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ISSN: 2238-1112

Para citar esse documento:


SILVA, Márcia Virgínia Mignac da; OLIVEIRA, Ana Clara Santos; MELO, Caíque
Silva; CARVALHO, Isis Dandara Vasconcelos de Araújo; DANTAS, Mariana
Calabrese; VÁSQUEZ, Esther Paola Bonfim. Cheias de assunto: conversas com
Dona Dança do Ventre. Anais do 6º Congresso Científico Nacional de
Pesquisadores em Dança – 2ª Edição Virtual. Salvador: Associação Nacional de
Pesquisadores em Dança – Editora ANDA, 2021. p. 2274-2279.

www.portalanda.org.br

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ISSN: 2238-1112

Cheias de assunto: conversas com Dona Dança do Ventre

Márcia Virgínia Mignac da Silva (UFBA)


Ana Clara Santos Oliveira (UFAL)
Caíque Silva Melo (UFBA)
Isis Dandara Vasconcelos de Araújo Carvalho (UFBA)
Mariana Calabrese Dantas (UFBA)
Esther Paola Bonfim Vásquez (UFBA)

Relatos de Experiência com ou sem demonstração artística

Resumo: O texto relata lives realizadas em 2020, por um grupo de artistas e


pesquisadoras vinculadas ao Projeto de Pesquisa Oriente-se: Dança do Ventre,
Orientalismo e Feminismo Decolonial (PPGDANÇA/UFBA). O interesse é propor
uma conversa sobre a Dança do Ventre, expondo possibilidades de existências
pluriversais. Em um sistema mundo colonial capitalista, a dança não acontece
incólume à desigualdade de gênero, racismo, machismo, gordofobia e LBTQI+fobia
enquanto afecções sociais. A partir daí, foram levantadas questões artístico-
pedagógicas e políticas em torno das ideias de Katz e Greiner (2005), Katz (2010),
Gielen (2015), Said (2007), Grosfoguel (2008) e Ramose (2011). A conversa
promoveu reverberações via comentários no decorrer das lives e significativa difusão
no meio midiático, extrapolando a tríade “mediador-convidado-Dona Dança do
Ventre”. Promoveu também uma representação ficcional, com a feitura de uma
boneca “Dona Dança do Ventre”.

Palavras-chave: DANÇA DO VENTRE. LIVES. PLURIVERSALIDADE.


DECOLONIALIDADE.

Abstract: The text reports live performances in 2020, by a group of artists and
researchers linked to the Oriente-se Research Project: Belly Dance, Orientalism and
Decolonial Feminism (PPGDANÇA/UFBA). The interest is to propose a conversation
about Belly Dance, exposing possibilities of pluriversal existences. In a colonial
capitalist world system, dance does not happen unaffected by gender inequality,
racism, machismo, fatphobia and LBTQI+phobia as social affections. From there,
artistic-pedagogical and political issues were raised around the ideas of Katz and
Greiner (2005), Katz (2010), Gielen (2015), Said (2007), Grosfoguel (2008) and
Ramose (2011). The conversation promoted reverberations via comments during the
lives and significant diffusion in the media, extrapolating the triad “mediator-guest-
Dona Dança do Ventre” (Ms. Dance of the Belly). It also promoted a fictional
representation, with the making of a doll “Dona Dança do Ventre” (Ms. Dance of the
Belly).

Keywords: BELLY DANCE. LIVES. PLURIVERSALITY. DECOLONIALITY

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1. Apresentação

O objetivo central desse texto é relatar lives realizadas em 2020 por um


grupo de artistas e pesquisadores1 vinculadas ao Projeto de Pesquisa Oriente-se:
Dança do Ventre, Orientalismo e Feminismo Decolonial (PPGDANÇA/UFBA),
interessados em propor uma conversa “cheia de assunto” sobre a Dança do Ventre.
Indaga-se, principalmente, de quais maneiras críticas o contexto contemporâneo da
Dança do Ventre tem sido abordado. Como perpetuar esse saber no solo brasileiro,
problematizando as reiterações historicamente construídas pelo imaginário cultural
ocidental? Finalmente, como ponderar a dança numa crise sanitária e
epidemiológica e, repropor outros modos de feitura?
Neste sentido, foi realizado o ciclo de lives intitulado “Cheias de Assunto:
conversas com Dona Dança do Ventre”, dentro da rede social Instagram durante o
ano de 2020. Em cada live se levantaram questões artístico-pedagógicas e políticas
à figura ficcional da Dona Dança do Ventre. Em sua complexidade de nomes e
contextos de atuação, a personagem fictícia2 de uma senhora foi construída com a
finalidade de personificar essa prática longínqua, transformada ao longo do tempo
com inúmeras feições. O exercício retórico expunha as experiências de cada
integrante com a pergunta disparadora: Como você encontrou a Dona Dança do
Ventre?

1
Márcia Mignac, Camila Saraiva, Caíque Melo, Paola Vásquez, Rita Carneiro, Mariana Calabrese,
Ana Clara Oliveira, Isis Dandara Vasconcelos e Thaís (Luuluu) Coelho.
2
Para dar feição a essa representação, foi confeccionada uma boneca por meio da linha Abigail
Friends, com a criação e assinatura do artista João Perene numa aposta criativa e humorada. Este foi
um jeito encontrado para o tratamento reflexivo nos encontros on-line, transpostos também de forma
lúdica nas aparições públicas no perfil coletivo na rede social já citada.
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Figura 1 (à esquerda): Dona Figura 2 (à direita): Perfil do


Dança do Ventre. grupo “Cheias de Assunto”.

Esse é o interesse deste texto: apresentar as problematizações gerais do


ciclo de lives e concomitantemente, discorrer a análise relativa a “Dona Dança do
Ventre”.

2. Conversas cheias de assunto

A preparação dessas lives foi feita em encontros online semanais, de


duas horas de duração cada. A primeira live envolveu Márcia Mignac, Camila
Saraiva e Rita Carneiro, realizada no dia 21 de agosto de 2020. Apresenta a dança
como uma arte diversa, motivo pelo qual impossibilita pensar em apenas um modo
universal de feitura. Camila questiona a representação da odalisca como uma
ritualística máxima do feminino. Já Rita destaca a importância do protagonismo de
mulheres pretas na dança do ventre e problematiza como essa arte gestada no
Egito, se rendeu à ditadura do embranquecimento no ocidente, em atendimento ao
modelo colonial racista.
A segunda live foi realizada por Paola Vásquez, Isis Dandara e Caíque
Melo no dia 25 de setembro de 2020. A exposição compara os contextos na capital e
no interior do Estado, no que tange às práticas artísticas e pedagógicas da Dança do
Ventre. Ressalta a importância, por exemplo, das políticas públicas de fomento à
arte e cultura nas cidades do interior, para que agentes e profissionais de dança não
necessitem migrar em direção aos centros urbanos. 2276
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A maternidade e a dança como ocorrências que se constituem


mutuamente, foi um aspecto pautado pela experiência de Isis. A artista inicia a live
com uma performance com seu filho de colo, afirmando a potência artística da
mulher na maternidade.
Caíque problematiza o poder colonizador eurocêntrico, e por
consequência a intervenção da sociedade patriarcal na liberdade estilística do
artista, com a negação da presença do homem na Dança do Ventre.
A terceira live, realizada em 30 de outubro de 2020, envolveu Ana Clara,
Mariana Calabrese e Thaís Coelho. Thaís reafirma a dança como campo de
conhecimento. Faz pensar sobre o ofício da Dona Dança do Ventre, diante das
inúmeras possibilidades. Destaca o ofício de professora, entendendo a educação
como uma emancipação do ser. Por fim, ressalta que a Dona Dança do Ventre pode
ser o que ela desejar.
Mariana Calabrese traz o questionamento em torno do padrão estético
hegemônico. Discute os conceitos de gordofobia e pressão estética, a fim de serem
feitas mudanças no cenário artístico, incentivando o protagonismo dos corpos
gordos. Também foi apontado as expectativas do público, comparando a ligação
direta do padrão estético social (ocidental) com o padrão estético da dança.
A última live foi realizada em 19 de dezembro de 2020 e incluiu Mariana
Calabrese, Ana Clara e Paola Vásquez. Foi abordado os contextos virtuais onde a
Dança do Ventre é apresentada. Assim como os recursos de exposição e
visibilidade atuam na existência do usuário virtual e a sua legitimação na dança, em
atendimento à virada excibicionista. Afinal, o que se pretende é muito mais afirmar a
“arte como poder de exibição” (GIELEN, 2015).
Questionamentos feitos para se pensar a Dança do Ventre e fusões em
perspectivas descoloniais. Pois, no “sistema-mundo
patriarcal/capitalista/colonial/moderno” (GROSFOGUEL, 2008, p. 124), contrapor
com lucidez a realidade das estruturas racistas, machistas e classistas que coabitam
a Dona Dança do Ventre é uma atitude descolonial. Neste sentido, as feituras da
dança constituem corpo e desenham os contornos do tipo de mundo que se deseja
habitar, como uma ação política de enfrentamento ao que está posto.

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3. Conclusão

É perceptível com essa ação das lives e agora, na produção dessa escrita
coletiva, que as questões junto a Dona Dança do Ventre perpassam as insurgências
do mundo de agora. Pois, segundo Katz (2010) importa falar o que não estava
audível e enfrentar o que está posto de modo distinto ao das borboletas, “que não
sobreviveram ao momento em que um alfinete lhes atravessa o corpo para fixá-los
no lugar” (Bauman, 1999, p.12). Que a Dança do Ventre possa continuar a se mover
de modo pluriversal e desviante das molduras impostas.

Márcia Virgínia Mignac da Silva


UFBA
marcia.mignac.silva@gmail.com
Professora Adjunta da Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia. Docente
dos Cursos de Graduação, Especialização e Pós-Graduação
(PPGDANÇA/PRODAN). Mestre em Dança/PPGDANÇA-UFBA. Doutora em
Comunicação e Semiótica/PUC-SP.

Ana Clara Santos Oliveira


UFAL
anaclaradanca@gmail.com
Doutoranda em Artes, (PPGARTES-UFMG), sob a orientação do Prof. Dr. Arnaldo
Leite de Alvarenga. Professora do Curso de Dança (ETA/ICHCA-UFAL).
Pesquisadora e Artista da Dança. Mestra em Dança (PPGDANÇA-UFBA). Diretora
da Zambak Cia de Dança Tribal.

Caíque Silva Melo


UFBA
caique-melo@live.com
Mestrando no PPGDANÇA-/UFBA. Graduando no curso de Bacharelado e
Licenciado em Dança pela Escola de Dança/UFBA. Técnico em Dança/FUNCEB.
Um dos Fathers da HouseofTremme. Dançarino, coreógrafo, professor, produtor e
pesquisador na área da Dança.

Isis Dandara Vasconcelos de Araújo Carvalho


UFBA
isisdandara.vasconcelos@gmail.com
Dançarina, professora, coreógrafa e produtora de dança. Graduada (Licenciatura e
Bacharelado) em Dança/UFBA, Pós-graduada em Estudos Contemporâneos em
Dança-UFBA. Diretora do Fluxus Festival de Dança, Corpóreos Festival, Dança em
Fluxo Feira-Salvador.
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Mariana Calabrese Dantas


UFBA
marianacdpov@gmail.com
Graduanda no curso de Licenciatura em Dança /UFBA. Formada em Ballet Clássico
no método Vaganova. Possui vivências em Dança Contemporânea e Dança do
Ventre. Dançou em eventos de dança árabe como Mercado Persa/SP e Luz do
Ventre/SP. Lecionou aulas de Baby Classe e foi bolsista PIBID/UFBA no subúrbio de
Salvador.

Esther Paola Bonfim Vásquez


UFBA
eu.paolavasquez@gmail.com
Mestranda em Dança (PPGDANÇA-UFBA). Bacharela em Produção Cultural e
Licenciada em Dança pela UFBA. Técnico em Dança (Funceb). Diretora da Hariq
Cia de Danças Árabes

Referências:

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e Ambivalência. Rio de Janeiro: Jorge Zahar


Editor, 1999.
BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
GIELEN, Pascal. Criatividade e outros fundamentalismos. São Paulo:
Annablume, 2015.
GROSFOGUEL, Ramón. Para descolonizar os estudos de economia política e
os estudos pós-coloniais: transmodernidade, pensamento de fronteira e
colonialidade global. Revista Crítica de Ciências Sociais, n.80, p.115-147, março
2008. Disponível em: <http://www.ces.uc.pt/rccs/includes/download.php?id=982>.
Acesso em: 23 de mar. 2021.
KATZ, Helena. O Papel do corpo na transformação da política e biopolítica. In:
GREINER, Christine. O Corpo em crise: novas pistas e o curto-circuito das
representações. São Paulo: Annablume, 2010.
KATZ, Helena; GREINER, Christine. Por uma Teoria do Corpomídia. In: GREINER,
Christine. O corpo: pistas para estudos indisciplinares. São Paulo: Annablume,
2005.
RAMOSE, Mogobe Bernard. Sobre a Legitimidade e o Estudo da Filosofia
Africana. Ensaios Filosóficos. Volume IV. Outubro 2011. Disponível em:
<https://filosofiaafricana.weebly.com/uploads/1/3/2/1/13213792/mogobe_b._ramose_
-_sobre_a_legitimidade_e_o_estudo_da_filosofia_africana.pdf>. Acesso em: 25 de
mar. 2021.
SAID, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução
de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
DEBORD, G. A Sociedade do espetáculo e Comentários sobre a sociedade do
Espetáculo. Tradução de Estela dos Santos Abreu. São Paulo: Contraponto Editora,
1997.
WOLF, Naomi. O mito da beleza: como as imagens de beleza são usadas contra as
mulheres. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2018.
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