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e as suas
flores
rupi kaur
WKHVXQDQGKHUÀRZHUV
traduzido do inglês por
maria santos nunes e
leonor santos nunes
TÍTULO
RVROHDVVXDVÀRUHV
TÍTULO ORIGINAL
WKHVXQDQGKHUÀRZHUV
© 2017, Rupi Kaur
Todos os direitos reservados.
YRFrVVmRDGH¿QLomRGRDPRU
conteúdos
murchar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
cair. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
crescer . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 153
ÀRULU. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 195
as abelhas chegaram à procura do mel
as flores soltaram risadinhas
enquanto se despiam para esse momento
o sol sorriu
– o segundo nascimento
murchar
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– cemitério
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foste-te embora
e eu ainda te queria
mas merecia alguém
que tivesse vontade de ficar
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ontem
a chuva tentou imitar as minhas mãos
tocando no teu corpo todo
rachei o céu ao meio por ter deixado a chuva cair
– ciúmes
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– faz de conta
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os colibris dizem-me
que o teu cabelo está diferente
digo-lhes que isso não me interessa nada
enquanto os fico a ouvir
a descrever cada pormenor
– fome
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– dependência
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o que é o amor
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bem digo-lhe
já não acho que o amor seja ele
se o amor fosse ele
ele estaria aqui não estaria
se ele fosse o tal
seria ele que estaria aí sentado à minha frente não seria
se o amor fosse ele teria sido simples
já não penso que o amor seja ele repito
acho que o amor nunca foi
acho que eu só queria alguma coisa
queria dar-me a qualquer coisa
que acreditasse ser maior do que eu
e quando vi uma pessoa
que provavelmente servia para o efeito
decidi
fazer dele meu companheiro
e eu perdi-me nele
ele usou e abusou
embrulhou-me na palavra especial
até eu ficar convencida de que só tinha olhos para me ver
mãos para me sentir
um corpo só para estar comigo
oh como me deixou vazia
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não podes
entrar e sair de mim
como se eu fosse uma porta giratória
tenho muitos milagres
a acontecer dentro de mim
para ser a opção que mais te convém
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– leal
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eu penso
em ti
mas tu pensas
noutra pessoa
não quero
quem me quer
porque quero outra pessoa
– a condição humana
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perguntas
conta-me amor
como é que a dor correu para ti
como é que o luto doeu
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baby
meu doce
meu amor
desde que nos separámos
quantas vezes imaginaste
que era a minha mão a masturbar-te
quantas vezes me procuraste nas tuas fantasias
e acabaste a chorar em vez de te vires
não me mintas
eu consigo perceber quando mentes
porque tens sempre uma pontinha de
arrogância na tua resposta
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– fantasmas
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tentei chegar a um
mas não houve respostas
no final da última conversa
– desenlace
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perguntas-me
se podemos ser amigos
eu explico-te que uma abelha
não sonha em beijar a boca de uma flor
para depois se contentar com as suas folhas
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ergue-te
disse a lua
e o novo dia chegou
o espetáculo continua disse o sol
a vida não para para ninguém
puxa-te pelas pernas
quer queiras seguir em frente quer não
é essa a dádiva
a vida obriga-te a esquecer as saudades
a pele descama até não haver
nenhuma parte que por eles tenha sido tocada
os teus olhos finalmente só os teus olhos
não os olhos que os fixavam a eles
vais conseguir chegar ao fim
do que é apenas o princípio
vá lá
abre a porta para o que aí vem
– tempo
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cair
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– insensibilidade
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ontem
quando acordei
o sol caiu e rolou pelo chão
as flores degolaram-se a elas próprias
a única coisa com vida aqui sou eu
e quase não sinto que vivo
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muitas vezes
zangamo-nos com outras pessoas
por não fazermos
aquilo que devíamos ter feito por nós
– responsabilidade
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porque
deixaste uma porta
aberta
ali no meio das minhas pernas
foste preguiçoso
esqueceste-te
ou deixaste-me inacabada de propósito
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casa
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– ingrata
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diz-lhes que
eu fui o lugar mais quente que conheceste
e que me tornaste fria
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a ironia da solidão
é que todos a sentimos
ao mesmo tempo
– juntos
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mordo os lábios
e pergunto se está quase a acabar
– salão de estética
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– vive plenamente
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eras meu
e a minha vida era cheia
já não és meu
e a minha vida
é cheia
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os meus olhos
fazem de espelho
qualquer superfície refletora por onde passem
à espera de ver alguém belo a olhar para eles
os meus ouvidos pedem elogios
mas por mais longe que procurem
nada me satisfaz
vou a clínicas e a lojas
à procura de poções de beleza e novas técnicas
já tentei lasers
já tentei tratamentos faciais
já tentei micropigmentação e cremes caros
e por um minuto de esperança preenchem-me
fazem-me brilhar de orelha a orelha
mas assim que me sinto bonita
a magia desaparece de repente
precisamente onde a devia encontrar
estou disposta a pagar qualquer preço
por uma beleza que faça virar cabeças
a toda a hora noite e dia
– a busca interminável
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– introvertido
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como o arco-íris
depois da chuva
a alegria revelar-se-á
depois da mágoa
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apesar de saberem
que não vão durar muito
mesmo assim decidem viver
a sua vida esplendorosa
– girassóis
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quando a vires
diz-lhe que não há um dia que passe
em que eu não pense nela
aquela miúda que acha que tu és
tudo aquilo que ela sempre desejou
quando a empurras contra a parede
e ela chora
diz-lhe que choro com ela
o barulho da parede de gesso a partir-se aos bocados
quando é espancada com a cabeça dela
também vive nos meus ouvidos
diz-lhe para correr para mim
já tirei a porta das dobradiças
abri todas as janelas
lá dentro há um banho quente já preparado
ela não precisa desse género de amor que lhe dás
eu sou a prova de que ela se vai libertar
e encontrar o caminho de volta para ela
se eu consegui sobreviver a ti
também ela há de conseguir
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a arte de crescer
mamas
diziam
e eu odiava essa palavra
odiava ter vergonha de dizer essa palavra
que apesar de se referir ao meu corpo
não me pertencia
era deles
e eles repetiam-na como
se estivessem a meditar sobre ela
mamas
disse ele
deixa-me ver as tuas
não há nada para ver aqui a não ser a culpa e a vergonha
tentei apodrecer na terra que pisava com os pés
mas continuo a um palmo de distância
dos seus dedos obcecados
e quando ele investe para se babar nas minhas meias luas
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– comunidade
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não choro
porque sou infeliz
choro porque tenho tudo
e no entanto sou infeliz
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deixa ir
deixa partir
deixa que aconteça o que acontecer
nada
neste mundo
te foi prometido
nem nada te pertence
– só te tens a ti mesmo
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sim
é possível
odiar e amar alguém
ao mesmo tempo
faço isso todos os dias
a mim própria
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algures no caminho
perdi o amor-próprio
e tornei-me o meu pior inimigo
pensei que já tinha visto o demónio
nos tios que nos tocavam quando éramos crianças
nos gangues que pegaram fogo à nossa cidade
mas nunca vi ninguém com tanta fome
da minha carne como eu
arranquei a minha pele só para me sentir viva
vestia-a do avesso
deitei-lhe sal por cima só para me castigar
a agitação bloqueou os meus nervos
o meu sangue coalhou
tentei até enterrar-me viva
mas a terra mostrou repulsa
já apodreceste disse
não há nada que eu possa fazer
– ódio-próprio
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– automutilação
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– amor-próprio
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– aceitação
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tens tanto
mas queres sempre mais
para de ansiar pelas coisas que não tens
e olha para aquilo que tens
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criar raízes
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– imigrante
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– verde e azul
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– campo de refugiados
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– lições da mamã
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– descansa em paz
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– barco
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e se chegarmos à porta
e nos baterem com ela na cara perguntei
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as fronteiras
são feitas pelo homem
só nos separam fisicamente
não deixem que nos virem
uns contra os outros
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depois da operação
diz-me
que estranho
terem acabado de me tirar
a primeira casa dos meus filhos
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– circunstâncias
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o meu deus
não está parado à espera numa igreja
nem sentado ao cimo das escadarias de um templo
o meu deus
é o fôlego do refugiado quando vai a fugir
vive na barriga da criança faminta
no coração do protesto
o meu deus não mora entre páginas
escritas por homens santos
o meu deus
vive entres as coxas suadas
das mulheres que se vendem por dinheiro
a última vez que foi visto, lavava os pés de um sem-abrigo
o meu deus
não é tão inacessível
como eles queriam que pensássemos
o meu deus bate dentro de nós infinitamente
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tive um sonho
vi a minha mãe
com o amor da sua vida
e não havia filhos
nunca a tinha visto tão feliz
– e se
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– colonizar
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a minha voz
é o fruto
de dois países que chocaram um com o outro
qual é o mal
de o inglês
e a minha língua materna
terem feito amor
a minha voz
é o pai das suas palavras
e a mãe da sua pronúncia
qual é o mal
de a minha boca carregar dois mundos
– pronúncia
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140
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depois desorientação
anos a imaginar aquele momento
a ensaiar as palavras
mas a boca parece que se esqueceu de tudo
sentiu um pontapé no estômago
quando viu as sombras que lhe cercavam os olhos
e os ombros que carregavam um peso que não se via
parecia que lhe tinham sugado a vida
141
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e se
não houver tempo suficiente
para lhe dar tudo o que ela merece
acham
que se eu pedir aos céus com muita força
a alma da minha mãe
podia voltar para mim como minha filha
para eu lhe poder dar
o conforto que ela me deu
toda a minha vida
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– testemunha de um milagre
143
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1790
ele tira menina acabada de nascer dos braços da esposa
leva-a até ao quarto ao lado
segura-lhe a cabeça com a mão esquerda
e gentilmente estala-lhe o pescoço com a direita
1890
uma toalha molhada para a embrulhar
em grãos de arroz e
areia no nariz
uma mãe conta o truque à nora
fui obrigada a isso diz ela
tal como a minha mãe
e a mãe dela
1990
uma notícia num jornal diz
foram encontradas cem recém-nascidas enterradas
nas traseiras da casa de um médico numa aldeia vizinha
a esposa fica a pensar se terá sido para ali que ele a levou
imagina a sua filha a tornar-se a terra
que aduba as raízes que alimentam este país
1998
a oceanos de distância numa cave de toronto
um médico dá assistência a um aborto ilegal
é uma mulher indiana que já tem uma filha
uma já é um fardo pesado diz ela
144
rupi kaur
2006
é mais fácil do que pensas dizem as minhas tias à minha mãe
elas conhecem uma família
que já o fez três vezes
conhecem uma clínica. se ela quiser arranjam-lhe
o número de telefone. o médico até receita comprimidos
para nascerem rapazes.
já trataram uma mulher que mora no fim da rua dizem
e agora ela tem três rapazes
2012
doze hospitais na área de toronto
só revelam o sexo do bebé às famílias
às 30 semanas de gravidez
os doze hospitais pertencem a zonas onde há
muita imigração do sul asiático
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lembra-te do corpo
da tua comunidade
respira as pessoas
que te teceram
foste tu que te tornaste tu próprio
mas os que vieram antes de ti
fazem parte da tua textura
– honrar as raízes
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148
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inglês macarrónico
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150
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mais vírgulas
para no fim perceber que há coisas
no mundo tão infinitas
que nunca podem ter um ponto final
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crescer
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sinto-me apreensiva
porque apaixonar-me por ti
significa desapaixonar-me por ele
não estava preparada para isso
– seguir em frente
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será bem-vindo
um companheiro
que seja meu igual
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– a meio do caminho
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estou a tentar
não te cobrar pelos erros dos outros
estou a tentar aprender
que não és responsável
pelas minhas feridas
como posso castigar-te
pelo que não fizeste
usas as minhas emoções
como uma farda engalanada
não és frio nem
selvagem nem esfomeado
és medicinal
tu não és eles
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166
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– celebração
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um
homem
que chora
– uma bênção
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– checklist
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às vezes
proíbo-me
de dizer as palavras em voz alta
como se por saírem da minha boca muitas vezes
as gastasse
– amo-te
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– dedos
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esta manhã
disse às flores
o que faria por ti
e elas abriram-se
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– sexo
177
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– à distância
178
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sou
feita de água
claro que me emociono facilmente
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– o tal
180
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a lua é responsável
por sublevar as marés
da águas calmas
amor
eu sou as águas calmas
e tu és a lua
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182
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quando estás
cheio
e eu estou
cheia
somos dois sóis
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quando a morte
me segurar na mão
seguro-te com a outra
e prometo encontrar-te
em todas as vidas
– compromisso
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foi como se
tivessem enfiado cubos de gelo
por dentro da minha t-shirt
– orgasmo
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já
estiveste
dentro de mim
– outra vida
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ser
duas pernas
num só corpo
– uma relação
190
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deves ter
um favo de mel
no lugar do coração
senão
como podia um homem
ser tão doce
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– a conquista
192
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193
florir
rupi kaur
o universo empenhou-se em ti
esculpiu-te para oferecer ao mundo
uma coisa diferente de tudo e todos
quando duvidas
de como foste criado
duvidas de uma energia maior do que nós os dois
– insubstituível
197
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198
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199
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nunca mais
vou comparar o meu caminho com o dos outros
200
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201
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muitos tentaram
mas não conseguiram apanhar-me
sou o fantasma dos fantasmas
em toda a parte e em parte nenhuma
sou truques de magia
na magia da magia
que ninguém conseguiu desvendar
sou um mundo envolto em mundos
dobrado em sóis e luas
podes tentar mas
não vais conseguir pôr-me as mãos em cima
202
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quando nasci
a minha mãe disse
tens deus em ti
consegues senti-lo a dançar
204
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205
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sou da terra
e à terra voltarei outra vez
a vida e a morte são velhas amigas
e eu sou a conversa que elas têm
sou a tagarelice pela noite fora
as gargalhadas e as lágrimas
o que há a recear
se sou a dádiva que dão uma à outra
este lugar nunca me pertenceu
sempre fui delas
206
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odiar
é uma coisa fácil e para preguiçosos
mas amar
requer força
toda a gente tem
mas nem todos estão
dispostos a praticar
207
RVROHDVVXDVÀRUHV
linda morena
o teu cabelo espesso é um casaco de visom que nem todos
podem comprar
linda morena
detestas a hiperpigmentação
mas a tua pele não consegue evitar
sorver todo o sol que conseguir
és um íman para a luz
monocelha – a ponte entre dois mundos
vagina – muito mais escura do que as outras
porque quer esconder uma mina de ouro
as olheiras tê-las-ás muito cedo
– aprecia as auréolas
morena linda
consegues arrancar deus das entranhas deles
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rupi kaur
– obrigada
209
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210
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212
rupi kaur
estou
no topo dos sacrifícios
de milhões de mulheres antes de mim
a pensar
que posso fazer
para tornar mais alta esta montanha
para que as mulheres depois de mim
possam ver mais longe
– herança
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– funeral
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– família
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– monocelha
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– os problemas do papá
não são brincadeira nenhuma
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222
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– humana
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é uma bênção
ser da cor da terra
sabes quantas vezes
as flores me confundem com a sua casa
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– remédio
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és um espelho
se continuas a matar-te fome de amor
só irás conhecer pessoas que também
te vão matar à fome de amor
se te encheres de amor
o universo dar-te-á
os que te vão amar também
– contas simples
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– tapada/destapada
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há montanhas a crescer
debaixo dos nossos pés
que não podem ser detidas
tudo aquilo por que passámos
preparou-nos para isto
tragam os vossos martelos e punhos
temos muitos preconceitos para derrubar
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convenceram-me
de que só tinha mais uns anos pela frente
antes de ser trocada por uma rapariga mais nova
como se os homens ganhassem energia com a idade
e as mulheres se tornassem insignificantes
podem ficar com as mentiras deles
porque ainda agora comecei
parece que acabei de sair do útero
os meus vintes são o aquecimento
para aquilo que realmente vou fazer
espera até eu chegar aos trintas
verás uma bela exibição
da terrível. indomável. mulher que há em mim.
como me posso ir embora se a festa ainda nem começou
os ensaios começam aos quarenta
fico mais madura com a idade
não tenho prazo de validade
e agora
o grande evento
as cortinas abrem-se os cinquenta
o espetáculo vai começar
– intemporal
234
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para te curares
tens de
ir ao fundo
da ferida
e beijá-la até ao cimo
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236
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237
RVROHDVVXDVÀRUHV
agora
não é altura
de ficarmos caladas
nem de vos dar espaço a vocês
quando não tivemos direito a espaço nenhum
agora
é a nossa hora
de denunciarmos
de falarmos tão alto quanto for preciso
até nos ouvirem
238
rupi kaur
a representação
é vital
de outra forma a borboleta
rodeada de traças
incapaz de se ver a ela própria
continuará a tentar ser como as traças
– representação
239
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aceita o elogio
não fujas com vergonha
de mais uma coisa que te pertence
240
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– progresso
241
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– mantém o passo
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243
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244
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se nunca ficaste
do lado dos oprimidos
ainda vais a tempo
– incentiva-os
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não tens
de te preocupar
com mais nada
o sol e as suas flores estão aqui.
248
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250
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251
RVROHDVVXDVÀRUHV
– sobre a autora
252
rupi kaur
253
RVROHDVVXDVÀRUHV
– sobre o livro
254
rupi kaur
255