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Memória & Invenção

Organização
Tatiane Sousa
Apoio Cultural:

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Memória & Invenção
Organização
Tatiane Sousa
Ficha catalografica

design gráfico : Hector Isaias

ilustração capa: Antônio Américo

editoração: Chão
A topada é na, vírgula.

Maria Norma Colares


Autoras
Autores

Alana Loiola

Aline Valério

Alvo

Aurora Arcana

Cássia Barroso Bandeira

Fernando Albuquerque

Flávio da Conceição

Gáby Targino

Horácio Almeida

Leticia Moreira

Lídia Colaço de Albuquerque

Malui

Neide Ávila

Pat Tx

Rosa Morena

Sergio Rubens

Taciana Santos
Epílogo
Tatiane Sousa

Inventar um si, partir-se ao meio para inventar um meio


de mundo que não existe. Existe, talvez, na imaginação,
no delírio de ser o que se quer. Memórias são águas-vivas
dançando no fundo do mar. Dançamos com memórias feito
águas-vivas, nadamos com elas para o fundo e para o raso
de narrativas nem sempre vividas, conectando o “aterrissar
no mundo” com a “fundação de uma bolsa de valores”. As
escritas autobiográficas, desenharam uma experiência
poética inicial, à medida que traçaram um itinerário entre
o individual/coletivo, real/ficcional.

Para além e adentro das autobiografias ficcionais, ou


não, o itinerário feito na/pela memória conectou outros
pontos no percurso. Seguimos caminho nas leituras de
texto, nas reflexões políticas e poéticas sobre o mundo e
nos entendimentos que tem força para ventilar algumas
reflexões acerca de memória e invenção. Nisso as palavras
encontraram outros temas. E o amor veio. Nem precisou
chamar. Subverteu o verso e a prosa, a rima e a métrica..
colocou o dedo na cara dos gêneros textuais e fez o que
quis. Inventar um amor que não exista e convidá-lo a
tomar um chá com torradas num domingo à tarde, olhando
pelas entrelinhas da saudade, da ausência, dos ciclos, do
vambora, do deixa pra lá, dessa “ mania [...] de querer ver
os olhos”.

Nisso a escrita atravessou a fronteira, olhou as cadeiras que


estão postas a mesa da “grande literatura” e quem são as
pessoas que tem ocupado esses lugares, que tem se servido
nessa mesa posta. Inventar outros lugares e cavar brechas
para reposicionar as cadeiras que estão na mesa. Afinal,
a poesia nem sempre tá afim de rimar amor e dor, como
diz o poeta, o outro. Então recorreu-se a sutileza, esse
corte tão fino na pele que até o sangue pede licença pra
sair pelo orifício. Uma frestinha pode viraser um rasgo
grande na superfície mais fina e mais espessa da pele que
veste a cidade, as “pessoas-cidades”.

Deixar o invisível habitar o mistério, sem virar os olhos


quando ele bate no ombro e chama nosso nome. Cartas
de tarô pronunciaram as letras que compõem uma
utopia e provérbios anunciaram purvires que espreitam
nas brechas e nas dobras do espaço-tempo. Manifestar o
que se anuncia nos corpos que se esgueiram nas bordas
do sistemas de violência e de opressão para inventar uma
escrita pro corpo e um corpo pra escrita.

O tempo é o agora, um imperativo. Inventar “espaços


perecíveis de liberdade”, durante 2 ciclos de oficinas
literárias, cada uma com carga horária de 20h/aulas.
Espaços perecíveis, que passaram como um raio,
deixando que a gente pudesse ver o tempo se formar
e dizer: - tá bonito pra chover! Liberdade pra dizer,
liberdade pra discordar, liberdade pra confrontar,
liberdade pra desistir, liberdade pra.

Sem ela, não seria possível pensar com quantas palavras


se escreve uma utopia? E mesmo efêmeros, perecíveis,
os troncos das oficinas fraccionados em fruição e
criação plantearam utopias e delírios que não cabem nos
cânones, nem nas categorias de uma língua, que mesmo
viva, já nasce claudicante (por que apartada de uma visão
de gênero, raça e classe). É possível pensar nas palavras
para erguer uma utopia, num mundo em que não se tem
mais tempo, em que não se tem mais?
Fiquemos com a pergunta .
Agradecimentos

À Secretaria da Cultura do Estado do Ceará/Secult/Ce,


que através do XII Edital Ceará de Incentivo às Artes,
tornou possível esse projeto.

À Vila das Artes, que através da cessão de espaço tornou


possível os encontros.

À Edilson Pereira, Isadora Ravena e Danichi Hausen


Mizoguchi pela contribuição nas reflexões sobre Memória
e Invenção e qual o papel da Literatura na construção de
uma utopia.

À todas, todos, todes, autoras e autores, que compõem


esse e-livro, pela disponibilidade em entrar na roda e
botar o seu.

À Maria Norma Colares, poeta de quinta grandeza, que


cedeu o poema que integra a epígrafe.

À Cassia Barroso pelo trabalho de elaboração da ficha


catalográfica.

À equipe técnica composta por Hector Isaias, Thiberio


Azevedo que chegaram junto pra que esse projeto
pudesse navegar pelo bits e bites.
Manifesto
#1
paro.

penso
sinto
e s c a n c a r o

volte!!!!!!!

reaja

quero
saboreio
vivo.

Aline Valério
Divino
Rosa Morena

Procuro um poema
Que me vista a pele
E me desnude a alma

Um poema que me faça chorar


Diminuindo a dor
Que se propaga
Dentro de mim.

Procuro um poema
Que perdoe
As minhas culpas
E alivie os meus pesadelos.

Procuro um poema
Que sendo divino
Suporte o profano
Que habita dentro de mim.
Eu vi o sonho correr atrás de mim
Neide Ávila

Eu vi o sonho correr atrás de mim


Em face do perigo que corri
Me encontrei com a razão
Com fragmentos de tempo
Dos momentos que os sonhos
Eram pra mim ilusão
A palavra me trai
Alana Loiola

Como é ingênua a recordação, a


tentativa de descrever o que passou
Já foi, como aquele vento forte antes da
chuva começar
Na tentativa de lembrar eu me esqueci,
traída pela memória
Ou traída pela palavra?

No espaço no qual me encontro agora,


com as palavras, não vejo sentido em
lembrar de partes difíceis, lembro
do choro entalado na garganta,
inflamando os tecidos internos
as amígdalas pulsando no pescoço
entre as lágrimas e as palavras que não
saíram,

há um espaço

Ou talvez seja um pedaço de memória?

A palavra me trai quando tento usá-la


para lembrar
para descrever ou reescrever o que
passou, como aquele vento
já está chovendo, o vento já se encontra
com outros cabelos para balançar
Traída pela memória e pela a palavra
Me resta tempo para lembrar e
escrever?
Ah, o tempo
Tão subestimado e superestimado
Já não sou mais o tempo de agora,
passeio pelo tempo que passou,
ilusoriamente

Já sou tempo que vem, querendo


entender as últimas linhas escritas
Já não sou mais
mas também já não sei o que(m) sou

Sou essa tentativa de recordar e viver


existindo e reescrevendo o
esquecimento e descobrindo as
palavras que estavam presas na
garganta.
Quatro paredes
Malui

Existir entre quatro paredes depois de


existir em quatro paredes orgânicas.
Pareceu um baque. E aí me chamaram
de Maria. E outros adjetivos que
encontrei também é Maria, taurina,
neta do Rubens, mulher. Mulher?
Valha…
A minha mãe disse que eu nasci depois
dela tomar uma coca cola, às 19:00
da noite. Minha vò disse que eram as
sete da manhã, elas não entram em
acordo e eu fico entre o ascendente
geminiano e o sagita. Era segunda-
feira e provavelmente estava nublado.
Um presidente havia sido agredido
com tomates depois de estabelecer
autoritariamente a regra de que todos
os políticos na Holanda usariam
moicanos. Ele lambia seus lábios com o
gosto doce de tomate e eu chorava em
um hospital alencarino. Minha mãe se
questionava se a enfermeira havia me
sequestrado, enquanto me banhava.
Minha vó observava tudo e pensava a
logística de irem todos pra casa, meu
pai sentia medo, meu avô em casa me
dedicava uma música.
Ode ao Poema
Rosa Morena

Só os poemas devoram as minhas


tempestades
Só os poemas escutam os meus gritos
como janelas abertas
Só os poemas transitam na madrugada
onde sou insônia
Só os poemas conversam com as
minhas esperanças
e os meus desertos
Só os poemas assustam os meus
fantasmas
e quebram os meus silêncios
Só os poemas recolhem os pedaços
que sobraram dos meus sonhos
Só os poemas me salvam da volúpia
do asfalto quente
Só os poemas testemunham os meus
naufrágios
e os meus atalhos para sobreviver

Só os poemas me sabem.
22 de setembro
Horácio Almeida

2000.

23 horas e 15 minutos no horário de


Brasília. Em outros lugares, mais cedo
e em outros, mais tarde. Durante a
infância, tinha muita curiosidade em
saber que horas era no Japão. Hoje, eu
sei. Eram 11:15 da manhã.

Mas isso não interfere (será?) no


acontecido:

o cúspide virgem/libra que sou foi


cuspido no mundo.

Tava chovendo, mas não era chuva vinda


das nuvens. Era uma chuva mais íntima.
Uma chuva que vi outras vezes quando
olhava para o rosto de minha mãe.

O mundo naquele dia só não foi mais


chato porque nasci.

Quem liga para a fundação de um grupo


de bolsas de valores se nesse dia eu fui
fundado?

Aliás, olá. Sou Horácio.


A bola
Gaby Targino

Pensei que a bola era apenas um objeto


e que era só isso, nunca pensei como
forma de arte. Até lembrar , através dela,
do meu pai.

Quando eu tinha 2 anos, meu pai me


levava à praia duas vezes por semana
pra jogar bola e brincar,

ele queria que eu fosse jogadora de


futebol, mas com 2 ou 3 anos, eu disse
a ele que queria ser artista e ele só disse
“ tudo bem, mas seja a melhor”, então a
bola ali representou a liberdade que o
meu pai sempre permitiu. Além da nossa
ligação. Talvez por isso eu nunca deixei
de amar futebol e é uma paixão até hoje,
talvez por isso não posso aceitar mais
ser podada ou que não possa realizar

meus sonhos, talvez por isso também eu


ame liberdade e ame saber que a tenho.

Amo a liberdade de ser quem eu sou e


de poder sonhar e realizar. Vivemos em
um planeta Terra – redondo, temos que
afirmar ainda – talvez representando
ciclos, que tudo são ciclos e que nada
se finda por completo, sempre algo
ressurge e assim a continuidade eterna
de todas as coisas. Então a bola e os ciclos
também me levam a espiritualidade, que
também me lembra o meu pai, e como
ele também sempre foi compreensivo
quando eu entrei na Umbanda. A
liberdade de ser quem sou. Às vezes amo
e às vezes detesto o mundo que estou,
mas sou grata pois também é feito dos
ciclos que, no momento, tento fazer com
que traga outro ciclo, e assim vai.

A bola, redonda, cíclica, que passa por


todos em algum momento, seja sabendo
usá-la ou não; a bola que vê muito, que
surge e ressurge; cria e des-cria, a bola
que corre, rola, voa, apanha e bate, a
bola que me lembra meu pai, me lembra
o mundo, me lembra viajar, me lembra
a infinitude da vida e dos sonhos e das
mudanças e de ser artista.

Obrigada, pai.
Como criança
Neide Ávila

Me reconheço muitas vezes nas saídas


inusitadas, engraçadas, dissimuladas
que as crianças apresentam. Com elas
me encontro com um eu mais profundo,
meio perdido que pulsa dentro de mim.
Gostaria, em inúmeras situações poder
voltar a ser criança, sem o peso do que
a vida adulta amontoou sobre minhas
costas, cansada de carregar fardos que
muitas vezes nem são meus. O agora, o
instante que nem sempre é percebido, o
já, as experimentações em tempo real, é
apenas vivido, é o território de supremo
poder de emanar a alma límpida e
fecunda da mente criativa infantil.
Quero viajar sem pensar no valor das
coisas, montar no tapete mágico da
imaginação infantil e me contentar com
a brisa no rosto, sem pensar no amanhã.
Amanhã? “Ele é o depois do ontem”,
o dia que não existe e que antecede o
que ainda não veio. As contradições se
fazem presentes, imanentes, e furam
as bolhas criadas para separar, moldar
o que não é como o mundo de regras
gostaria que fosse. E o futuro que não
nos pertence, nem mesmo existe. As
certezas andam soltas, ao vento, sem
perceber os abismos e as ciladas da vida
adulta que aprisionam e corrompem.

verão - 3.000
Primavera de depois de amanhã
Rosa Morena

primavera de depois de amanhã


eu vi, quando o corpo
ferido manchou de palavras
a rua indiferente
Eu mesma ou ficção?
Aline Valério

Era 9 de outubro de 1983, e a louca


viagem de viver estaria só começando.
Enquanto uma guerra nuclear mundial,
entre Estados Unidos e União Soviética,
quase “estourava” no mundo, havia
uma grande expectativa no 308, na
pacata rua Álvaro Martins, no bairro
fortalezense Jardim América: Tereza
e Chico esperavam o nascimento da
primogênita, e com ela muitos sonhos e
desejos. Mas de quem?

O sol acabara de nascer, minha


mãe – que odiava acordar cedo –
despertara entre o desconforto das 40
semanas e o terror da voz de uma amiga
da minha avó materna dizendo: “Parto
normal não dói, é como cagar um coco”.
Incrível como o ser humano não perde a
oportunidade de ficar calado.


Como de costume, meu pai varria o
quintal e cantava; naquele dia ao som
de alguns dos hits do momento: Rita Lee
e seu álbum recém-lançado Bombom.
Entre as faixas “Desculpe o Auê”, “On
the Rocks” e - as mais polêmicas e
censuradas para menores de 18 anos -
“Arrombou o cofre” e “Degustação”, meu
pai, 25 anos, e minha mãe, 21, deixavam
ecoar pelas letras o sentimento de
moderninhos e descolados.

Opala, black power, minissaia de


contos, “comportamentos subversivos” e
discurso liberal lembravam a juventude
do casal. Mal sabiam eles que a liberdade
viria, de verdade, aos 39 anos da libriana
“porra louca” que sempre se disfarçou
de boazinha.
Não havia quadro ou pó de giz
Taciana Santos

Não havia quadro ou pó de giz


nesse dia, nem apito, balanço ou
fumaça
Já era noite
dividida entre festa e silêncio
tensão e alívio.
Capricorniana,
nasceu sob o céu anoitecido de estrelas
Tecidos em espirais,
caem sobre os olhos de tua mãe,
seguidas das bochechas de teu pai
quais caminhos te reservam, ternura?
Quando janeiro iniciou 1995,
e lobos extintos voltaram pra casa
no aniversário em que D. Pedro disse
que fico
Numa segunda feira qualquer
balançando na rede
para espantar o calor
sussurrei baixinho
Vai menina, ser livre na vida!
Foi a bondade que escolheu teu nome.
Se você cruzar uma linha
Pat Tx

Se você cruzar uma linha na outra


formando uma cruz, você terá um ponto
de encontro entre elas que costumamos
chamar de meio.

A cruz tem esse meio, assim como nosso


corpo possui esse meio, se é que me
entende. Assim como a América do Sul
possui.

Se você cruzar linhas no corpo, pode


chegar até outro sul: o cú. E se você
cruzar linhas na América do Sul,
geograficamente você terá Cuiabá.

Nasci doze de novembro de


noventa e sete, querendo muito vir
ao mundo, feliz e cabeluda. Não só
querendo vir ao mundo, mas querendo
muito que meu mapa astral fosse do
jeito que fosse, sendo assim a chegada
situada no tempo dos homens às 6h59
da

manhã. Manhã solar, onde vez ou


outra acordo no horário que nasci e me
pergunto o que será que isso significa,
ainda mais às quartas-feiras, como
no dia que aqui encarnada aterrissei.
Acho que chegou a hora de inventar um
significado.
Manifesto
#2
faço
construo
mutilo

su…gira

cresça
a
tro
pele

afete

GRITO

p l
u o

refaça.

Horácio Almeida
Estação
Alvo

Lembro daquele dia que


timidamente
eu fui te encontrar na estação
O meu coração batia forte
com cada toque e olhar que trocávamos

Tudo que eu queria era


acabar com a tua sede
e te beijar até cansar

Pegamos nossas bicicletas


mas a chuva também nos pegou
Eu queria que chovesse hoje

Quero lembrar de nós


de baixo das árvores
nos protegendo das gotas grossas
da chuva forte

Eu sempre fico preso


nas poucas
e nas pequenas
lembranças boas
das minhas paixões.
Nosso encontro em Iracema
Alana Loiola

Como areia macia da Praia de Iracema,


sinto suas costas, seu peitoral e braços

Quando os toco e o abraço

Sua pele queimada e ardente do sol, das


quatro da tarde

Sentamos na areia e falamos sobre a


vida

O som do mar de Iracema tem poesia,


rimos das crianças, do cachorro com
sua bolinha

Brincamos com nossas piadas internas,


com nossa saudade e vontade

Lamentamos como a vida, às vezes, é


injusta e dolorosa

O mar ainda nos olha

Olhamos para ele de volta e nos


voltamos para nosso abraço

E o afeto?

Fica marcado na areia de Iracema, na


canga amassada
Naquele dia nos despedimos e nos
reencontramos

O mar ainda nos olha, o sol ainda


esquenta nossa pele e nosso carinho

Tão macia são as palavras e como o


som das ondas quebrando chega até
nós

Cobrimos os olhos com lentes meio


escuras, com algumas tímidas lágrimas

O sorriso aparece em alguns momentos

Acho que sabemos aproveitar o tempo

Somos atentos

O mar nos olha novamente, fotografa


nossa confissão

Refletido em nossos olhos

Parece que sabemos apreciar a vida, o


mar e a poesia dessa cidade.
Eu vi solidão imbuída na ternura,
mas faltava o olhar
Letícia Moreira

Eu vi solidão imbuída na ternura, mas


faltava o olhar

Até eu não mais.

contradição.

faltava

tempo afeto.

lacuna. você ainda vê? o que precisa ser


compartilhado?

a um toque de distância. ficção castrada

na porta de casa.

Você ainda me enxerga?

Deixo esse bilhete pra te ver

Daqui te sinto

Respiro. Enxergo!

(alguém que vê. yeux ouvert)


Rios e Perdão
Atributo: Água
Aurora Arcana

Olhos de chuva

Boca da nascente

Que o céu reflita o oceano

Que o oceano reflita o céu

Desaguando e levando seu corpo

Sua lembrança

Que as correntes te carreguem para o


riacho de onde viemos

Afogando a monstruosidade que se


tornou pra mim

Mas que também apaguem a memória


de mim que existe em você

As águas vão curar teus sentidos e


mesmo assim (nunca mais) vai achar o
caminho de volta para “nós”

Por enquanto, preciso que vá embora

Adeus
Estar apaixonada e não ser
correspondida
Rosa Morena

Estar apaixonada e não ser


correspondida

Fugir sem saber pra onde ir

Ser o porquinho que construiu a casa


de palha

A inocência de chapeuzinho vermelho


pela estrada a fora
Paratodos
Alvo

Sou péssimo em criar


boas memórias

Talvez você seja


melhor do que eu
Riso Perdido
Neide Ávila

Por um tempo desaprendi a sorrir


Não sabia mais sentir
O gosto de uma risada
Não achava graça numa piada
Não sabia mais rir por dentro
Não havia mais sentimento
No meu rir
No meu cantar
Não conseguia mais sentir
O prazer de gargalhar
Não conseguia nem lembrar
Um sorriso de alegria
Ou a alegria de sorrir
(...)
Um riso solto
Um riso largo
Um riso doce
Atraente
Já não sabia mais sorrir
De repente
Tudo era amargo
Tudo era frio
Vazio
Um rio de amargura
E aquela doçura
Não tinha mais lugar
(...)
Um riso forçado
Um riso perdido
Um riso fingido
Um riso esquecido
Na gaveta da alegria
E pensar que um dia
Ele foi tão colorido
Chegava a ser engraçado
Era estampado
De chita
Com as cores mais bonitas
Que se pode imaginar
(...)
E assim foi por muito tempo
Um riso solto ao vento
Sem nenhuma expressividade
Não revelava a verdade
Só disfarçava o meu penar
Até meu dia cruzar
Com a alegria do teu olhar
Que ativou os meus sentidos
Encontrou os meus perdidos
Pude me reencontrar
Um olhar envolvente
Que iluminou de repente
Trouxe brilho ao meu sorriso
E hoje tudo que eu preciso
É desse teu olhar.
Eu vi muito fogo
Aurora Arcana

Eu vi muito fogo
Fogo demais
Entrando por todos os buracos
da casa
não era morte, não
era desejo
comia tudo, tudo
mastigou tudo e foi embora
deixou só faísca pra começar
de novo e de novo e de novo
4 (Tempo contado)
Alvo

4 horas
1/6 de um dia

Talvez esse tenha sido o tempo que


ficamos juntos da última vez
Talvez menos

Você olhava para o relógio e já tinha


hora marcada para partir
eu fingia que era normal você nunca
querer ficar

E as despedidas já doíam a muito


tempo
eu tentava disfarçar

Meu semblante triste e meus olhos


molhados
se contentavam com uma promessa
que nunca se concretizava
Embaça os olhos
Alana Loiola

Embaça os olhos
Água salgada arrepia a pele
Passeia pela boca e as maçãs
Vou colorindo
Colorindo minha dor
Minha saudade
Minha angústia

Colorindo
Meu corpo
Meus lábios
Meu prazer

Deixando manchada
A roupa
Sua face
E minhas cicatrizes

Colorindo minha lembrança


Minha tristeza
E melancolia
Fazendo tricô com (noss)os caminhos
paralelos
Trilhando minha verdade e minha
mentira
Em preto e branco
Como diria Chico
coloco na vitrine minhas dores e meu
tesão
Em promoção
Para te dar cor(agem) e alegria.
Desenho de um olhar
Rosa Morena

Não era feio


Tinha cabelos que pareciam planta
Galhos grossos, armados de tempo
Tinha grosso modo de existir
Fincado no chão feito planta
Os cabelos tomavam-lhe as feições
Essa mania que eu tenho
De querer ver os olhos.
Entre Oásis e Arcanos
Aurora Arcana

Você chama pelo meu nome


Deito nos teus pés como felina
Subindo entre os pelos das pernas de
terra molhada
Terra molhada pelo suor entre nós dois
Meus cabelos enroscando no teu corpo
como serpentes
Sou o demônio que monta em você
quando deita
A luz que incomoda os olhos pela
manhã
Te conto meus segredos ao pé do
ouvido
Desvendando na ponta dos dedos
Desenhando desejos
Me cobrindo como uma onda
Te mergulho
Nos misturamos em mar
Vislumbres no meio do deserto
Morando nos mistérios da tua boca
Aquilo que cabe dentro
Letícia Moreira

Aquilo que cabe dentro dele


o que cabe dentro de mim
Partilho o beijo, o cafuné
o toque…te eterniza
na memória, no fragmento
da retina que se move lentamente
só pra te guardar em mim
Fui partida
Alana Loiola

Fui partida
Fui muita
Fui acelerada, fui ansiosa, fui
carinhosa, fui sedutora, fui leal, fui de
verdade
Fui coração, força e medo
Fui à vontade
Fui ‘cabeça’, fui de cabeça, mergulhando
com dores e tempestade
Fui sereno de chuva
Fui nadando e sentindo o sol queimar
meu rosto
Fui apaixonante e apaixonada
Fui transbordante e viciante
Fui para dentro
Fui expulsa do meu próprio lar
Fui até o passado
Fui no futuro (inexistente)
Transgredi a conjugação
Voltei
Fui expectativa e lira
Fui agonia
Fui confusão e calmaria
Várias coisas em uma coisa só
Vários momentos em um só
Fui tudo isso
E fui também despedida.
Fim de tarde no Poço da Draga
Alvo

Nós dois nas pedras, sentados


enquanto as ondas dançam
e o sol pinta nossa pele
partindo

(E tive que assumir para o meu eu


o quanto desejava isso)

Você atrás de mim


teus braços em meus ombros
os respingos das ondas
molhando nosso silêncio

O cheiro do mar e o teu cheiro


O vento e o teu abraço
Tudo isso misturado
Clichê

(Como eu queria que esse momento


se repetisse infinitas vezes)
Nos braços do Redentor
Horácio Almeida

Nossos corpos dançando ao som da


playlist que cê colocou. Dança nua,
crua. Carne apertada. Tesão de ti ter
perto. Tesão de ter ali. Aquele frio
apartamento alugado no centro da
Cidade Maravilhosa foi quente por uma
noite. Último dia de viagem. Eu não
sabia o que esperar ou fazer ou pensar,
eu só sabia que horas se passam. Eu e
você tínhamos um tempo limite naquele
lugar. Era como uma bomba onde não se
tem como impedir a explosão iminente
e só o que se podia fazer era aproveitar
cada momento vivo.
E aproveitamos.
A pizza que pedimos estragou e eu
não me importei, porque, naquele dia,
entre comer e passar mais meia hora
abraçado, enrolado, excitado contigo,
eu preferia que nem comida tivéssemos
pedido. Exagero talvez, mas meu
ascendente e lua em câncer amam esse
afeto. Afeto. Intimidade. Amam. Amo. O
teu toque em cada centímetro do meu
corpo, eu lembro. Lembro também da
catarse, do choro quando finalmente
percebi que estava dando a hora. Você
me disse palavras de consolo que, por
um momento, resolveram a situação. E
me abraçou. Forte.
Até que a bomba explodiu.
Pequena correria de ajeitar as coisas,
mala, mochila, cabelo, coração.
Te dei uma pulseira que nem faço ideia
se você ainda tem, mas me conforta
saber que minha memória pode está ao
alcance do seu braço pra quando você
quiser.
Tudo pronto. O carro de aplicativo que
pedi veio rápido. Rápido demais. Sentado
naquele banco só conseguia pensar uma
coisa. Por que não sentamos lado a lado?
Eu queria ter segurado sua mão até
chegarmos a sua parada: a ponte. Quer
dizer, as pontes. Teve a que você passou
após me abraçar fortemente, depois
que desceu do carro. E teve a ponte que
construí, a da distância. Essa era a que
eu mais tive vontade de derrubar.
O aeroporto vazio, madrugada. Dentro
do avião vi sua mensagem de despedida
enquanto olhava pela janela as casas,
os edifícios. Tentativa de te ver na
janela do seu quarto que eu nem sabia
onde era. No lugar disso vi ele. Grande
e imponente. Com seus braços abertos.
Como se oferecesse um abraço.
Não eram os braços abertos do Redentor
que eu queria.
Eram os seus.
Onde se encontra o amor?
Sergio Rubens

Onde se encontra o amor?

Será num verso romântico

Em cada gesto semântico

Ou no perfume da flor?

Na inspiração do autor

Ou no abraço da criança?

Num olhar de esperança

Ou num sorriso qualquer?

Talvez em um bem me quer

Ou numa doce lembrança

No desejo dos amantes

Ou no encostar dos lábios?

Nos pensamentos dos sábios

Ou nas ausências constantes?


Será nos sons dissonantes

Que se encontra o amor?

Talvez na ausência dor

Ou na feliz coincidência

No desprezo da aparência

Ou no universo multicor?

Aonde que está o amor?

Será que está no lar?

Talvez em algum lugar

Que haja paz e bom humor.

Pode está em um clamor

Lutando por liberdade.

Ou talvez na amizade

Que de graça é concedida.

Pode estar na despedida

Ou na dor de uma saudade.


Manifesto
#3
percebo
pretendo
compreendo
tolero

proponho

reflito

resisto

converso

respeito

SINTONIZO.

Lídia Colaço Albuquerque


A justiça
Cassia Barroso Bandeira

A justiça se cria no presente.


O ferro para ser ferro tem que passar
pelo fogo.
Na carta, mulher negra aparentando
meia-idade, aparenta ser
forte também. Está no alto, como
se falasse para uma multidão.
Ao fundo, um céu azul claro e com
nuvens. Em sua mão, uma tocha de
fogo. Do seu lado, uma
espécie de escadaria.
Batentes que a levarão ao alto.
Quando você se partiu
Alana Loiola

eu sei
vai se partir
morte e vida vão se
dividir
ver a morte
o chão da casa está cheio de giletes
Verão 3000
Rosa Morena

Eu vi a fragmentação da
violência, em um instante
de ternura.
Já não contemplo a finitude.
Teofurolho
Flávio da Conceição

Teofurolho catolinquifero
deusesperatus
civilizarrastão ruminagente
gramaticavida dessujeita nerohumores
futhomem go go gool
potriarcpatrão porchomem
fagocitogoverarte
necroverve distópico avatareternus
pensakpensa saberpensar
RizomAnhangá
Orilogos
Exup
Oxalá-Ifé
três décadas após a volta na
travessia da violência
Pat Tx

três décadas após a volta na travessia


da violência

eu vi a contradição no desejo da raiva.

me consumindo por inteira com


ternura.

numa ternura que devora somente um


instante.

sentia o perigo dela tomando conta do

meu corpo, pesando no peito até num

ato de saudade da arte, vivi meus pés e

engolida pela raiva, voltei a


translucidez,

pó, joga a bomba


Ser que nasce dentro de qualquer peito
Malui

Ser que nasce dentro de qualquer peito,


fazendo morada em sujeitos após

uma pequena ou grande dose de calor


que pode ser engolida de

uma vez ou aos poucos gerando uma


lembrança que é um dos principais

alimentos para nutrição da ternura, que


por sua vez pode ser alimentada

por muitas coisas, pessoas e


experiências.
Identidade
Rosa Morena

As pedras eram minhas irmãs


O mesmo silêncio
O mesmo destino
A mesma solidão.

Irmãs desgastadas
Por vento
Chuva
Erosão
E tempo.
15º dia após a destruição da lua
Alvo

Eu vi incoerência
Uma borboleta do tamanho do frio
Os momentos de afeto eram perigosos
E o amor que eu tinha
Era apenas um desejo
Que morreu
Com a solidão, sem o brilho da
invenção
da existência, insustentável
em um mundo que nada mudou
mesmo sem a lua
Depois do que vi não mais acredito em
tempo
Elo
Neide Ávila

Elo, conexão, sentir, sentidos que se


entrelaçam.
Aquilo que nos toca,
o que toca o outro.
Pode ser algo sereno, ou um
turbilhão.
Pode transitar entre o positivo ou
negativo.
Conjunto de emoções…
As palavras às vezes faltam
para descrever o misto de
sensações que os sentimentos nos
provocam.
Crise dos mísseis e guerra nuclear
Fernando Albuquerque

Ano que nasci, crise dos mísseis e


guerra nuclear
copa do mundo, eu do signo de gêmeos,
muito sentido
um clima muito quente, semana
desenha um local no interior do Ceará
o que aconteceu? a terra parou
de girar não tinha sol. só escuridão.
Eu estava ali a cidade também
Letícia Moreira

No café, tomando um expresso com


chantily e os pés esticados no puff- o
velho me dava a benção, a cidade
poderia ser toda minha.

teria sido mais um dia comum, exceto


pelo fato de eu estar pelo menos em
algumas horas… inteira. No meio dos
livros, linhas, questionamentos, não
tinha dúvidas que tudo ao redor apenas
existia e o momento era aquele dele,
inteiro, servido e visível a olho nu, bem
ali na minha frente. Nas páginas em
cada dobra um movimento central, me
retomava pouco a pouco e em cada
linha, uma redescoberta a possibilidade
escancarada numa página escrita.
no silêncio de quem compartilhava o
mesmo momento, segurando pelas
bordas com dedos inteiros… sem perigo
de cair num momento de distração.
Nas andanças procurando encontrar
nas prateleiras um detalhe que me
fizesse saltar os olhos, novas estórias
me pegaram pela mão, e cada livro
olhado naquele sebo me devolvia
uma parte esquecida, que achei que
os rabiscos por cima nos labores
cotidianos tinham a tornado ilegível.
com os livros nas mãos, algumas
anotações no pequeno caderno e uma
borbulhação constante na mente que
ia e vinha entre as prateleiras, uma
pequena pausa. Enquanto tomava um
café com chantilly e acomodava meu
corpo como se todo aquele espaço me
fosse pertencido, a rotina alheia me
estapeou com dedos de algodão. O ir e
vir do outro acordou meu movimento
adormecido, em alguns momentos
achei que hibernação não tinha data
marcada- na verdade talvez ainda
não tenha- mas a prévia dela me
agarrou pelos olhos. Eu ainda estava
ali imersa numa cidade que transborda
possibilidades em cada sol do meio dia
brincando de arder a pele, em cada
brisa no fim de tarde que parece que vai
levar o corpo inteiro.

Eu ainda estava ali e de repente flashes


fotografaram o devaneio, flashes
mentais. Eu poderia estar em qualquer
lugar, em Tokyo, Nova York, Paris- por
que não? mas eu estava ali naquele
momento- e eu ainda estou- o sol me
encarava num deboche ácido, se falasse
talvez dissesse “ se liga garota, teus pés
também tocam esse chão”
eu havia me esquecido, achando que
os rabiscos eram maiores que a letra
por debaixo deles, mas ainda era
legível. Enquanto terminava o café,
olhando pro lado pensando neles, os
conselhos solares- a mente já estava
no último grau de borbulhação pelo
visto- uma carta do tarot saltava do
baralho, em movimento, em cotidiana.
Imaterializada

o velho barbudo, de cabelo branco


num voyage branco antigo, uma peça
completamente fora da órbita “normal”
do cotidiano no centro da cidade. Me
encarava, sem desejo, sem sexualidade
envolvida, me encarava como se
cúmplice do sol também tivesse sua
mensagem subliminar a dizer.

O encarei de volta, sem medo, sem


culpa. Inteira, com todos os rabiscos
legiveis por detrás de toda aquela
aparente bagunça;

Eu estava ali e a cidade também.


Inverno 2050
Rosa Morena

Eu vi
janelas fechadas na
negritude da noite
o grito e o silêncio
Minha utopia
Alana Loiola

A vejo, parece pensar há muito tempo


há juventude e densidade no seu rosto e
no seu céu
Seu caminho, entre águas, pedras,
estradas e sofreguidão,
fica difícil se mover
A vejo, vê o mundo, seu céu e se
distancia
Quanto tempo dura a distância?
Quanto tempo dura o encontro?
Seus medos parecem paredes
rebocadas, de quadro e de
tinta a óleo
Uma casa decorada e arrumada, mas
não
está pronta para ficar sozinha.
De uma janela, como sua imaginação
vê a água, o barco e o desejo
lhe falta a passagem para retirar-se
da casa, do medo e das pedras
São um só?
Encontra o desejo com a distância que
o tempo não diz.
Como escrevo minha utopia?
Já vi
Pat Tx

Já viu os ditados pescados na


imaginação coletiva? Foram
descobertos no biscoito maria da sorte:

Quem não pisa devagar, acorda o


elefante.

De nada adianta o escaldo do sol, se


congela no ar-condicionado.

Mudarás de número no whatsapp, não


cairás nas mesmas conversinhas.
Manifesto
#4
su
je
ita
ram

nego.

ando ando ando

corro corro corro corro corro corro

re
existo

re
vivo

LUTO!

Sergio Rubens
Utopia
Cassia Barroso Bandeira

Justiça para o mínimo

dos fatos

Justiça aguçada

em todos os seres humanos

A verdade em tudo e em todos

Que a verdade

seja o principal

teor do ser humano


Eu vi pau com L
Malui

Eu vi pau com L, translucidez e afeto


em uma escrita-violência que quebrava
violência

instante de ternura ansiava muito,


muito, ansiava ainda um gole. afago
no tempo que se diluíssem dentro
dos corpos como coragem, próximo
passo, que levando os olhos para outros
panoramas faz a cabeça arrastar o
corpo.
Matéria
Pat Tx

Escrevo a Utopia no meu corpo, na


minha vida e horizontalmente de
acordo com o impossível. O que é a
Utopia?

Com quantas palavras escrevo a utopia?


Eis que surge: 4 palavras no dia 4 do
mês 4 ao tirar 4 de Ouros no Tarot.

Pareceu mais um sinal de presença


neste presente: olha pra frente!

Pensando nessa pergunta, surge


outra questão, a minha Utopia tem
entrado meu discurso? Nos espaços de
convivência?

Minha racionalidade tem estado de


acordo com meus sonhos?

A tal jornada com esses pés


incansavelmente dançantes na
travessia trouxeram o Tarot para essa
conversa de cumadre com o acaso. Ele
dizendo, por meio de outra boca, que
estou apegada à algo que nem tenho
clareza do que se é, de brincadeira quis
jogar uma luz…
Equilibre-se: não tenha medo.

CUIDADO! Periga-se deixar tudo pra


trás: tenha medo.

Não seja consumida pelas suas próprias


conquistas, deixa tudo pra trás.

Não confie, fica com o faro fino.

CONFIA! Não fica parada no tempo.

Direcionando todas esses diálogos que


o meu perímetro mental pratica, foco
minhas energias. É Limpeza! Foi o Tarot
que me disse por meio de outra boca,
outra garganta, outro eco do mundo.

É pelo acaso que se constrói minha


crença utópica.
Um homem só
Taciana Santos

Um homem só

bradava maldizendo alguma coisa.

Parangaba.

Hora de pico.

Alguns riam, outros se afastavam,


outros se viravam,

o Homem Só incomodava as pessoas


nas filas.

Eu, não tão distante e vendo a cena


só pensei “lá vem o pregador de
intolerâncias” e de fato, ele veio. E veio
bradando suas intolerâncias de Homem
Só. Nem todo mundo ouvia.

Era a intolerância de um trabalhador


só. Que sozinho, sem passeata,
megafone ou camiseta de cor,
bradava indignado com o aumento da
passagem.

O Homem Só, tinha lá seus 40/50 anos,


vestia-se como veste um trabalhador,
gritava como gritava um trabalhador,
indignava-se como se indignava um
trabalhador.
Reclamava em seus berros o aumento
da passagem, o salário ruim, a vida
difícil, os filhos pra criar, o lazer
prejudicado.

Reclamava o governo que não olhava


pra ele, que era um Homem Só, no
meio da plataforma.

Gritava como quem pede socorro


e estava pedindo de verdade, pois
o Homem Só, só grita para outros
homens sós, é onde ele anda e onde ele
pode ser, quem sabe, ouvido.

Reclamava que 20 centavos quase


partiu o país em mil, e esse aumento
aqui? Pra onde vai o Brasil? Como EU
vou para algum lugar?

Em suas palavras só lhe faltava o grito


explícito de socorro porque de fato
talvez já estivesse gritando por socorro
ali.

O Homem Só, foi tido por louco,


ignorado, ninguém queria ouvir.

Eu, que primeiro me vi em recusa e


depois entendi, me pus a ouvir este
homem, me compadeci de sua dor,
porque sou estudante mas também sou
filha de trabalhador.

Mas eu , uma mulher só,


(Que pode uma mulher só?)

como outros tantos sós que passaram


por ele, me compadeci de seus gritos,
porque também eu queria gritar, mas
por ser mulher só, sangrei por dentro e
só. Subi no ônibus caro e só.

essa noite me sonhei nascendo

e minha mãe me lavava nas águas do


rio

ela me sorria

lembro seus dentes, seus cabelos, suas


feições

seus cabelos lisos e com franja

seus colares e miçangas

e me dizia palavras que eu não entendia

e me sorria

Eu era um bebê.

Sorria, batia braços e pernas

sentindo a água correr

eu vi as pedras do rio

eu vi a mata se abrir

e num bocejo uivante do vento


eu vi a copa das árvores se abrir

me mostrando o céu azul

Sendo bem vinda a fazer parte disto.

O sol me ofuscou a vista

ao abrir os olhos, depois da claridade

o olhar retoma o foco

quase passei da parada.


Confissão
Rosa Morena

O meu peito engano


Sofre de corrosão nas artérias
Sinto dor na terceira vértebra

Choveu no emaranhado dos meus dias


Verões não enxugaram os meus
invernos
Ausências envelheceram as minhas
pretensões

Tenho sonhos empoeirados para o voo


Nenhuma noite é maior que a minha
insônia
Nenhum corpo é maior que a minha
sombra

Ando atravessada de memórias


Nenhuma noite estrelada me socorre.
CidadeDramaturgiaDaRelação
Pat Tx

Pessoas-cidades, como vivem?

Elas habitam narrativas, pois estar vivo


é relação. Você já visitou uma pessoa-
cidade essa semana?

Seu chão, suas habitações, seus becos


secretos… Sentiu o seu clima?

Elas são fluxos que visitamos ao nos


perdermos de um universo, tropeçando
numa prazerosa e difícil queda
contínua em outro,“sem querer” (será
mesmo?).

Um delicioso fluxo de desejo se


abre nessa visitação porque acaba
bombeando vida. Sabe de uma coisa, a
sensação é de querer sair correndo ao
lado dessas sinuosidades de controle,
nas ruas das pessoas-cidade.

Ah, as ruas das pessoas-cidade.

Rua, essa organização temporária e


transitória que construímos juntos,
alguns mais conscientes que outros
em diferentes estados de consciência.
Se reinventando a cada instante, a
experiência protagoniza a criação do
ambiente e não a estrutura, mesmo
concreta, fazendo com que esse
ambiente entre em nós pelas nossas
entranhas de solo e cabeça, quando
as nossas raízes crescem para cima e
para baixo ao caminhar pela pessoa-
cidade. Numa trovoada tempestuosa
na urbanidade humana, nasce a
relação de intimidade. Qual a fração de
tempo de um acontecimento para ele
ser emocionante dentro das pessoas-
cidades?

Coisas muito grandes e muito pequenas


habitam as pessoas-cidade. No grande,
ficou opaco, mas no pequenininho,
ao investigarmos com a lupa do tato
cardíaco, como uma mágica aparece
a potência da narrativa que residimos.
Ali achei você! Você também é uma
pessoa-cidade.
Na memória do corpo
Rosa Morena

Na memória do corpo
Estava a solidão
Sentada de braços abertos
Magia da criação
Malui

calor escaldante, forças temporais se


sobrepondo a magia da criação

e movimentos gerando desnorte. folhas


nascendo em meio ao desnorte

e dureza. energia de recomposição.


beleza e coragem se sobressaindo
em um ambiente caótico. luz e cores
contrastando em desordem e amor.
Caderno oculto
Alvo

Meu caderno de poesias


se escondeu de mim
Está cansado de ser usado
Já não possui folhas em branco
Uso até a parte de trás de algumas

Pobre caderno
agora se escondeu
mas eu vou achar
Isso é uma ameaça
caderno safado
Está tentando me sabotar

E eu o encontrei debaixo da cama


sorrindo de forma estática
como se não estivesse
fugindo
Uma utopia
Neide Ávila

Com quantas palavras escrevo uma


utopia?
Sete bilhões de pessoas
com um nome registrado
seguindo regras do mundo,
um mundo globalizado
que não contempla a todos
muitos sequer são lembrados.
cheio de hierarquias
que sustentam o poder
uns vivem na miséria
sem saber o porquê
pouco acesso possuem
só o básico para sobreviver
pairam nuvens escuras
que distorcem a compreensão…
Dá vida ao corpo e ao sangue
Alana Loiola

dá vida ao corpo e ao sangue


aquilo que impulsiona
aquece as camadas da pele antes do sol
Por quê?
Sergio Rubens

Por que que a dor existe?


Por que que existe a morte?
Por que mesmo havendo sorte
O azar também persiste?
Por que que a gente insiste
Em errar do mesmo jeito?
Por que é que o respeito
Não se junta a liberdade?
Por que existe saudade
No coração do sujeito?

Por que que o amor não vence


E supera logo o ódio?
Por que no topo do pódio
É a maldade que convence?
A quem é que pertence
A riqueza dessa terra?
Por que que não se encerra
O que não preenche mais?
Por que somos tão banais?
Por que que existe a guerra?

Por que que a fome mata


Se tem comida sobrando?
Por que se vive ajudando
A tanta gente ingrata?
Por que quem tem mesa farta
Tem o coração tão pobre?
Por que que o ser mais nobre
Sofre por fazer o bem?
Por que é que quem mais tem
Na verdade sempre encobre?

Por que que a poesia


Não nasce como uma fruta?
Por que a vida é tão bruta?
Por que temos agonia?
Por que é que a alegria
De repente vai embora?
Por que que a gente chora
Por quem não nos deu valor?
Por que que esse tal de amor
Sempre sai de porta afora?
Deus continua a olhar
Com carinho para a gente,
Ou será que de repente
Parou de nos vigiar?
Pois já deixamos de amar
E acolher o nosso irmão,
Na busca da perfeição
Só buscamos o dinheiro,
E aquele amor verdadeiro
Falta em nosso coração.
Manifesto
#5
pego

voo

viajo

sonho

canto

bebo

danço

durmo.

Taciana Santos
O som do silêncio
Letícia Moreira

Respirando devagar fechei os olhos.


Tudo que veio a mente foi aeroporto.
Não um aeroporto específico, mas a
ideia do lugar, a ambientação, o cheiro
a forma e toda simbologia guardada
nas miudezas dos olhares estampados
naquele lugar que costura as nuances
embaçadas entre idas e vindas. E o
silêncio que acompanha cada passo
em direção ao embarque, sobrevoando
entre um destino e outro, o vazio de
barulho enquanto o peito borbulha
sons abafados.

Esse silêncio que faz tudo parecer


menor e ao mesmo tempo alargado
demais e cada num instante entre o
piscar de olhos. O som da chegada, o
estrondo que pisar em novo território
faz por dentro as vezes silencia as
palavras e as descobertas brotam
pelos vãos craquelados da calçadas,
por vezes tão silenciosas que os
olhos não dão conta… enquanto o
aeroporto é territorio de ninguém e ao
mesmo tempo de todos, do instante
do momento num alo fino de polos
opostos, convergindo num mesmo
momento- a transição e todos as vozes
que ficam pelo caminho e o silêncio
diante do novo
O silêncio que repousa no peito em
meio ao caos que pulsa os olhos e se
dissolve num estalo de dedos, trazendo
a realidade e seus sons de volta à tona
no maciço do cotidiano que se brinca
de movimento não tão fluido assim se
instalando no corpo inteiro.

Quantos silêncios cabem nos ruídos


das horas?

na sombra

pendendo pro lado

o ruído na imagem

possibilitando a brecha

de interpretação

o movimento

no desfazer

em concha

dele que instala

habita sem pressa


compacto

nas miudezas

dos minutos

arrastando no

pelos braços

cabelos

diafragma

....

silencio
O que era ontem
Aurora Arcana

O que era ontem


Hoje já não é mais
Lagarta arrastando a barriga no chão
Borboleta deslizando no ar
Futuro
Cassia Barroso Bandeira

Eu vi a chuva no terreno
quase seco, ela batia e escorria,
quase não entrava na superfície.
O tempo fechava e abria, como
o casamento da raposa, dizia
antes os mais novos. Hoje somos
maduros e adiantados na
idade das lisas travas, moldadas,
quase bonitas. Chego com
tempo de te beijar na aeronave
que fumaçava para levantar voo.
A tempos cheguei e a saudade
engoli quando a poeira
das estrelas adentrou a ternura.
A potência eu vi nos olhos dela.
Porque hoje é domingo…
Aline Valério

Hoje é domingo! Dia de visitar meus


pais, uma tradição desde que comecei
a morar sozinha. É sempre muito boa
a sensação de acolhimento, amor,
alegria que perdura toda semana e
emana durante esse dia que tantas
pessoas acham chato. É mágico chegar
e ser recebida com afetos e sorrisos, a
piscina de plástico no quintal e a farra
na cama pequena para tanta bagunça.
O dia é sempre colorido pelos pequenos
momentos que tantas vezes não
observamos com mais detalhes…
Hoje, mesmo sendo domingo, o
colorido foi diferente. Meu pai
está no seu 13º dia de internação
no Hospital de Messejana, vulgo
Hospital do Coração. E sim, Covid-19.
Papai tem comorbidades: é cardíaco
e trombofílico. Enfim, recebemos
– nossa família – boletim médico
diariamente; sem qualquer outra forma
de comunicação. Medo? Ansiedade?
Também, mas sobretudo esperança
e energias positivas para aquecer sua
luta, sua garra, sua força de viver.
Hoje é domingo, quase meio-dia. Hoje
é domingo e não está sendo do mesmo
jeito. Mas qual a graça se todos os dias
forem iguais?
Pois bem. Hoje o banho no quintal foi
de mangueira. Hoje a filha mais velha
(eu) e a neta (minha filha Marina), em
vez de chegar e estar tudo pronto – pois
papai acorda sempre muito cedo para
preparar tudo – colorimos o varal com
as roupas que lavamos do nosso velho;
roupas que ainda estavam ensacadas de
quando peguei no hospital. Eu e Marina
sentimos a maciez do ensaboar, a
doçura de cada palavra trocada naquele
momento. Sentimos o sol, o vento, a
terra… como é bom tocar com os pés no
chão!
Na cozinha, mamãe terminou de
preparar o almoço. Hoje éramos
somente nós três à mesa: eu, mamãe e
Marina. E embora, de longe, o coração
e a mente fossem embaladas por
uma música que papai adora escutar
porque se lembra do meu avô paterno
- “Naquela mesa tá faltando ele, e a
saudade dele…” -, não havia tristeza.
Hoje é domingo. Meu pai almoçou
no hospital e nós em casa. Senti que
estávamos conectados, juntos.
A vida é um acontecimento e não nos
cabe querer controlar…
Viva nosso domingo! Viva nossa
tradição! E que nunca nos falte fé,
paciência e vida colorida.
Aceitar a jornada
Pat Tx

Aceitar a jornada de
ir para outro lado
Perceber quando se está no meio do
caminho
A consciência podendo vir dos pés ou
do coração, sem ser a cabeça
Insurreição
Rosa Morena

Minha casa é aqui dentro

Nenhum rumor obediente alcança meu


sossego

Aqui dentro escrevo novas intenções

E o discurso, deles, não sopra seus


exageros

Ontem aqui dentro

Hoje aqui dentro

Amanhã aqui dentro

Insubmissa.
Verbete
Cassia Barroso Bandeira

Ato ou estado de ser único,


sentimento que poderá remeter
à nostalgia, tristeza e outros
que o valha.

Sentimento que dói

Ser ou
saber ser só.
Atravessando o abismo
Aurora Arcana

Atravessando o abismo
em corda bamba
minha visão desce
nossos olhares se encontram
(paraliso)
O mundo gira
em
“delírio”
Meu corpo brinca com a gravidade
Se fecho os olhos
Se me deixo cair
Vou morrer ou voar?
Talvez para transformar
Transmutar
Transgredir
Eu preciso, ainda, trabalhar com
delicadeza
e paciência no casulo
É possivel desaprender a sonhar?
Aline Valerio

É possível desaprender a sonhar?

Despertador toca.
Cansaço,
Enfado.
Pro-cras-ti-no.
Força!
Há boletos

Atraso,
Trânsito,
Escola sem vida,
Há zumbis ainda da pandemia.

Aula,
Conteúdo,
Sono,
Celular,
Há desencanto demais nesse lugar.

Vida,
Sorrisos,
Desejos,
Preciso me reencontrar.

Mas é possível reaprender depois de


desaprender a sonhar?
Delirar-se ficcionar-se
Letícia Moreira

ficicionar, delirar, fixar, obssecar-se.

Pensar, escrever sobre linguagem


sempre me é fabuloso- faltam verbos
pra descrever o quão pulsa minha mente
nesse assunto( ironico não?) O texto
de hoje nasceu dessas confabulações
internas após ler alguns livros teoricos,
ler alguns ensaios sobre e se pariu por
si só numa linguagem própria que uma
vozinha interna sussurava: Escreve.
Então lá vai:

Um rastro curvilíneo se arrasta entre


meus seios, me jogando em outra
dimensão e espaço, mas em todas
elas, escrevo. Escrevo porque quero
permanecer, e não há outra forma de
existir senão pela linguagem, essa coisa
que tonteira a cabeça, e passa pelo dedo
mindinho até meu fio de cabelo, e qual
palavra uso pra definir esse emaranhado
de sentimento aqui dentro numa vã
ilusão que se traduzirá pela palavra?
mas se não for por ela, por quem será? O
corpo se encaixa nesse dispositivo, mas
por si só não me é suficiente- um perdão
ao teatro- assim como todos esses
códigos que juntos produzem sentido e
significado também não traduzem, não
bastam, e que pretensão tola essa de
traduzir. Colocar algo no lugar de outro
pra exemplificar o turbilhão que se
passa por dentro junto a água, sangue,
pulsação, e simplesmente dar a ele um
significado que possa decodificar parte
por parte dessa mistura sem nome-
impalpável- como vou palpar aquilo que
me foge da boca.

Não existo fora dela e ela existe em mim,


dentro do peito rasgado e remendado-
alterei- e eu existo dentro dela no
úmido dos olhos, nos pés inquietos, dos
acessórios do corpo que ainda me resta
saber quais sãos, essa frase me agarrou
pelos pés, joelhos, cotovelos, espiral.
aquilo que perco os olhos é porque
comunicou aquilo em que eu mesma
já tinha me comunicado em silêncio- a
linguagem conflui imbricado na voz do
outro um sussurro difônico da minha
própria voz. A linguagem emaranhada,
teço caminhos afetados pelos caminhos
do outro- tento, ensaio, artículo uma
forma da bendita tradução, inexistente
pra me fazer entender, mas não só, pra
me fazer fixada, incrustrada, buscando
sobreviver ao fragmento, mas como não
fragmentar, se colocar inteira em ato em
gesto, sempre vai ser um fragmento, um
fragmento que atravessa a retina alheia
e permanece para além do todo.
E o todo é as partes, as partes e todo,
pecinhas de quebra cabeça mapeiam o
porque, porque falar, porque insistir nas
linguagens,se inserir ali na miudeza das
partes, repetindo, aliterando até chegar
ao todo, martelando, impregnado até
estar, estar até não questionar, não seria
a linguagem uma forma de questionar o
estado de estar seria fugir dela, e sem ela
não há porquê, nem razão. Sem as partes
o todo é outro, a linguagem do outro
em mim, a ruptura dessa linguagem, a
criação e instituição de novas linguagens
para poder se adequar no todo, peça
central, peça chave, romper com o todo
é procurar outras partes, de preferência
que não se descolem do eu, o eu que vai
se reinventando em processos de tatear
novas linguagens, afetadas em outros
relacionamentos, outros ambientes,
conexões e sintagmas que as compõem,
no plano real procurando significante
e significado, atravessando o estômago
em busca daquele que integra coração,
mente e estômago- o sentido.
Na ponta dos dedos tocando o teclado,
tocando a caneta, escrevendo no quadro,
marcando com marca-texto alguma
dramaturgia, decifrando cada palavra,
e se não por se fixar nas entrelinhas
com o sentido da palavra, da linguagem,
pra que escrever? me perco sem fios
vermelhos, a linguagem é labirinto,
segmentada, em cada fragmento um
pedaço do escritor, doei tanto aos
fios que nem seis mais quais parte de
mim ou do outro, mas talvez escrever
seja isso- esse encontro atravessado
das mais variadas experiências, o que
seria da minha prosa sem a poesia do
cotidiano? sem o encontro, a porta
batida, o avião decolando, aterrissagem,
pés na areia, parto, cicatriz, aleitamento,
sangue, palco, texto, livro, sintetizo,
me cravo na síntese, comunico. A
linguagem é renascimento, vida, poder,
simetria, confluência é tudo que disse
que é dentro dos seus próprios limites
e demarcações, afinal o que seria do
escritor sem o verbo?
Fortaleza, 2023

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