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Huberto Rohden - Ídolos Ou Ideal
Huberto Rohden - Ídolos Ou Ideal
ÍDOLOS
OU IDEAL?
PENSAMENTO AVULSO SOBRE DEUS, O HOMEM E O UNIVERSO
UNIVERSALISMO
ADVERTÊNCIA
A conhecida lei de Lavoisier diz que “na natureza nada se crea e nada se
aniquila, tudo se transforma”, se grafarmos “nada se crea”, esta lei está certa
mas se escrevermos “nada se cria”, ela resulta totalmente falsa.
Devemos aprender com a sabedoria milenar dos tempos: Somos livres para
semear, mas somos obrigados a colher aquilo que semeamos. A escolha é da
responsabilidade de cada um. Essa é a inexorável lei cósmica que rege a
harmonia do Universo.
Assim, se alguém só quer receber e não quer dar, devolvendo à usina divina o
que dela recebeu, interrompe o fluxo contínuo – e sua vida fica sem luz, força e
calor. Feche, pois, o circuito dos dons divinos, distribuindo aos homens o que
de Deus recebeu. „De graça dai o que de graça recebestes‟.
Onde não há efluxo de bens na horizontal, não pode haver influxo na vertical:
homem que não dá a seus irmãos não pode receber do Pai celeste. A falta de
fluxo contínuo é suicídio lento por asfixia moral.”
Sou carpinteiro, nas horas vagas. Depois de terminado algum trabalho maior,
fica o soalho da carpintaria cheio de pedaços e pedacinhos de madeira, tábuas
e sarrafos de diversos tamanhos e feitios. Em vez de jogar fora ou usar como
lenha essas sobras, reúno as melhores e delas faço algum objeto útil ou de
simples enfeite: uma casinha para as corruíras fazerem ninho, uma cadeirinha
ou mesinha para crianças, uma casinha de bonecas, ou algum vaso para
flores.
Durante quase meio século escrevi e publiquei umas dezenas de livros, sobre
filosofia universal, filosofia do Evangelho, assuntos de religião, biografias e
divulgação científica; mas os meus livros não-publicados são mais numerosos
que os que andam nas mãos dos leitores: e mais numerosos ainda são os
cadernos de pensamentos vários, impressões de fora e experiências de dentro
– um mundo de coisas heterogêneas, fragmentos de todas as espécies.
***
Apagam-se cada vez mais as fronteiras materiais dos povos, nessa idade dos
aviões a jato – e diluem-se cada vez mais as fronteiras mentais, nesse avanço
da cultura universal.
Assim, se alguém só quer receber, e não quer dar, devolvendo à usina divina o
que dela recebeu, interrompe o fluxo contínuo – e sua vida fica sem luz, força e
calor. Feche, pois, o circuito dos dons divinos, distribuindo aos homens o que
de Deus recebeu; porquanto, “o que fizerdes a um desses meus irmãos mais
pequeninos, a mim é que o fazeis”.
Onde não há efluxo de bens na horizontal, lá não pode haver influxo na vertical:
o homem que não dá a seus irmãos não pode receber do Pai celeste. E falta de
fluxo contínuo é suicídio lento por asfixia, arteriosclerose moral.
SEGURO DE VIDA
Sim – mas da vida dos outros. Eu não posso fazer um seguro de vida pessoal
sem fazer um seguro de vida universal. Quem quiser salvar-se individualmente,
talvez que entre no céu – mas esse céu é povoado de refinados egoístas como
ele, que quiseram salvar-se sem os outros, ou à custa dos outros. Todos eles
estão num céu infernal. Prefiro estar num inferno celestial...
Não posso ser feliz no meu céu enquanto um único ser humano for infeliz no
seu inferno e não tenha a possibilidade de entrar no céu da felicidade. Detesto
esse céu! Quero sair dele! Prefiro sofrer no inferno com o grosso da
humanidade a gozar nesse céu com uma elite de refinados egoístas.
Onde eu possa fazer bem a meus semelhantes, mesmo entre sofrimentos, ali é
o meu céu.
DEUS EM TI
“Despoja-te de toda e qualquer cobiça! O que, depois disto, sobrar de ti, isto é
Deus” (Meister Eckhardt). A soma total das tuas cobiças, físicas e mentais, não
são o teu verdadeiro Eu – são apenas a tua máscara ou a tua “persona”*.
* A palavra latina “persona” (pessoa) quer dizer “máscara”. “Persona”, composto de “per”
(através) e “sonare” (soar, falar), era, entre os romanos aquela máscara de boca aberta através
da qual os atores do palco falavam. Desempenhar a “persona” ou máscara do rei, do vilão, do
mendigo, equivalia à nossa expressão hodierna “desempenhar o papel” de...
A pessoa ou personalidade do homem não é, pois, o seu verdadeiro Eu, senão apenas um
invólucro, uma máscara fictícia e temporária da sua verdadeira individualidade humana. O seu
verdadeiro Ego é sua alma.
ESPELHO OU JANELA?
O profano egoísta acha-se no meio duma sala cujas paredes são espelhos,
como no célebre museu de Grevin, de Paris; para onde quer que ele se volte,
só vê o seu Eu, sempre seu próprio Eu – isto é, o seu pseudo-Eu físico-mental
que ele erroneamente identifica com o seu verdadeiro Eu espiritual. Que
admira que esse homem fique egocêntrico?
CRISTO E CRISTIANISMO
Ambos nasceram no Oriente próximo, em sua forma humana – mas o
cristianismo eclesiástico é criação típica do Ocidente, que o Oriente jamais
aceitará. Se o nosso cristianismo teológico se converter no cristianismo
evangélico, também o Oriente se tornará cristão.
1) “Antes de tudo, aconselharia aos cristãos que vivessem assim como o Cristo
viveu.
CICLOS CÓSMICOS
Um ano mundial (aion) abrange cerca de 25.920 anos terrestres. Um mês
mundial corresponde a cerca de 2.160 anos terrestres.
Cada mês mundial inaugura na terra uma nova era, cujo fim é sempre
acompanhado de grandes tribulações e tempestades de todo gênero – expira
um inverno tormentoso para dar lugar a uma nova primavera de evolução.
Os maus espíritos, que são soltos no fim de cada ciclo cósmico, não são maus
em absoluto, mas sim relativamente maus – assim como são más as
tempestades que preludiam o advento da primavera e quebram os galhos
podres e arrancam as folhas secas, a fim de preparar a grande ressurreição da
natureza.
INDIVIDUAL – COLETIVO
O coletivismo só pode ser perfeito pela união de homens individualmente
perfeitos, irradiando amor desinteressado. O indivíduo só pode ter possibilidade
de ulterior evolução das suas faculdades, através de uma vida fundada num
coletivismo perfeito desse gênero. A missão da sociedade está em garantir ao
indivíduo, não só a maior segurança, mas também todos os meios necessários
para o seu aperfeiçoamento.
O maior perigo do coletivismo mal orientado está na tendência de querer
suprimir o indivíduo e coibir a livre expansão das suas faculdades e talentos.
Valores reais se perderiam deste modo, o que, cedo ou tarde, redundaria em
detrimento do Todo Social.
A RELIGIÃO DE EINSTEIN
“A minha religião – diz ele – consiste numa humilde admiração do espírito
supremo, ilimitado, que se revela nos pequenos detalhes que somos capazes
de perceber com a nossa mente débil e fraca: – a presença de um Poder
Racional superior, revelado no universo incompreensível – é o que é a minha
idéia de Deus.”
O COSMOS É INDIVISÍVEL
Escreve o grande cientista contemporâneo, Dr. Gustavo Stromberg: “Temos
razões para crer que todos os atributos do cosmos sejam interrelacionados e
formem um Todo unificado. O cosmos em si mesmo é um e indivisível; e é
devido a uma peculiaridade da nossa mente e do nosso sistema nervoso que o
apreendemos na forma de categorias (quer dizer: fenômenos concretos).
Matéria, vida e consciência têm as suas raízes num mundo além de tempo e
espaço.”
CRIMES E VÍCIOS
“Crimes, quase sempre nos chocam demais – vícios, quase sempre, nos
chocam de menos.” (C. Hare.)
EXCESSIVAMENTE CLARO
Dizem uns: O homem de hoje paga os seus débitos de ontem.
Acham outros: O homem de hoje não paga débito algum, mas nasceu
simplesmente nesse estado inferior.
A VOZ DA INTUIÇÃO
Um senso íntimo e indefinível me diz:
1) que não fui o que sou, e que posso vir a ser mais do que sou;
2) que aquilo que posso vir a ser depende de uma integração no Todo, de um
serviço prestado ao Universo, ao Todo, a Deus;
4) que a integração no grande Todo é feito pelo Amor, por um amor racional,
espontâneo, radiante, jubiloso;
Tudo isto que estou dizendo a meus leitores, digo-o em primeiro lugar a mim
mesmo. Eu sou o meu leitor e ouvinte número um – o meu pequeno Eu físico-
mental está sentado como dócil discípulo aos pés do Mestre, que é o meu Eu
espiritual, o meu Cristo interno, o meu Emanuel.
UNO E MÚLTIPLO
Deus é um ou uno em sua essência, no seu eterno SER – porém múltiplo na
sua existência, no seu AGIR temporário. Os mundos múltiplos são a expressão
do Deus uno e único.
Será que só quando morto pode o homem estar em paz com seus
semelhantes?
Sim, só depois de morto – ou morto para a vida do corpo, ou então morto para
a vida do seu egoísmo. Se não quiser morrer para o egoísmo, terá de morrer
para a vida corpórea, se é que quer ter paz com seus irmãos humanos.
“Eu vim para que os homens tenham a vida, e a tenham em maior abundância.”
BUROCRATIZANDO OU VOLATILIZANDO
O CRISTIANISMO
São estes os dois grandes perigos da atualidade. O sectário estreito
burocratiza o espírito de Cristo, procurando encerrá-lo em fórmulas
doutrinárias. O liberal superficial volatiza a alma do cristianismo, difundindo-a
pelos vastos areais da sua indiferença religiosa, até não sobrar nada da divina
essência do Evangelho.
ADULTERAÇÃO DA BÍBLIA
A Bíblia, sobretudo no mundo protestante, foi transformada numa simples
coletânea de preceitos éticos ou numa teologia escolástica, em uma espécie de
dose de ópio destinada a manter pacientemente submissas as bestas de carga
humanas; dos misteriosos surtos de experiência mística que produziram a
Bíblia, desse vastíssimo incêndio do espírito divino de que as palavras
humanas são apenas cinzas frias – disto nada sabem nem suspeitam os
cultores da “letra morta”. A “bibliolatria”, como lhe chama Harry Émerson
Fosdick, é a pior inimiga da Bíblia.
REALISMO – IDEALISMO
O Cristianismo é um vasto realismo horizontal, animado por um profundo
idealismo vertical.
TOTALITARISMOS – CATÓLICO
E PROTESTANTE
“O catolicismo tem sustentado o nazismo, o fascismo, o integralismo, e todas
as outras formas de totalitarismo político, porque ele mesmo é o totalitarismo
por excelência, e numa esfera mil vezes pior que a esfera política, na espera
espiritual da consciência. Os países de preponderância católica são
invariavelmente aqueles em que o comunismo medra mais espantosamente.
Entretanto, ele está conosco todos os dias até à consumação dos séculos,
cheio de graça e de verdade...
Só há cristianismo-fato.
Antes da Encarnação, o Cristo, o eterno Logos, era Theoria (palavra grega que
quer dizer “visão”); depois da Encarnação, essa eterna Theoria ou “Visão” se
tornou Praxis, isto é, “Ação”, atualizou-se, tornou-se realidade palpável, visível;
o espírito divino do Cristo materializou-se na carne humana de Jesus.
DO CRISTIANISMO AO CRISTO
Não é o cristianismo que pode salvar o mundo, mas só o Cristo. O cristianismo
é, hoje em dia, teoria e teologia humana, o Cristo é realidade divina.
O mundo de hoje nada tem que esperar do cristianismo, tudo tem que esperar
do Cristo.
DA CARIDADE AO AMOR
Se houvesse entre nós mais amor, não haveria necessidade da caridade,
porque a caridade é filha da miséria, mas a miséria é filha da nossa falta de
amor. O egoísmo humano, que é falta de amor, cria a miséria, a indigência, a
pobreza, a fome, a desnudez; e, em face dessa numerosa prole gerada por
nosso desamor, faz-se mister a caridade. A caridade não remedia os males da
sociedade, apenas os atenua temporária ou parcialmente; é uma espécie de
injeção, de anestésico, de soporífero, de pomada ou cataplasma que o homem
egoísta que desejaria ser altruísta aplica às dolorosas chagas abertas pelo
egoísmo e desamor dos homens. Se não houvesse exploradores, não haveria
explorados, e, se não houvesse exploradores nem explorados, não haveria mi-
séria – e não haveria ambiente propício para exercer a caridade. O triunfo do
amor tornaria impossível o exercício da caridade – a não ser em casos
excepcionais, catástrofes inesperadas, terremotos, incêndios, enchentes, e
outros fenômenos não dependentes da maldade dos homens; nessas ocasiões
excepcionais seria necessária a caridade, mesmo entre homens cristificados
pelo amor; mas a caridade não seria uma necessidade normal, permanente, da
nossa sociedade.
Será que não deveríamos traduzir: “Pobres, sempre os tereis convosco, se não
me tiverdes a mim”? A miséria sempre estará presente onde o Cristo está
ausente, e, por haver miséria gerada pela ausência do Cristo, faz-se mister a
caridade como lenitivo dessa miséria.
E a miséria continua...
O certo é que Deus não entra nem necessita de entrar na alma; porquanto ele
está na alma desde o início, ou melhor, ele mesmo é essa alma. O que importa
é que esse Deus objetivamente presente na alma pela realidade ontológica se
torne também subjetivamente presente pela percepção lógica; isto é, que o
homem se torne consciente dessa imanência de Deus. Enquanto o homem
ignorar essa presença íntima de Deus, ele é mau, pecador, egoísta, porque
não renasceu ainda pelo espírito, não se despojou ainda do homem velho, nem
se revestiu do homem novo; mas no dia e na hora em que ele se tornar
consciente da realidade interna da imanência de Deus nele, esse homem
passará das trevas à luz, da morte à vida, do egoísmo ao amor, do pecado à
santidade. Não é possível que um homem que tenha conhecido o seu
verdadeiro Ser divino viva, por muito tempo, em desarmonia com essa
realidade por ele conhecida; cedo ou tarde, o seu Agir se conformará com o
seu Ser; a sua Ética se revestirá das cores da sua Mística; a sua Vida será
sintonizada pela sua Fé, se é que essa Fé é uma experiência íntima, e não
apenas a encampação externa de opiniões alheias.
APREENDER E COMPREENDER –
DESCOBRIR FATOS, REALIZAR VALORES
Aprende-se e apreende-se mentalmente – compreende-se espiritualmente.
“Não há nada no intelecto que não tenha estado no senso”, diz o velho adágio
filosófico. O que os sentidos percebem fisicamente, o intelecto o concebe e
elabora metafisicamente; mas essa elaboração metafísica do intelecto não
despoja a percepção física do seu caráter visceralmente individual e unilateral.
Só quando o homem compreende – isto é, “prende totalmente” – é que ele
sabe de fato o que a coisa é em si mesma: Mas esse compreender não é um
processo analítico-silogístico, um ato sensitivo-intelectivo; o compreender é um
fato simultâneo, repentino, um lampejo de dentro, uma revelação ou iluminação
interna, e não uma aquisição externa. A compreensão não é derivada dos
objetos externos, mas do sujeito interno, do grande, eterno e infinito SUJEITO,
que é Deus, e que, em sua forma humana, se chama alma. Aprende-se de
fora, compreende-se de dentro. O aprender é feito pelo ego físico-mental – o
compreender é feito pelo ego racional-espiritual, pelo Emanuel, pelo Cristo
interno, por Deus em nós.
Nenhum fato externo me pode fazer feliz ou infeliz – só uma realização interna
é que me abre as portas do céu ou do inferno.
Quão estupenda era a filosofia cósmica daquele que disse: “Que aproveita ao
homem ganhar o mundo inteiro, se chegar a sofrer prejuízo em sua própria
alma?”
Que aproveita ao homem descobrir e possuir todos os fatos externos, pela luz
da inteligência – se com isto perder um único grau do seu valor interno, que só
a alma pode realizar?
“O DESERTO VIVENTE”
É este o título de uma das mais maravilhosas películas naturistas de Walt
Disney, The living desert (em vernáculo: “O drama do deserto”).
Vai-se atrofiando, não raro, a vida material e social desse feliz vidente de
universos supra-sensíveis e ultra-intelectivos; a sua vida econômica declina...
Feliz dele se uma pessoa de posses materiais e de compreensão espiritual
entrar na vida desse homem!... Do contrário, acabará o seu contenedor
material por sucumbir sob a veemência do seu conteúdo espiritual... Entretanto,
mesmo assim, continuará ele a ser feliz, porque possui o principal da felicidade,
a realização dos valores internos, mesmo com o sacrifício dos fatores
externos...
Sou eu mais crístico e mais amigo de Deus depois de dizer “sim”, e menos
espiritual depois de dizer “não” a uma pergunta sobre a divindade de Cristo?
Na realidade, o meu “sim” ou o meu “não” nada tem que ver com o meu
verdadeiro cristianismo, se por cristianismo se entende a união com o espírito
de Deus, e não este ou aquele grupo eclesiástico a que pertenço por força de
nascimento ou de outras circunstâncias externas fortuitas.
Enquanto eu não puder dizer, com absoluta verdade “Já não sou eu que vivo –
o Cristo é que vive em mim”, não aceitei o espírito de Cristo, embora professe a
mais ortodoxa das fórmulas sobre a divindade de Cristo. Mahatma Gandhi
nunca aceitou nenhum credo eclesiástico; Albert Schweitzer é conhecido como
herege pelas igrejas cristãs protocolares – mas dificilmente encontraremos dois
homens que vivam com maior pureza e fidelidade o espírito de Cristo, em
profundo amor de Deus e vasta caridade dos homens.
O homem espiritual não faz com que outros tenham satisfação nele, mas
contribui para que os homens sintam insatisfação de si mesmos, vejam a sua
imperfeição e tenham desejo de maior perfeição.
O homem espiritual é uma passagem, e não uma parada; é uma entrada e uma
saída para Deus. A sua simples presença é um chamariz, um desafio, por
vezes um ultimatum e um doloroso exame de consciência.
O homem espiritual não é, em geral, uma fascinante personalidade, como
certos cavalheiros dos nossos salões elegantes. Possivelmente, é ele mais
repelente do que atraente, porque a sua retilínea lealdade aos princípios
eternos é inquietante para muitos. Sentem-se perturbados em sua presença,
como o Evangelista diz de Herodes em face do Precursor encarcerado. Em
presença do homem espiritual, muitos começam a pensar em coisa séria,
alguns até aprendem a orar. O campo magnético que circunda o homem
espiritual faz oscilar todas as agulhas que não estejam devidamente
polarizadas pelo norte divino – e ninguém sabe o que vai acontecer depois, nas
almas receptivas... Pode haver terremotos, tempestades, incêndios de
Pentecostes... Pode ser que muitos ídolos e fetiches, tidos por intangíveis e
sagrados, caiam dos seus pedestais...
“Segue-me!”...
“Deixa que os mortos sepultem os seus mortos – tu, porém, vai e proclama o
reino de Deus!”...
Pode ser que alguém ouça, no silêncio de sua alma, coisas terríficas como
esses trovões, quando sai da presença de um homem espiritual.
Cuidado! Alta-tensão!...
Perigo de vida!...
Mantenha distância!...
Certamente!
De quê? Do nada?
Não!
É separado de Deus?
Quando dois ou mais homens se unem em Deus pela mística nasce entre eles
com-união pela ética. Os raios de um círculo aproximam-se uns dos outros na
razão direta que se aproximam do centro comum do círculo, e distanciam-se
uns dos outros na razão que se distanciam do centro. Não pode haver
comunhão (com-união) sem união. A paternidade única de Deus crea a
fraternidade universal dos homens. Querer estabelecer a fraternidade humana
sem a paternidade divina é tão absurdo como querer fazer um círculo sem
centro ou um edifício sem alicerce.
QUE É PERSONALIDADE?
A personalidade principia com o ego – e culmina no Eu. Satã é o ego
petrificado – Cristo é o mais vigoroso Eu.
O homem profano desenvolveu o seu ego, mas não cultivou o seu Eu.
DESCOBRIMENTO – OU REVELAÇÃO?
O homem inteligente descobre pequenas coisas – grandes coisas são
reveladas ao homem espiritual, suposto que ele seja receptivo, que possua
espaços internos assaz amplos em que possa jorrar a plenitude do Além.
Será que eu conheço a Deus e o mundo espiritual assim como alguém que,
depois de muito pesquisar e varrer o céu com o telescópio, descobre,
finalmente, um astro? – ou será como quem levanta o fone do aparelho
telefônico e escuta o que alguém está dizendo do outro lado? Será que eu
descubro a Deus – ou que Deus se revela a mim?
O homem inteligente, escreveu Einstein, descobre aquilo que é (das was ist) –
o homem espiritual realiza aquilo que deve ser (das was sein soll). Descobrir se
refere aos fatos objetivos da natureza externa – realizar tem que ver com os
valores internos dentro do próprio sujeito.
Quem sabe o que é Deus, não descobriu um objeto de fora – teve uma
revelação do seu sujeito de dentro, uma vez que “o reino de Deus está dentro
de vós”.
Da união desses dois pólos, divino e humano, positivo e negativo, é que nasce
toda a luz e toda a força da vida humana.
Assim diz certa teologia eclesiástica. E conclui: “Por isto, é necessário que
haja, através dos séculos, um homem infalível neste mundo, que possa decidir
com clareza e precisão o que é verdade e o que é erro.”
Neste ponto, Buda era bem mais lógico do que certos teólogos. Quando
alguém perguntava ao grande iluminado o que era Deus, Buda não respondia.
Por que não? Porque, se o consulente não sabia por experiência própria o que
era Deus, nem o saberia depois de ouvir uma definição da parte de alguém que
o sabia; mas, se o consulente sabia o que era Deus, a afirmação de um
terceiro não lhe daria certeza, nem a sua negação lhe tiraria a certeza que ele
possuísse.
Quem sabe por experiência interna que há Deus pode tranquilamente escutar
todas as negações desta verdade – nada modifica a sua experiência interna,
que lhe dá certeza.
A grande e gloriosa verdade é esta: Ninguém me pode dar experiência que não
tenho – e ninguém me pode tirar a experiência que tenho. A certeza, porém,
vem da experiência interna, e não de argumentos externos. Quem tem
experiência é invulnerável em sua certeza. A experiência não é transferível
nem auferível. Ela não vem de fora da alma – ela brota das divinas
profundezas da alma.
Por isto, é profundamente ilusório querer dar certeza a alguém por intermédio
de um homem infalível. Suposto mesmo que esse homem infalível tivesse, ou
tenha, essa certeza experiencial, nem por isto poderia ele dar aos filhos da sua
igreja essa certeza, que é absolutamente intransferível. Transferíveis são as
coisas externas, de corpo e da mente, os argumentos, as provas científicas, as
demonstrações analíticas – mas nada disto me dá certeza real de Deus e da
vida eterna. Quem não tem experiência interna não tem certeza de uma
realidade espiritual.
O único auxílio que fatores externos nos podem prestar, nesse plano, é o fato
de aplainarem o caminho que leva a essa certeza definitiva. Mestres,
educadores, escritores, oradores, diretores espirituais podem apontar-nos o
caminho certo onde nós possamos ter certeza espiritual – mas nenhum deles
nos pode dar essa certeza. Todos eles são como setas na encruzilhada,
marcos à beira da estrada, que indicam o rumo certo, mas não obrigam o
viandante a seguir caminho certo.
O rumo indicado pelo maior dos mestres da humanidade, nas páginas áureas
do Evangelho, sobretudo no Sermão da Montanha, possui o máximo de certeza
que se possa imaginar, e a sua linguagem é absolutamente clara e precisa;
querer criar uma instância de certeza acima da certeza dada por Jesus Cristo é
procedimento absurdo, e até arrogante. Não há nada mais infalível que as
palavras de Jesus, no Evangelho.
Daí, porém, não se segue que todo homem que leia o Evangelho da certeza
tenha certeza daquilo que Jesus afirma. Enquanto o leitor for apenas leitor, não
terá certeza alguma; só se passar a viver, por experiência íntima, o espírito do
Evangelho, é que ele terá certeza. A certeza não vem da inteligência – vem da
vivência. Quem não vive a alma do Evangelho não tem certeza das verdades
por ele proclamadas. Saber não quer dizer ter ouvido dizer, ter lido, ter
decorado; saber quer dizer literalmente saborear. Saborear, porém, não é um
processo mental, mas uma experiência vital. Quem não saboreia a realidade
espiritual não sabe como é que ela sabe, que sabor tem, porque lhe falta a
experiência vital da realidade espiritual.
PENSAMENTO SINTETIZADO
“Escrevi um livro tão grande – disse alguém – porque não tive tempo para
escrever um livro pequeno.” De fato, para condensar devidamente em 100
páginas o que está derramado em 1.000, requer-se mais tempo e, sobretudo,
maior intensidade de pensamento do que para ser difuso e prolixo.
Ninguém sabe se a sua oração vai ser eficiente na direção em que ele deseja
ou espera; ignora se aquilo que ele tem em mente vai acontecer ou não. A
oração parece algo como um jogo de azar, totalmente arbitrária. Na realidade,
é certo, a oração obedece a leis invariáveis – mas o homem não conhece
essas leis.
Nessa zona, qualquer pedido, por mais altruístico, seria impossível e absurdo.
Quem pediria? O que pediria? Falta tanto a consciência do “quem” ou sujeito,
como também a noção do “quê” ou objeto, porque essa polaridade é criação da
pequena consciência físico-mental, que, nesse plano, não funciona.
***
Entretanto, cada um deve orar no nível em que vive, sem orgulho nem
presunção. A total realização do nível em que vive de momento é a melhor
preparação para a ascensão a um nível superior.
A razão por que não podemos entender como a oração atua é o fato de que
“entender” representa um “menos”, algo individual, unilateral – ao passo que a
oração em si mesma tem que ver com um “mais”, com a ordem cósmica,
universal, onilateral, com o grande TODO. O “menos” não pode jamais
“compreender” (prender, abranger, totalmente), mas tão-somente “entender”, e
assim a maior parte do “compreender” fica fora da sua zona e jurisdição.
Por isto, o benefício da oração é certo, mas o modo como ela atua é incerto, e
nunca será certo, à luz do intelecto analítico. A oração nunca será objeto de
uma investigação ou técnica científica.
Pela oração, o homem, primeiramente, entra para seu interior, para dentro da
Realidade; daí ele toma rumo ao mundo exterior, levando consigo a luz de
dentro e transfigurando com esta luz todas as coisas do mundo externo.
Para o homem identificado com a Suprema Realidade já não existe, nem pode
existir, medo, porque medo supõe inferioridade, que nasce da ignorância – ele,
porém, é um sapiente,
A FASCINANTE AVENTURA DA
ORAÇÃO SUPERIOR
A prece, nos seus estágios superiores, aparece sempre aureolada de um tal ou
qual espírito aventureiro – a tendência de abandonar o que é familiar,
confortável, facilmente compreensível e atingível, e o anseio de explorar
mundos ignotos e dificilmente conquistáveis. Velhas garantias e seguros
tradicionais são ultrapassados, e, em lugar deles, surge o espírito pioneiro de
uma grande mobilidade através de zonas de estranha incerteza inicial.
Há santos em todas as religiões – o que não prova que essas religiões sejam
boas como um todo. Santidade é atributo do indivíduo, e não duma
coletividade.
VERDADEIRA CATOLICIDADE
Todo o verdadeiro monoteísta, ou melhor, monista, que realize pela ética a sua
mística, é genuinamente “católico”, quer dizer, “universalista”. Católico não-
universalista é pseudo-católico.
PROCESSO DE INCUBAÇÃO
A vida humana é, a bem-dizer, um processo de incubação, transição de um
estado de consciência a outro. A nossa consciência espiritual, ainda hoje em
estado de latência, tem de passar da sua potencialidade para a atualidade. E o
calor necessário para promover essa longa incubação se chama “oração”.
A LEI DA EVOLUÇÃO
O íntimo quê da evolução, sobretudo no mundo espiritual, não é segurança,
estabilidade, calma, mas sim o desejo de ultrapassar todas as fronteiras da
vida já vivida e conhecida – e isto significa aventura, perigo, incerteza; é o
abandono de todos os Iitorais familiares e o salto mortal para dentro de um
mundo totalmente ignoto.
É também este o íntimo quê do amor, que deseja arriscar algo e ultrapassar o
seu próprio Eu conhecido. O amor é essencialmente cósmico.
Mais tarde, oramos pelo bem de outras pessoas, para as libertar de algum mal
e conseguir-lhes algum bem.
Finalmente, não oramos por objeto algum, mas tão somente pela progressiva
identificação do sujeito individual Eu com a Realidade Universal, Deus. E todo
o nosso desejo se resume no anseio de estarmos muito tempo na luminosa
presença de Deus, assim como a planta deseja estar envolta e penetrada pela
luz solar. Todo o nosso impuro desejo de “ter” acabou no puro desejo de “ser”.
E então só conhecemos esta grande melodia: Deus, santificado seja o teu
nome... venha a nós o teu reino... seja feita a tua vontade...
A NATUREZA: É DEMOCRÁTICA
– OU ARISTOCRÁTICA?
A natureza não faz caso de massa, mas sim de elite. Produz milhões e bilhões
de seres inferiores, para, finalmente, produzir um único ser superior. A massa
serve apenas de pedestal para a elite. A vasta horizontal tem de servir à alta
vertical. A natureza visa qualidade, e para isto ela se serve de quantidades.
Pode uma lagarta solver o problema da sua vida? Pode dizer-nos por que vive
a comer sem cessar? Por que morre? Porque repousa no interior do casulo?
Não! A lagarta não pode dar resposta a essas perguntas, porque não sabe o
porquê dos seus atos; só depois de virar borboleta, e olhando para trás, é que
pode solver os enigmas da sua vida de lagarta.
E você julga poder saber agora por que vive, sofre e morre? Você, que ainda é
muito “lagarta”? Solver de verdade só se pode de cima para baixo, não de
baixo para cima, só do superior para o inferior, e não vice-versa.
Agora, meu amigo, você pode apenas crer numa solução definitiva – saber só
pode depois de passar para um plano superior de experiência e vivência.
Uma das maiores imperfeições da Lei Antiga é a idéia de que Deus mande aos
homens doenças para os “castigar”. Jesus ensina que as doenças são “obras
de, Satanás”, isto é, da inteligência não devidamente iluminada pelo espírito.
“Não tornes a pecar, para que não te aconteça coisa pior.” “Tem confiança
(disse ao paralitico) os teus pecados te são perdoados”. No caso da mulher
encurvada havia 18 anos, afirma o texto sacro: “Satanás a mantinha presa,
havia 18 anos” – Deus, – ou Satanás?...
Se doenças fossem provas do amor divino, por que não consta de uma única
doença de Jesus?
Verdade é que, uma vez doentes por causa da nossa inteligência unilateral, o
melhor, que podemos fazer é aceitar o sofrimento como castigo e remédio, a
fim de alcançarmos redenção.
Tu nos perdoas as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos
devedores.
ANÁLISE PSICOLÓGICA E
SÍNTESE METAFÍSICA
Estas duas ciências, aquela do Ocidente, esta do Oriente, abrem o caminho
para um conhecimento melhor de Deus e do homem. Dão, pelo menos, a linha
reta que o homem deve manter para chegar ao destino, preservando-o dos
inúteis ziguezagues.
“Se o olho não fosse solar – diz Goethe – jamais poderia contemplar o sol.”
AMOR FRUSTRADO
“Se amor fosse simplesmente atração sexual, um superficial sex-appeal, não
poderia haver verdadeira frustração, nesse plano, porquanto o mundo está
cheio de seres masculinos e femininos, de maneira que, falhando um, o
frustrado ou frustrada poderia escolher outro – e acabaria a frustração.
Mas o verdadeiro amor é algo muito mais além do simples macho e da simples
fêmea. No mundo animal não há frustração, porque não existe verdadeiro
amor. Quanto mais humano é o homem ou a mulher, maior possibilidade existe
para uma frustração amorosa trágica, mortífera. O verdadeiro amor é algo
cósmico, místico, único e irrepetível, do qual não se pode fazer, sem mais nem
menos, uma segunda ou terceira edição; ele está para além do nosso alcance;
é algo que nos “acontece”, e não está em nosso poder fazer com que
“aconteça” pela segunda ou terceira vez. Algo se partiu nesse delicado cristal
da alma que amava, e não há conserto... Se os nossos romances e películas
cinematográficas substituem, em cinco ou dez minutos, um amor por outro
amor, provam apenas a sua horripilante superficialidade, e, para cúmulo do
nosso barbarismo civilizado, essa banalidade é considerada como um
progresso...
EXPERIÊNCIA CÓSMICA
É algo para além da mística, ou então uma mística universal. O místico foge do
mundo para se encontrar com Deus, mas o homem da experiência cósmica
penetra tão profundamente na alma do universo, que atinge o Deus do mundo
no mundo de Deus. Naturalmente, não é o homem que realiza essa
experiência – ela lhe “acontece” com um contato vital com a própria Vida do
Universo. Daí por diante, todo o seu antigo “dever” ético se transforma num
novo “querer” místico, numa fome e sede, num flamejante entusiasmo, numa
irresistível paixão por essa estupenda Realidade que está para além de todos
os nomes, como a Vida, o Espírito, o Amor, a Beatitude...
A física nuclear dos nossos dias não admite substâncias, no plural; conhece
uma única substância, que, segundo a matemática de Einstein, é a luz
universal. Substâncias, no plural, seriam as diversas formas da luz, como, por
exemplo, os 92 elementos naturais da química, desde o hidrogênio (H) até ao
urânio (U). Entretanto, é possível provar experimentalmente que, após a
consagração, a substância do pão continua presente na hóstia, inalterada, e
não foi substituída por nenhuma outra substância. Logo, no plano objetivo,
ontológico, não houve nenhuma “transubstanciação”, como o dogma afirma.
Entretanto, não negamos a presença real do Cristo sob essas espécies; mas
essa presença é criada pela fé do crente, é uma presença subjetiva, e não
objetiva. Portanto, uma presença fictícia, ilusória? De forma alguma! As
criações da nossa fé não são irreais; são até mais reais que as coisas
objetivas. O sujeito consciente é muito mais poderoso do que os objetos
inconscientes, ou apenas subconscientes.
Por quê?
Quanto mais o homem se esvaziar do seu pequeno ego, tanto mais será
plenificado pelo grande Eu; já não viverá ele (o ego) humano, mas o Cristo (o
divino Eu) viverá nele.
A VERDADEIRA CATOLICIDADE –
ESSA DESCONHECIDA
Por ocasião da comemoração do “dia do papa”, disse o arcebispo de Porto
Alegre, V. S., com muita oratória e pouca verdade:
Mas esse “suspiro” não se realizará, enquanto não se operar uma mudança
radical no setor a que o sr. arcebispo pertence. Se na basílica de São Pedro,
em Roma, fosse proclamado o Evangelho de Jesus Cristo, sem adições nem
deduções, estaria removido um dos grandes obstáculos que dificultam a
verdadeira Catolicidade, isto é, a Universalidade do Cristianismo. Mas, onde
quer que prevaleçam interesses de classe sobre a causa sagrada da Verdade,
é impossível essa Catolicidade. A Verdade não tem partido nem credo, não
conhece classes nem interesses; ela é universal como a luz, a vida, o espírito.
Qualquer aditamento restritivo à gloriosa palavra “católico” ou “universal”
adultera o sentido dela; não pode haver “catolicidade romana”, assim como não
pode haver “universalidade parcial”. Só pode haver catolicidade sem
aditamento algum, universal, ilimitada, irrestrita.
Enquanto o sacerdócio continuar a ser uma profissão, em vez dum puro ideal,
não é possível o triunfo do Evangelho, nessa sociedade eclesiástica.
Toda a sociedade tem por base o direito; mas direito é sinônimo de egoísmo.
Se Jesus tivesse fundado uma sociedade eclesiástica baseada na idéia do
direito, não seria a sua igreja o reino de Deus, mas sim uma criação do
egoísmo humano.
Doente está algo que eu tenho, e não aquilo que eu sou; algo nas minhas
periferias, no meu ego ou na minha persona, é que está desarmonizado – mas
eu sou perfeita saúde e sanidade, porque eu, na minha essência, sou a
essência de Deus e do Universo, que não estão nem podem jamais estar
doentes.
Antes de tudo, não basta pensar, nem simplesmente querer essa re-
harmonização, porque tanto o pensar como o querer são do ego, que é fraco e
está doente – doente não cura doente. É necessário que eu viva integralmente
esse processo de re-harmonização – e essa profunda vivência é do meu
verdadeiro e divino Eu, que não está doente, e pode, portanto, curar o ego
doente.
Mas é precisamente aqui que terminam todas as teorias e técnicas. Aqui não
há mestre nem discípulo – aqui deve atuar uma profunda e misteriosa vivência
ou experiência da última realidade do próprio homem.
Por que é tão rara e tão difícil essa profunda vivência da verdade sobre o
nosso verdadeiro Eu?
A cura pela fé é, na realidade, uma cura pela Verdade – assim como a doença
vem da in-verdade, ou do erro.
Enquanto o ego separatista se mantiver nessa ilusão e nessa prepotência, e
enquanto o Eu for vítima da sua impotência, nada via acontecer; a doença
continua, porque continua o erro. Só quando o Eu conquistar plena vitória
sobre o ego, derrotando as trevas do erro com a luz da Verdade – então
terminará a doença, porque a Verdade é essencialmente libertadora.
Além disto, o que, não raro, é decisivo nesse processo é um grande sofrimento,
porque o sofrimento, devidamente compreendido e espontaneamente aceito,
possui uma extraordinária força purificadora e redentora; purifica-nos do erro e
redime-nos para a verdade.
Sente também, ou adivinha com seguro instinto, que nessa direção está a sua
felicidade, a consecução do seu grande destino.
De fato, o homem é muito mais aquilo que pode vir a ser do que aquilo que ele
é, no plano das suas realidades objetivas e históricas. A sua verdadeira
“natura” é aquela coisa “na(sci)tura”, aquilo que vai nascer, porque foi
concebido e anda em gestação no seio misterioso do seu ser.
Mas... o que aí vai escrito é perigoso para os profanos – só deve ser lido pelos
iniciados... Para aqueles é veneno – para estes é alimento.
Pior ainda quando essa revelação divina é passada de boca em boca, escrita,
traduzida, interpretada repetidas vezes, em diversas línguas. No fim, é ela tão
impura e adulterada com as águas dum rio, quando, após um percurso de
milhares de quilômetros, atingem o seu estuário final.
Somente alguém que possua experiência divina igual à do gênio espiritual que,
de início, recebeu essa mensagem da Divindade.
Que admira que muitos, e dos melhores, não queiram saber de “religião”? Que
a considerem “ópio para o povo” e ridícula “superstição”?...
É bem de admirar que ainda haja, sobre a face da terra, quem se entusiasme
pela religião, depois de tão horripilantes deturpações.
Quanto às coisas externas, Deus as pode realizar sem nós, e até muito melhor;
não necessita de nenhum de nós para realizar as mais estupendas maravilhas
da ciência e técnica das organizações sociais e prodígios de arte. A única coisa
que Deus não pode realizar sem nós é o nosso próprio Eu. Este, em virtude da
nossa consciência e liberdade, está, por assim dizer, fora da jurisdição divina.
Na zona onde eu sou livre Deus não manda – sou eu que mando. Nessa zona
isenta eu sou Deus, autônomo, onipotente; o que eu fizer de bom ou de mau,
nessa zona livre, sou eu, e só eu, quem o faz; aqui, sou eu o único
responsável, porque o dom da liberdade que Deus me concedeu me isentou do
alcance da sua jurisdição.
Por quê?
Como assim?
A magia mental – que é poder sem amor – tenta destruir o Universo, mas
acaba sempre destruído o próprio mago mental, uma vez que a magia é do
Intelecto, e todo o Intelectualismo sem o amor é auto-destruidor.
Por isto, a sapiência da Constituição Cósmica não permite que alguém adquira
consciência universal sem que possua amor universal.
PARAFRASEANDO OS INICIADOS
Há uma consciência local – mas há também uma consciência ultra-Iocal.
Esta visão atinge as coisas pelo lado de dentro, assim como elas são, de fato,
na sua realidade, e não como parecem ser segundo as suas aparências. Vêem
as coisas no seu verdadeiro ser, e na sua verdadeira ordem.
NO CÉU E NO PURGATÓRIO
O homem de consciência cósmica, no mundo presente, está no céu – mas
continua a viver no purgatório. Os sofrimentos do ego continuam, mas são
permeados pela leveza e serenidade da luz interna da experiência celeste. O
quê, ou fato, do seu sofrer é o mesmo que o dos outros – mas o como desse
sofrer é muito diferente. Esse homem pode sofrer gozosamente, pode ser feliz
no meio do sofrimento – assim como o profano pode ser infeliz no meio dos
seus gozos.
Por isto, o homem de consciência cósmica não pede a Deus que o liberte do
sofrimento, mas que lhe intensifique cada vez mais a luz da visão interna, que,
graças à sua misteriosa alquimia, transforma tudo e permeia todas as coisas
externas, de maneira que estas, de opacas que eram, se tornam transparentes
como límpidos cristais.
MÍSTICA E ÉTICA
Nem sempre a ética do homem corresponde ao grau da sua mística, enquanto
ele se acha ainda em vias de evolução. Por vezes, os seus altos vôos místicos
têm de arrastar consigo o peso morto de uma ética ainda sacrificial e precária.
Tão densa é a opacidade multimilenar do velho ego que a luz do novo Eu não
consegue, logo de início, lucificar plenamente as paredes espessas desse
invólucro egoísta – e essa incapacidade é o maior tormento para o Eu divino no
homem em vias de cristificação. Por vezes, o seu humano ego geme em cruel
agonia: “Pai, se possível, passe de mim este cálice sem que eu o beba!”... Mas
logo o seu divino Eu ressalva: “Contudo, não se faça a minha, e sim a tua
vontade”...
CONSCIÊNCIA CÓSMICA
É MAIS QUE MORALIDADE
Quando um homem altamente ético ou moral consegue um amor que abrange
todos os seres, é isto, para ela, uma espécie de talento, ou uma virtude
heróica, da qual tem plena consciência, porque é o resultado de tremendos
esforços e dolorosos sacrifícios; é o termo final de processo de auto-disciplina
de longos anos.
O amor universal com que ele abrange todos os seres – o Real e os realizados
– não é, para ele, uma virtude, um heroísmo ético, um talento moral, mas sim
uma profunda e vasta natureza. Como ele se sente integrado no Grande Todo
do Cosmos, nenhum merecimento há nesse fato de integração, porque é o seu
clima, a sua atmosfera vital, a sua beatitude.
Está na íntima natureza do homem viver abundantemente. “Eu vim para que os
homens tenham a vida – disse o maior dos mestres da humanidade – e que a
tenham na maior abundância.”
Mas o homem eticamente consciente dos nossos dias sabe que ele é um viajor
de regiões longínquas, um peregrino do Infinito; sabe que, por mais que ele se
tenha distanciado do mundo infra-humano – do mineral, do vegetal e do animal
– muito distante se acha da meta final, da plena realização de todas as suas
potencialidades latentes. E talvez que haja dois seres humanos que se acham
no mesmo ponto de evolução ascensional; uns realizaram 10 graus, outros 20,
outros talvez 50 graus de despertamento das suas potências dormentes.
Parece que, até hoje, um único homem atingiu a plenitude da sua perfeição, e
por isto se chamava ele o “filho do homem”, quer dizer o pleni-homem, o
homem integral.
SOLUÇÃO ÚLTIMA
DE TODOS OS PROBLEMAS
Resume-se essa solução suprema, mais ou menos, nos seguintes termos:
Homem, renuncia ao eu pessoal e submerge no nós universal – esse nós que,
em seu primeiro estágio, se chama humanidade, e, no último, Deus.
Realiza com a maior perfeição e com jubiloso amor todos os teus trabalhos,
sem jamais esperar reconhecimento, aplausos, gratidão, nem aguardares
resultados visíveis!
Se assim fizeres, o teu velho ego protestará, indignado, afirmando que a tua
vida é um absurdo e tu és um tolo; pois, como poderias renunciar ao maior
triunfo de milhares e milhões de anos de evolução, que é o teu ego? Que valor
teria ainda a tua vida sem os encantos do ego, que se nutre de elogios,
aplausos e resultados palpáveis dos seus trabalhos?
Dizem os psicólogos que essa treva é uma reação do cansaço causado pela
passagem através dos dois primeiros estágios evolutivos, da purificação e da
iluminação, que, necessariamente, precedem a União.
Para que essa união mística apareça em todo o esplendor da verdade daquilo
que ela é na realidade, isto é, uma puríssima graça de Deus – deve a grande
escuridão acampar no limiar do santuário.
Depois de passar por essa treva espessa, está a alma definitivamente adulta e
madura para ingressar no reino de Deus.
Quando alguém, após esse encontro com Deus, volta ao meio da sociedade,
no princípio não enxerga nada, não compreende mais a linguagem dos outros,
embora veja e ouça tudo materialmente. A sua alma continua distante, muito
distante... Depois, obrigado a retomar o fio da sua vida profissional, tem a
impressão de estar num jardim de infância, ou num teatro de fantoches... Por
que toda essa correria em derredor? Por que essa desenfreada lufa-lufa, a pé,
de carro, de avião a jato? Que querem esses bonecos humanos? Será que têm
de realizar algo de importante? Evidentemente, são vítimas de uma alucinação
coletiva, que eles tomam muito a sério... Ninguém sabe, propriamente, por que
corre, grita, ri, chora, gesticula, acumula dinheiro e mais dinheiro... Será que
eles não percebem que estão montando museus de zeros?... Esses homens
importantes parecem-se com formigas que tiveram desmanchado o seu
formigueiro e põem-se a correr estonteadamente em todas as direções, sem
saber por que e para quê...
É esta a voz que ecoa, sem cessar, na alma do místico que teve o seu
encontro com Deus. E, se alguém lhe oferecesse “todos os reinos do mundo e
sua glória”, não se daria ele ao trabalho de estender a mão para se apoderar
dessas sombras e dessas bonecas de celulóide, que formam o cobiçado alvo
da desenfreada lufa-lufa e das guerras dos profanos...
Para onde?
PARTURIÇÃO MÍSTICA
Entre a iluminação da alma e sua definitiva unificação com Deus, jaz o
tremendo mistério da parturição do homem cósmico. No meio dessas dores de
parto agoniza a alma, sofrida de Deus e sofrida de si mesma...
Outrora, sabia o homem algo sobre Deus – e isto era delicioso; agora sabe ele
a Deus – e isto é terrífico, porque esse saber é um viver e um ser – e isto é
algo mortífero – e vivificante...
E Verdade me libertou...
Foi abolido o inferno, desde que o paraíso tomou conta de mim. Também,
como poderia haver inferno lá onde Deus está?... A onipresença do céu
eclipsou a presença do inferno...
Foi também abolida a morte, pois como poderia haver morte, lá onde impera a
vida?
Absolutamente não! Devo amar a todos assim como me amo a mim. Se eu não
amasse a mim, não teria norma para o amor aos outros. Devo ser
absolutamente solidário no meu amor. Devo amar-me em tudo e tudo em mim.
Eu e o Universo somos um. Sinto em mim as pulsações da vida universal, e
faço pulsar no universo a minha própria vida. Eu vivo a vida cósmica, e a vida
cósmica me vive e vitaliza.
Por que essa amizade e confidência? Será porque eu, engolfado naquele
capítulo sobre um místico que conversava com a natureza como Francisco de
Assis, me achava envolto em auras de simpatia cósmica?...
Muitas vezes, à noite, quando leio, vêm dançar sobre as páginas do livro umas
pequenas mariposas vestidas de seda branca, que eu chamo “noivinhas”;
pousam sobre o papel e se quedam, estáticas, vibrando apenas as minúsculas
antenas. A luz as põe numa espécie de samadhi, e elas, misticamente
inebriadas de luz, se sentem no “terceiro céu”. Falo com as delicadas
“noivinhas” de alvíssimo enxoval, e lhes entrego a minha mensagem para o Pai
de toda luz, vida e amor...
EU ESTOU EM TUDO –
E TUDO ESTÁ EM MIM
Vamos substituir a palavra “Deus”, tão abusada, pela palavra “Vida”, tão
querida.
A Vida é a essência de todas as coisas. Eu, pelo fato de estar vivo, participo da
Vida Universal, que está em todos os seres vivos.
Por isto, eu vivo em todos os seres vivos, em virtude da Vida, e sou amigo de
todos os meus irmãos viventes.
Fazer “milagre” é um simples corolário desta minha união com a Vida
Universal. Nada é impossível a quem se torna consciente dessa universal
“simbiose”, dessa grande “convivência cósmica”.
PROPINQUIDADE E LONGINQUIDADE
Quando uma pessoa de consciência individual está comigo, eu sinto
deleitosamente a sua tépida propinquidade – mas, quando uma pessoa de
consciência cósmica está comigo, sinto-lhe, para além da grata proximidade
individual, a solene longinquidade universal, sinto-a como que envolta numa
aura de indefinível sacralidade...
Meu ignoto Amigo e Senhor! Ando sempre à tua procura, porque te achei, e
nunca te acho plenamente. Quanto mais te acho mais te procuro, porque o
meu pequeno finito anda sempre faminto do teu grande Infinito, e quanto mais
me alimento de ti, tanto mais fome tenho de ti... Deus do céu! Será que esta
fome progressiva que tua progressiva posse me dá não acabará por me
aniquilar e dissolver em ti totalmente? Será que não acabarei em dulcíssima
eutanásia mística, diluindo-me todo em ti, ó divino Oceano sem praias nem
fundo? Se assim for – adeus, pequenina onda do meu Eu! Volta em paz para
donde vieste!... Deixa de existir – e volta a ser... Desprende-te das praias da
efêmera existência e afoga-te nos abismos da eterna Essência... Adeus!... Que
o meu pequeno Eu, limitado de nome e forma, se dilua no infinito Pélago, sem
nome nem forma!... Nirvaniza-te, pequeno Algo, abisma-te no Nada, no seio do
grande Todo!... Des-nasce para o teu existir individual e nasce para o Ser
Universal!...
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AÇÃO – ADORAÇÃO
Duas asas que me levam às alturas.
Todo o meu externo agir poderia ser feito por Deus, e muito melhor – mas o
seu interno adorar e amar não pode ser feito por Deus em meu lugar.
Tanto vale a minha ação quanto vale a minha adoração. As minhas ações são
outros tantos zeros sem o algarismo positivo “1” da minha adoração, que
valoriza com a sua plenitude todas as vacuidades dos zeros: 1 000 000.
A visão mental não pode ser corrigida por si mesma, senão apenas por uma
visão superior, intuitiva, panorâmica.
Tudo que é cientificamente lógico não é real, mas aparente, porque a ciência
trata apenas dos fatos, mas não da realidade. Os fatos estão para a realidade
assim como um objeto refletido no espelho está para esse reflexo.
ESTUPRO ESPIRITUAL
Querer impor a outros uma crença ou experiência espiritual é crime de
violência ou estupro, e isto em dois sentidos.
Esse estupro espiritual é, talvez, o maior crime que certas igrejas dogmáticas
cometem contra a humanidade, consoante a norma “Crê ou morre!”
QUIETUDE É PUREZA
Como tornar clara uma água turva?
Homem! Pratica inação – e não haverá nada que não possa ser feito!
Deixa que cada coisa siga seu curso natural e não interfiras com coisa alguma
– e tudo sairá certo!
COMPREENDER É SER
Não fales de oceano a uma poça d‟água!
Não sabes que ninguém pode compreender coisa maior do que ele mesmo é?
VERDADES PARADOXAIS
Se quiseres ser grande – humilha-te!
O profano, quanto mais goza tanto mais incapaz se torna de gozar, e, por fim,
expira o último resquício da sua capacidade de gozar – e então só lhe resta um
inferno de tédio, o manicômio ou o suicídio. O próprio gozo impossibilita o gozo
– é esta a maldição de todo o gozo profano.
O HOMEM INFINITO
O homem não é um ser finitus, findo, acabado – ele é infinitus, não-findo, não-
acabado, porque ele é uma sinfonia inacabada.
Os problemas duma lagarta não acabam com a lagarta, mas sim com a
borboleta, porque a lagarta é uma sinfonia inacabada. A lagarta é a borboleta
“infinita”, não finda, por acabar...
Quanto mais me aproximo da Luz, mais largas e espessas são as sombras que
projeto após mim, porque mais nítida se torna a consciência da minha finitude...
EU E O UNIVERSO SOMOS UM
Hoje, pelas 10 horas da noite, ao voltar do meu solitário Shangri-la, no bosque
de Washington, após intensa meditação, parei uns momentos, no meio do trilho
que conduz ao campo da Universidade onde leciono – e sobreveio-me intensa
luz, que me envolvia e permeava, uma luz imaterial de dentro... E fui inundado
pela grande Verdade, que é suprema Felicidade, de que eu e o Universo
somos um... Vivia a minha íntima união com Deus, que parecia total
identidade... E, como Deus é a essência de todas as coisas, também eu estava
essencialmente em todas as coisas, vivia em cada uma das creaturas de Deus
ao redor de mim, que estavam em mim – pedras, plantas, insetos, aves, ar,
terra, música de grilos e cigarras – meus irmãos, minhas irmãs dormentes,
semi-dormentes... E eu, o único irmão maior vígil, acordado, no meio desse
misterioso dormitório de Deus...
Outros ainda agem em perfeita harmonia com o seu “dever”, mas nada sabem
desse senso compulsório, porque toda a sua consciência está empolgada por
um delicioso e espontâneo “querer”. Estes resolveram o problema central da
vida: querer o dever. Eles sabem o que Gandhi quis dizer com as estranhas
palavras: “A Verdade é dura como diamante – e delicada como flor de
pessegueiro.” A objetiva dureza do dever se lhes converteu na subjetiva
delicadeza do querer...
RELIGIÃO E MORALIDADE
Não há nenhum nexo direto entre religião e moralidade, contanto que como
religião se entenda a mística, a experiência cósmica da Infinita Realidade.
Depois de passar pela experiência mística, o homem continua a ser ético, mas
a sua ética perdeu o colorido moral do “dever”; esse homem já não é ético por
virtude, por um imperativo categórico de consciência, “tu deves”, mas sim como
um suave e espontâneo transbordamento da sua experiência com Deus, “eu
quero”... Não ama a seu semelhante como a si mesmo porque veja nisto uma
obrigação moral, um preceito ético, mas simplesmente porque o mar do seu
amor divino lança suas ondas impetuosas sobre todas as praias e ilhas
humanas e infra-humanas dos arredores...
Esse homem faz o bem por ser bom, nem pode deixar de fazer o bem, porque
o seu ser-bom é a sua íntima natureza, que ele, finalmente, descobriu. A sua
alteridade ética no meio dos homens não é incompatível com a sua identidade
mística com o grande Todo da Divindade, porque ele vê todas as partes nesse
Todo. Solitário em Deus, não pode deixar de ser solidário com todas as
creaturas de Deus, porque vê o Deus do mundo no mundo de Deus.
Na mística divina, o homem recebe, e por isto pode dar jubilosamente e sem
limites, porque esse dar humano nascido do receber divino é lucro que faz
enriquecer.
Conformidade e desconformidade!
Satisfação e insatisfação
CREDO DINÂMICO
Não pode haver credo estático, passivo. O meu crer depende do meu poder, e
o meu poder depende do meu ser individual.
Ora, o meu ser está em contínuo crescimento; logo, também o meu poder e
meu crer são processos dinâmicos, em contínuo crescimento. Quem crê hoje
apenas aquilo que creu ontem, quem aos 50 anos crê apenas o que cria aos 5,
e nada mais, sofre de paralisia infantil – ou então virou múmia! Quem hoje crê
mais o que cria ontem, goza de vigorosa saúde espiritual e moral.
O segundo tocou-lhe nas enormes orelhas, e achou que elefante era uma
espécie de chapa.
O terceiro puxou-lhe o rabinho, e disse que elefante era algo parecido com uma
corda.
O quarto tentou abraçar-lhe a volumosa barriga, e opinou que elefante era uma
espécie de barril.
Por fim, falou o viajante montado no paquiderme e declarou que elefante não
era nada disto, embora tudo aquilo fizesse parte do animal. Faltava aos cegos
a intuição do Todo orgânico e vivo.
Mas, na ordem individual, não há duas pessoas iguais. A natureza não é uma
democracia, mas sim uma hierarquia cósmica.
É proibido pensar!
Personalidade é tabu!...
Oxalá, os nossos sofrimentos, criados por nós mesmos, possam ser o prelúdio
da nossa redenção!
Essa redenção, porém, não vem de fora, de terceiros, nem vem das periferias
do nosso ego humano, nosso carcereiro – a redenção vem do centro do nosso
Eu divino, porque “o reino dos céus está dentro de nós”...
E, uma vez que o Todo de Brahman está presente no Nada de Maya, essa
Maya deixa de ser o Nada e se torna Algo, depois de fecundada pelo Todo.
E assim o homem clarividente, vendo Maya, intui Brahman em seu seio e pode
adorá-lo nessa sua inabitação.
Eu não sou infeliz por causa de algo que me aconteceu, por obra e mercê de
terceiros – eu sou infeliz por causa de algo que está em mim mesmo e que foi
despertado por acontecimentos externos. Esses acontecimentos são apenas
os detonadores de um explosivo que estava acumulado dentro de mim; o
veneno da minha infelicidade já pré-existia a esse envenenamento, sempre em
vésperas de romper em tragédia. O pior de tudo não é essa eclosão da
tragédia latente, mas é o fato de estar latente em mim essa tragédia, embora
ainda em estado potencial, dormente, embrionário. E quem criou esse germe
de infelicidade não foram as perversidades dos homens nem as adversidades
da natureza – fui eu mesmo.
Meu Eu não foi ofendido, magoado. Ninguém me pode fazer mau, exceto eu
mesmo – todos os outros apenas me podem fazer mal. Receber o mal é algo
que me acontece – ser mau é algo que eu sou, como também o seu contrário,
ser bom. Daquilo eu sou o objeto inerme – disto eu sou o sujeito poderoso. Ser-
mau é o único mal verdadeiro – mas isto não me pode acontecer de fora, sem
culpa minha. Outros me podem fazer mal ou bem – só eu me posso fazer mau
ou bom.
Se qualquer fator fora de mim me pode fazer feliz ou infeliz, não sou realmente
feliz...
TODOS OS MUNDOS ESTÃO AQUI
O homem comum fala do “outro mundo”, e entende por esse “outro” algum
lugar distante e um tempo ainda não presente.
Na realidade, porém, esse “outro mundo” nada tem que ver com tempo e
espaço, mas sim com o maior ou menor grau da nossa percepção. Quando
sintonizo o meu aparelho de rádio por ondas longas, só percebo mensagens
eletrônicas emitidas nessa onda, enquanto as outras mensagens emitidas em
ondas curtas, igualmente presentes no ar, passam despercebidas, como se
não existissem.
O crivo da minha razão, porém, é de todos o mais fino, com interstícios tão
pequeninos que quase nada lhes escapa, a não ser as realidades
indizivelmente sutis. Pela razão espiritual percebo, até certo ponto, até o
Infinito, o Absoluto, o Eterno, o Universal, que o intelecto não registra.
Se os meus três crivos não deixassem passar nada, mas retivessem tudo,
então teria eu consciência de tudo, e seria onisciente e oniconsciente como
Deus. E, neste caso, os meus crivos deixariam de ser crivos, porque estariam
totalmente fechados, sem interstício de espécie alguma. Eu não perceberia
pelos sentidos, nem conceberia pelo intelecto, nem intuiria pela razão, mas eu
seria essa própria Realidade Integral. Isto, naturalmente, não é possível,
porque eu nunca poderei ser Deus. Possível é tão-somente que eu intensifique
a minha experiência de Deus, que me divinize, sem me deificar, diminuindo
cada vez mais os interstícios dos meus crivos e retendo cada vez mais a
realidade consciente.
INDIMENSIONALIDADE
Os meus sentidos percebem o que é tridimensional, como os corpos materiais.
O meu intelecto concebe o que é indimensional, como verdade, justiça, lei; mas
essa indimensionalidade é relativa, porque ainda obedece à lei de causa e
efeito.
Ekklesía é, pois, algo que foi chamado fora, evocado, selecionado do meio
duma grande massa. Ekklesia é elite, escol.
INQUIETUDE METAFÍSICA DO
HOMEM MODERNO
O homem que passou por duas guerras mundiais não pode mais crer na força
redentora da nossa cultura e civilização, como o podiam os otimistas do
século19.
Nunca se sentiu o homem tão frustrado e tão cético como em nossos dias. E a
perspectiva de uma nova guerra, com armas nucleares, apaga na alma do
homem moderno a derradeira centelha de otimismo e esperança na sua cultura
e civilização.
“O reino de Deus não vem com observâncias (rituais), mas o reino de Deus
está dentro de vós”...
O homem não pode ser alo-remido, nem ego-remido, mas sim auto-remido,
porque esta auto-redenção é cristo-redenção, teo-redenção.
Quem se encontrou com Deus é feliz, mesmo no meio dos sofrimentos – quem
não se encontrou com Deus é infeliz, mesmo no meio dos gozos.
“Fizeste-nos para ti, Senhor, e inquieto está o nosso coração até que encontre
quietação em ti” – estas palavras proferidas, há quase 15 séculos, por um
homem infeliz que encontrou felicidade em Deus, continuam a ser
integralmente verdadeiras em nossos dias.
Quem não fizer violência a si mesmo, não pode tomar de assalto o reino da
felicidade.
MATEMÁTICA E MÍSTICA
Tudo que é perceptível pelos sentidos é material. O material, porém, é tri-
dimensional. Todos os corpos materiais têm três dimensões: linha, plano, cubo
– comprimento, largura, espessura.
O ponto não é corpo material, porque não tem dimensão alguma, nem existe
como tal.
E é precisamente aqui que começa o tenebroso mistério: como posso ter noção
do Todo antes de conhecer as suas partes? Não é o Todo a soma total das
partes?
Se assim fosse, é claro que eu não poderia ter experiência do Todo senão pela
soma das partes. Na verdade, porém, o Todo não é a soma das partes, não é
uma síntese de antíteses, mas é a grande TESE anterior a qualquer anti-TESE
e sin-TESE, não é um Composto de componentes, mas é anterior a
componentes e composto, porque é Todo simples, absoluto, que se revela e
manifesta em partes várias, mas não se parte. Aliás essa palavra “partes” é
inexata, porque o Todo não tem partes. Os mundos não são partes ou
centelhas de Deus, como dizem os poetas. Melhor seria dizer, os mundos são
como os pensamentos do grande PENSADOR (Deus). O pensamento não é
uma parte do pensador, mas uma manifestação parcial do mesmo.
Para que o homem possa ter a intuição do Todo antes de conhecer as partes,
deve ele ultrapassar a zona dos processos analíticos da inteligência, que só
conhece partes; deve abismar-se no oceano da visão espiritual, que entra em
contato direto com a Essência, o Real, o Todo.
Que é absurdo?
Diz Tertuliano que só crê nas coisas que são absurdas, porque estas são
grandes, ao passo que as coisas pequenas podem ser inteligidas e
mentalmente analisadas, precisamente por serem pequenas.
Esse absurdo não é produto do ego, mas é uma dádiva do Infinito, e o ego só
pode receber esse carisma divino no caso que se desegofique e ultrapasse a
sua própria estreiteza.
SEXISMO E EGOÍSMO
A igreja romana assume atitude hostil em face do sexo e sexismo – ao mesmo
tempo que é laxa em matéria de egoísmo. Pode um católico ser tão egoísta
como quiser, contanto que seja anti-sexualista, é considerado bom católico.
Por isto, o Código de Direito Canônico considera delito muito mais grave o
padre casar pelo cartório do que simplesmente viver com mulher e ter filhos
com ela, porque, no segundo caso, continua ele legalmente solteiro.
CIDADÃO DO UNIVERSO
Disseram a Sócrates: “Já que és cidadão de Atenas, vive como bom
ateniense.” Ao que o filósofo respondeu: “Eu sou cidadão do Universo, e
procuro viver como bom cidadão cósmico.”
NO TERCEIRO CÉU
Entre 9 e 10 da noite...
O meu eterno EU, liberto do peso do meu pseudo-eu, contemplava esta massa
dormente, inerte, e EU pairava sobre ela, tão leve, tão luminoso, tão divino...
Como é possível alguém se identificar com o seu ego mortal?! Esse homem
deve ser vítima de completo analfabetismo...
Aleluia... Hosana...
A MORTE DE JESUS
Falei com uns teólogos luteranos. Dão imensa importância ao fato histórico da
morte física de Jesus no Calvário; acham que esse evento foi o clímax de toda
a história da humanidade.
Esse triunfo da vida sobre a morte, nascido da sua experiência divina – “eu e o
Pai somos um” – é fato único na história da humanidade. A existência humana
de Jesus se acha tão intimamente vinculada com a essência divina do Cristo
que ele pode, tranquilamente, permitir, e até provocar a morte física.
Quem vive 100% a sua imortalidade pode descer ao marco zero da sua
mortalidade. Todos os seres vivos temem a morte e a evitam quanto possível,
porque nenhum deles tem plena consciência da sua imortalidade. Os seres
inconscientes da natureza inferior aceitam, com relativa calma, a morte do
indivíduo, porque têm o instinto biológico da sua sobrevivência na espécie,
porque neles predomina a “consciência do grupo”, e não a “consciência do
indivíduo”, e, como o grupo ou a espécie sobrevive, pouco importa que o
indivíduo morra.
“Vem o príncipe deste mundo, mas sobre mim não tem poder – porque eu
venci o mundo.”
TALENTO – E GÊNIO
O homem ético, que faz o bem, é um talento – mas o homem místico, que é
bom, é um gênio.
Talento é técnica.
Gênio é inspiração.
O homem místico é inspiração que se revela em éticas; ele é bom e por isto faz
bem.
TOLERÂNCIA – OU COMPREENSÃO?
Dizer que alguém é tolerante em face de outras religiões ou filosofias, não é
louvor, é censura.
E eu mesmo, em que ponto estou? No marco 20, 70, 90? Esteja onde estiver, o
certo é que há muitos viajores abaixo e muitos acima de mim. Por isto, eu não
apenas “tolero” os meus companheiros rumo ao Infinito, eu os compreendo e
aprovo; sei que estão comigo na mesma direção. Mesmo que alguns deles
estejam ainda ziguezagueando, incertos, para a direita e para a esquerda, que
importa? O erro também é aliado da verdade; um dia, também eles entrarão na
linha reta e iniciarão a sua ascensão. O que eu posso fazer por eles é
prosseguir em linha reta e ser tão bom e feliz que também eles tenham o
desejo de seguir o mesmo caminho.
Nós estamos ainda labutando nas olarias, a ver se conseguimos fabricar uns
tijolinhos individuais assaz resistentes para suportarem tamanho peso...
Estamos alimentando a fornalha da mística, donde sairão os indivíduos
depurados do último resto de egoísmo, para garantirem a ética da
humanidade...
Quem não aprendeu a ser solitário com Deus não pode ser solidário com os
homens...
A vasta horizontal da ética é sustentada pela profunda vertical da mística – fora
desta geometria não há salvação!...
TU ÉS O QUE PENSAS
O homem é o resultado dos seus pensamentos habituais. A atitude mental cria
os atos externos. Quem vive, habitualmente, em pensamentos largos e
benévolos não pode praticar atos estreitos e malévolos.
Por isto, cuidado com os pensamentos! Alimento para muitos – veneno para
muitíssimos...
Nações Unidas é, sem dúvida, um belo ideal – mas nunca será sólida realidade
enquanto não tivermos Mentes Unidas – o MU terá de preceder o NU.
PLATÃO E ARISTÓTELES
O homem realmente genial não cria padrões de conhecimento, como o talento;
mas acende faróis em praias longínquas para orientar os nautas da
humanidade.
Se, porém, o Universal é o Real, então está ele imanente em cada indivíduo,
onipresente, e, neste caso, religião é o despertamento e a evolução desse
germe divino na alma, e a hierarquia não é de necessidade absoluta, embora
possa ser relativamente útil, suposto que seus membros já tenham despertado
em si o Deus dormente. Neste último caso, a hierarquia humana perde muito
do seu prestígio, porque, em última instância, cada homem tem dentro da sua
alma a hierarquia divina, embora apenas em estado latente, e a salvação é
possível sem sacerdotes, bispos, papa, sacramentos, Bíblia, etc. Os quakers
(Society of Friends), frisando a “luz interna” (inner light) como supremo tribunal
do homem, foram excomungados pela Igreja Anglicana, incapaz de
compreender tão grande verdade. Mas essa “luz interna” só se acende na alma
no seio de um grande silêncio e de prolongadas meditações.
O IDEAL É O REAL
Devido à nossa estreiteza, chamamos o Irreal o Ideal, quando o Ideal é que é o
Real por excelência, porque o Ideal é o Universal, o Abstrato, ao passo que o
concreto (isto é, o “condensado”) é apenas um estado de passivilização ou
deteriorização, uma objetivação secundária. Os fatos não são a Realidade, mas
apenas uma projeção ou objetivação, um reflexo no espelho da Realidade.
O Super-ser, de Plotino.
Tudo isto e mil outros nomes são tentativas de dizer o indizível, de dar nome ao
Anônimo e Inominável.
O MISTÉRIO DA ESFINGE
Meio leão, meio mulher – poder e beleza – deitada, com a cabeça erguida,
fitando com os grandes olhos cheios de vacuidade – vácuos de Maya e plenos
de Brahman – o deserto do Infinito, para além de todos os horizontes finitos,
envolta numa aura de eternidade – que símbolo mais eloquente poderia haver
para o homem imerso em Deus, cheio de poderosa beleza e de belo poder, tão
longínquo no seu ser e tão propínquo no seu agir?...
Esfinge, tu és eu...
Até esse tempo, terá a humanidade sofrido tais horrores, com guerras
nucleares e seu sucedâneo, os aparelhos bélicos de matéria astral mente-
guiados, que os homens estarão maduros para compreender o espírito do
Cristo-redentor.
VERDADE E BELEZA
Verdade sem Beleza fere.
A Vontade, o eros, é a força que trilha esse caminho lúcido rumo à vida.
A Inteligência é um canal.
NEO-PLATONISMO
Ver a grande unidade do Real para além de todas as diversidades que esse
Real projeta no mundo dos fenômenos; enxergar o mar eterno por debaixo das
ondas efêmeras; descobrir a luz incolor para além da dispersão multicor; intuir
Brahman em plena Maya – isto é neo-platonismo, que enche a alma de uma
grande segurança, serenidade e beatitude. Não torna o homem indiferente e
apático em face do mundo e da vida, mas afirma todas as pequenas vidas
individuais por amor à grande Vida Universal, ama as cores por causa do
Incolor, as ondas por causa do Mar, os ruídos por causa do Silêncio, Maya por
causa de Brahman. É o amor-livre substituindo o amor-escravo dos profanos e
o amor-nulo dos indiferentes.
Se isto é religião, não tem a Rússia razão em bradar que “religião é ópio
(mistificação) para o povo”? E, em vez de gritar contra o ateísmo e anti-
cristianismo dos soviéticos, não seria melhor que o clero começasse a ser
integralmente sincero com o povo e consigo mesmo, não sacrificando a
Verdade do Evangelho aos seus interesses financeiros e ao seu prestígio
social?
As mais terríveis armas de que o comunismo dispõe foram forjadas pelas
igrejas cristãs, e o berço de todo o ateísmo é a teologia clerical.
O caráter de Jesus não é nem paulino nem agostiniano, nem asiático nem
africano, mas nitidamente universal, cósmico. Desligado de tempo e espaço, de
rito e raça, de credo e classe, é a mensagem do Nazareno algo totalmente
inédito e original.
O GRANDE ENIGMA DA FÉ
É deveras estranho que o homem não queira sacrificar o seu ego para realizar
o seu Eu. A razão dessa renitência é a falta de experiência que ele tem do seu
verdadeiro Eu, a alma; o homem profano, quando muito, crê vagamente na
realidade da alma, que lhe é como fogo pintado, mas não fogo real. Tudo que é
simples objeto de crença é vago e ineficiente. E por isto não tem ele a coragem
de enfrentar alguma dificuldade para realizar o seu Eu central, a alma. Crê na
alma, mas não tem fé, no sentido de experiência direta e vital dessa realidade.
Mas esse sacrifício de agir como se já tivesse experiência divina antes de a ter
é o melhor preparativo para essa experiência. É um sofrimento metafísico – e
sem sofrimento não há redenção.
Dizem que o gênio antecipa o seu tempo, o que não é bem exato; segundo as
eternas leis cósmicas, aparece o gênio precisamente quando o mundo
necessita dele. Isto, porém, não quer dizer que ele não sobrepuje as massas
por séculos e milênios – mas isto faz parte do seu tempo e da sua missão. Se o
gênio fosse apenas um passivo refletor, um espelho acomodatício à opinião
pública dominante, aos caprichos da turbamulta, não seria gênio; ele é gênio
por seu inconformismo, por ser pioneiro e diretor de milhares e de milhões.
Esta sua missão, naturalmente, não pode deixar de ser o seu martírio – um
martírio glorioso. Um bandeirante de mundos ignotos não deve esperar outra
coisa. O seu destino é, geralmente, trágico, no presente. Se fosse um pacífico
conformista, viveria em paz com todos os medíocres; mas, por ser um
transformista, muitos o temem, muitíssimos o odeiam – e uns poucos o amam
e admiram. Só um grande homem pode ser intensamente odiado e
intensamente amado. Mediocridades não são odiadas nem amadas – são
esquecidas.
O gênio é amado com mística veemência por todos aqueles que nele vêem o
seu próprio Eu melhor e mais puro – e é odiado com metafísica violência por
aqueles que se sentem eclipsados em sua pequenez pela grandeza do gênio.
O gênio nunca é amado com afetiva familiaridade, mas amado e adorado como
um misto de assombro e admiração...
Quem não sente em si a coragem de ser mártir, não se arvore em pioneiro das
massas!
ALMA
Este conceito ocidental não existe no Oriente como entidade permanente. Em
vez disto há o “princípio de consciência” (consciousness, Bewusstsein), que é
como que um foco variável, capaz de se condensar e descondensar, conforme
as experiências que adquire; um vortex do Eu em evolução.
Ser como criança, não por ignorância natural, mas por sapiência de
experiência. É ultrapassar não só o subconsciente infantil, mas também o
consciente juvenil e entrar no superconsciente cósmico.
VIDA – OU OS MEIOS DA VIDA?
É deveras estranho! O homem comum passa a existência toda correndo atrás
dos meios de vida – e se esquece da vida! Vítima duma espécie de alucinação
coletiva, pensa que deva acumular mais e mais matéria-morta para poder viver,
e quanto mais possui, mais deseja possuir – e no fim de 60, 80 anos morre
sem ter vivido realmente... Agoniza meio século à margem da vida...
Ninguém pode ser consciente do Todo, a consciência exige algo finito, algo
parcial. Para além de todos os finitos cognoscíveis está o Infinito Incognoscível.
O oriental, por sua vez, foge de todas as periferias existenciais e vai cavando
rumo ao centro essencial. Para ele, Deus não ex-siste, mas in-siste, ou melhor,
simplesmente siste, ou é; Deus é o grande SISTENTE, o ENTE, o YAHVEH, o
puro SER. Mas esse É, ou EU SOU O QUE SOU, está para além de todas as
existências, e, por isto mesmo, para além do nosso Consciente. Para além do
ocaso do Consciente dos sentidos e da mente desponta a alvorada do
Inconsciente da razão espiritual.
AUTO-REDENÇÃO – OU ALO-REDENÇÃO?
Se a nossa teologia ocidental é a última palavra sobre o Cristianismo, então, é
evidente que o Ocidente cristão é eternamente incompatível com o Oriente
pagão, e todos os esforços dos missionários são, praticamente, inúteis; só será
aceito pelos ignorantes, mas nunca pelos sapientes.
A ponte existe, mas não está nas técnicas de uma apropriação externa,
horizontal, mas sim numa profunda experiência vertical da alma humana de cá
e de lá. A vacuidade central do oriental e a plenitude periférica do ocidental são
idênticas. O Infinito de Dentro é o Infinito de fora. Deus é o Todo, e o Nada, o
Sim e o Não, a Luz e as Trevas – não na horizontal das polaridades, mas na
vertical da impolaridade.
QUAL É A GRAÇA?
Literatura imensa tem sido escrita sobre o mistério da “graça”.
Charis e Gratia significam, propriamente, beleza. Também em vernáculo,
usamos esse vocábulo para dom gratuito e beleza.
Para além das luzes da ribalta, do cenário visível do nosso Consciente, por
entre a invisível penumbra dos bastidores do Inconsciente, converge toda a
sabedoria dos séculos e milênios da humanidade...
O oriental tem contato mais direto com o nirvana do Inconsciente do que com o
sansara do Consciente. Geralmente, o chinês, o japonês, o hindu não
conhecem nervosidade. O ocidental vive mais no Consciente e menos no
Inconsciente, e procura então substituir a falta de segurança interna com toda a
espécie de seguranças ou pseudo-seguranças externas, dominando
violentamente o ambiente pelas conquistas da ciência e da técnica.
ABSOLUTA OBJETIVIDADE
O ídolo do homem ocidental, sobretudo do cultor das ciências exatas, se gaba
da sua “absoluta objetividade” – e não percebe o ridículo dessa sua atitude...
Gaba-se de uma bonequinha de celulóide ou dum aviãozinho de elástico, como
as crianças do jardim de infância.
O homem oriental tem horror a essa objetividade, porque já compreendeu que
o objetivo é derivado, ilusório, reflexo no espelho, eco longínquo da Realidade.
Prefere o nirvana do Inconsciente ao sansara do Consciente, e encontra paz
nessa estratosfera, onde não há tempestades nem conflitos, por falta de
suficiente diferenciação e polaridade.
ANALISAR E PROFANAR
Cuidado com a análise de textos sacros! Toda a análise profana!
Tudo que se pode pensar e dizer é degradado; não é a Realidade integral nem
a Sacralidade pura. Real e puro é somente o impensável e o indizível. Só o que
se pode sentir e viver misticamente, na silenciosa solidão da alma com Deus,
isto é que é plenamente verdadeiro, belo e puro – e muitos textos sacros
refletem essa pureza sacral, que de modo algum deve ser prostituído com
análises mentais nem com ruídos verbais. “A letra mata – mas o espírito dá
vida”...
Não faz mal que uma experiência mística seja intelectualmente absurda e
paradoxal...
Cada um dos dois, como se vê, entende com a palavra “Eu” algo grandemente
diverso. “Vós sois deuses” – estas palavras de Jesus são tipicamente orientais,
que o ocidental tenta em vão justificar. Idem “Vós sois a luz do mundo” – que
teólogo dualista pode aprovar tais palavras, quando a sua igreja lhe manda crer
que todo homem é treva e pecado por sua íntima natureza, “escravo de
Satanás”, “filho da ira divina”, como se lê em todos os nossos catecismos e
tratados teológicos? É deveras estranho que a igreja, através de quase dois
milênios, tenha podido manter uma teologia diametralmente oposta ao espírito
do Cristo. Só mesmo a força de uma acintosa e sistemática ignorância de seus
filhos e graças a uma casuística exegética que consegue injetar aos textos
sacros um sentido que eles não têm.
OSMOSE CÓSMICA
Quando o nosso Consciente se expõe demoradamente à atuação direta do
Inconsciente, experimentamos uma sensação de progressiva libertação; uma
força estranha nos invade, que nos enche de alegria anônima. É que o nosso
Consciente equivale a uma prisão, uma fraqueza, uma angústia – ao passo que
o Inconsciente é liberdade, força, largueza.
É assaz comum esse erro, que Cristianismo seja apenas ação, realização
externa, e, no melhor dos casos, ética, caridade, filantropia. Na verdade,
porém, o Cristianismo do Cristo é a mais alta mística transbordando em ética,
adoração manifestando-se em ação.
PRELIMINARES
FECHAR O CIRCUITO!
SEGURO DE VIDA
DEUS EM TI
ESPELHO OU JANELA?
CRISTO E CRISTIANISMO
CICLOS CÓSMICOS
INDIVIDUAL - COLETIVO
A RELIGIÃO DE EINSTEIN
O COSMOS E INDIVISÍVEL
CRIMES E VÍCIOS
EXCESSIVAMENTE CLARO
A VOZ DA INTUIÇÃO
UNO E MÚLTIPLO
ADULTERAÇÃO DA BÍBLIA
REALISMO - IDEALISMO
DO CRISTIANISMO AO CRISTO
DA CARIDADE AO AMOR
“O DESERTO VIVENTE”
ACEITAR A DIVINDADE DE CRISTO - O QUE É?
QUE É PERSONALIDADE?
DESCOBRIMENTO - OU REVELAÇÃO?
PENSAMENTO SINTETIZADO
VERDADEIRA CATOLICIDADE
PROCESSO DE INCUBAÇÃO
A LEI DA EVOLUÇÃO
AMOR FRUSTRADO
EXPERIÊNCIA CÓSMICA
PENSAMENTO E SENTIMENTO
AUTO-REALIZAÇÃO - OU ALO-REALIZAÇÕES?
PARAFRASEANDO OS INICIADOS
NO CÉU E NO PURGATÓRIO
MÍSTICA E ÉTICA
PARTURIÇÃO MÍSTICA
PROPINQUIDADE E LONGINQUIDADE
AÇÃO - ADORAÇÃO
EM PERSPECTIVA - OU EM PANORAMA?
ESTRUPO ESPIRITUAL
QUIETUDE É PUREZA
COMPREENDER É SER
VERDADES PARADOXAIS
O HOMEM INFINITO
EU E O UNIVERSO SOMOS UM
RELIGIÃO E MORALIDADE
CREDO DINÂMICO
EKKLESÍA
MATEMÁTICA E MÍSTICA
SEXISMO E EGOÍSMO
CIDADÃO DO UNIVERSO
NO TERCEIRO CÉU
A MORTE DE JESUS
TALENTO - E GÊNIO
TOLERÂNCIA - OU COMPREENSÃO?
GRAUS DE CONSCIÊNCIA
TU ÉS O QUE PENSAS
PLATÃO E ARISTÓTELES
O IDEAL É O REAL
O MISTÉRIO DA ESFINGE
VERDADE E BELEZA
O GRANDE ENIGMA DA FÉ
ALMA
AUTO-REDENÇÃO - OU ALO-REDENÇÃO?
QUAL É A GRAÇA?
ABSOLUTA OBJETIVIDADE
ANALISAR É PROFANAR
OSMOSE CÓSMICA
Nasceu na antiga região de Tubarão, hoje São Ludgero, Santa Catarina, Brasil
em 1893. Fez estudos no Rio Grande do Sul. Formou-se em Ciências, Filosofia
e Teologia em universidades da Europa – Innsbruck (Áustria), Valkenburg
(Holanda) e Nápoles (Itália).
Rohden não está filiado a nenhuma igreja, seita ou partido político. Fundou e
dirigiu o movimento filosófico e espiritual Alvorada.
Ao fim de sua permanência nos Estados Unidos, Huberto Rohden foi convidado
para fazer parte do corpo docente da nova International Christian University
(ICU), de Metaka, Japão, a fim de reger as cátedras de Filosofia Universal e
Religiões Comparadas; mas, por causa da guerra na Coréia, a universidade
japonesa não foi inaugurada, e Rohden regressou ao Brasil. Em São Paulo foi
nomeado professor de Filosofia na Universidade Mackenzie, cargo do qual não
tomou posse.
Nos últimos anos, Rohden residia na capital de São Paulo, onde permanecia
alguns dias da semana escrevendo e reescrevendo seus livros, nos textos
definitivos. Costumava passar três dias da semana no ashram, em contato com
a natureza, plantando árvores, flores ou trabalhando no seu apiário-modelo.
À zero hora do dia 8 de outubro de 1981, após longa internação em uma clínica
naturista de São Paulo, aos 87 anos, o professor Huberto Rohden partiu deste
mundo e do convívio de seus amigos e discípulos. Suas últimas palavras em
estado consciente foram: “Eu vim para servir à Humanidade”.
A FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA
O SERMÃO DA MONTANHA
O NOSSO MESTRE
ÍDOLOS OU IDEAL?
ESCALANDO O HIMALAIA
O CAMINHO DA FELICIDADE
DEUS
EM ESPÍRITO E VERDADE
PORQUE SOFREMOS
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A GRANDE LIBERTAÇÃO
FILOSOFIA DA ARTE
ORIENTANDO
ROTEIRO CÓSMICO
A METAFÍSICA DO CRISTIANISMO
A VOZ DO SILÊNCIO
A NOVA HUMANIDADE
O HOMEM
ESTRATÉGIAS DE LÚCIFER
O HOMEM E O UNIVERSO
IMPERATIVOS DA VIDA
PROFANOS E INICIADOS
NOVO TESTAMENTO
LAMPEJOS EVANGÉLICOS
A EXPERIÊNCIA CÓSMICA
MARAVILHAS DO UNIVERSO
ALEGORIAS
ÍSIS
COLEÇÃO BIOGRAFIAS:
PAULO DE TARSO
AGOSTINHO
MAHATMA GANDHI
JESUS NAZARENO
PASCAL
MYRIAM
COLEÇÃO OPÚSCULOS:
CENTROS DE AUTO-REALIZAÇÃO