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Responsável pelo Conteúdo:

Prof. Ms. Rodrigo Medina Zagni

Revisão Textual:
Profª Dra. Patrícia Silvestre Leite Di Iório
A Lição dos Clássicos
(Maquiavel)

Nessa unidade, vamos tratar do tema “a lição dos clássicos


(Maquiavel)”.

Na pasta de mesmo nome, você irá encontrar o seguinte


conteúdo:

1) Um texto teórico que aborda o desenvolvimento


sobre o pensar e o fazer político no Ocidente;

2) Uma apresentação narrada no formato “adobe


presenter”, que sintetiza o conteúdo teórico de forma
bastante elucidativa;

3) Uma problematização que ressalta os significados e a


importância prática do conteúdo, sua realidade e
aplicação;

4) Atividades de sistematização, tratando-se de uma


questão no estilo do ENADE;

5) Uma atividade reflexiva, que consiste na produção


de um texto de análise crítica;

6) Material complementar sobre o tema;

7) Referências bibliográficas.

Agora, mãos à obra e havendo qualquer dúvida entre em


contato com seu professor tutor!

Atenção

Para um bom aproveitamento do curso, leia o material teórico atentamente antes de realizar
as atividades. É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma.
Contextualização

Quando pensamos na política na dimensão dos Aparelhos de Estado, estamos


pensando diretamente nas relações entre política e poder. Isso porque são os Estados quem
têm o poder para fazer a guerra e para declarar a paz; para criar leis e instrumentos coercitivos
que façam com que elas sejam obedecidas; que impõe sua autoridade aos seus circunscritos
determinando-lhes seus direitos e seus deveres etc.

Obviamente, este poder não se exerce sem o recurso da força ou,


minimamente, da ameaça ao recurso da força. Sendo assim, cabe-nos indagar:
de onde provém este princípio legitimador para o exercício da força em
relações políticas? Política e poder são termos co-relatos, complementares ou
antagônicos? É preciso romper com a ética para governar ou é preciso ter ética acima de
tudo? É preciso romper com a moral ou vincular-se a uma para ser um bom governante?

Maquiavel, o fundador da ciência política nos fornece respostas no momento em que


confere referenciais teóricos para a visão que estabelece no momento embrionário da ciência
política: a postura realista.

Nesta unidade, vamos conhecer então essa dimensão da obra maquiaveliana,


profunda, complexa e rica em sentidos fundamentais e que, ainda hoje, não foram
substituídos para explicar aspectos fundamentais de processos e instituições políticas.

Em busca das respostas às perguntas aqui elaboradas, embrenhe-se pelo conteúdo


teórico, apresentação narrada e demais materiais dessa unidade, a fim de entendermos as
relações entre política e poder em Maquiavel.
Material Teórico

GLÓRIA, FORTUNA E VIRTÚDE

A relação entre “glória” e “morte”


A primeira relação que devemos empreender na durante o Renascimento estava
análise de parte da obra de Nicolau Maquiavel (1469- diretamente ligada às práticas
1527) - considerado o fundador da Ciência Política e virtuosas dos indivíduos em vida. O
poeta Francesco Petrarca (1304-
responsável por seu desprendimento da religião - é com o
1374), representante máximo do
período histórico que atravessava a Florença de seu tempo:
chamado primeiro humanismo ou
o Renascimento Cultural (o período da História da Europa pré-renascentismo, no Soneto XII
aproximadamente entre fins do século XIII e meados do (dedicado a Pandolfo Malatesta,
século XVII). senhor de Rimini, in: I trionfi e rime
varie, Milano, s. ed., 1926, p. 105),
defendia que por meio da transcrição
de atos memoráveis em registros
literários, os homens então
protagonistas seriam lembrados pela
posteridade, imortalizados pela fama.
Os atos humanos poderiam não ser
Portrait of Niccolo Machiavelli vãos e, desta forma, seriam
IMAGEM: © Stefano Bianchetti/Corbis registrados pelos homens de letras, a
FOTÓGRAFO Stefano Bianchetti
COLEÇÃO Corbis Art fonte da glória e da imortalidade. Na
introdução a obra de Maquiavel,
Comentários sobre a primeira década
A “glória”, termo presente em toda a obra de de Tito Lívio (Imprensa Oficial, p.
Maquiavel, é um dos temas que marcaram este período e 17), o autor denuncia a existência no
remonta diretamente à discussão renascentista sobre a imaginário de seu tempo e a
morte, tema co-relacionado à glória e muito próximo do preocupação corrente em sua obra
com a glória. Neste caso, convém
Homem daquele tempo, pela proximidade das pestes
citá-lo: “Enfim, se este trabalho não
(primordialmente a Peste Negra), pragas e das guerras que
me der glória, também não me
devastaram a Europa durante a baixa Idade Média (do
servirá de condenação”.
século XI ao século XIV).
Illustration of Victims of Bubonic Plague from the Toggenberg Bible
Título original: Painting shows a scene of people suffering from the bubonic plague in the 15th century
from the Toggenberg Bible.
IMAGEM: © Bettmann/CORBIS
COLEÇÃO Bettmann

Por conta exatamente da proximidade constante da morte, percebe-se neste período


uma crença profundamente difundida na existência da vida em espírito após a morte do corpo
físico, e cuja mediação com o indivíduo seria feita, segundo os preceitos medievais, pela
Igreja. Contudo, no período de que estamos tratando, a instituição católica estava sob ataque
direto da intelectualidade renascentista, apontada como corrupta e suscetível aos desejos
mundanos de seus párocos, perdendo o status sagrado de mediadora das relações humanas
com o pós-morte.

Obviamente, essa perda de influência da Igreja em relação ao Homem daquele tempo


se deu em razão do declínio do poder político do papado, produto do longo histórico de
violências perpetradas pela Igreja (a atuação da Santa Inquisição, que punia hereges com a
expropriação de seus bens e, não raras vezes, com a morte nas fogueiras; as cruzadas que
vitimaram árabes e judeus etc.), e também da difusão que passavam a ter as ideias
protestantes (a partir de Martinho Lutero) e a adesão que diversos Estados, reinados,
principados e ducados deram a essa nova doutrina religiosa.
O Homem do Renascimento perdia então, com o declínio da influência e do próprio
poder política da Igreja, seu mediador primordial entre o mundo dos vivos – o universo mortal
- e o mundo dos mortos – o universo da imortalidade.

Outro conceito largamente utilizado por


Maquiavel e que denuncia sua difusão no
imaginário renascentista é o de virtú. A perda de
prestígio e poder por parte da Igreja deu espaço
para a difusão, como já dissemos, da Reforma
Protestante (movimento reformista cristão iniciado
no século XVI por Martinho Lutero) e que, nesse
contexto, teve origem histórica nas reflexões sobre a
morte, defendendo que os homens poderiam, por
meio de uma conduta virtuosa em vida, serem
salvos após a morte de seu corpo físico e sem
intermediação alguma da Igreja. A salvação seria
garantida pelo próprio indivíduo (não mais pela
Igreja) em vida a partir dos juízos de que seria
portador, sobre o bem e o mal, sobre o certo e o
errado. Por meio do livre arbítrio, ou seja, da
liberdade de empreender escolhas, o indivíduo
tomaria para si a sorte de seu destino após a morte:
se decidisse por seu justo, bom e correto, estaria

salvo por conta de suas próprias condutas; de igual Gouache Portrait of Martin Luther
forma, se optasse por ser mau, desonesto e injusto, This illustration was published in Memoirs of the
Court of Queen Elizabeth.
amargaria a condenação eterna no mundo dos IMAGEM: © Stapleton Collection/Corbis
DATA DE CRIAÇÃO ca. 1825
mortos, também por conta exclusivamente de suas
COLEÇÃO Historical Picture Library
condutas.

Identificamos no discurso de Maquiavel, relações intrínsecas entre glória, fortuna e


virtú, valores que, conforme estamos verificando, são comuns à Europa do Renascimento.

A ideia da glória renascentista tem em sua base o registro das ações virtuosas dos
homens, já que dessas ações dependeria sua própria salvação, como patrimônios da
humanidade. A indagação de cunho religioso sobre a glória celeste, até então dada pela Igreja
e que defendia a glória como pertencente apenas ao plano divino, celestial, não ao plano dos
mortais; passava a ter uma resposta dada no campo moral da virtude terrena, ou seja, a glória
deveria ser conquistada, de acordo com a virtú (ou a virtude) demonstrada pelo indivíduo em
vida.
Já a fortuna se refere à circunstância, sorte e mobilidade. A alegoria que melhor
expressa essa ideia é a imagem da “roda da fortuna”, largamente difundida nesse mesmo
período e que passou a ser reproduzida, chegando-nos, hoje, na carta de tarô que leva o
mesmo nome. A fortuna seria responsável por metade da regência (dos destinos) da vida
humana, enquanto o governo se encarregaria da outra metade1.

The Wheel of Fortune Color Print


IMAGEM: © Michael Nicholson/CORBIS
DATA DE CRIAÇÃO 16th century
DATA DA FOTOGRAFIA ca. 2003
FOTÓGRAFO
Michael Nicholson
COLEÇÃO Historical

Pensando ainda na alegoria da “roda da fortuna”, na obra “O Príncipe”, escrita em


1513, a concepção de tempo para Maquiavel aparece como mutável, em constante
transformação, tal qual a roda da fortuna que, desta forma, não pararia de girar. Ocorre que,
da mesma forma que a roda, até mesmo o tempo seria passível de ser controlado pelo
indivíduo, portador do livre arbítrio (da possibilidade de fazer escolhas morais) e da virtú (que
possibilitaria realizar as escolhas certas).

1
MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 119.
É importante salientar que durante os quase mil anos em que a Igreja foi hegemônica
na Europa, determinando como o Homem deveria compreender a própria realidade e a si
mesmo, imperava uma espécie de fatalismo em relação ao tempo, ou seja, o Homem não
teria controle algum sobre as mudanças e as transformações que se operavam ao seu redor e
com relação a sua própria vida. Para esses novos tempos, de Renascimento, segundo
Maquiavel, a roda da fortuna, ou seja, as transformações que determinariam os destinos do
mundo e do próprio Homem poderia ser domada pelo príncipe virtuoso.

Pensando em termos políticos, o governante, nominado por Maquiavel como o


“Príncipe”, deveria ser aquele que controlaria as mudanças na sociedade, nos limites do seu
reino; ou seja, ao Príncipe caberia o controle sobre a “roda da fortuna”. Para Maquiavel, o
que possibilitaria ao Príncipe exercer controle sobre a “roda da fortuna”, como vimos, seria o
livre arbítrio e a virtú.

É preciso então,
Detail of Weavers in City Scene
antes de mais nada, in The Allegory of Good
definir a virtú segundo Government: The Effects of Good
Government in the Cityby
seu uso fluente no Ambrogio Lorenzetti
Título original: Detail of the fresco by
pensamento Ambrogio Lorenzetti entitled 'The
maquiaveliano. A virtú Effects of Good Government', in the
Sala della Pace in the Palazzo
do governante estaria Pubblico in Siena. The picture centers
intrinsecamente on the section devoted to the effects
of Good Government in the city of
relacionada à sua Siena. At the center in the foreground,
versatilidade na guerra, partial view of a workshop where
three men are weaving. On the right a
ou seja, seu man is leading two donkeys loaded
conhecimento with bags.
IMAGEM: © Alinari
estratégico, militar, Archives/CORBIS
capacidade de liderança LOCAL Siena, Italy
COLEÇÃO Fratelli Alinari Historical
e de exercer autoridade.
Para Maquiavel, o
refinamento adquirido com o ócio e o luxo, aliado à religião e à incapacidade de esforços,
afeminava os homens, ou seja, furtava-lhe a virilidade, impondo-lhe valores que o desviariam
das possibilidades de dominar as circunstâncias e, como consequência, passaria a ser
dominados por elas, uma vez que, para Maquiavel, “a fortuna é mulher” por natureza. Trata-
se de uma visão notadamente machista uma vez que autoridade, liderança e versatilidade nas
armas eram considerados atributos exclusivamente masculinos.
A defesa que Maquiavel fez de a virtú ser o
atributo necessário ao governante para tomar as
rédeas da fortuna em suas mãos, também se verifica
Maquiavel, na obra Comentários sobre a
primeira década de Tito Lívio, determinou difundida profundamente no âmbito da
que os homens e os elementos, em intelectualidade renascentista. Nas artes, por
natureza, são os mesmos que outrora, e que
exemplo, expressão máxima dessas ideias de cunho
os modelos passados poderiam ser
aplicados perfeitamente a momentos político verifica-se nos afrescos do pintor italiano
posteriores, sem observar as diferenças entre Ambrogio Lorenzetti (1290-1348), pintados nas
distintas épocas, sociedades, meio
paredes do Salão dos Nove (Sala dei Nove) ou
geográfico e outros fatores. Nesse caso,
convém citarmos o próprio autor “... os que Salão da Paz (Sala della Pace) no Palácio Público
se dedicam a ler a história ficam limitados à de Siena: Allegoria do Bom Governo, Efeitos do
satisfação de ver desfilar os acontecimentos
Bom Governo na Cidade e no Campo, e Alegoria
sob os olhos sem procurar imitá-los,
julgando tal imitação mais do que difícil, do Mau Governo e seus Efeitos na Cidade e no
impossível. Como se o sol, o céu, os Campo. Fundamentalmente no primeiro, a virtude
homens e os elementos não fossem os
do bom governante é o motivo alegórico central do
mesmos de outrora; como se a sua ordem,
seu rumo e seu poder tivessem sido afresco e revela o ideal humanista de “vir-virtutis” (“vir”,
alterados”. do latim, significa “homem” e, “virtutis”, significa “virtude”, sendo assim, trata-
se do “homem virtuoso”). Na alegoria do vir-virtutis, o
bom e piedoso
varão virtuoso, capaz de realizar atos que almejem a
glória, teria obrigatoriamente que ser versado nas artes da guerra, para ser capaz de dominar
a roda da fortuna e fazê-la girar a seu favor.

O SENTIDO PRAGMÁTICO E POLÍTICO DA HISTÓRIA

Haveria, para Maquiavel, uma clara distinção entre a virtú e o que chamou de “...
diversidade do sujeito ...”, podendo por vezes as conquistas de um governante depender mais
desta do que daquela. Porém, a virtú seria uma qualidade essencial ao príncipe, não podendo
ser forjada por meio de imitações. Para Maquiavel, os exemplos que deveriam ser imitados
seriam aqueles que demonstrassem adaptabilidade à diversidade de situações ao longo da
história; porém a virtú não poderia ser imitada e, mesmo nesse contexto, imitar exemplos
(mesmo em recorrência à história) poderia funcionar ou não. Esta ideia ganha outra
roupagem nos “Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio”, obra escrita entre 1513 e
1517, na qual Maquiavel criticou o fato de não serem imitados os “... atos admiráveis de
virtude que a história registra, nos antigos reinos e repúblicas, envolvendo monarcas, capitães,
cidadãos, legisladores, todos que trabalharam pela grandeza da pátria...” (p. 17).
Para Maquiavel, esses homens ilustres eram apenas admirados, quando deveriam ter
seus exemplos seguidos. Suas constantes referências a episódios históricos para legitimar suas
ideias, baseando-os em atentas e minuciosas observações de fatos similares no passado, para
determinar a direção mais acertada a se tomar numa ação futura, nos revelam exatamente a
prática da imitação das ações que os ilustres homens no passado tomaram para lidar com
problemas que reapareceriam, com outra vestimenta, no futuro. Ainda, nos revelam um uso
pragmático e até mesmo didático da História. Há, portanto, no pensamento maquiaveliano, a
ideia de que a recorrência à história permitiria ao príncipe, como ferramenta governamental, a
imitação de modelos políticos que funcionaram no passado.

Detail of Norman Conquest of England


fromThe Bayeux Tapestry
IMAGEM: © The Art Archive/Corbis
DATA DE CRIAÇÃO ca. 1073-1082
LOCAL Hastings, England
FOTÓGRAFO
Alfredo Dagli Orti
COLEÇÃO The Picture Desk Limited
Vejamos como o próprio

Maquiavel criticou os políticos de seu tempo por não terem feito o uso devido do
passado: “Com maior espanto ainda vejo que, nas causas que agitam os cidadãos e nos males
que afetam os homens, sempre se recorrem aos conselhos e remédios dos antigos (...).
Contudo, quando se trata de ordenar uma república, manter um Estado, governar um reino,
comandar exércitos e comandar a guerra ou de distribuir justiça aos cidadãos, não se viu
ainda um só príncipe, uma só república, um só capitão, ou cidadão, apoiar-se no exemplo da
Antiguidade.” (Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio. Op. cit. p. 17)

Para Maquiavel, a realidade seria complexa e estaria suscetível a intensas


transformações, o que repercutiria na política definindo sua natureza como caótica e mutável.
Ocorre que, como vimos, no pensamento maquiaveliano é possível ao príncipe domar a
própria realidade, fazendo com que ela se transforme ao seu favor, dominando as situações
que se apresentem por meio de ações que prefigurem a virtú como, por exemplo, a força, a
astúcia, as articulações políticas etc.

A constante recorrência aos fatos históricos para legitimar suas teorias supõe uma ideia
de ciclicidade para a história, e que uma atenta observação de inúmeros eventos similares no
passado, bem como seus consequentes resultados, a curto e longo prazo, levariam o
observador a uma mais adequada tomada de decisão. Haveria, portanto, uma utilidade para
o estudo histórico. Não apenas isso, se o príncipe deveria ser versado na arte da guerra, desta
forma deveria também ser profundo conhecedor da história.
A ELABORAÇÃO MAQUIAVELIANA DO REALISMO POLÍTICO

Durante séculos, a obra de Maquiavel foi taxada como um


código de despotismo e tirania, de cruel cinismo e insensibilidade;
por outro lado, é certo que boa parte das leituras que são feitas,
fundamentalmente sobre “O Príncipe”, deslocam completamente o
texto de seu contexto histórico e passam a fazer juízos de valor
sobre o autor, cobrando-lhe uma moral com a qual o próprio
Maquiavel propôs romper.

Trata-se da moral religiosa, aquela que determinava não só


os padrões de bem e mal, justo e injusto, certo e errado, segundo
os preceitos cristãos; mas que também definia o que seria um bom
governo e, por conseguinte, um bom governante, submetido
obviamente à autoridade da Igreja.

Ocorre que, como já dissemos, trata-se de uma autoridade,


ao tempo de Maquiavel, já decadente; motivo pelo qual pôde o Statue of Niccolo
autor libertar a política da religião ou, mais adequadamente, Machiavelli in Corridoio
Vasariano
libertá-la da moral religiosa. Trata-se da primeira vez que a política Statue of the politician and
ganhou autonomia, nesse caso em relação à moral, o que fez com writer Niccolo Machiavelli in
the Vasari Corridor outside
que a posteridade atribuísse à Maquiavel a criação da própria the Uffizi Gallery.
Ciência Política; isso porque não encontramos nos seus argumentos IMAGEM: © Paul
Seheult/Eye
reflexões sobre o que seria um governo ideal; mas prescrições Ubiquitous/Corbis
claras de como fazer a política. É aí que se define a ciência, DATA DA FOTOGRAFIA
10 de junho de 2007
distinguindo-se da filosofia: enquanto a filosofia é especulativa e LOCAL Florence, Italy
consiste na dimensão do pensar, nesse caso do pensar a política; a FOTÓGRAFO Paul Seheult
COLEÇÃO Encyclopedia
ciência ocupa-se da dimensão do fazer, obviamente sobre como
fazer a política. Maquiavel foi o primeiro a dar corpo a essa então
nascente ciência.

Se, nesses termos, não estava preocupado com a dimensão


do ideal, com o que Maquiavel estava preocupado quando se
ocupou de questões relativas ao fazer político? A resposta é,
obviamente, o contrário do ideal, ou seja, o real. Ao focar
seus esforços na realidade política, afastando-se da idealidade
e, desta forma, da quase totalidade dos autores do
pensamento político do passado e ao seu tempo, Maquiavel
inaugurou também o realismo político.

Niccolo Machiavelli by Antonio del Pollaiolo


IMAGEM: © Arte & Immagini srl/CORBIS
NOME DO CRIADOR Antonio del Pollaiolo
DATA DE CRIAÇÃO ca. 1465
DATA DA FOTOGRAFIA ca. 1985-1995
COLEÇÃO Corbis Art
Mas, voltemos alguns instantes sobre a questão da moral, uma vez que o risco é
concluir, equivocadamente, que o realismo político seria imoral.

Sabemos que as morais são construídas socialmente e, em alguma medida,


internalizadas pelo indivíduo, que passa a pautar suas condutas a partir da sua concepção
sobre o certo e o errado, o justo e o injusto, o bem e o mal etc. Quando o indivíduo ativa seu
livre arbítrio para fazer suas escolhas morais, ele o ativa a partir da sua dimensão ética, que
contém não só sua moral, mas o conjunto de significados e valores que a constituem.

A questão é que não é correto dizer que o


realismo político de Maquiavel não possui uma ética; o
que o maquiavelianismo relegou foi a moral religiosa,
não toda e qualquer moral! Sendo assim, existe uma
ética no realismo; ocorre que não se trata da mesma
ética cristã, que podemos definir como a ética da
conveniência, uma vez que as condutas orientadas por
ela almejam o bem no decurso das próprias ações do
indivíduo. Já a ética do realismo é aquela que
podemos nominar como a “ética da responsabilidade”,
ou seja, ela não se completa no decurso da ação do
indivíduo, mas no resultado final de suas ações. Fica
mais simples compreender pelas palavras do próprio
Maquiavel, quando escreveu que: “os fins justificam os
meios”; ou seja, não se pode acusar os meios de serem
imorais quando o objetivo final é moral. Sendo assim, 445 x 600 - 85k - jpg -
não é certo dizer que o realismo de Maquiavel é imoral www.tudorhistory.org/people/more/moresket
ch.jpg
e antiético; a questão é que se trata de outra ética, Veja abaixo a imagem
para uma política livre de amarras morais, como as da em: www.apostles.com/moresketch.html

Igreja.

É essencial, então, analisarmos os


pressupostos de Maquiavel do ponto de vista
Há menções ainda em referência
funcional, como claras e objetivas instruções para
à inclinação do homem para a
obtenção e manutenção do poder político. maldade e a inveja no
Comentários sobre a primeira
Daí os motivos pelos quais o próprio década de Tito Lívio, p. 17.
Maquiavel adjetivou sua obra como realista, aplicável
como modelo e distinta dos demais pensadores
contemporâneos ou que o precederam na história, preocupados em idealizar sociedades de
forma utópica e visionária, e que nunca puderam ser aplicadas de forma integral como projeto
político ou social.
É possível identificar uma discussão travada, no âmbito do próprio Humanismo do
Renascimento, próximo ao ano em que Maquiavel escreveu “O Príncipe” e “Comentários
sobre a primeira década de Tito Lívio”. Podemos relacionar seus argumentos às obras:
“Utopia”, de Thomas More, escrita apenas três anos depois de “O Príncipe”, portanto em
1516; e “O elogio da loucura”, de Erasmo de Rotterdam, um manual educativo para os
príncipes e que ia contra os preceitos maquiavelianos, apesar de ter sido escrito em 1511,
portanto antes de “O Príncipe”.

A obra realista de Maquiavel se opunha ainda à tradição utópica religiosa, à ideia de


Marcílio de Pádua, de Ambrogio Lorenzetti, e até mesmo às virtudes aristotélicas como a
magnanimidade.

O pensamento maquiaveliano se distanciou das obras de seu tempo exatamente por ter
determinado que o príncipe não pudesse ser bom, em relação à moral cristã, em virtude da
própria natureza humana e da complexidade e mutabilidade das circunstâncias,
demonstrando que a realidade não se coagulava com a conduta moral idealizada por outros
autores.

Considerava o liberalismo como mais uma forma de manipular o povo, pois se fosse
efetivamente aplicado, tornaria o governo inviável em razão de os súditos deixarem de temer
o soberano. Por outro lado, o príncipe deveria manter características liberais, fazendo com que
o povo acreditasse em uma espécie de ilusão.

Já vimos que, segundo Maquiavel, o governante


deveria ser temido e nunca odiado e, se preciso, temido
e não amado. Para tanto, governar seria a arte de
manter-se num fino limiar, um tênue limite entre o
temor impresso aos governados e seu consequente
controle; e o ódio das massas, que trariam
catastroficamente revoltas populares e rebeliões
ameaçando diretamente o Governo. O revés do amor
ao príncipe não poderia ser o ódio e sim o temor, nesse
caso mais seguro que o próprio amor.

Para Maquiavel, a facilidade com que o povo


poderia ser ludibriado pelos governantes dar-se-ia pelo
Profile Of Niccolo Machiavelli
Título original: Niccolo Machiavelli (1469-1527),
fato de os homens julgarem mais com o olhar do que
Italian political philosopher famous for his book "Il com outros sentidos. A ideia que o povo deveria ter a
Principe" (1513).Engraving 1755. BPA2# 3657
IMAGEM: © Bettmann/CORBIS respeito do príncipe deveria ser de alguém piedoso,
COLEÇÃO Bettmann
íntegro, humano, religioso e dotado de fé. Sendo assim,
nada era mais necessário do que a aparência religiosa a fim de garantir a credibilidade do
governante e permitir-lhe domínio sobre o povo. Por outro lado, as mesmas qualidades teriam
de ser deixadas de lado sob certas circunstâncias e, a fim de exercer domínio sobre a fortuna,
deveria o governante agir diretamente contra os mesmos princípios se necessário fosse.
O príncipe, por sua natureza, deveria apresentar ao menos uma das seguintes
características: a da raposa, com perspicácia, inteligência e diplomacia para agradar ao povo e
fazer-lhe acreditar que era bondoso; ou o leão, rude, feroz e letal, conduta que agradaria mais
aos soldados de seu exército do que ao povo. Porém, ao apresentar uma das características, o
príncipe agradaria a apenas um dos grupos, desagradando o outro. Deveria, portanto,
dissimular as características que lhe faltassem a fim de estabelecer o equilíbrio. Neste caso, a
força deveria ser aliada à astúcia e o príncipe deveria assumir a imagem híbrida: parte raposa,
parte leão.

OS MOTIVOS HISTÓRICOS DE MAQUIAVEL PARA A CRIAÇÃO DA


POLÍTICA COMO CIÊNCIA

Já dissemos que seria impossível tecer considerações a respeito


do pensamento maquiaveliano sem antes observar o contexto
do período em que vivia. Portanto, vamos nos ater, nas
próximas linhas, a essa essencial tarefa.

Nicolau Maquiavel nasceu em Florença, em 1469. Era um


burocrata do primeiro escalão, ocupava o mais alto cargo da
Segunda Chancelaria de Florença, o de secretário, posição de
elevado prestígio na administração pública florentina. Cargo
que foi perdido em 1512, com a queda do Governo
republicano frente à invasão do território italiano por
franceses, que subjugaram os Governos locais.

A realidade dos reinados, ducados e principados da Península


Itálica (a Itália, como Estado nacional, só seria criada em
City View by Andre Burian
1871) era, portanto, complexa e não podia ser dada por meio IMAGEM: © André Burian/Corbis
DATA DA FOTOGRAFIA 2006
de uma construção teórica moralizante. Temos, então, um LOCAL Florence, Italy
contexto desfavorável a discussões éticas e morais que FOTÓGRAFO André Burian
COLEÇÃO Corbis Art
passaram então ao segundo plano: para Maquiavel, era
imprescindível estipular medidas funcionais para o
restabelecimento da ordem obliterada pelos invasores, e a
efetiva retomada e manutenção do poder.

Condizente com este contexto, lemos em “O Príncipe” a repulsa e a preocupação de


Maquiavel em relação às invasões armadas estrangeiras em territórios soberanos, referência
óbvia ao fácil domínio que se estabeleceu por parte das tropas francesas em terras italianas.
Desejava que os reinados italianos fossem novamente conquistados; porém com armas
próprias.
No tratado Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio, Maquiavel determinou
que mesmo que um governante desejasse manter seus domínios “... dentro de justos
limites” deveria armá-lo da mesma forma como se armaria uma república imperialista,
como a romana por exemplo. A necessidade de manter exércitos preparados para a
guerra garantiria a paz ao impor aos países vizinhos, ou mesmo repúblicas
expansionistas, a certeza de que seus exércitos não poderiam ser vencidos.

The Battle of Saint Vincent by Giorgio Vasari


IMAGEM: © Massimo Listri/CORBIS
NOME DO CRIADOR Giorgio Vasari
DATA DE CRIAÇÃO 1563-1565
LOCAL Florence, Italy
FOTÓGRAFO Massimo Listri
COLEÇÃO Corbis Art

Ao escrever “O Príncipe” e “Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio”,


Maquiavel demonstrou um profundo conhecimento em estratagemas políticos, militares e da
história. Articulando todos esses elementos para a elaboração do que nominamos como
“realismo político”, a função de seus textos era clara: fazer-se notar pelos governantes de seu
tempo.

Havia sido exilado e de certa forma privado de sua liberdade, limitando-se a uma vida
de trivialidades. Pode-se dizer que esta fase de sua obra trata-se de uma tentativa em fazer-se
ouvir pelos poderes que o governavam, para que fosse retirado do ostracismo em que vivia,
privado de suas liberdades mais fundamentais.
Deixava, como vimos, a subjetividade dos valores morais e éticos para abraçar a
política como estratégia, atendendo a fins bem claros. Se a virtú do príncipe se definiria pela
versatilidade na arte da guerra, se a sua liberdade lhe havia sido subtraída exatamente por
conta de uma invasão militar, e se o restabelecimento dela dependia efetivamente de um
enfrentamento com as forças invasoras, compreende-se porque para Maquiavel, ao seu
tempo, a política realista levaria à exaltação da “arte da guerra”, passando a refletir sobre
como e contra quem o príncipe deveria travá-las.

Até Maquiavel, a interpretação vigente era a de que a guerra implicaria no fim da


política; no pensamento maquiaveliano, a guerra fazia parte da política. Sendo assim, a guerra
não poderia ser evitada, mas travada quando no momento oportuno; quanto muito poderia
ser postergada, mas sempre ao preço da desvantagem.

Não só na mobilização da força armada, na forma da guerra, consistiria o uso político


da força. A própria política definir-se-ia pela força! Você está acompanhando o raciocínio?
Então, vamos continuar!

As leis, para Maquiavel, só seriam obedecidas por aqueles que temessem a aplicação
das sanções legais decorrentes de seu descumprimento. Em termos ideais, os indivíduos
obedeceriam às leis por compreenderem profundamente seus significados frente à ideia de
bem comum; mas não era este o ponto de vista de Maquiavel, que não estava preocupado
com termos ideais, senão com os termos reais. Nessa concepção realista, os homens não
perseguiriam o bem comum, mas seu bem individual; por conta disso, temendo sofrer com o
uso da força pelo Estado caso descumprisse a lei, passaria a obedecê-la. Sendo assim, a lei
decorreria das armas e as armas construiriam os Estados; portanto política e guerra tinham
significados correlacionados.

Nas palavras de Maquiavel: “... um homem que queira fazer em todas as coisas
profissão de bondade deve arruinar-se entre tantos que não são bons”. Mais diretamente,
sobre as relações entre bem comum e benefícios individuais, nos esclarece Maquiavel que “...
os homens só fazem o bem quando é necessário”.

A inaplicabilidade de projetos adjetivados como utópicos tinha, portanto dois fatores


complicadores: a natureza variável dos povos e a natureza humana inclinada para a maldade,
isso porque, para Maquiavel, os homens poderiam ser qualificados como: “... ingratos,
volúveis, simulados e dissimulados, [os homens] fogem aos perigos, são ávidos de ganhar e,
enquanto lhes fizerem bem, pertencem inteiramente a ti, te oferecem o sangue, o patrimônio,
a vida e os filhos (...) desde que o perigo esteja distante; mas, quando precisas deles,
revoltam-se”.
Seria então necessário que quem
estabelecesse a forma de um Estado e promulgasse
suas leis, partisse do princípio de que todos os
homens seriam maus, estando dispostos a agir com
perversidade sempre que houvesse ocasião.

É exatamente a perspectiva realista que


permite identificar o Homem em estado de egoísmo,
e não a idealista, que deposita imensa fé no Homem
que relegaria a sua própria felicidade plena em nome
do bem comum; que faz com que Maquiavel defenda
a tese de que o príncipe não deveria ser amado, mas
temido; se possível, poderia ser amado, mas seria
imprescindível que fosse temido.

Nesses termos, pensando a política, no


Roman slinger, ca. 66 AD, armed with a
contexto vivido por Maquiavel, é possível shorter sling and wearing a longer sling
compreender porque o príncipe deveria dedicar-se around his head
Slingers are often described as Peltasts, which is a
exclusivamente à guerra, principalmente em larger category that includes javelineers and
tempos de paz. Deveria dominar as estratégias e archers.
técnicas bélicas e estar sempre preparado para
qualquer contingência. Trata-se de um antigo princípio romano, expresso na locução latina
“Si vis pacem para bellum” (“Se queres a paz, prepara a guerra”), escrita pelo romano Publius
Flavius Vegetius Renatus na obra "Epitoma rei Militaris", escrito provavelmente no ano 390,
reafirmado por Maquiavel com o mesmo sentido.

A POLÍTICA COMO PODER, O PODER PELA FORÇA E A POLÍTICA


COMO ESTRATÉGIA DE PODER

Maquiavel não se limitou a uma análise superficial e subjetiva


sobre a conjuntura política pela qual atravessava Florença.
Passou a criticar severamente, sob vários aspectos, a invasão de
Carlos VIII – Rei da França – e posteriormente seu filho Luis XII,
à Itália, enumerando seus erros: “... aniquilou os menos
poderosos; introduziu ali [Itália] um estrangeiro poderosíssimo
[o papa Alexandre]; não veio habitar no lugar; não instalou
Charles VIII de France
2 avr 2004 à 16:19. Kelson (18475 colônias.” (p. 15)
octets)
source : http://www.heraldica.org/to
pics/france/rois_ic.htm
Defendia até mesmo o assassinato como
forma de permanência e obtenção do poder em “Não se pode propriamente chamar
um território conquistado, para os casos específicos de virtú o fato de assassinar seus
em que a monarquia tivesse sido o sistema de concidadãos, trair os amigos, não
governo anteriormente vigente. Isso se explica pelo ter fé, piedade nem religião. Deste
modo pode-se adquirir poder, mas
fato lógico de que a simples existência de não a glória”
descendentes de um monarca deposto
representaria ameaça ao poder do conquistador
que ali se estabeleceria. Sua estabilidade política dependeria, portanto, da aniquilação
daqueles que eventualmente poderiam reivindicar o trono e cooptar apoio popular para isso
apenas pelo fato de carregar o mesmo sangue que o monarca deposto. Vemos, então, que
Maquiavel reconhecia a existência de um poder natural legitimado pela hereditariedade, ou
uma “... natural afeição ...”, que pressupõe a garantia do amor do povo ao seu governante, a
exceção de vícios excepcionais que pudessem torná-lo odioso.

Admitia também a devastação completa de territórios conquistados, para os casos de


terem sido livres antes da conquista; pois acreditava que povos acostumados à república
(símbolo de liberdade ao tempo de Maquiavel) nunca se curvariam a um principado (uma
monarquia) sem se rebelar.

Apesar de defender a manutenção do poder mesmo com práticas de assassinato,


defendia também a ideia de que melhor seria se o povo visse no governante alguém justo, o
que resultaria em maior estabilidade de seu governo. Não que as medidas impopulares não
devessem ser tomadas! A questão é que qualquer medida impopular decidida pelo príncipe
deveria ser atribuída e executada a outra pessoa, designada em segredo pelo próprio
governante, o qual, após aplicar as medidas necessárias, seria executado pelo príncipe por tê-
las aplicado, a fim de garantir o prestígio e a admiração do povo, que teria no príncipe a
imagem do homem “justo”.

Maquiavel admitia desta forma a ascensão de um governante por meio de condutas


criminosas, atos vis e traições; porém atribuía a essas ações motivações diversas à fortuna ou à
virtú, afirmando que desta forma o governante alcançaria o poder, mas nunca alcançaria a
glória.

A glória, por sua vez, lhe garantiria estabilidade uma vez que os súditos, nutrindo
admiração por seu soberano, mais dificilmente se sublevariam. Por isso a necessidade de o
soberano, além de ser temido, também ser amado.

Sobre isso, Maquiavel demonstrou imensa preocupação. Defendeu que ao tomar posse
de um Estado, o governante deveria refletir longamente sobre todas as medidas impopulares
que deveria aplicar, e executá-las de uma só vez, de forma rápida, eficaz e implacável, a fim
de logo serem esquecidas. Já o bem, esse deveria ser ministrado em doses pequenas e diárias,
para que o povo tivesse sempre a sensação de que estava sendo feita justiça por parte do
governante.

De qualquer forma, o príncipe deveria ter como aliado o povo que governava,
exercendo sobre ele meios de manipulação. Isso porque o perigo real não seria o povo; mas
sim a nobreza, que uma vez declarada inimiga do governante teria a capacidade intelectual de
contra ele se articular, confabular e conspirar, até usurpar-lhe o poder. Seria, portanto,
essencial para o governante exercer meios de controle diversos sobre seu povo e outros mais
diretos sobre a nobreza.

Para a manutenção dos inimigos internos sob controle e as bases populares como
aliadas, Maquiavel considerava ainda questões relativas à defesa dos territórios conquistados,
defendendo que o exército não poderia ser constituído por estrangeiros mercenários. Atribuía
o momento pelo qual passavam os reinados italianos à delegação de exércitos estrangeiros
para a manutenção da soberania nacional, que fracassaram de forma retumbante. Na mesma
chave incluíam os exércitos aliados, utilizados em combate para defender uma pátria que não
era a sua. Para Maquiavel, o exército deveria ser essencialmente nacional.

SÍNTESE DO PENSAMENTO MAQUIAVELIANO

Temos então uma síntese do pensamento


maquiaveliano a partir da identificação, nos dois tratados
analisados, da seguinte premissa básica: a fortuna, ou seja,
as circunstâncias são complexas e mutáveis, e a natureza
humana maléfica. Para transformar as circunstâncias a seu
favor e, literalmente, fazer com que roda da fortuna gire a
seu favor, o príncipe deveria usar toda a sua astúcia para
identificar exatamente o momento de usar e de relegar a
virtú – que é a regra – para agir contra a fé e a caridade,
para que, conservando a paz (preparando-se sempre para a
guerra), o Governo pudesse enfim garantir o bem comum. Engraved Portrait Of Niccolo
Machiavelli
Título original: Engraved portrait of
Italian political philosopher Niccolo
Machiavelli (1469-1527), whose
principal work, " Il Principe" (1513),
details his theory of government and
offers advice for consolidating power.
French engraving by Fournier.
IMAGEM: © Bettmann/CORBIS
COLEÇÃO Bettmann
Material Complementar

Ainda sobre o tema “a lição dos clássicos (Maquiavel)”, indico os textos abaixo, a título
de leitura complementar:

ELIAS, Norbert. O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995

MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. São Paulo: Hemus, s/dMONTAIGNE,

Michel Eyquem de. Ensaios. São Paulo : Abril Cultural, 1984

MORE, Thomas. Utopia. São Paulo: Martin Claret, 2000.

VIANA, Alexandre Martins; “Estudo introdutório às 95 teses de Martinho Lutero”; Revista


Espaço Acadêmico; n. 34, mar/2004.

Indico ainda os filmes:

O sétimo selo; dir.: Ingmar Bergman; drama, Suécia, 1957. Lutero; dir.: Eric
Till; drama, Alemanha, 2003.
Referências

ELIAS, Norbert. O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995

MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. São Paulo: Hemus, s/d

MONTAIGNE, Michel Eyquem. Ensaios. São Paulo : Abril Cultural, 1984

MORE, Thomas. Utopia. São Paulo: Martin Claret, 2000.

VIANA, Alexandre Martins; “Estudo introdutório as 95 teses de Martinho Lutero”; Revista


Espaço Acadêmico; n. 34, mar/2004.
Anotações

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