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ANÁLISE DO COMPORTAMENTO
APLICADA (ABA) PARA TEA E
DEFICIÊNCIA INTELECTUAL.
2

Mary Cristina Olimpio Pinheiro

ANÁLISE DO COMPORTAMENTO APLICADA


(ABA) PARA TEA E DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
1ª edição

São Paulo
Platos Soluções Educacionais S.A
2023
3

© 2023 por Platos Soluções Educacionais S.A.

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Fernanda Cristina Silva Sepe

Editorial
Beatriz Meloni Montefusco
Carolina Yaly
Márcia Regina Silva
Paola Andressa Machado Leal

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


_____________________________________________________________________________
Pinheiro, Mary Cristina Olimpio
P654a Análise do comportamento aplicada (ABA) para TEA e
deficiência intelectual/ Mary Cristina Olimpio Pinheiro, –
São Paulo: Platos Soluções Educacionais S.A. 2023.
32 p.

ISBN 978-65-5356-478-7

1. Conceitos 2. Comportamento 3. Avaliar. I.Título.

CDD 150
_____________________________________________________________________________
Raquel Torres – CRB 8/10534

2023
Platos Soluções Educacionais S.A
Alameda Santos, n° 960 – Cerqueira César
CEP: 01418-002— São Paulo — SP
Homepage: https://www.platosedu.com.br/
4

ANÁLISE DO COMPORTAMENTO APLICADA


(ABA) PARA TEA E DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

SUMÁRIO

Apresentação da disciplina ___________________________________ 05

A Ciência da Análise do Comportamento______________________ 07

Princípios da Análise do Comportamento Aplicada____________ 19

O Comportamento Verbal na prática em ABA_________________ 32

Planejamento e processos de ensino com base em ABA


relacionados ao TEA___________________________________________ 44

Análise do Comportamento Aplicada ao ensino de pessoas com


deficiência Intelectual_________________________________________ 56

Planejamento e processos de ensino em ABA relacionados a


deficiência intelectual_________________________________________ 68
5

Apresentação da disciplina

Na disciplina Análise do comportamento aplicada (ABA) para o Transtorno


do Espectro Autista (TEA) e Deficiência Intelectual, você aprenderá sobre
os principais conceitos, estratégias e indicativos científicos de quanto
essa ciência vem auxiliando no ensino de pessoas desses públicos em
específico.

Os objetivos gerais da disciplina são:

• Analisar o desenvolvimento histórico e epistemológico do


Behaviorismo.

• Compreender a construção da Análise do Comportamento


Aplicada (ABA).

• Estudar as pesquisas relevantes, derivadas da aplicação da técnica


em pessoas com TEA e Deficiência Intelectual.

A disciplina está dividida em seis temas:

No tema 1, você conhecerá a ciência Análise do Comportamento e sobre


a história da filosofia que embasa essa ciência, o Behaviorismo.

No tema 2, será apresentado o que é a ABA, os conceitos que a


embasam e como se inicia historicamente a relação entre ABA e TEA.

No tema 3, você aprenderá sobre o comportamento verbal, seus


diferentes tipos e a importância de sua avaliação para prática em ABA.
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No tema 4, serão abordados aspectos importantes para a prática


em ABA, desde sua avaliação até os diferentes modelos de ensino
que fundamentam, estratégias específicas para pessoas com TEA e
deficiência intelectual.

No tema 5, serão apresentados alguns comportamentos característicos


ao diagnóstico de Deficiência Intelectual, e como a ABA está associada
ao ensino desde público.

Por fim, no tema 6, você conhecerá algumas estratégias específicas para


práticas voltadas a Deficiência Intelectual com base nesta ciência.

A ABA tem se consolidado cientificamente como efetiva na promoção


de aprendizagens de pessoas com autismo e deficiência intelectual.
Por isso, esta disciplina é toda voltada ao seu enriquecimento teórico e
prático, proporcionando maior familiarização com o tema, caso tenha
interesse em trabalhar com ABA na prática.

Bons estudos!
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A Ciência da Análise do
Comportamento
Autoria: Mary Cristina Olimpio Pinheiro
Leitura crítica: Fernanda Cristina Silva Sepe

Objetivos
• Conceituar e diferenciar Análise do Comportamento de
Behaviorismo.

• Apresentar as principais bases epistemológicas do


Behaviorismo.

• Diferenciar Behaviorismo Metodológico de


Behaviorismo Radical.
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1. A Análise do Comportamento

A Psicologia é múltipla no seu olhar sobre o mundo, o que proporciona


concepções diferentes sobre o entendimento do comportamento
humano, a depender do referencial teórico que se observe. Agora você
estudará como a Psicologia enxerga o mundo por meio das lentes da
Análise do Comportamento.

A Análise do Comportamento é considerada uma ciência. Isso quer dizer


que seus conhecimentos produzidos podem ser testados, repetidos,
avaliados e mesmo reavaliados por diferentes cientistas com base em
métodos científicos reproduzíveis (MOREIRA; HANNA, 2012).

Já que a Análise do Comportamento é uma ciência, você sabe qual é o


seu objeto de estudo? Muitos vão responder que é o comportamento.
Porém, apesar de parecer uma resposta simples, é importante você
compreender qual o significado de comportamento para esta ciência, já
que mesmo na Psicologia a palavra pode ter diferentes significados.

O termo comportamento, apesar de ser de uso diário e sobre um


fenômeno em princípio simples, envolve uma série de contradições e
ambiguidades, usos justapostos, diferentes palavras em diferentes idiomas
e culturas gerais e acadêmicas. Vale lembrar, inclusive, que, na Psicologia,
lidamos com termos os quais, muitas vezes, são de uso cotidiano da vida
social, mas que adquirem uma dimensão epistêmica e prática muito
específica. (POLACO; BERIA; MIRANDA, 2021, p. 165)

A compreensão sobre o que é comportamento mudou e evoluiu ao


longo da história do Behaviorismo, inclusive pode-se ter variações de
classificações de comportamento, como o comportamento reflexo,
comportamento operante, comportamento social, comportamento
verbal, entre outros. Dessa forma, mais assertivo do que dizer que o
objeto de estudo é o comportamento, pode-se compreender a Análise
9

do Comportamento como a ciência que estuda o ser humano a partir de


sua interação com o ambiente (MOREIRA; MEDEIROS, 2018).

O uso do termo “interação” não é por acaso e implica analisar as


experiências individuais como um processo de retroalimentação.
Cada interação do indivíduo com seu ambiente altera o modo como
as interações seguintes ocorrerão, caracterizando um processo
extremamente dinâmico e complexo. (MOREIRA; HANNA, 2012, p. 6)

Cabe destacar que para Análise do Comportamento o conceito de


ambiente não está relacionado exatamente ao lugar físico que a pessoa
está, como uma escola, casa ou trabalho. O ambiente é definido como
“aspectos do mundo que um organismo é capaz de perceber”, e que
assim exercessem influência sobre o comportamento (MOREIRA;
HANNA, 2012, p. 21). Os autores Moreira e Medeiros (2018, p. 213)
exemplificam que o ambiente pode referir-se “ao mundo físico (as coisas
materiais), ao mundo social (interação entre outras pessoas), a nossa
história de vida e à nossa interação com nós mesmos”.

Para Moreira e Hanna (2012), a importância de analisar o


comportamento por meio de suas interações não está em observar
apenas como a pessoa age no seu dia a dia, mas observar em que
condições ela se comporta desse modo, e o que ela recebe de
consequências do ambiente para continuar se comportando.

Para que fique mais claro para você, pense em um psicólogo que recebe
uma criança no consultório com a queixa de que ela tem se jogado
no chão e começado a chorar. Apenas com essas informações, você
conseguiria dizer porque ela se comporta desse modo? Não é possível
determinar porque a criança tem agido assim, sendo preciso investigar
por meio de algumas indagações iniciais, por exemplo: Onde a criança se
comporta assim? Quem está com a criança nesses momentos? O que faz
com que ela pare esse comportamento? Entre muitos outros fatores que
serão importantes, para determinarmos por que a criança tem se jogado
no chão.
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Como esclarecem os autores Moreira e Hanna (2012), qualquer


comportamento deve ser analisado por meio de suas relações entre
eventos, cabendo ao analista do comportamento identificar e modificar
essas relações.

Agora que você já sabe o que é a Análise do Comportamento e qual seu


objeto de estudo, você irá aprender sobre a história do Behaviorismo,
pois isso auxiliará a você entender a atual compreensão do objeto de
estudo da Análise do Comportamento.

2. Behaviorismo – a filosofia da Análise do


Comportamento

Você já ouviu por aí o termo Behaviorismo e achou que fosse a mesma


coisa que Análise do Comportamento? Pois bem, apesar de comumente
serem utilizados como sinônimos, possuem sentidos diferentes. O termo
Behaviorismo é uma palavra em inglês que deriva do termo behavior,
que traduzida para o português significa comportamento, o que pode
ter contribuído para que muitos façam essa associação de similaridade.

Para Baum (2018, p.16), o Behaviorismo é um “[...] conjunto de ideias


sobre essa ciência chamada análise comportamental, e não a ciência em
si, o behaviorismo não é propriamente uma ciência, mas uma filosofia
da ciência”. Logo, a Análise do Comportamento é um termo muito mais
amplo, que se embasa na filosofia denominada como Behaviorismo.

Não existe um modo único de pensar no Behaviorismo, inclusive


o autor Baum (2018) afirma que os behavioristas divergem quanto
ao entendimento do que é behaviorismo, mas concordam com a
possibilidade de uma ciência do comportamento. Além disso, a autora
Chiesa (2006) deixa posto o quanto não há uma única forma do
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Behaviorismo ser apresentado historicamente, sendo complexo traçar


uma linha histórica linear entre os acontecimentos.

Diante disso, nos próximos tópicos serão destacados os trabalhos


de Ivan Petrovich Pavlov, John Broadus Watson e Burrhus Frederic
Skinner. Isso auxiliará a você conhecer fatos importantes para história
do Behaviorismo, assim como diferenciar entre os dois principais
momentos que constituem esta filosofia: o Behaviorismo Metodológico e
o Behaviorismo Radical.

2.1. Os estudos de Ivan P. Pavlov

Ivan Petrovich Pavlov foi um fisiologista russo que por meio de seus
experimentos mostrou a possibilidade de estudos fisiológicos serem
conduzidos em seres ainda vivos (CHIESA, 2006). Seu estudo mais
conhecido leva seu próprio nome, Cães de Pavlov, e possibilitou a
observação da aprendizagem de novos comportamentos reflexos, o
que foi chamado de condicionamento reflexo ou Condicionamento
Pavloviano (MOREIRA; MEDEIROS, 2018).

Para compreender o funcionamento do experimento de


condicionamento reflexo, é importante que você lembre o que é um
comportamento reflexo. Moreira e Medeiros (2018) o definem como
uma relação entre um estímulo e uma resposta específicos. Sendo o
estímulo uma mudança ocorrida no ambiente, e a resposta o efeito que
se produz no organismo, por exemplo, quando você se aproxima de
uma comida gostosa (estímulo) e sua boca começa involuntariamente a
salivar (resposta).

Os comportamentos reflexos são inatos, pois nascem com os seres


vivos. O que Pavlov demonstrou por meio do experimento Cães
de Pavlov foi que alguns comportamentos reflexos poderiam ser
aprendidos. Segundo Moreira e Medeiros (2018) o experimento
aconteceu da seguinte forma: primeiro os cães ficaram privados de
12

alimentação, sendo observado que eles começavam a salivar (resposta)


assim que viam a comida (estímulo). Também foi observado que o
som produzido por um sino era um estímulo neutro para eles, não
produzindo reações fisiológicas como a saliva. Foi então realizada o
emparelhamento do som do sino com a apresentação da comida, ou
seja, toda vez que eles iam receber a comida o sino era tocado. Passado
um tempo, sendo repetida várias vezes a associação de estímulos, entre
som do sino e comida, o sino, que antes era um estímulo neutro passou
a ser um estímulo que também gerava a resposta da salivação, já que os
cães tinham associado o sino a saber que iriam receber a comida.

Para Chiesa (2006) os estudos de Pavlov proporcionaram mudanças


de perspectivas na Fisiologia e também da Psicologia da época, que
predominantemente explicava o comportamento humano por meio
de respostas mentalistas. A autora também destaca que o fisiologista
impactou diretamente os estudos de John Broadus Watson e Burrhus
Frederic Skinner, os dois nomes mais influentes do Behaviorismo.

2.2. O nascer do Behaviorismo – O Behaviorismo


Metodológico

A história do Behaviorismo se inicia ao longo do próprio surgimento da


Psicologia. E é no século XIX que a Psicologia começa a se construir como
ciência, os autores Moreira e Hanna (2012) indicam como marcos os
estudos de Gustav Fechner e Wilhelm Wundt, assim como a criação do
primeiro laboratório de Psicologia Experimental por Wundt, na cidade
de Leipzig, na Alemanha. Neste período o objeto de estudo da Psicologia
estava voltado para a compreensão do funcionamento da consciência,
utilizando para isso métodos introspectivos.

Segundo Baum (2018, p. 20), a Psicologia do século XIX era então


chamada de “ciência da mente”.
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A palavra grega psique significa algo semelhante a “espírito”, porém mente


parecia menos especulativo e mais passível de estudo científico. Como
estudar a mente? Os psicólogos propuseram a adoção de métodos dos
filósofos: a introspecção. Se a mente era um palco ou uma arena, então
deveria ser possível olhar dentro dela e ver o que estava ocorrendo; esse
era o sentido da palavra introspecção. (BAUM, 2018, p. 20)

Cabe destacar que, esse pensar no funcionamento da consciência


implicava perceber o homem de forma dualista. Já que “muitas vezes, o
mental, o interno, foi identificado com o subjetivo, enquanto o objetivo
foi identificado com o físico e o externo” (POLACO; BERIA; MIRANDA,
2021, p. 167). Uma divisão entre interno e externo, mental e físico.

John Broadus Watson, psicólogo estadunidense, era um crítico aos


métodos introspectivos, para ele “as ciências naturais não se preocupam
com a consciência ou introspecção, e nem a psicologia deveria fazê-lo”
(CHIASA, 2006, P. 167).

Em busca de um novo olhar sobre a Psicologia, em 1913, Watson publica


o artigo Psychology as the behaviorist view it, traduzido para o português
“A Psicologia como um behaviorista a vê”, que junto a outros artigos do
mesmo autor é denominado de “Manifesto behaviorista”, e o que faz de
Watson o fundador do Behaviorismo (MOREIRA; HANNA, 2012, p. 1).

A partir de seus estudos, em 1916, Watson começa a definir sua


proposta psicológica, por meio do estudo do condicionamento (POLACO;
BERIA; MIRANDA, 2021). Seus principais objetivos eram a previsão e
controle do comportamento que pode ser observado com o uso do
método experimental, o que implicava manipular “[...] características
do ambiente e verifica-se o efeito de tais manipulações sobre o
comportamento dos sujeitos” (MOREIRA; HANNA, 2012, p. 2).

A psicologia de Watson, segundo Chiasa (2006, p. 175), propunha que a


Psicologia não deveria focar no estudo dos “eventos internos”, até que
tivesse métodos capazes de observá-los e descrevê-los com um grau de
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controle experimental. O psicólogo não rejeitava a ideia de um homem


dualista, apenas focava seus estudos no comportamento observável.

Um dos estudos mais conhecidos de Watson se chama “o caso do


pequeno Albert”, e foi realizado em 1920 em conjunto com a psicóloga
Rosalie Rayner. Seu objetivo era verificar se o condicionamento
pavloviano poderia contribuir com o estudo do comportamento
emocional, o que pode ser afirmado (MOREIRA; MEDEIROS, 2018).

O experimento consistia em verificar se o bebê Albert, de dez meses,


poderia aprender a ter medo de algo que antes não tinha. Para
isso, estando em um local controlado, observaram que Albert ficava
assustado (resposta) quando ouvia sons estridentes causados por
uma martelada (estímulo), este era um estímulo incondicionado para a
resposta incondicionada de medo. Também foi observado que quando
Albert estava próximo a um rato albino (estímulo), ele não apresentava
nenhuma resposta emocional (estímulo neutro). Foi então realizado
o emparelhamento dos dois estímulos, barulho e rato, e ao longo de
sucessivas apresentações o bebê passou a sentir-se assustado quando
era apresentado apenas ao rato (MOREIRA; MEDEIRO, 2018).

Os estudos de Watson inauguram o Behaviorismo, e dão uma nova visão


de mundo para a Psicologia da época. Para os autores Polaco, Beria e
Miranda (2021), o século XX consolida uma Psicologia Comportamental,
principalmente por meio de behavioristas da França, Rússia e Estados
Unidos da América (EUA), que demarcam como não há um único modo
de pensar dentro dessa filosofia. Nomes como o de Henri Piéron, V.
Bechterev, Walter Hunter, Albert Weiss, Sidney Bijou, Henri Wallon,
André Tilquin, Pierre Navill, Jacob Kantor, entre outros.

Sendo um desses nomes de grande destaque para a história do


Behaviorismo o de Burrhus Frederic Skinner, que inaugura o que é
conhecido como Behaviorismo Radical.
15

2.3. B. F. Skinner e o Behaviorismo Radical

Os estudos de Burrhus Frederic Skinner, psicólogo norte-americano,


se iniciam por influência de nomes como Ivan Pavlov e John Watson.
Porém, aos poucos Skinner vai se distanciando desses pesquisadores e
construindo um novo Behaviorismo (MOREIRA; MEDEIROS, 2018).

Skinner não concorda com os behavioristas da época que focavam


nos métodos das ciências naturais, como medição e controle dos
experimentos. Ao invés disso, o psicólogo acreditava que para promover
uma ciência do comportamento era preciso um trabalho focado no
“desenvolvimento de termos e conceitos que permitissem explicações
verdadeiramente científicas” (BAUM, 2018, p. 24).

Outro grande diferencial do Behaviorismo de Skinner, é que ele


acreditava que por mais complexo que fosse o comportamento humano,
ele poderia ser estudado. E isso incluía o trabalho em laboratório
voltado para compreensão dos “fenômenos subjetivos” (MOREIRA;
MEDEIROS, 2018, p. 212).

Você pode até estar achando que incluir fenômenos subjetivos no


estudo do comportamento é só um acréscimo ao que já era estudado
antes, mas isso fez uma mudança total na história do Behaviorismo.
Skinner propunha que consciência, pensamento, memórias, dentre
outros que eram considerados como eventos privados, deveriam ser
estudados, assim como os comportamentos observáveis (MOREIRA;
HANNA, 2012).

Diante disso, o Behaviorismo iniciado por J. Watson, passou a


ser conhecido como Behaviorismo Metodológico e o de Skinner
denominado de Behaviorismo Radical. Segundo Moreira e Hanna (2012),
a publicação do artigo “Análise operacional de termos psicológicos”, em
1945, foi o marco do nascimento do Behaviorismo Radical.
16

No Behaviorismo Radical os eventos privados são considerados eventos


físicos, assim como os eventos públicos, por isso são passíveis de
estudo (MOREIRA; HANNA, 2012). Além disso, tanto os eventos públicos
quanto privados são considerados comportamentos, sendo os públicos
observáveis por mais de uma pessoa, enquanto os eventos privados são
os comportamentos observáveis apenas por aquele que se comporta
(MOREIRA; MEDEIROS, 2018).

Você lembra lá do começo onde foi falado que o pensar em homem


formado por um interno e externo ou corpo e mente era chamado de
dualismo? Como o Behaviorismo Radical pensa nos eventos internos
como sendo de uma mesma natureza dos eventos externos, ele é
considerado um pensar de homem monista, sendo que esta é mais
uma grande diferença que o distancia do pensamento Behaviorismo
metodológico.

E como Skinner explicava o funcionamento desses comportamentos?


Para além do entendimento do condicionamento pavloviano, que
explica o desenvolvimento de alguns comportamentos do dia a dia, o
psicólogo denominou como comportamento operante a maioria dos
comportamentos. Segundo Moreira e Medeiros (2018, p. 50), pode-se
classificar como operante o comportamento que “produz consequências
que se constituem em alterações no ambiente e cuja probabilidade de
ocorrência futura é afetada por tais consequências”.

Seu estudo mais conhecido é o da Caixa de Skinner, ou Caixa de


Condicionamento Operante, que era uma caixa criada especificamente
para o experimento. Nela era colocado um rato com privação água,
que ficava a explorar o ambiente, até que quando ele se aproximava
da barra presente na caixa, era recompensado com água. Segundo
Moreira e Medeiros (2018), pode-se dizer que o comportamento do
rato se repetia enquanto nada desse processo fosse modificado,
logo o comportamento era controlado pelas consequências do
ambiente. O experimento da caixa de Skinner também contribuiu para
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serem observados e explicados muitos processos que envolvem o


desenvolvimento e manutenção de comportamentos, como os reforços,
punições, modelação, extinção, dentre outros.

Um outro marco na história do Behaviorismo foi a publicação do artigo


“Seleção por Consequências”, em 1981, na revista Science. Neste artigo se
formalizava o modelo explicativo do Behaviorismo Radical, denominado
de modelo de seleção por consequências, que teve influência da teoria
da evolução das espécies por seleção natural, de Charles Darwin
(MOREIRA; HANNA, 2012, p. 4).

Por meio dessa publicação Skinner falou mais sobre como os


comportamentos se constituíam e eram mantidos para além do nível de
seleção individual (seleção operante), por meio de três níveis de seleção
do ambiente filogenético, ontogenético e cultural. A seleção filogenética
ajuda a selecionar novas características fisiológicas, comportamentais
e anatômicas de uma mesma espécie, a seleção ontogênica opera
selecionando novos comportamentos individuais apresentados pelo
ambiente do indivíduo. E o nível de seleção cultural está relacionado
à variabilidade de práticas culturais de um grupo que permite o
surgimento de novos comportamentos (MOREIRA; HANNA, 2012).

[...] na medida em que diferentes contingências (ontogenéticas,


filogenéticas e culturais) refletirão em diferenças no modo como cada
organismo relacionar-se-á com o mundo, podemos assumir que cada
organismo percebe o mundo de uma maneira peculiar, idiossincrática,
subjetiva. (MOREIRA, HANNA, 2012, p. 44)

Foram apontados até aqui apenas alguns pontos relevantes das


contribuições de Skinner, com seu Behaviorismo Radical. Porém, o
pesquisador publicou muitas obras sobre diferentes assuntos da
Psicologia, influenciando diretamente as mais diversas áreas, como as
terapias comportamentais modernas, a educação, a educação especial,
o tratamento do autismo, as organizações, as pesquisas de laboratório,
entre outras áreas.
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Caso você tenha interesse em compreender mais sobre a Análise


do Comportamento e o Behaviorismo, pode procurar ampliar seus
conhecimentos por meio de fontes que, segundo Baum (2018), ajudaram
a área adquirir maior identidade, são as seguintes revistas: Journal of
the Experimental Analysis of Behavior (JEAB) e Journal of Applied Behavior
Analysis (JABA), e organizações profissionais como a Association for
Behavior Analysis. No Brasil, temos a Associação Brasileira de Psicologia
e Medicina Comportamental (ABPMC) e a revista Brasileira de Terapia
Comportamental e Cognitiva.

Referências
BAUM, W. M. Compreender o Behaviorismo: comportamento, cultura e evolução.
3 ed. Tradução de Maria Tereza Araújo Silva. Porto Alegre. Artmed Editora, 2018.
CHIESA, M. Behaviorismo radical: a filosofia e a ciência (CE Cameschi, trad.).
Brasília: IBAC Editora & Editora Celeiro, 2006.
MOREIRA, M. B.; MEDEIROS, C. A. de. Princípios básicos de análise do
comportamento. Artmed, 2018.
MOREIRA, M.; HANNA, E. S. (2015). Bases filosóficas e noção de ciência em análise
do comportamento. In: HUBNER, M. (Ed.). Temas clássicos da psicologia sob a
ótica da análise do comportamento (p. 2–19). Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2012.
POLANCO, F. A.; BÉRIA, J. S.; MIRANDA, R. L. História do behaviorismo: O que
sabemos até hoje? In: DE FÁTIMA KIRCHNER, L.; DE SOUZA, P. C.; DE CARVALHO
KANAMOTA, P. F. (Ed.). Diálogos em Análise do Comportamento-Volume II (p.
164-180). 1. ed. Brasília, Instituto Walden4, 2021.
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Princípios da Análise do
Comportamento Aplicada
Autoria: Mary Cristina Olimpio Pinheiro
Leitura crítica: Fernanda Cristina Silva Sepe

Objetivos
• Definir o que é a Análise do Comportamento
Aplicada (ABA).

• Compreender a construção histórica da Análise


do Comportamento Aplicada relacionada ao
TEA.

• Apresentar os conceitos e princípios da ABA.


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1. A Análise do Comportamento Aplicada (ABA)

A Análise do Comportamento Aplicada (ABA) tem se tornado conhecida


por práticas voltadas ao desenvolvimento de crianças com Transtorno
do Espectro Autista (TEA). Devido a essa popularização é possível que
você já tenha ouvido pessoas falando sobre ABA como se ela fosse um
método, ou técnica facilmente aplicável, o que não é verdade. Mas,
afinal, o que é ABA? E qual a sua relação com o Transtorno do Espectro
Autista? No estudo de hoje você aprenderá mais sobre os fundamentos
dessa abordagem científica.

Para compreender o que é a Análise do Comportamento Aplicada (ABA)


é importante que você saiba que a Análise do Comportamento é uma
ciência que tem como objeto de estudo o comportamento humano
em sua interação com o ambiente. E o Behaviorismo é a filosofia que
embasa essa ciência. Diante disso, segundo Lear (2004), podemos definir
ABA como:

[...] um termo advindo do campo científico do Behaviorismo, que observa,


analisa e explica a associação entre o ambiente, o comportamento
humano e a aprendizagem. Uma vez que um comportamento é analisado,
um plano de ação pode ser implementado para modificar aquele
comportamento. (LEAR, 2004, p. 4)

O termo Análise do Comportamento Aplicada é a tradução das palavras


em inglês Applied Behavior Analysis, por isso, sua sigla é conhecida como
ABA, fazendo referência à ordem da escrita na língua inglesa.

A prática em Análise do Comportamento Aplicada (ABA) requer pensar


na elaboração de intervenções individualizadas que devem sempre
respeitar a necessidade, observando progressos e dificuldades, e
alterando o planejamento de ensino se necessário (BORBA; BARROS,
2018).
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Lear (2004, p. 15) explica que “ABA é um termo “guarda-chuva” descreve


uma abordagem científica que pode ser usada para tratar muitas
questões diferentes e cobrir muitos tipos diferentes de intervenções”.
Como exemplo, podemos encontrar trabalhos em ABA direcionados
à Educação, Educação Especial, Transtorno do Espectro Autista (TEA),
Deficiência Intelectual, dentre outras aplicações.

Apesar de posto que ABA não está relacionada apenas ao trabalho


junto a pessoas com autismo, a associação entre ABA e TEA é muito
forte, e existe uma explicação histórica e científica para isso que será
apresentada no tópico a seguir.

1.1. A relação entre Análise do Comportamento Aplicada


e Transtorno do Espectro Autista (TEA)

Para as pesquisadoras Camargo e Rispoli (2013), o número de


diagnósticos de Transtorno do Espectro Autista (TEA) tem aumentado
devido à maior popularização sobre o transtorno e processo de
consolidação de instrumentos que contribuem para a avaliação cada vez
mais precoce.

Com um número crescente de pessoas diagnosticadas com Transtorno


do Espectro Autista (TEA), aumenta-se também a procura por
intervenções que auxiliem no desenvolvimento e inclusão social dessas
pessoas na comunidade. Mas por que pessoas com autismo precisam de
intervenções?

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é considerado um Transtorno do


Neurodesenvolvimento, que é um grupo de transtornos caracterizados
por apresentarem suas características já no início do desenvolvimento
humano (APA, 2013). Além disso, esse grupo de transtornos leva a
déficits no desenvolvimento que podem vir a dificultar atividades
pessoais, sociais, acadêmicas ou mesmo profissionais.
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Especificamente o TEA consiste em déficits no desenvolvimento,


principalmente nas áreas relacionadas à comunicação social e interação
social. Além de padrões de comportamentos restritos e repetitivos, que
podem vir a limitar interesses ou atividades (APA, 2013). Lembrando que
no próprio conceito de TEA temos a palavra espectro, que serve para
demarcar que apesar das características em comum que definem esse
transtorno os comportamentos vão variar bastante de uma pessoa com
autismo para outra.

Camargo e Rispoli (2013) demarcam uma característica


importante do TEA (presente também em todos os Transtornos do
Neurodesenvolvimento) de que não há uma cura. A pessoa nunca
deixará de ser autista e conviver com características comuns a esse
transtorno, mas as terapias podem vir a minimizar comportamentos
que estejam refletindo em atrasos no desenvolvimento, ampliar
comportamentos que ajudem nas atividades da vida diária (AVDs), no
maior ganho de autonomia, independência e no processo de inclusão
social desse indivíduo.

Cabe destacar que no autismo existem os especificadores de gravidade


(APA, 2013), uma classificação que demarca o nível de apoio que uma
pessoa precisa para a realização das AVDs. Existem três níveis de apoio
em que no nível 1 a pessoa precisa de pouco suporte, no nível 2 a
pessoa precisa de suporte moderado e no nível 3 a pessoa precisa de
suporte substancial para realização da maioria de suas atividades. As
terapias podem justamente auxiliar em ganhos de comportamentos
que façam com que a pessoa passe para um nível de apoio com
maior independência, já que os graus variam de acordo com os
comportamentos atuais do indivíduo.

Dentre a variedade de terapias oferecidas no atendimento de pessoas


com TEA, as intervenções e métodos educacionais baseados na
Análise do Comportamento demonstram reduzir sintomas e ajudar a
23

ampliar o desenvolvimento das habilidades sociais, comunicativas e


comportamentos adaptativos (CAMARGO; RISPOLI, 2013).

Você já deve estar percebendo que a relação entre ABA e TEA se


mantém por sua efetividade, mas voltando em uma das perguntas
iniciais desse texto, de onde surgiu essa relação? Segundo Lear (2004),
Ivar Lovaas foi o primeiro psicólogo a publicar um estudo sobre o uso da
Análise do Comportamento Aplicada (ABA) no ensino de habilidades em
crianças com autismo, no ano de 1987. O estudo de Lovaas demonstrou
que ABA possibilitou a maior aquisição de habilidades em crianças com
TEA que não apresentavam uma deficiência intelectual associada.

O estudo foi conduzido junto a um grupo de 19 crianças pequenas com


autismo. Para que você compreenda melhor os resultados alcançados,
observe a Tabela 1. Nela você pode perceber que os participantes foram
divididos em dois grupos, um que passou por tratamento com base em
ABA, e um grupo controle que não passou por tratamento (LEAR, 2004).

No grupo que passou por tratamento em ABA (Tabela 1): 47% das
crianças conseguiram atingir os níveis intelectuais e comportamentais
esperados para alunos de 1° ano na época do estudo; 40% do grupo
recebeu diagnóstico de Deficiência Intelectual (DI) leve, e frequentaram
classes especiais com apoio à linguagem; e 10% foram diagnosticados
com Deficiência Intelectual (DI) grave (LEAR, 2004).

Já no grupo controle que não passou por tratamento com base em


ABA (Tabela 1): apenas 2% das crianças conseguiram alcançar o
desenvolvimento esperado para cursar o 1° ano na época; 45% do
grupo foi diagnosticado com Deficiência Intelectual (DI) leve; e 53%
diagnosticada com Deficiência Intelectual (DI) grave (LEAR, 2004).

Tabela 1 – Resultados do estudo de Lovaas


Níveis educacionais Diagnosticadas Diagnosticadas
esperados com DI. Leve com DI. Severa
24

Receberam
47% 40% 10%
tratamento em ABA
Não receberam
2% 45% 53%
tratamento em ABA

Fonte: adaptada de Lear (2004).

Observando esses resultados, podemos perceber que o grupo que


recebeu intervenções baseadas na Análise do Comportamento Aplicada
se desenvolveu consideravelmente mais do que o grupo que não
recebeu. Além disso, em contraponto, observando o grupo controle
que não recebeu intervenções em ABA, há um número muito maior
de crianças diagnosticadas com DI, esses diagnósticos podem ser
justamente um reflexo do não oferecimento de uma estimulação do
desenvolvimento de forma individualizada como a ABA oferece.

A Análise do Comportamento Aplicada passou então a ser considerada


para o desenvolvimento de muitas crianças com TEA. A autora Lear
(2004, p. 13) destaca que nos Estados Unidos da América (EUA), em 1993,
uma mãe chamada Catherine Maurice escreveu o livro Let Me Hear Your
Voice: A Family Triumph Over Autism (“Quero escutar sua voz: a vitória de
uma família sobre o autismo”), onde Catherine escreveu sobre como a
ABA foi eficaz para o desenvolvimento de seus dois filhos com TEA. A
publicação de Catherine contribuiu com a popularização da ABA no país,
influenciando outros familiares de pessoas com autismo.

Para Borba e Barros (2018), a Análise do Comportamento Aplicada


(ABA) vem se consolidando junto a serviços direcionados a pessoas com
autismo, visto sua forma de atuação mais singular, em que é possível
observar os mais variados comportamentos presentes no autismo, e
assim traçar planos de ações individualizados, com objetivos claros e
específicos a cada demanda do desenvolvimento humano.
25

Cabe ainda destacar que o processo de avaliação, elaboração de


planejamentos e aplicação de intervenções é algo dinâmico. Ao passo
que a pessoa vai apresentando avanços, dificuldades ou o surgimento
de outros comportamentos que necessitem investigação, é necessário
que o planejamento seja revisto (BORBA; BARROS, 2018). Por isso, a
importância de buscar profissionais que compreendam os conceitos
da Análise do Comportamento, tenham noção da diversidade de
comportamentos que podem estar presentes em um planejamento e
que envolvam escola e família.

Na intervenção ABA o profissional elabora um currículo que depende de


cada criança, mas geralmente é amplo; incluindo habilidades acadêmicas,
de linguagem, sociais, de cuidados pessoais, motoras e de brincar. O
intenso envolvimento da família e da escola no programa é uma grande
contribuição para o seu sucesso, uma vez que possibilita o aumento da
intensidade da intervenção. (BORBA; BARROS, 2018, p. 7)

Agora que você já sabe o que é ABA, e como ela pode ser promotora do
desenvolvimento de pessoas com autismo, é importante que conheça
alguns conceitos que dão base para eficiência de sua aplicabilidade. Isso
auxiliará você a compreender melhor o que é proposto na prática.

2. Principais conceitos da Análise Aplicada do


Comportamento (ABA)

Para Borba e Barros (2018), os conceitos mais importantes sobre


Análise do Comportamento Aplicada (ABA) são os de comportamento e
ambiente, sendo o entendimento deles muito interligado.

O comportamento é a ação ou a atividade de um indivíduo em relação ao


seu ambiente. São exemplos de comportamentos, andar, falar, chorar,
sorrir, ficar parado, pensar, ficar com raiva, agredir. Ambiente são todos
os eventos com os quais o indivíduo pode manter algum tipo de relação.
26

Nesse sentido, é mais produtivo falarmos de eventos ambientais ou


estímulos específicos do que em ambiente, porque o termo ambiente
envolve tantas coisas que é impossível nós nos relacionarmos com todo o
nosso ambiente de uma vez só. (BORBA; BARROS, 2018, p. 10)

A maioria dos comportamentos do dia a dia são chamados de


comportamentos operantes, denominação que foi dada a partir dos
estudos do psicólogo B. F. Skinner. Esses são comportamentos que
agem produzindo alterações no ambiente, ao mesmo tempo que
são afetados pela probabilidade de uma nova ocorrência no futuro
(MOREIRA; MEDEIROS, 2018).

A aprendizagem de comportamentos operantes se dá pelo que é


chamado de condicionamento operante, processo que foi descoberto
a partir do experimento da Caixa de Skinner produzido com ratos. No
condicionamento operante novos comportamentos são aprendidos a
partir das consequências, produzidas pelo ambiente, consequências
que podem ser fortalecedoras ou enfraquecedoras para que a resposta
ocorra novamente.

Lear (2004) explica que para compreensão do comportamento é preciso


entender que há um antecedente denominado como estímulo que
provoca o comportamento, sendo o comportamento a ação resposta a
esse antecedente, e a essa ação há sempre uma consequência.

Para que fique mais claro veja um exemplo no Quadro 1.

Quadro 1 – Conceito de comportamento operante


Comportamento Operante
Estímulo Resposta Consequência
Maria entra na sala Pedro fala “bom dia” Maria Sorri

Fonte: elaborado pela autora.

No Quadro 1, Maria entra na sala, sendo assim um estímulo para


que Pedro se comporte ao cumprimentá-la, em resposta Maria sorri,
27

que é um comportamento que pode fazer com que Pedro aumente


seu comportamento de cumprimentá-la. Agora se Maria mostrasse a
língua para ele, pode ser que como consequência Pedro parasse de
cumprimentá-la.

As consequências que nossos comportamentos produziram no passado


influenciam sua ocorrência futura. É nesse sentido, de forma geral, que
dizemos que o comportamento é controlado, ou influenciado, por suas
consequências. Dizer que as consequências dos comportamentos os
controlam, de maneira geral, é o mesmo que dizer que elas determinarão
se os comportamentos que as produziram ocorrerão com maior ou menor
frequência no futuro. (MOREIRA; MEDEIROS, 2018, p. 49)

Segundo Borba e Barros (2018), o que o analista do comportamento


faz é justamente identificar os comportamentos, estímulos e respostas
que estão relacionados entre si e analisar qual a função desse
comportamento. Ou seja, compreenda o que está sendo favorável para
que esse comportamento continue ocorrendo, ou deixe de ocorrer.

A análise funcional é o nome dado ao processo de descrever os


elementos que fazem parte do comportamento, a fim de melhor
compreender sua relação (BORBA; BARROS, 2018). No Quadro 1,
você pode observar justamente os elementos (estímulo, resposta e
consequência) que compõem uma análise funcional.

Outro conceito que é base essencial para o entendimento da Análise do


Comportamento Aplicada (ABA) é o de reforço. Há dois tipos de reforços,
o positivo e o negativo, e ambos são consequências que sempre
aumentam a probabilidade de o comportamento ocorrer novamente
(BORBA; BARROS, 2018).

A diferença entre eles é que no reforço positivo há a adição de uma


coisa agradável que resulta no fortalecimento, já no reforço negativo
há a retirada de algo desagradável, que também irá resultar na maior
probabilidade de o comportamento ocorrer (LEAR, 2004). Observe no
28

Quadro 2 os exemplos de reforço positivo e reforço negativo expressos


por meio de uma análise funcional.

Quadro 2 – Exemplo de reforço positivo e reforço negativo


Antecedente Comportamento Consequência (Reforço) Tipo
Criança percebe a Criança faz contato Ganha uma massinha que
Reforço positivo
terapeuta visual com a terapeuta gosta da textura
Criança sente dor Criança aponta a
A mãe corta a etiqueta fora Reforço negativo
onde está a etiqueta etiqueta machucando

Fonte: elaborado pela autora.

Existem dois tipos diferentes de reforços negativos que são


denominados como fuga e esquiva. Caracteriza-se como fuga quando
já existe um estímulo aversivo no ambiente, e então é emitida uma
resposta como forma de retirar esse estímulo aversivo (BORBA; BARROS,
2018). Já a esquiva ocorre quando há o atraso ou evitação para não ter
contato com um estímulo que já é considerado aversivo pelo indivíduo
(MOREIRA; MEDEIROS, 2018, p, 66).

Como exemplo de fuga você pode pensar em uma criança que está em
uma sala de aula, e nas aulas de artes seus colegas fazem muito barulho
(estímulo aversivo para essa criança), então ela sai da sala (fuga). Visto
que em todas as aulas de artes o barulho se repete, pode ser que essa
criança comece a evitar entrar na sala na hora da matéria de artes
(esquiva). Lembrando que tanto a fuga quanto a esquiva, por serem
reforços negativos, aumentam a probabilidade de o comportamento
ocorrer.

Na prática da Análise do Comportamento Aplicada (ABA), é preciso


que na hora da avaliação já comece a ser observado o que é ou não
reforçador para aquela pessoa. Pois lembre que para essa ciência
cada pessoa tem um processo de aprendizagem de mundo diferente
ou outro. Por exemplo, um brinquedo com música pode ser super
reforçador para uma criança, mas ser superincomodo para outra. Então
29

não existem reforçadores, sejam eles positivos ou negativos, que sejam


universais.

Já que o reforço negativo e positivo aumenta a probabilidade de um


comportamento ocorrer, o que será que diminui? A punição e a extinção
são dois processos que podem reduzir a frequência de respostas serem
emitidas (BORBA; BARROS, 2018).

Tal qual o reforço, podem ocorrer punições de dois tipos, punição


positiva e punição negativa.

A distinção entre punição positiva e negativa consiste na mesma distinção


feita com relação ao reforçamento positivo e negativo: se um estímulo é
acrescentado ou subtraído do ambiente. Tanto a punição positiva quanto a
negativa diminuem a probabilidade de o comportamento que as produziu
voltar a ocorrer. (MOREIRA; MEDEIROS, 2018, p. 70)

Para ajudar na compreensão e fixação dos conceitos, pense em um


menino que está jogando bola (comportamento) na sala e apanha, esta é
denominada como uma punição positiva, pois um estímulo foi acrescido
(apanhar). Agora se esse menino está jogando bola na sala, e recebe
como punição a perda de sua mesada, esta é uma punição negativa, pois
há a perda de um estímulo (mesada).

Já a extinção ocorre quando um reforçador para de ser oferecido (LEAR,


2004). Por exemplo, toda vez que a criança se joga no chão porque quer
uma bala a mãe dá a bala (reforço), se a mãe parar de dar a bala, com
o tempo a tendência é que essa criança pare de se jogar. Um efeito
curioso indicado por Lear (2004), sobre o processo de extinção, é que
antes do comportamento diminuir a frequência, há picos que podem
ter maior intensidade do comportamento, por exemplo, a criança ao
ver que se jogou no chão e a mãe não deu a bala, começa a emitir mais
comportamentos como gritar ou chorar, na espera de receber o reforço
que antes era oferecido.
30

Uma coisa importantíssima a se destacar, já que agora você compreende


melhor alguns conceitos da Análise do Comportamento, é que a
punição é um recurso pouco eficiente para aprendizagem, pois apesar
de diminuir a ocorrência de alguns comportamentos, ela não ensina o
comportamento assertivo.

Para Borba e Barros (2018), a punição promove o desenvolvimento


de comportamentos de medo, ansiedade ou opressão, e contribuem
para que quem pune seja visto como um estímulo aversivo, ou seja,
alguém que a pessoa que está sendo punida queira ficar longe. Por
isso, a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) se baseia em práticas
voltadas ao uso de reforços positivos que ajudam a criança a entender
os comportamentos esperados para seu desenvolvimento e assertivos
para a vida em sociedade.

Com este conteúdo você aprendeu um pouco mais sobre o que é a


Análise do Comportamento Aplicada (ABA), sua relação com o TEA
e alguns conceitos que fundamentam essa abordagem científica. É
importante que você continue a fazer leituras e busque exercícios de
fixação sobre os conceitos da ABA, pois eles guiarão a efetividade da
prática.

Referências
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (APA). Manual diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais: DSM-5. Porto Alegre: Artmed, 2013.
BORBA, M. M. C.; BARROS, R. S. Ele é autista: como posso ajudar na intervenção?
Um guia para profissionais e pais com crianças sob intervenção analítico
comportamental ao autismo. Cartilha da Associação Brasileira de Psicologia e
Medicina Comportamental (ABPMC), 2018.
CAMARGO, S. P. H.; RISPOLI, M. Análise do comportamento aplicada como
intervenção para o autismo: definição, características e pressupostos filosóficos.
Revista Educação Especial, v. 26, n. 47, p. 639-650, 2013.
31

LEAR, K. Ajude-nos a aprender–um programa de treinamento em ABA (Análise do


Comportamento Aplicada) em ritmo autoestabelecido. Trad. Margarida Hofmann
Windholz, p. l0, 2004.
MOREIRA, M. B.; MEDEIROS, C. A. de. Princípios básicos de análise do
comportamento. Artmed, 2018.
32

O Comportamento Verbal
na prática em ABA
Autoria: Mary Cristina Olimpio Pinheiro
Leitura crítica: Fernanda Cristina Silva Sepe

Objetivos
• Conceituar o comportamento verbal.

• Diferenciar comportamento verbal do


comportamento não verbal.

• Apresentar os diferentes tipos de


comportamento verbal.

• Aprender aspectos importantes para a avaliação


do comportamento verbal.
33

1. O comportamento Verbal

A linguagem está presente em grande parte do nosso dia a dia, pois


é por meio dela que é possível a comunicação com outras pessoas, a
aquisição de muitos comportamentos da cultura e também é ela que
auxilia em muitas outras aprendizagens ao longo de toda a vida. Diante
de sua relevância, você já se perguntou como é possível que os seres
humanos aprendam grande parte da linguagem? Pois bem, no estudo de
hoje você vai aprender sobre como a Análise do Comportamento explica
esse fenômeno, e qual sua importância dentro da Análise Aplicada do
Comportamento (ABA).

O estudo da linguagem pela ciência Análise do Comportamento


se fortalece com a publicação do livro Verbal Behavior (traduzido
para o Brasil com o título O Comportamento Verbal), em 1957, pelo
psicólogo fundador do Behaviorismo Radical, Burrhus Frederic
Skinner (GOYOS, 2018). A partir desse marco, muitos outros estudos
foram sendo conduzidos e publicados por periódicos da área, com
foco no entendimento do que é a linguagem e como é possível o
desenvolvimento de programas de ensino.

Em sua publicação, Skinner tratou o tema da aquisição da linguagem


como um processo de aprendizagem de comportamentos verbais.
Como explica Barros (2003), o comportamento verbal segue os mesmos
princípios do comportamento operante. Então, para que você entenda
como funciona o comportamento verbal, é importante que antes você se
lembre do conceito de comportamento operante.

O comportamento operante é aquele que opera sobre o ambiente,


promovendo consequências, ao mesmo tempo em que também é
influenciado por essas consequências, refletindo no aumentar ou
diminuir das chances de o comportamento voltar a ocorrer (MARTIN,
34

2018). Observe no Quadro 1 um exemplo de comportamento operante,


descrito por meio de uma análise funcional.

Quadro 1 – Comportamento operante

Comportamento Operante Não Verbal


Antecedente Comportamento Consequência Efeito
Fortalecimento do
Maria está com Busca água na Bebe água e elimina
comportamento de
sede. cozinha. a sede.
buscar água.

Fonte: elaborado pela autora.

Um apontamento importante sobre a nomenclatura é a de que todos


os comportamentos operantes que não são operantes verbais são
chamados de comportamentos não verbais (BARROS, 2003), conforme
apresentado no Quadro 1, justamente para diferenciar visto que são
comportamentos com a mesma natureza.

Como já indicado, o comportamento verbal também é um


comportamento operante, logo também altera ambiente e sofre
consequências das alterações ambientais causadas. O autor Martin
(2018), retrata a diferença entre o comportamento verbal e o
comportamento operante, por meio da explicação dada pelo próprio
Skinner:

Ele definiu comportamento verbal como o comportamento reforçado


pela mediação de outra pessoa, quando a pessoa que fornece o reforço
foi especificamente treinada para fornecê-lo. O comportamento verbal é
contrastado com o comportamento não verbal, que é aquele reforçado
pelo contato com o ambiente físico. (MARTIN, 2018, p. 460)

Agora observe no Quadro 2 um exemplo de comportamento verbal.


35

Quadro 2 – Exemplo de comportamento verbal


Comportamento Verbal

Antecedente Comportamento Consequência Efeito

Fala para o seu namorado: Fortalecimento do


Maria está com Bebe água e
“você pode pegar água para comportamento de
sede. elimina a sede.
mim, por favor?” pedir.

Fonte: elaborado pela autora.

O comportamento verbal, apesar de ser um comportamento humano


complexo, também pode ser estudado por meio da análise funcional
(BARROS, 2003). Lembrando que na vida real estão ocorrendo muitos
comportamentos ao mesmo tempo, sejam eles verbais ou não verbais, a
análise funcional é justamente um modo representativo, que te ajuda a
selecionar o comportamento a ser estudado e modificado. Contribuindo
para que você compreenda melhor a interação, entre comportamentos,
antecedentes e consequências, como representados nos Quadros 1 e 2.

Uma característica importante trazida por Barros (2003) é de que


o comportamento verbal só é possível por meio de consequências
relacionadas a um ouvinte que tenha sido treinado por uma
comunidade verbal.

A comunidade verbal engloba as pessoas que foram ensinadas a se


comunicarem por meio de interações, umas com as outras, dentro de
um mesmo idioma. De forma mais conceitual, Borba e Barros (2018)
definem que a comunidade verbal engloba as pessoas que aprenderam
a se comportar promovendo consequências para as respostas, ou seja,
fornecendo reforçadores nas relações comunicativas entre ouvinte e
falante. Os autores ainda trazem que a comunicação não diz respeito
apenas à comunicação falada (comunicação vocal).

Os membros da comunidade verbal ora são falantes (ou seja, emitem


comportamentos verbais), ora são ouvintes (ou seja, produzem as
alterações que reforçam o comportamento verbal dos outros). A palavra
36

“ouvinte” aqui, assim como a palavra “falante”, não deve ser levada ao pé
da letra. Por exemplo, se o falante usa linguagem de sinais, o ouvinte na
verdade vê o comportamento verbal do falante e se comporta de forma a
reforçá-lo. Mesmo assim, usando os termos “ouvinte” e “falante”. (BORBA;
BARROS, 2018, p. 45)

Logo, o comportamento verbal é sempre aprendido na relação com


outras pessoas, e vai se desenvolvendo com o tempo. Só que um
detalhe importante sinalizado por Borba e Barros (2018) é que ao
contrário dos comportamentos não verbais, ele não precisa ser mantido
(consequência) por algo concreto do ambiente (como no exemplo
do Quadro 2, mantido por ter recebido a água pedida), ele pode ser
mantido apenas por outro comportamento verbal de pessoas nas
interações estabelecidas.

Por exemplo, quando você conversa com alguém que gosta do tema
que você está falando, muito provavelmente a pessoa vai continuar o
assunto e vocês se manterão dialogando sobre o tema (fortalecimento
do comportamento). Ao contrário, se você começa a falar sobre um
tema, e a pessoa sinaliza que não quer falar disso, a tendência é que
você troque de assunto (enfraquecimento do comportamento).

Além disso, o ouvinte pode influenciar também a forma como o


comportamento verbal é emitido (BARROS, 2003). Por exemplo,
quando alguém se comunica em uma apresentação de trabalho, muito
provavelmente irá utilizar uma linguagem mais formal, com o tom de voz
mais seguro, sem muitas entonações, e sem muitas gesticulações faciais.
Já quando alguém se comunica com um bebê, é mais comum usar
palavras curtas, até mesmo sílabas repetidas como “mama”, fazer um
tom de voz mais infantilizado e usar muitas gesticulações e expressões
faciais.

Agora que você entendeu o conceito de comportamento verbal, é


importante que saiba que para além da comunicação por meio da
fala ou da linguagem de sinais, o comportamento verbal abrange
37

também outras formas que tenham o efeito de promover alterações


no comportamento de outras pessoas, como exemplos, os gestos de
modo geral, formas de olhar que tem algum significado específico de
comunicação ou mesmo a escrita (BORBA; BARROS, 2018). Devido a essa
diversidade, o comportamento verbal pode ser dividido em diferentes
tipos, que serão apresentados no tópico a seguir.

1.1 Os diferentes tipos de comportamentos verbais

É importante que você aprenda quais são alguns tipos de


comportamentos verbais, pois a maioria dos programas que tem como
base a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) utiliza estratégias
voltadas para o fortalecimento de algum tipo em específico. Está
estratégia tem como objetivo privilegiar o que a pessoa precisa
desenvolver primeiro naquele momento do desenvolvimento, para
depois ir aprendendo outros tipos de comportamentos verbais
progressivamente.

Na Figura 1, estão apresentados seis tipos de comportamentos verbais.

Figura 1 – Tipos de Comportamento Verbal

Fonte: elaborado pela autora.


38

Para que você compreenda os diferentes tipos de comportamentos


verbais, nomeados na Figura 1, cabe relembrar que as respostas podem
ser vocalizadas (faladas) ou motoras, por meio de gestos, desde que
estes gestos correspondam a códigos gestuais que fazem parte de
uma linguagem ou língua, como no caso da Língua Brasileira de Sinais
(LIBRAS).

O comportamento do tipo ecoico corresponde às respostas verbais, que


possuem uma mesma estrutura entre estímulo e resposta (BARROS,
2003). Por exemplo, os pais dizem “mamãe” (estímulo), e a criança
vocaliza “mamãe” (resposta ecoica). Ou seja, no comportamento de
ecoar, ocorre uma imitação, onde a pessoa repete exatamente o
estímulo que ouviu de outra pessoa (BORBA; BARROS, 2018).

É importante que você não confunda o comportamento ecoico com


a ecolalia. Já que o comportamento verbal ecoico tem uma função,
sendo importante dentro do processo de aquisição de vocabulário.
Em contrapartida, na ecolalia, que é muito comum em pessoas com
Transtorno do Espectro Autista (TEA) e em outros transtornos do
neurodesenvolvimento, ocorre a repetição de palavras, mas essa
repetição não necessariamente tem contexto ou função comunicativa
(BORBA; BARROS, 2018). Em muitos casos a função da ecolalia está
ligada à autorregulação e estimulação sensorial.

Outro tipo de comportamento verbal é o tato, em que as respostas


verbais sempre correspondem à nomeação de pessoas, objetos e
demais características comuns dentro de ambiente social e cultural
(BARROS, 2003). Por exemplo, criança e mãe observam um palhaço, e a
criança vocaliza correspondentemente “palhaço”.

O ato de tatear, ou seja, emitir tatos, é construído ao longo do


desenvolvimento infantil, por meio da interação com outras pessoas
de uma mesma cultura que vão lhe mostrando objetos, sentimentos,
39

situações e nomeando até que a criança aprenda a tatear também


(BORBA; BARROS, 2018).

É denominado de mando o comportamento verbal motivado por uma


necessidade da pessoa, que é emitido caracterizando um pedido, ordem
ou uma pergunta realizada como forma de obter uma informação
(BORBA; BARROS, 2018). Por exemplo, quando um aluno se vira para
outro e fala “me dá a minha caneta que está com você”, ou como
pergunta “você pode me dar a minha caneta, por favor?”

Perceba que em muitas situações tatos e mandos são simbolizados


pelas mesmas palavras, o que vai variar é justamente a função
empregada pelo comportamento verbal. Por exemplo, uma criança que
está começando a falar muitas vezes diz apenas água para vocalizar um
pedido de água, não apenas a nomeação.

O comportamento intraverbal corresponde ao comportamento que está


“[…] sob controle de outro comportamento verbal do próprio falante
ou de outra pessoa” (BORBA; BARROS, 2018, p. 49). Por exemplo, você
diz “vamos falar as vogais A, E, I” e a pessoa completa “O, U”. A maioria
dos comportamentos intraverbais ocorrem por correlações aprendidas
por meio da cultura, por exemplo, se alguém disser: “filho de peixe...”, é
muito provável que muitas pessoas vão responder: “peixinho é”.

O comportamento do tipo textual é uma resposta controlada por um


estímulo necessariamente textual também chamado de “estímulos
discriminativos verbais visuais (BARROS, 2003, p. 78), sendo necessário
que a resposta seja correlacionada corretamente ao que está escrito
no texto. Ou seja, é quando alguém vê as palavras escritas e as lê, por
exemplo, quando você está doente e lê a receita prescrita pelo médico
para ter acesso ao tratamento correto.

O último tipo representado na Figura 1 é o comportamento autoclítico,


que segundo Barros (2003, p. 79), corresponde as [...] unidades de
40

comportamento verbal que comentam, qualificam, enfatizam, ordenam,


coordenam e alteram a função de outros comportamentos verbais.
Exemplos de comportamentos autoclíticos são o uso de ironias por
exemplo, quando alguém entra em um quarto muito desorganizado e
fala para o dono do quarto “nossa, como você é organizado!”.

Além dos tipos apresentados neste texto, também existem outras


formas de comportamentos verbais, tendo sido trazidos para o seu
estudo os tipos mais comumente trabalhados nas práticas em Análise
do Comportamento Aplicada (ABA).

2. A importância da Avaliação do
Comportamento Verbal

O comportamento verbal tem sido trazido como destaque


nesse estudo, pois muitas crianças com Transtorno do Espectro
Autista (ABA), Deficiência Intelectual, entre outros Transtornos do
Neurodesenvolvimento, podem vir a ter atrasos significativos na
comunicação e contribuir com atrasos no desenvolvimento de forma
geral. Como já mencionado anteriormente, a comunicação auxilia na
aquisição de outras aprendizagens.

Além disso, o atraso no desenvolvimento de comportamentos verbais


pode contribuir com o aumento de comportamentos desafiadores, uma
vez que quando crianças ainda não têm um repertório comunicativo,
elas acabam optando por gerar outras modificações no ambiente
para conseguirem o que querem, como chorar para obterem algo, a
exposição a situações perigosas para pegarem o que querem, entre
outras situações (BORBA; BARROS, 2018).

Em contrapartida, os pesquisadores Borba e Barros (2018) afirmam que


quando crianças com TEA até sete anos de idade conseguem ter uma
41

boa aprendizagem no repertório de comportamentos verbais, este é um


indicativo de um bom desenvolvimento até a vida adulta. Isso explica
por que muitas intervenções baseadas em Análise do Comportamento
Aplicada (ABA) focam em treinamentos de comportamentos verbais
como parte mais importante do planejamento.

O autor Goyos (2018) também enfatiza a importância da ABA para


o desenvolvimento da fala, desde que a pessoa tenha condições
fisiológicas para falar. Diante disso, antes de iniciar as intervenções em
ABA, é preciso que a pessoa seja avaliada por médicos e fonoaudiólogos,
a fim de descartar lesões neurológicas, perdas auditivas,
comprometimento na musculatura de órgãos utilizados na fala, entre
outros aspectos que podem vir a impossibilitar a comunicação vocal.

Avaliado que a pessoa possui condições fisiológicas de falar, e mesmo


assim apresenta atrasos na aquisição de comportamentos verbais, é
importante realizar a avaliação do repertório atual, o que abarca desde
observar atrasos diretos nos comportamentos verbais como também
avaliar se há atrasos em comportamentos pivotais.

Os comportamentos pivotais são aqueles que servem como base


para o desenvolvimento de outros comportamentos (GOYOS,
2018). Para exemplificar, pense em um bebê que está começando a
aprender seus primeiros comportamentos ecoicos, as habilidades
de observação, manter contato visual e imitação junto a um adulto,
serão comportamentos pivotais base para a aquisição de ecoicos, ou
comportamentos motores como apontar, gesticular com as mãos, que
são base para aquisição de comportamentos de mando ao pedir algo.

Outro aspecto importante no processo de avaliação do repertório atual


é identificar as possíveis barreiras do desenvolvimento. Sendo barreira
um termo comumente utilizado para designar comportamentos que
estejam atrapalhando o desenvolvimento, como exemplos de barreiras
42

podem ser citadas a ecolalia, comportamentos problemas, imitação


comprometida, entre outras.

Um instrumento que tem se popularizado na avaliação do repertório


individual, principalmente na avaliação de comportamentos verbais,
é o Verbal Behavior Milestones Assessment and Placement Program (VB-
MAPP), construído por Mark L. Sundberg. A pesquisa da autora Martone
(2018) teve como alguns de seus objetivos traduzir e explicar o uso do
instrumento no Brasil.

O VB-MAPP é um instrumento que possibilita a avaliação de crianças


com autismo, deficiência intelectual ou algum outro atraso no
desenvolvimento, com foco em orientar programas individualizados em
ABA. E segundo Martone (2018), auxilia na avaliação e desenvolvimento
da linguagem, pois por meio dele é possível analisar sistematicamente
as relações entre os comportamentos verbais e o controle do ambiente
que os mantêm, sendo possível traçar os objetivos e delineamento do
programa de intervenções mais eficazes individualmente.

O VB-MAPP avalia o repertório verbal por meio de 170 marcos de


comportamentos esperados para cada faixa etária de 0 a 48 meses,
porém o instrumento acaba sendo utilizado em idades mais avançadas
diante dos atrasos no desenvolvimento. Esta avaliação possibilita
não apenas estabelecer os comportamentos verbais em atrasos, mas
também identificar comportamentos pivotais essenciais para cada
faixa etária. Além disso, ele possui uma avaliação própria de diversas
barreiras do desenvolvimento.

No estudo de hoje você pode aprender mais sobre o comportamento


verbal, seus diferentes tipos e a importância da avaliação para o
planejamento de intervenções baseadas em ABA. Por fim, ressaltamos
a importância de que os profissionais que queiram atuar junto a
pessoas com transtornos do neurodesenvolvimento devem continuar
fazendo leituras para compreender melhor os diferentes tipos de
43

comportamentos verbais e a melhor forma de desenvolvê-los na


prática. A mesma indicação serve para a avaliação, sendo importante
um conhecimento abrangente do VB-MAPP ou outro instrumento à sua
escolha antes da prática.

Referências
BARROS, R. da S. Uma introdução ao comportamento verbal. Revista brasileira de
terapia comportamental e cognitiva, v. 5, n. 1, p. 73-82, 2003.
BORBA, M. M. C.; BARROS, R. S. Ele é autista: como posso ajudar na intervenção?
Um guia para profissionais e pais com crianças sob intervenção analítico-
comportamental ao autismo. Cartilha da Associação Brasileira de Psicologia e
Medicina Comportamental (ABPMC), 2018.
GOYOS, C. ABA: ensino da fala para pessoas com autismo. São Paulo: Edicon, 2018.
Martin, Ga; PEAR, J. Modificação do comportamento: o que é e como fazer. 10. ed.
Rio de Janeiro: Roca, 2018.
MARTONE, M. C. C. Tradução e adaptação do Verbal Behavior Milestones
Assessment and Placement Program (VB-MAPP) para a língua portuguesa
e a efetividade do treino de habilidades comportamentais para qualificar
profissionais. Tese (doutorado em Psicologia) – Universidade Federal de São Carlos,
São Carlos, 2017.
44

Planejamento e processos
de ensino com base em ABA
relacionados ao TEA
Autoria: Mary Cristina Olimpio Pinheiro
Leitura crítica: Fernanda Cristina Silva Sepe

Objetivos
• Aprender aspectos sobre o planejamento e processo
de ensino em ABA.

• Conhecer possibilidades de avaliação do


comportamento.

• Conhecer alguns tipos de programas de ensino


baseados em ABA relacionados ao ensino de
pessoas com TEA.
45

1. Colocando em prática programas de ensino


em ABA

A Análise do Comportamento Aplicada (ABA) se baseia na ciência


denominada como Análise do Comportamento, possuindo princípios
cientificamente validados experimentalmente que demarcam a sua
efetividade, principalmente em casos de Transtorno do Espectro
Autista (TEA). Diante de sua importância, o estudo de hoje tem como
temas principais apresentar o processo comum entre intervenções de
planejamento voltados ao atendimento de pessoas com TEA, assim
como apresentar três diferentes tipos de abordagens interventivas para
esse público.

Para compreender a prática com base na ABA é importante saber que


não existe um modelo único de intervenção ou mesmo estratégias
específicas com base em um modelo metodológico que você aplicará em
todas as crianças com TEA. A ABA é uma ciência baseada em evidências,
ou seja, é um meio de unir conhecimentos científicos a prestações de
serviços, a fim de melhorar a qualidade de vida das pessoas (DUEÑAS;
BAK; PLAVNICK, 2018).

Antes de falar de fato de práticas interventivas, cabe destacar


que segundo Dueñas, Bak e Plavnick (2018, p. 89), intervenções
comportamentais conceitualmente compreendem ações de
“manipulações antecedentes e de consequências para promover
mudanças de um comportamento ou ensinar uma habilidade para
indivíduos”, conduzidas por um analista do comportamento. Ou seja, são
os meios utilizados nos programas de ensino estruturados com base em
ABA.

A prática em Análise do Comportamento Aplicada tem como


características ser sempre individualizada e planejada, cabendo
ao analista do comportamento seguir alguns passos para um bom
46

planejamento de intervenções como: avaliação inicial; criação de


um currículo (também chamado de plano ou programa) de ensino
individualizado, programação de intervenções (KRACKER, 2018). Além
disso, é importante sempre estar atento ao planejamento, produzindo e
avaliando o programa em si. Esses passos estão representados na Figura
1 e serão melhor definidos nos tópicos a seguir.

Figura 1–Passos de intervenções baseadas em ABA

Fonte: elaborado pela autora.

1.1 Avaliação e identificação de objetivos de ensino

A avaliação tem como objetivo identificar comportamentos-alvo a serem


promovidos e comportamentos-problemas a serem minimizados, sendo
a avaliação uma etapa fundamental para a construção de objetivos
claros que guiarão um bom programa de ensino. Além disso, os autores
Ribeiro, Sella e Souza (2018) explicam que essa etapa também deve ser
capaz de mostrar relações entre os comportamentos e ambientes, ou
seja, explicar por que o comportamento se mantém e qual a sua função.
47

Por isso, Kracker (2018) afirma a necessidade de as avaliações serem


bem planejadas, o que implica a escolha de aspectos como o qual será
o melhor ambiente para a sua realização, escolha por procedimentos e
materiais para coleta de dados, e mesmo a organização da sessão, para
que ela seja motivadora para que o indivíduo em avaliação interaja e
forneça respostas.

Segundo Ribeiro, Sella e Souza (2018), para realizar uma avaliação é


possível adotar métodos de avaliação diretos e indiretos. Os métodos
indiretos correspondem aos meios que promovem informações gerais
iniciais sobre o avaliado, os quais são identificados de acordo com o
próprio avaliado, ou por pessoas que fazem parte do seu convívio.
Como exemplos temos entrevistas, aplicação de escalas e checklists
respondidos sem observação direta de comportamentos.

Segundo os mesmos autores, a entrevista comportamental é o


primeiro passo para se iniciar uma avaliação e deve ser capaz de
obter informações importantes para a formulação de hipóteses sobre
as funções dos comportamentos e também para o planejamento de
intervenções. Ainda é destacável que a entrevista é uma primeira
oportunidade de construir vínculos, seja com o próprio indivíduo que
receberá a intervenção ou com os seus familiares, cuidadores ou mesmo
professores.

Algumas desvantagens da entrevista estão relacionadas a: ela não


ser passível de observar diretamente o comportamento, o que pode
promover ideias errôneas; as respostas não serem quantificáveis,
sendo mais difíceis de serem acompanhadas ao longo do processo; e o
entrevistado pode não trazer dados tão confiáveis, devido a expectativas,
falsas memórias, ou mesmo entendimento errado de alguma questão
(RIBEIRO; SELLA, SOUZA, 2018). Um exemplo muito comum é que alguns
familiares de pessoas com TEA, quando perguntados podem dizer que
a criança brinca, só que quando chega o momento de observação, a
criança está apenas balançando ou enfileirando um carrinho como
48

forma de se estimular sensorialmente (comum em crianças com TEA),


ou seja, a criança não está dando a função adequada ao objeto em uma
brincadeira, logo, ela não está brincando.

Ribeiro, Sella e Souza (2018) explicam que as escalas ou checklists


são instrumentos que mensuram especificamente alguns tipos
de comportamentos quantitativamente, o que objetiva elencar os
comportamentos-alvos a serem trabalhados. Como mencionado, há
alguns checklists utilizados como forma de observação indireta, logo,
não necessariamente precisa da participação do avaliado ou familiar
presente para o preenchimento. Um exemplo é o Child Behavior Checklist
(CBCL), que mensura comportamentos de habilidades sociais.

Já os métodos de avaliação diretos correspondem a meios que


obrigatoriamente necessitam da observação direta do avaliado e
daqueles que fazem parte de seu convívio (KELLEY et al., 2011 apud
RIBEIRO; SELLA, SOUZA, 2018). Neste tipo de avaliação, além dos
comportamentos serem avaliados, esses também são manipulados
ao longo do processo, já que muitas vezes objetos em específicos são
colocados para direcionar comportamentos, ou mesmo o analista do
comportamento interfere fazendo solicitações. Como exemplo, temos
observações e instrumentos como checklists, inventários ou protocolos.

Kracker (2018) explica que a observação é um bom meio de obter dados


no ambiente natural da pessoa a fim de compreender a função de
alguns comportamentos desafiadores. Esse tipo de registro aumenta a
quantidade de dados qualitativos que ajudarão a compor um programa
de ensino individualizado. Estas observações, como já mencionado,
também podem ser semiestruturadas, acontecendo com um controle
maior do ambiente, a fim de verificar habilidades gerais a serem
avaliadas (RIBEIRO; SELLA, SOUZA, 2018).

Lafrance (2018) ressalta o quanto para uma boa avaliação é importante


utilizar diferentes tipos de instrumentos, até porque, estes serão
49

capazes de avaliar informações distintas do comportamento. O que


reforça a importância de múltiplas medidas, a fim de assegurar melhor
as informações ao traçar o programa de ensino individualizado.

Segundo Kracker (2018), devido ao uso de ABA principalmente com foco


em intervenções para o autismo, muitas pesquisas têm se empenhado
em desenvolver manuais com instrumentos que auxiliam a etapa
de avaliação. No Quadro 1, foram reunidos apenas alguns desses
instrumentos para que você conheça alguns checklists, inventários ou
protocolos. Porém, lembre-se de que para a aplicação de qualquer
instrumento é importante um estudo refinado sobre seu manual,
além do conhecimento base em análise do comportamento, antes da
aplicação prática.

Quadro 1–Instrumentos de avaliação

Instrumento Ano de publicação Objetivo

Passo a passo, seu Avalia 26 habilidades básicas para aquisi-


caminho: Guia Curri- 1988 ção de autonomia, ajudando na construção
cular para o Ensino de 2006 reeditado de currículos por meio de programas de
Habilidades Básicas ensino.
Avalia 580 itens de comportamentos re-
Inventário Portage lacionados às áreas de desenvolvimento
Operacionalizado 1969 motor, linguagem, cognição, socialização e
(IPO) autocuidados.
Social Skills Solutions: Checklist de 345 habilidades sociais. Inclui
A Hands-on Manual for 2002 estratégias para o ensino dessas habilida-
Teaching Social Skills des.
to Children with Autism
Socially Savvy: An Avalia 110 habilidades sociais diferentes
assesment and curric- 2006 sugerindo atividades e estratégias de inter-
ulum guide for young venção.
children
Verbal Behavior Mile- Avalia 170 habilidades da aprendizagem,
stones Assessment linguagem, avaliação de transição e barrei-
2008
and Placement Pro- ras comportamentais. O instrumento ainda
gram (VB-MAPP) traz estratégias de ensino.
Assessment of basic Avalia 544 habilidades de linguagem, inte-
language and learn- 2014 ração social, autocuidados, comportamen-
ing skills – Revised tos motores e acadêmicos.
(ABLLS-R)
Fonte: adaptado de Kracker (2018) e Ribeiro, Sella e Souza (2018).
50

Como já mencionado, os instrumentos mencionados são meios de


mensuração de comportamentos eficazes, mas é importante que você
se atente para quais comportamentos quer avaliar para fazer a escolha
de instrumento correto (KRACKER, 2018). Dessa forma, até mesmo esta
escolha de instrumentos deve ser um planejamento individualizado da
sessão, pois, por exemplo, no caso de avaliação de crianças com TEA,
quando na entrevista os familiares não mencionam qualquer dificuldade
em relação às habilidades sociais, e você também não as identifica em
observações iniciais, não necessariamente você precisará aplicar algum
protocolo que mensure esse tipo de comportamento.

Outro ponto importante sobre o processo de avaliação, é que por meio


das entrevistas, observações e aplicações de instrumentos já é possível
que você vá levantando as preferências da pessoa atendida. Isso ajudará
a definir reforçadores e compreender melhores formas de guiar o
caminhar da prática.

No tópico a seguir você aprenderá mais sobre os caminhos para o


planejamento de intervenções após o processo de avaliação, mas antes
de encerrarmos este tópico é importante ressaltar que no caso de
avaliação e acompanhamento de crianças e adolescentes, é essencial o
diálogo contínuo com familiares, escola e demais terapias que a pessoa
frequente. Então, como mencionado, as pessoas que têm contato com
o indivíduo avaliado, em outros espaços, podem contribuir muito com
informações e colaboração ao longo de toda a intervenção baseada em
ABA.

2. Diferentes tipos de programas de


ensino em ABA

Após ter sido realizada a avaliação, chega o momento de organizar


o programa de ensino, que também pode ser denominado como
51

currículo de ensino, Planejamento Educacional Individualizado (PEI) ou


Planejamento Individualizado Terapêutico (PIT) a depender da literatura
ou contexto de aplicação da ABA. Segundo Kracker (2018), o primeiro
passo é elencar os principais objetivos, que são construídos com
base nos resultados alcançados junto aos instrumentos utilizados na
avaliação.

Alguns instrumentos de avaliação, como o citado VB-MAPP (Quadro 1),


já trazem uma base construída de como você deve realizar a seleção de
objetivos e delineamento de programas de ensino, pensando em um
currículo que privilegie o ensino de habilidades por meio de uma base
sequencial ao desenvolvimento humano esperado para cada faixa etária
(WINDHOLZ, 1988 apud KRACKER, 2018). Ou seja, os objetivos devem ser
definidos, incentivando o desenvolvimento dos comportamentos mais
simples para os mais complexos.

Outro fator importante para definir os objetivos de um programa


de ensino é eleger não apenas marcos de comportamentos a serem
alcançados, mas também retratar barreiras dos comportamentos que
devem ser minimizadas, privilegiando os ganhos de comportamentos
que promovam maior desenvolvimento. Além disso, o ganho de
aprendizagens deve ser considerado de forma processual, não sendo
necessário elencar tantas habilidades de uma vez só, principalmente
em objetivos de mais curto prazo. Deixe metas grandes para serem
trabalhadas a longo prazo, sendo conquistadas como resultado de
metas menores trabalhadas no dia a dia.

Com os objetivos postos, chega a hora de promover as práticas para


alcançar o que foi estabelecido, mas e agora? Como fazer isso? Como
já mencionado, não há um único modelo interventivo em Análise do
Comportamento Aplicada (ABA Nos tópicos a seguir serão apresentados
três tipos de estratégias de ensino: a Intervenção comportamental
intensiva precoce (EIBI), o Ensino por Tentativas Discretas (DTT) e a ABA
Naturalística.
52

2.1 Intervenção comportamental intensiva precoce (EIBI)

A Intervenção comportamental intensiva precoce (EIBI) é uma


intervenção voltada principalmente para o atendimento de crianças
entre dois a três anos com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Segundo Dueñas, Bak e Plavnick (2018), esse tipo de intervenção
deve ter no mínimo 30 horas semanais de terapia comportamental
individualizada.

Um programa de ensino baseado em EIBI pode ter vários tipos de


intervenções focais, a depender da necessidade de cada criança. Dueñas,
Bak e Plavnick (2018) indicam o autogerenciamento, a modelação e o
Prompting (dicas) e reforço como algumas das intervenções que podem
ser utilizadas na EIBI. O autogerenciamento corresponde a ensinar
a criança a identificar eventos que estão ocorrendo nos ambientes,
de forma natural, a fim de estimular que ela consiga engajar-se em
comportamentos específicos de interação, esperados nesses ambientes
(MITCHEM et al., 2001 apud DUEÑAS; BAK; PLAVNICK, 2018).

Dueñas, Bak e Plavnick (2018) explicam que modelação corresponde à


ação de dar instruções, para que a criança atenda ao que está sendo
pedido, até que ela consiga realizar o comportamento-modelo de
forma semelhante, sem apoio. Já Prompting (dicas) e reforço é uma
forma de dar suporte ou ajuda, por meio do uso de ajuda física, dica,
uso de imagem, apoio escrito ou modelado, para que a criança acerte a
resposta solicitada. Neste processo, a dica ou ajuda é dada junto ao que
está sendo pedido, e quando a criança acerta a resposta, ela é reforçada
com o que for de sua preferência. Cabe destacar que a intenção é
que essa dica vá deixando de ser dada, ao passo que a criança vai
aprendendo a responder com maior facilidade.

2.2 Ensino por Tentativas Discretas (DTT)


O Ensino por Tentativas Discretas (DTT) é um modelo de intervenção,
que segundo Silva e Matsumoto (2018), tem sido utilizado eficazmente
53

desde os estudos de Ivar Lovaas, pesquisador responsável pelos


primeiros estudos inserindo a ABA ao ensino de crianças com
Transtorno do Espectro Autista (ABA), em 1970.

O DTT é um método de ensino estruturado por meio do planejamento


individualizado, com a finalidade de proporcionar comportamentos
que a pessoa precisa aprender. Dessa forma, o terapeuta ou pessoa
treinada para a aplicação oferece instruções, esperando a criança
responder ou oferecendo ajuda de dicas para que ela responda, e
quando esta interage respondendo corretamente, é oferecido o reforço
imediatamente seguido ao comportamento, sendo dado um espaço de
tempo para solicitar as próximas atividades e assim sucessivamente
(SILVA; MATSUMOTO, 2018).

Silva e Matsumoto (2018, p. 129) ainda indicam que o DTT pode ser
utilizado com outras estratégias baseadas em ABA e tem alta taxa
de efetividade, pois “as tentativas são rápidas e, por isso, acontecem
repetidas vezes, para que a criança tenha diversas possibilidades de
aprender”, além de ser um treino focado em um para um com objetivos
muito bem elaborados para promover as mais diversas habilidades.

2.3 Ensino em Ambientes Naturais

O ensino em ambientes naturais que vem sendo divulgado como ABA


Naturalista, segundo Souza (2018), tem como finalidade aumentar
a promoção de comportamentos verbais e a generalização de
comportamentos, por meio do próprio ambiente natural da pessoa,
como a escola ou a própria casa.

Tais estratégias focam na emissão natural do comportamento e em


respostas mais prováveis de serem generalizadas, mais do que em padrões
de respostas. Estes últimos são observados em contextos estruturados,
nos quais a manutenção do responder se dá por meio de consequências
primariamente arbitrárias, como no DTT. Um comportamento é
54

naturalmente emitido, quando a produção de suas consequências


mantenedoras é produto do responder do próprio organismo. (Souza;
2018, p. 200)

Na estratégia naturalista ainda ocorrerá a busca por objetivos a serem


alcançados, mas em vez de uma sistematização superestruturada
para treinar novos comportamentos, as habilidades serão ensinadas
naturalmente junto à rotina e interações comuns da pessoa. Além
disso, Souza (2018) ressalta que isso não impede do terapeuta ou
aplicador treinado modificar o ambiente, a fim de promover operações
motivadoras de comportamentos a serem trabalhados.

2.4 Registro e acompanhamento do Programa de Ensino


baseado em ABA

Ao avaliar e propor um programa de ensino, é importante se atentar


que em alguns casos muitos serão os objetivos elencados a serem
trabalhados, principalmente em crianças com Transtorno do Espectro
Autista (TEA) que possuam atrasos significativos no desenvolvimento.
Dessa forma, é preciso elencar primeiro objetivos que priorizem
habilidades mais básicas, que serão importantes para a aquisição de
outros comportamentos, como exemplos temos: sentar, olhar, imitar,
mas também é importante planejar objetivos a médio e longo prazos
(LAFRANCE, 2018). Como já mencionado, alguns instrumentos como o
VB-MAPP já trazem modelos de como planejar quais objetivos elencar
prioritariamente.

Para acompanhar se os objetivos a curto, médio e longo prazo têm sido


alcançados, é importante manter registros detalhados que facilitem
acompanhar os ganhos ou barreiras em possíveis comportamentos.
E claro, estipular datas elencadas aos objetivos para possíveis
reavaliações, pois se observado que os objetivos não têm sido
alcançados, é preciso reestruturar o planejamento de ensino, a fim de
55

que esse volte a estimular o desenvolvimento pleno da pessoa com


Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Referências
DUEÑAS, A.; BAK, M. Y. S.; PLAVNICK, J. Práticas baseadas em evidência e análise
do comportamento aplicada. In: SELLA, A. C.; RIBEIRO, D. M. (org.). Análise do
comportamento aplicada ao transtorno do espectro autista. Curitiba: Appris,
2018, p. 85-102.
KRACKER, C. A importância do uso de protocolos de avaliação e elaboração
de currículo individualizado. In: DUARTE, C. P. COLTRI, L. SILVA, L. R. V. (Orgs.).
Estratégias de análise do comportamento aplicada para pessoas com
transtorno do espectro autista. São Paulo: Memnon Edições Científicas, 2018, p.
10–36.
LAFRANCE, D. Planejando intervenções individualizadas. In: SELLA, A.C.; RIBEIRO,
D. M. (org.). Análise do comportamento aplicada ao transtorno do espectro
autista. Curitiba: Appris, 2018, p. 137-166.
RIBEIRO, D. M. SELLA, A. C. SOUZA, A. A. de. Avaliação do Comportamento. In: SELLA,
A. C.; RIBEIRO, D. M. (org.). Análise do comportamento aplicada ao transtorno do
espectro autista. Curitiba: Appris, 2018, p. 123- 136.
SOUZA, A. C. Estratégias de Ensino Naturalísticas: Ensino Incidental. In: SELLA, A.
C.; RIBEIRO, D. M. (org.). Análise do comportamento aplicada ao transtorno do
espectro autista. Curitiba: Appris, 2018, p. 200-212.
SILVA, L. C.; MATSUMOTO, M. S. Ensino por Tentativas Discretas. In: DUARTE, C. P.;
SILVA, L. C. L.; VELLOSO, R. L. (Orgs.), Estratégias de análise do comportamento
aplicada para pessoas com transtorno do espectro autista. São Paulo: Memnon
Edições Científicas, 2018, p. 127-139.
56

Análise do Comportamento
Aplicada ao ensino de pessoas
com deficiência Intelectual
Autoria: Mary Cristina Olimpio Pinheiro
Leitura crítica: Fernanda Cristina Silva Sepe

Objetivos
• Conceituar a deficiência intelectual.

• Descrever comportamentos característicos da


deficiência intelectual.

• Apresentar a Análise do Comportamento Aplicada


(ABA) como forma de atendimento a pessoas com
deficiência intelectual.
57

1. O desenvolvimento da pessoa com


Deficiência Intelectual

A Análise do Comportamento Aplicada (ABA), vêm se tornando


conhecida pela criação de programas de ensino específicos para pessoas
com Transtorno do Espectro Autista (TEA), Deficiência Intelectual (DI)
e também para outros transtornos do neurodesenvolvimento. Neste
tema, você aprenderá porque pessoas com Deficiência Intelectual
podem se beneficiar com intervenções baseadas em ABA. Antes de
adentrarmos especificamente na relação entre ABA e Di, é importante
que você relembre o que é a deficiência intelectual e suas características
mais comuns.

A American Association on Intellectual and Developmental Disabilities


(AAIDD), é uma associação internacional, formada por pessoas que
se organizaram com a finalidade de defender os direitos das pessoas
com deficiência intelectual (AAIDD, 2010), sendo essa associação uma
das pioneiras a lutar pelo uso da nomenclatura atual da deficiência
intelectual que é ainda muito recente. Por isso, você já pode ter ouvido
outras terminologias, relacionadas a essa condição, mas que estão em
desuso, como deficiência mental, retardo mental ou mesmo termos já
considerados capacitistas, como retardado ou mesmo mongoloide.

Cabe ressaltar que o capacitismo é o termo designado ao uso de


expressões ou comportamentos preconceituosos, direcionados a
pessoas com deficiência ou algum Transtorno Mental. Dessa forma, em
sua prática, é essencial que utilize apenas o termo atual e correto, que é
deficiência intelectual.

Segundo a AAIDD e a Organização Mundial da Saúde (OMS), a deficiência


intelectual conceitua-se como uma condição caracterizada por limitações
substanciais no funcionamento intelectual e nos comportamentos
adaptativos, que sejam permanentes durante todo o período de
58

desenvolvimento, e tenham início antes dos vinte e dois anos (AAIDD,


2010).

No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V), a


deficiência intelectual ou Transtorno do Desenvolvimento Intelectual,
é caracterizado como um Transtorno do Neurodesenvolvimento,
relacionado a déficits funcionais intelectuais e adaptativos com relação
aos domínios conceituais, sociais e práticos (APA, 2013), ressaltando que
esses déficits precisam aparecer no período inicial ao desenvolvimento
humano.

Quanto ao entendimento do que é funcionamento intelectual, este


se caracteriza como o próprio entendimento do que é a inteligência,
ou seja, a capacidade de aprendizagem, raciocínio, habilidade para
resolver problemas, para pensar de forma abstrata entre outras
comportamentos relacionados (AAIDD, 2010).

É muito comum que na avaliação seja analisada a inteligência por meio


do Quociente de Inteligência (QI), inclusive a AAIDD (2010), destaca que
para a classificação de deficiência intelectual são necessários meios
de avaliação do QI, que pontuem de 70 a 75 em QI, o que caracteriza
uma limitação significativa do funcionamento intelectual. Entretanto,
como posto, a deficiência intelectual não está relacionada apenas a
incapacidades no funcionamento intelectual, mas também devem estar
presentes atrasos significativos em comportamentos adaptativos.

Os comportamentos adaptativos são caracterizados como um grupo de


habilidades denominadas como conceituais, sociais e práticas, que se
desenvolvem ao longo da vida (AAIDD, 2010). Assim como, no caso do
funcionamento intelectual, existem testes padronizados que podem vir a
contribuir na avaliação de comportamentos adaptativos.

Na Figura 1, são apresentados alguns comportamentos que caracterizam


alguns exemplos de comportamentos adaptativos.
59

Figura 1 – Exemplos de comportamentos adaptativos

Fonte: adaptada de AAIDD (2010) e APA (2013).

Como representado na Figura 1, é possível observar que pessoas com


deficiência intelectual podem ter algumas dificuldades relacionadas
a compreensão de conceitos socialmente construídos, dificuldades
em emitir comportamentos que possibilitam maior reciprocidade nas
relações interpessoais, assim como em executar comportamentos da
rotina diária, como se alimentar, manter-se em segurança, compreender
regras sociais, entre outros.

Cabe destacar que o comportamento adaptativo preza por uma


constante observação e adaptação junto ao ambiente da pessoa, visto
que as práticas mudam de tempos em tempos (AAIDD, 2010). Por
exemplo, as formas de comunicação, muito antigamente eram enviadas
por cartas, passou-se a existir chamadas telefônicas e, recentemente, há
a existência de múltiplas formas de comunicação via smartphones. Dito
isso, ressalta-se que para que esses comportamentos se desenvolvam, é
importante uma boa leitura dos estímulos do ambiente social.

Ainda sobre o diagnóstico de deficiência intelectual especificadores


de gravidade atual, ou seja, uma classificação do transtorno do
60

neurodesenvolvimento em leve, moderado, grave ou profunda, o


que agrupará maior ou menor nível de dependência e aquisição de
habilidades desse grupo de pessoas (APA, 2013). No próprio DSM-V,
você pode encontrar informações mais detalhadas sobre esses níveis de
gravidade. Neste texto, não será realizado esse detalhamento, pois, para
a prática em Análise do Comportamento Aplicada (ABA), sempre será
necessária uma avalição individualizada do repertório atual do indivíduo,
a fim de promover programas de ensino individualizados, logo, na ABA,
o especificador de gravidade não necessariamente contribuirá com a
prática.

Inclusive, a própria associação internacional que versa sobre a


deficiência intelectual, a Association on Intellectual and Developmental
Disabilities (AAIDD), ressalta que o diagnóstico da deficiência intelectual
deve sempre ter como base uma avaliação cultural e social do ambiente
em que a pessoa avaliada se desenvolve, e por quê toda essa atenção? A
associação considera que diferenças linguísticas e sociais podem afetar
diretamente nas considerações para efetivação de um laudo.

Pense no seguinte exemplo, um profissional avaliará uma criança e


se comunica falando e fazendo perguntas a ela, e a criança passa a
consulta toda sem responder falando, ou emite palavras sem significado
para o profissional. Facilmente, esse profissional poderia concluir que
a criança apresenta atraso na aquisição da linguagem, dificuldade
de interação social recíproca e indicaria, como suposição, investigar
mais o caso, sendo possível a classificação como uma criança com
deficiência intelectual. Na entrevista com os familiares o profissional
se dá conta que a criança se comunica facilmente pela fala sim, só
que ela é indígena, logo, sua língua materna é a língua de sua etnia
e ela apenas não desenvolveu o português. Logo, as características
descritas não seriam suficientes para um diagnóstico em DI. Por isso, a
importância da avaliação ser sempre conduzida por meio de uma equipe
multiprofissional, levando-se em conta os comportamentos aprendidos
socialmente.
61

Quanto às comorbidades, a deficiência intelectual pode aparecer


associada a paralisia cerebral, quadros de epilepsia, Transtorno de
Déficit de Atenção/Hiperatividade, Transtorno do Espectro Autista (TEA),
Transtornos de Ansiedade e Transtorno do Movimento Estereotipado
(APA, 2013). Assim como também há a possibilidade de associação com
algumas síndromes como as Síndrome de Down, Síndrome de Rett e
Síndrome de Cri Du Chat.

Agora que estão apresentados o conceito e principais características


que podem emergir em um diagnóstico de deficiência intelectual, é
possível que você já tenha percebido que esse grupo de pessoas pode
precisar de intervenções específicas que ajudem ao longo de seu
desenvolvimento. Dessa forma, no tópico a seguir, será apresentado
mais sobre a relação entre Análise do Comportamento Aplicada e a
deficiência intelectual.

2. Análise do Comportamento Aplicada a


Deficiência Intelectual

Para a AAIDD (2010), o principal motivo para classificar uma pessoa com
deficiência intelectual deve ser o foco na construção de um conjunto
personalizado de serviços e emprego de estratégias, que ofereçam
suporte a essa pessoa, por um período de tempo de acordo com sua
necessidade, e que vise o objetivo de proporcionar maior bem estar,
ganho de autonomia e inclusão social. A Análise do Comportamento
Aplicada (ABA) surge como uma das intervenções que possibilitam
ganhos para o desenvolvimento dessas pessoas por meio de programas
de ensino individualizados.

Fazzio (2002), ao trazer um pouco sobre a história da relação entre


ABA e pessoas com transtornos do neurodesenvolvimento, diz que
desde o próprio surgimento dessa ciência, os estudos já se voltavam
62

para esse público. Tendo na década de 1950, estudos que focavam


comportamentos em específico desse grupo.

As pesquisas continuaram e, na década de 1970, já existiam estudos


de ABA voltados para comportamentos e situações específicas, como
treino de banheiro, manejo de comportamentos relacionados a
agressão ou comportamentos específicos de pessoas com transtornos
do neurodesenvolvimento (FAZZIO, 2002 apud FOXX; AZRIN, 1975;
PATTERSON; REID; JONES; CONGER, 1975).

Apesar das pesquisas relacionando ABA e transtornos do


neurodesenvolvimento já mostrarem evidências que comprovavam
sua eficiência, o pesquisador Fazzio (2002) explica que os críticos
acreditavam haver ainda pouca validação de que os ganhos, em
habilidades por meio dessas intervenções, fossem pouco generalizados,
ou seja, eram ganhos restritos ao ambiente controlado em que eram
conduzidas as pesquisas.

Segundo o mesmo autor, nos anos posteriores, surgiram muitos


estudos mostrando a importância da ABA ser planejada para outros
espaços, para além dos momentos planejados, como na clínica. Por
isso, esta ciência foi sendo disseminada para além dos profissionais da
Psicologia, assim como, hoje, há um movimento para familiares também
aprenderem estratégias que podem ser incorporadas à rotina diária.
Ao pensar na prática em ABA para pessoas com deficiência intelectual,
este é um ponto importante, visto que essa condição tem como
características: dificuldade para aprender, dificuldades de memorização
e perceber comportamentos sociais. Logo, quanto mais espaços e
pessoas empregam a mesma forma de ensino, mais fácil se torna a
generalização e aprendizagem de novos comportamentos.

Na década de 1980, Lovaas (1981), que se destacou pelos estudos


de ABA em pessoas com TEA, também aplicava intervenções
comportamentais junto a crianças com deficiência intelectual. Inclusive,
63

o livro Teaching Developmentally Disabled Children: the me book, publicado


por Lovaas, em 1981, tinha como público-alvo familiares e professores
de pessoas com diagnósticos de “deficiências do desenvolvimento”, não
sendo exclusivamente direcionado ao público com TEA (FAZZIO, p. 38,
2002).

Junto ao trabalho de Lovaas (1981), a autora Martone (2017, p. 15),


destaca a publicação do livro Comportamento Verbal, em 1957, como
influenciadora para construção de uma linha de pesquisa independente
sobre a aquisição de linguagem em crianças com autismo ou outros
atrasos do desenvolvimento, como a deficiência intelectual. Nas décadas
seguintes, os estudos em ABA só vêm aumentando e enfatizando a
relevância de práticas comportamentais, independente do público em
específico.

Não existe uma prática em ABA específica para pessoas com deficiência
intelectual, assim como não há uma prática em ABA específica a
pessoas com autismo. A ABA é uma ciência que pode guiar a aplicação
de práticas junto a pessoas com deficiência intelectual, sendo essas
práticas sempre construídas por meio de avaliação de repertório de
comportamentos iniciais, a fim de elencar intervenções específicas, pois,
como visto, mesmo junto a um diagnóstico de deficiência intelectual,
existem diversas classes de comportamentos diferentes que podem
precisar serem desenvolvidas.

Dessa forma, cada criança com deficiência intelectual precisará de um


plano de ensino individualizado, que pode ser compreendido como a
sistematização de habilidades que devem visar respostas específicas
que espera desenvolver no repertório do indivíduo (FAZZIO, 2002). Logo,
cada pessoa com deficiência intelectual terá muito especificamente
objetivos a serem trabalhados. Apesar disso, pensando nas
características comuns a deficiência intelectual, ressalta-se que algumas
pessoas precisaram iniciar com treinos que foquem no desenvolvimento
64

de comportamentos base, mais simples, para depois serem trabalhadas


habilidades mais complexas.

Um dos instrumentos que pode vir a auxiliar, em casos de


deficiência intelectual, como forma de avaliar o repertório atual e
planejar intervenções específicas, é o Manual do Inventário Portage
Operacionalizado. Ele foi adaptado pelas autoras Willians e Aiello
(2020), e elenca 580 comportamentos distribuídos em cinco áreas
do desenvolvimento: motora, cognitiva, da linguagem, socialização e
autocuidados.

Cada área do desenvolvimento agrupa comportamentos que podem


vir a orientar intervenções específicas em crianças com deficiência
intelectual, que possuam déficits nessas áreas. O instrumento sinaliza
sua aplicação na faixa etária de zero a seis anos, mas pode vir a ser
utilizado em faixas etárias maiores, visto os déficits que podem estar
presentes em pessoas com deficiência intelectual em idades mais
avançadas.

O desenvolvimento motor corresponde a habilidades ligadas a


“movimentos coordenados por pequenos e grandes músculos”
(WILLIANS; AIELLO, 2020 apud BLUMA et al., 1978). Já o desenvolvimento
da cognição, é entendido como a capacidade da compreensão das
palavras, conceitos em diferentes contextos ambientais e que permitem
fazer relações de diferenças e semelhanças.

Segundo Willians e Aiello (2020), o desenvolvimento da socialização


está ligada a habilidades base para o estabelecimento de relações
interpessoais com outras pessoas, e o desenvolvimento da linguagem
corresponde a habilidades ligadas ao próprio desenvolvimento de
comportamentos verbais.

A área de desenvolvimento de autocuidados, segundo os mesmos


autores, corresponde a capacidade de autonomia e para realizar
65

atividades de cuidados diários, como atividades ligadas a alimentação,


higiene, se manter seguro, entre outros comportamentos.

Figura 2 – Exemplos de comportamentos ligados as


áreas de desenvolvimento

Fonte: adaptada de Willians e Aiello (2020).

Cabe destacar que os exemplos trazidos na Figura 2 são apenas


alguns de múltiplos comportamentos possíveis dentro das áreas do
desenvolvimento discriminadas, que são detalhados ao longo do
Manual do Inventário Portage Operacionalizado (WILLIAMS; AIELLO, 2020).
Além disso, caso você tenha percebido, algumas habilidades podem
estar relacionadas a mais de uma área do desenvolvimento, como
exemplo, indicar que quer ir no banheiro, pode ser entendida como
uma habilidade que pode fazer parte do desenvolvimento social, da
linguagem e de autocuidado.
66

Do mesmo modo que alguns comportamentos estão presentes em


mais de uma área de desenvolvimento humano, é também importante
destacar que as intervenções baseadas em ABA podem vir a trabalhar
mais de uma classe de comportamentos ao mesmo tempo. Por isso,
práticas em ABA devem sempre valorizar a utilização de diferentes
recursos, estratégias e utilizar espaços diferentes que proporcionem
maior generalização. Assim como, devido a característica comum
a deficiência intelectual, que é a dificuldade de memorização, será
importante sempre relembrar, mesmo os conceitos que antes já
pareciam aprendidos.

Por fim, a AIDD (2012), ressalta a importância de um trabalho voltado ao


respeito aos interesses da própria pessoa com deficiência, assim como
de seus familiares, sendo essa uma característica também presente
na prática em ABA, onde os objetivos e intervenções devem levar em
consideração os desejos e satisfação dos envolvidos.

Referências
AMERICAN ASSOCIATION ON INTELLECTUAL AND DEVELOPMENTAL DISABILITIES.
Definition of intellectual disability. AAIDD, 2010. Disponível em https://www.aaidd.
org/intellectual-disability/definition . Acessado em: 29 maio 2023.
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais: DSM-5. Porto Alegre: Artmed, 2013.
FAZZIO, D. F. Intervenção comportamental no autismo e deficiências de
desenvolvimento: uma análise dos repertórios propostos em manuais de
treinamento. Dissertação (Mestrado em Estudos Pós-Graduados em Psicologia
Experimental: Análise do Comportamento), p. 112. São Paulo: Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, 2002.
LOVAAS, O. I. The ME Book. Teaching developymentally disabled children. Baltimore,
Maryland: University Park Press, 1981.
MARTONE, M. C. C. Tradução e adaptação do Verbal Behavior Milestones
Assessment and Placement Program (VB-MAPP) para a Língua Portuguesa
e a efetividade do treino de habilidades comportamentais para qualificar
67

profissionais. Tese (Doutorado em Psicologia). Programa de Pós-Graduação em


Psicologia, p. 265. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos, 2017.
SKINNER, B. F. Verbal behavior. New York: Appleton-Century-Croft, 1957.
WILLIAMS, L. C de A.; AIELLO, A. L. R. Manual do Inventário Portage
Operacionalizado: avaliação do desenvolvimento de crianças de 0 a 6 anos.
Curitiba: Juruá, 2020.
68

Planejamento e processos de
ensino em ABA relacionados a
deficiência intelectual
Autoria: Mary Cristina Olimpio Pinheiro
Leitura crítica: Fernanda Cristina Silva Sepe

Objetivos
• Aprender como elencar objetivos em
intervenções Análise do Comportamento
Aplicada (ABA), com foco em pessoas com
deficiência intelectual.

• Apresentar estratégias de ensino voltadas ao


ensino de pessoas com deficiência intelectual.

• Conhecer habilidades sociais e a importância


de seu ensino para pessoas com deficiência
intelectual.
69

1. A prática em ABA junto a pessoas com


deficiência intelectual

Neste tema, você terá a oportunidade de compreender como priorizar


a seleção de objetivos a serem ensinados por meio de intervenções
baseadas em ABA junto a pessoas com deficiência intelectual. Dessa
forma, será possível aprofundar seus conhecimentos acerca da
relevância do ensino de habilidades sociais para esse público.

O desenvolvimento de um programa de ensino em ABA para uma


pessoa com deficiência intelectual segue as mesmas etapas comuns
à prática dessa ciência com outros públicos. As etapas incluem: 1)
avaliação com o uso de diversos instrumentos; 2) identificação de
comportamentos-alvo, que guiarão a criação de objetivos individuais
no plano de ensino; 3) adoção de um ou mais modelos de ensino; e 4)
práticas diárias para o alcance dos objetivos estabelecidos no programa.
Além disso, a autora Lafrance (2018) afirma ser essencial que todas
as práticas sejam registradas para fortalecer o acompanhamento
individual.

Segundo a mesma autora, no decorrer da avaliação será possível


identificar os déficits (comportamentos que precisam ser desenvolvidos)
e excessos comportamentais (comportamentos que precisam ser
minimizados pois podem atrapalhar o desenvolvimento da pessoa).
Em pessoas com deficiência intelectual, é possível que estejam
presentes atrasos em muitos comportamentos das diferentes áreas do
desenvolvimento, por isso, segundo Lafrance (2018, p. 138), é necessário
priorizar os comportamentos a serem trabalhados primeiro para
“garantir que as habilidades menores e mais simples serão ensinadas
e que a intervenção seja organizada de maneira hierárquica para
maximizar a probabilidade de grandes ganhos”.
70

Considerar a hierarquização dos objetivos é importante na prática


com pessoas que possuem deficiência intelectual, uma vez que, como
possíveis características, podem apresentar dificuldade nos processos
de aprendizagem, dificuldades para generalização, memorização e
aquisição de comportamentos adaptativos, entre outras características
(APA, 2013). Por isso, é essencial selecionar objetivos de forma
cuidadosa e priorizar um ensino estruturado em etapas que a pessoa
consiga acompanhar. Deve-se, ainda, dar preferência ao ensino de
comportamentos que favoreçam a independência e a autonomia do
indivíduo. Diante disso, surge a pergunta: como escolher o que deve ser
priorizado no ensino de pessoas com deficiência intelectual?

Para ajudar a determinar quais comportamentos devem ser elencados


como de maior ou menor prioridade, a pesquisadora Lafrance (2018),
citando os autores Rosales-Ruiz (1996) e Baer (1997), apresenta o
conceito de “cusp comportamental”, também chamado de cúspide
comportamental ou mesmo considerado por outros autores como
comportamentos base, o que conceitualmente refere-se a:

[..] mudanças de comportamento que têm consequências para o


organismo além da própria mudança. Os autores explicam que isso
acontece quando o indivíduo faz contato com novas contingências,
significando, no sentido amplo, exposição a contextos e ambientes
diferentes, estímulos novos e, até mesmo, a aquisição de novos
comportamentos que podem levar a mudanças futuras no repertório
comportamental. (LAFRANCE, 2018, p. 139)

Em outras palavras, é quando alguém aprende algo que promove


aprendizagens para além da aprendizagem propriamente dita, por ser
um comportamento importante para promover novas contingências
em outros contextos e espaços. Por exemplo, quando uma criança
aprende letras do alfabeto, isso possibilita que, posteriormente,
consiga ler frases, assimilar textos e compreender conteúdos diversos
disponibilizados pelas leituras. Isso ilustra a ideia de Lafrance (2018), de
71

que a aquisição de comportamentos básicos é um pré-requisito para o


desenvolvimento de habilidades mais complexas.

A mesma autora, citando Bosch e Fuqua (2001), descreve cinco


orientações que podem ser consideradas ao se pensar quais
comportamentos dar prioridade. Na Figura 1, essas são descritas em
forma de perguntas.

Figura 1–Perguntas para orientar a seleção de


comportamentos-alvo

Fonte: adaptada de Lafrance (2018 apud BOSCH; FUQUA, 2001).

As perguntas sugeridas na Figura 1 podem ser exemplificadas com a


seguinte situação: pense que você optou por ensinar uma pessoa com
deficiência intelectual a apontar em um contexto clínico, para que peça
coisas que deseja. Agora, respondendo às perguntas: o comportamento
de apontar é uma habilidade que permite acesso a novos reforçadores,
contingências e ambientes? Muito possivelmente, sim, visto que o
comportamento pode ser atendido em outros ambientes e por outras
pessoas; é um comportamento válido de ser aprendido no momento?
Pode ser que sim, principalmente, se é uma criança que ainda não se
72

comunica pela fala. Possibilita o desenvolvimento de outras áreas sem


orientação específica? Possivelmente, sim, já que, por meio do apontar,
a criança pode ir compreendendo outros comportamentos ligados ao
comportamento verbal. Apontar ajuda a minimizar comportamentos
desafiadores ou inapropriados? Muito provavelmente, sim, pois a
criança estará expondo o que quer, diminuindo a frequência dela tentar
se comunicar de forma menos assertiva. Por último, apontar afetara as
pessoas a sua volta? Se as pessoas interagirem de volta, com certeza
serão afetas, se comunicando mais com a criança que está aprendendo.

A autora Lafrance (2018) também indica que sejam priorizados objetivos


relacionados a comportamentos-alvo em áreas do desenvolvimento
que possuam maiores déficits ou excessos comportamentais,
principalmente, quando esses déficits ou excessos podem ser
considerados como barreiras ao desenvolvimento saudável, como
comportamentos de autoagressão, agressão, destruição de objetos
entre outros.

Outra dica importante para elencar os objetivos, segundo Lafrance


(2018, p. 146), é de que é preciso pensar nos objetivos a curto, médio
e longo prazo, de forma hierárquica, os objetivos a curto prazo devem
priorizar os comportamentos relacionados ao aprender a aprender, ou
seja, aqueles comportamentos que mostram que a pessoa está disposta
a novas aprendizagens. De exemplo, pode-se pensar em um contexto
clínico infantil, onde são estipulados de objetivos a curto prazo que a
criança comece a perceber mais os brinquedos da sala, olhe mais para o
terapeuta, sente para brincar entre outros comportamentos.

Já os objetivos a médio prazo, segundo a mesma autora, podem


corresponder a tentativas de melhorar a precisão, frequência e duração
dos comportamentos que foram traçados a curto tempo, ou mesmo,
aumentando aos poucos a complexidade os comportamentos de
curto prazo. Então, por exemplo, se o objetivo inicial era que a pessoa
percebesse o terapeuta e brincasse, a médio prazo, pode se estabelecer
73

que a pessoa interaja mais durante a intervenção, use os brinquedos por


iniciativa própria, inicie brincadeiras junto ao terapeuta.

Por fim, Lafrance (2018) descreve que os objetivos a longo prazo devem
ser mais gerais dentro do programa de ensino, comportamentos
mais amplos a serem alcançados. Então, ainda usando os exemplos
anteriores, pode-se esperar que a criança observe mais as pessoas
e objetos ao seu redor em diferentes espaços, inicie contatos com
outros adultos e crianças, brinque com outras crianças, entre outros
comportamentos.

Elencados os objetivos a serem trabalhados, podem ser utilizados


diferentes modelos de ensino, como em ambientes naturais, o Ensino
por Tentativas Discretas (DTT), entre outros modelos. Entre esses, as
autoras Domeniconi e Benitez (2021, p. 35) ressaltam o uso da “análise
de tarefas”, que “consiste na subdivisão de comportamentos motores
complexos em componentes menores e mais facilmente ensináveis”.

Para a prática utilizando a análise de tarefas, as mesmas autoras


explicam que é preciso identificar quais comportamentos menores
compõem uma cadeia de respostas que levam a um comportamento
mais complexo. Por exemplo, tomar banho é uma ação de autocuidados
que envolvem vários comportamentos menores: 1) tirar as roupas; 2)
ligar o chuveiro; 3) passar o sabonete por todas as partes do corpo; 4)
tirar todo o sabonete do corpo; 5) secar todo o corpo com a toalha; 6)
vestir roupas limpas.

Perceba que uma ação que para você poderia ser considerada
simples, como tomar banho, é composta por uma grande cadeia de
comportamentos menores que as crianças, no geral, vão aprendendo
aos poucos ao longo do desenvolvimento. Por isso que no ensino de
algumas pessoas, como as pessoas com deficiência intelectual, contribui
quando esses passos sejam bem definidos, explicados e relembrados
até que consiga desempenhar a tarefa com autonomia.
74

Uma dica válida para contribuir durante o uso da análise de tarefas, é


utilizar recursos concretos como apoios visuais que demonstrem os
comportamentos de forma sequencial. O apoio visual pode ficar preso
no ambiente em que o comportamento é esperado, como forma de
auxiliar como uma dica para a aprendizagem. Quando o comportamento
esperado já estiver aprendido, você pode ir sinalizando apenas com
dicas faladas e retirar o apoio visual, como no exemplo anterior, apenas
falar: não esqueça de lavar bem a cabeça.

É importante o trabalho constante junto a pessoas com deficiência


intelectual, visto que a condição promove atrasos e dificuldades que se
estendem ao longo de todo o desenvolvimento (APA, 2013),mas atenção,
pois isso não quer dizer que não aprendem, apenas que são pessoas
que diante a novos estímulos e demandas, talvez precisem de apoio
mesmo já estando na fase adulta. Por isso, é importante que para além
de um trabalho clínico focado em ABA, outras pessoas que fazem parte
da vida dessa pessoa aprendam formas que possibilitem a estimular
e sempre incentivar a independência. Além disso, a perspectiva da
inclusão social pontua o quanto é importante que os ambientes se
adaptem para receber pessoas com deficiências, e não ao contrário, a
pessoa com deficiência se adaptar para atender as demandas dos locais.

Entre as características marcantes no diagnóstico da deficiência


intelectual, estão os déficits em comportamentos adaptativos (APA,
2013). No tópico a seguir, serão apresentadas estratégias para o treino
de habilidades sociais, que podem ser utilizadas em diversos espaços e
vêm a contribuir junto ao desenvolvimento e autonomia desse público.

2. ABA com foco na promoção de habilidades


sociais

As autoras Yazawa e Rodrigues (2021, p. 6) afirmam que a Análise


do Comportamento “tem demonstrado potencial tecnológico no
75

desenvolvimento de repertório social adequado junto a pessoas com


diferentes expressões de deficiência”.

Os autores de referência no campo de estudos sobre as habilidades


sociais, Del prette e Del Prette (2017, p. 24), a definem como “um
conjunto de comportamentos sociais que apresentam características
específicas” dentro de uma determinada cultura, que favorecerão
relações interpessoais mais saudáveis na sociedade.

Segundo os mesmos autores, a competência social se refere ao


resultado da avaliação do repertório atual em emitir habilidades sociais,
ou seja, da capacidade social atual do indivíduo em desempenhar
comportamentos sociais em diferentes ambientes.

Existem diferentes classes subclasses de habilidades sociais. Na Figura


2, serão apresentadas algumas das classes mais comuns que podem ser
incorporadas na prática junto a ABA, com foco na deficiência intelectual,
assim como alguns comportamentos que podem fazer parte dessas
classes.
76

Figura 2- Classes de habilidades sociais

Fonte: adaptada de Del Prette e Del Prette (2005; 2017).

Tem uma classe de habilidades sociais que não foi trazida junto a
Figura 2, por se tratar de uma classe mais ampla que abarca algumas
subclasses, que é a habilidade social de assertividade. Está, segundo
Del Prette e Del Prette (2017), relacionada a comportamentos como:
defender direitos próprios e das demais pessoas; questionar; fazer e
recusar pedidos; admitir falhas; expressar sentimentos de forma não
agressiva nem omissiva com os próprios sentimentos; manejar críticas;
saber se portar diante de pessoas que possuem maior autoridade; entre
outros comportamentos relacionados a ações que são socialmente
consideradas assertivas.

Você pode ter notado que alguns comportamentos podem fazer parte
de mais de uma classe de habilidades sociais, assim como, na prática,
ao realizar uma atividade, podemos trabalhar mais de uma classe
por vez. Por exemplo, imagine que você está trabalhando com ABA
em um contexto clínico e, então, estipula uma atividade de ida até o
77

supermercado para comprar ingredientes para fazerem um bolo juntos.


Nesta atividade, você pode aproveitar o percurso, o mercado e as
interações sociais que ocorrerão neste percurso para ensinar diferentes
classes de habilidades sociais, por exemplo, você pode ensinar que só
pode andar na calçada e tem que respeitar a sinalização de trânsito
(comportamentos relacionados a civilidade); ao chegar no mercado,
respeitar sua vez na fila (comportamento de civilidade e assertividade),
conseguir regular as emoções mesmo que demore (comportamento
ligado a expressividade emocional), dizer olá para o moço que trabalha
no caixa (habilidade de comunicação e civilidade), oferecer ajuda para
carregar as sacolas (habilidade de empatia e fazer amigos), conversar
durante o percurso (comportamentos relacionados as habilidades de
comunicação e fazer amizades) dentre muitas outras ações e classes de
habilidades sociais que podem ser trabalhadas.

As habilidades sociais, como qualquer outro comportamento social


,pode ser aprendido ao longo de toda a vida, de forma mais natural,
por meio das relações interpessoais, ao longo da história de vida do
indivíduo, ou podem ser ensinadas por meio de treinos ou estratégias
para exercitar as habilidades que estejam com maior déficit no
repertório individual (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2017).

Cabe destacar que quando os planos de ensino possuem estratégias


com foco na promoção de habilidades sociais, o aumento do
repertório social também pode vir a contribuir junto ao manejo de
comportamentos inadequados, o que consequentemente pode vir a
ampliar os comportamentos mais assertivos, que contribuam junto ao
desenvolvimento de forma geral (YAZAWA; RODRIGUES, 2021). Por isso,
a importância de incluir o treinamento com foco em ampliar ou refinar
habilidades sociais ao longo das mais variadas intervenções com base
em ABA.

No exemplo apresentado, de que podemos ensinar habilidades sociais


em uma ida para o mercado, é possível perceber que as habilidades
78

sociais podem ser ensinadas para além de um contexto clínico e


em ambientes fechados. Até porque, é importante envolver outros
espaços e pessoas diferentes para contribuir com a generalização
das aprendizagens. Por isso, as autoras Yazawa e Rodrigues (2021)
defendem a instrumentalização para além da área da Psicologia, ou
de treinos específicos por meio da ABA, pois é importante capacitar
professores, familiares e demais profissionais da saúde que atuem junto
a pessoas com deficiência intelectual, para poderem também estimular
essas habilidades.

Como considerações finais sobre o tema, cabe sinalizar que é


importante que as pessoas que trabalharão o ensino de habilidades
sociais, também devem prestar atenção em suas próprias habilidades
sociais. Isso porque, para além dos treinos e estratégias em si, os
comportamentos sociais são aprendidos ao longo de toda vida, por
meio da observação, imitação, conversa, ou seja, ao longo de interações
sociais entre pares.

Referências
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (APA). Manual diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais: DSM-5. Porto Alegre: Artmed, 2013.
DEL PRETTE; AP DEL PRETTE, A.Z. Competência social e habilidades sociais:
manual teórico-prático. Petrópolis: Vozes, 2017.
DEL PRETTE, A..; DEL PRETTE, Z. A. P. Psicologia das habilidades sociais na infância:
Teoria e Prática. Petrópolis: Vozes, 2005.
DOMENICONI, C; BENITEZ, P. Princípios e métodos para o ensino de
comportamentos novos a pessoas com deficiência intelectual. Revista DI, [s. l.], n. 3,
2012.
LAFRANCE, D. Planejando intervenções individualizadas. In: SELLA, A. C.; RIBEIRO,
D. M. (org.). Análise do comportamento aplicada ao transtorno do espectro
autista. p. 137-166. Curitiba: Appris, 2018.
YAZAWA, T.; RODRIGUES, O. M. P. R. Manejo comportamental de crianças com
deficiência: avaliação dos efeitos de um programa utilizando os princípios da
Análise do Comportamento. Revista Educação Especial, [s. l.], v. 34, p. 1-21, 2021.
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