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Saí dali num galope desesperado

Estribo de Prata Corri até que me dei conta que o


silencio havia brotado.
Adaptado para poema
Beatriz Villar. Na calada da noite, a lua crescia
cada vez mais.
Quando de repente, uma picada no
Senhoras e senhores
pé direito quase me fez cair para
Apresento a vocês
trás.
A história que seu Alexandre
Já contou mais de uma vez.
Puxei a rédea, parei, ouvi um barulho
Se é verdade ou não?
de guizo e junto um mal
Bom, aí eu já não sei.
pressentimento...
Certa vez, a muito tempo,
O se sogro foi visitar
Tratou logo de pegar o estribo de
Quando me virei avistei uma
prata
cascavel assanhada enorme, com
Para o cavalo selar.
dois metros de comprimento.
-Almocei com ele, como sempre
- Dois metros de comprimento?
fazia duas vezes por mês.
Questionou o cego Firmino.
E na volta pra casa, no caminho,
- Não é demais não?
rezei.
Irritado com a interrupção seu
Alexandre bradou em indignação.
Enquanto o sol se punha
A lua vermelha enorme aparecia
- Quem viu a cobra foi o senhor ou
Essas de cara ruim, que tragédia
fui eu?
anuncia.
- Foi o senhor!
Quase que de imediato respondeu.
No meio do caminho, avistei um
cachorro que uivava desesperado...
- Então, apenas escute.
“Cala boca diabo” gritei
O senhor que não vê,
amedrontado.
Quer enxergar mais que os que tem
vista!
Dei-lhe um chute com o bico da bota
e esporei o cavalo.
Depois da interrupção, prosseguiu
Tudo ficou em silêncio, mas, depois
Já que quando se trata de causos ele
de um galope, uivou de novo o
é especialista.
desgraçado.
- Travei uma briga danada com a
Benzi-me, rezei baixinho uma oração
cobra
de sustância...
Que quase morreu de tanto levar
Tremendo, continuei andando
chicotada.
tentando deixar o cachorro na
Desanimada ela meteu o rabo entre
ignorância.
as pernas e saiu desanimada.
(corrigindo)
Meteu o rabo entre as pernas, - Saí para fora, já arrumado, e não
A cobra que não tinha pernas. encontrei o meu cavalo.
Gritei para o muleke me trazer o
Sim, corrigindo, pois outra vez mesmo com a mesma sela e estribo
Interrompeu o cego Firmino. que usei no mês passado.
“E cobra há de ter perna?”
- Não posso patrão.
(continuando) O estribo está muito pesado.
- Obriguei-a a voltar Impossível carrega-lo.
Machuquei-lhe a cabeça
Depois de conseguir matar Fui ver a coisa de perto e nem
Medi só pra ter certeza. acreditei.
O torno estava quebrado, a sela
- Nove palmos e meio de estava no chão.
comprimento Tentei suspende-la, mas foi em vão.
Nove palmos e meio seu Firmino
Entendeu? O louro esquerdo suspendeu, mas o
Mais de dois metros, penso eu. direito permaneceu no chão.

- Deve ser isso mesmo, não sei. - Cheguei mais perto e tomei um
Tô escutando. susto dos demônios.
Sempre me dou mal quando O estribo estava enorme!!!
questiono. Para conseguir arrasta-lo foram
necessários 3 homens!
Seu Alexandre, como um bom
caçador que era, tomou o chocalho - Todos se espantaram e
da cascavel para si e contou os anéis começaram e começaram a me
para saber se era velha. questionando:
“Como foi, onde foi, por que vira, por
17anéis,17 anos... que mexe”
Todos sabem que cada anel Passei três dias matutando...
equivale a um ano de vida...
velha, experiente. Após dias de reflexão,
Já pensou se ela acerta a mordida? Cheguei a uma conclusão

Voltou a montar o cavalo e rumou Naquela noite, de lua cheia mês


para casa. passado a cascavel não mordeu o
Chegando lá, contou tudo o que couro da bota...
aconteceu para a sua esposa, A bicha feriu o estribo e deixou todo
Cesárea. o veneno que tinha no corpo.
Ainda bem que está morta.
Passando-se um mês, o ocorrido
jazia no esquecimento. E assim, toda noite de lua cheia o
Quando, novamente em noite de lua estribo inchava, do mesmo jeito que
cheia, seu Alexandre se preparava incham as mordeduras de cobras...
para viajar.
Todo mês seu Alexandre retirava do
estribo 2,3,4,5 arrobas de prata.
Por anos isso se repetiu
Prata todo mês de graça!!!

E o estribo seu Alexandre? Ainda


está com o senhor?

Ah, com o tempo parou de inchar, se


tornou comum.
Julgo que o veneno perdeu a
validade.
Natural, não é verdade?

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