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UNIOESTE – UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ

CAMPUS DE MARECHAL CÂNDIDO RONDON - PR

CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS - CCA

PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL

MESTRADO E DOUTORADO

MÁRCIA HANZEN

RAIZ DE ROÇA: EMPODERAMENTO FEMININO E CAPITAL SOCIAL NA


AGRICULTURA FAMILIAR

MARECHAL CÂNDIDO RONDON


PARANÁ – BRASIL
2021
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
MÁRCIA HANZEN

RAIZ DE ROÇA: EMPODERAMENTO FEMININO E CAPITAL SOCIAL NA


AGRICULTURA FAMILIAR

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural
Sustentável – Mestrado e Doutorado do
Centro de Ciências Agrárias da Unioeste –
Universidade Estadual do Oeste do Paraná,
como requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Desenvolvimento Rural
Sustentável.

Orientadora:
Prof. Dra. Sandra Maria Coltre

MARECHAL CÂNDIDO RONDON


PARANÁ – BRASIL
2021
AGRADECIMENTOS

Agradecimentos especiais ao PPGDRS - Programa de Pós-Graduação em


Desenvolvimento Rural Sustentável da UNIOESTE, campus de Marechal Cândido
Rondon, que me oportunizou o desafio do Mestrado.
A todas as 37 mulheres rurais associadas à AAFEMED, que me concederam
entrevista escrita e em especial as entrevistadas do documentário: Teolide Parizotto
Turcatel, Roseli Turcatel Motter, Janete Maia Nodari, Claudia Regina Mainatz, Tereza
Fátima Toniazzo, Lidiane Toniazzo, Rafaela Toniazzo, Grabriela Toniazzo, Neire
Gorete Tubiana, Ana Thomé Slongo, Laura Dagostin Valiati. Obrigada por este aporte
de conhecimento para me conceder as entrevistas que resultaram no documentário.
Para Marcielo Cologni, aqui representando a AAFEMED – Associação dos
Agricultores Familiares e Agroecológicos de Medianeira, pela disponibilidade e
abertura de portas, sempre buscando colaborar e contribuir com o resultado da
pesquisa. Foi o que me possibilitou a acesso às 37 mulheres que responderam à
pesquisa quantitativa.
Meu carinho especial aos colegas de PPGDRS Flávia Piccinin Paz, Juçara
Elza Hennerich, Jonas Recalcatti, Edirce Ana Vogt, Clara Heinzmann, Neron Alipio
Cortes Berghauser, Nândri Strassburger e Mariell Lima Costa. Pela parceria nas
publicações, ajuda nas pesquisas, intensos colóquios acerca das temáticas
abordadas em sala, troca de bibliografias, portabilidade, caronas, desabafos e muitos
almoços, cafés e cappuccinos, doces e amargos.
Para Alexandre Kunhaski, Tatyelle Schunemann e Cauê Vergopolan Hanzen,
meus agradecimentos e a justa divisão dos créditos das imagens do documentário.
Movidos pelo aprendizado e pela oportunidade de produzir algo diferente, doaram seu
tempo livre para me ajudar na filmagem das entrevistas.
À musicista gaiteira Adriana de Los Santos, do grupo Gurias Gaúchas, pela
sensibilidade em tocar apenas no acústico da gaita e colocar à disposição a trilha
sonora de sua música intitulada “Cumplicidade”. Sem dúvida, a música trouxe poesia
ao documentário.
Agradecimentos técnicos à Vision Art Produções por acrescentar ao trabalho
a plástica dos grandes documentários.
Agradecimentos Institucionais à AAFEMED – Associação dos Agricultores
Familiares e Agroecológicos de Medianeira, à Costa Oeste News, Grupo MP e Jornal
Mensageiro.
Agradeço a professora Dra. Carla Nacke Conradi, cujo rigor da avaliação e cuja
experiência de pesquisadora no campo da História das Mulheres, me levou a repensar
a pesquisa, seja pelos aportes do método da história oral e das categorias analíticas,
relações de gênero, mulheres e empoderamento feminino.
Para minha orientadora, professora Dra. Sandra Maria Coltre, cuja orientação
e sustentação me ajudou a fuir e aprimorar a pesquisa, me deu forças e me permitiu
quebrar alguns paradigmas e ousar para além do planejado. Espero não ter dado
muito trabalho.
Agradeço ao professor Dr. Wilson Zonin por me inspirar este tema tão especial
e carente de um olhar tanto científico quanto histórico, motivando as mulheres rurais
a buscar ocupar seu lugar de fala.
Em especial agradeço a banca avaliadora formada pelos Professores Doutores
Sandra Maria Coltre, Adriana Maria De Grandi, Clério Plein e Maria Fátima Menegazzo
Nicodem. As orientações dadas na qualificação me levaram a ampliar o olhar sobre
a pesquisa e ir a campo, o que mudou minha percepção sobre o objeto de pesquisa.
Jamais esquecerei as palavras de reconhecimento pelos resultados da dissertação.
Por fim, para as mulheres da minha vida: Dona Severa Hanzen, minha mãe,
nascida agricultora, minhas avós “moda” Ilse Hanzen e “moda” Lúcia Lauschner...
Minha bisa, “vôvo” Madalena, extraordinária e empoderada! Uma vida de mulheres
agricultoras, que são, sem dúvida, minha força ancestral!
“Triste, louca ou má
Será qualificada
Ela quem recusar
Seguir receita tal

A receita cultural
Do marido, da família
Cuida, cuida da rotina

Só mesmo, rejeita
Bem conhecida receita
Quem não sem dores
Aceita que tudo deve mudar

Que um homem não te define


Sua casa não te define
Sua carne não te define
Você é seu próprio lar

Eu não me vejo na palavra


Fêmea, alvo de caça
Conformada vítima

Prefiro queimar o mapa


Traçar de novo a estrada
Ver cores nas cinzas
E a vida reinventar

E um homem não me define


Minha casa não me define
Minha carne não me define
Eu sou meu próprio lar...”
Música: Francisco, el Hombre
Letra:Juliana Strassacapa / Sebastián Piracés-
Ugarte / Andrei Martinez Kozyreff / Mateo Piracés-
Ugarte / Rafael Gomes
(2016)
RESUMO

HANZEN, Marcia. Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE - 2021. Raiz de roça:
Empoderamento feminino e capital social na agricultura familiar. Orientadora: Drª Sandra Maria Coltre.

Esta dissertação investigou como a participação das mulheres agricultoras na Associação dos
Agricultores Familiares e Ecológicos de Medianeira - AAFEMED, contribui para o aumento do
empoderamento e do capital social. Neste contexto, o empoderamento e capital social como ampliação
da liberdade de escolher e agir, do poder dos indivíduos sobre os recursos e decisões que afetam suas
próprias vidas, se associa às questões de gênero, da agricultora familiar e seu lugar de fala. O estudo
foi exploratório com corte transversal em 2020, sem considerar a evolução dos dados no tempo. Os
dados de fonte primária foram coletados por meio de questionários aplicados para 37 agricultoras que
participaram espontaneamente do estudo. Na primeira parte levantou o perfil destas agricultoras e na
segunda parte levantou o grau de contribuição dos indicadores de capital social, econômico, social e
pessoal, para o empoderamento e as melhorias ocorridas nesta participação. Os dados foram tratados
em porcentagem e analisados descritivamente. Além disso, elaborou-se um documentário com 11
agricultoras sobre o tema que depois de editado foi disponibilizado o acesso pelo código (QRcode) para
complemento do tema. Os resultados apontaram que a participação na AAFEMED agregou maior
empoderamento pessoal (57%), o empoderamento econômico continuou igual para 59% das
entrevistadas e no empoderamento social houve uma agregação para 47% e para 53% das
entrevistadas permaneceu igual. Não houve indício de piora em nenhum dos indicadores analisados
em nenhuma das dimensões de empoderamento e capital social. Para 67% das agricultoras houve
melhoras satisfatórias e muito significativas nas dimensões que constroem o empoderamento e o
capital social, da mesma forma para 52% delas estes resultados estão vinculados aos 14 anos de
trabalho da AAFEMED. Todos os indicadores analisados evidenciaram que sim, a AAFEMED
contribuiu, principalmente para o empoderamento pessoal e aumento do capital social das mulheres
rurais associadas.

Palavras-chave: Gênero. Empoderamento. Capital Social. Agricultora familiar. Associativismo.

.
ABSTRACT

HANZEN, Marcia. State University of Western Paraná - UNIOESTE - 2021. Farming roots: Women's
empowerment and social capital in family farming. Advisor: Drª Sandra Maria Coltre.

This thesis investigated how the participation of female farmers in the Family and Ecological Farmers
Association of Medianeira - AAFEMED, contributes to increased empowerment and social capital. In
this context, empowerment and social capital as an extension of freedom to choose and to act over the
resources and decisions that affect their own lives, is associated with gender issues, of the female family
farmer and of her standpoint. This was an exploratory study with a cross-section in 2020, without
considering the evolution of the data over time. The primary data were collected by means of
questionnaires given to 37 female farmers that volunteered to participate in the study. The first part
surveyed the profile of these female farmers and the second part surveyed the extent that social capital,
economic, social and personal indicators contributed to empowerment and improvements that occurred
during this study. The data were treated as percentages and analysed descriptively. In addition, a
documentary was elaborated with 11 female farmers on the subject which, after being edited, was made
accessible through a code (QRcode) to complement the topic. The results indicated that participation in
AAFEMED added greater personal empowerment (57%), economic empowerment remained the same
for 59% of the interviewees and for social empowerment there was an increase for 47% while for 53%
of the interviewees it remained unchanged. There was no indication of worsening in any of the indicators
analysed in any of the dimensions of empowerment or social capital. For 67% of the female farmers
there were satisfactory and very significant improvements in the dimensions that build empowerment
and social capital, similarly for 52% of them these results are linked to the 14 years of work of AAFEMED.
All indicators analysed showed that indeed, AAFEMED has contributed, mainly to the personal
empowerment and increased social capital of the female rural members.

Keywords: Gender. Empowerment. Social capital. Family farmer. Associativism.


LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Oito dimensões para a sustentabilidade ................................................. 19


Tabela 2 - Evolução do feminismo em ondas, representadas pelas autoras mulheres
do período ................................................................................................................. 39
Tabela 3 – Capital social – conceitos e principais expoentes. .................................. 48
Tabela 4 - Indicadores do Capital Social .................................................................. 56
Tabela 5 - Avanços e conquistas dos movimentos das mulheres rurais no Brasil .... 67
Tabela 6 – Variáveis pesquisadas ............................................................................ 72
Tabela 7 – Caracterização das propriedades rurais pesquisadas – junho/setembro
2020. ......................................................................................................................... 97

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Mapa conceitual do empoderamento, capital social e desenvolvimento


sustentável ................................................................................................................ 55
Figura 2 - Reportagem do Jornal Mensageiro sobre as ações do MPMP ................ 78
Figura 3 - Reportagem do Jornal Mensageiro sobre a comemoração dos 10 anos do
MPMP ....................................................................................................................... 81
Figura 4 - Evento de inauguração da primeira Feira do Produtor de Medianeira. .... 82
Figura 5 - Encontro do Dia Internacional da Mulher 2012. ....................................... 86
Figura 6 - Reunião de grupos de mulheres no I Encontro de Mulheres Rurais do
Mercosul Ampliado, em Medianeira no ano de 2018. ............................................... 87
Figura 7 - I Encontro de Mulheres Rurais do Mercosul Ampliado, em Medianeira no
ano de 2018 – momento da leitura da Carta de Medianeira. .................................... 88
Figura 8 - Representação do espaço territorial de localização das 37 propriedades
das agricultoras rurais associadas à AAFEMED ....................................................... 93
Figura 9 - Prédio da Casa do Produtor – local de comercialização da AAFEMED ... 94
Figura 10 - Ambiente interno da Casa do Produtor – comercialização da AAFEMED
.................................................................................................................................. 95
Figura 11 - Ambiente interno da Casa do Produtor – checkout ................................ 95
Figura 31 – Elevação do percentual de altas contribuições da AAFEMED na
construção da dimensão pessoal. ........................................................................... 132
Figura 38 – Processos de empoderamento das mulheres agricultoras da AAFEMED.
................................................................................................................................ 144
Figura 40 - Mapa conceitual das mulheres rurais da AAFEMED e sua correlação com
a aquisição de capital social, empoderamento e desenvolvimento..........................151
Figura 41 - Abertura do documentário e código QR de acesso ao vídeo. .............. 168

LISTA DE GRÁFICOS

Figura 12 - Número de filhos (A) e dependentes (B) por unidade familiar. ............... 98
Figura 13 – Faixa etária das agricultoras pesquisadas. ......................................... 100
Figura 14 – Categorias de produtos agropecuários produzidos nas unidades
pesquisadas. ........................................................................................................... 102
Figura 15 - Participação das mulheres agricultoras nas atividades agrícolas da
propriedade. ............................................................................................................ 103
Figura 16 – Principais atividades não agrícolas desenvolvidas nas propriedades. 103
Figura 17 – Responsabilidade de execução das atividades não agrícolas na
propriedade. ............................................................................................................ 105
Figura 18 – Faixas de renda atribuídas a comercialização de produtos junto a
AAFEMED. .............................................................................................................. 108
Figura 19 – Despesas da família e da propriedade assumidas pela mulher .......... 109
Figura 20 – Distribuição da responsabilidade no pagamento das contas da unidade
familiar. .................................................................................................................... 111
Figura 21 – Responsabilidade pelas atividades do lar. .......................................... 112
Figura 22 – Escolaridade apresentada pelas mulheres (A) e seus cônjuges (B .... 115
Figura 23 – Tempo de vivência na agricultura. ....................................................... 116
Figura 24 - Diferentes formas organizativas das mulheres da AAFEMED ............. 117
Figura 25 – Tempo de participação na AAFEMED. ................................................ 119
Figura 26 – Espaços de capacitação proporcionados pela AAFEMED. ................. 120
Figura 27 – Percentuais de contribuições proporcionadas às mulheres rurais pela
participação na AAFEMED. ..................................................................................... 122
Figura 28 - Contribuições registradas pelas mulheres rurais na dimensão dos
indicadores econômicos, pela participação na AAFEMED. ..................................... 128
Figura 29 - Contribuições registradas pelas mulheres rurais na dimensão dos
indicadores sociais, pela participação na AAFEMED. ............................................. 130
Figura 30 - Contribuições registradas pelas mulheres rurais pela participação na
AAFEMED na dimensão pessoal. ........................................................................... 131
Figura 32 - Contribuições registradas pelas mulheres rurais pela participação na
AAFEMED na dimensão do empoderamento.......................................................... 133
Figura 33 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da
participação na AAFEMED. ..................................................................................... 135
Figura 34 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da
participação na AAFEMED na dimensão econômica. ............................................. 137
Figura 35 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da
participação na AAFEMED na dimensão social. ..................................................... 139
Figura 36 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da
participação na AAFEMED na dimensão pessoal. .................................................. 140
Figura 37 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da
participação na AAFEMED na dimensão do empoderamento. ............................... 142
Figura 39 – Percentuais gerais da identificação dos processos de empoderamento
(A), e no antes e depois da AAFEMED (B). ............................................................ 146
LISTA DE SIGLAS

AAFEMED – Associação dos Agricultores Familiares e Ecológicos de Medianeira


APAM - Associação dos Pequenos Produtores de Medianeira
APPROME - Associação Feira Pequeno Produtor Rural de Medianeira
APROMED - Associação dos Produtores Orgânicos de Medianeira
BIOLABORE – Cooperativa de Trabalho e Assistência Técnica do Paraná
CAPA – Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor
CEBs – Comunidades Eclesiais de Base
CEFURIA – Centro de Formação Urbano Rural Irmã Araújo
CEPAL - Comissão Econômica, que para a América Latina e o Caribe
CMMAD – Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica
COAFASO – Cooperativa da Agricultura Familiar e Solidaria do Oeste do Paraná
CONTRAF - Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na
Agricultura Familiar do Brasil
CSW - Comissão sobre a Situação da Mulher
Contag - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
CPT - Comissão Pastoral da Terra
EMATER - Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
FAO - Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura
IECLB - Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IICA - Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura
IDR/PR – Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná
INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
MMC - Movimento das Mulheres Camponesas
MEB – Movimento de Educação de Base
MMC/PR – Movimento de Mulheres Camponesas do Paraná
MPMP - Movimento Popular das Mulheres do Paraná
MST - Movimento Sem Terra no Brasil
ODS - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030
ONU - Organização das Nações Unidas
PAA - Programa de Aquisição de Alimentos
PNAE - Programa Nacional de Alimentação Escolar
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PT – Partido dos Trabalhadores
PPGDRS - Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural Sustentável.
QRCode - Código Barramétrico Bidimensional
REAF - Reunião Especializada da Agricultura Familiar do Mercado Comum do Sul
SANEM - Sociedade de Amparo ao Necessitado Medianeirense
UFPA - Unidade Familiar de Produção Agrária
UNICAFES - União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia
Solidária
UTFPR – Universidade Tecnológica Federal do Paraná/Medianeira.
YANTEN - Centro Popular de Saúde
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 9
1.1 OBJETIVOS................................................................................................................... 14
1.1.1 Objetivo geral ................................................................................................... 15
1.1.2 Objetivos específicos........................................................................................ 15
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................................. 16
2.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ......................................................................... 16
2.1.1 Desenvolvimento sustentável na ótica da equidade de gênero ........................ 20
2.2 AGRICULTURA FAMILIAR E RURALIDADE ................................................................. 25
2.3 COOPERAÇÃO E RECIPROCIDADE NA AGRICULTURA FAMILIAR .......................... 30
2.4 FEMINISMO COMO CONTRAMOVIMENTO DESCOLONIZADOR ............................... 36
2.5 EMPODERAMENTO E CAPITAL SOCIAL..................................................................... 45
2.6 INDICADORES DE EMPODERAMENTO E CAPITAL SOCIAL ..................................... 57
2.6.1 Capital social e gênero ..................................................................................... 60
2.7 LUTAS E HISTÓRIAS ADORMECIDAS NA CONSTRUÇÃO DO ASSOCIATIVISMO ... 62
3 MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................... 72
4 RESULTADOS....................................................................................................... 76
4.1 OS MOVIMENTOS DE LUTA DAS MULHERES RURAIS NO CAMINHO DA CRIAÇÃO
DA AAFEMED ..................................................................................................................... 76
4.1.1 A AAFEMED na atualidade .............................................................................. 90
4.2 AS MULHERES DA AAFEMED, O EMPODERAMENTO E O CAPITAL SOCIAL .......... 97
4.2.1.2 A agricultora familiar associada à AAFEMED e a geração de renda e vida 109
4.2.1.3 A mulher agricultora familiar da AAFEMED na busca, construção e partilha do
conhecimento .......................................................................................................... 116
4.2.2 As mulheres agricultoras da AAFEMED e as relações de empoderamento e
capital social construídas ........................................................................................ 123
4.2.2.1 Percepções sobre capital social e empoderamento das mulheres agricultoras
e a participação na AAFEMED ................................................................................ 123
4.2.2.2 Percepções das mulheres agricultoras sobre o capital social e empoderamento
em relação ao antes e depois da AAFEMED .......................................................... 136
4.2.2.3 A mulher rural da AAFEMED, o empoderamento e o capital social: uma estrada
a construir e percorrer ............................................................................................. 147
4.2.3 A mulher rural da AAFEMED e o elo entre empoderamento, capital social e
desenvolvimento rural sustentável: o caminho já percorrido até aqui ..................... 150
4.3 DOCUMENTÁRIO RAIZ DE ROÇA ............................................................................. 154
4.3.1 A mulher rural da AAFEMED, e um olhar para além de suas próprias falas .. 157
4.3.2 Apresentação do documentário Raiz de Roça ............................................... 168
5 CONCLUSÕES .................................................................................................... 172
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 176
APÊNDICE 1: QUESTIONÁRIO ............................................................................. 189
APÊNDICE 2: ENTREVISTA 2 - ROTEIRO DO DOCUMENTÁRIO ....................... 195
APÊNDICE 3: DOCUMENTOS DE AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM ......... 198
DOCUMENTÁRIO ................................................................................................... 198
ANEXO 1: LEI MUNICIPAL Nº 62/2009 ................................................................ 200
TERMO DE USO DO BARRACÃO DA PREFEITURA PARA A AAFEMED E
OUTRAS ASSOCIAÇÕES ..................................................................................... 200
ANEXO 2: ATA DE FUNDAÇÃO DA AAFEMED .................................................. 202
ANEXO 3: CARTA DE MEDIANEIRA ................................................................... 207
9

1 INTRODUÇÃO

A insatisfação que permeia a vida das mulheres rurais é proposta como


discussão na busca da promoção de avanços. Suas histórias requerem ser contadas:
de origens humildes, na roça, nascidas e criadas entre os cheiros, odores e suores do
campo; entre os animais, a horta, a cozinha, o forno de tijolos, o tanque, a estrebaria
e a desnatadeira; entre o moedor de cana, a pá de mexer, a escumadeira e a lenha
no fogo. Via de regra, nenhuma história de mulher rural é fácil. Não há romantismo ou
bucolismo. Elas cresceram num lugar social e numa cultura sob a perspectiva de
submissão ao pai, ao marido, ao genro ou ao filho homem.
Essas mulheres são militantes à sua maneira, e cresceram em trincheiras de
luta pela terra, quer seja em assentamentos em busca de um pedaço de chão que
seja seu, quer seja na luta por permanecer na propriedade da família após o
casamento ou a sucessão. Buscando seu lugar de fala dentro da própria família.
Muitas vezes sendo colocadas no papel de simples partícipes do cotidiano do mundo
rural. É este o mundo no qual as agricultoras dividem as mesmas angústias de quem
é sempre tratado como subalterno, mesmo em lares rurais carregados de afeto.
Na rota dessas vivências e reflexões, é que surgiram as motivações para a
escolha deste tema. Elas se originam, com a autoria de alguém que nasceu e cresceu
ao lado de mulheres muito fortes, mas que estavam e estão sempre colocadas um
passo atrás de seus maridos, disputando com as sombras, mesmo sendo elas, não
raras vezes, o verdadeiro esteio desta família rural.
Os estudos sobre a questão de gênero e do feminismo são uma contribuição
interdisciplinar, pois permeiam os vários campos a que esta discussão perpassa,
proporcionando novos olhares a esse tema tão complexo, que é pensar o gênero e o
feminismo. Essa invisibilidade ideológica a que foram submetidas as mulheres ao
longo da história, começa a se transformar em força do feminino no cotidiano da
sociedade, em todos os campos (PEDRO, 2018).
As mulheres sempre estiveram presentes na evolução das sociedades, mas
nunca antes com tamanha visibilidade, embora, esta ainda não seja homogênea. O
grande paradoxo para a quinta onda do feminismo seja dar às mulheres seu lugar de
fala, sejam elas negras ou brancas, ricas ou pobres, heterossexuais ou homossexuais,
10

solteiras ou casadas, de qualquer idade, raça e credo, urbanas ou rurais. É preciso


querer falar sobre as mulheres.
Neste sentido, o feminismo, que para Garcia (2015, p.13) é definido como “a
tomada de consciência das mulheres como coletivo humano, da opressão, dominação
e exploração [...] do patriarcado”, passa a ser o conceito sustentador deste estudo. A
tomada de consciência é fator crucial para o seu empoderamento e aumento de capital
social no âmbito de sua vida.
Cabe trazer à discussão o uso da palavra “gênero”, que aqui cooptará Pedro
(2005, p.78), cujo conceito “tem uma história que é tributária de movimentos sociais
de mulheres [...]. Tem uma trajetória que acompanha a luta por direitos civis, direitos
humanos, enfim, igualdade, respeito e liberdade”.
Que as mulheres sofrem de preconceito no meio rural, isto é fato. O que o
sustenta é que sempre deu a elas um papel relegado ao segundo plano nos trabalhos
da propriedade rural, tem suas origens na própria história da humanidade. Cabia aos
homens prover a caça, plantar e colher, e às mulheres cuidar das coisas da casa, dos
pequenos animais e dos filhos (GARCIA JR, 1989); (BOURDIEU, 1980). Mulheres,
ainda são em muitos lugares deste mundo globalizado, moeda de troca, mão de obra
inferiorizada, instrumento da sucessão patriarcal, objeto de prazer, troféu e descarte.
Repensar este modelo histórico de desenvolvimento rural e das conquistas do
feminismo para dentro da porteira e tantos outros espaços dessa agricultura familiar,
é fundamental, pelo crescimento do papel das mulheres rurais nas associações, nas
posições de liderança, como provedoras não só de alimentos, mas de educação, de
afeto e de sucessão, na maioria dos casos.
As mulheres rurais têm algo que as difere e caracteriza das mulheres urbanas.
Elas não separam a família da atividade econômica; não têm um claro discernimento
de sua função enquanto genitoras e sócias na propriedade, enquanto mão de obra
economicamente ativa e sem remuneração. Artífices de sua própria história, possuem
um papel fundamental na continuidade da agricultura familiar, para o sustento de toda
a família (MULHERES RURAIS, 2019).
Neste contexto, Tedeschi e Colling (2015), destacam que a invisibilidade do
trabalho feminino no campo no Brasil, se deu pela percepção da imagem masculina
como modelo principal de provedor, o que levou o feminino a não desenvolver seu
capital social e se empoderar do seu papel na sociedade.
11

A invisibilidade da mulher começa a se reverter quando ela se torna


independente financeiramente, ou quando busca fora do âmbito familiar uma fonte de
renda independente. Este contexto fica evidenciado quando Sen (2007, p.252), fala
sobre as liberdades substantivas. O autor afirma que “a contribuição da mulher para
a prosperidade da família é mais visível quando ela trabalha fora de casa e recebe um
salário. Ela também tem mais voz ativa, pois depende menos dos outros”.
Um estudo feito por Mamta Murthi, Anne-Catherine Guio e Jean Drezè, e
apresentado por Sen (2007) analisando o senso da Índia de 1981 a 1991, coloca as
liberdades substantivas no foco quando analisa o impacto da participação feminina na
força de trabalho, a incidência da pobreza (e níveis de renda), o grau de urbanização,
[...] variáveis que podem associar-se mais estreitamente à condição de agente das
mulheres. Porém, o estudo levou ao que Sen denominou de “efeito líquido”, quando
essa liberdade substantiva, e os direitos alcançados pela condição de agente das
mulheres, se dissipa diante de uma sociedade em que o homem possui larga
resistência a auxiliar no trabalho doméstico e na criação dos filhos.
O efeito líquido se ameniza quando estas mulheres passam pelo processo de
alfabetização. “Nesse caso, o impacto do ganho de poder e do papel da condição de
agentes das mulheres não perde eficácia em razão de problemas causados pela
inflexibilidade da participação masculina nos cuidados com os filhos e nas tarefas
domésticas” (SEN, 2007, p.256).
Este papel da condição de agente das mulheres acrescenta também ao capital
social adquirido por elas neste processo de empoderamento. Quanto mais se
desenvolve este papel de agente, mais ele se soma ao acúmulo de capital social,
individual e coletivo.
Putnan (1993), pontua o capital social como ganhos obtidos devido as
interações sociais, formais e informais, dos indivíduos e grupos de forma pública em
busca de benefícios compartilhados. Para ele, a base desta argumentação está no
compromisso cívico, para o qual normas e valores que, se compartilhados com
confiança, podem promover cooperação e eficiência, ou seja, o capital social está nas
relações praticadas entre os indivíduos. Esta análise também é realizada por
Fukuyama (2000), Fine (2001) e Barquero (2007), para os quais, tais dinâmicas
relacionais afetam os aspectos políticos, filosóficos e religiosos, amplos e
contraditórios do mundo atual.
12

O empoderamento, apontam Kleba & Wendausen (2009), é um termo de


grande amplitude com muitas faces, pois envolve processos de cognição, emocionais
e atitudinais. O empoderamento é um sentimento de pertencer, ser valorizado e ser
aceito na sociedade. Envolve tanto o nível cognitivo e psicológico como o político, que
é estabelecido pelo autorreconhecimento obtido pelas redes de relações, que podem
fortalecer esse sentimento de autoestima e poder atuante em seu habitus, seja qual
for.
Ainda assim, na atualidade, o uso da palavra gênero, para Pedro (2005, p.78),
“tem uma história que é tributária de movimentos sociais de mulheres, [...] que
acompanha a luta por direitos civis, direitos humanos, enfim, igualdade e respeito”.
Apesar de medidas de desenvolvimento se fundamentarem em fatores
econômicos, renda familiar, índices de consumo e industrialização, que são
importantes, destaca Sen (2017), que não são suficientes, já que não consideram o
fator social que impede a mensuração da capacidade de capital social e
empoderamento. Porém, muitas associações se estabelecem com o intuito de diminuir
esta lacuna.
A forma como se configurou a participação das mulheres nas mais diversas
frentes de lutas, movimentos políticos e sociais, igrejas e associações e
principalmente na organização do Movimento Popular de Mulheres do Paraná, coloca
as agricultoras da AAFEMED - Associação dos Agricultores Familiares e Ecológicos
de Medianeira, como um resultado hibrido desta mistura social, cultural e ideológica
que precedeu a Constituição de 1988 e nos anos seguintes assumiu postura de
contramovimento em favor dos direitos das mulheres rurais, ainda a serem
conquistados.
Quando a AAFEMED foi criada em 2006, com o objetivo de fortalecer as
famílias e auxiliá-las a comercializar seus produtos dentro das exigências da
legislação brasileira, pertinentes a produtos orgânicos ou de cultivo tradicional, dando
assistência técnica, com um estabelecimento adequado à comercialização, pois neste
período, e antes dele, a dificuldade de aceitação do mercado consumidor de produtos
orgânicos não esteticamente padronizados, era muito grande.
A AAFEMED forneceu apoio ao desenvolvimento rural dos agricultores e
agricultoras para que desenvolvessem, com o fruto do seu trabalho, cooperação e
13

associativismo, a sustentabilidade de sua família e seu preparo para dar continuidade


ao meio de sobrevivência e melhoria da qualidade de vida no campo.
Ao longo do desenvolvimento deste estudo será possível observar, porém, que
os resultados da AAFEMED, perpassam aqueles mais aparentes, relacionados em
processos associativos, como os ganhos econômicos, ambientais e sociais. Eles
expõem uma mescla de histórias, raízes, indivíduos, em um processo de descoberta
e construção contínua. Na busca de aguçar e expressar estes resultados, adianta-se
aqui a fala de Lidiane Toniazzo, uma das protagonistas deste trabalho.
Lidiane, que é neta da bisa Lidi, filha da Tere e mãe da Gabriela, como são
conhecidas; uma mulher rural de terceira geração morando em Medianeira, a segunda
mulher ocupando a presidência da AAFEMED, ao ser perguntada, se ser neta e filha
de agricultora, influenciou em sua decisão de voltar para o campo, responde revelando
a profundidade das bases dessas relações e empresta, como metáfora o título deste
trabalho.
[...]para você gostar e fazer uma coisa boa da agricultura, tu tem que ser da
raiz... Pra gente voltar pro sítio, voltar a trabalhar na roça, no campo... a gente
tem que ter uma raiz, né? Raiz de roça, como minha mãe fala, né. Mais raiz
de roça que a minha mãe e a minha vó não tem, né (risos). Então sim, o fato
de elas serem agricultoras... Isso ajuda muito! (LIDIANE, entrevista em 31 de
outubro, 2020).

Ser “raiz de roça”, pode representar um dos elementos basilares do capital


social dessas mulheres rurais da agricultura familiar, como fonte do seu ethos, da sua
dimensão sinérgica e a base da sua agregação social.
A compreensão e o entendimento desta teia fatores e indicadores, impressos
dentro da AAFEMED, atuante no universo da mulher rural, justificam este estudo, que
irá investigar, se efetivamente o trabalho da AAFEMED contribui para o aumento do
capital social e empoderamento, especificamente destas mulheres agricultoras em
prol da sua sustentabilidade.
Para além do registro escrito, o estudo apresenta de forma complementar, um
documentário, que apresenta informações valiosas e complementares das histórias
dessas mulheres, importantes para compreender a caracterização híbrida das
associadas da AAFEMED. Entre outros elementos, a história oral é importante para o
levantamento dos dados apontados, explicando, relatando, o momento em que vivia
o Brasil quando da formação da realidade que culminou com a criação da AAFEMED.
De acordo com Thompson (1998, p.337), “a história oral devolve às pessoas em suas
14

próprias palavras. E ao lhe dar um passado, ajuda-as também a caminhar para um


futuro construído por elas mesmas”.
Em vista destes argumentos, o estudo busca responder a seguinte questão:
Quanto a participação na AAFEMED contribui para o aumento do empoderamento e
do capital social das agricultoras familiares associadas?
Para responder a pergunta do estudo, o objetivo geral foi Investigar como a
participação na AAFEMED contribui no empoderamento e capital social das
agricultoras familiares associadas.
Para melhor entendimento o presente estudo está organizado com introdução
e objetivos, fundamentação teórica, procedimentos metodológicos, resultados e
discussões e considerações finais; seguem ainda, o referencial bibliográfico utilizado
e os anexos.

1.1 OBJETIVOS

Quanto aos objetivos, destaca-se que para Richardson et al. (2012, p.63), o
objetivo geral apresenta o que se pretende alcançar no estudo. Já os específicos
demonstram as etapas a seguir para que o objetivo geral seja cumprido e
recomendam os autores que:

O primeiro objetivo específico seja exploratório, o segundo descritivo e o


terceiro, se necessário seja explicativo. É importante respeitar as regras na
formulação de objetivos de pesquisa: o objetivo deve ser claro, preciso e
conciso; o objetivo deve expressar apenas uma ideia. [...] e deve referir-se
apenas à pesquisa que se pretende realizar. Não são objetivos de uma
pesquisa, propriamente, discussões, reflexões ou debates em torno a
resultados do trabalho. Essas ações são uma exigência de todo trabalho
científico: a revisão dos modelos utilizados.

Os autores indicam a importância de seguir as regras para a formulação dos


objetivos, para evitar gerar outros temas fora do tema original:

Os objetivos devem ser claros, precisos e concisos. O objetivo deve


expressar apenas, uma ideia. Em termos gramaticais, deve incluir apenas um
sujeito e um complemento. Os objetivos devem referir-se, apenas, à pesquisa
que se pretende realizar (RICHARDSON et al., 2012, p.63).
15

1.1.1 Objetivo geral

Investigar como a participação na AAFEMED contribui no empoderamento e


capital social das agricultoras familiares associadas.

1.1.2 Objetivos específicos

a) Realizar discussão teórica relacionando os temas de desenvolvimento


sustentável, empoderamento e capital social;
b) Descrever as ações da AAFEMED para a sustentabilidade das agricultoras
associadas;
c) Investigar como a participação das agricultoras na AAFEMED contribui para o
seu empoderamento e capital social;
d) Elaborar um documentário sobre as mulheres agricultoras da AAFEMED.
16

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

O desenvolvimento sustentável é um conceito que expressa, em apenas duas


palavras, preocupação com o meio ambiente, com os atuais habitantes da Terra e
com as gerações futuras. Relaciona o ser humano com seu planeta, declara que é
responsável pelo equilíbrio desta convivência e, principalmente, pelas consequências
futuras de seus atos. A origem devidamente certificada é explicitada por Veiga (2015,
p.9), e a mais reproduzida quando o assunto é desenvolvimento sustentável: “é a
ambição de que a humanidade venha a atender às suas necessidades atuais sem que
venha a comprometer a possibilidade de que as futuras gerações também possam
fazê-lo”.
A metáfora utilizada por Veiga (1998) e originária de Joan Robinson, costuma
comparar o desenvolvimento ao elefante: difícil de definir, mas muito fácil de
reconhecer. Ainda Veiga (1998, p.11), o desenvolvimento caracterizava-o como “um
processo sistêmico mediante o qual uma economia consegue simultaneamente
crescer, reduzir desigualdades sociais e preservar o meio ambiente (acrescentando:
fácil de falar, difícil de conseguir)”. O âmago da questão do desenvolvimento, e que
deve estar explícita em qualquer visão de sustentabilidade, é garantir que gerações
presentes e futuras tenham as mesmas condições de viver no planeta.
E neste contexto de garantir condições Sen (2017), contribui com o tema
quando discute desenvolvimento como expansão das liberdades substantivas, de se
levar em conta os aspectos sociais da vida humana, muito além dos econômicos, para
descrever desenvolvimento. É preciso ampliar as capacidades humanas no sentido
da evolução do ser. Sobre isso, Veiga (2015, p.15), cita as quatro principais
capacidades que o crescimento deve gerar para se auferir desenvolvimento: “ter uma
vida longa e saudável, ser instruído, ter acesso aos recursos necessários a um nível
de vida digno e ser capaz de participar da vida da comunidade”. E o pré-requisito para
alcançar estes quatros resultados é a liberdade sobre suas próprias escolhas, de
forma que sejam exercidas com plena cidadania para ampliar suas capacidades, e
consciência de suas consequências (SEN, 2017).
17

As análises da sustentabilidade sistêmica de Veiga (2015), e as liberdades


substantivas de Sen (2017), remetem a Sachs (2008) cujo olhar sobre o
desenvolvimento mostra uma adaptação para novas realidades ao longo das últimas
décadas:
O desenvolvimento não se presta a ser encapsulado em fórmulas simples. A
sua multidimensionalidade e complexidade explicam o seu caráter fugidio. Ao
longo dos anos o conceito tem incorporado experiências positivas e negativas
que o fizeram evoluir, refletindo todas as mudanças que vem acontecendo na
sociedade, na política e nas “modas” intelectuais (SACHS, 2008, p.25).

Para Sen (2017), uma concepção adequada de desenvolvimento deve ir além


da acumulação de riqueza, do crescimento do Produto Interno Bruto e de outras
variáveis relacionadas à renda. Sem desconsiderar a importância do crescimento
econômico, há muito além dele, uma vez que desenvolvimento se relaciona com
qualidade de vida e exercícios de liberdades civis. Porém, a desigualdade entre
mulheres e homens restringe de várias formas tais liberdades.
Segundo Sachs (2008), a evolução da ideia de desenvolvimento, no último
meio século, aponta para a sua complexificação, representada pela adição de
sucessivos adjetivos, econômico, social, político, cultural, sustentável – e, o que é
mais importante, pelas novas problemáticas das sociedades globalizadas.
O Relatório Brundtlan da CMMAD – Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (1988), define Desenvolvimento Sustentável como "[...] aquele que
atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as
gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades" (BARBOSA, 2008. p.02).
E, acrescenta que para haver um desenvolvimento sustentável é necessário que todos
tenham suas necessidades básicas atendidas e lhes sejam proporcionadas
oportunidades de concretizar suas aspirações a uma vida melhor.
Para Boff (2015, p.128), “uma sociedade só pode ser considerada sustentável
se ela mesma, por seu trabalho e produção, tornar-se mais e mais autônoma. Se tiver
superado níveis agudos de pobreza ou tiver condições de crescentemente diminuí-la.
Se seus cidadãos estiverem ocupados em trabalhos significativos”.
Considerando a visão do setor agrícola para Martins (2001), ao se referir às
“Diretrizes de Política Agrária e Desenvolvimento Sustentável para o Brasil”,
apresentadas em 1994 pela FAO/INCRA, que enfatiza a dimensão social da
sustentabilidade, e propõe que para alcançá-la, a sociedade brasileira deveria optar
pelo fortalecimento e expansão da agricultura familiar através de um programa de
18

políticas públicas como forma de reduzir os problemas sociais, englobando políticas


agrícolas, industriais e agrárias de curto, médio e longo prazo..

O desenvolvimento sustentável obedece ao duplo imperativo ético da


solidariedade com gerações presentes e futuras, e exige a explicitação de
critérios de sustentabilidade social e ambiental e de viabilidade econômica.
Estritamente falando, apenas as soluções que considerem esses três
elementos, isto é que promovam o crescimento econômico com impactos
positivos em termos sociais e ambientais, merecem a denominação de
desenvolvimento (SACHS, 2008, p.36).

Assim, contempla-se o desenvolvimento sustentável como necessário e


contínuo no meio social e ambiental, uma vez que promove o crescimento econômico
e, acima de tudo, o bem maior que é a qualidade de vida para todos. A vivência prática
envolve em articular, continuamente, políticas que levem em conta todos os princípios
do desenvolvimento sustentável, para gerar a qualidade de vida para todos, proposta
por estes princípios.
Seria necessário debater sobre sociedade sustentável, considerando o tipo de
desenvolvimento que se deve ou quer promover, muito mais do que simplesmente
impor limites ao crescimento.
[...] sustentável é a sociedade ou o planeta que produz o suficiente para si e
para os seres dos ecossistemas onde se situa; que toma da natureza
somente o que ela pode repor; que mostra um sentido de solidariedade
generacional ao preservar para as sociedades futuras os recursos naturais
de que elas precisarão (BOFF, 1999, p.137).

Em oposição a uma banalização e deturpação do conceito de


desenvolvimento, Veiga (2015, p.41) discorre sobre um fenômeno em curso que se
configura em um movimento, é “o processo necessariamente contraditório da
emergência de um novo valor, cujo sentido essencial é de responsabilidade por
oportunidades e limites que condicionarão as vidas das próximas gerações da espécie
humana”. Para tanto, o autor ainda aponta que:
[...] nada impede que sustentabilidade sistêmica da sociedade
frequentemente exija renovadores choques de destruição criativa. Como nos
ecossistemas, o que está em risco é a resiliência do conjunto, não a
durabilidade específica de seus indivíduos, famílias, grupos ou mesmo
espécies (VEIGA, 2015, p.40).

Neste contexto entender as dimensões possíveis da sustentabilidade auxiliam


na concretude das ideias. Sobre as dimensões, Sachs (2002) apresentou oito
dimensões para a sustentabilidade:
19

Tabela 1 – Oito dimensões para a sustentabilidade


Dimensão Descrição
Social Alcance de um patamar razoável de homogeneidade social; distribuição de renda
justa; emprego pleno e/ou autônomo com qualidade de vida decente; igualdade no
acesso aos recursos e serviços sociais
Cultural Mudanças no interior da continuidade (equilíbrio entre respeito à tradição e inovação);
capacidade de autonomia para elaboração de um projeto nacional integrado e
endógeno (em oposição às cópias servis dos modelos alienígenas); autoconfiança
combinada com abertura para o mundo.
Ecológica Preservação do potencial do, capital natureza, na sua produção de recursos
renováveis; limitar o uso dos recursos não renováveis.
Ambiental Respeitar e realçar a capacidade de autodepuração dos ecossistemas naturais.
Territorial Configurações urbanas e rurais balanceadas (eliminação das inclinações urbanas
nas alocações do investimento público); melhoria do ambiente urbano; superação das
disparidades inter-regionais; estratégias de desenvolvimento ambientalmente
seguras para áreas ecologicamente frágeis (conservação da biodiversidade pelo
ecodesenvolvimento).
Econômica desenvolvimento econômico intersetorial equilibrado; segurança alimentar;
capacidade de modernização contínua dos instrumentos de produção; razoável nível
de autonomia na pesquisa científica e tecnológica; inserção soberana na economia
internacional.
Política (Nacional): democracia definida em termos de apropriação universal dos direitos
humanos; desenvolvimento da capacidade do Estado para implementar o projeto
nacional, em parceria com todos os empreendedores; um nível razoável de coesão
social.
Política (Internacional): eficácia do sistema de prevenção de guerras da ONU, na garantia da
paz e na promoção da cooperação internacional; um pacote Norte-Sul de co-
desenvolvimento, baseado no princípio da igualdade (regras do jogo e
compartilhamento da responsabilidade de favorecimento do parceiro mais fraco);
controle institucional efetivo do sistema internacional financeiro e de negócios;
controle institucional efetivo da aplicação do Princípio da Precaução na gestão do
meio ambiente e dos recursos naturais; prevenção das mudanças globais negativas;
proteção da diversidade biológica (e cultural); gestão do patrimônio global, como
herança comum da humanidade; sistema efetivo de cooperação científica e
tecnológica internacional e eliminação parcial do caráter commodity da ciência e
tecnologia, também como propriedade da herança comum da humanidade.
Fonte: Sachs (2002, p.85)

Neste processo de construção Martins (2001), cita que em 1986 a World Found
for Nature promoveu a Conferência de Otawa, na qual ficaram estabelecidos
princípios básicos do desenvolvimento rural sustentável, entre os quais, a integração
entre conservação e desenvolvimento, a satisfação das necessidades básicas
humanas, o alcance da equidade e justiça social, o fornecimento da autodeterminação
social e diversidade cultural e a manutenção da integração ecológica. Baroni (1992),
encara esses princípios com foco no crescimento renovável, a mudança de qualidade
do crescimento, a satisfação das necessidades essenciais de alimentação, energia,
água, saneamento básico e emprego, a garantia de um nível sustentável de
população, a conservação e proteção da base de recursos, a reorientação da
tecnologia e gestão de risco e a reorientação das relações econômicas.
20

O imperativo ético da solidariedade é incluído por Sachs (2002), como


compromisso com as gerações atuais e futuras, para promover impactos positivos que
podem ser entendidos como melhoria do capital social e empoderamento. O objetivo
não é competir com o consumismo concentrador de renda e riquezas; mas literalmente
ser uma economia solidária, preocupada mais em produzir uma vida melhor para
todos os envolvidos.
O desenvolvimento como apoio ao capital social e o empoderamento, sempre
se fará presente em suas formas e controvérsias. O foco aqui é destacar que o
desenvolvimento e a sustentabilidade também se inserem em todas as atividades
produtoras do planeta, inclusive na agricultura familiar.

2.1.1 Desenvolvimento sustentável na ótica da equidade de gênero

São muitas as visões que colocam o desenvolvimento em diferentes prismas,


propiciando vários olhares sobre o tema. Sen (2010), ressalta que o enfoque nas
liberdades humanas contrasta com visões mais restritas de desenvolvimento, como
as que identificam desenvolvimento como o crescimento do Produto Nacional Bruto
(PNB), aumento de rendas pessoais, industrialização, avanço tecnológico ou
modernização social (SEN, 2010, p.16).
Ainda para o autor, as liberdades humanas são a base para o desenvolvimento,
em especial as liberdades individuais. E só há liberdade se o desenvolvimento se fizer
em condições de expansão e respeito a essas liberdades, melhorando o potencial
para os indivíduos cuidarem de si mesmos e mudarem as realidades à sua volta, de
outras pessoas e da comunidade como um todo. Para Sen (2000, p.10), “o
desenvolvimento consiste na eliminação de privações de liberdade que limitam as
escolhas e as oportunidades das pessoas de exercer ponderadamente sua
capacidade de agência”. Ao se referir à questão específica da mulher o autor
acrescenta que:

A condição de agentes das mulheres é um dos principais mediadores da


mudança econômica e social, e sua determinação e suas consequências
relacionam-se estreitamente a muitas das características centrais do
processo de desenvolvimento (SEN, 2007, p.263).
21

Nessa perspectiva da condição de agente das mulheres, muitas organizações


e instituições estão projetando suas linhas de trabalho e projetos nas ações que levem
a uma maior equidade de gênero em âmbito global. Há uma sinergia no que tange a
projetos locais, que busquem desenvolver o empoderamento de mulheres, urbanas e
rurais, negras, brancas e indígenas. Entre estas organizações há um grande destaque
às ações da ONU - Organização das Nações Unidas, que junto com inúmeros
objetivos, trabalha o desenvolvimento sustentável como um todo, com vistas à
conscientização mundial dos principais temas em comum entre as nações.
A ONU também promove o empoderamento das mulheres, já que a liderança
feminina promove igualdade de gênero, oportunidades iguais, garantia de saúde,
segurança e liberdade em cenários de violência e pleno controle da vida, sendo este
o quinto dos 17 importantes ODS - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da
Agenda 2030 (ONUMULHERES, 2020).
Os ODS possuem todos os olhares voltados para as questões ambientais, as
minorias e a necessidade de erradicar, além da pobreza, violências históricas, como
o racismo, a homofobia e a luta pela equidade de gênero. Buscam ampliar os alcances
já feitos para garantir que acabe a discriminação com mulheres e meninas em
qualquer canto do mundo. Ainda há grandes desigualdades, em algumas regiões e
países mais que em outros, sendo negado o direto às mulheres de igual acesso a
direitos básicos.
Outro órgão de expressão mundial que possui foco no desenvolvimento
sustentável e nas questões de gênero é o PNUD - Programa das Nações Unidas para
o Desenvolvimento, que possui três âmbitos de desenvolvimento: erradicação da
pobreza em todas as suas formas e dimensões, aceleração das transformações
estruturais e construção de resiliência a crises e conflitos. A atuação do PNUD em
todo o mundo é no sentido de apoiar os países a erradicar a pobreza, reduzindo
significativamente as desigualdades e a exclusão social. Dentro destes âmbitos, o
PNUD possui seis eixos transversais para o cumprimento de seus objetivos, dentre os
quais o sexto é empoderamento das mulheres e igualdade de gênero.

Cada eixo inclui uma combinação de assessoria sobre políticas, assistência


técnica, finanças e programas. Cada um tem o potencial de desvendar o
caminho para o desenvolvimento sustentável. No entanto, nenhum eixo será
efetivo sozinho. Precisamos de todos eles para alcançar os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável – ODS (UNDP, 2017, p.4).
22

Territorialmente, nos países do Mercosul, é importante citar a Reunião


Especializada da Agricultura Familiar do Mercado Comum do Sul - REAF, órgão
assessor do Grupo Mercado Comum, criado em 2004, como um espaço de diálogo
regional voltado à promoção do fortalecimento institucional e da construção conjunta
de políticas públicas para a agricultura familiar e a facilitação da comercialização para
seus produtos. A REAF dá visibilidade para a agenda alimentar nos países do
Mercosul e garante segurança e soberania alimentar e nutricional às suas populações
a partir do reconhecimento da agricultura familiar como segmento social, econômico
e estratégico (REAF, 2020).
A pauta sobre equidade de gênero passou a fazer parte das discussões da
REAF em 2006, com um conjunto de ações de promoção da igualdade das mulheres
nos diversos países participantes, através da Comissão de Equidade de Gênero da
Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar (REAF) do Mercosul.
No Brasil, um trabalho em andamento sobre equidade de gênero é feito pelas
cooperativas associadas à UNICAFES - União Nacional das Cooperativas da
Agricultura Familiar e Economia Solidária, que tem como missão promover
desenvolvimento econômico, inclusão social da agricultura familiar e economia
Solidária, fortalecendo as cooperativas, articulando os ramos, representando este
modelo de organização.
Por ser uma cooperativa, a UNICAFES tem por finalidade principal a prestação
de serviços às suas filiadas. Desta forma, a UNICAFES mantém uma base de
profissionais que oferecem entre outros serviços para suas filiadas as “ações de
gênero e geração” (UNICAFES, 2020).
Para Maria da Graça Amorim, coordenadora de mulheres da
Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do
Brasil (CONTRAF-Brasil), “um grande desafio para as mulheres no meio rural é a
construção de políticas públicas para combater a desigualdade no campo, que está
relacionada à pobreza rural” (ONUMULHERES, 2018).

[...] o empoderamento das mulheres do campo também exige políticas


diferenciadas de assistência técnica e extensão rural. Muitas vezes, o que as
mulheres querem não é o mesmo que os maridos e filhos querem”. Outra
demanda é que seja retomado o programa de habitação rural,
“importantíssimo para garantir autonomia, empoderamento e se livrar da
violência (ONUMULHERES, 2018).
23

As desigualdades, pobreza, baixa formação, pouca possibilidade de aquisição


da terra, são características do patriarcado muito fortes na cultura e economia latina,
da qual o Brasil faz parte. O protagonismo, para as minorias, só poderá se dar em
maior ou menor grau, em condições mínimas de liberdade (SEN, 2010). Na
complexidade de um conceito mais amplo de sustentabilidade:

[...] vivemos igualmente em um mundo de privação, destituição e opressão


extraordinárias. Existem problemas novos convivendo com os antigos – a
persistência da pobreza e de necessidades essenciais não satisfeitas, fomes
coletivas e fome crônica muito disseminadas, violação de liberdades políticas
elementares e de liberdades formais básicas, ampla negligência diante dos
interesses e da condição de agente das mulheres e ameaças cada vez mais
graves ao nosso meio ambiente e à sustentabilidade de nossa vida econômica
e social (SEN, 2010, p.09).

Mulheres rurais querem e precisam de trabalho, de crédito, de políticas de


habitação, de vida sem violência, de direito à propriedade, de voz dentro da família e
de liberdade de escolha. Reflete o autor a seguir, um pouco das marcas do
patriarcado:
A propriedade da terra e capital nos países em desenvolvimento tende a
concentrar-se acentuadamente nos membros do sexo masculino da família.
Em geral, é muito mais difícil para uma mulher iniciar um empreendimento,
mesmo de proporções modestas, por não possuir bens que possam servir de
garantias aos credores (SEN, 2007, p.261).

Considerando as ações das organizações para alcançar os diversos grupos e


segmentos estratégicos que trabalham as questões das mulheres, no sentido de
alcançar maior equidade de gênero para diminuir a pobreza, a violência e aumentar a
conscientização ambiental; a visão que se tem é que as mulheres estão passando de
ser posse, objeto e mão-de-obra não computada na propriedade, para um papel de
protagonismo inédito, tanto como papel social quanto como resultado econômico.

Pode-se dizer que nada atualmente é tão importante na economia política do


desenvolvimento quanto um reconhecimento adequado da participação e da
liderança política, econômica e social das mulheres. Esse é, de fato, um
aspecto crucial do “desenvolvimento como liberdade (SEN, 2007, p.263).

Veiga (2006), corrobora com esta visão, que Sen chama de liberdade
substantiva, abordada no decorrer da dissertação:
[...] a necessidade de se reconhecer o papel das diferentes formas de liberdade
no combate às absurdas privações, destituições e opressões existentes em um
mundo marcado por um grau de opulência que teria sido difícil até mesmo
imaginar um ou dois séculos atrás [...] pobreza e tirania, carência de
oportunidades econômicas e destituição social sistemática, negligência dos
24

serviços públicos e intolerância ou interferência de Estados repressivos


(VEIGA, 2006, p.33-34).

Todavia, como Tedeschi1 (2014, p.36), coloca muito bem em sua pesquisa
sobre as mulheres no meio rural do noroeste do Rio Grande do Sul, quando os
diversos “enfoques sobre desenvolvimento consideram de fato as mulheres como seu
agente econômico não histórico, tem tornado invisível e subvalorizado a gestão, o
direito e a participação política das mesmas”.
Observar que o papel das mulheres cresceu nas propriedades rurais da
agricultura familiar, no entanto, não significa seguramente que as famílias estão
mudando sua forma de pensar em relação ao papel da mulher. Ao contrário, pode
traduzir apenas que “a participação da mulher se tenha ampliado muito mais pela
necessidade de uma força de trabalho para desempenhar o conjunto de atividades do
que por uma ‘tomada de consciência de gênero” (TEDESCHI, 2014, p.129).
Mas o que se pode perceber, pelo estudo de Tedeschi (2014), é que ocupar o
espaço nas diversas forças de trabalho se constitui um caminho promissor para
alcançar maior equidade de gênero na agricultura familiar. Sem essa redistribuição
das forças de trabalho, em que também o homem participe da rotina da casa e da
criação dos filhos, diminuindo a dupla jornada de trabalho das agricultoras, é difícil
falar sobre empoderamento feminino de fato.
Este é o contexto atual em que se discute equidade de gênero, em especial na
agricultura familiar. Sabe-se que o fato de as organizações nacionais e internacionais
abraçarem esta causa das mulheres rurais, possui um cunho social, mas também um
forte olhar econômico sobre esta realidade. Cabe a essas organizações ajudar as
famílias rurais a construir novas premissas com base em novas relações sociais
cotidianas de gênero, superando velhos paradigmas do patriarcado e da subordinação
da mulher. É preciso sair da invisibilidade e ir definitivamente para a luz.

2.2 AGRICULTURA FAMILIAR E RURALIDADE

1 DO SILÊNCIO À PALAVRA – Histórias e memórias de mulheres na perspectiva de gênero no meio


rural do noroeste do estado do Rio Grande do Sul. Um estudo realizado por Losandro A. Tesdeschi
sobre as mulheres rurais da região já citada, em relação à sua participação em espaços públicos.
Constituiu-se de oficinas com a participação das famílias de agricultores, sindicato das trabalhadoras
rurais, movimentos de mulheres e grupo de educadores.
25

O caráter de família é definido por Chayanov (1974, p.47), como "[...] um dos
principais fatores na organização doméstica, totalmente determinado pela
disponibilidade dos membros da família”. Esse caráter familiar dava base a todos os
serviços da propriedade, tanto no campo, com os pequenos e grandes animais,
quanto ainda com os próprios afazeres domésticos, dos quais o papel da mulher era
fundamental. Esta base familiar continuou ao longo dos anos sendo o cerne da
agricultura familiar como a conhecemos hoje, sem uma grande evolução nos papéis
que cada membro da família exerce no processo produtivo.
Quando os camponeses foram, pela primeira vez, nominados com o termo
agricultores familiares no Brasil, tratava-se de uma categorização pautada em
algumas variáveis que respondiam a necessidades de sobrevivência destas famílias
rurais, e que viriam a propiciar novas oportunidades de sobrevivência para elas.

No Brasil, o debate sobre a agricultura familiar ganha força a partir do final


dos anos 1980 e início dos anos 1990, sendo que a emergência da expressão
"agricultura familiar" parece ocorrer, simultaneamente, nas esferas política e
acadêmica (PLEIN, 2010, p.103).

A agricultura familiar é caracterizada por Abramovay (1997), como aquela em


que a gestão, a propriedade e a maior parte do trabalho vêm de indivíduos que
mantêm entre si laços de sangue ou de parentesco, como o casamento. Apesar de
muitos autores adotarem linhas de pensamento diferentes, estes três atributos básicos
de gestão, propriedade e trabalho familiares, estão presentes na maioria delas.
Ponderam os autores supracitados, que a agricultura familiar tem uma dinâmica
toda própria, devendo, portanto, ser analisada de forma específica dentro do contexto
de desenvolvimento sustentável, tão importante que é definida em lei.
Segundo o Decreto 9.064 de 31 de maio de 2017 a Unidade Familiar de
Produção Agrária - UFPA e o empreendimento familiar rural deverão atender aos
seguintes requisitos:

I - Possuir, a qualquer título, área de até quatro módulos fiscais;


II - Utilizar, no mínimo, metade da força de trabalho familiar no processo
produtivo e de geração de renda;
III - auferir, no mínimo, metade da renda familiar de atividades econômicas
do seu estabelecimento ou empreendimento; e
IV - Ser a gestão do estabelecimento ou do empreendimento estritamente
familiar.
§ 1º O disposto no inciso I. não se aplica ... extrativistas, pescadores, povos
indígenas, integrantes de comunidades remanescentes de quilombos e
comunidades tradicionais.
26

§ 2º Na hipótese de pescadores artesanais, de aquicultores, de maricultores


e de extrativistas que desenvolvam tais atividades não combinadas com
produção agropecuária,
inciso I ... a área do estabelecimento será considerada igual a zero.
Decreto 9.064 de 31de maio de 2017 (consulta maio/2019  Art. 3º)

Essa classificação ampliou as atividades dos agricultores rurais, trazendo para


dentro da agricultura familiar as categorias afins que estavam mais próximas, mas não
necessariamente iguais.

A incorporação e a afirmação da noção de agricultura familiar mostraram-se


capaz de oferecer guarida a um conjunto de categorias sociais, como, por
exemplo, assentados, arrendatários, parceiros, integrados as agroindústrias,
entre outros, que não mais podiam ser confortavelmente identificados com as
noções de pequenos produtores ou, simplesmente, de trabalhadores rurais
(SCHNEIDER 2003, p.100).

Esta realidade é pouco discutida no mundo rural brasileiro, mas o país pode
chamar de agricultura familiar a quase totalidade de propriedades rurais. Por isso, se
torna necessário considerar outras variáveis para separar o que seria agricultura
familiar do restante das propriedades rurais brasileiras.
A permanência do rural, enquanto espaço integrado, porém específico e
diferenciado, é reforçada quando se leva em conta as representações sociais a
respeito do meio rural. Wanderley (2001, p.32), defende que “o mundo rural se move
em um espaço específico, o espaço rural, entendido em sua dupla face”. Primeiro
enquanto um espaço físico diferenciado, como construção social do espaço rural, das
formas de dominação social, estrutura de posse e uso da terra e outros recursos
naturais. Em segundo lugar, enquanto um lugar de vida, isto é, lugar onde se vive
particularidades do modo de vida e referência identitária e lugar de onde se vê e se
vive e interpreta o mundo.
Aponta Wanderley (2001), que a ruralidade é um modo de vida, no qual a
socialização tem pertinência e sentimento de pertencimento, e quando as relações
internas intrínsecas, culturais e históricas são específicas do mundo rural, onde há
muito que avançar no meio rural, conforme já destacado pelos autores.
O sentimento de pertencimento à terra é inserido à discussão por Medeiros
(2017) e Wanderley (2001), tendo o agricultor familiar como parte da própria
preservação do meio ambiente e deste espaço de vida. Abramovay (2000), por sua
vez, dá a este mesmo espaço de vida outra noção de valor, mais contemporânea,
muito além dos conceitos tradicionais de progresso e urbanização. O valor que a
27

ruralidade vem adquirindo, define para os agricultores quase que um estilo de vida,
nascido das raízes culturais dos antepassados, e sendo considerado um patrimônio
da agricultura familiar.
As decisões e opções que tais famílias possuem, destaca Schneider (2001), se
fundamentam por suas redes de relações sociais, econômicas e culturais em seu
espaço rural. Se esse espaço rural expandir isso afetará a produção agrícola, o tipo
de conhecimento exigido e a diversificação de cultivo.
Este universo de pluriatividades na agricultura familiar é chamado por Graziano
da Silva (1999, p.170) de o “Novo Rural”.

Este Novo Rural, como bem o temos denominado, pode ser também
resumido em três grandes grupos de atividades: a) uma agropecuária
moderna, baseada em commodities e intimamente ligada às agroindústrias;
b) um conjunto de atividades não-agrícolas, ligadas à moradia, ao lazer e a
várias atividades industriais e de prestação de serviços; c) um conjunto de
novas atividades agropecuárias, localizadas em nichos especiais de
mercados.

Esse novo rural implica em um meio dinâmico de pessoas que têm ali o seu
lugar e sentido de vida e de existência e sobrevivência, seu lugar de trabalho e
sustentabilidade, e não um investimento temporário ou para agregação de capital
econômico.
A relevância da agricultura familiar vai além da economia e da geração de
renda, posto que deve ser destacada a questão social e cultural desse modelo de
produção, pois o agricultor familiar tem uma relação diferente com a terra, mais
próxima, com mais tradição familiar, fazendo parte da manutenção da cultura local.
Neste universo do novo rural, assim como anteriormente, há uma categoria
social, cuja visibilidade, valorização e importância continua subjugada: trata-se das
mulheres rurais, as agricultoras, que são parte fundamental do sucesso deste modelo
de agricultura familiar, mas que permanecem à sombra do patriarcado dominante na
ruralidade. É contra este contexto de privilégios em detrimento de minorias, entre elas
a de mulheres rurais, que se insurge um novo lugar de fala que ao longo das últimas
décadas tenta romper com a prática da subordinação feminina.
O Jornal Mensageiro (1993), importante veículo jornalístico escrito do município
de Medianeira e região, com 46 anos de existência, que acompanha, ainda que
timidamente, a trajetória das mulheres rurais de toda a região em que distribui o
semanário, na edição de 11 de março de 1993, alusiva ao Dia Internacional da Mulher,
28

fez uma enquete a algumas agricultoras, ao que as respostas indicam similaridades


entre a falta de equidade na área urbana e rural, mas que marcadamente mostram o
quanto o ambiente familiar era opressor para estas mulheres rurais:
Apesar dos avanços, das conquistas que conseguiram, existe ainda muita
discriminação em relação a mulher. Um exemplo disso são os inúmeros
casos de mulheres que são violentamente espancadas pelos maridos, por
vergonha ou por medo, muitas vezes não denunciam, deixando-os livres e
impunes. Isso não acontece somente com mulheres de classe social baixa,
mas também com as de classe alta. Outra discriminação contra a mulher é a
exploração do corpo através da propaganda, muitas vezes fazem isso por
questão de sobrevivência ou de ilusão. Também no mercado de trabalho,
“padrão de beleza” e “boa aparência”, discriminação racial, teste de não
gravidez, como se a maternidade fosse um empecilho. A preferência que é
dada aos homens em relação a administração, a falta de confiança e
credibilidade da mulher, profissão não reconhecida como dona de casa sem
direitos... A questão do machismo, muitas mulheres têm que se submeter ao
“chefão”... Essas são apenas algumas das discriminações que a mulher sofre.
(Iraci Maino, Presidente do Movimento Popular de Mulheres do Paraná em
Medianeira, entrevista ao Jornal Mensageiro, em 11 de março, 1993).

A mulher é ainda muito discriminada, porque o machismo nunca deixou de


existir, e muitas vezes a discriminação acontece até mesmo dentro da própria
casa, e algumas vezes por parte da Igreja, e até por outras mulheres. (Dejane
Severguinini, agricultora, entrevista ao Jornal Mensageiro, em 11 de março,
1993).

A mulher ainda é muito discriminada, tanto em seu local de trabalho como em


muitos outros locais, onde a maioria das vezes o homem também tem mais
preferência. Ela também é muito discriminada em casa, onde muitas vezes
não é reconhecido seu valor. (Amalia Danetto, agricultora, entrevista ao
Jornal Mensageiro, em 11 de março, 1993).

Outro estudo que merece destaque pela similaridade com a realidade deste
estudo de caso foi realizado por Tedeschi (2014), que fez uma aprimorada pesquisa
sobre as famílias da agricultura familiar do noroeste do Rio Grande do Sul, e sua
análise sobre histórias e memórias de mulheres na perspectiva de gênero capturou
dados significativos para compreender como o meio rural perpetua a subordinação
feminina no cotidiano da família e da propriedade.
Na análise de Tedeschi (2014, p.61), “a agricultora não permaneceu no âmbito
do lar, cuidando dos filhos, mas sempre acompanhou em igualdade de função o
marido na produção, cumprindo uma rotina que começa antes mesmo do nascer do
sol”. Contudo, no campo das decisões e dos espaços de poder, ainda cabe ao homem
o poder de fala e de representação da família.
Mas, para Tedeschi (2014, p,128), o que mais marcou esta parte do estudo
foram declarações comuns como:
29

As mulheres ajudam a discutir em casa, mas são os homens que expõe as


ideias; “as mulheres tem medo de falar”; “a culpa é dos homens que convidam
as mulheres para ir às reuniões somente na última hora e nem explicam para
onde vão e porque”; os homens são mais livres, as mulheres sempre estão
presas nos afazeres domésticos”; Este sentimento de “medo” retrata a real
condição da mulher agricultora, pois na prática, ela é tratada (e condicionada
socialmente para se ver) como uma pessoa “inferior”. Cabe aos homens o
poder da representação e do discurso. São eles que devem discutir, dar
ideias, participar, executar.

Em menor número, o estudo de Tedeschi (2014), mostrou que as famílias que


desenvolveram um projeto de agroindustrialização e que aumentaram o seu ganho
financeiro em função da nova atividade, se obrigaram a rever a distribuição do
trabalho pela sua especialização, sendo o papel da mulher muito importante nesta
nova configuração
Neste contexto, o papel da mulher adquire importância muito acima do
reconhecimento que lhe vem sendo dado no espaço rural. A mulher tem importância
fundamental, dada a contribuição com o seu trabalho e por meio de sua intervenção
em processos decisórios, para o desenvolvimento sustentável da agricultura familiar
e sua constituição enquanto base da vida rural constituída.
Para Tedeschi & Colling (2015), as mulheres rurais, no contexto do trabalho,
faziam parte relevante desta discussão e ganhavam força nos movimentos de luta do
sindicalismo agrário desde a década de 1980, em busca de fortalecer as bases
políticas para a reivindicação de seus direitos sociais. Todavia, o papel das mulheres
rurais ainda carece de ser reconhecido de fato, para que possa ser, dessa forma,
respeitado de direito. Há que se dar luz ao papel destas protagonistas, cuja relevância
é decisiva na agricultura familiar. Que possam ter oportunidades de conhecimentos
que subsidiem seu papel de liderança na lida da propriedade, reconhecimento e
respeito do seu núcleo social e participação nas decisões financeiras, em posição de
equidade com os membros masculinos da família.

2.3 COOPERAÇÃO E RECIPROCIDADE NA AGRICULTURA FAMILIAR

A agricultura familiar tem enfrentado o distanciamento cada vez maior da


agricultura tradicional em meio à crise civilizatória em que está inserida a
30

contemporaneidade, que se dirige cada vez mais ao caminho da exploração


predatória da natureza, usando como pretexto o aumento da produção de alimentos
para o mundo. Não se descarta que a agricultura familiar também faz agricultura
tradicional, mas a proporção, mesmo em termos de área, uso de tecnologias para
maior rendimento e ganhos de produção é descabível de comparativos.
Para a agricultura familiar, no conceito de Wanderley (2001) e Abramovay
(1992), restou assumir o seu papel de produtora de alimento pronto para a mesa, o
chamado alimento de verdade, a agroindustrialização de seus próprios produtos e a
comercialização por meio do associativismo e da solidariedade com seus pares,
juntamente com outros pequenos produtores que possuem o mesmo viés produtivo
(SINGER, 2013). Não se trata de um papel de resignação, mas de visão de
oportunidades outras que não a agricultura do Agro (“Tec e Pop”). Utilizar o
associativismo, a cooperação, a reciprocidade e a confiança como formas de obter
maiores resultados financeiros e ganhar novos mercados passa a ser alternativa
estratégica para tornar a propriedade viável e manter o produtor e sua família no
campo.
Sobre isso, Abramovay( 1992, p.102), contribui de forma fundamental:
A família e a comunidade de certa forma, emprestam sentido à atividade
camponesa. Trabalho e vida não são duas dimensões cindidas: as crianças,
as mulheres, enfim um organismo único produz com base no objetivo de gerar
não só os meios de vida, mas sobretudo um modo de vida. A unidade
indissolúvel da existência está também no conjunto de significados vitais que
os elementos básicos do trabalho incorporam; a terra não é um simples fator
de produção, as outras unidades produtivas não são apenas concorrentes e
os comerciantes não são só sanguessugas.

Destaca Singer (2013), que esta postura passa pela forte ligação com sua
história, preocupação com as boas práticas de produção, respeito ao meio ambiente
por meio do cumprimento da legislação, mas principalmente pelo enraizamento à
terra, como ambiente de vivência e de convívio com sua família, vizinhos e
comunidade. E é na qualidade das relações de cooperação e reciprocidade, que há a
possibilidade de compor um cenário pelo qual o econômico possa ter como adjetivo a
solidariedade, se apresentando como uma saída para o desenvolvimento da
agricultura familiar solidária.
Para Higgins (2005, p.29), as relações de cooperação e reciprocidade [...]
“constituem um patrimônio ‘não visível’, mas altamente eficaz, a serviço dos sujeitos
sociais, sejam estes individuais ou coletivos”. A conclusão a que ele mesmo nos leva
31

é de que a cooperação e reciprocidade são as bases das relações, e o combustível


da confiança que fundamenta fortemente o aumento de capital social e do
empoderamento.
Putnam (2006), em seu estudo de 20 anos na Itália sobre capital social,
chegou a conclusões importantes sobre como a intangibilidade do capital social se
encontra nas inter-relações humanas de reciprocidade, principalmente de confiança.
A confiança social, para Putnam (2006), é fundamental para o capital social e
pode emanar de duas fontes conexas: as regras de reciprocidade e os sistemas de
participação cívica. A mais importante dessas regras é a da reciprocidade.

Existem dois tipos de reciprocidade, por vezes chamados de reciprocidade


"balanceada" (ou "específica") e reciprocidade "generalizada" (ou "difusa"). A
primeira diz respeito à permuta simultânea de itens de igual valor; por
exemplo, quando colegas de trabalho trocam seus dias de folga ou quando
políticos combinam apoiar-se mutuamente. A reciprocidade generalizada diz
respeito a um a contínua relação de troca que a qualquer momento apresenta
desequilíbrio ou falta de correspondência, mas que supõe expectativas
mútuas de que um favor concedido hoje venha a ser retribuído no futuro
(PUTNAM, 2006, p.181).

Os atos isolados são altruísticos a curto prazo, mas quando tomados em


conjunto, normalmente beneficiam a todos os participantes, e estão, de maneira geral,
associados a um amplo sistema de intercâmbio social. Para Putnam (2006), quanto
mais elevado o nível de confiança numa comunidade, maior a probabilidade de haver
cooperação, que age de maneira a se realimentar.
Os estudos realizados por Putnam (2006, p.182), apontam que “as relações
continuadas frequentemente se revestem de um significado social que encerra fortes
expectativas de confiabilidade e abstenção de oportunismo”. As formas de capital
social se multiplicam com o uso e definham com o desuso, se acumulam com a
formação de círculos virtuosos, relações que gerem cada vez mais confiança,
reciprocidade, empoderamento e espírito de cooperação pessoal e coletivo, e que
sobretudo tragam benefícios sociais e econômicos a todos da comunidade. Mas o
capital social também pode gerar círculos viciosos, quando as relações de cooperação
descambam para uma cooperação cujo objetivo é apenas juntar interesses, sem o fim
maior de gerar pertencimento. Dessa forma, o capital social acumulado nem sempre
é positivo.
Sair em defesa do comunitaríssimo como posição política, é para Portes (2000),
considerado legítimo. Entretanto, há necessidade de investigações empíricas para
32

avaliar seus diferentes efeitos em seus amplos aspectos, tanto os positivos como os
negativos.
Já Colleman (1988), foi o autor que deu mais visibilidade ao tema. Argumentou
que, para gerar capital social, dependia das expectativas, redes de comunicação e de
normas e sanções imposta pelo grupo. Defendeu a questão da aquisição da dádiva,
e acreditava que o Estado não serve como mediador da criação de capital social. Seu
foco foi que a educação é um condicionador para aumentar capital social pois pode
gerar capital humano. Discutiu a intangibilidade de capital social, considerando que
ele está intrínseco às relações, de forma inseparável da estrutura social.
Neste contexto, a economia solidária segundo Singer (2013), pode ser uma
alternativa superior ao capitalismo, no sentido de empoderar os pequenos agricultores
para se tornarem produtores, poupadores, consumidores dentro do seu contexto e ter
uma vida melhor. A economia solidária segue o preceito de que as práticas e os
valores das iniciativas econômicas solidárias, podem fazer os agricultores familiares
assumirem a condição de sujeitos de sua transformação social, possuindo relações
com outros sujeitos e grupos, o que em consequência possibilita distribuição de renda
e igualdade social e a formação de seu capital social.
A economia solidária se traduz em “um novo modo de produzir e viver em
cooperação de maneira sustentável. Um modo de vida material e simbólico que tem
por base relações, princípios e sentimento de solidariedade radical” (SANTOS;
NASCIMENTO, 2018, p.15).
A cooperação e a reciprocidade das relações são a base das iniciativas
econômicas solidárias pautadas na confiança, o que pode fortalecer a agricultura
familiar com base comunitária, e promover um modo de vida sustentável, com alto
capital social e empoderamento no espaço rural tanto de homens como de mulheres.
Neste aspecto, Polanyi (2000), acrescenta que “a reciprocidade atua
principalmente em relação à organização sexual da sociedade, isto é, família e
parentesco, e a redistribuição é importante principalmente em relação a todos aqueles
que têm uma chefia em comum e têm, assim, um caráter territorial” (POLANYI, 2000,
p.67).
A reciprocidade e a cooperação, são típicas da natureza humana. “Na medida
em que o ser humano é um ser social há, em qualquer coletividade humana, uma
tendência ou propensão básica para cooperar” (DE FRANCO, 2001, p.20).
33

Mas esta propensão só se concretiza socialmente na medida em que os


modos de regulação de conflitos sejam democráticos, construtivos e com um forte
senso de coletividade. Ainda De Franco (2001, p.25), afirma que “está propensão
jamais se ampliará socialmente se os padrões de organização forem hierárquico-
verticais e se os modos de regulação de conflitos forem autocráticos, baseados na
violência e na coerção”.
Quando a reciprocidade e a cooperação se dão entre uma pessoa e outra, ou
entre uma pessoa e um grupo, ou até entre grupos, o que se observa é um forte
sentimento de confiança entre ambas as partes. A confiança é um valor coletivo, que
afeta também o capital social e o empoderamento, e para que se desenvolvam
depende das relações que são articuladas pelos atores envolvidos (GRANOVETTER,
1992).
O alerta é que nem sempre é uma qualidade positiva, visto que em algumas
situações a confiança acaba quando a relação de interesse deixa de existir. A
reciprocidade sempre deve ser considerada como elemento decisivo para gerar o
capital social e o empoderamento, pois propicia a participação cívica de instituições
de maneira voluntária e cooperativa (ABRAMOVAY, 2000).
Esse posicionamento é defendido por Polanyi (2000) e Putnam (1993), pela
importância que a cooperação e o compromisso, como objetivos comunitários, afetam
e sustentam os fatores econômicos e a sustentabilidade.
Putnam (1993), indica que os sistemas de participação cívica são uma forma
essencial de capital social, sendo que quanto mais desenvolvidos forem esses
sistemas numa comunidade, maior será a probabilidade de que seus cidadãos sejam
capazes de cooperar em benefício mútuo. As associações comunitárias, as
cooperativas, os clubes de serviço e desportivos, os grupos de voluntariado e afins
representam o que se constitui um elo fundamental da interação horizontal do
empoderamento com o capital social. Os sistemas verticais, se constituem em
hierarquizar os processos, governanças, meios de comercialização, e outros que
possam ser implementados para ganho ou organização por escala.
A verticalização salientada por Putnam (2006, p.183), mostra que “por mais
ramificada e por mais importante que seja para seus membros, é incapaz de sustentar
a confiança e a cooperação social". Ao passo que fluxos horizontais costumam ser
mais confiáveis, por dar mais transparência ao processo de cooperação, gerar mais
34

confiança entre as partes envolvidas e evitar a exploração por alguma das partes
sobre as outras.
A confiança, para Putnam (2006, p.180), “promove a cooperação. Quanto
mais elevado o nível de confiança numa comunidade, maior a probabilidade de haver
cooperação. E a própria cooperação gera confiança”. Esta pode emergir das normas
de reciprocidade vinculadas aos valores e nos sistemas de participação cívica, que
por sua vez criam a possibilidade de empoderamento e melhoria nas relações e
decisões. Nesse contexto, normas serão aceitas e seguidas com o objetivo de evitar
oportunismos.
Cooperação e confiança também são a base das relações na agricultura
familiar brasileira, que possui características muito plurais, de acordo com as diversas
regiões geográficas, por si só muito distintas. A característica principal, no entanto, o
nome já revela, é de organização familiar. Via de regra, não separa produção, gestão
e comercialização, e todos os membros são participantes ativos, ainda que com
diferentes tarefas e responsabilidades.

O peso da produção familiar na agricultura faz dela hoje um setor único no


capitalismo contemporâneo: não há atividade econômica em que o trabalho
e a gestão estruturam-se tão fortemente em torno de vínculos parentescos e
donde a participação de mão-de-obra não contratada seja tão importante
(ABRAMOVAY, 1992, p.209).

A dinâmica territorial, por sua vez, tem participação decisiva na vocação


produtiva, sendo que a produção e comercialização normalmente são feitas via
associativismo e/ou economia solidária. Basso (2013), estabelece um sistema de
classificação que determina os tipos de racionalidade produtiva: a convencional (com
forte ligação ao mercado, informatizados, usam tecnologias, associados a
cooperativas com fortes relações entre os membros de seu grupo); não-convencional
(orientados para as práticas ecológicas, comercialização em mercados locais, nichos
orgânicos com grande diversificação de culturas e baixa tecnologia, voltados mais ao
consumo do que ao mercado), e de transição (entre os dois primeiros).
Na análise apresentada, a racionalidade convencional e a não-convencional
são as que trabalham em cooperação, que praticam a comercialização em sistema
associativista e participam de grupos de economia solidária, num sistema de
confiança entre os atores, como forma de enfrentamento a economia mercantilista.
35

[...] a saída lógica foi organizar os pequenos agricultores em empresas


solidárias que realizassem no nome delas as compras e as vendas,
proporcionando-lhes com isso o que os economistas chamam de poder de
mercado, além de ganhos de escala (SINGER, 2001, p.106).

Para Basso (2003, p.193), que “os vínculos de cooperação, por um lado,
valorizam a reciprocidade entre as famílias, por outro, estão assentados na redução
dos custos de produção”, pois se utilizam dessa cooperação no contexto do trabalho
familiar e do grupo, da logística, da comercialização e distribuição. Associados a
empresas solidárias, ganham visibilidade, credibilidade e competitividade, pois
passam a comercializar sua produção como produto final para o mercado consumidor,
em comunicação direta com ele.

A agricultura em grupo proporciona condições para obtenção de resultados


na economia de escala, na participação e capacitação, na utilização de
máquinas e equipamentos, na oferta de trabalho, na preservação do meio
ambiente, na estabilidade e renda, assim como, na utilização dos escassos
serviços públicos (VILLELA, 2006, p.1).

Outra grande vantagem da cooperação em associações e economia solidária,


segundo Villela (2006), é a facilitação do acesso a preços menores de insumos, que
oportunizam um aumento na produtividade e na qualidade da terra. Como movimento
de resistência, manter as características de cooperação e reciprocidade é uma
questão de sobrevivência da agricultura familiar. É notório o aumento da dificuldade
para que as famílias da pequena propriedade consigam aumentar seus ganhos, sua
comercialização e sua melhoria da qualidade de vida, ou mesmo a propriedade da
terra, sem trabalhar associativamente.
No Brasil, inúmeras regiões que procuram se organizar em várias formas de
cooperação, cuja confiança e reciprocidade são a mola mestra, “que não se opõem
evidentemente à concorrência, mas, ao contrário, fornecem um quadro onde os
mercados podem funcionar de maneira mais adequada” (ABRAMOVAY, 2000, p.11).
Não à toa, o verbete mais utilizado em cooperativas e associações, como
slogan da propaganda, tanto para o público de associados quanto para o consumidor
final, é a palavra “juntos”. Criar ambientes de cooperação saudáveis e profícuos
imbricados na confiança e reciprocidade certamente exige esforços individuais e
coletivos, juntando grupos com objetivos em comum e dando a eles legalidade para
que esforços em conjunto frutifiquem e se perpetuem. Há que se fortalecer as
identidades de grupo, mas de uma forma que valorize todos os atores que fazem parte
36

do mundo rural. Neste aspecto, é salutar a visão de Scott (2005, p.18), que afirma que
"as identidades de grupo são um aspecto inevitável da vida social e da vida política, e
as duas são interconectadas porque as diferenças de grupo se tornam visíveis,
salientes e problemáticas em contextos políticos específicos”.
Neste sentido, o patriarcado continua fortemente intrínseco às relações
sociais, agindo quase que de maneira subliminar no papel de cada ator na família e
no grupo.
É nesses momentos – quando exclusões são legitimadas por diferenças de
grupo, quando hierarquias econômicas e sociais favorecem certos grupos em
detrimento de outros, quando um conjunto de características biológicas ou
religiosas ou étnicas ou culturais é valorizado em relação a outros – que a
tensão entre indivíduos e grupos emerge. Indivíduos para os quais as
identidades de grupo eram simplesmente dimensões de uma individualidade
multifacetada descobrem-se totalmente determinados por um único
elemento: a identidade religiosa, étnica, racial ou de gênero (SCOTT, 2005,
p.15).

Essa determinação, pautada em um único elemento, replica às mulheres, ao


longo do tempo, um papel subalterno, claramente evidenciado na rotina do trabalho
na propriedade rural e na pouca liberdade de decisões sobre sua própria vida e suas
escolhas pessoais.
2.4 FEMINISMO COMO CONTRAMOVIMENTO DESCOLONIZADOR

A concepção de gênero é discutida historicamente, mas passa a adquirir


visibilidade com os grupos e movimentos feministas. O tema, feminismo, foi descrito
e analisado por Grosfoguel (2008), no contexto do processo de colonização nas
sociedades ocidentais, replicando, ad eternum, valores éticos, usos, costumes,
linguajares, formas de pensar e interpretar, criou uma visão de mundo na perspectiva
dos colonizadores.
Na análise de Quijano (2005), foi a Europa que levou seu perfil
eurocêntrico/branco/patriarcal para todas as sociedades ocidentais e colonizadas,
restando a estas populações a dizimação ou subjugação, e a consequente herança
da colonialidade.
A expropriação da cultura das populações colonizadas, a repressão das formas
de produção de conhecimento dos colonizados, suas formas de expressão e maneiras
de ver e interpretar a realidade e a subjugação da própria cultura dos dominados para
sobrepor a ordem de costumes e valores do dominador, levou as novas sociedades
37

formadas a repetir o modelo colonizador “em tudo que fosse útil para a reprodução da
dominação, seja no campo da atividade material, tecnológica, como da subjetiva,
especialmente religiosa” (QUIJANO, 2005, p.121).
O papel da América neste novo sistema mundo, para o autor, constituiu a
primeira identidade de modernidade com seus próprios valores praticados nas
sociedades europeias onde o patriarcado imperava. Neste sistema, a mulher não
participava dos processos decisórios, nem mesmo como mão de obra para produção
de riquezas. Nas Américas, este formato de sociedade foi implantado e reproduzido,
e a mulher só possuía algum valor hegemônico se comparada ao homem mestiço ou
negro.
O acesso à cidadania feminina “é um dos pontos de convergência das tensões
e exclusões que demarcam esse novo contexto e serve para problematizar os debates
sobre democracia e desenvolvimento”, defende (BARQUERO, 2007, p.89). Em
Cappelin (1999), entendemos que é preciso compreender a cidadania como uma
forma de usufruir direitos, introduzindo a diferença sexual – marca social, além da
biológica – para ajudar a perceber sob que modalidades sociopolíticas mulheres e
homens usufruem dos direitos civis, sociais e políticos.
Este modelo instituiu a ideia de raça e gênero, para justificar as diferenças de
superioridade entre conquistadores e conquistados, e assim consolidar o formato
histórico de distribuição de renda e do controle do capital (QUIJANO, 2005;
MALDONADO-TORRES, 2008). Além disso, Quijano (2005, p.118), aponta como “o
intersexual ou de gênero: os povos conquistados e dominados foram postos numa
situação natural de inferioridade, e consequentemente também seus traços
fenotípicos, bem como suas descobertas mentais e culturais”. Para Grosfoguel (2008,
p.118), “as relações de poder globais no âmbito do “sistema mundo
europeu/euro-norte-americano moderno/capitalista colonial/patriarcal”, formam o que
ele mesmo chama de “conceitualização descolonial alternativa do sistema-mundo””.
A colonialidade deixou heranças malditas, dentre as quais talvez a maior delas
seja a subordinação ao pensamento hegemônico eurocêntrico nas esferas do
conhecimento, que se instauraram da mesma forma nas estruturas de poder,
marcadamente as raciais e patriarcais.
Para o autor, o lugar de fala da sociedade colonizada situa-se subalterno em
relação ao lugar de fala da sociedade colonizadora. Para ele, ninguém escapa das
38

hierarquias de classe sociais, sexuais, espirituais, linguísticas, geográficas e raciais,


da evolução histórica da formação da sociedade mundial, colonizando pelo
patriarcado, capitalizando e nominando de modernidade.
A defesa que Grosfoguel (2008, p.125), faz na discussão sobre a colonialidade,
é que “todo o conhecimento se situa, epistemicamente, ou no lado dominante, ou no
lado subalterno das relações de poder, e isto tem a ver com a geopolítica e a corpo-
política do conhecimento”. Isso imbricou as relações de poder ao conceito de
dominante/dominado/subalterno.

Esse novo e radical dualismo não afetou somente as relações raciais de


dominação, mas também a mais antiga, as relações sexuais de dominação.
Daí em diante, o lugar das mulheres, muito em especial o das mulheres das
raças inferiores, ficou estereotipado junto com o resto dos corpos, e quanto
mais inferiores fossem suas raças, mais perto da natureza ou diretamente,
como no caso das escravas negras, dentro da natureza (QUIJANO, 2005,
p.129).

Ao explanar as relações sexuais de dominação, Quijano (2005, p.129), defende


que “a ideia de gênero se tenha elaborado depois do novo e radical dualismo como
parte da perspectiva cognitiva eurocentrista”, elucida conflitos de ordem cognitiva, que
culminam na forma que a sociedade coloca o subjugo da mulher, sobretudo nas
sociedades ocidentais, o que originou o patriarcado.
Nesta matriz de poder aparece esta dimensão do patriarcado que, associada
ao capitalismo, marca profundamente a forma como as sociedades colonizadas
reproduzem suas próprias relações de poder. O que Grosfoguel (2008, p.119), chama
de “lugar epistémico étnico-racial/sexual/de gênero”, e Maldonado-Torres (2008,
p.65), define como “outras formas fundamentais de diferenciação hierárquica, como
as de gênero e sexualidade”, mais popularmente definido pelo movimento feminista
global como patriarcado, contra o qual o feminismo se coloca.
Esse pensamento é foco de grande discussão por grupos feministas
espalhados por todos os países, em especial os ocidentais e, seguramente passou a
marcar as sociedades colonizadas por este estereótipo, o patriarcal.

O patriarcado europeu e as noções europeias de sexualidade, epistemologia


e espiritualidade foram exportadas para o resto do mundo através da
expansão colonial, transformadas assim nos critérios hegemónicos que iriam
racionalizar, classificar e patologizar a restante população mundial de acordo
com uma hierarquia de raças superiores e inferiores (GROSFOGUEL, 2008,
p.124).
39

Para Baquero (2007, p.91), “o patriarcado extrapolou o seu poder sobre o


familiar e entrou na esfera do trabalho e da política. As diferenças sexuais sempre
foram usadas como desculpas para deturpar os direitos individuais das mulheres”.
Quando as primeiras mulheres começaram a se destacar em posições
historicamente dominadas pelos homens, não tinham a consciência de que sua luta
seria tão intensa e historicamente transformada em referência para quebrar os
padrões patriarcais na evolução da sociedade (TIBURI, 2019). Ao mesmo tempo, no
contexto da colonialidade a evolução em relação ao patriarcado é ínfima.
Já Garcia (2015), afirma que foram as mulheres, feministas na sua maioria, que
tomaram consciência de sua condição analisando as suas condições de trabalho,
baseadas na ideia da diferença sexual. E, foram elas a retratar e historicizar através
de suas obras e artes, as conquistas ainda que ínfimas, sobre o patriarcado.
A trajetória das feministas é longa e árdua, com a concepção de gênero sendo
discutida historicamente e ainda persistindo em buscar um conceito universal,
adquirindo visibilidade com os diversos movimentos feministas, sobretudo o
movimento feminista negro do final do século XIX.
Uma breve análise desses movimentos é salutar para compreender que esta
não é uma luta nova e nem mesmo homogênea. Conforme a Tabela 02,
historicamente denominadas de ondas, essas lutas foram marcadas por autoras,
historiadoras, militantes e mulheres comuns que buscaram o respeito ao seu direito
individual e suas liberdades sociais e substantivas.

Tabela 2 - Evolução do feminismo em ondas, representadas pelas autoras mulheres


do período
AUTORAS ANO ONDA OBRA TEMÁTICA
Mary 1792 Primeira Uma Um dos documentos fundadores do
Wollstonecraft, onda Reivindicação feminismo, denunciou a exclusão das
pelos Direitos mulheres do acesso a direitos básicos no
da Mulher. século XVIII.
Discute as transformações do capitalismo
industrial e a condição da mulher na
sociedade.
Virginia Woolf 1929 Um teto todo Aborda o preconceito e as dificuldades que as
seu. mulheres encontravam naquele tempo se
quisessem dedicar suas vidas a uma profissão
intelectual e o seu cerceamento à liberdade de
expressão,
Simone de 1949 Segunda O segundo sexo Ativista política e teórica social. Temáticas do
Beauvoir onda feminismo em estudos acadêmicos em
universidades de todo o mundo.
40

1967 A mulher
desiludida
Betty Friedan 1963 A mística A tentativa das mulheres de encaixar-se no
feminina padrão patriarcal e suas angústias e
sentimentos
Monique Wittig 1969 Les guérillères Críticas ácidas à sociedade patriarcal e aos
papéis de gênero sexistas do final dos anos
1960.
Germaine Greer 1970 A mulher Defende que a família nuclear, consumista,
eunuco tradicional e suburbana é fruto da sociedade
patriarcal que obrigou a mulher a ser uma
espécie de pilar da família.
Kate Millett 1970 Política sexual Crítica às obras de nomes como D.H
Lawrence, Henry Miller e Sigmund Freud, e
discute o impacto do patriarcado nas relações
sexuais e na sexualidade.
Ursula K. Le A mão esquerda Colocou o feminismo no centro de suas
Guin 1969 da escuridão histórias.
1974 Os despossuídos

Audre Lorde 1984 Terceira Sister outsider


Coletânea de discursos e artigos da poeta
onda feminista que fala de sexismo, racismo, luta de
classes e outros temas, entre mulheres negras
Margaret 1985 O conto de Aia Explora os temas da subjugação das mulheres
Atwood, e os vários meios pelos quais elas perdem seu
individualismo e independência.
Fonte: Elaboração da autora com base nos autores supracitados, 2020

Outra importante abordagem sobre as conquistas feministas foi feita por


Pedro (2005), quando buscava elucidar a subordinação das mulheres no contexto
histórico, buscando uma explicação nas diferenças de gênero por meio da cultura. A
autora faz a síntese das conquistas das ondas feministas e pontua como se dá a
quarta onda, a que se prolonga até a atualidade:

Enquanto a chamada primeira onda feminista, no século XIX e início do XX,


centrou-se principalmente na reivindicação de direitos políticos das mulheres,
como votar e ser eleita, a segunda onda, depois da Segunda Guerra Mundial,
priorizou lutas pelo direito ao corpo, ao prazer, e contra o patriarcado. A
terceira onda, nos anos 1990, focaliza a diversidade das mulheres, diferentes
em cores, etnias, nacionalidades, religiões e origens culturais. [..] Quarta
onda que se dá nas ruas em grandes manifestações, mas principalmente
através do espaço das redes sociais. Diferente das anteriores que
conquistaram novos direitos, muito da primavera das mulheres ou quem sabe
a quarta onda, acontece para não perder direitos duramente conquistados,
para combater a cultura do estupro, para lutar contra a violência (PEDRO,
2018).

A cidadania foi negada historicamente aos índios e índias, escravos e escravas,


negros e negras, e às mulheres de qualquer etnia. Aos negros por serem propriedade,
aos pobres por não possuírem propriedades e às mulheres por serem relegadas às
atividades domésticas (BAQUERO, 2007). A superioridade sobre esses grupos
41

considerados subalternos se constitui um pensamento hegemônico entre as


sociedades patriarcais, que historicamente foi combatido pelos movimentos
feministas, e que chegou à contemporaneidade ainda buscando legitimidade.
Subestimar a opressão, rejeição e dificuldades a que passaram as mulheres
para contar de alguma forma as histórias de sua opressão seria continuar replicando
o modelo patriarcal (ALVES & PITANGUY, 1985; GARCIA, 2015). Todas as ondas
feministas foram marcadas por forte repressão, que fosse pública, nas ruas, ou
privada, dentro do lar dessas mulheres. E até a terceira onda, ela foi de mulheres
brancas defendendo mulheres brancas, pois as mulheres negras ainda se
encontravam à margem das discussões sobre cidadania, direitos, liberdades,
feminismo e empoderamento, o que mudou rapidamente a partir da década de 1980,
quando o protagonismo das mulheres negras aflorou.
Não se pode deixar de destacar as autoras negras como Audre Lorde, Angela
Davis, Bell Hooks, Patricia Hill Collins, Kimberlé Williams Crenshaw, Lélia Gonzalez,
Sueli Carneiro, Nilma Gomes, Djanila Ribeiro, Joice Berth, Carla Akotirene e três
décadas de mulheres negras que, não visualizando sua luta representada no
feminismo das mulheres brancas, criaram um movimento próprio, do qual o feminismo
branco se apropria de acordo com a conveniência (BERTH, 2018).
Quando se faz referência à problemática de gênero, “[...] o panorama do
desenvolvimento tende a ser adverso às mulheres, expressando-se pelo não
reconhecimento de direitos específicos ou por forma de violência exercida contra elas”
(BAQUERO, 2007, p.90).
Em seus ensaios, Judith Butler ratifica essa luta constante das mulheres em
buscar igualdade de gênero. Para Butler (2019, p.21), “a noção de um patriarcado
universal tem sido amplamente criticada em anos recentes, por seu fracasso em
explicar os mecanismos da opressão de gênero nos contextos culturais concretos em
que ela existe”. Propõe ainda que o conceito de gênero é complexo e, portanto, exige
um conjunto interdisciplinar e pós-disciplinar de discursos, para não transformar essa
discussão em retóricas de estudos sobre mulheres, apenas do ponto de vista da
mulher.
Esta subalternização é explicada por Ribeiro (2017, p.35), quando afirma que
“a mulher não é pensada a partir de si, mas em comparação ao homem”. A mulher
não é definida em si mesma, mas em relação ao homem e através do olhar do homem.
42

Este olhar confina esta mulher a um papel de submissão que comporta significações
hierarquizadas.
É o que Simone de Beauvoir em seu livro “O Segundo Sexo” (1949) chama de,
“O Outro”, onde o mundo não é apresentado às mulheres com todas as possibilidades,
e o olhar masculino sobre a mulher é de dominação, colocando-a sempre em posição
de subordinação. “As mulheres nunca, portanto, constituíram um grupo separado que
se pusesse para si em face do grupo masculino; nunca tiveram uma relação direta e
autônoma com os homens” (BEAUVOIR, 1970, p.90).
Outro ponto tão importante quanto o lugar de fala, é a posição de escuta.
Ribeiro (2017) e Tiburi (2019), confirmam o ponto de vista de Kilomba (2019), que
enfatiza que “é necessário escutar por parte de quem sempre foi autorizado a falar”.
É preciso que o patriarcado, que sempre teve sua autoridade de fala respeitada, passe
a assumir um lugar de escuta, de respeito pelo espaço das mulheres, sendo
necessário que elas ocupem seu lugar de fala, de maneira empoderada e definitiva.
Seria romper com a subalternidade imposta pelo patriarcado, pois o lugar de fala só
se concretiza como, se tiver em contraposição um lugar de escuta, rompendo com o
poder unilateral patriarcal. É contra este contexto de privilégios em detrimento de
minorias, entre elas a de mulheres rurais, que se insurge o lugar de fala.
A violência dos opressores que os faz também desumanizados, não instaura
uma outra vocação – a do ser menos. Como distorção do ser mais, o ser
menos leva os oprimidos, cedo ou tarde, a lutar contra quem os fez menos.
E esta luta somente tem sentido quando os oprimidos, ao buscar recuperar
sua humanidade, que é uma forma de criá-la, não se sentem idealistamente
opressores, nem se tornam, de fato, opressores dos opressores, mas
restauradores da humanidade em ambos (FREIRE, 1987 p.20).

Mulheres trabalhadoras vêm trilhando importantes caminhos, ao apoderarem-


se de políticas públicas voltadas à agricultura familiar, abrindo o próprio acesso e
reivindicando a criação e implementação de políticas próprias. A dura lida diária para
conseguir uma melhoria de renda, um sentido de independência financeira, torna a
mulher cada vez mais empoderada no meio rural, o que sugere uma perspectiva de
um futuro mais igualitário para as mulheres da agricultura familiar. Porém há que se
trabalhar também pela conquista de independência social e pessoal, sobretudo no
âmbito coletivo.
Se existe uma pauta em evidência direta ou indiretamente em temas
retoricamente discutidos na sociedade colonizada é o feminismo, que se contrapõe
ao patriarcado, como discurso contra hegemônico.
43

[...] o feminismo é contradiscurso em relação ao patriarcado na forma de


Estado, Mídia, Igreja, Família, Capital. Todas essas instituições vendem suas
ideologias como discurso verdadeiro essencializando o feminino e as
mulheres como suas portadoras. [...] as vozes nunca são neutras (TIBURI,
2019, p.227).

Para Tiburi (2019, p.226), “o feminismo cresce em todos os espaços sociais.


Grupos e coletivos enriquecem o cenário de luta pelos direitos das mulheres e, como
não pode deixar de ser, de todas as minorias das quais o signo ‘Mulher’ é uma
expressão básica, um signo de luta, raça e classe social”.
O feminismo, dentro do processo de descolonização, é uma das mais antigas
lutas contra o patriarcado, onde a mulher sempre foi considerada subalterna até
mesmo no processo de colonização. Para Grosfoguel (2008), a discussão não é
desenvolver uma política de identicidade feminina, ela já existe e não é uma identidade
subalterna como induzem os paradigmas eurocêntricos. A discussão é o respeito do
patriarcado por essa identicidade feminina como igualitária à sua própria, não melhor,
nem pior ou subordinada.
Não se pode conceber que nas sociedades atuais, resultado da soma de muitas
interferências históricas colonizadoras, existam ainda identidades puras, que não
tenham sofrido interferência da colonização europeia, e ela mesma de outras
sociedades em tempos antigos. Grosfoguel (2008, p.141), indica que, “uma vez que
todas as identidades modernas são uma construção da colonialidade do poder no
mundo colonial/moderno, a sua defesa não é tão subversiva como pode parecer à
primeira vista”. E, defende ainda, que o patriarcado, como forma de subordinação da
mulher nas sociedades, é tão maléfico e com racionalidade de dominação, que não
se justifica por forma nenhuma, quer seja natural, social, política ou espiritual. Mas
como todo processo dominador/dominado,
[...] o sistema de exploração é um espaço de intervenção crucial que requer
alianças mais vastas, em termos não apenas de raça e diferença sexual, mas
também de classes e entre uma diversidade de grupos oprimidos, em torno
da radicalização da noção de igualdade social. [...] ao contrário da noção
limitada, abstrata e formal de igualdade que é típica da modernidade
eurocêntrica, a ideia aqui é alargar a noção de igualdade a todas as relações
de opressão, sejam elas raciais, de classe, sexuais ou de género. O novo
universo de significação ou novo imaginário de libertação necessita de uma
linguagem comum, apesar da diversidade de culturas e formas de opressão
(GROSFOGUEL, 2008, p.141).

O patriarcado europeu e as noções europeias de sexualidade, epistemologia e


espiritualidade foram exportadas para o resto do mundo através da expansão colonial,
44

transformadas assim nos critérios hegemónicos que iriam racionalizar, classificar e


patologizar a restante população mundial de acordo com uma hierarquia de raças
superiores e inferiores. Esse pensamento justifica o feminismo como contradiscurso
ao patriarcado tão presente nas instituições que vendem suas ideologias através da
visão de um feminino que se aceita subordinado (TIBURI, 2019).
A Interseccionalidade nas lutas por direitos foi colocada em pauta por Lorde
(2019), para a qual esta revolução do feminismo não é um evento único, e o
empoderamento feminino deveria estar no cronograma e nas pautas das discussões
das próximas décadas.
Um conceito que parece ser cada vez mais um caminho a ser seguido para se
alcançar a igualdade social, é o que Quijano (2000) e Grosfoguel (2008), chamam de
estratégia da socialização do poder, que vem ao encontro desta busca de liberdades
que o feminismo representa como contradiscurso e práticas de libertação.
Neste sentido, tais estratégias de socialização do poder implicarão
possibilidades de empoderamento feminino sem subjugação de sua identidade com a
possibilidade de aumento do seu capital social. No caso das mulheres rurais, a esfera
familiar é o seu paradoxo, pois ao mesmo tempo em que o patriarcado se perpetua
da porteira para dentro, é ali o embrião da sua resistência, onde elas começam seu
processo de identicidade feminina igualitária. Mesmo que não o denomine de
feminismo é na esfera familiar rural que as mulheres se empoderam e desenvolvem
seu capital social no sentido virtuoso ou positivo.

2.5 EMPODERAMENTO E CAPITAL SOCIAL

Empoderamento, na língua portuguesa, é um neologismo, pois adequou uma


palavra já existente do dicionário, para lhe dar o mesmo significado de empowerment,
que na língua inglesa significa o processo de ganhar liberdade e poder para fazer o
que você quer ou controlar o que acontece com você. Rappaport, em 1977 deu à
palavra o seu significado atual, que é dar poder ou capacitar (BERTH, 2018).
As origens da palavra empoderamento e seu significado conceitual, emergem,
de acordo com Barquero (2012), no século XVI, quando Martinho Lutero desencadeou
45

a Reforma Protestante. Ao traduzir a Bíblia do latim para o alemão, possibilitou a uma


grande parcela da população, principalmente os mais pobres, o acesso aos Livros
Sagrados, dificultando assim a manipulação do uso dos mesmos conforme a
conveniência do clero
Como destaca Arendt (2001, p.36), poder “[...] corresponde a habilidade
humana não apenas para agir, mas para agir em conjunto. O poder nunca é
propriedade de um indivíduo; pertence a um grupo e permanece em existência apenas
na medida em que o grupo conserva-se unido”. Foucault (1979), debateu o tema, na
obra “Microfísica do poder”, defendendo que o poder é uma prática social presente
em todas as sociedades, construída ao longo da sua evolução.

Trata-se [...] de captar o poder em suas extremidades, em suas últimas


ramificações [...] captar o poder nas suas formas e instituições mais regionais
e locais, principalmente no ponto em que ultrapassando as regras de direito
que o organizam e delimitam [...] (FOUCAULT, 1979, p.182).

Nos idos de 1960, Paulo Freire escrevia a “Teoria da Conscientização” como


estratégias e práticas de atuação para a libertação de grupos oprimidos, que segundo
uma forte linha de pensamento sobre o assunto foi o precursor da Teoria do
Empoderamento que emergiria dos movimentos feministas na década de 1980.
Diferentemente de Rappaport (1977), que acreditava que era preciso instrumentalizar
grupos oprimidos para torná-los empoderados, Freire acreditava que, “os próprios
grupos que foram subalternizados deveriam empoderar a si próprios, processo esse
que se inicia com a consciência crítica da realidade aliada a uma prática
transformadora” (BERTH, 2018, p.27). Para Freire, a educação é um ato político
(1968), a libertação é um ato social (1960), e a conscientização deve ser vista a partir
do social e do coletivo, e não a partir do individual (1986).

Se você não é capaz de usar sua liberdade recente para ajudar os outros a
se libertarem através da transformação global da sociedade, então você só
está exercitando uma atitude individualista no sentido do empowerment ou
da liberdade. [...]. Sua curiosidade, são fundamentais para a transformação
social, mas não são por si só suficientes (FREIRE; SHOR, 1986, p.71).

Apesar da inegável contribuição do educador brasileiro para estratégias de


erradicação das desigualdades. Berth (2018), aponta que Freire foi muito abstrato ao
definir o oprimido, sem lhe dar identidade de gênero, raça, sexualidade e outros.
Assim, quem fez este papel, preenchendo a lacuna da Teoria do Empoderamento,
foram as feministas, principalmente as negras, que colocaram as mulheres no centro
46

desta discussão, ressignificando o empoderamento como instrumento de


emancipação política e social.
Mas onde Freire ignorou o gênero e a subordinação das mulheres como
elemento crítico para a libertação, havia outras influências importantes
influenciando ativistas e movimentos sociais que emergiram naquele
momento: entre eles a redescoberta dos ‘subalternos’ [..] e o papel
hegemônico das ideologias dominantes e o despertar das teorias da
construção social e pós-colonial (BATLIWALA, 1994).

Berth (2018), pondera que a ressignificação do empoderamento está ligada


ao desenvolvimento estratégico social, por meio de trabalhos de recuperação
consciente das potencialidades de indivíduos e grupos considerados subalternos,
visando a liberdade desses grupos, em processos amplos em muitas frentes de
atuação. Pondera ainda sobre o empoderamento individual e coletivo, argumentando
que são:
[...] duas faces indissociáveis do mesmo processo, pois o empoderamento
individual está fadado ao empoderamento coletivo, uma vez que uma
coletividade empoderada não pode ser formada por individualidades e
subjetividades que não estejam conscientemente atuantes dentro de
processos de empoderamento (BERTH, 2018, p.42).

O seu conceito deve ser bem apreendido para não haver equívoco quanto ao
seu uso. León (2001), explica que empoderamento pode ser usado como
empoderamento individual ou coletivo. O empoderamento utilizado no âmbito
individual se foca nos processos cognitivos do indivíduo, em busca de controle
pessoal, ter sucesso por si mesmo, sem aceitar ajudas dos demais. Buscam
autonomia, autocontrole onde sentimentos de solidariedade e cooperação ficam em
planos inferiores decisórios e desconectados do contexto histórico e sociopolítico. A
autora classifica o empoderamento individual, nesta perspectiva como mera ilusão.
Ao que usam empoderamento no âmbito coletivo, se inserem neste contexto onde
geram possibilidades de desenvolver autoestima e autoconfiança pela ação coletiva
ao participar da comunidade ao qual está envolvida.
Neste sentido, Kelba e Wendausen (2009, p.736), ponderam que
empoderamento “é um processo dinâmico que envolve aspectos cognitivos, afetivos
e condutuais”. É um sentimento de pertencimento, que aumenta o poder da autonomia
pessoal pelas relações coletivas e institucionais.
Uma publicação que foi desenvolvida em conjunto pela ONU Mulheres Brasil
e a Rede Brasil do Pacto Global em 2017 traz a definição de empoderamento como:
47

Dar ou adquirir poder ou mais poder. O empoderamento significa uma


ampliação da liberdade de escolher e agir, ou seja, o aumento da autoridade
e do poder dos indivíduos sobre os recursos e decisões que afetam suas
próprias vidas. A pessoa empoderada pode definir os seus objetivos, adquirir
competências (ou ter as suas próprias competências e conhecimentos
reconhecidos), resolver problemas e desenvolver seu próprio sustento. É,
simultaneamente, um processo e um resultado (ONUMULHERES, 2017).

Esse processo de retroalimentação, no interior do qual os atores com


características em comum se juntam para conquistar interesses conjuntos, em maior
ou menor grau, geram mudanças e tomadas de consciência de seus valores sociais
coletivos, aumentando seu engajamento por meio do aumento de confiança e
cooperação solidária entre os participantes do grupo. Mulheres empoderadas agindo
coletivamente geram um grupo de mulheres ainda mais empoderadas, com a
percepção e consciência do que León (2001) chama de “seu eu social”.
Por sua vez, indica Portes (2000), que capital social deve, também, ser bem
compreendido, pois tem causado discussões entre sociólogas/os, estudiosas/os do
desenvolvimento e economistas. Há um debate ideológico e epistemológico em
relação ao tema, o que mostra o quanto ainda há a evoluir na discussão sobre capital
social, não podendo ser confundido com outros tipos de capital, já que ele se encontra
nas relações interpessoais no contexto do habitus de cada pessoa, frente ao contexto
que habita.
Apesar desta polêmica, Portes (2000), esclarece que a expressão “capital
social”, não incorpora novidade para os sociólogos, pois já é sabido que a participação
em grupos abre possibilidades de se obter vantagens positivas para o indivíduo e para
a comunidade envolvida. Entende que capital social é um termo atual que busca
recuperar discussão antiga sobre a importância da sociabilidade no mundo atual onde
o presencial e o virtual se articulam.
Ressalta o autor, que o termo não deve ser tratado como solução para todos
os males como apontam alguns estudos. Sua importância se localiza em duas fontes:
em primeiro lugar, o conceito incide sobre as consequências positivas da
sociabilidade, pondo de lado as suas características menos atrativas; em
segundo lugar, enquadra essas consequências positivas numa discussão
mais ampla acerca do capital, chamando a atenção para o fato de que as
formas não monetárias podem ser fontes importantes de poder e influência,
à semelhança do volume da carteira de ações ou da conta bancária
(PORTES, 2000, p.133).

Feito o esclarecimento, o primeiro autor a utilizar a expressão “capital social” e


descrever suas principais premissas no meio acadêmico, foi o jovem professor
48

americano, presbiteriano, rotaryano e republicano, de uma comunidade rural


empobrecida, Lyda Judson Hanifan, em 1916, em um ensaio sobre o compromisso
comunitário com a democracia e o desenvolvimento. Putnam (2003), descreve parte
do documento, que poderia perfeitamente ser um artigo contemporâneo:

...esos elementos tangibles, [que] cuentam sumamente en la vida diária de


las personas, a saber, la buena voluntad, la camaraderia, la compreensión y
el trato social entre indivíduos y famílias, características constitutivas de la
unidade social [...]Abandonado a sí mismo, el individuo es socialmente um
ser indefeso [...] Pero si entra en contacto com sus vecinos, y estos com
nuevos vecinos, se producirá una acumulación de capital social que podrá
satisfacer de imediato sus necesidades sociales y producir unas
possibilidades sociales suficientes para mejorar de forma sustancial las
condiciones de vida de toda la comunidad (PUTNAM, 2003, p.10).

Se empoderamento é entendido como um sentimento de pertencimento, capital


social, para se desenvolver, está na relação com os outros, situado nas estruturas da
sociedade, e a qualidade desta relação, indicará se ele será avaliado subjetivamente,
como positivo ou negativo (PORTES, 2000).

Tabela 3 – Capital social – conceitos e principais expoentes.


Autores Conceito de Capital Social
[...] o conjunto dos recursos reais ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede
durável de relações mais ou menos institucionalizadas de interconhecimento mútuos, ou,
Pierre
em outros termos, à vinculação a um grupo, como o conjunto de agentes que não somente
Bourdieu são dotados de propriedades comuns (passíveis de serem percebidas pelo observador,
pelos outros e por eles mesmos), mas também que são unidos por ligações permanentes
e úteis (BOURDIEU, 1980, p. 02).
James “Variedade de entidades com dois elementos em comum: todos elas consistem num certo
aspecto das estruturas sociais e facilitam determinadas ações dos atores — pessoas ou
Coleman
atores coletivos — no interior da estrutura” (COLEMAN, 1988, p.980).

Robert “Aqui o capital social diz respeito a características da organização social, como confiança,
normas e sistemas, que contribuam para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando
Putman
as ações coordenadas” (PUTNAM, 2006, p.177).
“capital social é uma norma informal instanciada que promove a cooperação entre dois ou
mais indivíduos. As normas que constituem o capital social podem variar de uma norma
Francis
de reciprocidade entre dois amigos, até doutrinas complexas e elaboradamente articuladas
Fukuyama como o cristianismo ou o confucionismo” (FUKUYAMA, 2000, p.1)
“Conjunto de recursos incorporados em uma estrutura social e que são acessados ou
mobilizados em ação intencionais. Por esta definição, a noção de capital social contém
Nan Lin três ingredientes: recursos incorporados em uma estrutura social, acessibilidade a tais
recursos por indivíduos, e uso ou mobilização de tais recursos sociais por indivíduos em
ações intencionais” (LIN, 1999, p.35).
Fonte: Elaboração da autora com base nos autores supracitados, 2020.

Os registros da Tabela 3 demonstram como a definição de capital social


envolve aspectos subjetivos e objetivos desta relação. Neste sentido, alertam os
49

autores, principalmente Portes (2000), do cuidado em concluir em estudos somente


aspectos positivos ou definitivos.
Para Woolcock (1998), a essência do capital social é a sociabilidade
organizada, um conjunto de interdependências entre os indivíduos, com objetivos
coletivos ou não, atuando de forma consciente para realizar atividades do cotidiano.
De Franco (2001, p.25), propõe que o capital social é o conjunto de padrões de
uma organização ou sociedade, somados aos seus modos de regulação, e que: tudo
depende desses padrões. A cooperação é típica da natureza humana, que possui uma
forte propensão a cooperar. E, essa predisposição é a responsável por gerar capital
social. Pondera o autor, que “esta propensão jamais se ampliará socialmente se os
padrões de organização forem hierárquico-verticais e se os modos de regulação de
conflitos forem autocráticos, baseados na violência e na coerção”.
Para Fernandes (2002, p.376), “o capital social torna-se um conceito amplo e
difuso, uma vez que redes de confiança e solidariedade podem referir-se desde a uma
densa rede de organizações e associações civis [...] até as conexões sociais mais
informais, como relações de amizade”.
O capital social, segundo Higgins (2005), foi incorporado como o quinto fator
de produção junto aos três fatores tradicionais, terra, trabalho e capital físico
(ferramentas e tecnologia), somados ao capital humano (educação e saúde). Autores
que defendem esta incorporação, também defendem que a cooperação e o
compromisso com objetivos comunitários são o que sustenta os fatores econômicos.

[...] as relações sociais constituem um patrimônio “não visível”, mas altamente


eficaz, a serviço dos sujeitos sociais, sejam estes individuais ou coletivos.
Neste sentido, se as relações estão baseadas na reciprocidade e na
expectativa de cumprimento mútuo – caso contrário haveria sanção social –
os motores da ação coletiva serão a confiança e a cooperação (HIGGINS,
2005, p.29).

A síntese de Higgins (2005), aponta o capital social na agenda do


desenvolvimento, sendo tratado como tema central ou transversal por Coleman,
(1988), Putnam (1996), Wollcock (1998). Para estes, redes sociais e compromisso
cívico formam, na nova perspectiva, um conjunto de fatores-chave para a
sustentabilidade dos programas de desenvolvimento. Elas podem gerar benefícios
mútuos. E, capital social é visto também por Recuero (2005), como um conjunto de
conexões entre um grupo de pessoas que geram inúmeros recursos provenientes
dessas conexões.
50

A atenção do Banco Mundial também se voltou ao capital social, quando


procurou implementar um novo paradigma integrando quatro fatores atrelados a estas
conexões: sociais, culturais, econômicos e institucionais (HIGGINS, 2005), que
chamou de Iniciativa Capital Social.
O Banco Mundial aborda que o capital é valioso e que as relações com outras
pessoas e grupos, culminam em troca de experiências, enriquecimento de ideias e
parcerias, em contraponto ao capital pessoal e físico, que pertence exclusivamente
ao indivíduo. Resumidamente, quatro formas de capital social são apontadas pelo
Banco Mundial (2003), que os levou a desenvolver um questionário para dimensioná-
los considerando:
Natural - recursos naturais que podem ser aproveitados em cada espaço
geográfico. Físico - sociedade, infraestrutura, máquinas e os equipamentos.
Humano - nível de educação, saúde e acesso à informação da população.
Social – utilização de novos conceitos para análises e projetos que fomentam
o desenvolvimento.

Todavia, o estudo do Banco Mundial considerou indicadores mensuráveis,


evitando avaliar os indicadores subjetivos, demonstrados pelos estudos que envolvem
o capital social. Apesar disso, sua contribuição é muito importante para estudos
empíricos futuros. Os resultados mostraram que quanto maior a presença de capital
social, maior é a possibilidade de formação de redes, com resultados melhores na
produção econômica desta região e dos indivíduos participantes dessas redes.
Putnam (2003, p.13), resume a importância do capital social de maneira
simples e direta, quando afirma que “as redes têm valor, acima de tudo, para quem
está nelas”, pois ele reside nas relações que acontecem todos os dias e pode abrir
espaço para o empoderamento e o aumento de capital social, que pode levar à
sustentabilidade destas redes no mundo atual.
Para Rowlands (1997), citado por Oakley & Claiton (2003, p.18), o processo
de empoderamento pode ser explorado também em três diferentes níveis:

Pessoal: desenvolver um sentido de autoestima e capacidade; Relacional:


desenvolver habilidade para negociar e influenciar na natureza das relações
e decisões tomadas em relação a estas; Coletivo: há indivíduos que
trabalham para gerar um impacto maior, como a formação de uma
cooperativa ou o envolvimento com as estruturas políticas.

O empoderar-se começa no aumento das capacidades pessoais, passando


pelas relações de grupo e organizações, culminando com o acesso a recursos e a
estruturas de mudança. O processo de empoderamento deve estar atrelado ao
51

gradual reconhecimento, por parte das mulheres, das estruturas de poder que estão
presentes na própria vida delas e dos grupos a que elas pertencem e em sua liberdade
de ação.
O poder como maior confiança na capacidade pessoal para levar adiante
algumas formas de ação; como aumento das relações efetivas que as
pessoas desprovidas de poder podem estabelecer com outras organizações;
como resultado da ampliação do acesso aos recursos econômicos, tais como
créditos e insumos (OAKLEY; CLAITON, 2003, p.12).

Toda essa mudança na abordagem do papel da mulher na sociedade se deve


ao potencial das mulheres de produzir, ter sua própria renda, desenvolver uma carreira
profissional, e tomar decisões dentro e fora do âmbito familiar. Percebe-se que todos
esses aspectos têm em comum a contribuição positiva para fortalecer a voz ativa e a
condição de agente das mulheres, por meio da independência e do ganho de poder.
Neste sentido, Batliwala (1994), León (2001), Sardenberg (2009) e Siqueira
(2014) reiteram que o processo de empoderamento individual da mulher somente será
possível por meio das relações com a coletividade de forma cooperativa e solidária.
Os espaços de participação política constituem estruturas mediadoras de
processos de empoderamento, facilitando a superação de conflitos e a
ressignificação das relações sociais, possibilitando a revisão de papéis e de
sentidos na produção da vida cotidiana (KLEBA & WENDAUSEN, 2009,
p.733).

No entanto, ressalta Sardenberg (2009), que apesar dos progressos mais


pautados no campo econômico, as mulheres continuam a enfrentar a discriminação,
a marginalização e a exclusão, ainda que a igualdade entre homens e mulheres seja
um preceito internacional universal, um direito humano fundamental e inviolável.
A necessidade das mulheres de se sentirem pertencentes a algo maior é um
processo natural, indica Baquero (2006), pois este processo não se dá apenas no
contexto individual, mas antes e, principalmente, no coletivo, pois o empoderamento
para ser, deve acontecer no sentido da comunidade onde essas mulheres estão
inseridas, em seus grupos de convívio, em cooperação e confiança, exercendo sua
plena cidadania.
Como agente de empoderamento, a Organização das Nações Unidas – ONU
Mulheres criou uma cartilha, na qual apresenta os sete Princípios de Empoderamento
das Mulheres:
1. Estabelecer liderança corporativa sensível à igualdade de gênero, no mais
alto nível. 2. Tratar todas as mulheres e homens de forma justa no trabalho,
respeitando apoiando os direitos humanos e a não-discriminação.
3. Garantir a saúde, segurança e bem-estar de todas as mulheres e homens
que trabalham na empresa. 4. Promover educação, capacitação e
52

desenvolvimento profissional para as mulheres. 5. Apoiar empreendedorismo


de mulheres e promover políticas de empoderamento das mulheres através
das cadeias de suprimentos e marketing. 6. Promover a igualdade de gênero
através de iniciativas voltadas à comunidade e ao ativismo social. 7. Medir,
documentar e publicar os progressos da empresa na promoção da igualdade
de gênero (ONU, 2019).

No contexto do espaço rural, as relações de poder estão diretamente ligadas


às relações de gênero, do que resulta a diferença de inserção das mulheres nos
espaços produtivos e organizativos. Espaços de poder têm uma forte implicação de
gênero, requerendo uma transformação no acesso da mulher também aos bens
econômicos, transformação esta que depende de um processo de empoderamento
desta mulher (SIQUEIRA; SARDENBERG, 2012).
Uma das grandes colaborações de Putnam (2006), é o estudo sobre a
cooperação espontânea entre atores e grupos, por meio do capital social. Essa
importância dada à cooperação, na temática do capital social, também é salientada
por Franco (2001), que avalia o crescimento social da cooperação entre os atores e
chama a essa ampliação de capital social.
Os estudiosos do tema supracitados se empenham em asseverar que capital
social e empoderamento são complementares, porque a médio e longo prazo levam
à cidadania e ao entranhamento dos valores democráticos, ao mesmo tempo, que se
alicerçam nas estruturas familiares tradicionais em um contexto interligado.
Alguns conceitos devem ser levados em consideração para o entendimento
mais amplo da síntese que, a seguir, se apresenta:
a) Ator-agente1 – indivíduo que gera uma ação, que produz movimento e
diferença, como mediador, articulador e conector de grupos, conectando-se a
outros grupos, a partir e além dele, criando pontes com outras redes (LATOUR,
1994), (CASTELLS, 1999), (HIGGINS & RIBEIRO, 2018);
b) Ethos2 - é uma palavra com origem grega, que significa caráter moral. É usada
para descrever o conjunto de hábitos ou crenças que definem uma
comunidade ou nação. No âmbito da sociologia e antropologia, o ethos são os
costumes e os traços comportamentais que distinguem um povo. A cultura, os
costumes, normas e regras de conduta, que devem ser observadas por todos
os seus membros de uma sociedade (LASTORIA, 2001); o ethos guarda a
marca da estrutura que conforma a tradição de um povo, seu “espírito”, em
determinado tempo histórico (CANIELLO, 2003); ethos como uma consciência
53

ética universal e atitude moral básica do homem, considerado individual ou


coletivamente (PIRES, 2001);
c) Dimensão sinérgica3 - examinar predisposições do indivíduo a participar de
ações cooperativas, ações de natureza coletiva em sua comunidade,
atividades de natureza cooperativa em níveis mais amplos, com outras
comunidades; identificar formas distintas de envolvimento cidadão em
formação de círculos virtuosos de construção, interação do sujeito com outras
instâncias de cooperação (BAQUERO; BAQUERO, 2007);
d) Agregação social4 – se refere aos graus de engajamento do ator com o grupo,
ou grupos. A confiança que os atores manifestam quando participam do grupo
(BAQUERO, 2007);
e) Pontes sociais5 – se refere às conexões entre os grupos. Conectam um grupo
a outro e possibilitam que o ator participe de outros grupos por meio de uma
cadeia de associações (BAQUERO, 2007);
f) Redes6 – o social é formado a partir das associações, redes que se formam a
cada momento, através de alianças, fluxos e mediações (LATOUR, 1994),
(CASTELLS, 1999);
g) Meios Inovadores7 – o ator não é um agente inovador isolado, mas parte de
uma estrutura, do meio que o faz agir (ABRAMOVAY, 2000), (CASTELLS,
1999);
h) Mercados8 – tipos específicos de estruturas sociais, interações recorrentes e
padronizadas entre atores, mantidas por meio de sanções (ABRAMOVAY,
2000). Na sociologia econômica, vários autores foram resumidos por Plein,
que definiu o mercado como [...] uma estrutura socialmente construída e
moldado por um conjunto de instituições, uma vez que as relações econômicas
estão enraizadas (embeddedness) nas relações sociais [...] (2012, p.247).

Cabe esclarecer que o conceito de Polanyi (1978), embeddedness:

se refere à formação de significado para as ações dos atores inseridos num


contexto ou ambiente institucional historicamente determinado, e expressa a
ideia de que as estruturas sociais, estabelecidas e enraizadas em regras,
normas, convenções, hábitos, etc. condicionam o comportamento social dos
indivíduos (SCHNEIDER; ESCHER, 2011, p.196).

A forma dos agricultores familiares se relacionarem com os mercados, para


Plein (2012, p.247), “implica compreender as diferentes dinâmicas de inserção
54

mercantil associadas às particularidades dos produtos, dos processos produtivos, das


formas de organização e de comercialização dos produtos”.
Os autores que assentam seus estudos e teses nestes conceitos, levam ao
entendimento de que os mesmos estão intrínsecos e correlacionados na relação de
desenvolvimento sustentável, empoderamento e capital social, que podem ser
perfeitamente aplicados no contexto das agricultoras familiares.
O esquema apresentado foi construído considerando a variável tempo, pois o
processo descrito de desenvolvimento sustentável, empoderamento e capital social
não é algo adquirido a curto prazo, ao contrário. Algumas pequenas comunidades,
assim como associações, organizações e até mesmo nações demoram décadas,
perpassando gerações até poder avaliar positivamente este processo, considerando
que não se trata de uma relação linear. “Nesse sentido, a construção de capital social
deve ser analisada dentro de uma compreensão da evolução histórica e das
condições materiais do país, além de considerar-se como um processo de interações
sociais que levam a resultados construtivos” (BANKSTON; ZHOU, 2002, p.285).
A relação tempo também é correlacionada ao espaço, pois o capital social se
desenvolve associada a um determinado território, o que une as agregações sociais
transformando-as em pontes sociais. Tempo e território, nesta análise, são
relacionais.
O território, assim, também é entendido como espaço de organização, luta e
resistência política e cultural, para além da sua substantivação em virtude de
fatores e processos econômicos, culturais e naturais, concepção intimamente
relacionada à conquista de autonomia e ao desenvolvimento com mais
equidade social (SAQUET, 2015, p.78).

As redes e os fluxos estão sempre presentes e, de certa forma, caracterizam a


formação dos territórios, “[...]De maneira geral, são redes produtivas, comunicativas,
dos movimentos sociais, [...] sempre significando interdependência, conexão, relação
entre sujeitos, lugares e territórios” (SAQUET, 2015, p.89). Neste contexto, é
fundamental acrescentar a importância da formação de identidades alicerçadas no
território. É justamente pautado na formação de um território, com laços históricos,
culturais, econômicos, pessoais e coletivos, que se fortalece a cooperação dos atores
entre si e com outras instituições, criando redes de confiança mutua, todas
conectadas.
55

Ao considerar todos os autores discutidos, a Figura 1 apresenta uma síntese


desse contexto de relações que envolvem empoderamento e capital social, como
caminho pessoal e coletivo para o desenvolvimento sustentável.

Figura 1 - Mapa conceitual do empoderamento, capital social e desenvolvimento


sustentável

Fonte: Organizado pela autora com base nos autores supracitados, 2020.
56

Não se trata de uma construção fechada, mas uma síntese que permanece
aberta para análise e contribuição conceitual, na busca do entendimento de todos os
elementos que imbricam na formação do empoderamento e capital social, na
perspectiva do desenvolvimento sustentável. O mapa apresentado pode servir de
base para analisar diversas realidades de grupos, associações e, em uma análise
mais expandida, de uma sociedade de qualquer porte.

2.6 INDICADORES DE EMPODERAMENTO E CAPITAL SOCIAL

Se, empoderamento é colocado como um termo polissêmico, e vem sempre


de “arenas conflitivas, onde necessariamente se expressam relações de poder”
(KEBA E WENDAUSEN, 2009, p.742), é entendido e avaliado como um sentimento
de pertencer, autoestima elevada, autovalorização, convicção interna de controle,
postura ativa e proativa e capacidade de adaptação.
Tanto empoderamento como capital social objetivam sustentabilidade pessoal,
econômica e social. Os indivíduos necessitam de vários tipos de recursos para bancar
sua sobrevivência, e ao fazer isso, articulam estruturas cognitivas, criando relações
sociais que podem agregar de maneira positiva, ou não, à sua sustentabilidade.
A tabela 4 apresenta o mapeamento dos indicadores de capital social de
Balanza e Abreu (2013). Eles elencaram os indicadores dos principais estudiosos
sobre o tema e que deu suporte a este estudo e de forma a demonstrar a amplitude
do que aqui foi discutido.

Tabela 4 - Indicadores do Capital Social


AUTORES/OBRAS INDICADORES
Bourdieu - Participação Cívica – Prestígio – Fama
(1980; 1984; 1985; 1986; 2005) - Reputação – Pertencimento – Lealdade
Coleman - Confiança - Reciprocidade - Status - Lealdade -
(1988; 1990) Importância das conexões - Canais de informação -
Normas e Sanções - Superposição - Alcance das
conexões
Putnam - Recompensas - Apoio social – Sanções -
(1993; 1994; 1995; 1995: 2000; 2001; Conversações cívicas - Fidelidade - Honra –
2003) Reconhecimento
57

Fukuyama - Raio de confiança - Solidariedade espontânea –


(1995; 1999; 2002; 2009) Cooperação
Lim - Status - Fluxo de informações – Confiança -
(1982; 1986; 1990; 1992; 1999; 2001) Influência/Poder – Identidade – Credibilidade –
Reconhecimento
Stone - Confiança - Assistência - Tempo despendido -
(2001) Visitas - Investimento financeiro - Reciprocidade -
Investimento na relação - Tempo de ação –
Encontros
Baum - Participação Cívica – Pertencimento – Amizade –
(2000) Manifestações - Espírito de equipe
Régis et al, - Apoio emocional - Troca de experiências -
(2006) Maximização de contatos - Visibilidade –
Credibilidade
Nahapiey e Ghoshal Dimensão cognitiva: -Linguagem - Narrativas -
(1998) Estereótipos - Código - Impressões - Apoio
Dimensão Estrutural: - Centralidade – Densidade –
Pertencimento - Identificação
Dimensão Relacional: - Amizade - Respeito -
Confiança - Normas e Sanções - Conversação –
Informações
Uphoff - Experiências adquiridas - Cooperação -
(2000) Generosidade – Solidariedade
Fonte: ALDANZA; ABREU (2013, p.224)

Em seu estudo sobre comunidade e democracia da Itália moderna, Putnam


(2006), explica algumas das principais características que definem e que se
transformam em indicadores para medir o capital social de um grupo ou comunidade.
Para Putnam (2006, p.177), “a cooperação voluntária é mais fácil numa comunidade
que tenha herdado um bom estoque de capital social sob a forma de regras de
reciprocidade e sistemas de participação cívica”. Aqui o capital social diz respeito a
características da organização social, como confiança, normas e sistemas, que
contribuam para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando as ações
coordenadas:
Assim como outras formas de capital, o capital social é produtivo,
possibilitando a realização de certos objetivos que seriam inalcançáveis se
ele não existisse [...]. Por exemplo, um grupo cujos membros demonstrem
confiabilidade e que depositem ampla confiança uns nos outros é capaz de
realizar muito mais do que outro grupo que careça de confiabilidade e
confiança [...]. Numa comunidade rural [...] onde um agricultor ajuda o outro
a enfardar o seu feno e onde os implementos agrícolas são reciprocamente
emprestados, o capital social permite a cada agricultor realizar o seu trabalho
com menos capital físico sob a forma de utensílios e equipamento (PUTNAM
2006, p.177).

Uma das grandes colaborações de Putnam (2006) é a cooperação espontânea


entre atores e grupos, através do capital social. Essa importância dada á cooperação
na temática do capital social também é salientada por Franco (2001), que avalia o
58

crescimento social da cooperação entre os atores e chama a essa ampliação de


capital social.
Outro componente básico do capital social é a confiança, pois promove a
cooperação espontânea Putnam (2006). Quanto mais elevado o nível de confiança
numa comunidade, maior a probabilidade de haver cooperação, que age de maneira
a se realimentar.
Uma característica específica do capital social - confiança, normas e cadeias
de relações sociais - é o fato de que ele normalmente constitui um bem
público, ao contrário do capital convencional, que normalmente é um bem
privado. "Por ser um atributo da estrutura social em que se insere o indivíduo,
o capital social não é propriedade particular de nenhuma das pessoas que
dele se beneficiam." Assim como todos os bens públicos, o capital social
costuma ser insuficientemente valorizado e suprido pelos agentes privados
(PUTNAM, 2006, p.180).

Para Putnam (2006), a confiança social pode emanar de duas fontes conexas:
as regras de reciprocidade e os sistemas de participação cívica. A mais importante
dessas regras é a da reciprocidade.

Existem dois tipos de reciprocidade, por vezes chamados de reciprocidade


"balanceada" (ou "específica") e reciprocidade "generalizada" (ou "difusa"). A
primeira diz respeito à permuta simultânea de itens de igual valor; por
exemplo, quando colegas de trabalho trocam seus dias de folga ou quando
políticos combinam apoiar-se mutuamente. A reciprocidade generalizada diz
respeito a um a contínua relação de troca que a qualquer momento apresenta
desequilíbrio ou falta de correspondência, mas que supõe expectativas
mútuas de que um favor concedido hoje venha a ser retribuído no futuro
(PUTNAM, 2006, p.181).

Os atos isolados são altruísticos a curto prazo, mas quando tomados em


conjunto normalmente beneficiam todos os participantes, e está, de maneira geral,
associada a um amplo sistema de intercâmbio social. Para Putnam (2006, p.182), “as
relações continuadas frequentemente se revestem de um significado social que
encerra fortes expectativas de confiabilidade e abstenção de oportunismo”.
As formas de capital social se multiplicam com o uso e definham com o desuso,
se acumulam com a formação de círculos virtuosos, relações que gerem cada vez
mais confiança, reciprocidade, empoderamento e espírito de cooperação pessoal e
coletivo, e que sobretudo tragam benefícios sociais e econômicos a todos da
comunidade. Mas o capital social também pode gerar círculos viciosos, quando as
relações de cooperação descambam para uma cooperação cujo objetivo é apenas
juntar interesses, sem o fim maior de gerar pertencimento. Dessa forma, o capital
social acumulado nem sempre é positivo.
59

Os estoques de capital social, como confiança, normas e sistemas de


participação, tendem a ser cumulativos e a reforçar-se mutuamente. Os
círculos virtuosos redundam em equilíbrios sociais com elevados níveis de
cooperação, confiança, reciprocidade, civismo e bem-estar coletivo. Eis as
características que definem a comunidade cívica (PUTNAM, 2006, p.186).

Portanto, apontar os indicadores do capital social adequados para a análise


das sociedades é tarefa complexa, pois também precisa ter um olhar sobre a
temporalidade e o território, respeitando-se as especificidades de cada grupo ou
comunidade. Os indicadores estabelecem relações e estas estão fortemente ligados
ao contexto sócio, político e pessoal frente a cultura e bases históricas de cada região
do mundo.

2.6.1 Capital social e gênero

A cidadania foi negada historicamente aos índios e índias, escravos e escravas,


negros e negras, e às mulheres de qualquer etnia. Aos negros por serem propriedade,
aos pobres por não possuírem propriedades e às mulheres por serem relegadas às
atividades domésticas (BAQUERO, 2007). A superioridade sobre esses grupos
considerados subalternos se constitui um pensamento hegemônico entre as
sociedades patriarcais, que historicamente foi combatido pelos movimentos
feministas, e que chegou à contemporaneidade ainda buscando legitimidade.
Quando se faz referência à problemática de gênero, [...] o panorama do
desenvolvimento tende a ser adverso às mulheres, expressando-se pelo não
reconhecimento de direitos específicos ou por forma de violência exercida contra elas
(BAQUERO, 2007, p.90).
Em seus ensaios, Judith Butler ratifica essa luta constante das mulheres em
buscar igualdade de gênero. Segundo Butler (2019, p.21), “a noção de um patriarcado
universal tem sido amplamente criticada em anos recentes, por seu fracasso em
explicar os mecanismos da opressão de gênero nos contextos culturais concretos em
que ela existe”. Propõe ainda que o conceito de gênero é complexo, e, portanto, exige
um conjunto interdisciplinar e pós-disciplinar de discursos, para não transformar essa
discussão em retóricas de estudos sobre mulheres, apenas do ponto de vista da
mulher.
60

O acesso à cidadania feminina “é um dos pontos de convergência das tensões


e exclusões que demarcam esse novo contexto e serve para problematizar os debates
sobre democracia e desenvolvimento”, defende Baquero (2007, p.89). É preciso
compreender a cidadania como uma forma de usufruir direitos, introduzindo a
diferença sexual – marca social, além da biológica – para ajudar a perceber sob que
modalidades sociopolíticas mulheres e homens usufruem dos direitos civis, sociais e
políticos (CAPPELLIN,1999, p.206). Estas ações se relacionam na busca do
empoderar o capital social individual e coletivo no âmbito da sociedade onde o
indivíduo está inserido. Dentro do escopo das discussões de gênero, os conceitos de
empoderamento e capital social mostram-se pertinentes para repensar a questão da
cidadania.
Em suas análises, Baquero (2007, p.90), aponta que [...] reflexões sobre
empoderamento e capital social destacam as noções de civismo, confiança e
participação como elementos de comportamento essenciais para reduzir esses
déficits e atingir o desenvolvimento humano pleno e sustentável.

O conceito de desenvolvimento recebe sucessivos acréscimos: ao econômico


somam-se o social, o cultural e o político, em seguida, o sustentável; como
última adição, o adjetivo humano, pelo qual a multiplicação de bens materiais
será substituído pelo objetivo de plena realização de homens e mulheres
(SACHS, 2001; BAQUERO, 2007).

Em sua maioria, altos índices de capital social são associados a maior equidade
social de gênero e igualdade social principalmente quando vinculados a indicadores
sociais como bem-estar da comunidade, educação para as crianças e adolescentes,
segurança, baixo nível de violência contra as mulheres, índices de saúde, lazer
público, etc. Assim, sociedades com índices mais altos de capital social teriam
também maior igualdade social e política de gênero (CAIAZZA e PUTNAM, 2005;
SACCHET, 2009).
Redes interpessoais são influenciadas por questões de gênero, pois homens e
mulheres tendem a apresentar índices similares de capital social, mas advindos de
grupos com características diferentes. Os homens tendem a participar em grupos mais
heterogêneos, como trabalho, economia e lazer. O capital social das mulheres,
também via de regra, vem da participação em grupos menores e mais homogêneos
ligados à esfera da família e da comunidade, assumindo uma característica de
voluntariado e tipicamente feminino (GIDENGIL ET AL, 2003; SACCHET, 2009).
61

Numa discussão ampla e resgatando o direito à plena cidadania, é papel da


sociedade e do Estado, [...] encontrar mecanismos que propiciem opções e
oportunidades a quem nunca as teve, entre estas: [...] encontrar caminhos para
combater a exclusão social, garantir os direitos humanos das mulheres e obter
equidade de gênero (BAQUERO, 2007, p.90). A articulação destes mecanismos
envolve os elementos de capital social não apenas em nível econômico, como também
social e pessoal.
Portanto, Putnam (2005); avaliando o que se constitui o capital social em
sociedades equilibradas, com uma cultura de aceitação dos direitos e das
necessidades dos outros, cujas políticas de gênero são desenvolvidas e capazes
devem abranger as pautas feministas de forma igualitária e com respeito às
individualidades. Nesta perspectiva altos índices de capital social podem favorecer
também a igualdade de gênero, e por analogia, o sentimento de pertencimento e
empoderamento feminino.
É neste contexto que as mulheres rurais foram construindo suas histórias de
luta em direção a consciência de suas liberdades, a autonomia e ao empoderamento,
abrindo caminho para seu reconhecimento enquanto indivíduo.

2.7 LUTAS E HISTÓRIAS ADORMECIDAS NA CONSTRUÇÃO DO


ASSOCIATIVISMO

Todos os levantamentos históricos feitos no sentido de compreender a


realidade atual das agricultoras associadas à AAFEMED, bem como as influências
recebidas e impressas nas atitudes cotidianas, mostram como as mulheres rurais se
organizaram, ao longo dos anos 1980-90, para reivindicar seus direitos, buscar
igualdade e se posicionar em favor da equidade de gênero.
Mas há ainda uma história anterior a este período, e que tem influência direta
e participação ativa na construção das lutas das mulheres do Paraná, sobretudo as
rurais. Entre os principais movimentos influenciadores está a Teologia da Libertação,
que deu força aos movimentos populares de 1960, quando se firmou como “uma
releitura do Evangelho na ótica da solidariedade com os pobres e oprimidos” (KNAPIC,
62

2005, p.63); em um momento de modernização da Igreja com o Concílio Vaticano II,


e de grandes mudanças sociais e políticas na América Latina, o que oportunizou o
surgimento de outros movimentos.
Neste período, motivada por este movimento de transformação social e política,
surgia o que Knapic (2005, p.65), chamou de “uma tendência inovadora, a esquerda
católica”, o MEB – Movimento de Educação de Base, sob a coordenação de Paulo
Freire. O foco do movimento era a alfabetização, conscientização dos excluídos para
que se tornassem protagonistas de sua própria história. Nascia aí alguns dos
principais conceitos de Paulo Freire, entre eles o embrião das discussões sobre
empoderamento.
Já no final da década de 1960 e início de 1970, o tema da libertação –
econômica, cultural, política e religiosa – torna-se central para os teólogos católicos.
Boff (1986, p.8) aponta que “[...] quando da Teologia da Libertação fala de pobres
inclui toda essa gama de oprimidos [...] negros, índios, mulheres [...] que merecem
participar da vida e da liberdade [...]”.
Em plena Ditadura, em 1975, dentro da Igreja Católica, surgiu a CPT -
Comissão Pastoral da Terra, na Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB),
como resposta às questões referentes principalmente ao desmatamento da
Amazônia, as causas indígenas, o abuso aos direitos dos trabalhadores rurais,
invasão de terras e assassinatos de líderes dos movimentos sindicais e populares.
Ao longo de sua atuação passou a assumir um posicionamento político mais próximo
da esquerda e de cunho ecumênico, com forte participação da IECLB - Igreja
Evangélica de Confissão Luterana no Brasil. A Igreja católica, porém, nunca deixou
de atuar intensamente, através da participação dos padres e religiosas nas frentes de
luta e no enfrentamento da ditadura. Posteriormente, a bandeira de maior importância
da Pastoral da Terra passou a ser a reforma agrária.
A Comissão Pastoral da Terra – CPT, teve grande influência no processo de
formação do MPMP. A CPT surge em 1975 ligada à Igreja Católica. Com isso
adquiriu caráter ecumênico, tanto no sentido dos trabalhadores que eram
apoiados, quanto na incorporação de agentes de outras igrejas cristãs, como
a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil – IECLB. [...] A CPT
atuou na luta pela Reforma Agrária, dos atingidos por barragens, pelos
direitos humanos e também na luta pela valorização e libertação da mulher
camponesa (GADELHA et al, 2017, p.187).
63

Já as CEBs – Comunidades Eclesiais de Base, nascidas na década de 1950,


junto com a CNBB, adquiriram uma grande força na década seguinte, como
movimentos populares, inicialmente na zona rural e depois para as cidades.

O mais importante neste processo era a possibilidade de intervir


coletivamente sobre a realidade, onde as pessoas se descobriam
participando delas não como expectadores, mas como agentes
transformadores da mesma (KNAPIC, 2005, p.73).

Na década de 1980, o Brasil vivia o clima político do movimento das Diretas Já.
Mas não era apenas esta bandeira que movimentava os grupos sociais, em especial
os minoritários, cujas pautas se encontravam à margem das grandes discussões
nacionais.

A inclusão das mulheres rurais trabalhadoras ocorreu ainda mais tarde,


principalmente porque, para poder receber os benefícios da previdência
social deviam, antes de mais nada, ser reconhecidas como trabalhadoras
rurais. Esse reconhecimento, por sua vez, era de difícil comprovação, tendo
em vista que grande parte do trabalho feito por elas é invisível, sendo
geralmente declarado como “ajuda” às tarefas executadas pelos homens e,
com frequência, restrito às atividades domésticas, mesmo que essas incluam
atividades vinculadas à produção. Assim, no início considerado como
“dependentes”, seja dos pais ou dos maridos, passam paulatinamente a
serem vistas como “autônomas”, portadoras de direitos individuais, o que lhes
permite serem incorporadas como beneficiárias da previdência social
(BRUMER, 2002, p.3).

Neste grupo de minorias, embora não por número, mas por


representatividade, estava a categoria de mulheres rurais, que além do sistema
patriarcal histórico também lutavam por cidadania e direitos básicos. Carneiro (1987,
p.11), salienta que “a participação de mulheres em movimentos sociais no campo
toma uma característica singular na década de 80 quando são realizados os primeiros
encontros voltados para problemas que lhes são específicos”.

A mobilização das mulheres rurais não se formou na prática sindical, mas a


partir de debates das condições de vida, realizadas em pequenos grupos, a
maioria de matriz religiosa ligada às pastorais. [...] As mulheres vão
percebendo que são exploradas, que elas trabalham sem ter direito a
benefício algum, que não são ninguém, que o “macho manda”, que elas são
submissas e seu trabalho não é reconhecido (TEDESCHI, 2014, p.62).

O desenvolvimento do empoderamento feminino, de acordo com Ferrari (2013,


p.2), passa por alguns pré-requisitos que precisam estar presentes “na sociedade,
pelo conhecimento dos direitos da mulher, por sua inclusão social, instrução,
64

profissionalização, consciência de cidadania. [...] por uma transformação no conceito


que ela tem dela mesma, em sua autoestima”.
A busca por mais visibilidade das mulheres, passa pela dificuldade em contar
e valorizar a sua participação na história. Nos anais oficiais, o papel de protagonista
raramente pertence às mulheres, ainda que o tenha sido em realidade, o que para
Perrot (2015, p.21), é explicado porque “sua presença é frequentemente apagada,
seus vestígios, desfeitos, seus arquivos, destruídos”.

Tal fato não implica, porém, que a mulher estivesse ausente das lutas
travadas por camponeses e trabalhadores rurais em momentos anteriores.
No entanto, observa-se, nessa época, uma mudança na qualidade desta
participação. Até então, a inserção feminina nos movimentos sociais no
campo realizava-se, normalmente, através da participação dos respectivos
maridos ou de outros familiares (CARNEIRO, 1987, p.11).

Os movimentos sociais foram se organizando por Estado e concentrados nas


maiores cidades, ou aquelas com um movimento já em ebulição. O Movimento
Popular das Mulheres do Paraná – MPMP, saiu de Curitiba e se instalou nos
municípios do interior, onde começou a trabalhar as pautas comuns às mulheres
rurais. O cunho dessas pautas, pelo momento histórico, era característico de
esquerda, reunindo as comunidades através das Igrejas Católica e Protestante, com
as Comunidades Eclesiais de Base.
Era também um período de ebulição do Movimento Sem Terra no Brasil. O
MST, muito ligado à Teologia da Libertação da Igreja Católica, neste período histórico,
passou a estimular a participação também de mulheres na luta. Na análise de Leite e
Oliveira (2016, p.183), “essas mulheres têm se revelado ao longo de anos, na história
de muitos assentamentos, como importantes agentes de articulação com o poder local
e na elaboração de alternativas produtivas”, de forma a impactar as bases de dois
ambientes que são, ainda hoje, destinados às mulheres no mundo rural: subordinada
ao marido, como cuidadora do lar e dos membros da família, e a invisibilidade de suas
atividades produtivas, tidas como apenas uma ajuda no espaço da agricultura familiar
(LEITE; OLIVEIRA, 2016). Porém, a atuação das mulheres era muito presente e
possuía uma importância grande para a manutenção do movimento, até mesmo e em
especial em momentos muito críticos, como os conflitos de reintegração de posse das
propriedades invadidas.
Na região oeste e sudoeste do Paraná o clima era ainda mais agravado pelas
desapropriações e indenizações realizadas em função da construção de Itaipu
65

Binacional. Muitos agricultores indenizados, em função da conjuntura econômica


nacional com uma inflação e desvalorização muito rápida da moeda, da
supervalorização das terras na região e do pouco hábito que esses pequenos
agricultores tinham em lidar com negociações, acabaram procurando um lugar sob as
lonas dos acampamentos do Movimento Sem Terra.
Um desses movimentos, que teve grande importância para que as mulheres
rurais saíssem da subalternidade e deixassem as tarefas ditas menores da casa para
um segundo plano, da horta e dos pequenos animais, e passassem a frequentar
reuniões e encontros de formação e aprofundamento, foi no MPMP – Movimento
Popular de Mulheres do Paraná2, contribuindo para uma mudança radical na forma
como as mulheres rurais viam a sua participação na família, na propriedade, na
comunidade e na percepção de sua própria liberdade.
Com os movimentos sociais em ebulição, as igrejas apoiando as bases, e a
pauta da mulher emergindo, é que começaram a acontecer os encontros do MPMP
em todo o Paraná. O primeiro evento que reuniu as mulheres aconteceu em 20 de
novembro de 1981, no município de Francisco Beltrão. Participaram mulheres de
Castro, Medianeira, Curitiba, Capanema e Turvo, representando o que se consolidaria
mais tarde em sete regiões do Paraná. O 1º Encontro de Mulheres do Paraná buscava
discutir especificamente as pautas femininas, e já possuía 4 experiências realizadas
com mulheres rurais. Este evento é considerado o marco do MPMP, pois a partir daí
as sete regiões do Estado começaram a formar suas bases de atuação junto às
mulheres, sendo que cada região respeitou suas especificidades e procurou trabalhar
conforme a realidade de cada local (KNAPIK, 2005)3.
Na década de 1990 as CEBs foram se transformando e se engajando em novas
pautas e novos movimentos que passaram a fazer parte das lutas sociais da cidade e

2
Paralelamente, outros movimentos do mesmo cunho se desenvolveram nas diversas regiões do
Brasil, dentre eles o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Rio Grande do Sul (MMTR),
criado em 1989; o Movimento de Mulheres Agricultoras (MMA) de Santa Catarina, criando em 1983; o
Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Sertão Central (MMTRSC) de Pernambuco, criado
em 1982. Na PB, o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Brejo (MMB) e o Movimento de
Mulheres Trabalhadoras da Paraíba (MMT/PB), criados na década de 1980, a Articulação das Mulheres
Trabalhadoras Rurais da Região Sul, criado em 1988; e o Movimento da Mulher Trabalhadora Rural do
Nordeste (MMTR-NE), criado em 1986. Todos estes movimentos possuíam pautas em comum, e
tinham foco na mulher rural e suas lutas cotidianas por direitos, liberdades e visibilidade (AGUIAR,
2015).
3 Por ocasião da comemoração dos 10 anos do Movimento Popular de Mulheres do Paraná – MPMP,

a Editora Gráfica Popular CEFURIA lançou a Série “Memórias de Lutas Populares no Paraná Pós-
Ditadura Militar”, sendo que coube a Marcia Carneiro Knapik o levantamento detalhado das lutas de
mulheres rurais que antecederam ou foram contemporâneas do MPMP.
66

do campo. Os elementos de reflexão, passaram a ser a preocupação com o meio


ambiente, através dos debates sobre a ecologia, o desenvolvimento sustentável, o
empoderamento da mulher e as situações de violência, as discussões sobre gênero,
o racismo, etc. Estas pautas foram arduamente discutidas nos movimentos, passando
a gerar transformações políticas, econômicas e sociais palpáveis e definitivas tanto
no meio urbano quanto rural.
Sobre esse período, Knapic (2005, p.76), ressalta que “a importância das CEBs
foi imensa, na sua contribuição no movimento sindical, no movimento de
trabalhadores rurais, na organização das bases e principalmente nos movimentos
populares”.
Em 2000, um movimento nacional marca um novo momento na vida das
mulheres rurais de todo o Brasil, vindo também a influenciar as mulheres de
Medianeira, participantes do MPMP: a Marcha das Margaridas4.
No processo histórico e político de organização das mulheres rurais,
destacam-se a agência da Igreja, por intermédio das CEBs e pastorais; a
emergência do “novo sindicalismo” e das “oposições sindicais” e a atuação
do movimento feminista. Aspectos importantes a serem considerados para se
compreender as questões que conduziram ao surgimento da Marcha das
Margaridas no ano de 2000, os elementos que a constituem, sua forma de
organização desde a articulação de movimentos e organizações com
histórias distintas – e concepções nem sempre convergentes –, suas metas,
estratégias estabelecidas. Ainda, as características que a diferenciam da
forma de fazer política do Movimento de Mulheres Camponesas, com o qual
apresenta uma clivagem política importante (AGUIAR, 2015, p.56).

A marcha tornou-se uma manifestação de mulheres rurais de todo o Brasil,


organizada pela Contag - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
que acontece desde o ano de 2000, sempre no dia 12 de agosto, como forma de
lembrar, homenagear e protestar a morte de Margarida Maria Alves, líder sindical e
trabalhadora rural da Paraíba, assassinada em 1983.

4
Um detalhado estudo sobre a história da Marcha das Margaridas foi realizado por Vilenia Venâncio
Porto Aguiar em 2015, em sua Tese de Doutorado. A análise parte de uma etnografia da Marcha das
Margaridas 2011, considerada um movimento que se expressa numa manifestação pública, assumindo
a forma de uma marcha que ocorre a cada quatro anos na capital federal, Brasília. Ao mesmo tempo
em que procura estabelecer processos de diálogo e negociação com o Estado, a Marcha busca dar
visibilidade às mulheres do campo e da floresta. A Marcha que abarca uma pluralidade e uma
diversidade de mulheres, agricultoras familiares, trabalhadoras rurais, assentadas, quebradeiras de
coco, seringueiras, extrativistas, ribeirinhas, pescadoras, quilombolas, mulheres do campo, das águas
e das florestas. A tese discute a constituição desse sujeito político em termos de pluralidade,
diversidade e de busca de uma linguagem e de uma identificação que agregue os seus diversos
interesses, sem, contudo, desconsiderar as diferenças e as subjetividades.
http://www.memoriaemovimentossociais.com.br/sites/default/files/publicacao/tese_somos_todas_mar
garidas_finalizada_03_de_agosto_de_2015_1.pdf
67

[...] a Marcha das Margaridas se consolidou como uma ampla estratégia de


luta que agrega milhares de mulheres do campo, das águas e da floresta de
todo o país. Com alegria e colorido, as mulheres vêm à público performatizar
um ato-manifesto que reúne pautas, de norte a sul do país, na luta contra
retrocessos e pela garantia de direitos. A força política de mobilização da
Marcha rasga com os estereótipos de previsibilidade, calmaria, resignação e
silêncio, muitas vezes destinados às mulheres no imaginário social
(MACIAZEKI-GOMES; HERRERA ORTUÑO, 2020, p.4)

Um dos grandes resultados da Marcha, sem dúvida, foi mostrar às mulheres


que elas não estão sozinhas, que são milhares, e juntas se tornam uma multidão de
trabalhadoras rurais de muitas raças – indígenas, negras, brancas, miscigenadas -
criando a força intangível que seria necessária quando do retorno às suas regiões,
para suas lutas locais. Assim a Marcha das Margaridas passou a ter importância
estratégica também para a formação das mulheres do MPMP.

Tabela 5 - Avanços e conquistas dos movimentos das mulheres rurais no Brasil


Década de Movimentos de mulheres rurais, que buscavam reivindicar e conquistar seus direitos
1980 como cidadãs, sindicalização, documentação, direitos previdenciários e participação
política. Dentre estes movimentos, destaque para o Movimento Popular de Mulheres
do Paraná – MPMP.
Reuniões, encontros, passeatas e coleta de assinaturas para reivindicação das
pautas femininas, que em sua maioria foram incluídas na Constituinte de 1988.
1990 Intensas mobilizações como o movimento das mulheres rurais.
2000 Movimento “Marcha das Margaridas” que garantiu às mulheres rurais o direito a
posse e a titulação conjunta da propriedade da terra, contribuindo para autonomia
econômica.

2003 A titulação conjunta da terra para áreas constituídas por um casal passa a ser
obrigatória.
2004 Programa Nacional de Documentação da Mulher Trabalhadora Rural, pelos
documentos civis e trabalhistas para as trabalhadoras rurais.
2005/2006 Direito das mulheres realizarem, através do PRONAF Mulher, operações de
microcrédito rural para o desenvolvimento de atividades produtivas.
Fonte: Rua; Abramovay (2000).

A forma como se configurou a participação das mulheres nas mais diversas


frentes de lutas, dos sem terra, movimentos políticos, igrejas católica e luterana,
Pastoral da Terra, comunidades eclesiais de base, clubes de mães e associações,
mas principalmente na organização do Movimento Popular de Mulheres do Paraná -
MPMP, coloca as agricultoras da AAFEMED como um resultado híbrido desta mistura
social, cultural e ideológica que precedeu a Constituição de 1988 e nos anos seguintes
assumiu postura de contramovimento em favor dos direitos das mulheres rurais ainda
a serem conquistados.
68

Historicamente, o MPMP caracteriza-se como o movimento popular de


mulheres que deu origem ao MMC/PR – Movimento de Mulheres Camponesas do
Paraná. Knapik (2005) descreve uma forte articulação em várias cidades do Estado,
entre elas Medianeira, Cascavel, Castro, Turvo, Capanema e a capital, Curitiba. Os
registros históricos mostram que o Primeiro Encontro de Mulheres foi feito em
Francisco Beltrão em 1981, organizado por agentes da Pastoral da Terra, com objetivo
de ampliar a formação das mulheres, participação nas organizações sociais, e iniciar
um processo de empoderamento (GADELHA et al., 2017), ainda que nesse período
não se usasse a palavra para denominar a intenção do encontro, que culminou com a
criação do MPMP.
Com objetivos pautados na valorização da mulher, que era um tema em
ascensão, sobretudo na luta contra uma opressão e desigualdades alicerçadas no
patriarcado, o MPMP já nasceu com muita força. Knapik (2005), cita 03 linhas centrais
de atuação: a autovalorização da mulher; conscientização de homens e mulheres
sobre o patriarcado como ferramenta do capitalismo e a discussão de um novo modelo
de sociedade. A metodologia que o MPMP aplicou foi o simbolismo das bandeiras.
Inicialmente eram 04 bandeiras de luta que surgiram em 1985 e resumiam as pautas
gerais das reuniões das mulheres, que se tornavam específicas quando discutidas
dentro das realidades regionais. Uma interessante descrição do desenvolvimento
dessas bandeiras foi feita por 03 estudos realizados cronologicamente por Ferreira
(1993), Holleben (2003) e Knapik (2005), que estão brevemente comentadas a seguir:
a) Bandeira “Mulher e Bíblia” – fazia uma releitura da Bíblia na ótica da mulher, e
surgiu na Teologia da Libertação, quando se discutia a opção preferencial pelos
pobres, como teologia a partir da mulher. Procurava transformar a visão
submissa da mulher na sociedade pela visão das heroínas libertárias do povo
hebreu na Bíblia. Esta bandeira teve um papel muito importante na formação
das mulheres em acampamentos e assentamentos, trabalhando as diferentes
realidades;
b) Bandeira “Mulher e Sindicato” – surgiu quando os grupos de mulheres
passaram a se reunir e discutir e trocar experiências de luta, pautas de
reivindicação e representatividade. A maior luta dessas mulheres foi enfrentar
a discriminação e preconceito dos próprios sindicatos que deveriam
representá-las, mas que pensavam e agiam no sindicato como espaço só de
69

homens. As maiores conquistas foram importantes vitórias em pontos cruciais


para o processo de empoderamento das mulheres, dentre eles a capacitação
de mulheres para assumir postos de comando dentro dos sindicatos, a luta pelo
reconhecimento legal da profissão de agricultora e seus direitos, lutar pela
reforma agrária, capacitação de mulheres agricultoras, etc;
c) Bandeira “Mulher e Política” – por alguns chamada de “Mulher e Constituinte”
pelo momento histórico da Assembleia Nacional Constituinte que o Brasil vivia,
e posteriormente se dedicando à conscientização e formação política das
mulheres nas suas bases. Teve papel fundamental na elaboração da Lei sobre
Aposentadoria e Previdência e na participação das mulheres como candidatas
a cargos políticos. Usou a dinâmica de elaborar cartilhas e trabalhar com as
bases as principais temáticas ligadas aos direitos legais da mulher e a
participação no processo democrático através do voto e representatividade
política da mulher;
d) Bandeira “Mulher e Saúde” – foi a primeira e ganhou relevância entre as bases,
pois discutia sexualidade, gravidez e contraceptivos, planejamento familiar,
saúde tradicional e alternativa, convivência familiar, etc. Tentava mostrar às
mulheres uma tomada de consciência do corpo, do domínio e das liberdades
sexuais, maternidade, e um sentido de resgate do seu poder ancestral de cura
através da manipulação de ervas medicinais e da saúde alternativa.

Sobre esta bandeira da saúde, cabe citar com elevado destaque a criação do
Centro Popular de Saúde Yanten, uma entidade filantrópica com fins de fomentar a
produção de plantas medicinais e cursos de formação para agricultores e agricultoras
familiares com vistas a discutir os problemas cotidianos das famílias, relacionando as
doenças com questões que iam desde as relações de trabalho e produção, baixa
qualidade de vida, pobreza, sistema de saúde precarizado, alimentação inadequada,
destruição do ecossistema e da natureza local, até a escolha do modelo político,
econômico, social e cultural do país.
Posteriormente, com a expansão das discussões e a presença das mulheres
em praticamente todas as áreas dos movimentos sociais, mais três bandeiras de luta
foram agregadas às 04 primeiras:
70

a) Bandeira “Mulher e Educação” – buscou desenvolver uma metodologia na


ótica da mulher para capacitação no MPMP. Na prática, ia desde
campanhas de alfabetização das mulheres a lutar para que a educação
formal formasse cidadãos mais críticos, sem preconceito e mais plural;
b) Bandeira “Mulher e Meio-ambiente” – era a percepção do colapso do meio
ambiente e a denúncia contra a poluição industrial, desmatamento e
contaminação dos rios. Ao mesmo tempo foi quando começou uma
conscientização mais expressiva sobre as questões ambientais, como
reciclagem do lixo, uso de produtos biodegradáveis, consumo responsável
e alimentação mais saudável;
c) Bandeira “Mulher e Autossustento” – buscou discutir desde a dependência
do Brasil a outros países, como a do agricultor ao governo brasileiro. Deu
ênfase ao ensino de como funciona o capitalismo, ao mesmo tempo, que
fortalecia as ações coletivas e comunitárias, com a ideia de que as
mulheres precisavam estar em todas as etapas da cadeia produtiva. Desta
forma o MPMP estimulava o trabalho auto gestionário, na perspectiva de
que liberdade só é possível se ela for também financeira.

Escolhidas por interesse pessoal e/ou por necessidades da sua região de


atuação, as bandeiras de luta foram a forma que o MPMP encontrou para dar
formação a estas mulheres. Saúde era a mais procurada, seguida da bandeira da
Bíblia e em menor número as da Política e Sindicato. A conclusão é que estas últimas
exigem maior formação, entendimento e conscientização.
Os encontros de formação eram de nível estadual e regional, reforçados por
encontros nacionais. Assim as participantes dos encontros tinham a incumbência de
repassar o conteúdo das formações às mulheres de sua comunidade, muitas vezes
no Clube de Mães ou em reuniões na igreja.
Estes esforços foram refletidos nos municípios e comunidades rurais e
principalmente em cada mulher agricultora participante, e foram responsáveis pelos
inúmeros desdobramentos em organizações civis que mudaram a história das
sociedades locais. Destes desdobramentos surge também o objeto de estudo desta
pesquisa.
71

3 MATERIAL E MÉTODOS

Este estudo de caso é exploratório pois, segundo Richardson et al (2012),


“busca conhecer as características de um fenômeno para descobrir onde pode haver
melhorias”. O corte proposto é transversal, em 2020 sem considerar a evolução dos
dados no tempo.
Os dados de fontes primárias foram coletados por meio de questionários e
entrevista. Os dados secundários foram coletados nos registros da organização
bibliográfica científica.
A Instituição em estudo possui hoje 126 famílias de agricultores familiares
associados, dos quais 55 são consideradas inativas; três dos proprietários são
solteiros e um é viúvo. Além desses casos, em sete famílias as mulheres possuem
trabalho na área urbana e não participam das tarefas da propriedade. Ao excluir-se os
casos mencionados, a população pesquisada foi de 60 mulheres agricultoras
familiares, que foram convidadas a participar espontaneamente da pesquisa. Destas
mulheres associadas convidadas através de abordagem da entrevistadora, 61,66%
(37) concordaram em participar da pesquisa.
Os instrumentos de coleta de dados se constituíram de um questionário e uma
entrevista. O questionário, em sua primeira parte se propôs a levantar o perfil das
agricultoras com 24 questões com escalas diversas (APÊNDICE 1).
A segunda parte do questionário foi constituída de 30 questões sobre
empoderamento e capital social, e, nesta etapa, 15 questões têm escala de
contribuição (nada contribui, pouco contribui, contribui e muito contribui). A opção pela
escala par serviu para evitar a tendência central e conseguir dados mais precisos a
respeito da opinião das respondentes. As outras 15 questões consideram o antes e o
depois da participação na AAFEMED, com escalas (melhorou, continuou igual, piorou)
(APÊNDICE 2).
Por sua vez, a entrevista, com 54 questões, foi utilizada para elaborar um
minidocumentário, com a devida autorização prévia das agricultoras, com vistas a
registrar o estudo que ficará na AAFEMED como patrimônio histórico, cultural e
contribuição para o desenvolvimento rural (APÊNDICE 3).
72

Frente ao que foi apresentado anteriormente, segue tabela das variáveis a


serem utilizadas, escolhidas de acordo com o contexto e afinidade do tema.

Tabela 6 – Variáveis pesquisadas


VARIÁVEL INDICADORES DE EMPODERAMENTO
PARTICIPAÇÃO CAPITAL SOCIAL (Sentimento de pertencer, autoestima
elevada, autovalorização, convicção
interna de controle, postura ativa e proativa
e capacidade de adaptação).
ECONÔMICO
Participar da status, recompensas financeiras, Contribuição ao empoderamento
AAFEMED participação cívica, investimento
financeiro.
SOCIAL
Participar da pertencimento, apoio social, Contribuição ao empoderamento
AAFEMED cooperação, apoio emocional
PESSOAL
Participar da confiança, poder pessoal, Contribuição ao empoderamento
AAFEMED respeito, reputação
Participar da ANTES E DEPOIS
AAFEMED Melhorou, continuou igual, piorou Melhorou, continuou igual, piorou
Fonte: Dados do estudo, 2020

O método de filmar e gravar a pesquisa sendo realizada in locco, sem nenhum


preparo prévio do (a) pesquisado (a), busca interpretar a linguagem corporal e
emocional impossível de ser expressa no formulário escrito (LIMA, 2015). Sob essa
ótica, é salutar apresentar a importância dos vídeos e das transcrições para pesquisas
qualitativas. Autores como Pallatieri e Grando (2010) destacam a importância dos
vídeos para o professor que quer compreender mais o pensamento de seus alunos.
Os autores defendem

A vídeogravação como instrumento fundamental para registrar esse


movimento das ações mentais e corporais. Ou seja, através dos vídeos, o
professor tem a possiblidade de perceber nas ações corporais das crianças
(ao interagir com materiais) um possível movimento do pensamento
acontecendo [...] (PALLATIERI; GRANDO, 2010, p.23).

Pallatieri e Grando (2010), destacam especificamente o vídeo como


instrumento para entender o pensamento de crianças, como registro de ações mentais
e corporais, o que se busca captar na maioria das pesquisas qualitativas.
Como instrumento de pesquisa,

o vídeo é um importante e flexível instrumento para coleta de informação oral


e visual. Ele pode capturar comportamentos valiosos e interações complexas
e permite aos pesquisadores reexaminar continuamente os dados. Ele
estende e aprimora as possibilidades da pesquisa observacional pela captura
do desvelar momento-a-momento, de nuances sutis na fala e no
73

comportamento não verbal. E é superior às notas do observador, uma vez


que não envolve edição automática (MARTIN, 1999, p.86).

Na análise do aspecto metodológico de se utilizar o vídeo como instrumento de


pesquisa, conclui-se que é de extrema importância para as pesquisas que utilizam tal
metodologia, pois permitem aos pesquisadores observar detalhes que, talvez, passam
despercebidos no decorrer da pesquisa de campo.
O documentário segue o formato Storytelling que coletou histórias dessas
mulheres rurais, permitindo levantar dados qualitativos por meio da captura de
imagens que transcrevem sentimentos, sensações, medos, relutâncias, recusas,
repulsas, discrepâncias e outras reações sutis que dificilmente são reveladas em
entrevistas estruturadas.
Convencionou-se selecionar as histórias mais relevantes com linhas diferentes
que foram escolhidas por adesão das associadas, para posterior entrevista.
a) Estilo da narrativa: foi em formato de Storytelling, estilo que utiliza recursos
audiovisuais para contar histórias, utilizando-se das palavras do entrevistado;
b) Cenário: buscou sempre coletar as imagens no ambiente natural da
pesquisada. Não modificou o ambiente em função da coleta de imagem.
Sempre o mais real possível, pois tratou-se de um documentário;
c) Coleta de imagens (filmagem): foi feita pelo entrevistador e uma auxiliar
técnica propositadamente mulher, para que não houvesse nenhum
constrangimento em relação à presença de um elemento do gênero masculino;
d) Imagens: foram captadas imagens gerais da propriedade e pequenos detalhes
do cotidiano para complementação;
e) Roteiro: foram feitas perguntas iguais para todas as entrevistadas, em
linguagem coloquial, buscando captar respostas emocionais de cada uma. A
entrevistadora teve a liberdade de mudar o estilo de pergunta para adaptar ao
entendimento da entrevistada, sem, contudo, mudar seu significado. Algumas
perguntas foram respondidas em bloco ou simplesmente suprimidas;
f) Material técnico para captação de imagem e som: foi utilizado 03 celulares,
01 microfone de lapela, 01 microfone de captação de ambiente, um
estabilizador de imagem para celular e 01 tripé grande para celular.
74

As falas mais relevantes foram transcritas e utilizadas no contexto da origem


da AAFEMED e na complementação das informações quantitativas já apresentadas.
A seleção das mulheres rurais associadas à AAFEMED para o documentário
foi feita através de uma história de vida que representasse um determinado grupo de
agricultoras com uma caminhada semelhante e por adesão espontânea. Além das
mulheres que vivenciaram os anos anteriores à fundação da AAFEMED. Assim, a
combinação destes parâmetros culminou nas 11 mulheres entrevistadas.
O código barramétrico bidimensional (QR Code) foi utilizado como forma de
facilitar o acesso do leitor ao vídeo/documentário, sem precisar que o mesmo esteja
anexo à dissertação. O arquivo original do vídeo/documentário se encontra
armazenado no site oficial de PPGDRS - Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Rural Sustentável.
75

4 RESULTADOS

Os resultados e discussões foram apresentados em três abordagens, sendo


que a primeira é composta pelo resgate histórico da criação da AAFEMED e junta
informações de pesquisa documental, além de depoimentos colhidos durante as
entrevistas com as mulheres associadas; a segunda apresenta os dados e análises
das informações coletadas por meio dos questionários da pesquisa; e a terceira é
composta pelo documentário, gravado durante todo o processo de pesquisa. Estas
etapas são relacionadas e interdependentes e compõem de forma única as
considerações finais do estudo.

4.1 OS MOVIMENTOS DE LUTA DAS MULHERES RURAIS NO CAMINHO DA


CRIAÇÃO DA AAFEMED

No município de Medianeira houve uma grande participação das mulheres nos


movimentos anteriormente descritos, principalmente pela formação de lideranças
femininas que buscavam levar as pautas das agricultoras às instâncias superiores.
Fortemente vinculado ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais, tiveram apoio da Igreja
Católica, através de nomes como o padre Adriano Van de Ven, padre Tomaz Hughes,
padre Arturo Pauli, padre Shigeyuki Nakanose (Shigue), Irmã Maria Sônia, Bispo Dom
Olívio Fazza, pastor Fux, Teolide Parizotto Turcatel, Iraci Maino, entre outros e outras.
Torna-se importante ressaltar que já nos primórdios dos movimentos a liderança de
várias mulheres já despontava.
Padre Tomás era um líder para nós. Padre Tomás, padre Patrício e padre
Adriano. A Teolide era coordenadora da catequese e eu era catequista. A
gente ia lá e ela ensaiava os cantos. E aquele jeito, aquela voz inspirava. Ela
cantava e a gente já aprendia... A gente era mais jovem também, e aprendia
fácil... (risos) Eu lembro... era assim: -“Quem disse que somos nada, que não
temos nada para oferecer, repare nossas mãos abertas trazendo as ofertas
do nosso viver...” são coisas que ficaram gravadas na mente... hoje não se
canta mais isso na Igreja. Hoje parece que até o Deus modificou. Antes
parece que Deus estava próximo, ele caminhava com a gente. Hoje parece
que ele está longe... que a gente tem que buscar lá no céu (JANETE,
entrevista em 07 de outubro, 2020).
76

Uma das lideranças foi marcadamente exercida por Teolide Turcatel, também
fundadora do Centro Popular de Saúde Yanten5, uma organização não governamental
sem fins lucrativos com objetivo de trabalhar e desenvolver a saúde da mulher através
das plantas medicinais.

O MPMP foi um movimento que surgiu da necessidade de buscar a questão


da saúde da mulher. Então nós começamos assim nós aqui em Medianeira
era eu Pedronilda, Inês Ribeiro, Zélia Santin, Iraci Maino e mais algumas
outras mulheres, mas nós éramos mais a linha de frente. A gente começou
juntar as mulheres para discutir a questão da saúde da mulher. Romper com
muitos tabus, na questão do corpo, do pecado, dos nomes que se dava para
o corpo da mulher, para as partes genitais. Enfim, foi assim buscar este
entendimento e desmistificar todos estes tabus E aí a gente também começou
a lutar na questão da organização as mulheres para a questão da saúde
pública. Foi ali que nós então começamos [...] (TEOLIDE, entrevista em 03
de outubro de 2020).

Da mesma forma que nas outras cidades do Paraná, o MPMP possuía 04


bandeiras que constituíam suas principais reivindicações perante o cenário do Brasil
pós Ditadura. Havia muito a se conquistar em termos de direitos civis para as
mulheres, como a licença maternidade, o direito à aposentadoria como agricultora, só
concedido aos homens pela Constituição Brasileira. Na sua fala sobre estes tempos
de luta, Dona Teolide expressa o foco do Movimento Popular de Mulheres do Paraná
e as estratégias junto às mulheres:

Tínhamos 04 bandeiras: mulher e sindicato, mulher e direitos, que era


política, mulher e saúde, mulher e Bíblia. Então a gente fazia nas nossas
reuniões tinha um grupo que praticava, por exemplo um grupo comigo, um
você... e um junto com a outra, mas depois no final no plenário todo mundo

5 O Centro Popular de Saúde Yanten é uma Associação fundada em 03 de junho de 1990. Instituição
referência na região oeste do Paraná no trabalho com educação popular em saúde, principalmente com
as plantas medicinais, orientando para o uso correto das ervas, com identificação das diversas
espécies, incentivo à preservação da natureza e realização de práticas populares. Surgiu como
movimento social na década de 1980, junto à Entidade SANEM (Sociedade de Amparo ao Necessitado
Medianeirense), com participação das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) da Igreja Católica e de
outras Igrejas (Luterana); Necessidade de se organizar a população para discutir o acesso de todos
aos serviços públicos de saúde; Grande participação das mulheres nos debates sobre: saúde,
educação, sexualidade, cidadania, sindicalismo, estudos bíblicos na ótica da mulher, alimentação
saudável e plantas medicinais; Organização de hortas comunitárias e de encontros para a produção de
remédios caseiros (pomadas, xaropes, tisanas, xampus, sabonetes). O YANTEN como ASSOCIAÇÃO
(Fundada em 03 de junho de 1990), tem como missão promover a vida, com ações educativas em
saúde e biodiversidade, valorizando o conhecimento popular e científico para o bem de todos. Como
LABORATÓRIO DE PRODUÇÃO DE MEDICAMENTOS FITOTERÁPICOS, obteve autorização de
funcionamento pelo Ministério da Saúde desde 1993.
77

sabia tudo o que tinha acontecido, tá. Então no final era o resumo de todos
os grupos (TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

As identidades de grupo, para Scott (2005, p.18), “são um aspecto inevitável


da vida social e da vida política, e as duas são interconectadas porque as diferenças
de grupo se tornam visíveis, salientes e problemáticas em contextos políticos
específicos” Conforme constatações da pesquisa, as instituições, como a Igreja
Católica e a Luterana no município de Medianeira, tinham uma influência direta e
bastante forte para estas mulheres. Ligadas a um credo que pregava o patriarcado
quase como dogma de fé, a participação do padre Tomás, padre, Sirilo, pastor Fux e
outros, a força da Pastoral da Terra, das comunidades eclesiais de base e a ligação
com movimentos de esquerda como o MST reforçava a necessidade de mobilização
para um empoderamento político, frente às mudanças pretendidas com as Diretas Já
e a nova Constituição a ser promulgada em 1988.

[...] eu era mais religiosa então eu levava a bandeira bíblica, mas era a Bíblia
na ótica da mulher, resgatando as guerreiras da Bíblia e mostrando o valor
da mulher dentro da fé. Tinha daí outra pessoa que fazia a educação política,
tinha outra que falava da mulher e sindicato, assim de canalizar a mulher
(TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

O protagonismo se evidenciava nas ações que aconteciam quando estas


mulheres retornavam às suas regiões e colocavam em prática o que aprendiam nos
encontros. “Éramos muito ousadas, e hoje a gente cala. Porque não era só para ajudar
as mulheres, não era só pela saúde... Era para uma formação política. Sim, porque
éramos movimento popular de esquerda... Era época das Diretas Já...”).

Nós tínhamos formação política, estudávamos o que era uma lei orgânica do
município... O que a gente iria elaborar os projetos... De como que a gente ia
se comportar também como candidata, quais eram as exigências de você ser
uma vereadora, uma prefeita... [...] Fazer a mulher valorizar o seu corpo, fazer
a mulher ser mais companheira do seu marido, discutir as questões da
agricultura familiar... (TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

Na visão de Butler (2003, p.18), “na teoria feminista, a construção de uma


identidade definida, envolvendo a categoria mulheres como sujeito do feminismo,
justifica-se no sentido de propiciar visibilidade às mulheres, considerando que suas
vidas eram mal representadas ou não representadas”. A celebração da fogueira
descrita por Dona Teolide, momento que acontecia durante estes encontros do
MPMP, demonstra todo trabalho no sentido de empoderar estas mulheres para o pleito
político nas suas localidades, para participar das decisões que circundavam a opinião
78

da sociedade brasileira naquele momento de retorno à democracia, em que seria


elaborada uma nova constituição no país.

[...] era para pôr mulheres na política e aí a gente fez um encontrão, primeiro
em Guaíra e depois Curitiba. E daí o pessoal lá, ligado mais à questão
política, dava formação política [...] E aí o que a gente fazia, acendia uma
grande fogueira. Olha o que nós fazíamos. Uma grande fogueira, tinha as
baianas que primeiro faziam uma celebração toda de branco e ficávamos
todas em volta da fogueira. Era tudo uma celebração popular, era linda, gente
eu... Quando eu começo contar essa história eu me emociono... E aí depois
nós, quem tinha pretensão de ser candidata ou que melhor se identificava ia
ao redor da fogueira... As outras ficavam do outro lado da fogueira e a gente
ficava do lado de cá da fogueira, e a gente fazia o discurso, como que a gente
se preparava para fazer um discurso público... [...] Apresentando propostas
que nós queríamos que a mulher levasse como referência na sua candidatura
política. Olha gente, hoje não tem mais isso (TEOLIDE, entrevista em 03 de
outubro de 2020).

Figura 2 - Reportagem do Jornal Mensageiro sobre as ações do MPMP

Fonte: Jornal Mensageiro, edição de 06/04/1989.

Em 1993, da mesma forma que nas outras cidades onde se constituiu o


Movimento, outras bandeiras foram assumidas pelo MPMP, como a da Educação,
baseada em Paulo Freire; a do meio-ambiente que discutia alimentação saudável,
agricultura alternativa e reciclagem; e a bandeira do auto sustento, que evidenciava a
necessidade das mulheres de independência financeira.
As reuniões realizadas começavam a estabelecer as primeiras distinções de
gênero, ainda que não faladas claramente. Como afirmava Léon (1986), o que
mobilizava estas mulheres era a princípio o sentimento de ser reconhecida pela
primeira vez como categoria social e política, começando uma incipiente distinção
79

entre o papel de homens e mulheres, neste começo de mobilização. O que importava


era o fortalecimento de uma identidade rural coletiva. Na fala de Janete Nodari, uma
agricultora familiar do assentamento Sávio de Medianeira, está contida uma história
de luta:
Isso foi em 1986. Foi o primeiro assentamento da região oeste do Paraná. Na
época as mulheres participavam na saúde. Tinha setor da educação, setor
da saúde, setor da higiene, setor da disciplina. A educação? Sempre mulher.
A saúde? Mulher. A saúde alternativa, usava-se muito a saúde alternativa...
Chás... quanto curso que nós fizemos sobre chás... A dona Teolide e a Iraci
Maino... Nossa essas duas mulheres sempre estiveram com nós. E elas
faziam curso de culinária, nossa quanto alimento alternativo que a gente
aprendeu a usar nos cursos, super legal. Então a mulher se destacou muito
(JANETE, entrevista em 07 de outubro, 2020).

As palavras de Dona Teolide corroboram com esta visão:


Antes era nas paróquias nas pastorais nós trabalhamos na constituição de
88, na questão da educação... A questão do menino azul e menina rosa,
desmistificar isso que não tinha nada a ver... Que era coisa assim de as
mulheres ensinar os meninos fazer trabalho caseiro; ensinar as meninas que
elas também podem ser alguém na vida. E aí a gente começou a fazer
também formação política (TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

Ao mesmo tempo, que as lideranças estavam cada vez mais engajadas na


formação dessas mulheres através de inúmeras ações, palestras e cursos, as
mulheres rurais da agricultura familiar começavam a estabelecer uma nova percepção
do seu papel no âmbito familiar e na própria comunidade. Teresa Toniazzo, que na
época possuía vacas de leite e participou da primeira versão da feirinha, que
acontecia sob uma lona, na frente da igreja matriz de Medianeira, descreveu este
momento:
Eu participava do Clube de Mães da comunidade aqui. E a gente saía para
cá e para lá, né. Sempre a gente participava de alguma palestra ou outra. E
sempre eles incentivam, diziam assim óh - que a mulher também tinha
oportunidade de fazer alguma coisa, tinha que ter coragem. Mas a gente
como foi criado na base do medo e sempre que o homem que tomava a
frente, a gente ficava sempre de braços cruzados. Até que chegou uma hora
que a gente tomou coragem e enfrentou também o serviço... As coisas né
(TERESA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

A participação do Yanten, para estas mulheres, foi de uma importância


fundamental, uma vez que se tratava de mulheres que já estavam engajadas
politicamente e já possuíam formação e informação para replicar conhecimento às
outras mulheres rurais.
O reconhecimento sobre esta importância era notório, uma vez que o Yanten,
na pessoa da Dona Teolide Turcatel, e posteriormente da sua filha Roseli, foram
lembradas e citadas por todas as entrevistadas como líderes e formadoras de novas
80

lideranças entre as agricultoras. Teresa, quando perguntada sobre quem promovia os


encontros de formação, respondeu que “a maioria das palestras eram do Yanten né.
Da Roseli do Yanten, que ela convidava muito. Eu participei dos encontros com ela
também, fui em Curitiba com ela né. Quantos encontros com ela... As reuniões dela
ajudaram muito” (entrevista em 31 de outubro de 2020).
Outra importante força deste período de formação de bases para a evolução
da agricultura familiar foi a Sindicato dos Trabalhadores Rurais, que sempre colocava
a mulher como parceira do homem na propriedade, tanto como força de trabalho,
como líder da família e detentora de direitos sobre a propriedade. Sobre isso, Teresa
ressalta:
O Aristeu também né, do sindicato. E ele incentivou muito as mulheres né.
Me guardou muito, né. Ele falou assim para as mulheres saírem de casa, não
ficar só trabalhando e não ver onde vai e o que acontece, né. Para mim ajudou
muito. Foi uma coisa que eu marquei. Que a gente trabalha e trabalha, deixa
que vai, leva né. E não sabe onde vai (TERESA, entrevista em 31 de outubro,
2020).

Merece destaque o MPMP, que trabalhou as bases e uniu as mulheres rurais


para um evento em Brasília, que durou 7 dias e reuniu 1.200 mulheres de todo o país,
culminando na inserção dos direitos das mulheres rurais na Constituição de 1988,
como os direitos trabalhistas e igualdade entre homens e mulheres, o direito às
mulheres da aposentadoria e à licença maternidade, aposentadoria aos agricultores
em regime de economia familiar, com homens a partir dos 60 anos e mulheres a partir
dos 55 anos e à pensão por morte com valor de um salário mínimo a qualquer dos
cônjuges.
A fala de Dona Teolide ilustra estas conquistas históricas para as mulheres
rurais:
Fizemos as mulheres todas trocarem seu título lá na carteira, colocando
AGRICULTORA; porque a mulher não conseguia se aposentar porque não
tem uma profissão DO LAR na carteira para se aposentar. E daí nós fizemos
todas trocar os títulos para mulher agricultora... Era uma profissão que ela
tinha... Com isso ela conseguiu se aposentar. Então nós lutamos muito pela
questão da aposentadoria da mulher agricultora, tamanha a importância
(TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

Todos estes movimentos, encontros, reuniões e marchas culminaram no que


se pode chamar de início do processo de construção de uma identidade política
feminina em todo o Brasil, mas, sobretudo, para a região oeste do Paraná e o
município de Medianeira. Estas mulheres foram as responsáveis por tudo o que veio
depois.
81

Figura 3 - Reportagem do Jornal Mensageiro sobre a comemoração dos 10 anos do


MPMP

Fonte: Jornal Mensageiro, edição de 20/12/1991.

O depoimento da Janete quando perguntada como ela se vê, denota a junção


destes vínculos, sentimentos, orgulhos e valores adquiridos através de gerações.
Eu sou uma campesina. Eu me vejo muito campesina. Me vejo muito assim
na foto da minha vó, ela era campesina... com os traços de índia... eu tenho
no meu sangue lá longe. E a minha vó gostava de pegar as coisas mais da
natureza para se alimentar. Eu adoro mexer na minha horta, com as minhas
flores... [...] eu gosto de estar na natureza...[...] eu acho que sou uma
campesina. Não tem como eu descrever outra coisa (JANETE, entrevista em
07 de outubro, 2020).

Outra entrevistada, a agricultora agroecológica, Claudia Mainatz, que trabalha


essencialmente com orgânicos, assim descreve o seu começo de participação:

A entrada na AAFEMED foi bem inusitada na época, né Janete. Eu acho que


a gente estava fazendo feira lá na avenida né, que era você, era a Tere né.
Eu comecei levando os ovos caipira, o frango caipira, e eu conheci esse
pessoal maravilhoso que é a Tere, a Lidiane... Todos eles iam fazer feira, e
eu peguei o gosto por isso (risos). E daí logo depois a gente comprou esse
sítio aqui né, e eu continuei fazendo parte da AAFEMED. Só que assim, a
gente fazia parte e meio longe distante do que tinha que ser feito. Agora eu
estou mais aproximada do pessoal, assim eu tenho mais conhecimento da
Associação, da cooperativa e coisarada... Eu ganhei com muito
conhecimento nesses anos né, e é importante... a associação e a cooperativa
são importantes para o agricultor... que tá louco (CLAUDIA, entrevista em 24
de outubro, 2020).

O primeiro relato de um espaço físico adequado para os feirantes foi


mencionado em 1990, quando foi criada a Associação dos Feirantes que pleiteou junto
82

à Prefeitura um espaço de melhor estrutura para comercialização. Esse


funcionamento precário da Feira na Praça Angelo Da Rolt, sob pressão constante da
polícia e de comerciantes estabelecidos, durou em torno de 3 anos.
Após isso, em 8 de dezembro de 1990, a prefeitura municipal construiu e
inaugurou 28 boxes de concreto, totalizando 206m2 em um terreno de esquina ao lado
da praça central de Medianeira, ainda com possibilidade de dobrar a capacidade de
exposição. Vilmar Pozzolo se tornou o primeiro presidente da Associação dos
Feirantes que se fortaleceu com o novo local. Naquele novo modelo, ela funcionava
para comercialização dos produtos aos sábados de manhã, somente, pois a produção
dos feirantes era ainda muito pequena para mais dias de venda. Esses produtores
participantes da Associação dos Feirantes viriam mais tarde criar a APROME.

Figura 4 - Evento de inauguração da primeira Feira do Produtor de Medianeira.

Fonte: Jornal Mensageiro, edição de 14/12/1990.

Também no final dos anos 1980 uma entidade internacional organizou os


produtores para a criação da APAM - Associação dos Pequenos Produtores de
Medianeira, que construiu um supermercado para comercialização de produtos da
agricultura familiar no centro de Medianeira.
83

A história da APAM atravessou mais de uma década, porém culminou em


dívidas e falência. Sobre esse período, Janete lembra como era o funcionamento e a
participação das agricultoras no cotidiano da APAM:
Foi feito um projeto da APAM na época, isso foi lá pelos anos 90, final de 80,
depois que a gente já era assentado aqui. Daí foi feito um projeto da APAM e
do Yanten lá. A gente fazia parte da APAM também, e ela foi grande em
Medianeira, nossa. Tinha mercado, tinha feira, tinha caminhão... de caminhão
nós fazíamos feira. Era todo sábado, nós íamos de caminhão. Ele passava lá
pela linha Santa Rita, Maralucia, e vinha aqui pegava nós e levava [...] as 5
horas a gente saía, chegava lá 6 horas, arrumava as coisas e quando abria
nós estávamos prontos para vender nossos produtos. Fazia um queijinho e
levava para feira, as verdurinhas... Nós arrumava tudo nas caixas [...] levava
tudo pra feira... O caminhão passava. A APAM tinha um frigorífico, tinha um
box no Ceasa, daí nós estávamos começando a avançar, né. Porque nós
estávamos produzindo mais... Aí vinha o caminhão e levava nossos produtos
para o Ceasa... a gente estava andando bem... Só que daí era o mercado,
era o box no Ceasa e era o frigorífico, daí a administração não foi lá aquelas
coisas... E faliu (JANETE, entrevista em 07 de outubro, 2020).

Com muitas dívidas, a APAM abriu falência e deixou os associados


desassistidos. Mas os produtores continuaram a trabalhar em cooperação, sendo o
embrião de outras associações.
Nos anos 2000 existia uma forte atuação na região oeste do Paraná do Fórum
Oeste de Entidades para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar. Era uma
entidade que congregava várias instituições e entre elas o Yanten.

[...] ... O Yanten tem na sua base de constituição, está no seu estatuto social,
essa aproximação, essa relação com outras organizações que também
promovam a vida, que também tenham esse comprometimento com o
desenvolvimento; com a defesa da vida, da agricultura orgânica, da
sustentabilidade e também do desenvolvimento da agricultura familiar. A
produção das plantas medicinais é que se dá na agricultura familiar (ROSELI,
entrevista em 24 de outubro, 2020).

O Fórum tinha sede em Cascavel e vários municípios participavam, existindo


nesse período uma discussão muito grande em toda região oeste do Paraná sobre a
produção orgânica de alimentos. Junto ao Fórum Oeste, a Unioeste, campus de
Marechal Cândido Rondon, teve uma participação muito efetiva, inclusive na produção
científica de pesquisar agricultores que estavam em fase de conversão para a
agricultura orgânica, o que motivava essas famílias de agricultores a produzirem e
fazerem essa conversão das suas propriedades para a produção orgânica.
E isso começou a despertar um olhar sobre o nosso município, os agricultores
sempre foram muito organizados. Mas se pensar uma produção agrícola
orgânica no nosso município, para isso eles não estavam organizados. E
junto ao Fórum Oeste, representando o Yanten a gente participou de muitas
feiras, nós tivemos oportunidade de levar nossas mulheres participar dessas
feiras, então isto foi desertando um olhar para o nosso município. [...] Como
84

é que a gente poderia disseminar esse conhecimento no nosso município


(ROSELI, entrevista em 24 de outubro, 2020).

Junto com o Sindicato dos trabalhadores foi viabilizado um curso de formação


aos agricultores voltado às práticas da produção orgânica. Posteriormente foi criada
com apoio da Emater e Prefeitura Municipal de Medianeira, a Comissão Municipal de
Agricultura Orgânica. E todo esse trabalho de formação resultou na criação de uma
Associação que trabalhasse com a produção orgânica no município, que contribuísse
também na parte de insumos, a APROMED – Associação de Produtores Orgânicos
de Medianeira que posteriormente faria parte da formação da AAFEMED –
Associação dos Agricultores Familiares e Ecológicos de Medianeira.
A APROMED - Associação dos Produtores Orgânicos de Medianeira, foi
fundada em 24 de julho de 2002, onde se reuniram membros da comissão municipal
de agricultura orgânica de Medianeira e agricultores interessados na formação da
associação dos produtores orgânicos de Medianeira, com vistas a produzir em
sistema agroflorestal e orgânico. Neste momento da fundação, apenas uma mulher
assinou a ata de presença, Roseli Turcatel, representando a entidade Yanten.

Com as mulheres o trabalho do Yanten sempre foi muito voltado com a


questão do cuidado, da horta, das plantas medicinais, do conhecimento, da
troca... [...] Uma preocupação grande com a saúde da mulher, desse cuidado
dela com seu corpo, de usar as plantas como remédio e como alimento. Da
participação dela nos sindicatos, nas cooperativas e nas associações
(ROSELI, entrevista em 24 de outubro, 2020).

Nesse processo de formação para a agricultura orgânica, reforçado pelas


ações do Fórum Oeste de Entidades para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar,
de toda a formação advinda dos movimentos sociais das décadas anteriores, dos
assentamentos criados para alocar as famílias acampadas, de um mercado em
formação para consumo de produtos coloniais e orgânicos, é que se formou o
ambiente para somar em uma única associação os produtores da APROMED e dos
antigos associados à APAM.

Como surgiu a APAM... A antiga APAM funcionava ali em frente a saída dos
ônibus na Rodoviária. [...] Era também um trabalho de nossas mulheres que
estavam trazendo suas coisinhas para vender, enfim. Eu era pra ser a
presidente, mas depois os homens acharam que deveria ser um outro, e
trouxeram alguém lá de Guarapuava... Funcionou um tempo e depois veio
todo aquele dinheirão da Bélgica praquele projetão, que pra nós ( do Yanten)
sobrou só um tantinho assim. Com a Ann e o Cris que foram os agrônomos,
e eles ficaram com todo aquele dinheirão e montaram aquele mausoléu que
hoje é o Panorama, e foram, foram, foram e expandiram, e depois não deram
85

mais conta, e acabou da noite para o dia fechar, que eu não entro no mérito
deles. [...] (TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro, 2020).

Com o mesmo estatuto da APAM adaptado para a nova Associação, a


AAFEMED, nasceu sociedade civil com personalidade jurídica e sem fins lucrativos,
com sede no município de Medianeira, herdeira dos associados e dos parcos
recursos deixados pela APAM e congregando também os produtores da
APROMED, começou a funcionar em barracas de lona, dividindo espaço com a praça
dos feirantes.
Depois começou um grupo a se reunir e começar a pensar das agricultoras
ter de novo seus produtos, aí começou umas feiras lá perto da praça, aí tinha
a feira dos agricultores, tinha aquela outra feira, daí a prefeitura fez aqueles
coxinhos lá (da Associação dos Feirantes já mencionada). Mas não dava
certo, aí resolveram então os próprios agricultores juntos, maridos, a formar
então a tal da AAFEMED. Aí com a ajuda da prefeitura fez aquele pavilhão
aí... e foi (TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

Nas lembranças de Janete, que na época já morava no Assentamento Sávio


com sua família, o começo da AAFEMED foi uma nova caminhada. “Aos poucos a
AAFEMED foi conquistando, a gente entrou... o Paulo Bussolo era nosso técnico...
Fomos produzir batata doce e milho verde. Depois mandioca, com casca ainda... milho
com palha... Isso faz uns 15 anos” (JANETE, entrevista em 07 de outubro, 2020).
Por isso que eu valorizo muito essa Associação que nós temos aqui, né. E
toda... Toda vez que eu entro na Feira... (emoção e choro) me faz lembrar da
luta, né. Dos agricultores lá... Uma praça ao lado da igreja matriz, que nos
dias de chuva aquele povo estava lá 5 horas da manhã, 6 horas da manhã,
vendendo seus produtos... E eles tinham que, com aquelas lonas pretas, cada
barraquinha tinha um rodo sabe, uma vassoura. E quando acumulava muita
água eles tinham que ir lá e puxar para cima ... Pediam licença pra gente né,
porque eles tinham que tirar a água para que não inundasse a barraca e não
prejudicasse os produtos. Então quando eu olho para essa caminhada e eu
vejo a feira hoje, a AAFEMED, com uma estrutura que é adequada para a
venda dos produtos, eu vejo assim como os nossos agricultores são fortes,
como as nossas agricultoras são fortes... Como é importante nós também
como consumidores valorizarmos o que é produzido no nosso município
(ROSELI, entrevista em 24 de outubro, 2020).

Em paralelo à criação da AAFEMED, as pautas foram tomando novos rumos,


considerando as novas realidades e os desafios de buscar maior valorização das
mulheres rurais perante a própria família, a sua independência econômica e o seu
empoderamento através da equidade de gênero. O ponto alto a cada ano era a
comemoração do Dia Internacional da Mulher, quando encontros cada vez maiores
reuniam a cada ano mais mulheres, com discussões que levavam à reflexão sobre o
empoderamento da mulher.
86

Figura 5 - Encontro do Dia Internacional da Mulher 2012.

Fonte: Acervo pessoal – Roseli Turcatel Motter.

As ações eram realizadas no dia 8 de março, com encontros que reuniam mais
de 800 mulheres de toda a região, em sua maioria rurais, sempre em Medianeira,
onde elas desenvolviam as pautas políticas e sociais, falavam da necessidade de
organização, tinham advogados para encaminhar aposentadoria, e tratavam da saúde
de mulher, com médicas e enfermeiras, discutiam o tema da violência doméstica, e
começaram as primeiras discussões sobre empoderamento feminino.
Os eventos também em relação ao Dia da Mulher, que o Yanten já fazia
anterior a esta data. Começamos a comemorar ano a ano a partir do ano
2000, foi quando eu também comecei a ter uma participação maior, né,
sempre foram muito focados nessa área da saúde da mulher, desse cuidado
dela com o seu corpo, dela usar as plantas como medicamento natural, mas
também como alimento na sua vida, a discussão sobre a participação delas
no sindicato, nas cooperativas, buscando muito essa força feminina... que eu
te digo que ela é de cada uma de nós, né? E eu creio muito nisso, que nós
nos juntamos (ROSELI, entrevista em 24 de outubro, 2020).

Em 2018, aconteceu o último grande encontro de mulheres. Chamado de


Encontro de Mulheres Rurais ligadas à União Nacional das Cooperativas da
Agricultura Familiar e Economia Solidária (UNICAFES), que era nacionalmente
realizado desde 2010, a partir da parceria entre a Reunião Especializada da
Agricultura Familiar (REAF) e Reunião Especializada de Cooperativas do Mercosul
(RECM), que possibilitou o I Encontro de Mulheres Rurais do Mercosul Ampliado,
com o privilégio de ser sediado por Medianeira, e contou com a participação de
representantes do Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai e Uruguai,
somando aproximadamente 1.200 mulheres e jovens.
87

O evento aconteceu em Medianeira justamente por causa desta mobilização


que já existia: A intenção era focar em um município que tivesse trabalho com
as mulheres e que fosse um ponto de potencializar tudo aquilo que já
acontecia e principalmente valorizar essas organizações de mulheres [...]
Trazer para a região oeste e focar em Medianeira, primeiro porque era um
pólo mais central dos municípios; existia uma estrutura que favorecesse a
participação de 1.000 mulheres; e porque existiam organizações que já
faziam toda uma mobilização com as mulheres, e que isso também era
importante para que o evento tivesse sucesso (ROSELI, entrevista em 24 de
outubro de 2020).

Voltado para as questões de gênero, 2018 foi um ano em que a Comissão sobre
a Situação da Mulher (CSW), a reunião mais significativa da agenda das mulheres,
convocada pela ONU, e a Reunião Especializada da Agricultura Familiar (REAF) do
Mercosul, faziam ações específicas para incrementar o alcance dos Objetivos do
Desenvolvimento Sustentável até 2030, discutindo desafios, oportunidades e
similaridades entre os países para se alcançar a igualdade de gênero e o
empoderamento das mulheres rurais. Deste evento se originou um documento
chamado “Carta de Medianeira” (ANEXO 4), que entre outros temas centraliza a
discussão da participação da mulher nos espaços de poder, principalmente no âmbito
da agricultura familiar.

Figura 6 - Reunião de grupos de mulheres no I Encontro de Mulheres Rurais do


Mercosul Ampliado, em Medianeira no ano de 2018.

Fonte: Acervo pessoal – Roseli Turcatel Motter.


O evento que se propôs discutir os desafios e oportunidades para alcançar a
igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres e meninas rurais, trouxe à luz,
dos diversos grupos de discussão a pouca participação equitativa das mulheres no
contexto da ruralidade. “Nós observamos ainda que nas estruturas de representação
da agricultura familiar, quem ainda são os escolhidos na sua grande maioria, são os
homens” (ROSELI, entrevista em 24 de outubro de 2020).
88

Essa Carta foi um momento riquíssimo, de você se encontrar com mulheres


de outras regiões e também de outros países, né... e você perceber que
independente do lugar onde você está, ou da função que você ocupa, até da
tua própria visão de mundo, os desafios que envolvem as mulheres são muito
semelhantes. E uma das discussões que me chamou mais a atenção [...] foi
como ampliar a participação das mulheres nesses espaços de tomadas de
decisões. O que a gente observou na elaboração desse documento, é sim
existe crédito de acesso para as mulheres... como ampliar esse acesso.
Como oportunizar que mais mulheres possam estar ocupando esses
espaços. Já existem mulheres que ocupam esses espaços. Mas como
ampliar para que a gente tenha uma participação mais equitativa das
mulheres. Porque sim, nós podemos... Sim nós podemos (ROSELI, entrevista
em 24 de outubro de 2020).

Este foi o último evento de mulheres realizado em Medianeira com o intuito de


discutir as inúmeras bandeiras de luta. Teve ampla participação das mulheres que
foram convidadas por suas respectivas associações, cooperativas, instituições e/ou
órgãos, porém pouca divulgação nos veículos de imprensa locais e regionais,
denotando que o tema agricultura familiar e as questões de gênero na vida rural,
carecem ainda de muita discussão e mudanças.

Figura 7 - I Encontro de Mulheres Rurais do Mercosul Ampliado, em Medianeira no


ano de 2018 – momento da leitura da Carta de Medianeira.

Fonte: Acervo Unicafes.

Como a própria Carta de Medianeira (2018) deixa claro, “transformar a


sociedade rumo ao desenvolvimento sustentável, com igualdade de gênero, a partir
do associativismo e do cooperativismo, é o desafio que se apresenta”.
A situação das mulheres rurais, de forma geral, continua sendo desvantajosa e
extremamente subalterna aos homens, o que fica claro tendo em vista sua baixa
representatividade nos postos de liderança, sua participação majoritária nas tarefas
89

mal remuneradas e na economia informal, muitas vezes disfarçada de


empreendedorismo. Mas principalmente, continua sendo desvantajosa porque a sua
contribuição para o trabalho, essencialmente das tarefas da casa, dos cuidados com
a família, da propriedade e da terra, continuam invisíveis e sem respeito ou
remuneração.

4.1.1 A AAFEMED na atualidade

Em agosto de 2006, associados de 02 associações, a APROMED e a APAM,


que neste momento passava por um processo de dissolução, depois de intensos
debates sobre os objetivos muito semelhantes das duas associações, e chegando
num acordo, decidiram juntar-se e criar a Associação dos Agricultores Familiares e
Ecológicos de Medianeira – AAFEMED, com o objetivo de fortalecer as famílias de
agricultores familiares e auxiliá-las a comercializar seus produtos dentro das
exigências da legislação brasileira, pertinente a produtos orgânicos ou de cultivo
tradicional, dando assistência técnica, com um estabelecimento adequado à
comercialização.
Então os antigos produtores da APAN se juntaram com a APROMED e
montaram a AAFEMED, aí foi quando a mãe começou também junto. Mas
daí vendia lá na pracinha né... Era só montada as barracas no sábado de
manhã e... mas a mãe levava pouca coisa, ela fazia um pão... Fazia um
pouquinho de macarrão que ela fazia em casa... era pouca coisa. E aí quando
eles conseguiram aquele barracão ali né que foi conseguido ali com as duas
associações que se juntaram, então aí a gente começou a vender para
merenda escolar. Daí tudo começou a ficar mais... Foi aonde que a gente veio
trabalhar com ela daí... Que aí a gente tinha mais vendas, mais pedidos né
(LIDIANE, entrevista em 31 de outubro, 2020).
.
Sobre os objetivos da Associação, cabe salientar que ela foi criada com o
objetivo primordial de organização da produção dos associados, estabelecer uma
regularidade de entrega dos produtos e fazer uma distribuição do que cada agricultor
familiar produziria para entrega na feira.
Pela Associação a gente quase não faz nada, porque é só para a gente ter
mesmo associação para nós organizar... porque como nós estamos em
quatro... nós que organizamos a de Medianeira. Então a Associação ela fica
para organizar aqui a de Medianeira né. Então a gente só trabalha com o
pessoal que está ali na diretoria mesmo. Não é nem para comercialização.
Seria para organização, porque a Associação não vende né. Nós trabalhando
90

na parte da organização aí. Porque a parte assim que é para comercialização


já entra com o pessoal da cooperativa daí. Quando a gente fazer reunião ali
tem sempre o presidente da cooperativa, o diretor, participa com nós também.
Da Coafaso, que quem vende, quem faz a parte da comercialização tudo é
cooperativa. Nós é só para manter a organização do nosso... Não que a
gente não... tipo assim... nós que vemos como que a gente faz para vender...
nós que vamos atrás da merenda né. Mas é eles que... os programas, tudo
sai pela cooperativa [...] (LIDIANE, entrevista em 31 de outubro, 2020).

A primeira presidente mulher da AAFEMED, Rafaela Toniazzo, também


evidenciou outro objetivo não explícito no estatuto da Associação, mas que foi
fundamental para a decisão de dar legalidade ao trabalho de produção e venda dos
agricultores:
No começo a associação se formou para poder fazer o objetivo de vendas.
Então no começo era para venda. Juntar para poder ter força, porque a outra
feira era separado. Então no começo aquelas pessoas que se juntaram era
para isso, pra poder vender. E depois quando eles cresceram e precisava
ficar legal, perante a lei, eles precisaram fazer a cooperativa. Então a
cooperativa chegou depois porque precisava ser legalizado, para poder
legalizar a venda. Então no começo o objetivo da cooperativa era para isso
(RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

Sobre este modelo de comercialização, ANJOS; GODOY: CALDAS (2005,


p.13), salientam que:
As feiras livres consistem num sistema local de comercialização muito
particular representando o limiar difuso entre o rural e o urbano, fim da fase
produtiva e início da fase de consumo, bem como um espaço social detentor
de atributos peculiares que presumidamente, asseguram sua persistência na
sociedade contemporânea.

O começo foi marcado por dificuldades relacionadas à falta de um local


apropriado para a comercialização. Em um terreno público, embaixo de tendas de lona
improvisadas, os feirantes se reuniam para vender seus produtos direto ao
consumidor. As condições de trabalho eram precárias, improvisadas. Para Teresa, foi
um começo muito difícil:
Aí começamos a fazer feira na rua lá, né só eu de mulher lá no meio dos
homens fazer feira na rua. Os pés na água quando chovia. Que eles
arrumavam uma barraca né, daí começou a fazer... Aí apareceu a outra
associação lá que está agora. Começamos a trabalhar ali (TERESA,
entrevista em 31 de outubro, 2020).

Em entrevista, a neta da Teresa, Gabriela Toniazzo, que atualmente faz o curso


superior de Zootecnia na Unioeste em Marechal Cândido Rondon, conta que ia com
a avó todo sábado, acordava muito cedo e a acompanhava na venda da feirinha na
rua:
91

[...] em vista do que tem hoje era horrível né. Nos dias de chuva era salve-se
quem puder, que era tudo aberto, então não tinha como ficar lá em dia de
chuva. Era difícil porque não era tão conhecida como a que é hoje... e não
vendia na mesma proporção que vende hoje, e a minha vó não fazia tudo que
ela faz hoje. Ela fazia muito pouco de muito menos coisas... era muito mais
coisas praxes assim... leite, macarrão, ovo e bolacha [...] (GABRIELA,
entrevista em 31 de outubro, 2020).

Da mesma forma, Ana Slongo, que na época ainda não possui sua
agroindústria de Doces e Geleias, conta que era comum aparecer a polícia e fazer
todos os feirantes recolherem os produtos e saírem correndo, pois a ferinha na rua
era considerada ilegal por não possuir um CNPJ e principalmente, porque nenhum
produtor possuía autorização da Vigilância Sanitária ou qualquer outro órgão para
comercializar seus produtos, todos coloniais.
Apenas em 2009 a prefeitura municipal cedeu um novo local com estrutura
física para atender as necessidades dos agricultores.
A Casa do Produtor de Medianeira veio responder aos anseios de três
associações: Associação dos Artesãos de Medianeira, Associação Feira Pequeno
Produtor Rural de Medianeira - APPROME, e Associação dos Agricultores Familiares
e Ecológicos de Medianeira – AAFEMED, que em 2009 receberam da administração
pública, através da LEI Nº 62/2009, de 23 de junho de 2009 (ANEXO 3), a concessão
de uso do local, para funcionamento coletivo, onde se constituiu a popular “Feirinha”
de Medianeira, com o objetivo de comercialização dos produtos de todos os
associados.
Ações dos governos federal e estadual do período, em especial dos governos
do PT (2002 a 2016), com destaque para dois programas voltados para a agricultura
familiar, contribuíram para fortalecer a economia das famílias pertencentes à
AAFEMED, com visível melhoria da qualidade de vida para as mesmas. O primeiro
programa, PNAE - Programa Nacional de Alimentação Escolar foi criado em 1983, em
uma releitura da Campanha da Merenda Escolar do governo de Getúlio Vargas, de
1954. O segundo programa, PAA - Programa de Aquisição de Alimentos foi criado
pelo art. 19 da Lei nº 10.696, de 02 de julho de 2003 e possui duas finalidades básicas:
promover o acesso à alimentação e incentivar a agricultura familiar.
As políticas públicas do PNAE e PAA alavancaram o crescimento da
comercialização e consequentemente da produção dos associados, que passaram a
produzir com regularidade e frequência, obtendo faturamento também mais regular, o
92

que possibilitou ganhos econômicos e um planejamento de investimentos na


propriedade de médio e longo prazo.
Algumas associadas foram buscar, além da Feira, PNAE e PAA, outros pontos
de venda de seus produtos, como outras feiras em cidades vizinhas, supermercados
e varejo de produtos coloniais, a exemplo de Ana Slongo, Claudia Mainatz, Neire
Tubiana e Laura Valiati.
Ana, que possui uma agroindústria de geleias, compotas e polpas, conta
entusiasmada:
Hoje vendo minhas geleias em 04 pontos além da feira. Entrego na feira de
Missal, Matelândia, em um mercadinho em Medianeira, e agora fui convidada
a vender também na Boreal, que é a feira de São Miguel do Iguaçu. Mas
seguramente meu melhor ponto é de longe a AAFEMED (ANA SLONGO,
entrevista em 19 de novembro, 2020).

Claudia Mainatz, que produz orgânicos, também possui hoje outros pontos de
distribuição de suas hortaliças: “Levo meus produtos no Portal Colonial e na Feira de
Matelândia, além da entrega na AAFEMED em Medianeira, para vender na feirinha
de lá”.
Neire Tubiana produz milho verde e tomates em estufa. Atualmente já
comercializa 80% de sua produção de tomates na rede de supermercados da Lar,
sendo que apenas 20% vão para a Feira do Produtor.
Laura Valiati, que entrega carnes de ovelha, suíno e frango caipira na
AAFEMED, também possui um box fixo na APROME. Em 2020 começou a construir
um frigorífico para abate artesanal de ovinos, suínos e frango. Seu planejamento é
criar uma rede regional de criadores para fornecer ao seu frigorífico e posterior
comercialização em restaurantes e casas de carne especializadas. Seu depoimento
sobre a evolução da produção e dos pontos de venda deixa clara a importância da
AAFEMED:
Eu estou fazendo a agroindústria para poder abater e entregar nos mercados,
açougues, nos restaurantes e mais que eu quero entregar nas duas feiras na
APROME e na AAFEMED. Então menina se eu te falar que eu acho que uns
10 ou 12 mil por mês eu tiro. Aí não é tudo limpo, mas o que me mantém é
isso aí, porque a lavoura ela é um ganho extra para mim já né, mas o que me
mantém é a feira e fatura na média de 10 a 12 mil (LAURA, entrevista em 31
de novembro, 2020).

A produção diversificada garante à AAFEMED e seus associados uma


clientela fiel que consome seus produtos coloniais, entre outros alimentos, grãos (soja,
milho, feijão, amendoim, pipoca, etc.), leites e seus derivados, frango, ovos e uma
93

infinidade de hortaliças e frutas conforme a sazonalidade da produção. Além de


embutidos diversos, derivados da cana de açúcar, como melado, açúcar mascavo,
doces e aguardente, e panificados caseiros e massas com receitas de família.
Abaixo segue mapa de localização das propriedades das agricultoras
associadas à AAFEMED (Figura 9), sendo que estão distribuídas em sua grande
maioria no município de Medianeira, e em menor proporção também em Serranópolis
do Iguaçu e Matelândia.

Figura 8 - Representação do espaço territorial de localização das 37 propriedades


das agricultoras rurais associadas à AAFEMED

Fonte: Adaptação do mapa da Secretaria de Planejamento do município de Medianeira, 2020.

Muitos desses associados já possuem, inclusive, linhas de produtos,


agroecológicos ou de produção convencional, com marcas próprias, rotulagem e
embalagem personalizada, desenvolvida com auxílio técnico da AAFEMED e
parceiros institucionais em alguns casos, e em outros por iniciativa dos próprios
associados. Neste sentido, cabe esclarecer que a AAFEMED possui parceria com a
Itaipu Binacional e Biolabore – Cooperativa de Trabalho e Assistência Técnica do
Paraná, cuja missão é fornecer serviços técnicos especializados e produtos para o
94

desenvolvimento sustentável. Na prática, a Biolabore presta assistência técnica


agronômica, auxílio e orientações às agroindústrias, fomento a boas práticas,
agroecologia, desenvolvimento de novos produtos, etc., para os associados e
associadas da AAFEMED.
Muitas parceiras, entidades e instituições que colaboraram com novas
práticas de produção sustentável, ecológica, agroecológica e orgânica, além de dar
suporte a questões jurídicas e visibilidade à AAFEMED fazem parte da história da
Associação: Biolabore, Capa, Coafaso, IDR-PR (Emater), Centro Popular de Saúde
Yanten, Itaipu Binacional, Prefeitura Municipal de Medianeira, Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Medianeira e UTFPR – Universidade Tecnológica Federal
do Paraná/Medianeira.
A produção dos associados da AAFEMED é comercializada na Casa do
Produtor Rural, popularmente chamada de Feirinha, localizada na Rua Santa
Catarina, 2355 no centro do município de Medianeira (Figura 10).

Figura 9 - Prédio da Casa do Produtor – local de comercialização da AAFEMED

Fonte: A autora, 2020.

A Casa do Produtor Rural conhecida como feirinha é um ambiente dividido em


02 formatos de comercialização. A primeira divide aproximadamente 60% do espaço
em boxes de comercialização de produtos de hortifrutigranjeiros, da APROME –
Associação de produtores de Medianeira, onde os produtores adquirem os boxes
mediante pagamento de aluguel para a APROME. Os outros 40% do espaço são
utilizados para a exposição e venda dos produtos da agricultura familiar e
agroecológica dos associados da AAFEMED.
95

Figura 10 - Ambiente interno da Casa do Produtor – comercialização da AAFEMED

Fonte: A autora, 2020.

A ilustração acima, mostra o ambiente de venda (Figura 11) que se caracteriza


como sendo de varejo, no sistema de autosserviço, onde o próprio cliente escolhe o
produto e se dirige ao caixa para pagamento, não havendo interferência ou
direcionamento de um atendente ou vendedor para direcionar a escolha por marcas
ou produtores específicos.

Figura 11 - Ambiente interno da Casa do Produtor – checkout

Fonte: A autora, 2020.


No formato de autosserviço, como um pequeno supermercado de produtos da
agricultura familiar, a peculiaridade desta comercialização é que os associados e
associadas entregam o produto que é vendido na forma de varejo, expostos em
prateleiras como em um supermercado, e cujo papel de vendedor não é do produtor
e da produtora rural, mas funciona como autosserviço.
Os pagamentos são realizados no check-out, com atendimento de 03
funcionários da AAFEMED, que acumulam as funções de atendimento, venda,
administração, financeiro e contabilidade da Associação, sendo que é de
96

responsabilidade da administração da feira o faturamento da venda para cada


produtor.
Para esses agricultores familiares a AAFEMED foi e continua sendo
fundamental para a agricultura familiar, pois garante a comercialização e
consequentemente continuidade e expansão da atividade, na mesma propriedade,
com boas perspectivas para a sucessão.

4.2 AS MULHERES DA AAFEMED, O EMPODERAMENTO E O CAPITAL SOCIAL

Os dados apresentados nesta seção são o resultado da aplicação de 60


questionários, dos quais 37 (62%) foram respondidos, sistematizados e discutidos.
Estão apresentados em dois grandes grupos; o primeiro composto pelos itens:
unidade produtiva, geração de renda e vida, construção e partilha do conhecimento
que são componentes da caracterização geral e relações de empoderamento e capital
social construídas. O segundo grupo de dados registra as percepções sobre capital
social e empoderamento das mulheres agricultoras da AAFEMED, analisado também
em relação ao antes e depois da AAFEMED.
Como último item desta seção, a mulher rural da AAFEMED e o elo entre
empoderamento, capital social e desenvolvimento rural sustentável: o caminho já
percorrido até aqui, apresenta uma análise geral dos dados obtidos e reconstruí, com
base nestes, o mapa do capital social segundo a experiência das mulheres
agricultoras da AAFEMED.

4.2.1 Caracterização geral

4.2.1.1 A unidade produtiva da agricultora familiar da AAFEMED

As propriedades rurais pertencentes às agricultoras participantes do estudo


estão caracterizadas, de maneira geral, nos itens abaixo, considerando suas
especificidades econômicas, sociais e ambientais.
As propriedades pesquisadas estão distribuídas nos municípios de Medianeira,
Matelândia e Serranópolis do Iguaçu, conforme descrição na Tabela 7.
97

Tabela 7 – Caracterização das propriedades rurais pesquisadas – junho/setembro


2020.
Número de propriedades por tamanho de área
Número de (ha)
Municípios
propriedades
Até 10 10 a 20 20a 30 30 a 40
Medianeira 31 22 6 2 1
Serranópolis do Iguaçu 4 2 2
Matelândia 2 2
Total 37 26 8 2 1
Total (%) 100 70,3 21,62 5,41 2,70
Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Do universo amostral de 60 mulheres associadas e ativas na AAFEMED, 37 se


disponibilizaram a participar da pesquisa, ou seja, 61,6%. Deste percentual, 81%
possuem suas propriedades localizadas no município de Medianeira, 14% no
município de Serranópolis do Iguaçu e 5% em Matelândia.
A maioria das propriedades pesquisadas, 70,3%, possui até 10 hectares de
área, percentual que, se somado ao segundo estrato, perfaz mais de 90% das
propriedades com no máximo 20 hectares. As pequenas áreas de extensão dos
estabelecimentos rurais são uma característica da região Oeste do Paraná, onde os
municípios em questão possuem a maioria dos seus estabelecimentos rurais
categorizados como de agricultura familiar.
Esta realidade está expressa nos dados do censo agropecuário do IBGE
(2017), que registram que do total de estabelecimentos rurais nos municípios de
Matelândia, Serranópolis do Iguaçu e Medianeira, 74,46%, 83,15% e 75,89%,
respectivamente são de agricultura familiar e, comportam além do enquadramento de
área, os demais quesitos estipulados pela lei 11.326 de 2006 referentes ao
enquadramento na categoria.
Além das especificidades de lei, o associativismo é outra característica da
agricultura familiar. Segundo dados do mesmo censo, do total de estabelecimento
rurais no Brasil, 39,5% possuem alguma forma de associação e, deste total, 78,21%
são de agricultores familiares.
A associação, seja na modalidade de associação agrícola ou cooperativa,
proporciona melhores possibilidades de incremento na escala de produção, no poder
de negociação, seja por insumos ou na comercialização, no acesso a tecnologia, na
obtenção de crédito, no acesso a políticas públicas, entre outras vantagens, que
98

minimizam os gargalos resultantes do limite de área das unidades produtivas


(MEDEIRO, 2015).
Os indicadores dos municípios em questão corroboram com os dados nacionais
e registram que do total de estabelecimentos rurais, que possuem alguma forma de
associação, 76,88%, 87,61% e 80,75% são de agricultores familiares,
respectivamente nos municípios de Matelândia, Serranópolis do Iguaçu e Medianeira.
Fagotti (2017, sp.), alerta para um aspecto dos processos associativos que está
além dos descritos acima e que é fundamental para o desenvolvimento efetivo dos
mesmos. Para o autor, este aspecto é aquele que acolhe “elementos como da
cooperação, comunicação, reciprocidade e ajuda mútua”, e os torna estratégicos
frente às questões estruturais.
Estes dois argumentos, podem comportar um ângulo não visível nos dados
apresentados, porém, constatado durante o desenvolvimento da pesquisa, que é a
concentração de mais de uma agricultora associada por comunidade, este fato remete
a um possível efeito, de estímulo, difusão, apoio ou influência da associação nas
comunidades, que pode estar alicerçado na relação entre as associadas, ou mesmo
em um traço mais individual com a AAFEMED como instituição e as “facilitações” de
acesso a mercado e políticas públicas proporcionadas.
A estrutura familiar dos estabelecimentos pesquisados mostra que 54% (19)
das entrevistadas tem um único filho, e em outo ângulo 46% (15) delas declara não
possuir nenhum dependente em sua unidade familiar (Figura 12).

Figura 12 - Número de filhos (A) e dependentes (B) por unidade familiar.

A B Número de Dependentes
15%
46%
24%

15%

1 Dependente 2 Dependentes
3 Dependentes Não Possui

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.


99

Os dados acima mostram que 77% (27) das famílias pesquisadas tem entre um
e dois filhos. Em acordo com os estudos, considerados aqui, estes dados podem
expressar que as estruturas familiares estão mudando também na área rural, as
famílias estão menores com menos filhos e cada vez mais sem dependentes, o que
não parece uma falácia, se contorna desta forma quando a análise se prospecta para
as questões de sucessão na propriedade.
A redução do número de indivíduos nas famílias rurais já foi destacada por
Paulilo (2000, p.2), em uma perspectiva global, presente em escala gradual no Brasil
e de forma mais enfática na região Sul, segundo a autora, o Brasil estava “entre os
países que apresentaram uma queda de mais de 40% na taxa de fertilidade” entre as
mulheres de maneira geral “em um período de 20 anos”. Castiglioni (2020, p.12),
reforça a afirmativa, observando que “a taxa de fecundidade total, de 6,16 filhos por
mulher em 1940, começou a declinar no decorrer da década de 1960, baixando para
1,77 em 2018”, a autora pontua ainda, a quase equiparação desta taxa entre a área
rural e urbana.
A realidade é de um esvaziamento populacional do meio rural, que até meados
dos anos sessenta era caracterizado por famílias com um “elevado número de filhos”
o que obrigava estas famílias a muitas vezes “adotar procedimentos que reduzissem
o número de herdeiros potenciais, tais como o envio de filhos para a carreira militar
ou religiosa, assim como via financiamento de estudos” (SACO DOS ANJOS, et al.
2006, p.12). Na atualidade a situação é distinta, e apresenta às famílias rurais temas
como, as dificuldades de sucessão, o envelhecimento e a redução de potencial
produtivo de alimentos.
Os dados da Figura 13 complementam a discussão anterior, registrando 68%
(25) das agricultoras entrevistadas com mais de 46 anos de idade, enquanto somente
0,6% (2) das mesmas apresentam menos de 36 anos de idade. Soma-se a informação
que do público total pesquisado, 75% (28) declaram estado civil como casadas.
100

Figura 13 – Faixa etária das agricultoras pesquisadas.

6%
36% 25%

33%

15 a 25 26 a 35 36 a 45 46 a 55 acima de 56

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Os resultados obtidos são complementares às argumentações de diversos


pesquisadores sobre o envelhecimento da população rural e compatíveis com os
dados nacionais do IBGE (2017) que registram 70,86% dos agricultores com mais de
45 anos e entre as mulheres, este percentual é de 66,36%. Em recorte para a
agricultura familiar, curiosamente, este índice sobe para 69,34% das mulheres. Sendo
que aquelas com mais de 55 anos perfazem 43,86% do total de mulheres nos
estabelecimentos agropecuários de agricultura familiar.
Spanevello et al. (2017), pondera que no Brasil é considerado idoso, segundo
o Estatuto do Idoso de 2003, as pessoas com 60 anos ou mais, o mesmo autor, utilizou
dados do censo populacional de 2002 e 2010, para comprovar que neste período o
número de pessoas idosas no meio rural passou de 8,2% para 11,4%,
respectivamente. Os dados do IBGE de 2017, embora em outra faixa etária, já
demonstram que 23,17% dos agricultores possuem mais de 65 anos, o que confirma
uma escalada preocupante do envelhecimento rural.
Novamente, especificando-se o enfoque para as mulheres rurais, alguns
aspectos precisam ser analisados e melhor discutidos, como os considerados por
Konzen e Areosa (2018):

[...] no meio rural são encontradas maiores dificuldades no acesso às


necessidades básicas dos idosos. As diferenças entre as zonas urbanas e
rurais referem-se às carências estruturais básicas, as quais podem interferir
na saúde e na qualidade de vida dos idosos, por exemplo. A velhice no meio
rural apresenta aspectos singulares que necessitam ser contextualizados. No
que diz respeito as relações de gênero no processo de envelhecimento a
aposentadoria rural tem se mostrado uma importante política pública de
101

acesso à renda e de igualdade entre os sexos. O benefício representa para


as mulheres idosas a possibilidade de decidirem suas vidas, algo que talvez
ocorra pela primeira vez, uma vez que a liberdade financeira lhes confere
maior poder. [...]. Muitas mulheres idosas rurais têm atuado na participação
financeira da família, sendo por vezes as principais provedoras do núcleo
familiar (KONZEN; AREOSA, 2018, p.351).

Se por um ângulo a população rural reduz e envelhece por outro é possível


observar a diversificação de suas atividades produtivas em uma resistente e resiliente
capacidade de adequação a realidade não só econômica, mas, de disponibilidade de
mão de obra, versando com a necessidade de otimização de renda por área.
A Figura 14 mostra a diversidade e as especificidades da produção de
alimentos nas unidades familiares pesquisadas.
São observados 19 produtos diferentes, com presença predominante e comum
do leite, hortaliças, panificados, mel, grãos, aves e frutas, respectivamente em ordem
de indicação recorrente entre as entrevistadas.
Scheneider e Niederle (2008, p.36), relacionam a diversidade na agricultura
familiar como “estilos de agricultura”, e ponderam que o agricultor familiar “abarca uma
diversidade de formas de fazer agricultura que se diferencia segundo tipos diferentes
de famílias, o contexto social, a interação com os diferentes ecossistemas, sua origem
histórica, entre outras”. Estas raízes imersas na própria estruturação familiar
adicionam um elemento primordial na discussão de agricultura familiar, na
manutenção da própria família e sua reprodução como estrutura social.
No centro desta perspectiva está a mulher agricultora, que seguidamente
recebe o reconhecimento de responsável por grande parte da conservação da
biodiversidade no meio rural, esta inferência, porém, deve ser feita com cuidado e
reconhecendo que dentro da estrutura construída na lógica patriarcal ela “recebe”,
normalmente, um espaço limitado, “a casa e o quintal” que “se tornam espaços
femininos”, reproduzindo um modelo onde “o trabalho do homem está ligado à
produção e o da mulher, à reprodução ou subsistência” (JALIL, 2009, p.78).
É constatável que, com as mudanças e transformações ocorridas na agricultura
familiar nas últimas décadas, este espaço “concedido” à mulher agricultora passou a
gerar renda, ganhou mercado, políticas públicas, tecnologia, reconhecimento na
soberania alimentar, mas não deixou de ser uma herança do sistema.
102

Figura 14 – Categorias de produtos agropecuários produzidos nas unidades


pesquisadas.

Agroindustria ovinos 2,70


Frutas 5,41
Frutas 5,41
Lacteos 2,70
Ovos 2,70
Aves 5,41
Mel 8,11
Cana de Açucar 2,70
Suínos 2,70
Grãos 5,41
Lavoura 2,70
Cachaça 2,70
Agroindústria cana-de-açúcar 2,70
Agroindústria panificados 13,51
Agroindústria embutidos 2,70
Vinicultura 2,70
Hospedaria, treinamento de equinos 2,70
Leite 32,43
Agroindústria geleias 2,70
Hortaliças 16,22

0 5 10 15 20 25 30 35

Percentual Número de produtores

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Para aprofundar a discussão é fundamental o entendimento de como as


mulheres rurais estão vivendo e gerindo a ampliação deste espaço e como estão
construindo ou reconstruindo as relações de gênero neste contexto. Neste aspecto, a
Figura 15 dimensiona a participação das mulheres agricultoras na execução das
atividades agrícolas da propriedade.
A característica marcante da agricultura familiar é a prevalência da família nas
atividades de produção, gestão, comercialização, historicamente, com a mulher em
um papel de coadjuvante, realizando um trabalho invisível. Os dados da Figura 15
mostram, porém, que elas estão em 75% (28) das atividades de base produtiva
agrícola das propriedades, onde 24% (9) delas se declaram responsáveis únicas, e
com participação igualitária ao cônjuge em 51% (19) das mesmas.
103

Figura 15 - Participação das mulheres agricultoras nas atividades agrícolas da


propriedade.

24% 19%
3%
3%

51%

Conjuge Filho Genro O Casal Eu mesma

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Os resultados apresentam mudanças na dinâmica de desenvolvimento da


agricultura familiar entre as associadas da AAFEMED, de responsabilidades, abertura
e conquista de espaço pela mulher dentro da unidade familiar, que assume
características comuns e ao mesmo tempo particulares, dependentes do contexto de
relações sociais e institucionais construídas.
Além da diversidade de espécies e produtos na base produtiva agrícola das
unidades familiares, 78,34% (29) destas declaram que apresentam atividades não
agrícolas como forma de renda e reprodução social. A Figura 16 elenca as principais
atividades consideradas não agrícolas pelas entrevistadas.

Figura 16 – Principais atividades não agrícolas desenvolvidas nas propriedades.

Não tenho nenhuma 45,95%

Outra 8,11%

Alimentação 8,11%

Agroindústria 40,54%

Turismo Rural 21,62%

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.


104

Entre as propriedades com atividades não agrícolas, 40,54% (15) envolvem a


agroindustrialização de alimentos, o que reflete o encurtamento dos elos das cadeias
produtivas e a própria linha e oportunidade de trabalho e comercialização junto a
AAFEMED.
O processamento de alimentos por famílias rurais é uma prática histórica e
compõem a própria definição de agricultura familiar, voltado inicialmente para a
mantença da família, ganhou ares de agroindustrialização, em alguns casos, saiu das
cozinhas e foi para estruturas específicas, quando finalizados, ocuparam um espaço
de demanda importante no mercado consumidor. Novamente o viés remete ao
trabalho da mulher agricultora, visto que o processamento de alimentos era, e ainda
é, em grande parte dos produtos ditos coloniais, feito principalmente por elas, como
uma extensão da sua própria cozinha (WILKINSON et al. 2017).
No caso específico da AAFEMED, a possibilidade de venda direta retroalimenta
a própria pluriatividade das propriedades estudadas, visto que manter uma oferta de
diversos produtos, atender a expectativa dos consumidores para o colonial, natural,
tradicional e ao mesmo tempo utilizar o potencial de diversidade da agricultura familiar
resultam na geração de renda e estabilidade para a unidade produtiva.
Nas unidades familiares de produção, o sistema produtivo em geral se
assenta no trabalho da terra, realizado por uma família, e na produção
primária, destinada prioritariamente à satisfação das necessidades internas
da propriedade e do grupo doméstico (composto pelos membros da família).
Nessa forma de organização do trabalho e da produção, as atividades
agrícolas quase sempre coexistem e se complementam com outras
atividades não-agrícolas, como o artesanato e o comércio, tornando as
unidades pluriativas (SCHENEIDER; NIEDERLE, 2008, p.41).

Outra atividade que aparece com destaque nas propriedades estudadas é o


turismo rural, em 21,62% (8) delas, atividade crescente na agricultura familiar e que
remete também as relações construídas e em construção dentro e fora da
propriedade. O turismo rural é considerado uma atividade não agrícola que promove
benefícios econômicos e também sociais, capaz de gerar renda, melhorar a qualidade
de vida e ainda evidenciar o trabalho da mulher agricultora (SILVA et al., 2002).
Em um contexto maior, para Silva et al. (2002, p.41) “os agricultores estão
encontrando novas oportunidades a partir da valorização de bens não tangíveis, antes
ignorados, como a paisagem, o lazer e os ritos do cotidiano agrícola e pecuário”
compondo um campo de pluriatividades capaz de agregar econômica e socialmente
no caminho de um novo rural possível que destaca a participação da mulher:
105

Além do valor econômico, o turismo traz implícitos valores sociais e culturais,


que significam mudanças positivas e negativas. Nesse sentido, há uma forte
valorização social destacada pelas mulheres a partir do convívio com os
turistas. Hoje, o turismo é visto, especialmente pelas mulheres, não só como
uma fonte de recurso econômico para a família, mas também como uma fonte
de conhecimento cultural, de redução do isolamento e de envolvimento social
(socialização) (LUNARDI et al., 2015, p.205).

Nesta linha de construção, a Figura 17 demonstra a importante participação da


mulher agricultora na construção de alternativas de renda e produção, também, e em
maior percentual nas atividades não agrícolas.

Figura 17 – Responsabilidade de execução das atividades não agrícolas na


propriedade.
13%
3%
23% 13%

19%
29%

Conjuge Filho Filha O Casal Eu mesma Outro

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

A Figura 17 incrementa importantes dados na discussão. Inicialmente, a


responsabilidade de desenvolvimento da atividade, que em 23% (7) dos casos é da
mulher agricultura, e paralelamente em 29% (9) das unidades é compartilhada pelo
casal, ou seja, ela está presente no processo como agente principal, mas também
como parceira igualitária na concepção do casal em 53% (16) das propriedades.
A aparente dualidade que pode ser observada como “pano de fundo” na
afirmativa de responsabilidade da mulher em contraponto a responsabilidade do casal,
deve ser tratada aqui pela teoria da igualdade na diferença, que teve como grande
conquista a possibilidade de mudanças efetivas nas relações de gênero:

Não obstante, a grande conquista do projeto feminista igualdade na diferença


foi a possibilidade de mudança nas relações de gênero, na medida em que
as mulheres (e os homens) puderam se libertar dos velhos estereótipos e
construir novas formas de se relacionar, agir e se comportar. Essa
possibilidade tem permitido aos homens se libertarem do peso do machismo
e às mulheres se libertarem do imperativo do feminino, ambos podendo ser
sensíveis, objetivos, fortes, inseguros, dependentes, independentes, com
liberdade e autonomia, e não seguirem imperativos categóricos determinados
pelo gênero. É assim que se concretiza a ideia de gênero como construção
106

social. Nessa perspectiva, a reconstrução do feminino leva necessariamente


à reconstrução do masculino. Essa relação nunca será uma relação sem
conflito; ao contrário, será sempre um espaço de luta e tensão dialética, onde
estão em jogo diferentes poderes e desejos. Por isso, é importante que
homens e mulheres, nas suas experiências subjetivas, possam exercitar a
lógica, a razão, a intuição e a sensibilidade para construir novos valores e
novas formas de se relacionar na vida afetivo-sexual, no casamento, na
família, no trabalho, enfim, em todas as relações sociais (ARAÚJO, 2015,
p.48)

Com base na reestruturação das relações de gênero, geracionais, sociais e


econômicas, o protagonismo da mulher agricultora nas atividades que envolvem o
“dentro e fora” da propriedade se estende desde a concepção até a comercialização
dos produtos e neste processo é capaz de aferir a mesma uma situação igualitária de
poder, atuando na condição de agente:

Esses diversos aspectos da situação feminina (potencial para auferir


rendimentos, papel econômico fora da família, alfabetização e instrução,
direitos de propriedade, etc) podem, à primeira vista, parecer
demasiadamente demasiados e díspares. Mas o que todos eles têm em
comum é a contribuição positiva para fortalecera voz ativa e a condição de
agente das mulheres – por meio da independência e do ganho de poder
(SEN, 2007, p.249).

É possível identificar que há uma relação cíclica, construída não só no núcleo


familiar, como também junto aos movimentos sociais, que além da mobilização,
conscientização, e do papel na geração de políticas públicas, proporcionam espaços
de mercados, de prospecção e reconhecimento da agricultura familiar. No caso da
AAFEMED, este espaço possibilita a venda direta e como consequência a relação
com o consumidor, desta relação nasce e cresce a estima, a valorização da atividade,
do aprendizado, da vida rural, um insumo importante no desenvolvimento do rural e
das relações de gênero.
Um segundo ponto de análise está relacionado aos dados da Figura 17 em
comparativo a Figura 15, onde é possível identificar o maior percentual da mulher nas
atividades não agrícolas e também o envolvimento dos filhos, em especial das filhas,
nestas atividades, observando que as filhas, não figuram nas responsabilidades
produtivas das atividades agrícolas.
Neste recorte, duas analogias são possíveis, aquela que envolve os filhos de
forma mais significativa nas atividades não agrícolas e aquela de promove a inclusão
de uma nova geração de mulheres na agricultura, também via atividades consideradas
não agrícolas. Independente de ser dentro ou fora da propriedade, estas ações
107

cooperam para a discussão e reconstrução de um sistema de valores dentro da família


e na sociedade de forma geral. Neste sentido Sen (2007, p.251), afirma que:
As disposições que regem o compartilhamento na família são dadas, em
grande medida, por convenções estabelecidas, mas também sofrem
influência de fatores como o papel econômico e o ganho de poder das
mulheres e os sistemas de valores da comunidade.

Fortalecendo as afirmativas construídas até aqui, é importante acrescentar a


fala de Gabriela Toniazzo, filha de uma das agricultoras da AAFEMED:

Um pouco sim. Mas é igual eu te falei, por livre e espontânea vontade. Tudo
que eu aprendi... eu nunca quis sair dessa área. às vezes até eu penso...
nossa, eu poderia trabalhar numa empresa? Poderia. Mas seria o que eu
gostaria... eu estaria feliz? Porque eu acho que sobre tudo o que eu aprendi
com elas, eu tenho que trabalhar, eu tenho que estudar alguma coisa que eu
goste, que eu me sinto bem fazendo. Se eu ganhar pouco como a Rafa falou,
eu poderia trabalhar na cidade, viver melhor ganhar mais... poderia. Mas
estaria feliz? entendeu? eu acho que elas me ensinaram... que eu tenho que
trabalhar com que me faz bem, com o que me faz feliz, para mim poder deitar
na cama e dormir não estar cansada psicologicamente né. (GABRIELA,
entrevista em 31 de outubro, 2020).

A referência a voltar, ou ficar na propriedade está presente também na fala da


agricultora Claudia Mainatz:
Eu sou uma pessoa que me criei no sítio né, até os 15 anos e depois eu fui
morar para a cidade com meus pais né. E isso não me agradou muito né.
Fiquei até uns 22 anos e conheci o meu esposo. E nisso a gente juntou uma
ideia, ficamos morando uns dois anos em Medianeira e surgiu a ideia de
comprar um sítio. Daí a gente veio da cidade para morar no sítio, e tudo isso
a gente foi transformando né, porque não tinha nada. Não tinha casa, não
tinha nada... E a gente foi transformando a ideia e estamos aí produzindo do
jeito que tá aí, tranquilo (risos) [...] Então, olha, esse ano nos superamos, bem
superado. Até porque o Ildo está pensando em ficar comigo na propriedade,
pelo fato da melhoria da saúde e tudo né. Então a gente está pensando,
analisando bem né, para ele de repente ficar e continuar a trabalhar junto
comigo, porque querendo ou não senão eu teria que pagar alguém. Porque
tem dias que é bastante entrega e tal. A gente tem colheita, tem que fazer as
limpezas né; porque não é assim levar de qualquer jeito né. Então a gente
está pensando bem dessa forma para ele ficar junto (CLAUDIA, entrevista em
24 de outubro, 2020).

As falas de Gabriela e Claudia exemplificam relações construídas dentro e fora


das propriedades da agricultura familiar impulsionadas, não só pelo espaço construído
internamente, mas também pela prospecção do trabalho rural em atividades não
agrícolas, que envolvem dinamismo, reconhecimento econômico e social.
108

4.2.1.2 A agricultora familiar associada à AAFEMED e a geração de renda e vida

Ao ponderar as duas formas de visualização das atividades na unidade


produtiva, como atividades agrícolas e não agrícolas, que ao fim, devem ser vistas
como complementares e retroalimentadas, a pergunta sobre a rentabilidade das
mesmas acrescenta outro dado importante à análise (Figura 18), neste aspecto,
segundo os dados da pesquisa, 43% (16) das entrevistadas atribui uma renda de até
R$ 1000,00 ao mês à comercialização de produtos via AAFEMED.

Figura 18 – Faixas de renda atribuídas a comercialização de produtos junto a


AAFEMED.

6%
43%
35%

16%

Até R$ 1000,00
Entre R$1000,00 e R$2500,00

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.


A faixa de R$ 2500,00 a R$ 4000,00 é declarada por 35% (13) das
participantes, faixas de valores que são significativas para a agricultura familiar e em
especial para a realidade de área e região aqui estudada.
Rahmeier (2016, p.131), em estudo da agricultura familiar da Mesorregião
Oeste do Paraná, atribuiu uma média de receita mensal entre R$ 1.332,54, em
Diamante do Oeste, Diamante do Sul e Ramilândia a R$ 6.173,71, nos demais
municípios da região, sendo que desta última 18,54% é originária de atividades não
agrícolas.
Um cuidado a ser observado nestes dados é de que a agricultura familiar, em
sua diversidade, pode variar na região em uma gama de fatores importantes na
composição da renda, entre os quais o tamanho da área, que pode chegar a 80
hectares, muito superior à área das propriedades aqui estudadas.
Seguindo neste mesmo contexto, a Figura 19 relaciona as despesas assumidas
pela mulher que refletem diretamente no desenvolvimento da propriedade e
manutenção familiar.
109

Figura 19 – Despesas da família e da propriedade assumidas pela mulher

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

A diversidade de itens elencados pelas mulheres como responsabilidades


assumidas na manutenção e investimento na propriedade e na família, já demonstra
a importância das atividades mantidas pela mesma dentro do contexto de
desenvolvimento e continuidade da unidade produtiva.
Além dos itens de despesas básicas, como supermercado, água, luz, roupas,
figuram a aquisição de insumos para a propriedade e o custo de equipamentos,
elementos que refletem a preocupação com a manutenção e melhoria dos aspectos
produtivos, estes dois itens somados, foram elencados por 28% (35) das
entrevistadas.
Os itens educação dos filhos e poupança ou investimentos também alcança um
percentual considerável, principalmente à realidade de resistência e exclusão desta
categoria, onde estas duas áreas dificilmente são alcançadas.
Em contribuição a análise dos dados aqui expostos Spanevello et al. (2016,
p.5), traz a lembrança de um caminho percorrido:
É possível considerar que com o passar dos anos as mulheres foram
conquistando seu espaço no meio rural, como a fundação de movimentos
sociais com o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais. As principais
questões centravam-se no reconhecimento da profissão de agricultoras e não
mais como doméstica ou “do lar”, buscando quebrar a invisibilidade do
trabalho da mulher na propriedade, os direitos sociais como aposentadoria e
salário maternidade; o direito a sindicalização, questões relacionadas à saúde
da mulher, entre outras.
110

Neste arcabouço, pode-se ver a mulher rural, como um potencial represado


pelas definições sociais, que foi se transformando para mudar a visão sexista, assumir
o lugar de indivíduo e alimentar suas próprias transformações.
Corroborando na figuração deste processo, os gastos próprios foram citados
por 11% (13) das mulheres entrevistadas. Nesta perspectiva o item gastos próprios,
se reveste de significado, reflete a autonomia, um espaço de liberdade e de existência,
no sentido de visibilidade da mulher rural e conduz a um paralelo com o pensamento
de Foucault (2004), do “cuidado de si”, que também carregado de significado
subjetivo, é entendido “como a maneira pela qual o sujeito faz a experiência de si
mesmo”, consigo, onde alcança o pensamento do “governo da vida”, de ações sobre
si.
Este estado para Pinheiro et al. (2018, p.63), é onde “o sujeito não é visto como
docilizado, passivo e dominado”, onde ele cede “espaço ao sujeito ativo que é capaz
de práticas de si”, para os autores é onde “a liberdade de ação passa a ser condição
para essa especificidade do governo de si”. Cabe lembrar que para Foucault (2008),
a liberdade está relacionada às experiências, a experimentação, que permitem aos
indivíduos inventarem seus caminhos e escolhas.
O pensamento de Michel Foucault está aqui posto como uma forma de remeter
o percentual dedicado aos cuidados próprios à aspectos positivos, de alcance da
liberdade de ação das mulheres agricultoras, porém, está também para a reflexão
frente ao entendimento desta mulher sobre o que e quais são os gastos próprios por
ela expressos. Neste contrapondo Thum et al. (2011, p.580) pondera que o
“autocuidado das mulheres rurais também abrange o contexto familiar, a socialização
de crenças e hábitos através das gerações”, é cuidar da família, da estrutura produtiva,
das relações construídas, o que também é parte da sua liberdade de ação, de
experimentação e de escolhas.
Os dados e análises até aqui fundamentadas, permitem configurar o
protagonismo de um percentual considerável de mulheres na concepção,
desenvolvimento, gestão e planejamento das atividades produtivas e na construção
da determinação de suas liberdades.
Neste sentido, alguns pesquisadores alertam para a apropriação masculina
destas conquistas que se reflete de maneira definitiva na manipulação dos valores
111

arrecadados pelas atividades desenvolvidas na unidade produtiva. Um exemplo


prático deste fato é relatado por Spanevello et al. (2016), ao analisar a linha de crédito
Pronaf Mulher, segundo os autores:

Em muitos casos, as mulheres investigadas participam da experiência de


acesso ao crédito em razão do esgotamento da capacidade do marido em
retirar mais investimentos. [...] É possível afirmar que a experiência do acesso
ao crédito não representa mudanças nas relações de trabalho entre homens
e mulheres nas propriedades e nem mesmo na gestão. A gestão continua
sendo de responsabilidade do marido e não das mulheres que acessaram o
crédito. Por isso, os resultados apontam que a inserção das mulheres na linha
de crédito do PRONAF, não representa uma possibilidade de autonomia e
geração de renda exclusiva para as mulheres, especialmente nas situações
em que o crédito é destinado para as atividades agropecuárias, como grãos
(SPANEVELLO et al. 2016, p.13).

Frente a este aspecto, a presença da mulher na destinação final dos recursos,


pode refletir a participação ativa, determinante da mesma no processo não só de
geração, mas, de apropriação de renda. A Figura 20 registra que a mulher é a
responsável por manipular o dinheiro proveniente das atividades quando no
pagamento de contas em 30% (11) dos casos estudados, somando de maneira
transversal que em 38% (14) dos casos esta tarefa é atribuída ao casal, portanto,
tendo a mulher como participante igualitária, perfazendo 68% (25) das situações
apresentadas.

Figura 20 – Distribuição da responsabilidade no pagamento das contas da unidade


familiar.

16%
38%
13%

3%
30%

Conjuge Filho Filha Eu mesma O Casal

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

É possível verificar a mulher presente em todo o contexto da cadeia produtiva,


criando, gerando, administrando, estabelecendo relações sociais de maneira efetiva.
112

Apesar dos aspectos positivos acentuados aqui, não se pode deixar de


observar aqueles ainda a serem superados como em 16% (6) dos casos onde a efetiva
ação final com o recurso gerado é realizada pelo cônjuge, o que aponta um espaço
ainda em construção e consolidação, mas também aponta a necessidade de estudos
mais aprofundados para caracterizar estas relações.
Em visão complementar, e até paradoxal, a mulher ainda é a maior responsável
pelas atividades do lar. Segundo os dados 100% (37) das entrevistas não conta com
nenhuma ajuda externa (contratada) para as atividades de rotina de suas casas e
100% (37) delas ainda se considera responsável principal por estas atividades, como
um “alento”, 47% (17) das entrevistadas afirmam contar com a ajuda dos familiares
(Figura 21).

Figura 21 – Responsabilidade pelas atividades do lar.

47%
53%

Sim Sim, mas compartilho com membros da familia

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

A responsabilidade pelas atividades do lar é uma herança cultural que


acompanha a mulher desde os primeiros tempos, e a torna uma “eterna” responsável
pela “casa” e pela educação dos filhos, tarefa não só inferida pela sociedade, como
auto assumida como parte de uma educação machista e patriarcal, considerando
inclusive a mulher como reprodutora deste padrão.
Esta perspectiva polêmica, mas necessária para a compreensão e evolução
das questões de gênero no meio rural, foi discutido por Costa et al. (2015, p.164), em
um trabalho realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na região Sul
deste estado. Segundo as autoras este processo de entendimento precisa considerar:
113

[...] que o processo de construção cultural das desigualdades de gênero, ao


longo da história, constitui-se em disposições permanentes a "se submeter",
sendo que para as mulheres a sujeição na relação reconhece, na sua pouca
força física uma inferioridade "natural". [...] As desigualdades de poder entre
os gêneros tornam difícil delimitar as fronteiras entre os comportamentos
generificados pela cultura e veiculados pelo sistema exploração/dominação
de mulheres e, o momento em que ocorre a ultrapassagem de determinados
limites eles se tornam violência. Assim, as desigualdades entre os sexos,
produtoras de iniquidades e vulnerabilizações, se constituem em violências
em si. [...] “que a submissão da mulher rural está atrelada, principalmente, ao
fator de dependência" do marido, das "obrigações de esposa" e também do
desejo de manter a família unida, mesmo que aparentemente (COSTA et al.
2015, p.164).

É possível desenvolver um paralelo simbólico na naturalidade de assumir-se


responsável primeira e em 47% dos casos única, pela limpeza, comida, cuidado com
os filhos, pelo “lar”, esta naturalidade reflete a interiorização da função social imposta
a mulher de manutenção e reprodução, aparentemente presente mesmo naquelas
com determinado caminho percorrido para o empoderamento de si. Neste aspecto
vale ressaltar mais uma conclusão do estudo de Costa et al. (2015, p.165), que trata
da representação da relação entre homens e mulheres ainda muito presente na área
rural:
É a produção - (re)produção - de comportamentos narrativos, sendo o
masculino a fonte dessa produção [...] a relação entre homens e mulheres
nas dimensões analisadas tem mostrado o caráter de dominação, atribuindo
à mulher a "condição" de submissão, retratada em obediência, reprodução,
fidelidade, cuidadora do lar e da educação dos filhos. Os papéis de gênero,
naturalizados, influenciam formas de nascer, viver e morrer em situação de
submissão e ainda têm se configurado em condutas esperadas e "destino"
em muitos contextos sociais.

Os dados expostos e discutidos até aqui, tornam aparente as conquistas e


desafios das mulheres rurais e também a profundidade dos atos impostos por tanto
anos de reprodução de um modelo social onde a mulher “nasceu” para ser um
acessório a um ser prioritário e “superior”.
Nesta profundidade, Stropasolas (1995, p.254) remete uma inter-relação entre
as questões sucessórias e de migração do meio rural para o urbano e as relações de
gênero, segundo o autor:
[...] o processo sucessório e, de certa forma, toda a organização do processo
de trabalho são enviesados contra a mulher. Nas regiões coloniais em que
predomina a agricultura familiar, verifica-se um padrão a respeito da
sucessão nas propriedades rurais. Esse padrão comporta variações e
exceções, mas são principalmente os filhos homens que herdam a terra,
enquanto as mulheres se tornam agricultoras por casamento.
114

Continua o autor, baseado nos trabalhos da Comissão Econômica, que para a


América Latina e o Caribe (Cepal) este viés sucessório com a migração seletiva e as
relações de gênero no campo, pode ser estabelecido de maneira mais explícita:
[...] a vida no campo é mais atraente para os rapazes que para as moças. Se
aqueles herdam terra ou têm apoio para levar adiante atividades produtivas,
podem elaborar projetos de vida que são alternativas válidas em relação à
emigração para a cidade. Para as moças, entretanto, uma vida como esposa
camponesa – conhecendo outras alternativas possíveis – pode ser rejeitada
ou objeto de resistência, diante de aspirações de vida em outro meio cultural
e ocupacional (STROPASOLAS, 1995, p.254).

Fato transversal às discussões propostas é que as mudanças necessárias


estão nas estruturas das relações e concepções e também, que esta é uma
construção vem sendo feita junto às agricultoras, da AAFEMED e de suas famílias,
promovendo a consciência de que “o papel limitado da condição de agente ativa das
mulheres afeta gravemente a vida de todas as pessoas – homens e mulheres,
crianças e adultos” (SEN, 2007, p.248).

4.2.1.3 A mulher agricultora familiar da AAFEMED na busca, construção e partilha do


conhecimento

O rompimento com os padrões de submissão, de subordinação e de


invisibilidade da mulher na área rural tem sido objeto de ação de organizações
institucionalizadas, da auto-organização e de ações políticas em escala crescente nas
últimas décadas e já repercute diversos resultados, incluindo os apresentados pela
presente pesquisa.
Todo o processo até aqui construído pode ser associado em sua base ao que
Max-Neef (2008), chama de romper com a lógica que “coisifica” as pessoas e
relações, gerando um desenvolvimento alternativo baseado no “empoderamento das
mulheres” que inclui a afirmação, valorização e a capacitação das mesmas.
Pensamento ao qual se acrescenta que a capacitação, neste contexto, pode assumir
diversos cenários e propostas alcançadas, institucionalizadas ou autoconstruídas.
Buscando expressar este percurso, a Figura 22 (A) registra que mesmo em
menor percentual total, 100% (37) das mulheres rurais possuem ensino fundamental,
e em comparativo com os dados da Figura 22 (B), referentes a escolaridade de seu
cônjuge, elas são a maioria com ensino médio e com igualdade percentual no ensino
superior.
115

Figura 22 – Escolaridade apresentada pelas mulheres (A) e seus cônjuges (B).

8%
A 8% B 8%

50%
26%
42% 58%

Ensino Fundamental
Ensino fundamental Ensino Médio
Ensino médio Ensino Superior
A (Mulheres) Ensino superior
Figura 11 – Grau não seus
de escolaridade das mulheres (A) e de tem cônjuges (B).

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Para o aprofundamento da análise dos dados expostos até este ponto, busca-
se o pensamento de Sen (2007, p.254-255), que refere o “efeito líquido” ao estado de
liberdade substantiva e aos direitos alcançados pela condição de agente das
mulheres, que se dissipa diante de uma sociedade em que o homem possui larga
resistência a auxiliar no trabalho doméstico e na criação dos filhos. O mesmo autor
afirma que este efeito líquido se ameniza quando estas mulheres passam pelo
processo de alfabetização:
Nesse caso, o impacto do ganho de poder e do papel da condição de agentes
das mulheres não perde eficácia em razão de problemas causados pela
inflexibilidade da participação masculina nos cuidados com os filhos e nas
tarefas domésticas (SEN, 2007, p.256).

Nesta mesma linha, Santana e Oliveira (2015, sp.), afirmam que “a capacitação
da mulher independente do espaço ou formato, é um passo que “abre as portas do
lar, numa espécie de corredor entre a casa e a rua e à comunidade, perpassando
neste corredor afinidades, autonomia, autoestima e liberdade”.
Nesta concepção, o conhecimento construído junto a instituições de ensino
formal, expressa também a libertação da mulher agricultora, seu movimento na
construção de cenários mais dinâmicos que sugerem formas alternativas de
desenvolvimento, baseadas no associativismo, na venda direta, na diversificação e na
reconstrução das relações.
116

Os resultados positivos deste processo, que remetem a busca contínua destas


mulheres, remontam das próprias raízes, de suas ligações com a terra e com a
produção de alimentos.
Um dos indicativos destas ligações, muitas vezes entremeadas de histórias e
construções culturais é o tempo, ou, melhor expressão, é o pertencimento desta
mulher ao mundo rural. A Figura 23 registra que 88% (30) das entrevistadas sempre
foram agricultoras.

Figura 23 – Tempo de vivência na agricultura.


3% 9%

88%

De 5 a 10 anos De 10 a 15 anos Sempre exerci a função

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.


Nesta base, a partilha do conhecimento sempre foi uma constante entre os
agricultores familiares, em especial entre as mulheres, nas relações comunitárias, a
partilha de receitas, plantas medicinais, sementes, modos de fazer, talentos trocados
e difundidos. Esta prática é vista ao longo da história nas relações sociais das
comunidades rurais, e em muitos aspectos, fortalecida dentro de organizações como
associações, igrejas, clubes de mães, entre outras formas de arranjo de necessidades
e fortalecimentos.

As mulheres depois, tinham sempre essa formação, mandamos todo mês um


material para os clubes, elas tinham suas reuniões e muitas delas
desenvolveram também por exemplo artesanato em cursos que a gente
levava, de bordados [...] essa questão das conservas, isso tudo elas
desenvolveram com ajuda também ... que na época era a Consuelo da
Emater, ela caminhava conosco, e muitas vezes ela levava elas lá. Tivemos
a Regina Celli do Rio de Janeiro que junto com o projeto de Itaipu a Roseli
levou para toda a região. As mulheres concorriam em receitas de pratos, de
bolos, ganhavam prêmio e estão lá na revista da Itaipu... Isso tudo foi
agregando. Elas aproveitaram muito [...] (Antes) se levava pras feiras, se ia
pra Francisco Beltrão, se levava os crochês, eu levava os nossos produtos, a
outra levava suas compotas, a outra levava suas orquídeas, a outra levava
seus guardanapos,... Seus tapetes e mais outras coisas que ela fazia, a outra
levava seus chás também...[...] (TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de
2020).
117

Ratificando esta discussão, estudos feitos pelo Instituto Interamericano de


Cooperação para a Agricultura - IICA, 2003, atribuem a agricultura familiar e
principalmente a mulher a própria sobrevivência, acentuando que são elas as
responsáveis pela alimentação básica (pequenos animais, verduras, frutas, sementes,
ervas), e que, portanto, “detêm habilidades e experiências necessárias à condução de
um processo de desenvolvimento humano local sustentável” (IICA, 2003, p.59).
A Figura 24 registra 7 diferentes formas organizativas das quais as
entrevistadas são participantes e que são junções e espaços de partilha destes
conhecimentos. Ressaltando que apenas 10% (5) delas participam exclusivamente da
AAFEMED.

Figura 24 - Diferentes formas organizativas das mulheres da AAFEMED

Igreja
10%
Associação de moradores
12%
36%
Rotary, Lions ou Rotaract
8%
Clube de Mães

10% Associações de pais da


22%
escola
2% Outras associações

Apenas AAFEMED

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

A participação citada por 36% (18) das agricultoras junto às igrejas locais leva
a reflexão desta como uma histórica esfera de junção, organização e mobilização nos
espaços rurais, bem como, em outro ângulo, de formação e difusão de definições
sociais sexistas.
Além do MPMP, já mencionado anteriormente, um exemplo de movimento das
mulheres rurais que nasceu sob a igreja popular, representada pelas Comunidades
Eclesiais de Base (CEBs) e pelos trabalhos das pastorais, foi o Movimento das
Mulheres Camponesas (MMC), nascido em Santa Catarina e hoje forte referencial
nacional de conquistas e espaço das mulheres rurais.
118

A igreja popular e as CEBs constituíram um importante espaço de formação e


inicialmente de embate contra o sindicalismo corporativista que proibia a
sindicalização das mulheres e, portanto, travava a luta por seus direitos como
agricultora. Neste campo tenso, as igrejas fomentaram e até sustentaram os
movimentos das mulheres agricultoras inicialmente.
Sobre o paradoxo de pensamento dentro da própria igreja convencional, Aguiar
(2016), esclarece que havia um distanciamento entre os movimentos das mulheres
rurais e aqueles caracterizados como feministas, na época, mais urbanos, a
aproximação entre os dois campos, deu-se em parte pela pauta sindical e construiu
um novo espaço dentro da própria Igreja:

[...] Se, na década de 1970, parecia ser inconcebível a convivência entre


feminismo e religião, na década seguinte, a experiência nas CEBs
impulsionou um conjunto de reflexões, inclusive por parte de teólogas que
delas participavam como agentes de pastoral. Ao perceberem uma
participação diferencial das mulheres nesses espaços, essas teólogas
advogaram que elas fossem valorizadas a partir de seu cotidiano e de sua
experiência de vida de mulher pobre [...] estabeleceu-se na década de 1980,
um diálogo entre feministas e religiosas que levou, a partir de 1985, à
produção da Teologia Feminista, “[...] uma elaboração teológica que investe
singularmente na composição entre religião e alguns pressupostos
feministas, referenciada a um movimento de mulheres organizadas dentro da
Igreja Católica” (ROHDEN, 1996, p.96).

Segue o autor que, a mulher agricultora tem por história, cultura e reprodução
de definições sociais, uma proximidade com as Igrejas, que embora controverso, foi
onde encontrou e formou seu espaço de resistência, mobilização e formação. Com a
mudança e superação de algumas pautas iniciais estes vínculos foram enfraquecendo
e de certo ângulo se transformando em movimentos independentes e formalizados,
as comunidades se esvaziando e as igrejas, no caso de muitas comunidades rurais,
foram fechadas, abandonadas, em muitos casos passaram a serem somente urbanas.
Neste viés se fortalecem, alicerçadas em diversos casos por políticas públicas, as
associações rurais.
É interessante observar que 22% (11) das mulheres apontam a participação
em associações de moradores, que remete ao reforço do pertencimento local, da vida
em comunidade e da persistência na mobilização e organização. Neste sentido,
Rahmeier (2016, p.110), complementa que “do total de estabelecimentos familiares
no Oeste Paranaense, 17,94% são associados” em diferentes formas organizativas.
119

Outro dado relevante é a participação da mesorregião oeste do Paraná que


“ultrapassa a média do Estado, pois 40,7% dos estabelecimentos familiares”
apresentam formas associativas locais.
Individualizando a participação na AAFEMED, a Figura 25, mostra que 42%
(15) das mulheres participantes da pesquisa são fundadoras da associação e mais de
30% (11) é participante a mais de 5 anos.

Figura 25 – Tempo de participação na AAFEMED.

30%
42%

11%
17%

Desde a fundação De 1 a 3 De 3 a 5 Mais de 5

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Os resultados apontam para o pertencimento, comprometimento e


consolidação da AAFEMED como parte do próprio formato de desenvolvimento
adotado entre estas associadas, em uma simetria, que assume uma correlata e
fundamental forma coletiva de organização.
Em um esforço de expressar de forma escrita a relação de pertencimento e
resistência das mulheres rurais, De Freitas (2007) faz referência ao “enquadramento
da memória” (de autoria de Pollack, 1987), remontando suas histórias, lembrando e
revivendo suas lutas, das vitórias e também dos retrocessos, neste exercício o auto
reconhecimento talvez seja uma das possíveis explicações. Para a autora “à medida
que as memórias femininas” emergem “do silenciamento” e “são compartilhadas nos
grupos femininos”, contribuem no fortalecimento da organização e asseguram a
possibilidade de “uma efetiva participação nas decisões de interesse doméstico,
profissional, educativo e, também, nas decisões, nas ações coletivas”. Para De Freitas
(2007, p.47):
Isso significa que lembrar não é apenas falar da vida e de sua perpetuação
através da história, mas é também falar do seu reverso, dos esquecimentos,
120

dos silêncios e, ainda, da permanência das memórias subterrâneas entre o


esquecimento e a memória social.

A AAFEMED, além de espaço de organização e partilha do conhecimento


endógeno, é local de outras formas de capacitação, 75% (28) das mulheres afirmam
encontrar na associação estimulo para a capacitação. Neste sentido a Figura 26
aponta quais os principais espaços onde são proporcionadas as capacitações, e
corrobora com a proposta de reflexão acima, onde os momentos de troca, entre as
próprias agricultoras, são entendidos como espaços de capacitação.

Figura 26 – Espaços de capacitação proporcionados pela AAFEMED.

2% Treinamentos sobre como


melhorar a produção

29%
34% Reuniões sobre como melhorar
o convívio entre os associados

Reuniões para trazer novidades


sobre a produção e a Feira
7%
28%
Reuniões para discutir
problemas e soluções referentes
à AAFEMED
Outros

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Os resultados de reconhecimento dos espaços de capacitação dizem muito


sobre a própria fundamentação dos movimentos sociais. Observa-se que o espaço
com maior percentual está atribuído as reuniões para a construção de soluções e
discussão de problemas da AAFEMED, que se somado ao espaço de reuniões para
discutir novidades sobre a feira, pode proporcionar uma analogia da centralidade da
organização como foco e base principal perfazendo 68% (38) do espaço considerado
como de capacitação.
Estes espaços são criados, construídos muitas vezes, na soma de iniciativas
individuais, de mulheres que já participaram de outros espaços, trocaram outras
experiências, viveram outras frentes de luta e vão se transformando em novas formas
organizativas de construção e empoderamento.
121

Na última reunião do Unicafes que teve aqui em Medianeira, lá no Recanto


Olivo, tinha mulheres do Brasil, Paraguai, da Argentina, do Uruguai.. Lideres.
E nós falamos do empoderamento. O empoderamento é fazer com que nós
mechamos no estatuto da Unicafes, das cooperativas, que a mulher entre
também no espaço de poder. Que a mulher tenha poder de decisão... Isso é
empoderar alguém. Porque ser escadinha, trabalhar nos bastidores a mulher
sempre trabalhou... Tanto na igreja, como na sociedade, como na família
também. Às vezes a mulher é a chefe da carruagem, mas ela não é
empoderada. Quem vai lá é o homem. Então empoderar alguém é dar-lhe
condições para que ela ocupe espaços de poder. Poder de decisão. Que ela
apresente suas propostas, que ela tenha decisão de fazer valer suas
propostas, principalmente os direitos ligados a ela. Isso é empoderamento
não ocupar o lugar do homem, mas ocupar o seu lugar. Ser parceira do
homem, mas lado a lado (TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

Dona Teolide deixa claro em sua fala que as mulheres rurais discutem o tema
do empoderamento já há tempos em seus eventos e encontros, que não se trata de
pauta nova, e que uma parte significativa do caminho já foi feita. É preciso, segundo
a fala acima, avançar, com ajuda das associações, cooperativas e instituições afins.
Contudo, os espaços de capacitação ainda estão aquém do que poderiam
proporcionar às associadas em termos de construção e manutenção da consciência
de luta. Aliado ao fato de a AAFEMED não possuir nos seus objetivos essa formação
de base, torna-se importante ressaltar que a fala das mulheres associadas durante a
entrevista para o documentário e informações qualitativas, sugere que a Associação
passe a ter um olhar mais voltado também para as questões de gênero, com vistas a
fomentar desta forma também o crescimento da agricultura familiar, nos preceitos de
um desenvolvimento rural sustentável.

4.2.2 As mulheres agricultoras da AAFEMED e as relações de empoderamento e


capital social construídas

No aprofundamento das discussões, em direção ao empoderamento e ao


capital social, os dados a seguir são baseados nos indicadores econômicos, sociais e
pessoais que refletem a condição particular da mulher agricultora em seu núcleo
familiar, na associação, na comunidade e na sociedade.
Em ênfase complementar, estes indicadores foram abordados também no
antes e depois da AAFEMED, e juntas as duas abordagens, e os dados de base
refletem um tecido entrelaçado, complexo e consistente no tecer do empoderamento
e do capital social.
122

4.2.2.1 Percepções sobre capital social e empoderamento das mulheres agricultoras


e a participação na AAFEMED

A discussão dos dados partirá da visualização geral para as abordagens


pontuais dentro de cada variável pesquisada. Neste aspecto a Figura 27 considera
todas as dimensões, e os dados obtidos referentes às contribuições proporcionadas
e a percepção destas pelas mulheres rurais participantes da AAFEMED.

Figura 27 – Percentuais de contribuições proporcionadas às mulheres rurais pela


participação na AAFEMED.

Status econômico.
100
Recompensas
Reputação.
financeiras.
80

60
Respeito pessoal. Participação cívica.
40

20

Poder pessoal. 0 Investimento financeiro

Confiança pessoal. Pertencimento

Apoio emocional. Apoio social

Cooperação

Não contribui nada % Contribui pouco %


Contribui de modo satisfatório % Contribui muito %

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

A Figura 27 mostra que os indicadores, pertencimento, confiança e


investimento financeiro, foram considerados, entre os conceitos de maior contribuição
via AFFEMED, com 33% (12), 24% (9) e 27% (10), respectivamente das opiniões.
123

O resultado é significativo e traz reflexões acerca do pertencimento e confiança


entre os indivíduos e as relações associativas, comunitárias e suas conexões com a
formação do capital social.

Pode-se inferir assim, que o capital social estabelece certa conexão entre
indivíduos e redes sociais, fazendo nascer regras de reciprocidade e
lealdade. Para tanto, é necessário que haja algum grau de solidariedade e
confiança mútua em uma comunidade, o que faz com que o capital social
esteja relacionado com o desenvolvimento de uma região e o seu progresso.
“Em regiões onde o a questão comunitária é presente, o capital social é maior,
conforme demonstram vários estudos” (KONRAD; SCHWINN, 2013, p. 221).

O pertencimento a um grupo social, além de uma necessidade geral dos


indivíduos, prospecta uma ligação direta com o reconhecimento em relação à
comunidade ou grupo social no qual estão inseridos. O sentimento de pertencimento
está ligado a organização do indivíduo em torno de projetos comuns, de forma
particular, naqueles que atuam no desenvolvimento sócio económico e cultural, onde,
segundo Bonomo et al (2013), os indivíduos compartilham além do território, seus
interesses, necessidades, desejos comuns, e atuam na formação de redes individuais
e coletivas, capazes de modificar diversos setores, pensamentos, definições pessoais
e sociais.
Para Wanderley e Favareto (2013), o atendimento de necessidades
específicas, como no caso das mulheres associadas a AAFEMED, a geração de renda
em uma abordagem inicial, ao que acrescentam os autores, o acesso a tecnologias
agrícolas e não agrícola, informação, comunicação, pode superar o isolamento das
famílias rurais e permite o fortalecimento de laços de pertencimento.
Bonomo et al. (2013, p.94), afirma que o processo de pertencimento social
orienta, fortemente, o modo como as informações sociais são tratadas, “como cada
um pensa sobre si mesmo e, por conseguinte, como se organizam os fundamentos
dinâmicos que constituem e garantem certa permanência à identidade social”. Para
os autores é nos laços de confiança que está a identificação de princípios lógicos que
justificam a opção por uma vida em comum:

Mas eu acho que eles têm um foco comercial e não pessoal... Eles não
estavam precisando ajudar alguém... eles estavam precisando de um lugar
pra vender porque eles tinham a produção pra vender, e precisavam ter uma
renda. Mas hoje isso já está bem fixo, uma coisa que está bem tranquila. E
ali o ponto de venda, não interessa se eu saio ou se o fulano sai... ele vai
continuar. Né porque já é uma marca e ele vai continuar. Então já dá pra se
pensar em mudar agora o foco, né... Colocar algumas coisas mais novas. [...]
124

E às vezes é nesse bate-papo que elas se empoderam mais. Não, eu posso


fazer isso, eu dou conta de fazer isso... (RAFAELA, entrevista em 31 de
outubro de 2020).

Na fala de Rafaela, está implícita a necessidade comum que motivou a junção


para a formação da associação, a geração de renda, e implícito está também o
pertencimento e a confiança, na continuidade e na aposta em novas estruturas
organizativas, no planejamento de novas ações e na própria visualização desta
necessidade.
Os dados da Figura 27 mostram ainda o predomínio do índice de satisfação em
relação às contribuições proporcionadas pela participação na AAFEMED, com
destaque para os parâmetros financeiros, com recompensas financeiras e status
econômico, seguidos pela cooperação, com percentuais de 73% (27), 65% (24) e 54%
(20) respectivamente das entrevistadas.
Os dados refletem o motivo imediato de formação e mesmo de manutenção da
AAFEMED, como descrito pelas associadas:

A associação, ela só organiza. É isso que nós fazemos. O pessoal ali, eu


mesma que estou na diretoria, o pessoal da diretoria a gente se reúne todo
mês ali... mas é assim para debater se precisa melhorar alguma coisa na
feirinha, no nosso estabelecimento, para ver se precisa melhorar... ahh,
aquele produto que está indo para a escola não tá bem, não tá bem
embalado... ahh tem um produtor falando que não sei o quê.... ahh tem um
produtor trazendo um produto que não está de boa qualidade... Essa é a
nossa parte da associação (LIDIANE, entrevista em 31 de outubro de 2020).

Sobre os elementos pontuados acima, é importante a realização de conexões


nem sempre explícitas no cotidiano, ou na própria percepção das participantes de
processos associativos, em especial no caso das mulheres rurais submersas por
décadas de definições sociais excludentes.
A começar pelo fato de que, assim como é histórico o processo de exclusão da
agricultura familiar das alternativas, conexões e vistas dos mercados convencionais,
bem como de sua própria originalidade como modo de ser e viver, também é histórico
seu processo de adaptação, de resistência e “metamorfose” que em primeiro reflexo
consideram a manutenção do seu espaço rural, da terra e da reprodução do sistema
de produção e vida familiar. Neste pensamento a prioridade para a viabilização
econômica não pode ser vista de forma isolada, ela é carregada de simbolismos e
significados, principalmente para a mulher rural. Para Herrera (2015. p.25):
125

A proposta de adoção de uma nova perspectiva analítica para tratar da


realidade das mulheres priorizando os aspectos multifuncionais da agricultura
tem como objetivo de ir além das abordagens de orientação meramente
produtivista, oriundas da visão econômica dominante, que tende a naturalizar
a economia, isto é, a considerar os arranjos econômicos como naturais e
necessários. [...] A função da reprodução socioeconômica, quando analisada
à luz da multifuncionalidade agrícola, possibilita que a sociedade e as
próprias famílias rurais reconheçam o papel central que as agricultoras
exercem. Pois, as atividades realizadas pelas mulheres são retiradas do seu
ocultamento.

Para a autora, na resistência ou exclusão dos processos de homogeneização


da produção rural, a diversidade e a multifuncionalidade da agricultura familiar,
emerge como própria forma de sobrevivência e reprodução social da categoria e neste
percurso emerge também a mulher agricultora, que embora oculta como “ajudante”
em um sistema produtivo sempre foi multifuncional em suas responsabilidades de
“reprodução6”. Neste complexo cenário Herrera (2015, p.26) afirma que a visão da
dimensão econômica da mulher rural perfaz “as fontes geradoras de renda; os
trabalhos domésticos e de care7; a sociabilidade; a condição de permanência no
campo; e a condição de instalação de jovens e as consequentes questões relativas à
sucessão”.
Na perspectiva aqui apresentada, na qual a dimensão econômica é destaque,
recomenda-se o entendimento da mulher rural sobre a complexidade e amplitude
desta dimensão, em uma analogia possível e definitiva com a reprodução social da
agricultura familiar. Da mesma forma que o ganho econômico proporciona todos os
aspectos relacionados por Herrera ele também alimenta o protagonismo e espaço da
mulher rural, desde seu núcleo familiar até a sociedade como um todo, envolvendo
nesta construção a cooperação, fundamental para a própria sobrevivência e muitas
vezes viabilidade financeira da agricultura familiar.
Nos dados apresentados, as três variáveis que estão em maior desalinho à
satisfação, considerando como pouca parcela de contribuição da AAFEMED, são o
poder pessoal e o respeito pessoal, em percentuais iguais, seguidos da reputação,
sendo 46% (17), 46% (17) e 38% (14) respectivamente.

6
As mulheres foram historicamente responsáveis pelo cuidado e pela saúde da família, pela segurança alimentar, porém, estas
tarefas socialmente atribuídas a elas, também são invisibilizadas e precarizadas, por se tratar de tarefas reprodutivas (GRUPO
KRISIS, 1999).
7
Segundo Hirata (2010, p.43), “o termo care é dificilmente traduzível, porque é polissêmico. Cuidado, solicitude, preocupação
com o outro, estar atento a suas necessidades, todos esses diferentes significados estão presentes na definição do care”.
Segundo Boris (2014), “o trabalho de care envolve serviços pessoais para outrem: são atividades que se voltam para as
necessidades físicas, intelectuais e afetivas e para outras demandas emocionais de cônjuges, filhos e pessoas idosas, doentes
ou com deficiências”.
126

Para Popova (2012, p.6), o capital social possui diferentes níveis e uma
variedade de formas, desde o capital social “estrutural com base em papéis
estabelecidos, redes sociais e estruturas suplementadas por regras, procedimentos e
precedentes”, até o “cognitivo referindo-se a normas e valores compartilhados, por
cada indivíduo”. Para a autora:

As duas formas de capital social podem ser complementares, mas não


necessariamente interdependentes - laços cognitivos pessoais podem não
evoluir para capital social estrutural, como a existência de associações
comunitárias não implica relações interpessoais fortes entre seus membros.
A interação social, entretanto, pode promover uma base para a constituição
do capital social por meio da persistência de seus efeitos em um ou ambos
os níveis (POPOVA, 2012, p.6).

Em analogia, pode-se entender que o poder pessoal e o respeito são parte dos
resultados possíveis no ambiente associativo e elementos constitutivos do capital
social. De maneira direta Sales (2007), afirma que:

A participação das mulheres nos movimentos sociais é também um espaço


de luta, de contestação dos dispositivos de poder que organizam saberes
dominantes, mas não deixa de ser uma possibilidade de escapar do controle
familiar e de vivenciar outros códigos. A partir do envolvimento em
movimentos sociais as mulheres se sentem fortalecidas e começam a
produzir seus processos de reação à submissão, passam a reconhecer que
possuem um determinado capital específico suficiente para formar um grupo
de produção, ter uma renda. Depois de experimentar uma atividade produtiva
rentável, as mulheres não são as mesmas, já não se sentem tão prisioneiras,
estão mais abertas às multiplicidades do mundo, sonham com liberdade e,
assim, contagiam outras mulheres, afetando e sendo afetadas por esses
desejos (SALES, 2007, p.442).

Este processo, indicado por Salles, pode ser gradual e ao mesmo tempo
continuo. Neste sentido os dados mostram que a contribuição nula teve maior
expressão para a participação cívica com 30% das opções das entrevistadas.
A participação cívica é para Putnam (1993, p.177), “um círculo virtuoso” que
resulta, quando em comunidade, “em equilíbrio social, com elevados níveis de
cooperação, confiança, reciprocidade, envolvimento cívico e bem estar coletivo”. Ao
que, o autor acrescenta que estas são características da organização social, que
podem melhorar a eficiência da sociedade facilitando ações coordenadas (PUTNAM,
1993, p.167).
A reflexão de Putnam pode ser submetida à reflexão na fala da agricultora e
atual presidente da AAFEMED:
127

Assim olha, eu vou falar bem a verdade assim... Porque eu já participei da


cooperativa também. Eu fiquei de fiscal. As pessoas reclamam, mas eles não
gostam de participar. A cooperativa já fez várias programações com pessoas
que... da EMATER... Só que daí tem que perder o tempo sabe [...] tem que
ficar lá o dia todo... tem que às vezes ir para Foz, porque a gente somos em
quatro né... eu não posso dizer que toda vez tem que ser aqui em Medianeira,
não... Tem que ser em Foz, tem que ser em Missal... Mas eles não
participam... ninguém tem interesse. Tanto que a gente agora precisa ir tomar
umas boas decisões aí para nossa cooperativa, mas a gente não acha
ninguém para ir. Quem está na diretoria da associação tem que ir na da
cooperativa também porque ninguém quer participar. Então às vezes não é
que falta tipo a cooperativa não tem. Não é isso... é porque as pessoas vão
também tanto que você viu né (risos) (LIDIANE, entrevista em 31 de outubro
de 2020).

A fala da Lidiane confirma os resultados e indica a dificuldade de participação


mais efetiva entre as associadas, principalmente no que se refere a ações de
articulação e resgatando a fala de Putnam, importantes para a melhoria da sociedade
e do bem estar coletivo.
Sob este aspecto, Correia (2007), traz a reflexão, para a realidade aqui
construída, que a cooperação e participação, como elementos definitivos para a
participação cívica, são vistos em um contexto de construção familiar e social:

É no contexto familiar que se alicerçam atitudes de aceitação da diferença e


de tolerância, ou pelo contrário se transmitem os primeiros sentimentos de
discriminação e intolerância. Os indivíduos que aprendem a cooperar na
família, tenderão a buscar soluções para os problemas coletivos da
comunidade através da cooperação (CORREIA, 2007, p.111).

Soma-se ao contexto aqui referido a capacitação e a construção das relações


dentro e fora da associação:

Mas eu acho que essa de participar é porque a pessoa que não entende, é
difícil de se botar, porque são todos agricultores. Os com estudo são poucos
os que estão envolvidos. Então os filhos dos agricultores envolvidos são os
que se envolvem na diretoria. E os agricultores que estão sozinhos não tem
entendimento, então é difícil tentar fazer uma coisa que você não tem nem
noção do que é. Até mesmo a gente não tem muita noção de como é que
funciona. A gente sabe porque a gente procura e porque a gente pergunta,
mas o resto não... (tenso) (RAFAELA, entrevista em 31 de outubro de 2020).

Na construção do entendimento e da discussão dos resultados as figuras


seguintes propõem a visualização dos mesmos por dimensões, a começar pela Figura
28 com os resultados das contribuições para os indicadores econômicos.
128

Figura 28 - Contribuições registradas pelas mulheres rurais na dimensão dos


indicadores econômicos, pela participação na AAFEMED.

73%
67%

53%

35% 33%
30%
27%
22%
19%
14% 14%
5% 3% 5%
0% 0%

Status econômico Recompensas Participação cívica Investimento


financeiras financeiro
NADA POUCO SATISFATÓRIO MUITO

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

De forma geral, na Figura 28 observa-se o predomínio das contribuições


consideradas satisfatórias nas recompensas financeiras, no status econômico e na
participação cívica respectivamente.
É possível observar que para as variáveis, investimentos financeiros,
recompensas financeiras e status econômico, foram atribuídos, respectivamente para
27%, 22% e 19%, o conceito de muita contribuição da AAFEMED. Os dados condizem
com os demais dados econômicos apresentados até o momento pela pesquisa, onde
a AAFEMED comprova sua importância na geração de renda para as unidades
produtivas e para as mulheres rurais associadas.
Um caminho inicial para estes resultados está na base formativa da própria
associação, considerando que as associações rurais devem ser compreendidas como
resposta ao isolamento do ambiente rural, como forma de atender exigências e
indicações das políticas públicas e dos mercados, sendo capaz de viabilizar a
produção a menores custos, suprimir exigências tecnológicas e dificuldades de
comercialização. São iniciativas de organização coletiva que desenvolvem
instrumentos e ferramentas importantes para a produção, organização da produção,
agregação de valor e de comercialização da produção (SILVEIRA et al. 1999).
129

Sob outro ponto de vista, esta alternativa, quando direcionada para a mulher
rural, proporciona um foco sobre a liberdade e a construção de seu espaço como
indivíduo, considerando o que:

Trabalhos empíricos recentes evidenciaram o modo como o respeito e a


consideração pelo bem estar das mulheres são acentuadamente
influenciados por variáveis como o potencial das mulheres para auferir uma
renda independente, encontrar emprego fora de casa, ter direitos de
propriedade, ser alfabetizadas e participar como pessoas instruídas nas
decisões dentro e fora da família (SEN, 2007, p.248/249).

Para o investimento financeiro o percentual de contribuição considerado pouco


foi predominante entre as entrevistadas, porém paradoxalmente este também foi,
entre as 4 variáveis observadas, aquela com maior percentual de contribuição
considerada muito significativa. Em uma visão complementar, 60% das entrevistadas
considera a contribuição no investimento financeiro entre satisfatória e muito
significativa.
Duas perspectivas, ainda possíveis de análise, no que refere ao investimento
financeiro e a participação cívica, onde 35% das entrevistadas consideram pouca a
contribuição ao investimento econômico, e 54% das participantes considera pouca ou
nenhuma contribuição da AAFEMED na participação cívica.
De forma a abordar estas diferentes respostas e ao menos tempo reforçar a
discussão sobre participação cívica, observa-se inicialmente a fala das agricultoras
sobre a participação na AAFEMED:

Olha, bem pouco. Tanto como eu falei para você... Eu tenho muitas que eu
não conheço. Tem muitas que eu não conheço das que são associadas lá.
Mesmo eu sendo Presidente, né. A gente conhece lá por nome... Conhece
assim... Quem vai mais lá na feirinha... Assim conheço porque no sábado eu
vou às vezes almoçar, levar... Mas assim de ter assim de se reunir ou de
participarem de reunião ou de alguma coisa, não. Bem pouco (LIDIANE,
2020, entrevista em 31 de outubro de 2020).

Não existe muito envolvimento. Eu acharia que seria até interessante e


importante porque quando você conhece outras histórias que deram certo, ou
que não deram, você acaba sempre aprendendo mais, e talvez seria muito
interessante para gente para outras pessoas também né. Porque a gente
começou num ramo e às vezes a gente acaba influenciando, porque tem lugar
para todo mundo trabalhar né. Tem lugar e espaço para todo mundo, e às
vezes o que tu faz por ajudar outra pessoa também a melhorar de vida,
melhorar como pessoa, como mulher (RAFAELA, entrevista em 31 de outubro
de 2020).
130

O esclarecimento para a variação dos dados pode ser observado em uma


análise ampliada das falas de Lidiane e Rafaela, onde estas afirmam que poucas
famílias são participantes de forma mais constante e efetiva, o que pode afetar a
possibilidade de renda ao ponto de investimentos financeiros, e em ângulo cíclico com
menor sentimento de pertencimento, menos cooperação e menor participação cívica.
Na dimensão social as variáveis consideradas formam os resultados expressos
na Figura 29.

Figura 29 - Contribuições registradas pelas mulheres rurais na dimensão dos


indicadores sociais, pela participação na AAFEMED.

56%
53%
47%
43%
33% 36% 36%
31%
24%
17%

8%
3% 5% 3% 5%
0%

Pertencimento Apoio social Cooperação Apoio emocional

NADA POUCO SATISFATÓRIO MUITO

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Os dados da Figura 29 destacam a variável pertencimento com elevada


contribuição para 33% das mulheres, que se somado ao percentual de satisfação
chega a 76% das entrevistadas. Para 24% das entrevistas, porém, pouco foi
acrescentado ao sentimento de pertencimento, reforçando esta linha 36% das
mulheres também reconhecem poucas contribuições no apoio social e na cooperação
e 31% no apoio emocional.
Para Bonomo et al. (2013, p.91), a construção de um grupo e, respectivamente
de sua imagem social, envolve complexidades, entre as quais a consideração de
recursos simbólicos e afetivos que facilitem e impulsionem o aprender a fazer parte e
a permanecer nele. Os autores lembram que a sociabilidade camponesa “ se organiza
por meio da estrutura social comunitária, favorece a reflexão acerca da dinâmica de
131

pertencimento grupal e de sua relação com os processos de identidade e de representações


sociais”.
Há, porém, de se considerar que os “tempos” são diferentes para cada
indivíduo, principalmente para mulher rural que a tanto está condicionada a uma
realidade de “acessório” nas unidades produtivas. Associações são compostas de
indivíduos com recursos simbólicos e afetivos diversos, saber como e estar disposto
a ter a perspectiva de gerar pertencimento deve ser também um papel da própria
associação que tenha por objetivo promover a construção do capital social.

Talvez seja por um costume né. Que vinha de antigamente que os homens
tomavam conta de tudo e as mulheres trabalhavam e eles tomavam conta
das outras coisas. E talvez seja uma falha nossa, como sociedade e como
associação. Talvez a gente teria que hoje mudar o foco né. [...]... e talvez
fazer um trabalho que inteirasse mais elas, e que como elas entendessem
mais como as coisas funcionam, tivessem mais vontade de participar. Talvez
se a gente fizesse alguma coisa de um estudo, ou um programa que a gente
pudesse conversar e explicar as coisas, ou uma conversa simples de
comadre com um lanche ou alguma coisa. Talvez a gente se envolvesse
mais, talvez isso mudaria, talvez elas tivessem um novo sentido, porque
quando você vai fazer uma troca de ideias e experiências, a gente vai tendo
uma visão diferente de como as coisas funcionam. Talvez eles participariam
mais (RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

Complementando a discussão a Figura 30 registra os dados da pesquisa na


dimensão pessoal.

Figura 30 - Contribuições registradas pelas mulheres rurais pela participação na


AAFEMED na dimensão pessoal.
50% 48%
46% 46% 46%
40%
38%
32%

14%
11% 11%
3% 3% 3% 3% 5%

Confiança Poder pessoal. Respeito Reputação

NADA POUCO SATISFATÓRIO MUITO

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Os dados mostram uma perspectiva mais positiva na variável confiança, que


se refere ao respeito da mulher a si e a suas próprias opiniões, em um possível laço
132

com a variável do pertencimento (Figura 18), que pode estar relacionada ao


reconhecimento da associação como um lugar de fala, onde se reflete esta confiança.
O poder pessoal e o respeito foram as duas variáveis com contribuições
consideradas entre satisfatórias e poucas, presumindo que estas mulheres
encontraram seu lugar de fala e estão buscando a repercussão destas falas na família,
na comunidade e na sociedade que repercutem também na construção da sua
reputação nestes ambientes.
A Figura 31 remete ao questionamento feito às mulheres, e que formou a base
da dimensão pessoal, como forma de esquematizar um processo em construção.

Figura 31 – Elevação do percentual de altas contribuições da AAFEMED na


construção da dimensão pessoal.

Fonte: Dados do questionário, 2020.

Este processo de construção e empoderamento está também expresso na fala


das associadas:

Eu tinha medo de nunca trabalhar, nunca conseguir arrumar um serviço, eu


achei que não nunca ia aprender a dirigir... A minha mãe também foi criada
sobre muitos medos, e a gente cresceu também sobre muitos medos
também, que a gente não dava conta, que a gente não ia conseguir, que a
gente não ia ser nada. [...] Então eu me sinto muito bem. A gente sabe que a
gente consegue... às vezes a gente, por mais que tenha medo, a gente luta
contra esse medo e vai lá para tentar, a gente não desiste. Coisa que quando
a gente é mais nova isso abala muito a gente, né [...] eu acho que quando
você se empodera, e você se dá o respeito, as outras pessoas também te
respeitam. E quando você dá a tua opinião meio... Ah.. Será que eu vou falar,
que eu estou falando certo ou não... Se você não se valorizar os outros
133

também não te valorizam. Eu acho que a valorização começa por você. Se


você acha que a tua opinião é importante, que vai mudar alguma coisa, e
você fala isso e você fala isso com essa visão eu acho que as pessoas
também dele desse jeito (RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

Sob este aspecto, a Figura 32 mostra os dados referentes à dimensão do


empoderamento e propõe uma discussão mais ampla sobre a análise das dimensões
anteriores.

Figura 32 - Contribuições registradas pelas mulheres rurais pela participação na


AAFEMED na dimensão do empoderamento.

64%
55%
50%

36%

25%
17% 19%
14%
8%
6%
3% 3%

Empoderamento Empoderamento social. Empoderamento


pessoal. econômico.

NADA POUCO SATISFATÓRIO MUITO

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Seguindo a tendência apresentada pelos dados anteriores, o empoderamento


econômico apresenta maior reconhecimento entre as contribuições proporcionadas
pela AAFEMED, porém na variável empoderamento pessoal, é possível verificar um
contraponto a ser relacionado com o item anterior, apresentando percentual entre
nada e pouco somando 42% de contribuição.
Este resultado ratifica o anterior em análise que permeia a já abordada
anteriormente (Figuras 19 e 20), quando se analisa que, embora mais confiante em si
e na certeza de suas capacidades, o reflexo em ações ainda pode apresentar entraves
nos grupos sociais aos quais pertence. Neste mesmo sentido o empoderamento social
segue o raciocínio, porém, com índices de satisfação mais elevados e significativos,
que por sua vez podem refletir o próprio pertencimento sentido em relação a
134

AAFEMED, bem como as perspectivas de futuro no processo de construção junto a


associação.
Como abordagem geral, para Romano (2002), o empoderamento é um
complexo processo social que inclui diversos aspectos, tanto pessoal, quanto
coletivamente, onde os grupos sociais são responsáveis na construção de ambientes
e condições favoráveis para que as mudanças aconteçam.
A linha construída na análise das dimensões e na prospecção destas, conjunta
e complementarmente, traz a AAFEMED centrada aparentemente na viabilização
econômica destas famílias, porém, é possível observar, e em determinado
pensamento, atribuir a este espaço financeiro conquistado e também ainda em
conquista, a própria visualização da mulher em relação a suas demandas. Esta mulher
é capaz de reconhecer que precisa de mais espaço, respeito e reconhecimento,
reverbera em uma pesquisa (nesta) sua visão enquanto agente ou potencial agente
dentro de sua família, unidade produtiva, associação e sociedade em geral.
As dificuldades iniciais, observadas, parecem estar no espaço da família e na
unidade produtiva, sendo a AAFEMED, mesmo com suas carências de abrangência
destes aspectos, uma estrutura basal e de fomento à consciência de espaço e luta da
mulher rural.

4.2.2.2 Percepções das mulheres agricultoras sobre o capital social e empoderamento


em relação ao antes e depois da AAFEMED

A análise aqui referida, objetiva compreender se a participação das mulheres


agricultoras na AAFEMED surtiu efeitos positivos, negativos ou manteve a
neutralidade no cotidiano das entrevistadas em relação às dimensões e variáveis
consideradas e seus consequentes reflexos no empoderamento e no capital social.
A discussão dos dados parte da visualização geral para as abordagens
pontuais dentro dos indicadores e dimensões construídas. Neste processo a Figura
33 considera todas as variáveis e indicadores obtidos referentes às contribuições
proporcionadas às mulheres rurais pela participação na AAFEMED, considerando o
antes e depois da associação.
135

Figura 33 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da


participação na AAFEMED.

Status econômico
90
Recompensas
Reputação 80 financeiras
70
60
Respeito pessoal 50 Participação cívica
40
30
20
10
Poder pessoal 0 Investimento financeiro

Confiança Pertencimento

Apoio emocional Apoio social

Cooperação

Piorou % Continuou igual % Melhorou %

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Segundo os dados observados, as variáveis recompensas financeiras (84%)


(31), status econômico (84%) (31), confiança (73%) (27), e investimento econômico
(70%) (26), foram respectivamente consideradas, com maior percentual de melhora
na perspectiva do antes e depois da AAFEMED.
Por sua vez as variáveis participação cívica (67%) (25), cooperação (57%) (21),
apoio social (68%) (25) e apoio emocional (65%) (24), continuaram iguais mesmo
depois da participação na AAFEMED.
Para Popova (2012, p.3), o cooperar para o desenvolvimento mútuo, aqui
considerando a dimensão econômica, como componente de um contrato social pode
formar a base para a construção de identidades e relacionamentos sociais tanto no
âmbito familiar quanto ao longo da divisão cultural e econômica do trabalho. Segundo
a autora, o capital social pode “mobilizar recursos e distribuí-los na sociedade, trazer
maior segurança, inclusão social e participação econômica ou substituir as
deficiências do Estado e do mercado”.
136

Sim.. sim. Porque, assim, eu não, mas que nem a mãe aqui é tudo de lá da
agroindústria que ela tira o dinheiro. Tudo sai dali... Ela não tem outra fonte
de renda. Tudo o que ela faz aqui, tudo o que a gente investe, é tudo em
cima da agroindústria. Se a gente não tivesse, por exemplo, na associação...
Tem coisas que a gente não poderia estar vendendo. Por exemplo, a
merenda escolar não poderia né. Então sim, melhorou. Não vou dizer 100%
mas 98% (LIDIANE, entrevista em 31 de outubro, 2020).

Com predominância de considerações sem melhora está a variável, apoio


social, participação cívica, e o apoio emocional, respectivamente, aspectos do
associativismo que podem ser vistos de forma, individual, ou correlatas, dentro dos
processos de consolidação e mesmo de formação da associação, visto o intuito inicial
da AAFEMED de atuar especificamente na facilitação da comercialização, que pode
ser observado aqui como um viés para o desenvolvimento dos demais indicadores.
Some-se o estado de permanência como avaliação também das variáveis,
pertencimento, cooperação e poder pessoal. Sobre as quais é importante considerar,
a correlação com a participação cívica.
Neste aspecto de inter-relação, considera-se que a teoria do conceito de
comunidade cívica e civismo se assenta “aludindo à construção de identidades fortes
de pertença que permitam o estabelecimento de relações de cooperação e confiança
recíprocas enraizadas nas instituições” (MARTINEZ, 2010, p.50); novamente
remetendo a um processo de construção.
O autor, ao discutir os diferentes teóricos do capital social destaca o
reconhecimento da origem do capital social no capital econômico, segundo a autora o
capital econômico “passa por uma espécie de transformação para se reinvestir e
acrescer”:

Tanto o capital econômico quanto o cultural são fontes do capital social e


permitem sua geração mediante esse mecanismo de mutação. A pertença a
redes e grupos explica que, com um mesmo acúmulo de capital cultural ou
econômico, os indivíduos possam desenvolver trajetórias com desempenhos
diferentes (MARTINEZ, 2010, p.44).

A visualização mais detalhada dos resultados foi abordada na expressão dos


mesmos nas dimensões econômica, social, pessoal e do empoderamento. A Figura
34 registra a contribuição considerada pelas agricultoras na dimensão econômica no
antes e depois da AAFEMED.
137

Figura 34 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da


participação na AAFEMED na dimensão econômica.

83% 86%

69% 70%

28% 27%
17% 14%

0% 0% 3% 3%

Status Recompensas Participação Investimento


econômico. financeiras cívica financeiro

PIOROU IGUAL MELHOROU


Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Os dados apresentam melhoras na dimensão econômica, principalmente


relacionadas às recompensas financeiras e ao status econômico seguido pelo
investimento financeiro.
A urgência das questões econômicas nos processos de desenvolvimento
assume um particular aspecto na agricultura familiar, além da manutenção da renda,
a manutenção do sistema produtivo e da própria pose da terra. Neste sentido o
enfrentamento do mercado assume características especificas em processos
associativos:

[...] os mercados não são elementos de deterioração da cultura e da vida


social, mas, ao contrário, são construídos permanentemente pela própria
qualidade dos vínculos estabelecidos, em cada sociedade, entre os
indivíduos e entre os grupos sociais. Os mercados não são os invasores da
integridade cultural do mundo. Eles se encontram – como provam
os equipamentos sociais em que se apoia o julgamento das singularidades –
entre os principais produtos da própria cultura humana. São, portanto, um
espaço de atuação política, cujo sentido não é forçosamente o de aniquilar a
diversidade, exterminar a cultura e aviltar os laços sociais [...] O próprio
mercado passa a ser visto como construção política, cultural, em cujas
estruturas é permanente a intervenção consciente e voluntária dos atores
(ABRAMOVAY, 2007, p.3).

Os mercados estão ligados ao capital social e aos processos associativos:

Não dispondo de bens físicos para dar em garantia, os participantes, na


verdade empenham suas relações sociais. Assim o capital social é usado
138

para ampliar os serviços de crédito disponíveis nessas comunidades e para


aumentar a eficiência com que aí operam os mercados (PUTNAM,
1993/1996, 178).

Some-se a esta análise o histórico de exclusão da agricultura familiar, o


decorrente sucateamento das unidades produtivas e a insegurança de manutenção
dos programas de políticas públicas, sejam elas de facilitação de canais de
comercialização, de esferas organizativas, de legislação sanitária em relação a
produção e comercialização de produtos in natura ou processados, ou ainda a
carência de assistência técnica e extensão rural regular e adequada a realidade da
agricultura familiar. Estes, entre outros fatores, como acesso à informação e
conhecimento, contribuem para a urgência no atendimento às questões financeiras e
da importância destas para a continuidade e desenvolvimento dos processos de
associativos.
As reflexões acima remetem novamente ao apontamento do capital econômico
como fonte geradora do capital social, e contribuem para o entendimento da
importância da AAFEMED na geração de renda, especialmente das mulheres rurais.
Sob a perspectiva da própria necessidade de continuidade e perseverança nos
processos associativos é importante a análise e registro de que a dimensão
econômica comporta também a participação cívica com menor percentual de melhora,
segundo as entrevistadas, mesmo após a participação na AAFEMED. O ângulo de
convite a observação aqui, porém, é que para 28% das entrevistadas a participação
cívica melhorou, o que dada sua conexão já exposta com o pertencimento e com a
própria base de formação do capital social, pode ser visto como um aspecto positivo
em um processo em construção dentro da AAFEMED.
A relação direta, com a participação cívica e a dimensão social, entre outras
considerações, projeta para a discussão os dados registrados na Figura 35.
Nos significativos e correlatos dados da Figura 35, observa-se que a dimensão
social, em todas as suas variáveis, segundo mais de 50% das entrevistadas não
apresentou nenhuma melhoria, com destaque para o apoio social com quase 70%
(26) e para o apoio emocional com 65% (24) das opiniões.
139

Figura 35 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da


participação na AAFEMED na dimensão social.
69%
65%
59%
54%
46%
41%
35%
31%

0% 0% 0% 0%

Pertencimento Apoio social Cooperação Apoio emocional

PIOROU IGUAL MELHOROU

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Em outro e complementar ângulo, a melhora é constatada de forma respectiva


decrescente na cooperação, pertencimento, apoio emocional e apoio social. Embora
em menor percentual que a manutenção das condições anteriores na AAFEMED, a
percepção de melhora está presente, e pode sugerir a análise dos resultados como
parte de um processo de desenvolvimento específico desta dimensão, onde a
cooperação possa ser propulsora do pertencimento e desencadear, discussões,
decisões, capazes de alavancar ações que identifiquem, caracterizem e fomentem o
apoio emocional e social de forma ainda mais significativa para todas as participantes.
A dimensão social está relacionada em parte às expressões da dimensão
pessoal de cada agricultora, neste sentido a Figura 36 considera esta dimensão e
suas variáveis.
Com percepção de 73% (27) das agricultoras, a confiança melhorou depois da
AAFEMED. Nas demais variáveis é possível observar percentuais próximos da
igualdade entre melhora e permanência do estado anterior à associação, sendo que
somente na variável poder pessoal o percentual de melhora é inferior ao de
permanência.
140

Figura 36 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da


participação na AAFEMED na dimensão pessoal.

73%

54%
46% 48%49% 49%51%

27%

3%
0% 0% 0%

Confiança Poder pessoal. Respeito Reputação.

PIOROU IGUAL MELHOROU

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Segundo Martinez (2010), ao analisar os conceitos de Coleman sobre o capital


social, o mesmo pode ser entendido como um elemento de inclusão de normas,
valores, confiança e reciprocidade, sendo compartidos e utilizados com fins
produtivos. Elementos que permeiam a formação das variáveis da dimensão pessoal
e que assim como referido na análise anterior (item 4.1.2, na Figura 20), mostram uma
tendência a evolução dentro da AAFEMED, a partir da confiança que estas mulheres
apresentam em si, na ocupação gradual de posições de liderança, e da consequente
expansão das perspectivas de atuação, como expressa a primeira presidente mulher
da associação, Rafaela Toniazzo:

Só que eles nunca tiveram o objetivo de integração entre eles. Talvez seria
interessante fazer um programa para ajudar as mulheres, porque muitos
deles é aquelas mulheres que fazem em casa, os maridos põem no carro, vai
lá na feira, vende, o marido recebe e vai embora. Para instigar, impulsionar...
Por exemplo, aqui em casa uma ajuda a outra, então a coisa vai embora. Mas
as vezes a gente vê que as outras são sozinhas, então às vezes ajudaria, né,
dar esse empurrãozinho (RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

No que diz respeito às variáveis “poder pessoal”, “respeito” e “reputação”,


observa-se uma visão contraditória entre as entrevistadas. A variação desta
percepção pode estar associada a inúmeros fatores, entre os quais, o tempo de
associação, a participação efetiva e mesmo as definições de gênero, de opção de
desenvolvimento da unidade produtiva encontradas na unidade familiar, na
141

comunidade e na própria mulher como indivíduo. Estas características são


observadas e analisadas pelas participantes:

Por exemplo, não sei se alguma outra mulher iria pegar o meu lugar, por
exemplo da presidência, não sei. Porquê pode ser se der um incentivo, pode
ser. Mas senão, pode ser que volte só com homens mesmo. Assim no meu
ver. A mesma coisa que eu vejo que nem quando a gente tá falando lá da
cooperativa, que ninguém... Se não é os homens que vão, mulher nenhuma.
Só tem eu lá. Eu e a Cláudia. Eu acho que a gente... O que é o que os homens
fazem, nós fazemos também, e tranquilo. Pelo que eu estou ali agora esse
tempo eu vejo que... Quando eu entrei eu dizia: -eu Deus acho que não vou
conseguir. Agora não.. eu vejo que é tranquilo. Mas não sei se as mulheres
teriam coragem. ... não sei te dizer (LIDIANE, entrevista em 31 de outubro,
2020).

Eu acho que elas não... como que eu vou falar pra você. Não sei te dizer
também se os maridos não permitem, eu não acho que seja isso. Eu acho
que seja um pouco de falta de elas ter um pouco assim de interesse, sabe.
Porque como marido faz, ele que se vire né. Então talvez elas ...ou também
elas não tem informação de elas poder estar poder estar participando. Porque
às vezes ali o marido vai lá na feirinha, leva, recebe, entrega e pronto. Para
elas eééé... elas não se envolvem com a Associação talvez né... eu acho que
é isso. (LIDIANE, entrevista em 31 de outubro, 2020).

Então é isso que eu falo... tem muitas que às vezes elas não sabem dessas
coisas, que não participam também. É porque não conhecem.
É que nem a Ana. A Ana como ela cuida da agroindústria lá, ela participa
também. O marido dela tem outra atividade. E como ela participa da feira, ela
participa da diretoria, ela participa das reuniões... Eu acho que é isso. É como
falei antes... A falta de conhecimento faz você não se envolver na feira.
(RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

Mas eu acho que eles tem um foco comercial e não pessoal... Eles não
estavam precisando ajudar alguém... eles estavam precisando de um lugar
pra vender porque eles tinham a produção pra vender, e precisavam ter uma
renda. Mas hoje isso já está bem fixo, uma coisa que está bem tranquila. E
ali o ponto de venda, não interessa se eu saio ou se o fulano sai... ele vai
continuar. Né porque já é uma marca e ele vaí continuar. Então já dá pra se
pensar em mudar agora o foco, né... Colocar algumas coisas mais novas.
(RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

As variações no ambiente formativo, nas histórias destas diversas mulheres,


tornam ainda mais importante, fundamental e rico o ambiente de partilha e construção
coletiva, ciente e rico na própria diversidade. Neste caminho a Figura 37 apresenta as
percepções das agricultoras sobre o empoderamento nas dimensões consideradas
anteriormente.
142

Figura 37 - Contribuições proporcionadas às mulheres rurais antes e depois da


participação na AAFEMED na dimensão do empoderamento.

59% 57%
53%
47%
43% 41%

0% 0% 0%

PIOROU IGUAL MELHOROU

Empoderamento pessoal. Empoderamento social. Empoderamento econômico.

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Em um aspecto aparentemente contrário à construção dos resultados


anteriores, a melhora é percebida de forma mais significativa do empoderamento
pessoal, para o social e para o econômico respectivamente.
Nos dados anteriores, de maneira geral, as variáveis relacionadas a dimensão
econômica aparecem aferindo melhoras tanto no antes e depois, como escolhidas
como elementos de maior contribuição da AAFEMED, porém quando a pergunta é
referente ao empoderamento econômico, 59% (22) destas mulheres afirmam que este
item não melhorou com a associação.
Uma percepção semelhante foi observada por Karam (2004) ao estudar a
participação das mulheres rurais na produção orgânica em Santa Catarina, onde
constatou que as mulheres tinham protagonismo no processo de conversão da
produção agrícola convencional para a orgânica. Porém, segundo a autora “à medida
que os homens das famílias percebiam os resultados obtidos, tanto na produção como
na renda auferida, muito rapidamente passaram a assumir um papel mais decisivo no
processo produtivo” (KARAM, 2004, p.314).

[...] a situação de opressão e subordinação da mulher no meio rural passa


pela naturalização do papel do homem e da mulher, que está relacionada
com relação hierárquica dentro das famílias rurais, cuja base material é a
divisão sexual do trabalho. Esta diferenciação é determinada socialmente
143

através de vivências, símbolos e representações, e se reproduz no cotidiano


da dinâmica familiar (HERERA, 2012, p.2).

Entendendo o empoderamento como um caminho que percorre o


reconhecimento dos meios (direitos, recursos, capacidades, oportunidades), o
processo (tomada de decisão, análise de realidade, ação) em direção a finalidade,
que é a aquisição de controle sobre si, como agente, como indivíduo, e
consequentemente sobre seus processos, é importante observar que o mesmo
apresenta-se muitas vezes como cíclico (BARLETT, 2004); permeando diversos
atores, se transformando e reconhecendo a cada etapa, novos meios, processos e
finalidades.
Algumas decisões no início, porque foi assim, no início ele não acreditava que
a produção de orgânicos né ia dar certo, que nem eu te falei, eu levava
pouco... Aí eu fui estudando, porque eu fiz cursos né, para ver qual a quantia
mais ou menos que eu poderia estar levando que me desse lucro. E isso foi
aumentando os pedidos né, depois foi aumentando as quantidades... o
pessoal pedindo... E observei que quanto mais quantidade mais eu estava
ganhando, porque daí para mim plantar um pé ou 200 pé de alface era
indiferente. No início eu achava que 50 quilos era demais... Hoje em dia 50
quilos é pouco a produção que a gente tem. Então isso foi o olhar do que eu
estou levando e quantidades tudo, agora ultimamente tudo é anotado no
papel, pra gente ter uma ideia do quanto por semana está saindo e entrando,
e eu estou ganhando realmente [...]. Daí tem aquela questão né, que é a
gente colocar nas ideias do marido, do filho né, que dá para ser feito dessa
forma e a gente conseguir um ganho... é difícil um pouco né. Mas a gente
conseguiu, daí agora está tendo aquela questão de conjuntura né, você está
se ligando para a gente seguir no mesmo caminho. Isso é importante eu acho
(CLAUDIA, entrevista em 24 de outubro, 2020).

Pode-se alavancar aqui uma discussão que, perante os dados apresentados


na Figura 26, apresenta a construção deste processo, perfazendo o empoderamento
pessoal, social em direção ao econômico, cíclicos em si e como conjunto
interdependente (Figura 38).
A Figura 38 remete o olhar do empoderamento pessoal na perspectiva das
agricultoras da AAFEMED como a dimensão de maior melhoria proporcionada pela
associação, este aspecto, como fundamentado, é também dependente dos demais e
assim com estes, é específico, diverso, construído em cada realidade individual e
prospectado na construção coletiva.
144

Figura 38 – Processos de empoderamento das mulheres agricultoras da AAFEMED.

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Soma-se, a reflexão de Sen (2007, p.246), que afirma que as mulheres deixam
de ser receptoras passivas e “são vistas cada vez mais, tanto pelos homens como por
elas próprias, como agentes ativos de mudança: promotoras dinâmicas de
transformações sociais que podem alterar a vida das mulheres e dos homens”.
A gente tem toda a questão dos valores aqui que a gente adquiriu. Eu já
coloquei dinheiro na conta do meu filho, para ele ter uma reserva para ele. Eu
tenho o próprio dinheiro que a gente produz aqui para a gente saber o quanto
a gente tem e a gente pode se alimentar com isso. Porque no início era o
dinheiro do Ildo né, que era trabalho de professor. Mas daí como que eu ia
falar para os agricultores que a agricultura familiar dava certo né? Daí depois
do curso que eu fiz eu falei assim, nós temos que fazer uma conta separada
para a gente ver o quanto realmente a propriedade está dando sustento pra
gente. E isso daí eu conseguia passar para os outros agricultores que dá
certo (CLAUDIA, entrevista em 24 de outubro, 2020).

A fala da Cláudia explicita uma postura de protagonista, como colocando em


evidência a sua função de agente ativo de mudança, com a preocupação de adquirir
conhecimento, implementar e testar este conhecimento, para depois poder
compartilhar com os outros agricultores e agricultoras, atestando uma preocupação
que não se restringe à própria família, mas se estende às outras também.
145

4.2.2.3 A mulher rural da AAFEMED, o empoderamento e o capital social: uma estrada


a construir e percorrer

Entre os destaques a serem feitos neste ponto, está a importância da geração


de renda como garantia da segurança financeira das famílias rurais que além de sua
finalidade direta de subsistência e manutenção, parece impulsionar o
desenvolvimento, a busca da mulher rural em direção as demais dimensões,
construindo pontes para o alcance, fortalecimento do desenvolvimento pessoal e
social como forma de construir o empoderamento e o capital social.
Esta perspectiva parte da base de que “qualquer tentativa prática de aumentar
o bem-estar feminino não pode deixar de recorrer à condição de agente das próprias
mulheres para ocasionar tal mudança” (SEN, 2007, p.247). Ao ser questionada sobre
o sentimento de como mulher, ser independente e empoderada, Claudia corrobora
com Sen (2007).
Olha, hoje em dia sim. Assim, pontos importantes porque eu tive muitas
conquistas né, na época antes de vir morar para cá eu fiz a minha própria
carteira de motorista para não precisar depender do marido, porque hoje em
dia vejo algumas amigas minhas agriculturas que não tem né, para sair
sozinha lá e fazer... E tudo assim na questão de ir lá negociar, também eu
que estou negociando lá para fazer as entregas. Só que agora tem um
conjunto né, porque eu também não faço tudo sozinha, que nem a Janete
falou, não faço sozinha, não tem como a gente fazer tudo sozinho... ou a
gente paga alguém ou a gente depende da família senão não tem como
(CLAUDIA, entrevista em 24 de outubro, 2020).

A condição da mulher rural, como protagonista dos processos de


desenvolvimento, prioriza a família e a unidade produtiva, mas também mantem e
fortalece um processo de individuação, que parte para a consciência e a busca de seu
espaço nas demais dimensões e gera este processo dentre os demais atores do seu
cotidiano.
Eu acho que desde a minha bisa, para minha avó, para minha mãe, todas
nós somos mulheres fortes na família. Todas somos mulheres
independentes, ninguém precisa de um homem. Nem minha mãe precisou...
Nem minha vó, nem minha bisa... Tanto que minha bisa tá lá... Tudo o que
ela tem que foi ela que construiu. Ela que acordava cedo trabalhar do mesmo
jeito que a minha avó acorda cedo trabalhar, do mesmo jeito que a minha
mãe vem trabalhar cedo. Então nós somos mulheres muitos poderosas
dentro da nossa família. Isso eu sei... Eu acho que eu aprendi com elas isso,
a não depender de nenhum homem ou nenhuma outra pessoa, entendeu?
São... Como é que eu vou dizer... São o orgulho né! Não é qualquer pessoa
que pode dizer... Que veio de uma família de agricultores e que não dependeu
de ninguém além delas mesmas para poder conseguir as coisas... (choro)
(GABRIELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).
146

Ai... São a minha influência. Quando eu crescer eu quero ser igual a todas.
Se eu pudesse tirar o que é de melhor de todas elas... Seria pra mim ser igual
a elas... Tirar um pouquinho de bom de cada uma... eu acho que já sou. Eu
acho que tudo que eu aprendi com elas, desde quando eu ia trabalhar com a
minha avó, tirar leite com ela quando eu era pequenininha com ela que a
minha mãe precisava trabalhar fora... Então se eu não aprendesse com isso
não ia ter outra coisa para mim aprender... Então são mulheres sensacionais.
Eu falei que eu não queria falar porque eu ia chorar... (GABRIELA, entrevista
em 31 de outubro, 2020).

A percepção das dimensões do empoderamento expressas pelas mulheres


esclarece sua visão dos processos junto a AAFEMED e também como agente em
suas unidades produtivas, percebendo a condição de empoderamento pessoal, social
e econômico em consonância com os demais resultados da pesquisa, entendendo a
base e consequência de um processo de empoderamento de “dentro para fora”.
De maneira geral, a Figura 39 registra os percentuais observados, de melhoria,
satisfação ou piora, em relação aos processos de empoderamento (A), e também no
antes e depois da AAFEMED (B) considerando todas as dimensões e variáveis
utilizadas na pesquisa.

Figura 39 – Percentuais gerais da identificação dos processos de empoderamento


(A), e no antes e depois da AAFEMED (B).

15% 1%
4%
29% 47%
A B
52%

52%

Nada Pouco Satisfatório Muito Piorou Ficou Igual Melhorou

Fonte: Pesquisa de campo, 2020.

Para 67% (25) das agricultoras houve melhoras satisfatórias e muito


significativas nas dimensões que constroem o empoderamento, da mesma forma para
52% (19) delas estes resultados estão vinculados aos 14 anos de trabalho da
AAFEMED.
147

Os dados apontam um processo de construção, que na analogia proposta, é


um caminho que proporciona acesso, mas, por vezes, exige um sair da zona de
conforto e ocupar o espaço criado por mulheres que historicamente abriram este
caminho participando do Movimento Popular de Mulheres, das CEB´s, da Pastoral da
terra, do MST, ou simplesmente do clube de mães das suas comunidades, em um
período em que era muito difícil à mulher buscar espaço dentro de casa, e mais ainda
fora dela.
De forma figurativa, como nesta análise e nas palavras de Popova (2012, p.14),
são caminhos do e para o capital social:

Algumas formas podem contribuir para a coesão social, enquanto outras têm
maior probabilidade de estimular a fragmentação social; alguns podem ser
uma fonte de ajuda mútua e proteção, outros simplesmente permitem a
mobilização para a violência. Todas as abordagens, entretanto, compartilham
a ideia de que, ao criar pontes e mitigar relações exclusivas, o capital social
pode prevenir conflitos e facilitar a ação coletiva e a obtenção dos resultados
desejados. Tem a capacidade de motivar os indivíduos a trabalharem juntos,
pois o resultado final é visto não apenas como um 'bem comum', mas também
como um 'benefício pessoal'. Com potencial para permitir o desenvolvimento
e auxiliar na superação de problemas, o capital social é um mecanismo
gerador de mudanças e pode melhorar a qualidade de vida (Tradução nossa).

A eterna jornada das mulheres ao longo da história está há muitas gerações de


alcançar a equidade de gênero. Porém, há um processo muito claro apontando o
caminho, para que ele seja mais rápido e menos penoso, que é gerar capital social
para empoderar as mulheres coletivamente, o que leva o pensamento e a ação para
além do capital humano, formado por ações individuais:

[...] além do capital humano é imprescindível também à existência de capital


social, que corresponde aos aspectos do ambiente social, como o senso de
confiança, a reciprocidade, as redes sociais e o associativismo, capazes de
aumentar o desenvolvimento social e favorecer a construção da cidadania e
da democracia (SCHMIDT, 2006, p.1757).

Sabe-se que o capital social não é unanimidade e carece de mais


aprofundamento, mas também que é um valor palpável e que diferencia grupos,
associações, comunidades, cidades, regiões e até países pela sua influência no
empoderamento das populações.
“Portanto, o capital social é esse conjunto de recursos, ainda que simbólicos,
de cuja apropriação depende em grande escala o destino de certa comunidade”
(PUTNAM, 1993, p.178).
148

4.2.3 A mulher rural da AAFEMED e o elo entre empoderamento, capital social e


desenvolvimento rural sustentável: o caminho já percorrido até aqui

Capital social é um contraponto ao conceito de sociedade como um conjunto


de indivíduos independentes, buscando e alcançando objetivos independentes. É
justamente pautado na cooperação dos atores entre si e com outras instituições,
criando redes de confiança mútua, todas conectadas.
Uma consideração importante é sobre confiança, que é um valor coletivo, uma
qualidade das relações e não dos atores em sentido individual (Granovetter, 1992).
Nem sempre é uma qualidade positiva, visto que em algumas situações a
confiança acaba quando a relação de interesse deixa de existir. Neste ponto, a
reciprocidade deve ser considerada, pois sendo o elemento decisivo para gerar o
capital social é também o que propicia a participação cívica de instituições de maneira
voluntária e cooperativa (ABRAMOVAY, 2000).

Está claro que, presentemente, as dimensões de capital social (tais como:


confiança das relações entre os indivíduos e instituições; redes e canais
informativos; normas e sanções efetivas) são de importância fundamental na
formação da vida econômica e social. O capital social é considerado
produtivo, pois torna possível alcançar determinados objetivos que na sua
ausência não seria possível (BAQUERO, 2003, p.95).

É preciso considerar a relação social como a diferença fundamental entre


capital social e outras formas de capital, pois o mesmo reside nas relações, e objetiva
a resolução dos problemas comuns da coletividade, nas agregações sociais e nas
pontes sociais, principalmente as institucionais como associações formais e informais
de pessoas em que o conhecimento e as visões de mundo formam-se e são
transferidas (PUTNAM, 1995; BAQUERO, 2003).

[...] obrigações, confiança, fluxo de informações, amigos, cultura, normas,


redes e engajamento cívico constituem-se em indicadores parciais sobre o
que é o capital social e onde reside. Se a metáfora de bens e capitais é útil
para analisar as relações sociais, deve ter em conta a habilidade
transformadora do capital de uma coisa para outra (BAQUERO, 2003, p.94).

Embora o capital social seja fomentado por uma variedade ampla de


interações formais e informais entre os membros de uma comunidade, uma análise
plena dessas interações não é observável. O que se pode observar é a prevalência
de filiação em organizações voluntárias em um determinado contexto (BAQUERO,
149

2003). Capital social é avaliado de forma subjetiva pelos envolvidos e o contexto social
afeta esta avaliação.
Como resultado, ser membro de associações tem se tornado o indicador mais
adequado para examinar a construção ou dissociação de capital social. Acredita-se
que, ao fazer parte de associações, as pessoas desenvolvem interações entre si,
aumentando a possibilidade do desenvolvimento de confiança recíproca entre elas.
Como resultado observa-se o aumento da capacidade da ação coletiva,
cooperação e confiança intragrupo, possibilitando que os objetivos coletivos sejam
alcançados mais facilmente, o que Baquero (2007) chama de pontes sociais.
O que se pretendeu foi compreender se o fato de os atores sociais
participarem de grupos e associações facilita o crescimento da cooperação e o
empoderamento. Se a resposta for positiva, as associações podem ser excelentes
formas de adquirir capital social, possibilitar o empoderamento dos envolvidos bem
como fortalecer a democracia.
No caso específico da AAFEMED - Associação dos Agricultores Familiares e
Ecológicos de Medianeira, o olhar se coloca sobre as mulheres rurais participantes
ativas ou não, deste processo de empoderamento coletivo e construção de capital
social por meio da participação na associação.
Portanto, em resposta a pergunta do estudo os resultados apontaram que a
participação na AAFEMED agregou maior empoderamento pessoal (57%) (21), o
empoderamento econômico continuou igual para 59% (22) das entrevistadas e no
empoderamento social houve uma agregação para 47% (17) e para 53% (19) das
entrevistadas permaneceu igual.
Não houve indício de piora em nenhum dos indicadores analisados em
nenhuma das dimensões de empoderamento.
Nos dados apresentados, os três indicadores que estão em maior desalinho à
satisfação, considerando como pouca parcela de contribuição da AAFEMED, são o
poder pessoal 46% (17), e o respeito pessoal 46% (17), em percentuais iguais,
seguidos da reputação 38% (14),
Os indicadores, pertencimento, confiança e investimento financeiro, foram
considerados, entre os conceitos de maior contribuição via participação na AAFEMED,
com 33% (12), 24% (9) e 27% (10), respectivamente das opiniões.
150

Segundo os dados observados, as variáveis recompensas financeiras (84%)


(31), status econômico (84%) (31), confiança (73%) (27) e investimento econômico
(70%) (26), foram respectivamente consideradas, com maior percentual de melhora
na perspectiva do antes e depois da AAFEMED.
Por sua vez as variáveis participação cívica (67%) (25), cooperação (57%) (21),
apoio social (68%) (25) e apoio emocional (65%) (24), continuaram iguais mesmo
depois da participação na AAFEMED.
A parte que menos reverberou foi a participação cívica, que carece de um
empenho maior por parte da Associação, uma vez que tanto a pesquisa quantitativa
como as entrevistas qualitativas deixaram bem claro a baixa participação da
AAFEMED no fortalecimento dessa variável.
Para 67% (25) das agricultoras houve melhoras satisfatórias e muito
significativas nas dimensões que constroem o empoderamento, da mesma forma para
52% (19) delas estes resultados estão vinculados aos 14 anos de trabalho da
AAFEMED.
Todos os indicadores analisados evidenciaram que sim, a AAFEMED
contribuiu, principalmente para o empoderamento pessoal das mulheres rurais
associadas.
Cabe aqui apresentar o modelo anteriormente proposto (Figura 40), trazendo
para o estudo o papel dos atores, no caso, as mulheres rurais da AAFEMED.
Neste sentido, foram substituídos os conceitos no mapa conceitual da
correlação entre capital social, empoderamento e desenvolvimento, pelos atores em
seus papéis no organograma das mulheres rurais da AAFEMED e sua correlação com
a aquisição de capital social, empoderamento e desenvolvimento, conforme
resultados das pesquisas quantitativa e qualitativa.
151

Figura 40 - Mapa conceitual das mulheres rurais da AAFEMED e sua correlação com
a aquisição de capital social, empoderamento e desenvolvimento

Fonte: Elaborado pela autora, 2020.


152

O mapa conceitual apresentado procurou resumir de maneira didática todos os


elementos que a pesquisa trouxe à luz, acrescido à análise qualitativa e à observação
in loco, por ocasião da filmagem e análise das imagens e áudio do documentário.
Levou-se em consideração toda a gama de análises realizadas, informações
adquiridas nas mais diversas fontes desta pesquisa, para que o mapa fosse o mais
completo possível, sem contanto eliminar a possibilidade de continuar a produzir
análises sobre a temática e complementação do estudo.
O objetivo é que o mapa seja autoexplicativo, uma vez que se apresentou toda
a teorização sobre a formação do capital social em um grupo social, neste caso o das
mulheres rurais associadas à AAFEMED, com aquisição de empoderamento
individual e coletivo. Não obstante, pode ser uma ferramenta simplificada para
visualizar o caminho realizado pelas mulheres rurais associadas à AAFEMED, para
aquisição de capital social e empoderamento coletivo.

4.3 DOCUMENTÁRIO RAIZ DE ROÇA

Participaram do documentário 11 agricultoras conforme critério especificado na


metodologia, cujo histórico e principais características estão descritos abaixo em
ordem de entrevista:

1. TEOLIDE PARIZOTTO TURCATEL – Uma das fundadoras do Centro Popular


de Saúde Yanten, uma entidade que participou ativamente nas décadas de
1980 a 2010 da formação das agricultoras através dos Clubes de Mães e dos
movimentos sociais do período. A trajetória do YANTEN se confunde com a
história das feiras que foram evoluindo ao longo do tempo em Medianeira. O
Yanten desenvolve produtos fitoterápicos e estimula a produção de plantas
medicinais e PANC´s. Foi muito importante na luta pela saúde da mulher. A
entrevista foi realizada na manhã de 03 de outubro de 2020, na sala de
atendimento do Yanten. 72anos.
2. ROSELI TURCATEL MOTTER – Filha da Dona Teolide, assumiu o Yanten
nos anos 2010, sendo responsável pela organização dos eventos de mulheres
para discussão e motivação do empoderamento feminino, de abrangência
153

regional, com participação dos movimentos estaduais, regionais e municipais,


normalmente com parceria da Itaipu Binacional. As plantas medicinais e os
fitoterápicos também sempre foram o foco da participação da entrevistada. A
entrevista foi realizada na manhã de 24 de outubro de 2020 na casa da
entrevistada. 52 anos.
3. JANETE MAIA NODARI – Possui uma história ligada aos movimentos de luta
pela terra. Filha de agricultores que foram indenizados devido à inundação de
suas terras pelo lago de Itaipu. Se tornaram acampados do Movimento sem
Terra, e posteriormente foram contemplados com um pedaço de terra no
Assentamento Sávio de Medianeira. A entrevista foi realizada na tarde de 07
de outubro de 2020 na frente casa da entrevistada, sob as árvores de sombra.
49 anos.
4. CLAUDIA REGINA MAINATZ - Filha de agricultores, foi para a cidade
trabalhar, mas não se acostumou. Casou-se com um professor e convenceu o
marido a voltar para a agricultura. Compraram um sítio em Matelândia, e ela se
tornou produtora agroecológica de hortaliças enquanto o marido continuou na
sua profissão professor. Este ano de 2020 estão pensando em ambos se
dedicarem somente à propriedade. Tem um único filho adolescente que ajuda
a mãe nos trabalhos. A entrevista foi realizada na tarde de 24 de outubro de
2020 na casa da entrevistada. 38 anos.
5. TEREZA FÁTIMA TONIAZZO – Sempre foi agricultora, exceto alguns anos
em que se casou e foi para a cidade, mas em dois anos voltou para o campo.
Possui três filhas: Lidiane, Patrícia e Rafaela. Junto com as filhas ela toca uma
agroindústria de panificados e serve o Café Rural para eventos de empresas e
outros. A entrevista foi realizada na tarde de 31 de outubro de 2020 na
propriedade onde fica a agroindústria. 62 anos.
6. LIDIANE TONIAZZO – 2ª PRESIDENTE MULHER. Filha de Dona Teresa, é a
atual Presidente da AAFEMED. Quando jovem deixou a agricultura e foi para
morar e trabalhar na cidade. Quando a mãe começou com a agroindústria,
voltou para o campo para trabalhar e morar. Junto com a mãe e as duas irmãs,
trabalha na agroindústria de panificados da mãe. A entrevista foi realizada na
tarde de 31 de outubro de 2020 na propriedade onde fica a agroindústria. 42
anos.
154

7. RAFAELA TONIAZZO – 1ª PRESIDENTE MULHER - filha de Dona Teresa,


junto com a mãe e as duas irmãs, trabalha na agroindústria de panificados da
mãe. Quando jovem deixou a agricultura e foi para estudar e trabalhar na
cidade. Deixou a profissão de professora quando a mãe começou com a
agroindústria, voltando para o campo para trabalhar e morar. Junto com a mãe
e as duas irmãs, trabalha na agroindústria de panificados da mãe. A entrevista
foi realizada na tarde de 31 de outubro de 2020 na propriedade onde fica a
agroindústria. 33 anos.
8. GRABRIELA TONIAZZO – neta de Dona Teresa e filha da Lidiane -
Acadêmica de Zootecnia na Unioeste – MCR. Mora na cidade onde fica a
universidade e quando é necessário, volta para ajudar a mãe, as tias e a avó
na agroindústria. A entrevista foi realizada na tarde de 31 de outubro de 2020
na propriedade onde fica a agroindústria. 20 anos.
9. NEIRE GORETE TUBIANA – agricultora, filha de agricultores, casada com
agricultor. Abandonaram o campo por 10 anos e retornaram. Arrendatária da
propriedade que cultiva. Produtora de tomates orgânicos em estufas. Possui
uma história de envolvimento com o Clube de Mães como líder, e o Movimento
de Mulheres como participante. Sem participação no MST. A entrevista foi
realizada na tarde de 07 de novembro de 2020 na varanda da casa. 52 anos.
10. ANA THOMÉ SLONGO – Agricultora, casada com agricultor. Sempre viveu
no campo. Decidiu investir em um negócio seu, e como tinha afinidade com as
geleias e muita fruta na propriedade resolveu fazer uma Agroindústria de
Geleias e Compotas. Considera este o seu negócio, e não do marido. A
entrevista foi realizada na tarde de 19 de novembro de 2020 na varanda da
casa. 52 anos.
11. LAURA DAGOSTIN VALIATY – é a única que participa tanto da AAFEEMED
como da APROME (a outra associação que vende na Feira) – Agricultora, filha
de agricultores e casada com agricultor. Sempre viveu no campo. Quando o
marido teve seu segundo AVC decidiu vender as vacas de leite e investir
fortemente em ovinos, suínos e frango caipira, fazendo desde a criação,
carneação e entrega do produto no ponto de venda da feira. Em 2020, após o
marido passar por 2 AVC, resolveu montar um inédito frigorífico de ovinos,
leitões s e frango. Considera este o seu negócio o e de suas 03 filhas, sendo
155

que uma delas é a Veterinária da propriedade e a mais nova cursa Engenharia


de Produção na UTFPR. A entrevista foi realizada na tarde de 31 de novembro
de 2020 na varanda da casa. 53 anos.

4.3.1 A mulher rural da AAFEMED, e um olhar para além de suas próprias falas

As narrativas das mulheres rurais da AAFEMED durante as filmagens para o


documentário se tornaram, por vários vieses, reveladoras, e não apenas para a
pesquisadora, mas sobre tudo para as pesquisadas. A condução das perguntas ia, de
certa forma, conduzindo as entrevistadas a concluírem sobre sua própria condição de
subordinadas, ou não, ao patriarcado, em especial no que se refere ao âmbito familiar.
As falas, perguntas e reflexões mergulharam em histórias e narrativas
transformadoras de um tempo passado e culminaram em uma reflexão sobre
atualidades e futuros possíveis. Neste sentido o documentário aqui apresentado tem
por objetivo revelar olhares e detalhes destas narrativas e reflexões e relacioná-las
com os resultados apresentados nos itens anteriores como forma de promover um
alinhavo mais profundo de resultados que permeiam a vida de uma sociedade
construída a tantas mãos e histórias.
Do ponto de vista do empoderamento, a percepção de algumas entrevistadas,
que ao longo dos questionamentos iam adquirindo mais confiança para falar, se
mostrou por diversas vezes obtusa, deixando transparecer à pesquisadora que estas
mulheres em sua maioria têm dificuldade em entender o que é empoderamento e
como ele se mostra no cotidiano. No contraponto, o entendimento sobre o que é o
patriarcado e como ele se mostra na vida dessas mulheres, percepções acerca da
subordinação da mulher dentro da propriedade e as tarefas que a ela são relegadas,
muitas vezes mostraram existir na própria mulher a visão patriarcal do seu papel no
núcleo familiar e no seu entorno.
Para Merleau-Ponty (2006, p.256), “a emoção […] é uma variação de nosso ser
no mundo […] e manifesta aquele mesmo poder de ordenar os estímulos e situações
que estão no seu auge no plano da linguagem“. Dessa forma o autor conclui que a
voz também atua como “um termômetro do estado emocional” (p.16), podendo-se
identificar através do ritmo da fala, do tom; da entonação e da respiração, de acordo
com as emoções. Complementado pelos gestos, consegue-se fazer uma leitura de
156

comunicação não verbal rica de significados mais genuínos que a própria fala,
podendo ser concordantes ou discordante das palavras proferidas pelo entrevistado.
Utilizando a ótica de Merleau-Ponty (2006), a linguagem corporal das mulheres
rurais entrevistadas, revela medos, alegrias, reservas, silêncios e até contradições
entre o escrito, o verbal e o não-verbal, que acabaram por ser fonte de informação
para este trabalho. Por isso, a importância também de trazer alguns elementos não-
verbais, juntando-os às falas das entrevistadas para tentar compreender a auto
avaliação que estas mulheres fazem do seu próprio empoderamento. "O que todos
esses aspectos têm em comum é a contribuição positiva para fortalecer a voz ativa e
a condição de agente das mulheres - por meio da independência e do ganho de poder"
(SEN, 2017, p.249).
O conceito proferido por Teolide Turcatel foi o norteador das falas que as
entrevistadas apresentaram, e define muito bem o entendimento que a maioria delas
tem do que é empoderar-se:

Na minha experiência empoderamento é dar à mulher condições para que ela


seja ela mesma. Tenha autonomia. Então empoderar alguém é dar-lhe
condições para que ela ocupe espaços de poder. Poder de decisão. Que ela
apresente suas propostas, que ela tenha decisão de fazer valer suas
propostas... Principalmente os direitos ligados a ela. Isso é empoderamento
(TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

Sobre se a mulher caminha para uma evolução quanto às suas liberdades e


sua condição de agente junto aos movimentos e associações que atua, Scott reforça
que “como membro de um movimento de luta, esse alguém encontra apoio e
solidariedade” (2005, p.18). Perguntada sobre esta evolução através da participação
nos movimentos, Roseli Turcatel Motter fala da voz feminina ainda muito reprimida:

Toda participação que a mulher acaba se envolvendo, seja no Clube de


Mães, seja nos trabalhos da comunidade, das comunidades onde elas fazem
parte, seja nas reuniões do Sindicato, das cooperativas, né... Até no
planejamento da produção, faz com que de alguma forma contribuam sim
para a evolução da mulher, né. Nós estamos evoluindo todos os dias. O que
ainda é interessante a gente observar é que a voz da mulher ela ainda é muito
reprimida. Eu percebo isso muitas vezes nas reuniões, uma mulher começa
a falar rapidinho ela é cortada de alguma forma. Eu nunca vejo em nenhuma
reunião a palavra de um homem ser cortada. Em nenhuma reunião. Das
mulheres sim. [...] É uma caminhada... Nós podemos mostrar essa força,
sabe. Mas é um exercício que começa dentro de casa. Quando um filho teu
te interrompe... Quando o marido te interrompe... (ROSELI, entrevista em 24
de outubro, 2020).
157

O processo de empoderamento é lento, e passa pela mudança de


comportamento da sociedade, segunda as entrevistadas, passando pela mudança
dentro das famílias, em relação às mulheres. “Nós, para mudar esse mundo machista
não é fácil. Os homens eles tem isso nooo (sangue)... Mas a mulher se destaca,
nossa. Não é só... É em tudo, a mulher está avançando, ela está tomando (espaço)...
E no ambiente familiar não é diferente” (JANETE, entrevista em 07 de outubro, 2020).
A postura empoderada da mãe coloca em xeque essa subalternidade ao
masculino, fazendo com que os filhos comecem também a considerar uma postura
mais equitativa para com as mulheres, e as filhas se vejam também mais
empoderadas, como a mãe. Teresa Toniazo, agricultora de uma família de mulheres
rurais muito atuantes na terra, e filha de uma pioneira na agricultura em Medianeira,
descreve a sua mãe e se emociona:
A minha mãe é uma guerreira. A minha mãe sempre foi de enfrentar roça...
de enfrentar o serviço. Esses dias eu estava conversando com o vizinho,
nosso amigo, ele falou assim: - eu nunca esqueço da tua mãe, quando nós
viemos morar aqui ela dizia “demo demo Tuzi... demo...” E ela ia na frente
roçar mato e cortar a árvore... Ela que ia na frente. Até hoje que ela é assim,
ainda tem coragem [...] eu admiro muito, sempre falo assim para minha
família, falo assim se ela tivesse a oportunidade de estudar que tem hoje, ela
ia ser uma pessoa que ela ia enfrentar um poder. [...] Esse veio de
agricultora... veio da minha mãe (TERESA, entrevista em 31 de outubro,
2020).

A forma como Teresa descreve a mãe, mostra como esta postura, diante do
enfrentamento da dura lida no campo, de ser esposa e mãe, empoderada, a
influenciou como filha e estendeu esta influência para sua educação, refletindo
também na construção da relação de Teresa, com suas filhas Lidiane, Rafaela e
Patrícia. Perguntada se se sentia independente e empoderada, Teresa, um pouco
encabulada, olha para o chão, esfrega as mãos como que buscando as palavras para
explicar como conseguiu ao longo de uma vida difícil com o companheiro, se colocar
em posição de liberdade para fazer seu caminho pelas suas próprias escolhas.
Olha agora sim... De uns anos para cá, porque muitos anos atrás antes não.
Acho que foi coragem de enfrentar as dificuldades que apareceram. Quando
a gente começou a colocar a mão na massa. Trabalhar a gentes sempre
trabalhou. [...] Não que a gente despreze o companheiro, mas eu acho que a
gente tem que se valorizar. Hoje se eu disser assim: - não quero mais, não
faço mais, não faço. Eu faço porque eu quero fazer. Depois de tanto
sofrimento a gente aprende... Muitas vezes a gente perdia o sono, chorava...
Isso não resolve nada. E com o passar do tempo a gente vê que, ou você
toma uma decisão né, ou você vai cada vez mais para baixo... (TERESA,
entrevista em 31 de outubro, 2020).
158

Tanto que, quando houve uns problemas aqui que nós estávamos
encaminhados... [...] Eu até saí de casa porque... Que a gente começa a fazer
um negócio assim e começa a se sair bem e a pessoa já não admite, né? Aí
nós demos uma parada, aí voltamos atrás e eu falei, não. Se for para tocar o
negócio eu vou tocar o negócio pra frente, mas vai ser do meu jeito, eu que
vou fazer tudo, não vai mais ter oportunidade de pôr... Não foi muito fácil, não.
Mas está indo né. Tá indo melhor que eu pensava. e hoje fala que... para mim
não fala, mas para os outros ele fala que o negócio está indo bem.[...] Homem
não admite que mulher faça um negócio que se saia bem, né (TERESA,
entrevista em 31 de outubro, 2020).

As mulheres agricultoras possuem uma dinâmica diária de trabalho que se


constitui em jornada dupla, em que a maioria é responsável pela maior parte das
atividades domésticas, além de ser uma força braçal na produção em níveis
semelhantes aos membros masculinos da família, se tornando essencial tanto na
rotina da casa quanto na dinâmica produtiva da propriedade. Em tom de reflexão,
Neire Tubiana, produtora de tomates e milho verde, fala em tom de reflexão:
Eu ajudo eles. É... Eu acho que a gente comete um erro falando assim. Que
nem antigamente as mulheres tinham medo de dizer que eram agricultoras...
Falavam que eram do lar, e eu acho que a gente ainda tem um pouco dessa
cultura. Mas na verdade eu sou uma terceira pessoa... Eu sou uma terceira
ajuda pra eles... Venho uns minutos antes, faço o almoço e o serviço da casa
e depois à tarde volto de novo (pra lavoura), até de noite. [...] cultura errada
que a gente tem de achar que mulher era só da casa. Na verdade as mulheres
fazem tanto quanto os homens, talvez não o mesmo trabalho que eles, os
pesados, [...] mas a maioria eu faço tudo (NEIRE, entrevista em 07 de
novembro de 2020).

A igualdade é um princípio absoluto e uma prática historicamente contingente.


“Não é a ausência ou a eliminação da diferença, mas sim o reconhecimento da
diferença e a decisão de ignorá-la ou de levá-la em consideração” (SCOTT, 2005,
p.15). A relação com o marido demonstrada na fala de Lidiane Toniazo, atual
presidente da Associação, demonstra que para estas mulheres o empoderamento
trouxe o reconhecimento da diferença como fator de igualdade. O diálogo intrafamiliar
gira em torno do papel de cada um, com uma comunicação que gera a harmonia
cotidiana.
Eu sim... (risos) Meu dinheiro é meu (risos)... Eu falo pro meu marido, ele
trabalha, claro, a gente ajuda, não é assim... Porque a gente é casado né.
Mas ééé... O meu dinheiro, eu falei... Que nem agora eu tenho uma filha na
faculdade e eu ajudo ela. Então, quando ela passou no vestibular eu falei, tá
eu vou te ajudar os cinco anos que você tem que ficar aí na faculdade porque
ela tá na Unioeste, mas como ela tá lá em Marechal ela tem que pagar
aluguel, comida, água, luz, internet... Então eu falei para ela assim, então
esses cinco anos eu vou te ajudar. Então eu trabalho para pagar a faculdade
dela e para comprar as coisas para os meus dois outros filhos. Então a parte
de casa é com ele, e a minha parte do dinheiro eu ajudo a minha filha na
faculdade e o que eu preciso (LIDIANE, entrevista em 31 de outubro, 2020).
159

Essa relação de igualdade na diferença, alcançada por meio do


empoderamento, é, para SEN, uma construção através da capacidade desta mulher
de gerar independência econômica e adquirir conhecimento por meio de uma maior
formação pessoal e profissional.
[...] "o modo como o respeito e a consideração pelo bem estar das mulheres
são acentuadamente influenciados por variáveis como o potencial das
mulheres para auferir uma renda independente, encontrar emprego fora de
casa, ter direitos de propriedade, ser alfabetizadas e participar como pessoas
instruídas nas decisões dentro e fora da família" (SEN, 2017, p.249).

As conquistas no campo da formação pessoal e profissional dessas mulheres


foram muito grandes nos últimos anos. As mulheres passaram a ter o comando sobre
pequenas ações como o ir e vir com liberdade, quando aprenderam a dirigir, por
exemplo. Uma mudança muito simples que mudou radicalmente o cotidiano dessas
mulheres.
Hoje em dia as mulheres rurais estão empoderadas, elas estão mais liberais...
Cada uma está procurando seu lugar na face da terra, né. Antigamente, tu
chegava numa casa eu lembro, quando eu era criança eu nunca vi uma
mulher falar de trabalho, de negócio, era sempre o marido. Hoje em dia não.
Hoje tu chega, cada uma tem seu trabalho, ganhando seu dinheirinho. [...]
Mas cada uma está tomando um rumo diferente, sabe. Uma tem agroindústria
de pão, hoje está fazendo bolacha, outra faz pastel... Isso é uma coisa que
está ajudando muito na renda familiar, sabe. [...] e o importante é a mulher se
sentir bem que ela tenha seu próprio dinheirinho, seu próprio ganho... Acho
muito importante isso, sabe (LAURA, entrevista em 30 de novembro de 2020).

Talvez, como acrescentou a Roseli, seja necessário que as mulheres


comemorem mais as suas conquistas, que transfiram estas evoluções para outras
mulheres, ampliando a aquisição de tais liberdades para consolidá-las:

A gente precisa celebrar as conquistas, que não foram poucas. Nós


precisamos traduzir todas essas conquistas macro, da parte de diretos... para
a parte micro há o suor e a participação de muitas mulheres. E como nós
traduzimos isso no nosso dia-dia nessa parte do nosso micro-sistema no
nosso núcleo familiar. Toda vez que nós nos colocamos no caminho que não
é o isolamento... Que nós nos pegamos nas mãos... Acho que isso é uma
forma de empoderamento (ROSELI, entrevista em 24 de outubro, 2020).

Para a Gabriela Tonniazo, da quarta geração de agricultoras de Medianeira, o


empoderamento se mostra na evolução das liberdades de estudar, escolher uma
profissão, que pode ser exercida fora ou dentro da propriedade, que pode levar a
diferentes caminhos, que perfazem, porém, a escolha de ficar na terra. A sua fala
esclarece como, para uma menina agricultora, o seu empoderamento se fez:

Então nós somos mulheres muitos poderosas dentro da nossa família. Isso
eu sei... eu acho que eu aprendi com elas isso, a não depender de nenhum
160

homem ou nenhuma outra pessoa, entendeu. Como eu já falei que a minha


bisa ensinou a minha vó trabalhar, a minha avó ensinou a minha mãe a
trabalhar, e influenciou ela a estudar e a minha mãe me influenciou a estudar
antes de trabalhar. Isso é muito importante porque se eu tenho o que eu tenho
hoje, se eu estou estudando hoje, é por causa da minha mãe, da minha vó e
da minha bisa né, com certeza (GABRIELA, entrevista em 31 de outubro,
2020).

Gabriela, com uma tatuagem no braço em homenagem aos avós, outra para a
mãe e a última para a tia Rafaela, quando questionada se estas mulheres agricultoras
da família são empoderadas, responde segura e emocionada, confirmando
firmemente a percepção de um empoderamento adquirido e pactuado entre as
mulheres da família, em detrimento de todas as dificuldades passadas pelas gerações
anteriores.

Sim com certeza, sem dúvida alguma. São... como é que eu vou dizer... são
o orgulho né! Não é qualquer pessoa que pode dizer... que veio de uma
família de agricultoras e que não dependeu de ninguém além delas mesmas
para poder conseguir as coisas... (choro) (GABRIELA, entrevista em 31 de
outubro, 2020).

No entanto, a percepção de Gabriela, pode ser uma exceção. De maneira mais


generalizada, há uma grande probabilidade de que as mulheres mais jovens possuam
pouca ou nenhuma conexão com as conquistas de suas mães e avós. Há como que
um elo perdido entre a geração atual e as passadas em relação aos direitos e
liberdades conquistadas por suas antecessoras. Este elo perdido pode refletir muito
na relação de pertencimento desta geração ao meio rural, direta e indiretamente
repercutindo nas relações de sucessão e continuidade da agricultura familiar.
Proporcionar formas de conhecimento e valorização das histórias, suas
interconexões, pode ser capaz de proporcionar a visualização e importância da
participação de cada geração nos processos de construção, resgatando não somente
a “penosidade”, mas, as vitórias e conquistas.
Scott (2005, p.23), defende que “os indivíduos não são iguais; sua
desigualdade repousa em diferenças presumidas entre eles, diferenças que não são
singularmente individualizadas, mas tomadas como sendo categóricas”. Essas
diferenças se referem justamente à “identidade de grupo” que Scott coloca como
podendo ser de gênero, entre outros grupos.
Desta forma, entender seu pertencimento a própria história pode desdobrar-se
em uma identificação com um grupo, ou entre grupos e passar a nortear novas
histórias, construindo de pequenos passos, novas pontes e realidades:
161

As mulheres depois, tinham sempre essa formação, mandamos todo mês um


material para os clubes, elas tinham suas reuniões e muitas delas
desenvolveram também por exemplo artesanato em cursos que a gente
levava, de bordados [...] essa questão das conservas, isso tudo elas
desenvolveram com ajuda também ... que na época era a Consuelo da
Emater, ela caminhava conosco, e muitas vezes ela levava elas lá. Tivemos
a Regina Celli do Rio de Janeiro que junto com o projeto de Itaipu a Roseli
(Turcatel) levou para toda a região. As mulheres concorriam em receitas de
pratos, de bolos, ganhavam prêmio e estão lá na revista da Itaipu... Isso tudo
foi agregando. Elas aproveitaram muito (TEOLIDE, entrevista em 03 de
outubro de 2020).

Nas construções e relações, as respostas e pensamentos individuais passam


a ser coletivos e perfazem a participação política, um território de muita luta e grandes
conquistas, que apesar de uma construção aparentemente sólida apresenta na
atualidade um difícil período de perdas, principalmente no que se refere à
representatividade política. Neste aspecto as mulheres, e nesse grupo se incluem as
rurais, perderam rapidamente espaços de conquista que se consideravam
praticamente consolidados.

Na questão do avanço político, as mulheres parecem que estão meio assim...


Não sei. Me parece que a mulher não avançou muito. Tanto é que você pode
ver que temos algumas candidatas, tem [...], e a [...}, que são aqui da cidade.
Do interior nós não temos. Que eu tenha visto que é uma mulher do interior
nossa (batendo o punho no peito)... As mulheres se acomodaram. ... se...
se... Sabe. Não é que se acomodaram. Eu acho que não sei se perceberam
que não vale a pena... ou não sei. se lutaram tanto... [...] Então vem também
um pouco esse desânimo, Tantos anos que nós temos aí o movimento de
mulheres, os clubes de mães... mandando material... fazendo formação
(TEOLIDE, entrevista em 03 de outubro de 2020).

Esse afastamento das mulheres dos movimentos de luta por seus direitos e
contra o patriarcado, ao longo dos anos que se seguiram, apontada nos relatos de
Dona Teolide e confirmadas pela Janete e outras entrevistadas, sobretudo das
mulheres que participavam indiretamente dos encontros de formação e informação,
tem para Scott (2005) a explicação justamente na perda da identidade de grupo, na
falta de continuidade dos movimentos e na adequação das bandeiras de luta para as
novas realidades e necessidades das mulheres.
Eu respondi essa pergunta numa live. Que fazer¿ Eu disse: - gente, eu não
vejo outra saída senão voltar pra base, sabe. Voltar pra base e começar
tuuuuudo de novo. Porque o povo está acomodado, alienado, e esse
isolamento social é terrível e acabou matando o pouco que a gente tinha
ainda. As mulheres não se reúnem mais, não vai mais material pra elas...
cada uma pra sí, quem tem alguma coisa que faz. (Antes) se levava pras
feiras, se ia pra Francisco Beltrão, se levava os crochês, eu levava os nossos
produtos, a outra levava suas compotas, a outra levava suas orquídeas, a
162

outra levava seus guardanapos,... seu tapetes e mais outras coisas que ela
fazia, a outra levava seus chás também... Hoje não tem (TEOLIDE, entrevista
em 03 de outubro de 2020).
Naquela época eu não lembro assim de uma mulher assim que estava na
liderança. Hoje são várias mulheres que estão na liderança. Nossa, e quantas
que morreram em combate, dá para se dizer assim. As mulheres todas, é lei,
é ordem, tem que ter a mulher junto porque na bandeira mesmo, quando se
coloca a bandeira tem a mulher e o homem, já para caminhar junto (JANETE,
entrevista em 07 de outubro, 2020).

Nesse ponto, torna-se importante ressaltar o quanto a AAFEMED se tornou um


divisor de águas para muitas dessas mulheres rurais. A entrevista da Laura Valiati,
produtora de ovelhas, frango caipira e leitões, que atualmente está inaugurando um
frigorífico, deixa claro os ganhos financeiros e a importância da liberdade econômica
e a contribuição na renda familiar, que dá a esta mulher mais autonomia e respeito,
até da própria família.
Eu posso dizer que a partir do momento que eu comecei a fazer feira, a
participar da AAFEMED, que eu comecei a fazer feira, minha vida mudou
100%. [...] A feira eu trabalho e tenho rendimento toda semana. [...] Então
depois que eu comecei a fazer feira, eu praticamente construí a minha casa,
eu tive meus carros todos pagos, a minha agroindústria quase toda paga...
então para mim a feira é meu ganha pão, muito bom, sabe. Consegui ajudar
bastante minhas filhas (LAURA, entrevista em 30 de novembro de 2020).

Na visão da primeira presidente mulher da AAFEMED (2017/2018), Rafaela


Toniazo, a Associação poderia ter um papel mais efetivo na manutenção dos elos
entre as mulheres rurais, promovendo mais encontros e interação com troca de
experiências e conhecimento:
Não existe muito envolvimento. Eu acharia que seria até interessante e
importante porque quando você conhece outras histórias que deram certo, ou
que não deram, você acaba sempre aprendendo mais, e talvez seria muito
interessante para gente para outras pessoas também né. Porque a gente
começou num ramo e às vezes a gente acaba influenciando, porque tem lugar
para todo mundo trabalhar né. Tem lugar e espaço para todo mundo, e às
vezes o que tu faz por ajudar outra pessoa também a melhorar de vida,
melhorar como pessoa, como mulher (RAFAELA, entrevista em 31 de
outubro, 2020).

A não participação, para Rafaela, se reflete no fato de que os hábitos e


costumes da mulher rural são mais fortes que a própria formação que os movimentos
propiciaram a estas mulheres.
Talvez seja por um costume né. Que vinha de antigamente que os homens
tomavam conta de tudo e as mulheres trabalhavam e eles tomavam conta
das outras coisas. E talvez seja uma falha nossa, como sociedade e como
associação. Talvez a gente teria que hoje mudar o foco né. [...]... e talvez
fazer um trabalho que inteirasse mais elas, e que como elas entendessem
mais como as coisas funcionam, tivessem mais vontade de participar
(RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).
163

Talvez se a gente fizesse alguma coisa de um estudo, ou um programa que


a gente pudesse conversar e explicar as coisas, ou uma conversa simples de
comadre com um lanche ou alguma coisa. Talvez a gente se envolvesse
mais, talvez isso mudaria, talvez elas tivessem um novo sentido, porque
quando você vai fazer uma troca de ideias e experiências, a gente vai tendo
uma visão diferente de como as coisas funcionam. Talvez eles participariam
mais (RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

A aferição de nota em relação ao grau de empoderamento das mulheres rurais


associadas, deixa claro a necessidade de um maior engajamento das associadas, da
mesma forma que indica um alto índice de resultados positivos
Das que estão à frente e que se envolvem, eu acho que uma nota 9 ou uma
nota 10. Porque elas fazem tudo o que elas podem. Elas fazem tudo o que
está ao alcance delas e tudo que elas conseguem fazer. E talvez para aquelas
que não se envolvem, você também vai dar uma nota baixa, mas porque
talvez não é porque elas querem é porque elas talvez não consigam sozinhas.
Talvez elas precisam de uma ajuda, precisam de uma influência né. Mas para
as que estão lá, elas dão tudo de si. Elas se envolvem com vontade de ver
as coisas funcionarem, não só para ter o lucro e nem só para se aparecer. É
para ter esse orgulho, dizendo, eu consigo, eu dou conta, eu vou...
(RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

Por exemplo não sei se alguma outra mulher iria pegar o meu lugar, por
exemplo da presidência, não sei. Porquê pode ser se der um incentivo, pode
ser. Mas senão, pode ser que volte só com homens mesmo. Assim no meu
ver. A mesma coisa que eu vejo que nem quando a gente tá falando lá da
cooperativa, que ninguém... Se não é os homens que vão, mulher nenhuma.
Só tem eu lá. Eu e a Cláudia. [...] O que é o que os homens fazem, nós
fazemos também, e tranquilo. Pelo que eu estou ali agora esse tempo eu vejo
que... Quando eu entrei eu dizia: - meu Deus acho que não vou conseguir.
Agora não.. eu vejo que é tranquilo. Mas não sei se as mulheres teriam
coragem... Não sei te dizer... (LIDIANE, entrevista em 31 de outubro, 2020).

Dois exemplos de que a participação mais efetiva na Associação traz maior


liberdade e geração de renda para estas mulheres e suas famílias foram citados na
entrevista com a Lidiane e a Rafaela, como sendo agricultoras com diferentes
histórias, mas cuja efetividade na participação da rotina de entrega dos produtos,
recebimento, e produção futura, tornam essas mulheres mais empoderadas que as
outras que não o fazem:
A Claudia... É ela que leva os produtos, ela que recebe os produtos na feira,
ela que leva os produtos da merenda escolar... Então ela entrou. Tanto que
ela está participando agora um curso que a gente está fazendo de formação
para a diretoria da cooperativa. Você vê. Mas é porque ela vai na feira, ela
leva os produtos dela. Então talvez ela não iria. Talvez ela não iria se fosse
ele que fizesse esse papel, de estar lá na feirinha recebendo, porque a
informação vai para a pessoa que vai lá. Se o marido dela que vai lá a
informação vai para ele. - Óóh a gente vai ter formação para isso... vai ter que
precisar dinheiro para a diretoria disso... é ele que vai receber essa
informação... então talvez daí ela não participaria... e como e ela que vai você
vê que aí ela entrou. Pode ser isso. Mas pode ser um pouco de falta de
vontade também... Entendeu? Tem muitas que às vezes não querem. Eu sei
164

que tem muitas lá que não querem nem que vem falar (LIDIANE, entrevista
em 31 de outubro, 2020).

É que nem a Ana Slongo. A Ana como ela cuida da agroindústria lá, ela
participa também. O marido dela tem outra atividade. E como ela participa da
feira, ela participa da diretoria, ela participa das reuniões. Eu acho que é isso.
É como falei antes... A falta de conhecimento faz você não se envolver na
feira (RAFAELA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

De uma maneira singular é possível verificar na fala destas mulheres além do


orgulho de pertencer a um movimento de resistência, luta e construção, uma vontade
sublinhar de proporcionar este mesmo sentimento de liberdade a outras mulheres.
Elas buscam explicações em suas próprias histórias talvez, para justificar a ausência,
dificuldade das demais em seguir o caminho do empoderamento. Lidiane, ao ser
questionada, sobre visualizar ou não um caminho de empoderamento para as
mulheres, afirma:

Algumas né... Algumas pode ser. Mas poucas... Eu acho que poucas! Vou
ser bem sincera. É o que eu penso. Eu acho que poucas... Quando a gente
fez a assembleia da AAFEMED mulheres eram poucas que estavam
participando. Estava eu, estava a Cláudia, e eu acho que a Rafa . (LIDIANE
entrevista em 31 de outubro, 2020).

Eu acho que elas não... como que eu vou falar pra você. Não sei te dizer
também se os maridos não permitem, eu não acho que seja isso. Eu acho
que seja um pouco de falta de elas ter um pouco assim de interesse, sabe.
Porque como marido faz, ele que se vire né. Então talvez elas ...ou também
elas não tem informação de elas poder estar poder estar participando. Porque
às vezes ali o marido vai lá na feirinha, leva, recebe, entrega e pronto. Para
elas eééé... elas não se envolvem com a Associação talvez né... eu acho que
é isso. (LIDIANE entrevista em 31 de outubro, 2020).

Neste caminho de reflexão, a partilha de experiências e resultados é uma base,


uma alavanca para o desenvolvimento, um instrumento, uma necessidade e também
uma “ânsia” de quem vê além da dificuldade da luta a alegria da conquista individual
e coletiva. Esta “ânsia” pode conduzir a uma conclusão importante deste trabalho, a
volta, a reconstrução das bases, expressa como uma forma de continuidade junto as
novas gerações, mas que pode ser vista também como uma necessidade de apoio,
também as mulheres de que iniciaram este processo:

O poder passa por nossas mãos, mas mãos que se abraçam. Mãos que
pegam nas mãos e que mostram que tem força, porque nós nunca estamos
sozinhas juntamos. [...] É uma caminhada, (ROSELI, entrevista em 24 de
outubro, 2020).

Essa nossa participação nos faz pensar... em tudo o que foi, do jeito que foi,
e uma necessidade muito grande de como é que nós lidamos com isso de
agora para frente. Como é que nós nos pegamos as mãos e nos fortalecemos
165

para seguir em frente porque a caminhada, ela é constante, o aprendizado


ele é constante (ROSELI, entrevista em 24 de outubro, 2020).

Nós temos no nosso município um berço de luta histórica pelo direito à terra
prometida (Movimento Sem Terra), e como é que nós, dentro de um novo
contexto, nos fortaleçamos para que as gerações que vem depois de nós
possam sentir essa força, né (ROSELI, entrevista em 24 de outubro, 2020).

Este apanhado apresentado tem a intenção de dar mais elementos para


promover uma reflexão em torno das múltiplas realidades que criam a vida rural das
mulheres agricultoras familiares. São distintos perfis, com bases diferentes que
permeiam todas as suas vidas e as tornam mais, ou menos empoderadas. Nos
diálogos transcritos percebe-se forte produção de capital social através das relações
e pontes sociais geradas pelas relações de confiança que se transformam em
cooperação e reciprocidade. Teresa nos explicita este sentimento de coletividade e
reciprocidade:
Eu tenho orgulho de estar onde eu estou, e mais pelas minhas filhas que me
dão toda força e estão do meu lado, que se não fosse por elas... E tenho todo
apoio delas. Então o mais que me sinto orgulhosa... E de que tenho alguém
que está do meu lado me dando força. Porque se fosse sozinha, não teria
como né... no caso ir pra frente. [...] A agroindústria? Ninguém comanda... As
quatro comandam (TERESA, entrevista em 31 de outubro, 2020).

A cooperação e a reciprocidade podem ser entendidas como uma linha


condutora que arrebanha e une tanta diversidade em direção a aparente viabilidade
econômica, mas que se permitido, outro olhar, apresenta esta viabilidade como
consequência de processos de empoderamento e construção de um capital que
fundamenta relações pessoais, individuais, coletivas em um novo contexto de social
passível de liberdade de construção.
São mulheres de luta, cada uma com um passado cultural, econômico e familiar
diferente, com bases também diversas, mas que possuem as mesmas angústias num
mesmo cotidiano. Há que se trabalhar por equidade de gênero para dentro da porteira,
no âmbito familiar e na educação dos filhos para a diminuição das desigualdades e
consequente eliminação do patriarcado como rotina na vida dessas mulheres rurais.
E para fora da porteira, é preciso dar maior ênfase à formação dessas
mulheres, ao conhecimento sobre a terra, a produção, a administração da
propriedade, a comercialização dos produtos e o retorno financeiro.
Para além de qualquer porteira, a busca é pela total liberdade substantiva das
mulheres rurais associadas da AAFEMED.
166

4.3.2 Apresentação do documentário Raiz de Roça

O desafio imposto à produção de um documentário como resultado da pesquisa


qualitativa foi de uma elevada dificuldade, visto que as entrevistas geraram uma gama
muito grande de informações, todas elas muito ricas e relevantes tanto para o
resultado desta pesquisa, como para estudos correlatos e transversais futuros, a
ponto de se tornar difícil concentrar o foco na temática específica deste trabalho.
A escolha do formato Storytelling se deu pela forma mais livre e solta de se
captar as informações em forma de uma narrativa estimulada apenas por perguntas
ou palavras-chave que servem para o entrevistado como um gatilho mental sobre o
assunto. Está relacionado com uma narrativa e significa a capacidade de contar
histórias relevantes. Em inglês a expressão "tell a story" significa "contar uma história"
onde o storyteller é o contador de histórias. Também é muito usado no contexto da
aprendizagem, sendo uma importante forma de transmissão de elementos culturais
como regras e valores éticos.
Para os historiadores o ato de contar histórias dentro da evolução humana
surgiu há mais de cem mil anos, tendo sido utilizado inicialmente para transmitir e
compartilhar informação e conhecimento entre os homens primitivos. Mcsill (2013)
destaca a importância destes hábitos narrativos:
Os nossos ancestrais já tinham esse hábito, quando, ao fim de cada dia, se
reuniam em volta das fogueiras e contavam suas fantásticas caçadas e
vitórias. Já naquele tempo, essa era a maneira de legitimar uma liderança por
meio da referência. A história seria ainda para perpetuar práticas e
conhecimentos arraigados àquelas culturas, tão necessários à sobrevivência
dos grupos, e que esses líderes repassavam dentro de suas histórias.
Storytelling é a arte de contar uma história, ou seja, por meio da palavra
escrita, da música, da mímica, das imagens, do som ou dos meios digitais
(MCSILL, 2013, p.31).

O ser humano estabelece ligações interpessoais através do ato de contar


histórias. Núnez (2009, p.15), aponta que “um relato tem algo de sagrado, pois é uma
verdade universal carregada de emoções e de sensações. Sendo uma verdade
universal, um relato é capaz de contribuir dando sentido aos momentos de nossas
vidas, dando iluminação, respostas e conselhos a respeito de mistérios e dúvidas do
mundo que nos rodeia”.
Na contemplação das entrevistas para o documentário, foram organizados três
grupos de depoimento assim distribuídos: o primeiro com lideranças femininas
externas à AAFEMED mas que fizeram parte fundamental na história da fundação da
167

Associação. O segundo composto por lideranças femininas atuais, entre elas a


primeira presidente mulher e a atual. O terceiro grupo constituído pelas mulheres
associadas que fazem parte da AAFEMED na atualidade, objeto deste estudo.
O método utilizado foi o da naturalidade, não sendo apresentado nenhum
roteiro prévio para as entrevistadas, deixando que as palavras e recursos audiovisuais
para transmitir a história seguissem um curso mais natural e emocional. As histórias
foram contadas de improviso, seguindo apenas um roteiro-base de perguntas
similares ao formulário estruturado da primeira fase. Para a presidente da AAFEMED
e as mulheres que participaram das questões da formação histórica da associação,
as perguntas foram adequadas para este fim.
O formato Storytelling, como área de expressão, permite levantar dados
qualitativos por meio da captura de imagens que transcrevem sentimentos,
sensações, medos, contensões, recusas, repulsas, discrepâncias e outras reações
sutis que dificilmente são reveladas em entrevistas estruturadas.
Sobre a duração, a princípio não foi criado um limitador de tempo para o
documentário, mas com a separação das imagens mais relevantes, somado a outros
elementos visuais e de cunho histórico, como recortes de jornal da época, apenas
como complementação da informação, o mesmo encerrou em um tempo de 60
minutos.
A marca desenvolvida buscou significados nas falas das entrevistadas, no que
se chegou à expressão “raiz de roça” já explicada na introdução deste trabalho. O
desenho foi inspirado na “árvore da vida”, um símbolo que remonta a criação do
mundo, sendo uma das duas árvores que Deus teria plantado no centro do jardim do
éden. A simbologia da árvore da vida atravessa as inúmeras culturas ocidentais e
orientais com o mesmo significado: o sagrado sobre a vida, a fecundidade e a
imortalidade, vitalidade, força, capacidade de vencer desafios e resiliência.
Para apresentar o documentário, utilizou-se um leitor de código QR (QRCode)
para ter acesso pelo celular, ou ainda para visualização em um computador e abrir na
plataforma do Youtube, onde permanecerá depositado (Figura 41).
168

Figura 41 - Abertura do documentário e código QR de acesso ao vídeo.

Fonte: A autora (2020).

A escolha por contar a sequência de vida de cada uma e a cobertura de


imagens destas mulheres rurais propositadamente em seu ambiente cotidiano,
realizando tarefas cotidianas, foi uma tentativa de condensar em menos tempo a rotina
atual com as lembranças de uma história única para cada entrevistada.
As falas foram coletadas separadamente de todos os outros membros da
família, em especial isoladamente do marido, para que não houvesse interferência,
influência ou pressão de outras partes, ainda que veladas.
O estilo do documentário traz muito dessas mulheres, donas de histórias tão
diferenciadas, e mais, da visão da pesquisadora sobre estas realidades, duras e
sofridas, mas puras, alegres, muito diversas, o por que não, mais felizes.
Autoexplicativo, o documentário não tem a pretensão de ser um marco na vida
dessas mulheres rurais, mas uma peça documental que possa permitir uma reflexão
sobre o passado, presente e futuro dessas e de todas as mulheres rurais, em especial
para as mulheres jovens que possuem o compromisso do resgate de valores, do
retorno às bases e dos campos de luta. Outrossim, o documentário também não
pretende se fechar em torno de uma única abordagem, podendo possuir vários
olhares e várias interpretações, subjetivo que é.
Foram abordados os temas de maior relevância que apareceram no evoluir
da pesquisa, na visão da pesquisadora, que após a captura de mais de 30 horas de
169

áudio e vídeo, sintetizou em 60 minutos uma rápida visão histórica, alguns dados da
vida, do cotidiano e as impressões, opiniões e posicionamentos que deram subsídio
para uma análise qualitativa da pesquisa.
170

5 CONCLUSÕES

A desigualdade de gênero remonta em um processo histórico de determinação


do “lugar” da mulher. Este processo agrega elementos constitutivos que o
fortaleceram e o tornaram uma definição social.
As considerações trazem este conflito em análise para os espaços locais onde
a mulher age e reage cotidianamente, onde melhor se pode identificar as demandas
e as ferramentas para a superação das desigualdades.
As conexões entre a mulher agricultora e os movimentos locais (associação,
comunidade) necessitam de “alimento”, participação, confiança, pertencimento, como
forma de fortalecer o grupo e a ela como agente, em uma troca essencial,
principalmente até que os processos de empoderamento, pessoal, social e econômico
estejam fortalecidos.
A ampliação das receitas, do status econômico da mulher agricultora não
significa necessariamente seu empoderamento econômico. Assumir uma condição de
destaque dentro da unidade produtiva, em atividades agrícolas e, ou não agrícolas,
em diferentes níveis de atuação, da produção a comercialização, não finda
necessariamente em uma condição de empoderamento, mesmo considerando papéis
na definição, no planejado, na execução, na priorização, também nestes diferentes
níveis. Nos momentos, de decisão, parece emergir os ainda latentes sentimentos de
subordinação, de ceder a exigência, do homem em seu papel nato de agente
produtivo.
Este fato está na raiz da formação da mulher, na sua responsabilidade pela
família, na sua capacidade desenvolvida, pela imposição do papel reprodutivo, de
suprir aos outros (filhos, maridos, pais) para depois pensar em si, Mas está
principalmente ligado ao ver, e muitas vezes reconhecer o homem como determinante
das definições produtivas.
No estudo foi possível detectar os diferentes níveis e elementos constitutivos
do capital social, que estão presentes no fortalecimento da dimensão pessoal, social
e econômica, que são cíclicos em cada dimensão, visto a unicidade de cada história
de cada núcleo familiar e destes em relação às mudanças em curso, o que leva a
visão da relação cíclica entre as dimensões, com uma clara alavanca proporcionada
171

pela dimensão econômica no empoderamento pessoal da mulher, ao que segue o


fortalecimento mútuo das demais dimensões.
Nesta base, o processo de estabelecimento e construção do capital social está
presente, é cíclico e entrelaçado, nas relações pessoais, sociais e econômicas da
mulher como indivíduo e do próprio grupo como associação, em melhorias e
consolidações a serem construídas, mas em base forte o suficiente para movimentar
espaços de comercialização, buscar outras formas organizativas (cooperativa),
constituir lideranças femininas e projetar ações futuras.
O trabalho de pesquisa construído, possibilitou o entendimento da formação e
do desenvolvimento destas mulheres, na individualização de suas identidades e da
associação como esfera organizativa e seus papéis, enlaces e entraves na construção
do empoderamento e na formação do capital social.
É possível identificar a necessidade de maior aproximação entre as mulheres
da associação, da busca de fortalecimento mútuo tanto no aspecto de
empoderamento pessoal como social, com ações direcionadas para as mulheres. Isto
se mostra muito claro nas entrevistas e no documentário. As mulheres mais jovens
percebem a necessidade de integração e troca com as outras mulheres, e as mais
velhas percebem a necessidade de voltar às bases.
O estudo possibilitou a comprovação de que a própria AAFEMED é resultado
de lutas anteriores. A evolução histórica dos movimentos sociais, em especial os que
possuíram foco nas mulheres, tiveram papel fundamental nas conquistas da
Constituição de 1988 e as transformações que vieram como consequência, citando
apenas um exemplo, que foi o direito a aposentadoria das mulheres rurais. Os
movimentos encabeçados pelas igrejas, em busca de igualdade social e econômica,
com relação muito próxima com o MST, oportunizaram a criação de inúmeros
assentamentos e propiciaram formação de base para esses agricultores e
agricultoras.
A volta a essas bases, remetida pelas agricultoras na pesquisa qualitativa, pode
denotar dois aspectos importantes; em primeira instância da necessidade destas
mulheres de apoio e reflexos de suas ações em bases organizativas, formadas mais
exclusivamente por mulheres, e em segunda e complementar, podem ser um reflexo
visto do seu empoderamento pessoal que gera tal necessidade de organização,
partilha e expansão dos resultados até aqui alcançados.
172

Entre os resultados implícitos está o fortalecimento das questões geracionais e


de sucessão, principalmente com o envolvimento em atividades não agrícolas, onde
as jovens e os jovens rurais parecem encontrar maior afinidade e espaço para
construção de suas histórias, e passam a prospectar uma possível continuidade nas
unidades produtivas. As novas gerações possuem um árduo trabalho de levar ao
âmbito familiar as discussões de modernização, novas tecnologias de produção,
novos mercados e a sucessão na propriedade. Estão representadas neste trabalho
pelas falas da Gabriela Toniazo, que cursa Zootecnia e já se decidiu em permanecer
no campo com a mãe e as tias; mas também pelos filhos da Janete, da Ana Slongo,
da Neire, da Laura e o Cauã da Cláudia, que com apenas 14 anos acompanha a mãe
nas atividades da feira.
O documentário, como peça complementar ao estudo, é uma ode ao passado
para tentar compreender o presente, e através da percepção do
pesquisador/expectador/aprendiz tentar perscrutar o futuro não muito distante da
agricultura familiar e o universo das mulheres rurais. Se faz premente a necessidade
das agricultoras receberem atenção aos processos em andamento, reconhecimento
social ao trabalho como agricultora e principalmente aos esforços coletivos
encampados por elas, seja no âmbito familiar, na propriedade, nas atividades
produtivas ou na comunidade.
O processo de empoderamento parece começar na consciência da própria
mulher agricultora como indivíduo, livre para exercer suas próprias escolhas. Em um
processo produtivo, esta consciência normalmente se dá em ambiente coletivo, parte
da troca de experiências, de capacitações e reflete em uma construção individual
frente a sua unidade familiar. E mesmo nesta construção, o coletivo está presente
como alicerce de via econômica ou até como espaço para compartilhamento de
histórias, angústias e soluções. À medida que a consciência como individuo se
fortalece, ocorre o fortalecimento também dos espaços coletivos e todo este processo
faz uso do capital social, gerado não somente nas relações imediatas com a
AAFEMED, mas forjado em gerações de luta e trabalho pelo fortalecimento da mulher
rural.
Os estudos futuros sugerem que as questões de gênero e de sucessão
caminham cada vez mais próximas e dividem o mesmo cenário, alguns paradigmas,
e por vezes as mesmas dificuldades. Há que se fazer mais estudos geracionais, e
173

dentro deste viés, buscar o empoderamento das meninas frente ao direito de herança
da terra, e principalmente, frente ao direito de querer permanecer na terra.
Os estudos acerca do capital social precisam ser aprofundados, sobretudo
aquele referente à mulher rural, abordando de forma mais minuciosa as questões e
relações desta mulher como indivíduo, estabelecer pontos de relações entre os
diferentes atores e individualizar as dimensões destas construções. Noutro ângulo
considerar a família como um todo em futuras pesquisas, entender como o homem
deste processo está posicionado, suas percepções e possíveis contribuições ou
entraves ao processo.
Por fim, a pesquisa possibilitou a conclusão de que o capital social é gerado e
também gerador dos resultados da AAFEMED, em uma alusão a um caminho de
construção e troca, que por vezes impõem a necessidade de reduzir a marcha, desviar
as pedras, reclamar a outras instituições sua melhoria, sua conservação, ou parar,
conversar com o vizinho, pedir um equipamento, uma ajuda, compartilhar opiniões e
soluções. Ao final a certeza é de que este é o caminho, que fazê-lo lentamente, faz
parte da realidade construída e que individualizar cada metro percorrido é parte do
aprendizado e do fortalecimento. Saber que este caminho é comum às mulheres da
família e da comunidade como um todo, é saber que é possível compartilhar e dividir
a sua construção de forma a torná-lo cada vez mais definitivo e forte.
Se a sociedade continuar com sua postura patriarcal, há que se encontrar
pontos de inflexão para buscar novos caminhos, que podem inclusive significar voltar
às origens das discussões entre os diversos grupos de mulheres, ou pura e
simplesmente voltar às bases.
174

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187

APÊNDICE 1: QUESTIONÁRIO
188

EMPODERAMENTO FEMININO E CAPITAL SOCIAL NA AGRICULTURA FAMILIAR


QUESTIONÁRIO PRIMEIRA PARTE - PERFIL

1. Onde fica sua propriedade? _____________________________________


2. Qual o tamanho da sua propriedade em Hectare? __________________________
3. Qual a sua idade? ( ) De 15 a 25 anos ( ) De 26 a 35 anos ( ) De 36 a 45 anos ( ) De
46 a 55 anos ( ) Acima de 56 anos
4. Qual sua escolaridade?
( ) Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio ( ) Ensino Superior
5. Qual a escolaridade do seu marido?
( ) Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio ( ) Ensino Superior
6. É você quem faz as tarefas do lar?
( ) Sim ( ) Não ( ) Sim, mas compartilho com outros membros da família
7. Você tem empregada para as tarefas do lar? ( ) Sim ( ) Não
8. Há quanto tempo você possui atividade de agricultora?
( )Menos de 5 anos ( )Menos de 10 anos ( )Menos de 15 anos ( )Sempre fui agricultora.
9. Há quanto tempo participa da AAFEMED?
( ) Desde que foi fundada ( ) De 1 a 3 anos ( ) De 3 a 5 anos ( ) Mais de 5 anos
10. Qual seu estado civil?
( ) solteira ( ) casada ( ) viúva ( ) divorciada

11. Você tem filhos? ( ) não tenho filhos ( ) 01 filho ( ) 02 filhos ( ) 03 filhos ( ) 04 filhos
( ) Mais de 04 filhos

12. Quantos dependentes você tem?


( ) 01 ( ) 02 ( ) 03 ( ) 04 ( ) Mais de 04 ( ) Não tenho dependentes

13. Qual a principal atividade produtiva da propriedade?_________________________


14. Quem é o principal responsável por esta atividade?
( ) Marido ( ) Filho ( ) Filha ( ) Genro ( ) O Casal ( ) Eu mesma sou a
responsável

15. Quais os produtos que a propriedade produz para vender pela AAFEMED? Marque todas as que
você produz na propriedade:
( ) Embutidos (salame, morcilha, torresmo)
( ) Laticínios (leite, queijo, nata, requeijão e outros derivados de leite)
( ) Frutas
( ) Verduras
( ) Legumes
( ) Tubérculos (mandioca, batata-doce, batatinha, cenoura, beterraba, rabanete, outros)
( ) Panificados (pães, bolos, cucas e bolachas)
( ) Mel, melado, açúcar mascavo, geleias, conservas, chás medicinais
( ) Outros
189

16. Qual desses valores abaixo mais se aproxima da renda mensal resultante da parceria com a
AAFEMED?
( ) Até R$ 1.000,00 mensais
( ) De R$ 1.000,00 a R$ 2.500,00 mensais
( ) De R$ 2.500,00 a R$ 4.000,00 mensais
( ) De R$ 4.000,0 a R$ 5.500,00 mensais
( ) Acima de R$ 5.500,00 mensais

17. Existe alguma outra atividade extra que algum membro da família realiza além da produção
agrícola?
( ) Sim ( ) Não

18. Qual atividade é esta?


( ) Turismo Rural
( ) Agroindústria
( ) Eventos
( ) Alimentação – Restaurante Rural, Café Rural, Coquetel
( ) Outra
( ) Não tenho nenhuma atividade extra na propriedade.

19. Se sim quem executa?


( ) Marido ( ) Filho ( ) Filha ( ) O Casal ( ) Eu mesma executo ( ) Outro.

20. Você assume alguma despesa da família e propriedade? Se sim, qual? Marque todas as que
você paga.
( ) supermercado, água, luz.
( ) educação dos filhos
( ) roupas da família
( ) insumos da propriedade
( ) parcela de algum equipamento comprado para os trabalhos da propriedade
( ) faço uma poupança ou investimentos para o futuro da família
( ) gasto com coisas para mim.
( ) Outros
( ) Não assumo nenhuma despesa da propriedade

21. Quem da família vai à cidade pagar as contas?


( ) Marido ( ) Filho ( ) Filha ( ) Genro ( ) Nora ( ) Sou eu mesma ( ) O casal

22. A AAFEMED promove ou estimula cursos para você melhorar a sua produção ou aumentar seus
conhecimentos?
( ) sim
( ) Não

23. Se sim, quais cursos?


( ) Reuniões de treinamento sobre como melhorar a produção
( ) Reuniões sobre como melhorar o convívio entre os associados
( ) Reuniões para trazer novidades sobre a produção e a Feira
( ) Reuniões para discutir problemas e soluções referentes à AAFEMED
( ) Outros

24. Você participa de outras Entidades ou Associações, além da AAFEMED? Assinale quais: (Pode
marcar várias escolhas)
( ) Igreja
( ) Associação de moradores
( ) Rotary, Lions ou Rotaract
( ) Associação de Damas
( ) Associações de pais da escola
( ) Outras associações
( ) Outra entidade não descrita
( ) Participo apenas da AAFEMED
190

ANÁLISE SOBRE CAPITAL SOCIAL E EMPODERAMENTO


FAÇA UM X NO QUADRADO DA RESPOSTA QUE VOCÊ QUER DAR

Indique o quanto participar da NÃO CONTRIBUI CONTRIBUI CONTRIBUI


CONTRIBUI POUCO DE MODO MUITO
AAFEMED contribui para melhorar as NADA SATISFATÓRIO
questões abaixo na sua vida:
01 O quanto participar da AAFEMED status
contribui para eu melhorar o meu padrão econômico.
de vida econômico.
02 O quanto participar da AAFEMED recompensa
contribui para aumento do meu ganho de s financeiras.
renda mensal.
03 O quanto participar da AAFEMED participação
contribui para que eu participasse mais cívica.
ativamente das questões da associação
e da comunidade onde eu moro,
participando das decisões, até mesmo
políticas.
04 O quanto participar da AAFEMED investimento
contribui para que eu pudesse comprar financeiro
algo de maior valor, como coisas para a em minha de
casa, a produção, pagar os estudos dos vida.
filhos ou fazer uma poupança ou uma
viagem.
05 O quanto participar da AAFEMED sentimento
contribui para que eu me sinta mais de pertencer
respeitada na como agricultora e como a uma
liderança. comunidade.
06 O quanto participar da AAFEMED apoio social
contribui para que eu receba apoio nas quando
minhas decisões para com a associação preciso.
quando eu preciso.
07 O quanto participar da AAFEMED cooperação
contribui para que eu receba ajuda, e quando
colaboração dos membros da necessito.
associação quando necessito para
realizar alguma tarefa ou participar de
algo.
08 O quanto participar da AAFEMED apoio
contribui para que eu me sinta amparada emocional.
como amiga e parceira pelos membros
da associação.
09 O quanto participar da AAFEMED confiança
contribui para aumento de minha pessoal.
confiança em mim mesma e nas minhas
opiniões.
10 O quanto participar da AAFEMED poder
contribui para aumento da minha pessoal.
influência sobre a família e sobre as
decisões dos outros associados.
11 O quanto participar da AAFEMED respeito
contribui para aumento do meu respeito pessoal.
pelas minhas vontades e decisões.
191

12 O quanto participar da AAFEMED minha


contribui para aumento do respeito que reputação.
as outras pessoas tem por mim.
13 O quanto participar da AAFEMED meu
contribui para o aumento do meu poder empoderam
sobre minhas próprias decisões para a ento pessoal.
minha vida.
14 O quanto participar da AAFEMED meu
contribui para o aumento da minha empoderam
própria consciência de que eu posso ento social.
ajudar a mudar os problemas da minha
comunidade, participando das
discussões que acontecem.
15 O quanto participar da AAFEMED meu
contribui para o aumento do meu direito empoderam
sobre a a nossa terra, a casa, o carro, ou ento
sobre os lucros que a venda dos econômico.
produtos pela associação me dão.
192

SOBRE ANTES E DEPOIS DE PARTICIPAR DA AAFEMED. DOS


QUESTIONAMENTOS ABAIXO, VOCÊ PODE AFIRMAR QUE MELHOROU, PIOROU
OU CONTINUOU IGUAL:
Considerando o ANTES e o DEPOIS de PIOROU CONTINUOU MELHOROU
IGUAL
participar da AAFEMED, indique sobre:
16 Meu padrão de vida econômico. Status econômico

17 Meu ganho de renda mensal. Recompensas


financeiras
18 Minha participação nas questões da Participação
comunidade onde eu moro, participando cívica
das decisões, até mesmo políticas.
19 Minha capacidade de comprar algo de Aumento de
maior valor, como coisas para a casa, a investimento
financeiro na vida
produção, pagar os estudos dos filhos, pessoal
fazer uma poupança ou uma viagem.
20 Me sinto mais respeitada como agricultora Meu sentimento
e como liderança na minha comunidade. de pertencer a
uma comunidade
21 Tenho mais apoio das outras agricultoras Apoio social
quando dou uma opinião ou decido fazer recebido das
outras agricultoras
algo.
22 Eu recebo ajuda das outras agricultoras, e Cooperação
colaboração dos membros da associação quando necessito
das outras
quando necessito para realizar alguma agricultoras
tarefa ou participar de algo.
23 Apoio emocional das outras agricultoras Apoio emocional
para que eu me sinta amparada como das outras
agricultoras
amiga e parceira pelos membros da
associação.
24 Minha confiança em mim mesma e nas Confiança pessoal
minhas opiniões.

25 A minha influência sobre a família e sobre Poder pessoal


as decisões dos outros associados.
26 O meu respeito pelas minhas vontades e Respeito pessoal
decisões.
27 O respeito que as outras pessoas tem por Reputação
mim.
28 O meu poder sobre minhas próprias Empoderamento
decisões para a minha vida. pessoal

29 A minha própria consciência de que eu Empoderamento


posso ajudar a mudar os problemas da social
minha comunidade, participando das
discussões que acontecem.
30 O meu direito sobre a nossa terra, a casa, Empoderamento
o carro, ou sobre os lucros que a venda dos econômico
produtos pela associação.
193

APÊNDICE 2: ENTREVISTA 2 - ROTEIRO DO DOCUMENTÁRIO


194

SEGUNDA PARTE - ROTEIRO DO DOCUMENTÁRIO

01. Quem é você? Se descreva.


02. Qual a sua idade?
03. Até qual série você estudou?
04. Você é casada? Tem filhos? Tem mais algum dependente?
05. Há quanto tempo você é agricultora?
06. Me conta como é a sua rotina. Você gosta dessa sua rotina?
07. Como a AAFEMED entrou na vida de vocês? Há quanto tempo faz isso?
08. O que vocês produzem aqui na propriedade?
09. Quais os produtos que a propriedade produz para vender pela AAFEMED?
10. Quem da família que lida mais com essa produção que é vendida pela AAFEMED?
11. O que dá mais lucro, disso tudo que vocês produzem?
12. Tem alguma atividade que não está ligada diretamente à produção rural?
13. E quem é que faz cada atividade? É feito junto? Vocês dividem as tarefas? Como é isso?
14. E o dinheiro, quem cuida? Quem paga? Quem decide pela compra das coisas?
15. Você vai à cidade passear ou pagar as contas, ou fazer alguma coisa que é pra você?
16. Qual a maior vantagem de ser associado?
17. E a desvantagem, tem alguma?
18. Como era antes da AAFEMED? Era melhor ou pior?
19. Você se sente uma mulher independente e empoderada?
20. Qual é o seu maior orgulho?
21. Tem alguma coisa que você lamenta, que te deixa triste?
22. Vocês MELHORARAM DE VIDA depois que começaram a participar da AAFEMED?
23. E NA COMUNIDADE, tão participando mais? ou é igual?
24. Quando vocês precisam, as outras famílias da Associação ajudam? Como que é isso,
vocês se ajudam sempre? me conta.
25. E a relação com as outras mulheres da AAFEMED, como é?
26. E quando tem um problema, assim mais de família, as outras mulheres dão conselho,
vocês conversam sobre essas coisas pra se ajudar?
27. E as outras mulheres e homens da associação, quando você dá uma opinião eles te
respeitam?
195

28. E como que é na comunidade quando vocês precisam fazer um curso, ou quando muda a
lei, a contabilidade, ou se vocês querem melhorar os produtos... tem treinamento pela
Associação?
29. Você compra alguma coisa você mesma todo mês? Para a sua vida?
30. Você se dá um presente de vez em quando?
31. Você tira férias? Planeja uma viagem?
32. O que é a felicidade para você?
33. E você é feliz?
34. Tem algum sonho que você gostaria de realizar? Você acha que vai conseguir?
196

APÊNDICE 3: DOCUMENTOS DE AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM


DOCUMENTÁRIO
197

TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE ENTREVISTA E DE


USO DE DEPOIMENTOS E IMAGENS.

Eu_______________________________________________________, documento
de identificação número (RG, RNE ou passaporte)
_______________________________, depois de conhecer e entender os objetivos,
procedimentos metodológicos usados na pesquisa, bem como de estar ciente da
necessidade do uso de meu depoimento (escrito ou áudio) e ou imagem, autorizo,
através do presente termo, a pesquisadora Márcia Hanzen do projeto de pesquisa
intitulado “EMPODERAMENTO FEMININO E CAPITAL SOCIAL NA AGRICULTURA
FAMILIAR”, a colher meu depoimento e ou realizar as fotos/vídeos que se façam
necessárias sem quaisquer ônus financeiros a nenhuma das partes. Ainda declaro,
por meio deste termo, que concordei em ser entrevistada e/ou participar na pesquisa
de campo referente ao projeto/pesquisa ora descrito.

Afirmo que aceitei participar por minha própria vontade, sem receber qualquer
incentivo financeiro ou ter qualquer ônus e com a finalidade exclusiva de colaborar
para o sucesso da pesquisa. Fui informada dos objetivos estritamente acadêmicos do
estudo.

Não obstante, libero a utilização dos dados coletados na forma de depoimento, áudio,
vídeo e fotos para fins científicos e de estudos (dissertações, teses, livros, artigos e
slides), bem como a utilizar minha imagem e voz coletados por entrevistas,
questionários, vídeo, e áudios, para utilização, para mídia eletrônica (TVS aberta e a
cabo, Circuito Fechado, Eventos, Internet, Mídias Sociais e Rádio) e mídia impressa
(Revistas, Jornais, Outdoor, Adesivo, Folder e outros), em favor do pesquisador,
acima especificado, obedecendo ao que está previsto na legislação vigente.

Toda a utilização prevista não tem limitação de número de vezes ou prazo podendo
ocorrer em todo o território brasileiro por tempo indeterminado.

_____________________, __ de ______ de __________.

__________________________________
Assinatura da Pesquisadora responsável pelo projeto

_______________________________
Assinatura do Sujeito da Pesquisa
198

ANEXO 1: LEI MUNICIPAL Nº 62/2009


TERMO DE USO DO BARRACÃO DA PREFEITURA
PARA A AAFEMED E OUTRAS ASSOCIAÇÕES
199
200

ANEXO 2: ATA DE FUNDAÇÃO DA AAFEMED


201
202
203
204
205

ANEXO 3: CARTA DE MEDIANEIRA


206
207
208

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