Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Goiânia
2016
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS E LINGUÍSTICA
FACULDADE LETRAS
Goiânia
2016
Ficha catalográfica elaborada automaticamente
com os dados fornecidos pelo(a) autor(a), sob orientação do Sibi/UFG.
A Toponímia, subárea da Onomástica, ocupa-se do estudo dos nomes dos lugares, ou seja, de
seus significados, de suas origens, das transformações e das motivações que influíram nas
escolhas desses nomes. Nesta tese, apresenta-se o estudo toponímico dos primeiros
municípios do estado do Tocantins, aqueles que se iniciaram e estabeleceram-se a partir da
mineração do ouro, no século XVIII. Trata-se também do estudo dos nomes dos rios –
hidronímia – da região devido à importância deles para a formação desses municípios. Na
maioria das vezes, os cursos d’agua são os primeiros elementos do meio ambiente a serem
batizados. Posteriormente, seus nomes passam a nomear também os aglomerados urbanos que
se formam em suas margens. Pretendeu-se, com este trabalho, identificar os significados e as
motivações que influenciaram a escolha dos nomes desses lugares. Para isso, procurou-se
descrever, analisar e interpretar os topônimos que compõem esse sistema onomástico, tendo
em vista que não são signos comuns da língua por sua função específica de referenciar e
identificar entidades no espaço geográfico, ao mesmo tempo que são instrumentos de
veiculação de ideologias. Por isso, este trabalho vai além da Linguística teórica, adota-se uma
visão interdisciplinar, em que a história, a geografia e outras áreas do conhecimento
interseccionam-se. Assim, buscou-se uma orientação metodológica capaz de unir essas áreas
no tratamento do fenômeno linguístico. Escolheu-se trabalhar com os princípios da
Linguística Histórica de tendência sociocultural, na perspectiva do método Onomasiológico e
em conjunto com o Wörter und Sachen (Palavras e Coisas), uma vez que são teorias do campo
da semântica correlacionadas com a história e a cultura. Procedeu-se à coleta de dados por
meio de documentos escritos de valor historiográficos que confirmam a existência dos
topônimos em épocas anteriores e na atualidade. Esses documentos permitiram a
reconstituição histórica dos fatos que motivaram a escolha toponímica e o resgate dos
possíveis significados. Percebeu-se que as motivações para as escolhas dos nomes dos
primeiros municípios tocantinenses fixam-se em crenças, valores culturais, ideologias,
aspectos da realidade física da região, além dos aspectos cognitivos. Esses fatores refletem-se
nas estruturas linguísticas dos topônimos, traduzindo a intencionalidade do denominador no
ato denominativo. E ainda, a toponímia dessa região em estudo conserva a visão de mundo e
as ideologias de poder, principalmente a política e a religiosa, do período inicial de sua
formação com pequenas alterações ao longo da história. Por isso, é um repositório de
memória coletiva por armazenar aspectos importantes da vida em sociedade, constituindo-se
em um rico patrimônio linguístico-cultural.
The toponym field, a sub-area of Onomastics, studies the names of places, their meanings and
origins, the changes and motivations which influence the process of choosing those names.
This study presents a toponym investigation regarding the first cities in the state of Tocantins,
the ones that started and established themselves from gold mining in the 18 th century. It also
approaches the names of rivers – hydronymy – in the region due to the significance of them in
the establishment of the cities. Since, in most cases, waterways are the first environmental
elements named. Afterwards, their names become the identification of urban settlements by
the riverside. This study aims to identify senses and motivations that influenced the process of
naming these places. To that end, toponyms shaping this Onomastics system were described,
analyzed and interpreted, observing that, because of their specific role in referencing and
identifying things in a geographic space, they are not ordinary signs of language, they are
instruments of ideological propagation at the same time. Hence, this investigation has gone
beyond theoretical Linguistics, it employs an interdisciplinary viewpoint, in which there is an
intersection among history, geography and other knowledge areas. Thus, we searched for a
methodology that enables combining these areas as to treat the linguistic phenomenon. We
have decided on using principles of Historic Linguistics with sociocultural traces, in the
Onomastics method perspective and along with Wörter und Sachen (Words and Things), since
they are both theories that approach semantics as related to history and culture. Data
collection, which has been carried out through historiography written documents, sustained
toponyms existence before and nowadays. These documents allowed a historical retreat of
facts that encouraged the toponym choice and retrieve possible meanings. Aspects regarding
beliefs, cultural values, ideologies, geographic features, and cognition were identified as the
motivation when choosing the names of the first cities in Tocantins. These factors reflect
themselves in the toponym linguistic structure, translating the dominant intentionality when
naming places. Besides, toponym of the region observed preserve a world-view and an
ideology of power perpetuation, mainly related to politics and religion, from the very
beginning and with slight changes throughout the history. Therefore, it is a collective memory
repository, because it records significant aspects of life in society, representing a valuable
linguistic-cultural heritage.
Keywords: Onomastic. Toponym. Lexicon. Culture. History. Cities from Tocantins state.
LISTA DE ABREVIATURAS
art. – artigo
adj. – adjetivo
corr. – corruptela
cat. – catalão
desin. – desinência
dial. – dialeto, dialetal
fr. – francês
esp. – espanhol
eng. – engadino
ex. – exemplo
it. – italiano
hebr. – hebraico
lat. – latim
lomb. – lombardo
pl. – plural
port. – português
prep. – preposição
prov. – provençal
rom. – romeno
rét. – rético
sic. – siciliano
subst. – substantivo
suf. – sufixo
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 13
PARTE I .................................................................................................................................. 19
ONOMÁSTICA E HISTÓRIA.............................................................................................. 19
CAPÍTULO 1 – PROCEDIMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS ........................ 20
1.1 ONOMASIOLOGIA ....................................................................................................... 21
1.2 WÖRTER UND SACHEN (PALAVRAS E COISAS) ................................................... 23
1.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................................................................... 26
CAPÍTULO 2 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ............................................................. 32
2.1 O LÉXICO ...................................................................................................................... 32
2.1.1 O léxico português .................................................................................................. 34
2.1.2 Formação e ampliação do léxico português ......................................................... 38
2.2 ONOMÁSTICA .............................................................................................................. 41
2.2.1 O nome próprio ...................................................................................................... 43
2.2.3 Nomes próprios: aspectos semânticos .................................................................. 46
2.2.4 Toponímia: aspectos gerais ................................................................................... 49
2.2.4.1. Aspectos socioculturais, históricos e físicos..................................................... 51
2.2.4.2 O signo: o linguístico e o toponímico................................................................ 54
2.2.4.3 Estrutura do topônimo ....................................................................................... 63
2.2.4.4 Motivação toponímica ....................................................................................... 64
2.2.4.5 Classificação toponímica ................................................................................... 67
2.2.5 Hierotoponímia: topônimos relacionados ao sagrado......................................... 75
CAPÍTULO 3 - CONTEXTO SÓCIO-HISTÓRICO DO ESTADO DO TOCANTINS . 80
3.1 MENTALIDADE DA ÉPOCA ....................................................................................... 80
3.2 A RELAÇÃO ENTRE IGREJA E ESTADO .................................................................. 82
3.3 OCUPAÇÃO DO TERRITÓRIO GOIANO ................................................................... 84
3.3.1 Os povos indígenas ................................................................................................. 88
3.3.2 Os negros ................................................................................................................. 90
3.3.3 Os brancos ............................................................................................................... 92
3.4 O ESTADO DO TOCANTINS ....................................................................................... 94
PARTE II................................................................................................................................. 97
APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS .................................................................. 97
CAPÍTULO 4 - HISTÓRICO DOS LUGARES E ANÁLISE TOPONÍMICA ................ 98
4.1 OS PRIMEIROS ARRAIAIS .......................................................................................... 98
4.1.1 Almas ..................................................................................................................... 100
4.1.1.1 Topônimo Almas ............................................................................................. 101
4.1.2 Arraias ................................................................................................................... 102
4.1.2.1 Topônimo Arraias ............................................................................................ 105
4.1.3 Chapada da Natividade ....................................................................................... 107
4.1.3.1 Topônimo Chapada da Natividade .................................................................. 109
4.1.4 Conceição do Tocantins ....................................................................................... 110
4.1.4.1 Topônimo Conceição do Tocantins ................................................................. 112
4.1.5 Dianópolis .............................................................................................................. 114
4.1.5.1 Topônimo Dianópolis ...................................................................................... 116
4.1.6 Monte do Carmo................................................................................................... 118
4.1.6.1 Topônimo Monte do Carmo ............................................................................ 121
4.1.7 Natividade ............................................................................................................. 123
4.1.7.1 Topônimo Natividade ...................................................................................... 127
4.1.8 Paranã ................................................................................................................... 129
4.1.8.1 Topônimo Paranã ............................................................................................. 131
4.1.9 Porto Nacional ...................................................................................................... 133
4.1.9.1 Topônimo Porto Nacional ............................................................................... 135
4.1.10 Príncipe ............................................................................................................... 137
4.1.10.1 Topônimo Príncipe ........................................................................................ 138
4.1.11 Taguatinga .......................................................................................................... 139
4.1.11.1 Topônimo Taguatinga.................................................................................... 141
4.1.12 Classificação geral dos topônimos .................................................................... 142
4.2 HIDRONÍMIA: OS NOMES DOS RIOS...................................................................... 144
4.2.1 O rio Tocantins e seus afluentes .......................................................................... 147
4.2.1.1 Hidrônimo Tocantins ....................................................................................... 149
4.2.2 Rio Paranã ............................................................................................................ 149
4.2.2.1 Hidrônimo Paranã ............................................................................................ 150
4.2.3 Rio Palma .............................................................................................................. 151
4.2.3.1 Hidrônimo Palma ............................................................................................. 152
4.2.4 Rio Palmeiras ........................................................................................................ 153
4.2.4.1 Hidrônimo Palmeira ........................................................................................ 153
4.2.5 Rio Manuel Alves ................................................................................................. 154
4.2.5.1 Hidrônimo Manuel Alves ................................................................................ 155
4.2.6 Rio do Sono ........................................................................................................... 156
4.2.6.1 Hidrônimo Sono .............................................................................................. 157
4.2.7 Classificação geral dos Hidrônimos .................................................................... 158
4.3 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............................................................................. 159
CONCLUSÃO ....................................................................................................................... 164
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 167
ANEXOS................................................................................................................................ 175
ANEXO A - FOTOS DOS RIOS......................................................................................... 176
ANEXO B - CIDADES HISTÓRICAS .............................................................................. 179
ANEXO C – MAPAS .......................................................................................................... 193
ANEXO D – LEIS E DECRETO ........................................................................................ 198
ARTIGO 13 DA CONSTITUIÇÃO DE 1988 QUE TRATA DA CRIAÇÃO DO ESTADO
DO TOCANTINS ............................................................................................................... 198
DECRETO LEGISLATIVO Nº 001, DE 1º DE JANEIRO DE 1989. ................................. 200
LEI COMPLEMENTAR Nº 1, DE 9 DE NOVEMBRO DE 1967 ...................................... 202
LEI COMPLEMENTAR Nº 46, DE 21 DE AGOSTO DE 1984 ......................................... 206
13
INTRODUÇÃO
1
Conferir mapa da mesorregião oriental do Tocantins nos anexos, p. 193.
14
que orientou toda a pesquisa: que fatores motivaram as escolhas dos topônimos dos primeiros
municípios do Tocantins? Essa pergunta levou a formular a hipótese de que os nomes das
cidades refletem o ideal político, religioso, sociológico e cultural da época. Uma mudança
nesses ideais reflete-se, na maioria das vezes, na alteração toponímica. Em outras palavras,
quando um topônimo é substituído por outro é porque aquele já não atende aos ideais da
sociedade.
Primeiramente, pensou-se em trabalhar a toponímia do Tocantins com um viés mais
histórico. Para isso, escolheram-se as cidades do ciclo do ouro por serem o berço da história
desse Estado. Além disso, a razão de escolher essa região têm motivações outras, uma delas
pessoal: por ter nascido na cidade de Dianópolis, lá cresci ouvindo histórias e relatos sobre a
busca desenfreada dos portugueses pelo ouro, sobre os aldeamentos indígenas e o sofrimento
dos escravos negros. Tudo isso fez parte do meu imaginário desde a infância. Antes de
aprender a ler, ouvia os mais velhos contando histórias de meninas índias sendo capturadas
como um animal selvagem e “amansadas” para se tornarem esposas e/ou escravas de homens
“brancos”. Essas narrativas eram repetidas à exaustão como se fosse algo natural. Na época,
esses relatos eram algo fantástico para o mundo de uma criança. Somente mais tarde é que se
compreendeu a dimensão sócio-histórica, política e ideológica desse contexto.
As histórias das lutas políticas separatistas do norte goiano desde o século XIX até o
XX também fazem parte da vida da maioria dos moradores dessa região, visto que alguns
parentes eram militantes desses ideais. Participavam sempre que podiam dessas reuniões
políticas, depois contavam em casa o que havia sido tratado e em que situação encontrava-se a
luta pela emancipação do território.
Os discursos fundamentados nos diversos movimentos políticos já eram algo
conhecido e aceito como verdadeiro. Esses discursos tinham como principal função justificar
a diferença cultural e econômica da região norte em relação à região sul do Estado de Goiás.
Destacam-se três momentos importantes nas lutas separatistas do norte goiano, sendo o
primeiro de 1821-1823; o segundo de 1956-1960; e o terceiro de 1985-1988. Cada um teve
um contexto político, sociocultural e econômico específico, mas com o mesmo propósito, a
emancipação política do norte (RODRIGUES, 2011).
Por causa desses discursos divulgados na sociedade durante décadas, não se
questionou a mudança repentina de uma identidade. Apenas mais tarde é que se pensou a
respeito diante da pergunta sobre a identidade de quem nascera nessa região antes da divisão
do estado de Goiás. O argumento era que para ser tocantinense teria que ter nascido depois de
1988, uma vez que, antes dessa data, a região ainda pertencia ao estado de Goiás, por isso
15
2
A sússia (súcia ou súça) é dançada no folclore de algumas cidades tocantinenses como Paranã, Santa Rosa do
Tocantins, Monte do Carmo, Natividade, Conceição do Tocantins, Peixe, Tocantinópolis dentre outras. É
considerada uma dança de origem africana, a qual se realiza com músicas agitadas, ao som de tambores e cuícas,
com homens e mulheres dançando em círculo (PORTAL TOCANTINS, 2016).
3
Pequena formiga avermelhada de picada dolorida. Como dança folclórica, consiste em os dançarinos
sapatearem como se estivessem sendo mordidos pelas formigas jiquitaia (PÓVOA, 2002).
A jiquitaia é um passo da dança da sússia, ou seja, dança-se a jiquitaia na sússia (PORTAL TOCANTINS,
2016).
4
A Catira é dançada em círculo formando pares que dançam ao som das mãos e dos pés, num sapateado
compassado. É comum entre os grupos que fazem parte dos giros das folias de reis e do Divino Espírito Santo,
sendo o que diferencia a Catira dos foliões do Tocantins com a Catira apresentada em outros estados (PORTAL
TOCANTINS, 2016).
5
Os Caretas são personagens mascarados que protegem um espaço com mantimentos e aqueles que se atrevem a
tentar pegá-los podem levar algumas chicotadas dos mascarados. Esses personagens fantasiam-se com máscaras
de couro, papel ou cabaça, com chicotes feitos de sola ou trançados de palha de buriti na mão. É uma
manifestação que se realiza anualmente na Semana Santa, entre a Sexta-feira da Paixão e a madrugada do
Sábado de Aleluia, com algumas variações em outras regiões do estado (RODRIGUES, 2014).
16
Linguística Histórica, o projeto envolve pesquisa nos estado de Goiás, Tocantins, Minas
Gerais e Maranhão. Esse projeto teve seu início em outro projeto, o FILOBAND (Filologia
Bandeirante), tornando-se depois independente deste. O FILOBAND (Filologia Bandeirante),
por sua vez, propõe um mapeamento linguístico nas regiões onde os bandeirantes paulistas e
portugueses foram os responsáveis pela colonização, dos séculos XVII ao XIX.
19
PARTE I
ONOMÁSTICA E HISTÓRIA
20
1.1 ONOMASIOLOGIA
conceito (significado)
designação
coisa (referente)
nome (significante)
etimologia encontra-se no conhecimento dessa realidade. Para isso, recomenda que seja
necessário conhecer, sempre que possível, o objeto designado por um termo, para que o
significado seja devidamente captado. Ao conhecer a realidade, a natureza, as medidas, a
forma, o uso dos objetos, é possível estabelecer a origem e a história das palavras com que
esses mesmos objetos foram designados.
Os mentores desse método, Hugo Schuchardt (1842-1929) e Rudolf Meringer (1859-
1913), consideravam que as coisas vêm antes das suas denominações, podendo existir sem
que sejam nomeadas, enquanto as palavras dependem das “coisas”, estão ligadas a elas. Por
isso, Schuchardt, mais do que Meringer, fala de Sachen und Worter “Coisas e Palavras”. Eles
fundaram, em 1909, a revista Kulturhistorische Zeitschrift für Sprach- und Sachforschung
(Palavras e Coisas: Revista de Cultura e História para Pesquisa de Linguagem e de Coisas),
para divulgação do método, dos seus objetivos e resultados. O título da revista instituiu o
nome do método.
A ideia de que as coisas precedem as palavras já estava implícita na gramática grega.
Ao conhecer profundamente a “coisa”, chega-se ao “étimo” da palavra que a designa, ou seja,
ao significado correto e originário com que a coisa foi primeiramente nomeada. É importante
esclarecer aqui que Schuchardt (apud BASSETO 2013, VIDOS 2001) entendia por Sachen
“coisa” qualquer realidade, podendo se referir tanto a acontecimentos e estados como a
objetos, ao sensível e ao insensível, ao real e ao irreal.
Como observa Ilari (2006), um exemplo muito comum na literatura para ilustrar esta
abordagem é a história da palavra fígado e de seus cognatos românicos (it. fégato, fr. foie, cat.
e prov. fetge, esp. hígado, port. fígado, rom. ficát, e eng. Fiyat). Apesar de essas palavras
serem tradução exata do latim iecur, era impossível traçar entre elas uma derivação fonética
regular. Só depois de saber que coisa (Sachen) havia significado o latim ficatum, forma
originária das palavras românicas, é que se chegou à origem destas.
Para Campbell (2004), o método Wörter und Sachen (Palavras e Coisas) tem a ver
com inferências histórico-culturais que podem ser feitas pela investigação das palavras,
25
baseando-se na ‘analisabilidade’ das palavras. Supõe-se que as palavras que são analisadas em
partes transparentes (vários morfemas) podem ter sido criadas mais recentemente na língua do
que palavras que não tenham essa transparência morfêmica. Essa técnica dá uma cronologia
relativamente aproximada para diferentes tipos de vocabulário. Sobretudo, supõe-se que itens
culturais denominados por termos analisáveis são também adquiridos mais recentemente
pelos falantes e aqueles que são expressos por palavras não analisáveis representam itens mais
velhos e instituições. Outra estratégia desse método envolve fazer inferências por meio de
informações de itens culturais de quem os nomes sofreram visivelmente mudança de
significado.
Crowley (2003) admite que o método “Palavras e Coisas” pode ser usado para fazer
reconstrução cultural e chegar ao conteúdo de uma protocultura. O argumento é que, se se
pode reconstruir uma palavra para alguma coisa na protolíngua, é possível também supor que
a coisa a que ela se refere foi provavelmente de importância cultural na vida dos seus falantes,
ou que foi ambientalmente marcante. Além disso, segundo o autor, o método pode também
dizer muito sobre a terra natal de uma família linguística, assim também é possível, por meio
do método Palavras e Coisas, fazer suposições sobre as rotas legítimas seguidas pelos povos
para se chegar aos locais em que se encontram no presente.
Finalmente, Basseto (2013) destaca que os trabalhos com o método “Palavras e
Coisas” ultrapassou os limites estreitos dos neogramáticos, ao abandonar as leis cegas
propostas por estes e buscar o que existe de vivo na linguagem. Esse método destacou a
semântica ao estabelecer a etimologia e até a biografia das palavras. Além disso, tornou os
estudos filológicos mais objetivos.
Ao levar em conta as considerações tecidas acima, percebe-se que o método “Palavras
e Coisas” pode ser aproveitado na Toponímia. Quando se busca relacionar a história do lugar
com a história do nome que o representa está-se vinculando a palavra (o nome) à coisa (o
lugar). Além disso, pode-se fazer inferências histórico-culturais pela investigação do
topônimo, como propõe Campbell (2004, p. 415), visto que “os aspectos linguísticos dos
nomes de lugar frequentemente permitem fazer inferências históricas sobre as línguas e os
povos que as falavam”.
Diante disso, para os estudos toponímicos em que se busca relacionar os fatores
linguísticos, históricos e socioculturais, o método Onomasiológico ligado ao “Palavras e
Coisas” são bem significativos, visto que eles capturam com mais precisão as relações entre
língua e sociedade e, mais especificamente, entre léxico e cultura.
26
Este trabalho tem como objeto de pesquisa os topônimos dos primeiros municípios do
estado do Tocantins, os quais se localizam na mesorregião oriental desse estado. Os
topônimos são Almas, Arraiais, Chapada da Natividade, Conceição do Tocantins, Dianópolis,
Monte do Carmo, Natividade, Paranã, Porto Nacional, Príncipe e Taguatinga. Além desses,
contempla-se neste trabalho os nomes dos rios que cortam essa mesorregião: Tocantins,
Paranã, Palma, Palmeira, Manuel Alves e Sono.
A pesquisa teve como principal objetivo a descrição, a análise e a classificação, desses
topônimos, centrando-se nas motivações toponímicas que predominaram no ato
denominativo. Além disso, buscou-se interpretar os significados desses nomes a partir da
etimologia, da história e da geografia local. Para isso, iniciou-se a pesquisa fazendo um
levantamento histórico e geográfico dos municípios contemplados e do estado do Tocantins
desde a ocupação pelos primeiros exploradores até a atualidade para formação do corpus.
Utilizou-se para coleta dos dados, os diários de viagem de naturalistas europeus que
visitaram o Brasil entre os séculos XVIII e XIX. Um deles é o livro do botânico inglês George
Gardner, Viagem ao interior do Brasil principalmente nas províncias do Norte e nos distritos
do ouro e do diamante durante os anos de 1836-1841 (1975). Neste texto, o autor deixou
registrado dados importantes a respeito da fauna e flora, das condições do meio ambiental,
dos usos e costumes do povo, além de dados geográficos e históricos dos lugares por onde
27
andou. Nesse livro, encontram-se informações sobre os antigos arraiais, aldeias e vilas, tais
como Conceição, Almas, Chapada, Natividade, Porto Imperial (atual Porto Nacional), Arraias
e Duro (atual Dianópolis). Ele menciona também os rios Palma, Manuel Alves e Tocantins,
dentre outros, e as serras e chapadas.
Outro importante documento histórico tem-se nos relatos da viagem pelo interior do
Brasil do médico, geólogo, botânico austríaco Johann Emmanuel Pohl, em seu livro Viagem
no interior do Brasil entre os anos de 1817 a 1821 (1976). Nesse material, além de referir-se
aos arraiais, aldeias, vilas e aos elementos geográficos, o autor ressalta também os
acontecimentos culturais, por exemplo, a festa do Espírito Santo, em Santa Cruz, e de Nossa
Senhora da Natividade, em Natividade dentre outros.
Outra obra consultada foi a do botânico, naturalista e viajante francês Augustin
François César Prouvençal de Saint-Hilaire, Viagem à província de Goiás (1975). No
entanto, os registros desse autor, ao citar o estado de Goiás, focam-se na região sul. Apesar da
sua importância para a histórica de Goiás, para este trabalho, em especial, mostrou-se
insuficiente por não se referir à região norte.
Em compensação, as obras do militar, historiador luso-brasileiro e Governador das
Armas da Província de Goiás, Raimundo José da Cunha Matos, Itinerário do Rio de Janeiro
ao Pará e Maranhão pelas Províncias de Minas Gerais e Goiás (2004 [1836]), Chorographia
Histórica da província de Goyaz (1979 [1874]), são um repositório de informações a respeito
da formação dos antigos arraiais e da situação em que estavam nas primeiras décadas do
século XIX. Referem-se também, com precisão, aos elementos geográficos, bem como à
fauna e à flora local. Essas obras são indispensáveis para quem deseja conhecer a história em
conjunto com a geografia dos estados por onde passou o autor.
A literatura historiográfica a respeito da colonização de Goiás contribuiu bastante para
a constituição deste trabalho. Uma das obras consultadas foi do Pe. Luiz Antônio da Silva e
Souza, O Descobrimento da Capitania de Goyaz: governo, população e coisas notáveis, de
1812, (1967), um referencial teórico indispensável para os estudos sobre a colônia e a
província de Goiás. Além de José Martins de Alencastre, Anais da província de Goiás (1979)
e outros.
Todavia, o grande referencial para a construção do contexto sócio-histórico baseou-se
na vasta obra do historiador Luís Palacin e seus colaboradores, tais como O Século do ouro
em Goiás (1994), História de Goiás: 1722-1972 (2008), História de Goiás em Documentos I:
Colônia (1995), Sociedade Colonial: 1549 a 1599 (1981), Coronelismo no extremo norte de
Goiás: O Padre João e as três revoluções de Boa Vista (1990). Nesse conjunto teórico,
28
A partir das necessidades e objetivos da pesquisa, adaptou-se esse modelo para uma
ficha lexicográfico-toponímica que permitisse agrupar as informações essenciais de cada
30
topônimo suficientes para análise. Essas fichas serão apresentadas no capítulo 4, organizadas
por ordem alfabética, considerando os seguintes elementos:
Topônimo: Município:
Localização:
Estrutura morfológica:
Etimologia:
Outros topônimos:
Contexto histórico:
Motivação toponímica:
31
Mecanismo conceptual:
Taxonomia:
Fonte: adaptada de Dick (2004).
Neste capítulo, faz-se uma discussão dos pressupostos teóricos que fundamentaram a
pesquisa. Inicialmente, apresenta-se uma abordagem sobre a construção do léxico a partir da
percepção, passando pela categorização e chegando à nomeação do mundo exterior. Aborda-
se também o léxico português e os processos de formação e ampliação desse léxico, visto que
“o sistema onomástico utiliza-se dos mesmos constituintes disponíveis no léxico virtual de
uma língua” (DICK, 2001, p. 81). Isso quer dizer que a Onomástica faz parte da Lexicologia.
Em seguida, trata-se da Onomástica, a ciência maior em que estão inseridas a Toponímia e a
Antroponímia. Consequentemente, a seguir, faz-se uma discussão a respeito da Toponímia
com o objetivo de apresentar os conceitos básicos da disciplina, seu alcance e perspectivas,
além de abordar os conceitos determinantes para essa área tais como signo toponímico,
motivação e classificação toponímica.
2.1 O LÉXICO
Couto (2007) salienta, ainda, que a parte efetiva do léxico nomeia fenômenos, ideias,
coisas, ações e qualidades físicas, psíquicas e sociais do meio ambiente. No entanto, nem tudo
do meio ambiente físico, social ou psíquico recebe um nome. Isso somente ocorrerá se o
fenômeno despertar o interesse positivo ou negativo dos membros da comunidade, como já
bem observou Sapir (1969). O interesse dos falantes por determinado fenômeno torna-o
visível, capaz de se interpor entre os membros de uma população, em um momento de
interação comunicativa. Isso faz com que um dado do meio ambiente receba um nome, ou
seja, lexicalize-se, seguindo o processo que vai da percepção à conceptualização. Assim,
compreende-se que o léxico é formado e armazenado na mente dos falantes como resultado da
projeção dos aspectos do meio ambiente que lhes são interessantes.
Ao nomear a sua realidade, os seres humanos classificam e organizam o modo como
percebem o mundo. Biderman (2001) observa que a atividade de nomear é consequência do
processo de categorização. Este, por outro lado, fundamenta-se na capacidade dos seres
humanos de discernir traços característicos entre os referentes percebidos ou apreendidos pelo
seu aparato sensitivo e cognitivo. Uma vez que ocorre o processo de categorização, o ato de
nomear vem logo em seguida. Por isso, a categorização é o processo em que se baseia a
semântica de uma língua natural e foi por meio dele, também, que o homem desenvolveu a
capacidade de associar palavras a conceitos.
Para Biderman (2006), a nomeação da realidade pode ser vista como a primeira etapa
na trajetória científica de conhecimento do universo realizado pela mente humana. Ao
identificar semelhanças e diferenciar traços característicos que individualizam os referentes
em seres distintos, o homem foi, aos poucos, “estruturando o conhecimento do mundo que o
cerca, dando nomes (palavras e termos) a essas entidades discriminadas” (BIDERMAN, 2006,
p. 1). Ao nomear o mundo ao seu redor, os falantes constroem e reconstroem seu léxico.
No processo de aquisição da linguagem, o léxico é o domínio que não cessa; é um
processo contínuo na vida de um indivíduo. O léxico é incorporado, paulatinamente, por meio
de atos sucessivos de cognição da realidade e de categorização da experiência, por meio de
signos linguísticos: os lexemas. “A percepção, a concepção e a interpretação dessa realidade
são registradas e armazenadas na memória [...]” (BIDERMAN, 2001, p. 181). Segundo a
autora, a forma como ocorre esse processo na memória não é conhecido; o que se sabe é que
ela registra de forma ordenada o sistema lexical.
No entanto, Biderman (2001) ressalva que os dados empíricos comprovam que os
indivíduos estruturam mentalmente o seu repertório léxico segundo os modelos e os usos de
34
De acordo com Batista (2011), o léxico apresenta dois tipos: o léxico interno e o
externo. O primeiro refere-se ao conjunto de conhecimentos que todos os falantes têm da sua
língua materna, tais como a estrutura, o significado, a composição e a formação das unidades
lexicais. Esse léxico interno representa a competência lexical, o conhecimento abstrato,
internalizado. O segundo tipo, léxico externo, é o conjunto de palavras à disposição do uso e
da dicionarização. Nesse sentido, o léxico externo pode ser definido como o inventário
completo dos vocábulos de uma determinada língua disponível aos falantes.
35
O léxico é a parte da língua aberta e suscetível a expansões, devido ao fato de ele estar
sempre apto a incorporar novas unidades e descartar outras que não são mais usadas pelos
falantes. Isso ocorre em consequência de o léxico recortar a percepção do mundo, em seus
aspectos naturais, biológicos, sociais e culturais. Isso quer dizer que o falante representa
linguisticamente o seu mundo por meio de itens lexicais, “aqueles que possuem uma
significação por elas mesmas, já que categorizam (a partir de modelos que podem ser tomados
como gerais) o mundo a nosso redor” (BATISTA, 2011, p. 34).
Biderman (2001) afirma que o sistema lexical de uma língua é o resultado de todas as
experiências acumuladas por uma sociedade e o acervo de sua cultura, passados por gerações.
Os falantes são os agentes que atuam na perpetuação e reelaboração contínua do léxico de
uma língua. Nesse processo, o léxico pode ser ampliado, modificado ou reduzido. Isso ocorre
em consequência das transformações sociais e culturais que irão afetar os usos vocabulares.
Assim, são os usuários da língua – os falantes – que criam e conservam o seu léxico, na
interação com seu meio físico-ambiental, social e cultural.
Essa afirmação vai ao encontro a de Sapir (1969, p. 45), o qual assegurar que “o léxico
da língua é que mais nitidamente reflete o ambiente físico e social dos falantes”. O autor
ressalta, ainda, que o léxico completo de uma língua pode ser visto como um registro
complexo de todas as ideias, interesses e ocupações que chamam a atenção da comunidade.
Nesse sentido, o acervo lexical de uma língua constitui-se de um conjunto de lexemas
– ou de palavras – que representam o mundo extralinguístico, nomeando as coisas, as
qualidades e os processos. Tem um forte componente semântico, que se estrutura no exterior
do sistema linguístico, na relação entre indivíduo e sociedade. Fazem parte desse conjunto o
verbo, o adjetivo, o substantivo e o advérbio nominal, compreendidos pela linguística como
classe aberta, por estarem sempre se enriquecendo, devido às mudanças do mundo exterior
(CARVALHO, 2009).
Com relação ao acervo lexical do português, de acordo com Coutinho (1976), formou-
se a partir do latim popular, tendo como base as palavras que passaram por transformações no
romance lusitânico. São elas que compõem o padrão fonético e morfológico do português.
Acresce que essa modalidade do latim prevaleceu sobre a do latim clássico ou culto em toda a
Península Ibérica. Porém, o latim clássico veio a colaborar com o léxico português em um
momento posterior.
Com as mudanças socioculturais, houve a necessidade de novos termos para novos
elementos, e esses termos foram buscados no latim clássico e introduzidos na língua por meio
da escrita, para suprir as necessidades de um vocabulário erudito, literário ou religioso.
36
6
Comunidade quilombola localizada no município de Chapada da Natividade.
7
Comunidade quilombola localizada no município de Santa Rosa do Tocantins.
37
A respeito dos termos recebidos das línguas indígenas, destaca-se o Tupi pela difusão
histórica dessa língua. Dietrich e Noll (2010) observam que esse léxico, considerado típico do
português brasileiro, não desempenha nenhuma função no âmbito do vocabulário básico. Para
eles, a influência dessa língua no português brasileiro é indiscutível no vocabulário e em
nomes próprios (toponímia, hidronímia, coronímia, antroponímia). Esse vocabulário indígena
sobressai-se por conter uma grande quantidade de substantivos oxítonos, geralmente,
incomuns ao português. Eles referem, frequentemente, ao ambiente natural dos indígenas
como os nomes de frutos e plantas, fauna, formas de paisagem, topônimos, hidrônimos,
antropônimos. Os colonizadores portugueses, devido à necessidade de nomear objetos e
realidades desconhecidas para eles, mas comuns na natureza e na vida no Brasil, adotaram
termos das línguas autóctones.
Dietrich e Noll (2010) observam também que ao contrário do léxico básico, os
topônimos (nomes próprios de lugares, rios, praias, campos, serras) e antropônimos (nomes
individuais de pessoas, sobrenomes, apelidos, alcunha, pseudônimo e outros) não têm suas
origens em uma das línguas gerais do período colonial, pois foram criados em um período
posterior em que essas línguas já não eram mais faladas. Dessa forma, o Tupi funciona como
o grego e o latim antigo nas ciências, isto é, uma fonte virtual ou repositório de raízes lexicais
para formar topônimos e antropônimos. Em se tratando dos nomes de origem Tupi, os
topônimos Paranã (TO) e Taguatinga (TO) são exemplos que se apresentam neste estudo.
Para falar dos termos provindos de línguas africanas, Bonvini (2008) inicia lembrando
que empréstimo linguístico é um fenômeno sociolinguístico normal e frequente, resultado do
contato de povos de línguas e culturas diferentes. Posto isso, o empréstimo linguístico
representa a capacidade que as línguas têm de apropriarem-se de termos de outras quando
necessários à sua própria expressividade e/ou quando o contexto discursivo o exigir.
Assim, em situação de contato linguístico e cultural ocorrem trocas bilaterais entre
falantes. Em relação ao contato do português com línguas africanas, termos oriundos destas,
encontrados no léxico do português brasileiro, são testemunhas dessa relação linguística e
cultural, além de estarem sujeitos a ela. No Brasil, esse contato ocorreu a partir da segunda
metade do século XVI até o final do século XIX com a importação de escravos africanos.
Durante esses quatro séculos, quatro milhões (ou mais) de africanos das mais variadas
culturas e línguas entraram no Brasil. Dentre as línguas, pode-se citar o Iorubá (ou Ioruba) e
Nagô (da Nigéria), Gege (do Daomé), Mina (da Costa do Ouro), Mandinga e Haussá (da
Guiné e da Nigéria), línguas Banto (de Angola e do Congo), Quincongo, Cabida e outras. A
contribuição africana pode ser percebida na sociedade brasileira por meio dos costumes e na
38
8
Comunidade quilombola.
9
Comunidades quilombolas.
40
aglutinação, os elementos fundem-se num todo fonético, com acento único, ocorrendo perda
ou alteração de fonema.
Segundo Basílio (2007), o que caracteriza e define a função do processo de
composição é a sua estrutura, dado que cada uma das bases que se juntam para formar uma
palavra composta tem seu papel definido pela estrutura da composição. Para exemplificar,
essa autora cita o composto formado por substantivo + substantivo, em que o primeiro
funciona como núcleo da construção e o segundo como modificador, especificador ou
qualificador, tais como sofá-cama, couve-flor, salário-família. Em composição de substantivo
+ adjetivo, o núcleo é sempre o substantivo e o adjetivo o modificador, independente da
ordem que ocorrer como em erva-doce, amor-perfeito. Em composto formado com verbo +
substantivo, o substantivo tem a função semelhante a do objeto direto do verbo na sentença
como em guarda-roupas, mata-mosquito, beija-flores.
A autora destaca que a função da composição é a nomeação ou caracterização de seres
pela junção de dois elementos semânticos, de existência independente no léxico, em apenas
um elemento lexical. Essa nomeação por esse processo pode ser descritiva ou metafórica,
independente dos casos de acidentalidade, ou nomeação arbitrária. Assim, na nomeação
descritiva, um ser, entidade, substância e outros itens são denominados por suas
características objetivas mais relevantes. Tem-se nesse tipo de composição o núcleo e um
elemento particularizante correspondente ao especificador. Exemplos desse tipo encontram-se
nas formações de substantivo + substantivo, como em sofá-cama, papel-alumínio.
Outro caso de nomeação pelo processo de composição é a que ocorre por meio da
metáfora. Tem-se uma situação de nomeação metafórica quando a descrição do objeto, em
vez de caracterizá-lo por critérios objetivos, faz por meio de uma representação em termos
associativos. Entretanto, é importante destacar que nas denominações metafóricas por
composição, a metáfora somente será reconhecida se o significado for conhecido pelo falante,
uma vez que ele não poderá ser inferido pela simples observação das formas. Por exemplo, no
caso do nome do doce olho de sogra, apesar de apresentar característica com um olho, só é
possível compreender seu significado se conhecer as acepções do termo sogra na nossa
cultura. Logo, “o distanciamento entre o significado do todo e o significado das partes é
normal nas formas compostas pela própria função da nomeação; esse distanciamento é
especialmente acentuado no caso das formações metafóricas” (BASÍLIO, 2007, p.33).
Em se tratando do léxico toponímico, o processo de composição demonstra alta
produtividade, principalmente por meio da justaposição, tanto substantivo + substantivo,
substantivo + adjetivo quanto adjetivo + substantivo. Podem ser citados, como exemplos, os
41
topônimos Monte do Carmo (TO), (subs + subs), Chapada da Natividade (TO) (subs + subs),
Porto Nacional (TO) (subs + adj), Campos Lindos (TO) (subs + adj), Nova Olinda (TO) (adj +
subst), Novo Jardim (TO) (adj + subs).
Outro mecanismo de formação de palavras que deve ser considerado é o hibridismo.
Ele consiste na combinação de elementos de línguas diversas para formar novos vocábulos.
Entretanto, não se considera um novo processo de formação vocabular, pelo fato de o falante
nativo não identificar ou determinar sincronicamente a origem da língua das partes que
compõe as palavras formadas por meio de hibridismos. De acordo com Monteiro (2002), os
processos que produzem vocábulos híbridos são os mesmos de derivação e composição, a não
ser pela origem dos elementos formadores, como nos exemplos sociologia (latim + grego),
burocracia (francês + grego) e psicomotor (grego + latim).
Ainda a respeito de composição, é relevante mencionar aqui as considerações de
Camara Jr. (1975) sobre os helenismos. A grande quantidade de helenismos eruditos
integrados à língua portuguesa favoreceu certos prefixos que passaram a funcionar no
processo de formação de novas palavras, de características eruditas e literárias. Ocorreu o
mesmo com alguns termos gregos de significação definida que passaram a servir de base
sufixal em determinadas áreas semânticas como -polis, para indicar “cidade” em nomes
compostos na toponímia brasileira, por exemplo, em Petrópolis “cidade de Pedro” (D. Pedro
II), Florianópolis “cidade de Floriano” (Floriano Peixoto). No corpus em estudo, o sufixo -
polis está presente no topônimo Dianópolis (cidade das Dianas).
Como se destacou no início, a Onomástica localiza-se no domínio da Lexicologia,
pois tem como objeto de estudo uma parte específica do léxico: os nomes próprios. Por isso,
na próxima seção, apresenta-se uma discussão a respeito dessa ciência.
2.2 ONOMÁSTICA
mundo desde a antiguidade, como pode ser comprovada nas importantes obras da história e da
civilização da humanidade.
Apesar de fazer parte da nossa vida e ser fruto da nossa cultura, não pensamos muito
sobre o nome próprio, no porquê de alguém ou um lugar ter o nome que tem. No entanto, o
estudo sobre o nome começou a ser pensado e formulado no século II a.C., pelo gramático
grego Dionísio de Trácia, responsável pela sistematização da primeira gramática ocidental
(CARVALHINHOS, 2008). A partir desse contexto, surge a Onomástica, a ciência que se
ocupa dos estudos da origem e alterações (na forma e no significado) dos nomes próprios. Ela
é um ramo das ciências linguísticas e, atualmente, divide-se em dois campos: a Toponímia
(estudo do topônimo ou nome de lugar) e a Antroponímia (estudo do antropônimo ou nome
pessoal).
Seu método de trabalho se desenvolve, principalmente, em linha documental a partir
de dados oficiais como mapas, listas de nomes ou outros documentos de valor historiográfico
e lexicográfico. Com isso, possibilita a junção da história da nomenclatura com momentos
históricos e sociais mais amplos. E essa é a perspectiva adotada para este trabalho. Por outro
lado, apesar de pertencer à ciência da linguagem, a onomástica estabelece-se a partir do
suporte de outros campos do saber como a geografia, a botânica, a história, a antropologia, a
etnografia dentre outras. Visto dessa forma, a Onomástica é uma especialidade de caráter
interdisciplinar.
Segundo as considerações tecidas anteriormente, a onomástica divide-se em dois
ramos principais: a Antroponímia e a Toponímia. E, por sua vez, tanto a Antroponímia e mais
ainda a Toponímia podem apresentar subdivisões, dependendo de uma série de considerações.
Por exemplo, a Toponímia, segundo o objeto de denominação, apresenta taxonomias como
hidronímia, astronímia, litonímia, odonímia, oronímia, dentre outros termos que são
correspondentes, respectivamente, de objetos que constituem formações aquosas, astros,
formações pétreas, vias ou caminhos e serra.
Por sua vez, a Antroponímia ocupa-se dos nomes de batismo, os sobrenomes -
patronímicos ou matronímicos - assim como os apelidos, alcunhas e nomes diminutivos.
Igualmente, a Antroponímia não ocorre de forma homogênea, haverá uma série de tradições
diferentes de acordo com os povos ou culturas. Isso quer dizer que os sistemas de
denominação de pessoas são muito diferentes segundo os povos. Porém, é possível afirmar
que os nomes pessoais são um traço comum ou universal nas línguas, uma vez que as pessoas
são denominadas em todas as sociedades, em algum momento de suas vidas. Pelo menos é o
que informa a literatura examinada. Os estudos dos sistemas onomásticos revelam que os
43
nomes existem e são controlados pelas necessidades e práticas sociais, as quais podem variar
de acordo com a visão de mundo de um determinado povo. Assim, também são variáveis as
intenções e as motivações que estão por traz da escolha dos nomes em cada sociedade (DICK,
1992).
Entende-se que a Onomástica, como disciplina, deverá comprometer-se e fixar como
objeto de estudo os sistemas de denominação que justifiquem os processos de atribuição de
nomes em geral. De acordo com Solís (1997), nessa perspectiva, os nomes são os produtos de
algo que os provoca e esse algo não é outra coisa senão o sistema denominativo elaborado
pelas culturas para atribuir nomes às entidades que sua atividade cognitiva percebe.
Por ser um campo de estudo muito vasto que se volta para o estudo dos nomes
próprios tanto atribuídos a seres humanos quanto a lugares, delimita-se para este trabalho
pesquisar o sistema onomástico voltado para os nomes de lugares, ou seja, para a Toponímia,
caracterizando como objeto de estudo os nomes dos primeiros municípios do estado do
Tocantins. Esses municípios correspondem às primeiras povoações da região norte do estado
de Goiás10, formadas a partir do descobrimento das minas de ouro por bandeiras paulistas no
final do século XVII e até meados do século XVIII.
O rótulo nome (noun) é atribuído à classe de palavras em que ocorre a maior parte dos
nomes de pessoas, lugares e coisas (SHACHTER, 2002). Para Camara Jr. (1984, p. 177), “o
nome indica as ‘coisas’, quer se trate de objetos concretos ou de noções abstratas, de seres
reais ou de espécie: Pedro, mesa, verde, verdor, bondade, cavalo, são igualmente nomes”.
Segundo ele, morfologicamente, o nome em português se distingue pela possibilidade da
categoria de gênero e pela indicação de número (singular/plural). Da perspectiva funcional, os
nomes desempenham a função de núcleos do sujeito, do objeto direto, do objeto indireto e
agente da passiva. Na linguagem usual, encontra-se nome com o sentido de “denominação”
ou, ainda, de nome próprio. É nesse sentido que o nome será abordado neste trabalho.
O ato de nomear é resultado da vida em sociedade. O homem, para identificar e
nomear as coisas ou entidades da sua realidade, utiliza-se de palavras. “E a designação e a
nomeação dessas realidades cria um universo significativo revelado pela linguagem”
(BIDERMAN, 2006, p. 01).
10
Antes da separação do estado de Goiás, em 1988, a região em que se localiza o estado do Tocantins era
reconhecida como Norte Goiano.
44
Desse modo, a classe do nome é formada por termos utilizados para nomear uma
entidade da realidade. No entanto, os nomes podem se referir a um conjunto de uma espécie,
conhecido nos estudos linguísticos tradicionais como nomes comuns, ou a seres individuais,
particularizando-os em meio a muitos de sua espécie. Estes são os nomes próprios. Trask
(2006, p. 206) define nome próprio como uma forma linguística usada para selecionar uma
única pessoa, coisa ou lugar, ou seja, “gramaticalmente, um nome próprio é um sintagma
nominal com uma função altamente diferenciada, a de apontar para alguma entidade
individual: Getúlio Vargas, Brasília, o Corcovado”.
De acordo com Payne (1997, p. 39), “nomes próprios são usados para tratar e
identificar pessoas em particular ou personagens culturalmente significativas ou lugares”. Eles
são usados para se referir a indivíduos específicos que podem ser identificados tanto pelo
falante quanto pelo ouvinte. Em relação aos aspectos gramaticais, os nomes próprios diferem
dos comuns porque, geralmente, não aparecem com artigos, modificadores, possuidores,
orações relativas ou outros dispositivos que tornam os nomes mais identificáveis. Segundo o
autor, no inglês os nomes próprios se distinguem na medida em que eles, dificilmente, levam
artigos, quantificadores ou outros modificadores.
Numa visão filosófica da linguagem, Brito (2003) ressalta que os nomes são elementos
da língua que têm a função de “estar por objetos”. Essa função é apreendida no ato de nomear,
porque, pela nomeação, um vínculo é estabelecido entre o nome e o objeto que ele nomeia, de
modo que, a partir desse momento o nome estará na sentença pelo objeto. No entanto, há
maneiras diferentes de um nome se referir a um objeto. Quando ele se refere a um conjunto de
objetos que compartilham características comuns, que os classificam como membros desse
conjunto, sem visar um objeto particular, tem-se nome de espécie. Por outro lado, termos
usados para designar certos objetos, para se referir a eles pela menção de seus nomes, são
nomes próprios.
Todavia, a classe dos nomes próprios é bastante heterogênea. Estão incluídos nessa
classe nomes de pessoas, lugares, nomes próprios de animais e plantas, nomes próprios de
entidades, nomes próprios de objetos, seres naturais e seres fantásticos, o nome das artes, da
ciência e movimentos intelectuais, nomes de planetas e astros, entre outros. Alguns autores
que tratam do assunto divergem quanto aos membros que podem ser incluídos nessa
categoria. Porém, os nomes de pessoas e de lugares sempre são referidos nessa classificação.
Eles constituem os nomes próprios por excelência.
A respeito dos nomes que se situam no campo da onomástica (Toponímia e
Antroponímia), Camara Jr. (1975) faz algumas considerações importantes. Ele lembra que
45
Saber se um nome tem significado é uma questão bastante antiga, chegando até a
atualidade sem um consenso entre os estudiosos, principalmente os filósofos. De acordo com
Lyons (1979), a discussão da relação entre as palavras e as “coisas” às quais elas se referem
ou significam, vem sendo proposta desde a época antiga, na história da gramática tradicional.
Essas discussões tiveram início com os filósofos gregos da época de Sócrates e Platão, os
quais propuseram que a relação semântica que liga as palavras às coisas é a de “denominar”.
A partir dessa proposta, decorre outra questão, que é a de saber se os “nomes” dados às
“coisas” eram de origem “natural” ou “convencional”. No decorrer do desenvolvimento da
gramática tradicional, torna-se habitual afirmar que o significado da palavra é a “coisa” ou
“coisas” que ela denomina. Para Palmer (1979), as palavras são, nesse sentido, nomes ou
rótulos para as coisas.
Lyons (1979), ao estudar a referência, utiliza o termo “referente” para as “coisas”
denominadas ou significadas pelas palavras. Ao fazer isso, ele assegura que a relação
existente entre palavras e coisas (seus referentes) é de referência. Sendo assim, “as palavras
não “significam” nem “denominam” as coisas, mas se referem às coisas” (1979, p. 429). O
autor, tomando como base o conhecido triângulo semiótico, destaca que a relação entre forma
e referente não é direta. Dito de outro modo, a forma, para ligar-se ao seu referente, precisa da
mediação do significado (conceptual), o qual faz a associação deste com aquela de maneira
independente. Lyons (1979, p. 430) apresenta essa associação com o triângulo a seguir:
Significado
Palavra
Referente
Forma
47
Para Borba (2005), a ligação entre o significado e o referente é possível para alguns
setores do vocabulário, isto é, quando as palavras nomeiam os eventos, as coisas, atributos do
mundo exterior. Nesse caso, elas referem-se às coisas, aos eventos, aos atributos que são os
seus referentes. Isso mostra que a referência vem da nossa experiência com o mundo exterior,
mais especificamente da relação entre língua e mundo, mas isso não quer dizer que o
significado seja o referente, mas sim a representação dele. Para ele, toda unidade léxica tem
seu valor codificado que é seu significado básico, porém, com o uso, outras associações são
incorporadas ao signo fazendo parte de suas possibilidades significativas. Essa variação
significativa geralmente está ligada ao contexto cultural – hábitos, crenças, atividades típicas
– dos falantes.
E com relação ao nome próprio, se eles têm significados ou apenas servem de
referência ao ente denominado, é uma questão muito discutida pela Semântica Formal e pela
Filosofia da Linguagem. Não se pretende estender nessas áreas, mas apenas mencionar as
duas correntes filosóficas que se confrontam no tratamento da questão semântica dos nomes
próprios; a teoria causal ou da referência direta e a teoria descritiva. Segundo Brito (2003), de
um lado estão os que defendem, como Kripke (1971) e Stuart Mill (1843) a primeira. A base
dessa teoria é que o significado não tem qualquer função na semântica dos nomes próprios,
pois eles vinculam-se aos objetos nomeados de forma direta. Por isso, para cumprir sua
função referencial, os nomes próprios não precisam se vincular às descrições ou ser sinônimo
delas. Penco (2006, p. 115) destaca que “a referência do nome depende de um batismo inicial
e da cadeia causal que liga esse batismo ao uso subsequente do nome na comunidade”. Nesses
termos, não se fala em sentido de um nome e sim da cadeia causal que une um nome ao objeto
nomeado.
Do outro lado, estão os que compactuam com Frege, ou seja, os que vinculam aos
nomes próprios o sentido para explicar como eles cumprem a função de estar por objetos
particulares na sentença, ou seja, a relação entre o nome próprio e o objeto denominado é feito
por intermédio do sentido. E, ainda, os nomes próprios possuem, além do sentido, a
referência. A noção de sentido, aqui, remete-se a uma descrição ou um conjunto de descrições
definidas que possibilitam identificar o referente. Para Frege (apud Oliveira 2010, p. 95), “o
sentido é o caminho que nos leva à referência”. E ainda, o conceito de significado incorpora o
de referência e o de sentido, isto é, significado, para ele, é sentido e referência. Nessa
vertente, chamada descritivista, a sua principal argumentação é de que “somente por meio do
sentido a que os nomes próprios estão vinculados que eles podem desempenhar seu papel
referencial” (BRITO, 2003, p. 10).
48
Era Vargas, muitas cidades tiveram os nomes trocados por outro de origem Tupi, refletindo o
ideal nacionalista da época.
A definição da palavra toponímia envolve o significado etimológico do próprio
vocábulo, do grego topos (lugar) e onoma (nome). No domínio da Linguística, a Toponímia
investiga o léxico toponímico com o propósito de estudar a origem, as significações e as
transformações desses nomes. Nos estudos toponímicos, é possível perceber a relação entre
povo, língua e território; e esse território, pode ser físico e/ou imaginário.
Essa visão é muito importante, já que é por meio da relação povo-território que os
nomes de lugares são estabelecidos. Possivelmente, começando pela posse do território, uma
vez que “o espaço, ou território é um dos primeiros pontos de referência para que um
agrupamento de pessoas possa erigir-se em comunidade” (COUTO, 2007, p. 258). A partir
daí, nomeiam-se os aspectos do meio ambiente como uma espécie de acordo que permite a
vivência e a convivência em sociedade, no território apossado.
A nomeação dos lugares sempre foi uma atividade muito comum para a humanidade.
Desde os tempos mais remotos, os registros antigos da história da civilização humana
confirmam essa ação do homem sobre o lugar em que habita ou pretendia habitar, o que
sugere uma forma de posse ou dominação, assim como significação, organização e orientação
do espaço. Por outro lado, a nomeação manifesta-se como a ação do meio físico e
sociocultural sobre o homem.
Por isso, considera-se que a Toponímia é interdisciplinar. Nela, congregam-se várias
áreas do conhecimento humano. Podem-se estudar os nomes de um lugar enfocando os
aspectos físicos, socioculturais, mentais e históricos, interligados ou separadamente. Assim, a
toponímia pode ser objeto de estudo da Geografia, História, Antropologia, Psicologia Social,
dentre outras. Dick (1992) afirma que é possível fazer uma análise dos fatos toponímicos por
meio de qualquer uma dessas áreas citadas, todavia, nenhuma delas, tomada isoladamente ou
com exclusivismo, alcançaria a plenitude do fenômeno toponomástico. Isso ocorre devido ao
fato de a Toponímia ser, acima de tudo, “um imenso conjunto complexo línguo-cultural, em
que os dados das demais ciências se interseccionam necessariamente e, não, exclusivamente”
(DICK, 1992, p.16).
Na condição de disciplina linguística, a Toponímia vale-se, principalmente, dos
conhecimentos da Semântica, da Lexicologia, da Etnolinguística, da Dialetologia e da
Linguística Histórica. Atualmente, as áreas mais recentes em estudos da linguagem, como a
Ecolinguística, têm contribuído grandemente para a ampliação dos estudos toponímicos. A
noção de Ecossistema Fundamental da Língua (EFL), proposta pela Ecolinguística, formado
51
por um povo (P) convivendo em determinado território (T) e falando uma língua (L) traz para
esses estudos uma visão integradora (holística) do fenômeno linguístico (COUTO, 2007). Na
maioria dos casos, os estudos que tratam de toponímia, são feitos pelo viés histórico e
sociocultural ou pela relação homem/meio ambiente natural. No entanto, esquecem-se de que
o homem é uma entidade psíquica, que possui um cérebro/mente, que por meio dele é que os
seres humanos percebem e estruturam seu mundo. Nesse sentido, Solís (1997, p. 15) afirma
que “todo sistema de denominação é uma elaboração cognitiva de uma cultura, portanto, é
produto mental que evidencia determinada concepção cultural”.
Em se tratando de atos de cognição, outra área que tem contribuído para os estudos
toponímicos é a Linguística Cognitiva. As abordagens, nessa área, têm dado destaque para os
processos de categorização, de metáfora e metonímia e para os modelos cognitivos. Esses
processos são muito relevantes para compreender os sistemas de nomeação como resultados
da experiência e da cognição humana, tendo o corpo como centro. Afirma Ferrari (2011, p.
21) que “a linguística cognitiva adota uma perspectiva empiricista, alinhando-se a tradições
psicológicas e filosóficas que enfatizam a experiência humana e a centralidade do corpo
humano nessa experiência”. Para ela, nessa perspectiva, investiga-se a mente humana
juntamente com o corpo, uma vez que a experiência, a cognição e a realidade, para serem
concebidas, fundamentam-se no corpo. Um exemplo dessa experiência tem-se na forma de
nomear os lugares ou entidades geográficas a partir da percepção do denominador na
interação com meio ambiente físico e cultural.
As teorias semióticas também têm contribuído significativamente para os estudos
toponímicos, por compreender que os nomes de lugares são signos da língua que se
diferenciam dos demais por apresentarem motivação linguística, já que eles mantêm uma
ligação direta com seus referentes. Por isso, alguns conceitos da semiótica podem ser
aplicados à Toponímia, para ajudar a entender as motivações contidas nesses signos. Essas
duas perspectivas são tratadas adiante mais detalhadamente.
Diante desse fato, nesta subseção, faz-se uma breve apreciação acerca da Toponímia em
relação aos aspectos socioculturais, históricos e físicos.
De fato, o estudo toponímico de região apresenta os aspectos socioculturais dos grupos
e suas memórias históricas, os quais se refletem na forma dos topônimos. No entanto, o léxico
toponímico não refletirá apenas os aspectos mencionados, mas também o da relação
homem/espaço e homem/homem. Assim, compreende-se que o topônimo refere-se ao lugar e
ao homem que o criou. Daí se dizer que os nomes próprios de lugares proporcionam amplas
possibilidades de estudo.
De acordo com Santos e Seabra (2011), o nome de um lugar, por sua natureza
icônicamente simbólica, pode fornecer conhecimentos fundamentais sobre os povos e os
lugares, já que
Tendo em vista o que foi exposto, pode-se afirmar que o topônimo é fruto da ação do
homem sobre a natureza física, espacial e temporal e da natureza sobre o homem. Ele reflete
as suas crenças, seus sentimentos e ideologia no ato da nomeação. O topônimo também
preserva aspectos importantes dos valores culturais, políticos e sociais do momento
denominativo na sua estrutura interna e na externa (elementos linguísticos), além de manter
traços de períodos anteriores da língua ou de línguas.
E, ainda, o nome do lugar – o topônimo – é um elemento de legitimação de identidade
cultural por ser uma representação simbólica específica do espaço. Ao nomear um lugar, o
homem cumpre com a finalidade de identificar, particularizar e referenciar os espaços
geográficos apossados e os imaginados.
Dick (1992) adverte que o topônimo não é um signo comum da língua. Como suporte
de identificação, ele carrega uma carga ideológica, política, histórica e sociocultural.
Outra razão de se estudar o nome de lugar é que o topônimo, conforme Dick (1996),
como signo linguístico desempenha dupla função, uma, a que exerce no universo do discurso
como signo comum de língua e outra, a de suporte de identificação em que sugere pistas,
indica caminhos interpretativos, torna-se evidência de comportamentos extintos e resgate de
memórias vivenciadas, que seria a função toponímica propriamente dita. E acrescentando,
pode manter em sua estrutura linguística marcas de estágio anterior da língua, assim como
vestígios de contato linguístico, já que, como ressalta Campbell (2004, p. 415), “os aspectos
linguísticos dos nomes de lugar frequentemente permitem fazer inferências históricas sobre as
línguas e o povo que as falava”.
Dick (1992) destaca ainda que, ao refletir, de perto, a vivência do homem, tanto como
entidade individual ou como membro de um grupo, a Toponímia desempenha um importante
papel para a história de um povo, isto é, a função de conservar suas tradições ou os registros
de suas características mais importantes. Por ela se inscrever em um contínuo tempo-espacial
delimitado, comporta-se, também, como a crônica de uma comunidade, registrando o presente
para o conhecimento das gerações futuras.
54
Dessa forma, é possível constatar, por meio da definição peirceniana de signo, que ele
é uma representação de alguma coisa para alguém, está no lugar da coisa que ele representa,
não é a coisa em si. Além disso, tem a condição de afetar a mente do interpretante, ou seja,
daquele que vê, lê ou ouve o signo, para que este busque o seu significado. Nesses termos,
destaca-se uma relação de interdependência entre, pelos menos, três extremos: i) a face
perceptível do signo, o representamem, ou significante; ii) o que ele representa, o objeto ou
referente e iii) o que ele significa, interpretante ou significado.
55
Peirce (2005) concebe os signos em três divisões amplas, a saber: ícone, índice e
símbolo. Fundamentado não somente nesse autor, mas também em Delbecque (2008) e
Fidalgo e Gradim (2005), os principais tipos de signos serão conceituados a seguir.
Os ícones são os signos que apresentam as qualidades próprias, a primeira percepção
que o intérprete possui sobre o elemento do mundo real. É um signo em que há semelhanças
entre o significante e o significado. Em outras palavras, um ícone é uma representação -
auditiva, visual ou de outra espécie – de alguma coisa. Uma fotografia, uma pintura, as
imagens, diagramas são exemplos de ícones por evidenciar semelhança com o objeto
representado. Além desses, as metáforas são também relacionadas a ícones.
Conforme Delbecque (2008), para compreender os signos icônicos é preciso perceber
certa semelhança. E essa relação tem de ser estabelecida de forma quase que consciente por
quem observa. Por outro lado, a semelhança com o objeto representado pode ser
extraordinária, como quando se observam as imagens sacras ou em ícones menores, os que
aparecem na tela do computador; ou pode ser mais abstrata como o que acontece com as
placas que sinalizam os banheiros masculinos e femininos e os ícones das placas rodoviárias.
Os índices são signos que apresentam uma relação direta entre o representamem e o
objeto. Um índice (ou signo indexical) tem a função de indicar o que está nas suas
proximidades. Nos índices, a forma e o significado estão interligados, são contíguos, ou seja,
caracterizam-se pela relação de contiguidade ou associação com aquilo que representam. Eles
também apresentam traços de dêiticos, pois os interlocutores podem recuperar o referente por
meio de lembranças de seus detalhes. A fumaça é índice de fogo, nuvens carregadas é indício
de chuva, dentre outros.
Os índices, para Delbecque (2008) são os sinais mais primitivos e os mais limitados,
pois dependem do hic et nunc, ou seja, do aqui e agora. Entretanto, estão muito difundidos no
nosso sistema de comunicação. Podem ser amplamente encontrados na linguagem mímica e
gestual, no código de trânsito e na esfera da publicidade. Os dêiticos também são exemplos
importantes de signos indiciais como as expressões que referem demonstrativamente, como
“este aqui”, “esse aí”, “aquele ali”.
Os símbolos são signos que se referem ao objeto em razão de uma convenção, lei ou
associação geral de ideias. Ou seja, por não haver uma relação de semelhança e nem
contiguidade entre o significante e o significado, ela é estabelecida convencionalmente, de
forma intencional, e aprendida nas relações sociais. Os símbolos são considerados os signos
genuínos.
56
A autora ressalta ainda que os signos simbólicos estão reservados aos seres humanos,
uma vez que as necessidades comunicativas exigem muito mais que indicações indexicais ou
imitações icônicas. O homem necessita comunicar por meio de formas mais abstratas. Para
falar de acontecimentos do passado ou do futuro, de objetos que não estão nas proximidades,
ou sobre suas emoções, seus medos e expectativas utiliza-se de signos simbólicos. O sistema
mais elaborado de signos simbólicos, certamente é o da língua natural em todas as suas
formas, falada e escrita. Segue-se um quadro representativo das relações entre forma e
significado nos três tipos de signos.
Por fim, os signos indexicais, por se constituírem de dois elementos que se encontram
em prolongamento um do outro, ou seja, contíguos, pode um substituir o outro. Nos signos
icônicos, por sua vez, uma imagem pode tomar o lugar do objeto real. Já os signos simbólicos
são mais abrangentes, por permitirem que o espírito humano ultrapasse os limites de
contiguidade e semelhança, para constituir uma relação simbólica entre forma e significado.
Todas estas relações – icônica, indexical e simbólica – estão no alicerce da estruturação da
linguagem.
Os signos linguísticos encontram-se relacionados ao símbolo, pois a relação com o
objeto referido é construída arbitrariamente, em uma espécie de acordo entre os membros de
um grupo social. Saussure (2000) define o signo linguístico como resultado da associação
entre o significante e o significado, lembrando que a relação estabelecida entre eles é
convencional, acertada entre os falantes, por não haver nenhum vínculo sugestivo entre os
dois elementos. É nesse contexto que Saussure define o signo linguístico como arbitrário. No
entanto, há casos em que os signos linguísticos apresentam motivações, que podem ser de
natureza fonética, morfológica ou semântica.
57
Guiraud (1980) propõe que a motivação das palavras pode ser interna ou externa ao
sistema linguístico. O autor entende como motivação interna as motivações morfológicas, as
que ocorrem na composição e na derivação, que buscam a motivação em palavras já
existentes na língua. Por motivação externa, aquela que mantém um vínculo com o elemento
extralinguístico. Ela pode ser de caráter fonético, como as onomatopeias, quando a forma
fônica reproduz o ruído nomeado. Os sons da natureza, ruídos e gritos de animais, barulho de
máquina e outros designam o animal ou a coisa, associando, por contiguidade, os sons
produzidos, por exemplo, o nome da ave: Bem-te-vi. E de caráter metassêmico, quando há
mudança de sentido. Isso ocorre em consequência da similaridade entre o significado da
palavra já conhecida e o objeto que pretende nomear, como nas metáforas “cabeça de prego”,
“folha de papel” e “pé-de-cabra”; em associações como nas metonímias em que o nome é
formado por uma relação de aproximação com o objeto que quer nomear, por exemplo,
“girassol”, “pica-pau”, “beija-flor”.
Para o autor, a língua é um sistema de signos que serve para comunicação de ideias, as
quais evocam na mente de outrem as imagens conceituais das coisas. Sendo assim, a palavra
não transmite a coisa, mas a imagem dela. Por isso, “o signo linguístico é uma associação de
duas imagens mentais, uma forma acústica significante ou nome, e um conceito significado,
ou sentido” (GUIRAUD, 1980, p. 33). É um processo psíquico, recíproco, bipolar. O nome
traz à memória o significado e este, o nome. É importante ressalvar que a associação
significante e significado é convencional, pois resulta de acordos implícitos ente os falantes.
No entanto, o autor esclarece que, incialmente, todas as palavras são sempre
motivadas etimologicamente, seja pela relação natural entre forma acústica e a coisa
significada – onomatopeias -, ou pela relação intralinguística entre as palavras no interior da
língua. Exemplos de motivação por relação intralinguística têm-se na formação de palavras
por derivação e composição, ou na relação semântica, quando há mudança de sentido ou por
empréstimo de outras línguas. Em outras palavras, a motivação etimológica é uma das forças
criadoras da linguagem.
A despeito do que foi exposto, não se anula a afirmação de que os signos linguísticos
se enquadram na categoria dos símbolos. No entanto, observa-se que uma parte dos signos
linguísticos apresenta característica de ícones e índices. Exemplo da primeira pode ser
constatado nas metáforas que expressam a ideia de “parecer ser” e “parecer com”, ou seja,
ideia de similaridade. Já a segunda, pode-se verificar nas metonímias quando a qualidade do
objeto é incorporada ao nome, em uma relação de contiguidade. Elas consistem em tomar a
58
parte pelo todo, conteúdo pelo continente, o instrumento pela ação, o produto pelo produtor e
outros.
De acordo com Guiraud (1980), a metáfora e a metonímia são modos constantes de
nominação que causam mudança de sentido. “Damos a coisa um nome que já pertence a uma
outra coisa com o qual associamos: associação por similaridade das coisas na metáfora,
associação por contiguidade na sinédoque e na metonímia” (GUIRAUD, 1980, p. 63). Sendo
assim, é interessante pensar em como os processos cognitivos de metáfora e metonímia agem
na nomeação dos lugares.
Conforme o autor, na metonímia a coisa recebe o nome de outra coisa com a qual
mantinha contato: a parte pelo todo, produtor pelo produto, instrumento pela ação, dentre
outros. Topônimos relacionados à paisagem local pode ser um exemplo desse tipo de
nominação, como Palma (TO) (rio e cidade), Pequizeiro (TO) (cidade), os quais se referem à
flora, e em Arraias (TO) (rio e cidade) e Mateiros (TO) (cidades), à fauna. Quanto à metáfora,
uma das maneiras mais constantes da nominação popular, em que plantas, animais,
instrumentos e corpo humano constituem fontes interessantes para denominações metafóricas.
Como exemplo de topônimos tem-se em Pé do Morro (TO), Pé de Galinha (BA). As
metáforas também desempenham função importante nas denominações de noções abstratas
que são associadas a objetos ou a processos concretos.
Os indivíduos demonstram uma imensa criatividade e dinamismo no uso de sua língua
com o intuito de nomear os seres do seu mundo. Para isso, primeiramente, recorrem aos
processos que se dão no interior do seu próprio cognitivo, acionados pelas impressões do
meio ambiente natural. A metáfora e a metonímia são mecanismos cognitivos muito utilizados
para tal fim.
Por isso, é relevante também apresentar como a metáfora e a metonímia estão sendo
estudadas pela Linguística Cognitiva. De acordo com Chiavegatto (2009), os conhecimentos
adquiridos por meio das experiências vivenciadas pelos indivíduos em suas comunidades
desde os primeiros anos de vida são a base em que estão organizadas as construções
linguísticas. Esses conhecimentos são acumulados na memória, parcialmente estruturados,
hierarquizados e relativamente permanentes. São os domínios cognitivos. Essas estruturas não
são fixas, mas vão se alterando na medida em que se acumulam novas experiências ao longo
da vida que são acionadas para compor os significados linguísticos.
Nessa perspectiva, metáforas e metonímias recebem uma nova interpretação, diferente
da que tradicionalmente era atribuída nos estudos de literatura e retórica. Aqui, metáfora e
metonímia são instrumentos cognitivos, uma vez que a linguagem corrente está repleta de
59
expressões metafóricas e metonímicas que geralmente não são reconhecidas como tais por
estarem generalizadas, convencionalizadas e lexicalizadas.
As metáforas e metonímias são fenômenos conceptuais e formam importantes modelos
cognitivos. O que as diferencia é que enquanto a primeira envolve domínios cognitivos
(domínios da experiência) diferentes, em que projeta a estrutura de um domínio-origem na
estrutura correspondente do domínio-alvo, a segunda realiza-se dentro de um mesmo domínio,
ao ativar e realçar uma categoria ou um subdomínio por referência a outra categoria ou
subdomínio dentro do mesmo domínio (SILVA, 1997).
Conforme Lakoff e Johnson (2012), a metáfora e a metonímia são tipos de processos
diferentes, sendo que
campesina. Esses reinos constituem fonte de vida para essas pessoas, uma vez que eles
compartilham o espaço físico-geográfico com esses elementos da natureza e, portanto, “há
uma relação material, principalmente de contiguidade existencial no espaço, entre esses
significados e os nomes atribuídos aos lugares” (CASTRO, 2012, p. 203). Por manterem uma
relação de convivência natural e fraterna com esses elementos da natureza, eles são acionados
como motivos para designar lugares como Bacuri, Açailândia, Bacabal, Brejo, Patos,
Raposa, Poção de Pedras, Pedreiras.
Em sequência, apresenta, pelo mesmo mecanismo de relação material, especialmente
de contiguidade factual do homem com o espaço físico-geográfico, os nomes de pessoas que
são atribuídos aos lugares, como os nomes dos possessores, dos políticos, dos intelectuais e os
nomes de eventos sócio-históricos. Por essa relação de contiguidade factual entre homem-
espaço, têm-se topônimos como Pinheiro, Presidente Dutra, Presidente Vargas, Humberto de
Campos e, como representantes de eventos sócio-históricos, Feira Nova do Maranhão,
Vitória do Mearim, dentre outros. É importante observar, também, que, quando um lugar é
batizado com o nome do Santo padroeiro, o denominador está fazendo uso da relação de
contiguidade do lugar com o santo protetor, como em Santa Luzia do Paruá, Santa Quitéria
do Maranhão, São Raimundo das Mangabeiras, Santo Antônio dos Lopes.
Nesses exemplos ficou evidente que os topônimos carregam, em si mesmos, traços
tipicamente relacional entre o lugar e as experiências humanas, que se mostram, por vezes, de
forma contígua, em que a forma toponímica é a representação de algo que pertence ao lugar
ou o descreve.
No entanto, Castro (2012) lembra que há evidências de que a metáfora e a metonímia
não são excludentes entre si, a fronteira que as separa é bastante delicada. Assim, os reinos
vegetal, animal, mineral são domínios diferentes no que diz respeito ao lugar. Por isso, o
acionamento desses campos no ato denominador pode ocorrer metaforicamente. Por outro
lado, eles mantêm uma relação de contiguidade com o lugar, pois os nomes desses campos
somente são escolhidos se tiverem alguma relação com o local. Os nomes de vegetais, de
animais e de minerais acionados para compor um topônimo são aqueles que se encontram na
localidade denominada ou próxima a ela. Enfim, “a relação em que considera os diversos
tipos de relações de contiguidade e que gera o mecanismo metonímico parece ainda mais
básica do que a relação de apreensão de domínios diferentes, que gera o mecanismo
metafórico” (CASTRO, 2012, p. 205).
Tendo em vista o exposto, é possível afirmar que os topônimos, além de serem
resultados da relação do homem com seu mundo natural e sociocultural, são, também, o
62
nele despertou sua atenção, ativou o seu campo cognitivo. Portanto, antes de serem
configurados na onomástica, os nomes de lugares passam pelo crivo da cérebro/mente, ou
seja, pela interpretação cerebral. Cognitivamente, o denominador fará associação entre o lugar
e aquilo que o caracteriza, o identifica; ou a eventos históricos, socioculturais ou religiosos
que marcaram o lugar e os transportam para o nome. Assim, os aspectos cognitivos, físicos,
sociais, culturais, religiosos e históricos se interseccionam no ato denominativo, os quais
impulsionam o denominador a fazer determinadas escolhas na nomeação de um lugar.
De acordo com Solís (1997), a toponímia tem como objeto de estudo as emissões
linguísticas que cumprem a função de nomes das entidades geográficas. No que se refere à
formação linguística dos topônimos, dependendo da língua, eles podem ser formados por
palavras, frases ou orações, de forma inclusiva ou com supressão de alguma das unidades
mencionadas. Essas emissões linguísticas são formadas a partir das regras do sistema de
denominação das culturas envolvidas e das regras da gramática de uma língua específica, uma
vez que em qualquer sistema linguístico haverá meios para formar emissões que funcionem
como nomes.
Disso se entende que todos os topônimos, se forem um nome simples ou composto,
seguem as regras de formação de palavras, e se forem frases e orações, as regras gramaticais
da língua em que estejam inseridos. Para se entender a constituição linguística dos topônimos
tocantinenses em estudo é fundamental buscar na teoria toponímica, primeiramente, os
recursos para a sua compreensão, ou seja, entender como uma formação linguística une-se a
um lugar a partir da sua configuração na nomenclatura onomástica.
Para Dick (1992), o topônimo quando é formalizado na nomenclatura onomástica,
une-se ao acidente geográfico que o identifica, compondo com ele um conjunto ou uma
relação mútua que se pode perceber em seus termos formadores. Dois aspectos básicos
depreendem-se dessa relação, a saber: o termo ou elemento genérico que se relaciona à
entidade geográfica que receberá a denominação; e o outro, o elemento ou termo específico, o
topônimo propriamente dito, que carrega em si mesmo a noção espacial que identificará e
singularizará a entidade denominada das outras semelhantes. Esses elementos ou termos
ocorrem no sintagma toponímico de forma justaposta (rio das Almas) ou aglutinada (Paraúna,
“rio negro”), conforme a estrutura da língua em que estão inseridos.
64
Muitas vezes, com o passar do tempo e com a falta de uso na língua, alguns termos ou
elementos que se apresentavam aglutinados perdem o sentido genérico, carecendo de adotar
como reforço um novo termo genérico para complementar a ideia perdida, (rio Paranã, ‘rio
grande, parecido com o mar’). Outro caso que pode ocorrer é a falta de elemento específico
nos topos. Essa função é exercida pelo termo genérico que junta, concomitantemente, as duas
categorias, determinado e determinante. É o caso em que uma entidade geográfica é única na
região, não precisa de complementações referenciais. Em outro caso, ela é tão significativa
para a comunidade, que um termo específico atribuindo-lhe características alteraria “o caráter
de plenitude enfática que se empresta o nome comum, transformado em próprio, na fala da
população” (DICK, 1992, p.11). Em outro momento, o termo genérico vem acompanhado de
algum qualificativo que colabora para explicá-lo, tornando-o mais descritivo como em rio
Claro, morro Alto, rio Preto.
Com isso, chega-se à constituição morfológica dos topônimos. Dick (1992) sugere que
os topônimos podem apresentar três estruturas: (i) topônimo ou elemento específico simples,
é aquele determinado por um só formante, que pode apresentar-se acompanhado também de
sufixação diminutiva, aumentativa, ou de outras significações linguísticas. Pertence a esse
grupo os topônimos com as terminações em -lândia, -pólis e -burgo; (ii) topônimo composto
ou elemento específico composto, aquele que se apresenta com mais de um elemento
formador, de origens diversas entre si, do ponto de vista do conteúdo; (iii) topônimo híbrido
ou elemento específico híbrido formado por elementos linguísticos de diferentes
procedências. Esse tipo de formação na toponímia brasileira estabeleceu-se com a língua
portuguesa + indígena ou indígena + portuguesa.
Essa constituição morfológica proposta por Dick (1992) servirá de base para
identificar a estrutura linguística dos topônimos tocantinenses em conjunto com a teoria
lexical de formação de palavras na língua portuguesa.
associação convencional e não natural. Para exemplificar cita a palavra mar. A ideia
(significado) desta palavra não está conectada à sequência de sons (significante) por uma
ligação intrínseca, pois pode ser representada perfeitamente por outra sequência, como pode
ser vista em diferentes línguas. Por isso, ressalta que o significante é imotivado, ou seja, sua
relação com o significado é construída de modo arbitrário.
Quanto ao signo toponímico, viu-se que ele, apesar de fazer parte dos signos comuns
da língua, diferencia-se destes por ser um signo motivado. Em vista disso, Solís (1997, p. 27)
adverte que “o motivo toponímico é o elemento cultural ou natural que provoca, sugere ou
induz para que uma determinada entidade receba, no momento de sua denominação, o nome
que tem”. Um exemplo de motivo cultural tem-se no desejo de comemorar um fato histórico
dando o nome do episódio a uma entidade geográfica. O autor mostra que a província de
Bolognesi, em Ascash, tem esse nome por causa do herói Francisco Bolognesi. Exemplos de
motivação cultural no corpus em estudo tem-se no topônimo Manuel Alves que denomina um
rio em homenagem a um padre que ajudou no aldeamento dos índios Acroá. Um motivo
natural tem-se nos elementos da natureza que funcionam como agente de uma denominação.
Como exemplo, o autor informa que, na toponímia quéchua, os motivos mais utilizados para
denominar são caraterísticas da paisagem.
Dick (1990) destaca que a motivação toponímica pode ser encarada por dois aspectos, a
do denominador e das razões que o levaram, entre várias possibilidades, a selecionar uma
delas que mais respondesse às suas necessidades momentâneas de opção. Outro aspecto
refere-se à natureza do produto dessa escolha, ou seja, do próprio conteúdo do topônimo,
revelado pelos componentes linguísticos.
A autora lembra ainda que as dificuldades de averiguação das causas que estruturam
ambas as perspectivas de análise residem em fatos distintos. Do ponto de vista do
denominador e das causas de sua ação, nem sempre é possível assegurar a intencionalidade
que direcionou o ato de nomeação pela ausência sua ou pela distância cronológica do
aparecimento do nome. Caso o topônimo não esteja registrado historicamente em fontes
seguras, corre-se o risco de trabalhar com constantes hipóteses e sugestões que dificilmente
conduzirão à “verdade” do designativo. Contudo, o conjunto das circunstâncias socioculturais
que compõe a realidade em que o denominador fez parte de sua dinâmica pode facilitar o
conhecimento dos motivos que o animaram no momento da nomeação. Esse direcionamento
pode ser constatado na análise dos topônimos tocantinenses.
Outro fator envolvido na motivação toponímica está relacionado à forma básica e à
funcionalidade do topônimo. De outro modo, diz respeito à natureza significativa dos nomes
de lugares, que induz, simultaneamente, ao problema das classificações toponímicas. Dick
(1990, 1992) informa que é a presença de um vínculo entre o objeto denominado e seu
67
pensamento de Sapir (1969). Esses fatores, por sua vez, subdividem-se em categorias menores
de 27 taxes, das quais 11 estão relacionadas aos aspectos físicos e 16 aos aspectos
antropoculturais do ambiente. Com essa classificação, busca-se apreender as causas
motivadoras das denominações e chegar à significação toponímica. Pode-se afirmar que essa
metodologia veio garantir a autonomia dos estudos sincrônicos ao privilegiar o exame
linguístico do léxico toponímico.
O modelo de Dick compõe-se da seguinte maneira:
Outra classificação para os topônimos tem-se na proposta por Solís (1997). Conforme
o autor, essa classificação acontece de acordo com dois critérios: a origem linguística e a
entidade geográfica a que se denomina. O primeiro critério refere-se à língua ou família de
línguas de que procede a emissão linguística que funciona como topônimo. Na toponímia
brasileira, têm-se topônimos de diferentes línguas indígenas, como o Tupi quinhentista, outros
provenientes do Caribe, Aruak, Bororo, e outros da língua portuguesa, e em menor proporção,
herdados de algumas línguas africanas como o Quimbundo e o Iorubá.
Conforme a entidade geográfica, a utilização desse critério implica uma classificação
das entidades geográficas efetivas na cultura, possibilitando a constituição de uma taxonomia
que seja capaz de diferenciar, inicialmente, entidades naturais de entidades culturais, que, por
sua vez, podem dividir-se em uma série de subclasses. Nessa perspectiva, os estudos
toponímicos relacionam-se diretamente com as atividades cognitivas que particularizam uma
sociedade na organização e conceptualização do meio ambiente em que habita. Para Solís
(1997), baseado na perspectiva cultural ocidental, podem-se classificar as entidades
geográficas da seguinte maneira:
Rochas
71
Ilhas
Ladeiras e outros
homófono somente pela letra maiúscula na ortografia, mas, nesse caso o sentido primitivo é
alienado em favor do local. Como exemplo cita a cidade de Pontevedra, que, ao se
deslocarem para ela, as pessoas têm em mente a capital da província respectiva e não a ponte
que proporcionou o nome, conceito já apagado da memória coletiva, senão, relegado ao
subconsciente. Exemplos dessa natureza podem-se citar os topônimos Ponte Alta do Bom
Jesus (TO), Porto Nacional (TO).
Certamente, nem sempre as origens dos topônimos estão ligadas a um nome comum
presente em dicionários gerais ou regionais. Nesse caso, para encontrar a etimologia do nome
é necessária uma análise científico-linguística, visto que a toponímia é primordialmente uma
disciplina linguística, embora careça de disciplinas auxiliares como a História Antiga e
Medieval, a Arqueologia, a Geografia, a Geologia, a Botânica, dentre outras.
Diante dessas considerações, Piel (1979) percebe que a classificação dos topônimos
galegos fundamenta-se em dois aspectos principais, formando duas categorias gerais: 1)
nomes de significação “transparente”, aqueles que mantêm suas significações reconhecíveis
de imediato, ditos de outro modo, nomes falantes; 2) nomes de significação “opaca”, nomes
mudos, aqueles que não podem ser relacionados, de imediato, a um elemento do léxico geral-
comum.
O autor faz uma análise crítica de uma parte dos nomes toponímicos galegos, com
intenção de saber até que ponto seria possível uma interpretação etimológica e quais as
motivações que, proporcionalmente, conduziram a sua formação. Desse inquérito, ele
formulou uma classificação para os topônimos galegos, composta por 17 categorias nocionais,
a saber:
Outras noções que não entraram na classificação anterior, as quais foram apreciadas a
parte, no quadro seguinte.
Piel (1979) refere-se também à íntima ligação que existe entre os nomes geográficos e
o nome de pessoas. Segundo ele, a maior parte dos sobrenomes galegos corresponde a nomes
de terra, apesar de não se ter a consciência disso. Como exemplo desse fato, o autor lembra o
sobrenome do “príncipe dos poetas” portugueses, Luís de Camões, que na sua origem era um
topônimo galego, e dessa forma, deixa entrever a importância da toponímia para a história
genealógica. “Pode, aliás, afirmar que, em todo o mundo, civilizado ou não, um antropônimo
converte-se em topônimo com a mesma facilidade com que se opera o fenómeno inverso”
(PIEL, 1979, p. 10). O autor faz também uma breve referência aos nomes de montes e serras,
assim como de rios. Para serras e montes, predominam as denominações metafóricas, como
Corno de Boi, podendo referir-se também as localidades ou santuários situados nas suas
mediações. Quanto aos nomes de rios de importância, como o Miño, Eume, Ulla, Tambre e
outros, ressalta que constitui o patrimônio toponímico pré-latino da Galiza, preservando os
nomes mais antigos.
A partir dessas classificações e taxonomias propostas pelos autores Dick, Solís e Piel,
busca-se orientar a classificação dos topônimos tocantinenses. Existem outras classificações
taxonômicas, porém, não serão abordadas aqui. Para este trabalho, as três classificações são
suficientes.
Em se tratando de taxonomia, segue-se uma apreciação da hierotoponímia, categoria
ligada à manifestação do sagrado nos nomes de lugares. O sagrado é o resultado daquilo “que
a cultura, como coletividade, reconhece como merecedor de respeito e reverência porque toca
a todos” (GOMES, 2013, p.136). A religião, por sua vez, está ligada a esse sentimento.
A religião, segundo Gomes (2013), além de derivar do sentimento do sagrado, de fazer
parte de todas as culturas, de servir como identidade mítica que congrega pessoas em torno de
uma origem transcendente e de uma finalidade última da existência, ela é vista com mais
frequência como uma instituição cultural. E como instituição ela está conectada a outras
instituições culturais. Por outro lado, Geertz (2012) parte da noção de religião como uma
instituição social, a adoração como atividade social e a fé como uma força social.
Percebeu-se a importância dessa categoria toponímica em particular devido à
relevância da religiosidade na denominação dos primeiros núcleos urbanos do estado do
Tocantins. Assim, busca-se compreender como a religiosidade, entendida como instituição
sociocultural, influi nos nomes de lugares.
75
Chaves (1956) destaca que a influência religiosa na escolha dos nomes de lugares
(toponímia) e pessoas (antroponímia) foi sempre marcante em Portugal como em toda parte.
Essa influência origina-se pelo fato de a religião católica ter sido sempre a religião oficial
nesse país e, consequentemente, pela devoção fiel do povo português ao culto e à tradição da
Igreja. Esse ideal cristão acompanhou os portugueses nos tempos dos grandes
“descobrimentos” e conquistas ultramarinas, a todas as costas e ilhas aonde eles chegaram.
Assim, cabos, enseadas, baías, acidentes do litoral, ilhas e ilhéus, que iam sendo dominados
eram batizados com nomes religiosos. O mesmo ocorria com as povoações fundadas pelos
colonizadores e os lugares de missão em que os missionários se fixaram para suas atividades.
A norma para a aplicação dos nomes seguia a devoção dos colonizadores, os seus
onomásticos, o dia e/ou a época litúrgica do “descobrimento”, o nome do santo do Soberano
reinante.
O autor cita o Brasil e outras províncias ultramarinas como provas evidentes desse
costume, ainda que os nomes oficiais, atualmente, não sejam reconhecidos por extenso, não
invalida o que historicamente foi constituído. Chaves (1956) lembra que Luanda é a Cidade
de S. Paulo de Luanda; Macau, a Cidade do Santo Nome de Deus de Macau; Rio de Janeiro, a
Cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro e São Paulo de Piratininga. Além de que o primeiro
nome do Brasil foi Terra de Santa Cruz e Vera Cruz. Ressalta ainda que não poderia ser
diferente, dado que a visão de mundo, a cultura e a mentalidade da época dos navegadores e
colonizadores era essa.
Não podiam os Portugueses estabelecer um hiato histórico e de acção entre o que era
nacional em Portugal e o que tinha de ser igualmente nacional para além do mar. Se
as instituições metropolitanas foram o padrão da colonização e administração dos
territórios ultramarinos, e constituíam a força criadora dessa mesma actividade, era
de esperar que toda a vida espiritual dos navegantes e colonizadores transmitisse
germes da mesma altura às terras ultramarinas. Terras e mares receberam em parte
notável nomes santificados pela Igreja Católica. Indígenas, convertidos pelos
missionários, recebiam nomes litúrgicos, que significavam adesão completa e
sugestão de vida cristã (CHAVES, 1956, p. 178).
Entre as outras obras bem aceitas à Divina Majestade, e pelo nosso coração
desejadas, existe sobretudo esta: que seja exaltada, principalmente na nossa época, e
em toda parte se espalhe e se dilate a Religião Cristã, se cuide da salvação das
almas, (e) se abatam as nações bárbaras e sejam reduzidas à mesma fé (Apud Dick
1992, p. 156).
77
A saída da viagem de Pedro Álvares Cabral para a terra que viria a ser a brasileira foi
antecipada por um cerimonial que incluía missa na Ermida de Nossa Senhora do Belém, a
doação da bandeira de Cristo pelo Rei e de outras relíquias e cruzes que iriam acompanhar os
navegantes durante a viagem e, nesse tempo, estariam entregues aos cuidados espirituais do
franciscano Frei Henrique de Coimbra. Assim, partiram as embarcações sob a proteção de
Nossa Senhora da Esperança, e com denominações como Trindade, Anunciada, Espírito
Santo, Santa Cruz, São Pedro e outros.
Não é difícil compreender a influência do contexto místico, arraigada na cultura
lusitana e também no acatamento à autoridade papal a que os príncipes católicos europeus
estavam submetidos, na formação das primeiras povoações e suas denominações dos
acidentes brasileiros ao tomarem posse dessas terras. Sendo assim, os primeiros topônimos
eram atribuídos conforme o calendário religioso romano, a exemplo do Monte Pascoal e Ilha
de Vera Cruz e, à medida que iam adentrando o interior, essa tradição foi mantida, como é o
caso das primeiras povoações do estado de Goiás.
Carvalhinhos (2009) afirma que o berço da toponímia brasileira encontra-se em
Portugal, já que os portugueses que chegaram ao Brasil para colonizá-lo usaram na
denominação desse território a língua corrente do século XVI e a ideologia religiosa da época.
Com a expulsão dos últimos mouros de Granada, em 1492, a Península Ibérica torna-se
completamente independente. Nessa época, estado e igreja eram uma única instituição,
marcados pelos anseios de riqueza, poder e os horrores da inquisição. O Deus cristão
representado por essa instituição era um deus cruel e punidor dos que se afastavam dos ritos e
preceitos da igreja Católica, visão usada como instrumento de controle e dominação dos
povos.
A partir dos estudos com a hierotoponímia brasileira, Dick (1992, 1990) chega a
algumas conclusões.
que consistia na doação de terras a um santo de devoção para a construção de uma capela e,
consequentemente, a formação de um povoado. O patrimônio pertencia ao santo que seria o
patrono da capela e o lugar teria o nome desse santo. Esse processo de povoamento no interior
de Goiás iniciou-se no século XIX, após o declínio da mineração, chegando até a década de
1950. No estado do Tocantins, não se encontrou na literatura consultada nenhum caso desse
tipo de povoamento.
Na medida em que esse imenso território foi sendo ocupado, organizado, dominado e
denominado, os valores, simbolismos, crenças e costumes cristãos católicos foram os
fundamentos para a formação histórica e sociocultural do lugar. Goiás e Tocantins têm uma
base cultural essencialmente católica que se expressa na toponímia local, confirmando a
declaração de Dick (1990, 1992) de que um dos fatores de natureza cultural mais marcante na
toponímia brasileira é a religiosidade.
80
da sociedade não religiosa da época, ou seja, com o mercantilismo e com a expansão dos seus
domínios.
De acordo com esse autor, alguns fatores como o mercantilismo oficial e particular, o
luxo ostensivo, a dissolução dos costumes, o humanismo antropocêntrico e a razão de Estado
certamente abalaram o teocentrismo medieval, mas o ideal e a ambição à transcendência
permaneceram.
No discurso, o “serviço de Deus” estava em primeiro lugar. Seria a finalidade a que
tudo deveria subordinar-se, discurso que os documentos oficiais repetem até a saturação. No
entanto, o serviço de Deus e o serviço do Rei, que era o seu representante temporal, mostram-
se indissoluvelmente unidos. O serviço de Deus e do Rei, são, ao mesmo tempo, o bem do
povo, na teoria e no discurso, constituindo uma hierarquia de valores para o cristão, o súdito e
o cidadão. Essa hierarquização está indicada no Regimento de Tomé de Souza: “primeiro ‘o
serviço de Deus e exalçamento de nossa santa fé’, depois ‘o serviço meu e proveito dos meus
reinos e senhorios’, por fim ‘o enobrecimento das capitanias e povoações das Terras do Brasil
e o proveito dos naturais delas” (PALACÍN, 1981, p. 269).
Com relação a isso, Hoornaert (1992) cita o trecho do rei Dom João III do mesmo
regimento, citado por Palacín (1981), destinado ao governador Tomé de Sousa que diz: “A
principal causa que me levou a povoar o Brasil foi que a gente do Brasil se convertesse à
nossa santa fé” (1992, p. 24).
Contudo, percebe-se que essa hierarquização religiosa dos valores tem as
características de uma ideologia. Serviu para “santificar” todo tipo de interesse político e
social. Conforme Hoornaert (1992), esse discurso doutrinário esconde um discurso guerreiro.
O discurso em torno da evangelização no Brasil não questiona a legitimidade da ordem
estabelecida pelo projeto colônia, mas participa da agressividade desse mesmo projeto
compactuando e justificando a opressão e escravização de indígenas e africanos.
A vida religiosa deparada no Brasil do século XVI tinha as mesmas manifestações e as
mesmas tendências gerais de Portugal e da Europa cristã, como um todo. Mas, aqui alguns
dos traços barrocos da religiosidade da contrarreforma com a tendência à exteriorização da
religião e à dissolução entre fé e moral tornaram-se mais marcantes devido às influências do
ambiente. A estabilidade da fé era a principal característica dessa religiosidade. Uma fé nem
sempre vivida em suas últimas consequências, e nem suficientemente instruída, contudo,
sempre considerada como algo essencial e indiscutível (PALACÍN, 1981).
O autor ressalta que, no Brasil como na Península Ibérica, a “unidade da fé”
desempenhou na formação da nacionalidade um papel que em outros lugares foi
82
desempenhado pela cultura e a raça. Luta-se contra o herege e não contra o estrangeiro. Para
pedir doação de terra, a concessão de alguma sesmaria, o que era requerido era a profissão de
fé católica e não a cidadania portuguesa.
As grandes datas da existência estavam marcadas pelos sacramentos da igreja e
carregadas de sentido religioso, bem como o calendário do ano recebia seu ritmo e seu relevo
do calendário litúrgico. O costume medieval de designar uma data não pelo mês, mas pelo dia
do santo litúrgico continuava e as grandes épocas eram as do ciclo cristão, a saber: o advento
e o natal, a quaresma e a páscoa, pentecostes, assim como as festas populares eram dos santos
universais (São Pedro, Nossa Senhora e São João) e as festas dos padroeiros locais.
A ação da igreja ainda era muito ampla e penetrava profundamente nos homens,
embora o movimento secularizador já começasse a se despontar com o surgimento das
cidades. A igreja era responsável pelo ensino e a assistência social, a moralização e
fiscalização dos costumes com tribunais e políticas próprias e até o enquadramento jurídico da
população só se realizava por meio da paróquia. Palacin (1981) considera que a igreja teve
papel muito importante para o assentamento e expansão da colônia, com a obra “pacificadora”
entre os colonos e os índios. Assim, a penetração religiosa, lenta e “pacífica”, abria caminho
para a colonização, como pode ser vista na fundação de São Paulo, na contribuição do padre
Manuel de Nóbrega para a conquista e povoamento do Rio de Janeiro, na penetração na
região de Sergipe e pacificação do Rio Grande. Nesse contexto, concretiza-se o projeto do
sistema colonial, fundamentado no padroado português em que a Igreja e a Coroa se unem
para um mesmo fim, ou seja, a expansão dos seus territórios.
A relação entre Igreja e Estado tem origem no direito de padroado concedido pela
Santa Sé aos reis de Portugal. O direito de padroado, segundo Azzi (1992), não foi uma
apropriação de atribuições religiosas da Igreja pelos monarcas portugueses, mas uma forma
própria de compromisso entre a Igreja de Roma e o governo de Portugal. Os monarcas
portugueses unindo os direitos políticos de realeza com os títulos de grão-mestre de ordens
religiosas passam a exercer, ao mesmo tempo, o governo civil e religioso, principalmente nas
colônias e domínios portugueses.
O padroado atribuía aos reis lusitanos o direito à cobrança e administração dos
dízimos eclesiásticos, isto é, a uma taxa de contribuição dos fiéis para manutenção da igreja,
vigente desde épocas remotas, em que cada cristão tinha por obrigação contribuir com a
83
décima parte dos lucros gozados do trabalho da terra. No século XVI, época da colonização
do Brasil, a cobrança dos dízimos passa a ser feita pelo próprio rei de Portugal, que, como
grão-mestre da Ordem de Cristo, tinha como obrigação também zelar pelo bem espiritual das
colônias portuguesas.
Aos monarcas, era reservado também o direito de escolher os nomes para ocupar o
governo das dioceses, das paróquias e outros benefícios eclesiásticos. Além disso, tinham
como obrigação zelar pela construção e conservação dos edifícios do culto, de remunerar o
clero e de promover a expansão da fé cristã. Assim, os reis portugueses tornavam-se uma
espécie de delegado pontifício para o Brasil, isto é, o chefe efetivo da igreja em formação. Por
outro lado, ao papa cabia apenas a confirmação das atividades religiosas do rei.
À Coroa portuguesa competia, ainda, implantar a fé cristã nas terras brasileiras e isso
conduzia a uma identificação entre colonização e cristianização. Nesse sentido, a nova igreja a
ser constituída no Brasil dependia diretamente dos monarcas portugueses, os quais, herdeiros
de certo modo da mentalidade constantina, consideravam a organização eclesiástica como um
departamento de Estado. Por isso, criou-se no Brasil o estado cristão e como religião oficial o
catolicismo. E a missão desse estado era subjugar e incorporar os indígenas à cultura
portuguesa e à religião cristã.
Acresce ainda que os colonizadores portugueses, de acordo com Hoornaert (1974,
p.32), “participaram largamente da mentalidade dos seus reis. Eles pertenciam a uma igreja
estabelecida e participavam de um estado de espírito comum a todos os católicos da época,
pelo menos na península Ibérica”. Esse espírito a que se refere o autor é o de combate aos
inimigos da fé. Com essa mentalidade os portugueses procuram implantar no Brasil uma
sociedade cristã. Essa sociedade fundamentava-se no nacionalismo português, pois o
português é por nascimento e por direito cristão, ao passo que o nativo é pagão e infiel. E,
dessa forma, os costumes trazidos pelos portugueses são cristãos. Por outro lado, os costumes
indígenas são considerados de cunho pagão e gentílico e precisavam ser combatidos. Os
nomes portugueses são cristãos, os nomes indígenas são vinculados ao paganismo, por isso
precisam ser trocados por nomes cristãos.
Outra consequência lógica dessa mentalidade é revelada ao reconhecer a religião mais
por limites territoriais do que por padrões espirituais. Assim, os territórios conquistados pelos
portugueses tornam-se imediatamente cristãos. Em contrapartida, as terras habitadas pelos
indígenas é ainda domínio do mal e precisam ser conquistadas. Por isso, a conquista das
novas terras pelos portugueses se faz com a cruz e por outros símbolos religiosos como
84
ermidas, oratórios ou capelas. Esses últimos serviram ainda como posto de controle no
interior do imenso território.
Nesses termos, no sistema de padroado, há uma via de mão dupla; o governo que usa a
religião para fins políticos e a Igreja que usa o poder político para se promover. O interesse
do Estado passa a ser o interesse da Igreja e vice-versa. Colonização e evangelização tornam-
se um projeto único, qual seja a dominação dos territórios e dos povos em nome da fé e da
coroa. Esse sistema põe em evidência a aliança entre o político e o religioso para a
evangelização e a conquista. Certamente, a evangelização não deixa de ser também uma
forma de conquista pela força, principalmente, ideológica. A religião, nesse contexto, serviu
como um mecanismo eficiente para a manutenção da unidade e coesão social do império
português em expansão.
Apesar de tudo isso, não se pode deixar de ressaltar a contribuição que a Igreja
Católica deu à formação cultural brasileira e à construção de uma identidade nacional. Essa
contribuição está refletida também na toponímia brasileira como herança de uma época e de
uma mentalidade. Na toponímia das cidades históricas do estado do Tocantins não foi
diferente. Muitos topônimos ainda guardam as marcas religiosas, tais como Natividade,
Conceição, Monte do Carmo, Almas; outros as perderam com o tempo, como é o caso de
Dianópolis, Arraias, Paranã, Taguatinga. Todavia, essa herança portuguesa mantém-se na
cultura local com as peregrinações anuais aos santuários do Senhor Bonfim, da Sucupira, das
Missões; das festas em homenagem aos santos padroeiros; as Folias do Divino Espírito Santo,
Folias de Reis dentre outras.
por ter sido o centro da colonização na época. Algumas expedições eram de caráter oficial,
outras de empresas comerciais particulares, mas com o mesmo fim: explorar o interior à
procura de riquezas minerais e capturar os índios para servirem como escravos ou para a
catequização.
Quanto ao século XVII, a documentação que conserva informações precisas da
passagem de bandeiras pelo estado de Goiás é relativamente abundante. De São Paulo, saíam
as bandeiras em busca dos índios chegando até o extremo norte de Goiás. No começo, faziam
seus percursos utilizando canoas pelos cursos dos rios Paranaíba, Tocantins e Araguaia,
voltando a São Paulo pelo rio Tietê. A partir da introdução de muares, por volta de 1630, as
bandeiras preferiram fazer a viagem por terra, para atravessar todo o território goiano. De
acordo com Palacín e Moraes (2008), há pelo menos 16 bandeiras documentadas.
Apolinário (2007) informa que, da Amazônia portuguesa, pelo caminho fluvial,
vieram as “entradas” de sertanistas e missionários jesuítas. Para Palacin e Moraes (2008), as
“descidas” eram as expedições feitas pelos jesuítas do Pará. Estes criaram, no Amazonas, um
sistema bem estruturado de “aldeias” de aculturação de indígenas. E, para trazer os índios
para essas aldeias, organizavam expedições fluviais, subindo o rio Tocantins até chegar a
Goiás. No entanto, nem os bandeirantes, nem os jesuítas iam para se fixarem. Iam e levavam
os indígenas goianos para o norte e para o Sul, traçavam roteiros para mostrar o caminho, mas
não criaram povoações.
É costume creditar o título de descobridor de Goiás a Bartolomeu Bueno da Silva, o
Anhanguera. Na realidade, ele não foi o primeiro explorador a chegar à região, e sim o
primeiro que veio a Goiás visando fixar-se neste território. Ao descobrir as minas de ouro em
Minas Gerais e depois em Mato Grosso, o Anhanguera pediu uma licença ao rei para
organizar uma bandeira a fim de procurar ouro em Goiás, uma vez que este território se situa
entre aqueles, poderia haver ouro também.
A afirmação de Silva e Souza (1967, p. 5) ilustra bem a intenção dos primeiros
colonizadores, a saber: “menos o amor da glória e desejo de ser útil, que o interesse próprio e
aquela ambição, que leva muitas vezes os homens por incalculáveis perigos às mais árduas,
mais importantes empresas, foi o motivo do descobrimento de Goiás”.
Quanto ao pedido do Anhanguera, o rei de Portugal concedeu a licença, determinando
ao Governador da Província dar um regimento à bandeira. Todos os gastos seriam por conta
dos organizadores que, em troca, receberiam vantagens nas novas minas que descobrissem,
além dos principais cargos políticos na região.
86
norte da capitania que abrangia uma zona extensa, entre o rio Tocantins e os chapadões dos
limites com a Bahia. Nessa região, na sua maior parte árida e áspera, encontravam-se algumas
povoações dispersas: Arraias, São Félix, Cavalcante, Natividade e Porto Real (Porto
Nacional), o arraial localizado mais ao norte.
Outros arraiais isolados surgiram fora dessas regiões em locais pontuais também
devido à mineração. É o caso de Pilões na região do Araguaia, a povoação mais ocidental;
Pilar e Crixás, nas matas da região do Araguaia; Couros (Formosa), no caminho da Bahia,
limite oriental da capitania. O restante do território goiano ficava ainda sem nenhuma
povoação: o sul e o sudeste, todo o Araguaia e o norte, desde Porto Nacional até o Estreito. A
povoação dessas zonas vai ocorrer durante o século XIX e XX por consequência da expansão
da agropecuária e da construção da rodovia federal BR 153. Esse fato pode ser comprovado
pelos relatos do Brigadeiro Lysias Rodrigues que, em 1931, atravessou todo o território e
constatou a sua baixa densidade populacional (RODRIGUES, 2001b).
Após 20 anos do início da exploração das minas, Goiás tinha crescido em população e
importância que não podia ser mais administrado à distância pelo governador de São Paulo,
capitania a qual pertencia. Sendo assim, a corte portuguesa transformou-o em capitania
independente. Em 1749, assume o primeiro governador e capitão-general, o Conde dos Arcos.
O território goiano passou a ser chamado de Capitania de Goiás, permanecendo, assim, até a
independência, quando se torna Província.
O governo de cada Capitania brasileira, apesar de ser independente, estava diretamente
ligado ao Rei e aos organismos centrais de Lisboa, como o conselho Ultramarino. Ele era
responsável pela administração e aplicação das leis e comandava o exército composto de
soldados de cavalaria – os dragões – e pedestres. O ouvidor ficava responsável pela justiça e a
arrecadação dos impostos cabia ao intendente, cujos cargos eram independentes do
governador (PALACÍN; MORAES, 2008).
Esse foi o contexto histórico em que nasceram os municípios objeto deste estudo,
tendo os descobrimentos auríferos como pretexto para suas fundações. Porém, ao chegar à
região, os exploradores encontraram-na povoada de inúmeros grupos indígenas. As relações
que travaram entre si não foram de cortesia. Não se pode deixar de mencionar a presença dos
negros desde o início da ocupação do estado do Tocantins. A seguir, apresenta-se um
panorama da participação dos indígenas, dos brancos europeus e dos africanos na formação
dos antigos arraiais e, consequentemente, na toponímia.
88
A questão indígena foi sempre um entrave aos objetivos do colonizador português que
a enfrentou com inúmeras medidas as quais, na grande maioria, resultaram na exterminação
das populações indígenas. Os colonos viam nos índios um trabalhador aproveitável; a coroa
portuguesa, um povoador para as extensas áreas despovoadas; e os missionários, um rebanho
que precisava ser reconduzido para o reino da fé cristã-católica. Com esses objetivos e
posições aparentemente contrárias resultaram em conflitos mútuos que levaram o governo a
tomar providências para tentar aldear os índios e “pacificá-los” para serem aproveitados como
mão de obra escrava ou semiescrava. Os aldeamentos constituíam-se em reunir os índios em
povoações fixas, supervisionada por uma autoridade leiga ou religiosa. Os índios deviam
cultivar o solo e aprender a religião cristã.
Os aldeamentos dirigidos por religiosos não deram resultados favoráveis aos objetivos
do governo português e dos colonos, devido ao fato de os religiosos manterem os índios
sujeitos aos seus controles, preparando-os para servirem de mão-de-obra para seus próprios
interesses. A partir da política do Marquês de Pombal, os aldeamentos passaram a ser
dirigidos por uma orientação leiga, a qual objetivava a “pacificação” dos índios para
solucionar o problema do despovoamento do sertão e da mão de obra (PARENTE, 2007).
Para Pombal, ao invés de manter o índio segregado como faziam os jesuítas, os autóctones
deveriam ser transformados em cidadãos ativos na tarefa do povoamento, por meio da sua
integração na sociedade (CHAIM, 1974).
De acordo com Palacín (1995), o número exato das populações indígenas do território
de Goiás antes da chegada das bandeiras paulistas, no início do século XVIII, é de difícil
precisão. O que se sabe é que eram numerosas, ocupando do sul ao norte as terras que
formariam, mais tarde, a capitania de Goiás. Encontravam-se divididos em “nações”, termo
utilizado para designar tribos e grupos indígenas com características diferentes entre si. As
principais que são citadas pelo autor e pelos viajantes do século XIX, como Pohl (1976),
Gardner (1975), Saint-Hilaire (1975) e Cunha Matos (2004), e também Chaim (1974) são
Kaiapó, Xavante, Goiá, Crixá, Araé, Xerente, Xacriabá, Karajá, Acroá, Javaé. Essas tribos
indígenas foram as que mais entraram em choque com os colonizadores do território goiano e
que foram, posteriormente, alojadas em aldeamentos mantidos pela fazenda Real.
Em Goiás, repetiu-se o que ocorreu na costa brasileira no século XVI: ocupação das
terras indígenas, escravização dos que se mostravam pacíficos e matança daqueles que não
cederam ao colonizador; aldeamentos de pequenos grupos que, em pouco tempo, sucumbiam
89
Meterem de paz em 1751 as nações de Acreá e Chacriabá, e para elas fez formar as
aldeias do Duro e Formiga, em que se despenderam enormes somas, que S.M.
aprovou, ficando regendo as mesmas aldeias o coronel Wenceslau Gomes da Silva
que foi empregado nesta conquista juntamente com Gabriel Álvares e Manuel
Álvares11 (SILVA e SOUZA, 1967, p. 22).
11
Esses dois nomes são registrados em outros autores como Gabriel Alves e Manuel Alves, sendo o último
tomado para denominar dois rios no estado do Tocantins.
90
3.3.2 Os negros
alimentados e nem vestidos adequadamente, não tinham tempo de descanso e nem tempo para
proverem seu sustento. Além disso, não cuidavam da vida espiritual deles, pois não atentavam
para que fossem batizados. Sem contar com os castigos bárbaros que lhes eram acometidos,
causando a mutilação ou até a morte.
As origens étnicas dos africanos que chegaram ao território de Goiás, segundo Salles
(1992), são principalmente de dois grupos: sudaneses e bantos. Os sudaneses, também
denominados de Yorubá, Gêge, Haussá e Mina, conforme a região de origem, entravam
preferencialmente pela Bahia, através dos sertões da região oriental da capitania, indo até
Meia Ponte. A partir desse local, eram distribuídos para outros núcleos. Possivelmente, os
sudaneses foram maioria em Goiás por serem os mais citados na documentação consultada
pela autora. Os Mina eram preferidos nas zonas de mineração por possuírem certa experiência
nesse trabalho trazida da costa africana. O outro grupo africano que também veio para a
capitania de Goiás foi o Banto. Nesse grupo incluem-se os Angola, Congo ou Cabinda e
Benguelle 12. Eles procediam do sul do continente africano e chegaram às regiões centrais do
Brasil pelo Rio de Janeiro, Alagoas, Pernambuco, Maranhão e Pará. Sudaneses e Banto
fundiram-se na população escrava como um todo, ficando conhecidos apenas pela designação
depreciativa de negros.
Dessa forma, o negro teve presença marcante desde o início da colonização de Goiás.
Porém, diferente do índio, a sua atuação não se destaca nos documentos históricos da vida
goiana, apesar da sua presença em todo o período colonial, já que eles eram a força de
trabalho que movia a economia da época. Essa invisibilidade na documentação é
consequência da visão da sociedade escravocrata que via os homens e mulheres negros como
mercadorias da qual deriva valor. Os negros, por serem considerados mercadorias, tinham
legislação própria, diferente da indígena, principalmente nas regiões mineiras. Nas primeiras
jazidas descobertas, no início do século XVIII, os negros serviam como parâmetro para a
divisão das datas auríferas (PARENTE, 2007).
No final do século XVIII, a sociedade goiana apresentava algumas diferenças em
relação aos primeiros anos da capitania. A população branca diminuiu consideravelmente,
enquanto aumentou a dos mestiços que constituíam 31% da população em 1804 (CHAIM,
1987). Os grupos indígenas que restaram afastaram-se dos núcleos populacionais, procurando
abrigo nas zonas mais afastadas. Referente a isso, Palacín e Moraes (2008) destacam que, ao
diminuir o número de africanos, cresce o número de mulatos em consequência da falta de
12
Assim como a grafia das línguas indígenas, o plural é feito sem o uso da letra s por não fazer parte da língua
portuguesa, a grafia das línguas africanas também será feita assim, pelo mesmo motivo.
92
mulheres brancas nas minas, fato determinante para a mestiçagem em grande escala
principalmente entre branco e negro, não antes vista no Brasil. Em 1804, em Goiás, negros
livres e mulatos já somavam mais de 77% da população livre.
No estado do Tocantins, essa representação tão alta de pessoas afrodescendentes é
ainda muito marcante principalmente na região sudeste. Essa presença é mais nitidamente
encontrada nas cidades de Arraias, Conceição do Tocantins, Natividade e Monte do Carmo.
Nessas cidades, as manifestações culturais de matriz africana têm um significado ímpar.
Conforme Silva (2008), dentro das Irmandades de Pretos, dedicadas a vários santos católicos,
formadas de africanos de várias nações e seus descendentes, desenvolveram-se muitas
práticas culturais e religiosas. Essas práticas fundiram-se com o catolicismo formando uma
marca cultural e identitária do povo tocantinense. Nas irmandades, os ex-escravos
encontraram espaço para exercer a sociabilidade, como nas festas em homenagem aos santos.
Nessas festas, manifestações culturais e religiosas de origem africana e portuguesa
misturam-se em um sincretismo religiosos que tem perdurado por gerações. Festas com essas
características podem ser vistas nas do Divino Espírito Santo que ocorre em várias cidades
tocantinenses e naquelas feitas em homenagem ao santo ou santa padroeiro. Nessas festas,
ainda hoje se dança a súcia, a jiquitaia, a congada, a roda de São Gonçalo, vistas como
herança das origens africanas no estado do Tocantins.
Essas manifestações culturais de procedência africana, até pouco tempo, não eram
valorizadas pela sociedade, ficando, muitas vezes, restritas às comunidades rurais. Pela
história do negro no estado marcada pela escravidão e pelo preconceito, presume-se que os
topônimos tocantinenses não tenham origem em alguma língua africana ou que o negro seja o
denominador dos lugares contemplados neste trabalho.
3.3.3 Os brancos
Os brancos, conforme ressaltam Palacín e Moraes (2008), foram sempre minoria. Com
a exaustão das minas, essa parcela da população tornou-se ainda menor, uma vez que, com o
esgotamento cada vez mais intenso das minas, as famílias brancas migravam para outras
regiões. No entanto, era com essa minoria que estava centrada todo o poder e quase toda a
riqueza. Os cargos administrativos superiores eram de nomeação da Corte e para ser eleito ou
escolhido aos cargos administrativos locais (vereador, juiz ordinário e outros) o candidato
deveria pertencer ao grupo dos “homens bons”, formado pelas famílias tradicionais. E ser
“homem bom” queria dizer ser “homem branco”.
93
Palacin (1994) garante que é difícil de precisar o número exato de brancos que havia
em Goiás no século XVIII por falta de dados mais precisos. Entretanto, pelo recenseamento
de 1804, eram 7.273, em uma população de 50.135 habitantes, totalizando um pouco mais de
14% da população. Número que demonstra uma queda na população branca em consequência
da exaustão das minas. Esse fato é mais evidente no norte, onde havia arraiais que
praticamente não possuíam famílias brancas.
Com relação a isso, Gardner (1975, p. 162), em sua viagem aos arraiais do norte da
Província de Goiás, em 1840, comenta que no arraial da Conceição “tem uma população de
cem pessoas (...), negros e mulatos formam a maioria dos residentes e poucos brancos vimos
nos quatro dias em que lá ficamos”. Quanto à Natividade, ele refere que “a população, com
cerca de duas mil almas, compõe-se das mesmas raças mistas já frequentemente encontradas
(p.157)”. Cunha Matos (1979) relata que em Goiás, de todos os arraiais por onde passou, o da
Conceição era o que havia menos gente branca. Em relação à Natividade, Pohl (1976, p. 271)
destaca que “os negros e mulatos formam a maioria da população e é visível a progressiva
diminuição dos brancos”.
Isso reforça a afirmação de Palacín (1994) que os brancos eram uma minoria em Goiás
logo no início do século XIX. Nas minas, a população branca era constituída, principalmente,
pelos mineiros. Ser mineiro, na época, era aspiração de todos os habitantes das minas, pois se
constituía em um alto título de honra de que toda a população se orgulhava. Enquanto ser
agricultor, comerciante era tida como atividades de baixo nível, causando com isso, a escassez
de materiais de primeiras necessidades para a sobrevivência nas minas. Ser mineiro era
acessível apenas para o branco e isso não era muito difícil, necessitando apenas de um escravo
e um local para garimpar.
Havia também uma camada da população branca que era constituída por gente sem
profissão, sem emprego, consequentemente, sem renda, que viviam nos arredores das cidades,
sobrevivendo da mendicância ou de pequenos furtos. Pouco acima dos chamados vadios,
ficava a classe dos trabalhadores braçais, constituída de brancos pobres. Mais considerados
socialmente que as duas classes anteriores são os mestres e oficiais, que correspondem
atualmente aos operários especializados. Outra categoria composta por gente branca era a dos
funcionários públicos, que os documentos designam de “filhos da folha”. Na realidade,
formavam uma categoria muito reduzida, as três folhas – militar, civil e eclesiástica. Ao ser
instalada a capitania, essa categoria contava com apenas cem nomes para uma população de
aproximadamente trinta mil habitantes (PALACÍN, 1994).
94
“Norte” em Goiás, segundo Palacín (1990), deixou muito cedo de ser apenas um
denotativo geográfico para significar oposição política, fundada, primeiramente, em um
quadro de retrocesso social e econômico e, mais tarde, de subdesenvolvimento. A oposição
política entre norte-sul tem início ainda nos primeiros anos do período de mineração devido à
diferença de valores na cobrança de impostos. Assim, ao estabelecer o imposto de capitação13
em 1735, nas minas do norte, que surgiram com a denominação de minas do Tocantins,
determinou-se que pagassem mais aos cofres públicos por escravos do que as minas do Sul.
Isso desagradou os mineiros nortistas que se opuseram a essa medida e exigiram a revogação
da ordem. Nesse sentido, Cavalcante (2003) destaca que o peso do isolamento e a
discriminação fiscal são os fatores que desde o início provocaram o sentimento separatista na
população do norte.
Quase um século depois, para facilitar a administração fiscal e judiciária o Príncipe
Regente dividiu a Capitania em duas Comarcas. Comarca do Sul com a sede em Vila Boa e
Comarca do Norte com a sede no extremo norte da Capitania Real, em São João das Duas
Barras, e pertencia a ela os julgados de Natividade, Porto Real, Conceição, Arraias, São Felix,
Cavalcante, Flores e Traíra, tendo como ouvidor Joaquim Teotônio Segurado. Segundo
Palacín (1990), essa divisão serviu para agravar ainda mais as diferenças entre norte e sul.
Esse fato ocorreu em 18 de março de 180914, data em que se comemora atualmente no estado
do Tocantins o Dia da Autonomia.
Porém, as lutas políticas separatistas do norte goiano que começaram no século XIX
somente terminaram no final do século XX e com a criação do estado do Tocantins. Houve
vários movimentos políticos que tinham como principal justificativa para a separação a
diferença cultural da região norte em relação ao sul, o atraso econômico e o abandono político
13
Taxa cobrada pela propriedade de cada escravo de ambos os sexos acima de 12 anos de idade
(NASCIMENTO, 2009).
14
Conferir mapa da Capitania de Goiás, em 1809, nos anexos p. 195.
95
das autoridades do estado de Goiás. Destacam-se três momentos importantes nas lutas
separatistas do norte goiano; o primeiro de 1821-1823; o segundo de1956-1960; e o terceiro
de 1985-1988. Cada um teve um contexto político, sociocultural e econômico específico, mas
com o mesmo propósito, a emancipação política dessa região (RODRIGUES, 2011).
No período Imperial, o sonho de emancipação do norte continuou a ser realimentado,
retomando as ideias surgidas ainda durante a exploração aurífera. O Visconde de Taunay,
monarquista, deputado por Goiás, propôs a divisão e a instalação de uma capital em
Tocantinópolis (1873 e 1879). Esse movimento separatista continuou na República, quando
outros políticos apresentaram projeto de redivisão do Brasil em 34 estados, incluindo o
território norte de Goiás. Em 1943, políticos do norte de Goiás, assinaram um documento
chamado de o “Manifesto ao Povo do Vale do Tocantins”, que levam ao presidente Getúlio
Vargas, propondo a criação do território tocantinense. Os estudantes que residiam na Casa dos
Estudantes do Norte Goiano (CENOG), criada em 1960, tiveram uma importante participação
no retorno ao “sonho nortista”, ao propagar ideias de autonomização do Norte (PÓVOA,
1999).
A luta pela emancipação do estado do Tocantins fortaleceu-se com o deputado goiano
Siqueira Campos nas décadas de 70 e 80. Este apresentou um projeto para dividir o Estado de
Goiás. O projeto foi aprovado pela primeira vez por unanimidade no Congresso em 20 de
março de 1985. Em 10 de dezembro do referido ano, o presidente da República, José Sarney,
vetou na integra “o sonho autonomista” alegando desequilíbrio econômico do norte em
relação ao sul. Todavia, na constituição de 1988, esse projeto foi aprovado, fixando a data de
05 de outubro o Dia da Criação do Estado, data da promulgação da Constituição de 1988 e 1º
de Janeiro de 1989, o dia da instalação do Estado15.
Durante esse longo período de lutas separatistas, as estratégias discursivas para
demarcar as fronteiras e formar identidades fundamentavam-se nas diferenças culturais e
econômicas entre o norte e o sul de Goiás. Para Cavalcante (2003), à medida que o Centro-Sul
goiano fortalecia sua economia relacionando-se com o mercado da região sudeste do Brasil,
acentuavam-se as diferenças internas entre o norte e o sul do estado. A expressividade dessa
diferença foi devidamente tomada e colocada no centro do discurso autonomista regional da
década de 1980 para marcar a diferença entre estado do Tocantins e estado de Goiás. Essa
identificação marcada pela diferença entre o norte e sul alimentou o imaginário social,
legitimando e justificando a criação do novo estado.
15
Encontra-se nos anexos p. 196, o artigo 13 da Constituição de 1988 que trata da criação do estado do
Tocantins.
96
16
Conferir mapa da divisão político-administrativa do estado do Tocantins p. 197.
17
Conferir, nos anexos p. 200, o Decreto Legislativo nº 001, de 01 de janeiro de 1986 que trata da mudança
dos termos Norte e Goiás para Tocantins.
18
Conferir mapa da divisão política por regiões administrativas do estado do Tocantins nos anexos p. 194.
97
PARTE II
19
Conferir nos anexos p. 196 o mapa do estado do Tocantins com a localização desses municípios.
20
Aldeia: pequena povoação, sem jurisdição, dependente administrativamente da vila à qual pertencia. Era
formada exclusivamente de índios e administrada pelos missionários. Arraial: povoação de caráter temporário,
geralmente formado em função de certa atividade econômica. Vila: uma pequena comunidade urbana dotada de
certa autonomia política na esfera municipal, com um governo local e com câmara municipal. Povoado: um
pequeno aglomerado sem autonomia administrativa (NASCIMENTO, 2009).
21
A lei complementar nº 01 de 09/11/1976 e a Nº46 de 21/08/1984 encontram-se nos anexos p. 202 a 207.
100
4.1.1 Almas22
A cidade de Almas inicia-se com o topônimo arraial de São Miguel e Almas. Cunha
Matos (1979) informa que o arraial de São Miguel e Almas está situado a quatorze léguas ao
oriente de Natividade e contêm setenta e três casas humildes e a igreja de São Miguel, muito
pobre. Naquela época, o arraial era freguesia 23, contava com uma companhia de ordenanças e
ficava distante três léguas do Rio Manuel Alves e dez do registro do Duro.
Cazal (1817) refere-se ao local como arraial das Almas que se localiza a vinte léguas
(120 km) ao leste do arraial de Natividade, um pouco afastado do rio Manuel Alves e próximo
à estrada que dá acesso ao Duro. Os habitantes criavam gado, cultivavam vários mantimentos
e algodão.
Gardner (1975) relata que a vila de Almas estava situada em uma enseada e possuía
poucas ruas irregulares com casas baixas e de aspecto miserável, construídas de grandes
tijolos crus, de barro misturado à grama aparada e seca ao sol. Considerou o número de
habitantes em torno de oitocentos, em que a maior parte era de negros, mulatos e mestiços
resultantes da união de negros e índios. O autor inicia o relato chamando o local de vila e, em
seguida, de aldeia. Nesses termos, coloca que a aldeia tinha uma igreja em condições quase
tão ruins quanto a do Duro, e como este, não havia sacerdote que residia no local.
Segundo consta na Biblioteca do IBGE (2015), 29 de setembro de 1734 marca a
chegada dos primeiros exploradores ao local em busca de minas de ouro, tendo como
principal explorador o português Manuel Rodrigues de Araújo. Em seguida, chegou outro
português, Bernardo Homem, que se estabeleceu na região por volta do ano 1820. Dedica-se à
exploração das minas de ouro e, para isso, emprega largamente a mão de obra escrava. Apesar
de não haver registro, conforme destaca Póvoa (1999), Bernardo Homem é considerado o
fundador do arraial. Ele construiu a primeira igreja católica e trouxe de Portugal várias
imagens sacras, inclusive a de São Miguel Arcanjo, que é o padroeiro da cidade. No
imaginário católico, São Miguel Arcanjo é o protetor das almas do purgatório, vindo daí a
motivação dos topônimos São Miguel e Almas e, posteriormente, Almas.
Ao se tornar distrito pela lei provincial nº15 de 10/11/ 1854, muda a denominação para
Miguel e Almas, subordinado ao município de São José do Duro. Depois passa a pertencer ao
município de Natividade até 1937. A partir de 1938, o distrito de Miguel e Almas passa a ser
22
Conferir fotos da cidade de Almas nos anexos p. 188.
23
Freguesia: agrupamento, povoação paroquiana, paróquia (HOUAISS, 2004).
101
chamado de Almas, pela lei estadual nº557 de 30/03 e pela lei estadual nº 2.094 de 14-11-
1958 é elevado a categoria de município, desmembrando-se de Natividade.
O topônimo Almas é formado por elemento específico simples (subst. alma + desin. pl.
-s) e está inserido na categoria taxonômica de natureza antropocultural, classifica-se em
hierotopônimo por se tratar de um topônimo relacionado à religiosidade. A doutrina cristã,
católica ou protestante, considera a alma como uma entidade sagrada e imortal; a essência da
vida humana.
A motivação para a escolha desse nome vem do topônimo do antigo arraial de São
Miguel e Almas, que tinha esse nome em homenagem a São Miguel Arcanjo. O termo Almas
liga-se a esse santo, porque, na doutrina cristão-católica, Miguel é o santo protetor e defensor
das almas que deixam este mundo para levá-las a Deus para o julgamento. Com o tempo,
provavelmente, o lugar ficou sendo referido apenas por Almas e, a partir de 1938, pela lei
102
estadual nº557, esse topônimo torna-se oficial. A devoção a São Miguel permaneceu até a
atualidade como padroeiro da cidade.
Quanto ao mecanismo conceptual, destaca-se a metonímia devido à relação de
contiguidade entre a parte pelo todo, no caso, a devoção a uma entidade, a parte, estende-se ao
lugar em que moram as pessoas que se dedicam a ela. A religiosidade é uma manifestação do
espírito humano, por isso considera que o topônimo de índole religiosa está associado a essa
manifestação, isto é, a suas crenças e ideologias. Portanto, nesses casos, a relação que
aproxima o lugar e seu nome é o sentimento humano. Esse sentimento faz com que coisas
distantes aproximem-se, por meio de uma teia de simbolismos promovidos pela linguagem.
4.1.2 Arraias24
A cidade de Arraias inicialmente era conhecida como arraial de Arraias e tem esse
nome por estar situada próxima a um ribeirão abundante em espécie desse peixe. O arraial foi
formado a partir das descobertas das minas de ouro, fato ocorrido por volta de 173925. De
acordo com Apolinário (2007), as notícias do descobrimento das ricas minas de Arraias
provocou uma enorme concorrência de pessoas loucas por enriquecimento rápido, pois o
ouro, como fonte de riqueza fácil, fazia parte do imaginário dos colonizadores e também da
política da época.
Outra versão histórica para o início dessa cidade é que ela foi fundada a partir de uma
missão jesuíta chamada Boqueirão dos Tapuios, em 1733, na Chapada dos Negros. Essa
missão transformou-se em um arraial e em uma importante mina aurífera. De qualquer forma,
o ouro foi o grande responsável pelo surgimento do arraial que depois veio a se tornar a
cidade de Arraias.
Assim, a sua primeira povoação formou-se nas proximidades de um rico filão de ouro,
localizado no alto da chapada. Segundo a tradição popular local, acredita-se que antes de ser
povoada por mineradores brancos, ela fora um refúgio de negros aquilombados e, por esse
motivo ficou conhecida como “Chapada dos Negros”. Ainda nos dias atuais é possível
encontrar no alto dessa chapada vestígios do primeiro povoado tais como ruínas de casas,
regos de captação de água e muro de pedras, que são atribuídos à presença dos escravos
naquele lugar.
24
Conferir fotos da cidade de Arraias nos anexos p. 179.
25
Ferreira (1958) destaca que a descoberta das primeiras minas de ouro em Arraias ocorreu por volta de 1736.
103
A partir do descobrimento das primeiras minas de Arraias, a notícia desse fato trouxe
ao lugar grande quantidade de pessoas à procura de riquezas. Como já mencionado
anteriormente, a riqueza proporcionada pelo ouro fazia parte do imaginário dos primeiros
colonos que migraram para as terras arraianas. Essa era a mentalidade da época, tanto da
coroa portuguesa quanto dos seus súditos, o enriquecimento fácil pela exploração das terras
coloniais.
Devido ao contínuo fluxo de pessoas que chegavam ao local, dos mais distantes
lugares, o arraial cresceu de forma improvisada e descontínua. Ao fazer uma vistoria em todas
as minas de Goiás, o então Governador da Capitania de São Paulo, Dom Luís de
Mascarenhas, chega a esse arraial em 1740 e ordena a transferência da população que vivia na
Chapada dos Negros para uma área um pouco afastada das minas. Em Silva e Souza (1967)
encontra-se a seguinte informação a respeito de Arraias:
O pequeno Arraial de Arraias, que tira o seu nome do Rio Arraias, é cercado de
serras e construído sobre uma colina. Dois riachos fornecem boa água potável, o
Córrego Rico e o Córrego Maravilha. São auríferos e outrora davam abundante
produção. Singular é a cor pardacenta desse ouro, que, por isso, chama-se “ouro
podre”. (...) De acordo com esboços do plano, feito pelo próprio Governador Geral
Dom Luís de Mascarenhas quando aqui esteve, foi o arraial edificado em 1740. A
igreja é cercada de casas por todos os quatro lados. (...) Há uma segunda igreja,
insignificante, e sobre uma colina, vê-se uma terceira, ainda não concluída. Agora,
que a extração do ouro é pequena, os habitantes vivem da criação de gado e da
fabricação de queijo. Nas roças são cultivados algodão, milho e fumo (POHL, 1976,
p. 277).
26
Os autores denominam de ouro podre o que Sousa e Silva (1967) chama de ouro pobre. Possivelmente, quando
ele usa esse termo está referindo-se ao valor desse ouro que era mais baixo do que o ouro comum. Pohl (1976)
ressalta que a cor pardacenta do ouro podre parecia indicar a mistura com platina e que serviu para fabricação de
moedas.
104
Esse município conta com grande potencial turístico ainda pouco explorado. Como
atrativos naturais, têm-se a Chapada dos Negros com suas ruínas de casas, muralhas e
galerias, as grutas da Lapa. Têm-se também as festas religiosas em homenagem a santos
católicos, como a Romaria de Nossa Senhora dos Remédios, padroeira da cidade, Santos Reis,
São Sebastião e a Festa do Divino, propicia, também, o contato intenso com quilombolas.
Esses atrativos formam o patrimônio histórico-cultural desse local.
O topônimo Arraias foi motivado pelo rio de mesmo nome que atravessa a cidade.
Nesse rio, como em outros no estado, o peixe raia, mais conhecido como arraia, era
abundante. Provavelmente, o rio Arraias teve muita importância para a formação do lugar,
uma vez que os antigos aglomerados humanos foram constituídos sempre próximos aos
cursos d’águas para o abastecimento do líquido e como fonte de alimento. No caso do lugar
em questão, além dessas razões, acrescenta-se a busca pelo ouro que era retirado dos rios e
córregos, o chamado ouro de aluvião. Conforme já exposto, Arraias foi um núcleo minerador
e sua formação decorreu dessa atividade. Apesar das atividades mineratórias que deram
origem ao lugar, o denominador foi impressionado pelo aspecto físico para nomeá-lo
demonstrando a cosmovisão do homem ligado à terra e à natureza.
No decorrer da sua existência e das mudanças socioeconômicas e históricas, passa de
arraial para vila e depois para cidade, mas o nome foi relativamente mantido. No início do
século XIX, o termo Arraias estava ligado a Nossa Senhora dos Remédios, cuja devoção
ainda se mantém forte em que é reverenciada como padroeira local. Megale (1980, p. 325),
citando Santo Tomás de Villanova, diz que “Maria é o único remédio para todos os nossos
trabalhos, todas as nossas angústias e todas as nossas necessidades”. De acordo com a autora,
o povo, conhecedor dessa verdade, deu vários títulos à Maria, tais como: medicina do Mundo,
Saúde dos Enfermos, Senhora da Saúde e Nossa Senhora dos Remédios. Este último
popularizou-se na Lusitânia, vindo depois para o Brasil.
O topônimo Arraias é formado por elemento específico simples, acrescido da prótese
de a- e -s plural. Está inserido na categoria taxonômica de natureza física e classificado como
zootopônimo por ser um topônimo resultante de espécie animal. Destaca-se como uma
denominação espontânea motivada pelo meio ambiente sem imposição oficial, pelo menos
inicialmente. Quanto ao mecanismo conceptual, a presença do processo metonímico é
facilmente percebido, pois há uma relação de contiguidade em que a espécie de peixe que
havia em abundância no rio denominou-o e essa denominação estende-se para o nome do
lugar.
107
Em minhas visitas a esse lugar fui sempre hospitaleiramente acolhido pelo capitão
Batista, português idoso ali estabelecido desde muitos anos e sogro do proprietário
da fazenda Sociedade. Falava frequentemente de Pohl e Burchell, ambos os quais se
demoraram algum tempo em Arraial e de quem parece ter sido íntimo (GARDNER,
1975, p. 160).
108
O autor comenta também que suas visitas ao arraial da Chapada renderam-lhe grandes
acréscimos de vegetais às suas coleções, já que as montanhas calcárias próximas ao local são
muito ricas em plantas.
Pohl (1974) relata também que esteve no arraial da Chapada da Natividade, e que este
se situava sobre uma pequena colina, distante duas léguas (12 km) do arraial de Natividade.
Ele calcula que esse arraial possuía 60 casas de tijolos cozidos e cobertas de telhas,
destacando-se pelo tamanho e aparência a casa do comandante de Natividade. Em toda parte,
percebeu vestígio da extinta opulência dos habitantes, porém, naquele momento,
encontravam-se em situação econômica decadente. Refere-se à igreja de Santana, que estava
em ruínas, e à construção da igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos.
A única riqueza que deu renome a este arraial proveio naturalmente da extração do
ouro, que era tirado da terra argilosa de aluvião dos riachos. Atualmente, também
neste local se queixam de que, como em toda parte, diminuiu a produção do ouro, e
isso é natural, pois aqui atuaram negativamente as mesmas causas que levaram à
decadência tantos de outros estabelecimentos semelhantes (POHL, 1976, p.270).
E duas causas principais a que se refere o autor é a falta de mão de obra servil, já que a
maioria dos escravos morreu e não podia ser substituída. Além do esgotamento do terreno
aluvial que já se encontrava escavado em todas as direções. É importante recordar que para a
sociedade colonial o trabalho braçal era reservado aos escravos, mesmo com a possibilidade
de ainda encontrar o metal precioso, não se empenhavam nessa labuta homens livres, apesar
de empobrecidos.
Constata-se uma diferença de olhar entre a descrição de Pohl (1976) e a de Cunha
Matos (2004) em relação às casas e à igreja de Santana27. O que para aquele eram ruínas e
decadência, para este era boa e bela. Cunha Matos (2004) destaca que “o arraial de Chapada o
qual é muito extenso e ainda têm várias boas casas; a igreja de Santa Ana com três altares,
muitas peças de prata, e excelentes ornamentos (p.184)”. Pohl (1976, p. 270) imbuído da
visão etnocêntrica europeia da época, sobressai no seu relato a sua percepção baseado no
modelo de cidade europeia. Assim, comenta que “todo o lugar revela vestígios da extinta
opulência dos habitantes, hoje se encontra em total decadência; a Igreja de Santana está quase
em ruínas”.
Atualmente a cidade de Chapada da Natividade conta com uma população em torno
de 3.363 habitantes conforme o censo do IBGE de 2014. Em 28 de setembro de 1995 torna-se
município independente do de Natividade.
27
Ver a igreja de Santana nos anexos p. 183.
109
28
Da mesma maneira como os "registros" fiscalizavam o ouro, "contagens" eram especializadas na tributação de
gado e outros animais (IBGE, 2015).
110
O antigo arraial de Conceição, segundo Cunha Matos (2004; 1979), foi edificado no
ano de 1741, em um local próximo a alguns montes de nome Bocaina que possuíam bastante
ouro. Na ocasião em que o autor passou pelo local ainda havia muito desse metal precioso,
mais abundante do que em outros distritos da província. Por essa época, o arraial de
Conceição já era cabeça de julgado, era extenso e possuía 70 casas, algumas consideradas
boas e a igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição29 e a do Rosário, ambas pequenas e
com um altar. Cunha Matos considerou o arraial aprazível, mas com um grande problema de
falta de água, culpando por isso o desleixo dos habitantes. Como era militar, não deixou de
informar que no local havia uma brilhante companhia de cavalaria e outra, não menos
brilhante, de infantaria, uma de Henriques e uma de ordenanças. O autor faz a seguinte
observação quanto a população local: “de todos os arraiais por onde tenho transitado em
Goiás, o da Conceição é aquele em que há menos gente branca; mas os pardos e pretos são
29
Ver a igreja de Nossa Senhora da Conceição e da cidade nos anexos p.190.
111
limpos e bem apessoados” (2004, p. 180). E acrescenta que a riqueza do povo era ouro e a
criação de gado vacum nos excelentes pastos do julgado.
Azevedo (1987), pela época em que foi escrito seu anuário, refere-se ao local como
vila da Conceição e reafirma a data da fundação para 1741. Ressalta que essa vila possuía
muito ouro e que para lá foram muitos aventureiros em busca do metal precioso. Eles
construíram a capela de Nossa Senhora da Conceição, elevada à categoria de freguesia pela lei
provincial de 23 de junho de 1835. O arraial da Conceição foi elevado à vila pela lei de 14 de
Outubro de 1854, sendo instalada em abril do ano seguinte. Esse autor reitera o que Cunha
Matos expôs sobre o arraial com relação às igrejas e o local de edificação, mas comenta
também que, se a vila teve alguns momentos de prosperidade, teriam sido passageiros, pois o
que se via era o empobrecimento da população.
Para realçar essa ideia, descreve a vila em que esta era composta de casas construídas
de adobe, não assoalhada e nem forrada, com ruas desalinhadas e sem calçamento, cobertas de
arbustos e capim como as taperas. Na estação das chuvas, as ruas transformavam-se em
brejos. Descreve seus habitantes como pálidos por causa das febres crônicas paludosas que
anualmente os acometiam. Ressalta ainda que não havia gente branca, por elas não
suportarem a insalubridade do clima.
Interessante ressalva desse autor com relação aos habitantes do local é que eles seriam
obedientes às leis, alegres e oficiosos, mas observa que falavam o português com um sotaque
e inflexão própria dos baianos, com quem eles fazem comércio.
Com relação à água que abastece a cidade de Conceição do Tocantins, é consenso na
bibliografia consultada afirmar que é escassa e de má qualidade.
Pohl (1976), que passou pelo arraial de Conceição alguns anos antes de Cunha Matos,
refere-se ao local como sendo um insignificante arraial localizado em uma região
extremamente pedregosa e seca, fundada no período de abundante extração do ouro, em 1741.
Conta que o lugar possuía duas igrejas e que o vigário, que deveria morar em Vila da Palma,
morava nesse arraial devido à igreja daquela vila ter sido destruída pelos índios, em 1783.
Com a extração de ouro, os habitantes do arraial da Conceição desfrutaram de riqueza, porém,
por falta de braços – certamente dos braços dos escravos – e de água, essa fonte de renda tinha
secado. Eles viviam da criação de gado, praticando pouco a agricultura. O número de casas
aproximava-se de oitenta, na época.
Quando da passagem do Barão de Mossâmedes pelos anos de 1771 a 1773, no seu
diário, registra que havia muito pouca gente no arraial da Conceição, no entanto, este era um
julgado devido às distâncias de um julgado para outro. Estava situado em local muito estéril,
112
observando que, na distância de onze léguas, os seus animais não molharam as ferraduras. De
acordo com esse diário, o Barão foi recebido com ostentação que se igualava ao tamanho do
local. Como era cortês com todos, agradeceu muito o cortejo. Por ser um lugar pequeno e
haver pouco trabalho a ser feito, retirou-se, em seguida, para o arraial de Arraias (PINHEIRO;
COELHO, 2006).
Quanto à formação administrativa, o arraial foi elevado à condição de vila de
Conceição do Norte, em 1854. Perdeu parte de seu território em 1884 para a criação da Vila
de São José do Duro, à qual fica subordinada até 1963 quando recupera a autonomia e torna-
se, pela Lei Estadual nº 4.486, município de Conceição do Norte (IBGE, 2015). Após a
divisão do estado de Goiás, o termo “Norte” foi substituído por “Tocantins” de acordo com o
Decreto Legislativo nº 001, de 01 de janeiro de 1989.
toponímia quanto na antroponímia, uma vez que o termo Conceição é encontrado em todas as
regiões do país nomeando lugares e pessoas, além de capelas, igreja e santuários dedicados a
esse orago.
Em se tratando do mecanismo conceptual, pode ser considerado um topônimo
metonímico por apresentar a relação entre o espaço e a experiência humana (o sentimento
religioso) em que o nome do santo padroeiro é utilizado para denominar o lugar. Assim, há
uma relação de contiguidade em que parte (santo) nomeia o todo (o lugar). Com isso,
percebem-se também as características de signo indexical, visto que o nome do santo está
associado ao lugar ou vice-versa, indicando que um faz parte do outro, está em adjacência ao
outro.
Quanto à mudança de nome, percebe-se que o termo Conceição manteve-se ao longo
dos séculos de formação do lugar. O que mudou foi o termo específico que indica a
localização. Antes da divisão do estado de Goiás, era Norte, indicando a região desse estado
em que ficava localizada. Após a criação do estado do Tocantins, o termo Tocantins substituiu
o Norte. Assim, a sistematização do nome encontra-se desde o início, indicando que a
devoção dos primeiros moradores a Nossa Senhora, como força motivadora para tal escolha,
resistiu ao tempo. Além disso, representa uma herança de um patrimônio sociocultural
português, preservado na toponímia e na antroponímia brasileiras.
4.1.5 Dianópolis30
Dianópolis é uma das cidades mais antigas do estado do Tocantins e sua formação está
ligada tanto às minas de ouro como também aos aldeamentos dos indígenas que habitavam a
região. Ferreira (1958) relata que o povoamento de Dianópolis é muito remoto, foi fundado
em 1750 a partir da aldeia dos índios Acroá, descendentes dos Jê centrais. As razões para o
aumento da população foi a descoberta das minas de ouro, como a Tapuia que ainda existe na
zona urbana. Para esse autor, o primeiro topônimo foi São José do Ouro que, por corruptela,
mudou para São José do Duro, passando antes por D’ouro. Saint-Hilaire (1975) também
comenta sobre essa mudança linguística em nota de rodapé, ao se referir à aldeia do Duro.
Segundo Póvoa (1999), Dianópolis foi o antigo arraial do Duro fundado por volta de
1751, em consequência de aldeamento. Era um povoado pequeno e pouco habitado,
constatado no dicionário topográfico do Império do Brasil de José Saturnino da Costa Pereira
30
Conferir fotos da cidade de Dianópolis nos anexos p. 185.
115
(1854), situado ao norte da Capitania de Goiás, atual estado do Tocantins, no topo da Serra
Geral. O autor exagerou um pouco ao usar o termo topo, visto que a cidade encontra-se
próxima a essa serra.
Ligada ao arraial, estava a aldeia de São José do Duro. Cunha Matos (2004) informa
que ela estava assentada perto da serra do mesmo nome, serra do Duro, de onde proveio o
nome do arraial e da aldeia. Fundada em 1751 para habitação dos índios Acroá, Xacriabá,
Aricobé, Caiapó e Tupinambá, que também povoaram a aldeia de São Francisco Xavier da
Formiga, destruída pelos Acroá antes da fundação do Duro. Os diretores responsáveis por
essas aldeias foram os religiosos da Companhia de Jesus.
Na época em que Cunha Matos passou pela aldeia, esta tinha uma população de 36
fogos ou famílias, compostas de 201 pessoas. Conforme o autor, em 1823 tinha recebido uma
relação dos descendentes dos primeiros indígenas aldeados. Essa relação constava de 49
Acroá, 6 Aricobé, 6 Caiapó e 6 de língua geral ou tupinambá com idade entre 17 e 60 anos.
Além dos índios, existiam no território da aldeia várias famílias não índias que foram viver ali
em completa “ociosidade”.
Cunha Matos relata que existia na aldeia uma capela dedicada a São José, que era
assistida pelo vigário José Cardoso de Mendonça que também cuidava da paróquia de São
Miguel e Almas. À distância de três léguas da aldeia de São José do Duro, existiu a aldeia de
Formiga. As duas pertenciam à Missão de São Francisco Xavier. Missão religiosa que
cuidava da administração espiritual dos índios, dirigida pelos jesuítas, tendo como objetivo
produzir alimentos para o consumo dos dois aldeamentos já existentes, bem como para os
outros que se formassem.
Já o registro do Duro ficava a uma légua (6 km) da aldeia de São José, na garganta da
serra do Duro, na entrada para as províncias do Maranhão, Bahia e outras. No registro, havia
uma Tropa de Linha de Goiás que servia de casa de arrecadação dos direitos de entradas de
mercadorias e de fiscalização das rendas de saída do gado e outros gêneros de exportação.
No diário do Barão de Mossâmedes, encontra-se a seguinte informação a respeito do
Registro e da Aldeia do Duro.
Ex.ª intentou hir ao Regº. do Duro; porem como veio ao Arrayal da Nativid e. o vigro.
e o capitam Roque Regente do Indios, que ali ainda se conservão aldeados; dezistio
desta ideia. Mandou S. Exª. fardar a sua custa o capitam Roque (Indio da Nação
Gougué) (...), e a bem disto mandou pelo vigário hum precioso[?] presente aos
outros Indios de ferramentas pª. a fabrica das suas lavouras (2006, p.115).
116
A mudança toponímica de São José do Duro para Dianópolis representa o que Dick
(1990) ressalta sobre as denominações sistemáticas, por imposição de uma autoridade ou
daqueles que têm o poder do mando, distanciando-se das realidades ambientais ou do gosto
popular. Em um primeiro momento, percebe-se a força da religião como fator motivador do
nome e em seguida, a força política das oligarquias locais. Nesse sentido, pode-se afirmar que
a toponímia tem a função, além de outras tantas, de afirmação do poder político, ideológico e
sociocultural. Ou seja, “batizar um lugar não significa apenas posse (capitação mental/física),
referência, orientação, mas também ideologia e visão de mudo” (SEEMANN, 2005, p. 221).
O topônimo Dianópolis encontra-se incluso na taxonomia de natureza antropocultural
e classifica-se em antropotopônimo, por se tratar de nomes de pessoas atribuídos a lugar. É
constituído por elemento específico simples, com terminação em -polis. Quanto ao
mecanismo conceptual, apresenta o processo metonímico por constar, na atribuição do nome
de pessoa ao lugar, uma relação de contiguidade existencial no espaço, pois as pessoas cujo
nome foi transformado em topônimo nasceram e cresceram nesse lugar, fizeram parte da sua
história. Como signo linguístico, tem alto grau de indexicalidade, já que Dianópolis indica o
lugar das Dianas ou o lugar em que viveram.
A cidade de Monte de Carmo teve como primeiro topônimo apenas Carmo. Segundo o
Dicionário Topográfico do Império do Brasil, de José Saturnino da Costa Pereira, de 1834,
Carmo era um pequeno arraial da Província de Goiás, no distrito de São João das Duas
Barras, povoado em razão das suas minas de ouro, descoberto em 1764 por Manoel Sousa
Ferreira. Possivelmente um erro na ordem dos números, pois em Pohl (1976, p. 266),
encontra-se a seguinte afirmação: “como tantas outras povoações semelhantes, este arraial
deve sua origem à cobiça do ouro. Foi fundado em 1746 por Manuel de Sousa Ferreira”.
Ainda de acordo com Pohl (1976), como os outros povoados, o arraial do Carmo
estava em ruínas, uma vez que para a exploração das minas, os habitantes precisam de
escravos para realizar o trabalho. Anteriormente era um lugar populoso e abastado por causa
das ricas lavras de ouro. Esse arraial ficava próximo à serra Geral e era rodeado por serras em
semicírculos. Possuía 150 casas, na maioria, construídas de tijolo queimado e cobertas de
telhas. Segundo ele, era por causa dos ataques dos índios que incendiavam os telhados de
31
Conferir fotos da cidade de Monte do Carmo nos anexos p. 189.
119
palha. Relata que as igrejas de Nossa Senhora do Carmo e a de Nossa Senhora do Rosário
eram construções muito simples. Apesar da boa aparência do arraial, a população estava
empobrecida. Os habitantes sobreviviam precariamente com as suas plantações de milho,
fumo, algodão e cana-de-açúcar, alguns frutos e hortaliças. Ainda criavam gado, cabras e
ovelhas.
Cunha Matos (2004; 1979) afirma que o arraial do Carmo era extenso e aprazível, foi
fundado em 1741, próximo aos rios da Água Suja e Sucuriú. Esses rios formavam pântanos,
causando moléstias graves. Possuía cento e sete casas entre pequenas e grandes e a igreja
matriz de Nossa Senhora do Carmo bem ornada, excelente lâmpada e banqueta de prata,
contrastava com a pobre ermida de N. Senhora do Rosário. Em seus termos, havia uma
companhia de infantaria, uma de cavalaria, uma de Henriques milicianos e uma de
ordenanças. No entanto, não havia oficiais, fato comum na Comarca de São João das Duas
Barras, em razão do olhar indiferente das autoridades para com essa comarca, o que deu
motivo à separação violenta.
O arraial do Carmo e seu distrito já foram mais ricos e povoados. Nos seus arredores
encontram-se cerca de 90 fazendas de criação de gado e plantações que haviam sido
abandonadas. Isso ocorreu devido, possivelmente, aos ataques dos índios “selvagens”, à
diminuição do ouro, à extinção dos escravos e à emigração para a província do Pará. Cunha
Matos relata também que próximo ao rio da Formiga existiu uma aldeia deste nome, povoada
pelos Acroá. Essa aldeia ficou deserta uma vez que os índios foram transferidos para a aldeia
de São José do Duro. Póvoa (1999) revela que a aldeia de Formiga atualmente é a cidade de
Pindorama, que faz divisa com Monte do Carmo pelo lado leste.
O município de Monte do Carmo foi desmembrado do território de Porto Nacional no
ano 1963 e estabelecido a partir de 1º de Janeiro de 1964. Atualmente, a cidade de Monte do
Carmo tem uma população estimada em 7.412 habitantes, tendo como santo padroeiro, desde
o início da formação do arraial, Nossa Senhora do Carmo. A capela em devoção a essa santa
foi construída em 1802, em cuja construção foi gasto o valor correspondente a 1.450 oitavas
de ouro doada pelos habitantes locais. Essa construção ficou sob a responsabilidade de uma
irmandade, criada especificamente para gerenciar a capela (IBGE, 2015).
Observa-se aqui o quanto os movimentos econômicos impactam as povoações. Antes,
no período de mineração, o arraial do Carmo era um esplendor de riqueza e o arraial de Porto
Real era apenas um porto para acesso entre dois núcleos de mineração, Carmo e Pontal. Com
a exaustão das minas e, consequentemente, o esvaziamento desses dois arraiais, e mais ainda a
abertura do porto que servia como entreposto de navegação do rio Tocantins até o Pará, Porto
120
Real ganhou notoriedade, cresceu, desenvolveu-se e se tornou dono daqueles espaços a que
antes a ela eram subordinados.
Em relação à religiosidade local, entre os dias 7 a 18 de julho, a população de Monte
do Carmo mobiliza-se para festejar a santa padroeira, Nossa Senhora do Carmo, o Divino
Espírito Santo e Nossa Senhora do Rosário. Pessoas de várias cidades da região e de outros
Estados participam desses festejos. No decorrer desses dias, a cidade transforma-se em um
palco com apresentação de folias, rei, rainha, imperador, imperatriz, cavaleiros, amazonas,
congos, alferes, foliões e taieiras32, com vestimentas coloridas, dançando, cantando e
percorrendo as ruas e praças da cidade (MESSIAS, 2008). Nesse contexto, encontra-se uma
mistura de fé religiosa e cultura popular, que vai do sagrado ao profano e vice-versa.
O festejo de Monte do Carmo é um acontecimento envolto de grande importância, um
dos eventos religiosos de maior visibilidade no estado do Tocantins, formado por um conjunto
de eventos religiosos controlados pela igreja católica que envolve três momentos distintos.
32
Grupo de mulheres tradicionalmente vestidas de baianas, que acompanha o andor de Nossa Senhora do
Rosário (HOUAISS, 2001).
121
Além do Morro das Figuras, há a cachoeira do Fueiro, com duas quedas d’água muita
apreciadas pelos visitantes, bem como a gruta histórica do Morro do Salão e a Usina
Hidrelétrica Isamu Ikeda, no rio Balsas, na divisa dos municípios de Monte do Carmo e Ponte
Alta do Tocantins. A cidade conta ainda com artesanato, manifestações artísticas e comidas
típicas (IBGE, 2015).
Quanto às formações administrativas, inicialmente era um arraial que passou a distrito
com a mesma denominação de Carmo, pela lei provincial nº 14, de 23-07-1835, subordinado
ao município de Porto Nacional. Em 1920, a denominação mudou-se para Monte do Carmo e,
em seguida, na divisão administrativa referente ao ano de 1933, o distrito volta a denominar-
se Carmo. Em 1937, a denominação é alterada para Nossa Senhora do Monte Carmo. Um ano
depois o distrito de Nossa Senhora do Monte Carmo volta à denominação de, simplesmente,
Carmo. Pelo decreto-lei estadual nº 8305, de 31-12-1943, o distrito de Carmo passou a
chamar-se Tairuçú. Esse nome não foi aceito pelos habitantes do município que pediram o
retorno da denominação anterior. Pela lei municipal nº 186, de 23-07-1953, o distrito de
Tairuçú passou a denominar-se Monte do Carmo. Assim permanecendo até a data atual
(IBGE, 2015).
controversa) por Manoel Sousa Ferreira. Nas divisões territoriais de 1936 e 1937, encontra-se o
distrito com o nome de Nossa Senhora do Monte do Carmo. Houve decreto-lei estadual em 1943
denominando esse lugar de Tairuçú. No entanto, os habitantes não o aceitaram e dez anos depois,
por lei municipal, é denominado de Monte do Carmo. O município de Monte do Carmo foi
desmembrado do território de Porto Nacional no ano 1963 e estabelecido a partir de 1º de Janeiro de
1964.
Motivação toponímica: Serra do Carmo
Mecanismo conceptual: metonímica
Taxionomia de natureza física: Geomorfotopônimo – topônimo resultante de forma topográfica
Hierotopônimo – topônimo relacionado ao sagrado
É grande a devoção do povo brasileiro a Nossa Senhora do Carmo. Esse fato pode ser
percebido nos inúmeros topônimos e antropônimos que aparecem com o termo Carmo. Na
cidade de Monte do Carmo, a dedicação a essa devoção mariana conservar-se até os dias
atuais, demonstrada nos festejos em honra à padroeira da cidade, todos os anos, no mês de
julho.
O topônimo Monte do Carmo tem a estrutura morfológica formada por elemento
composto híbrido contendo os substantivos monte e Carmo, ligados pela preposição de +
artigo o indicando posse, em que o primeiro termo é de origem latina e o segundo, do
hebraico. Inclui-se na taxonomia de natureza física, classificado como geomorfotopônimo por
ser um topônimo resultante de acidente topográfico, no caso “monte”. Todavia, se se pensar
no termo Carmo referindo-se a Nossa Senhora do Carmo tem-se um hierotopônimo por se
tratar de nome relacionado ao sagrado. O aspecto religioso permanece marcado na formação
do topônimo Monte do Carmo. Em vista disso, as duas taxes são possíveis para classificá-lo,
pois a função dos nomes dos lugares ultrapassa a de referenciar, englobam identidades,
valores, crenças e ideologia do denominador.
Quanto ao mecanismo conceptual que atuou na escolha do nome, pode-se afirmar que
foi o metonímico. A denominação dada ao acidente geográfico (serra do Carmo) é também
dada à cidade, em uma relação de contiguidade relacional, em que um está ligado ao outro no
espaço geográfico e pelo olhar do denominador. Pode-se dizer que Carmo indica o monte que
indica a cidade.
4.1.7 Natividade
33
Um tipo de rocha utilizado para ornamentação e calçamentos.
125
comportava a população. Outra capela também pequena era a de Nossa Senhora dos
Terceiros, a que Cunha Matos (2004) menciona como capela de Nossa Senhora do Terço.
Pohl refere-se ainda à igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos que, se tivesse sido
acabada, superaria todos os demais templos da Capitania. Em relação à construção da igreja
de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, Pohl (1976) informa que
A edificação dessa igreja foi iniciada pelos negros livres, segundo uma grandiosa
planta, mas só a metade ficou concluída; por falta de meios, sobretudo pela
diminuição da produção de ouro, a construção teve de ser abandonada.
Obstinadamente, recusaram o oferecimento dos habitantes não-negros de
contribuírem em comum para o término do belo edifício (...). O orgulho dessa gente
não lhe permite aceitar a bem intencionada contribuição de seus concidadãos, e o
que já se construiu, breve estará em ruínas (POHL, 1976, p. 271).
Outro viajante que registrou sua passagem por Natividade foi Cunha Matos (2004;
1979). Seu relato é bem parecido com o de Pohl, diferenciando-se na quantidade de casas.
Cunha Matos informa que o arraial de Natividade era muito extenso, com boas praças, ruas
largas e algumas casas grandes e 188 fogos34 compunha a povoação no ano de 1824. Naquela
época, havia quatro igrejas: a matriz de Nossa Senhora da Natividade, templo grande, a
pequena e antiga capela de São Benedito, a de Nossa Senhora do Terço, pequena e pobre, e a
de Nossa Senhora do Rosário. Essa última era uma grande capela-mor de um grande templo
que teria começado e estava na altura de oito palmos. Essa igreja continua inacabada e
atualmente tornou-se monumento histórico, símbolo cultural da cidade e do estado do
Tocantins35.
Interessante observação de Pohl (1976) que deve ser registrada aqui quando se refere à
diminuição do ouro nas minas de Natividade. Para ele, os habitantes levavam uma vida de
miséria e isso era em consequência também da diminuição dos escravos necessários para
realizarem o trabalho. A população era formada, na sua maioria, por negros e mulatos e com
poucos brancos em progressiva diminuição. Sobreviviam da criação de gado e do cultivo da
cana-de-açúcar, da qual extraía a aguardente, das plantações de algodão, milho, mandioca,
legumes e um pouco de fumo. O autor encontra no local algumas pessoas que se dedicam ao
ofício de artífice e ao comércio.
Cunha Matos (2004) comenta que residia no local o Vigário-Geral da Comarca do
Norte que era o Pe. Gonçalo Fernandes Souto. Esse autor via nos habitantes de Natividade
uma espécie de civilização cortesã, com gente limpa e bem tratada, mas inimiga declarada do
34
Sentido de família, lar, casa, habitação.
35
Ver foto das igrejas de Nossa Senhora do Rosário e de Nossa Senhora da Natividade nos anexos p. 180-181.
126
governo da comarca do sul de Goiás, com quem mantinha relações muito raras. Interessante
também é seu relato sobre a inimizade dos habitantes do arraial de Natividade em relação aos
da vila da Palma devido a interesses políticos, pois eles queriam que sua cidade permanecesse
sede da comarca do norte, tarefa que coube à Vila da Palma.
Antes de fundar a vila que seria a sede da comarca de S. João das Duas Barras,
Natividade foi residência por alguns anos do ouvidor e corregedor Joaquim Teotônio
Segurado que a preferia devido à excelência de seu clima, ficando como sede provisória dessa
comarca.
O nome atual desse lugar é em homenagem a Nossa Senhora da Natividade, que se
tornou padroeira a partir de 1735 quando chegou ao arraial uma imagem dessa santa vinda de
Portugal, transportada por barco pelo Rio Tocantins e depois nos ombros dos escravos até o
arraial. Essa imagem é a mesma que se encontra na igreja Matriz de Natividade, uma das mais
antigas do Estado, datada de 1759 (IBGE, 2015). Em Azevedo (1987), tem-se a informação
de que a festa da padroeira que acontecia entre os dias 30 de agosto a 8 de setembro, era de
grande concorrência dos fiéis. Pohl (1976) presenciou os festejos de Nossa Senhora da
Natividade e conta que, pela sua estada, realizavam-se as novenas da Natividade da Virgem
Maria. A igreja dedicada a essa santa estava totalmente iluminada à noite para os sacerdotes
celebrarem as vésperas. “Em 8 de setembro, dia da festa propriamente dita, apareceram todos
os habitantes em grande gala (POHL, 1976, p. 273)”. Na atualidade, Nossa Senhora da
Natividade é padroeira também do estado do Tocantins.
Em consequência de seu conjunto arquitetônico formado por igrejas, casarões
coloniais e a ruína da igreja de Nossa Senhora do Rosário, a cidade de Natividade é
atualmente patrimônio histórico nacional, além de ter o título de cidade mais antiga do estado
do Tocantins, com quase 300 anos de fundação.
Também ligado ao município de Natividade, distante 24 km, está o Povoado do
Bonfim, local em que ocorre a maior e a mais tradicional festa religiosa do Estado do
Tocantins. Essa romaria recebe todos os anos uma grande quantidade de fiéis vindos de
diversas regiões do estado e de fora dele. A festa de Nosso Senhor do Bonfim acontece de 7 a
17 de agosto. A respeito desse local, Cunha Matos (2004) relata que chegou à capela do
Senhor do Bonfim e passa a noite em uma casa dos romeiros. Conta que a ermida do Senhor
do Bonfim era santuário famoso da Comarca de São João das Duas Barras, apesar de que a
devoção, na época, não estivesse sendo muito cultuada. A ermida era pequena e com uma
imagem de Cristo crucificado. Em frente à igreja ficavam as casas para acolher os romeiros,
no entanto, encontravam-se todas em péssimo estado.
127
Quanto à origem da romaria, há uma lenda local para justificá-la. Conta essa lenda que
um vaqueiro, ao percorrer a região onde está localizado o Povoado do Bonfim36, encontrou
uma imagem do Senhor do Bonfim em cima de um tronco de uma árvore. Ele a levou para
Natividade e compartilhou o achado com os demais moradores. No dia seguinte, a imagem
desapareceu e voltou ao local onde fora encontrada pela primeira vez. Dizem que esse fato se
repetiu várias vezes até os moradores perceberem que seria nesse local que a imagem deveria
ficar. Construíram uma capela para o Senhor do Bonfim dando início à peregrinação anual na
localidade em que hoje se tornou uma das maiores festas religiosas do Estado.
36
Ver foto da igreja e do povoado do Bonfim nos anexos p. 182.
128
4.1.8 Paranã37
Barra do Palma. Arraial da - que floresceu nos princípios da capitania e nêle tiveram
algumas propriedades os padres da companhia, foi despovoado pelas invasões dos
gentios. Estava situado na barra do rio, que deu nome a este lugar (SILVA e
SOUZA, 1967, p. 60).
37
Ver foto da cidade de Paranã, da igreja de São João Batista nos anexos p. 191-192.
130
portuguesa. Antes de ser instalada a Vila de São João da Palma, a sede da ouvidoria ficou
funcionando na vila de Natividade de 1807 a 1815. A sede foi removida desta para aquela
logo após sua edificação. Esse fato tornou-se o motivo da desavença dos moradores desses
dois lugares durante muito tempo.
Nessa circunstância, a extinta povoação da Barra da Palma passou a ser a vila de São
João da Palma pelo alvará de 25 de janeiro de 1814, em benefício a el-Rei D. João VI. Esse
monarca concedeu, mais tarde, o título de marquês de São João da Palma ao governador e
capitão D. Francisco de Assis Mascarenhas, o governador e Capitão-general da Capitania,
naquela época. Rodrigues (1978, p. 121) cita o padre Luís Gonçalves dos Santos, em
Memórias do Reino do Brasil que diz:
A igreja da vila, que foi capela-mor do tempo dos jesuítas, construída no século XVII
e consagrada a São Félix de Cantalício, perdeu o nome desse santo para tomar a invocação de
São João Batista. Esse é o santo padroeiro de Paranã com celebração no período dos festejos
do Divino Espírito Santo. Além desses, fazem parte do calendário religioso local a Folia de
Reis e a Procissão dos Navegantes pelo rio Palma.
A cidade está situada na confluência dos rios Paranã e Palma que se unem e desaguam
no Tocantins. Quando Cunha Matos passou pela atual Paranã, esta já era a vila de São João da
Palma. Ele ressalta que a localidade da vila era belíssima, por estar no meio dos dois grandes
rios. No entanto, o terreno era baixo e continha algumas lagoas junto às casas, o que a tornava
um lugar úmido e extremamente insalubre.
131
Pelo fato de a cidade ficar entre dois rios que desaguam no rio Tocantins, Paranã foi
impactada economicamente pelo comércio fluvial, tornando-se um entreposto importante na
exportação e importação de mercadorias entre o estado de Goiás e a cidade de Belém no
estado do Pará.
Quanto à formação administrativa, o Alvará de 25-02-1814 eleva a antiga povoação de
Barra do Palma à categoria de vila com a denominação de São João da Palma, instalada em
17-07-1815. “Reconhecendo-se posteriormente que a vila prosperava e que a sua população
desejava elevá-la à categoria de cidade, foi atendida essa justa reivindicação pela lei
provincial de 5 de outubro de 1857” (FERREIRA, 1958, p. 325), denominada apenas de
Palma. Em seguida, pelo decreto-lei estadual nº 8305, de 31-12-1943, o município de Palma
tomou a denominação de Paranã (IBGE, 2015). Não se encontrou na bibliografia consultada
justificativa para a alteração do topônimo Palma para Paranã. Os dois topônimos referem-se
aos rios em cuja convergência a cidade está localizada. De acordo com o conhecimento local,
é porque o rio Paranã tem mais importância para a cidade em termos econômicos, visto que
ele é mais rico em peixes e também pelo seu potencial turístico.
cidade, o que veio a conseguir no dia 5 de outubro 1857. Pelo Decreto-Lei Estadual nº 8305, de 31-
12-1943, o município de Palma tomou a denominação de Paranã.
Motivação toponímica: nome do rio em cujas margens a cidade está situada.
Mecanismo conceptual: metonímico
Taxonomia de natureza física: Hidrotopônimo – topônimo resultante de acidente hidrográfico
O topônimo Paranã foi motivado pelo nome de um dos rios em cujas margens a
cidade está situada, na confluência do rio Palma com o Paranã. Inicialmente, o nome desta
cidade fazia referência ao rio Palma, a saber; Barra do Palma, São João da Palma e Palma.
Nos meados do século XX, muda-se de denominação para Paranã. Isso indica a importância
que esses rios têm para a população local. A cidade de Paranã, desde os primórdios de sua
formação, servia como um porto para os exploradores que desciam o rio Tocantins em direção
ao Pará.
A formação lexical desse topônimo apresenta um elemento específico simples de
origem tupi que significa rio grande, semelhante ao mar. Insere-se na categoria taxonômica de
natureza física, classificado como um hidrotopônimo por se tratar de nome de rio. Nesse
topônimo, o processo metonímico que se faz presente, já que há um prolongamento do nome
do rio para o nome do lugar. Nota-se também que esse processo conceptual está por trás dos
topônimos anteriores que evocava o nome do outro rio que se faz presente no local, o Palma.
É importante ressaltar a mudança toponímica que ocorreu nesse local. No decorrer de
quase três séculos passou por quatro mudanças, as primeiras ainda evocando o rio Palma e, na
denominação atual, o rio Paranã. Percebe-se que o topônimo Barra do Palma e Palma estão
ligados estritamente aos aspectos da natureza, enquanto São João da Palma liga-se, também,
aos aspectos antropoculturais, um nome de índole religiosa, um hagiotopônimo, mas também
política, visto que está implícito no nome do príncipe regente Dom João IV. Ele instituiu a
vila de São João da Palma e a Comarca de São João das Duas Barras. Isso mostra a influência
da religião, da política, da ideologia e das crenças refletidas nos nomes dos lugares. Vale
ressaltar que, naquela época, a igreja e o estado estavam unidos em um único projeto,
expandir seus territórios. Por isso, os monarcas exerciam o governo civil e religioso.
Com as mudanças ocorridas no Brasil e no mundo para a secularização das coisas, os
nomes de santos que denominavam cidades, sozinhos ou com um elemento particularizador,
tiveram forte tendência a desaparecer totalmente ou permanecendo apenas o elemento
específico. O primeiro caso ocorreu com o topônimo São José do Duro que é mudado para
Dianópolis, no segundo, com o topônimo São Miguel e Almas para Almas e São João da
133
Palma para Palma. Nas três ocorrências, a devoção aos santos permanece, como pode ser
verificada nas demonstrações de fé da população nos festejos anuais em homenagem a eles.
Ainda, na conservação das igrejas construídas sob a invocação desses santos e santas desde os
tempos de arraiais.
A cidade de Porto Nacional está localizada na margem direita do rio Tocantins, o qual
atravessa todo o município de sul a norte.
Segundo Oliveira (2004), o antigo arraial de Porto Real (atual Porto Nacional) tem sua
origem ligada a dois núcleos mineratórios, Bom Jesus do Pontal (1738), à esquerda, e Nossa
Senhora do Carmo (1746), à direita do Rio Tocantins. De início, em um ponto estratégico, um
homem estabeleceu-se com sua canoa, fazendo o intercâmbio entre os dois arraiais, por isso
ficou conhecido por passador. De acordo com a memória local, chamava-se Felix Camoa,
descendente de portugueses. Por esse feito, consideram-no fundador da cidade.
Conforme relatos de alguns historiadores, baseado na tradição oral, após ataque dos
índios Xavante, os sobreviventes do arraial de Bom Jesus do Pontal juntaram-se ao passador.
Azevedo (1987) também faz menção a um rancho de passador situado à margem
direita do rio como o início humilde desse lugar e que justifica também o nome de Porto.
Conta esse autor que esse era um ponto de passagem e hospedagem para garimpeiros e
transeuntes que na época exploravam as minas do Carmo e de Pontal. A invasão repentina dos
Xerente, que em uma noite fizeram de Pontal um cemitério, contribuiu para a formação de
Porto Nacional. Os sobreviventes, para se protegerem de novos ataques dos índios,
atravessaram o rio e juntaram-se ao rancho do passador. Com o fim da exploração das minas
auríferas do Carmo, muitas famílias vieram se estabelecer nessa margem do rio Tocantins.
Consta no diário do Barão de Mossêmedes, 1771 a 1773, que sua comitiva atravessou
o rio Tocantins em direção ao arraial de Pontal em um lugar chamado Porto, sem nenhuma
referência a um termo especificador. Esse diário não faz referências se há moradores no local,
somente às pessoas que conduziam a embarcação. Entende-se que nessa época o arraial ainda
não havia se constituído.
Quanto a isso, o viajante Emanuel Pohl, em1819, (1976) relata que o arraial de Porto
Real era uma das povoações mais novas do Brasil composta de cerca de 30 casas, algumas
cobertas de telhas e a maioria de palha de palmeira. A água era trazida do rio com bastante
esforço da população em função do relevo do lugar. Havia uma pequena igreja recém-
134
construída e o vigário que residia no arraial do Carmo vinha celebrar missa três ou quatro
vezes por ano, durante as grandes festas religiosas. O arraial contava com uma guarnição de
dez soldados que sobreviviam de suas plantações, pois não recebiam seus soldos havia quatro
anos. Os habitantes locais viviam da cultura do algodão, fumo e mandioca que eram
cultivados às margens férteis do rio Tocantins, além da cana de açúcar para a produção da
rapadura e cachaça.
Em 1824, ano em que Cunha Matos passa por Porto Real, afirma que o arraial era
muito pequeno por ser muito novo, com 47 casas, todas insignificantes, conforme seu olhar
europeu. Na época, existia a pequena capela Nossa Senhora das Mercês, filial da paróquia do
Carmo. Algumas décadas depois, foi construída a grande e admirável igreja em invocação a
essa santa e um quartel de registro de embarcações que desciam o rio Tocantins para a
Província do Pará ou vinham de lá para Goiás. Segundo o autor, em 1810 o Ouvidor Joaquim
Teotônio Segurado tornou-o cabeça de julgado compreendendo os distritos paroquiais do
Carmo e Pontal.
Como já mencionado anteriormente, Porto Real foi a primeira denominação oficial
desse lugar. Em 1831, o arraial de Porto Real é elevado à condição de vila e em 1835 à
cidade, com a denominação de Porto Imperial. Após a proclamação da república, em 1889,
passa a ser chamada de Porto Nacional.
Azevedo, em seu Annuario Historico, Geografico e Descriptivo do Estado de Goyaz
de 1910 (1987), para essa época, declara que Porto Nacional era uma das mais adiantadas
cidades em todos os pontos de vista. Era o centro, “a cabeça que rege, o coração que manda
seus effluvios vitaes a essas regiões nortenses, de todo o Brasil as mais afastadas dos grandes
centros comerciais e civilizadores” (1987, p. 187).
A partir do século XIX até meados do século XX a cidade de Porto Nacional foi um
importante entreposto comercial da região Norte do então estado de Goiás, em consequência
das relações comerciais que mantinha com o estado do Pará, mais especificamente, Belém.
Isso foi possível pela sua localização estratégica às margens do rio Tocantins, via de
comunicação com outros centros comerciais, em uma época que não havia estrada
(OLIVEIRA, 2004).
Com o estabelecimento da ordem religiosa dominicana, Porto Nacional passou a ser o
centro de irradiação espiritual e cultural de toda a região norte de Goiás, cujos primeiros
missionários, Frei Gabriel, Frei Miguel e Frei Domingos Nicollet, tiveram como função a
135
educação dos jovens e a construção da catedral de Nossa Senhora das Mercês38 (FERREIRA,
1958). Esse fato teve um papel relevante para o desenvolvimento dessa região. Outro fator
que contribuiu para isso consistiu na fundação de periódicos locais. Ainda em 1891, já
circulava o periódico a Folha do Norte; depois veio O Incentivo em 1901e em 1905 o Norte
de Goiás.
Em meados do século XX, com a construção da rodovia Belém-Brasília, BR 153,
Porto Nacional perdeu o título de entreposto comercial. Os polos de desenvolvimento que
antes estavam localizados às margens do rio Tocantins são transferidos para as margens dessa
rodovia, fato que contribuiu para a formação de novos centros urbanos.
4.1.9.1 Topônimo Porto Nacional
38
Conferir fotos da cidade de Porto Nacional nos anexos p. 184.
136
O topônimo Porto Nacional foi motivado, primeiramente, pelo aspecto do lugar que
servia como porto. O diário do Barão de Mossâmedes, escrito entre 1771 a 1773 (PINHEIRO;
COELHO, 2006), informa que o lugar chamava-se o Porto. Com as mudanças
socioeconômicas que ocorreram no local, o porto, termo genérico relativo à entidade
geográfica, foi adquirindo termos específicos que o particularizavam em épocas determinadas.
Assim, o termo genérico, no período colonial, adquiriu o termo específico de Real
formando o topônimo Porto Real. Em seguida, com a mudança de regime de governo, do
Brasil colônia para império, outro termo específico foi-lhe acrescido, tornando-se Porto
Imperial. Com a Proclamação da República, o topônimo passa por outra mudança, de Porto
Imperial para Porto Nacional.
Quanto à taxonomia, o topônimo Porto Nacional pertence à categoria de natureza
física, classificado como um geomorfotopônimo. Nessa taxe, estão inclusos os topônimos
relativos às formas topográficas, subdividas em elevações e depressões do solo e ainda, as
formações litorâneas. Incluídas nesta última estão: costa, cabo, angra, ilha e porto (Dick,
1992). Por outro lado, se se pensar em porto como um local de interação e convivência entre
pessoas, deixa de ser um geomorfotopônimo. O porto, inicialmente era um local de passagem
para algumas pessoas e de trabalho para outras, tornou-se um topônimo pelo uso frequente nas
situações comunicativas para se referir ao local. Nessa circunstância, classifica-o como um
sociotopônimo, categoria de natureza antropocultural, por demonstrar relação com a vida
social.
O mecanismo conceptual fixa-se no processo metonímico em que a parte – o lugar que
servia como porto – representa o todo, nesse caso toda a cidade. Nesses termos, pode-se
perceber que o topônimo apresenta características dos signos indexicais, visto que eles
indicam algo que se encontra nas proximidades ou associa-se a algo que o representa.
Primeiramente, por indicar um lugar de abrigo para as embarcações, o significado do nome
está associado ao que o lugar representa. Segundo, pela relação espacial entre o porto (lugar) e
a povoação que se expandiu a partir dele, tornando-se a cidade Porto Nacional.
Quanto à estrutura morfológica, o topônimo é formado por elemento composto
específico contendo o substantivo porto proveniente do latim pŏrtus -us e o adjetivo nacional
originário do termo francês national (nation + sufixo al), significando o porto que pertence ao
Estado ou à Nação.
Percebe-se que a denominação do lugar, incialmente, foi feita de forma espontânea,
ou seja, com a referência constante ao lugar que servia de porto, com o passar do tempo, o
nome comum torna-se um topônimo. Na medida em que o poder político vai sendo
137
constituído no local, o nome passa a ser imposto pelos representantes, inicialmente da coroa
portuguesa – Porto Real – do império – Porto Imperial – e, em seguida, pelos representes do
governo republicano – Porto Nacional.
4.1.10 Príncipe39
39
Ver nos anexos a foto do povoado de Príncipe nos anexos p. 181.
138
De acordo com o histórico do lugar, o povoado do Príncipe recebeu esse nome por
ordem da rainha D. Maria I, para que assim fosse chamado em homenagem a seu filho D.
João VI. Desse modo, a motivação toponímica pode ser considerada de forma sistemática ou
oficial, relacionada ao poder de mando de dirigentes e descobridores.
A princípio, diz a lenda, foi encontrada nas minas de ouro uma pepita de ouro com
formato de menino, nas proximidades de Natividade, que ofertaram à rainha quando o
príncipe nascera. Em seguida, a rainha deu a ordem para que o lugar em que fora encontrada a
pepita fosse batizado com o nome de Príncipe. Nisso tudo, pode-se perceber uma relação
metafórica ou icônica entre a peça de ouro e a figura de um menino, como sendo a figura do
menino príncipe. Depois, há uma associação metonímica, em uma relação de contiguidade, de
parte (a mina em que foi encontrada a pepita de ouro) para o todo (o arraial), que passa a ser
nomeado com o título do menino a quem o artefato foi ofertado.
Supõe-se que o príncipe Dom João VI recebera esse nome em homenagem a São João
Batista. Por isso, comemore-se no povoado do Príncipe o dia desse santo com grande festejo
popular nos dias 23 e 24 de junho.
4.1.11 Taguatinga40
40
Conferir fotos da cidade de Taguatinga nos anexos p. 186 -187.
140
Ainda segundo Cunha Matos, diante do Registro estava a majestosa serra Geral,
distante ¼ de légua (1½ km). Faz referência também à catarata dos Dois Irmãos ou da
Taguatinga que, pela força da queda d’água, ouvia-se ao longe o barulho como de um trovão.
Atualmente, é conhecida como cachoeira do Registro 42. Acredita-se que a atual cidade de
Taguatinga foi formada nos arredores desse registro, pois os detalhes a que o autor faz
41
Os registros eram os pontos estratégicos estabelecidos pela fazenda Real ou pelos contratadores das Entradas,
onde escravos, gados, cargas de secos e molhados e as pessoas que entram e saem dos povoados pagavam o
respectivo imposto dos quintos reais (SALLES, 1992, p. 158).
42
Ver foto da cachoeira do Registro nos anexos p. 184.
141
referências no Itinerário de 1823-1824 coincidem com o que se tem hoje nos arredores do
município. Ou pode ter acontecido o que Palacín (1994) menciona a respeito dos registros de
Goiás, que, inicialmente, encontravam-se nas fronteiras, mas com o tempo e por comodidade
foram retrocedendo e fixando-se nos arredores dos arraiais.
Póvoa (1999) ressalta que o topônimo Taguatinga significa “barro branco” e a
localidade teve, anteriormente, os topônimos Brejo e Travessia do Brejo. Em 1834 o local já
possuía a denominação de Santa Maria, em 1855 passa a denominar Santa Maria de
Taguatinga. A partir de 1948, adota o nome atual.
De acordo com Ferreira (1957), a partir da Lei Providencial nº 4, de 6 de novembro de
1855, o povoado de Santa Maria de Taguatinga, foi elevado à condição de vila, mas
pertencendo ao Município de São Domingos. Posteriormente, anexa-se ao Município de
Arraias e, em seguida, pela Lei nº 425, de 10 de novembro de 1868, desmembrado de Arraias,
torna-se o Município de Taguatinga.
entendimento do ambiente físico (taxe de natureza física) quanto do social (taxe de natureza
antropocultural). Desse modo, verificou-se que no corpus ocorrem três geomorfotopônimos,
um zootopônimo, um hidrotopônimo e um litotopônimo, os quais estão associados ao
ambiente natural. Ocorrem também um antropotopônimo, três hierotopônimos e um
axiotopônimos, categorias relacionadas ao ambiente social. Na seção seguinte, apresentam-se
o histórico e a análise dos nomes dos rios.
Branco, rio Preto, rio Verde, rio Vermelho. Outro detalhe que servia como motivação para
nomear os rios foi a natureza da vegetação que predominava nas suas margens. Nesse sentido,
tem-se rio da Palma, rio Buriti, rio Angico, rio dos Cocos, dentre outros.
Também servia como motivo para nomeação dos rios a abundância das aves. Dessa
motivação resultaram nomes como rio dos Papagaios, das Garças, das Araras; a grande
quantidade de animais também foi fator motivacional, a saber: rio das Antas, rios dos
Macacos, rio dos Bois. Assim, também serviram as espécies de peixe, por certo, têm-se na
hidrografia brasileira nomes como rio Piauí ou rio dos Peixes Malhados, rio das Arraias, rio
Piranhas, dentre outros.
Em contrapartida, os não índios, a quem o autor chama de “civilizados”, no passado e
presente, serviram-se do sentimento religioso para batizar os rios. Rodrigues (2001) informa
que eles recorriam ao Flos Sanctorum para escolher um nome de um santo de sua devoção.
Desse tipo de motivação tem-se rio São Francisco, rio Santa Teresa, rio São João, rio Santa
Maria. Têm-se também nomes de rios que indicam razões patrióticas como Quinze de
Novembro, rio Independência e outros. Além de casos que expressam homenagem a um
indivíduo importante no cenário político ou religioso. Assim é que tem rio Roosevelt, rio
Manuel Alves, rio Honório.
As lendas também contribuíram para a formação dos nomes dos rios brasileiros. Das
lendas vieram os nomes dos rios: das Amazonas, do Sono, das Almas. Não se pode esquecer-
se dos nomes dos rios que provieram dos metais preciosos como rio da Prata, rio do Ouro.
Dessa forma, percebe-se que vários fatores contribuíram para motivar o batismo dos rios
brasileiros, e, consequentemente, dos rios escolhidos para este estudo.
Dick (1992) aponta que o elemento “água” teve influência acentuada na toponímia
brasileira, “indo ao encontro da tendência universal que sempre condicionou o homem a
transformá-la em instrumento no ato denominativo” (1992, p. 80), uma vez que os cursos
d’água continuamente foram imprescindíveis para a sobrevivência dos seres humanos e do
meio ambiente em geral.
Como tendência universal, o estado de Goiás e Tocantins não fogem à regra. Os cursos
d’água serviram de inspiração para dar nomes a várias localidades no passado. Em Curado
(2013), encontram-se registrados os topônimos como Água Fria (Caçu), Rio do Peixe
(Caturaí), Entre-Rios (Ipameri), Água Limpa (Jandaia), Riachão (Mambaí), São José do
Turvo (Paraúna), Trahyras (Tupiraçaba), Manchão do Pacu (Jaupaci), Santa Rita do
Paranaíba (Itumbiara), Água Fria, Carmo do Rio Verde, Hidrolândia, Lagoa Santa,
Piracanjuba, Rialma, Rio Quente, Rio Verde, Piranhas.
146
Já é fato conhecido que a geografia brasileira deve ao Tupi grande parte dos nomes de
lugares, apesar de aparecerem nomes de outras línguas indígenas como o Bororo, no Centro-
Oeste, Caribe e Aruaque no Amazonas, dentre outros. Teodoro Sampaio (1901) afirma que o
indígena fazia uso de elementos descritivos do seu ambiente, por possuir uma visão prática e
objetiva do mundo. Dick (1992), complementando essa afirmação, aponta que o indígena,
além de fazer uso de elementos descritivos puros, utilizava, também, os descritivos
associativos no seu sistema de nomeação. Isso explica a forma como os rios eram
denominados pelos povos indígenas: pela cor da água, profundidade, se tinham corredeiras,
cachoeiras, pedras brilhantes, muitos peixes, dentre outros elementos. No entanto, esse
mecanismo de nomeação não se restringe ao homem do passado. Há muitos nomes descritivos
na toponímia brasileira atual, como foi apontado anteriormente.
Dick (1992) considera que os povos indígenas brasileiros costumavam designar os
cursos de água por meio dos significados genéricos do hidrônimo em seus dialetos de origem.
No Tupi antigo, as expressões como y/pará/paraná são traduzidas como “água”, “mar”, “rio”
em função apelativa. Os índios Aruaque e Caribe da região Norte usavam a expressão uêne
“rio” como em Queceuene (Rio Branco de hoje, quecé significando branco e uêne rio), ári
“rio” em Ucaiari (ucái, branco e ari rio em aruaque). No bororo, têm-se os termos genéricos
bo para rio, iáo água, po/poba para foz ou embocadura, paro para ribeirão, como em bororeu
(bo água, rereu que corre).
No léxico de origem tupi, o estrato linguístico indígena que mais prevaleceu na
toponímia nacional, o elemento “água” é indicado pelo y (vernacularizado em i ou em u) que
Sampaio (DICK, 1992) traduziu como sendo o líquido, o fluído, o curso d’água e, por
extensão, o “rio”. O y (ou i) pode aparecer no início, no fim ou no meio dos topônimos que
têm essa conotação de água, rio ou curso d’água. Dessa forma, os topônimos Ipojuca (água
podre), Jacareí (rio do jacaré), Caraípe (rio do cará) servem de exemplo para cada uma das
três posições do y nos topônimos que se remetem a água.
Segue uma breve apresentação histórico-geográfica dos rios que foram importantes
para a formação das cidades antigas do estado do Tocantins, além do que alguns hidrônimos
serviram de motivação para denominar essas localidades. Esses rios foram os caminhos do
sertão tocantinense em épocas em que não havia estradas. Era por esses rios que o ouro saía
dos antigos arraiais. Após a época da mineração, eles foram os caminhos para o comércio do
Pará. A navegação, principalmente no rio Tocantins, mesmo em condições precárias, durou
até os meados do século XX – mais especificamente, até a década de 60 – quando a BR-153
foi construída.
147
Não há um consenso quanto ao lugar em que o rio perde o nome de Maranhão e passa a
ser chamado de Tocantins. Andrade (2010) aponta que o rio Tocantins nasce na união do rio
Maranhão e Almas e daí em diante até Belém, Pará, o rio percorre um curso de 1710 km.
Por outro lado, Rodrigues (2001), após analisar vários fatores para a escolha de um
formador principal de um rio, é enfático em afirmar que o rio Tocantins nasce com o nome de
Paranã, nas proximidades da cidade de Formosa, como filete d’água rumo ao norte pelo Vão
43
Conferir fotos dos rios nos anexos p. 176-178.
148
do Paranã. O Rio Paranã, após receber o rio Palma, passa a ser chamado pelos moradores
locais de Paranatinga. Assim, “ao receber o Paranatinga pela margem esquerda o rio
Maranhão, é que toma o nome real de Rio Tocantins, que vai entregar no Pará ao Oceano
Atlântico, único digno de recebê-lo” (p.104).
O rio Tocantins apresenta características variadas em que cachoeiras, estirões,
corredeiras, pedregais atribuem a nobreza de um gigante, variando em trechos com
características de rio de planalto e de rio de planície. Das nascentes até a sua foz percorre
2.400 km cortando o país no sentido sul-norte. Na divisa dos estados do Tocantins e Pará, no
local conhecido como Bico do Papagaio, recebe o rio Araguaia, seu principal afluente. Ao
longo do seu curso, o rio Tocantins pode ser dividido em três trechos distintos, a saber: Alto
Tocantins, que se inicia das nascentes e vai até a cachoeira do Lajeado44, uma extensão de
1.050 km; Médio Tocantins, da cachoeira do Lajeado até a cachoeira de Itaboca45, perfazendo
980 km; Baixo Tocantins, da cachoeira de Itaboca à foz, com aproximadamente 370 km.
Cunha Matos (2004) observa que o rio Tocantins recebe o nome de uma tribo indígena
assim chamada. No entanto, os primeiros colonizadores portugueses do século XVII já se
referiam a um grande rio que se perdia no Amazonas com esse nome, muito tempo antes de
descobrirem outros percursos desse rio mais próximos das nascentes, no território goiano,
com o nome de rio Maranhão. Nos registros antigos, o rio Maranhão, desde a sua origem na
lagoa Formosa ou de Félix da Costa, até a confluência do Araguaia era chamado de Pará
Upeba. Ainda com relação ao nome, “no caso do Tocantins, sabe-se que esse nome foi
aplicado por viver em suas margens a poderosa e valente tribo dos índios Tocantins, daí ser
conhecido a princípio como rio dos Tocantins” (RODRIGUES, 2001, p. 39).
Seus principais afluentes pela margem direita, dentro do território do atual estado do
Tocantins, são os rios Bagagem, Tocantinzinho, Paranã – com o rio Palma e Palmeira -,
Manuel Alves da Natividade, Manuel Alves Grande, rio do Sono. E da margem esquerda os
rios Araguaia e Santa Tereza. Estes não serão contemplados nesse estudo, porque priorizou os
rios que fazem parte da mesorregião oriental do Tocantins, em cuja região localizam-se as
cidades que fazem parte deste estudo.
44
Cachoeira do Lajeado já não existe. Atualmente, localiza-se a Usina Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães.
45
Cachoeira de Itaboca também não existe, nesse local foi construída a Usina Hidrelétrica de Tucuruí.
149
Hidônimo: Tocantins
Localização: estado de Goiás, Tocantins, Maranhão e Pará.
Estrutura morfológica: elemento simples
Etimologia: O termo Tocantins, refere-se ao grupo indígena que teria habitado junto à foz do rio
Tocantins-PA. Em Sampaio (2001), encontra-se o termo tucantins corr. tucam-tim, que quer dizer
nariz de tucano, ponta de tucano, que deu seu apelido ao rio.
Motivação toponímica: grupo indígena que habitava próximo a foz
Mecanismo conceptual: metonímico
Taxonomia de natureza antropocultural: Etnotopônimo – relacionados a elementos étnicos
Informações enciclopédicas: o rio Tocantins nasce no estado de Goiás, com o nome de Maranhão.
Corre sempre em direção ao norte e recebe pela direita os rios se junta ao rio Araguaia, no extremo
norte do estado do Tocantins, divisa com o Pará. Entra no estado do Pará e desagua no rio
Amazonas, acima da cidade de Belém (PEREIRA, 1854). Das nascentes até a sua foz, percorre
2.400 km. Esse rio passa pelos estados de Goiás, Tocantins, Maranhão e Pará.
De acordo com Rodrigues (2001), o rio Paranã nasce a poucos quilômetros da cidade
de Formosa, no Planalto Central de Goiás, a mais de 800 metros de altitude, baixando ao nível
150
Hidrônimo: Paranã
Localização: nasce no Planalto Central em Goiás e desagua na mesorregião oriental do Tocantins –
microrregião de Dianópolis.
Estrutura Morfológica: elemento simples
Etimologia: O termo Paranã provém do tupi-guarani e quer dizer ‘semelhante ao mar’, ‘tão grande
como o mar’. Como denominação de rio, quer dizer ‘rio enorme, caudal, imenso, o mar’ (Sampaio,
1901).
Motivação toponímica: advém dos aspectos dimensionais
Mecanismo conceptual: metafórico
Taxonomia de natureza física: dimensiotopônimo
Informações enciclopédicas: nasce no estado de Goiás, na serra das Araras. Une-se ao rio Palma
tornando o rio Paranatinga logo abaixo da cidade de Paranã e desagua no rio Maranhão formando a
partir daí o rio Tocantins.
151
Palma (rio da). Rio da província de Goiyás, na comarca de Porto Imperial. Tem
príncipio na serra do Duro, e procede da reunião dos ribeiros da Palmeira, do
Mosquisto e Sobrado, e corre no rumo d’oestenoreste, atravessa a freguesia da
Conceição e vai juntar-se com o rio Paranan, abaixo da villa de São João da Palma
[...] (SAINT-ADOLPHE, 1845, p.191).
Hidrônimo: Palma
Localização: mesorregião oriental do Tocantins – microrregião de Dianópolis
Estrutura Morfológica: elemento simples
Etimologia: do lat. palma -ae, ‘folha de palmeira’ (CUNHA, 2007 ). Família da ordem das arecales
que reúne 203 gêneros e 2.650 espécies de árvores, tronco geralmente indiviso (o estipe), também
conhecidas como palmeira e coqueiro (HOUAISS, 2001).
Motivação toponímica: vegetação abundante nas proximidades do rio
Mecanismo conceptual: metonímico
Taxonomia de natureza física: fitotopônimo
Informações enciclopédicas: nasce na serra Geral, recebe o rio Palmeira e entra no rio Paranã
abaixo da cidade de Paranã.
Esse rio nasce na Serra Geral, a qual divide os Estados da Bahia, de Goiás e do
Tocantins, com um curso seguindo para o oeste até Dianópolis e a partir daí altera o seu curso
na direção sul. Faz parte da Bacia do Tocantins. Possui muitas quedas d’água, fato que atraiu,
recentemente, a construção de usinas hidrelétricas. O rio Palmeiras desemboca no rio Palma,
que depois se junta ao Paranã e, consequentemente, ao rio Tocantins (ECOLNEWS, 2014).
Cunha Matos (2004) registra rio da Palmeira, ficando implícita a relação do rio com a
vegetação local, e observa também que ele desagua no rio da Palma pela margem direita.
No estado do Tocantins, as palmeiras chamam a atenção pela quantidade e, com
isso, acrescentam ao local um panorama especial. Além disso, são de grande importância para
a manutenção e conservação do ecossistema, bem como uma fonte de renda para a população
no fornecimento de matéria prima para confecção de artesanato, produtos alimentícios,
remédios e óleos industriais. Dentre outras espécies de palmeiras, sobressaem-se o Babaçu, a
Carnaúba e o Buriti. Importa salientar que o Babaçu está presente em toda a região do estado,
principalmente na região norte, preferindo lugares secos, enquanto o Buriti é encontrado em
terrenos encharcados, preferencialmente perto de rios (NASCIMENTO, 2009).
O hidrônimo Palmeira assim como o Palma, está relacionado com a vegetação local.
É formado por elemento simples por meio de derivação pelo acréscimo do sufixo -eira, ao
nome “Palma”. A metonímia faz-se presente na escolha do nome para o curso d’água, uma
154
Nasce na serra do Duro ou Geral e termina seu curso ao entrar no rio Tocantins pela
margem direita. Encontra-se em Alencastre (1979) e Póvoa (1999) que o nome desse rio
advém do nome do padre Manuel Alves que, juntamente com seu irmão Gabriel Alves,
enviados pelo governador e capitão-general D. Marcos de Noronha, ajudou a promover a
conquista dos índios Acroá e Xacriabá,
Esse rio é um dos principais do sudeste do estado do Tocantins e, por suas belezas
naturais, propicia lazer às populações adjacentes. As cidades Porto Alegre do Tocantins, Rio
da Conceição, Natividade, Dianópolis e Almas são beneficiárias, de alguma forma, das águas
desse rio.
Outro com o mesmo nome é Manuel Alves Grande que nasce na serra das
Mangabeiras, separa o estado do Tocantins com o do Maranhão e desagua no rio Tocantins
acima da cidade de Filadélfia. De acordo com Saint-Adolphe (1845), o rio Manuel Alves
Grande foi descoberto em 1728 pelo sertanista de quem herdou o nome.
155
Nasce na serra das Figuras na divisa dos estados do Tocantins e do Piauí e desemboca
no rio Tocantins pela margem direita logo abaixo da cidade de Pedro Afonso.
Segundo Cunha Matos (1979), recebeu o nome de rio do Sono porque foram mortos
pelos índios Xavante alguns mineiros que, cansados da jornada de trabalho, dormiram à
margem desse rio descuidadamente, surpreendidos pelos índios, tiveram um sono eterno. Em
suas margens habitavam vários grupos indígenas, principalmente, os Xavante.
Rodrigues (2001) conta que a razão do nome desse rio está em uma lenda contada a
ele pelos moradores que diz que uma neta de um fazendeiro foi raptada às margens desse rio
por alguns índios. A garota de 16 anos chamava-se Flor do Paraíso, muito bonita, virtuosa,
bondosa e era querida por todos. Todos os dias, ao amanhecer, saía de casa para pegar água,
colher flores e, às vezes, pescar. Certo dia, não voltou para a casa e seus parentes foram
procurá-la e não a encontrando, concluíram que teria sido raptada pelos índios. Na manhã
seguinte, a garota aparece em uma ubá (canoa) e conta que realmente fora raptada, mas que
rezara fervorosamente e, por milagre, uma nuvem de mosquito desceu sobre seus raptores que
caíram em pesado sono, permitindo com que ela fugisse com a sua canoa. E desde esse dia, o
rio foi chamado rio do Sono.
Cazal (1817) e Saint-Adolphe (1845) consideram que a motivação para a escolha do
nome do rio está relacionada com o desaparecimento de algumas pessoas. Eles relatam que
alguns exploradores curiosos subiram o rio com canoas e desaparecem. Não houve mais
notícias deles. Acredita-se que eles foram mortos pelos índios, sendo entregue ao perpétuo
sono. Por isso, esse rio é assim denominado.
157
Encontra-se em Ribeiro (2002 [1819], p. 56 apud Castro 2012, p.81) outra motivação
para a escolha do nome desse rio. Essa motivação refere-se à lentidão da sua correnteza.
Assim, “vinte léguas ao norte dos Dois Funis, deságua da parte de leste, no Tocantins, o bem
nomeado rio do Sono, mais largo do que o rio Manuel Alves Grande, que, mais do que
corrente, parece antes lagoa estagnada, motivo este que lhe provém tal nome”.
Topônimo: Sono
Localização: mesorregião oriental do Tocantins – nasce na microrregião do Jalapão e desagua na
de Porto nacional.
Estrutura Morfológica: elemento específico simples (subst.)
Etimologia: do lat. somnus -i ‘sono’ (CUNHA, 2007; HOUAISS, 2004).
Motivação toponímica: a nomeação do rio foi motivada pela lenda de uma menina raptada pelos
índios às margens desse rio. Ela foi salva por uma nuvem de mosquitos que atacara seus raptores
fazendo-os cair em pesado sono (RODRIGUES, 2001).
Mecanismo conceptual: metonímico
Taxonomia de natureza antropocultural: mitotopônino/animotopônimo
Informações enciclopédicas: o rio do Sono nasce na serra das Mangabeiras, continuação da serra
Geral, este rio é o maior totalmente localizado no estado, desagua no Tocantins pela margem
direita entre as cidades de Pedro Afonso e Bom Jesus do Tocantins. Faz parte do circuito Jalapão.
citada por Ribeiro (2002 [1819] apud Castro 2012), é um fato pontual. Esse rio, nas
proximidades de Pedro Afonso, tem sua correnteza bastante forte.
A metonímia é o mecanismo conceptual que subjaz à escolha desse topônimo, ou seja,
um evento (mesmo que mitológico) ocorrido nas margens do rio é utilizado para nomeá-lo.
Nesse sentido é que se afirma que a toponímia é repositório de memória histórica de uma
sociedade. Entretanto, se for considerado um animotopônimo, a metáfora é que atua nesse
contexto, pois ocorre uma relação de similaridade, interpretado pelo psiquismo do
denominador, que vê na vagarosidade da correnteza desse rio a aparência de algo adormecido.
Por essa razão, denomina-o de rio do Sono.
A análise dos hidrônimos revelou que a motivação toponímica de quatro deles está
associada ao ambiente sociocultural. Foram registrados um dimensiotopônimo, um
etnotopônimo, um antropotopônimo e mitotopônimo ou animotopônimo, dependendo da
motivação escolhida para justificar a denominação do rio do Sono. Por outro lado,
verificaram-se dois hidrônimos com motivação toponímica associada ao ambiente natural ou
físico. Os dois estão classificados como fitotopônimo, a cuja motivação reflete a vegetação
próxima do curso d’água.
O estudo da hidronímia da mesorregião oriental do Tocantins evidenciou as
características do ambiente natural e sociocultural da região. Esse fato corrobora a afirmação
de que a cultura e o meio ambiente influenciam o léxico de uma língua (SAPIR, 1969),
principalmente o léxico toponímico.
Nesta subseção 4.3, apresenta-se a discussão dos resultados das análises feitas nas
subseções anteriores. Foram analisados onze topônimos das primeiras cidades do estado do
Tocantins e seis hidrônimos dos rios mais importantes para a mesorregião oriental desse
estado.
Conforme a análise, os topônimos foram distribuídos em categorias de natureza
antropocultural e física. Quanto à categoria de natureza antropocultural, destacam-se os
hierotopônimos, cuja motivação liga a devoção do denominador a uma entidade sagrada.
Esses topônimos são Natividade, Conceição do Tocantins e Almas. Nos dois primeiros, o
sagrado é visto na devoção à Virgem Maria, no último, a São Miguel, o protetor das almas.
Essa prática revela a ideologia religiosa, política e cultural dos colonizadores como a força
motivadora para tais escolhas, herança de um patrimônio sociocultural português que ficou
preservado nos topônimos.
Há também um antropotopônimo, nome de pessoa dado ao lugar. No entanto, não é
qualquer pessoa que tem seu nome transformado em topônimo. Isso é exclusivo para aqueles
que têm o poder de mando, representantes do poder local; personalidades artísticas, figuras
consideradas de prestígio ou aqueles que contribuíram de alguma forma com o
desenvolvimento socioeconômico local. Encontra-se nessa taxe, o topônimo Dianópolis,
formado a partir do nome de quatro mulheres “as Dianas” mais o sufixo -polis. Essa formação
indica uma relação de posse (cidade de ...) entre o local e a(s) pessoa(s) ou família,
evidenciando a influência delas sobre as demais. Ter um lugar nomeado com esse tipo de
160
composição, antropônimo + sufixo -polis, não é um ato simples de nomeação, mas acima de
tudo, uma demonstração de poder e da força política das oligarquias locais, muito comum no
Brasil. Afinal, a toponímia é uma das esferas sociais em que se encontra com mais precisão
as marcas de dominação do poder político, ideológico e sociocultural, visto que quem tem o
poder para mandar também tem o poder para nomear. Bem parecido acontece com os
topônimos incluídos na taxe Axiotopônimo, topônimos relacionados aos títulos e dignidades.
Tem-se nesse trabalho o topônimo Príncipe.
Quanto aos topônimos de natureza física, apresentam-se três geomorfotopônimo Porto
Nacional, Chapada da Natividade e Monte do Carmo. São aspectos da geografia local que
impulsionaram o denominador a escolher esses nomes dentre tantos possíveis. Esses
topônimos são, segundo Dick (1992), geralmente espontâneos, bem ao gosto popular, em que
a entidade geográfica é nomeada primeiro e, com o passar do tempo, o nome se estende ao
lugar. Essa categoria mostra o homem ligado à natureza, que convive diariamente com um
monte que está diante dele, sendo sua referência espacial; com uma chapada cheia de minério
e uma flora rica em espécie nativa que contribui para a sobrevivência da população; ou um
porto, que incialmente é apenas um local propício para atracar pequenas embarcações e que,
por algum motivo transforma-se em uma povoação. Entretanto, na medida em que os poderes
socioeconômico, político e religioso vão se constituindo, há a necessidade de acrescentar-lhes
termos especificadores. É nesse momento que entra em ação as ideologias política e religiosa.
Então, surge o Porto Real > Imperial > Nacional; a Chapada da Natividade e o Monte do
Carmo.
Sendo assim, a classificação desses topônimos na taxe dos geomorfotopônimos tornar-
se incompleta, visto que eles apresentam características que vão além de aspecto físico. O
primeiro representa o lugar de encontro, espaço de convivência da população, podendo ser
considerado também como um sociotopônimo. Os outros dois exibem aspectos religiosos na
própria composição do topônimo, os quais não devem ser desconsiderados. Em virtude disso,
foram classificados também como hierotopônimos. Esses fatos ressaltam que uma análise
toponímica focada apenas em um aspecto do topônimo não consegue abranger todas as
constituições semânticas desses nomes.
Na categoria de natureza física encontram-se também as taxes hidrotopônimo,
litotopônimo e zootopônimo. Um hidrotopônimo é motivado por um acidente hidrográfico,
geralmente próximo e de relevância à povoação que nomeia. É o caso do rio Paranã que
nomeia a cidade de Paranã.
161
isso, a dominação religiosa perde força e os topônimos são reordenados para atenderem a
outros interesses e a outras ideologias. Quando isso ocorre, o santo ou a santa de devoção da
população permanece como o padroeiro ou padroeira do local, sendo lembrado(a) anualmente
nos festejos dedicados a eles.
É importante frisar também que, nos processos de mudança toponímica, o que quase
sempre justifica a troca de um nome por outro é a dominação política, visto que são as
pessoas que detêm o poder sociopolítico local são as mesmas que têm o poder para dar nomes
e também para mudá-los.
A análise dos hidrônimos revelou que os nomes dos rios são preservados mais que os
nomes de cidades, por não haver tantas interferências de motivações políticas e ideológicas na
denominação dos cursos d’água. Os nomes dos rios estão ligados, principalmente, aos
aspectos da natureza física circundante, ao nome de grupo indígena que habitava a região, aos
aspectos dimensionais e lendas. Apenas um hidrônimo refere-se à personalidade religiosa. Os
cursos d’água são batizados, na maioria das vezes, de forma espontânea, em que o processo
metonímico é o mais relevante, pela relação de contiguidade entre o curso d’água e a natureza
nas suas margens, os grupos indígenas e os demais aspectos que motivaram o hidrônimo. Aos
aspectos dimensionais, estão relacionados a metáfora, baseados na similaridade e na
comparação.
Portanto, as motivações que estão por trás dos topônimos das primeiras cidades
tocantinenses são variáveis dependendo da mentalidade da época, das ideologias políticas,
religiosas e culturais de cada momento. Dessa forma, os aspectos cognitivos, físicos, sociais,
culturais e históricos se interseccionam no ato denominativo, os quais impulsionaram o
denominador a fazer determinadas escolhas na denominação de um lugar.
164
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALKMIM, T., PETTER, M. Palavras da África no Brasil de ontem e de hoje. In: FIORIN, J.
L., PETTER, M. (org.). África no Brasil: a formação da língua portuguesa. São Paulo:
Contexto, 2008.
AZZI, R. A instituição eclesiástica durante a primeira época colonial. In: HOONAERT et al.
História da Igreja no Brasil. Ensaio de interpretação a partir do povo. 4. ed. Petrópolis:
Vozes e Edições Paulinas, 1992.
BAUER, M. W., GALKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual
prático. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2004.
CASTRO, M. C. D. de. Maranhão: sua toponímia, sua história. Goiânia, 2012. Tese
(Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística. Faculdade de Letras,
Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2012.
COUTINHO, I. de L. Gramática Histórica. 7a. ed., Rio de Janeiro: Livro Técnico, 1976.
COUTO, H. H. do. Ecolinguística: estudo das relações entre língua e meio ambiente. Brasília:
Thesaurus, 2007.
______. Itinerário do Rio de Janeiro ao Pará e Maranhão pelas Províncias de Minas Gerais
e Goiás. Belo Horizonte: Inst. Cultural Amilcar Martins, 2004.
______. Toponímia e Antroponímia: coletânea de estudos. 3 ed. São Paulo: FFL/USP, 1992.
______. Atlas toponímico do Brasil: teoria e prática II. Revista Trama - Volume 3 - Número
5 - 1º Semestre de 2007 – p. 141-155. Disponível em: <http://e-
revista.unioeste.br/index.php/trama/article/viewArticle/965>. Acesso em 07 jan. 2014.
______. Quem precisa de identidade? In: Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos
culturais. SILVA, T. T. (org). 10 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.
ILARI, R., BASSO, R. O português da gente: a língua que estudamos a língua que falamos.
São Paulo: Contexto, 2007.
LAKOFF, G., JOHNSON, M. Metáforas de la vida cotidiana. 9. ed. Madrid: Catedra, 2012.
LYONS, J. Introdução à linguística teórica. São Paulo: Cia. Ed. Nacional, 1979.
OLIVEIRA, R. P. de. Semântica Formal: uma breve introdução. 2. ed. Campinas: Mercado de
Letras, 2010.
______. Coronelismo no extremo norte de Goiás: O Padre João e as três revoluções de Boa
Vista. São Paulo: Loyola, 1990.
POHL, J. E. Viagem no interior do Brasil, entre os anos de 1817 a 1821. Belo Horizonte: Ed.
Itatiaia; São Paulo: EDUSP, 1976.
SAMPAIO, T. O Tupi na Geographia Nacional. São Paulo: Typ. da Casa Eclectica, 1901.
Disponível em: <http://biblio.etnolinguistica.org/sampaio_1901_tupi>. Acesso em: 08 out.
2015.
SOUZA, A. J. Geografia linguística: dominação e liberdade. 3.ed. São Paulo: Contexto, 2001.
ANEXOS
176
Fonte: www.ferias.tur.br
Rio Palmeira
Fonte: br.geoview.info
177
Rio do Sono
Fonte: www.mochileiro.tur.br
Fonte: fotostrada.com.br
178
Rio Paranã
Fonte: pt.wikipedia.org
Rio Tocantins
Fonte: www.mochileiros.com
179
Arraias
Igreja Matriz de Nossa Senhora dos Remédios
Fonte: http://www.ferias.tur.br/fotos/9809/arraias-to.html
Fonte: conexaoto.com.br
180
NATIVIDADE
Centro Histórico
Fonte: joiasdenatividade.com
Fonte: encantosdocerrado.com.br
181
Fonte: mundoint3iro.blogspot.com
POVOADO DO PRÍNCIPE
Fonte: br.geoview.info
182
POVOADO DO BONFIM
Imagem do Senhor do Bonfim
Fonte: g1.globo.com
Fonte: g1.globo.com
183
CHAPADA DA NATIVIDADE
Igreja de Santana
Fonte: encantosdocerrado.com.br
184
PORTO NACIONAL
Fonte: conexaoto.com.br
Fonte: http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/107
185
DIANÓPOLIS
Fonte: www.brasilocal.com
Fonte: www.brasilocal.com
186
TAGUATINGA
Fonte: www.visitpalmas.com
Fonte: arquivososriosdobrasil.blogspot.com
187
Fonte: www.vidadeturista.com
Taguatinga
Fonte: http://www.taguavip.com.br
188
ALMAS
Fonte: www.cidade-brasil.com.br
Almas
Fonte: www.almas.to.gov.br
189
MONTE DO CARMO
Fonte: surgiu.com.br
Monte do Carmo
Fonte: www.cidade-brasil.com.br
190
CONCEIÇÃO DO TOCANTINS
Conceição do Tocantins
Fonte: www.ferias.tur.br
Fonte: www.voga.arq.br
191
PARANÃ
Igreja de São João Batista
Fonte: encantosdocerrado.com.br
Fonte: euamoparana.blogspot.com
192
Fonte: dreamelo.blogspot.com
Conjunto arquitetônico
Fonte: dreamelo.blogspot.com
193
ANEXO C – MAPAS
Fonte: https://wikimedia.org/Tocantins_Meso_OrientaldoTocantins.svg
Fonte: https://observatoriogeogoias.iesa.ufg.br/p/2343-mapas
196
Fonte: http://www.tribunatocantins.com.br/imagem14.html
198
Art. 13. É criado o Estado do Tocantins, pelo desmembramento da área descrita neste artigo,
dando-se sua instalação no quadragésimo sexto dia após a eleição prevista no § 3º, mas não
antes de 1º de janeiro de 1989.
§ 1º - O Estado do Tocantins integra a Região Norte e limita-se com o Estado de Goiás pelas
divisas norte dos Municípios de São Miguel do Araguaia, Porangatu, Formoso, Minaçu,
Cavalcante, Monte Alegre de Goiás e Campos Belos, conservando a leste, norte e oeste as
divisas atuais de Goiás com os Estados da Bahia, Piauí, Maranhão, Pará e Mato Grosso.
§ 2º - O Poder Executivo designará uma das cidades do Estado para sua Capital provisória até
a aprovação da sede definitiva do governo pela Assembleia Constituinte.
I - o prazo de filiação partidária dos candidatos será encerrado setenta e cinco dias antes da
data das eleições;
III - são inelegíveis os ocupantes de cargos estaduais ou municipais que não se tenham deles
afastado, em caráter definitivo, setenta e cinco dias antes da data das eleições previstas neste
parágrafo;
199
IV - ficam mantidos os atuais diretórios regionais dos partidos políticos do Estado de Goiás,
cabendo às comissões executivas nacionais designar comissões provisórias no Estado do
Tocantins, nos termos e para os fins previstos na lei.
A Assembleia Constituinte do Estado do Tocantins, nos termos do § 6º, do Art. 13, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias e o Art. 40, da Lei Complementar Federal nº31, de
11 de outubro de 1977,
DECRETA:
Art. 1º. Até a promulgação da Constituição, o Estado do Tocantins adotará, no que couber, a
atual Constituição e legislação do Estado de Goiás, ressalvadas as normas específicas contidas
na Constituição Federal e na Lei Complementar Federal nº 31 de 11 de outubro de 1977.
Art. 3º. Fica o Governador do Estado autorizado a baixar Medidas Provisórias, com força de
lei, nos termos do Art. 62, da Constituição Federal.
Art. 4º. Os Municípios de Miracema do Norte, Paraíso do Norte, Colinas de Goiás, Axixá do
Tocantins, Sítio Novo de Goiás, Ponte Alta do Norte, Dois Irmãos de Goiás, Pindorama de
Goiás, Conceição do Norte, Itaporã de Goiás, Aliança do Norte, Buriti do Norte, Divinópolis
de Goiás, Santa Tereza do Norte passam a se denominar de Miracema do Tocantins, Paraíso
do Tocantins, Colinas do Tocantins, Axixá do Tocantins, Sítio Novo do Tocantins, Ponte Alta
do Tocantins, Dois Irmãos do Tocantins, Pindorama do Tocantins, Conceição do Tocantins,
Itaporã do Tocantins, Aliança do Tocantins, Buriti do Tocantins, Divinópolis do Tocantins e
Santa Tereza do Tocantins.
46
Disponível em www.al.to.gov.br/arquivo/10494. Acesso em 04/09/2015
201
Art. 5º. Dentro do ano de 1989, o Chefe do Poder Executivo poderá ausentar-se do Estado e
do País, por períodos que não ultrapassem, cada um, a quinze dias, sempre que entender
necessário. Para prazo superior, dependerá de licença da Assembleia.
Art. 6º. Este Decreto Legislativo entra em vigor na data de sua publicação. Assembleia
Estadual Constituinte do Estado do Tocantins, em 1º de janeiro de 1989.
Art. 1º - A criação de Município depende de lei estadual que será precedida de comprovação
dos requisitos estabelecidos nesta Lei e de consulta às populações interessadas.
Art. 2º - Nenhum Município será criado sem a verificação da existência, na respectiva área
territorial, dos seguintes requisitos:
I - população estimada, superior a 10.000 (dez mil) habitantes ou não inferior a 5 (cinco)
milésimos da existente no Estado;
II - eleitorado não inferior a 10% (dez por cento) da população;
III - centro urbano já constituído, com número de casas superior a 200 (duzentas);
IV - arrecadação, no último exercício, de 5 (cinco) milésimos da receita estadual de impostos.
§ 1º - Não será permitida a criarão de Município, desde que esta medida importe, para o
Município ou Municípios de origem, na perda dos requisitos exigidos nesta Lei.
§ 2º - Os requisitos dos incisos I e III serão apurados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, o de nº II pelo Tribunal Regional Eleitoral do respectivo Estado e o de número IV,
pelo órgão fazendário estadual.
§ 3º - As Assembleias Legislativas dos Estados requisitarão, dos órgãos de que trata o
parágrafo anterior, as informações sobre as condições de que tratam os incisos I a IV e o § 1º
deste artigo, as quais serão prestadas no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da data do
recebimento.
47
Disponível em http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/104003/lei-complementar-1-67. Acesso em
03/09/2015.
203
Art. 4º - Para a criação de Município que resulte de fusão de área territorial integral de dois ou
mais Municípios com a extinção destes, é dispensada a verificação dos requisitos do art. 2º.
Parágrafo único - No caso deste artigo, o plebiscito consistirá na consulta às populações
interessadas sobre sua concordância com a fusão e a sede do novo Município.
Art. 5º - Somente será admitida a elaboração de lei que crie Município, se o resultado do
plebiscito lhe tiver sido favorável pelo voto da maioria dos eleitores que comparecerem às
urnas, em manifestação a que se tenham apresentado pelo menos 50% (cinquenta por cento)
dos eleitores inscritos.
§ 1º - Os Municípios somente serão instalados com a posse do Prefeito, Vice-Prefeito e
Vereadores, cuja eleição será simultânea com a daqueles Municípios já existentes, ressalvado
o disposto no art. 16, § 1º, da Constituição.
§ 2º - A exigência deste artigo se estende ao caso de fusão de Municípios.
Parágrafo único - A criação ou supressão de Distritos, Subdistritos e de suas sedes, bem como
o desmembramento do seu território, no todo ou em parte, para anexação a outro Município,
dependerão sempre de aprovação das Câmaras Municipais interessadas, através de resolução
aprovada, no mínimo, pela maioria absoluta dos seus membros.
204
Art. 7º - Não se inclui nas exigências desta Lei a criação de Municípios nos territórios
federais.
Art. 8º - A Lei que criar o novo Município definirá seus limites segundo linhas geodésicas
entre pontos bem identificados ou acompanhando acidentes naturais.
Art. 10 - Serão admitidas exceções às regras do artigo anterior, quanto ao direito de prioridade
à nomenclatura, se acorrerem motivos imperiosos, mediante acordo entre as Unidades
Federativas interessadas.
Fixa normas sobre repetição de topônimos de cidades e vilas, incorporadas ao texto da Lei
Complementar nº 1, de 9 de novembro de 1967.
Art. 10 - Serão admitidas exceções às regras do artigo anterior, quanto ao direito de prioridade
à nomenclatura, se acorrerem motivos imperiosos, mediante acordo entre as Unidades
Federativas interessadas.
48
http://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/104002/lei-complementar-46-84. Acesso em 03/09/15
207
JOÃO FIGUEIREDO