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(Julia 1210)
Digitalização: Lu Avanço
Revisão: Regina R.
Projeto Revisoras 1
UM PASSADO QUE FERE-Daphne Clair
(Julia 1210)
Querida leitora
Hoje, enquanto estou editando este livro, a chuva cai lá fora. Não dá para saber se está
calor ou frio, pois aqui dentro da redação o ar-condicionado está ligado (às vezes faz
frio demais, às vezes faz um calor insuportáve). Porém, nada disso me aborreceu. Esta
história é tão linda, que me fez esquecer de tudo ao redor!
Tenho certeza de que o mesmo aconteçera com voçê!
Janice Florido
Publisher
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UM PASSADO QUE FERE-Daphne Clair
(Julia 1210)
Todos os direitos reservados, inclusive o direito de reprodução total ou parcial, sob qualquer forma.
Esta edição é publicada através de contrato com a
Harlequin Enterprises Limited, Toronto, Canadá.
Silhouette, Silhouette Desire e colofão são marcas
registradas da Harlequin Enterprises B.V.
Todos os personagens desta obra são fictícios.
Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas
terá sido mera coincidência.
Título original: His Trophy Mistress
Tradução: Dorothea de Lorenzi
Editora e Publisher: Janice Florido
Editora: Fernanda Cardoso
Editoras de Arte: Ana Suely S. Dobón, Mónica Maldonado
Paginação: Dany Editora Ltda.
EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.
Rua Paes Leme, 524 - 10g andar CEP 05424-010 - São Paulo - Brasil
Copyright para a língua portuguesa: 2002 EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.
Impressão e acabamento:
RR DONNELLEY AMÉRICA LATINA Tel: (55 11) 4166-3500
CAPÍTULO I
Radiantes, a noiva e o noivo avançaram pela nave da igreja até a porta. Atrás deles,
Paige Camden, madrinha da noiva, mantinha um sorriso fixo, enquanto tomava conta da
garota de cinco anos encarregada de atirar pétalas de flores, e que parecia estar sempre
prestes a pisar no véu da noiva.
Inclinou-se e pôs a mão no ombro da criança, a fim de alertá-la. Quando voltou a se
erguer, seus olhos cor de avelã, que passeavam de modo sereno pelas fileiras de
convidados, encontraram outros cor de esmeralda, que fizeram com que ficasse rígida e
esquecesse de sorrir.
O que estaria Jager Jeffries fazendo no casamento de sua irmã?, perguntou-se.
E lindo como sempre. Os estonteantes olhos verdes, sob as sobrancelhas bem
delineadas, contrastavam com a pele morena. A boca, que lhe dava uma ar de teimosia,
e o nariz reto completavam o rosto parecido com o de um antigo guerreiro.
Os cabelos negros estavam muito bem cortados, e o terno caro e elegante delineava-lhe
os ombros largos, os quadris estreitos e as longas pernas musculosas, proclamando o
quanto subira na vida, com seus trinta e um anos de idade.
E Paige o amara muito, com tamanha paixão que acabara resultando em desastre,
extinguindo-se em seu próprio fogo até que só restaram cinzas.
— Paige? — O padrinho segurou-lhe o braço e murmurou ao seu ouvido: — Tudo bem?
O cortejo já ia adiantado, e os convidado começavam a se acotovelar as suas costa,
— Sim — mentiu, voltando a sorrir. Tropecei no vestido, só isso.
Afastou o olhar de Jager e sacudiu, sem necessidade, a longa saia lilás, começando a
avançar, contente por ter o braço do padrinho para ampará-la.
Saíram da igreja e foram saudados pelo sol de inverno. Um fotógrafo os fez ficar junto
ao feliz casal, e Paige manteve o sorriso durante toda a sessão de fotos. Continuava
sorrindo quando chegaram à recepção e sentou-se à mesa principal.
Seu queixo começava a doer, e seus nervos se encontravam à flor da pele. Quando o
padrinho serviu-lhe vinho tinto, ela segurou a taça com dedos trémulos e emborcou
metade, percebendo, tarde demais, que derramaram algumas gotas no vestido de cetim.
Com discrição, molhou a ponta de um guardanapo em um copo cheio de gelo e limpou a
mancha. Pelo menos o vermelho desapareceu, deixando apenas uma leve nódoa rosada,
que mal se enxergaria de longe.
Fixou o olhar na mesa em frente, tentando convencer-se de que o choque se devera ao
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fato de não ver Jager fazia muito tempo, e que isso trouxera de volta antigas
lembranças.
No entanto, se tivessem colocado em seu prato um pouco de grama em vez do suculento
frango com salada, o gosto teria sido o mesmo. Mal conseguia engolir a comida, e ia
empurrando algumas garfadas com o resto do vinho.
Com um enorme esforço respondeu à pessoa ao lado, que tentava conversar, ergueu a
taça para os brindes e aplaudiu os discursos. Por fim, apesar de não enxergar muito bem
sem os óculos, não resistiu à tentação de percorrer o olhar pelo salão acarpetado de
púrpura e repleto de mesas com arranjos florais, a fim de certificar-se de que Jager se
encontrava ali.
E estava mesmo.
Sentava-se a uma mesa próxima, recostado no espaldar e parecendo muito à vontade, o
que a irritou. Como se esperasse que Paige o encontrasse, ergueu a taça com um ar
irónico e bebeu, sem deixar de fitá-la. Apesar de ela ver tudo um tanto borrado e fora de
foco, a força de atração de Jager era implacável.
Apertou a taça com força, mas não correspondeu à saudação silenciosa, apenas
encarando-o de modo acusador.
"Como ousa?!", dizia sua expressão. "Como pôde, Jager, comparecer ao matrimónio de
Maddie e arruinar meu dia?" Por certo recebera convite, mas de Maddie, claro, concluiu
Paige. Sua irmã jamais teria feito tal coisa. Então, fora Glen Provost, o noivo, ou sua
família. Mas como Jager conhecera Glen? E por que Maddie não a prevenira?
Quando Paige tornou a fitá-lo, notou que Jager a encarava. Parecia uma serpente
hipnotizando um coelho.
E, pela segunda vez naquele dia, desviou-se, sentindo as batidas aceleradas do coração
de encontro ao decote profundo do corpete da roupa, que, de repente, parecia apertada
demais. Soltando um profundo suspiro, percebeu que o padrinho ao lado observava,
fascinado, o movimento de seus seios.
Mas ela sabia que a visão não era assim tão interessante. A beleza física jamais seria seu
ponto forte.
Com os olhos cor de avelã e a pele clara, sua aparência era bastante comum, nem se
comparando à beleza de Maddie, sua irmã caçula.
Maddie tinha olhos azuis e grandes, uma boca cheia e sensual e um perfeito nariz
arrebitado. Os cabelos loiros e ondulados causariam inveja a Paige, caso não a amasse
tanto.
Depois de passar anos tentando ondular, afofar ou apenas conseguir que sua cabeleira
ficasse presa com algum penteado da moda, Paige desistira e acabara se conformando
em mantê-los naturais e lisos. No momento, adotara um corte logo abaixo das orelhas e
escovava-os todas as noites até que brilhassem. Desistira também de rinsagens e
tinturas, e mantinha-os ao natural: pretos.
Havia muito decidira não competir com Maddie ou qualquer outra garota bonita. Era um
tipo comum, e não valia a pena tentar ser o que não conseguia. Pelo menos não era feia,
e precisava dar graças por isso. Tinha um rosto e um corpo proporcionais e
harmoniosos, apesar de não causar furor. Na verdade, suas medidas eram as mesmas de
Maddie. Porém, a irmã sempre parecera mais curvilínea e sexy,talvez por ser mais baixa
de estatura.
Maddie nunca se preocupara em ficar alta demais quando tinha doze anos, e sua mãe
jamais lhe dissera que a maquiagem não fazia milagres e que era melhor não .chamar
muita atenção para seu rosto. Não. Esses comentários sempre eram endereçados à mais
velha, lembrou Paige.
Quando os noivos iam cortar o bolo, sua mãe colocou a mão elegante adornada com um
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passos bem treinados, e ela o acompanhou, sentindo a força das coxas musculosas de
encontro às suas, até que o número acabou com um acorde súbito, quase fazendo-a
perder o equilíbrio e segurar-se com firmeza no ombro largo.
Permaneceram abraçados, longe de tudo e de todos. A expressão alegre abandonara o
semblante de Jager, que parecia sombrio, os ossos da face em evidência.
Paige viu-se refletida em suas pupilas, e sentiu dor ao perceber que ele apertava sua mão
com muita força.
A respiração acelerou, e sua pele começou a arder em um fogo conhecido e lânguido.
— Paige...
Antes que ela pudesse dizer algo, alguém gritou seu nome,mas de modo agudo e
ansioso:
— Paige! Ela piscou diversas vezes ante a interrupção, tentando afastar-se de Jager, que
continuava a apertá-la nos braços.
Era sua mãe quem a chamara, junto de Henry, seu pai,que parecia constrangido e
aborrecido, enquanto a esposa se mostrava beligerante.
— Blake está a sua procura. A próxima dança é dele. Blake? Por um instante Paige não
soube de quem se tratava, mas logo lembrou. O padrinho.
— Não o vi. — Não percebera ninguém desde que começara a dançar com Jager.
— É melhor ir andando...
De novo tentou afastar-se dele. Jager largou sua mão, porém mantendo sua cintura
cingida, e a fez virar-se para os pais.
— Como vão, sr. e sra. Camden? — Jager os saudou, com polidez.
Henry acenou com brusquidão, e Margaret, disse, com frieza:
— Estamos bem, Jager, e Paige, como pode ver, está ótima. — Fez uma pausa e
examinou a filha, ansiosa. — Não esperávamos vê-lo aqui.
— Foi um espécie de convite de última hora.
— Sério?
O comentário gélido não pedia explicações, e Jager mudou de assunto, bruscamente.
— Ouvi dizer que está se saindo muito bem em seu trabalho — comentou Henry.
Margaret olhou para o marido, parecendo surpresa. Era evidente que nunca ouvira falar
nisso.
— Tem razão, sr. Camden.
— Sim, parece que se tornou muito ambicioso.
— Vou vivendo.
Henry soltou uma risada rouca.
— Diria que mais do que isso.
— Do que está falando, Henry? — Margaret quis saber.
— Estamos atrapalhando os convidados. — Henry ignorou a pergunta da mulher —
Para continuarmos conversando, é melhor sairmos daqui.
Mas a música voltou a parar, e outros convidados começaram a deixar a pista. Margaret
encarou Jager.
— Como madrinha, Paige tem algumas tarefas a cumprir. Ele acenou, compreendendo,
e afastou as mãos de Paige.
— Ela não está amarrada, nem acorrentada — brincou, fitando-a e murmurando: —
Quer me deixar, Paige?
Ecos do passado voltaram a assaltá-la. Será que Jager estava fazendo de propósito?
— Tenho mesmo o que fazer. Foi bom revê-lo, Jager. Margaret suspirou, aliviada. Jager
arqueou as sobrancelhas um instante e sorriu, seu silêncio dizendo que achava
engraçado ela pensar que se livraria dele com tanta facilidade.
Paige sentiu um arrepio de apreensão percorrer-lhe a espinha. Jager mudara muito nos
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últimos anos. O rapaz sempre na defensiva era agora um homem confiante e sexy, não
apenas devido aos atributos físicos, mas porque adquirira uma postura calma, repleta de
virilidade.
A sensualidade inocente de antes se escondia sob uma aura de sofisticação, o que o
tornava ainda mais perigoso.
Bem, ela própria também mudara, decidiu, afastando-se e passando a procurar a irmã e
o padrinho. Já não era uma sonhadora adolescente e sabia que amor era mais do que
apenas atração sexual. Apenas a paixão não vencia os obstáculos da vida adulta.
Tendo aprendido uma dura lição, jurara guiar-se pela cabeça, e não mais pelo coração.
Observou o longo véu de Maddie sobre os cabelos loiros
e ondulados, e foi ter com a irmã, sorrindo para as pessoas com quem ela conversava. A
noiva pegou-a pela mão e conduziu-a para os aposentos destinados à troca de roupa do
jovem casal.
Fechando a porta, Maddie virou-se para Paige.
— Tudo bem? Lamento, Peg. Não fazia ideia de que Jager viria. Foi uma incrível
coincidência. Você não vai acreditar!
— Coincidência? Ele não foi convidado?
— Sim, por Glen. Mas Glen não sabia que... Bem, jamais mencionei o nome de Jager,
portanto, como ele saberia? Acontece que Jager é um parente.
— De Glen?
— Sim. Jager é meio-irmão de Glen.
Paige abriu a boca, atónita, com mil pensamentos cruzando seu cérebro, com um em
evidência, que verbalizou, numa exclamação:
— Jager encontrou sua família! Maddie apenas a fitou, com ar especulativo, e então aos
poucos as coisas foram se encadeando. Paige engoliu em seco.
— A mãe de... Glen?
A irmã balançou a cabeça em veemente negativa, fazendo o véu dançar.
— Seu pai... e uma garota que conheceu antes da mãe de Glen. A sra. Provost ainda não
sabe, e com o casamento e tudo o mais, não seria bom dar a notícia neste momento. O
sr. Provost pediu segredo até poder contar-lhe, porém Glen fez questão da presença do
novo irmão aqui. Os dois só se viram duas vezes, mas deram-se bem desde o início.
Glen era filho único, e Paige podia imaginar a mudança que o aparecimento de um
irmão causara em sua vida.
— Há quanto tempo ficaram sabendo?
— Poucas semanas, creio. Glen só me contou hoje. Não fazia a menor ideia e não
consegui ficar a sós com você nem um instante ainda... Não falei para Glen sobre você e
Jager. — Maddie torceu as mãos. — Isso arruinou seu dia?
— Lógico que não!
Para ser franca, trouxera-lhe dor e mágoa, mas isso não iria interferir no dia especial da
irmã, que deveria ser feito apenas de felicidade. Por isso, mentiu:
— Nós dois já esquecemos as loucuras da juventude. Foi... engraçado revê-lo.
— Sim, acho que tudo aconteceu há muitos anos e já passou. Tem certeza de que não
ficou abalada?
— Estou bem, pare de se preocupar, Mad. Não é melhor voltarmos à festa? Seu marido
pensará que já o abandonou.
Maddie foi até a penteadeira e sentou-se em frente.
— Jamais! Meu marido... — repetiu com ar sonhador, pegando um batom. — Imagine,
eu, uma senhora casada!
— E bastante nova, querida. Mas com maturidade suficiente para saber o que está
fazendo, espero. Já que eu não me saí bem em matéria de casamentos.
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CAPITULO II
Jager não voltou a aproximar-se, porém, enquanto Paige cumpria seus deveres e
dançava com os padrinhos e com outros mais, notava estar sendo observada por ele, que
se mantinha encostado na parede com os braços cruzados, ou caminhando pelo salão,
trocando algumas palavras aqui e ali com um ou outro, e conversando por vários
minutos com Glen e Maddie.
Quando Maddie atirou o buque para um grupo de mulheres ansiosas, Paige manteve os
braços ao longo do corpo, e deixou que uma outra moça ao lado pegasse as flores.
Já que os noivos iam embora, queria muito escapar também, pois nada mais tinha a
fazer ali. Sentia-se exausta, cansada de sorrir e com uma terrível dor de cabeça.
Procurou pela mãe e disse-lhe ao ouvido:
— Importa-se de que eu vá para casa? Não farei falta aqui.
— Claro, querida. Seu pai e eu precisamos ficar até o último convidado sair, mas tenho
certeza de que Blake a levará.
Assim dizendo, Margaret olhou em torno, procurando o padrinho.
— Não é preciso, mamãe. Pegarei minha bolsa e chamarei um táxi. Há um telefone no
saguão.
— Bem... se acha melhor...
— Sim. Vejo você amanhã. — Paige inclinou-se e beijou-a no rosto. — Foi um lindo
casamento.
— Sim, sem dúvida.
O rosto da sra. Camden brilhava de satisfação. Pelo menos conseguira que a mais nova
das filhas se casasse em grande estilo.
No saguão, Paige encontrou um cartão de uma empresa de táxis pendurado na cabine
telefónica, e digitava o último algarismo quando uma mão de dedos longos e fortes
segurou-lhe o ombro e a fez soltar o fone, enquanto ouvia o zumbido da linha
interrompida.
— Não precisa de táxi — disse Jager. — Eu a levo para casa.
As mãos de Paige crisparam-se, e ela não se virou.
— Obrigada, mas dispenso a carona.
— Por quê? Meu carro está bem aí, na calçada.
Ela não sabia o que responder sem parecer rude ou nervosa. Com gentileza, Jager
colocou o fone no gancho, dando tempo para que Paige arranjasse uma desculpa.
— Não queria tirá-lo de seu caminho.
Jager nem se deu ao trabalho de responder, e a empurrou na direção da porta, que se
abriu a sua passagem.
— Para onde devo levá-la, Paige?
— Para a residência de meus pais.
Esperou por um comentário sarcástico, mas Jager apenas disse:
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— Precisamos de um banho.
Havia um banheiro que Paige e Maddie dividiam.
— Vamos subir — sugeriu.
Afinal, era o mínimo que poderia fazer por ele.
O rosto de Jager também estava sujo de sangue e havia manchas em sua camisa,
enquanto os cabelos de Paige brilhavam com inúmeros fragmentos do pára-brisa.
Jager a seguiu pela escada de mármore acarpetada, que abafava seus passos.
A porta do quarto de Paige estava aberta e, com presteza, ela se dirigiu ao banheiro,
acendendo a luz e revelando o interior todo branco, com o box transparente, as torneiras
douradas e as toalhas macias. Paige ofereceu-lhe uma que tirou da prateleira.
— E melhor lavar o rosto.
Em seguida, ela abriu um dos armários espelhados, mirando seu reflexo pálido.
— Pegarei algo para recolhermos os estilhaços. — Paige retornou ao quarto, retirou
uma fronha do travesseiro e levou-a ao banheiro, onde a estendeu sobre a pia. — Agora,
pode passar o pente e retirar os fragmentos.
— Você primeiro.
Com gesto rápido, Jager retirou os óculos de Paige e colocou-os sobre um balcão de
mármore. Antes que ela pudesse protestar, segurou-a pela nuca.
— Posso fazer isso sozinha...
— Mas não consegue enxergar. Incline-se para frente, meu bem. Senão os estilhaços
cairão em suas costas.
A expressão carinhosa dita com displicência a pegou desprevenida, invadindo-a como
uma onda de calor. Temendo que ele percebesse o rosto corado e o brilho nas pupilas,
Paige baixou a cabeça.
Jager deslizou-lhe os dedos da nuca ao topo do crânio, e começou a passar o pente.
— Isto pode doer um pouco.
Paige sentiu uma fisgada e prendeu a respiração.
— Aqui está! — Jager deixou cair sobre o mármore um caco maior. — Estava
encravado no couro cabeludo, mas creio que o tirei por inteiro. Não se mexa!
Pegou uma toalha de rosto e molhou e passou-a sobre o ferimento.
— Está sangrando um pouco, mas o corte não foi profundo.
— Você está em pior estado que eu.
De fato, Jager ficara o tempo todo preocupado em protegê-la na hora do acidente.
— Não é nada. Tem iodo?
— Não é preciso. Estou bem, juro.
Jager tomou-lhe o rosto entre as mãos e o examinou.
— Nenhum corte das faces.
Ela tentou se afastar, mas as mãos fortes a retiveram.
— Ainda não terminamos. — Jager a encaminhou para a banheira e abriu a torneira.
— Olhe, eu...
— Quieta! — Com gentileza ele acabou de limpar o sangue, deixando à mostra
pequenas perfurações na pele. — Teve sorte. Nós dois tivemos.
Jager a secou, em seguida. Examinou o vestido em frangalhos e todo manchado.
— Vai querer trocar de roupa.
Paige recordou como ficara agitada por causa da leve; mancha de vinho que derramara
ao jantar, incidente que pareceu contecer séculos atrás, fazendo a perceber como fora
insignificante. Poderiam ambos ter morrido, menos de uma hora antes...
Estremeceu, lembrando-se dos terriveis momentos que passara, quando parecera que o
mundo iria terminar para ela. E para Jager.
Tremia tanto que ele voltou a segurá-la.
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CAPÍTULO III
Foi um beijo de tirar o fôlego. Paige não conseguia raciocinar, nem mover-se, a não ser
para erguer os braços e agarrá-lo, como se fosse uma tábua de salvação em um mar de
desejo e sensualidade.
Seu corpo parecia estar possuído por um fogo líquido que a consumia de um jeito
delicioso, e só conseguia sentir a pressão das formas fortes e viris e dos lábios
exigentes.
O beijo foi se tornando cada vez mais sensual. Jager afastou as lapelas do roupão e
acariciaram-lhe os seios, os mamilos intumescidos, fazendo-a gemer de prazer.
Paige acariciou o tórax musculoso em um gesto que já fora habitual em suas vidas.
Jager tomou-a nos braços e ambos caíram sobre a cama, continuando a se afagar com
desespero, enquanto Paige voltava a se maravilhar, como acontecera um dia, ao vê-lo
tão excitado por sua causa.
Com olhos enevoados pela paixão, ela percebeu que Jager despira a calça, mas antes
tirara um preservativo do bolso. Consciente do que iria acontecer, entregou-se sem
restrições, e ambos se uniram no ato de amor mais uma vez, depois de tantos anos...
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Maddie foi uma grande emoção, somado àquela batida... creio que não estava
raciocinando direito.
— E agora lamenta o que ocorreu entre nós — concluiu, zangado.
— Nada significou! — insistiu Paige, como se tentasse convencer a si mesma. —
Portanto, por favor, deixe tudo como está.
— E se não conseguir?
— São necessários dois para isso. Espero que respeite meus sentimentos.
— Eu respeito. Por que você não?
— Como assim?
— Raciocine. E depois me avise sobre sua conclusão. Paige ouviu o ruído do telefone
sendo desligado, e sentiu um misto de raiva e alívio. Dizer a ele quando chegasse a uma
conclusão? Que esperasse sentado!
Quando fizera Jager acreditar que voltaria para os Estados Unidos, Paige falara com
sinceridade.
Viera para o lar preparada para rever seu futuro e começar um novo capítulo em sua
história, sentindo-se grata pela ajuda dos parentes. Porém, quando Maddie e Glen
voltaram da lua-de-mel, continuava na Nova Zelândia, e arrumara um emprego como
desenhista gráfica em uma grande editora. Comprara um chalé na ponta do ancoradouro,
e dos fundos da residência via-se a água, através das árvores que cresciam em uma
encosta.
— Mamãe acha que você é maluca — disse Maddie com franqueza, na primeira vez em
que foi visitá-la com o marido, e encontrando Paige a raspar a madeira das janelas do
chalé. — Esperava que comprasse algo na cidade, um apartamento fácil de se manter,
e... Bem, nada como... isto.
— Para ser franca também pensei nisso. Paige só se interessara pelo chalé por causa da
localização. Quando o corretor dissera que tinha uma propriedade em uma parte um
tanto deserta, com vegetação e água ao redor, Paige logo tivera ideia de pô-la abaixo e
projetar uma casa nova. Entretanto, algo no pequeno e dilapidado chalé chamara-lhe a
atenção e, num impulso, decidira recuperá-lo. Glen observou a tinta descascada e o
portão meio caído.
— Será preciso mais do que uma mão de tinta para colocar este lugar em ordem...
Com relutância, Paige parou com o que fazia.
— Querem um café?
Lá dentro, Glen passeou o olhar pela sala pequena e escura, e raspou o bico do sapato
no carpete gasto.
— Aposto que a madeira por baixo é de boa qualidade. Era provável que sim. A maioria
das construções antigas
tinha assoalho de madeira muito boa.
— Ficam lindos com móveis modernos — disse o cunhado.
— Glen é um arquiteto frustrado. — Maddie sorriu. — Queria que comprássemos uma
velha casa para consertá-la, mas viver em meio às obras me deixaria louca. Temos
amigos que estão "remodelando" suas residências há anos!
— Esse será um trabalho gigantesco para uma só pessoa. Não planeja fazer tudo
sozinha, não é, Paige?
— Já mudei a fiação e as telhas, Glen. Contratarei marceneiros para consertar os
armários da cozinha e reformar o banheiro, mas espero também fazer muita coisa com
minhas próprias mãos.
— Sou ótimo com um pincel. .
Maddie fitou o teto, em um gesto de desespero.
— Pelo amor de Deus, Paige! Deixe o pobre homem ajudá-la! Paige gargalhou.
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CAPÍTULO IV
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Glen prometera vir ajudar com a reforma do chalé no fim de semana seguinte, mas
Paige se espantou ao ver Maddie descer do automóvel também. E a surpresa maior foi
quando Jager surgiu do banco de trás.
Maddie se aproximou, carregando uma cesta.
— Preparei um lanche, irmãzinha. Jager pediu para vir na última hora, e não soubemos
o que dizer... Você se importa, Paige?
Glen já se aproximara também e a fez lembrar: — Disse que toda a ajuda seria bem-
vinda... Enquanto isso, Jager examinava a casa com expressão crítica, do telhado novo
às paredes descascadas. Por fim, ergueu as sobrancelhas e encarou Paige em um silêncio
significativo.
— Tudo bem — ela afirmou para a irmã e o cunhado. Aborrecida, deu-se conta de que
usava um jeans velho e uma camiseta larga. Maddie, entretanto, estava linda, com uma
blusa de linha azul e uma fita combinando nos cabelos. Aliás, as roupas de Jager
também não eram apropriadas para serviços pesados, observou.
Glen, que usava, short e camiseta surrados, remexeu no porta-malas e retirou uma
trouxa,, que atirou para o meio-irmão.
— Tome. Vista isso. Era um macacão de operário. Jager se dirigiu a Paige:
— Se quiser, posso ir embora.
— Não é preciso. E bem-vindo para me dar uma mão. Ele voltou a olhar para o chalé.
— Vai ser um trabalho e tanto...
— Preciso me manter ocupada. Pintar, martelar e polir ajudavam Paige a ficar bastante
cansada e adormecer logo, sem precisar andar de um lado para o outro, insone, como
fazia na residência dos pais.
Notou a curiosidade ser substituída por um brilho de entendimento nos olhos de Jager,
mas, antes que pudesse dizer algo, Glen os chamou:
— Por onde devemos começar?
Jager e Glen pintaram as paredes de fora do chalé, e Maddie ajudou Paige a pintar os
batentes das janelas. A manhã passou depressa, fazendo-os suar em bicas.
Glen despiu a camiseta e enxugou a testa.
— Gostaria de nadar um pouco.
— O mar é logo ali. — Jager apontou.
— Mas não trouxeram roupas de banho.
— E quem precisa, Maddie? — Glen indicou seu short velho.
Jager despiu o macacão, surgindo também de short.
— Há uma praia adiante, e a água é bem funda, mas tranquila — informou Paige. — Se
quiserem nadar, posso levar algumas toalhas.
— Vocês duas não querem vir conosco?
— Maddie e eu vamos preparar o almoço.
Uma hora depois, os dois voltaram com as toalhas amarradas na cintura, sorridentes e
famintos.
Após se vestirem, todos se sentaram para comer na varanda, e devoraram sanduíches,
Maddie e Glen nos degraus da escada, Paige e Jager encostados nas pilastras.
Um vizinho passou com seu cachorro e acenou para Paigé, que respondeu ao
cumprimento.
— Você o conhece? — quis saber Jager.
— Sim, ele mora no final da rua.
— Sozinho?
— Não sei. Leva o cão para passear todos os dias e acenamos um para o outro. As
pessoas por aqui são amistosas.
— E quantas sabem que mora só? Paige o encarou, surpresa.
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Aidan. Entretanto, isso a deixou ainda mais triste, e acabou adormecendo para sonhar
com Jager.
No domingo à noite as paredes do chalé brilhavam com a tinta nova, e na segunda-feira,
conforme Jager prometera, o funcionário da empresa de segurança a visitou e fez um
orçamento.
Mais tarde, Jager telefonou.
— Instale logo o alarme, Paige.
— Mas moro em uma rua tranquila...
— O perigo existe em todos os lugares.
— Pare de me dar ordens!
— Quero ter certeza de que estará segura.
Apesar de ser uma mulher independente, Paige sentiu um grande prazer com a
preocupação dele.
CAPÍTULO V
A medida que a reforma progredia, tornou-se um acordo tácito Jager trabalhar com
Glen, e Paige acostumou-se a vê-lo chegar ao lado do cunhado.
Ajudaram a retirar o carpete carcomido, que deveria ser trocado. Tomando fôlego, Glen
passou os dedos por entre os cabelos castanhos, sorrindo, satisfeito.
— Acho que vou tomar um banho.
— Usem o banheiro à vontade. — Paige limpou na ponta da camiseta as lentes dos
óculos empoeiradas. — Apesar de no momento não estar muito bonito.
Os dois tinham retirado o chão de ladrilhos para a reforma ali também.
— Ou podem nadar, se preferirem.
Voltando a se inclinar sobre o trabalho, Glen comentou:
— Nadar levaria muito tempo. Queremos terminar com isto.
Jager fitou Paige.
— Por que não vai se refrescar e deixa o resto conosco?
Ela balançou a cabeça em negativa. O projeto da reforma era seu e, apesar de
agradecida pelo grande auxílio, não permitiria que fizessem tudo sozinhos.
Olhou para Maddie, que entrava naquele instante, linda e bem-arrumada como sempre.
Ela fora um anjo, carregando os materiais e preparando as refeições, mas recusava-se a
ficar de joelhos e se envolver em trabalhos braçais.
Depois de o velho carpete ter sido retirado por completo e os detritos amontoados no
portão, Maddie ponderou:
— É melhor dormir em nossa casa, Paige. Seu quarto está repleto de móveis e mal dá
para chegar até a cama.
Tudo fora passado para aquele cómodo a fim de se limpar os demais.
— Entretanto, não tem muita mobília — comentou Jager.
— Não queria muita coisa atrapalhando o serviço. Teria sido mais sensato ter cuidado
do assoalho primeiro,mas Paige estivera ansiosa para se mudar assim que comprara o
chalé.
— Deve ter tido muitos móveis bonitos nos Estados Unidos.
— Mas não fazia muito sentido trazer tudo para a Nova Zelândia, Jager.
Na realidade, Paige tivera de dar ou vender muito do que adquirira com Aidan, e só
mantivera algumas fotos e objetos de valor sentimental.
— Creio que tentou cortar os laços que a prendiam a seu falecido marido.
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Glen inclinou-se e serviu mais vinho para Jager, terminando com a garrafa.
— Vou buscar outra.
— Para mim, não, Glen. Precisarei dirigir, lembra-se?
— Temos muitos sofás, Jager, é só escolher um.
Glen abriu outra garrafa e, dessa vez, Jager não protestou quando encheu seu copo até a
borda.
Depois disso, tudo começou a ficar um tanto embaçado para Paige. Em determinado
momento, foram todos para a sala de estar, e o vinho parecia brotar das mãos de Glen,
que pôs música no aparelho de som. Ele e Maddie dançaram um pouco, muito
agarrados, e em seguida ela bocejou, dizendo que ia se deitar.
Caminhou meio trôpega até a porta da suite, tropeçou e soltou um gritinho.
Glen apressou-se a ampará-la.
— Venha, amor. Um pé depois do outro. Vocês dois vão ficar bem se não voltarmos
para a sala?
Ao lado oposto de Paige, um braço apoiado no encosto do sola, Jager ergueu o copo.
— Claro! Boa noite.
Paige resolveu desligar o aparelho de som. - Desmancha-prazeres...
Ela arqueou as sobrancelhas.
— Desculpe-me. Queria ouvir música?
— Só se quiser dançar comigo.
Os olhos dele luziam, tentadores, e Paige recusou com um gesto. A sala parecia
balançar.
— Acho que não serei capaz. O que será que puseram nesse vinho?
— Álcool. Paige deu risada.
— Não diga! Fez efeito em você também?
Jagér parecia o mesmo: bonito, sem um fio de cabelo fora do lugar, e muito confiante.
— Bem, não terei de dirigir para casa e... — Ganhou tempo colocando o copo vazio
sobre a mesa. — Creio que não quer dividir a cama comigo, quer?
— Estou um pouco bêbeda, mas não tanto. Jager gargalhou.
— Sendo assim, chamarei um táxi.
Mas nenhum dos dois se mexeu. Estavam em cantos opostos, e mesmo assim Paige
sentia-se como se uma teia invisível a arrastasse para o ex-marido.
Estremeceu sem querer, tentando se recompor.
— Por que fez isso? — Jager se aproximou dela.
— Tento me manter acordada. Os últimos dias foram bastante cansativos.
— Não deve se estafar. Amanhã ajudarei Glen a retirar a mobília do quarto.
— Tem sido de grande ajuda, Jager. Obrigada.
— Queria fazer isso.
— Por quê?
— Imagina que tenho segundas intenções?
— Não é sempre assim? Jager riu de novo.
— Foi um golpe baixo e mentiroso, Paige!
— Sério? — Ela olhou-o fixamente, depois acrescentou: — Tenho minhas dúvidas.
Jager franziu a testa.
— Faz ideia do que está dizendo? Porque eu não faço.
— Talvez seja a bebida. — Um pensamento começava a se formar na mente de Paige,
mas apesar de ser importante não sabia como externá-lo. — Alguma vez me amou de
verdade?
Os olhos de Jager pareceram escurecer, e seu rosto tornou-se uma máscara misteriosa.
As palavras pareceram pairar sobre os dois, como facas afiadas, e Paige desprezou-se |
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por tê-las pronunciado. No entanto, essa questão a atormentara durante anos. Desde a
primeira vez em que Jager declarara seu amor. Desejara tanto acreditar nele que afastara
:as dúvidas e decidira assumir o sonho.
— O que acha? — disse ele, optando por fazer outra pergunta. — Meu Deus! Se ainda
precisa me perguntar isso...
— Amou? Ou casou-se com o dinheiro de meu pai?
Era tarde demais para voltar atrás, e de repente Paige percebeu que precisava demais
saber.
Por um instante, achou que Jager iria matá-la, tal a fúria em seu semblante. Quando por
fim falou, foi como se estivesse sufocado e não conseguisse verbalizar direito:
— Para mim, o mudo girava em torno de você. Tinha como certo que as estrelas e a lua
desapareceriam em uma noite escura e sem-fim, caso me deixasse. Quando isso
aconteceu, pensei que fosse morrer. O sol não voltaria a brilhar e nada mais de bom
aconteceria no mundo. Você era o centro de minha vida e o motivo de meu coração
pulsar. A grande razão para me manter vivo. Isso parece amor?
Paige ficou tonta e não conseguia falar. Abriu a boca, lutando para responder, mas o riso
de Jager lhe causou um arrepio.
— E lógico que estava errado. O mundo não acabou e continuei a viver, respirar, comer
e andar. Tudo continuou na mesma, até que um dia compreendi o quanto nossa união
significara pouco, na realidade.
Paige engoliu em seco, sem compreender por que se sentia tão triste com aquilo tudo.
Jager prosseguiu:
Meu coração estava partido, mas nada mais mudara por causa disso. Uma mulher me
deixara, mas haviam muitas outras, descobri, assim que curei minhas feridas e parei de
sentir pena de mim mesmo.
— Mas não tornou a se casar! — exclamou Paige, cheia de ciúme.
— Como disse, não cometo o mesmo erro duas vezes.
— Nem eu! Quero dizer... não com a mesma pessoa! Ficaram calados por um instante.
— Então não quer ganhar outra aliança de mim, Paige?
— Ora! Evidente que não! Já não fizemos muita bobagem da primeira vez?
Jager sorriu, bem-humorado.
— Pelo menos nisso concordamos. — Fitou-a com atenção. — Mas nossa vida sexual
era incrível. Ainda é... a julgar pela noite do casamento de Maddie.
Paige sentiu o coração disparar. Qualquer novo relacionamento sexual com Jager estava
fora de questão. Ergueu o queixo, em desafio.
— Não quero outra aliança e também não vou dormir com você de novo.
— Que impasse! — Jager zombava, como se não acreditasse no que ela afirmava.
Tentando manter-se forte, Paige o encarou.
— Vai ou não chamar o táxi? Jager não se moveu logo, mas acabou dando de ombros e
dirigiu-se ao telefone e ligou para a empresa de táxis.
— Não precisa ficar acordada por minha causa, Paige. Eu espero do lado de fora do
prédio.
— Então, boa noite.
— Boa noite. Jager avançou para a porta, mas deu meia-volta e postou-se na frente de
Paige. Sem tocá-la deu-lhe um beijo nos lábios.
— Tenha bons sonhos.
Ela permaneceu imóvel como uma pedra, as mãos crispadas, vendo-o sair.
No dia seguinte, os quatro deram prosseguimento à arrumação do chalé. Depois que
Glen e Maddie foram embora, Jager demorou-se um pouco mais.
— Qual o próximo passo, Paige?
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— Sou responsável por mim mesmo, Paige, sempre fui. Isso não irá mudar.
— Como foi que o sr. Provost o encontrou? — Paige se sentou no sofá.
Jager a acompanhou e se acomodou no outro canto, com sua posição característica, as
mãos cruzadas na nuca.
— Contratou um detetive particular que localizou a tia que tomou conta de mim, depois
que minha mãe foi embora.
Paige recordou-se da amargura de Jager quando lhe falara que, com poucos meses de
idade, a mãe o abandonara com uma tia que possuía vários filhos, e fora para outra
cidade. De vez em quando, ela enviava um pouco de dinheiro para a irmã, mas jamais
regressou nem procurou por Jager. Então, de repente, parara de enviar dinheiro.
Quando Jager tinha cinco anos de idade, a tia colocara seus pertences em uma valise e
avisara que uma boa senhora viria levá-lo para seus novos pais. Jager era muito pequeno
na época para compreender o que isso significava.
— Creio que titia já não aguentava mais — dissera a Paige. — Não pedira para criar
mais uma criança, e tinha uma família muito grande.
Mas ele era quase um bebe, pensara Paige, indignada.
O primeiro lar adotivo durou até o casal em questão começar a ter os próprios filhos.
Assim que o primeiro nasceu, pediram ao governo para arranjar outro lar para Jager.
— Que crueldade! — exclamara, quando ele lhe contara esse episódio triste.
— Nunca prometeram que ficariam comigo para sempre. Jager dera de ombros. — Não
tiveram culpa por eu ser novinho demais para compreender.
Mas fora a terceira rejeição em tão tenra idade, e a mágoa foi enorme. Portanto, não foi
surpresa que o próximo casal que o adotou viesse a ter dificuldades com sua rebeldia. E
assim acontecera várias outras vezes.
Quando por fim o governo encontrou-lhe um lar adequado, .Jager já havia perdido
vontade de se relacionar com uma família, e aprendera a manter as emoções sob uma
capa de indiferença.
Jamais lhe disse isso, mas Paige deduzira muita coisa pelos comentários que fazia e as
confidências esporádicas. .Jager nunca soubera se expressar bem com palavras.
Porém, era muito inteligente para perceber que criar encrenca não o levaria a nenhum
lugar, e que teria sempre de tomar conta de si mesmo.
Após alguns incidentes na adolescência com a polícia, por causa de bebidas e brigas de
rua, encontrara trabalho em um navio pesqueiro e, depois de mais alguns empregos,
rumara para o sul.
— Queria procurar sua mãe? — Paige indagara.
— Para quê? Essa mulher não me quer ver surgir à soleira, e eu não atravessaria a rua
para cumprimentá-la, caso me dissessem que era ela.
Foi difícil encontrar serviço na cidade grande, e, quando um dia Jager entrou em uma
loja de artigos de segunda mão à procura de roupas, quase não tinha dinheiro e
perspectivas. Como fazia duas vezes por semana, Paige, de uniforme escolar e duas
tranças, ajudava atrás do balcão do estabelecimento que vendia de panelas a chinelos. A
escola de elite que frequentava fazia questão de incutir certos princípios nos alunos,
induzindo-os a ajudar os necessitados.
A maioria dos voluntários era constituída por pessoas mais velhas que ela, e os clientes
da loja eram jovens ricos à procura de roupas antigas e diferentes, casais que não
desejavam gastar muito com peças para os filhos em crescimento e gente menos
afortunada, que constituía a maioria da clientela.
Quando Paige contara que desejava dar uma mão, a mãe torcera o nariz.
— Nossa! Lidar com roupas usadas e objetos velhos... Não sabe de onde vieram,
menina!
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Como se pudesse ter esquecido, pensara Paige. Será que o moço não sabia como era
deslumbrante? Mas só balançara a cabeça, respondendo:
— Lembro, sim.
— Queria agradecer-lhe. Usei as roupas em uma entrevista de emprego e fui aprovado.
— Que ótimo! Em que vai trabalhar?
Ele a observara com cautela, antes de dizer:
— Apenas para ajudar na cozinha de uma lanchonete. Não é efetivo, mas... ora! Pelo
menos mata minha fome! E nos dão comida de graça.
Paige sentira um baque no coração, e indagara, logo se arrependendo de ser intrometida:
— Nós?
— Eu e os outros empregados famintos. Jager a fizera rir, e Paige sentira-se feliz por
perceber que estava tentando agradá-la. Enrubescera ainda mais ao julgar que era
absurdo crer que um rapaz sensacional como aquele se interessaria por ela. Em especial
quando estava usando uniforme, sem maquiagem e de tranças, conforme exigia o
colégio.
Não se tratava de algum velho com mania por meninas, mas sim de um rapaz quase de
sua idade. Por certo gostava de ter, garotas bonitas que combinassem com sua própria
formosura. Loiras com cabelos ondulados, morenas esculturais ou ruivas estonteantes.
Enfim, jovens que usavam batom para realçar os lábios sensuais, e sombra nos olhos
azuis, verdes ou negros. E que não precisavam usar óculos.
Ela era apenas Paige Camden, com seu rosto comum.
Entretanto, para seu espanto, lá estava o garoto, fitando-a como se gostasse de sua
companhia. Então, de modo ainda mais surpreendente, ele a convidou:
— Quando acaba seu expediente? Podemos tomar um café mais tarde? A partir desse
segundo, Jager nunca mais sairia de seu coração.
CAPÍTULO VI
Jager mudou de posição no sofá e passou os dedos por entre os cabelos. O movimento
fez Paige estremecer e voltar à realidade. Estavam os dois no chalé, e Maddie e Glen
tinham ido embora.
— No que estava pensando? — Jager quis saber. — Deveria me sentir grato pelo fato de
meu pai ter afinal se lembrado de minha existência?
— Dentre todas as pessoas, você é uma das que sabem que erros são cometidos quando
se é muito jovem e... guiado pelos hormônios. Seu pai não devia ser muito mais velho
que você quando nós...
— ...nos casamos — completou Jager com rispidez. — Há uma diferença, porém.
— Bem, o que importa é que afinal não deu certo para nós dois.
— Tem razão. — Jager levantou-se de supetão. — Se pretende começar com esse
assunto de novo...
Paige se deu conta de que ele estava certo. Falar sobre o casamento que tiveram só traria
amargura. Conduziu-o até a porta.
— Obrigada mais uma vez por ter me ajudado tanto.
— Sempre às ordens. — Jager voltou-se para ela, segurando a maçaneta. — Para
qualquer coisa, e estou falando sério, Paige.
Depois que Jager foi embora, o chalé pareceu muito solitário. Paige perambulou pelos
cómodos, apagando as luzes, fechado portas, e por fim viu-se fitando a cama vazia no
quarto de hóspedes. Imaginou Jager deitado ali, a sua espera, como sempre fizera
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gesto de cabeça.
— Tem razão, não se pode viver no passado. — Encarou Paige. — O marido de minha
filha morreu nos Estados Unidos, e ela voltou para retomar suas atividades.
Paige cortou um pedaço do peixe macio com muita força.
Estava chocada com a mãe. Pensara que Margaret iria querer que mantivesse um
respeitável período de luto, antes de ponderar sobre a possibilidade de sair com outros
rapazes.
— Meus pêsames, Paige — falou Philip, com seriedade. Sentindo a simpatia dele, ela
agradeceu. Afinal, não era culpa do pobre rapaz se seus pais quisessem empurrá-lo para
cima dela.
Depois da refeição, Paige mostrou algumas amostras de papel de parede para Margaret,
enquanto os homens conversavam sobre negócios.
Após alguns minutos, Margaret foi fazer café, e recusou .a ajuda da filha. Philip veio
sentar-se a seu lado no sofá. — Está remodelando sua residência? Paige logo descobriu,
espantada, que Philip era fanático por reformas e decoração, e tinha muitos conselhos
úteis para dar. Quando a mãe se aproximou com o café, ele fez menção de se levantar,
mas Margaret o deteve.
Assim que foi possível, Paige retirou-se, mas antes foi quase pressionada pelos pais a
convidar Philip para visitar o chalé e ver as maravilhas que operara ali.
Pelo menos evitara um convite formal para sair com ele, pensou, e poderia protelar a
visita a sua casa por muito tempo.
No sábado seguinte, Paige se levantou cedo e preparou-se para colocar o papel de
parede que escolhera. Maddie e Glen tinha viajado no fim de semana para comparecer
ao casamento de um amigo, e Paige garantira que poderia fazer o serviço sozinha. De
qualquer maneira, não desejava monopolizar o cunhado, pois sabia que a irmã não tinha
especial piedileção por reformas.
Não tivera mais notícias de Jager, mas meia hora mais larde, ao terminar de empapelar
uma parede da sala, escutou o motor de um carro se aproximando e sentiu um baque no
peito. Alguém bateu na porta. Entre!
Ouviu a maçaneta girar de leve, e alguém chamou: Paige?
Em seguida, Philip surgiu à entrada, as lentes dos óculos refletindo o soí da manhã.
Usava roupas esportivas, e Paige achou que era bastante atraente. Porém, não como
Jager.
A fim de encobrir o grande desapontamento, brindou-o com um sorriso caloroso.
— Philip! Que gentileza ter vindo! Espere um momento...
— Não se mova! Continue! — Ele atravessou a sala e postou-se junto à escada. — Está
fazendo um bom trabalho, Paige, mas será mais rápido se houver quatro mãos cuidando
disso.
E tinha razão. Philip demonstrou ser muito bom com os cantos das paredes e das portas,
e em breve a casa já ostentava uma nova aparência.
Terminavam com uma parte bastante difícil ao redor da lareira, quando uma nova batida
na porta se fez ouvir.
— Com licença. — Paige colocou uma longa tira de papel sobre a mesa e foi atender.
Jager surgiu e foi logo dizendo:
— De que adianta ter um alarme contra ladrões se deixa a porta sempre destrancada?
— E pleno dia e pensei...
— Deveria ter mais juízo! Tudo bem se estivesse aqui comigo e Glen, mas sozinha...
— Não estou só. Ele estacou.
— Imaginei que o automóvel lá fora fosse de algum vizinho.
— Jager, venha comigo para conhecer Philip. — Paige avançou para a sala de estar,
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com Jager logo atrás. — Não posso parar com o que estou fazendo.
— E quem é esse tal... Philip largou o pincel e endireitou o corpo. Parecia maior,
o tórax estufado, os ombros eretos, embora fosse mais baixo que Jager, e essa postura
fez Paige compará-lo a um galo de briga, pronto para o ataque.
Por trás das lentes grossas, examinou o novo visitante com frieza.
— Philip sou eu — afirmou, com calma, sem se intimidar com o olhar fixo de Jager.
Sentindo que o clima de repente se tornara tenso, Paige tralou de fazer as apresentações.
Quando Philip adiantou-se estendeu a mão, pensou que fossem disputar uma queda-de-
braço, mas Jager o cumprimentou, mantendo as pálpebras semicerradas e uma
expressão distante. Observou as paredes, e em seguida Philip.
— É decorador profissional? Paige o contratou?
— Philip é um amigo — adiantou-se Paige, apesar de só telo visto uma vez. —
Prontificou-se a me dar uma mão.
— Mas já lhe disse que se precisava...
— Philip tem experiência, Jager.
Um brilho malicioso surgiu nos olhos verdes dele.
— Verdade? — Examinou a camiseta larga e manchada, que quase cobria todo o short
de Paige, e deteve-se nas belas |pernas. — Também tenho um pouco.
Encarou Philip.
— Paige e eu também já... trabalhamos juntos.
Philip não era tolo, e seu olhar alerta passeou de um para o outro, até que Paige
apressou-se a falar:
— Meu cunhado trouxe Jager até aqui. Os dois são irmãos.
— Então também é seu parente, de certa forma — replicou Philip.
Jager aquiesceu.
— Pode-se dizer que sim.
Relanceou outro olhar malicioso para Paige, que recusou-se a enfrentá-lo. Então, virou-
se para examinar a sala.
— Sem dúvida estiveram ocupados. Chegou há muito tempo Philip?
Ele consultou o relógio, mas Paige se adiantou de novo:
— Fizemos muito em pouco tempo. Philip tem muita prática. — Pigarreou,
acrescentando: — Você também me ajudou muito, Jager, com seus músculos, movendo
móveis e levantando peso. Agora estou em outra fase da reforma, e Philip ofereceu seus
préstimos para a decoração.
Por um instante, Jager a examinou, mas logo se dirigiu no estranho a sua frente.
— E professor, Phil?
Philip apoiou o cotovelo na escada.
— Sou contador... Jag.
Jager sorriu, mas Paige teve dúvidas de que fosse um sorriso genuíno.
— Um homem de números, hein? Então como adquiriu experiência com... decoração?
— Minha ex-mulher e eu fizemos três reformas durante nosso casamento. — Philip o
fitava com toda a calma.
Jager enfiou as mãos nos bolsos, como era seu hábito.
— E nenhuma o satisfez?
— Reformávamos e vendíamos os imóveis com um bom lucro.
— Ou seja, é um homem que está sempre em movimento... Philip sorriu, fazendo-se de
desentendido.
— A cada vez adquiríamos uma casa melhor.
— E não está mais casado?
— Não — disse Philip, com uma ponta de amargura. — No momento ela é corretora de
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CAPÍTULO VII
Os dois homens pareciam ter feito uma trégua muda. Quando Philip começou a
flexionar os braços e fazer caretas de dor, Jager assumiu seu posto na escada.
Ao final da tarde, estavam se revezando, e Paige sentia uma terrível dor de cabeça. Sem
saber como, assumira a mulher indefesa que serve chá e biscoitos e prepara o almoço,
entregando aos membros do sexo masculino pincéis e , facas quando necessário, e de
vez em quando recebendo permissão para passar cola, mas nada mais importante, como
subir nas escadas ou colocar o papel nas paredes.
Não era justo. Sem dúvida que os dois desempenhavam a tarefa muito mais depressa do
que ela, mal parando para comer, embora agradecessem muito pelos refrescos que lhes
trazia de meia em meia hora. Pareciam competir para ver quem se saía melhor e mais
depressa, com maior ímpeto e decisão, algo que não existira quando Jager e Glen
trabalharam juntos.
Terminaram de empapelar a sala de visitas e um dos quartos, e então Paige disse:
— Estou cansada. — Era verdade, apesar de seu cansaço derivar mais da tensão no
ambiente que do esforço físico. E a luz do sol começava a diminuir. — Obrigada,
rapazes, mas vamos parar por hoje, enquanto preparo o jantar.
Pensou ver um brilho de alívio no rosto de Philip, que tirou os óculos e passou o braço
pela testa.
— Não precisa cozinhar, Paige, é melhor que vá dormir logo — Jager pôs a mão no
ombro de Philip, que pareceu recuar um pouco. — Vamos, Phil. E melhor irmos embora
e deixarmos a senhora descansar.
Já que Paige se manteve calada, Philip não teve como argumentar. Acabou sorrindo e
concordando com Jager.
Paige não insistiu, para evitar incentivar disputas. Entretanto, em meio à entrega de
jaquetas e cumprimentos de boa-noite, Jager conseguiu levar Philip até a porta e fazê-lo
descer primeiro os degraus da escada. Dando um passo atrás, lalou para Paige:
— Trate de comer alguma coisa, mesmo que seja apenas um sanduíche.
Sem esperar por uma resposta, Jager inclinou a cabeça e beijou-a na boca, de um jeito
tão leve, que ela nem teve tempo de corresponder.
— Vejo você amanhã. — E então desceu correndo, a jaqueta pendurada no ombro, a fim
de reunir-se a Philip.
Philip também prometera retornar pela manhã, mas Jager chegou primeiro. Paige o
conduziu para a cozinha, onde estava fazendo café.
— Veio cedo...
— Ainda bem que você já estava de pé.
Ela pegou a torrada que preparara e ofereceu.
— Quer mais alguma coisa?
— Eo suficiente.
Jager passeou o olhar crítico pela camiseta e o short que Paige usava e murmurou:
— Tenho algumas críticas a fazer...
— Não sou magra demais! — gritou ela, na defensiva. Ele a encarou, espantado.
— Calma! Ia falar sobre o papel de parede naquele canto.
Nunca tive reclamações a respeito de seu físico, meu bem.
Exasperada, Paige deu-lhe as costas e fingiu lidar com o coador.
Quando mais tarde abriu a porta para Philip, Jager tomava café, encostado no balcão da
cozinha.
— Só poderei ficar até a hora do almoço, Paige. Minha esposa... ex-esposa... me pediu
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para tomar conta das crianças porque precisa estudar. Está se formando em Direito. —
Parecia constrangido e orgulhoso ao mesmo tempo, e ao ver Jager, cumprimentou-o. —
Bom dia.
— Bom dia. Você tem filhos, Phil?
Apesar de permanecer na mesma posição displicente, Paige sentiu a tensão de Jager
retornar.
— Um menino e uma menina — ela se apressou a responder, e logo virou-se para
Philip. — Não era preciso vir hoje.
— Sem dúvida! — reforçou Jager. — Não queremos tirá-lo do convívio de sua família.
Pareceu não perceber o olhar irritado que Paige lhe lançou por usar o verbo no plural,
mas Philip sorriu, bem-humorado.
— Claro, mas tenho toda a manhã. E detesto deixar serviço pela metade.
— Eu também. — Jager falou fitando o outro com intensidade. — No entanto, mesmo
tendo chegado aqui primeiro, às vezes penso que perdi meu tempo.
Quando terminaram de empapelar o vestíbulo, Philip foi embora, desculpando-se por
não poder ficar mais.
— Foi de grande auxílio, e sou muito grata. Por que não vem jantar uma noite dessas?
Traga as crianças e as levaremos à praia.
Philip pareceu se alegrar com o convite.
— Obrigado, Paige. Farei isso.
Depois que fechou a porta, Paige viu que Jager a observava da cozinha, encostado no
batente.
— Que jogada! Convidá-lo com os filhos! Já os conhece?
— Ainda não.
Paige encaminhou-se até ele, e ficaram frente a frente. Alto e forte, Jager parecia uma
muralha.
Contar que mal conhecia Philip não era uma boa ideia, concluiu. Além disso, ante o
enorme poder viril e sensual que emanava de Jager, não conseguia raciocinar direito.
Com esforço, ergueu o queixo e encarou-o.
Um brilho misterioso iluminava os olhos verdes, e Jager perguntou:
— Quer ter filhos?
A pergunta súbita a pegou desprevenida.
— Aidan e eu queríamos um bebé, mas... não aconteceu. Sentiu lágrimas nos olhos e
mordeu o lábio, tentando dete-las, mas foi em vão. Pensava já ter chorado tudo o que
podia por Aidan, e era humilhante prorromper em soluços diante de Jager.
Ele cerrara as sobrancelhas e, endireitando a coluna, pegou-a pelo braço e a conduziu
até a mesa.
— Sente-se — ordenou, com um resmungo.
Jager não sabia como agir com uma mulher em pranto, poucas vezes vira Paige chorar.
Ela engoliu um soluço, e tentou sorrir.
— Estou bem.
— Dá para perceber — replicou, com sarcasmo. — Quer um café? Ou uma bebida mais
forte?
— Um café será ótimo.
Paige empertigou-se, tirou os óculos e puxou para trás uma mecha. Enxugou as lágrimas
e tornou a pôr os óculos, com um gesto decidido.
Ficou vendo Jager preparar café fresco e trazer pão, manteiga e queijo para ela, além de
presunto fatiado. Deu-lhe um prato e uma faca, e serviu a bebida fumegante na caneca.
— Coma, Paige — ordenou de novo, puxando uma cadeira. Depois que se alimentaram,
Jager preparou mais café, e voltou a sentar-se junto dela, segurando a caneca com força.
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CAPÍTULO VIII
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Sem demora fizeram amor de novo,mas agora com mais calma e ternura,e Paige afastou
de si qualquer pensamento sobre o que aconteceria no futuro.
Na manhã seguinte acordou e viu Jager entrar na suite,com cabelos molhados e vestindo
o jeans da vespera.fitou-a com atenção.
—Tudo bem?
—Sim...
Paige procurou se sentar,tentando não deixar o lençol escorregar e mostrar os seios ainda agradavelmente
sensiveis pelas caricias,mas,ao passar a mãonos cabelos,acabou por descobrir-se.
Jager desviou-se da visão e tratou de apanhar a camisa no chão.
—Preciso ir,Paige.Tenho um encontro de negócios logo cedo e necessito me trocar primeiro.
Paigepercebeu que adquirira modos mais formais,seu lado pratico voltara para os afazeres.
—Voltarei hoje a noite,se voce quiser. —Sentou-se no Colchão e enfiou as meias e OS sapatos,
beijando-a de leve nos lábios. — Até mais tarde.
Segundo depois, Paige ouviu a porta da frente bater.
Passou o dia em uma espécie de transe, e mal percebeu como se levantou para ir
trabalhar, pois parecia um robô, com gestos automáticos e pensamento distante.
Logo que voltou para o chalé, Jager apareceu trazendo comida chinesa e uma garrafa de
vinho branco, e como em um passe de mágica, Paige sentiu-se viva, vibrante e animada
outra vez, repleta de expectativa.
Jager pôs a mesa, serviu o vinho, e até fez uma surpresa, desembrulhando uma vela
quadrada e dourada em um castiçal de vidro.
Paige lembrou-se de quando eram recém-casados e haviam jantado peixe com fritas,
certa noite. Jager fizera uma singela decoração, com tocos de velas e plantas colhidas
em um quintal.
Contendo lágrimas de saudade, Paige tomou um gole do vinho e mordiscou a comida
deliciosa, sem de fato estar com apetite. Era o tipo de jantar caro, que jamais teriam tido
na época de casados.
— Não vamos conseguir comer tudo isso! — exclamou, vendo a variedade de pratos a
sua frente.
— Podemos guardar o resto, como costumávamos fazer. Jager ergueu o copo para um
brinde, o olhar cheio de promessas sensuais. E seria apenas isso, constatou Paige,
recordando a franqueza rude que usara na véspera, à qual não fizera objeções.
Já era tarde para remediar sua atitude, e era inútil tentar negar que a volúpia entrara com
todas as forças em seu coração.
Jager podia fugir de um compromisso sério outra vez, fechar sua alma para o amor,
porém era impossível negar que ambos se completavam de maneira plena e maravilhosa
quando se tratava de sexo.
Paige mordeu o lábio, sentindo um ciúme ridículo das mulheres que por certo ele tivera
ao longo dos anos, depois do divórcio. Entretanto, tinha certeza de que foram
envolvimentos sem consequência, pois, assim que tornara a vê-la, Jager a quisera outra
vez. Os anos de distância não os tinham afastado de verdade um do outro.
"Só posso lhe dar isso..."
E Paige aceitaria sem exigir nada mais. Pelo menos por enquanto. Ergueu o copo e
retribuiu o brinde.
Após o jantar, Jager a fez permanecer sentada e lavou a louça. Depois, beijou-a com
uma ternura especial e levou-a para o quarto.
Paige estava quase adormecendo quando o telefone tocou.
— Paige? Estava dormindo?
— Não, Maddie. Como foi a cerimónia?
— Linda e muito divertida. E como vai a decoração do chalé?
— Na realidade, já terminou. O papel de parede foi todo colocado.
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— Acabou? — Maddie tapou o bocal e falou algo para Glen. — Jager a ajudou?
— Sim, ele tem sido muito... prestativo. Sorriu enquanto Jager mordiscava sua orelha.
— Paige, na semana passada deixei escapar para nossos pais que ele estava indo aí para
ajudá-la.
Então fora por isso que Margaret ficara tão ansiosa para apresentá-la a Philip, concluiu
Paige, sem conseguir evitar uma risada. Bem, o tiro saíra pela culatra, pois caíra mais
rápido nos braços de Jager. Um olhar para o provável rival fizera com que ele
apressasse a reconquista. No momento, beijava-lhe os ombros.
— Tudo bem, então? — prosseguiu Maddie, mais aliviada por escutar a irmã rir. — Não
ficou aborrecida?
— Não é segredo, Maddie.
Curioso, Jager sentou-se, a testa franzida.
— O que foi?
Paige meneou a cabeça, querendo dizer que não era nada. Maddie afirmou:
— De qualquer modo, creio que estavam errados sobre ele. Eu era muito criança na
ocasião para ter uma opinião, e quase nunca via Jager, mas achava que era muito bonito
e inteligente.
— Era, de fato.
Naquele instante, Jager a beijava com total intimidade, fazendo-a corar ao imaginar que
a irmã podia vê-los.
— Nossos pais não podem mais dizer que Jager é um joão-ninguém. Ora! Olhe para ele!
Tornou-se um verdadeiro sucesso!
Paige olhou para Jager, e apreciou os músculos rijos e a pele bronzeada.
— Estou um pouco cansada, Maddie... Tantas reformas... Preciso dormir.
Depois que desligou, Jager quis saber:
— Está mesmo cansada?
— Com preguiça. — Paige deslizou para debaixo dos lençóis, sem afastar a mão que
segurava-lhe o seio. — Isso é tão bom... Não pare...
— O que Maddie queria? — Jager continuava a excitá-la com seus dedos hábeis.
— Falar sobre você. Acha-o incrível.
— E você concorda com ela?
Para ser franca, Paige o julgava um amante esplêndido, mas uma pessoa complexa e
perigosa. Talvez a atração que sentia por Jager se originasse do fato de no passado ter
sido considerado indigno dela. E quem sabe a decisão de torná-la apenas sua amante
fosse uma maneira que descobrira para humilhar seus pais...
— Creio que não precisa ser elogiado para se sentir seguro, Jager.
Philip telefonou na noite seguinte, quando Paige e Jager ouviam música sentados no
sofá. Ela se reclinava em seu ombro e, quando fechava os olhos, podia imaginar os anos
voltando para trás e os dois adolescentes outra vez, recém-casados e ainda
deslumbrados com as novidades.
A campainha do telefone soou, estridente, quebrando o clima romântico, e Paige
apressou-se a atender no vestíbulo.
Escondendo o aborrecimento, saudou Philip com animação, e depois de anunciar que o
serviço terminara, agradeceu de novo pela ajuda e renovou o convite:
— Quando vai rever seus filhos? Então está combinado. No próximo domingo... Sim, é
claro, extensivo aos demais. Fico contente.
Quando retornou à sala de estar, a música acabara, e Jager tirava o CD. Fechou o estojo
de plástico com gesto rápido e quis saber:
— Era Philip?
— Sim. — Paige sentou-se de novo. — Convidei-o...
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— Eu ouvi.
Paige o encarou, desafiadora.
— Tinha prometido. Não posso voltar atrás.
Jager ficou em silêncio, porém, o franzir irónico das sobrancelhas demonstrava que
pensava na época em que ela quebrara as promessas solenes do matrimónio. Sem
querer, Paige segurou com força o estofado.
— Por acaso estou reclamando? — replicou Jager com calma.
"Sim, está gritando a plenos pulmões, mas não com palavras." Resistindo à necessidade
de argumentar ou pedir desculpas, disse:
— Tanto faz.
Mas no fundo desejava que Jager a tomasse nos braços, em vez de fitá-la com tamanho
sarcasmo.
— Já percebeu que pode estar dando a Philip uma esperança indevida?
— Não dei nenhuma indireta, se é isso o que quer saber. Só demonstrei que estou
agradecida pelo auxílio.
Sem dúvida iria se certificar de que Philip soubesse que não estava interessada em
nenhum envolvimento romântico.
— Obrigado.
— Não tem nada a ver com você, Jager. — Paige não ia permitir que ele imaginasse
poder mandar na sua vida. —Não estou fazendo nada para agradá-lo, só porque estamos
dormindo juntos. Não faça castelos no ar!
Um brilho de desafio surgiu nas pupilas dele.
— Quer brigar, querida?
— Não. — O que Paige queria era fazer amor de um jeito bem selvagem. — Só quero
que saiba que não irá me controlar.
— E alguma vez controlei? Paige mordeu o lábio e admitiu:
— Não.
Jager sempre lhe dava a oportunidade de afastar-se, mas era tão seguro em seus talentos
sexuais... E os dois se sentiam muito atraídos um pelo outro.
— Fico feliz que tenhamos esclarecido esse ponto. Agora..". — Jager se levantou e
ajudou-a a se erguer, segurando-lhe as mãos. — ...vamos para a cama?
Os filhos de Philip eram crianças meigas e bem-educadas, e a tarde foi muito agradável.
Quando o jantar terminou, ele ajudou Paige com a louça, enquanto a meninada assistia a
um vídeo na sala.
— Obrigado pelo convite. — Ele passou o pano de prato para Paige. — Foi uma delícia.
— Eu que agradeço, Philip. Foi muito gentil me ajudando, e precisava agradecer-lhe de
alguma forma.
Philip apoiou-se na pia e fitou-a.
— Tem visto Jager nos últimos dias?
— Sim. Com uma certa frequência.
Philip cerrou os lábios com força, e murmurou:
— Então, estou fora do páreo.
— Você é um homem muito bom, Philip.
— E você é fantástica. — Fez uma pausa. — Tenho a impressão de que Jager é bastante
rude, e não quero vê-la magoada.
Paige se emocionou.
— Aprecio sua preocupação, mas sei lidar com Jager. Entretanto, questionou-se se isso
era verdade, pois tinha
certeza de que poderia se ferir de novo.
— Tudo bem, não vou meter o nariz onde não sou chamado. — Philip beijou-a na testa.
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CAPÍTULO IX
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amantes. Tinham uma vida social intensa e recebiam convites para comparecerem a
diversos eventos. Até mesmo os Zimmerman, um casal de cerca de sessenta anos,
tinham lhes oferecido o mesmo quarto durante um fim de semana em seu bangalô de
praia.
— Quando pretende que aconteça? Será formal? Jager não sorriu, mas ela pôde perceber
o alívio que sentira com sua tácita anuência.
Algumas noites mais tarde, Jager chegou ao chalé trazendo uma sacola plástica com o
logotipo de uma butique elegante.
— Trouxe-lhe um presente. Espero que sirva.
Paige retirou da sacola um vestido de chiffon negro envolto em papel de seda,
segurando-o pelas tiras douradas que se cruzavam na frente e desciam em ziguezague
nas costas. Era lindo, muito caro e sexy.
— Quero que o use no jantar que vou oferecer. Experimente. Paige estava trémula, e
sentia um nó na garganta. Deixou o traje cair como uma nuvem macia de volta na
sacola:
— Não.
Jager arqueou as sobrancelhas.
— Não gostou? Fica muito bem de preto, querida. Pode acreditar que ficará linda com
ele.
Paige sabia disso. E usando aquele vestido ninguém olharia para seu rosto; Seria a
amante perfeita, o troféu sensual do homem de negócios de sucesso. Cerrou os punhos.
— Não quero que me compre roupas, Jager. O vinco na testa aumentou, e ele redarguiu:
— Mas já lhe dei presentes antes.
Sim, dera-lhe lingeries e camisolas eróticas que ela aceitara por sentir prazer em usá-las
só para ele, em particular.
— Isso é diferente — explicou, sentindo-se sufocar.
— É só um vestido, ora. O que há de errado? Não tem nada de diferente do outro verde
com uma fenda na saia, que me deixa louco. Ou do top preto de veludo com um só
botão.
Jager conhecia todo o guarda-roupa dela. Como poderia explicar a recusa em usar uma
peça que ele lhe dava? Ela mesma não conseguia definir suas sensações.
Sabia que isso não mudaria nada, mas se aceitasse aquele "presente", estaria admitindo
que não passava de um símbolo de status, um troféu a ser exibido.
— Não é um traje íntimo, todos irão vê-lo. Você quer me exibir, Jager.
— Será um jantar particular, e gosto de exibi-la. Ora! Qualquer homem gostaria e
sentiria orgulho! Isso por acaso é crime?
Paige desistiu de fazê-lo compreender a sutileza de seu raciocínio, e replicou com
simplicidade:
— Não preciso de outro vestido. Jager pareceu pensativo.
— Há muito tempo não compra roupas.
Era verdade. Paige gastara quase tudo o que tinha do seguro de Aidan na reforma do
chalé, deixando de lado uma pequena soma para emergências. Recebia um bom salário,
e um dia teria sua parte na herança do pai, mas no momento preferia ser independente e
gastar com bom senso e parcimônia.
— Lamento que meu guarda-roupa não chegue aos pés de sua imagem social.
— Quando éramos casados, uma de suas principais queixas era não ter nada para vestir.
Paige gostaria de não ter sido lembrada disso. Ao contrário de Jager, jamais conseguira
sentir-se bem usando roupas de segunda mão, e sem dúvida ele tinha razão em chamá-la
de mimada.
— Se quer que use algo novo, Jager, diga-me e eu mesma comprarei.
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Jager dava a impressão de ler em seu semblante a tristeza pelo que poderia ter sido, e
Paige tratou de disfarçar.
— Nada. — Olhou em volta. — E... impressionante. ■
— Mais do que a casa de seus pais?
A residência dos Camden era grande e planejada por arquitetos de renome, com piscina
e jardim onde Paige e Maddie haviam desfrutado muitas horas felizes com os amigos.
Era um lar de família, a decoração escolhida por sua mãe, combinando elegância e
aconchego.
— E preciso fazer comparações? — desafíou-o. O olhar de Jager era enigmático.
— Perguntei por perguntar.
Paige sabia que ele nunca fazia isso, mas não quis começar uma discussão antes de os
convidados chegarem. Bebericou o vinho e mudou de assunto outra vez, fazendo
comentários sobre o lindo panorama.
Quando a campainha soou, sentiu um grande alívio. A presença de mais gente dissiparia
a tensão.
Os Zimmerman mal haviam se acomodado com seus drinques quando a campainha
tocou de novo, e Maddie e Glen entraram de mãos dadas. Cada vez que seus olhares se
cruzavam, sorriam como se não conseguissem evitar. O casamento parecia ter
fortificado o amor que sentiam um pelo outro, e Paige experimentou mais uma vez uma
pontada de inveja.
Quando Jager oferecia um copo de vinho à Maddie, a campainha voltou a soar, e ele foi
atender.
Paige conversava com a irmã, sentada em um dos sofás, quando os novos convidados
entraram. Ela voltou-se e levou um susto ao ver seus pais com sorrisos educados
plantados nos rostos, e fitando-a.
Paige ergueu-se de supetão e derramou um pouco de vinho, correndo a pegar um
guardanapo de papel. Jager postou-se a seu lado, e ela murmurou:
— Por que não me avisou?
— Queria fazer uma surpresa. Margaret aproximou-se e beijou a filha.
— Não está contente por nos ver?
— Sim, mamãe, é claro...
Paige forçou-se a sorrir e beijou Henry também. Encarou Jager, tentando descobrir por
que os chamara, mas, como anfitrião perfeito ele já perguntava a Margaret o que
gostaria de beber. E, quando mais convidados chegaram, pediu:
— Paige, pode servir vinho branco seco para sua mãe? Não houve oportunidade para
falar-lhe a sós.
Ela ocupou o lugar em frente a Jager à mesa, mantendo uma conversação animada,
fazendo sinais discretos para o pessoal do bufe a cada vez que os pratos deviam ser
trocados, e esforçando-se para que todos se sentissem bem.
Depois do jantar, café e licores foram servidos. Os serviçais do bufe limparam tudo e
foram embora, e enquanto Paige conversava com os Zimmerman, observou" Jager
aproximar-se de Henry, que admirava a paisagem das vidraças enormes.
Henry virou-se, com expressão um tanto cansada, e Paige percebeu que Jager inclinara a
cabeça, parecendo ouvir com respeito o que ele dizia.
Não pareciam inimigos naquele momento. Henry até acabou dando um tapinha
amigável no ombro de Jager quando foi embora, e Margaret disse com sinceridade:
— Foi uma noite maravilhosa, Jager. Adorei conversar com Serena Zimmerman.
Maddie e Glen ficaram mais um pouco, após todos os demais já terem ido. Sentaram-se
lado a lado no sofá, ela enroscada nos braços do marido. Quando Jager voltou da porta,
Maddie disse:
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sobre seus lábios. — Não sei por quê, mas está zangada comigo. Não quero que vá
embora aborrecida, Paige. Não precisamos fazer amor, se não deseja. Basta dividirmos a
cama.
Sim, concluiu ela, estava furiosa consigo mesma e com ele, de um modo muito confuso,
sem atinar com o porquê.
E havia também a notícia da gravidez de Maddie, a alegria do casal em iniciar uma
família, o último teste que provava desejarem permanecer juntos para sempre. E isso,
em contrapartida, enfatizava de maneira cruel seu próprio relacionamento com Jager.
Nada de compromissos, laços ou promessas, exceto o envolvimento sexual, efémero e
instável.
Não era o suficiente, e o desconforto continuava no coração de Paige. Crescia a cada
instante, como um aperto de mão de ferro. Sentiu os olhos arderem e colocou as mãos
no rosto para disfarçar as lágrimas indiscretas. A última coisa que queria era chorar na
frente de Jager.
— Está mesmo cansada... — Com gesto rápido, ele a tomou nos braços e embalou-a
como a uma criança.
Paige apertou os olhos com força, enquanto era transportada até o quarto principal. A
raiva voltou a dominá-la.
— Jager, já lhe falei que...
— Fique quieta. — Deitou-a no leito, e, quando ela tentou lutar, prendeu-lhe os pulsos.
— Descanse. Posso me arranjar no quarto de hóspedes, se preferir. Não estou pedindo
nada, Paige, só oferecendo uma cama para esta noite. Agora, sente-se, e tirarei seu
vestido. É bonito demais para ficar todo amassado.
Parecia que qualquer objeção a mais seria ridícula e, ainda desconfiada, Paige
aquiesceu. Sabia que essa discussão em certo sentido era um sintoma de problemas mais
profundos em seu relacionamento. Talvez fosse hora de enfrentá-los, mas não nesse
instante.
— Lavarei suas roupas íntimas se desejar — ofereceu-se Jager.
Ela achou graça do oferecimento simples e prático, mas sentiu um nó na garganta.
— Pode deixar, Jager. Cuidarei disso amanhã, quando voltar para casa.
Paige se enfiou debaixo das cobertas e tirou os óculos, colocando-os sobre o criado-
mudo.
— Quer usar o banheiro, antes? — Jager pendurou o vestido dela.
— Não. — Trouxera uma escova de dentes na bolsa, e já lavara o rosto. — E não
precisa dormir no quarto de hóspedes. Mas... quero dormirl
Jager aproximou-se e beijou-lhe a ponta do nariz.
— Não demoro.
A cama era muito espaçosa, e podiam se acomodar ali sem encostar um no outro.
Entretanto, Paige ficou contente quando sentiu o calor de Jager a seu lado.
Cerrou as pálpebras, com estranhas emoções, e ainda lutando contra o pranto. Era
impossível continuarem daquele modo, e talvez essa fosse a última vez que
compartilhavam o mesmo leito.
Adormeceu quase de imediato, apesar da confusão mental.
Quando despertou, pela manhã, constatou logo que estava sozinha. Um quimono preto
de cetim jazia ao pé da cama. Paige o vestiu e foi até o banheiro.
Quinze minutos depois, já havia tomado banho, e lavado e secado a roupa íntima com o
secador de Jager.
Imaginou se alguma vez ele já o usara, ou se ficava ali para atender às necessidades das
visitas femininas. Deu de ombros e decidiu que era apenas mais um acessório.
Voltando ao quarto, olhou para o vestido pendurado e viu que não era adequado para o
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CAPÍTULO X
Na verdade, Paige não tinha fome, mas assim conseguia uma desculpa para protelar o
rompimento inevitável ou mesmo aceitar as coisas do jeito que estavam, e as migalhas
que Jager lhe ofereceria enquanto a atração durasse.
Eram pensamentos muito tristes.
— Dormiu como uma pedra, sabia? Pensei em acordá-la, mas parecia tão tranquila que
desisti.
— Quer uma medalha por bom comportamento? — replicou Paige, com ironia, embora
no íntimo desejasse que ele a tivesse acordado e feito amor, mesmo sabendo que depois
seria mais difícil terminar com tudo.
— Não, mas não recusaria um premio — brincou Jager. Deslizou o olhar sensual sobre
o corpo dela, fazendo-a desviar o rosto. Flertar estava fora de questão naquele momento,
ponderou Paige, tratando de se concentrar na comida. Quando terminaram, Jager retirou
os pratos e fez café.
— Está muito pensativa. — Voltou a sentar-se à mesa. Paige mexeu a colher na bebida
quente, tentando ganhar tempo.
— Creio que precisamos conversar, Jager.
— Sobre o quê?
Ela examinou-lhe a expressão preocupada e a testa franzida.
— Sobre nosso relacionamento e... o que pretendemos um do outro.
Jager recostou-se no espaldar, semicerrando os olhos.
— O que você pretende? — perguntou, com a calma. Paige recolocou a colher ao lado
do guardanapo e admirou a vista do ancoradouro, reluzente com os iates balançando
sobre a água como se fossem gaivotas.
Apertou o tecido acetinado do quimono e disse:
— Quero coisas que não pode me dar... ou não quer dar. Não o culpo, Jager. Jamais fez
promessas desde que nos reencontramos, porém não... — Engoliu em seco. — Não de-
sejo continuar tendo um... caso.
— Caso?!
— E assim que se chama a nossa relação. Quando duas pessoas dormem juntas sem
compromissos ou promessas, livres para fazerem no dia seguinte o que bem
entenderem.
O rosto de Jager adquiriu uma estranha expressão vazia.
— Está terminando tudo comigo? — quis saber. Paige tornou a engolir em seco.
— Se não existe outro tipo de futuro entre nós... sim. Depois de um longo silêncio,
Jager empurrou apeadeira e se levantou.
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— Seu pai está muito bem impressionado com Jager — disse a sra. Camden, após
concluir a conversa sobre a chegada do neto. — Acredita que ele amadureceu muito.
— Jager tem mais de trinta anos, mãe.
— Sim, mas Henry acha que tem um cérebro esplêndido.
— Sempre teve — redarguiu Paige, sem deixar o hábito de defendê-lo.
— Pode ser, mas suas maneiras deixavam muito a desejar, e seja lá como for, você era
muito jovem para se casar na época. Foi tudo um erro.
— Sei disso.
— Creio que fizemos o que devíamos para ajudá-la. Que absurdo! Agora que já não
fazia a menor diferença,seus pais olhavam Jager com bons olhos...
— Isso já passou, mamãe. Nada mais importava.
Na manhã seguinte, Paige teve de se esforçar para se recompor. Tratou de levantar-se e
viver a rotina do dia. Mas a comida não tinha gosto, e parecia estar no meio de uma
neblina densa que de vez em quando a deixava entrever a realidade, mas sem participar
de corpo e alma.
Não se sentia assim desde as primeiras semanas após a morte de Aidan, fazia quase um
ano. Mas se recuperara por causa de... Jager.
Porém, agora o sofrimento era maior. Aidan já não estava neste mundo, e nada o traria
de volta, entretanto... bastaria dar um telefonema para falar com Jager. Só teria que
digitar alguns números e dizer "sim" para tê-lo de volta em sua vida.
Mas haveria o preço a pagar. Jager talvez nunca a perdoasse por fazer chantagem e
obrigá-lo a se casar de novo.
Paige respirou fundo quando chegou o fim de semana,porque não teria de fazer força
para parecer um ser humano, conversando, sorrindo e trabalhando como os demais.
Tinha vontade de ficar na cama o dia inteiro, mas tratou de fazer um pouco de
jardinagem. Mexia com a terra, retirando as ervas daninhas e sentindo a calma que isso
proporcionava, quando uma voz ao lado disse:
— Deixe-me ajudar.
Uma onda de felicidade a invadiu ao ver Jager ali parado. Era bem de seu estilo
aparecer quando estava sem maquiagem, suja, suada e usando suas roupas mais
horrendas.
— Estou fazendo direito — murmurou como uma criança, passando a mão na testa.
— Sei disso, mas posso ser mais rápido.
Ele se agachou e flexionou os músculos sobre a camiseta branca e o jeans. Era assim
que se vestia quando o conhecera, lembrou Paige, mas no momento a calça era de uma
marca famosa, e a camiseta, muito cara, ajustava-se a seu físico de maneira impecável.
Paige sentou-se no primeiro degrau da escada e retirou as luvas de plástico. Por que
Jager viera? Tinha medo de perguntar.
Ele continuou trabalhando em silêncio e logo terminou.
— Acha que é o suficiente, Paige?
— Sim.
Jager largou os instrumentos, mas continuou imóvel, observando a terra negra.
— Estraguei tudo na outra noite. Fui um idiota.
— Acho que nós dois fomos. Não queria pressioná-lo.
— Fiquei furioso quando reagiu a meu plano. Queria que se comportasse como
imaginei.
Paige piscou diversas vezes, aturdida.
— Fala como se estivéssemos em uma disputa. O que planejava, Jager? Algum tipo de
vingança?
Ele remexeu na terra, distraído.
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UM PASSADO QUE FERE-Daphne Clair
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— Só queria você, mas precisava me proteger. Jurei nunca mais sofrer como sofri
quando me abandonou na primeira vez. Agora seria diferente, ficaria no controle. Sem
promessas, sem compromissos, e se tudo terminasse seria porque eu decidira assim.
Paige suspirou.
— Percebi que estava se esquivando, sempre na defensiva. Pretendia me dar o fora mais
tarde?
Seria uma vingança justa, Paige teve de admitir.
— Tentei esquecer esse tipo de plano, depois que dormimos juntos. Tudo ficou
diferente.
— Como assim?
Jager a fitou, os olhos verdes e brilhantes.
— Não foi uma coincidência eu ter aparecido no casamento de sua irmã. Depois que
Lawrence me contatou, não tinha motivos para voltar a vê-lo, mas nessa visita que meu
pai me fez, falou-me de Glen e perguntou se gostaria de conhecê-lo também. Em
seguida, revelou com quem meu irmão ia se casar. — Fez uma pausa significativa. —
Glen ainda acha que foi sua a ideia de me convidar para a cerimónia.
— Você o usou!
— E também para ser convidado para seu chalé. A queima-roupa, Paige perguntou:
— Sente alguma coisa por sua família ou por Glen? Jager pareceu pensar um pouco.
— Sim. Lawrence é um bom homem que cometeu um erro estúpido e tenta fazer o
máximo para se redimir, e o respeito por isso. Glen... é um amigo. Uma pessoa boa,
honesta, carinhosa e disponível. Não existem muitos como ele. E a mãe dele... —
Parecendo surpreso consigo mesmo, admitiu: — Gosto muito dela. Descobrir que o
marido teve um filho com outra deve ter sido uma experiência dura, mas Paula agiu com
dignidade e generosidade.
— Também me usou, Jager? Ele franziu a testa.
— Dei essa impressão?
— Sentia-me uma amante paga, mas não amada.
— Não foi minha intenção. Só sabia que a queria... e que precisava tê-la.
— Na cama?
— Em minha vida. E parecia estar dando certo. Quando a fiz ir a meu apartamento,
senti que tudo estava resolvido e que não teria de expor meus sentimentos, nem fazer
promessas de amor eterno;
— Nada de compromissos, sei disso...
— Então, você puxou o tapete sob meus pés. Não me ocorrera que bastaria você
ameaçar terminar tudo para me deixar tremendo de medo. E foi isso o que aconteceu.
Senti-me... indefeso.
— Você?!
Paige passeou o olhar pelo físico musculoso, os ombros largos, a postura altiva e os
olhos verdes e arrogantes de Jager.
— Desculpe-me, querida.
Paige não sabia o que dizer. O silêncio prolongou-se, e por fim Jager se aproximou.
— Prometo qualquer coisa. Faço tudo para tê-la de volta, Paige. Se quer casar, assim
será. — Ajoelhou-se a sua frente e tomou~lhe as mãos.
— Disse que me amava — lembrou-o Paige, sem erguer o rosto.
— E sempre te amarei. É verdade, não posso lutar contra isso, e aviso que, se me deixar
de novo, não me darei por vencido com tanta facilidade como da primeira vez.
— Também disse que se apaixonou quase logo que nos conhecemos.
— Isso mesmo. Senti uma grande atração por você, e fiquei surpreso, porque não fazia
meu tipo.
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UM PASSADO QUE FERE-Daphne Clair
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UM PASSADO QUE FERE-Daphne Clair
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UM PASSADO QUE FERE-Daphne Clair
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DAPHNE CLAIR vive na Nova Zelândia com seu marido holandês e tem cinco filhos. Aos oito anos de
idade escreveu sua primeira novela, sobre um tigre que foi domesticado. Esse épico nunca chegou aos
editores, mas tigres metamorfoseados ainda existem em seus livros, trinta ao todo, que já escreveu para a
Harlequin Mills &Boon. Ela já produziu cinquenta obras, entre livros de poesia, contos e não-ficção, e já
recebeu prémios literários na Nova Zelândia e nos Estados Unidos.
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