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3 Solomon Michoels (1890-1948) – ator e encenador soviético de origem judaica, diretor do Teatro
Judaico de Moscovo. Morto pelos oficiais do Ministério de Segurança do Estado. (N. dos T.)
5 Miron Vóvsi (1897-1960) – médico soviético, académico. Foi preso durante o processo dos «médicos
assassinos». Libertado depois da morte de Stálin. (N. dos T.)
6 Lídia Timachuk (1898-1983) – médica cardiologista soviética. A sua carta sobre o tratamento
incorreto de A. Jdánov foi aproveitada na campanha de incriminação dos «médicos assassinos» em
1953. (N. dos T.)
8 Os mineiros Nikita Isótov e Aleksei Stakhánov e a tecelã Dússia (Evdokia) Vinográdova foram, em
1935, os iniciadores do movimento de reorganização do trabalho, com o objetivo de aumentar a
produção laboral. (N. dos T.)
10 Em maio de 1896, nos dias de coroação do czar Nicolau II, durante a festa na praça Khodínskaia em
Moscovo, aconteceu uma tragédia. Atraído pelos rumores das grandes benesses que o governo ia
oferecer, o povo começou a afluir à praça. Devido à má organização, 1389 pessoas morreram e 1300
ficaram gravemente feridas no aperto. (N. dos T.)
11 Vila de Góri – lugar na Geórgia onde nasceu Ióssif Djugachvíli (Stálin). (N. dos T.)
12 Aleksei Ríkov (1881-1938) – político e homem de Estado soviético, comissário do povo (ministro)
do Interior em 1917, presidente do Conselho Nacional de Economia entre 1924 e 1930. Preso em 1937,
foi condenado e fuzilado um ano depois. Nikolai Bukhárin (1888-1938) – economista russo, político e
homem de Estado soviético, membro da Academia das Ciências da URSS. Em 1928, pronunciou-se
contra a intensificação da coletivização no campo, propondo a via evolucionária do desenvolvimento da
economia, declarando «aventureiro» o curso de Stálin da coletivização e industrialização totais. Em
1937 foi preso, acusado de atividade antissoviética e, em 1938, foi fuzilado. (N. dos T.)
13 Andrei Vichínski (1883-1954) – homem de Estado soviético, jurista. Nos anos 1935-1939,
procurador-geral da URSS. Neste cargo, foi um dos mais implacáveis executores das repressões
políticas. (N. dos T.)
14 Comunismo de guerra – assim era denominada a política do Estado soviético nos anos de 1918-
1921, nas condições de guerra civil. As suas características principais eram a extrema centralização da
gestão da economia, a nacionalização da indústria (grande, média e, em parte, pequena), a
monopolização por parte do Estado de muitos produtos agrícolas, a requisição de géneros alimentícios,
a proibição do comércio privado, a cessação do funcionamento do mercado financeiro, a distribuição
igualitária dos bens, a militarização do trabalho. (N. dos T.)
18 Nikolai Nekrássov (1821-1877) – poeta e escritor, crítico literário e editor russo, satírico,
invetivador de injustiças sociais. (N. dos T.)
20 «Dez anos sem direito a correspondência» – sentença que significava, de facto, a pena capital. (N.
dos T.)
22 Lavrênti Béria (1899-1953) – comissário do povo (ministro) do Interior desde 1938, comissário-
geral de Segurança do Estado desde 1941, uma das personalidades mais próximas de Stálin. Depois da
morte de Stálin, foi preso, acusado de espionagem e fuzilado. (N. dos T.)
23 Guênrikh Iagoda (1891-1938) – comissário do povo (ministro) do Interior entre 1934 e 1936,
presidente da OGPU da URSS em 1934, comissário-geral da Segurança do Estado em 1936.
Organizador de perseguições e repressões políticas em massa. Em 1937 foi preso, acusado de crimes
comuns e políticos contra o Estado soviético, de organização de atentados contra Stálin, de preparação
de golpe de Estado. Fuzilado em março de 1938. Nikolai Ejov (1895-1940) – comissário do povo
(ministro) do Interior entre 1936 e 1938, comissário-geral da Segurança do Estado desde 1937,
executor de repressões políticas em massa. Fuzilado em resultado do processo-crime em que foi
acusado de preparação de golpe de Estado, de espionagem e, até, de ter cometido «atos de sodomia com
fins antissoviéticos e interesseiros». Víktor Abakúmov (1908-1954) – homem de Estado e militar
soviético, ministro da Segurança do Estado em 1946-1951. Participou em repressões políticas. Preso
em 1951 (em resultado da denúncia feita por M. Riúmin), foi acusado do crime lesa-pátria. Passados
três anos, foi fuzilado. Mikhaíl Riúmin (1913-1954) – oficial dos órgãos da Segurança do Estado. Tinha
alcunha de «anão sangrento». Foi um dos falsificadores do «caso dos médicos assassinos». Depois da
morte de Stálin, preso e fuzilado. Vsévolod Merkúlov (1895-1953) – político e homem de Estado
soviético, general. Ministro da Segurança do Estado em 1941, 1943-1946. Depois, ministro do Controlo
do Estado. Participou na condenação à pena capital dos oficiais polacos em Katin. Assinou penas
capitais aos «inimigos do povo» na Ucrânia Ocidental em 1941-1943. Em resultado, foram executadas
mais de 10 mil pessoas. Preso na mesma altura que Béria, fuzilado. Bogdan Kobúlov (1904-1953) –
coronel-general, um dos dirigentes dos órgãos da Segurança do Estado. Homem de confiança de Béria.
Organizou e realizou, em 1944, a deportação de tchetchenos, inguches, tártaros da Crimeia, búlgaros e
gregos. Torturou pessoalmente pessoas na Lubianka. Participou na liquidação dos oficiais polacos em
Katin (1940). Preso e fuzilado juntamente com Béria. (N. dos T.)
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25 O Cazaquistão era uma das regiões para onde se mandavam os deportados. (N. dos T.)
28 Palavras de uma das personagens do drama No Fundo, de Maksim Górki. (N. dos T.)
8
«Mas que diabo me tentou a andar a pé», repetia Pinéguin. Não lhe apetecia
pensar naquelas coisas obscuras e más que estavam adormecidas dentro dele
há dezenas de anos e, de repente, acordaram. A essência não estava num ato
feio, a essência estava numa casualidade estúpida que o fez cruzar-se com o
homem a quem destruíra a vida. Se não se encontrassem na rua, o que estava
a dormir não teria acordado.
Mas acordou, e Pinéguin, sem dar por isso, pensava cada vez menos na
casualidade estúpida, preocupando-se e afligindo-se cada vez mais: «Nada a
fazer, facto é facto, fui precisamente eu que denunciei o Ivan, e poderia
passar sem isso, e quebrei a coluna vertebral ao homem, raios o partam. Não
fosse isso, e agora, ao encontrarmo-nos, seria tudo maravilhoso. Eh, diabo,
subiu-me uma porcaria à alma, como se tivesse metido a mão no saco de uma
senhora e esta me tivesse agarrado a mão, e tudo aos olhos dos meus
secretários, ajudantes, do meu motorista; oh, oh, que desgraça, nem apetece
viver depois deste nojo… Talvez toda a minha vida seja apenas uma
ignomínia. Era preciso viver de maneira absolutamente diferente.»
E, em grande perturbação, Pinéguin entrou no restaurante da Direção do
Turismo do Estrangeiro, onde todos, o maître d’hôtel, os empregados de
mesa e o porteiro o conheciam desde há muito.
Ao vê-lo, dois empregados do guarda-roupa saíram a correr de trás do
balcão, sussurrando: «Bem-vindo, bem-vindo» – e, roncando como cavalos,
estenderam as mãos impacientes até à vestidura de Pinéguin. Tinham olhos
perspicazes, olhos bons de despachados e espertos rapazes russos que
registavam perfeitamente na memória quem vinha, o que vestia, o que disse
de passagem. Contudo, no que respeita ao Pinéguin, com a sua insígnia de
deputado, recebiam-no de corações abertos, quase como seu chefe direto.
Sem pressas, sentindo com o pé a superfície macia e ao mesmo tempo
flexível do tapete, Pinéguin entrou no restaurante. Uma penumbra solene
envolvia a sala espaçosa, de teto alto. Pinéguin inspirou lentamente o ar
calmo, simultaneamente fresco e tépido, passou os olhos pelas mesas
cobertas de toalhas engomadas; os vasos lapidados com flores, os copos e os
cálices brilhavam modestamente. Dirigiu-se para um cantinho acolhedor, o
seu preferido, sob a folhagem rendilhada de um filodendro.
Estava a navegar entre as mesinhas com bandeiras de muitas potências do
mundo, e parecia que eram navios de linha e cruzadores, e que ele era
almirante no navio-chefe, passando a frota em revista.
Então, sob esta sensação de ser almirante, uma sensação que o ajudava a
viver, sentou-se à mesa, estendeu devagar a mão até à ementa com capa cor
de azeitona azulada, sólida como a do diploma de laureado, abriu-a e afundou
os olhos nas «Entradas frias».
Passando a vista pelos nomes de pratos, datilografados na sua língua
materna e nas outras principais línguas do mundo, folheou a página de cartão,
examinou «Sopas», mascou com os lábios e olhou de soslaio para «Pratos de
carne» e «Pratos de caça».
E no mesmo instante em que hesitou entre carne e caça, o empregado, ao
adivinhar as suas dúvidas, pronunciou:
– O filet mignon, hoje, está excecional.
Pinéguin guardou um longo silêncio.
– Bem, que seja o filet – disse.
Estava sentado, com os olhos semicerrados, na penumbra e no silêncio, e a
ponderável justeza da sua vida debatia-se com a perturbação e o terror que, de
repente, tinham ressuscitado nele, com o fogo e o gelo do arrependimento.
Mas já o veludo pesado que tapava a porta para a cozinha se mexia, e
Pinéguin determinou pela cabeça careca do empregado: «É o meu.»
A bandeja navegava até Pinéguin da semiescuridão, e ele via o salmão
cinzento-rosado entre os pequenos sóis de limão, o caviar moreno, a verdura
dos pepinos de estufa, os flancos arredondados do jarro de vodca e a garrafa
de água mineral.
Aliás, não era tão grande gastrónomo como isso, nem sequer tinha muita
fome neste momento, mas foi precisamente neste momento que o velho de
casaco acolchoado deixou de incomodar mais uma vez a sua justeza.
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Ao chegar à estação dos comboios, Ivan Grigórievitch sentiu que não valia
a pena continuar a vaguear pelas ruas de Leninegrado. Parou no meio do
edifício frio e alto da estação e refletiu.
Talvez algumas das pessoas que passaram ao lado do velho sombrio,
olhando para o quadro negro dos horários, pensassem: ei-lo, o homem russo
regressado do campo correcional, está a matutar, a escolher um caminho.
Não, não estava a escolher um caminho.
Durante a sua vida, dezenas de juízes de instrução compreenderam que
Ivan Grigórievitch não era monárquico nem socialista-revolucionário, nem
socialista-democrata, que não participou na oposição trotskista nem na de
Bukhárin e Ríkov. Não era adepto da igreja nova nem da igreja velha, nem
dos adventistas.
Na estação, pensando nos dias penosos em Moscovo e Leninegrado,
recordou uma conversa com um general de artilharia czarista que era seu
vizinho de tarimba. O velho disse: «Não vou do campo para lado nenhum –
aqui há calor, conheço as pessoas, alguém me dará um bocado de açúcar,
outro vai dar-me um pastel da encomenda postal.»
Ivan viu lá velhos desses por mais de uma vez – já não queriam sair do
campo, o campo tornou-se a casa deles, tinham comida à hora certa, esmola
da boa gente, calor do fogareiro.
Na verdade, não tinham para onde ir: alguns guardavam no fundo dos seus
corações doentes uma recordação do brilho dos lustres de Tsárskoe Seló, do
sol invernal de Nice; outros lembravam-se de Mendeléev, vizinho deles, que
ia lá a casa tomar chá com a família deles, ou do jovem Blok, recordavam
Skriábin e Répin; outros ainda guardavam nas cinzas ainda tépidas a memória
de Plekhánov, de Guerchúni, de Trigóni29, de amigos do grande Jeliábov.
Havia casos em que os velhos postos em liberdade pediam que os aceitassem
de novo no campo, o furacão da vida lá de fora derrubava-os, não se
seguravam nas pernas fracas, trementes, as enormes cidades assustavam-nos
com o seu frio, com a sua falta de amigos.
Ivan Grigórievitch tinha vontade de voltar para dentro do arame farpado, de
reencontrar toda aquela gente habituada aos trapos quentes, à tigela de sopa
intragável, ao fogareiro da barraca. Apetecia-lhe dizer-lhes: «É verdade, a
liberdade mete medo!»
Então, contaria aos velhos de forças perdidas como tinha sido ver um
parente, como se aproximara da casa em que vivia a mulher amada, como
esbarrara com um colega da universidade que lhe propusera ajuda. E diria aos
velhos do campo correcional que não havia felicidade maior do que, cego,
sem pernas, rastejar de barriga para fora do campo e morrer em liberdade,
nem que fosse a dez metros do maldito arame.
29 Aleksandr Blok (1880-1921) – grande poeta simbolista russo. Iliá Répin (1844-1930) – pintor russo.
Gueórgui Plekhánov (1856-1918) – teórico e propagandista russo do marxismo, ativista do movimento
operário e socialista russo e internacional. Grigóri Guerchúni (1870-1908) – um dos fundadores e
líderes do partido dos socialistas-revolucionários. Em 1902, organizou o atentado contra o ministro do
Interior D. Sipiáguin e dos governadores das cidades de Khárkov e Ufá. Mikhaíl Trigóni (1850-1917) –
revolucionário russo, membro da organização «Liberdade do Povo». (N. dos T.)
10
31 OBKhSS – Departamento para a Luta contra as Pilhagens da Propriedade Socialista. (N. dos T.)
32 A frase pertence a Vladímir Lénin (artigo «Os bolcheviques conseguirão manter o poder?»). (N. dos
T.)
11
36 Em 1931, Maksim Górki publicou um artigo com a proposta de se criar uma espécie de enciclopédia
dedicada à história das fábricas. (N. dos T.)
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Nos últimos dias, Ivan Grigórievitch andava taciturno, quase não falava
com Anna Serguéevna. Mas no trabalho pensava muito nela e em Aliocha, e
não deixava de olhar para o relógio de pêndulo na parede da oficina – quanto
faltava até voltar para casa?
E, por qualquer razão, nestes seus dias taciturnos, refletindo na vida do
campo correcional, recordava mais do que tudo o destino das mulheres
presas… Parecia que nunca antes tinha pensado tanto nas mulheres.
… A igualdade entre a mulher e o homem não foi estabelecida nas cátedras
universitárias nem nas obras dos sociólogos… A sua igualdade foi
demonstrada não só no trabalho fabril, não só nos voos cósmicos, não só no
fogo da revolução – foi firmada na história da Rússia, em todos os séculos
dos séculos, pelo sofrimento escravo, prisional, do campo correcional, do
comboio de trânsito.
Perante os séculos de escravidão, perante Kolimá, Norilsk, Vorkutá, a
mulher tornou-se igual ao homem.
O campo correcional confirmou também a segunda verdade, simples como
um mandamento: a vida dos homens e das mulheres é inseparável.
Uma força satânica reside na proibição, na barragem. A água dos riachos e
rios apertada pela barragem manifesta a sua força secreta, obscura. Esta força
oculta, invisível sob aquele seu marulho carinhoso, sob os reflexos do sol,
dos nenúfares que baloiçam, revela de repente a implacável raiva da água –
derruba pedras, faz girar as pás da turbina com louca velocidade.
É implacável a força da fome quando a barragem separa o homem do seu
pão. A necessidade natural e boa de se alimentar transforma-se numa força
que extermina milhões de vidas, obriga as mães a comerem os seus próprios
filhos – a força da crueldade e da bestialização.
A proibição que separa as mulheres presas dos seus homens estropia os
seus corpos e as suas almas.
Tudo o que é feminino – a ternura, o cuidado, a paixão, a maternidade – é o
pão e a água da vida. Tudo isso nasce na mulher porque há no mundo
maridos, filhos, pais, irmãos. Tudo isso preenche a vida do homem – porque
há no mundo a mulher, a mãe, a filha, a irmã.
Mas de repente a força da proibição entra na vida. E tudo o que era simples
e bom, o pão e a água potável da vida, revela a sua maldade baixa e as suas
trevas.
Como por milagre, a violência e a proibição transformam, inevitavelmente,
o bom no mau dentro da pessoa.
Entre o campo correcional de criminosos comuns masculino e o feminino
havia uma faixa de terreno deserto – chamava-se zona de fogo –, e as
metralhadoras abriam fogo mal um homem aparecia na terra de ninguém. Os
criminosos atravessavam, rastejando, a zona de fogo, cavavam passagens,
enfiavam-se debaixo do arame farpado, ou passavam por cima dele, e quem
não tinha sorte ficava nessa zona com a cabeça baleada ou as pernas cortadas
pelas rajadas das metralhadoras. Isto lembrava o movimento louco e trágico
do peixe na desova pelos rios atravessados pelas barragens.
Quando os serralheiros e os carpinteiros eram mandados trabalhar nos
sinistros campos femininos de regime severo, as mulheres, que durante
longos anos não viram caras masculinas nem ouviram a voz masculina,
assediavam esses homens, extenuavam-nos até à morte. Os criminosos
comuns tinham medo desses campos, onde as mulheres achavam felicidade
na possibilidade de tocarem no ombro do homem morto, eles tinham medo de
ir lá mesmo sob a proteção de armas de fogo.
A desgraça negra e sombria deformava os presos, transformava-os em
animais.
Nos trabalhos forçados, as mulheres obrigavam outras mulheres a relações
antinaturais. Surgiam nas barracas das mulheres personalidades absurdas –
mulheres de vozes roufenhas, de andar largo, de feitio masculino, de calças
enfiadas em botas de soldado. E ao lado delas, criaturas míseras, perdidas –
as suas concubinas.
As mulheres-machos bebiam tchifir37, fumavam tabaco forte,
embebedavam-se e espancavam as suas amiguinhas mentirosas e levianas,
mas também as protegiam de ofensoras e outras pretendentes com punhos e
navalhas. Este mundo de relações trágico e monstruoso era o amor no campo
de trabalhos forçados. Era assustador, não provocava risos nem conversas
obscenas entre os ladrões e assassinos, apenas o terror.
O frenesi sexual nos trabalhos forçados não conhecia o impedimento das
distâncias na taiga, nem do arame farpado, nem das paredes de pedra, nem
das fechaduras, avançava contra os cães-lobos de guarda, contra uma
navalha, atirava-se sob o fogo das metralhadoras. Assim, o peixe do oceano
Pacífico avança, com olhos saídos das órbitas e as espinhas dorsais partidas,
para o lugar de desova, despedaçando-se contra as rochas nas correntes e
cataratas dos rios montanhosos.
Mas, ao mesmo tempo, os presos guardavam nas almas o amor de mulheres
e mães, e as presas, noivas «à revelia», que nunca viram nem iam ver os seus
eleitos do campo, estavam prontas para qualquer tortura em nome da
fidelidade ao seu desgraçado eleito do campo correcional, em nome de uma
treta fantasiada.
Há coisas que serão perdoadas ao ser humano se ele, na imundície e no
fedor da violência prisional, continuar a ser humano.
37 Tchifir – bebida tradicional das prisões russas. Obtém-se pela preparação de um chá extremamente
concentrado. Produz um efeito narcótico. (N. dos T.)
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39 Borch – sopa ucraniana feita de beterraba, outros legumes e carne. Bolo «Napoleão» – bolo folhado
com recheio de creme. (N. dos T.)
43 Tarás Chevtchenko (1814-1861) – poeta, pintor, pensador, democrata revolucionário ucraniano. (N.
dos T.)
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55 Aleksandr Uliánov (1866-1887) – irmão mais velho de Vladímir Uliánov (Lénin), revolucionário,
membro da fração terrorista da organização «Liberdade do Povo». Participou na preparação do atentado
contra o czar Alexandre III, mas foi preso. Juntamente com os seus camaradas foi condenado à pena
capital e enforcado. (N. dos T.)
57 De uma poesia do poeta soviético Nikolai Poletáev (1889-1935). (N. dos T.)
59 Kvas – bebida refrescante tradicional russa, feita à base de pão de centeio. (N. dos T.)
60 Pável Pestel (1793-1826) – coronel do exército russo, um dos líderes da Associação Secreta do Sul
antimonárquica e republicana. Foi preso depois da tentativa de derrubamento do poder autocrático
pelos dezembristas em 1825 e, passado meio ano, executado. Mikhaíl Bakúnin (1814-1876) –
revolucionário russo, um dos fundadores do movimento do anarquismo e do populismo. Serguei
Netcháev (1847-1882) – revolucionário russo, aventureiro e niilista. Organizador da «União da
Vingança Popular» que tinha como objetivo a preparação de uma «terrível revolução» pelos
revolucionários que «conhecem apenas a ciência da destruição, desprezam a opinião pública e a moral
social». Na sua atividade, recorria a métodos de falsificação e criminosos. Netcháev e os seus
companheiros serviram de protótipos para as personagens do romance Demónios de Fiódor
Dostoiévski. (N. dos T.)
64 Do livro Almas Mortas de Nikolai Gógol. «Troica» é uma atrelagem de três cavalos lado a lado, o
que permite atingir uma grande velocidade. (N. dos T.)
71 No dia de São Jorge outonal, até 1649, os camponeses tinham direito a mudar-se para outro senhor.
(N. dos T.)
72 Aleksei Nikoláevitch Tolstói (1882-1945) – escritor russo soviético. Nikolai Semiónov (1896-1986)
– um dos fundadores da química física russa. (N. dos T.)
23
74 Anatóli Lunatchárski (1875-1933) – escritor russo soviético, político e líder social, tradutor,
publicista, crítico literário e de arte, académico. Entre 1917-1929, comissário do povo (ministro) de
Educação. (N. dos T.)
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78 Cruzador «Almaz» – navio da Marinha Imperial Russa, construído em 1903. Em janeiro de 1918,
tomou parte numa revolta e estabelecimento do poder soviético em Odessa. Deixou uma memória
sinistra porque os marinheiros transformaram o cruzador numa espécie de calabouço. (N. dos T.)
79 Mikhaíl Saltikov-Chedrin (1826-1889) – escritor russo, autor de obras satíricas de forte crítica
social. (N. dos T.)
81 Oprítchnina – denominação da política interna do czar Ivan, o Terrível em 1565-1572, com o fim de
enfraquecer a influência económica e política da grande aristocracia feudal, de realizar medidas de
escravização ainda mais profunda dos camponeses. Foi criado um aparelho especial e um exército
incontestavelmente obedientes ao czar, não sujeitos ao julgamento dos órgãos gerais e do tribunal do
Estado. Os fidalgos de oprítchnina recebiam terras confiscadas aos grandes senhores feudais que
sofreram também repressões muito cruéis. (N. dos T.)