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Plenilúnio
ciclos fecundos
para corpos
que sangram
Morena Cardoso
1
Treze
luas
Prelúdio-Manifesto: Carta ao Patriarcado 3
Apresentação 5
Ciclicidade 11
O elixir 26
Mandala da Lua 40
Vaporização de Útero 50
2
Prelúdio
-Manifesto Carta ao
Patriarcado
Invocar um Território Ritualístico.
É da ponta da flecha que avança o nosso rezo: leite nas tetas, punhos erguidos,
olhos atentos, largos sorrisos. É com os pés na terra que avança o nosso rezo:
plantando sementes, acordando adormecidos, cantando novos tempos, por
descansos merecidos.
Sei dos seus fardos, das suas dores, das suas feridas e desamores.
Essa mente dura, essa existência imatura.
Deve ser cansativo portar toda essa armadura.
Estamos saindo dos escombros, dos buracos que você nos meteu.
De tanto soterrar, não é que floresceu?
Mas veja bem meu sinhô, não precisamos de mártires não... isso é coisa de
vocês: que gostam da dor, gozam roucos na violência. Pra ti aqui não tem
nenhuma, nenhuma a mais, nem a menos, com ou sem intento.
Nenhuma. Entendeu?
Dissipamos a carência no encontro, suas migalhas não têm mais encanto. Temos
refúgio, estamos mais fortes, umas nas outras, encontramos nosso norte – ou
sul, para nossa sorte.
Pensou que nos calaria? Pois agora aguente, o grito aqui segue o fio que atraves-
sa o silêncio hereditário de nossas tantas avós. Não lembra como se faz?
4
Olá,
seja muito bem-vinda!
1
Iniciei essa compilação em 2014, atualizando os conteúdos a cada ano, ou seja, este conteúdo já foi
revisado, corrigido, editado e ampliado quase uma dezena de vezes - buscando acompanhar os giros
possíveis às novas perspectivas. Inclusive seu título, que passou de “o diário da lua vermelha”, para “jorna-
da mulheridades” e agora “jornada plenilúnio: ciclos fecundos para corpos que sangram”.
5
que pode simular uma atitude negativa especialmente diante dos pensamentos
vanguardistas, no ponto de vista dos avanços que problematizam gênero, sexo,
identidade, transgeneridade e não-binarismo. Consciente desse risco, esse tra-
balho contribui para que, em avançar, possamos também juntar em retaguarda
fragmentos derramados e esquecidos em tropeços, às margens do caminho em
nossa jornada enquanto humanidade. Sim, nem toda mulher sangra, e nem todes2
que sangram são mulheres.
Estes conteúdos são subjetivos, sendo grande parte deles coletados no contato
com mulheres guardiãs de saberes tradicionais ao redor do mundo, transmitidos
oralmente e apreendidos empiricamente. Não espere, portanto, um abarrotamento
de referências bibliográficas ou cientificismos (presentes, porém, na tentativa de
conscientizar o inconsciente e defender um território inaugural de produção de
conhecimento). Iremos puxar o fio da ancestralidade em convocar tantas “outras”3
mulheres que vieram antes de nós. Sentar aos pés daquelas que aqui pisaram e abri-
ram caminhos possíveis e necessários de resistência, luta, curandería4 e memória.
Aprendendo – ao invés de explorar os conhecimentos – com estas que protegem,
expandem e defendem a vida. A reivindicação de novas-velhas epistemologias se
faz deste modo indispensável, em especial, dessas que ecoam conhecimentos des-
de as vísceras, ou desde o centro dos ossos, no nosso caso, desde a caverna escura
do útero – lugares esses onde as memórias não podem ser negociadas.
Culturalmente, temos sido a negação e, ao mesmo tempo, o medo, de uma
sociedade patriarcal que tem visto as mulheres como um inimigo insurgente fren-
te à sua posição de poder. Faz-se necessário, desde este corpo, pensar modos
de superação dos estabelecidos contornos, automatismos e ideologias que o en-
clausuram e que o definem. É daí que parte esse trabalho, em pensar novas narra-
tivas possíveis a respeito dos conhecimentos, saberes e mistérios do feminino que
superem o estigma dos conceitos de irracionalidade, superstição, primitivismo,
pensamento pré-lógico e anti cognitivo – que em muito configuraram a obstru-
ção do saber essencial à reabilitação da Vida.
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Gênero neutro
3
Utilizo propositalmente “outras” com aspas, para justamente tencionar a discussão de alguns dispara-
dores: Quem tem direito legítimo à fala? Quais vozes são visibilizadas (ou não) no regime de autorização
discursiva? Quem é “o outro” (específico, identitário) e quem é o sujeito pensado como universal? Ver
mais em RIBEIRO, Djamila. O que é: lugar de fala? Belo Horizonte: Letramento, 2017.
4
Uma provocação a qual me comprometo durante esta escrita é invocar sujeitos sociais dissidentes à
monopolização do conhecimento pelas estruturas formais da sociedade – e o referente léxico que orbita
as suas (não) existências: me deem licença para falar em curandeiras, rezo, curandería, espírito, espiritua-
lidade, espírito, cura, sanación, conexão… e adiante.
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Antes de começarmos, gostaria de te relembrar (ou fazer-te saber) que este
não é somente um caminho de construção de conhecimento, mas de descons-
truções. Em acompanhar mulheres e mais mulheres, anos a fio, me surpreendi (e
sigo me surpreendendo) pela profundidade com a qual estas tiveram suas rea-
lidades tocadas e suas perspectivas transformadas a partir desse simples gesto
de acolher-se no próprio corpo, desde os saberes ancestrais do feminino. Nem
sempre este caminho se faz por trajetórias lineares ou constâncias, mas em gi-
ros espirais por vezes desestabilizadores e desafiantes (respira profundo aqui um
pouquinho…) sugiro que, junto à leitura deste livro, você possa nutrir o hábito de
escrever um diário, documentando os conteúdos que possam vir a emergir a partir
de então. Observe as sincronicidades, dê espaço aos insights, contribua com seus
momentos de reflexão e interiorização. Anote seus sonhos e busque, na medida
de suas possibilidades, compreender o que eles estão dizendo sobre seus proces-
sos internos. Uma jornada, prestes a começar. Seja muito bem-vinda e que seja
um potente mergulho.
Nos vemos do outro lado,
Morena Cardoso
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Abre os
caminhos
pra ela passar
Te convido a um pequeno ritual para que você possa adentrar um território sutil
de investigação, de aprofundamento em direção ao seu além de dentro. Este é um
espaço sagrado, que nos conta sobre memórias, impressões e histórias que mui-
tas vezes não estão sendo integralmente acolhidas, observadas e compreendidas.
Permita tocar-se nos seus espaços íntimos e secretos, onde sentir é curar. Entrar
em contato é dar-se a oportunidade para que esses pontos de anestesia possam
se fazer novamente sentir, adquirir um novo sentido. Ao revisitar espaços internos,
passamos a compreender melhor quem somos, a ter um maior entendimento a
respeito das nossas escolhas, padrões, medos, limitações, potências. Ao conhecer
a si mesma, você amplia a oportunidade de escrever a sua própria jornada, em
seus próprios termos.
Para este simbólico ritual, busque se recolher em um espaço silencioso e re-
servado, onde você possa se entregar ao contato com você mesma de forma
tranquila e segura. Comece fechando seus olhos, intencionando algumas respira-
ções profundas enquanto observa o ar que entra e sai de suas narinas, se tornando
mais e mais presente – deixando para trás as lembranças do passado e se des-
prendendo das expectativas do futuro –, permitindo que a cada respiração você
possa internalizar um pouco mais. Vamos juntas, descascar algumas camadas…
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Vá aos poucos buscando se recordar de sua menarca...
Como sentiu a reação das pessoas à sua volta, diante deste seu novo momento?
Você se sentiu honrada, respeitada, acolhida… nesse novo momento de sua vida?
Você sentiu medo, nojo, vergonha ou repulsa?
Como foi para você sentir que era momento de crescer?
Como você passou a enxergar a si mesma depois desse evento?
Algumas ideias que você tinha a respeito de si mesma mudaram naquele mo-
mento?
De que formas essa experiência te afetou?
(respiro profundo)
Vamos aprofundar!
Já se perguntou por que em determinadas fases do seu ciclo menstrual você fica
mais expansiva, compassiva, em outras mais introspectiva, impaciente?
Já percebeu as mudanças que ocorrem nos padrões do seu corpo, no seu nível
de disposição, sexualidade, em suas formas de expressão… de acordo com as
suas flutuações hormonais?
(respiro profundo)
Agora, busque entrar em contato com aquele momento em que você se deu
conta, pela primeira vez, que “era uma menina” e que, por razões diversas,
“diferente de um menino”.
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Como foi a sensação de perceber que o simples fato de você habitar esse corpo
as pessoas te definiriam em tantos sentidos?
(respiro profundo)
Como você lida com a sua fertilidade? Você a vê como um problema? Estar fértil
é um risco? Como percebe sua capacidade de conceber, gestar e parir? Você
permite que ela se expresse ou preferia que ela não existisse? Como lida com ela?
(respiro profundo)
Caso você conheça sua linhagem feminina, pense sobre essas mulheres que
vieram antes de você. Caso não conheça sua linhagem biológica, observe
aquelas que você carrega como referência em sua jornada de vida:
Se sim, o que você gostaria de mudar nestes padrões e fazer diferente saindo
desta tendência?
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Você renega forçosamente a essas mulheres e/ou a seus padrões?
(respiro profundo)
Como você se relaciona com as mulheres ao seu redor, para além de sua família?
(respiro profundo)
11
Ciclicidade
Estamos cada vez mais distantes da nossa natureza cíclica. Ao deixar de obser-
var nossos tempos internos, a velocidade das máquinas passa a definir os nossos
ritmos. Os conceitos de eficiência, desempenho e maturidade emocional estão
muito distorcidos e, assim, ouvimos em uníssono e altivez: “sou a mesma, todos
os dias”. O que isso nos traz, afinal? Desconexão. Vivemos em uma sociedade ex-
cessivamente domesticadora. Mergulhadas em verniz pasteurizado, perdemos em
muito a capacidade intuitiva, o potencial visionário e poder instintivo. Nos afastar
do saber dos ciclos, é abrir mão de uma preciosa ferramenta: o direito de conhecer
a si mesma e decifrar, conhecer e descrever o mundo a partir do saber-do-corpo.
5
KRENAK, Ailton. A vida não é útil. Pesquisa e organização Rita Carelli. 1a ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 2020.
12
Não se pode escolher entre as emoções que desejamos ou não sentir. Não
podemos escolher nos entorpecer para não sentir dor, solidão, frustração, medo,
tristeza ou raiva, sem nos abster de todos os outros sentimentos, como alegria,
êxtase, contentamento ou prazer. Acreditando ter tomado as rédeas de suas vidas
e emoções através de dispositivos reguladores (psíquicos, sociais e culturais), mui-
tas de nós estão, em verdade, anestesiando-se contra a proliferação das pulsões,
dos afetos, dos desejos, da Vida.
Observe à sua volta, tudo é cíclico e impermanente: Uma semente germina,
vira um botão de rosa que se abre em flor, decai, perde suas pétalas, morre e uma
nova semente germina. O mesmo acontece com o dia e a noite, o verão e o in-
verno, a lua cheia e a lua nova. O mesmo acontece com o ciclo menstrual e com
o ciclo de vida dessa natureza que, não esqueçamos, somos.
Lembre-se também: ser cíclica é vulnerabilizar-se. Na impermanência o con-
trole se esvai e é somente em entregar-se integralmente que se faz possível tran-
sitar pelos ciclos de vida-morte-renascimento – espaço de morte e renascimento
de velhos e novos mundos, dentro e fora de nós.
Nosso convite aqui é que você volte à sua ciclicidade, deixe o seu corpo livre
para ovular, para sangrar. Deixe-se livre para descer às sombras e se surpreenda
com retornos cada vez mais brilhantes. Permita que suas emoções oscilem, como
as marés. Com o tempo e o intento, você perderá as tantas aversões pelo seu in-
verno psíquico, perderá os tantos apegos pelos seus verões, em sentir plenitude6
por cada uma de suas paisagens internas, sabendo que isso também irá mudar.
Ciclicidade na prática? A C E G I K M O Q S T W X Z
Busque observar como você se sente de forma distinta a cada fase do dia, do mo-
mento em que você acorda até quando for se deitar, de acordo com o ciclo do
sol: meia-noite, seis da manhã, meio-dia, seis da tarde etc. Em qual momento do
dia você se sente mais cansada ou mais disposta? Mais expansiva ou mais intros-
pectiva? Mais acelerada ou mais tranquila? Mais eficiente ou mais dispersa? Perce-
ber as particularidades de cada um desses momentos do dia é um primeiro passo,
que parece um tanto óbvio (e é, e por ser tão óbvio é tão pouco cuidado) mas que
te permitirá, a partir dessa observação, começar a criar correlações com os de-
mais ciclos, do micro ao macro: ciclos da lua (nova, crescente, cheia, minguante),
o ciclo solar (com as quatro estações: inverno, primavera, verão e outono), com
seu ciclo menstrual… mas passo por passo, seguimos adiante!
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Daí surge o título desse trabalho, como “plenilúdio” que representa a lua cheia, porém enquanto jorna-
da, representa também a plenitude que independe das fases do ciclo. Há inteireza no que quer que seja,
quando se está com o que é.
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As quatro
fases do ciclo
menstrual
entre a matéria e
o encantamento
7
GALEANO, Eduardo. Los híjos de los días. Montevidéu: Siglo XXI. 2011.
8
Ciclar, como verbo. Um neologismo necessário e urgente em tempos de linearidade.
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influenciado pelas emoções, o ritmo laboral, a alimentação, a vida sexual, os hor-
mônios, os medicamentos e o ambiente de cada uma, entre outros fatores.
Além da perspectiva fisiológica que muitas conhecemos, iremos também aden-
trar os saberes ancestrais, que trazem novas dimensões de entendimento a respeito
das muitas facetas que nos habitam enquanto mulheres. A identificação com as
imagens arquetípicas é parte importante na construção da nossa realidade. O reco-
nhecimento com a mitologia9 nos fornece uma origem e um guia no nosso cami-
nho. Usamos os arquétipos para visualizar as fases pelas quais as mulheres passam
durante a vida, para que essas imagens nos ajudem a representar as energias de
cada fase do nosso ciclo.10 As estações do ano11 mais uma vez demonstram esse
sistema circular ao qual fazemos parte, assim como a Mãe Terra, que se renova e se
transforma continuamente. Os animais de poder e as direções sagradas, trago da
tradição andina. A lua, em sua constante dança cósmica, transita por diferentes pos-
turas de luminosidade e escuridão, crescendo e minguando, agindo sobre as marés,
as colheitas, os plantios, o ciclo menstrual e tudo mais o que pulsa sobre a terra.
Iremos fragmentar os ciclos em quadrantes, para nos facilitar o entendimento
de cada uma de suas fases e diferentes nuances. São estes:
A semente
A primeira fase do ciclo se inicia com a chegada da lunação12: A semente. Energia
do inverno, lua nova13, meia-noite. Direção Sul e animal de poder da serpente.
9
Os arquétipos das deusas gregas como manifestações da psique feminina, também incluídas por mim no
estudo do ciclo neste contexto, vem pela mentoria da Jean Shinoda Bolen, psiquiatra e psicanalista jun-
guiana, a quem acompanho desde 2013 (Ver mais em BOLEN, Jean Shinoda. As deusas e as mulheres: nova
psicologia das mulheres. Tradução Maria Lydia Remédio. São Paulo: Paulus, 1990.) Este livro pode gerar um
certo desconforto, especialmente àquelas que estão mais desterritorializadas da viscosidade heterocisnor-
mativa, porém, com devidas ressalvas, representa ainda uma boa fonte de pesquisa sobre o tema.
10
Outra referência no estudo dos arquétipos do ciclo menstrual: GRAY, Miranda. Lua vermelha. As ener-
gias criativas do ciclo menstrual. São Paulo: Editora Pensamento, 2017.
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O ciclo das estações do ano foi um conhecimento incorporado através do meu encontro Emil Luna,
um homem medicina com quem tive a oportunidade de estudar na Romênia em 2015. Pela tradição Me-
xica da Danza de la Luna de Ollintlahuimetztli, da qual sou parte desde 2016 junto à Abuela Malinali), me
inspirei nas poéticas e forças dos ciclos lunares. As direções sagradas e os animais de poder da tradição
de Munay-ki a qual fui iniciada em 2013 no Peru.
12
A palavra menstruação tem como sílaba-raíz, mens, mensis, que quer dizer mês. Nós utilizamos então
“lunação”, evidenciando a relação do ciclo menstrual com o ciclo lunar, em substituição ao calendário
gregoriano. Ver sobre Lunacepção (LACEY apud MARTÍN, 2015, 156)
13
Reiterando, isso não quer dizer que mulheres sempre menstruam na lua nova – ou que é certo ou me-
lhor, menstruar na lua nova. Neste contexto, nos serve apenas como referência a uma força arquetípica.
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Representada pelos arquétipos das deusas Héstia e Perséfone (como deusa do
mundo subterrâneo).
O sangramento da menstruação é causado pelo desprendimento da camada
mais interna do útero, o endométrio, que se desenvolveu no ciclo anterior. A hi-
pófise, uma pequena, mas poderosa glândula localizada na base do cérebro, envia
uma mensagem aos ovários para que os folículos comecem a crescer. O mensa-
geiro, aqui, é o hormônio folículo estimulante.
Recolher-se e sair um pouco do mundo pode ser revelador nesse momento.
Apesar de parecer o contrário, é durante este período que ocorre o mais potente
despertar. A lunação pede isolamento, pois a mulher está no auge de seus pode-
res mais intuitivos e visionários. Esse é o momento para ter sonhos auspiciosos,
acessar insights importantes, receber visões e ideias criativas. É a oportunidade
para questionar sobre seu propósito de vida e suas escolhas, sobre o que você
deseja levar ou não para o próximo ciclo, indo além da necessidade de segurança,
controle e apreciação, em direção a um espaço de não materialidade adentrando
seus mundos internos. Sua lunação pode te proporcionar tudo isso.
Este período não deveria ser desperdiçado com tarefas mundanas nem distra-
ções sociais, ao contrário, se dirigir para a meditação concentrada, a acumulação de
energia espiritual e a renovação da sua força vital. Para isso, é preciso criar e defender
um tempo e um espaço para si mesma. Mesmo com as limitações da vida moder-
na, podemos, com boa vontade e perseverança, experimentar seguir o exemplo das
nossas ancestrais, que se refugiavam nas “Tendas da Lua”14. Esses eram templos de re-
ligação, rezo, purificação, descanso e contemplação, que permitiam às mulheres dei-
xarem suas obrigações e papéis sociais durante o sangramento e entrarem em retiro.
Crie a sua própria tenda, respeitando e acolhendo as suas reais possibilidades.
Durante esse período, busque formas de diminuir o seu ritmo, de evitar sobre-
cargas. Tente ser um tanto mais gentil consigo mesma. Faça pequenos rituais de
cuidados de si. Mesmo que por um pequeno instante apenas, busque brechas de
respiro profundo dentre as atribuladas configurações de seus dias. Experimente,
mesmo no caos de uma vida urgente, incorporar a postura interna de reclusão,
introspecção e quietude, tão bem-vindas nesse momento.
14
Como grande parte do que se refere ao feminino e ao sagrado, a tenda da lua também é um processo
amplamente romantizado. Apesar de mulheres de diferentes tradições (sobre esse tema tenho como es-
pecial referência as mulheres Quechua, Yurok, Nootka ) mencionarem este como um espaço de reclusão
eletiva, de purificação e solidão voluntária, é importante reiterar que historiadores e antropólogos afir-
mam que, em muitas sociedades primitivas, as mulheres eram excluídas da vida comum no momento da
menstruação, não por ser a elas concedido um momento de descanso e acolhimento, mas por serem
consideradas impuras, malogradas. Ver mais DELANEY, Janice. The course: a cultural history of menstrua-
tion. First University of Illinois Press edition, 1988.
16
A semente, assim como o inverno, representa o poder e a energia de criação
em estado latente. Fala sobre um início promissor – como guardando por dentro
toda a informação contida em uma enorme árvore, ou em uma deslumbrante flor
– que pedem nutrição e cuidado, para sustentar o crescimento, silêncio e presen-
ça, para dar espaço ao que precisa germinar. A terra que adormece em acumula-
ção de força vital até que desponte em uma nova primavera.
A direção sagrada do Sul guarda o animal de poder da serpente: ela, que pe-
netra nas profundezas do solo da mãe terra, assim como te convida a entrar em
contato com os seus mundos subterrâneos; que enxerga no escuro e te ensina a
intuição como guia. Ela, que troca de pele quando precisa crescer para além de
si mesma, que rompe com as antigas cascas que a impedem de se expandir. Para
trocar de pele, a serpente entra em repouso e neste rito de renascimento nos inspira
a deixar para trás o passado e aquilo que não mais nos serve, aquilo que já não mais
nos pertence – permitindo um caminhar em beleza, integridade, verdade e retidão.
• Deusa virgem15, inteira em si mesma. Não depende dos outros para estar
bem consigo;
15
“Deusas invulneráveis” é um termo cunhado por Dra. Jean Shinoda Bolen (assim como “deusas vulnerá-
veis”, em contraponto), que referencia a que é uma-em-si-mesma, que não “pertence” a outres ou que é
“impenetrável” – que não é afetada pela necessidade de estar vinculada a um relacionamento afetivo para
se sentir completa, ou que não depende unicamente da aprovação de outres para sentir-se legitimada.
(BOLEN, 1990, p. 63)
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• Interesses de ordem espiritual.
O Broto
A segunda fase do ciclo menstrual: Fase Folicular, depois da menstruação, antes
da ovulação (essa separação ajuda a compreender a energia sutil de cada mo-
mento do ciclo, porém, para fins de percepção de fertilidade como método, con-
sideramos a fase folicular como o 1º dia de menstruação até a ovulação). O botão
de flor, o broto. Energia da primavera, da lua crescente, da manhã, do amanhecer.
Direção Leste, o animal de poder da águia. Representada pelos arquétipos das
deusas Ártemis e Atena, e Perséfone (como a menina).
Logo após a menstruação os folículos começam a crescer, desenvolver-se e
produzir estrógeno. Em ciclos mais longos, tem-se um período seco e sem muco,
característico do período infértil. Em ciclos mais curtos, o útero já começa a pro-
duzir muco cervical e a preparar o endométrio, podendo passar da menstruação
direto para a próxima fase. Por isso, algumas mulheres dizem engravidar durante
a menstruação. Ou seja, a fase pré-ovulatória pode variar muito, tanto de mulher
para mulher quanto de ciclo para ciclo. Nos ovários, os folículos continuam a cres-
cer e produzir cada vez mais estrógeno, que prolifera o endométrio, se tornando
cada vez mais espesso, podendo então receber um embrião. O colo do útero fica
mais alto, macio e aberto. O útero trabalha na produção de fluido cervical. Quanto
mais perto da ovulação, mais lubrificante, transparente e úmido o fluido se torna.
A vulva e os seios podem ficar mais inchados.
Caso você tenha se permitido um tempo de recolhimento, observação de si
e quietude durante a sua lunação, agora vai sentir que começa a ficar cheia de
energia, em todos os aspectos. Já renovada, vai voltando devagar para o mun-
do. Fisicamente, são cada vez maiores os níveis de estrógenos. Esses hormônios
são deixados no sangue e produzem efeitos em todo o corpo, inclusive na pele,
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cabelos, na disposição para fazer, trabalhar e produzir, oferecendo sensações
de bem-estar e vitalidade – a energia e o humor tendem a ficar em alta durante
esse período.
Em geral, nesta fase, é possível enfrentar os desafios mundanos com mais de-
terminação e coragem. Com pensamento linear, firmeza e maior concentração,
você tende a sentir mais confiança em si mesma, está mais enfocada, e expressa
com mais verdade e clareza as suas ambições, ideais, ideias, objetivos e propósitos.
É hora de colocar em prática as suas visões, mensagens e intuições, recebidas du-
rante e sangramento. Com a clareza de pensamento e discernimento, é também
um bom momento para resolução de conflitos, que você pode sabiamente adiar
para serem resolvidos aqui nesta fase do ciclo. É comum sentir uma abertura espe-
cial para o novo, ou seja, este é um bom momento para começar a implantar novos
hábitos – como parar de fumar, se alimentar melhor, nutrir relações saudáveis, ou
se dedicar conscientemente ao que é efetivamente importante para você neste
momento. É comum também nesta fase que você comece a ficar mais atenta com
a aparência, expresse entusiasmo e ânsia de viver a vida intensamente. Com uma
sexualidade fresca e renovada, pode ser que se sinta mais leve, como uma menina
que desperta a brincadeira, a leveza, o riso, a excitação, ânimo e disposição.
Como a energia da primavera, esta é uma fase em que você pode se perceber
mais regenerativa, dinâmica e inspiradora, assim como a energia da lua crescente e
do amanhecer, que convidam a um novo começo, ao renascer. Sob a regência do
Leste, a águia e o condor vem ensinar sobre voar alto, para além de si, enxergando o
mundo sobre uma perspectiva mais ampla e desidentificada. Inspira o poder do foco
e decisão, trazendo a possibilidade de incorporação e fortalecimento da energia do
masculino,16 que se manifesta como força de vontade, atitude, resolução e decisão.
16
Que nada tem a ver com identidade de gênero.
19
• Quieta, despretensiosa, “menininha”, bons comportamentos, filha da mãe;
• Ativa e exploradora;
• Pouco ajustada aos papéis sociais femininos, “faz do seu próprio modo”;
• Pensamento estratégico;
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• Habilidosa e eficiente: persegue seus objetivos com clareza, inteligência
e destreza.
Logo antes da ovulação o estrógeno está em seu nível máximo. Com isso, lá
no cérebro, a hipófise percebe que tudo está indo bem nesse ciclo menstrual e
manda outra mensagem para os ovários. O mensageiro, desta vez, é o hormônio
luteinizante, que comanda a liberação do óvulo. O fluido cervical está no máximo
da umidade… cada vez mais férteis!
Mulher em Flor
A terceira fase do ciclo menstrual: ovulação, o florescimento. Energia do verão,
lua cheia, meio-dia. Direção Norte e animal de poder do beija-flor. Representada
pelos arquétipos das deusas Afrodite, Hera e Deméter.
O folículo libera o óvulo, que sai de um dos ovários e é captado pela tuba ute-
rina. Se houver espermatozoides dentro do sistema reprodutor e sexual da mulher,
um deles pode alcançar o óvulo na tuba uterina, possivelmente levando à fecun-
dação. Não importa se esses espermatozoides acabaram de chegar ou estão ali há
alguns dias (tendo em geral uma sobrevida de 72 horas).
Logo após a ovulação: no ovário, agora com o óvulo liberado, o folículo vazio
passa a se chamar corpo lúteo e continua a produzir estrógeno, mas em menor
quantidade. O corpo lúteo manda uma mensagem para os ovários e o útero atra-
vés do hormônio progesterona, que significa “pró-gravidez”. Como o óvulo já foi
liberado, os folículos não precisam continuar crescendo, de forma a evitar uma
ovulação extra no mesmo ciclo.
A progesterona torna o endométrio glandular e rico em vasos sanguíneos, ou
seja, a condição ideal para que o embrião se fixe no útero. Esse hormônio aumenta
o metabolismo do corpo e eleva a temperatura basal. Depois da ovulação, os óvu-
los continuam vivos por algumas horas ou dias, sobrevivendo, em média, 24 horas.
Se o óvulo for fecundado: o embrião vai viajar pela tuba uterina até o útero e
fixar residência. Em torno de 7 dias após a ovulação, uma mensagem é enviada
para o corpo lúteo. O mensageiro é o hormônio HCG, que indica que o endomé-
trio deve permanecer, em vez de ser expelido na forma de uma nova menstrua-
ção. Por isso, devem-se realizar os testes de gravidez ao final do período pós-o-
vulatório (em média, 14 dias depois da ovulação). Caso contrário, pode haver um
resultado falso negativo.
Em geral, nesse período, a mulher se encontra expansiva, extrovertida, fértil
– em muitos aspectos –, transbordando em si, manifestando a abundância que
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vibra e floresce dentro e fora de si. É um momento de grande ímpeto criativo. Essa
energia que pode criar uma vida, gerar um bebê, pode também ser usada para
seus projetos, para recriar uma vida para si, junto aos seus, e para o coletivo. Uma
energia de potência de vida bem direcionada pode criar grandes revoluções.
A sexualidade se encontra cada vez mais aflorada e a libido pode aumentar
significativamente nesse período, expressando um desejo de conexão e intimida-
de com si mesma através do outro. Nesta terceira fase do ciclo menstrual, durante
o período fértil, pode ser que você se encontre menos focada em seus próprios
interesses e desejos egocêntricos, e passe a olhar para o seu entorno com mais
cuidado e carinho. Essa é a representação do arquétipo da mãe, que representa
esse espaço de nutrição, proteção, acolhimento, suporte e ancoramento, sus-
tentação. Essa energia da Grande Mãe pode ser compartilhada e manifestada das
mais diversas formas: oferecendo seu tempo para uma escuta carinhosa, aumen-
tando sua capacidade de doação, expondo suas emoções e abrindo seu coração,
cuidando de um jardim, criando expressões artísticas, compartilhando energias
criativas, nutrindo um propósito de vida, uma empresa ou um projeto, cozinhando
para as pessoas queridas, oferecendo um abraço protetor e amparando, em sere-
nidade e amor, ativando seu papel como agente de transformação social enquan-
to doa essa energia a um propósito comum.
O corpo fértil dá sinais de transformação: os hormônios podem deixar a pele
mais reluzente, os cabelos mais brilhantes, a vagina aumenta seu tamanho e se
torna mais úmida, os seios mais fartos. Toda essa energia age como um feromônio
natural, que sutilmente atrai e magnetiza. Como uma flor no ápice de seu desa-
brochar, como o sol do meio dia, ou a energia do verão, como o brilho reluzente
da lua cheia que a tudo ilumina, assim você se faz pulsando em sua força de vida.
Sob a regência da direção Norte e o animal de poder do beija-flor, a mu-
lher pode acessar mais facilmente qualidades como empatia, amor incondicional,
compaixão, fluidez, adaptabilidade, entrega e transparência. Um maravilhoso an-
tídoto para cura e cuidado de nossas relações.
22
• Apaixona-se facilmente e deixa muito de seus objetivos pessoais de lado
para viver uma paixão;
Folhas Secas
A quarta fase do ciclo menstrual: Fase Lútea (entre ovulação e próxima menstrua-
ção, período pré-menstrual), as folhas secas, período pré-menstrual. Depois da
ovulação, até o início da menstruação. Energia do outono, lua minguante, o en-
tardecer e anoitecer. Direção oeste e animal de poder do jaguar.
A fase lútea dura de 12 a 16 dias. Se a menstruação é irregular isso significa que
a primeira fase (folicular) do ciclo que sofreu alterou. Ou seja, não é a menstrua-
ção que atrasa ou adianta, mas a ovulação. Dessa forma, ao saber quando você
23
ovula, é possível saber quando você vai estar menstruada. Com a aproximação do
período infértil, o muco cervical vai ficando cada vez mais seco, até deixar de ser
produzido. Além disso, o colo do útero vai ficando mais baixo e firme (durante a
menstruação e ovulação este colo do útero fica macio e mais aberto para passa-
gem do sangue e do sêmen). Se até essa fase não tiver ocorrido a fecundação, o
corpo lúteo se desintegrará cerca de 14 dias após a ovulação. Com isso, caem os
níveis de estrógeno e progesterona. A temperatura basal também diminui, e de-
pois virá a menstruação.
Frequentemente, a mulher pré-menstrual experimentará um tremendo e re-
pentino aumento de energia. É sugerido que se drible a falta de direcionamento
para aplicar esta energia a canais produtivos e adiantar o que for possível antes do
próximo sangramento.
Nessa fase pode surgir a indisponibilidade de fazer pelo outro, concentrando
em si mesma e em suas próprias necessidades. Muitas mulheres se tornam hostis,
briguentas e impacientes durante esse período: elas precisam se afastar das pessoas
à sua volta para poderem ficar sozinhas, respeitando seus tempos internos e espa-
ços sagrados. Muitas dizem que durante a TPM “deixam de ser elas mesmas” ou “não
se reconhecem”. Entretanto, podemos por uma outra perspectiva, podemos pensar
que nessa fase é possível se ver com um pouco mais de clareza. Aquilo que não foi
expresso, integrado ou aceito durante o decorrer do ciclo, pode nesse momento vir
à tona. Apesar de inoportuno, essa situação também nos proporciona alguns be-
nefícios: nos poupa de somatizações, convida a posicionamentos, instiga a tomada
de decisões e evidencia conflitos. Temos aqui a oportunidade de nos libertarmos
daquilo que não nos serve, abrindo espaço para iniciar um novo ciclo. Trata-se de
uma oportunidade de mais alinhamento e conexão com quem se é, por debaixo das
máscaras, indo além dos padrões repetitivos, das crenças limitantes, das escolhas
inconscientes e da necessidade de segurança, controle e/ou apreciação.
Muitas vezes, entrar em contato com aquilo que renegamos é desconfortá-
vel e até doloroso, tirando-nos imediatamente da zona de conforto. Entretanto,
com a visão correta e a firme intenção (de nos conhecer, crescer, amadurecer,
transformar), esse processo se torna não só mais leve, como também bem-vin-
do e necessário.
Assim como a lua começa a minguar, deixando de estar plena e brilhante,
pode ser que você também comece a entrar em um processo sutil de “morte”,
de “escuridão”, representado também pelo entardecer, pelo outono, pelas folhas
secas que caem em direção à terra para proteger as raízes durante o inverno. Sob
a regência do Oeste, o jaguar vem como o guardião do entre-mundos, é ele que
conhece o limiar da vida e nos ensina que a morte – não somente do corpo físico
24
– é passagem, travessia. O jaguar fala sobre a importância de se fazer escolhas,
sobre o que devemos deixar para trás. Para renascer, é preciso deixar morrer.
A partir da observação dos meus próprios processos pessoais, e da observa-
ção das tantas mulheres com as quais entrei em contato através deste trabalho,
não atribuo à fase da TPM nenhuma representação arquetípica, nenhuma deusa
em especial. Explico: pela minha percepção, o que acontece aí é a expressão das
sombras das deusas, em um movimento de reequilibração, tanto de facetas que
não foram expressas (acolhidas, renegadas ou negligenciadas), quanto facetas
que estiveram presentes de forma exacerbada, em desequilíbrio. Ou seja, através
da TPM você pode analisar quais facetas arquetípicas estão mais ou menos pre-
sentes em sua vida, como elas foram trabalhadas no último ciclo, e como elas se
apresentam a você agora, em forma de reatividade, desconforto ou sentimento
de inapropriação – caso você não tenha estado consciente delas. Isso não quer
dizer que você precise manifestar todos os arquétipos em um único ciclo, o tem-
po todo. Em alguns momentos de nossas vidas, algumas características se tornam
mais necessárias e importantes do que outras. Está tudo bem e é inclusive sau-
dável e funcional que seja assim. Sugiro, porém, que você se lembre sempre de
questionar: “Quais deusas estou nutrindo e quais estou renegando?”
Sem certo ou errado. A decisão de tornar-se quem se é, e como, é somente sua.
Porém, esta decisão precisa vir de um lugar consciente em que todas as suas outras
facetas possam dialogar entre si e consensualmente escolherem seus lugares de
importância em sua vida. É saudável que cada um desses arquétipos possa encon-
trar espaço de fala dentro de você, evitando que se exacerbam, não dando espaço
a outras facetas, o que te faria crescer verticalmente ao invés de ciclicamente. Ao
hierarquizar e fixar determinados arquétipos, você se torna unifacetada, e pode ser
que se cristalize como um clichê, um personagem, uma máscara que você mesmo
criou, acreditando e trabalhando fielmente por ela e por sua manutenção – o que
pode custar um preço alto em sua vida profissional, ou em suas relações, ou em sua
saúde emocional, dependendo da deusa que você escolhe seguir.
Quem você se torna? Aquela que você nutre! E o que você é não necessaria-
mente precisa ser resultado do que você deixou de ser. As suas muitas deusas po-
dem caminhar de mãos dadas, se ajudando mutuamente. Nada melhor do que o
ciclo menstrual para te ajudar a reconhecer as tantas facetas que existem aí dentro,
para que você possa efetivamente tornar-se uma tomadora de escolhas. Somos
muitas... quem você quer dar voz agora? Feita a escolha de qual arquétipo você de-
seja nutrir, como seguir então honrando todas as outras facetas que te habitam? A
resposta está em manter um diálogo saudável e amoroso com as muitas partes de si.
25
O elixir
17
Plínio (23-79 d.C.), o filósofo naturalista romano escreveu essas linhas sobre o ciclo menstrual em seu
livro “Naturalis Historia”. Trecho desde o genial e catártico: STROMQUIST, Liv. A origem do mundo: uma
história cultural da vagina ou vulva vs. o patriarcado. Tradução de Kristin Lie Garrubo. 1a ed. São Paulo:
Quadrinhos na Cia, 2018.
26
de uma forma mágica, misteriosa. Um corpo guiado pelo cosmos, que dialoga
com as forças ocultas da lua e da maré, um corpo-oráculo, um corpo-território.
Esse sangue, que flui para fora, mas não acarreta nem a morte, nem invalidez, vem
e vai com uma regularidade que a ação humana não poderia mudar. Apenas um
mistério ainda maior, a criação da vida humana, poderia alterar o seu padrão.
Para reduzir a ameaça de destruição pelas “forças invisíveis” que dirigiriam o
sangramento feminino, os homens, a princípio, fizeram do útero uma deusa. A
adoração e apaziguamento da Grande Mãe e sua sangrenta fertilidade poderiam
garantir sua segurança temporária.18 Mais tarde, quando a agricultura começou a
substituir a caça e a acumulação passou a ser possível na economia primitiva, a
relativa estabilidade permitiu ao homem usar meios diretos de isolamento da mu-
lher menstruada. Ele a tornou então um tabu – a própria palavra pode se originar
de uma expressão polinésia para menstruação: tupua.19
Desde as sociedades primitivas – onde o conhecimento acerca da fisiologia é
rudimentar, na melhor das hipóteses – até aqui, cada distinto contexto histórico e
social se instrumentalizou com os devidos meios de exclusão e opressão contra
os corpos que sangram. O racionalismo patriarcal segue desprezando e violen-
tando a tudo aquilo que não se pode controlar, e mulheres continuam a sofrer
18
Ver mais DELANEY, Janice. The course: a cultural history of menstruation. First University of Illinois Press
edition, 1988.
19
Tabus existem para proteger os humanos do perigo, diz Franz Steiner desde o conceito de “sociologia
do perigo”. Assim como na menstruação, os tabus se referem tanto ao exercício de proteção da socie-
dade contra determinado indivíduo que oferece perigo, quanto ao exercício de proteção dos indivíduos
contra eles próprios. Ver STEINER, Franz. Taboo. Baltmore: Pequin, 1956. p. 21.
27
os tabus de séculos passados: direito, medicina, religião, psicologia, farmacologia
etc. em meneios cada vez mais sutis seguem assim os perpetuando.
O resultado disso é certamente a identificação das mulheres com uma con-
cepção degradada da realidade corporal. Em pesquisa recente20 feita com 1,5 mil
mulheres no Brasil e outros países como Índia, África do Sul, Filipinas e Argentina,
mostrou que 54% delas, entre 14 e 24 anos, sabiam nada ou tinham poucas infor-
mações sobre menstruação no momento da menarca. 39% delas pedem absor-
ventes emprestado como se fosse um segredo, 57% sentem-se sujas durante a
menstruação e 40% se sentem inseguras e pouco atraentes. Para as meninas em
idade escolar, 10% delas afirmam que por vezes o período menstrual impede de ir
à escola.21 Está tudo bem não querer ou não gostar de menstruar. Como dito no
início, cada mulher é uma… mas me perguntaria certamente, de onde vem índi-
ces tão altos de rejeição à menstruação enquanto uma mulher sangra em média
7 anos durante toda sua vida fértil, ou enquanto 26% da população global está em
idade reprodutiva? Não seria o momento de começarmos a compor as nossas
próprias narrativas?
As coisas estão mudando, lentamente, porém. Mulheres estão ativamente co-
locando a menstruação em um lugar de celebração e poder, de resistência (es-
pecialmente no âmbito das artes e enfrentamento em respeito a políticas públi-
cas) e não de vergonha. Certamente, abordar ao assunto “mulher”22 ao máximo
aspecto elementar e óbvio da feminilidade, daremos a nós mesmas e a nossas
irmãs um novo respeito pelo que tem sido, para muitas, um amistoso incômodo.
A forma como a menstruação é falada ainda pode claramente afetar em como a
menstruação é percebida. Dito isso, trago aqui algumas perspectivas que podem
elucidar e inspirar diferentes formas de pensar o sangue menstrual, desde uma
postura efetivamente afirmativa. Fomos despejadas de nossos próprios domínios,
porém, relembramos o caminho de volta àquilo que se faz abrigo, ode ao desejo,
recipiente de alma, oásis, ferramenta de luta.
Pesquisa feita pela marca Sempre Livre, da Johnson & Johnson, em parceria com a KYRA Pesquisas e
20
Consultoria.
21
Um tema muito importante a ser problematizado é sobre a “pobreza menstrual”, que é um grande indi-
cativo sobre como a sociedade ainda invisibiliza a menstruação e as especificidades desse corpo https://
www.unicef.org/brazil/media/14456/file/dignidade-menstrual_relatorio-unicef-unfpa_maio2021.pdf .
Acesso em: 21 de setembro de 2021.
22
“Mulher” aqui vem antecedendo a ideia de sujeito de autodeterminação, não porque essa seja a nos-
sa premissa, mas a premissa de uma sociedade cisgênero normativa, que considera o útero como um
aspecto reduzido e definitivo na concepção de “ser mulher”. Por mais distópico que seja, ou pareça ser,
este útero precisa ainda ser validade enquanto um território de legitimação e luta nas batalhas feministas,
por apropriação de narrativas e descolonização dos corpos.
28
Ritualizar la sangre 23
É necessário esvaziar a nossa útera/coração da dor
que atormenta o nosso equilíbrio, nos limpar das
sombrias palavras, imagens e tabus que nos impe-
dem de valorizar a nossa própria natureza. Nós mu-
lheres, precisamos empreender uma viagem até as
nossas profundezas com os nossos sentidos expan-
didos. Precisamos nos apropriar desses espaços que
nos usurparam e recuperar a sabedoria que ainda
permanece silenciada dentro de nós mesmas.24
23
Sempre achei mais bonito la sangre do que o sangue, assim como a útera - não somente por estar
no feminino (como água, vida, semente e terra…) mas também por honrar às mis hermanas que correm
insurgentes pelas veias (abertas) da América Latina.
24
MARTÍN, Pabla Pérez. Manual de introdução à Ginecologia Natural. Ginecosofía Ediciones. 2015, p. 114.
25
Uma confusão comum é entender feminino como algo intrínseco às mulheres. Aqui, feminino não faz
referência a gênero.
29
o que veio à tona na última fase do seu ciclo menstrual, a TPM (que prefiro chamar de
força pré-menstrual). Como vimos anteriormente, é nessa última fase do ciclo que as
sombras emergem à superfície para que se possa entrar em contato com os conteúdos
menos conscientes que orquestram muitas de suas escolhas, ações, reações, relações,
formas-pensamento. Em observá-los – buscando fazê-lo com carinho e compaixão por
si mesma –, entregue-os à Terra, junto ao seu sangue. Entregue aquilo que você não
quer mais levar para o novo ciclo. Entregue-se com confiança, sabendo que deixar ir não
é perder, é abrir espaço.
Entregue à Terra todas as impressões negativas que você carrega a respeito de si,
entregue memórias do seu corpo em forma abortos, traumas e abusos… intencione a
entrega dos seus desequilíbrios físicos, intencione a regeneração do seu corpo, do seu
sistema. Enquanto oferece seu sangue, crie espaço para seu potencial visionário, intuiti-
vo, instintivo. Perceba como a cada ciclo uma nova realidade se abre para manifestar um
espaço interno de muito mais consciência, conexão e poder sobre si mesma. É hora de
relembrarmos o caminho de volta para casa.
Aquelas que sentem o chamado de oferecer seu sangue para a Terra devem escolher
uma forma de recolhê-lo. Isso pode ser feito através de Coletores Menstruais, Calcinhas
Menstruais ou Bioabsorventes. Os coletores são práticos e eficientes, entretanto muitas
mulheres não se adaptam e questionam a introdução de materiais inorgânicos no corpo.
Caso você opte pelos copinhos, pode diluir seu sangue em um pouco de água e devol-
vê-lo à Terra.
Os bioabsorventes são feitos de algodão. Essa opção é segura, higiênica e ecológica.
Para coletar o seu sangue é necessário deixar o absorvente de molho por algumas horas
na água, sem nenhum produto químico (segundo a Ginecologista Débora Rosa, é ideal
que não se deixe os absorventes de molho por muitas horas, com o risco de colonizar
o absorvente com algum microrganismo patógeno da própria flora). É essa água com
sangue que você irá utilizar para plantar a sua lua. Depois de coletar o sangue, você pode
lavar o absorvente com sabonete de coco, ou como preferir.
Em ambos os casos, você pode plantar a sua lua em um jardim ou um simples va-
sinho de planta com terra em seu apartamento, por exemplo. Além disso, você pode
escolher uma planta que tenha um significado especial para você: roseira, sálvia, tancha-
gem, artemísia, são plantas de forte representação do feminino. Ah, você pode também
utilizar o sangue como um ótimo biofertilizante para hortas e jardins. É interessante tam-
bém sangrar direto na Terra. Ao tomar consciência de que o seu fluxo menstrual não é
contínuo você pode desenvolver a percepção de acocorar-se e permitir que ele escorra
livremente sobre a Terra. Você pode fazer isso em vaso grande também, caso não tenha
um jardim, deixando que seu útero se abra em uma conexão direta com a sabedoria an-
cestral da Mãe Terra, como faziam nuestras ancestras.
A ideia é que você “plante a sua lua” como um pequeno ritual, uma ou mais vezes
durante seu ciclo, conforme sua intuição e natural disposição. Crie um ritual pessoal,
lembrando que não existem regras sobre como fazê-lo. O importante aqui é desenvolver
30
a sua própria forma de conexão e rezo – o que vale mesmo é o intento, a clareza, a fir-
meza de intenção. Faça isso por você mesma, pelo seu crescimento, pela sua evolução
e por todas as suas relações, por aquelas que vieram antes de você e as que estão a vir.
Faça isso por nossa coletividade que há tanto se esqueceu do caminho de volta para
casa. Como qualquer oferenda, esse é um ato de agradecimento e retribuição a todas as
bênçãos recebidas – mesmo em tempos distópicos, certamente há muito a agradecer.
Sobre o ritual de plantar a lua, saiba que ele vai muito além da menstruação. O
importante aqui é a intenção. Ou seja, use a sua intuição e a sua criatividade para
criar o seu próprio ritual. Você pode oferecer algo simbólico à Terra, que faça sen-
tido para você, seguindo o mesmo princípio de uma oferenda em agradecimento
e limpeza sobre ciclo que passou, em rezo pela abundância e gratidão pelo que
há de vir, como forma de fechamento e abertura de ciclos, sobre a força de trans-
formação da vida-morte-renascimento, a cada lua nova.
• Fique com o seu corpo assim como ele é, e fique atenta a ele;
• Durma mais, sonhe mais. Essa é uma fase propícia para sonhos
auspiciosos. Faça perguntas antes de dormir. Na terceira noite de
sangramento, você pode colocar um pouco de sangue entre as suas
sobrancelhas, na altura do Ajna Chakra (terceiro olho), para ativar o seu
potencial visionário. Anote, grave em áudio ou desenhe os seus sonhos
para que você possa lembrar-se deles. Permita que seus sonhos te guiem
e contem histórias sobre si mesma!
• Dance (de forma livre e espontânea) para soltar o quadril, mover o ventre
– junto com as emoções e as tensões
• Devolva o seu sangue para a Terra, pare de vez com o uso de absorventes
descartáveis;
• Use velas e luzes baixas no templo sagrado do seu lar, busque criar um
ambiente que possibilite a sua quietude interna. Crie um espaço de
acolhimento e conforto para si mesma;
• *Use uma joia especial que sinalize a você e a outras pessoas que você
está na lua. Algumas opções são a Pedra da Lua, Garnet, Cornalina etc.
Vale também brincar com as roupas, lençóis e/ou toalhas vermelhas;
• Descanse, escreva, silencie, medite, seja, crie. Que tal desenhar utilizando
seu próprio sangue?
32
• Conecte-se com a natureza, caminhe de pés descalços; receba as
mensagens, ensinamentos e sinais que a Mãe Terra tem para te oferecer
neste momento;
Receitinha da amiga Halana Faria, médica ginecologista à frente do “ginecologia feminista”. Ver mais
26
em http://www.halanafaria.med.br.
33
de nenhum tipo. Isso não significa necessariamente que se você sente cóli-
cas então tem alguma doença. Várias coisas podem estar sendo causadoras
como por exemplo a alimentação inflamatória de que sempre falo – com
excesso de glúten, laticínios, açúcar, industrializados. A falta de exercícios fí-
sicos, falta de boas noites de sono, rotina de trabalho estressante, pequenas
grandes coisas que precisam ser equilibradas. As cólicas também podem vir
diferentes a cada mês, refletindo como foi seu ciclo. Questões emocionais
e sutis costumam estar envolvidas, desde fases complicadas momentâneas
até uma relação difícil com seu feminino desde a adolescência.
A grande maioria das cólicas menstruais se resolve com: calor e repou-
so! O útero é uma musculatura lisa que dói devido a contrações, com o
aquecimento ele relaxa. Chás quentinhos, por exemplo de Camomila, ca-
nela e cravo ou gengibre. Uma sopinha gostosa feita com carinho, meias
nos pés, cobertorzinho, um livro, um filme, música, uma boa conversa (de
preferência livro, filme, música ou conversa tranquilos né) são sem dúvidas
o santo remédio. E claro, a boa e velha compressa quente local. Você pode
fazer uma compressa com ervas ou passar óleo de copaíba com umas goti-
nhas de óleo essencial de lavanda no ventre e botar a bolsa de água quente
por cima. “Ah mas não dá pra parar toda a vida pra fazer isso!” Talvez esteja
exatamente aí o problema. A dor é seu corpo pedindo pausa, pedindo des-
canso, pedindo cuidado. Se cuidar não é fazer exame e tomar remédio. Se
cuidar é muitas vezes apenas ouvir seu corpo e se dar amor.27
27
Texto de contribuição pela médica ginecologista Bel Saide. Ver mais em https://ginecologianatural.
com.br.
34
O s
malefício s
do s
ab s orventes
Hoje em dia, é bem difícil encontrar informações de qualidade a respeito dos ris-
cos e malefícios dos absorventes internos e externos. Além de poucas pesquisas
sobre o assunto, as que existem são abafadas pelas grandes indústrias farmacêuti-
cas e fabricantes destes produtos. Isso é no mínimo confuso para quem quer fazer
uma escolha consciente e conhecer a qualidade/risco do produto que consome.
Conheça sobre alguns dos compostos dos absorventes internos e externos:
36
pesticidas e mais de 90% das vendas de sementes agrícolas geneticamente
modificadas transgênicas.
Isso sem considerar os 13 mil absorventes que cada mulher joga na Terra no
decorrer de toda a sua vida fértil, isso é em média 182 quilos de lixo plástico tóxico
que demora 500 anos que demora para sua decomposição (ou seja, o primeiro
absorvente criado no mundo ainda está entre nós). É hora de repensar!
37
A “força
pré-menstrual”
uma nova perspectiva :
39
A Mandala
da Lua
Esse é um diagrama em que você documenta a cada dia como se sente, para com-
preender os ritmos, as frequências, os arquétipos, as tendências e as limitações de
cada fase do seu ciclo menstrual. Uma mulher pode não estar ciente de qualquer
mudança em seu corpo no decorrer do ciclo mensal, mas as possibilidades de
contraste ajudam a torná-las mais evidentes. Dessa maneira, você entenderá me-
lhor seus processos internos e conseguirá prever como vai estar ou se sentir du-
rante seu ciclo, criando condições mais amorosas e harmônicas para transitá-los.
A Mandala da Lua te oferece a possibilidade de compreender suas reações e
flutuações em cada fase específica, como, por exemplo: o melhor momento de
ter aquela conversa delicada, começar novos projetos, parar e silenciar, trabalhar
e realizar, dormir um pouco mais, compartilhar sua energia ou focar em si mes-
ma e em seus processos pessoais. Além disso, ela te ensina a lidar com sua TPM
(podendo, assim, evitar situações desgastantes ou desagradáveis). Te ajuda a re-
conhecer seu período fértil (para prevenir ou potencializar uma gestação, junto
ao estudo do Método Sintotermal que ensino adiante), te apoia em conhecer seu
próprio corpo. Em um nível mais sutil, ela permite que você possa observar suas
estruturas arquetípicas dominantes – seus padrões limitantes e repetitivos, suas
capacidades e desejos latentes, suas prioridades e potencialidades.
40
Sabemos que muitas vezes a velocidade da nossa vida cotidiana nos impede
de iniciar um novo projeto, mesmo que seja apenas escrever um diário durante 15
minutos. Entretanto, sugiro que você experimente e se dê este presente!
O que faz desse estudo ainda mais interessante, é que ele serve a todas as
pessoas independente do corpo físico. É para pessoas que têm ou não um útero,
para quem ovula ou não, para quem menstrua ou não. Para quem não menstrua
sugiro ainda sim o estudo da Mandala da Lua, começando sempre pela lua nova,
terminando ao fim do ciclo lunar, e comparando os padrões após três meses de
preenchimento e investigação. Para as mulheres em menopausa, vale lembrar
menstruação é criação, e que este período pode ser percebido e sentido de ma-
neira muito mais fluida e orgânica quando as mulheres estão investidas em ativi-
dades artísticas e criativas!
• Fase lunar: consulte o calendário lunar para saber que fase da lua
corresponde a cada dia do ciclo.
Energia física
• Estou disposta? Fazer atividades físicas é fácil ou difícil?
• Me sinto sensual?
28
Inspirado em GRAY, Miranda. Lua vermelha. As energias criativas do ciclo menstrual. São Paulo: Editora
Pensamento, 2017.
41
• Me sinto confortável com alguém perto de mim fisicamente?
Energia emocional
• Me sinto emocionalmente forte e confiante?
• Aceito os outros?
42
Energia mental
• Estou pensando claramente ou estou divagando?
• Estou organizada?
43
Em paz
com a sua
fertilidade
29
Trecho de texto compartilhado pela médica ginecologista Bel Saide. Ver mais: https://ginecologianatu-
ral.com.br/.
44
te impulso dos contraceptivos para a ressignificação dos paradigmas da mulher,
em todos os níveis, entre as décadas de 60 e 70. Esse movimento ajudou mulhe-
res a legitimar nosso poder de escolha e nosso posicionamento sexual diante do
homem (apesar de ter, ao mesmo tempo, induzido à ideia de uma disponibilidade
sexual constante), do prazer, da maternidade, além de promover a nova força da
mulher no meio público, através do exercício profissional e outros papéis sociais.
Não podemos negar a grande eficiência e praticidade desses métodos, muito im-
portantes nos dias de hoje, especialmente em nossas rotinas extenuantes e sobre-
cargas de obrigações.
• Tenho medo de ser fértil (de florescer, de ser a minha melhor versão, de
me expandir)?
30
Por Débora Rosa. Ver mais em: https://www.ginecologistanatural.com.br/.
46
e sobre o próprio corpo? Aliás, considerando-se que as mulheres são férteis durante
apenas alguns dias do ciclo, é irônico pensar que elas arriscam tão vasta gama de
efeitos colaterais. Para quê? Para se proteger de um homem que produz milhões de
espermas por hora. Temos, em média, 15 formas de contraceptivos para mulheres
(entre DIU, diafragma, pílula, anel vaginal, implantes etc.), enquanto existem apenas
3 opções de contraceptivos masculinos: vasectomia, camisinha e gozar fora! Já
pensou que se permitir ser fértil é também um ato político?31
31
Para quem deseja conhecer mais sobre métodos de percepção de fertilidade indico os trabalhos de O
Lado Oculto da Lua, Fertilidade Consciente, Fluencia Corporal e o Programa Online Devir-Mulher, aqui na
DanzaMedicina – com tudo isso e um tanto mais.
47
Ser no mundo
a ciclicidade
a nosso favor
• Aproveitar a fase da TPM para dar espaço à sua urgência criativa, finalizar
e concluir os projetos. Este é o momento para observar quais as questões
internas e externas que impedem sua realização, seu crescimento
profissional e pessoal, que impedem que você viva a realidade que você
quer e deseja. Hora de colocar na balança o que é realmente necessário e
eficiente, o que você quer ou não levar para o novo ciclo. Hora de avaliar
as suas escolhas e entrar em contato com as sombras por trás das suas
intenções, atitudes, vontades e desejos. Momento de enxergar a si mesma
com mais verdade, para crescer em sabedoria e alinhamento neste novo
ciclo que irá em breve se iniciar junto com a menstruação.
49
Vaporização
de
Útero
• O sangue se torna mais claro, mais brilhante, flui com mais facilidade e o
ciclo se torna mais regular. Lembrando que o sangue menstrual deveria
ser vermelho brilhante, não possuir coágulos e fluir com facilidade;
51
• Caso tenha uma infecção vaginal ou ferida aberta
52
Quais ervas utilizar
A regra de ouro é usar ervas comestíveis orgânicas, quer recém-colhidas ou secas.
Algumas tradições oferecem fórmulas à base de plantas específicas para dife-
rentes condições.
Deixe a sua intuição guiá-la para as plantas que você precisa, escolhendo
aquelas pelas quais você se sente atraída.
Para mais inspiração em trabalhar intuitivamente com plantas, um dos meus
livros favoritos sobre o tema são os de Stephen Harrod Buhner.
A oração e a intenção é uma parte importante do trabalho com as plantas e
uma forma potente de acesso à cura além do físico, ouvindo a voz de seu coração,
refinando sua intuição e deixando-se guiar pelo espírito das plantas.
53
concepção. Evite as vaporizações após a concepção. Alecrim, Rosmarinus
Officinalis (aumenta a circulação para os órgãos reprodutivos). Losna,
Artemisia Absinthium (antifúngica e antibacteriana), Manjericão, Ocimum
Basilicum (estimulante uterino). Calêndula, Calendula Officinalis (limpeza,
cicatrização e antiinflamatório). Camomila, Matricaria Chamomilla
(calmante para os tecidos vaginais). Pétalas de rosa vermelhas (resfriamento,
gentileza e adstringente para os tecidos dos órgãos genitais). Lavanda,
Lavandula (antisséptico, antiespasmódico, sedativo, relaxante).
• Blend pós-aborto:
Você pode dar início às vaporizações quando parar de sangrar. Artemísia,
Artemisia Vulgaris (auxilia no fluxo menstrual). Orégano, Origanum
Vulgare (calmante, ativa circulação) Calêndula, Calendula Officinalis
(limpeza, cicatrização e antinflamatório). Lavanda, Lavandula (antisséptico,
antiespasmódico, sedativo, relaxante).
• Blend pós-parto:
Se você passou por uma cesariana, deve esperar um pouco mais para
começar as vaporizações, até que esteja totalmente recuperada. Orégano.
Origanum Vulgare (calmante, ativa circulação). Alecrim. Rosmarinus
Officinalis (aumenta a circulação para os órgãos reprodutivos). Folhas
de Framboesa (fortalece, tonifica e relaxa o útero e músculos pélvicos.
Calêndula, Calendula Officinalis (limpeza, cicatrização e anti-inflamatório).
Mil-folhas, Achillea Millefolium (adstringente, limpeza, antibacteriano).
Confrei, Symphytum Officinale (calmante, cicatrizante, tônica e analgésica).
54
A doença
como
caminho
É importante refletir sobre como os desequilíbrios em nosso corpo físico são por
vezes manifestações de processos internos mais profundos. Estas manifestações
agem como campainhas que nos convidam a entrar em contato com os aspectos
do nosso ser que estão muitas vezes relegados ao inconsciente; como memórias de
dor, crenças limitantes, traumas ou desconexão. Os desequilíbrios relacionados ao
útero, aos ovários ou às mamas podem servir como um convite para uma observação
mais cuidadosa a respeito da nossa relação com o feminino; um corpo que te cha-
ma para que você se perceba, se escute, se cure em níveis mais profundos.
Infelizmente, a medicina convencional ainda caminha em passos lentos em
direção a uma visão de saúde integrativa. Já existem suficientes pesquisas que
comprovam a influência de nossas emoções e padrões mentais na manifestação
de desequilíbrios físicos e existe, porém, uma ignorância crônica e estrutural que
reafirma uma postura de negação, fuga, leviandade e negligência, quando se trata
de apropriar-se do corpo e da saúde em uma perspectiva holística.
Muitas mulheres se esquecem de seu poder de autogestão, e se focam essen-
cialmente em mascarar os sintomas. É sim importante respeitar e compreender
os limites e as possibilidades de cada um, mas é também legítimo pensar neste
processo como uma oportunidade de investigação e cuidado de si. Para isso é
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necessário entrar em contato com questões que lhe são muitas vezes desconfor-
táveis, dolorosas, ou simplesmente complexas – mas em algum nível, possíveis de
serem trabalhadas.
Acredito ser importante estar atenta aos sinais, observar as formas como a vida
está buscando se conectar e se comunicar com você. Acredito ser importante
confiar… confiar na vida e seus processos, como um exercício de entrega, devo-
ção e imanência. Receba cada um desses sinais no seu corpo físico como uma
oportunidade para alcançar uma caminhada mais consciente. Ao compreender a
doença como um caminho para o despertar, você estará dando energia e força
para que o equilíbrio se restabeleça em todos os aspectos de sua vida.
Busque, na medida de suas possibilidades, encontrar apoio de profissionais de
saúde que te gerem confiança na tomada de decisões, que possam te apoiar em
sua forma de ver e pensar o corpo e em suas reflexões sobre a melhor forma de
cuidar de sua saúde e bem-estar.
Outro compartilhamento importante que sinto ser necessário neste dado con-
texto, é de que muitas pessoas que trabalham o corpo como processo psicosso-
mático e abraçam as terapias naturalistas e integrativas, agem por vezes em um
movimento contrário à saúde e ao acolhimento. Rotulam doenças como dese-
quilíbrios psíquicos específicos e acabam por fim culpabilizando o indivíduo pelo
processo de adoecimento, com se isso fosse simplesmente uma questão de esco-
lha e/ou tomada de consciência. Infelizmente (ou felizmente), nem tudo depende
de pensar positivo ou ter uma postura ativa de mudança diante da vida. É comum
dizerem “você tem determinada doença porque você é assim...”, “você irá se curar
se mudar a forma de pensar...”, “você cria a sua realidade e a sua cura depende
de você...”. Bem, em minha perspectiva (e claro, não é uma verdade absoluta), é
preciso ser mais humilde e menos romântico diante do que a vida nos promove
como experiência. Tirar bons aprendizados do adoecimento é diferente de pen-
sar em estratégias psíquicas e espirituais que trazem resoluções imediatas. Como
eu disse anteriormente, repito: A ditadura da naturopatia pode ser tão mesquinha
quanto o uso indiscriminado da medicalização. Seja generosa com você mesma.
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Que seja apenas o início desta tecedura
Terminamos por aqui nossa “Jornada Plenilúnio”. Na verdade, ela apenas começou.
A grande magia desses conhecimentos está em perceber que eles não termi-
nam em si, mas abrem portas para novos universos internos de exploração e des-
cobertas, sim… este é só o começo de algo grandioso que está por vir, individual e
coletivamente. É para isso que seguimos trabalhando!
Seja muito bem-vinda à DanzaMedicina, temos muito a oferecer caso você
sinta o desejo de se aprofundar em seus mergulhos: programas online, retiros
e vivências presenciais, conferências e um tanto mais. Sinta-se acolhida, assim
como você é, e conte conosco para o que quiser e necessitar; estamos juntas
neste caminho e faremos nosso melhor para te apoiar. Confira nossa agenda em
www.danzamedicina.net
Ah, leia hoje com carinho aquelas palavras escritas em seu primeiro dia de
diário… sobre suas impressões a respeito de habitar um corpo que sangra. Algo
mudou por aí?
Mas primeiro, conte a você mesma: escreva a você mesma uma carta contan-
do sobre toda a beleza e o poder de habitar-se. Se amar é um ato revolucionário!
Dúvidas, sugestões, compartilhamentos?
Escreva para nós: connect@danzamedicina.net
Seguimos relembrando,
Morena Cardoso
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2021 Permitida a redistribuição, download e compartilhamento,
mas sempre mencionando o autor, sem modificar a obra e sem utilizá-la para fins comerciais.
Ficha técnica
Imagens
Fotos miolo
Renata Chebel
Luiza Ananias
Melissa Maurer
Papelicula
(As fotos foram feitas especialmente para a DanzaMedicina e sob sua direção)
Capa
Engin Akyurt (unsplash)
Fundos miolo
Fly: D (unsplash)
Desenhos
Acacia excelsa, Benth; Trees, Harvad University Botany Libraries
Projeto gráfico, capa e enexos
Glória Campos (Mangá)
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