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Informativo 996-STF
Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE
DIREITO CONSTITUCIONAL
DIREITO À SAÚDE
▪ Inconstitucionalidade da Lei 13.269/2016, que autorizou o uso da fosfoetanolamina sintética.

MEDIDAS PROVISÓRIAS
▪ É possível o controle judicial dos pressupostos de relevância e urgência para a edição de medidas provisórias, no
entanto, esse exame é de domínio estrito, somente havendo a invalidação quando demonstrada a inexistência cabal
desses requisitos.

DIREITO ADMINISTRATIVO
PODER DE POLÍCIA
▪ É possível a delegação do poder de polícia – inclusive da possibilidade de aplicação de multas – para pessoas
jurídicas de direito privado?

DIREITO PROCESSUAL PENAL


PRISÃO PREVENTIVA
▪ Pais e outros responsáveis por menor de 12 anos ou por pessoa com deficiência possuem direito à prisão domiciliar,
desde que observados os requisitos do art. 318 do CPP e não tenham praticado crime com violência ou grave ameaça
ou contra os próprios filhos ou dependentes.

DIREITO TRIBUTÁRIO
PARCELAMENTO TRIBUTÁRIO
▪ Para que ocorra a exclusão do contribuinte do REFIS é indispensável a sua prévia intimação.

ICMS
▪ Mato Grosso do Sul tem direito exclusivo ao ICMS sobre importação de gás da Bolívia considerando que é nesse
Estado que está localizado o estabelecimento do destinatário jurídico do gás, ainda que ele seja enviado para outros
Estados logo em seguida.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA
▪ Não é legítima a incidência de contribuição social, a cargo do empregador, sobre os valores pagos a título de salário-
maternidade

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DIREITO CONSTITUCIONAL

DIREITO À SAÚDE
Inconstitucionalidade da Lei 13.269/2016, que autorizou o uso da fosfoetanolamina sintética

É inconstitucional a Lei nº 13.269/2016, que autorizou o uso da fosfoetanolamina sintética


("pílula do câncer) por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna mesmo sem que
existam estudos conclusivos sobre os efeitos colaterais em seres humanos e mesmo sem que
haja registro sanitário da substância perante a ANVISA.
Ante o postulado da separação de Poderes, o Congresso Nacional não pode autorizar, atuando
de forma abstrata e genérica, a distribuição de medicamento.
Compete à ANVISA permitir a distribuição de substâncias químicas, segundo protocolos
cientificamente validados. O controle dos medicamentos fornecidos à população leva em conta
a imprescindibilidade de aparato técnico especializado, supervisionado pelo Poder Executivo.
O direito à saúde não será plenamente concretizado se o Estado deixar de cumprir a obrigação
de assegurar a qualidade de droga mediante rigoroso crivo científico, apto a afastar
desengano, charlatanismo e efeito prejudicial.
STF. Plenário. ADI 5501/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 23/10/2020 (Info 996).

Fosfoetanolamina sintética ("pílula do câncer")


Um professor da USP, Gilberto Chierice, atualmente aposentado, desenvolveu, na década de 1970, uma
substância chamada de fosfoetanolamina sintética, que serviria para auxiliar na cura contra o câncer.
Durante muitos anos, a fosfoetanolamina sintética foi distribuída gratuitamente para inúmeros
portadores de câncer que aceitavam participar das pesquisas. A substância ficou conhecida como "pílula
do câncer".
Ocorre que a fosfoetanolamina era ministrada aos doentes sem que tivesse havido ainda aprovação desta
substância pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Diante disso, em junho de 2014, uma portaria da USP proibiu a distribuição da fosfoetanolamina até que
houvesse a aprovação da Anvisa. A vedação imposta fez com que diversos pacientes buscassem o Poder
Judiciário pedindo o afastamento da proibição e o fornecimento da substância.
Além disso, os doentes e familiares de pacientes fizeram inúmeras campanhas na internet pedindo para
que as autoridades liberassem a distribuição e o uso da fosfoetanolamina.

Lei nº 13.269/2016.
Diante da grande repercussão causada, o Congresso Nacional decidiu aprovar a Lei nº 13.269/2016
autorizando o uso da fosfoetanolamina sintética por pacientes portadores de câncer, mesmo sem a
aprovação da Anvisa. Veja o que diz a Lei:
Art. 1º Esta Lei autoriza o uso da substância fosfoetanolamina sintética por pacientes
diagnosticados com neoplasia maligna.
Art. 2º Poderão fazer uso da fosfoetanolamina sintética, por livre escolha, pacientes
diagnosticados com neoplasia maligna, desde que observados os seguintes condicionantes:
I - laudo médico que comprove o diagnóstico;
II - assinatura de termo de consentimento e responsabilidade pelo paciente ou seu representante
legal.
Parágrafo único. A opção pelo uso voluntário da fosfoetanolamina sintética não exclui o direito de
acesso a outras modalidades terapêuticas.
Art. 3º Fica definido como de relevância pública o uso da fosfoetanolamina sintética nos termos
desta Lei.
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Art. 4º Ficam permitidos a produção, manufatura, importação, distribuição, prescrição,


dispensação, posse ou uso da fosfoetanolamina sintética, direcionados aos usos de que trata esta
Lei, independentemente de registro sanitário, em caráter excepcional, enquanto estiverem em
curso estudos clínicos acerca dessa substância.
Parágrafo único. A produção, manufatura, importação, distribuição, prescrição e dispensação da
fosfoetanolamina sintética somente são permitidas para agentes regularmente autorizados e
licenciados pela autoridade sanitária competente.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

ADI 5501
A Associação Médica Brasileira (AMB) ajuizou ADI contra a Lei n.º 13.269/2016.
A entidade alegou que, diante do “desconhecimento amplo acerca da eficácia e dos efeitos colaterais” da
substância em seres humanos, sua liberação é incompatível com direitos constitucionais fundamentais,
como o direito à saúde (arts. 6º e 196), o direito à segurança e à vida (art. 5º), e o princípio da dignidade
da pessoa humana (art. 1º, III).
Na ADI, a autora argumentou que a fosfoetanolamina sintética foi testada unicamente em camundongos,
tendo sido eficaz apenas no combate do melanoma (câncer de pele).
A AMB explicou que a “pílula do câncer” não passou pelos testes clínicos em seres humanos exigidos pela
legislação e que a permissão do seu uso causa risco grave à vida e à integridade física dos pacientes.

O STF, ao apreciar a medida cautelar, concordou com a tese defendida na ADI? A Lei nº 13.269/2016,
que autorizou o uso da fosfoetanolamina, contraria a Constituição Federal?
SIM. Em 2016, o STF, por decisão majoritária, deferiu medida liminar para suspender a eficácia da Lei nº
13.269/2016.
É inconstitucional a Lei nº 13.269/2016, que autorizou o uso da fosfoetanolamina sintética ("pílula do
câncer) por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna, mesmo sem que existam estudos
conclusivos sobre os efeitos colaterais em seres humanos e mesmo sem que haja registro sanitário da
substância perante a ANVISA.
STF. Plenário. ADI 5501 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 19/5/2016 (Info 826).

Violação ao direito à saúde (art. 196 da CF/88)


A Lei nº 13.269/2016, ao permitir o uso da fosfoetanolamina suspendendo a exigência do registro
sanitário, violou o direito à saúde previsto no art. 196 da CF/88, considerando que é dever do Estado
reduzir o risco de doença e outros agravos à saúde dos cidadãos.
O Poder Público tem o dever de fornecer medicamentos e tratamentos médicos à população. No entanto,
isso deve ser feito com responsabilidade, devendo-se zelar pela qualidade e segurança dos produtos em
circulação no território nacional.
A busca pela cura de enfermidades não pode ser feita sem se preocupar com a qualidade das drogas
distribuídas aos indivíduos, sendo necessária uma rigorosa análise científica.
A Lei nº 13.269/2016 permitiu a distribuição do remédio sem o controle prévio de viabilidade sanitária.
Entretanto, a aprovação do produto no órgão do Ministério da Saúde é condição indispensável para a sua
industrialização, comercialização e importação com fins comerciais, conforme exige o art. 12 da Lei nº
6.360/76.
O registro é condição para o monitoramento da segurança, eficácia e qualidade terapêutica do produto.
Sem o registro, há uma presunção de que o produto é inadequado à saúde humana.
A lei impugnada é casuística ao dispensar o registro do medicamento como requisito para sua
comercialização, e esvazia, por via transversa, o conteúdo do direito fundamental à saúde.

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Ofensa ao princípio da separação dos Poderes


O STF entendeu, ainda, que a Lei nº 13.269/2016 ofendeu o princípio da separação de Poderes. Isso porque
incumbe ao Estado o dever de zelar pela saúde da população. Para isso, foi criada a Anvisa, uma autarquia
técnica vinculada ao Ministério da Saúde, que tem o dever de autorizar e controlar a distribuição de
substâncias químicas segundo protocolos cientificamente validados.
A atividade fiscalizatória é realizada mediante atos administrativos concretos devidamente precedidos de
estudos técnicos. Não cabe ao Congresso, portanto, viabilizar, por ato abstrato e genérico, a distribuição
de qualquer medicamento.
Assim, é temerária a liberação da substância em discussão sem os estudos clínicos correspondentes, em
razão da ausência, até o momento, de elementos técnicos assertivos da viabilidade do medicamento para
o bem-estar do organismo humano.

Julgamento definitivo
Em 2020, o STF confirmou a medida cautelar e julgou procedente o pedido formulado para declarar a
inconstitucionalidade da aludida lei. Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin, Dias Toffoli e Gilmar
Mendes, que conferiram interpretação conforme à CF ao art. 2º da referida norma.

É inconstitucional a Lei nº 13.269/2016, que autorizou o uso da fosfoetanolamina sintética ("pílula do


câncer) por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna mesmo sem que existam estudos
conclusivos sobre os efeitos colaterais em seres humanos e mesmo sem que haja registro sanitário da
substância perante a ANVISA.
Ante o postulado da separação de Poderes, o Congresso Nacional não pode autorizar, atuando de forma
abstrata e genérica, a distribuição de medicamento.
Compete à ANVISA permitir a distribuição de substâncias químicas, segundo protocolos cientificamente
validados. O controle dos medicamentos fornecidos à população leva em conta a imprescindibilidade
de aparato técnico especializado, supervisionado pelo Poder Executivo.
O direito à saúde não será plenamente concretizado se o Estado deixar de cumprir a obrigação de
assegurar a qualidade de droga mediante rigoroso crivo científico, apto a afastar desengano,
charlatanismo e efeito prejudicial.
STF. Plenário. ADI 5501/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 23/10/2020 (Info 996).

MEDIDAS PROVISÓRIAS
É possível o controle judicial dos pressupostos de relevância e urgência para a edição de
medidas provisórias, no entanto, esse exame é de domínio estrito, somente havendo a
invalidação quando demonstrada a inexistência cabal desses requisitos

Inexistindo comprovação da ausência de urgência, não há espaço para atuação do Poder


Judiciário no controle dos requisitos de edição de medida provisória pelo chefe do Poder
Executivo.
STF. Plenário. ADI 5599/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 23/10/2020 (Info 996).

O que é medida provisória?


Medida provisória é um ato normativo editado pelo Presidente da República, em situações de relevância
e urgência, e que tem força de lei, ou seja, é como se fosse uma lei ordinária, com a diferença de que ainda
será votada pelo Congresso Nacional, podendo ser aprovada (quando, então, é convertida em lei) ou
rejeitada (situação em que deixará de existir).
As regras sobre as medidas provisórias estão previstas no art. 62 da CF/88.

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É possível que o Poder Judiciário analise se a medida provisória editada possui relevância e urgência?
Em uma ADI proposta, é possível que o STF julgue inconstitucional medida provisória pelo fato de ela
não ter relevância e urgência?
SIM.
O STF admite a possibilidade de controle judicial dos pressupostos de relevância e urgência para a edição
de medidas provisórias. No entanto, “o escrutínio a ser feito pelo Judiciário neste particular é de domínio
estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal
desses requisitos” (RE 592.377).
Em outras palavras, somente em casos excepcionais será possível a declaração de inconstitucionalidade
com base nesse argumento.

Inexistindo comprovação da ausência de urgência, não há espaço para atuação do Poder Judiciário no
controle dos requisitos de edição de medida provisória pelo chefe do Poder Executivo.
STF. Plenário. ADI 5599/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 23/10/2020 (Info 996).

No mesmo sentido:
O art. 62 da CF/88 prevê que o Presidente da República somente poderá editar medidas provisórias em
caso de relevância e urgência.
A definição do que seja relevante e urgente para fins de edição de medidas provisórias consiste, em regra,
em um juízo político (escolha política/discricionária) de competência do Presidente da República,
controlado pelo Congresso Nacional.
Desse modo, salvo em caso de notório abuso, o Poder Judiciário não deve se imiscuir na análise dos
requisitos da MP.
STF. Plenário. ADI 4627/DF e ADI 4350/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgados em 23/10/2014 (Info 764).

 (Agente PC/GO 2016 CEBRASPE) Por força do princípio da separação de poderes, é vedado ao Poder
Judiciário examinar o preenchimento dos requisitos de urgência e de relevância por determinada medida
provisória. (errado)
 (Advogado Telebrás 2015 CEBRASPE) Segundo entendimento do STF, os requisitos constitucionais
legitimadores da edição de medidas provisórias, quanto aos conceitos jurídicos indeterminados de
relevância e urgência, apenas em caráter excepcional se submetem ao crivo do Poder Judiciário, por força
do princípio da separação de poderes. (certo)

Forma de realizar esse controle


A forma de se realizar esse controle deve depender da motivação apresentada pelo chefe do Poder
Executivo.
A motivação, embora não seja requisito constitucional expresso, facilita o controle da legitimidade e dos
requisitos constitucionais autorizadores, seja pelo Legislativo, seja pelo Judiciário.
Existindo motivação, ainda que a parte não concorde com os motivos explicitados pelo Presidente da
República para justificar a urgência da medida provisória, não se pode dizer que eles não foram
apresentados e defendidos pelo órgão competente.

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DIREITO ADMINISTRATIVO

PODER DE POLÍCIA
É possível a delegação do poder de polícia – inclusive da possibilidade
de aplicação de multas – para pessoas jurídicas de direito privado?

Importante!!!
É constitucional a delegação do poder de polícia, por meio de lei, a pessoas jurídicas de direito
privado integrantes da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente
público que prestem exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em
regime não concorrencial.
STF. Plenário. RE 633782/MG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 23/10/2020 (Repercussão Geral – Tema
532) (Info 996).

NOÇÕES GERAIS SOBRE O PODER DE POLÍCIA


O que é poder de polícia?
Segundo o art. 78 do CTN, poder de polícia é...
- uma atividade realizada pela administração pública
- consistente em regular a prática de um ato ou a abstenção de fato,
- limitando ou disciplinando direitos, interesses ou liberdades das pessoas
- em benefício do interesse público (segurança, higiene, ordem etc.).

Algumas vezes nas provas é cobrada a redação literal do art. 78, razão pela qual vale a pena a sua
transcrição aqui:
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou
disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em
razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina
da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou
autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos
individuais ou coletivos.
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo
órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se
de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

Fundamento do poder de polícia:


É o princípio da predominância do interesse público sobre o privado.
De um lado, os particulares possuem direitos individuais (ex: direito de se locomover com seu carro). De
outro, a Administração Pública possui o poder-dever de restringir esses direitos sempre que eles, de
alguma forma, conflitarem com os interesses da coletividade (ex: a Administração pode instituir rodízios
de veículos em virtude do excesso de número de automóveis na cidade).
Assim, o poder de polícia limita o exercício de alguns direitos individuais em benefício do interesse público.

Exemplos de realização do poder de polícia


Licença concedida pelo Município para construir segundo determinados critérios, licença para dirigir,
licença para ter porte de arma, alvará de funcionamento de indústria etc.

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Polícia administrativa x Polícia judiciária


Vale ressaltar que o poder de polícia se caracteriza como “polícia administrativa”, que é diferente da
polícia judiciária:
POLÍCIA ADMINISTRATIVA POLÍCIA JUDICIÁRIA
Atua sobre bens, direitos ou atividades. Tem seu campo de atuação voltado para as
pessoas.
Atua para evitar ou reprimir o ilícito Atua contra o ilícito penal.
administrativo.
Exercida por diversos órgãos da Administração. É exercida pelas polícias civil e federal.
Rege-se pelo Direito Administrativo. Rege-se pelo Direito Processual Penal.

Quem exerce
O poder de polícia é exercido pelos órgãos e entidades da Administração Pública.
Vale ressaltar que, em alguns casos, o poder de polícia pode ser exercido por órgão que também exerça o
poder de polícia judiciária. Ex: quando a Polícia Federal faz a fiscalização das empresas de segurança
privada ou quando emite passaporte.

Modalidades de exercício
PREVENTIVO REPRESSIVO
Poder de polícia preventivo ocorre quando a Poder de polícia repressivo ocorre quando a
Administração Pública estabelece normas Administração Pública impõe sanções administrativas
prevendo que o particular somente poderá ao particular que pratica um ilícito administrativo.
exercer determinado direito se cumprir Vale ressaltar que a aplicação dessa sanção não
algumas exigências. depende do Poder Judiciário, podendo ser aplicada
diretamente pela própria Administração. A isso
chamamos de autoexecutoriedade.
Ex: licença para dirigir, autorização para porte Ex: interdição do estabelecimento comercial,
de arma de fogo etc. apreensão de mercadorias etc.

Atributos do poder de polícia


O poder de polícia possui três atributos (características):
DISCRICIONARIEDADE AUTOEXECUTORIEDADE COERCIBILIDADE
Em regra, a Administração A Administração Pública pode, Significa que as medidas
Pública tem a liberdade de com os seus próprios meios, adotadas pela Administração
definir a oportunidade e executar seus atos e decisões, podem ser impostas
conveniência da prática dos atos sem precisar de prévia coercitivamente aos
de poder de polícia. autorização judicial. particulares.
Ex: a definição do dia e do local Ex: pode interditar um Ex: o poder público pode
onde haverá uma fiscalização da estabelecimento comercial sem apreender as mercadorias
vigilância sanitária. autorização judicial. estragadas de um
supermercado.
Obs: a lei poderá impor que Obs: nem sempre a autoexe- Obs: a autoexecutoriedade e a
determinado ato de poder de cutoriedade da Administração coercibilidade estão
polícia seja vinculado. Ex: licença será suficiente. É o caso, p. ex., intimamente ligadas e alguns
para o exercício de uma da multa. Se o particular não autores trabalham os dois
profissão. quiser pagar, será necessário atributos como sendo
propor ação judicial contra ele. sinônimos.

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Controle judicial
Os atos de poder de polícia são atos administrativos e poderão ter a sua validade impugnada no Poder
Judiciário pelas pessoas eventualmente prejudicadas.

DELEGAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA


O STJ e o STF discutiram sobre a possibilidade de delegação do poder de polícia a pessoas jurídicas de
direito privado. O caso concreto foi o seguinte:
Na capital mineira, a atividade de policiamento de trânsito é feita pela Empresa de Transporte e Trânsito
de Belo Horizonte – BHTrans. Vale ressaltar que a BHTrans é responsável, inclusive, pela aplicação das
multas de trânsito.
O ponto controverso dessa situação está no fato de que a BHTrans é uma sociedade de economia mista
(pessoa jurídica de direito privado).

Diante disso, surgiu a seguinte polêmica: é possível a delegação do poder de polícia – inclusive da
possibilidade de aplicação de multas – para pessoas jurídicas de direito privado?
Julgado do STJ: não
O STJ possuía julgado afirmando que o poder de polícia da administração é exercido com base no “poder
de império do Estado”. Em virtude disso, o exercício do poder de polícia não poderia ser delegado para
particulares.
Assim, o poder de polícia, por ser uma atividade típica do Estado, não poderia ser delegada.
Vale ressaltar que até seria possível que o Estado delegasse para particulares a realização de atividades
de apoio ao exercício do poder de polícia. Isso é chamado de aspectos materiais do poder de polícia.
Para o STJ, o ato de poder de polícia pode ser dividido em quatro fases (“ciclos de polícia”):
ORDEM CONSENTIMENTO FISCALIZAÇÃO SANÇÃO
DE POLÍCIA DE POLÍCIA DE POLÍCIA DE POLÍCIA
É a legislação que É a fase na qual a Aqui a Administração Consiste na aplicação
estabelece os limites eAdministração dá o verifica se o particular das penalidades
condições necessárias consentimento para que está cumprindo as administrativas para
para o exercício da o particular pratique regras estabelecidas na aquele que descumpriu
atividade ou uso dos determinada atividade ordem de polícia. a ordem de polícia.
bens por parte dos ou para que utilize o Ex: o fiscal vai até o Ex: o fiscal constata que
particulares. bem segundo a ordem açougue para verificar o açougue não está
Ex: as normas de de polícia em vigor. se o estabelecimento acondicionando de
vigilância sanitária. Ex: licença para dirigir, cumpre a legislação forma adequada as
autorização para sanitária. carnes e aplica multa.
construir etc.
Esta fase não pode ser Pode ser delegada para Pode ser delegada para Não pode ser delegada
delegada. particulares. particulares. para particulares.

Obs: as fases 1 (ordem) e 3 (fiscalização) estão presentes em todo e qualquer ato de poder de polícia. As
fases 2 e 4 podem ocorrer ou não.

Exemplo: para o STJ, a imposição de multas de trânsito é uma atividade de poder de polícia e, portanto,
somente poderia ser exercida pelo Estado. Seria possível, no entanto, que a Administração Pública
contratasse uma empresa privada para a instalação e manutenção de radares de velocidade nas vias
públicas. Isso porque esta é apenas uma atividade de apoio ao poder de polícia. A imposição da multa
continuaria sendo privativa do Estado.

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Em suma, segundo esse julgado do STJ:


• o poder de polícia é uma atividade típica do Estado, não podendo ser delegada a particulares. Ex:
imposição de multa de trânsito.
• as atividades de apoio ao poder de polícia podem ser delegadas. Ex: instalação de radares.

Confira trecho da ementa:


(...) 2. No que tange ao mérito, convém assinalar que, em sentido amplo, poder de polícia pode ser
conceituado como o dever estatal de limitar-se o exercício da propriedade e da liberdade em favor do
interesse público. A controvérsia em debate é a possibilidade de exercício do poder de polícia por
particulares (no caso, aplicação de multas de trânsito por sociedade de economia mista).
3. As atividades que envolvem a consecução do poder de polícia podem ser sumariamente divididas em
quatro grupo, a saber: (i) legislação, (ii) consentimento, (iii) fiscalização e (iv) sanção.
4. No âmbito da limitação do exercício da propriedade e da liberdade no trânsito, esses grupos ficam bem
definidos: o CTB estabelece normas genéricas e abstratas para a obtenção da Carteira Nacional de
Habilitação (legislação); a emissão da carteira corporifica a vontade o Poder Público (consentimento); a
Administração instala equipamentos eletrônicos para verificar se há respeito à velocidade estabelecida em
lei (fiscalização); e também a Administração sanciona aquele que não guarda observância ao CTB (sanção).
5. Somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização são delegáveis, pois aqueles referentes à
legislação e à sanção derivam do poder de coerção do Poder Público. (...)
STJ. 2ª Turma. REsp 817.534⁄MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10/11/2009.

Posição do STF: sim


É constitucional a delegação do poder de polícia, por meio de lei, a pessoas jurídicas de direito privado
integrantes da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem
exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial.
STF. Plenário. RE 633782/MG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 23/10/2020 (Repercussão Geral – Tema 532)
(Info 996).

O fato de a pessoa jurídica integrante da Administração Pública indireta destinatária da delegação da


atividade de polícia administrativa ser constituída sob a roupagem do regime privado não a impede de
exercer a função pública de polícia administrativa.
O regime jurídico híbrido das estatais prestadoras de serviço público em regime de monopólio é
plenamente compatível com a delegação, nos mesmos termos em que se admite a constitucionalidade do
exercício delegado de atividade de polícia por entidades de regime jurídico de direito público. Isso porque
a incidência de normas de direito público em relação àquelas entidades da Administração indireta tem o
condão de as aproximar do regime de direito público, do regime fazendário e acabar por desempenhar
atividade própria do Estado.
O STJ, ao desdobrar o ciclo de polícia, entende que somente os atos relativos ao consentimento e à
fiscalização são delegáveis, pois aqueles referentes à legislação e à sanção derivam do poder de coerção
do Poder Público. Segundo a teoria do ciclo de polícia, o atributo da coercibilidade é identificado na fase
de sanção de polícia e caracteriza-se pela aptidão que o ato de polícia possui de criar unilateralmente uma
obrigação a ser adimplida pelo seu destinatário.
Apesar da substancialidade da tese, verifica-se que, em relação às estatais prestadoras de serviço público
de atuação própria do Estado e em regime de monopólio, não há razão para o afastamento do atributo da
coercibilidade inerente ao exercício do poder de polícia, sob pena de esvaziamento da finalidade para a
qual aquelas entidades foram criadas.
A Constituição da República, ao autorizar a criação de empresas públicas e sociedades de economia mista
que tenham por objeto exclusivo a prestação de serviços públicos de atuação típica do Estado, autoriza,

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consequentemente, a delegação dos meios necessários à realização do serviço público delegado, sob pena
de restar inviabilizada a atuação dessas entidades na prestação de serviços públicos.
Por outro lado, cumpre ressaltar a única fase do ciclo de polícia que, por sua natureza, é absolutamente
indelegável: a ordem de polícia, ou seja, a função legislativa. A competência legislativa é restrita aos entes
públicos previstos na Constituição da República, sendo vedada sua delegação, fora das hipóteses
expressamente autorizadas no tecido constitucional, a pessoas jurídicas de direito privado.
Em suma, os atos de consentimento, de fiscalização e de aplicação de sanções podem ser delegados a
estatais que possam ter um regime jurídico próximo daquele aplicável à Fazenda Pública.

Voltando ao caso concreto:


Para o STF, a Empresa de Transporte e Trânsito de Belo Horizonte – BHTRANS pode ser delegatária do poder
de polícia de trânsito, inclusive quanto à aplicação de multas, porquanto se trata de estatal municipal de
capital majoritariamente público, que presta exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e
em regime não concorrencial, consistente no policiamento do trânsito da cidade de Belo Horizonte.
A posição do STF foi a que prevaleceu, devendo ser adotada nas provas.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PRISÃO PREVENTIVA
Pais e outros responsáveis por menor de 12 anos ou por pessoa com deficiência possuem direito
à prisão domiciliar, desde que observados os requisitos do art. 318 do CPP e não tenham
praticado crime com violência ou grave ameaça ou contra os próprios filhos ou dependentes

Importante!!!
Tem direito à substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar — desde que
observados os requisitos do art. 318 do Código de Processo Penal e não praticados crimes
mediante violência ou grave ameaça ou contra os próprios filhos ou dependentes — os pais,
caso sejam os únicos responsáveis pelos cuidados de menor de 12 anos ou de pessoa com
deficiência, bem como outras pessoas presas, que não sejam a mãe ou o pai, se forem
imprescindíveis aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 anos ou com deficiência.
STF. 2ª Turma. HC 165704/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 20/10/2020 (Info 996).

NOÇÕES GERAIS SOBRE PRISÃO DOMICILIAR


Prisão domiciliar do CPP x Prisão domiciliar da LEP
O tema “prisão domiciliar” é previsto tanto no CPP como na LEP, tratando-se, contudo, de institutos
diferentes, conforme se passa a demonstrar:

PRISÃO DOMICILIAR DO CPP PRISÃO DOMICILIAR DA LEP


Arts. 317, 318 e 318-A do CPP. Art. 117 da LEP.
O CPP, ao tratar da prisão domiciliar, está se A LEP, ao tratar da prisão domiciliar, está se
referindo à possibilidade de o réu, em vez de ficar referindo à possibilidade de a pessoa já condenada
em prisão preventiva, permanecer recolhido em cumprir a sua pena privativa de liberdade na
sua residência. própria residência.
Trata-se de uma medida cautelar por meio da qual Trata-se, portanto, da execução penal
o réu, em vez de ficar preso na unidade prisional, (cumprimento da pena) na própria residência.

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 10


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permanece recolhido em sua própria residência.


Continua tendo natureza de prisão, mas uma
prisão “em casa”.
Hipóteses (importante): Hipóteses (importante):
O juiz poderá substituir a prisão preventiva pela O preso que estiver cumprindo pena no regime
domiciliar quando o agente for: aberto poderá ficar em prisão domiciliar quando se
tratar de condenado(a):
I — maior de 80 anos;
I — maior de 70 anos;
II — extremamente debilitado por motivo de
doença grave; II — acometido de doença grave;

III — imprescindível aos cuidados especiais de III — com filho menor ou deficiente físico ou
pessoa menor de 6 anos de idade ou com mental;
deficiência;
IV — gestante.
IV — gestante;

V — mulher com filho de até 12 (doze) anos de


idade incompletos;

VI — homem, caso seja o único responsável pelos


cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade
incompletos.

Obs.: os magistrados, membros do MP, da


Defensoria e da advocacia têm direito à prisão
cautelar em sala de Estado-Maior. Caso não exista,
devem ficar em prisão domiciliar.
O juiz pode determinar que a pessoa fique usando O juiz pode determinar que a pessoa fique usando
uma monitoração eletrônica. uma monitoração eletrônica.

Natureza jurídica da prisão domiciliar


(Promotor MP/RJ 2018) É correto afirmar que a prisão domiciliar, no âmbito da persecução penal, consiste
em medida alternativa ou diversa à prisão preventiva?
Resposta: NÃO. Não é correto afirmar que a prisão domiciliar, no âmbito da persecução penal, consista
em medida alternativa ou diversa à prisão, tratando-se, na verdade, de medida substitutiva à prisão
preventiva, pois inclusive o decreto da medida impõe ao julgador a análise dos pressupostos autorizadores
da prisão preventiva (CPP, artigos 311/312, do CPP). Se presentes, poderá caber a prisão domiciliar, desde
que configurada uma das situações do artigo 317/318 do CPP. Por outro lado, as medidas alternativas ou
diversas à prisão, previstas nos artigos 319/320 do CPP, somente têm lugar exatamente quando a extrema
ratio da ultima ratio (Prisão Preventiva) não puder ser decretada, mas houver alguma necessidade de
acautelamento dos meios e fins do processo por medida menos tormentosa.

Estatuto da Primeira Infância


A Lei nº 13.257/2016 prevê a formulação e implementação de políticas públicas voltadas para as crianças
que estão na “primeira infância”.
A Lei nº 13.257/2016 promoveu alterações no Código de Processo Penal, em especial no regime de prisão
domiciliar. Veja:

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 11


Informativo
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Inciso IV - prisão domiciliar para GESTANTE independente do tempo de gestação e de sua situação de saúde

CPP
ANTES DA LEI 13.257/2016 ATUALMENTE
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva
pela domiciliar quando o agente for: pela domiciliar quando o agente for:
(...) (...)
IV - gestante a partir do 7º (sétimo) mês de gravidez ou IV - gestante;
sendo esta de alto risco.

Desse modo, agora basta que a investigada ou ré esteja grávida para ter direito à prisão domiciliar. Não
mais se exige tempo mínimo de gravidez nem que haja risco à saúde da mulher ou do feto.

Inciso V - prisão domiciliar para MULHER que tenha filho menor de 12 anos
A Lei nº 13.257/2016 acrescentou o inciso V ao art. 318 com a seguinte redação:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
(...)
V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;

Esta hipótese não existia e foi incluída pela Lei nº 13.257/2016.

Inciso VI - prisão domiciliar para HOMEM que seja o único responsável pelos cuidados do filho menor de
12 anos
A Lei nº 13.257/2016 acrescentou o inciso VI ao art. 318 com a seguinte redação:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
(...)
VI - homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade
incompletos.

Esta hipótese também não existia e foi incluída pela Lei nº 13.257/2016.

HABEAS CORPUS COLETIVO 143641/SP (MÃES PRESAS)


Se uma mulher grávida estivesse em prisão preventiva, o juiz, obrigatoriamente, deveria conceder a ela
prisão domiciliar com base no art. 318, IV, do CPP? As hipóteses de prisão domiciliar previstas nos incisos
IV e V do art. 318 do CPP eram consideradas obrigatórias ou facultativas?
A maioria da doutrina e os julgados do STJ afirmavam que não.
O entendimento que prevalecia era o de que a substituição da prisão cautelar pela domiciliar não era
automática e o juiz deveria analisar, em cada caso concreto, se a prisão domiciliar seria suficiente.
Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. RHC 81.300/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 06/04/2017.
Assim, apesar da previsão do art. 318, IV e V, do CPP, muitas mulheres, mesmo estando grávidas ou com
filhos menores de 12 anos, permaneciam recolhidas nas unidades prisionais cumprindo prisão preventiva.
Em poucos casos, os juízes concediam a prisão domiciliar.

Habeas corpus coletivo decidido em 2018


Diante desta realidade, foi impetrado um habeas corpus coletivo no STF pedindo que a Corte
reconhecesse, de forma ampla e geral, que as presas grávidas ou com filhos menores de 12 anos possuem
direito à prisão domiciliar. Trata-se do HC 143641/SP.

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 12


Informativo
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O que o STF decidiu no HC 143641/SP?


REGRA: SIM. As hipóteses são obrigatórias.
Em regra, deve ser concedida prisão domiciliar para todas as mulheres presas que sejam:
- gestantes
- puérperas (que deram à luz há pouco tempo)
- mães de crianças (isto é, mães de menores até 12 anos incompletos) ou
- mães de pessoas com deficiência.

EXCEÇÕES:
Não deve ser autorizada a prisão domiciliar se:
1) a mulher tiver praticado crime mediante violência ou grave ameaça;
2) a mulher tiver praticado crime contra seus descendentes (filhos e/ou netos);
3) em outras situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes
que denegarem o benefício.
STF. 2ª Turma. HC 143641/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20/2/2018 (Info 891).

Logo em seguida à decisão do STJ foi editada a Lei nº 13.769/2018. O que essa Lei fez?
A Lei nº 13.769/2018 positivou no CPP o entendimento manifestado pelo STF.
A principal diferença foi que o legislador não incluiu a exceção número 3.
Além disso, na exceção 2 não falou em descendentes, mas sim em filho ou dependente.
Veja o art. 318-A incluído pela Lei nº 13.769/2018 no CPP:
Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por
crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que:
I - não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;
II - não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente.

HABEAS CORPUS COLETIVO 165704/DF (PAIS PRESOS)


Habeas corpus coletivo impetrado em favor dos presos homens (decidido em 2020)
Como vimos acima, o HC 143641/SP beneficiou as presas mulheres (gestantes, puérperas e mães). Não
mencionou nada, contudo, a respeito dos presos homens.
Diante disso, a DPU impetrou habeas corpus coletivo sustentando que a decisão proferida pelo STF no HC
143641/SP em favor das mulheres presas deveria ter seu alcance estendido a todos os presos que sejam
os únicos responsáveis por pessoas na mesma situação, pelas mesmas razões e pelos mesmos
fundamentos.
Segundo a DPU, a decisão, ao tutelar direito das crianças filhas de mães presas, acabou por discriminar as
que não têm mãe, mas encontram, em outros responsáveis, o sentimento e a proteção familiar, ferindo,
assim, o princípio constitucional da igualdade.

O STF concordou com o pedido da DPU?


SIM.
Tem direito à substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar — desde que observados os
requisitos do art. 318 do Código de Processo Penal e não praticados crimes mediante violência ou grave
ameaça ou contra os próprios filhos ou dependentes — os pais, caso sejam os únicos responsáveis pelos
cuidados de menor de 12 anos ou de pessoa com deficiência, bem como outras pessoas presas, que não
sejam a mãe ou o pai, se forem imprescindíveis aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 anos ou
com deficiência.
STF. 2ª Turma. HC 165704/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 20/10/2020 (Info 996).

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 13


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Prioridade absoluta
Em observância à proteção integral e à prioridade absoluta conferidas pela CF/88 às crianças e às pessoas
com deficiência, é cabível a substituição da prisão preventiva em prisão domiciliar, nos casos dos incisos
III e VI do art. 318 do CPP, quando o contexto familiar do investigado ou réu demonstrar a sua importância
para a criação, o suporte, o cuidado e o desenvolvimento de criança ou pessoa com deficiência, bem como
em decorrência das atuais circunstâncias de grave crise na saúde pública nacional que geram riscos mais
elevados às pessoas inseridas no sistema penitenciário, em especial em razão da proliferação do
Coronavírus (Covid-19) no Brasil.

Recusa deve ser fundamentada


Eventual recusa à substituição deve ser amplamente fundamentada pelo magistrado e só deve ocorrer em
casos graves, tais como a prática pelo acusado de crime com violência ou grave ameaça à pessoa ou a
prática de delitos contra sua própria prole.
Ressalte-se que o art. 318, VI, do CPP, prevê expressamente que, nos casos de presos do sexo masculino,
o juiz deverá substituir a prisão preventiva pela domiciliar caso ele seja o único responsável pelos cuidados
do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.
Em se tratando de outras pessoas presas que não sejam a mãe ou o pai, o inciso III estabelece que deverá
o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar se o preso for imprescindível aos cuidados especiais de
pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência.
Com base nesse entendimento, a Segunda Turma concedeu a ordem de habeas corpus coletivo.

Art. 318 é muito cobrado nas provas


Leia novamente o art. 318 do CPP porque ele é muito exigido nas provas objetivas:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
I - maior de 80 (oitenta) anos;
II - extremamente debilitado por motivo de doença grave;
III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com
deficiência;
IV - gestante;
V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;
VI - homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade
incompletos.
Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste
artigo.

Vou demonstrar isso:


 (Promotor MP/CE CEBRASPE 2020) É cabível ao juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar a
homem que, condenado pelo crime de corrupção passiva, seja o único responsável pelos cuidados do seu
filho de dez anos de idade. (certo)
 (FCC/DPE/AP/Defensor/2018) Na fase de conhecimento, a prisão domiciliar pode ser concedida
ao preso se for imprescindível aos cuidados de pessoa com deficiência. (certo)
 (FCC/MPE/MT/Promotor/2019) O Código de Processo Penal e a Lei de Execuções Penais
disciplinam a prisão em residência particular. É requisito comum a ambas as normas a presa ser
gestante. (certo)
 (FGV/TJ/SC/Analista/2018) A prisão domiciliar prevista no art. 318 do Código de Processo Penal
será admitida quando a ré estiver grávida, desde que seja de risco a gravidez ou a gestação
ultrapasse 7 meses. (errado)

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 14


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 (Ieses/TJ/SC/Cartórios/2019) Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar, entre


outros casos, quando o acusado for maior de 80 anos. (certo)
 (MPE/GO/Promotor/2019) Embora o Código de Processo Penal seja silente sobre o assunto, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou que o homem, caso seja o único responsável
pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos, poderá ser beneficiado com
a prisão domiciliar, por questões humanitárias e em analogia à situação da mulher. (errado)
 (Vunesp/PC/BA/Escrivão/2018) Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar
quando o agente for maior de 70 (setenta) anos. (errado)
 (Vunesp/PC/SP/Investigador/2018) Entre outras hipóteses, de acordo com os expressos termos
do art. 318 do CPP, poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente
for arrimo de família. (errado)
 (Vunesp/TJ/MT/Juiz/2018) É cabível a substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar
aos acusados, primários e de bons antecedentes, responsáveis pelos cuidados de filho de até oito
anos de idade incompletos, desde que utilizem aparelho de monitoração eletrônica à distância.
(errado)
 (MPE/PR/Promotor/2019) O juiz pode substituir a prisão preventiva por prisão domiciliar
quando se tratar de mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos. (certo)
 (FCC/DPE/MA/Defensor/2018) Sobre a prisão domiciliar para mulheres gestantes e com filhos
com até 12 anos de idade, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do “Habeas Corpus”
coletivo nº 143641, decidiu expressamente que os juízes competentes devem proceder a análise
da substituição da prisão preventiva pela domiciliar de ofício, sendo dispensável pedido realizado
por advogado ou defensor público. (certo)

DIREITO TRIBUTÁRIO

PARCELAMENTO TRIBUTÁRIO
Para que ocorra a exclusão do contribuinte do REFIS é indispensável a sua prévia intimação

É inconstitucional o art. 1º da Resolução 20/2001 do Comitê Gestor do Programa de


Recuperação Fiscal (CG/Refis), no que suprimiu a notificação da pessoa jurídica optante do
Refis, prévia ao ato de exclusão.
STF. Plenário. RE 669196/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 23/10/2020 (Repercussão Geral –
Tema 668) (Info 996).

REFIS
A Lei nº 9.964/2000 previu a possibilidade de que o devedor de tributos federais pudesse parcelar seus
débitos. Esse parcelamento foi chamado de REFIS (“Programa de Recuperação Fiscal”).
Veja o que disse o art. 1º da Lei:
Art. 1º É instituído o Programa de Recuperação Fiscal – Refis, destinado a promover a
regularização de créditos da União, decorrentes de débitos de pessoas jurídicas, relativos a
tributos e contribuições, administrados pela Secretaria da Receita Federal e pelo Instituto Nacional
do Seguro Social – INSS, com vencimento até 29 de fevereiro de 2000, constituídos ou não,
inscritos ou não em dívida ativa, ajuizados ou a ajuizar, com exigibilidade suspensa ou não,
inclusive os decorrentes de falta de recolhimento de valores retidos.

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 15


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Para as empresas esse parcelamento é bom considerando que não precisam pagar à vista os débitos que
possuem de tributos federais e não correm o risco de sofrer penhora ou outras restrições.

Comitê Gestor
A Lei afirmou que o Refis deveria ser administrado por um Comitê Gestor, com competência para
implementar os procedimentos necessários à execução do Programa.
O Comitê Gestor é integrado por um representante da Receita Federal e por outro da Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional.

Exclusão do REFIS
O art. 5º da Lei previu as hipóteses de exclusão do REFIS, ou seja, situações nas quais a empresa perde o
direito de continuar no parcelamento.
Art. 5º A pessoa jurídica optante pelo Refis será dele excluída nas seguintes hipóteses, mediante
ato do Comitê Gestor:
I – inobservância de qualquer das exigências estabelecidas nos incisos I a V do caput do art. 3º;
II – inadimplência, por três meses consecutivos ou seis meses alternados, o que primeiro ocorrer,
relativamente a qualquer dos tributos e das contribuições abrangidos pelo Refis, inclusive os com
vencimento após 29 de fevereiro de 2000;
III – constatação, caracterizada por lançamento de ofício, de débito correspondente a tributo ou
contribuição abrangidos pelo Refis e não incluídos na confissão a que se refere o inciso I do caput
do art. 3o, salvo se integralmente pago no prazo de trinta dias, contado da ciência do lançamento
ou da decisão definitiva na esfera administrativa ou judicial;
IV – compensação ou utilização indevida de créditos, prejuízo fiscal ou base de cálculo negativa
referidos nos §§ 7º e 8º do art. 2º;
V – decretação de falência, extinção, pela liquidação, ou cisão da pessoa jurídica;
VI – concessão de medida cautelar fiscal, nos termos da Lei no 8.397, de 6 de janeiro de 1992;
VII – prática de qualquer procedimento tendente a subtrair receita da optante, mediante
simulação de ato;
VIII – declaração de inaptidão da inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, nos termos
dos arts. 80 e 81 da Lei nº 9.430, de 1996;
IX – decisão definitiva, na esfera judicial, total ou parcialmente desfavorável à pessoa jurídica,
relativa ao débito referido no § 6º do art. 2º e não incluído no Refis, salvo se integralmente pago
no prazo de trinta dias, contado da ciência da referida decisão;
X – arbitramento do lucro da pessoa jurídica, nos casos de determinação da base de cálculo do
imposto de renda por critério diferente do da receita bruta;
XI – suspensão de suas atividades relativas a seu objeto social ou não auferimento de receita bruta
por nove meses consecutivos.

Veja, pela redação do caput, que a exclusão é materializada por um ato do Comitê Gestor.

Resolução do Comitê Gestor


O Comitê Gestor editou inicialmente a Resolução nº 9, de 12 de janeiro de 2001, dispondo sobre a exclusão
do Programa de Recuperação Fiscal de pessoa jurídica optante.
Em seguida, em 27 de setembro de 2001, elaborou outro ato normativo (a Resolução nº 20/2001)
prevendo que a pessoa jurídica optante do REFIS poderia ser excluída do programa mesmo sem prévia
notificação.
Essa Resolução foi questionada e o STF decidiu que ela viola os princípios do devido processo legal, da
ampla defesa e do contraditório.

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 16


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É inconstitucional o art. 1º da Resolução 20/2001 do Comitê Gestor do Programa de Recuperação Fiscal


(CG/Refis), no que suprimiu a notificação da pessoa jurídica optante do Refis, prévia ao ato de exclusão.
STF. Plenário. RE 669196/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 23/10/2020) (Info 996).

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem constantemente reafirmado a garantia da plenitude de


defesa como uma pretensão à tutela jurídica.
A garantia da pretensão à tutela jurídica — albergada no art. 5º, LV, da CF — envolve não somente o direito
de manifestação e de informação sobre o objeto do processo, mas também o direito de ver seus
argumentos contemplados pelo órgão julgador.
O exercício da autotutela estatal (como o caso da exclusão do REFIS) deve ocorrer por meio de
procedimento administrativo que confira àqueles que eventualmente venham a ser atingidos pela decisão
invalidatória oportunidade de manifestação prévia, observados os desdobramentos da ampla defesa.
Nesse sentido:
Ao Estado é facultada a revogação de atos que repute ilegalmente praticados; porém, se de tais atos já
decorreram efeitos concretos, seu desfazimento deve ser precedido de regular processo administrativo.
STF. Plenário. RE 594296, Rel. Dias Toffoli, julgado em 21/09/2011 (Repercussão Geral – Tema 138).

Desse modo, é obrigatória a notificação prévia do contribuinte, antes da apreciação da representação,


para que ele possa se manifestar sobre as irregularidades nela apontadas.
Além disso, deve ser dado ao interessado a oportunidade para exercer sua defesa contra o ato de exclusão
do REFIS. Esse ato tem caráter individual e afeta diretamente o contribuinte em sua esfera particular de
direitos.
Ademais, considerações particulares, em tese, podem ter potencial para interferir na deliberação a ser
adotada pelo Conselho Gestor. Em outras palavras, há necessidade de apreciação da situação
particularizada do contribuinte.
Assim, para que ocorra a exclusão do contribuinte do REFIS é indispensável a sua prévia intimação.

Como deve ocorrer essa intimação?


O entendimento do STJ é no sentido de que essa intimação pode ser feita por Diário Oficial ou pela
internet:
Súmula 355-STJ: É válida a notificação do ato de exclusão do programa de recuperação fiscal do Refis pelo
Diário Oficial ou pela Internet.

ICMS
Mato Grosso do Sul tem direito exclusivo ao ICMS sobre importação de gás da Bolívia
considerando que é nesse Estado que está localizado o estabelecimento do destinatário jurídico
do gás, ainda que ele seja enviado para outros Estados logo em seguida

O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) incidente nas


operações de importação de mercadorias tem como sujeito ativo o estado em que localizado o
domicílio ou o estabelecimento do destinatário jurídico da mercadoria importada.
A conclusão acerca de quem será o destinatário jurídico do bem depende da análise do negócio
jurídico entabulado entre as partes e das circunstâncias fáticas do caso concreto.
Na importação própria, sob encomenda, o destinatário jurídico da mercadoria é o
estabelecimento importador.

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 17


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O fato de o gás natural não poder ser estocado no estabelecimento do importador não altera a
sujeição exacional ativa e passiva do ICMS-importação.
STF. Plenário. ACO 854/MS, ACO 1076/MS e ACO 1093/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgados em
22/10/2020 (Info 996).

A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte:


A Petrobrás importa gás natural da Bolívia.
Esse gás natural é importado por meio do estabelecimento da empresa que fica em Corumbá (MS).
Depois que chega em Corumbá, esse gás é distribuído, por meio de dutos, a diversos estados da Federação,
entre eles São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Primeira pergunta: a importação desse gás natural está sujeita ao pagamento de ICMS?
SIM.
A CF/88 prevê que haverá cobrança de ICMS nos casos de mercadoria importada do exterior ou nas
hipóteses de serviço prestado no exterior. Ex: uma empresa que fabrica roupas deverá pagar ICMS se
importou da China uma máquina têxtil para utilizar em sua linha de produção.
Veja a redação do art. 155, 2º, IX, “a”, da CF/88:
Art. 155 (...)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
IX - incidirá também:
a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica,
ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim
como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o
domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço;
(...)

Sujeito ativo do ICMS-importação nos casos em que a mercadoria “entra” no Brasil por um Estado-
membro, mas tem como destino outro Estado
No caso concreto acima analisado, o gás natural entra pelo Estado do Mato Grosso do Sul, mas de lá segue
para São Paulo.
Diante disso, indaga-se:

O sujeito ativo desse ICMS será o Estado do Mato Grosso do Sul ou o Estado de São Paulo?
O Estado do Mato Grosso do Sul. A resposta para essa pergunta encontra-se na parte final do art. 155, 2º,
IX, “a”, da CF/88:
Art. 155 (...)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
IX - incidirá também:
a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica,
ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim
como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o
domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço;
(...)

Ao interpretar o dispositivo constitucional, o STF concluiu que o sujeito ativo do ICMS-importação é o


Estado-membro no qual estiver localizado o destinatário da operação. No entanto, o Min. Gilmar Mendes

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 18


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assinalou que a jurisprudência do Supremo se firmou no sentido de que a circulação que importa para a
incidência do ICMS é a circulação econômico-jurídica de bens, o que significa a alteração da titularidade
sem a necessidade do deslocamento físico da mercadoria.
A própria Lei Kandir dispensa a entrada física dos bens no estabelecimento para que ocorra a compensação
do imposto. Ou seja, o direito de crédito existe a partir da circulação jurídica de bens, independentemente
da circulação física.
O relator explicou que a importação nem sempre envolve a necessidade de entrada física dos bens no
estabelecimento destinatário da importação. Pode ocorrer, também, a entrada ficta, contábil ou simbólica
da mercadoria. A conclusão sobre quem será o destinatário jurídico do bem dependerá da análise do
negócio jurídico firmado entre as partes e das circunstâncias fáticas do caso.

Súmula vinculante 48
O STF possui o seguinte enunciado sobre o tema:
Súmula vinculante 48-STF: Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do
ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro.

Vale ressaltar, contudo, que a SV 48 trata sobre o aspecto temporal. Assim, o desembaraço aduaneiro
refere-se ao aspecto temporal do fato gerador da obrigação tributária, momento em que o tributo passa
a ser exigível, entendimento que é objeto da SV 48.
Logo, a decisão acima não conflita com o entendimento manifestado na Súmula 48 porque estamos
tratando de aspectos diferentes:
• aspecto temporal da hipótese de incidência: desembaraço aduaneiro; é nesse momento que se deve
recolher o imposto.
• aspecto pessoal da obrigação tributária: o sujeito ativo é o Estado-membro no qual está domiciliado ou
estabelecido o destinatário legal da operação que deu causa à circulação da mercadoria

E quem é o destinatário final da mercadoria, bem ou serviço?


“Destinatário final”, para os fins desse tributo, é o destinatário legal da operação da qual resulta a
transferência de propriedade da mercadoria. É essa pessoa o sujeito passivo do imposto.
O destinatário de que trata o art. 155, § 2º, IX, “a”, da Constituição é o destinatário jurídico, isto é, o
destinatário legal da operação (o importador-adquirente).

Nas palavras do Min. Gilmar Mendes:


“O sujeito ativo competente para a instituição do ICMS-importação são os estados e o Distrito
Federal, nos moldes do citado art. 155, II, da CF, que receberão as prestações pecuniárias relativas
às operações de importação que se realizem nos limites do seu território. De acordo com o art. 4º
da LC 87/96 (Lei Kandir), contribuinte é aquele que promove a importação, a qualquer título. Entre
os Estados, conforme a redação do art. 155, § 2º, IX, a, da CF, o imposto caberá àquele onde estiver
situado o domicílio ou estabelecimento do destinatário da mercadoria ou do bem. No entanto, a
Constituição Federal não definiu qual deve ser considerado o estabelecimento destinatário da
mercadoria.
Uma interpretação literal da previsão contida no art. 11, I, d, da LC 87/96 poderia levar o intérprete
a considerar como estabelecimento destinatário meramente aquele estado onde ocorreu o
desembaraço aduaneiro. Ocorre que essa interpretação é incabível, visto que confunde o aspecto
temporal do fato gerador (momento em que o tributo passa a ser exigível) com a sujeição
exacional passiva, além de desconsiderar o próprio fato jurídico da importação, o que não se
coaduna com o texto constitucional. De fato, a jurisprudência desta Corte já se posicionou sobre
essa questão no sentido de considerar que o destinatário é o destinatário econômico-jurídico do

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 19


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bem; e de que o local do desembaraço aduaneiro não se confunde com o local do destinatário
jurídico da importação, ainda que possam ser faticamente o mesmo.”

Da análise das relações jurídicas no caso concreto, o sujeito ativo decorrente do ICMS é o Estado de Mato
Grosso do Sul, onde está o estabelecimento importador da Petrobras, destinatário legal da mercadoria e
que deu causa à circulação do gás, com a transferência de domínio.
As cláusulas do contrato de compra e venda celebrado entre a Petrobras e a petrolífera boliviana
enfatizam o lugar de cumprimento da obrigação de entregar o produto importado – entre as localidades
de Puerto Suárez (Bolívia) e Corumbá (Brasil).
Além disso, o contrato firmado entre a Petrobras e a Companhia de Gás São Paulo (Comgás) esclarece que
o gás importado da Bolívia é comercializado pela estatal brasileira, já internalizado no território nacional.
Segundo o relator, esse contrato, assim como os firmados com os demais estados requerentes, tem
natureza de compra e venda, pois estabelece diversas obrigações à Petrobras, inclusive a responsabilidade
pelas características e pela constância da qualidade do produto, o que demonstra que a sociedade de
economia mista não é uma mera prestadora de serviços dos estados. Trata-se, a seu ver, não de
importação por conta e ordem de terceiro com as companhias estaduais, mas de importação própria sob
encomenda.

Em suma:
O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) incidente nas operações de
importação de mercadorias tem como sujeito ativo o estado em que localizado o domicílio ou o
estabelecimento do destinatário jurídico da mercadoria importada.
A conclusão acerca de quem será o destinatário jurídico do bem depende da análise do negócio jurídico
entabulado entre as partes e das circunstâncias fáticas do caso concreto.
STF. Plenário. ACO 854/MS, ACO 1076/MS e ACO 1093/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgados em
22/10/2020 (Info 996).

Inconstitucionalidade parcial do art. 11, I, “d”, da LC 87/96


O art. 11, I, “d”, da LC 87/96 prevê o seguinte:
Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição
do estabelecimento responsável, é:
I - tratando-se de mercadoria ou bem:
(...)
d) importado do exterior, o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física;

O STF, ao julgar o ARE 665134 (Repercussão Geral – Tema 520), declarou a inconstitucionalidade parcial,
sem redução de texto, desse art. 11, I, “d”, com o objetivo de afastar o entendimento de que o local da
operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento
responsável pelo tributo, é apenas e necessariamente o da entrada física da mercadoria importada. Isso
porque, conforme vimos acima, não é necessariamente o da entrada física.

Quem é considerado importador?


A Receita Federal admite três formas de importação de bens do exterior:

FORMAS DE IMPORTAÇÃO
b) por conta e
a) por conta própria c) por encomenda
ordem de terceiro

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 20


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Na importação por conta Na importação por conta e A importação por encomenda se


própria, a importadora adquire ordem de terceiros, o equipara, para a maioria da
bens no exterior em seu nome e adquirente da mercadoria doutrina, à importação por
os revende posteriormente para importada contrata empresa conta própria, tendo em vista
terceiros. intermediária, prestadora de que a importadora ou trading
Nessa hipótese, existem dois serviço para que promova, por não é uma mera intermediária
contratos de compra e venda: conta e ordem da contratante, o ou prestadora de serviço; nas
• um entre o fornecedor despacho de importação da duas hipóteses, o importador
estrangeiro e o importador mercadoria em nome desta. realiza duas operações: a
• e outro entre o importador e o Aqui, a empresa importadora é primeira relativa à importação
adquirente no mercado interno. mera prestadora de serviços, de mercadoria do exterior em
Nessa situação, a venda do bem sendo claro que o real seu próprio nome, e a segunda
no mercado interno é negócio importador é o adquirente da (em decorrência ou não de
jurídico estranho à importação, mercadoria. encomenda), relativa à venda
pois a importadora possui a livre desse bem ou mercadoria no
disponibilidade do bem para dar mercado interno.
a ele a procedência que melhor Nesses casos, em que ocorrem
lhe aprouver. duas operações, haverá,
consequentemente, duas
hipóteses de incidência do ICMS:
• uma referente ao fato jurídico
da importação do bem, na qual
deverá ser cobrado o ICMS-
importação previsto no art. 155,
§ 2º, IX, a, da CF, e
• a outra concernente à
posterior venda desse mesmo
bem no mercado interno,
momento em que incidirá a
regra constante do caput do art.
155.
A destinatária econômica A destinatária jurídica é quem dá A destinatária jurídica é a
coincide com a jurídica, uma vez causa efetiva à operação de sociedade empresária
que a importadora utiliza a importação, ou seja, a parte importadora (trading company),
mercadoria em sua cadeia contratante de prestação de pois é quem incorre no fato
produtiva. serviço consistente na realização gerador do ICMS com o fito de
de despacho aduaneiro de posterior revenda, ainda que
mercadoria, em nome próprio, mediante acerto prévio, após o
por parte da importadora processo de internalização.
contratada.

Assim, na importação própria, sob encomenda, a importadora não é mera intermediária do consumidor
interno ou simples prestadora de serviço, porque atua por conta própria, negociando e internalizando o
bem no mercado para posterior revenda, independentemente de esta ter sido negociada antes ou depois
da importação. Por isso, nessa hipótese, o destinatário jurídico da mercadoria é o estabelecimento
importador.

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 21


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Na importação própria, sob encomenda, o destinatário jurídico da mercadoria é o estabelecimento


importador.
STF. Plenário. ACO 854/MS, ACO 1076/MS e ACO 1093/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgados em
22/10/2020 (Info 996).

No caso concreto, o gás natural não tem como ser estocado no estabelecimento da Petrobrás localizado
em Mato Grosso do Sul. Em outras palavras, o gás não entra fisicamente no estabelecimento que está
em Corumbá (MS). Isso interfere na tributação do ICMS?
NÃO.
A circulação que importa para a hipótese de incidência do ICMS é a circulação econômico-jurídica de bens,
o que significa a alteração da titularidade sem que seja necessário o deslocamento físico da mercadoria.
A própria LC 87/96 contempla a figura da circulação jurídica ou simbólica (art. 12) e dispensa, em seu art.
20, a entrada física dos bens no estabelecimento para que ocorra a compensação do imposto. Ou seja, de
acordo com essa previsão, o direito de crédito existe a partir da circulação jurídica de bens,
independentemente da ocorrência de circulação física.
No que se refere ao gás natural, devido a sua composição química, é impossível, fisicamente, a
armazenagem e estocagem no estabelecimento do importador. A transferência de gás natural em sua
forma gasosa se opera de modo contínuo e sua alocação apenas é viável depois de submetida a processo
de industrialização, quando assume a forma líquida e não mais gasosa.
Acrescente-se que, o Plenário do STF, em sede de repercussão geral (Tema 520), declarou a
inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto do art. 11, I, d, da LC 87/96, para afastar o
entendimento segundo o qual o local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto
e definição do estabelecimento responsável pelo tributo, seria apenas o da entrada física do bem
importado, tendo em vista, exatamente a juridicidade de circulação ficta de mercadoria, desde que haja
efetivo negócio jurídico.
No caso, mediante contrato de importação própria, sob encomenda, estabelecimento da Petrobras,
localizado em Corumbá/MS, adquire gás natural diretamente de empresa na Bolívia.
O gás é entregue à Petrobras no ponto em que ocorre a sua entrada no território nacional, naquele
município. Há a transferência da titularidade jurídica do bem, na qual o gás sai da esfera jurídica da
empresa boliviana e passa à titularidade da Petrobras e, somente uma vez internalizado, passa a ser de
domínio das empresas situadas nos territórios dos estados requeridos, ocorrendo, dessa forma, dois
negócios jurídicos com dupla incidência tributária.

O fato de o gás natural não poder ser estocado no estabelecimento do importador não altera a sujeição
exacional ativa e passiva do ICMS-importação.
STF. Plenário. ACO 854/MS, ACO 1076/MS e ACO 1093/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgados em
22/10/2020 (Info 996).

DIREITO PREVIDENCIÁRIO
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA
Não é legítima a incidência de contribuição social, a cargo do empregador,
sobre os valores pagos a título de salário-maternidade

É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o


salário- maternidade.
STF. Plenário. RE 576967, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 05/08/2020 (Repercussão Geral –
Tema 72) (Info 996 – clipping).

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 22


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Contribuições para a seguridade social


A CF/88 prevê, em seu art. 195, as chamadas “contribuições para a seguridade social”.
Consistem em uma espécie de tributo cuja arrecadação é utilizada para custear a seguridade social (saúde,
assistência e previdência social). Veja o texto da Constituição:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos
termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à
pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre
aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art.
201;
III - sobre a receita de concursos de prognósticos;
IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.

A CF/88 determina que os recursos arrecadados com as contribuições previstas no art. 195, I, “a” e II serão
destinados exclusivamente para o pagamento de benefícios previdenciários do RGPS (administrado pelo INSS).
Em razão disso, a maioria dos autores de Direito Previdenciário denomina as contribuições do art. 195, I,
“a” e II de “contribuições previdenciárias”, como se fossem uma subespécie das contribuições para a
seguridade social. Nesse sentido: Frederico Amado.

Contribuições previdenciárias
A contribuição previdenciária é uma espécie de tributo cujo dinheiro arrecadado é destinado ao
pagamento dos benefícios do RGPS (aposentadoria, auxílio-doença, pensão por morte etc.)
Existem duas espécies de contribuição previdenciária:
PAGA POR QUEM INCIDE SOBRE O QUE
1ª) Trabalhador e demais segurados Incide sobre o salário de contribuição, exceto no caso do
do RGPS (art. 195, II). segurado especial.
2ª) Empregador, empresa ou Incide sobre a folha de salários e demais rendimentos do
entidade equiparada (art. 195, I, “a”). trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física
que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício.

Para que incida a contribuição previdenciária sobre os valores pagos aos empregados é necessário que a
verba paga tenha duas características cumulativas:
a) precisa ter natureza remuneratória; e
b) deve ter um caráter de habitualidade.

Vamos analisar se os valores pagos a título de salário-maternidade estão, ou não, sujeitos à contribuição
previdenciária.

O que é o salário-maternidade?
Trata-se de benefício previdenciário “devido a todas as seguradas do RGPS, sem exceção, que visa
substituir a sua remuneração em razão do nascimento do seu filho ou da adoção de uma criança, pois
nesse período é preciso que a mulher volte toda a sua atenção ao infante, sendo presumida legalmente a
sua incapacidade temporária de trabalhar.” (AMADO, Frederico. Direito Previdenciário sistematizado.
Salvador: Juspodivm, 2013, p. 636).
Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 23
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Qual é o tempo de duração do salário-maternidade?


Em regra, o salário-maternidade será pago pelo período de 120 dias, com data de início no 28º dia que
antecede o parto e vai até 91 dias após o nascimento da criança (art. 71 da Lei nº 8.213/91).
Exceção: no caso de mães de crianças nascidas até 31 de dezembro de 2019 acometidas por sequelas
neurológicas decorrentes da Síndrome Congênita do Zika Vírus, o salário-maternidade será devido por 180
dias (art. 5º, II, da Lei nº 13.985/2020).

Adoção ou guarda judicial:


Ao segurado ou segurada da Previdência Social que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção
de criança é devido salário-maternidade pelo período de 120 (cento e vinte) dias (art. 71-A da Lei nº
8.213/91).

Incide contribuição previdenciária sobre o valor recebido a título de salário-maternidade?


NÃO.
É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário-
maternidade.
STF. Plenário. RE 576967, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 05/08/2020 (Repercussão Geral – Tema
72) (Info 996 – clipping).

O salário-maternidade é prestação previdenciária paga pela Previdência Social à segurada durante os


cento e vinte dias em que permanece afastada do trabalho em decorrência da licença-maternidade.
Configura, portanto, verdadeiro benefício previdenciário.
Por não se tratar de contraprestação pelo trabalho ou de retribuição em razão do contrato de trabalho, o
salário-maternidade não se amolda ao conceito de folha de salários e demais rendimentos do trabalho
pagos ou creditados, a qualquer título à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo
empregatício. Como consequência, não pode compor a base de cálculo da contribuição previdenciária a
cargo do empregador, não encontrando fundamento no art. 195, I, “a”, da Constituição.
Qualquer incidência não prevista no referido dispositivo constitucional configura fonte de custeio
alternativa, devendo estar prevista em lei complementar (art. 195, §4º).
Desse modo, o STF declarou a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o
salário-maternidade, prevista no art. 28, §2º, e da parte final da alínea “a”, do §9º, da Lei nº 8.212/91:
Art. 28 (...)
§ 2º O salário-maternidade é considerado salário-de-contribuição.

Art. 28 (...)
§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente:
a) os benefícios da previdência social, nos termos e limites legais, salvo o salário-maternidade;

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 24


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EXERCÍCIOS
Julgue os itens a seguir:
1) Ante o postulado da separação de Poderes, o Congresso Nacional não pode autorizar, atuando de forma
abstrata e genérica, a distribuição de medicamento. ( )
2) Inexistindo comprovação da ausência de urgência, não há espaço para atuação do Poder Judiciário no controle
dos requisitos de edição de medida provisória pelo chefe do Poder Executivo. ( )
3) (Agente PC/GO 2016 CEBRASPE) Por força do princípio da separação de poderes, é vedado ao Poder Judiciário
examinar o preenchimento dos requisitos de urgência e de relevância por determinada medida provisória. ( )
4) (Advogado Telebrás 2015 CEBRASPE) Segundo entendimento do STF, os requisitos constitucionais
legitimadores da edição de medidas provisórias, quanto aos conceitos jurídicos indeterminados de relevância
e urgência, apenas em caráter excepcional se submetem ao crivo do Poder Judiciário, por força do princípio
da separação de poderes. ( )
5) É constitucional a delegação do poder de polícia, por meio de lei, a pessoas jurídicas de direito privado
integrantes da Administração Pública indireta de capital social majoritariamente público que prestem
exclusivamente serviço público de atuação própria do Estado e em regime não concorrencial. ( )
6) (Promotor MP/CE CEBRASPE 2020) É cabível ao juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar a homem
que, condenado pelo crime de corrupção passiva, seja o único responsável pelos cuidados do seu filho de dez
anos de idade. ( )
7) (FCC/DPE/AP/Defensor/2018) Na fase de conhecimento, a prisão domiciliar pode ser concedida ao preso se
for imprescindível aos cuidados de pessoa com deficiência. ( )
8) (FCC/MPE/MT/Promotor/2019) O Código de Processo Penal e a Lei de Execuções Penais disciplinam a prisão
em residência particular. É requisito comum a ambas as normas a presa ser gestante. ( )
9) (FGV/TJ/SC/Analista/2018) A prisão domiciliar prevista no art. 318 do Código de Processo Penal será admitida
quando a ré estiver grávida, desde que seja de risco a gravidez ou a gestação ultrapasse 7 meses. ( )
10) (Ieses/TJ/SC/Cartórios/2019) Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar, entre outros casos,
quando o acusado for maior de 80 anos. ( )
11) (MPE/GO/Promotor/2019) Embora o Código de Processo Penal seja silente sobre o assunto, a jurisprudência
do Supremo Tribunal Federal firmou que o homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de
até 12 (doze) anos de idade incompletos, poderá ser beneficiado com a prisão domiciliar, por questões
humanitárias e em analogia à situação da mulher. ( )
12) (Vunesp/PC/BA/Escrivão/2018) Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente
for maior de 70 (setenta) anos. ( )
13) (Vunesp/PC/SP/Investigador/2018) Entre outras hipóteses, de acordo com os expressos termos do art. 318 do
CPP, poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for arrimo de família. ( )
14) (Vunesp/TJ/MT/Juiz/2018) É cabível a substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar aos acusados,
primários e de bons antecedentes, responsáveis pelos cuidados de filho de até oito anos de idade incompletos,
desde que utilizem aparelho de monitoração eletrônica à distância. ( )
15) (MPE/PR/Promotor/2019) O juiz pode substituir a prisão preventiva por prisão domiciliar quando se tratar de
mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos. ( )
16) (FCC/DPE/MA/Defensor/2018) Sobre a prisão domiciliar para mulheres gestantes e com filhos com até 12
anos de idade, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do “Habeas Corpus” coletivo nº 143641, decidiu
expressamente que os juízes competentes devem proceder a análise da substituição da prisão preventiva pela
domiciliar de ofício, sendo dispensável pedido realizado por advogado ou defensor público. ( )
17) O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) incidente nas operações de
importação de mercadorias tem como sujeito ativo o estado em que localizado o domicílio ou o
estabelecimento do destinatário jurídico da mercadoria importada. ( )
18) É constitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário-
maternidade. ( )
Gabarito
1. C 2. C 3. E 4. C 5. C 6. C 7. C 8. C 9. E 10. C
11. E 12. E 13. E 14. E 15. C 16. C 17. C 18. E

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OUTRAS INFORMAÇÕES

CLIPPING DAS SESSÕES VIRTUAIS


DJE DE 19 A 23 DE OUTUBRO DE 2020

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 576.967


RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
Decisão: Após os votos dos Ministros Roberto Barroso (Relator), Edson Fachin, Rosa Weber e Cármen Lúcia, que davam
provimento ao recurso extraordinário; e dos votos dos Ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Gilmar
Mendes, que negavam provimento ao recurso, pediu vista dos autos o Ministro Marco Aurélio. Falaram: pelo recorrente,
o Dr. Renato Guilherme Machado Nunes; pela recorrida, o Dr. Paulo Mendes de Oliveira, Procurador da Fazenda
Nacional, e o Dr. José Levi Mello do Amaral Júnior, Procurador-Geral da Fazenda Nacional; pelo amicus curiae
Confederação Nacional da Saúde – Hospitais, Estabelecimentos e Serviços (CNS), o Dr. Breno Ferreira Martins
Vasconcelos; e, pelo amicus curiae Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB, a Dra. Daniela Lima
Andrade. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de Mello e Luiz Fux. Presidência do Ministro Dias Toffoli.
Plenário, 06.11.2019.
Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o Tema 72 da repercussão geral, deu provimento ao recurso
extraordinário, para declarar, incidentalmente, a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre
o salário maternidade, prevista no art. 28, §2º, da Lei nº 8.212/91, e a parte final do seu §9º, alínea a, em que se lê “salvo
o salário-maternidade”, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Alexandre de Moraes, Ricardo
Lewandowski, Gilmar Mendes e Dias Toffoli (Presidente), que negavam provimento ao recurso. Foi fixada a seguinte
tese: "É inconstitucional a incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário
maternidade". Plenário, Sessão Virtual de 26.6.2020 a 4.8.2020.
Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO TRIBUTÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM
REPERCUSSÃO GERAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DO EMPREGADOR. INCIDÊNCIA SOBRE O
SALÁRIO-MATERNIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL. 1. Recurso extraordinário
interposto em face de acórdão do TRF da 4ª Região, que entendeu pela constitucionalidade da incidência da contribuição
previdenciária “patronal” sobre o salário-maternidade. 2. O salário-maternidade é prestação previdenciária paga pela
Previdência Social à segurada durante os cento e vinte dias em que permanece afastada do trabalho em decorrência da
licença-maternidade. Configura, portanto, verdadeiro benefício previdenciário. 3. Por não se tratar de contraprestação
pelo trabalho ou de retribuição em razão do contrato de trabalho, o salário-maternidade não se amolda ao conceito de
folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título à pessoa física que lhe preste
serviço, mesmo sem vínculo empregatício. Como consequência, não pode compor a base de cálculo da contribuição
previdenciária a cargo do empregador, não encontrando fundamento no art. 195, I, a, da Constituição. Qualquer incidência
não prevista no referido dispositivo constitucional configura fonte de custeio alternativa, devendo estar prevista em lei
complementar (art. 195, §4º). Inconstitucionalidade formal do art. 28, §2º, e da parte final da alínea a, do §9º, da Lei nº
8.212/91. 4. Esta Corte já definiu que as disposições constitucionais são legitimadoras de um tratamento diferenciado às
mulheres desde que a norma instituidora amplie direitos fundamentais e atenda ao princípio da proporcionalidade na
compensação das diferenças. No entanto, no presente caso, as normas impugnadas, ao imporem tributação que incide
somente quando a trabalhadora é mulher e mãe cria obstáculo geral à contratação de mulheres, por questões
exclusivamente biológicas, uma vez que torna a maternidade um ônus. Tal discriminação não encontra amparo na
Constituição, que, ao contrário, estabelece isonomia entre homens e mulheres, bem como a proteção à maternidade, à
família e à inclusão da mulher no mercado de trabalho. Inconstitucionalidade material dos referidos dispositivos. 5. Diante
do exposto, dou provimento ao recurso extraordinário para declarar, incidentalmente, a inconstitucionalidade da
incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, prevista no art. art. 28, §2º, e da parte final da
alínea a, do §9º, da Lei nº 8.212/91, e proponho a fixação da seguinte tese: “É inconstitucional a incidência de contribuição
previdenciária a cargo do empregador sobre o salário- maternidade”.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 596.832
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 228 da repercussão geral, deu provimento ao recurso
extraordinário e fixou a seguinte tese: "É devida a restituição da diferença das contribuições para o Programa de
Integração Social – PIS e para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins recolhidas a mais, no regime de
substituição tributária, se a base de cálculo efetiva das operações for inferior à presumida", nos termos do voto do

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 26


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Relator, vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Dias Toffoli (Presidente), que davam provimento ao recurso, mas
se manifestavam pela inclusão de ressalva na tese de repercussão geral. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.
PIS E COFINS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – ARTIGO 150, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL –
RECOLHIMENTO A MAIOR – DEVOLUÇÃO. É devida a restituição da diferença das contribuições para o Programa
de Integração Social – PIS e para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins pagas a mais, no regime de substituição
tributária, se a base de cálculo efetiva das operações for inferior à presumida.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 601.146
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
REDATOR DO ACÓRDÃO: MIN. ALEXANDRE DE MORAES
Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 358 da repercussão geral, deu provimento ao recurso
extraordinário para excluir a reforma concedida pelo acórdão recorrido, fixando a seguinte tese: “A competência
constitucional do tribunal para decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças
é específica, nos termos do artigo 125, § 4º, não autorizando a concessão de reforma de policial militar julgado
inapto a permanecer nas fileiras da corporação”, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, Redator para
o acórdão, vencidos os Ministros Marco Aurélio (Relator), Edson Fachin e Luiz Fux. Não participou deste julgamento,
por motivo de licença médica, o Ministro Dias Toffoli (Presidente). Plenário, Sessão Virtual de 29.5.2020 a 5.6.2020.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 358. CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO. PROCESSO AUTÔNOMO DE PERDA DE POSTO E PATENTE DE MILITAR.
COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL PARA DECIDIR
SOBRE QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE REFORMA AO POLICIAL
AFASTADO. 1. Cuida-se, na origem, de Representação apresentada perante Tribunal de Justiça, mediante a qual se
requereu a perda da graduação da praça e a exclusão dos quadros da polícia militar de agente policial condenado pela
prática dos crimes de concussão e prevaricação. 2. O Tribunal de origem julgou parcialmente procedente a Representação,
no sentido de se decretar a reforma disciplinar do policial em questão, com proventos proporcionais ao tempo de serviço.
O afastamento da corporação fundamentou-se no fato de que sua conduta ofendeu o decoro da classe e o pundonor policial
militar. Por outro lado, considerando que, por mais de vinte anos de atividade na corporação, não registrava sanções
disciplinares e constavam em seu favor inúmeros elogios e medalhas por serviços prestados, o Tribunal decidiu conceder-
lhe o benefício previdenciário. 3. O art. 102 do Código Penal Militar (Decreto-Lei 1.001, de 21 de outubro de 1969)
estabelece que a condenação da praça à pena privativa de liberdade, por tempo superior a 2 (dois) anos, importa sua
exclusão das Forças Armadas. 4. O art. 125, § 4º, da Constituição de 1988 dispõe que “compete à Justiça Militar estadual
processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos
disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir
sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças”. 5. O texto constitucional não recepcionou o
art. 102 do Código Penal Militar em relação aos Policiais Militares, exigindo para esses, no campo judicial, a incidência
do procedimento previsto pelo artigo 125, §4º da CF. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a possibilidade de perda
de graduação dos praças das policias militares em virtude de decisão do Tribunal competente, mediante procedimento
específico. 6. A previsão constitucional dessa específica competência para os Tribunais não afastou as tradicionais
competências administrativas no âmbito da própria corporação, inclusive a possibilidade de sanção de perda da graduação,
aplicada após procedimento administrativo, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. 7. Em relação à questão
constitucional com repercussão geral reconhecida, a Constituição não conferiu aos Tribunais competência para dispor
sobre outras penas arroladas no Código Penal Militar, ou sobre questões administrativas e previdenciárias, que seguem
sendo afeitas ao âmbito da corporação. 8. A reforma do militar é questão estranha ao processo autônomo de perda de
posto e patente de militar, e está fora do âmbito de competência atribuído pela Constituição Federal, no art. 125, § 4º, ao
Poder Judiciário. Assim, neste caso concreto, o acórdão recorrido, ao decidir pela reforma compulsória do militar, ofendeu
não apenas o art. 125, § 4º, da Constituição Federal, como também o princípio da separação de poderes, por interferir em
decisão administrativa, própria da Corporação. 9. Recurso extraordinário a que se dá provimento, para excluir a reforma
concedida pelo acórdão recorrido. Tese de repercussão geral: "A competência constitucional do tribunal para decidir sobre
a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças é específica, nos termos do artigo 125, § 4º, não
autorizando a concessão de reforma de policial militar julgado inapto a permanecer nas fileiras da corporação”.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO 602.917
RELATORA: MIN. ROSA WEBER
REDATOR DO ACÓRDÃO: MIN. ALEXANDRE DE MORAES
Decisão: O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 324 da repercussão geral, deu provimento ao recurso
extraordinário para julgar improcedente o pedido inicial e fixou a seguinte tese: "É constitucional o artigo 3º da Lei
7.798/1989, que estabelece valores pré-fixados para o IPI", nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes,
Redator para o acórdão, vencidos os Ministros Rosa Weber (Relatora), Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Cármen

Informativo XXX-STF – Márcio André Lopes Cavalcante | 27


Informativo
comentado

Lúcia e Celso de Mello. Falou, pela recorrente, a Dra. Luciana Miranda Moreira, Procuradora da Fazenda Nacional.
Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 324. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO.
IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS - IPI. CÁLCULO. ESTABELECIMENTO DE VALORES
PRÉ-FIXADOS (“PAUTAS FISCAIS”). RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. INEXISTÊNCIA.
CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 3º DA LEI ORDINÁRIA 7.798/1989. 1. O Imposto sobre Produtos
Industrializados, previsto nos artigos 153, IV e §3º, da Constituição Federal e 46 a 51 do CTN, é de competência da União
e incide sobre o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou
o aperfeiçoe para o consumo (art. 46, parágrafo único, do CTN). 2. O artigo 146, III, a, da CF/1988 dispõe que compete
à lei complementar definir normas gerais acerca da definição de tributos e dos respectivos fatos geradores, bases de
cálculo e contribuintes. O Código Tributário Nacional (Lei 5.172/1966), recepcionado pela Constituição de 1988 como
lei complementar, regulamentou o IPI, definindo que a base de cálculo do imposto é o valor da operação de que decorre
a saída da mercadoria. 3. A Lei 7.798/1989, objeto de conversão da Medida Provisória 69, de 19 de junho de 1989, trouxe
em seu artigo 3º que o Poder Executivo poderá estabelecer classes de valores a serem pagos a título de IPI, para
determinadas bebidas e alimentos. 4. As chamadas “pautas fiscais” estabelecem valores de referência para a base de
cálculo do imposto e têm como escopo facilitar a tributação e evitar a evasão fiscal. O Fisco utiliza valores pré-fixados
para enquadramento do produto, buscando eliminar a possibilidade de manipulação dos preços da operação. 5. Tal
mecanismo, enfim, facilita a fiscalização tributária e evita a sonegação fiscal. 6. A reserva legal no âmbito do direito
tributário significa que todos os aspectos da regra matriz da hipótese de incidência tributária, seja os elementos
antecedentes da norma (material, temporal e espacial), seja os consequentes (quantitativo e pessoal), devem ser
taxativamente regulados por lei em sentido estrito. 7. Entretanto, tanto a doutrina tributária mais moderna, quanto esta
CORTE SUPREMA, vêm empregando ideia mais flexível do princípio da legalidade tributária, permitindo, por vezes, o
complemento de determinado aspecto da obrigação tributária mediante ato infralegal, desde que a lei trace limites à
regulamentação pelo Executivo. 8. Quanto ao tema, veja-se trecho do voto do ilustre Min. DIAS TOFFOLI nos autos do
RE 838.284 que, julgado sob o rito da repercussão geral (Tema 829), fixou a tese de que Não viola a legalidade tributária
a lei que, prescrevendo o teto, possibilita o ato normativo infralegal fixar o valor de taxa em proporção razoável com os
custos da atuação estatal, valor esse que não pode ser atualizado por ato do próprio conselho de fiscalização em percentual
superior aos índices de correção monetária legalmente previstos. 9. A Lei 7.798/1989 tratou apenas de regulamentar o
que já estava disposto no CTN, conceituando, portanto, o que seria valor da operação para fins de definição da base de
cálculo do IPI. A legislação aplicável ao IPI cuidou de trazer todos os aspectos da regra matriz de incidência tributária,
de forma que ao Poder Executivo foi delegada apenas a possibilidade de esmiuçar o conceito de valor da operação para
fins de se determinar o valor de IPI a ser pago. 10. Não houve qualquer alteração da base de cálculo; apenas se instituiu
uma técnica de tributação que leva em consideração o próprio valor da operação comumente verificada no mercado, em
respeito, portanto, ao que determina o CTN. 11. Do mesmo modo, não há falar em usurpação do arquétipo constitucional
e legal que regulamenta a matéria. Confirma esse entendimento o disposto no artigo 1º da Lei 8.218/1991, que, ao delegar
ao Ministro da Economia, Fazenda e Planejamento a possibilidade de alterar os valores do IPI, impôs que a alteração deve
se dar até o limite que corresponder ao que resultaria da aplicação da alíquota a que o produto estiver sujeito na TIPI
sobre o valor tributável. 12. Assim, a instituição de classes de valores utiliza como parâmetro o preço convencional do
produto (valor médio costumeiramente cobrado). Logo, é evidente que o preço do produto não perdeu seu caráter essencial
na definição do valor a ser cobrado, o que demonstra a compatibilização da Lei 7.798/1989 com a sistemática do CTN.
13. Recurso extraordinário a que se dá provimento, para julgar improcedente o pedido inicial. Tese de repercussão geral:
"É constitucional o artigo 3º da Lei 7.798/1989, que estabelece valores pré-fixados para o IPI".

OUTRAS INFORMAÇÕES
19 A 23 DE OUTUBRO DE 2020

Emenda Regimental STF nº 57, de 16.10.2020 - Altera dispositivos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
Resolução STF nº 707, de 19.10.2020 - Prorroga a suspensão de prazos de processos físicos no Supremo Tribunal
Federal.

Supremo Tribunal Federal – STF


Secretaria de Altos Estudos, Pesquisas e Gestão da Informação
Coordenadoria de Difusão da Informação

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