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Editora da PUC-SP
Direção: Miguel Wady Chaia
Conselho Editorial
Ana Maria Rapassi
Cibele Isaac Saad Rodrigues
Dino Preti
Dirceu de Mello (Presidente)
Marcelo da Rocha
Marcelo Figueiredo
Maria do Carmo Guedes
Maria Eliza Mazzilli Pereira
Maura Pardini Bicudo Véras
Onésimo de Oliveira Cardoso
O CAPITAL ESCRAVISTA-MERCANTIL
E A ESCRAVIDÃO NAS AMÉRICAS
São Paulo
2010
Copyright © 2010, Julio Manuel Pires e Iraci del Nero da Costa. Foi feito o depósito legal.
O capital escravista-mercantil e a escravidão nas Américas / orgs. Julio Manuel Pires, Iraci
del Nero da Costa. - São Paulo : EDUC : FAPESP, 2010.
226 p. ; 23 cm.
Contém dados biográficos
ISBN 978-85-283-0417-6
Direção
Miguel Wady Chaia
Produção Editorial
Sonia Montone
Preparação e Revisão
Sonia Rangel
Editoração Eletrônica
Waldir Antonio Alves
William Martins
Capa
Dora Longo Bahia
Realização: William Martins
Secretário
Ronaldo Decicino
1. Introdução nn 7
Julio Manuel Pires
Iraci del Nero da Costa
2. O capital escravista-mercantil nn 13
Julio Manuel Pires
Iraci del Nero da Costa
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INTRODUÇÃO
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dizer, é preciso ir além dele, sem deixar de lado suas imensas contribui-
ções ao entendimento de nossa história socioeconômica; e isso terá de ser
realizado em três níveis: no metodológico, no teórico e no plano da reali-
dade concreta. É justamente à análise de proposições concernentes aos
três níveis acima referidos que vai dedicada a última parte do capítulo, em
que é trazida à discussão uma nova forma de capital, o capital escravista-
mercantil, à qual se deverá a base estrutural mestra da economia brasileira;
esboça-se, ademais, uma categorização alternativa à de Caio Prado quanto
a nossas atividades produtivas mais relevantes.
No capítulo subsequente, João Paulo A. de Souza propõe que a acei-
tação da existência do capital escravista-mercantil permite a superação
da dicotomia entre o modelo interpretativo do sentido da colonização,
proposto originalmente por Caio Prado Júnior, e o modelo do arcaísmo
como projeto, proposto por Fragoso e Florentino (2001). O primeiro, por
retratar a sociedade colonial como uma projeção imediata da expansão
comercial europeia, tem enfrentado dificuldades em acomodar as recentes
evidências empíricas de que a economia colonial podia apresentar uma
relativa autonomia, realizando acumulação endógena. O segundo, ao
tentar explicitamente acomodar essas evidências, acaba recusando a exis-
tência de um sentido da colonização tal como originalmente formulado.
Para explicitar a forma como o modelo do capital escravista-mercantil
supera esse dilema, é apresentada uma analogia entre o capital escravista-
mercantil e o desenvolvimento da teoria do valor de Marx em O Capital.
Apresenta-se, por fim, o estudo desenvolvido por Rodrigo Alves
Teixeira, no qual são perseguidos dois objetivos. Em primeiro lugar, discutir
as linhas principais da historiografia sobre o período colonial brasileiro da
perspectiva dos seus fundamentos metodológicos. Essa análise crítica da
historiografia parte de uma leitura de Marx que resgata a herança da dialé-
tica hegeliana na compreensão da concepção marxiana da História. Em
segundo lugar, a partir da defesa de um dos modelos propostos no debate
concernente à formação do mundo colonial, qual seja, o baseado na cate-
goria capital escravista-mercantil como uma particular forma do capital
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INTRODUÇÃO
Referências bibliográficas
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Julio Manuel Pires
Iraci del Nero da Costa
T
D – M – D’; D – D’ e D – M < ... P ... M’ – D’.
Mp
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A nosso ver, além das três acima arroladas, Marx sugeriu uma quarta
forma de existência do capital. Assim, ao tratar dos efeitos decorrentes do
desenvolvimento do comércio e do capital comercial, afirmou:
Por eso en los Estados norteamericanos del Sur el trabajo de los negros
conservó cierto suave carácter patriarcal mientras la producción se
circunscribía sustancialmente a las propias necesidades. Pero, tan pronto
como la exportación de algodón pasó a ser un resorte vital para aquellos
Estados, la explotación intensiva del negro se convirtió en factor de un
sistema calculado y calculador, llegando a darse casos de agotarse en siete
anos de trabajo la vida del trabajador. Ahora, ya no se trataba de arrancarle
una cierta cantidad de productos útiles. Ahora, todo giraba en torno a la
producción de plusvalia por la plusvalia misma. (1964, v. I, pp. 181-182)
1 Sobre o termo escravismo colonial, veja-se Gorender (1992, p. 157 ss). Diga-se, ademais,
que, embora não tomemos o escravismo colonial como um modo de produção, como o
fez Gorender, concordamos em larga medida com suas percucientes análises.
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aqui aventado. No que tange às áreas do mundo moderno nas quais se deu
a revivescência do escravismo, impõe-se restrição de ordem histórico-
lógica, pois agora a existência do capital escravista-mercantil viu-se condi-
cionada pela ampliação dos mercados mundiais ocorrida na fase final de
transição do feudalismo ao capitalismo. A emergência e o amadurecimento
desse modo de produção definem-se, pois, como o pano de fundo no qual
se deu o alargamento e a consolidação do capital escravista-mercantil
nos séculos XVI e seguintes. Por seu turno, o estabelecimento do capita-
lismo como modo de produção dominante na Europa ocidental acarretou
a subordinação daquela forma de existência do capital ao capitalismo. O
evolver deste último, vale dizer o processo de desenvolvimento do capital
industrial (que deitava raízes, como é próprio de sua natureza, em todo o
planeta) e da sociedade burguesa impõe, ademais, um limite absoluto ao
capital escravista-mercantil, o qual conheceu sua superação nos marcos e
como decorrência daquele desenvolvimento. Assim, para Marx, à medida
que o capital industrial
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no existieran otros estados libres con trabajo asalariado, todas las condiciones
sociales en los estados esclavistas asumirían formas precivilizadas. (Grifos de
Marx, 1980, p. 159)
Esto no excluye que dentro del sistema burgués de producción sea posible la
esclavitud en tal o cual punto. Pero la misma sólo es posible porque no existe
en otros puntos, y se presenta como una anomalía frente al sistema burgués
mismo. (Ibid, p. 425)
3 Com respeito a esse ponto também podemos contar com a esclarecedora interpre-
tação de Gorender: “O escravismo colonial só possibilita um mercado interno estreito,
pouco elástico, inadequado aos fins da produção mercantil, que tende à especialização.
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Mas esse problema estava de antemão resolvido, pois sua solução constituía uma das
premissas da criação da plantagem colonial. A produção desta última se escoaria no
mercado externo já existente e em ampliação, com uma demanda crescente de gêneros
tropicais – o mercado da Europa (grifo de Gorender, 1992, p. 163). Mais adiante, acres-
centa o autor: “Estavam criadas as condições objetivas para que o escravismo mercantil
assumisse a única forma em que pode se desenvolver com amplitude: a forma de escra-
vismo colonial, isto é, de um modo de produção dependente do mercado metropoli-
tano. [...] O escravismo colonial não comportava a mercantilização total, pois subsiste
nele um setor de economia natural, porém o comércio intensificado não exerce efeito
desagregador na sua estrutura. O escravismo colonial nasce e se desenvolve com o
mercado como sua atmosfera vital. A explicação já se contém no exposto acima: um
modo de produção baseado na escravidão é compatível com a finalidade mercantil se
estiver conjugado a um mercado externo apropriado. A existência prévia do mercado
externo constitui, portanto, premissa incondicional” (grifos de Gorender, 1992,
pp. 163-164).
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3. Um ponto a discutir
[...] nuestro método pone de manifiesto los puntos en los que tiene que
introducirse el análisis histórico, o en los cuales la economía burguesa como
mera forma histórica del proceso de producción apunta más allá de sí misma
a los precedentes modos de producción históricos. Para analizar las leyes de
la economía burguesa no es necesario, pues, escribir la historia real de las
relaciones de producción. Pero la correcta concepción y deducción de las
mismas, en cuanto relaciones originadas históricamente, conduce siempre
a primeras ecuaciones – como los números empíricos por ejemplo en las
ciencias naturales – que apuntan a un pasado que yace por detrás de este
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5. Capital escravista-mercantil:
pressupostos e resultados de sua ação
4 Deve-se notar que Caio Prado Júnior prendeu-se, sobretudo, à forma como a valori-
zação das novas terras aparece ao observador que a toma da perspectiva do comércio
externo, não levando em linha de conta a existência do capital escravista-mercantil, ao
qual, com base na exploração do trabalho escravo, cumpria, além da apropriação de
parcela substantiva da mesma, a própria criação da mais-valia.
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5 “Hasta en los Estados Unidos, después de que la zona intermedia entre los estados del
Norte, en que regía el sistema de trabajo asalariado, y los estados esclavistas del Sur,
se transformó en una zona de abastecimiento de esclavos, en que, por tanto, el esclavo
lanzado al mercado esclavista se convertía a su vez en elemento de la reproducción anual,
llegó un momento en que esto no bastaba y fue necesario recurrir por el mayor tiempo
posible a la trata de esclavos africanos para tener el mercado abastecido” (Marx, 1964,
v. II, p. 426).
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D2
D < Me
D1 — M < ... P ... M’ — D’
Mp
Em que:
D = capital-dinheiro.
D1 = gastos na compra de mercadorias.
D2 = gastos de aquisição do plantel.6
M = capital-mercadorias.
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Sendo:
M = Me + Mp
D = D1 + D2
D’ = D1 + d
d = D2 + L sendo: d = mais-valia.
L = lucro do escravista, líquido do gasto de aquisição do plantel.8
Donde:
D’ = D1 + D2 + L
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D2
D < Me
D1 — M <
Mp
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7. Considerações finais
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Referências bibliográficas
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3. CAUSAS IMEDIATAS DA SUPERAÇÃO
DO CAPITAL ESCRAVISTA-MERCANTIL
Julio Manuel Pires
Iraci del Nero da Costa
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CAUSAS IMEDIATAS DA SUPERAÇÃO DO CAPITAL ESCRAVISTA-MERCANTIL
1 “Hasta en los Estados Unidos, después de que la zona intermedia entre los estados del
Norte, en que regía el sistema de trabajo asalariado, y los estados esclavistas del Sur,
se transformó en una zona de abastecimiento de esclavos, en que, por tanto, el esclavo
lanzado al mercado esclavista se convertía a su vez en elemento de la reproducción anual,
llegó un momento en que esto no bastaba y fue necesario recurrir por el mayor tiempo
posible a la trata de esclavos africanos para tener el mercado abastecido”. Marx (1964,
p. 426).
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2 Tal tentativa viu-se frustrada pela reação desfavorável das potências europeias e dos
Estados Unidos à nova nação. Segundo Craton, “esse novo e orgulhoso país e sua
economia foram imediatamente marginalizados, tanto pelo espírito independente dos
próprios haitianos quanto pela calculada indiferença ou o antagonismo ativo, baseado
na paranoia racista das principais potências, inclusive os Estados Unidos” (1995, p. 32).
3 “Ao longo do século XIX, o Haiti teve a mais baixa porcentagem de trabalhadores sem
terra entre todas as ilhas das Antilhas”. Foner (1988, p. 30).
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4 Nas colônias britânicas espalhadas por todo o mundo, algo em torno de 700.000
pessoas foram libertadas, 311.000 só na Jamaica e 83.000 em Barbados.
5 No mesmo sentido, Craton afirma “resultasse ou não da frequentemente alegada
tendência nacional britânica no sentido da mudança evolutiva, em vez da revolucio-
nária, e de uma concomitante facilidade de adaptação pragmática, o processo nas
Índias Ocidentais Britânicas demonstrou aspectos de um ‘continuum’, com antecipa-
ções e sobrevivências de cada lado da emancipação formal dos escravos, em lugar de
fases profundamente marcadas e mudanças abruptas” (1995, p. 33).
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7 O eixo fundamental da análise seguinte baseia-se em Moore Jr. (1975, pp. 141-189).
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estados quanto à escravidão. Tal solução, entretanto, parece não ter sido
satisfatória, pois o problema da escravatura nos territórios desempenhou
papel crucial para conduzir à guerra.
Tratava-se, dentre outras questões, de definir a que interesses/conve-
niências o Governo Central iria se colocar à disposição.
9 Para maiores detalhes a respeito dos republicanos radicais e suas políticas durante o
período da “Reconstrução” e sua derrota para o Partido Democrata com a “Redenção”,
veja-se Foner (1988), especialmente pp. 73-176, e Moore Jr. (1975, pp. 183-189).
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10 “A Espanha havia prometido aos britânicos desde 1817 abolir o tráfico de escravos, e
em 1835 permitiu que seus navios fossem revistados e julgados os traficantes espanhóis
por autoridades britânicas” (Cardoso e Brignoli, 1983, p. 151).
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The environment of the 1870s, with the legal provision for the eventual end
of slavery and the outbreak of rebellion in the east, encouraged some slaves to
press for whatever concessions they could obtain. In doing so they made use of
old techniques as well as new. (Scott, 1985, p. 74)
[...] em 1879 o governo espanhol preparou uma lei abolicionista final, posta
em vigor no dia 29 de julho de 1880. Ela decidia a abolição total, mas esten-
dia o patronato a todos os novos libertos, em lugar de uma indenização
pecuniária aos proprietários. Tal patronato terminaria em 1888. (Ibid.,
p. 153)
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11 “They [os casos levados perante as Juntas] show the inadequacy of conceptualizing slave
and patrocinado behavior in terms of ‘accomodation’ or ‘resistance’, and the necessity of
analyzing that behavior in terms that reflect the complexity of patrocinados’ goals and
strategies” (Scott, 1985, p. 141).
12 “O artigo 4 da lei de 1880 enumerava as obrigações do patrono: manter seus patro-
cinados, vesti-los, dar assistência aos doentes, pagar o estipêndio mensal estipulado,
educar os menores, alimentar, vestir e dar assistência quando doentes aos filhos de seus
patrocinados” (Scott, 1987, p. 473).
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Chile, Suécia e Holanda. A extinção do tráfico por parte da Espanha demorou mais a
efetivar-se, em virtude da sensibilidade da corte espanhola aos interesses econômicos
dos proprietários de escravos, sobretudo cubanos e porto-riquenhos. Para maiores
detalhes, vide Saco (1965, pp. 213-229).
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14 Posição semelhante a essa pode ser encontrada no estudo de Slenes (1986), o qual, no
entanto, discorda da tese que associa a postura antiabolicionista dos produtores do
Vale do Paraíba a uma mentalidade pré-capitalista ou ao domínio do capital comercial
sobre o processo produtivo. Esse autor procura demonstrar que os fazendeiros dessa
região comportavam-se segundo os mesmos padrões de racionalidade de seus colegas
do oeste paulista, apenas “se enganaram na década de 1870 na sua percepção da estabi-
lidade futura da escravidão como instituição” (p. 142), sofrendo as consequências desse
erro nos anos seguintes.
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8. Considerações finais
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4. SOBRE A NÃO EXISTÊNCIA
DE MODOS DE PRODUÇÃO COLONIAIS
Iraci del Nero da Costa
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3 Interessa, aqui, ressaltar o sentido de alguns dos termos que estamos a utilizar: a) o
capital é o sujeito desse processo; b) como observado acima, esse processo é correlato
ao estabelecimento (efetivação) do modo de produção capitalista na Europa ocidental;
o escravismo moderno resolve-se no capitalismo, ou seja, no estabelecimento das rela-
ções de produção capitalistas; essa resolução, que é a culminância daquele processo,
dá-se segundo processos históricos concretos, vale dizer, embora seja determinada
pelo capital e pelo modo de produção capitalista, seus condicionantes imediatos são de
variada ordem: econômicos, políticos, religiosos, formação de massa crítica de popu-
lação, luta dos próprios escravos, compensações políticas e/ou econômicas entre nações
ou entre nações e suas áreas de influência, disponibilidade para emigração de popu-
lações excedentes, solidariedade com os cativos (baseada no humanitarismo) a qual
também tem dimensões políticas, etc.
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SOBRE A NÃO EXISTÊNCIA DE MODOS DE PRODUÇÃO COLONIAIS
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5. A FORMAÇÃO DAS ECONOMIAS PERIFÉRICAS
SOB A ÓTICA DA HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL
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A FORMAÇÃO DAS ECONOMIAS PERIFÉRICAS SOB A ÓTICA DA HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL
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A FORMAÇÃO DAS ECONOMIAS PERIFÉRICAS SOB A ÓTICA DA HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL
(4) Nessas áreas não se definiram novos modos de produção, pois elas
conheceram um longo período de transição que culminou – (5) dado o
próprio amadurecimento da sociedade burguesa em escala local e mundial –
com a superação, (6) sem a necessidade de “revoluções burguesas”, do
escravismo. Tais áreas periféricas mostraram-se (7) estritamente depen-
dentes das economias centrais, sem a existência das quais não poderiam
se reproduzir; não obstante, (8) elas conheceram uma autonomia relativa
na medida em que nelas se desenvolveram atividades econômicas voltadas
para seus mercados internos; (9) assim, nem eram totalmente autônomas,
nem se comportaram como meros apêndices das economias e sociedades
centrais. Impõem-se, assim, duas conclusões maiores: (10) a história
econômica deve considerar o estudo da gênese e amadurecimento do capi-
talismo como um todo orgânico do qual faz parte a emergência de áreas
periféricas como as situadas no Novo Mundo, incluindo-se aí, obviamente,
o estudo da formação econômica e social do Brasil; ademais, na medida
em que na periferia não se estabeleceram novos modos de produção,
(11) seu estudo tem de se pautar pela compreensão dos processos histó-
ricos concretos mediante os quais tais áreas foram incorporadas à
economia mundial.
Referência bibliográfica
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6. ALGUMAS OPINIÕES SOBRE A CATEGORIA
“MODO DE PRODUÇÃO”
Iraci del Nero da Costa
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ALGUMAS OPINIÕES SOBRE A CATEGORIA “MODO DE PRODUÇÃO”
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ALGUMAS OPINIÕES SOBRE A CATEGORIA “MODO DE PRODUÇÃO”
E mais:
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Cumpre notar, por fim, que, a meu juízo, “tal solidariedade só será
superada quando o for o próprio capitalismo” porque
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ALGUMAS OPINIÕES SOBRE A CATEGORIA “MODO DE PRODUÇÃO”
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ALGUMAS OPINIÕES SOBRE A CATEGORIA “MODO DE PRODUÇÃO”
Referências bibliográficas
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7. REPENSANDO O MODELO INTERPRETATIVO
DE CAIO PRADO JÚNIOR
Iraci del Nero da Costa1
1. Introdução
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a grande massa da população que lhe serve de mão de obra. Doutro lado,
no funcionamento, um fornecedor do comércio internacional dos gêneros
que este reclama e de que ela dispõe. Finalmente, na sua evolução, e como
consequência daquelas feições, a exploração extensiva e simplesmente
especuladora, instável no tempo e no espaço, dos recursos naturais do país.
(Ibid., p. 129)
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REPENSANDO O MODELO INTERPRETATIVO DE CAIO PRADO JÚNIOR
2 Como sabido, muitos autores coevos legaram-nos depoimentos sobre essas questões;
escusamo-nos, portanto, de reproduzi-los aqui. Assim, recordando que suas opiniões
marcaram-se, quase sempre, pelo eurocentrismo e por claras perspectivas ideológicas,
cingimo-nos, tão somente, à transcrição de uma ilustrativa passagem das impressões
deixadas pelo português Augusto Emílio Zaluar, que percorreu o território paulista
em 1861, e na qual, certamente industriado por um morador local, contrapôs as
mentalidades ora referidas: “À exceção das pessoas mais ilustradas, dos fazendeiros e
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REPENSANDO O MODELO INTERPRETATIVO DE CAIO PRADO JÚNIOR
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No ambiente asfixiante da grande lavoura, vimo-lo noutro capítulo, não sobra lugar
para outras atividades de vulto. O que não é produção em larga escala de alguns
gêneros de grande expressão comercial e destinados à exportação, é fatalmente rele-
gado a um segundo plano mesquinho e miserável. Não oferece, e não pode oferecer
campo para atividades remuneradoras e de nível elevado. E assim, todo aquele que
se conserva fora daquele estreito círculo traçado pela grande lavoura, e são quase
todos além do senhor e seu escravo, não encontra pela frente perspectiva alguma.
(...) Um último fator, finalmente, traz a sua contribuição, e contribuição apreciável
de resíduos sociais e inaproveitáveis. É a instabilidade que caracteriza a economia e
a produção brasileiras e não lhes permite nunca assentarem-se sólida e permanente-
mente em bases seguras. Em capítulo anterior já assinalei esta evolução por arrancos,
por ciclos em que se alternam, no tempo e no espaço, prosperidade e ruína, e que
resume a história econômica do Brasil Colônia. As repercussões sociais de uma tal
história foram nefastas: em cada fase descendente, desfaz-se um pedaço da estrutura
colonial, desagrega-se a parte da sociedade atingida pela crise. Um número mais ou
menos avultado de indivíduos inutiliza-se, perde suas raízes e base vital de subsistência.
Passará então a vegetar à margem da ordem social” (Prado Júnior, 1987, pp. 285-286).
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4 Como avançado, na própria obra de Caio Prado Júnior encontramos muitas referências
a tal possibilidade, a qual também se viu fartamente documentada por autores coevos.
Apenas a título ilustrativo reproduzimos, pois, dois destes relatos: “Ninguém aqui,
disse-me o comandante, quer ganhar dinheiro para trabalhar, por pouco que seja, de
um modo constante. Os fazendeiros, que possuem todos grandes extensões de terra,
deixam os pobres cultivá-las na quantidade que quiserem; com muito pouco trabalho
estes últimos estão certos de ganhar o bastante para viver durante um ano, e preferem
repousar a gozar de bem-estar devido a alguns suores” (Saint-Hilaire, 1937, p. 163).
“O único recurso que ao pobre cabe é pedir, ao que possui léguas de terra, a permissão
de arrotear um pedaço de chão. Raramente lhe é recusada tal licença, mas como pode
ser cassada de um momento para outro, por capricho ou interesse, os que cultivam
terreno alheio e chamam-se agregados, só plantam grãos cuja colheita pode ser feita
em poucos meses, tais como o milho e o feijão. Não fazem plantações que só deem ao
cabo de longo tempo como o café” (Saint-Hilaire, 1974, p. 24). “Conseguem-se terras
tanto por doação como por compra e, como as distribuem baseados só no mapa, sem
qualquer medição no terreno, não admira que surjam contestações e confusões com
respeito às divisas. A fim de esclarecer e confirmar suas pretensões, há muitos proprie-
tários que instalam ao redor de suas fronteiras certo número de pequenos sitiantes a
que chamam de “moradores”; estes pagam um pequeno foro, buscam seu sustento prin-
cipalmente pelo cultivo de verduras e preenchem as importantes funções de vigias,
impedindo invasão por parte dos proprietários e furtos de madeira. São geralmente
gente bronca, que tem família, por vezes um ou dois escravos, e muito acrescem à
população local; amam contudo a independência e raramente permanecem depois que
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8 Anote-se, a este respeito, a afirmação: “Por ‘brecha’ não entendemos, de forma alguma,
um elemento que pusesse em perigo, mudasse drasticamente ou diminuísse o sistema
escravista. A analogia com uma brecha na muralha de uma fortaleza assediada seria
algo totalmente equivocado. O que queremos significar – e cremos que também
Lepkowski, ao criar a expressão – é uma brecha para o escravo, como se diria hoje ‘um
espaço’, situado sem dúvida dentro do sistema, mas abrindo possibilidades inéditas para
atividades autônomas dos cativos” (Cardoso, 1987, pp. 121-122). Autonomia essa com
a qual concordamos desde que vista em termos relativos e como parte integrante do
sistema escravista (ou do chamado “sistema do Brasil”), ao qual, ademais, também não
era estranha, como sabiamente postulado por Aristóteles para o escravismo antigo, a
própria possibilidade da alforria: “Todo esclavo debe tener ante los ojos una meta definida
o un término exacto de su trabajo. Colocar ante él el premio de la libertad es algo justo
y conducente, porque teniendo por delante el premio asignado a su trabajo y conociendo
el tiempo necesario para su consecución, el esclavo se entregará de todo corazón a su
trabajo” (Aristóteles, 1964, p. 1.382)
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Estas suas roças, e o produto que delas tiram, fazem-lhes adquirir certo
amor ao país, distrair um pouco da escravidão, e entreter-se com esse seu
pequeno direito de propriedade. Sem dúvida, o fazendeiro enche-se de
certa satisfação quando vê chegar o seu escravo da sua roça trazendo o
seu cacho de bananas, o cará, a cana, etc. (Werneck, Francisco Peixoto de
Lacerda [Barão de Pati do Alferes] apud Gorender, 1978, p. 263)
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rada, por um lado, como uma das causas explicativas do vigor e resistência
do escravismo entre nós, e, por outro, do tardio advento da abolição defi-
nitiva da escravidão no Brasil.
A conclusão maior que se impõe das considerações acima postas é
imediata: todas as condições aqui reportadas, em maior ou menor escala,
operaram, sempre, no sentido de afirmar e dar maior solidez ao escravismo
e podem ser colocadas entre os fatores explicativos da grande resistência
demonstrada por essa instituição e de sua prolongada persistência entre
nós. Nada mais errôneo, pois, do que tomá-las como capazes de descarac-
terizar ou “arranhar” as relações escravistas então vigentes. Elas não podem
ser arroladas, portanto, entre as causas da superação do trabalho escravo
no Brasil, fato esse que, não obstante, não as impediu de sobreviverem ao
sistema escravista e de contribuírem, dada a supressão do escravismo, para
o estabelecimento e afirmação das relações de produção emergentes.
Ora, a sociedade escravista moderna (intrinsecamente dependente
dos mercados mundiais, como evidenciaremos adiante em tópico dedicado
ao capital escravista-mercantil) é a própria encarnação da dependência
com respeito ao mundo exterior, seja quanto à colocação de parcela subs-
tantiva do produto gerado, seja no respeitante à sua própria manutenção
no tempo, pois necessitava, crucialmente, do fornecimento externo de mão
de obra cativa. Assim, aceita a ideia de que os elementos avocados para
desqualificar o modelo de Caio Prado Júnior atuaram, sempre, de sorte a
reafirmar o escravismo, vemo-nos em face de uma aparente contradição:
se, num primeiro lapso, nossos argumentos contradizem o modelo em tela,
num segundo passo trabalham a favor da tese central do mesmo modelo. É
forçoso, portanto, enfrentarmos essa contradição aparente; ademais, de seu
esclarecimento emergirá não só a solução para o impasse no qual estamos
enleados, mas, também, para as demais questões que ensejaram a redação
destas notas. Partamos, pois, do modelo em foco.
Qual seria a grave limitação do modelo interpretativo de Caio Prado
Júnior? Onde estaria seu “erro”, como perguntariam alguns? A nosso juízo, tal
limitação deveu-se ao fato de ele haver transposto para o plano fenomênico,
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11 Neste tópico apresentamos uma versão sumária de alguns pontos centrais de trabalhos
nos quais a categoria capital escravista-mercantil viu-se tratada de maneira mais larga
e pormenorizada, a eles remetemos o leitor interessado nessa análise: Pires e Costa
(1994); Costa e Pires (1994, 1995, 2000).
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8. ENTRE O SENTIDO DA COLONIZAÇÃO E
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DE UM DILEMA ATRAVÉS DO CONCEITO
DE CAPITAL ESCRAVISTA-MERCANTIL
João Paulo A. de Souza1
1. Introdução
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2. O paradigma pradiano
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por sua vez, eram por ele consideradas unidades autárquicas, em grande
medida autossuficientes. No clássico Formação Econômica do Brasil,
Furtado (1961), que partilhava do paradigma pradiano, atribui um
caráter funcional mais importante ao setor não exportador. Segundo o
autor, em momentos de conjuntura econômica externa favorável, haveria
expansão do setor exportador e concentração de seus recursos produtivos
na produção dos bens exportáveis. Esse movimento seria acompanhado
do aumento do mercado interno voltado ao fornecimento de gêneros de
consumo a esse setor exportador, havendo, inclusive, aumento do grau
de monetização das trocas. Por outro lado, em momentos de crise, as
unidades exportadoras voltariam a empregar seus fatores, agora ociosos,
na produção autárquica de bens de consumo e, por conseguinte, haveria
regressão do mercado interno para atividades de subsistência de baixa
monetização. Esse movimento pendular emprestava resiliência ao sistema
em épocas de crise, impedindo que estas ensejassem mudanças estruturais
mais amplas.
Os dois casos acima exemplificam a operação da heurística posi-
tiva. Neles, Novais e Furtado propuseram hipóteses ora para desenvolver
proposições que não haviam sido objeto de um detalhamento na obra de
Caio Prado – por exemplo, Furtado dá um caráter funcional ao setor não
exportador antes apenas vislumbrado –, ora para propor uma explicação
alternativa para uma de suas proposições nucleares – como foi o caso de
Novais. Em ambos os casos, pode-se dizer que o objeto das proposições
foi o cinto protetor do programa. Similarmente, em nenhum deles foi dito
algo que pudesse comprometer seriamente o núcleo – vale dizer que, para
Furtado, o desenvolvimento do setor interno acompanharia as flutuações
do setor exportador, não se conferindo um grau de autonomia significativo
àquele.
Quais seriam, por fim, as heurísticas negativas ligadas ao Sentido da
Colonização? Em termos gerais, pode-se dizer que os caminhos que nele
não se acomodam e que, em última instância, poderiam ser-lhe nocivos,
são, por exemplo, pesquisas que demonstrem a existência de um mercado
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3. Evidências empíricas
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5 Mariutti et alii (2001) apresentam algumas críticas relevantes à forma como Fragoso
e Florentino interpretam os dados apresentados como evidência da autonomia da
economia colonial ante as flutuações externas. A propósito dos dados relativos aos
preços dos bens exportados, critica-se o fato de os autores do Arcaísmo haverem usado
médias anuais para representar um período de elevada variância na série de preços. Essa
variância, mostram eles, provocou períodos de significativa recuperação nos preços
no interior da série analisada, o que poderia ter induzido os fazendeiros a investirem.
Além disso, os autores destacam a vinda da corte portuguesa para o Rio em 1808 como
um poderoso fator exógeno de dinamização da economia da região. Embora concor-
demos com essa última observação, que nos obriga a matizar o entusiasmo de Fragoso
e Florentino, a suposição de que os fazendeiros não tenham podido dar-se conta da
tendência de queda nos preços em um período de mais de dez anos, sendo confundidos
por sua variância, parece restringir demasiadamente a racionalidade daqueles enquanto
investidores.
6 Na primeira versão do Arcaísmo, datada de 1993, Fragoso e Florentino estendem o
poder explicativo de suas pesquisas, que tratam do final do século XVIII e da primeira
metade do século XIX, para todo o período colonial. Esse procedimento recebeu
críticas de diversos autores, entre eles Mariutti et alii (2001). Como resultado, na
segunda edição do Arcaísmo, lançada em 2001, Fragoso e Florentino restringem sua
análise ao período coberto por suas pesquisas, que chamam de economia colonial
tardia, correspondente ao período de consolidação das formas mercantis de acumu-
lação e de hegemonia do capital mercantil residente.
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exterior com a metrópole para que esta, então, pudesse ser superavi-
tária com o resto do mundo, através da revenda dos produtos coloniais.
Entretanto, na passagem do século XVIII para o XIX, o Brasil registrou
um déficit comercial bilateral com Portugal. De acordo com Fragoso e
Florentino, tal situação foi sustentável durante o período porque havia
um mercado interno de reexportação de bens a partir do porto do Rio de
Janeiro para outras capitanias e mesmo para outras localidades do império
ultramarino português. Esse mercado, dizem os autores, era relativamente
infenso às conjunturas internacionais e, ademais, realizava boa parte de
suas transações em moeda metálica, permitindo a cobertura do déficit sem
restringir o crescimento da demanda agregada interna.
Por fim, outro corolário da relativa autonomia da economia colonial
é o chamado “paradoxo de Minas”: o fato de que Minas Gerais possuía
o maior contingente de escravos do Brasil à época da abolição, mesmo
depois da decadência da mineração. Como se sabe, a elevada razão de
masculinidade de alguns dos plantéis da região desautoriza uma interpre-
tação baseada apenas no crescimento vegetativo da população escrava –
a qual, aliás, em si, não é suficiente para explicar sua manutenção em
uma região já menos integrada ao fluxo exportador. Fragoso e Florentino,
então, atribuem tal fato à rentabilidade das empresas da região, voltadas,
em grande parte, ao abastecimento do mercado interno.7
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4. Um dilema na historiografia?
Como vimos no início deste artigo, nos anos 40, a ideia de que a
colonização da América tropical, e do Brasil em particular, foi realizada
segundo móveis alheios ao desenvolvimento das sociedades que original-
mente habitavam esses territórios, surgiu como chave explicativa destinada
a dar conta dos determinantes essenciais da evolução dessas sociedades. Os
autores que, com maior ou menor entusiasmo, a adotam, seja identificando
o sentido dessa evolução na expansão do capital mercantil europeu, como
faz Caio Prado, seja no processo de acumulação primitiva que resultaria no
capitalismo industrial nas economias centrais, como faz Fernando Novais,
ou seja ainda na instauração do modo de produção capitalista nas áreas
ainda não sujeitas a ele, como faz Iraci Costa, o fazem por uma importante
razão. Eles creem que, sem o entendimento dessa determinação essencial,
a análise da evolução dessas sociedades tende necessariamente a ficar presa
à superfície dos fenômenos, tal como a descrição da sucessão de ciclos por
Simonsen, contra a qual se voltou a crítica de Caio Prado.
De forma propositalmente simplificada, podemos expressar o
projeto desses autores como uma opção pela essência, sem a qual a
compreensão da aparência fenomenal de nossa sociedade ficaria seria-
mente comprometida.
Por outro lado, vimos que esses fenômenos, expressos na literatura
empírica aqui apenas breve e incompletamente exposta, muitas vezes não
se acomodam bem nas proposições e heurísticas derivadas do Sentido da
Colonização. Em alguns casos, as evidências mostradas, especialmente
aquelas que atestam um grau não desprezível de autonomia das flutuações
coloniais, parecem pertencer à heurística negativa do paradigma pradiano,
contradizendo algumas de suas proposições fundamentais.
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8 Iraci Costa, como veremos, posiciona-se de maneira diferente em face desse dilema.
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9 A título de exemplo, tomemos Luna (1981), que estuda localidades de Minas Gerais
em diversas épocas do século XVIII. A atividade mineira, caracterizada por um grau
elevado de mobilidade social ante outras atividades econômicas da época, podia gerar
situações como a da Comarca do Serro do Frio, que em 1738 registrava os ex-cativos
como perfazendo 22,2% dos proprietários de escravos.
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[...] como conciliar esse dado [a convergência da taxa de lucro para a taxa
média], que é ao mesmo tempo uma espécie de exigência da racionalidade
do sistema, com a lei do valor, a qual estabelece a necessidade de equivalên-
cia dos tempos de trabalho no intercâmbio das mercadorias? (1983, p. 116)
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a acreditar que há uma contradição entre a lei do valor, tal como exposta
por Marx até a dita seção do volume III, e resposta dada pelo autor para
garantir a aderência de sua teoria à realidade fenomenal do capitalismo.
Com efeito, além de deixar de ser a regra de troca entre distintas mercado-
rias, a lei do valor, que determinava ser o trabalho a única fonte do valor e
da mais-valia, parece enfrentar problemas no momento em que se permite
que uma unidade produtiva que mobilize mais capital variável obtenha o
mesmo lucro que outra unidade cujo capital total tenha a mesma magni-
tude, mas que utilize proporcionalmente menos capital variável. Marx
expressa essa mesma perplexidade:
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11 Cumpre lembrar que o projeto inicial dos marginalistas, de derivar os preços a partir
das preferências dos agentes, esbarra em alguns problemas. Em particular, ele não
resolve o problema da circularidade da determinação de preços a partir de preços, visto
que, nas taxas marginais de substituição dos agentes, indicadoras de suas preferências,
já estão embutidos os preços relativos dos bens. A esse respeito, e com relação às dife-
renças entre a abordagem clássico-marxiana e a neoclássica no que diz respeito à deter-
minação dos preços de mercado, veja-se Prado (2005, 2006).
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objeto estudado são tais que, para dizê-lo, devemos dizer o seu contrário.
Assim, diríamos: O Sentido (pressuposto) é a Economia Autônoma (posta),
a Elite Colonial Residente (posta).
Com efeito, num juízo de reflexão como esse, em que o sujeito está
pressuposto, o predicado nega o sujeito. Ao dizer o que é o Sentido, somos
obrigados a dizer o seu contrário – a economia autônoma, o mercado
interno, etc. Entretanto, essa negação dialética não o expulsa do discurso,
pois, do contrário, seríamos conduzidos a um juízo convencionalista.
Por um lado, o uso do juízo de reflexão permite-nos guardar os
fenômenos apresentados pelas evidências empíricas, pois eles são necessa-
riamente ditos quando buscamos exprimir o Sentido. Por outro lado, esse
juízo permite-nos guardar a essência de nossa evolução, pois é dizendo o
seu contrário que contamos como o Sentido afinal se realiza. A resposta
dialética, como se vê, supera o dilema da historiografia, preservando tanto
a essência como a aparência, vale dizer, tanto os fatos como a chave para a
sua compreensão.15
No plano histórico mais propriamente dito, foi o capital escravista-
mercantil – uma forma evanescente16 do capital – o elemento que, no
período que vai dos descobrimentos até a abolição, realizou, em porções
da América tropical, a negação concreta do Sentido para enfim realizá-lo.
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8. Conclusão
17 Neste artigo, não tratamos, propositalmente, das críticas que, no final dos anos 60 e nos
anos 70, foram dirigidas ao modelo de Caio Prado Jr. Propostas especialmente por Ciro
Flamarion Cardoso (1975a, 1975b e 1975c), Jacob Gorender (1992) e Antonio Barros
de Castro (1977, 1980, 1984), essas críticas foram realizadas antes do boom da historio-
grafia monográfica, tendo em comum o fato de serem críticas de caráter mais propria-
mente teórico. Embora uma análise detalhada de suas valiosas contribuições esteja fora
do escopo deste artigo, o que nos impede de fazer-lhes justiça, podemos dizer que o
sentido geral dessas críticas foi de retirar o foco analítico das articulações da economia
colonial com a economia internacional – como teria feito, segundo eles, a abordagem
circulacionista dos autores do paradigma pradiano – para então voltá-lo “para dentro”,
ou seja, para a forma como a produção e o trabalho eram realizados na colônia. À guisa
de balanço final, podemos dizer que essas críticas, embora tenham tido o mérito de
evitar uma radicalização das posições e, portanto, de evitar conduzir o debate a um
vicioso dilema tal como exposto aqui, ficaram no geral aquém de uma lógica da contra-
dição. Por exemplo, Barros de Castro, embora afirme que o “projeto colonial e/ou
mercantilista subsiste”, diz que “o ‘objetivo’ maior dessa realidade – o seu ‘sentido se
se quiser – lhe é agora inerente: atender as suas múltiplas necessidades, garantir sua
reprodução” (Castro, 1980, pp. 88-89). O autor, embora recuse derivar imediatamente
as consequências do “projeto colonial ou mercantilista”, levando em conta a interpo-
sição da estrutura interna no caminho dos interesses externos, não menciona explicita-
mente a lógica que permitiria a estes últimos se realizarem através dessa interposição.
Já Cardoso e Gorender, buscando uma alteração de enfoque similar, propõem que nas
colônias haveria a vigência de modos de produção específicos, diferentes do modo de
produção das economias centrais. Com isso, seria possível estudar as especificidades
internas dessas economias, evitando-se a subordinação de suas relações de produção
à esfera da circulação internacional de mercadorias. Entretanto, o “fato colonial”, nas
palavras de Cardoso (1975b), é preservado, fazendo com que esses modos de produção
tenham um caráter dependente, ou seja, eles não garantem sua reprodução autônoma,
dependendo dos mercados externos. O uso do conceito de modo de produção colonial
pelos autores não conduz, a nosso ver, a uma resposta adequada para a necessidade de
utilizar a lógica da contradição da forma como propomos aqui. Para uma crítica do uso
do conceito de modo de produção colonial, ver Costa (1985).
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SCHWARTZ, Stuart B. (1983). Segredos internos: trabalho escravo e vida escrava
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153
9. CAPITAL E COLONIZAÇÃO:
A CONSTITUIÇÃO DA PERIFERIA
DO SISTEMA CAPITALISTA MUNDIAL1
Rodrigo Alves Teixeira
1. Introdução
1 Uma primeira versão deste texto foi apresentada no encontro da ANPEC de 2005,
em Natal-RN. Naquela versão, ativemo-nos às questões metodológicas. Aqui, apro-
fundamos aquelas discussões em alguns pontos, em particular na apresentação da
concepção dialética das significações – para o que nos apoiamos em Fausto (1987
e 1988) e suas implicações para a leitura da concepção marxiana da História. Além
da discussão metodológica, acrescentamos uma discussão sobre o desenvolvimento
do capitalismo enquanto um sistema mundial e sobre o lugar da colonização nesse
processo, para embasar a crítica ao uso das categorias modo de produção e formação
econômico-social na interpretação de nosso período colonial. Este artigo foi desenvol-
vido a partir das discussões suscitadas na disciplina “Formação Econômica e Social do
Brasil: Modelos Interpretativos”, ministrada no Instituto de Pesquisas Econômicas da
USP pelo professor Nelson Nozoe no primeiro semestre de 2003, disciplina essa que foi
concebida no bojo do NEHD (Núcleo de Estudos em História Demográfica da FEA/
USP). Agradeço aos demais colegas do curso pelas excelentes e instigantes discussões e
aos professores Nelson Nozoe, José Flávio Motta e Iraci Costa, com os quais tive a opor-
tunidade de discutir uma versão preliminar deste texto. Os erros e imprecisões que aqui
permanecerem são de minha responsabilidade.
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Todo povo tem na sua evolução, vista à distância, um certo “sentido”. Este
se percebe não nos pormenores da sua história, mas no conjunto dos
fatos e acontecimentos essenciais que a constituem num longo período de
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3 Ao falar de pormenores aqui, parece-nos que Caio Prado Júnior esteja falando dos acon-
tecimentos empíricos isolados, ou seja, da história factual. No caso da nossa história
colonial, são, por exemplo, os sucessivos “ciclos” de produtos de exportação, descritos
por Roberto Simonsen, fenômenos isolados aos quais Caio Prado Júnior busca dar uma
significação teórica, ou seja, encontrar a essência que os move. Também podem ser
vistos como pormenores os elementos presentes na sociedade colonial que não estavam
diretamente relacionados ao sentido da colonização, mas eram subsidiários a ele, como
o mercado interno da colônia e seus elementos constituintes. Fazendo parte da “geração
de 30”, ao lado de Sérgio Buarque de Hollanda e Gilberto Freyre (como destaca Antônio
Candido no seu prefácio ao Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Hollanda), Caio
Prado participa assim da revolução de nossa historiografia que busca romper com a
história factual para engajar-se na formulação de teorias, ou seja, de modelos interpre-
tativos que buscam explicar os fatos isolados em seu conjunto, identificando a lógica
que os une.
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4 Marx alerta para este erro de considerar a história de forma teleológica, como uma
sucessão de etapas predeterminadas, na passagem seguinte: “O chamado desenvolvi-
mento histórico repousa em geral sobre o fato de a última forma considerar as formas
passadas como etapas que levam a seu próprio grau de desenvolvimento, e dado que
ela raramente é capaz de fazer a sua própria crítica, e isso em condições bem determi-
nadas – concebe-as sempre sob um aspecto unilateral” (1978, p. 120). Além do risco de
teleologia, Marx aponta também para outro problema, presente nos economistas polí-
ticos, de partirem dos conceitos da sociedade capitalista e ignorarem as diferenças com
relação às demais sociedades passadas, ou seja, ignorar a história: “Se é certo, portanto,
que as categorias da Economia burguesa possuem [caráter de – RAT] verdade para
todas as demais formas de sociedade, não se deve tomar isto senão cum grano salis [ou
seja, em sentido bem determinado, com cautela - RAT]. Podem ser desenvolvidas, atro-
fiadas, caricaturadas, mas sempre essencialmente distintas” (ibid.). Muitos marxistas,
porém, entre eles o estruturalismo de Althusser e o próprio Jacob Gorender (que
discutiremos adiante), incorreram nesse erro e tomaram as categorias criadas para o
estudo da sociedade capitalista para estudar as sociedades passadas sem muita cautela.
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que se formou sobre aquela base. Aqui fica clara sua filiação ao materia-
lismo histórico: a vida social é explicada a partir da vida material.5
Assim, no modelo pradiano, a economia e a sociedade coloniais
seriam um mero apêndice de um sistema mais amplo, que tem seu centro
na Europa, e toda sua dinâmica se subordinaria a esse centro. Não havia
aqui espaço para a reprodução de uma sociedade autônoma.
Na próxima seção, trataremos de dois outros autores, que são vistos
pela historiografia crítica como desenvolvimentos do modelo pradiano. O
primeiro é Celso Furtado (1980), que desenvolveu a ideia de subordinação
da colônia ao comércio externo, buscando explicitar os ciclos reflexos da
economia colonial ao mercado europeu. Esse autor, entretanto, desenvolve
suas ideias a partir de uma perspectiva keynesiana, e não marxista, e não
colocou sua obra explicitamente como um aperfeiçoamento do modelo de
Caio Prado Júnior. São dois os motivos para, apesar disso, destacarmos aqui
sua obra: sua importância na historiografia e na interpretação da economia
brasileira e latino-americana e pelo fato de Fragoso e Florentino, em seu
5 Não poderíamos omitir algumas opiniões sobre esse complicado tema. De nossa parte,
não acreditamos haver a separação radical entre base econômica e superestrutura,
que a nosso ver foi utilizada por Marx muito mais para fins didáticos, embora tenha
trazido mais problemas que soluções, o que ele próprio percebeu logo de início, tendo
suprimido da sua obra O Capital o prefácio anterior (de 1857) que havia preparado
(conhecido como o Prefácio à Contribuição à Crítica da Economia Política) e no qual
apresentava tais noções. A dificuldade que levou Marx a suprimir tal prefácio é exata-
mente a dificuldade de se apresentar de antemão, antes do desenvolvimento lógico das
categorias, conceitos construídos dialeticamente, que num prefácio aparecem como
se fossem meras definições formais ou categorias abstratas, à maneira das teorias
construídas com a lógica formal. Ou seja, trata-se de um problema em geral de se
fazer prefácios quando se trata de uma obra construída com uma abordagem dialé-
tica, problema que já havia sido destacado por Hegel, no prefácio à sua Fenomenologia
do Espírito. Em Fausto (1988, especialmente cap. 4) encontramos uma exposição de
como não é adequado separar a “base econômica” e a “superestrutura”, pois a relação
entre elas é uma relação dialética de posição e pressuposição. Infelizmente, como se sabe,
as fáceis leituras vulgares de Marx tiveram preponderância sobre a leitura dialética,
apesar das inúmeras advertências do próprio autor. Remetemos o leitor ao texto de Ruy
Fausto, que desenvolve uma compreensão dialética da relação entre a “superestrutura” e
a “base econômica”.
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6 É importante ressaltar que Caio Prado Júnior foi mais cuidadoso que Fernando Novais,
pois fala em capital comercial, mas não em “capitalismo comercial”, evitando, caute-
losamente, usar a categoria modo de produção ao tratar do período colonial. Para
uma discussão mais detalhada sobre a categoria “capitalismo comercial”, ver o texto de
Horacio Ciafardini (1988).
7 Como veremos na seção 3, um dos modelos interpretativos mais recentes consegue
resolver essa questão com a criação de uma nova forma do capital, o capital
escravista-mercantil.
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8 Utilizo aqui uma separação, para fins didáticos, entre o que seriam as “críticas teóricas”
e as “críticas empíricas”. Entendo por críticas teóricas aquelas que foram motivadas
por ou partiram de discussões no plano lógico e metodológico, ou seja, de discussões
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sobre a maneira como os autores incorporaram a leitura de Marx. E, por críticas empí-
ricas, estamos entendendo principalmente os desenvolvimentos da pesquisa com fontes
primárias que evidenciam os limites do modelo pradiano no que diz respeito à apre-
ensão da complexidade da economia colonial e que partem dos estudos das fontes
documentais. Claro que tanto as críticas empíricas não deixam de ser teóricas como
tampouco as críticas teóricas deixaram de se fundamentar em evidências empíricas.
Mas há distinções claras entre os dois tipos de crítica, de forma que achamos justifi-
cável a distinção que, ainda que imperfeita, será útil para nossos propósitos neste artigo.
Agradeço a um parecerista anônimo da revista por ter apontado para a necessidade de
desenvolver melhor essa distinção, que não estava clara no texto original, e assumo a
responsabilidade pela opção de mantê-la no texto.
9 Remetemos aqui à noção abrangente de demografia histórica tal como apresentada por
Motta e Costa (1997). Segundo os autores: “As centenas de trabalhos produzidos na
área tiveram, ademais, regra geral, um caráter nitidamente monográfico. Amiúde deti-
veram sua atenção em uma ou poucas localidades, variando amplamente em termos do
intervalo temporal contemplado. (...) O valor inestimável desses ‘transbordamentos’ de
natureza monográfica está na própria demanda que ora se coloca no sentido da síntese
dos achados neles presentes. De fato, os estudos monográficos apontaram claramente
muitas das insuficiências, quer da aproximação, ainda paradigmática, de Caio Prado
Júnior, quer de autores que o sucederam, perfilhando com maior ou menor intensidade
ou criticando com maior ou menor contundência o modelo pradiano, tais como Celso
Furtado, Fernando Novais, Ciro Flamarion Cardoso e Jacob Gorender, dentre outros”
(p. 156). Assim, há atualmente uma forte concentração dos esforços dos historiadores
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nos estudos monográficos baseados em fontes documentais, o que tem gerado uma
enorme riqueza nos estudos empíricos a respeito da sociedade colonial, mas, por outro
lado, há uma escassez de trabalhos visando dar interpretações mais gerais, em modelos
interpretativos da nossa história, agora enriquecidos pelas novas descobertas empíricas.
Esse passo é sem dúvida o mais importante, como reconhecem Motta e Costa, os quais
escrevem que se torna necessário agora “preocupar-se com a integração dos resultados
alcançados no decurso dos últimos lustros em modelos mais gerais, interpretativos de
nosso evolver histórico. Aí está, assim entendemos, o mais rico filão que se abre ao
futuro da demografia histórica brasileira” (p. 156).
10 É interessante notar que, entre os historiadores (como entre outros cientistas sociais),
há os dois extremos, aqueles mais voltados à teoria e que constroem estruturas teóricas
que buscam dar conta de largos períodos históricos em interpretações mais gerais no
espaço e no tempo, e aqueles mais voltados à pesquisa empírica, segundo os quais
os dados refutam qualquer teoria que pretenda ter caráter geral. Isso nos parece ser
parte da eterna discussão iniciada entre o positivismo e o historicismo na teoria do
conhecimento: o positivismo (em sua versão do Círculo de Viena) recorrendo à
lógica dedutiva, otimista com relação ao poder de explicação das teorias, na busca de
“leis gerais”, e o historicismo recorrendo ao empírico (e às vezes cedendo à tentação
de uma “lógica” indutiva) e com seu ceticismo quanto às abstrações e generalizações
das teorias, com sua tendência a produzir estudos de casos e trabalhos monográficos
(como ocorreu com a Escola Histórica Alemã de Economia, no século XIX). Nessa
tensão, não podemos nos esquecer que há tentativas de superação, das quais as mais
influentes são as de Max Weber (herdeiro da Escola Histórica Alemã que buscou conci-
liar as duas noções adotando uma postura neokantiana com a noção de tipos ideais) e
a de Karl Marx (com a dialética materialista). Neste trabalho, discutiremos apenas a
linhagem marxista, embora reconhecendo a importância de uma tradição weberiana
de interpretação, inaugurada no estudo da sociedade brasileira com Raízes do Brasil, de
Sérgio Buarque de Hollanda. Como veremos, na historiografia brasileira, essa tensão
também aparece, e as diferenças entre os autores muitas vezes está na solução (ou falta
de solução) metodológica para essa questão, que é central neste trabalho.
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11 Esse texto de Gorender é muito rico, e de grande importância para nossa discussão pelo
seu caráter metodológico, inclusive porque o autor também discute o estruturalismo
de Althusser (identificando sua noção kantiana de criação de conceitos como univer-
sais abstratos) e o historicismo, bem como se defronta com a teoria da dependência de
Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto (Cardoso e Faletto, 1975) e com um texto
do filósofo José Arthur Gianotti (1976).
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Para o primeiro caso, que é o que está em questão aqui, sem a deter-
minação posição, o conceito permanece como pressuposição, portanto
como conceito negado, generalidade negada, e, por isso mesmo, apenas
um universal abstrato.13 A passagem da pressuposição à posição, que nesse
caso é uma passagem da possibilidade ou contingência à efetividade, exige
a negação do não ser (a negação da negação), ou seja, exige a posição
efetiva da generalidade que permite a confecção do conceito. E quando a
generalidade é posta, ela se nega em particularidade, pois é histórica, ou
seja, é uma abstração real (abstração que se opera no próprio objeto, não
como categoria puramente subjetiva). Sobre a categoria trabalho, para ficar
num exemplo famoso, escreve Marx, no Prefácio:
13 Como mostra Fausto, nesse caso do pressuposto como o possível ou o ainda não
posto, a distinção pressuposição/posição é próxima da distinção aristotélica entre
potência e ato.
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E mais a diante:
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14 Com a ideia de obscuridade, Fausto (1988, cap. 2) refere-se aos objetos contraditórios,
que rompem com os princípios basilares da lógica formal, como o princípio da não
contradição. Assim, enquanto o discurso formal seria aquele que trata apenas de signi-
ficações “claras”, ou seja, apenas a respeito do que se pode dizer que é ou que não é, a
dialética trata das significações obscuras, às quais cabe tanto o ser como o não ser.
15 A esse respeito, ver Teixeira (2003), especialmente capítulos 2 e 3.
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O que se pretende frisar é que o feudalismo tem em sua base uma “substân-
cia” histórica – união química entre o econômico e o político – inexistente
no capitalismo. Num tal contexto, não tem, pois, cabimento discutir o peso
relativo do “econômico”, que simplesmente não existe como tal. Tampouco
tem sentido pretender sequer estabelecer a “lei econômica que preside o
movimento desta sociedade”. Em outras palavras, este regime social e sua
evolução são rigorosamente intratáveis pela economia política, e não se
pode fazer com ela o análogo do que Marx fez para o capitalismo. (Castro,
1980, p. 84)
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17 Entendemos que a crítica de Gorender seja mais quanto à rigidez do esquema de combi-
nações do estruturalismo, nos quais ele não encontraria espaço para um novo modo de
produção escravista colonial, do que ao esquema abstrato propriamente dito. Ele tem
a mesma concepção de generalidade do uso das categorias da economia política para
se estudar outras sociedades, como se constituíssem uma teoria geral da história (ou
estruturas conceituais gerais), o que, no nosso entender, não era o objetivo de Marx, o
que ele próprio explicitou várias vezes.
18 Apesar de Oliveira (2003) ter feito sua crítica ao esquema interpretativo dualista anali-
sando a sociedade brasileira já depois de 1930, acreditamos haver um importante para-
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No regime social que aqui se instala há dois teclados; os teclados são dois,
mas a música é uma só. Há a produção de mercadorias, com a sua par-
titura composta de determinações econômicas. E há a escravidão, um
velho tema, que permite improvisos de muita força. A teoria desta reali-
dade está por ser produzida. Mas não será negando características funda-
mentais do regime social, aqui surgido, que ela poderá vir a ser construída.
Nesta empresa, como se procurou mostrar neste trabalho, há que resistir
a duas tentações: tomar esta realidade como uma história sem determina-
ções próprias, com o que se resvala, inexoravelmente, para a teleologia; ou
concebê-la como um sistema socioeconômico homólogo ao capitalismo
e, como tal, passível de ser apreendido através de uma Economia Política.
(1980, pp. 106-107)
lelo entre sua análise e as discussões presentes nesse trabalho, particularmente com
as ideias de Castro como também com as de Fragoso e Florentino. Voltaremos a essa
questão adiante.
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20 Claro que, se a produção de castores em cativeiro for possível e menos custosa que
sua caça, a primeira será preferida e a nação de caçadores se torna uma nação de cria-
dores de castores. No caso do mercado de escravos no Brasil, ao que tudo indica, era
mais atrativo importar o escravo do que a produção local de “gado humano”, conforme
Castro (1977, p. 206).
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esse autor, uma vez fundada a história universal pelo capitalismo, só faz
sentido falar-se em capitalismo, e o processo de formação da sociedade
brasileira é inseparável do desenvolvimento do capitalismo. Os dois outros
tópicos acima completam o quadro: o escravismo que se produziu aqui
é um escravismo produtor de mercadorias com vistas à valorização do
valor, e, assim, o nosso escravismo pode ser estudado da perspectiva da
economia política, ou seja, com os agentes sendo vistos como personifi-
cações de categorias econômicas (contrariamente às opiniões de Castro).
Isso é possível, acrescentamos nós, pois o capital é o sujeito desse processo,
e os homens são, portanto, apenas suportes dessa categoria econômica.
É exatamente pelo fato de o capital ser o sujeito desse processo, por
ser ele o responsável pela universalidade e pela generalidade, que se torna
legítimo que nosso período colonial seja estudado pelas categorias da
economia política. Assim, Pires e Costa veem a adequação da generalidade
dos conceitos, coerentemente com a postura do materialismo dialético,
na própria realidade concreta, que é a da inserção do período colonial no
processo mais amplo de constituição do capitalismo.
Cabe agora compararmos essa postura com uma questão que colo-
camos à obra de Fernando Novais. Como destacamos anteriormente, há
um problema lógico-teórico se, para defender Novais das acusações de
teleologia, recorrêssemos à consideração do capital comercial como sujeito
do processo que leva à acumulação primitiva de capital. Isto porque, como
se sabe, o capital comercial não é uma forma autônoma, e, portanto, não
pode se constituir como sujeito dando origem a uma totalidade. Novais,
apesar de aparentemente não se dar conta desse problema ou de não
enfrentá-lo, contorna-o, de uma forma que não é rigorosa, com o uso
da categoria capitalismo comercial. Entretanto, essa categoria é impró-
pria dentro da perspectiva marxista, visto que o capital só ganha auto-
nomia quando o conteúdo da relação formal D – M – D’ é a produção e
extração do excedente, a partir do momento em que a força de trabalho
se encontra disponível no mercado como mercadoria a ser utilizada no
processo produtivo.
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Não obstante, o próprio autor afirma não ser seu objetivo negar (em
sentido vulgar, não dialético) o modelo pradiano:
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6. Conclusões
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25 A noção de “sentido” aqui proposta, entretanto, não é exatamente aquela de Caio Prado
Júnior, nem a do “sentido profundo”, de Fernando Novais, como ficará claro adiante.
Entretanto, ela guarda relações com essas duas noções.
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26 O tema da exceção foi resgatado por Francisco de Oliveira em recente debate sobre a
obra de Michael Löwy na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.
Entendemos que em seu polêmico texto recente, O ornitorrinco, Oliveira mostra com
maestria o monstrengo social que o capitalismo gerou no Brasil de hoje, com sua capa-
cidade de gerar a exceção e colocar lado a lado o moderno e o atraso, que também são
forma de manifestação da imensa desigualdade social neste país.
27 Basta atentar para o retrocesso nos direitos trabalhistas verificado nas três últimas
décadas, mesmo nos países centrais, após o fim da Era de Ouro do capitalismo e do
Welfare State, e para os frequentes retrocessos nos direitos políticos que sofreram
vários países ao longo do século XX (do fascismo, apontado por Benjamin, às dita-
duras militares na América Latina), geralmente tendo a “segurança” como motivo.
Para acontecimentos mais recentes, basta ver os retrocessos atuais, no plano das rela-
ções internacionais e mesmo dos direitos individuais, vindos das nações que seriam as
“guardiãs” da ética e da democracia burguesas, agora tendo como mote o “combate ao
terrorismo”.
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28 Penso aqui na análise que Fausto (1988, cap. 4) faz sobre o papel do Estado e da posição
do Direito na sociedade capitalista, na visão marxiana. Segundo o autor, a posição do
Estado e do Direito, ou seja, a posição da igualdade e da não contradição de classes no
plano jurídico (com o trabalho livre e sua transformação em uma mercadoria como
outra qualquer), que é a igualdade no plano da aparência do sistema, servem para
esconder a desigualdade no plano da essência. Assim, aponta o autor que a contradição
que Marx apresenta em O Capital, particularmente na passagem da seção I para a seção
II, não é a contradição de classes, mas uma contradição entre a contradição de classes e
a aparente ausência de contradição. O interessante para nossa discussão é que, na peri-
feria do sistema capitalista, essa aparência por diversas vezes foi dispensada, ou seja, a
acumulação capitalista aqui, baseada na exploração de classe, por diversas vezes pres-
cindiu da máscara que precisou usar para prosseguir na Europa, seja utilizando-se do
trabalho escravo, seja nas formas camponesas como a meação, formas nas quais fica
clara a extração do excedente.
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30 Fragoso e Florentino, para reforçar seu argumento de que as ações das elites mercantis
do Rio de Janeiro eram primordialmente políticas e não econômicas, mostram que a
rentabilidade das atividades rentistas para as quais se voltavam os comerciantes após
enriquecerem (compra de imóveis, terras, escravos, etc.) eram menos lucrativas que as
atividades mercantis. Eles concluem com isso que o que eles buscavam era, portanto,
status, poder, o que estaria de acordo com a ideia de um projeto arcaizante, não capi-
talista. Uma objeção a se fazer é que, ainda que as taxas de rentabilidade nessas ativi-
dades de fato fossem menores, isso não habilita a concluir que eram ações não racionais
ou não motivadas pela lógica da acumulação capitalista. Optar por um investimento
menos rentável pode significar simplesmente aversão a risco. De qualquer forma, o
consumo ostentatório, bem como a acumulação de riquezas pessoais e certos tipos de
bens que trazem status não são de forma alguma estranhos a uma sociedade capitalista,
como já mostrou Thorstein Veblen na sua famosa Teoria da Classe Ociosa.
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Referências bibliográficas
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10. SOBRE OS AUTORES