KALEVALA
"Terra de Kalevi" o Épico Finlandês em Prosa.
RUNA I
NASCIMENTO DE VÄINÄMÖINEN.
NO passado distante, existiu uma
donzela muito bela, conhecida
como Filha do Éter, que viveu por
muitas eras nas vastas extensões
do céu, sobre pradarias ainda não
conhecidas.
2 Contudo, sua existência se tor-
nou cansativa e triste, e ela acabou
vivendo sozinha por muitas eras
nos espaços infinitos acima da es-
puma do mar, em uma solidão no
éter.
3 Desesperada, ela desceu ao
oceano, sinalizando sua carruagem
e deitando em seu leito.
4 Então, o vento crescente de
uma tempestade violenta soprando
do leste chicoteou o oceano em on-
das, jogando-a para lá e para cá,
cercada pela tempestade e pelas
ondas ondulantes, incapaz de subir
à superfície.
5 Por setecentos anos, ela vagou
pelo oceano, nadando aqui e ali,
consciente apenas do seu trabalho,
antes que finalmente desse à luz
seu primogênito, após nove anos
da existência humana.
6 Nadou como uma mãe d'água
em todas as direções do mar, as-
a
O Grande Espírito da mitologia finlandesa; sua morada é em Jumala.
Ukko – nome masculino que significa “velho” em finlandês
sustada com a luta dos ventos tem-
pestuosos, nadando incessante-
mente antes que seu primogênito
nascesse.
7 A mulher começou a chorar su-
avemente e expressou sua tristeza
com estas palavras pesadas no co-
ração:
8 "Sinto-me profundamente infe-
liz e amaldiçoada pela vida que te-
nho.
9 Como pude acabar nesta situa-
ção? Deixei meu lar celestial no
éter e vim habitar no meio do oce-
ano, onde sou jogada pelas ondas e
balançada pelos ventos e águas.
10 Só conheço dor e problemas
nesta vastidão salgada.
11 Seria muito melhor para mim,
ó Ukkoa, se eu fosse uma donzela
no éter, em vez de me tornar uma
mãe d'água neste mundo frio e
triste.
12 Cada movimento é doloroso e
sinto sofrimento constante en-
quanto permaneço nas águas e va-
gueio pelo oceano.
13 Imploro a ti, ó Deus, gover-
nante dos céus, que venhas até
aqui e me ajudes a me livrar desse
sofrimento e trabalho de parto.
 14 Venha o mais rápido possível,
para que possa me libertar dessa si-
tuação difícil e ajude esta donzela
indefesa!"
15 Quando a donzela celestial
parou de fazer suas súplicas, não
demorou muito antes que um belo
pato descesse dos céus e voasse
apressadamente em direção à mãe
d'água.
16 Ele voou para lá e para cá,
procurando um lugar seguro para
fazer seu ninho.
17 Ele procurou por uma colina
gramada ou por qualquer pedaço
de vegetação que pudesse encon-
trar, mas não teve sorte.
18 Infelizmente, ele não encon-
trou um lugar protegido ou ade-
quado para construir seu ninho em
segurança.
19 Enquanto voava lentamente e
olhava ao redor, o pato começou a
pensar em voz alta e a debater con-
sigo mesmo:
20 "Será que devo construir mi-
nha morada nos ventos ou em meio
às enchentes? Certamente, os ven-
tos iriam destruí-la e as ondas a le-
variam para longe".
21 A filha do Éter, também co-
nhecida como mãe d'água, levan-
tou seus ombros e joelhos acima da
superfície do oceano para permitir
que o pato construísse um ninho
seguro em sua proteção.
22 Voando lentamente, o pato
notou os ombros e joelhos da mãe
d'água e pensou que eram colinas
gramadas no fundo do oceano.
23 Aproveitando o local de nidi-
ficação seguro, o pato colocou seis
ovos de ouro e um de ferro, que a
mãe d'água chocou com o calor de
seus joelhos e ombros.
24 Após três dias, os ovos eclo-
diram, mas a mãe d'água ficou com
fogo em suas veias, e a donzela
moveu seus ombros, sacudindo o
ninho e fazendo com que os ovos
caíssem no oceano, onde se trans-
formaram em fragmentos que se
uniram para formar a abóbada in-
ferior e superior da Terra e do Céu,
respectivamente.
25 Os raios da lua, a luz do sol e
das estrelas, e as nuvens também
foram formados a partir dos ovos.
26 O tempo passou rapidamente,
e o brilho do sol e da lua continuou
a iluminar os dias e as noites.
27 E a filha do Éter, como uma
mãe d'água, nadou pelo mar com
as inundações diante dela e o céu e
oceano atrás.
28 Depois de nove anos, final-
mente no verão do décimo ano, ela
ergueu sua cabeça acima da super-
fície, levantando sua testa das
águas para começar seus trabalhos
de criação nas cristas de águas
azuis e nas poderosas águas em
desperdício diante dela.
29 Onde ela virou sua mão na
água, uma colina fértil surgiu, e
onde ela descansou seu pé, ela faz
um buraco para os peixes.
30 Quando ela mergulhava nas
águas, ela descia nas muitas pro-
fundezas do oceano.
 31 Quando ela virou de lado, as
margens niveladas subiram, e onde
sua cabeça apontava para a terra,
amplas baías e enseadas surgiram.
32 Quando nadava uma distância
da costa e descansava de costas,
ela criava rochas e moldava recifes
ocultos, onde muitos navios nau-
fragaram e muitas vidas foram per-
didas.
33 Assim as ilhas foram criadas
e as rochas foram fixadas no vasto
oceano.
34 Os pilares do céu foram plan-
tados e os campos e florestas fo-
ram criados.
35 As pedras quadriculadas de
muitas cores brilhavam sob o sol
prateado e todas as rochas perma-
neceram bem estabelecidas.
36 Mas Väinämöinena, o cantor
velho e fiel, ainda não havia con-
templado a luz do sol ou visto o
luar dourado.
37 Ele demorou trinta verões e
trinta invernos em sua masmorra,
pacífico na imensidão das águas
no amplo seio do mar.
38 Por muito tempo, ele conside-
rou como não nascer para viver e
florescer nos espaços envoltos em
escuridão, em limites desconfortá-
veis, onde ele não havia visto o
luar ou o sol prateado.
39 Então ele clamou:
40 "Leve-me, ó Lua, eu te rogo,
leve-me.
a
O herói principal do Kalevala; o herói de Vainola (Vainola), cuja mãe, Ilmatar,
caiu do ar no oceano. Väinämöinen – nome masculino impronunciável em portu-
guês que significa “rio largo e de fluxo lento”.
41 Leve-me, tu, ó Sol acima de
mim.
42 Leve-me, tu, ó Ursa do céu.
43 Liberte-me desta escuridão e
prisão triste, destes portais impró-
prios, deste lugar estreito de des-
canso, desta morada escura e som-
bria.
44 Deixe-me vagar pelo oceano,
caminhar sobre as ilhas e na terra
seca.
45 Quero caminhar como um an-
tigo herói, respirar o ar livre e ver
a lua ao entardecer, a luz prateada
do sol e a Ursa Maior, para que eu
possa contemplar as estrelas."
46 Quando a Lua se recusou a li-
bertá-lo, o Sol não quis ajudar e
nem a Ursa Maior ofereceu assis-
tência, ele sentiu seu fardo e sua
vida se tornou apenas um aborreci-
mento.
47 Então, ele decidiu explodir os
portais externos de sua escura e
sombria fortaleza, usando seu
dedo forte, mas sem nome, para
abrir a fechadura resistente.
48 Com os dedos do pé esquerdo
e da mão direita, ele rastejou atra-
vés dos portais maleáveis até che-
gar ao limiar de sua morada.
49 Ajoelhado na soleira, ele se
lançou para frente, mergulhando
nas profundezas do oceano, gi-
rando com as mãos na água, explo-
rando seu novo ambiente ao nadar
para o norte, sul, leste ou oeste.
 Väinämöinën nasce. Nikolai Kochergin.

50 Assim o nosso herói final- libertado da sua mãe Ilmatara, a fi-

mente chegou à água e descansou
lá por cinco anos.
51 Depois, passou seis longos
anos e até sete anos no oceano, até
o outono do oitavo ano.
52 Foi quando ele finalmente
deixou as águas e chegou a uma
costa desprovida de verdura em
um promontório.
53 De joelhos no chão ele plan-
tou seu pé direito na terra sólida,
movendo rapidamente suas mãos
sobre ela.
54 Em seguida, ele ficou ereto
para ver o sol, o luar dourado, a
Grande Ursa e as estrelas.
55 Esse nosso herói é Väinämöi-
nen, o maravilhoso mago, que foi
lha do Éter.
RUNA II.
SEMEAGEM DE VÄINÄMÖINEN.
Então o velho Väinämöinen
emergiu com seus pés sobre uma
ilha vasta e desprovida de vegeta-
ção, banhada pelo oceano.
2 Ele permaneceu na ilha por
muitos verões e invernos, refle-
tindo longamente sobre quem de-
veria semear a ilha e espalhar as
sementes.
3 Finalmente, ele pensou em Pel-
lerwoinenb, o primogênito das pla-

a
Ilmatar – nome feminino que também é derivado do finlandês “ilma”, que signi-
fica “ar”. Ilmatar é uma deusa semi-andrógina(?) dos céus. Ela é a mãe de Ilmari-
nen, Väinämöinen e Lemminkäinen.
b
O semeador das florestas.
nícies e pradarias, e um menino es-
guio chamado Sampsaa, que deve-
ria semear a ilha deserta com as se-
mentes da floresta.
4 Pellerwoinen concordou e se-
meou diligentemente a ilha, espa-
lhando sementes em todos os pân-
tanos, planícies, montanhas e va-
les.
5 Logo, as sementes férteis bro-
taram, as árvores da floresta cres-
ceram, as copas dos abetos apare-
ceram e os pinheiros se espalha-
ram.
6 Os vidoeiros surgiram de todos
os pântanos, os amieiros cresce-
ram no solo solto e as tílias no solo
maduro.
Pellerwoinen semea. Nikolai Kochergin.
a
Um sinônimo de Pellerwoinen.
7 Os zimbros também cresce-
ram, com bagas agrupadas nos ra-
mos de espinheiro.
8 Este foi o trabalho de Peller-
voinen, o menino esguio Sampsa,
em sua infância.
9 Neste momento, o herói cha-
mado Väinämöinen se levanta para
observar ao seu redor.
10 Ele observa como as semen-
tes plantadas por Sampsa estão
crescendo e como a colheita de
Pellerwoinen está prosperando.
11 Väinämöinen vê as árvores
jovens se espalhando densamente
e a floresta se tornando mais bo-
nita.
12 No entanto, ele percebe que o
carvalho não brotou ainda.
 13 A árvore do céu ainda está
dormindo dentro da bolota, desfru-
tando de sua própria felicidade.
14 Por isso, Väinämöinen espera
por mais três noites e outros tantos
dias.
15 Ele espera até que uma se-
mana tenha passado e examina o
trabalho novamente.
16 Infelizmente, o carvalho
ainda não havia crescido e não ha-
via deixado sua morada de bolota.
17 Väinämöinen, um herói an-
tigo, estava observando quatro
donzelas à distância.
18 As donzelas eram noivas da
água e ele viu uma quinta donzela
na praia macia e arenosa, cercada
por grama orvalhada e flores, perto
das florestas da ilha, estendendo-
se em direção ao mar.
19 Algumas das donzelas esta-
vam ceifando, enquanto outras
juntavam o que havia sido cortado,
formando uma leira no prado.
20 Do fundo do oceano, emergiu
um imponente gigante chamado
Tursasa, que era forte e robusto.
21 Ele pisoteou e comprimiu
toda a grama que as donzelas ha-
viam recolhido.
22 Enquanto isso, um fogo acen-
deu-se dentro delas, fazendo as
chamas subirem até o céu e redu-
zindo as pilhas de grama a cinzas.
23 Nesse local, tenro espalhou as
sementes dos gigantes, plantando
a
O mesmo que Iku-Turso. Um gigante maligno do mar.
b
Um sinônimo de Ilmatar, a mãe de Väinämöinen.
c
Uma das donzelas místicas e enfermeira de Väinämöinen
uma bolota que brotou rapida-
mente e se tornou um majestoso
carvalho, alimentado pelo solo
rico em cinzas que as donzelas ha-
viam lavado da água.
24 O carvalho cresceu com mui-
tos galhos que se espalharam am-
plamente, elevando-o acima das
nuvens de tempestade.
25 Seus galhos se estendiam para
as nuvens brancas no céu, e suas
folhas eram tão densas que bloque-
avam a luz do sol, os raios da lua e
até mesmo a luz das estrelas no
céu.
26 Väinämöinen, refletiu por um
momento e ponderou cuidadosa-
mente sobre como derrubar o po-
deroso carvalho que havia sido cri-
ado para seu deleite.
27 Ele pensou em como cortar os
cem galhos da majestosa árvore.
28 Ele refletiu sobre como a vida
dos homens e dos heróis seria triste
e como o lar dos habitantes do oce-
ano seria triste se o sol não bri-
lhasse sobre eles e se a luz da lua
não os alegrasse.
29 Ele considerou que nenhum
herói poderoso havia nascido para
derrubar o poderoso carvalho e
cortar seus cem galhos.
30 Depois de refletir profunda-
mente, Väinämöinen disse em voz
alta: "Kapéb, filha do Éter, antiga
mãe do meu ser, Luonnotarc, mi-
nha enfermeira e ajudante, em-
prestem-me as forças da água, que
possuem grandes poderes.
31 Conceda-me a força dos oce-
anos para derrubar este poderoso
carvalho e arrancar esta árvore do
mal, para que a luz do sol brilhe
novamente e a lua possa brilhar
mais uma vez."
32 Imediatamente uma forma
dos oceanos surgiu, ergueu-se um
herói das águas.
33 Este herói não pertencia aos
maiores nem aos menores, mas ti-
nha um tamanho longo como o
dedo indicador de um homem e
mais alto do que a mão de uma mu-
lher.
34 Ele usava um gorro, botas, lu-
vas, listras e um cinto de cobre,
além de carregar uma machadinha
com cabo do tamanho de uma mão
de mulher e uma lâmina com a lar-
gura de um dedo.
35 O fiel Väinämöinen observou
o herói com atenção e perguntou:
"És tu, senhor, divino ou humano?
Qual destes apenas conheces?
36 Diga-me qual é o teu nome e
posição.
37 Pareces-te muito com um ho-
mem, tens o porte de um herói,
embora do comprimento do dedo
indicador de um homem, tão es-
casso quanto alto como casco de
rena."
38 Väinämöinen dirigiu-se nova-
mente à figura emergente do oce-
ano e expressou: "Eu acredito que
tu sejas um ser humano, descen-
dente dos heróis-pigmeus.
39 No entanto, é possível que es-
teja já sem vida ou em estado mo-
ribundo, incapaz de fazer algo
além de sucumbir."
40 O herói pigmeu respondeu ao
valente Väinämöinen: "Verdadei-
ramente sou um deus e um herói
das tribos que governam o oceano.
41 Vim até aqui com o propósito
de derrubar o carvalho e cortar
seus galhos com a minha machadi-
nha."
42 Väinämöinen, responde ao
herói nascido no mar: "Devo lhe
dizer que nunca houve em ti a
força necessária, nem mesmo te foi
concedida a capacidade para arran-
car esse poderoso carvalho, para
derrubar essa coisa maléfica, tam-
pouco para cortar seus cem ra-
mos."
43 Enquanto ele terminava de fa-
lar, suas pálpebras permaneciam
imóveis e o pigmeu já se transfor-
mara em um gigante poderoso.
44 Com apenas um passo, ele
deixou o oceano e se estabeleceu
como um herói nos campos da flo-
resta ao redor.
45 Com sua cabeça perfurando
as nuvens e sua barba estendendo-
se até os joelhos, seus cabelos ca-
íam até os tornozelos e seus olhos
e pés estavam a uma grande distân-
cia.
46 Seus ombros eram ainda mais
distantes.
 47 Sem perder tempo, ele come-
çou a afiar seu machado com seis
blocos duros de arenito e sete pe-
dras de amolar mais macias.
48 Com suas vestes longas e es-
paçosas batendo nos ventos do
céu, ele se posicionou ao lado do
carvalho.
49 Com seu segundo passo, ele
chegou à terra escura e com o ter-
ceiro, alcançou os galhos do carva-
lho.
50 Usando seu machado afiado,
ele golpeou o tronco com um golpe
poderoso e o cortou com o se-
gundo golpe.
51 Ao descer com a terceira vez,
faíscas voaram para cima, incendi-
ando o carvalho.
52 Antes de descer pela quarta
vez, a árvore havia produzido cem
ramos, sacudindo a terra e o céu ao
cair.
53 Seus galhos se estendiam para
o leste e as copas das árvores voa-
vam para o oeste.
54 As folhas foram espalhadas
para o sul e os cem galhos foram
para o norte.
55 Aqueles que tomaram um ga-
lho alcançaram o bem-estar eterno,
enquanto aqueles que se segura-
ram no topo da árvore obtiveram o
poder da magia.
56 Aqueles que colheram a fo-
lhagem experimentaram um de-
leite que nunca cessou.
57 Algumas lascas foram espa-
lhadas e levadas para as terras do
a
A Terra do Norte; Lapônia.
norte pelos ventos da tempestade e
correntes oceânicas.
58 Na Terra do Norte, a bela e es-
belta donzela estava lavando um
cocar na praia.
59 Ela batia suas vestes nas ro-
chas e enxaguava seu vestido de
seda nas águas de Pohyolaa.
60 Foi nesse momento que ela
avistou as lascas sendo levadas pe-
los ventos e águas.
61 Decidida, ela juntou as lascas
em um saco e as levou para o an-
tigo pátio.
62 Lá, ela pretendia fazer flechas
encantadas para o grande mago,
transformando as lascas em armas
para o hábil arqueiro.
63 Isso porque o poderoso carva-
lho havia caído, perdendo seus
cem galhos, e era importante que o
Norte pudesse ver o sol e o suave
brilho do luar, permitindo que as
nuvens mantivessem seus cursos e
a abóbada do céu fosse estendida
sobre cada lago e rio, bem como
sobre as margens de cada ilha.
64 A beleza variada dos bosques
surgiu e as florestas cresceram de
maneira encantadora.
65 Vinhas e flores voltaram a
brotar.
66 Os pássaros voltaram a cantar
nas copas das árvores, com alegres
tordos e cucos nas bétulas.
67 Bagas cresceram nas monta-
nhas, flores douradas apareceram
nos prados e diversas ervas de
 A Àguia parabeniza Väinämoinën por sua sabedoria. Nikolai Kochergin.
muitas cores surgiram, juntamente
com diversos tipos de vegetação.
68 Entretanto, lamentavelmente,
a cevada não está crescendo.
69 Väinämöinen, após partir re-
flete cuidadosamente.
70 Pelas margens das águas, en-
controu seis sementes de cevada
dourada, além de sete grãos ama-
durecidos na costa superior da
a
Frequentemente usado para Kaleva.
b
Terra do Norte, na beira da areia
do oceano.
71 Ele escondeu essas sementes
em suas bolsas de confiança, feitas
de pele de esquilo, algumas delas
confeccionadas com pele de marta.
72 Com pressa, espalhou as se-
mentes e plantou rapidamente os
grãos de cevada nas margens das
águas de Kaleva, nas colinas e pla-
nícies de Osmab.
 73 ouça! O chapim emite seus
gritos desordenados a partir do
álamo, dizendo: "A colheita de ce-
vada em Osma e Vainolaa será im-
pedida, caso o terreno não seja de-
vidamente preparado e a floresta
nivelada, além da queima dos ga-
lhos até se transformarem em cin-
zas."
74 Väinämöinen, decidiu cons-
truir para si um machado com o
objetivo de cortar árvores na flo-
resta.
75 Ele então começou a executar
sua tarefa, limpando e nivelando as
árvores.
76 Com grande habilidade, ele
derrubou árvores de todas as espé-
cies, exceto a bétula, que ele dei-
xou como um local de descanso
para os pássaros.
77 Esse espaço especial foi re-
servado para que o cuco pudesse
cantar com sua voz doce, já que
esta é uma ave sagrada e os ramos
da bétula são considerados sagra-
dos.
78 Uma águia desceu dos céus e
voou pelo ar para poder observar.
79 Então, ela disse: "Por que, an-
tigo Väinämöinen, deixaste a
bétula em pé e não a derrubou?"
80 Väinämöinen respondeu:
"Deixei a bétula em pé para que os
pássaros pudessem descansar nela,
e para que o cuco pudesse cantar
seu canto sagrado".
81 A águia respondeu: "Seu jul-
gamento foi sábio ao deixar a
a
A casa de Väinämöinen e seu povo; um sinônimo de Kalevala
bétula em pé, como um lugar de
descanso para os cucos e todos os
pássaros, até eu posso descansar
sobre ela".
82 Väinämöinen, traz consigo
seus grãos mágicos de cevada.
83 Ele carrega consigo sete se-
mentes de grãos em suas bolsas
confiáveis, feitas de pele de es-
quilo e algumas de pele de marta.
84 Ele se apressa para semear
suas sementes, espalhando os
grãos de cevada com diligência.
85 Enquanto o faz, ele diz para si
mesmo: "Eu as sementes da vida
estou semeando, por entre meus
dedos abertos, com a ajuda do meu
Criador, neste solo enriquecido
com cinzas, brotem e floresçam
neste solo.
86 Mãe antiga, tu que vives
abaixo da terra e do oceano, a mãe
dos campos e florestas, traz um
solo rico e faça a cevada florescer.
87 Peço-te que traga os grãos da
semente ao broto para que a ce-
vada possa crescer.
88 A terra nunca produzirá ce-
vada madura e nutritiva sem ajuda.
Sua força nunca faltará se os doa-
dores derem assistência, agracia-
rem a semeadura e agradecerem as
filhas da criação.
89 Que a terra se erga do seu
sono, despertando da terra ador-
mecida das eras.
90 Que os grãos de cevada come-
cem a brotar, as folhas cresçam e
os caules verdejantes se elevem.
 91 Que as próprias espigas se de-
senvolvam e produzam cem vezes
mais, resultado de meu habilidoso
e honesto labor em cultivar a la-
voura e semeadura.
92 Ukko, tu ó Deus acima, tu, ó
Pai dos céus, que vives no alto do
Éter; que limitas todas a nuvens do
céu; enviai nuvens de chuva do
leste, nordeste, oeste e noroeste, e
do sul uma quente nuvem; para
que do céu caia a chuva, e as nu-
vens derramem seu mel, para que
os espigas encham e amadureçam,
e os campos de cevada farfalhem."
93 Ukko, o pai dos céus, man-
teve seu conselho no espaço da nu-
vem e deu bons conselhos no Éter.
94 Ele enviou nuvens de diferen-
tes direções - do leste, nordeste,
oeste, noroeste e sul - para unir e
costurar todas as arestas, formando
uma grande nuvem que foi lançada
para a terra.
95 A nuvem de chuva caiu rapi-
damente, deixando cair suas gotas
como mel, para que as espigas de
cevada pudessem amadurecer ra-
pidamente.
96 As sementes de cevada cres-
ceram, desdobrando-se, e as espi-
gas coloridas surgiram, brotando
do rico solo do pousio, do trabalho
habilidoso e honesto de Väinämöi-
nen.
97 Alguns dias passam desperce-
bidos, e tantas outras noites voam
rapidamente.
98 Após a viagem do sétimo dia,
na manhã do oitavo dia, o sábio e
ancião Väinämöinen foi inspecio-
nar sua plantação de cevada para
verificar o resultado de seu traba-
lho com o arado e a semeadura.
99 Ele ficou satisfeito ao encon-
trar a cevada crescendo forte, com
nós triplos e espigas de seis lados.
100 Väinämöinen, o idoso e leal,
virou sua face e observou ao redor.
101 E eis que surge um cuco da
primavera, que observa a graciosa
bétula e repousa sobre ela, can-
tando docemente: "Por que a
bétula prateada foi deixada ilesa
enquanto toda a floresta foi cor-
tada?", questionou ao antigo
Väinämöinen.
102 Ele respondeu: "Eu deixei a
bétula intocada para que pudesse
crescer sozinha, se tornando um lar
para ti, ó cuco de voz doce, para
cantar alegremente.
103 Cante aqui com sua garganta
de veludo, com sua voz de prata,
tocando a flauta dourada do cuco.
104 Cante pela manhã, à noite,
na hora do meio-dia, para que as
florestas cresçam melhor, a cevada
amadureça, o Norte fique mais rico
e Kalevala seja preenchida com
alegria."
RUNA III.
VÄINÄMÖINEN E YOUKAHAINEN.
Väinämöinen, o antigo menes-
trel, passou sua vida em plena sa-
tisfação nos prados de Vainola e
nas planícies de Kalevala.
Ele cantava lendas sempre maravi-
lhosas e canções de sabedoria e sa-
gacidade antigas, cantando um dia,
depois um segundo, e até mesmo
no crepúsculo da noite, cantando
até o amanhecer.
2 Ele cantava os contos de heróis
dos velhos tempos e contos de eras
há muito esquecidos, bem como as
lendas da criação.
3 Antigamente, essas lendas
eram familiares às crianças, mas
agora nossos filhos não as cantam
mais.
4 Muitos heróis já cantaram
parte dessas lendas, especialmente
nestes tristes dias de maldade em
que nossa raça se abateu.
5 Por toda parte, a história viajou
e homens distantes espalharam o
conhecimento do canto do herói e
da canção de Väinämöinen.
6 Os ecos foram ouvidos ao sul e
toda a Terra do Norte ouviu a his-
tória.
7 Na distante e sombria Terra do
Norte, habitava o jovem e impru-
dente menestrel da Lapônia, cha-
mado Youkahainena, que, certa
vez, durante um banquete com
seus amigos e companheiros, ou-
viu a história de um cantor mais
doce e hábil em cantar lendas do
que ele próprio.
8 Esse cantor vivia nos prados de
Vainola, nas planícies de Kalevala,
e era ainda mais habilidoso do que
aquele que ensinara Youkahainen.
a
Um célebre menestrel de Pohyola.
9 Imediatamente, o bardo sentiu-
se enfurecido, e a inveja começou
a crescer em seu peito.
10 Ele invejou Väinämöinen, fa-
moso por sua habilidade como
cantor, cuja doçura superava a sua
própria. E
11 le apressou-se em procurar
sua mãe, que era sábia, e jurou que
viajaria para o sul, levando con-
sigo sua habilidade como bardo.
12 Ele pretendia competir com
Väinämöinen em uma batalha nas
habitações de Vainola, nas caba-
nas da Terra do Norte.
13 "Não", responde o pai ansi-
oso, "não vá para Kalevala."
14 A mãe, tomada por temor,
respondeu: "Não, não vá até onde
está Väinämöinen, lá para desfiá-
lo para uma batalha.
15 Com seu canto, ele é capaz de
encantá-lo e enfeitiçá-lo, levando-
o de volta com desonra e fazendo-
o afundar na neve Congère.
16 Além disso, seus dedos e pés
flexíveis serão transformados em
gelo."
17 Estas são as palavras de You-
kahainen:"É benéfico receber o
julgamento de um pai, mas ainda
melhor é receber o conselho de
uma mãe.
18 No entanto, a melhor opção é
tomar sua própria decisão.
19 Eu pretendo enfrentar o me-
nestrel e desafiá-lo em uma com-
petição de canto.
 20 Irei desafiá-lo como bardo
para a batalha, e cantarei para ele
meus doces compassos, lendas
mais antigas e sabedoria acumu-
lada.
21 Que o famoso bardo de Su-
omi, que é considerado o melhor
dos cantores, seja derrotado na
competição e se torne um infeliz
menestrel.
22 Através de minhas canções,
vou transformá-lo para que seus
pés sejam como pedra de peder-
neira e suas vestes inferiores como
carvalho.
23 Este famoso cantor, assim en-
feitiçado, carregará sempre em seu
coração um fardo de pedra, em seu
arco de ombro de mármore, em sua
mão uma manopla de pederneira e
em sua testa uma viseira de pedra."
24 O feiticeiro Youkahainen não
deu ouvidos aos conselhos pater-
nais e maternos e conduziu seu
corcel, cujas narinas exalavam
fogo e cascos soltavam faíscas,
saindo de seu estábulo.
25 Prendeu-o a seu trenó dou-
rado e, impetuoso, montou-o sobre
a neve, saltando sobre o último
banco cruzado.
26 Com seu chicote de bétula es-
maltado de pérola, bateu no corcel,
que imediatamente partiu em sua
jornada em direção ao norte, galo-
pando incessantemente durante
todo o dia e nos dias seguintes.
27 Após três dias, ao anoitecer,
chegou aos prados de Vainola, nas
planícies de Kalevala.
28 O correu que Väinämöinen, o
mágico, cavalgava durante o pôr
do sol ao longo da estrada.
 29 Ele conduzia seu cavalo com
prazer e silenciosamente percorria
as pacíficas campinas de Vainola e
as planícies de Kalevala.
30 O jovem e ardente Youkahai-
nen, impulsionado por sua monta-
ria espumante, avança com ímpeto
contra o cantor, sem desviar o seu
curso.
31 O encontro é inevitável e os
eixos se chocam violentamente,
resultando no emaranhamento dos
hames, colares, rédeas e tirantes
dos cavalos.
32 A força do impacto faz com
que ambos parem bruscamente e
observem a situação.
33 Nesse momento, gotas de
água escorrem do arreio e do cola-
rinho, enquanto vapores se elevam
das narinas dos cavalos.
34 Fala o menestrel, Väinämöi-
nen: "Quem és tu, e de onde? Pois,
tu vens como um jovem estupido,
descuidado e atiraste-te em minha
direção.
35 Destruíste minhas flechas e
trilhos, arruinando o colarinho do
meu piloto.
36 Além disso, meu trenó dou-
rado encontra-se em pedaços, com
sua caixa e patins quebrados."
37 Youkahainen então responde,
disse finalmente as palavras que se
seguem: "Eu sou o jovem You-
kahainen, mas primeira responda:
38 quem és, de onde vens, para
onde vais, e de que tribo humilde
descendes?"
39 Vainamoinen, sábio e ancião,
respondeu assim ao jovem menes-
trel: "Se tu és apenas Youkahai-
nen, então és obrigado a me conce-
der toda a estrada, já que sou mui-
tos anos mais velho que tu."
40 Em seguida, o arrogante You-
kahainen dirigiu-se novamente a
Väinämöinen e proferiu as seguin-
tes palavras: "Não importa se é jo-
vem ou velho, a idade não tem
grande relevância.
41 O que importa é a sabedoria
e conhecimento de cada um, e
aquele que possui maior sabedoria
e conhecimento, e é um bom can-
tor, será o responsável por liderar
o caminho, enquanto o outro se-
guirá atrás.
42 És tu o famoso mago e menes-
trel Väinämöinen? Então vamos
começar a cantar as nossas antigas
lendas e a sabedoria que acumula-
mos ao longo do tempo, para que
possamos ouvir um ao outro e jul-
gar um ao outro em uma competi-
ção de provérbios mágicos."
43 Väinämöinen assim respon-
deu em tom modesto: "O pouco
que sei não é suficiente para ser
digno de ser cantado, e mesmo
meu canto não é grandioso.
44 Tenho passado todos os meus
dias na fria e sombria Terra do
Norte, em uma terra desolada e so-
litária onde moro em minha casa
de campo.
45 As canções que reuni são sim-
ples e repetitivas, muitas delas na
medida do cuco, e eu mal consigo
me lembrar delas.
 46 No entanto, como tu exigiste
arrogante um desafio, eu o aceito.
47 Então, diga-me agora, jovem
cheio de sabedoria, o que tu sabes
além dos outros, abra agora teu es-
toque de conhecimento."
48 A resposta de Youkahainen, o
jovem e impetuoso menestrel da
Lapônia, foi a seguinte:"Eu possuo
um vasto conhecimento adquirido
ao longo dos anos, e posso afirmar
com clareza absoluta que cada te-
lhado deve ser dotado de uma cha-
miné, bem como cada lareira deve
possuir uma pedra específica para
sua construção.
49 As vidas das focas são reple-
tas de liberdade e alegria, enquanto
as morsas desfrutam de uma vida
feliz alimentando-se de salmões
descuidados e banqueteando-se di-
ariamente com percas e badejos.
50 Os badejos preferem viver em
áreas rasas e tranquilas, enquanto
os salmões encontram seu lar em
fundos planos.
51 O lúcio realiza a desova em
climas frios e desafia as tempesta-
des de inverno.
52 No outono, os poleiros nadam
lentamente, com as costas tortas,
caçando em águas profundas.
53 Durante o verão, eles deso-
vam em águas rasas e saltam na
costa do oceano.
a
Uma montanha da Finlândia.
b
Um lago na Finlândia.
c
Ja'men (Ya'men). Um rio da Finlândia.
d
Kar-ja'la, (karya'la). A sede da cachoeira, Kaatrakoski.
e
O mesmo que Wuoksen (Vuoksen).
54 Caso essa sabedoria seja con-
siderada insuficiente, posso com-
partilhar outros assuntos e dizeres
mágicos.
55 Por exemplo, todos os ho-
mens do Norte aram com renas,
enquanto cavalos-mães aram as
terras do Sul e a Lapônia Interior
ara com bois.
56 Conheço bem todas as árvo-
res da montanha de Pisaa, em toda
a sua grandeza, e na rocha Horna
crescem abetos altos e esguios, en-
quanto as árvores nas montanhas
são magras.
57 Há três cachoeiras, três ocea-
nos interiores e três montanhas al-
tas, atirando para a abóbada do
céu.
58 Hallapyorab está próximo de
Yaemenc, Katrakoski em Karyalad,
e a água caindo de Imatra ruge ao
cair em Wuoksie."
59 Em seguida, disse
Väinämöinën: "Contos de mulhe-
res e a sabedoria das crianças não
são do agrado de um herói barbudo
e maduro o suficiente para o casa-
mento.
60 Em vez disso, conte-me a his-
tória da criação, descreva o início
do mundo e as criaturas que nele
habitam, e apresente também algu-
mas reflexões filosóficas."
 61 Então respoudeu: "Conheço
bem sobre as fontes dos chapins,
os quais são belos passarinhos.
62 A víbora, por outro lado, é
uma serpente verde.
63 Os badejos habitam em águas
salobras, enquanto os poleiros po-
dem ser encontrados em todos os
rios.
64 É sabido que o ferro enferruja
com o tempo, e esse processo o
torna mais fraco.
65 O umber possui um sabor
amargo, e a água fervente pode ser
perigosa.
66 O fogo, por sua vez, é sempre
uma ameaça constante.
67 Como o primeiro médico é o
Criador considerado, e o mais an-
tigo remédio sendo a água, uma
das substâncias mais antigas utili-
zadas para tal.
68 A magia é tida como filha da
espuma do mar, enquanto Deus é
considerado o primeiro e melhor
conselheiro.
69 As águas brotam de cada
montanha, e o fogo desceu do céu
pela primeira vez.
70 O ferro é moldado a partir da
ferrugem, enquanto o cobre é cri-
ado a partir das rochas.
71 Os pântanos são considerados
as terras mais antigas, e o salgueiro
é a árvore que apareceu pela pri-
meira vez.
72 Os abetos foram as primeiras
casas, e as pedras ocas foram as
primeiras chaleiras."
73 Agora, assim responde
Väinämöinën à Youkahainen: "Po-
des me dar agora um pouco de sa-
bedoria? Esse absurdo é tudo o que
conheces?"
74 Respondeu Youkahainen:
"Posso te contar uma história an-
tiga sobre os tempos primordiais.
75 Contarei sobre quando eu
arava o mar salgado, varria as ilhas
e cavei grutas de salmões e caver-
nas profundas.
76 Eu também criei todos os la-
gos e empilhei as montanhas ao
seu redor, colocando rochas em
cima delas.
77 Eu estava presente como um
herói sábio e antigo, o sexto dos
heróis, e o sétimo dos heróis primi-
tivos, quando os céus foram cria-
dos e os espaços etéreos se forma-
ram.
78 Eu vi quando o céu tinha pila-
res de cristal e o belo arco-íris se
arqueava.
79 Fui testemunha da colocação
da Lua em órbita, do plantio do Sol
prateado e da estação firme da
Ursa, com as estrelas sendo asper-
gidas pelos céus."
80 Disse o antigo Väinämöinën:
"Tu és o líder dos mentirosos, o co-
mandante supremo de todos eles.
81 Nunca exististe e nunca esti-
veste presente durante a criação do
mundo.
82 Quando o mar salgado foi
arado, as ilhas cercadas pelo mar
foram escavadas, as grutas dos sal-
mões foram cavadas, as cavernas
foram escavadas, os lagos foram
criados e as montanhas foram
amontoadas ao redor deles, as ro-
chas foram empilhadas sobre elas.
83 Nunca foste visto ou ouvido
falar durante a criação da terra, dos
espaços etéreos, dos pilares de
cristal no ar, da colocação da Lua
em órbita, do plantio do Sol prate-
ado e da estação firme da Ursa
Maior, nem quando os céus foram
salpicados com estrelas."
84 Youkahainen ficou furioso
com a resposta de Väinämöinen e
retrucou: "Senhor, uma vez que
sou falho em sabedoria, ofereço-
lhe batalha com minha espada.
85 Convido-o, famoso bardo e
menestrel, o antigo cantor de ma-
ravilhas, para testar nossa força
com espadas largas.
86 Vamos colocar nossas lâmi-
nas à prova e ver quem é o mais
habilidoso."
87 Disse o antigo Väinämöinën:
"Eu não temo a tua espada, a tua
sabedoria, a tua prudência ou a tua
astúcia.
88 Não me impressionas nem um
pouco com teus desafios, pois és
apenas um fanfarrão insignifi-
cante, vaidoso e sem importância.
89 Se eu aceitar o desafio, não
será contigo, mas sim com um ad-
versário verdadeiramente digno."
90 Então, Youkahainen, com a
boca torta e rosto sarcástico, sacu-
diu seus cabelos dourados e res-
pondeu: "Aquele que evita medir a
sua própria lâmina teme testar a
sua força em batalhas maiores, en-
frentando desafios que exigem co-
ragem e habilidade.
91 É como um javali na floresta,
com medo de se arriscar e ser der-
rotado.
92 O medo e a covardia os trans-
formarão em suínos, com corações
e rostos de porcos.
93 Mas eu, através do meu canto,
irei expor esses heróis-covardes,
lançando-os para cá e para lá, pi-
sando neles na lama e no leito, tra-
tando-os como o lixo que são."
94 Väinämöinen ficou irritado e
cresceu em cólera, ficando carran-
cudo e feroz.
95 Finalmente, ele quebrou o si-
lêncio e começou a cantar um ma-
ravilhoso canto.
96 Ele não cantou histórias in-
fantis ou sagacidade das mulheres,
mas sim heróis barbudos que eram
desconhecidos pelas crianças e
donzelas, conhecidos apenas pela
metade pela noiva e pelo noivo e
em parte por muitos heróis.
97 Estes eram tempos tristes de
maldade, quando a raça estava so-
frendo.
98 Väinämöinen cantou grande-
mente até as montanhas de cobre e
as rochas duras e saliências ouvi-
rem seus tons mágicos e tremerem.
99 Os penhascos da montanha
foram despedaçados, todo o oce-
ano se ergueu e caiu, e as colinas
distantes ecoaram.
 100 Youkahainen ficou parali-
sado em silenciosa admiração, en-
quanto seu trenó com enfeites de
ouro flutuava como mato nas on-
das.
101 Väinämöinen cantou sobre
sua espada com cabo de ouro, sua
besta alegremente pintada, suas
flechas rápidas e emplumadas, seu
cachorro com focinho dobrado,
seu boné de sua testa, suas mano-
plas em juncos nas águas, sua ves-
timenta de cor púrpura em nuvens
brancas nos céus, e seu cinto cra-
vejado de joias em estrelas cinti-
lantes ao seu redor.
102 Infelizmente para Youkahai-
nen, Väinämöinen cantou sobre
ele afundando cada vez mais fundo
nas profundezas da areia move-
diça, em sua tortura, até que seu
cinto desapareceu na lama e na
água.
103 Foi só então que Youkahai-
nen compreendeu com clareza sua
loucura e o fim da jornada que ha-
via se aventurado em vão para a
glória de uma disputa com o
grande e velho Väinämöinen.
104 Quando o triste jovem You-
kahainen de Pohyola, tenta mover
seu pé direito com todas as suas
forças, porém, infelizmente, o pé
não obedece.
105 E quando ele tenta mover
seu pé esquerdo, eis que o encontra
transformado em pedra de peder-
neira.
106 Youkahainen, profunda-
mente triste e desesperado, fez
uma sincera súplica a Väinämöi-
nen: "Ó sábio e digno menestrel, és
o único verdadeiro mago.
107 Peço-te que cesse teu encan-
tamento e apenas afaste tua magia.
108 Permita-me deixar este pân-
tano de horror e liberar-me desta
prisão pedregosa e deste tormento
mortal.
109 Pagar-te-ei um resgate de
ouro."
110 O antigo Väinämöinen inda-
gou: "Indaga-me agora, qual será o
teu resgate, se eu interromper meu
encantamento, se eu renunciar à
minha magia, e te livrar do teu
pântano aterrorizante, libertando-
te da tua prisão rochosa e aliviando
o teu tormento mortal?".
111 O jovem Youkahainen res-
pondeu: "Em minha morada, pos-
suo duas bestas mágicas e um par
de arcos de poder maravilhoso.
112 Um dos arcos é tão leve que
uma criança pode dobrá-lo, en-
quanto o outro só pode ser dobrado
pela força.
113 Escolha dentre estes, o que
melhor lhe agradar."
114 Assim falou o antigo
Väinämöinen: "Eu não desejo as
tuas bestas mágicas, pois já possuo
algumas delas.
115 As tuas bestas são mais do
que inúteis para mim. Tenho arcos
em grande abundância, em cada
prego e viga.
116 Esses arcos são tão podero-
sos que superam qualquer outro
caçador, e até mesmo caçam sozi-
nhos."
 117 E aconteceu que o antigo
Väinämöinen cantou mergulhando
ainda mais na lama e na água,
ainda mais profundamente no pân-
tano do tormento o pobre You-
kahainen.
118 Assim respondeu Youkahai-
nen: "Em minha morada, possuo
duas chalupas encantadas, barcos
magníficos e admiráveis.
119 Um deles navega graciosa-
mente sobre as águas do oceano,
enquanto o outro foi confeccio-
nado para transportar cargas pesa-
das.
120 Assim, escolha entre eles
aquele que melhor lhe convier."
121 E disse o antigo Väinämöi-
nen: "Não desejo possuir as tuas
chalupas mágicas, pois já possuo o
suficiente delas.
122 Todas as minhas baías estão
cheias de chalupas, e todas as mi-
nhas costas estão alinhadas com
elas.
123 Algumas foram construídas
antes mesmo de os ventos serem
marinheiros, e outras foram feitas
para navegar contra eles."
124 Ainda aconteceu que o
bardo e menestrel de Vainola co-
meçou a cantar uma vez mais so-
bre o pobre Youkahainen, que es-
tava afundando cada vez mais
fundo em seu tormento, em areia
movediça até a altura do cinturão.
125 Diante desse sofrimento, o
bardo da Lapônia expressou sua
angústia e falou novamente para
Väinämöinen: "Em minha casa há
dois garanhões mágicos, um deles
é um piloto rápido como um raio,
e o outro foi feito para suportar far-
dos pesados.
126 Tomai o que te agrada de-
les".
127 E disse Väinämöinen: "Eu
não desejo teus garanhões, pois já
tenho o suficiente deles.
128 Meus estábulos estão reple-
tos de garanhões mágicos, co-
mendo milho em cada manjedoura
e tendo costas largas para suportar
a água.
129 Eles carregam a água em la-
cinhos em suas garupas".
130 Ainda aconteceu que o bardo
e menestrel de Vainola começou a
cantar uma vez mais sobre o pobre
Youkahainen, que estava afun-
dando cada vez mais fundo em seu
tormento, submerso até os ombros.
131 Falou Youkahainen: "Ó tu, o
antigo Väinämöinen, Tu és o único
mago verdadeiro.
132 Rogo-te que ponhas fim ao
teu encantamento.
133 Por favor, abandona a tua
magia.
134 Se o fizeres, eu te darei ouro
abundante e incontáveis depósitos
de prata brilhante.
135 Meu pai obteve essas rique-
zas através das guerras e das bata-
lhas árduas."
136 Disse Väinämöinen:"Não al-
mejo teu ouro, tampouco desejo
tua prata, pois já possuo o bastante
de ambos.
 137 Meus aposentos estão reple-
tos de ouro abundante, e sacos de
prata pendem de cada prego.
138 E o ouro cintila sob a luz so-
lar, enquanto a prata brilha sob o
luar."
139 O fanfarrão, Youkahainen,
foi submergido ainda mais profun-
damente em seu pântano de tor-
mento, afundando até o queixo em
lama e água.
140 Apesar disso, ele continuava
falando e suplicando: “Ó, tu
Väinämöinen, antigo e venerável,
és considerado o maior dentre to-
dos os magos que já existiram.
141 Imploro-te que me ergas
deste poço de desespero e agonia,
desta prisão de tormento.
142 Ofereço-te todos os meus
campos de milho e todo o meu mi-
lho armazenado em celeiros, se as-
sim puderes me resgatar desta vida
infeliz e garantir minha liberdade
eterna.”
143 Väinämöinen respondeu:
"Seja vosso milho transportado a
outros mercados e disponibilize
vossos celeiros aos necessitados.
144 Pois em verdade, possuo
grande abundância de milho e
campos em todos os bairros, de
sorte que o milho floresce em to-
dos os meus domínios.
145 Pois a colheita de alguém
sempre parecerá mais farta em
a
A irmã de Youkahainen. Aino – Nome feminino que significa "A único" em fin-
landês.
seus próprios campos, e seu pró-
prio grão sempre terá um sabor
mais doce."
146 O jovem e imprudente me-
nestrel da Lapônia, carregado de
tristeza, encontrava-se profunda-
mente afundado na lama e na água.
147 Acorrentado pelo medo e
cheio de angústia, sua barba estava
suja de lama, e sua boca, que ou-
trora era orgulhosa e cheia de algas
marinhas, agora estava enredada
na grama.
148 Nesse estado, o jovem me-
nestrel Youkahainen suplica: “Ó
antigo Väinämöinen, tu que és o
mais sábio dos cantores de sabedo-
ria, peço-te que cesse enfim teus
encantamentos e que afaste tua
magia de mim.
149 Rogo-te que restaure minha
vida anterior e me liberte deste tor-
mento sufocante.
150 Que meus olhos sejam liber-
tos da areia e água.
151 Prometo-te, em troca, minha
irmã Ainoa, a filha mais bela de
minha mãe, para ser tua noiva para
sempre e satisfazer teu prazer.
152 Ela varrerá os quartos dentro
de tua cabana, manterá tua morada
em ordem, lavará as travessas de
ouro para ti, estenderá teu sofá
com lençóis finos e tecerá cobertas
douradas para tua cama.
153 Além disso, ela assará para ti
o pão-de-mel.”
 154 Väinämöinen, o velho sábio
e fiel, tendo encontrado enfim o
resgate tão desejado: a jovem e
bela filha da Lapônia, querida irmã
de Youkahainen.
155 Feliz ele por tê-la conquis-
tado, mesmo em sua idade avan-
çada, pois ela será sua noiva para
sempre e orgulho e alegria de
Kalevala.
156 Agora, senta-se na Rocha da
Alegria, Väinämöinen alegre
canta, entoando suas canções em
três repetições para quebrar o en-
canto da magia e diminuir seu po-
der, a fim de dissipá-lo completa-
mente.
157 Quando o feitiço é quebrado,
Youkahainen, embora triste, fica
mais sábio.
158 Ele sai arrastando os pés da
areia movediça, levantando sua
barba da água.
159 Conduz seu corcel das ro-
chas, traz seu trenó de volta dos
juncos, chama seu chicote de volta
do oceano e coloca seu trenó dou-
rado em ordem.
160 Em seguida, ele se joga no
banco cruzado, estala seu chicote e
o leva de volta para casa, apres-
sando-se com o coração pesado.
161 Ao chegar em casa, ele en-
contra sua mãe, a mãe de Aino,
grisalha e idosa, e fica ainda mais
triste.
162 Desatento, ele se aproxima
de sua casa fazendo barulho e al-
voroço, e acaba dirigindo impru-
dentemente contra a cobertura,
quebrando as hastes contra os por-
tais e destruindo em pedaços seu
belo trenó.
163 Então a mãe, percebendo ra-
pidamente o ocorrido, repreendeu-
lo-ia por sua imprudência.
164 No entanto, o pai inter-
rompe: "Por que destruíste teu
trenó de neve? Por que destruíste
tuas colinas? Por que retornaste
para casa de forma tão estranha?
165 Qual é a razão por trás de teu
comportamento rude e selvagem?"
166 E aconteceu que Youkahai-
nen, que estava com o boné torto
na testa, caiu em pranto e seu cora-
ção se partiu.
167 Sua cabeça ficou deprimida
e sua mente abatida, e seus olhos e
lábios expressavam tristeza.
168 Ele não respondeu ao seu pai
ansioso. Ai, pobre Youkahainen!
169 Então, a mãe o indagou
prontamente, em busca de compre-
ender a razão por trás de sua tris-
teza: "Por favor, diga-me, meu pri-
mogenito, por que choras? Por que
teu coração está tão abatido e tua
mente tão desanimada? Por que
teus olhos expressam tanta tris-
teza?"
170 Youkahainen respondeu: "Ó
mãe dourada, sempre fiel, há uma
causa suficiente para minha tris-
teza e lágrimas amargas.
171 Todos os meus dias passarão
infelizes, pois prometi a bela Aino,
tua amada filha e minha devotada
irmã, ao decrépito Väinämöinen
como noiva para ele para sempre;
 172 será seu teto acima dele, su-
porte abaixo dele e bela compa-
nheira ao lado da lareira.
173 Esta causa é amarga para
mim e traz grande sofrimento."
174 Então, a mãe se levantou ale-
gremente e bateu palmas de felici-
dade.
175 Ela se dirigiu a Youkahai-
nen, seu amado filho, e disse: "Não
chores mais, meu filho.
176 Não há motivo para tuas lá-
grimas, nem razão para tua tris-
teza.
177 Eu já alimentei essa espe-
rança muitas vezes e tenho orado
por muitos anos para que o pode-
roso bardo e herói, sábio e valente
Väinämöinen, se torne o esposo da
bela Aino e o genro para mim, sua
mãe".
178 Mas a bela e adorável don-
zela, irmã querida de Youkahai-
nen, que ao chegar ao limiar ime-
diatamente caiu em um choro
amargo e prolongado.
179 Chorou durante todo o dia e
toda a noite, continuando a chorar
no segundo e terceiro dia, porque
uma grande tristeza havia se apos-
sado de seu jovem coração.
180 Então, a mãe de cabelos gri-
salhos indagou a sua filha, Aino,
de maneira solene: "Por que estás
a chorar, adorável filha? Encon-
traste um nobre pretendente.
181 Tu governarás tua espaçosa
morada, sentar-te-ás em sua janela
para descansar, enxaguarás suas
travessas de ouro e caminharás
dentro de teu lar como uma rai-
nha."
182 Chorosa respondeu Aino:
"Ó minha querida e misericordiosa
mãe, há uma causa suficiente para
a minha tristeza e um motivo sufi-
ciente para o meu amargo choro.
183 Devo soltar as minhas tran-
ças ensolaradas, as minhas tranças
belas e douradas, pois não posso
mais adornar o meu cabelo com
jóias ou amarrar a minha cabeça
com fitas.
184 Tudo isso deve ser escon-
dido sob o chapéu de linho que
uma esposa deve usar para sempre.
185 Choro pela manhã, choro
pela noite, e choro pela minha be-
leza que agora está desaparecendo.
186 A minha infância se foi e a
minha juventude também.
187 O sol prateado e o luar dou-
rado, que eram a esperança e o pra-
zer da minha infância, foram tira-
dos de mim agora para sempre, e
tão cedo serão esquecidos na ban-
cada de ferramentas do meu irmão,
na janela da minha irmã ou na casa
do meu pai."
188 Disse novamente a mãe de
cabelos grisalhos: "Cessa tua tris-
teza, donzela tola, pois tu és in-
grata por chorar.
189 Não há motivo para tua la-
mentação, nem o menor motivo
para derramar lágrimas.
190 Em toda parte, o sol prate-
ado brilha tão intensamente sobre
outras famílias.
191 O luar brilha não apenas
através das janelas abertas de teu
pai e na bancada de trabalho de teu
irmão.
192 Flores desabrocham em cada
prado e bagas crescem em cada
montanha.
193 Tu podes ir sozinha e encon-
trá-las, ir e encontrá-las todo o dia.
194 Não só os prados de teu ir-
mão, mas também outras áreas têm
belas videiras e flores.
195 As montanhas de teu pai não
são as únicas que produzem bagas
maduras e nutritivas.
196 Flores florescem em outros
prados e bagas crescem em outras
montanhas.
197 Assim como aqui, minha
adorável Aino."
RUNA IV.
O DESTINO DE AINO.
Ao romper da aurora, a donzela,
irmã justa de Youkahainen, diri-
giu-se prontamente à floresta para
colher brotos de bétula, a fim de
confeccionar vassouras.
2 Ela colheu borlas de bétula e,
em seguida, preparou um pacote
para seu pai, amarrou uma vas-
soura de bétula para sua mãe e bor-
las de seda para sua irmã.
3 Imediatamente, a jovem Aino
correu para casa, deixando a flo-
resta por uma trilha.
4 Quando ela se aproximou da
borda da floresta, vê! o antigo
Väinämöinen, que a espiava furti-
vamente.
5 Aino estava vestida com es-
mero em roupas caras.
6 Então, o menestrel dirigiu-se a
ela e disse: "Aino, beleza das Ter-
ras do Norte, não use a cruz dou-
rada em teu peito, as pérolas bri-
lhantes em teus ombros e as tran-
ças ruivas e douradas para os ou-
tros.
7 Use-as apenas para mim, doce
donzela".
8 Eis que a donzela prontamente
respondeu, sizendo: "Não é para ti,
nem tampouco para outrem, que eu
penduro em meu pescoço a cruz,
ou que adorno meus cabelos com
fitas de seda.
9 Não necessito mais das diver-
sas bugigangas que me foram tra-
zidas por navio ou chalupa.
10 Antes, prefiro vestir-me com
roupas simples, alimentar-me da
casca do pão de cevada e habitar
para sempre com minha mãe em
nossa modesta cabana, junto a meu
pai".
11 Então ela jogou fora a cruz de
ouro que trazia consigo e arrancou
as joias de seus dedos.
12 Rapidamente soltou seu colar
brilhante e desamarrou suas fitas
de seda.
13 Com indignação, lançou to-
das essas peças nas samambaias e
flores da floresta.
14 Em seguida, a donzela cha-
mada Aino, apressou-se para a ca-
bana de sua mãe.
15 Seu pai estava sentado na ja-
nela, dedicado a talhar um ma-
chado de carvalho.
 16 Então, ele dirigiu-se à sua fi-
lha: "Por que choras, minha bela
Aino, minha amada filha?"
17 A donzela respondeu: "Meu
pai, tenho motivos justos para cho-
rar e razões válidas para o meu
luto.
18 A razão pela qual choro e so-
fro é porque retirei a cruz de meu
peito, o broche de cobre de meu
cinto e o cinto de prata da minha
cintura.
19 A minha cruz era bela e dou-
rada."
20 Próximo à porta encontrava-
se sentado o irmão de Aino, escul-
pindo um jugo de boi feito de ma-
deira de bétula.
21 Ele perguntou: "Por que estás
chorando, minha querida Aino,
minha irmã devota?"
22 Ela respondeu: "Irmão, tenho
motivos suficientes para chorar e
lamentar.
23 São bons motivos que me le-
vam ao luto.
24 Por isso, venho diante de ti
sem os anéis que antes adornavam
meus dedos e sem o colar bonito
que enfeitava meu pescoço.
25 Eram anéis dourados que tu
me deste, e o colar, pérolas e
prata!"
26 No limiar da porta encon-
trava-se a irmã de Aino, que habil-
mente tecia um cinto de ouro.
27 Observando o choro de Aino,
sua irmã perguntou: "Por que cho-
ras, minha amada irmã Aino?"
28 Ela respondeu: "Tenho moti-
vos suficientes para chorar, minha
irmã, e bons motivos para minha
tristeza.
29 É por isso que venho até ti
como podes ver.
30 Não há nenhum filete escar-
late em minha cabeça, nenhuma
trança de prata em meu cabelo, ne-
nhuma fita roxa em meus braços,
nenhum colar brilhante em volta
do meu pescoço, nenhuma cruz de
ouro em meu peito, e nenhum
brinco de ouro em minhas ore-
lhas."
31 Próximo à entrada da leiteria,
encontrava-se sentada a mãe de
Aino, enquanto fazia creme desna-
tado.
32 Então, perguntou para sua
amada filha Aino, com ternura e
afeto: "Por que choras, minha que-
rida Aino, filha devotada?"
33 A jovem, soluçando, respon-
deu: "Minha mãe amorosa e mise-
ricordiosa, choro por uma causa
suficiente e boas razões para mi-
nha tristeza.
34 Fui à floresta para amarrar
vassouras e colher brotos, especi-
ficamente para obter algumas
bétulas borlas.
35 Amarrei um feixe para meu
pai, um segundo para minha mãe,
um terceiro para meu irmão e as
borlas de seda para minha irmã.
36 Depois, voltei para casa pela
trilha que saía da floresta.
37 No entanto, quando cheguei à
fronteira da floresta, Osmoinen, o
antigo Väinämöinen do milharal,
falou comigo.
 38 Dizendo: 'Bela donzela, não
uses isso para os outros, mas ape-
nas para mim. Doce donzela, usa
uma cruz dourada em teu peito, pé-
rolas brilhantes sobre teus ombros,
amarra para mim tuas tranças rui-
vas e tece para mim tuas tranças de
prata'.
39 Então, joguei a cruz de ouro e
as joias de meus dedos, rapida-
mente soltei meu colar brilhante e
desatei minhas fitas de seda. Indig-
nada, lancei todas essas coisas nas
samambaias e flores da floresta.
40 Depois, eu disse ao cantor:
'Não para ti e nem para os outros,
pendurarei a cruz em meu pescoço
e enfeitarei meu cabelo com fitas
de seda. Não preciso mais de mui-
tas bugigangas trazidas por navio e
chalupa. Prefiro vestir a roupa
mais simples, alimentar-me da
casca do pão de cevada e morar
para sempre com minha mãe na ca-
bana com meu pai'."
41 mãe, com cabelos grisalhos,
falou para sua amada filha, Aino,
usando palavras reconfortantes:
"Não chore mais, minha adorável
donzela.
42 Não desperdice mais sua doce
juventude.
43 Durante um ano, coma minha
doce manteiga para se fortalecer e
ficar corada.
44 No segundo ano, coma bacon
fresco para ficar alta e majestosa.
45 No terceiro ano, apenas gulo-
seimas, para ficar bela e adorável.
46 Agora, suba até o topo da co-
lina e vá para o depósito na monta-
nha.
47 Abra o grande compartimento
e encontrará caixas, baús e caixo-
tes.
48 Abra a caixa maior e levante a
cobertura berrante para encontrar
seis cintos de ouro e sete vestidos
multicoloridos, tecidos pelas belas
filhas da Lua e moldados pelas do-
ces virgens do Sol.
49 Quando eu era jovem, vagava
pelas montanhas como uma don-
zela, caçando bagas no bosque.
50 Por acaso, ouvi as filhas da
Lua tecendo e as filhas do Sol gi-
rando, sobre a borda azul da flo-
resta, em uma montanha alta e dis-
tante.
51 Fiquei escondida enquanto
suplicava às belas filhas da Lua
por sua prata e às doces virgens do
Sol por seu ouro.
52 Elas me deram generosa-
mente seus tesouros para enfeitar
minhas têmporas e cabelo.
53 Quando voltei para casa, usei-
os por três dias e os guardei com
cuidado em suas caixas, onde per-
maneceram por muitas estações.
54 Agora, enfeite sua testa com
fita de seda, apare as têmporas
com ouro e use um colar de pérolas
em seu pescoço.
55 Vista-se em puro linho
branco e use o mais rico vestido
curto, prendendo-o com um cinto
de ouro.
 56 Use meias de seda e sapatos
de couro fino.
57 Enfeite seu cabelo com tran-
ças douradas e prenda-o com fios
de prata.
58 Use anéis em seus dedos e ba-
bados delicados em suas mãos.
59 Então, venha enfeitada para
seu quarto e volte para esta casa,
para ser saudada pelos seus paren-
tes e amigos, corada como bagas
vermelhas e tão radiante quanto o
raio de sol de seu pai.
60 Ande com beleza e majestade,
mais linda que o luar."
61 E assim se expressou a mãe à
sua filha Aino, que chorava.
62 No entanto, a jovem donzela
não cedeu aos desejos de sua mãe.
63 Em vez disso, correu imedia-
tamente para o pátio, lá para chorar
em amarga tristeza, sozinha e an-
gustiada.
64 Após esperar por muito
tempo, Aino, cheia de lamenta-
ções, finalmente expressou seus
pensamentos em um solilóquio:
"Com o que posso comparar agora
a felicidade de um lar e a alegria da
fortuna? Seria como as águas do
rio, como as ondas do lago e como
as águas cristalinas fluindo.
65 E quanto à dor cortante que
sinto por causa do filho do frio in-
fortúnio? Seria como o espírito do
pato marinho, como o gelo no in-
verno e a água aprisionada no
poço.
66 Esses pensamentos frequente-
mente vagam pela minha mente,
na infância quando eu era uma
donzela livre e alegre, brincando
nos prados com cordeiros, sem co-
nhecer dor ou problemas.
67 Agora, minha mente está
cheia de tristeza, eu ando cansada
pelo pântano, pelo restolho, pelas
amoreiras e pela floresta sombria,
até que minha vida esteja cheia de
escuridão e meu espírito, branco
de angústia.
68 Para mim, seria melhor se eu
nunca tivesse visto a luz do sol, ou
se tivesse nascido e morrido
quando criança, em vez de ter vi-
vido como uma donzela nestes
dias de pecado e tristeza, debaixo
de uma estrela tão infeliz.
69 Teria sido melhor para mim
se eu tivesse morrido no oitavo
dia, depois de sete noites ter desa-
parecido; precisaria de um pouco
de linho, um pequeno caixão e
uma sepultura menor.
70 Minha mãe teria lamentado
um pouco, meu pai também talvez,
minha irmã teria chorado o dia in-
teiro e meu irmão poderia ter der-
ramado uma lágrima.
71 Assim terminaria todo o luto."
72 Eassim aconteceu que Aino, a
pobre donzela, derramou muitas
lágrimas e suspirou profunda-
mente.
73 Seu pranto foi incessante, du-
rando não apenas um dia, mas
dois, e ainda um terceiro desde a
manhã até a noite.
74 Quando sua mãe a questionou
novamente: "Por que choras, mi-
nha amada filha? Por que trazes a
dor contigo?”
 75 A donzela respondeu chorosa:
"Eu choro e sofro porque me tor-
narei uma donzela miserável por
toda a minha vida.
76 Isso ocorre desde o momento
em que tu deste a pobre Aino e
prometeste tua filha ao velho
Väinämöinen para confortá-lo em
seus anos decadentes.
77 Ele terá um telhado sobre sua
cabeça durante as tempestades e
um manto para aquecê-lo em sua
casa.
78 Seria muito melhor se tu ti-
vesses me enviado para baixo das
ondas do mar salgado para me tor-
nar irmã do badejo e amiga da
perca e do salmão.
79 É melhor cavalgar nas ondas,
nadar na espuma do mar como
uma sereia e ser amiga dos peixes
ágeis do que ser o consolo de um
velho.
80 Preferiria ser a irmã do ba-
dejo e amiga da perca e do salmão
do que a escrava e querida de um
velho, sendo seu suporte para se-
gurá-lo quando ele cambaleia, mão
para ajudá-lo quando ele treme,
braço para guiá-lo quando ele va-
cila e força para dar a ele quando
ele enfraquece."
81 Terminando de falar, ela dei-
xou sua mãe e foi imediatamente
correndo em direção à montanha.
82 Chegando ao topo, ela abriu a
maior caixa guardada lá e removeu
seis tampas, revelando seis cintos
de ouro e sete vestidos de seda.
83 Ela escolheu o que mais lhe
agradou e se vestiu para parecer a
mais bela, adornando-se com ouro
em suas têmporas, prata em seu ca-
belo, fitas roxas em seus ombros,
uma faixa azul em volta de sua
testa, uma cruz dourada, anéis e
joias adequados para realçar sua
beleza.
84 Ela abandona seus muitos te-
souros e deixa o depósito na mon-
tanha, cheio de objetos valiosos de
ouro e prata.
85 Ela vagueia por campos e pra-
dos, por campos de pedra devasta-
dos e estéreis, pântanos e florestas,
pela vasta e triste floresta, indo de
um lado para outro, cantando des-
cuidadamente enquanto ela va-
gueia.
86 Sua canção triste e ecoante
diz: "Ai de mim, minha vida mal-
fadada! Ai de Aino, de coração
partido! Que a dor e a angústia não
sejam ainda mais profundas, nem
meu sofrimento ainda maior.
87 Se eu tiver que suportar esse
peso de tristeza e viver em desâ-
nimo com um coração entriste-
cido, prefiro entregar minha vida
para sempre e morrer infeliz.
88 Agora é hora de Aino partir
deste mundo cruel para o reino de
Tuoni, o reino dos que partiram, a
ilha do além.
89 Não chorem por mim, ó Pai;
querida Mãe, retire sua censura;
amável irmã, enxugue suas lágri-
mas; querido irmão, não chore por
mim.
 90 Quando eu afundar sob a es-
puma do mar, farei minha casa em
grutas de salmão e meu leito em
águas cristalinas, usando samam-
baias aquáticas como meu sofá e
travesseiro."
91 Durante todo o dia, Aino, a
pobre, caminhou.
92 No dia seguinte, triste e exa-
usta, continuou vagando até o ter-
ceiro dia, desde a manhã até a
noite, quando a noite cruel a envol-
veu.
93 Foi então que ela alcançou a
margem arenosa, chegando final-
mente à fria e sombria praia do
mar.
94 Sentou-se na rocha da tris-
teza, sozinha no frio e na escuri-
dão, ouvindo apenas a música dos
ventos e das ondas ondulantes, que
cantavam todo o canto fúnebre de
Aino.
95 Durante toda aquela noite, a
donzela cansada chorou e vagueou
na fronteira, entre a areia e os sei-
xos lavados pelo mar.
96 Ao romper da aurora, a perso-
nagem vislumbra três ninfas mari-
nhas sobre um promontório que se
projeta para o mar.
97 Há ainda outras quatro donze-
las da água, que se encontram sen-
tadas nas bordas que são constan-
temente atingidas pelas ondas, al-
ternando entre nadar e repousar so-
bre as rochas.
98 Apressadamente, a donzela
triste e chorosa, conhecida como
Aino, se dirige ao encontro das se-
reias, que são fadas das águas. En-
quanto chora, Aino remove suas
vestimentas com cuidado, pendu-
rando suas roupas de seda nos ga-
lhos dos amieiros, deixando cair
sua cruz de ouro na praia.
99 Ela também pendura suas fi-
tas no álamo, suas meias de seda
nas rochas, seus sapatos de pele de
veado na grama, e deixa seu colar
brilhante na areia junto com seus
anéis e outras joias.
100 No mar, a uma distância
considerável, havia uma rocha
com as cores do arco-íris, bri-
lhando na luz prateada do sol.
101 Em direção a ela veio a infe-
liz donzela, Aino, nadando em sua
direção.
102 Ela subiu na pedra erguida,
desejando ali descansar por um
momento e repousar sobre a rocha
de beleza.
103 De repente, balançando para
lá e para cá entre as ondas, a pedra
de muitas cores caiu com um es-
trondo e rugido das águas no fundo
do profundo e ilimitado mar azul.
Aino, agarrando-se às bordas es-
carpadas da rocha, afundou bem
abaixo da superfície, perecendo no
fundo do mar.
104 Cantando enquanto a pedra
descia, Aino lamentou a sua morte:
"Uma vez eu vim nadar à beira-
mar para me divertir entre as on-
das; com a pedra de muitas cores,
a pobre Aino afundou no fundo do
profundo e ilimitado mar azul,
como um filhote de pássaro bonito
pereceu.
 105 Nunca venha pescar, pai, nas
margens dessas águas, nunca du-
rante toda a sua vida, se tu amas a
tua filha Aino."
106 “minha terna mãe, dirigi-me
à costa marítima, buscando deleite
entre as ondas.
107 Com uma pedra de múltiplas
cores, submergi a pobre Aino nas
profundezas do vasto e insondável
mar azul, e assim, como um meló-
dico pássaro, ela pereceu.
108 Jamais misture teu pão, ó
prezada mãe, com a espuma e as
águas do oceano cerúleo.
109 Nunca, em todos os dias de
tua vida, se tu amas a tua filha
Aino.
110 Querido irmão, adentrei às
margens do mar, na busca de di-
versão entre as ondas.
111 Com a pedra de muitas co-
res, afundei a pobre Aino nas pro-
fundezas do insondável e vasto
mar azul.
112 Ela pereceu como um meló-
dico e gracioso pássaro.
113 Jamais conduzas teu corcel
guerreiro com altivez, tampouco
tragas teu corredor real.
114 Não permitas que teus cor-
céis adentrem as águas que deli-
neiam as fronteiras do mar azul.
115 Nunca, em todos os dias de
tua vida, se tu amas a tua irmã
Aino.”
116 “minha amada irmã, dirigi-
me à costa marítima em busca de
recreação entre as ondas.
117 Utilizando uma pedra de
múltiplas tonalidades, afundei a
pobre Aino nas profundezas do in-
sondável e vasto mar azul.
118 Como um majestoso pás-
saro melodioso, ela pereceu. Ja-
mais venhas para lavar tuas pálpe-
bras nestas ondas ondulantes e na
espuma do mar.
119 Nunca, em todos os dias de
tua vida, se tu amas a tua irmã
Aino.
120 Todas as águas do mar azul
serão o sangue do corpo de Aino.
Todos os peixes que nadam nessas
águas serão a carne de Aino para
sempre.
121 Os salgueiros à beira-mar
serão as costelas de Aino no por-
vir.
122 E todas as ervas marinhas da
margem terão crescido a partir das
tranças de Aino.”
123 Assim, a donzela desapare-
ceu, e assim pereceu a adorável
Aino.
124 Quem se encarregará de nar-
rar essa história cruel? Quem le-
vará as más notícias até a morada
de sua mãe, que outrora foi o lar da
adorável Aino? Será o urso que re-
petirá essa história e transmitirá as
tristes novidades à sua progeni-
tora? Não, pois o urso não pode ser
o mensageiro, pois ela destruiria os
rebanhos de gado.
125 Quem, então, terá a respon-
sabilidade de contar essa história
cruel? Quem levará as más notí-
cias até a cabana de seu pai, que
outrora foi o lar da adorável Aino?
Será o lobo que repetirá essa histó-
ria e trará a triste notícia a seu ge-
nitor? Não, pois o lobo não pode
ser o mensageiro, pois ele se ali-
mentaria dos cordeiros mansos e
gentis.
126 Quem, então, terá o encargo
de relatar a história cruel? Quem
ousará trazer as más notícias à casa
de sua irmã? Acaso a raposa repe-
tirá a narrativa? Ela se tornará
mensageira das novidades? Não,
pois não convém que a raposa as-
suma tal papel, visto que ela se de-
leitaria com os patos e as galinhas.
127 Quem, então, terá a respon-
sabilidade de narrar a história re-
pleta de sofrimento? Quem se dis-
porá a levar as tristes notícias até a
morada de seu irmão, o local que
outrora abrigava a amada Aino?
Será que a lebre será incumbida de
repetir a história e transmitir a do-
lorosa mensagem a seu irmão?
Sim, é a lebre que se tornará o
mensageiro, proclamando a todos
a história cruel que se desenrolou.
128 E assim, a lebre inofensiva
respondeu, dizendo: "Eu serei o
mensageiro que levará as más no-
tícias à antiga morada de Aino, a
fim de relatar essa história aos seus
familiares."
129 Com presteza avançou o
mensageiro de orelhas alongadas,
ágil como os ventos que o prece-
dem.
a
O Princípio do Mal; mesmo que Hisi, Piru e Jutas.
130 Velozmente galopou, tal
qual o voo das águias, seu pescoço
contorcido impulsionando-o para a
frente, até alcançar o ansiado
abrigo, outrora lar da encantadora
Aino.
131 A morada encontrava-se
imersa em silêncio e desabitada;
então, ele adentrou a casa de ba-
nho, onde deparou-se com um
grupo de donzelas, cada uma em-
penhada em varrer com vassouras
de bétula.
132 A lebre assentou-se na so-
leira e, assim, as donzelas dirigi-
ram-lhe a palavra: “Escuta-me, Ó
Pernas-compridas, pois considera-
mos assar-te; Ó Olho-grande, co-
gitamos ensopar-te.
133 Serás assado para o desje-
jum de nossa senhora e ensopado
para o jantar de nosso mestre.
134 Faremos de ti um banquete
para Aino, assim como para o seu
irmão, Youkahainen! É preferível,
portanto, que galopes velozmente
de volta à tua toca nas montanhas,
do que te tornares o prato principal
de nossos jantares.”
135 E assim, a lebre altiva profe-
riu sua resposta, relatando o des-
tino de Aino com palavras solenes:
"Que não se pense que venho a
este lugar para ser assado em uma
frigideira ou cozido em uma cha-
leira.
136 Deixem que Lempoa encha
suas mesas! Trouxe notícias som-
brias, vim para contar a cruel his-
tória do desaparecimento e morte
de Aino, a amada irmã de You-
kahainen.
137 Com a pedra adornada por
múltiplas cores, Aino foi submer-
gida nas profundezas das águas
vastas e insondáveis, como um
belo pássaro cantor que pereceu.
Seus laços foram pendurados nos
choupos, sua cruzeta de ouro dei-
xado na praia, mantos de seda
adornaram os amieiros, suas meias
de seda repousaram sobre as ro-
chas, seus sapatos de pele de cervo
descansaram na grama, seu colar
brilhante se perdeu na areia, assim
como seus anéis e joias.
138 Nas ondas repousa a adorá-
vel Aino, adormecida no profundo
e ilimitado mar azul, nas cavernas
dos salmões, sendo a companheira
do badejo e amiga dos peixes
ágeis."
139 A tristeza se abate sobre a
mãe idosa, e de seus olhos azuis
brotam lágrimas amargas.
140 Ela expressa seu pesar em
palavras lamentosas, com o cora-
ção partido, respondendo da se-
guinte forma: "Escutai, ó todas as
mães, e ouçam atentamente, apren-
dam comigo uma história de sabe-
doria.
141 Nunca forcem suas filhas a
deixarem o lar paterno contra sua
vontade, para unir-se a noivos que
não amam.
142 Eu, como mãe cruel e insen-
sata, expulsei minha adorável
Aino, a mais bela filha das Terras
do Norte."
143 Com tristeza, a mãe de cabe-
los grisalhos derrama lágrimas
amargas, que escorrem por seu
rosto enrugado.
144 Essas lágrimas descem até
alcançar o seio, e dali fluem até a
borda de sua vestimenta.
145 Elas prosseguem, descendo
pelas meias de seda, até tocar os
sapatos feitos de pele de veado.
146 E então, sob seus pés calça-
dos com sapatos de pele de veado,
as lágrimas fluem incessante-
mente, como uma corrente que se-
gue em direção à terra como sua
possessão e à água como sua parte
destinada.
147 Enquanto as lágrimas caem
e se misturam, formando três ria-
chos em sua origem, das pálpebras
da mãe surgem correntes de lágri-
mas peroladas.
148 Fluiam como pequenos rios,
e cada riacho crescia, transfor-
mando-se em uma torrente impetu-
osa.
149 E em cada torrente impetu-
osa e ruidosa, uma catarata se
forma, espumando sob a luz prate-
ada do sol.
150 A partir da agitação da cata-
rata, três rochas erguem-se majes-
tosas, sustentando pilares grandio-
sos.
151 De cada rocha, no seu topo,
brotam três colinas cobertas de
verdejantes vegetações.
 152 E de cada colina, bétulas sal-
picadas surgem em trio, erguendo-
se em direção aos céus.
153 No topo de cada bétula, re-
pousa um cuco dourado, procla-
mando seu chamado.
154 E os três cantam, todos em
harmonia: "Amor! Ó Amor!" res-
soa o primeiro chamado.
155 O segundo canta, clamando:
"Pretendente! Pretendente!"
156 E o terceiro chama e ecoa,
trazendo consolação: "Consola-
ção! Consolação!"
157 Aquele chamado de "Amor!
Ó Amor!" ecoa, convocando três
luas e continuando incessante-
mente, dirigindo-se à donzela que
rejeita o amor, adormecida nos
castelos das profundezas maríti-
mas.
158 O pretendente canta, procla-
mando "Pretendente! Preten-
dente!" por seis luas, persistindo
incansavelmente, para o preten-
dente que canta e corteja sem ser
ouvido.
159 Aquele que tristemente
canta e ecoa: "Consolação! Conso-
lação!" continua a entoar incessan-
temente por toda a sua vida, para a
mãe de coração partido, que deve
lamentar e chorar eternamente.
160 Quando a mãe solitária e de-
safortunada foi agraciada com o
cântico sagrado do cuco, uma tris-
teza profunda invadiu seu coração.
161 Em meio a lágrimas doloro-
sas, ela expressou seu pesar: "Ao
escutar o canto do cuco, minha
alma se enche de melancolia.
162 Lágrimas escorrem dos
meus olhos cansados, percorrendo
meu rosto marcado pelo tempo.
163 São lágrimas imponentes,
semelhantes a pérolas marinhas de
prata.
164 Meus cotovelos, que teste-
munharam o passar dos anos, en-
velhecem junto comigo.
165 Meus dedos enrugados se
curvam, cansados em todos os seus
membros.
166 Meu corpo estremece em
uma paralisia exaustiva.
167 Ao escutar o canto do cuco,
o cântico sagrado do cuco."
RUNA V.
LAMENTAÇÃO DE VÄINÄMÖINEN.
AS notícias se espalharam longe
e extensamente, alcançando os ou-
vidos de homens distantes, que fi-
caram cientes da história da fuga e
morte de Aino.
2 Ela era a amada irmã de You-
kahainen, considerada a mais bela
dentre todas as filhas da criação.
3 Väinämöinen, o valoroso e ve-
raz, prontamente mergulhou em
um pranto amargo.
4 Chorou durante a aurora, cho-
rou ao anoitecer, sem descanso, la-
mentou a longa noite de tristeza.
5 Sua Aino havia partido, a don-
zela havia desaparecido, afundado
no abismo do mar azul, vasto e ili-
mitado.
6 Repleto de aflição, o antigo
cantor, Väinämöinen das Terras do
Norte, com um coração sobrecar-
regado e lágrimas amargas, apres-
sou-se em direção às agitadas
águas.
7 Eis a oração e a indagação do
suplicante:
8 "Dize-me, Untamo, ó sonha-
dor,
9 Revela-me, Ó Indolência, as
visões que te acometem,
10 Onde podem os deuses das
águas encontrar refúgio,
11 Onde as donzelas de Wellamo
podem descansar?"
12 Então Untamo, em resposta,
contou seus sonhos preguiçosa-
mente, eis as suas palavras: "Lá re-
sidem as sereias, habitação das
donzelas de Wellamo, no promon-
tório adornado com exuberante ve-
getação, na ilha coberta por densas
florestas, nas águas profundas e
translúcidas, nas costas purpúreas.
13 Ali repousam as donzelas do
mar, as donzelas de Wellamo, em
seus aposentos à beira-mar, des-
cansam em suas cavernas aquáti-
cas, nas rochas com as cores do
arco-íris, nas saliências das falé-
sias."
14 Imediatamente, Väinämöinen
apressa-se em direção a uma casa
de barcos situada à beira-mar.
15 Ele observa com diligência os
anzóis e as linhas que considera
adequados.
16 Prepara varas de pesca, redes
secas e as coloca em um barco
feito de cobre.
17 Então, ele começa a remar ra-
pidamente em direção à ilha co-
berta de floresta, até o ponto ador-
nado de vegetação exuberante e o
promontório tingido de púrpura,
onde habitam as ninfas do mar.
18 Mal chega à ilha, o menestrel
prontamente inicia sua pescaria.
19 Com destreza, ele lança o an-
zol para longe e o recupera ágil-
mente das águas, girando-o em um
elo giratório de cobre preso a uma
linha prateada de pesca.
20 O anzol que ele usa é dou-
rado.
21 Eis que ele lançou sua rede de
pesca, tecida com fios de seda,
buscando capturar suas presas.
22 Com perícia, ele lançou sua
rede em ângulos longos e mais lon-
gos, dedicando-se a essa tarefa por
dias e noites, desde o amanhecer
até o anoitecer, até mesmo ao
meio-dia.
23 Inúmeras vezes ele lançou sua
rede, perseverando em sua pesca-
ria.
24 E eis que, finalmente, numa
manhã ensolarada, sua persistên-
cia foi recompensada.
25 Ele se deparou com um peixe
dotado de poderes mágicos, que
brincava em sua linha de pesca,
saltando e agitando as águas com
ímpeto.
26 Porém, o peixe, exausto após
a árdua luta, finalmente sucumbiu
às habilidades do pescador.
27 Com habilidade e destreza, o
pescador o capturou e o acomodou
seguro no fundo de sua embarca-
ção de cobre, digna de um herói.
28 Väinämöinen, erguendo-se
com altivez, proferiu as seguintes
palavras em um espanto reverente,
em forma de enigma: "Este, dentre
todos os peixes do mar, é o mais
formoso que já meus olhos con-
templaram.
29 Não há igual a ele, por certo.
30 É indubitavelmente mais su-
ave que o salmão, suas manchas
brilham com maior intensidade
que as da truta, sua coloração é
mais acinzentada que a do lúcio de
Suomi.
31 Possui menos nadadeiras que
qualquer fêmea, superando em nú-
mero as nadadeiras de todo peixe
macho.
32 Não se assemelha às listras
das donzelas nascidas no seio do
mar, tampouco ao cinturão das se-
reias, nem mesmo às asas de qual-
quer pássaro melodioso.
33 Sua aparência é, de certa
forma, similar à do nosso salmão
do norte, proveniente das grutas
mais profundas do mar azul."
34 No cinto do antigo herói, re-
pousava uma faca adornada com
prata, cuidadosamente embai-
nhada.
35 Retirando-a de seu estojo, ele
utilizá-la-ia para cortar o peixe em
pedaços, visando prepará-lo para o
assado.
36 Com maestria, transformá-lo-
ia em um desjejum requintado,
uma refeição ao meio-dia, um ban-
quete saboroso e um jantar no-
turno.
37 Com destreza, assim como
um peixe, ele avança, tocando ha-
bilmente com sua reluzente lâmina
de prata.
38 Com velocidade surpreen-
dente, o peixe salta sobre as águas
e mergulha abaixo da superfície
serena do mar, partindo do barco
de fundo de cobre, do esquife per-
tencente a Väinämöinen.
39 Nas vastas extensões das on-
das, a uma considerável distância,
eis que se ergue rapidamente do
mar, no sexto e sétimo vagalhão.
40 Sua cabeça emerge majesto-
samente acima das águas, além do
alcance dos apetrechos de pesca.
41 Assim, dirige-se a Väinämöi-
nen, repreendendo com veemência
o antigo herói, em tais palavras: "Ó
Väinämöinen, honrado menestrel
do passado, não ouse presumir que
vim a este lugar como um salmão
pronto a ser capturado, apenas para
ser retalhado em pedaços, vestido
e degustado como um simples ba-
dejo.
42 Não serei para ti uma refinada
refeição matinal, tampouco um de-
leite ao meio-dia, nem sequer uma
saborosa ceia.
43 Pois não passarei a ser a
quarta refeição na Terra do Norte."
44 Disse o antigo Väinämöinen:
"Por que então vieste para cá, se
não for para o meu jantar?"
 45 Assim respondeu o peixe sem
nome, dizendo: "Eu vim a ti, ó me-
nestrel, para encontrar repouso e
demorar em teus braços.
46 Desejo amar-te e confortar-te,
tornando-me tua esposa e compa-
nheira de vida eternamente.
47 Embelezarei tua cama com
lençóis brancos, acariciarei tua ca-
beça enquanto repousas no traves-
seiro.
48 Limparei teus aposentos e os
preencherei de alegria.
49 Manterei tua moradia em or-
dem, acenderei o fogo quando ne-
cessário, assarei para ti biscoito de
mel e encherei teu copo com água
de cevada.
50 Farei tudo o que desejares.
51 Eu não sou um peixe esca-
moso que habita as vastas águas
salgadas do mar, nem uma truta
que nada nos rios das terras ao
norte.
52 Também não sou um badejo
que vive nas profundezas das
águas, nem um salmão que per-
corre as correntezas dos mares do
norte.
53 Eu sou uma jovem donzela
cheia de alegria, uma amiga e irmã
dos peixes.
54 Sou a irmã mais nova de You-
kahainen, sou eu, Aino, a quem tu
pescas e a quem tu amas.
55 Em tempos passados, eras re-
conhecido como um herói elo-
quente, um homem de sabedoria
em suas palavras.
56 Agora, porém, tu, Väinämöi-
nen, te tornaste um tolo, carente de
discernimento e juízo.
57 Não possuis conhecimento
suficiente para me preservar.
58 Teu coração é cruel, tuas
mãos estão manchadas de sangue.
59 Tentaste tirar minha vida com
uma faca destinada aos peixes, pla-
nejando me cozinhar para a tua re-
feição.
60 Eu, uma sereia de Wellamo,
antes conhecida como a bela e en-
cantadora Aino, querida irmã de
Youkahainen."
61 E assim falou o velho
Väinämöinen, com pesar e pro-
fundo arrependimento em seu co-
ração:
62 "Oh, tu que és a irmã de You-
kahainen, a formosa Aino de
Pohyola, peço-te que voltes para
mim mais uma vez!"
63 A sereia, sabiamente, respon-
deu: "O espírito de Aino nunca
mais virá a ti e sofrerá maus tra-
tos."
64 A jovem donzela desceu rapi-
damente das águas, proveniente da
superfície das ondas, em direção
aos seixos repletos de cores diver-
sas.
65 Ela se dirigiu às cavernas pi-
torescas do arco-íris, onde as se-
reias residem e permanecem.
66 Väinämöinen, não desani-
mado, ponderou profundamente e
considerou com sabedoria como
poderia viver, trabalhar e conquis-
tar sua amada.
 67 Com cuidado, ele lançou sua
rede de pesca de seda, movendo-a
habilmente através da espuma e
das ondas, pelas baías e canais si-
nuosos.
68 Ele a arrastou pelas águas se-
renas, pelos domínios dos salmões
e pelas moradias das donzelas da
água, navegando pelas águas de
Vainola, atravessando o profundo
azul do oceano, os lagos distantes
da Lapônia, os rios de Youkolaa e
os mares de Kalevala.
69 Ele esperava encontrar assim
sua amada Aino.
70 Muitos foram os peixes que
ele capturou, todas as formas de
criaturas semelhantes a peixes,
mas ele não conseguiu encontrar a
donzela do mar, a donzela da água
de Wellamo, a filha mais formosa
das terras do norte.
71 E assim, o antigo menestrel,
cuja mente estava abatida e o cora-
ção desanimado, disse em pro-
funda tristeza: "Eu sou tolo e mi-
nha insensatez é grande, pois não
possuo nem inteligência nem dis-
cernimento.
72 Houve um tempo em que eu
possuía algum conhecimento, al-
guma percepção da sabedoria e até
mesmo um pouco de instinto.
73 No entanto, todas as minhas
virtudes me abandonaram nestes
dias tristes de perversidade.
74 Minha juventude e vigor des-
vaneceram, minha percepção se
a
Jouko'la (Youko'la). A terra natal ou habitação de Youkahainen.
foi e meu entendimento se dissi-
pou. Toda minha prudência foi
destinada aos outros!
75 Aino, a quem amo e estimo, a
quem tenho procurado honrar por
todos esses anos, agora é uma don-
zela de Wellamo, outrora uma
amiga prometida quando necessá-
rio, e minha noiva prometida para
sempre.
76 Houve um tempo em que a ti-
nha ao meu alcance, quando a en-
contrei nas grutas de Wellamo e a
levei em meu barco de cobre, com
minha linha de pesca feita de prata.
77 No entanto, ai de mim! Não
pude mantê-la e não percebi que a
tinha conquistado tarde demais
para cortejá-la e conquistá-la.
78 Deixei-a escapar entre meus
dedos, para a morada das donzelas
aquáticas, para o reino de Wel-
lamo."
79 Väinämöinen partiu, carre-
gando consigo apenas o vazio das
mãos e o peso no coração.
80 Sem demora, ele dirigiu-se à
sua terra, à sua morada em Kale-
vala.
81 Durante sua jornada, proferiu
estas palavras: "O que terá aconte-
cido com o cuco, outrora portador
de alegria, que costumava alegrar
as manhãs e as noites, frequente-
mente entoando sua canção ao
meio-dia? O que terá silenciado
seu canto? Que força terá mudado
sua melodia? A tristeza deve ter
calado seu canto e a compaixão al-
terado seu chamado.
82 Não mais ouço seu canto, que
costumava encher minha manhã de
prazer e minha noite de felicidade.
83 Jamais descobrirei o segredo,
como viver e prosperar, como des-
cansar na terra e vagar pelos ma-
res! Somente minha idosa mãe,
que habita na face da Terra do
Norte, certamente me aconselharia
a respeito de meus pensamentos e
ações.
84 Que este cálice de dor possa
passar por mim, que esta tristeza
possa abandonar-me e que esta nu-
vem sombria se dissipe."
85 Nas profundezas, a mãe des-
pertou do seu sono eterno e disse:
"Eu estava apenas descansando,
mas agora despertei para respon-
der-te.
86 Conta-me qual é o teu pensa-
mento e qual é a tua ação, para que
eu possa te ajudar a passar por esse
cálice de aflição e para que essa
tristeza possa se dissipar e essa es-
curidão se dissolver.
87 Parte imediatamente em dire-
ção à Terra do Norte e visita as fi-
lhas de Suomi.
88 Tu as encontrarás sábias e en-
cantadoras, superiores em beleza a
Aino e mais dignas de se tornarem
tuas esposas.
89 Elas não são tão volúveis e to-
las como as inconstantes donzelas
da Lapônia.
90 Toma para ti uma compa-
nheira para a tua vida dentre as ho-
nestas casas de Suomi, uma das fi-
lhas virtuosas da Terra do Norte.
91 Ela irá encantar-te com sua
amabilidade, trazer-te felicidade
com sua bondade.
92 Sua forma é perfeita e sua
conduta é fácil, seus passos são
graciosos e cada movimento é
cheio de sagacidade e bom com-
portamento.
93 Ela honrará o teu lar e a tua
família."
RUNA VI.
JORNADA INFELIZ DE VÄINÄMÖINEN.
VÄINÄMÖINEN, idoso e verda-
deiro, está agora se preparando
para uma jornada em direção à al-
deia das Terras do Norte, à terra
dos invernos rigorosos, à terra com
pouco sol e às terras habitadas por
mulheres dignas.
2 Ele monta seu ágil cavalo real,
ajusta cuidadosamente o freio feito
de ouro, coloca a sela em suas cos-
tas, com fivela de prata e estribos
de cobre.
3 Sentado em seu corcel, inicia
sua jornada para o norte.
4 Ele avança vigorosamente, ga-
lopando pela estrada, sentado em
sua sela habilmente trabalhada,
montado em seu cavalo manchado
de magia, atravessando os prados
de Vainola e as planícies de Kale-
vala.
 5 Ele galopa rapidamente e dis-
tante, muito além de Vainola, con-
tornando o deserto das águas até
chegar às margens do mar azul,
sem permitir que seus cascos se
molhem durante a corrida.
6 No entanto, o perverso You-
kahainen nutria rancor em seu co-
ração, alimentando o verme da in-
veja por Väinämöinen, o magní-
fico encantador.
7 Ele construiu uma besta cruel
usando aço e outros metais, pin-
tando o arco em diversas cores e
moldando a parte superior com co-
bre.
8 Ele adornou o arco com prata
nevada e utilizou ouro para de-
corá-lo.
9 Em seguida, procurou os ten-
dões mais fortes, encontrando-os
no veado de Hisi, e entrelaçou li-
nho de Lempo.
Youkahainen vigia Väinämoinën. Nikolai Kochergin.
10 A cruel besta estava com-
pleta, com corda e haste, e suas
pontas afiadas. O arco era belo e
poderoso, certamente não havia
sido feito de maneira desprezível.
11 Nas costas, havia um corcel
pintado, com belos potros em cada
extremidade.
12 Próximo à curva do arco, ha-
via uma pintura de uma donzela
dormindo, enquanto perto do enta-
lhe havia uma lebre saltitante.
13 Assim, o arco formou-se de
maneira maravilhosa.
14 Ele cortou algumas flechas
para sua aljava, cobrindo-as com
as melhores penas.
15 As hastes das flechas foram
moldadas a partir do carvalho, e as
pontas foram feitas do metal mais
afiado.
16 Quando as hastes e as pontas
estavam prontas, ele emplumou
cuidadosamente suas flechas com
penas de andorinha e espinhos das
asas do pardal.
17 Ele endureceu as flechas em-
plumadas de forma adequada e in-
fundiu novas virtudes em cada
uma delas.
18 Ele as mergulhou no sangue
de serpentes e no veneno de víbo-
ras.
19 Agora todas as suas flechas
estão prontas, e sua besta cruel está
pronta e amarrada.
20 Aguarda-se a chegada do sá-
bio Väinämöinen.
21 Youkahainen, o menestrel da
Lapônia, espera há muito tempo,
sem se cansar.
22 Ele aguarda com vigilância o
antigo cantor, observando-o ao
amanhecer, ao entardecer e inces-
santemente ao meio-dia.
23 Fica à espreita do mágico, es-
perando e observando com uma
espécie de inveja.
24 Ele senta-se junto à janela
aberta e fica atrás da cerca viva,
observando.
25 Fica no caminho, ouvindo e
vigiando ao longo dos balcões de
prados.
26 Sua aljava está pendurada em
suas costas, com flechas empluma-
das.
27 Ele carrega consigo uma po-
derosa besta, como se estivesse
mergulhado no veneno de uma ví-
bora.
28 Ele espera, observa e não se
cansa, escutando da janela da casa
de barcos.
29 Ele permanece no final do
ponto de nevoeiro, próximo ao rio
que flui em direção ao mar, perto
da corrente sagrada e do redemoi-
nho, próximo à queda de fogo do
rio sagrado.
30 No alvorecer, quando a aurora
pintava o céu, o menestrel da La-
pônia, Youkahainen de Pohyola,
direcionou seu olhar para o Nor-
deste.
31 Seus olhos se voltaram ao
nascer do sol, onde avistou uma
nuvem negra pairando sobre o oce-
ano e algo azul sobre as águas.
32 Em um solilóquio, ele ponde-
rou:"Seriam aquelas nuvens no ho-
rizonte ou talvez o amanhecer do
dia? Não são nuvens que se apro-
ximam no horizonte, nem o raiar
do novo dia.
33 É o antigo Väinämöinen, o re-
nomado e sábio encantador, que
cavalga em direção à Terra do
Norte.
34 Montado em seu corcel, ele
cavalga no cavalo mágico de Vai-
nola."
35 Num instante, o jovem You-
kahainen, o orgulhoso e perverso
trovador da Lapônia, tomou sua
besta com pressa, e preparou seu
arco e flechas com a intenção de
matar Väinämöinen.
36 A velha mãe perguntou rapi-
damente ao seu filho, Youkahai-
nen, e disse-lhe estas palavras:
"Quem é o alvo da tua besta? Em
cujo coração estão destinadas as
tuas flechas envenenadas?"
37 Respondeu Youkahainen:
"Eu criei essa poderosa besta, um
arco moldado e flechas envenena-
das, com o propósito de acabar
com a vida de Väinämöinen, o
amigo das águas.
38 Planejo atirar no velho mago,
o bardo e herói eterno, visando seu
coração, fígado, cabeça e ombros.
39 Com este arco e flechas em-
plumadas, pretendo destruir meu
rival poeta."
40 Então, a mãe idosa respondeu
com reprovação e proibição, di-
zendo: "Não deves matar o bom
Väinämöinen, o antigo herói das
Terras do Norte, pertencente a uma
nobre linhagem, pois ele é filho da
minha irmã, meu sobrinho.
41 Se tu o matares, Ai! toda a
alegria desaparecerá e nossos ma-
ravilhosos cantos perecerão.
42 É melhor que a alegria esteja
presente na terra, assim como a
música mágica, do que nos reinos
inferiores, no domínio de Tuonia,
onde residem aqueles que parti-
ram, na terra além."
43 Então o jovem Youkahainen,
após ponderar profundamente, er-
gueu a besta com uma mão, en-
quanto a outra parecia enfraquecer
ao puxar a cruel corda do arco. Por
fim, ele proferiu estas palavras
com o peito inflado de inveja:
a
"Que toda alegria desapareça eter-
namente, que os prazeres terrenos
pereçam rapidamente, que se ex-
tinga a música mais doce da terra,
que a felicidade se vá para sempre;
lançarei minha flecha contra este
rival menestrel, sem me importar
com o que é o fim."
44 Com destreza e agilidade, ele
prepara seu arco incandescente,
enquanto descansa a arma em seu
joelho esquerdo.
45 Seu pé direito permanece fir-
memente plantado no chão, pro-
porcionando estabilidade.
46 Assim, ele encorda o arco
com invejável habilidade. Seleci-
ona três flechas de sua aljava, es-
colhendo criteriosamente a melhor
delas.
47 Com cuidado meticuloso,
ajusta a corda do arco e coloca a
flecha emplumada com precisão.
48 Coloca-a sobre a corda de li-
nho, segurando a arma em seu om-
bro.
49 Com precisão, aponta na dire-
ção da margem, mirando direta-
mente no coração de Väinämöi-
nen, esperando pacientemente que
ele se aproxime galopando.
50 Enquanto aguarda, nas som-
bras de um arbusto, pronuncia as
seguintes palavras: "Corda de li-
nho, sê tensa e elástica; voa rapi-
damente, flecha de freixo emplu-
mada; acelera velozmente, projétil
mortal; ágil como a luz, flecha en-
venenada, adentra o coração de
Väinämöinen.
51 Se porventura segurar-te
baixo demais, que os deuses te ele-
vem; se meus olhos te mirarem
com excessiva altitude, que os
deuses te façam descer."
52 Com firmeza, ele agora aci-
ona o gatilho, como um relâm-
pago, a flecha voa sobre a cabeça
de Väinämöinen.
53 Direcionando-se ao céu mais
elevado, ela se lança em veloci-
dade e atravessa as mais altas nu-
vens, dispersando todo o rebanho
das nuvens de lã, em sua jornada
rápida em direção ao céu.
54 Não desanimado, com uma
seleção rápida e um ajuste ágil,
Youkahainen aponta seu arco e
dispara rapidamente uma segunda
flecha.
55 A flecha acelera veloz como
um raio, mirando bem baixo o pro-
jétil.
56 Ela mergulha na terra, perfu-
rando as regiões mais baixas e di-
vidindo a antiga Montanha de
Areia em duas partes.
57 Youkahainen, sem sentir
medo algum, prontamente lança
um terceiro disparo.
58 Veloz como a luz, ele acelera
em sua jornada e atinge o corcel de
Väinämöinen, o ágil nadador oceâ-
nico.
59 Seu golpe acerta próximo ao
cinto dourado, perfurando o ombro
do corredor.
60 E aconteceu que o sábio
Väinämöinen, em seguida, caiu-se
precipitadamente sobre as águas,
mergulhando sob as ondas que se
moviam como ondulações, saindo
da sela de seu corcel, cuja arma-
dura era manchada de magia.
61 E eis que um vento poderoso
e tempestuoso se levantou, ru-
gindo furiosamente sobre as águas,
carregando o velho Väinämöinen
para longe da terra, sobre as ondas,
nas altas e ondulantes ondas, pelas
vastas extensões do mar.
62 Vangloriou-se, o jovem You-
kahainen, acreditando que Waino
estava morto e sepultado.
63 Com palavras jactanciosas,
ele disse: "Nunca mais, velho
Väinämöinen, nunca mais em to-
dos os dias da tua existência, en-
quanto a luz dourada da lua bri-
lhar, nunca mais contemplarás
com teus olhos os prados de Vai-
nola, as planícies de Kalevala.
64 Deves nadar por seis anos in-
teiros nos vastos oceanos, enfren-
tar as ondas por sete verões, caval-
gar as ondas espumantes por oito
anos, na vastidão das águas.
65 Passarás por seis longos outo-
nos como um abeto, sete invernos
como uma pedra e oito longos ve-
rões como um álamo."
66 E logo o menestrel da Lapô-
nia acorreu ao seu aposento encan-
tado, ao que sua mãe dirigiu-se a
ele:"Acaso tu, filho meu, ceifaste a
vida do bom Väinämöinen, o filho
de Kalevala?"
 67 Eis que Youkahainen respon-
deu, dizendo: "Eis que eu matei o
velho Väinämöinen e derrubei o fi-
lho de Kalevala.
68 Para que ele agora possa arar
as vastas águas do oceano e varrer
as ondas.
69 Ele encontrará repouso nas
rochas que se erguem e se deitará.
70 Ele mergulhou de cabeça nas
águas salgadas, afundou o mágico
em suas profundezas.
71 Ele se voltou para a praia, vi-
rando as costas para a rocha, esta-
belecendo assim seu eterno des-
tino.
72 Portanto, ele tem para viajar
os mares sem limites, cavalgando
as ondas que se erguem majesto-
sas."
73 Esta é a resposta da mãe: "Ai
da terra por causa da tua ação! A
alegria e o canto desapareceram
para sempre.
74 A sagacidade das eras se per-
deu! Tu mataste o bom Väinämöi-
nen, o antigo cantor da sabedoria.
75 Mataste o orgulho de Suwan-
talaa, o herói de Vainola, a alegria
de Kalevala."
RUNA VII.
O RESGATE DE VÄINÄMÖINEN
EIS que Väinämöinën, o velho e
verdadeiro, atravessou as profun-
dezas do mar, navegando como um
ramo trêmulo de álamo, como um
galho murchado de salgueiro.
a
O mesmo que Vainola(?)
2 Durante seis dias de verão e
seis noites sob o brilho dourado da
lua, ele nadou incansavelmente.
3 Contudo, as ondas se erguiam
diante dele, e o céu e o oceano se
estendiam atrás dele.
4 Com valentia, ele persistiu por
mais dois dias e enfrentou duas
longas noites em batalha avante.
5 Mas na noite do oitavo dia, o
coração de Väinämöinën foi to-
mado pela desolação, pois suas
unhas se perderam e seus dedos ja-
ziam mortos e agonizantes.
6 Väinämöinën, triste e exausto,
falou: "Oh, como estou desafortu-
nado, minha vida velha! Ai de
mim, filho do infortúnio! Fui um
tolo quando a sorte me sorriu, ao
abandonar minha casa e minha fa-
mília por uma donzela bela e en-
cantadora.
7 Aqui estou, sob o céu estre-
lado, em meio a essa cruel imensi-
dão de água, nadando e vagando
dia e noite, lutando contra os ven-
tos das tempestades, sendo lan-
çado por ondas crescentes, perdido
nas vastas extensões deste imenso
mar, neste oceano sem fim.
8 Minha vida é fria, triste e me-
lancólica, uma dor insuportável
para que eu possa permanecer
sempre nestas águas, lutando pela
minha existência.
9 Não consigo compreender
como posso prosperar, encontrar
comida e abrigo nessas águas frias
e desprovidas de vida, nesses dias
de terrível infortúnio.
10 Acaso construirei minha mo-
rada com o vento? Certamente ela
não encontraria um fundamento
seguro.
11 E se eu construísse minha
casa sobre as ondas? Sem dúvida,
as ondas a destruiriam.”
12 Da longínqua Pohyola surge
uma ave, do ocidente vem uma
águia.
13 Não se classifica entre as mai-
ores, tampouco entre as menores.
14 Uma de suas asas toca as
águas, enquanto a outra percorre
os céus.
15 Sobre as ondas ela desliza seu
corpo e com seu bico toca as falé-
sias.
16 Voa incansavelmente, para
então pousar com segurança.
A Águia resgata Väinämoinën. Nikolai Kochergin.
17 Observa à frente, observa
atrás, e eis que avista o valente
Väinämöinën, no dorso azul do
oceano.
18 A águia, então, se aproxima
dele e indaga: "Por que, ó antigo
herói, estás navegando nas profun-
dezas do mar?"
19 "Eis que eu sou o antigo
Väinämöinën, amigo e compa-
nheiro das águas, um renomado
cantor de sabedoria.
20 Decidi aproximar-me de uma
donzela das Terras do Norte e cor-
teja-la, uma donzela que reside na
sombria Terra das Trevas.
21 Assim, parti rapidamente em
uma jornada, cavalgando na vasti-
dão do oceano.
22 E ao chegar, numa manhã ao
despontar da aurora, encontrei-me
na baía de Luotolaa, próxima ao rio
impetuoso de Youkola.
23 Contudo, nesse lugar, o mal-
vado Youkahainen, com seu arco e
flecha, ceifou a vida do meu corcel
e tentou me ferir com suas armas
mortais.
24 Em seguida, precipitei-me
nas águas, mergulhando sob a su-
perfície do mar salgado, deixando
para trás a sela do meu corcel má-
gico, um corcel cuja pelagem era
adornada de poderes encantados.
25 E eis que sobreveio um vento
impetuoso, uma tempestade pode-
rosa, que se levantou do leste e do
oeste, como um redemoinho arre-
batador.
26 Fui levado em direção ao
vasto mar, sobre as ondas que se
erguiam diante de mim.
27 Por muitos dias vagueei pelas
águas, nadando e me balançando
enquanto era levado cada vez mais
longe.
28 Durante incontáveis noites,
lutei contra as ondas impetuosas e
o rugir do mar, enfrentando os
ventos furiosos e as águas tumul-
tuosas que me cercavam.
29 Ai de mim, desafortunado é o
meu destino! Minha existência é
um fardo insuportável, pois não
encontro solução para este pro-
blema que me oprime.
30 Desconheço os caminhos da
vida e da morte diante das águas
amargas deste impiedoso mar.
a
Uma baía da Finlândia, com o nome de Joukola.
31 Devo erguer minha morada
sobre os ventos? Oh, que tolice!
Pois não encontrará alicerces segu-
ros.
32 E se eu edificar minha casa
sobre as águas? Certamente, as on-
das implacáveis a demolirão.
33 Será, então, que devo deslizar
perpetuamente por entre as ondas?
Devo escolher entre a vida e a
morte?
34 E o que me sucederá se eu me
entregar à morte, se sucumbir sob
as águas, perecendo neste lugar
com frio e fome?"
35 Assim respondeu o pássaro
do Éter: "Não te desanimes, pois,
coloca-te entre meus ombros, so-
bre minhas costas, e assenta-te fir-
memente, que eu te erguerei das
águas e conduzindo-te o levarei
com minhas asas para cima, levar-
te-ei para onde desejares.
36 Lembro-me bem do dia em
que tu prestaste serviço à águia,
quando favoreceste os pássaros.
37 Tu deixaste a bétula erguida,
quando as florestas de Osmo fo-
ram devastadas nas terras de Kale-
vala, tornando-se um lar para os
pássaros canoros fatigados e um
lugar de repouso para as águias."
38 Então, Väinämöinën surge e
eleva sua cabeça acima das águas
com ousadia, erguendo-se das on-
das do mar.
39 Ele se assenta sobre a águia,
nos ombros emplumados da
mesma.
 40 O imenso pássaro o transporta
rapidamente pelos céus, levando o
antigo Väinämöinën pelo caminho
dos ventos favoráveis, flutuando
nas brisas primaveris.
41 Ele é levado até a costa dis-
tante das Terras do Norte, em dire-
ção à sombria Sariola, onde a
águia deixa sua carga e voa para se
reunir aos seus companheiros.
42 Na solidão e no cansaço,
Väinämöinën se prostrou imedia-
tamente em profundo pranto.
43 Com voz angustiada, ele der-
ramou lágrimas copiosas e gemeu
em tom pesaroso, à margem do
mar azul.
44 No alto de um promontório
triste, suas feridas numerosas, in-
fligidas pelos ventos impiedosos e
pelas águas agitadas, causavam-
lhe tormento.
45 Seus cabelos e barba se en-
contravam desgrenhados, agitados
pelo bramido das ondas.
46 Por três longos dias, ele derra-
mou lágrimas desalentadas, la-
mentando nas noites de aflição.
47 Perdido e sem encontrar dire-
ção, ele vagava pela floresta sem
uma pegada que o guiasse no ca-
minho.
48 Não havia indicação de re-
torno à sua morada em Kalevala, à
sua amada casa e aos seus parentes
queridos.
49 Uma jovem e graciosa don-
zela da Terra do Norte, dotada de
beleza encantadora e amável apa-
rência, desafiou o Sol em uma
aposta.
50 Ela também desafiou a Lua,
afirmando que surgiria antes deles
na manhã seguinte.
51 E assim, a donzela, radiante
em sua beleza, levantou-se muito
antes do nascer do Sol e do desper-
tar da Lua de suas camas sob o
oceano.
52 Antes que o galo cantasse ao
raiar do dia, antes que o Sol rom-
pesse o sono, ela já havia tosqui-
ado seis cordeiros delicados e co-
lhido seis lãs brancas deles.
53 Essas lãs foram utilizadas
para criar rolos de fiação, que por
sua vez foram transformados em
fios para tecer.
54 Com esses fios, ela produziu
vestes extremamente suaves e fi-
nas, tudo isso antes do amanhecer
e antes mesmo que o adormecido
Sol tivesse nascido.
55 Após concluir essa tarefa, a
criada procedeu a limpar as mesas
feitas de madeira de bétula, em se-
guida, varreu o chão do andar tér-
reo do estábulo utilizando uma
vassoura feita de folhas e galhos
provenientes das bétulas da Terra
do Norte.
56 Ela cuidadosamente recolheu
a sujeira com uma pá feita de cobre
e a levou para fora do estábulo,
atravessando a porta em direção ao
prado, na fronteira distante, pró-
ximo às ondas do vasto mar.
 57 Enquanto ela estava lá, ouviu
um lamento vindo das águas, um
choro vindo da praia e uma voz de
um herói lamentando.
58 Então a jovem rapidamente
dirige-se à sua morada, apres-
sando-se ao lar de sua mãe. E as-
sim diz: "Eis que percebi um som
de angústia vindo do vasto oceano,
ouvi um lamento ressoando da
beira do mar, na praia alguém está
tomado de pesar."
59 Louhi, a anfitriã de Pohyola,
uma dama anciã e desdentada das
Terras do Norte, apressou-se em
sair de sua residência, atravessou o
pátio e dirigiu-se ao prado, che-
gando à praia.
60 Ela prestou atenção aos sons
de choro que ouviu, o lamento de
alguém imerso na tristeza.
61 Ela escuta a voz de alguém
enfrentando dificuldades e captou
um grito heróico repleto de angús-
tia.
62 Diante disso, a antiga Louhi
responde: "Este não é um lamento
de crianças, tampouco são as lágri-
mas de mulheres.
63 É assim que choram os bravos
heróis barbudos; trata-se de um
grito heróico de angústia."
64 Com rapidez, impulsiona seu
barco em direção à água, para en-
frentar as enchentes.
65 Seu navio, de beleza admirá-
vel, avançava remando com uma
velocidade comparável à de um
raio, em direção ao entristecido
Väinämöinën.
66 Ela oferece consolo ao herói,
confortando-o enquanto ele cho-
rava em meio a um bosque de sal-
gueiros, em uma situação lamentá-
vel, cercado por amieiros e ála-
mos, próximo ao mar salgado.
67 Seu rosto tremia, com cabelos
em desalinho, expressando tristeza
por meio de seus ouvidos, olhos e
lábios.
68 A anfitriã de Pohyola, Louhi,
diz ao Väinämöinën: "Revela-me a
tua insensatez, qual foi a causa que
te trouxe a esse estado lamentá-
vel."
69 E o sábio e venerável
Väinämöinën ergueu a cabeça e fa-
lou, dizendo: "Verdadeiramente,
reconheço que é uma tolice que
trouxe-me tantos problemas para
minha vida.
70 Fui conduzido a esta terra ha-
bitada por estranhos, a essas terras
desconhecidas e inadequadas.
71 Eu era feliz ao lado de meus
parentes, em meu lar distante e em
minha terra natal, onde meu nome
era honrado e reverenciado."
72 Louhi, a anfitriã de Pohyola,
respondeu a Väinämöinën:"Eis
que desejo obter tal conhecimento,
então permito-me indagar-te,
quem és tu dentre os heróis anti-
gos, entre toda a hoste de heróis?"
73 Esta é a resposta de
Väinämöinën:“Antigamente, meu
nome era mencionado com fre-
quência, e eu era ouvido e honrado
como um menestrel e mágico du-
rante os longos e sombrios inver-
nos.
 74 Eu era chamado de Cantor das
Terras do Norte, cuja fama ecoava
pelos vales de Wainola e pelas vas-
tas planícies de Kalevala.
75 Ninguém poderia conceber
que uma tla infortúnio pudesse re-
cair sobre o sábio Väinämöinën.”
76 Louhi, a anfitriã de Pohyola,
respondeu com vivacidade: “Le-
vante-se, ó herói, do desconforto
de seu leito entre os salgueiros.
77 É hora de seguir por um novo
caminho.
78 Vem comigo para aquela mo-
rada e conte suas estranhas aventu-
ras, relate a história de seus infor-
túnios."
79 Agora, ela toma o infeliz he-
rói e o levanta do seu leito de tris-
teza.
80 Com cuidado, ela o coloca em
seu barco, garantindo sua segu-
rança.
81 Em seguida, começa a remar
com determinação e força, direcio-
nando-se para sua casa na praia,
rumo às moradas de Pohyola.
82 Chegando lá, ela dá de comer
ao herói faminto, proporciona des-
canso ao antigo Väinämöinën e lhe
oferece calor, comida e abrigo.
83 E logo o herói se recupera ra-
pidamente.
84 A anfitriã de Pohyola dirigiu-
se ao antigo cantor com a seguinte
pergunta: "Por que, Väinämöinën,
amigo e companheiro das águas,
choraste em tons tristes e amargos
na margem do oceano, entre os
álamos e salgueiros?"
85 Respondeu Väinämöinën:
"Tinha boas razões para o meu
choro, uma causa suficiente para
toda a minha tristeza.
86 Por muito tempo eu nadei, ba-
tendo nas ondas, nas águas que se
estendem.
87 Essa é a razão do meu choro.
88 Tenho vivido em labuta e tor-
tura desde que deixei minha casa e
meu país, deixei minha terra natal
e parentes, e cheguei a esta terra de
estranhos, a estes portais desco-
nhecidos.
89 Todas as tuas árvores têm es-
pinhos para me ferir, todos os teus
galhos, espinhos para me perfurar.
90 Até as bétulas me dão proble-
mas, e os amieiros trazem descon-
forto.
91 Meus companheiros, ventos e
águas, só o Sol parece amigável,
neste país frio e cruel, perto destes
portais desconhecidos."
92 Louhi respondeu: "Por favor,
não derrames mais lágrimas,
Väinämöinën, e não te aflijas mais,
ó querido amigo das águas. T
93 u és bem-vindo entre nós e te-
rás o privilégio de compartilhar
nosso convívio.
94 Sentar-te-ás à mesa conosco,
desfrutando dos manjares servi-
dos, como o saboroso salmão e o
delicioso toucinho.
95 Também terás a oportunidade
de saborear o saboroso badejo pes-
cado em nossas águas cristalinas."
96 Assim respondeu o velho
Väinämöinën, em gratidão: “Eu
nunca frequento mesas desconhe-
cidas, mesmo que a comida nelas
seja rara e saborosa.
97 Meu país de origem é o mais
querido para mim, minha própria
mesa é a mais doce e minha pró-
pria casa é a mais atraente.
98 Peço, bondoso Ukko, Deus
acima de mim, que tu, Criador
cheio de misericórdia, me permitas
visitar novamente o meu amado lar
e país.
99 É preferível viver em meu
próprio país, onde posso beber de
suas águas saudáveis em simples
cálices de madeira de bétula, do
que vaguear por terras estrangei-
ras, onde teria acesso aos licores
mais raros em tigelas de ouro per-
tencentes a estranhos."
100 Louhi, a anfitriã de Pohyola,
respondeu ao mago: "Qual será a
recompensa que me concederás se
eu te levar para qualquer lugar que
desejares? Poderás retornar à tua
terra natal e encontrar teus paren-
tes, estar no aconchego do teu
amado lar e lareira, caminhar pelos
prados de Wainola e pelas planí-
cies de Kalevala."
101 Estas são as palavras de
Väinämöinën: "Qual seria uma re-
compensa adequada? Tu deverias
conduzir-me de volta ao meu
povo, à minha casa e à minha terra
distante, às fronteiras da Terra do
Norte, onde eu possa ouvir o canto
a
Sampo. A joia que Ilmarinen forjou com os metais mágicos; um talismã de su-
cesso para o possuidor; uma fonte contínua de conflito entre as tribos do Norte.
do cuco, ouvir o sagrado canto do
cuco.
102 Devo oferecer-te tesouros de
ouro e encher as tuas taças com a
mais refinada prata?"
103 Esta é a resposta simples de
Louhi:"Ó tu, antigo Väinämöinën,
és o único mágico verdadeiro e sá-
bio. E
104 u nunca pedirei riquezas,
nem ouro, nem prata.
105 O ouro destina-se às flores
das crianças e a prata às joias do
garanhão.
106 Serias capaz de forjar o
Sampoa para mim e martelar uma
tampa colorida? Usando as pontas
das penas de cisne branco, o leite
da maior virtude, um único grão de
cevada e a lã mais fina das ove-
lhas?"
107 Esta é a resposta de Louhi:
"Eu também te concederei minha
filha como esposa. A
108 lém disso, te recompensarei
através da donzela e te levarei de
volta à tua amada terra natal, às
fronteiras de Wainola, onde pode-
rás desfrutar do som do canto do
cuco, ouvir o sagrado canto do
cuco."
109 Väinämöinën, profunda-
mente arrependido, respon-
deu:"Lamento, mas não tenho a
capacidade de criar o Sampo para
ti, tampouco posso realizar a tarefa
de confeccionar uma tampa colo-
rida.
 110 No entanto, leva-me de volta
à minha terra distante e, lá, envia-
rei Ilmarinena para atender ao teu
pedido.
111 Ele é um habilidoso ferreiro
capaz de forjar o Sampo desejado
e dar forma à tampa com cores vi-
brantes.
112 Além disso, ele também é
capaz de conquistar a tua adorável
donzela.
113 Ilmarinen é um ferreiro
digno, considerado o primeiro e
mestre nessa arte.
114 Ele é conhecido por ter for-
jado os próprios céus e ter criado
uma capa oca no ar.
115 Em nenhum lugar encontra-
remos vestígios do seu martelo,
nem uma única marca de suas te-
nazes."
116 A anfitriã Louhi respon-
deu:"Eu concederei minha filha
somente a ele.
117 Faço a promessa de entregar
minha criança em casamento
àquele que forjará o Sampo para
mim.
118 Ele martelará a tampa com
cores, usando as pontas das penas
de cisne branco e o leite da maior
virtude.
119 Também usará um único
grão de cevada e a mais fina lã de
ovelhas."
120 Em seguida, a anfitriã
Louhi, de forma rápida, engatou
um corcel de pelagem malhada ao
a
Ilmarinen – Nome masculino derivado do finlandês “ilma”, que significa “ar”.
seu trenó feito de madeira de
bétula.
121 Ela colocou Väinämöinën
no assento cruzado e o preparou
para a sua jornada.
122 Então ela se dirigiu ao antigo
menestrel: “Não ergas os olhos
para o céu, não olhes para cima du-
rante a tua jornada, enquanto o teu
corcel estiver fresco e brincalhão,
enquanto a estrela do dia iluminar
o teu caminho antes que a estrela
da tarde se eleve.
123 Se os teus olhos estiverem
voltados para cima enquanto a es-
trela do dia ilumina o teu caminho,
um terrível infortúnio te atingirá,
algum triste destino te alcançará."
124 Em seguida, o antigo
Väinämöinën empreendeu sua jor-
nada com diligência.
125 Ele se apressou alegremente
em direção à sua casa e acelerou
com um coração feliz.
126 Ele partiu da sempre som-
bria Terra do Norte, da sombria
Sariola.
RUNA VIII.
A DONZELA DO ARCO-ÍRIS.
A bela e encantadora filha de
Pohyola, honra da terra e da água,
assentou-se no arco celestial, no
seu ponto mais elevado e resplan-
decente.
2 Vestia um traje feito do tecido
mais luxuoso, ornamentado com
ouro e prata, enquanto tecia teias
 Väinämoinën convida a Donzela do Arco-Íris. Nikolai Kochergin.
de uma textura dourada, entrela-
çando fios de prata.
3 Empunhava uma lançadeira
feita de ouro e um pente de tecela-
gem feito de prata.
4 Com destreza, a lançadeira de
ouro voava alegremente entre os
dedos ágeis da donzela, enquanto
o torno girava rapidamente, te-
cendo as fibras com velocidade.
5 O pente de prata também voava
velozmente entre os dedos da don-
zela, nascida do céu, enquanto ela
tecia teias de uma beleza maravi-
lhosa.
6 O antigo Väinämöinën vinha,
conduzindo o seu trenó, retor-
nando para casa pela estrada.
7 Ele vinha da Terra do Norte,
sempre sem sol, da sombria Sari-
ola.
8 Ele havia percorrido apenas
uma curta distância, quando ouviu
o som do tear celestial, enquanto a
donzela habilmente manobrava a
lançadeira.
9 Rapidamente, o impensado
Väinämöinën ergueu seus olhos
maravilhados e contemplou a abó-
bada do céu, onde avistou o arco
da beleza.
10 Sentada no arco, estava a bela
Donzela do Arco-Íris, a glória da
terra e do oceano, tecendo ali um
tecido dourado e trabalhando com
a prata sussurrante.
11 Väinämöinën, o antigo me-
nestrel, interrompe velozmente o
seu corredor e fixa os olhos na en-
cantadora donzela. Em seguida,
ele se dirige a ela: "Por favor, ve-
nha, bela donzela, e sente-se ao
meu lado no meu trenó de neve."
12 Assim, a Donzela da Beleza
respondeu:“Diga-me o que desejas
de mim, devo acompanhá-lo no
trenó de neve(?)”.
13 Fala o velho Väinämöinën e
responde assim à Donzela da Be-
leza: "Esta é a razão da tua vinda:
tu irás assar biscoitos de mel para
mim, irás preparar água de cevada,
encherás meus copos com cerveja
espumante, cantarás ao lado da mi-
nha mesa, alegrar-te-ás dentro dos
meus portais, caminhará uma rai-
nha dentro da minha morada, nos
salões e câmaras de Wainola, nas
cortes de Kalevala."
14 A Donzela da Beleza, sentada
em seu trono nos céus, respondeu:
"Ontem, durante o crepúsculo, eu
fui aos prados floridos.
15 Lá, eu caminhei entre a natu-
reza comum, onde o Sol se põe
para descansar.
16 Foi lá que ouvi um pássaro
cantando, o tordo, entoando melo-
dias simples e suaves, expressando
os pensamentos doces das donze-
las e as preocupações das mães.
17 Então, eu fiz uma pergunta ao
encantador cantor, dirigi-me ao
tordo com uma simples indagação:
'Cante para mim, adorável pássaro
melódico, cante de forma que eu
possa compreender.
18 Cante para mim com um ge-
nuíno sotaque, sobre como viver
com a maior alegria e a mais doce
felicidade, como uma donzela em
companhia de seu pai ou como
uma esposa ao lado de seu marido'.
19 "O pássaro canoro me deu a
resposta, o tordo cantou esta infor-
mação: Os dias de verão são claros
e quentes, mas a liberdade da don-
zela é ainda mais calorosa.
20 O inverno é frio como ferro,
assim como a vida das mulheres
casadas.
21 As donzelas que vivem com
suas mães são como frutas madu-
ras e avermelhadas.
22 As mulheres casadas, por ou-
tro lado, são como cachorros acor-
rentados no canil, raramente pe-
dem favores, pois às esposas os fa-
vores não são dados."
23 Väinämöinën, velho sábio e
verdadeiro, respondeu à Donzela
da Beleza: "É tolo o tordo que
canta dessa maneira, e é uma bo-
bagem o gorjeio do pássaro ca-
noro.
24 As donzelas são tratadas
como bebês, enquanto as esposas
são consideradas rainhas e alta-
mente honradas.
25 Venha, doce donzela, para o
meu trenó de neve.
26 Eu não sou desprezado como
herói, nem mesmo o mais cruel
dos mágicos.
27 Venha comigo e eu farei de ti
esposa e rainha em Kalevala."
28 A resposta da Donzela da Be-
leza foi: "Eu te consideraria um
herói, um poderoso herói, eu te
chamaria assim, quando tu quebra-
res um cabelo dourado usando fa-
cas que não possuem fio, quando
tu me prenderes um ovo de pássaro
com uma armadilha que eu não
possa ver."
29 Väinämöinën, um habilidoso
e antigo, conseguiu partir um fio
de cabelo dourado de maneira pre-
cisa, utilizando facas que não pos-
suíam fio.
30 Em seguida, ele conseguiu
prender um ovo de forma segura,
usando uma armadilha que a don-
zela não viu.
31 “Venha, doce donzela, para o
meu trenó de neve, eu fiz o que de-
sejas.”
32 A resposta da donzela foi a se-
guinte: "Não irei entrar no teu
trenó de neve sob nenhuma cir-
cunstância, a menos que tu sejas
capaz de descascar um arenito.
Além disso, exijo que me faças um
chicote com gelo, cuidadosamente
cortado de forma a não gerar lascas
ou fragmentos."
33 Väinämöinën, o verdadeiro
mágico, não se deixou intimidar
nem desencorajar.
34 Com habilidade, ele descas-
cou o arenito arredondado e cortou
habilmente um chicote do gelo,
sem perder nem a menor lasca,
nem o menor fragmento.
35 Em seguida, ele chamou a
donzela novamente para se sentar
em seu trenó de neve.
36 A resposta da Donzela ao
grande mago foi a seguinte: "Eu
irei somente com aquele que for
capaz de construir um navio ou
uma chalupa utilizando as lascas
do meu fuso e os fragmentos da
minha roca, e lançar essa embarca-
ção nas águas para que flutue.
37 O barquinho não poderá ser
empurrado com o joelho, movido
com o braço, tocado com a mão,
girado com o pé, nem impulsio-
nado por qualquer outro meio."
38 O hábil Väinämöinën disse:
"Não há pessoa alguma na Terra
do Norte, nem sob a abóbada ce-
leste, que possua a habilidade que
possuo em construir uma embarca-
ção a partir dos pedaços de rochas
e lascas de fuso".
39 Então, ele recolheu os frag-
mentos da roca e as lascas do fuso
com diligência.
40 Apressou-se a partir do barco
em direção a uma montanha de
ferro, onde se dedicou a reunir os
muitos fragmentos.
41 Com grande zelo, ele mane-
jou o martelo e a machadinha, sem
se deixar intimidar.
42 Sem hesitar, construiu o na-
vio, trabalhando com afinco du-
rante o primeiro dia e também no
segundo.
43 No terceiro dia, trabalhou
com mãos firmes.
44 Contudo, na noite desse ter-
ceiro dia, o malvado Hisi agarrou
a machadinha, Lempo segurava o
cabo torto, fazendo com que o ma-
chado se desviasse ao cair, batendo
nas pedras e se quebrando em vá-
rios pedaços.
45 Os fragmentos ricochetearam
das rochas, perfurando a carne do
mágico e cortando o joelho de
Väinämöinën.
 46 Lempo guiou o machado afi-
ado, Hisi separou as veias.
47 Rapidamente, jorrou uma cor-
rente de sangue, que tinha uma co-
loração carmesim.
48 Väinämöinën, um homem
idoso e verdadeiro, conhecido
como um feiticeiro sábio, diz: "Ó,
machado afiado e cruel, feito de
metal afiado, a tua finalidade é
cortar as árvores em pequenos pe-
daços, cortar o pinheiro e o sal-
gueiro, cortar o amieiro e a bétula,
cortar o zimbro e o álamo.
49 No entanto, não deves cortar
o meu joelho em pedaços, nem ras-
gar as minhas veias."
50 Então, o antigo Väinämöinën
começa seus encantamentos e seu
canto mágico a respeito da origem
do mal.
51 Cada palavra é dita em per-
feita ordem, sem qualquer esforço
para lembrar.
52 Ele entoa sobre a origem do
ferro, com o propósito de moldar
um parafuso e assim preparar uma
fechadura segura, para proteger as
feridas causadas pelo machado e
pelas pequenas machadinhas.
53 No entanto, o riacho flui, cor-
rendo desenfreado como uma tor-
rente.
54 Ele mancha as ervas nos pra-
dos, cobrindo praticamente toda a
vegetação, não deixando sequer
um pouco de verde à vista.
55 Enquanto flui e avança, ele
emerge do joelho do mágico, das
veias de Väinämöinën.
56 Agora o sábio e antigo menes-
trel empreende a tarefa de coletar
líquens do arenito, bem como dos
troncos das bétulas, e também de
colher musgo dos pântanos, en-
quanto retira a grama dos prados.
57 Seu intento é deter o curso do
riacho de coloração carmesim e
buscar o fechamento das feridas
expostas.
58 Contudo, seus esforços reve-
laram-se infrutíferos, e a corrente
carmesim continua a fluir inces-
santemente.
59 Väinämöinën, sentindo dor e
temendo a fraqueza, entrega-se ao
choro, com o coração carregado de
tristeza.
60 Com rapidez, ele agora
prende seu corcel ao trenó de ma-
deira de bétula e sobe com descon-
forto no banco cruzado.
61 Golpeia seu corcel em uma
sucessão veloz, estalando seu chi-
cote acima do condutor, e o corcel
avança rapidamente.
62 Como os ventos, ele varre a
estrada até se aproximar de uma al-
deia na Terra do Norte, onde o ca-
minho se divide em três partes.
63 Väinämöinën, idoso e fiel, se-
gue o caminho mais baixo e se
aproxima rapidamente de uma ca-
bana espaçosa.
64 Diante da porta, faz sua per-
gunta rápida:"Há alguém habi-
tando este lugar, que possa com-
preender a dor que carrego e curar
esta ferida causada por um ma-
chado? Pode alguém verificar este
riacho de cor carmesim?"
65 Um menino posicionou-se em
um canto, num banco adjacente a
um bebê, e respondeu ao herói:
"Não existe ninguém nesta resi-
dência capaz de compreender a dor
que sentes, de curar as feridas cau-
sadas pelo pequeno machado, de
conter o fluxo escarlate; alguém
habita aquela casa de campo, quem
sabe possa ser de auxílio para ti."
66 Väinämöinën, chicoteia seu
corcel para fazê-lo galopar en-
quanto corre ao longo da estrada.
67 Ele dirige-se apenas por uma
curta distância, no meio das estra-
das, em direção a uma cabana lo-
calizada à beira da estrada.
68 Ao chegar lá, ele pergunta a
alguém que está na soleira da porta
e faz suas perguntas pelas janelas
abertas.
69 Assim ele pergunta:"Existe
alguém nesta cabana que possa
compreender a dor que estou so-
frendo? Existe alguém que possa
curar essa ferida causada pelo ma-
chado? Existe alguém que possa
conter esse riacho de cor carme-
sim?"
70 No chão jazia uma bruxa,
perto da lareira repousava a velha
senhora.
71 Foi então que ela dirigiu suas
palavras a Väinämöinën, respon-
dendo-lhe com dificuldade entre
os dentes: "Nesta humilde cabana,
não há ninguém capaz de compre-
ender a intensidade de sua dor,
tampouco de curar as feridas pro-
vocadas pelos machados, ou con-
ter o fluxo do sangue vermelho
como carmesim.
72 No entanto, naquela casa vizi-
nha, talvez haja alguém disposto a
lhe prestar auxílio."
73 Väinämöinën, sem se sentir
intimidado, chicoteia seu piloto
para que o cavalo acelere e corre
ao longo da estrada.
74 Ele dirige apenas uma curta
distância nas altas estradas e ga-
lopa até uma cabana modesta.
75 Em seguida, ele se dirige a al-
guém que está próximo da cober-
tura, sentado no batente da porta, e
pergunta: "Existe alguém nesta ca-
bana que possa ter conhecimento
da dor que estou sofrendo? Al-
guém que possa curar essa ferida
causada pelo machado e conter
esse fluxo carmesim?"
76 Próximo à lareira estava sen-
tado um idoso.
77 No lugar aquecido pelo fogo,
estava sentado o homem de barba
grisalha.
78 Ele então respondeu a
Väinämöinën: "Feitos grandiosos
foram realizados, coisas extrema-
mente maravilhosas foram efetua-
das, apenas através de três palavras
do mestre.
79 Ao narrar as causas, rios e
oceanos foram acalmados, as que-
das d'água dos rios foram reduzi-
das, enseadas foram formadas a
partir de promontórios, ilhas foram
erguidas do fundo do mar."
 RUNA IX.
ORIGEM DO FERRO.
Väinämöinën, encorajado dessa
forma, levanta-se prontamente do
seu trenó de neve sem solicitar au-
xílio a ninguém.
2 Ele se dirige imediatamente à
cabana e adentra a casa, onde se
senta.
3 Em seguida, duas donzelas
chegam trazendo cântaros de prata
e cálices de ouro.
4 Elas mergulham os objetos um
pouco, mas apenas com a menor
quantidade possível do sangue das
feridas do mágico Väinämöinën.
5 Da lareira, o velho chama, o
homem idoso com barba grisalha
faz-lhe a pergunta: "Por favor,
diga-me quem és entre os heróis,
quem és entre todos os grandes
mágicos? Observa! O teu sangue
enche sete barcos e oito das maio-
res embarcações de bétula, fluindo
das veias de algum herói, das feri-
das de algum mágico.
6 Tenho outras questões que gos-
taria de te perguntar.
7 Diga-me a causa deste pro-
blema que enfrentas.
8 Narra-me a fonte dos metais,
descreve a origem do ferro e como
ele foi inicialmente criado."
9 Então, o antigo Väinämöinën
respondeu ao homem de barba gri-
salha: "Possuo um conhecimento
profundo sobre a origem dos me-
tais, incluindo o ferro.
10 Posso afirmar que o arco feito
de aço é considerado antiquado.
11 A mais antiga mãe é o ar, se-
guida pela água como o irmão
mais velho, o fogo como o se-
gundo irmão e o ferro como o ir-
mão mais novo.
12 O primeiro criador é Ukko, o
criador dos céus.
13 Foi ele quem separou o ar e a
água antes que o metal, o ferro,
existisse.
14 Ukko, o criador dos céus, es-
fregou vigorosamente suas mãos e
pressionou-as firmemente em seus
joelhos, resultando no surgimento
de três belas donzelas, três filhas
magníficas. Estas foram as mães
do ferro e do aço de cor azul bri-
lhante.
15 Tremulando, elas caminha-
ram pelos céus, atravessaram as
nuvens adornadas com prata, com
seus seios transbordando do leite
que seria usado para criar o futuro
ferro.
16 Esse leite fluía incessante-
mente das bordas cintilantes das
nuvens para a terra, preenchendo
os vales e acalmando as águas em
seu chamado ao sono.
17 A mais velha das filhas de
Ukko derramou leite preto nos ca-
nais dos rios.
18 A segunda filha derramou
leite branco sobre as colinas e
montanhas, enquanto a filha mais
nova espalhou leite vermelho pe-
los mares e oceanos.
 19 Onde o leite preto foi derra-
mado, cresceu o ferro dúctil e es-
curo.
20 Onde o leite branco foi derra-
mado, cresceu o ferro de cor mais
clara.
21 E onde o leite vermelho foi
derramado, cresceu o ferro verme-
lho e quebradiço.
22 Após a passagem do tempo, o
Ferro se apressou em visitar o
Fogo, seu amado irmão mais ve-
lho, para melhor conhecer o pró-
prio irmão.
23 Imediatamente, o Fogo come-
çou a rugir e trabalhou para consu-
mir seu irmão mais novo, o amado
irmão.
24 Nesse momento, o Ferro per-
cebeu o perigo iminente e salvou-
se fugindo rapidamente dos avan-
ços da chama ardente.
25 Ele fugiu para cá e para lá, de
maneira silenciosa, buscando
abrigo nos pântanos, nos vales, nas
fontes ruidosas e junto aos rios que
serpenteiam em direção ao mar,
nas amplas margens dos pântanos
onde os cisnes construíram seus
ninhos e onde os gansos selvagens
chocam seus filhotes.
26 O ferro se encontra nas terras
pantanosas, estendendo-se ao
longo dos cursos de água, oculto
por muitas eras nas florestas de
bétulas.
27 No entanto, não pode perma-
necer oculto para sempre diante
das buscas de seu irmão.
28 Aqui e ali, o fogo o alcançou
e o levou para a fornalha, onde lan-
ças, espadas e machados podem
ser forjados e adequadamente mar-
telados.
29 Nas águas enegrecidas dos
pântanos, os ursos vinham cami-
nhando da charneca e os lobos cor-
riam.
30 Foi lá que o ferro apareceu,
onde as patas dos lobos pisaram e
onde os ursos deixaram suas pega-
das.
31 Então, o ferreiro, Ilmarinen,
veio à terra para exercer sua habi-
lidade com o metal.
32 Ele nasceu no Monte do Car-
vão e foi criado com destreza nos
campos onde se produz carvão.
33 Em uma mão, segurava um
martelo de cobre, enquanto na ou-
tra tinha uma pinça de ferro.
34 O ferreiro nasceu durante a
noite e, pela manhã, construiu sua
forja.
35 Com cuidado, buscou uma
colina favorável onde os ventos
pudessem encher seu fole.
36 Descobriu uma colina nas ter-
ras pantanosas, onde o ferro estava
abundantemente escondido.
37 Foi ali que ele ergueu sua for-
nalha de fundição e colocou seu
fole de couro.
38 Seguiu os rastros deixados
pelos lobos e trilhou o caminho
dos ursos.
39 Encontrou as formações jo-
vens do ferro nos rastros deixados
pelos lobos dos pântanos e pelo
urso cinzento.
 40 Em seguida, o ferreiro, Ilma-
rinen, dirigiu-se ao ferro adorme-
cido nestes termos: 'Tu és o metal
mais útil, está adormecido nos
pântanos, escondido em condições
humildes, onde o lobo caminha pe-
los pântanos e o urso dorme nas
matas.
41 Pensaste e considerastes cui-
dadosamente qual seria sua posi-
ção no futuro.
42 Devo colocá-lo na fornalha
para torná-lo livre e útil?'
43 Ferro, por sua vez, ficou to-
mado pelo medo, angústia e horror
ao ouvir menções ao Fogo, a força
que pode destruí-lo.
44 Ilmarinen, o ferreiro, volta a
falar novamente e se dirige ao
Ferro, desta forma: 'Não se preo-
cupe, metal útil.
45 Com certeza, o Fogo não te
consumirá, não queimará seu ir-
mão mais novo, não causará danos
ao seu parente mais próximo.
46 Venha ao meu aposento e for-
nalha, onde o fogo arde livre-
mente.
47 Tu viverás, crescerás e pros-
perarás, tornando-se as espadas
dos heróis, fivelas para os cintos
das mulheres'
48 Antes que a estrela da noite
aparecesse, o minério de ferro ti-
nha sido retirado dos pântanos e
elevado dos leitos de água.
49 Foi levado até a fornalha e o
ferreiro o colocou no fogo, inse-
rindo-o na sua fornalha de fundi-
ção.
50 Ilmarinen operou o fole,
dando três movimentos com o
cabo, e o ferro fluía em correntes
provenientes da forja do mágico.
51 Logo, transformou-se em
algo semelhante a fermento de pa-
deiro, suave como a massa de pão
de cevada.
52 Nesse momento, o metal, o
Ferro, exclamou: 'Maravilhoso
ferreiro, Ilmarinen, ó tira-me, tira-
me de tua fornalha, deste fogo e
desta tortura cruel.'
53 Ilmarinen, assim respondeu:
eu replico a ti: 'Eu te retirarei de
minha fornalha, estás apenas
pouco assustado. Tu te tornarás um
grande poder, capaz de perecer o
melhor dos heróis e ferir o teu ir-
mão mais querido.'
54 Imediatamente, Ferro fez uma
promessa solene, jurando diante da
fornalha, da bigorna, das tenazes e
do martelo.
55 Eis as palavras que ele profe-
riu com veemência: 'Comprometo-
me a derrubar muitas árvores e a
devorar os corações das monta-
nhas.
56 No entanto, não matarei meu
parente mais próximo, não elimi-
narei o mais valente dos heróis e
nem ferirei meu irmão mais que-
rido.
57 Prefiro viver em liberdade ci-
vil, pois minha vida seria mais fe-
liz se eu pudesse servir meus se-
melhantes como ferramentas para
sua comodidade, ao invés de ser
um instrumento de guerra, cau-
sando a morte de meus amigos e
parentes próximos, e ferindo os fi-
lhos da minha mãe.'
58 Agora, Ilmarinen, o mestre,
renomado e habilidoso ferreiro, re-
tira o ferro do fogo e o coloca so-
bre a bigorna.
59 Ele o martela com destreza
até que fique maleável, forjando
uma variedade de utensílios refina-
dos, como lanças, espadas, macha-
dos, facas e garfos, além de uma
ampla gama de ferramentas de
martelos.
60 Muitas coisas que o ferreiro
precisava, muitas coisas ele não
poderia moldar, como a pinça de
ferro, o martelar o aço do ferro e a
capacidade de tornar o ferro endu-
recido.
61 Ilmarinen, após uma cuida-
dosa e profunda ponderação, refle-
tiu longamente.
62 Ele decidiu reunir cinzas de
bétula e mergulhá-las na água para
criar uma lixívia que endurecesse
o ferro, permitindo a formação do
aço necessário.
63 Ele provou a mistura com a
língua, avaliando cuidadosamente
o resultado.
64 O ferreiro então disse: 'Todo
esse trabalho é em vão, não será
capaz de moldar o aço do ferro,
nem fazer com que o minério ma-
cio endureça'.
65 Neste momento, uma abelha
sobrevoa o prado, uma Asa-azul
que vem das flores.
66 Ela voa pelo ar e finalmente
pousa em segurança próximo à
fornalha da forja.
67 Assim como o ferreiro se di-
rige à abelha, estas são as palavras
de Ilmarinen: 'Pequena abelhinha,
gracioso passarinho, traga-me mel
em suas asas.
68 Peço-lhe que traga a doçura
dos prados perfumados, proveni-
ente dos delicados cálices das flo-
res, das pontas de sete pétalas, para
que, dessa forma, possamos auxi-
liar a água na produção do aço do
ferro'.
69 O pássaro maligno do Hisi,
conhecido como vespa, ouviu as
palavras de Ilmarinen enquanto es-
tava empoleirado na empena da
cabana.
70 Ela voou rapidamente para a
casca de bétulas, enquanto as bar-
ras de ferro estavam esquentando e
o aço era temperado.
71 A vespa picou com veloci-
dade, espalhando todos os horrores
de Hisi.
72 Ela trouxe a bênção da ser-
pente, o veneno da víbora, o ve-
neno da aranha e as picadas de to-
dos os insetos, tudo misturado com
minério e água, enquanto o aço es-
tava sendo temperado.
73 Ilmarinen, hábil ferreiro, o
primeiro entre todos os ferreiros,
pensou que a abelha, sem dúvida,
lhe trouxera mel dos prados perfu-
mados, dos pequenos cálices de
flores, das pontas de sete pétalas.
74 E ele proferiu as seguintes pa-
lavras: 'Bem-vinda, bem-vinda, é a
tua vinda,portadora do doce néctar
das flores, que trazes para auxiliar
na forja do aço do ferro!'
75 Ilmarinen, o antigo ferreiro,
imergiu o ferro na água, uma água
misturada com diversos venenos,
pensando que era apenas o mel de
uma abelha selvagem.
76 Dessa forma, ele moldou o
aço a partir do ferro.
77 Quando ele o mergulhou na
água, uma água misturada com
muitos venenos, e o colocou na
fornalha, o ferro endurecido cres-
ceu com ira, quebrando o jura-
mento que havia feito.
78 Ele consumiu suas próprias
palavras como cães e demônios, e
impiedosamente feriu seu próprio
irmão, enfurecendo-se loucamente
contra seus parentes.
79 O sangue jorrou como riachos
das feridas do homem e do herói.
80 Essa é a origem do ferro e do
aço de cor azul claro."
81 Diante da lareira, ergueu-se
um homem de barba grisalha. Com
um gesto, sacudiu suas pesadas
madeixas e respondeu:"Agora, co-
nheço a origem do ferro e a fonte
do aço, assim como os males que
eles trazem consigo.
82 Maldito seja tu, ferro cruel, e
maldito seja o aço que provém de
ti.
83 Lanço minha maldição sobre
ti, língua do mal, e que tua vida
seja amaldiçoada para sempre! No
passado, eras de pouco valor, sem
forma, beleza, força ou grande im-
portância.
84 Descansavas na forma de leite
e por eras permaneceste escondido
nos arfantes seios das três filhas de
Deus, nos confins das nuvens e na
abóbada azul dos céus.
85 No passado, tu eras insignifi-
cante e desprovido de atributos va-
lorosos.
86 Não possuías forma atraente
nem beleza cativante, tampouco
exibias força ou relevância signifi-
cativa.
87 Estavas na condição de água
estagnada, repousando tranquila-
mente nas vastas extensões dos
pântanos e nas encostas íngremes
das montanhas.
88 E assim eras, apenas matéria
sem forma, mera partícula de po-
eira com tonalidade enferrujada.
89 Sem dúvida, em tempos pas-
sados, tu eras destituído de grandi-
osidade, sem possuir nem força
nem beleza.
90 Quando o alce te pisoteava,
quando o corço te pisava, quando
as pegadas dos lobos se encontra-
vam em ti e as patas dos ursos ar-
ranhavam teu corpo, certamente te
mostravas de pouco valor.
91 Na verdade, eras insignifi-
cante quando o habilidoso Ilmari-
nen, o primeiro entre todos os fer-
reiros, te trouxe das terras pantano-
sas enegrecidas e te levou para sua
antiga forja, onde te colocou na ar-
dente fornalha.
 92 Com efeito, tu possuías pouca
vitalidade, pouca força e represen-
tavas pouco perigo quando estavas
no fogo sibilando, rolando como
água fervente proveniente da for-
nalha da forja.
93 Naquele momento, tu fizeste
o juramento mais vigoroso, pela
fornalha, pela bigorna, pela tenaz e
pelo martelo, pela morada do fer-
reiro, pelo fogo dentro da fornalha.
94 Agora, sem dúvida, te tor-
naste poderoso e capaz de se enfu-
recer na mais selvagem fúria.
95 Tu quebraste todas as tuas
promessas e desrespeitaste os teus
votos solenes.
96 Como um cão, envergonhaste
a honra e desonraste a ti mesmo e
à tua família.
97 Manchaste tudo com o sopro
do mal.
98 Diga-me, quem te conduziu a
essa maldade? Quem te ensinou
toda a tua malícia? Quem te pro-
porcionou tamanha depravação?
Será que foi teu pai ou tua mãe?
Talvez o mais velho dos teus ir-
mãos, ou a mais nova das tuas ir-
mãs? Ou até mesmo o pior dentre
todos os teus parentes? Será que
foi algum deles que te transmitiu a
tua natureza maligna?
99 Mas não foi teu pai, nem tua
mãe.
100 Não foi o mais velho dos
teus irmãos, nem o mais novo das
tuas irmãs.
101 Nem tampouco o pior dentre
todos os teus parentes.
102 Foste tu mesmo quem cau-
sou todo este mal.
103 Tu és a causa de todos os
nossos problemas.
104 Vem e contempla as tuas
más ações.
105 Corrige essa inundação de
danos antes que eu revele aos teus
cabelos grisalhos da mãe e ao teu
velho pai.
106 Imensa é a angústia de uma
mãe, profunda é a tristeza de um
pai, quando um filho comete ações
malignas, quando uma criança
corre descontrolada e sem lei.
107 Ó riacho carmesim, cesse o
fluir incessante das feridas de
Väinämöinën; interrompa o curso
do sangue das eras que corre pelas
veias do mágico.
108 Permaneça imóvel como os
pilares de cristal no céu, posicio-
nando-se como colunas firmes no
oceano, como bétulas majestosas
na floresta, altos juncos nos pânta-
nos e rochas elevadas na costa do
mar.
109 Que assim seja pelo poder da
poderosa magia!
110 Certamente, tua vontade
deve te impelir de forma inevitável
a fluir em teu ciclo infinito.
111 Percorres as veias de
Väinämöinën, atravessas ossos e
músculos, pulmões, coração e fí-
gado do poderoso sábio e cantor.
112 É melhor ser o alimento dos
heróis do que desperdiçar tua força
e virtude nos prados e florestas,
sendo perdido em pó e cinzas.
 113 Flua eternamente em teu cír-
culo; deves cessar este fluxo de
sangue vermelho carmesim.
114 Não manche mais a grama e
as flores, nem macule estas colinas
douradas, orgulho e beleza de nos-
sos heróis.
115 Tuas moradas e depósitos le-
gítimos encontram-se nas veias do
mágico, no coração de
Väinämöinën.
116 Retira agora tuas forças para
lá, apressando-te em teu fluxo rá-
pido.
117 Não fluas mais como corren-
tes carmesim, não enchas mais la-
gos com tua cor vermelha, não de-
ves correr como riachos durante a
maré alta, nem sinuosamente
como rios.
118 Interrompas o teu fluir, por
meio de uma palavra mágica, tal
como as quedas de Tyrya ou os
rios de Tuoni que se aquietam
quando o céu retém suas gotas de
chuva e o mar desiste de suas
águas durante a escassez das esta-
ções ou nos anos de fogo e tortura.
119 Se não atenderes a este pe-
dido, tomarei outras medidas, pois
possuo o conhecimento de outras
forças.
120 Invocarei os ferros de Hisi e
neles te submeterei a fervura e as-
samento, com o objetivo de conter
o teu fluxo carmesim e, dessa
forma, salvar o herói ferido.
121 Caso essas medidas se reve-
lem ineficientes e as ações toma-
das se mostrem inúteis, invocarei
Ukko, o ser Onisciente, reconhe-
cido como o mais poderoso dos
criadores, superando em força to-
dos os heróis antigos e sendo mais
sábio do que os mágicos do
mundo.
122 Ele examinará atentamente o
fluxo carmesim da ferida e a curará
com sua sabedoria, curará o feri-
mento causado por um machado.
123 Ukko, Deus de amor e mise-
ricórdia, Deus e Mestre dos céus,
peço que venha até aqui, pois sua
presença é necessária e urgente.
124 Rogo-te que estenda sua
mão para auxiliar seus filhos, to-
cando esta ferida com dedos que
possuem o poder de cura.
125 Interrompa o fluxo desse vi-
tal sangue heróico e enfaixe a fe-
rida com cuidado, utilizando sua-
ves folhetos e misturando-os com
flores medicinais.
126 Dessa forma, poderemos de-
ter o fluxo vermelho carmesim e,
assim, salvar a vida deste grande
mago.
127 Peço-lhe, salve a vida de
Väinämöinën."
128 No momento em que as pa-
lavras mágicas eram pronuncia-
das, o fluxo de sangue cessou.
129 O homem de barba grisalha,
regozijando, instruiu seu jovem fi-
lho a ir à forja e preparar um bál-
samo curativo.
130 O bálsamo seria feito a partir
de uma mistura cuidadosa de ervas
de fibras tenras, plantas medici-
nais, caules que secretam mel, raí-
zes e flores.
131 No caminho, ele se depara
com um carvalho e, dirigindo-se a
ele, o filho pergunta: "Possuis mel
em teus ramos? Corre em ti uma
seiva repleta de doçura?".
132 O carvalho, com sua sabedo-
ria, responde: "Certamente, con-
tudo, na noite anterior, o mel es-
correu sobre meus galhos disper-
sos, enquanto as nuvens espalha-
ram sua fragrância.
133 Elas peineiraram o mel entre
as minhas folhas, provindo de sua
morada celestial."
134 Em seguida, o filho recolhe
lascas de madeira de carvalho e os
galhos mais jovens dessa árvore.
135 Ele colhe uma variedade de
ervas curativas, incluindo flores e
ervas mais raras encontradas das
Terras do Norte.
136 Essas plantas são colocadas
dentro de uma chaleira de cobre e
inseridas na fornalha.
137 O filho deixa as ervas mace-
rarem e fervem juntas, juntamente
com os pedaços de casca do carva-
lho.
138 São utilizadas muitas ervas
com virtudes curativas.
139 Ele as deixa embebidas por
um dia, depois por mais um, e em
seguida, por três longos dias du-
rante o clima de verão, tanto du-
rante o dia quanto à noite.
140 Após esse período, ele testa
seu bálsamo mágico, verificando
se está pronta e se seu remédio está
completo.
141 No entanto, o bálsamo se
mostra ineficaz e indigno.
142 Ele acrescentou outras ervas
às já existentes, ervas conhecidas
por suas virtudes curativas.
143 Essas ervas foram trazidas
de nações distantes, localizadas a
centenas de léguas ao norte.
144 Elas foram colhidas pelos
mais sábios menestréis e trazidas
por nove encantadores.
145 Após três dias, o bálsamo foi
embebido novamente.
146 Durante três noites, o fogo
foi cuidadosamente controlado.
147 Por nove dias e noites, ele
foi observado constantemente.
148 Em seguida, o curandeiro
experimentou novamente o un-
guento, examinando-o com cau-
tela e fazendo testes.
149 Finalmente, ele descobriu
que estava pronta e concluiu que o
bálsamo mágico estava acabado.
150 Próximo dali encontrava-se
uma bétula com múltiplos ramos,
localizada à margem do prado.
151 Infelizmente, ela tinha sido
maliciosamente quebrada pelo vil
Hisi.
152 Com presteza, ele toma seu
bálsamo curativo e aplica-o nos
galhos fraturados.
153 Esfrega cuidadosamente o
bálsamo nas áreas lesionadas e, as-
sim, dirige-se à bétula: "Por meio
deste bálsamo, eu te unjo, co-
brindo tuas feridas com este un-
guento.
 154 Que os teus locais lesiona-
dos sejam adequadamente protegi-
dos.
155 Agora, a bétula deve se recu-
perar, tornando-se ainda mais bela
do que antes."
156 É verdade que a bétula rapi-
damente se restabeleceu, adqui-
rindo uma beleza ainda maior do
que antes.
157 Seus galhos se tornaram
mais uniformes e seu tronco mais
robusto e majestoso.
158 Essa transformação se deu
graças ao poder curativo do bál-
samo e do unguento mágico.
159 Aplicou-os sobre o arenito
lascado, os blocos quebrados de
granito e as fissuras nas monta-
nhas.
160 Como resultado, as partes
danificadas se reuniram e todos os
fragmentos cresceram juntos.
161 Então, o jovem retornou
prontamente com o bálsamo que
havia finalizado.
162 Ele entregou o unguento ao
homem idoso de barba grisalha, e
o menino proferiu as seguintes pa-
lavras: "Aqui trago o bálsamo da
cura, trago-te um unguento mara-
vilhoso.
163 Ele une as partes quebradas
do granito, faz com que os frag-
mentos se unam, aquece as racha-
duras nas montanhas e restaura a
bétula ferida."
164 O velho testou o bálsamo
mágico com a língua e descobriu
que era um remédio eficaz, pos-
suindo virtudes mágicas.
165 Em seguida, ungiu o menes-
trel e utilizou o bálsamo mágico
para curar as feridas de
Väinämöinën.
166 Enquanto fazia isso, proferiu
palavras de sabedoria antiga, di-
zendo: "Não confie apenas em sua
própria virtude e não dependa ape-
nas de seu próprio poder.
167 Coloque sua confiança na
força do seu Criador.
168 Não se orgulhe de sua pró-
pria sabedoria, mas fale com a lín-
gua do poderoso Ukko.
169 Se há doçura em minha
boca, ela vem do meu Criador.
170 Se minhas mãos estão cheias
de beleza, toda a beleza vem de
Ukko."
171 Quando as feridas foram tra-
tadas com unguento, quando o un-
guento mágico as tocou, imediata-
mente o antigo Väinämöinën so-
freu uma terrível dor e angústia.
172 Ele afundou no chão em tor-
mento, virando-se de um lado para
o outro, procurando descanso em
vão.
173 Sua dor persistia até que o
barba grisalha a dissipou, banindo-
a pela ajuda da magia.
174 Ele afastou seu tormento
mortal para o tribunal de todos os
nossos problemas, para a mais alta
colina de tortura, para as rochas e
saliências distantes, para as monta-
nhas que carregam o mal, para o
reino do perverso Hisi.
 175 Então ele tomou um tecido
de seda e rapidamente o rasgou em
pedaços, fazendo tiras iguais para
fazer uma bandagem.
176 Amarrou as pontas com fitas
de seda, criando assim uma banda-
gem de cura.
177 Em seguida, habilmente en-
volveu o joelho e o tornozelo de
Väinämöinën, envolvendo as feri-
das do mágico.
178 E o de barba grisalha profe-
riu esta oração: "O tecido de Ukko
é a bandagem, a ciência de Ukko é
o cirurgião.
179 Estes serviram ao herói fe-
rido, envolvendo as feridas do Má-
gico.
180 Ó Deus misericordioso, olha
para nós, vem e guarda-nos, bon-
doso Criador, e protege-nos de
todo o mal! Guia nossos pés para
que não tropecem, guarda nossas
vidas de todos os perigos, dos bos-
ques perversos de Hisi."
181 Väinämöinën, um homem
idoso e digno, experimentou a po-
derosa assistência da magia.
182 Ele sentiu a ajuda graciosa
de Ukko e imediatamente seu
corpo se fortaleceu.
183 Suas feridas se curaram ins-
tantaneamente, e a terrível dor de-
sapareceu rapidamente.
184 O herói cresceu em força e
resistência, e pôde caminhar em
total liberdade.
185 Ele movimentou seus joe-
lhos em todas as direções, sem co-
nhecer nem dor nem problemas.
186 Então, o antigo
Väinämöinën ergueu seus olhos
para o alto Jumala e olhou com
gratidão para o céu.
187 Ele sentiu alegria e contenta-
mento enquanto se dirigia ao onis-
ciente Ukko.
188 Esta foi a oração que o me-
nestrel proferiu: "Ó seja louvado,
tu Deus de misericórdia, permita-
me louvar-te, meu Criador, pois
me deste assistência e concedeste
tua proteção.
189 Curaste minhas feridas e
acalmaste minha angústia, baniste
toda minha dor e problemas causa-
dos pelo Ferro e por Hisi.
190 Ó, vós, povo de Wainola,
povo desta geração e o povo das
eras futuras, não vos orgulheis em
emulação de barcos fluviais ou
chalupas oceânicas, vangloriando-
se de sua bela aparência; pois so-
mente Deus pode realizar a con-
clusão e dar causa ao seu final per-
feito.
191 Nunca a mão do homem
pode encontrá-la, nunca o herói
pode alcançá-la.
192 Ukko é o único Mestre."
RUNA X.
ILMARINEN FORJA O SAMPO.
Väinämöinën, o mágico, monta
em seu corcel de cor de cobre, en-
gatando rapidamente seu corcel de
pés velozes e colocando-o no trenó
de neve.
 2 Ele salta imediatamente sobre
o assento cruzado e estala seu chi-
cote adornado com joias.
3 O corcel voa adiante como os
ventos, enquanto o piloto acelera
como um relâmpago, fazendo o
trenó de neve ranger e chocalhar, e
a estrada desaparecer rapidamente.
4 Ele atravessa pântanos e flores-
tas, sobre colinas e vales, sobre
pântanos, montanhas, férteis planí-
cies e prados.
5 Assim, ele viaja por um dia, de-
pois outro, e então um terceiro,
desde a manhã até a noite.
6 chegar à noite do terceiro dia,
ele alcança a ponte infinita de
Osmo, os campos e pastagens de
Osmo, e as planícies de Kalevala.
7 Foi então que o herói falou o
seguinte: "Que os lobos devorem o
sonhador, que o Lapônio seja co-
mido no jantar, que a doença des-
trua o fanfarrão, aquele que disse
que eu nunca mais veria minha
amada pátria, minha parentela,
nunca mais durante toda a minha
vida, nunca enquanto o sol bri-
lhasse, nunca enquanto o luar bri-
lhasse nos prados de Wainola, nas
planícies de Kalevala."
8 Então, o venerável
Väinämöinën, um antigo bardo e
renomado cantor, deu início ao seu
ato de revitalizar seus encantamen-
tos.
9 Ele entoou com maestria as pa-
lavras diante de um imponente pi-
nheiro, cuja grandiosidade era de
tirar o fôlego.
10 Sua melodia ecoou tão alto
que ultrapassou as nuvens em
constante crescimento, alcançando
com seu topo e galhos dourados os
próprios céus.
11 O pinheiro espalhou seus ga-
lhos pelo éter, em meio à lumino-
sidade radiante do sol.
12 Agora, ele entoa novamente
de maneira encantadora, cantando
para que a lua brilhe eternamente
sobre os galhos verdejantes do
abeto.
13 No topo, ele entoa à constela-
ção da Ursa Maior.
14 Em seguida, ele retorna rapi-
damente ao seu lar, apressando-se
em direção aos imponentes portões
dourados.
15 Sua cabeça está inclinada e
seu rosto enrugado, com o chapéu
levemente torto em sua testa.
16 Ele havia prometido a Ilmari-
nen, o artista mágico, que retorna-
ria como resgate para salvá-lo da
tortura nos distantes campos das
Terras do Norte, na triste Sariola.
17 Quando o garanhão de
Väinämöinën parou no campo de
Osmo e no prado, ele subiu rapida-
mente em seu trenó de neve.
18 O mágico então ouviu alguém
batendo, quebrando carvão dentro
da forja, utilizando um martelo pe-
sado.
19 Väinämöinën, renomado me-
nestrel, adentrou a forja direta-
mente e lá encontrou Ilmarinen, o
ferreiro, martelando com seu mar-
telo de cobre.
 20 Ilmarinen dirigiu-se com as
seguintes palavras: "Sê bem-
vindo, meu irmão Väinämöinën, o
respeitável e venerável
Väinämöinën! Por qual razão esti-
veste ausente por um longo perí-
odo? Onde te ocultaste por tanto
tempo?"
21 Väinämöinën, em resposta,
proferiu as seguintes palavras: "De
fato, vivi durante um longo perí-
odo, em que inúmeros dias som-
brios se arrastaram e muitas noites
tristes perduraram.
22 Flutuei em meio ao oceano
implacável, chorei nos pântanos e
nas florestas da Terra do Norte, um
lugar sempre desagradável e obs-
curo conhecido como Sariola.
23 Percorri essas terras junto aos
lapões, um povo envolto em feiti-
çaria."
24 Imediatamente, Ilmarinen
respondeu com prontidão:"Ó tu,
velho Väinämöinën, reconhecido e
eterno cantor, conte-me sobre tua
jornada em direção ao norte, tuas
andanças pela Lapônia e sua dolo-
rosa jornada de retorno ao lar."
25 Disse o menestrel,
Väinämöinën:"Tenho uma história
maravilhosa para te contar, meu ir-
mão.
26 Nas terras do Norte, habita
uma virgem em uma aldeia, uma
donzela que não aceitará um
amante, rejeita a mão de um herói
e desdenha o coração de um mago.
27 Toda a Terra do Norte canta
seus louvores, elogiando seu valor
e beleza mágica.
28 Ela é a mais bela donzela de
Pohyola, filha da terra e do oceano.
29 De suas têmporas emite o bri-
lho do luar, e seu peito, o esplen-
dor do sol.
30 Sua testa resplandece o arco-
íris, e em seu pescoço, as sete es-
trelinhas, além da Grande Ursa que
repousa em seu ombro.
31 Ilmarinen, digno irmão, és o
único habilidoso ferreiro.
32 Vá e contemple sua beleza
maravilhosa.
33 Observe-a usando roupas de
ouro e prata, vestindo-se com as
melhores vestimentas.
34 Veja-a sentada no arco-íris,
caminhando sobre as nuvens de
púrpura.
35 Forje o Sampo mágico para
ela e crie uma tampa com várias
cores.
36 Como recompensa, receberás
a virgem e conquistarás essa noiva
de beleza.
37 Parta e traga a adorável don-
zela para a sua casa em Kalevala."
38 O irmão Ilmarinen dirigiu-se
a Väinämöinën: "Ó tu, astuto
Väinämöinën, que já me prome-
teste resgatar-te da sempre som-
bria Terra do Norte, ao oferecer
tua devotada cabeça em troca.
39 No entanto, eu nunca irei visi-
tar as Terras do Norte, tampouco
ver a tua donzela, e não nutrirei
amor pela Noiva da Beleza.
40 Jamais sob o luar brilhante,
irei à sombria Pohya ou às planí-
cies de Sariola, onde as pessoas se
devoram e afundam seus heróis no
oceano, nem mesmo em troca de
todas as donzelas da Lapônia."
41 O irmão Väinämöinën profe-
riu: "É-me possível relatar-lhe pro-
dígios ainda mais grandiosos.
Ouça a minha narrativa extraordi-
nária: Testemunhei o abeto em
plena floração, com flores adorna-
das por ramos de coloração esme-
ralda.
42 Essa cena deslumbrante ocor-
ria nos campos e bosques de
Osmo.
43 No topo da árvore, o luar res-
plandecia, enquanto a Ursa Maior
habitava seus galhos."
44 Ilmarinen respondeu de forma
cética: "Não consigo crer em tua-
história, nem confiar em teus con-
tos de maravilhas, a menos que eu
mesmo testemunhe o abeto em
flor, com seus numerosos ramos
verde-esmeralda, acompanhado da
Ursa e de um brilhante luar."
45 Esta é a resposta de
Väinämöinën:“Não acreditarás na
minha história? Vem comigo e eu
te mostrarei, se meus lábios falam
fato ou ficção."
46 Rapidamente, eles partem em
uma viagem de descoberta, ansio-
sos por testemunhar o magnífico
abeto.
47 Väinämöinën assume a lide-
rança na jornada, enquanto Ilmari-
nen o acompanha de perto.
48 Conforme se aproximam das
fronteiras de Osmo, Ilmarinen se
apressa para poder contemplar
essa maravilha.
49 Ele espreita a Urso no topo do
abeto, que está sentado em galhos
de esmeralda.
50 E, enquanto observa, também
vislumbra o brilho do luar dou-
rado.
51 O antigo Väinämöinën falou
assim: "Querido Ilmarinen, suba
nesta árvore e traga para baixo os
raios dourados da lua.
52 Traga a Lua contigo quando
descer dos galhos altos do abeto."
53 Ilmarinen, consentindo com-
pletamente, prontamente escalou o
abeto dourado, alcançando o topo
do céu, com o propósito de trazer
os raios dourados da lua e trazer
também a constelação da Ursa
Maior do céu, retirando-a dos ra-
mos mais altos do abeto.
54 Após isso, o abeto em flor di-
rigiu-se a Ilmarinen com as se-
guintes palavras: "Ó tu, herói in-
sensato e imprudente, careces de
inteligência e discernimento.
55 Tu sobes pelos meus galhos
dourados sem nenhum julga-
mento, buscando tomar meus raios
de luar e tirar minha luz prateada
das estrelas, roubando meu Urso e
galhos floridos."
56 Com rapidez comparável ao
pensamento, o venerável
Väinämöinën entoou uma vez
mais em tons mágicos.
57 Ele entoou sobre um vendaval
que varria os céus, sobre ventos
selvagens enfurecidos.
 58 O cantor proferiu as seguintes
palavras: "Ó tempestade, toma o
ferreiro, leve-o em seu navio.
59 Faça isso rapidamente e colo-
que o herói na eternamente som-
bria Terra do Norte, na sombria
Sariola".
60 Eis que o vento da tempes-
tade, com rapidez, cobre o céu de
escuridão.
61 Agita-se o ar com vigor,
transformando-se em veleiro.
62 É nele que embarca o ferreiro
Ilmarinen, fugando dos galhos do
abeto, rumo à desolada Terra do
Norte, à sombria Sariola.
63 Navegou Ilmarinen pelos
ares, avançando incansavelmente
para o norte, seguindo a trilha dos
ventos impetuosos.
64 Sob a lua e a luz solar, caval-
gou ele nas costas amplas da
Grande Ursa, até que finalmente se
aproximou das densas florestas de
Pohyola e das moradas de Sariola.
65 Desceu ele sem ser notado,
passou despercebido pelos caçado-
res e não foi farejado pelos cães de
guarda.
66 Louhi, a anfitriã de Pohyola,
uma dama antiga e desdentada da
Terra do Norte, está de pé no pátio
aberto e se dirige a Ilmarinen, en-
quanto observa o herói estran-
geiro.
67 Ela pergunta: "Quem és tu,
vindo aqui no vento da tempes-
tade, sobre o caminho do trenó do
éter, despercebido pelos cães de
guarda de Pohya? Dos heróis anti-
gos, de toda a hoste de heróis?"
68 Ilmarinen responde: "Certa-
mente não vim aqui para ser la-
drado pelos cães de guarda, nestes
portais desconhecidos, nos portões
de Sariola."
69 Em seguida, a anfitriã da
Terra do Norte dirigiu-se nova-
mente ao herói estrangeiro: " Tu já
conheceste o ferreiro de Wainola,
o herói Ilmarinen, um habil fer-
reiro e artista? Por muito tempo,
aguardo ansiosamente a sua che-
gada, e há muito tempo esperamos
por este momento nas fronteiras da
Terra do Norte, para que ele possa
forjar o Sampo para mim."
70 O herói Ilmarinen disse: "De
fato, conheço o ferreiro Ilmarinen,
pois eu mesmo sou ele.
71 Sou o habilidoso ferreiro e ar-
tista."
72 Louhi, a anfitriã das Terras do
Norte, uma dama desdentada de
Sariola, corre imediatamente para
sua morada.
73 Eis as palavras que Louhi pro-
fere: "Venha, tu, a mais nova de
minhas filhas, venha, tu, a mais
bela de minhas donzelas.
74 Vista-se com as melhores
roupas, enfeite teu cabelo com as
joias mais raras, coloque pérolas
em seu peito inchado, use um colar
de ouro em teu pescoço, amarre
tua cabeça com fitas de seda, faça
tuas bochechas parecerem frescas
e coradas, e mantenha seu sem-
blante belo e cativante.
75 Pois o artista Ilmarinen, vindo
de Kalevala, está aqui para forjar-
nos o Sampo, martelar-nos a tampa
em cores."
76 A filha da Terra do Norte,
uma jovem honrada tanto pela
terra como pela água, prontamente
veste suas melhores roupas, esco-
lhendo vestidos ricos em beleza,
selecionando o mais fino do seu
guarda-roupa de seda.
77 Ela então adorna-se com um
filete de seda, coloca uma faixa de
cobre em sua testa, cinge sua cin-
tura com um cinto de ouro e
adorna seu pescoço com um colar
de pérolas.
78 Seu peito brilha com ouro re-
luzente, e em seus cabelos há fios
de prata.
79 Saindo de seu aposento, ela se
apressa ao salão, atenta e ouvindo,
repleta de beleza e alegria, com
orelhas atentas e olhos brilhantes,
bochechas coradas e um rosto en-
cantador, esperando ansiosamente
pelo herói estrangeiro.
80 Louhi, a anfitriã de Pohyola,
conduziu o herói Ilmarinen até sua
morada na Terra do Norte, em sua
casa em Sariola.
81 Ela o sentou em sua mesa
farta e lhe ofereceu as melhores
iguarias, proporcionando-lhe todo
o conforto necessário.
82 Em seguida, ela falou da se-
guinte maneira: "Ó tu, ferreiro Il-
marinen, mestre da forja! Será que
és capaz de forjar para mim o
Sampo, martelando a tampa com
cores, feita das pontas das penas de
cisnes brancos, utilizando o leite
de maior virtude e um único grão
de cevada, e a mais fina lã de ove-
lhas? Se fores capaz de fazer isso,
terás como recompensa a minha fi-
lha mais bela por este serviço pres-
tado."
83 Estas são as palavras de Ilma-
rinen:"Eu forjarei para ti o Sampo,
martelarei a tampa com cores,
usando penas de cisne branco, leite
da maior virtude, um único grão de
cevada e a mais fina lã de cordei-
ros.
84 Uma vez que forjei o arco do
céu e moldei ao ar em uma cober-
tura côncava antes que a terra ti-
vesse um começo."
85 E assim, o ferreiro mágico
partiu para forjar o maravilhoso
Sampo, em busca de uma oficina
de ferreiro.
86 Ele procurou fervorosamente
por ferramentas adequadas para re-
alizar seu trabalho.
87 No entanto, ele não encontrou
nenhum lugar propício para execu-
tar a forja.
88 Não havia ferraria disponível,
nem foles para avivar o fogo, nem
uma chaminé para direcionar a fu-
maça.
89 Além disso, ele não encontrou
uma bigorna para moldar o metal,
nem tenazes e martelo para dar
forma à obra.
90 Em seguida, o artista Ilmari-
nen expressou em solilóquio, di-
zendo: "Apenas as mulheres de-
sencorajam, apenas os patifes dei-
xam o trabalho incompleto, nem os
demônios, nem os heróis, nem os
Deuses mais sábios."
91 Então, o ferreiro Ilmarinen
começou a procurar um local ade-
quado para construir uma forja e
plantar um fole, nas terras do
Norte, nas colinas e prados de
Pohya.
92 Ele procurou durante um dia e
depois durante um segundo dia.
93 Antes da noite do terceiro dia,
uma pedra surgiu em seu campo de
visão, uma pedra que brilhava com
as cores do arco-íris.
94 Foi nesse lugar que o ferreiro
Ilmarinen começou seu trabalho
para construir a forja.
95 Ele acendeu uma fogueira e
ergueu uma chaminé.
96 No dia seguinte, colocou seu
fole e, no terceiro dia, construiu a
fornalha.
97 Assim, ele começou a forjar o
Sampo.
98 O eterno artista mágico, o an-
tigo ferreiro Ilmarinen, que foi o
primeiro de todos os ferreiros, mis-
turava certos metais e colocava a
mistura em um caldeirão.
99 Ele então o colocava no fundo
da fornalha e chamava os merce-
nários para a forja.
100 Habilmente, eles trabalha-
vam o fole, cuidavam do fogo e
adicionavam o combustível du-
rante três belos dias de verão e três
curtas noites do solstício de verão.
101 Foi somente após esse perí-
odo que as rochas começaram a
florescer nas pegadas dos trabalha-
dores, graças ao calor mágico pro-
veniente da fornalha.
102 No primeiro dia, Ilmarinen
se curvou e observou atentamente
o interior de sua fornalha, procu-
rando ver o que poderia estar se
formando a partir do fogo mágico
e dos metais.
103 Das chamas, surgiu uma
besta com um brilho semelhante
ao dos raios da lua, um arco dou-
rado com pontas de prata.
104 Em sua haste reluzia o cobre
brilhante, e o arco era forte e ma-
ravilhoso.
105 No entanto, ai! a besta era de
má índole, exigindo um herói to-
dos os dias e duas cabeças em dias
de festa.
106 Ilmarinen, o hábil artista,
não se agradou dessa criação e de-
cidiu quebrar o arco em vários pe-
daços.
107 Ele o lançou de volta na for-
nalha e manteve os mercenários
trabalhando no fole, empenhado
em forjar o mágico Sampo.
108 No segundo dia, o ferreiro
curvou-se e examinou cuidadosa-
mente o interior da fornalha.
109 Dali, emergiu um objeto
feito de metais fundidos, asseme-
lhando-se a um barco de cor púr-
pura.
110 Cada parte dele reluzia em
tons dourados, e os remos eram ha-
bilmente forjados em cobre.
 111 O esquife possuía uma be-
leza admirável, porém, lamenta-
velmente, estava manchado por
algo maligno.
112 Rapidamente se envolvia em
problemas, instigando brigas e se
lançando em combates maliciosos,
sem qualquer provocação.
113 Ilmarinen, o hábil artista,
também não se agradou dessa cri-
ação e quebrou o esquife em vários
pedaços.
114 Ele o lançou de volta na for-
nalha e manteve os mercenários
trabalhando no fole, empenhado
em forjar o mágico Sampo.
115 No terceiro dia, Ilmarinen, o
renomado ferreiro, curvou-se e
examinou cuidadosamente o fundo
da fornalha.
116 Lá, ele avistou uma novilha
majestosa, cujos chifres resplande-
ciam em ouro, chamada Kimmoa.
117 Sobre sua cabeça, ostentava
a constelação da Ursa Maior, e em
sua testa, um disco solar radiante.
118 Era uma bela vaca com po-
deres mágicos.
119 No entanto, lamentavel-
mente, essa criatura era de índole
maligna.
120 Ela corria precipitadamente
pela floresta, atravessando pânta-
nos e prados, desperdiçando todo o
seu leite ao correr.
121 Ilmarinen, o hábil artista,
também não se agradou dessa cri-
ação e cortou a vaca em vários pe-
daços.
a
Kim'mo. Um nome para a vaca; a filha de Kammo, o patrono das rochas.
122 Ele a lançou de volta na for-
nalha ardente e manteve os merce-
nários trabalhando no fole, empe-
nhado em forjar o mágico Sampo.
123 No quarto dia, Ilmarinen
desceu e examinou cuidadosa-
mente a fornalha até o fundo.
124 Lá ele viu um belo arado
emergindo do fogo dos metais.
125 A ponta e a relha do arado
eram douradas, e a viga era feita de
cobre forjado.
126 Os cabos eram de prata fun-
dida, tornando-o um arado encan-
tador e maravilhoso.
127 No entanto, infelizmente, ele
era indisciplinado.
128 Ele arava campos de milho e
cevada e sulcava os prados mais
férteis.
129 Ilmarinen, estava insatisfeito
com sua criação.
130 Decidiu, então, quebrar rapi-
damente o arado em pedaços e
jogá-lo de volta na fornalha.
131 Ele permitiu que os ventos
atendessem ao fole, deixando os
ventos da tempestade incendiarem
os metais.
132 Os ventos do céu competiam
ferozmente: o vento leste soprava,
o vento oeste rugia, o vento sul gri-
tava e o vento norte uivava.
133 Sopraram um dia e depois
um segundo, sopraram o terceiro
desde a manhã até a noite.
134 Foi quando o fogo saltou pe-
las janelas e as faíscas voaram para
cima pela porta.
 135 Nuvens de fumaça subiram
para o céu, misturando-se com as
nuvens enquanto os ventos da tem-
pestade dobravam o fole.
136 Na terceira noite, Ilmarinen,
inclinando-se para examinar seus
metais, encontrou-se diante das
profundezas da fornalha.
137 Lá testemunhou o milagroso
Sampo emergir, contemplou a
tampa multicolorida.
138 Rapidamente, o talentoso ar-
tesão de Wainola empunhou a te-
naz e a bigorna, martelando habil-
mente o Sampo com força.
139 No processo, ele o forjava de
modo exímio.
140 De um lado, o Sampo moía
farinha; do outro, produzia sal; em
outra face, forjava fortuna, en-
quanto a tampa exibia suas múlti-
plas cores.
141 Assim, o Sampo moía inces-
santemente, movendo-se de um
lado para o outro com um balançar
suave.
142 Moía uma medida ao romper
do dia, uma medida própria para
alimentação, uma segunda medida
destinada ao mercado e uma ter-
ceira medida para ser armazenada.
143 Com grande alegria, a nobre
dama da Terra do Norte, chamada
Louhi e conhecida como anfitriã
de Pohyola, parte levando consigo
o mágico Sampo.
144 Ela o conduz em direção às
colinas de Sariola, nas majestosas
montanhas de cobre.
145 Lá, ela coloca nove fecha-
duras sobre essa maravilha e faz
com que três poderosas raízes se
espalhem ao seu redor.
146 Essas raízes crescem na terra
por nove braças, sendo uma delas
uma imensa raiz localizada sob a
montanha, outra sob a areia do
leito do mar, e a terceira sob a mo-
rada das montanhas.
147 Humildemente, Ilmarinen
implora pela resposta voluntária da
donzela. Eis suas palavras: "Que-
res vir comigo, bela donzela, tor-
nar-te minha esposa e rainha para
sempre? Eu forjei para ti o Sampo,
e forjei a tampa em diversas co-
res."
148 A bela e adorável filha das
Terras do Norte respondeu ao fer-
reiro: "Quem se aventurará na pró-
xima primavera e no segundo ve-
rão para liderar o canto e o eco do
cuco? Quem atenderá ao seu cha-
mado e cantará com ele no outono?
Deveria eu partir para terras dis-
tantes? Deveria esta alegre donzela
desaparecer dos campos de Sari-
ola, dos pântanos e florestas de
Pohyola, onde o cuco canta e
ecoa? Se eu deixasse a casa de meu
pai, se a amora de minha mãe de-
saparecesse, se estas montanhas
perdessem suas cerejas, então o
cuco também desapareceria.
149 Todos os pássaros deixa-
riam a floresta, abandonariam os
picos das montanhas e partiriam de
meus campos e florestas nativas.
Jamais, em minha vida, direi adeus
à virginal liberdade, nem aos cui-
dados e trabalhos de verão, para
que a colheita não seja negligenci-
ada, para que as bagas não sejam
deixadas para trás, para que os pás-
saros melódicos não abandonem a
floresta, para que as sereias não
deixem as águas, para que eu não
cante mais com elas."
150 Ilmarinen, o mágico e eterno
forjador de metal, estava com o
quepe torto e a cabeça abaixada.
151 Seu coração estava pesado e
desapontado, e suas mãos estavam
vazias, enquanto ele pensava em
como alcançar sua pátria distante,
seu lar amado e querido, os prados
de Wainola.
152 Ele desejava retornar da
nunca agradável Terra do Norte e
da sombria Sariola.
153 Então, Louhi, a senhora do
Norte, falou com o pretendente Il-
marinen:"Ó tu, ferreiro Ilmarinen,
por que tens o coração tão pesado?
Por que está teu semblante tão aba-
tido? Tens em mente viajar dos va-
les e colinas de Pohya para os pra-
dos de Wainola, para tua casa em
Kalevala?"
154 Essa é a resposta de Ilmari-
nen:"Minha mente anseia para lá,
para minha terra natal.
155 Deixe-me partir rumo aos
meus parentes e ali permanecer,
descansando em meu próprio
país."
156 Imediatamente, Louhi, uma
anfitriã das Terras do Norte, con-
cedeu ao herói todo conforto ne-
cessário.
157 Ela o alimentou com comi-
das requintadas e deliciosas, e o
acomodou em um barco feito de
cobre, revestido com o mesmo ma-
terial.
158 Louhi convocou os ventos
para ajudá-lo e o vento norte o
guiou de volta para sua terra natal.
159 Assim, o hábil Ilmarinen
partiu em viagem em direção à sua
pátria.
160 Ele navegou pelas profunde-
zas azuis das águas, viajando por
um dia e depois por um segundo
dia, até que, na terceira noite, che-
gou aos pacíficos prados de Wai-
nola, à sua casa em Kalevala.
161 Num instante, o venerável
Väinämöinën voltou-se para Ilma-
rinen e disse-lhe:"Ó meu irmão,
exímio artesão do metal, tu, que és
o eterno criador de maravilhas,
forjaste o mágico Sampo? Forjaste
a sua tampa em várias cores?"
162 O irmão Ilmarinen disse es-
tas palavras conforme o mestre fa-
lou: "Sim, eu criei o Sampo má-
gico.
163 Forjei a tampa com várias
cores, que balança para lá e para
cá.
164 Ela moe uma medida ao
amanhecer, uma medida para ser
consumida, uma segunda medida
para o mercado e uma terceira me-
dida para o armazém.
165 Louhi possui o maravilhoso
Sampo, eu, porém, não tenho a
Noiva da Beleza."
 RUNA XI.
LAMENTO DE LEMMINKAINEN.
Esta é a história de Ahti, também
conhecido como Lemminkainena,
filho de Lempo, Kaukomielib.
2 Ahtic era o governante das
ilhas, tendo crescido entre as casas
das ilhas, no local onde sua amada
mãe residia, nas margens do oce-
ano e nas pontas dos promontórios.
3 Ele se alimentava de salmão e
badejo dos oceanos, o que o tornou
um herói poderoso.
4 Em suas veias corria o sangue
de gerações passadas, sua postura
era altiva e sua presença domi-
nante.
5 Sua mente e corpo se desenvol-
veram de forma perfeita.
6 Mas, ai! ele possuía falhas.
7 Seu coração e sua moral eram
maus, e ele vagava por lugares im-
próprios, passando dias e noites
nas casas de donzelas alegres e
participando das danças das vir-
gens, envolvendo-se com donzelas
de longas tranças.

a
O que significa é desconhecido, possivelmente relacionado ao finlandês Lempi
"amor".
b
Um nome próprio masculino que significa “observado, distraído ; mentalmente
distante ; viajante indiferente , sem objetivo e aventureiro , impelido a viajar pelo
desejo de viajar ; sonhador cuja mente está frequentemente sonhando acordado em
outro tempo e lugar”
c
Ahti – Nome masculino de significado desconhecido. Este é o nome do deus fin-
landês do oceano, dos rios e da pesca.