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Página da internet acima mencionada adaptada e formatada por
Luis Antonio Vergara Rojas - LAVRo
Mallarmé está on-line?
Por Felipe Fortuna
"Em seguidas ocasiões, o poema "Um Lance de Dados" e o projeto do
"Livro", ambos de Stéphane Mallarmé (1842-1898), são considerados como
etapas decisivas para a literatura de vanguarda e para a confluência entre palavra,
imagem e som.
Na percepção de Augusto de Campos, "os pressupostos formais da poesia da
Era Tecnológica" poderiam ser encontrados na produção final do poeta francês.
Com sua estrutura fragmentária, inovadora disposição espacial e utilização de
variada tipologia, o poema, publicado na revista Cosmopolis em 1897, procurou
romper com a linearidade e a ordem hierarquizada da leitura: questionou, do
mesmo modo, os limites da página e o espaço dos versos. O acaso fez com que
"Um Lance de Dados" só fosse conhecido como poema isolado em 1914; e a
fatalidade fez com que o Livro sonhado pelo poeta se transformasse em obra
póstuma – ou melhor, que os fragmentos e apontamentos para a execução de um
planejado Livro só viessem a público em 1957, graças à pesquisa de Jacques
Scherer. Se a modernidade pode mesmo exibir as duas obras como precursoras,
sobretudo pela ampliação da experiência poética e pelo recurso à técnica, não
devem ser esquecidas outras dimensões que também se apresentam nos impasses
e nas soluções trazidas pela poesia contemporânea, estejam ou não diretamente
vinculadas às inovações.
Em "A Arte no Horizonte do Provável" (1969), Haroldo de Campos não deixa
de observar a existência de uma "temática existencial" no Livro de Stéphane
Mallarmé; porém, bem mais preocupado com os aspectos formais, prefere
salientar que aquela obra "refoge completamente à idéia usual de livro e
incorpora a permutação e o movimento como agentes estruturais." Em seus
comentários sobre "uma nova física do livro", o poeta concreto provavelmente se
alinha às longas digressões de Maurice Blanchot em "O Livro por Vir" (1959):
digressões tanto mais atraentes na medida em que o crítico francês se pergunta
sobre o futuro da literatura, ao considerar que "os livros, os escritos e a
linguagem estão destinados a mutações", sendo a dispersão um traço comum.
O "Livro" concebido por Stéphane Mallarmé estaria destinado a ser único e
absoluto, capaz de abarcar a totalidade – segundo um ideal que foi transmitido
pelo romantismo alemão. Maurice Blanchot reconhece os "contatos mundanos"
do poeta francês com as doutrinas ocultistas, bem como as tentações ao
esoterismo que muitas vezes tomaram a forma de versos hermético s e tortuosa
sintaxe. Em "The Mechanic Muse" (1987), Hugh Kenner chega a comentar que o
movimento simbolista arregimentou grupos de "católicos malogrados,
convencidos na infância de que existiam fórmulas verbais de eficiência." Cita o
soneto de Stéphane Mallarmé com rimas raras em yx ("Puras unhas no alto ar
dedicando seus ônix") como exemplo de "iconografia cristã", no qual alguns
versos terminam com aquela letra cruciforme... Em outras palavras: por trás do
"Livro" estaria um símbolo da Bíblia, no qual o Verbo ou a Poesia representaria a
um só tempo o sagrado e a redenção. Bem mais do que qualquer outro crítico,
Umberto Eco, em "Obra Aberta" (1962), salienta o aspecto religioso do Livro, e
afirma que este "revelaria uma equívoca encarnação mística e esotér ica de uma
sensibilidade decadente ao fim de sua parábola."
Por outro lado, o aspecto da obra total e unitária talvez perturbe de modo
irreparável o poeta moderno ou contemporâneo que dispõe, com palavras, do
fragmento. Para este poeta, a imprevisibilidade e mesmo a inovação jamais se
relacionam a um sistema coeso, no qual se procura eliminar o acaso para alcançar
a expressão pura. Pelo contrário, o acidental é a matéria-prima: imagine-se, por
exemplo, o método de composição literária de Kurt Schwitters.
Ainda que persistam, em formas latentes ou não, as contradições de Stéphane
Mallarmé em seu projeto final, nenhuma delas consegue comparar-se à
condenação, pelo poeta, da linguagem utilizada pelos jornais e pelos posters, em
oposição à linguagem da poesia, que deveria circular com restrições. Num texto
intitulado "Étalages" ("Vitrines"), o poeta censura a presença da literatura nos
jornais, além do comércio geral de livros na rua. A poesia, segundo entende, não
deve estar presente ao espetáculo público do mercado: sua divulgação precisa
sempre ser reduzida. Encontra-se assim o principal obstáculo aos que se
permitem a fácil transposição do projeto do Livro para a internet, com seus
hipertextos e suas páginas infinitas: o novo formato eletrônico não estimularia ,
do início ao fim, um rebaixamento estético? A disposição gráfica dos textos nas
colunas dos jornais influenciou a idéia de leitura formulada pelo poeta francês,
que atuava na imprensa com seus versos de circunstância e suas apreciações
críticas. Mas sua fascinação pela imprensa era ambivalente: e Stéphane Mallarmé
criticava muito mais a circulação do que o tipo de texto que cada um dos veículos,
o livro e o jornal, estampava em suas respectivas páginas. Possivelmente ficaria
surpreso se tivesse conhecimento de que o Livro tem sido com alguma freqüência
mencionado como um precursor dos meios eletrônicos de divulgação e de
circulação de textos, imagens e sons.
Entre os discípulos brasileiros e modernos do poeta francês, foi
precisamente Haroldo de Campos quem acabou encaminhando sua obra poética
rumo a uma síntese que também almejava a utopia de uma obra total ou, ao
menos, de ambiciosa abrangência, como a unificar a poesia e a ciência, sem faltar
à pulsação mística. Na etapa final da sua carreira, o poema-livro "A Máquina do
Mundo Repensada" (2000) já indica essa preferência: forma conservadora em
tercetos rimados e a tarefa de amalgamar, em versos, os temas cósmicos
presentes em Dante, Camões e Drummond, além da extensa vulgarização
científica sobre novos conceitos de Física, o acaso e o caos. No sentido estrito da
palavra, é inegável que Haroldo de Campos produziu um livro religioso – ou
mesmo um livro ecumênico, em sua acepção grega: aberto para o mundo inteiro.
Assim teria sido transmitida a lição mística de Stéphane Mallarmé, que por fim
revelou não mais um poeta de vanguarda, porém um devoto aspirante à poesia
universal, seguindo a tradição, tornando-a até mais arcaica para tentar atingir o
insondável, o indeterminado e o futuro.
Stéphane Mallarmé

A Tarde de Um Fauno e Outros Poemas

1) Túmulo de Edgar Poe


2) Brinde
3) Cansado do Repouso Amargo
4) O Acaso
5) Fosse
6) A Vendedora de Roupas
7) Angústia
8) Brisa Marinha
9) À Preocupação de Viajar
10) Aparição
11) Suspiro
12) Poesia
13) A Tarde de um Fauno (Écloga 1865-1875)
14) Santa
15) Carta a Henri Cazalis (1864)
16) Santa

17) Tombeau d’Edgar Poe


18) Salut
19) Brise Marine
20) Carta a Henri Cazalis (francês)
21) L'APRES-MIDI D'UN FAUNE
22) Un Coup de Dés
1

TÚMULO DE EDGAR POE

Como em Si mesmo enfim a eternidade o muda,


O Poeta suscita com um gládio nu
Seu tempo assombrado por não ter entendido
Que a morte triunfava nessa voz estranha!

Eles, tal vil tremor de hidra ouvindo outrora o anjo


Dar um sentido mais puro às palavras da tribo
Proclamaram muito alto o sortilégio bebido
Na onda sem honra de alguma negra mistura.

Da terra e da nuvem adversos, ó agravo!


Se nossa idéia com não esculpe um baixo-relevo
De que se orne deslumbrante a tumba de Poe,

Calmo bloco caído aqui de um desastre obscuro


Que este granito ao menos mostre sempre seu marco
Aos negros vôos da Blasfêmia esparsos no futuro.

("Tombeau d’Edgar Poe" [Túmulo de Edgar Poe].


Tradução Joaquim Brasil Fontes)
2

BRINDE

Nada, esta espuma, virgem verso


Apenas denotando a taça;
Como longe afogam-se em massa
Sereias em tropa ao inverso

Navegamos, ó meus diversos


Amigos, eu já sobre a popa,
Vós a proa que rompe em pompa
As vagas de trovões adversos.

Empenho-me em pura voragem


sem mesmo temer a arfagem
A, de pé, este brinde erguer:

Solitude, recife, estrela,


Não importa o que valer
O alvo desvelo em nossa vela.

Tradução de José Lino Grünewald - Poemas - Ed. Nova


Fronteira
3

CANSADO DO REPOUSO AMARGO

Uma linha de azul fina e pálida traça


Um lago, sob o céu atrás da nuvem clara
Molha no vidro da água um dos cronos aduncos,
Junto a três grandes cílios de esmeralda, juncos.
4

O ACASO

Cai
a pluma
rítmico suspense do sinistro
nas espumas primordiais
de onde há pouco sobressaltara seu delírio a um cimo
fenescido
pela neutralidade idêntica do abismo.
5

FOSSE

Seria
pior
não
mais nem menos
indiferentemente mas tanto quanto
6

A VENDEDORA DE ROUPAS

O olho vivo com que vês


Até o seu conteúdo
Me aparta de minhas vestes
E como um deus vou desnudo.
7

ANGÚSTIA

Não vim domar teu corpo esta noite, ó cadela


Que encerras os pecados de um povo, ou cavar
Em teus cabelos torpes a triste procela
No incurável fastio em meu beijo a vazar

Busco em teu leito o sono atroz sem devaneios


Pairando sob ignotas telas do remorso,
E que possas gozar após negros enleios,
Tu que acima do nada sabes mais que os mortos:

Pois o Vício, a roer minha nata nobreza,


Tal como a ti marcou-me de esterilidade,
Mas enquanto teu seio de pedra é cidade

De um coração que crime algum fere com presas,


Pálido, fujo, nulo, envolto em meu sudário,
Com medo de morrer pois durmo solitário.
8

BRISA MARINHA

A carne é triste, sim, e eu li todos os livros.


Fugir! Fugir! Sinto que os pássaros são livres,
Ébrios de se entregar à espuma e aos céus imensos.

Nada, nem os jardins dentro do olhar suspensos,


Impede o coração de submergir no mar
Ó noites! nem a luz deserta a iluminar
Este papel vazio com seu branco anseio,
Nem a jovem mulher que preme o filho ao seio.
Eu partirei! Vapor a balouçar nas vagas,
Ergue a âncora em prol das mais estranhas plagas!

Um Tédio, desolado por cruéis silêncios,


Ainda crê no derradeiro adeus dos lenços!
E é possível que os mastros, entre ondas más,
Rompam-se ao vento sobre os náufragos, sem mastros,
sem mastros, nem ilhas férteis a vogar...
Mas, ó meu peito, ouve a canção que vem do mar!

Tradução: Augusto de Campos


9

À PREOCUPAÇÃO DE VIAJAR

Para além de uma Índia esplêndida e turva


− Este salvação seja o mensageiro
O tempo, cabo que teu poupe duplo

Como sobre alguma verga parte inferior


Plongeante com caravelle
Tirava espuma sempre ébats
Um pássaro de anúncio novo
Quem gritava monotonement
Sem que a barra varie
Um inútil jazigo
Noite, desespero e pierrerie

Pelo seu canto reflectido até


Sorrir pálido Vasco.

Tradução de Liana Carreira.


11

APARIÇÃO

Ficava triste a lua. E serafins chorosos


Punham-se, entre os botões e as flores vaporosos
E calmos, a tirar de expirantes violas

Brancos ais a escorrer nos azuis das corolas.


Do teu primeiro beijo, abençoado dia.
Já que martirizar-me adora, a fantasia
Sábia, absorvia o odor de tristeza e de queixa

Que, mesmo sem lamento e sem dissabor, deixa


A colheita de um Sonho ao peito que o colheu.
Cismava, com o olhar no chão que envelheceu,
Quando, com o cabelo ao sol, subitamente,
Na rua, à tarde, tu surgiste sorridente

E a fada julguei ver, com chapéu clareado,


Do meu sono feliz de menino mimado,
Que deixava nevar das mãos meio afrouxadas
Alvíssimos buquês de estrelas perfumadas.
12

SUSPIRO

Minha alma demanda, ó irmã tão serena,


Tua fronte onde sonha um outono sardento,
E o errante céu do teu olhar angélico,
Tal como a suspirar, num jardim melancólico,
Fiel, um jacto branco sobe para o Azul!

− Para o Azul de Outubro pálido, terno e puro,


Nos lagos a mirar o langor infinito:
E deixa à flor da água onde a fulva agonia
Das folhas voga ao vento abrindo um frio sulco
O sol quente a arrastar seu longo raio ruivo.
13

POESIA

Toda alma que a gente traça


lenta, no ar, em resumidos
vários anéis de fumaça
noutros anéis abolidos
atesta qualquer cigarro
por pouco que separado
fique da cinza e do ssaro
seu claro beijo inflamado.
Assim o côro dos poemas
dos lábios voa sutil.
A realidade, não temas,
excluí-la, porque é vil.
A exatidão torna impura
tua vaga literatura.

(tradução de Luis Martins)


Do livro: "Obras Primas da Poesia Universal", Livraria
Martins Editora, 1954, SP
14

A TARDE DE UM FAUNO
(Écloga 1865-1875)

O fauno:

Estas ninfas quero eu perpetuar.


Tão puro,
o seu claro rubor, que volteia no duro ar
pesando a sopor.
Foi um sonho o que amei?
Massa de velha noite, essa dúvida, sei,
muito ramo subtil estendendo, provava
meu engano infeliz, que enganado tomava
por triunfo, afinal um pecado de rosas.
Reflitamos.

Quem sabe as mulheres que glosas


são configurações de anseios que possuis?
Repara na ilusão que emana dos azuis
e frios olhos, fonte em pranto, da mais casta
Suspiros, toda, a outra - alegas que contrasta,
como brisa diurna e tépida que passa?
Mas não! Neste desmaio imóvel, lasso - ameaça
a todo matinal frescor de suave fama
se uma fonte murmura, esta flauta a derrama
no vizinho silvedo, irrigando-o de acordes;
nenhum vento aqui faz, senão os sopros concordes
desta avena que o som em chuva árida espalha,
e senão no horizonte, em sua calma sem falha,
o sereno bafor da pura inspiração,
visível, regressando ao céu, por ascensão.
Ó plagas sículas e calmas, da lagoa,
que saqueadas tem minha vaidade, à toa,
e tácita- no amor das flores destes páramos – DIZEI
"que aqui me achava em busca destes cálamos sonoros
quando além, por entre as brandas linhas
de ouro glauco, a fulgir nas fontes e nas vinhas,
eis ondeia uma alvura. animal em repouso;
mas que logo também, ao lento e langoroso
prelúdio linear da avena de cinabre
vôo, de cisnes não, de náiadas se abre."

A hora fulva que arde inerte não revela


a astúcia, de intenções de aliciação tão bela.
Sinto-me despertar sob um fervor de antanho,
onda antiga de luz envolvendo-me em banho,
eu, lírio, um dentre vós segundo a ingenuidade!

Mais que o nada tão doce, essa espontaneidade,


beijo, sussurro suave e soma de perfídia,
meu corpo, sem mais prova, atesta ainda, insídia,
uma oculta mordida augusta, de alto dente;
mas, vede, arcano tal tomou por confidente
o gêmeo junco, par que sob o azul se soa;
que recebendo em si o sôpro, logo entoa
e sonha, em solo longo e leve, que a beleza
em derredor está a mudar-se com presteza
dentro na confusão de si mesma e do canto;
e nas modulações altas de amor,entanto
evanescendo esvai-se apaga-se a teoria
clara, de dorsos e de flancos; ó magia
de uma sonora e vã monótona mesmice!

Flauta maligna, órgão de fugas, sem ledice,


vai, fístula, florir no lago e ali me aguarda.
Eu, cheio de rumor altivo, já me tarda
falar de deusas; por idólatras pinturas,
de suas sombras irei tomar-lhes as cinturas.
Assim, quando ao racimo extraio-lhe a substância sorvo
e contra a mágoa apuro a minha vigilância,
e rindo soergo no ar o já vazio cacho
e, na pele de luz assoprando, eu me acho
-ébrio- capaz de então a tarde toda o olhar.

Outras RECORDAÇÕES, vamos, ninfas, lembrar


"Meus olhos entre o junco... além uma figura
imortal que se banha e a cálida brancura
luminosa do corpo em onda leve imerge.
Sôbre o áureo esplendor dos cabelos converge
um claror e um fremir de fulva pedraria!
Corro; mas a meus pés, jungidas na agonia do langor
deste mal de serem dois em um,
vejo duas dormindo, em abraço comum.
Como estavam tomei e trouxe a esta eminência
desamada da sombra e dela sem frequência;
aqui se esvai ao sol das rosas o perfume;
mas para o nosso embate a força aqui me assume."

Ó furor virginal, eu te adoro, ó concisa


fúria de corpo nu, fardo nu que desliza
fugindo ao lábio ardente e a refulgir livores
de ampla trepidação da carne em seus pavores!
E isso, da inumana à tímida que vê
já perdida a inocência e dos olhos revê
uma lágrima louca ou um tanto menos triste.
"Meu crime foi querer, na fôrça que me assiste,
apartar dividir um tufo desgrenhado
de beijos e de amor, dos deuses bem guardado.
Na hora em que esconder eu ia o riso ardente
na feliz maciez de urna, só - e contente
procuro no condor de pluma em que se agita
o sabor da emoção que vívida palpita
na sua ingênua irmã, pequena, que não cora
eis de meus braços que se esquecem foge fora
tal ingrata cruel, que na impiedade esfria
a estuosa ebriez em que me consumia."

Foi pena. Irei buscar alhures a esperança


de em meus chavelhos ver, enastrada, uma trança.
Bem sabes, ó paixão, que rubras mui vermelhas
cada cereja abriu seu murmurar de abelhas.
E o nosso sangue vai, enviado em seu ensejo,
percorrendo o pendor eterno do desejo.
Na hora em que de ouro e cinza este bosque
se pinta logo em festa se exalta a folharia extinta.
Ó Etna, é junto a ti! Vênus vem pelos ares.
Leve na lava pousa ingênuos colcanhares
enquanto sonolento as chamas tens em calma.
Tenho pois a rainha!

Ó dura pena...
A alma
de palavras vazia e o corpo em letargia
sucumbem afinal ao fero meio-dia.
Cumpre dormir assim, no olvido, de mansinho,
deitado nesta areia.
Ó que delicia ao vinho
a boca oferecer e a seu astro eficaz!

Par, adeus: Quero ver como ûa sombra se faz.


Belo Horizonte, 18.08.1959
[Nota do tradutor: "relida em 02.1963 e achada ruim"]
http://www.letras.ufmg.br/lourenco/banco/FR02.html
15

SANTA

Numa janela vigilante


O sândalo que se desdoura
De sua viola cintilante
Outrora com flauta ou mandora,
A Santa pálida perante
O velho livro que se escoa
Do Magnificat evolante
Outrora em vésperas e noa:
Na vidraria de ostensório
Que a harpa noturna do Anjo plange
Das suas asas de velório
Para a delicada falange
Com que, sem sândalo afinal
E sem velho livro ela vence-o,
À plumagem instrumental,
Som, a música do silêncio.
16

CARTA A HENRI CAZALIS (1864)

Manhã de quinta-feira
7 de janeiro de 1864
Meu Henri,
Enfim envio-lhe este poema sobre o Azul, que você
parecia tão desejoso de possuir. Trabalhei nele, nestes
últimos dias, e não esconderei que ele me causou um
desconforto infinito – além do fato de que antes de
pegar a pena era preciso, para conquistar um momento
de perfeita lucidez, demolir minha desoladora
Impotência. Isso me causou muito desconforto, pois ao
banir mil graciosidades líricas e belos versos que
assombravam incessantemente meu cérebro, eu quis
permanecer implacavelmente em meu tema. Juro a você
que não há uma palavra que não me tenha custado
várias horas de pesquisa, e que a primeira palavra, que
reveste a primeira idéia, além de tender por si própria
ao efeito geral do poema, serve ainda para preparar a
última. O efeito produzido, sem nenhuma dissonância,
sem nenhum floreado, mesmo adorável, que distraia –
é isso que procuro. Tendo lido os versos para mim
mesmo, duzentas vezes talvez, estou certo de que ele
foi alcançado. Resta agora o outro lado a considerar, o
lado estético. São belos, há neles um reflexo da Beleza?
Aqui começaria minha imodéstia se eu falasse, e cabe a
você decidir.
Henri, como estamos longe daquelas teorias de
composição literárias à maneira das quais nosso
glorioso Emmanuel pega um punhado de estrelas na via
Láctea para semeá-las sobre o papel, e deixá-las se
formarem ao acaso em constelações imprevistas! E
como sua alma entusiasmo [sic], ébria de inspiração,
recuaria de horror diante de minha maneira de
trabalhar! Ele é o poeta lírico em toda a sua admirável
efusão. Todavia, quanto mais eu avançar, mais serei
fiel às severas idéias que me foram legadas por meu
grande mestre Edgar Poe.
O poema inaudito do Corvo foi feito assim. E a alma do
leitor goza absolutamente como o poeta quis que ela
gozasse. Ela não sente uma impressão diferente
daquelas com as quais ele havia contado. – Assim, siga
meu pensamento em meu poema, e veja se é isso que
você sentiu ao me ler. Para começar de uma maneira
mais ampla, e aprofundar o todo, eu não apareço na
primeira estrofe. O azul tortura o impotente em geral.
Na segunda, começa-se a pressentir, por minha fuga
diante do céu possuidor, que sofro dessa terrível
doença. Preparo ainda nessa estrofe, por uma
fanfarrice blasfematória Quelle nuit hagarde/ Que noite
selvagem, a estranha idéia de invocar as névoas. A
súplica ao Cher Ennui/Caro Tédio confirma minha
impotência. Na terceira estrofe, enfureço-me como o
homem que vê realizado seu desejo mais ardoroso. A
quarta começa com uma exclamação grotesca, de
colegial libertado. O céu está morto! Em seguida,
munido de admirável certeza, imploro à Matéria. Eis aí
a alegria do Impotente. Cansado do mal que me corrói,
quero provar a simples ventura da multidão, e esperar
pacientemente a morte obscura… Digo: Eu quero! Mas o
inimigo é um espectro, o céu morto reaparece e eu o
escuto cantando nos sinos azuis. Ele passa, indolente e
vitorioso, sem sujar-se nessa bruma e simplesmente
me atravessa. Diante do que eu exclamo, cheio de
orgulho e não vendo aí um justo castigo para minha
covardia, que possuo uma imensa agonia. Quero fugir
ainda, mas sinto meu erro e atesto que estou possuído.
Foi preciso toda essa lancinante revelação para motivar
o grito sincero, e bizarro, do fim, o azul… – Veja que,
para aqueles que, como você e Emmanuel, procuram
em um poema outra coisa além da música do verso,
existe aí um verdadeiro drama. E foi terrivelmente
difícil combinar, em uma justa harmonia, o elemento
dramático, hostil à idéia de Poesia pura e subjetiva,
com a serenidade e a calma de linhas necessárias à
Beleza.
Mas você me dirá que são muitos obstáculos para
versos que são bem pouco dignos deles. Bem o sei.
Entretanto, divertiu-me indicar-lhe como julgo e
concebo um poema. Abstraia destas linhas qualquer
alusão a mim, qualquer coisa que tenha ligação com
meus versos, e leia estas quatro páginas, friamente,
como o esboço, muito mal escrito e informe, de um
artigo de arte.
Tuus,
STÉPHANE MALLARMÉ
Não vou me reler. E lamento-o por você ter que me ler,
povero!

Tradução: Liana Carreira Martins . Graduanda em


Português-Francês pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
17) TOMBEAU D’EDGAR POE

Tel qu’em Lui-même enfin l’éternité le change,


Le Poète suscite avec um glaive nu
Son siècle épouvanté de n’avoir pás connu
Que la mort triomphait dans cette voix étrange!

Eux, comme un vil sursaut d’hydre oyant jadis l’ange


Donner uns sens plus pur aux mots de la tribu
Proclamèrent très haut le sortilège bu
Dans le flot sans honneur de quelque noir mélange.

Du sol et de la nue hostiles, ô grief!


Si notre idée avec ne sculpte um barelief
Dont la tombe de Poe éblouissante s’orne,

Calme bloc ici-bas Chu d’um désastre obscur


Que ce granit du moins montre à jamais sa borne
Aux noirs vols du Blasphème épars dans le futur.
18) SALUT

Rien, cette écume, vierge vers


À ne désigner que la coupe;
Telle loin se noie une troupe
De sirènes mainte à l'envers.

Nous naviguons, ô mes divers


Amis, moi déjà sur la poupe
Vous l'avant fastueux qui coupe
Le flot de foudres et d'hivers;

Une ivresse belle m'engage


Sans craindre même son tangage
De porter debout ce salut

Solitude, récif, étoile


À n'importe ce qui valut
Le blanc souci de notre toile.
19) BRISE MARINE

La chair est triste, hélas! et j´ai lu tous les livres.


Fuir! là-bas fuir ! Je sens que des oiseaux sont ivres
D´être parmi l´écume inconnue et les cieux!
Rien, ni les vieux jardins reflétés par les yeux

Ne retriendra ce coeur qui dans la mer se trempe


O nuits ! ni la clarté déserte de ma lampe
Sur le vide papier que la blancheur défend
Et ni la jeune femme allaitant son enfant.

Je partirai ! Steamer balançant ta mâture,


Lève l´ancre pour une exotique nature!
Un Ennui, désolé par les cruels espoirs,
Croit encore à l´adieu suprême des mouchoirs!

Et, peut-être, les mâts, invitant les orages


Sont-ils de ceux qu´un vent penche sur les naufrages
Perdus, sans mâts, sans mâts, ni fertiles îlots...
Mais, ô mon coeur, entends le chant des matelots!
20)

Mon Henri,
Je t’envoie enfin ce poeme de l’Azur que tu semblais si
désireux de posséder. Je l’ai travaillé, ces derniers
jours, et je ne te cacherai pas qu’il m’a donné
infiniment de mal, - outre qu’avant de prendre la
plume il fallait, pour conquérir un moment de lucidité
parfaite, terrasser ma navrante Impuissance. Il m’a
donné beaucoup de mal, parce que bannissant mille
gracieusetés lyriques et beaux vers qui hantaient
incessamment ma cervelle, j’ai voulu rester
implacablement dans mon sujet. Je te jure qu’il n’y a
pas un mot qui ne m’ait couté plusieurs heures de
recherche, et que le premier mot, qui revêt la premiere
idée, outre qu’il tend par lui-même à l’effet général du
poème, sert encore à préparer le dernier. L’effett
produit, sans une dissonance, sans une fioriture, même
adorable, qui distraie, — voilà ce que je cherche. — Je
suis sur, m’étant lu les vers à moi-même, deux cents
fois peut-être, qu’il est atteint. Reste maintenant
l’autre côté à envisager, le côté esthétique. Est-ce beau,
y a-t-il un reflet de la Beauté? Ici, commencerait mon
immodestie si je parlais, et c’est à toi de décider.
Henri, qu’il y a loin de ces théories de composition
littéraires à la façon dont notre glorieux Emmanuel
prend une poignée d’étoiles dans la voie lactée pour
les semer sur le papier, et les laisser se former au
hasard en constellations imprévues! Et comme son âme
enthousiasme [sic], ivre d’inspiration, reculerait
d’horreur devant ma façon de travailler! Il est le poète
lyrique, dans tout son admirable épanchement.
Toutefois, plus j’irai, plus je serai fidéle à ces séveres
idées que m’a léguées mon grand maître Edgar Poe.
Le poème inoui du Corbeau a été ainsi fait. Et l’âme du
lecteur jouit absolument comme le poète a voulu
qu’elle jouit. Elle ne ressent pas une impression autre
que celles sur lesquelles il avait compté. - Ainsi, suis
ma pensée dans mon poème, et vois si c’est là ce que
tu as senti en me lisant. Pour débuter d’une façon plus
large, et approfondir l’ensemble, je ne parais pas dans
la première strophe. L’azur torture l’impuissant en
général. Dans la seconde, on commence à se douter,
par ma fuite devant le ciel possesseur, que je souffre
de cette terrible maladie. Je prépare dans cette strophe
encore, par une forfanterie blasphématoire Et quelle
nuit hagarde, l’idée étrange d’invoquer les brouillard.
La prière au Cher Ennui confirme mon impuissance.
Dans la troisième strophe, je suis forcené comme
l’homme qui voit réussir son voeu acharné. La
quatrième commence par une exclamation grotesque,
d’écolier délivré. Le ciel est mort! Et, de suite, muni de
cette admirable certitude, j’implore la Matière. Voilà
bien Ia joie de I’Impuissant. Las du mal qui me ronge,
je veux goûter au bonheur commun de la foule, et
attendre patiemment la mort obscure… Je dis: Je veux!
Mais l’ ennemi est un spectre, le ciel mort revient, et je
l’entends qui chante dans les cloches bleues. Il passe,
indolent et vainqueur, sans se salir à cette brume et me
transperce simplement. A quoi je m’écrie, plein
d’orgueil et ne voyant pas là un juste châtiment de ma
lâcheté, que j ‘ai une immense agonie. Je veux fuir
encore, mais je sens mon tort et avoue que je suis
hanté. Il fallait toute cette poignante révélation pour
motiver le cri sincére, et bizarre, de la fin, l’azur… - Tu
le vois, pour ceux qui, comme Emmanuel et comme toi,
cherchent dans un poème autre chose que la musique
du vers, il y a là un vrai drame. Et ç’a été une terribIe
difficulté de combiner, dans une juste harmonie,
l’élérrlent dramatique, hostile à l’idée de Poésie pure et
subjective, avec la sérénité et le calme de lignes
nécessaires à la Beauté.
Mais tu vas me dire que voilà beaucoup d’embarras
pour des vers qui en sont bien peu dignes. Je le sais.
Cela, toutefois, m’a amusé de t’indiquer comment je
juge et je conçois un poème. Abstrais de ces lignes
toute allusion à moi, et tout ce qui a rapport à mes
vers, et lis ces quatre pages, froidement, comme
l’ébauche, fort mal écrite et informe, d’un article d’art.
Tuus,
STÉPHANE MALLARMÉ.
Je ne me relis pas. Et je te plains d’avoir à me lire,
povero!
21) L'APRES-MIDI D'UN FAUNE
(Eglogue - 1865-1975)

Le Faune:
Ces nymphes, je les veux perpétuer.
Si clair,
Leur incarnat léger, qu'il voltige dans l'air
Assoupi de sommeils touffus.
Aimai-je un rêve?
Mon doute, amas de nuit ancienne, s'achève
En maint rameau subtil, qui, demeuré les vrais
Bois même, prouve, hélas! que bien seul je m'offrais
Pour triomphe la faute idéale de roses.
Réfléchissons...
ou si les femmes dont tu gloses
Figurent un souhait de tes sens fabuleux!
Faune, l'illusion s'échappe des yeux bleus
Et froids, comme une source en pleurs, de la plus
chaste:
Mais, l'autre tout soupirs, dis-tu qu'elle contraste
Comme brise du jour chaude dans ta toison?
Que non! par l'immobile et lasse
pâmoison
Suffoquant de chaleurs le matin frais s'il lutte,
Ne murmure point d'eau que ne verse
ma flûte
Au bosquet arrosé d'accords; et le seul vent
Hors des deux tuyaux prompt à s'exhaler avant
Qu'il disperse le son dans une pluie aride,
C'est, à l'horizon pas remué d'une ride
Le visible et serein souffle artificiel
De l'inspiration, qui regagne le ciel.

O bords siciliens d'un calme marécage


Qu'à l'envi de soleils ma vanité
saccage
Tacite sous les fleurs d'étincelles,
CONTEZ
«Que je coupais ici les creux roseaux domptés
» Par le talent; quand, sur l'or glauque de lointaines
» Verdures dédiant leur vigne à des fontaines,
» Ondoie une blancheur animale au repos:
» Et qu'au prélude lent où naissent les pipeaux
» Ce vol de cygnes, non! de naïades se sauve
» Ou plonge... »

Inerte, tout brûle dans l'heure fauve


Sans marquer par quel art ensemble détala
Trop d'hymen souhaité de qui cherche le la:
Alors m'éveillerai-je à la ferveur première,
Droit et seul, sous un flot antique de lumière,
Lys! et l'un de vous tous pour l'ingénuité.

Autre que ce doux rien par leur lèvre ébruité,


Le baiser, qui tout bas des perfides assure,
Mon sein, vierge de preuve, atteste une morsure
Mystérieuse, due à quelque auguste dent;
Mais, bast! arcane tel élut pour confident
Le jonc vaste et jumeau dont sous l'azur on joue:
Qui, détournant à soi le trouble de la joue,
Rêve, dans un solo long, que nous amusions
La beauté d'alentour par des confusions
Fausses entre elle-même et notre chant crédule;
Et de faire aussi haut que l'amour se module
Évanouir du songe ordinaire de dos
Ou de flanc pur suivis avec mes regards clos,
Une sonore, vaine et monotone ligne.
Tâche donc, instrument des fuites,
ô maligne
Syrinx, de refleurir aux lacs où tu m'attends!
Moi, de ma rumeur fier, je vais parler longtemps
Des déesses; et par d'idolâtres peintures
À leur ombre enlever encore des
ceintures:
Ainsi, quand des raisins j'ai sucé la
clarté,
Pour bannir un regret par ma feinte écarté,
Rieur, j'élève au ciel d'été la grappe vide
Et, soufflant dans ses peaux lumineuses, avide
D'ivresse, jusqu'au soir je regarde au travers.

O nymphes, regonflons des SOUVENIRS divers.


"Mon oeil, trouant les joncs, dardait chaque encolure
Immortelle, qui noie en l'onde sa brûlure
Avec un cri de rage au ciel de la forêt;
Et le splendide bain de cheveux
disparaît
Dans les clartés et les frissons, ô pierreries!
J'accours; quand, à mes pieds, s'entrejoignent
(meurtries
De la langueur goûtée à ce mal d'être deux)
Des dormeuses parmi leurs seuls bras hasardeux;
Je les ravis, sans les désenlacer,
et vole
À ce massif, haï par l'ombrage frivole,
De roses tarissant tout parfum au soleil,
Où notre ébat au jour consumé soit
pareil."

Je t'adore, courroux des vierges, ô délice


Farouche du sacré fardeau nu qui se glisse
Pour fuir ma lèvre en feu buvant, comme un éclair
Tressaille! la frayeur secrète de
la chair:
Des pieds de l'inhumaine au coeur de la timide
Qui délaisse à la fois une innocence, humide
De larmes folles ou de moins tristes
vapeurs.
"Mon crime, c'est d'avoir, gai de vaincre ces peurs
Traîtresses, divisé la touffe échevelée
De baisers que les dieux gardaient si bien mêlée:
Car, à peine j'allais cacher un rire
ardent
Sous les replis heureux d'une seule (gardant
Par un doigt simple, afin que sa candeur de plume
Se teignît à l'émoi de sa soeur qui s'allume,
La petite, naïve et ne rougissant pas:)
Que de mes bras, défaits par de vagues trépas,
Cette proie, à jamais ingrate se délivre
Sans pitié du sanglot dont j'étais encore ivre. »
Tant pis! vers le bonheur d'autres m'entraîneront
Par leur tresse nouée aux cornes de mon front:
Tu sais, ma passion, que, pourpre et déjà mûre,
Chaque grenade éclate et d'abeilles murmure;
Et notre sang, épris de qui le va saisir,
Coule pour tout l'essaim éternel
du désir.
À l'heure où ce bois d'or et de cendres se teinte
Une fête s'exalte en la feuillée
éteinte:
Etna! c'est parmi toi visité de
Vénus
Sur ta lave posant tes talons ingénus,
Quand tonne une somme triste ou s'épuise la flamme.
Je tiens la reine!
O sûr châtiment...
Non, mais l'âme
De paroles vacante et ce corps alourdi
Tard succombent au fier silence de midi:
Sans plus il faut dormir en l'oubli du blasphème,
Sur le sable altéré gisant et comme j'aime
Ouvrir ma bouche à l'astre
efficace des vins!
Couple, adieu; je vais voir l'ombre que tu devins.
22) UN COUP DE DES

UN COUP DE DÉS
JAMAIS
QUAND BIEN MÊME LANCÉ DANS DES CIRCONSTANCES
ÉTERNELLES
DU FOND D'UN NAUFRAGE
SOIT
que
l'Abîme
blanchi
étale
furieux
sous une inclinaison
plane désespérément
d'aile
la sienne
par
avance retombée d'un mal à dresser le vol
et couvrant les jaillissements
coupant au ras les bonds
très à l'intérieur résume
l'ombre enfouie dans la profondeur par cette voile
alternative
jusqu'adapter
à l'envergure
sa béante profondeur en tant que la coque
d'un bâtiment
penché de l'un ou l'autre bord
LE MAÎTRE
hors d'anciens calculs
où la manoeuvre avec l'âge oubliée
surgi
inférant
jadis il empoignait la barre
de cette conflagration
à ses pieds
de l'horizon unanime
que se
prépare
s'agite et mêle
au poing qui l'étreindrait
comme on menace
un destin et les vents
l'unique Nombre qui ne peut pas
être un autre
Esprit
pour le jeter
dans la tempête
en reployer la division et passer fier
hésite
cadavre par le bras
écarté du secret qu'il détient
plutôt
que de jouer
en maniaque chenu
la partie
au nom des flots
un
envahit le chef
coule en barbe soumise
naufrage cela
direct de l'homme
sans nef
n'importe
où vaine
ancestralement à n'ouvrir pas la main
crispée
par delà l'inutile tête
legs en la disparition
à quelqu'un
ambigu
l'ultérieur démon immémorial
ayant
de contrées nulles
induit
le vieillard vers cette conjonction suprême avec la
probabilité
celui
son ombre puérile
caressée et polie et rendue et lavée
assouplie par la vague et soustraite
aux durs os perdus entre les ais

d'un ébat
la mer par l'aieul tentant ou l'aieul contre la mer
une chance oiseuse
Fiançailles
dont
le voile d'illusion rejailli leur hantise
ainsi que le fantôme d'un geste
chancellera
s'affalera
folie
N'ABOLIRA
COMME SI
Une insinuation
simple
au silence
enroulée avec ironie
ou
le mystère
précipité
hurlé
dans quelque proche
tourbillon d'hilarité et d'horreur
voltige
autour du gouffre
sans de joncher
ni fuir
et en berce le vierge indice
COMME SI
plume solitaire éperdue
sauf
que la rencontre ou l'effleure une toque de minuit
et immobilise
au velours chiffonné par un esclaffement sombre
cette blancheur rigide
dérisoire
en opposition au ciel
trop
pour ne pas marquer
exigûment
quiconque
prince amer de l'écueil
s'en coiffe comme de l'héroique
irrésistible mais contenu
par sa petite raison virile
en foudre
soucieux
expiatoire et pubère
muet
rire
que
SI
La lucide et seigneuriale aigrette
de vertige
au front invisible
scintille
puis ombrage
une stature mignonne ténébreuse
debout
en sa torsion de sirène
le temps
de souffleter
par d'impatientes squames ultimes
bifurquées
un roc
faux manoir
tout de suite
évaporé en brumes
qui imposa
une borne à l'infini
C'ÉTAIT
LE NOMBRE
issu stellaire
EXISTÂT-IL
autrement qu'hallucination éparse d'agonie
COMMENÇÂT-IT ET CESSÂT-IL
sourdant que nié et clos quand apparu
enfin
par quelque profusion répandue en rareté
SE CHIFFRÂT-IL
évidence de la somme pour peu qu'une
ILLUMINÂT-IL
CE SERAIT
pire
non
davantage ni moins
indifféremment mais autant
LE HASARD
Choit
la plume
rythmique suspens du sinistre
s'ensevelir
aux écumes originelles
naguères d'où sursauta son délire jusqu'à une cime
flétrie
par la neutralité identique du gouffre
RIEN
de la mémorable crise
ou se fût
l'événement
accompli en vue de tout résultat nul
humain
N'AURA EU LIEU
une élévation ordinaire verse l'absence
QUE LE LIEU
inférieur clapotis quelconque comme pour disperser
l'acte vide
abruptement qui sinon
par son mensonge
eût fondé
la perdition
dans ces parages
du vague
en quoi toute réalité se dissout
EXCEPTÉ
à l'altitude
PEUT-ÊTRE
aussi loin qu'un endroit
fusionne avec au delà
hors l'intérêt
quant à lui signalé
en général
selon telle obliquité par telle déclivité
de feux
vers
ce doit être
le Septentrion aussi Nord
UNE CONSTELLATION
froide d'oublie et de désuétude
pas tant
qu'elle n'énumère
sur quelque surface vacante et supérieure
le heurt successif
sidéralement
d'un compte total en formation
veillant
doutant
roulant
brillant et méditant
avant de s'arrêter
à quelque point dernier qui le sacre
Toute Pensée émet un Coup de Dés
VIDA E OBRA

BIOGRAFIA

Stéphane Mallarmé (1842-1898). Poeta francês que figura entre os


iniciadores do simbolismo. Nasceu em Paris e cursou bacharelado em
Sens.

Mallarmé começou a publicar seus poemas na revista "Parnaso


Contemporâneo", editada na capital francesa na década de 1860, qua ndo
ele se mudou para o interior da França com o objetivo de ensinar inglês
nas escolas da região. Dos 21 aos 28 anos o poeta viveu com a família em
três cidades: Tournon, Besançon (terra de Victor Hugo) e Avignon.

Anos depois, Mallarmé conheceu os poetas Rimbaud e Paul Verlaine.


Mallarmé se utilizava dos símbolos para expressar a verdade através da
sugestão, mais que da narração. Sua poesia e sua prosa se caracterizam
pela musicalidade, a experimentação gramatical e um pensamento
refinado e repleto de alusões que pude resultar em um texto às vezes
obscuro. Seus poemas mais conhecidos são L'APRÉS-MIDI D'UN FAUNE
(1876), que inspirou o prelúdio homônimo do compositor francês Claude
Debussy, e Herodias (1869). Outras obras importantes de Mallarmé são a
antologia Verso e prosa (1893) e o volume de ensaios em prosa
Divagações (1897).

Mallarmé destacou-se por uma literatura, em que se mostra ao mesmo


tempo lúcida e obscura. É por isso considerado um poeta difícil e
hermético. Em suas famosas tertúlias literárias, em sua casa, em París,
na rue de Rome, reunia-se a elite intelectual da época para sessões de
leitura e conversas sobre arte e literatura. Entre os convidados, André
Gide e Oscar Wilde. Seus comentários críticos sobre literatura, arte e
música estimularam enormemente aos escritores simbolistas franceses,
assim como aos artistas e compositores da escola impressionista, que ao
final do século XIX desenvolveram uma arte espontânea em oposição ao
formalismo da composição. No livro (projeto e idéias publicadas e m
1956). Mallarmé pretende atribuir ao poeta a missão de escrever a obra
que, por ser a explicação órfica da terra, submeterá ao domínio do
espírito humano o azar, símbolo da imperfeição desse espírito. Um jogo
de dados jamais abolirá o azar (1897), é um l ongo poema de versos livres
e tipografia revolucionária que constitui a declaração trágica da
impossibilidade de atingir o estabelecido no livro.
Também escreveu penetrantes artigos sobre a moda feminina de seu
tempo. Mallarmé desempenhou um papel fundamental na evolução da
literatura no século XX, especialmente nas tendências futurista e
dadaístas. Está entre os precursores da poesia concreta ao lado de
Guillaume Apollinaire (1880-1918) e o escritor americano Ezra Pound
(1885-1972).

Stéphane Mallarmé morreu em 1898, em Paris, sem ter chegado a


concluir a grande obra de sua vida. A Grande Obra, com letra maiúscula,
é um projeto que ele revela em cartas, em correspondências a amigos.
Três anos antes de sua morte ele escreve ainda um poema falando deste
sonho, de constituir uma Grande Obra, no sentido quase que alquímico
da palavra. Um livro em vários volumes que totalizasse o mistério órfico
da terra. Mallarmé morreu angustiado sem atingir seu objetivo, mas
deixou admiradores em todo o mundo e suas obras conti nuam a ser
reeditadas, mais de 100 anos após a sua morte. A Grande Obra, para ele,
seria um livro com a estrutura de uma obra arquitetônica, ligada numa
espécie de sintonia com o universo". A "Grande Obra" que Mallarmé
sonhava, no entanto, não significava reunir todos os seus escritos, mas
escrever uma nova obra o que para a sua grande frustração, morreu sem
realizar.

Um dia antes de morrer, Mallarmé pressentiu a chegada da morte. Pediu


à mulher Marie e à filha Geneviève que queimassem todos os seus
escritos, como fizeram Franz Kafka e o poeta Virgílio. Ele morreu
asfixiado no dia seguinte. Mas, felizmente, elas não cumpriram o desejo
dele.

(Fonte: www.beatrix.com.br)
OBRAS

HÉRODIADE, 1869 – HERODIAS

L'APRÉS-MIDI D'UN FAUNE, 1876 - THE AFTERNOON OF THE FAUN


- inspired Claude Debussy to compose his Prélude à l'aprés -midi d'un
faune (1894); choreographed and danced by Nijinsky for Diaghilev's
Russian Ballet in 1912

PROSA, 1880

POÉSIES, 1887

ALBUM DE VERS ET DE PROSE, 1887

ALBUM DE VERS ET PROSE, 1891

PAGES, 1891

LA MUSIQUE ET LES LETTRES, 1891

VERS ET PROSE, 1893

DIVAGATIONS, 1897

UN COUP DE DÉS JAMAIS N'ABOLIRA LE HASARD, 1897

POÉSIES, 1899

MADRIGAUX, 1920

VERS DE CIRCONSTANCE, 1920

CONTES INDIENS, 1927

POÉSIES COMPLETES, 1928

ŒUVRES COMPLÉTES, 1951

PROPOS SUR LA POÉSIE, 1953

LETTRES, 1959

LES 'GOSSIPS', 1962

POUR UNTOMBEAU D'ANATOLE, 1962

CORRESPONDANCE 1862-71, 1959-71

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