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Os doze degraus da humildade

Depois de termos apontado o remédio para a


cura da soberba, é hora de sermos bem
concretos. Como podemos viver na prática a
virtude da humildade? Quais passos devemos
dar para sermos humildes, a exemplo de Jesus?
Nesta aula de nosso curso de Terapia das
Doenças Espirituais, São Bento de Núrsia e
Santo Tomás de Aquino nos tomam pela mão e
nos ajudam a subir os doze degraus da
humildade. Saiba quais são eles e comece a
praticá-los!
Depois de termos apontado o remédio para a cura da soberba, é
hora de sermos bem concretos. Como podemos viver na prática a
virtude da humildade? Quais passos devemos dar para sermos
humildes, a exemplo de Jesus?

Nesta aula de nosso curso de Terapia das Doenças Espirituais, São


Bento de Núrsia e Santo Tomás de Aquino nos tomam pela mão e
nos ajudam a subir os doze degraus da humildade. Saiba quais são
eles e comece a praticá-los!

Um dos assuntos tratados na última aula foi a relação aparentemente


paradoxal entre as virtudes da magnanimidade e da humildade, que
constituem como que contrapontos na vida de perfeição.
Comparando o organismo sobrenatural a uma árvore, é possível
dizer que, enquanto a magnanimidade faz a árvore crescer e elevar-
se, a humildade faz com que ela lance raízes profundas na terra,
dando-lhe uma base firme de sustentação. Em Cristo, essas duas
virtudes se conjugam de modo admirável, como canta o hino
cristológico de Filipenses (cf. 2, 6-11). Ele não se apegou à Sua
natureza divina, mas assumiu a humana para, depois, ter o Seu nome
exaltado acima de todo nome. Humilhando-Se, Nosso Senhor foi
elevado.

Nesse mesmo hino, São Paulo destaca que Jesus humilhou-se,


"fazendo-se obediente até a morte" ( Fl 2, 8). Com isso, o Apóstolo
aponta o que o padre Garrigou-Lagrange considera o grande sinal
da humildade, a obediência:

"O sinal da humildade é a obediência, enquanto a soberba nos


inclina a fazer a própria vontade e a buscar aquilo que nos exalta,
e a não querer deixar-nos dirigir pelos demais, mas a dirigir os
outros. A obediência é o contrário da soberba. Mas o Unigênito
do Pai, vindo do céu para salvar-nos e sanar-nos da soberba, fez-
se obediente até a morte na cruz. A obediência torna meritórios
nossos atos e sofrimentos, de tal modo que, de inúteis que estes
últimos poderiam parecer, podem chegar a ser muito fecundos.
Uma das maravilhas realizadas por nosso Senhor é ter feito que
fosse proveitosa a coisa mais inútil, como é a dor. Ele glorificou-a
mediante a obediência e o amor" [1].

O Doutor Angélico faz alusão a essa mesma virtude quando explica


que "a humildade está, essencialmente, no apetite, na medida em
que alguém refreia os impulsos do seu ânimo, para que não busque,
desordenadamente, as coisas grandes" [2].

Além da obediência, porém, há outros caracteres da virtude da


humildade, que São Bento de Núrsia resume em "doze degraus", no
capítulo VII de sua Regra, e que Santo Tomás de Aquino explica de
modo muito didático na Suma Teológica, dividindo-os em quatro
níveis [3]:

1. Raiz e fundamento: (12.º) "o temor de Deus e a recordação dos


seus mandamentos".

Depois de citar a obediência, pela qual "alguém refreia os impulsos


do seu ânimo", e o "conhecimento que impede que alguém se
superestime", o Aquinate afirma que "o princípio e raiz (principium et
radix) dessas duas atitudes é a reverência que se presta a Deus". Por
isso, no dizer de São Bento,

"O primeiro grau da humildade consiste em que, pondo sempre o


monge diante dos olhos o temor de Deus, evite, absolutamente,
qualquer esquecimento, e esteja, ao contrário, sempre lembrado
de tudo o que Deus ordenou, revolva sempre, no espírito, não só
que o inferno queima, por causa de seus pecados, os que
desprezam a Deus, mas também que a vida eterna está
preparada para os que temem a Deus; e, defendendo-se a todo
tempo dos pecados e vícios, isto é, dos pecados do pensamento,
da língua, das mãos, dos pés e da vontade própria, como também
dos desejos da carne, considere-se o homem visto do céu, a todo
momento, por Deus, e suas ações vistas em toda parte pelo olhar
da divindade e anunciadas a todo instante pelos anjos." [4]

A razão da supremacia desse princípio é bastante simples: como a


soberba é um vício no relacionamento do homem com Deus, a sua
terapia deve começar justamente ordenando a relação entre criatura
e Criador. Esse também é o caminho para a cura da vaidade, pois
quem reverencia e glorifica a Deus transfere o seu apetite de glória
para o lugar apropriado.

2. Com relação à vontade: (11.º) "não querer seguir a própria


vontade"; (10.º) "submeter-se por obediência ao superior"; (9.º)
"abraçar pacientemente por obediência as coisas ásperas e duras".
Em resumo, é preciso contrariar-se por amor a Deus. Assim como
pela desobediência de Adão e Eva o pecado entrou no mundo, é pela
virtude da obediência que nos vem a salvação. A humildade ensina a
sempre nos dirigirmos com Cristo ao Horto das Oliveiras, e
repetirmos com Ele: "Não seja feita a minha vontade, mas a tua" ( Lc
22, 42).

Embora seja muito importante, principalmente na vida religiosa, a


obediência é o mais desprezado dos conselhos evangélicos. São
muitos os que louvam a pobreza e ainda há quem admire a
castidade, mas a obediência é frequentemente tratada como coisa
para idiotas, porque ensina a dobrar a própria vontade, e as pessoas,
de um modo geral, não estão dispostas a isso, não querem ser
contrariadas. Acontece que a obediência funciona justamente
quando não se está de acordo com o que se manda. É muito fácil
fazer aquilo com que se concorda, não há nada de mais nisso.
Renunciar a si mesmo e conformar a própria vontade à de outro, eis
uma atitude valorosa e constante na vida dos santos e santas da
Igreja.

3. Com relação ao conhecimento da própria debilidade e miséria:


(8.º) "reconhecer e confessar os próprios defeitos"; (7.º) "crer e
confessar ser indigno e inútil para tudo"; (6.º) "crer e confessar ser o
mais vil e miserável de todos".

Note-se que os degraus da humildade apresentados até aqui são


muito interiores, afinal, não se pode começar um edifício pela
fachada. Quem se preocupasse mais com estampar na vitrine a sua
humildade cairia no pecado – já denunciado na última aula – da
hipocrisia, que Santo Agostinho denomina " magna superbia". É
claro que o reconhecimento dos próprios defeitos, recomendado por
São Bento, pode manifestar-se exteriormente – quando, por
exemplo, uma pessoa assume que errou, ao invés de ficar tentando
desculpar-se –, mas mesmo essa atitude não passa de extensão de
uma humilhação interior diante de Deus e do próximo.

4. Com relação aos atos ou manifestações exteriores: (5.º)


"submeter-se em tudo à vida comum, evitando as singularidades";
(4.º) "não falar sem ser perguntado"; (3.º) "falar com poucas
palavras e em voz humilde, não clamorosa"; (2.º) "não ser dado ao
riso néscio"; (1.º) "manter os olhos baixos".

Há, por fim, a humildade que se manifesta. Se não estiver fundada


na vontade e em um profundo autoconhecimento, no entanto, ela
não passa de soberba disfarçada. Por isso, que não se comece pelo
fim, que não se substitua a essência pelas aparências. Quem quer
ser humilde deve começar dispondo o seu coração diante de Deus.
Feito isso, esses "atos ou manifestações exteriores" de que fala São
Bento irão surgindo como que espontaneamente.
As três vias e as três conversões
Qual a necessidade de um curso de “terapia das
doenças espirituais”? Onde se situa o combate
aos pecados capitais no caminho de perfeição?
O que nos aguarda depois que começamos a
abandonar os pecados da carne? Nesta aula
conclusiva de nosso curso, Padre Paulo Ricardo
apresenta um “mapa” da vida interior para
orientar os nossos alunos. A santidade não está
simplesmente em “não pecar”. Há muita coisa
para estudar e viver além disso!
Qual a necessidade de um curso de “terapia das doenças
espirituais”? Onde se situa o combate aos pecados capitais no
caminho de perfeição? O que nos aguarda depois que começamos a
abandonar os pecados da carne?

Nesta aula conclusiva de nosso curso, Padre Paulo Ricardo


apresenta um “mapa” da vida interior para orientar os nossos alunos.
A santidade não está simplesmente em “não pecar”. Há muita coisa
para estudar e viver além disso!

Faz parte de uma antiquíssima tradição na Igreja dividir a vida


espiritual em três idades (também chamadas de graus ou vias),
correspondentes ao estágio em que se encontra uma alma no
desenvolvimento da virtude da caridade (cf. S. Th., II-II, q. 24, a. 9).
Há, assim: (i) a via purgativa, dos principiantes; (ii) a via iluminativa,
dos progredidos; e (iii) a via unitiva, dos perfeitos.
O processo de "terapia das doenças espirituais" – descrito ao longo
de todo esse curso – insere-se no esforço dos iniciantes, depois do
qual existe todo um caminho místico, cujas linhas gerais importa
pelo menos antever agora, a fim de iluminar a própria purificação
ascética que a antecede.

Para tanto, além de considerar as três idades da vida interior, cabe


recorrer à linguagem do sacerdote dominicano Réginald Garrigou-
Lagrange, que fala também de três conversões a abrir cada uma das
fases do caminho de perfeição.

A primeira conversão acontece quando a pessoa abandona o


pecado mortal para viver na graça de Deus, inaugurando a via
purgativa, assim chamada por tratar-se de um período de
purificação do coração. A razão disso é que o pecado tem as suas
consequências: mesmo depois de perdoados, ficam ainda na alma
como que os seus resquícios – que Santo Tomás de Aquino chama
de "reliquiae peccati: relíquias do pecado" (S. Th., III, q. 86, a. 5). O
combate a essas inclinações parte sobretudo da pessoa, que é
chamada ao jejum, à penitência e à oração para ascender ativamente
na vida em Deus.

A segunda conversão é a passagem para a via iluminativa e dá início


a uma fase eminentemente mística do caminho de perfeição. A partir
de agora, mais do que uma determinação pessoal, é o penitente
quem vai sofrer as ações de Deus. Também chamada de "noite
escura dos sentidos", essa segunda conversão faz com que a
pessoa experimente provações para purificar a sua fé. Estas podem
ser de vários tipos: aridez na oração, enfermidades físicas,
perseguições, ou mesmo fracassos profissionais, tudo para tirar as
escoras de sua fé e fazê-la pender totalmente de Deus. A alma deixa
de ter "razões" para crer e a sua razão passa a ser unicamente Deus
mesmo.
Essa segunda conversão é necessária porque, depois de combater
os pecados capitais mais grosseiros – como são, por exemplo, a
gula, a luxúria, a ira e a avareza –, fica na pessoa a tentação da
vaidade e da soberba, rainha de todos os vícios. Quem começa a
deixar as obras da carne e progredir nas virtudes precisa ter
consciência clara de sua miséria e de que nada pode operar senão
pela graça de Deus, fugindo da armadilha de procurar a própria
glória e a própria excelência. Depois que, por assim dizer, a pessoa
limpou as suas vestes por seu próprio esforço, agora é Deus quem
entra para alvejar e purificá-las.

Não se trata de uma purificação total porque também há grandes


padecimentos que se experimentam na via iluminativa, como
comprova a vida dos santos. Além disso, se Deus permitir, a alma
ainda pode passar por uma terceira conversão, chamada de "noite
escura do espírito", e entrar na última das três idades da vida interior,
que é a dos perfeitos. Como só almas verdadeiramente eleitas
realizam essa passagem, não é este o lugar nem o momento
apropriado para esse assunto.

Importa, por fim, fazer uma breve descrição da via iluminativa, cuja
característica fundamental é a manifestação ordinária dos dons do
Espírito Santo. Esses dons, embora já estejam presentes em toda
alma em estado de graça, só começam a aparecer de modo patente
e constante na idade dos progredidos, tornando-os capazes de
ações realmente divinas. Não se trata dos mesmos carismas a que
São Paulo faz referência em 1 Cor 12: enquanto estes são
concedidos por Deus para a utilidade comum dos fiéis, aqueles
fazem parte do organismo sobrenatural que é a graça santificante, e
que, por si mesma, é muito maior do que todas as graças gratis
datae enumeradas pelo Apóstolo (cf.S. Th., I-II, q. 111, a. 4-5).

Os dons em questão somam sete e seu elenco é extraído das


próprias Escrituras (cf. Is 11, 1-3): são a sabedoria, a inteligência, o
conselho, a fortaleza, a ciência, a piedade e o temor de Deus. Deles,
o primeiro a manifestar-se na alma em processo de santificação é o
temor de Deus, considerado pelo Autor Sagrado "o princípio do
saber" (Pr 9, 10). É diferente do escrúpulo, porque este perturba a
alma e a acabrunha, enquanto o temor de Deus verdadeiramente
dispõe a pessoa ao Seu serviço, inspirando o horror de ofendê-Lo.
Depois, vão aparecendo os outros dons, o da piedade, o da fortaleza
etc., que vão pouco a pouco transformando a pessoa em Cristo.

Este, contudo, é tema para aprofundar em um próximo curso, sobre


as virtudes e os dons do Espírito Santo.

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