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Brasília - DF
2012
TÂMARA TENÓRIO BORGES DE CARVALHO PIMENTEL
Brasília
2012
Dissertação de autoria de Tâmara Tenório Borges de Carvalho Pimentel, intitulada “O
ENFRENTAMENTO POLÍTICO DOS CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS
DECORRENTES DA IMPLANTAÇÃO DE USINAS HIDRELÉTRICAS”, apresentada
como requisito parcial para obtenção do grau de mestre em Planejamento e Gestão Ambiental
da Universidade Católica de Brasília, em 28 de junho de 2012, defendida e aprovada pela
banca examinadora abaixo assinada:
____________________________________
Professora Ph.D. Renata Marson Teixeira de Andrade
Orientadora
Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão Ambiental - UCB
____________________________________
Professor Dr. Paulo Ricardo da Rocha Araujo
Examinador Interno
Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão Ambiental - UCB
____________________________________
Dr. Luis Carlos Ferreira
Examinador Externo
Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL
Brasília
2012
À Deus, toda a glória!
Aos meus pais, por todo amor e estímulo.
Ao meu marido, Máglius, pelo apoio e
companheirismo.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à professora Renata, minha orientadora, pelo auxílio e, acima de tudo, pela
amizade.
À Agência Nacional de Energia Elétrica, pelo investimento nesta pesquisa.
Aos examinadores Paulo Ricardo e Luis Carlos, pela disponibilidade de materiais e
pelas sugestões, que tanto auxiliaram na elaboração deste trabalho.
Aos professores e funcionários do curso de mestrado do Programa de Pós Graduação
em Planejamento e Gestão Ambiental, pela convivência harmônica, apoio e amizade.
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo avaliar a evolução da gestão dos conflitos socioambientais
decorrentes da geração de energia hidrelétrica no Brasil da década de 1970 até os dias atuais.
Para tanto foram selecionados 06 conflitos socioambientais ocorridos na implantação de
grandes barragens para geração de eletricidade no Brasil e no mundo, escolhidos com base no
relatório elaborado pela CMB (2000) e no livro de Mc Cully (2007); posteriormente,
analisou-se a gestão dos conflitos socioambientais em três usinas hidrelétricas no Brasil, UHE
Sobradinho e UHE Itaparica, localizadas no rio São Francisco, e UHE Belo Monte, situada no
rio Xingu, escolhidas para fins de estudo de caso comparativo, de acordo com os critérios:
período histórico em que ocorreram a implantação e os conflitos; visibilidade e repercussão
através da mídia; capacidade de mobilização dos atores e interferência sobre a política do
meio ambiente e direitos humanos; disponibilidade de dados e informações. Os resultados
corresponderam à construção de um quadro comparativo, que apresentou as principais
características de cada uma das três usinas – UHE Sobradinho, UHE Itaparica e UHE Belo
Monte – com a posterior análise dos conflitos desencadeados em cada caso. Ao final do
trabalho ilustra-se, por meio de um diagrama, a evolução dos conflitos socioambientais em
usinas hidrelétricas no Brasil, da década de 1970 até os dias atuais, enfatizando-se a influência
do contexto sociopolítico sobre as políticas públicas e sobre a gestão de conflitos. Finalmente,
conclui-se que: houve maior inclusão social no processo decisório inerente aos projetos
hidrelétricos ao longo do tempo, em decorrência do avanço da legislação ambiental e da
incorporação dos instrumentos de gestão de conflitos, como a negociação e a mediação; a
democratização permitiu um crescente controle social sobre as ações e políticas públicas; a
existência dos movimentos sociais é vital para reforçar a proteção, bem como a inclusão da
população atingida e menos favorecida nas decisões a elas pertinentes.
This study aims to evaluate the evolution of the management of environmental conflicts
arising from the generation of hydroelectric power in Brazil in the 1970s to the present day.
Therefore, we selected 06 environmental conflicts occurring in the deployment of large dams
for electricity generation in Brazil and the world, chosen based on the report by the CMB
(2000) and the book of Mark Cully (2007); then we analyzed the management of
environmental conflicts in three hydropower plants in Brazil, Sobradinho and Itaparica,
located in the São Francisco, and Belo Monte, located on the Xingu River, chosen for the
comparative case study, according to the criteria: historical period that occurred in the
deployment and conflict; visibility and impact through the media; ability to mobilize actors
and political interference with the environment and human rights; and availability of data and
information. The results corresponded to the construction of a comparative table, which
presented the main characteristics of each of the plants chosen for the comparative case study
– Sobradinho Dam, Itaparica Dam and Belo Monte Dam - for later analysis. At the end of the
work is illustrated by means of a diagram, the evolution of environmental conflicts in
hydroelectric plants in Brazil, from the 1970s to the present day, emphasizing the influence of
sociopolitical context on public policy and the management conflict. Finally, we conclude
that: there was greater social inclusion in decision-making inherent in hydropower projects
over time, due to the advancement of environmental legislation and the incorporation of the
instruments of conflict management, such as negotiation and mediation; democratization
allows one increasing social control over the actions and policies; and the existence of social
movements is vital to ensure protection as well as the inclusion of the affected population and
less favored in decisions relevant to them.
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 84
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CAP. 1 - INTRODUÇÃO
O setor elétrico vem ocupando posição estratégica nos debates nacionais sobre a
questão ambiental desde as décadas de 70 e 80, quando foram implantados grandes
empreendimentos hidrelétricos que, embora contribuam para o desenvolvimento do país,
foram responsáveis por enormes impactos sociais e ambientais (BRASIL, 2006).
Por esse motivo, um dos princípios basilares do planejamento do setor elétrico é o do
desenvolvimento sustentável, ao lado do princípio da segurança do abastecimento e o da
modicidade tarifária para os consumidores. Para atender à demanda futura de energia elétrica
é que se torna necessária a expansão de sua geração no Brasil, mediante a elaboração e análise
de alternativas de implantação de novas usinas, considerando-se os componentes
tecnológicos, econômicos e socioambientais (BRASIL, 2006). Moret e Ferreira (2008)
corroboram esse raciocínio ao afirmarem que, por ser a energia um fator estruturante da
sociedade atual, o planejamento do setor elétrico deve levar em consideração os fatores social,
econômico e ambiental.
O grande número de variáveis envolvidas no planejamento para o setor elétrico requer
a formulação de políticas públicas complexas. A importância dessas políticas é crescente,
visto que o setor elétrico depende de investimentos privados. Portanto, o papel do governo
cada vez mais se restringe ao gerenciamento da expansão, cabendo-lhe a tarefa de definir
políticas de interesse da sociedade que nem sempre estariam entre as prioridades do setor
privado. O dever de suprir a demanda por energia elétrica sem prescindir do desenvolvimento
sustentável é do governo. Cabe à sociedade exigir essa atuação responsável por meio dos
movimentos sociais, da participação efetiva nas audiências públicas e da eleição de
representantes governamentais corretos (GOLDEMBERG; MOREIRA, 2005).
Conforme demonstrado pela literatura, a gestão de conflitos socioambientais
relacionados à construção de empreendimentos hidrelétricos envolve uma variedade de atores
sociais. A própria democracia tratou de intensificar os conflitos ambientais, haja vista a
abertura do processo decisório, que passou a permitir a participação da sociedade civil em
etapas específicas, bem como a transparência dos procedimentos intrínsecos.
Assim, considerando a classificação de Little (2001) para os conflitos socioambientais
que giram em torno dos impactos ambientais e sociais gerados pela ação humana e natural, o
presente trabalho buscará avaliar os conflitos socioambientais que decorrem da implantação
de empreendimentos hidrelétricos no Brasil, focalizando sua evolução histórica, bem como a
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forma como são conduzidos esses conflitos. A seguir, um resumo da forma como o trabalho
foi estruturado.
Primeiramente será trazida a revisão da literatura nacional e internacional sobre o
tema, explicitando-se os pontos de interesse para a pesquisa, que servirão para contextualizar
os casos apresentados posteriormente. Os aspectos abordados são: meio ambiente e
desenvolvimento; usinas hidrelétricas no Brasil; riscos e vulnerabilidade social em barragens;
conflitos socioambientais na implementação de Usinas Hidrelétricas; gestão de conflitos; e
conflitos em usinas hidrelétricas no mundo.
Em seguida, serão apresentados os estudos de caso, com um breve histórico dos
conflitos socioambientais desencadeados em cada um, destacando-se as ferramentas de gestão
de conflitos utilizadas. Depois de coletados, os dados foram agrupados em uma tabela
comparativa, o que facilitou a análise dos dados e a discussão dos resultados encontrados. Ao
final do trabalho ilustra-se, por meio de um diagrama, a evolução dos conflitos
socioambientais em usinas hidrelétricas no Brasil, da década de 1970 até os dias atuais,
enfatizando-se a influência do contexto político sobre as políticas públicas e sobre a gestão de
conflitos implementada.
com as lutas dos atingidos por barragens, as denúncias de movimentos ambientalistas e com o
despertar de uma sensibilidade para as questões sociais e ambientais em alguns segmentos do
próprio setor elétrico.
Vainer (2007) conclui que o confronto de idéias e projetos sustenta um triplo
aprendizado: i) o da democracia, que leva, necessariamente, ao conflito; ii) o da
responsabilização social e ambiental crescente do setor elétrico e de suas empresas; iii) o da
necessidade de qualificar quadros técnicos e criar os espaços legais e institucionais favoráveis
à resolução e/ou explicitação dos novos conflitos e desafios sociais e ambientais associados
aos grandes projetos hidrelétricos.
Bermann (2007), por sua vez, ressalta a desconsideração com que são tratadas as
populações ribeirinhas atingidas pela implementação de usinas hidrelétricas. Os interesses
dessas populações são negligenciados no processo de construção das usinas, uma vez que seu
envolvimento no processo decisório é limitado pela falta de transparência e assimetria de
informações.
A gestão democrática dos recursos hídricos pressupõe a participação das populações
atingidas pelos empreendimentos hidrelétricos no processo de decisão subjacente, mediante a
construção de consensos, reconhecendo interesses divergentes que devem ser incorporados no
processo de negociação (BERMANN, 2007).
Assim, cumpre-nos investigar se a gestão democrática relativa à construção de usinas
hidrelétricas avançou no Brasil desde a década de 1970, período da ditadura militar, onde os
direitos dos cidadãos não eram respeitados e não havia liberdade de expressão, até os dias
atuais, com a abertura do processo decisório através da democracia. Somente a comparação
do passado com o presente será capaz de responder à nossa pergunta-chave: como evoluíram
os conflitos socioambientais decorrentes da implantação de usinas hidrelétricas no Brasil da
década de 1970 até os dias atuais?
1.2 OBJETIVOS
1.3 JUSTIFICATIVA
muito da estrutura política do país, que limita ou facilita a implementação de políticas (Swain
e Chee, 2004).
Os conflitos socioambientais no setor energético como um todo, são, também, um
fator importante para a ANEEL (agência reguladora do setor elétrico), principalmente quanto
à tomada de decisões relativas a novas outorgas. As energias renováveis têm ganhado cada
vez mais espaço na matriz elétrica nacional, principalmente com o aumento significativo da
participação das usinas eólicas. Entretanto, por mais que haja incentivos públicos para
aumentar os investimentos em fontes alternativas de energia, a hidráulica ainda será a
principal fonte de energia elétrica do Brasil nos próximos anos (EPE, 2011).
Assim, considerando: (1) a necessidade de expansão do setor elétrico brasileiro para
atender à crescente demanda nacional por energia elétrica, sendo a hidreletricidade a principal
fonte de energia elétrica no Brasil; (2) e que sua implantação provoca impactos sociais e
ambientais potenciais geradores de conflitos, este estudo propõe o aprofundamento dos
estudos a respeito dos conflitos socioambientais decorrentes da implantação de usinas
hidrelétricas, com vistas a avaliar a evolução da gestão dos conflitos socioambientais
decorrentes da geração de energia hidrelétrica no Brasil da década de 1970 (período de
ditadura militar) até os dias atuais (democracia).
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CAP. 2 - METODOLOGIA
memórias servem para registrar as impressões que vão surgindo na mente do pesquisador à
medida que os dados são cumulativamente colhidos e codificados. Já a técnica de display
(figura ilustrativa) é utilizada para se chegar às conclusões finais. Trata-se de uma
concentração dos dados num único lugar, ordenados segundo categorias, de maneira visual,
propiciando o estabelecimento de relações e facilitando a extração de conclusões (MILES;
HUBERMAN, 1994). O display no caso deste trabalho correspondeu às tabelas, que tiveram a
função de agrupar os dados para facilitar a comparação dos casos e a extração de conclusões,
e ao diagrama elaborado ao final da etapa da análise, o qual demonstra de forma clara os
resultados da pesquisa.
A partir dos dados históricos coletados e analisados foi possível: (i) traçar um perfil
dos conflitos socioambientais desencadeados na construção dos empreendimentos
hidrelétricos; (ii) identificar os atores envolvidos em cada conflito; (iii) observar as
ferramentas de resolução de conflitos utilizadas; (iv) identificar o impacto das políticas
públicas existentes sobre os conflitos; e (v) criar uma tabela sintética com os principais
conflitos, suas causas e consequências.
A metodologia empregada encontra-se sintetizada no quadro a seguir:
17
Fonte: A autora.
18
A Carta Magna inovou ao dedicar um capítulo inteiro ao meio ambiente. Por esse motivo,
Silva (2004) afirma que todo "o capítulo do meio ambiente é um dos mais importantes e
avançados da Constituição de 1988". O tema ambiental é discutido ao longo de toda a
Constituição Federal, sendo o art. 225 o ponto principal de um regime constitucional
dedicado, em vários tópicos, à gestão dos recursos ambientais.
Primeiramente, o inciso LXXIII, do art. 5º da Constituição Federal, traz o meio
ambiente como garantia fundamental de qualquer cidadão, permitindo a proposição de ação
popular para anular ato lesivo ao meio ambiente, ficando o autor, salvo comprovada má fé,
isento das custas judiciais e do ônus da sucumbência. Nesse instante pode-se notar a
importância que o constituinte concedeu ao meio ambiente, visto que permitiu a qualquer
cidadão a impetração de ação com a finalidade de proteção ambiental.
Já o art. 225 da Constituição Federal postula o direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado como um novo direito fundamental da pessoa humana, uma vez
que ele é necessário tanto para proporcionar saúde física, como uma qualidade de vida digna
(MILARÉ, 1998).
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
Ao atribuir ao meio ambiente ecologicamente equilibrado a qualificação jurídica de
bem de uso comum do povo quis o poder público deixar claro que o meio ambiente é um bem
pertencente à coletividade e, portanto, indisponível, tanto para o Poder Público como para o
povo. Essa ideia de indisponibilidade do meio ambiente vem reforçada pela necessidade de
preservação do meio ambiente em atenção às gerações futuras, motivo pelo qual as atuais
gerações não podem dispor do patrimônio ambiental (SOUZA et al, 2010). Por isso, cabe ao
Estado assegurar o equilíbrio harmonioso entre o homem e o meio ambiente em que vive,
devendo sempre o interesse de proteção ao meio ambiente, por ser um interesse público,
prevalecer sobre os interesses individuais privados.
sendo parte desse custo repassado ao consumidor final. Segundo o Relatório do BIRD (2008),
os custos de se lidar com as questões ambientais e sociais no desenvolvimento de
empreendimentos hidrelétricos no Brasil representam 12% do custo total da obra.
Por outro lado, como visto anteriormente, os custos financeiros não internalizam o que
é incomensurável, por exemplo, a diminuição da qualidade de vida e impactos na cultura e
modus vivendi da população ribeirinha. Desta maneira, aconselha-se observar as mudanças na
paisagem e outros aspectos ambientais importantes que afetem o social, os quais devem ser
incluídos nos custos do projeto no momento da tomada de decisão, inclusive aquelas decisões
associadas à escolha de alternativas para geração de energia elétrica: usinas hidrelétricas x
outras fontes alternativas de energia. Por esse motivo, Tundisi (2007) salienta a necessidade
de se elaborarem estratégias de longo prazo que conciliem a produção da hidreletricidade com
a preservação ambiental, assim como prevenção e mitigação dos impactos sociais gerados.
Tundisi (2007) alega, ainda, que, embora a construção de empreendimentos
hidrelétricos traga impactos socioambientais, ao longo do tempo, esses impactos negativos
são minimizados pela expansão das economias regionais, uma nova organização
socioeconômica e adaptações da flora e fauna dos reservatórios a essas novas condições.
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Essa exportação da injustiça ambiental é verificada quando uma empresa é retirada de uma região por alguma
eventual pressão social que tenha sofrido, e após, se realoca facilmente em outro ponto onde a legislação ou a
mobilização social e política sejam débeis (ACSELRAD; MELLO; BEZERRA, 2009).
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Segundo Deutsch (1973 apud ALMEIDA, 2003), para se estudar o conflito, deve-se
partir das seguintes variáveis: (1) as características das partes no conflito; (2) a relação de uma
parte com a outra; (3) a natureza da questão que dá origem ao conflito; (4) o ambiente social
em que ocorre o conflito; (5) o público interessado no conflito; (6) as estratégias empregadas
pelas partes; e (7) as consequências do conflito para cada parte.
Com relação às funções desempenhadas no conflito, esse mesmo autor ressalta que
elas podem ser positivas ou negativas. Caso o conflito previna a estagnação de uma relação,
ele pode ser considerado positivo, uma vez que estimula novos interesses e a curiosidade,
explorando a capacidade de cada indivíduo (DEUTSCH, 1973 apud ALMEIDA, 2003).
O conflito pode ser classificado, ainda, segundo duas classes de processos: os
cooperativos, onde a interdependência implica ganhos mútuos; e os competitivos, em que a
relação é inversa, onde uma das partes sai ganhando e a outra sofrendo prejuízos (DEUTSCH,
1973 apud ALMEIDA, 2003). O autor destaca ainda, como consequências de processos
cooperativos de resolução de conflitos, o fato de a comunicação ser mais efetiva, haver uma
maior coordenação de esforços e um maior sentimento de aceitação de ideias.
Com relação aos conflitos socioambientais, Little (2001, p. 107) os caracteriza como
disputas entre grupos de atores sociais que possuem distintas formas de se relacionar e
interagir com o meio natural. Além disso, “cada ator social tem sua própria forma de
adaptação, ideologia e modo de vida, que entram em choque com as formas dos outros grupos
dando assim a dimensão social do conflito socioambiental”. Para este autor, os conflitos
socioambientais podem ser classificados em três principais tipologias a depender se as
disputas ocorrem em torno i) do controle sobre os recursos naturais, ii) dos impactos
ambientais e sociais gerados pela ação humana e natural e iii) do uso dos conhecimentos
ambientais.
Os conflitos podem ser caracterizados, ainda, pelos elementos: natureza, atores sociais,
campo específico, objeto em disputa, lógica ou dinâmica de evolução, mediadores e tipologia
(FARIA, 2004b). Bredariol (2001), por sua vez, argumenta que os conflitos ambientais nas
áreas urbanas dos países em desenvolvimento são atrelados à questão da equidade social. Já
nas áreas rurais, eles estão relacionados à apropriação de recursos naturais ou à preservação
de culturas. Little (2001, p. 115) salienta ainda que “cada conflito tem seus ambientes naturais
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particulares, seus atores sociais e seus nós próprios de conflito”. Portanto, “o tratamento, e
possível resolução dos conflitos, precisam ser precedidos por uma etapa de pesquisa e análise
das raízes e causas do mesmo” Little (2001, p. 115).
O conflito pode nascer, ainda, de disputas entre as classes sociais detentoras do capital
e aquelas detentoras da força de trabalho, devido a interesses divergentes quanto à
apropriação de riquezas, quanto ao reconhecimento social e quanto à detenção de poder.
Nesse caso, os diferentes grupos sociais se enfrentam nos campos econômico, político e social
(NASCIMENTO, 2001 apud FARIA, 2004b).
Acselrad, Mello e Bezerra (2009), asseveram que as disputas socioambientais
concretas opõem diversos modos de apropriação da natureza, o que expõe seu caráter
democrático. “A questão ambiental não representa necessariamente um entrave ao
desenvolvimento, mas uma dimensão constitutiva de um modelo de desenvolvimento que se
quer democrático e inclusivo” (ACSELRAD; MELLO; BEZERRA, 2009). Assim, tem-se que
o conflito pode ser visto como uma forma de exposição dos problemas e uma chance de
procurar melhorar as formas de apropriação e utilização do meio ambiente.
Esses mesmos autores argumentam, ainda, que os conflitos socioambientais são
originados pelas diferenças socioeconômicas desencadeadas pelo avanço da apropriação
privada e pela adoção de esquemas de ocupação em larga escala de um lado, e de outro lado
pelas lutas sociais, que questionam essa concepção capitalista, expressa pela produção de
divisas a qualquer custo (ACSELRAD; MELLO; BEZERRA, 2008).
Para Leff (2000), os conflitos ambientais são desencadeados por interesses divergentes
quanto à utilização e apropriação dos recursos naturais e levam a sociedade a pensar de uma
maneira mais voltada para o desenvolvimento sustentável. Esses conflitos não serão
resolvidos pela ciência ou pela ecologia, mas sim pelas diferentes formas de enxergar o
ambiente, pela diversidade cultural e pelo saber ambiental. A participação da sociedade é
fundamental para a gestão ambiental, e o diálogo de saberes produzido pelas diferentes
culturas e identidades auxiliará na resolução dos conflitos ambientais.
Para Ormeño e Saavedra (1995 apud BREDARIOL, 2001, p. 58) os conflitos
ambientais são definidos como “a incompatibilidade de interesses que emerge como um
resultado da prevenção ou reparação de danos”. Esses autores reconhecem três atores
envolvidos nesses conflitos: os que provocam o dano, os que recebem os danos e as agências
reguladoras.
Nesse contexto, Little (2001) ressalta que a resolução dos conflitos socioambientais no
campo da ação política concentra-se na implementação de políticas públicas e de diversas
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estratégias e táticas políticas, Assim, os conflitos ambientais aparecem como base para a
construção das políticas ambientais (BREDARIOL, 2001). Quando se referem
especificamente aos conflitos em políticas públicas, Little (2001) e Bredariol (2001) afirmam
que duas partes principais são envolvidas: os decisores políticos e a população. Cite-se, por
exemplo, a discussão a respeito do novo código florestal, em que movimentos sociais e
organizações da sociedade civil lançaram carta de repúdio à Medida Provisória (MPV) nº 558
editada pela Presidenta Dilma Roussef em janeiro de 2012, apontando que essa MPV
extinguiu ilegalmente vastas áreas de unidade de conservação (UC) na Amazônia para abrigar
canteiros e reservatórios de grandes hidrelétricas sem estudos técnicos e qualquer consulta às
populações afetadas e à sociedade brasileira em geral. Isso demonstra a preocupação da
sociedade com a preservação ambiental e sua vontade de participar ativamente do processo
decisório inerente às políticas públicas ambientais (AMIGOS DA TERRA, 2012).
A boa notícia é que esses conflitos têm um potencial significativo para transformar,
tornando-se um importante catalisador para a mudança social positiva. A figura a seguir,
ilustra essa relação entre conflitos socioambientais e políticas públicas:
Bucci (1996 apud FREITAS FILHO; CASAGRANDE, 2008, p. 430) define políticas
públicas como:
arranjos institucionais complexos, expressos em estratégias formalizadas ou
programas de ação governamental, visando coordenar os meios à disposição do
Estado e as atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente
relevantes e politicamente determinados, e resultam de processos conformados
juridicamente.
Segundo Loureiro et al (1992 apud LAYRARGUES, 2000) as políticas públicas na
área ambiental serão efetivas somente se os atores sociais e os conflitos nela envolvidos
estiverem claramente determinados.
Agra Filho (2008) salienta que o papel do governo na resolução dos conflitos
socioambientais não abrange a coordenação efetiva do processo ou a construção de um
consenso, mas se restringe, tão somente, a identificar medidas que minimizam as
preocupações ambientalistas. Agra Filho (2008) afirma que o governo tem atuado como uma
parte interessada na viabilização dos projetos de usinas, uma vez que sua preocupação
primordial é o desenvolvimento do país, ficando a sustentabilidade ambiental em segundo
plano. Assim o papel do governo na mediação de conflitos fica sem sombra de dúvida
pendendo para os interesses privados e não da sociedade afetada.
A prática da avaliação dos impactos ambientais no Brasil negligencia a questão da
justiça social e se mostra omissa em relação à equidade ambiental, por apresentar
uma abordagem precária e reducionista das questões sociais na elaboração dos
diagnósticos. Na fase de análise dos impactos ambientais os aspectos sociais
favoráveis são exacerbados e os desfavoráveis são, geralmente, subdimencionados
(AGRA FILHO, 2008, p. 135).
Essa tímida atuação do governo com relação à implementação de políticas públicas
voltadas à diminuição dos impactos socioambientais pode ser explicada pela captura dos
Órgãos públicos pelo poder econômico das grandes empresas privadas, o que tem
comprometido a autonomia soberana na condução e aplicação de políticas públicas dos
agentes políticos (FREITAS FILHO; CASAGRANDE, 2008).
Dessa forma, pode-se afirmar que a consolidação do setor elétrico brasileiro depende
de um Estado de interesse social e ambiental forte, capaz de promover os pilares necessários à
sua expansão sem prescindir, contudo, da criação de instrumentos de mercado que diminuam
as assimetrias de poder e de informações entre os atores envolvidos (FROTA, 2001).
Aos planejadores de políticas públicas cabe informar à sociedade que a
disponibilização de energia elétrica na quantidade demandada implica impactos ambientais e,
consequentemente, a potencialização dos conflitos deles decorrentes, os quais precisam ser
“negociados, mitigados e acertados pelos agentes” (FROTA, 2001).
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esses países acabem por construir as grandes barragens para exportar energia elétrica para os
países onde impera a democracia e, por esse motivo, não se permite a construção deliberada
de barragens ou qualquer empreendimento que implique remanejamentos em larga escala.
A abertura do processo político favorece a presença efetiva das populações atingidas
em todas as etapas do processo decisório adjacente, inclusive nas questões relativas a
reassentamentos. Essa participação, por outro lado, não ocorre nos regimes autoritários, em
que se verificam práticas autoritárias e excludentes (ARAÚJO et al., 2000).
Vivacqua (2005) salienta que a resolução dos conflitos mediante negociação e é muito
mais vantajosa e econômica do que a resolução de conflitos na esfera judicial, que além de
demorada, é dispendiosa. O autor cita ainda, a arbitragem, como ferramenta auxiliadora na
resolução de conflitos fora da esfera judicial. Exemplo de arbitragem utilizada pelo governo é
a constituição de comissões e grupos que atuam como árbitros na resolução de conflitos,
como os Comitês de Bacia Hidrográfica, criados pela Lei nº 9433/97, que arbitram em
primeira instância os conflitos relacionados aos recursos hídricos.
Costa (2003) também propõe a utilização dos métodos alternativos de resolução de
conflitos, definidos como aqueles independentes do monopólio estatal, e cita três principais:
(1) negociação: acordo encontrado pelas próprias partes; (2) mediação: negociação facilitada
por um terceiro; e (3) arbitragem: substituição da vontade das partes por um terceiro. Os
objetivos dos métodos alternativos de resolução de conflito são atender os interesses das duas
partes envolvidas e pacificar o conflito de uma maneira mais eficiente, visando sempre o
caráter educativo do processo preventivo de novos conflitos.
Dentre as formas de se abordarem os conflitos, Costa (2003) relata a autotutela
(solucionados pela força), a autocomposição (solucionado pelas partes) e a heterocomposição
(solucionados por um terceiro). Dentro dessa classificação, tem-se a heterocomposição estatal
e a alternativa, podendo ser vinculante (protegido pela coercibilidade estatal) ou não. Dentro
da classe vinculante ressalta-se a arbitragem. Já no lado da autocomposição, em que as partes
não têm uma solução imposta, tem-se a mediação e a negociação (COSTA, 2003).
Costa (2003) cita a privacidade e a liberdade de decidir sem a intervenção de terceiros
como principais vantagens da negociação. É também o método menos custoso e de maior
controle sobre os resultados.
Já Acselrad, Mello e Bezerra (2009) criticam a resolução de conflitos baseada na
negociação, afirmando que “o encaminhamento do conflito não se dá pela discussão sobre
aquilo que é justo ou injusto, mas pela maior ou menor capacidade dos agentes de
barganharem seus interesses, tidos como foro provado”. Nesse argumento eles acrescentam
que quando o litígio envolve atores sociais com acentuada desigualdade de poder, a resolução
negociada de conflitos pode operar como uma tecnologia de desmobilização social. Ponderam
ainda que em certos casos a negociação não impede o agravamento dos conflitos, e o
consenso estabelecido harmoniosamente, ao mesmo tempo em que reduz o nível de
agressividade entre os atores, encobre os conflitos, que permanecem latentes.
Com relação à mediação, Costa (2003) destaca que suas principais características são
o sigilo, a preservação das relações entre as partes, a informalidade, a flexibilidade do
33
2
As decisões tomadas com base na arbitragem são definitivas, sendo seu resultado imposto a ambas as partes. O
resultado não pode ser questionado e sua aplicação é obrigatória. O próprio poder judiciário trata de garantir sua
execução. Por esse motivo diz-se tratar de um método vinculante, pois a decisão não é passível de ser alterada ou
questionada.
3
Art. 18. A atuação da ANEEL para a finalidade prevista no inciso V do art. 3º da Lei nº 9.427, de 1996, será
exercida direta ou indiretamente, de forma a:
I - dirimir as divergências entre concessionários, permissionários, autorizados, produtores independentes e
autoprodutores, bem como entre esses agentes e os consumidores, inclusive ouvindo diretamente as partes
envolvidas;
II - resolver os conflitos decorrentes da ação reguladora e fiscalizadora no âmbito dos serviços de energia
elétrica, nos termos da legislação em vigor;
III - prevenir a ocorrência de divergências;
IV - proferir a decisão final, com força determinativa, em caso de não entendimento entre as partes
envolvidas;
V - utilizar os casos mediados como subsídios para regulamentação. (BRASIL, 1996 )
34
comprovação, por parte dos agentes envolvidos, de que não chegaram a um acordo entre si.
Entretanto, Costa (2003) ressalta que o arbitramento adotado pelas Agências Reguladoras não
passa de um processo administrativo, uma vez que é utilizado por um Órgão da
Administração que atua impondo uma decisão sobre o administrado, bastando o surgimento
desses atos para que sua prestação torne-se exigível. Em se tratando de contratos
administrativos de longo prazo, a arbitragem é uma garantia necessária para que o contrato
possa sobreviver às várias transformações na economia. Nesse sentido, o artigo 23 da Lei nº
8.987/95 explicita a necessidade de se estabelecer no contrato administrativo cláusula que
defina foro e modo amigável de solução de divergências entre as partes (COSTA, 2003).
A mediação na ANEEL é atribuição da Superintendência de Mediação Administrativa
Setorial, resumindo-se a uma audiência, na qual se tenta a composição amigável, seguida de
uma imposição de conduta pela própria ANEEL caso não se chegue a um acordo (COSTA,
2003). A mediação adotada pela ANEEL não pode ser considerada uma mediação pura, uma
vez que as partes sabem que terão uma decisão, seja tomada por elas mesmas ou pelo
mediador, caso a autocomposição seja frustrada. Contudo, essa postura da Agência não é
considerada ruim, pois é uma opção diante da desigualdade entre as partes (quando há o
consumidor de um lado e a concessionária de outro, por exemplo). Ademais, considera-se
válida a posição adotada pelas Agências Reguladoras, visto que o contexto brasileiro é
diferente do contexto estrangeiro, de onde os métodos alternativos de resolução de conflitos
são originários. Assim, por mais que esses métodos tenham sido importados, eles devem ser
ajustados à realidade nacional, para que seus efeitos sejam proveitosos (COSTA, 2003).
No presente estudo, serão utilizados os métodos de resolução alternativa de conflitos
definidos por Costa (2003) para comparar os três estudos de caso. Assim, será verificado se os
métodos de negociação, mediação e/ou arbitragem foram adotados em cada um dos casos e
como facilitaram e/ou influenciaram a gestão dos conflitos.
mais acelerada, motivada pelo apoio do Banco Mundial (GLOBALIZATION ..., 2001). Mas
foi no final dos anos 1980, que ambientalistas e sociólogos começaram a desempenhar um
papel mais importante no processo de planejamento, e por meados dos anos 1990 a
participação das populações afetadas e das ONGs nesse processo tornou-se mais significativo
(MC CULLY, 2001). A existência dos movimentos sociais contra a construção de barragens é
muito importante para reforçar a proteção, bem como a inclusão da população atingida e
menos favorecida nas decisões a elas pertinentes. Os exemplos de movimentos sociais
antibarragens na Tailândia, Malásia, Índia, EUA e Brasil, demonstram a evolução dos
conflitos socioambientais contra barragens em diferentes regiões do mundo, e as respectivas
consequências nas políticas públicas ambentais e sociais desses países.
Democracia; o
sucesso do
CRAB implicou
na melhora das
medidas
compensatórias
Desalojamento dos atingidos,
Machadinho Uruguai 15.700 1.140.000 CRAB 2002
de pessoas bem como na
diminuição do
número de
pessoas
Brasil
reassentadas.
Ditadura militar;
Desalojamento população
de pessoas; atingida falhou
contaminação da em conseguir
Tucuruí Tocantins 30.000 8.370.000 CABA 1984
água e declínio significativas
do número de concessões.
peixes
Democracia; os
Desalojamento protestos em
de pessoas com torno de Pak
Associação dos Mun levaram o
Pobres (AOP), consequentes
problemas de governo a decidir
moradores, não mais
ONGs, compensação e
reassentamento; construir
organizações barragens para
estudantis, declínio do nº de
peixes; clara produção de
Tailândia Pak Mun Mun 8.500 136.000 acadêmicos e 1994 energia na
ambientalistas; ausência de
participação da Tailândia;
lançamento da decisão pela
campanha população
atingida no importação de
“Deixe o rio eletricidade dos
Mun correr processo de
planejamento. países vizinhos.
livre”.
36
O livro do Mc Cully, Silenced Rivers (2001), é fundamental neste capítulo, uma vez
que traz um histórico dos conflitos socioambientais decorrentes da construção de barragens no
mundo. Além disso, as publicações de Joji (1999) e do WORLD COMMISSION ON DAMS
(2000) foram utilizadas por trazerem experiências passadas e recentes com barragens,
apresentando estudos de caso que envolvem conflitos decorrentes da formação de grandes
reservatórios. A obra de Swain e Chee (2004) agregou bastante informação, principalmente
37
para os estudos de caso da Malásia e da Tailândia. Ademais, foram feitas pesquisas em sites
de ONGs engajadas nas lutas antibarragens, como o International Rivers4, que tem sido
referência pelo apoio na luta sistemática da sociedade civil contra a construção de grandes
barragens em rios em todo o mundo, e o Movimento dos Atingidos por Barragens, movimento
social organizado contra a construção de barragens no Brasil.
Com a finalidade de fornecer opções alternativas para o desenvolvimento eficaz e
participativo nos processos de tomada de decisões envolvendo obras de grandes barragens,
fundou-se a Comissão Mundial de Barragens– CMB (World Commission on Dams – WCD),
constituída por stakeholders de todo o mundo, com interesses diferenciados e conhecimentos
na área de geração hidrelétrica e grandes reservatórios. Sua missão é facilitar uma melhor
compreensão das experiências passadas e mais recentes com barragens (JOJI, 1999). Em
novembro do ano 2000, a CMB desenvolveu um relatório final, no qual estabeleceu diretrizes
abrangentes para a construção de barragens. Esse relatório descreve uma estrutura inovadora
para o planejamento de projetos de água e energia, a fim de proteger o meio ambiente e a
população atingida pelas barragens, além de garantir que os benefícios de sua construção
sejam distribuídos de forma mais equitativa (WORLD COMMISSION ON DAMS, 2000).
De acordo com Joji (1999), no ano de 1997, cerca de 800.000 barragens foram
construídas no mundo. Mais de 45.000 delas são grandes represas, as quais provocaram o
deslocamento forçado de 40 a 80 milhões de pessoas (WORLD COMMISSION ON DAMS,
2000). A implantação de grandes barragens desencadeou conflitos socioambientais em todo o
mundo, principalmente por causa desses deslocamentos compulsórios e de outros impactos
socioambientais decorrentes dos grandes reservatórios formados, os quais seguem descritos
no Quadro 01. Mc Cully (2001) salienta, ainda, que, até 2007, foram implantadas no mundo
cerca de 120 barragens para geração de energia elétrica que implicaram em deslocamentos
populacionais compulsórios. De acordo com o Banco Mundial (1994 apud JOJI, 1999), a
maioria das pessoas reassentadas como resultado de projetos de barragens pertence aos mais
pobres e a camadas mais vulneráveis da sociedade. Segundo Joji (1999), a perda de terras
tradicionais tem causado danos à integridade, estabilidade e, em última instância, à
sobrevivência das comunidades afetadas.
4
Disponível em: <www.internationalrivers.org>. Acesso em: 17 maio 2012.
38
gerar 1.450 MW. Ela é a maior barragem do rio Narmada, cujo reservatório inundou 245
aldeias, deslocando mais de 43.000 famílias (WORLD COMMISSION ON DAMS, 2000).
No início do ano de 1986, os ativistas e a população ribeirinha afetada pela barragem
Sarovar Sardar fundaram o movimento “Narmada Dharangrast Samiti – NDS” (Comitê para
a população de Narmada afetada por Barragens). Os moradores participantes do NDS se
recusavam a ser remanejados de suas terras ou a cooperar com os funcionários da represa até
que suas demandas por justa compensação e informações sobre os impactos do projeto fossem
atendidas.
Os estudos ambientais para o projeto não foram realizados e o número de pessoas a
serem deslocadas não era conhecido, o que levou o movimento a concluir que as informações
sobre os benefícios do projeto eram fraudulentas e o reassentamento justo, impossível (MC
CULLY, 2001).
A transmissão da campanha anti-Sardar Sarovar pela imprensa nacional, que começou
no final dos anos 1980, implicou a ampliação do movimento, que recebeu o apoio de
ambientalistas, religiosos, sem-terra e defensores dos direitos humanos ao redor de todo o
país. Em 1989, essa crescente rede social formada foi denominada de “Salve o Movimento
Narmada” (Narmada Bachao Andolan – NBA) (MC CULLY, 2001).
O movimento NBA começou, então, a pressionar o Banco Mundial para que deixasse
de financiar o projeto de Sardar Sarovar (integrantes do movimento fizeram greve de fome
por mais de vinte dias)5. Finalmente, em março de 1993, o banco anunciou sua retirada. A
reação inicial das autoridades indianas foi reforçar o uso da violência e intimidação contra os
ativistas (MC CULLY, 2001).
Depois de muitos conflitos entre o NBA e o governo indiano, as autoridades
governamentais concordaram em suspender a construção da barragem, até que houvesse
progresso na questão dos reassentamentos (MC CULLY, 2001).
No final, a barragem acabou sendo construída, mas a luta do NBA não foi em vão.
Após os conflitos decorrentes da construção da barragem Sardar Sarovar, líderes políticos
afirmaram que não seriam mais implementados projetos que implicassem remanejamentos em
larga escala (MC CULLY, 2001).
5
O NBA possui o lema “Nos afogaremos mas não nos moveremos” para impedir que as políticas hídricas de
grandes barragens venham desalojar e mudar a forma de viver de milhares de ribeirinhos e camponeses. Dentre
as suas táticas, incluem-se o “auto-sacrifício por afogamento” e as greves de fome. Em janeiro de1991, algumas
lideranças do movimento realizaram uma greve de fome de vinte e dois dias até que o Banco Mundial escutasse
as propostas do movimento (ARAÚJO et al., 2010).
43
pela Guerra, principalmente para a fabricação de alumínio e produção de plutônio para bomba
atômica (WORLD COMMISSION ON DAMS, 2000).
Uma das modificações causadas pela construção da usina no ecossistema aquático do
rio Columbia foi a redução da população de salmão. A falta de uma passagem na barragem
para os peixes acabou com a área de desova do salmão por mais de 1.000 km rio acima. O
Relatório final do World Commission on Dams (2000) aponta fortes modificações na pesca e
na alimentação de tribos indígenas localizadas na região, devido a essas alterações ocorridas
na população de salmão.
Duas cidades indígenas americanas tiveram que ser deslocadas. No local onde uma
delas se restabeleceu, não havia o suprimento de água, além de terem sido inundados alguns
cemitérios indígenas (WORLD COMMISSION ON DAMS, 2000).
A partir de 1940, o governo americano resolveu abandonar sua prática de adquirir o
consentimento dos índios e passou a apenas informá-los por cartas o valor que receberiam
pelas terras. Contudo, somente aquelas pessoas que tinham o título legal da propriedade
receberam a compensação a que tinham direito, ficando de fora uma grande quantidade de
pessoas, principalmente os indígenas que careciam de direitos de posse da terra (WORLD
COMMISSION ON DAMS, 2000).
Em relação à população não indígena americana, pelo menos oito cidades foram
inundadas com um total de 5.700 pessoas deslocadas (WORLD COMMISSION ON DAMS,
2000).
As lutas contra grandes barragens nos EUA começaram nos anos 1950, com o
planejamento da barragem Echo Park, localizada no rio Green, estado do Colorado. Essa foi a
primeira barragem a provocar séria oposição nos EUA, pois inundaria uma área protegida
que abrangia parte do Monumento Nacional de Dinossauros, e sua implantação abriria
precedente para que fossem desenvolvidos outros projetos em áreas protegidas. Ao final de
muitas lutas entre o movimento ambientalista americano e o governo, a construção da
barragem Echo Park foi suspensa (MC CULLY, 2001).
45
Mais tarde, muitas outras lutas foram sendo travadas entre o Bureau of Reclamation6 e
o movimento ambientalista norte-americano, sendo simbólica a luta contra duas barragens
para geração de energia elétrica que seriam construídas no Grand Canyon, na bacia do
Colorado. A campanha contra essas barragens marcou mais de uma década de batalhas contra
barragens na bacia do Colorado, as quais acabaram com os anos de “ouro” para os
construtores de barragens nos EUA e desempenharam um papel vital na formação do
moderno movimento ambiental no país (MC CULLY, 2001).
Embora apenas um dos reservatórios fosse atingir diretamente uma parte do parque
nacional, os ambientalistas acreditavam já terem sido implantadas barragens suficientes sobre
os canyons do Colorado, dentro ou fora das áreas oficialmente protegidas. Dessa vez, o
movimento antibarragens estava melhor preparado e mais determinado do que nunca, pois já
haviam vencido em Echo Park e tinham a motivação de outras tragédias já ocorridas no
Colorado. Sabiam que deveriam evitar que outro desastre acontecesse (MC CULLY, 2001).
O movimento utilizou táticas como e-mails e depoimentos ao Congresso, argumentos
econômicos, filmes, artigos em revistas, dentre outras, para convencer a população e o
governo de que a construção das usinas tinha mais desvantegens do que vantagens. Além
disso, eles argumentaram que havia formas mais baratas e menos destrutivas para se gerar
energia elétrica (MC CULLY, 2001).
A década de 1970 foi marcada por diversas lutas antibarragens, que foram travadas
principalmente em nível local e estadual, sem projetos que obtivessem alcance nacional, como
as barragens do Colorado nos anos 1950 e 1960. Com o movimento antibarragens
consolidado, a construção de represas nos EUA foi diminuindo cada vez mais com o apoio
crescente dos presidentes que foram se elegendo. Finalmente, em 1994, o Bureau of
Reclamation declarou que “a era de construção de barragens nos EUA terminou. A
possibilidade de haver futuros projetos é extremamente remota, ou até mesmo impossível”
(MC CULLY, 2001).
6
Órgão Público Federal responsável pelo planejamento de barragens no Oeste dos EUA.
46
nacional para fazer frente aos planos de construção de grandes barragens, sendo estabelecido,
em 1991, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) (MOVIMENTO DOS
ATINGIDOS POR BARRAGENS, 2011).
O MAB costuma adotar práticas de ação direta, por meio da ocupação de canteiros de
obras de barragens e dos prédios das empresas empreendedoras. Essa estratégia, segundo
Acselrad, Mello e Bezerra (2009), constitui uma forma de questionar os empreendimentos e
de abrir um debate sobre a pertinência ou não de que eles sejam implementados em
determinado território, nos quais a população impactada é pouco ou nada consultada.
Esta etapa do trabalho apresentará como estudo de caso três usinas hidrelétricas
planejadas e/ou implantadas no Brasil: a UHE Sobradinho, implantada à época da ditadura
militar, em operação desde 1982; a UHE Itaparica, construída no período que se estendeu de
1976 a 1988, correspondente à transição democrática brasileira; e a UHE Belo Monte, que é
um caso atual de bastante repercussão na mídia, em fase de implementação. Esse
levantamento será realizado para fins de comparação, com foco na gestão de conflitos
realizada pelo poder público nas três usinas. O objetivo é avaliar a evolução da gestão dos
conflitos decorrentes da construção de usinas hidrelétricas no Brasil, bem como sua influência
na vida da população afetada.
7
Empresa estatal, controlada pelo Ministério de Minas e Energia.
50
externalidade negativa que deveria ser neutralizada. A população ribeirinha que ali estava
instalada era um entrave a ser removido para a formação do reservatório. Contudo, essa
prioridade dada à questão energética foi estabelecida pelo Poder Executivo sem qualquer
consulta à sociedade, desconsiderando, portanto, seus verdadeiros interesses (SIGAUD,
1986).
Não obstante a literatura tenha trazido aspectos relacionados à resistência da
população ao projeto de reassentamento imposto pela CHESF (DUQUÉ, 1984; SIGAUD,
1986; BARROS, 1984), não se tratava de um movimento organizado e com força nacional. A
organização sindical era frágil e não houve atuação de partidos políticos durante o
deslocamento. Sigaud (1986) salienta que a Igreja Católica começou a influir ativamente
somente no final do processo. Nesse sentido, não houve uma mediação política para a
organização da população na luta por seus desejos e direitos. Assim, a resistência da
população ao projeto de reassentamento imposto foi formada basicamente pela organização
comunitária local, preexistente à intervenção do Estado, constituída “por parentelas com
fortes laços de solidariedade” (SIGAUD, 1986, p. 37). Segundo Sigaud (1986, p. 37), essa
organização social “adquiriu funções „políticas‟ no momento do conflito e funcionou como a
principal instância de organização e pressão política”. Houve, portanto, uma reação coletiva,
realizada por meio das articulações existentes entre os povoados. Sigaud (1986) afirma que,
apesar de essas articulações serem preexistentes, elas foram fortalecidas ao longo do
enfrentamento do conflito com a CHESF.
O fato de a população ter se recusado a se deslocar para o projeto de colonização do
INCRA, situado a 700 km de distância do reservatório, e ter optado por ser reinstalada de
forma precária na borda do lago, apesar da resistência da CHESF a essa solução, foi
considerada uma vitória popular, uma vez que conseguiu impor o que lhe parecia mais
conveniente (DUQUÉ, 1984). Dessa forma, por mais que a reação da população tenha sido
limitada, a pressão por ela exercida sobre a CHESF pode ser considerada uma resposta
política, que foi capaz de alterar os rumos que estavam sendo impostos pelo Estado
(SIGAUD, 1986).
Diante disso, resta claro que a principal causa dos conflitos sociais na implantação da
UHE Sobradinho foi o deslocamento compulsório da população ribeirinha, que tinha seu
modo de vida atrelado à utilização do rio, com fortes laços culturais estabelecidos no local.
Com isso, o impacto causado pelo empreendimento foi rebatido com uma resposta cultural da
população à intervenção que lhe estava sendo imposta pelo Estado de cima para baixo.
52
Entretanto, o fim dos impactos socioambientais gerados em Sobradinho só será visto quando a
população deslocada tiver recuperado sua auto suficiência (SIGAUD, 1986).
Nota-se, ainda, que não houve mediação na gestão dos conflitos. O que houve foi uma
pressão social sobre o governo, que terminou impondo a vontade popular. Apesar dos baixos
valores das indenizações e da desestruturação da organização social preexistente, a vitória
popular foi obtida quando os rumos que haviam sido traçados pelo Estado foram alterados.
No caso de Sobradinho restou claro que o conflito manifestado pela resistência da população,
por mais que tenha sido limitado, foi o fator que determinou sua vitória frente ao
autoritarismo estatal vigente à época da implantação desse empreendimento.
8
Em 1979 criou-se uma estrutura organizativa chamada de Pólo Sindical dos trabalhadores do Submédio São
Francisco para lutar contra os efeitos negativos da construção da Usina Hidrelétrica de Itaparica, unificando
posseiros, arrendatários, pequenos agricultores e sem terras da região, constituindo-se como uma organização de
trabalhadores rurais para defesa dos direitos dos camponeses perante o governo (BOMFIM, 1999).
53
9
Fontes secundárias, como notícias veiculadas pela mídia, pelo Ministério Público e outros Órgãos do Poder
Público, como IBAMA e ANEEL, além de pesquisas realizadas por cientistas e notícias publicadas em sites de
ONGs e movimentos sociais contra Belo Monte.
55
10
Art. 2º, inciso VI - Sugerir a adoção de medidas necessárias para garantir o atendimento à demanda nacional
de energia elétrica, considerando o planejamento de longo, médio e curto prazos, podendo indicar
empreendimentos que devam ter prioridade de licitação e implantação, tendo em vista seu caráter estratégico e
de interesse público, de forma que tais projetos venham assegurar a otimização do binômio modicidade tarifária
e confiabilidade do Sistema Elétrico (BRASIL, 1997a).
11
Art. 1º - Indicar o Aproveitamento Hidrelétrico de Belo Monte, localizado no rio Xingu, no Estado do Pará,
como projeto de geração de energia elétrica com prioridade de licitação e implantação, na forma prevista no art.
2o, inciso VI, da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997 (BRASIL, 1997a).
12
Composta pelas empresas do Grupo Eletrobras (Eletrobras: 15,00%; Chesf: 15,00%; e Eletronorte: 19,98%);
pelas Entidades de Previdência Complementar Petros (10,00%) e Funcef (5,00%); pelo Fundo de Investimento
em Participações Caixa FIP Cevix (5,00%); pelas Sociedades de Propósito Específico Belo Monte Participações
S.A. (Neoenergia S.A.), com 10,00% e Amazônia (Cemig e Light) com 9,77%; pelas Autoprodutoras Vale
(9,00%) e Sinobras (1,00%) e pela empresa J.Malucelli Energia (0,25%).
57
a) Reservatório:
Área: 516 km2;
b) Capacidade Instalada Mínima:
Casa de força principal: 11.000,0 MW;
Casa de força complementar: 233,1 MW;
c) Número de unidadades:
Casa de força principal: 18
Casa de força complementar: 6
13
O novo Modelo do setor elétrico define que a comercialização de energia elétrica é realizada em dois
ambientes de mercado, o Ambiente de Contratação Regulada - ACR e o Ambiente de Contratação Livre - ACL.
A contratação no ACR é formalizada através de contratos bilaterais regulados, denominados Contratos de
Comercialização de Energia Elétrica no Ambiente Regulado (CCEAR), celebrados entre Agentes Vendedores
(comercializadores, geradores, produtores independentes ou autoprodutores) e Compradores (distribuidores) que
participam dos leilões de compra e venda de energia elétrica. Já no ACL há a livre negociação entre os Agentes
Geradores, Comercializadores, Consumidores Livres, Importadores e Exportadores de energia, sendo que os
acordos de compra e venda de energia são pactuados por meio de contratos bilaterais (CAMÊRA DE
COMERCIALIZAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA, 2012).
14
O início do suprimento diz respeito a data em que a energia deve ser entregue ao comprador. Portanto, a usina
já deve estar em operação comercial, para que seja capaz de honrar os CCEAR.
58
15
A Licença de Instalação para a UHE Belo Monte foi concedida pelo IBAMA sob o nº 795, em 01 de junho de
2011, e é válida por seis anos. Contudo, sua validade está atrelada ao cumprimento dos condicionantes por ela
estabelecidos.
59
- Igreja Católica
Na região de Altamira, a Igreja Católica é uma instituição com muita influência sobre
os grupos sociais locais, além de possuir um forte sentido missionário. Articulada
internacionalmente e com ampla atuação na Amazônia, ao combinar religião com prática
social, exerce uma forte influência política na região (FARIA, 2004b).
Sua principal missão é a defesa dos grupos indígenas da região Amazônica, exercendo
influência, também, nas questões sociais ligadas à defesa dos excluídos urbanos. Seu
posicionamento é de oposição ao projeto de Belo Monte, em alinhamento com a posição dos
movimentos sociais (FARIA, 2004b). Toni, Souza e Porro (2006, p. 20) afirmam que a “igreja
católica foi o aliado mais importante na evolução dos movimentos de base da Transamazônica
e sua maior fonte de recursos”.
Frise-se, nesse sentido, a atuação do bispo do Xingu, Dom Erwin Kräutler, que
representa a Igreja Católica ativamente na proteção dos mais pobres e dos mais frágeis, dos
indígenas, dos ribeirinhos e dos extrativistas da Amazônia, e tem feito uma oposição
16
Os Municípios são Altamira, Anapu, Brasil Novo, Medicilândia, Pacajá, Placas, Rurópolis, Senador José
Porfírio, Uruará e Vitória do Xingu.
60
Tabela 2 - Área diretamente afetada pela implantação da UHE Belo Monte, conforme EIA/RIMA, maio/2009
Área Diretamente Afetada – ADA
Localidade Imóveis Famílias Pessoas
Altamira 4.747 4.362 16.420
Meio rural 1.241 824 2.822
Total 5.988 5.186 19.242
Fonte: (BRASIL, 2010c).
Para permitir a expropriação das terras afetadas pela usina, foi necessária a emissão da
Declaração de Utilidade Pública (DUP)18, pela ANEEL, das áreas necessárias à construção de
Belo Monte. Algumas considerações devem ser levantadas em relação ao ato de declaração de
utilidade pública a ser emitido pela ANEEL. Seus contornos encontram-se fundados no
Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941 (BRASIL, 1941). Por meio da redação
17
São as áreas vizinhas que ficam em volta da UHE Belo Monte e do reservatório, denominadas AID – Área de
Influência Direta. Elas incluem não só as terras que vão ser ocupadas pelas obras e pelo reservatório, mas
também aquelas que vão sofrer interferências diretas, negativas ou positivas, do empreendimento (BRASIL,
2009).
18
Sobre esse assunto, a Lei nº 9.074, de 07 de julho de 1995, estabelece em seu art. 10 que “cabe à Agência
Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, declarar a utilidade pública, para fins de desapropriação ou instituição de
servidão administrativa, das áreas necessárias à implantação de instalações de concessionários, permissionários e
autorizados de energia elétrica” (BRASIL, 1995).
63
conferida ao art. 2º19, constata-se que, mediante declaração de utilidade pública, todos os bens
poderão ser desapropriados pelos entes políticos a quem foi atribuído o poder de emissão da
DUP (União, Estados, Municípios e o Distrito Federal). Portanto, percebe-se que o
procedimento desapropriatório inicia-se pelo ato declaratório de utilidade pública que se
configura como ato tipicamente emanado de autoridade pública que delimita quais bens
passam a ser necessários para o cumprimento de uma finalidade pública (CRETELLA
JÚNIOR, 1972).
Nesse sentido, a ANEEL, por meio das Resoluções Autorizativas nº 2.853, de 05 de
abril de 2011, e nº 3.293, de 20 de dezembro de 2011, declarou de utilidade pública as áreas
de terra com superfície total de 285.906,2305 ha (duzentos e oitenta e cinco mil, novecentos e
seis hectares, vinte e três ares e cinco centiares) necessárias à implantação dos reservatórios,
da APP (área de preservação permanente), dos canteiros de obras, das demais estruturas e dos
reassentamentos populacionais da UHE Belo Monte (BRASIL, 2011; 2012b). Vale ressaltar
que, desse total, 119.563,8922 ha referem-se à área destinada à construção de
reassentamentos. Sobre esse aspecto, saliente-se que Belo Monte foi o primeiro
empreendimento em que quase a metade das áreas declaradas de utilidade pública (41%)
foram destinadas a reassentamentos. Isso indica um avanço na preocupação da concessionária
(solicitante da DUP, que justifica a necessidade das áreas requeridas) em atender aos anseios
da população local e evitar os conflitos sociais na região (BRASIL, 2010b).
Com relação às populações indígenas, os impactos ligados ao aumento da população
são mais fortes para as terras indígenas mais próximas do empreendimento, quais sejam:
Paquiçamba, Arara da Volta Grande do Xingu e para a Área Indígena Juruna do km 17. O
aumento da chegada de pessoas à região tende a provocar o aumento das pressões sobre essas
terras indígenas e seus recursos naturais, bem como o aumento da disseminação de doenças e
da exposição dos indígenas ao alcoolismo, à prostituição e às drogas (BRASIL, 2009).
Para evitar esses efeitos negativos sobre os povos indígenas da região, a Norte Energia
propôs projetos e programas ligados à educação ambiental, à saúde e saneamento nas terras
19
Art. 2º Mediante declaração de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União, pelos
Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios.
§ 1º A desapropriação do espaço aéreo ou do subsolo só se tornará necessária, quando de sua utilização
resultar prejuizo patrimonial do proprietário do solo.
§ 2º Os bens do domínio dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios poderão ser desapropriados
pela União, e os dos Municípios pelos Estados, mas, em qualquer caso, ao ato deverá preceder autorização
legislativa.
§ 3º É vedada a desapropriação, pelos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios de ações, cotas e
direitos representativos do capital de instituições e emprêsas cujo funcionamento dependa de autorização do
Govêrno Federal e se subordine à sua fiscalização, salvo mediante prévia autorização, por decreto do Presidente
da República. (Incluído pelo Decreto-lei nº 856, de 1969) (BRASIL, 1941).
64
indígenas, além de um plano que incentive a população indígena a continuar morando nas
aldeias (BRASIL, 2009).
Não obstante todos os esforços empreendidos pelo Poder Público e pela Norte Energia
no sentido de minimizar os impactos sociais negativos advindos da construção da usina,
algumas preocupações vêm sendo demonstradas por ONGs, ambientalistas e a população
afetada, incluindo os povos indígenas que habitam próximos à região.
Segundo Hurwitz et al. (2011), no caso de Belo Monte, questões políticas se
sobrepuseram a critérios técnicos e preceitos legais, oferecendo riscos imensos para seus
investidores. Os autores ressaltam a importância do respeito às normas legais de proteção ao
meio ambiente, bem como a necessidade de uma participação efetiva da sociedade civil no
planejamento estratégico do setor elétrico.
Sob esse aspecto, vale ressaltar a motivação para a importância política concedida a
Belo Monte. As fontes alternativas de energia dificilmente suprirão a demanda energética
exigida pelo país. Considerando que o Brasil possui o domínio da tecnologia de construção e
operação das UHE, o modelo do desenvolvimento da matriz energética brasileira não pode
deixar de lado seu enorme potencial hidrelétrico. O grande problema é que os primeiros
empreendimentos hidrelétricos foram implantados à custa de enormes impactos sociais e
ambientais, o que terminou por marcar negativamente projetos desse tipo. Cabe, portanto, ao
poder público, “resgatar a enorme dívida com os atingidos pelas barragens dos megaprojetos
hidrelétricos anteriores, realizados com total desprezo pelas populações residentes nas suas
áreas de impacto” (FONSECA, 2005).
Com a experiência proporcionada pelos grandes impactos ambientais e sociais
causados no passado, o projeto para a construção da UHE Belo Monte se mostra inovador, ao
construir em conjunto com a população local o Plano de Desenvolvimento Regional
Sustentável (PDRS) do Xingu, antes mesmo que a usina seja implantada (FONSECA, 2005).
Além disso, a Norte Energia elaborou um Plano de Atendimento à População Atingida, com o
objetivo de “reduzir os impactos sociais negativos decorrentes da implantação da UHE Belo
Monte e apresentar soluções que considerem as expectativas e demandas da população
atingida por este empreendimento” (NORTE ENERGIA, 2011). A seguir, serão explicitados
esses dois planos, que integram, juntamente com o EIA/RIMA já mencionados, a gestão de
conflitos socioambientais empreendida em Belo Monte.
65
20
O PBA tem a finalidade de detalhar as recomendações incluídas no EIA e nas condicionantes da Licença
Prévia, visando a obtenção da Licença de Instalação (LI), necessária para o início das obras (PDRS XINGU,
2012).
68
21
A Licença Prévia de Belo Monte de nº 342/2010 foi concedida pelo Ibama em 01/02/2010, tendo como um dos
requisitos a realização de audiências públicas as quais foram realizadas e contaram com a participação de cerca
de 5.000 pessoas. Conforme a própria denominação, essa Licença exige o cumprimento de um conjunto de
condicionantes dentro de prazos estipulados. Adicionalmente, para efeito de obtenção da Licença de Instalação,
os planos socioambientais devem ser detalhados e constar do PBA. A seguir, os condicionantes relativos ao
Programa da área rural:
[...] 2.14 Apresentar no PBA proposta de constituição, garantia de representatividade, funcionamento e
integração do Fórum de Acompanhamento e dos Fóruns de Discussão Permanente, incluindo sua interface com
os conselhos e comissões específicas.
2.15 Apresentar no PBA convênios firmados com os órgãos competentes visando ações de regularização e
fiscalização fundiária nas áreas a serem afetadas pelo empreendimento.
2.16 Apresentar no PBA a metodologia que será adotada na valoração e os critérios para cálculo de áreas
remanescentes viáveis, considerando necessariamente o “isolamento social” pela saída de moradores atingidos
da região.
2.17 Apresentar no PBA o Cadastro Socioeconômico – CSE dos grupos domésticos da Área Diretamente
Afetada – ADA, incluindo os moradores e demais pessoas que utilizem o trecho da Volta Grande em suas
atividades; os pescadores de peixes ornamentais e pescadores comerciais – tanto a montante como a jusante de
Altamira; os trabalhadores ligados às atividades de praias, incluindo comerciantes, barqueiros e outras funções
relacionadas a atividades exercidas nesses locais, com identificação de geração de trabalho e renda, bem como os
oleiros e trabalhadores de atividades mineráveis e extrativistas. Esses grupos domésticos deverão ser público-
alvo do programa de Monitoramento dos Aspectos Socioeconômicos.
2.18 Detalhar no PBA, a forma e metodologia de análise dos impactos que poderão ser mitigados pelo Projeto de
Reparação (compensação social), de forma a deixar claro aos atingidos quais perdas poderão ser "compensadas
socialmente" e as respectivas compensações.[...]
2.32 Dependerão de licenciamento no órgão municipal ou estadual de meio ambiente as seguintes obras
decorrentes: ... reassentamentos [...]
69
22
Compreende as áreas necessárias para a formação dos reservatórios e para a implantação da infraestrutura do
empreendimento. Os grupos domésticos da ADA constam como uma das condicionantes ambientais, no item
2.17 da LP nº 342/2010.
71
fluxo do rio. Eles anseiam que o assunto sobre a implantação de Belo Monte seja colocado na
pauta da Terra Rio + 20 (International Rivers, 2012).
Principais
Rio/ Potência Reservatório Principais causas do Metodologias
Período de Contexto
Barragem Instalada (km2) / movimentos conflito/ de gestão de
Estado implantação sociopolítico
(MW) Deslocados sociais consequências conflitos
para população
Os baixos
Movimento de valores das
resistência indenizações e a
formado forma arbitrária
Não houve
basicamente pela de seu
mediação na
organização estabelecimento; Autoritarismo
gestão dos
comunitária o deslocamento político (regime
conflitos, mas
local, compulsório e militar);
sim uma
preexistente à mal planejado conjuntura
pressão social
intervenção do da população desfavorável às
São sobre o
4.214/ Estado; a atingida; reivindicações
Sobradinho Francisco/ 1.050,3 1973 e 1978 governo, que
60.000 organização destruição de populares;
BA terminou
sindical era hábitos população não
alterando os
frágil; não houve culturais; participou
rumos que
atuação de desespero e efetivamente do
estavam
partidos insegurança processo de
sendo
políticos; gerados na reassentamento.
impostos pelo
influência ativa população frente
Estado.
da Igreja aos aspectos
Católica no final coercitivos de
do processo. atuação da
CHESF.
Plano de
Desocupação;
incorporação
da negociação
Emergência do Desalojamento
na gestão de
campesinato de pessoas com
Início do conflitos, com
como força foco principal
processo de a participação
social no
São abertura da população
organizada; descumprimento
Itaparica Francisco/ 1.479,6 1976 a 1988 843/ 40.000 política e atingida no
fortalecimento do cronograma
PE e BA consequente processo
do movimento das obras
transição decisório;
sindical de planejadas para
democrática. assinatura do
trabalhadores o
termo de
rurais. reassentamento.
compromisso
entre CHESF
e Pólo
Sindical.
74
Principais
Rio/ Potência Reservatório Principais causas do Metodologias
Período de Contexto
Barragem Instalada (km2) / movimentos conflito/ de gestão de
Estado implantação sociopolítico
(MW) Deslocados sociais consequências conflitos
para população
Elaboração
Mudanças na do PDRS do
paisagem, no Xingu pelo
comportamento governo em
das águas do rio conjunto com
Xingu e dos a população;
igarapés, na elaboração do
Movimento Pelo fauna e na Plano de
Implantação Desenvolvimento vegetação; Democracia: Atendimento
iniciada em da deslocamento empoderamento à População
ago/2011. Transamazônica compulsório da da população, Atingida pela
Xingu/ Início da 516/ 19.000 e do Xingu – população com sua Norte
Belo Monte 11.233
PA operação (previsão) MDTX; Igreja ribeirinha; consequente Energia;
comercial Católica; ONGs; aumento das inclusão no EIA/RIMA;
prevista para e o Sindicato dos pressões sobre processo avanço na
jan/2015. trabalhadores terras indígenas decisório. legislação
rurais. e seus recursos ambiental e
naturais; maior na gestão
pressão por pública;
serviços básicos, negociação e
decorrentes do participação
aumento popular no
populacional. processo
decisório.
Fonte: A autora.
Esse Plano prevê, por exemplo, a escolha, por parte da população atingida, da
melhor forma de compensação pelo deslocamento compulsório (indenização
em dinheiro ou reassentamento p.ex.). Já a mediação pode ser verificada tanto
em Itaparica quanto em Belo Monte, na ação dos sindicatos, que atuaram na
defesa dos direitos dos trabalhadores rurais, e na participação da Igreja em
defesa dos índios e da população ribeirinha. Em Belo Monte, pode-se citar,
ainda, a mediação realizada pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI) em
defesa dos interesses dos povos indígenas.
d) Comparando-se os três casos analisados, percebe-se, também, uma evolução na
legislação ambiental e nas políticas públicas relacionadas à implantação de
barragens. Cite-se, nesse sentido, importantes marcos legais como a Política
Nacional de Meio Ambiente, instituída pela Lei 6938/1981, as Resoluções
CONAMA nº 001/1986 e nº 237/1997, e a Constituição Federal de 1988.
Todos esses regramentos trouxeram importantes instrumentos para proteção do
meio ambiente e das pessoas atingidas por barragens. A exigência de
elaboração do EIA/RIMA como condição para obtenção do licenciamento
ambiental é um exemplo dessa evolução. À época da implantação das usinas de
Itaparica e Sobradinho, não havia a obrigatoriedade de se elaborar o
EIA/RIMA como pré-requisito para obtenção do licenciamento ambiental.
Esses estudos permitem que o Órgão Ambiental tenha o maior número de
informações possíveis sobre os impactos socioambientais que serão causados
pelo empreendimento. A partir dessas informações, o IBAMA apresenta um
conjunto de condicionantes para mitigação desses impactos, que devem ser
seguidas pelo empreendedor como pré-requisito para se obter a licença de
instalação, necessária ao andamento das obras. Em Belo Monte já houve a
elaboração do EIA/RIMA por parte do empreendedor, que, só obteve a
necessária Licença de Instalação após atender aos condicionantes estabelecidos
pelo IBAMA.
Tomando como base as variáveis de Deutsch (1973, apud ALMEIDA, 2003) para
definição dos conflitos, podemos analisar os conflitos decorrentes da implantação de usinas
hidrelétricas ocorridos nas três usinas selecionadas da seguinte maneira:
1. as características das partes no conflito: de um lado tem-se a população
atingida pela construção de grandes barragens, que é a parte mais vulnerável e
fragilizada, possuindo menos informações e menos capacidade de impor suas
77
23
Texto fornecido por Luis Carlos Ferreira via e-mail, em 2012.
80
UHE Sobradinho: 1973 e 1978 UHE Itaparica: 1976 a 1988 UHE Belo Monte: 2011 a 2015
Fonte: A autora.
Diante do exposto, observa-se que em Belo Monte houve, graças à nova legislação,
um avanço no atendimento aos interesses da população afetada pelo empreendimento. A
principal preocupação do governo federal, nesse sentido, foi exatamente a de evitar conflitos
decorrentes dos impactos na vida dos atingidos, como aqueles ocorridos na implantação de
projetos anteriores, como Sobradinho e Itaparica.
Em Sobradinho, os interesses dos atingidos foram negligenciados, e os
reassentamentos foram construídos “em cima da hora”, causando sérios transtornos à
população. Já em Belo Monte foram utilizadas técnicas de negociação e mediação, havendo a
81
CAP. 6 - CONCLUSÃO
Verifica-se que o objetivo geral deste trabalho foi alcançado, uma vez que a análise
dos conflitos do setor elétrico, por meio da utilização da metodologia do estudo de caso,
permitiu a realização do mapeamento desses conflitos, indicando os atores envolvidos, seus
interesses, preferências, estratégias e dilemas. A análise dos conflitos em usinas hidrelétricas
revela a realidade de exclusão política das populações atingidas por um lado e, por outro lado
o interesse das empresas privadas, do governo e de alguns membros da sociedade civil, que
defendem a expansão da geração de energia elétrica proveniente dos recursos hídricos.
Entretanto, os estudos de caso apresentados demonstram, também, uma evolução da
participação da população atingida no processo decisório, alcançada por meio da
democratização, que concedeu visibilidade aos conflitos, e do progresso da legislação que
rege a implantação de usinas hidrelétricas. Neste ponto, cabe ressaltar o lado positivo dos
conflitos, que tiveram a capacidade de promover a discussão sobre as questões sociais
relacionadas à construção de barragens, e a consequente melhora do tratamento concedido aos
atingidos.
Observa-se, no entanto, que grande parte dos conflitos socioambientais travados
atualmente em virtude da implantação de usinas hidrelétricas, são motivados por percepções e
referências baseadas nas experiências das grandes usinas instaladas nos anos 1970 e 1980,
antes da atual legislação ambiental, sob amparo de um governo autoritário e, por isso mesmo,
num momento de muita fragilidade da sociedade civil organizada. Para que tais referências
sejam atualizadas, devem ser consideradas as reais condições hoje asseguradas pela legislação
vigente, principalmente pelo controle social a que estão sujeitos os novos empreendimentos
(FERREIRA, não publicado).
O licenciamento ambiental é considerado o principal lócus para resolução dos
conflitos dessa natureza, tendo em vista que a elaboração do EIA/RIMA e a realização de
audiências públicas para avaliar seus resultados, permitem o levantamento da opinião pública
sobre o projeto, e a posterior elaboração de condicionantes ambientais pelo Órgão Ambiental.
Somente após o cumprimento desses condicionantes pelo empreendedor, que incluem
reassentamentos, desenvolvimento de infraestrutura, dentre outros aspectos ligados aos
impactos gerados pelo empreendimento, é que as obras podem ser iniciadas.
O uso de metodologias de apoio à resolução de conflitos tem o poder de auxiliar os
diferentes grupos sociais a se representar. Para empresários, tem conduzido a uma obrigação
83
de se voltar para a sociedade, permitindo a melhor identificação dos interesses nela presentes,
além de minimizar ou, até mesmo, evitar demoras e riscos, que inviabilizam a realização de
seus investimentos. Para a sociedade, cria-se um foro que permite identificar e defender os
diferentes interesses. Para o Estado, pode representar uma oportunidade de amadurecimento
da democratização e de transformação de políticas públicas.
A relação entre o conflito socioambiental e a criação de políticas públicas torna-se
clara, à medida que são analisados os avanços alcançados na legislação ambiental brasileira,
desde a época da implantação da UHE Sobradinho até a atualidade, representada pela
construção da UHE Belo Monte. A política ambiental brasileira, instituída pela Lei
6938/1981, e o advento da Constituição Federal de 1988, são exemplos claros de que a
explicitação dos conflitos socioambientais leva à formulação de políticas públicas mais
abrangentes e inclusivas.
A melhor forma de se resolverem os conflitos socioambientais é mediante a criação de
espaços públicos de participação que viabilizem a emancipação política da sociedade,
possibilitando sua efetiva responsabilização para a gestão ambiental no setor elétrico. A
resolução dos conflitos socioambientais decorrentes da implantação de usinas hidrelétricas
depende, portanto, do incentivo à educação ambiental, por meio da sensibilização dos
indivíduos e do engajamento coletivo a respeito das questões socioambientais circunscritas.
Assim, recomenda-se a realização de novos estudos a respeito dos métodos de apoio à
resolução de conflitos em usinas hidrelétricas, focalizando a educação ambiental como
principal aspecto incentivador para o aumento da participação e da inserção social no
processo decisório, tornando a prática da negociação mais justa e eficaz.
84
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