Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
A MONARQUIA E OS BANHOS DE
MAR: O CASO BRASILEIRO
Rio de Janeiro
jul./set. 2016
147
Resumo: Abstract:
Este artigo situa a atitude dos membros da fa- This article assesses the attitude of the members
mília real brasileira em relação às práticas de of the Brazilian royal family towards the prac-
banho de mar adotadas pelas realezas europeias. tice of sea-bathing, as adopted by European
Relata a presença de D. João, Carlota Joaqui- royalties. It discusses the presence of D. João,
na, Pedro I, Pedro II, Tereza Cristina e Isabel Carlota Joaquina, Pedro I, Pedro II, Tereza
nas praias de banho da Corte Imperial. Analisa Cristina and Isabel on the bathing beaches of
como o exemplo tímido dado pelos monarcas the Imperial Court. We analyze how the timid
brasileiros deixou a aristocracia do Rio de Ja- example given by the Brazilian monarchs left
neiro indiferente aos banhos de mar e atrasou a the aristocracy of Rio de Janeiro indifferent to
adesão dos cariocas à sua prática. sea bathing and delayed the adherence of the
Cariocas to this practice.
Palavras-chave: Banhos de mar; Monarquia; Keywords: Sea baths; monarchy; Rio de Ja-
Rio de Janeiro. neiro.
Ao contrário do que sugere a anedota do rei nu,25 não havia nem lei
nem costume, no tempo das monarquias fortes, que impedisse um sobera-
Por essa época, a filha mais velha do casal, a princesa Isabel, também
fazia uso dos banhos de mar, como parte de um tratamento médico, em
resposta ao seu “temperamento linfático (...), a um certo grau de cloro-
-anemia que se notava em seu hábito externo, bem como aos sintomas
evidentes de um vício herpético”.32 Não era evidente a eficácia dessa tera-
pêutica, mas Sua Alteza insistiu nos banhos de mar. De 1886 a 1889, sem-
pre na primavera, Isabel instalou-se no seu palácio da rua da Guanabara,
em Laranjeiras, de onde saía, no final da tarde, para o banho da praia do
Flamengo, em companhia do esposo, o conde d’ Eu.33
ladeira dos Tabajaras), que, escalando o morro de São João, ligava o final
da rua Real Grandeza, em Botafogo, à primeira via traçada em Copaca-
bana, a rua do Barroso (atual rua Siqueira Campos). Agora, era possível
alcançar o lugar por meio de veículos, atenuando-se o sacrifício dos pe-
regrinos que demandavam a Igrejinha de Nossa Senhora de Copacabana,
única edificação da localidade, além das cabanas de pescadores que a
rodeavam.36 Nessas condições, parte do povo carioca se animou a ir ver
as famosas baleias. E o jovem Imperador, acompanhado da esposa e das
duas filhinhas, também se colocou a caminho, na manhã de 22 de agosto.
Não era por acaso, mas pela defesa deliberada de um estilo de vida
e ao mesmo tempo de uma política de Estado, que o monarca brasileiro
desprezava as oportunidades de conferir à sua vida pessoal a espetacula-
ridade em que investiam os seus colegas europeus para bem governar. Os
banhos de mar dos Bragança, no Rio de Janeiro, eram de uma intimidade
essencialmente burguesa.
nas ruas, onde aristocracia e diplomacia podiam fazer valer sua elegância.
Aí Pedro II passeava à vontade ao lado dos súditos, como naquele dia em
Copacabana.42
42 – SCHWARCZ, Lilia Moritz. Op. cit., pp. 231-244; CARVALHO, José Murilo de. Op.
cit., p. 95; KOSERITZ, Carl Von. Imagens do Brasil, pp. 61-68; RENAULT, Delso. O Rio
antigo nos anúncios de jornais 1808-1850, p. 236.
Referências bibliográficas
ANDERSEN, Hans Christian. Contos de Andersen. Tradução: Louisa Ibañez dos
Santos. São Paulo: Editorial Bruguera, 1969.
BERGER, Eneida e Paulo. Copacabana – História dos Subúrbios. Rio de Janei-
ro: Departamento de História e Documentação da Prefeitura do Distrito Federal,
s/d.
CARVALHO, José Murilo de. D. Pedro II. São Paulo: Companhia das Letras,
2007.
Copacabana 1892-1992 – subsídios para a sua história. Rio de Janeiro: Comis-
são Organizadora das Comemorações do I Centenário do Bairro de Copacabana,
1992.
CORBIN, Alain. O território do vazio – A praia e o imaginário ocidental. Tradu-
ção: Paulo Neves. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
CAVALCANTI, Nireu. A reordenação urbanística da nova sede da Corte. In Re-
vista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro, v. 436, pp.
149-199, 2007.
Correio Mercantil.
Diário do Comércio.
Diário do Rio de Janeiro.
DUNLOP, Charles Julius. Rio Antigo. Rio de Janeiro: Laemert, 1956.
EDMUNDO, Luiz. A Corte de D. João no Rio de Janeiro (1808-1820), 2ª edi-
ção. Rio de Janeiro: Conquista, 1957.
EBEL, Ernst. O Rio de Janeiro e seus arredores em 1824. Tradução: Joaquim de
Sousa Leão Filho. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1972.
ELIAS, Norbert. A sociedade de corte. Tradução: Ana Maria Alves. Lisboa: Es-
tampa, 1987.
FLETCHER, James Cooley, e KIDDER, Daniel Parish. Tradução: Elias Dolia-
niti. O Brasil e os brasileiros: esboço histórico e descritivo. Companhia Editora
Nacional, 1941.
Folha Nova, A.
FREYRE, Gilberto. Ordem e Progresso, 4ª edição. Rio de Janeiro: Record,
1990.
GERSON, Brasil. A história das ruas do Rio. Rio de Janeiro: Livraria Brasiliana
Editora, 1965.
Gazeta da Tarde.
Gazeta de Notícias.
Gazeta do Rio de Janeiro.
Idade d’ Ouro do Brasil.
LADURIE, Emmanuel Le Roy. Saint-Simon ou o sistema da Corte. Tradução:
Sergio Guimarães. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.
LENCEK, Lena e BOSKER, Gideon. The beach – the history of paradise on
earth. New York: Penguin Books, 1999.
LUSTOSA, Isabel D. Pedro I – Um herói sem nenhum caráter. São Paulo: Com-
panhia das Letras, 2006.
LYRA, Heitor. História de D. Pedro II – Ascensão. São Paulo: Companhia Edi-
tora Nacional, 1939.
MACEDO, Joaquim Manuel de. Memórias da Rua do Ouvidor. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1988.
MARTIN-FUGIER, Anne. Os ritos da vida privada burguesa. In ARIÈS, P., E.
DUBY, G. História da vida privada – Da Revolução Francesa à Primeira Guer-
ra. Tradução: Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.
MONTEIRO, Tobias. História do Império: a elaboração da Independência.
Belo Horizonte e São Paulo: Itatiaia e Edusp, 1981.
NORTON, Luiz. A Corte de Portugal no Brasil. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1938.
Paiz, O.
PEREIRA, Antonio Batista. Figuras do Império e outros ensaios. São Paulo:
Companhia Editora Nacional, 1931.
Progresso Médico, O.
RAUCH, André. Les vacances et la nature revisitée (1830-1939). In CORBIN,
Alain et al. L’Avènement des loisirs 1850-1960. Paris: Flamarion, 1995.
RENAULT, Delso. O Rio Antigo nos anúncios de jornais, 1808-1850. Rio de
Janeiro: José Olympio, 1969.
____. Rio de Janeiro: a vida da cidade refletida nos jornais 1850-1870. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
REZZUTTI, Paulo. D Pedro, a história não contada. São Paulo: Leya,
2015.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. As barbas do Imperador – D. Pedro II, um monarca
nos trópicos, 2ª edição. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
SILVA, Camila Borges da. O Símbolo Indumentário: distinção e prestígio no Rio
de Janeiro (1808-1821). Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura; Arqui-
vo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, 2010.
SOUSA, Octavio Tarquínio de. A vida de D. Pedro I. Belo Horizonte: Itatiaia,
1982.
TAUNAY, Afonso de E. O Rio de Janeiro de antanho: impressões de viajantes
estrangeiros. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1938.
TRAVIS, John K. Continuity and change in english sea-bathing, 1730-1900: a
case of swimming with the tide. In FISCHER, Stephen. Recreation and the sea.
Exeter: University of Exeter Press, 1997.
VEBLEN, Thorstein. Teoria de la classe ociosa. Tradução: Vicente Herrero. Mé-
xico: Fondo de Cultura Económica, 1974.
WEBER, Eugen. França fin-de-siècle. Tradução: Rosaura Eichenberg. São Pau-
lo: Companhia das Letras, 1988.