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NOVA School of Business and Economics

Licenciaturas de Economia e de Gestão

2018/2019

Cálculo I

Resumo teórico

Elaborado por Simão Fernandes Correia


1 Conceitos básicos e revisão de lógica
O objectivo desta secção é relembrar alguns conceitos que são usados frequentemente em Mate-
mática. Sem eles, a mera compreensão do que nos é apresentado torna-se complicada.

1.1 Proposições
Uma proposição (ou asserção, armação) é algo que só pode ter dois valores lógicos: verdadeiro
ou falso.
Dadas duas proposições (que iremos designar por A e B ), podemos construir várias novas
proposições:

• Negação  A: é a armação  A é falso ou Não A. É verdadeira se A for falsa e falsa se


A for verdadeira;

• Conjunção A ^ B: em linguagem corrente, é a asserção  A e B . Esta nova armação só é


verdadeira quando tanto A como B forem verdadeiras.

• Disjunção A _ B : corresponde à asserção  A ou B . A única forma de esta asserção ser


falsa é se tanto A como B forem falsas.
• Implicação A ñ B: signica  A implica B  (ou então: sempre que A é verdade, B também
é). Para esta nova proposição ser falsa, é preciso que A seja verdadeira mas B seja falsa.
Na implicação A ñ B, dizemos que A é o antecedente e B é o consequente.

Além disso, dizemos que A é uma condição suciente para B (basta que A seja verdade
para B também o ser). Por outro lado, B é uma condição necessária para A (se B não for
verdade, A também não pode ser - ou então a implicação seria falsa).

• Equivalência A ô B: é uma forma simplicada de escrever que A ñ B e B ñ A. Em


linguagem corrente, corresponde a  A é verdadeira se e só se B for verdadeira. Usa-se
para dizer que as duas armações são equivalentes.

Exemplo 1.1. (Construção de novas proposições).

A : A Terra é plana - Falso;

B : Existe sal nos oceanos - Verdadeiro;

 A: A Terra não é plana - Verdadeiro;


A ^ B : A Terra é plana e existe sal nos oceanos - Falso, porque uma das armações (neste
caso, A) é falsa.

A _ B: A Terra é plana ou existe sal nos oceanos - Verdadeiro, porque uma das armações
é verdadeira.

A ñ B: Se a Terra é plana, existe sal nos oceanos - Verdadeiro. Neste caso, como o
antecedente A é falso, a implicação é sempre verdadeira (nem importa se B é verdadeira
ou não).

B ñ A: Se existe sal nos oceanos, a Terra é plana - Falso. Como o antecedente B é
verdadeiro, para a implicação ser verdadeira, a Terra tinha de ser plana, o que é falso.

A ô B: A Terra é plana se e só se existe sal nos oceanos - Falso, porque as duas armações
têm valores lógicos diferentes.

1
É importante saber a negação destas novas proposições:

•  p Aq é o mesmo que A:  p Aq ô A;
•  pA ^ B q é dizer que a conjunção é falsa. Para isso, uma das armações A ou B tem de
ser falsa, ou seja,  A é verdade ou  B é verdade. Matematicamente,

 pA ^ B q ô p A _  B q.
•  pA _ B q é dizer que a disjunção é falsa. Tal só acontece quando A for falsa e B também,
ou seja, quando  A for verdadeira e  B também.
 pA _ B q ô p A ^  B q.
Estas regras de negação da conjunção e da disjunção são por vezes chamadas de Leis de
De Morgan.

•  pA ñ B q é dizer que a implicação é falsa, ou seja, A é verdadeira e B é falsa.


 pA ñ B q ô pA ^  B q
Exemplo 1.2. (Negações).
A: Existem duas pessoas com alturas diferentes.
B : Todos os animais são da mesma espécie.
 A: Não existem pessoas com alturas diferentes.
 B : Nem todos os animais são da mesma espécie.
A ^ B : Existem duas pessoas com alturas diferentes e todos os animais são da mesma
espécie.
 pA ^ B q: Não existem pessoas com alturas diferentes ou nem todos os animais são da
mesma espécie.
A _ B: Existem duas pessoas com alturas diferentes ou todos os animais são da mesma
espécie.
 pA _ B q: Não existem pessoas com alturas diferentes e nem todos os animais são da mesma
espécie.

Dada uma implicação A ñ B , chamamos de implicação recíproca à asserção B ñ A. A


implicação  B ñ A é chamada de contra-recíproco. Na verdade, o contra-recíproco é
equivalente à implicação original (simplesmente está reescrita de forma diferente):

pA ñ B q ô p B ñ  Aq.

Em Matemática, partimos de alguns pressupostos básicos (chamados axiomas) e, a partir


deles, tentamos descobrir as implicações desses pressupostos. Normalmente, um resultado mate-
mático é algo da forma

Se se vericarem (HIPÓTESES), então (CONCLUSÃO).

que não é mais do que dizer que (HIPÓTESES) ñ (CONCLUSÃO). Uma demonstração de um
resultado matemático é uma dedução lógica desta implicação, partindo das hipóteses até chegar
à conclusão pretendida, e que normalmente envolve vários passos.

2
Exemplo 1.3. Se x é um número natural, x2 ¥ x.
Demonstração: Se x é um número natural, então x ¥ 1. Multiplicando em ambos os lados por
x, a desigualdade permanece válida, porque x ¡ 0. Logo x  x ¥ 1  x, ou seja, x2 ¥ x.
Existem várias denominações para um resultado matemático:

• Teorema: é um resultado de uma importância destacada;

• Proposição: um resultado de menor importância;

• Lema: é por norma um resultado cuja utilidade é ser usado numa demonstração de uma
proposição ou de um teorema (só por si não tem grande interesse);

• Corolário: é uma consequência directa de um teorema ou proposição. Normalmente é um


caso particular que tem muita utilidade.

1.2 Quanticadores
Existem dois símbolos usados frequentemente em Matemática aos quais se dá o nome de quan-
ticador.
O quanticador universal @ é usado quando queremos dizer que uma dada propriedade Apxq
é válida para todos os elementos x de um dado conjunto C. Formalmente, escreve-se

@xPC : Apxq

Em linguagem corrente, quando aparece um quanticador universal, devemos ler como para
qualquer..., para cada..., para todo o..., usando a que nos zer mais sentido.

Exemplo 1.4. (Quanticador universal)

• Vamos escrever a asserção Todos os números naturais são positivos. usando o quantica-
dor universal. Esta armação diz que a propriedade ser positivo é válida para todos os
números naturais. Neste caso C  N e Apxq :  x ¡ 0 e portanto escreve-se
@ x P N : x ¡ 0.
• Dados quaisquer dois números inteiros, o seu produto é positivo.: neste caso, temos uma
propriedade que é válida para todo o par x, y de números inteiros. Escrevemos então

@xPZ@yPZ : xy ¡ 0.
ou, de forma abreviada,
@ x, y P Z : xy ¡ 0.
• Traduzindo por palavras a asserção

@x P t1, 2, 3, 4u : x2   0,
lemos Para qualquer x P t1, 2, 3, 4u, x   0.
2

• A asserção
@ x, y, z P N : pz  0 ñ xyz  0q
lê-se como Para todo o x, y, z P N, se z  0, então xyz  0.

3
O quanticador existencial D é usado quando queremos dizer que existe um elemento do
conjunto C que verica a propriedade Apxq. Formalmente,

Dx P C : Apxq
Quando aparece um quanticador existencial, devemos lê-lo como existe... ou para algum....

Exemplo 1.5. (Quanticador existencial)

• Vamos escrever a asserção Existe um número natural que é negativo. usando o quanti-
cador existencial. Esta armação diz que a propriedade ser negativo é válida para algum
número natural. Neste caso C  N e Apxq :  x   0 e portanto escreve-se
D x P N : x   0.
• Existem dois números inteiros tais que o seu produto é positivo.: neste caso, temos uma
propriedade que é válida para algum par x, y de números inteiros. Escrevemos então

DxPZDyPZ : xy ¡ 0.
ou, de forma abreviada,
D x, y P Z : xy ¡ 0.
• Traduzindo por palavras a asserção

Dx P t1, 2, 3, 4u : x2   0,
lemos Existe um x P t1, 2, 3, 4u tal que x   0.
2

• A asserção
D x, y, z P N : xyz 0
lê-se como Para alguns x, y, z P N, xyz  0.

Os quanticadores aparecem frequentemente em denições e resultados matemáticos. É im-


portante saber lê-los da forma correcta para se conseguir compreender o que está escrito.
Finalmente, vejamos o que acontece quando negamos uma asserção com um quanticador:

•  p@x P C : Apxqq é dizer que não é verdade que a propriedade A seja válida para todos
os elementos de C . Isso signica que existe pelo menos um elemento em C para o qual A
é falsa, ou seja, Dx P C :  Apxq. Resumindo

 p@x P C : Apxqq ô pDx P C :  Apxqq.


•  pDx P C : Apxqq é dizer que não há nenhum elemento em C para o qual A seja verdade.
Isso signica que, para qualquer elemento em C , A é falsa, ou seja,@x P C :  Apxq. Logo
 pDx P C : Apxqq ô p@x P C :  Apxqq.

Exemplo 1.6. (Negação de quanticadores)

• A negação de  @x P N : x ¡ 1 é

Dx P N : x ¤ 1.

• A negação de  Dx P Z : x2  2 é
@x P Z : x2  2.
4
2 O conjunto dos números reais
Nesta cadeira, iremos trabalhar sobre o conjunto dos números reais R. Recordemos outros
conjuntos importantes:

• O conjunto dos números naturais N  t1, 2, 3, 4, ...u;


• O conjunto dos números inteiros Z  t..., 2, 1, 0, 1, 2, ...u;
• O conjunto dos números racionais

Q  tp{q : p, q P Z, q  0u.
?
Nestes conjuntos não estão incluídos certos números, como o 2.
?
Proposição 2.1. O número 2 (isto é, o número positivo cujo quadrado é 2) não pertence a
Q.
?
Demonstração. Vamos fazer um raciocínio por absurdo: o que aconteceria se 2 P Q? Se

?
chegarmos a algo contraditório, ca provado que isto não pode ser verdade e portanto que
2 R Q?. ?
Se 2 P Q, então existem dois naturais p, q tais que 2  p{q . Podemos sempre supor que a
fracção é irredutível, ou seja, que p e q não têm divisores comuns. Então

? 2
2  p 2q2  pq2 , logo p2  2q2 .
Isto implica que p2 é par e portanto p também é par.
Se p é par, podemos escrevê-lo como p  2k , k
P N. Então
2q 2  p2  p2k q2  4k 2 , logo q 2  2k 2 .

Concluímos que q2 é par. Mas, se assim for, tanto p quanto q são pares, ou seja, são ambos
?
divisíveis por 2. Mas isto contradiz o facto de p e q não?terem divisores comuns. Isto é um absurdo,
baseado na possibilidade de 2 estar em Q. Então 2 R Q, como queríamos demonstrar.
?
O exemplo do 2 mostra que, se dispusermos os números racionais sobre uma recta ordenada,
existem pontos da recta que não correspondem a nenhum número racional. Cada um desses pon-
tos irá corresponder àquilo que chamamos de número irracional (ou seja, um número que não
pode ser escrito como o quociente de dois números inteiros). Desta forma, a recta ca comple-
tamente preenchida com um misto de números racionais e irracionais. Ao conjunto constituído

?
pelos números racionais e pelos irracionais dá-se o nome de conjunto de números reais.
Exemplos clássicos de números irracionais são: 2 (o número maior que 0 cujo quadrado é
igual a 2); π (a razão entre o perímetro e o diâmetro de uma circunferência); o número de Neper
e; etc.
Sobre o conjunto dos números reais, estão denidas as operações de soma, subtracção, mul-
tiplicação e divisão (por um real diferente de zero). Todas estas operações gozam das mesmas
propriedades que se vericam sobre números racionais. Além disso, o conjunto dos números reais
está totalmente ordenado, ou seja, podemos sempre comparar dois números reais e dizer qual
deles é maior (ou se são iguais). O mesmo já acontecia com os números racionais.
Os números racionais e irracionais estão misturados na recta real: entre qualquer par de
racionais existe um irracional e entre qualquer par de irracionais existe um racional. Isto signica

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que qualquer segmento em R de comprimento positivo tem uma innidade de racionais e uma
innidade de irracionais.
Existe uma propriedade extra sobre o conjunto R que não se verica sobre Q. Para a explicar,
precisamos de introduzir alguns conceitos.

Denição 2.2. Dado um conjunto C € R, dizemos que


• a P R é um majorante de C se, para qualquer x P C , x ¤ a;
• b P R é um minorante de C se, para qualquer x P C , x ¥ b;
• um majorante c P R é o supremo de C se for o menor dos majorantes, ou seja,

@x majorante de C : c ¤ x.
Nesse caso, escrevemos c  sup C . Se c P C , dizemos que c é o máximo de C e escrevemos
c  max C ;
• um minorante d P R é o ínmo de C se for o maior dos majorantes, ou seja,
@x minorante de C : d ¥ x.
Nesse caso, escrevemos d  inf C . Se d P C , dizemos que d é o mínimo de C e escrevemos
d  min C ;
• C é majorado se existem majorantes de C ;
• C é minorado se existem minorantes de C ;
• C é limitado se for majorado e minorado;
Exemplo 2.1. Se C s0, 1s,
• r1, 8r é o conjunto dos majorantes;
• s  8, 0s é o conjunto dos minorantes;
• 1 é o supremo de C e também é o máximo, porque 1 P C;
• 0 é o ínmo de C, mas não é mínimo porque 0 R C;
• C é limitado porque tem majorantes e minorantes.

Exemplo 2.2. Se D s  8, 2rYr3, 4r,


• r4, 8r é o conjunto dos majorantes;
• O conjunto dos minorantes é vazio;

• 4 é o supremo de D, mas não é o máximo porque 4 R D;


• Não existe ínmo porque não existem minorantes;

• D é majorado mas não é minorado. Logo não é limitado.

Uma propriedade fundamental sobre o conjunto dos números reais é a seguinte:

Proposição 2.3. Qualquer subconjunto de R não-vazio e majorado tem um supremo (em R).

6
Esta propriedade, juntamente com as operações usuais e a relação de ordem, possibilitam a
construção da Análise em R.
? ? ?
Nota 2.1. A mesma propriedade não é válida sobre Q: se C s  2, 2rXQ, o supremo é 2,
que não pertence a Q.
Nota 2.2. Dado um subconjunto C de R majorado e não vazio, o conjunto dos seus majorantes
é sempre da forma rsup C, 8r. O único majorante que pode pertencer ao conjunto é o supremo
e, nesse caso, o supremo é também o máximo de C.
Nota 2.3. As propriedades acima referidas sobre majorantes, supremos e máximos são também
válidas para minorantes, ínmos e mínimos. Por exemplo, todo o subconjunto de R minorado e
não-vazio tem um ínmo em R.

3 Topologia em R
Denição 3.1. A distência entre dois pontos x, y P R é dada por dpx, yq  |x  y|.
Note-se que

• a distância é simétrica (d px, yq  dpy, xq), ou seja, a distância de x a y é a mesma que a


distância de y a x;
• a distância é sempre não-negativa e é igual a zero se e só se x  y;
• é válida a desigualdade triangular:

dpx, y q ¤ dpx, z q dpz, y q, x, y, z, P R.


Heuristicamente, esta desigualdade diz que é mais curto o caminho directo de x a y do que
o caminho que vai primeiro a z e depois a y.
Denição 3.2. Dado um ponto a P R e  ¡ 0, chamamos vizinhança de a de raio  ao conjunto
V paq  tx P R : |x  a|   u sa  , a r.
Denição 3.3 (Classicação topológica de um ponto em relação a um conjunto) . Dado um
conjunto C € R e um ponto a P R, dizemos que
• a é um ponto interior de C se existir uma vizinhança de a contida em C , ou seja,
D ¡ 0 : V paq € C.
O conjunto dos pontos interiores de C (ou simplesmente o interior de C ) é designado por
intpC q;
• a é um ponto exterior de C se existir uma vizinhança de a que não intersecta C , ou seja,
D ¡ 0 : V paq X C  H.
O conjunto dos pontos exteriores de C (ou o exterior de C ) é designado por extpC q;
• a é um ponto fronteiro de C se qualquer vizinhança de a tiver pontos dentro e fora de C ,
@ ¡ 0 : V paq X C  H ^ V paq X pRzC q  H.
O conjunto dos pontos fronteiros de C (ou a fronteira de C ) é designado por frpC q;

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• a é um ponto aderente de C se qualquer vizinhança de a tiver pontos em C , isto é,

@ ¡ 0 : V paq X C  H.
O conjunto dos pontos aderentes de C (ou a aderência de C ) é designado por C ;

Nota 3.1. Resulta directamente da denição que:

1. um ponto ou é interior ou é fronteiro ou é exterior (com disjunções mutuamente exclusivas).


Assim sendo,

int pC q  RzpfrpC q Y extpC qq, extpC q  RzpfrpC q Y intpC qq


frpC q  RzpintpC q Y extpC qq.

Isto signica que, se já soubermos dois dos conjuntos, o terceiro é formado por todos os
restantes pontos de R;
2. um ponto interior a C tem de pertencer a C; um ponto exterior a C não pode pertencer a
C; um ponto fronteiro pode ou não pertencer a C;
3. um ponto é exterior a C se e só se for interior a Rz C ;
4. um ponto é aderente se for interior ou fronteiro, ou seja,

C  intpC q Y frpC q.
Denição 3.4. Um conjunto C € R diz-se aberto se intpC q  C . Por outro lado, dizemos que
C é fechado se C  C . Se C for limitado e fechado, dizemos que C é compacto.
Exemplo 3.1. Dados dois reais a   b, temos

intpra, bsq sa, br, frpra, bsq  ta, bu, extpra, bsq  Rzra, bs, ra, bs  ra, bs.
Como a aderência do intervalo ra, bs é igual ao próprio intervalo, podemos dizer que ra, bs é
fechado. Por outro lado, este conjunto é limitado (tem majorantes e minorantes - por exemplo,
a é minorante e b é majorante). Assim sendo, podemos dizer que o intervalo ra, bs é compacto.
Exemplo 3.2. Dados dois reais a   b, temos

psa, brq sa, br, frpsa, brq  ta, bu, extpsa, brq  Rzra, bs, sa, br  ra, bs.
int

Como o interior de sa, br é igual ao próprio sa, br, o intervalo é aberto. Comparando com o
exemplo anterior, vemos que ra, bs e sa, br têm o mesmo interior, a mesma fronteira e o mesmo
exterior. Isto signica que não podemos reconstruir um conjunto a partir do seu interior, exterior
e da sua fronteira.

Denição 3.5. Dado um conjunto C € R não-vazio e um ponto a P C , dizemos que


• a é um ponto de acumulação de C se qualquer vizinhança de a tiver pontos de C diferentes
de a, ou seja,
@ ¡ 0 : pV paq X C qztau  H.
O conjunto dos pontos de acumulação de C é chamado de derivado de C e é denotado por
C 1.

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• a é um ponto isolado se existe uma vizinhança de a cujo único ponto de C é o próprio a:

D ¡ 0 : V paq X C  tau.
Nota 3.2. Um ponto aderente ou é isolado ou de acumulação.

Teorema 3.6 (Teorema de Bolzano-Weierstrass) . Todo o subconjunto de R limitado e innito


admite pelo menos um ponto de acumulação.

4 Sucessões
Denição 4.1. Uma sucessão é uma aplicação u : N Ñ R (faz corresponder a cada natural um
único real). Por norma, denota-se por un o número real correspondente ao natural n (ou seja, o
n-ésimo elemento da sucessão). A notação usual para uma sucessão é pun qnPN . A expressão que
dene a sucessão chama-se de termo geral da sucessão.
Exemplo 4.1. Como exemplos de termos gerais de sucessões, temos

• un  1{n, n P N;
• vn  p1qn , n P N;
"
• wn  5, n par,
en , n ímpar.

Por outro lado, a aplicação u:R ÞÑ R, upnq  n3 , n P R, não é uma sucessão, porque não tem
como domínio o conjunto N.
Uma sucessão também pode ser denida por recorrência: o n-ésimo elemento da sucessão é
denido à custa dos anteriores. Por exemplo, a recorrência

un un 2, u1  1
1

dene a sucessão de termo geral un  2n  1. Outros exemplos são:

vn 2  vn vn 1 , v1  3, v2  1{3,

wn 1  wn2  nwn5 , w1  2
Por vezes, esta forma de denir a sucessão é mais simples do que usando o termo geral. Por
exemplo, não é trivial escrever o termo geral da sucessão pwn qnPN .
Denição 4.2. Uma sucessão pun qnPN diz-se crescente (resp. decrescente) se
@n P N un 1 ¥ un presp. un 1 ¤ un q.
Se a desigualdade for estrita, dizemos que é estritamente crescente (resp. estritamente decres-
cente).
Se uma sucessão for crescente ou decrescente, dizemos que é monótona. Se o for estritamente,
dizemos que é estritamente monótona.

9
Denição 4.3. Uma sucessão pun qnPN diz-se majorada se existir um número real M tal que
un ¤M para todo o n P N.
De forma análoga, a sucessão diz-se minorada se existir m P R tal que
un ¥m para todo o n P N.
Se uma sucessão for minorada e majorada, diz-se que é limitada.
Dada uma sucessão pun qnPN , podemos construir uma nova sucessão, a que chamamos de sub-
sucessão, seleccionando uma quantidade innita de un 's e renumerando. Por exemplo, podemos
considerar a subsucessão dos números pares

u1 , u2 , u3 , u4 , u5 , ... u2n , u2n 1, ...


Ó Ó ... Ó ...
u2 , u4 , ... u2n , ... ou seja, vn  u2n
Ó Ó ... Ó ...
v1 , v2 , ... vn , ...
ou a dos números ímpares

u1 , u2 , u3 , u4 , u5 , ... u2n , u2n 1, ...


Ó Ó Ó ... Ó ...
u1 , u3 , u5 , . . . u2n 1, . . . , isto é, wn  u2n1
Ó Ó Ó ... Ó ...
w1 , w2 , w3 , . . . wn 1 ...
ou ainda a subsucessão a partir do terceiro elemento

u1 , u2 , u3 , u4 , u5 , ... u2n , u2n 1,


...
Ó Ó Ó ... Ó Ó ...
u3 , u4 , u5 , . . . u2n u2n 1 , . . . , ou seja, zn  un 2
Ó Ó Ó ... Ó Ó ...
z1 , z2 , z3 , . . . z2n2 z2n1 . . .

4.1 Limite nito de uma sucessão


Um conceito muito importante em Análise é o de limite de uma sucessão. É uma forma rigorosa
de dizer que, à medida que avançamos na sucessão, nos vamos aproximando de um dado número
real.
Vamos então tentar compreender como podemos denir que uma sucessão tende para L P R.
A ideia deverá ser que, quanto mais avançamos na sucessão, mais perto estamos de L. Isto
signica que deveremos considerar a distância de cada elemento da sucessão un a L, que é dada
por |un  L|. Para traduzir a noção de que vamos cando cada vez mais próximos de L, tomamos
uma qualquer distância xada  ¡ 0 e pedimos que, a partir de certa altura (ou seja, para todos
os elementos a partir de um certo n0 P N), a distância dos elementos da sucessão a L seja mais
pequena do que . Agora precisamos de traduzir esta ideia para algo rigoroso:

Por palavras: Formalmente:

Para qualquer distância  ¡ 0, @ ¡ 0


existe um natural n0 tal que Dn0 P N :
para todos os naturais seguintes @n ¥ n0
a distância de un a L é menor que . |un  L|   .
10
Denição 4.4 (Limite nito de uma sucessão). Dada uma sucessão pun qnPN , dizemos que tem
limite L P R (ou que tende para L ou ainda que converge para L) se
@ ¡ 0 Dn0 P N : @n ¥ n0 |un  L|   .
Nesse caso, escrevemos un Ñ L ou lim un  L e dizemos que a sucessão un é convergente.
Exemplo 4.2. Vamos ver, usando a denição, que a sucessão denida por un  1{n converge
para 0. Para isso, temos de mostrar que, qualquer que seja a distância  ¡ 0, a partir de certa
altura, |un |   . Fixamos então uma dessas distâncias  ¡ 0 e vamos ver o que signica |un | ser
menor que essa distância:

|un  0|    ô |1{n|    ô 1{n    ô 1{   n.


Ou seja, un estar a uma distância de 0 menor que  é equivalente a dizer que n ¡ 1{. Assim
sendo, se tomarmos como n0 o primeiro natural maior do que 1{, temos

@n ¥ n0 n ¥ n0 ¡ 1{, ou seja, |un |   .


Como conseguimos fazer isto para qualquer , ca demonstrado que un Ñ 0.
Nota 4.1. Uma sucessão pode ter todos os termos diferentes do seu limite: por exemplo, a
sucessão de termo geral un  1{n converge para 0.
Nota 4.2. No que toca a limites, não importa o que acontece com os primeiros elementos da
sucessão (o que importa é o que acontece a partir de certa ordem). Por exemplo, a sucessão de
termo geral "
3, n ¤ 10000,
vn  1{n, n ¥ 10000.
ainda converge para 0.
Proposição 4.5 (Propriedades dos limites nitos). São válidas as seguintes armações:
1. O limite de uma sucessão, se existir, é único (não nos podemos aproximar ao mesmo tempo
de pontos diferentes);
2. Se uma sucessão converge para L, então qualquer sua subsucessão também converge para
L;
3. Se un Ñ L e vn Ñ M , então
(a) lim un  L M;
vn
(b) lim un  vn  L  M ;
(c) lim un vn  LM ;
(d) Se M  0, então lim un {vn  L{M ;
(e) lim eu  eL , lim sinpun q  sinpLq, lim cospun q  cospLq;
n

(f) Se L ¡ 0, lim lnpun q  lnpLq.


4. Dado a P R, a sucessão denida por
un  a, n P N

é convergente e o seu limite é a.

11
5. Se un ¤ vn , n P N, un Ñ L e vn Ñ M , então L ¤ M. O mesmo não é válido com
desigualdades estritas.
Exemplo 4.3. Usando estas propriedades, é fácil ver as seguintes convergências:

e1{n
1
1
n
Ñ 1, 1
n2
 n1  n1 Ñ 0, 3
n
 n12 Ñ 3, etc.

Nota 4.3. A propriedade 2 implica que, se duas subsucessões tiverem limites diferentes, então
a sucessão não pode ser convergente. Por exemplo, tomemos a sucessão un  p1qn .
• A subsucessão dos pares é  p1q2n  1, e portanto lim u2n  1;
u2n
2n1
• A subsucessão dos ímpares é u2n1  p1q  1, e portanto lim u2n1  1;
Como os dois limites são diferentes, podemos concluir que un não é convergente.

Nota 4.4. É importante não cometer o erro de passar só alguns termos ao limite: para além de
não fazer sentido, pode mesmo dar um resultado errado, como mostra o exemplo


1  lim  lim n  limpn  0q  0.


n 1
n n
Exemplo 4.4. Como estas regras, podemos calcular o limite do quociente de duas sucessões
polinomiais quando o grau do numerador é menor ou igual ao do denominador:

 am1 nm1 am nm


wn  a0b a1 n
b1 n  bk1 nk1 bk nk
, m ¤ k, bk  0.
0

Colocando nm (resp. nk ) em evidência no numerador (resp. denominador), obtemos

m
 nnk a0bn
1
m a1 nm11  am1 n11 am m
 nnk uvn
wn 1
0 nk b1 nk11  bk1 n1 bk n

É fácil ver que lim un  am e lim vn  bk . Portanto


"
am nm m   k,
lim wn  lim  lim b nakmm  0,
bk nk k am {bk , m  k
O importante a reter deste exemplo é que, perante uma expressão racional, o importante é
perceber quais são os termos mais relevantes no numerador e no denominador e colocá-los em
evidência. Esta é a justicação rigorosa para podermos desprezar termos neste tipo de expressões.

Exemplo 4.5 (Limites de potências). Partindo das regras dos limites, podemos calcular o limite
de sucessões da forma un  abn n
usando a igualdade

 elnpa q  eb ln a .
abnn
bn
n n n

Assim, concluímos que, se lim an  A ¡ 0 e lim bn  B , então

lim abn  lim eb ln a  eB ln A  AB .


n n n

Proposição 4.6 (Número de Neper). A sucessão de termo geral



n
un  1
1
n
, nPN

é convergente. O seu limite é denotado por e e denomina-se de número de Neper.

12
4.2 Critérios de convergência de sucessões
Existem vários critérios muito úteis para saber se uma sucessão é convergente, que são o conteúdo
dos três teoremas que se seguem:

Teorema 4.7 (Convergência de sucessões monótonas) . São válidas as seguintes armações:


• Toda a sucessão crescente e majorada tem um limite nito.
• Toda a sucessão decrescente e minorada tem um limite nito.
Corolário 4.8. Qualquer sucessão limitada tem, pelo menos, uma subsucessão convergente.
Exemplo 4.6. Considere-se a sucessão denida por

un  n n 1, n P N.

Vamos ver, usando o teorema anterior, que un é convergente.

1. A sucessão é crescente? Dado n P N,

 un  pnpn 1q1q 1  n n 1  pn pn 1q 1qpnnpn 2q 2q  pn


2
un 1
1
1qpn 2q
¥0
Logo un ¤ un 1 para qualquer nPN pun qnPN é crescente.
e portanto

2. A sucessão é majorada? Sim, porque, qualquer que seja n P N,

un  n n 1 ¤ nn  1.
Como a sucessão pun qnPN é crescente e majorada, pelo Teorema 4.7, camos a saber que pun qnPN
é convergente.

Exemplo 4.7. Considere-se a sucessão denida por

vn  31n n P N.

1. A sucessão é decrescente: dado n P N,




vn 1  vn  3n1 1  31n  31n 1


3
 1   3n2 1 ¤ 0.

2. A sucessão é minorada, porque vn ¥ 0, para qualquer n P N.


Como a sucessão pvn qnPN é decrescente e minorada, pelo Teorema 4.7, ca demonstrado que
pvn qnPN é convergente.
Teorema 4.9 (Sucessões enquadradas) . Dadas três sucessões pun qnPN , pvn qnPN e pwn qnPN , su-
ponhamos que
un ¤ wn ¤ vn , para todo o n P N.
Então, se un Ñ L e vn Ñ L, a sucessão wn também converge para L.
Corolário 4.10. Se un Ñ 0 e vn é limitada, então un vn Ñ 0.

13
Demonstração. Para simplicar, supomos que un ¥ 0. Se vn é limitada, então existe M P R tal
que
M ¤ vn ¤ M, n P N.
Multiplicando por un , obtemos
M un ¤ un vn ¤ M un
Como lim un  0, temos
lim M un  lim M un  0.
Assim sendo, pelo Teorema das Sucessões Enquadradas, lim un vn  0.
Exemplo 4.8. Considere-se a sucessão

zn  sinnpnq .
Para utilizarmos o Teorema 4.10, temos de escrever zn como o produto de um factor limitado
por outro que tende a 0:

zn  un vn , onde un  n1 e vn  sinpnq.
Como |vn | ¤ | sinpnq| ¤ 1, vn é limitada. Por outro lado, já sabemos que un Ñ 0. Logo, pelo
Corolário 4.10, zn  un vn Ñ 0.
Exemplo 4.9. Vamos calcular o limite de

 n n3 p11q
3 n
wn .

O termo maior tanto em cima como em baixo é n3 . Dividindo em cima e em baixo,

p1qn
wn  1
1
n3
1 .
n3

O denominador tende para 1. Para o numerador, precisamos de calcular o limite de

 pn13q  n13  p1qn  (tende a 0)  (limitada),


n
zn

Pelo Corolário 4.10, lim zn  0 e portanto


wn Ñ 11 0
0
 1.
Exemplo 4.10. Considere-se a sucessão de termo geral

¸
n
un  n2
1
 n2 1 n2
1
 n2
1
.
k 1
k 1 1 n

Vamos procurar duas expressões, dependendo só de n, que enquadrem cada termo da soma: por
exemplo,

n2
1
n
¤ n2 1 k
¤ n2 1 1
, para qualquer 1¤k ¤ n.

14
Logo
¸
n ¸
n

n2
1
¤ un ¤ n2
1
.

k 1
n 
k 1
1
Vejamos se podemos aplicar o Teorema das Sucessões Enquadradas: por um lado,

¸
n

n2
1
 n 2
1
 1
n 1
Ñ 0;

k 1
1 n 1 n

por outro lado,


¸
n

n2
1
 n 2
1
 1
Ñ 0;

k 1
n n n n 1
Como os dois limites são iguais, concluímos que

lim un  0.
Teorema 4.11 (Critério da razão). Dada uma sucessão pun qnPN não-negativa, suponhamos que
lim
un 1
un
 L.
Então a sucessão
?u
n é convergente e
n

lim
?u  L.
n
n

Exemplo 4.11. Usando o critério da razão, vamos calcular o limite de


c
vn  n 1
n!
.

Como
1{pn 1q!
1{n!
 pn n! 1q!  pn n!
1qn!
 n 1 1 Ñ 0,
o critério da razão implica que lim vn  0.

4.3 Limites innitos de sucessões


A noção de limite pode extender-se a sucessões cujos elementos se tornem innitamente grandes.
A ideia é que, para qualquer barreira M P R que se coloque, a partir de certa altura, todos os
elementos da sucessão ultrapassam M.
Por palavras: Formalmente:

Para qualquer barreira M real, @M P R


existe um natural n0 tal que Dn0 P N :
para todos os naturais seguintes @n ¥ n0
un ultrapassa M. un ¥ M.

Denição 4.12 (Sucessão innitamente grande) . Dada uma sucessão pun qnPN , dizemos que
diverge para 8 (ou que é innitamente grande) se
@M P R D n0 P N : @n ¥ n0 un ¥ M.
Nesse caso, escrevemos lim un  8 ou que un Ñ 8.

15
Exemplo 4.12. Vamos ver, usando a denição, que a sucessão de termo geral un  n diverge
para 8. Para isso, temos de mostrar que, qualquer que seja a barreira M P R, a partir de
certa altura, un ¥ M. Fixamos então uma dessas barreiras M e vamos ver o que signica un
ultrapassar essa barreira:
un ¥M ôn¥M
Isto signica que, se tomarmos como n0 o primeiro natural maior do que M, temos

@n ¥ n0 un  n ¥ n0 ¥ M.
Como conseguimos fazer isto para qualquer M, ca demonstrado que un Ñ 8.
Denição 4.13. Dada uma sucessão pun qnPN , dizemos que
1. diverge para 8 se un divergir para 8. Nesse caso, escrevemos lim un  8 ou
un Ñ 8;
2. diverge em módulo para 8 se |un | divergir para 8;
3. é divergente oscilante se não for nem convergente, nem divergente para 8 nem for di-
vergente em módulo.
Proposição 4.14 (Propriedades dos limites innitos). São válidas as seguintes armações:
1. uma sucessão não pode convergir e divergir para 8 ao mesmo tempo. Também não se
pode ter un Ñ 8 e un Ñ 8;
2. Se uma sucessão diverge para 8, então qualquer sua subsucessão também diverge para
8;
3. Se un Ñ 8 e vn Ñ M , M P R Y t8u, então
(a) se M  8, limpun vn q  8;
(b) se M ¡ 0 ou M  8, lim un vn  8;
(c) se M   0 ou M  8, lim un vn  8;
(d) Se M  8, então lim vn {un  0;
(e) lim eu  8, lim lnpun q  8.
n

4. Uma sucessão pun qnPN diverge em módulo para 8 se e só se a sucessão p1{un qnPN converge
para 0.
Nota 4.5 (Indeterminações). Existem diversos casos que não são cobertos pelas propriedades
dos limites nitos ou innitos. Esses casos correspondem a indeterminações do tipo

p 8q p8q, 8
8,
0
0
, 0  8.

Estes casos requerem uma análise mais cuidada, usando critérios de convergência ou manipulações
algébricas.

Proposição 4.15. Sejam pun qnPN e pvn qnPN duas sucessões tais que
un ¤ vn , para todo o n P N.
Então,
1. se un diverge para 8, vn também diverge para 8.
2. se vn diverge para 8, un também diverge para 8.

16
4.4 Séries
Um caso particular de sucessão é o de soma parcial:

¸
N
SN  an , pan qn¥n 0 sucessão dada.
n n0
Por exemplo,
¸
N ¸
N ¸
N
SN  1
, TN  1
n
, UN  n.
 n
n 1  2
n 0 
n 3

Se SN convergir para um número real S, então deveremos poder dizer que S corresponde à
soma de todos os an 's e, nesse caso, escreveremos algo como


S  an .

n n0

Denição 4.16. Uma série é dada pela soma de todos os elementos de uma dada sucessão
pan qn¥n e denota-se por
0

an .

n n0

A sucessão pan qn¥n0 é denomidada de termo geral da série. Se a sucessão das somas parciais
convergir para S , então a série diz-se convergente e o seu valor é S . Caso contrário, diz-se que
a série é divergente. Neste caso, não é possível atribuir um valor à série.
Exemplo 4.13. A série de termo geral
"
n, n ¤ 3
an  0, n ¥ 4
, n ¥ 1,

tem como sucessão das somas parciais

1, 3, 6, 6, 6, . . . 6, . . .
°8
Como esta sucessão converge para 6, a série  an
n 1 é convergente e o seu valor é 6.
Exemplo 4.14. A série de termo geral  1, n ¥ 1 tem como sucessão das somas parciais
an

SN  1 1    1  N

Como esta sucessão diverge para 8, a série °8n1 an é divergente e não podemos dar-lhe um
valor real.

Proposição 4.17. Se uma série é convergente, então o seu termo geral converge para 0. Por
outras palavras, se o termo geral não converge para 0, a série é divergente.
Proposição 4.18. Se pan qnPN e pbn qnPN são tais que 0 ¤ an ¤ bn , n P N, e

bn converge,
n 1 
°8
então a série  an também é convergente.
n 1

17
Demonstração. Como an , bn ¥ 0, a sucessão das somas parciais AN  °Nn1 an é crescente. Por
outro lado, temos
¸
N ¸
N 8̧
AN  an ¤ bn ¤ bn   8,

n 1 
n 1 
n 1

Logo AN é uma sucessão crescente e majorada. Assim sendo, pelo Teorema 4.7, AN é convergente.

Denição 4.19. Uma série geométrica é uma série cujo termo geral pan qn¥n satisfaz 0

an 1
an
 r, para qualquer n ¥ n0 .

Ao número real r dá-se o nome de razão da série.


Dada uma série geométrica da forma


rn ,
n 0 ¥
olhemos para a sua N -ésima soma parcial:

¸
N
SN  rn 1 r r2  rN .

n 0

Esta soma é a soma de uma progressão geométrica. Logo

 r r  1 1 .
N 1
SN

Com esta fórmula, podemos estudar explicitamente a convergência desta série geométrica, ob-
tendo assim o critério da convergência das sucessões geométricas:

• Se |r|   1, então rN 1 Ñ 0 quando N Ñ 8. Isto implica que a sucessão das somas parciais
converge para 1{pr  1q. Logo a série geométrica de razão r é convergente e


rn  1 1 r .

n 0

• Se |r| ¥ 1, então o termo geral da série não converge para 0. Logo a série é divergente.
Exemplo 4.15. Consideremos a série
¸ 3n
5n 1  .
¥
n 2

Esta série é geométrica:


n 1 n 1 
an 1
an
 53pn 1
5
q1 3n  53 .
Para estudarmos a convergência desta série, temos de a relacionar com a série


n
¸ 3
.
¥
n 0
5

18
Em primeiro lugar, substituímos n por m  n  2. Então

¸ 3n ¸ 3pn2q 2 ¸ 3m 2

5n 1   5pn2q 1
 5m 1
.
¥
n 2 n2¥0 ¥
m 0

Depois, colocamos em evidência os factores a mais:


m
¸ 3m 2
32 ¸ 3
m 1
 51 m¥0 5
.
m 0 ¥ 5
Usando o critério de convergência de séries geométricas, a série é convergente e


m
¸ 3n 32 ¸ 3
5n1
 51 m¥0 5
 59 1 1 3  92 .
n¥2 5
°
Proposição 4.20 (Critério da razão para convergência de séries) . Dada uma série ¥ an ,
n n0
suponhamos que  
 an 1 
lim 
a   L.
n

Então
• se L ¡ 1, a série diverge;

• se L   1, a série converge;
• se L  1 , a série diverge.
Nos restantes casos, o critério é inconclusivo.
Exemplo 4.16. Consideremos a série
8̧ 1
.
n 3
n!
Aplicando o critério da razão, como

1
lim
pn 1q!  pn n! 1q!  n 1 1 Ñ 0,
1
n!

a série é convergente.

19
5 Funções reais de variável real
5.1 Denições e propriedades básicas
Uma função real de variável real é uma aplicação f : Df Ñ R, onde Df € R é o domínio de f .
Para uma função car bem-denida, temos de denir o seu domínio e a sua expressão, isto é,
para cada ponto x P Df , qual é o valor de f pxq P R. Como exemplos de funções reais de variável
real, temos
f : r0, 1s Ñ R, f pxq  cospxq,
g : R Ñ R, g pxq  x2 ex ,
h :s0, 8rÑ R, hpxq  ln x.
Os seguintes exemplos não são funções reais de variável real:

f : C Ñ R, f pz q  z 3 , porque o domínio não está contido em R,


g : R Ñ C, g pxq  ix, porque as imagens não estão todas em R,
h : R Ñ R, hpxq  1{x, porque a imagem de 0 não está denida.

Para duas funções serem iguais, é necessário que tanto os domínios como as suas expressões
sejam iguais.

Nota 5.1. Uma função f : Df Ñ R pode ser representada no plano cartesiano: no eixo das
abcissas colocamos o domínio da função e depois desenhamos o gráco

tpx, f pxqq : x P Df u.
Existem diversas modicações que podemos fazer a uma dada função f e cujo gráco pode ser
obtido a partir do de f.
• Translacção nas abcissas: se considerarmos g pxq  f px  cq, o gráco de g é igual ao gráco
de f transladado na horizontal por c;

Figura 1: Translacção do gráco de f quando c  3.

• Translacção nas ordenadas: se considerarmos g pxq  f p xq a, o gráco de g é igual ao


gráco de f transladado na vertical por a;

20
Figura 2: Translacção do gráco de f quando a  3{2.

• Simetrias: caso g pxq  f pxq, o gráco de g obtém-se do de f fazendo uma simetria em


relação ao eixo vertical. Por outro lado, se g pxq  f pxq, essa simetria é em relação ao
eixo horizontal;

Figura 3: Simetria em relação ao eixo vertical.

• Homotetias: dado k ¡ 0, o gráco de gpxq  kf pxq obtém-se esticando o gráco de f na


vertical por um factor de k . Por outro lado, o gráco de g pxq  f px{k q é obtido esticando
na horizontal por um factor de k.

21
Figura 4: Dilatação na horizontal do gráco de f quando g pxq  f px{2q.

Nota 5.2. Por vezes, o que nos é dado é somente a expressão da função. Nesse caso, convenci-
onamos que o domínio é o maior subconjunto de R onde a expressão dada faz sentido, chamado
de domínio maximal.

Exemplo 5.1. Para cada uma das seguintes expressões, calculemos o seu domínio maximal:

• f pxq  x2 tem sentido para qualquer xPR e portanto o seu domínimo maximal é R;
• g pxq  ln x só tem sentido se x ¡ 0. Logo o seu domínio maximal é s0, 8r;
?
• hpxq  1  x2 : é necessário que o que está dentro da raíz quadrada seja um número
não-negativo, ou seja, que 1  x2 ¥ 0. Concluímos então que o domínio maximal é r1, 1s.
Denição 5.1. Dada um função f : Df Ñ R, Df € R, chamamos de contradomínio ao conjunto
das imagens de f :
CDf tf pxq : x P Df u.
Dadas duas funções f : Df Ñ R e g : Dg Ñ R, se CDf € Dg , então podemos construir a
função composta
g  f : Df
Ñ R, pg  f qpxq  gpf pxqq, x P Df .
Exemplo 5.2. Considere-se f pxq  sinpxq, x P R e g pxq 
?x, x ¥ 0. O contradomínio de f é
r1, 1s, que não está incluído no domínio de g. Portanto não podemos denir a função composta
g  f . Por outro lado, como o contradomínio de g está incluído no domínio de f (que é R),
podemos denir
?
f  g : r0, 8rÑ R, pf  g qpxq  f pg pxqq  sinp xq.

Denição 5.2. Seja f Ñ R, Df € R. Dizemos que:


: Df
1. f é injectiva se, para quaisquer x, y P Df , f pxq  f py q implica x  y (ou seja, objectos
diferentes têm imagens diferentes);

22
2. f é sobrejectiva se qualquer número real for imagem de algum objecto:
@y P R Dx P Df : f pxq  y.

Isto é equivalente a dizer que o contradomínio é R.


3. f é bijectiva se for injectiva e sobrejectiva.
4. f é crescente (resp. decrescente) se
@x, y P Df x¤y ñ f pxq ¤ f pyq presp. x ¤ y ñ f pxq ¥ f pyqq.
Se a desigualdade for estrita, dizemos que é estritamente crescente (resp. estritamente
decrescente).
Se uma função for crescente ou decrescente, dizemos que é monótona. Se o for estrita-
mente, dizemos que é estritamente monótona.
P R tal que
5. f é majorada se existir M
@x P Df f pxq ¤ M.
Analogamente, f é minorada se existir m P R tal que
@x P Df f pxq ¥ m.
Se f for majorada e minorada, dizemos que é limitada.
6. M é máximo de f se existir c P Df tal f pcq  M e
f pxq ¤ M, @x P D f .
Ao ponto c chamamos maximizante de f .
7. m é mínimo de f se existir c P Df tal f pcq  m e
f pxq ¤ M, @x P Df .
Ao ponto c chamamos minimizante de f .

Nota 5.3. Se uma função é estritamente monótona, então é injectiva. Se for somente monótona,
não é possível garantir que é injectiva: por exemplo, a função constante f : R Ñ R, f pxq  1, é
monótona e não é injectiva.

Se uma função f : Df Ñ R for injectiva, então podemos denir a função inversa


f 1 : CDf Ñ Df , f 1 py q  o único x P Df tal que f pxq  y.

O facto de y P CDf garante que existe pelo menos um x nestas condições, enquanto que a
injectividade garante que esse x é único.

Exemplo 5.3. Considere-se a função f p xq  3x 2. Note-se que não nos é indicado qual é o
domínio nem qual é o conjunto de chegada. Assim sendo, por convenção, o domínio é o maior
conjunto de R para o qual a expressão faz sentido (ou seja, Df  R) e o conjunto de chegada é
R. Será que esta função é injectiva? Dados x1 , x2 P R,
f px1 q  f px2 q ñ 3x1 2  3x2 2 ñ 3x1  3x2 ñ x1  x2 .

23
Concluímos então que f é injectiva. Qual é o contradomínio de f? Para cada y P R, temos de
ver se existe x P Df tal que f pxq  y :

y2
y  3x 2ôx
3
P Df
Como isto é válido para qualquer y P R, concluímos que o contradomínio é R. Além disso, a
expressão acima diz-nos precisamente qual é o único x P Df tal que f pxq  y , ou seja, a expressão
acima é a expressão da inversa de f:
y2
f 1 : R Ñ R, f 1 py q  .
3
Finalmente, como o contradomínio é igual ao conjunto de chegada, f é sobrejectiva e portanto é
bijectiva.

Exemplo 5.4. Considere-se a função g : R Ñ R, g pxq  x2 1. Esta função não é injectiva:

g p2q  p2q2 1  5  22 1  g p2q.

Assim sendo, não é possível inverter g.

Exemplo 5.5. Considere-se a função h : r0, 8rÑ R, hpxq  x2 1. Apesar de a sua expressão
ser idêntica à do exemplo anterior, o seu domínio de denição é diferente (e portanto h é uma
função diferente). Será que h P r0, 8r são tais que hpxq  hpyq, então
é injectiva? Se x, y

hpxq  hpy q ñ x2 1  y 2 1 ñ |x|  |y | ñ x  y porque x, y ¥ 0.

Assim sendo, podemos inverter h: dado z P R,

?
z  hpxq ô z  x2 1 ô z ¥ 1 ^ x  z  1.

Neste caso, o contradomínio é tz P R : z ¥ 1u  r1, 8r e portanto

?
h1 : r1, 8rÑ r0, 8r, h1 pz q  z  1.

Por m, como o contradomínio de h é diferente de R, h não é sobrejectiva.

Nota 5.4. Os dois exemplos acima mostram a importância do domínio nas propriedades da
função: apesar da expressão algébrica ser a mesma, num caso a função era injectiva e no outro
caso não o era.

5.2 Funções trignométricas


Consideremos a circunferência centrada na origem e de raio 1. Para cada número real positivo
x, consideramos o caminho sobre a circunferência começando em p1, 0q e de comprimento x,
seguindo o sentido anti-horário. Denimos que as coordenadas do ponto onde termina essa curva
são pcos x, sin xq, o cosseno e o seno de x. Se x for negativo, tomamos a curva de comprimento
|x| no sentido horário. Desta denição resulta logo que 1 ¤ cospxq, sinpxq ¤ 1 e que
cospx 2π q  cospxq, sinpx 2π q  sinpxq,

24
Figura 5: A representação geométrica das funções sin, cos e tan, para x ¡ 0.

já que andando mais 2π  dou somente mais uma volta à circunferência e termino exactamente no
mesmo ponto (recorde-se que o perímetro da circunferência é 2π ). Além disso, como pcos x, sin xq
são as coordenadas de um ponto da circunferência, temos de ter

cos2 x sin2 x  1.

Assim sendo, cam denidas as funções

cos : R Ñ r1, 1s, sin : R Ñ r1, 1s.

Sempre que cospxq  0 (ou seja, quando x  kπ{2, P Z), podemos ainda denir a função
k
tangente tan:
sinpxq
tan : tx P R : x  kπ {2, k P Zu Ñ R, tanpxq 
cospxq
.

Para visualizar esta função, traçamos a recta vertical que passa por p1, 0q. Para cada x P R,
marcamos o ponto pcospxq, sinpxqq e traçamos a recta que passa por este ponto e pela origem. A
intersecção entre as duas rectas é o ponto de coordenadas p1, tanpxqq. Esta intersecção não está
bem-denida quando as rectas são paralelas, o que acontece quando x  kπ {2, k P Z.

Nota 5.5. Para cada ponto da circunferência no primeiro quadrante, podemos construir um
triângulo rectângulo: Repare-se, como a hipotenusa tem comprimento 1, temos

sinpxq  cospxq 
comprimento do cateto oposto comprimento do cateto adjacente
, ,
comprimento da hipotenusa comprimento da hipotenusa

o que bate certo com a denição mais usual de seno e cosseno.

25
Figura 6: Relação com a denição usual de seno e cosseno.

Estas funções trignométricas não são injectivas nos seus domínios:

cosp0q  cosp2π q, sinp0q  sinp2π q, tanp0q  tanp2π q.

No entanto, restringindo o seu domínio, pode acontecer que sejam invertíveis:

• É possível ver que a função f : r0, π s Ñ r1, 1s, f pxq  cospxq é bijectiva (tente vericar
gracamente). Assim sendo, podemos denir a função inversa, à qual damos o nome de
arccos:

arccos : r1, 1s Ñ r0, π s, arccospy q  o comprimento do arco cujo coseno é y.

• A função f : rπ{2, π{2s Ñ r1, 1s, f pxq  sinpxq é também bijectiva (novamente, tente
vericar gracamente). Logo podemos denir a função inversa, à qual damos o nome de
arcsin:

arcsin : r1, 1s Ñ rπ {2, π {2s, arcsinpy q  o comprimento do arco cujo seno é y.

• Finalmente, a função f :s  π {2, π {2rÑ R, f pxq  tanpxq é também uma bijecção. A sua
inversa é denominada de arctan:

arctan : R Ñs  π {2, π {2r, arctanpy q  o comprimento do arco cuja tangente é y.

26
5.3 Limite de uma função num ponto
Nesta secção, denimos o conceito de limite de uma função f : Df Ñ R num ponto a P Df1 .
O objectivo é dizer que, quando nos aproximamos do ponto a, as imagens correspondentes
aproximam-se de um determinado valor L. Existem duas formas de conceptualizar esta ideia:

• A aproximação a a pode ser feita usando sucessões. Se pxn qnPN é uma sucessão de pontos
do domínio diferentes de a com xn Ñ a, então podemos construir a sucessão das imagens
pf pxn qqnPN . Então o que deverá acontecer é que esta nova sucessão convirja para L. Ou
seja
@pxn qnPN , xn P Df ztau : xn Ñ a ñ f pxn q Ñ L.
• Usando vizinhanças: tal como na denição de limite nito de sucessões, o conceito de
aproximar de L pode ser denido à custa de vizinhanças. Fixada uma certa distância
δ ¡ 0, consideramos a vizinhança sL  δ, L δr. Tendo em conta a ideia intuitiva de limite,
o que deverá acontecer é que, quando tomo pontos sucientemente próximos de a (isto é,
cuja distância a a seja menor que uma certa distância ), a imagem desses pontos está na
vizinhança sL  δ, L δr. Traduzindo isto para linguagem matemática,
@ ¡ 0 Dδ ¡ 0 : 0   |x  a|   δ ñ |f pxq  L|   .
Denição 5.3 (Limite nito de uma função num ponto). Dado f : Df Ñ R, seja a P Df1 . Dado
L P R, dizemos então que f converge em a para L se
@pxn qnPN , xn P Df ztau : xn Ñ a ñ f pxn q Ñ L.
Nesse caso escrevemos limxÑa f pxq  L.
Escolhemos como denição a primeira alternativa, outros autores preferem a segunda. No
entanto, a seguinte proposição mostra que as duas possibilidades são equivalentes:

Proposição 5.4. Uma função f Ñ R tem limite nito em a P Df1 se e só se


: Df
@δ ¡ 0 D ¡ 0 : 0   |x  a|   δ ñ |f pxq  L|   .
Exemplo 5.6. Vamos ver, usando as duas denições, que, sendo f : R Ñ R, f pxq  x2 ,
lim x2 1  1.
x Ñ0
• Usando sucessões: dada uma sucessão pxn qnPN , se xn Ñ 0, então x2n Ñ 02  0. Logo
f pxn q  x2n 1Ñ0 1  1. Como isto é válido para qualquer sucessão, ca demonstrado
que
lim x2 1  1.
x Ñ0
• Usando vizinhanças: xado  ¡ 0, tenho primeiro de ver o que signica |f pxq  1|   :
|f pxq  1|    ô |px2 ?
1q  1|    ô |x|   .
Isto signica que, se escolher δ 
?, tenho
?
0   |x  0|   δ ñ |x|    ñ |f pxq  1|   .
Como este processo é possível independentemente de , ca demonstrado que

lim x2 1  1.
x Ñ0

27
A denição usando sucessões tem várias vantagens: por um lado, permite o uso das propri-
edades dos limites de sucessões; por outro, permite extender facilmente a noção de limite num
ponto para incluir limites innitos.

Denição 5.5 (Limite innito de uma função num ponto) . Dado f : Df Ñ R, seja a P Df1 .
Dado L P R, dizemos então que f diverge em a para 8 (resp. 8) se
@pxn qnPN , xn P Df ztau : xn Ñ a ñ f pxn q Ñ 8 (resp. f pxn q Ñ 8q
Nesse caso escrevemos limxÑa f pxq  8 (resp. limxÑa f pxq  8).

Denição 5.6 (Limite de uma função em 8). Dado f : Df Ñ R com Df não-majorado,


dizemos o limite de f em 8 é L se
@pxn qnPN , xn P Df : xn Ñ 8 ñ f pxn q Ñ L
Nesse caso escrevemos limxÑ 8 f pxq  L. Nesta denição, L pode ser tanto um número real
como 8.

Denição 5.7 (Limite de uma função em 8). Dado f : Df Ñ R com Df não-minorado,


dizemos o limite de f em 8 é L se
@pxn qnPN , xn P Df : xn Ñ 8 ñ f pxn q Ñ L
Nesse caso escrevemos limxÑ8 f pxq  L. Nesta denição, L pode ser tanto um número real
como 8.

Nota 5.6. É possível denir limites innitos usando uma abordagem topológica. Para o decorrer
deste curso, a denição com sucessões será suciente.

Tendo em conta que o limite de funções é denido à custa de limites de sucessões, obtemos
imediatamente as seguintes propriedades:

Proposição 5.8 (Propriedades dos limites de funções). São válidas as seguintes armações:
1. O limite de uma função num ponto, se existir, é único (não nos podemos aproximar ao
mesmo tempo de pontos diferentes);
2. Se limxÑa f pxq  L e limxÑa g pxq  M , com L, M P R, então
(a) limxÑa f pxq g pxq  L M;
(b) limxÑa f pxq  g pxq  L  M ;
(c) limxÑa f pxqg pxq  LM ;
(d) Se M 0, então limxÑa f pxq{gpxq  L{M ;
(e) limxÑa ef pxq  eL , limxÑa sinpf pxqq  sinpLq, limxÑa cospf pxqq  cospLq;
(f) Se L ¡ 0, lim lnpf pxqq  lnpLq.
Aqui, a pode ser um número real ou 8.

28
3. Dado b P R, a função f : R Ñ R denida por
f pxq  b, nPN

tem limite b em qualquer ponto do seu domínio.


4. Se f pxq ¤ g pxq, @x P Df X Dg , a P Df1 X Dg1 e
lim f pxq  L, lim g pxq  M,
xÑa xÑa

então L ¤ M . O mesmo não é válido com desigualdades estritas.


5. Se limxÑa f pxq  8 e limxÑa gpxq  L, então
(a) Se L P R ou L  8, limxÑa f pxq g pxq  8;
(b) Se L ¡ 0 ou L  8, limxÑa f pxqg pxq  8;
(c) Se L   0 ou L  8, limxÑa f pxqg pxq  8;
(d) Se L P R, limxÑa g pxq{f pxq  0;
(e) limxÑa ef pxq  8 e limxÑa ln f pxq  8.
Nota 5.7. Tal como no caso das sucessões, existem diversas situações onde não é possível aplicar
as propriedades dos limites, tais como

0 8 , p 8q  p 8q, 0  8.
0
,
8
Estes casos correspondem a indeterminações que terão de ser levantadas usando manipulações
algébricas ou critérios de convergência.

Proposição 5.9 (Funções enquadradas). Dado D € R, sejam f, g, h : D Ñ R e a P D1 . Se


f pxq ¤ g pxq ¤ hpxq, @x P D
e limxÑa f pxq  limxÑa hpxq  L, então
lim g pxq  L.
x Ña
Por vezes, é conveniente tratar separadamente o limite de uma função no limite à esquerda e
à direita do ponto limite a:
Denição 5.10 (Limites laterais nito de uma função num ponto). Dado f : Df Ñ R, seja
a P D1 . Dado L P R, dizemos então que o limite de f em a por valores superiores (ou à direita
f
de a) é L se
@pxn qnPN , xn P Df ztau : xn Ñ a ^ xn ¡ a ñ f pxn q Ñ L.
Nesse caso escrevemos limxÑa f pxq  L. Analogamente, dizemos então que o limite de f em a
por valores inferiores (ou à esquerda de a) é L se
@pxn qnPN ,
P Df ztau :
xn xn Ñ a ^ xn   a ñ f pxn q Ñ L.
Nesse caso escrevemos limxÑa f pxq  L.
Proposição 5.11. Se existirem ambos os limites laterais, então a função tem limite no ponto
se e só se os limites laterais forem iguais.

29
Exemplo 5.7. Existem vários limites notáveis que são úteis para levantar indeterminações. Aqui
não apresentamos a prova destas convergências, remetendo para a bibliograa disponível.

1. limxÑ0   1;
ex 1
x

2. limxÑ0 sinxpxq  1;

3. limxÑ0 lnp1x xq  1;

4. limxÑ0 1cosx
p xq  0 ;

limxÑ8 ax  8, a ¡ 1;
x
5.

6. limxÑ8 xax  0, a ¡ 1;
7. limxÑ0 x lnpxq  0;

5.4 Continuidade
Denição 5.12. Dada f : Df Ñ R e a P Df , dizemos que f é contínua em a se
• a for um ponto isolado do domínio;
• a for um ponto de acumulação e

lim f pxq  f paq.


x Ña
Se uma função for contínua em todos os pontos do seu domínio, diremos simplesmente que é
contínua no seu domínio.
Proposição 5.13. São válidas as seguintes armações:
1. As funções racionais, as funções trignométricas, as exponenciais, os logaritmos, as cons-
tantes e as raízes de índice arbitrário são funções contínuas nos seus domínios maximais;
2. A soma, a diferença, o produto, o quociente e a composição de funções contínuas origina
uma função contínua no seu domínio.
?x
Exemplo 5.8. A função f pxq  e 1{ sinpxq é uma função contínua em todo o seu domínio:

?
ex , x, 1{x e sinpxq são funções contínuas, por serem, respectivamente, uma exponencial,
uma raíz quadrada, uma função racional e uma função trignométrica;

pex  ?xqpxq  e x é contínua, porque é composição de funções contínuas;


?
• a composta

• a composta p1{x  sinpxqqpxq  1{ sinpxq também é contínua;

• como f é a soma das duas funções contínuas, f é contínua.

Exemplo 5.9. Considere-se a função f r7{2, 3rYt4u esboçada na gura.


denida em

• A função tem limite igual 0 em x  2. Como f p2q  0, a função não é contínua neste
ponto.

• O ponto x4 é um ponto isolado do domínio. Logo f é contínua em x  4. Como x4


não é um ponto de acumulação, não faz sentido falar de limite neste ponto.

30
• A função diverge para 8 em x  3. Não se coloca problema em relação à continuidade
porque x3 não pertence ao domínio.

Exemplo 5.10 (Prolongamento por continuidade). Suponhamos que f : Dztau Ñ R é contínua


e tem limite nito L em a. Então podemos denir o prolongamento de f a D por continuidade:
"
f pxq, x P Dztau
f˜ : D Ñ R, f˜pxq 
L, xa

Este prolongamento é feito de forma a que esta nova função seja contínua (daí dizermos que é
por continuidade).

Proposição 5.14 (Limite da função composta) . Se f : D Ñ C, g : C Ñ R forem funções


contínuas e
lim f pxq  b, lim g py q  L
x Ña y Ñb
então limxÑa pg  f qpxq  L. Por outras palavras,
lim g pf pxqq  lim g py q
x Ña y Ñb
Exemplo 5.11. É importante a hipótese de continuidade: se

"
x0
f pxq  g pxq  f pxq,
0,
x0
,
1,

então pg  f qpxq  1 para qualquer x P Rzt0u e


lim f pxq  lim g pxq  0, lim pg  f qpxq  lim 1  1.
xÑ0 xÑ0 x Ñ0 xÑ0

31
Exemplo 5.12. Usando o limite da função composta, podemos mudar a variável no limite que
se pretende calcular: por exemplo, suponhamos que queremos calcular

1
ln 1
lim g py q  lim
y2
,
y Ñ 8 yÑ 8 1
y2

Tomando y  f pxq  1{?x, sabemos que, quando y Ñ 8, x Ñ 0 . Logo, como todas as


funções envolvidas são contínuas,

ln p1 xq
1
ln 1
y
lim
Ñ 8 1
y2
 yÑlim8 gpyq  xlim
Ñ0
g pf pxqq  lim
xÑ0 x
 1.
y2

Na prática, não é necessário apresentar os passos intermédios da mudança de variável.

Teorema 5.15 (Teorema de Bolzano) . Dada uma função f : ra, bs Ñ R contínua e um valor
k P R entre f paq e f pbq, existe c P ra, bs tal que f pcq  k.
Demonstração. Considere-se o conjunto

A  tx P ra, bs : f py q   k para qualquer y entre a e x.u

Este conjunto é não-vazio (aP A) é é majorado (por b, por exemplo). Logo tem um supremo
Corolário 5.16. Dada uma função f : ra, bs Ñ R contínua, se f paqf pbq   0, existe c Psa, br tal
que f pcq  0.
Demonstração. Escolhendo k  0, a condição f paqf pbq   0 mostra que k está entre f paq e f pbq.
Como f é contínua, podemos aplicar o Teorema de Bolzano e concluir a existência de c P ra, bs
tal que f pcq  k  0. Como f paq, f pbq  0, c não pode ser igual a a nem a b.

Teorema 5.17 (Teorema de Weierstrass) . Uma função contínua denida sobre um conjunto
compacto tem sempre máximo e mínimo.
Exemplo 5.13. Todas as hipóteses são importantes para a aplicação do teorema:

• Se f pxq  1{x, x Ps0, 1s, f é contínua no seu domínio, o domínio é limitado e f não tem
nem máximo nem mínimo. O problema aqui é que o seu domínio não é fechado;

• Se f pxq 
?x, x ¥ 0, f é contínua, o domínio é fechado mas não é limitado;
• Se f pxq  1{x, x Ps0, 1s e f p0q  0, o seu domínio é r0, 1s, que é compacto, mas f não é
contínua.

Exemplo 5.14. Dada uma função f : r0, 1s Ñ R contínua e positiva, mostremos que ela é maior
que um certo valor m ¡ 0: pelo Teorema de Weierstrass, f tem um mínimo m. Como m é
imagem de algum objecto e f é positiva, temos m ¡ 0. Como m é mínimo,

f pxq ¥ m ¡ 0, @x P r0, 1s.

32
6 Diferenciabilidade
Seja f : ra, bs Ñ R e x, x0 Psa, br, com x  x0 . O declive da recta secante que passa por
px0 , f px0 qq e px, f pxqq é dado pela taxa de variação média
f pxq  f px0 q
TVMx,x 
x  x0
0 .

À medida que aproximamos o ponto x de x0 , a recta intersecta o gráco de f em dois pontos


cada vez mais próximos. Se pudermos considerar o limite quando x Ñ x0 , obteremos no nal
uma recta que é tangente ao gráco de px0 , f px0 qq. Qual é o declive desta recta tangente?
f em

f pxq  f px0 q
declive da recta tangente  lim declive da recta secante  lim
x  x0
.
xÑx 0 xÑx 0

Denição 6.1. Dada uma função f : Df Ñ R e um ponto x0 interior a Df , dizemos que f é


derivável em x0 se existir o limite
f pxq  f px0 q
x  x0
lim ,
x Ñx0
podendo este ser nito, 8 ou 8. Se o limite for nito, dizemos que f é diferenciável em x0
e denimos a derivada de f em x0 como sendo
f pxq  f px0 q
f 1 px0 q  lim
x  x0
.
x Ñx0
Uma função que seja diferenciável em todos os pontos interiores do seu domínio é chamada
diferenciável.
Nota 6.1. Usando a mudança de variável h  x  x0 , temos

f pxq  f px0 q f px0 hq  f px0 q


lim
x Ñx0 x  x0
 hlim
Ñ0 h
.

Podemos usar qualquer um destes limites para estudar a diferenciabilidade de f.


Nota 6.2. Note-se que

f p x0 hq  f px0 q f p x0 hq  f px0 q  f 1 px0 qh


lim
hÑ0 h
 f 1 px0 q ô hlim
Ñ0 h
0
Esta equivalência é especialmente útil no contexto da cadeira de Cálculo II.

Exemplo 6.1. Vamos estudar a diferenciabilidade de f pxq  x2 3 no ponto x0  1:


f p1 hq  f p1q pp1 hq2 3q  p12 3q 2
lim
Ñ0
h h
 hlim
Ñ0 h
 hlim 2h h
Ñ0 h
 hlim
Ñ0
2 h  2.

Como o limite existe e é nito, dizemos que f  1 e que f 1 px0 q  2.


é diferenciável em x0
Exemplo 6.2. Vamos estudar a diferenciabilidade de f pxq  |x| no ponto x0  0: neste caso,
separamos o limite quando h é positivo ou negativo:

• h ¡ 0:
f p0 hq  f p0q |0 h|  0
h
lim
Ñ0 h
 hlim
Ñ0 h
 hlim
Ñ0
h
h
 hlim
Ñ0
1  1;

33
• h   0:
f p0 hq  f p0q |0 h|  0 h  lim 1  1;
h
lim
Ñ0 h
 hlim
Ñ0 h
 hlim
Ñ0 h hÑ0

Como os limites laterais são diferentes, o limite não existe, e portantof não é derivável em x  0.
Exemplo 6.3. Consideremos f pxq 
? x, x P R. Então
3

?
f p0 hq  f p0q
?1  8.
3

lim
hÑ0 h
 hlim
Ñ0 h
h
 hlim
Ñ0 p hq2 3

Como o limite é 8, dizemos que f é derivável em x  0 mas que não é diferenciável em x  0.


Denição 6.2. Dada uma função f : ra, bs Ñ R,
• se x0 P ra, br, chamamos de derivada de f à direita de x0 ao limite (se existir)

f px0 hq  f px0 q
f 1 px q  lim .
d 0
h Ñ0 h
Se fd1 paq existir, dizemos que f é derivável em a. Se for nito, dizemos que é diferenciável
em a e que a sua derivada é fd1 paq;
• se x0 Psa, bs, chamamos de derivada de f à esquerda de x0 ao limite (se existir)
f px0 hq  f px0 q
f 1 px q  lim .
e 0
h Ñ0 h
Se fe1 pbq existir, dizemos que f é derivável em b. Se for nito, dizemos que é diferenciável
em b e que a sua derivada é fe1 paq;
Nota 6.3. Uma função é derivável num ponto interior x0 se e só se as derivadas à esquerda e
à direita existirem e forem iguais (podendo ser innitas). Uma função é diferenciável se e só se
estas derivadas forem iguais e nitas.

Exemplo 6.4. Seja f : R Ñ R, f pxq  0 se x0 e f p0q  1.


1. Derivada à direita de x  0:
f p0 hq  f p0q 01
h
lim
Ñ0 h
 hlim
Ñ0 h
 8.
2. Derivada à esquerda de x  0:

f p0 hq  f p0q 01
h
lim
Ñ0 h
 hlim
Ñ0 h
 8.
Como as duas derivadas laterais são diferentes, a função não é derivável em x  0.
Usando a denição e alguns limites notáveis, podemos deduzir as seguintes regras de derivação:

Proposição 6.3 (Regras de derivação I). São válidas as seguintes armações:


1. se f pxq  a, a P R, f 1 pxq  0 para qualquer x P R;

34
2. pex q1  ex , x P R;
3. pln xq1  1{x, x ¡ 0;
4. psin xq1  cos x, x P R;

5. pcos xq1   sin x, x P R;


6. pxk q1  kxk1 , para qualquer x onde ambas as expressões tenham sentido.
7. Se f e g são diferenciáveis em x0 , então
(a) f g é diferenciável em x0 e pf g q1 px0 q  f 1 px0 q g 1 px0 q;
(b) f g é diferenciável em x0 e pf g q1 px0 q  f 1 px0 qg px0 q f px0 qg 1 px0 q;
(c) se g px0 q  0, f {g é diferenciável em x0 e

1 1 1
f
g
px0 q  f px0 qgpx0gqpx qg2 px0 qf px0 q .
0

Exemplo 6.5. Se f pxq  tanpxq  sinpxq{ cospxq,

psinpxqq1 cospxq  pcospxqq1 sinpxq  cos2 pxq sin2 pxq  1 ,


f 1 pxq 
cos2 pxq cos2 pxq cos2 pxq

já que cos pxq sin2 pxq  1.


2

Apesar destas regras, precisamos de saber ainda como se comporta a diferenciabilidade em


relação à composta e à inversa de funções.

Proposição 6.4 (Derivada da função composta). Sejam f : Df Ñ Cf e g : Dg Ñ R com


Cf €Dg (para a composta g  f estar bem-denida). Dado x0 P Df , suponhamos que f é
diferenciável em x0 e g é diferenciável em f px0 q. Então g  f é diferenciável em x0 e
pg  f qpx0 q  g1 pf px0 qqf 1 px0 q.
Proposição 6.5 (Regras de derivação II). Se f : D Ñ R é uma função diferenciável, então
1. pef pxq q1  ef pxq f 1 pxq;
2. pcospf pxqqq1   sinpf pxqqf 1 pxq;
3. psinpf pxqqq1  cospf pxqqf 1 pxq;
4. se f ¡ 0, plnpf pxqqq1  f 1 pxq{f pxq;
5. pf pxqn q1  nf pxqn1 f 1 pxq, n P N.
Exemplo 6.6. Usando a derivada da função composta, vamos calcular a derivada de hpxq 
esin x : como h  pg  f q, com g  ex e f  sin x,

h1 pxq  g 1 pf pxqqf 1 pxq  esin x cos x.

35
Exemplo 6.7. Dadas funções f, g , com f ¡ 0, qual é a derivada de f g ? Em primeiro lugar,
escrevemos
f pxqgpxq  egpxq ln f pxq .
Agora, aplicamos a regra da composta:

pf g q1 pxq  egpxq ln f pxq pgpxq ln f pxqq1  egpxq ln f pxq g1 pxq ln f pxq g pxqpln f pxqq1
 1

 egpxq ln f pxq g1 pxq ln f pxq gpxq ff ppxxqq


Proposição 6.6 (Derivada da função inversa). Seja f : Df Ñ CDf uma função bijectiva e
seja f 1 : CDf Ñ Df a sua inversa. Dado um ponto y P CDf , seja x o único objecto tal que
f pxq  y . Se f 1 pxq  0, então f 1 é diferenciável em y e

pf 1 q1 pyq  f 11pxq  f 1 pf 11 pyqq .


Exemplo 6.8. Usando o facto de que a função logaritmo é a função inversa da exponencial,
vamos calcular a sua derivada: neste caso, f p xq  ex e f 1 pyq  ln y. Como f 1 pxq  ex ¡ 0 ,
posso aplicar sempre calcular a derivada da função inversa:

pf 1 pyqq1  pln yq1  f 1 pf 11 pyqq  f 1 pln1 yq  eln1 y  y1 .


a
Exemplo 6.9. Sabendo que cosparcsin y q  1  y 2 , y Ps  1, 1r, calculemos a derivada de
arcsinpy q, que é a função inversa de f pxq  sinpxq. A derivada de sinpxq é cospxq, que é não-nula
desde que x  kπ {2, k P Z. Nesse caso,

parcsinpyqq1  f 1 parcsin
1
pyqq  cosparcsinpyqq  a
1 1
, y Ps  1, 1r.
1  y2
Exemplo 6.10. Sabendo que

cos2 parctan y q  P R,
1
, y
1 y2
calculemos a derivada de arctanpy q, que é a função inversa de f pxq  tanpxq. A derivada de
tanpxq é 1{ cos2 pxq, que é não-nula. Portanto

parctanpyqq1  f 1 parctan
1
pyqq  cos parctanpyqq  1
2 1
y2
, y P R.
Dada uma função diferenciável f : Df Ñ R, podemos olhar para a função derivada f1 :
intpDf q Ñ R. Se a função derivada for diferenciável num ponto x0 , temos

f 1 px0 hq  f 1 px0 q
f 2 px0 q  pf 1 q1 px0 q  lim .
h Ñ0 h
Ao valor f 2 px0 q chamamos segunda derivada de f em x0 . Se a primeira derivada de f for
diferenciável, dizemos que f é duas vezes diferenciável.
Por iteração, podemos também denir a n-ésima derivada de uma função e falar de funções
n vezes diferenciáveis.

Nota 6.4. Para simplicar notações, quando o número de derivadas k é muito elevado, escre-
vemos simplesmente f pkq px0 q em vez de colocarmos uma linha por cada derivada. Por exemplo,
escrevemos
f p6q px0 q em vez de f 42 px0 q.

36
6.1 Resultados sobre funções diferenciáveis
Proposição 6.7. Se f : Df Ñ Cf é diferenciável num ponto x0 , então f é contínua em x0 .
Proposição 6.8. Dada uma função diferenciável f :sa, brÑ R,
1. se f 1 ¥ 0 sobre sa, br, então f é crescente;
2. se f 1 ¤ 0 sobre sa, br, então f é decrescente;
3. se f 1 ¡ 0 sobre sa, br, então f é estritamente crescente;
4. se f 1   0 sobre sa, br, então f é estritamente decrescente;
5. se, para algum ponto x0 Psa, br, se tiver
f 1 pxq   0, x Psa, x0 r, f 1 px0 q  0, f 1 pxq ¡ 0, x Psx0 , br

então x0 é minimizante de f em sa, br e f px0 q é um mínimo local de f ;


6. se, para algum ponto x0 Psa, br, se tiver
f 1 pxq ¡ 0, x Psa, x0 r, f 1 px0 q  0, f 1 pxq   0, x Psx0 , br

então x0 é maximizante de f em sa, br e f px0 q é um máximo local de f ;


Teorema 6.9 (Teorema de Lagrange). Dada uma função f : ra, bs Ñ R contínua em ra, bs e
diferenciável em sa, br, existe c Psa, br tal que
f pbq  f paq
f 1 pcq 
ba
.

Exemplo 6.11. Dado f : r1, 1s Ñ R,

f p xq 
2x
2
 x2  3 x
x4 5 lnp1 x2 q 1
vamos ver que existe um ponto onde a derivada de f é positiva e menor do que 1: f é contínua,
diferenciável e

2131
f p1q 
2 5 ln 2
 2 53ln 2 , f p1q 
213 1
2 5 ln 2
 2 51ln 2 .
Logo existe c Ps  1, 1r tal que

f p1q  f p1q
f 1 pcq  2 1
2 5 ln 2
valor que está, de facto, entre 0 e 1.

Uma consequência directa do teorema de Lagrange é:

Teorema 6.10 (Teorema de Rolle). Dada uma função f : ra, bs Ñ R contínua em ra, bs e
diferenciável em sa, br, se f paq  f pbq, então existe c Psa, br tal que f 1 pcq  0
Corolário 6.11. Dada uma função f : ra, bs Ñ R contínua e diferenciável,
• entre dois zeros de f existe, pelo menos, um zero de f 1 ;

37
• entre dois zeros consecutivos de f 1 existe no máximo um zero de f .
Exemplo 6.12. Mostremos que o polinómio f pxq  x3  5x 2 tem, no máximo, três raízes. Em
primeiro lugar, f é contínua e diferenciável tantas vezes quantas se quiser. Se f tivesse quatro
raízes r1   r2   r3   r4 , então, pelo Teorema de Rolle,
1. entre r1 e r2 , f 1 teria um zero em r11 ;
2. entre r2 e r3 , f 1 teria um zero em r21 ;
3. entre r3 e r4 , f 1 teria um zero em r31 ;
Temos obviamente r11   r21   r31 . Podemos aplicar o mesmo raciocínio para f 1 :
1. entre r11 e r21 , f 2 teria um zero em r12 ;
2. entre r21 e r31 , f 2 teria um zero em r22 ;
e novamente r12
  r22 . No entanto, é fácil ver que
f 1 pxq  3x2  5, f 2 pxq  6x.
2 2 2
A única raíz de f é x  0, contradizendo a existência de r1 e r2 . Logo f não pode ter quatro
raízes.

Exemplo 6.13. Mostremos que o polinómio f p xq  x3  5x 2 tem exactamente 3 raízes: a


ideia é aplicar o teorema de Bolzano em intervalos disjuntos. Como f é contínua e

f p3q  10, f p0q  2, f p1q  2, f p3q  14,


aplicando o teorema de Bolzano,

• como f p3qf p0q   0, s  3, 0r;


existe uma raíz em

• como f p0qf p1q   0, existe uma raíz em s0, 1r;

• como f p1qf p3q   0, existe uma raíz em s1, 3r;

Estas raízes são obviamente diferentes (estão em intervalos disjuntos). Pelo exemplo anterior,
sabemos que, no máximo, f tem três raízes. Podemos concluir então que f tem exactamente
três raízes.

Proposição 6.12 (Regra de L'Hôpital). Dadas duas funções f, g diferenciáveis em a P R,


suponhamos que f paq  g paq  0, g 1 paq  0 e que g pxq  0, x  a. Então
f pxq 1
xÑa g pxq
lim  fg1 ppaaqq .
Demonstração. Como f e g são diferenciáveis em a, temos

f pxq  f paq f pxq g pxq  g paq g pxq


f 1 paq  lim  xlim g 1 paq  lim  xlim
x Ña xa Ña x  a , x Ña xa Ña x  a
Como g 1 paq  0, pelas propriedades dos limites,

f p xq
f pxq xa f 1 paq
xÑa g pxq
lim  xlim 
Ña gpxq g1 paq .
xa

38
Proposição 6.13 (Regra de Cauchy) . Dadas duas funções diferenciáveis f, g : D Ñ R e um
ponto a P D, suponhamos que
f pxq 8, f 1 pxq
xÑa g pxq
lim  00 ou
8 xÑa g 1 pxq
lim existe.

Então
f p xq f 1 pxq
xÑa g pxq
lim  xlim
Ña g1 pxq .
O resultado ainda é válido quando o domínio é não-majorado (resp. não-minorado) e a  8
(resp. a  8).
Exemplo 6.14. Vamos aplicar a regra de Cauchy para levantar várias indeterminações:

1. limxÑ0 x ln x: em primeiro lugar, temos de escrever como uma indeterminação do tipo 0{0
ou 8{8:
lim x ln x  lim
x Ñ0 x Ñ0
ln x
1 8
8.
x
Tentemos aplicar a regra de Cauchy: as funções são diferenciáveis e

pln xq1  lim 1


 xlim x  0.
1
x
Ñ0 
lim
x Ñ0 1 x 1
x2
Ñ0
x

Logo, pela regra de Cauchy, limxÑ0 x ln x  0.


2. Como

lim
x2 1 8,
8
x Ñ 8 ex
vamos calcular o limite do quociente das derivadas:

px2 1q1  lim 2x  8 .


xÑ lim
8 pex q1 xÑ 8 ex 8
Este limite é também ele uma indeterminação nas condições da regra de Cauchy. Como

p2xq1  lim 2  0,
x
lim
Ñ 8 pex q1 xÑ 8 ex
a regra de Cauchy implica que
px2 1q1  0
x Ñlim
8 pex q1
e, novamente pela regra de Cauchy,

x2 1
x
lim
Ñ 8 ex  0.
3. limxÑ0 psin xqx : em primeiro lugar, escrevemos na forma exponencial:
psin xqx  ex lnpsin xq .
Basta então calcular o limite no expoente: como

lnpsin xq
x
lim x lnpsin xq  lim
Ñ0 x Ñ0 1 8
8,
x

39
vamos ver o limite correspondente às derivadas:

plnpsinxqq1  lim cos x 2


1   xlim  x cos x  00
sin x
lim
x Ñ0 1 x Ñ0 1
x2
Ñ0 sin x
x

Como obtivemos novamente uma indeterminação, vamos tentar calcular o limite para o
quociente das derivadas:

lim 
px2 cos xq1  lim  2x cos x  x2 sin x  0.
x Ñ0 psin xq1 xÑ0 cos x
Assim sendo, pela regra de Cauchy,

x2 cos x
lim  0
x Ñ0 sin x
e portanto, igualmente pela regra de Cauchy,

lim psin xqx  elim Ñ x 0 p


x ln sin x q  e0  1.
x Ñ0
6.2 Fórmula de Taylor
Dada uma função f diferenciável em aPR e dado b P R, escrevemos

f pxq  f paq bpx  aq Rpxq, Rpaq  0,


onde R é um certo resto que vem da diferença entre a função f e a recta P pxq  f paq bpx  aq.
Para a recta ser uma boa aproximação de f, o resto deve ser pequeno. Temos


R p xq f pxq  f paq  bpx  aq f pxq  f paq


xÑa x  a
lim  xlim
Ña xa
 xlim
Ña xa
 b  f 1 paq  b.
Se b  f 1 paq, então o resto é parecido com x  a. Por outro lado, se b  f 1 paq, então R é muito
mais pequeno do que xa (mesmo quando dividimos R por x  a, ainda obtemos algo a tender
para 0). A conclusão é que a melhor aproximação de f em a usando rectas é
P1 pxq  f paq f 1 paqpx  aq
Ao polinómio P chamamos polinómio de Taylor de primeira ordem e dizemos que o desenvolvi-
mento de Taylor de primeira ordem de f em a é

f pxq  f paq f 1 paqpx  aq Rpxq  P1 pxq Rpxq


Ao valor f 1 paqpx  aq chamamos de diferencial de f em a e escrevemos dfa pxq. Este valor é uma
aproximação à diferença entre f pxq e f paq:
f pxq  f paq  dfa pxq Rpxq  dfa pxq.
Exemplo 6.15. Dado f pxq  x 3{px 3q
2
e x
, calculemos um valor aproximado de f p0.1q a
partir do valor em x  0: escolhemos a  0 e escrevemos

f pxq  f p0q f 1 p0qpx  0q Rpxq  f p0q f 1 p0qx


Como f p0q  2 e f 1 p0q  2{3, obtemos

f pxq  2
2
x.
3
Logo o diferencial de f entre 0 e 0.1 é de 2{30 e f p0.1q  2 2{30.

40
Se f for diferenciável n vezes, então podemos aproximá-la de uma forma ainda mais precisa
usando um polinómio de grau n: o desenvolvimento de Taylor de f de ordem n em a é

f 2 paq f pnq paq


f pxq  f paq f 1 paqpx  aq px  aq2  px  aqn Rn pxq,
2 n!
onde Rn é o n-ésimo resto da aproximação e satisfaz

Rn pxq
x
lim
Ña px  aqn  0.
O polinómio de Taylor de grau n é

f 2 paq f pnq paq


Pn pxq  f paq f 1 paqpx  aq px  aq2  px  aqn .
2 n!
No caso em que a  0, o desenvolvimento chama-se desenvolvimento de MacLaurin.

Proposição 6.14. Se f for n 1 vezes diferenciável, então o resto no desenvolvimento de Taylor


de ordem n pode ser escrito como
f pn 1q pcq
Rn pxq  px  aqn 1
c entre a e x.
pn 1q!
,

Esta fórmula para o resto é denominada de resto de Lagrange.


Exemplo 6.16. Sendo f pxq  3 sin x, façamos o desenvolvimento de MacLaurin de ordem 3 e
estimemos o resto: como

f 1 pxq  3 cos x, f 2 pxq  3 sin x, f 3 pxq  3 cos x, f p4q pxq  3 sin x

temos f p0q  0, f 1 p0q  3, f 2 p0q  0, f 3 p0q  3 e

f 2 p0q 2 f 3 p0q 3
f 1 p0qx
3x3
3 sin x  f pxq  f p0q x x R3 pxq  3x  R3 pxq.
2! 3! 6
Usando a fórmula do resto de Lagrange,

f p4q pcq 4
R3 pxq   3 sin c 4
x x , c entre 0 e x.
4! 4!
Logo
 
 3 sin c 4  4 4
|R3 pxq|  
 4! x 
  | sin c| x8 ¤ x8 .
Assim sendo, se escolhermos, por exemplo, x  1, temos uma estimativa do erro cometido pela
aproximação do polinómio de Taylor de terceira ordem:
 

 3  13 
3 sin 1
  31
6   |R3 p1q| ¤ 8 .
1

Exemplo 6.17. Considere-se g p xq  ex . Como g 1 p xq  g2 pxq      gpnq pxq  ex , o desenvol-


vimento de MacLaurin de g de ordem n é

f 2 p0q 2 f pnq p0q n


f 1 p0qx
x2 xn
ex  f p0q 2
x  n!
x Rn pxq  1 x
2
 n!
Rn pxq.

Pondo x  1, obtemos, a partir deste desenvolvimento, um valor aproximado de e1  e:


41
• se n  2, e  1 1 1{2  2.5;
• se n  4, e  1 1 1{2 1{6 1{24  2.70833 . . . ;
• se n  10, e  2.71828 . . . ;

Qual é erro máximo cometido pela aproximação de ordem n? Usando o resto de Lagrange,
sabemos que existe c Ps0, 1r tal que

f pn 1 q pcq c
Rn p1q 
p1  0qn 1  pn e 1q!
1q! pn
Queremos então estimar este resto: como c Ps0, 1r,

 
 c 
|Rn p1q| ¤  pn e 1q!    pn e
1q!
  pn 3 1q! ,
porque e   3. Por exemplo, o erro cometido na aproximação de ordem 10 é menor do que

3
11!
 12305600
1
  0.000000075 . . .
Quando n Ñ 8, a estimativa do resto de Lagrange mostra que Rn p1q Ñ 0. Logo


8̧ 1 ¸
n  

e  nlim e  nlim e 1   nlim


Ñ8 Rn p1q  0
1 1 1
1
n 0
k! Ñ8  k!
k 0
Ñ8 2 n!

ou seja,
8̧ 1
e .
k1
k!

O desenvolvimento de Taylor em torno de um ponto também pode ser usado para o cálculo
de limites nesse ponto:

Exemplo 6.18. Sejam f pxq  sin x e g pxq  ex  1. Temos

x
lim
Ñ0 ex
sin x
1x  00 .
Façamos o desenvolvimento de MacLaurin (porque o ponto onde estamos a fazer o limite é 0) de
segunda ordem de cada uma das funções:

x2
sin x  x R2 pxq, ex  1  x  Q2 pxq,
2
onde
R2 p xq Q2 pxq
lim
xÑ0 x2
 0, lim
x Ñ0 x2
 0.
Logo

R2 pxq
pq
 1{82
1 R2 x
x2
lim
sin x
ex  1  x
 xlim x
 xlim x x2
pq
0
 8
x Ñ0 Ñ0 x2
2 Q2 pxq Ñ0 x2 1
2
Q2 x
x2
0

42
6.3 Estudo aprofundado de funções
Usando a informação contida nas derivadas de uma função, podemos perceber o seu comporta-
mento de uma forma bastante precisa.

Denição 6.15. Seja f : Df Ñ R. Dizemos que f é convexa (resp. côncava) se qualquer


segmento ligando dois pontos do gráco de f car acima (resp. abaixo) do gráco.
Exemplo 6.19. Consideremos f pxq  ax2 , a P R. Se a ¡ 0, facilmente se vê que f é convexa;
se a   0, então a é côncava.

Proposição 6.16. Seja f :sa, brÑ R duas vezes diferenciável. Se f 2 ¡ 0 (resp. f2   0), então
f é convexa (resp. côncava).
O estudo de uma função f : Df Ñ R inclui o seguinte:
1. Cálculo do domínio onde a função é contínua, derivável ou diferenciável;

2. Vericar se f é par ou ímpar: se f pxq  f pxq, dizemos que f é par. Se f pxq  f pxq,
dizemos que é ímpar.

3. Assímptotas verticais: se existir a P Df1 tal que

lim f pxq  8 ou lim f pxq  8,


x Ña xÑa
então f tem uma assímptota vertical em x  a;
4. Assímptotas horizontais ou oblíquas: se o domínio de f não for majorado e

f pxq
x
lim
Ñ8 x  m P R, x
lim f pxq  mx  b P R,
Ñ8
então f tem uma assímptota oblíqua de equação y  mx  b. O mesmo acontece trocando
8 por 8;
5. Intersecção com os eixos: a intersecção com o eixo horizontal equivale a resolver a equação
f pxq  0. A intersecção com o eixo vertical corresponde simplesmente a f p0q (se 0 pertencer
ao domínio);

6. Monotonia: se a função for diferenciável, calculamos as regiões onde f1 é positiva, negativa


ou nula. Pelas propriedades das derivadas, sabemos que o sinal de f1 é indicador da
monotonia de f;
7. Indicação de máximos ou mínimos locais: correspondem a pontos de mudança no sinal da
derivada;

8. Concavidade: se a função for duas vezes diferenciável, calculamos as regiões onde f2 é


positiva, negativa ou nula. O sinal de f2 determina a convexidade de f.
9. Indicação de pontos de inexão: correspondem a pontos de mudança no sinal da segunda
derivada;

10. Esboço do gráco de f, tendo em consideração toda a informação obtida nos pontos ante-
riores.

43
f pxq  x2 3x 5   1.
Exemplo 6.20. Façamos o estudo da função denida por

x 1 ,x

1. Como f é uma função racional, é diferenciável quantas vezes se quiser em todo o seu
domínio. Como é diferenciável, é contínua em todo o seu domínio;

2. Como

f pxq 
 x2 3x  5
 f pxq, f pxq,
x 1
f não é par nem ímpar;

3. Como
3x  5
x
lim
Ñ1
x2
x1
 0 1  8,
f tem uma assímptota vertical em x  1;
4. Calculemos os limites correspondentes às assímptotas oblíquas:

f pxq x2 3x  5
lim
xÑ8 x
 xÑ8
lim
xpx  1q
 1,


4x  5
x2 3x  5
lim pf pxq  xq  lim  x  lim  4.
xÑ8 xÑ8 xÑ8 x  1 x1
Logo f tem uma assímptota oblíqua de equação y  x 4;
5. Pontos de intersecção com o eixo horizontal:
?
f pxq  0 ô x 2
3x  5  0 ô x 
3  9 20
2
Ponto de intersecção com o eixo vertical: f p0q  5;
6. A derivada de f é
x2  2x 2
f 1 pxq 
px  1q2 .
Então

• f 1 p xq  0 se e só se x2  2x 2  px  1q2 1  0, o que é impossível.

• f 1 pxq   0 se e só se x2  2x 2  px  1q2 1   0, que também é impossível.

• f 1 pxq ¡ 0 para qualquer x  1.


Assim sendo, concluímos que f é estritamente crescente em qualquer intervalo contido no
seu domínio;

7. Como f1 nunca muda de sinal, f não tem máximos nem mínimos locais;

8. A segunda derivada de f é

f 2 p xq  
2
px  1q3 .
Logo

• f 2 p xq  0 não tem solução;

• f 2 pxq   0 se e só se px  1q3 ¡ 0, ou seja, x ¡ 1;

44
• f 2 p xq ¡ 0 px  1q3   0, ou seja, x   1;
se e só se

Assim sendo, concluímos que f é côncava em s1, 8r e convexa em s  8, 1r;

9. Não existem pontos de inexão.

10. Resumimos a informação obtida sobre os sinais de f, f 1 e f2 numa tabela:

3?29 1
3 ?29
2 2

f - 0 + n.d. - 0 +

f1 + + + n.d. + + +

f2 + + + n.d. - - -

Usando as propriedades sobre derivadas, camos a saber que:

3?29 1
3 ?29
2 2

sinal de f - 0 + n.d. - 0 +

monotonia de f Õ Õ Õ n.d. Õ Õ Õ
” ” ” “ “ “
concavidade de f n.d.

Podemos agora esboçar o gráco de f:

45
Figura 7: Pontos de intersecção com o eixo horizontal (a azul); ponto de intersecção com o eixo
vertical (a vermelho); assímptota vertical (a verde); assímptota oblíqua (a roxo); gráco de f (a
preto)

f pxq  x2 ex , x P R.
2
Exemplo 6.21. Façamos o estudo da função denida por

1. Como f é o produto de um polinómio pela composta de uma exponencial com outro poli-
nómio, é diferenciável quantas vezes se quiser em todo o seu domínio. Como é diferenciável,
é contínua em todo o seu domínio;

2. Como f pxq  f pxq, f é par;

3. Como f é contínua em R, não existem assímptotas verticais;

4. Calculemos os limites correspondentes às assímptotas oblíquas:

f pxq
lim xex  0,
 xÑ8 2
lim
xÑ8 x

lim f pxq  lim x2 ex  0,


2

x Ñ8 x Ñ8
Logo f tem uma assímptota oblíqua de equação y  0;
5. Pontos de intersecção com o eixo horizontal:

f pxq  0 ô x2 ex
0ôx0 2

Ponto de intersecção com o eixo vertical: f p0q  0;

6. A derivada de f é
f 1 pxq  2xex p1  x2 q
2

Então

• f 1 pxq  0 se e só se x0 ou x  1.

46
• f 1 p xq   0 se e só se xp1  x2 q   0, ou seja, x Ps  1, 0rYs1, 8r;
• f 1 p xq ¡ 0 se e só se xp1  x2 q ¡ 0, ou seja, x Ps  8, 1rYs0, 1r;
7. f tem máximo local em x  1, onde atinge o valor f p1q  e1 e um mínimo local em
x  0;
8. A segunda derivada de f é

f 2 pxq  ex p4x4  10x2 2q.


2

Logo

• f 2 p xq  0 se e só se

? d
?
10  100  32 10  68
x 2
 8
, e portanto, x
8
;

• f 2 p xq   0 se e só se
? ?
10  68
8
 x   2 10
8
68
;

• f 2 p xq ¡ 0 nos restantes casos.

9. f tem quatro pontos de inexão


d
?
10  68
x .
8

10. Resumimos a informação obtida sobre os sinais de f, f 1 e f2 numa tabela. Como f é par,
façamos só para x ¥ 0:

?68 ?68
b b
10 10
0 1
8 8

f 0 + + + e1 + + +

f1 + + + + 0 - - -

f2 + + 0 - - - 0 +

Isto implica que

?68 ?68
b b
10 10
0 1
8 8

sinal de f 0 + + + e1 + + +

monotonia de f Õ Õ Õ Õ 0 × × ×
” ” “ “ “ ”
concavidade de f 0 0

Podemos agora esboçar o gráco de f, recordando que, como f é par, o gráco é simétrico
em relação ao eixo vertical:

47
Figura 8: Ponto de intersecção com o eixo horizontal e vertical (a azul); máximo local (a verme-
lho); pontos de inexão (a verde); gráco de f (a preto).

7 Primitivação
Dada uma função real de variável real g :sa, brÑ R, podemos perguntar se g é a derivada de
alguma função f, ou seja, se existe uma função f :sa, brÑ R tal que

f 1 pxq  g pxq, x Psa, br.


Nesse caso, dizemos que f é uma primitiva de g.
A operação de primitivação é inversa à de derivação: em vez de calcularmos a derivada a
partir de uma função dada, calculamos uma função a partir da sua derivada.

Proposição 7.1. Dada uma função g :sa, brÑ R, suponhamos que f1 e f2 são duas primitivas
de g . Então existe uma constante C tal que
f2 p xq  f1 p xq C, x Psa, br.
Por outro lado, se f é uma primitiva de g , então f C , com C P R, também é uma primitiva
de g .
Demonstração. 1. Se f1 e f2 são primitivas de g,
pf2  f1 q1 pxq  f21 pxq  f11 pxq  gpxq  gpxq  0, x Psa, br.
1 1
Como pf2  f1 q ¥ 0, f2  f1 é crescente em sa, br. Por outro lado, como pf2  f1 q ¤ 0, f2  f1
é decrescente em sa, br. Como as únicas funções simultaneamente crescentes e descrescentes são
as funções constantes, temos

f2 pxq  f1 pxq  C, x Psa, br, para algum C P R.


Logo f2 pxq  f1 pxq C, como queríamos mostrar.

2. Se f é uma primitiva de g, então

pf C q 1 p xq  f 1 p xq pC q1  gpxq, x Psa, br.


Logo f C também é uma primitiva de g.

48
Tendo em conta o resultado acima, percebemos que não existe uma primitiva f , mas sim uma
família de primitivas
f C, C P R.
Para dizermos que esta família é primitiva de g, escrevemos

Pg f C, C P R.
Se conseguirmos escrever g  f 1 , então
Pf1  Pg  f C.

Vemos assim que a primitiva de uma derivada é a própria função, a menos de uma constante.

Proposição 7.2. Dadas funções f, g :sa, brÑ R,


1. P pf gq  P f P g;
2. se c P R, P pcf q  cP f .

7.1 Primitivas imediatas


Para obtermos resultados sobre primitivação, vamos olhar para cada uma das regras de derivação
e reescrevê-las usando primitivas. Por exemplo, olhemos para a regra de derivação da potência:

puk q1 pxq  kuk1 pxqu1 pxq.


Então
 
P kuk1 pxqu1 pxq  P puk q1 pxq  uk pxq C, C P R.
Escrevendo n  k  1, obtemos

P pun u1 q 
un 1
n 1
C, C P R, n  1.

Podemos fazer o mesmo para as regras de derivação da exponencial, logaritmo, seno, cosseno,
arco-seno e arco-tangente, obtendo assim uma tabela de primitivas imediatas:

Proposição 7.3. São válidas as seguintes primitivas:


1. (Potência):
P pun u1 q 
un 1
n 1
C, C P R, n  1;

2. (Logaritmo): 

u1
P
u
 log |u| C, C P R;
3. (Exponencial):
P pu1 eu q  eu C, C P R;
4. (Seno):
P pu1 sin uq   cos u C, C P R;

49
5. (Cosseno):
P pu1 cos uq  sin u C, C P R;
6. (Arco-seno): 

u1
P ?  arcsinpuq C, C P R;
1  u2
7. (Arco-tangente): 

u1
P
1 u2
 arctanpuq C, C P R.
Exemplo 7.1. Calculemos a primitiva de f  2xex : como
2


P p2xex
2
q  P px2 q1 ex 2
,

podemos aplicar a regra de primitivação da exponencial com u  x2 :

P p2xex
q  ex C, C P R. 2 2

Exemplo 7.2. Calculemos a primitiva de f  cospxq cospsinpxqq: como

cospxq cospsinpxqq  psinpxqq1 cospsinpxqq  u1 cos u, u  sinpxq

podemos aplicar a regra de primitivação do cosseno:

P pcospxq cospsinpxqq  sinpsinpxqq C, C P R.


Por vezes, é preciso ajustar uma constante a multiplicar para podermos aplicar as regras de
primitivação.

Exemplo 7.3. Calculemos a primitiva de f  e2x : como a derivada do expoente é 2, precisamos


de acertar as constantes, introduzindo à mão o factor 2:



P pe qP  2e  12 P  12 e2x P R.
2x 1 2x
2e2x C, C
2

Exemplo 7.4. Calculemos a primitiva de f  x2 sinpx3 q. A derivada do argumento do seno é


3x2
, que é quase o que está a multiplicar do lado de fora. Precisamos só de acertar as constantes,
introduzindo à mão o factor 3:



P px2 sinpx3 qq  P  3x2 sinpx3 q  13 P 3x2 sinpx3 q  13 cospx3 q P R.
1
C, C
3

Exemplo 7.5. Calculemos a primitiva de f  1{p4 x2 q. A expressão é semelhante à da fórmula


da primitivação do arco-tangente: em vez de 4, deveria estar 1. Vamos então colocar o 4 em
evidência: 



P
4
1
x2
P 1
4
1 1
x2 {4
 14 P 1
1
px{2q2 .

A derivada do que está dentro do quadrado é 1{2, pelo que precisamos de acertar constantes:




1 1
 1 1{2
 1 px{2q1
 1 arctanpx{2q P R.
4
P
1 px{2q2 4
P 2
1 px{2q2 2
P
1 px{2q2 2
C, C

50
Nota 7.1. Dois comentários acerca das constantes C:
• enquanto a expressão tiver um termo da forma P p...q, não é necessário pôr a constante C
(ela está incluída dentro do P );
• no nal, a família de primitivas é dada por uma primitiva especíca mais uma constante
arbitrária (não importa se essa constante vinha multiplicada por 2 ou por 1, continua
sempre a ser uma constante arbitrária).

7.2 Primitivação por partes


Recorde-se a regra de derivação do produto:

pf gq1 pxq  f 1 pxqgpxq f pxqg 1 pxq, x Psa, br.

Reescrevemos esta regra como


f 1g  pf gq1  f g1 .
Aplicando P de ambos os lados, obtemos a regra de primitivação por partes:


P f 1g  P ppf gq1  f g1 q  f g  P pf g1 q.
A metodologia para aplicarmos esta regra deverá ser a seguinte:

1. Escrever a função como o produto de duas funções;

2. Dizer qual dessas funções é f1 e qual é g;

3. Determinar f;
4. Aplicar a regra;

5. Observar se a nova primitiva é mais complicada que a inicial. Se for, o melhor será voltar
atrás.

Exemplo 7.6. Qual será a primitiva de x ln x? Em primeiro lugar, analisamos as várias regras
de primitivação imediata para ver se alguma se aplica. Chegando à conclusão de que nenhuma
delas funciona, vamos então tentar primitivar por partes: como a derivada de ln x é mais simples
que a sua primitiva, escolho
Pp x  ln x q
Ó Ó
f1 g
Agora temos de indicar uma função f tal que f1  x: por exemplo, f  x2 {2. Aplicando a regra
de primitivação por partes,


x
x2 x2
pln xq1
2
P px ln xq  ln x  P  x2 ln x  P .
2 2 2

Esta última primitiva é imediata:

x2 x x2 ln x 2
P px ln xq  ln x  P   x4 C, C P R.
2 2 2

51
Exemplo 7.7. Qual será a primitiva de arcsin x? Novamente, analisamos as várias regras de
primitivação imediata para ver se alguma se aplica. Chegando à conclusão de que nenhuma
delas funciona, vamos então tentar primitivar por partes. Em primeiro lugar, escrevo

arcsin x  1  arcsin x

de forma a ter um produto. A derivada do arcsin x é mais simples, por isso escolho

Pp 1  arcsin x q
Ó Ó
f1 g

Agora temos de indicar uma função f tal que f1  1: por exemplo, f  x. Aplicando a regra de
primitivação por partes,



P parcsin xq  x arcsin x  P xparcsin xq1  x arcsin x  P ? x
.
1  x2
Esta última primitiva é mais simples do que a inicial; por isso, vamos continuar. Recomeçamos
o processo: será que alguma das primitivas imediatas se aplica? A resposta é sim, a da potência:

 
P ? x
 P xp1  x2 q1{2   12 P 2xp1  x2 q1{2
1  x2
2 1{2
  12 p1 1x{2 q C  p1  x2 q1{2 C, C P R.

Voltando ao problema inicial,




P parcsin xq  x arcsin x  P ? x
 x arcsinpxq p1  x2 q1{2 C, C P R.
1  x2
Exemplo 7.8. Qual será a primitiva de ex sin x? Analisando as várias regras de primitivação
imediata, vemos que nenhuma delas funciona. Vamos então tentar primitivar por partes. Escolho

Pp ex  sin x q
Ó Ó
f1 g

Agora temos de indicar uma função f tal que f1  ex : por exemplo, f  ex . Aplicando a regra
de primitivação por partes,

P pex sin xq  ex sin x  P ex psin xq1  ex sin x  P pex cos xq .
Esta última primitiva não é mais complicada do que a inicial; por isso, vamos continuar. Reco-
meçamos o processo: será que alguma das primitivas imediatas se aplica? Não, portanto vamos
outra vez aplicar uma primitivação por partes: escolho

Pp ex  cos x q
Ó Ó
f1 g

e aplico a regra:

P pex cos xq  ex cos x  P ex pcos xq1  ex cos x P pex sin xq .

52
Reparamos que chegámos exactamente à mesma primitiva que tínhamos no início. Vamos então
escrever tudo desde o início:

P pex sin xq  ex sin x  P pex cos xq  ex sin x  ex cos x  P pex sin xq .

Então, passando esta última primitiva para o lado esquerdo,

ex sin x  ex cos x
P pex sin xq  C, C P R.
2

7.3 Primitivação por substituição


Outra regra de derivação importante é a regra de derivação da composta:

pf  φq1 ptq  f 1 pφptqqφ1 ptq.


Aplicando P de ambos os lados,

 
 P pf  φq1 ptq  P f 1 pφptqqφ1 ptq
f pφptqq C
1
Se escrevermos f pxq  g pxq e t  φ
1 pxq, obtemos a regra de primitivação por substituição:

pP gpxqq  f pxq C  f pφptqq C  P gpφptqqφ1 ptq
?
Exemplo 7.9. Calculemos a primitiva de x3x 2. Vericamos primeiro se alguma das primiti-
vas imediatas se aplica e de seguida tentamos fazer por partes. Vendo que isso não resulta, repa-
?
ramos que a primitiva era mais fácil se a raíz cúbica não lá estivesse. Então fazemos t 3
x 2,
ou seja, xt 3
 2  φptq. Aplicando a regra de primitivação por substituição,
?   a 
P x x 2  P φptq φptq 2  φ1 ptq  P pt3  2qt  3t2
3 3


P 3t6  6t3  37 t7  64 t4 C, C P R.
?
Agora temos de ter o cuidado de regressar à variável original x. Como t  3
x 2, obtemos
então

?   ? 3 ?
P x3x 2 P 3t6  6t3  73 t7  32 t4 C  73 p 3
x 2q7 
2
p3x 2q3 C, C P R.
Exemplo 7.10. Calculemos a primitiva de sin x.
? Vericamos primeiro se alguma das primitivas
imediatas se aplica e de seguida tentamos fazer por partes. Vendo que isso não resulta, reparamos
que a primitiva era mais fácil se a raíz quadrada não lá estivesse. Então fazemos x  φptq  t2
(por forma a cortar com a raíz). Aplicando a regra de primitivação por substituição,

? a
P sin x  P sinp φptqqφ1 ptq  P p2t sin tq.

Esta primitiva parece mais fácil do que a anterior, pelo que continuamos o cálculo. Esta nova
primitiva não é imediata, mas facilmente se resolve com uma primitivação por partes:

Pp 2t  sin t q
Ó Ó , f   cos t.
g f1

53
Aplicando então a regra,

P p2t sin tq  2t cos t  P p2 cos tq  2t cos t


P R. 2 sin t C, C

Agora temos de ter o cuidado de regressar à variável original x. Como t 


?x, obtemos então
? ? ?
P sin x  2t cos t 2 sin t C  2 x cos x 2 sin x C.
?
?1x2 q
Exemplo 7.11. Calculemos a primitiva de earccosp . Vericamos primeiro se alguma das
primitivas imediatas se aplica e de seguida tentamos fazer por partes. Vendo que isso não resulta e
tendo em conta o termo 1x2 , vamos escrever x  sin t  φptq (porque 1x2  1sin2 t  cos2 t).
Aplicando a regra de primitivação por substituição,

?1x2 q ?1φ ptqq


P earccosp  P earccosp φ1 ptq  P pet cos tq.
2

Esta já foi calculada na secção anterior:

et cos t et sin t
P pet cos tq  et cos t P pet sin tq  C, C P R.
2
Regressando à variável original x, como t  arcsin x, obtemos então

?1x2 q cosparcsin xq earcsin x sinparcsin xq


P earccosp
t
et sin t arcsin x
e cos t
2
C e 2
C.

7.4 Primitivação de funções racionais


Uma classe de funções primitiváveis é a das funções racionais

P pxq
Qpxq
.

Apesar de existir um método geral para primitivar estas funções, iremos considerar somente o
caso em que Q é um polinómio de grau 1 ou 2.

7.4.1 Divisão de polinómios


Antes de se proceder a qualquer cálculo de primitivas, devemos vericar se o grau de P é menor
do que o grau de Q. Caso não o seja, teremos de fazer a divisão de polinómios.
Se tivermos dois números naturais D (o dividendo) e d (o divisor), podemos escrever

D  dq r, q, r P N, r   d, q quociente, r resto.

Esta decomposição implica


D
d
q r
d
, r   d.
Para obtermos q e r, aplicamos o algoritmo clássico de divisão. O mesmo pode ser feito para
polinómios: se P tiver grau igual ou superior a Q, podemos escrever

P
Q
q R
Q
, grau de R   grau de Q.

54
Exemplo 7.12. Queremos dividir x2 1 por 2x. Escrevemos então

x2 + 1 2x

Em x2 , quantas vezes cabe x? Cabe x{2 vezes, pelo que escrevo

x2 + 1 2x
2x  x{2 x{2

Agora faço a diferença no lado esquerdo:

x2 + 1 2x
x2 x{2
0 + 1

Como o resto tem grau menor que o divisor, o algoritmo pára e obtemos

x2 1
2x
 x2 1
2x
.

Exemplo 7.13. Queremos dividir x3  3x 1 por x2  1. Escrevemos então

x3 + 0 - 3x + 1 x2  1

Em x3 , quantas vezes cabe x2 ? Cabe x vezes, pelo que escrevo

x3 + 0 - 3x + 1 x2  1
x 2
x + 0 - 1x x

Agora faço a diferença no lado esquerdo:

x3 + 0 - 3x + 1 x2  1
x3 + 0 - x x
0 + 0 - 2x + 1

Como o resto tem grau menor que o divisor, o algoritmo pára e obtemos

x3  3x 1
 x x2x
x2  1 21
1
.

Exemplo 7.14. Queremos dividir x


3
2x2  4 por x  1. Escrevemos então

x3 + 2x2 + 0 - 4 x1

Em x3 , quantas vezes cabe x? Cabe x2 vezes, pelo que escrevo

x3 + 2x2 + 0 - 4 x1
x3 - x x2

Agora faço a diferença no lado esquerdo:

x3 + 2x2 + 0 - 4 x1
x3 - x2 x2
0 + 3x2 + 0 - 4

55
Como o resto tem grau maior que o divisor, o algoritmo continua. Em 3x2 , quantas vezes cabe
x? Cabe 3x vezes:
x3 + 2x2 + 0 - 4 x1
x3 - x2 x2 3x
0 + 3x2 + 0 - 4
3x2 - 3x
0 + 3x - 4

Como o resto tem grau igual que o divisor, o algoritmo continua. Em 3x, quantas vezes cabe x?
Cabe 3 vezes:
x3 + 2x2 + 0 - 4 x1
x3 - x2 x2 3x 3
0 + 3x2 + 0 - 4
3x2 - 3x
0 + 3x - 4
3x - 3
0 - 1

Como o resto tem grau menor que o divisor, o algoritmo pára e obtemos

x3 2x2  4 1 .
x1
 x2 3x 3
x1

7.4.2 Método dos coecientes indeterminados


Após termos procedido à divisão de polinómios, teremos

Rpxq
R   grau
Qpxq
, grau de de Q.

Se Q tiver grau 1, então R é uma constante e a primitiva é imediata. Vamos agora olhar para
a situação em que Q tem grau 2 e o coeciente de x2 é 1:
• Q tem duas raízes reais distintas a, b: neste caso escrevemos

R p xq
Qpxq
 x A a B
xb
,

para certas constantes A e B que teremos de determinar. Para isso, reduzimos o membro
direito ao mesmo denominador:

R p xq
Qpxq
 ApxpxbqaqpxBpxbq aq
Para as expressões serem iguais, os numeradores têm de ser iguais.

Rpxq  Apx  bq B px  aq.

Isto determina os coecientes A e B.


• Q tem uma única raíz a: neste caso, Qpxq  px  aq2 e escrevemos

Rpxq
Qpxq
 xA1 a px A2aq2 ,
A determinação de A1 e A2 é análoga à do caso anterior.

56
• Q não tem raízes: neste caso, escrevemos

Qpxq  px  cq2 d, d ¡ 0,
determinamos c e d e escrevemos

R p xq
Qpxq
 apx Rpbxqq2 c
.

Depois destas manipulações algébricas, a expressão nal consistirá sempre numa soma de
primitivas imediatas (logaritmos, potências e/ou arco-tangentes).

Exemplo 7.15. Vamos primitivar x{px2  1q. Em primeiro lugar, vericamos que o coeciente
do numerador é menor que o do denominador, pelo que não é preciso fazer divisão de polinómios.
O denominador tem duas raízes: a1 e b  1. Escrevemos então

x
x2  1
 x A 1 x
B
1
 Apx 1q B px  1q
x2  1
.

Igualando os numeradores,

Apx 1q B px  1q  x ñ A B  1, A  B  0.
Vemos então que AB  1{2:
x
x2  1
 x1{21 1{2
x 1
As primitivas das funções do membro direito são imediatas:

P
x
x2  1
 12 P x 1 1 1
P
1
2 x 1
 21 ln |x  1| 1
2
ln |x 1| C, C P R.
Exemplo 7.16. Vamos primitivar p2x  1q{px2  4x 4q. Em primeiro lugar, vericamos que o
coeciente do numerador é menor que o do denominador, pelo que não é preciso fazer divisão de
polinómios.
O denominador tem uma única raíz a  2. Escrevemos então

2x  1
x2  4x 4
 xA1 2 px A22q2  A1xp2x4x2q A2
4
.

Igualando os numeradores,

A1 px  2q A2  2x  1 ñ A1  2, 2A1 A2  1.
Vemos então que A1  2 e A2  3 :
2x  1
x2  4x 4
 x 2 2 px 3 2q2
As primitivas das funções do membro direito são imediatas:

2x  1
P
x2  4x 4  P x 2 2 P
3
px  2q  2 ln |x  2| 
2
3
x2
C, C P R.

57
Exemplo 7.17. Vamos primitivar px 3q{px2  4x 5q. Em primeiro lugar, vericamos que o
coeciente do numerador é menor que o do denominador, pelo que não é preciso fazer divisão de
polinómios.
O denominador não tem raízes reais. Escrevemos então

x2  4x 5  apx bq2 c  ax2 2abx b2 c ñ a  1, b  2, b2 c  5.

Vemos então que a  1, b  2 e c  1:


x 3
x2  4x 5
 px x 2q23 1
 xpx2 2q22 3
1
 px x 2q22 1 px  2q2
5
1

As primitivas das funções do membro direito são imediatas:

P
x 3
x2  4x 5
 P px x 2q22 1
P
px  2q2
5
1
 12 lnp1 px  2q2 q 5 arctanpx  2q C, C P R.

8 Integral de Riemann
Considere-se o seguinte problema: dada uma função positiva f : ra, bs Ñ R, será possível dar um
valor A à área que se encontra entre o gráco da função e o eixo das abcissas?
O caso mais simples é o da função constante f pxq  c, x P ra, bs, onde o valor da área
é A  cpb  aq. Que outros casos serão igualmente fáceis de analisar? Por exemplo, se f
for constante por ramos, ou seja, se existir uma divisao do intervalo ra, bs em subintervalos
rxi , xi 1 s, i  1, . . . , N , de tal forma que
f pxq  ci , x P rxi , xi 1 s,
então o valor da área é simplesmente a soma das áreas dos rectângulos de base rxi , xi 1 s:
¸
N
A ci pxi 1  xi q.

i 1

Consideremos agora uma função positiva f : ra, bs Ñ R contínua. Em vez de tentarmos


encontrar logo o valor da área, tentemos primeiro obter uma estimativa por defeito. Por exemplo,
é claro que o valor da área é maior do que


A¥ min f pxq pb  aq.


Pr s
x a,b

Se dividirmos o intervalo ra, bs em subintervalos rxi , xi 1 s, i  1, . . . , N , podemos estimar por


defeito usando o mínimo em cada intervalo:

¸
N
A¥ min f p xq p xi 1  xi q .

i 1
Pr
x xi ,xi 1 s
Esta desigualdade é verdadeira para qualquer subdivisão do intervalo ra, bs que se considere,
o que implica que:
1

1 Se A é maior do que todos os elementos de um dado conjunto, é porque é majorante. Logo A é maior ou
igual ao supremo desse conjunto (pela denicao de supremo).

58
Figura 9: Subdivisões do intervalo e estimativas da área.

N 

A ¥ A  sup min f pxq pxi 1  xi q :



i 1
Pr
x xi ,xi 1 s
)
N P N ^ x1   x2        xN   xN 1 subdivisões do intervalo ra, bs .

Por outro lado, podemos também estimar por excesso o valor da área usando a mesma ideia:

¸
N
A¤ max f p xq pxi 1  xi q.

i 1
Pr
x xi ,xi 1 s
Novamente, esta desigualdade é verdadeira para qualquer subdivisão do intervalo ra, bs que
se considere e portanto:

N 

A ¤ A  inf max f pxq pxi 1  xi q :



i 1
Pr
x xi ,xi 1 s
)
N P N ^ x1   x2        xN   xN 1 subdivisões do intervalo ra, bs .

Se A  A, então, como A está enquadrado entre estes dois valores, temos de ter necessaria-
mente A  A  A.

Denição 8.1. Dada uma função f : ra, bs Ñ R, dizemos que f é integrável se A  A. Nesse
caso, denimos o integral de f em ra, bs como sendo
»b
f pxqdx  A  A
a

Note-se que, de acordo com esta denição, se f for negativa e integrável, então A, A ¤ 0, o
que implica que o integral de f é negativo. O integral corresponde assim ao valor da área afecta
de sinal delimitada por f, onde as regiões onde f é negativa contam negativamente para o valor
da área (quando f é negativa, a área encontra-se acima do gráco e por isso a mudança no sinal).

59
Proposição 8.2. Qualquer função contínua num intervalo ra, bs é integrável.

Proposição 8.3. Se f, g : ra, bs Ñ R são funcões integráveis,


• dado c P ra, bs,
»b »c »b
f pxqdx  f pxqdx f pxqdx
a a c

• se k P R, então kf é integrável e
»b »b
kf pxqdx  k f pxqdx
a a

• a soma f g é integrável e
»b »b »b
pf pxq g pxqqdx  f pxqdx g pxqdx
a a a

• o integral sobre um intervalo de comprimento 0 é 0:


»a
f pxqdx  0.
a

Denição 8.4. Se f : ra, bs Ñ R é integrável, denimos


»a »b
f pxqdx   f pxqdx.
b a

8.1 Cálculo de integrais


A denição de integral não nos permite calcular facilmente o seu valor, pelo que precisamos de
algum ingrediente extra para podermos fazer cálculos explícitos.

Denição 8.5. Se f : ra, bs Ñ R é integrável, denimos o integral indenido de f como sendo


»x
F pxq  f py qdy, x P ra, bs.
a

Fixado x Psa.br e dado h pequeno, temos

»x h »x »x h
F px hq  F pxq  f py qdy  f py qdy  f py qdy  f pxqppx hq  xq  f pxqh.
a a x

Dividindo tudo por h, vemos que

F px hq  F pxq
h
 f p xq
O membro esquerdo é uma razão incremental de F, pelo que se coloca a questão sobre o que
acontece quando hÑ0 (ou seja, se F é diferenciável em x):

F px hq  F pxq
Será que
h
lim
Ñ0 h
 f pxq ?

60
Teorema 8.6 (Teorema Fundamental do Cálculo). Se f : ra, bs Ñ R é contínua, então o integral
indenido
»x
F pxq  f py qdy
a

é uma função diferenciável e F 1 pxq  f pxq.


O que o Teorema Fundamental do Cálculo nos diz é que o integral indenido f é uma primitiva
de f. Como quaisquer duas primitivas diferem por uma constante,

F pxq  pP f qpxq C, Pf uma primitiva xada de f.

A única incógnita é a constante C. Tendo em conta que F paq  0, temos

0  F paq  pP f qpaq C, o que nos permite concluir que C  pP f qpaq


Obtemos assim a fórmula de Barrow:

»x
f py qdy  pP f qpxq  pP f qpaq, onde Pf é uma primitiva qualquer de f.
a
O cálculo de integrais reduz-se agora ao cálculo de uma primitiva da função integranda,
usando as ferramentas desenvolvidas na secção anterior.

Nota 8.1. Por conveniência, escrevemos rgpxqsba para designar gpbqgpaq. Assim sendo, podemos
reescrever a fórmula de Barrow como
»b
f pxqdx  rP f pxqsba , onde Pf é uma primitiva qualquer de f.
a

³3
Exemplo 8.1. Considere-se f p xq  x2 x e calculemos f pxqdx: como uma primitiva de f é
x3 {3 x2 {2,
2
a fórmula de Barrow implica

»3 


 3
f pxqdx  x3 {3 x2 {2  
9 8
2
9 2
2 2 3

³π
Exemplo 8.2. Considere-se g pxq  2x sin x2 e calculemos 0
g pxqdx: como uma primitiva de g
é sin x2 , a fórmula de Barrow implica
»π
 π
g pxqdx  sin x2 0
 sin π2 .
0

Exemplo 8.3. Considere-se


» x2
g p xq  f py qdy.
0
³x
Sendo F p xq  0
f py qdy , podemos escrever g pxq  F px2 q. Logo, pelo Teorema Fundamental do
Cálculo e pela regra de derivação da função composta,

g 1 pxq  pF px2 qq1  F 1 px2 q2x  2xf px2 q.

61
Exemplo 8.4. Considere-se
» x3
g p xq  f py qdy.
x
³x
Sendo F p xq 0
 pq
f y dy , podemos escrever g x F x3 p q  p q p q
F x . Logo, pelo Teorema Funda-
mental do Cálculo e pela regra de derivação da função composta,

g 1 pxq  pF px3 q  F pxqq1  F 1 px3 q3x2  F 1 pxq  3x2 f px3 q  f pxq.

Exemplo 8.5. Calculemos o limite

³ ex
1
sinpxqdx
lim .
x Ñ0 x
0
Tendo em conta que o limite é uma indeterminação do tipo
0 , vamos aplicar a regra de Cauchy:
usando o Teorema Fundamental do Cálculo,

³ x 1
sinpxqdx
e

lim
x Ñ0
1
x1
 xlim
Ñ0
ex sinpex q  sin 1.

A regra de Cauchy implica agora que

³ ex
sinpxqdx
lim
x Ñ0
1
x
 sinp1q.

62

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