluíram
ou interrogaram sobre situações que vivera:
O estágio religioso é um apuramento é um apuramento subjetivo muito diferente e
mais aprofundado quando comparado com o estágio ético, e ele consegue ter uma
auto- referência muito mais estável que o voyeurismo estético do outro estágio.73

Em confronto direto com Scar, Simba acaba por escorregar e fica pendurado no
precipício, tendo o tio acima dele, em postura idêntica a que seu pai outrora estivera e resultou
na sua morte. Em uma situação completamente desfavorável, com os olhos nos olhos de seu
algoz, Simba percebe que racionalmente não há nada o que fazer, ele está sozinho, não há
como haver intervenção de outrem naquela situação, estão somente ele e o tio, somente um
deverá sair vivo dali. Para piorar a situação, Scar havia dito aos presentes que Simba fora o
responsável pela morte de Mufasa. Estava tudo terminado para Simba:

- Bem, Simba – disse Scar, claramente curtindo o momento. – agora é sua


oportunidade de confessar. Diga a eles quem é o responsável pela morte de Mufasa.
– Todos os olhos se voltaram para Simba. Cada olhar era um peso de chumbo em
suas costas. Suspirou. Não havia por que fingir mais. Scar estava certo. Se queria ser
rei, as leoas precisavam saber da verdade. –Fui eu – disse. (...) Ele confessa! – Scar
gritou, sem se importar com o momento mãe e filho. – Assassino! (...) Se não fosse
por você, o rei estaria vivo, é culpa sua ele está morto! Você nega? – Não.- disse
Simba. (...) Dando um passo à frente, Scar levantou uma pata e a cruzou pelo rosto
de Simba. – Diga, você é o rei? Você é o rei? – Ele atacou Simba mais uma vez.
Enquanto sentia a pata de Scar sobre o seu rosto, empurrando-o em direção à beirada
da pedra do rei, Simba se acovardou. – Você é o quê? – insistiu Scar. –eu sou... eu
sou... nada. – disse Simba.74

Um dos principais elementos que compõe a passagem dramática do estágio ético para
o religioso é o Salto de fé, que podemos perceber que ocorre com o personagem do filme, ao

73
ERICKSEN, Lauro. TRANSIÇÕES DOS ESTÁGIOS DA VIDA EM KIERKEGAARD E SUAS
PERSPECTIVAS TEOLÓGICAS. Revista Veritas: Porto Alegre – RS, 2019.
74
O Rei Leão. Adaptado por Elizabeth Rudnick; Tradução: Raquel Nakasone. São Paulo: Universo dos
Livros, 2019.
42
enfrentar o tio, descobre que o rei fora assassinado pelo próprio irmão, e agora Simba está na
mesma situação do pai: a beira da morte:

Do salto de fé, compreende-se que a verdade não está contida na mente do homem,
ela está um passo além do nosso ser em si- mesmo em relação ao além. Aquilo que
salta é o próprio nada, o universo de possibilidades existenciais do homem. O passo
além do que é dado, para o estágio religioso, é a realização da relação intima
(subjetiva) com a divindade.75

Diante da consciência do seu nada, Simba se abre a todas as suas possibilidades


existenciais, já não está preso ao que Nala espera dele ou o estilo de vida proposto por Timão
e Pumba, ele salta para o infinito, salta para o absoluto daquilo que ele pode ser, não de forma
racional ou movido por terceiros, sua singularidade é espelhada naquele que É; para
Kierkegaard, Jesus, para Simba, Mufasa, seu Pai. Assim o faz, sem precisar de guias e livre de
quaisquer amarras relacionadas à sua história particular:

Scar fez uma pausa, inclinando-se para que somente Simba ouvisse suas próximas
palavras. – E aqui está o meu segredinho: eu matei Mufasa. – A cabeça de Simba se
virou. Seus olhos encontraram os de Scar e, naquele instante, ele soube o que
aconteceria. Simba não tinha matado o pai. Scar tinha. Scar tivera a chance de salvar
o irmão, mas em vez disso, o deixara cair. Exatamente como ia fazer com Simba
agora. Uma onda de raiva o inundou e, antes que pudesse pensar no que estava
fazendo, Simba soltou um rugido. Com toda a sua força, Simba salta da beirada da
pedra do reino e para de frente com Scar, em posição de enfrentamento.76

A respeito do drama da existência humana, que passa pelos estágios referidos por
Kierkegaard, France Farago, diz:

O coração do drama humano está na relação da existência com uma transcendência


que constitui sua abertura a um além de si mesma ou, em outras palavras, existência
significa poder de decisão, possibilidade de ser e de nada, como dúvida e como fé,
uma ação interior de liberdade convocada a fazer opções decisivas.77

75
ERICKSEN, Lauro. TRANSIÇÕES DOS ESTÁGIOS DA VIDA EM KIERKEGAARD E SUAS
PERSPECTIVAS TEOLÓGICAS. Revista Veritas: Porto Alegre – RS, 2019.
76
O REI leão. Direção de Roger Allers e, Rober Minkoff. EUA: Wall Disney Pictures. 1994. (89 min).
77
FARAGO, France. Compreender Kierkegaard. Petrópólis, RJ: Editora Vozes, 2011. p. 128.
43
CONCLUSÃO

O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma análise comparativa entre a


filosofia dos estágios, do dinamarquês Sören Kierkegaard, com a obra de Walt Disney O Rei
Leão. Onde é possível perceber elementos do existencialismo no filme, abrindo margem para
que o estudo da filosofia seja realizado usando elementos do cotidiano humano, de modo
especial os jovens, podendo ser usado como um chamariz para profundas reflexões
filosóficas.
Não foi possível averiguar se os criadores de O Rei Leão tiveram a intenção de
levantar questões filosóficas já trabalhadas por Kierkegaard, ou se estes elementos filosóficos
surgiram de forma acidental na trama; mas a respeito do pensamento Kierkegaardiano, por
meio da obra o rei leão, se pode dizer algo: a filosofia de Kierkegaard pode ser encontrada, e
comprovada, mais de 140 anos depois de sua morte, não sendo por tanto mero fruto de sua
imaginação: os estágios, de verdade, tem fundamento na realidade da experiência humana
universal.
Temos como resultado o conhecimento a respeito da possibilidade de se trabalhar o
estudo da filosofia por meio de instrumentos não convencionais, mas que estão presentes no
cotidiano humano, proporcionando o enxergar o mundo e as pessoas por um prisma mais
existencialista.
Como parte fundamental de uma sociedade, a indivíduo, ao tomar consciência a
respeito da filosofia dos estágios da existência, e no seu lidar com a realidade finita e infinita,
pode trabalhar seu desenvolvimento pessoal, propiciando assim o desenvolvimento do meio
onde está inserido, apesar das limitações do filósofo, ou de algum pensamento seu.

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REFERÊNCIAS

ABBAGNANO, Nicola, 1901-1990. Dicionário de filosofia. 1. ed. São Paulo: Editora WMF
Martins Fontes, 2012.

BUENO, Silveira, 1898-1989. Silveira Bueno: minidicionário da língua portuguesa. 2. ed.


São Paulo: FTD, 2007.

ERICKSEN, Lauro. TRANSIÇÕES DOS ESTÁGIOS DA VIDA EM KIERKEGAARD E


SUAS PERSPECTIVAS TEOLÓGICAS. Revista Veritas, Porto Alegre – RS, 2019.

FARAGO, France. Compreender Kierkegaard. Petrópólis, RJ: Editora Vozes, 2011.

GARDINER, Patrick. Mestres do Saber. Trad. Antônio Carlos Vilela. São Paulo: Edições
Loyola, 2013.

KIERKEGAARD, Sören. O Desespero Humano. São Paulo: Martin Claret, 2011.

KIERKEGAARD, Sören. Temor e Tremor. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

LE BLANC, Charles. Figuras do Saber. Trad. Marina Appenzeller. São Paulo: Estação
Liberdade, 2003.

NASSER, Maria Celina de Queiroz Carrera. O que dizem os símbolos?. São Paulo: Paulus,
2003.

O Rei Leão. Adaptado por Elizabeth Rudnick; Tradução: Raquel Nakasone. São Paulo:
Universo dos Livros, 2019.

O REI leão. Direção de Jon Fraveau. EUA: Wall Disney Pictures, 2019. (118min).

O REI leão. Direção de Roger Allers e, Rober Minkoff. EUA: Wall Disney Pictures. 1994.
(89min).

AUTOR DESCONHECIDO. Nomes das Personagens do Filme O Rei Leão. Publicado em


24. 07. 2019. O nome perfeito. Disponível em:
http://onomeperfeito.blogspot.com/2019/07/nomes-das-personagens-do-filme-o-
rei.html?m=1. Acessado em 5 de abril de 2022.

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AUTOR DESCONHECIDO. Concerto MEC traz ópera “Don Giovanni, de Mozart.EBC,
2021. Disponível em: http://radios.ebc.com.br/opera-completa/2021/01/opera-completa-traz-
don-giovanni-de-mozart. Acessado em 22 de fevereiro de 2022.

SABBAGA, Julia. O Rei Leão supera Pantera Negra e se torna a 10ª maior bilheteria da
história. Publicado em: 17. 08. 2019. Omelete. Disponível em:
http://www.omelete.com.br/walt-disney/o-rei-leao-supera-pantera-negra-e-se-torna-a-10a-
maior-bilheteria-da-historia. Acessado em 10 de março de 2022.

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