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CONTATO IMEDIATO

DE 7º GRAU
O Caso Villas Boas
Caio Lima
NOTA
Esta não é uma história de ficção; embora tenhamos optado por escrevê-la em
formato de romance. Procuramos ser o mais fiel possível aos fatos narrados
há muitos anos pelo próprio envolvido no caso, Antônio Villas Boas, o qual,
à época, 1957, um jovem de 23 anos de idade, morador e agricultor na região
rural da pequena cidade de São Francisco de Sales, em Minas Gerais.

Este livro é o dramático relato de um caso de Contato Imediato de Sétimo


Grau* entre o protagonista, Antônio Villas Boas e uma presumível
extraterrestre, dentro de uma nave espacial alienígena.
*(Contato Imediato de Sétimo Grau ― segundo proposição da “Black Vault Encyclopedia Project” —
by John Greenewald Jr. USA. ― é um raríssimo caso de contato extremamente íntimo entre um
humano e uma alienígena).

Recentemente, até para melhor esclarecimento e fidelidade à narrativa deste


caso, tentamos fazer contatos com parentes e amigos da família de Antônio
Villas Boas (morto em 1991), muitos deles moradores em algumas cidades da
região onde se deu o evento. Porém, para nossa surpresa e desapontamento,
nenhum deles, parentes e/ou amigos, se prontificou a dizer qualquer coisa a
respeito do acontecido.

Mais surpreendente ainda foi o temor que pareceu tomar conta dos poucos
parentes, amigos e até mesmo de algumas autoridades municipais da cidade
de São Francisco de Sales com os quais tentamos falar a respeito do caso. Um
desses parentes (que não quis ser identificado), mesmo colocando em prática
a velha tradição mineira da boa hospitalidade e atenção dada também aos
desconhecidos, foi bastante afável até que lhe fosse revelada nossa intenção
de escrever mais sobre o que ficou conhecido como o Caso Villas Boas.

Visivelmente incomodado com a conversa que mal havia se iniciado, nosso


interlocutor deixou bem claro que não iria dizer mais nada, alegando que
tanto ele quanto quaisquer outros que tinham conhecimento do episódio
estavam definitivamente proibidos (?) de dar maiores informações a respeito;
e que havia até mesmo uma espécie de ameaça (???) para quem se dispusesse
a falar sobre o assunto.

Claro que insistimos para saber de quem e/ou de onde partiram tais
‘proibições’ e ‘ameaças’. Porém, mais uma vez foi totalmente inútil nossa
insistência: além de não nos dizer absolutamente nada sobre o caso, aquele
parente do nosso personagem Antônio Villas Boas ainda nos “aconselhou
para que esquecêssemos” o caso; o que, naturalmente, não o fizemos. E aqui
a história contada em forma de romance, à qual procuramos ser o mais
fidedigno possível com os fatos.
I

Por isso vos digo, ó nobre bodhisattva, que existem muito mais coisas em
todo

o Universo do que pode conceber a mente dos homens, enquanto mortais


comuns.

Sidharta Gautama.

Já eram quase onze horas da noite daquele sábado, 5 de outubro de 1957,


quando as visitas que haviam chegado ao entardecer à casa dos Villas Boas
resolveram se despedir. Depois de passarem várias horas agradáveis
contando causos, tocando moda de viola e saboreando os quitutes preparados
por dona Enésia, mãe de Antônio Villas Boas e por suas seis irmãs, algumas
delas casadas.

Os visitantes tomaram seus lugares nos bancos de tábuas rústicas da caçamba


de madeira puxada por um velho trator, o qual deu a partida e acelerou
vagarosamente em direção à estrada poeirenta, enquanto os familiares de
Villas Boas agradeciam a aprazível visita, desejavam feliz regresso e
prometiam retribuir a visita tão logo fosse possível, uma vez que estavam
todos empenhados em lavrar as terras antes que começassem as chuvas que
pareciam não tardar.

Já em seu quarto que dividia com seu irmão João, e como estava muito calor,
Antônio resolveu abrir a janela que dava para os fundos do quintal, quando
de repente percebeu uma luz esbranquiçada, de origem indefinida, na direção
norte e que iluminava tudo ao redor, uma iluminação bem mais forte que a
iluminação da pouca luz da lua em seu quarto crescente.

Espantado e curioso, e para evitar incomodar o restante da família que já


havia se recolhido, chamou quase sussurrando pelo irmão que também já
havia se deitado. Muito cansado e sonolento, João não se interessou pelo
possível fenômeno, murmurou alguma coisa ininteligível e voltou a dormir.
Sem saber exatamente o que fazer, Antônio fechou imediatamente a janela,
deitou-se e procurou desviar os pensamentos daquela inusitada luz. Sob a
claridade fraca e trêmula do velho lampião, ligou o velho rádio a pilha de
Ondas Médias e Curtas, que imediatamente começou a chiar numa forte e
inusitada estática.

Antônio girou o botão de frequência pra direita e pra esquerda, mas o


desagradável ruído provocado pela estática só se fazia aumentar, sem
conseguir sintonizar nenhuma estação (coisa que não era lá muito difícil
àquelas horas da noite). Quase por instinto concluiu que a estática tinha tudo
a ver com a misteriosa luz, vinda sabe-se lá de onde. Intrigado e um tanto
curioso, Antônio decidiu abrir novamente a janela e, para sua surpresa, a luz
começou a aumentar de intensidade e vir rapidamente em sua direção.

Assustado, fechou com força a janela e, de um pulo, praticamente caiu sobre


seu irmão João que dormia profundamente.

― João!... João! ... Acorda, João! ... Acorda! ― Disse quase sussurrando,
enquanto chacoalhava pelos ombros o irmão que dormia profundamente.

― Que foi???.. Que foi???... O que está acontecendo??? ― Quase por


instinto João havia levantado o tronco, sobressaltado, e ainda sentado na
cama encarava o irmão.

― Olha ali... Olha... ― Balbuciou Antônio apontando com uma das mãos
para a janela veneziana que deixava passar pelas frestas a forte luz
esbranquiçada, enquanto que, com a outra mão, apertava fortemente o ombro
do irmão.

― Meu Deus!... Que... Que diabo é isso?... Disse João levantando-se da


cama.

― Eu não sei, João... Eu não sei!

O rádio, que ficara ligado, começou a estalar mais fortemente por causa da
estática. E quando João fez menção de desliga-lo para evitar aquele ruído
insuportável, este desligou de repente, como se tivesse recebido um forte
curto-circuito e queimado. E foi aí que ouviram uma espécie de zumbido
vindo do lado de fora da casa, parecido com o ruído de catraca de roda de
bicicleta, quando se gira o pedal para trás.

Quase sem saber o que fazer, João apanhou e vestiu a calça de brim cinza que
estava dependurada num cabide de parede, enquanto Antônio fazia o mesmo.
Estendeu os braços e apanhou a carabina de dois canos num suporte logo
acima do cabide, verificou rapidamente os cartuchos e apanhou mais uns
quatro que estavam numa pequena caixa dentro na gaveta de um velho
camiseiro, enquanto João apanhava o lampião a querosene e girava o
pequeno eixo para aumentar a chama e luminosidade do pavio. E foi nesse
exato momento que a luz pareceu se movimentar em direção à frente da casa.
E nem perceberam que a estática do rádio que voltara a funcionar de novo,
diminuía de intensidade enquanto a luz parecia se afastar em outra direção.

Pé ante pé, seguiram pelo longo corredor que dava acesso aos outros quartos
da casa e terminava na ampla sala de estar. Estranharam o fato de os dois
cachorros, um perdigueiro e um fila brasileiro tigrado, ambos bravíssimos, e
que vivam soltos no quintal de terra batida não terem dado um único latido.
Na verdade, apenas ganiam baixinho, com medo, trêmulos e encolhidos junto
à porta da sala, do lado de fora da casa, na varanda.

A luz branca agora alumiava todo o espaço da frente da casa, inclusive a


varanda, a porta da sala e as duas grandes janelas venezianas de madeira, cuja
luz infiltrava-se por baixo e por cima da porta, além das ranhuras das
venezianas. Com receio de abrir a porta, João apanhou um banquinho de
madeira rústica num dos cantos da sala e postou-o junto à porta. Subiu no
banquinho e procurou observar pelo vão da porta, mas a extrema claridade da
luz o impediu de ver qualquer coisa.

Somente conseguia ouvir os ganidos baixinhos e desesperados dos dois cães


colados à porta, além do ruído semelhante a catraca de roda de bicicleta,
quando se girava o pedal para trás. Ruído que, juntamente com a luz começou
a se afastar primeiro em direção ao sul e logo em seguida na direção sudeste.

De um ímpeto, João pulou de cima do banquinho, engatilhou os dois canos da


arma e abriu a porta de supetão, deixando passar, mesmo sem querer, os dois
grandes cães que invadiram a sala e dispararam feito um raio pelo corredor
em direção à cozinha, onde se enroscaram debaixo da grande mesa de
madeira rústica, trêmulos de pavor. Alguma coisa os assustara imensamente.

Do lado de fora da casa, Antônio e João não viram nada de anormal, à


exceção da atitude bastante estranha dos dois animais, normalmente
destemidos e bravos, mas que naquele momento se encontravam encolhidos
debaixo da mesa da cozinha, ganindo baixinho de medo.

Os dois irmãos, depois de darem uma volta completa em redor da casa, e


como não encontraram nada e a tal luz esbranquiçada havia desaparecido por
completo, resolveram entrar e com muita dificuldade conseguiram botar pra
fora os cães apavorados de medo. No quarto, o rádio à pilha transmitia um
programa noturno em ondas médias da antiga Rádio PRE-5 (atual Rádio
Sociedade AM de Uberaba – MG.). Nenhum chiado ou estática;
absolutamente nada de anormal na transmissão do velho rádio de cabeceira.

Antônio abaixou o volume do rádio, apagou o lampião e procurou dormir um


pouco. No entanto, mesmo cansado e com sono, somente conseguiu pregar os
olhos quando já amanhecia o dia. Estava nervoso demais com os últimos
acontecimentos.

Antônio acordou um pouco antes das onze horas, e por causa do calor
insuportável que fazia, tomou um rápido banho frio e depois foi até a cozinha
onde uma de suas irmãs, que não havia acompanhado a família à missa na
Igreja de São Francisco de Sales no pequeno povoado com o mesmo nome,
terminava de preparar o almoço.

Dizendo à irmã que não queria almoçar, comeu apenas uma fatia de queijo
fresco e um pedaço do bolo de fubá que havia sobrado do dia anterior,
acompanhados com uma caneca de café quente. Sentia-se ligeiramente
indisposto. Pouco depois chegava a família e as perguntas sobre a tal “luz
misteriosa” foram se sucedendo, umas após outras. João havia contado a
todos, com detalhes, o sucedido na noite anterior.

Logo depois do almoço, o velho patriarca da família, Jerônimo Pedro Villas-


Boas, chamou discretamente os dois filhos e levou-os para o quarto onde
dormia com a esposa, dona Enésia. Depois de trancar a porta com a tramela, procurou saber
em detalhes o que acontecera durante a madrugada, uma vez que, mesmo sem se levantar da cama, fora
acordado pelos cães que teimavam em deixar a “segurança” da cozinha.

Depois de ouvir o relato dos filhos, Jerônimo apanhou uma carabina calibre 20 num suporte na parede
logo acima da penteadeira e um antigo, mas ainda eficiente revólver Smith&Wesson, calibre 38, que
estava numa gaveta da penteadeira. Colocou as duas armas sobre a cama e em seguida apanhou numa
outra gaveta duas caixas de munições, uma para cada arma respectivamente.

Mandou que os filhos levassem as armas e as caixas de munição para o quarto deles. Depois, explicou
que, se de novo acontecesse durante a noite ou a madrugada qualquer coisa de estranho como “a tal luz
esbranquiçada” que aparecera sobre a casa na noite passada, toda a família deveria ser imediatamente
acordada. Os filhos anuíram com um sinal de cabeça e discretamente levaram as armas para o quarto,
onde iriam fazer “companhia” a outra carabina de cano duplo calibre 12, que pertencia a João.

Como era domingo, o pai, os filhos e alguns cunhados tiraram o restante do dia pra irem pescar num
ribeirão não muito longe da propriedade. A rotina de trabalho só voltaria ao normal dia seguinte,
segunda-feira, quando trabalhavam em dois turnos de até doze horas, com os empregados da fazenda
fazendo o turno diurno e os irmãos o turno da noite, por causa do forte calor.

Não podiam perder tempo, uma vez que a terra deveria estar totalmente arroteada e feita a calagem para
controlar o pH do solo, até no máximo trinta dias antes da semeadura dos brotos de cana de açúcar e
das chuvas de verão, ás quais começariam em dezembro. Depois de muito comentarem sobre a tal “luz
esbranquiçada”, e como não houve mais nenhum incidente no decorrer daquela semana, o assunto
começou a cair no esquecimento, embora Antônio sempre fizesse questão de levar junto algum de seus
irmãos. Não queria ser surpreendido no campo, sozinho, caso a tal luz resolvesse aparecer de novo.

Pouco mais de uma semana se passou. E naquela tarde quase noite de segunda-feira, 14 de outubro,
logo depois do jantar, Antônio e seu irmão mais novo José examinaram o combustível, a água do
radiador e o óleo do motor do potente trator International Harvester à gasolina, com o qual iriam fazer
o turno da noite. Estava uma bela noite, relativamente fresca, a lua cheia naquela noite já havia entrado
para seu quarto minguante, o que parecia deixar a noite com maior profusão de brilhantes estrelas.

Depois de cerca de quatro horas de trabalho, resolveram dar uma parada rápida. Antônio desligou o
motor do trator, apanhou o chamado cantil de caboclo, um vasilhame para água feito de cabaça, uma
canequinha esmaltada e uma garrafinha de vidro com café. Em seguida acenderam com a binga de
metal um cigarro de palha e mal começaram a dar umas baforadas quando viram na ponta norte do
campo, justamente sobre a parte que haviam acabado de arar, uma luz forte, só que desta vez de
vermelho-claro muito forte, que iluminava boa parte do campo recém-arado.

Ficaram imóveis por alguns instantes, olhos fixados na luz, até que Antônio, irritado, atirou longe o
cigarro que mal começara a fumar e sem tirar os olhos da luz, disse entre dentes:
― Já tô com o saco cheio dessa disgrama de luz dos inferno!...

Dito isto, disparou a passos rápidos em direção à luz, para desespero de José que gritava apavorado
para que o irmão voltasse para o trator. Sem dar importância aos gritos do irmão, Antônio apressou
ainda mais o passo, e até tentou correr em direção à luz, esquecendo-se momentaneamente que correr
sobre um campo recém-arroteado é tarefa quase impossível; uma pisada errada entre um sulco e um
torrão de terra poderia causar uma grave torção do pé ou do joelho, ou até mesmo uma fratura. Quando
Antônio se aproximou uns cinquenta metros da luz, esta se deslocou numa velocidade espantosa para a
ponta sul do campo e ali permaneceu parada, a uns cem metros de onde se encontrava.

Antônio deu meia volta e continuou a perseguição, agora em direção ao sul. E mais uma vez, ao se
aproximar, a luz voltou rapidamente para o ponto ao norte onde aparecera antes. E como Antônio não
desistia, aquelas idas e vindas continuaram por vezes seguidas, até que Antônio, estafado, com a boca
seca de raiva e quase sem fôlego parou a meio do caminho, levantou desafiadoramente os braços com
os punhos fechados, respirou profundamente e berrou alto e bom som em direção à claridade da
misteriosa luminosidade:

― O que é que você quer, sua desgraçada?... Você é do bem ou do mal?... É de Deus ou do *trem
ruim? (*Demônio). Sem, obviamente obter nenhuma resposta, Antônio fez o máximo esforço para
juntar alguma saliva na boca ressecada, deu uma cusparada no chão em direção à luz e voltou para
junto do irmão, no trator. Apanhou a cabaça d’água no embornal de pano e sem usar a canequinha,
bebeu de um só gole quase a metade da água. Tomou uma golada do café frio e acendeu outro cigarro
de palha, previamente preparado, enquanto José também acendia um.

Fumando em silêncio enquanto observavam a luz que permanecia parada na ponta norte do campo, os
irmãos queriam e precisavam fazer perguntas um ao outro sobre o que poderia ser aquela estranha
aparição, mas não conseguiam articular nenhuma palavra. E foi naquele exato momento que a luz
começou a emitir raios multicoloridos em todas as direções, que lembrou o sol poente. Depois de fazer
um quase imperceptível movimento para os lados, simplesmente desapareceu em altíssima velocidade
em direção ao horizonte.

José ligou o trator e os faróis, e sob o pouco brilho da lua nova passando para minguante, continuaram
o trabalho até quase o amanhecer do dia e depois retornaram à casa onde o cheiro de café fresquinho e
broa de milho assada que dona Enésia acabara de preparar se espalhava por rodo o terreiro. Tomaram
café em silêncio, e depois de rápido banho frio, foram para os seus respectivos quartos. João acabara de
se levantar e depois do café, iria substituir os irmãos. Perguntou a Antônio se estava tudo bem, que
apenas anuiu positivamente com a cabeça, sem contar o ocorrido no campo. Não iria adiantar nada; e
ainda causaria uma desnecessária preocupação ao irmão.

Já passava do meio dia quando Antônio acordou. Depois de almoçar, procurou não pensar mais na
emblemática luz. Apanhou as apostilas do Curso de *Madureza por Correspondência que fazia e tentou
concentrar-se ao máximo nos estudos, porém, sua mente parecia fixar-se tão somente e apenas na
estranha aparição da noite anterior.

(*Madureza = Antigo curso, presencial ou por correspondência que abarcava ao mesmo tempo o
ginasial e o colegial. Equivalente hoje ao supletivo, para galgar à Faculdade.)

Como não conseguia mesmo se concentrar nos estudos, guardou as apostilas e os cadernos, apanhou
alguns pregos e um martelo e foi fazer pequenos reparos em algumas tábuas do curral. Não contou a
ninguém da família sobre o acontecido, e pediu a José que fizesse o mesmo: não valeria a pena deixá-
los preocupados com algo que nem ele mesmo sabia o que era.

À noite, Antônio e José partiram no trator para mais uma jornada de trabalho no campo. A lua, em sua
última fase de minguante, no dia seguinte, 16,entraria para a fase de lua nova. Durante toda a noite e
madrugada quase não tiraram os olhos dos céus, cujas estrelas, parecendo um pouco pálidas por causa
da lua quase nova, muitas vezes chegavam a parecer nova presença da misteriosa luz. Porém, nada
aconteceu: a tal luz misteriosa parecia ter desaparecido de uma vez por todas.

Mais tranquilos, retornaram à fazenda pouco antes de o nascer do sol. O empregado que faria o turno
do dia já os aguardava. Depois de lavaram as mãos e o rosto na bica d’água ao lado da cozinha,
tomaram o café da manhã em silêncio. Silêncio só quebrado por José quando avisou que mais tarde iria
a cavalo até a cidade de São Francisco de Sales visitar o dentista pra dar um jeito num dente do siso que
estava inflamando dia a dia e aumentando cada vez mais a dor.

Perguntou ao irmão se precisava de alguma coisa da cidade, e Antônio lhe pediu que comprasse alguns
lápis pretos, envelopes, selos e um vidrinho de tinta para a sua caneta-tinteiro; precisava enviar à Escola
por correspondência seus exercícios e respostas às lições do seu curso.

Antônio, agora um pouco mais tranquilo com os acontecimentos causados pela luz misteriosa dos
últimos dias, e agora que esta parecia ter desaparecido para sempre, dormiu um sono profundo e
reparador, só acordando, bastante descansado, por volta das duas horas da tarde. Tomou um rápido
banho frio, almoçou e aproveitou para colocar as lições e os estudos em dia. Tinha um grande objetivo
de vida: tornar-se, um dia, um doutor da Lei, um grande advogado. E para que isto acontecesse, teria
que se preparar muito bem e tirar boas notas no Curso.

José retornou da cidade no finzinho da tarde. Desarreou o cavalo e deu-lhe água num cocho e farelo de
milho num outro. Com o lado esquerdo do rosto bastante inchado por causa do siso que o dentista
resolvera extrais, José entrou na cozinha, retirou o embornal que trazia a tiracolo e entregou as
encomendas do irmão. Em seguida apanhou os remédios que o dentista lhe passara, como analgésicos e
antibióticos injetáveis à base penicilina. Estes últimos seriam aplicados por uma de suas irmãs, que
possuía alguma noção de enfermagem.

Já estava escurecendo, e com muita dificuldade Antônio conseguiu convencer o irmão para que ficasse
em casa e não o acompanhasse naquela noite nos trabalhos do campo. José precisava repousar por
causa da extração do dente e a subsequente inflamação. Este acabou concordando muito a contragosto,
uma vez que, mesmo não comentando sua inquietação com as ocorrências dos últimos dias (para não
causar mais apreensão), José se preocupava, e muito, com a segurança e o bem estar de seu irmão mais
velho.
II

A lua cheia estava iniciando este seu novo ciclo justamente nessa noite, dia
16. Antônio preferiria que fosse noite de lua mansa (lua cheia), uma vez que
seu brilho suntuoso deixavam as noites e madrugadas quase tão iluminadas
quanto à claridade da luz do dia, o que não era o caso da lua nova.

Antônio apanhou o embornal de pano com a cabaça d’água, o vidro com café
e os cigarros de palha que havia enrolado pouco antes. Colocou no bolso a
binga e o canivete preso à uma corrente de metal. Pensou por um momento
em levar consigo pelo menos uma das armas, o revólver ou carabina que seu
pai havia deixado no quarto dele e do irmão João. Porém, desistiu da idéia.
Nunca gostara de armas; haja vista que, ao contrario do pai, dos irmãos e
cunhados que possuíam às vezes mais de uma, Antônio nunca possuiu
nenhuma.

Com um aceno de mão despediu-se da mãe e do irmão que continuavam na


cozinha, deu partida no motor, acendeu os faróis e acelerou em direção aos
campos para mais uma jornada de trabalho. Depois de umas cinco horas de
trabalho ininterrupto e depois de arrotear boa parte do campo, Antônio
desligou e pulou do trator para dar uma ‘esticada’ nas pernas. Aproveitou
para tomar uma golada de água e de café e acendeu um cigarro de palha.

Enquanto fumava, deu uma boa espiada nos céus em todas as direções, mas a
única coisa que via eram as estrelas e o céu iluminado pela lua nova e uma ou
outra ‘estrela cadente’ que deixavam belos riscos no firmamento. Subiu
novamente no trator, deu a partida, ligou os faróis e continuou o trabalho,
quando, de repente, no lado norte, a luz vermelha reapareceu. Por acaso
Antônio conduzia o trator naquela mesma direção e sentiu que todo o seu
corpo se arrepiava, quando percebeu que a luz vinha em sua direção.

Sem desligar a máquina, apenas colocou o motor em ponto morto e pisou no


freio. A luz se aproximou, aumentando progressivamente de tamanho. Era
um objeto oval e brilhante, que ficou estático, pairando a uns 50 metros da
cabeça do agricultor. Paralisado pelo medo, Antônio ficou momentaneamente
sem nenhuma reação.. Após uns 2 minutos, o objeto desceu e pousou a uns
15 metros de distância de onde ele estava.

Foi quando ele conseguiu distinguir nitidamente os contornos da estranha


máquina: era parecido com um gigantesco ovo alongado, apresentando três
picos metálicos, de ponta fina e base larga, dispostos um ao lado do outro.
Em cima da nave algo girava a alta velocidade e emitia uma luz vermelha
fluorescente, ao mesmo tempo em que emitia também aquele ruído peculiar
de catraca de bicicleta girando para trás, o mesmo ruído que Antônio e seu
irmão João haviam percebido quando da primeira aparição da luz sobre a
casa, alguns dias antes.

Como que hipnotizado tanto pelo medo quanto pela surpresa, Antônio mal
conseguia respirar. Seu cérebro parecia querer estalar, uma vez que não
conseguia racionar ou tomar qualquer atitude que fosse. Sentia-se
completamente dominado, abismado, atônito e com medo; muito medo.

De repente, a parte debaixo do objeto se abriu e deixou sair três suportes


metálicos, do tipo telescópicos. E Antônio concluiu que os suportes metálicos
eram uma espécie de trem de pouso da nave. Percebendo instintivamente que
algo iminente – talvez muito perigoso e ruim -- poderia acontecer com ele,
resolveu fugir no trator. Desesperado, puxou a pequena alavanca lateral que
acionava o hidráulico, desvencilhando o trator da grade de aração com seus
discos de corte circulares.

Livre do pesadíssimo implemento agrícola que poderia diminuir o torque do


motor e a velocidade do veículo, Antônio girou rapidamente o volante do
trator para a esquerda e pisou fundo no acelerador. No entanto, mal
conseguiu avançar alguns poucos metros com o veículo quando o motor
parou repentinamente e os faróis se apagaram.

Tentou ainda dar a partida, mas o motor não pegou mais. Antônio pulou do
trator e começou a correr, mesmo sabendo da grande dificuldade ou, até se
poderia dizer, da impossibilidade de se correr sobre um campo recém-
arroteado. Porém, também não conseguiu ir muito longe: um ser que mal
chegava à altura dos seus ombros agarrou-o pelo braço.

Desesperado, Antônio aplicou-lhe um golpe que o fez perder o equilíbrio,


largar o seu braço e cair para trás. Novamente tentou correr, quando três
outros seres instantaneamente o agarraram pelos braços e pernas e o
ergueram do solo. Embora dominado, Antônio ofereceu resistência,
esbravejando, xingando e desesperadamente pedindo por socorro, mesmo
sabendo que ninguém, absolutamente, poderia ouvi-lo e/ou socorrê-lo num
raio de vários quilômetros.

Embora magros e de estatura baixa, os alienígenas pareciam ter uma força


física quase descomunal; e assim conseguiram por fim fazê-lo subir por uma
escada flexível e bamboleante para o interior da nave, onde se encontrava o
quinto alienígena..

Os cinco usavam macacões bem colantes, de uma fazenda bem grossa,


cinzenta, muito macia e, em alguns pontos, colada com tiras pretas. Cobrindo
a cabeça e o pescoço, usavam um capacete da mesma cor, mas de um
material que parecia mais consistente e reforçado atrás, com estreitas tiras de
metal. Este capacete cobria a cabeça toda, deixando à mostra somente os
olhos, os quais Antônio pôde distinguir através de algo parecido com um par
de óculos redondos.

Os estranhos fixaram-no com seus olhos claros, que lhe pareciam de cor
azul. Acima dos olhos, o capacete tinha duas vezes a altura de uma testa
normal. Provavelmente, sobre a cabeça, debaixo do capacete, deveriam usar
mais alguma coisa, invisível de fora. A partir do meio da cabeça, descendo
pelas costas e entrando no macacão, à altura das costelas, Antônio notou três
tubos redondos, de prata, dos quais não saberia dizer se eram de borracha ou
metal. O tubo central descia pela coluna vertebral à esquerda e à direita
desciam os dois outros tubos, até uns 10 cm abaixo das axilas.

Não viu nenhuma depressão ou protuberância que indicasse uma ligação


entre esses tubos e um recipiente ou instrumento, escondido debaixo do
macacão. As mangas do macacão eram estreitas e compridas; os punhos
continuavam em luvas grossas. Percebia-se que os seres mal conseguiam
tocar com as pontas dos dedos a parte interna da mão. Contudo, isto não os
impediu de segurara-lo com tamanha firmeza e manipular habilmente os
tubos de borracha, enquanto lhe faziam uma sangria.

Quanto aos seus macacões, parecia que eram uma espécie de uniforme, pois
todos os tripulantes usavam um escudo do tamanho de um pires. De lá, uma
tira de pano, prateada ou de metal, ligava-se à cinta estreita, sem fivela.
Nenhum dos macacões tinha bolsos ou botões. As calças eram compridas e
colantes e continuavam numa espécie de botas, sem, no entanto, mostrar onde
terminavam as calças e começavam as botas.

Nas pontas, as botas eram levemente encurvadas para cima. Os alienígenas


movimentavam-se hábil e rapidamente; só que o macacão parecia interferir
um pouco com os movimentos livres do seu corpo, pois eles aparentemente
passavam a idéia de figuras um tanto rígidas. Todos eles eram mais ou menos
do tamanho de Antônio, à exceção de um deles, que não chegava nem à
altura do seu queixo.

Dentro da estranha nave, no que parecia ser uma antessala completamente


vazia e sem nenhum tipo de móvel, três dos alienígenas o mantinham seguro
pelos braços e pernas, enquanto o quarto ser começou a retirar suas roupas.

— O que vocês querem comigo, seus desgraçados?...O que vocês querem? —


Gritava Antônio, angustiado e com muita raiva. O alienígena que o despia
parou por um momento, encarou-o e fez um sinal com uma das mãos, sinal
que Antônio, mesmo não entendendo o significado, deixou-o de certa forma
um pouco mais aliviado. Depois continuou a lhe tirar o resto das roupas, até
deixa-lo completamente despido como nasceu. Levado para outra sala cuja
porta pareceu se abrir automaticamente numa das paredes, Antônio foi
colocado numa espécie de cama sem cabeceira ou pés visíveis. Estava coberta
com um tecido grosso, cinzento, parecendo bastante rústico, mas limpo e
macio.

Um líquido espesso, transparente, parecido com óleo – mas que não deixava
a pele engordurada – foi passado com uma esponja macia em todo o seu
corpo. De outra sala cuja porta era parecida com a primeira, surgiram dois
seres segurando nas mãos uma espécie de tubo de ensaio dos quais saiam
uma espécie de tubo flexível e transparente.

Um líquido espesso, oleoso, mas que não deixava a pele engordurada foi
passado em seu corpo com uma espécie de esponja macia. Em seguida, um
deles colocou a extremidade de um dos tubos no que parecia um tubo de
ensaio, e a outra ponta, que possuía uma peça de embocadura parecida com
uma ventosa, foi no queixo de Villas-Boas. O agricultor não sentiu dor,
apenas a sensação de que a pele estava sendo sugada.

Viu seu próprio sangue escorrer pelo tubo flexível e se depositar no tubo de
ensaio, que ficou cheio até a metade. O tubo flexível foi então retirado. O
outro tubo, que ainda não havia sido usado, foi colocado do outro lado do
queixo, de onde se coletou mais sangue, até completar o vasilhame. A pele de
Antônio ficou ardendo e coçando no lugar das sangrias.

Deixado sozinho na sala, percebeu que em uma pequena parte de uma das
paredes pequenos furos, quase imperceptíveis começaram a exalar uma
espécie de fumaça de cheiro desagradável e sufocante, o que acabou lhe
provocando náuseas. Sentindo que ia vomitar e não encontrando
absolutamente nenhuma pia, vaso ou sanitário onde pudesse fazê-lo, Antônio
levantou-se da cama e em seguida abaixou-se ao lado do que seria a parte dos
pés da cama e vomitou ali mesmo.

Deitou-se de novo na cama. E agora que suas narinas estavam impregnadas


com o cheiro da fumaça que continuava saindo dos orifícios na parede,
sentiu-se melhor, mais tranquilo e confiante até. Sua intuição apurada pareceu
“lhe dizer” que os alienígenas não lhe fariam mal nenhum, e que aquela
fumaça tinha um objetivo: deixa-lo mais calmo, mais relaxado.
III

Antônio esperou por um longo tempo até que, para seu espanto, uma das
portas se abriu e surgiu uma mulher inteiramente nua. Seus cabelos eram
macios e louros, quase cor de platina ― como que esbranquiçados — e lhe
caíam na nuca, com as pontas viradas para dentro. Usava o cabelo repartido
ao meio e tinha grandes olhos azuis, amendoados. Surpreso e um tanto
admirado, Antônio percebeu que a alienígena era de estatura baixa; porém,
belíssima. O que mais lhe chamou a atenção foi o fato de que os pelos das
axilas e do púbis eram vermelhos como sangue.

Tinha os seios pequenos, mas bonitos e firmes. A cintura era fina, as nádegas
arredondadas e volumosas, as coxas grossas e sensuais.

A alienígena aproximou-se de Antônio em silêncio, sentando-se na cama ao


seu lado e não deixando dúvidas acerca de suas intenções. Ela o abraçou e
começou a esfregar suavemente seu rosto e seu corpo contra o dele. Ela não
usava nenhum tipo de perfume, mas Antônio percebeu o suave aroma, o
chamado ‘odor di femina’ que emanava, junto com certo calor, de suas partes
íntimas, a excitante fragrância dos feromônios femininos, os aromáticos
hormônios femininos que atuam na atração sexual.

Antônio, malgrado a situação em que se encontrava, ou seja, levado à força


para uma nave espacial e mantido complemente nu por horas, estava
excitadíssimo. A porta se fechou e Antônio a abraçou com força, mas
carinhosamente. Tentou beijar sua boca de lábios finos, mas ela pareceu não
entender ou simplesmente recusou-se a beijá-lo na boca. Ao invés disso, ela
foi descendo a mão pelo corpo de Antônio até encontrar e agarrar seu pênis,
o qual começou a acariciar e a fazer delicados movimentos de vai e vem.
Com gestos suaves, ela deitou-se na cama, e sem soltá-lo, puxou-o pra cima
de si. E Antônio Villas Boas, um lavrador de vinte e três anos de idade que
nunca antes havia se deitado com uma mulher, penetrou-a com certa força, o
que a fez soltar uma espécie de grunhido, talvez de dor e de prazer ao mesmo
tempo. Alguns poucos minutos depois ele atingia o orgasmo. Respirou fundo,
e ainda dentro dela, recomeçou a fazer movimentos agora mais compassados
de vai e vem. Ela correspondia aos movimentos em silêncio, somente
quebrados por um ou outro grunhido ininteligível, os quais, de certa forma,
irritavam seu parceiro.

Depois de um segundo orgasmo, quando a alienígena fez menção de sair


debaixo dele, Antônio tentou segurá-la para mantê-la na mesma posição;
queria continuar fazendo sexo com aquela parceira tão atraente e ao mesmo
tempo completamente desconhecida. Ela, no entanto, estava decidida e, num
ímpeto, levantou-se e ficou de pé, olhando enigmática e carinhosamente para
Antônio, durante alguns segundos. Em seguida, voltou-se e caminhou em
direção à porta, à qual se abrira com um simples levantar de mão da
alienígena.

Antes de sair, ela parou e se voltou em direção a Antônio agora sentado na


cama e, com um quase sorriso enigmático, apontou um dedo para ele, depois
apontou para seu próprio ventre e em seguida apontou para cima. A
mensagem não poderia ser mais clara: ela iria ter um filho de Antônio em
algum lugar das estrelas, e ele, Antônio, iria ser pai de uma criança híbrida,
fruto de uma relação íntima entre um terráqueo e uma alienígena. Um filho
que iria nascer em algum lugar do vasto Universo; um filho que ele mais que
provavelmente nunca viria a conhecer.

IV
De novo sozinho, sentado sobre a cama dentro de uma espaçonave
extraterrestre para à qual fora levado à força, Antônio se sentia ao mesmo
tempo aturdido e sem saber nem mesmo o que pensar de tudo aquilo: as
coisas ocorreram rápidas demais. Menos de um minuto depois que a moça
saíra, entretanto, a porta tornou a se abrir e um alienígena ainda uniformizado
entra na sala. Trazia suas roupas e o par de botinas mateiras. Com um gesto,
fez sinal para que Antônio se vestisse; o que este fez rapidamente e de muito
bom grado.
Em seguida, entraram na sala os cinco alienígenas que o apanharam várias
horas antes. Com um sinal para que Antônio os acompanhasse, saíram da sala
em direção à porta que dava talvez para a saída da nave, a mesma porta com a
escada metálica bamboleante por onde Antônio havia sido forçado a entrar
momentos antes.
Quando Antônio passou ao lado de uma pequena plataforma que saía da
parede -- uma espécie de mesinha embutida -- percebeu que havia ali um
pequeno objeto de metal escuro, um pouco maior e com o formato parecido
com um maço de cigarros. Procurando não ser visto, apanhou o objeto:
precisava levar alguma coisa da nave que pudesse provar para quem quer que
fosse que estivera lá. Porém, foi descoberto por dos alienígenas, que
imediatamente arrancou o objeto de suas mãos e o recolocou no mesmo lugar
onde estava.
Desceram a escada metálica e Antônio sentiu a velha e boa terra sob seus
pés. Todos permaneceram parados, em completo silêncio, até que os
alienígenas estenderam a mão e apertaram a mão dele, uma espécie de
despedida silenciosa. Em seguida subiram rapidamente as escadas, e menos
de um minuto depois a nave começou a emitir o já conhecido ruído de catraca
de bicicleta quando se gira o pedal para trás.
O brilho das luzes avermelhadas se tornou mais forte, e Antônio
instintivamente se afastou de debaixo da nave, à qual, ato contínuo recolheu
as grandes hastes telescópicas de metal, pairou no ar por uma fração de
segundo e disparou numa velocidade inimaginável em direção ao norte.
Antônio continuou ali parado e olhando para os céus por mais alguns
momentos, sentimentos confusos, um misto de alegria e de gratidão aos
estranhos seres que não lhe causaram nenhum mal. Muito ao contrário,
pensou ele. O que Antônio não poderia saber é que naquele momento estava
passando por um fenômeno psicológico que somente uns vinte e tantos anos
depois a Ciência o chamaria de “Síndrome de Estocolmo”, quando um
sequestrado cria uma forte empatia com seus sequestradores.
Caminhou até aonde estava o trator e apanhou um cigarro de palha.
Quando foi procurar o ‘isqueiro bala’ de metal amarelo, não conseguiu
encontra-lo. Provavelmente tenha caído de seu bolso quando do entrevero
com os alienígenas. Lembrou-se do outro velho isqueiro de pedra que sempre
estava no fundo do embornal: uma ponta de chifre de boi com algodão, uma
pedra de cristal de quartzo e um pedaço de lima. Depois de várias tentativas,
finalmente conseguiu acender o cigarro de palha.
Fumando de pé ao lado do trator, Antônio olhou para cima, e somente a
lua nova já bem alta a caminho do leste e nenhuma estrela, à exceção da
Estrela D’alva (Na verdade, o planeta Vênus) com seu brilho intenso
indicava que não demoraria muito para a alvorada. Calculou que havia ficado
dentro da nave entre quatro e cinco horas, uma vez que, quando foi arrastado
pra lá, devia ser mais ou menos uma hora da manhã, e como lavradores não
usam relógios durante os trabalhos no campo, não poderia calcular com
certeza.
Calmamente Antônio galgou os dois estribos do trator, e sem saber se o
motor pegaria ou não, girou a chave do contato. O motor pegou na hora, ao
mesmo tempo que os faróis iluminaram o espaço à frente. Puxou um pouco
mais a alavanca do hidráulico, girou o volante em direção ao oeste, onde
ficava a casa, mas não engatou a marcha.
A pretexto de aquecer o motor, esperou alguns momentos para observar o
céu em direção ao norte e pensou na mulher extraterreste com a qual havia
feito amor e que levava em seu ventre uma sementinha, seu filho, fruto
daqueles momentos que o marcariam enquanto vivesse. Finalmente engatou a
marcha, começou a acelerar devagar e sem pressa sob a luz do luar da lua
nova, cujos raios fizeram brilhar uma lágrima que teimava escorrer em seu
rosto curtido pelo sol.

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Notas clínicas e relatório sobre o exame médico, assinado


pelo Dr. Olavo Teixeira Fontes.

Dados pessoais do paciente: Antônio Vilas Boas, branco, solteiro,


fazendeiro, residente em São Francisco de Sales, Minas Gerais.

– Ficha Clínica: Conforme o seu depoimento, ele teria deixado o


aparelho alienígena em 16 de outubro de 1957, por volta de 5 h e
30 m.
O seu estado físico era de muita fraqueza, pois nada havia ingerido
desde às 21 h da véspera e, enquanto estava na máquina, vomitou
diversas vezes. Voltou para casa, exausto e dormiu quase o dia
todo. Ao acordar às 16 h e 30 m, sentiu-se bem e tomou uma
refeição regular. No entanto, já naquela noite e nas noites
seguintes, não conseguia dormir. Ele ficava muito nervoso,
fortemente excitado e sempre que conseguia pegar no sono,
sonhava com os acontecimentos da noite anterior, como se
estivesse revivendo tudo.
A essa altura, despertava, com um grito e tinha a sensação de estar,
outra vez, preso por seus sequestradores.
Após ter passado repetidamente por aquela experiência, ele desistiu
de tentar dormir naquela noite e procurou passá-la, lendo e
estudando. No entanto, tampouco logrou realizar este seu intento,
pois não conseguia concentrar-se naquilo que estava lendo; seus
pensamentos sempre voltavam e giravam em torno dos
acontecimentos daquela noite sinistra.
Ao raiar o dia, ele estava completamente confuso, andando de um
lado para o outro, fumando um cigarro após o outro. Sentiu-se
cansado, exausto. Teve vontade de comer alguma coisa, mas
acabou tomando somente um cafezinho; logo em seguida, sentiu-se
mal, vomitou; a ânsia de vômitos e as fortes dores de cabeça
continuaram durante todo o dia. Como ele estava absolutamente
sem apetite, rejeitou qualquer alimento.
Também a segunda noite, após o incidente, ele a passou em claro e
no mesmo estado físico. Ainda sentiu seus olhos arderem, mas as
dores de cabeça cederam. No segundo dia, continuou com ânsia de
vômitos e sem apetite, porém, não vomitou mais, provavelmente
porque nada comeu. Igualmente, os olhos ardiam mais e
começaram a lacrimejar constantemente, embora não fosse
constatada qualquer inflamação do tecido conjuntivo, nem fossem
notados sintomas de qualquer outra irritação da vista ou
impedimento da visão.
Na terceira noite, o paciente conseguiu dormir, normalmente. A
partir de então, ele sentiu uma excessiva necessidade de sono, que
perdurou mais de um mês. Até durante dia chegou a cochilar,
pouco importava onde se encontrasse ou o que estivesse fazendo;
cochilava mesmo enquanto conversava com outras pessoas. Para
adormecer, bastava ficar quieto por algum tempo.
Durante aquele estado de sonolência, os seus olhos continuavam a
arder e lacrimejar. Quando, no terceiro dia, as ânsias de vomito
cederam, seu apetite voltou e ele comeu normalmente. Os olhos
pioravam, quando expostos ao Sol, e, assim sendo, procurou evitar
toda claridade.
No oitavo dia, quando já estava trabalhando no campo, sofreu uma
ligeira efusão de sangue, no antebraço; no dia seguinte, o
hematoma infeccionou, formando pus e provocando coceiras.
Depois de sarar, no lugar do hematoma ficou um circulo vermelho.
Uns 4 a 10 dias mais tarde, de repente e sem qualquer ferimento
prévio, semelhantes lesões dermatológicas apareceram nos
antebraços e nas pernas.
Começavam com uma pústula, aberta ao meio, que provocava
fortes coceiras e levava uns 10 a 20 dias para sanar. O paciente
referiu que essas pústulas, depois de sanadas, deixavam cicatrizes,
com manchas vermelhas escuras à sua volta. Ele informou que,
anteriormente, jamais havia sofrido de eczemas ou irritações
cutâneas, tampouco de hematomas, contusões, ou feridas abertas
(segregando sangue); quando estas últimas apareciam, vez por
outra, eram tão leves que nem chegava a notá-las.
Igualmente, no 15º dia após a sua experiência, surgiram duas
manchas amareladas, mais ou menos simetricamente dispostas, à
direita e à esquerda do nariz, o paciente comentou a respeito:
"aquelas manchas pareciam como se a pele fosse esbranquiçada,
desprovida de irrigação sanguínea". Depois de uns dez dias, as
manchas desapareceram tão de repente quanto havia surgido. Ao
lado das cicatrizes deixadas pelas pústulas, esporadicamente
surgidas nos braços, ao longo desses últimos meses, ainda ficaram
duas pequenas feridas abertas. Os demais sintomas descritos não
voltaram a aparecer, até o momento. Atualmente, o paciente sente-
se bem e ele próprio considera bom o seu presente estado de saúde.
Ele nega a ocorrência de sintomas, tais como febre, diarreia,
hemorragias, icterícia, durante a fase aguda da sua doença ou logo
em seguida. Tampouco referiu quedas de pelos no corpo ou rosto,
ou queda de cabelos, no período de outubro até agora. Na fase da
sonolência, a sua capacidade de trabalho não ficou notadamente
diminuída. Da mesma maneira, não se registrou qualquer
diminuição na sua libido, na sua potência ou visão, como não teve
anemia, nem pústulas na boca.
– Quanto às doenças infantis agudas, o paciente referiu ter sofrido
de sarampo e varicela, sem complicações. Não teve doenças
venéreas. Em anos passados, sofreu de uma colite, que não
incomoda mais.
– Exame médico: trata-se de pessoa do sexo masculino, de cor
branca, cabelos pretos, macios, olhos escuros. Ausência de
sintomas de males agudos ou crônicos.
– Biótipo: pernas compridas, leptossômico. Fácies: atípico, altura
média (1,64m, descalço), esbelto, porém, forte e de musculatura
bem desenvolvida.
– Estado de nutrição: nenhum sintoma de carência de vitaminas;
nenhuma má-formação ou anomalia física.
– Pelos do corpo e característica sexuais: normais.
– Dentes: em bom estado de conservação.
– Gânglios: não palpáveis externamente.
– Mucosas: todas um tanto pálidas.
– Exame dermatológico: foram constatadas as seguintes alterações
patológicas:
1. À direita e à esquerda do queixo, duas pequenas manchas,
*hipercromáticas (*Condição anormal e patológica em que os glóbulos vermelhos se
apresentam excessivamente corados.) quase redondas; uma delas é do tamanho
de uma moeda de 10 centavos; a outra é maior e de contornos
irregulares. Ali, a pele parece mais fina e delicada, como recém-
formada ou um tanto atrofiada. Inexistem pontos de referência para
determinar o tipo e a idade daquelas duas manchas. Tudo quanto se
pode dizer a respeito resume-se no seguinte: são cicatrizes de
feridas superficiais, na pele, relacionadas com efusão de sangue,
datando, no máximo, de uns doze meses e, no mínimo de um mês.
É licito supor que se trata de manchas da pele, as quais,
provavelmente, desaparecerão dentro de alguns meses. Além
dessas manchas, não foram constatadas outras manchas similares
ou marcas na pele.
2. Foi notada a presença de cicatrizes deixadas por feridas na pele
(datando de alguns meses, no máximo), na parte externa da mão,
nos antebraços e nas pernas. O exame revelou tratar-se de pequenas
pústulas ou feridas cicatrizadas, com a pele saindo, esfolando nas
bordas, o que permite concluir por seu aparecimento em data
recente. Duas dessas pústulas, no braço direito e no esquerdo, ainda
não chegaram a curar-se; apresentam-se como pequenos nós ou
bubões, salientes, avermelhados; são mais duros do que a pele ao
seu redor, causam dor quando comprimidos e, no seu centro,
segregam um liquido amarelado, seroso.
A pele circundante apresenta alterações inflamatórias. Vestígios de
pequenos arranhões, feitos pelas unhas do paciente, permitem
supor que se trata de urticária. Quanto às alterações patológicas
constadas, cumpre mencionar que todas as cicatrizes e alterações
dermatológicas se encontram no centro de uma área
hipercromática, de cor lilás clara, um sintoma completamente fora
do âmbito das nossas experiências, razão pela qual não é possível
avaliar a importância ou o significado de tais áreas.
Como o médico-examinador não é dermatologista, necessita das
condições necessárias para a devida diagnose deste sintoma e,
assim sendo, limita-se a descrever as alterações em apreço, que,
aliás, também foram documentadas por fotos.
– Estado neurológico e orientação no espaço e tempo: adequada.
– Reações sensoriais, afecções: dentro do normal.
–Atenção espontânea e estimulada: normal.
– Percepções e associações mentais: reações normais.
– Memória a longo e a curto prazo: adequada.
– Memória visual: extraordinária; detalhes relatados verbalmente
são, de imediato, esboçados ou ilustrados pelo próprio paciente.
Ausência de quaisquer sintomas diretos ou indiretos de uma doença
mental.
Olavo Fontes, Doutor em Medicina
Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 1958.

Em resumo, o Dr. Fontes tornou a salientar que, logo no início dos


exames, soube que Antônio não tem qualquer disposição
psicopática. Ao prestar o seu depoimento, nem por uma só vez, ele
caiu em contradições ou perdeu o autocontrole. Igualmente,
quando, por algumas ocasiões, hesitou em responder a uma
pergunta, revelou comportamento normal de um indivíduo que não
quer responder a determinadas perguntas, sobre circunstâncias fora
do comum. Sempre quando isto aconteceu, ele disse, simplesmente:
"não sei" ou "não sei explicar isto", mesmo sabendo que tais
evasivas poderiam pôr em dúvida a credibilidade do seu relato.
Aliás, Antônio disse ao jornalista João Martins que se sentiu sem
jeito para falar de certos detalhes, por exemplo, quanto à
extraterrestre. Tampouco Antônio revelou inclinações para a
superstição, o misticismo; ele não considerou os tripulantes do
objeto como ‘anjos’, ‘super-homens’ ou ‘demônios’, mas, sim,
entendeu que se tratava simplesmente de homens provenientes de
outras regiões, de outro planeta. Ele explicou esta idéia pelo fato de
o tripulante que o acompanhou ao deixar o objeto voador, ter
apontado primeiro para ele, depois para o solo e, por fim, para o
céu. Além disso, durante toda a sua permanência a bordo, Antônio
observou como os tripulantes usavam uniformes e capacetes
fechados; dali ele concluiu que o ar normalmente aspirado por eles
deveria ser diferente daquele aqui na Terra. Quando o jornalista
João Martins disse a Antônio que, caso aquele seu relato viesse a
ser divulgado, muitas pessoas iriam considerá-lo como um louco
ou impostor, Antônio não se impressionou absolutamente diante de
tais perspectivas, mas disse apenas: "Nesse caso, convidaria as
pessoas que falam tais coisas a irem até minha terra e que se
informassem sobre minha pessoa. Logo saberiam do conceito de
que desfruto lá, se estou sendo considerado como homem direito,
ou não."
Hoje em dia, Antônio está casado e vive muito feliz com a mulher
e os filhos na fazenda. Ele continua afirmando que o incidente se
deu tal qual foi por ele descrito e, fora disso, não quer saber mais
nada a respeito. Antônio jamais tomou drogas ou tóxicos.

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Introdução

Após sua extraordinária experiência, Antônio Villas Boas


procurou um farmacêutico da localidade de São Francisco de Sales,
MG, no intuito de aliviar os problemas decorrentes do contato. O
farmacêutico havia lido reportagens de João Martins para a Revista
O Cruzeiro, e era muito aberto ao tema. Ele recomendou a Antônio
Villas Boas que procurasse o repórter João Martins para relatar-lhe
sua experiência. Antônio assim o fez, através de carta, que foi
prontamente respondida pelo repórter. Depois de algumas
correspondências, o protagonista foi ao Rio de Janeiro onde
conheceu pessoalmente o repórter e o ufólogo Dr. Olavo Fontes,
um dos pioneiros neste tema no Brasil. Olavo era médico e
professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil e
foi quem inicialmente divulgou o caso, através do Boletim da
SBEDV (26/27) e em seguida pela revista inglesa “Flying Saucer
Rewiew” (F.S.R.), 8 anos após o acontecido. Ainda em 1958,
Olavo Fontes remeteu um relatório à APRO, na época uma das
mais conceituadas entidades de pesquisa ufológica do planeta, que
na ocasião resolveu não publicá-lo, só o fazendo anos depois,
quando o caso já era plenamente conhecido e divulgado no meio
ufológico.
Apesar de o relato ser muito conhecido e comentado nos meios
ufológicos do início da década de 1960, apenas poucos grupos
nacionais sabiam de fato onde o caso ocorrera e tinham meios de
contatar o protagonista. A SBEDV era uma das entidades mais
atuantes dessa época, tendo investigado os mais importantes casos
ufológicos das décadas de 50, 60 e 70. Mesmo sendo tão atuante,
ela desconhecia o local exato do caso, para que pudesse iniciar sua
própria investigação. Vencidas estas dificuldades, a investigação da
SBEDV teve início, ocorrendo nos primeiros meses de 1962. Os
ufólogos Dr. Walter Buller e Dr. Mário Prudente Aquino viajaram
até São Francisco de Salles para realizar a pesquisa de campo. Ao
chegar à localidade, procuraram inicialmente o farmacêutico que
atendeu Antônio Villas Boas pouco tempo depois do caso ter
ocorrido. Através deste, eles conseguiram conversar com o
protagonista que relatou, então, os detalhes de sua fantástica
experiência.
De início, Antônio mostrou-se arredio, um pouco tenso e
desconfiado. Em virtude disso, a entrevista inicial durou apenas 45
minutos abordando aspectos mais gerais do caso, sem abordar o
aspecto de estudo genético com cópula, realizado a bordo do
aparelho. No dia seguinte, a pesquisa continuou com uma visita dos
pesquisadores à fazenda dos Villas Boas. Nessa etapa eles
conheceram o local onde o caso ocorreu, e complementaram a
entrevista com a testemunha. Os resultados desta pesquisa foram
divulgados inicialmente, de forma resumida, no Boletim da
SBEDV, edição 26/27 (em inglês), de junho de 1962. O boletim
teve grande repercussão no exterior, gerando enorme interesse por
parte da comunidade ufológica internacional. Mais tarde, o caso foi
exposto novamente na revista Flying Saucer Review (F.S.R.), nos
meses de janeiro/fevereiro e julho/agosto de 1965. Este artigo da
F.S.R. motivou uma série de reportagens da Revista O Cruzeiro
Internacional, que em três ocasiões (16/01/1965; 1/2/1965 e
16/2/1965) divulgou o caso, desta vez em espanhol.
Em 1966, o Dr. Olavo Fontes divulgou seu relatório pessoal
sobre o caso, que foi divulgado pela SBEDV e pela F.S.R. ao longo
de cinco edições entre os meses de julho e dezembro de 1966 e
janeiro e junho de 1967. Depois destas divulgações iniciais, o caso
consolidou-se como um clássico da Ufologia Mundial, sendo citado
em inúmeros livros, revistas, palestras, reportagens, sites,
documentos, etc.
.

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