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FACULDADE EVANGÉLICA DE TECNOLOGIA, CIÊNCIAS E

BIOTECNOLOGIA DA CGADB - FAECAD

TEOLOGIA FEMINISTA

Rio de Janeiro/RJ
2018
TEOLOGIA FEMINISTA

Trabalho apresentado como exigência


da disciplina de História da Igreja do curso
de Teologia, sob orientação do Me. Lucas
Gesta.

Rio de Janeiro/RJ
2018
1

INTRODUÇÃO

Muitos costumam definir simplesmente teologia como o estudo de Deus, como


se isso fosse possível. Na verdade falamos de um Ser infinito, atemporal e que se
revela parcialmente a nós, e dentro de nossas limitações e preconceitos procuramos
traduzir estas revelações, segundo nossas percepções, produzindo respostas as
questões do nosso tempo.
As novas teologias são respostas a movimentos sociais, por razões justas ou
não, propõem novos dogmas a igreja cristã, apesar de não serem exclusivas do
cristianismo, delimitaremos nosso estudo a fé cristã, seus conceitos e paradigmas.
O movimento feminista foi importante para a igreja pós-moderna
especialmente na igreja cristã brasileira, desenvolvendo uma teologia feminista que
vai além da questão do sacerdócio.
Como movimento inclusivista, ele têm sua importância na Igreja brasileira pelo
fato de ser composta de 52% de mulheres (católicos e evangélicos), segundo censo
2010 IBGE.
Entretanto, é notório a extrapolação bíblica com suas novas interpretações,
tais como aborto, gênero e a eterna injustiça opressora.
Repensar o cristianismo como unidade na diversidade é o grande desafio para
os teólogos da atualidade.
2

Surgimento da Teologia Feminista


Para entender a Teologia Feminista e sua influência na igreja e preciso
entender o movimento feminista e como surge na sociedade, sua importância e
consequências, como igreja muitas vezes nos limitamos a simples questão de
ordenação feminina, porém seus ideais são mais amplos.
Os primeiros registros têm início na primeira metade dos anos de 1700
quando uma inglesa, Mary Wollstonecraft, escreveu A Vindication of the Rights of
Woman (A Vindicação dos Direitos da Mulher). Um ano depois desta publicação,
Olimpe de Gouges publicou um panfleto em Paris intitulado Le Droits de La Femme
(Os Direitos da Mulher) e uma americana, Judith Sargent Murray, publicou On the
Equality of the Sexes (Sobre a Igualdade dos Sexos).
Em 1848 cerca de 100 mulheres se reuniram em uma convenção em Seneca
Falls, Nova York, para ratificar a Declaração dos Sentimentos escrita para defender
os direitos naturais básicos da mulher. As autoras da Declaração dos Sentimentos
reclamavam que as mulheres estavam impedidas de galgar posições na sociedade
quanto a empregos melhores, além de não receber pagamento equitativo pelo
trabalho que realizavam. Notaram que as mulheres estavam excluídas de profissões
tais como teologia, medicina e advocacia e que todas as universidades estavam
fechadas para elas. Denunciavam também um duplo padrão de moralidade que
condenava as mulheres a penas públicas, enquanto excluía os homens dos mesmos
castigos em relação a crimes de natureza sexual.
A Declaração dos Sentimentos foi um marco profundamente significativo no
movimento feminista1.
Elisabeth Cady Staton, protestante e militante do movimento sufragista
(movimento do direito ao voto feminino), por volta dos anos de 1895-1898, Staton
publica, em colaboração com um grupo de mulheres protestantes que realizavam
estudos bíblicos, a Bíblia da Mulher (Woman´s Bible).
Em 1911, na Grã-Bretanha, um grupo chamado Aliança Joana D’arc,
reivindica a igualdade entre mulheres e homens e criticava a visão única e
hegemônica de um Deus somente masculino. A crítica desse movimento
direcionava-se à visão androcêntrica de Deus e expressava-se na frase: “Orai a
Deus, e Ela os ouvirá.”
1
LOPES, Augustus Nicodemus. O Feminismo Cristão: Como Tudo Começou.
Disponível em: <http://tempora-mores.blogspot.com/2011/12/o-feminismo-cristao-como-tudo-
comecou.html>. Acesso em: 16 jun 2018.
3

A construção do feminismo moderno começou com a obra da filósofa


francesa Simone de Beauvoir, Le Deuxième Sexe (O Segundo Sexo), em 1949. As
mulheres, segundo de Beauvoir, foram definidas e diferenciadas tomando como
referencial o homem e não com referência a elas mesmas.
No início dos anos 60 uma jornalista americana, Betty Friedan, transformou os
conceitos filosóficos de Simone de Beauvoir em alguma coisa mais assimilável para
a mulher moderna, ao publicar A Mística Feminina, um livro onde examinava o papel
da mulher norte-americana. De acordo com Friedan, as mulheres dos seus dias
foram ensinadas a buscar satisfação apenas como esposas e mães. Ela afirmou que
esta mística do ideal feminino tornou as mulheres infantis e frívolas.
Alguns consideram que o movimento feminista se inicia na igreja com a obra
de Katherine Bliss, The Service and Status of Women in the Church (O Trabalho e o
Status da Mulher na Igreja, 1952) como o marco inicial do moderno movimento
feminista dentro da cristandade.
O livro era baseado numa pesquisa sobre as atividades e ministérios nos quais
as mulheres cristãs estavam comumente envolvidas. Bliss observou que, embora as
mulheres estivessem extremamente envolvidas na vida da Igreja, a participação
delas estava limitada a papéis auxiliares tais como Escola Dominical e Missões. As
mulheres não participavam em lideranças tradicionalmente aceitas, tais como as
atividades de ensino, pregação, administração e evangelismo, ainda que muitas
delas pareciam estar preparadas e terem dons para este exercício. Bliss chamou a
atenção da Igreja para a reavaliação dos papéis homem/mulher na Igreja,
particularmente da ordenação de mulheres.
A obra de Bliss serviu de munição para ativistas cristãos na luta pelos direitos
civis e políticos em 1961. Eles, junto as feministas na sociedade secular, começaram
a vocalizar o seu descontentamento com o tratamento diferenciado que as mulheres
recebiam por causa do seu sexo, inclusive dentro das igrejas cristãs. Neste mesmo
ano, vários periódicos evangélicos publicaram artigos sobre a “síndrome das
mulheres limitadas aos papéis da casa e esposa”, onde se argumentava que as
mulheres estavam restritas a papéis inferiores na Igreja. Os homens podiam se
tornar ministros ordenados, mas às mulheres se lhes impunham barreiras nas
atividades ministeriais como ensino, aconselhamento e pastoreamento. As
mulheres, afirmavam os ativistas, desejam participar da vida religiosa num nível
mais significativo do que costura ou a direção de bazares ou arrumar a mesa da
4

Santa Ceia ou serviços gerais tais como o levantamento de recursos para os


necessitados, os quais frequentemente são designados a elas. Tanto quanto com
trabalho físico, elas desejam contribuir com ideias para a Igreja.
A atenção sobre os papéis do homem e da mulher dentro da Igreja se tornou
mais intenso na medida em que o movimento secular das mulheres foi ganhando
força. Em 1961 o Concílio Mundial de Igrejas distribuiu um panfleto intitulado Quanto
à Ordenação de Mulheres, chamando as igrejas afiliadas para um “reexame de suas
tradições e leis canônicas”.
Na América Latina, a Teologia Feminista começou a tomar corpo nos anos de
1960 e 1970. Ivone Gebara, Elza Tamez, Maria Pilar Aquino entre outras, foram
algumas referências para a região.
A condição social da mulher no AT
Havia muitas orientações e ensinamentos diferentes no Judaísmo antes da
destruição do Templo, e diferiam significativamente, tanto na teologia como na
prática, mas todas acreditavam firmemente que a Torá foi dada por Deus a Moisés
no Monte Sinai e a Torá, sem exceção, era uma base inabalável e inquestionável
para todas essas orientações e ensinamentos. Muitos dos textos Judaicos do
período do Segundo Templo apresentam uma releitura ampliada. Embora esses
textos ou ensinamentos tenham sido baseados na Torá, eles tiveram entendimentos
muito diferentes e interpretações.
1 – Período do primeiro Templo
O período do primeiro Templo compreende o Século XI a.C. (cerca de 990
anos) até 586 a.C. com a destruição do rei babilônico Nabucodonosor.
A família está baseada na instituição do patriarcado. O pai tem autoridade
absoluta. Tem poder de vida e morte sobre seus filhos e filhas: define seu destino e
pode puni-los caso se revoltem e desobedeçam às ordens do patriarca e, no caso
das filhas, até vendê-las como concubinas. A posição da mulher hebreia, de acordo
com a lei, não é das melhores. Não podia abandonar seu marido, designado como,
seu amo e senhor. A poligamia era aceita. Por outro lado, apesar de a lei bíblica
aceitar a poligamia, Se um homem tiver duas mulheres…(Dt 21.15), o relato da
Criação fala de um ideal monogâmico. Na Bíblia existem outras passagens que
relatam a desigualdade social da mulher, mesmo sabendo que uma boa parte delas
foi escrita no final do período do 1º Templo e compilada no período pós-exílio, ou
seja, relatam fatos de um período anterior e espelham realidades de um período
5

posterior. Na vida cotidiana, parece que o panorama era bastante diferente 2. Alguns
casos:
Abraão é pressionado por Sara para expulsar sua serva / concubina Agar,
junto com Ismael, filho que tivera com Abraão. O patriarca consulta Deus e ouve a
afirmação: “[...] tudo o que te disser Sara, escuta em sua voz”. (Gn 21.12)
Respeitada e com liderança espiritual e moral, vemos a juíza e profetiza
Débora que comandou, lado a lado com seu general Baraque, o exército que venceu
os cananeus, utilizando-se de uma estratégia, revelada a ela por Deus. (Jz 4; 5).
A profetiza Hulda é citada como contemporânea de Jeremias. Muitas de suas
profecias são semelhantes às dele. Considerada sábia e muito respeitada, foi
consultada pelo rei Josias e fez duras repreensões e advertências pelos desvios do
povo. (2 Rs 22.14-26).
A filha de Saul e uma das esposas de David, denominada Mical, representa
um exemplo de mulher ativa e dinâmica, com forte personalidade, tendo se chocado
com David; certamente não se tratava de uma mulher submissa e obediente a seu
poderoso e respeitado marido. (2 Sm 6.20-23).
A presença de mulheres em espaços públicos é constatada em inúmeros
casos e exemplos.
Eliezer e Rebeca (Gn 24) ou entre Moisés e Séfora (Êx 2). A singela história
de Ana e Elcana mostra a presença de mulheres nos cultos públicos em Silo. (1 Sm
1) A participação das mulheres nos cultos é constatada em inúmeros exemplos: elas
cantam e dançam nas festas e comemorações, seja no Tabernáculo, seja no
Templo. A exclusão das mulheres do espaço público não é o ideal da sociedade
judaica do período do Primeiro Templo.
Vemos, na construção do Tabernáculo, no deserto do Sinai, a presença de
mulheres em várias tarefas e atribuições, não sendo impedidas de frequentá-lo ou
controladas de alguma maneira. (Êx 35.22; Dt 31.22 e Js 8.35). Elas muitas vezes
foram incluídas em funções públicas tribais ou nacionais, tomando parte em
instituições e exercendo funções políticas (Jz 4.4-8; 2 Sm 14.2-4; 1 Rs 19.2 e 21.8).
Os textos bíblicos refletem um enorme respeito pela mulher, quando
comparam o amor de Deus por seu povo, ao amor de um marido por sua esposa.

2
FELDMAN, Sérgio Alberto. A mulher na religião judaica (período bíblico: primeiro e
segundo Templos). MÉTIS: história & cultura – v. 5, n. 10, p. 251-272, jul./dez. 2006. Disponível
em: <http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/metis/article/download/810/573 >. Acesso em: 16 jun
2018.
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Um exemplo desse caso é o livro de Oséias. A moral sexual aparentemente é


severa, mas o enfoque deve ser devidamente reavaliado. Trata-se de uma
sociedade tribal, patriarcal e relativamente livre. Por um longo período, conviveu sem
a existência de um Estado coercivo e foi nômade. Ao se estabelecerem em Canaã,
sedentarizando-se, os hebreus tiveram que se adaptar a novos desafios e às
transformações que obrigaram a adoção de mudanças nos hábitos e costumes e na
moral.
A centralização com a criação da monarquia altera o equilíbrio do poder. Os
anciãos, os patriarcas ainda são denominados e respeitados como os líderes do
povo, em nível local. O seu poder decresce apesar de o respeito e a obediência
serem mantidos em nível familiar. O rei e sua burocracia ocupam o espaço:
determinam os controles sociais e as regras a serem seguidas. Os interesses do
Estado levam a uma “estatização” da própria fé ancestral. A sacralização da
monarquia e, em particular, da dinastia davídica oferecem um exemplo dessa
junção. O Templo de Jerusalém e a rígida rotina dos sacrifícios ao Deus único são
facetas dessa união do político com o religioso. O rei “substitui” o patriarca. Sobram
poderes locais aos anciãos, mas, cada vez mais, restritos ao mundo da família e da
aldeia. A moralidade tradicional associada ao pacto e aos valores tribais perde força
numa sociedade cada vez mais aberta às relações políticas. As esposas dos reis
trazem os cultos estrangeiros à corte e tornam esses cultos uma espécie de
novidade. É o caso da esposa egípcia de Salomão (1 Rs 11) e o famoso caso da
luta entre o profeta Elias e a rainha fenícia de Israel, conhecida como Jezabel. (1 Rs
19). São confrontos religiosos e culturais que mostram que a sociedade hebraica
não estava mais fechada para o mundo. No final do período do Primeiro Templo,
podem ser percebidas alterações nas condições da mulher na sociedade, mas isso
se evidencia no período do Exílio e no período do 2º Templo.
2 – Período do segundo Templo
O período do segundo Templo compreende 515 a.C. reconstruído pelos judeus,
19 a,C. Ampliado por Herodes, o Grande, até a destruição romana em 70 d.C.
As mudanças nos padrões morais foram um processo lento, mas contínuo de
urbanização e de contatos com o mundo externo.
A destruição do Primeiro Templo, assim como o Exílio, foi considerado pela
maioria dos pensadores da época como castigo para o povo desobediente e infiel à
Lei e ao Pacto. A História deveria servir de lição, e o povo deveria agir como um
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povo santo. (Lv 19). Surgem novas leis ou se adotam com mais rigor antigas leis. A
ética e a moralidade do povo santo exigiam um elevado grau de pureza: alimentos
proibidos (Lv 11ss); a preocupação social com os órfãos e as viúvas; o código da
guerra. (Dt 20ss).
As doutrinas escatológicas são fortemente influenciadas pelas doutrinas orientais
e um rígido legalismo passou a impregnar toda a sociedade e inicia uma forte
tendência ao controle social dentro da comunidade judaica pós-exílica. Tudo isso
altera o status feminino nesse período em que se inicia a ter uma visão da mulher
como um ser tentador: esta deve ser controlada. Para prevenir riscos para a moral
pública, deve ser retirada de espaços públicos. O trecho dos Provérbios, conhecido
como “a mulher virtuosa” (Pv 31.0-31), se tornou um símbolo do modelo feminino.
A exclusão das mulheres dos cultos é processual, lenta e definitiva. Cria-se, no
período do segundo Templo, um espaço feminino diferenciado para presenciar os
sacrifícios rituais de animais no pátio do santuário. Há divergências entre os
pensadores: alguns acreditam que esse espaço sempre existiu; já outros
consideram que foi criado na reforma do Templo feita por Herodes, numa época
bem tardia. Aparentemente, a separação tem como precedente nesse período, a
festa de Sucot (Tabernáculos) na qual se fazia uma celebração relativa à água, que
era tumultuada, e, na opinião dos contemporâneos, levava à imoralidade.
O Judaísmo passa a definir para a mulher espaços privados, em função das
tendências já formuladas: conceitos de pureza ritual, visão misógina da mulher como
um ser perigoso e tentador, conceito do povo santo em espera pela redenção
(escatologia), a forte moralidade surgida no período do segundo Templo e dos
contatos com os gregos ou povos helenizados. Em alguns casos, o contato com
certas culturas cria tensões e em outros acelera tendências. A sexualidade e o
desejo se tornam pecado. É preciso impedir a fornicação, o adultério, a tentação e a
volúpia carnal, as mulheres são retiradas dos espaços públicos, são excluídas de
cerimônias religiosas e limitadas na sua atuação. As suas funções educacionais e
religiosas se resumem ao espaço do lar, da família e da vida privada.
A condição social da mulher no NT
O apóstolo Paulo é criticado pela descrição supostamente negativa das
mulheres. Embora a teoria paulina de que “já não há mais o homem e a
mulher...em Cristo” (G13.8) seja aclamada como revolucionária, ele é visto de
modo oposto como produto de sua cultura em outros textos nos quais parece
8

subordinar ou denegrir as mulheres (1 Co 14.34-35). Só podemos determinar se


Paulo apenas reflete as opiniões que sua cultura tem das mulheres ou discorda
delas de modo significativo (positiva ou negativamente) pelo exame de algumas das
passagens paulinas mais debatidas à luz de sua cultura 3.
1 – Papéis de homens e mulheres
Em geral As cartas paulinas são cartas motivadas, isto é, ocasionadas por
circunstâncias específicas e, assim, tratam de certas situações, como respostas a
elas. As cartas paulinas mais primitivas não lidam especificamente com mulheres,
homens ou o casamento com muita frequência. Em 1 Coríntios 7, Paulo se dirige a
cristãos que, como alguns grupos em sua cultura, passaram a valorizar o estilo de
vida de solteiro; entretanto, a visão deles criou certas complicações. Uma dessas
complicações é que alguns dos que valorizam o estilo de vida de solteiro já são
casados e sua vocação de celibato dentro do casamento cria para os cônjuges, e
talvez para eles mesmos, o perigo de tentação sexual (1 Co 7.2,5 e 1 Co 7.9). Em 1
Coríntios 7,2-5 ele se dirige a maridos e mulheres em termos de igualdade. Os
contratos de casamento judaicos estipulavam certos deveres exigidos de maridos e
mulheres, mas Paulo concentra-se em um único dever relevante aqui, as relações
sexuais. É significativo que esse não seja simplesmente um dever para os maridos,
como em alguns textos judaicos, mas um dever recíproco (1 Co 7.3-4). Paulo
demonstra sensibilidade especial pelos sentimentos da mulher nesse assunto, em
contraste com a ênfase da cultura grega na satisfação sexual masculina. Outra
complicação de seu estilo de vida é que alguns cristãos agora queriam se divorciar,
ou devido à falta de satisfação sexual ou para seguir um estilo de vida celibatário ou,
como os filósofos cínicos, um estilo de vida livre das dificuldades do casamento, mas
não de relações sexuais; 1 Co 6.12-20. Em resposta, Paulo depois de apelar à
proibição do divórcio por Jesus, Paulo passa a modificá-la sem achar, de modo
algum, que contesta a autoridade dessa proibição; era amplamente entendido que
declarações gerais de princípio precisavam ser modificadas em certas situações.
2 – Paulo e a cabeça coberta das mulheres
O texto (1 Co 11.21) refere-se claramente ao costume das mulheres de cobrir a
cabeça, pelo menos durante o culto. Frequentemente, um xale (que cobria só os

3
HAWTHORNE, Gerald F.; MARTIN, Ralph P.; REID. Daniel G. (Orgs.). DICIONÁRIO
DE PAULO E SUAS CARTAS. Tradução de Barbara Theodoto Lambert. 2 ed.,São Paulo: Loyola,
2008. P. 636.
9

cabelos) era usado para isso, mas em alguns lugares também eram usados véus
que cobriam o rosto.
Provavelmente a recomendação de Paulo era questão cultural que simbolizavam
valores. No mundo mediterrâneo antigo, o cabelo das mulheres era objeto
fundamental da concupiscência masculina assim, as sociedades que usavam
coberturas na cabeça consideravam as mulheres de cabeça descobertas infiéis aos
maridos, isto é, em busca de outro homem, de modo inverso, esperava-se que
virgens e prostitutas não cobrissem a cabeça, pois procuravam homens. Desse
modo, as mulheres que cobriam a cabeça consideravam as que não o faziam uma
ameaça; entretanto, as mulheres de cabeça descoberta, sem dúvida, consideravam
restritivo o costume de cobri-la e achavam que o modo como enfeitavam o cabelo
era só da conta delas4. É significativo que entre as mulheres de cabeça descoberta
incluíam-se, provavelmente, as cultas e de posição superior, das famílias que
acolhiam a maioria das Igrejas domésticas, e poderiam causar controvérsias de
conflito de classes, já que usavam penteados elegantes e cabeças descobertas.
O propósito paulino ao aconselhar a cobertura da cabeça era a unidade da
Igreja, mas seus argumentos são os que melhor persuadiriam os leitores. Ele
apresenta alguns argumentos principais em favor de sua posição:
Valores de família – A cabeça da mulher é o homem, por isso, se ela desonra a
cabeça, descobrindo-a em uma cultura onde isso é desonroso, ela desonra o marido
(1 Co 11.26) a ordem da criação, o exemplo da natureza e o do decoro conforme
prescrevia o costume. Paulo reforça esse sentimento de vergonha; quando o cabelo
de uma mulher era cortado curto ou raspado, isso era uma grande desonra e
simbolizava a perda da feminilidade.
A ordem da criação – (1 Co 11.7-12); em essência, Paulo diz: “Adão foi criado
antes de Eva, portanto as mulheres devem cobrir a cabeça”. Apesar de Gênesis
1.26-27 que o homem e a mulher juntos representavam a imagem de Deus.
A autoridade do marido reflete a posição das mulheres em uma sociedade na
qual elas já estão subordinadas aos maridos e modifica essa posição em uma
direção mais progressiva. Paulo afirma que a mulher, formada do homem, também
reflete a glória do homem (1 Co 11.7), mas também é verdade que os homens se
originam das mulheres; na verdade, ambos são inseparáveis diante do Senhor (1 Co
4
HAWTHORNE, Gerald F.; MARTIN, Ralph P.; REID. Daniel G. (Orgs.). DICIONÁRIO DE
PAULO E SUAS CARTAS. Tradução de Barbara Theodoto Lambert. 2 ed.,São Paulo: Loyola, 2008.
P. 637.
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11.11-12). Embora em defesa de seu ponto de vista baste que a mulher proceda do
homem, Paulo modifica seu argumento para que ninguém lhe atribua mais sentido
do que ele pretende, ele usa isso apenas como argumento para coberturas de
cabeça, não para tudo que alguém possa extrapolar a partir dele.
A natureza, a ordem natural das coisas – (1 Co 11.13-15). Paulo argumenta a
partir do costume grego e romano presente, ou pode ser que ele argumente que os
cabelos da mulher crescem naturalmente mais que os dos homens.
Paulo se ocupa de problemas com os quais a congregação luta, inclusive
problemas de sexos originários da cultura. Ele também defende a importância da
unidade da família e da Igrejas cristãs; além disso, enquanto fornece argumentos em
defesa do decoro no trajar para manter a Igreja unida, ele busca persuadir a mulher
que ouve a leitura da carta na Igreja a se lembrar desses argumentos sem
questionar o direito que ela tem de se vestir como quer (1Cor 11.10), em nenhum
lugar deste texto Paulo subjuga a mulher.
3 – Paulo e a submissão das esposas
Embora diversas passagens paulinas abordem a subordinação das mulheres no
lar (Ef 5.22-33; Cl 3.18; 1 Tm 5.14; Tt 2.4-5). É preciso fazer uma análise da situação
social e cultural da mulher, em nenhum lugar elas gozavam da liberdade social hoje
reconhecida como direito seu. Influentes atitudes masculinas antigas em relação às
mulheres muitas vezes soam rudes para ouvidos modernos; para alguns mestres
judaicos primitivos, as mulheres eram inerentemente más; Josefo proclamou que a
Lei prescrevia a subordinação para o próprio bem delas; Fílon reclama que as
mulheres não têm senso e louva a exceção, a imperatriz Lívia, por se tomar
“intelectualmente masculina”; Plutarco, um dos mais progressistas autores a respeito
do assunto, sugere positivamente que as mulheres podem aprender filosofia com os
maridos — mas negativamente baseia isso no dado de que, se deixadas à própria
conta, elas farão tolices. Tais atitudes naturalmente afetaram a forma como eram
tratadas nos lares antigos, onde os homens sempre tinham o poder. A lei romana
conferia completa autoridade sobre mulher, filhos e escravos ao chefe masculino da
casa, conhecido como páter-famílias. A discreta submissão da mulher era
considerada uma de suas maiores virtudes em toda a Antiguidade greco-romana.
4 – Paulo e o ministério das mulheres
Paulo aprova o ministério das mulheres. Em uma sociedade na qual, em sua
maioria, as pessoas eram semianalfabetas, e as funções didáticas competiam,
11

naturalmente, àqueles que sabiam ler e falar bem. Com exceções, essas funções se
limitavam aos homens. Embora inscrições de sinagogas antigas indiquem que em
algumas mulheres desempenhavam papel proeminente, as mesmas inscrições
indicam que isso era exceção em vez de norma.
Embora os papéis das mulheres variassem de região para região, certas
passagens paulinas deixam claro que ele estava entre os autores mais
progressistas. Em uma breve carta de recomendação no final de Romanos, Paulo
recomenda a portadora da carta, em quem os romanos podem confiar, para explicá-
la a eles (Rm 16.1-2). Febe é “diaconisa” da Igreja de Cencréia, a cidade portuária
de Corinto; a palavra (diakonos) refere-se aparentemente a uma pessoa com
responsabilidades administrativas na Igreja primitiva, mas que, nas cartas de Paulo,
em geral refere-se a um ministro da palavra de Deus, tal como ele próprio. Ele
também a chama de “protetora” de muita gente, palavra que na Antiguidade se
referia normalmente a patronos, alguns dos quais eram mulheres. Como patrona, ela
era a dona da casa onde a Igreja se encontrava e ocupava uma posição de honra.
Nas saudações paulinas seguintes (Rm 16.3-16), o apóstolo relaciona um
número cerca de duas vezes maior de homens que de mulheres, mas elogia um
número mais de duas vezes maior de mulheres que de homens. Isso talvez indique
sua sensibilidade à oposição de alguns setores que, sem dúvida, as mulheres
enfrentavam em seu ministério. Entre os ministros mais importantes que ele
relaciona está Prisca (diminutivo de Priscila), possivelmente mencionada antes do
marido, Aquila, por ter uma posição social mais elevada (Rm 16.3-4). Lucas também
a descreve como coministro com o marido, ao qual se junta na instrução de outro
ministro, (At 18.26). Paulo também relaciona dois companheiros apóstolos (este é o
jeito mais natural de interpretar “apóstolos eminentes”, pois em nenhuma outra
passagem Paulo apela a elogios dos “apóstolos”), Andrônico e Júnias. O nome
“Júnias” é claramente feminino, mas autores inclinados a duvidar que Paulo se
referisse a um apóstolo do sexo feminino sugerem que seja uma abreviação do
nome masculino “Juniano”. Mas essa abreviação não ocorre em nossas inscrições
oriundas de Roma e é, de qualquer modo, muito rara comparada ao nome feminino,
que é comum; a sugestão baseia-se na suposição de que uma mulher não podia ser
apóstolo, não em nenhum indício inerente ao texto em si. Em outra carta, Paulo se
refere ao ministério de duas mulheres em Filipos, mulheres que, como seus muitos
coministros do sexo masculino, participavam de seu trabalho pelo Evangelho ali (Fl
12

4.2-3). A Macedônia era uma das regiões onde eram designados papéis mais
proeminentes para as mulheres, e isso pode ter facilitado para as colegas de Paulo
assumirem uma posição de destaque (At 16.14-15). Paulo, que classifica os profetas
em segundo lugar, depois dos apóstolos (1 Co 12.28), pressupõe a existência de
profetisas e só exige que elas, como outras mulheres da congregação, cubram a
cabeça (1 Cor 11.5). Nesse ponto, ele segue a tradição do AT (onde as mulheres
preenchiam a função profética muito menos que os homens, mas, mesmo assim,
assumiam posições de proeminência e autoridade; exemplo, Ex 15.20; Jz 4.4; 2 Rs
22.13-14) e outros elementos do cristianismo primitivo (At 2.17-18, 21-29).
Paulo parece restringir o ministério das mulheres (1 Co 14.34-35), mas no
mundo antigo era comum os ouvintes interromperem os mestres com perguntas,
mas isso era considerado rude se as perguntas refletissem ignorância do assunto,
como as mulheres eram normalmente consideradas menos instruídas que os
homens, Paulo sugere uma solução de curto prazo e uma de longo prazo para o
problema. A solução de curto prazo é que as mulheres parassem de fazer as
perguntas desconcertantes; a solução de longo prazo é que elas deviam ser
instruídas e ter aulas particulares com os maridos. Na época, muitos maridos
duvidavam do potencial intelectual das mulheres, mas Paulo era um dos autores
antigos mais progressistas quanto a esse assunto. A solução paulina de longo prazo
confirma a capacidade das mulheres para aprender e as coloca em pé de igualdade
com os homens. Primeiro, Paulo claramente não impõe às mulheres o silêncio total,
pois antes, na mesma carta, ele espera que elas rezem e profetizem publicamente
junto com os homens (1 Co 11.4-5); assim, ele deve querer apenas silenciar uma
forma específica de falar. Segundo, no contexto não há nada que apoie a ideia de
que aqui Paulo se refira a mulheres que ensinavam a Bíblia. A única passagem em
toda a Bíblia que poderia ser aduzida em favor dessa posição é 1 Timóteo 2,11-14.
força que isso e talvez signifique “apoderar-se da autoridade”; nessa interpretação,
Paulo apenas proíbe as mulheres de assumir autoridade com arrogância, do mesmo
modo que teria proibido os homens de fazê-lo. Outras passagens em Paulo que
demonstram claramente que ele aprova que as mulheres exerçam o ministério da
palavra de Deus (acima) indicam que 1 Timóteo 2.9-15 não proíbe o ministério das
mulheres em todas as situações, mas limita-se à situação em Éfeso e talvez em
algumas outras congregações que enfrentam crises semelhantes nesse período da
história da Igreja. Os textos paulinos que abordam os papéis das mulheres na Igreja
13

e no lar sugerem que Paulo seja classificado entre os autores antigos mais
progressistas.
Perfil da igreja cristã brasileira
Um ponto interessante e não menos importante é a influência da teologia
feminista na igreja brasileira hoje, já que no último censo feito pelo IBGE os dados
demonstram a presença significativa da mulher na igreja, conforme demonstrado
abaixo:
1 – Distribuição por gênero e cor

Fonte: IBGE tabela 1.4.5 População residente, por cor ou raça, segundo o sexo e os grandes grupos de religião – 2010 (adaptado)

Fonte: IBGE tabela 1.4.5 População residente, por cor ou raça, segundo o sexo e os grandes grupos de religião - 2010(adaptado)

2 – Distribuição por escolaridade

Fonte: IBGE tabela 1.4.9 Pessoas de 25 anos ou mais de idade, por nível de instrução, segundo o sexo e os grandes grupos de
religião – 2010(adaptado)

Fonte: IBGE tabela 1.4.9 Pessoas de 25 anos ou mais de idade, por nível de instrução, segundo o sexo e os grandes grupos de religião –
2010(adaptado)

Os perigos da Teologia Feminista para Igreja Cristã


É evidente que o movimento feminista não é uniforme, a justa revisão do seu
papel na sociedade, bem como sua participação mais efetiva no ministério cristão
deve ser revista, porém numa sociedade pós-moderna em que tudo é relativo há de
se observar alguns pontos que podem ser perigosos a valores pétreos bíblicos:
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1 – A descaracterização masculino e feminino e seus papéis na família, o ideal


andrógino;
2 – Homossexualismo;
3 – Novos tipos de famílias;
4 – Eco feminismos, uma exaltação a natureza, todos os seres são iguais, riscos de
panteísmo.
5 – Aborto, o direito de escolha de gerar ou não.
Conclusão
O período bíblico se iniciou com hábitos e costumes que privilegiaram a
participação pública da mulher em cerimônias e na religião judaica. Na sociedade
tradicional (patriarcal e rural), há relativa liberdade da mulher. A centralização do
poder político culmina com a criação do Estado e da monarquia associada a uma
crescente urbanização e contatos com o mundo externo. O Exílio babilônico (586-
536) e as transformações sociais que se seguem acentuam um processo, lento e
gradual, de exclusão das mulheres da vida pública e dos rituais religiosos
praticados.
No NT devemos considerar uma igreja que transpassa o judaísmo tradicional.
Paulo tem que lidar com situações de modo a conciliar uma igreja eclética, respostas
pertinentes a um ambiente sociocultural diferente de hoje, parecendo muitas vezes
em seus textos como uma visão machista em relação a mulher.
Apesar de não parecer a teologia feminista tem uma amplitude e influência
muito maiores que possamos imaginar, muitas vezes ficamos presos somente a
questões de liderança ou cargos eclesiásticos, porém questões sobre aborto,
homossexualismo, ou mesmo o gênero de Deus tem influenciado uma geração.
Numa breve pesquisa é notório uma imensa produção literária sobre a
Teologia Feminista bem como um significativo número de teólogas estudiosas do
tema. As Escrituras são inclusivistas, porém o que temos visto no cristianismo é um
sectarismo crescente, reinterpretando a Bíblia segundo interesses e visões.
A Teologia Feminista veio a ser profundamente afetada pela hermenêutica
pós-moderna, a qual ensina que a escrita e a leitura de qualquer texto são
irremediavelmente determinadas pelas perspectivas sociais e experiências de vida
dos seus autores e leitores desconsiderando ou mesmo não dando ênfase ao
conceito da inspiração e infalibilidade da Bíblia. Ela é uma corrente de pensamento
que propõe uma reflexão a respeito do papel e da visão da mulher na Bíblia, prega
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uma interpretação sociológica das escrituras em detrimento de uma leitura literal e


fundamentalista.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LOPES, Augustus Nicodemus. O Feminismo Cristão: Como Tudo Começou.


Disponível em: <http://tempora-mores.blogspot.com/2011/12/o-feminismo-cristao-
como-tudo-comecou.html>. Acesso em: 16 jun 2018.

FELDMAN, Sérgio Alberto. A mulher na religião judaica (período bíblico:


primeiro e segundo Templos). MÉTIS: história & cultura – v. 5, n. 10, p. 251-272,
jul./dez. 2006. Disponível em:
<http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/metis/article/download/810/573 >. Acesso
em: 16 jun 2018.

HAWTHORNE, Gerald F.; MARTIN, Ralph P.; REID. Daniel G. (Orgs.). DICIONÁRIO
DE PAULO E SUAS CARTAS. Tradução de Barbara Theodoto Lambert. 2 ed.,São
Paulo: Loyola, 2008.

BÍBLIA. Português. A Bíblia de Jerusalém. Nova edição rev. e ampl. São Paulo:
Paulus, 2002.
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ANEXOS
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