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FACULDADE DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS NEOLATINAS
CURSO DE MESTRADO
Rio de Janeiro
2017
2
Rio de Janeiro
2017
3
Examinada por:
_________________________________________________________________________
Presidente, Prof. Dr. Antonio Francisco de Andrade Júnior (PPGLEN/ UFRJ)
_________________________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Danielle de Almeida Menezes (UFRJ)
_________________________________________________________________________
Prof. Dr. Leandro da Silva Gomes Cristovao (CEFET/RJ)
_________________________________________________________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Mercedes Riveiro Quintans Sebold (PPGLEN/ UFRJ) - Suplente
________________________________________________________________________
Rio de Janeiro
2017
4
IN MEMORIAM
A minha avó Véra, por sempre
acreditar na minha capacidade e
demonstrar seu orgulho por mim.
AGRADECIMENTOS
7
A Deus por iluminar o meu caminho, proteger minha família, atender às minhas
orações e me sustentar sempre.
A Antonio Andrade pela paciência, confiança e apoio. Obrigada, de coração, pelos
ensinamentos e por mostrar-me que as dificuldades podem ser a todo momento superadas.
A meu marido Fabio, aos meus filhos Bernardo, Luísa e Helena, aos meus pais
Domingos e Vera, ao meu irmão Ricardo, às minhas cunhadas Ângela e Ane e a minha
prima Pia pelo carinho, força, afago nos momentos difíceis e compreensão pela minha
ausência. Obrigada por aturarem meu mau-humor, minhas inquietações e impaciência.
Às minhas amigas do coração Ana Paula, Vivian, Renata e Edjane e aos meus
famliares pelo incentivo e pelo respeito aos meus momentos de estudo.
Aos professores Miguel Ángel Zamorano Heras, Maria Aurora Consuelo Alfaro
Lagorio e Leticia Rebollo Couto pelas provocações e motivações. Em especial, agradeço à
professora Ana Paula Beato-Canato pela ajuda, pelo tempo disponibilizado e,
principalmente, pelo carinho.
Aos meus amigos de mestrado Danielle Olivieri, Elíria Fugazza, Carol Gandra,
Carol Luques, Carol Ecard, Victor Gomes, Jefferson Evaristo, Larissa Arruda, Priscila
Marinho, Júlia Pelajo pelo apoio e colaboração. A minha amiga Patrícia Araújo Fernandes
pelo ombro amigo nas horas complicadas, pelas broncas, pelos elogios, por estar sempre ao
meu lado ofereço a minha eterna gratidão.
A todos os meus alunos e ex-alunos, que me são fonte de energia, inspiração e
estímulo para a pesquisa.
Ao Programa de Pós-Graduação em Letras Neolatinas da UFRJ, pelo apoio,
infraestrutura e qualidade, deixo meu muito obrigada.
RESUMO
8
RESUMEN
9
ABSTRACT
10
This dissertation concerns the discussion about the stress and discourse conflicts
that emerged on the political and educational levels after the implementation of the
Municipal Decree Nº 31,187 from 10/06/2009 that sets the Program Rio de Janeiro Global
Child (Programa Rio Criança Global), that aims to increase the teaching of the English
language, consequently reducing the teaching of the Spanish language, prescribed as
mandatory by the Law 2,939, of 11/24/1999, in the field of the municipal system of public
education.For the purposes of this research we use, mainly, the studies of Foucault (1984,
1999, 2003, 2008, 2013) and Bakhtin (2003, 2010) as theoretical references from the
Discourse Analysis as well as the studies about argumentation developed by Fiorin (2016),
Kock (2009, 2011), Koch and Elias (2016) and Charaudeau (2008), for the study of the
statements taken from the corpora: (a) Municipal Decree Nº 31,187 from 10/06/2009; (b)
Newsletter E/SUBE/ n°17; (c) letter from the APEERJ to the Municipal Department of
Education of Rio de Janeiro; and (d) semi-structured interviews with Spanish teachers at SME-
RJ.The results of the analyses point out, on one hand, to the frequent mobilization of
argumentative strategies that reveal the critical positioning marked by the awareness of the
fading of linguistic plurality in the APEERJ utterances and on the other hand, positions
that, although they also have a critical nature, they are not able to build arguments that
question the voice acclaimed by the ideological forces that legitimate the place of the
English as the only language to be taught at school and frequently use narrative resources
on the elaboration of their utterances.
SUMÁRIO
11
INTRODUÇÃO................................................................................................................. 13
4. As Entrevistas ............................................................................................................... 92
INTRODUÇÃO
13
1
Segundo Foucault (2008) o conceito de governamentalidade caracteriza "o conjunto constituído pelas
instituições, procedimentos, análises e reflexões, os cálculos e as táticas que permitem exercer essa forma
bastante específica, embora muito complexa de poder que tem por alvo principal a população, por principal
forma de saber a economia e por instrumento técnico essencial os dispositivos de segurança. Em segundo
lugar, por ‘governamentalidade’ entendo a tendência, a linha de força que, em todo Ocidente, não parou de
conduzir, e desde há muito, para a preeminência desse tipo de poder que podemos chamar ‘governo’ sobre
todos os outros – soberania, disciplina – e que trouxe, por um lado, [e, por outro lado], o desenvolvimento
de toda uma série de saberes. Enfim, por ‘governamentalidade’, creio que se deveria entender o processo, ou
antes, o resultado do processo pelo qual o Estado de justiça da Idade Média, que nos séculos XV e XVI se
tornou o Estado administrativo, viu-se pouco a pouco 'governamentalizado' " (FOUCAULT, 2008a, p. 143-
144).
14
2
O texto completo da Lei 11.161 está no Anexo 01.
3
O texto completo da Medida Provisória 746 se encontra no Anexo 02.
4
Vide texto completo da Lei Estadual 2.447 no Anexo 03.
5
A íntegra do texto da Lei Ordinária Municipal nº 2.939 está no Anexo 04.
6
Vide texto completo do Decreto 31.187 no Anexo 05.
15
7
Vide texto completo da Circular E/SUBE/n°17 no Anexo 06.
8
Ideologias linguísticas são sistemas de ideias que articulam noções da linguagem, as línguas, a fala e/ou a
comunicação com formações culturais, políticas e/ou sociais específicas. As ideologias se associam às
práticas e às ideias naturalizadoras e normalizadoras de uma ordem extralinguística que legitimam um tipo
determinado de saber que serve de suporte para o exercício do poder e autoridade (DEL VALLE, 2007, p.20-
22)
16
10
A íntegra das entrevistas está no Anexo 08.
17
11
Segundo Delors, a globalização pode ser entendida como “um movimento em que todas as economias do
mundo se tornaram dependentes dos movimentos de um conjunto mais ou menos importante de capitais,
transitando rapidamente de um lugar para outro” (DELORS, 2000, p. 37).
12
Segundo Spolsky e Shohamy, as crenças levam à constiuição de uma “ideologia consensual”, o que pode
levar à atribuição de valor positvo e prestígio a uma língua e a determinados usos linguísticos (Apud SILVA,
2014, p. 04).
18
I FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Existem momentos na vida onde a questão de saber se se pode pensar diferentemente do que se pensa,
13
De acordo com Foucault (2008b, p 43), "No caso em que se puder descrever, entre um certo número de
enunciados, semelhante sistema de dispersão, e no caso em que entre os objetos, os tipos de enunciação, os
conceitos, as escolhas temáticas, se puder definir uma regularidade (uma ordem, correlações, posições e
funcionamentos, transformações), diremos, por convenção, que se trata de uma formação discursiva"
(FOUCAULT, 2008b , p. 43).
14
Segundo Foucault, a verdade, ou melhor, a vontade de verdade, é um regime instituído por um processo
coercitivo, mas também produtivo, existente na relação saber e poder. Portanto, há em todo enunciado uma
“vontade de verdade”, fato que, pela oposição verdadeiro e falso, legitima uma única como verdadeira
(FOUCAULT, 2013).
15
Segundo Lopes e Macedo, as disciplinas que organizam um currículo "são construções sociais que
atendem a determinadas finalidades da educação e, por isso, reúnem sujeitos em determinados territórios,
sustentam e são sustentadas por relações de poder que produzem saberes” (LOPES e MACEDO, 2011, p.
121).
19
1. Linguagem e Discurso
Em outras palavras, enunciado "é uma proposição ou uma frase considerada desde
o ponto de vista de suas condições de existência" (CASTRO, 2009, p.136), ou seja, é uma
prática social, um acontecimento que não se resume à estreita relação entre significante e
significado, senão ao modo como os signos se articulam em seu meio em um determinado
momento histórico, político, econômico e social.
O conjunto de enunciados, desde que apoiados em uma mesma formação
discursiva, é denominado por Foucault como discurso16. A expressão formação discursiva
(FD) foi utilizada pelo filósofo para referir-se ao conjunto de elementos que não possuem
uma origem comum, um a priori histórico, mas que estão conectados, apesar da dispersão,
por regras de formação, por condições que possibilitam seu aparecimento em uma
determinada época. Nas palavras de Foucault:
16
Segundo Foucault, discurso é "um conjunto de enunciados, na medida em que se apoiem na mesma
formação discursiva; ele não forma uma unidade retórica ou formal, indefinidamente repetível e cujo
aparecimento ou utilização poderíamos assinalar (e explicar, se for o caso) na história; é constituído de um
número limitado de enunciados para os quais podemos definir um conjunto de condições de existência"
(FOUCAULT, 2008a, p. 132-133).
21
Cabe ressaltar que os saberes são, concomitantemente, frutos das relações de poder,
"como as necessidades de governo da população ou da natureza da Modernidade e
instituem relações de poder na medida em que autorizam determinados grupos e seus
saberes e excluem outros" (GARCIA, 2010b, p. 233).
Dito isto, nas palavras de Foucault, o objetivo de analisar o discurso como
dispositivo é:
2. Controle Discursivo
parafrástico, representa o retorno aos mesmos espaços do dizer, ainda que produzidos com
diferentes formulações. O comentário estaria na ordem da estabilização dos dizeres, ou
seja, na reprodução e manutenção das "verdades" já antes estabelecidas pelo grupo social.
Estas considerações são de grande relevância para esta investigação, uma vez que
analisaremos enunciados referentes à seleção das línguas estrangeiras que devem ser
promovidas e ensinadas nas escolas da rede municipal do Rio de Janeiro, em especial a
Língua Espanhola. Entendemos que tais enunciados se produzem parafrasticamente e
materializam um conjunto de pensamentos provenientes das relações de poder entre
sujeitos constituídos historicamente que defendem a legitimação de suas ideias, de suas
vontades de verdade de acordo com seus interesses.
atravessam e lhe atribuem um caráter heterogêneo. Cabe ressaltar que sendo o discurso
heterogêneo, podemos dizer que o sujeito também o é, uma vez que "atrás da linearidade
'da emissão de uma única voz', se faz ouvir uma 'polifonia' [...] o discurso é
constitutivamente atravessado pelo discurso do Outro" (AUTHIER-REVUZ, 2004, p. 69).
Como dito no parágrafo anterior, todo discurso é dialógico, pois é direcionado pela
memória discursiva, também chamada interdiscurso18 (ORLANDI, 2013, p. 31), pelos
vestígios do "já dito", pela articulação de múltiplas vozes sociais. Além disso, todo
discurso é orientado para a resposta. Em um ato comunicativo, os enunciados estabelecem
relações de sentido entre sujeitos que igualmente desempenham um papel ativo em uma
interação, pois a atividade de enunciação permite que o enunciador ressignifique o sentido
do dito e coenunciador assuma sobre o discurso uma postura ativa de resposta. A
assimilação dos discursos alheios ocorre de diferentes maneiras, pois sempre haverá
posicionamentos em concordância ou discordância, complementação e adaptação em
relação ao já-dito, pois, a palavra se constitui em um espaço de discussão, uma arena de
luta onde os valores sociais e ideológicos, materializados nas vozes dos sujeitos, se
entrecruzam e se confrontam para a produção de sentidos em um lugar e momento
determinados historicamente. De acordo com Bakthin:
O enunciado está repleto dos ecos e lembranças de outros enunciados, aos quais
está vinculado no interior de uma esfera comum da comunicação verbal. O
enunciado deve ser considerado acima de tudo como uma resposta a enunciados
anteriores dentro de uma dada esfera: refuta-os, confirma-os, completa-os,
baseia-se neles, supõe-nos conhecidos e, de um modo ou de outro, conta com
eles (BAKHTIN, 2003, p. 316).
18
Retomaremos o conceito de interdiscurso em outro momento mais específico.
27
19
Segundo Chauí (1997), o neoliberalismo é um projeto econômico e político que ataca o chamado Estado-
Providência ou Estado de Bem-Estar social-democrata ao afirmar que esse tipo de Estado destrói a liberdade
dos cidadãos e a competição sem as quais não há prosperidade. Em outras palavras, o neoliberalismo pode
ser entendido como uma ideologia política e econômica capitalista que defende a liberdade de mercado e a
não intervenção estatal sobre a economia.
28
II CONTEXTUALIZANDO A QUESTÃO
a apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que eles trazem consigo.
O Programa Rio Criança Global (PRCG)20 foi criado com a finalidade de tornar
"fluentes" em língua inglesa os alunos da rede municipal do Rio de Janeiro. As
justificativas dadas para a implementação do PRCG foram as necessidades da atual
sociedade globalizada e os eventos mundiais que ocorreram no Rio de Janeiro: a Copa do
Mundo de Futebol de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Momentos considerados
ímpares para o desenvolvimento econômico deste município. De acordo com o site
Rioeduca da prefeitura desta cidade:
20
Vide anexo 05.
21
Advertimos aos leitores que a página web <cidadeolimpica.com.br>, que explicava o porquê da criação
do PRCG, foi retirada de circulação no ano de 2014:
30
oferecidas (Espanhol, Francês e Inglês) eram um agravante adicional, pois não permitiam
uma concentração no estudo de uma única língua do sexto ao nono ano. A solução para
este problema foi a escolha de uma única língua estrangeira: o inglês. Como consequência,
as línguas espanhola e francesa foram retiradas da grade curricular do Ensino Fundamental
II22. De acordo com a página oficial da Prefeitura desta cidade, "o Programa Rio Criança
Global define como prioridade o ensino do inglês como língua estrangeira e tem como
objetivo a universalização desta língua nas escolas municipais até 2016" (RIO DE
JANEIRO, 2010). O PRCG atende a alunos do primeiro ao nono ano e seu objetivo, de
acordo com o discurso governamental, é permitir "maior acesso às informações globais via
web e também maior interação com o público esperado para os Jogos Rio 2016: turistas e
delegações" (Rio de Janeiro, 2010).
Este Programa foi implementado no Ensino Fundamental I e, gradativamente,
ampliado para todo os anos do Ensino Fundamental II:
Art. 1.º
http://www.cidadeolimpica.com.br/wp-content/themes/cidadeolimpica_v3/projetos/EOM/pt/projeto-
riocriancaglobal.php
22
O texto com a grade curricular oficial se encontra no Anexo 09.
31
Art. 2.º
O PRCG é considerado uma política pública, segundo Hofling (2001), por ser de
responsabilidade do Estado sua formulação, implementação e manutenção. É também
considerado uma política social por visar a diminuição das desigualdades sociais advindas
dos processos socioeconômicos. E, finalmente, de política educacional, por se constituir,
23
O artigo 190 da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro proíbe o desvio de função dos servidores
municipais:
"Art. 190 - É vedado o desvio de função, assim entendido o exercício de cargo ou emprego estranho àquele
ocupado pelo servidor.
Parágrafo único - Constitui falta grave do servidor responsável por órgão de qualquer hierarquia a permissão
do desvio de função por servidor sob sua subordinação, ou sua tolerância" (RIO DE JANEIRO, 2010b).
32
segundo Garcia (2010) por um conjunto de direções, princípios e políticas que devem guiar
o trabalho docente com o objetivo de capacitar os alunos em língua inglesa para a ação e
participação no mundo. Em conjunto, todas as políticas mencionadas, produzem "efeitos
variados sobre a realidade, os sujeitos, as relações, os comportamentos e as línguas"
(SEVERO, 2013, p. 458).
De acordo com os estudos de Collares; Moysés; Geraldi (1999), podemos considerar
o PRCG como uma política pública que faz parte de um plano de governo que não costuma
ser divulgado no processo eleitoral. Dessa forma, entendemos que apenas alguns sujeitos
se responsabilizam pelas definições das necessidades sociais e, baseados nisso, "elegem
prioridades e elaboram programas" (COLLARES; MOYSÉS; GERALDI, p. 214, 1999)
com os quais pretendem submeter à população, que nem sempre assume como suas tais
definições.
Além disso, segundo os autores supracitados, os programas educacionais refletem
uma política de descontinuidade que se caracteriza-se pelo eterno recomeçar, pois a cada
mudança de gestão, projetos são interrompidos sem consulta, escuta e avaliação prévia
entre os sujeitos envolvidos. Cabe ressaltar que a descontinuidade:
Nesse sentido, podemos afirmar que o PRCG ao ampliar o ensino da língua inglesa
para todos os anos do ensino fundamental rompe com as diretrizes que regulavam o ensino
de línguas estrangeiras até o momento de sua implementação. No entanto, essa ruptura e
descontinuidade das diretrizes adotadas pela gestão anterior podem ser entendidas como
uma prática comum que, apesar de um aparente paradoxo, se revela contínua no que diz
respeito à manutenção do poder baseada no saber.
24
"O Banco Mundial é uma organização internacional que surgiu da Conferência de Bretton
Woods (1944) para atender às necessidades de financiamento da reconstrução dos países
devastados pela Segunda Guerra Mundial. O nome oficial da instituição criada em Bretton
Woods era 'Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento' (BIRD). A instituição,
35
(BRASIL, 2006, p. 96), fato que evidencia a contradição existente entre os discursos
provenientes das esferas políticas e educacionais.
Segundo Lopes (2008), as reformas educacionais são marcadas por mudanças na
organização curricular através de documentos que prescrevem não somente as maneiras de
abordar os conteúdos, como também as disciplinas que são entendidas como válidas e
legítimas para serem ensinadas. O objetivo seria a formação de "trabalhadores com as altas
habilidades e a capacidade de inovação entendidas como essenciais para sustentar os
modelos tecnológicos de produção vigentes" (LOPES, 2008, p. 20).
A explicação para as reformas, de acordo com Lopes (2008), estaria na:
Assim, só aparece aos nossos olhos uma verdade que seria de riqueza,
fecundidade, força doce e insidiosamente universal. E ignoramos, em
contrapartida, a vontade de verdade, como prodigiosa maquinaria destinada a
excluir todos aqueles que ponto por ponto, em nossa história procuraram
contornar essa vontade de verdade e recolocá-la em questão contra a verdade, lá
justamente onde a verdade assume a tarefa de justificar a interdição
(FOUCAULT, 2013a, p 19-20).
27
Segundo Altenhofen e Broch (2011) e Broch (2014), o plurilinguismo designa as competências que um
sujeito possui em mais de uma língua, ou seja, uma "postura linguística plural" (ALTENHOFEN e BROCH,
2011, p. 17), definição que vai além da ideia de diversidade linguística, isto é, a coexistência de diferentes
línguas na sociedade.
39
28
Nas palavras de Lagares e Savedra, com base nos estudos de Calvet, uma política linguística pode ser
entendida como "um conjunto de decisões tomadas pelo poder público a respeito de quais línguas serão
fomentadas, ensinadas ou eventualmente reprimidas e eliminadas; de quais funções as línguas terão ou
deveriam ter, de que espaços sociais ocuparão" (LAGARES; SAVEDRA, 2012, p.15).
40
de que a elaboração de uma política linguística pode ser feita por qualquer grupo, porém,
“apenas o Estado tem o poder e os meios de passar ao estágio do planejamento, de pôr em
prática suas escolhas políticas” (CALVET, 2007, p. 20-21).
Apesar de esta investigação estar centrada no planejamento linguístico do ensino
fundamental realizado pela SME-RJ entre os anos de 2010 e 2016, não poderíamos deixar
de destacar que o Governo Federal, através da Medida Provisória 746/2016 está, de igual
maneira, retirando a língua espanhola do ensino médio. O documento propõe a
obrigatoriedade do ensino da língua inglesa no ensino médio e, para tanto, revoga a "Lei
Do Espanhol" , Lei 11.161, de 5 de agosto de 2005, que obriga a oferta da língua
espanhola no Ensino Médio.
Em suma, entendemos o PRCG - e também a Medida Provisória 746/2016 - como
exemplos de decisões tomadas e implementadas no sentido de modo hierarquizante e
vertical, no qual os agentes, representados pelas instâncias governamentais, fazem valer a
sua escolha, confirmando um gesto de cunho político hegemônico, e demonstram sua
vontade de se autoafirmarem e marcarem seus posicionamentos, independentemente do
grau de sucesso que tenham na realização de seus atos (RAJAGOPALAN, 2013, p.34-35).
Embora estejamos destacando o poder governamental como repressor e
controlador, faz-se imprescindível recordar as reflexões foucaultianas que revelam que o
exercício do poder não possui um único sentido: o de cima para baixo, o macro. De acordo
com o filósofo (1984), o poder não pertence a um único grupo, instituição ou ao Estado. O
poder se irradia, se exerce em forma de micropoderes que agem também nas relações mais
horizontalizadas (governo dos outros e/ou governo de si mesmo) e que podem sustentar e
confirmar o poder advindo das instâncias de autoridade, caso o saber compartilhado seja
considerado verdadeiro pela sociedade. Dessa forma, os macro e micropoderes são
indissociáveis, uma vez que nos governam e nos fazem governar de acordo com as práticas
sociais e vontades de verdade.
Sendo assim, a garantia do êxito do PRCG não pode estar relacionada apenas ao
poder exercido pelas instâncias governamentais, uma vez que os agentes responsáveis pela
41
2.3. A Glotopolítica
Nesta investigação, dada a amplitude do tema que nos cerca, nos concentraremos
nos estudos glotopolíticos que se dedicam a refletir sobre as línguas inglesa e espanhola
como par hegemônico no contexto educacional na atualidade.
Tendo este trabalho um viés foucaultiano, cabe-nos esclarecer que Foucault era
cauteloso ao usar o termo ideologia para explicar a história do saber e o exercício do poder.
Nas palavras do autor, a noção de ideologia é dificilmente utilizável pelas seguintes razões:
em relação constante com seu meio e evoluem em reação aos estímulos provenientes deste
meio29” (CALVET, 1999, p. 102. Tradução livre).
O sistema ecolinguístico “está constituído pela organização social, pela dimensão
dos grupos de falantes, pelas funções ocupadas pelas línguas, pelo papel social de seus
falantes, pelo grau de plurilinguismo deles30”, etc. (CALVET, 1999, p. 102.Tradução
livre), fatores que influenciam a forma e o status quo das línguas. Segundo este modelo,
cerca de 6.700 línguas31 se organizariam através de uma distribuição hierárquica
determinada por relações de força. O inglês ocuparia o primeiro nível, sendo a língua
hipercentral, e o espanhol ocuparia o segundo nível, por este motivo seria a língua
supercentral, juntamente com o português, francês, alemão, entre outras.
Segundo Calvet (1999), o inglês é uma língua hipercentral, pois seus falantes têm
forte tendência monolíngue. Ao redor da língua inglesa gravitam dezenas de línguas - as
supercentrais - , cujos falantes, quando bilíngues, falam uma língua também supercentral
ou inglês. Em torno das supercentrais gravitam as línguas centrais em torno das quais as
línguas periféricas também se movimentam.
Este modelo nos permite compreender os mecanismos adotados para a
implementação de políticas e planejamentos linguísticos neste país. No sistema
educacional nacional o inglês desempenha o papel de língua hipercentral. A promulgação
das Leis Federal nº 11.161/05, Estadual nº 2.447/95 e Municipal nº 2.939/99, que obrigam
o ensino de espanhol, se constituem em um ato de intervenção linguística que por um lado
opera no sentido de reafirmação das matrizes ibéricas e das relações interamericanas que
aproximam as relações linguisticas e culturais do português e do espanhol e, por outro,
ratificam o cunho mercadológico do ensino do par hegemônico inglês/espanhol como
línguas estrangeiras na atualidade.
No entanto, a grande questão é: por quê? Por que as línguas inglesa e espanhola são
as únicas que parecem justificar-se como essenciais no currículo escolar? Quais práticas
discursivas sustentam e legitimam as posições destas línguas como hiper e supercentral?
29
Do original: "les langues, equivalentes aux espèces, s’organisent en populations qui sont en relations
constantes avec leur milieu, et evoluent en réaction aux stimulli parvenant de ce milieu”.
30
Do original: "est constitué par l’organisation sociale, la taille des groupes de locuteurs, les fonctions des
langues, le rôle social de leurs locuteurs, leur degré de plurilinguisme, etc."
31
Segundo o sociolinguista Louis-Jean Calvet existem por volta de 6700 línguas faladas hoje em todo o
mundo (CALVET, 1999)
45
NEGRI, 2010, p. 330). Esta exclusividade é qualificada pelos estudiosos como tirânica "ao
não se submeterem às leis internacionais, dominando a ordem global", em uma referência à
intervenção militar feita ao Iraque, o que ecoa os modos de atuação do imperialismo
clássico (HARDT e NEGRI, 2005, p. 92).
Tal fato caracteriza um "neoimperialismo", expressão usada pelo linguista Robert
Phillipson (2008; 2013), ou seja, uma política de domínio que inclui não apenas o
territorial, o militar, o econômico, mas também o cultural, baseados na cooperação ou no
silenciamento de outras nações que legitimam muitas vezes o uso da força em nome da
paz. Neste contexto, o exercício do bipoder está fundamentado no domínio dos saberes, e
na vontade de verdade dos grupos dominantes (nações ricas, instituições financeiras
internacionais e supranacionais), mas a força bélica não é descartada e, se necessário, é
usada para manter a ordem e os interesses globais.
Recordemos a frase de Nebrija, "a língua sempre foi companheira do império"
(NEBRIJA, 1492), não só no sentido imperialista, mas também como companheira do
"neoimperialismo", isto é, como a língua do capitalismo contemporâneo que serve aos
interesses do mundo corporativo e dos governos por ele influenciados ( SKUTNABB e
PHILLIPSON, 2013).
O inglês mundial "pertence a todas as pessoas (do mundo) que falam inglês, mas
ele não é a língua nativa de ninguém” (RAJAGOPALAN, 2006, p. 99), pois o idioma não
está vinculado a nenhum Estado-nação. Não é o inglês britânico ou o americano que é o
falado aqui ou acolá. Segundo Ortiz, o preço pago pela hipercentralidade da língua inglesa
é a sua deformação. Mundializado, se desprende de suas raízes, passa a desterritorializado
e passível de ser camaleonicamente apropriado, re-significado e re-entoado, ratificando
que a homogeneidade linguística é uma ilusão ideológica (ORTIZ, 2004).
Em concordância com Ortiz, adotaremos o termo "inglês mundial". Acreditamos
que o termo "inglês global" deve ficar reservado para designar processos econômicos e
tecnológicos que ocorrem devido à globalização. Tampouco faremos uso da expressão
"inglês internacional", pois essa concepção nos remete a um idioma íntegro que circula
entre as nações e não é o caso, como explicitado no primeiro parágrafo (ORTIZ, 2004,
p.09)
48
A Inglaterra ganha quase 1 bilhão e 300 milhões de libras com o ensino de inglês e
10 bilhões de libras por ano com exportações de itens a ele relacionados (KINOCK, 2006).
Este exemplo legitima o caráter mercadológico que permeia o ensino, não somente do
inglês, mas das línguas estrangeiras na contemporaneidade. É importante destacar que a
disseminação da língua inglesa promove a busca por outras mercadorias linguísticas
(GRADDOL, 2006), uma vez que a aprendizagem de outros idiomas reflete a crença de
inserção no mercado de trabalho e de ascensão social e, por consequência, gera lucros para
as indústrias de ensino de línguas, o que caracteriza o processo de comoditização do
ensino de línguas e o status neoliberal da educação, temática que discutiremos mais
adiante.
Embora o inglês esteja desterritorializado e não seja imposto por nenhum Estado-
nação, ainda se faz presente como imperialista no imaginário dos sujeitos. Segundo Cox e
Assis-Peterson é do conhecimento de todos “que o alcance de nossa voz terá a amplitude
da língua que falamos. Isso nos coloca diante de um imperativo: ‘Aprenda inglês’!” (COX
e ASSIS-PETERSON, 2007, p. 09-10) em uma referência à expansão do inglês em escala
planetária e à globalização. Sendo assim, aprender inglês, atualmente, é ter acesso aos
49
O Pan-hispanismo, segundo Del Valle (2007), se refere aos esforços feitos pela
Espanha na promoção internacional da língua espanhola através da expansão de uma
consciência comunitária, uma ideologia linguística que reforça o sentimento de lealdade à
língua e às visões de identidade coletiva entre todos os países hispanofalantes.
Segundo o linguista, o mundo globalizado e as perspectivas econômicas positivas,
advindas de laços e investimentos empresariais em outros países, propiciaram o surgimento
da Espanha como controladora e divulgadora do idioma e da cultura hispânicos. Para tanto,
não mede esforços para desenvolver uma consciência comunitária que possa ser
compartilhada com as antigas colônias, fundamentando-se na hispanofonia, uma ideologia
linguística que concebe o idioma como a materialização de uma ordem coletiva: ordem
que deve ser conseguida através da afinidade cultural, psicológica, afetiva e do sentimento
de lealdade à "língua". Em outras palavras, um sistema de ideias formados por noções
linguísticas e visões da identidade coletiva que deve ser entendido no contexto do
desenvolvimento político e econômico da Espanha. Essa ideologia faz parecer a presença
do capital espanhol natural e legítimo ao progresso mascarando a versão pós-moderna da
velha relação colonial.
É importante ressaltar que o controle e a promoção da língua espanhola foram
autolegitimados pela Real Academia Española - RAE - e pelo Instituto Cervantes e para
que a língua se internacionalizasse foi necessário separá-la dos vínculos culturais e
nacionais, torná-la pan-hispânica. Esta desassociação entre língua e cultura concede,
segundo as instituições espanholas, um caráter neutro ao idioma. Contudo, acrescentamos
que por trás dessa aparente unidade e neutralidade, as instituições espanholas apresentam a
variedade central peninsular em suas produções (dicionários, aulas virtuais) e justificam a
escolha por não estar em interação com outras línguas, ter menos elementos
diferenciadores a respeito da "língua comum", ter suficiente importância demográfica e
apresentar grande projeção cultural através dos meios de comunicação a toda comunidade
hispanofalante (MAR-MOLINERO, 2013, p.171).
50
32
A expressão comunidade imaginada foi cunhada pelo cientista político e historiador Benedict Anderson.
Segundo o autor, uma comunidade imaginada é independente das explorações e desigualdades que existem
dentro de seus limites territoriais, dessa forma, é interpretada como uma grande fraternidade constituída por
pessoas que se percebem como integrantes de um determinado grupo que defende os mesmos interesses e
possuem o mesmo objetivo (ANDERSON, 2005)
51
33
As Orientações Curriculares para o Ensino Médio criticam a adoção da ideia de espanhol estândar, que
seria um idioma estrangeiro a ser ensinado sem favorecer os "sotaques locais, as construções e o léxico
peculiares de sua região e cultura, em nome de privilegiar esse Espanhol que poderia, em tese, ser entendido
onde quer que seja" (BRASIL, 2006, p. 134).
52
dos discursos, dos domínios de objeto, etc." (FOUCAULT, 1984, p. 07). Cabe ressaltar que
nosso foco não é a ordem cronológica dos fatos, mas as práticas instituídas pelas relações
de poder. Nas palavras de Orlandi:
A história está ligada a práticas e não ao tempo em si. Ela se organiza tendo
como parâmetro as relações de poder e de sentidos, e não a cronologia: não é o
tempo cronológico que organiza a história, mas a relação com o poder (a
política). (ORLANDI, 1990, p.42)
de língua inglesa e língua francesa são criadas por meio da "Resolução de Consulta da
Mesa do Desembargo do Paço de 14 de julho de 1809" 36, dando início ao processo de
institucionalização de tais línguas.
Esta decisão política marca a primeira de uma série de rupturas que constituem a
memória discursiva sobre o ensino de línguas no Brasil, ao passar o status das línguas
inglesa e francesa de recomendadas a regulamentadas institucionalmente. Dessa forma,
novos dizeres são instaurados tanto no âmbito pedagógico (metodologias de ensino,
material didático, etc.) quanto no social, político e econômico. De acordo com a lei, ambas
as línguas eram de grande utilidade e, por esta razão, suas escolhas podem ser atribuídas a
uma política de Estado, uma vez que o contexto de produção desse discurso governamental
está inserido na época da invasão francesa a Portugal, a vinda e o estabelecimento da
Família Real Portuguesa no Brasil, com o apoio da Inglaterra.
A criação do Colégio Pedro II, em 1837, e a reforma de 1855, que dividia o ensino
em dois ciclos37, impulsionaram a ampliação do ensino das línguas estrangeiras modernas.
E, assim, o alemão e o italiano, juntamente com o inglês e o francês foram incluídos no
currículo da escola secundária. Embora a língua espanhola não apareça na grade curricular,
seu ensino passa a ser oferecido como optativo em 1919, após a aprovação do professor
Antenor Nascentes, através de concurso público com defesa de tese, para a cátedra de
espanhol (FREITAS, 2011). Em 1925, o professor foi transferido para a cadeira de
português (ESCRAGNOLLE DÓRIA apud FREITAS, 2011) e a língua espanhola
enfrentou um período de esquecimento até o ano de 1942.
Em 1942, a Reforma de Capanema desempenhou um importante papel no ensino de
línguas estrangeiras no Brasil. Apesar de polêmica por ser autoritária, por minimizar a
diversidade linguística ao promover apenas o francês, o inglês e o espanhol e silenciar as
demais línguas, não se pode negar que foi "a reforma que mais deu importância ao ensino
36
O texto completo com a Resolução de Consulta da Mesa do Desembargo do Paço de 14 de julho de 1809
está disponível no site: http://www.camara.leg.br/Internet/InfDoc/conteudo/Colecoes/Legislacao/Legimp-
A4_8.pdf
37
O regulamento para o Colégio Pedro II, aprovado pelo Decreto n. o 1.556, de 17 de fevereiro de 1855
(disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-1556-17-fevereiro-1855-
558426-publicacaooriginal-79672-pe.html), estabelecia um ciclo de ensino com duração de quatro anos e o
outro com duração de três anos. As línguas estrangeiras ensinadas durante os sete anos de estudos eram:
latim, francês, inglês, grego, alemão e italiano. Os alunos que cumprissem os dois ciclos recebiam o título de
Bacharel em Letras e, assim, adquiriam o direito de fazer matrícula em qualquer instituição de ensino
superior.
54
38
Texto disponível em: http://www.helb.org.br/index.php/linha-do-tempo/1035-1961/32-ldb-de-1961
55
III METODOLOGIA
1. Monumentos e Arquivo
59
finalidade de não mais detectar a origem, o progresso, a continuidade histórica das ideias,
mas a existência das interrupções que transformam os sentidos antes instaurados. Para
tanto, faz-se necessária uma investigação minuciosa do documento para que se transforme
em monumento. Nas palavras de Foucault:
[...] a história mudou sua posição acerca do documento: ela considera como sua
tarefa primordial, não interpretá-lo, não determinar se diz a verdade, nem qual
seu valor expressivo, mas sim trabalhá-lo no seu interior e elaborá-lo: ela o
organiza, recorta, distribui, ordena e reparte em níveis, estabelece séries,
distingue o que é pertinente e não é, identifica elementos, define unidades,
descreve relações (FOUCAULT, 2008a , p. 07).
Isto implica dizer que a análise aqui proposta possui o objetivo de desvelar o
documento, quer dizer, de ultrapassar a superficialidade dos discursos na busca de
unidades, séries, contradições que possam provocar descontinuidades, rupturas dos
paradigmas até então estabelecidos e transmitidos historicamente sobre o ensino de línguas
estrangeiras para, assim, transformá-los em monumentos.
De acordo com Foucault, ao convertermos os documentos em monumentos os
discursos passam a ser descritos "como práticas específicas no elemento do arquivo"
(FOUCAULT, 2008a, p.174). O signo arquivo, em seu sentido denotativo, é compreendido
como termo que se refere ao:
Entretanto, para Foucault (2008a), o arquivo não é apenas uma totalidade de textos
que refletem a memória social coletiva, não é um somatório de textos inertes acumulados
por uma sociedade que aguarda o "milagre eventual da sua ressurreição" (FOUCAULT,
2008a , p. 147). O arquivo é um jogo de regras que permite o surgimento, a transformação
ou o desaparecimento de enunciados. "É a lei do que pode ser dito", não no sentido da
interdição, mas da possibilidade da "multiplicidade dos enunciados" (FOUCAULT, 2008a,
p.147). Operar com a noção de arquivo é considerar que os enunciados são mutáveis de
significação, é compreender que as condições históricas que viabilizam tanto a formação
como a permanência, a transformação e o desaparecimento desses enunciados permitem
61
que os monumentos não tenham uma única interpretação, senão várias leituras. Segundo
Foucault:
São todos esses sistemas de enunciados (acontecimentos de um lado, coisas de
outro) que proponho chamar de arquivo [...] o arquivo define um nível
particular: o de uma prática que faz surgir uma multiplicidade de enunciados
[...] ele faz aparecerem as regras de uma prática subsistirem e, ao mesmo tempo,
se modificarem regularmente. É o sistema geral da formação e da transformação
dos enunciados (FOUCAULT, 2008a, p. 146-147).
enunciados pela perspectiva arqueológica não busca a origem dos enunciados, senão seus
acúmulos.
Nesse contexto, Foucault, ao ampliar o campo de investigação e incluir o estudo
das práticas não discursivas na análise dos enunciados, propõe uma análise do "saber em
termos de estratégia e táticas do poder" (CASTRO, 2009, p. 185). Dessa forma, o método
arqueológico passa a englobar o genealógico, ou seja, a análise deve considerar a
enunciador no discurso. Tais marcas podem ser observadas em função das formações
imaginárias que temos, ou seja, a imagem que se tem de um aluno, um docente, etc. A
partir desse momento, construiremos um objeto discursivo, ou seja, analisaremos o que é
dito no discurso presente no corpus e "o que é dito em outros, em outras condições,
afetados por diferentes memórias discursivas" (ORLANDI, 2013, p. 65). Por último, nos
aprofundaremos um pouco mais e atingiremos o processo discursivo, isto é, observaremos
o modo como a história faz parte dos discursos, uma vez que estes refletem sentidos "já
realizados, imaginados e possíveis" (ORLANDI, 2013, p. 67) através de processos como
paráfrase, polissemia, o (não) dito. Dessa forma, encontraremos gestos de interpretação
construídos na historicidade (trama de sentidos no texto) e poderemos "explicitar o modo
de constituição dos sujeitos e de produção dos sentidos (ORLANDI, 2013, p. 68) nas
relações de poder.
É pensando no processo discursivo que envolve as formas de inscrição do histórico,
do político e do ideológico nos discursos que perfazem as políticas de ensino de línguas
estrangeiras que sentimos a necessidade de empreender a análise linguístico-enunciativa
dos corpora, centrando-nos na discussão sobre a presença e produtividade, no interior
desse arquivo dos principais tipos de argumentos categorizados por Fiorin (2016, p. 112), a
saber: a) os quase lógicos; b) os que se fundamentam na estrutura do real; c) os que
fundam a estrutura do real. Em seguida, analisaremos os mecanismos argumentativos -
elementos linguísticos que mostram a força argumentativa dos enunciados - (KOCH, 2011,
2016; CHARAUDEAU, 2016), utilizados para a produção do efeito de persuasão.
É necessário destacar que, embora toda a análise esteja sendo pensada sob o viés
discursivo, cada objeto de estudo merecerá uma forma singular de abordagem, uma vez
que nosso corpora é constituído por distintos gêneros.
\
2. A Constituição do Arquivo
que designa instâncias de produção discursiva dentro das quais se pode identificar um
conjunto de gêneros caracterizados por "práticas ou rotinas comunicativas
institucionalizadas" (MARCUSCHI, 2003. p. 24).
Os domínios discursivos a serem analisados neste trabalho se referem, segundo a
classificação adotada por Marcuschi (2008), aos discursos: jurídico, interpessoal e
instrucional. Tais domínios discursivos englobam “tipos relativamente estáveis de
enunciados” (BAKHTIN, 2003, p. 262), denominados por Bakhtin como gêneros
discursivos, que são mobilizados de acordo com cada situação de interação verbal, que
deve considerar os objetivos visados, o lugar social e o papel dos participantes. Para
Maingueneau (2008), os gêneros discursivos são dispositivos de comunicação
determinados pela condição sócio-histórica que torna possível seu aparecimento, ou seja,
estão em um contínuo processo de transformação, assim como as atividades humanas e por
esta razão podemos dizer que são relativamente estáveis.
Os textos selecionados para análise referentes ao domínio jurídico pertencem aos
âmbitos federal e municipal. Inicialmente, o Decreto Municipal n.° 31.187/09, que dispõe
sobre a implementação do Programa Rio Criança Global na cidade do Rio de Janeiro, será
o centro da análise. Entretanto, faz-se imprescindível a compreensão, ainda que en passant,
das Leis Federal n.° 9.394/96 e Municipal n.° 2.939/99, que deliberam sobre o ensino de
língua estrangeira, devido às relações de poder estabelecidas hierarquicamente entre estes
discursos. A constituição do recorte excluiu os textos referentes à educação estadual pois,
apesar do dever de atuarem em regime de colaboração, os Municípios - assim como os
Estados - possuem autonomia na elaboração e execução de políticas e planos educacionais
desde que estejam em consonância com as diretrizes e planos nacionais de educação
(BRASIL, 1996, art. 10).
À instância interpessoal de produção discursiva pertencem os seguintes textos: a
Circular E/SUBE/ n° 17, destinada às corregedorias de educação e aos diretores das
unidades escolares, e a Carta da APEERJ, endereçada à ex-secretária municipal de
educação. A análise de ambos os discursos terá como objetivo principal verificar as ações
referentes à implementação, à compreensão e aos posicionamentos assumidos diante dos
dizeres do Decreto.
Finalmente, analisaremos os discursos das entrevistas semiestruturadas, que são
próprias do domínio discursivo instrucional, pois, segundo Marcuschi (2003), transmitem
saberes relacionados aos campos educacional, científico e acadêmico. Serão realizadas
65
Outra questão relevante para esta investigação é o fato de as entrevistas não serem
tomadas em sua integralidade para a análise, mas como um campo no qual circulam
determinados discursos. Sendo assim, haverá necessidade do recorte para a exclusão do
"material excedente", como nos propõem Rocha, Daher e Sant'Anna (2004), de acordo
com os objetivos da pesquisa. Em outras palavras, daremos preferência a fragmentos mais
relevantes às questões levantadas por esta investigação, isto é, aos enunciados de defesa e
manutenção da língua espanhola na grade curricular do Município do Rio de Janeiro. No
entanto, lembramos que todas as entrevistas poderão ser lidas integralmente nos anexos.
As entrevistas são consideradas semiestruturadas por combinarem perguntas abertas
e fechadas possibilitando que o entrevistador e o entrevistado possam discorrer sobre o
assunto. Em relação às questões previamente definidas, apresentamos sua estruturação:
2) Em sua opinião, quais os motivos que levaram a atual gestão do município do Rio de
Janeiro a retirar a língua espanhola das escolas?
Esta pergunta tem por finalidade averiguar o conhecimento dos entrevistados acerca
das motivações que impulsionaram a implementação do PRCG.
4) Você conhece a Lei Municipal n.° 2.939/99 e o Decreto Municipal n.° 31.187/09? Que
implicações esses documentos trazem para o ensino de LE na rede municipal?
Com esta pergunta buscaremos a resposta para a nossa hipótese de pesquisa.
Supomos que no discurso dos professores entrevistados encontraremos a materialização de
ideologias linguísticas que argumentam a favor da importância da língua espanhola através
da reprodução de discursos neoliberais. Além disso, acreditamos que não haverá
enunciados que refutem a implementação da Lei 2.939/99, mas apenas a do Decreto nº
31.187, revelando, assim, a falta de uma consciência político-linguística que reconheça a
importância do ensino plural de línguas estrangeiras e não se limite às línguas
"internacionais", mais especificamente ao par hegemônico inglês e espanhol.
68
IV ANÁLISE
direitos e obrigações senão em virtude de lei. Sendo assim, um Decreto terá "ordenação
com força de Lei" ((MICHAELIS ONLINE, 2009) quando obedecer as hierarquias
institucionais pré-estabelecidas.
Um decreto, assim como qualquer gênero, se caracteriza por seus enunciados
relativamente estáveis, por uma construção composicional, por um conteúdo temático
relacionado ao contexto de produção, e por um estilo (BAKHTIN, 2003). O conteúdo
temático não versa somente pelo assunto específico do texto, mas também pelo "domínio
de sentido que se ocupa o gênero" (FIORIN, 2008, p. 62), isto é, todo e qualquer gênero
pertencerá a uma determinada esfera e será constituído por um conteúdo que o torna único
numa interação. Os decretos pertencem ao domínio jurídico e seu conteúdo temático será
sempre uma ordem ou resolução emitida por uma autoridade. O estilo diz respeito "à
seleção de meios linguísticos" (FIORIN, 2008, p. 62), isto é, a escolha do vocabulário,
adequação da linguagem, seleção de estruturas frasais e gramaticais que caracterizam um
determinado gênero.
A construção composicional se refere à estrutura, à organização textual, às marcas
mais explícitas que nos permitem categorizar cada gênero. O Decreto Municipal nº
31.18742, nosso objeto de análise, possui caráter prescritivo e pertence à tipologia injuntiva,
ou seja, tem o objetivo de fazer com que o interlocutor realize a ação requerida. O
documento possui uma superestrutura que o determina por suas regularidades formais. A
seguir, elencaremos as partes que constituem a construção composicional do Decreto e
aproveitaremos suas passagens mais produtivas para desenvolvermos nossa análise a
respeito de suas estratégias enunciativas e do modo como ele mobiliza sentidos em torno
dos discurso sobre a língua.
a) Epígrafe: é o termo inicial do texto legal, no qual podemos identificar o tipo de ato, sua
numeração e data.
42
Remetemos novamente ao Anexo 05.
43
Informamos que todas as citações de corpora serão feitas em itálico e sem adentramento.
70
Institui o programa “Rio Criança Global 2016” para promover o ensino das línguas estrangeiras
nas escolas da rede municipal de ensino.
d) Autoria: a "autoria" do texto é atribuída ao Prefeito desta cidade por ser a autoridade que
se encontra investida legalmente para a promulgação do ato.
O PREFEITO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, no uso das atribuições que lhe são conferidas
pela legislação em vigor [...]
ser o sujeito social que detém o poder de fazer valer o documento através de sua assinatura,
não lhe pertencem exclusivamente, tampouco ao grupo que desenvolveu o PRCG e o
Decreto. Em outras palavras, os enunciados não pertencem totalmente aos seus autores /
enunciadores. Segundo Bakhtin, o locutor é dono da palavra no instante do ato fisiológico,
de materialização do som (BAKHTIN, 2010). No entanto, ao considerarmos a palavra
como signo ideológico, a categoria da propriedade não pode ser aplicada, uma vez que o
signo é atravessado dialogicamente por diversas vozes sociais.
e) Fundamento: são argumentos utilizados para justificar o decreto.
CONSIDERANDO que a Cidade do Rio de Janeiro sediará os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos
no ano de 2016;
CONSIDERANDO que no ano de 2016, com a realização das Olimpíadas, a Cidade do Rio de
Janeiro receberá turistas de todo o mundo, o que propiciará a convivência com diversas culturas;
CONSIDERANDO que uma das características do mundo contemporâneo é o estreitamento de
culturas, por intermédio da disseminação do saber, da arte, da tecnologia, da comunicação e dos
esportes;
CONSIDERANDO que a aprendizagem da Língua Estrangeira não se resume, apenas, no domínio
de habilidades a partir de um inventário de estruturas lingüísticas, mas envolve, também, a
apropriação de novos olhares sobre o mundo que nos cerca, envolvendo diferentes culturas e
dizeres;
CONSIDERANDO que o enfoque adotado pela Secretaria Municipal de Educação, compreende a
linguagem como uma forma de apropriar-se de práticas discursivas na Língua Estrangeira,
especialmente, o idioma inglês;
44
Vide anexo 06.
74
DECRETA:
Art. 1.° Fica criado, no âmbito da Secretaria Municipal de Educação, o Programa Rio Criança
Global, que tem por objetivo ampliar, para todos os anos do Ensino Fundamental, o ensino da
Língua Inglesa nas unidades escolares da Rede Pública Municipal de Ensino, com enfoque na
conversação.
Art. 2.° O Programa a que se reporta o artigo 1.° será implementado gradualmente, a partir do
ano de 2010, da seguinte forma:
I – em 2010: 1.° ao 3.° ano;
II – 2011: inclui-se o 4.° ano;
III – 2012: inclui-se o 5.° ano;
V– 2013: inclui-se o 6.° ano;
VI – 2014: inclui-se o 7.° ano;
VII – 2015: inclui-se o 8.° ano;
VIII – 2016: inclui-se o 9.° ano.
Art. 3.° Nas unidades escolares do Programa Escolas do Amanhã, além das atividades
desenvolvidas no horário normal, deverá haver reforço do ensino da Língua Inglesa, no
contraturno, duas vezes por semana, em diferentes níveis de complexidade (Básico, Intermediário
e Avançado).
2. A Circular E/SUBE/ n° 17
47
Remetemos novamente ao Anexo 06.
77
língua inglesa para todos os anos do ensino fundamental. Nesse sentido, a Circular
E/SUBE/ n° 17 tem paradoxalmente como objetivo "reafirmar" ditos que não foram ditos
no Decreto.
Sendo assim, encontramos um processo polissêmico na compreensão do enunciado
do Decreto exposto na Circular, pois ao tentar replicar parafrasticamente os ditos do
Decreto, a Circular acaba abrindo brecha para o equívoco e o deslocamento de sentido,
imbricando um processo polissêmico em meio a uma tentativa de paráfrase. Isso mostra
que, no movimento de retorno ao mesmo espaço do dizer, à memória discursiva
(ORLANDI, 2013), ocorrem deslizamentos, de tal modo que se reconhece um sentido no
Decreto que, na verdade, é o preenchimento de um lugar de lacuna no texto.
Os demais parágrafos da Circular se constituem em prescrições, em normas e
medidas a serem adotadas pelas unidades escolares, ignorando os ditos no Decreto
Municipal nº 31.187, a Lei Ordinária Municipal nº 2.939 - que institui a obrigatoriedade do
idioma espanhol na grade curricular e está em vigor - e os direitos dos professores de
espanhol e francês determinados tanto no edital do concurso para o qual se submeteram
como no estatuto dos servidores48.
Cabe ressaltar que o único argumento dado para o cumprimento das prescrições
está fundamentado no argumento de autoridade que se caracteriza por ser um argumento de
coexistência, ao relacionar "um atributo com a essência ou [...] um ato com a pessoa"
(FIORIN, 2016, p. 170). De acordo com Fiorin (2016), podemos recorrer a dois tipos de
autoridade: a da ordem do saber (um perito ou especialista) e a do domínio do poder
(aquele que sobre os outros exerce um certo comando). No caso da Circular E/SUBE/ n°
17, temos o argumento de autoridade do domínio do poder, uma vez que é exercido por
uma instância superior que apela para o respeito, para a reverência. Este tipo de argumento
é plausível, mas não necessariamente é verdadeiro e, por este motivo, pode ser alvo de
ironias, desconfianças (FIORIN, 2016) e questionamentos.
As estratégias argumentativas mais utilizadas para sustentar o argumento de
autoridade foram as modalizações deônticas de obrigatoriedade e de proibição. Segundo
Nascimento (2010), o fenômeno da modalização ou modalidade é um artifício
argumentativo que permite ao locutor responsável pelo discurso imprimir uma avaliação
ou ponto de vista sobre o conteúdo da enunciação. Dessa forma, o locutor deixa pistas do
48
O Estatuto dos Professores da Rede Municipal de Ensino do Rio de Janeiro está disponível na página:
https://www.superprofessores.com.br/public/uploads/material/20131202132653_58c35ad525f3670a9a1ab09
95a94d8a6.pdf.
79
que deseja ou de como quer que seu discurso seja lido através de três tipos de modalização:
a epistêmica, a avaliativa e a deôntica.
A modalização epistêmica ocorre quando o locutor expressa uma avaliação sobre o
valor da verdade da proposição. A modalização avaliativa apresenta "uma avaliação ou
juízo de valor a respeito de uma conteúdo proposicional" (NASCIMENTO, 2010, p. 33).
Finalmente, a modalização deôntica que indica que o locutor considera o conteúdo dos
enunciados como algo que deve ou precisa ocorrer de maneira obrigatória. Ainda de
acordo com Nascimento (2010), a modalização deôntica possui nuances que podem ser
classificadas da seguinte maneira: (a) de possibilidade - indica que o conteúdo da
proposição é algo facultativo e o interlocutor poderá ou não exercê-lo; (b) de
obrigatoriedade - expressa a obrigatoriedade de que algo deve ocorrer e o interlocutor deve
obedecê-lo; (c) de proibição - expressa que o conteúdo da proposição é algo proibido e
deve ser considerado como tal pelo interlocutor.
Dito isto, passemos aos enunciados que revelam as modalizações deônticas de
obrigatoriedade (DO) e de proibição (DP) na Circular E/SUBE/ n° 17:
b. Não será permitida (DP) a oferta de ensino de Espanhol ou Francês em detrimento da oferta de
ensino de inglês, para as turmas de 1° ao 9° ano ou de 6° ano experimental.
c. Caso a escola tenha, também, professores de espanhol ou Francês, estes devem assumir (DO)
as turmas de Projetos ou, em caso de escolas de Turno Único, trabalhar em disciplinas eletivas.
[...]
As locuções verbais que aparecem nos fragmentos acima foram utilizadas como
modalizadores deônticos com a finalidade de obrigar a todos que estão vinculados às
instituições escolares a cumprirem as prescrições descritas. Consideramos que os
argumentos do domínio do poder elencados a priori não são apresentados - dentro do
gênero Circular - como passíveis de questionamento. Pelo contrário, eles são expostos
como regras pautadas no lugar da legitimidade e autoridade da Secretaria de Educação,
enquanto instância reguladora e controladora dos profissionais da escola, e no Decreto,
enquanto dispositivo normativo.
Note-se que, ao dizer que "ratifica" algo já pré-existente num decreto, o gênero em
questão não solicita uma atitude de um leitor que compare ambos os textos. Entretanto,
percebemos, ao abordarmos uma posição crítica diante desses enunciados, que eles estão
sujeitos a questionamentos, pois todas as normas e ordens dadas estão baseadas numa
compreensão dos ditos do Decreto Municipal nº 31.187, marcada por um posicionamento
atravessado pelos valores ideológicos que perpetuam parafrasticamente as representações
sobre o status do inglês como língua estrangeira na contemporaneidade. É por esta razão
que a Circular se autoriza a dizer que "ratifica" algo que, na verdade, está na ordem do não
dito no Decreto.
O outro aspecto a ser apontado é que a Circular afirma que seu gesto enunciativo
tem o propósito de "também eliminar dúvidas e equívocos" relacionados à implementação
do Decreto. Tal ato se revela contraditório, uma vez que se deseja eliminar o "equívoco",
porém se opera com o equívoco de leitura do texto-base, dentro da rede intertextual. Além
disso, busca-se silenciar dizeres antagônicos e conflitantes em relação ao poder
governamental, que se caracteriza como prescritivo, autoritário e ratificador da ideologia
linguística dominante.
3. A Carta da APEERJ
49
Vide Anexo 07.
81
À Ex.ª Senhora Secretária Cláudia Costin
À Ex.ª Senhora Subsecretária de Ensino Helena Bomeny
Quanto ao corpo textual, um texto argumentativo possui uma lógica composta pelos
seguintes componentes: a asserção de partida, a asserção de chegada e a asserção de
passagem (CHARAUDEAU, 2008). Optamos por esta classificação, embora feita de
maneira simplificada, para melhor analisar os argumentos que sustentam o ponto de vista
do texto.
A asserção de partida pode ser chamada de dado ou premissa, isto é, um fato do
qual decorre uma consequência.
82
ASSERÇÃO DE PARTIDA
Em menos de dois anos, uma língua que deveria ser ensinada em todas as séries do ensino
fundamental, se limite ao caráter “eletivo”, a uma oferta incerta, quiçá relegada ao
esquecimento.
lei mais importante no que concerne o ensino da língua espanhola no âmbito municipal e,
talvez, o argumento de maior poder de persuasão sobre a SME-RJ. Contudo, o fragmento
"uma língua que deveria ser ensinada em todas as séries do ensino fundamental" pode ser
tomado como índice da lacuna do não-dizer (ORLANDI, 2013). Essa afirmação
pressupõe a seguinte ideia: se "deveria" é porque há alguma prescrição ou regulamentação
sobre a questão. Dessa forma, subentende-se que é do conhecimento da APEERJ a
obrigatoriedade do ensino de espanhol, para toda a educação básica, prescrita pela Lei
Ordinária Municipal nº 2.939, ainda que não possamos asseverar que esta tenha sido uma
das intenções discursivas do documento.
O silenciamento da APEERJ, de acordo com Orlandi (2013), pode ser entendido
como um lugar de recuo necessário, um silêncio fundador, ou seja, um silêncio que nos
indica um outro sentido. Em outras palavras, sendo o conteúdo da Carta uma crítica à
atual política linguística monolíngue adotada pela SME-RJ, seria uma incoerência utilizar
como argumento principal os enunciados da Lei Ordinária Municipal nº 2.939, que
reproduzem o mesmo tipo de discurso centrado na obrigatoriedade do ensino uma LE, o
espanhol. Por este motivo, acreditamos que o não-dito foi uma estratégia argumentativa
utilizada para uma defesa do status de democrático do pleito apresentado para a inscrição
da carta na formação discursiva prevalente nas políticas educacionais voltadas para o
ensino de LE na contemporaneidade, as quais advogam pela noção de plurilinguismo.
Passemos aos argumentos relativos à asserção de passagem. Neste trecho também
há o predomínio dos argumentos fundamentados na estrutura do real, mais
especificamente, aos pertencentes ao argumentum ad consequentiam. Segundo Fiorin,
estes argumentos são utilizados para defender uma determinada ação, "levando em conta
os efeitos que ela produz" (FIORIN, 2016, p. 165). Devido a sua natureza diversa, podem
ser classificados em descritivos, pois apresentam fatos; em avaliativos, uma vez que
opinam sobre um dado elemento e; em incitativos, visto que "convocam a realizar uma
ação ou a evitar que algo se produza" (FIORIN, 2016, p. 165), considerando os efeitos
positivos ou negativos do ato em questão.
Nos enunciados abaixo, observamos os três tipos de argumentos descritos no
parágrafo anterior:
ASSERÇÃO DE PASSAGEM
85
Ao longo de seus 30 anos, nossa associação luta para que o ensino de línguas estrangeiras
seja respeitado e valorizado em todos os âmbitos. Essa luta não é não 50 apenas pela expansão
da língua espanhola nas escolas, mas pela implementação de um ensino de línguas que
propicie ao estudante refletir sobre a sua participação na sociedade, sobre seus deveres,
anseios e conquistas futuras.
É também objetivo desta associação lutar em prol das causas dos seus professores, muitas
vezes, submetidos a políticas governamentais que não estão atentos às suas reais necessidades
e justas reivindicações.
Nesse sentido, cabe mencionar a enorme indignação desta associação ao tomar conhecimento,
por meio de relatos de seus membros e pela já mencionada subsecretária, que os professores
de espanhol da rede municipal de ensino do Rio de Janeiro estão em vias de trabalhar com
turmas de reforço de língua portuguesa. Possivelmente, fora de suas escolas de origem, onde
muitos possuem mais de 10 anos de vínculo,e prestes a ter seus horários pulverizados e
limitados a poucos tempos de aula com os estudantes.
50
Ressaltamos que o texto original foi mantido mesmo com os problemas relacionados à norma culta da
Língua Portuguesa.
86
51
Para consultar Matriz Curricular de 2012, vide Diário Oficial do Rio de Janeiro n° 223 de 3 de fevereiro de
2012: http://doweb.rio.rj.gov.br/visualizar_pdf.php?edi_id=1651&page=1
52
Cabe destacar que estas informações retratam minha experiência profissional como professora de espanhol
no município do Rio de Janeiro de 2000 a 2014. No ano de 2012, devido a implementação do PRCG, fui
convidada a assumir a direção da escola em que lecionava e no ano de 2013, optei por trabalhar
administrativamente na 5ª Corregedoria Regional de Educação. Ambas as funções me foram apresentadas
como alternativas de trabalho, uma vez que não havia turmas disponíveis para a aprendizagem de língua
espanhola.
53
Para consultar a atual Matriz Curricular, vide Diário Oficial do Rio de Janeiro n° 160 de 11 de Novembro
de 2016: http://doweb.rio.rj.gov.br/visualizar_pdf.php?edi_id=3263&page=1
87
Essa luta não é não apenas pela expansão da língua espanhola nas escolas, mas pela
implementação de um ensino de línguas que propicie ao estudante refletir sobre a sua
participação na sociedade, sobre seus deveres, anseios e conquistas futuras.
O operador argumentativo "mas" não surge, nesse trecho, com carga adversativa,
senão com sentido aditivo, principalmente por estar relacionado ao operador anterior "não
apenas", pois ambos ligam dois argumentos orientados no mesmo sentido, ou seja, somam
justificativas que defendem o mesmo posicionamento. Dessa forma, podem ser
classificados como operadores que acrescentam um argumento a favor de uma mesma
conclusão, caracterizando, assim, uma relação discursiva-argumentativa de conjunção
(KOCH, 2016).
Observemos o uso do articulador textual "embora" no fragmento que segue:
suficiente para modificar a conclusão, isto é, não possui peso suficiente para persuasão
(KOCH, 2016, p. 71).
Não encontramos outros argumentos relativos à importância da língua espanhola
no cenário mundial na asserção de passagem, apenas à relevância da aprendizagem de
uma LE para a formação de "alunos-cidadãos críticos e conscientes" na asserção de
chegada:
ASSERÇÃO DE CHEGADA
Conclusão Concluímos esta carta, reafirmando que a APEERJ sempre estará aberta ao
diálogo com o poder público para a viabilização de ações em prol do ensino de
espanhol no Rio de Janeiro, como a realização de cursos de capacitação ou
projetos similares. Essa parceria, no entanto, espera desse órgão o respeito
devido ao trabalho do professor de línguas estrangeiras e o lugar do espanhol
como um dos integrantes do componente curricular, de imprescindível
relevância à formação de alunos-cidadãos críticos e conscientes do valor da
aprendizagem de uma língua estrangeira.
Essa parceria, no entanto, espera desse órgão o respeito devido ao trabalho do professor de
línguas estrangeiras e o lugar do espanhol como um dos integrantes do componente curricular
[...]
4. As Entrevistas
91
55
Professora Ana, mestre em linguística, lotada na sala de leitura, 41 anos de idade, exerce a profissão há 22
anos e é funcionária da SME-RJ há 16 anos.
92
Ana: Eu acho que (por um) interesse (.) 56 político e econômico... eu acho que (.) por causa dos
cursos de Inglês né que estavam pelo menos na minha escola que a minha escola é uma Escola do
Amanhã (.) então tinha um (.) tinha Cultura Inglesa tinha curso de Inglês da dentro da minha
escola (.) já não sei direito qual era o o curso não mas acho que era Cultura (.) a Cultura também
que fazia a seleção dos professores de Inglês (.) a Cultura que:: (.) dava:: aqueles cursos de
aperfeiçoamento também pra professores de Inglês (.) né e (.) até no quando eu tava estudando pro
mestrado (.) escrevendo a dissertação (.) eu lembro de ter ouvido até tenho essa (.) essa fala da da
(.) antiga secretária ela disse que (.) [dentro de] 57 (grifos nossos)
Segundo a professora Maria58, a retirada está ocorrendo por uma questão política,
mas não especificou qual seria:
Maria: Eu acredito que seja por (.) questão política (.) né (.) eu fiz o o concurso em dois mil e
do::ze (.) inicialmente eram destinadas pra minha CRE dez vagas (.) só que (.) anteriormente
houve um um concurso pra Inglês (.) que foram destinadas quinhentas vagas pra Inglês (.) então
(.) e:: infinitas né (.) vagas assim e foram chamados (.) professores extras da língua inglesa (.)
então eu acredito que o direcionamento do município do Rio seja pra (.) com para língua
estrangeira seja o Inglês e não (.) o Espanhol (grifos nossos)
A professora Rosa59 disse não entender, uma vez que a antiga Secretária de
Educação reconhecia a importância do idioma espanhol. Além disso, atribui a gradativa
exclusão da língua espanhola a uma ação individual da Ex-Secretária de Ensino:
Rosa: Na verdade:: ninguém entende nada... a respeito disso porque:: (.) inclusive a secretária (.)
a antiga secretária a Claudia Costin (.) ela dizia que o Espanhol era muito importante (.) mas ela
mesmo (.) ela (.) resolveu retirar (.) ela disse que não era:: (.) eh:: (.) segundo o que (.) chegou
56
As convenções de transcrição estão disponíveis no Anexo 11.
57
As transcrições podem ser lidas na íntegra no Anexo 08.
58
Professora Maria, mestre em literatura hispânica, 43 anos, atua no magistério há 18 anos como professora
de espanhol e há 04 na rede municipal do RJ.
59
Professora Rosa, especialista em tradução, 44 anos, atua há 18 anos como professora de espanhol, sendo 17
no município do RJ.
93
pra:: (.) pra nós professores ela disse que seria uma aberração... no município o ensino de língua
espanhola que o importante é o Inglês (grifos nossos)
Maria: Defendo por (.) pela língua ser uma língua mais próxima à língua portuguesa pelos nossos
(.) eh:: países vizinhos (.) e também (.) pela:: facilidade que o aluno tem (.) ao estudar uma língua
neolatina (.) já que (.) nós (.) ramificamos do Latim
Rosa: Principalmente com co::m (.) nosso país cercado de países de língua espanhola (.) então a
proximidade é muito maior do que o contato com a língua inglesa a língua inglesa (.) é mais
comercial (.) ou (.) no traba::lho mas assim contato mesmo possibilidades de viagem até do (.) dos
brasileiros a a a fronteira mesmo a entrada deles aqui tá muito grande (.) então acredito que:: °é
mais importante° (grifos nossos)
Ana: Eu defendo mas eu acho que tinha que existir (.) não sei eh eh (.) uma:: organização
diferente porque realmente não tem continuidade do ensino tanto do Inglês quanto do Espanhol
porque (.) o aluno faz Espanhol no sexto ano não quer dizer que ele vai fazer Espanhol no sétimo
ano (.) né e o aluno que faz Inglês no sexto também não quer dizer que ele vai continuar fazendo
Inglês no sex- no sétimo (.) então eles tinham que organizar de uma maneira em que o aluno talvez
pudesse escolher (grifos nossos)
Maria: Bom... eu acredito que:: a rede não está (.) preparada para (.) este tipo de:: mudança...
primeiro pelo número de (.) profissionais que não (.) eh:: (.) completa o quadro mesmo tendo::
havido dois (.) concursos anteriores (.) né (.) e:: o ensino do Inglês como eu já havia falado que
existem mais (.) professores de Inglês (.) eles substituem (.) os de língua espanhola↓ (.) então eh
a:: secretaria ela (.) ela constrói uma lei (.) e na prática existe uma o::utra regulamentação (.) por
quê? (.) porque eu fui informada que eu só poderia entrar pela (.) diretora do RH da quinta CRE
que eu só poderia entrar nas turmas de projeto oitavo e (.) nono ano (.) e é o que a direção tem
feito comigo ao longo desses anos ao longo desses quatro anos (.) e essa lei existe mas está
engavetado (.) não está sendo posta em prática (.) e eu acredito que não será posta em prática
primeiro pelo desconhecimento dela por nós (.) profissionais da língua (.) espanhola (.) e segundo
pela prática da secretaria municipal que (.) estende o ensino da língua inglesa para quase todas
para quase toda a rede... eu não acredito na (.) que isso será posto em prática (.) e:: será uma lei
como está atualmente engavetado (grifos nossos)
Ana: Ah acaba que os professores de língua espanhola da da rede vão ficar não podem ser
demitidos né acabam fazendo outras coisas tem professor que tá trabalhando (.) co::m projeto (.)
eu conheço (.) tem gente como eu que tá na sala de leitura (.) e o projeto é pra você trabalhar com
todas as disciplinas (.) me ofereceram mas eu não quis (.) primeiro que era todo dia (.) ou todas as
manhãs ou todas as tardes e dando aula de todas as matérias e com alunos problemáticos (.) né
fora da idade escolar (.) eh aí eu não aceitei (.) porque eu também tinha outra matrícula e eu não
queria entrar nessa dando aula de Português tudo bem que Português dá agora Matemática
Ciências História Geografia Inglês (.) né (.) e na sala de leitura eu achei mais conveniente (.) mas
eu também já trabalhei dando (.) dupla (.) fazendo dupla de Português (.) não me ofereceram ficar
só com Português não nem me obrigaram... né assim não me obrigaram a nada (.) por enquanto (.)
me deram a sala de leitura porque tava disponível [na minha escola] (grifos nossos)
Rosa: Bom na prática o que:: pode-se observar por exemplo (.) a ideia (.) que foi passada pra nós
é que o aluno começaria o 6º ano com Inglês (.) e iria até o 9º ano então aos poucos o Espanhol
seri::a retirado (.) sendo que (.) como não tem onde colocar os professores de Espanhol (.) então
foi permitido (.) tá foi uma concessão (.) segundo o que chega pra gente que os professores
permanecessem no nono ano (.) oitavo nono (.) sexto ano e sétimo não poderiam dar mais aula de
97
Espanhol (.) e aí a criança vem com sexto e sétimo com o Inglês e ele passa pro Espanhol no
oitavo e nono (grifos nossos)
Ana: Porque o prefeito Eduardo Paes baixou um decre::to... tirando o Espanhol da grade
curricular
98
Ana: Ué pelo que eu vi aqui ele só valoriza o Inglês (.) né desconsiderou completamente a lei que o
que o (.) que o Conde sancionou
Ana: ...eu lembro de ter ouvido até tenho essa (.) essa fala da da (.) antiga secretária ela disse que
(.) [dentro de]
Maria: [Hmm não] só conheço aquele (.) decreto do Lula que institucionaliza a (.) língua
espanhola (.) para o ensino médio só
Rosa: Na verdade:: ninguém entende nada... a respeito disso porque:: (.) inclusive a secretária (.)
a antiga secretária a Claudia Costin (grifos nossos)
Ana: ... até no quando eu tava estudando pro mestrado (.) escrevendo a dissertação (.) eu lembro
de ter ouvido até tenho essa (.) essa fala da da (.) antiga secretária ela disse que (.) [dentro de]
Ana: isso dentro de um certo período não me lembro agora exatamente (.) todos os alunos da rede
estudariam Inglês isso acho que já (.) me acendeu uma:: (.) uma:: (.) uma dúvida sei lá já já (.) já
deixou uma dúvida na minha cabeça eu falei caramba o que que vão fazer com o Espanhol isso
quando eu fazia o mestrado (.) já te::m o que (.) uns cinco anos aí
Maria: ... porque eu fui informada que eu só poderia entrar pela (.) diretora do RH da quinta CRE
que eu só poderia entrar nas turmas de projeto oitavo e (.) nono ano (.) e é o que a direção tem
feito comigo ao longo desses anos ao longo desses quatro anos ... (grifos nossos)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
100
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Acessado em: 25 de janeiro de 2017.
SIQUEIRA, D. S. P. Inglês como língua internacional: por uma pedagogia intercultural crítica.
2008. 358 f. Tese (Doutorado em Letras e Linguística) − Instituto de Letras, Universidade Federal
da Bahia, Salvador, 2008.
APÊNDICE
Prezado(a) estudante:
Atenciosamente,
Matrícula: _____________________________________________________
Assinatura:______________________________________________________
Local e data:_____________________________________________________
Matrícula: ______________________________________________________________
Assinatura:______________________________________________________________
Local e data:____________________________________________________________
ANEXO I
Art. 1o O ensino da língua espanhola, de oferta obrigatória pela escola e de matrícula
facultativa para o aluno, será implantado, gradativamente, nos currículos plenos do ensino
médio.
§ 1o O processo de implantação deverá estar concluído no prazo de cinco anos, a partir
da implantação desta Lei.
§ 2o É facultada a inclusão da língua espanhola nos currículos plenos do ensino
fundamental de 5a a 8a séries.
Art. 2o A oferta da língua espanhola pelas redes públicas de ensino deverá ser feita no
horário regular de aula dos alunos.
Art. 3o Os sistemas públicos de ensino implantarão Centros de Ensino de Língua
Estrangeira, cuja programação incluirá, necessariamente, a oferta de língua espanhola.
Art. 4o A rede privada poderá tornar disponível esta oferta por meio de diferentes
estratégias que incluam desde aulas convencionais no horário normal dos alunos até a
matrícula em cursos e Centro de Estudos de Língua Moderna.
Art. 5o Os Conselhos Estaduais de Educação e do Distrito Federal emitirão as normas
necessárias à execução desta Lei, de acordo com as condições e peculiaridades de cada
unidade federada.
Art. 6o A União, no âmbito da política nacional de educação, estimulará e apoiará os
sistemas estaduais e do Distrito Federal na execução desta Lei.
ANEXO II
Art. 1º A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com as seguintes
alterações:
"Art. 24. ...................................................................................
..........................................................................................................
..........................................................................................................
I - linguagens;
II - matemática;
IV - ciências humanas; e
§ 7º A parte diversificada dos currículos de que trata o caput do art. 26, definida em
cada sistema de ensino, deverá estar integrada à Base Nacional Comum Curricular
e ser articulada a partir do contexto histórico, econômico, social, ambiental e
cultural.
§ 15. Além das formas de organização previstas no art. 23, o ensino médio poderá
ser organizado em módulos e adotar o sistema de créditos ou disciplinas com
terminalidade específica, observada a Base Nacional Comum Curricular, a fim de
estimular o prosseguimento dos estudos.
§ 16. Os conteúdos cursados durante o ensino médio poderão ser convalidados para
aproveitamento de créditos no ensino superior, após normatização do Conselho
Nacional de Educação e homologação pelo Ministro de Estado da Educação.
I - demonstração prática;
Art. 4º O disposto no art. 26 e no art. 36 da Lei nº 9.394, de 1996, deverá ser
implementado no segundo ano letivo subsequente à data de publicação da Base Nacional
Comum Curricular.
125
I - sejam escolas implantadas a partir da vigência desta Medida Provisória e atendam às
condições previstas em ato do Ministro de Educação; e
§ 1º A transferência de recursos de que trata o caput será realizada com base no número
de matrículas cadastradas pelos Estados e pelo Distrito Federal no Censo Escolar da
Educação Básica, desde que tenham sido atendidos, de forma cumulativa, os requisitos dos
incisos I e II do caput.
§ 2º A transferência de recursos será realizada anualmente, a partir de valor único por
aluno, respeitada a disponibilidade orçamentária para atendimento, a ser definida por ato
do Ministro de Estado da Educação.
§ 3º Os recursos transferidos nos termos do caput poderão ser aplicados nas despesas de
manutenção e desenvolvimento das escolas participantes da Política de Fomento, podendo
ser utilizados para suplementação das expensas de merenda escolar e para aquelas previstas
nos incisos I, II, III, VI e VIII do caput do art. 70 da Lei nº 9.394, de 1996.
126
Art. 7º Os recursos de que trata o parágrafo único do art. 5º serão transferidos pelo
Ministério da Educação ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE,
independentemente de celebração de termo específico.
Art. 10. Os Estados e o Distrito Federal deverão fornecer, sempre que solicitados, a
documentação relativa à execução dos recursos recebidos com base no parágrafo único do
art. 5º ao Tribunal de Contas da União, ao FNDE, aos órgãos de controle interno do Poder
Executivo federal e aos conselhos de acompanhamento e controle social.
Publicação:
ANEXO III
Art. 1º - Torna-se obrigatório a inclusão no Currículo Escolar das Escolas Públicas do
Estado do Rio de Janeiro o ensino da língua estrangeira moderna, idioma espanhol.
Art. 2º - O ensino de espanhol estará incluído como componente curricular do primeiro e
segundo graus, na área de comunicação e expressão.
Art. 3º - Ao Poder Executivo caberá a elaboração dos atos de regulamentação referentes às
normas estabelecidas nesta Lei.
Art. 4º - Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em
contrário.
MARCELLO ALENCAR
Governador
Tipo de
Revogação Em Vigor
129
ANEXO IV
Art. 2º - Fica o Poder Executivo autorizado a instituir concurso público com vista à seleção
de professores para atender o disposto nesta Lei.
Art. 3º - Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, o Poder Executivo poderá instituir
convênios com entidades públicas e privadas, para atender ao disposto nesta Lei.
Art. 4º - As despesas decorrentes da execução do disposto nesta Lei correrão à conta de
dotações orçamentárias próprias, a serem incluídas na Lei Orçamentária Anual, ficando o
Poder Executivo autorizado a abrir créditos adicionais, suplementares ou especiais.
Art. 6º - Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em
contrário.
ANEXO V
Institui o programa “Rio Criança Global 2016” para promover o ensino das línguas
estrangeiras nas escolas da rede municipal de ensino.
DECRETA:
Art. 1.° Fica criado, no âmbito da Secretaria Municipal de Educação, o Programa
Rio Criança Global, que tem por objetivo ampliar, para todos os anos do Ensino
Fundamental, o ensino da Língua Inglesa nas unidades escolares da Rede Pública
Municipal de Ensino, com enfoque na conversação.
Art. 2.° O Programa a que se reporta o artigo 1.° será implementado gradualmente,
a partir do ano de 2010, da seguinte forma:
I – em 2010: 1.° ao 3.° ano;
II – 2011: inclui-se o 4.° ano;
III – 2012: inclui-se o 5.° ano;
V– 2013: inclui-se o 6.° ano;
VI – 2014: inclui-se o 7.° ano;
VII – 2015: inclui-se o 8.° ano;
VIII – 2016: inclui-se o 9.° ano.
Art. 3.° Nas unidades escolares do Programa Escolas doAmanhã, além das
atividades desenvolvidas no horário normal, deverá haver reforço do ensino da Língua
Inglesa, no contraturno, duas vezes por semana, em diferentes níveis de complexidade
(Básico, Intermediário e Avançado).
Art. 4.° Este Decreto entrará em vigor na data de sua publicação.
ANEXO VI
133
134
ANEXO VII
135
ASSUNTO: Carta oficial da APEERJ referente ao ensino de Espanhol na rede municipal
À Ex.ª Senhora Secretária Cláudia Costin
À Ex.ª Senhora Subsecretária de Ensino Helena Bomeny
vínculo,e prestes a ter seus horários pulverizados e limitados a poucos tempos de aula com
os estudantes.
A subutilização do trabalho dos professores que se dedicam ao ensino de língua
espanhola também é tema de debate neste documento. Embora os representantes da
Secretaria Municipal de Educação tenham ressaltado, mais de uma vez, que “a prioridade é
o aluno e não o professor”, sabemos que dificilmente se aprende/ensina algo diminuindo os
partícipes da mediação e da construção do conhecimento.
Cabe ressaltar também que é no mínimo contraditória a realização de um concurso
de 100 vagas para professor de espanhol quando os atuais professores da rede vivem essa
situação inaceitável. É difícil compreender que uma língua falada em mais de 20 países
como língua materna perca seu espaço em uma das maiores redes municipais de ensino da
América Latina.
Concluímos esta carta, reafirmando que a APEERJ sempre estará aberta ao diálogo
com o poder público para a viabilização de ações em prol do ensino de espanhol no Rio de
Janeiro, como a realização de cursos de capacitação ou projetos similares. Essa parceria, no
entanto, espera desse órgão o respeito devido o trabalho do professor de línguas
estrangeiras e o lugar do espanhol como um dos integrantes do componente curricular, de
imprescindível relevância à formação de alunos-cidadãos críticos e conscientes do valor da
aprendizagem de uma língua estrangeira.
Nestes termos, a APEERJ solicita a devida revisão da decisão de retirar da grade
uma disciplina tão importante com a Língua Espanhola, para que possamos desenvolver
novas parcerias com a Secretaria Municipal de Educação. Desta maneira esperamos que,
alunos, professores e comunidade escolar sejam contemplados com um ensino público de
línguas plural e de qualidade.”
ANEXO VIII
138
Cristina: E:: (.) por quê? (.) por que que não tem aula de Espanhol?
Ana: Porque o prefeito Eduardo Paes baixou um decre::to... tirando o Espanhol da grade
curricular
Ana: [Foi] gradativamente primeiro saiu do:: se::xto a::no do sétimo a::no (.) aí eu ainda
dei aula no oitavo e no nono (.) aí no ano seguinte só no na- no nono e depois (.) parou
Cristina: E:: (.) na sua opinião (.) quais são os motivos que levaram a atual gestão do
município (.) a retirar a língua espanhola das escolas?
Ana: Eu acho que (por um) interesse (.) político e econômico... eu acho que (.) por causa
dos cursos de Inglês né que estavam pelo menos na minha escola que a minha escola é uma
Escola do Amanhã (.) então tinha um (.) tinha Cultura Inglesa tinha curso de Inglês da
dentro da minha escola (.) já não sei direito qual era o o curso não mas acho que era
Cultura (.) a Cultura também que fazia a seleção dos professores de Inglês (.) a Cultura
que:: (.) dava:: aqueles cursos de aperfeiçoamento também pra professores de Inglês (.) né
e (.) até no quando eu tava estudando pro mestrado (.) escrevendo a dissertação (.) eu
lembro de ter ouvido até tenho essa (.) essa fala da da (.) antiga secretária ela disse que (.)
[dentro de]
Ana: isso dentro de um certo período não me lembro agora exatamente (.) todos os alunos
da rede estudariam Inglês isso acho que já (.) me acendeu uma:: (.) uma:: (.) uma dúvida
sei lá já já (.) já deixou uma dúvida na minha cabeça eu falei caramba o que que vão fazer
com o Espanhol isso quando eu fazia o mestrado (.) já te::m o que (.) uns cinco anos aí
Ana: Eu defendo mas eu acho que tinha que existir (.) não sei eh eh (.) uma:: organização
diferente porque realmente não tem continuidade do ensino tanto do Inglês quanto do
Espanhol porque (.) o aluno faz Espanhol no sexto ano não quer dizer que ele vai fazer
Espanhol no sétimo ano (.) né e o aluno que faz Inglês no sexto também não quer dizer que
ele vai continuar fazendo Inglês no sex- no sétimo (.) então eles tinham que organizar de
uma maneira em que o aluno talvez pudesse escolher (.) eu acho (.) né porque tem fran-
>tem escola que ainda tem Francês< (.) o Francês também tá saindo (.) mas tem Francês
139
Espanhol e Inglês (.) então era tudo muito bagunçado (.) eu acho que eles tinham que
arrumar de uma maneira que pudesse haver uma continuidade no ensino
Ana: É a lei que:: deixa eu ver se eu me lembro dela (.) que fala do ensino do Espanhol no
ensino fundamental?
Cristina: Vou te dar pra ler (.) você lê só o (.) esse essa lei aqui é a lei que fala do Espanhol
e aqui na última folha (.) tem o decreto (.) aí depois que você ler só esse iniciozinho aqui
Ana: ah tá
((Silêncio))
Cristina: I::sso
Ana: [aí]
Cristina: [Esse]
Ana: tá certo
((Silêncio))
Cristina: Ãh-hã
((Silêncio))
Cristina: Foi?
Ana: °Ãh-hã°
Cristina: Agora (.) comparando esses dois (.) que implicações (.) esses documentos (.) eh
trazem pro ensino de língua estrangeira na rede (.) na rede municipal?
Cristina: [Eh] o que que você acha após ler (.) esses documentos (.) como é que fica a
língua estrangeira quais são (.) as consequências ou as orientações (.) o que:: acarreta (.)
pro ensino de língua estrangeira?
Ana: Ué pelo que eu vi aqui ele só valoriza o Inglês (.) né desconsiderou completamente a
lei que o que o (.) que o Conde sancionou
Cristina: Ãh-hã
Ana: Ah acaba que os professores de língua espanhola da da rede vão ficar não podem ser
demitidos né acabam fazendo outras coisas tem professor que tá trabalhando (.) co::m
projeto (.) eu conheço (.) tem gente como eu que tá na sala de leitura (.) e o projeto é pra
você trabalhar com todas as disciplinas (.) me ofereceram mas eu não quis (.) primeiro que
era todo dia (.) ou todas as manhãs ou todas as tardes e dando aula de todas as matérias e
com alunos problemáticos (.) né fora da idade escolar (.) eh aí eu não aceitei (.) porque eu
também tinha outra matrícula e eu não queria entrar nessa dando aula de Português tudo
bem que Português dá agora Matemática Ciências História Geografia Inglês (.) né (.) e na
sala de leitura eu achei mais conveniente (.) mas eu também já trabalhei dando (.) dupla (.)
fazendo dupla de Português (.) não me ofereceram ficar só com Português não nem me
obrigaram... né assim não me obrigaram a nada (.) por enquanto (.) me deram a sala de
leitura porque tava disponível [na minha escola]
141
Ana: Porque não tinha °vaga pra mim° (.) não tinham vaga pra mim (.) e eu sou muito
antiga na escola eu tô lá desde dois mil e sete
Cristina: Ãh-hã
Ana: Entendeu (.) e assim (.) eh esse ano (.) uma novidade (.) esse ano (.) eles (.) surgiu a
possibilidade de eu voltar (.) com o nono ano (.) pra dar Espanhol acredita?
Ana: Pois é porque (.) a sala de leitura (.) a da minha escola ela tem uma professora que
está afastada (.) primeiro que ela foi pra uma o::utra escola pra ficar perto de casa pra tratar
pra cuidar da mãe dela que tava com câncer (.) a mãe faleceu... e ela ficou cedida lá
naquela escola (.) agora o marido em menos em pouco tempo o marido faleceu (.) então ela
está de licença sem venci- eh de licença médica
Cristina: Ãh-hã
Ana: Podendo voltar a qualquer momento e eh o meu futuro é incerto (.) aí cogitou-se a
possibilidade de dela voltar (.) e eu ter que pegar o nono ano porque eles não tinham lugar
pra me colocar
Cristina: Ah entendi (.) então você voltaria pro nono ano e ela entraria pra sala de [leitura]
Ana: [É] aí:: eu falei mas como assim se não tem mais Espanhol na rede ou seja uma
bagunça né (.) eh:: (.) mas aí eu fui à CRE conversei com a moça ela falou não (.) você é
de Espanhol (.) você fica na sala de leitura (.) foi assim que ela falou (.) Rosângela
responsável lá da sétima CRE
Maria: Sim
Cristina: E:: como é feito (.) como é ensinado o Espanhol na sua escola?
Maria: Como é feito a minha entrada (.) nas turmas ou como eu (.) ministro a aula↓
Cristina: Como o ensino de Espanhol é feito na sua escola (.) ele exi::ste (.) tá em que quais
[tu::rmas]
Maria: [Isso] (.) ele existe (.) ele é destinado a turmas de:: (.) projeto que são aqueles
alunos que (.) passaram da (.) faixa etá::ria (.) e:: eu tenho atualmente quatro turmas de
projeto (.) duas pela manhã e (.) duas à tarde (.) e eu tenho duas turmas regulares né de
oitavo e (.) nono anos (.) à tarde
Cristina: E quantas turmas regulares tem na escola? (.) você sabe? (.) de oitavo e de nono?
Maria: Não (.) eu trabalho só duas turmas né (.) dois anos regulares à tarde uma turma é
uma de oitavo e outra de nono como eu havia:: dito (.) °antes°
Cristina: E:: na sua opinião (.) quais os motivos que levaram a atual gestão do município
do Rio de Janeiro a retirar a língua espanhola das escolas?
Maria: Eu acredito que seja por (.) questão política (.) né (.) eu fiz o o concurso em dois
mil e do::ze (.) inicialmente eram destinadas pra minha CRE dez vagas (.) só que (.)
anteriormente houve um um concurso pra Inglês (.) que foram destinadas quinhentas vagas
pra Inglês (.) então (.) e:: infinitas né (.) vagas assim e foram chamados (.) professores
extras da língua inglesa (.) então eu acredito que o direcionamento do município do Rio
seja pra (.) com para língua estrangeira seja o Inglês e não (.) o Espanhol
Maria: Primeiro por causa do concurso pelo número de vagas (.) e segu::ndo que a CRE só
me permite entrar em turmas de projeto (.) e oitavo e nono anos
Cristina: E você acha que o Espanhol (.) eh você defende a manutenção do Espanhol
Maria: [Defe::ndo]
Maria: [Defe::ndo]
Maria: Defendo por (.) pela língua ser uma língua mais próxima à língua portuguesa pelos
nossos (.) eh:: países vizinhos (.) e também (.) pela:: facilidade que o aluno tem (.) ao
estudar uma língua neolatina (.) já que (.) nós (.) ramificamos do Latim
Maria: [Hmm não] só conheço aquele (.) decreto do Lula que institucionaliza a (.) língua
espanhola (.) para o ensino médio só
Maria: [Tá]
Cristina: [Aí] eu vou te dar (.) essa aqui (.) é a lei 2939 só pra você ler
Maria: [Ãh-hã]
Cristina: [o que] que tá falando né (.) e esse é o decreto (.) aí você lê e depois eu te
pergunto
Maria: Tá
Cristina: Ma- não precisa ler em voz alta não só pra você saber
Maria: OK
Maria: Tá
((Silêncio))
Maria: ( )
Maria: (tá)
((Silêncio))
Cristina: O quê?
Maria: no decreto
144
Cristina: Ãh
Maria: No decre::to (.) institui-se o programa Rio Criança Global para promover o ensino
das línguas estrangeiras nas escolas da rede municipal de ensino
Cristina: Ãh-hã
Maria: Aí↑ (.) fala sobre a importâ::ncia né de uma língua estrangeira (.) só que no artigo
um (.) fica cria::do (.) esse progra::ma (.) e institucionaliza o ensino da língua inglesa nas
unidades escolares da rede pública ni- municipal com enfoque na conversação (.) e no
segundo artigo (.) tá:: (.) eh explica como será a implementação (.) e diz (.) nas unidades
escolares do programa Escolas do Amanhã além das atividades (.) desenvolvidas no
horário normal (.) deverá haver reforço no ensino da língua inglesa no contratu::rno
Cristina: [O programa] Rio Criança Global (.) é essa implementação do Inglês que tá sendo
feita nas escolas
Cristina: [É não sei se] não é o termo não é bilíngue né mas eles tão querendo padroniza::r
o ensino de Inglês né
Maria: É
Cristina: Padronizar o ensino de Inglês (.) só ↑ que aquilo ali é um decreto onde amplia o
ensino de Inglês e aqui é uma lei (.) que obriga o ensino de Espanhol
Maria: [Municipal é]
Maria: Hmm
Cristina: a lei o decreto (.) eu queria que você me falasse quais são as implicações que
esses documentos (.) trazem pro ensino de língua espanhola aqui na no ensino de língua
espanhola não no ensino de língua estrangeira na rede... o que que você acha desses
documentos
Maria: [Ãh]
Maria: Bom... eu acredito que:: a rede não está (.) preparada para (.) este tipo de::
mudança... primeiro pelo número de (.) profissionais que não (.) eh:: (.) completa o quadro
mesmo tendo:: havido dois (.) concursos anteriores (.) né (.) e:: o ensino do Inglês como eu
já havia falado que existem mais (.) professores de Inglês (.) eles substituem (.) os de
língua espanhola↓ (.) então eh a:: secretaria ela (.) ela constrói uma lei (.) e na prática existe
uma o::utra regulamentação (.) por quê? (.) porque eu fui informada que eu só poderia
entrar pela (.) diretora do RH da quinta CRE que eu só poderia entrar nas turmas de projeto
oitavo e (.) nono ano (.) e é o que a direção tem feito comigo ao longo desses anos ao longo
desses quatro anos (.) e essa lei existe mas está engavetado (.) não está sendo posta em
prática (.) e eu acredito que não será posta em prática primeiro pelo desconhecimento dela
por nós (.) profissionais da língua (.) espanhola (.) e segundo pela prática da secretaria
municipal que (.) estende o ensino da língua inglesa para quase todas para quase toda a
rede... eu não acredito na (.) que isso será posto em prática (.) e:: será uma lei como está
atualmente engavetado
Maria: Mas não uma uma eu eu eu penso assim (.) um é a teoria outra é a prática
Maria: De nada espero que as minhas palavras (.) sejam úteis pra você::
Cristina: Entrevista com Rosa... Rosa (.) o Espanhol é ensinado na sua escola?
146
Rosa: É
Cristina: Também?
Rosa: Também
Rosa: Tem uma professora cedida (.) na nossa escola mas de matrícula eu (.) e uma outra
professora que agora tá saindo porque:: (.) Espanhol não pode ficar na escola de turno
único↓
Cristina: Entendi (.) e você vai ficar dando aula de Espanhol pro ano que vem?
Rosa: Não
Cristina: Entendi... então a retirada vai ser no ano que vem porque é uma escola de turno
único (.) então só vai ter Inglês
Rosa: [Isso]
Cristina: [Entendi] °tá°... e vem cá (.) qua::is na sua opinião quais são os motivos que
levaram a atual gestão do município do Rio de Janeiro a retirar a língua espanhola das
escolas?
Rosa: Na verdade:: ninguém entende nada... a respeito disso porque:: (.) inclusive a
secretária (.) a antiga secretária a Claudia Costin (.) ela dizia que o Espanhol era muito
importante (.) mas ela mesmo (.) ela (.) resolveu retirar (.) ela disse que não era:: (.) eh:: (.)
segundo o que (.) chegou pra:: (.) pra nós professores ela disse que seria uma aberração...
no município o ensino de língua espanhola que o importante é o Inglês
147
Rosa: Principalmente com co::m (.) nosso país cercado de países de língua espanhola (.)
então a proximidade é muito maior do que o contato com a língua inglesa a língua inglesa
(.) é mais comercial (.) ou (.) no traba::lho mas assim contato mesmo possibilidades de
viagem até do (.) dos brasileiros a a a fronteira mesmo a entrada deles aqui tá muito grande
(.) então acredito que:: °é mais importante°
Cristina: Você sabe por que (.) que o Espanhol tá sendo retirado?
Rosa: Não
Rosa: Não
Rosa: Não
Rosa: Não
Rosa: Não
Rosa: [Não]
Cristina: Existe uma lei municipal (.) que é essa 2939 (.) que obriga o ensino do Espanhol
Rosa: Ãh-hã
Cristina: E logo depois em 2009 lo-logo depois não dez anos depois em 2009 vem um
decreto (.) que (.) pede a ampliação do ensino do Inglês
Rosa: Ãh-hã
Cristina: Ele não é um decreto que fere (.) a lei municipal porque ele é um decreto
Rosa: Ãh-hã
Rosa: Isso
Cristina: Né (.) e aí o que que você acha disso que que implicações esses documentos
trazem pro ensino de língua es- de língua estrangeira na rede municipal né (.) a gente tem
uma lei municipal que obriga uma determinada língua um decreto que (.) na prática obriga
outra língua (.) que:: implicações esses documentos trazem pro ensino da língua
estrangeira?
Rosa: Bom na prática o que:: pode-se observar por exemplo (.) a ideia (.) que foi passada
pra nós é que o aluno começaria o 6º ano com Inglês (.) e iria até o 9º ano então aos poucos
o Espanhol seri::a retirado (.) sendo que (.) como não tem onde colocar os professores de
Espanhol (.) então foi permitido (.) tá foi uma concessão (.) segundo o que chega pra gente
que os professores permanecessem no nono ano (.) oitavo nono (.) sexto ano e sétimo não
poderiam dar mais aula de Espanhol (.) e aí a criança vem com sexto e sétimo com o Inglês
e ele passa pro Espanhol no oitavo e nono
Cristina: °Ãh-hã°
Rosa: Então isso já (.) complica bastante o ensino (.) no que se- poderia ser uma
continuidade (.) né poderia ter o Inglês poderia ter o Espanhol (.) começa no sexto ano
aquela turma com o Inglês essa com o Espanhol (.) e vai até o final mas não eles têm essa
mudança (.) e:: (.) geralmente o material oferecido não é um material (.) bom (.) não é um
material bom (.) então pro oitavo no- e nono ano o livro que chega é um livro que o aluno
deveria ter tido (.) eh:: (.) aula no sexto e no sétimo ter vindo já com (.) a didática daquele
livro pra chegar (.) naquele conteúdo (.) não, é o conteúdo que (.) tem que ser colocado pra
ele daquela forma sem ele antes conhecer o livro (.) então na verdade a gente nem trabalha
o conteúdo do oitavo e nono (.) que é imposto pelo:: pelo livro que chega (.) então (.)
acarreta bastante problema
Cristina: Tá só [isso]
Rosa: [Eles] têm livros próprios (.) eh dependendo da escola tem o:: (.) eu não sei se é o
Brasas ou Cultura Inglesa um dos dois (.) tá inserido em algumas escolas (.) na minha
escola tem então tem um grupinho de alu::nos que (.) fazem aquele (.) aquele cursinho ali
(.) paralelo (.) e tem o:: o Inglês é dado um livro (.) eh tem todo um suporte pra eles
também
ANEXO IX
149
ANEXO X
150
151
152
ANEXO XI
Convenções de transcrição
Símbolos Especificações
... pausa não medida
(.) micropausa
- corte abrupo da fala
? entonação ascendente
:: duração mais longa do alongamento da vogal
↑ subida de entonação
↓ descida de entonação