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ARTIGO - A Ineficiência Do Modelo Tradicional de Treinamento em Pátio Aberto
ARTIGO - A Ineficiência Do Modelo Tradicional de Treinamento em Pátio Aberto
RESUMO
O presente artigo avalia, por meio de uma revisão bibliográfica, o modelo tradicional de
treinamento em combate a incêndio que se desenrola em pátio aberto e como é inadequado para
capacitar bombeiros para combaterem incêndios estruturais dentro das edificações sinistradas,
destacando a importância do treinamento para eficiência e segurança do combate, as diferenças
entre os incêndios estruturais e o que ocorre nos treinamentos em pátio aberto, o binômio
segurança-realismo que envolve os treinamentos que buscam eficiência e a doutrina
Compartment Fire Behavior Training (CFBT). Conclui-se que os treinamentos nos moldes da
doutrina CFBT são seguros e eficientes para capacitarem os bombeiros para conhecer o
comportamento do fogo em ambientes fechados, reconhecer os fenômenos que podem decorrer
do comportamento extremo do fogo e aplicarem técnicas adequadas ao combate a incêndio de
modo ofensivo.
ABSTRACT
The present article, by means of a bibliographical revision, evaluates the traditional model of
firefighting training that occurs in pen areas and how it is inadequate to train firefighters to fight
structural fires in offensive tactics, emphasizing the importance of training to ensure efficiency
and safety in fire control operations, the differences between structural fires and and what is
found in plain area trainings, the safety-realism binomial that involves the firefight training
methods that seeks efficiency and the doctrine of Compartment Fire Behavior Training (CFBT).
The study realizes that the CFBT methods are safe and efficient to develop in the firefighters the
skills to know the compartment fire behavior, to recognize the phenomena that may occur and to
apply adequate techniques in offensive firefight operations.
1. INTRODUÇÃO
Ocorre que o treinamento dos bombeiros não se desenvolveu no mesmo passo. Ainda hoje, no
Brasil e até em países desenvolvidos como os Estados Unidos, bombeiros civis e militares são
preparados com métodos de treinamentos que eram aplicados no início do século passado,
quando o combate era feito exclusivamente de modo defensivo, distante do fogo e externamente à
edificação sinistrada. Não se preparam os bombeiros hoje para o combate ofensivo, o que torna
esse tipo de combate ineficiente e inseguro.
O presente artigo tem por escopo analisar: a importância dos treinamentos para a eficiência e
segurança do combate a incêndio, sobretudo no interior de edificações; a ineficiência do modelo
tradicional de treinamento em preparar bombeiros para o combate ofensivo; a necessidade de
implementar realismo nos treinamentos e como isso afeta a segurança e, por fim, a doutrina de
treinamento chamada de Compartment Fire Behavior Training como proposta eficiente e segura
de capacitação de bombeiros para combate a incêndios estruturais de modo ofensivo.
Os corpos de bombeiros (CBs) foram criados originalmente para combaterem incêndios. Depois,
com o desenvolvimento das sociedades e a conseqüente ampliação da natureza e fontes dos riscos
e ambientes, os CBs foram assumindo a tarefa de atender aos mais variados tipos de sinistros.
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Os bombeiros de hoje, por treinarem uma gama muito grande de atividades, treinam menos
combate a incêndio e, consequentemente, acumulam menos conhecimento prático acerca de
incêndios. Juntamente com isso, a diminuição das ocorrências de incêndio significa aumento na
segurança preventiva, mas tem se traduzido como fonte de insegurança nas operações de combate
ofensivo, pois, geram menos oportunidades para os bombeiros acumularem experiência e isso
tem sido causa de ferimentos e óbitos no combate.
Um estudo da NFPA sobre morte de bombeiros em incêndios estruturais de 2002 aponta que as
três maiores causas de mortes de bombeiros em incêndios são perder-se na edificação, colapso da
estrutura e progressão do fogo. O mesmo estudo aponta a falta de experiência em incêndios reais
como uma potencial causa das mortes de bombeiros por ferimentos graves conseqüentes do
colapso da estrutura ou da progressão rápida do fogo (FAHY, 2002)
No mesmo sentido vê-se um relatório técnico especial, da USFA (2003), cujo texto relata que
evitar ser pego por essas duas condições letais – continuará a ferimentos e baixas aos
bombeiros.
(sem destaque no original)
O chefe de bombeiros Edward Hartin (2007a) observa que “a segurança dos bombeiros nas
operações de combate a incêndio melhorou minimamente nos últimos 27 anos a despeito do
significante avanço tecnológico dos equipamentos de proteção individual”. No Brasil, nem sequer
se chegou a fazer estudo semelhante sobre a segurança no combate.
Vê-se assim o quão importante são os treinamentos para conferir eficiência ao combate e
segurança aos bombeiros.
Esse tipo de treinamento exclusivamente em pátio aberto apresenta alguns problemas sérios. O
primeiro deles é que o treinamento em pátio aberto não prepara para reconhecer e agir ante aos
fenômenos do comportamento do fogo em ambientes fechados.
Pode-se perceber que os incêndios estruturais são bem diferentes dos que ocorrem ao ar livre,
entretanto, continuamos a basear nosso treinamento quase que exclusivamente em ambientes
externos, sem reproduzir as condições ambientais e do comportamento do fogo em um incêndio
em compartimento. Isso causa ineficiência e insegurança no combate.
Treinar bombeiros para combate a incêndio estrutural sem que eles encarem um incêndio em
compartimento e vejam na prática o que se ensina na teoria acerca do comportamento e evolução
do foco e da fumaça é equivalente a mandar soldados para o combate sem que tenham disparado
um tiro. É como treinar mergulhadores sem que eles mergulhem.
Outro problema do treinamento exclusivamente em pátio aberto é que o ambiente físico de uma
edificação é completamente diferente do encontrado no pátio. Quando bombeiros treinados
exclusivamente em pátios abertos deparam-se com ocorrências eles sentem enorme dificuldade
em se adaptar às condições reais, o que só é mitigado após anos de serviço muitos incêndios
enfrentados. A armação de linhas no interior de uma edificação não é feita do mesmo jeito que se
faz no pátio aberto, onde se pode montar as mangueiras em linha reta. Em muitos casos não há
contato visual entre todos os integrantes da guarnição; o espaço para armação das mangueiras é
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reduzido pelas paredes, corredores, portas e mobília; o calor é maior e a visibilidade menor; etc.
Isso gera ineficiência no combate e insegurança para o bombeiro.
Não se está aqui desprezando o treinamento em pátio aberto, afinal as habilidades adquiridas nos
treinamentos em pátio aberto são base para o desenvolvimento das habilidades necessárias para
combate a incêndio estrutural e são plenamente aplicáveis nas táticas defensivas de combate. O
que se quer dizer é que o treinamento deve ir além.
Nesses países, como também na França, o treinamento com fogo real foi introduzido exatamente
para contra-atacar as mortes e ferimentos graves de bombeiros relacionadas às várias formas de
progressão rápida do fogo (GRIMWOOD; DESMET, 2003).
efetivo é essencial para preparar os serviços de bombeiros para cumprirem suas missões de
preservação da vida e da propriedade (USFA, 2003).
Na Suécia, após a morte de dois bombeiros em 1982 devido a uma explosão dos gases
combustíveis presentes na fumaça, desenvolveram-se duas frentes de trabalho: pesquisa científica
e acadêmica acerca do comportamento do fogo e desenvolvimento de um programa de
treinamento para aumentar a segurança dos bombeiros no combate a incêndio incorporando
realismo nos exercícios e demonstrações práticas do comportamento do fogo. Nascia o
Compartment Fire Behavior Training – CFBT, explicado em detalhes adiante.
Nesse país, a teoria da combustibilidade da fumaça tem sido há muito entendida e os métodos de
treinamento prático pelos quais os bombeiros são ensinados a reconhecer, antecipar e como lidar
com fenômenos de ignição dos gases remontam meados dos anos 80. Isso reduziu o número de
bombeiros mortos por causa de fenômenos de combustão da fumaça de uma média de 3 a cada
dois anos para zero, desde a introdução de um programa de treinamento de comportamento do
fogo imbuído de realismo (CEDERHOLM apud RAFFEL, 1999b).
Uma das práticas modernas em se tratando de treinamento em combate a incêndio que incorpora
realismo no treinamento é o Live Fire Training (treinamento com fogo real), ou seja,
treinamentos nos quais há simulacros de incêndio com fogo.
O relatório TR100 (USFA, 2003) aponta que de 1987 a 2001 o índice de ferimentos resultantes
de treinamentos subiu 15% enquanto o número de bombeiros no mesmo período cresceu apenas
5%. O mesmo estudo observa que o treinamento com fogo real tem sido um dos tipos de
treinamento que lideram as estatísticas em causa de fatalidades.
Tão necessário quanto implementar o realismo nos treinamentos de combate a incêndio a fim de
aumentar a segurança nas operações, é necessário prover meios para que os treinamentos, apesar
de imbuídos de realismo, sejam seguros, pois não faz sentido que sés treine com mais realismo
para evitar mortes em operação e elas ocorram nos treinamentos. Grimwood (GRIMWOOD et al.
2005) observa que assim como as baixas de bombeiros durante o atendimento a emergências são
inaceitáveis e mais inaceitáveis ainda são as mortes ocorridas em treinamentos.
Os treinamentos com fogo real ocorrem de algumas formas: 1) pela queima de edificações
marcadas para demolição; 2) com simuladores a gás; 3) em edificações construídas para
treinamento e 4) em simuladores de incêndio construídos a partir de contêineres metálicos.
O documento TR-100 (USFA, 2003) faz uma análise dos modelos mais implementados de
treinamentos com fogo real e traça algumas observações acerca do realismo e da segurança. O
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relatório nem aborda os treinamentos em pátio aberto, pois, evidentemente, são muitíssimo
seguros mas não tem o realismo necessário.
Acerca das pistas com gás, Grimwood e Desmet (2003, p. 48) afirmam que “o uso de sistemas
abastecidos com GLP não servem adequadamente para ensinar o comportamento do fogo”. O
mesmo raciocínio é válido para o GNV. Apesar do fogo ser real nesses simuladores, ele não se
desenvolve, não se comporta e não reage às técnicas de combate como um fogo real em
compartimento.
Em alguns corpos de bombeiros nos EUA e Inglaterra e outros países da Europa, usam-se
edificações abandonadas ou prestes a serem demolidas para treinamento provocando nelas um
incêndio. Essa situação é diametralmente oposta às pistas com focos sólidos ao ar livre. O
realismo é total, mas o controle sobre o fogo é praticamente nenhum, o que reduz a segurança a
níveis perigosos.
O uso de uma estrutura adquirida geralmente oferece o cenário mais realista em que se
pode treinar bombeiros em métodos e operações de combate ao fogo. O elemento
simulação nesse tipo de treinamento é mínimo. Uma vez iniciado o fogo, ele mais
razoavelmente se aproxima da “coisa real” comparado a um simulador a gás.
Além de ser um treinamento economicamente inviável (a destruição da estrutura pelo fogo não
permite muitas execuções com segurança) não há “realismo”, já que realismo se refere ao que é
próximo ao real. Nos incêndios provocados em edificações abandonadas, o fogo é efetivamente
real. Isso não é de todo bom, pois não há controle sobre o desenvolvimento do fogo, o que
prejudica a segurança.
A formatação inicial do CFBT, desenvolvida na Suécia nos anos 80 usa instalações construídas,
mas a partir de contêineres navais metálicos. Com essa modelagem, eles foram (e são) capazes de
demonstrar de modo eficiente a formação, acúmulo, transporte e ignição dos gases resultantes da
pirólise dos combustíveis sólidos em um compartimento, bem como técnicas de combate.
É essencial lembrar que essas estruturas modulares são apenas simulacros de condições
mais realistas e o fogo no treinamento nunca poderá replicar o fogo real por questões de
segurança. Não há muita carga incêndio durante os treinamentos e os eventos
experimentados dentro dos simuladores, em geral, ocorrem mais rapidamente no
‘mundo real’ em um ambiente compartimentado que é genuinamente desconhecido para
o bombeiro. Ainda assim, os simuladores modulares são tão realistas quanto se pode
querer para o treinamento de bombeiros.
aprimorar o treinamento dos bombeiros para melhor prepará-los para os combates realizados no
interior das edificações. O acidente com 2 bombeiro em 1982 que desencadeou a o surgimento do
CFBT foi investigado (como ocorre normalmente na Suécia, Inglaterra, EUA e outros países) e
chegou-se à conclusão que os bombeiros não conheciam adequadamente o comportamento do
fogo no interior de uma edificação e não estavam preparados para reagir aos fenômenos que
podem surgir.
O CFBT é uma concepção de treinamento que visa, por meio de teoria e exercícios realistas,
preparar bombeiros para as situações que encontrará em um combate a incêndio estrutural. O
CFBT tem sido desenvolvido e aprimorado em outros países por estudiosos (bombeiros e
acadêmicos) do assunto.
Edward Hartin, um dos modeladores da concepção atual do CFBT explica da seguinte forma: O
CFBT integra tópicos relativos a comportamento do fogo, ventilação e convecção do foco em um
contexto de combate a incêndio estrutural.
Uma análise das baixas de bombeiros em incêndios estruturais mostrou erros comuns
que são geralmente resultado de inexperiência ou de uma abordagem reativa. Os
princípios do CFBT devem ensinar os bombeiros a serem mais proativos e antecipar
possíveis eventos antes de ocorrerem. Eles devem também tornar-se mais atentos no
desenvolvimento de uma abordagem tática e seus efeitos caso não adotada. [...] Tomado
como um dos meios de aumentar a segurança dos bombeiros, o CFBT até então provou-
se o mais seguro e efetivo método de atingir essa meta.
repetidos, uma abordagem universal evoluiu no design e uso dessas instalações para
ensinar vários aspectos do comportamento do fogo. Como exemplo, há módulos de
observação para flashover [nos quais os instruendos ficam dentro do módulo
observando o fenômeno], unidades com janelas para backdraft [para que a observação
possa ser feita do exterior] e módulos de combate tático onde a abordagem da porta e o
avanço da equipe são praticados. As especificações de design e métodos de uso variam
nos muitos tipos e ainda podem oferecer adaptações locais, enquanto permanecem
conforme o modelo sueco original.
(destaques no original)
Como se vê, há um largo espectro de estruturas que pode servir de base para treinamentos e
pesquisa, contudo, os relatos apontam para a modelagem sueca de treinamento com uso de
contêineres marítimos (CFBT) visando preparar os bombeiros no conhecimento do
comportamento extremo do fogo em compartimento e no uso de técnicas de combate adequadas
6. CONCLUSÃO
No presente estudo foi visto como os treinamentos são importantes para conferirem eficiência
para o combate a incêndio e segurança para os bombeiros, contudo, também se discutiu como o
modelo tradicional de treinamento em pátio aberto não prepara os bombeiros para as operações
de combate a incêndio ofensivas, mais comuns nos dias atuais devido aos avanços nos EPIs,
devido às diferenças entre o ambiente e o comportamento do fogo no treinamento e as condições
do ambiente e do fogo nos incêndios estruturais reais. Viu-se que uma saída é o incremento dos
treinamentos com realismo. No entanto, quanto mais os treinamentos parecem-se com incêndios
reais, mais os riscos de incêndios estão presentes nos treinamentos. Foi abordado que muitas das
práticas de treinamento com fogo real, ou não são realistas o suficiente ou não são seguras. O
modelo sueco do treinamento a partir de contêineres metálicos tem se mostrado eficiente no
treinamento, pela redução no número de mortes e acidentes nos países onde foi implementado e,
ao mesmo tempo, seguro, pelo baixo índice de acidentes relatados ao longo de mais de 20 anos de
aplicação.
REFERÊNCIAS
- FAHY, Rita F. U.S. Fire service fatalities in structural fires, 1977-2000. Quincy, MA:
National Fire Protection Association, 2002.
- GRIMWOOD, Paul. et alii. 3D Firefighting: techniques, tips, and tactics. Stillwater, OK: Fire
Protection Publications. 2005.
- HARTIN, Edward. Why is Compartment Fire Behavior Training (CFBT) Important? Jun.
2007. Disponível em < http://cfbt-us.com/pdfs/WhyIsCFBTImportant.pdf > . Acesso em: 15 jul.
2009.
- ______. Realistic hot fire training to deal safely… Austrália: Fire Austrália Journal, 1999.
disponível em < http://users.tpg.com.au/sraffel/papers/realistic_live_fire_training_to_.pdf>.
Acesso em: 15 jul. 2009.