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Prólogo

Este livro foi idealizado por mim, Soraya Heloisa, nascida em Londrina,
estado do Paraná, dia 26 de janeiro de 1968. Foi por um mongolismo
geográfico da cegonha que nasci aqui nesta cidade do norte no Paraná, mas
poderia até ter nascido no castelo de Buckingham, no Reino Unido, e ter sido
uma princesa, o que seria o ideal. No entanto, minha cegonha pegou um vento
de través e outro a barlavento, o que me deixou em uma situação
complicadíssima, pois foi tudo ao contrário do que seria uma história de
príncipes e princesas. Afinal sou uma sobrevivente, então vamos entrar nesta
mágica saga que seria entrar no âmago deste livro, pois, caros leitores, esta
história é marcante e única porque Deus não me poupou de nada, nem de
tragédias e nem de vitórias. Sendo assim, convido os caros leitores para viajar
nesta aventura chamada vida.

Andiamo insieme ...

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No final da década de 1960, exatamente no dia 26 de janeiro de 1968,


nasce de cesárea, na Santa Casa de Londrina, a menina Soraya Heloisa,
depois de 6 dias de sofrimento tentando vir ao mundo. Nesse momento
finalmente o fôlego de vida me foi dado e tudo começa como um filme que irá
ter início, meio e fim.
Deus me colocou em uma família pobre e muito simples, cujos
integrantes trabalhavam na lavoura de café, na época áurea do café no norte
do Paraná, cujo grão era conhecido como Ouro Verde e Londrina era
denominada a capital do café.
Meu avô materno José Balduino era uma pessoa rude de caráter forte,
como também era forte fisicamente. Tudo ia bem com a família e a vida
continuava, mas eu não tive a oportunidade de conhecer meu pai, João Luis da
Silva, pois Deus o levou cedo, quando ele tinha 49 anos, tendo ele falecido de
AVC um ano depois de meu nascimento. Não tive contato com meus familiares
paternos, pois nunca fui apresentada a eles, apenas sabia que tinha uma meia-
irmã pianista cujo nome era Silvania da Silva, e minha referência de família
foram meus tios e tias maternos sendo eles 3 tios: João, Mario e Tony, e
minhas 4 tias: Maria Aparecida, Dirce, Marlene, Marcia, como também meu avô
José e minha avó Ana. que por vaidade não gostava de ser chamada de avó,
então nós a chamávamos de mãezona. Meu bisavô Sebastião Vilas Boas era
filho de uma escrava com um alemão. Assim sendo, minha descendência
provém de africano, italiano, alemão, português e índio. Depois da morte de
meu pai biológico, quando eu estava com 1 ano e meio de idade, minha mãe
se casou de novo com um homem de origem italiana e austríaca.
Quando eu estava com 2 ou três 3 anos eu morava vizinha ao colégio
Marista e a vida era simples, muito simples. Eu tinha um cachorro chamado
Dunga, a quem amava muito, mas um dia deram fim nele, o que me deixou
muito triste. Também tinha uma pequena bicicleta vermelha e sempre andava
de calcinha e camisetinha, minha roupa preferida, ou talvez só tivesse somente
aquelas roupas, e mesmo tendo uma vida simples eu era feliz naquela época,
pois minhas relações afetivas eram muito boas, e tinha meus tios e tias sempre

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presentes. Minha tia Dirce me levava para ver as abelhas no muro do grande
Colégio Marista, o que para mim era uma grande aventura. Havia muitas
abelhas e eu tinha medo delas, mas ao mesmo tempo aquilo me fascinava,
porque eu via que elas trabalhavam muito e produziam muito mel. Uma outra
diversão que eu adorava era ir brincar na praça da Avenida Tiradentes onde
havia um labirinto... Nossa! Entrar naquele labirinto era incrível, pois mesmo
sentindo um medo terrível, aquilo me encantava. Tanto minha mãe, Aurora,
quanto minhas tias sempre me levavam lá. E quando meu padrasto Gervásio,
que considero como pai, ia junto com minha mãe, além de me levarem sempre
a essa praça, nós tirávamos fotos no jardim de rosas vermelhas e assim seguia
minha vida.
Na esquina da minha casa havia uma padaria que existe até hoje cujo
nome é Pão Francano e lá eu tinha amigos. Um belo dia eu sumi porque havia
dormido atrás do sofá da família que era proprietária da Pão Francano e
morava na sobreloja, e nesse mesmo período, eu já tinha uma conta na
Padoca para comprar chocolates. Que delícia de infância!
Nessa mesma casa morávamos todos juntos e naquela época meu pai
Gervasio também tinha um fusca vinho. Ele era magro e costumava usar
brilhantina no cabelo, pois queria ficar parecido com o ator James Dean. La vita
stava seguendo, e logo meu pai comprou uma casa na Rua Ponta Grossa, era
uma casa verde grande, de madeira, que ficava numa esquina. Quando
mudamos para a nova casa, minha primeira descoberta foi que nela havia um
quarto onde o ex-proprietário guardava mantimentos como arroz, feijão, café e
tinha pegadores de alumínio enormes. Eu achei tudo aquilo a 7ª maravilha do
mundo. Afinal era filha única e tinha todos os meus tios para mim, meus avós,
meu bisavô e me lembro bem daquela época em que vivia feliz na nossa casa,
onde morávamos todos juntos, e lá ainda tínhamos um quintal com horta, um
pé de nêsperas, e de ameixa japonesa. Mas também havia uma fossa
perigosíssima que tinha um formigueiro enorme, e um dia as formigas subiram
em mim e me picaram toda. Foi tão horrível que até hoje me arrepio só de me
lembrar. Também nós tínhamos uma cachorra que se chamava Laica, ela era
preta e dócil e sempre dava cria, mas minha avó Ana odiava que ela desse
cria, pois dava muito trabalho e ficava aquela cachorrada espalhada. Até que
chegou um dia em que vi seu sangue alemão aflorar e ela começou a pegar os
cachorrinhos e depois batia a enxada na cabeça deles e os jogava na fossa...
Quando vi aquilo eu enlouqueci e comecei a gritar e chamá-la de bruxa. Mas
depois que ela terminou o serviço, me pegou de jeito e perguntou: “Quem é
bruxa?”. Eu dizia: “Você mesma”. E aí o chinelo comia solto. Foi assim que
descobri o que era matar o mal pela raiz...
Entretanto, meu quintal era mio paradiso e continuou a sê-lo, pois nele
meu avô José tinha uma pequena horta onde ele plantava algumas hortaliças e
também cenouras, e eu e minha tia Marcia sempre íamos à horta e pegávamos
as cenouras, comíamos e colocávamos as folhas das cenouras no mesmo
lugar para ninguém descobrir que as tínhamos comido. Ela também me
ensinava a cantar uma cantiga que eu amava e que era assim: “a borboleta

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está na cozinha fazendo chocolate para a madrinha, café com leite quero tomar
com aquela senhorinha que vou casar...” Uau! Eram tempos lindos aqueles...
Sempre senti grande apreço por meu avô, que já era um senhor. Ele era
filho de índios, de pele bem morena, tinha dentes fortes e separados na frente,
seu físico também era forte, e todos os dias eu sentava num banco na frente de
casa para tirar espinhas inexistentes do rosto dele. Nós nos dávamos bem, e
sempre ele me levava no bosque, no centro de Londrina, para brincar no
parquinho e eu amava brincar nesse lugar, mas havia um ritual para ser
seguido. Quando chegávamos no parque ele tirava minhas botas ortopédicas e
antes de irmos embora ele lavava meus pés na pia do banheiro, onde eu ficava
maravilhada com os desenhos pintados na parede. Depois de arrumada,
voltávamos a pé para nossa casa, que ficava longe do centro, na rua Ponta
Grossa. Meu avô costumava levar um cajado, que era um cabo de vassoura
com um prego na ponta para pegar as folhas do jardim e, assim, seguíamos
para casa e quando chegávamos às vezes ele fazia uma pipoquinha para mim,
pois ele tinha um carrinho de pipocas.
Eu tinha um amigo chamado Diógenes Rosa e nós brincávamos com
pedrinhas, carrinhos e fazíamos estradinhas longas para nossos carrinhos
passarem, e todos os dias nós víamos sua mãe, dona Doroteia, quando
estávamos envolvidos nas nossas brincadeiras, pois ela vinha sempre chamá-
lo para ir pra casa.
Na frente de minha casa tinha uma família de japoneses que era
composta pelo Toshiro; esse era meu algoz, porque ele tinha uma arma de
elástico e atirava feijão em mim, e quando Edson, irmão da minha amiga Rosi,
o ajudava, eu chamava minha tia Dirce para me defender, afinal ela já era
muito briguenta. Tinha também as irmãs Ayume, e Yume, e Renato, um lindo
japonês por quem eu tinha um sentimentino strano, mas ele só queria que eu
fosse sua filhinha, pois tinha muitos anos a mais que eu, já era adulto e lindo e
me levava para tomar banho relaxante no ofurô que a família deles tinha no
fundo da casa. Essas lembranças são indimenticabile. Afinal, era divertido nos
vermos todos usando cada um sua toalha num quarto muito quente, com uma
tina de água onde todos ficávamos juntos. Tudo era muito legal. Essa família
também era proprietária de uma peixaria que ficava no Mercadão Shangrilá.
Na mesma rua em que morávamos, morava também a família de minha
amiga Tania Vaz, uma alemãzinha loira que um dia foi atropelada e nós
estávamos juntas naquele momento, porém não fui atingida pelo carro, mas eu
fiquei muito assustada. A família da Rosi e do Edson também morava na
mesma rua e nós brincávamos todo santo dia. Era uma delícia! Rosi tinha as
panelinhas mais lindas do mundo e a casa dela era impecável, pois sua mãe,
dona Neide, era caprichosíssima na limpeza, por isso o chão da casa dela
estava sempre brilhante. Seu Ataide, esposo dela, sempre chegava no fim da
tarde e tínhamos que parar de brincar. Um dia Edson teve que fazer cirurgia da
fimose e, quando ele falava que tinha feito, eu ficava no pé dele para ele me
mostrar. Até que um dia ele mostrou e eu sosseguei, bellooo, já era muito

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curiosa naquela época e achava mágico aquilo, então pedia para ver o pirulito
dele. Naquele tempo eu só tinha 6 anos, imagina o que eu faria com 50... Não
era nada demais, eu era apenas uma menina curiosa.
Meus tios Salvador e Nilda tinham 3 filhos: Leila, Silene e o Victor, e era
uma festa quando eu ia à casa deles principalmente à noite. .Era uma delícia
poder brincar na pracinha que ficava em frente da casa deles, e éramos
sempre eu e Leila que dominávamos nas brincadeiras, por sermos as maiores.
Na praça havia lindas flores de cor laranja, então corríamos e pulávamos o
muro para poder brincar. Nas vezes em que eu dormia na casa da tia era bom
demais, porque nós tomávamos banho no tanque e minha tia Nilda nos fazia
um fantástico strogonoff que somente ela sabia fazer. Às vezes, aos domingos
eles faziam churrasco também que era comandado pelo tio Salvador e tia
Nilda, ao qual sempre compareciam meus avós e meus tios também, entre eles
meus avós Tereza e Victor, tio Fernando e, às vezes, o tio Laerte e tio Paulo
também.
.Com 6 anos eu iria iniciar uma nova saga na minha vida, que seria
começar os estudos. Fui então matriculada na Escola Santa Maria, num colégio
de freiras, onde iniciei as aulas na pré-escola com a tia Francisca, que era
professora. Eu e minha prima Leila brincávamos de massinha e também de
professora e tomávamos conta da sala de aula para nossa tia. Essa escola
tinha a festa junina mais linda que se possa imaginar, da qual eu participava
vestida de anjo com asas cor-de-rosa e jogava pétalas de rosas na estátua
Nossa Senhora. Nessa mesma época meus pais costumavam me levar na
zona rural, no Distrito de Maravilha, onde os primos de minha mãe tinham um
sítio. Lá era um lugar muito gostoso porque eu podia correr pelo milharal,
tomava leite de vaca tirado na hora, via cobra que eu achava horrível, e, além
disso, a comida feita no fogão à lenha era deliciosa, pois sempre tinha arroz,
feijão, frango caipira e verduras. Tudo era saboroso! A Mariazinha é quem era
a responsável por essas delícias que fazia. Pedro, esposo dela, trabalhava na
lavoura e com animais também, pois ele era o capataz. Quando chegava o final
da tarde, tomávamos banho de bacia... Tempos bons foram aqueles!
Nessa mesma ocasião, perto da minha casa havia uma fábrica de balas
que se chamava Ouro Verde, e eu amava ir até a fábrica com moedas
emprestadas da meia cheia de moedas de 1 cruzeiro e 50 centavos de meu
pai. Encontrar essa meia tinha sido minha grande descoberta e a cada dia a
meia ia se esvaziando, mas ninguém sabia quem é que estava por trás disso.
Pois bem, depois que descobri a meia com dinheiro, percebi que agora podia
comprar minhas balas diárias, meus ioiôs coloridos no Bar do Sardinha, um bar
maravilhoso, bem fuleiro, mas cheio de coisas penduradas coloridas onde
havia de tudo, inclusive tinha tubaína que eu achava uma delícia, e por isso era
um lugar onde eu amava ir. Mas também passava no Bar Fuad, porque esses
bares ficavam na rua Rebouças e lá eu podia comprar doces, leite, sorvetes,
era demais! Para escolher as minhas balas preferidas eu e minhas amigas
sempre passávamos por lá. Eu ia com um belo modelito: camisetinha,
shortinho, calcinha e descalça, ou com chinelinho de florzinhas, e pedia balas

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de abacaxi e coco que eram as que eu mais gostava, por serem as melhores.
Eu era freguesa também de um sorveteiro, que sempre tinha sorvete para
todas as minhas amiguinhas – eu comprava para elas porque sempre fui
generosa.
Um dia estava brincando no jardim e meu tio Tony tinha um viveiro de
passarinhos, em sua maioria eram canários. Fiquei olhando bem para eles e
não tive dúvida, acabei soltando todos, mas não entendi muito bem a surra que
tomei e tampouco a tamanha raiva de meu tio, mas fiquei bem feliz vendo-os
voar e conquistar sua liberdade. E tínhamos uma tartaruga também enorme
que comia muito tomate, e assim era meu mundo naquela época, um mundo
mágico que o palco da infância nos oferece. Tenho em minha lembrança o dia
em que tive sarampo e fiquei muitíssimo mal e, no colo de minha tia Marlene,
eu tomava chá de sabugueiro, que foi recomendado porque este chá era muito
bom para que eu melhorasse rápido. Lembro-me que realmente eu estava mal
demais e com febre muito alta, mas felizmente consegui sair daquela situação
com louvor.
Sempre fui agitada e, querendo uma brincadeira, eu adorava ajudar
minha tia Cidinha fazer quindins e gelatina para todos nós, mas em especial
para mim, certamente, então minhas tias me mimavam com lindas roupas
bordadas e anel de pérola e brinquinhos de pérolas que eram um mimo, afinal
eu era uma negrinha linda e bem cuidada, mi è venuta una voglia strana... Eu
queria muito uma irmã e meus pais providenciaram essa menina a quem eu dei
o nome de Andrea. Essa menina nasceu branca de olhos azuis e aí as coisas
mudaram, pois toda a atenção era para ela e eu acho que regredi muito nessa
fase. Mas a vida ia passando e depois de uma briga de meu pai com minha tia
Marcia fomos morar em uma casa no Jardim do Sol, e me lembro de minha
mãe, nervosa, cuidando de minha irmã, eu e meu pai, e das pessoas que iam
nos visitar. Um dia um ladrão entrou em casa e eu dormia num quarto sozinha,
quando ouvi um barulho, era um tiro, e meu pai espantou o algoz ladrão que
havia roubado o dinheiro dele. E assim, la vitta stava seguendo.
Naquele tempo eu tinha poucos amigos e minha diversão era colocar as
roupas de minha mãe e usar seus sapatos de salto alto e, também, quando
minha prima Leila sempre nos visitava, nós nos maquiávamos, enquanto minha
irmã, que era bem pequena, brincava com a Silene. A casa era de madeira,
mas sempre limpa, pois minha mãe deixava tudo sempre em ordem e eu
continuava estudando na Escola Santa Maria. Nessa escola eu tinha uma
amiga, a irmâ Dalva, que usava um hábito branco e sempre estava sorridente,
eu a amava, pois aonde ela ia eu também ia, sempre juntas de mãos dadas.
Nos fundos do colégio havia um pé de amora enorme e era embaixo dele que
fazíamos nossos lanches. Aquilo era mágico, porque eu ia lá embaixo da
árvore para tomar meu lanche junto com minhas amigas, e quando o sino
tocava, então retornávamos às salas de aula todo dia la faccenda era cosi. Eis
que certa vez aconteceu um dia negro, muito negro, pois minha garrafa térmica
caiu da carteira e quebrou. Foi tão grande o meu susto que chorei muito, pois
sabia que minha mãe iria ficar muito brava e acabei chorando a tarde inteira

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por isso. Pois bem, eis que finalmente chegou o fim de aula e nada demais
aconteceu, levei apenas uns puxões de orelha e ouvi muita falação.
Depois de ter passado um certo tempo desde que aquele algoz ladrão
tinha entrado na nossa casa, todos ficaram aterrorizados com o risco que
corremos durante a invasão daquele individuo em casa. Para não passarmos
mais por riscos assim, meu pai resolveu que tínhamos que mudar de endereço,
e assim nós mudamos para uma casa na rua Dona Carlota, 129, no bairro
Aeroporto, na cidade de Londrina, PR. Quando chegamos naquela rua, vimos
que ela não tinha asfalto, havia muitos pés de café ao redor, e tudo em volta
era feio. Havia casas com cerca de balaústres e casas muito simples, a nossa
casa era uma edícula de 1 quarto, sala, cozinha, banheiro, e foi nesse lugar
que tudo começou. Éramos 2 meninas, com nosso pai e nossa mãe, e nossa
casa era pequena demais, mas até que era bonitinha. Na frente de casa havia
um gramado grande onde eu brincava com meus brinquedos, e tinha uma
senhora que sempre passava pela calçada e brincava comigo, ela tinha
cabelos brancos, era brincalhona e usava sempre vestido e chinelo havaiano.
Do lado de casa havia uma mulher cujo nome era Carlinda, que tinha filhas
gêmeas chamadas Fabricia e Patricia e nós brincávamos sempre juntas. Ela
tinha uma casa pequena e um marido que se chamava Antonio. Ele bebia e à
noite cantava perto do nosso muro e olhava a lua. Logo depois veio mais uma
menina que se chamava Fabiane, e passado certo tempo ela teve mais uma
gravidez, e dessa vez ela ganhou trigêmeos: o Fernando, Fabio e Fabiane.
Depois que o marido dela veio a falecer quando caiu de um andaime, meus
pais a ajudavam muito, mesmo porque ela não tinha condições de cuidar dos
filhos sozinha, afinal eles ainda eram pequenos, e ela não tinha profissão.
Assim sendo, meu pai deu uma máquina de costura para ela, que soube usá-la
muito bem e acabou tornando-se uma ótima costureira.
Em nossa casa o tempo passava entre escolas, brincadeiras na rua com
amigos e com meu pai, e sempre nós brincávamos de Bola queimada.
Também andávamos muito de bicicleta, até que um dia, ao descer a rua de
casa, um cachorro enorme mordeu meu braço, e a partir desse acidente perdi
um pouco o encanto da bike. Mas sempre havia outras brincadeiras, como
Passa anel, Balança caixão, e em especial o jogo de Bets, do qual meu pai
participava. Jogávamos Bets com bolinha de tênis, o que era o máximo, porque
ficávamos horas brincando. Eu tinha várias amigas e nós frequentávamos a
casa uma das outras, mas na minha casa elas quase não iam porque minha
mãe não gostava muito que fossem lá.
Aos 7 anos ingressei no Grupo Escolar Nossa Senhora de Lourdes, que
era do lado da igreja. Fui com minha amiga Celeida, que devia ter 1 ou 2 anos
a mais que eu. Quando já havíamos cantado o Hino Nacional e entramos nas
salas de aula, acabei dando um verdadeiro show, pois chorei muito, mas muito
mesmo. Naquele momento me sentia sozinha sem meus pais e queria minha
amiga Celeida, e embora todos tentassem me consolar eu não conseguia parar
de chorar e só queria ir embora. Então assim foi feito e finalmente voltei para
casa sentindo muita vergonha, e assim que cheguei fui repreendida por minha

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mãe, mas para mim o que importava era que eu estava em casa. Nos dias que
se seguiram, todas as tardes eu ia até a casa da Celeida para irmos juntas ao
Grupo Escolar. Mas chegou um dia em que o pai dela me recebeu com cara de
poucos amigos e me disse: “Não entre, espere lá fora, pois você é muito
entrona”. Fiquei sem jeito e me lembro bem que a partir daquele dia passei a
esperar por minha amiga do lado de fora. Na nossa vizinhança havia também a
dona Cássia, que morava em uma casa mimosa de esquina, com cerca viva, e
como nós estávamos sempre jogando bets, volta e meia a bolinha caía na casa
dela, e aquilo a deixava muitíssimo brava. Um belo dia ela foi até nossa casa
para conversar com minha mãe e reclamar de mim, sendo que eu era só uma
menina que queria apenas brincar.
Eu guardava comigo um segredo pessoal que para mim era muito triste.
Por sofrer de enurese noturna, todas as noites eu urinava na cama e também
sonhava que estava fazendo xixi na cama e que ia dar tempo de ir ao banheiro.
Aquilo parecia uma maldição e, às vezes, levava uns tapas de minha mãe e
outras vezes eu olhava para ela e seu rosto era de reprovação ou apenas um
motivo de riso triste. Nós tínhamos uma empregada negra que eu amava muito,
a nossa querida Zefa. Ela não sabia escrever, nem ler, portanto não tinha o
intelecto desenvolvido, mas cuidava de mim, de nós todos, fazia uma comida
muito boa e lavava roupa no tanque, pois ainda não tínhamos máquina de lavar
roupa naquela época. Nesse tempo meu pai já tinha construído a casa da
frente e com isso foi necessário ter mais pessoas para trabalhar em casa para
ajudar minha mãe. Então tínhamos também a Neide, filha da Zefa, e dona
Maria, que também cozinhava. Meu pai, aos meus olhos, naquele momento
era um grande pai, pois ele nos dava carinho e toda a subsistência necessária
para vivermos.
Nessa época eu já tinha mudado de escola e estudava no Colégio Mario
de Andrade, o que era muito legal, mas eu já era gordinha e não gostava de
dois meninos malvados, Fernando e Fernando Bays, que me batiam quando eu
ia tomar água e que me chamavam de baleia, saco de areia. Eu queria matá-lo,
esquartejá-lo, mas isso não passava de mera vontade, pois ele era bem maior
que eu e, não contente com isso, na sala de aula ele apontava o lápis
deixando-o com ponta bem fina mesmo e cravava nas minhas costas e eu fazia
cara de mercador, pois não adiantava reclamar. Isso aconteceu no segundo
ano do curso primário e nesse período eu estudava com minha prima Leila e
um dia nós estávamos tendo aula de matemática e eu queria porque queria
saber como se fazia conta de dividir com três números na chave e então ficava
chamando a professora Terezinha, mas em vez de me atender, ela me deu um
tapa no rosto e eu fiquei assustada, sem ação e prestando atenção nos rostos
das outras crianças que riam sem parar. Minha prima não podia fazer nada e
ficou me olhando enquanto eu chorava, sentindo muita vergonha, Depois disso,
matemática para mim virou um bicho de sete cabeças, tipo 2 + 2 são 5. Mas
sou brava em outras coisas e queria justiça. Então contei para minha mãe e ela
foi ao colégio conversar com a tal maldita professora. Fiquei esperando um
quebra-pau por minha causa, mas só vi quando ela foi embora pacificamente.

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Aquilo me deixou louca da vida, mas passou. Nessa mesma escola todos os
dias minha mãe demorava muito para ir me buscar, pois assim que terminavam
as aulas todos os alunos iam embora, mas eu tinha que ficar lá esperando por
minha mãe, e acabava dando um show quando começava a chorar muito, mas
muito mesmo. Então a dona Alice, monitora do colégio, me pegava no colo e
ficava comigo até minha mãe chegar, e era sempre assim. Por isso é que eu
gostava muito dela, e também achava que dona Alice era muito linda, cheirosa,
morena de cabelos bem cuidados e negros.
Na realidade, naquela época tudo para mim era uma grande festa, pois
eu, meus tios e tias e seus namorados gostávamos de ficar na frente de minha
casa, onde havia um gramado enorme no qual eu, minha tia Cidinha e meu
futuro tio Luis Henrique adorávamos rolar sobre ele e ríamos muito. Às vezes
minha irmã também participava. Tinha também a tia Marcia e Fred, seu
namorado e meu futuro tio. Ele era mais sério, usava bigode. e costumava me
dar uma coisa que eu adorava, que eram as bonecas de papel que se
comprava em banca de revista. Aquilo para mim era um presente que eu
amava muito. Fred e Luis Henrique eram primos e faziam faculdade no
Cesulon e, durante o dia, trabalhavam numa linda fazenda, em Rolândia, que
era do Sr. Eduardo. Quando eles chegavam do trabalho, iam sempre ao Bar do
Nadir para fazer um happy hour.
Minhas tias eram super vaidosas e certo dia tia Marcia me perguntou se
eu sabia passar roupa e eu, de pronto, respondi que sim, claro. Mas quem
poderia imaginar que uma menina da minha idade sabia passar uma linda
roupa nova de veludo preto? Não deu outra, pois acabei queimando a calça
dela. Claro que tia Marcia ficou muito brava, mas tentei acalmá-la e
rapidamente lhe disse: “Calma, meu pai tem cem milhões no banco, ele compra
outra pra você”.
Nessa época minha irmã já tinha uns 4 anos e minha mãe me mudou de
escola, então fui para uma escola estadual que se chamava Nossa Senhora de
Lourdes. Nossa diretora era a dona Edith, que às vezes costumava ir até às
salas de aula, e quando isso acontecia todos nós ficávamos bem assustados,
pois ela era bastante enérgica. Nessa escola tive um professor inesquecível
que dava aula de português, o Sr Nelson Ubiali, que tinha a maior paciência
comigo e ele me ensinava análise sintática que não era nada fácil, pois para
mim era um bicho de 7 cabeças. Nessa escola eu tinha alguns amigos queridos
de quem gostava muito, como a Eliane, Elaine, Valdir entre outros, e todos os
dias conversávamos e brincávamos juntos. E era la vita seguendo. Naquela
época eu tinha 9 anos e já estava me sentindo mocinha, e minha mãe estava
grávida de meu irmão Junior, o que a fez sentir-se muito feliz, porque ela e meu
pai queriam muito um menino, na realidade acho que quanto a filhos, minha
mãe se identificava mais com menino do que com meninas. Naquele momento
minha mãe estava com a barriga enorme e quando aparecia lá em casa o meu
tio Tony, um rapagão a quem eu adorava por ele ser muito querido, ele beijava
a barriga de minha mãe e dizia que seu sobrinho seria jogador de futebol, e
por isso meu irmão foi presenteado com um meião de jogador de futebol ainda

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na barriga dela. Nós já havíamos mudado da edícula para a nossa casa da


frente do terreno, e eu a achava linda porque era nova e bem cuidada. Então
minha mãe teve o cuidado de arrumar o quarto azul do Junior e eu ficava no
outro quarto e dormia num escuro total, enquanto minha irmãzinha ia dormir no
quarto de minha mãe porque ela tinha medo de escuro e assim a vida ia
passando.
Quando estava com 10 anos eu me via na 5ª série e notei que eu estava
mudando de menina para mocinha. Tinha uma paixão por um lindo loiro que se
chamava Davi, mas não era correspondida, então ficava sonhando com ele,
divagava, não prestava atenção nas aulas, não queria fazer nada e acabei
reprovando de ano, o que me deixou muito mal com minha família e comigo
mesma e me sentindo incapaz, mas tutto bene non fa niente. Na verdade eu
sempre queria brincar na rua com meus amigos e meu pai era meu
companheiro, então brincávamos de bola queimada, de passa-anel, balança
caixão, e principalmente de bets, e essa brincadeira era a melhor, pois meu pai
era meu parceiro e éramos craques, pois sempre ganhávamos. E como as
bolinhas eram de tênis, ou seja, as melhores, elas sempre caíam nos terrenos
vazios cheio de mato ou nos quintais das casas, então lá íamos nós viver a
aventura de encontrá-las para poder continuar o jogo. Um dia ganhei uma bike
Caloi azul que me deixou muitíssimo feliz e uma vez, descendo com ela a rua
de casa, um cachorrão mordeu meu braço e chorei muito, mas lavamos com
sabão e minha mãe disse não ser nada demais, eu acreditei e tutto bene.
Eu era gordinha quando estava com 11 anos, então minha mãe me
levou para fazer uma consulta com uma endocrinologista chamada dona
Henriqueta, e ela descobriu que eu era hipertensa. No mesmo período sofri um
grave trauma em uma manhã, quando ao atravessar a rua Hugo Cabral com
minha mãe, ela me virou e falou: “Sabia que você não tem pai?”. Nossa! Aquilo
para mim foi muito, mas muito triste e me lembro que faltou meu chão e
cheguei a passar mal, pois meu pai era tudo para mim, meu herói, meu tudo, e
dali para a frente me tornei uma pessoa diferente. Com relação à hipertensão,
meu pai tinha um amigo médico, o Dr Paulo Batista dos Santos, que se tornou
um grande amigo também, e quando meus pais me levaram até seu
consultório, ele pediu para que me levassem a São Paulo. E assim fui fazer um
check up, e quando vi já estávamos na Beneficência Portuguesa para fazer um
exame dos rins, e bem na hora em que eu já estava preparada sobre a mesa é
que perceberam que eu estava no lugar errado. Naturalmente que eu estava
com muito medo, mas em seguida já saímos e fomos direto para o Hospital
Albert Einstein e, finalmente, lá foi feito meu exame. Furaram minha virilha.
colocaram um cateter que ia até a artéria de meu rim, fizeram exame da
hipófise, enfim, me viraram do avesso e nada descobriram, e até então o
diagnóstico passou a ser considerado de fundo emocional. E sempre que eu ia
no Dr. Paulo Batista, nas sextas-feiras, às 17 horas, ele me falava que não era
para engolir muitos sapos de ninguém e acho que ele estava certo naquele
momento. Mas hoje em dia penso que os sapos de pernas abertas fazem parte
de nossas vidas.

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Certo dia em que eu estava no consultório do Dr. Paulo conversando,


ele teve que atender uma ligação. Quando voltou ele estava pálido e disse-me:
“Filha, vou te levar no Hospital Infantil, porque seu irmão sofreu um acidente”.
Em seguida já fomos para lá. Quando vi o estado de minha mãe fiquei
apavorada, porque ela chorava muito, mas muito mesmo. Então fiquei sabendo
que a Andrea e o Junior estavam brincando e um portão enorme tinha caído
sobre sua cabeça. A situação dele era bem feia e eu, sempre com minha mãe,
pude entrar na sala e ver de longe o médico suturando a cabeça de meu irmão
na parte de trás. Foi horrível ver o corte que ia de um lado a outro de sua
cabeça, e achei que ele iria morrer. Ficamos no Hospital Infantil junto com ele,
mas o Junior sempre foi ativo e logo estava brincando, pois felizmente tudo
acabou bem. E esse menino já com 4 anos sabia jogar futebol muito bem e ele
era a menina dos olhos de meus pais, Ele tinha o Wando que cuidava dele
para minha mãe e o levava para brincar na praça.
Naquela época minha avó e meus tios João, Tony e Dirce mudaram-se
para nossa casa e tive que me adaptar com a mudança. Meu quarto passou a
ter beliche e dormíamos todos juntos. Naquela época, tia Dirce se converteu à
igreja evangélica e me levava junto para ir à Igreja Presbiteriana Renovada,
onde íamos sempre. Lá as mulheres não podiam usar calça comprida, porque
os padrões morais seguidos pela igreja eram muito rígidos, mas na realidade
eu ia em companhia de minha tia, pois quando se está com 12 anos, a garota
ou o garoto acabam indo na onda, e também foi lá que conheci molte ragazze,
entre elas a Lucimar, como também o meu fã Walderly e seus vários irmãos.
Lembro-me também de uma amiga em especial, a querida Sheila, além da
Alvaceli, do Douglas, do Marco. Frequentei essa igreja por um tempo, mas
naquela época dizia-se que aquele que frequentava a igreja evangélica ia com
a rapadura embaixo do braço, que era como os outros consideravam nossa
bíblia, e meu pai e meus tios tiravam o maior barato. Um dia estávamos no
culto e chegou um senhor negro bem alto gritando dentro da igreja. Eu não
sabia muito bem o que era aquilo, então me disseram que ele estava
endemoniado, então o levaram para os fundos da igreja e começaram a orar
por ele. O que mais me marcou naquele momento foi o fato de que não tive
dúvida sobre aquilo que estava acontecendo, então cheguei bem perto dele e
vi que seus olhos estavam vidrados e vermelhos e que ele ficava com as mãos
para trás. Nunca mais me esqueci de ter visto aquele quadro chocante.
Um dia fui para a igreja e meu fã Walderly começou a me elogiar e eu
fiquei muito sem jeito, pois era muito novinha ainda, então ele pediu meu
telefone e eu dei. Quando cheguei em casa ele me ligou e cantou um hino para
mim, claro que gostei, mas eu não soube administrar a situação pelo fato dele
ser mais velho que eu. Ele era gordinho e tinha um rosto lindo, realmente era
uma graça de pessoa. Sua família tinha uma Kombi azul porque era numerosa
e era com ela que faziam seus passeios e iam almoçar aos domingos na casa
de um irmão da igreja, que era muito legal. Uma vez nos reunimos na casa do
Marco Valle, e foi mágico imaginar que 38 anos atrás ter um frezzer da Kibon
em casa era chiquérrimo. Ele nos ofereceu um lanche com sorvete no final.

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Lembro-me que o meu era de coco. Dona Odete, sua mãe, tinha cabelo preto
com um lindo coque atrás da cabeça. Quando eu tinha 13 anos tinha meus
amigos que moravam perto de minha casa, como a Celeida, Luciana, Fatima,
Silvana, Julio, Davi, Lincoln, Iran, Jussara, Soraya, Sergio, enfim eram vários
amigos, e eu, sempre gordinha nessa época, achava o Iran lindo demais e era
apaixonada por ele, e ele pela Jussara, meu desafeto, e quando os via juntos
meu coração saía pela boca.
Uma vez fizemos uma festa entre nós, para escutar música, comer
guloseimas da nossa época de adolescência, e minha mãe quis que eu levasse
minha irmã junto. Eu usava uma linda roupa branca com uma flor lilás do lado
da blusa, mas não me conformava por ter que levar minha irmã, que era 6 anos
mais nova que eu. Então chorei muito com minhas amigas. Com o passar do
tempo, um dia Iran disse-me que, se eu emagrecesse, ele me namoraria. Pois
bem, consegui perder muito peso e quando um dia ele veio me pedir em
namoro e até levou um vinho para meu pai, eu o rejeitei e falei que não o
namoraria, e disse também que eu estava magra, mas não mais disponível
para ele, e que tinha que me aceitar como eu era.
Quando eu estudava inglês na Escola de Inglês Cultural tinha aula 2
vezes por semana, minha mãe me deixava na porta da escola e depois da aula
eu ia até as Lojas Americanas para comer club lasa, meu lanche preferido,
tomava um refrigerante e depois voltava e esperava minha mãe na frente da
escola. Sentia falta de passear, e não tinha tempo para nada porque meu
tempo era ocupado, pois tinha que ir para o colégio, estudava inglês, nadava,
ia ao catecismo, não parava um minuto durante o dia, e à noite estava
quebrada e dormia cedo.
Quando estava com 13 anos estudava no Colégio Hugo Simas e lá havia
a cooperativa onde comprávamos material escolar e também tinha cantina,
pois era um colégio estadual, assim sendo tinha merenda. Eu amava comer
arroz-doce, baião de 2, polenta com carne moída, e tínhamos também o Sr.
Nelson, grande figura do colégio. Ele era pipoqueiro e vendia doces tradicionais
de nossa época assim como doce de abóbora, geleias, enfim vários outros.
Como sempre, eu ficava paquerando os meninos do colégio, entre eles o João
Vicente, o Guilherme, via sempre o Lincoln pelo colégio, o André, e tinha
minha amiga inseparável, a Samea, uma libanesa que morava próximo ao
centro do lado da Padaria Central cujos pudins de leite eram maravilhosos.
Meu pai, que era matemático e zootecnista, trabalhava com números e
animais, ou seja, tinha uma banca de jogo de bicho e o pai da Samea
trabalhava para ele e sempre mandava deliciosas esfihas de carne, e todos os
dias nós ficávamos juntas na hora do intervalo. Tinha também o amigo
Sombreiro, nome dado a ele porque tinha cabelos enrolados, e na rua Hugo
Cabral havia um pequeno bar que tinha mesa de pebolim onde se joga o
futebol de mesa manipulando bonecos presos a manetes, que é jogado em
dupla. Era uma delícia matar aulas para jogar pebolim com minha turma,
geralmente éramos eu, Sombreiro, André, Samea, Carlinhos Mendes e meu
querido amigo Mario Brito. Essa era nossa galera com todos nós jogando

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sempre juntos. Tínhamos também outra brincadeira, que era fingir que
batíamos no telefone público e em seguida caía-se no chão como se
estivéssemos entrando em convulsão... essa era demais! Tinha outro amigo,
que era o Marcelo Guerchmann, e como ele morava perto de minha casa nós
sempre íamos embora juntos todos os dias até meu bairro, onde eu morava.
Era uma boa pernada, pois morávamos no Bairro Aeroporto, mas eu ia
andando feliz da vida.
Eu também tinha outras famílias com quem convivia, uma delas era a
família Stulzer, que era composta pelo Sr. Claudio e dona Nega, seus filhos
Claudia, Grace, Eduardo, José Maria e Tadeu, os genros Rui, ex-marido da
Claudia, e Claudio, ex-marido da Grace, os netos Rafael, Ruizinho, Lilian e pelo
nosso querido autista Kaka, filho da Grace, ou seja, Carlos Eduardo, hoje
adulto e frequentador assíduo da APAE. Essa família era a maior comédia, e
com eles eu me divertia e tinha grande apreço por todos. O senhor Claudio, um
alemão que mesmo mostrando toda a característica de sua origem um pouco
rude, me fazia rir muito quando ele dizia que em baile de branco eu não
entrava e nem de preto, e que eu iria ficar na janela porque não era preta nem
branca. Essa era uma de suas brincadeiras. Dona Nega, sua esposa, também
era uma amiga muito querida e dona de um humor indescritível que, além de
ser ótima cozinheira, era uma senhora simples, mas de conteúdo requintado e
nobre, e foi ela que me ajudou a segurar as pontas em períodos traumáticos de
minha vida, ela era descendente de italianos e vikings. Esse casal tinha filhos
lindos. Eu era apaixonada pelo Eduardo e dava presentes a ele tipo pôster ou
quadros de Chaplin, entre outras coisas. Ele era 7 anos mais velho que eu e
me beijava, me amassava e depois ia na frente de minha casa ficar com a
Adelia. Eu ficava muito mal, mas tudo bem. Eu sempre tive grande apreço pelo
José Maria, um homem sensível e querido que era o filhinho da mamãe muito
amado por ela, então aos domingos eu sempre ia almoçar na casa deles, pois,
como já havia mencionado, a dona Nega era bravíssima na cozinha, tanto é
que nos sábados à tarde ela já começava a preparar o almoço de domingo e o
mais legal era a jogatina de baralho. Eu gostava muito de jogar canastra, jogo
de cartas que pode ser jogado em duplas de parceiros e ficávamos até altas
horas jogando. Era muito gostoso e divertido, porque tínhamos bom humor,
falávamos parolaccias, ou seja, palavrões, porque durante o jogo podíamos ser
como queríamos. Para mim a melhor hora era quando Eduardo me levava
para casa e me dava uns amassos. Era um tempo bom aquele, mas sofrido,
pois eu sabia que ele não gostava de mim, só se aproveitava porque eu era um
pouco volúvel.
Outra família que eu também adorava era a de uns amigos muçulmanos
e seus componentes eram o Sr. José Kamar, sua segunda esposa Idalina,
seus filhos Janete, Alizinho, Farinha, Nadia, Samira, Alfredo, Fátima e Suad.
Eu gostava de ficar com a Janete, que era um pouco mais velha que eu. Janete
é libanesa, cuidava da casa, estudava e tinha um sonho: fazer curso de direito
e morar fora. A família era proprietária de uma loja de móveis que se chamava
Modelar Móveis e pertencia à família Kamar. Eu e Janete sempre estávamos

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juntas na cozinha ou dando uma volta nos arredores do bairro, paquerando e


descobrindo coisas novas. Aos sábados sempre havia jantares para os sheiks
na casa do Sr. Ali e nós, mulheres, ficávamos cozinhando para eles,
arrumávamos a mesa tipicamente como a cultura manda, e o cardápio era uma
delícia. Lá aprendi fazer alguns pratos árabes e Alfredo era estudante de
medicina em Pouso Alegre, mas sempre vinha a Londrina nas férias e nos
feriados para visitar a família, porém ele também ficava em São Paulo onde
seus irmãos por parte de pai residiam. Foi bem nesse vaivém que me
interessei pelo Alfredo e ele me paquerava, e já era experiente, e eu me
babava por ele, afinal ele era um estudante de medicina que estava a fim de
mim e já nessa época eu tinha 14 para 15 anos. Nosso hobby, quando ele
vinha para Londrina, era sair com a Brasília do Sr. Ali e comer pastel no Bar
Seleto. Janete tinha ciúme de nós dois e sempre ela tinha que ir na frente e eu
ficava indignada, assim a vida ia passo a passo. Certo dia, num fim de ano eu
tinha ganhado um disco de vinil da minha diva, titia Rita Lee, e ele, bêbado,
vomitou em cima do meu disco. Aquilo me fez sentir tanto ódio! Foi bem em
uma dessas idas e vindas dele que um dia ele me deu um beijo no portão de
sua casa. Aquilo para mim foi estranhamente bom, pois sentir uma língua pela
primeira vez na boca tem um poder enorme sobre a cabeça de uma
adolescente BV, ou seja, boca virgem eu não era mais. E foi aí que começou
um sentimentino strano per mio habib Shaui, mas ele gostava da Laila, uma
libanesa. Eu sabia bem como era esse turco, por isso não alimentava muito
esse amor. Teve um dia em que estávamos na parte de cima do sobrado onde
eles moravam e quando vi estava fazendo uma arte branca nada demais, e
ainda levei a culpa, pois o Sr. Ali nos pegou no flagra. Ele brigou comigo: “Olha
o que você fez, quando você tiver 18 anos vamos ao motel, aí te ensino tudo”.
Putz... iria ter que esperar mais tempo e assim la vita ia seguendo.
Um dia eu e Janete conhecemos uns moços lindos residentes de
medicina de uma república e eu comecei a frequentar o paraíso onde moravam
os meus novos amigos Lito, Drácula, Cassiano e Robertão, uau! Aquilo para
mim realmente era um paradiso. Nessa época eu estudava no Colégio Maxi e
agora que já conhecia Lito e nós nos dávamos muitíssimo bem, pois ele era
muito querido, sensível, além de ser um rapaz simples e inteligente. Como eu
já havia falado para minha mãe que estava indo mal na escola e que precisava
de aulas particulares de física, combinei com Lito para que ele me desse essas
aulas em minha casa. Minha mãe gostou da ideia porque ela sempre quis que
eu fosse uma boa aluna, então nos deixava sozinhos para que eu pudesse
aproveitar mais essas aulas e melhorar minha aprendizagem. E como graças a
Deus não era mais boca virgem comecei a beijá-lo durante as aulas
particulares de física que ele me deu.
Eu sabia que ele tinha uma namorada da idade dele, mas mesmo assim
nós nos curtíamos, porém os dias se passavam e comecei a pensar bem sobre
nossa relação. Pensava comigo mesma, ele me beija e tem outra, então que
vida era essa em que não se faz uma escolha? Pensando sobre isso, tomei a
decisão de também beijar o Drácula, e assim o fiz. Ele era de Presidente

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Prudente, tinha uma moto 125, era tímido e cantava muito bem, além de ser
um ótimo violonista. Um dia estava em casa e minha mãe avisou que Drácula
tinha ido em casa e que perguntou por mim. Não tive dúvida, fiquei esperando
e ele veio me convidar para beber uma cerveja e comer um aperitivo, o que me
fez sentir mocinha e valorizada pelos jovens médicos, porque, na realidade, eu
queria todos, mas sempre voltava para o Lito e para nossas aulas. Um dia fui
procurar o Lito e encontrei o Cassiano, um loiro bonito de Itapira, então nos
beijamos, e foi lindo ouvi-lo dizer na minha cara: “Se eu soubesse que ia
acontecer algo a mais, matava minha aula de inglês”. Mas não passou de
beijos, e eu ainda era uma menina virgem.
Um dia conheci uma família que morava numa casa ao lado da casa da
família Kamar, que era muito pobre e seus integrantes trabalhavam como
contrabandistas de produtos do Paraguai. Essa família era composta pelo
Gilberto (já falecido), Gilmar, Gilson, Tania e sua mãe, a Magali, e então
começamos a fazer amizade e um moço que se chamava Jonas me beijou e
depois de uns dias começamos a namorar. Ele ia à minha casa quase todo
dia, nos beijávamos e com o tempo ele me convidou para ir com minha família
até Guaraci, onde morava a família dele, e me deu um anel de compromisso.
Mas naquela época eu tinha 15 anos e o compromisso que eu queria era com
minha vida e não desejava me casar com ele. Como eu estudava no Hugo
Simas, ficava muito tempo com minha amiga Samea e ele tinha ciúmes de
nossa amizade, mas eu não aceitava isso. Certa vez ele me pegou pelo braço
nas Lojas Americanas e disse que eu não poderia ficar mais com minha
amiga. Não aceitei isso e terminei meu namoro.
No tempo de minha adolescência viajei para alguns lugares como
Cuiabá, Tangará da Serra, e também sempre íamos para São Paulo, porque
meus pais levavam eu e minha irmã para consultar um médico endocrinologista
com a finalidade de fazermos um tratamento para podermos perder peso.
Naquela época eu já tinha conhecido Minas Gerais também.
Tenho uma amiga muito querida chamada Josiane, outra libanesa por
quem tenho muito apreço, pois já tínhamos passado por muitas coisas juntas.
Ela tinha um primo chamado Horacio, que era um agrônomo que fazia
camisetas e acabou virando um empresário bem-sucedido da área de
confecções. Um dia eu viajei para Camboriú e estava atravessando a avenida
Atlântica, quando um carro parou em cima de mim fazendo o maior barulho e
buzinando muito, e quando olhei para quem estava dirigindo fiquei surpresa,
pois simplesmente era o Horacio, que me convidou para entrar no carro. Então
ele me beijou, abraçou e disse: “Você por aqui?”. Respondi: “Sim, estou de
férias com meus pais”. Fomos andar por umas bandas e trocamos só uns
beijos e nada demais. Mais fui caminhar na praia, pois é um lugar que amo
demais, tanto é que já conheci praias de todo o Brasil praticamente. Mas em
Santa Catarina, especialmente Camboriú, me arremete a tempos gloriosos, e
nesses dias eu estava acampada num camping muito legal com minha família
e conheci Rudi, um belo surfista de Florianópolis. Ao meio-dia entramos no mar
e fomos um pouco mais para o fundo. Ele tinha cabelos loiros longos e até

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seus cílios eram loiros, e sua aparência atraente chamava a atenção das
pessoas. Fiquei abraçada no pescoço dele e dando uns beijos ele dizia: “Ei
morena maravilhosa, você tem a temperatura na sombra a 200 graus”. Mas
naquele momento meu pai acabou interrompendo nosso amasso, assobiando
na beira do mar para que nós saíssemos da água. Fiquei muito revoltada com
aquilo e saí brava do mar e aquela situação broxante do meu loiro Rudi deixou-
o assustado. Enfim tivemos que sair do mar, ele desistiu de mim e foi embora.
No dia seguinte, por volta das 16 horas, eu estava catando conchinhas na praia
com minha tia Marcia quando apareceu um homem muito bonito e de físico
forte, mais maduro que eu. Ele estava com um carro Buggy e com uma galera
na praia e de repente disse: “Meu Deus! De onde você é?”. Respondi que era
de Londrina, em seguida quis saber meu nome, eu lhe disse e ele então se
apresentou: “Meu nome é Carlos Alberto Barbieri. Meu Deus! Onde tem mulher
linda como você?”. “Em Londrina”, respondi. Dali em diante ficamos batendo
papo na praia e logo ele me convidou para um Luau que iria ter à noite, mas
meu pai não deixou e eu fiquei desolada.
Fazia um ano que eu tinha feito uma cirurgia plástica nos seios com um
médico maravilhoso, pois minha mãe queria me levar para ser operada com o
Pitanguy, e na ocasião eu não tive coragem, mas ao passar de um tempo eu
operei, e 3 dias depois, ao ver o resultado adorei, pois meus seios ficaram bem
mais bonitos me deixando com a autoestima alta. E então ficamos vários dias
na praia, o que foi ótimo. No final das férias a volta para casa era sempre mais
demorada, porque estávamos mais cansados e queimados do sol. Enfim, na
viagem de volta da praia sempre costumávamos parar na lanchonete e
restaurante onde tinha deliciosas tortas, e a minha em especial era sempre a
de pêssego.
Era final de ano e as aulas começariam em fevereiro. Eu estudava no
Colégio Maxi e naquela época ficava dividida em meus pensamentos entre
estudo e diversão, e ficava em dúvida se estudava ou se me divertia porque,
naquele tempo, foi bom demais estudar no Colégio Maxi, onde fiz vários
amigos, em especial Valeria Manella. Cosi la vita seguea e eu, como sempre,
volta e meia frequentava a casa dos Stulzer, meus amigos alemães. E em um
certo sábado dona Nega me convidou para assistir a uma apresentação de
dança indiana e seguimos para o glorioso teatro Ouro Verde, considerado um
ícone do patrimônio cultural de Londrina, desde a época em que o norte do
Paraná vivia o auge do café, cujas plantações tornaram-se a maior renda do
Paraná. Quando chegamos nos assentamos bem na frente do teatro e logo a
minha querida dona Nega diz: “Filha, olha que moço lindo, vá até ele para
conhecê-lo”. E assim foi. Nós nos olhamos e seguimos para a mesma direção,
ele usava uma calça jeans e uma camisa branca, e eu um chemisier branco e
sapatos de couro, e no pescoço dois lenços em composé marrom com uma
linda concha de madrepérola. Naquela hora fui tímida e apenas nos
apresentamos dizendo nossos nomes. Ele se chamava Ody Silveira Junior,
mas como o espetáculo estava prestes a começar voltamos logo para nossos
respectivos assentos. Passaram-se os anos e eis que certo dia em que estava

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no Shopping Royal eu o vi vestido de branco na companhia de 2 lindos


meninos comendo lanche do Mc Donald’s. Fiquei vendo aquela cena e pensei
que ele devia ser médico e naquela época eu fazia faculdade na Unopar, mas
cada um seguiu suas vidas. Até que um certo dia, quando estava na
coordenação de meu curso de turismo e hotelaria, vi uma revista médica e
descobri que ele era um famoso cirurgião plástico, então não tive dúvida e
pensei comigo: “vou até ele e vou dar minha concha que usei no dia em que
nos conhecemos no teatro”, e assim realizei meu sonho. Marquei um horário
numa sexta-feira às 17:20h e quando o vi a emoção foi forte; ele era um belo
rapaz com um bigodinho charmoso e lindos olhos azuis. Conversamos sobre
amenidades e dei a concha a ele e disse-lhe, tímida: “Lembre-se do Titanic,
lindo romance aos meus olhos”. E assim foi e a vida seguiu.
Retomando minha vida, eu ainda estudava no Colégio Maxi, fazia
natação, comia comida macrobiótica, pois precisava perder peso e sempre
azarava pelo colégio e ruas de Londrina. Minha amiga Valeria tinha uma
mobilete preta e nós sempre saíamos com ela, com minha mãe sempre
tentando nos controlar, mas não adiantava muito, pois fugíamos de mobilete e
sempre íamos a lugares diferentes tipo o Bar do Souza, que era um lugar muito
legal, pois tinha roda de samba e aperitivos deliciosos, e lá ficávamos
paquerando os moços, foi um tempo muito gostoso aquele. Naquela época eu
já tinha 17 ou 18 anos, e sempre viajava para o Paraguai ou Argentina e
também para Cuiabá, entre outros estados. Na minha adolescência, aos
domingos minha família ia para o sítio dos seus familiares no distrito de
Maravilha e eu ficava em casa sozinha e, às vezes, com minha irmã. Quando
estava sozinha ficava no disk amizade, ou seja, 145, e também tinha uma
opção, que era dirigir o Monza azul de meu pai. Naquela época, a Avenida
Higienópolis era o point da cidade, pois lá aconteciam determinados eventos,
como a comemoração da copa do mundo, entre outras atividades, e era lá que
os carros subiam e desciam para que os jovens pudessem paquerar, o que era
muito bom e divertido.
Nas próximas férias retornei a Santa Catarina, especialmente para
Camboriú, viajando junto com a mãe e o irmão da minha amiga Graziela, cujo
apelido era Popó. Primeiramente fomos a Guaratuba ficando lá por uns dias, e
seguimos depois para Camboriú, onde fiquei em um camping sozinha em uma
pequena barraca enquanto Graziela e sua mãe ficaram no hotel do Candeias.
Tudo foi muito legal, embora tenha acontecido um acidente que assustou as
pessoas, quando um dia um rapaz, estudante de medicina, foi tomar banho e
levou um choque que o fez perder a consciência e a memória. Mas a rotina do
camping seguiu normalmente e nós nos divertíamos andando de bondinho, de
trenzinho, saíamos à noite, íamos à praia, enfim curtimos muito. Certa noite,
estávamos andando pela cidade e na frente da boate Moby Dick encontramos
um rapaz chamado Gerson, que era um lindo loiro alto, diferente e musculoso,
que estava de pernas esticadas na calçada. Por coincidência ele era amigo de
Graziela, então paramos e, papo vai, papo vem, ele acabou nos convidando
para irmos ao apartamento dele e lá fomos nós 3 na moto DT vermelha.

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Quando chegamos, começamos a conversar e logo percebi que ele estava a


fim da Graziela, mas acabou ficando comigo. Ele dizia que para beijar
precisava escovar os dentes e escovamos com close up vermelho, depois me
levou para o camping e no outro dia queria me levar para passear na montanha
de moto, mas tive medo e fiquei na praia mesmo. Eu e Graziela curtimos pra
valer aqueles deliciosos dias que ficamos na praia, depois seguimos para
Curitiba e ficamos na casa da avó de Graziela. Ela era uma senhora que
morava sozinha e muito querida, e nós andávamos pelo bairro em que ela
morava, que era próximo da Rua XV. Estava muito frio, mas, como nós
estávamos queimadas pelo sol da praia, levamos numa boa aquele clima ao
qual não éramos acostumadas. Ao voltarmos para Londrina, a mãe de
Graziela, que dirigira o carro na ida, também dirigiu na volta.
De volta para casa, logo começaram as aulas e no colégio nós
aproveitávamos bem o tempo. Minha amiga Valeria sabia bem como dirigir uma
moto e no intervalo sempre nós pegávamos a moto do Prof. Preto para comer
bolinho de carne ou queijo no Bar Lorena que existe até hoje, pois esses
quitutes são deliciosos. Naquela época, Valeria paquerava o Zé Roberto e nós
íamos até a casa dele para andarmos com sua XL, a qual também aprendi a
dirigir, pois era bom demais. Mas aos sábados o melhor programa mesmo era
ir ao Bar do Souza para paquerar e se deliciar com aquelas porções enquanto
a roda de samba corria solta. Na casa de meus pais sempre havia churrasco
nos sábados e os Stulzer sempre estavam junto conosco, e certa vez o Tadeu
nos apresentou a Ângela Luchesi e a Fátima, entre outras pessoas, e foi uma
tarde muito boa. A partir dali comecei a frequentar a casa da Ângela e uma
noite fomos fazer strogonoff, e lá estavam presentes também seus amigos
Marcelo Vendramini, João Marcelo e William. Enquanto estávamos cozinhando,
de repente ouvi Marcelo perguntar para a Ângela: “De onde apareceu essa
coisa, Ângela? Que linda...!”. E assim começou nosso affair. Depois de
comermos fomos ficar na frente do Balancê, embora estivesse fazendo muito
frio, pois estávamos em julho, em pleno inverno, e lá ficamos conversando até
tarde. Quando fomos embora, Marcelo me deixou em casa e me deu um beijo.
Pensei que não fosse vê-lo mais, pois ele morava em Votuporanga e tinha uma
namorada há 6 anos. Então segui minha vida normalmente sempre na
companhia de minha amiga Ângela. Certo dia mandei uma foto para o Marcelo,
e ele me ligou dizendo que viria até minha cidade, então fiquei à sua espera o
dia inteiro, mas ele não apareceu. Nessa época meu pai tinha um Gol creme e,
como eu já dirigia, resolvi pegar o carro e dirigi o dia inteiro, ansiosa, e nada
dele chegar, mas à noite ele apareceu pedindo mil desculpas e disse que iria
voltar com a ex-namorada, porém, se não desse certo, ele viria me procurar.
Mas eu estava com raiva e disse-lhe que nem que ele fosse o cocô do cavalo
do bandido eu voltaria para ele. E naquela mesma noite coloquei meu vestido
novo e fui com minha fiel escudeira Ângela ao Bar July Pop e lá encontramos
Fabrício, que era irmão do Marcelo e depois seria meu futuro marido. Ele
estava junto com sua namorada e quando me viu disse: “Meu Deus! O que é
isso, Ângela? Quem é essa menina?”. Ela respondeu: “A ex do seu irmão”.
Logo depois fomos embora e no dia seguinte Fabrício foi até minha casa. Ele

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estava com seu Fusca branco e ali começou toda uma história, pois sabendo
sobre minha dor de cotovelo pelo Marcelo ele grudou em mim. Querendo me
consolar ele me levava no Restaurante Veneza para comermos, depois
começou a ir até minha casa e, não deu outra, acabamos ficando. Ele me
beijou e assim iniciamos um relacionamento. Com menos de 1 mês
começamos a transar e fiz questão de que Marcelo ficasse sabendo, no
entanto quando eu e Marcelo nos encontrávamos nos dávamos muito bem,
pois sempre tive um grande apreço por ele. Eu tinha 18 anos nessa época e,
finalmente, depois de muito amasso graças a Deus não era mais virgem, no
entanto a vida seguia e eu via a olhos nus que o meu relacionamento não iria
dar certo, pois eu era muito diferente dele e não pensávamos igual nem nos
dávamos bem, mas continuava com aquele homem nem sei por quê. O final
daquele relacionamento foi uma gravidez depois de um ano e 3 meses de
muito sexo, mas muito mesmo, pois essa arte me fascina, e estando grávida
era mais ainda.
Estando grávida sabia da responsabilidade que eu teria com casa,
marido e um bebê que queria muito, mas não estava preparada para a
maternidade, e acabei entrando em depressão, pois eu fazia algumas coisas
em casa de manhã e chorava muito o dia inteiro. Numa noite quando
estávamos indo dormir, ele me ofendeu e eu revidei, mas o pior era o medo
que eu tinha do olhão que ele fazia, quando arregalava seus enormes olhos
verdes no escuro, então comecei a gritar e ele me pegou pelo pescoço, mas
escapei e fui para a casa de minha mãe que era perto da nossa. Já se via a
que nível nosso relacionamento chegara, pois na realidade nunca nos demos
bem, éramos imaturos, novos demais, sem estrutura emocional, com
problemas na família. Fabricio era filho de pai separado e já vinha de um lar
desestruturado e eu tinha um relacionamento ruim com minha mãe, enfim tudo
estava errado. O tempo foi passando, minha barriga foi crescendo e, como sou
hipertensa, no terceiro mês comecei a ter problemas, meus pés incharam
demais, eu ficava ofegante, enfim não era nada fácil. Entrando no quarto mês,
um dia fomos buscar minha tia Marlene em um hospital na cidade vizinha e
minha mãe aproveitou pedir para que a enfermeira aferisse minha pressão
arterial e ela estava altíssima, tendo dado 24x18. Por causa disso não queriam
me deixar sair daquele hospital, e minha mãe não teve dúvida e acabou me
levando para Londrina, onde fiquei internada num hospital por 2 semanas
vivendo um tédio total. Saí de lá num sábado de manhã e liguei para o meu ex-
marido, mas ele não ouviu o telefone, então liguei para meus pais e eles foram
me buscar. Ao chegar em casa, na hora do almoço já tive um desentendimento
com Fabricio, meu ex-marido, e por volta das 16 horas minha pressão estava
alta de novo e lá fui eu de volta para o hospital, onde fiquei internada por mais
uns dias, mas sempre estava mal.
Quando cheguei no sexto mês e uma semana de gravidez, meu médico
chegou em uma terça-feira de manhã e abriu o jogo me dizendo: “Olha, vamos
dar uma injeção em você para amadurecer o pulmão do seu bebê e vamos tirá-
lo na quinta-feira, pois já não estamos pensando mais no bebê e sim em sua

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saúde, afinal você pode ter um bebê de novo”. E foi assim que nasceu, no dia
10 de fevereiro de 1989, o meu pequeno grande homem que era para ser
chamado de Mateus, mas minha mãe e meu ex foram no cartório e o
registraram como Fabricio. Ele foi um vencedor desde o início, pois passou por
poucas e boas para conseguir sobreviver, tendo nascido com 6 meses e uma
semana pesando 1570 kg e 47 cm. Quando eu o vi pela primeira vez não
acreditei que ele fosse sobreviver, pois era um bebezinho frágil, respirava muito
mal e tinha um balão de oxigênio na cabeça, O que foi mais incrível que
ocorreu é que naquele mesmo período nasceram vários prematuros, não se
sabe o motivo sobre esse acontecimento. O fato é que alguns ficaram com
sequelas por falta de oxigênio na cabeça.
Como minha pressão felizmente já estava controlada, logo pude sair do
hospital, mas meu bebê ficou lutando pela vida bravamente e todos os dias eu
ia ao hospital para vê-lo, porque eu precisava tirar leite já que ele mamava 1 cc
por vez e pelo nariz, era uma situação deprimente, mas consegui passar por
ela graças ao apoio da família e do corpo clínico do hospital. Em abril meu
príncipe chegou em casa, ele era do tamanho de uma boneca, pesava agora
1900 kg e quando mamava era em uma pequena mamadeira de 30 ml, era
uma situação dificílima, mas levamos numa boa. Naquele mesmo momento
meu cunhado Marcelo sofreu um acidente que lhe causou uma fratura exposta
no tornozelo, e por ter tido problemas na casa de seu pai, acabou vindo para
minha casa para que eu pudesse cuidar dele, pois, além de ter machucado
feio, sentia dores terríveis. Como meu ex-marido trabalhava durante o dia e eu,
meu bebê e meu ex-cunhado e ex-ficante ficávamos em casa, era até divertido,
mas também cansativo, afinal eu era uma ex-filhinha de papai e ter que
assumir uma família e tudo mais não foi nada fácil para mim. Eu e Marcelo
conversávamos muito, sempre nos demos bem e tínhamos um bom papo, e
tudo era bom demais. Nessa ocasião Marcelo tinha uma namorada que morria
de ciúmes dele comigo, e eu tinha ciúmes dele com ela. Minha cabeça era um
inferno astral, mas la vita seguea e eu continuei levando aquela minha vida
nova de patricinha e mulher casada, com filho e família. Certo dia fiz o jantar do
Marcelo e coloquei numa bandeja como de costume e a namorada dele ficou
muito brava e tomou a bandeja de minha mão. Ele prontamente falou sério e
áspero com ela que todos os dias eu preparava a refeição e levava para ele e
nunca tinha dado problema, o que a deixou louca da vida. Então peguei meu
bebê e fui para a casa de minha mãe, ficando lá por um tempo e sentindo muito
ciúme, porque gostava dele secretamente. Uma outra vez meu ex-marido
disse-me: “Hoje tenho que levar o Marcelo no motel.” Perguntei com quem ele
iria e ele me respondeu que era com a namorada dele. Fiquei louca da vida
naquela hora, e hoje penso quanta imaturidade eu tinha naquela época...
Passado um tempo meu pai deu entrada em um apartamento para nós
morarmos. Era bem pequeno, mas afinal era nosso, e ali fiz bons amigos entre
os vizinhos, e quase todos eram famílias com bebês, então costumávamos
ficar no pátio brincando com nossas crias, o que era muito bom. Enquanto
meu ex-marido viajava a semana toda, eu sempre ficava sozinha e me habituei

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a resolver as coisas, foi então que resolvi fazer o vestibular para educação
artística em 1990, e passei e assim fui para a faculdade fazer o curso. Conheci
pessoas incríveis de várias das artes no Centro de Educação, Comunicação
em Artes – CECA, departamento da UEL. Naquele período da minha vida tinha
muitos afazeres e conheci e fiz vários amigos, em especial Regina Jorge,
Maristela (já falecida), Sueli, Marilza, enfim várias pessoas de quem gostava
muito, mas passou o tempo e eu estava desestimulada com meu marido e com
tudo, e depois de um ano e meio abandonei o curso e perdemos o
apartamento. Então nos mudamos para a rua da minha mãe, e eu cuidava de
meu bebê e fazia blusinhas de tricô para ele, eram bons tempos aqueles. Eis
que num domingo de manhã acordamos e fomos para a casa de minha mãe e
lá pelas 10:30h todos começaram a pintar a frente da casa dela. Comecei a
fazer o almoço e de repente senti falta de meu filho, que nessa época tinha 3
anos e meio. Nós começamos a procurar pela casa, nos vizinhos, em todos os
lugares e nada, não conseguimos encontrá-lo. Todos choravam muito, então
fizemos um mutirão e saímos todos para procurá-lo nos arredores e nada dele
aparecer. Ligamos para a Polícia e nos disseram que somente depois de 24
horas é que a polícia vai atrás para encontrar uma criança desaparecida, pois
ele não era uma criança especial. Quando liguei para a Polícia novamente às
13 horas, disseram-me que haviam localizado um garoto loirinho de
aproximadamente 3 anos e meio, que estava no Shopping Londrina, no centro
da cidade. Então fomos todos para lá, e ficamos sabendo que uma advogada
que já havia trabalhado com crianças havia visto um garotinho no meio de
crianças de rua e, ao notar que ele estava limpo e bem vestido, achou que ali
havia algo diferente e estranho, então ligou para a Polícia. E foi graças à
ligação dela é que pudemos encontrá-lo.
Meu ex-marido Fabricio continuava sempre viajando e meu pai sempre
nos ajudando financeiramente, contudo não havia nada de prosperidade e eu já
estava estressada com aquela situação, pois estava sempre sem dinheiro, não
podia fazer nada de diferente e aquilo me matava, mas a vida ia passando
lentamente como grão por grão numa ampulheta. Com 4 anos meu filho entrou
no Marista, que era um colégio muitíssimo bom e lá ia ele todos os dias. No
primeiro dia eu sofri ao deixá-lo sozinho na escola, mas ele foi com a sua
professora na primeira hora e me deixou sorrindo. Foi um ano de muita alegria
e doçura, mas seis anos depois, em 22 de fevereiro de 1994 eu e meu marido
nos separamos de fato e de corpos, e meu maior pesadelo estava prestes a
começar, porque eu não estava preparada para cuidar de um filho sozinha,
sem dinheiro, sem estrutura emocional e também sem uma família unida de
fato para me auxiliar. Quando fiquei grávida cheguei a engordar 36 quilos e
quando decidi me separar comecei a nadar na ACEL, então um dia eu nadava,
no outro dia caminhava. Eis que um dia fui ao Dr. Paulo Sakurai, médico por
quem tenho grande apreço e, por coincidência, soube que sua esposa, Edneia,
e seus filhos nadavam no mesmo clube. Lá foi onde fiz bons amigos, em
especial a Anadyl, que nadava junto comigo, e foi assim que em 8 meses
consegui perder 38 quilos e me tornar uma linda mulher. Assim a vida seguia
em paz, eu cuidava de meu filho, trabalhava com minha mãe na pequena

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confecção dela de uniformes profissionais porque, além de não ter tido


experiência em alguma área de trabalho, também não cheguei a me formar na
UEL, mas eu estava satisfeita comigo, porque sabia que agora eu era bonita e
tinha um filho de 6 anos, que todos pensavam que ele era meu irmão.
Quando meu ex-marido viu que eu tinha emagrecido, ele enlouqueceu e
queria voltar, mas não tinha mais jeito, porque eu já tinha mudado de casa indo
morar no Residencial Santos Dumont e sempre meu ex ficava dando em cima
de mim. Ma come la vita e bella seguea normalmente per altre scopo, em julho
de 1994 ele me fez a proposta de voltarmos e morarmos em Curitiba, tomando
a iniciativa junto com minha mãe, que sempre não se importava muito com o
que eu sentia ou pensava, na verdade, minha mãe sempre dizia que para ela o
que era mais importante era o bem-estar de meu filho. Pero tutto bene, e enfim
um dia ele me mandou as passagens para irmos para Curitiba, e lá fomos eu e
o meu fiel escudeiro Fabricinho. Quando lá chegamos meu ex não gostou de
eu ter levado meu filho, porque o que ele mais queria era curtir a vida comigo.
Foi um final de semana muito bom, mas quando chegou a hora de ir embora,
estávamos na rodoviária de Curitiba no dia 27 de julho de 1994 às 17:10h, e eu
estava na porta do ônibus com meu filho e meu ex-marido, naquele momento
chorávamos, pois não sabíamos ao certo como seria nosso futuro. Naquele
momento vi um homem de calça de moletom cinza usando uma camiseta
branca e tênis, que segurava uma pasta de trabalho nas mãos enquanto nos
olhava atentamente e o ônibus da Ouro Branco esperava os passageiros
entrarem. Aquele homem tinha uma aparência diferente, era alto, de olhos
azuis, usava barba e não parava de me olhar. Enfim, depois das despedidas,
eu e meu filho finalmente entramos no ônibus e fomos para nosso assento, que
era o último, e olhando pela janela chorávamos fragilizados pela separação,
porque mesmo não amando mais meu ex-marido, permanecia o vínculo entre
pai e filho, mas pensando racionalmente sabíamos que isso não iria segurar
nosso casamento, já que não existia mais nada entre nós.
A viagem seguiu tranquila e na metade do caminho paramos no
restaurante Soledad. Aproveitei para levar meu piccolo bambino in bagno per
fare pipi, e quando chegamos no balcão para comermos alguma coisa vi um
belo homem de olhos azuis que me olhava descaradamente, enquanto comia
uma coxa de frango frita tranquilamente. Fizemos um lanche rápido e
retornamos ao ônibus para prosseguirmos a viagem, era uma noite de domingo
e quando chegamos a Londrina aquele homem, cujo nome era Newton
Geronazzo, pediu meu telefone. Naquele momento percebi que ele tinha uma
aliança, mas mesmo assim dei a ele meu número de telefone, e em seguida
fomos embora para casa. Na segunda-feira o dia passou normalmente e meu
filho dormiu na casa de minha mãe e à noite eis que toca o telefone e minha
história muda. Era ele. Chovia muito naquela noite e nós ficamos 2 horas e
meia no telefone conversando sobre amenidades e sobre tudo. Eu tinha 27
anos e ele, 34, afinal, éramos jovens e formávamos um belo par. Depois de
quase 2 horas de conversa pelo telefone, ele me convidou para sair e eu
concordei, pois nos demos muitíssimo bem. Então peguei meu possante, já

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que eu tinha ganhado de meu pai um Fusca Fafá bege e fui para o hotel
Sahão, e, chegando lá, vejo um homem muito atraente usando calça cáqui de
linho, uma camisa de listas de cores creme e cáqui e sapatos marroquinos na
cor marrom. Ao vê-lo, fiquei enlouquecida, mas me controlei, tivemos uma
conversa rápida e saímos dali para irmos beber alguma coisa no Bar Pink, na
rua Maringá. Era tarde da noite, o bar era simples, mas tinha seu charme
devido à presença de gatos soltos no ambiente. Sentamo-nos para beber
alguma coisa, nos apresentamos e eu o indaguei sobre a aliança, mas ele
respondeu que não tinha. Sabendo que ele estava mentindo, fui franca e disse-
lhe que ele tinha sim, pois eu havia visto, foi aí então que ele resolveu
confessar a verdade e começou a falar sobre sua pessoa. “Tudo bem, vou me
apresentar. meu nome é Newton, tenho 34 anos, sou casado com uma mulher
9 anos mais velha que eu, tenho um filho de 4 anos e não sou feliz. Acho que
não conheço esse tal de amor.” A partir dali, víamos que nos dávamos bem e
desde o primeiro momento falei de meu casamento, que tinha um filho pequeno
para cuidar e sobre o que eu tinha ido fazer em Curitiba. Quando ele contou
que era consultor de informática, disse-lhe que eu ainda não tinha completado
minha formação. Depois dessa conversa inicial nos beijamos, e naquele
momento no bar estava tocando ”Killing me softly”, uma música de Roberta
Flack. Naquele momento ele me disse: “Vamos eleger essa música como
nossa”. Eu era baixinha perto dele, então fiquei em cima do meio-fio e ele na
parte de baixo, nos beijamos e foi ótimo aquele momento, embora eu tenha
sentido medo de me envolver, mesmo assim continuei com aquele homem,
pois desde o primeiro momento tudo foi mágico, e lá pelas 3 da manhã fomos
embora. Deixei-o no hotel feliz da vida, já que aquela era minha primeira
experiência depois do casamento que realmente tinha mexido comigo.
Ele fazia consultoria na Sercomtel e a partir daquele encontro me
convidou para almoçarmos juntos no dia seguinte, então fomos ao Veneza.
Conversamos amenidades do dia a dia, sobre trabalho, enfim podíamos ser
nós mesmos sem barreiras, pois, além de nos darmos muito bem desde o
começo, as coisas fluíam naturalmente. A partir daquele dia, sempre depois de
almoçarmos, eu com meu possante o deixava na empresa, à noite íamos
sempre jantar fora e o levei ao Vilão, nosso bar, nossa referência de amor, de
conversar de relaxar, de comer, tomar vinho... enfim, na terceira noite fomos
ao Cinco Coelhinhos. Eu estava me sentindo meio sem jeito, pois era recém-
separada, mas ele era uma pessoa experiente e conduziu a situação muito
bem, e foi ótimo. Depois fomos embora e eu sempre dizia que estava com
medo de me envolver, porque ele era casado e eu poderia me machucar com
esse nosso relacionamento, mas ele sempre dizia: “Que nada... fique
tranquila”. E assim fomos nos envolvendo, durante a semana nós ficávamos
juntos em Londrina e na sexta-feira à noite ele voltava para Joinville e eu
descansava o final de semana porque fazíamos amor muitas vezes, era uma
loucura. Então no final de semana eu recarregava as energias, pois ele ia
embora na sexta e voltava no domingo à noite. Quando ele chegava, para mim
era um êxtase, afinal eu amava muito aquele homem, nosso relacionamento
era perfeito, nunca brigávamos, sempre conversávamos sobre tudo e

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chegávamos a consenso. Gostávamos de beber à noite um bom vinho e fazer


amor, muito amor, conversar e mostrar muito carinho, e de frequentar nosso
bar predileto, que era o Vilão, onde nos beijávamos muito, e rolavam também
uns pezinhos debaixo da mesa para esquentar a relação. Depois dormíamos
na minha casa e de manhã íamos trabalhar, na hora do almoço eu ia com meu
super fusca pegá-lo para almoçar e íamos a diversos restaurantes em
Londrina, depois ele ia para minha casa à noite. Para mim era mágico estar
com ele, eu costumava nadar quase todos os dias e estava com uma cor linda,
o que me fazia sentir uma bela mulher e isso para mim era uma sensação de
poder.
Era inverno e um dia depois do almoço fomos ao Zerão, lá deitamos na
grama de mãos dadas e ficamos olhando as árvores e conversando como se a
vida não tivesse pressa. Lá no lago nós tínhamos nosso banco onde às vezes
eu sentava em seu colo ou ao seu lado simplesmente para conversar,
enquanto ele dizia que só estava faltando uns patinhos nadando para aquilo
ser um quadro perfeito. logo chegaram – se os patos mas ele não estava mais,
Já tinham se passado alguns meses e ele me convidou para ir a Palotina.
Fiquei com medo, mas aceitei, então nos encontramos em Curitiba e logo o vi
de camisa lilás numa escada lindamente me olhando, e fomos ao encontro um
do outro, nos beijamos e nos afagamos. Em seguida fomos guardar as malas,
e depois de um tempo seguimos para Palotina. Durante a viagem de ônibus,
íamos nos amassando enquanto eu ficava recostada no peito dele, pois era
assim que dormíamos toda noite. Chegando a Palotina ficamos no Hotel
Dallas, que era um hotel simples, mas tinha piscina, e era lá que eu ficava
durante as tardes até ele chegar da cooperativa onde dava consultoria. Quando
ele chegava, nós nos amávamos como loucos apaixonados e depois íamos
jantar em pequenos restaurantes da cidade. Ele me via na piscina e dizia que
queria me ver com um maiô branco e naqueles dias teve uma noite em que
choveu e acabamos tomando chuva juntos, então nos beijamos muito e
ficamos nos abraçando e amando, sem nos importarmos com a chuva
molhando nossos corpos. Os dias passaram rápido, ele terminara o trabalho de
consultoria na cooperativa, então chegou a hora de voltarmos para nossas
casas e, na viagem de volta, como de costume, vim com a cabeça deitada
sobre seu peito, mas percebi que ele estava diferente, porém parecia que
estava tudo bem. Finalmente chegamos a Curitiba e de lá ele foi para Joinville,
eu voltei para Londrina e assim la vita seguea normale.
Eu tinha uma amiga querida, a Regina, e os amigos José Márcio, Alex,
além da Geny, hoje já falecida, e à noite sempre íamos à casa de Alex para
dançar e beber cerveja. Sua família era gaúcha por quem eu tinha muito
apreço. Na sala da casa da Geny tinha uma vitrola onde colocávamos discos
para dançarmos. Um dia levei o meu lindo prince Newton, naquele dia eu
estava com um vestido curto preto e usava um colar Cleópatra, e ele estava
elegante como sempre. Passamos um bom tempo lá e depois fomos embora
passear com meu Fusca Fafa e aí o coro comia porque rolava altos namoros
naquele carro... tempos bons aqueles. Certa noite, fomos ao Vilão, bebemos

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um pouco e em seguida fomos para a estrada atrás do Shopping Catuaí,


sempre brincando e papeando, então descobrimos a estrada da nossa vida.
Aquela estrada é linda e enquanto ele estava dirigindo fomos nos beijando, eu
via que as copas das árvores na beira da estrada iam se encontrando umas
nas outras formando um túnel. Até fizemos amor dirigindo, o que foi uma
grande experiência, e assim acabamos elegendo aquele caminho como nossa
romântica estrada. Depois voltamos para nosso ninho de amor e dormimos
abraçados como sempre, eu me sentia feliz, mas muito feliz naquela época, e
costumava dizer que não havia no mundo mulher mais feliz que eu, pois tinha
certeza disso.
Certa manhã ele me ligou e fez um convite: “Vamos jantar com o
Fabricinho hoje. Deixa eu falar com ele?” . Na época meu filho estava com 6
anos e conversou com ele e disse-lhe: “Aceito jantar com você e depois quero
ir numa sorveteria, tá?”. Chegou à noite e fomos ao Shopping Catuaí,
comemos uns sanduíches e Newton perguntou ao Fabricinho se ele queria
outro, e naturalmente ele disse que queria sim. Então pegou-o pela mãozinha e
lá foram os dois até o balcão. Fiquei vendo aquele cena maravilhada, depois
tomamos sorvete e fomos para casa como de costume, passado algum tempo
e a campainha tocou. Era minha mãe, como sempre repressora e brava. Abri o
portão e perguntei se tinha acontecido alguma coisa: “Quem está aí?”
Respondi: “Nós três”. Ela entrou como um homem e, muito brava, estendeu a
mão para Newton e foi lhe dizendo: “Olha, o que você está fazendo aqui, se
você tem compromisso? Você tem filho, não é mesmo? Então primeiro vá
resolver sua situação e depois volte. Você quer casar com minha filha? Você
ama minha filha?”.
Ele dizia: “Não sei se amo ou não amo, só sei que nunca senti nada
parecido por ninguém, como é meu sentimento por ela e nem sei se vou casar
ou não”. Em seguida, Newton olhou para mim e falou: “Querida, fique quieta,
não responda...” E depois de ter destruído minha noite e tudo, minha mãe foi
embora, e o clima entre eu e Newton infelizmente ficou péssimo. Ele ficou
passando as mãos no cabelo, estava muito nervoso e foi embora para o hotel
enquanto eu fiquei chorando e aí tudo mudou. Depois ele me disse: “Sua mãe
é só um lado da moeda, e se nós ficarmos juntos ela não vai passar de ser
uma visita com um pouco mais de liberdade em nossa casa”. Por tudo isso que
passei, cheguei a odiar minha mãe por ela ter destruído a coisa mais linda de
minha vida.
Estávamos em outubro e, com tudo aquilo acontecendo, meu amor se
distanciou e tudo mudou. Certo dia, estávamos no quarto e ele me mostrou a
foto de seu filho Arthur, em seguida ligou para ele, que estava na casa da avó,
e ouviu-o dizer: “Oi papai, estou na casa da vovó fazendo bagunça”. Eu era
jovem, amava todo mundo e já queria pertencer a ele, e assim fomos levando
nosso relacionamento adiante até maio de 1995 quando finalmente tudo
acabou. Levei-o pela última vez até a rodoviária e quando ele entrou no ônibus
e ficou me olhando chorei muito.

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E assim ele foi embora para nunca mais nos pertencermos um ao outro,
no entanto, eu não parava de pensar nele, e passei um período de muito
sofrimento que foi bem maior do que eu poderia suportar. Cheguei a sofrer de
gastrite nervosa e andava curvada, porque sentia muita dor no estômago e
comecei também a sofrer de insônia, o que foi muito difícil para mim, pois era
uma grande dificuldade conseguir dormir a noite inteira. E pra piorar minha
situação, num domingo ladrões entraram em minha casa e levaram todas as
minhas joias, e alguns dias depois descobri que esses algozes ladrões tinham
me observado durante 1 semana antes de cometerem o delito. No dia do roubo
meu ex-marido comentou sobre o que os ladrões tinham roubado, pois ele
havia entrado em minha casa e perguntou se haviam roubado alguma coisa de
nosso filho porque ele só se preocupava com isso, Fiquei muito nervosa, pois
já odiava esse homem, estava sem meu ex-amor, e tudo aquilo que estava
acontecendo era demais para mim. Foi nesse momento que me vi sozinha,
pois havia muitos problemas com minha família e tinha meu filho para criar.
Com tantas aflições acontecendo em minha vida, pensei muito em procurar
ajuda profissional e comecei a ir a uma psicóloga chamada Estela, e com ela
comecei a fazer análise até 2 vezes por semana. Como eu chorava demais,
quando saía da terapia, ia caminhar no Lago Igapó e chegava a andar uns 11
quilômetros por dia às vezes, aquilo me fazia sentir melhor, e um dia, quando
estava indo para o lago, jurei que não amaria mais ninguém porque se amor
era passar por tanto sofrimento não queria mais aquilo.
Eu trabalhava com minha mãe na pequena confecção dela de roupas
profissionais e a ajudava nas vendas, no corte, na costura, em tudo, e me
sentia tão sensível que não gostava de ficar sozinha e queria sempre aos finais
de semana ficar com minha mãe. Mas minha tia Dirce começou a mandar na
casa de minha mãe e dizia: “Você vai para sua casa com seu filho porque
minha irmã quer descansar”. E assim íamos eu e meu filho para nossa casa
que ficava no Residencial Santos Dumont e lá ficávamos. Mas à noite eu não
dormia, me sentia abandonada desde que Newton fora embora e nas longas
noites ouvia músicas do João Mineiro Marciano, passava roupa até de manhã e
via sempre o sol nascer. Minha pressão arterial subia e naquela época minha
única diversão era caminhar ou ir nadar na AREL. Um dia descobri que minha
amiga Silvia estava morando no mesmo condomínio em que eu morava.
Silvinha era professora de matemática de meu irmão e uma pessoa muito
esforçada, que sempre estava comigo, me dava força para continuar e me
estimulava a sair, pois naquela época havia a Kauali, que era uma casa de
shows de música sertaneja que fazia grande sucesso, e às vezes eu ia com
ela para me divertir um pouco. Silvia, Sandrinha, Luzia e eu éramos jovens,
mas meu filho ainda era pequeno e ficava difícil sair muito com elas, pois eu
sempre estava trabalhando e levando meu filho na escola e ao Kumo para
fazer o curso, enfim tinha que fazer as coisas que uma mãe faz. Mas eu odiava
trabalhar na confecção, pois lá passava por humilhações que partiam de meus
pais, mas também de meus irmãos, os quais, por serem mais jovens, se
achavam no direito de mandar na casa de meus pais, pois eles moravam lá e
nós tínhamos que seguir as regras.

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Um dia tive uma discussão com meu irmão Gabriel e ele me empurrou
com tanta força que acabei batendo a parte de trás da cabeça, e isso acabou
causando uma alteração e formigamento no meu corpo todo. Naquela hora
meus pais estavam chegando de uma caminhada e meu irmão me levantou,
por motivos banais.
Em 1998, um dia vi um anúncio de um curso de comissária de bordo no
aeroclube de Londrina e, naquele momento, já fazia bastante tempo que não ia
até a casa de minha mãe de tanta desavença que acontecia. E foi pela janela
que ela me atendeu. Eram umas 19 horas e eu lhe pedi se seria possível ela
pagar esse curso para mim, e assim foi que comecei a estudar no aeroclube,
onde fiz amigos e estudava uma apostila enorme. Eu me achava super fashion
e a Samanta era raio laser e virávamos noites e mais noites estudando para
passar na banca do DAC. Eu tinha meu super Fusca Fafá e ia com ele para
todos os lados e fiz vários amigos que eram pilotos, estudantes do curso de
comissária de bordo, professores e depois das aulas nos íamos passear pela
cidade, e às quartas-feiras íamos na Friends, que era uma boate super
interessante frequentada por pessoas que queriam ver o mundo cor-de-rosa.
Na entrada sempre havia umas maravilhosas drag queens e aquele mundo era
mágico, onde nós nos divertíamos pra valer dançando altas músicas e vendo
gogo boys maravilhosos. Assim era o delicioso mundo da aviação, pois
podíamos fazer quase tudo. Eis que um dia ia ter show da minha diva Rita Lee
e eu ia ao show com certeza, então antes de ir para o aeroclube, quando
estava indo para a boate Cinema Café onde ia acontecer o show, eis que num
cruzamento perto do evento uma caminhonete cinza me pára e eis que vejo um
loiro maravilhoso que me disse: “Vou te convidar para jantar e não aceito não
como resposta”. Ele se chamava Fabio e me pediu o telefone e eu dei, mas
não imaginei que realmente ele fosse ligar para mim, pois não tinha apostado
todas as fichas nesse convite, mas no dia seguinte ele me ligou e fomos ao
Vilão para tomar um vinho. Ele era um gentil veterinário, maravilhoso, cheiroso,
muito educado e começou a me indagar com relação à minha vida pessoal,
minha formação, enfim, queria me conhecer e eu, naquela época, era apenas
uma estudante de comissária. Quando saímos do Vilão ficamos deitados na
caminhonete entrelaçados, enquanto pessoas que estavam dentro do bar nos
viam, mas nós não estávamos nem aí e levamos tudo numa boa. Depois de
alguns amassos muito bons, ele me levou para casa nos braços dele enquanto
escutávamos umas músicas lindas. Ambos éramos jovens, lindos e
irreverentes, e chegamos ao meu modesto apartamento. Ele quis dormir na
minha casa, mas como eu disse que não seria possível, ele nunca mais
apareceu, o que me deixou frustrada, pois adorei aquele loiro italiano, ma la
vita e cosi piano piano ci arriva il scopo giusto bene bene, ma una volta era la
vita chi ci seguea.
Eis que finalmente chegou o dia de nossa prova e vieram os militares de
Canoas para nos aplicar a prova no hangar do aeroclube, então fizemos a
temida prova e, felizmente, passei com notas altas e finalmente recebi meu
CCT com láurea. Enfim, Soraya super fashion tinha passado e assim, após o

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final do curso, eu e Samanta tivemos que ir para Canoas para fazermos


exames no Hospital Aeronáutico e deu tudo certo. A viagem foi muito divertida
e quando chegamos já era certa a nossa sobrevivência na selva, pois bem, em
uma sexta-feira cheguei ao Aeroclube, onde os tenentes militares bombeiros
Natal, Dorival e Tomzar nos orientaram para irmos para o hangar. Chegando lá
estávamos todos juntos e fomos divididos em grupos, em seguida o tenente
Dorival jogou no chão várias jararacas e cascavéis e nos disse que todos iriam
ter que pegar na cobra utilizando a técnica de imobilização dos répteis. Esse foi
um dos maiores traumas de minha vida porque eu não tinha coragem de pegar
na cobra e o tenente me disse: “Você vai reprovar no DAC”. “Tudo bem, o
medo é maior que eu” – disse para ele. e via todos pegando na cobra,
enquanto eu e mais umas 3 meninas não conseguíamos pegá-las. Foi então
que ele me ordenou: “Senta no chão!”. Eu sentei na hora e ele colocou uma
cascavel enorme entre minhas pernas e naquela hora sentia o coração bater
forte e minha jugular pulsava demais. Quando saí daquela situação fui para a
casa de meus pais e chorei muito enquanto contava a eles o que havia ocorrido
e ambos só me olharam. Então meu pai disse em seguida: “Deixa quieto e
basta”. Isso me convenceu e acabei voltando para concluir o curso.
Para continuar a sobrevivência nós podíamos levar uma mochila com
remédios, 1 maiô, produtos de higiene, sal, guloseimas tipo bolachas, iogurte, o
que quiséssemos, e uma muda de roupa embrulhada em saco plástico. Bem
antes de entrarmos no ônibus os militares tiraram de nossas mochilas as
comidas e deixaram apenas uns pacotes de bolachas em algumas delas, e
finalmente entramos no ônibus, e seguimos em viagem para a Usina 3 Bocas.
Lá encontramos equipamentos de marinharia e a Giselda, nossa galinha que
iria ser morta, em seguida fizemos fila na estrada de chão com um pelotão dos
dois lados da estrada e começamos a caminhar pela noite adentro até
chegarmos a um rio onde fora jogado óleo diesel para a água pegar fogo que
nós teríamos que enfrentar. Portanto cabia a nós realizarmos mais essa prova
que era apagar o fogo, então assim fizemos e cumprimos nossa prova, e
mesmo molhados e com frio continuamos a caminhar. Logo depois tivemos que
rastejar bem baixo na água porque havia fios de nylon esticados que poderiam
cortar nosso pescoço e cada um estimulava o outro, e assim prosseguimos
sempre caminhando pela noite adentro. Quando chegamos à casinha da
fumaça era quase de manhã e tivemos que entrar nela para pegar objetos que
estavam espalhados pelo chão. A fumaça era intensa e sufocava, e quando
erguíamos a lona para respirar nos empurravam de volta, já era de manhã e
todos estavam exaustos, com fome e sede, pois tínhamos andado a noite
inteira, e fomos atrás de uma casa para fazermos xixi coletivo. Todas nós
descobrimos que algumas tinham levado bolachinhas na mochila e dividíamos
uma bolacha recheada em 4, sendo apenas um pequeno pedaço para cada
uma, e isso para mim foi uma grande lição de vida muito grande, pois me
aguçou o sentimento de solidariedade e penso que todos deviam passar por
uma experiência de sobrevivência, porque numa situação assim somos uns
pelos outros. Em seguida descansamos um pouco e seguimos em nossa

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aventura caminhando pelas fazendas enquanto uma equipe de televisão nos


acompanhou por um longo período.
Também tivemos que pular num fosso com água suja e sair rapidamente
e, em seguida, quando começamos a subir para a entrada da mata havia uma
plantação de inhame e um dos tenentes pegava aqueles inhames da terra, nos
fazia abrir a boca e comer, e seguíamos adiante. Éramos dois grupos e os
tenentes precisavam saber o azimute certo, ou seja, o rumo verdadeiro para
que as equipes se encontrassem, pois nossa equipe pegou o rumo errado e
nos perdemos ao caminharmos uma noite toda pela mata fazendo picada,
cortando o mato para podermos passar e revezando os equipamentos,
enquanto dona Giselda fedida ia de mão em mão. Assim foi nossa noite e
então tivemos que soltar nosso rojão de segurança para que a outra equipe
pudesse nos achar, mas nada de sermos encontrados, e tivemos que enfrentar
a mata à noite, pois ela é fria, muito fria. Até que chegamos num rio e sempre
que se chega a um rio deve-se seguir o seu curso, então nós ficamos à beira
do rio para dormirmos com os pés nas árvores e fizemos uma fogueira para
que os animais não chegassem até nós. Também bebemos uma cachaça para
esquentar, e nossa Giselda estava salva já que ninguém comeu a galinha, e de
manhã todos tomamos banho no rio, que foi ótimo, depois gritávamos para que
a outra equipe pudesse nos localizar, mas ninguém aparecia. Até que,
finalmente, lá pelas 11h da manhã o tenente Tomzar nos achou seguindo o
curso do rio, então prosseguimos juntos no rumo verdadeiro, e lá pelo meio-dia
e meia estávamos todos sem energia, porque ficamos sem água e também
sem comer desde sexta à noite e já era domingo na hora do almoço. Em
seguida teve a marinharia, da qual não participei porque estava em outra
equipe, mas tínhamos um desafio para encarar, que era atravessar um rio que
era grande e tinha muita correnteza, e nossos tenentes nos orientavam como
havíamos de fazer. Viviane, que foi comissária da TAM e fundadora de nossa
escola, participou de nossa sobrevivência e seu nome de guerra da aviação era
Valentina. Como já havíamos feito a falsa baiana anteriormente, agora deveria
ser mais fácil, então atravessaram uma corda de um lado até o outro e
dávamos as mãos umas às outras até chegarmos no outro lado do rio, il sole
ero cosi scaldante cosi terribile e ainda tínhamos somente que subir e
atravessar um campo de milho até chegar à estrada que nos levaria à fazenda
J 4, e assim subimos. Mas quando chegamos na estrada, Rita entrou em
choque e teve que levar um belo tapa no rosto para acordar de novo e nesse
momento parou uma caminhonete na estrada. O motorista olhou para nós e já
foi dizendo: “Coloque ela aqui dentro e você lindamente suja aí entre também”.
Assim tive sorte de ir para a fazenda de caminhonete e chegando lá estavam
fazendo um churrasco que rolou ate à noite. Para meu prazer o tenente Dorival
foi pegar uma cerveja no tanque e eis que havia um sapo lá que o fez gritar, e
claro que nós amamos, pois descobrimos o ponto fraco dele. Já o nosso medo
eram as cobras, enquanto o dele era o sapo. Naquela sobrevivência de sexta à
noite até domingo à noite acabei perdendo 4,500 kg.

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Passado um pequeno tempo depois que pudemos voltar para casa,


houve uma tragédia que nos marcou muito. Em um sábado muito frio e
chuvoso eu estava na aula de inglês no Cambridge e quando cheguei na casa
de minha mãe vi na televisão que Jack e Vivian haviam morrido juntos num
acidente de carro e ela estava grávida de 5 meses. Aquilo foi um choque para
todos, pois éramos unidos, então seguimos para o Aeroclube a fim de saber o
que faríamos e quem chamaríamos para que o evento fúnebre fosse realizado.
No velório estávamos todos vestidos de comissários e comissárias.
Depois da ocorrência desse triste acidente, a escola de comissária
perdeu um pouco de sua magia. Mas tínhamos que prosseguir nossa vida, e
naquela época eu e meus amigos frequentávamos o Beco, que era o bar do
Jack, cujo ambiente era muito bom, e costumávamos ir lá para sentarmos e
batermos papo juntos naquele lugar tão gostoso. Depois aconteceu nossa
formatura, que foi no Empório Guimarães, tendo sido uma festa muito linda.
Fiquei muito feliz por ver que todos os meus amigos e também meu pai, Estela
e Fernando compareceram. Foi tudo muito gostoso, e após a formatura eu e
meus amigos fomos para o Friends dançar e lá ficamos até altas horas da
noite.
Depois da formatura, comecei a correr atrás de emprego como
comissária, mas eu teria que morar em São Paulo e tinha meu filho Fabrício,
que na época estava com 9 anos, para cuidar. Então pedi para minha mãe
cuidar dele para mim, porém ela simplesmente me disse: “Quem pariu Mateus
que balance o berço”, ou seja, cada um que cuide de seu filho, la vita seguea
un’altra volta pero no faccevo niente. Então decidi prestar vestibular
novamente, porque em 1994 eu havia prestado para contábeis e tinha
passado, então cheguei a fazer o curso durante 6 meses à noite, mas com filho
pequeno não era fácil, pois ou eu o deixava na minha mãe e às vezes levava
comigo, ou cuidava dele. Então parei a faculdade e em 1999 prestei vestibular
para turismo e hotelaria em julho daquele ano e comecei a estudar em
fevereiro de 2000, tendo iniciado meu curso na Unopar – Campus Piza O curso
havia começado naquele ano e tinha várias matérias interessantes, assim
sendo estávamos todos juntos na mesma barca. Com o curso seguindo
normalmente, eu e minhas amigas azarávamos à noite indo comer um salgado
que se chamava jacaré no Bar do Renato e aquilo era uma delícia, mas
também paquerávamos bastante e para nós tudo era bom demais, e assim o
tempo foi passando. Naquele ano nós tínhamos aula de estatística, que era o
nosso calcanhar de aquiles, mas vencemos aquela etapa em outubro.
Um dia eu tive que operar a cabeça para tirar um lipoma e sentia muita
dor e à noite estávamos todos na frente da Unopar na hora no intervalo,
quando Samuel, namorado da amiga Ana Paula, disse-me que ele tinha um
amigo para me apresentar. Perguntei-lhe quem era essa pessoa e ele
respondeu que era um italiano e operário de alto nível de uma multinacional
que viaja ensinando os funcionários das fábricas da Europa inteira, e também
veio a Cambé para realizar esse trabalho. No dia em que conheceu Giuseppe
soube que ele não falava português, e Samuel sabia que eu conhecia um

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pouco a língua italiana, porque em 1990, quando eu fazia educação artística na


UEL, tinha feito também um curso de italiano e compreendia um pouco essa
língua. Mas embora eu não falasse tão bem o idioma e era pouco o vocabulário
que eu sabia, assim mesmo acabamos nos conhecendo aos poucos e
começamos a namorar. Ele estava hospedado no Bristol e sempre ficávamos lá
para aproveitar o flat, naquele período eu não tinha muito tempo disponível
para namorar, pois fazia faculdade, estágio, fazia curso de inglês aos sábados,
cuidava de casa, e cuidava de um filho também, o que era muita coisa que me
deixava ocupada o dia inteiro. Devido a isso, começamos então a namorar à
noite e quando ia para a faculdade deixava o Giuseppe na minha mãe que não
falava nada de italiano. Ele ficava lá e, quando eu chegava, dizia que não
suportava piu nessuno ci fa capire, o que me fazia rir muito, e assim seguíamos
nossa vida. Saíamos para almoçar, para jantar, para passear e um dia meu
filho estava tocando trompete no Shopping Royal, pois era dezembro e fomos
vê-lo tocar com sua banda. Ele ficou branco e senti pena, mas eu estava
namorando pela primeira vez depois de 7 anos, então encaramos a criança.
Depois Giuseppe foi embora para a Itália, especificamente para Scandolara,
província de Cremona, bene allora ele me ligava duas vezes por dia e chorava.
Eu não o amava, mas gostava de conversar com ele, e quando foi no Natal ele
me ligou e me convidou para viajar até a Itália para conhecer a sua família.
Fiquei com um pouco de medo porque nunca tinha viajado sozinha para o
exterior, mas meu amigo Black me incentivou a colocar o pé na estrada, e isso
me entusiasmou, então, decidida, aceitei o convite de Giuseppe e fui curtir o
inverno europeu.
Chegando em Milão, lá estava ele me esperando. Como eu não falava
muito bem a língua italiana, fiquei na imigração, mas logo conheci uma
escritora carioca que intercedeu por mim, e depois que fui liberada encontrei
Giuseppe e então seguimos para Cremona. Assim que chegamos tive a
oportunidade de ouvir um lindo canto gregoriano, um gênero musical que
aprecio tanto, ainda mais pelo fato de poder ouvir sendo cantado em uma igreja
muito antiga e lindíssima. Depois comemos uma deliciosa e originalle pizza
italiana e seguimos para Scandolara Ravara, um piccolo paese com 500
pessoas morando naquele lugar e fomos direto para a casa de Ariela, sorella
de Giuseppe. Fiquei encantada com todos os integrantes da família, que era
constituída por típicos meridionais italianos e composta pela Ariela, Lucciano,
Alfredo, Rosaria e Federica, e foi mágico conhecê-los, pois além de serem
acolhedores me faziam ser muito querida por eles. Ariela era professora da
escola elementare per bambini, Lucciano era operário, Alfredo era um bambino
que me adorava, Rosaria era mais tímida e Federica, uma linda italianinha que
estudava 5 idiomas. Claro que allora come avevo arrivato cosi cominciava una
nuova vita per me sim, porque tudo era novo e eu entendia pouquíssimo o
idioma e Giuseppe me levava nos pubs onde seus amigos estavam e me
colocava entre eles, me apresentava e eu não entendia niente, apenas sorria e
me virava no inglês. Conheci várias pessoas diferentes, entre eles homens e
mulheres interessantes, homens todos tatuados com suas roupas de grifes
famosas como Gucci ou usando carros das marcas Harley, Mini Cooper, Alfa

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Romeo, além de motos possantes. Todos os dias saíamos à noite para jantar
em ristorantes, trattorias, pubs, agriturismos, enfim, cada dia íamos a um lugar
diferente, e assim conheci também todo o norte da Itália, visitando cidades
como Milano, Cremona, Scandolara Ravara, Casalmaggiore, Colorno, Parma,
Mantova, Veneza, Murano, Merano, Florença, Trento, Trentino-Alto Adige,
Lago de Garda com seus cisnes brancos e negros, e um Parque Termal
maravilhoso com seus cedros enormes, e seus belos castelos. Em cada
passeio que fiz pude ver lugares belíssimos, mas entre todos esses lugares
que visitei, o mais lindo foi o Lago de Garda, onde pude assistir um
maravilhoso casamento. E assim foi minha vida na Itália com meu ex fidanzato
Giuseppe durante minha estada nesse belo país, mas o choque cultural, além
dos objetivos diferentes que havia entre nós, não nos deixou seguir a vida
juntos, embora o tempo que passei lá tenha sido uma grande experiência para
mim.
De volta ao Brasil, no começo de faculdade e fiz um Famtour pelo
centro-oeste de Santa Catarina. Éramos 40 pessoas de Londrina e região e
partimos de Londrina com destino a Friburgo, Videira, Treze Tílias e Piratuba,
as cidades catarinenses que estavam no nosso roteiro. Chegamos em Treze
Tílias, que é considerada o Tirol do Brasil e conta com 2,500 habitantes, tendo
sido colonizada por imigrantes da região do Tirol, principalmente do Tirol
austríaco, mas também do Tirol italiano. Passamos mais dias em Treze Tílias,
onde ficamos hospedados no Treze Tílias Park Hotel, um lindo hotel que fica
no alto de um morro e é super confortável, e, além disso, o hotel tem uma
piscina térmica coberta maravilhosa onde passávamos grande parte do tempo.
As casas de Treze Tílias têm um galo muito interessante em seus telhados
para dar boas-vindas aos visitantes que chegam às residências, e a cidade
oferece também outros atrativos como turismo rural; a gastronomia que é
deliciosa, especialmente ao meu paladar, e onde me deliciei com uma super
mega torta de ricota, da qual me lembro até hoje com água na boca. À noite
era um fervo, pois íamos num bar rústico muito legal onde curtíamos com os
amigos e os austríacos muita música boa, muita cerveja e comida. Os
austríacos e seus descendentes são alegres e muito queridos. Quando era
hora de ir embora estávamos todos no ônibus e eu avistei um grupo de loiros
todos usando terno azul-marinho, não tive dúvida, desci do ônibus para me
despedir e avistei um lindo austríaco loiro, então me apresentei e me despedi
ao mesmo tempo. E logo depois ele entrou no ônibus para desejar bons
negócios a todas as pessoas do grupo, e em seguida partimos para Piratuba,
onde passamos 3 dias. É uma linda e pitoresca cidade de minha querida Santa
Catarina, e lá tem hotéis estilo europeu onde as pessoas costumam andar de
roupão pelas ruas porque existe um parque termal no meio da cidade.
Estávamos no mês de junho e especialmente no dia 12 e o hotel onde fiquei
era uma graça e tinha uma sacada onde ficávamos e à meia-noite, no lado de
fora um grupo de músicos vestidos com casacos pesados e usando chapéus
começou a tocar e a cantar músicas lindas. Foi uma cena belíssima que nunca
mais esquecerei. Ficamos por uns dias em Piratuba, que é uma cidade muito

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bem frequentada e tem uma gastronomia deliciosa e típica que a região sul do
Brasil nos apresenta.
Quando voltei para Londrina retomei minha rotina normal que era ser, ao
mesmo tempo, mãe, estudante, dona de casa e empresária também, porque
surgiu a oportunidade de eu ter uma cantina no Campus Catuaí, que teve o
espaço cedido pelo Sr. Marco Lafranchi, sendo que ele era nada mais nada
menos que o proprietário da Unopar, tornando-se um amigo. E foi assim que de
2001 a 2003 trabalhei nessa cantina, e isso foi uma experiência imensurável
para mim, pois não tinha experiência na área, mas na hora da necessidade fez-
se a ocasião e eu precisava me formar no curso de turismo e hotelaria. Eu
contava com 6 funcionários e também 1 cozinheiro muito especial que tinha
mãos de fada, e minha brigada era de primeira, pois eles sabiam da minha
situação e que eu precisava me formar. E trabalhar era essencial para que
essa cantina fosse estruturada, porque eu a peguei no concreto, então tivemos
que investir algum dinheiro que veio através de meu pai. Até então nunca havia
trabalhado tanto em minha vida. Eu chegava pela manhã na universidade e ia
embora às 22:45h todos os dias, e no sábado era dia de faxina e compras.
Para começar a semana, mesmo tendo funcionários, minha mãe e minha tia
me deram uma mão, no entanto isso causou grande inveja entre meus
familiares, porque eles não aceitavam que essa oportunidade fosse só para
mim, a ponto de no final eu não ter mais voz ativa para nada. Na última
Páscoa em que a cantina estava aberta eu estava tão cansada de trabalhar
muito e estudar, ser mãe, cuidar do Fred, meu lindo cachorro cooker spaniel
branco e preto e fiel escudeiro, e saber que meu filho fora passar o final de
semana com o pai dele, que dormi 3 dias seguidos comendo apenas barra de
cereais e bebendo água. Tudo isso acabou me deixando extremamente
estressada.
Naquela época eu era cheia de amigos porque tinha grande ibope na
universidade e também no período em que eu estudava. Eis que numa manhã
em que eu estava na cantina vejo um enorme prince loiro, o Aecio,
caminhando em minha direção e sorrindo disse-me: “Bom dia, me dá um beijo
e uma água de coco”. Não perdi tempo, pois além de ser um homem bonito ele
era inteligente, doutor na área em que atuava, e tudo começou assim. Sempre
nos víamos na universidade e começamos a nos cumprimentar, o tempo foi
passando e surgiu dentro de mim um sentimentino strano cosi forte, que me fez
pensar: “essere amore”, e a partir desse dia eu ficava esperando a hora de
encontrá-lo andando pela Unopar sempre bem arrumado. Ele tinha um estilo
casual, mas elegante ao mesmo tempo, e um dia descobri que ele iria ser
candidato a vereador e enlouqueci, porque eu também tinha esse mesmo
pensamento e quando passava por situações difíceis – que não eram poucas –
sempre procurava por ele e lhe pedia um emprego, mas não surtia efeito. Eis
que um dia fui até Cambé, onde ele residia, para ouvir um comício e lá estava
ele todo poderoso. Quase tive uma síncope momentânea dos sentidos e ele
me apresentou para seus amigos, mas em seguida o chamaram para se dirigir
ao governador e o povo foi abrindo caminho para ele passar. Aquilo foi demais

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para mim, pois aquele homem poderoso me fascinava, mas nada deu certo e
la vita seguito un’ altra volta.
Passou o tempo e em junho de 2003 tive que fechar a cantina. Estava
passando por um período muito difícil por ter que perder minha fonte de renda
e, além disso, passei por outro trauma nessa mesma época quando não pude ir
à festa de minha formatura, porque minha família decidiu que as parcelas da
formatura não seriam pagas mensalmente, já que elas seriam pagas só no final
do curso. Mas quando chegou o dia da formatura nada foi pago e não pude ir à
minha festa de formatura porque não tinha um vestido para usar naquela
ocasião. Além disso, em julho daquele mesmo ano minha mãe teve que passar
por uma cirurgia do coração e foi uma fase dificílima para mim porque me
preocupava com ela e nossa família ficou muito abalada. Dias depois, certa
noite eu estava na Unopar e Aécio estava lá, então fui conversar com ele e
acabei contando tudo o que estava ocorrendo comigo e com minha família
naquele momento e ele me perguntou se estava tudo sob controle. Na
realidade eu nem sabia, mas me senti segura e fui para meu apartamento
enquanto ele foi seguindo meu carro, então fui para minha casa e ele seguiu o
caminho dele. Assim era minha vida. Depois disso ainda fiquei muito tempo em
contato com ele, mas esse amor não se concretizou.
Como havia terminado minha graduação em 2003, logo em 2004 entrei
na pós-graduação e nesse período meu filho foi morar com o pai dele. Foi uma
época de muito sofrimento, e o dia em que ele foi embora com o pai acabou
tornando-se uma data inesquecível. Como eu morava na beira do Lago Igapó,
à noite fui até lá e chorei demais e não me conformava por ele ter que partir
porque nós não tivemos uma família bem estruturada. Mas teve que ser assim.
Finalmente fiz um ano de Pós-Graduação em Cerimonial Protocolo e Eventos
com muita dificuldade, porque por ter vivido um tempo de muito stress sem
meu filho, cheguei a passar muito mal com relação à minha pressão arterial.
Eis que em uma manhã de domingo encontrei uma de minhas primas na
beira do lago e ela me convidou para conhecer seu apartamento na famosa
Gleba Palhano. Após esse convite, um dia tomei a decisão de ir à casa dela
para visitá-la. Quando cheguei lá, o marido dela já perguntou o que eu tinha ido
fazer ali, depois me disseram que eu podia subir. Quando subi, ela me disse
para entrar e eu a cumprimentei, em seguida me perguntou: “Já olhou tudo por
aqui?”. Havia umas pessoas lá e eu disse normalmente: “Sim, por quê?”. Ela
me respondeu: “Porque se já viu tudo pode ir embora, pois você não tem o
mesmo sangue de nossa família”.
E foi porque eu não era filha legítima da família é que fui parar no
hospital já que minha pressão tinha subido muito. Felizmente o meu querido Dr.
Antonio Furlan me atendeu como sempre de maneira especial, e passei a noite
no Hospital do Coração. De manhã, Dr. Furlan, muito simpático como de
costume, trouxe-me um delicioso café da manhã, e ele sempre me tratava com
cuidados que para mim foram inesquecíveis. Quando tive alta e fui para casa
eu estava tão cheia de remédios que não pude subir até meu apartamento,

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porque ao chegar não havia luz no prédio e eu morava no sexto andar. Então
não tive opção a não ser ficar no carro esperando a luz chegar e acabei
dormindo, até que acordei com um vizinho passando a mão no meu rosto e
dizendo que eu já poderia subir.
Nesse meio tempo minha especialização seguia normalmente, mas
naquele ano eu tive muitos problemas devido ao estilo de vida que levava. As
coisas não andavam bem na casa de minha mãe onde eu fazia minhas
refeições, pois eu não conseguia emprego e nessa época estava morando na
rua Jerusalém, em um apartamento muito bom na Gleba Palhano. E lá, depois
que um de meus irmãos me machucou o braço, eu dependia de alguém para
me vestir e então comecei a ter contato com a minha querida amiga Wal, já
falecida, que sempre me ajudava em tudo. Eu amava a família dela porque
todos eram pessoas maravilhosas, composta pelo Judson, seu marido e
Lincoln, seu filho.
Nessa época, me sentia cansada da vida que levava e já estava de saco
cheio de tanto sofrer com minha família, devido à violência física e psicológica,
pois o que passei foi desumano. No ano de 2005 meu pai disse que iria me tirar
do apartamento em que eu morava, o que me deixou revoltada. Com isso eu
estava sempre sozinha porque não ligava para as pessoas, entretanto, depois
de ter sofrido um trauma, certa vez liguei para o Vinicius pedindo ajuda para as
coisas que aconteciam em casa e ele me disse: “Funerária Santa Luzia, sua
desgraça é minha alegria”. Então realmente parei de ligar e pensei: “já que é
assim não ligo nunca mais para ninguém”, e assim foi durante anos.
Passado certo tempo, um dia procurei meu ex-sogro que até então era
meu contato, porque através dele eu ligava para meu filho que foi morar em
Curitiba. Quando cheguei ao bar onde ele ficava, ele me recebeu gritando:
“Negra maldita! Negra filha da puta! Você não é mais minha nora!”. Naquela
hora eu me revoltei e ergui a mão para ele, enquanto ele me deu um soco no
nariz e na boca, que me deixou toda machucada, e ainda por cima me jurou de
morte. Naquele momento havia um japonês no bar que viu tudo o que
acontecera, e ele me disse: “Filha, eu vi o que ele fez, tenha calma...”. Dali fui
levada até à delegacia e em seguida ao posto de saúde para fazer exame
médico. Passado algum tempo depois recebi uma intimação e, quando fui ver
qual seria a causa da intimação, fiquei sabendo que meu ex-sogro havia me
processado e, por falta de provas, eu fui condenada a fazer serviço
comunitário. Pois bem, eu ia todos os dias trabalhar chorando, porque sabia de
minha inocência, mas, felizmente, lá fiz bons amigos, em especial o Dr João
Ricardo, entre outros. Isso ficou marcado na minha vida não só pela violência,
mas também pelo ato de racismo que sofri. Depois disso liguei para o Newton,
meu ex, para que ele me ajudasse, porque eu não suportava mais viver aqui.
Nessa época eu tinha um Escort velho que odiava e eis que novamente
o lipoma que eu tinha na cabeça precisava ser tirado, pois bem, certo dia fui ao
Hospital de Clínicas e, ao ser chamada para entrar na sala de cirurgia, fui
bravamente. Dr Solis e Dr Thiago me disseram que eu poderia correr risco de

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sofrer uma parada cardíaca e que era necessário que eu ficasse ciente da
possibilidade desse risco. Então disse a eles: “Não vou ter nada disso”, e me
deitei de bruços para que iniciassem a cirurgia, que foi funda, porque o lipoma
era grande. Quando saí da sala para voltar pra casa, minha mãe estava lá, e
como nosso relacionamento era péssimo, não sei se fiquei feliz ou triste, mas
ela fez a parte dela, me pegou e me levou para meu apartamento no
Residencial do Lago e, antes de ir embora, disse-me: “Olha, você fica aí na sua
casa porque eu não posso te levar para a minha casa, pois meu marido não
deixa”. Pois bem, tive que me virar como sempre, mas à noite alguma coisa
rompeu e inchou muito, então peguei o carro e fui para o PAM. Lá o Dr
Alexandre Prospero me atendeu, me deu uma injeção e perguntou se eu
estava sozinha. Respondi que sim e ele me avisou: “Então te dou essa injeção
e você vaza daqui, pois tem dez minutos para chegar até sua casa porque você
vai dormir”. Então fui pra casa e cheguei a dormir um dia e meio, mas acho que
na verdade foram dois dias.
Nesse período meu filho havia ido embora, eu estava sozinha e não
podia usar o computador da casa de minha mãe para terminar minha
monografia. Então eu tinha que ir a um Cyber Café e descobri um na Avenida
Higienópolis que se chamava Ilusion e era uma bagunça, na verdade era uma
loucura, eu não conseguia me concentrar muito e não era fácil para mim. Mas
como todos os dias eu ia lá, fiz novas amizades, e entre eles o Bigão, meu fiel
escudeiro, que sabia mais ou menos sobre minha história e tinha também belos
exemplares da raça humana e masculina, assim sendo comecei a ser leiloada
como se fosse um objeto promíscuo, coisa que não era e nunca fui. Porém
havia dois deles que me chamavam e atenção: o Fabio e o Fernando,
entretanto não foi possível estar com eles, pois não queria repetir a história de
casamento, embora a vontade fosse grande.
Com o passar do tempo minha situação em Londrina não estava nada
bem e eu já estava saturada de estar sozinha e também sem meu filho. Minha
vida estava amarga e sem sentido, emprego, que era tão essencial para mim,
não conseguia achar, e, além disso, meu pai disse que ia me tirar do
apartamento que eu tanto adorava, porque foi lá nesse condomínio, em que
morei pela primeira vez, que tive a oportunidade de fazer muitos bons amigos.
Então pensei: “vou embora daqui”, e assim fiz viajando para Joinville e me
hospedei no Hotel Sabrina por 1 mês. Procurei o Itamar, que era meu contato
e amigo do Newton, porém ele não me recebeu no escritório, então não o
procurei mais e fui resolver minha vida. Era o mês de dezembro e passei o
Natal sozinha na recepção do hotel, brincando no computador, porque meu
dinheiro era contado e não podia fazer nada senão não comia. Em seguida,
comecei a procurar um lugar para morar e depois de algum tempo fiz amizade
com o padre Bertino e acabava chorando as minhas dores com ele. Alguns
dias depois tive a oportunidade de conhecer a SESMA, Sociedade Espírita
Samaritanos de Maria, e passei a frequentar porque fui muito bem atendida. Lá
recebia passes e lia muitos livros, chegando a ler cerca de 50 livros espíritas,
segundo meus cálculos. Além disso, conheci um círculo de pessoas

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maravilhosas que muito me ajudaram, pois graças a elas tive a chance de


receber atenção e carinho para continuar a encarar a vida com mais alegria e
saber vivê-la. Na biblioteca municipal também li muitos livros de autoajuda, e
naquele momento já morava em um prédio estilo enxaimel de quitinetes e,
além de ler muito para passar tempo, vivia procurando emprego e cheguei a
ficar com muitas bolhas enormes nos pés de tanto andar porque eu não tinha
dinheiro para transporte.
Pouco tempo depois comecei a frequentar um cyber diariamente, e eis
que um dia tive uma crise de tosse tão terrível, que chamou a atenção de uma
moça chamada Ana Lucia, e ela me perguntou se eu tinha tuberculose. De tão
feia que fiquei eu ria e dizia que não, e assim surgiu uma grande amizade entre
nós duas, e a partir dali comecei a ir até a casa dela e ela vinha na minha e
sempre procurou me ajudar quando precisei. Eu lavava roupas no Shopping
Mueller e estendia no terraço do prédio, então costumava levar as roupas em
uma mala enorme até que um dia Ana Lucia se dispôs a me ajudar para lavar
minhas roupas na casa dela, e assim nos tornamos amicíssimas, pois nunca
me esqueço das pessoas que me estenderam a mão. Ela tinha dois filhos, o
Natan e o Juan, e nós passávamos bons momentos juntas, às vezes escutando
música ou saindo para comer um pedaço de torta na Padaria São José, que
era uma delícia, e minha preferida era a Marta Rocha. E assim minha vida ia
acontecendo em Joinville.
Fiz alguns amigos no prédio em que morava. Eles eram bailarinos do
Bolshoi e de vez em quando eu era convidada para vê-los dançar. Um balé que
me marcou muito foi Dom Quixote, tanto pela beleza do figurino maravilhoso
dos seus bailarinos quanto pela beleza da dança em si. Meus queridos vizinhos
bailarinos acabaram se tornando amigos fiéis e, como eu sempre fazia pão
caseiro, eles iam tomar café comigo, mas, entre eles, o amigo mais especial
para mim sempre foi o Alex, que tinha 20 anos de idade, era homossexual
assumido e dono um caráter indescritível, sensível, amável e estava sempre
comigo.
Com meus outros amigos do prédio, como a Katia, Sandra, Lincoln,
Waldecir, todos éramos unidos e sempre estávamos juntos. E sabendo que
Joinville é considerada a cidade mais úmida do Brasil, pois lá chove muito e
quando faz calor é quente demais, eu e Alex costumávamos andar sempre na
chuva e sempre no calor, e ainda fazíamos caminhada. Meu filho Fabrício
estava longe, mas tive a felicidade de conhecer esse pessoal amigo que me
dava muito apoio.
Nessa época eu recebia uma semanada de quinhentos reais e era com
esse dinheiro que eu podia ir ao mercado para fazer o que precisava.
Entretanto eu precisava correr atrás de emprego e para isso sempre pude
contar com a ajuda de meu amigo Alex, mas como eu era de fora e sem
referências, não conseguia, porém não perdia a esperança. E quando chegava
sexta-feira eu me dava um presente e comia um pastel de presunto e queijo
que eu adorava, na pastelaria perto de minha casa. Mas também ia dançar no

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Bar Paiol com meus lindos bailarinos Bolshoi malhados e gays maravilhosos.
Certo dia, dei um show dançando com um dos participantes do grupo classe A,
que era um grupo de pagode fantástico, dancei pra valer e foi ótimo. Havia
também o Bar Expresso, onde nós íamos com o dinheiro contado para beber
um delicioso chopp de trigo, e lá fizemos amigos como o Nado, que anos
depois cometeu suicídio, e Chico, entre outras pessoas que conheci. Era uma
vida difícil, pois estava longe de todos, mas fiz grandes amigos lá e fiquei um
ano e três meses longe de casa, porém estava vinculada à minha tia Dirce,
porque somente ela atendia ao telefone e decidia o que eu poderia fazer devido
ao pouco dinheiro que mandavam para mim. Às vezes nem atendiam ao
telefone, e por causa disso eu tinha que fazer ligação a cobrar para outras
pessoas da família e amigos, e isso também me trouxe desavenças, pois
descobri que nem sempre as pessoas são realmente aquelas com quem
podemos contar para nos ajudar. Essa era a realidade, mas o pior eram as
bolhas enormes que eu tinha nos pés de tanto andar atrás de emprego junto
com o Alex. No inverno meus pés sofriam muito com o frio que fazia em
Joinville, pois lá o inverno é bastante rigoroso, e esse problema nos pés
acabou me marcando muito. Sofrendo com isso, eu acabava ligando para a
Dirce, e ela me dizia: “Vai trabalhar nem que seja de doméstica e compre as
meias”, como se emprego fosse fácil para uma forasteira como eu.
Um dia fui a uma reunião da VoIP para ver se surgia uma oportunidade
de trabalho e conheci a Eliane, ela então me apresentou ao dono de um hotel
de terceira categoria, mas que poderia ser a possibilidade de um emprego. Ao
chegar lá achei assustador, pois nunca tinha visto tanto rato em toda minha
vida e cheguei a pensar “não sei como não tem leptospirose”. Acabei indo
apenas 3 ou 4 dias, pois o nível era baixíssimo, no entanto minha semanada
era tão pouca que me submeti a isso, pois os hóspedes do hotel eram
moradores de rua, caixeiros-viajantes, vendedores ambulantes. E certo dia na
hora do almoço um hóspede me pediu para pegar alguma coisa na geladeira e
assim o fiz. Então ele me desacatou dizendo que se eu era tão culta porque
sempre estava com um livro nas mãos, por que me submetia a trabalhar
naquele lugar? E em seguida jogou um saco de lixo na minha cara. Não tive
dúvida e chamei a polícia, e ele disse que iria me matar. Mas assim que a
polícia chegou, o dono do hotel tomou as dores do suposto hóspede – se é que
se pode dizer assim –, ai tinha o Hotel Mates ao lado cujo dono veio ver o
que estava acontecendo e me fez uma proposta para trabalhar à noite e eu
aceitei, mas pouco tempo depois ele me mandou embora. Então fui atrás de
outros empregos e acabei indo até o renomado Hotel Bourbon, mas o chef de
recepção disse com arrogância que eu estava malvestida para pleitear um
emprego naquele hotel. Mesmo assim eu não desistia, porém certa noite eu
passei mal sentindo dores terríveis nos rins, então chamei o SAMU, e eles
prontamente me socorreram com o maior carinho do mundo. A dor era tanta
que me fez sentir náusea, então me deram um remédio na veia e a dor foi
passando. Em seguida o socorrista do SAMU pegou o número do meu celular e
passou a me enviar mensagens para saber como eu estava me sentindo, mas
estando ainda sob o efeito do remédio na veia eu não conseguia enxergá-las.

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No dia seguinte, quase na hora do almoço, tive a mesma dor e fui até ao
hospital São José onde tomei remédio na veia novamente. O médico disse-me
que já sabia o que eu tinha e que eu não iria andar mais, e que quando eu
estivesse com mais idade iria ter que andar de cadeira de rodas. Naquela hora
entrei em pânico, mas como continuava com dores de repetição renal, veio um
segundo médico para me atender e constatou que eu estava apenas com uma
cólica renal.
Depois disso passei a ser acompanhada pelos médicos do Posto
Atendimento Médico Bucarein, aos meus olhos referência de atendimento, pois
eu adorava o Dr. Rebert, um ginecologista maravilhoso que se tornou meu
amigo e que era coordenador do curso de medicina de Joinville. Um dia ele me
perguntou em que eu era formada e após lhe falar sobre minha formação, ele
prontamente me perguntou se eu tinha interesse em dar aula numa
universidade, e naturalmente eu disse que sim, pois acreditei que ele fosse
implantar o curso de turismo na Univille, mas não aconteceu como o esperado.
O tempo foi passando e num certo dia fui almoçar num restaurante na
Rua do Príncipe e estava entrando na galeria quando vejo um homem
encostado na parede que acabei reconhecendo na hora e sabia que seu nome
era Lincoln Lundgren, pois estudara com ele. Então logo perguntei: “Você é de
Londrina?”. Ele confirmou que sim, então eu lhe disse: “Nossa! Eu estudei com
você”. Acabamos batendo um longo papo e fiquei sabendo que ele estava
separado, tinha 2 filhos, um de 4 anos e um de 10 anos, e contou que morava
no Quinta da Boa Vista. Ele havia estudado na mesma escola onde eu estudei,
no Colégio Hugo Simas, e sempre o via pela escola. Após esse casual
reencontro, não chegamos a ser amigos estreitos, mas trocávamos mensagens
através do Orkut naquela época, porém ele ainda era apaixonado pela ex-
mulher e só falava nela,. Aquilo me cansou, então eu o mandei às favas e
segui curtindo a vida e procurando emprego como sempre.
Certa vez tive a ideia de montar um curso na área de alimentos e
bebidas, porque já tinha experiência nessa área, e também a dissertação da
minha monografia era em excelência no atendimento ao cliente, na área de
alimentos e bebidas. Sendo assim, procurei uma escola profissionalizante para
oferecer meu curso e eles aceitaram. Só que, infelizmente, seria um trabalho
temporário, mas mesmo assim foi muito bom o tempo que passei lá e, além
disso, finalmente pude comprar meu megacomputador e passei um mês
decente.

Eis que numa noite de neblina, eu com meu fiel amigo Alex, sempre
junto comigo, estávamos atravessando a rua entre o Müller e o Paiol e me
aparece um dos animais que mais amo, o Eleição, um lindo cavalo Andaluz
branco com um uma crina enorme e lindos olhos azuis mas muitíssimo agitado
e bravo, e assim prosseguíamos andando pela rua durante a noite para
podermos ver a arquitetura das casas, porque o Alex queria ser arquiteto. A
nossa preferida era uma casa azul royal com branco que ficava perto do

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Hospital Santa Helena, mas dava pena ver que o terreno era pequeno para o
tamanho da casa. Mesmo assim ela era um de nossos sonhos de fada.
A rua onde morava a amiga Ana Lucia era super movimentada, mesmo
porque nessa rua havia uma boate incrível que fora aberta recentemente e
também já existia o Zoom, um bar alemão que era excelente, onde eu tinha um
amigo chef negro que me disse para levar um currículo para uma possível
contratação e assim o fiz. Naquela noite, como sempre, tinha uma névoa e eu
estava indo para casa, quando numa esquina o sinal fechou e fiquei
aguardando ele abrir. Ao olhar para o lado, vi um lindo moreno em uma BMW
conversível azul-marinho que também estava esperando que o sinal abrisse
para ele e, naquele momento, nós nos olhamos, sorrimos um para o outro e
tivemos uma conversa rápida. Ele se chamava Flavio, morava em São Paulo e
era criminalista. Quando o sinal abriu continuei meu trajeto normalmente e eis
que de repente aquele homem maravilhoso de sorriso incrível parou ao meu
lado e me disse: “Entra que vou te levar para casa”. Fiquei surpresa e nem
acreditei naquilo, mas entrei no carro e começamos a conversar e quando ele
disse que era advogado, fui até estúpida ao dizer-lhe que não gostava do
pessoal que trabalha na área de Direito e desfiei um rosário de motivos por
pura timidez. Ele era um belo homem e muito elegante disse: “Amore...”, Eu
perguntei: “E o dinheiro?”. Então ele disse: “Amore, vamos fazer plástica”. Eu
me fiz de desentendida e ele me perguntou o que eu tinha ido fazer àquela
hora da noite. Respondi que tinha ido levar um currículo, minhas referências e
formação, pois estava atrás de um emprego e no meio da conversa perguntei a
ele se gostava de música italiana. Ele respondeu que sim e mencionou uma em
especial: “Il tuo nome in maiúsculo”
Durante nossa conversa fiquei sabendo que ele simplesmente era um
descendente da família Orleans e Bragança e me impressionou ver o quanto
ele era educado e elegante. Foi uma pena não termos ficado, mas entendo que
foi pela postura, e o que importa é que tive diante de mim um lindo prince
moreno, que me marcou muito por sua atitude educada ao mostrar não ter
preconceito com relação à idade, porque ele era 9 anos mais jovem que ele e
também não teve preconceito quanto à minha cor.
A vida ia passando tranquilamente, mas num certo dia, à noite, comecei
a me sentir tão incomodada que acabei surtando, então fui ao Posto Bucarein e
de lá me mandaram para um hospital pelo SAMU. Chegando lá a médica me
perguntou se eu tinha uma amiga em Joinville. Respondi que sim, mas que não
queria incomodá-la, então eles pegaram minha bolsa e ligaram para minha
mãe. Em seguida me deram um remédio tão forte que me deixou baqueada por
uns 5 dias, mas quando acordei no hospital lembro-me que perguntei ao
enfermeiro se eu tinha morrido e ele disse que sim. De repente vi o rosto de
minha mãe, que me pegou e junto com meu irmão Junior e o Walter, marido de
uma prima, me levaram para minha casa do lado do bombeiro e lá tomei
banho, mas nem vi nada. E em seguida me trouxeram de volta para Londrina ,
minha cidade natal,

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Porém eu estava completamente fora de mim, dopada, e queria somente


dormir. A médica de Joinville tinha me dado diagnóstico de esquizofrenia com
apenas uma avaliação feita em posto de saúde, mas isso não era verdade, pois
não é possível fechar um diagnóstico tão sério apenas com uma avaliação.
Como agora eu já estava em Londrina, fiquei na casa de minha mãe e
alguns dias depois um componente da família veio conversar comigo e me
disse que eu iria ter que tomar uma injeção nem que fosse por intervenção
judicial. Logo depois fui levada para a sala onde havia três leões de chácara
me esperando que me pegaram e me seguraram enquanto outra pessoa
aplicava uma injeção em mim. Assim que eles foram embora, pouco tempo
depois comecei a notar que meu corpo foi amolecendo pouco a pouco e, como
tinha uma economia no banco, resolvi arrumar minhas coisas e fui procurar
ajuda nos lugares onde havia feito estágio, pois era formada em turismo e
hotelaria e pós-graduada em eventos. Então fui a 3 hotéis onde eu sabia que
tinha amigos, mas não os encontrei, porém não desisti e decidida fui até ao
Hotel Bourbon onde conversei com Dr. Roberto e mostrei a ele a mancha roxa
que havia em meu braço, vi que nesse momento ele pensava muito e resolveu
ligar para o Dr. Ody.
Em seguida decidi me hospedar no Hotel Ideal onde passei uma
semana, por estar receosa de minha família, pois naquela noite em que tomei a
injeção não sabia para que era e fiquei assustadíssima. Depois decidi ir até o
PAM – Pronto Atendimento Municipal e liguei para minha mãe. Assim que ela
chegou, na frente da médica pedi a receita da injeção, tomei da mão de minha
mãe e vi que era para esquizofrenia. A partir dali começou minha saga, com
minha mãe me infernizando e dizendo que eu precisava de psiquiatra, enfim eu
ligava para o Dr. Ody continuamente e ele dizia para eu ir até ao seu
consultório na Solis, mas eu estava tão debilitada com aquela situação e com
vergonha também porque estava passando por um trauma, e isso não foi nada
fácil.
Certo dia fui à casa do Aecio e foi seu pai que me atendeu prontamente.
Ele era um grande advogado criminalista, e educadamente me fez entrar e me
deu atenção enquanto conversávamos. Nossa conversa fez muito bem para
mim, pois me me fez sentir melhor e em seguida fui para casa de ônibus, pois
eu não tinha mais carro. Se por um lado a visita à casa de Aecio me fez sentir
tão bem, por outro lado eu estava revoltada com relação à minha família e ao
surto pelo qual estava passando e, além disso, também estava sofrendo de
sudorese, o que me incomodava muito, e continuei a lutar contra tudo isso.
No fim daquele dia fui ao Hospital Evangélico, chamei minha mãe por
telefone e falei para o atendente o que tinha ocorrido comigo, pois havia
tomado uma injeção, mas fiquei sem saber o que era. Senti tanto ódio dentro
de mim que pedi para chamarem a polícia, mas na hora não fizeram isso, e o
médico que me atendeu chamou minha mãe e minha tia Dirce. Não demorou
muito pude ouvi-lo dizer a elas que eu poderia fazer o tratamento em casa ou
ser internada. Escutei tia Dirce dizer: “Tadinha, ela precisa descansar a mente”.

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Fui então internada no Pinel, hospital psiquiátrico onde vi tanta desgraça


que não creio que passei por aquilo. Lá tinha de tudo, então eu me ajoelhava
no chão e orava a Deus pedindo que aquilo passasse logo para que eu
pudesse sair daquele terrível lugar. Nesse hospital os pacientes não podem
ligar para os parentes, e isso é algo que não se pode imaginar. Eu só pensava
em ligar para o Dr. Ody para pedir que ele me salvasse, mas eles não
deixavam, no mesmo dia à tarde, antes da internação, já havíamos conversado
e ele me indagou: “Por acaso você é interditada?”. Respondi que não e fiquei
sabendo então que tamanho abuso de família só poderia acontecer se eu fosse
interditada. Mesmo assim acabei passando por esse filme de terror por 13 dias.
Durante minha permanência lá, meu maior trauma foi um dia em que o
psicólogo me disse: “Vamos fazer terapia ocupacional chapada de remédio”, e
tive que pintar uma caixa de madeira quase dormindo. Meu Deus do céu!
Como é que eu ia poder pintar quando estava entupida de remédio, bem
depois de implorar a uma enfermeira para fazer uma ligação para minha
família? Mesmo tendo minha mãe comigo durante a noite, durante o dia eu
ficava com os pirados do Pinel, e quando saí de lá estava a terra. Eu me
lembro que chorava e perguntava quem iria me querer depois de eu ter
passado por uma internação psiquiátrica e, na realidade, a minha médica dizia
que eu não precisava falar para todos que tinha passado por isso. No entanto
aquilo não me abalou mais porque sabia de minha condição psicológica, de
meu modus vivendi e quem eu sou.
Ao sair do Hospital Pinel tive acompanhamento psiquiátrico e com
terapia com a Norma por 4 meses e no fechamento de diagnóstico constou que
meu caso tinha sido um surto de stress de alto nível depois de tanto sofrimento
em algum lugar iria somatizar minhas dores emocionais, mas depois dessa
situação fiquei realmente abalada, o que fez com que minha autoestima
baixasse muito e acabei perdendo minha confiança afetiva e profissional, pois
a cidade de Londrina – provinciana como é – não acredita que uma pessoa
possa ter problema e se recuperar. Tanto é verdade porque depois de ter
passado por um problema de saúde acabei sendo perseguida por pessoas
influentes e assim não conseguia arrumar emprego.
Minha mãe e minha tia têm uma pequena confecção de uniformes
profissionais e um dia minha cunhada Camila me perguntou: “Por que você não
aceita a proposta de trabalhar na confecção de costureira e também no corte?”.
Comecei a pensar bem sobre essa possibilidade e cheguei à conclusão de que
se eu não estava conseguindo emprego, talvez fosse uma oportunidade
trabalhar nessa área, mesmo sendo um ofício que eu odiava. Assim me decidi
e fiz esse trabalho por 8 anos, mas durante esse período passei por situações
que me marcaram muito. Tudo porque minha tia Dirce sempre quis dominar a
casa de minha mãe onde ficava a confecção em que eu trabalhava. E foi por
esse motivo que sempre foram elas que dominavam a situação tanto dos
negócios da confecção quanto dos problemas e das rotinas da casa de minha
mãe.

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O tempo que passei naquela confecção não foi nada fácil em primeiro
lugar e porque eu odiava o que fazia, pois ficava pensando na minha formação
acadêmica, na especialização, e quando tocava no assunto sobre arrumar
outro emprego escutava minha mãe e minha tia dizendo que eu estava velha
demais para arrumar outro trabalho. Elas também questionavam quem iria
querer uma pessoa como eu, pois, segundo elas, os empreendedores iriam
querer mocinhas para trabalhar em suas empresas, e isso deixava minha
autoestima para baixo e fazia eu me sentir incapaz para reagir contra aquele
ambiente doente em que eu vivia, onde só ouvia conversas de doenças o dia
todo, além de ganhar mal. Foi então que a certa altura da vida comecei a pedir
a Deus que me colocasse em outro emprego com pessoas alto-astral, e enfim
surgiu uma agência de turismo onde aprendi várias coisas, pois tive que
começar do zero e ainda não tinha clientes para oferecer meus produtos, que
seriam passagens aéreas, pacotes de viagens. Além disso, houve também
uma coisa muito interessante da qual participei através da agência, que foi o
festival do turismo em Foz do Iguaçu no Hotel Rafain. Essa feira conta com 250
participantes da área do turismo sendo eles hoteleiros, proprietários de
operadoras de turismo, proprietários de pousadas, ou seja, pessoas que atuam
no grande mercado do turismo que envolve a hotelaria, gastronomia, lazer,
receptivo, agência de turismo, enfim uma gama de opções que envolvem essa
área. Também pela agência pude viajar para Caldas Novas, cidade que eu já
conhecia quando viajei para lá na minha adolescência, mas que atualmente
está muito mudada porque a cidade cresceu e ergueram-se muitos prédios de
alto padrão. Há também 3 parques aquáticos na cidade, sendo eles Clube
Privé, Náutico e Water Park, e quando estive na cidade com meus amigos do
Famtur de Londrina e região, tivemos a oportunidade de fazer visita técnica a
vários hotéis da cidade e fiquei hospedada no Prive Riviera Park Hotel, onde
fiquei muito bem instalada e pude desfrutar da gastronomia maravilhosa e das
piscinas de águas termais deliciosas. Nós ficávamos até tarde nas piscinas e
isso fez com que estreitássemos amizade com as pessoas que participaram do
Famtur, pois Famtur significa a reunião de várias agências de turismo que
enviam 1 pessoa representando sua agência, e com a visita nas cidades
podem oferecer para seus clientes o produto que consiste na rede hoteleira,
lazer, gastronomia, enfim, envolve todo um complexo turístico a ser
comercializado em suas agências. Ficamos então 4 dias em Caldas Novas e foi
divertido pra valer, pois fomos em bares curtir uma seresta de música regional
e no 5º dia voltamos à nossa cidade natal depois de 14 horas de viagem.
Na época em que trabalhei na agência de turismo aconteceu algo muito
interessante no ano de 2007, quando certa tarde eu estava saindo de meu
prédio aproximadamente às 18:00 h, e eis que, na frente de meu prédio,
encontro Lincoln Ludgren, meu amigo de escola na adolescência a quem já
havia encontrado em Joinville, depois de 10 anos. Esse reencontro na frente
de casa foi cheio de sacolas do mercado e foi muito bom, pois paramos para
uma breve conversa, colocamos o papo em dia, trocamos Facebook, mas não
nos achamos, e o tempo passou. Três meses depois eis que o encontro
novamente, trocamos nosso WhatsApp e começamos a nos falar, e num certo

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dia ele quis vir em minha casa, pois morávamos a apenas 1 quadra de
distância e a partir dali começamos a nos conhecer, como dizia ele. Quando
chegou novembro ele disse-me que estávamos namorando e eu já tinha um
grande apreço pelos seus filhos João e Felipe, mas quando chegou janeiro,
bem no dia do meu aniversário tudo acabou, e continuei sozinha pela vida
afora, mas sozinha nunca porque mulher sem confusão não vive, pois sempre
um pé cansado tem um chinelo largo para descansar segundo minha avó, a
mãezona, pois ela sempre dizia isso.
Quando chegou o mês de abril acabei perdendo o emprego e isso me
afetou muito, inclusive cheguei até a perder o sono, ficando 50 dias sem
dormir. Foi então que minhas sobrinhas Ana Carolina e Amanda me indicaram
um médico, o Dr. Luis Piccoli. Sendo assim, comecei a ir às consultas, mas
num breve período me vi apaixonada por ele e um certo dia pirei e falei a ele
que não poderia mais ir às consultas. Ele quis saber qual era a razão e então
respondi: “Acho que me apaixonei por você”, mas não sabia nem como olhar
nos olhos dele de tanta timidez que eu sentia. Nessa hora ele olhou para mim e
disse-me que isso era um motivo torpe e naquele momento eu não sabia o que
fazer, então saí à francesa e procurei o Dr. Luis, outro médico renomado e
querido, mas depois acabei retornando ao consultório do Dr. Luis Piccoli e
estou com ele até hoje. Felizmente agora estou muito bem, pois estou
melhorando a cada dia e meu diagnóstico felizmente não é esquizofrenia.
Atualmente tenho também meu novo projeto para este ano de 2018, que
já coloquei em execução desde que iniciei um curso de gastronomia na
segunda semana de agosto e espero ter sucesso total, pois gosto de cozinhar
e também de estar entre pessoas interessantes e inteligentes. Quanto ao amor,
tão logo seja possível, espero encontrar meu prince para que eu possa
mergulhar num oceano de amor sincero, delicioso e muito próspero .

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