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INSTITUTO DE ECONOMIA
CAMPINAS
2018
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE ECONOMIA
CAMPINAS
2018
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CAPES
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Economia
Mirian Clavico Alves - CRB 8/8708
Defendida em 28/02/2018
COMISSÃO EXAMINADORA
O ponto final desta tese encerra um ciclo de doze anos. Quando, aos 18 anos, escolhi a
Unicamp em 2006, não imaginava as transformações profissionais e pessoais que viriam. Ao
longo desses anos, pude contar com o apoio de inúmeras pessoas, muitas das quais farão parte
ainda de muitos “ciclos” da minha vida.
Nada seria possível sem o apoio irrestrito dos meus pais, José Alberto e Beatriz, que
sempre estiveram ao meu lado, especialmente nos momentos de incerteza, característicos da vida
acadêmica, e das minhas irmãs, Isabela e Débora, que sempre me deram forças e torceram por
mim. Muito obrigado por tudo, amo vocês.
Desde 2009 ganhei também o apoio e a companhia da Patrícia nessa jornada. Vivemos
juntos momentos de felicidade, de angústia, de muita saudade pela distância (entre Ribeirão Preto
e Campinas ou Brasil e Alemanha) e, sobretudo, de muito companheirismo, cumplicidade e amor.
Obrigado por estar ao meu lado nos momentos mais decisivos da minha vida nesses nove anos.
Esta trajetória de muitas realizações também não seria possível sem a minha querida
orientadora e “Mestra” Daniela Prates. Desde a graduação, aulas da Dani fomentaram meu
interesse pela economia internacional e economia monetária. No mestrado, sua orientação foi
fundamental para que decidisse pela carreira acadêmica e, assim, entrasse no doutorado. Ao
longo do doutorado, o papel ativo e sempre presente da Dani como orientadora proporcionou
experiências marcantes para minha vida profissional e pessoal. Uma delas foi a oportunidade de
morar em outro país e aprofundar a discussão do tema desta tese a partir de outras abordagens e
metodologias. Muito obrigado por todos os conselhos, as palavras de apoio, as oportunidades, por
me fazer pensar criticamente e sempre expandir meu campo de visão, por acreditar no meu
trabalho. Admiro muito você como professora, orientadora e amiga.
A Professora Barbara Fritz também foi fundamental nesta caminhada, me recebendo de
maneira muito acolhedora no Instituto Latino Americano (LAI) da Universidade Livre de Berlim.
As apresentações e discussões nos seminários do LAI agregaram muito a minha tese. Muito
obrigado por todos os seus conselhos, críticas e ensinamentos. Sua dedicação à pesquisa,
docência, bem como aos seus orientandos, é inspiradora.
Agradeço também a todos os professores que convivi ao longo da graduação e pós-
graduação, especialmente ao Bruno, um amigo para todas as horas e com conselhos sempre
precisos, à Maryse, pelas aulas e inúmeras conversas interessantes, ao Giuliano, meu orientador
da graduação e amigo (sempre com conselhos valiosos), ao Pedro Rossi – pelos conselhos e
aprendizado desde a graduação - e ao André Biancarelli.
Além dos professores, agradeço também a todos os meus amigos e colegas da pós-
graduação, em especial Nathalie – pela ajuda na pesquisa e discussões sobre a tese -, Nicholas,
Camila, Marília, Gabriel, Renato, Ana Luíza, Paulo Ricardo, Rafael, Ítalo, Flávio, Felipe,
Ricardo. Meus amigos queridos Alex e Paulo foram fundamentais nesse período. Muito obrigado
pelos momentos de descontração (no tradicional almoço na Tia da maionese) e pelos conselhos
valiosos em relação à tese.
Gostaria de agradecer também meus amigos e colegas da Freie Universität Berlin, que me
acolheram muito bem ao longo do doutorado Sanduíche, em especial Alejandro Marquez-
Velazquez e Carmen Marull, que foram meus “anjos da guarda” em toda minha estadia.
Agradeço aos professores da Facamp, que propiciam um excelente ambiente de trabalho e
crescimento profissional e intelectual, em especial José Augusto Gaspar Ruas e Rodrigo
Sabbatini – pela oportunidade e confiança no meu trabalho – e Daví Nardy. Ademais, tenho o
privilégio de poder participar de discussões e seminários, organizados pelos Professores João
Manuel Cardoso de Mello e Luiz Gonzaga Belluzzo, que contribuem para minha formação
docente. Minha gratidão também se estende aos meus alunos, que sempre me inspiraram no
aperfeiçoamento das aulas e me motivaram nesta reta final de tese.
Os funcionários do Instituto de Economia foram fundamentais em todos esses anos,
sempre eficientes e prestativos. Agradeço especialmente Fátima, Andrea, Marinete, Ricardo,
Regina (in memoriam), Eduardo, Régis. Agradeço também à Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelas bolsas de estudos que me foram concedidas.
No campo pessoal, muitas pessoas contribuíram para que eu pudesse chegar ao ponto final
desta tese. Agradeço especialmente ao meu amigo Marcelo, pelos anos de convivência na
graduação e pós-graduação, meu querido amigo Rafael, pelos 20 anos de amizade, e sua esposa
Lara, meus queridos amigos de Berlim – Vikki, Alan e Nico – pelo companheirismo e momentos
inesquecíveis e meu amigo-irmão querido Felipe Barone.
Resumo
The Keynesian-structuralist approach relates the exchange rate policy of emerging countries
to the asymmetric insertion of these countries into the contemporary International Monetary
and Financial System (SMFI). This thesis aims to deepen and systematize the links between
this approach and the exchange rate policy in emerging countries. In order to achieve this
objective, this thesis is structured in three chapters. The chapters one and two focus on the
construction - through a bibliographical review and descriptive statistics - of the structural and
domestic constraints, which shape the aforementioned theoretical framework. Finally, the
analysis of the exchange rate policy, according to the constraints, is applied to four case
studies in the third chapter. Each case involves a qualitative analysis of the exchange rate
policy - constructed during the first two chapters - and a quantitative analysis, in order to
verify the effectiveness of the interventions that best answered the conditions. The results of
case studies allow three general conclusions. The first one points out that the reduction of
financial openness through the foreign exchange market institutions is a necessary condition
to reach a larger space of exchange policy. The second one testifies to the difficulty of
market-friendly instruments in achieving exchange policy space, even though they are
effective in curbing exchange rate volatility in the short term. The third points to the need to
think about combinations of exchange rate policies with different time horizons.
Figuras
Tabelas
Tabela 1.1: Funções da moeda: dimensões pública e privada. 45
Tabela 1.2: Classificação dos Regimes de Câmbio e Monetário 2014 56
Tabela 1.3: Motivações para as intervenções no mercado de câmbio 58
Tabela 1.4: Volume das intervenções via reservas internacionais 63
Tabela 1.5: Impacto dos instrumentos de política cambial 67
Tabela 1.6: Os efeitos do boom e os instrumentos de GFC – 2009-2011 68
Tabela 2.1: Volume (estimado) dos mercados onshore e offshore de balcão – moedas
82
selecionadas
Tabela 2.2: Indicador de Solvência e reservas internacionais – anos e países selecionados 99
Tabela 2.3: Posição Internacional de Investimento (US$ milhões) – países selecionados 102
Tabela 2.4: Participação estrangeira nos mercados de títulos públicos denominados em
108
moeda doméstica (% total de títulos)
Tabela 2.5: Emissão Internacional de Títulos Privados (US$ milhões) – países
142
selecionados
Tabela 2.5: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) – países
143
selecionados
Tabela 3.1: Resultado líquido das operações de swaps cambiais e esterilização das
157
operações no mercado à vista
Tabela 3.2: Resultado Modelo GARCH (1,1) 2003-2008 196
Tabela 3.3: Resultado Modelo GARCH (1,1) 2008-2016 196
Tabela 3.4: ROC por faixa de ROM 207
Tabela 3.5: Resultados Modelo GARCH (1,1) 214
Tabela 3.6: Principais medidas de gestão dos fluxos de capitais e regulação dos
238
derivativos cambiais - Brasil
Tabela 3.7: Principais medidas de gestão dos fluxos de capitais e regulação dos
239
derivativos cambiais – Coréia do Sul
Tabela 3.9: Resultados Modelo GARCH (1,1) 241
Tabela 3.10: Resultados Modelo GARCH (1,1) 242
Gráficos
Gráfico 1.1: Volatilidade cambial diária (desvio padrão) – períodos selecionados 64
Gráfico 1.2: Variação cambial acumulada nos períodos selecionados (em %) 64
Gráfico 2.1: Índice KAOPEN (2014) 78
Gráfico 2.2: Volume dos mercados onshore e offshore por segmento 85
Gráfico 2.3: Volume dos mercados onshore e offshore por participante 86
Gráfico 2.4: Volume dos mercados onshore por segmento (em %) 88
Gráfico 2.5: Volume dos mercados onshore por participante (em %) 88
Gráfico 2.6: Fluxos líquidos de capitais privados de não residentes - países selecionados
95
(em US$ milhões)
Gráfico 2.7: Fluxo líquido de capitais privados pré-crise (2003-2007) - média - US$
96
milhões
Gráfico 2.8: Fluxo líquido de capitais privados pós-crise (2008-2016) - média - US$
96
milhões
Gráfico 2.9: Saldo conta corrente - % PIB 97
Gráfico 2.10: Saldo Conta Corrente - % PIB 97
Gráfico 2.11: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Brasil 104
Gráfico 2.12: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - México 104
Gráfico 2.13: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Turquia 105
Gráfico 2.14: Emissão internacional de títulos (US$ milhões) - Coréia do Sul 105
Gráfico 2.15: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) - Brasil 106
Gráfico 2.16: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) - México 106
Gráfico 2.17: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) -Turquia 107
Gráfico 2.18: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) -Coréia do
107
Sul
Gráfico 2.19: Padrão de comércio - América Latina 128
Gráfico 2.20: Padrão de comércio - Leste Europeu 128
Gráfico 2.21: Padrão de comércio - Sudeste Asiático 129
Gráfico 2.22: Padrão de comércio - Coréia do Sul 129
Gráfico 2.23: Padrão de comércio - México 129
Gráfico 2.24: Padrão de comércio - Turquia 130
Gráfico 2.25: Índice de complexidade econômica - países selecionados 130
Gráfico 2.26: Índice de preço das commodities e taxa de câmbio real (Brasil, Chile,
144
Colômbia e México)
Gráfico 3.1: Posição líquida em cupom cambial - (US$ milhões) 152
Gráfico 3.2: Posição líquida em dólar futuro- US$ milhões 153
Gráfico 3.3:Posição em dólar mercado à vista - Bancos (US$ milhões) 153
Gráfico 3.4: Balanço de pagamentos (1999-2017) - US$ milhões 155
Gráfico 3.5: Dívida externa Curto Prazo - Bancos (Direita) e empresas não-financeiras -
156
US$ milhões
Gráfico 3.6: Intervenções no mercado à vista pós CFG (US$ milhões) 161
Gráfico 3.7: Diferencial de juros (Over Selic - Libor) - % 163
Gráfico 3.8: Posição Comprada Líquida - swaps cambiais - US$ milhões (valor nocional) 164
Gráfico 3.9: Taxa de câmbio nominal US$/R$ 166
Gráfico 3.10: Posição Vendida Líquida do Bacen - swaps cambiais - US$ milhões (Valor
166
nocional)
Gráfico 3.11: Fluxo cambial e empréstimos de CP Bancos - US$ milhões 171
Gráfico 3.12: Intervenções no mercado à vista (US$ milhões) e depreciações abruptas
172
(frequência - direita)
Gráfico 3.13: Empréstimos externos (fluxo) de curto e longo prazo - milhões US$ 174
Gráfico 3.14: Volatilidade (desv. padrão) e regulação 176
Gráfico 3.15: FRA de cupom cambial e regulação (frequência - direita) 177
Gráfico 3.16: Taxa de câmbio (esquerda; US$/R$) e regulação 178
Gráfico 3.17 - Balanço de Pagamentos (US$ milhões) 181
Gráfico 3.18: Investimentos em carteira - US$ milhões 181
Gráfico 3.19: Participação dos não-residentes no estoque de dívida pública (%) 183
Gráfico 3.20: Endividamento Externo - empresas não-financeiras (% Reservas) 183
Gráfico 3.21: Custo de esterilização (% PIB - esquerda) e diferencial de juros (% - direita) 185
Gráfico 3.22: Fluxo líquido reservas e PEMEX - US$ milhões 188
Gráfico 3.23: Taxa de câmbio nominal - peso/dólar 188
Gráfico 3.24: Volatilidade (desv. pad) e leilões de venda (direita) 194
Gráfico 3.25: Leilões de venda (direita) e depreciações extremas (esquerda) 194
Gráfico 3.26: Dolarização (Depósito em dólar/ M2 - %) 198
Gráfico 3.27: Volume de transações mercado de câmbio 199
Gráfico 3.28: Balança Comercial (em US$ milhões) e Preços das commodities (direita -
200
2005=100)
Gráfico 3.29: Conta corrente e financeira (US$ milhões) 201
Gráfico 3.30: Dívida externa privada e pública em relação às reservas internacionais -
202
Curto e Longo Prazo
Gráfico 3.31: Passivo Externo Bruto (US$ milhões) 202
Gráfico 3.32: Corredor da taxa de juros 204
Gráfico 3.33: Intervenções mercado à vista (direita US$ milhões) e depreciações abruptas 205
Gráfico 3.34: Compra de divisas no mercado à vista (direita - US$ milhões) e volatilidade
206
(desvio padrão)
Gráfico 3.35: ROM - Volume de reservas em dólar e ouro (US$ milhões) 209
Gráfico 3.36: Limites do ROM e uso efetivo (% em relação ao total de reservas) 209
Gráfico 3.37: Taxa de câmbio nominal won/dólar 220
Gráfico 3.38: Balanço de Pagamentos - Média móvel 3 trimestres (US$ milhões) 221
Gráfico 3.39: Balança comercial - Exportações e importações (US$ milhões) 222
Gráfico 3.40: Dívida Externa (US$ milhões) e relação Dívida Externa/Reservas 223
Gráfico 3.41: Empréstimos externos - filiais dos bancos estrangeiros (em won) 223
Gráfico 3.42: Participação de investidores não-residentes nos mercados de títulos
224
domésticos (%)
Gráfico 3.43: Taxa de câmbio won/dólar e Índice de preço dos produtos importados
225
(direita, 2010=100)
Gráfico 3.44: Custo (estimado) de esterilização das reservas internacionais (em % do PIB) 225
Gráfico 3.45: Regulações e taxa de câmbio (esquerda) (2009-2017) 233
Sumário
Introdução ..................................................................................................................... 17
1.Perspectivas teóricas da política cambial nos países emergentes .......................... 23
Introdução ............................................................................................................................. 24
1.1 Política cambial: conceitos e taxonomia .................................................................... 25
1.2 Aspectos teóricos da política cambial nos países emergentes ................................... 38
1.2.1. A credibilidade das instituições e os fundamentos macroeconômicos ......... 42
1.2.2. A preponderância dos fatores externos ......................................................... 44
1.2.3 A abordagem keynesiana-estruturalista da hierarquia de moedas ............ 46
1.2 A relação entre hierarquia de moedas e política cambial .......................................... 56
1.3.1. A escolha dos países emergentes .................................................................. 57
1.3.2. As conexões entre política cambial e assimetrias do SMFI .......................... 58
Considerações finais ............................................................................................................. 70
2.Os condicionantes domésticos da política cambial nos países emergentes ........... 73
Introdução ............................................................................................................................. 74
2.1 Abertura financeira e institucionalidade do mercado de câmbio ............................... 77
2.2 Os aspectos financeiros da vulnerabilidade externa .................................................. 94
2.3 Gestão da política monetária: a inter-relação entre as taxas de juros e de câmbio .. 110
2.4 Inserção comercial e padrões de comércio .............................................................. 122
2.5 Relação entre condicionantes estrutural e domésticos e o impacto sobre a autonomia da
política cambial ................................................................................................................... 130
Considerações Finais .......................................................................................................... 137
Anexo estatístico ................................................................................................................. 140
3. A análise da política cambial sob a ótica dos condicionantes domésticos e estrutural:
os casos de Brasil, Coréia do Sul, México e Turquia. .............................................. 144
Introdução ........................................................................................................................... 145
3.1 Brasil: o horizonte curto-prazista e o pioneirismo nas mudanças............................ 148
3.1.1 A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e
câmbio flutuante .................................................................................................... 148
3.1.2 A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio
flutuante.................................................................................................................157
3.1.3 Resposta aos condicionantes e efetividade da política cambial ................... 168
3.2 México: a continuidade da política cambial ................................................................. 177
3.2.1 A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e de
câmbio flutuante .................................................................................................... 177
3.2.2 A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio flutuante.183
3.2.3 Resposta aos condicionantes e efetividade da política cambial ................... 189
3.3 Turquia: a simbiose da política monetária e cambial numa economia parcialmente
dolarizada ............................................................................................................................ 195
3.3.1. A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e de
câmbio flutuante .................................................................................................... 195
3.3.2A gestão da política cambial no regime de metas de inflação e câmbio flutuante..202
3.3.3 A resposta aos condicionantes e a efetividade da política cambial .............. 209
3.4.1. A evolução dos condicionantes após a adoção do regime de metas de inflação e
câmbio flutuante .................................................................................................... 213
3.4.2 A gestão da política cambial no regime de câmbio flutuante e metas de inflação.223
3.4.3. A resposta aos condicionantes e a efetividade da política cambial ............. 227
Considerações Finais .......................................................................................................... 231
Anexo estatístico ................................................................................................................. 235
Apêndice ............................................................................................................................. 237
A) Análise da efetividade da política cambial - Coréia do Sul.................... 237
B) Análise da efetividade da política cambial – Brasil ............................... 238
C) Entrevista com agentes que operam no mercado de câmbio mexicano . 239
Conclusão .................................................................................................................... 242
Referências Bibliográficas ......................................................................................... 250
17
Introdução
1
De acordo com Chesnais (1996), Aglietta & Coudert (1990) e Prates (2015), a globalização financeira refere-se
a um ambiente sem barreiras internas entre os diferentes mercados financeiros e de interpenetração entre os
mercados financeiros nacionais e internacionais. Braga (1997) e Prates (2015) ressaltam também outra
característica fundamental desse ambiente: a conexão entre mercados de diferentes temporalidades, ou seja,
mercados à vista e de derivativos (que são de liquidação diferida).
2
Aizenman (2008, p. 1), no The New Palgrave Dictionary of Economics, define países de mercados emergentes
como “countries (…) that are not well established economically and financially, but are making progress in that
direction”. Nesta tese, será utilizado o termo países (ou economias) emergentes, que se referem aos “países
periféricos (ou em desenvolvimento) que se inseriram no processo de globalização financeira a partir dos anos
1990” (Prates, 2002, p.147).
18
3
Os efeitos inflacionários decorrem do maior impacto das variações cambiais sobre os preços domésticos nas
economias emergentes em relação aos países desenvolvidos. O repasse da taxa de câmbio para a inflação (pass-
through) é definido como a variação percentual nos preços domésticos devido a uma variação de 1% na taxa de
câmbio (ver Aron et. al., 2014 e Farhi, 2006).
19
flutuação suja implica, portanto, a existência de uma dualidade impossível, nos termos de
Flassbeck (2001), ou de um “dilemma”, nos termos de Rey (2013) – ao invés da trindade
impossível ou do “trilemma” mencionados acima. Ou seja, num contexto de livre mobilidade
de capitais, a necessidade de intervenção – pelos motivos supracitados - restringe a autonomia
de política monetária.
BIS (2005), Moreno (2005), Mohanty & Berger (2013) e Domanski et. al. (2016)
sistematizaram tais motivações por meio de entrevistas junto aos bancos centrais dos países
emergentes. Conforme Moreno (2005), sob o regime de flutuação suja, as intervenções
refletem, em parte, o desejo das autoridades monetárias de manter a estabilidade
macroeconômica e financeira. Já Domanski et al. (2016) sugere que as motivações não
dependem apenas do regime monetário adotado, mas também da exposição dos países a
choques externos, das posições dos agentes em moeda estrangeira e de outras circunstâncias
macroeconômicas. Alguns autores, como Archer (2005), Domanski et. al. (2016) e Prates
(2007), buscaram também mapear as motivações, bem como outras categorias da política
cambial, como metas, canais de transmissão e instrumentos de intervenção.
A relevância de cada categoria da política cambial sofreu alterações ao longo do
tempo, especialmente após a Crise Financeira Global (CFG), que eclodiu em setembro de
2008, com a falência do banco de investimento Lehman Brothers. O aumento da dívida em
moeda estrangeira nas economias emergentes e do descasamento de moeda no balanço dos
agentes no período pós-crise aumentou ainda mais a preocupação das autoridades monetárias
em relação à estabilidade financeira e, consequentemente, à frequência das intervenções, em
comparação ao período pré-crise4.
Já as justificativas teóricas do uso da política cambial são heterogêneas na
literatura econômica. Em linhas gerais, a literatura mainstream5 associa o uso da política
cambial, no âmbito do binômio regime de câmbio flutuante-metas de inflação, à fragilidade
dos fundamentos macroeconômicos e à falta de credibilidade e transparência das autoridades
monetárias. Ou seja, a política cambial ativa representa uma distorção do modelo do NCM,
4
O período “pré-crise” compreende a fase de alta do ciclo de liquidez internacional, de 2003 a 2007. Já o “pós-
crise” se inicia a partir da eclosão da CFG e se estende até a data de conclusão desta tese. Para uma análise do
período pós-crise e suas fases, ver Farhi (2012).
5
Visão convencional ou “[...]mainstream economics is that which is taught in the most prestigious universities
and colleges, gets published in the most prestigious journals, receives funds from the most important research
foundations, and wins the most prestigious awards” (DEQUECH, 2007, p. 281).
20
que sustenta o regime de metas de inflação. Contudo, após a eclosão da CFG, o papel da taxa
de câmbio no arcabouço teórico convencional foi repensado por alguns autores. De acordo
com Blanchard et. al. (2010) e Ostry et. al. (2012), no binômio regime de metas de inflação–
câmbio flutuante, a taxa de câmbio deveria ser um objetivo de política juntamente com a
estabilidade de preços:
países emergentes. Duas perguntas emergiram: de que forma o espaço de política cambial dos
países emissores de moedas periféricas é afetado pelas assimetrias do SMFI? Como a política
cambial pode responder a essas assimetrias e, consequentemente, aumentar o seu grau de
autonomia?
O objetivo desta tese, portanto, é responder a essas questões, ou seja, aprofundar e
sistematizar as inter-relações entre o referencial teórico keynesiano-estruturalista e a política
cambial nos países emergentes. Para atingi-los, ela foi estruturada em três capítulos. Os dois
primeiros capítulos se debruçam na construção – por meio de revisão bibliográfica e
estatística descritiva - dos condicionantes estrutural (as assimetrias do SMFI) e domésticos,
que conformam o referencial teórico e analítico. Assim, o capítulo I discute, inicialmente, as
definições e a taxonomia da política cambial, bem como as justificativas teóricas para o seu
uso na literatura do mainstream e na abordagem keynesiana-estruturalista. Em seguida, as
conexões entre o que se denomina aqui de condicionante estrutural e o espaço de política
cambial são estabelecidas para os países emergentes que adotam o binômio regime de metas
de inflação–câmbio flutuante. O segundo capítulo se dedica ao detalhamento dos
condicionantes domésticos – nos países emergentes que adotam o regime macroeconômico
supracitado - e suas relações com o condicionante estrutural. Por fim, a análise da política
cambial de acordo com os condicionantes será aplicada a quatro estudos de caso - Brasil,
México, Turquia e Coréia do Sul - no terceiro capítulo. Cada caso envolve dois tipos de
análises – qualitativa, a partir do referencial construído nos dois primeiros capítulos, e
quantitativa, utilizando estatística descritiva e econometria -, a fim de verificar a efetividade
das intervenções que melhor responderam aos condicionantes estrutural e domésticos.
23
Capítulo 1
Introdução
8
Para efeitos de simplificação, países desenvolvidos, países centrais e países avançados serão considerados
sinônimos.
9
Tais inovações referem-se ao desenvolvimento de novos serviços e produtos financeiros a partir dos anos 1970
no contexto de desregulamentação dos mercados financeiros dos países centrais e aumento da importância e/ou
emergência dos investidores institucionais. Dentre as principais inovações no período, destaca-se a securitização
(emissão de títulos em mercados primários e transformação de ativos não-negociáveis em negociáveis), os
derivativos financeiros e (Carvalho et. al., 2015).
10
O termo Consenso de Washington foi cunhado por Willamson (1990) para se referir a uma pauta de reformas
exigida para a América Latina por organismos multilaterais (FMI e Banco Mundial), pelos ministros das
finanças do G7 e pelos bancos credores. Tais reformas incluíam um programa de estabilização macroeconômica
ortodoxo, desregulação dos mercados domésticos, privatização de empresas estatais, abertura comercial e
retirada das restrições ao investimento direto externo (Cintra, 1997).
25
11
Uma definição semelhante é dada por Edison (1990, p.7): “(...) sterilized intervention is a pure change in the
relative stocks of national-currency bonds held by the public that is not accompanied by a change in the
monetary base”.
12
Esses custos estão associados, principalmente, às operações de esterilização do impacto monetário do acúmulo
de reservas internacionais, já que a taxa de juros que incide sobre essas operações (mediante seja a emissão de
títulos públicos, seja operações compromissadas) é geralmente mais elevada do que a remuneração das reservas
internacionais, aplicadas no mercado financeiro do país emissor da divisa-chave (Estados Unidos) ou de
países/regiões emissores de moedas centrais (como a área do euro).
27
fatores autônomos (que impactam a demanda e oferta de moeda) podem contribuir para
manter a taxa de juros constante (Prates, 2007; Moreno, 2005).
Por fim, o terceiro ponto ignorado refere-se aos objetivos da política cambial. Os
propósitos das intervenções das autoridades monetárias nos mercados de câmbio emergentes
vão além da influência na taxa de câmbio. De acordo com as entrevistas realizadas junto a
diversos Bancos Centrais de países emergentes pelo Bank of International Settlements (BIS)
em 2005 e 2013, as intervenções no mercado de câmbio possuem diversos objetivos, dentre
eles a acumulação de reservas internacionais, a estabilidade financeira e a redução da
vulnerabilidade externa – tais objetivos serão detalhados a seguir.
As diversas limitações da definição acima apresentada são contrastadas com
visões mais amplas da política cambial. Nesse contexto, há uma segunda definição na
literatura, na qual a política cambial é vista como “any sale or purchase of foreign exchange
against domestic currency which monetary authorities undertake in the exchange market”
(Jurgensen, 1983, p. 82). As intervenções aqui são tratadas de forma mais ampla e se
estendem não somente ao mercado de câmbio à vista, mas também ao de derivativos, por
meio do uso de swaps, opções, etc.
A terceira definição considera como política cambial “qualquer transação que
altera a posição líquida em moeda estrangeira do setor público” (Prates, 2007, pp. 8; Archer,
2005). Dessa forma, além das intervenções – realizadas pelo Banco Central e pelo Tesouro –
nos mercados à vista e de derivativos mencionadas na definição anterior, essa abordagem
também engloba as operações de dívida denominadas ou indexadas em moeda estrangeira
(Archer, 2005).
Por fim, a quarta definição amplia ainda mais o horizonte da política cambial, pois
inclui as “intervenções passivas”, ou seja, operações de compra/venda de moeda estrangeira
fora do mercado de câmbio, realizadas pelo Banco Central junto a entidades públicas ou
privadas (Adam & Henderson, 1983). Um exemplo desse tipo de intervenção, que será visto
no terceiro capítulo, é a compra, pelo Banco Central do México, dos dólares gerados pela
Petróleos do México (PEMEX).
A definição de política cambial adotada por essa tese também é mais ampla,
quando comparada ao conceito restrito de intervenção esterilizadora, porém se limitará apenas
ao lócus de negociação da taxa de câmbio, ou seja, aos mercados de câmbio à vista e de
28
derivativos, se aproximando, portanto, da definição adotada por Archer (2005) e Prates (2007)
– descrita acima. No entanto, vale acrescentar à discussão conceitual dois pontos.
O primeiro deles refere-se aos instrumentos que não alteram a posição líquida em
moeda estrangeira do setor público, mas são utilizados a fim de atender diretamente objetivos
de política cambial. Por exemplo, algumas regulações macroprudenciais, como a definição de
limites para posição líquida em moeda estrangeira dos bancos no mercado de derivativos,
visam conter a volatilidade cambial e/ou evitar a apreciação de uma determinada moeda e,
portanto, podem ser considerados instrumentos de política cambial. Outros exemplos incluem
também instrumentos de controle de capitais e regulações na posição dos agentes que operam
no mercado de derivativos de câmbio (Fritz & Prates, 2015). Como tais medidas fogem das
definições listadas acima, alguns autores referem-se às regulações macroprudenciais e aos
controles de capitais como instrumentos auxiliares ou políticas complementares à política
cambial (Mohanty & Berger, 2013; Prates, 2014).
O segundo diz respeito à relação entre política monetária e taxa de câmbio,
especificamente a relação entre a variação da taxa de juros básica e a variação da taxa de
câmbio nominal. O tema ganhou especial relevância após a adoção do regime de metas de
inflação por vários países emergentes. Nesse arcabouço teórico, a taxa de juros serve como
âncora nominal do nível preços de bens e serviços e do nível do produto de numa determinada
economia. Porém, de acordo com os teóricos do regime de metas de inflação, em situações
específicas, a taxa de juros pode ser utilizada com o intuito de impactar a trajetória e o nível
da taxa de câmbio, corrigindo os desvios dessa taxa em relação à suposta taxa de câmbio de
equilíbrio e servindo, portanto, como política cambial (ver Banbula et. al., 2011 e Corsetti et.
al., 2010).
Contudo, é importante ressaltar que o impacto de uma variação na taxa de juros
sobre a posição líquida em moeda estrangera dos agentes participantes do mercado de câmbio
(por meio da alteração da rentabilidade dos títulos denominados em moeda doméstica em
posse de investidores estrangeiros, por exemplo) é indireto, ou seja, os juros afetam a
remuneração dos títulos denominados numa determinada moeda doméstica que, por sua vez,
provoca mudanças na posição em moeda estrangeira dos agentes participantes do mercado de
câmbio. Ou seja, o lócus da política monetária é o mercado de reservas, onde são realizadas as
30
intervenção dos Bancos Centrais, pois o aumento no volume de intervenção já não era
condição suficiente para conter os movimentos das taxas de câmbio. Dessa forma, as ações do
Banco Central no mercado de câmbio passaram a considerar como opção – ainda que auxiliar
- a gestão dos fluxos de capitais e do mercado de derivativos, a fim de lidar com a nova
configuração dos mercados de câmbio supracitada (Prates, 2015).
A definição adotada acima permite o desenvolvimento de uma taxonomia da
política cambial, que será dividida em cinco categorias de análise: objetivos
macroeconômicos, metas (objetivos específicos), indicadores monitorados, canais de
transmissão e instrumentos de intervenção13. A análise de cada categoria é baseada tanto na
literatura empírica quanto em entrevista realizadas junto a Bancos Centrais de países
emergentes e desenvolvidos (ver, por exemplo, BIS, 2005 e 2013; Neely, 2005; Lecourt,
2006).
Ainda que motivações relacionadas à estabilidade financeira sejam explicitadas
pelas autoridades monetárias, os objetivos relacionados a mudanças na trajetória ou
manutenção de um determinado nível da taxa de câmbio dificilmente são divulgados pelos
Bancos Centrais comprometidos com algum tipo de regime de flutuação (pura ou suja). Dessa
forma, a identificação dos principais objetivos macroeconômicos se dá por meio das
entrevistas realizadas junto às autoridades monetárias e das análises das intervenções em cada
país emergente. De maneira geral, Moreno (2005), Mohanty & Berger (2013) e Prates (2007)
destacam quatro objetivos gerais: controle da inflação, equilíbrio e competitividade externa,
estabilidade financeira (prevenção de crises e desordens de mercado) e redução da
vulnerabilidade externa e melhora na classificação de risco de crédito (rating) soberano.
Neste contexto, os objetivos macroeconômicos impõem metas (ou seja, objetivos
específicos) a serem alcançadas e que se resumem, basicamente, ao controle da volatilidade e
movimentos abruptos na taxa câmbio e/ou a manutenção de um determinado nível ou
trajetória desse preço-chave. Moreno (2005) sugere que tais metas variam de acordo com o
regime de câmbio adotado por cada país. Ou seja, em países com regime de câmbio
intermediário, os objetivos macroeconômicos são alcançados principalmente por meio da
influência sobre o nível da taxa de câmbio. Já em países que possuem regimes de câmbio
13
Moreno (2005) e Prates (2007) também propuseram uma taxonomia e classificam a política cambial de acordo
com seus objetivos macroeconômicos, metas (ou objetivos específicos) e indicadores monitorados.
31
canal da coordenação, no qual a intervenção do Banco Central operaria por meio da resolução
de falhas de coordenação no mercado de câmbio. Tais falhas ocorreriam, principalmente, em
momentos de predomínio das análises técnicas (ou grafistas) nas operações do mercado de
câmbio, afastando, assim, a taxa de câmbio de seus fundamentos (representados pelas análises
fundamentalistas). Ao perceber esse cenário, o Banco Central anunciaria sua intervenção,
coordenando as ações dos traders fundamentalistas, que, por sua vez, levariam a taxa de
câmbio de volta para um nível consistente com os fundamentos macroeconômicos.
No caso das intervenções não esterilizadoras, há ainda o canal da política
monetária, que transmite – de forma indireta, como visto acima - os efeitos da mudança no
diferencial entre os juros domésticos e os juros do mercado monetário internacional para a
taxa de câmbio (Archer, 2005).
Por fim, os instrumentos de política cambial são a última categoria de análise
proposta por essa taxonomia. A variedade desses instrumentos está diretamente relacionada
ao conceito de política cambial que se adota. Ou seja, quanto mais restrito o conceito de
política cambial, menor o leque de instrumentos disponíveis.
O instrumento de intervenção mais utilizado pelos Bancos Centrais é a compra ou
venda de moeda estrangeira no mercado de câmbio ou títulos (soberanos) denominados em
moeda estrangeira (Adler e Tovar, 2013; Mihailov, 2016). Conforme mencionado, esse tipo
de intervenção é acompanhada por operações de esterelização, que podem ser feitas tanto por
instrumentos convencionais – principalmente títulos emitidos pelo Banco Central ou pelo
tesouro - quanto por instrumentos não convencionais - requerimento de reservas e depósitos
governamentais principalmente (Mohanty & Berger, 2013; Gabor, 2016).
Apesar de menos frequentes, os instrumentos de intervenção nos mercados de
derivativos de câmbio ganharam maior relevância após a crise financeira global de 2008,
principalmente nos países emergentes (Mohanty & Berger, 2013). Nesse mercado, há três
instrumentos frequentemente utilizados pelas autoridades monetárias: a compra ou venda de
câmbio futuro, os swaps e as opções (Adler e Tovar, 2013).
O contrato de compra ou venda de moeda estrangeira nos mercados futuro e
forward de câmbio é feito sob uma taxa de câmbio pré acordada entre as partes e pode ser
33
14
Os ganhos e perdas de um instrumento non-deliverable são liquidados na moeda doméstica. Já as operações
envolvendo instrumentos deliverables são liquidadas na moeda estrangeira de denominação do contrato, em
geral dólar ou euro (Prates, 2014).
34
15
Ver Prates & Fritz (2016) para uma revisão de literatura sobre o tema.
35
Indicadores
Objetivos Macro Metas Canais de transmissão Instrumentos
monitorados
Condições de mercado
Compra e venda de moeda
Controle da inflação Resistir a movimentos abruptos (volumes transacionados; Canal de equilíbrio de
do patamar da taxa de câmbio. estrangeira no mercado à vista
posições dos diferentes portfólio.
ou derivativo de câmbio.
participantes)
Compra/Venda de títulos
Amortecer o impacto da variação Canal da coordenação dos
Prevenção de crises e Fluxos de capitais públicos indexados à taxa de
desordens de mercado dos preços das commodities agentes
câmbio
37
Redução da vulnerabilidade
Gestão dos fluxos de capitais e
externa e melhora do rating Transações nos mercados Canal da política
regulação do mercado de
soberano de derivativos monetária
derivativos
16
A conta financeira refere-se à antiga conta de capital, denominada assim antes da adoção dos critérios da
BMP5 do FMI.
39
17
Conforme ressalta Eichengreen (2002), Brasil, Chile, Colômbia, Israel, República Tcheca e Polônia adotoram
o regime de metas de inflação na segunda metade da década de 1990.
40
fato levou a novas classificações dos regimes de câmbio, que mostraram um crescimento mais
tímido dos regimes de flutuação pura entre os anos 1990 e 2000 (Calvo & Reinhart, 2002;
Levy-Yeyati & Sturzenegger, 2013).
Calvo e Reinhart (2002) denominaram o fenômeno acima de “medo de flutuar”
(fear of floating) dos policy makers, que temiam os efeitos perversos provocados por
variações bruscas na taxa de câmbio e, portanto, adotavam deliberadamente políticas para
estabilizá-la.
Calvo e Reinhart (1999) pontuam que as crises cambiais que atingiram os países
emergentes na década de 1990 revelaram que tais países estão sujeitos a reversões abruptas
dos fluxos de capitais ou até a paradas súbitas (sudden stops) desses fluxos. Essa
instabilidade, combinada com o regime de câmbio flutuante, teria gerado volatilidade nas
taxas de câmbio dos países emergentes, provocando efeitos deletérios em suas economias,
caracterizadas pelos elevados pass-through e grau de descasamento de moedas (currency
mismacht) - passivos denominados em moeda estrangeira e sem hedge (ou seja, com risco de
variação cambial) em contrapartida a ativos denominados em moeda doméstica - nos balanços
dos agentes participantes do mercado (Aghion et al., 2001; Mühlich, 2014). Ademais, o
acúmulo de passivos em moeda estrangeira pelos países emergentes estaria associado, em
grande medida, à incapacidade desses países realizarem empréstimos no exterior
denominados em suas respectivas moedas, fenômeno conhecido posteriormente como pecado
original (original sin) (Eichengreen, Haussman & Panizza, 2002; Biancareli, 2010).
De acordo com Eichengreen & Haussman (1999, p. 12, tradução livre) “os
descasamentos de moeda e de prazos causados pelo original sin criam um dilema para a
política cambial”. Na presença de regimes de câmbio intermediário e fixo (excluindo os casos
de união monetária e dolarização), o aumento da taxa de juros, a fim de defender a moeda
doméstica de uma possível desvalorização, poderia gerar pressões sobre o passivo dos bancos
que possuem descasamento de prazos e resultar, assim, numa crise bancária e cambial – já que
as incertezas em relação ao sistema bancário gerariam mais pressões sobre moeda doméstica.
Por outro lado, a presença de regimes de flutuação também poderia gerar fragilidades nos
balanços dos agentes com descasamento de moedas. Nesse contexto, as autoridades
monetárias seriam mais relutantes em deixar a taxa de câmbio flutuar, evidenciando o
conceito do “medo de flutuar” exposto acima.
41
desalinhamentos cambiais. Dessa forma, o regime de flutuação suja não seria incompatível
com o RMI (Ghosh et.al., 2015)
Portanto, a questão relevante passa a ser não mais a necessidade da política
cambial, mas por que tais países são acometidos por desequilíbrios, tornando o uso da política
cambial tão frequente. Em outras palavras, quais são as fontes das instabilidades e
desequilíbrios, que levam as autoridades monetárias ao uso da política cambial?
al., 2002; Eichengreen et. al., 2002). Dentre os diversos fundamentos macroeconômicos, o
nível de estoque de dívida é alvo recorrente da literatura. Conforme atestam Reinhart, Rogoff
e Savastano (2003), os países emergentes se caracterizariam por uma elevada intolerância à
dívida (dívida pública interna e externa) – argumento conhecido na literatura como debt
intolerance. Os autores o atribuem ao longo histórico de inadimplência das economias em
desenvolvimento que, por sua vez, se devia à imprudência na gestão das políticas econômicas
e à (fraca) institucionalidade vigente.
Ademais, a relação entre fundamentos macroeconômicos e política cambial pode
ser feita por meio da análise dos modelos de determinação da taxa de câmbio18. De acordo
com alguns modelos do mainstream (dentre os quais se destaca o modelo da sobrereação de
Dornbush (1976)), no longo prazo a taxa de câmbio é determinada por variáveis reais,
enquanto no curto prazo ela é guiada principalmente por variáveis financeiras. Dessa forma,
diversos autores sugerem intervenções no mercado de câmbio para a proteção contra
variações bruscas da taxa de câmbio no curto prazo e para a coordenação das expectativas dos
investidores (Allen et. al., 2002; Reitz & Taylor, 2008). O uso do canal da coordenação pelos
bancos centrais (descrito na seção 1.1), por exemplo, seria uma forma de corrigir os desvios
da taxa de câmbio em relação aos fundamentos no curto prazo (Reitz & Taylor, 2008).
Portanto, a política cambial seria um importante instrumento para estabilizar a
taxa de câmbio no curto prazo, sujeita aos movimentos do mercado financeiro, e corrigir os
desvios desta última em relação aos fundamentos. No longo prazo, as políticas voltadas aos
fundamentos e a melhora na institucionalidade prevaleceriam, gerando um menor medo de
flutuar.
18
De acordo com a classificação proposta por Prates (2015), há cinco gerações de modelos de determinação da
taxa de câmbio na literatura mainstream. Em linhas gerais, a primeira geração de modelos reconhece a
importância das variáveis de estoque (monetárias e financeiras) em relação às variáveis de fluxo (comércio de
bens e serviços). Essa geração também tem o mérito de apontar a importância das variáveis financeiras no curto
prazo. Os modelos de segunda geração sugerem que os movimentos do câmbio se assemelham a um “passeio
aleatório”, baseado na hipótese de eficiência dos mercados de câmbio (que não permite lucro, portanto, na
arbitragem de juros entre duas moedas). Os modelos de terceira geração, por sua vez, incluem rigidezes no curto
prazo que impede que a taxa de câmbio caminhe segundo os fundamentos. Os modelos de quarta geração
incorporam as heterogeneidades dos agentes e os comportamentos miméticos em suas análises, por meio de dos
modelos de microestrutura dos mercados. Por fim, a quinta geração de modelos analisa o forward premium, que
deriva da não verificação empírica da paridade descoberta da taxa de juros, por meio da investigação dos tipos de
carry trade no mercado financeiro internacional.
44
19
Conforme (Eichengreen et. al., 2002, p.33): “the global portfolio is concentrated in a very few currencies for
reasons largely beyond the control of the excluded countries”.
45
Ademais, Dowd & Greenaway (1993), Mühlich (2014) e Cohen (2007) apontam
três fatores adicionais que explicariam a predominância contínua de um número reduzido de
moedas nos portfólios dos investidores globais. O primeiro fator é a histerese em relação ao
uso de uma determinada moeda, derivada principalmente do elevado custo-benefício ao se
trocar uma moeda com uma ampla rede de transações por uma moeda com baixa
externalidade de rede. O segundo fator é a aversão ao risco do investidor em relação a uma
moeda com pequena rede de transação. Por fim, o terceiro fator relaciona-se com a liquidez e
profundidade dos mercados onde são transacionadas as moedas internacionais. Ou seja, os
investidores procuram denominar seus contratos em moedas cujos mercados são amplos, com
baixos custos de transações e menos vulneráveis.
Além dos fatores econômicos listados acima, Cohen (1998, 2004, 2007, 2012,
2015) aponta também determinantes políticos – pertencentes à literatura de Economia Política
Internacional (EPI) - da posição das diferentes moedas no plano internacional, tais como a
capacidade militar e a participação em organizações multilaterais, que serão vistos com maior
profundidade na próxima subseção. Segundo o autor, a junção dos determinantes políticos e
econômicos conformam uma pirâmide monetária20, que estabelece uma hierarquia entre as
diferentes moedas (e quase-moedas) domésticas, conforme sua influência ou domínio dentro e
fora de suas respectivas jurisdições ou, em outras palavras, conforme seu uso (como meio de
pagamento, unidade de conta e reserva de valor) nos planos doméstico e internacional.
Observa-se, portanto, certa heterogeneidade entre as abordagens acima, que se
unem na refutação dos fundamentos macroeconômicos e da credibilidade das instituições
como os principais fatores geradores de desequilíbrios nos países emergentes. No entanto, a
função da moeda enquanto reserva de valor e ativo financeiro no plano internacional e suas
20
No topo dessa pirâmide estão as Top currencies, cujo uso, em todas as funções, é disseminado ao redor do
globo; logo abaixo vêm as Patrician currencies, cujo uso também é disseminado entre as diversas regiões,
porém não exercem plenamente todas as funções da moeda em âmbito internacional; logo em seguida estão as
Elite currencies, que possuem algum grau de internacionalização, porém não exercem muita influência além de
suas fronteiras nacionais; por fim, há as Plebeian currencies, que estão praticamente circunscritas aos espaço
doméstico, com reduzida influência internacional. Após esses quatro níveis, há mais três níveis – Permeated
currencies, Quase-currencies, Pseudo-currencies -, que dizem respeito a soberania monetária de uma
determinada moeda doméstica. Para uma descrição detalhada, ver Cohen (2004, p. 14-16).
46
implicações num contexto de abertura financeira não são discutidas detalhadamente nas
diferentes abordagens - apesar de Cohen (1998 e 2015) reconhecer essa função (de reserva de
valor) na construção de sua pirâmide monetária.
Essas diferentes abordagens também geram diferentes implicações de política
cambial (e macroeconômica). Conforme Eichengreen (2002), países com baixa dolarização de
seus passivos, com mercados financeiros líquidos e profundos e que ofereçam hedge para as
posições descobertas em moeda estrangeira dos agentes devem adotar o binômio metas de
inflação e regime de câmbio flutuante, com pouco uso da política cambial. Se as condições
acima não forem satisfeitas, o regime de câmbio fixo (ou a âncora cambial) é a melhor
solução de política. Já Cohen (2015) relaciona currency power (poder monetário) e autonomia
de política, indicando que esta última é fundamental para que um país exerça influência em
outros territórios por meio de sua moeda (ver Peruffo, 2016).
21
Vale ressaltar que o termo “assimetria” utilizado por Prates (2002) e Ocampo (2001a e 2001b) foi emprestado
de Prebisch (1949 e 1981), que destacou três tipos de assimetrias no âmbito da relação centro-periferia:
tecnológica/produtiva, macroeconômica e financeira. Tavares (2000, p. 131) também enfatiza “o dinheiro
internacional e não o progresso técnico” como traço preponderante da relação centro-periferia.
47
22
Conforme Aglietta (1986, p. 33, tradução livre), “(..) a moeda nacional é soberana em seu próprio espaço. Ela
o deixa de ser quando se torna uma divisa, ou seja, dívida de um banco ou de uma instituição pública nacional
circulando entre não-residentes como meio de pagamento internacional (...) a primeira qualidade das divisas é
sua conversibilidade. Contrariamente, a primeira qualidade da moeda é sua unicidade”. Essa definição, portanto,
está vinculada à conversibilidade de direito da moeda. Assim, toda moeda doméstica utilizada além das
fronteiras nacionais torna-se uma divisa. Já a definição acima, utilizada por De Conti (2011), refere-se à
conversibilidade de fato, definida em Prates (2002, p. 148) como “a sua capacidade de desempenhar em âmbito
internacional as três funções da moeda: meio de pagamento, unidade de conta e de denominação dos contratos, e
ativo de reserva”. Essa tese utilizará os termos propostos por De Conti (2011) – “moeda-periférica” e “divisa”.
23
De Conti & Prates (2016) mostram a composição atual da hierarquia de moedas nas dimensões públicas e
privadas das funções da moeda com base em diferentes bases de dados, mas sobretudo do relatório trienal do BIS
(2016). De acordo com os autores, a evolução dos indicadores e o voluntarismo político chinês –
consubstanciado na entrada do renminbi na cesta (base de cálculo) dos depósitos especiais de saque do FMI -
sugere uma maior participação da moeda chinesa no plano internacional.
49
Porém, o que faz uma moeda tornar-se uma divisa? De acordo com as subseções
anteriores, o uso de uma moeda nacional enquanto moeda no âmbito global é determinado, no
campo econômico, pelos fundamentos macroeconômicos e pela credibilidade das instituições;
ou pelo tamanho da economia nacional e, consequentemente, pelas externalidades em rede
que se criam em torno do padrão monetário das economias internacionalmente mais
relevantes (Eichengreen, 1996). Já no campo político, Cohen (2004 e 2015) ressalta a
participação dos Estados Nacionais nos organismos multilaterais, bem como o poderio militar
de cada país.
No entanto, conforme destacam De Conti, Prates & Plihon (2014) e Desai (2013),
não basta apenas que essa participação privilegiada exista, mas que seja exercida de modo a
promover a moeda desejada enquanto encarnação da liquidez no plano internacional. Por
exemplo, no período pós-Bretton Woods, os Estados Unidos (EUA) adotaram políticas em
prol do uso internacional do dólar, a fim de restaurar e manter a posição da sua moeda como
divisa-chave do Sistema Monetário Internacional contemporâneo. Entre as diversas ações que
o governo norte-americano adotou, é possível destacar: a política do “dólar forte”, adotada por
Paul Volcker (presidente do Federal Reserve) em 1979 como resposta aos questionamentos
acerca do papel do dólar como moeda reserva internacional ao longo dos anos 1970; o acordo
de Plaza, em 1985, que representou uma tentativa dos EUA de estimular seu setor produtivo
via desvalorização do dólar, sem ameaçar a posição de sua moeda no plano internacional; o
50
acordo de Louvre em 1987, quando os ministros das Finanças do G-7 acordaram estabilizar o
dólar em torno dos níveis então vigentes, já que a moeda norte-americana se desvalorizou
rapidamente (40% em relação ao iene, por exemplo) a partir do acordo de Plaza (Tavares,
1985; Eichengreen, 1996; Desai, 2013).
Dessa forma, o papel ativo do Estado, conhecido também como “voluntarismo
político”, na internacionalização de uma moeda doméstica é um importante determinante do
seu uso além das fronteiras nacionais (De Conti, 2011; Herr, 2006;). Nesse sentido, pode-se
estabelecer um paralelo com o papel do Estado na determinação da moeda doméstica.
Conforme análise de Dequech (2013) de diferentes abordagens da moeda de inspiração
keyesiana24, mesmo sendo um fenômeno convencional, em última instância, a moeda, para
funcionar enquanto tal, ainda necessita da sanção do Estado. Desde logo, porém, inexiste um
organismo político que faça as vezes de um Estado a nível internacional nos moldes do
existente na esfera nacional. Tampouco uma agência mundial que defina e assegure as
relações contratuais entre entidades nacionais distintas. Inexiste também um imposto global
sob a administração de um órgão mundial com a capacidade necessária para impor a unidade
de conta e o meio de pagamento do mesmo. Nesse contexto, a tensão fundamental, ao
contrário da economia nacional, não é aquela entre o Estado e os agentes privados, mas entre
Estados Nacionais nas diversas formas em que se manifestam suas relações de poder. Em
outras palavras, o reconhecimento social da divisa-chave passa pelas relações de poder entre
os Estados.
Conforme ressaltado acima, as implicações das assimetrias do SMFI para as
economias emergentes podem ser feitas a partir de uma abordagem keynesiana, na qual
prevalece uma economia monetária de produção (Keynes, 1932 e 1936). Ou seja, tanto no
plano doméstico como no plano internacional, a moeda tem influência crucial na decisão de
gastos dos agentes e de alocação da riqueza no curto e no longo prazo. De maneira
esquemática, podemos explicitar essa relação por meio da aplicação da equação da taxa de
24
Dequech (2013) reúne essas abordagens em dois grupos. A visão convencionalista enfatiza o caráter
convencional da moeda, cuja forma superior de liquidez se dá essencialmente por meio da legitimação social –
os principais expoentes dessa visão são Aglietta & Orlean (2002). Já a visão pós-keynesiana destaca o papel do
Estado na determinação do ativo selecionado como moeda por meio da imposição daquilo que servirá como
unidade de conta e meio de pagamento de contratos e impostos – os principais expoentes dessa escola são
Davidson (1994) e Wray (1998). A partir desses dois grupos, Dequech (2013) evidencia que tanto o caráter
convencional da moeda quanto sua definição como criatura do Estado não são abordagens excludentes, mas
podem ser combinadas.
51
juros própria dos ativos (Keynes, 1936, cap.17) para o mercado de câmbio (Kaltenbrunner,
2015; Andrade & Prates, 2013; Prates, 2014). De acordo com a equação original:
(1) 𝑟𝑎 = 𝑎 + 𝑞 − 𝑐 + 𝑙
sendo “a” a apreciação (ou depreciação) esperada do ativo, “q” a quase-renda (ou rendimento)
esperado do ativo, “c” os custos de carregamento desse ativo e “l” seu prêmio de liquidez
(Keynes, 1936). Quando aplicamos a equação (1) ao mercado de câmbio e consideramos as
assimetrias, podemos comparar a taxa de retorno de uma determinada moeda periférica com a
taxa de retorno da divisa-chave (Kaltenbrunner, 2015; Andrade & Prates, 2013)25. Assim:
(2) 𝑟 = 𝑎 + 𝑞 − 𝑐 + 𝑙
(3) 𝑟 ∗ = 𝑞 ∗ − 𝑐 ∗ + 𝑙 ∗
sendo que (2) representa a taxa de retorno da moeda periférica; (3) representa a taxa de
retorno da divisa-chave; 𝑎 representa a expectativa de apreciação da moeda periférica em
relação à divisa-chave. Numa condição de equilíbrio (𝑟 = 𝑟 ∗ )26 entre (2) e (3), temos:
(4) (𝑞 − 𝑞 ∗ ) + 𝑎 = (𝑙 ∗ − 𝑙) + (𝑐 − 𝑐 ∗ )
25
Vale ressaltar que Kaltenbrunner (2015) não considera em sua equação de retorno os custos de carregamento.
De acordo com a autora, “in line with Keynes’s assumption for the closed economy, carry costs are considered
negligible for money and short-term financial instruments” (Kaltenbrunner, 2015, p. 433).
26
De acordo com Kaltenbrunnner (2015, p.431), a condição de equilíbrio é um aspecto formal, ou seja, não
implica necessariamente igualdade das taxas de retorno. Dessa forma, a comparação entre as taxas de retorno das
moedas periféricas e divisas segue a mesma lógica das comparações estabelecidas por Keynes no capítulo 17.
52
27
Conforme De Conti (2011, p. 171), a liquidez de mercado “(...) diz respeito às condições em que um ativo é
transacionado em determinado mercado, ou seja, aos custos – monetários e temporais – envolvidos na
operação”. Conforme o autor, ela é determinada por quatro fatores: instituições, tamanho e histórico de
transações do mercado e agentes participantes.
28
As moedas periféricas possuem um prêmio de liquidez pequeno, porém positivo, já que desempenham,
mesmo que marginalmente, alguma função da moeda em âmbito internacional; por exemplo, no boom do ciclo
de liquidez que antecedeu a CFG, várias economias emergentes emitiram títulos soberanos denominados na
própria moeda. Assim, o “caráter ilíquido” da moeda periférica no plano internacional, ressaltado em diversos
pontos da tese, se refere a um baixo prêmio de liquidez, porém não igual a zero.
53
Fonte: Palludeto & Abouchedid (2016), a partir de De Conti, Prates e Plihon (2014).
29
Haldane (2011, p.3) ressalta que “(..) the gap between core and periphery has been closing. The relative
contribution of intra-advanced country external portfolio asset stocks fell from around 99% to 84% between
1980 and 2005. Over the same period, the relative contribution of advanced to emerging market external
portfolio asset stocks rose from virtually nothing to over 8%. That is a fairly dramatic shift in international
investors’ portfolio choice”
55
das autoridades monetárias nos mercados de câmbio) e/ou ajustes na taxa de juros (e nas taxas
de remuneração dos títulos domésticos que funcionam como quase-moeda).
A posição de uma moeda doméstica na hierarquia condiciona, portanto, a
autonomia – nos termos definidos na introdução desta tese - das políticas monetária e cambial
do respectivo país emissor. Por exemplo, o Banco Central de uma economia emergente pode
elevar sua taxa básica de juros em face de uma reversão nos fluxos de capitais (causada, por
exemplo, por uma mudança na política monetária norte-americana) mesmo em momentos de
recessão econômica – contrariando, portanto, objetivos domésticos. Neste contexto, a pró-
ciclicidade das políticas dos países emergentes é, portanto, uma manifestação da restrição de
autonomia não somente da política monetária, mas da política econômica de forma geral.
Dessa forma, “as assimetrias monetária e financeira implicam assimetria macroeconômica, a
qual diz respeito aos diferentes graus de autonomia de política dos países que integram o
sistema” (Prates, 2002, p. 150). De acordo com essa definição, a posição de uma determinada
moeda na hierarquia implica restrições não apenas em suas políticas monetária e cambial, mas
também em outras políticas macroeconômicas.
Ademais, a assimetria macroeconômica coloca em xeque a trindade impossível, já
que num ambiente de livre mobilidade de capitais, a autonomia de política monetária é
restrita, independentemente do regime cambial adotado. Assim, como destaca Flassbeck
(2001), os países que não emitem a divisa-chave se deparam com uma dualidade impossível;
ou, nos termos de Rey (2013), o trilema torna-se um dilema, já que “independent monetary
policies are possible if and only if the capital account is managed” Rey (2013, p.3). Contudo,
vale ressaltar que ao contrário da abordagem keynesiana-estrututuralista adotada nesta tese,
esses autores não levam em consideração as assimetrias entre países centrais e periféricos, que
resulta numa perda ainda maior de autonomia de política macroeconômica para esses últimos
países.
Além da política monetária, a politica cambial dos países emergentes também
sofre restrições oriundas das assimetrias monetária e financeira. Em outras palavras, a posição
da moeda de um determinado país nessa hierarquia também condiciona os objetivos, metas,
canais de transmissão e instrumentos da política cambial. Tais restrições são tema da próxima
seção.
57
30
As análises empíricas realizadas neste e nos próximos capítulos serão baseadas nessa lista. No entanto, os
suportes empíricos das referências bibliográficas aqui utilizadas nem sempre consideram a mesma amostra de
países emergentes, o que não inviabiliza seu uso ao longo desta tese.
58
31
Várias questões mencionadas nesta seção serão retomadas de forma mais detalhada nos próximos dois
capítulos.
32
Os Bancos Centrais que participaram dessa entrevista são: Argélia, Argentina, Brasil, Chile, Colômbia,
República Tcheca, Hong Kong, Hungria, Índia, Indonésia, Israel, Coréia do Sul, Malásia, México, Peru,
Filipinas, Polônia, Rússia, Arábia Saudita, Cingapura, África do Sul, Tailândia, Turquia e Emirados Árabes.
59
Indonésia), entre 2001 e 2009, Pontines & Rajan (2011, p. 253) sugerem a proeminência da
competitividade externa como objetivo macroeconômico, ou seja, uma maior reação da
política cambial desses países nos momentos de apreciação nominal de suas respectivas
moedas em relação aos momentos de depreciação. .
Ao comparar o resultado da tabela 1.3 com a entrevista realizada por Lecourt et.
al. (2006) junto aos Bancos Centrais dos países avançados33, pode se verificar algumas
diferenças em relação aos objetivos mais importantes. Para 90% das autoridades monetárias
desses países, as intervenções tinham como motivação conter ou mudar uma determinada
trajetória da taxa de câmbio, fenômeno conhecido como, “lean against the wind”, enquanto
para 66% dos entrevistados as intervenções buscaram corrigir ou prevenir desalinhamentos da
taxa de câmbio dos seus fundamentos. A redução da volatilidade e das desordens de mercado
foi motivação das intervenções de apenas 33% dos entrevistados. Os resultados sugerem,
portanto, que os principais objetivos macroeconômicos da política cambial dos países
avançados entrevistados não se subordinam à contenção da volatilidade e/ou movimentos
abruptos na taxa de câmbio e, portanto, se relacionam de forma mais estreita a objetivos
domésticos, como controle inflacionário ou competitividade externa.
Considerando que as metas da política cambial são pautadas pelos seus objetivos
macroeconômicos, boa parte das intervenções dos bancos centrais dos países emergentes tem
como meta geral a redução dos impactos dos movimentos do ciclo de liquidez global sobre a
taxa de câmbio e, consequentemente, sobre os mercados financeiros domésticos (Mohanty &
Berger, 2013; Ostry, 2016). A redução da especulação excessiva no mercado de câmbio, a
acumulação de reservas internacionais e a contenção de movimentos abruptos de entrada e
saída de capitais são os principais objetivos específicos relatados pelas autoridades
monetárias, sugerindo, portanto, que os efeitos das assimetrias condicionam as metas desses
países. Dentre as metas listadas, a acumulação de reservas internacionais ganhou especial
relevância ao longo do boom de fluxos de capitais no período pré-crise (2003-2007), quando
diversos países emergentes (com exceção de alguns países da Europa Central e do Leste)
aproveitaram o momento de bonança para alavancar suas reservas em divisas (Menkehoff,
2013).
33
Os Bancos Centrais que responderam ao questionário são dos seguintes países: Austrália, Bélgica, Dinamarca,
Alemanha, Canadá. Inglaterra, Banco Central Europeu, Hungria, Irlanda, Noruega, Estados Unidos, Suíça,
Suécia.
60
Manter a estabilidade
monetária 7 2 2 10 2 2
Impedir movimentos
bruscos dos fluxos de 4 3 1 5 5 1
capital
Acumular ou reduzir
reservas internacionais 7 0 2 6 2 2
Amortecer os impactos do
ciclo dos preços das 3 1 3 4 1 3
commodities
Competitividade externa 2 2 3 4 1 3
Atenuar problemas de
funding de bancos e 4 2 0 5 2 0
corporações
mais efetivo nesses países34 (Menkhoff, 2013; Canales-Kriljenko, 2004; Neely, 2005). No
entanto, essa conclusão contrasta com a opinião dos Bancos Centrais, em entrevista para o
BIS (2013), sobre o canal de transmissão mais efetivo. De acordo com as autoridades
monetárias entrevistadas, as intervenções são mais efetivas, em sua maioria, por meio do
canal das expectativas (expectativas sobre a taxa de câmbio futura e as próximas
intervenções).
O contexto de dominância do canal das expectativas, na visão das autoridades
monetárias, sugere, portanto, que a efetividade dos canais de transmissão da política cambial
nos PEMP não depende somente de fatores domésticos (especificamente institucionais) como,
por exemplo, a maior presença, em volume, do Banco Central no mercado de câmbio.
Considerando os efeitos das assimetrias monetária e financeira, o canal da expectativa nos
PEMP pode ser afetado pela sinalização das políticas cambial e monetária dos PED. De
acordo com essa hipótese, as sinalizações das autoridades monetárias dos PED ou as
expectativas dos investidores sobre os próximos passos dessas autoridades alteram a
preferência pela liquidez no plano internacional, que, por sua vez, impacta os canais de
transmissão da política cambial dos PEMP de diferentes modos. É um desdobramento,
portanto, dos trabalhos de Rey (2013) e Flassbeck (2001), mencionados na seção anterior, e
também de Aglietta (2004). Conforme esse último, no período pós-abertura financeira, as
decisões de política monetária estão mais dependentes dos canais das expectativas, ou seja, as
taxas de juros de longo prazo são cada vez mais guiadas pelas expectativas dos agentes sobre
as decisões e sinalizações dos Bancos Centrais em relação às suas respectivas taxas de juros
de curto prazo e demais variáveis macroeconômicas.
Assim, por exemplo, se as expectativas dos agentes em relação à política
monetária norte-americana apontassem para uma redução da taxa de juros de longo prazo,
haveria um aumento da liquidez internacional e, portanto, uma pressão para apreciação das
moedas periféricas. Tal pressão prevaleceria independentemente das expectativas (ex-ante)
dos agentes em relação à sinalização dos bancos centrais dos PEMP. Caberia, portanto, aos
bancos centrais desses países “ajustarem” suas sinalizações ao novo cenário. (Figura 1.4).
34
Vale ressaltar que o canal de equilíbrio de portfólio ganha relevância no caso de grandes intervenções em
volume (Menkhoff, 2013).
62
35
De acordo com Fawley & Neely (2013, p. 52), “QE policies are those that unusually increase the monetary
base, including asset purchases and lending programs. Programs designed to improve credit conditions—that is,
credit easing—are a special case of QE if they also increase the monetary base”
36
Para maiores detalhes sobre o impacto da política monetária norte-americana nos mercados financeiros
internacionais, ver Rey (2013).
37
Ademais, as indefinições acerca do aumento da taxa de juros norte-americana após o anúncio do tapering
comprometeram as intervenções dos Bancos Centrais dos países emergentes realizadas por meio do canal das
expectativas, dificultando, portanto, a contenção da volatilidade cambial.
38
Para efeitos de simplificação, utilizou-se a medida padrão de volatilidade, o desvio padrão. Outras formas de
mensuração, propostas por Ramos (2016), serão utilizadas no terceiro capítulo.
63
2009, marca o início do terceiro período que se estende até março de 2013. Por fim, abril de
2013, quando se intensificam as especulações acerca do tapering (anunciado em maio), marca
o início do último período que se estende até 2015 no caso da taxa de câmbio e abril de 2016
no caso das reservas internacionais (últimos dados disponíveis). Para simplificação, a variação
mensal das reservas será usada como proxy da intervenção das autoridades monetárias no
mercado à vista.
No período de bonança entre 2003 e 2007, os Bancos Centrais dos PEMP atuaram
principalmente por meio da compra de expressivos volumes de divisas. Nos momentos de
baixa no ciclo de liquidez (o primeiro entre setembro de 2008 e março de 2009, e o segundo
entre abril de 2013 e abril de 2016), marcados por maior volatilidade e depreciação das
moedas periféricas (ver gráfico 1.1 e 1.2), o percentual das vendas aumentou, porém em
proporções menores quando comparados às compras nos períodos de bonança (com exceção
da Coréia do Sul no período da crise financeira global). Os dados, portanto, corroboram
Fratzscher et.al. (2015) e sugerem uma assimetria da compra e venda de moeda estrangeira no
mercado.
64
39
Tais informações foram extraídas da base do FMI sobre os ativos e passivos em moeda estrangeira dos bancos
centrais – ”Data Template on International Reserves and Foreign Currency Liquidity” – por meio do link:
http://www.imf.org/external/np/sta/ir/IRProcessWeb/index.aspx.
40
No caso brasileiro, as linhas de swaps não foram utilizadas, principalmente pelo caráter non-deliverable dos
derivativos de câmbio (cujo mercado possui maior liquidez em relação ao mercado à vista), minimizando,
portanto, a perda de reservas nos momentos de crise de liquidez (Prates, 2015).
68
possuem participação significativa na conta financeira dos países que recorreram a esses
instrumentos –, tendo, assim um caráter assimétrico, e também contracíclico, já que
praticamente não foram adotadas restrições sobre as saídas de capitais (Gosh, Ostry e Qureshi,
2017). Uma das possíveis razões dessa assimetria é a própria assimetria financeira que atinge
os PEMP: por não ser uma medida “market friendly”, a imposição dessas restrições nos
momentos de baixa do ciclo de liquidez internacional poderia provocar reações abruptas dos
investidores estrangeiros, impactando negativamente a volatilidade da taxa de câmbio desses
países (Tabela 1.6).
Investimento
Peru 5,9 5,6 9,3 Sim
Direto
Outros
Tailândia 5 Fluxos de 9,3 4,3 Sim
Capital
Outros
Turquia 6,9 Fluxos de 6,5 21,4 Sim
Capital
Fonte: FMI (2011b) e Prates & Cunha (2011). Elaboração Própria.
Notas:
(1) Período: terceiro trimestre de 2009 ao segundo trimestre de 2010.
(2) Variação (%) da taxa de câmbio nominal efetiva do piso da crise até dezembro de 2010.
(3) Aumento em % do PIB, do piso da crise até dez/2010.
(4) Variação do índice de preços (em%) frente ao mesmo mês do ano anterior, média do 2º
sem/2010.
41
Conforme exposto acima, vale ressaltar que, num regime de metas de inflação, o controle inflacionário
também exerce protagonismo como objetivo macroeconômico.
71
taxa de câmbio por meio do impacto na posição líquida dos agentes participantes do mercado
de câmbio. Seguindo essa definição, a análise da política cambial foi dividida em cinco
categorias: objetivos macroeconômicos, metas, canais de transmissão, instrumentos de
intervenção e indicadores monitorados.
A partir da definição e da categorização do objeto de análise desta tese, a segunda
seção se dedicou à contextualização da política cambial ao longo do período analisado. A
adoção formal, por diversos países emergentes, de regimes de câmbio flutuante e metas de
inflação após as crises da segunda metade da década de 1990, implicava, em teoria, a
passividade da política cambial nesses países. Porém, a literatura constatou que a política
cambial de fato continuava ativa, não somente em momentos de baixa no ciclo de liquidez
internacional, mas também nos períodos de boom. Dentre os diversos motivos elencados para
as intervenções, se destaca o “medo de flutuar”, principalmente em razão dos descasamentos
de moedas presentes nos balanços privados e públicos dos países emergentes e do maior pass-
through. Parte da literatura mainstream reconhece que esses desequilíbrios são causados pela
baixa ou nula participação das moedas domésticas nos mercados financeiros internacionais,
porém as explicações para tais diferenças variam conforme o approach teórico.
Esta tese parte do referencial teórico keynesiano-estruturalista das assimetrias
monetária e financeira, analisando a relação entre os balanços dos agentes e a política cambial
sob a perspectiva de uma economia monetária de produção. Assim, as características que
conformam o retorno sobre a moeda periférica – dentre elas o menor prêmio de liquidez em
relação à divisa - implica, dentre outros fatores, maior volatilidade em sua taxa de câmbio.
Em outras palavras, as assimetrias monetária e financeira geram instabilidades nas taxas de
câmbio dos PEMP, cuja dinâmica é determinada, em última instância, pela política monetária
dos PED. A configuração do SMI atual, portanto, restringe a autonomia de política cambial (e
demais políticas econômicas) dos PEMP, que atuam como policy takers no plano
internacional.
Seguindo a taxonomia de política cambial apresentada na primeira seção, as
restrições do espaço de política cambial se manifestam por meio do direcionamento dos
objetivos macroeconômicos para a estabilidade financeira e prevenção de crises mediante a
redução da volatilidade cambial; da subordinação do canal das expectativas da politica
cambial ao canal das expectativas da política monetária dos PED, e; do surgimento de
assimetrias na adoção de instrumentos, em razão da precaução no uso de reservas
internacionais e de medidas “market unfriendly”. A forma pela qual os diferentes países
72
emergentes vão lidar com tais manifestações depende dos condicionantes domésticos da
política cambial, que serão analisados no próximo capítulo.
73
Capítulo 2
Introdução
42
No mesmo sentido aqui adotado, Prates (2007) também relaciona os condicionantes com os objetivos
macroeconômicos. De acordo com a autora, os objetivos e metas de política cambial dependem de dois
conjuntos de fatores (tratados aqui como condicionantes domésticos). O primeiro “(...) inclui os condicionantes
estruturais, dentre os quais o estágio de desenvolvimento econômico, as características dos mercados financeiros
domésticos e o grau de abertura financeira” (Prates, 2007, p. 9). O segundo “(...) consiste nos condicionantes
conjunturais ou macroeconômicos, que incluem, além da situação do balanço de pagamentos, o grau de pass-
through das variações cambiais aos preços e de currency-mismatch” (Prates, 2007, p. 9). Já Domanski et. al.
(2016, p.68) justificam que tais objetivos “depend not only on countries’ choice of monetary regime but also on
their exposure to external developments, their aggregate balance sheet positions and macroeconomic
circumstances”.
75
volatilidade da taxa de câmbio (Prates, 2007; Domanski et. al, 2016). Portanto, a efetividade
de uma determinada política cambial que tenha como objetivo macroeconômico a estabilidade
financeira/prevenção de crises e como meta a redução da volatilidade cambial, passa
necessariamente pela redução da vulnerabilidade externa, considerada aqui um condicionante
doméstico.
Outro condicionante é a inter-relação entre taxa de juros e taxa de câmbio, que se
acentua especialmente nesses países, num ambiente de livre mobilidade de capitais e reduzida
autonomia de política econômica (Prates, 2015, p. 133). Consequentemente, a gestão da
política monetária torna-se um dos condicionantes domésticos da política cambial,
especialmente sob o regime de metas de inflação, já que o elevado repasse cambial
característico das economias emergentes torna o controle inflacionário um dos principais
objetivos macroeconômicos da política cambial (Caselli & Roitman, 2016; BIS, 2013). Outro
fator que aproxima tais políticas é a esterilização das intervenções no mercado de câmbio, já
que esta gera consequências para a operacionalização da política monetária e para o custo
financeiro da dívida mobiliária federal, como se verá a seguir.
Por fim, o último condicionante da política cambial considerado relaciona-se com
o objetivo macroeconômico da competitividade externa, listado por alguns autores – dentre
eles Bresser-Pereira (2012) e Guzman, Ocampo & Stigltiz (2014) – como a principal
motivação da política cambial (e da política econômica em geral) para se buscar o
desenvolvimento econômico (ver Gala & Libanio, 2010). Portanto, a competitividade externa
é uma das formas de ampliar autonomia da política cambial em relação aos impactos adversos
das assimetrias monetária e financeira. No entanto, ainda que os efeitos de uma taxa de
câmbio competitiva sejam positivos no médio e longo prazo para esses autores, os impactos
dessa taxa, no curto e médio prazo, podem ser heterogêneos, dependendo do padrão de
comércio de cada país – e, consequentemente, da integração da respectiva estrutura produtiva
às cadeias globais de valor (Hiratuka & Sarti, 2017). Assim, a busca por um patamar
depreciado de uma determinada moeda periférica, por exemplo, pode provocar no curto prazo
efeitos negativos sobre a balança comercial de um determinado país - dado seu padrão de
comércio – e aumentar, inclusive, sua vulnerabilidade externa43. Os efeitos negativos podem
43
Há diversas ponderações na literatura sobre o efeito positivo da depreciação cambial sobre o saldo da balança
comercial. De acordo com a condição Marshall-Lerner, esse efeito só ocorre se a soma das elasticidades das
exportações e importações for maior que a unidade. Já Magee (1973) denominou de Curva J a resposta lenta da
balança comercial à variação da taxa de câmbio. Tal curva foi testada em diversos países – ver, por exemplo,
Lobo (2007) e Wilson (2001).
76
se estender também para o controle inflacionário, no caso de um elevado repasse cambial para
os preços dos produtos importados.
De acordo com o referencial analítico proposto, os condicionantes domésticos
listados acima – abertura financeira e institucionalidade do mercado de câmbio;
vulnerabilidade externa; gestão da política monetária e padrão de comércio – se relacionam
com a política cambial conforme a figura 2.1. Assim, a interação entre, de um lado, os
instrumentos de intervenção e, de outro lado, a abertura financeira e a institucionalidade do
mercado de câmbio impacta, positiva ou negativamente, os outros três condicionantes
domésticos, que também se relacionam entre si. Dois pontos principais emergem da figura
abaixo. Primeiramente, a interação entre, de um lado, os instrumentos de política cambial e,
de outro lado, a abertura financeira e a institucionalidade do mercado de câmbio pode ocorrer
de forma ativa, isto é, alterando as regulações até então vigentes, ou acomodatícia, ou seja, se
adequando a tais regulações. Segundo, vale ressaltar que nem sempre todos os condicionantes
domésticos são afetados na condução de uma determinada política cambial. Ou seja, a escolha
de um certo instrumento, meta e objetivo pode envolver - além da abertura financeira e
institucionalidade - apenas um ou dois condicionantes dentre os três listados. Conforme os
diferentes impactos, os objetivos macroeconômicos, traçados previamente, são alcançados ou
não. Os condicionantes domésticos são tema das próximas quatro seções. Por fim, na última
seção deste capítulo, tais condicionantes são relacionados com o referencial teórico
apresentado no primeiro capítulo.
78
44
Vale ressaltar que o indicador kaopen considera não apenas as restrições na conta financeira, mas também
restrições na conta de transações correntes, além de tarifas comerciais e a presença de múltiplas taxas de câmbio
(Chinn e Ito, 2008).
79
Rep. Tcheca
Indonesia
Polônia Hungria
Tailândia Filipinas
Coréia do Sul
Peru
México
Colômbia
Chile
Brasil
África do Sul
Turquia
Fonte: http://web.pdx.edu/~ito/Chinn-Ito_website.htm
Nota: Os países foram numerados de 1 a 14 para facilitar a visualização gráfica
45
Vale ressaltar que o índice Kaopen considera apenas regulações sobre a conta financeira (especificamente
controles de capitais), não incorporando, portanto, outros tipos de regulações, como a regulação macroprudencial
e dos mercados de derivativos (Chinn & Ito, 2008; Prates, 2012). Assim, por exemplo, a adoção de regulações
macroprudenciais pela Coréia do Sul após a CFG, que será analisada no próximo capítulo, não foi incorporada
no cálculo do Kaopen de 2014 apresentado no gráfico 2.1.
46
De acordo com o BIS (2016b, p.28), dealers são “financial intermediary that stands ready to buy or sell assets
with its clients”
80
47
Os residentes que operam nos mercados onshore estão sujeitos à jurisdição de um determinado país mesmo
fora das fronteiras nacionais.
48
Vale ressaltar que a ausência de jurisdição não impede iniciativas de regulação internacional. Por exemplo, o
mercado de NDF está migrando gradativamente a plataformas centralizadas de negociação, quem possuem
melhor estrutura de clearing (ver McCauley e Shu, 2016).
82
50
Conforme Moore et. al. (2016), o aumento do volume negociado em alguns mercados de câmbio emergentes
de balcão se deve principalmente ao mercado de derivativos (especialmente o mercado de swaps).
83
Tabela 2.1: Volume (estimado)a dos mercados onshore e offshore de balcão – moedas selecionadasb
1995 1998 2001 2004 2007 2010 2013 2016
Moeda
Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore Onshore Offshore
BRL - - 5.127 - 5.529 364 3.790 1.353 5.762 7.338 14.094 13.120 17.203 41.964 19.747 30.938
CLP - - 1.255 - 2.328 - 2.462 - 4.003 - 5.544 966 11.956 3.948 7.491 4.973
COP - - - - 397 - 802 - 1.860 - 2.794 1.174 3.343 2.487 3.867 4.031
CZK - - 5.128 - 2.094 203 2.383 534 5.029 2.089 5.110 2.493 4.912 14.146 3.822 10.411
HUF - - 1.448 - 587 - 2.827 881 6.858 2.088 4.196 12.959 3.854 18.837 3.305 11.992
IDR - - 1.766 - 3.875 - 2.332 - 3.039 629 3.381 2.636 5.011 4.038 4.633 5.457
KRW - - 3.557 - 9.809 152 20.529 1.547 35.236 3.189 43.824 16.432 47.520 16.675 47.814 36.028
MXN - - 8.659 - 8.593 1.662 15.270 6.134 15.314 28.250 17.019 32.917 32.112 103.241 20.223 76.833
PEN - - - - 241 - 306 - 805 - 1.425 - 2.171 1.035 1.496 2.379
PHP - - 759 - 1.064 - 678 95 2.338 1.170 5.017 1.690 3.733 4.058 2.578 4.461
PLN - - 2.664 - 5.146 454 6.535 761 9.225 16.130 7.847 24.155 7.564 30.005 9.116 26.207
THB - - 3.119 - 1.912 - 3.119 753 6.314 185 7.390 260 12.784 4.312 10.544 7.694
TRY - - - - 1.043 - 3.489 - 4.096 1.844 16.817 12.466 27.277 43.386 22.282 50.530
ZAR 5.165 - 8.933 - 9.941 1.753 9.797 4.200 13.974 16.320 14.375 14.298 20.946 38.757 21.160 28.135
Total 5.165 - 42.415 - 52.558 4.588 74.319 16.259 113.852 79.231 148.832 135.566 200.386 326.890 178.077 300.069
a. Os volumes onshore e offshore foram estimados de acordo com McCauley & Shu (2016, p. 84, gráfico 3): “onshore is defined as all trades executed in the jurisdiction
where a currency is issued on a “net-gross” basis (ie adjusted for local inter-dealer double-counting). Offshore is calculated as the difference between total for the currency on
a “net-net” basis (ie adjusted for local and cross-border inter- dealer double-counting) and onshore transactions”.
b. BRL: real; CLP: peso chileno; COP: peso colombiano; CZK: coroa tcheca; HUF: florin húngaro; IDR: rupiah; KRW: won; MXN: peso mexicano; PEN: sol peruano; PHP:
peso filipino; PLN: sloty polonês; THB: bath tailandês; TRY: lita turca; ZAR: rand sul-africano.
Fonte: BIS (2016)
84
51
Vale ressaltar a diferença entre forwards e futuros. Enquanto os contratos futuros são padronizados e
negociados em mercados organizados (bolsas de valores), os contratos forwards são instrumentos de balcão,
acordados entre agentes privados, que estabelecem os termos e condições específicos de cada contrato. Dessa
forma, contratos forwards possuem um maior risco de contraparte, pois não possuem clearing houses ou outras
instituições que garantam as transações. A fraca institucionalidade também implica a ausência de marcação a
mercado em grande parte dos contratos forwards (Farhi, 2006b).
85
Offshore
Onshore
Offshore
Onshore
Offshore
Onshore
Offshore
Onshore
Offshore
Onshore
Offshore
Onshore
Offshore
Onshore
Onshore
Onshore
Onshore
Onshore
Onshore
Offshore
Offshore
Offshore
Offshore
Offshore
Offshore
Offshore
Brasil México Coréia do Sul Polônia Hungria Turquia África do Sul
Quadro 2.1: Institucionalidade dos mercados à vista e de derivativos (2015) – países selecionados
País/mercado Colômbia México Chile Brasil
Agentes: podem atuar nos Agentes: somente os bancos Agentes: Mercado primário de câmbio Agentes: No mercado primário, as
segmentos primário e (comerciais) podem atuar no é negociado num sistema chamado operações com divisas devem ser
interbancário: bancos, mercado primário; já o mercado Datatec, onde Bancos e Corretoras de formalizadas em contratos de câmbio
corporações financeiras interbancário compreende bancos Valores operam uns com os outros de e realizadas por meio de instituições
(semelhantes aos bancos de (comerciais, de investimento e acordo com limites preestabelecidos financeiras autorizadas pelo Banco
múltiplos), fundos de pensão, entre eles. No mercado interbancário, Central. Restrição à abertura de
investimento no Brasil),
seguradoras e quaisquer instituições 25 bancos podem participar, sem contas em moeda estrangeira. No
corretoras, seguradoras, fundos
registradas como instituições qualquer intervenção do Banco Central. mercado interbancário, diversas
de pensão e agentes fiduciários
financeiras. Não há restrição para Não há restrições para abertura de instituições financeiras (bancos e
sob a supervisão da
abertura de contas em moeda contas de moeda estrangeira. não-bancos) podem atuar, porém
Superintendência Financeira.
estrangeira. Dealers: todas as instituições devem prestar contas de suas
Restrição à abertura de contas
À vista Dealers: Somente bancos financeiras operações e posições em moeda
em moeda estrangeira.
Posição de câmbio: além dos Posição de câmbio: permitida para estrangeira ao Bacen.
Dealers: todas as instituições bancos (comerciais e de bancos, corretoras, seguradoras e Dealers: Somente bancos
financeiras investimento), fundos de pensão, sociedades de investimentos; não há Posição de câmbio: permitida para
Posição de câmbio: todos os seguradoras, corretoras e agentes limites. bancos. Atualmente, não há limite de
agentes podem ter posição de fiduciários. Mas a posição de divisas posição comprada ou vendida.
câmbio. Mas, não podem manter dos bancos (comprada ou vendida) é
posição vendida a partir da restrita a 15% do seu capital.
contratação de empréstimos no
mercado interbancário
internacional (operações de
linha). Limite de posição: 20% do
91
Relevante nos mercados forward e Relevante nos mercados forward e Relevante no mercado de forwards e
Relevante para os mercados
swaps. Transações são reguladas e swaps. Operações são reguladas e opções (com limites de posições para
forwards e swaps. Operações são
Derivativos restritas para hedge (documentos permitidas apenas para hedge. bancos nacionais e estrangeiros e
reguladas e permitidas apenas para
que comprovam a posição aberta de exportadores)
hedge de algumas operações.
câmbio).
País/mercad
Polônia Hungria República Tcheca Turquia
o
Agentes: Qualquer instituição As autoridades monetárias Qualquer instituição financeira e não Agentes: qualquer instituição
financeira pode atuar no mercado removeram todas as restrições sobre financeira, autorizada pelo Banco financeira e não financeira
primário. A regulação foi adequada as transações no mercado de câmbio Central, pode atuar no mercado autorizada pelas autoridades
aos padrões da União Europeia. No em 2001 nos mercados primários e primário e interbancário. Grande parte monetárias. Grande parte dos
mercado interbancário, não há interbancário. Todas as instituições dos dealers são bancos, parte deles agentes pode ter conta em moeda
À vista limites para as operações, que são
financeiras podem ter posições estrangeiros. Residentes e não- estrangeira no país (alto nível de
abertas de câmbio. Residentes e residentes podem ter conta em moeda dolarização).
concentradas em poucos bancos
não-residentes podem ter conta em estrangeira. Dealers: Somente bancos
(cerca de 20 instituições). Residentes
moeda estrangeira. Posição de câmbio: permitida para
e não-residentes podem ter conta
bancos, com regulação do Banco
em moeda estrangeira.
Central sobre as posições vendidas
93
Fonte: FMI (2015),Prates (2015), Bancos Centrais dos países emergentes selecionados.
ciclo doméstico aos movimentos do ciclo de liquidez global52 (Gonçalves, 1998; Rosa &
Biancarelli, 2017). Os choques provindos do ciclo global podem se transmitir de diversas
formas às economias domésticas.
A intensificação da abertura financeira das economias emergentes ao longo dos
anos 1990 e 2000 e o boom dos fluxos de capitais entre 2003 e 2007 impulsionaram, pelo lado
dos fluxos, a entrada de capitais privados nessas economias (Gráfico 2.6). De maneira geral,
os empréstimos externos se sobressaíram tanto no período pré-crise – com destaque para a
Coréia do Sul – quanto no período pós-crise em relação aos demais fluxos privados (fluxos de
portfólio e IDE). Os fluxos de IDE também possuem relevância na média dos fluxos líquidos
– destaca-se Brasil, México e Coréia do Sul -, conferindo, supostamente, maior estabilidade
aos fluxos de capitais privados, em razão da natureza menos volátil deste tipo de fluxo. No
entanto, os fluxos de IDE possuem componentes desestabilizadores, que comprometem seu
suposto caráter de longo prazo. Os fluxos direcionados a fusões e aquisições, por exemplo,
pode contribuir para o aprofundamento dos desequilíbrios causados pelos fluxos de capitais
de curto prazo. Os fluxos de IDE podem ser utilizados também como funding de operações de
curto prazo (carry trade), por meio dos empréstimos intercompanhias (Akyüz, 2017, p. 182-
183).
Em relação à conta corrente (gráficos 2.9 e 2.10), pode se observar no gráfico 2.9
os países (especialmente Brasil, Chile, Peru e Indonésia) que se beneficiaram do boom dos
preços das commodities no período pré-crise – e, portanto, chegaram a registrar superávits em
conta corrente no período – e que tiveram suas contas de transações correntes duramente
afetadas, conjuntamente com os países do gráfico 2.10, no pós-crise, com o enfraquecimento
do comércio mundial. Tal fato, portanto, pressionou ainda mais o balanço de pagamentos
desses países, principalmente Turquia e Peru, que possuem altos níveis de dolarização em
suas economias.
52
Há outras definições de vulnerabilidade externa (ver Gonçalves et al, 1998, p. 57; Painceira & Carcanholo,
2002; Gonçalves, 2005; Carcanholo, 2010).
96
2008
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015e
Fonte: Institute of International Finance (IIF)
Nota: 1. Todos os países da amostra exceto o Peru, que não é considerado na base de dados da IIF
Fonte: IIF
97
Fonte: IIF
Fonte: IIF
98
Fonte: IIF
A fim de evitar tais impactos descritos acima – e a repetição das crises cambiais
da década de 1990 – os países emergentes adotaram diferentes medidas visando a melhora dos
indicadores relacionados à solvência e liquidez externa54. A principal delas foi a acumulação
de reservas, que se intensificou ao longo do boom dos fluxos de capitais pré-crise, conforme
mencionado no capítulo anterior. A expansão do colchão de liquidez combinada com o bom
desempenho do saldo da balança comercial – em razão, principalmente, do boom dos preços
das commodities e maior dinamismo do comércio mundial, mencionados acima – foram
determinantes para a melhora dos indicadores de liquidez e solvência externa,
respectivamente55 (Tabela 2.2).
Além disso, essa melhora veio acompanhada de uma redução na dolarização dos
passivos externos em alguns países, em especial dos títulos soberanos (Akyuz, 2014). A maior
participação das emissões de títulos em moeda doméstica causa efeitos patrimoniais positivos,
já que a depreciação da moeda local provoca uma redução dos passivos externos, diminuindo
o risco de perda excessiva de reservas em momentos de crise de liquidez. Embora não haja
dados específicos sobre “desdolarização” dos passivos externos em todos os países da
amostra, o movimento da posição internacional de investimento (passivos menos ativos
externos) pode sugerir a maior/menor presença de passivos denominados em moeda
doméstica; ou seja, passivos mais concentrados em suas respectivas moedas tendem a
diminuir nos momentos de baixa no ciclo de liquidez (Akyuz, 2017; Rosa & Biancarelli,
2017). A tabela 2.3 revela uma melhora da posição internacional de investimento (passivos
menos ativos externos) nos momentos de baixa (2008) e instabilidade no ciclo de liquidez
54
Os indicadores de solvência e liquidez externa constituem medidas convencionais da vulnerabilidade externa
no médio e longo prazo e no curto prazo, respectivamente. A solvência externa representa a capacidade de um
país honrar seus compromissos externos de médio e longo prazo por meio da geração de divisas, ou seja, das
exportações. Já a liquidez externa representa a capacidade de honrar os compromissos externos de curto prazo
por meio do estoque de reservas internacionais (ver Prates, 2006).
55
De acordo com Akyüz (2017, p. 138), a principal referência até a CFG para a mensuração da vulnerabilidade
externa era a dívida externa de curto prazo. Dessa forma, a acumulação de reservas internacionais deveria ser
suficiente para cobrir a dívida externa de curto prazo em moeda estrangeira (regra de Greenspan-Guidotti).
100
internacional (a partir de 2012) em grande parte dos países, principalmente Brasil e Coréia do
Sul56. Já países com elevados níveis de dolarização em seus passivos externos, como o Peru,
apresentam o efeito contrário: em momentos de crise, a posição internacional de investimento
se deteriora.
56
Ver para o caso brasileiro Noije (2015).
101
Dívida Externa
95,3 135,1 70,1 39,2 39,0 46,7
Tailândia Bruta/Exportações
Reservas 13.305 35.982 38.046 85.349 167.389 151.266
Dívida Externa
67,5 73,8 64,5 71,2 56,7 58,6
Coréia do Sul Bruta/Exportações
Reservas 14.793 32.678 121.345 262.150 304.236 363.167
Fonte: Institute of International Finance (IIF)
57
Conforme Gonçalves et. al. (2008, p. 120), a vulnerabilidade estrutural externa “está dada por el desempeño
externo relativo de determinado país comparativamente con el desempeño relativo de otros países. Compara,
entre varios países, el diferencial relativo de indicadores de inserción económica internacional en uma
perspectiva de largo plazo”.
102
58
Nos Brics, tais emissões aumentaram principalmente nos mercados offshore, por meio das subsidiárias no
exterior das empresas nacionais. De acordo com (AKYÜZ, 2014), considerando apenas os residentes, as
emissões de títulos pelas corporações não-financeiras totalizaram US$ 480 bilhões entre 2010 e 2013; quando se
considera as empresas nacionais, as emissões saltam para US$ 940 bilhões no mesmo período, revelando,
portanto, a importância das emissões pelas subsidiárias.
104
Fonte: BIS
112 bilhões aproximadamente, em março de 2015. Tal comportamento pode refletir o impacto
do programa de swaps câmbio/juros (cross currency swaps) sobre a captação externa dos
bancos residentes (ver tabela 2.6 do anexo estatístico).
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
0
01/12/1995
01/01/1997
01/02/1998
01/03/1999
01/04/2000
01/05/2001
01/06/2002
01/07/2003
01/08/2004
01/09/2005
01/10/2006
01/11/2007
01/12/2008
01/01/2010
01/02/2011
01/03/2012
01/04/2013
01/05/2014
01/06/2015
Não Bancos Bancos Corp. Não financeiras
01/12/2015
01/12/1995
01/12/1996
01/12/1997
01/12/1999
01/12/2000
01/12/2001
01/12/2002
01/12/2003
01/12/2004
01/12/2005
01/12/2006
01/12/2007
01/12/2008
01/12/2009
01/12/2010
01/12/2011
01/12/2012
01/12/2013
01/12/2014
Corp. não financeiras Bancos Não Bancos
baixas taxas de juros, a melhora dos ratings soberanos ao longo dos anos 2000, o baixo nível
da relação dívida pública/PIB em comparação aos países desenvolvidos e a maior oferta de
hedge nos mercados de derivativos de câmbio – que se tornaram mais líquidos, conforme
visto na seção anterior - são os principais fatores de atração de uma parcela cada vez maior de
investidores não-residentes aos mercados de títulos públicos, especialmente investidores
institucionais59 (Polychronopoulos & Binstock, 2013; Kaltenbrunner & Painceira, 2014;
Banco Mundial, 2014 ).
Considerando a amostra analisada, a participação estrangeira nos mercados de
títulos públicos, por exemplo, é expressiva na Indonésia, Polônia, Peru, México e África do
Sul (Tabela 2.4; FMI, 2016; Klingebiel, 2014). No entanto, vale ressaltar que após o anúncio
do tapering em 2013, a presença de tais investidores diminuiu, especialmente nos mercados
peruanos, turcos, sul-africanos e húngaros (FMI, 2016).
A presença crescente dos investidores estrangeiros nos mercados de títulos
domésticos, especialmente no período de boom entre 2009 e 2011, está longe, porém, de
indicar qualquer avanço das moedas periféricas em relação à hierarquia de moedas por meio
da superação do original sin. A pró-ciclicidade dos fluxos de capitais e a predominância de
investidores institucionais torna o mercado de títulos, em especial o de títulos públicos,
estruturalmente vulneráveis a reversões nos ciclos de liquidez internacionais e à política
monetária norte-americana, já que as decisões do Fed podem impactar diretamente o
rendimento dos títulos públicos denominados nessas moedas. Portanto, a vulnerabilidade
gerada pelos mercados de títulos não está mais vinculada somente à dívida pública externa,
mas também ao financiamento da dívida interna (Akyüz, 2017, p. 146).
59
Conforme Kaltenbrunner & Paincera (2014, p. 8 apud Goldman Sachs, 2010), “(…) general DEC data show
that international institutional investors, such as pension, mutual and insurance funds have increased their asset
allocation to DECs equities from below 2% in 2000 to 6% in 2010.”
109
variação cambial) e funding (na moeda periférica) no mercado de FX swaps – caso típico nos
mercados financeiros sul-coreanos, que será visto no próximo capítulo. Os agentes também
podem captar recursos externos de curto prazo para operações de arbitragem - entre os
mercados à vista e de derivativos e/ou mercados onshore e offshore – como no caso dos
bancos brasileiros, que também serão estudados no próximo capítulo. Por fim, os próprios
derivativos de câmbio podem ser alvos de operações especulativas, como, por exemplo,
derivatives carry trade – que não envolvem, em muitos casos, influxos de capitais, porém
aumentam a sensibilidade dos mercados a choques externos60. Vale ressaltar que todos os
casos descritos acima envolvem um elevado grau de alavancagem, característico dos
mercados de derivativos financeiros.
Portanto, a piora dos indicadores de solvência e liquidez após a crise financeira
global de 2008 evidenciou a fragilidade da estratégia centrada somente na acumulação de
reservas para atingir o objetivo da estabilidade financeira e chamou a atenção para outras
dimensões da vulnerabilidade externa. O crescimento da dívida privada – tanto via emissão de
títulos quanto por meio de empréstimos bancários –, a maior participação dos investidores nos
mercados de títulos domésticos e a maior presença de bancos estrangeiros tornam o ciclo
doméstico – principalmente o ciclo de crédito – mais sensível ao ciclo de liquidez
internacional. Ademais, o aumento da liquidez nos mercados de derivativos de câmbio,
apontado na primeira seção, torna as moedas periféricas alvo das operações de derivatives
carry trade e, portanto, fontes de maior vulnerabilidade externa. Este cenário evidencia a
necessidade de diversificação de metas e instrumentos de política cambial para alcançar a
estabilidade financeira. O uso da regulação macroprudencial por alguns países emergentes
durante o mini-boom de fluxos de capitais entre 2009 e 2011 e o aumento da utilização de
derivativos de câmbio como instrumentos de política cambial apontam para essa
diversificação.
60
Conforme Kaltenbrunner & Paincera (2015, p. 10), “derivatives markets not only allow short-term, directional
position taking on the exchange itself, they also offer the possibility to hedge any exposure in other domestic
currency–denominated assets classes which further stimulates foreign investments in these assets”.
111
neste modelo é variável de ajuste (ver Arestis & Sawyer, 2003 e 2008). No entanto, a gestão
da política monetária de facto nos países emergentes, sob o regime de metas de inflação e
câmbio flutuante, intensificou a dependência entre política monetária e política cambial,
evidenciando a importância da relação entre as taxas de juros e câmbio. Tal fato reproduz,
portanto, os efeitos da dualidade impossível (ou dilema), discutida no primeiro capítulo: num
ambiente de livre mobilidade de capitais, se acentua a inter-relação entre as taxas de juros e de
câmbio e o impacto das decisões de portfólio dos investidores sobre tais preços-chave
(Flassbeck, 2001; Rey, 2013; Prates, 2015).
Essa relação se manifesta de diversas formas. Uma delas refere-se a conflitos de
objetivos macroeconômicos em momentos de boom dos fluxos de capitais e alta inflação,
definidos por Ryoo et. al. (2013) - do Banco Central da Coréia do Sul – como “duplo vínculo”
(double bind). Ou seja, num cenário de alta inflação e grande influxo de capitais, a elevação
da taxa de juros básica, a fim de conter o avanço inflacionário, intensificará a entrada de
capitais, fomentando ainda mais a apreciação cambial e gerando, inclusive, impactos sobre a
estabilidade financeira.
No entanto, este cenário pode ser desejável num contexto de elevado pass-through
(ou repasse cambial) da taxa de câmbio para os preços e de “fear of floating” das autoridades
monetárias (Calvo e Reinhart, 2002). Sob a ótica dos preços domésticos, o repasse pode
ocorrer por meio de dois canais: o primeiro, direto, por meio do impacto da taxa de câmbio
nos insumos importados para a produção ou nos bens finais importados61; o segundo, indireto,
mediante o impacto da variação do preço dos bens importados (insumos e finais) sobre a
demanda por bens produzidos internamente que competem com os produtos importados
(Aron et. al., 2012).
De maneira geral, o repasse cambial nos países emergentes se reduziu ao longo
dos anos 1990 e 2000. Taylor (2000) explica esse comportamento por meio da mudança do
regime monetário durante o período conhecido como grande moderação. A adoção de regimes
transparentes e críveis, tais como o regime de metas de inflação, teria contribuído para a
redução e menor persistência da inflação nos países emergentes. Esse ambiente teria reduzido
o poder de formação de preço das firmas, impactando, portanto, a capacidade dessas empresas
61
De acordo com Aron et. al. (2012), o repasse cambial para os preços dos produtos importados podem ser
completos ou incompletos. Os repasses são completos quando os preços são rígidos na moeda do país
exportador. Assim, “variations in the exchange rate leave the exporter’s prices in their own currency
unchanged, while destination market prices vary closely with the exchange rate” (Aron et. Al. 2012, p. 102). Já
em relação aos repasses cambiais incompletos - o caso mais comum - os preços denominados na moeda do país
exportador variam conforme a taxa de câmbio, diminuindo o repasse cambial para os preços importados.
112
repassarem custos, inclusive aqueles derivados da taxa de câmbio, para os seus preços. Num
contexto de preços rígidos, seguindo o modelo do novo-consenso, e grande concorrência
nacional e internacional, os preços só serão alterados se as alterações na taxa de câmbio forem
permanentes, ou seja, se tal taxa mudar de patamar ou trajetória.
A maioria dos modelos que identificam a tendência à queda no repasse cambial é
linear em relação à trajetória da taxa de câmbio. No entanto, pesquisas recentes investigaram
respostas assimétricas dos preços às flutuações da taxa de câmbio (Aron et. al., 2014,
Bussière, 2007; Marazzi & Sheets, 2007; Pollard & Coughlin, 2003; Caselli & Roitman,
2016). Há dois tipos de assimetrias exploradas na literatura. A primeira identifica um maior
repasse aos preços em períodos de depreciação em comparação a períodos de apreciação
cambial. Tal assimetria problematiza, portanto, a redução do repasse cambial nos anos 2000,
identificada nos modelos lineares, já que grande parte das moedas periféricas se apreciou em
relação ao dólar no período. A segunda considera que pequenas variações na taxa de câmbio
não são incorporadas nos preços (indicando rigidez nos preços) (Aron et. al., 2014).
Os resultados empíricos encontrados para os países emergentes são bastante
heterogêneos, em razão dos diversos modelos e métodos de estimação utilizados e, portanto,
de difícil comparação. De maneira geral, apesar da redução nos últimos anos, o repasse
cambial nesses países é maior em comparação aos países emissores de divisas. Em relação aos
modelos lineares, Brussière & Peltonen (2008) estimaram, para 27 países emergentes, a
elasticidade dos preços importados às variações na taxa de câmbio entre 1990 e 2006.
Considerando a amostra analisada, México, Brasil e Tailândia possuem as maiores
elasticidades (entre 60% e 70%), enquanto Coréia do Sul, República Tcheca, Polônia,
Hungria, Colômbia, Chile, Turquia, Filipinas, África do Sul, Peru possuem elasticidades
baixas e moderadas. Já Ca’Zorzi et al. (2007) analisam o repasse cambial para os preços
domésticos entre 1975 e 2004 em alguns países da amostra. México e República Tcheca
possuem os maiores repasses cambiais para os preços domésticos - entre 60% e 80% em
resposta a um choque de 1% na taxa de câmbio -; Hungria, Polônia e Chile possuem repasses
moderados (em torno de 40%), enquanto Turquia e Coréia possuem repasses cambiais
pequenos (em torno de 10%).
Nos últimos anos, seguindo os desdobramentos teóricos, os modelos empíricos se
voltaram para as assimetrias do repasse cambial entre os períodos de apreciação e
113
depreciação. Caselli & Roitman (2016) analisam dois casos de não-linearidades62 para 28
países emergentes. O primeiro caso avalia o efeito de grandes depreciações (10% e 20%)
sobre os preços em comparação a períodos de baixas depreciações (abaixo dos limites
indicados). Nos primeiros seis meses de choque (10 e 20%), o repasse cambial para os preços
foi de 40% e 44% respectivamente, contra 10% nos períodos considerados normais. No
segundo caso, os autores comparam os repasses cambiais em períodos de depreciação e
apreciação. Os resultados indicam que há assimetrias principalmente nos oito primeiros meses
após o choque (de depreciação ou apreciação). Enquanto os episódios de depreciação são
caracterizados por um repasse cambial de 38% após doze meses, os períodos de apreciação
registram um repasse cambial em torno de 10%. Ademais, os autores ressaltam os repasses
cambiais elevados da Turquia nos momentos de depreciação, destoantes (outliers) dos demais
países analisados.
Além do caso geral, há também análises empíricas em cada país. Em todos os
casos, os modelos confirmam a hipótese de maior repasse cambial nos períodos de
depreciação. No caso brasileiro, Pimentel et. al. (2016) estimam um repasse cambial, entre
1999 e 2012, de 11,38% (em relação à variação cambial) nos momentos de depreciação e
2,84% nos casos de apreciação cambial. Forero & Veja (2016) também encontram no Peru
assimetrias entre o repasse cambial no caso de 1% de apreciação (choque de 0,2% na
inflação) e 1% de depreciação cambial (choque de 0,3% sobre a inflação). Assimetrias
também foram relatadas na Turquia (KAL et. al., 2015), Filipinas (Delloro et. al., 2017),
México, Polônia, África do Sul, Coréia do Sul (Mihaljek & Klau, 2008). Ademais, Mihaljek e
Klau (2008) também estimaram assimetrias no repasse cambial no caso de variações cambiais
acima de 5%, encontrando resultados significativos para Tailândia, México, Hungria e
Turquia. Portanto, os casos específicos corroboram o resultado geral acima: as assimetrias do
repasse cambial (nos casos de apreciação e depreciação e também nos casos de variação
cambial acima de um limite definido) são relevantes em grande parte dos países da amostra,
independentemente da redução do repasse cambial ao longo dos anos 2000 (ver Mihaljek &
Klau, 2008).
Por fim, tais assimetrias evidenciam os efeitos negativos da posição das moedas
periféricas no SMI, vistos no primeiro capítulo. A elevada volatilidade e os momentos de
grande depreciação das moedas periféricas, comuns nos períodos de maior preferência pela
62
Caselli & Roitman (2016) distinguem não-linearidades e assimetrias do repasse cambial. De acordo com os
autores, não linearidade refere-se a depreciações acima ou abaixo de um determinado parâmetro ou países sob
regime metas de inflação versus países sem tal regime macro. Já as assimetrias referem-se às diferenças dos
efeitos dos episódios de apreciação e depreciação sobre os preços.
114
63
Conforme observa Santaella (2012, p.5), do Banco Central do México, “the problem of FX interventions for
inflation targeting is that the main commitment of the central bank is with price stability and not with FX
stability.”
64
Para conter os impactos da compra de divisas no mercado à vista, o Banco Central vende dólar, por exemplo,
no mercado à vista e compra a moeda americana no mercado futuro ou forward.
115
dos anos 2000 (principalmente nos países asiáticos), período de grande apreciação dessas
moedas. No entanto, é difícil estabelecer uma conexão entre o aumento da posição líquida no
mercado de derivativos e a contenção dos efeitos da apreciação cambial, já que tais
instrumentos podem ser utilizados para outros fins, seja para oferecer hedge para os agentes,
seja para influenciar a liquidez desses mercados.
A operação doméstica via títulos públicos federais – tanto por meio da venda
definitiva quanto por meio de operações compromissadas - é a principal opção de
esterilização dos bancos centrais dos países emergentes da amostra (quadro 2.2). Vários
países, porém, proíbem a emissão desses títulos pelos bancos centrais por duas razões
principais. A primeira refere-se à possibilidade desses títulos impactarem a liquidez do
mercado de títulos emitidos pelos tesouros nacionais (ECB, 2006). Já a segunda considera as
consequências negativas dessas operações para o balanço do Banco Central, em razão do
elevado diferencial de juros em grande parte dos países (Moreno, 2011; quadro 2.2). Diante
dessa proibição, a maioria dos bancos centrais, principalmente dos países da Europa Central e
do Leste e da América Latina, utiliza os títulos governamentais, comprados no mercado
secundário ou negociados junto aos tesouros nacionais. A esterilização via títulos
governamentais aumentou cinco vezes entre 1999 e 2010 (de US$ 1 trilhão em 1999 para US$
5 trilhões em 2010).
Há diversas implicações derivadas do uso desse tipo de instrumento para a
esterilização. A primeira refere-se à redução da posição credora líquida, ou mudança para uma
posição devedora líquida, do Banco Central em relação ao sistema financeiro, decorrente do
uso extensivo do estoque de títulos (do tesouro) para a esterilização das intervenções,
diminuindo a capacidade do Banco Central de conduzir a política monetária. De acordo com
ECB (2006), a esterilização por meio da venda de títulos pode tornar o banco central
dependente de operações que absorvem liquidez (liquidity-absorving transactions), o que
dificulta a gestão do mercado monetário, já que este é mais facilmente gerido por meio de
operações de provisão de liquidez (liquidity-providing operations).
Ademais, a maior presença de investidores não residentes nos mercados de títulos
públicos, analisada na seção anterior, pode tornar a esterilização via operações com títulos
públicos prejudicial para a estabilidade financeira, já que estas podem fomentar ainda mais a
entrada deste tipo de investidor65. A maturidade dos títulos de dívida pública utilizados nessas
operações pode intensificar esse processo, fomentando as operações de curto prazo. De
65
Conforme Moreno (2011), esse episódio ocorreu no Peru, obrigando as autoridades monetárias a adotar
restrições ao acesso de investidores estrangeiros aos mercados de títulos públicos domésticos.
116
acordo com as estatísticas do BIS sobre os mercados de dívida pública66, a maturidade dos
títulos públicos dos países da amostra aumentou entre 1995 e 2016 – de 2,9 anos, em média,
para 8,2 anos. No entanto, os mercados europeus (Hungria, Polônia, República Tcheca e
Turquia) e brasileiro ainda estão concentrados em títulos de menor prazo – maturidade de 4
anos nesse conjunto de países.
A maior oferta de títulos de curto prazo por meio de operações de esterilização
também pode afetar o balanço dos bancos domésticos. De acordo com Gadanecz et. al.
(2014), a esterilização via oferta de títulos de curto prazo pode inflar os balanços dos bancos
domésticos e, consequentemente, fomentar o crédito bancário ao setor privado - dependendo
da posição de capital de tais bancos e da efetividade do canal do crédito da política monetária.
Essa relação contradiz (ou relativiza) um dos objetivos da esterilização das intervenções, qual
seja, neutralizar o canal da política monetária. Todavia, tal argumento se baseia na visão
convencional (NCM), na qual os bancos dependem de reservas para conceder crédito. Numa
visão pós-keynesiana – crítica à posição supracitada – o aumento da participação dos títulos
nos ativos dos bancos pode inibir a concessão de crédito, já que, de acordo com essa
perspectiva, os bancos criam moeda conforme suas respectivas preferências pela liquidez e
estado das expectativas (Carvalho et. al., 2015).
A terceira forma de esterilização, bastante recorrente nos últimos anos, se dá pelo
ajuste dos requerimentos de reservas (compulsório) sobre os depósitos bancários. Esse
instrumento apresenta diversos aspectos positivos. O primeiro refere-se à facilidade de
implementação, pois, além de evitar boa parte dos problemas acima, não exige um mercado
de títulos líquido, sendo, portanto, acessível para a maioria dos países. Tal instrumento possui
também menos externalidades negativas sobre à política fiscal, em comparação ao uso da
política de juros, além de pode ser utilizado como medida anticíclica (Moreno, 2011). Por
exemplo, na crise financeira global de 2008, momento de reversão dos fluxos de capitais,
alguns bancos centrais que utilizam esse instrumento – como Brasil, Peru e Colômbia -
optaram pela redução dos requerimentos de reservas, com o intuito não apenas de esterilizar a
venda de divisas no mercado à vista e estimular (de maneira anticíclica) o crédito 67, mas
também de evitar a redução das taxas de juros e afetar os influxos de capitais (já que neste
período ocorre um aumento expressivo no repasse cambial) (Moreno, 2011). Do mesmo
modo, após o retorno dos fluxos de capitais aos mercados emergentes em 2009, alguns bancos
66
Ver maiores detalhes em http://www.bis.org/statistics/c2.pdf
67
Vale que ressaltar que o objetivo de estimular o crédito via redução dos compulsórios depende da efetividade
do canal do crédito da política monetária (Carvalho et. al., 2015).
117
moeda estrangeira do Banco Central. De acordo com os autores, esse custo é mensurado por
meio do produto entre custo marginal da intervenção e a posição líquida em moeda
estrangeira. O custo marginal de intervenção, por sua vez, é definido como o custo de
oportunidade em aumentar a posição líquida em moeda estrangeira do banco central,
determinado pelos desvios da paridade descoberta da taxa de juros. Esses custos (ou os
desvios em relação à paridade) podem ser calculados tanto ex-post, ou seja, considerando
variações cambiais em t-1, quanto ex-ante, que considera a variação cambial esperada. Dessa
forma, a mensuração dos custos ex-ante pode ser um importante instrumento na condução da
política cambial.
Partindo desse referencial teórico, Adler & Mano (2016) mensuram o custo
marginal e total ex-ante para um conjunto de países, inclusive os países da amostra, entre
2002 e 2013. Os resultados sugerem que Brasil e Turquia apresentam o maior custo marginal
ex-ante (ou os maiores desvios em relação à paridade descoberta da taxa de juros). No
entanto, quando se considera os custos totais (custo marginal vezes a posição líquida em
moeda estrangeira), Tailândia, Hungria, Filipinas e Coréia do Sul se destacam, indicando que,
embora Brasil e Turquia apresentem maiores custos marginais, a posição líquida em moeda
estrangeira dos bancos centrais desses países é menor em relação à posição líquida dos países
com menores custos marginais. Ademais, grande parte dos 73 países da amostra de Adler &
Mano (2016) apresentaram, no período mencionado, um custo total ex-ante abaixo de 1% do
PIB, assim como os custos de esterilização calculados por Moreno (2011) – quadro 2.2.
119
Banco Central
Títulos emitidos pelo
Hungria Não 4,0 4,9 1,8
Banco Central
Fonte: Prates (2007) e Mohanty & Scatigna (2005)
122
68
Assim como Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014), Bresser-Pereira (2012) propõe, como medida de
neutralização da doença holandesa, a taxação das exportações desses setores com baixo dinamismo (ou baixas
externalidades de aprendizado).
123
Entretanto, Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014) apontam possíveis problemas, que
derivam desta opção de política. O principal deles diz respeito ao trade off entre
desvalorização cambial e salários reais. Ou seja, conforme ressaltado na seção anterior, em
razão do repasse cambial assimétrico em grande parte dos países da amostra, desvalorizações
tendem a causar fortes pressões inflacionárias, impactando negativamente os salários reais no
curto prazo. Porém, Rapetti (2013) ressalta que os baixos salários reais impulsionam, no
médio e longo prazo, o aumento da acumulação de capital no setor mais dinâmico,
impactando emprego e renda e, portanto, a demanda agregada. A solução para esse dilema, na
visão de Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014), seria política e social, isto é, convencer a
população dos benefícios da desvalorização no médio e longo prazo69; para Frenkel & Rapetti
(2014) e Bresser-Pereira (2012) uma política fiscal responsável é fundamental para conter
possíveis pressões inflacionárias geradas pela desvalorização cambial70.
Contudo, as duas soluções para o dilema acima não consideram uma possível
incompatibilidade entre a política cambial de longo prazo proposta e o regime
macroeconômico adotado pelos países emergentes da amostra. Conforme ressaltado na seção
anterior, o regime de metas de inflação subordina a política cambial e entrelaça ainda mais as
políticas monetária e cambial. Assim, nas fases de alta do ciclo de liquidez internacional, o
câmbio segue sua tendência cíclica de apreciação – nos termos de Bresser-Pereira (2012) -,
auxiliando a política monetária no controle da pressão inflacionária, provocada,
principalmente, pelo crescimento doméstico. Neste cenário, portanto, a independência entre
política monetária e cambial passa necessariamente pela flexibilização do binômio regime de
metas de inflação/câmbio flutuante. Em outras palavras, assumir uma política cambial
anticíclica implica não só mudança no regime de câmbio, mas também uma revisão nos
pilares do regime de metas, já que o câmbio apreciado não será mais um recurso das
autoridades monetárias para reduzir o repasse cambial.
Alguns países emergentes “ensaiaram” essa opção durante o boom de fluxos de
capitais entre 2009 e 2011 por meio do uso de instrumentos de gestão dos fluxos de capitais
(ver, por exemplo, FMI, 2011). Porém, tais instrumentos buscaram mais conter o ímpeto pró-
cíclico dos fluxos de capitais, e seus efeitos sobre a volatilidade da taxa de câmbio, do que
reverter – pelo menos oficialmente - a trajetória de apreciação em direção a uma taxa de
69
Conforme Guzman, Ocampo & Stiglitz (2014, p. 10), “the implementation of competitive RER policies
requires social coordination that in many occasions is difficult to achieve—especially so when the sectors that
would lose purchasing power in the present believe that they will not share the potentially larger purchasing
power of the aggregate economy in the future”.
70
De acordo com Bresser-Pereira (2012, p. 16), “o déficit público enfraquece o Estado e causa inflação, devendo
ser evitado, a não ser em momentos de recessão”.
124
câmbio competitiva, principalmente naqueles países que possuem fear of depreciation (ver,
por exemplo, Barbosa-Filho, 2015 e Ros, 2015)71. No caso do Brasil, por exemplo, o uso de
instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e derivativos foi além da estabilidade financeira
(via taxa de câmbio), envolvendo também a reversão da trajetória de apreciação do real. No
entanto, após o anúncio do tappering pelo Fed em 2013, o aprofundamento da depreciação da
moeda brasileira levou o Banco Central a intervir via swaps cambiais, sugerindo não apenas
uma preocupação com a estabilidade financeira, mas também um receio em relação ao
impacto da desvalorização sobre o nível de preços (Prates, 2015).
Assim, o binômio regime de metas de inflação/câmbio flutuante fomenta em
alguns países uma constante tensão entre a busca pela competitividade externa e o controle
inflacionário como objetivo de política cambial. Essa tensão, por sua vez, dependerá, dentre
outros fatores, da gestão da política monetária – abordada na seção anterior – e da relação
entre taxa de câmbio e o padrão de comércio dos países emergentes que adotam esse regime
macroeconômico.
Ao longo dos anos 2000 e 2010 se observou importantes mudanças na estrutura
produtiva global, com destaque para o rearranjo das estratégias globais de organização da
atividade produtiva e do surgimento da China como grande fornecedora mundial de produtos
manufaturados (Hiratuka & Sarti, 2017). Neste cenário, entre 2003 e 2011 – período de
elevada queda da taxa de câmbio real (ou seja, apreciação real da moeda brasileira) –, a
participação dos insumos básicos e de menor complexidade econômica72 na pauta de
exportação dos países latino-americanos da amostra (Brasil, Chile, Colômbia e Peru)
aumentou de forma expressiva em detrimento dos outros setores, em especial, os bens
intermediários e de capitais (Gráfico 2.19 e 2.25). Os dados de comércio apenas refletem,
portanto, a especialização regressiva na estrutura produtiva desses países. Esse cenário tornou
a taxa de câmbio dos países latino-americanos ainda mais atrelada aos preços das
commodities, reforçando a posição dessas moedas como “commodity currencies”
(Kohlscheen et. al., 2016; Cashin et. al., 2004). Esse tipo de inserção, portanto, tem
implicações não apenas para a estrutura produtiva, mas também para o movimento da taxa de
câmbio. Assim, nos momentos de boom dos fluxos de capitais – entre 2003 e 2007 e 2009-
2011 – o aumento dos preços das commodities contribuiu para a apreciação intensa das
moedas periféricas (Kohlscheen et. al., 2016; De Roure, 2013; ver Gráfico 2.25 no apêndice).
71
Ver, por exemplo, Domanski et. al. (2016) e Mohanty & Berger (2013).
72
O índice de complexidade econômica mede a intensidade de conhecimento relativo de uma economia por
meio da mensuração da quantidade de conhecimento requerido na produção dos bens exportados (ver Hidalgo &
Hausmann, 2009).
125
Nesse sentido, variações abruptas nos preços das commodities podem gerar o mesmo efeito
nas “moedas commodities”, gerando consequências, portanto, para a estabilidade financeira.
O México manteve e aprofundou seu padrão de comércio – integrado à cadeia de
valor norte-americana na ponta intensiva em trabalho - com pequeno ganho de participação do
setor de insumos básicos, especialmente petróleo, como será visto no próximo capítulo (ver
gráfico 2.19; López, 2014). Conforme Cepal (2014, p. 12), o país
73
Nos casos de República Tcheca e Hungria destaca-se a plataforma de exportação de automóveis. Ver
https://wits.worldbank.org/CountryProfile/en/Country/HUN/Year/2015/Summary e
https://wits.worldbank.org/CountryProfile/en/Country/CZE/Year/2015/Summary
74
Os dados mais desagregados em relação ao gráfico 2.19 foram consultados diretamente na base do Banco
Mundial de comércio exterior (World Integrated Trade Solution). A base turca pode ser acessada a partir do link:
https://wits.worldbank.org/CountryProfile/en/Country/TUR/Year/2015/Summary.
126
40%
em % do Total
30%
20%
10%
0%
Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação
2003 2011 2015
30%
25%
20%
15%
10%
5%
0%
Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação
2003 2011 2015
40%
Em % do Total
30%
20%
10%
0%
Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação
2003 2011 2015
Bens de capital Bens de consumo Bens Intermediários Insumos básicos
128
40
30
20
10
0
Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação
2003 2011 2015
40
Em % do Total
30
20
10
0
Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação
2003 2011 2015
50
Em % do Total
40
30
20
10
0
Exportação Importação Exportação Importação Exportação Importação
2003 2011 2015
75
O quadro lista apenas a característica principal de cada condicionante em cada país.
131
podem impactar a posição líquida em moeda estrangeira dos agentes e/ou a posição dos
investidores não residentes nos mercados locais. Ao mesmo tempo, países com elevado
diferencial de juros (q-q*) podem atrair um maior volume de capitais de curto prazo sob a
estratégia de search for yield, afetando negativamente a vulnerabilidade externa.
A gestão da política monetária, por sua vez, impacta principalmente o diferencial
de rendimentos entre a moeda periférica e as divisas (q-q*). Assim, um elevado pass-through
(simétrico ou assimétrico) pressionaria o diferencial de juros, que, por sua vez, impactaria
também o custo financeiro da intervenção – dependendo da maneira pela qual a esterilização é
realizada. As ações da política monetária, via diferencial de juros, e da política cambial,
objetivando o controle inflacionário, impactariam também as expectativas em relação à
depreciação da moeda periférica, afetando negativamente (a). Conforme relatado acima, todos
os países possuem um repasse cambial assimétrico, tornando a relação entre política cambial e
(q-q*) mais estreita.
Já o padrão de comércio relaciona-se principalmente com a expectativa de
apreciação/depreciação da moeda periférica, ou seja, com a redução do atributo (a). Conforme
mencionado na seção anterior, a manutenção da expectativa de depreciação, via política
cambial, pode provocar efeitos distintos, dependendo do padrão de comércio de cada país,
sobre a competitividade externa e, consequentemente, sobre a vulnerabilidade externa. Ou
seja, em alguns países, a depreciação cambial não é acompanhada de melhora na
competitividade externa, podendo gerar inclusive – dependendo do padrão de comércio - uma
piora no saldo comercial, impactando negativamente a vulnerabilidade externa.
Por fim, a relação dos condicionantes domésticos com o condicionante estrutural
gera impactos sobre a autonomia de política cambial (quadro 2.4). Conforme a figura 2.1 (da
Introdução deste capítulo), tais efeitos não são isolados, dependendo, portanto, da inter-
relação entre os condicionantes domésticos e da sua interação com a política cambial – que
será visto no próximo capítulo. No entanto, para efeitos teóricos, vale ressaltar, brevemente, o
efeito isolado de cada condicionante doméstico. Assim, ceteris paribus, um elevado grau de
abertura financeira e menor regulação, por exemplo, intensificam os impactos das assimetrias
sobre a taxa de câmbio, reduzindo, portanto, a autonomia de política cambial. O aumento da
vulnerabilidade externa, por sua vez, também reduz o espaço de política cambial – por meio
do impacto sobre a volatilidade cambial e o “medo” de usar as reservas internacionais, por
exemplo -, assim como a presença do repasse cambial assimétrico, que aproxima ainda mais
as gestões da política monetária e cambial. Já em relação ao padrão de comércio, a
concentração das exportações em produtos de menor complexidade e das importações em
132
restrito)
- Elevação do passivo
externo pós-crise
- Mercado à vista
- Elevada participação de - Repasse cambial
(mais líquido)
invest. estrangeiros no assimétrico Bens de consumo
Indonésia Moderada - Regulação: mercado
mercado de títulos - Esterilização: Títulos (Baixa complexidade)
de derivativos (mais
públicos Banco Central
restrito)
- Repasse cambial
FX swaps (mais - Participação dos fluxos assimétrico Commodities
África do Sul Baixa
líquido) de portfólio - Esterilização: Títulos (Baixa complexidade)
Banco Central
Fonte: Elaboração própria
136
Considerações Finais
uma maior competitividade externa pode gerar impactos negativos sobre a vulnerabilidade
externa – dependendo do padrão de comércio e dos efeitos sobre os influxos de capitais de
curto prazo – e sobre a gestão da política monetária – considerando os efeitos do repasse
cambial assimétrico que atinge todos os países da amostra.
Já a terceira refere-se à identificação de algumas especificidades (condicionantes)
regionais em relação ao comportamento dos países da amostra. Países do sudeste asiático, por
exemplo, caracterizam-se por uma maior regulação no mercado de câmbio e por um padrão de
comércio concentrado na importação de insumos básicos e exportação de bens de capitais (de
maior complexidade). No caso dos países do leste europeu, há menor regulação no mercado
de câmbio, dominância dos mercados de FX swaps, maior vulnerabilidade externa
(considerando todas as dimensões supracitadas) e padrão de comércio integrado à cadeia de
valor alemã. Já os países latino-americanos são caracterizados pelas moedas commodities,
pelos mercados de derivativos de câmbio dominados pelos contratos forwards (especialmente
non-deliverables), com exceção do Brasil, e maior vulnerabilidade externa. A presença de tais
especificidades regionais exige, portanto, diferentes respostas da política cambial em relação à
escolha de objetivos, metas instrumentos e canais de transmissão.
Por fim, a quarta consideração refere-se ao caráter estrutural de alguns
condicionantes domésticos. Conforme observado nas seções acima, o repasse cambial
assimétrico – fator importante da gestão da política monetária - e a estrutura produtiva – que
conforma o padrão de comércio – se alteram somente no longo prazo. Ademais, tais
alterações não dependem somente da política cambial e estão sujeitos, portanto, a outras
políticas econômicas, como a política industrial. Já a vulnerabilidade externa pode ser alterada
no curto prazo no que se refere à liquidez externa – mediante variação da dívida externa de
curto prazo e/ou das reservas internacionais – e, assim, nesta dimensão, é impactada pela
política cambial, principalmente pelos instrumentos que modificam a institucionalidade do
mercado de câmbio e/ou a abertura financeira. Já na sua dimensão de médio e longo prazo,
que diz respeito à solvência externa, o dinamismo das exportações também é crucial e, assim,
a iniciativas de política cambial direcionadas para o padrão de comércio (voltadas para a
sustentação ou aumento da competitividade externa) se revelam fundamentais.
Ademais, é interessante observar que as principais moedas periféricas, em termos
de volume, nos mercados internacionais – peso mexicano, won sul-coreano, real brasileiro e
lira turca – possuem ao mesmo tempo características regionais e específicas. No caso
brasileiro, o padrão de comércio é concentrado na exportação de commodities (e/ou bens de
menor complexidade), assim como os demais países sul-americanos da amostra. No entanto,
140
Anexo estatístico
Tabela 2.6: Dívida Privada Externa - Empréstimos bancários (US$ milhões) – países selecionados
Países Setores 1995 2002 2007 2011 2013 2015
Bancos 30.400 28.012 54.628 94.279 86.700 90.617
Brasil Não Bancos 30.075 29.751 40.277 90.076 105.505 111.500
I. não financeiras 0 0 0 0 40.102 64.433
Bancos 4.984 4.233 12.673 22.725 20.344 18.882
Chile Não Bancos 8.730 13.941 15.909 24.279 21.371 19.386
I. não financeiras 0 0 0 0 10.867 12.873
Bancos 18.932 9.623 16.079 28.390 29.702 20.651
México Não Bancos 44.087 38.598 49.763 56.197 50.433 61.498
I. não financeiras 0 0 0 0 24.984 40.808
Bancos 2.448 2.488 4.338 7.794 11.272 10.655
Colômbia Não Bancos 7.898 5.457 7.339 7.559 10.849 13.886
I. não financeiras 0 0 0 0 5.976 8.423
Bancos 4.263 5.699 26.841 26.883 12.498 7.985
Hungria Não Bancos 2.247 4.236 17.460 16.914 17.074 11.266
I. não financeiras 0 0 0 0 7.296 7.674
Bancos 1.652 7.494 34.716 44.475 41.606 29.540
Polônia Não Bancos 3.125 7.993 26.042 29.958 28.124 20.227
I. não financeiras 0 0 0 0 16.077 13.489
Bancos 5.055 6.190 16.433 11.474 12.504 10.504
Rep. Tcheca Não Bancos 2.069 4.580 15.413 16.510 15.252 10.071
I. não financeiras 0 0 0 0 5.451 5.410
Bancos 6.730 6.891 33.874 57.862 83.792 85.299
Turquia Não Bancos 12.196 26.645 79.090 71.991 70.103 73.267
I. não financeiras 0 0 0 0 30.625 42.649
Bancos 8.126 8.745 17.851 13.227 13.082 18.239
África do Sul Não Bancos 6.158 5.797 12.214 11.737 17.082 17.160
I. não financeiras 0 0 0 0 5.899 10.780
Bancos 20.656 7.977 20.594 26.473 21.216 27.221
Indonésia Não Bancos 26.752 19.720 20.099 30.177 47.506 59.873
I. não financeiras 0 0 0 0 8.867 22.876
Bancos 4.856 6.609 9.624 11.035 12.665 10.526
Filipinas Não Bancos 2.197 6.367 8.072 9.396 10.878 12.477
I. não financeiras 0 0 0 0 1.931 6.973
Bancos 78.520 11.011 14.651 19.267 44.357 34.229
Tailândia Não Bancos 11.884 4.861 5.973 11.514 17.507 16.250
I. não financeiras 0 0 0 0 1.828 3.843
Bancos 59.965 45.603 135.823 111.414 98.545 105.800
Coréia do Sul Não Bancos 14.670 11.345 18.105 28.407 16.850 11.288
I. não financeiras 0 0 0 0 2.002 4.351
Bancos 1.893 1.096 5.477 10.330 13.036 12.050
Peru Não Bancos 3.056 3.159 4.598 10.329 11.053 22.129
I. não financeiras 0 0 0 0 4.949 17.863
Fonte: BIS (International Banking Statistics)
143
Capítulo 3
Introdução
76
O modelo Tobit é um modelo estatístico proposto por Tobin (1958) para descrever a relação entre uma
variável dependente (não negativa) y e uma variável independente (ou vetor) x.
146
77
Do ponto de vista dos condicionantes, a primeira fase se caracterizou pela ampliação do grau de abertura da
economia brasileira na gestão Armínio Fraga Neto, principalmente do mercado de derivativos por meio da
resolução 2689 (26 de janeiro de 2000), que eliminou as restrições à participação dos investidores estrangeiros
nos mercados domésticos de derivativos, visando aumentar a liquidez nesse segmento de mercado (Bacen,
2000).
78
Uma revisão do processo de abertura financeira no Brasil e dos seus impactos sobre os mercados de câmbio
pode ser vista em Prates (2015) e Prates & Farhi (2015).
149
Os recursos captados por tais linhas somente podem alterar a posição de câmbio
dos bancos quando são convertidos em reais no mercado primário de câmbio, gerando
impacto positivo no fluxo cambial e negativo na posição de câmbio. Essas vendas, por sua
vez, estão isentas de eventuais alíquotas de IOF, já que o fator gerador desse imposto é o
contrato de câmbio, ausente nessa operação (Rossi, 2014; Prates, 2015).
Por outro lado, essa restrição implica que todas as transações sejam liquidadas em
reais, inclusive as operações nos mercados de derivativos de câmbio (organizados e de
balcão), conferindo, portanto, o caráter non deliverable desses mercados. Dessa forma, tais
mercados estão fora do escopo do regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais
Internacionais e não há, portanto, nenhum limite para as posições de bancos e outros agentes
nesses mercados – desde que essas últimas estejam de acordo com as regras impostas pela
BM&FBovespa (Prates & Farhi, 2015; Prates, 2015; Rossi, 2014).
Tais fatores são decisivos na dinâmica de hedge-especulação-arbitragem79 no
mercado de câmbio e, portanto, na formação da taxa de câmbio brasileira. Conforme Ventura
& Garcia (2009), Prates (2015), Rossi (2014) e Farhi (2006), a assimetria de liquidez entre os
segmentos do mercado de câmbio faz do mercado futuro de dólar o lócus de formação da taxa
de câmbio (real/dólar). Dessa forma, a taxa de câmbio R$/US$ se forma primeiramente no
primeiro vencimento do mercado futuro e, por meio de operações de arbitragem realizadas
pelos bancos (únicos agentes que podem manter posições de câmbio no mercado à vista), é
transmitida para a cotação à vista.
79
A posição especulativa considera “as posições líquidas, compradas ou vendidas, num mercado de ativos
financeiros (à vista ou de derivativos) sem cobertura por uma posição oposta no mercado com outra
temporalidade no mesmo ativo (posição hedge), ou num ativo efetivamente correlato” (Farhi, 1999, p.104). As
operações de arbitragem, por sua vez, procuram lucrar com as diferenças (distorções) entre as taxas de câmbio
nos diferentes segmentos do mercado de câmbio ou entre as taxas de juros de diferentes moedas (Prates, 2015;
Rossi, 2014).
150
80
A taxa de câmbio futura é determinada pela sua cotação à vista capitalizada pelo diferencial entre os juros de
duas moedas no período de tempo considerado (ver Prates, 2015, p. 97, Box 1).
81
De acordo com o Bacen (2012) o contrato de swap cambial com ajuste periódico, negociado na BM&F, tem
como objeto de negociação o diferencial entre a taxa de juros efetiva e a variação cambial, definidas como: (a) a
taxa de juros efetiva de depósitos interfinanceiros (DI), definida pela acumulação das taxas médias diárias de DI
de um dia, apuradas pela Cetip para o período compreendido entre a data da operação e a data de vencimento; (b)
a variação cambial, medida pela taxa de câmbio de reais por dólar, negociada no segmento de taxas livremente
pactuadas (cotação de venda) para entrega pronta e observada entre o dia útil anterior à data de operação,
inclusive, e a data de vencimento, exclusive.
151
400000
200000
-200000
-400000
-600000
jan/05
jan/07
jan/09
jan/11
jan/13
jan/15
jan/17
set/03
mai/04
mai/06
mai/08
mai/10
mai/12
mai/14
set/15
mai/16
set/05
set/07
set/09
set/11
set/13
set/17
Fonte: Bacen
prazo de maturação dos títulos públicos domésticos (ver quadro 2.2, segundo capítulo)
proporciona um elevado ganho de curto prazo nas operações de especulação e arbitragem.
As diversas operações descritas acima revelam o caráter curto-prazista de grande
parte de grande parte dos influxos de capitais e das posições em derivativos, que afeta
negativamente a resiliência da economia brasileira a choques externos. Do ponto de vista dos
fluxos, a conta financeira assume um papel preponderante a partir de 2006 e 2007. Vale
observar a entrada crescente e estável de Investimento Direto Externo (IDE) – fomentado
pelos empréstimos intercompanhia - no período pós CFG e a intensa entrada de fluxos de
portfólio e de empréstimos entre 2006 e 2007, 2009-2011 e 2013-2015, período de vigência
dos swaps cambiais, que serão abordados nas subseções abaixo.
O crescimento e a estabilidade do IDE foram importantes para contrabalançar a
reversão do saldo de transações correntes após a CFG. A deterioração dessa rubrica se baseou
fundamentalmente na piora do déficit na conta de serviços e o declínio do saldo comercial.
Em relação à primeira, vale destacar o déficit na subconta de viagens internacionais – pouco
elástica em relação ao câmbio – e de aluguel de equipamentos – cujo crescimento está
vinculado à produção e exportação de plataformas da Petrobrás (Cintra, 2015; Biancarelli,
Rosa & Vergnhanini, 2016).
Já o saldo comercial tem sua dinâmica explicada principalmente pela
concentração das exportações em insumos básicos – gerando, portanto, uma maior
dependência do ciclo de preços das commodities – e pela variação do quantum importado –
em especial a importação de combustíveis, que depende do preço do petróleo nos mercados
internacionais. O desempenho do saldo comercial brasileiro ao longo do período estudado
evidencia, portanto, a intensificação da especialização regressiva – fenômeno comum dos
países sul-americanos da amostra, visto no segundo capítulo. Neste contexto, de acordo com
Biancarelli, Rosa & Vergnhanini (2016), o impacto das variações da taxa de câmbio sobre o
desempenho do comércio exterior (e, assim, do saldo da conta de transações correntes) teria
perdido um pouco de relevância, já que esse desempenho também estaria associado a
problemas estruturais da indústria brasileira, cuja superação não dependeria somente da
variação ou nível da relação real/dólar (gráfico 3.4).
154
10.000
5.000
-5.000
-10.000
-15.000
nov/00
nov/05
nov/10
nov/15
jul/12
mar/99
jan/00
jul/02
mai/03
mar/04
jan/05
jul/07
jan/15
jul/17
mai/08
mar/09
jan/10
mai/13
mar/14
set/01
set/06
set/11
set/16
Transações Correntes IDE Portfólio Empréstimos
Fonte: Bacen
assumiram elevadas posições vendidas em dólar a termo nos mercados de balcão (registrados
na Central de Custódia e Liquidação Financeira de Título - CETIP), muito além da proteção
cambial correspondente às suas respectivas operações. Essas posições especulativas tinham
como contraparte os bancos, que vendiam tais produtos para as empresas com elevados
payoffs82 (ver Borghi & Farhi, 2009).
Já a terceira dimensão consiste na escalada da dívida externa privada de curto
prazo, principalmente a parcela correspondente aos empréstimos externos contraídos pelos
bancos (equivalente à quase totalidade da dívida) e, em menor medida, pelas empresas não
financeiras após a CFG (gráfico 3.5). O comportamento do estoque de dívida externa privada
foi influenciado principalmente pelo boom dos fluxos de capitais entre 2009 e 2011 e pelo
impacto das intervenções via swaps cambiais, entre 2013 e 2015, sobre as operações dos
bancos. Nesse último caso, conforme mencionado acima, a manutenção do cupom cambial
elevado estimulou a captação de empréstimos em moeda estrangeira pelos bancos (Garcia &
Volpon, 2014).
Fonte: Bacen
82
Payoff refere-se à diferença entre o valor do ativo subjacente estabelecido no contrato e o valor observado na
data de liquidação (Farhi, 2006).
156
Tabela 3.1: Resultado líquido das operações de swaps cambiais e esterilização das
operações no mercado à vista
Reservas
Swaps Cambiais Total
Internacionais
2008 5 328 121 290 126 618
2009 2 281 -150 000 -147 719
2010 - -48 530 -48 530
2011 694 43 346 44 041
2012 1 124 21 185 22 309
2013 -2 382 34 068 31 685
2014 -10 681 24 630 13 950
2015 -102 628 259 973 157 345
2016 83 804 -324 123 -240 319
Fonte: Bacen
157
83
No inicio da vigência do novo regime de câmbio, entre janeiro e abril de 1999, o Bacen utilizou uma
quantidade expressiva de dólares das reservas internacionais – mais de US$ 12 bilhões, cerca de 30% do total –
na tentativa frustrada de evitar a flutuação do real (por meio de posições em derivativos assumidas antes de
15/01/99) (Prates, 2015).
158
84
O “efeito Lula” – termo utilizado para expressar o temor dos investidores com uma eventual vitória do
presidente Lula e seu impacto sobre a política econômica – contribuiu para deterioração das expectativas dos
agentes residentes e não residentes (ver Toledo, 2002).
85
Vale ressaltar que o FMI permitiu o lançamento desse instrumento, com a condição que este estivesse
vinculado às Letras Financeiras do Tesouro (LFT), títulos públicos pré-fixados de curto prazo. Tal
condicionalidade acabou se revelando um erro e provocando reações em cadeia no mercado secundário. Os
agentes buscavam a proteção contra a variação cambial e não estavam interessados em manter títulos pré-fixados
em carteira, num contexto de instabilidade financeira. Dessa forma, as vendas de LFTs no mercado secundário
levaram a fortes quedas de seus preços e, portanto, uma elevação na taxa de juros, contaminando a estrutura de
preços dos títulos públicos. Tal fato levou o BCB, no final de maio de 2002, a antecipar a marcação a mercado
das carteiras das instituições financeiras e dos fundos mútuos, diante do risco de resgate em massa de
investidores institucionais e corporativos mais bem informados. Essa medida, por sua vez, provocou uma
desvalorização patrimonial abrupta dos fundos de DI e renda fixa, com uma volatilidade significativa nos
retornos diários e uma crise de confiança, que levou ao resgate de R$ 54,5 milhões nos três meses após a
mudança de regra. Grande parte desses repasses foram direcionados para a compra de dólar, intensificando a
desvalorização do real (Prates, 2015).
86
Esse período foi marcado também pelo dos títulos cambiais pelo Tesouro Nacional – tanto os emitidos no
mercado nacional quanto no mercado internacional -, que persistiu no período posterior. Ademais, o Tesouro
passou a intervir no mercado de câmbio à vista com o intuito de pré-financiar compromissos externos,
adquirindo US$ 7,3 bilhões em 2004, segundo estimativa (Prates, 2015).
159
4 000
2 000
- 2 000
- 4 000
- 6 000
set/08 set/09 set/10 set/11 set/12 set/13 set/14 set/15 set/16 set/17
Fonte: Bacen
O retorno dos fluxos de capitais aos países emergentes, que se iniciou a partir do
segundo trimestre de 2009, e a recuperação dos preços das commodities a partir de janeiro do
mesmo ano representaram um ponto de inflexão da política cambial sob o ponto de vista dos
condicionantes. Os efeitos do “tsunami monetário”, provocado pelo quantitative easing, sobre
a taxa de câmbio nominal – mesmo com a atuação do Bacen no mercado à vista por meio do
acúmulo de reservas – geraram preocupações da autoridade monetária em relação aos efeitos
desse boom sobre a estabilidade financeira e sobre a trajetória de apreciação do real 87. Em
resposta a esses temores, a autoridade monetária decidiu pelo uso progressivo de instrumentos
que alteraram diretamente à institucionalidade do mercado de câmbio.
Num primeiro momento, em outubro de 2009, o Bacen decidiu pela aplicação de
uma alíquota de 2% do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre influxos de
portfólio (ações e renda fixa). Essa alíquota subiu progressivamente, atingindo 6% outubro de
2010. No entanto, nesse mesmo mês, o governo foi além do aumento do IOF sobre influxos
de portfólio e instituiu a primeira técnica de gestão de derivativos cambiais da história: a
elevação do IOF, de 0,38% para 6%, sobre as margens de garantia dos contratos futuros de
câmbio, bem como o fechamento de algumas brechas que se intensificaram após o aumento
do imposto, como o depósito de margem via de títulos ou de fiança bancária (Fritz & Prates,
2014).
87
Ver Valor Econômico (2011a e 2011b).
161
88
Nesta tese, “técnicas de gestão dos fluxos de capitais e derivativos cambiais” e “instrumentos de gestão dos
fluxos de capitais e regulação de derivativos de câmbio” serão utilizados como sinônimos.
89
De acordo com Rossi (2014), os impostos sobre os derivativos são transmitidos ao mercado offshore pela
própria dinâmica do mercado. Nesse mercado, os bancos assumem a ponta contrária da aposta realizada pelo
investidor. Para fazer hedge dessa operação, os bancos recorrem ao mercado onshore, impactando, portanto, as
posições em tal mercado. Assim, ao se deparar com um imposto para tal operação no onshore, é natural que o
banco repasse o custo para o seu cliente no mercado offshore, impactando-o.
162
Fonte: Bacen
10.000
5.000
-5.000
-10.000
-15.000
Oct-2012
mar/11
jun/11
Oct-2011
mar/12
jun/12
Feb-2011
Sep-2011
nov/11
Feb-2012
Sep-2012
nov/12
jan/11
Apr-2011
May-2011
jul/11
jan/12
Apr-2012
jan/13
Dec-2011
May-2012
jul/12
Dec-2012
Aug-2011
Aug-2012
Fonte: Bacen
90
De acordo com Fundap (2013, p. 9), a apreciação do real em janeiro e fevereiro de 2012 foi determinada, em
grande medida, pela injeção de 1 trilhão de euros pelo Banco Central Europeu a juros de 1% ao ano. Grande
parte dessa quantia foi direcionada para a compra de títulos e ações nos mercados emergentes, inclusive o Brasil.
164
4,00
3,50
3,00
2,50
2,00
1,50
Fonte: Bacen
100.000
80.000
60.000
40.000
20.000
Fonte: Bacen
166
Vulnerabilidade
Extena
Fonte: Elaboração Própria
168
entre 2013 e 2015, quando o crescente estoque de swaps cambais conviveu com um crescente
estoque de dívida externa de curto prazo contraída pelos bancos. Conforme ressaltado acima,
o nível relativamente elevado do cupom cambial (em relação ao custo de captação externo)
estimulou a contração de empréstimos de curto prazo pelos bancos para as operações de
arbitragem. Tais operações, por sua vez, foram importantes para compensar o saldo negativo
do movimento de câmbio contratado no período e, assim, evitar a intensificação da
depreciação do real (Rossi, 2015; Garcia, 2014; gráfico 3.11). No entanto, as bases para a
contenção da volatilidade e aumento da taxa de câmbio são frágeis e contraditórias, já que
pioram, ao mesmo tempo, o perfil do passivo externo, com a maior presença de empréstimos
de curto prazo. Vale ressaltar que a gestão da política monetária nesse arcabouço se vincula
ainda mais com a política cambial, já que a necessidade de manutenção do cupom cambial
elevado e das condições de carry trade podem pressionar a taxa básica de juros para cima.
Por fim, as intervenções via swaps foram efetivas na oferta de hedge aos
participantes do mercado de derivativos de câmbio, principalmente empresas não-financeiras
e bancos estrangeiros, e na estabilidade do nível da taxa de câmbio. No entanto, os efeitos
sobre a volatilidade entre 2013 e 2015 – período de vigência do programa de swaps cambiais -
não são conclusivos (Araujo, 2016; Janot & Macedo, 2016).
ago/12
dez/15
nov/13
fev/10
fev/15
abr/09
mar/12
jun/13
mar/17
jul/10
jan/13
abr/14
jul/15
mai/11
mai/16
set/09
out/11
set/14
out/16
Fonte: Bacen
170
Fonte: Bacen
91
Em uma entrevista ao jornal britânico Financial Times em 28 de setembro de 2010, Guido Mantega, então
Ministro da Fazenda do Brasil, declarou que o mundo vive atualmente sob uma “guerra das moedas” (“currency
war”) ou guerra cambial.
172
8000
6000
4000
2000
-2000
-4000
Fonte: Bacen
173
Fonte: Bacen
0
1
2
3
4
5
6
7
8
0,01
0,02
0,03
0,04
0,05
0,06
06/01/2009
0
09/10/2009 04/05/2009
12/22/2009 04/07/2009
175
177
92
De acordo com FMI (2015, p. 2071-2072), “Commercial banks may hold foreign exchange demand deposits
payable in Mexico, provided the account holders are (1) individuals located in the 20-kilometer strip parallel to
the northern international boundary line of Mexico or in the states of Baja California or Baja California Sur; (2)
legal entities residing in Mexico; or (3) official representatives of foreign governments, international
organizations, and analogous institutions. Foreign employees of such offices, organizations, or acting as foreign
correspondents must be accredited by Mexico through the appropriate authority. Commercial banks may hold
foreign exchange time deposits of firms established in Mexico and payable abroad.”
178
câmbio nas operações de compra e venda de moeda estrangeira e a ausência de dealers nos
mercados à vista e interbancário. Tais características permitem o transito livre das instituições
financeiras, em especial bancos múltiplos e de desenvolvimento, nos diversos segmentos do
mercado de câmbio. (ver entrevista no apêndice C; FMI, 2015). Concomitantemente à
institucionalidade, a estrutura de comércio exterior mexicana (ver segundo capítulo, item 2.4)
- concentrada na exportação de manufaturados para os Estados Unidos - estimula ainda mais
as operações do par peso/dólar93. A combinação desses diferentes condicionantes, por sua vez,
torna o peso uma das moedas periféricas de maior liquidez no mercado (offshore) de câmbio,
sendo utilizada, inclusive, como proxy nos mercados emergentes.
No entanto, as características dos condicionantes descritos acima impactam
negativamente outro condicionante considerado nesta tese: a vulnerabilidade externa. Sob o
ponto de vista dos fluxos, após a crise que atingiu o sistema financeiro mexicano em 1994, os
IDE’s assumiram o protagonismo na conta financeira em razão, principalmente, da entrada
das empresas americanas. Conforme Martínez et. al. (2015), entre 1999 e 2009, os
investimentos das empresas norte-americanas representaram 54% do IDE (líquido) total. A
integração comercial mexicana com o mercado norte-americano, por sua vez, tornou o país
latino-americano dependente das flutuações da economia dos Estados Unidos, e, portanto,
estruturalmente vulnerável a possíveis choques no país vizinho. A partir de 2009, os
investimentos em carteira assumiram o protagonismo dos influxos de capitais (gráfico 3.17),
principalmente no mercado de títulos de dívida pública (gráfico 3.18), que registrou grande
entrada de investidores não-residentes, principalmente entre 2009 e 2012.
93
Conforme o (então) presidente do BM, Agustín Carstens, "for at least two decades now we have had this
commitment to be a very open economy in Latin America – trade is a very important part of our activity and the
integration with the US makes it inevitable to have a well-designed and well-established FX market. We have a
very good settlement process, the peso is [traded] 24 hours a day (…) so we have pretty much ensured that
people who want to take or reduce peso positions can do it in a very agile way." (Euromoney, 2013)
179
15.000
10.000
5.000
-5.000
-10.000
Oct-Dic 1994
Oct-Dic 1995
Oct-Dic 1996
Oct-Dic 1997
Oct-Dic 1998
Oct-Dic 1999
Oct-Dic 2000
Oct-Dic 2001
Oct-Dic 2002
Oct-Dic 2003
Oct-Dic 2003
Oct-Dic 2004
Oct-Dic 2005
Oct-Dic 2006
Oct-Dic 2007
Oct-Dic 2008
Oct-Dic 2009
Oct-Dic 2010
Oct-Dic 2011
Oct-Dic 2012
Oct-Dic 2013
Oct-Dic 2014
Oct-Dic 2014
Oct-Dic 2015
Oct-Dic 2016
IDE Portfólio Outros Investimentos
Fonte: BM
10.000
Emissão de títulos
8.000 governamentais no
exterior
6.000
Títulos públicos
4.000
2.000
0 Emissão de títulos
privados no exterior
-2.000
Ene-Mar 2015
Ene-Mar 1994
Ene-Mar 1995
Ene-Mar 1996
Ene-Mar 1997
Ene-Mar 1999
Ene-Mar 2000
Ene-Mar 2001
Ene-Mar 2002
Ene-Mar 2005
Ene-Mar 2006
Ene-Mar 2007
Ene-Mar 2009
Ene-Mar 2010
Ene-Mar 2011
Ene-Mar 2012
Ene-Mar 2014
Ene-Mar 2016
Fonte: BM
vencimentos dos títulos públicos indexados ao peso (Borio et. al, 2005; quadro 2.2, segundo
capítulo). Os investidores estrangeiros, que haviam abandonado os mercados de títulos
públicos na segunda metade da década de 1990, retornaram principalmente a partir dos anos
2000 e após a CFG voltaram a dominar tais mercados, cujos títulos agora estão denominados
em moeda doméstica, minorando, portanto, os efeitos de choques externos. De acordo com o
gráfico 3.19, o mercado de Bonos (títulos de maior prazo de vencimento) é o principal destino
dos investidores não residentes, que quintuplicaram o volume investido em tais títulos entre
2009 e 2017. No entanto, esse cenário pode agravar a vulnerabilidade dos mercados
financeiros mexicanos a choques externos. Conforme o FMI (2017, p.12):
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Fonte: BM
Fonte: BM
No que tange à gestão da política monetária, Baharumshah et. al. (2017) e Chávez
(2017) concluem, mediante análise empírica, pela assimetria do repasse cambial no caso
mexicano – fato estruturalmente apontado para os países emergentes da amostra no segundo
capítulo. Conjuntamente a essas evidências, Rodríguez & Hernández (2011) apontam que as
intervenções do BM no mercado à vista são cruciais para o alcance da estabilidade de preços,
182
94
O BM também absorve liquidez por meio de instrumentos convencionais de política monetária, utilizados em
outros países emergentes: depósitos compulsórios de bancos comerciais e de desenvolvimento; e vendas
definitivas de títulos emitidos pelo BM (Prates & Blikstad, 2017).
95
Seguindo Domanski et. al. (2016), a estimativa do custo de esterilização para México, Turquia e Coréia do Sul
se deu a partir do produto entre diferencial de juros e variação das reservas, excluindo a variação cambial. Para
efeitos de simplificação, considerou-se que as reservas eram compostas somente por ativos denominados em
dólar.
183
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Abr-Jun 1900
Diferencial de juros Custo de esterilização
Fonte: BM
96
Entre 1995 e 2003, o BM adotou uma meta operacional quantitativa para a política monetária, baseada nos
saldos acumulados dos bancos em suas respectivas contas de reservas no banco central. O regime de metas de
inflação entrou em vigor oficialmente em 2001 e a instituição da taxa de juros de curto prazo como meta
operacional ocorreu apenas entre 2004 e 2005 (ver Carrasco & Ferreiro, 2013 e Prates & Blikstad, 2017).
184
vista – uma medida pró-cíclica. De acordo com BM (2003, p.1), “dado o nível que se
alcançou as reservas internacionais e seu ritmo de acumulação (...), é possível concluir que os
benefícios líquidos dos custos (de acumulação) mencionados seriam cada vez menos
significativos”. Assim, o BM se dispôs a vender trimestralmente 50% do total de ativos, em
dólares, acumulados no trimestre imediatamente anterior.
Tal programa se encerrou em agosto de 2008, porém o leilão de dólares logo foi
retomado em outubro de 2008, com a eclosão da CFG, de maneira discricionária e não
discricionária – por meio dos programas de leilões extraordinários e leilão de dólares com e
sem preço mínimo. Vale ressaltar que os leilões com preço mínimo, instrumento utilizado
após a CFG, foram desenhados para outorgar liquidez nos momentos de depreciação (diária)
do peso mexicano acima de 2%. Havia, portanto, um temor (não explicitado) das autoridades
monetárias mexicanas em relação às depreciações excessivas de sua moeda após a crise, fato
também identificado por outros estudos de caso – por exemplo (Chmelarova; Schnabl, 2006)
– e que pode ser caracterizado como “fear of depreciation”.
Entre abril de 2009 e novembro de 2011, período de boom nos fluxos de capitais,
o BM fez uso de outros instrumentos de política cambial, além dos leilões de dólares
mencionados acima, buscando estabilidade financeira. O primeiro refere-se a créditos em
dólar para as instituições financeiras, ancorados na linha de swaps estabelecida entre BM e
Fed, que se deu entre abril de 2009 e fevereiro de 2010. O segundo instrumento, utilizado
entre fevereiro de 2010 e novembro de 2011, foi a venda de opções de venda de dólares para
os agentes, com o intuito de acumular reservas internacionais (Quadro 3.2)
Após 2011, o Banco Central continuou atuando apenas por meio dos leilões (pré-
anunciados) de dólares, especialmente nos momentos de maior volatilidade da taxa de câmbio
em 2014 e 2015 (gráfico 3.20). Recentemente - a partir de fevereiro de 2017 - o BM passou a
adotar um novo instrumento de política cambial: leilões de NDFs – num montante máximo de
US$ 20 bilhões – liquidados em pesos mexicanos. A meta da autoridade monetária é oferecer
hedge para os participantes do mercado de câmbio sem afetar o volume de reservas
internacionais (BM, 2017). Tal mudança reforça a tendência, apontada por Domanski et. al.
(2016) e discutida no primeiro capítulo, de utilização de instrumentos liquidados em moedas
domésticas por bancos centrais de países emergentes após a CFG, fator positivo para a
autonomia da política cambial – sem considerar o impacto sobre os demais condicionantes
(Quadro 3.2).
Percebe-se, portanto, que as intervenções do BM no mercado de câmbio são
concentradas nas vendas de dólares nos mercados à vista, mesmo em momentos de bonança
185
dos fluxos de capitais – diferentemente, portanto, de grande parte dos países emergentes, que
compraram divisas nesses períodos. Conforme apontado na subseção anterior, a acumulação
de reservas se deu diretamente por meio da PEMEX (Gráfico 3.22)97 e, portanto, fora do
mercado de câmbio. Assim, o preço do petróleo (e o quantum exportado) possui influência
significativa não só na estabilidade financeira, mas também na tendência de apreciação do
peso (Rodriguez & Hernandez, 2012).
Ademais, nos períodos de boom, 2003-2007 e 2009-2011, a venda de divisas
aprofundou essa tendência, sugerindo uma menor preocupação do BM com o nível da taxa de
câmbio nos momentos de apreciação. Contrariamente, nos períodos de reversão ou
instabilidade no ciclo de liquidez, o BM atuou não apenas com o intuito de prover liquidez da
divisa, mas também de limitar a depreciação do peso mexicano, revelando, portanto, uma
assimetria em relação à trajetória da taxa de câmbio. Essa assimetria se revelou também na
atuação do BM: as intervenções (líquidas) no mercado à vista no período de compra de
divisas (1996-2001) totalizaram US$ 10 bilhões, enquanto no período dominado pelas vendas
de divisas (2008-2017) as operações chegaram à US$ 55 bilhões aproximadamente.
set-04
set-06
set-08
set-10
set-12
set-14
set-16
jan-02
mai-03
jan-04
mai-05
jan-06
mai-07
jan-08
mai-09
jan-10
mai-11
jan-12
mai-13
jan-14
mai-15
jan-16
mai-17
Fonte: BM
97
De acordo com o comunicado de imprensa do dia 22/02/2010, “la fuente más importante de acumulación de
reservas proviene de las compras de dólares que el Banco de México hace directamente a Petróleos
Mexicanos…” (BM 2010).
186
Fonte: BM
187
Estabilidade Vulnerabilidade
financeira externa
Venda de dólares no Redução do custo
2003-2008 Parcialmente Parcialmente
mercado à vista de intervenção
Controle Gestão da política
inflacionário monetária
Vulnerabilidade
Resistir a
Prevenção de movimentos externa
Venda de dólares no abruptos do
Outubro 2008 crises e desordens Parcialmente Parcialmente
mercado à vista patamar da taxa
no mercado de câmbio. Gestão da política
monetária
- Out/2008 – Abr/
2010; Vulnerabilidade
Reduzir
Venda de dólares no - Mar-Set/2009; volatilidade Externa
Estabilidade cambial
mercado à vista com e - Abr/2009- Parcialmente Parcialmente
Financeira
sem preço mínimo Fev/2010; Influência sobre o Gestão da Política
nível e trajetória
- Nov/2011- Monetária
da taxa de câmbio
Abr/2013;
- Mar-Nov/2015;
188
-Dez/2014 –
fev/2016
A partir dessa constatação, pode-se inferir que, ao não interferir diretamente nas
condições pelas quais a moeda-chave (moeda no plano internacional) é transacionada pela
moeda periférica, a política cambial mexicana não questionou o espaço de política cambial
conferido pela posição de sua moeda no Sistema Monetária Internacional. Essa aceitação
decorre principalmente de fatores relacionados à economia política da política cambial, ou
seja, do referencial analítico e teórico dos policy makers em relação à regulação do mercado
de câmbio. Novamente para Carstens,
Onde ret é o retorno sobre a taxa de câmbio (taxa oficial FIX, calculada no
mercado interbancário), I refere-se aos leilões de venda de dólares com e sem preço mínimo e
às vendas discricionárias, DIF é o diferencial entre a taxa básica de juros e o fed fund rate,
VIX (Volatility Index) é um índice mensurado pelo Chicago Board Options Exchange
(CBOE) e utilizado aqui como uma proxy da preferência pela liquidez da divisa; PET é o
preço do petróleo em dólares (tipo West Texas Intermediate), utilizado por Rodriguez e
Hernandez (2011) e que possui influência na taxa de câmbio, já que o BM compra os saldos
em dólares da PEMEX; e 𝜀𝑡 é o termo de distúrbio.
A fim de verificar os impactos pré e pós-crise do instrumento de intervenção, esta
tese estimou a equação acima para dois períodos distintos: entre maio de 2003 e julho de
2008, período do programa de vendas de dólares no mercado à vista; entre agosto de 2008 e
fevereiro de 2016, que compreende vendas discricionárias e programas de vendas de
dólares98,99. De maneira geral, vale ressaltar que nos dois modelos estimados, o componente
assimétrico da volatilidade condicional (𝛾) é estatisticamente significante, ou seja, a
volatilidade cambial se acentua em momentos de depreciação do peso mexicano. Tal relação é
evidenciada, por exemplo, na trajetória de depreciação do peso mexicano após 2015, já que
esta é acompanhada por uma elevação da volatilidade cambial (gráfico 3.25).
De acordo com a Tabela 3.2, entre maio 2003 e julho de 2008, as intervenções do
BM foram efetivas e impactaram negativamente a volatilidade da taxa de câmbio. Vale
98
As séries utilizadas nos modelos foram submetidas a testes de raiz unitária (Augmented Dickey Fuller), que
confirmaram suas respectivas estacionariedades.
99
Todos os modelos foram estimados por meio do software Eviews.
194
100
Em janeiro de 2006, o BRCT adotou explicitamente (de facto) o regime de metas de inflação, com bandas de
2% para baixo ou para cima da meta estipulada. Qualquer resultado acima dessa banda obriga o BRCT a se
justificar publicamente (Nettekoven, 2016).
101
Considera-se nesta tese a visão pós-keynesiana da soberania monetária proposta por Prates (2017) que possui
três pilares básicos: o Estado possui a soberania política para definir a moeda nacional enquanto unidade de
conta e meio de pagamento; a moeda pode ser criada endogenamente; e o banco central e o tesouro são
instituições diferentes, mas estreitamente vinculadas. De acordo com Dequech (2013), nesta escola de
pensamento, a moeda pode ser vista, conjuntamente, como criatura do Estado e como uma convenção.
196
44%
39%
34%
29%
24%
Fonte: BRCT
102
As alíquotas dos requerimentos de reservas em moeda estrangeira incidem sobre os depósitos bancários e
fundos de participação estrangeiros e outros passivos em moeda estrangeira. As alíquotas variam conforme a
maturidade de cada passivo. Para maiores detalhes ver:
197
ações não impelem a entrada ou saída de alguma modalidade de fluxo de capital ou sinalizam
alguma trajetória para taxa de câmbio. Ademais, no período pré-crise, o BRCT tentou
diminuir essa postura acomodatícia, tanto por meio da retirada do seu papel de intermediador
do mercado de depósito em moeda estrangeira, entre 2002 e 2008, quanto mediante a extinção
da remuneração dos depósitos compulsórios em moeda estrangeira (BRCT, 2008 e 2010).103
20000
US$ milhões
15000
10000
5000
0
18-07-2007
09-07-2015
13-04-2004
01-10-2004
18-04-2005
22-09-2005
06-03-2006
14-08-2006
12-02-2007
28-12-2007
03-07-2008
05-01-2009
24-06-2009
11-12-2009
28-05-2010
02-12-2010
06-05-2011
19-10-2011
30-03-2012
13-09-2012
01-03-2013
15-08-2013
10-03-2014
20-08-2014
30-01-2015
17-12-2015
21-06-2016
Forward à vista swaps
Fonte: BCRT
http://www.tcmb.gov.tr/wps/wcm/connect/TCMB+EN/TCMB+EN/Main+Menu/MONETARY+POLICY/Reser
ve+Requirement+Ratios
103
O BRCT costuma atuar, desde 1988, como intermediário ou ativamente (por meio de transações) nos
mercados interbancários de câmbio e de depósitos em moeda estrangeira (uma espécie de mercado de reservas
bancárias em dólar). Após a adoção do regime de câmbio flutuante, a autoridade monetária se retirou
gradativamente, entre 2002 e 2008, desses mercados, porém logo retornou após a eclosão da CFG e o aumento
da instabilidade nos mercados interbancários.
198
correntes, que variam, principalmente, conforme o preço das commodities (ver gráfico 3.28;
Kayalar et. al. 2016).
25.000,00 250,00
20.000,00 200,00
15.000,00 150,00
10.000,00 100,00
5.000,00 50,00
0,00 0,00
2003/02
2009/02
2001/02
2001/10
2002/06
2003/10
2004/06
2005/02
2005/10
2006/06
2007/02
2007/10
2008/06
2009/10
2010/06
2011/02
2011/10
2012/06
2013/02
2013/10
2014/06
2015/02
2015/10
2016/06
2017/02
Exportação Importação Global Price Index Commodities
Fonte: BCRT
A conta financeira, por sua vez, é dominada, desde 2009, por fluxos de portfólio,
especialmente títulos de renda fixa e outros investimentos, em detrimento dos fluxos de IDE
(gráfico 3.29). Tais fluxos de portfólio tiveram um comportamento volátil ao longo do
período, especialmente após a CFG, comprometendo, em alguns momentos, o financiamento
da conta corrente deficitária. Os títulos de renda fixa são emitidos no mercado local, em
grande parte pelo governo turco e por bancos, que concentram suas emissões no curto prazo
(gráfico 3.29).
Em relação aos estoques, houve melhora nos indicadores de solvência e liquidez
no período pré-crise (2003-2007) e no período de boom pós-crise (2009-2011) – ver tabela 2.1
no segundo capítulo – graças ao aumento expressivo do volume de reservas e das exportações.
No entanto, após 2011, há uma piora desses indicadores – principalmente os indicadores de
liquidez - e deterioração da posição internacional de investimento, em razão, principalmente,
da escalada do passivo externo bruto - em especial títulos de dívida pública e privada e
empréstimos externos contraídos pelos bancos - e redução do nível de reservas internacionais
(Tabela 2.2). A dívida externa, em especial, aumentou tanto nos setores privados
(especialmente no curto prazo, chegando a quase 100% do volume de reservas em 2014)
200
2011-Q3
2002-Q1
2002-Q3
2003-Q1
2003-Q3
2004-Q1
2004-Q3
2005-Q1
2005-Q3
2006-Q1
2006-Q3
2007-Q3
2008-Q1
2008-Q3
2009-Q1
2009-Q3
2010-Q1
2010-Q3
2011-Q1
2012-Q1
2012-Q3
2013-Q1
2013-Q3
2014-Q1
2014-Q3
2015-Q1
2015-Q3
2016-Q1
2016-Q3
2017-Q1
Dívida Privada CP Dívida Pública LP Dívida Privada LP
Fonte: BCRT
2016-Q4
2005-Q4
2006-Q2
2006-Q4
2007-Q2
2007-Q4
2008-Q4
2009-Q2
2009-Q4
2010-Q2
2010-Q4
2011-Q2
2011-Q4
2012-Q2
2012-Q4
2013-Q2
2013-Q4
2014-Q2
2014-Q4
2015-Q2
2015-Q4
2016-Q2
2017-Q2
Fonte: BCRT
A gestão da política monetária, por sua vez, é coerente com a posição vulnerável
da economia turca aos impactos das assimetrias monetária e financeira e da institucionalidade
dos mercados de câmbio e financeiro, na qual os agentes detêm posições em moeda doméstica
e estrangeira. Sob a égide do regime de metas de inflação – e o compromisso, por lei, com a
estabilidade de preços -, o repasse cambial assimétrico elevado, em relação aos países da
201
10
maior risco para o investimento
5 em moeda estrangeira
16.10.09
11.01.05
11.04.05
11.10.05
02.01.06
26.06.06
14.09.07
14.12.07
16.05.08
23.10.08
16.01.09
17.04.09
17.07.09
15.10.10
05.08.11
19.09.12
23.01.13
17.04.13
21.08.13
28.08.14
21.04.16
20.07.16
25.11.16
Piso (Borrowing rate) Teto (lending rate)
Fonte: BCRT
lira é 6% (embutidos nesta taxa a expectativa de depreciação da lira e o prêmio pela iliquidez
da lira no plano internacional), o banco depositará, no máximo, um percentual de reservas em
dólar equivalente a um ROC igual a 2. Ou seja, acima desse coeficiente, o banco será
indiferente entre depositar suas reservas em dólares ou em lira e, assim, o ROM perderá
eficácia (ver Alper at. al., 2013). No entanto, a identificação desse “teto” para o ROC é
complexa devido à incerteza em relação ao comportamento da taxa de câmbio lira/dólar no
futuro. A função do BRCT, portanto, é calibrar as faixas do ROM, e o ROC correspondente a
cada uma, de modo a responder à “demanda” por depósitos de reservas em moeda estrangeira
e evitar variações bruscas no uso dessa opção pelo sistema bancário.
Nas fases de alta do ciclo de liquidez internacional e/ou nos momentos de maior
diferencial de juros, o funding em dólar é mais barato que o funding em lira turca,
impulsionando a parcela em dólar das reservas bancárias. Essa decisão, por sua vez, freia a
pressão pela apreciação da moeda turca. Na fase de baixa, o movimento é contrário: a
composição das reservas bancárias se concentra na moeda local, reduzindo também pressões
pela depreciação da lira. Percebe-se, portanto, que o ROM atua como estabilizador
automático, com o objetivo de conter a volatilidade da taxa de câmbio e os efeitos do ciclo de
fluxos de capitais sobre a vulnerabilidade externa do país. Conforme as análises empíricas de
Odunco et. al. (2013) e Degerli & Fendoglu (2013) 107, esse mecanismo cumpre seu objetivo
107
Ambos os autores consideram a data de inicio de suas análises outubro de 2010, após a remoção da
remuneração dos requerimentos de reservas em moeda estrangeira. De acordo com Degerli & Fendoglu (2013, p.
10), a ausência de remuneração das reservas (compulsórias) é considerado um pré-requisito para a utilização dos
requerimentos de reservas como um instrumento de política cambial.
206
50.000
40.000
30.000
20.000
10.000
0
16/09/2011 16/09/2012 16/09/2013 16/09/2014 16/09/2015 16/09/2016 16/09/2017
Fonte: BRCT
108
Degerli & Fendoglu (2013) estimam o impacto do ROM sobre as expectativas em relação à volatilidade
cambial e a movimentos abruptos da taxa de câmbio. Os autores utilizam como proxy das expectativas as opções
de compra e venda de dólar.
109
A autoridade monetária também promoveu um aumento dos limites de transação em moeda estrangeira nos
mercados de depósito (ver BRCT, 2015).
207
40
30
20
10
0
Fonte:BRCT
208
Institucionalidade do
Mercado de câmbio
2002-2008 (Compra) Estabilidade
Acumulação de
Compra e Venda de 2009-2011 (Compra) financeira;
reservas; Gestão da Política
divisas no mercado à 2006 (Venda) Controle Parcialmente Parcialmente
Conter volatilidade e Monetária
vista 2009 (Venda) Inflacionário
nível
2011-2015 (Venda) (implícito)
Vulnerabilidade
Extena
Institucionalidade do
Mercado de câmbio
Estabilidade
Reserve Option
Financeira
Mechanism (ROM) – Conter volatilidade Gestão da Política
Novembro 2011 - Parcialmente Parcialmente
Regulação cambial Monetária
Controle
macroprudencial
Inflacionário
Vulnerabilidade
Extena
Fonte: Elaboração própria
209
do BRCT nos mercados à vista e de depósito, derivada da maior preferência pela liquidez da
divisa-chave, evidenciou a autonomia reduzida de política cambial, sujeita a paradas súbitas e
instabilidade nos fluxos de capitais, independentemente do maior volume de reservas
internacionais (e, portanto, da maior capacidade de intervenção).
O uso de instrumentos de política monetária não-convencionais após o retorno dos
fluxos de capitais no segundo trimestre de 2009 – principalmente o ROM e o corredor
assimétrico da taxa de juros – revelou uma postura mais ativa (ante uma postura até então
acomodatícia) do BRCT em relação aos efeitos da fase de alta do ciclo de liquidez
internacional sobre a taxa de câmbio e o crédito em moeda estrangeira e lira turca. Conforme
Nettekoven (2016, p. 159),
“(…) the Turkish central bank has realized that a simple inflation
targeting strategy is not functional for a peripheral economy like
Turkey, which has large foreign currency indebtedness and is subject
to the destructive effects of the unanchored cross-border capital
flows”.
Com base em Oduncun et. al. (2013), esta tese também analisará, por meio de um
110
GARCH , o impacto do ROM sobre a volatilidade da lira em relação ao dólar entre
15/09/2011 (data do primeiro registro de reservas pelo ROM no BRCT) e 27/07/2017, num
total de 1472 observações. Diferentemente dos trabalhos supracitados, este modelo se baseará
na taxa de câmbio em relação ao dólar e no montante em dólar de reservas depositado por
meio do ROM111. Para controlar o efeito de outras variáveis sobre a taxa de câmbio, será
considerado o diferencial entre a taxa básica de juros norte-americana (fed fund rate) e a
borrowing rate, taxa de juros de depósito, que serve de referência para os influxos de capitais
e, portanto, é alvo principal na implementação do corredor assimétrico da taxa de juros; as
intervenções pré-anunciadas e discricionárias do BRCT (durante o período de análise, o
BRCT não realizou leilões de compra de dólares); e o VIX, utilizado no caso mexicano acima
como uma proxy da aversão ao risco sistêmico As equações abaixo descrevem o modelo a ser
estimado:
Onde RET é o retorno da taxa de câmbio (calculado por meio da diferença do logaritmo do
câmbio em t e t-1); DIF é o diferencial de juros; I refere-se aos leilões de venda de dólar no
mercado à vista; ID refere-se às vendas discricionárias de dólar no período; VIX refere-se ao
Volatility Index; ROM (Reserve Option Mechanism) é o montante em dólar depositado por
meio desse mecanismo e 𝜀𝑡 é o termo de erro (com distribuição normal e média igual a zero).
Ademais, todas as séries foram submetidas ao teste de raiz unitária ADF (Augmented Dickey
Fuller), que atestou a estacionariedade das mesmas.
Conforme a tabela 3.5, a variável 𝑅𝑂𝑀𝑡 é significativa e possui sinal negativo, ou
seja, quando maior o volume depositado por meio do ROM, menor a volatilidade da taxa de
câmbio, resultado que corrobora a importância desse instrumento em suavizar os efeitos da
hierarquia sobre a taxa de câmbio. As vendas de dólar também são estatisticamente
significantes, porém o sinal dessa variável é positivo, ou seja, quanto maior a intervenção,
110
O modelo GARCH foi desenvolvido por Bollerslev (1986) a partir do modelo ARCH (Autoregressive
Conditional Heteroscedastic) elaborado por Engle (1982). De acordo com Oduncun et. al. (2013, p.10), “One of
the most appealing features of the GARCH framework, which explains why this model is so widely used in the
literature, is that it captures one of the well-known empirical regularities of the returns, the volatility clustering”.
111
Divulgados no site do BCRT (http://www.tcmb.gov.tr/wps/wcm/connect/tcmb+en/tcmb+en).
212
maior a volatilidade cambial. Uma das possíveis razões para esse resultado é a insuficiência
do montante vendido para lidar com o aumento da volatilidade e depreciação da lira após
2014. Outro fator que pode influenciar nesse resultado é o “lag” de um dia de reação do
BRCT aos picos de volatilidade, afetando a relação entre intervenção e retorno (Aysan, 2014).
Apesar de ser efetivo na redução dos impactos dos fluxos de capitais de curto
prazo sobre a volatilidade da taxa de câmbio, o ROM não representou maior autonomia de
política cambial. Assim como as operações via swaps cambiais, analisadas no caso brasileiro,
as ações do BRCT por meio do ROM e do corredor assimétrico da taxa de juros buscaram
apenas conter (ou suavizar) a transmissão dos efeitos da hierarquia à taxa de câmbio, sem, no
entanto, ir de encontro aos impactos do condicionante estrutural por meio de mudanças nos
condicionantes domésticos. Conforme ressalta Aysan (2014) e Nettekoven (2016), tais
medidas são market-friendly, ou seja, não mudam a institucionalidade do mercado de câmbio
e a composição dos fluxos de capitais; apenas alteram a rentabilidade das diferentes moedas –
conforme o retorno dos ativos estudados no primeiro capítulo – em direção a um objetivo de
política cambial (estabilidade financeira), sem alterar, no entanto, a rentabilidade do sistema
bancário e financeiro.
Assim, mesmo com a efetividade do ROM, houve o crescimento da dolarização
do sistema financeiro e o agravamento da vulnerabilidade externa, vistos acima. Essa
contraposição gera, portanto, uma contradição: a suavização da volatilidade cambial no curto
prazo ocorre ao mesmo do aumento do risco e incerteza em relação aos movimentos da taxa
de câmbio no longo prazo e seus efeitos sobre a posição dos agentes em moeda estrangeira.
213
3.4 Coréia do Sul: resposta de longo prazo aos condicionantes domésticos e estrutural
No período pré-crise, especialmente entre 2005 e 2007, tais filiais intensificaram suas
operações de especulação e arbitragem e incorreram em elevados descasamento de prazos em
suas posições em dólar. Esse comportamento dos bancos estrangeiros, por sua vez, deu
suporte para posições mais arriscadas dos bancos domésticos e empresas não financeiras (em
especial empresas exportadoras) (Prates & Fritz, 2016).
Essas últimas se protegiam de duas formas contra a apreciação do won ao longo
do período de boom pré-crise: por meio da venda de dólares nos mercados forwards ou por
meio da compra, junto aos bancos domésticos e estrangeiros, de opções de venda de dólares, a
fim de se protegerem da forte apreciação do won no período.
O último instrumento – conhecido como knock-in knock-out (KIKO) – oferecia
payoffs positivos para as empresas se o won apreciasse moderadamente em relação ao dólar.
Por outro lado, as empresas teriam payoffs negativos se a moeda coreana depreciasse
significativamente (Prates & Fritz, 2016; Khil & Suh, 2010). Assim, as opções KIKO não são
propriamente um instrumento de hedge, pois, diferentemente das opções comuns, oferecem
proteção apenas nos períodos de apreciação moderada, se tornando um instrumento de alto
risco nos momentos de depreciação. Ademais, as posições assumidas pelas empresas em
opções KIKO iam, geralmente, muito além de suas operações, evidenciando ainda mais o uso
desse instrumento para a especulação (Khil & Suh, 2010).
Para cobrir as posições assumidas junto aos seus clientes (e também para
especular e arbitrar em relação à moeda sul coreana) nos mercados de opções e forwards, os
bancos realizavam operações nos mercados de swaps e à vista. Os bancos estrangeiros
contraiam empréstimos de curto prazo em divisas junto as suas respectivas matrizes, vendiam
os montantes no mercado à vista e compravam títulos públicos sul-coreanos. Além disso, tais
instituições ofereciam funding para os bancos domésticos nos mercados de FX swaps 112. Já os
bancos domésticos compensavam a maior dificuldade no acesso aos empréstimos em moeda
estrangeira com o funding de curto prazo, propiciados pelas filiais dos bancos estrangeiros,
nos mercados de FX swaps (e também nos mercados de swaps de moeda), vendendo o
montante em divisa nos mercados à vista.
A “alimentação” de toda essa engrenagem vinha, portanto, dos empréstimos de
curto prazo contraídos pelas filiais dos bancos estrangeiros, que serviam de funding
diretamente para tais instituições e indiretamente para os bancos domésticos por meio dos FX
112
A regulação frouxa sobre as instituições estrangeiras – que exigia somente gerenciamento do risco de capital,
sem o monitoramento, portanto, do risco de liquidez - em relação aos bancos domésticos impulsionava ainda
mais as operações descritas acima (Baba & Kokenyne, 2011).
217
1.500
1.400
1.300
1.200
1.100
1.000
900
800
Fonte: BdC
Fonte: BdC
A análise dos estoques, por sua vez, corrobora a contradição identificada nos
fluxos. A escalada da dívida externa privada de curto prazo, em especial dos bancos
estrangeiros, superou a acumulação expressiva de reservas no período pré-crise e provocou,
portanto, deterioração dos índices de liquidez (gráfico 3.40). Após a CFG, a diminuição dos
estoques de dívidas dos bancos e dos empréstimos em moeda estrangeira das filiais dos
bancos estrangeiros – mesmo nos períodos de boom entre 2009 e 2011 – provocou uma
redução da relação dívida de curto prazo/reservas, que se tornou ainda menor por conta da
aceleração a acumulação de reservas após a crise. Tal cenário se torna mais evidente quando
se olha para a Posição Internacional de Investimento (tabela 2.1, segundo capítulo). Após a
CFG, diferentemente de grande parte dos países da amostra, a Coréia do Sul não se aproxima
dos valores da PII no período pré-crise, em razão, principalmente, da diminuição do passivo
externo bruto e aumento do volume de reservas, e, após 2013, se torna o único com PII
positiva, revelando, portanto, uma situação confortável em relação à vulnerabilidade externa.
Essa reversão da vulnerabilidade externa após a CFG também se verifica nas
outras dimensões pontuadas no segundo capítulo. A principal delas, a participação dos
investidores não-residentes nos mercados de títulos públicos, se elevou de forma expressiva
por meio das operações de carry trade, conduzidas em grande parte pelas filiais dos bancos
estrangeiros. Após a imposição de um imposto sobre a compra dos títulos públicos por não
residentes, em janeiro de 2011, a participação dos mesmos se estabiliza, neutralizando uma
importante fonte de instabilidade dos fluxos de capitais (Gráfico 3.40)
220
Fonte: BdC
35.000.000
30.000.000
25.000.000
20.000.000
15.000.000
nov/14
dez/16
ago/08
dez/11
ago/13
nov/09
mar/08
jun/09
fev/11
out/12
mai/12
mar/13
jun/14
fev/16
jan/09
abr/10
set/10
jul/11
jan/14
abr/15
jul/16
set/15
Fonte: BdC
222
Fonte: BdC
1,5%
1,0%
0,5%
0,0%
-0,5%
-1,0%
1994 3
1995 3
1996 3
1997 3
1998 3
1999 3
2000 3
2001 3
2002 3
2003 3
2004 3
2005 3
2006 3
2007 3
2008 3
2009 3
2010 3
2011 3
2012 3
2013 3
2014 3
2015 3
2016 3
Fonte: BdC
223
A análise dos condicionantes acima aponta para a construção de uma posição mais
vulnerável, após a intensificação da abertura financeira no final dos anos 1990, das
instituições participantes do sistema financeiro sul coreano. O Banco da Coréia (BdC), por
sua vez, foi pouco sensível, no período que antecedeu a CFG, a tais transformações,
intervindo apenas por meio da compra de dólares no mercado à vista, com a meta explícita de
acumulação de reservas internacionais e sob o objetivo macroeconômico da estabilidade
financeira.
“For several years after the currency crisis of 1997, the accumulation
of foreign exchange reserves was one of the objectives of intervention.
A strong stock of FX reserves helps to minimise external vulnerability
and to increase confidence in the economy” (Ryoo, Kwon & Lee,
2013, p. 208).
115
De acordo com FMI (2011, p. 71), ao longo do ápice da CFG (último trimestre de 2008), o nível de reservas
caiu US$ 64 bilhões e o índice do mercado de ações coreano despencou 70%.
116
Nesse período, o BDC também atuou por meio de intervenções verbais. De acordo com Ryoo, Kwon & Lee
(2013, p. 2010), o BDC “(…) also use verbal intervention to give speculative forces warning by conveying the
authorities’ concerns and intentions related to foreign exchange market developments. Verbal intervention must
be used limitedly, as its effects on the market will lessen if it is used frequently”.
117
O BdC também realizou acordos de swaps de moedas junto ao Banco Central Japonês (equivalente a US$ 30
bilhões) e ao Banco Popular da China (1,8 bilhão de yuans). Para maiores detalhes sobre todos os instrumentos
utilizados pelo BDC para conter a crise de liquidez no mercado de câmbio após a CFG ver
http://www.bok.or.kr/broadcast.action?menuNaviId=1920.
225
Assim como os demais países estudados neste capítulo, a Coréia do Sul interviu
de maneira assimétrica no mercado à vista de câmbio, acumulando reservas internacionais nos
períodos de boom dos fluxos de capitais e, portanto, baixa preferência pela liquidez da divisa
(FMI, 2013). No entanto, o uso de tal instrumento não foi suficiente para conter os efeitos da
hierarquia sobre a volatilidade da taxa de câmbio, pois não respondia completamente aos
condicionantes domésticos. Ou seja, a institucionalidade do mercado de câmbio (combinada
com as características da abertura financeira) possibilitou a formação de posições em moeda
estrangeira alavancadas e descobertas concomitantemente, e em ritmo superior, à acumulação
de reservas internacionais. Dessa forma, além de não impactar a formação das operações
descritas na subseção acima, a compra de divisas não se mostrou suficiente para conter a
deterioração dos índices de liquidez dos agentes privados. Tal constatação se cristalizou na
eclosão da CFG, quando os Bancos Centrais norte americano, japonês e chinês aturam como
emprestadores de última instância por meio de swaps de moedas.
Portanto, qualquer mudança estrutural na sensibilidade da taxa de câmbio e da
economia sul coreana a choques externos passaria necessariamente pela limitação das
operações das filiais dos bancos estrangeiros e bancos domésticos nos mercados de câmbio.
Após a CFG, essa constatação também foi compartilhada pelo BdC, que, por meio das
medidas macroprudenciais, respondeu diretamente a dois condicionantes intrinsicamente
conectados: a institucionalidade do mercado de câmbio e a vulnerabilidade externa
(Choongsoo, 2010). A inclusão formal da estabilidade financeira como um dos objetivos de
política no estatuto do BdC conferiu um caráter estrutural às medidas macroprudenciais, que
buscavam a redução da volatilidade (e da expectativa de volatilidade) da taxa de câmbio no
longo prazo. A resposta do BdC aos condicionantes domésticos, portanto, manifesta uma
intenção de ampliar a autonomia da política cambial aos efeitos conjunturais da política
monetária dos países emissores de divisas ou às manifestações da hierarquia de moedas. Nas
palavras do então presidente do BdC, Choongsoo Kim:
For countries like Korea, meanwhile, whose currencies are not key
currencies and have not yet been sufficiently internationalized,
measures for responding to policies such as the quantitative easing by
key currency countries cannot be found in economic textbooks written
228
in the past. A new task for us, therefore, is to find alternative measures
appropriate to our domestic circumstances by ourselves, through our
own research (Choongoo, 2013.
Ademais, conforme Ree et. al. (2013), Baumann & Gallagher (2013) e os gráficos
3.45 e 3.46, os instrumentos utilizados pelo BdC contribuíram para redução das posições
descobertas (em moeda estrangeira) dos bancos – tanto por meio da diminuição do
endividamento externo de curto prazo quanto por meio da limitação e taxação das posições
nos mercados forwards e de opções. Tais fatos, por sua vez, tornaram os mercados de câmbio
mais resilientes a choques externos118.
Portanto, apesar de alguns resultados conflitantes, pode-se afirmar que o uso de
instrumentos condizentes com os condicionantes domésticos e estruturais – que aumentam a
autonomia de política cambial – foram efetivos em reduzir a volatilidade cambial,
principalmente as variações bruscas na taxa de câmbio. Tal fato permite que o BdC não só
intervenha menos nos momentos de maior preferência pela liquidez da divisa, mas também
atue em resposta a diferentes objetivos domésticos, ligados à competitividade externa dos
produtos exportados, controle inflacionário e/ou estabilidade financeira119. Nas palavras do
BdC:
118
Conforme o teste de stress realizado por Ree et. al. (2013), que simulou o mesmo pico do VIX registrado na
CFG para as crises da Grécia em 2011 e o tapering em 2013, a taxa de câmbio won/dólar se tornou mais
resiliente nos períodos de maior aversão ao risco.
119
Por exemplo, após a CFG, o BdC atuou na ponta comprada em dólar no mercado à vista, visando não apenas
a redução da vulnerabilidade externa, mas também a estabilidade do nível da taxa de câmbio won/dólar (FMI,
2013)
230
Fonte: BdC
Fonte: BdC
231
Considerações Finais
a gestão da política monetária, pois reforça ainda mais a relação entre política monetária e
cambial. Tais impactos negativos contribuem para acentuar os efeitos da hierarquia de moedas
sobre a taxa de câmbio nos momentos de reversão do ciclo de liquidez, fortalecendo a
dependência da política cambial brasileira frente à política monetária dos países emissores de
divisas e à preferência pela liquidez dos investidores globais.
A reação brasileira aos dilemas de política cambial pós-crise, por meio da adoção
de instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e regulação de derivativos de câmbio,
propiciou a resposta mais adequada aos condicionantes domésticos e estrutural. Tais
regulações atingiram boa parte das possibilidades de ganho de especulação e arbitragem com
a moeda brasileira– contrariamente à postura acomodatícia da intervenção via swaps
cambiais. A vulnerabilidade externa também foi impactada positivamente, por meio,
principalmente, da redução dos empréstimos de curto prazo denominados moeda estrangeira,
atenuando as possibilidades de choques oriundos de movimentos das divisas. Houve também
uma breve dissociação entre a gestão da política monetária e os objetivos de política cambial,
que se concentraram na reversão da trajetória de câmbio em direção a um patamar mais
competitivo. Ao atingir positivamente os condicionantes domésticos listados, as regulações
responderam ativamente à hierarquia de moedas, reduzindo a subordinação da política
cambial à política monetária dos países emissores de divisas.
Embora a análise por meio do referencial teórico ateste para a adequação dos
instrumentos de gestão dos fluxos de capitais aos condicionantes, o estudo empírico sobre a
efetividade de tais instrumentos na contenção da volatilidade apontou para o efeito reverso do
esperado. Tal resultado, no entanto, é condizente com as constantes arbitragens regulatórias
que geraram volatilidade no cupom cambial e impediram a contenção da volatilidade cambial
no curto prazo.
Já o México se diferencia substancialmente do caso brasileiro, pois o BM atua
fundamentalmente por meio da venda de divisas no mercado de câmbio. A continuidade da
política cambial mexicana, antes e depois da CFG, contrasta com mudanças significativas nos
condicionantes domésticos. Em relação à vulnerabilidade externa, o aumento da participação
dos investidores não-residentes nos mercados de títulos públicos domésticos e a elevação do
estoque de dívida externa das empresas não-financeiras contribuiu para tornar a taxa de
câmbio (e as demais variáveis macroeconômicas) mais sensível a choques externos. A
“indiferença” da política cambial em relação aos condicionantes domésticos e estrutural
impactou a efetividade das intervenções no mercado à vista. Tais instrumentos não se
233
Anexo estatístico
Tabela 3.6: Principais medidas de gestão dos fluxos de capitais e regulação dos
derivativos cambiais - Brasil
Data Tipo de medida Medida
19/10/2009 Controle de capital IOF de 2% sobre influxos de portfólio (ações e renda fixa)
18/11/2009 Controle de capital IOF de 1,5% sobre emissão de Deposit Receipts (DR)
4/10/2010 Controle de capital Aumento da alíquota de IOF de 2% para 4% sobre a
aplicação de estrangeiros em fundos de renda fixa e títulos
do Tesouro. A alíquota de IOF sobre aplicações em ações,
em vigor desde outubro de 2008, foi mantida em 2%.
7/10/2010 Controle de capital A migração, por investidores não residentes, de aplicações
em renda variável e ações para aplicações em renda fixa
está sujeita ao fechamento de novo contrato de câmbio
(câmbio simultâneo), impedindo que os investidores
deixem de pagar a nova alíquota de IOF para renda fixa.
18/10/2010 Controle de capital Nova elevação da alíquota de IOF, agora de 4% para 6%,
para aplicações em renda fixa, por investidores não
residentes.
18/10/2010 Regulação de derivativos Elevação da alíquota de IOF sobre margens de garantia
cambiais dos contratos futuros de câmbio de 0,38% para 6% e
proibição de cumprimento dessas margens mediante
empréstimos de títulos públicos e garantia bancárias.
30/12/2010 Controle de capital IOF de 1,5% sobre cancelamento de DRs
6/1/2011 Regulamentação prudencial Recolhimento de depósito compulsório (em reais) de 60%
do valor das posições vendidas em câmbio, assumidas
pelos bancos, que exceder o menor dos seguintes valores:
US$ 3 bilhões ou o patrimônio de referência (Nível I). A
medida entrou em vigor em 4/4/2011. Objetivo: trazer a
posição vendida dos bancos no mercado à vista para US$
10 bilhões.
29/3/2011 Controle de capital Imposição de IOF de 6% sobre as captações externas de
até 360 dias (as captações externas com prazo inferior a
90 dias já eram tributadas com alíquota de IOF de 5,38%).
4/4/2011 Controle de capital Renovações de empréstimos externos devem realizar
câmbio simultâneo (devem contabilizar os fluxos
cambiais “fictícios” referentes ao pagamento da dívida,
sujeito a IOF de 0,38%, e à nova captação, sujeita a IOF
de 6%). Bloqueia-se, assim, um instrumento de evasão da
medida precedente.
6/4/2011 Controle de capital IOF de 6% passa a incidir também sobre empréstimos
externos com prazo de até dois anos, sobre repactuação e
assunção de dívidas, e sobre empréstimos
intercompanhias sob o mesmo prazo.
8/7/2011 Regulação prudencial Mudança nas regras de recolhimento compulsório (em
reais) sobre posições vendidas em câmbio. Percentual de
60% passa a incidir sobre o montante que exceder o
menor dos seguintes valores: US$ 1 bilhão ou o
patrimônio de referência (Nível I).
26/07/2011 Regulação de derivativos IOF de 1% sobre posições vendidas em derivativos acima
cambiais de U$ 10 mil.
2/8/2011 Controle de capital Em Ato Declaratório publicado no Diário Oficial, a
Receita esclareceu que a alíquota de 6% do IOF incidente
sobre os empréstimos com prazo médio de até 720 dias
incide sobre as operações de empréstimos
intercompanhias.
236
Tabela 3.7: Principais medidas de gestão dos fluxos de capitais e regulação dos
derivativos cambiais – Coréia do Sul
Data Efetiva Tipo de medida Medida
Limites nas posições dos contratos firmados entre
exportadores e bancos nos mercado de forwards
19/11/2009 Regulação Prudencial (125% das receitas de exportação) ; requerimento de
capital sobre a posição de investidores estrangeiros
em títulos públicos.
- Limites nas posições em derivativos de câmbio
(50% dos capital para os bancos domésticos e 250%
do capital dos bancos estrangeiros);
14/06/2010 Regulação Derivativos
- Aumento dos limites dos contratos entre bancos e
empresas exportadoras nos mercados forwards
(100% da receita de exportação)
Limites sobre empréstimos em moeda estrangeira
01/07/2010 Controle de capitais
contraídos por residentes
237
Apêndice
Onde RET é o retorno sobre a taxa de câmbio won/dólar; DIF é o diferencial entre a taxa
básica de juros sul-coreana e a taxa básica de juros norte-americana (fed fund rate); I é uma
variável binária, na qual 1 representa os instrumentos de gestão dos fluxos de capitais (data de
anúncio); VIX é a proxy utilizada para a variação da preferência pela liquidez da divisa e e
𝜀𝑡 é o termo de erro (com distribuição normal e média igual a zero). Ademais, todas as séries
foram submetidas ao teste de raiz unitária ADF (Augmented Dickey Fuller), que atestou a
estacionariedade das mesmas.
Os resultados da estimação desse modelo, apresentados pela tabela abaixo,
contrariam as relações esperadas. Os efeitos das regulações sobre a volatilidade cambial não
são estatisticamente significantes e a relação entre o diferencial de juros e o retorno sobre o
câmbio é negativa. O único resultado esperado que se confirma é a relação positiva entre o
238
VIX e a volatilidade cambial, embora, de acordo com Ree et. al. (2013), após os instrumentos
de gestão dos fluxos de capitais, a reação da taxa de câmbio a variações no VIX foi suavizada.
I 1.60E-06 0.7707
Fonte: Eviews
Nota: *** estatisticamente significante à 1%; ** estatisticamente significante à 5%;
*estatisticamente significante à 10%
Onde RET representa o retorno sobre a taxa de câmbio real/dólar; DDIF representa o
diferencial entre a taxa básica de juros (Over Selic) e a taxa livre de risco (LIBOR); I refere-se
às intervenções no mercado à vista; SWAPS é uma variável binária, na qual 1 corresponde às
datas de anúncio dos leilões de swaps reversos; GFCD é uma variável binária,onde 1
corresponde às datas de anúncio dos instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e regulação
de derivativo e 𝜀𝑡 é o termo de erro (com distribuição normal e média igual a zero). Ademais,
todas as séries foram submetidas a um teste de raíz unitária (Augmented Dickey Fuller), que
apontou não-estacionariedade apenas para a série DDIF – série integrada de ordem 1.
Assim como o caso sul-coreano, alguns resultados, apresentados na tabela 3.9
abaixo, contrariam as relações esperadas. Os instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e
239
regulação de derivativos de câmbio possuem uma relação positiva com a volatilidade cambial,
enquanto as intervenções no mercado à vista e os swaps reversos são efetivos na contenção da
volatilidade (possuem uma relação negativa). Conforme ressaltado acima, o caráter não
efetivo das regulações no curto-prazo é compreensível, uma vez que tais medidas não são
acomodatícias, gerando, assim, mudanças bruscas nas posições dos agentes em moeda
estrangeira.
I -8.09E-09 0.0000***
Fonte: Eviews
Nota: *** estatisticamente significante à 1%; ** estatisticamente significante à 5%;
*estatisticamente significante à 10%
1. Além das dos bancos múltiplos, quais são as instituições autorizadas a receber
depósitos em dólares?
Resposta: Bancos de desenvolvimento.
Resposta: No México, apenas as pessoas jurídicas com domicílio no México podem ter contas
em dólares e pessoas físicas que se encontram na região de fronteira do norte (Estados Unidos
da América) e estados da Baja California e Baja California Sur. São depósitos em dinheiro
120
As respostas foram escritas em espanhol e traduzidas livremente pelo autor.
240
com ou nenhum talão de cheques à vista. Não se regula os valores. Não há limites para os
depósitos.
5. Conforme os dados de 2016 do BIS, é possível estimar que o mercado peso / dólar é
grande nos mercados offshore. Para o que essa demanda externa pode ser atribuída
pela moeda mexicana? E quais são os principais canais de transmissão entre os
mercados onshore e offshore?
Resposta: O peso mexicanos é uma das poucas moedas conversíveis de mercados emergentes
e uma das mais liquidas do mundo. Por este motivo é usada como uma proxy para mercados
emergentes em geral, sendo utilizada para fins especulativos e para hedge.
Resposta: Eles são praticamente iguais, com a diferença de que nos leilões com preço
mínimo, o preço (mínimo) é equivalente ao resultado da multiplicação da Taxa de Câmbio
(TC) publicada no dia útil anterior ao leilão pelos fatores determinados pelo comissão de
câmbio e previamente divulgados pelo Banxico. Enquanto os leilões sem preço mínimo, os
preços são determinados na chamada e não poderão exceder esse valor.
Conclusão
Esta tese procurou avançar na análise da política cambial dos países emergentes,
no contexto dos regimes de metas de inflação e câmbio flutuante, a partir do referencial
teórico keynesiano-estruturalista, que enfatiza as assimetrias existentes entre as diferentes
moedas domésticas no SMFI contemporâneo e suas implicações. Para tanto, o primeiro
capítulo se dedicou inicialmente à revisão dos principais conceitos de política cambial,
sugerindo uma definição mais ampla, que considera todas as ações da autoridade monetária
que impactam a posição líquida em moeda estrangeira dos agentes participantes do mercado
de câmbio, incluindo, assim, os instrumentos de gestão dos fluxos de capitais e regulação do
mercado de derivativos de câmbio. A partir da definição e da taxonomia da política cambial, a
segunda parte do capítulo se dedicou à revisão bibliográfica acerca das origens dos
desequilíbrios externos que levam ao uso da política cambial neste regime macroeconômico
predominante.
As implicações das assimetrias foram analisadas por meio da aplicação da
equação do retorno dos ativos de Keynes para o mercado de câmbio, proposta por Andrade &
Prates (2013) e Kaltenbrunner (2015). De acordo com essa equação – equação (4) do primeiro
capítulo -, a diferença estrutural – e, portanto, estável no curto e médio prazos - entre os
prêmios de liquidez da divisa-chave e das diferentes moedas periféricas implica que a equação
de retorno das moedas periféricas está sujeita às variações dos diferenciais de custo de
carregamento (c-c*) – não considerados por Kaltenbrunner (2015) - e de rentabilidade (q-q*),
e das expectativas de apreciação das moedas periféricas (a). Tais variáveis, por sua vez, estão
sujeitas aos efeitos das assimetrias monetária e financeira , que podem impulsionar a
volatilidade do retorno das moedas periféricas e, portanto, suas respectivas taxas de câmbio.
Antes, porém, de aprofundar e especificar a interação entre a política cambial e (c-
c*), (q-q*) e (a), buscou-se, na terceira parte do primeiro capítulo, detalhar quais possíveis
restrições o diferencial do prêmio de liquidez (l-l*) impõe à política cambial dos países
emergentes. Dentre as diversas características da política cambial nesses países relatadas pela
literatura – ver Menkhoff (2013) e BIS (2013) –, algumas podem ser interpretadas como
implicações das assimetrias, tais como a maior frequência de intervenção, a assimetria no uso
das reservas internacionais – em razão do possível impacto da diminuição das reservas sobre a
vulnerabilidade externa – e a importância fundamental das metas (ou motivações) de política
cambial relacionadas ao objetivo da estabilidade financeira.
243
esterilização das intervenções dos bancos centrais nos mercados à vista. No que tange ao
repasse cambial, todos os países da amostra apresentam pass-through assimétrico, ou seja,
nos momentos de depreciação o repasse cambial aos preços se eleva. Tal fato pode limitar a
queda no diferencial de juros (q-q*) nos momentos de baixa do ciclo de liquidez
internacional, dependendo da política monetária nos países centrais, ou condicionar a escolha
do controle inflacionário como objetivo macroeconômico. Já em relação às esterilizações,
Brasil e Turquia absorvem a liquidez gerada pela compra de divisas no mercado de câmbio
por meio de operações compromissadas de curto prazo, utilizando títulos do tesouro federal,
enquanto a maioria dos demais países esteriliza suas intervenções por meio da venda
definitiva de títulos do Banco Central.
Por fim, o último condicionante doméstico considerado é o padrão de comércio,
que remete à relação entre taxa de câmbio e competitividade externa. Ou seja, ceteris paribus,
o efeito da taxa de câmbio sobre o fluxo de comércio dependerá da configuração do padrão de
comércio em cada país e sua integração às cadeias globais de valor. Países exportadores de
commodities e com baixa complexidade em suas exportações – caso de Brasil, Chile, Peru e
Colômbia – aprofundaram seu padrão de comércio em razão da apreciação de suas respectivas
moedas entre 2003 e 2008 e 2009 e 2011 combinada com a ascensão chinesa. Já o padrão de
comércio mexicano e dos países da Europa Central e do Leste - caracterizado pela integração
às cadeias de valor das empresas norte-americanas e alemãs, respectivamente, e pelo elevado
conteúdo importado de suas exportações - continuou dependente da dinâmica econômica dos
países aos quais estão integrados e do repasse cambial sobre os preços dos insumos
importados. No caso dos países asiáticos, a ascensão chinesa mudou a configuração do
comércio intra-regional, absorvendo grande parte de suas exportações, enquanto suas
importações possuem maior dependência – em relação aos demais países estudados – de
insumos básicos.
O detalhamento dos condicionantes domésticos, juntamente com o estudo do
condicionante estrutural no primeiro capítulo, conforma o referencial teórico e analítico da
tese. Assim, a análise da política cambial a partir dos quatro condicionantes supracitados
permitiu verificar, qualitativamente, se tal política atenuou os impactos do diferencial de
prêmio de liquidez sobre a taxa de câmbio, ou seja, seus diferentes impactos sobre (c-c*), (q-
q*) e (a), diminuindo ou não seu grau de autonomia em relação aos efeitos de (l-l*).
A aplicação do referencial teórico e analítico foi feita no terceiro capítulo por
meio dos estudos de caso, escolhidos de acordo com a relevância, em volume, dos seus
mercados onshore e offshore. Os casos brasileiro e sul coreano são marcados pela mudança na
245
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