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1.1 Objetivos
Ensinar o aluno a demonstrar teoremas usando as técnicas de:
Demonstração direta;
Dizemos que um inteiro a divide um inteiro b, e denotamos por a|b, se a divisão de b por a
deixa resto 0 ou, em outras palavras, se existe um número inteiro c que, quando multiplicado
por a seja igual a b. Se a divide b, então b é divisível por a e vice-versa;
Um número natural é primo se ele possui exatamente 2 divisores, 1 e ele mesmo, e é composto
caso não seja primo e não seja 1. Note que o número 1 não é primo e nem composto, e 2 é o
único primo par;
1-1
1-2
O Teorema Fundamental da Aritmética nos diz que cada natural x>1 possui exatamente
uma decomposição em primos, ou seja, não podemos escrever um número como fator de
números primos de mais de uma forma (se desconsiderarmos a ordem dos fatores). Por isso,
no item anterior, escrevemos A decomposição em primos de um natural x... e não Uma
decomposição em primos de um natural x...;
O máximo divisor comum de dois naturais x e y, denotado por mdc(x, y), é o maior número
que divide simultaneamente x e y;
O mínimo múltiplo comum de dois naturais x e y , denotado por mmc(x, y), é o menor múltiplo
simultaneamente de x e y;
O fatorial de um número, denotado por n!, é igual ao produto de todos os números de 1 até
ele mesmo, ou seja, n! = n · (n − 1) · . . . · 2 · 1;
1.3 Demonstrações
Uma proposição é uma declaração que é verdadeira ou falsa. Na matemática, muitas vezes estamos
interessados em atestar a veracidade de determinadas proposições em algum contexto. Por exemplo,
poderíamos estar interessados em mostrar que todo número primo maior que 2 é ímpar ou que todo
quadrado perfeito possui um número ímpar de divisores.
Vale lembrar que nem toda proposição é verdadeira e, portanto, nem toda proposição pode ser
provada. De fato, quando queremos mostrar que uma proposição é falsa, basta mostrarmos a sua
negação é verdadeira. Se ela começa com Para todo... ou Todo..., então basta achar um exemplo em
que ela não se aplica para mostrar que ela é inválida. Por exemplo, para mostrar que a proposição
Todo número ímpar é primo é falsa, basta mostrarmos que existe um número ímpar que não é primo
(o 9 sendo o menor deles). O exemplo que contraria a proposição é chamado de contra-exemplo.
Se a proposição começa com Existe..., para provar que ela é falsa, temos então que mostrar que ela
não se aplica para todos os casos. Por exemplo, para mostrar que a proposição Existe um inteiro
que, quando elevado ao quadrado, é igual a 2 é falsa, teríamos que mostrar, de alguma forma, que
todo inteiro ao quadrado é diferente de 2. Claro que não teríamos como mostrar isso testando todos
os inteiros. Assim, teríamos que achar alguma outra forma de fazer isso. Veremos mais sobre isso
nas seções Seção 1.7 e Seção 1.10.
1-3
Universalização Essa proposição tem o formato Para todo elemento x em S, x tem a propri-
edade P. A Universalização estabelece a ideia de que todos os elementos de um conjunto
possuem determinada propriedade. Exemplo: Para todo x no conjunto dos números reais
não-negativos, a raiz quadrada de x é real não-negativa;
Existencialização Essa proposição tem o formato Existe um elemento x em S tal que x tem a
propriedade P. A existencialização estabelece a ideia de que existem elementos de um conjunto
que possuem determinada propriedade. Ela pode indicar também que existe exatamente uma
determinada quantidade ou ainda pelo menos uma determinada quantidade. Quando não há
a indicação explícita se a existencialização está se referindo a uma quantidade exata ou a
um limite inferior, pode-se supor sempre que ela se refere a um limite inferior (pelo menos).
Exemplo 1: Existe (pelo menos) um natural x tal que x é natural, primo e menor do que 10.
x
Exemplo 2: Existem exatamente 2 inteiros x tais que
x = |x|.
No resto desta nota, serão discutidos, principalmente, quatro tipos de técnicas usadas para de-
monstração de proposições: demonstração por exaustão, demonstração direta, demonstração por
contraposição e demonstração por absurdo.
10 = 2 · 5;
12 = 3 · 4;
14 = 2 · 7;
1-4
15 = 3 · 5;
16 = 2 · 8;
18 = 3 · 6;
20 = 2 · 10.
21 = 3 · 7.
Exercício 1. Prove por demonstração por exaustão que para todo k entre 10 e 20 existem inteiros
não-negativos x e y tais que 3x + 5y = k .
Considere a seguinte implicação: Se temos 13 pessoas em uma sala, nós podemos garantir que pelo
menos duas fazem aniversário no mesmo mês. A hipótese a ser suposta é temos 13 pessoas em uma
sala e a conclusão é pelo menos duas fazem aniversário no mesmo mês. Em uma prova direta dessa
implicação, partiríamos da hipótese e chegaríamos na conclusão.
Teorema 1. Todo primo maior do que 3 deixa resto 1 ou 5 quando dividido por 6.
Demonstração. Suponha que x é um número primo arbitrário maior do que 3 e seja r o resto
da sua divisão por 6. Temos que r não pode ser nem 2 nem 4, pois, caso contrário, existiria um q
inteiro tal que x = 6 · q + 2 ou x = 6 · q + 4, o que implicaria em x ser um número par e, portanto,
como x > 3, ele não poderia ser primo.
Similarmente, r não pode ser 3, pois, se assim fosse, existiria um q inteiro tal que x = 6 · q + 3, o
que faria com que x fosse um inteiro divisível por três.
Portanto, concluímos que o resto da divisão de x por 6 é 1 ou 5. Isso implica que todo primo maior
do que 3 deixa resto 1 ou 5 quando dividido por 6.
1-5
Note que, na prova acima, o fato de provarmos que x, um número primo maior do que 3, deixa resto
1 ou 5 quando dividido por 6 3 deixa resto 1 ou 5 quando
implica que todo primo maior do que
dividido por 6. Isso só acontece porque nós supomos que x é um primo maior do que 3 arbitrário.
O fato de x ser um primo arbitrário maior do que 3 implica em x representar qualquer primo maior
do que 3. Assim, quando provamos algo para x, estamos provando a mesma coisa para qualquer
primo maior do que 3.
Exercício 2. Prove por demonstração direta que o produto de quaisquer três inteiros consecutivos
sempre é divisível por 6.
Exercício 4 (⋆). Seja x um inteiro maior do que 1. Prove que x é primo se e somente se ele não é
divisível por nenhum primo menor do que ele.
Se temos uma implicação do tipo Se hipótese, então conclusão , a sua contrapositiva é Se não-
conclusão, então não-hipótese , onde não-hipótese é a negação (o oposto) da hipótese e não-
conclusão é a negação (o oposto) da conclusão . Uma implicação tem o mesmo signicado da sua
contrapositiva e, por isso, quando se demonstra uma, automaticamente estamos demonstrando a
outra.
Por exemplo, considere a implicação: Se x·y é par, então temos que ou x, ou y ou ambos são pares.
A hipótese é x·y é par e, assim, a sua negação é x·y é ímpar. A conclusão é ou x, ou y ou ambos
são pares e, assim, a sua negação é x e y são ímpares. Concluímos então que a contrapositiva da
proposição se x·y é par, então temos que ou x, ou y ou ambos são pares é a proposição se x e y
são ímpares, então temos que x·y é ímpar e, de fato, ambas as proposições são equivalentes.
Muitas vezes, como no caso acima, a contrapositiva de uma implicação pode ser considerada mais
fácil de se provar do que a proposição original. A seguir, vamos provar a implicação acima original
provando a sua contrapositiva.
Exercício 5. Prove por demonstração por contraposição que, se x+y é ímpar, x e y não tem a
mesma paridade, ou seja, um é par e o outro é ímpar.
Exercício 6. Seja x ̸= y . Prove por demonstração por contraposição que, se mdc(x, y) > 1, ou x
ou y ou ambos não são primos.
1-7
Quando temos um absurdo, nós podemos concluir então que a nossa suposição inicial (hipótese +
não-conclusão) é falsa, porém, como sabemos que a nossa hipótese é verdadeira, pois já nos foi dada
como verdadeira, só nos resta concluir que a negação da conclusão é falsa e, portanto, a conclusão,
que é onde queremos chegar, é verdadeira.
Teorema 3. Em um triângulo retângulo não degenerado, a soma dos catetos é estritamente maior
do que a hipotenusa.
Demonstração. Suponha por absurdo, que temos um triângulo retângulo não degenerado (ou seja,
com catetos de tamanho positivo) cuja soma dos catetos a e b é menor ou igual à hipotenusa c. Assim,
a+b ≤ c ⇒ (a+b)2 ≤ c2 ⇒ a2 +2ab+b2 ≤ c2 . Invocando o Teorema de Pitágoras, temos também que
a2 +b2 = c2 . Juntando as duas equações acima, temos que c2 = a2 +b2 < a2 +2ab+b2 ≤ c2 ⇒ c2 < c2 ,
o que é um absurdo. Portanto, temos que a + b > c.
Demonstração. Suponha, por absurdo, que a quantidade de números primos é nita. Então,
existe um inteiro n que é o maior primo de todos. Sendo assim, considere o número x = n! + 1.
Temos que x não é divisível por nenhum número de 1 até n, pois, como n! é divisível por todos
os números de 1 à n, x deixa resto 1 quando dividido por qualquer desses números. Assim, como
todos os primos estão compreendidos entre 1 e n, temos que x não é divisível por nenhum primo
menor do que ele, o que implica que ele mesmo é um número primo (veja o Exercício 4), o que é
um absurdo porque n é o maior primo e x > n. Assim, concluímos que existem uma quantidade
innita de primos.
Note que, na prova acima, não há hipótese. Nesse caso, nós simplesmente assumimos a negação da
conclusão e chegamos a um absurdo, provando, assim, a conclusão.
Exercício 7. Prove por absurdo que, se A e B são conjuntos de tamanho nito, então |A ∪ B| ≤
|A| + |B|.
√
√ 2
Exercício 8. Prove por absurdo 2 é irracional. Você pode supor que um número racional
não-negativo diferente de 0 e 1 elevado a um irracional sempre resulta em um número irracional.
1-8
A =⇒ B é falsa, basta acharmos um exemplo que faz A ser verdadeiro e B ser falso;
A ⇐⇒ B é falsa, basta acharmos um exemplo que faz A ser verdadeiro e B ser falso ou A
ser falso e B ser verdadeiro;
Para provarmos que proposições dos tipos implicação, equivalência e universalização, são falsos,
precisamos encontrar exemplos que as tornam falsa. Tais exemplos são chamados de contraexemplo.
Assim, se queremos provar que a implicação se x é primo, x2 é ímpar é falsa, basta acharmos um
contraexemplo x que satisfaz a hipótese (x é primo), e torna a conclusão falsa (x2 não é ímpar). No
caso dessa
2
proposição, um contraexemplo é x = 2 que é primo e x = 4 que é par.
Exercício 9. Prove que a seguinte proposição é falsa: Para todo x ∈ N, (x + 2)! é divisível por x2 .