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UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA CAMPUS

GOVERNADOR VALADARES

ANA LAURA MORAES TORRES


ATÍLIO FRANCO DE MATTOS
CEZAR AUGUSTO MACHADO MARTINS
DIEGO JOSÉ PEREIRA LOPES
IZABELA CASARIM PACHECO
JAQUELINE GOMES XAVIER
JÉSSICA BRAVIN FERRARI
LETÍCIA TEIXEIRA DE SIQUEIRA VALADARES
LUIZ MÜLLER PIMENTEL DELFIM LACERDA
MARIANA DOS SANTOS PEREIRA
PEDRO DE ARAÚJO ALVES
REINALDO MACHADO JÚNIOR
THAYNÁ ALVES FERNANDES

PROJETO DE INTERVENÇÃO ESTÁGIO CURRICULAR DE CLÍNICA


MÉDICA
CONTROVÉRSIAS ACERCA DO ÍNDICE DE INTERNAÇÕES POR CONDIÇÕES
SENSÍVEIS À ATENÇÃO PRIMÁRIA (ICSAP): PANORAMA NACIONAL, REGIONAL E
MUNICIPAL

Governador Valadares, abril de 2023


2

UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA CAMPUS GOVERNADOR


VALADARES

ANA LAURA MORAES TORRES


ATÍLIO FRANCO DE MATTOS
CEZAR AUGUSTO MACHADO MARTINS
DIEGO JOSÉ PEREIRA LOPES
IZABELA CASARIM PACHECO
JAQUELINE GOMES XAVIER
JÉSSICA BRAVIN FERRARI
LETÍCIA TEIXEIRA DE SIQUEIRA VALADARES
LUIZ MÜLLER PIMENTEL DELFIM LACERDA
MARIANA DOS SANTOS PEREIRA
PEDRO DE ARAÚJO ALVES
REINALDO MACHADO JÚNIOR
THAYNÁ ALVES FERNANDES

PROJETO DE INTERVENÇÃO ESTÁGIO CURRICULAR DE CLÍNICA


MÉDICA
CONTROVÉRSIAS ACERCA DO ÍNDICE DE INTERNAÇÕES POR CONDIÇÕES
SENSÍVEIS À ATENÇÃO PRIMÁRIA (ICSAP): PANORAMA NACIONAL, REGIONAL E
MUNICIPAL

O presente projeto foi


elaborado pelos alunos do 9°
período do curso de Medicina
da Universidade Federal de
Juiz de Fora Campus
Governador Valadares, no
estágio de Clínica Médica, sob
a coordenação do Dr. Adhemar
Dias de Figueiredo Neto. As
informações a seguir
representam uma análise da
ICSAP nacional, regional e
municipal, com discussões
acerca da temática.

Governador Valadares, abril de 2023


3

SUMÁRIO

1. Introdução…………………………………………………………………………..4
2. Comparação das ICSAP no Brasil, Minas Gerais e suas Macrorregiões..6
3. Análise perfil internações clínicas no Hospital Municipal de Governador
Valadares…………………………………………………………………………..18
4. Correlação do perfil das internações com doenças de base sensíveis à
atenção primária versus ápices e desfechos patológicos……….………21
5. Discussão…………………………………………………………………..……..25
6. Considerações finais……………………………………………………………28
7. Referências……………………………………………………………………….29
4

1. Introdução

A Atenção Primária à Saúde (APS) é a principal porta de entrada do


Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. As internações por condições sensíveis à
atenção primária (ICSAP) representam uma condição de saúde que pode reduzir o
risco de hospitalização desnecessária por meio de ações efetivas de atenção
primária, e por esse motivo, têm sido utilizadas como ferramenta para avaliação da
APS. Este conceito foi desenvolvido por Billings et al., na década de 1990, como
corolário do conceito de morte evitável. Representa uma gama de problemas de
saúde para os quais uma ação efetiva na atenção primária reduziria o risco de
hospitalização. Essas atividades, como prevenção de doenças, diagnóstico precoce
e tratamento de condições agudas e manejo e acompanhamento de condições
crônicas, devem reduzir o número de pessoas hospitalizadas por esses problemas
(ALFRADIQUE et al, 2009; SANTOS et al, 2022).

Altas taxas de internação por doenças sensíveis à atenção primária em uma


população ou subgrupo podem indicar sérios problemas de acesso ao sistema de
saúde ou de seu desempenho. Essa internação excessiva é um sinal de alerta que
pode acionar o mecanismo de análise e buscar uma explicação para sua ocorrência.
Vários estudos têm mostrado que altas taxas de internação por condições sensíveis
à atenção primária estão associadas à cobertura inadequada de serviços e/ou baixa
resolutividade da atenção primária para determinados problemas de saúde.
Portanto, é um valioso indicador de monitoramento e avaliação (ALFRADIQUE et al,
2009).

A utilização da hospitalização por condições sensíveis à atenção primária


como indicador de acesso e qualidade da atenção primária foi inicialmente estudada
nos Estados Unidos. No Brasil, as investigações sobre essas internações ainda são
incipientes, embora alguns estados e municípios (incluindo o estado de Minas
Gerais) a considerem como estratégia de monitoramento das estratégias de
desempenho da saúde domiciliar (ESF) (ALFRADIQUE et al, 2009; SANTOS et al,
2022).

Em geral, estudos brasileiros apontam redução das internações por


condições sensíveis à atenção básica no SUS, principalmente nos estados de Minas
Gerais e Rio Grande do Sul. Essa redução pode ser entendida como um reflexo da
5

expansão da cobertura das ESFs em todo o país. No entanto, existem algumas


limitações para interpretar as tendências dessas internações: 1) o uso de diferentes
listagens de admissões para condições sensíveis à atenção primária, o que dificulta
a comparação dos resultados; 2) a falta de informação que permita analisar a
evolução destas internações em face às outras causas de internamento (SANTOS
et al, 2022).
6

2. Comparação das ICSAP no Brasil, Minas Gerais e suas Macrorregiões.

As Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária (ICSAP) têm


sido associadas universalmente como um indicador de resultado na avaliação da
APS. No Brasil, após a elaboração da lista nacional de Condições Sensíveis à
Atenção Primária (CSAP) em 2008, o indicador passou a ser usado para avaliar o
comportamento das internações hospitalares e a sua associação com a equipe da
Estratégia Saúde da Família (ESF).

No cenário internacional, inúmeras investigações sobre indicadores de


internações hospitalares são observados como medidas da efetividade da atenção
primária à saúde. O “Ambulatory Care Sensitive Conditions”, desenvolvido por
Billings et al. na década de 90, representa um desses indicadores. Traduzindo para
o português como “Condições Sensíveis à Atenção Primária”, representam um
grupo de problemas de saúde que ação efetiva da atenção básica promoveria uma
redução de internações. Essas ações dizem respeito a prevenção de doenças,
diagnóstico e tratamento precoce de condições em saúde agudas, controle e
acompanhamento de doenças crônicas e, como já mencionado, buscam a redução
das internações hospitalares por condições descritas na CSAP.

Os estudos sobre ICSAP no Brasil apresentam algumas limitações, dentre


elas a variabilidade, tanto nas metodologias quanto nas variáveis de controle,
principalmente as sociodemográficas, e aos grupos de doenças presentes na lista.
Além disso, desigualdades regionais podem ser visualizadas nas análises do ICSAP
nacional, apontando para organização, centralização e outros aspectos da APS nas
macrorregiões do país (ALFRADIQUE, 2009).

Historicamente, as taxas de ICSAP no Brasil e em suas regiões tiveram uma


redução entre 1999 e 2007, paralelamente à expansão da cobertura da ESF em
todo o país, ocorrendo maior redução nos estados de Minas Gerais e Rio Grande do
Sul. Entretanto, assim como existem limitações na elaboração dos dados, ocorre o
mesmo na interpretação desses valores. Primeiramente, cabe mencionar o uso de
diferentes listas de internações por condições sensíveis à APS, o que dificulta uma
padronização e comparação de resultados, além disso, há uma escassez de
informações para realizar uma comparação entre as internações sensíveis à APS e
a outras causas de hospitalizações.
7

Em 2006, as internações por condições sensíveis à atenção primária foram


responsáveis por 2.794.444 entre as 9.812.103 internações pelo SUS,
correspondendo a 28,5% do total de hospitalizações, com exclusão dos partos. A
taxa de hospitalizações por condições sensíveis à atenção primária foi igual a 149,6
por 10 mil habitantes (PINTO, 2019).

As tabelas 1 e 2 configuram, respectivamente, o perfil das causas de


internações por condições sensíveis a atenção básica no país em 2010 no sexo
feminino e masculino, realizando ainda uma variação percentual nos períodos de
2010–2019, 2010–2014, 2015–2019.

Tabela 1: Dez maiores causas, em 2010, de internações por condições sensíveis à atenção primária
no Brasil, no sexo feminino, e suas respectivas taxas de internação por 10 mil habitantes; e variação
percentual nos períodos 2010–2019, 2010–2014, 2015–2019, Brasil e regiões.

Fonte: Sistema de Informações Hospitalares.

Tabela 2: Dez maiores causas, em 2010, de internações por condições sensíveis à atenção primária
no Brasil, no sexo masculino, e suas respectivas taxas de internação por 10 mil habitantes; e
variação percentual nos períodos 2010–2019, 2010–2014, 2015–2019, Brasil e regiões.
8

Fonte: Sistema de Informações Hospitalares.

No que tange ao estado de Minas Gerais, as taxas de ICSAP/1000


habitantes variaram de 2009 a 2014, com uma redução de 5,47%, sendo a
insuficiência cardíaca a maior causa de ICSAP no estado, especialmente entre a
população idosa. Na população infantil, há uma mudança de causa principal, com
destaque para pneumonias bacterianas e gastroenterite (SILVA, 2017). Macinko et
al. (2011) encontrou taxas de ICSAP cerca de 7 vezes maiores para a população
idosa do que as taxas da população mais jovem, quando investigou a faixa etária
das ICSAP.

Um estudo ecológico realizado em Minas Gerais descreveu a taxa de


ICSAP em 452 municípios e analisou sua correlação com a cobertura da atenção
básica, sendo possível identificar a redução da taxa ICSAP nos municípios de
grande e médio porte com relação direta e positiva com a cobertura da ESF
(ALMEIDA, 2019). Sendo assim, menores taxas de ICSAP, em algumas regiões,
podem estar mais relacionadas à deficiência na oferta de leitos do que a um melhor
desempenho do sistema de saúde. O estudo de Silva (2017) estabeleceu correlação
positiva entre as variáveis, podendo indicar que a maior disponibilidade de leitos em
regiões mais desenvolvidas pode ocasionar maior busca pela atenção hospitalar,
assim como sua escassez determinar baixa procura pelos serviços hospitalares.
Entre 2008 e 2012, houve redução do número absoluto de ICSAP em todas
as faixas de população, o que é um bom resultado. A maior redução foi de 27,49%,
em municípios de 100 mil a 200.001 habitantes, enquanto a menor foi de 4,19%,
nos municípios com menos de 20 mil habitantes. REF

Em relação às macrorregiões de Minas Gerais, as causas de ICSAP para a


população infantil foram muito semelhantes em todas elas, sendo os 5 diagnósticos
principais: gastroenterites, pneumonias bacterianas, doenças pulmonares, infecções
renais e do trato urinário e asma. A proporção de ICSAP entre o sexo masculino foi
maior em todas as macrorregiões do estado. Já para a população idosa (60 anos ou
mais), houve maior variação para insuficiência cardíaca, doenças
cerebrovasculares, doenças pulmonares, pneumonias bacterianas, angina pectoris,
diabetes mellitus, infecções renais e do trato urinário. Nesse caso, a proporção foi
9

maior no sexo feminino, exceto nas macrorregiões Norte e Noroeste em 2009


(SILVA, 2017).

De acordo com a tabela 3, observa-se um aumento do ICSAP para a


população infantil em 6 macrorregiões, sendo mais expressivo na macrorregião
Jequitinhonha e Triângulo do Sul. Para a população idosa, o aumento foi visível em
6 macrorregiões diferentes entre 2009 e 2014, sendo mais expressivo no Triângulo
do Sul, Centro e Norte do estado (SILVA, 2017; COSTA, 2014).

Tabela 3: Taxas de ICSAP/1000 habitantes, em 2009 e 2014, por macrorregiões de saúde de Minas
Gerais.

Fonte: SILVA, 2017.

Segundo o estudo de Costa (2014), o número de ICSAP reduziu em 52 regiões de


saúde, incluindo Governador Valadares, e aumentou em 24, entre 2008 e 2012,
como vemos na tabela 4.

Tabela 4: Número de ICSAP dos municípios agrupados segundo as regiões de saúde de Minas
Gerais, de 2008 a 2012.
10
11

Fonte: DATASUS, Ministério da Saúde.

Como já dito, a cobertura da atenção primária apresentou associação


estatisticamente positiva em algumas macrorregiões no estudo de Silva (2017),
como representado no Gráfico 1, onde a associação foi mais expressiva no Sul e
Centro de MG.

Gráfico 1: Taxas de ICSAP/1000 habitantes e cobertura pela ESF em 2009 e 2014 nas macrorregiões
de saúde de Minas Gerais.
12

Fonte: SILVA, 2017.

A tabela 5 expõe o percentual de internações de pacientes residentes na


macrorregião de internação e advindos de outras macrorregiões do estado. A menor
proporção de pacientes que internaram fora de sua macrorregião de residência
foram nas macrorregiões Jequitinhonha e Triângulo do Sul, nas quais também foi
observada redução do número de leitos do SUS/1000 habitantes de 2,30% e
12,94%, respectivamente (SILVA, 2017).

Tabela 5: Distribuição das ICSAP nas macrorregiões de Minas Gerais, em 2009 e 2014.
13

Fonte: SILVA, 2017.

Por meio de campanhas de vacinação contra a Influenza direcionadas aos


grupos populacionais mais vulneráveis, houve redução da mortalidade por
complicações decorrentes de infecções preveníveis. Entre as macrorregiões do
estado foi observada redução das internações por pneumonias bacterianas entre a
população infantil em 9 das 13 macrorregiões, e na população idosa em 6 (SILVA,
2017).

Por fim, em relação aos gastos por ICSAP, notou-se redução do gasto
médio e per capita para a população infantil e aumento na faixa etária idosa nas
macrorregiões Sul, Oeste e Norte do estado. As doenças isquêmicas do coração,
insuficiência cardíaca e bronquite/enfisema e outras doenças pulmonares
obstrutivas crônicas são responsáveis pelos gastos mais expressivos com
internações em idosos. As tabelas 6 e 7 apresentam as variações percentuais entre
2009 e 2014 com os gastos para a população infantil e idosa, respectivamente
(SILVA, 2017).

Tabela 6: Gastos com ICSAP em dólar nas macrorregiões de Minas Gerais, em 2009 e 2014, para a
população infantil.
14

Fonte: SILVA, 2017.

Tabela 7: Gastos com ICSAP em dólar nas macrorregiões de Minas Gerais, em 2009 e 2014, para a
população idosa.

Fonte: SILVA, 2017.

Em Governador Valadares, houve um aumento de 24,90% dos gastos com


ICSAP entre 2009 e 2012, como evidenciado na tabela 8. A maior participação nos
15

gastos do estado em 2012 é de Belo Horizonte, e o maior aumento é observado na


região de Varginha, onde os gastos quase dobraram (COSTA, 2014).

Tabela 8: Gastos com ICSAP dos municípios agrupados segundo as regiões de saúde de Minas
Gerais, entre 2008 e 2012.
16

Fonte: DATASUS, Ministério da Saúde.

Ainda avaliando os gastos com ICSAP dos municípios de MG, verifica-se


que aqueles de menor porte populacional (até 20 mil habitantes), concentram a
17

maior parte dos gastos em todos os anos. Em 2012, os municípios dessa faixa
responderam por 47,22% do gasto total. Os menores percentuais são em
municípios de 100 a 200 mil habitantes que, em 2012, responderam por 4,41% do
total. Os municípios de 100 a 200 mil habitantes respondem pela menor participação
do gasto total com ICSAP (4,41%) (COSTA, 2014).
18

3. Análise perfil internações clínicas no Hospital Municipal de Governador


Valadares

Em análise ao Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS),


entre os anos de 2011 a 2022, como demonstrado na tabela 9, o perfil de
internações hospitalares do Brasil vem sendo liderado pelas internações
relacionadas à Gravidez, parto e puerpério, seguido pelas Lesões envenenamento e
algumas outras consequências de causas externas, que superou as Doenças do
aparelho circulatório a partir do ano de 2016. O perfil apresentado após a análise
corrobora com o apresentado no artigo “Perfil das internações hospitalares no
Brasil no período de 2013 a 2017”, sendo os maiores motivos das internações
hospitalares os relacionados à gravidez, parto e puerpério.

Tabela 9: Internações no Brasil, por ano, segundo o CID-10, 2011 a 2022.

Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).

Em consonância ao demonstrado no país, as internações relacionadas à


Gravidez, parto e puerpério também lideram o perfil de internações no estado de
Minas Gerais, como apresentado na tabela 10. Entretanto, o segundo lugar foi
ocupado pelas Doenças do aparelho circulatório entre os anos de 2012 a 2019 e no
ano de 2022, e nos outros anos (2012, 2020 e 2021) foi ocupado pelas Lesões
envenenamento e algumas outras consequências de causas externas. Entre os
anos de 2012 a 2015, a terceira maior causa de internação foi por Doenças do
aparelho respiratório.

Tabela 10: Internações em Minas Gerais, por ano, segundo o CID-10, 2011 a 2022.
19

Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).

Em relação ao município de Governador Valadares, como demonstrado na


tabela 11, somente no ano de 2011, as Lesões envenenamento e algumas outras
consequências causas externas liderou o perfil de internações no município. A partir
de 2012, o município segue a tendência nacional e estadual com as internações
relacionadas à Gravidez, parto e puerpério na liderança, sendo seguidas pelas
Lesões envenenamento e algumas outras consequências de causas externas,
seguido pelas Doenças do aparelho circulatório.

Tabela 11: Internações em Governador Valadares, por ano, segundo o CID-10, 2011 a 2022.

Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).

Em contrapartida, o Anexo II do Termo de Referência presente no edital de


licitação SES/DC-CL 27991699 (Processo SEI nº 1320.01.0140757/2020-22)
discorre sobre o perfil assistencial e listou as principais causas de internação na
Macrorregião de Saúde Leste de Minas Gerais, na seguinte ordem: Gravidez, parto
e puerpério; Doenças do aparelho respiratório; Doenças do aparelho
lesões/envenenamento; Doenças infecciosas e parasitárias. Sendo relevante
20

mencionar que esta Microrregião engloba Governador Valadares e mais quatro


Microrregiões: Mantena, Resplendor, Santa Maria do Suaçuí e Peçanha/São João
Evangelista.
21

4. Correlação do perfil das internações com doenças de base sensíveis à


atenção primária versus ápices e desfechos patológicos

Ao analisar os dados da tabela 9, tendo em vista a Lista Brasileira de


Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária, definida pela Portaria Nº
221, de 17 de abril de 2008, é possível identificar que pelo menos 64.816.310
internações decorreram de condições preveníveis pela APS.

O grupo 19 de condições sensíveis à atenção primária que trata de Doenças


relacionadas ao Pré-Natal e Parto está relacionado à maior causa de internação em
âmbito nacional, neste período, diz respeito à Gravidez, Parto e Puerpério, somada
a Algumas Afecções Originadas no Período Perinatal, são responsáveis por cerca
de 31.763.503 internações. Do total de internações, cerca de 144.963 evoluíram
para o óbito. Ademais, 138.607 gestantes apresentaram alguma doença infecciosa
e parasitária congênita.

Tabela 12: Internações, Óbitos segundo Ano processamento. Capítulo CID-10: XV. Gravidez parto e
puerpério, XVI. Algumas afecções originadas no período perinatal. Período: Jan/2011-Jan/2023

Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).

Tabela 13: Internações, Óbitos segundo Ano processamento. Capítulo CID-10: XV. Gravidez parto e
puerpério, XVI. Algumas afecções originadas no período perinatal. Lista Morb CID-10: Sífilis
congênita, Doenças infecciosas e parasitárias congênitas. Período: Jan/2011-Jan/2023
22

Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).

As doenças do aparelho respiratório, responsáveis por 12.573.961


internações englobam os grupos 5, 6, 7 e 8 representadas por (infecções de nariz e
garganta, pneumonias bacterianas, asma, bronquite, bronquiectasias, enfisema e
outras DPOCs). Do total de internações, 9.891.732 estavam associadas a tais
condições preexistentes, e cerca de 751.816 indivíduos evoluíram para o óbito na
internação. A Insuficiência Respiratória Aguda, condição que abrange afecções de
etiologia viral ou bacteriana constitui uma das principais causas de internação e
morbidade, sendo por vezes negligenciada na APS em países subdesenvolvidos, de
modo a evoluir para desfechos negativos e gastos substanciais em ambiente
hospitalar. Além disso, condições como DPOC e câncer de pulmão apresentam
perfil crescente em toda a sociedade, sobretudo em relação aos quesitos
socioeconômicos e hábitos de vida do país. Neste contexto, estratégias como a
Abordagem Prática à Saúde Pulmonar são capazes de ofertar cuidados integrados
de atenção primária com adaptações às particularidades da territorialização do
serviço, reduzindo sobrecarga hospitalar e adequando, ao primeiro nível, a
terapêutica de doenças respiratórias agudas, crônicas, transmissíveis e não
transmissíveis (PÉREZ-PADILLA et al, 2014).

Tabela 14: Internações, Óbitos segundo Ano processamento. Capítulo CID-10: X. Doenças do
aparelho respiratório. Lista Morb CID-10: Pneumonia, Bronquite enfisema e outras doenças
pulmonares obstrutivas crônicas, Asma. Período: Jan/2011-Jan/2023
23

Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).

Hipertensão, angina e insuficiência cardíaca, abrangem os grupos 9,10 e 11 e


estão relacionadas a 12.326.254 internações por doenças do aparelho circulatório.
Dessas, 5.373.574 indivíduos possuíam condições preexistentes como Hipertensão
Arterial, Doenças Isquêmicas do Coração ou Insuficiência cardíaca, e dessas,
342.2015 evoluíram para o óbito. A expansão de cobertura da APS, aliada a
melhora do acesso, bem como dos serviços de suporte das redes de urgência e
emergência são avanços favoráveis à redução da mortalidade relacionada a tais
condições. Neste sentido, promoção de mudanças dietéticas, incentivo à adoção de
atividades físicas, suspensão de hábitos tabágicos, além do monitoramento de PA e
pesquisa de lesões em órgão-alvo são condutas passíveis de serem realizadas na
atenção primária capazes de reduzir expressivamente quadros de alta
complexidade e desfechos negativos em nível terciário (LENTSCK et al, 2015).

Tabela 15: Internações, Óbitos segundo Ano processamento. Capítulo CID-10: IX. Doenças do
aparelho circulatório. Lista Morb CID-10: Hipertensão essencial (primária), Outras doenças
hipertensivas, Outras doenças isquêmicas do coração, Insuficiência cardíaca. Período:
Jan/2011-Jan/2023
24

Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).

Outras causa de internação por condições sensíveis à APS que se destacam,


em âmbito nacional são as infecções no rim e trato urinário; as infecções de pele e
tecido subcutâneo e as doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas,
representadas pelo diabetes mellitus com ou sem complicações, pela desnutrição
protéica e outras deficiências nutricionais.

As internações por doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas que


possuíam condições preveníveis pela APS correspondem a 2.095.545 casos e
cerca de 136.467 óbitos.

Tabela 16: Internações, Óbitos segundo Ano processamento. Capítulo CID-10: IV. Doenças
endócrinas nutricionais e metabólicas. Lista Morb CID-10: Diabetes mellitus, Desnutrição, Seqüelas
de desnutrição e de outras deficiências nutricionais. Período: Jan/2011-Jan/2023

Fonte: Ministério da Saúde - Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS).


25

5. Discussão

A análise evidenciou uma tendência de redução ao decorrer dos anos do


número de internações e nos custos financeiros, no município de Governador
Valadares, da região de Minas Gerais e à nível nacional. Essa queda muito está
associada a uma maior cobertura das Equipes de Saúde da Família (eSF)
introduzidas nas micro e macrorregiões do país, de forma a descentralizar o
atendimento, melhorar a qualidade de vida dos pacientes e evitar possíveis
internações à nível hospitalar. Entretanto, em algumas situações, não se pode ter
essa afirmativa como totalmente verdadeira, uma vez que é preciso levar em conta
a qualidade e intensidade das atividades da ESF que variam de um local para outro.
Outrossim, essas variações irão depender das características dos municípios de
cada região de saúde e das patologias que são mais prevalentes (ARANTES, et al,
2018).

A diminuição das internações ocorreu em todas faixa etárias, sendo que


dentre os números absolutos, crianças e idosos representam os principais
percentuais nas taxas de internações, o que pode ser correlacionado por
apresentarem maiores fragilidades e vulnerabilidades, por exemplo, por maior
dependência de cuidados específicos de saúde associados à idade (SANTOS, et al,
2022).

Apesar dos gastos públicos terem reduzido no contexto geral, houve um


aumento do gasto médio e per capita da população idosa em algumas regiões de
Minas Gerais, sobretudo devido à doenças cardiovasculares e metabólicas. Essa
população vem sendo alvo do que pode ser explicado pela transição epidemiológica
atual, principalmente, em relação à substituição das doenças transmissíveis por
doenças não-transmissíveis, ou seja, as doenças crônicas como a hipertensão
arterial (HAS) e diabetes mellitus (DM) (ARANTES, et al, 2018).

As doenças crônicas, são de âmbito a serem diagnosticadas, tratadas e


controladas à nível da atenção básica. A partir do momento que alguns desses
eventos não são evitáveis no nível primário, essas doenças podem atuar como
doenças predisponentes de novas complicações à saúde dos pacientes, como
26

hipertensão sendo causa de infarto agudo do miocárdio e dislipidemia sendo uma


causa de acidente vascular encefálico (AVE) (ARANTES, et al, 2018).

Não existe um consenso na literatura sobre quais seriam as internações por


condições sensíveis à atenção primária (ALFRADIQUE, et al, 2009). O Índice de
Desempenho do Sistema Único de Saúde (IDSUS), possui 24 indicadores para
verificar o cenário do SUS no Brasil. As internações sensíveis à atenção básica,
indicador do IDSUS, por exemplo, não trazem para os seus cálculos as internações
por doenças cerebrovasculares, doenças relacionadas a úlceras intestinais e
pré-natal e parto, por serem consideradas condições em que a atenção primária não
conseguiria evitar hospitalizações.

Mesmo que hajam indicadores para análise da ICSAP - da mesma maneira


que não há uma padronização dessas condições - há uma dificuldade, portanto,
para que seja feita uma análise fidedigna, pois existem Condições de Internação, as
quais não estão incluídas diretamente na ICSAP, mas que são consequências
diretas e comuns das doenças que a constituem. Diversas são essas condições de
internação hospitalar, como algumas infecções respiratória graves, embora
infecções respiratórias agudas estejam presente; complicações do diabetes, como a
cetoacidose diabética e outras; doenças renais como pielonefrite, glomerulonefrite
aguda e obstrução do trato urinário; complicações do HIV/AIDS; algumas doenças
cardiovasculares, por exemplo, arritmias graves, afecções de aorta; dentre outras.
Essas são apenas algumas condições de internação hospitalar que são
consequências de doenças presentes na lista de ICSAP, sendo assim, torna-se
importante que o profissional de saúde esteja atento com relação a essas
complicações e trabalhe para preveni-las, com o manejo adequado esperado pela
APS, das doenças subjacentes, a partir de uma abordagem multidisciplinar e
integrada do paciente (ARANTES, et al, 2018).

Portanto, verificando o contexto nacional, incluindo Governador Valadares, é


questionável até que ponto pode-se confiar que as taxas de ICSAP estão em
redução. Nessa conjuntura, é imprescindível novas revisões e padronizações das
causas definidas como evitáveis na lista do ICSAP, tanto para nível de comparação
dos índices nas regiões do Brasil, quanto para melhor conhecimento da real
situação da saúde nacional (SANTOS, et al, 2022).
27

Ademais, existem outros fatores que podem influenciar nas taxas de ICSAPS
e que não estejam apenas relacionadas à atenção primária, mas sim também com a
secundária e terciária. Pode-se salientar, principalmente, sobre o processo de
solução de casos na APS e na atenção especializada, políticas públicas sobre
liberação e expansão de leitos hospitalares e aumento ou diminuição de
intervenções e procedimentos antes realizados a nível hospitalar sendo feitos em
regime ambulatorial (ARANTES, et al, 2018).
28

6. Considerações finais

A partir dos levantamentos realizados é possível concluir que a redução das


taxas de ICSAP no Brasil constitui um ganho significativo para a saúde pública e é
resultado da expansão da cobertura das ESF no território nacional. Contudo, o
número de internação por doenças sensíveis à atenção primária ainda é alto, reflexo
da precariedade dos serviços de saúde em determinadas regiões do país.

Entre as causas de internação por condições sensíveis à APS as que


ganharam mais destaque foram as doenças relacionadas a gravidez, parto e
puerpério, o que ressalta a necessidade de melhoria das condições de acesso e
assistência das gestantes ao pré-natal ofertado nas UBS. Outra causa levantada
nas análises diz respeito às complicações oriundas das doenças cardiovasculares e
metabólicas, as quais devem, em suma, ser tratadas e conduzidas pela atenção
primária, cuja atuação eficiente é primordial para reduzir a sobrecarga de demanda
sobre os serviços secundário e terciário.

Nesse contexto, cabe ao setor público destinar recursos e investimentos para


garantir a prestação de ações preventivas pela Atenção Primária, como o
monitoramento da Pressão arterial, a Pesquisa de LOAs (lesões em Órgão-alvo),
programas de incentivo a cessação do tabagismo e etilismo, bem como de adoção
de prática regular de atividade física e dieta balanceada.

Por fim, como mencionado, ainda existem limitações substanciais na


elaboração e interpretação das taxas de ICSAP, o que dificulta a análise real da
situação de saúde tanto a nível local quanto nacional, logo, destaca-se a
importância da padronização das causas definidas como evitáveis na lista do
ICSAP. Além disso, é imprescindível que os novos rastreios incluam a avaliação das
causas não evitáveis de internação que são desfechos tardios de doenças passíveis
de tratamento e controle em nível ambulatorial, como o exemplo do Infarto Agudo do
Miocárdio, uma causa não evitável de internação, mas que poderia ser evitado com
o correto manejo de hipertensão, diabetes e dislipidemia a nível primário.
29

7. Referências

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lista brasileira como ferramenta para medir o desempenho do sistema de saúde (Projeto ICSAP -
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