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PLANTAS DOENTES PELO

USO DE AGROTÓXICOS
Novas bases de uma prevenção contra
doenças e parasitas
– A teoria da trofobiose –
FRANCIS CHABOUSSOU

PLANTAS DOENTES PELO


USO DE AGROTÓXICOS
Novas bases de uma prevenção contra
doenças e parasitas
– A teoria da trofobiose –

EDITORA
EXPRESSÃO POPULAR
Copyright © 2006, by Editora Expressão Popular

Revisão: Geraldo Martins de Azevedo Filho


Projeto gráfico, capa e diagramação: ZAP Design
Impressão e acabamento: Cromosete
Prefácio: Paul Pesson
Revisão técnica e apresentação: Luiz Carlos Pinheiro Machado
Tradução: Maria José Guazzelli

ISBN 85-87394-87-8

Todos os direitos reservados.


Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada
ou reproduzida sem a autorização da editora.

1a edição: janeiro de 2006

EDITORA EXPRESSÃO POPULAR


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SUM ÁRIO

APRESENTAÇÃO ............................................................................................. 9
PREFÁCIO ...................................................................................................... 11
À minha esposa, Jacqueline Thibault,
que, em sua vida e sempre ao longo de minha
carreira, não cessou de me apoiar e de me dar
o exemplo de coragem e de determinação.

Agradecimentos

À Editora L&PM, de Porto Alegre/RS,


pela concessão dos direitos de tradução;
À Patrícia Karina Ferraz da Rosa por
sua magnífica digitalização;
À Ariana Gomide Porro Ferrari pela
ajuda na revisão gráfica do texto.
APRESENTAÇÃO

Os agricultores, estudantes, técnicos, pesquisadores e professo-


res brasileiros têm, com esta obra, acesso a um texto fundamental e
pioneiro para se entender o verdadeiro e complexo processo de pro-
teção das plantas da ação deletéria dos agentes parasitários: insetos,
fungos, bactérias, vírus, ácaros, nematódeos, coccídeos.
Francis Chaboussou, ao enunciar, na década de 1970, a teoria da
trofobiose, lançou um dos pilares da agroecologia. Com o ciclo do gás
etileno no solo e com a teoria da transmutação dos elementos de
Kervran, a teoria da trofobiose forma a base em que se apóia a pro-
dução de alimentos limpos, sadios, dispensando o uso de agrotóxicos*
e de fertilizantes solúveis de síntese química.

*
A tradução literal do título deste livro em francês é As plantas doentes pelos
pesticidas (Les plantes malades des pestícides). Entretanto, no Brasil, a partir da
década de 1970, os pesticidas agrícolas passaram a ser chamados de agrotóxicos,
denominação, sem dúvida, mais apropriada e usada na tradução original, posição
seguida nesta revisão. (N. do R.)
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Ao longo desta obra, o leitor encontrará uma sólida argumenta-


ção científica apoiada em extensa e qualificada bibliografia, demons-
trando que os parasitas não atacam as plantas cujos sistemas
nutricionais estejam equilibrados. Isto porque, os parasitas têm uma
particularidade fisiológica: seu equipamento enzimático digestivo é
carente ou insuficiente em enzimas proteolíticas, isto é, enzimas que
desdobram as proteínas em substâncias mais simples, como os
aminoácidos, assimiláveis pelos organismos. Esse fato, simples, e até
mesmo primário, explica porque os fertilizantes solúveis e os
agrotóxicos atraem os parasitas, gerando, assim, um ciclo de depen-
dência. Logo, a questão fundamental na proteção das plantas à ação
dos parasitas é desenvolver um processo produtivo que permita à plan-
ta chegar a um ótimo de proteossíntese, ou seja, à formação de subs-
tâncias mais complexas, como as proteínas, que demandam a ação de
enzimas para serem desdobradas e utilizadas. Nós que nos preocu-
pávamos com a produção agrícola limpa – animal e vegetal – não
tínhamos, até Chaboussou, as formulação e sustentação teórica de
uma prática milenar, conhecida e difundida pelos verdadeiros
agroecologistas: as plantas cultivadas em solos ricos em matéria or-
gânica, proveniente de esterco, não são atacadas por pragas e doen-
ças: este fato é explicado pela teoria da trofobiose, pois a nutrição das
plantas com substâncias complexas gera uma predominância da
proteossíntese, circunstância fisiológica adversa aos parasitas.
Chaboussou, como Voisin, apresenta suas posições e os resultados
das pesquisas que deram embasamento à sua teoria e as suas conclusões
(e parece ser uma “técnica” francesa...) de forma repetitiva e aparente-
mente, “paciente”. Na verdade, é uma forma sutil de “ganhar” o lei-
tor para suas posições. Por outro lado, Chaboussou, não só apresenta
a sua teoria da trofobiose, como denuncia, comprovadamente, o apa-
recimento de novas doenças pelo efeito do emprego de agrotóxicos.
O estudo dos desequilíbrios biológicos produzidos pelos diferen-
tes tratamentos convencionais, antes de controlar os parasitas, como

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demonstra Chaboussou, provoca uma perturbação na fisiologia das


plantas trazendo, em conseqüência, o agravamento do problema
inclusive, transformando em parasitas seres que, antes, mantinham
um convívio harmônico com a plantas. São, como chamou o autor,
as doenças iatrogênicas, isto é, doenças provocadas pelo uso de supos-
tos remédios.
Não é acidental e nem sem causa, que as poucas dezenas de pra-
gas e doenças vegetais registradas há pouco mais de meio século, hoje
chega à casa do milhar. Não é acidental, também, que os alertas de
Howard, Russell, Rusch, Voisin, Faulkner e tantos outros têm sido,
até mesmo menosprezados, pela ciência convencional: há, nessa área,
um poderoso jogo de interesses, cuja conta os produtores agrícolas –
pequenos, médios e grandes, todos – estão pagando, com o uso cres-
cente dos agrotóxicos e fertilizantes. É bem recente o fracasso da
“revolução verde” para confirmar o que está dito e dispensar maiores
comentários sobre o assunto, da mesma forma do que está acontecen-
do com o “agronegócio”, apresentado como panacéia e, hoje, sobre-
vivendo em crise sobre crise.
Chaboussou identificou as causas do problema. Propõe como
solução, essencialmente, a correção das carências de elementos mine-
rais no solo, especialmente dos microelementos. Nesse ponto, o ci-
entista expôs ao mundo e de maneira inequíosca, que a causa das
infestações parasitárias é, principalmente, os desequilíbrios
nutricionais: é a predominância na fisiologia da planta, da proteólise
sobre a proteossíntese. Este cientista, ainda preso a uma conduta
convencional que ele próprio “destrói”, propõe uma solução basea-
da na correção em elementos minerais do solo, com ênfase nos
microelementos, isto é, um caminho convencional.
Ora, o equilíbrio da composição mineral do solo é condição sine
qua non para a sua fertilidade. Não é esta a questão em discussão. O
problema é como alcançar esse equilíbrio. O caminho proposto por
Chaboussou – da correção mecânica das deficiências do solo com a

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simples incorporação dos elementos que a análise química registra


como carentes – este caminho entra em contradição com sua própria
teoria: se o balanço proteossíntese – proteólise, processo fisiológico
interno da planta, é a base da proteção vegetal contra os parasitas
quando esse balanço é favorável à proteossíntese, as plantas estão
protegidas. Entretanto, o mecanismo de proteção é pouco conheci-
do mas, seguramente, é desencadeado a partir de fatores bióticos, nos
quais os microrganismos do solo desempenham papel preponderante.
E, seguramente, é através desse mecanismo que o solo se desintoxica,
se equilibra e passa a ser um integrante ativo no processo. Na propo-
sição da simples correção das eventuais carências, o solo é apenas um
receptáculo passivo.
Em diversas oportunidades, especialmente nos últimos capítu-
los, Chaboussou recomenda a aplicação de fertilizantes, com a fina-
lidade de corrigir os desequilíbrios do solo, especialmente de
microelementos. Trata-se de uma contradição com sua própria teo-
ria da trofobiose. É que, o solo desintoxicado e manejado corretamen-
te dispensa o uso de adubos como, aliás, estabelece a nossa lei de
fertilidade crescente (A fertilidade do solo, quando manejado sem agres-
são – aração e procedimentos similares – e com técnicas que estimulem a
biocenose é crescente, indo a limites ainda não identificados).
Portanto, a partir da teoria da trofobiose, que é a linha mestra do
processo, devemos pesquisar os meios bióticos de correção dos solos
que têm sido agredidos por decênios pela agricultura predatória. É
a partir do equilíbrio biocenótico da fertilidade do solo que se abre
o caminho para a produção de alimentos limpos, com a dispensa de
agrotóxicos e fertilizantes solúveis. Se o processo for conduzido
dialeticamente a partir da participação do animal na desintoxicação
do solo e na manutenção e melhoria de sua fertilidade, poder-se-á
dispensar o uso de quaisquer produtos químicos externos ao solo,
porque, com manejo correto, desencadeiam-se o ciclo etileno e a
transmutação dos elementos com baixa energia, os quais, com a

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trofobiose, conformam o tripé sobre o qual se ergue a produção


agroecológica. Isto, naturalmente, com a sustentação energética da
eficiente e gratuita energia solar.
Este livro deixa numerosos ensinamentos e aguça a curiosidade
para uma série de questões. Talvez, porém, a questão mais significa-
tiva diga respeito à atividade dos pesquisadores – fitopatólogos e
entomólogos. Modo geral, nossos cientistas debruçam-se sobre o
estudo de determinada praga ou doença, pesquisando profundamen-
te aspectos específicos e fazendo um controle com o objetivo da eli-
minação do parasita. Talvez fosse aconselhável uma análise mais
ampla, holística, a começar pelo equilíbrio metabólico e pelas neces-
sidades nutricionais da planta.
Dou um exemplo. No início do projeto Alegria, em Taquara, Rio
Grande do Sul, em 1964, a infestação de saúva era extremamente
intensa. Com o decorrer do tempo, graças ao manejo do Pastoreio
Racional Voisin, com a desintoxicação do solo e ausência completa
de agrotóxicos e fertilizantes, as saúvas desapareceram, mas as áreas
vizinhas continuaram infestadas. Por quê? A ciência convencional não
tem explicação para este fato e, diante do fato, fica-se com o fato e
desprezam-se as teorias ainda que esposadas por grandes nomes, como
diria Claude Bernard.
O desaparecimento natural das saúvas deve ser pesquisado sob
uma ótica inspirada na análise dos fatores externos que, certamente,
interferem nas questões internas do inseto. Em outras palavras, através
de uma análise holística, em que os fatores bióticos e abióticos em
suas interrelações e contradições levam às causas dos problemas e sobre
elas recaí a ação humana. Trabalhar sempre sobre as causas e não sobre
os efeitos, no caso, as pragas e doenças.
Todos devem ler e meditar sobre este texto: os produtores, para
questionarem seus técnicos quando esses recomendam agrotóxicos e
ou adubos solúveis; os estudantes, para indagarem a seus professores
sobre as posições de Chaboussou; os técnicos, para se capacitarem a

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uma conduta de produção sem veneno: o professor para levar aos seus
alunos uma posição contrária à agronomia convencional e, finalmente,
àqueles pesquisadores, que se distanciaram da realidade que desçam
de seu frágil pedestal e venham para a planície onde está a vida e,
portanto, a verdade.
Quanto às pesquisas fitopatológicas e entomológicas cabe uma
reflexão: a quase totalidade dessas pesquisas concentra-se em elimi-
nar (se possível) o parasita. A partir das informações deste texto, seria
desejável que se conhecesse o contexto ambiental – manejo e fertili-
dade do solo, clima, vegetação espontânea, uso de agrotóxicos e fer-
tilizantes solúveis – e relacionar o aparecimento dos parasitas com
esses fatores, como Chaboussou analisa a partir do quarto capítulo.
Chaboussou, por sua formação e por seu campo de pesquisa,
dedicou-se ao controle de parasitas das plantas. Como pesquisador
eclético, porém, não esqueceu os animais. Para isso, dedicou, sob o
título de “A agricultura biológica e a saúde dos vertebrados”, parte do
oitavo capítulo às repercussões dos desequilíbrios nutricionais à saúde
animal e seus produtos.
A aplicação da teoria da trofobiose – ao dispensar o uso dos
agrotóxicos e adubos solúveis – reveste-se de importância singular na
proteção ambiental. Essa é, por outro lado, questão transcendental
para a própria sobrevivência da espécie humana. As conseqüências da
dilapidação ambiental são noticiadas cada vez com maior freqüência:
recentemente, a redução do tamanho das ostras cultivadas na baía de
Florianópolis motivada pela elevação da temperatura da água do mar,
é um exemplo.
A biocenose viabiliza o desencadeamento de importantes proces-
sos em solos ricos em matéria orgânica, porosos e com limitada
compactação, pois se ativa a “nutrição das plantas, via compostos
orgânicos mais complexos, que seriam absorvidos diretamente pelas
raízes e serviriam de base à construção, pela planta, de seus consti-
tuintes, especialmente das proteínas”. Essa teoria, alicerçada em

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substantivos resultados experimentais compõem, com a teoria da


trofobiose de Chaboussou, a base de um novo e instigante paradigma,
este livre das perniciosas dependências econômicas, recuperando o
sentido dialético e, por isso mesmo verdadeiro, da desgastada expres-
são “trabalhar com a natureza”. Aí está para os cientistas sem precon-
ceitos e para os agricultores pesquisadores, a porta aberta para a
construção de uma doutrina que ofereça aos produtores a tecnologia
da vida, na qual se alcançaria a maravilhosa harmonia da natureza com
“sua própria consciência, o humano”. Esta construção estará conclu-
ída quando a ciência puder desenvolver um modelo de produção
capaz de alimentar a humanidade, sem dilapidação dos recursos não
renováveis, através do maravilhoso trabalho da vida do solo, em har-
monia com a máxima captação da energia solar pela fotossíntese.
A Editora Expressão Popular a reeditar e a Editora L&PM, a ceder
os direitos de tradução para a republicação em português, da obra de
Chaboussou – a quem os leitores devem agradecer – põem à dispo-
sição dos agricultores, estudantes, técnicos, pesquisadores e profes-
sores, um corpo de doutrina inédito na literatura científica
agronômica nacional, que constitui o primeiro pilar para a produção
limpa, sem venenos, dispensando agrotóxicos e fertilizantes solúveis
de síntese química. É a partir da compreensão da indispensabilidade
do emprego de insumos energéticos de origem solar e da dinâmica
da vida do solo, que se constrói a agricultura limpa, rentável e sus-
tentável, isto é, que se põe, em prática, a verdadeira agroecologia,
caminho seguro para perpetuar a produção de alimentos limpos,
como a própria sobrevivência da humanidade está a exigir.

Porto Alegre, RS, Verão de 2006.


Prof. Dr. Luiz Carlos Pinheiro Machado
Presidente do Instituto André Voisin
prvpinheiro@terra.com.br
lcpm@cca.ufsc.br

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PREFÁCIO

Durante minhas aulas de entomologia e de ecologia, no Institut


National Agronomique ou no curso superior de especialização do
DEA* de entomologia, na Universidade de Paris-VI, freqüentemente
tive a ocasião de apresentar a meus alunos os trabalhos de meu cole-
ga Francis Chaboussou e sua teoria da trofobiose. É um prazer para
mim, hoje, apresentar sua obra ao grande público.
Ao fazê-lo, desejaria me esforçar para fazer o leitor compreender a
extrema importância desta obra, que propõe aos pesquisadores agrôno-
mos, e aos agricultores, um conceito original e novos caminhos, que
resultam de uma reflexão madura baseada tanto nas pesquisas pesso-
ais do autor, como nos múltiplos dados experimentais de origem in-
ternacional, oriundos dos laboratórios ou das condições de campo.

*
Diplôme d’Etudes Approfondies (Diploma de Estudos Aprofundados). (N. da T.)
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Que me seja permitido, antes de mais nada, apresentar o autor


a seus leitores, apesar de ser bem conhecido nos meios da pesquisa
agronômica, na França e no exterior.
Biólogo de formação, diplomou-se na Universidade de Bordeaux.
Ali beneficiou-se dos ensinamentos de entomologia do prof. Feytaud,
e de zoologia e biologia dos professores Avel e Bounhiol. Em 1933,
entra, como jovem pesquisador, no Institut National de la Recherche
Agronomique. Nomeado para a Estação de Zoologia do Centro de
Pesquisas Agronômicas de Bordeaux, na região de La Grande Ferrade,
em Pont-de-la-Maye, aí desenvolverá toda sua carreira, encerrando-
a em 1976, como Diretor de Pesquisa e Diretor da Estação de Zo-
ologia desse Centro.
Nesta função, ele teve, inicialmente, a oportunidade de abordar
problemas entomológicos da época, como a reprodução de um
carabídeo, predador de um coleóptero do gênero Leptinotarsa,* ele-
mento potencial de controle dessa praga, de importação recente ou,
ainda, a invasão imprevista de gafanhotos migradores em Landes,
seguida de incêndios florestais. Após, se veria confrontado com pro-
blemas mais complexos e de grande importância econômica, envol-
vendo as culturas frutíferas de Agenais, as culturas de milho de Landes
e, obviamente, as pragas dos vinhedos da região de Bordeaux. Ele
formou, nessa época, alunos excelentes e colaboradores que assegu-
raram sua sucessão e mantêm, hoje, a reputação do Centro de Pesqui-
sas de Zoologia Agrícola do Sudoeste.
A diversidade de problemas entomológicos que apareceram e a
necessidade de propor soluções práticas de controle não haviam,
então, permitido a Francis Chaboussou aprofundar-se no estudo de
um assunto especificamente. Em 1960, entretanto, dois novos pro-
blemas se lhe apresentaram e, sobre os quais, enfim, ele espera poder

*
Doryphore no original. Corresponde ao “Colorado potato beetle”. (N. Da T.)

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empreender uma tese de doutorado em ciências: por um lado, o


estudo dos atrativos sexuais elaborados por fêmeas virgens de
lepidópteros (feromônios) e sua aplicação no controle de urna lagarta
da videira,* por outro, a análise das causas do aparecimento e proli-
feração de novas pragas em videiras, os ácaros fitófagos. Após ter bem
encaminhado os estudos sobre a lagarta, ele confiou seu prossegui-
mento a seus colaboradores e, a partir de então, consagrou-se de 1960
a 1969 ao estudo de ácaros da videira. É no curso dessas pesquisas que
se elabora o conceito da “trofobiose”, resultando na sua defesa de tese,
em 1969, em Paris.
A substituição dos arsenicais pelo DDT e por outros inseticidas
orgânicos sintéticos, particularmente nos tratamentos dos pomares
e vinhedos, teve como conseqüência a aparição, nos Estados Unidos
e Europa, de uma nova calamidade, os ácaros fitófagos, até então
relativamente pouco danosos; estes microscópicos picadores e suga-
dores de folhas provocam, por sua proliferação, prejuízos importan-
tes aos vinhedos e pomares. A primeira explicação geral proposta foi
de que o DDT e outros inseticidas polivalentes de contato elimina-
vam os predadores ou parasitas naturais desses ácaros fitófagos. Mas,
esses predadores são, essencialmente, outros ácaros, de diversos gê-
neros, e a hipótese não pôde ser confirmada.
Para a videira, o problema apresentava-se sob um aspecto muito
complexo, que Francis Chaboussou soube perfeitamente analisar. Três
espécies de ácaros intervêm, cada uma podendo proliferar em perí-
odos diferentes da estação e em função das datas de aplicação e da
natureza dos diversos tratamentos inseticidas ou fitossanitários apli-
cados à videira. Foi dissecando experimentalmente estes fenômenos
que o autor conseguiu mostrar que a ação dos agrotóxicos utilizados*

*
Po1ycrosis botrana. (N. da T.)
*
No original não existe a palavra agrotóxico. É usada a palavra pesticida. É,
entretanto, correto o uso da palavra agrotóxico, criada por A. Paschoal em 1975.
(N. do R).

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(particularmente inseticidas, contra larvas do cacho da uva; * ou


mesmo fungicidas) repercutia sobre os ácaros, por intermédio da
planta. Estes produtos provocam modificações no metabolismo da
planta, resultando num enriquecimento dos líquidos celulares ou
circulantes em açúcares solúveis e aminoácidos livres. Os ácaros
fitófagos picadores e sugadores dos tecidos vegetais encontram-se,
assim, favorecidos na sua alimentação. Isto se traduz, conforme as
espécies, por um aumento de sua fecundidade e de sua fertilidade,
da velocidade do desenvolvimento e do número de gerações e mes-
mo da longevidade. É, portanto, um fator trófico que está na origem
das proliferações dos ácaros fitófagos da videira. A esta dependência
estreita entre as qualidades nutricionais da planta e seu parasita,
Francis Chaboussou batizou de “trofobiose”. O termo já havia sido
utilizado pelos biologistas para designar as relações tróficas de algu-
mas formigas com pulgões, aos quais elas dedicam cuidados particu-
lares, mas o novo sentido dado pelo autor reveste-se de um grande
interesse: é o próprio objeto do livro que ele nos apresenta hoje.
Na realidade, lendo o livro de Francis Chaboussou, podemos nos
surpreender por encontrarmos apenas citações breves de suas próprias
pesquisas. Por isso, me parece justo sublinhar, aqui, sua importância
na origem do conceito de trofobiose, conceito que pesquisadores
posteriores confirmaram e ampliaram. Foi dessa forma que o autor
pôde mostrar a ação de fatores edáficos (relação K/Ca) sobre as pro-
liferações de certas cochonilhas de citros, no Marrocos; a incidência
da natureza do porta-enxerto sobre as reações de um mesmo enxer-
to aos tratamentos fitossanitários (proliferações de ácaros fitófagos);
e os efeitos favoráveis não-intencionais de certos acaricidas. Ocorre
uma desordem ou desequilíbrio metabólico da planta, que se revela
favorável aos parasitas sempre que os açúcares solúveis e os aminoá-
cidos livres dos tecidos vegetais estão em excesso, não estando normal-

*
Polychrosis botrama S. e Clysia ambiguella Hb. (N. da T.)

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mente incorporados na proteossíntese: desordem ou desequilíbrio


metabólico da planta, que se revela favorável aos parasitos.
As experiências se acumulam pelas pesquisas pessoais, bem como
pela revisão bibliográfica. Esta hipótese é confirmada por novas de-
monstrações e o autor procura aplicá-la às causas tróficas das doen-
ças fúngicas e até de doenças viróticas.
Os fungos parasitas são organismos osmotróficos que se nutrem,
como os insetos e os ácaros sugadores de seiva, de açúcares e
aminoácidos livres dos tecidos vegetais. Nada de surpreendente,
portanto, no fato de que todo o enriquecimento dos tecidos com
substâncias solúveis favoreça o desenvolvimento das micoses. Os
numerosos exemplos citados e analisados pelo autor, neste livro, são
provas deste fato.
Buscando analisar, segundo os princípios de sua teoria da
trofobiose, todos os casos “inexplicados” de proliferação de parasitas,
de eclosão de micoses, de aparição de viroses, da ineficiência de cer-
tos tratamentos; buscando explicar os efeitos indiretos ou inespera-
dos de diversos tipos de agrotóxicos (herbicidas, fungicidas,
inseticidas, acaricidas), Francis Chaboussou chama a atenção que se
chega, sempre, à existência de desequilíbrio entre dois processos
fundamentais da fisiologia vegetal: proteossíntese e proteólise.
O autor tem consciência clara que esses dois processos são eminen-
temente complexos e que os mecanismos e fatores em jogo são múltiplos.
Da mesma maneira, ele põe em evidência os desequilíbrios do meio
interior da planta (teor em açúcares solúveis e em aminoácidos livres),
revelando ou suspeitando de causas distantes indiretas, insidiosas: exces-
sos de adubações nitrogenadas solúveis, desequilíbrios de correções de K,
Ca, Mg; carência ou excesso em determinados oligoelementos,* muitos
dos quais são fornecidos à planta pelos agrotóxicos.

*
O termo oligoelemento é usado nesta obra como sinônimo de microelemento,
forma mais empregada no Brasil. Foi respeitada a forma original. (N. do R.)

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Em suma, o autor, preocupado com a proteção das culturas con-


tra seus parasitas ou suas doenças, volta-se mais para a planta doente
que para o parasita ou agente infeccioso. Admite-se, de muito bom
grado, que o homem “que nada lhe falta” sofre, hoje, diversas afecções,
que têm origem num excesso de bem-estar (excesso de carne, gordu-
ras, açúcar, excesso de álcool, de fumo e, mesmo, excesso de medica-
mentos), mas também num excesso de estresse ou de estímulos (excesso
de barulho ou de agitação, excesso de automóvel ou de TV). As plan-
tas cultivadas, em particular aquelas culturas industriais, são postas em
competição permanente, para um crescimento mais rápido, uma pro-
dução mais abundante, uma qualidade mais atraente.Nesses jogos
olímpicos da agricultura industrial, as plantas cultivadas são
superalimentadas, sofrendo algumas vezes até um empanturramento
de nitrogênio; elas são bem tratadas, como os campeões antes da pro-
va (a colheita!), pulverizadas, banhadas freqüentemente com misturas
fungicidas, inseticidas, acaricidas, a título preventivo; suas condições
de vida são artificializadas ao extremo (ciclos biogeoquímicos acelera-
dos, húmus reduzido, herbicidas, chuva artificial, sob cultura imper-
meável ou em estufas). Mas, às vezes, o campeão quebra antes da prova:
acamamento dos cereais, secamento do pecíolo do cacho de uva,
abortamento de frutos; aparentemente saudável, ele contrai, apesar de
todas as medidas preventivas, doenças súbitas e desastrosas (micoses,
viroses), ele sofre ataques maciços de parasitos(ácaros, pulgões).
Então, se chama à cabeceira destas plantas-campeãs os especialis-
tas mais renomados: fitopatologista, virologista, entomologista,
imunologista, cada um em sua área, dando seu diagnóstico e sua re-
ceita fitofarmacêutica. O próprio agrônomo, que deveria ser o médico
generalista de sua cultura, consulta o edafólogo, o climatogista, o
geneticista. Como salienta Francis Chaboussou, se estuda muito a
doença e não tanto o doente. Ele, médico dos vinhedos de Bordeaux,
assusta-se com este excesso de terapêutica e com esta insuficiência de
higiene da planta e de seu meio. Nossas culturas industriais, diz ele,

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sofrem de doenças cujas causas têm sua origem num excesso de cuida-
dos fitossanitários; ele fala, então, de doenças “iatrogênicas”.
Certamente, não se poderia negar os imensos progressos da agri-
cultura industrial, graças, em particular, à seleção, às correções e aos
tratamentos fitossanitários! Nós temos, na França, belas culturas e
belas colheitas! Mas, voltando a uma comparação, talvez abusiva,
porém não desprovida de sentido, podemos também dizer que o
homem moderno vive certamente melhor e mais longamente que
aquele da Idade Média, eliminaram-se ou controlaram-se muitas das
grandes doenças epidêmicas: varíola, tuberculose, peste, malária...
Mas ele está, hoje em dia, sujeito a novas e múltiplas doenças orgâ-
nicas ou infecciosas (arteriosclerose, câncer, gripe). Do mesmo modo,
se é certo que as plantas cultivadas pagaram um pesado tributo a
certas calamidades epidêmicas ou certas pragas, bem antes do desen-
volvimento do controle químico moderno (requeima da batata que
arruinou a Irlanda, Phylloxera que arrasou os vinhedos europeus,
bicudo do algodão e cochonilhas dos citros nos Estados Unidos), só
se pode constatar a repetição incessante de afecções ou ataques que
sofrem as culturas industriais, o que acarreta, como para o homem,
um aumento crítico das despesas fitofarmacêuticas.
Tão logo desenvolveram-se os tratamentos fitossanitários na Fran-
ça, com a aparição de numerosos inseticidas, fungicidas ou herbicidas
sintéticos, nasceram duas palavras novas: “fitofarmárcia” e “fitiatria”,
a fitofarmácia teve um grande desenvolvimento, conduzindo ao nas-
cimento da indústria de agrotóxicos, mas, pode-se dizer que a fitiatria,
ou medicina das plantas, manteve-se superficial, aparentemente li-
mitada ao universo especializado da parasitologia: estudo de micoses,
bacterioses, viroses (fitopatologia) e dos parasitas animais das cultu-
ras (especialmente entomologia e nematologia).
Certamente os agrônomos, no campo da pesquisa agronômica de
fisiologia vegetal, preocuparam-se em melhorar o crescimento, a pro-
dução, a resistência das plantas cultivadas, e interessaram-se por tudo

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

o que diz respeito à nutrição mineral da planta, seus desequilíbrios, suas


carências. Mas falta, incontestavelmente, uma ligação estreita entre a
fitofarmárcia e a fisiologia vegetal. O estudo das repercussões dos
agrotóxicos, de todos os tipos e sob todas as suas formas de aplicação
sobre a fisiologia da planta, somente foi abordado de forma superfici-
al: efeitos tóxicos diretos, mais comuns. Os efeitos indiretos, a longo
e curto prazos, tais como Francis Chaboussou apresenta em numero-
sos exemplos, foram negligenciados.
Já que o agrônomo se tornou o “generalista” para o estudo das
plantas cu1tivadas, não é de se surpreender que tenham sido os agrô-
nomos práticos, isto é, os produtores, os primeiros a notar e a tentar
corrigir, empiricamente, os efeitos dos excessos de cuidados tróficos
e fitossanitários dispensados às plantas cultivadas de forma industrial.
Estes produtores quiseram, de alguma forma, desenvolver o que eu
chamaria, de bom grado, uma agroproteção das culturas, com a
substituição dos métodos de proteção da agricultura de tipo indus-
trial, os quais abusam, em particular, dos tratamentos fitossanitários,
seja a título curativo ou mesmo preventivo.
Assim, nasceu o que se chamou de agricultura biológica. O ter-
mo, sem dúvida, se prestaria a discussões, mas o uso generalizou-se
graças à imprensa e à mídia. Graças, sobretudo, a um grande públi-
co apaixonado pela ecologia e obcecado pelos problemas de poluição.
Por razões que não nos cabe analisar agora aqui, razões múltiplas
e, às vezes, imponderáveis, é lamentável que uma espécie de divórcio
se tenha estabelecido entre os agrônomos promissores do que chamei,
aqui, a agroproteção das culturas, e a maioria dos agrônomos pesqui-
sadores ou dos próprios quadros da pesquisa oficial.
Uma crítica freqüentemente dirigida às teorias desses pioneiros
é dizer-se “que não há nada de novo nisto, pois não passa de uma
generalização abusiva de alguns dados insuficientes”, ou ainda “estes
métodos não podem satisfazer as necessidades de uma produção
industrial, isto é, competitiva e cobrindo as necessidades”.

24
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

O autor desta obra não contradiria o fato de que, desde há muito,


agrônomos, e dos mais renomados, têm chamado a atenção para a
importância do estado fisiológico da planta, como elemento de sua
resistência às doenças infecciosas e parasitárias ou, ainda, alertando
contra os riscos potenciais do abandono da adubação orgânica, do uso
abusivo dos adubos nitrogenados solúveis, da redução da atividade
biológica dos solos, citando os nomes de A. Demolon, G. Bertrand,
J. Dufrénoy, P. Chouard e muitos outros. Sem contar que os traba-
lhos de numerosos pesquisadores ou biólogos do INRA * são citados
trazendo um apoio direto ou indireto à teoria da trofobiose ou aos
princípios ecológicos da agroproteção das culturas.
Quanto a tratar as pesquisas de Francis Chaboussou uma gene-
ralização abusiva, considero, pessoalmente, um julgamento caduco.
Este livro, precisamente, aporta muitos fatos em apoio à posição de
Chaboussou, se tomamos da literatura científica internacional, que
urge, a meu ver, não deixar de testar mais adiante, esse conceito da
trofobiose.
Sem qualquer dúvida, as condições tróficas oferecidas pela planta
a seus parasitas, por mais importantes que sejam, não representam os
únicos fatores em jogo nas explosões populacionais de insetos ou de
ácaros fitófagos, ou na aparição e expansão de moléstias criptogâmicas,
bacterianas ou viróticas. O autor, sem dúvida, em alguns trechos, se
deixa levar na direção de algumas afirmações ou hipóteses, nas quais
nem todos os leitores o seguirão.
No entanto, quando ele se apóia nas belas pesquisas de nosso
colega C. Vago, da pesquisa agronômica, sobre os processos de
desencadeamento e interligação das doenças infecciosas nos insetos,
para tentar explicar (ao menos parcialmente) as eclosões e multipli-
cação das afecções viróticas nos cultivos industriais, só se pode, no-

*
Institut National de Recherches Agronomiques (Instituto Nacional de Pesquisas
Agronômicas). (N. da T.)

25
F R A N C I S C H A B O U S S O U

vamente, desejar que a pesquisa se debruce, com atenção, sobre es-


sas hipóteses emanadas da teoria da trofobiose.
Igualmente, quando ele examina as incidências secundárias de
uma desordem da proteossíntese nas plantas cultivadas (conseqüên-
cias eventuais de desequilíbrios nutricionais ou de tratamentos
fitossanitários) sobre a alimentação animal ou humana, mesmo que
aí esteja, apenas um aspecto muito parcial do problema, a hipótese
não é gratuita e merece ser levada em consideração.
Sem dúvida, os diversos problemas suscitados foram abordados
por um ou outro dos setores da pesquisa agronômica oficial, mas a
leitura do livro de Francis Chaboussou, de bom grado, leva a pen-
sar que sua idéia diretriz, expressa na sua teoria da trofobiose, po-
deria ser, para os diversos pesquisadores, uma linha comum de
direção bastante útil.
Quanto à afirmação de que os métodos culturais preconizados no
contexto da agroproteção das culturas não seriam aplicáveis às culturas
industriais, é conveniente sublinhar que o autor , antes de mais nada,
deseja que a metodologia geral proposta não seja condenada apenas
sobre este critério, mas que seja, antes, testada, verificada ou
desmentida. Ele tem consciência que o sugerido, em particular as
aplicações foliares de oligoelementos, aproxima-se necessariamente,
no plano técnico e agronômico, dos métodos de controle químico da
agricultura industrial. Ë evidente que os métodos preconizados de-
vem ser testados quanto a seus efeitos eventuais a longo prazo, pois,
como em todas as coisas, o abuso pode ser a origem de novos
desequilíbrios.
O mérito de Francis Chaboussou neste livro é, partindo de uma
idéia simples, demasiadamente simples, já que foi negligenciada por
muito tempo por numerosos pesquisadores muito especializados,
mostrar que sua teoria da trofobiose pode fornecer uma aproximação,
e mesmo uma interpretação de uma quantidade de fatos que perma-
nece inexplicados no campo da proteção de culturas.

26
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

O Institut National de la Recherche Agronomique recentemente


definiu suas novas orientações no sentido de uma agricultura “mais
econômica e mais autônoma” (J. Poly), sem reduzir, no entanto, a
produtividade e sua qualidade. Para mim, não há dúvidas de que uma
pesquisa destinada a melhor definir os fatores de agroproteção das
culturas, em função das espécies vegetais cultivadas e das condições
de meio, pode efetivamente ajudar a atingir estes objetivos.

Paris, 18 de setembro de 1980.


Paul PESSON
Professor honorário
Institut National Agronomique
Paris-Grignon

27
PRÓLOGO

Uma eminente especialista em ácaros pôde observar: “Até 1945


os ácaros fitófagos eram tidos como inimigos menores da agricultura. Por
outro lado, há quinze anos o desenvolvimento destas espécies predatórias
atinge uma elevada significação econômica, ao mesmo tempo que sua lista
não pára de aumentar” (ATHIAS-HENRIOT, 1959).
Ora, uma tal ascensão dos ácaros à condição de inimigos maio-
res da agricultura, proliferando tanto sobre plantas de grande culti-
vo, como o algodão, quanto em videira ou árvores frutíferas, é,
concomitante, com o emprego agrícola de um dos primeiros inseti-
cidas de síntese e que deu o que falar: nos referimos ao DDT, ou
zidane. Efetivamente, as primeiras multiplicações do que, impropri-
amente, chamou-se de “aranhas vermelhas” ocorreram em macieiras,
em seguida dos tratamentos à base de DDT e dirigidos contra a larva
de Carpocapsa sp., ou “bicho das frutas”.
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Mais tarde, por outro lado, o DDT seria, de certa forma, subs-
tituído em tais processos “pró-ácaros” por toda uma série de outros
agrotóxicos sintéticos, como a maior parte de diferentes ésteres
fosfóricos, Parathion à frente, os carbamatos como o Carbaryl , os
ftalimidas, como Captan etc.
Assim, devido ao emprego de numerosos inseticidas sintéticos,
que haviam destronado os produtos minerais, assistiu-se ao nascimen-
to de uma nova indústria: a dos acaricidas.
Isto é, impuseram, ao mesmo tempo, aos agricultores novas e
pesadas coerções. Sobretudo, como teremos a oportunidade de men-
cionar neste trabalho, será demonstrado que numerosos acaricidas,
em princípio, destinados a exterminar os ácaros, os faziam, parado-
xalmente, proliferar, de acordo com o mesmo processo, pouco enten-
dido, e cujo estudo será objeto da primeira parte desta obra.
Entretanto, dois diferentes fatos, pelo menos, mereceriam aten-
ção. Por um lado, estes “desequilíbrios biológicos”, com.o foram chama-
dos, não diziam respeito somente às multiplicações de ácaros, mas
também de pulgões aleirodídeos, lepidópteros e até mesmos de
nematóides. Por outro lado, a utilização de certos agrotóxicos, como
os ditiocarbamatos (Maneb, Zineb, Mezineb), acarretam, também, o
desenvolvimento não só de pragas, mas de moléstias criptogâmicas
como Oidium e Botrytis. Certos observadores registravam até a expan-
são consecutiva de doenças viróticas. Trata-se de um grave fenôme-
no que parece estar bem confirmado, como demonstraremos.
Sem dúvida, seria suficiente apenas expor a diversidade destes
“desequilíbrios” que dizem respeito tanto a vírus, quanto a fungos
patógenos ou a ácaros, para perceber que o determinismo deste pro-
cesso não poderia residir, unicamente, na eventual destruição dos
inimigos naturais, que habitualmente é colocada como primeiro
argumento. Como pensamos mostrar na primeira parte desta obra
tudo se passa como se, por sua ação nefasta sobre o metabolismo da plan-
ta, os agrotóxicos rompessem a sua resistência natural.

30
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Em outras palavras: é necessário, daqui para frente, se ter consciên-


cia de um fato que, em princípio, não é de, outro modo,surpreendente
saber que, o agrotóxico – mesmo não provocando queimaduras ou fenôme-
nos de fitotoxicidade aparentes – pode mostrar-se tóxico para a planta, com
todas as conseqüências que isto pode causar sobre a resistência a seus agressores,
sejam eles fungos, bactérias, insetos ou mesmo vírus.
Assim, esta obra é destinada a todos aqueles que, de perto ou de
longe, estão implicados na utilização e recomendação dos agrotóxicos,
como técnicos e pesquisadores, mas também aos burocratas, especi-
almente os encarregados do registro e da colocação destes produtos
nas mãos dos usuários.
Nos mais de vinte anos que dedicamos a trabalhos sobre este
tema, não faltou oportunidade aos diversos responsáveis para toma-
rem conhecimento de nossas pesquisas e de nossas advertências.
Contudo, pode ser que assim reunidas numa mesma obra de sínte-
se, nossas concepções venham a ser acolhidas de outra forma, além do
sacudir de ombros ou da conspiração do silêncio.
Compreender-se-á, na sua leitura, que este livro é também um
grito de alarma, um grito destinado, em primeiro lugar, a ajudar os
agricultores a se liberarem da alienação na qual se encontram e que
reside numa absurda e arruinadora cadeia de intervenções com
agrotóxicos, resultante, ela mesma, de uma cadeia de doenças artifici-
almente provocadas.
Todavia, temos, cada vez mais, confiança no bom senso e na ló-
gica dos agricultores. Já são numerosos os que sentem, confusos, que
com o emprego quase desenfreado de agrotóxicos estão na direção
errada. Com efeito, os problemas de parasitismo das plantas não
cessam de se multiplicar e, é evidente, que não poderia ser de ou-
tra forma no contexto atual dos métodos de controle químico.
Assim, esperamos confiantes que, ao dar aos agricultores, causas
dessas dificuldades e desventuras, nosso trabalho os ajudará a
mudar de direção.

31
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Duas tarefas nos pareceram mais urgentes: primeiro, dar a expli-


cação dos perigos que corre a saúde da planta com os agrotóxicos e, espe-
cialmente, pelos herbicidas, à fertilidade do solo. Esta responsabilidade
é dividida com os adubos solúveis, como pensamos demonstrar.
Fm segundo lugar, destacar a natureza das relações que unem a
planta ao parasita. Assim, seremos conduzidos à segunda parte des-
ta obra, consagrada à outra face do problema, ou seja, os meios de
estimular a resistência da planta em relação a seus diferentes
agressores. Tendo como princípio básico o estímulo da proteossíntese por
correção de carências, serão consideradas as repercussões benéficas de
uma adubação equilibrada e o emprego de oligoelementos.
Enfim, julgamos lógico e indispensável expor, num último capí-
tulo, aquilo que, atualmente, podemos concluir das conseqüências de
diversas técnicas culturais em relação à uma questão que interessa a
todos: a saúde do rebanho e do homem chamados a consumir as
colheitas assim obtidas.
Não saberíamos concluir este “prólogo” sem expressar toda nossa
gratidão ao INRA (Institut National de la Recherche Agronomique),
ao qual tivemos a honra de pertencer durante mais de quarenta anos,
e ao qual ficamos, obviamente, profundamente ligados. Não tanto
porque nossos superiores e a maior parte de nossos colegas tenham
testemunhado um grande entusiasmo em relação a nossas concepções
um pouco revolucionárias, mas porque tivemos a vantagem de poder
trabalhar com toda a independência de espírito. Nunca seremos capa-
zes de apreciar suficientemente o preço desta liberdade e, até, desta
compreensão dada a um desditoso pesquisador, desgarrado num lamen-
tável não-conformismo pela chamada lógica de seus trabalhos.

Balizac, 29 de julho de 1980.

32
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

PRIMEIRA PARTE

PLANTAS DOENTES PELA QUÍMICA

33
CAPÍTULO I

AS DOENÇAS IATROGÊNICAS NAS PLANTAS

“Devemos ser curiosos para ver se o que vemos é o que sentimos ver. Devemos
analisá-lo, abri-lo, virá-lo, olha-lo por baixo e olhar atrás. O conformista,
simplesmente, não está programado para isso”.
James G. HORSFALL (The story of a nonconformist, 1975.)

É realmente uma coisa maravilhosa esta faculdade que têm os insetos de


distinguir uma árvore que não está mais em suas condições normais”.
Edouard PERRIS (Histoire des insectes du pin maritime.)

1. DEFINIÇÃO

Da mesma forma que em patologia humana ou animal, enten-


demos por “doença iatrogênica”, toda a afecção desencadeada pelo uso
– seja moderado ou abusivo – de um medicamento qualquer. Em pa-
tologia vegetal trata-se, portanto, do uso de agrotóxicos. Por outro
lado, fala-se mais freqüentemente de “desequilíbrio biológico” quando
se faz referência a uma proliferação brusca de uma ou outra praga, que
ocorre em seguida a um tratamento fitossanitário. É, por exemplo,
o caso – do qual voltaremos a falar – das proliferações de ácaros, em
seguida a numerosos tratamentos, tanto com fungicidas quanto com
inseticidas.
Assim, se falamos em “desequilíbrio”, foi porque, segundo a teo-
ria clássica, implicitamente se imputava tais proliferações apenas à
F R A N C I S C H A B O U S S O U

destruição dos inimigos naturais da nova praga. O freio estando


suprimido, o fitófago podia proliferar sem obstáculos.
Entretanto, essa teoria defronta-se com certas dificuldades. As-
sim, ela não saberia explicar:
– Como um certo número de agrotóxicos, perfeitamente inofen-
sivos para os inimigos naturais, podem, entretanto, acarretar multi-
plicação de diversos fitófagos – pulgões, por exemplo?
– Por que razão, um agrotóxico não acarretando nenhuma reper-
cussão deste gênero, em uma época determinada do ciclo da planta
em questão pode, entretanto, desencadear graves proliferações da
mesma praga em outro momento?
– Como pode ocorrer, que um inseticida aplicado em tratamento
do solo possa provocar proliferações de ácaros do gênero Tetranychus
sobre as folhas da batata cultivada a seguir?
– Enfim, no campo da patologia vegetal propriamente dita, é
evidente que o desenvolvimento de diversas moléstias, tanto viróticas
quanto criptogâmicas, não poderia ser atribuído a uma eventual
destruição de inimigos naturais, e isto pela simples razão de que esses
últimos são praticamente inexistentes!
É a razão pela qual, num primeiro momento, julgamos indispen-
sável revisar um certo número de casos de “desequilíbrios biológicos”,
provocados pelo uso de agrotóxicos.

2. DESEQUILÍBRIOS BIOLÓGICOS SEGUIDOS DOS


TRATAMENTOS DAS FOLHAS COM AGROTÓXICOS

A) Proliferações de pragas
Ácaros: é o caso por nós estudado, sobre videiras, seguido aos tra-
tamentos da folhagem com agrotóxicos (CHABOUSSOU, 1969). Foi
possível mostrar que diversos inseticidas como DDT, Carbaryl e nu-
merosos fosforados acarretam proliferações tanto de ácaros vermelhos

36
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

(Panonychus ulmi, Koch), como de ácaros amarelos (Eotetranychus


carpini vitis, Dosse) (fig.1).
Atualmente, por outro lado, as proliferações de ácaros fitófagos
em árvores frutíferas, plantas de grandes cultivos ou videiras, e con-
secutivas à utilização de produtos fosforados ou clorados, aí incluí-
dos – paradoxalmente – os próprios acaricidas (CHABOUSSOU,
1970), são por demais conhecidos para que continuemos insistindo
neste assunto.
Entretanto, devemos também chamar a atenção que tais prolife-
rações ocorrem não somente com a utilização de inseticidas, isto é,
de produtos com princípios tóxicos em relação aos inimigos naturais
dos ácaros (e ainda que o DDT, por exemplo, seja inofensivo para
ácaros do gênero Typhlodromus, principais predadores), mas também
com os produtos fungicidas, como o Captan, não tóxicos para os para-
sitas ou os predadores dos ácaros.
Pulgões: diversos produtos podem, igualmente, provocar prolife-
rações de pulgões (fig. 2). Por enquanto nos contentaremos em dar
dois exemplos.
MICHEL (1966) demonstrou experimentalmente através de
criações que, sobre o fumo, os tratamentos à base de um fosforado,
o Mevinphos, desencadeavam em Myzus persicae aumentos de
fecundidade e redução do ciclo evolutivo. Como resultado, produ-
zia-se, no curso da temporada, o aparecimento de uma geração su-
plementar (fig. 2).
Da mesma forma, estudando a reprodução de Aphis fabae sobre
o eixo floral da beterraba, SMIRNOVA (1965) constata um efeito
positivo do tratamento com DDT sobre a fecundidade do pulgão. O
pico máximo deste aumento da reprodução ocorre entre oito e quinze
dias após a intervenção inseticida. Veremos, adiante, que pode ocorrer
o mesmo com os herbicidas, ao estudar-se o determinismo destas
proliferações (MAXWELL e HARWOOD, 1961, e ADAMS e
DREW, 1969).

37
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Outros insetos: essas multiplicações “anormais”, após tratamentos


das folhas com agrotóxicos, não envolvem somente ácaros e pulgões,
mas também os aleirodídeos (van der LANN, 1961) sob influência
do DDT; as cochonilhas (KOZLOVA e KURDYUKOV, 1964)
pelos fosforados, e também os lepidópteros, seja por um produto
clorado, o Dieldrin, no tratamento do solo (LUCKMANN, 1960),
seja por um fosforado, como o Demeton (SAVESCO e IACOL,
1958).
Enfim, tais “doenças iatrogênicas” envolvem igualmente os
nematódeos, cujos níveis de populações são evidentemente muito mais
difíceis de controlar. Entretanto, certos fungicidas, como o Thiram
ou TMTD, acarretam, sobre cebola, crescimento de populações de
Ditylenchus dipsaci (BRESKI e MACIAS, 1967).
Da mesma forma, WEBSTER (1967) demonstrou experimental-
mente que, tanto em aveia resistente quanto suscetível, os tratamentos
herbicidas à base de 2,4-D acarretavam, em comparação às testemunhas,
um maior número do mesmo nematóide, Ditylenchus dipsaci. Saliente-
se que este tratamento com 2,4-D provoca na aveia hipertrofia das cé-
lulas, fenômeno provavelmente relacionado com o da proliferação.
Como já se pode suspeitar, tais proliferações de pragas que ocorrem
pela intermediação da planta, envolvem numerosos outros organismos
parasitas, inclusive os vírus, como pensamos mostrar mais adiante.. Se,
relativamente, há longo tempo, esses fenômenos foram constatados
envolvendo ácaros, pulgões e cochonilhas, é porque estes insetos picadores
mantêm-se sobre a planta durante toda a duração de seu ciclo evolutivo
e, conseqüentemente, sua multiplicação não poderia passar desaperce-
bida. O mesmo não ocorre com certas ordens de insetos como os
lepidópteros, por exemplo, submetidos a metamorfoses que exigem o
abandono do vegetal. Também é importante, como veremos a propósi-
to do tratamento do solo, registrar – graças a observadores perspicazes –
proliferações de lagartas endófitas do milho, como Ostrinia nubilalis Hb,
após certas desinfecções do solo.

38
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

B) Desenvolvimento de doenças fúngicas


Sobre este assunto, os trabalhos de JOHNSON (1946), que já ci-
tamos (CHABOUSSOU, 1972), parecem-nos exemplares. Desde aquela
época o autor chamava a atenção que “a reação da planta hospedeira ao
DDT podia abrir um novo rumo no que diz respeito ao estudo da resistência
do trigo à ferrugem”. Como a seqüência desta obra demonstrará abundan-
temente, pelo menos esperamos, não é somente a ação do DDT em
relação à ferrugem, mas também a de diferentes agrotóxicos quanto a suas
incidências positivas sobre o desenvolvimento de várias doenças nos le-
varão a elucidar o determinismo da resistência da planta a seus agressores.
JOHNSON (op. cit.) experimentou diversas variedades de trigo,
as quais inoculou com esporos de diversas raças de ferrugem (Puccinia
graminis tritici). As plantas foram, a seguir, tratadas com DDT, de-
pois de ter sido previamente estabelecido que este inseticida não
acarretava nenhum efeito direto sobre a virulência do fungo. Como
conseqüência dessas contaminações artificiais, JOHNSON constatou
que na variedade de trigo Khapli, todas as ferrugens tinham produ-
zido lesões, consideravelmente, mais extensas sobre as plantas trata-
das com DDT do que sobre os trigos testemunhas.
Por outro lado, nesta variedade mais sensível à ferrugem,
JOHNSON observou uma relação marcante entre a clorose e a exten-
são da doença. Parece, assim, bem demonstrado que a exacerbação da
suscetibilidade do trigo à ferrugem provocada pelo tratamento com DDT
é conseqüência direta das repercussões deste produto clorado sobre a fisi-
ologia da planta.
Os trabalhos de JOHNSON explicam determinadas dificuldades
de controle de diversas doenças, como daremos exemplos mais adiante,
quando as plantas tenham sido tratadas – isto é, “fisiologicamente
condicionadas” – por meio de certos agrotóxicos. É, particularmen-
te, o caso do oídio (Uncinula necator, Schw). Efetivamente, pudemos
mostrar sobre videira, durante dois anos consecutivos que, em com-
paração às testemunhas tratadas com água pura, diversos carbamatos

39
F R A N C I S C H A B O U S S O U

(ditiocarbamatos, como Maneb, Zineb e Propineb) tinham provo-


cado um desenvolvimento altamente significativo de oídio (CHA-
BOUSSOU et alii, 1966) (fig. 3).
Da mesma forma, pode-se questionar a responsabilidade destes
ditiocarbamatos no recrudescimento dos ataques de mofo cinzento
(Botrytis cinerea) constatado há uma quinzena de anos – isto é, des-
de o emprego destes fungicidas sintéticos – na maior parte dos vinhe-
dos do mundo inteiro. Demonstramos isto no desenvolvimento de
nossos experimentos sobre videiras.
Tais resultados, alias, só confirmam os já obtidos sobre tomate,
onde o Maneb, usado contra o míldio, provocou um aumento na
gravidade dos ataques de Botrytis (COX e HAYSLIP, 1956). Pesqui-
sas análogas, conduzidas sobre morangueiros, também mostraram que
as parcelas tratadas com zinco ou com Nabam + sulfato de zinco,
estavam significativamente mais atacadas por Botrytis (COX e
WINFREE, 1957). Veremos, no próximo capítulo, como as análi-
ses das folhas realizadas por estes autores permitirão compreender o
determinismo desta suscetibilidade.

C) “Dificuldades de controle”, “fracassos de tratamentos” ou, às


vezes, “ineficácia dos produtos”não significam, muitas vezes, se não
uma sensibilização da planta a ser protegida da doença a combater,
esta produzida pelo próprio agrotóxico.
1 – Fracassos dos ditiocarbamatos contra o míldio da videira, no final
da temporada
A partir da utilização dos novos fungicidas sintéticos, numero-
sas decepções e fracassos foram registrados no controle das doenças
da videira. Assim, em 1963, AMPHOUX denunciava as insuficiên-
cias do Captan, do Phaltan (2 ftalimidas) e do Zineb (2 formulações),
no controle do míldio.
Parece-nos útil citar: “A utilização de novos fungicidas (ou seja,
as quatro formulações supracitadas) não pode ser concebida sem o

40
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

risco de se ver desenvolver, intensamente, o míldio, durante o perío-


do de crescimento muito lento da videira: em agosto, setembro e outubro,
caso não se tenha o recurso de uma sólida cobertura cúprica, por ocasião
dos últimos tratamentos da estação”.
AMPHOUX acrescentava esta observação, que nos parece mui-
to importante: “Contudo, continua difícil precisar qual deva ser esta
“sólida cobertura indispensável”, já que, em certos casos, no fim da
safra, três tratamentos com calda bordalesa a 2% em videiras tratadas com
Orthocide 50 (Captan) mostraram-se insuficientes”. Voltaremos mais
adiante, sobre as repercussões, tanto dos produtos dessa síntese, como do
cobre, que nos esclarecerão sobre a causa desses fenômenos. No momento,
daremos um exemplo, dentre outros: Em 1966, DIETRICH e
BRECHBUHLER observaram: “em Riesling, o míldio do fim de
temporada instalou-se, principalmente, sobre as parcelas tratadas
com Euparen (Dichlofuanid) e com F 263-2* (um produto experi-
mental) e, em menor grau, sobre aquelas de Phaltan”.
Observemos, por enquanto, que nestes dois casos se trata de
dificuldades de fim de temporada. No caso que estudaremos agora,
veremos a evolução, na eficácia de um mesmo produto no decorrer da
temporada, o que nos permitirá, precisamente, explicar a razão dessa
“disparidade sazonal” na ação do produto, que também é encontrada nos
inseticidas.

2 – Evolução da eficácia de diversos fungicidas no decorrer da tem-


porada, em relação ao míldio da videira
Após os resultados dos ensaios do Instituto Técnico do Vinho
(ITV) contra o míldio, LE NAIL (1965) observou a disparidade da
eficácia dos diversos fungicidas testados em relação à doença, em fun-
ção da época dos levantamentos. Retomando a questão (CHA-
BOUSSOU, 1967), evocávamos, em Videiras e vinhos estas repercussões

*
Basfungin. (N. da T.)

41
F R A N C I S C H A B O U S S O U

apressadamente qualificadas de “secundárias”. Assim, observávamos:


“Ora, todos estes fenômenos só se esclarecerão, a partir do momento
em que conhecermos a natureza profunda das repercussões dos
agrotóxicos sobre a planta e que pudermos confrontá-las com as respec-
tivas necessidades dos fungos patogênicos e das pragas”. É chegado o
momento.
No decorrer destes ensaios, sete intervenções antimíldio foram
realizadas, em: 25 de maio; 1º, 8, 13, 22 de junho; 1º, 10, 20 de
julho e 12 de agosto. Constata-se, no curso dos diferentes levanta-
mentos efetuados nos dias 17 de julho, 25 e 26 de agosto, 25 e 26
de setembro, 16, 17 e 26 de outubro(este último, levantamento
envolvendo o peso das folhas), uma grande disparidade na ordem de
eficácia dos produtos.
Veremos, aqui, apenas as disparidades mais salientes encontradas
com os produtos utilizados puros, ou seja: Propineb e calda bordalesa,
em duas concentrações: 0,5% e 2%.
Ora, em 17 de julho, época do primeiro levantamento após as sete
primeiras intervenções, terminadas em 10 de julho, o Propineb (tam-
bém chamado Mezineb) – um ditiocarbamato de zinco, é o primei-
ro em eficácia. Na mesma época, a calda bordalesa a 2% está em
quarto lugar, e a 0,5% em ultimo (fig. 4).
Dois outros tratamentos ocorrem nos dias 29 de julho e 12 de
agosto. Os levantamentos de 25 e26 de agosto indicam que o
Mezineb recua ao 8º lugar, e que descerá para o 10º e último lugar,
no decorrer das observações de 23 e 24 de setembro e, l6 e l9 de
outubro.
Exatamente ao contrário, a calda bordalesa a 5% não cessa de
progredir na ordem de eficácia, à medida que se avança na tempora-
da. Do 8º lugar em 13 e 14 de setembro, passa a 3° nos dias 16 a 19
de outubro. Definitivamente, ela coloca-se à frente dos produtos
organocúpricos como cupro-Zineb, cupro-Carbatene, e dos produ-
tos orgânicos puros como Difolatan, Maneb e Propineb.

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Face à mediocridade desses resultados, dos produtos orgânicos


utilizados, seja associados ao cobre seja empregados puros, não fal-
tou invocar-se uma eventual ausência de sua persistência, se compa-
rada à da calda bordalesa. Contudo, as análises dos produtos que
persistem na superfície das folhas, absolutamente não confirmaram
esta hipótese. E mais, com certos produtos “ineficazes” registra-se,
entre os levantamentos de 17 de julho e 26 de agosto, 25 a 30 vezes
mais manchas de míldio. As parcelas tratadas com Mezineb não
apresentaram mais que 7,3% de folhas sãs em 23 e 24 de setembro.
É evidente que, neste caso, absolutamente, não se trata de uma
simples ineficácia dos produtos orgânicos, mas – exatamente como
para oídio e Botrytis – de uma estimulação do potencial biótico do míldio
provocada, indiretamente, pelas repercussões dos tratamentos repetidos com
esses “fungicidas” sobre a fisiologia da planta, assunto que estudaremos ao
longo do próximo capítulo.

3 – Disparidade da eficácia de Oxicarboxin e de Triforine em rela-


ção à ferrugem branca do crisântemo (Puccinia horiana, P. HENN)
Trata-se de trabalhos realizados por GROVET e HALLAIRE
(1973) sobre plantas em casa de vegetação. Os produtos foram uti-
lizados em pulverização sobre a folhagem ou por irrigação do solo, à
razão de 10 litros/m 2. Os autores consideraram um eventual efeito
fungicida por ação sistêmica.
Resultados dos tratamentos por pulverização. No momento da
pulverização, os pés de crisântemo possuíam 8 a 10 folhas, e tinham
de 14 a 18 na época da inoculação da doença. De modo geral, o
Oxicarboxin apresenta um efeito persistente: um só tratamento,
aplicado durante o período de incubação, impede o desenvolvimento
da ferrugem e protege as plantas durante vários dias, uma contami-
nação ulterior.
Entretanto, de maneira bastante excepcional, os autores avalia-
ram a gravidade da doença não somente em função dos produtos

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

utilizados mas, também, segundo a idade das folhas. Assim, puderam


constatar, especialmente sobre as testemunhas, uma resistência à
doença nas folhas recém-formadas, semelhante à das senescentes. Ao
contrário, as folhas de meia-idade (maduras) mostraram-se muito
mais sensíveis à doença. Precisemos que tal fenômeno é de ordem
geral, especialmente na videira, tanto para o míldio como para o
oídio. Isto demonstra bem, se ainda houvesse necessidade, a impor-
tância do estado fisiológico do órgão ou da planta inteira na sensibi-
lidade ao que se pode chamar de seus “parasitas” (fig. 5).
Por outro lado, no que diz respeito ao determinismo do modo de
ação dos produtos, nota-se um fenômeno particularmente interessan-
te: a eficácia dos dois fungicidas testados revela-se muito diferente,
segundo a altura de inserção da folha, isto é, segundo sua idade. O
gráfico da fig. 6, montado com base nos dados da fig. 5, mostra que
a eficácia da Triforine está inversamente relacionada à idade da folha,
a ponto de se tornar estimulação da doença para os níveis 12 e 13, que
são as últimas folhas formadas.
Estes resultados, absolutamente, não são isolados: num segun-
do ensaio, três tratamentos foram aplicados em 26 de julho e, 5 e 16
de agosto. Ora, vinte e seis dias após o último tratamento, o núme-
ro de manchas formadas, em função da idade da folha, dá um gráfi-
co sensivelmente análogo ao do experimento precedente.
Assim, a aplicação de três tratamentos ao invés de um só, à base
de Informe, a 30 g/hl, permitiu a proteção da planta até uma altura
mais elevada (10 folhas). A curva relativa aos ataques sobre as teste-
munhas evidencia a total resistência à ferrugem dos seis níveis mais
baixos das folhas.
Quando comparadas às testemunhas, as repercussões dos
fungicidas mostram uma modificação na doença que envolve, ao
mesmo tempo, sua gravidade e a altura das folhas. Se, como para o
experimento precedente, se estabelece, uma comparação à testemu-
nha, se a eficácia ocasionada pelos tratamentos produz curvas perfei-

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

tamente contínuas e que mostram bem o decréscimo da eficácia dos


produtos em função da juventude crescente dos tecidos foliares (fig. 6).
Como no caso precedente, parece que o processo teria por efeito
estimular a suscetibilidade das últimas folhas formadas na planta. Parece
bem demonstrado que esta estimulação da doença – e isto tanto com
Oxicarboxin como com Triforine – não seria explicável senão pelo efeito
destes “fungicidas” sobre a fisiologia do crisântemo.
Nessas condições, a ação anticriptogâmica destes produtos con-
tra a ferrugem nas outras folhas não seria resultado de um eventual
efeito tóxico em relação ao fungo parasita. Necessariamente, seria
interferência das repercussões destes agrotóxicos sobre o estado
bioquímico das folhas. Em princípio, tratar-se-ia de uma ação inversa
à do DDT sobre o trigo, que estudamos anteriormente. Antecipan-
do o próximo capítulo, pode-se presumir que estes produtos ajam
estimulando a proteossíntese e, portanto, provocando a regressão das
substâncias solúveis nos tecidos. Essas substâncias soluveis favorecem
não apenas o desenvolvimento da ferrugem, mas também o de uma
série de outras doenças (DUFRÉNOY, 1936).
Ora, fenômenos semelhantes são encontrados constantemente,
por menor que seja o cuidado na condução das observações. Vamos
dar um último exemplo, que diz respeito ao controle do míldio do
tomate.

4 – Resultados do Prothiocarb contra o míldio do tomate


BEYRIES e MOLOT (1977) concluem, dos seus experimentos
com Prothiocarb contra o míldio do tomate, que, nas fortes doses
utilizadas, entre 1% e 2% as folhas superiores são resistentes, enquanto
que as da base são sensíveis. Segundo os autores, isto significa que ou
no ápice da planta há maior concentração do produto, admitindo-
se que ele seja verdadeiramente fungicida ou, neste nível, “as modi-
ficações dos processos naturais de defesa da planta são bem mais
intensos que em outras áreas”.

45
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Estes autores parecem admitir, implicitamente, que o agrotóxico


pode ter modificado, favoravelmente, neste caso, a resistência da
planta à doença, quando esta regride. Ou num sentido desfavorável,
em caso contrário. BEYRIES e MOLOT (op. cit.) observam igual-
mente que: “A aplicação, no solo, do Prothiocarb aumenta a sensibi-
lidade das folhas da base – que são as primeiras atacadas – em razão
da forte umidade relativa existente neste nível”.
Falaremos novamente dos fracassos propriamente ditos dos tra-
tamentos e do desenvolvimento de moléstias fúngicas, bacterianas e
viróticas relacionadas ao uso dos agrotóxicos. Poderemos tratar me-
lhor destas questões após havermos estudado as repercussões dos
agrotóxicos sobre a fisiologia da planta e, através da teoria da trofobiose,
as relações que unem a planta e seus predadores.

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Número de F. Livres hibernantes


De E. carpini vitis Boisd., em 800 cm
em lenho de 2 anos

Fig 1. Multiplicação do ácaro amarelo da videira, Eotetranychus


carpini vitis Boisd por Carbaryl e Parathion (Carbaryl = Sévin)
(CHABOUSSOU, 1969.)

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

População do pulgão preto

Fig. 2. Multiplicação do pulgão preto da beterraba, Aphis fabae


Scop., consecutiva a diversos tratamentos com agrotóxicos (Dados do
Serviço da Proteção de Vegetais/experimentos de homologação de
1964.) Ordenadas logarítmicas.)

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Coeficiente de ataque
em 400 cachos

Fig. 3. Coeficientes de ataque de oídio sobre cachos de uva, em


função dos diferentes fungicidas utilizados contra o míldio. (Cepa
Cabernet-Sauvignon, método de blocos, 4 repetições. Ensaios 1966,
em Latresne [INRA].)

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

Cepa
peso das folhas
em gramas

Fig. 4. Resultados dos experimentos de controle de míldio, con-


duzidos em 1964 pelo Institut Technique du Vin (ITV). Este esque-
ma dá, em diversas datas, a ordem de eficácia dos produtos testados,
por ordem decrescente da esquerda para a direita.

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Número médio de manchas por folhas

Fig. 5. Repercussões de dois fungicidas, Triforine e Oxicarboxin, em


relação à ferrugem branca do crisântemo (Puccinia horiana), em fun-
ção da idade da folha. (Segundo dados de GROUET e HALLAIRE,
1973.) – Número médio de manchas por folha, em função da sua idade
e dos tratamentos aplicados em uma unica pulverização. (observação
15 dias após tratamento).

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

Percentual de Eficácia, em comparação às testemunhas

Fig. 6. Eficácia de Oxicarboxin e de Triforine contra a ferrugem


branca do crisântemo (Puccinia horiana), e em função da idade da
folha, comparada às testemunhas. (Segundo dados de GROUET e
HALLAIRE, 1973.)

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

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CAPÍTULO II

FISIOLOGIA E RESISTÊNCIA DA PLANTA

“O grande erro da terapêutica moderna foi estudar a doença sem se preocupar


com o terreno onde ela evolui”
Dr. Albert LEPRINCE (La médicine électronique, 1962).

“Este trabalho (seleção de linhagens resistentes dentro das populações) é, aliás,


delicado, porque a imunidade, a tolerância e a hipersensibilidade são funções
das condições do meio”.
P. LIMASSET e E.A. CAIRASCHI (La lutte contre les maladies à vírus des
plantes. Monografia INRA, 1941.)

INTRODUÇÃO
Acreditamos ter mostrado que a proliferação de pragas e, com mais
forte razão, o desenvolvimento de doenças, desencadeadas pelo uso de
agrotóxicos, não poderiam ser explicados somente pela destruição dos
eventuais inimigos naturais. No quarto capítulo, nos propomos a ex-
por suas causas tão profundamente quanto possível. Já sabemos que se
trata de fenômenos indiretos, que se atêm à modificação da fisiologia
da planta sob a ação dos produtos fitossanitários; quer se tratem de
inseticidas, de fungicidas e, com mais forte razão, dos herbicidas. Assim,
coloca-se em questão o problema das relações entre a planta e o que
podemos justamente chamar; seus “parasitas”. Estudando-o através de
um caso particular compreenderemos melhor toda a importância das
repercussões dos agrotóxicos sobre a saúde e a resistência do vegetal
assim tratado... E, freqüentemente, maltratado!

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

1. AS DUAS CONCEPÇÕES DO DETERMINISMO DA


RESISTÊNCIA
Pelo termo “resistência” não entendemos a capacidade da planta
de suportar, sem muitos danos, o ataque deste ou daquele predador,
e, pelo termo “tolerância”, a não receptividade ou imunidade (parcial
ou total).
Atualmente, há concordância em se reconhecer neste fenômeno
uma causa sobretudo, bioquímica, e não mecânica. Contudo, duas
concepções estão presentes para explicar este processo.
Segundo a teoria clássica, a resistência da planta procederia da
presença de substâncias antagônicas nos seus tecidos, tóxicas ou
apenas repulsivas ao “parasita” em questão.
Ao contrário, para nós que destacamos toda a importância da
nutrição sobre o potencial biótico dos organismos vivos, a imunida-
de estaria, antes de mais nada, relacionada com a ausência dos ele-
mentos nutritivos necessários ao crescimento e ao desenvolvimento
do parasita – seja vegetal ou animal. É a nossa teoria da trofobiose, que
desenvolveremos no decorrer do próximo capítulo.
É possível perguntar-se em que medida essas duas teorias não pode-
riam concordar entre si, já que, na presença de substâncias reputadas
como tóxicas ou antagônicas nos tecidos, encontrar-se-iam, na realidade,
correlacionadas à ausência de fatores nutricionais. Se isto fosse demons-
trado, seria o único critério a ser considerado para a resistência da
planta. Veremos em que medida justifica-se tal posição, pelo estudo
de um exemplo, o da resistência do milho à helmintosporiose.

2. CONDICIONAMENTO FISIOLÓGICO DO MILHO E


RESISTÊNCIA À HELMINTOSPORIOSE

A) Pesquisa de fatores antagônicos


O estudo de um determinado condicionamento da planta como
fator de resistência à helmintosporiose foi ilustrado pelos trabalhos

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

de MOLOT (1969) – já vimos que em suas pesquisas sobre a eficá-


cia de um fungicida, o Prothiocarb questionava o seu modo de ação.
Quanto à resistência do milho ao fungo Helminthosporium turcicum,
diversos fatores foram revisados: densidade de plantio, emasculação da
espiga e duração da luminosidade. O determinismo bioquímico da
resistência foi pesquisado pela análise de folhas, que envolveu açúcares
e fenóis, elementos provavelmente relacionados ao processo.
Na França, frisa MOLOT, esta doença só afeta, raramente, as
culturas de Landes e dos Pirineus-Atlânticos.
Em condições naturais, a doença jamais é observada sobre
plântulas. As primeiras manchas só aparecem em torno do estágio da
7ª e 8ª folha, e continuam a se desenvolver após a floração. As folhas
atacadas podem se dessecar prematuramente provocando, às vezes,
importantes quedas nos rendimentos.
Por outro lado, as condições de luminosidade (ou seja, o fotoperíodo),
como se sabe, efetivamente, podem modificar a resistência da planta
às doenças fúngicas e influem sobre a suscetibilidade do milho à
helmintosporiose. Assim, as plantas cultivadas sob fotoperíodos curtos são
muito mais sensíveis à moléstia. Teremos ocasião de retomar este fenôme-
no, que não é específico nem do milho, nem da helmintosporiose.
Após ter exposto estes primeiros dados, MOLOT conclui: “Pa-
rece ser a composição química da planta que exerce uma influência pre-
dominante nos fenômenos de resistência”. Portanto, não se trata de
qualquer barreira mecânica no processo de resistência.
Por outro lado, refere-se a diversos trabalhos, que estabelecem:
a) existe um gradiente de teores em glicídios ao longo do colmo;
b) essa concentração de açúcares condiciona a resistência do
milho em relação a um outro fungo patógeno, Diplodia zeae.
MOLOT orientou seus trabalhos sobre a pesquisa das eventuais
relações entre o teor em glicídios dos colmos e a resistência a outras
doenças, as fusarioses. É necessário resumir os resultados desses es-
tudos, ainda que saiamos do caso da helmintosporiose.

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

MOLOT (op. cit.) chega à conclusão que “quanto mais elevada for
a concentração em glicídios dos colmos em fim de período vegetativo,
mais baixa será a percentagem de quebra na maturidade”. (Estas con-
clusões resultam de observações sobre 17 linhagens, em que os teores
de glicídios foram avaliados em 15 de setembro, enquanto a avaliação
da quebra – que se admite estar em estreita relação com a doença – foi
feita em meados de outubro, ou seja, um mês mais tarde.)
Entretanto, tal conclusão não existe sem levantar certas dificul-
dades que não escaparam a seu autor. MOLOT completa: “Ora, os
glicídios, compostos importantes da nutrição carbonada dos fungos,
favorecem o crescimento miceliano. Portanto, pelo menos nas con-
centrações em que eles existem, não é possível atribuir-lhes um pa-
pel fungistático. Ao contrário, é permitido pensar que eles variam
correlativamente com outros fatores bioquímicos capazes de inibir o
crescimento miceliano”.
Temos que subscrever esta conclusão, mas devemos confirmar,
enfaticamente, que é sob um outro ângulo, bem diferente da ação de
eventuais substâncias antagônicas ou tóxicas, que divisamos os pro-
blemas do determinismo da resistência. E, os resultados relatados
adiante podem, aliás, conduzir-nos, como no estudo que vamos
abordar,aos fatores de resistência do milho à helmintosporiose.

B) O “fator A”, de BECK, e a resistência do milho à lagarta e à


helmintosporiose
O “fator A”, posto em evidência por BECK, no milho, determi-
naria a resistência à lagarta (Ostrinia nubilalis Hb). Trata-se de um
produto quimicamente identificado como 6-metoxibenzoxazolinona
e que teria também correlação negativa com o grau de sensibilidade
à helmintosporiose. (Estimativa pelo método das médias das concen-
trações logarítmicas).
MOLOT (op. cit.) observa: “Do ponto de vista biológico, isto
significa que o comportamento do milho está na dependência da

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

concentração do fator A nos tecidos. Notemos, entretanto, que teores


muito elevados desta substância, principalmente na linhagem B 49 não
tornam a planta imune. Além disto, uma linhagem ainda mais resistente
que a B 49, contém muito pouco de 6-metoxibenzoxazolinona. Conclui-
se que, se o fator A pode ser considerado como um fator de resistên-
cia à helmintosporiose, ele não intervém sozinho no mecanismo de
defesa da planta”.
Parece que com tais observações – cuja honestidade científica deve
ser louvada – chegamos ao âmago do problema. Isto implica que a
existência de uma resistência elevada do milho, mesmo com um fra-
co teor nos tecidos do fator A, não poderia ser considerada como uma
exceção, que, em gramática, pareceria confirmar a regra.. Se elevados
teores do fator A não produziriam resistência, e se em outras linha-
gens a resistência manifesta-se, a despeito de um baixo teor de 6-
metoxibenzoxazolinona (cuidadosamente identificada), é porque este
produto não provoca nenhuma toxicidade em relação ao fungo
patógeno.
Voltamos, obrigatoriamente, à nossa concepção de resistência
relacionada com a ausência ou, pelo menos, a carência dos elemen-
tos nutritivos necessários ao desenvolvimento do parasita.
Em relação ao processo de resistência do milho a Ostrinia,
SCOTT e GUTHRIE (1966) parecem tê-lo demonstrado perfeita-
mente. Suplementados com uma dieta artificial adequada, os milhos
resistentes foram perfeitamente aceitos pelas lagartas de Ostrinia nubilalis.
Este regime alimentar permitiu-lhes completar um ciclo perfeito,
absolutamente comparável ao que poderia ter-se desenvolvido às
expensas de uma linhagem suscetível.
Portanto, aí está a demonstração de que, se um inseto não ataca as
linhagens de milho ditas “resistentes”, é porque ele não encontra nos
tecidos dessas plantas (N. do R.) os elementos nutritivos necessários
para seu desenvolvimento e sua reprodução. E isto, sem que estejam
presentes, obrigatoriamente, eventuais produtos tóxicos nos tecidos.

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

Aliás, o próprio BECK parece ter-se dado conta da insuficiência de sua


teoria da imunidade da planta pela existência de substâncias antagô-
nicas; ele reconhece que “pesquisas deveriam ser empreendidas envolven-
do um melhor conhecimento das relações entre a nutrição do inseto, o estado
fenológico da planta e o comportamento do animal”.
Bem entendido, é o mesmo processo que deve ser posto em ação
no que diz respeito ao estudo das relações entre o fungo patógeno e
a planta. Em outros termos, o problema consiste em determinar
como o fator A pode inibir o desenvolvimento da helmintosporiose
se ele não é, realmente, um fungicida (os fitopatologistas têm prefe-
rido empregar os termos anticriptogâmico ou fungistático, o que nos
parece significativo).
Em outras palavras – e toda a questão está aí, em relação a uma
planta ou uma linhagem resistente, no caso, o milho – o fungo para-
sita morre envenenado ou perece de inanição? A resposta a esta questão
parece estar na terceira parte do trabalho de MOLOT, que envolve
o que ele denomina: “o modo de ação dos compostos fenólicos”.
Revisando os trabalhos anteriores referentes à resistência do milho
à helmintosporiose, MOLOT lembra que: “O crescimento miceliano
em presença de compostos fenólicos depende da cultura (KIRKHAM,
1957) e da presença ou ausência de nitrogênio no meio (KIRKHAM,
1954). Assim, um aumento da relação N/fenóis diminui a toxicidade
dos compostos fenólicos em relação ao gênero Venturia. Um aporte de
nitrogênio afeta, não somente a toxicidade dos fenóis, mas também sua
concentração na planta”.
Eis aí sobre o que refletir, quanto ao mecanismo da resistência
de compostos fenólicos. Se realmente agem como tóxicos, é neces-
sário então, explicar como a adição de certos produtos nitrogenados
pode ter a função de contraveneno? Sabe-se – como observa o pró-
prio MOLOT – que certos fungos, especialmente os que atacam a
madeira, usam os fenóis e seus derivados como substâncias nutri-
tivas...

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Entretanto, a toxicidade dos fenóis em relação ao fungo, absolu-


tamente não nos parece demonstrada e, o papel nutricional do nitro-
gênio nos parece, ao contrário, evidente no desenvolvimento e na
virulência de Helminthosporium. Os fatos nos parecem muito fáceis
de explicar se os consideramos sob o ângulo do crescimento e da
reprodução do agente patógeno. É isto que nos propomos a estudar
agora, analisando os resultados obtidos pelo tipo de fertilização so-
bre a resistência da planta à helmintosporiose.

C) Fertilização e resistência da planta à helmintosporiose.


Analisaremos antes o trabalho aprofundado de SHIGEYASU
Akai (1962), relativo à influência das repercussões potássicas sobre
a helmintosporiose do arroz. Anteriormente, ele observa que, certos
autores,como ONO e OKAMOTO, já haviam mostrado que a apli-
cação de potássio provoca uma diminuição do número de manchas
de Helminthosporium sobre as folhas.
Os experimentos de SHIGEYASU (op. cit.) foram desenvolvidos
a partir do arroz cultivado em solução nutritiva e tratado de manei-
ra a ser submetido a excessos ou carências de N ou de K. Ora, a menor
percentagem de manchas de grandes dimensões foi constatada com
o tratamento “excesso de K”, enquanto a mais elevada foi encontra-
da nos tratamentos para “carência de K” ou “carência de N”.
Por outro lado, a natureza da fertilização afeta igualmente a
taxa de germinação dos conídeos. De 37,7% nas testemunhas,
passa a 25,3% para o “excesso de K”, a 51,0% para a “carência de
K”, a 74,3% para “o excesso de N” e, enfim, a 90,4% para
a”carência de N”.
Estes dados destacam a importância do condicionamento da
planta pela fertilização, em relação à resistência à doença. Neste caso,
evidenciam a influência primordial do nível de potássio sobre a re-
sistência, por intermédio – como veremos agora – de suas repercus-
sões no teor dos elementos nitrogenados solúveis nos tecidos.

61
F R A N C I S C H A B O U S S O U

SHIGEYASU (op. cit.) realizou com efeito, análises de folhas


(sadias e doentes); um a cinco dias após a inoculação da doença. Essas
análises foram conduzidas, simultaneamente, sobre o teor de K e de
diversos aminoácidos livres como glutamina, asparagina e alanina.
Ora, de maneira geral, verifica-se que as folhas atingidas contêm
nitidamente menos aminoácidos que as folhas sadias. Presume-se que
esta deficiência resulta de seu consumo pelo fungo parasita. O autor
observa que:
“A taxa de germinação dos conídeos é proporcional à quantida-
de de aminoácidos livres contidos nas folhas e, quanto mais elevado
for o teor de aminoácidos livres, mais alta será a taxa de germinação”
(dos conídeos, N. do R.).
Quanto ao teor de potássio nas folhas, parece ter pouca impor-
tância, ao menos a partir de um certo nível. Isto confirmaria o fato
de que este elemento não agiria, por si próprio, sobre a resistência,
mas por intermédio de suas repercussões sobre o metabolismo da
planta.
Por outro lado, registra-se “uma correlação positiva entre o teor
de aminoácidos dibásicos das folhas do arroz e o crescimento das
manchas de helmintosporiose”. O autor acrescenta: “Neste experi-
mento, o teor de aminoácidos dibásicos era baixo. Ao contrário, as
folhas de arroz das parcelas com carência de potássio e de nitrogênio
apresentavam quantidades importantes de aminoácidos dibásicos e
um número elevado de manchas de Helminthosporium, de pequenas
dimensões”.
Após ter observado que as folhas da parcela com excesso de nitro-
gênio apresentavam os teores mais elevados de alanina, SHIGEYASU
(op. cit.) conclui: “Se a atividade de síntese das proteínas, a partir de
aminoácidos livres, decresce nas plantas deficientes em potássio – como
já foi demonstrado por diversos autores em várias plantas – este fenô-
meno pode favorecer o desenvolvimento de manchas sobre as folhas de
arroz das parcelas com carência de potássio”.

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Observemos rapidamente este processo que une a sensibilidade da


planta a uma deficiência na proteossíntese. Em resumo e com efeito,
devido ao papel fundamental que desempenha no metabolismo da plan-
ta e especialmente nos metabolismos glicídico e fosfatado e devido ao
paralelismo entre o teor de potássio e a intensidade da fotossíntese, o
potássio encontra-se na base de um metabolismo ligado à resistência da
planta, pelo favorecimento da síntese de proteínas e, conseqüentemen-
te, pela regressão das substâncias solúveis que acarreta. Encontra-se, pois,
na base de um metabolismo ligado à resistência da planta.
Torna-se necessário precisar que o potássio não age só, mas sim
segundo seu equilíbrio com os outros elementos, especialmente
catiônicos (CHABOUSSOU, 1973). Assim, SHIGEYASU (op. cit.)
observa, no arroz, a importância do antagonismo K/Mg. Da mesma
forma deve-se considerar a influência do Mg e do P nas parcelas onde
a relação K/N está desequilibrada por um excesso de N.
Enfim, o autor também procedeu a ensaios de fertilização com
oligoelementos. Os primeiros resultados evidenciaram que: “A sen-
sibilidade à helmintosporiose diminui pela aplicação de iodo, zinco e
manganês. Além disso, estes tratamentos parecem ter efeito favorável so-
bre o desenvolvimento vegetativo”.
Um comentário impõe-se imediatamente: não é por acaso que
esta terapia com oligoelementos age positivamente sobre o crescimen-
to, isto é, sobre a proteossíntese. É este último processo que acarreta
a resistência da planta à moléstia, por regressão das substâncias so-
lúveis nos tecidos. Voltaremos a este ponto fundamental ao longo
deste livro, especialmente no próximo capítulo.
Prosseguindo sua análise, SHIGEYASU (op. cit.) precisa que o
excesso de fósforo, a adição de cobalto e a carência de magnésio au-
mentam a sensibilidade do arroz ao Helminthosporium. Este fato leva-
o a concluir que é absolutamente impossível discutir sobre a
sensibilidade do arroz em relação a este parasita, apenas sob o ângu-
lo da fertilização potássica.

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

Este ponto de vista – a priori bastante evidente – encontra-se


confirmado pelos trabalhos de BOGYO (1955), que tratam da in-
fluência dos aportes de potássio e cálcio sobre a aparição e a gravida-
de de Helminthosporium turcicum em milho. De maneira geral,
enquanto o potássio aumenta a resistência, o cálcio agrava a sensibi-
lidade. Este fenômeno parece ter relação com o equilíbrio K/Ca na
planta, do que falaremos mais adiante. Um ponto importante subli-
nhado pelo autor: “uma vez que a planta disponha de quantidades
suficientes de potássio assimilável, a cal aplicada em doses crescentes
não provoca aumento da doença”.
Quer dizer, esta é toda a importância dos fenômenos de troca e
assimilação no metabolismo e resistência da planta.
Em resumo, dois anos de experimentos permitem a BOGYO con-
cluir: “A adubação potássica bem como o uso de esterco permitem uma dimi-
nuição significativa da gravidade dos ataques de Helminthosporium turcicum”.
Retenhamos, por enquanto, este efeito benéfico da fertilização
orgânica sobre a resistência da planta em relação à doença: a isto,
igualmente, voltaremos ao longo desta obra.
Definitivamente, os resultados de BOGYO e SHIGEYASU en-
contram-se para confirmar a ação benéfica da fertilização potássica,
quando esta é feita num contexto nutricional da planta, caracterizado por
um ótimo de proteossíntese. Ou seja, correlativamente, com a existên-
cia nos tecidos de, um mínimo de substâncias solúveis sensibilizadoras.
Esta concepção de determinismo bioquímico da resistência será
confirmada, a seguir, pelo estudo das relações entre determinados fato-
res ambientais ou culturais e a resistência do milho à helmintosporiose.

D) Determinismo bioquímico das repercussões de diversos fatores


sobre a resistência do milho à helmintosporiose
1 – Idade da planta
Como assinalado anteriormente, as plantas jovens de milho ja-
mais são atacadas: as primeiras manchas, com efeito, só se desenvol-

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vem ao nível da 7ª e 8ª folhas, continuando a se estender após a


floração.
Ora, sabe-se que em todas as folhas jovens a síntese protéica é
predominante, daí ter-se um mínimo de substâncias solúveis nos te-
cidos. Aqui, ainda, a resistência também está ligada a um fenômeno de
carência em elementos nutricionais em relação às necessidades do fungo
parasita. Propomo-nos a mostrar neste trabalho que se trata de um
fenômeno de ordem geral. Quanto ao processo inverso, ‘da suscetibili-
dade aos ataques de parasitas de diversas ordens, parece que se explica
pela existência de um estado bioquímico caracterizado, ao contrário,
qualquer que seja o fator em jogo, por uma proteólise dominante e pela
abundância de substâncias solúveis nos tecidos.
Assim se explica, notadamente, como veremos adiante, a carac-
terística sensibilidade na época da floração, tanto nos cereais como nas
árvores frutíferas.
Inversamente, a resistência das folhas maduras a doenças e insetos
sugadores, como os pulgões, parece ligada ao fato de, nestes órgãos
maduros, a maior parte do nitrogênio estar concentrada em proteí-
nas e, conseqüente-mente, o teor em compostos solúveis ser relativa-
mente baixo.

2 – Influência da luminosidade
A energia luminosa apresenta uma influência positiva sobre as
sínteses. Ao contrário, com luminosidade alterada e em penúria de
água estas são reduzidas. Neste caso, a abundância de aminoácidos
e ácidos orgânicos é que sensibiliza nutricionalmente a planta em
relação aos organismos patogênicos. A influência da luminosidade é
confirmada pelo do fotoperíodo e, portanto, em condições iguais, à da
latitude. MOLOT lembra que se YOUNG et. alii. (1959) assinalam
um crescimento de sensibilidade do milho à Diplodia zeae quando se
desloca um mesmo híbrido de um estado do norte dos Estados
Unidos, como Minnesota, para um estado mais meridional, como o

65
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Missouri ou Oklahoma, é porque a latitude diminui e, com ela, o


comprimento do dia.
Parece se tratar de um fenômeno de ordem geral. Assim,
UMAERUS 1959) assinala que a variedade de batata “Sebago”, con-
siderada como altamente resistente em dias longos, no Maine, mos-
tra-se, ao contrário, uma das variedades mais suscetíveis à requeima
(Phytophthora infestans) em dias curtos, na Flórida.

3 – Influência da emasculação da espiga


Esta operação, segundo MOLOT (op. cit.), tem por objetivo
aumentar a sensibilidade do milho em 25% em relação à helmintos-
poriose. Ora, o corte deste órgão reprodutor tem por resultado au-
mentar o teor de glicídios das folhas, porque sua migração para os
órgãos reprodutores não ocorre mais. Todavia, os glicídios não são os
únicos a não mais migrarem; ocorre o mesmo com os compostos
nitrogenados solúveis. Como chegamos à conclusão de que, sozinho,o
teor de glicídios nos tecidos não afetaria a resistência, somos induzi-
dos a pensar que ela possa estar inversamente relacionada ao teor em
compostos nitrogenados solúveis. A operação de emasculação acarreta,
provavelmente, uma regressão dessas substâncias.

4 – Influência da região de cultivo


Com a mudança de região, é evidente que certas condições de
cultivo encontram-se simultaneamente modificadas. Isto ocorre com
a latitude, sendo a energia recebida pela planta diferente. Não é
impossível que esta influência possa interferir na França, apesar das
diferenças de latitude estarem longe de alcançar a mesma escala que
nos Estados Unidos (oito (8) paralelos, em vez de 17 nos Estados
Unidos). Todavia, os departamentos de Landes e Pirineus-Atlânticos,
regiões assinaladas por MOLOT como as mais atacadas pela
helmintosporiose, são também as mais meridionais. Este fenômeno
concordaria, portanto, com o fato de uma grande sensibilidade des-

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

te mesmo milho em relação a Diplodia ou da batata à requeima, nos


estados do sul dos Estados Unidos.
Vimos, estudando as repercussões da fertilização potássica ou
nitrogenada, que a nutrição da planta pode estar igualmente em
discussão. Vimos também, a importância dos oligoelementos. Em
Landes, onde a helmintosporiose ataca com maior intensidade, os
solos – silicosos – são particularmente deficientes em cobre,. carência
esta que tem por resultado aumentar o teor dos tecidos em produ-
tos nitrogenados solúveis e, portanto, em elementos nutricionais
suscetíveis de sensibilizar o milho em relação a diversas moléstias e
especialmente à helmintosporiose.
Confirmaremos estas considerações, pelas conseqüências benéficas
resultantes das correções do solo e de pulverizações cúpricas ou à base
de complexos de oligoelementos, em relação àquilo que se pode
chamar “estado geral” da planta e sua resistência contra toda uma
gama de doenças ou pragas.

3. DISCUSSÃO GERAL E CONCLUSÕES REFERENTES ÀS


RELAÇÕES ENTRE O MILHO E A HELMINTOSPORIOSE
A respeito da podridão do colmo, provocada pelos ataques das
fusarioses, MOLOT (op. cit.) evidenciou uma correlação altamente
significativa entre o teor em glicídios dos colmos em 15 de setembro
e as percentagens de quebra em meados de outubro, isto é, corres-
pondente aos danos de Fusarium.
Entretanto, MOLOT, muito justamente, observa que, como os
glicídios são elementos importantes da nutrição carbonada dos fun-
gos, não seria possível lhes atribuir qualquer papel fungistático. Ao
contrário, diz ele, e sempre com a mesma preocupação de explicar a
resistência pela presença de um produto tóxico ao patógeno nos te-
cidos (fitoalexina), acrescenta: “Pode-se pensar que eles (os glicídios)
variam correlativamente com outros fatores bioquímicos capazes de
inibir o crescimento miceliano”.

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

Em resumo, podemos constatar que, mesmo munida de estudos


estatísticos (com transformações angulares), a hipótese do papel dos
glicídios como inibidores ou fungistáticos em relação às fusarioses não
se confirmou. Por outro lado, MOLOT observa que MESSIAEN
(1957), “trabalhando sobre um material mais heterogêneo, não
obteve uma relação linear entre o índice refratométrico e a percenta-
gem de colmos doentes”.
Por outro lado, MOLOT assinala duas séries de trabalhos que
põem o nitrogênio em questão. Primeiro TURK et alii. (1957) esta-
beleceram que, ao nível dos colmos e dos pedúnculos da espiga, o
material sensível aparece sempre deficitário emcarboidratos, e que existe
uma correlação entre a resistência a Diplodia e a relação N/sacarose.
Quanto às pesquisas de KIRKHAM (1954-1957), elas eviden-
ciam que “o crescimento miceliano em presença de compostos
fenólicos – reputados como inibidores – depende também, como
para a helmintosporiose, da idade da cultura e da presença ou ausên-
cia de nitrogênio no meio”. Assim: “Um aumento da relação N/fenóis
diminui a toxicidade dos compostos fenólicos em relação ao gênero
Venturia”.
Esta é, pelo menos, a interpretação do pesquisador sobre os fa-
tos. É curioso se constatar que, apesar da impossibilidade de eviden-
ciar qualquer fator antagônico, o autor obstina-se na procura de
eventuais compostos tóxicos face ao fungo parasita, como se uma
toxicidade fosse o único meio de inibir seu desenvolvimento. A im-
portância das relações de elementos onde o nitrogênio aparece como
numerador, em relação ao crescimento dos patógenos, deveria orientar
as conclusões para uma direção totalmente diferente!
Uma vez que o excesso de glicídios e mesmo de fenóis não con-
seguiria explicar a inibição do crescimento miceliano, deveríamos
perguntar-nos se esta inibição não poderia resultar de uma carência
nutricional e, no caso, de uma insuficiência em certos elementos
nitrogenados.

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Em outras palavras: a função positiva entre o valor da relação N/


fenóis e a virulência do fungo resultam, não da eventual toxicidade
dos fenóis face ao patógeno, mas sim do efeito positivo do nitrogênio sobre
seu desenvolvimento.
Aliás, foi exatamente a esta conclusão que fomos conduzidos pelo
estudo da virulência da helmintosporiose em relação ao arroz,
provocada por diversos tipos de fertilização; da mesma forma que pela
análise do determinismo bioquímico das repercussões de diferentes
fatores do meio ou dos tratosculturais sobre a resistência do milho à
mesma doença. Esta concepção do determinismo da resistência da
planta, baseada nos elementos nutricionais que ela pode oferecer ao
parasita, será amplamente verificada ao longo deste trabalho. Trata-
se da nossa teoria da trofobiose, que nos propomos a expor e estudar
no curso do próximo capítulo.

BIBLIOGRAFIA
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BOGYO Dr. 1955. L‘effet des apports de potassium et de chaux sur l’apparition de
l‘Helminthosporium turcicum chez le Mais. “Revue de la Potasse”, outubro de
1955.
KIRKHAM D.S. 1954. Significance of the ratio between the water soluble aromatic
and nitrogen constituents of apple and pear in the host parasite relationships of
Venturia species. “Nature”, 173, pp. 690-691.
KIRKHAM D. S. 1957. The significance of polyphenolic metabolites of apple and pear
in the host relations of Venturia inaequalis and Venturia pirina. “J. gen.
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MIESSIAEN C.M. 1957. Richesse en sucre des tiges de Mais et Verse parasitaire. “Rev.
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MOLOT P.M. 1969. Recherches sur la résistance du Mais à l’Helminthosporiose et aux
Fusarioses. “Ann. Phytopartho”: (I) Rôle de la composition chimique de la Plan-
te, pp. 55-74. (II) Facteurs de résistance, pp. 353-366. (III) Mode d ‘action des
composés phénoliques, pp. 367-383.
SCOTT G.E. et GUTHRIE W.D. 1966. Survival of European corn borer larvae

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SHIGEYASU Akai. 1962. Application de potasse et apparition d Helminthosporiose
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De TURK E.E., EARLY E.B., HOLBERT J.R. 1937. Resistance of com hybrids related
to carbohydrates. “III. Agric. exper. Stn. Ann. Rept”, 49 (1936), pp. 43-45.
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and resistance to Phytophthora infestans. “Amer. Potato J.”, 36, pp. l24-l3l.
YOUNG H.C., WILCOXON R.D., WHITEHEAD M.D., de WAY J.E.,
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of Diplodia maydis isolates inciting stalk rot of corn. “Plant Dis. Rept.”, 43, pp.
1124-1129.

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CAPÍTULO III

A TEORIA DA TROFOBIOSE

“Num programa de controle integrado, os fatores tróficos deverão ser


amplamente considerados: fungicidas e inseticidas não deverão mais ser
selecionados, quando com igual eficácia, unicamente segundo sua relativa
inocuidade aos inimigos naturais das pragas, mas também em função de sua
ação profunda sobre a planta e considerando-se suas eventuais repercussões
por trofobiose sobre a dinâmica das populações de pragas”. Pierre GRISON

Princípios e métodos de controle integrado (Accademia Nazionale dei Lincei.


Quaderno no 128, pp. 211-230. Rome, 1968)

1. A “TROFOBIOSE” COMO TEORIA DA RESISTÊNCIA


DA PLANTA
O caso estudado no capítulo precedente, envolvendo o determi-
nismo da resistência de diversas plantas à helmintosporiose, mostrou-
nos a impossiblidade de evidenciar a eventual existência de qualquer
fator antagonista a este fungo. Inúmeras vezes a hipótese das
“fitoalexinas” ou “alexinas” (literalmente: compostos de proteínas)
como explicação do fenômeno da imunidade foi posta em dúvida por
diferentes pesquisadores.
Assim, WOOD (1972) chama a atenção contra esta hipótese
precisando que “se existem numerosas asserções segundo as quais a
resistência seria ligada à presença de tais toxinas nas plantas sãs, a
maior parte delas não são muito convincentes”.
No que diz respeito à resistência do milho a Helminthosporium

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

turcicum, OBI (1975) observa que numerosos tipos de resistência a


este fungo não poderiam ser imputados a uma eventual produção de
fitoalexinas.
Por outro lado, KIRALY et alii. (1972) salientam que certas
observações sobre as ferrugens do trigo (Puccinia recondita Rob e
Desm. e P. graminis Pers.) conduzem ao conceito da “resposta
hipersensitiva” de uma planta hospedeira à infecção. Este tipo de
resistência é caracterizado pela desorganização, escurecimento e
morte (necrose) das células nos locais da infecção.
Estes mesmos autores fazem o relato de experiências mostrando
que a necrose hipersensitiva em relação à produção de uma fitoalexina é
apenas uma conseqüência e não a causa da resistência da batata e feijão
a Phytophthora infestans e do trigo às ferrugens. Eles concluíam assim:
“Em outras palavras, na interação natural de incompatibilidade hos-
pedeiro-patógeno, não era a necrose dos tecidos do hospedeiro que ini-
bia ou impedia o patógeno de prosseguir seu crescimento, mas, antes da
necrose, um ou vários mecanismos desconhecidos que inibem ou mesmo
matam o patógeno”.
É o estudo dos fatores de sensibilidade da planta que nos ajuda-
rá a dissecar as causas do fenômeno inverso, o da resistência. Para
tanto, torna-se necessário retomar os trabalhos do patologista fran-
cês DUFRÉNOY, ao qual a Academia de Agricultura acaba de prestar
uma homenagem. DUFRÉNOY (1936), analisando as repercussões
de diferentes fatores culturais sobre a resistência da planta, como as
fertilizações e adubações orgânicas, ressalta que: “O que varia na célula
é a concentração de determinadas substâncias absorvidas do meio
exterior; em condições desfavoráveis à sua utilização, estas substân-
cias podem se acumular nas soluções ditas ‘vacuolares’, na forma de
sal mineral ou ácidos orgânicos”.
DUFRÉNOY precisa que estas “condições desfavoráveis” podem
ser decorrentes de desequilíbrios na adubação, tanto dos macronu-
trientes, como os “clássicos” N, P, K, ou dos oligo-elementos. Transcre-

72
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

vemos a causa de sensibilidade, tal como concebido por DUFRÉNOY:


“Toda circunstância desfavorável à formação de nova quantidade de
citoplasma, isto é, desfavorável ao crescimento, tende a provocar, na solu-
ção vacuolar das células, um acúmulo de compostos solúveis inutilizados,
como açúcares e aminoácidos; este acúmulo de produtos solúveis parece fa-
vorecer a nutrição de microorganismos parasitas e, portanto, diminuir a
resistência da planta às doenças parasitárias”. (fig.7)

Fig. 7. Célula vegetal (folha de Helodea canadensis) . (Segundo GUINOCHET, 1965.)

Em outras palavras: um estado de proteólise dominante nos te-


cidos conduz a uma sensibilidade em relação aos parasitas. Esta con-
cepção, efetivamente, parece confirmada pela análise do fenômeno
inverso: o da resistência. Assim, TOMIYAMA (1963), analisando os
fenômenos fisiológicos e bioquímicos da resistência das plantas, as-
sinala que a fungo-toxicidade dos compostos fenólicos, “admitindo-
se que ela exista, não é muito elevada”, e que os outros grupos
importantes de toxinas também não são altamente tóxicos. Seus
próprios experimentos referentes a Phytophthora infestans parasitando

73
F R A N C I S C H A B O U S S O U

as células epidérmicas das folhas de batata mostram que a maior parte


das hifas intracelulares continuam vivas quando sobrevém “a morte
hipersensível”. Estas hifas intracelulares parecem precisar de dez
horas ou mais para morrerem, após a morte hipersensível da célula-
hospedeira.
Em resumo, tudo leva a crer que, sem nenhuma intoxicação, o
fungo parasita morre simplesmente de inanição.
Deduz-se, conseqüentemente, que a resistência da planta deveria
ser inerente a um ótimo de proteossíntese. É, efetivamente, o resultado
da análise de TOMIYAMA (op. cit), tendo registrado que “observou-
se um aumento das proteínas nos tecidos resistentes”. É, também, isto que
sugere outra observação do mesmo autor: “O acúmulo de amido, o
aumento de protídeos, os compostos fenólicos e a respiração indicam que
os materiais transportados estão relacionados com um metabolismo ace-
lerado no tecido que se mostra resistente ao ataque de parasitas”.
Assim, não é devido a qualquer efeito tóxico dos compostos
fenólicos que se exerce a resistência, mas sim como conseqüência de
uma carência de elementos nutricionais solúveis. A própria carência é
resultante de um estímulo da proteossíntese, que é acompanhada da pro-
dução de fenóis. Aliás, TOMIYAMA termina seu trabalho observan-
do a necessidade de mais estudos profundos relacionados aos fatores
nutricionais.
Parece justificada nossa concepção da trofobiose, segundo a qual:
“Todo o processo vital encontra-se sob a dependência da satisfação das neces-
sidades do organismo vivo, seja ele vegetal ou animal” (CHABOUSSOU,
1960).
Em outras palavras, isto significa que a planta ou, mais precisamente,
o órgão será atacado somente na medida em que seu estado bioquímico,
determinado pela natureza e pelo teor em substâncias solúveis nutricionais,
corresponda às exigências tróficas do parasita em questão.
É útil observar que estas relações de ordem nutricional já haviam
sido suspeitadas em 1956 por GARBER. Esse autor escreveu: “Se o

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

parasita prolifera ou metaboliza extensivamente num hospedeiro, o


hospedeiro deve fornecer todos os elementos nutritivos requeridos
pelo parasita; pela mesma razão, um hospedeiro suscetível apresen-
ta um ambiente inibidor ineficaz”.
GARBER (1956) fornece o exemplo de alterações na virulência
de mutantes bioquímicos de Klebsiella pneumoniae. Os mutantes que
necessitam de treonina, tirosina, leucina, histidina ou uracilo guar-
dam sua virulência. Ele conclui que a relação nutricional encontra-
se, assim, perfeitamente demonstrada. Ele continua: “Se o parasita não
pode proliferar ou metabolizar exclusivamente no hospedeiro, ele não pode
ser virulento”.
Gostaríamos de fazer aqui uma segunda observação em relação às
substâncias solúveis como elementos nutricionais indispensáveis aos
diversos parasitas. É óbvio que afirmando isto não pretenderíamos que
todos os parasitas – como ácaros, insetos, fungos parasitas ou vírus –
sejam tributários de um regime alimentar idêntico. Na realidade, isto
seria testemunhar uma profunda falta de conhecimento da diversi-
dade das necessidades nutricionais destes vários organismos. Todavia,
todos estes organismos – que se pode qualificar de “inferiores” –, devido a
seu equipamento enzimático, exigem alimentar-se de substâncias solúveis,
as únicas capazes de assimilarem.
Assim, é graças a um estado predominante de proteólise nos
tecidos da planta, que pode ser conseqüência de diversos fatores –
entre os quais os tratamentos com agrotóxicos – os quais nos ocu-
paremos de estudar nos próximos capítulos- que o parasita encon-
tra os elementos solúveis que lhes convém. Por isso é capaz de crescer
e se multiplicar numa planta já prejudicada no seu crescimento nor-
mal.
A seguir, vamos expor nossos conhecimentos relativos às neces-
sidades nutricionais das principais pragas e dos fungos patógenos. As
exigências dos vírus serão tratadas no quinto capítulo, consagrado a
essa grave questão.

75
F R A N C I S C H A B O U S S O U

2. NECESSIDADES NUTRICIONAIS DOS “PARASITAS”


ANIMAIS*
Com o estudo do que determina a seleção da planta pelo inseto
ou ácaro, podemos afirmar que estamos no âmago da entomologia
agrícola. De início, coloca-se uma questão fundamental: a escolha do
animal é devida a uma resposta a fatores atrativos ou repulsivos
emitidos pela planta, ou esta se encontra selecionada pela superiori-
dade que oferece ao fitófago?
São numerosos os trabalhos desenvolvidos para responder a esta
questão tão delicada, que exige muita atenção para não se cair na
armadilha do finalismo. Entretanto, diversos métodos de pesquisa
foram colocados em jogo. Citamos, especialmente, as observações dos
insetos em seu meio natural, sua ação predadora, o exame do
divertículo esofágico e dos excrementos, as adaptações estruturais, os
métodos histológicos e determinados métodos especiais, dos quais o
mais recente é dos mais interessantes: criações sobre meios nutriti-
vos artificiais ou sintéticos.
Assim, diversos autores puderam mostrar a estreita relação exis-
tente entre a morfologia das mandíbulas de Acridae e de Tettigonidae
e as formas de sua apreensão do alimento. Isto se constitui na demons-
tração das relações que unem a anatomia do inseto ao seu compor-
tamento alimentar e à sua nutrição. Todavia, em relação à descoberta
e ao ataque da planta, dois tipos de resposta do inseto foram distin-
guidos. O inseto seria governado por dois tipos de estímulos:
a) Os “token stimuli” (ou estímulos sinais), cuja natureza pode ser
olfativa ou gustativa, mas cuja característica seria acusar a presença de
produtos desprovidos de qualquer valor alimentar nos tecidos da

*
Segundo certos puristas, o termo “parasita” deveria ser reservado aos inimigos
naturais das pragas, que usam o corpo destas para efetuar uma parte de sua evolução.
Contudo, decidimos conservar este vocábulo para designar as próprias pragas,
pois caracteriza bem a natureza das relações que ligam a planta e os organismos –
sejam eles quais forem – que vivem às suas expensas.

76
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

planta. Entre estes, pode-se citar: os glicosídeos, os alcalóides, as


saponinas, os óleos essenciais, os taninos etc.
b) Os estímulos gustativos, que respondem à existência de fatores
nutricionais, tais como glicídios, protídeos, vitaminas etc.
É de duvidar que as controvérsias sobre a respectiva ação dessas
duas categorias de estímulos não tenham sido desprovidas de intenções
extracientíficas. Por exemplo, em relação à infalibilidade, real ou supos-
ta, do que foi convencionado chamar de instinto. THORSTEINSON
(1957) mostrou que os “token stimuli” exercem sua máxima ação sen-
sorial em relação a uma dieta quando esta apresenta o maior valor
nutritivo. Foi o que vimos com os trabalhos de SCOTT e GUTHRIE,
no capítulo precedente. Esses autores conseguiram fazer as lagartas de
Ostrinia nubilalis consumirem os milhos reputados resistentes,
suplementando-os com uma dieta adequada.
É, também, o que se verifica nos trabalhos de KENNEDY
(1951), sobre pulgões, que “Há uma espécie de discriminação sen-
sorial exercida pelos pulgões que está associada ao desenvolvimento fi-
siológico das plantas, mais do que à classificação botânica, e que está
ligada à nutrição dos afídeos, quando esta é avaliada pela fecundidade”.
Esta discriminação é exercida especialmente em função da idade
da folha de uma mesma planta. Assim, KENNEDY (op. cit.) obser-
va que as folhas em crescimento e as senescentes mostram-se mais
suscetíveis, em relação a Myzus persicate e Aphis fabae, que as folhas
maduras das mesmas plantas. A hipótese para explicar tais efeitos é
que a nutrição oferecida por esses dois tipos de folhas é especialmente rica
em compostos orgânicos nitrogenados solúveis e de alto valor nutritivo:
aminoácidos livres e amidos.
Estes compostos formam-se especialmente nas partes em cresci-
mento (com diferentes nuances entre as folhas muito jovens e jovens),
e quando do período de senescência, quando os protídeos dissociam-
se em aminoácidos. A proteólise, então, predomina sobre a
proteossíntese (KENNEDY, 1958).

77
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Deve-se, também, notar a preferência dos pulgões por galhas e


plantas atacadas por moléstias viróticas. Assim, Aphis fabae reproduz-
se cerca de uma vez e meia mais rápido sobre plantas com estas do-
enças que sobre plantas sãs. Veremos novamente este fenômeno,
ligado à composição bioquímica da planta, quando estudarmos as
doenças viróticas.
Esta correlação entre a escolha da planta pelo animal e seu valor
nutricional é encontrada, igualmente, em outros insetos como, por
exemplo, o bicho-da-seda (Bombyx mori) ou nos ácaros (CHA-
BOUSSOU, 1969). Trata-se de determinar, o mais precisamente
possível, não apenas os elementos nutricionais que entram em jogo, e
que sabemos serem, de maneira geral, produtos solúveis (aminoácidos
e glicídios redutores), mas também seu equilíbrio no metabolismo móvel
da planta. Agora, vamos examinar o que sabemos sobre as necessida-
des nutricionais das principais ordens de insetos.
De uma maneira geral, os insetos têm necessidade de:
1. Sais minerais: o potássio é indispensável aos coleópteros,
lepidópteros, dípteros e blatários.
2. Glicídios: as necessidades são muito variadas.
3. Aminoácidos: foi possível mostrar que dez aminoácidos são
comuns aos insetos e aos vertebrados. A diferença reside em que, nos
insetos, estes aminoácidos devem estar disponíveis sob forma livre, e
não sintetizados em protídeos ou proteínas mais complexas, como
para os vertebrados.
4. Lipídios: numerosos insetos são capazes de sintetizar suas re-
servas lipídicas a partir de hidratos de carboidratos.
5. Esteróis: os insetos são incapazes de sintetizar o núcleo esterol
e devem, portanto, encontrá-lo obrigatoriamente na sua dieta. Assim,
a produção de ovos viáveis de Musca domestica exige a presença de
colesterol, já que outros esteróis são incapazes de substituí-lo
(BERGMANN, 1965). Confirmando esta ação, LE BERRE e
PETAVY (1965) puderam mostrar a relação entre a presença de

78
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

esteróis no meio nutritivo e a viabilidade dos ovos de Locusta


migratoria.
Os autores HARLEY e THORSTEINSON (1967) experimen-
taram 20 produtos químicos vegetais, estudando o desenvolvimen-
to da longevidade e do comportamento alimentar de um gafanhoto,
Melanotus bivittatus Say. Concordando com os resultados apresenta-
dos, eles concluem que “no comportamento alimentar deste inseto, o
papel dos produtos químicos secundários é informá-lo sobre as dietas a
escolher”.
Os esteróis mostraram o maior efeito, simultaneamente, sobre o
comportamento alimentar, a longevidade e o crescimento do gafanho-
to. Assim, chega-se à hipótese de que a distribuição dos esteróis na
planta poderia fornecer o mecanismo das relações entre o inseto e a
planta-hospedeira.
Estudando o caso dos ácaros, veremos que também reagem po-
sitivamente à presença de esteróis na dieta. Ë necessário observar que
as repercussões dos esteróis foram muito menos estudadas que as dos
aminoácidos ou glicídios e, por outro lado, os quais veremos a
importância,conforme mostraram DUPEYRON e DUPEYRON
(1969), o enriquecimento da planta em nitrogênio protéico é acompa-
nhado de um aumento de esteróis.
6. Vitaminas: somente as vitaminas do grupo B, hidrossolúveis, são
indispensáveis aos insetos. Os meios nutritivos artificiais contêm,
ordinariamente, dez vitaminas.

Os equilíbrios nutricionais
Dos diferentes fatores nutricionais antes enumerados, os glicídios
e os aminoácidos foram os mais estudados e, especialmente, as reper-
cussões de seu equilíbrio sobre o potencial biótico do inseto em
questão.
A princípio, distinguimos os alimentos energéticos, que mantêm
a vida – trata-se principalmente dos glicídios – e alimentos plásticos,

79
F R A N C I S C H A B O U S S O U

necessários à formação de novos tecidos, que são os produtos


nitrogenados.
Contudo, observou-se que esta distinção não é absoluta: os
carboidratos podem ser necessários para a utilização das proteínas da
dieta. As experiências conduzidas com soluções nutritivas artificiais
parecem confirmar este fato, tanto do ponto de vista da preferência
quanto do nível do potencial biótico. Esses trabalhos referem-se prin-
cipalmente a pulgões, mas também a alguns outros insetos e ácaros.
Em relação aos pulgões, recordaremos as pesquisas de MITTLER
e DADD (1965) com Myzus persicae. Elas estabeleceram que, se o
açúcar é fundamental para a vida larval, uma mistura de aminoácidos
essenciais, potássio, magnésio e fosfatos é necessária para que se pro-
duza um crescimento apreciável. Sem aminoácidos a longevidade
permanece inalterada, mas a fecundidade é muito baixa. MITTLER
(1967) observa o efeito fago-estimulante dos açúcares: a nutrição é
medíocre ou inexiste nas dietas que apresentam um baixo teor em
sacarose (menos de 5%). O mesmo ocorre com baixas concentrações
em aminoácidos (menos de 1%). Para a sacarose, a escala ótima situa-
se entre 10 e 20%. Para os aminoácidos, a ingestão do alimento
aumenta com as concentrações crescentes na dieta, indo até 3%. Após
este limite, ela decresce levemente.
O autor observa que isto explica as diferenças nos ataques em
função da época, já que as concentrações em sacarose e aminoácidos
variam ao longo de todo o ano. Acrescentaremos que o mesmo ocor-
re com todos os outros fatores suscetíveis de agir sobre a fisiologia da
planta, como vimos antes, especialmente os tratamentos com
agrotóxicos e a fertilização.
São considerações análogas que desenvolve HOUSE (1967-
1969), após ter estudado o comportamento alimentar da mosca
Pseudosarcophaga affinis, em relação a dietas sintéticas. Os resultados
mostram uma preferência nítida por uma dieta equilibrada. Esse
autor especifica “que os fatores não nutricionais, como óleos essenci-

80
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

ais, glicosídios etc... e, suscetíveis de atuar sobre a atratividade por seu


gosto, odor ou cor, e outros ‘token stimuli’, absolutamente não são
responsáveis pela preferência”.
Em resumo, a escolha do inseto recai sobre uma dieta bem de-
terminada: a dieta F, contendo l,125% de aminoácidos e 1,5% de
glicose. A aptidão de elaborar as proteínas depende do equilíbrio da
dieta, especialmente dos aminoácidos, sais e os outros elementos
nutritivos, como a composição em minerais.
Estes resultados foram confirmados por diferentes pesquisadores
e voltaremos a eles, quando estudarmos as repercussões dos
agrotóxicos sobre a multiplicação de pulgões.
O estudo do comportamento dos lepidópteros conduz às mesmas
conclusões. Assim, vimos que a resistência do milho à lagarta de
Ostrinia nubilalis não pode ser explicada por eventuais efeitos tóxi-
cos de uma substância que estaria presente nos tecidos. Ao contrário,
BECK e HANCE (1958) mostraram que um determinado número
de aminoácidos tem efeitos significativos em relação ao comporta-
mento de nutrição dos primeiros estágios larvais da lagarta. Assim,
a duração média dos períodos de ingestão do alimento é aumentada
por um determinado número de aminoácidos, particularmente pela
L-alamina, o ácido de £-aminobutírico, a L-serina e a L-treonina. Sem
dúvida, não é necessário procurar em outro lugar a causa do ataque
em milhos reputados resistentes, quando são artificialmente
suplementados por uma dieta adequada que contenha estes elemen-
tos nutricionais- como tivemos a oportunidade de assinalar antes
(SCOTT e GUTHRIE, 1966).
Ainda nos lepidópteros, KNAPP et alii. (1965) observaram que
as linhagens de milho resistentes a Heliothis zea não apresentavam
nenhuma diferença na composição das proteínas em aminoácidos.
Essas linhagens resistentes mostraram nas amostras não protéicas, uma
concentração menor em aminoácidos, em relação às linhagens suscetíveis
que, ao contrário, revelavam concentrações muito elevadas.

81
F R A N C I S C H A B O U S S O U

O mesmo ocorre com os açúcares redutores: uma linhagem susce-


tível, MP17 x MP319, tem 22,53% desses açúcares, em relação ao
peso de matéria verde, enquanto uma linhagem resistente, como F44
x F6, tem apenas 15,03%.
Também o estudo do comportamento alimentar da lagarta do
algodoeiro, Earias fabia, mostrou que são as diferenças nos teores em
aminoácidos das diversas dietas que explicam sua utilização pelas
larvas, com repercussões inerentes sobre o crescimento (MEHTA e
SAXENA, 1973).
A própria natureza dos aminoácidos também intervém. Os expe-
rimentos referentes às preferências alimentares de trips, conduzidos
com duas espécies, sobre videiras e mamona, mostraram que as videi-
ras atacadas apresentavam uma ausência total de lisina, histidina e tirosina.
MARDZHANJAN et alii. (1965), estudando a causa da multiplica-
ção do ácaro Tetranychus urticae pelo DDT, sobre algodoeiro, observa-
ram o desaparecimento de certos aminoácidos livres, especialmente a
histidina, entre outras perturbações bioquímicas.
Ainda referente aos trips, SAXENA (1970) evidenciou que as
variedades de cebola resistentes continham glicina, histidina e cistina.
Isto parece, pois, ser uma confirmação do papel “dissuasivo” de um
aminoácido como a histidina.
Assinalaremos enfim, antes de passarmos ao caso dos ácaros, que
existe uma correlação positiva direta entre as espécies de plantas
selecionadas pelos acrídios e seu valor, no que se refere à longevidade,
ao crescimento e ao potencial de reprodução desses insetos
(MULKERN, 1967).
Os ácaros foram mais especificamente estudados devido a suas
multiplicações após os tratamentos com numerosos agrotóxicos.
Diversos métodos de pesquisa foram utilizados como as repercussões
da fertilização, e dos agrotóxicos, a criação sobre plantas (elas mesmas
condicionadas por determinadas soluções nutritivas) e, enfim, a cri-
ação direta sobre meios nutritivos artificiais.

82
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Freqüentemente, o nitrogênio solúvel foi questionado (CHA-


BOUSSOU, 1969). A espécie Tetranychus urticae, fácil de criar, foi
particularmente estudada. STORMS e NORDDINK (1970), a pro-
pósito do teor de aminoácidos nas plantas, precisam que o substrato dos
ácaros é constituído pelo conteúdo vacuolar das células. Para os ácaros, como
para os insetos, são exatamente as substâncias solúveis que interferem nas
repercussões nutricionais da dieta.
Segundo RODRIGUEZ (1967), T. urticae seria capaz de sinte-
tizar numerosos aminoácidos a partir da glicose: como alanina, áci-
do aspártico, cistina, ácido glutâmico, glicina, prolina, serina e
treonina. Para esta espécie de ácaros, os aminoácidos essenciais seri-
am arginina, histidina, isoleucina, leucina. metionina, fenilelanina,
tirosina e valina.
Assim, estaria confirmado, como observa RODRIGUEZ, que,
qualitativamente, as necessidades em aminoácidos dos ácaros são
iguais, não apenas às dos insetos, mas também, e, grosseiramente,
análogas às do rato.
Entretanto, as substâncias nitrogenadas não constituem os úni-
cos elementos nutricionais dos ácaros: os glicídios também intervêm,
como demonstrado inicialmente por FRITZCHE (1961). Assim, no
feijão, a fecundidade de T. urticae difere segundo a variedade e está
em estreita relação com o teor de açúcares redutores nas folhas.

Quadro 1. Fecundidade de T. urticae, em função da variedade de feijão e do teor


de açúcares redutores nas folhas.
Fecundidade Variedades de feijão Açúcares
redutores(mg/g mat. seca)
Alta Saxa 10,44
Média Goldregen 8,24
Baixa Prinsa 3,90

FRITZSCHE explica, igualmente, as diferenças de fecundidade


do mesmo ácaro em relação a diversas hortaliças, bem como a influ-

83
F R A N C I S C H A B O U S S O U

ência do estado fisiológico da planta – o lúpulo, no caso – sobre a


gravidade dos ataques.
O mesmo autor também evidencia um fenômeno ao qual volta-
remos: a influência de certas práticas culturais sobre a multiplicação
do ácaro vermelho, Panonychus ulmi Koch, em macieiras. Trata-se da
natureza da adubação: a cobertura morta de palhas propicia populações
relativamente fracas, em comparação a uma fertilização à base de adu-
bos verdes.
FRITZSCHE (op. cit.) também mostrou que em feijão a carên-
cia em potássio acarreta uma elevação no teor de açúcares redutores.
Daí o efeito nefasto de numerosas adubações desequilibradas (fig. 8).
A influência do estado fisiológico da planta sobre a nocividade do
ácaro foi diversas vezes demonstrada, especialmente por POE (1971).
O autor observa que em morangueiro T. urticae multiplica-se de uma
forma mais acelerada sobre plantas com frutos que sobre moranguei-
ros em crescimento e sem frutos. Ora, na análise, as folhas das plan-
tas com frutos mostraram níveis mais altos de sacarose, em
comparação às plantas sem frutos.
Efetivamente, DABROWSKI (1973) mostrou, após RODRI-
GUEZ, que um certo número de açúcares apresentaram um efeito de
fagoestimulação significativamente mais elevado que o mais eficaz dos
aminoácidos utilizado isoladamente.
MEHROTRA (1963) demonstrou que T. urticae possui nume-
rosas glucosidases capazes de hidrolisar diversos carboidratos, como
maltose, sucrose, trealose, melilose, lactose, melisitose e rafinose. Da
mesma forma, esse trabalho sugere que T. urticae contém todas as
enzimas necessárias para a utilização das fostato-hexoses no proces-
so de Embden-Meyerhof, exceto a desidrogenase lática.
Chega-se à conclusão de que são, antes de tudo, as relações en-
tre as substâncias nitrogenadas e os glicídios que determinam, tan-
to a suscetibilidade da planta ao ataque, como a fecundidade do ácaro.
RODRIGUEZ (1967) demonstrou que os elementos nutritivos

84
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

servem, efetivamente, de estimulantes de nutrição e que, pelo menos


numa primeira aproximação, um certo equilíbrio entre aminoácidos
e glicídios assegura o máximo de fecundidade.
Assim, os ensaios de criação sobre dieta artificial mostraram que
se a longevidade de T. urticae é aumentada abaixando-se o nível de
aminoácidos a 0,5% e mantendo-se o da sacarose em 2%, a
fecundidade e a fertilidade são reduzidas em média de 50%. A dieta
ótima para o desenvolvimento dos ovos apresentaria uma proporção
aminoácidos/sacarose de 1,5 a 2%.
Acrescentemos que, como nos insetos outros fatores alimentares
estreitamente ligados também repercutem sobre a reprodução e o
ataque à planta. Isto ocorre com os elementos fosforados (CANNON
e CONNEL, 1965).
Determinadas contradições parecem se explicar pela natureza do
metabolismo da planta e em função das respectivas proporções dos
diversos elementos nutritivos. Assim, HENNEBERRY (1963) regis-
tra uma maior fecundidade de T. telarius (igual a T. urticae) com o
aumento do N fornecido e absorvido e, ao contrário, uma redução no
teor do P e do total de carboidratos. A contradição com certos resul-
tados precedentes do autor, segundo ele próprio, se explicaria porque,
neste estudo, o total de carboidratos e de fósforo estão em correlação
negativa com o nitrogênio absorvido. Ora, nas plantas deficientes em
nitrogênio, um teor elevado em glicídios implica uma queda na forma-
ção de proteínas. Isto também explicaria que nos estágios ulteriores da
planta, quando o tamanho das folhas é função das possibilidades
fotossintéticas, o efeito inverso pudesse se produzir.
Na conclusão desse estudo, relativo às necessidades nutricionais dos
insetos e dos ácaros, os pontos principais que se destacam podem ser
assim resumidos:
1. A suscetibilidade da planta é função da existência de fatores
nutricionais em seus tecidos, especialmente elementos solúveis pre-
sentes no vacúolo das células e, em particular, aminoácidos e glicídios

85
F R A N C I S C H A B O U S S O U

redutores, como no caso de moluscos e crustáceos. Parece bem estabe-


lecido que numerosos insetos e ácaros sejam desprovidos de todo
poder proteolítico.
2. Como pensamos ter demosntrado, parece, em uma primeira
aproximação, que, um certo equilíbrio entre os elementos nitrogenados e
os glicídios seja necessário para assegurar, a cada espécie animal, uma
dieta ótima para seu crescimento e sua reprodução.
Entretanto, a própria natureza destes elementos pode interferir, já
que as diferentes espécies não têm exigências nutricionais idênticas,
como seria fácil de prever.
3. Vimos também, rapidamente, diversos fatores, ambientais ou
da natureza da planta, que confirmam a influência da nutrição sobre
a suscetibilidade. Além da variedade, a idade da folha, a época do ano
e a natureza da fertilização, todos estes, fatores os quais voltaremos a
mencionar.
4. Com o caso de Ostrinia nubilalis, viu-se como SCOTT e
GUTHRIE (1966) puderam tornar sensível um híbrido resistente,
suplementando-o com uma dieta nutricional adequada (contendo
principalmente ácido ascórbico, além de outras substâncias nutriti-
vas). Isto levou os autores a concluírem que: “Os experimentos de
criação mostram que, apesar das larvas comerem folhas podendo
conter a toxina ou o repulsivo (tese de BECK), elas continuam a
sobreviver e a se desenvolver rapidamente”.
Isto constitui a demonstração de que a resistência encontra-se
realmente ligada a uma carência da planta em elementos necessári-
os à praga.
O inverso também foi tentado, isto é, tornar resistente uma plan-
ta sensível através de uma suplementação nutricional. Assim,
KIRCHER et alii. (1970) mostraram, em alfafa, que nenhum dos
sucos de variedades resistentes tornou resistentes os colmos dos clones
sensíveis ao pulgão Theriophis maculata. Isto prova, salientam eles, que
a causa da resistência está excluída de toda a ação tóxica ou repulsiva.

86
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Ao contrário, como para Ostrinia nubilalis em relação ao milho,


foi possível mostrar que Solanum demissum, resistente a Leptinotarsa,
é perfeitamente aceita a partir do momento em que se infiltra suas
folhas com suco extraído da batata, Solanum tuberosum. Os autores
concluem que a resistência de S. demissum resulta da sua não aceita-
ção como alimento, e esta anorexia provoca a atrofia dos ovários do
inseto.
Portanto, dispomos de duas provas suplementares da estreita
correlação entre o valor nutricional da planta em relação ao parasita
e do ataque que disto resulta. Sobre este assunto, veremos o que se
refere aos parasitas vegetais e especialmente os fungos patógenos.

3. AS NECESSIDADES NUTRICIONAIS DOS FUNGOS


PATÓGENOS
Contrariamente aos entomologistas e aos acarologistas, que se
debruçaram entusiasticamente sobre as necessidades dos animais
como objeto de seus estudos, parece que aqueles fungos parasitos
tinham tentado muito menos os fitopatologistas. Exceto alguns ra-
ros casos, eles sequer se preocuparam com os problemas que envol-
vem as relações entre a planta – definida por seu estado bioquímico
– e sua resistência aos agressores. No máximo, como no estudo do caso
da helmintosporiose, certos patologistas consagraram-se à pesquisa
de produtos antagonistas. Vimos que, semelhante ao caso dos inse-
tos, esta via levava de fato, a um impasse. Assim, exatamente como
para a causa do ataque à planta pelas pragas, somos reconduzidos ao
estudo dos fatores nutricionais necessários a desses organismos infe-
riores.
Ao nosso conhecimento, HORSFALL e DIMOND (1957) são
os primeiros a tomarem como hipótese de trabalho as eventuais re-
lações entre a suscetibilidade da planta à doença e o conteúdo em
açúcares dos tecidos. Eles observaram que uma carência em boro e
certos tratamentos com reguladores de crescimento tinham por resul-

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

tado afetar o teor dos tecidos em glicídios e, conseqüentemente, a


sensibilidade da planta ao seu eventual parasita.
Estes autores, trabalhando sobre Alternaria solani do tomate,
anotaram a observação de um prático, segundo o qual as Bull plants,*
isto é, carregadas de folhas mas desprovidas de frutos, mostraram-se
índenes aos ataques de Alternaria. Efetivamente, a emasculação de
todas as flores tinha por resultado imunizar a folhagem em relação à
doença. E, reciprocamente, as plantas com abundância de flores
mostraram-se altamente suscetíveis à doença.
Os autores concluem: “Os frutos tiram das folhas alguma substância
que é responsável pela ‘resistência’ em relação à Alternaria, a qual não
poderia ser, senão o açúcar”.
Ora, se esta tentativa de relacionar o estado bioquímico da planta
à doença é meritória, é necessário se dar conta, por tudo que foi vis-
to, que atribuir a resistência apenas ao teor dos tecidos em açúcares
é concluir de maneira um tanto precipitada.
Prosseguindo sua tentativa de demonstração, HORSFALL e
DIMOND (op. cit.) recordam a observação corrente, da maior
suscetibilidade a Alternaria das folhas velhas de tomateiro do que das
jovens. Estes autores justificam o fato porque estes órgãos senescentes
contêm menos açúcares. Contudo, a idade das folhas afeta igualmen-
te a natureza e a quantidade dos elementos nitrogenados. Com efeito,
a proteólise sendo predominante nas folhas velhas, estas mostram-se mais
ricas em produtos nitrogenados solúveis que, como vimos, são nutricional-
mente sensibilizadores em relação aos fungos parasitas.
Em resumo, reencontramos aqui esta noção fundamental de que
a resistência não poderia ser atribuída a esta ou aquela substância a
priori considerada antagonista, presente nos tecidos da planta-hos-
pedeira, mas muito mais a uma carência nutricional. No caso de
Alternaria, a resistência estaria ligada a uma deficiência em elemen-

*
Em inglês no original. (N. da T.)

88
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

tos nitrogenados solúveis ou, mais exatamente, a uma relação muito


baixa N solúvel/glicídios. Como já observamos no caso da helmintos-
poriose, os açúcares não apresentam qualquer propriedade fitotóxica,
muito ao contrário.
Há outra observação de HORSFALL e DIMOND (op. cit.) que pode
dar lugar a uma interpretação totalmente contrária. Os autores observa-
ram que as mudas de tomate, em trânsito pelos mercados, tornavam-se
suscetíveis à Alternaria durante a noite. Eles acreditaram poder concluir
que era devido ao consumo do açúcar que ocorre nesse período. Contu-
do, com mais lógica, se pode atribuir tal sensibilização, neste período do
ciclo circadiano, à destruição das proteínas e à translocação dos produ-
tos nitrogenados que delas derivam. Esta atividade fornece ao fungo
parasita os elementos nitrogenados necessários a seu desenvolvimento.
Portanto, esta é a razão pela qual a distinção que fazem HORSFALL
e DIMOND, de “moléstias a altos e baixos teores em açúcar”, pode-
ria ser, mais logicamente, transformada em moléstias medidas em fun-
ção da relação nitrogênio solúvel/glicídios redutores.
Assim, a helmintosporiose, estudada no segundo capítulo, clas-
sificada por esses autores como “moléstia a baixo teor em açúcar”, deve
ser normalmente classificada entre as doenças com a relação N solú-
vel/glicídios relativamente elevada, já que o açúcar não mostra qual-
quer efeito antagonista ao fungo.
Esta concepção não apresenta somente um interesse teórico, mas
nos permite, por um condicionamento apropriado da planta, resistir
melhor às diversas agressões que ela pode sofrer. Veremos isto através
da natureza e equilíbrio da fertilização, pela utilização de tratamentos
foliares com produtos nutricionais (macro e oligoelementos) e trata-
mentos da semente, cuja terapêutica se realiza através de uma ação
indireta sobre o metabolismo da planta.
Analisando as concepções de GRAINGER (1967), igualmente
baseadas sobre o teor em açúcares dos tecidos, chegaremos à mesma
conclusão.

89
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Observando que a suscetibilidade das plantas às moléstias varia


durante todo o ciclo evolutivo de crescimento, GRAINGER recor-
da que os patologistas distinguem “ataques primários” e “ataques
secundários”, separados por um intervalo de boa saúde relativa, em
numerosas doenças de cereais.
Outro exemplo, a requeima da batata (Phytophthora infestans),
cujas infecções são muito graves sobre os brotos recém-saídos dos
tubérculos, é incapaz de contaminar as batatas na metade do ciclo de
crescimento. Daí a relatividade dos termos genéticos de “sensibilidade”
e de “resistência”. Assim, podemos já supor, como veremos confirmado,
abundantemente, adiante, tal concepção é perfeitamente justificada.
GRAINGER não parece dar valor absoluto à “resistência”, exclu-
sivamente definida geneticamente, ao contrário, ele vê uma relação
entre o ataque da planta e seu estado bioquímico caracterizado pela
relação Cp/Rs na qual Cp representa o peso total dos carboidratos e
Rs o peso seco residual dos tecidos (fig. 9).
Esta relação expressaria o potencial de vulnerabilidade do hospe-
deiro tanto em relação a bactérias patogênicas quanto a fungos para-
sitas. GRAINGER estabelece, com efeito, , em princípio, que os
glicídios são elementos nutricionais dos quais, antes de tudo os fun-
gos patógenos têm necessidade. Ele escreve: “Essas substâncias con-
tribuem (com o nitrogênio e a cinza*), não somente para a própria
constituição do agente patógeno, mas também constituem igualmen-
te uma fonte de energia para seu crescimento, já que o nitrogênio e
a cinza não são matérias energéticas”.
O próprio GRAINGER deve reconhecer que esta relação nem
sempre é estreita e que o crescimento da planta também parece in-
tervir. É porque, diz ele, torna-se necessário estabelecer uma rela-
ção inversa entre os dois fatores: Rs expressando a amplitude de

*
Por “cinzas” termo de tradução do artigo, pensamos que se deve entender como a
soma diversos elementos minerais.

90
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crescimento num dado período. Ora, precisamente, Rs represen-


ta, em parte, o teor em proteínas que está estreitamente ligado ao
crescimento. Conseqüentemente, a relação Cp/Rs escolhida por
GRAINGER se aproxima muito da C/N, ou de glicídios/elemen-
tos nitrogenados.
GRAINGER é forçado a concordar que, se a maioria dos fungos
parasitas são exigentes em glicídios como, por exemplo, a requeima
da batata (Phytophthora infestans), alguns outros, como os Pythium
têm “pouca atração” pelos açúcares. Neste caso é, portanto, sobretudo
às expensas dos elementos nitrogenados que eles se desenvolvem.
Ferrugens e carvões também fariam parte desta categoria de fungos.
Conclui-se que as necessidades nutricionais dos fungos poderiam se
mostrar diferentes segundo a categoria à qual eles pertencem, o que
nos parece bastante normal. Assim, retomemos as concepções de
HORSFALL e DIMOND, mas corrigidas, levando-se em conside-
ração o teor dos tecidos em nitrogênio solúvel, principalmente sob a
forma de aminoácidos livres.
Indicamos, por fim, que GRAINGER propõe uma verdadeira
escala do “potencial de vulnerabilidade” da planta, baseada na rela-
ção Cp/Rs. Assim, o que ele chama “a fase da barreira fisiológica”
correspondente, de fato, à imunidade, seria caracterizada por uma
relação inferior a 0,4; 0,5 ou 1, segundo o gênero do agente
patogênico.
A fase denominada “primeira fase receptiva” corresponde a uma
relação Cp/Rs entre 0,4 e 1 para os agentes patogênicos pouco exi-
gentes em glicídios ou entre 0,5 e 1 para os agentes patogênicos
“normais”. Quanto à fase dita “epidêmica”, ela intervem, quando a
relação Cp/Rs se eleva entre 1 e 10: quanto mais se eleva a relação,
mais grave é a epidemia.
GRAINGER distingue uma “fase de tolerância”, que ocorreria após
uma fase de hipersensibilidade. Neste caso, a relação cai de 10 para
1, e a planta tende a superar a moléstia, caso ela tenha sido atacada.

91
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Enfim, na fase “hipersensível”, Cp/Rs é maior que 10: é o caso


dos brotos recém-saídos de sementes, bulbos ou tubérculos, com altos
teores de glicídios (fig. 10).
GRAINGER observa que, devido à influência dos fatores
ambientais, estas diferentes fases da sensibilidade à doença não se
apresentam sempre da mesma maneira. “Certos hospedeiros são não-
receptivos durante uma grande parte do período em que as tempe-
raturas são adequadas a uma atividade intensa da maior parte dos
parasitas. Por outro lado, as fases de hipersensibilidade, extremamente
perigosas, e as fases de tolerância, menos receptivas, ocorrem quan-
do as temperaturas são relativamente baixas e os agentes patogênicos
menos ativos”.
É o que interpretamos disto fazendo notar que a proteossíntese
encontra-se inibida com baixas temperaturas, causando uma eleva-
ção no teor dos tecidos em substâncias solúveis. Este fenômeno está
ligado à exacerbação da sensibilidade da planta em relação à molés-
tia, já que a natureza e a gravidade da doença são determinadas pela
natureza e pelo nível das substâncias solúveis, nutricionalmente necessá-
rias ao parasita em questão.
Observemos que, para os fungos patógenos, a questão da “procu-
ra” da planta hospedeira não existe, uma vez que os esporos, emiti-
dos em número considerável, estão quase sempre presentes no meio
ambiente. Aqui, talvez ainda mais que para as pragas, é o estado fi-
siológico da planta ou do órgão que atua na sensibilidade ou, caso se
prefira, na resistência.
Estas considerações nos levam à noção de “períodos críticos” no
ciclo anual fisiológico da planta. São épocas no curso das quais a fi-
siologia e a resistência dos órgãos evoluem devido a certos processos
metabólicos que acompanham, como por exemplo, o crescimento, a
maturidade e a senescência da folha ou bem a formação e o desenvol-
vimento dos órgãos reprodutores, a fisiologia, cuja resistência dos
órgãos evoluem. Como nos preocuparemos ao longo desta obra a

92
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

folhagem da planta pode, segundo a época considerada,encontrar-se


mais ou menos sensível – ou resistente – aos ataques das diversas
pragas.
Precisamente, são os diversos fatores capazes de intervir na fisi-
ologia e, portanto, no estado bioquímico da planta ou do órgão que
iremos estudar agora, como já fizemos, rapidamente, no caso da
helmintosporiose.

4. OS DIVERSOS FATORES CAPAZES DE AGIR SOBRE A


PROTEOSSINTESE E, PORTANTO, SOBRE A
RESISTÊNCIA DA PLANTA
Estes diferentes fatores podem ser classificados em três categorias:
a) Fatores intrínsecos, que envolvem a constituição genética da
planta, entre os quais se pode distinguir:
1. A espécie e a variedade.
2. A idade dos órgãos ou da planta.
b) Fatores abióticos, que, provisoriamente, consideraremos em
conjunto:
3. O clima: energia solar, temperatura, umidade, precipitação e
eventuais influências cósmicas (lua).
c) Fatores culturais.
Distinguimos:
4. O solo: tanto do ponto de vista da composição química quan-
to da estrutura e aeração.
5. A fertilização: na qual distinguiremos fertilização, mineral e os
oligoelementos e, enfim, a adubação orgânica
6. A prática de enxertia: está demonstrada a influência do porta-
enxerto sobre a fisiologia do enxerto e reciprocamente.
7. Os tratamentos com agrotóxicos: que colocamos como causa do
desencadeamento de “desequilíbrios biológicos”.
A influência da espécie e da variedade, que ninguém contesta, deu
lugar a importantes pesquisas de ordem genética visando obter as

93
F R A N C I S C H A B O U S S O U

variedades resistentes. Todavia, não se deveria perder de vista, como


haveria a tendência de fazê-lo, que os genes não são mais que um dos
fatores que governam o metabolismo da planta. Como pôde obser-
var GROSSMANN (1968): “A produção de plantas resistentes foi, até
aqui, reservada à genética. É uma via penosa e que conduz, freqüente-
mente, a um sucesso apenas temporário”. Ele acrescentava ainda esta
reflexão a propósito da prática de determinadas terapêuticas: “Tal-
vez fosse mais simples e mais eficaz, no futuro, conferir a resistência às
plantas pela aplicação de produtos químicos”.
Está colocado o problema da modificação do metabolismo da
planta no sentido da resistência, ou seja, na direção inversa da que
conduz aos “desequilíbrios biológicos”, pelas repercussões dos
agrotóxicos e que evocamos no primeiro capítulo. Antes de podermos
tomar a via inversa destes fenômenos, ou seja, estimular em vez de
reprimir a resistência, é necessário analisar o processo nefasto. Pen-
samos ter explicado pela incidência dos agrotóxicos sobre o metabo-
lismo que agora será estudado mais de perto e em função de nossa
teoria da trofobiose.
Assim, o próximo capítulo será consagrado às repercussões dos
agrotóxicos sobre a fisiologia da planta e às modificações bioquími-
cas acarretadas pela aplicação de diversos produtos fitossanitários:
inseticidas, fungicidas e herbicidas. Após já termos estudado as ne-
cessidades nutricionais dos diversos parasitas, será possível explicar a
causa das multiplicações de pragas e do desenvolvimento das molés-
tias pela distorção do metabolismo da planta. Veremos que ela vai no
sentido previsto pela teoria da trofobiose: é, ao menos, o que nos
propomos demonstrar, ou seja, a inibição da proteossíntese.

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Teor em açúcares redutores

Fig. 8. Teores em açúcares redutores em diferentes níveis da fo-


lhagem de feijão, em função do tipo de carência na solução nutriti-
va. (Segundo FRITZSCHE, 1961)

95
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Fig. 9. Escala de sensibilidade da batata à requeima (Phytophthora


infestans) em função da relação Cp/Rs, expressando a relação entre o
peso total dos carboidratos contidos na planta inteira (Cp) e o peso
seco residual (isto é, menos os carboidratos). (Segundo GRAINGER,
1967)

96
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A) Potencial de vulnerabilidade da aveia (observada e testada) em


relação a Helminthosporium avenae, em função da época do ano.*
B) Aveia: relação Cp/Rs, em relação com as fases da doença que
ela revela.

97
F R A N C I S C H A B O U S S O U

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100
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

CAPÍTULO IV

AS REPERCUSSÕES DOS AGROTÓXICOS


SOBRE A FISIOLOGIA DA PLANTA

“Para que esta evolução seja possível [a da medicina da planta], é indispensável


estudar a fundo a fisiologia vegetal, especialmente nossos conhecimentos sobre
a circulação da seiva, se trata também de estudar as modificações provocadas
na planta pelos produtos químicos”. Paul MÜLLER

Le développement de la Phytopharmacie. (3º Congrès International de


Phytopharmacie, Paris, 1952)

1. A PARTICIPAÇÃO DOS AGROTÓXICOS NO


METABOLISMO DA PLANTA
A utilização de diversos hormônios, de herbicidas e o emprego dos
adubos foliares – técnicas presentes na prática agrícola corrente –
bastariam para mostrar que os tecidos vegetais deixam-se penetrar por
numerosos produtos ditos “fitossanitários”. Ao contrário, é necessá-
rio observar que muitas vias de entrada são possíveis:
• Antes de tudo, pela folha, durante os tratamentos clássicos com
inseticidas e fungicidas.
• Igualmente, pela raiz, como conseqüência, não somente, da
desinfecção do solo contra pragas, fungos patógenos ou
nematódeos, mas também pela queda de agrotóxicos prove-
nientes dos tratamentos da folhagem. Estas conseqüências
são mais importantes do que se poderia supor a princípio.

101
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Apenas mencionaremos a esterilização do solo devido a tra-


tamentos cúpricos prolongados e à destruição das minhocas
pelos ditiocarbamatos.
• Pela semente, como resultado de tratamentos das sementes
contra insetos ou moléstias das plântulas e cujas repercussões
indiretas sobre a fisiologia da planta podem explicar tanto a
ação benéfica procurada, como os efeitos tóxicos.
• Existe, enfim, uma quarta via, que diz respeito, em particular,
às árvores frutíferas: trata-se do tronco e galhos, por ocasião dos
tratamentos de outono, inverno ou de pré-brotação.
WILLAUME (1937) demonstrou que os óleos de antraceno
apresentavam uma ação estimulante sobre o crescimento das
árvores. Esta ação parece ligada à propriedade da substância
de crescimento apresentada pelo ácido antracênico contido
nesses óleos. Sabe-se que em determinadas diluições os óle-
os de antraceno podem acelerar a germinação dos grãos de
trigo. Certamente, é esta ação que provoca diferenças nas
épocas de eclosão dos ovos de inverno dos “aranhas verme-
lhas”, em árvores frutíferas, segundo elas tenham sido trata-
das ou não com os óleos de antraceno.
No que diz respeito à penetração dos agrotóxicos nas folhas, que
constitui a via mais freqüente, sabe-se que a cutícula e as paredes
cuticulares das folhas contêm numerosos lipídios que facilitam a
absorção dos compostos lipossolúveis. Este fato acentua, pois, toda
a importância da solubilidade das moléculas sobre as repercussões
indiretas dos agrotóxicos. Foi bem destacado, com efeito, que: “De
fato, é mais precisamente a afinidade do agrotóxico, pelos corpos
graxos de um lado e pela água, por outro, que vai condicionar sua
penetração no organismo animal ou vegetal. Ele deve antes atraves-
sar uma primeira barreira essencialmente lipídica (cutícula cerosa dos
vegetais, tegumentos dos insetos e dos animais superiores). É neces-
sário, para isto, possuir uma certa solubilidade nos lipídios. Após, é

102
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necessário que ele passe pela fase aquosa, que o veiculará até seu lo-
cal de ação. Esta fase aquosa constitui o meio vivo ao nível da célula,
como ao nível dos transportadores celulares (seiva, linfa, sangue). Uma
certa hidrossolubilidade é, portanto, necessária. E é, conseqüente-
mente, isto que chamamos de coeficiente de separação entre o óleo
e a água que condicionará seu transporte do meio exterior até seu local
de ação”. (Collectif , 1979).
Esta citação exige duas observações: a primeira é que os autores
exprimem-se como se o agrotóxico só pudesse agir no âmago do orga-
nismo visado, seja ele animal ou vegetal. Ora, classicamente, um
fungicida, à parte os produtos sistêmicos, tem reputação de agir na
superfície, pela barreira tóxica que ele constitui, pelo menos em
princípio, em relação aos esporos. Temos, portanto, uma nova atitude
envolvendo o modo de ação dos anticriptogâmicos que implicaria
uma ação dita curativa ou erradicante. Isto nos conduz a uma segunda
observação: de que maneira se produz esta ação e no que a modifica-
ção na fisiologia da planta, sob ação do produto, pode intervir? É isso,
precisamente, com que teremos que nos preocupar ao longo deste
trabalho.
O fato de que a cutícula e as paredes cuticulares das folhas con-
têm numerosos lipídios que facilitam a absorção de compostos
lipossolúveis explica, por exemplo, que um sal metálico como o óxi-
do de cobre hidratado resultante da aplicação da calda bordalesa,
possa penetrar na folha, como há muito tempo haviam afirmado
MILLARDET e GAYON (1887) e, mais recentemente, demonstra-
do por STRAUSS (1965).
A espessura da cutícula bem como o número e a repartição dos
estômatos também podem influir na penetração das caldas. Assim,
podem ser parcialmente explicadas as diferenças de sensibilidade em
relação a um mesmo agrotóxico, segundo a espécie e a variedade da
planta. Todavia, talvez seja a pressão osmótica das células que regule,
acima de tudo, a penetração das caldas.

103
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Quando o suco celular é isotônico ou hipertônico em compara-


ção à calda, não há risco de queimaduras, pois não há possibilidade
de penetração. Ao contrário, quando é hipotônico, as alterações são
mais freqüentes, pela plasmólise das células. MENZEL (1935) cons-
tatou que certas variedades de macieiras e de pereiras, que apresen-
tam uma forte pressão osmótica (30 a 38 atmosferas), são quase
completamente insensíveis às queimaduras por produtos cúpricos,
enquanto que outras variedades com baixa pressão osmótica (5,3 a
13,7 atmosferas) eram fortemente alteradas.
É sem dúvida, a esse fator que é necessário repontar as diferenças nas
penetrações dos produtos segundo o estado fisiológico da planta no momento
do tratamento. Por sua vez, o estado fisiológico depende dos fatores abióticos,
da idade dos tecidos, e da alimentação da própria planta.
Assim, a luz, favorecendo a abertura máxima dos estômatos,
aumenta a permeabilidade da folha. Uma elevação de temperatura
pode agir neste mesmo sentido: em tempo quente, um tratamento
com nicotina acarreta queimaduras, enquanto que este inseticida não
provoca nenhum fenômeno fitotóxico quando utilizado com baixas
temperaturas e sob baixa insolação. O mesmo se passa com os pro-
dutos à base de enxofre.
Esta influência da luz e da temperatura parece ser um fenôme-
no de ordem geral. Assim, SARGENT (1964) pode mostrar que o 2-
4 D penetra mais rapidamente nas folhas de feijão com luminosidade
elevada do que na obscuridade.
No que diz respeito à influência da idade, as plantas senescentes
deixam-se facilmente penetrar pelos produtos.
Enfim, a alimentação da planta também interfere, por sua influ-
ência sobre a pressão osmótica das células e, pois, a repercussão dos
adubos. COIC (1964), por exemplo, estabeleceu que uma alimen-
tação amoniacal pode traduzir-se simultaneamente por uma redução
dos cátions minerais, tais como Ca++ e Mg++ e, ao contrário, por uma
maior absorção de ácido fosfórico. Assim, é possível se perguntar se

104
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a penetração dos inseticidas fosforados na planta, como o Parathion,


não poderia se encontrar ligada à nutrição e, portanto, à adubação.
Parece evidente que também a natureza química do agrotóxico
influi: enquanto os ésteres fosfóricos, como o Parathion, desaparecem
rapidamente da superfície das folhas, penetrando na quase totalida-
de ao final de apenas dois dias (KHAMI, 1960), os produtos clorados,
como o Carbaryl, por exemplo, persistem muito mais tempo. Refe-
rente às suas relações com a planta, pode-se dizer, também, que os
produtos orgânicos sintéticos (talvez por isso sejam orgânicos) apresen-
tam uma afinidade toda particular pelos tecidos vegetais.
Ainda a respeito da penetração dos agrotóxicos nos tecidos da
planta e de suas repercussões – benéficas ou maléficas – sobre o
metabolismo, cabe considerar a influência eventual dos adjuvantes.
Assim, PARMENTIER (1969) pôde evidenciar que no controle de
Oidium em cereais:
1. “O cobre, o manganês e o cádmio podem ser utilizados em bai-
xa concentração sem fitotoxicidade, mas somente se o tensoativo
estiver em concentração suficiente”.
2. “O controle pode ser realizado com a ajuda de um número con-
siderável de produtos, mesmo os mais simples, desde que sejam
acompanhados de um tensoativo”.
PARMENTIER acrescenta: “Este tipo de controle apresentaria a
particularidade de que a escolha do produto de tratamento seria baseada
numa outra qualidade que não seu valor fungicida, mas principalmen-
te seu valor nutritivo”.
O mesmo autor, evocando “a influência de certas práticas cultu-
rais, especialmente a influência dos adubos nitrogenados, segundo
sua dose e sua época de aplicação”, estima que “esta influência pode-
ria agir sobre os estados fisiológico e bioquímico da planta-hospedeira, em
concordância com a teoria da trofobiose”. PARMENTIER (1973).
É necessário sublinhar a importância de tais observações? De uma
parte, elas parecem confirmar que os diversos produtos experimentados

105
F R A N C I S C H A B O U S S O U

agiram por via interna, e, portanto, graças a uma modificação benéfica do


metabolismo e, por outra parte, que se trata de uma ação intermediária
dos oligoelementos.
Teremos ocasião de voltar a esse assunto nos capítulos consagrados
à fertilização e aos tratamentos foliares.

2. REPERCUSSÕES DOS AGROTÓXICOS SOBRE O


METABOLISMO DA PLANTA
Se esta questão parece não preocupar, atualmente, os fitopatologistas
e os responsáveis pelo registro dos produtos, é necessário registrar, entre-
tanto, que diversas explicações foram-lhe consagradas. Mencionaremos,
especialmente, as de POIGNANT e THIOLLERE (1952), de RIPPER
(7º British Weed Control), de BRUISMA (1965), de CHABOUSSOU
(1965, 1969).
O que se depreende desses estudos? Dada a multiplicidade dos
produtos usados, a diversidade de plantas que sofreram suas ações,
bem como as condições ambientais, concebe-se que as conclusões
podem ser apenas de ordem geral. Nem por isto são menos impor-
tantes.
Um primeiro fato parece bem estabelecido: a despeito das barreiras
que devem ultrapassar e ás quais falamos antes, todos os agrotóxicos, sejam
minerais e, com mais forte razão, orgânicos, sejam fungicidas, insetici-
das ou acaricidas, todos penetram mais ou menos nos tecidos das plan-
tas (sobretudo se estão associados a certos tenso-ativos) e, portanto, agem
sobre seu metabolismo.
Assim, os agrotóxicos podem enriquecer a planta com o metal ou
metalóide contido na sua fórmula: cobre, ferro, zinco, enxofre, fósforo
etc...
Outros – é o que veremos adiante – parecem intervir pela própria
estrutura de sua molécula. É, bem entendido, o caso dos hormônios sin-
téticos, mas é também, como igualmente veremos, o caso dos produtos
clorados, como o DDT. Ainda que praticamente retirados do comércio

106
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atualmente, isto não diminui o interesse de seu estudo, pois sua ação pode
ser comparada à das substâncias de crescimento (fig. 11).
Certas contradições surgem na natureza das repercussões. Assim,
parece que um mesmo produto não conduz, necessariamente, às mes-
mas conseqüências em todos os casos. Isto se explica porque a incidên-
cia do agrotóxico não é só função de sua natureza química e de sua dose,
mas, também, do estado inicial da planta e de sua nutrição; mas também
da época das intervenções em relação a seu ciclo fisiológico anual.
No limite, pode-se até dizer que, em função da natureza da planta
e de seu estágio, cada caso é diferente. De maneira geral, foi mostra-
do que os agrotóxicos apresentam uma ação sobre os principais pro-
cessos fisiológicos, como respiração, transpiração e fotossíntese. Assim
– e é principalmente isso que nos interessa com atenção à nossa te-
oria –, se pode afirmar que, por sua ação sobre os processos antago-
nistas de proteossíntese e de proteólise, os agrotóxicos são capazes de
modificar, de uma maneira mais ou menos acentuada e mais prolon-
gada, a relação entre as substâncias nitrogenadas e os glicídios, por
sua ação sobre os processos antagonistas de proteossíntese e proteólise.
O mesmo processo ocorre envolvendo as relações entre as diferentes
formas de nitrogênio, ou seja, os critérios do nível de proteossíntese,
correlacionados ao processo de resistência.
Por seus efeitos indiretos e nutricionais, estes processos parecem
explicar as repercussões maléficas e, também, benéficas dos agrotóxicos,
até agora utilizados sob um ângulo totalmente diferente do estímulo da
resistência da planta. Veremos a confirmação disto pelo estudo de diver-
sos tipos de ação de agrotóxicos.

3. REPERCUSSÕES DO DDT
(DICLORODIFENILTRICLORETANO) SOBRE A
FISIOLOGIA DA PLANTA
Desde 1949, CHAPMAN e ALLEN assinalam diferenças na
sensibilidade das plantas ao DDT, segundo sua natureza botânica.

107
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Registra-se um aumento da proteossíntese, do tamanho das folhas,


da velocidade do crescimento e do rendimento em videira e batata,
mas um definhamento e redução de colheita em pepino.
Sobre trigo Khapi, FORSYTH (1954) constata que “o DDT
altera o metabolismo de tal forma que os aminoácidos e os açúcares
acumulam-se na folha, o efeito parecendo resultar de uma inibição de
síntese das proteínas e dos carboidratos”.
Este fato aproxima-se dos resultados obtidos por JOHNSON
(1946). Ele havia demonstrado que a exacerbação da sensibilidade do
trigo à ferrugem, acarretada pelo tratamento com DDT, era conse-
qüência direta das repercussões deste produto sobre a fisiologia da
planta. Aliás, JOHNSON sublinhava, desde esta época, que: “A re-
ação da planta-hospedeira ao DDT podia abrir uma nova via envolvendo
o estudo da resistência à ferrugem”.
Efetivamente, os resultados de FORSYTH relacionam a sensibi-
lidade do trigo com a abundância das substâncias solúveis nutricio-
nais nos tecidos. Isto confirma nossa hipótese de que é através do
processo de proteossíntese dominante, que estaria estimulada a resis-
tência à ferrugem. Os efeitos sensibilizadores dos herbicidas agiriam
no processo inverso.
Aliás, os trabalhos de ALLEN e de CASSIDA (1951), relati-
vos à influência de DDT sobre feijão, trazem indicações suplemen-
tares sobre o modo de ação deste produto. Enquanto o DDT
estimula o crescimento quando o feijão cresce numa solução
nutritiva não tamponada, na qual a auxina está ausente, quando
a auxina está presente, registra-se uma inibição de crescimento
(fig.12).
PILET, a respeito destas repercussões, registra que a natureza
físico-química do protoplasma está em jogo e que o equilíbrio entre
a síntese e a decomposição das proteínas, rompido pelas auxinas, pode
se deslocar em um sentido ou noutro, segundo o citoplasma aumente
de volume ou cesse de crescer.

108
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Aí está a explicação das diferentes ações do 2-4 D e do DDT, não


apenas segundo a dose utilizada, mas também em função dos dife-
rentes fatores que agem sobre a fisiologia da planta, seja: sua nature-
za botânica ou, dito de outra maneira, sua constituição genética, a
época da intervenção, as condições ecológicas e, enfim, a nutrição,
que, por sua vez, depende da natureza da fertilização.

4. REPERCUSSÕES DO 2-4 D SOBRE A FISIOLOGIA DA


PLANTA
Exatamente como para os outros produtos, MENORET (1960)
observa diferenças nas repercussões, segundo a planta tratada e a dose
utilizada.
Assim, na soja, o tratamento das raízes acarreta uma diminui-
ção das proteínas nas folhas, mas um aumento delas no colmo e na
raiz. Nos dois casos, contudo, observa-se um aumento considerável
do nitrogênio aminado solúvel e do residual. Ou seja, condições emi-
nentemente favoráveis ao desenvolvimento de diversas moléstias.
Em raros casos, principalmente com fortes doses de 2-4 D e nos
tecidos jovens, registra-se uma tendência ao estímulo da proteos-
síntese. De maneira geral, o 2-4 D (assim como diversos herbicidas
como Oxynil, Chlrophame * e Propanil) perturbam a transmissão do
código genético pelo RNA. É, aliás, a razão pela qual o 2-4 D) encon-
tra-se normalmente classificado entre os inibidores da síntese protéica.
(Collectif, 1979.)
Por outro lado, é necessário sublinhar que, sejam quais forem as
repercussões dos agrotóxicos sobre o metabolismo da planta e, portanto,
sobre sua resistência, elas guardam estreita relação com sua nutrição. A
propósito da ação do 2-4 D, ALTERGOT e POMAZONA (1963)

*
Oxynil e Chlrophame: nomenclatura desconhecida. Provavelmente se refere a
Ioxynil e Chloroprophame, respectivamente. Ambos são herbicidas que atuam em
nível de código transmissor. (N. da T.)

109
F R A N C I S C H A B O U S S O U

salientam que como todos os processos fisiológicos da planta estão


aumentados pelas substâncias de crescimento, esta necessita de uma
rápida alimentação complementar.
Assim, esses autores, experimentando, com diversas plantas como
trevo, milho e fava, obtiveram um aumento da capacidade redutora
e sintetizadora das plantas tratadas com uma solução nutritiva con-
tendo 2-4 D.
Todavia, utilizado só e na concentração 10-5, o 2-4 D inibe a sín-
tese das proteínas e aumenta as formas não protéicas do nitrogênio. Esta
inibição não se limita só às plantas adventícias. Os efeitos inibidores do
2-4 D podem ser nefastos ao cereal a proteger, provocando fenômenos de
sensibilização em relação às doenças.
ALABUSCHEV (1962), que obteve aumentos de colheita de
trigo, podendo atingir 15 a 20% com o 2-4 D, nota que a quali-
dade do cereal também deve ser levada em consideração. As proteínas
são as principais substâncias que determinam o valor nutricional de
uma planta. Ora, importantes modificações podem se produzir no
conteúdo protéico, de um lado, devido às condições do solo – e, por-
tanto, da fertilização –, e ainda aos tratos culturais, ao clima e à va-
riedade.
Os trabalhos desse autor mostraram que, em relação ao teor em
proteínas, obtém-se resultados diferentes segundo a época de apli-
cação do 2-4 D e as doses utilizadas. Tudo isto revela o quanto pode
ser delicado o manejo destes “hormônios sintéticos” que, aplicados
no outono, ainda conservam sua toxicidade na primavera, acarretan-
do uma ação depressiva sobre a microflora do solo. (ALABUSCHEV.,
op. cit.)
O produto utilizado em baixa dose pode mostrar uma ação
inibidora em relação ao crescimento do cereal a proteger e, conse-
qüentemente, sensibilizá-lo a diversas doenças. Agora, vamos exami-
nar as repercussões dos diversos agrotóxicos sobre as árvores frutíferas
e sobre a videira.

110
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

5. REPERCUSSÕES DOS AGROTÓXICOS SOBRE A


FISIOLOGIA DAS ÁRVORES FRUTÍFERAS E DA VIDEIRA

A) Repercussões dos agrotóxicos sobre a fisiologia do pessegueiro


Durante muito tempo, a “necrose hibernal”, também chamada
“doença café com leite” do pessegueiro deixou perplexos tanto os
fitopatologistas que se debruçaram sobre a questão, quanto os pro-
dutores que sofriam as conseqüências desta misteriosa “afecção”. No
que ela consistia?
Uma vez terminados os últimos tratamentos, na queda das folhas
e no momento da poda é que os estragos manifestam-se em toda sua
extensão. Contudo, esses estragos aparecem mais cedo, pelo fim do
outono, mas mesmo assim é necessário estar alerta e não descuidar da
vigilância do pomar.
Os sintomas são os seguintes: a casca, que normalmente seria
vermelha, apresenta, em algumas áreas, grandes manchas de co-
loração variável, geralmente de um marrom mais ou menos claro.
Nos casos graves, essas manchas podem se estender rapidamente,
sobre vários centímetros, até que o ramo, tendo mudado comple-
tamente de coloração, morre, murchando pela extremidade. A
casca está efetivamente morta e recobre uma madeira parcialmente
marrom.
GROSCLAUDE (1964-1966-1969), autor desta descrição,
pôde estabelecer que estas alterações eram devidas às repercussões
nefastas de determinados tratamentos com agrotóxicos. Os produtos
em questão eram, especialmente, Ziram, Azinphos e, segundo toda a
probabilidade, o Parathion era igualmente responsável.
Segundo os resultados dos questionários realizados junto aos
produtores, “pareceria que se pode aplicar as mesmas conclusões ao
Thiram ou “TMTD (tetrametildisulfuros)”. Isto não seria surpreen-
dente, observa GROSCLAUDE, dado o estreito parentesco quími-
co entre Thiram e Ziram: ambos são ditiocarbamatos, como Zineb e o

111
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Maneb, que citamos a propósito de suas implicações no desenvolvi-


mento de moléstias como Oidium e Botrytis.
Assim, estamos em presença de uma manifestação de um tipo
particular fitotoxicidade, diferente do que se chama comumente de
“queimaduras”, que aparecem logo após a aplicação do agrotóxico.
Contudo, aí não há simplesmente uma diferença de natureza; esses
fenômenos assinalam a existência de repercussões insidiosas dos agrotóxicos
sobre a fisiologia da planta. Incidências, aliás, plenamente confirma-
das pelas análises dos ramos, envolvendo duas formas de nitrogênio
e os açúcares redutores, conforme o quadro adiante:

Quadro 2. Resultados das análises dos ramos de pessegueiro,


em função da natureza dos tratamentos
Origem das amostras NSolúvel Ninsolúvel Açúcares Açúcares
redutores /N total
Parcela Ziram Ramo são 0,050 0,413 0,745 1,60
Parcela Ziram Ramo doente 0,057 0,475 0,632 1,18
Parcela testemunha Ramo são 0,083 0,587 0,415 0,61

Se damos crédito, esses dados são importantes como prova de que


o (ou os) agrotóxico(s) utilizado(s) neste caso o Ziram inibiu o pro-
cesso de proteossíntese no pessegueiro, devido à regressão das duas formas
de nitrogênio, sobretudo o insolúvel, simultaneamente à elevação do
teor de açúcares, em comparação às testemunhas.
Deve-se observar que na parcela “Z” – ramo são, pelo menos em
aparência – os dados mostram, em comparação à testemunha não
tratada, uma regressão da taxa de nitrogênio insolúvel. Isto significa
que, apesar de ainda não aparente, existe um fenômeno de fitoto-
xidade. Isto confirma o caráter insidioso que as repercussões dos
agrotóxicos podem tomar.
Estas inibições de proteossíntese provocam, ao mesmo tempo –
não tenhamos medo de repetir – uma sensibilização da planta em
relação a suas pragas (ácaros, pulgões, lepidópteros etc.), e às próprias

112
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

moléstias, pelo enriquecimento dos tecidos em substâncias solúveis.


É a razão pela qual questionamos imediatamente se tais perturbações
no metabolismo celular não poderiam se encontrar na origem do
desencadeamento das moléstias viróticas, como também suspeita
POLJAKOV em suas observações sobre a batata.
Os experimentos de GROSCLAUDE sobre as incidências dos
agrotóxicos responsáveis pela moléstia “café com leite” reforçam a
importância da nutrição da planta sobre as manifestações da doença.
GROSCLAUDE (1966) pôde mostrar que um complemento de
adubação orgânica, sob a forma de esterco de curral, atenua os danos
acarretados pelos agrotóxicos, se comparada a uma fertilização estri-
tamente mineral.

Quadro 3. Alteração de ramos de pessegueiro, em função do tratamento


com Ziram e da natureza da fertilização
Tratamentos Natureza da Ramos
com agrotóxicos fertilização alterados
Testemunha A: com matéria orgânica 4
C: só adubo NPK 13
Tratamento com Ziram D: com matéria orgânica 57
F: só adubo NPK 174

Esta regressão nas alterações produzidas pelo Ziram, graças ao


emprego de esterco de curral, nos parece muito significativa e
esclarecedora. Ela confirma plenamente a ação positiva da matéria
orgânica fermentada sobre a proteossíntese, como já tivemos ocasião
de mencionar (CHABOUSSOU, 1974 e 1979). Repercussões que
se traduzem correlativamente- como nos ocuparemos adiante- sobre
a resistência às moléstias e, em particular, em relação às moléstias
viróticas CHABOUSSOU, 1974; MEHANI, 1969).

B) Repercussões de diversos acaricidas sobre a fisiologia da macieira


São raros os pesquisadores que, até aqui, se preocuparam com as

113
F R A N C I S C H A B O U S S O U

repercussões dos inseticidas ou fungicidas sobre a fisiologia e a bioquí-


mica das plantas e da macieira, em particular. Esta é a razão porque
acreditamos ser importante analisar o interessante trabalho de
BLAGONRAVOVA, que trata das repercussões de diversos acaricidas e
inseticidas sobre os teores de nitrogênio protéico e não-protéico nas folhas
de macieira (variedade Reinette Simirenko) (CHABOUSSOU, 1977).
Resumimos, adiante, essa comunicação à Academia de Agricultura.
O autor estudou, sobre a fisiologia da macieira, as incidências de
seis produtos, Phosalone, Benzophosphate, Bromopropylate,
Chlorphenamidine, mistura BCPE + CPAS,* e Dicofol. As testemu-
nhas, para comparação, foram tratadas com água pura.
Os resultados estão resumidos nas fig. 13 e 14. Como se pode
constatar, as repercussões mais acentuadas, em comparação às teste-
munhas, dizem respeito a Dicofol, Chlorphenamidine e à mistura
BCPE + CPAS.

1. Repercussões do Dicofol
Esse produto acarreta, ao contrário dos outros, um muito níti-
do aumento do nitrogênio protéico: em 6 de julho, o teor era o triplo
que nas testemunhas. Contudo, esta elevação é seguida de uma queda
importante em meados de agosto.
Inversamente, até o mês de julho, ou seja, no curso da primeira
parte do ciclo vegetativo, os teores em nitrogênio não-protéico
regridem, em comparação aos da testemunha. É apenas no fim de
agosto – começo de setembro, isto é, na época em que todas as folhas
entram em proteólise, que os teores em nitrogênio solúvel se elevam
nitidamente acima dos das testemunhas.
Estas repercussões parecem explicar porque com o emprego deste
acaricida e, ao contrário de numerosos outros produtos, não se constata

*
Refere-se à mistura Dimite + Chlorfensulphide, respectivamente. (N. da T.) Esses
produtos são conhecidos sob o nome comercial de Anilix ou Milbex. (N.do R.)

114
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

proliferações secundárias de Tetranychus em fim de estação. Isto é con-


seqüência, não somente da eficácia imediata do produto, mas também
graças a seu efeito prolongado sobre a proteossíntese, produzindo assim,
como veremos adiante, uma ação trófica prolongada “antiácaro”.

2. Repercussões do Chlorphenamidine
As fig. 13 e 14 mostram que as incidências deste produto são
quase inversas às do Dicofol, ou seja, uma regressão do nitrogênio
protéico em comparação às testemunhas, que se prolonga até mea-
dos de agosto. Por outro lado, e parece correlativamente, registra-se um
considerável aumento de nitrogênio não-protéico (x 2,8).
Em outras palavras, na primeira parte do ciclo vegetativo da ma-
cieira, ou seja, aproximadamente até meados de julho, o Dicofol exerce
um claro efeito positivo sobre a proteossíntese, enquanto, ao contrá-
rio, se registra uma regressão do Chlorphenamidine. As repercussões
de ordem bioquímica deste último produto parecem explicar a
constatação de sua medíocre eficácia sobre videira* tanto em relação
à aranha vermelha (Panonychus ulmi) quanto à aranha amarela
(Eotetranychus carpini vitis). A elevação considerável da taxa de ni-
trogênio solúvel, registrada desde o mês de junho, com este produ-
to, só pode provocar um nítido aumento do potencial biótico dos
ácaros. Este fenômeno supera largamente o efeito acaricida imedia-
to e mais ou menos fugaz exercido pelo produto no momento de sua
aplicação.

3. Repercussões da mistura BCPE + CPAS (Anilix)


Em início de estação, as repercussões desta associação de
agrotóxicos são bastante comparáveis às de Dicofol. Assim, em rela-
ção às testemunhas constata-se um aumento do nitrogênio protéico,
que se prolonga até o mês de agosto. No final de setembro, registra-

*
Repercussões semelhantes foram registradas com Omethoate e Tetradifon.

115
F R A N C I S C H A B O U S S O U

se uma clara elevação do nitrogênio não protéico, que apresenta um


teor mais elevado, ou seja, 2,3 vezes mais que as testemunhas.
O efeito positivo sobre a proteossíntese até o mês de agosto é se-
guido, no fim da estação, de uma considerável regressão. Ora, se esta
associação de agrotóxicos, efetivamente comprova um efeito acaricida
imediato, por outro lado registram-se, diversas vezes, graves prolifera-
ções, ditas “secundárias”. Sobre laranjeiras, no Marrocos, nós mesmos
pudemos constatar consideráveis multiplicações do ácaro(Brevipalpus),
cujos ataques provocaram a quase totalidade da queda das folhas.
Este fenômeno parece resultar de um estado de proteólise acen-
tuada da folhagem, no caso onde, como na macieira, uma tal mistu-
ra provocaria,- como tudo faz pensar - as mesmas repercussões
fisiológicas sobre citros.

4. Repercussões do inseticida Phosalone


Comparado aos outros agrotóxicos que acabamos de revisar, este
produto parece caracterizar-se por efeitos muito mais moderados
sobre a composição bioquímica das folhas. Assim, em junho e julho
registra-se um muito leve aumento do teor de nitrogênio protéico,
que regride em agosto e, finalmente, atinge os mesmos valores das
testemunhas (fig. 13).
Os teores do nitrogênio não-protéico apresentam uma peculiarida-
de muito importante referente à resistência: quase constantemente são
inferiores ao das testemunhas. Sabe-se que, fazendo exceção a muitos
outros agrotóxicos o Phosalone caracteriza-se, de maneira geral, pela
ausência de repercussões estimulantes ao desenvolvimento dos ácaros.
Tal propriedade deste agrotóxico parece explicar-se por dois processos:
– ação positiva sobre a proteossíntese, no início do ciclo vegetativo
(13);
– manutenção, a seguir, do teor de nitrogênio não-protéico em
nível constantemente inferior ao das testemunhas, durante todo ci-
clo vegetativo da macieira (fig 14).

116
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Em resumo: o Phosalone, além de uma ação acaricida imediata, por


contato, parece, igualmente, apresentar uma ação anti-ácaro, por um efeito
trófico prolongado. Contudo, trata-se apenas de um “efeito não-intenci-
onal” e cuja ação benéfica é devida ao puro acaso. É, contudo, a tais efeitos
indiretos, via ação da fisiologia da planta, que pode ser explicada, por
exemplo, a ação anticriptogâmica de diversos produtos que não apresen-
tam, no sentido literal, eficácia fungicida. É, especialmente, o caso de
“fungicidas” clássicos como a calda bordalesa ou o enxofre.

6. REPERCUSSÕES DE DIVERSOS INSETICIDAS SOBRE


A FISIOLOGIA DA VIDEIRA
Durante vários anos de pesquisa, estudamos, nas condições reais
de campo, as repercussões sobre a fisiologia da videira, de diversos
inseticidas utilizados no controle de Eudemis botrana(Polychrosis
botrana); os agrotóxicos mais usados eram DDT, Carbaryl, Parathion,
Diazinon, Mevinphos, Carbophenothion e arseniato de chumbo
(CHABOUSSOU, 1969).
Em 1960, o tratamento foi feito em 24 de maio e as análises
foram realizadas sobre as folhas recolhidas em 15 de junho, ou seja,
vinte e um dias após o tratamento. O DDT provocou um aumento
significativo do nitrogênio total e do nitrogênio insolúvel. Também
constatou-se uma perturbação nos elementos catiônicos: o mesmo
produto clorado aumentou, em comparação às testemunhas, o teor
de K, enquanto diminuiu os de Ca e de Mg.
No mesmo ano, um segundo tratamento foi efetuado a 6 de
julho, e as análises foliares realizadas sobre levantamentos efetuados
em 5 de setembro, ou seja, sessenta e um dias após o tratamento. O
DDT continuava provocando um aumento significativo do nitrogênio
insolúvel e total, mesmo após tanto tempo de intervenção.
Outra repercussão estatisticamente significativa foi a regressão
do teor de cálcio, tanto com Mevinphos quanto com Carbaryl. Entre as
não significativas nota-se, com estes dois agrotóxicos, uma regressão

117
F R A N C I S C H A B O U S S O U

do magnésio e um aumento do potássio (cepa em experiência: Merlot


tinto).
Em 1961, com cepa Cabernet-Sauvignon, tratamento em 6 de
julho e análises sobre folhas colhidas em 17 de julho (onze dias após
o tratamento): nenhuma repercussão significativa. Contudo, regis-
tra-se com todos produtos experimentados, ou seja, DDT, Parathion,
Mevinphos e Carbaryl, um aumento do teor de potássio e uma regressão,
aparentemente correlativa, do cálcio nas folhas.
Em 1962, com cepa Merlot branco, as análises foram realizadas
em 14 de junho, ou seja, nove dias após o tratamento de 5 de junho.
Nessa época e com esse intervalo, um determinado número de reper-
cussões significativas são registradas:
– aumento do potássio com Carbaryl,
– aumento do magnésio com Parathion e Carbophenothion,
– aumento do cálcio com Parathion,
– aumento do fósforo com Parathion, Diazinon e Carbophenothion
– o que parece lógico, já que são produtos fosforados – mas tam-
bém com DDT.
A fig. 15 traz os resultados das repercussões do DDT, Parathion
e Carbaryl, em comparação com as testemunhas e sobre cada uma das
seis parcelas tratadas. Essas diferentes repercussões agem também de
forma distinta sobre as multiplicações de cada uma das duas espéci-
es de Tetranychus (fig. 16). Isto faz supor que as exigências nutricionais
desses ácaros são, também, diferentes.
Quando estudarmos os herbicidas, vamos retomar as perturba-
ções acarretadas pelos agrotóxicos sobre os equilíbrios catiônicos
(onde estão implicados K, Ca e Mg), condicionantes do fenômeno
da proteossíntese e, portanto, da resistência da planta.

7. CAUSAS DE CERTAS AÇÕES ANTIFÚNGICAS


Diversos produtos, de difícil qualificação quanto à ação
fitossanitária, podem apresentar um efeito indireto positivo sobre a

118
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

resistência da planta. Como exemplo temos a ação antifúngica do


arseniato de chumbo contra sarna e septoriose da pereira (DARPOUX
e ARNOUX, 1958); do Parathion, eficaz contra ferrugem coroada do
azevén (COURTILLOT, 1965); do 2-4 D (em determinadas doses),
contra Botrytis da fava (MOSTAFA e GAYED, 1956); do Carbaryl
contra Alternaria do algodoeiro ABO e DAHAB, 1965) etc.
Estes casos põem em questionamento o modo de ação dos
agrotóxicos, especialmente dos fungicidas. Tratar-se-ia de uma ação
antagonista, tóxica, em relação ao fungo parasita, mas sendo exercida
por via interna, sistêmica? Isto foi o que perguntaram dois autores
como SOMERS e RICHMOND (1962), testando Captan contra
Botrytis do feijão. O produto foi aplicado sobre as raízes para tentar
destruir o fungo por via endoterápica.
Utilizado desta maneira, este agrotóxico mostrou-se eficaz. Con-
tudo, análise das folhas mostrou que o máximo de Captan encontrado
só representava uma pequena fração daquela requerida para a inibi-
ção da germinação dos esporos in vitro. Assim, os autores concluíram
que: “A repercussão do produto sobre o metabolismo do hospedeiro seria
responsável pela ação anticriptogâmica observada sobre as folhas após
aplicação sobre as raízes”.
É desnecessário ressaltar a importância destas constatações, que
põe em discussão o modo de ação e, portanto, o da utilização dos
diversos agrotóxicos. Devemos enfatizar que determinados especia-
listas em controle moléstias por via química colocaram em dúvida a
eficácia fungicida dos produtos correntemente utilizados.
Assim, PARMENTIER (1979) contesta seriamente a eficácia de
produtos – ainda admitidos para a venda – contra ferrugens ou
escaldadura do centeio. Por outro lado, segundo ele, o enxofre me-
rece ser conservado, pois: “Não somente é barato e não apresenta
toxicidade, como proporciona, freqüentemente, aumentos de rendi-
mento desproporcionais à sua eficácia anticriptogâmica, independente-
mente da presença de parasitas”.

119
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Esses fatores podem ser apenas interpretados como uma ação in-
direta e benéfica sobre a fisiologia da planta a proteger, isto é, uma
ação positiva sobre a proteossíntese, provocada pelo enxofre. Efetiva-
mente, TURREL (1950) e TURREL e WEBER (1955) demonstra-
ram que o enxofre elementar em pó constitui um nutriente para as
folhas de limoeiro, sendo encontrado nas proteínas da planta. É efe-
tivamente a este efeito “secundário” que um velho autor como
MARTRES (1862) atribuía a regressão do Oidium pelo enxofre. É útil
citá-lo: “O efeito do enxofre é notável; posto em contato com o micélio
e as caulículas de Oidium, ele os destrói; mas é sua ação sobre a vege-
tação geral da planta que dá, sem dúvida, a maior contribuição a seu
sucesso. Fez-se, há diversos anos, experiências muito interessantes sobre
os efeitos do enxofre como adubo, dando à vegetação de diversas
plantas um estímulo plenamente favorável a seu desenvolvimento. As
videiras tratadas com enxofre, sobretudo com o orvalho, sentem particu-
larmente o efeito deste tratamento quando estão doentes; imediatamen-
te, as folhas pálidas e retorcidas reverdecem tornam-se lustrosas e maleáveis,
os sarmentos alongam-se e, se o mal não é muito forte, vê-se as
inflorescências esbranquiçadas, que começam a cobrir a baga, desapare-
cerem, da mesma maneira que desaparecem, sobre o corpo dos animais
submetidos a uma alimentação sã e abundante, os parasitas que os pre-
judicam”.
Assim, por uma espécie de premonição notável, este modesto
observador punha em evidência o efeito anticriptogâmico do enxo-
fre por ação positiva sobre o crescimento da planta, isto é, a
proteossíntese.
Inversamente, NIGHTINGALE (1932) e EATON (1941)
mostraram que as plantas ricas em nitrogênio e pobres em enxofre
continham em seus tecidos grandes quantidades de nitrogênio
aminado livre, nitratos e carboidratos (glicídios). Eles imputam este
fenômeno a uma diminuição do teor de redução dos nitratos e a uma
menor síntese das proteínas, acompanhada de uma proteólise elevada.

120
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O fenômeno de carência em enxofre, – sobreo qual voltaremos a falar


– explica a sensibilidade das plantas a diversas moléstias, pelo efeito
nutricional favorável ao desenvolvimento dos parasitas. Assim, o es-
tudo do modo de ação do enxofre por sua participação no metabo-
lismo ou sua carência, só reforça nossa concepção da trofobiose e da
conveniência de uma terapêutica orientada para a estimulação da
proteossíntese. É o que veremos na segunda parte deste trabalho, es-
tudando as repercussões da fertilização e dos tratamentos foliares,
com aportes de macro e microelementos, no metabolismo da plan-
ta. Veremos que a clássica calda bordalesa não é exceção à regra de ação
indireta sobre a fisiologia da planta – neste caso, benéfica como o
enxofre. Veremos agora as repercussões nefastas acarretadas sobre as
plantas pelos agrotóxicos.

8. REPERCUSSÕES NEFASTAS DE DIVERSOS


FUNGICIDAS
Por comodidade, arbitrariamente separamos o estudo das reper-
cussões do DDT, substâncias de crescimento, inseticidas e acaricidas.
Na realidade, o que nos interessa são as repercussões desses diversos
agrotóxicos na fisiologia da planta, segundo suas incidências sobre a
proteossíntese e, portanto, sobre a resistência do vegetal a seus ini-
migos. Antes de abordarmos o problema das repercussões dos
agrotóxicos sobre a própria vida e fertilidade do solo, gostaríamos de
estudar a influência da época e da repetição das intervenções na
fitotoxidade dos agrotóxicos.
Assim, BESEMER (1956), experimentando sobre macieiras,
pôde mostrar que:
• Geralmente, o período de sensibilidade e, até, de hipersensibilidade
em relação aos agrotóxicos começa, para as árvores frutíferas, pouco
antes da floração, para terminar somente um mês após a floração.
Isto não significa que depois as árvores tornar-se-iam resistentes
às queimaduras e outros fenômenos fitotóxicos.

121
F R A N C I S C H A B O U S S O U

A razão deste fato é que, na época em torno da floração todas as


folhas perdem simultaneamente seu poder de síntese e procedem, até
a uma certa decomposição de suas próprias proteínas. As substânci-
as solúveis são assim postas à disposição dos órgãos reprodutores. É
este estado de proteólise dominante que explica a sensibilidade aos
agrotóxicos e às diversas moléstias, numa determinada época.
• Em segundo lugar, BESEMER (op. cit.) pôs em evidência a
influência nefasta da repetição dos tratamentos. Assim, Ziram
e Ferbam manifestam ação fitotóxica somente após a quarta
aplicação em macieira. Os três primeiros tratamentos apre-
sentam, ao contrário, uma certa influência benéfica no desen-
volvimento das folhas.
Como já suspeitávamos, estudando os resultados de GROS-
CLAUDE sobre o pessegueiro, o inseticida Azinphós adicionado ao
Ziram agrava os danos.
A repetição de tratamentos e misturas de produtos são prática
corrente. Não raro, 20 a 30 intervenções sucedem-se nos pomares em
cultivo “químico”. Não é de surpreender que as diminuições de ren-
dimento tenham sido constatadas um ano, ou mesmo dois, após o
experimento com tratamentos consecutivos de Ziram (BESEMER,
op. cit.). Isto confirma as repercussões a longo prazo na fisiologia das
plantas perenes e, portanto, na diminuição da resistência às moléstias.
A estas incidências nefastas e incontroláveis, resultantes de tra-
tamentos diretos sobre as plantas, somam-se as repercussões indire-
tas dos agrotóxicos sobre a fertilidade do solo, via nutrição da planta.

9. REPERCUSSÕES DOS AGROTÓXICOS SOBRE A


NUTRIÇÃO DA PLANTA E A FERTILIDADE DO SOLO

A) NAR ou “net assimilation rate”,* critério do metabolismo da planta

*
Em inglês, no original: taxa líquida de assimilação. (N. da T.)

122
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

A NAR ou net CO 2 assimilation rate dos anglo-saxões, permite


avaliar o nível de assimilação da planta graças à análise do CO2 em luz
infravermelha. Em experimentos sobre folhas de macieira, HEIN-
RICKE e FOOT (1966) puderam mostrar que dois inseticidas
fosforados, Gusathion e Diazinon, reduziam, muito nitidamente, a
NAR da folhagem, após mais de uma semana da aplicação. Estudos
anteriores, dos próprios autores, tinham mostrado os mesmos efeitos
contrários de diversos agrotóxicos, como Aramite, Sulfenona, Tetradifon
e 2-45T, sobre o nível de fotossíntese das folhas de macieira.
HEINRICKE e FOOT (op. cit.) observam que esta regressão da
NAR excedia o intervalo recomendado entre as aplicações, podendo,
portanto, repercutir sobre os rendimentos, devido à diminuição do
potencial de fotossíntese das árvores. Estes autores não vislumbraram
eventuais repercussões sobre a diminuição da resistência da maciei-
ra em relação às moléstias. Mas esta sensibilidade é ligada a uma
inibição da proteossíntese, igualmente confirmada por SHARMA
(1975).
Pela técnica da NAR, SHARMA (op. cit.) mostrou que diversos
herbicidas aplicados no solo provocam repercussões sobre a fisiolo-
gia das folhas. Também é necessário não perder de vista que os
agrotóxicos aplicados sobre a folhagem podem contaminar o solo, por
escorrimento, de uma forma mais grave do que se supõe a priori.

B) Repercussões de diversos fungicidas sobre as minhocas e a


microflora do solo
O relatório do grupo internacional de controle integrado em
pomares (IOBC), relativo à reunião ocorrida em Bolonha, em 1972,
salienta, de um lado, a importância da fertilização e de outro, dos
tratamentos com agrotóxicos sobre a resistência da macieira a Oidium
nas folhas e às moléstias dos frutos.
Está bem especificado que o Captan estimula particularmente o
desenvolvimento de Oidium.

123
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Da mesma forma, as fertilizações nitrogenadas excessivas e os


tratamentos a base dos fungicidas Captan, Tuzet, Maneb, Metiram e
Mancozeb aceleram a maturação dos frutos e reduzem, por isso mes-
mo, sua resistência em relação aos parasitas de armazenazenamento,
tais como Gloesporium e Nectria.
Esta sensibilização parece ter sua origem – como é regra geral –
num processo de ordem nutricional. Os autores do relatório salien-
tam que “o nitrogênio total aumenta após quase todos os tratamentos
fungicidas”. E, também, que existem diferenças importantes no teor
de aminoácidos, segundo o agrotóxico usado.
Está bem especificado nesse relatório coletivo que certos
fungicidas anti-Oidium, como Dinocap e Binapacryl fazem os ácaros
regredirem, por um efeito tóxico imediato, mas estimulam, em segui-
da, sua multiplicação por um pós-efeito trófico indireto.
Entretanto, ainda há mais: após a decomposição do material
vegetal (principalmente folhas), contendo os fungicidas sistêmicos
que lhe foram aplicados (Benzimidazol, Benomyl, Thiophanate etc),
a grande maioria desses compostos entram no ecossistema do solo
podendo, assim, afetar os processos de decomposição. É bem conhe-
cido que os fungicidas sistêmicos inibem certos organismos saprófitas
do solo, tanto as micorrizas, como também sobre a videira como
sobre a macieira.
Enfim, Benomyl, Thiophanate e Thiabendazole mostraram-se muito
nocivos em relação a minhocas (Lumbricus terrestris). Esta influência
nociva em relação às minhocas explica o fato de que as folhas caídas
permaneçam intactas após pulverizações com fungicidas sistêmicos,
já que os oligoquetas são em grande parte responsáveis pela decom-
posição da folhagem morta.
O relatório precisa que “após as aplicações de Benomyl, as modifi-
cações na microflora podem causar o desenvolvimento de certos fungos
parasitas, anteriormente sem importância, como é o caso de Alternaria,
na regido do Lago de Constança”.

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Estudos precisos de diversos pesquisadores, envolvendo as reper-


cussões dos agrotóxicos em relação aos microorganismos do solo,
confirmam o exposto, conforme veremos.

C) Repercussões de diversos agrotóxicos – especialmente herbicidas


– sobre os microrganismos do solo e sobre a nutrição da planta.
PURUSHOTHAMAN et alii. (1973) estudaram o teor dos so-
los em ácido indolacético ou IAA, observando que a presença nos solos,
dessa substância de crescimento estava suficientemente provada, ainda
que se pudesse fazer reservas quanto à sua origem.
Estes autores observaram que as auxinas podem se acumular de
diversas maneiras:
1. por excreção do sistema radicular das plantas;
2. por decomposição da matéria orgânica;
3. por síntese, graças a certos organismos do solo.
Assim, se estimou que: 77% das bactérias, 60% dos fungos e
46% dos actinomicetos são capazes de produzir o IAA.
Esta constatação levou os autores a estudarem os efeitos do
Formothion (inseticida organofosforado endoterápico), do Benomyl
(um carbamato), e do Pentachloronitrobenzeno ou PCNB e de um
antibiótico, o sulfato de estreptomicina, sobre o metabolismo do IAA
no solo.
Tratavam-se de experimentas de laboratório em que o solo seco
recebia, ou não, triptofano ou glicose. Como se sabe, o triptofano é
um precursor do IAA; primeiro, convertido em triptamina é, em
seguida, desaminado em indol-3-acetoaldeído, este último dando, a
seguir, o IAA.
Os resultados indicam que, mesmo tendo originalmente muito
pouco de IAA, o solo o contém em grandes quantidades quando tem-
se o cuidado de suplementá-lo com triptofano. O tratamento do solo
com sulfato de estreptomicina inibe a elaboração do triptofano em IAA,
o que confirma que sua conversão é, em grande parte, microbiológica.

125
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Os inseticidas e fungicidas testados nesses experimentos provocaram


um decréscimo no teor em IAA no solo, sendo a regressão mais acentu-
ada com Formothion do que como Benomyl ou Pentachloronitrobenzeno.

Quadro 4. IAA sintetizado (em y /25mg de extrato de solo) em função dos


diferentes tratamentos do solo.
Tratamentos I.A.Asintetizado
Solo + triptofano + glicose 189,02
Solo + triptofano + glicose + Formothion 30,32
Solo + triptofano + glicose + Benlate 85,57
Solo + triptofano + glicose + Pentacloronitrobenzeno 114,20
Solo + triptofano + glicose + estreptomicina 55,26
Solo + glicose, sem triptofano 32,32

VLASSAL e LIVENS (1975), referindo-se a numerosos trabalhos


que estabeleceram a extrema sensibilidade da nitrificação em relação
aos agrotóxicos, evidenciaram os efeitos nefastos de alguns deles,
idênticos aos dos adubos nitrogenados, sobre as atividades da microflora
do solo e um efeito inibidor do BHC, ou hexaclorociclohexano, sobre
os microrganismos nitrificantes.
Num segundo trabalho, esses mesmos autores estudaram os efei-
tos de vários agrotóxicos, em diversas concentrações, sobre a
amonificação e a nitrificação, com especial atenção sobre a ação dos
produtos em presença de adubos amoniacais. Pensamos interessan-
te especificar o detalhe.
Esses experimentos foram conduzidos sobre dois tipos de solo,
ambos cultivados com beterraba açucareira. O solo A, proveniente de
planície, apresentava 3,3% de húmus; o solo B tinha tido um cul-
tivo de 15 anos de beterraba, com rotação de cereais, e não acusava
mais do que 1,9% de húmus. (Pode-se perguntar se, eventualmen-
te, não haveria aí uma relação de causa e efeito entre a cultura da
beterraba, os tratamentos com agrotóxicos que ela comporta e o baixo
teor de húmus que subsiste.)

126
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Os agrotóxicos testados incluíam cinco herbicidas, dois inseti-


cidas: (Heptacloro (l kg/ha) e Aldrin (3kg/ha) + Aldicarb e, em ou-
tro, Oxamyl e Prophos. (Obs.: o Oxamil é um carbamato
nematicida.)
De maneira geral, os agrotóxicos apresentaram um menor efeito
retardado no processo de nitrificação, no solo A que no solo B, devi-
do ao teor mais alto em húmus do primeiro. No entanto, os resul-
tados confirmam que a maior parte dos carbamatos provocam uma
regressão da nitrificação no solo, na dose padrão de aplicação. A
nitrogenase é, sobretudo, afetada pelo Oxamyl.
Os autores concluem que não apenas a nitrificação é sensível a
certos produtos, mas que o próprio processo da fixação de nitrogênio pelas
bactérias é afetado por alguns agrotóxicos. Especialmente os produtos
nocivos à nitrogenase são indesejáveis, pois impedem a fixação do
nitrogênio do ar.
Essas pesquisas foram confirmadas por trabalhos relacionados
não, mais a plantas anuais como a beterraba, mas a culturas perenes,
como as árvores frutíferas.
SHARMA (1975) estudou o efeito de diversos agrotóxicos sobre
a NAR de macieiras cultivadas em estufa. Assim, ele evidenciou que
produtos tão diferentes quimicamente como Diazinon, Dicofol,
Omite, Leptofos e o Thiram ou TMTD fazem a NAR decrescer em
mais de 10%.
Pulverizações repetidas de Dicofol reduzem significativamente a
NAR da folhagem de macieira. Sozinhos, os tratamentos de Dodine
não mostraram nenhuma influência significativa sobre a NAR.
Além disto, SHARMA (op. cit.) estudou as repercussões de di-
versos agrotóxicos aplicados no solo sobre a NAR das folhas de maciei-
ra Golden Delicious. Foi demonstrado que:
– Monuron faz decrescer a NAR em 45%
– Atrazine faz decrescer a NAR em 37%
– Simazine faz decrescer a NAR em 12%.

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F R A N C I S C H A B O U S S O U

SHARMA precisa, também, que: “A influência dos herbicidas sobre


a NAR apareceu dez dias após o tratamento e este efeito persistiu no res-
tante do período experimental, ou seja, quarenta dias”.
Isto significa que durante pelo menos quarenta dias, a proteossín-
tese da árvore frutífera encontrar-se-á afetada. Só podemos nos pergun-
tar quais serão, nestas condições, as conseqüências sobre sua resistência
em relação às moléstias e às pragas que se multiplicam às expensas das
substâncias solúveis presentes no vacúolo das células.
Esses resultados, envolvendo a folhagem da planta crescendo em
solo tratado, parecem explicáveis pelo que se passa ao nível do solo.
VICARIO (1972), procedendo a uma revisão bibliográfica, antes de
dar seus próprios resultados, recorda os pontos de vista de MOYER.
Este pesquisador refere que os tratamentos com agrotóxicos, que des-
troem um grande número de microrganismos do solo, podem provo-
car uma toxicidade indireta em relação às plantas, atribuída a uma
não-disponibilidade de fósforo. Esta hipótese parece concordar com a
propriedade que possui a matéria orgânica e, especialmente, o húmus,
de favorecer a assimilação do fósforo pelas plantas, como veremos a
propósito da influência da natureza da fertilização sobre a resistência
da planta. Esta questão será revista mais adiante, a propósito da influ-
ência da natureza da fertilização sobre a resistência da planta. MOYER
observa que determinados agrotóxicos, principalmente os que contêm
nitrogênio, são eles próprios cátions e que por isso podem deslocar
outros cátions do complexo de troca, tais como Ca, Mg e Zn.
VICÁRIO (op. cit.) pôde mostrar que 2-4 D - 2-4-MCPA e Malathion,
afetam P, K, e Ca, assim como o total de N trocável, nos solos argilosos.
Estas modificações, que lembram nossos próprios resultados com
diversos agrotóxicos em tratamento de folhas da videira, não podem
senão repercutir sobre o metabolismo e, portanto, sobre a resistên-
cia da planta.
Os trabalhos de GAWAAD et alii. (1973) confirmam a influên-
cia inibidora de diversos inseticidas de solo, tais como Kepone, Endrin,

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Dyfonate e um certo PP 221* (provavelmente um produto de expe-


rimentação) sobre a amonificação da peptona e a nitrificação do
sulfato de amônia.
Esses autores estabeleceram que os inseticidas e, em primeiro
lugar os clorados, têm uma influência inibidora sobre a atividade dos
fungos (especialmente os actinomicetos) e bactérias que participam
da amonificação, e sobre os nitrobacter que participam da transforma-
ção dos nitritos em nitratos.

Resumo
O conjunto desses trabalhos mostra que todos os agrotóxicos
incorporados ao solo, seja intencionalmente para desinfecção, não-
intencionalmente, após tratamentos de controle de insetos ou fun-
gos ou tratamentos herbicidas, são capazes de afetar a fisiologia da
planta através de sua nutrição. Os herbicidas parecem os mais perigo-
sos, devido a sua dupla ação: efeito direto no momento do tratamento,
ainda que subletal, em relação à planta e ação indireta, pela inibição da
nitrificação ou da amonificação, conseqüente à destruição dos microrga-
nismos do solo.
ROTINI e SEQUI (1974) já tinham salientado que: “O empre-
go de inseticidas e herbicidas causa grandes problemas no que diz
respeito à integridade das características do solo”. A matéria orgâni-
ca e o húmus que dela deriva podem, de certa forma, servir de “tam-
pão”, reduzindo um pouco o atraso provocado por este ou aquele
agrotóxico na nitrificação. Contudo, pode-se perguntar o que acon-
tece com a matéria orgânica e o húmus assim “tratados”? ROTINI e
SEQUI (op. cit.) observam, oportunamente, que “se deveria conside-
rar mais a influência dos inseticidas e dos herbicidas sobre as enzimas do
solo”.

*
Pirimifosetil. (N. da T.)

129
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Estes mesmos autores, por outro lado, observam: “Se um herbicida


comporta-se como um inibidor das enzimas do solo, todo o sistema ecoló-
gico poderá sofrer modificações profundas, e a própria fertilidade do solo
poderá ser alterada”.
Efetivamente, é o que confirmam os diferentes trabalhos que ana-
lisamos. Portanto, podemos nos perguntar quais podem ser as conse-
qüências provocadas pelos diversos agrotóxicos – herbicidas à frente –
sobre a resistência da planta assim perturbada em sua nutrição?
É necessário questionar em que medida as inibições da proteossín-
tese não apresentariam uma influência indireta, mas certa, sobre o
desenvolvimento das doenças e, especialmente das doenças viróticas,
eventualidade à qual já fizemos alusão. São estas importantes questões
que nos propomos tratar no próximo capítulo.

Fig. 11. Fórmulas comparadas do DDT e do 2-4 D

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Fig. 12. Repercussões de DDT pó a 70% sobre videira. À esquer-


da, planta testemunha; à direita, planta tratada (segundo DELHAYE,
Bull. Horticole. Liège, 1950). Observar as deformações das folhas,
idênticas às que podem ser provocadas por uma substância de cres-
cimento.

131
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Fig. 13. Repercussões sobre os teores de nitrogênio protéico em


folhas de macieira, acarretadas por diversos tratamentos com produtos
acaricidas. (Segundo BLAGONRAVORA, 1974.)

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Fig. 14. Repercussões sobre os teores de nitrogênio não-protéico


em folhas de macieira, em seguida a diversos tratamentos com pro-
dutos acaricidas. (Segundo dados de BLAGONRAVORA, 1974)

133
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Fig. 15. Equilíbrio dos elementos catiônicos K/Ca/Mg nas folhas


de videira, para cada uma das seis parcelas do quadrado latino, cor-
respondente aos tratamentos: DDT, Parathion, Carbaryl e testemunha,
em 14 de junho, após a intervenção inseticida de 5 de junho de 1962.

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Fig. 16. Níveis das populações totais de Panonychus ulmi e


Eotetranychus carpini vitis em 9 de julho de 1962, para o conjunto das
seis parcelas do quadrado latino e em função do equilíbrio K/Ca/Mg
nos tecidos foliares, em 14 de junho de 1962. (Experiência a cam-
po aberto, CHABOUSSOU, 1969, tese)

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138
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

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139
CAPÍTULO V

CAUSA DO DESENCADEAMENTO DE
MULTIPLICAÇÕES DE PRAGAS E DE
DOENÇAS PROVOCADAS PELOS
AGROTÓXICOS

“E através dos fenômenos de nutrição que podemos atingir os organismos vivos”. Claude
Bernard

1. A TROFOBIOSE COMO EXPLICAÇÃO DO AUMENTO


DA SENSIBILIDADE DA PLANTA AOS PARASITAS PELA
AÇÃO DOS AGROTÓXICOS

Os capítulos precedentes nos mostraram que:


• determinados agrotóxicos agravam o desenvolvimento, tanto de
doenças fúngicas, como também, como veremos adiante – viro-
ses – com a multiplicação de pragas, como ácaros, pulgões,
aleirodídeos, Todos organismos picadores, mas também os
lepidópteros, como, por exemplo, a Ostrinia nubilalis, do milho.
• estes ataques não são, absolutamente, devido ao desapareci-
mento de eventuais fatores antagonistas;
• ao contrário,o desenvolvimento das pragas tem por origem
um aumento do seu potencial biótico (ação positiva especi-
F R A N C I S C H A B O U S S O U

almente sobre a fecundidade, longevidade e velocidade de


reprodução desses organismos);
• estas modificações são de origem nutricional ou trófica: a
teoria da trofobiose é proposta como exp1icação do que foi
convencionado chamar de “desequilíbrios biológicos”.
Vimos também que, mesmo sem serem idênticas, as necessida-
des nutricionais dos diferentes “parasitas” são constituídas de
substâncias solúveis, como aminoácidos livres ou glicídios
redutores. Conseqüentemente:
• é criando um estado de proteólise dominante que os agrotó-
xicos sensibilizam a planta;
• é, inversamente, por estímulo da proteossíntese, através de di-
versas técnicas, que reforçaremos a resistência da planta.
É pelo estudo, tão aprofundado quanto possível, das relações en-
tre as repercussões dos agrotóxicos sobre a bioquímica da planta
e o desenvolvimento das pragas e das doenças, que poderemos.
É o que propomos fazer ao longo deste capítulo.

2. CAUSAS DAS PROLIFERAÇÕES DE ÁCAROS


Conforme tratamos no primeiro capítulo, pudemos demonstrar
pelas criações, que o ácaro(Tetranychus), alimentado à base de folha-
gem tratada com o produto responsável por sua multiplicação, tinha
seu potencial biótico aumentado. Isto ocorria pela elevação de sua
fecundidade (no sentido do número de ovos postos diariamente) e de
sua longevidade (os ácaros fazem postura até sua morte), pela redu-
ção de seu ciclo evolutivo (aptidão de chegar mais cedo à idade
reprodutiva) e por uma maior proporção de fêmeas na população
(distorção na proporção de sexos). (CHABOUSSOU, 1969) (fig. 17).
Um determinado número de produtos sintéticos, indiferentemen-
te, inseticidas ou fungicidas, podem também intensificar as multipli-
cações dos ácaros. Destacam-se, sobretudo, DDT, Carbaryl, Captan e
diversos ésteres fosfóricos. Nas condições em que aceleram a prolifera-

142
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

ção, esses produtos provocam uma inibição da proteossíntese. É este


enriquecimento dos tecidos da planta em substâncias solúveis que
repercute, de maneira positiva, sobre o potencial biótico desses animais
(fig. 18 e 19).
Este gênero de determinismo já havia sido aventado por alguns
pesquisadores. Assim, em 1965, MARDAJANIAN et al., numa
comunicação à Academia de Ciências da Geórgia*, assinalavam que
“a multiplicação de Tetranychus após tratamentos com DDT era de-
corrente das mudanças na composição bioquímica das folhas e, con-
seqüentemente, do regime de nutrição dos ácaros”.
Efetivamente, as análises de folhas do algodoeiro submetidos a
estes tratamentos, efetuadas a cada cinco dias, evidenciaram diversos
fenômenos, como:
– flutuações na atividade da peroxidase;
– queda regular do teor de clorofila;
– aumento da pigmentação antociânica;
– enfim, diminuição do teor de nitrogênio protéico;
– e, ao contrário, aumento da concentração de fósforo.
Apenas estes dois últimos processos bastariam para explicar o
aumento da fecundidade dos ácaros que se nutrem das folhas assim
tratadas.
Mencionamos efim, que a proporção de glicídios diminui, o teor de
amido aumenta e certos aminoácidos desaparecem como, por exemplo,
a histidina. Semelhantes perturbações no metabolismo da planta foram
igualmente registradas por outros pesquisadores, como SMIRNOVA
(1965), que se preocupou com o determinismo da multiplicação sobre
beterraba tratada também com DDT, o que veremos adiante.
Em relação ao fenômeno, aparentemente paradoxal, que consti-
tui a multiplicação dos ácaros por produtos acaricidas destinados, em

*
União Soviética. (N. da T.)

143
F R A N C I S C H A B O U S S O U

princípio, a destruí-los, como já mostramos, (CHABOUSSOU,


1970), merece atenção o fato de que, tão logo isto foi demonstrado,
os pesquisadores tentaram elucidar seu determinismo sem evocar
uma suposta destruição dos inimigos naturais ou um processo qual-
quer de resistência. Este foi o caso de WAFA et alii. (1969).
Esses autores – os quais pode-se supor que tenham sido, previ-
amente alertados por determinados fracassos de tratamentos –, estu-
daram dois tipos de repercussões conseqüentes a aplicações repetidas
de diversos acaricidas sobre citros. Primeiro, procederam a observa-
ções escalonadas envolvendo o nível das populações do ácaro
(Eutetranychus orientalis), (Klein), dos citros. Segundo, confrontaram
esses dados com a composição bioquímica das plantas cítricas sobre
as quais foram mantidas essas populações.
O experimento comportava sete “tratamentos”: Amidithion-
Formothion; Amidithion e Formothion em aplicações alternadas;
Amidithion e Demeton alternados; Amidithion, Formothion e Demeton
alternados com intervalos de duas semanas sem tratamentos, e
Formothion e Demeton em tratamentos alternados.
Os autores registraram que os inimigos naturais dos ácaros eram
raros e não podiam interferir de maneira sensível sobre o equilíbrio
das populações.
Resumindo, segundo os autores, os resultados indicam que os
acaricidas fosforados. quando utilizados só, em aplicações repetidas, pro-
vocam um aumento da infestação dos ácaros durante um período prolon-
gado.
Este efeito positivo sobre a multiplicação do ácaro pelos acaricidas
fosforados é atribuído à ação dos produtos sobre a composição bio-
química da planta. Assim, os autores registram com Amidithion,
Formothion e Demeton uma elevação do nível dos glicídios solúveis. Isto
tanto nos caules quanto nas folhas dos citros.
Esta constatação concorda com os resultados obtidos por
FRITZSCHE (1961) sobre feijão e por nós mesmos sobre videira, em

144
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

relação a Eotetranychus carpini vitis (CHABOUSSOU, 1970). Deve-


mos observar que o potencial biótico, via fenômeno da nutrição, não
depende somente dos glicídios, mas de um regime alimentar corres-
pondente a um certo equilíbrio:

Substâncias nitrogenadas £ solúveis glicídios redutores.

É, portanto, este equilíbrio que vamos ver relacionado com a


multiplicação dos pulgões.

3. CAUSAS DAS PROLIFERAÇÕES DE PULGÕES


Trata-se de um fenômeno análogo ao das proliferações de ácaros,
mas que talvez não sensibilize os observadores com a mesma inten-
sidade. Freqüentemente, a presença de colônias abundantes de pul-
gões após este ou aquele tratamento é debitada a uma simples
resistência ao agrotóxico (fig 4). Tanto é verdade que se confunde,
freqüentemente, multiplicação e resistência.
Entretanto, como disse antes, MICHEL (1964) obteve, sobre
fumo tratado com Mevinphos (inseticida fosforado), uma multiplica-
ção maior de Myzus persicae em comparação às testemunhas (fig. 20).
Esta elevação do potencial biótico resulta de um processo triplo:
a) aumento da fecundidade: a média de postura passa de 25,09 na
testemunha para 31,69, sobre fumo tratado com Mevinphos, a l cm3/
l, e para 46,30, em fumo tratado com Mevinphos a 2 cm3/l;
b) aumento da longevidade dos indivíduos: as relações entre o
número de indivíduos que chegam a se reproduzir em comparação
com o número dos indivíduos instalados são as seguintes:
– Testemunhas ............................ 69,60%
– Mevinphos: 2cm3 /l ................... 74,40%
– Mevinphos: 2cm3 /l ................... 87,43%
c) redução do ciclo evolutivo: isto é, a aptidão dos indivíduos, ali-
mentados sobre as folhas tratadas com agrotóxicos, para reproduzi-

145
F R A N C I S C H A B O U S S O U

rem-se mais precocemente. Em outras palavras, as gerações sucedem-


se em ritmo mais rápido devido a este fenômeno.
Estudando a reprodução de outro pulgão, Aphis fabae, sobre
hastes florais de beterrabas tratadas com DDT, SMIRNOVA (1963)
constata que a fecundidade do pulgão é diferente segundo o tempo
decorrido entre o tratamento e a contaminação artificial. O efeito
mais agudo sobre a fecundidade de Aphis fabae ocorre entre nove e
quinze dias após a aplicação do inseticida. Segundo o autor, esta exa-
cerbação da oviposição está correlacionada com a concentração em nitro-
gênio não-protéico das plantas assim tratadas.
Por outro lado e em concordância com os resultados de WAFA et alii.
(op. cit.) referentes aos ésteres fosfóricos sobre citros, registrou-se igualmen-
te, nas hastes florais da beterraba tratadas com DDT, um aumento nos
açúcares pela ação do agrotóxico, em relação às testemunhas.
Essas análises evidenciam que a multiplicação dos pulgões pelo DDT
resulta de um estado de proteólise dominante, criado pela ação do
agrotóxico, e de um estado nutricional da planta, que depende do
equilíbrio dos produtos nitrogenados e dos glicídios. Depende, tam-
bém, da própria natureza desses elementos (presença ou predomi-
nância deste ou daquele aminoácido) que tem como característica
serem substâncias solúveis, isto é, assimiláveis por esses organismos.
Essas inibições da proteossíntese são conseqüência de diversos
agrotóxicos e das substâncias estimulantes de crescimento utilizadas
como tais. MAXWELL e HARWOOD (1960) mostraram que o
tratamento das favas com 2-4 D provoca no pulgão Macrosiphum
pisum uma taxa de reprodução claramente mais elevada que nas tes-
temunhas. Como no caso precedente, este aumento de fecundidade
parece ter relação com o crescimento dos teores de aminoácidos livres
na seiva.
ADAM e DREW (1969), mostraram também, com trabalhos
sobre aveia e cevada, que as populações de duas espécies de pulgões,
Rhopalosiphum padi e Macrosiphum avenae, achavam-se associadas às

146
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

aplicações de 2-4 D. Estes aumentos do potencial biótico dos pul-


gões pelos hormônios de crescimento foram confirmados por criações
em laboratório.
Especialmente no caso da beterraba e dos cereais, fica evidente a
importância das interações entre o estado fisiológico da planta devi-
do à ação de diferentes agrotóxicos sobretudo inseticidas e herbicidas
que lhe são aplicados, e o desenvolvimento das doenças fúngicas e
viróticas. Estas últimas são favorecidas, simultaneamente, por um
estado onde predomina a proteólise e pela resultante multiplicação
dos pulgões vetores. Voltaremos adiante sobre esta questão fundamen-
tal, a propósito das doenças por vírus.
Não se pode concluir este parágrafo, dedicado aos pulgões, sem
evocar o caso da filoxera da pereira (Aphanostigma piri). Trata-se, ain-
da, de um “desequilíbrio biológico” que deixa os entomologistas e
técnicos encarregados do controle perplexos e impotentes. Todavia,
começa-se a suspeitar da provável influência de determinadas condi-
ções capazes de interferir no estado fisiológico da planta.
Assim, MOUSSION (1979) recorda as repercussões de diversas
técnicas culturais, trabalho do solo, fertilização e, enfim, “a utiliza-
ção de antiparasitários”. Todavia, o autor não precisa que esses fatores
poderiam agir por intermédio de suas repercussões sobre o metabo-
lismo da planta. A julgar pelas experiências apresentadas, talvez o
problema básico resida neste ponto.
Após ter recordado a influência positiva de um excesso de nitro-
gênio sobre o desenvolvimento dos pulgões, MOUSSION (op. cit.)
chega a esta observação “inesperada” – diz ele – feita pelos agentes do
INRA, no curso de testes em 1962, com um novo inseticida,
Demeton-methyl. As parcelas que receberam aplicações deste produ-
to foram invadidas por Aphanostigma piri e a colheita foi muito pre-
judicada.
Ele não questiona, se esta proliferação foi resultado de um pro-
cesso análogo ao das outras multiplicações de pulgões e ácaros. Este

147
F R A N C I S C H A B O U S S O U

fato coloca sob suspeição a influência do Demeton-methyl na fisiolo-


gia e estado bioquímico da pereira assim tratada.
MOUSSION (op. cit.) menciona, igualmente, um fato muito
significativo a nossos olhos. Trata-se da “insuficiência” (para empre-
gar sua expressão) de diversos outros inseticidas, entre os quais o
Parathion – óleo diesel, bem como de diferentes “inseticidas
polivalentes”, tenham eles ação de contato, ingestão ou inalação.
MOUSSION precisa, também, que os “inseticidas polivalentes”, de
contato ou sistêmicos, como “Azinphos-methyl”, Vamidothion e
Omethoate, devem ser evitados nos pomares atacados por esta filoxera.
Não apenas se mostram ineficazes, como, ele observa , “apresentam os
mesmos inconvenientes do Demeton-methyl, citado anteriormente”.
Em outras palavras, esses produtos, não só são apenas ineficazes,
mas parecem exacerbar a multiplicação do parasita, como no caso do
Demeton-methyl. A fim de demonstrar este efeito favorável ao pulgão,
ao invés de se constatar, com uma espécie, que Diazinon, Bromophos,
Dichlorfos, Endosulfan, Pirimicarb e Parathion- óleo diesel “foram um
fracasso total”, bastaria, simplesmente, observar com cuidado, os níveis
de população nas árvores assim tratadas e verificar se são superiores
ou não às levantadas sobre as testemunhas. E não comparar com os
resultados de um produto padrão, cujas repercussões sobre a planta
podem mascarar o fenômeno de estimulação.
Seria necessário, em suma, proceder como COX e HAYSLIP fi-
zeram para o desenvolvimento de Botrytis sobre tomates tratados com
Ditiocarbamatos contra a Phytophthora (p. 29).

4. CAUSAS DA MULTIPLICAÇÃO DE LEPIDÓPTEROS


Se as proliferações de ácaros, pulgões e aleirodídeos, desencadea-
das por toda uma gama de agrotóxicos, “saltam aos olhos”, é porque
estes parasitas permanecem sobre a planta durante a maior parte de
seu ciclo. Ora, o mesmo não ocorre com os lepidópteros, cujas exi-
gências de metamorfose levam-nos a mudar de meio e, portanto, a

148
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

deixar a planta-hospedeira. Entretanto, vimos pelas observações de


LUCKMANN (op. cit.), que tratamentos do solo com um insetici-
da clorado como o Dieldrin podiam aumentar as populações de
tortrice (Ostrinia nubilalis), no milho.
Com os trabalhos de TITOVA (1968), temos resultados tabu-
lados envolvendo os diversos processos que podem ser responsáveis
pelo aumento do potencial biótico do inseto.
TITOVA (op. cit.) conduziu seus estudos simultaneamente em
laboratório e a campo, envolvendo diversos lepidópteros nocivos,
avaliando os indivíduos sobreviventes após o tratamento, bem como
sua descendência. Assim, as experiências conduzidas com lagartas de
Heliothis armigera, alimentadas com tomateiro tratado com DDT e
Carbaryl, apresentaram os seguintes resultados:

Quadro 5. Resultados sobre o potencial biótico das mariposas oriundas de lagartas


alimentadas com folhas de tomateiro tratado com DDT e Carbaryl.
Tratamentos Fecundidade das Longevidade Peso (em mg) Mortalidade
fêmeas (em dias) das crisálidas das crisálidas
Testemunhas 452 15,2 278-285 46,5%
DDT 664 22,6 306-303 46,6%
Carbaryl 478 20,1 266-270 43,0%

O mesmo autor realizou experiências com Agrotis segetum sobre


plântulas de trigo, cujos grãos tinham sido tratados com Lindane. A
alimentação das lagartas às expensas desse trigo mostrou que:
• a duração do estágio larval é levemente prolongada com o
trigo oriundo de grãos tratados com Lindane – 39,4 dias
contra 32,4 no testemunha;
• o peso das crisálidas é aumentado, como no caso precedente:

machos fêmeas
Testemunhas 233 260 mg
Trigo oriundo de grãos-lindane 276 326 mg

149
F R A N C I S C H A B O U S S O U

As crisálidas de A. segetum mantidas a 5 – 6º C, durante três


meses, apresentavam apenas 16,9% de mortalidade quando prove-
nientes do “trigo-lindane”, contra 72,5%das testemunhas.
Isto parece constituir um fenômeno geral, já que as crisálidas de
H. armigera mantidas durante quatro meses à mesma temperatura de
5 – 6ºC, apresentavam 49% de mortalidade nas larvas oriundas das
folhas tratadas com lindane, contra 92% para as larvas alimentadas
com trigo-testemunha. O autor conclui assim: “Tudo isto mostra
uma forte resistência às condições experimentais adversas, em função
dos tratamentos químicos”.
O modo de alimentação das lagartas afeta igualmente a propor-
ção de crisálidas em diapausa bem como a fecundidade das fêmeas da
geração seguinte:

Alimentação com trigo tratado : fecundidade por fêmea


Testemunha : 43
DDT : 191
Carbaryl : 326

TITOVA (op. cit.) conduziu observações sobre lagartas de Hadena


sordida recolhidas em trigo no Casaquistão, tratadas com Methyl-
parathion. O autor constatou, em comparação às testemunhas:
– um aumento do peso das lagartas
– uma diminuição da mortalidade larval.
As análises da hemolinfa das lagartas mostraram a influência dos
tratamentos com agrotóxicos. Assim, parecem particularmente afe-
tados os teores dos íons Na+ e K+. Em Heliothis, nas lagartas tratadas
com “folhas DDT, Carbaryl e Methyl-parathion”, a relação Na/K é
inferior, em comparação às testemunhas. Esta relação, tomada como
indicador da intensidade metabólica, revela que em seguida a trata-
mentos inseticidas os indivíduos sobreviventes apresentam um me-
tabolismo reduzido, e que são mais resistentes a numerosos fatores

150
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

ambientais adversos, aí incluídos os tratamentos químicos. Este último


ponto corresponde ao que pudemos evidenciar nos ácaros, com o
Parathion (CHABOUSSOU, 1968).
Levando-se em consideração as repercussões dos agrotóxicos so-
bre a fisiologia da planta e as conseqüências resultantes sobre o po-
tencial biótico das pragas, por efeito nutricional, todo o controle
químico deve ser retomado sobre novas bases, bem como o controle
dito “integrado”. Veremos novas provas disto estudando as relações
entre a planta e o agrotóxico e o desencadeamento de doenças, que
este último pode provocar.

5. O DESENVOLVIMENTO DAS DOENÇAS FÚNGICAS E


BACTERIANAS CAUSADAS PELOS AGROTÓXICOS

A) Os ditiocarbamatos no desenvolvimento das doenças das plantas


No primeiro capítulo, referimo-nos aos “desequilíbrios biológicos”
provocados pelo emprego dos agrotóxicos no campo das doenças,
como o desenvolvimento da ferrugem do trigo pelo DDT ou do
Oidium e Botrytis na videira, pelo Maneb, Zineb e Propineb ou
Mezineb (CHABOUSSOU, 1966). Também fizemos referência aos
fracassos dos tratamentos com estes mesmos produtos, no fim da
estação de produção que, na realidade, acabam sendo processos de
sensibilização da planta em relação à moléstia a combater.
A este propósito GREWE (1967) observava: “Zineb e sobretudo
Maneb favorecem a infecção dos cachos de uva por Botrytis cinerea, a tal
ponto que, em numerosas regiões, o mofo cinzento tornou-se o pro-
blema patológico mais importante na agricultura”. No sul da Flórida,
a extensão desta moléstia em tomateiros é atribuída à utilização de
Maneb e Zineb contra Phytophthora (COX e HAYSLIP, 1956).
Efetivamente, estes dois autores mostraram que, em tomateiros,
os carbamatos da série etilada, tais como Zineb e Maneb, provocavam
a recrudescência dos ataques de Bobrytis.

151
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Estas repercussões nefastas do Maneb e Zineb foram encontradas


por COX e WINFREE (1957) também sobre morangueiros. Isto
demonstra a generalidade do fenômeno e levou estes autores a conclu-
írem: “É tentador associar o aumento da concentração de zinco nas
folhas com o crescimento aparente da suscetibilidade à infecção por
Botrytis. É bem conhecido que os excessos nos níveis dos oligoelementos
podem induzir a desequilíbrios em processos de grande importância
biológica”.
COX e WINFREE (op. cit.) fazem alusão ao acúmulo do zinco
nas folhas tratadas com Zineb.

Quadro 6. Concentração de zinco nas folhas de morangueiro (em ppm)


segundo os tratamentos com agrotóxicos
Tratamentos Folhas velhas Folhas jovens
Testemunha 16 44
Zineb 208 155
Nabam+ZnSO4 203 121
Thylat 17 41
Phygon 26 48
L.S.D.01 31 20

Os aumentos em zinco nas folhas, produzido pelo Zineb e pela


mistura Nabam + Zn SO 4, são acompanhados de alterações no
metabolismo normal da planta. Assim, COX e WINFREE (op. cit.)
observam:
“As diferenças envolvendo o conteúdo protéico, ainda que não sig-
nificativas, são sugestivas, em particular no que diz respeito às folhas
velhas, nas testemunhas e nos tratamentos Zineb e Nabam + Zn
SO4. Estas amostras contêm, em média, os seguintes valores”:

Quadro 7. Teor de nitrogênio protéico das folhas


Testemunhas ....................................................... 3,18
Zineb ................................................................. 3,08
Nabam + Zn SO 4 ............................................................................... 3,06

152
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Este fato conduziu os autores à seguinte conclusão:


“O trabalho reforça a hipótese de que estas aplicações de
fungicidas biditiocarbamatos podem aumentar a suscetibilidade de
certas plantas a Botrytis”. Como demonstram as análises já citadas, e
em concordância com a teoria da trofobiose, este processo parece se
encontrar relacionado com a diminuição da proteossíntese constatada
por estes autores. Esta sensibilização da planta por agrotóxicos como
os ditiocarbamatos não envolve somente as doenças fúngicas, mas
também as moléstias viróticas e bacterianas que, como as precedentes,
encontram-se em fase de expansão na agricultura. Como se surpre-
ender, se esta expansão procede de um mesmo determinismo?

B) Agrotóxicos e doenças bacterianas


Uma das doenças bacterianas mais graves é o “fogo bacteriano da
pereira” provocado por Erwinia amylivora.* Esta doença foi detectada
recentemente em Aquitaine, num pomar de Passe-Crassane, em Labatut
(Landes). Esta doença penaliza toda esta região, mas poupa determina-
dos produtores de Amou. Ocorre que estes conservam certos métodos
particulares de controle químico, aos quais voltaremos, pois nos parecem
estar relacionados com a imunidade das árvores assim tratadas, ainda que
não especificamente em relação a Erwinia amylivora.
Começa, atualmente, uma preocupação com as causas desta “ex-
plosão” de doença. Entre elas estão vagamente implicadas “as técni-
cas culturais”, sem que aí se incluam, entretanto, os tratamentos com
agrotóxicos. Contudo, diversas observações os colocam claramente em
questão.
Assim, FIERET e LARGE (1976) assinalam: “as substâncias de
crescimento, empregadas para melhorar a fixação das flores, agravaram
a tendência à segunda floração, e esta técnica deverá ser abandonada ou
melhor dominada”.

*
Agente da doença “Fire blight”. (N. da T.)

153
F R A N C I S C H A B O U S S O U

O questionamento das substâncias de crescimento no desenvolvi-


mento da doença bacteriana, que se pode qualificar “de empírico”,
parece plenamente justificado. Como vimos, estes produtos provocam
uma inibição da proteossíntese e, conseqüentemente, um enriquecimento
dos tecidos da planta em substâncias solúveis, nutricionalmente
sensibilizadoras.
Outra conclusão: estes mesmos autores observam que “as aduba-
ções nitrogenadas, freqüentemente muito pesadas, têm uma influência
marcante, sobretudo nos pomares não irrigados”.
Sabe-se que um excesso de fertilização nitrogenada, especialmen-
te com adubos amoniacais como o sulfato de amônia, correntemen-
te usado, tem como primeiro resultado aumentar o nível de
nitrogênio solúvel nas plantas. Assim, exatamente como para as subs-
tâncias de crescimento citadas anteriormente, é por um fenômeno de
inibição ou redução da proteossíntese que a árvore frutífera se tornaria mais
sensível à doença bacteriana.
Observações importantes devem ser efetuadas envolvendo as
repercussões dos agrotóxicos, por efeito indireto, sobre a fisiologia da
planta.
Em primeiro lugar, se deve recordar que podem ter incidências
nefastas as substâncias de crescimento aplicadas intencionalmente
sobre as árvores frutíferas, como a maior parte dos fungicidas e inse-
ticidas sintéticos. Estas intervenções podem, perfeitamente, ser su-
ficientes para colocar a planta num estado de sensibilidade tanto em
relação às pragas quanto às diversas doenças.
O processo de sensibilização é o mesmo, seja com pulgões, seja com
bactérias, seja a inibição ou interrupção da proteossíntese.. É comum
observar-se que, em Landes, as pereiras atacadas pela bacteriose de
Pseudomonas syringae são infestadas também por filoxera (FIERET e
LARGE, op. cit.).
Por outro lado, é necessário assinalar que podem agir sobre a fi-
siologia das árvores frutíferas, os agrotóxicos aplicados intencional-

154
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

mente* sobre as folhas e ramos, e os herbicidas, prática corrente ago-


ra, não apenas sobre cereais e hortaliças, mas também sobre árvores
frutíferas e videira. Está bem demonstrado que todos estes agrotóxicos
apresentam repercussões – algumas vezes mesmo a longo prazo –
sobre a bioquímica destas plantas perenes.
Já se sabia que Monuron provoca aumento do nitrogênio total e
do nitrogênio solúvel nas hortaliças (COOKE, 1955). RIES et alii.
(1963) estudaram, sobre pessegueiros das varidades Redhaven e
Richhaven, as repercussões de Simazine e Amitrol, em relação ao teor
em nitrogênio das folhas. Tanto sobre pessegueiros quanto sobre
macieiras, a mistura Simazine (4 libras por acre, ou seja, aproxima-
damente 4,5 kg/ha) + Amitrol (2 libras por acre, ou seja, aproxima-
damente 2,25 kg/ha) provocam, em comparação às parcelas limpas à
mão, níveis de nitrogênio mais elevados nas folhas. Esta elevação foi de
3,59% em comparação às parcelas limpas à mão, e de 3,02% em
comparação às com cobertura plástica do solo. A destruição das in-
vasoras era idêntica.
Repercussões como a estimulação de crescimento ou o aumento
do número de galhos laterais desenvolvidos sobre cada ramo podem,
à primeira vista, parecer benéficas. É de se temer, todavia, que estes
aumentos de vigor, traduzidos bioquimicamente por aumentos de nitro-
gênio nos tecidos e, sobretudo, de nitrogênio solúvel, não sensibilizem as
árvores em relação às diversas doenças, em especial às viróticas. Exa-
minaremos o assunto mais adiante.
Que os tratamentos com agrotóxicos podem produzir repercussões
sobre a sensibilidade – ou caso prefira, inibir a resisistência às doenças
das árvores frutíferas por suas incidências sobre a fisiologia dessas plantas
– nos parece perfeitamente demonstrado (como mostramos com o enxofre)
por certas repercussões – benéficas – produzidas por determinados produtos.

*
São chamados tratamentos preventivos, isto é, a aplicação do agrotóxico sem que
haja a ocorrência de praga ou de doença. (N. do R.)

155
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Não é por acaso que os pomares da região de Amou (Landes), a


que fizemos referência antes, são poupados de ataques de Erwinia
amylivora, o “fogo bacteriano”. Nessa área, com efeito, notaremos que
as árvores são tratadas por meio de produtos cúbricos contra P. syringae.
LAGAUDE (1979) observa, a propósito das moléstias bacteria-
nas do tomateiro: “Os produtos ricos em cobre podem ser utilizados.
Embora os produtos cúpricos não sejam bactericidas, foi possível
notar que exerciam uma ação contrária às bactérias”.
Em consequência, há unanimidade de que a ação devidamente
provada do cobre em relação às doenças bacterianas é indireta. A nosso
conhecimento, ninguém tentou explicar até agora este fato. Ora, no
que nos concerne e, segundo nossa concepção da trofobiose, o cobre
poderia ter uma ação positiva sobre a proteossíntese, como oligoelemento,
melhorando o metabolismo da planta.
Quanto a esta ação do cobre, observamos que:
a) em nossos próprios experimentos sobre videiras (cepas Semillon
e Sauvignon), a calda bordalesa provocou uma clara regressão do nitro-
gênio aminado e amoniacal, bem como dos glicídios solúveis totais nas
folhas (CHABOUSSOU: resultados não publicados).
b) PINON (1977), por outro lado, diz em seu trabalho que: “A
análise das folhas da amostra colhida no fim da floração revela uma
influência dos fungicidas antimíldio. Os níveis de nitrogênio total e de
nitrogênio solúvel das folhas são menos elevados no caso do tratamento com
calda bordalesa”.
Estes resultados, que exprimem a regressão das substâncias solú-
veis nutricionalmente sensibilizadoras, parecem explicar o efeito não
fungicida, mas antimicótico e antibacteriano, dos produtos cúpricos, por
sua ação sobre o metabolismo da planta.
Isto ocorreria por intermédio da influência do oligoelemento cobre
sobre enzimas como a polifenoloxidase e, portanto, positivamente sobre a
proteossíntese. Assim estaria explicada a polivalência dos produtos
cúpricos em relação a toda uma gama de doenças, aí compreendidas

156
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

as bacterianas e as viróticas. Voltaremos a este propósito na fertiliza-


ção e nos tratamentos foliares à base de oligoelementos.
Uma última observação a propósito do “fogo bacteriano” (Erwinia
amylivora): FIERET e LARGE (op. cit.) ressaltam que, em sementei-
ra, “nenhum ataque foi observado sobre as plantas sensíveis. Após as
considerações precedentes, podemos nos perguntar se esta imunidade
em sementeiras não seria devido a uma dupla circunstância: estas
plantas jovens, em período de crescimento ativo, são fisiologicamente re-
sistentes – como se constata através de outras doenças como, por exem-
plo, a causada por Phytophthora cambivora em castanheiras,* por outro
lado, pode também que esses indivíduos ainda não tiveram tempo de
ser sensibilizados pelos tratamentos repetidos com agrotóxicos,que,
habitualmente, são aplicados no pomar.
Enfim, hã um outro desencadeamento de doenças mais preocu-
pante: as diversas doenças que atingem os cereais, o que vamos exa-
minar agora.

C) Agrotóxicos e doenças dos cereais


Recentemente, um técnico de uma empresa de agrotóxicos ob-
servava que: “O mercado francês dos fungicidas destinados aos cere-
ais está em plena expansão. Enquanto em 1973 menos de 5% dos
cereais recebiam um tratamento fúngico durante seu desenvolvimen-
to, em 1978 mais de 30% das áreas semeadas foram tratadas (esta
percentagem atinge quase 40% para o trigo mole de inverno)”. O
autor prossegue: “Os fungicidas de aplicação nas partes aéreas dos
cereais considerados como um meio ocasional de preservar uma cul-
tura comprometida, atualmente são parte integrante do seu sistema
de produção, da mesma forma que a adubação, os herbicidas e até os
reguladores de crescimento” (DUPERRAY, 1979).

*
Refere-se à castanheira européia. (N. da T.)

157
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Não acreditamos que os agricultores se regogizem com a neces-


sidade na qual parecem encontrar-se, ou seja, a necessidade de recor-
rerem a tratamentos fúngicos... Nosso problema é saber se esta
necessidade não
Resultaria, precisamente, da utilização de herbicidas e outros
reguladores de crescimento – denunciados como favorecedores do
desenvolvimento da helmintosporiose – e cuja utilização, como su-
blinha o autor, agora entrou na prática corrente.
Referente aos cereais, recordemos que JOHNSON (1946) já
demonstrou experimentalmente que o DDT provoca um aumento
da sensibilidade do trigo à ferrugem, como conseqüência direta das
repercussões deste produto organoclorado na fisiologia do cereal.
Obviamente não é mais questão de tratar os cereais com DDT ou
outros produtos clorados, já interditados. Todavia, observa-se que as
incidências deste produto podem, perfeitamente, ser comparadas às
provocadas por uma substância de crescimento como 2-4 D.
Aliás, já se observou que: “Os herbicidas podem ter uma ação
favorável ou desfavorável sobre o estado sanitário das culturas”. “Pa-
rece que os ataques graves de esporão do centeio, observados há alguns
anos, e a multiplicação da fusariose são, em parte, devidos à utiliza-
ção de herbicidas que destruiriam apenas parcialmente as gramíneas”
(LEMAIRE e RAPILLY, 1970).
Registremos o fato fazendo, porém, as mais expressas reservas quanto
ao processo da sensibilização do cereal que é sugerido pelos autores. Eles
escrevem: “Além disto, os produtos à base de hormônios, que têm uma influ-
ência sobre a fisiologia dos cereais, podem torná-los mais receptivos a certas
moléstias transmitidas no momento da floração. Parece que certos parasitas
são favorecidos diretamente por diversos herbicidas e que, no futuro, será
importante escolher a substância ativa, objetivando destruir as ervas invaso-
ras, mas também levando em conta os parasitas presentes no solo”.
Assinalemos em seguida que, no caso do cereal encontrar-se con-
dicionado de tal forma a ser fisiologicamente resistente (segundo

158
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

nossa teoria, porque se encontrará num estado de proteossíntese


dominante), ele estará, ao mesmo tempo, imunizado, seja qual for o
nível de inoculantes, no biotipo. Veremos adiante, a propósito de
Pyricularia oryzae (do arroz), e da influência dos oligoelementos na
fertilização, que o nível do inoculante seria negligenciável se o esta-
do fisiológico – em outras palavras, o terreno, no sentido biológico do
termo – fosse o fator determinante da relação planta-parasita.
Um fato parece confirmar este ponto de vista: trata-se da época em
que se produzem as contaminações. Segundo os autores, este perío-
do de hipersensibilidade corresponderia ao momento da floração, o
que se enquadra perfeitamente em nossa teoria da trofobiose e nas
concepções de DUFRÉNOY. Com efeito, é no momento da formação
da inflorescência que todas as folhas perdem seu poder de síntese, e mes-
mo realizam uma determinada decomposição de suas próprias proteínas.
Isto ocorre para alimentar os órgãos reprodutores com substâncias
solúveis.
Nestas condições, parece normal – se é possível se dizer assim –
que este estado de proteólise dominante favorece o ataque de diver-
sos fungos patógenos e, mesmo, como veremos adiante, provoca o
desencadeamento de doenças viróticas. A situação de proteólise pode
estar eventualmente agravada pela ação proteolítica, ou, simplesmen-
te, proteoinibidora, agravada por um ou por outro agrotóxico, espe-
cialmente um herbicida, que pode agir direta ou indiretamente através
de repercussões sobre a nutrição da planta.
D’AGUILAR et alii. (1977) observam que: “Nos últimos anos
viu-se o surgimento e a multiplicação inquietante de numerosas e
graves doenças fúngicas e bacterianas de origem telúrica. O fato é
observado por todos os laboratórios que estudam as traqueomicoses,
traqueobacterioses, e agentes da podridão do colmo e das raízes. Os
agentes de enfraquecimento bacteriano e de origem viral também são
igualmente numerosos e preocupantes”. Segundo RIDE (INRA,
Angers), eles representam fenômenos complexos cujo estudo

159
F R A N C I S C H A B O U S S O U

etiológico necessita do concurso de diversas disciplinas e, na maio-


ria dos casos, de uma experimentação bastante longa.
Todavia, acreditamos que esses trabalhos só apresentarão resul-
tados, caso seja procurada a elucidação das relações que unem a planta
e o parasita, caso se disponha de uma hipótese de trabalho a este
respeito. Para as doenças viróticas, bem como para as outras afecções,
propomos nossa teoria da trofobiose, segundo a qual a sensibilidade
da planta encontra-se em estreita relação com o nível das substânci-
as solúveis nos tecidos. Este estado de proteólise encontra-se, simultane-
amente, sob a dependência da nutrição da planta e das repercussões dos
agrotóxicos (além de outros fatores, principalmente ambientais).
D’AGUILAR et alii. (op. cit.) observam igualmente que: “A aduba-
ção ou o emprego de fungicidas específicos podem causar desequilíbrios
biológicos: cada vez mais se tem consciência deste fenômeno em
fitopatologia, seja relacionado com as modificações do substrato (turfa,
húmus), adubações mais ricas ou práticas que forçam o crescimento. Estes
diferentes fatores agem sobre a fisiologia do hospedeiro, tornando-o mais sen-
sível”. E mais adiante: “Para LEMAIRE e JOUAN (INRA, Reunes), o
agravamento progressivo dos danos de Phytophthora sp. No colo dos
tomates em estufas pode estar relacionado com a utilização excessiva de
Benzimidazol, em tratamento da folhagem e do solo”.
Em resumo, e como observava POLJAKOV (op. cit.), após suas
pesquisas sobre as repercussões do tratamento das sementes com
diversos fungicidas: “Um dos principais fatores determinante da resis-
tência aos fungos é o estado fisiológico da planta-hospedeira”. Isto impli-
caria, portanto, em que o eventual efeito antimicótico obtido não seria
proveniente de uma ação fúngica de superfície, mas sim de uma ação
antimicótica através da modificação benéfica do metabolismo, sob a
ação do produto.
POLAKOV (op. cit.) precisava: “o ácido ditiocarbâmico, usado
durante quatro anos no controle de Phytophthora na batata, provoca-
va um aumento de outras moléstias, em particular de viroses”.

160
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Podemos nos perguntar se o emprego generalizado de herbicidas


e ditiocarbamatos, que exercem um efeito inibidor da proteossíntese,
não estaria englobado num processo de sensibilização dos cereais em
relação às doenças viróticas? Assim, poderiam se explicar os danos do
nanismo amarelo da cevada, cujo desenvolvimento acelerou-se nestes
últimos anos sem que se tenha, até agora, uma explicação realmente
satisfatória para este fato.
É este o duplo problema: responsabilidade dos agrotóxicos de
toda a ordem no desencadeamento das doenças viróticas, de um lado,
e a ordem de aparição na planta das diversas afecções e, de outro, o
que nos propomos abordar agora.

6. AGROTÓXICOS E DESENCADEAMENTO DAS


DOENÇAS VIRÓTICAS - SUCESSÃO DAS DOENÇAS NAS
PLANTAS

A) Agrotóxicos e desenvolvimento das viroses nas hortaliças


MARROU (1969) observa: “Desde que os horticultores familiari-
zaram-se com os principais parasitas de suas culturas, e desde que dispõem
de fungicidas eficazes, as doenças viróticas passaram a ter uma importância
predominante. Essas doenças são temidas, porque sua origem parece
misteriosa e seu desenvolvimento insidioso”.
Nesta proposição, registramos um julgamento: o fato de que os pro-
dutores se familiarizaram com os principais parasitas de suas culturas.
Em outras palavras, aprenderam com a ajuda visível desse autor a
reconhecê-las. Isto se aplica particularmente às doenças viróticas.
Em segundo lugar, MARROU faz uma aproximação entre dois
fatos:
• primeiro: utilização de novos fungicidas, qualificados de “efica-
zes” – o que “se discutirá mais adiante – e que têm por caracte-
rística serem produtos de síntese, como os ditiocarbamatos (Zineb,
Maneb e Mezineb), cuja responsabilidade no desenvolvi-

161
F R A N C I S C H A B O U S S O U

mento de certas doenças fúngicas como Oidium e Botrytis já


demonstramos;
• segundo: a predominância de doenças viróticas, ou seja, uma
categoria de moléstias que na batata, segundo POLJAKOV
(op. cit.), estaria recrudescendo, devido, precisamente, à
utilização dos ditiocarbamatos...
Provavelmente não é nesta relação de causa-efeito, via metabolis-
mo da planta, modificado pelo agrotóxico, que pensa MARROU. Ele
parece deixar subentendido que as doenças viróticas somente teriam
se desenvolvido a partir do momento em que os agricultores dispu-
seram de fungicidas considerados a priori eficazes, isto é, suscetíveis
de eliminar as doenças fúngicas e bacterianas.
Em outras palavras, a doença virótica ocuparia doravante o “ter-
reno” até então ocupado pelo fungo parasita ou pela bactéria. Este
desenvolvimento da doença virótica seria, de certa forma, o resulta-
do da destruição de um “concorrente” eliminado pelo fungicida re-
putado “eficaz”.
Todavia, o mínimo que se pode dizer é que os fatos não parecem
estar em acordo com esta concepção. Devemos observar que,
freqüentemente, se encontram, simultaneamente, presentes na mes-
ma planta doença fúngica e doença virótica. RUSSEL (1972) assinala
que, na beterraba açucareira, a Alternaria – que ele qualifica de “do-
ença fúngica associada” – encontra-se sobre as folhas das plantas
infectadas pelo vírus.
RUSSEL (op. cit.) assinala, ademais, que as folhas velhas da be-
terraba açucareira infectadas pelo vírus BMYV (Beet Mild Yellowing
Virus) – o mais comum na Grã-Bretanha e no norte da Europa – são
predispostas aos ataques de fungos parasitas, ditos “de fraqueza”,
entre os quais o Alternaria parece o mais importante.
O vírus absolutamente não faria concorrência ao fungo patógeno
mas, talvez, até favoreceria seu desenvolvimento. Admite-se, em
patologia humana, que todo o ataque micótico ou bacteriano é sem-

162
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

pre precedido de um ataque viral, ele próprio condicionado pela


capacidade da célula em aceitar ou recusar a ordem do vírus de
modificação de seu metabolismo.
Assim, chegamos à concepção de uma sucessão das moléstias, cuja
seqüência seria basicamente iniciada pelas doenças viróticas. Teremos
sua confirmação pelo estudo de fenômenos análogos nos insetos re-
alizado por VAGO.
Essa concepção do mecanismo do desenvolvimento das doenças
viróticas estaria em perfeita oposição com àquela relativa à elimina-
ção das doenças fúngicas, graças à suposta “eficácia” dos novos
fungicidas sintéticos. Temos boas razões para manter sérias reservas
quanto a esta “eficácia”.
Como primeiro exemplo, citamos MARROU, em relação a hor-
taliças: no controle químico de Phytophthora cactorum do moranguei-
ro, os doze produtos testados (sulfato de cobre – Calda bordalesa –,
Diclofuanid, Nabam, Dexon, Difolatam, Captan, Demosan, Mancozeb,
Vitavax, Tiabendazole, Udonkor e Daconil), segundo o experimentador,
nenhum merece ser considerado eficaz (NOURRISSEAU, 1970).
Da mesma forma, em relação às doenças dos cereais, das quais
falamos antes. Um especialista, PARMENTIER (1979) contesta
totalmente a eficácia das pulverizações fúngicas qualificadas de “es-
pecíficas” para controlar tanto os parasitas do pé, como a escaldadura
da cevada (Rhyncosporiose, no original. N. do R.) e, também as
ferrugens.
Quanto a SOENEN (1975), seguro de sua experiência de lon-
gos anos de testes com agrotóxicos em culturas frutíferas, sublinha que
“os últimos antifúngicos desenvolvidos não são necessariamente
fungicidas ou fungistáticos, mas intervêm de um modo ou de outro
na relação bioquímica entre o patógeno e seu hospedeiro”.
Diz, também, que “em culturas frutíferas, o valor de um fungicida
se estabelece mais por seus efeitos secundários que por sua atividade em
relação de um determinado fungo”.

163
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Já recordamos este caso a propósito do enxofre, o qual retomare-


mos adiante.
Caberia perguntar se, por um fenômeno de mascaramento ou de
confusão de sintomas, esse desenvolvimento das doenças viróticas não
seria ilusório, caso não fosse confirmado pelo pesquisador especialista
que o relata. Sabe-se que nem sempre é possível atribuir às infecções
virais sintomas realmente característicos. São poucos os sintomas que
efetivamente podem ser associados a viroses. Há diversas convergên-
cias de sintomas entre determinados fenômenos de carência e as
infecções virais. Isto se explicaria porque toda a nutrição deficiente do
vegetal, como por exemplo a relacionada a carências, pode ser a ori-
gem do desencadeamento da doença.
Todavia, um conjunto de observações em cereais, árvores frutíferas
e hortaliças mostra que parecem existir relações entre o desenvolvi-
mento das doenças viróticas e a utilização, freqüentemente repetida
sobre uma mesma cultura, dos novos fungicidas sintéticos. Somos
induzidos a perguntar se um processo análogo ao que estudamos,
envolvendo a sensibilização, pelos ditiocarbamatos, da videira e das
árvores frutíferas a Oidium e Botrytis, não estaria agindo no estímulo
do desenvolvimento das doenças viróticas? Sobretudo, se estas fossem
as primeiras a se manifestarem na seqüência das diversas afecções.
Dentro desta hipótese, seria por um distúrbio do metabolismo
celular que o agrotóxico teria provocado a proliferação do ou dos vírus
em primeiro lugar. Ora, estes só se multiplicam às expensas das for-
mas simples do nitrogênio (aminoácidos). Assim, novamente somos
conduzidos a encarar todas as proliferações de vírus como capazes de
resultar da incidência de qualquer fator que favoreça na planta um
estado fisiológico caracterizado por proteólise dominante, incluindo
as repercussões dos agrotóxicos.
De novo devemos precisar que a ação nefasta deste ou daquele
agrotóxico pode perfeitamente se encontrar superposta a uma má
nutrição da planta. Esta, por sua vez, pode resultar de uma fertiliza-

164
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

ção desequilibrada (excesso, por exemplo, de adubos nitrogenados,


ou carências minerais). As doenças viróticas poderiam, portanto, ser
desencadeadas por uma conjunção – provavelmente mais freqüente
do que se poderia pensar a priori – de práticas culturais desfavoráveis
à proteossíntese.
Assim, estaria explicada a noção de “latência” das doenças nas plan-
tas. Nas árvores frutíferas, a existência de “vírus latente” conduziria,
segundo MORVAN (1969), “ao absurdo da noção de plantas sem vírus”.
Esta afirmação acentua a importância das condições ambientais,
incluindo-se os tratamentos com agrotóxicos. Por um condiciona-
mento desfavorável à proteossíntese, o metabolismo da planta seria
capaz de favorecer o desenvolvimento do vírus e, até, de criá-lo. A este
respeito, as constatações de LÉPINE na virologia humana e os traba-
lhos de VAGO, envolvendo as doenças dos insetos, que trataremos
adiante, nos parecem fundamentais.
Eis o que escreve o especialista em doenças humanas: “Com os
progressos da terapêutica antinfecciosa e a redução das moléstias
bacterianas, vemos aumentar o número de doenças causadas pelos vírus,
que tendem cada vez mais a ocupar o primeiro plano da patologia infec-
ciosa” (Pierre LÉPINE, 1973).
Ora, esta observação, posta em paralelo com as constatações de
MARROU, envolvendo o desenvolvimento das doenças viróticas nas
hortaliças como conseqüentes do emprego de certos agrotóxicos, nos
parece impressionante. Numerosas questões se colocam, como:
• em que nível a regressão das doenças bacterianas pode estar
relacionada com o aumento das doenças viróticas?
• e, em que este aumento estaria ligado aos “progressos da
terapêutica”? Dever-se-ia considerar, também para as plan-
tas, a utilização de novos medicamentos e, especialmente,
dos antibióticos? Estes são suscetíveis de agir, não apenas em
relação ao agente patogênico, mas, também, indiretamente,
por intermédio do próprio paciente?

165
F R A N C I S C H A B O U S S O U

No que diz respeito às questões relativas à patologia humana são,


bem entendido, os médicos que devem responder e, antes de tudo,
refletir sobre isto. Seria importante saber em que medida se poderia
extrapolar da patologia humana para a patologia vegetal ou inversa-
mente. Isto, bem como o estudo do desenvolvimento das doenças
viróticas nos insetos, poderia nos trazer alguma luz no que diz respeito
aos problemas da mesma ordem, que se colocam nos vegetais. Ana-
lisaremos, agora, os notáveis trabalhos de Constantin VAGO sobre:
“L’enchainement des maladies chez les Insectes” (1956).*

B) Os trabalhos de Constantin VAGO sobre a sucessão das doenças


nos insetos
1. Influência da natureza da alimentação sobre o desenvolvimento
das doenças
No lepidóptero Vanessa urticae L., VAGO demonstrou que dois
modos de alimentação favorecem o desenvolvimento de poliedrose:*
• a alimentação contínua com folhas murchas, contendo pouca
clorofila e em vias de amarelecimento;
• a alimentação com urtigas, mas com diferentes repercussões
sobre a poliedrose, segundo a natureza do solo de onde provi-
nham as plantas:
– alimentadas com urtigas provenientes de um solo argiloso, as
larvas de primeira idade são atacadas pela poliedrose numa propor-
ção de 15 a 19%;
– aquelas que consumiram urtigas, desenvolvidas numa terra
arável, de aluvião, apresentam apenas 4%.

2. Bicho-da-seda, Bombyx mori L.


Alimentadas desde seu nascimento com folhas muito maduras,
os “bichos” apresentavam, desde a primeira muda, uma poliedrose

*
“A sucessão das moléstias nos insetos”. (N. da T.)

166
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elevada, com a afecção persistindo durante toda a duração da fase


larval.
Estas experiências acentuam a importância da alimentação e da
nutrição sobre a resistência do organismo aos agentes patogênicos.
Como não colocar estes resultados em paralelo com as repercussões
que envolvem a natureza da fertilização e a resistência da planta a
pragas e doenças?
As pesquisas de VAGO envolvendo as incidências da ingestão de
substâncias tóxicas talvez sejam as mais importantes para nós, pelas
conclusões a que podem conduzir.

3. Influência da ingestão de produtos químicos em pequenas doses


Em 1949-1951, a Estação de Sericicultura de Alès (INRA)
(transformada em Estação de Pesquisa de Patologia Comparada INRA
– CNRS – EPHE) teve que se preocupar com uma epidemia anor-
mal de uma doença* que atingia diversas regiões. Os levantamentos
realizados chegaram a resultados que se podem qualificar de funda-
mentais.
Esta doença atacava de uma forma claramente mais intensa nos
departamentos de Gard, Ardèch e Lozère. Ora, esta região era limi-
tada ao norte, por uma determinada fábrica de produtos químicos.
A gravidade da moléstia era simultaneamente função da proximida-
de desta fábrica e da direção dos ventos dominantes.
Os sintomas da doença em questão eram semelhantes aos da
grasserie, exceto pela turgescência. Os tecidos adiposos e sangüíneos
apresentavam lesões avançadas, e isto ocorria mesmo quando as lagar-
tas aparentemente não possuíam nenhum sintoma da doença.
As lagartas recolhidas nesta área confirmaram o efeito favorável da
nutrição sobre os ataques da doença: 2% de poliedrose na alimenta-

*
“Grasserie”, no original. (N. da T.) Grasserie é uma doença do bicho-da-seda caracterida
por um inchaço (gorduroso) anormal dos anéis do corpo do inseto. (N. do R.)

167
F R A N C I S C H A B O U S S O U

ção com as folhas recolhidas fora da zona contaminada; 20% – ou seja,


10 vezes mais – com as folhas colhidas na zona contaminada.
Outro ponto: a alimentação apenas com folhas provenientes da
zona contaminada apresentava:
– 13% de poliedrose com folhas previamente lavadas;
– 23% de poliedrose com folhas não lavadas.
Este resultado parece indicar (como faziam prever os resultados
da alimentação com folhas murchas, em Vanessa) que as repercussões
dos resíduos de venenos, apesar de importantes, não são as únicas em
questão. O veneno pode também ter agido após penetração nos te-
cidos, por modificação da bioquímica da folha.
VAGO não deixou de ver uma relação com fluoroses que ataca-
vam o gado na mesma região, e de que havia um caso semelhante na
Itália. Esta doença era, com efeito, provocada pela ingestão do fluoreto de
sódio (NaF), que era o constituinte essencial das emanações da fábrica em
questão.
Acrescentaremos que os fatores ecológicos igualmente influem:
um abaixamento da temperatura acarreta um agravamento espetacu-
lar da doença.
Contudo, alguns outros resultados de VAGO nos parecem ain-
da mais importantes, no sentido de que eles podem modificar total-
mente nossa maneira de considerar o desencadeamento das doenças
viróticas. Trata-se de provocar viroses sem haver infecções prévias.

4. Obtenção de viroses, no bicho-da-seda, sem infestação prévia


Graças a múltiplas precauções, VAGO conseguiu excluir todo o
aporte externo de vírus. Os experimentos envolveram as repercussões
de uma determinada alimentação do bicho-da-seda com uma plan-
ta não-habitual, Maclura aurantiaca. Em comparação com a alimen-
tação “normal”, às expensas de Morus alba, registra-se:
– um menor volume de ingestão de alimento;
– uma mortalidade precoce;

168
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– o desencadeamento de uma virose: a partir da terceira idade *


a poliedrose intensifica-se no lote “Maclura”. No curso da quarta e
quinta idades ela provoca na ninfose, a eliminação da quase totalidade
do lote. Nas testemunhas, a mortalidade é inferior a 20%.
Talvez os experimentos com o fluoreto de sódio sejam os mais sig-
nificativos. Para rastrear os efeitos “secundários” do veneno era indis-
pensável obter uma ação subletal. Para isto, as folhas de amoreira
foram mergulhadas numa solução de NaF puro, a 0,01% Os resul-
tados foram dos mais comprobatórios:
– alimentação com folhas contaminadas: 85%de viroses;
– alimentação com folhas sãs: 8% de viroses.
A partir do décimo-terceiro dia a virose torna-se importante e
subitamente os casos são mais numerosos: a curva da doença assina-
la rapidamente a perda quase total do lote.
Baseadas em suas experiências, cujo rigor é inatacável, as conclu-
sões de VAGO nos parecem de tal importância que se torna indispen-
sável transcrevê-las quase integralmente. Ele inicia afirmando: “Parece
possível desencadear uma virose aguda, não apenas sem infecção experi-
mental prévia, mas igualmente na ausência controlada do aporte de
vírus”.
VAGO acrescenta: “Os meios que permitem a obtenção deste efeito
são de natureza variada e os fatores responsáveis podem estar ligados à
alimentação, às intoxicações por certas substâncias químicas, bem como
às condições climaticas-fisiológicas”.
Em contrapartida, os fatores de não-aparição de virose correspon-
dem a um estado fisiológico ótimo, isento de qualquer distúrbio de
ordem patológica ou parapatológica. VAGO observa: “Estas duas con-
siderações traduzem os fatores de desencadeamento de virose como sendo
problemas fisiológicos que, apesar da natureza variada dos efeitos externos,
podem convergir para um mecanismo preciso na escala celular”.
Para VAGO: “O desencadeamento das viroses por fatores não infec-
ciosos nos aparece sob forma de um complexo, com uma parte primária,

169
F R A N C I S C H A B O U S S O U

englobando processos patológicos diversos e, secundariamente, representada


pela virose”.
Ora, como não comparar o que ocorre nos insetos com o que se
passa nos vegetais onde, com freqüência, encontram-se associadas
afecções fúngicas e doenças viróticas?
Como, também, não ver confirmada nossa hipótese do desencadea-
mento das doenças viróticas pelas repercussões dos agrotóxicos sobre
o metabolismo celular? À luz dos resultados de VAGO, este processo
parece cada vez mais provável. Aliás, o próprio VAGO não deixa de
fazer alusão aos ‘vírus em dormência” dos vegetais, designados mais
freqüentemente sob o termo de “vírus latentes”, dos quais fizemos referên-
cia antes. É este fenômeno que nos propomos estudar imediatamente..

C) Latência e desencadeamento das doenças nas plantas


1. Latência dos fungos parasitas nas árvores frutíferas
GROSCLAUDE (1966) observava que, devido à autoridade das
teorias pasteurianas relativas à assepsia dos seres vivos, temos ainda
dificuldades em admitir que um vegetal são possa, em seu estado
normal, abrigar impunemente fungos ou bactérias patógenas, man-
tendo-se esses parasitas em “estado latente”. E, contudo, estes exem-
plos são freqüentes.
GROSCLAUDE (op. cit.) define uma “infecção latente” como
uma infecção “que não produz temporariamente nenhum sintoma
visível, mas. que é capaz de se exteriorizar em determinadas circuns-
tâncias”.
Todo o problema consiste em saber quais podem ser os fatores
suscetíveis de fazer mudar este estado. Os fitopatologistas ficam sem-
pre embaraçados quando se trata de definir patogenia. Todavia, reco-
nhecem que não existe limite bem nítido entre saprófitas e parasitas.
Não vamos nos ater na distinção pouco sutil entre a “contaminação
latente” (geralmente na superfície do hospedeiro) e a “infecção
quiescente” (exteriormente visível, mas que não evolui). O importan-

170
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

te, acreditamos, é saber se o agente patogênico tem ou não potenci-


al para evoluir às expensas de seu hospedeiro.
GROSCLAUDE (op. cit.) dá diversos exemplos de fungos para-
sitas latentes”: Stereum purpureum, agente do “chumbo” e que, após
inoculação, pode aparecer com um ou dois anos de atraso; Cytospora
das arvores frutíferas que, para uns seriam saprófitas e, para outros,
patogênicos; enfim, as podridões, “bons exemplos de doenças com
períodos de incubação longos e mal definidos”. Na cerejeira “Saint-
Lucie”, GROSCLAUDE (op. cit.) pôde constatar, após inoculação,
uma latência de dois anos em cinco arvores, enquanto as vinte e duas
árvores restantes permaneciam aparentemente sãs, apesar da presença
de Armilariella nas raízes.
Entre os fungos “latentes”, GROSCLAUDE assinala que se pode
incluir as “podridões de armazenagem”, como Sclerotinia fructicola,
agente da moniliose na Austrália, e Gloesporium, Botrytis, Trichoseptoria,
Cylindrocarpon, etc., todas doenças recrudescentes após o emprego de
novos agrotóxicos sintéticos.*
Em definitivo, podemos concluir com GROSCLAUDE, que “a
assepsia numa árvore, se ela pode existir, é um estado totalmente
excepcional, exceto, talvez, durante as primeiras semanas de sua vida”.
Sua segunda conclusão é a seguinte: “O poder patogênico só pode
se manifestar se o agente encontra em seu hospedeiro condições conveni-
entes de desenvolvimento”..
Se podemos referendar semelhante formulação, divergimos, en-
tretanto, no que diz respeito às únicas condições que limitariam este
desenvolvimento. GROSCLAUDE vê apenas duas:
– o antagonismo entre os próprios microrganismos;
– a reação do hospedeiro, traduzindo-se por barreiras físicas ou
químicas.

*
Aliás, segundo BONDOUX (1963), é no pomar e não no depósito de frutas que se
deve iniciar o controle das doenças de armazenagem dos frutos. Acrescentaremos
que é o condicionamento adequado da árvore que deve preservá-la destes ataques.

171
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Em resumo, de acordo com as concepções clássicas, não haveria


imunidade ou resistência, se não por um antagonismo, seja por con-
corrência ou por barreira física. Acreditamos ter demonstrado e tradu-
zimos, em nossa teoria da trofobiose, que nas relações entre hospedeiro
e parasita, antes de tudo, influem os fatores nutricionais suscetíveis de
satisfazerem este último. Daí a importância do “condicionamento” da
planta pela natureza do solo e pela fertilização “corretiva” que se pode
fazer.
Consideremos, por exemplo, o caso da “moléstia do chumbo” da
videira. BRANAS (1974) assinala que é a carência em boro que pro-
voca esta moléstia. A prova? Este definhamento se cura por transplante,
ou seja, por uma alimentação em um outro solo e, também, pelo
aporte de boro na folhagem ou solo.
Aliás, esta carência em boro foi identificada em Portugal, com a
moléstia da “maromba” no vale do Douro. (Voltaremos, mais adiante
a este importante fenômeno que reside na convergência entre carên-
cias e doenças.)
Outro exemplo é o de Armillariella mellea, agente de uma “podri-
dão”. Os trabalhos de GARD mostraram, em ameixeiras na região de
Ente, a imunidade a este fungo patógeno nos solos que tinham, pelo
menos 30% de CaCO3. Segundo GUYOT (1931-1935), o mesmo
ocorre com nogueiras: Armillariella sp. não se desenvolve em solos que
contenham de 20 a 30% o de carbonato de cálcio. Através de cultu-
ras em laboratório, GUYOT demonstrou a influência inibidora dos sais
de cálcio e magnésio, assim como a ação estimuladora do potássio
(carbonato, sulfato, nitrato) em relação a Armillariella sp.
Mais adiante aprofundaremos a questão das relações entre ferti-
lização e resistência da planta. Os resultados acima coincidem per-
feitamente com o fato de que numerosas moléstias parecem ter por
origem uma carência do solo em cálcio, ou, mais exatamente, uma
relação catiônica Ca/K + Mg muito baixa. Isto resultaria numa redu-
ção da proteossíntese.

172
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Por outro lado, os oligoelementos intervêm de maneira importante na


fisiologia e, portanto, na resistência da planta. Assim, o iodo,pincelado
nas raízes, mostrou-se um excelente remédio contra Armillariella sp.
Ora, o iodo é um oligoelemento que parece essencial ao metabolismo – e,
portanto, à saúde da planta. ROUBINE e ARTSICHOSKAIA (1960)
observam que: “A nutrição mineral parece ser o fator decisivo
determinante da resistência que as plantas oferecem à infecção: o ex-
cesso de nitrogênio a deprime, o potássio e o magnésio melhoram-na,
os oligoelementos intervêm energicamente, especialmente zinco, lítio e iodo”.
Da mesma forma, SHIGEYASU (1962), no decorrer de seus ex-
perimentos de controle da helmintosporiose do arroz, por fertilização
com oligoelementos, nota que: “A sensibilidade à helmintosporiose dimi-
nui pela aplicação de iodo, zinco e magnésio. Ainda mais, esses tratamen-
tos parecem favorecer o desenvolvimento vegetativo”.
SHIGEYASU (op. cit.), continua, observando que “o efeito favo-
rável dos tratamentos com oligoelementos sobre o desenvolvimento
vegetativo do arroz não é acrescentado a seus efeitos positivos sobre a re-
sistência à moléstia: ele é, na realidade, a origem”.
Interpretamos isto da seguinte maneira: a ação positiva dos
oligoelementos sobre o desenvolvimento vegetativo, isto é, sobre a
proteossíntese, acarreta a resistência da planta à doença. Isto ocorre pela
regressão concomitante das substâncias solúveis necessárias ao desen-
volvimento dos parasitas.
Definitivamente, confirma-se que a “latência” deste ou daquele
patógeno resulta de uma insuficiência nos elementos nutritivos que lhes
são oferecidos. Inversamente, a interrupção da “latência” poderá provir
de uma má nutrição do vegetal, seja devido a uma carência (tanto de
macro como de oligoelementos), ou a uma inibição da proteossíntese,
por um agrotóxico qualquer.
Todavia, outros fatores podem agir sobre a fisiologia da planta e,
portanto, sobre sua resistência. Trata-se da influência do porta-enxer-
to sobre a fisiologia do enxerto e vice-versa.

173
F R A N C I S C H A B O U S S O U

2. Latência das doenças viróticas: influência do porta-enxerto


Segundo VAGO: “A análise do complexo – problemas meta-
bólicos com aparição tardia de viroses agudas – trouxe elementos
particularmente bem assimilados em patologia comparada. Com
efeito, ela simboliza, neste momento, junto com a lisogenia das
bactérias, os ‘vírus em dormência’ dos vegetais e o vírus da
drosófila, a questão do problema da infecção dos vírus sem infec-
ção prévia”.
Não se poderia negar que os resultados de VAGO, analisados
anteriormente, são extremamente inquietantes em relação às questões
que envolvem as repercussões dos diversos agrotóxicos sobre a
suscetibilidade das plantas às doenças viróticas e bacterianas.
Se o desencadeamento de uma doença virótica pode ser resultante
de má nutrição ou ingestão de um veneno, como o fluoreto de sódio,
por que não poderia ocorrer o mesmo nas plantas, onde os tratamen-
tos com agrotóxicos perturbam o metabolismo? Estes, principalmen-
te em intervenções repetidas, inibem o processo da proteossíntese,
estabelecendo, conseqüentemente, um estado eminentemente favo-
rável ao desencadeamento das diversas doenças.
Assim, poder-se-ia explicar como se originou esta concepção, já
mencionada antes, do “vazio da noção de mudas sem vírus” nas árvo-
res frutíferas. MORVAN (1970) escreve: “Os vírus latentes propri-
amente ditos correspondem a uma concepção diferente. No caso da
macieira, por exemplo, são os vírus que não provocam nenhum sin-
toma sobre o conjunto das variedades comestíveis. Tal evidência foi,
no início, fruto do acaso. Espécies, como as macieiras ornamentais,
com frutos pequenos, manifestaram anomalias inesperadas quando
se colocou, sobre elas, enxertos de árvores normais”.
Esta observação mostra toda a importância do estado fisiológico das
árvores, pelo menos sobre as manifestações dos sintomas das doenças
viróticas e, até, sobre a própria causa do seu desencadeamento. Estas
interferências recíprocas entre porta-enxerto e enxerto repercutem sobre

174
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

a nutrição deste último e, portanto, sobre sua suscetibilidade em re-


lação às diversas doenças, inclusive as viróticas.
Assim, não é por acaso que a doença “Sharka” manifesta-se, par-
ticularmente, nos damasqueiros enxertados sobre um determinado
porta-enxerto, o Brompton. E que, inversamente, SUTIC (1975),
obtém resistência em relação à mesma doença, por enxertia das plan-
tas sobre porta-enxertos especiais. Realmente a resistência das árvo-
res assim enxertadas parece estar ligada a um nível elevado de
proteossíntese provocado pela natureza da nutrição.
Em relação à suscetibilidade a “Sharka”, seria do maior interesse
comparar o estado bioquímico dos enxertos suscetíveis sobre
Brompton ao dos enxertos resistentes obtidos por SUTIC. Formula-
mos a hipótese de que, nestes últimos, a proteossíntese mostra-se mais
intensa, o que deveria se traduzir por um nível mais baixo das subs-
tâncias solúveis como aminoácidos e glicídios redutores.
Pesquisas análogas também deveriam ser empreendidas para
explicar a razão da resistência da ameixeira a “Sharka”, quando enxer-
tada sobre Saint-Julien. DO VALE (1972) mostrou, em relação aos
porta-enxertos dos limoeiros, que as combinações que davam os
melhores resultados apresentavam baixas quantidades de açúcares
solúveis nas folhas colhidas na primavera. Ocorre o inverso com os
porta-enxertos que dão resultados medíocres. Fenômenos análogos
foram registrados na videira: o porta-enxerto Riparia X Rupestris 3309
provoca, nas folhas das cepas européias enxertadas, um acúmulo de
aminoácidos, seguido da redução de sua transformação em proteínas.
Ou seja, um fenômeno que, segundo nossa teoria da trofobiose, sen-
sibiliza o enxerto às diversas doenças.
Voltaremos a estudar a importância da enxertia em relação à
resistência da videira às doenças e pragas. A natureza fisiológica do
porta-enxerto não explica tudo o que se refere ao desenvolvimento
atual das doenças viróticas: neste caso, ainda, parece que os
agrotóxicos carregam uma pesada responsabilidade.

175
F R A N C I S C H A B O U S S O U

3. Agrotóxicos e doenças viróticas


A análise da proposição de MARROU, referente ao desenvolvimen-
to das doenças viróticas nas hortaliças, nos levou a suspeitar dos novos
fungicidas sintéticos como causa deste fenômeno, da mesma forma
como foram responsabilizados pela sensibilização de diversas plantas
em relação a Oidium e Botrytis. Contudo, paradoxalmente, se procurou
controlar as doenças viróticas com agrotóxicos. Mas isto com diversas
causas, Os resultados obtidos foram os mais diversos, em sua maioria
decepcionantes, por razões agora mais fáceis de serem compreendidas.
A partir de determinados resultados sobre fumo, com o 2-4 D em
relação aos vírus X e Y, LIMASSET et alii. (1948), conduziram ex-
perimentos sistemáticos com este mesmo fitormônio sintético. Os
resultados mostram que o hormônio absolutamente não impediu a
contaminação nem destruiu o vírus, mas “simplesmente” manifestou
uma ação inibidora muito forte em relação à sua multiplicação.
Os experimentos in vítro mostraram que o 2-4 D era desprovido
de qualquer ação própria inativante. Sobre a planta, esta ação era
apenas temporária, e, com as doses utilizadas, o fumo sofria deforma-
ções características.
Em resumo, tratava-se de repercussões indiretas, induzidas pelo
2-4 D sobre a fisiologia do fumo. Estas eram perfeitamente capazes
de modificar a resistência à doença virótica e aos fungos parasitas.
Assim, foi na redução de glicídios nos tecidos que MOSTAFA e
GAYED (1956) viram a razão da eficácia do 2-4 D em relação a
Botrytis, na fava.
Por outro lado, CORS et alii. (1966), apoiando-se em que o
aumento da utilização dos fungicidas sistêmicos levantava a questão
de sua interferência sobre a multiplicação dos vírus, realizaram diver-
sos experimentos, principalmente em tratamento de sementes. Tra-
tava-se do vírus do mosaico da cevada, BMV. Os produtos Plantvax
e Benomyl favorecem o aumento da concentração de vírus nas folhas, na
maioria das condições.

176
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Todavia, praticamente não resultam destes experimentos conclu-


sões bem definidas envolvendo as relações entre crescimento da plan-
ta, concentração de vírus nas folhas e aspecto das plantas artificialmente
infectadas por BMV. Exceto, talvez, pela existência de uma certa inter-
ferência entre a ação dos fungicidas e a infecção pelo vírus.
A mesma ausência de conclusão geral resulta da revisão bibliográ-
fica de SMITH (1973) no que diz respeito às repercussões das subs-
tâncias de crescimento em relação à resistência das plantas às pragas
ou doenças.
Todavia, as concepções de VAN EMDEN (1964) trazem alguma
luz sobre estes fenômenos, confirmando plenamente nossa posição.
Experimentando Chlormequat contra pulgão da couve, Brevicoryne
brassicae, VAN EMDEN sugere que a aplicação deste produto acarre-
tou reduções na reprodução dos afídeos, pela regressão do nível de
aminoácidos e nitrogênio total nos tecidos, em seguida da aplicação de
Chlormequat.
Com este produto, e dentro das condições em que foi utilizado, VAN
EMDEN obteve resultados inversos aos de MICHEL (op. cit.) com
Mevinphos sobre Myzus persicae, e aos de MAXWELL e HARWOOD
(op. cit.) com 2-4 D, que, ao contrário, aumentaram a reprodução de
Macrosiphum pisum, em fava.
Pode-se mencionar, entretanto, que estes diferentes resultados
integram-se perfeitamente em nossa concepção da trofobiose, segun-
do a qual, não temos pena em repetir:
• a sensibilização da planta a seus diferentes parasitas está
correlacionada com uma inibição da proteossíntese, ou seja,
do que se poderia chamar mais comumente, mas com exati-
dão, de um certo envenenamento da planta;
• quanto ao estímulo da resistência, ao contrário, ela vai de
mãos dadas com a da proteossíntese e com a redução
concomitante do nível das substâncias solúveis.
Os herbicidas utilizados em cereais, cuja seletividade os técnicos

177
F R A N C I S C H A B O U S S O U

observam jamais ser total – também inibem a proteossíntese nestas


plantas. Por suas incidências, simultaneamente diretas sobre a plan-
ta e indiretas sobre a vida do solo, favorecem o desenvolvimento das
doenças viróticas, como suspeitam, agora, observadores cada vez mais
numerosos.
As árvores frutíferas sofrem repercussões “acumuladas” de
fungicidas, inseticidas, acaricidas e, agora, de herbicidas. Não seria de
surpreender que posteriormente sofressem uma desregulagem celular,
caracterizada por um estado predominante de proteólise, resultando,
finalmente, numa infecção por esta ou aquela doença virótica.
A batata é cultivada através de segmentos de tubérculos. Este
procedimento repete as eventuais desordens fisiológicas de uma ge-
ração à outra. Não é por acaso que POLJAKOV (1966) constata o
desenvolvimento de diversas doenças e, especialmente, viroses em
batata, após tratamentos com ditiocarbamatos.
Estes efeitos nefastos dos herbicidas e outros agrotóxicos podem
ser exacerbados quando os cereais estiverem em mau estado, vegetativo
no início do ciclo, seja devido a uma queda de temperatura ou a um
desequilíbrio da fertilização.
Resta estudar em que medida se pode explicar a multiplicação ou
mesmo a infecção de origem eventualmente endógena dos vírus, sob
a influência de diversos fatores.

4. As causas do desencadeamento e da multiplicação de vírus pelos


agrotóxicos
Em patologia animal ou humana, MONTAGNIER (1973)
observa, a propósito dos vírus cancerígenos, que existem argumentos
em favor da presença de um sistema “de vigilância” nas células dife-
renciadas, que controla seu estado de diferenciação, graças a uma
proteína especial.
MONTAGNIER (op. cit.) observa que: “À exclusão dos outros
programas, a manutenção do programa de diferenciação, ao nível pós-

178
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

transcricional, dependeria da síntese desta proteína e de seu estado


funcional. Como as outras células do mesmo tecido diferenciado
produzem a mesma proteína, é possível que a manutenção do esta-
do de diferenciação de cada célula dependa do teor global desta
proteína, graças a um intermediário do tipo hormonal”.
O mesmo autor acrescenta: “O importante é que toda a altera-
ção na atividade desta proteína acarretaria, seja qual fosse a causa, um
relaxamento do controle e também o alargamento da ‘abertura’ de
diferenciação. Novos programas apareceriam, novas mensagens po-
deriam ser lidas e, por meio delas, talvez, programas mitogenéticos”.
MONTAGNIER (op. cit.) observa que nos camundongos esta
capacidade de produzir interferon:
– diminui com a idade;
– é sensível às radiações;
– baixa nas células tratadas pelos hidrocarbonetos cancerígenos.
Assim, com MONTAGNIER, pode-se imaginar que os hidrocar-
bonetos diminuem as sínteses protéicas de uma célula ou de um grupo de
células. MONTAGNIER prossegue: “Esta ação, reversível, não tem
conseqüências duráveis para a maioria das sínteses, mas ela tem por
efeito, diminuir, durante um certo tempo, a produção de proteínas de
vigilância (como o interferon) e, também, enfraquecer o controle de
“abertura de diferenciação das células”.
Conseqüentemente, pode resultar a saída de novos programas e,
entre eles, programas mitogenéticos, sejam embrionários ou prove-
nientes de pró-vírus integrados mitogenéticos.
Pela freqüência dos casos vistos neste trabalho, nos perguntamos: se
os agrotóxicos exercem uma ação inibidora na proteossíntese – estimulando
a sensibilidade da planta às doenças fúngicas e provavelmente, bacterianas
– não poderiam, igualmente, por um mecanismo análogo, encorajar a
elaboração e a multiplicação dos vírus nas plantas assim tratadas?
Em apoio a esta hipótese, MONIER (1977) precisa que a expres-
são das informações necessárias à multiplicação dos vírus, normalmen-

179
F R A N C I S C H A B O U S S O U

te reprimida, “pode ser desbloqueada sob a influência de diversos


fatores, por exemplo: radiações ionizantes, luz ultravioleta, substân-
cias químicas cancerígenas ou mutagênicas, vírus cancerígenos para
DNA, hormônios”.
Da mesma forma, os resultados de VAGO levam a pensar que os
agrotóxicos poderiam acarretar a multiplicação dos vírus nas plantas,
por um mecanismo análogo.
Esta concepção une-se à de Maurice ROSE e Jore d’ARCES
(1957), segundo a qual: “Sob a influência de condições particulares,
desviando o metabolismo habitual,seja em seu equilíbrio, seja nas velo-
cidades de suas diversas reações, certos ácidos nucléicos normais poderiam
tornar-se, mais ou menos patogênicos, para o organismo que os contém”.
Finalmente, “a célula poderia, assim, fabricar seus próprios vírus e, um
número cada vez maior de biologistas, inclina-se a pensar dessa
maneira”.
Vimos com os trabalhos de VAGO que entre estas condições
particulares às quais fazem alusão os autores, figura a alimentação. No
que diz respeito à planta, são o solo e sobretudo a fertilização que estão
em questão. É ela que estudaremos no próximo capítulo.

180
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Fig 17. Repercussões do Carbaryl em duas doses, em relação à


fecundidade de Panonychus sobre videira (cepa Muscadelles), vinte
dias após o tratamento (CHABOUSSOU, 1969.)

181
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Fig. 18. Fecundidade global de Tetranychus urticae criado sobre


feijão tratado com Parathion, em comparação com a fecundidade no
feijão testemunha (CHABOUSSOU, 1969.)

182
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Fig. 19. Relação entre fecundidade e longevidade de 18 fêmeas


de T. urticae alimentadas sobre folhagem testemunha e sobre folhagem
tratada com Parathion, a 5 g/hl. (CHABOUSSOU, 1969.) 141.

183
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Fig. 20. Fecundidade e sucessão das gerações de Myzus persicae


criado sobre fumo tratado com Mevinphos ou Phosdrin em duas do-
ses e na testemunha (5 tratamentos: 5 e 24 de junho, 8 e 20 de julho
e 2 de agosto). (MICHEL, 1964.) 142

184
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188
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

SEGUNDA PARTE

PROTEÇÃO DA PLANTA POR ESTÍMULO DA


PROTEOSSÍNTESE

189
CAPÍTULO VI

FERTILIZAÇÃO E RESISTÊNCIA DA PLANTA

Entretanto,
“o biologista não poderá se satisfazer, a longo prazo, com uma solução que se detenha
no mal e não em suas causas. Portanto, ele deve preparar as bases de um sistema
que o conduza; a não mais considerar somente a ilusória erradicação de uma só
espécie através da química, mas ao conjunto de uma agrobiocenose, como reco-
menda a própria FAO. Nesse conjunto, como integrar-se-ão, harmoniosamente,
tanto os aspectos da ‘trofobiose’, no sentido de CHABOUSSOU (1961), como
a evolução dos organismos auxiliares (onipresentes mas pouco visíveis) e, ainda,
a competição interespecífica no próprio meio, ele mesmo em constante transfor-
mação, apesar ou devido à sua domesticação pelo homem”.
Pierre GRISON, Princípios e métodos de luta integrada, (Accademia Nazionale dei
Lincei. Quaderno no 128), Roma, 1968.

“Uma nutrição normal aumenta a resistência da planta”.


Albert DEMOLON

“Qualquer adubação que deixe a planta em sua condição fisiológica ótima con-
fere-lhe o máximo de resistência. Conseqüentemente, trata-se de fornecer à plan-
ta a adubação adequada, que lhe aporte os diversos elementos que ela exige, nas
proporções relativas a suas necessidades efetivas. Portanto, tanto o excesso como
a carência de um ou diversos elementos, que rompem o equilíbrio fisiológico nor-
mal da planta, são capazes de diminuir sua resistência natura”.
F. LABROUSSE, (Annales Agronomiques, 1932)

“Insetos e fungos não são a verdadeira causa da doença das plantas. Eles só ata-
cam plantas ruins ou plantas cultivadas incorretamente”.
Albert HOWARD (Testament Agricole)
F R A N C I S C H A B O U S S O U

1. AS CONDIÇÕES DA PROTEOSSÍNTESE
COIC resume, assim, o que se sabe, atualmente, sobre a síntese
das proteínas: “Imaginemos uma fábrica onde máquinas de fabrica-
ção de ferramentas fabricariam peças individuais, e também aquelas
que constituem essas máquinas ferramentas, elas próprias; e onde
outras máquinas montadoras realizariam a montagem dessas peças,
tanto para construir as máquinas de fabricação de ferramentas, como
para as máquinas montadoras”.
“Transpondo isto para a célula viva (não considerando, aqui, o
fato de que a célula ainda se divide em duas células semelhantes a
si mesma), temos uma imagem grosseira de seu funcionamento quí-
mico”.
“A máquina montadora nº 1 (ácido desoxiribonucléico ou DNA)
pode autocopiar-se com a ajuda de certas peças individuais
(nucleotídeos de desoxiribose); ela realiza, assim, a montagem da
máquina montadora nº 2 (ácido ribonucléico ou RNA), com a aju-
da de peças individuais análogas (nucleotídeos de ribose).
Esta máquina no 2 (RNA) procede, por sua vez, à fabricação de
máquinas ou materiais extremamente diversos (proteínas), entre os
quais figuram as máquinas ferramenta (enzimas), que servem à fabri-
cação de peças individuais variadas, especialmente nucleotídeos e
aminoácidos”.
As ligações peptídicas que necessitam de energia ocorrem em
presença de ATP (trifosfato de adenosina) e com a intervenção da
coenzima A. O esquema da fig.21 destaca a intervenção das substân-
cias, isto é, dos diversos elementos que entram em jogo nesta síntese
das cadeias protéicas, a partir da alimentação da planta e da
fotossíntese (antigamente chamada assimilação clorofiliana).
A respeito dessas substâncias que constituem a matéria vegetal,
recordaremos que:
– 95%da matéria seca das plantas é composta de quatro elemen-
tos: carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio;

192
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

– 4% pelos seguintes oito elementos : potássio, fósforo, cálcio,


magnésio, silício, enxofre, cloro e sódio;
– 1% (ou menos) do peso seco restante é constituído pelos
microelementos, também chamados oligoelementos, que podem ou
não ser indispensáveis.
É a partir destes treze elementos, ditos “macro”, e dos oligoele-
mentos (Cu, Fe, Zn, Mo, Mn, Li, B etc...), que se faz a síntese das
proteínas, cujo ótimo, segundo nossa teoria, está ligado a um máximo
de resistência da planta. É, pois, evidente que a adubação, pela quan-
tidade e natureza dos elementos nutricionais que fornece à planta,
constitui um dos fatores fundamentais da proteossíntese. Vamos
estudá-la sob a ótica de suas repercussões no metabolismo da planta e,
conseqüentemente, sobre o que se pode chamar de sua saúde.

2. OBJETIVO DA ADUBAÇÃO
Antes de abordar o estudo das repercussões sobre o metabolismo
e a resistência da planta, elemento por elemento, é útil recordar ra-
pidamente o objetivo da adubação.
A curto prazo, ela tem o papel de fornecer à planta todos os ele-
mentos de que necessita para se desenvolver e dar uma colheita “ren-
tável”. É o ponto de vista geralmente adotado pela agricultura
clássica, e que ninguém sonha contestar.*
A longo prazo, é oportuno prever a manutenção da fertilidade do
solo, além de não se provocar eventuais descontroles através de
agrotóxicos, introduzidos intencionalmente ou não no solo.
Em segundo lugar, é necessário evitar qualquer desequilíbrio ali-
mentar da planta, seja este resultante de desequilíbrios de ordem
quantitativa dos elementos colocados no solo ou da própria natureza

*
Atualmente, essa posição é contestada pela própria trofobiose em conjunto com
o ciclo etileno no solo, pela transmutação dos elementos com baixa energia,
sintetizada na “lei da fertilidade crescente”. (N. do R.)

193
F R A N C I S C H A B O U S S O U

destes elementos. Não é indiferente que estes elementos tenham origem


sintética ou biológica. Referimo-nos, especificamente, ao problema das
repercussões dos adubos nitrogenados.
Deixando de lado a questão do teor de resíduos tóxicos na pro-
dução, provenientes de agrotóxicos, nitratos ou nitritos, é necessário
preocupar-se com o valor nutricional das colheitas, em função da fer-
tilização. Apesar da relativa escassez de documentos disponíveis so-
bre este tema, trata-se de uma questão fundamental, pois toca de
muito perto a saúde dos animais domésticos e do próprio homem.
Estudaremos, portanto, as repercussões da fertilização mineral e
orgânica, sob o ângulo de suas incidências na proteossíntese. Para
comodidade de análise, abordaremos uma a uma as incidências de
diversos elementos minerais sobre o metabolismo, observando as
repercussões de seu equilíbrio.
Da mesma forma, este estudo nos levará à questão das repercus-
sões dos oligoelementos e de sua utilização terapêutica.

3. PAPEL DOS ADUBOS NITROGENADOS


Repetidamente os fertilizantes nitrogenados, especialmente os
amoniacais, têm sido citados como causadores de efeitos nefastos.
Efeitos que se referem à sensibilização da planta em relação a doen-
ças e insetos. Enumeraremos rapidamente alguns exemplos.
Segundo VAN EMDEN (1966), a reprodução de pulgões
(Brevicoryne brassicae e Myzus percicae) cresce com a elevação do teor
de nitrogênio solúvel no floema, conseqüente do uso de adubos
nitrogenados.
BREUKEL e POST (1959) registram um importante crescimen-
to das populações de Panonychus ulmi em macieira após a adubação
do pomar com sulfato de amônia.
METCALF (1970) constata que a fecundidade de Saccharosydne
saccharivora – a cigarrinha da cana-de-açúcar – e o teor de nitrogê-
nio nas folhas aumentam após aplicação de sulfato de amônia.

194
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

ADKRISSON (1958) registra que, em algodoeiro, a aplicação de


nitrato de amônia provoca um nítido aumento das populações de
Heliothis zea. (Similarmente aos agrotóxicos, constata-se que, as pro-
liferações devido aos adubos nitrogenados não envolvem somente os
insetos picadores ou os ácaros que se nutrem de seiva ou de suco
celular, mas que elas também envolvem os lepidópteros.).
De maneira geral, os adubos nitrogenados provocam o desenvol-
vimento de numerosas doenças, como ferrugens, Oidium no trigo,
Uromyces na beterraba, Cladosporium no tomate, Sclerotinia na cenou-
ra e requeima da batata (HERLIHY, 1970).
Igualmente, quando em grande abundância, o nitrogênio favo-
rece a ferrugem da ameixeira, sarna da macieira, o míldio da videira
(VILLEDIEU, 1932), o Botrytis da videira (SCHELLENBERG,
1935, in GROSCLAUDE, 1961).
STETTER (1971) demonstrou, experimentalmente, que uma
suplementaçãoo de nitrogênio, na ordem de 124kg/ha, fornecido
pelo nitrato de cálcio, aumenta a sensibilidade do trigo de inverno
em relação à podridão-das-raízes (Ophiobolus graminis), bem como à
cercosporiose-das-raízes (Cercosporella herpotrichoides).
PARMENTIER (1973) realizou trabalhos muito interessantes
com cereais. Após ter recordado que, no caso de Eresiphe graminis, a
adubação nitrogenada tem um papel determinante na invasão para-
sitária demonstrou, experimentalmente, a influência das práticas
culturais precedentes e o fato de que a infecção por Oidium, aumen-
ta com a quantidade de nitrogênio incorporado.
PARMENTIER (op. cit.) observa que existe um “limite de
sensibilização ao nitrogênio, expresso em unidades de nitrogênio
aplicado, a partir do qual o trigo apresenta uma elevação brutal da
invasão parasitária. Este teto é variável, segundo as práticas culturais
precedentes”.
Num segundo experimento, o mesmo autor evidenciou que a
percentagem de colmos sem Oidium é mais elevada nos colmos de

195
F R A N C I S C H A B O U S S O U

espiga longa. No curso de dois anos consecutivos, o número médio


de pústulas por colmo mostrou-se tanto mais elevado quanto mais leve
ou menos desenvolvido fosse o colmo.
Em outras palavras: esses resultados confirmam inteiramente
nossa concepção, já que, definitivamente, a sensibilização do trigo ao
oídio está na razão inversa do crescimento, isto é, do nível da proteossíntese.
Aliás, PARMENTIER evoca, “de acordo com o conceito da trofobiose”,
a influência de certas práticas culturais e, especialmente, a “dos adu-
bos nitrogenados, segundo sua dose e sua época de aplicação”.
Um outro fator importante reside na natureza sob a qual se apre-
senta o adubo nitrogenado em sua repercussão sobre a resistência da
planta. Assim, SOL (1967) mostrou que a fava cultivada em solução
nutritiva apresentava uma sensibilidade diferente quando o nitrogê-
nio era amoniacal ou nítrico. O primeiro tipo de adubo sensibiliza
muito mais a fava em relação a Botrytis. Isto porque as folhas dessas
plantas apresentam, em seus tecidos e exsudatos, teores mais eleva-
dos em aminoácidos (3 a 4 vezes mais) e em açúcares, comparando-
se às plantas cultivadas em solução com nitrogênio nítrico.
Em outras palavras: o nitrogênio sob forma amoniacal acarreta
um nível mais baixo de proteossíntese do que sob a forma nítrica.
Segundo VAN EMDEN (1966), é um fenômeno análogo que
explica por que o sulfato de amônia, correntemente usado pelos agri-
cultores, mostra-se particularmente “eficaz” para aumentar o conteú-
do de aminoácidos nas folhas e, portanto, sensibilizar as plantas em
relação às doenças, se comparado às repercussões menos nefastas dos
adubos nítricos. A “murcha de STEWART”, no milho, é agravada
pela fertilização com nitrato de amônia, mas não o é pela forma redu-
zida do nitrogênio.
Assinalamos, enfim, que uma fertilização rica em nitrogênio, geral-
mente, também favorece o desenvolvimento das doenças bacterianas das
folhas. Isto ocorre com a chamada “queima bacteriana” do fumo.
Contudo, se pode limitar e até suprimir os estragos, graças a um

196
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aporte conveniente de potássio. Como nos casos dos ácaros e dos


pulgões, as plantas com carência de potássio mostram-se, especial-
mente, mais sensibilizadas à infecção.
Referente às “relações entre a nutrição das plantas e doenças do ar-
roz”, TROLLENIER e ZEHLER (1977) observam que “um grande
número de organismos patogênicos dependem de constituintes solúveis
das células, como açúcares e aminoácidos. Estes compostos acham-se em
concentrações elevadas nas plantas abundantemente providas com nitro-
gênio, assim como nas plantas carentes em potássio”.
Os mesmos autores acrescentam: “A carência em potássio restrin-
ge a fosforilação, de forma que, se acumulam os carboidratos com
reduzido peso molecular e os compostos nitrogenados solúveis. Al-
guns estudos indicam que há quantidades mais elevadas de compos-
tos com baixo peso molecular nas variedades suscetíveis, que nas
variedades resistentes”.
Estas constatações nos levam a considerar o equilíbrio N/K na
resistência da planta e a estudar o papel do potássio no metabolismo.

4. PAPEL DO POTÁSSIO E DOS ADUBOS POTÁSSICOS


NO METABOLISMO E NA RESISTÊNCIA DA PLANTA

A) Papel do potássio no metabolismo da planta


O potássio é um elemento essencial no metabolismo. Muito
móvel, ele se encontra particularmente localizado nos tecidos
meristemáticos, onde se opera a fotossíntese. Ora, a proteossíntese é
tributária da glicogênese e, mais precisamente, da decomposição dos
glicídios, que fornecem suas cadeias carbonadas aos protídeos. Assim
se explicaria o papel do potássio na proteossíntese, sua carência se
acompanha de um problema geral da condensação em proteínas.
A carência de potássio provoca um aumento das enzimas de decom-
posição. ROUTCHENKO e LUBET (1966) mostraram, no milho,
que o fornecimento excessivo de N (NH4) e P, em relação às disponibi-

197
F R A N C I S C H A B O U S S O U

lidades de K, parece ser o principal responsável pelo acúmulo de NH4


na planta e, portanto, pela intoxicação amoniacal resultante.
Isto parece ser um fenômeno de ordem geral. MITCHELL et alii
(1976), nesse sentido, mostraram que a carência de K afeta a composi-
ção da farinha de gergelim. No caso de carência de K constata-se acúmulo
de todos os aminoácidos livres, exceto a cistina. Os autores resumem assim
seus resultados: “Os acúmulos e reduções observadas nos teores de pro-
teínas das plantas carentes em K apóiam a hipótese segundo a qual um
aporte adequado de K é necessário para que os aminoácidos sejam uti-
lizados de forma apropriada na síntese de proteínas”.
Esses resultados se explicam pelo fato de que numerosas enzimas
são ativadas de forma seletiva pelo K que, por este motivo, tem par-
ticipação em diversos processos biossintéticos, como a fosforilação e
a síntese do ATP (trifosfato de adenosina). Daí a importância do
equilíbrio N/K, já que o potássio influi na síntese das proteínas e,
portanto, como veremos adiante, na resistência da planta a seus di-
versos agressores.
Contudo, antes de abordar este assunto, devemos fazer uma
observação de ordem geral, porque ela é, pensamos, válida para os
diversos elementos. Uma coisa é reconhecer a importância do potás-
sio; outra, é a maneira de colocá-lo à disposição da planta. É aí que
a natureza da alimentação do vegetal, ou seja, a natureza dos adubos,
nas condições normais de cultivo, influi na resistência da planta e no
seu valor nutricional.
Com efeito, como vermos adiante, os aportes de adubos potássicos
geralmente, mas nem sempre, são benéficos. KOCH e MENGEL
(1972) nesse sentido mostraram que as leguminosas reagem aos
adubos potássicos de uma forma completamente diferente das outras
famílias de plantas. Como vimos antes, as plantas não leguminosas
mostram, com o aporte de adubos potássicos, um decréscimo dos
teores em aminoácidos solúveis, em correlação com seu efeito posi-
tivo sobre a proteossíntese: é o inverso do que esses autores consta-

198
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taram com uma leguminosa como o trevo vermelho. Os autores


concluem que: “A nutrição potássica das leguminosas afeta a fixação do
nitrogênio pelo Rhizobium leguminosarum”.
Esta conclusão é de uma importância fundamental para a práti-
ca da adubação. Sabe-se, também, que os adubos nitrogenados solúveis
provocam o desaparecimento das leguminosas. Assim, podemos pergun-
tar se, devido a sua toxicidade em relação aos microrganismos do solo –
Como dissemos antes, compartilhada com a de diversos agrotóxicos – não
teríamos a explicação dos efeitos nefastos provocados pelos adubos solúveis,
correntemente denunciados pelos agrobiologistas.

B) Repercussões do potássio sobre a resistência da planta


Uma primeira observação em relação ao potássio: trata-se de um
elemento necessário em grandes quantidades, já que deve estar presen-
te nos locais onde as sínteses são muito ativas, especialmente nos
meristemas. Ele constitui um caso bastante particular, no sentido de
que só existe sob forma de íons K, contrariamente ao N, P, Ca, Mg,
que entram nas combinações orgânicas permanentes. Presente na seiva
e no protoplasma, o potássio está estreitamente ligado à migração dos
aminoácidos: do lugar onde são formados, para os locais onde são
utilizados.
De fato, os casos em que o excesso de potássio foi assinalado como
nocivo são extremamente raros. Bem ao contrário, ao inverso dos
adubos nitrogenados, a maior parte dos autores concordam em con-
siderar que os adubos potássicos conferem aos vegetais uma maior
resistência, tanto às doenças como às pragas.
Realmente, como acabamos de ver, um tal processo resulta – afora
as repercussões sobre as leguminosa – em grande parte do seu efeito
positivo sobre a proteossíntese, com a regressão correlativa das subs-
tâncias solúveis que ele origina.
LEFTER e PASCU (1970) evidenciaram uma relação linear entre
a relação N/K 20 e a sensibilidade da macieira à sarna (fig. 22).

199
F R A N C I S C H A B O U S S O U

SCHAFFNIT e VOLK (1930) observaram que o K também


estimula a resistência da macieira ao Oidium, do míldio da videira e
à ferrugem dos cereais.
Observa-se, igualmente, que o potássio provoca uma resistência
do pessegueiro às doenças ditas “fisiológicas”.
A videira é bem conhecida por suas exigências de potássio. Elas
são mais importantes em dois períodos de sua vegetação: no início,
no momento da formação de folhas e, após, no período de lignificação
do sarmento. Todos os fatores que agem de um modo qualquer sobre
o metabolismo (temperatura, teor em água, hormônios, inibidores,
substâncias tóxicas) têm uma ação indireta sobre o potássio celular
e sua distribuição. Vimos que isto ocorre com diversos agrotóxicos,
como o Carbaryl, que aumenta o K ao mesmo tempo em que dimi-
nui o Ca (fig. 23).
Por outro lado, HOFFMANN e SAMISH (1969) observam que
as necessidades da videira em K diminuem quando os níveis de Ca
no solo são baixos. Assim, eles consideram que um alto nível de Ca
pode anular os efeitos desfavoráveis de um excesso de potássio.
Estes mesmos autores também observam que a concentração dos
aminoácidos constitui o melhor critério para a determinação do es-
tado nutricional do K na videira. Assim, na cepa Semillon, a 0,65%
de K correspondem 50 ppm de aminoácidos, enquanto que a 0,28%
de K a concentração de aminoácidos se eleva a 950 (fig. 24). Estes
dados revelam uma deficiência no processo da proteossíntese. Pode-
se temer, neste caso, repercussões nefastas sobre os rendimentos e
sobre a qualidade do vinho e, obviamente, sobre a resistência em
relação a diversas doenças.
Acrescentemos que o ótimo de concentração de K não seria uma
constante, mesmo para um período análogo da videira e um nível
homólogoda folha. Já chamamos a atenção para o fato de que o teor
dos elementos é função não apenas do clima e dos agrotóxicos apli-
cados sobre a videira, mas também da constituição genética (influ-

200
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

ência da cepa) e da natureza do porta-enxerto. Ou seja, de todos os


fatores que devem ser levados em conta para a pesquisa de um equi-
líbrio ótimo.
Referente às pragas tivemos ocasião de demonstramos, experimen-
talmente, as repercussões benéficas das fertilizações potássicas em
relação à resistência de Citrus às cochonilhas. Realizamos uma expe-
riência de adubação mineral conduzida sobre uma parcela de
bergamoteiras. Estes ensaios – origem puramente agronômicos –
tinham por objetivo, primitivamente, demonstrar que o aporte
maciço de potássio no solo acarretava um aumento de K nas folhas
e, correlativamente, uma redução de Ca, que se encontrava em exces-
so no solo. Este excesso nos fazia suspeitar de um desequilíbrio no
metabolismo das árvores, provocando sua sensibilidade em relação aos
ataques das cochonilhas (CHABOUSSOU, 1974)
Exceto para as testemunhas, os tratamentos foram: CaCO 3,
H2S04 e KN03. As observações foram feitas sobre duas espécies de
cochonilhas: Lepidosaphes beckii e Saissetia oleae. A fig. 25 mostra, em
1970, diferenças consideráveis nas populações, em função da fertiliza-
ção. Em comparação às testemunhas, confirma-se o efeito positivo do
cálcio sobre a multiplicação de Lepidosaphes beckii. Na colheita, as
populações nos frutos são aproximadamente o triplo. Os “tratamentos
potássicos” reduzem o nível das cochonilhas quase à metade.
Em 1971 (os ensaios estavam implantados desde 1965), as di-
ferenças ainda se acentuam entre as populações, especialmente sobre
galhos finos e folhas. Os tratamentos potássicos reduzem as
cochonilhas a um terço das presentes nas testemunhas (fig. 26).
Esta regressão das cochonilhas está ligada a fatores nutricionais
e, provavelmente, à relativa diminuição das substâncias solúveis da
seiva, em particular dos aminoácidos. Este processo parece ocorrer por
intermédio do estabelecimento, na planta, de um novo equilíbrio
catiônico. Se compararmos a população de L. beckii nos frutos colhi-
dos, com os valores da relação K/Ca+Mg das cascas, constata-se que

201
F R A N C I S C H A B O U S S O U

a regressão das populações parece estar ligada ao aumento desta re-


lação (fig. 27).
Inversamente, a diminuição desta mesma relação, pelo tratamen-
to CaCO3, está ligada à multiplicação da cochonilha, se comparada
às testemunhas (fig 27). Este último resultado confirma, portanto,
a hipótese dos efeitos favoráveis na multiplicação desse inseto, de um
excesso de cálcio no solo, como na região de Rharb.
A generalidade deste processo é confirmada pelos resultados
análogos obtidos com uma segunda espécie de cochonilha, a Saissetia
oleae.
Em resumo, estes resultados demonstram que uma correção
adequada do metabolismo da planta, graças a fertilizações apropri-
adas (neste caso, o aporte de potássio), permite obter uma regressão
sensível nas populações das pragas fitófagas, apenas pela via
nutricional. Veremos a seguir, a respeito da influência do cálcio, que
ele pode ter o mesmo efeito para as doenças.

5. PAPEL DO CÁLCIO E DAS CORREÇÕES CALCÁRIAS


NO METABOLISMO E RESISTÊNCIA DA PLANTA

A) Papel do cálcio no metabolismo da planta

WALLACE et alii.(1966) observam que:


– as plantas superiores parecem necessitar de grandes quantida-
des de cálcio;
– a questão destas necessidades é, ainda, extremamente confusa.
Talvez o cálcio seja o elemento essencial menos compreendido.
Paradoxalmente, as plantas calcífugas parecem acumular mais
cálcio que as calcícolas. Isto significa uma diferença fundamental no
metabolismo do cálcio nestas duas categorias de plantas. Podem ser
diferenças na fixação do Ca sobre os locais de troca iônica ou nas
modalidades de uso deste elemento. Estes fenômenos ocorreriam,

202
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

portanto, nas partes aéreas das plantas, pois nas raízes a evolução do
teor de Ca é praticamente idêntica numa espécie calcífuga, como o
tremoço, e numa calcícola, como a fava (BOUSQUET, 1971).
Outro fato importante referente ao metabolismo do cálcio: são os
numerosos “equilíbrios” em que está implicado. Já mencionamos o equi-
líbrio K+/Ca++, mas o cálcio está ligado a diversos outros elementos.
No milho, FALADE (1973) mostrou que o cálcio estimula a
absorção de K + e de Mg ++ até um determinado nível na solução
nutritiva, mas a inibe, ao contrário, em outros níveis. O potássio age
da mesma forma para a absorção de Ca++, enquanto o Mg++ comporta-
se de forma semelhante para a absorção de Ca e de K +.
SHEAR (1975) observa que, elevando-se suficientemente o teor
de Mg, a absorção de Ca pode ser aumentada.
Estas interrelações complexas podem explicar certos resultados
aparentemente contraditórios referentes às relações entre o Mg e as
afecções por carências de Ca, que nos ocuparemos mais adiante.
Assim, o blossom end rot* ou BER do tomate, bem como o coração
negro do aipo, estão relacionadas com os baixos valores da relação Ca/
total de sais solúveis.
Ora, como vimos, a suscetibilidade da planta está ligada a um teor
elevado do nitrogênio nos tecidos, o que parece significar que, nesse
caso, o equilíbrio catiônico é pouco favorável a um ótimo de
proteossíntese.
Outra relação clássica é a do cálcio e fósforo. O Ca estimula a ab-
sorção de fosfatos no milho, com certos teores de cátions, mas não
apresenta estes efeitos com outros, como para K e Mg (FALADE,
1973). Daí a importância, como veremos adiante, da relação Ca/P na
planta, no que diz respeito a sua resistência às doenças.

*
Em inglês no original. (N. da T.). A blossom-end-rot é uma doença fisiológica que
produz uma colaboração pálida nas flores, no decurso da floração. Ocorre em condições
desfavoráveis, com excesso de N e/ou carência de Ca. (Yepsen, 1966). (N. do R.)

203
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Estes fenômenos estão sempre relacionados com o processo da


proteossíntese, em que o íon Ca forma complexos com as proteínas.
Isto se expressa, também, da seguinte maneira: “as proteínas apre-
sentam uma afinidade considerável com o cálcio”. Também as vitami-
nas A e C estão estreitamente relacionadas ao metabolismo do
cálcio.
Efetivamente, são as relações que ligam o cálcio à matéria orgâ-
nica do solo e às leguminosas que parecem as mais interessantes. E,
também, as mais suscetíveis de nos fazer entender melhor o papel do
cálcio no processo da proteossíntese e, conseqüentemente, na resis-
tência da planta.

B) Adubação orgânica e cálcio


ALBRECHT (1941) estima que a fertilidade de um solo está
relacionada com o teor de cálcio trocável. E que este cálcio trocável se
encontra, ele próprio, relacionado com o teor do solo em matéria orgâ-
nica. Ele observa que, por outro lado, o acúmulo de matéria orgâni-
ca, a partir de blue-grass* não aumenta somente o Ca trocável, mas
também o Mg trocável.
ALBRECHT (op. cit.) observa que a matéria orgânica modifica não
somente a mobilidade do cálcio, mas também, do nitrogênio e do hidro-
gênio. Esse autor estima que Ca e H devem ser colocados à parte entre
os cátions, devido a suas propriedades particulares. “O cálcio é um
agente para encorajar a completa combustão da matéria orgânica”.
Um trabalho recente chega à conclusão que “o cálcio aumenta a
estabilidade biológica da matéria orgânica, enquanto a elevação do pH
tem uma função oposta” (LINÈRES, 1977).
Segundo ALBRECHT, “uma explicação mais plausível do alto
teor de matéria orgânica do solo chernozem é de que o elevado nível

*
Em inglês no original. Gramínea do gênero Poa. (N. da T.). Poa protensis, pasto-
azul. (N. do R.)

204
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

de Ca e de outras bases provoca grande fixação de nitrogênio, tanto


simbiótico quanto não simbiótico. Esta fixação produz mais carbo-
no e eleva o teor de matéria orgânica, apesar de aumentar sua
destruiçao pelos microorganismos, em meio tão favorável”.
Os trabalhos de LINÈRES (op. cit.) confirmam esta conclusão:
“A saturação das moléculas pelo Ca parece ser o fator determinante da
estabilização biológica dos humatos cálcicos, bem como do conjunto da
matéria orgânica dos solos com nível cálcico elevado”.
Em resumo, o aumento do nitrogênio e do cálcio não são absoluta-
mente processos independentes. E este processo está relacionado com a
matéria orgânica.
Por outro lado, ALBRECHT distingue o tipo de vegetação se-
gundo a relação silício/cálcio. A “vegetação carbonada”, que pode re-
sultar, com seu baixo teor em outros elementos nutritivos, é
reconhecida como “desmobilizadora” em relação aos íons, enquanto
que a vegetação de leguminosas, com uma baixa relação Si/Ca e um alto
teor em outros elementos além do silício, no solo, é conhecida como
“mobilizadora”destes íons.
Portanto, isto justifica, de outro modo que só pelo enriquecimen-
to do solo em nitrogênio, a prática de adubação verde com
leguminosas, preconizada desde sempre pelos agrobiologistas e, ago-
ra, novamente, pela agricultura clássica.
Ainda é necessário mencionar uma outra relação clássica: a do cálcio
e fósforo. O Ca, estimula no milho, a absorção de fosfatos a certos níveis
de cátions, mas não de outros. Tudo como ocorre com K+ e o Mg ++
(FALADE, 1973). Veremos adiante o papel da relação Ca/P no
mecanismo da resistência da planta.
Enfim – e aí talvez esteja o ponto mais importante do metabolismo
do cálcio – este elemento apresenta relações de certa forma privilegiadas
com os oligoelementos. Isso ocorre, por exemplo, com o boro, apesar das
funções deste elemento não estarem ainda muito claras. Contudo,
parece provado que o boro é capaz de manter o cálcio sob forma solúvel.

205
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Assim, tanto o boro fornecido através das raízes como por pulveriza-
ções foliares aumenta o movimento do Ca nas maçãs.
O cálcio, além do equilíbrio que manteria com numerosos ele-
mentos, é considerado, ele próprio, como desempenhando o papel
de um oligoelemento, ou quase, e o de um antitóxico, em relação a
eventuais excessos de elementos como o Mg, Cu, Fe, Mn e Zn e,
talvez, de outros íons (WALLACE et alii., 1966). Este é um aspecto
importante a ser retido, considerando-se a terapêutica pelos
oligoelementos, que abordaremos no próximo capítulo.

C) Repercussões do cálcio sobre a resistência da planta


Tudo o que vimos, referente ao papel do cálcio no metabolismo
da planta parece colocá-lo no centro dos fenômenos que resultam na
proteossíntese e inclusive, como veremos adiante, daqueles fenôme-
nos – extremamente complexos – como as relações com a matéria
orgânica, isto é, com a intervenção dos microrganismos. Voltaremos a este
assunto mais adiante.
A importância do cálcio na resistência da planta é surpreenden-
te. SHEAR (1975) enumerou pelo menos trinta afecções ou doen-
ças causadas por carências de cálcio. Citemos entre elas:
– as necroses ou “coração negro ou marrom”;
– a necrose “hipocotiledonar” do feijão;
– as rachaduras da cenoura, cereja, tomate;
– o coração negro do aipo;
– o bronzeamento da batata etc.
SHEAR (op. cit.) ressalta, por outro lado, todas as dificuldades
em admitir-se a carência de Ca como causa destas diversas doenças.
Ele escreve, a propósito: “A despeito de uma monumental evidência,
a aceitação universal de um inadequado teor de cálcio como fator geral
da origem dessas doenças foi lento. Mesmo se o papel ou papéis es-
pecíficos do cálcio como redutor ou preventivo dessas doenças ain-
da não estão determinados, à compreensão da função da nutrição com

206
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

cálcio, que pode ser afetada por cada uma das condições discutidas
anteriormente, é essencial, se quisermos reduzir as perdas econômi-
cas acarretadas por estes distúrbios”.
No que diz respeito ao papel do cálcio, acreditamos ter mostra-
do que ele se encontra em estreita relação com a estimulação da
proteossíntese, como veremos confirmado. Entretanto, SHEAR tam-
bém faz alusão aos diferentes fatores ecológicos suscetíveis de agirem
indiretamente sobre o metabolismo do cálcio na planta (e, acrescen-
taremos, dos outros elementos).
Estes são, principalmente:
– solo seco (considerado o fator mais importante da necrose do
tomate);
– inversamente, as regas sucessivas;
– altas temperaturas.
Observamos, de passagem, que todos estes diferentes fatores unem-
se para provocar uma inibição da proteossíntese.
Assim, KYDREV e TJANKOVA (1960), estudando as relações
entre as modificações provocadas pela seca e a infecção das plantas por
Puccinia triticina Erikss, evidenciaram que a seca provoca na planta
certos fenômenos considerados como favoráveis à infecção, especial-
mente a elevação do teor de nitrogênio não-protéico e a queda do teor
de auxinas.
Também no trigo, SLUKHAI e OPANASENKO (1974), encon-
traram que o déficit em água perturba o metabolismo dos compos-
tos nitrogenados, com uma redução da síntese protéica e o aumento
considerável de certos aminoácidos, como a asparagina e a prolina.
Efetivamente, parece que o acúmulo de prolina é característico do
metabolismo das plantas deficientes em água (RUHLAND, 1958).
Acrescentaremos que é desnecessário procurar em outro lugar a causa
de certas multiplicações bruscas e aparentemente inexplicáveis de inse-
tos como, por exemplo, pulgões e cochonilhas. Uma deficiência das
plantas em água provoca uma hidrólise das proteínas nas folhas e, con-

207
F R A N C I S C H A B O U S S O U

seqüentemente, um enriquecimento em nitrogênio solúvel, que acarreta


uma multiplicação de pulgões como, por exemplo, Aphis fabae, Myzus
persicae e Brevicorynae brassicae (WEARING e VAN EMDEN, 1967).
Assim, estes fatores ecológicos sobrepõem-se aos da carência em
cálcio. Além das necroses e rachaduras, pode-se citar as fusarioses,
Verticillium do tomate e Phytophthora do moranguinho, entre as
moléstias relacionadas com a carência em cálcio.
As carências “conjugadas” de Ca e Mg provocam a necrose e a
morte dos brotos do aspargo.
Uma tal ação nefasta das carências de cálcio se encontra, por ou-
tro lado, confirmada pelo efeito inverso produzido pela estimulação da
resistência das plants pelas correções calcárias. Assim, por exemplo:
• aumenta a resistência do tomate a Botrytis, com aportes su-
cessivos, seja de cal hidratada, seja de gesso agrícola, a doen-
ça parece se encontrar inversamente ligada à relação Ca/P
(STALL, 1963 e STALL et alii. 1965) (fig. 28);
• em relação ao mofo cinzento, em terreno calcário, os diversos
ditiocarbamatos não acarretam os mesmos graves inconveni-
entes assinalados anteriormente.
VERONA (1976) evidenciou a ação benéfica da cianamida
cálcica* em relação a diversas doenças. Isto ocorre, por exemplo, com
a helmintosporiose do milho (BOGYO, 1955), com Phytophthora
capsicii, Armillariella mellea, Pythium ultimum, Verticillium alboatrum,
Fusicoccum amygdali e Giberella zea.
VERONA (op. cit.) salienta a importância da quantidade de
cianamida colocada, bem como da época de aplicação. A cianamida
exerce uma influência inibidora indireta, via metabolismo da planta
e, portanto, seu emprego deve ser repetido e contínuo.
VEZ (1972) mostrou como a doença de cereais, Cercosporella
herpotrichides, era fortemente inibida pelas correções à base de

*
Adubo nitrogenado muito usado na Europa. Pouco conhecido no Brasil. (N. da T.)

208
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

cianamida, enquanto um ataque tardio se manifestava principalmen-


te nas parcelas que haviam recebido nitrato de amônia. (Isto confir-
ma os efeitos nefastos dos compostos amoniacais em relação à
resistência das plantas às moléstias, devido ao aumento do teor de ni-
trogênio solúvel nos tecidos.)
Conhece-se outros exemplos da importância do cálcio. GUYOT
(1935) demonstrou o papel antagonista do calcário e dos sais de
magnésio em relação ao desenvolvimento da podridão (Armillariella
mellea).* GARD (1929) demonstrou que os superfosfatos atacam o cálcio
e diminuem o teor deste no solo, favorecendo a aparição de focos de
podridão em nogueiras, provocados por Armillariella mellea. Esta doença
não existiria nos solos contendo de 20 a 25% de carbonato de cálcio.
O cálcio permite manter o pH do solo em limites favoráveis à
atividade biológica e à assimilação dos elementos nutritivos. Assim,
a calagem, na razão de 9t/ha, fez o pH passar de 3,8 a 4,3 após 24
semanas da aplicação. Segundo o Research Branch Report,* de Quebec
(1973), este fenômeno produz um acúmulo de nitrogênio na forma
de NO3, e não de NH4, como ocorre em condições mais ácidas. Ora,
vimos que, sob forma nítrica, o nitrogênio é muito menos capaz de
sensibilizar a planta a doenças do que sob forma amoniacal...
Contudo, não é seguro que este fenômeno ocorra diretamente por
intermédio da mudança de pH. HUBBELING e CHAUDHARY
(1969) salientam que o pH do solo não tem influência direta sobre
a reação de plântulas de tomate a Verticillium. Em duas variedades de
tomate, os autores observam que: “Uma nítida parada de crescimento
e uma coloração vascular marrom demonstraram que um forte ataque
do fungo está correlacionado com uma deficiência em Ca”.
Da mesma forma, CORDEN e EDGINGTON (1960) haviam
demonstrado que os tomates com carência de Ca eram claramente

*
Podridão ou fendilhamento anular das raízes. (N. do R. )
*
Em inglês no original. Relatório da Divisão de Pesquisa. (N. da. T.)

209
F R A N C I S C H A B O U S S O U

mais suscetíveis a Fusarium que as plantas normais. As plantas trata-


das com o ácidob – naftaleno acético (NAA) mostravam-se nitidamente
resistentes, mas a resistência induzida por este produto era nula nas plantas
deficientes em Ca.
Esta observação é fundamental: ela constitui uma demonstração
suplementar da influência indireta dos agrotóxicos sobre a resistência da
planta a seus agressores, seja ela anulada ou, ao contrário, estimulada. Em
outras palavras, o efeito buscado de resistência – erroneamente chama-
do fungicida” – deve, obrigatoriamente, passar por um novo estado fi-
siológico a planta, diferente de seu estado inicial. Vimos que este estado
é caracterizado por um metabolismo com proteossíntese dominante.
Assim se explicam as constatações desses mesmos autores, de que:
“os cátions, tais como os íons monovalentes, como Na+, NH+4 e K+,
que estavam em competição com os íons Ca++, tinham aumentado os
efeitos da doença”. Isto nos conduz ao estudo da noção do equilíbrio
catiônico e de suas conseqüências.

6. EQUILÍBRIO CATIÔNICO E RESISTÊNCIA DA PLANTA


Como vimos antes, em numerosos casos os adubos potássicos
aumentam a resistência da planta, parece através da elevação do teor
de K nos tecidos. Em outros casos, ocorre o contrário com o cálcio.
Em cada um desses dois casos, as relações K/Ca e K + Na/Ca + Mg
encontram-se modificadas, num ou noutro sentido: o novo equilíbrio
condiciona o metabolismo e o nível de proteossíntese da planta, que
poderá ser intensificado ou reduzido. Para um nível máximo de
proteossíntese, concebe-se que o valor dessas relações pode variar,
segundo a natureza genética da planta.
BOGYO (1955) observa que se o K provoca uma regressão de
helmintosporiose no milho, o cálcio, ao contrário, a aumenta. Toda-
via, observa-se igualmente que, quando o milho dispõe de K assimilável
em quantidade suficiente, a cal aplicada em doses crescentes não provoca
mais aumento da doença.

210
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Portanto, não há absolutamente contradição no fato de que num


caso o cálcio estimule a resistência à doença e, noutro, faça o inver-
so. Em termos ideais, se trata de um equilíbrio que resulta num
metabolismo caracterizado por um ótimo de proteossíntese. Este
ótimo é obtido por um determinado equilíbrio entre K e Ca, prova-
velmente diferente para cada família de plantas.
Os trabalhos de CRANE e STEWART (1962), com Mentha
piperita, parecem confirmar este ponto de vista. Essas pesquisas fun-
damentalmente colocaram em concorrência fatores que interferem
no crescimento, como a luz (dias curtos e longos) e o equilíbrio K/
Ca da solução nutritiva. Se resumirmos seus resultados, podemos
dizer que:
1. Os dias curtos acentuam o teor dos compostos solúveis nos
tecidos e, portanto, segundo nossa teoria, sensibilizam a planta em
relação a seus diferentes agressores. (Recordemos o exemplo das re-
percussões da latitude sobre a sensibilidade da batata a Phytophthora
infestans.)
2. Os efeitos do valor da relação Ca/K (ou inversamente) sobre-
põem-se aos principais efeitos atribuídos aos dias longos ou curtos:
dito de outra maneira, ao fotoperíodo (fig. 29).
Num contexto de síntese de proteínas com alto teor em
glutamina, um elevado teor de K nos tecidos e baixo de Ca provoca
uma concentração maior de N protéico e, ao contrário, uma menor
de N solúvel. Ou seja, condições favoráveis a um estímulo da resis-
tência da planta.
As três carências artificialmente provocadas, em K, Ca e S acarre-
tam, nas folhas, a presença de aminoácidos especiais, em que a
glutamina parece estar em equilíbrio com a asparagina. Estas vari-
ações em aminoácidos poderiam ser correlacionadas com “períodos
críticos”, efetivamente, constatados no curso do ciclo evolutivo da
planta, tanto em relação às pragas (Tetranychus sp., por exemplo)
quanto às doenças.

211
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Quanto às carências em oligoelementos, às quais serão mais es-


pecialmente tratadas no próximo capítulo, CRANE e STEWART
(op. cit.), mostraram que elas conduzem a conclusões análogas. As-
sim, as carências em Cu e em Mn provocam aumento do nitrogênio
solúvel nas folhas, sobretudo da glutamina. Estas carências levam à
sensibilização da planta a seus agressores. E, efetivamente o inver-
so que se obtém com a correção das carências.

7. INFLUÊNCIA DOS OUTROS ELEMENTOS – ENTRE


OS QUAIS O MAGNÉSIO – NO METABOLISMO E
RESISTÊNCIA DA PLANTA
Insistimos sobre a influência do potássio e do cálcio no me-
tabolismo da planta e elaboração das proteínas, fator que nos in-
teressa, particularmente, na resistência do vegetal, em relação a
seus diferentes parasitas. Contudo, é evidente que, além destes
dois elementos, muitos outros intervêm na cadeia das sínteses
protéicas. Aliás, eles figuram no esquema da fig. 21, com o sen-
tido das flechas indicando as principais “vias” do metabolismo.
Além dos oligoelementos e do enxofre, dos quais já falamos e
dos quais trataremos no próximo capítulo, é conveniente exami-
narmos, brevemente, o papel do magnésio.
Sabe-se que o magnésio faz parte da molécula da clorofila. É,
portanto, lógico que ele também intervenha nas cadeias de de-
composição e de síntese dos glicídios. As substâncias ricas em
energia (ATP) servem de intermediárias para as sínteses e degra-
dações. Ora, os compostos ricos em energia, utilizados na cadeia
de degradação das “oses” (açúcares), são compostos fosforilados,
e os sistemas enzimáticos destas mesmas cadeias necessitam, em
sua maioria, da presença de Mg.
A reação ADP + P =ATP só pode ocorrer na presença de Mg.
Daí a importância bioquímica das relações entre P e Mg. É pos-
sível dizer que “o ‘dínamo celular não pode funcionar sem magnésio”.

212
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

O metabolismo do fósforo também está estreitamente relaci-


onado com o cálcio. Portanto, não é surpresa constatar-se a exis-
tência de um antagonismo Ca-Mg. É porque esta relação justifica
o fato de ser possível, numa primeira aproximação, contentar-se
com a relação K/Ca para quantificar, sumariamente, o metabolis-
mo da planta e, em particular, o da proteossíntese.
É estabelecido, claramente, que a relação K/Ca influi na pro-
porção de Mg utilizada pelo vegetal, o que se explica pela influ-
ência do Ca sobre a absorção do Mg. Assim, se admite que:

K + Ca + MG = constante.

Existe uma nítida correlação entre N e Mg nas folhas das ár-


vores, com curvas de variação destes dois elementos sendo análo-
gas. Assim, o teor de Mg nas folhas de macieira, expresso em
percentagem de matéria seca, é, por exemplo:

– Folhas doentes, em início de clorose: .... 0,14 a 0,20 %


– Folhas sãs: ................................................ 0,30 a 0,45 %

Estas insuficiências, também chamadas “subcarências”, por-


que nem sempre muito aparentes, podem ser provocadas
involuntariamente pelos agricultores, pela utilização abusiva de
outros adubos, como os produtos ‘nitrogenados sintéticos. Estes
produtos podem também bloquear os oligoelementos no solo. As-
sim, a relação K/Mg no solo condiciona a quantidade de Mg uti-
lizada pelo tomateiro. Quando esta relação é muito elevada, há
clorose.
É necessário chamar a atenção sobre as relações do Mg com os
oligoelementos. Assim, para diversas enzimas implicadas no meta-
bolismo das “oses”, o Mg pode ser substituído pelo Mn, apesar da
atividade final do sistema não ser a mesma.

213
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Em resumo, é normal registrar-se fenômenos análogos de carên-


cia com o Mg, Fe e Mn.
Finalmente, consideremos as relações Ca/Mg, por um lado, e Ca/
matéria orgânica, por outro, e a relação deles com os diferentes
oligoelementos, antes de passar ao estudo das repercussões desses
últimos, nos parece racional estudar, em primeiro lugar, as repercus-
sões da adubação orgânica sobre a resistência da planta, pelo ângulo
eventual de sua influência na proteossíntese. É o que nos propomos
fazer agora.

8. REPERCUSSÕES DA ADUBAÇÃO ORGÂNICA NA


RESISTÊNCIA DA PLANTA A SEUS DIVERSOS
PARASITAS

A) Concepção de certos pesquisadores, práticos e agrobiologistas


Já em 1946, DEMOLON escrevia: “Como indicou Gabriel
BERTRAND, é possível que o emprego de adubos sintéticos e a diminui-
ção dos aportes de adubo orgânico venham um dia a tornar mais freqüen-
tes, para nós, estas manifestações patológicas”.
O eminente agrônomo que foi DEMOLON aludia a certas
doenças adquiridas por carências, como a “podridão” da beterraba,
eficazmente tratada por correções à base de borato de sódio, na razão
de 15 kg/ha.
Além disto, DEMOLON observava também que: “O número de
doenças viróticas aumenta rapidamente. Elas existiam anteriormente,
houve um reforço de sua virulência, ou foram introduzidas com as
novas variedades?”
Essas questões já haviam sido colocadas por outros práticos e
agrobiologistas. Assim, em sua obra Testament Agricole*, onde resu-

*
“Testamento Agrícola”. (N. da T.) Esta obra será publicada pela Editora Expressão
Popular. (N. do R.)

214
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

miu suas observações e os resultados de sua longa carreira, HOWARD


coloca “o problema do paralelismo inquietante entre o desenvolvimen-
to dos parasitas, o dos tratamentos antiparasitários e da fertilização
exclusivamente mineral”.
Em relação ao chá* ele constata que a compostagem obtida atra-
vés de uma técnica própria de fabricação – o processo INDORE –
causa “uma melhoria do crescimento, da vitalidade em geral e um aumen-
to da resistência às doenças”. Ele explica este fenômeno “pela ação es-
timulante do húmus sobre o desenvolvimento das micorrizas”.
A respeito da videira, ele comenta: “A vida prolongada das espé-
cies de videira é a característica do Oriente, da mesma forma que o
emprego de esterco e a ausência relativa de danos causados por insetos e
fungos”.
Quanto às doenças viróticas, das quais voltaremos a falar mais
adiante- ele observa: “uma das plantas estudadas em PUSA foi o
fumo. Em primeiro lugar, viu-se aparecer, nas minhas culturas,
plantas malformadas (neste meio tempo se pôde demonstrar que
um vírus era o responsável). O vírus desaparecia quase totalmente
quando se tinha o cuidado de obter boas sementes, de fazer as plântulas
crescerem convenientemente nas sementeiras, de zelar por um bom trans-
plante e pelo trabalho do solo: finalmente, o vírus desapareceu quase
inteiramente”.**

*
Refere-se ao chá-da-Índia. (N. da T.). Thea sinensis L. (N. do R.)
**
Devido a sua vasta e longa experiência, HOWARD necessariamente tornou-se
filósofo e teorizador. Assim, às vezes, ele resumiu suas concepções de maneira um
pouco contundente e não conformista, de seu próprio estilo como estas que
deixamos à meditação do leitor:
“A ciência perde-se num labirinto de detalhes”.
“O problema jamais é considerado em seu conjunto”.
“O aumento do número de pesquisadores obscureceu mais do que clareou vastos
problemas biológicos”.
Enfim: “O trabalho de equipe não é um remédio para os inconvenientes do
retalhamento dos problemas. A renda tecida pelo trabalho de equipe freqüentemente
é cheia de buracos”.

215
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Podemos escutar daqui os protestos dos virologistas: segundo eles,


o vírus não teria desaparecido, mas no máximo, suas manifestações. E
é, sem dúvida, isto que HOWARD quis dizer. Todavia, e como já
vimos a propósito dos trabalhos de VAGO e da incidência dos
agrotóxicos sobre a planta, é certo que um condicionamento adequa-
do da planta por uma nutrição equilibrada e ativa possa aniquilar o
próprio vírus. É, pois, o que discutiremos adiante.
Devemos, igualmente, citar um outro agrobiologista. RUSCH
(1972)* escreve: “A agricultura biológica facilita consideravelmente
a solução do problema (o das doenças e pragas). As plantas, que na
agricultura química não poderiam sobreviver sem ajuda de produtos
fitossanitários, podem ser cultivadas sem o socorro de nenhum de-
les, desde que as condições naturais ótimas sejam efetivamente preenchi-
das”.
Estas duas posições referentes à proteção da planta podem ser
resumidas de uma forma lapidar.
· A agricultura “clássica” assegura: “Minha planta cresce bem,
porque não está doente”.
Subentendido: pelo fato de que devemos destruir os eventuais
parasitas, é necessário intervir, freqüente e quimicamente, com os
diversos agrotóxicos. O melhor, como é freqüentemente preconiza-
do, é “cobrir a planta” de produtos, constituindo-se uma “barreira”.
Certo, hoje se preconiza, mais ou menos, um controle dito “in-
tegrado”, que não é mais do que um tipo de compromisso entre a luta
“química” e a luta “biológica”. Contudo, ambos, e com todas as con-
tingências que isto comporta, visam a destruição da praga. Vimos, nos
capítulos precedentes, todas as dificuldades e todos os inconvenien-
tes que isto acarreta.

*
A obra básica de Ruch é La fècondité du sol, Le courrier du livre, Paris, 1972. O
original, em alemão, foi publicado em 1968, pela Karl T. Haus Verlag. O nome do
autor é H. P. Rusch. O original grafou-se sem o “c” (Rush). (N. do R.)

216
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

· Diametralmente oposta é a atitude da agricultura biológica.


Esta é feita com o objetivo de “dissuadir” o parasita de ata-
car a planta. Sua atitude pode ser concretizada na fórmula:
“Minha planta não está doente porque cresce bem”.
Isto se justifica, segundo nossa teoria da trofobiose, na medida
em que o crescimento “ótimo”, do qual fala RUSCH, corresponde a
um ótimo de proteossíntese. Assim, somos conduzidos a nos pergun-
tar em que a adubação orgânica, da qual falamos antes, pode estimu-
lar a proteossíntese. Qual seria o processo em jogo?
Ora, Didier BERTRAND (1974) observava: “Se o emprego de
matéria orgânica é recomendado nas culturas desde há muito tempo,
as razões científicas deste emprego foram pouco estudadas”. Contudo,
nos últimos anos, um certo número de fatos foram estabelecidos. Eles
nos permitem ver mais claramente a causa deste fenômeno e explicar,
ao menos parcialmente, esta “propriedade indeterminada da matéria
orgânica” a que faziam referência PILAND e WILLIS (1937) a respei-
to da assimi1ação do cobre e do manganês pelo trigo. Esses autores
mostraram, em experiência de laboratório, uma nítida influência so-
bre o crescimento da gramínea, de um simples disco de papel-filtro
misturada ao quartzo que servia de suporte.
Para comodidade da exposição e, ainda que esta separação seja um
pouco artificial, podem ser distinguidos dois tipos de repercussões da
matéria orgânica: as que se relacionam mais especificamente à vida do
solo, e as outras, com a vida da planta. Estes dois tipos de influência
repercutem, finalmente, sobre o metabolismo e, portanto, sobre a
resistência da planta.

B) Propriedades da matéria orgânica em relação ao solo


A maior parte dos autores reconhecem que a adubação orgânica
tem um certo número de propriedades:
– melhoria da capacidade do solo no que diz respeito à retenção
de água;

217
F R A N C I S C H A B O U S S O U

– melhoria, igualmente, da microflora do solo;


– além disto, a adubação orgânica proporciona ao solo alimentos
minerais, em quantidades não desprezíveis, sobretudo N, S, P, Mg e K.
A matéria orgânica contém também os oligoelementos, que libera
no curso de sua decomposição. Em solo ácido, por exemplo, a ma-
téria orgânica faz o manganês passar ao estado reduzido, aumentan-
do assim sua mobilidade e disponibilidade para as plantas. Ao
contrário, teria sido observado que o adubo orgânico diminui a con-
centração de zinco disponível no solo, enquanto o extrato de alfafa a
aumenta. Quanto à celulose, constituinte essencial do filtro de pa-
pel da experiência de PILAND e WILLIS, à qual já nos referimos,
aumenta consideravelmente o teor de boro solúvel.
Pela importância dos oligoelementos na fisiologia da planta e, em
articular, na proteossíntese (que veremos confirmada no próximo
capítulo) parece que temos aí uma das razões pela qual a adubação
orgânica e, especialmente, as compostagens, estimulam a resistência.
Além disto, parece ocorrer o mesmo processo com os macroelementos.
No que diz respeito ao nitrogênio, lembrando que sua liberação e
sua estocagem mineral são fenômenos microbianos, DELAS et alii.
(1973) distinguem dois tipos de evolução no solo:
1. Nos materiais ricos em nitrogênio, isto é, com relação C/N bai-
xa, a decomposição vai se traduzir por uma liberação do nitrogênio
mineral; ela começa na primavera para atingir seu máximo no fim do
verão.*
2. Se, ao contrário, a relação C/N for elevada, por exemplo, a
matéria orgânica sendo uma palha ou esterco* pouco decomposto, os
microrganismos vão, em primeiro lugar, retirar o nitrogênio neces-
sário à sua síntese de proteínas. Há, portanto, aproveitamento
microbiano do nitrogênio ao invés de sua mineralização. Daí o efeito

*
Não esquecer que o autor refere-se ao Hemisfério Norte. (N. do R.)
*
Refere-se a esterco misturado com restos vegetais. (N. da T.)

218
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

depressivo do enterramento das palhas nas culturas, sem o aporte


complementar do nitrogênio mineral.
Estes resultados experimentais parecem explicar por que os “in-
ventores” da compostagem insistem num “amadurecimento” conve-
niente antes de seu emprego.
Outro ponto importante da ação da adubação orgânica é o da
estabilização da estrutura dos solos. Isto ocorre, primeiro, graças ao
trabalho dos microrganismos que se desenvolvem rapidamente, às
expensas das substâncias carbonadas. Após, num segundo estágio,
pelos produtos transitórios provenientes da humificação. Assim, se
chega ao último estágio: os ácidos húmicos, cuja evolução é muito lenta.
LEMAIRE (1972) demonstrou experimentalmente que o efeito
depressivo da palha desaparece ao cabo de dois meses de decompo-
sição em estufa, e que é necessário esperar três meses para obter efeitos
estimulantes. Ele acrescenta: “Pode-se imaginar que no curso da fer-
mentação as substâncias de efeito depressivo desapareçam ou se trans-
formam, dando nascimento às substâncias de efeito estimulante”.
Efetivamente, experimentando adubação orgânica em azevém,
LEMAIRE obteve, pela utilização da matéria orgânica, “um efeito
específico, traduzido por um estímulo do crescimento e um aumento dos
rendimentos”.
Certamente estes fatos são bem conhecidos pela maioria dos agri-
cultores e, principalmente, dos agrobiologistas. Contudo, seria útil
demonstrá-los experimentalmente. Diversos outros trabalhos também
permitem melhor compreender o mecanismo desta estimulação do
crescimento pelas diversas substâncias contidas no húmus.
FLAIG (1965) mostrou que no curso da formação das substân-
cias húmicas há liberação, por ação microbiana, de compostos facilmente
assimiláveis, como NH4 e NO3, que podem, portanto, servir direta-
mente à alimentação das plantas.
Esse autor identificou diversos ácidos, produtos da degradação
das ligninas ou de compostos fenólicos que mostraram influência

219
F R A N C I S C H A B O U S S O U

sobre a fertilidade do solo e sobre a amplitude de crescimento do


vegetal.
Por outro lado, a ação microbiana prossegue, pela formação de
fenóis e de quinonas, ainda produtos da decomposição das ligninas no
solo, e que se formam, portanto, quando da compostagem dos materiais
vegetais. FLAIG observa que quinonas e fenóis são pouco estáveis, mas
que, em compensação, são 10 a 100 vezes mais ativos que os produtos
resultantes diretamente da degradação da lignina.
FLAIG indica que a ação destas substâncias fisiologicamente
ativas depende das condições de meio, como a quantidade dos elemen-
tos nutritivos assimiláveis (fator que parece não ser considerado pelos
patologistas que procuram combater as doenças pelo emprego das
diversas substâncias de crescimento), e dos fatores ambientais, como
temperatura, luz e umidade. Isto permite explicar as contradições entre
diversos autores no que se refere à influência das frações húmicas sobre
o metabolismo do vegetal.
Assim, chegamos a um segundo tipo de ação da matéria orgânica.

C) Propriedades da matéria orgânica em relação à planta


Está confirmado que, além do aporte de substâncias nutritivas, a
adubação orgânica fornece à planta substâncias de crescimento, permi-
tindo a assimilação das primeiras.
De uma maneira geral, a ação dessas substâncias de crescimento se
traduz por um aumento do nível de respiração e de clorofila e, “refe-
rente à parte central do metabolismo, por reações de “fosforilação”
localizadas nas mitocôndrias.
Assim, a fosforilação oxidativa permite à planta armazenar ener-
gia para formação de ADP e ATP. Segundo FLAIG, “as duas reações,
de combustão do hidrogênio e de formação de ATP, estão acopladas.
Este acoplamento se reduz à medida que a concentração de substân-
cias fisiologicamente ativas aumenta, isto é, que o teor de fosfatos
minerais aumenta e o de ATP diminui”. Ora, observa ele,”para uma

220
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

intensidade determinada de interação, o aumento do teor de fosfato na


célula acelera os processos metabólicos ligados à presença dos íons de
fosfato”.
Finalmente, estes processos criam os produtos necessários à sín-
tese da matéria vegetal, como os açúcares. Os derivados glicídicos
participam da elaboração de compostos aromáticos, que por sua vez
produzem as ligninas, bem como os compostos cetônicos precursores dos
aminoácidos e das proteínas.
Essas relações entre a matéria orgânica e a assimilação do fósforo
têm sido confirmadas desde então por diversos trabalhos. Assim,
KUTE et alii. (1967) mostraram que em solo calcário, na presença
de colóides húmicos, os rendimentos aumentam nitidamente com o
aporte de adubos fosfatados. Isto se explica porque “o húmus, clara-
mente, fez a planta aumentar a utilização das reservas fosfóricas do solo
e da adubação orgânica fornecida”.
Da mesma forma, trabalhando em laboratório sobre discos de
beterraba, VAUGHAM e MAC DONALD (1971) confirmaram que
os ácidos húmicos estimulam a capacidade de absorção do fósforo.
Também é necessário mencionar os trabalhos de POONIA e
RHUMBLA (1974) relativos à fertilização da cevada. Estes autores
mostraram que a aplicação de esterco era muito eficaz para a produ-
ção de matéria seca num solo sódico, desde que esse fosse aplicado
com gesso agrícola. Não ocorre o mesmo fenômeno com o carbona-
to de cálcio. Os autores relatam que: “O desempenho medíocre da
colheita de cevada em um solo tratado com gesso agrícola, sem apli-
cação de adubo orgânico, indica que, apesar da carência em cálcio ser o
principal fator de um crescimento, medíocre da planta, os problemas de
condições físicas do solo e outras deficiências nutricionais eram igualmente
importantes”.
POONIA e RHUMBLA (op. cit.) observam também o aumen-
to gradual de potássio, em resposta às aplicações de adubo orgânico. Além
disto, uma aplicação de matéria orgânica em solo tratado com gesso

221
F R A N C I S C H A B O U S S O U

agrícola propicia uma absorção total de Ca, Mg, Na, N e P, de 3 a 5


vezes maior.
Está confirmado que a matéria orgânica fermentada estimula a
assimilabilidade dos elementos.
Em resumo, os diferentes trabalhos que acabamos de revisar, rela-
cionados às repercussões da matéria orgânica fermentada em relação ao
solo e à nutrição da planta, convergem, perfeitamente, para acentuar
seus efeitos positivos sobre o crescimento da planta. Vimos,que a planta
assim adubada assimila melhor os oligoe1ementos, o fósforo e, mesmo,
o potássio. Trata-se de um processo extremamente complexo e temos
ainda muito a aprender, especialmente sobre os fenômenos da elabo-
ração das substâncias de crescimento durante a fermentação da maté-
ria orgânica. Estes fenômenos explicam a estimulação da proteossíntese
que daí resulta, tendo como conseqüência a resistência da planta, re-
sistência que diz respeito, inclusive às doenças viróticas, como veremos
a seguir.

D) Adubação orgânica e resistência da planta às doenças viróticas


Foi, ao longo do quarto capítulo que tratamos, pela primeira vez,
dos efeitos benéficos da adubação orgânica sobre a resistência da planta.
Assim, pudemos constatar que sobre árvores de pessegueiro que rece-
beram esterco as repercussões nefastas do Ziram eram um pouco ate-
nuadas. As análises dos ramos mostraram que se tratava de um efeito
positivo da matéria orgânica fermentada sobre a proteossíntese. Vere-
mos, no caso de uma doença virótica – que consideramos exemplar –
que a regressão provocada pelo adubo orgânico procede, verdadeiramen-
te, do mesmo fenômeno.
MEHANI (1969) havia constatado na Tunísia, na variedade de
alcachofra “Violet de Provence”, a existência de um mosaico cujas
repercussões são particularmente freqüentes no segundo e, sobretu-
do, terceiro ano de cultura. Essa doença virótica é, evidentemente,
acompanhada de quedas consideráveis de rendimento.

222
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Ora, na França, onde havia trabalhado, MEHANI observara que


estas mesmas alcachofras jamais manifestavam os sintomas da doen-
ça. No entanto, transportadas para a Tunísia, elas exteriorizavam o
mosaico e não se restabeleciam mais.
Esta contradição levou o autor a estudar a influência dos adubos
orgânicos sobre as manifestações da virose. Os experimentos foram
baseados no fato de que, durante sete anos, uma plantação de alca-
chofras “bem cultivada” não apresentou sintomas de degenerescência.
Isto parece provar que, como na França, graças a certos fatores cultu-
rais, o vírus podia, senão desaparecer (para demonstrá-lo teria sido
necessário realizar análises), pelo menos permanecer indefinidamente
neste “estado latente”, que falamos anteriormente.
Segundo o próprio autor, “a freqüência desta degenerescência podia
ser vista como resultado de fatores desfavoráveis a um bom desenvolvimento
da planta”.
As experiências de MEHANI, efetivamente, mostraram que o emprego
de esterco reduziu consideravelmente os sintomas e repercussões nefastas da
degenerescência, como mostra o gráfico da fig. 30.
Entretanto, não se poderia perder de vista, na análise desse processo,
que a ação dessas adubações orgânicas é, de fato, superposta aos aportes
minerais. Tudo se passa como se a fertilização orgânica, favorecendo a
assimilação dos elementos, isto é, a proteossíntese, tivesse, ao mesmo tempo,
estimulado sua resistência em relação às manifestações nefastas do vírus.
Resumindo, os experimentos de MEHANI (op. cit.) trazem a
demonstração científica das constatações empíricas dos práticos e
agrobiologistas que citamos no início deste capitulo. Os resultados
também concordam com as conclusões apresentadas por CHOUARD
(1972) depois de uma missão na China, e que cremos necessário re-
produzir: “As práticas dos camponeses chineses que me foram relata-
das absolutamente não consistem em destruir os vírus ou eliminá-los,
mas em atenuar e, às vezes, fazer desaparecer, nas condições locais
particulares, a expressão dos sintomas da contaminação viral. O frio

223
F R A N C I S C H A B O U S S O U

noturno e a luz intensa têm estas propriedades, e ninguém sabe realmen-


te, até este momento, qual é a base científica rigorosa da atenuação dos
sintomas sem desaparição do vírus”.
CHOUARD acrescentava: “Não é, pois, desprovida de interes-
se, longe disso, a utilização dos métodos empíricos que eu chamaria
de ‘sintomatológicos’”.
Após termos estudado as relações entre as repercussões dos agrotóxicos
sobre a fisiologia da planta e o desenvolvimento das doenças viróticas,
acreditamos ser perfeitamente possível que um condicionamento
adequado da planta, através da nutrição, possa, ao contrário de cer-
tos agrotóxicos, não fazer desaparecer apenas os sintomas, mas tam-
bém o próprio vírus De qualquer forma, temos aí uma solução agronômica
que não é mais empírica – como já vimos e como veremos confirma-
do mais adiante – que o uso de agrotóxicos, especialmente nos
fungicidas, no controle fitossanitário.
É isto que nos propomos estudar no prõximo capítulo, consagra-
do à proteção da planta, através – como no mosaico da alcachofra –
da fertilização do solo e de tratamentos à base de oligoelementos, estes
últimos tendo sido, deliberadamente, deixados de lado, ou quase, até aqui.
Devemos chamar a atenção de que, se a adubação orgânica pode levar
aos resultados interessantes que acabamos de expor, é necessário que
os adubos orgânicos e compostagens contenham, não apenas substân-
cias de crescimento, mas também oligoelementos.

224
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Fig. 21. Intervenção dos elementos minerais no metabolismo do


nitrogênio.
(Esquema ROUTCHENKO, documento pessoal.)

225
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Fig. 22. Correlação entre o grau de ataque do fungo da sarna da


macieira (Endostigma inaequalis) e a relação N % / K2O % nas folhas
(Segundo LEFTER, PASCU e POP, 1970.)

226
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Fig. 23. Influência dos diversos inseticidas sobre a relação K / Ca


nas folhas da videira. (CHABOUSSOU, 1969.)

227
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Fig. 24. Relação entre o teor em K nas folhas de videira (cepa


Semillon) e seu conteúdo em aminoácidos. (Segundo HOFFMANN
e SAMISH, 1969.)

228
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Fig. 25. Influência do tipo de correção sobre bergamoteiras em


relação às populações da cochonilha (Lepidosaphes beckii), Newman,
em 1970. (Experimento CHABOUSSOU: Sidi Bouknadel, 1970.)

229
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Fig. 26. Influência do tipo de correção sobre bergamoteiras em


relação às populações de Lepidosaphes beckii , Newman, em 1971.
(Experimento CHABOUSSOU: Sidi Bouknadel, 1971.)

230
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Fig. 27. Contaminação dos frutos (bergamotas) por Lepidosaphes


becckii Newman, na colheita, segundo os diferentes tipos de corre-
ção e em função dos valores da relação K/Ca + Mg nas cascas. (10 de
outubro de 1969).

231
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Fig. 28. Correlação entre os ataques de Botrytis em tomate e a


relação Ca/P nos tecidos foliares, em função das correções à base de
cal hidratada. (Segundo os dados de STALL et alii. 1965.)

232
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Fig. 29. Esquema referente às influências conjugadas do


fotoperíodo e do equilíbrio dos elementos catiônicos K e Ca, em
relação aos fenômenos de proteogênese, de proteólise e do teor nas
folhas de certos aminoácidos, em Mentha piperita. (Segundo CRANE
e STEWART, 1962.)

233
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Fig. 30. Influência do esterco superposto a dos adubos minerais,


sobre as manifestações do mosaico da alcachofra. (Segundo dados de
MEHANI, 1969.)

234
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

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p. 1052.

238
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

239
CAPÍTULO VII

A CORREÇÃO DAS CARÊNCIAS COMO


TERAPÊUTICA DAS DOENÇAS

“Segundo SEZARY, os medicamentos ditos específicos, como o mercúrio, não


seriam específicos em relação aos germes patológicos, mas apenas agiriam nas
reações do organismo. Em outras palavras, mercúrio, bismuto e arsênico não
matariam o agente microbiano — o espiroqueta — mas aumentariam a vitalida-
de do organismo, de tal forma que este encontraria no medicamento um auxílio
para lutar contra a infecção. É a razão por que estes medicamentos podem curar
lúpus, psoríase, reumatismo blenorrágico, erisipela, asma etc.”.
Dr. Albert LEPRINCE (La Médicine Electronique)

“Uma proveitosa via de proteção da planta seria aberta se tivéssemos mais infor-
mações sobre os mecanismos naturais da resistência às doenças. Produtos quími-
cos sistêmicos, capazes de alterar o metabolismo da planta para induzir a
resistência, poderiam encontrar um lugar de destaque, para proteger os vegetais”.
Joseph KUC (The plant fights back, 1961)

“O controle de Oidium (dos cereais) pode ser enfrentado com a ajuda de um


número considerável de produtos, mesmo os mais simples, desde que sejam acom-
panhados de um tensoativo. Este tipo de controle, teria a particularidade de que
a escolha do produto seria baseada, em primeiro lugar, numa outra qualidade que
não o seu valor fungicida, ou seja, seu valor nutritivo”.
G. PARMENTIER (Parasitica, XXV, nº 3, 1969)
F R A N C I S C H A B O U S S O U

1. CARÊNCIAS E DOENÇAS
Um agrônomo, no sentido estrito da palavra, observou: “Não se
exclui que existem relações entre as carências e determinadas doenças,
especialmente bacterianas e viróticas. As doenças podem favorecer as
manifestações de carência e vice-versa. Por exemplo, as árvores com carên-
cia de boro ou zinco poderiam ser mais sensíveis a determinadas doenças
viróticas ou bacterianas”. (TROCMÉ, 1964.)
É curioso que esta aproximação não tenha incitado os patologis-
tas a certos questionamentos, especialmente, de saberem se, efetiva-
mente, não haveria relação de causa e efeito entre carência e patogenia,
além da convergência de sintomas. Acreditamos não haver dúvida de
que a carência antes e, depois da doença, constituem uma seqüência
obrigatória. Propomo-nos a dar vários exemplos, a seguir:

1. Em relação à videira
COOK e GOHEEN (1961) observam, no momento da colhei-
ta, a similaridade de sintomas nas cepas com enrolamento foliar e nas
videiras com carência de potássio. Na análise, nota-se, os dois tipos
de videiras mostram carências de K e Mg, que são praticamente idên-
ticas nos limbos. A única diferença, no caso do enrolamento, é que
o K se acumula nos pecíolos e a concentração de Mg, aí, é baixa. É
praticamente o inverso que ocorre com carência apenas de K.

2. Ora, sempre com a videira


Os fenômenos desse tipo, põe como causa as carências no de-
senvolvimento de doenças viróticas, que poderiam ser muito mais
freqüentes do que, geralmente, se imagina. Parece significativo que,
em Latresne, * DELAS e MOLOT (1967) tenham observado que:
“O vinhedo apresenta numerosos ataques de doenças viróticas: as ma-
nifestações que elas provocam (descolorações, enrolamentos, modifica-

*
Trata-se do vinhedo experimental do INRA, Bordeaux.

242
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

ções da forma das folhas), tornaram mais difícil a identificação dos


sintomas de carência”.
Esta confusão seria bastante lógica se, como se pode pensar, as
carências estiverem na origem do desencadeamento das doenças
viróticas, como acontece seguidamente, toda a dificuldade consiste
em determinar o limite entre a causa e o efeito. Mas, prosseguimos.

3. Carência de boro e chumbo da videira


BRANAS (1971) registra que a carência de boro provoca o
“chumbo” da videira. Ele observa que se trata de um enfraquecimento
curável pelo transplante para um terreno com nutrição mais favorá-
vel ou por aporte de boro nas folhas ou no solo.
Essa carência foi identificada, em Portugal, como a doença da
“Maromba” do vale do Douro.
Falaremos do boro e de outros oligoelementos mais adiante. É
necessário registrar que, também é a carência do solo em boro que está
na origem de uma doença da beterraba, isto é, da instalação de um
fungo patógeno, o Phoma betae.

4. Carência de boro e “vírula” do damasqueiro


PENA e AYUSO (1970) observaram que “diferentes razões levam
a pensar em uma origem viral, mas a evolução da doença e o resultado
das análises foliares conduzem à hipótese de uma carência de boro”.
Os autores ainda raciocinam, aqui também, como se estas duas
eventualidades sejam excludentes entre si, mas tudo leva a crer que uma
é conseqüência da outra. Depois, PENA e AYUSO (op. cit.) propuse-
ram-se a estudar as incidências dos aportes de boro no solo, em rela-
ção ao eventual restabelecimento das árvores atingidas. Eles notaram
indícios de uma interação vírus carência no boro. Infelizmente, apesar
de nossos esforços, não pudemos obter os resultados de seus trabalhos.
À primeira vista, parece mais racional corrigir a carência de um
oligoelemento diretamente no solo, porque se conhece as quantidades

243
F R A N C I S C H A B O U S S O U

que se coloca. Contudo, os resultados são aleatórios, porque não se


sabe se a planta realmente pôde absorver, devido a eventuais fenôme-
nos de bloqueio. Ao contrário, as pulverizações foliares dão resultados
muito mais rápidos no que diz respeito à identificação de uma carên-
cia. Voltaremos ao assunto, no próximo capítulo.

5. Carência de cobre e swollen shoot virus do cacau*


LOCKARD e ASOMANING (1965), trabalhando com nutri-
ção de cacau (Theobroma cacao), observam o inchamento de brotos
em plantas com carência de cobre, que se parecem com os causados
pelo swollen shoot virus. Isto leva os autores a sugerirem a hipótese de
uma interação: nutrição vírus no cacau.
Entretanto, esses autores propõem uma seqüência inversa à nos-
sa, a saber: o vírus competindo com a planta por alguns de seus
produtos metabólicos, provocaria uma deficiência de cobre, daí os
sintomas observados. Todavia, seus experimentos não conseguiram
confirmar esta hipótese. Mas eles constataram o agravamento da
doença na ausência de luz, isto é, por falta de energia recebida pela
planta. É a confirmação de que a doença estaria relacionada a uma
deficiência da proteossíntese, e que a causa primária da aparição do vírus
seria exatamente a carência de cobre, pois sabemos o papel desse
oligoelemento, para a proteossíntese.

6. Enfraquecimento de macieiras na Itália


REFATITI et alii. (1970) constataram, a partir de 1965, enfra-
quecimentos das macieiras, numa região restrita da província de
Sondio, na Itália. Os sintomas são: definhamento dos brotos, provi-
dos de raras folhas de cor verde-pálida, levemente enroladas; os

*
A grafia, no original de Chaboussou, cita os nomes das viroses em inglês, mas
trazemos significados como, “Vírus do inchamento do ramo do cacau”, não ocorre
no Brasil, Ceplac, 2006. (N. do R.).

244
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corimbos, freqüentemente incompletos, apresentam alterações na cor


de suas pétalas; a colheita, evidentemente, é reduzida e de medíocre
qualidade.
Até então nenhuma infecção fúngica ou bacteriana havia sido
registrada nas árvores enfraquecidas. Em compensação, “sintomas
de Stem Pitting Virus Disease* e de Blister Bark* (dois vírus) haviam
sido observados sobre os galhos principais e o tronco. O fenôme-
no foi detectado sobre árvores de todas as idades, a partir de cinco
anos.
Os autores consideram estranho que a doença só afete uma área
limitada e de cultivo relativamente recente. Observam que as condi-
ções ambientais não parecem muito diferentes das de outros cultivos
de macieiras na Itália.
Como não questionara natureza do solo, já que, às vezes, de um
metro para o outro a concentração em oligoelementos é extremamente
variável? Um congressista que assistia a esta comunicação observou
que tinha encontrado sintomas semelhantes, em pereiras, onde os
indicadores revelaram a presença de vírus latentes.
Ora, vimos anteriormente, que é necessário entender esta noção:
numerosos fatos nos fazem pensar que a doença pode ser desencadeada
por determinados fatores ambientais, por intermédio da nutrição e, sem
necessidade de infecção prévia.
Outra razão de suspeitar de carências como origem desta doen-
ça é que esses pesquisadores obtiveram uma “cura” através de pulveriza-
ções à base de produtos cúpricos e com zinco. Penetrando na planta e
agindo como medicamentos internos, como já sugerimos e como tratare-
mos adiante, esses elementos poderiam ser a origem da resistência, pela
modificação benéfica do metabolismo da planta.

*
“Vírus da acanaladura do tronco”. Sarasola e Sarasola, 1975. (N. do R.)
*
“Vírus da pústula da casca”. Sarasola e Sarasola, 1975. (N. do R.)

245
F R A N C I S C H A B O U S S O U

2. A TERAPÊUTICA PELA CORREÇÃO DE CARÊNCIAS

A) Correção de macroelementos
Como vimos no capítulo anterior, conforme o caso, o aporte de
K ou Ca no solo estimula a resistência da planta. A correção da ca-
rência produz um novo equilíbrio nos elementos catiônicos, especi-
almente na relação K/Ca, que parece ser uma das mais importantes.
Assim, NGUYEN et alii. (1972), em seus trabalhos sobre “a
influência da adubação nitrogenada, fosfatada e potássica na incor-
poração dos aminoácidos às proteínas e os rendimentos da alfafa”,
concluem que: “A fertilização com K aumentou levemente a concentra-
ção de N total, diminuiu o acúmulo dos aminoácidos livres e favoreceu sua
incorporação às proteínas”.
O problema é que esse equilíbrio é difícil de ser conseguido atra-
vés de adubos solúveis. A própria adubação potássica, benéfica neste
caso, pode ser nefasta em outros, por exemplo, afetando a fixação de
nitrogênio pelo Rhizobium leguminosarum, provavelmente pela des-
truição desta bactéria (KOCH e MENGEL, 1972).
Também está bem estabelecido, sem dúvida, por um processo
análogo, que as aplicações de nitrogênio solúvel dificultam ou inibem
totalmente a fixação do nitrogênio atmosférico. Assim, na fertiliza-
ção das pastagens que tenham leguminosas,seria necessário evitar a
utilização de nitrogênio na forma solúvel, sob pena de vê-las desapa-
recerem.
Esses fatos, há muito constatados pelos agrobiologistas, fizeram
com que se banissem todos os adubos solúveis, com alguma aparên-
cia de razão.
Os adubos provocam repercussões múltiplas, diretamente sobre a
nutrição imediata da planta e, indiretamente, sobre a vida e fertilida-
de do solo, pela ação tóxica sobre os microrganismos. Se o adubo foi
distribuído ao nível do solo, torna-se impossível a generalização dos
efeitos desta ou daquela correção, em relação à resistência da planta.

246
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O mesmo não ocorre quando os elementos nutricionais são for-


necidos à planta sob forma de pulverizações foliares, especialmente
no caso dos oligoelementos.

B) Correção do elementos menores ou oligoelementos

Já tivemos a oportunidade, especialmente ao longo do segundo


capítulo, de mostrar toda a importância dos oligoelementos na resis-
tência da planta. Isso se explica, por seu papel nas “máquinas ferra-
mentas” que são as enzimas e, portanto, sua importância no fenômeno
da proteossíntese, ligado à resistência.
Entretanto, antes de analisarmos o modo de ação de determina-
dos fungicidas clássicos, veremos exemplos de controle de doenças ou
insetos, pela simples ação dos oligoelementos.

1. Oligoelementos e brusone do arroz


PRIMAVESI et alii. (1972) dedicaram-se ao controle desta
moléstia durante vários anos. Observando que ela se torna cada vez
mais devastadora em todo o mundo, eles citam que dois autores,
SALLEBERRY-RIBEIRO 1970) e SANCHEZ NEIRA (1970) ve-
rificaram a ineficácia dos fungicidas. Não é, pois, a primeira vez que
encontramos constatações igualmente desiludidas. Assim, eles reco-
mendam, finalmente, correções equilibradas, como medida preventiva.
PRIMAVESI et alii. (op. cit.) puderam mostras as influências
benéficas do manganês e do cobre. Este último elemento aumentou
a quantidade e a qualidade da colheita. Eles chegam a esta importante
conclusão: “É evidente que a contaminação da semente, do solo e da
água, pelos esporos de Pyricularia não tem influência sobre a saúde da
planta quando a nutrição está equilibrada. Mesmo em variedades susce-
tíveis a doença não sobrevive. Pode-se admitir que os níveis de 18 ppm de
manganês e 2 ppm de cobre são suficientes para manter as plantas em bom
estado de saúde nos solos estudados”.

247
F R A N C I S C H A B O U S S O U

São estudos de diversos anos, com conclusões categóricas e até


revolucionárias: “É evidente, dizem eles, que nem o clima, que nos
três primeiros anos mostrou-se muito favorável à Pyricularia oryzae,
permitindo o desenvolvimento da doença nas diferentes regiões do
Estado [no Brasil], nem a presença de esporos podem ser respon-
sáveis pelos ataques devastadores nas lavouras de arroz. O
desequilíbrio mineral, que torna a planta suscetível ao ataque, parece
ser o fator decisivo”.
Seria difícil ressaltar com mais vigor e clareza a importância do
estado fisiológico da planta na sua resistência à doença.
Quanto à ineficácia dos fungicidas, assinalada por diversos autores
- e que concorda com as observações, do mesmo gênero, os cereais
(PARMENTIER, op. cit.) e as árvores frutíferas (SOENEN, op. cit.)
– ela se explica realmente pelo fato de que os produtos comerciais,
normalmente usados, não modificariam a fisiologia do arroz num
sentido favorável, ao nível da proteossíntese.
Parece ocorrer o contrário com os oligoelementos que, colocados
no solo, têm ação sobre a nutrição da planta. Isto, veremos agora,
confirmado por alguns exemplos.

2. Os Oligoelementos e a requeima da batata


MUDICH (1967) recorda que, segundo GALILOV, a suscetibi-
lidade da batata às doenças pode ser reduzida com a aplicação, no solo,
de determinados oligoelementos, como Cu, Mn, B e Zn. MUDICH
realizou experimentos para estudar os efeitos do aporte simultâneo de
diversos oligoelementos com o superfosfato, em relação à requeima.
Ora, nesses experimentos, só o molibdênio, ao contrário do Cu,
Zn e Mn provocou um decréscimo na sensibilidade da batata à re-
queima.
Segundo MUDICH (op. cit.), os oligoelementos só favorecem a
saúde da planta se utilizados juntamente com um adubo dito “de
base”. De certa forma os oligoelementos agem como “catalisadores”,

248
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

estimulando a atividade das enzimas e, conseqüentemente, acelerando


a elaboração de proteínas e substâncias de reserva, a partir dos
macroelementos.
Assim, relembramos que, o molibdênio favorece simultaneamente
a fixação microbiológica do nitrogênio, a amonificação e, enfim, o índi-
ce de nitrificação. Através do índice de nitrificação se pode ter uma boa
avaliação da atividade biológica global do solo.

3. Os Oligoelementos e “enrolamento do lúpulo”


PRUSA (1965) observa, antes de tudo, que as experiências para
demonstrar o caráter infeccioso da doença não puderam provar sua
origem virótica. Mas, foi possível, o autor estabelecer, claramente, a
relação entre as condições de nutrição e a variabilidade das manifes-
tações externas da doença.
PRUSA (op. cit.), pôde igualmente estabelecer, num experimento
de campo, que a doença foi inibida pela aplicação de sais de diferen-
tes elementos, sobretudo, B, Mg, Mn, Ni, I e Zn.
Por outro lado, as análises de folhas mostram nas plantas doen-
tes, um conteúdo mais baixo de zinco e uma concentração mais eleva-
da de P, K e Ca. As diferenças em relação aos outros elementos são
variáveis.
Na Alemanha Federal, esses resultados levaram a combater a
doença com preparados e “fungicidas” à base de zinco, como sulfato
de zinco e Zineb, que agem indiretamente sobre o metabolismo da
planta.
Estes tratamentos substituem os fungicidas clássicos à base de cobre,
que aumentam a intensidade da doença causada por Pseudoperonospora.
Efeitos similares ao do zinco podem ser obtidos com boro e
magnésio. Nas plantas doentes o teor destes elementos é mais baixo
que nas sãs.
Este novo exemplo de controle por tratamento à base de
oligoelementos confirma a estimulação da resistência pela modifica-

249
F R A N C I S C H A B O U S S O U

ção benéfica da fisiologia da planta. O próprio autor reconhece que


se trata de uma “terapia sintomática” da doença.
O agravamento da doença pelos produtos cúpricos nos leva a
questionar se, na maioria dos casos, ou até em sua totalidade, os
produtos antifúngicos não teriam ação indireta. É o que nos propo-
mos analisar no próximo parágrafo.

4. Oligoelementos, pulgões e doenças viróticas.


RUSSEL(1972) observa que a resistência ao vírus da icterícia da
beterraba,* compreende diversas formas:
– a resistência aos pulgões vetores do vírus;
– a resistência à inoculação dos vírus;
– a tolerância aos vírus.
Esse mesmo autor observa, “cada uma delas pode ser afetada por
diversos fatores, capazes de diminuir seriamente a resistência. Por
exemplo, os fatores que modificam a concentração de glicídios e
aminoácidos nas folhas afetam a resistência aos pulgões, bem como a
resistência à inoculação do vírus”.
RUSSEL (op. cit.) observa que “a resistência também é afetada
variando-se as concentrações de certos macro ou oligoelementos no
solo”.
Assim, os sais de lítio, zinco ou níquel estimulam o estabeleci-
mento dos pulgões na planta, enquanto o boro repele os afídeos
A transmissão do vírus seria aumentada pelo lítio e boro mas
inibida pelo cobre e zinco.
RUSSEL (op. cit:) sugere que os oligoelementos podem agir di-
retamente sobre o ataque de pulgões, e indiretamente modificando o
metabolismo dos tecidos foliares. Considerando-se o comportamento dos
pulgões, os dois fenômenos devem estar estreitamente ligados.Estes

*
Icterícia, ou amarelecimento, da beterraba é causado pelo vírus BYV (Valíela,
1969). (N. do R.)

250
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insetos se nutrem e preferem substâncias solúveis. Por esta razão, seja


em folhas muito jovens, seja em senescentes ricas em substâncias so-
lúveis, eles serão mais atraídos pelas plantas atacadas por vírus, por-
que elas encontram-se em estado de proteólise dominante. Aliás, sua
fecundidade é superior em plantas com virose do que em plantas sa-
dias.
Um fato parece confirmar este ponto de vista: o boro, que repele
o ataque de pulgões, também é o oligoelemento cuja carência é res-
ponsável pela doença do coração da beterraba, provocada por Phoma
betae. Como mencionei antes, esta afecção é eficazmente controlada
com incorporações no solo de borato de sódio, Bórax.
É um exemplo onde a melhoria da resistência da planta à moléstia
parece concordar com sua imunidade relativa ao pulgão. Quando
estudarmos o papel do boro na fisiologia da planta, veremos que se
trata de um efeito positivo desse oligoelemento sobre a proteossíntese,
de acordo com nossa teoria.*

3. EFICÁCIA DOS FUNGICIDAS CLÁSSICOS COMO


CORRETIVOS DE CARÊNCIAS

A) o caso da calda bordalesa


Em sua obra, clarividente, A evolução científica e a agricultura
francesa, DEMOLON observa que a calda bordalesa clássica a 2%,
formulada por MILLARDET, em 1886, não pôde ser igualada. Pros-
seguindo, ele sublinha: “Se, desde essa época, foram realizados pro-
gressos quanto à época e modo de aplicação(contra o míldio), o
mesmo não ocorreu com a explicação do papel aparentemente espe-
cífico do cobre. Quando as pesquisas identificarem o mecanismo de ação

*
Não se pode esquecer que a fisiologia da planta depende de sua fertilização e da
influência dos agrotóxicos aplicados. Por exemplo, na beterraba, não adiantaria
dosar bem os oligoelementos se os agrotóxicos, eventualmente aplicados, dessem
um efeito contrário.

251
F R A N C I S C H A B O U S S O U

do cobre, poderão se abrir novas vias capazes de conduzir mais longe e


melhorar uma situação que, por mais satisfatória que seja, penaliza a
viticultura com elevados custo”.
Como se pode constatar, estas linhas, escritas em 1946, ainda
permanecem atuais.Entretanto, é hora de questionarmos determina-
das dificuldades inerentes ao modo de ação do cobre e da calda
bordalesa. Sua origem é, como se sabe, essencialmente empírica:
percebeu-se que as videiras das extremidades das fileiras, aspergidas
com sulfato de cobre para afastar os gatunos, não sofriam com o
míldio, quando comparadas às outras.
Resumindo brevemente a questão, diremos que a dificuldade
para explicar a ação, em princípio fungicida, deste preparado, resi-
dia na insolubilidade em água, dos produtos depositados ou transforma-
dos na superfície da folha. Numerosas teorias foram propostas, mas
nenhuma é realmente convincente.
SOMERS (1965), especialmente, questionou “como o cobre tem
concentração tóxica suficiente para atacar o fungo (esporo), quando
a solubilidade de calda bordalesa pulverizada é tão baixa”. Ele chega
até a concluir que a formação de complexos cúpricos, a partir de reações
entre a calda bordalesa e os exsudatos da folha ou do esporo reduzem a
apreensão de cobre pelo esporo. Esse autor acredita que os complexos
hidrossolúveis de cobre, existentes na calda bordalesa, são menos
eficazes do que o ânion cúprico livre, na penetração do esporo. É uma
posição ainda vigente.
É necessário, igualmente, expor a posição de VILLEDIEU (1920-
1932), mesmo que seja uma opinião controvertida. Ele diz que a ação
da calda bordalesa seria, na realidade, devido à cal livre que contém.
Ele teria demonstrado que o cobre não se dissolve na água da chuva,
ou que a pequena quantidade dissolvida é impotente para matar os
esporos do míldio.
Baseando-se em SCHAFFNIT, VILLEDIEU reitera que o míldio
absolutamente não se acostuma ao cobre, como havia sido sugerido,

252
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

mas que “o abuso dos adubos químicos, especialmente o excesso de nitro-


gênio, que a uma nutrição desequilibrada, torna o.vinhedo muito mais
sensível aos ataques de míldio e até de oídio”.
Esta observação nos conduz de volta à questão das relações:

Planta --------Parasita --------Agrotóxicos

Os trabalhos de PANTANELLI (1921), referentes ao míldio,


mostraram a sensibilidade da folha, em relação ao fungo parasita: “A
composição mais favorável ao ataque é caracterizada por uma forte
proporção de açúcar, comparado ao amido, e de compostos
nitrogenados e fosforados, relativamente insolúveis, isto é, em rela-
ção à albumina, nucleínas e protídeos. Os ácidos livres parecem não
ter importância”.
Em outras palavras, o míldio não é exceção à regra nutricional dos
organismos patógenos: ele só se desenvolveria às expensas de substân-
cias solúveis encontradas na planta-hospedeira. Aliás, é a razão pela qual
as folhas “adultas” são mais atacadas no outono e pouco suscetíveis no
verão, enquanto as folhas muito jovens permanecem sem danos. Isto se deve
à ausência quase completa de compostos nitrogenados solúveis na água.*
É necessário saber em que medida o complexo sulfato de cobre-cal
da calda bordalesa altera a fisiologia da videira e explica uma eventual
resistência, induzida indiretamente. De acordo com resultados recen-
tes, parece que esse processo poderia, efetivamente, existir.
PINON (1977) constatou: “A análise das folhas colhidas no fim
da floração revela uma influência dos fungicidas antimíldio. Os teo-
res de nitrogênio total e solúvel das folhas são menos elevados, no caso do
tratamento com calda bordalesa”.

*
Segundo CHAMPIGNY (1960), em Bryophyllum daigremontianum a relação N
protéico/N dos aminoácidos é de 17,4, nas folhas muito jovens; 15,9 nas jovens e
28,8 nas adultas.

253
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Isto significa, pois, que a calda bordalesa mostrou um melhor efeito


sobre a proteossíntese do que os outros produtos testados. Isto pode-
ria explicar a causa de sua eficácia, concordando com nossa teoria.

B) O caso do Enxofre
Já comentamos no capítulo quarto o caso do enxofre. Parece
comprovado que sua eficácia reside, principalmente, na sua ação
positiva sobre a proteossíntese. O enxofre elementar, aplicado sobre as
plantas, é encontrado em suas proteínas. Isto, aliás, não escapou à
obsevação de certos agricultores, que notaram o seu efeito benéfico sobre a
vegetação da planta. Por outro lado, ele também pode agir sobre a resis-
tência da planta através da fertilização do solo. Um exemplo nos é dado
pela colza.*
Há alguns anos, na região de Landes, Gasconha, desenvolvem-se
novas culturas, especialmente a colza. A implantação dessa oleaginosa
nesses solos leves, ácidos e altamente podzolizados, ao invés dos
habituais solos calcários, exigiu pesquisas relacionadas às correções.
As pesquisas realizadas pelo Centro de Pesquisa do INRA – Bordeaux,
que foram objeto de comunicação à Academia de Agricultura
(COURPRON et alii., 1973), podem ser assim resumidas: A seme-
adura de colza (variedade Sarepta) foi realizada em meados de outu-
bro, na quantidade de 4 kg de semente/ha. O aporte de cal teve
influência reduzida nos rendimentos. Ao contrário, a adubação com
enxofre levou a um aumento da produção de 150% sobre a testemunha,
fosse qual fosse a dose utilizada (50 a 100 kg/ha, em forma de sulfa-
to de amônia, distribuído em diferentes épocas).
Quanto às causas desse fenômeno, cremos melhor dar a palavra
aos pesquisadores: “Nas condições particulares deste experimento, o
efeito espetacular do aporte de enxofre é explicado pela correção da
carência do solo neste elemento, mas, sem dúvida, também, porque

*
A colza também é chamada de canola (canadá). (N. do R.)

254
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

esta adubação, favorecendo o crescimento da colza, protegeu-a de um


ataque severo da mosca das sementeiras (Phorbia platura). Observou-se
que, no momento da floração, as manifestações deste ataque (dessecamento
parcial ou total da inflorescência e mal formações do talo) eram muito
mais numerosas nas parcelas testemunhas que nas que receberam sulfato
de amônia. Levantamentos efetuados em diferentes estágios
vegetativos confirmam a clara diferença entre o desenvolvimento das
plantas das parcelas que receberam enxofre e o das plantas proveni-
entes das parcelas testemunhas”.
Em resumo, a adubação, à base de enxofre, ou seja, a incorpora-
ção no solo de um elemento indispensável ao crescimento da planta
provocou, simultaneamente, um aumento espetacular dos rendimen-
tos e uma resistência aos ataques da mosca.Isto se explica, em defi-
nitivo, pelo efeito positivo da incorporação do enxofre sobre o nível
da proteossíntese.

C) Como atua o Maneb?


Ao longo do quarto capítulo, vimos que SOMERS e RICH-
MOND (1962), testando Captan nas raízes de feijão, contra
Botrytis, concluíram que sua ação antifúngica resultava da repercus-
são do produto sobre o metabolismo do hospedeiro. Ocorreria o
mesmo quando os outros produtos sintéticos mostram-se eficazes?
O caso do Maneb foi estudado por fitofarmacêuticos do INRA.
VIEL e CHANCOGNE (1966) observam que as suspensões de
Maneb na água absorvem oxigênio e que ocorre uma decomposição,
com solubilização do manganês. Segundo os autores, nenhum dos
produtos da decomposição estudados mostrou atividade suficiente,
em relação aos esporos, para explicar “o poder fungicida do Maneb”.
A presença de monosulfeto de etileno tiuram não é suficiente para
explicar a ação do Maneb. VIEL e CHANCOGNE concluem: “É
provável que exista um produto intermediário de decomposição,
pouco estável, o qual não conseguimos identificar”.

255
F R A N C I S C H A B O U S S O U

É difícil conceber que um produto pouco estável, fugaz, possa


mostrar qualquer eficácia. Não seria melhor pesquisar a ação do
manganês sobre a planta? Os próprios autores observam que este
elemento se solubiliza. Evidentemente, a solubilização favorece sua
penetração nos tecidos e, conseqüentemente, sua ação em relação à
resistência aos fungos patógenos – benéfica ou nefasta, segundo a dose
e as repetições dos tratamentos.
O estudo dos oligoelementos em relação à fisiologia da planta nos
permitirá entender melhor seu modo de ação na estimulação da re-
sistência e a maneira pela qual podemos utilizá-los para este fim.

4. OS OLIGOELEMENTOS NA FISIOLOGIA E NA
RESISTÊNCIA DA PLANTA

A) Como abordar o problema


Ainda temos muito que aprender sobre o papel dos diversos
oligoelementos na fisiologia e, portanto, na resistência da planta a seus
diversos agressores. Sabemos que são indispensáveis à proteossíntese
e que sua ação positiva neste processo é seguramente favorável. Inver-
samente, toda a carência provoca uma inibição da proteossíntese e o
desencadeamento de doenças, segundo um mecanismo que seria
supérfluo repetir.
Estas inibições no crescimento, fenômeno geral provocado por
toda a carência, tornam difícil e até quase impossível determinar,
apenas pelos sintomas, exatamente qual elemento que está em falta.
Exemplo: confusões possíveis entre carências em ferro e manganês e
entre potássio e magnésio.
Sabemos também, da necessidade de um equilíbrio entre macro e
microelementos, ao nível da planta, como vimos no caso de helmintos-
poriose no arroz. É útil entrar em alguns detalhes deste assunto.
Diversos pesquisadores encontraram uma estreita relação positiva
entre a concentração em aminoácidos dibásicos nas folhas do arroz e

256
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

o crescimento do tamanho das manchas de Helmintosporium. São


registradas quantidades importantes de aminoácidos dibásicos e um
número elevado de manchas de helmintosporiose nas parcelas com
carência de K e de N. Um dos aspectos do problema é encontrar um
equilíbrio K/N conveniente.
Por outro lado, SHIGEYASU Akai (1962) também observa que
a sensibilidade à helmintosporiose diminui com a aplicação de iodo, zinco
ou manganês. (São mais dois oligoelementos, I e Zn, que parecem
confirmar os resultados benéficos obtidos por PRIMAVESI et alii.
(1972) com o cobre e manganês, no solo.)
Observando que a carência de Mg, ou o excesso de P, ou a adição
de Co aumentam a sensibilidade do arroz a esse fungo, SHIGEYASU
Akai conclui: “não é possível discutir a proteção do arroz através da
adubação apenas pelo ângulo do potássio”.
É a procura de um equilíbrio entre os macroelementos e, destes,
com os oligoelementos necessários à planta que permitirá chegar-se
a um ótimo de proteossíntese. Antes, é necessário nos afastarmos do
empirismo em que ainda nos encontramos, revisando o que sabemos
sobre o metabolismo dos oligoelementos.

B) Classificação dos oligoelementos – Sinergismos e antagonismos –


Lei do ótimo de concentração nutritiva
Para julgar o papel dos oligoelementos, como assinalava COIC,
“basta saber que são indispensáveis ao funcionamento das máquinas-
ferramentas, como são chamadas as enzimas que presidem a fabricação
de peças soltas do metabolismo”. Isto o leva a distinguir os elementos
que são integralmente parte da enzima dos que são simplesmente
ativadores. Estes últimos não apresentam, pois, ação especifica, já que
podem ser substituídos por um outro elemento.
Ferro, cobre, zinco e molibdênio fazem parte do primeiro grupo;
manganês, cloro e boro, do segundo.
Um dos aspectos que nos interessa diretamente, referente às re-

257
F R A N C I S C H A B O U S S O U

percussões dos oligoelementos sobre a fisiologia da planta, reside nas


suas relações com os outros elementos e entre eles próprios. Assim,
essas ações parecem de ordem sinérgica.
É assim que encontramos, freqüentemente, associados em sua
ação, o cobre eo manganês.
PILAND e WILLIS (1937) constatam que o trigo cultivado em
solução hidropônica tem seu crescimento afetado quando as soluções
nutritivas contêm só cobre ou só manganês – mesmo na presença de
papel-filtro, que pode ser visto como a matéria orgânica necessária.
Quando os dois elementos estão presentes, o crescimento está asse-
gurado.
São concentrações precisas de cobre e manganês no solo, obtidas
através de uma fertilização e nutrição adequadas, que PRIMAVESI
et alii. (1972) associam à estimulação da resistência do arroz à
Pyricularia oryzae.
Estes resultados aproximam-se de determinados efeitos antifún-
gicos obtidos com fórmulas mistas organo-cúpricas de cobre, manganês
ou zinco, nas quais os produtos ativos estão presentes em doses bai-
xas, sendo ineficazes, se utilizados sozinhos. Por isto questionamos se
não se trata de uma ação indireta de tais fórmulas, que passaria, obri-
gatoriamente, por uma modificação benéfica da fisiologia da planta.
Segundo nossa concepção, isto consistiria numa estimulação da
proteossíntese.
Em outras palavras, não se trataria da adição de eventuais efeitos
tóxicos, já que cada um dos elementos é utilizado abaixo do nível de
eficácia, mas sim de uma ação sinergética dos oligoelementos sobre
a proteossíntese, com o respectivo aumento da resistência.
Os efeitos tóxicos provocados na planta pela repetição dos trata-
mentos parecem justificar esta posição, assunto que abordaremos nos
quarto e quinto capítulos.
Sinergismo e antagonismo entre elementos são noções muito pró-
ximas e, freqüentemente, difíceis de separar. Assim, se Mn e Cu são

258
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

capazes de agir sobre a resistência da planta, provavelmente por


sinergia, estes dois oligoelementos são antagonistas no metabolismo,
exatamente como cobre e boro ou zinco e cádmio.
Como nos macroelementos – relação K\Ca, por exemplo –, en-
contramos a noção de equilíbrio, que, por sua vez, está relacionada
com a “lei do ótimo de concentração nutritiva” elaborada por Gabriel
BERTRAND.
Trabalhando com o manganês, G. BERTRAND conseguiu esta-
belecer que o efeito deste oligo-elemento cresce com a quantidade
utilizada. Contudo, isto só é válido dentro de certos limites: acima
de uma determinada dose, as plantas são cada vez menores e menos
viçosas. Em resumo, obtém-se um máximo de efeito num ótimo de con-
centração, que nem sempre é a mais elevada.
É uma lei que se deveria ter presente quando são utilizados
oligoelementos para a proteção da planta, uma vez que, agindo sobre
o metabolismo, as repercussões destes produtos podem ser de interesse fun-
damental em relação à sua resistência.
Grosso modo, três casos podem ocorrer:
a) O primeiro é o que acabamos de ver: ressalvando-se que as
necessidades são diferentes segundo a natureza da planta e efeito
almejado, existe um ótimo na quantidade utilizada para o crescimen-
to da planta. Por exemplo, as leguminosas exigem mais molibdênio
que as gramíneas, mas a planta não tem tendência à saturação;
b) A toxicidade é marcante nas concentrações dos elementos que mal
ultrapassam o valor “ótimo”. É o caso do boro, em relação à beterraba;
c) O terceiro caso, bastante raro, é quando o elemento pratica-
mente não é tóxico, mesmo em doses fortes. Ele pode apresentar um
efeito favorável, devido a um modo de ação diferente, chamado “do
tipo farmacodinâmico”. O iodo, no homem e mamíferos, ilustra bem
este caso: um excesso de iodo jamais se torna muito grave.
Contudo, um mesmo oligoelemento pode entrar em um ou outro
caso da lei do ótimo de concentração nutritiva, dependendo da es-

259
F R A N C I S C H A B O U S S O U

pécie vegetal ou animal em questão. Isto é explicado, como observam


GOUDOT e BERTRAND (1968), pelas diferenças nos sistemas
enzimáticos existentes nos seres vivos.

C) Equilíbrio entre oligoelementos e cálcio


Pela mesma razão, explica-se que os efeitos dos oligoelementos
dependem de seus antagonismos com os outros elementos. A propó-
sito das repercussões do cálcio utilizado como corretivo, vimos que
STALL (1963) obteve, como mostramos, reduções muito significa-
tivas de ataques de Botrytis em folhas e frutos do tomate, graças a
correções com cal hidratada ou calcários dolomíticos. Contudo, ele
chama a atenção para o fato de que a doença aumenta, após determi-
nadas pulverizações à base de oligoelementos, nas parcelas tratadas
com uma dose média de cal hidratada, enquanto este fato não é cons-
tatado nas parcelas tratadas com altas ou baixas doses.
Isto explica a importância da natureza dos solos na resistência da
planta à doença. STALL (op. cit.) relaciona a distribuição de Botrytis,
na Flórida, com a concentração de calcário no solo. A doença ataca
pouco nos solos calcário-alcalinos, sejam estes de origem natural ou
resultantes de calagens repetidas.
Aplicações de Maneb e Zineb, que devemos considerar como
tratamentos com os oligoelementos manganês e zinco, respectivamen-
te, provocam agravamento da doença nos solos pobres em cálcio, e
menos nos solos calcários.
Devemos observar que estas repercussões dependem do número
e da freqüência das aplicações, isto é, definitivamente, da quanti-
dade de olzgoelementos com que os tecidos foram artificialmente enri-
quecidos. Os resultados de COX e WINFREE (1957), que
apresentamos,(no capítulo cinco), explicam como esta acumulação
pode ser nociva. Recordemos que, segundo as análises destes auto-
res, após tratamentos com Zineb ou Nabam + sulfato de zinco, as
folhas jovens dos morangueiros tratados continham 3,5 vezes mais

260
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

zinco que as testemunhas, enquanto que as velhas chegavam a 13


vezes mais.
Nessas condições, parece evidente que o ótimo de concentração
nutritiva foi ultrapassado e, que as alterações no metabolismo do
morangueiro não só podem sensibilizá-lo, em relação a Botrytis, mas
também em relação a outras doenças, como, Phytophthora e doenças
viróticas, sendo que estas podem até aparecer antes.
Algumas sementeiras de morangueiro, chegam a receber trinta
tratamentos com fungicidas, inseticidas e acaricidas! Os produtores, que
acreditam estar seguros contra doenças e insetos, conseguem o resultado
inverso, sensibilizando os morangueiros em relação a Verticillium e
Phytophthora.
O melhor meio para não incorrer em tais erros é:
• ter consciência de que todo o produto fitossanitário age,
principalmente, sobre a fisiologia da planta e, que esta ação
pode ser benéfica ou nefasta, se estimulam ou inibem a
proteossíntese;
• por outro lado, como se trata, em definitivo, de nutrir a
planta, adequar a distribuição das pulverizações nutritivas
que são tratamentos à base de oligoelementos, durante os
períodos em que as necessidades nutricionais da planta são
importantes.
É o que veremos a seguir.

D) Equilíbrio entre oligoelementos e fósforo


Outro antagonismo clássico é o de determinados oligoelementos
com o fósforo, como, por exemplo, Zn e PO4.
O Mn, quando em boas condições, catalisa o transporte dos
fosfatos; um excesso de P em relação ao equilíbrio Ca/Mg pode acar-
retar uma carência de manganês, particularmente no pessegueiro.
Aliás, está bem estabelecido que o excesso de correções calcárias
podem tornar o manganês não assimilável.

261
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Por outro lado, sob certas condições, que precisariam ser melhor
definidas, os oligoelementos aumentam a concentração de P no te-
cido das plantas e de diversos grupos de combinações fosfóricas, re-
forçando, assim, a chegada do cálcio nas células. A partir do que se sabe
sobre o papel do cálcio, este fenômeno pode estar na origem da
estimulação da resistência (POLJAKOV, 1972).
Os efeitos benéficos do cálcio sobre a resistência da planta justifi-
cam plenamente a sua presença nas fórmulas à base de oligoelementos
desenvolvidas por algumas firmas comerciais.
Outras relações importantes dos oligoelementos referem-se ao
boro. Por isso, vamos consagrar-lhe um estudo particular.

E) O boro no metabolismo da planta


O papel do boro, como de resto, de outros oligoelementos, per-
manece obscuro. Já vimos os graves efeitos que sua carência provoca
na planta. Inversamente, um aporte de boro na adubação do moran-
gueiro estimula a acumulação da vitamina C (PISKUNOV, 1965).
Os trabalhos de BAILEY e METTARGUE (1944) esclareceram
um pouco a questão do papel do boro e de outros oligoelementos,
como cobre, zinco, e manganês, estudados em tomate cultivado em
solução nutritiva.
Esses pesquisadores trabalharam na influência desses elementos
na atividade de diversas enzimas: catalase, invertase, oxidase e
peroxidase. Antes de mais nada, a resposta das enzimas a estes ele-
mentos depende da dose utilizada, que não é, necessariamente, a
mais alta, obedecendo à lei do ótimo de concentração nutritiva.
• Três enzimas apresentam um máximo de atividade com 1
ppm de zinco: são elas a peroxidase, a catalase e a oxidase;
• Três enzimas apresentam o mesmo máximo com 1 ppm de
boro: são a invertase, a peroxidase e a catalase (fig. 31).
Duas enzimas, invertase e catalase, mostram a maior resposta à
dose de 0,01 ppm de cobre.

262
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Em relação ao manganês, se o ótimo de atividade da peroxidase


é a 1 ppm, esta dose provoca um efeito depressivo sobre as outras três.
Esses autores não explicam tal fenômeno, mas observam que a
peroxidase é uma enzima protéica a base de ferro e fósforo, e que fer-
ro e manganês estão estreitamente associados na fisiologia da plan-
ta. Portanto, o manganês poderia afetar o ferro, como mencionado
antes, , o que explica as dificuldades em separar os sintomas de ca-
rência em ferro, das carências do manganês.
Também, BAYLEY e METTARGUE chegaram a esta conclusão
(op. cit.): “Estes resultados sugerem que as respostas enzimáticas são ex-
pressões das condições metabólicas gerais da planta, antes que das influ-
ências diretas dos oligoelementos sobre as enzimas. HEINICKE e NELLER
sugerem que a atividade da catalase mede o estado metabólico dos tecidos
e pode servir como indicador das respostas fisiológicas das plantas ao seu
ambiente”.
Esses autores também observam que a oxidase responde ao cobre
porque a polifenol-oxidase é uma enzima protéica à base de cobre, mas
este fato poderia ser uma exceção. Com efeito, WYND evidenciou
uma uniformidade considerável das respostas da catalase, da
peroxidase e da invertase em relação aos tratamentos com iodo.
Assim, o iodo, como o manganês e o boro fariam parte dos ativadores
de enzimas. Isto explicaria seus efeitos benéficos sobre a resistência da
planta, já citados (ROUBINE e ARTSICHOVSKAIA, 1960;
GARD, 1932).
Ademais, como já citado, o iodo, não apresentando efeitos tóxi-
cos mesmo em altas doses, poderia ser experimentado nos prepara-
dos fitossanitários, já que na pior das hipóteses eles se mostrariam
inofensivos. Quanto ao boro e, considerando nossas preocupações
referentes á resistência da planta, está, atualmente estabelecido que,
em razão das relações com a invertasa, ela pode afetar o mecanismo
dos glicídios e, em consequência, reforçar essa resistência, como vi-
mos quando das carências desse elemento.

263
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Vejamos uma nova prova com os trabalhos de RAJARATNAM


(1971-1972): esse autor trabalhou com dendezeiro, que pode ser ata-
cado por duas moléstias: Bud Rot* (broto vermelho) e Little Leaf* (fo-
lha pequena). Estas duas afecções são, na realidade, dois estágios da
mesma doença. Alguns pesquisadores atribuem à carência de boro, e
outros, a ataques de agentes patogênicos ou de insetos. RAJARATNAM
observa que estes dois pontos de vista são corretos, porque o aumento
da suscetibilidade à doença pode, perfeitamente, sobrevir como um
efeito secundário do estado bioquímico dos tecidos carentes em boro.
(É, pois, um pesquisador que se une às nossas concepções...)
No entanto, o autor vê a razão na ausência de polifenóis nos
tecidos – leucontocianinas – nos tecidos. Segundo sua opinião, estes
produtos estão associados à resistência a vírus, fungos parasitas e até
a ataques de insetos. RAJARATNAM se detém na teoria da resistên-
cia associada à presença, na planta, de fatores tóxicos antagonistas aos
parasitas.
Acreditamos já ter demonstrado toda a fragilidade dessa posição. Na
realidade, a presença de polifenóis, cuja toxicidade absolutamente não
foi demonstrada, é, ao contrário, concomitante à carência de fatores
nutricionais. Veremos uma nova prova, com as pesquisas do próprio
RAJARATNAM (1972) sobre as relações da nutrição em boro do
dendezeiro e sua suscetibilidade a um tetranyque, Tetranychus piercei.
Foram feitas culturas hidropônicas, com ou sem boro na solução
nutritiva e artificialmente contaminadas pelo ácaro.
As folhas das plantas cultivadas em solução sem boro foram as mais
intensamente prejudicadas, sem que tenha sido detectada a leucocia-
nidina. As das plantas cultivadas em solução com boro foram as menos
atacadas, e, também, as que apresentaram mais leucocianidina.
Contudo, e como já indicado antes, isto não comprova que a
presença ou ausência de leucocianidina tenha relação de causa e efeito

*
Em inglês no original. (N. da T.)

264
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com o maior ou menor ataque de Tetranychus. Mas, a ação do boro


sobre o metabolismo dos glicídios e proteínas poderia estar relacio-
nada com a nutrição dos ácaros. Isto é provado pelas repercussões da
carência de boro, que produz uma inibição do crescimento, isto é, da
proteossíntese, provocando maior concentração de substâncias solúveis
nos tecidos.
Em resumo, estes resultados confirmam a validade da terapêu-
tica pelo boro, desde que se considere a dose utilizada e o número de
tratamentos realizados. Isto a fim de não ultrapassar o ótimo de
concentração nutritiva, que poderia levar a níveis de toxicidade.
Chegaremos a este resultado através de intervenções apenas nos pe-
ríodos ditos “críticos” do ciclo fisiológico anual da planta em ques-
tão. Essas épocas são caracterizadas por necessidades nutricionais
particularmente elevadas. É a questão que vamos abordar, para ter-
minar este capítulo.

5. TRATAMENTOS “NUTRITIVOS” ATRAVÉS DE


PULVERIZAÇÕES FOLIARES

A) Os períodos críticos do ciclo anual da planta


A existência de períodos críticos no ciclo da planta cultivada
constitui uma das bases de nossa teoria da trofobiose. Se em determi-
nadas épocas as folhas se encontram mais sensíveis a ácaros, pulgões
ou fungos patógenos, é porque estão numa fase em que a proteólise
predomina sobre a proteossíntese.
Por exemplo, se considerarmos o caso das plantas perenes, como
a videira ou as árvores frutíferas, o estágio de botão floral caracteriza-
se por uma síntese dominante, efetuada, sobretudo, a partir das reservas
do lenho constituídas no ano precedente.
Ao contrário, no momento da formação da inflorescência, todas as
folhas perdem, simultaneamente, o poder de síntese e procedem, até,
a uma certa decomposição de suas próprias proteínas. Assim, a planta

265
F R A N C I S C H A B O U S S O U

em estágio de floração e, mais ainda, em estágio de fruto jovem, é


marcada por uma proteólise acentuada, com queda nítida do conteú-
do protéico nas folhas maduras.
Essa época de floração constitui, pois, um primeiro período de
sensibilidade acentuada para as plantas perenes.
Para as rosáceas é a época sensível à sarna e, também aquela de
sensibilidade aos danos dos agrotóxicos, com riscos de rugosidade ou
russeting.
Nos cereais é o estágio sensível a Oidium e à ferrugem. Este pe-
ríodo crítico se prolonga do estágio 3-4 folhas até a floração-
espigamento. Trata-se de uma época difícil na alimentação da planta,
especialmente para o manganês.
É, também, o período em que as árvores frutíferas manifestam
necessidades nutricionais intensas, ou seja, os estágios D, F2 e 1 de
FLECKINGER.
Em relação à videira, estes estágios “famintos” corresponderiam
ao estágio G da formação do cacho (estágio de BAGGIOLINI), e ao
do início da maturação.
Contudo, parece que outras épocas podem se mostrar sensíveis,
dependendo das necessidades nutricionais particulares da planta. É
o que vamos nos esforçar em destacar.

B) Ciclo fisiológico da macieira e suas necessidades nutricionais


ANDUS (1955) observa que na macieira existem dois valores
mínimos nos teores de auxinas (o zinco está ligado à síntese das
auxinas) correspondentes à queda de frutos: “queda de junho” e “que-
da na maturidade”.
Por outro lado, MASON e WITFIELD (1960), através de aná-
lises de N, P, K, Ca e Mg, distinguem dois períodos especiais de
atividade: fim de abril e fim de junho. São dois períodos em que os
teores dos cinco elementos analisados mudam de forma apreciável nos
tecidos, ainda que por um curto espaço de tempo.

266
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Estes dois períodos coincidiriam, portanto, de um lado, com um


crescimento rápido das folhas (abril) * e, de outro, com o momento
de crescimento dos rebentos (junho).
Pode-se presumir que estes dois períodos correspondem às neces-
sidades nutricionais mais intensas das árvores e que, logicamente, é
nestas épocas que devem ser realizados tratamentos destinados a
corrigir as carências e a nutrir as plantas (fig. 32).

C) Ciclo fisiológico da videira e períodos de sensibilização


Dois grandes períodos podem ser distinguidos no ciclo anual da
videira:
1. Da brotação à parada de crescimento, que resulta na formação
da folhagem;
2. Da parada de crescimento à queda das folhas: é o período de
uma intensa proteossíntese, com elaboração de reservas glucídicas.
A primeira fase é a época da floração, quando se encontra, como
dissemos antes, o período sensível a doenças como míldio e Botrytis.
A este respeito, é interessante analisar a fundamentação dos chama-
dos “tratamentos de segurança”.
Contestou-se a validade dessas intervenções, reprovando-se seu
empirismo. Elas absolutamente não se baseavam na evolução do
parasita – única considerada na fitopatologia clássica – mas na da
videira. As restrições eram inerentes a esta ótica, que se baseia unica-
mente no comportamento do patógeno em relação ao clima. Em
outras palavras, se abstraía o hospedeiro, que deve, obrigatoriamen-
te, estar num estado bioquímico bem determinado para que o fun-
go parasita possa se desenvolver. É o que vimos no início deste
capítulo, analisando brevemente as repercussões da calda bordalesa.
Entretanto, é necessário voltar a ela, para aprofundar a questão, na
medida do possível.

*
Chaboussou refere-se ao Hemisfério Norte. (N. do R).

267
F R A N C I S C H A B O U S S O U

I. Sobre a época das intervenções


Segundo a concepção de “tratamento geminado”, ou seja, dois trata-
mentos com calda bordalesa* envolvendo a aparição e o desenvolvimen-
to das inflorescências, MOREAU e VINET (1930) recomendavam:
– um primeiro tratamento quando os botões florais começam a
se separar, ou seja, o estágio H de BAGGIOLINI;
– um segundo tratamento, dez a doze dias mais tarde.
Esses mesmos autores observavam: “Após a floração, a ação dos
tratamentos de segurança continua a se exerce”. Isto dá, pois, a pensar
que a eficácia prolongada destes tratamentos só poderia ter por ori-
gem uma ação indireta sobre a resistência da videira, por repercussão
sobre seu metabolismo.
Ora, como nós vimos, efetivamente, que a calda bordalesa pro-
voca uma regressão do nitrogênio total e solúvel na folha, fenômeno pro-
vavelmente relacionado à resistência da videira, segundo nossa concepção
da trofobiose.

2. Sobre o modo de ação da calda bordalesa


Reiteradas vezes têm sido constatado que, em doses iguais de
cobre na calda, o oxicloreto de cobre sempre se mostra menos eficaz que
a calda bordalesa, em relação a diversas doenças, especialmente o
míldio (fig. 33). HORSFALL (1975) lembra que o óxido de cobre
desprovido de cal não pôde controlar os insetos da batata, tão bem quanto
a calda bordalesa e, conseqüentemente, não se obteve nenhum sucesso no
tratamento dessa planta.
HORSFALL (op. cit.) observa que a calda bordalesa estimula a
batata.

*
A qual, freqüentemente, adiciona-se arseniato de chumbo, contra as lagarta do
cacho – este produto pode ter uma ação antifúngica. (Chaboussou). No original
Tordeuses de la grape. Tordeuse – nome de diversas borboletas (Tortricides), cuja
largarta enrola as folhas das plantas em cartuchos, fazendo um estojo protetor
(Petit, 1983) (N. do R.)

268
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Estas diferenças de repercussões, certamente associadas a suas


incidências sobre a fisiologia da planta – como bem observa
HORSFALL – devem corresponder a diferenças na composição dos
produtos. Especialmente, observa-se que o cálcio deve ter um gran-
de papel na eficácia da calda bordalesa. Além disto, o enxofre do
sulfato de cobre pode também ter uma influência benéfica na
estimulação da planta, isto é, na proteossíntese.
Assim, esta “associação” empírica de cobre, enxofre e cálcio, que cons-
titui a calda bordalesa, poderia explicar sua notável eficácia em relação a
toda uma gama de doenças, graças a seu efeito positivo sobre a
proteossíntese.* Isto não significa que ela seja a última palavra em termos
de tecnologia. Se é pela satisfação das necessidades nutricionais da planta
que agem os produtos fitossanitários quando se mostram eficazes (exce-
ção feita aos venenos contra insetos), devem ser buscadas fórmulas espe-
cíficas para cada tipo de planta e cada tipo de solo. É como procedem
algumas firmas que fabricam produtos nutricionais deste gênero.
Queremos, ainda, recordar a propriedade “repelente” da calda
bordalesa, diversas vezes apresentada, especialmente a propósito de
Leptinotarsa sp.
MURBACH (1967) realizou uma experiência interessante,
exatamente relacionada a Leptinotarsa sp. Esse autor, numa experiên-
cia precedente, havia constatado que, ao contrário dos produtos
cúpricos, o Fentinacetato não tinha efeito repelente em relação a
Leptinotarsa sp., mas provocava uma forte diminuição do número de
posturas e de larvas, enquanto o Maneb parecia não ter qualquer
influência.
Assim, uma segunda experiência foi realizada. Estavam sendo
comparados: Oxicloreto de cobre (e não calda bordalesa), Fentinacetato,
Maneb e testemunha.

*
A calda bordalesa, fungicida clássico contra o míldio da videira é igualmente eficaz
contra oídio.

269
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Os resultados foram os seguintes:


Quadro 8. Repercussões dos produtos sobre a população de Leptinotarsa sp.
Tratamentos Posturas Insetos perfeitos População de mais de l0 larvas
na primavera - % de pés de batata
Oxicloreto de cobre 57 3 0,5%
Maneb 190 40 16,0%
Fentinacetato 122 31 1,09%
Testemunhas 296 35 33,6%

Segundo o autor, conclui-se que os fungicidas cúpricos, exclusi-


vamente por sua ação repelente, são capazes de assegurar uma pro-
teção praticamente suficiente contra a Leptinotarsa sp.
O Fentin-acetato não mostrou efeito repelente, mas os insetos só
atacaram muito levemente as folhas tratadas, cessando rapidamente
de se alimentar. Daí a queda na fecundidade.
Quanto ao Maneb não teria mostrado nenhuma ação perceptí-
vel sobre a densidade da população.
Pode-se perguntar se as repercussões desses diferentes produtos
não seriam, antes de tudo, devido a suas incidências sobre a fisiolo-
gia da planta. E, se este efeito “repelente” do cobre não seria, basica-
mente, resultado das mudanças produzidas no estado bioquímico dos
tecidos, antes do que dos resíduos na superfície? O comportamento
de Leptinotarsa sp. em relação à folhagem tratada com Fentinacetato
exige reflexão. Veremos, então, ao longo do próximo capítulo, que
uma adubação adequada às vezes é suficiente para “dissuadir”
Leptinotarsa sp., de não se alimentar da batata.
Ao contrário, MURBACH (op. cit.) observa que “os inseticidas
correntemente utilizados contra esta praga favorecem a multiplicação dos
pulgões vetores da batata, por eliminarem seus inimigos naturais” (P.
BOVEY e MEIER, 1962). Isto ocorre a tal ponto que estes autores
recomendam “limitar, ao estritamente necessário, o uso de produtos para
controlar Leptinotarsa sp., a fim de prevenir um aumento maciço de
infecções virais”.

270
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Estas observações agregam-se às de POLJAKOV, já referidas, que


descrevem o desenvolvimento de moléstias viróticas na batata, após a
utilização de ditiocarbamatos no controle da requeima. Assim, é possí-
vel ter-se reservas quanto ao processo observado por BOVEY e MEIER
para explicar este fenômeno. Mesmo admitindo-se que a destruição
dos inimigos naturais interfira em algum nível na multiplicação dos
pulgões, ainda é necessário que a planta se encontre num tal estado fi-
siológico que o vírus possa se multiplicar, fato que, geralmente, se perde de
vista.
No que se refere à incidência dos produtos sintéticos sobre a fi-
siologia da planta, está demonstrado que os “inseticidas fosforados”,
usados no controle de Leptinotarsa sp., causam repercussões seme-
lhantes às dos ditiocarbamatos, utilizados contra Phytophthora, ou seja,
provocam na planta um estado predominante de proteólise.
Ora, vimos que tal estado favorece, simultaneamente, a multiplica-
ção de pulgões e de vírus.
É a este menosprezo pelas incidências indiretas dos agrotóxicos
que deve ser imputado o agravamento dos problemas fitossanitários
e a impossibilidade, cada vez maior, de resolvê-los unicamente pela
destruição do parasita. Por isso, acreditamos que a única perspectiva
racional consiste na medicação interna da planta, baseada na concep-
ção da trofobiose.* Veremos os resultados nos próximos capítulos.

6. DETERMINAÇÃO E TRATAMENTOS DAS CARÊNCIAS


Os exemplos que vimos antes sobre o assunto, nos recorda:
– de um lado, a igualdade dos sintomas entre carências e doenças.
– de outro, da luta contra diversas doenças em relação ao solo,
tratamento da folha ou imersão de grãos em meio de certos

*
O Fentinacetato é usado como esterilizador de insetos, causando quebras
cromossômicas. (N. da T.) Esta posição visionária de Chaboussou deveria ser
analisada por todos os pesquisadores que se dedicam ao controle das pragas e
doenças. (N. do R.)

271
F R A N C I S C H A B O U S S O U

oligoelementos (fig. 34), bem como, a ação de produtos clássicos


como a calda bordalesa e enxofre, só podem ser explicados por seu
efeito benéfico – sobre a fisiologia da planta.
O mesmo ocorre com a ação de novos fungicidas sintéticos,
quando se mostram eficazes.
Parece justificada nossa hipótese dos produtos terem uma ação do
tipo “medicamento” através de interferências favoráveis no metabo-
lismo da planta. Segundo nossa teoria, se essas repercussões se mos-
tram benéficas, é porque são exercidas num sentido positivo sobre a
proteossíntese. Isto quer dizer que estes aportes permitiram corrigir as
carências que se opunham à realização da proteossíntese.
Assim, o problema do controle dos parasitas da planta se volta
definitivamente para:
1. a determinação da ou das carências;
2. os meios de corrigi-las sem, no entanto, atingir qualquer limite
de toxicidade, limite este, alcançado rapidamente com numerosos
produtos sintéticos, o que estudamos ao longo dos quarto e quinto
capítulos.
Em resumo, trata-se de atingir um equilíbrio envolvendo macro e
microelementos. É um trabalho difícil mas não desencorajador. Afi-
nal, se com nossa concepção da proteção da planta ainda estamos no
empirismo, o que dizer de um método que consiste em atingir o
parasita tratando a planta, sem se preocupar com as repercussões
sobre a “saúde” dela, suscetível de ser “perturbada” pela ação inter-
na dos agrotóxicos? Pensamos ter dado ampla demonstração de nos-
sa posição.
A determinação das carências só pode ser feita através de análise
foliar. Devido aos complexos fenômenos de bloqueio ou de trocas que
ocorrem no solo, a análise deste freqüentemente chega a resultados
de difícil interpretação. O contrário ocorre com o “diagnóstico foliar”,
ou melhor ainda, a análise dos extratos frescos dos tecidos condutores,
desenvolvido por ROUTCHENKO (1975).

272
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Pelas características desta obra, não nos é possível entrar em


detalhes a respeito dos números ótimos já obtidos e relativos aos
diversos elementos, e para as diferentes categorias de plantas. Dire-
mos, simplesmente, por nessecidade profissional, que algumas firmas
especializadas na elaboração de fórmulas “nutricionais” já reuniram
dados que permitem determinar limites para afirmar que há carên-
cias, graças ao confronto das doenças constatadas com os resultados
dos pesquisadores, de determinar os “limites”* fora dos quais pode-
se afirmar que há carências.
Ainda há importantes progressos a serem conseguidos nesta di-
reção, especialmente no que se refere à escolha dos elementos a serem
analisados. Sobre isso, precisamente, gostaríamos de fazer uma ob-
servação: estamos, perfeitamente, de acordo com os especialistas que
afirmam que as análises, para serem utilizáveis, devem ser rápidas e
de fácil interpretação.
Coloca-se, pois, o problema dos elementos a analisar e, o de saber,
o que se entende por análise “completa”. Assim não cessamos de in-
sistir e, esperamos ter demonstrado ao longo dessa obra, a resistên-
cia da planta é função de um mínimo de substâncias solúveis nos tecidos
foliares, especialmente nitrogênio.
A questão é se bastaria realizar estas análises nos períodos críti-
cos do ciclo vegetal para saber se a planta encontra-se num estado
anormal de proteólise e, portanto, de carência. Essas análises realizadas
ao longo dos períodos críticos do ciclo que falamos antes.
Contudo, essas análises não poderiam indicar a natureza dos
elementos- macro e microelementos- em que a planta se encontra
carente. Também seria necessário fazer análises de K, Ca, Mg e dos
principais oligoelementos: Fe, Mn, Zn, B, Ni; e, ainda, pode-se
acrescentar: Co, Mo e Li.

*
No original, fourchettes. “Limite entre dois valores extremos”. (Petit Robert,
1983), ( N. do R. )

273
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Somente através de experiências e cruzamento de dados a respeito


de um determinado tipo de planta - da qual conhecemos, mais ou
menos, as exigências nutricionais - quais são, de preferência, será
possível escolher os elementos a serem analisados.
Propositadamente, deixamos o P de lado. De maneira geral, sabe-
se que as variações de P estão relacionadas às do cálcio, que deverá
obrigatoriamente ser analisado. Portanto, nesse caso, a análise do
fósforo será supérflua, exceto em casos particulares.
Os elementos catiônicos, como vimos muitas vezes e, especial-
mente, no capítulo anterior, parecem ter grande importância. É fun-
damental conhecer a relação K/Ca que condiciona, em grande parte, o
metabolismo da planta, especialmente a quantidade de magnésio
utilizado pelo vegetal.
K e Ca, aliás, são antagonistas ao Mg e nos parece significativo que
a soma K + Ca+ Mg seja uma constante.
Quanto aos oligoelementos, os quais vimos a importância em re-
lação à resistência da planta às doenças, veremos novas provas para
estudar suas repercussões sobre a qualidade dos produtos. Será o tema
do último capítulo, quando teremos ocasião de examinar o papel de
certos microelementos, que deixamos de lado até aqui e de conside-
rar a melhor maneira de fazer participar no metabolismo da planta
para o maior benefício de sua resistência e da qualidade da colheita.

274
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Fig. 31. Resposta de diversas enzimas a diferentes concentrações


de boro na solução nutritiva, em folhas de tomateiro.

275
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Fig. 32. Estágios críticos do ciclo fisiológico da videira e das


rosáceas.
A) Videira: estágio G de BAGGIOLINI, de desenvolvimento do
cacho. É o estágio em que as folhas, em estado de proteólise e, por-
tanto, sensíveis às doenças, guardam suas reservas para assegurar a
floração e a frutificação. O mesmo processo ocorre nas árvores frutí-
feras e cereais.
B) Rosáceas: estágio do desenvolvimento acentuado dos frutos.
A partir do mês de julho, macieiras e pereiras servem-se de suas re-
servas das folhas adultas para assegurar o crescimento e aprovisiona-
mento do fruto em cálcio.

276
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Fig. 33. Resultados de experimentos da eficácia de diversos pro-


dutos contra o míldio da videira. Eles mostram, em particular, para
uma mesma dose de cobre, a nítida superioridade do sulfato de
cobre(sob a forma de calda bordalesa): nas fórmulas 7-8-9, 10-11-12
e 13-14-15, sobre o óxido de cobre: fórmula 1-2-3.

277
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Fig. 34. Regressão da Sclerotinia do girassol por imersão das se-


mentes em diversas soluções de oligoelementos. (Segundo dados de
P. V. POLYAKOV, 1971.)

278
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

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281
CAPÍTULO VIII

TÉCNICAS AGRÍCOLAS E QUALIDADE


DAS COLHEITAS

“O objetivo principal dos pesquisadores trabalhando com produção vegetal é


satisfazer as necessidades em oligoelementos, para obter a maior produção e melhor
qualidade possíveis”.
Yves COÏC et Claude TENDILLE.

Causes connues des variations des oligo-elements dans les végétaux.


Ann. Nutr. Amm. 1971. 25 – B97 – B131.)

“A produção de plantas resistentes foi, até agora, reservada à genética. É um ca-


minho difícil, e que, freqüentemente, conduz, como sabemos, a um sucesso ape-
nas temporário. Talvez fosse mais simples e eficaz, no futuro, conferir resistência
às plantas pela aplicação de produtos químicos”.
E. GROSSMANN(Confered Resistance in the Host. 1968) (World Review of Pest Control)

1. OS OLIGOELEMENTOS: CORRECÃO DE CARÊNCIAS


E FATORES DE QUALIDADE
O EXEMPLO DA VIDEIRA
Em repetidas vezes encontramos neste trabalho a videira e sua pro-
dução, como objeto principal de nossas pesquisas. No capítulo ante-
rior vimos como a carência em boro pode desencadear a “doença do
chumbo” na videira. Agora vamos examinar, à luz de experiências de
diversos autores, de que maneira as incorporações, seja de macro ou
microelementos obtiveram melhorias, tanto nas videiras, como, na qua-
lidade do vinho. Com isto se atinge um resultado duplo: aumento da
resistência da planta e melhor qualidade da produção a ser consumida,
em relação aos vertebrados ligados ao nível de proteossíntese.
F R A N C I S C H A B O U S S O U

A) Os oligoelementos nos solos dos parreirais: repercussões sobre a


qualidade do vinho
BERTRAND et alii. (1966), precisam antes de darem os resul-
tados de seus experimentos: “A cultura da videira tem um problema
muito particular, do ponto de vista dos adubos”... “Sabe-se que um
desequilíbrio em oligoelementos provoca uma diminuição dos ren-
dimentos, bem como modificações de qualidade, para as árvores fru-
tíferas. Portanto, seria desejável ver quais as repercussões sobre a
produção de vinho”.
Os experimentos desses autores foram realizados na região de
Pech Rouge, do INRA, Montpellier. Eles observam que o tratamento
das folhas é necessário no caso de haver problemas graves, mas que
nesta técnica ignoram-se as quantidades absorvidas de cada produ-
to. Corre-se o risco de cair num desequilíbrio por excesso. Como já
vimos, os ditiocarbamatos utilizados em tratamentos repetidos pro-
vocam excessos de zinco ou manganês nos tecidos, tornando-os tó-
xicos.
Contudo, a técnica de pulverizações foliares é preciosa no controle
das diversas doenças das plantas, bem como na melhoria da qualida-
de, desde que criteriosamente utilizada.
BERTRAND et alii. (op. cit.) realizaram experimentos com
aportes de boro, molibdênio e magnésio no solo.
Pode-se contestar a classificação de “oligo” ao magnésio, mas ele
tem uma importância considerável sobre a fisiologia da planta e so-
bre a saúde dos vertebrados que consomem o vegetal assim adubado.
Sempre em relação ao magnésio, BERTRAND observa que a
bruma do mar carregada pelo vento é uma fonte não negligenciável
desse elemento. Mesmo na região parisiense, onde este aporte é menor
que na propriedade de Pech Rouge, ele atinge 1 kg/ha/ano.
Referente ao rendimento, o magnésio mostrou um efeito adver-
so. Ao contrário, o molibdênio e o boro tiveram repercussões positi-
vas.

284
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Quanto à qualidade:
a) Magnésio: provoca um aumento do teor de açúcar; o ótimo
da dose de Mg se situaria em torno de 2,5 kg/ha. Este valor
propicia a melhor densidade do mosto;
b) Molibdênio: a quantidade de matéria seca aumenta com
maiores teores, a ponto do máximo ainda não ser atingido
com 0,8 kg/ha. Inversamente, o teor mínimo de cinzas é
obtido com aproximadamente 0,2 kg/ha. A densidade e a
acidez volátil aumentam como a matéria seca enquanto o grau
alcoólico tem seu ótimo com aproximadamente 0,35 kg/ha;
c) Boro: a densidade e acidez total crescem com o teor de boro,
enquanto a acidez volátil atinge o mínimo com aproximada-
mente 6kg de borato/ha. O grau alcoólico tem seu ótimo com
aproximadamente 0,35 kg/ha;
d) Os resultados da degustação são assim caracterizados por
BERTRAND et alii. (op. cit.):
“Todas as amostras das parcelas que receberam aporte de
magnésio são melhores à degustação e mais coloridas. O vi-
nho da parcela testemunha pode ser considerado como um
vinho branco manchado, e os outros vinhos, como rosés”.
“As amostras de vinhos provenientes das parcelas que recebe-
ram aporte de molibdênio são melhores à degustação”.
“Os vinhos provenientes de parcelas tratadas com boro são
pouco coloridos. A diferença com a testemunha é pouco
sensível”.
Os pesquisadores observam que não foram colocados nem zinco,
nem manganês. Contudo, detectou-se baixos teores destes elementos.
Estas possíveis pequenas deficiências podiam provocar modificações
no teor de açúcar, já que o zinco joga um papel essencial na síntese
destes últimos.
Isto demonstra que os diversos nutrientes devem ser associados
num equilíbrio conveniente, a fim de se obter resultados satisfatórios

285
F R A N C I S C H A B O U S S O U

nos diferentes objetivos visados: rendimento, resistência da planta e


qualidade da colheita. Veremos isto confirmado pelo exemplo a seguir
e pelos resultados obtidos através de preparados industriais que as-
sociam oligo e macroelementos, em função das necessidades
nutricionais especiais de cada tipo de planta cultivada.

B) Tratamentos foliares da videira através de oligoelementos


DOBROLYNBSKIJ (1975) estudou, especialmente, a influên-
cia de zinco e do manganês sobre a qualidade do vinho, determina-
da, neste caso, não pela degustação, mas em função do teor de
aminoácidos associados presentes nos bagos de uva.
Esse autor observa que as diferenças evidentes na composição da
uva e, portanto, dos vinhos, dependem das particularidades biológicas
da planta, isto é, da cepa, mas também das condições de crescimento,
isto é, clima, (fator bem conhecido dos viticultores) e, igualmente
agrotecnia. Isto engloba não apenas os processos culturais como a
fertilização, enxertia mas também os tratamentos com agrotóxicos, espe-
cialmente pelos oligoelementos que são usados, freqüentemente, em
excesso.
DOBROLYNBSKIJ (op. cit.) preconiza uma intervenção antes da
floração geral e outra no momento da formação dos grãos. Isto pare-
ce corresponder aos estágios G e J de BAGGIOLINI. Ele utilizou
uma fórmula na qual a calda bordalesa foi associada a 0, 05% de sulfato
de zinco e 0, 05% de sulfato de manganês.
As análises mostraram que estes tratamentos a base de oligoele-
mentos (cobre, zinco e manganês, mais enxofre e cálcio da calda
bordalesa) provocaram nas duas cepas tratadas, Aligoté e Cabernet-
Sauvignon, uma queda dos aminoácidos livres e um aumento dos
aminoácidos associados.
O conteúdo dos aminoácidos livres decresce às custas da alanina,
ácido glutâmico, ácido aspárgico e outros, enquanto aumenta a con-
centração de uma série de aminoácidos indispensáveis: valina, glicina,

286
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

leucina + isoleucina, cistina + cisteina, lisina, histidina, tirosina e


fenilalanina.
Na cepa Aligoté, a percentagem de aminoácidos associados em
relação ao total, é:

Testemunha Calda bordalesa Calda bordalesa


+ ZnSO 4 + MgSO 4
56,2% 60,1% 59,1%

DOBROLYNBSKIJ precisa, nas suas conclusões, que estes


oligoelementos, aumentando o número dos aminoácidos indispen-
sáveis, melhoram proporcionalmente o valor nutricional das uvas. Estes
resultados também estão correlacionados com o aumento da produtividade
e a elevação do conteúdo de açúcar das bagas.
Essas repercussões benéficas dos oligoelementos se explicam pelo
seu papel no metabolismo da planta, que tratamos no capítulo an-
terior.
Sabe-se que o zinco é necessário à síntese da clorofila e à do áci-
do indolacético ou IAA, cujo precursor é o triptofano. Sem o IAA –
hormônio indispensável – as plantas enfraquecem, e nas árvores fru-
tíferas se instala a doença chamada roseta das folhas, em que o alon-
gamento das hastes não se produz normalmente.
Em resumo, o zinco está ligado à síntese das auxinas, e à sua ação.
Daí os efeitos positivos dos tratamentos à base deste oligoelemento,
já que as carências ou subcarências (difíceis de serem identificadas
apenas por observação visual) são muito mais freqüentes do que se
poderia imaginar. BERTRAND et alii. (1961) observam que o nú-
mero de enzimas conhecidas que tem o zinco como constituinte é muito
elevado. Assim, as modificações histológicas provocadas pelos proble-
mas de funcionamento das cadeias enzimáticas podem ser melhor
explicadas.
Segundo BERTRAND e colaboradores, é necessário não esquecer

287
F R A N C I S C H A B O U S S O U

que estas cadeias variam com as espécies, pelo menos em importância


funcional, tanto que os sintomas observados em um caso não são neces-
sariamente os mesmos para as outras plantas. Por isso a dificuldade de
identificar as carências apenas pela observação visual e a necessidade de
recorrer-se às análises de folhas ou de suco celular.
O manganês, como o zinco, é indispensável aos animais e aos vege-
tais. Gabriel BERTRAND descobriu um fato novo, capital, ainda que
mal conhecido: o da subcarência, que não tem manifestação patológica
aparente, pelo menos num primeiro momento, mas causando uma re-
dução de rendimentos que pode ser bastante elevada. Descoberta em
aveia, Didier BERTRAND estima que as subcarências em manganês são
muito mais freqüentes do que se supõe. Isto parece confirmado pela
contraprova dos resultados benéficos, já relatados em videira.
COÏC mostrou, na Bretanha, que o manganês e o zinco podem
se encontrar bloqueados, isto é, não assimiláveis, devido a correções
calcárias exageradas. Daí o interesse pelos tratamentos foliares, mesmo
se o manganês não se comporta como um ativador de enzimas. Já
vimos o papel que ele pode desempenhar na resistência da planta às
doenças, especialmente a helmintosporiose e Sclerotinia do girassol.
Presume-se que sua ação positiva sobre a proteossíntese da videira,
como acabamos de ver, se acompanha igual e correlativamente, com
iguais repercussões sobre a resistência às doenças.

C) A técnica do controle por complexos sinérgicos de oligoelementos


Pelo menos duas razões são favoráveis à utilização de complexos de
oligoelementos:
Primeiro, os efeitos de sinergismo, precisamente e como já assina-
lamos, como aqueles do cobre e do manganês sobre o crescimento. E
que deveria se traduzir, teoricamente, segundo a nossa concepção, por
um efeito positivo sobre a resistência da planta.
Ora, efetivamente, parece que é o que se passa. Assim, DUFRÉ-
NOY (1930) observa que: “HOAGLAND e SNYDER obtêm moran-

288
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

gueiros mais vigorosos e mais resistentes a Oidium e Tetranychus numa


solução contendo 26 elementos do que numa com 12 elementos”.
Apesar de ignorarmos a causa exata do processo, podemos regis-
trar o fato e aproveitar estes resultados empíricos, embora menos
incertos que os decorrentes do uso de agrotóxicos, clássicos. Esses
últimos, mostram, ao contrário, uma vez mais incertos nos seus re-
sultados e, muito mais perigosos para a saúde da planta, como pen-
samos haver demonstrado antes.
Sem entrar em detalhes, apresentamos uma fórmula especialmente
estudada para a videira, que contém Zn, Mo, Mn, Fe, B, Co, Ca e Mg.
Transcrevemos, adiante, o que nos escreveu o autor dessa fórmula,
referente aos resultados obtidos: “O que posso afirmar é que em todos
os vinhedos assim tratados no meio-dia,* na França [segue a enumera-
ção das propriedades vitícolas], constatou-se modificações benéficas
após as aplicações dos oligoelementos. Os tratamentos acrescidos de
aplicações de zinco e manganês no inicio do período vegetativo, e boro, a partir
da floração, melhoraram a qualidade do lenho, tornou-se mais amadu-
recido e mais duro, aumentaram consideravelmente o tamanho do
cacho, particularmente sensível em Carigan, Syrah, Mouvèdre e
Sauvignon, e o espessamento da casca da uva”.
Referente às doenças, meu correspondente acrescentava: “O con-
junto destas condições faz com que, nestas propriedades, Botrytis não seja
mais considerada uma moléstia grave, mesmo não tendo sido feito trata-
mento especifico contra ela”.
“Paralelamente, houve redução e, após, desaparecimento total da esca*
(Stereum hirsutum) e erradicação da excoriose (Phoma reniformis)”.*

*
Meio-dia (Midi) significa também o Sul da França e ou da Europa. (N. do R)
*
Doença causada por S. Hissutum, chama-se “esca”. Pommer, 2003. (N. do R.)
*
A doença causada por P. Rerriformis, chama-se “excariose” ou “podridão branca
da uva”. Pommer, 2003. (N. do R.). As citações no original são, respectivamente,
Esca e Excoriose. (N. do R. )

289
F R A N C I S C H A B O U S S O U

O programa desses tratamentos compreende cinco aplicações,


entre o rebrote e a formação do cacho.
Conhecendo bem nosso correspondente, acreditamos não ser
possível debitar a um otimismo exagerado ou a uma propaganda
interesseira os fatos registrados. Eles acompanham os resultados das
repercussões benéficas dos oligoelementos sobre a resistência de di-
versas plantas por estimulação da proteossíntese em conseqüência da
correção de carências.
DOBROLYNBSKIJ e FREDOLENKO (1969), ressaltando as
relações de zinco e fósforo nas folhas da videira, observam que: “O
aumento da quantidade de nucleoproteínas e fosfatídeos nas folhas,
por influência do zinco, é extremamente importante. Sabe-se que um
aumento das nucleoproteínas, que são colóides hidrófilos, podem
explicar a influência favorável do zinco sobre a resistência da videira
à seca, ao calor e à geada”.
Por outro lado, a maior quantidade de compostos fosforados nos
cachos repercute na qualidade do vinho.
Finalmente – nesse trabalho os autores só enfocam a influência
do zinco – este elemento provoca:
– um aumento da produtividade;
– uma melhoria da qualidade (devida, como mostraram seus
trabalhos posteriores, ao acréscimo das cadeias de aminoácidos);
– uma aceleração da maturação dos cachos.
Estes trabalhos confirmam resultados práticos de controle e
demonstram que a utilização criteriosa dos oligoelementos permite
um aumento dos rendimentos, sem baixar a qualidade.
Esses fatos se explicam, pela simples razão de que estas técnicas têm
por base a estimulação da proteossíntese, como bem o demonstram as
análises da planta, ainda que esses métodos fossem empíricos, no
início, vimos que a fórmula complexa, desenvolvida para o tratamen-
to da videira, comportava um certo número de oligoelementos além
do magnésio que, como vimos, certos sábios o incluia entre eles. Este

290
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

elemento é dos mais importantes para a videira, como estimamos


necessário mostrar em seguida.

D) Secamento do engaço nos vinhedos: causas e tratamentos


Os secamentos do engaço foram registrados na Suíça, Alemanha e
no Leste da França, nos anos 1950-1960. Os sintomas manifestavam-
se entre a metade e o fim da maturação, por necroses no pedúnculo,
no eixo principal do cacho e suas ramificações. Fenômenos que podem,
finalmente, resultar no secamento completo do cacho.
Os porta-enxertos S04* e 5 BB** favorecem esta afecção. Determi-
nadas cepas, como Gewurztraminer, na Alácia, mostram-se mais sen-
síveis. Como a carência de Mg é decorrente de uma deficiência do solo
ou de um excesso de fertilização potássica, pode se inferir que o porta-
enxerto atua por um processo semelhante. O porta-enxerto 44-53
sensibiliza, igualmente, o enxerto em relação ao secamento do engaço.
Efetivamente, seja por um desequilíbrio hormonal ou por um
déficit alimentar, é uma carência de Ca e Mg que está na origem desta
afecção. Isto se traduz por relações mais elevadas de K/Ca, de K/Mg
e de K/Ca + Mg nos engaços.
O aporte ao solo de MgSO 4 diminui claramente os ataques de
secamento do cacho. Também se constata uma correlação altamente
significativa entre o teor em Mg das folhas e o secamento do engaço.
Assim se explicam, por exemplo, os excelentes resultados de
pulverizações com sulfato de magnésio sobre uma associação porta-
enxerto - enxerto particularmente sensível, como Cabernet-Sauvignon
enxertada sobre “SO4*”. Duas a três pulverizações de MgSO4 a 5%:
uma no início da floração; a segunda oito a dez dias após e, a tercei-
ra oito a dez dias após a segunda, deram resultados muito significa-
tivos:

*
Seleção Oppenheimer 4. (N. da T.)
**
Kober 5BB. (N. da T.)

291
F R A N C I S C H A B O U S S O U

– em 1973, os cachos atacados caem de 51-52% nas testemunhas


para 3,1 -3,66% nas plantas tratadas;
– em 1972, duas intervenções fizeram a doença involuir de 100%
para 50,5%.
Por isso o interesse de tratamentos preventivos com fórmulas à
base de complexos de oligoelementos e magnésio, como aquela citada.
Estas intervenções, baseadas em análises prévias, capazes de eviden-
ciar as subcarências, deveriam permitir evitar-se os graves inconve-
nientes resultantes das carências e, especificamente, da carência de
magnésio.
Estas carências, exatamente como na medicina humana e veteri-
nária são, na realidade, o leito das doenças, especialmente, as viróticas.
Admite-se a esse respeito, do ponto de vista nutricional, a qualida-
de está ligada ao nível de proteínas: o valor alimentar da colheita será,
pois, função não apenas de fatores genéticos, mas, também, de prá-
ticas culturais.
Por isso, chegamos, para concluir este capítulo e, também esta
obra, a examinar as repercussões da fertilização mineral e orgânica, e
também dos agrotóxicos (afora o problema dos resíduos), sobre a
qualidade da colheita.

2. FERTILIZAÇÃO MINERAL E QUALIDADE DA


COLHEITA

A) Considerações gerais
Como observou COÏC, “na agricultura, geralmente, a preocupa-
ção é maior com a quantidade do que com a qualidade”.
Às vezes nos preocupamos com uma certa qualidade, mas que só
diz respeito a um critério comercial. Freqüentemente, trata-se ape-
nas de um aspecto exterior. Assim, os frutos “manchados” são, comer-
cialmente, de “má qualidade”. É, igualmente, de má qualidade toda
a colheita maculada com resíduos de qualquer agrotóxico.

292
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Contudo, o que aqui entendemos por “qualidade” reside no seu


valor nutricional, isto é, na sua composição em elementos nutritivos.
Ora, esta pode estar alterada pela forma como a planta foi con-
dicionada, através das técnicas de cultivo. Já vimos que a planta e sua
produção podem ser modificadas pelos adubos que receberam ou
pelos tratamentos com agrotóxicos que sofreram. Afora toda a ques-
tão dos resíduos, os agrotóxicos e os adubos são igualmente capazes
de modificar, num ou noutro sentido, o valor nutricional da planta,
por ação sobre o seu metabolismo.
Os agrobiologistas há muito se deram conta disto e louvam obter
colheitas de melhor qualidade, graças a seus métodos de cultivo. Con-
tudo, antes de discutirmos esta polêmica, devemos estudar a maneira
como podem variar determinados critérios, em função de técnicas
usadas. Ora, a forma de adubação é precisamente uma das principais,
como também é a que, nesse sentido, temos mais informações.

B) Adubação e qualidade do trigo


I. A questão dos adubos nitrogenados
Ao longo do sexto capítulo, foi evidenciado, o papel, freqüente-
mente nefasto, dos adubos nitrogenados sobre a resistência da plan-
ta aos seus diversos parasitas. Isto porque os aportes de nitrogênio solúvel
ao solo provocam excesso de nitrogênio solúvel nos tecidos das plantas, não
convertido em proteínas.
Esta primeira observação já confirma os inconvenientes da adu-
bação nitrogenada solúvel em relação à qualidade da colheita. Com
efeito, a questão é se obter a mais alta concentração em protídeos e
proteínas.
Aliás, COÏC não dissimula que “a adubação nitrogenada coloca
árduos problemas em cultivo intensivo”. Ele precisa: “Um aumento
de aportes, especialmente, de adubos nitrogenados para melhor sa-
tisfazer as necessidades das culturas permitiu aumentar os rendimen-
tos e, correlativamente, os resíduos de matérias orgânicas

293
F R A N C I S C H A B O U S S O U

nitrogenadas. Disto resulta um aumento continuo da quantidade de


nitrogênio fornecido pelo solo às cultura”.
Ora, vimos antes e, falaremos adiante, a propósito da adubação
das pastagens dos inconvenientes deste nitrogênio mineral em rela-
ção às bactérias úteis e à fertilização do solo. Inconvenientes ainda
mais acentuados, tratando-se dos adubos nitrogenados amoniacais.
Segundo COÏC: “A nutrição amoniacal, comparada à nutrição
nítrica, leva a um acúmulo de nitrogênio orgânico solúvel e, mais
especificamente, de aminas (glutamina ou asparagina, conforme as
espécies vegetais)”.
Ainda COÏC: “quando os protídeos são constituídos por uma
certa proporção de nitrogênio orgânico solúvel, a variação da proporção
deste nitrogênio solúve,l no qual a composiçãoo em aminoaçidos daque-
la da proteína, como a variação de composição deste nitrogênio solúvel,
modifica a composição dos protídeos totais”.
A adubação nitrogenada solúvel e os tratamentos com herbicidas,
que inibem a proteossíntese por provocarem excesso de nitrogênio
solúvel no cereal, podem alterar a qualidade do grão, medida pela
riqueza em proteínas.
Pode-se questionar se o excesso de nitrogênio mineral ou orgânico
no solo, provocado por estas técnicas, não atuariam no bloqueio do
potássio. Sabe-se que excesso ou deficiência de potássio são nefastos,
podendo conduzir a um acúmulo de nitrogênio solúvel na planta,
como observou COÏC.
Inversamente, toda a prática que favoreça a proteossíntese melho-
ra, simultaneamente, a resistência da planta e a qualidade da colheita,
como no caso de correções de carências e, especialmente, o enxofre.

2. A questão do enxofre
Segundo o COÏC: “A deficiência em enxofre traduz-se por um
acúmulo de nitrogênio solúvel, isto é, de aminoácidos e de peptídeos que
não puderam ser utilizados na construção das proteínas”.

294
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Por outro lado, os aportes de enxofre, corrigindo uma carência ou


subcarência, melhoram, simultaneamente, os rendimentos e a qua-
lidade do grão: é, em particular, o que sobressai dos resultados de
BYERS e BOLTON (1979).
Esses autores, trabalhando com o trigo de primavera, mostraram
que a adição de enxofre ao nitrogênio solúvel pode aumentar a pro-
dução de 40 a 110%; a relação N/S parece fundamental: os grãos dos
tratamentos que deram as produções mais elevadas em matéria seca
e proteína bruta apresentavam uma relação N/S em torno de 15.
A composição do grão inteiro em aminoácidos, também foi, sig-
nificativamente, modificada pelos tratamentos de fertilização. Assim,
o trigo, cultivado sem aporte de enxofre e com o nível mais elevado de
nitrogênio continha menos da metade do total de cistina e de metionina
(em relação à percentagem total dos aminoácidos) encontradas no grão
daquele trigo cultivado com quantidades adequadas de adubos à base de
enxofre.
Os grãos das plantas carentes em enxofre, além das deficiências
de cistina e de metionina, apresentaram menos treonina, leucina,
isoleucina e lisina.
Comprovadamente, estas repercussões da fertilização com enxofre
repercutem sobre o valor nutricional do cereal. BYERS e BOLTON
(op. cit.), a partir de seus resultados, concluem pela necessidade de
se dispor de uma quantidade adequada de enxofre, sobretudo quan-
do se propõe a utilizar altas doses de nitrogênio. Isto, afim de asse-
gurar ao grão, a mais alta, qualidade possível, seja qual for o cultivar
considerado.
Estes mesmos autores registram que “interesses opostos podem
surgir entre agricultores que buscam o máximo de produção, consu-
midores interessados na qualidade do grão – determinada pelo teor em
proteínas – e industriais preocupados com o valor de panificação do
trigo, ou seja, o índice de tenacidade ou W. Segundo BYERS e
BOLTON (op. cit.), estas três exigências podem ser satisfeitas, des-

295
F R A N C I S C H A B O U S S O U

de que se assegure à planta uma concentração suficiente em enxofre,


sobretudo quando se faz elevadas aplicações de adubos nitrogenados
solúveis. Mas isto não resolve os outros inconvenientes deste tipo de
adubo, evocados antes, especialmente a redução que pode provocar
nas bactérias úteis.
Em resumo, parece demonstrada a importância do enxofre na
fertilização, em relação aos rendimentos, à qualidade da colheita e à
resistência às doenças.
Como todos estes processos resultam na existência de um nível
máximo de proteossíntese na planta, é evidente que a fertilização
com enxofre, por mais interessante que seja, não é a única variável
em jogo. Como pensamos ter demonstrado, ao longo dessa obra, a
proteossíntese depende ainda de um certo número de parâmetros,
especialmente dos oligoelementos de que ela pode dispor, para asse-
gurar ao máximo o seu metabolismo. É esse fator que, vamos exa-
minar em seguida.

3. A questão dos oligoelementos


É opinião geral que a fertilização com P, K, Ca e Mg não oferece
problemas, pois se trata “apenas” de restituir as exportações. Isto pode
ser correto considerando-se apenas os rendimentos, mas se conside-
ra, diferentemente, se encaramos a resistência da planta e seu valor
nutricional.
DOMSKA (1973), em experimentos a campo, com trigo e ce-
vada, mostrou que a melhor qualidade é atingida somente através de
um equilíbrio bem determinado entre os aportes de adubos
nitrogenados, fosforados e potássicos, que não corresponde, necessa-
riamente, às doses mais elevadas: ao contrário, autor observa que as
doses máximas de fertilizantes fizeram decrescer as quantidades de prote-
ínas no grão de trigo.
Por “fertilizantes” entenda-se os adubos solúveis NPK. DOMSKA
(op. cit.) observa que este tipo de adubação faz com que “a maioria dos

296
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

aminoácidos decresçam, exceto alguns, como a prolina, isoleucina,


leucina, fenillanina e alanina”
Ao contrário, precisa DOMSKA, quando os oligoelementos são
acrescentados, a concentração e o valor nutricional da proteína aumen-
tam. DOMSKA, que testou B, Cu, Zn, Mn e Mo, observa que estes
oligoelementos aumentam a concentração do total de aminoácidos (de
91,7g para 101,3g, e de 70,6g para 80,6g); a concentração dos
aminoácidos livres (de 331,2 para 396,1 e, de 240,1 para 267,6 mg/
% em peso); bem como o valor biológico da proteína (75 para 77e 55 para
61, segundo o índice EAA). *
Contudo, aqui também se trata de respeitar um certo equilíbrio.
DOMSKA observa que o valor biológico do grão de cevada baixou,
ao longo dos experimentos de 1966 ao nível mais baixo de adubação
NPK. Esse valor também ocorreu em 1965: o índice EAA passa de
73 para 56, devido a doses muito fortes de oligoelementos. Neste
caso, provavelmente, estava-se fora do ótimo de concentração nutri-
tiva, sobre a qual insistimos antes.

C) Adubação e valor nutricional das pastagens


1. Nutrição e potencial biótico
Certamente, é uma empreitada bastante difícil determinar o valor
nutricional deste ou daquele alimento em relação a esta ou aquela
espécie de animal doméstico, no contexto de nossos conhecimentos
atuais. E, contudo, foi possível observar que: “O conhecimento da
alimentação adequada a cada raça, em função do trabalho específico que
lhe é solicitado, é uma das bases da ciência da criação.” (Maurice ROSE
e Jore d’ARCES, 1957.)
Entretanto, pelo que precede, pôde-se demonstrar é um estado
nutricional específico da planta ou órgão que, segundo nossa teoria

*
EAAI: Essencial Amino Acid Index. Expressão em inglês do índice criado por Oser
(1951), para definir a qualidade da proteína por seu conteúdo em aminoácidos
essenciais. (N. do R.)

297
F R A N C I S C H A B O U S S O U

da trofobiose, determina a suscetibilidade, ao contrário, ou a resis-


tência à doença ou inseto. Assim, devemos admitir o mesmo, para a
saúde dos vertebrados, em função da composição de sua alimentação.
Efetivamente, Maurice ROSE e Jore d’ARCES, em sua obra
Evolution et Nutrition* (1957), de onde retiramos a citação preceden-
te mostram, através de diversos exemplos, a importância da natureza
da alimentação sobre a saúde e sobre o desenvolvimento dos animais.
Assim, eles citam o caso do rebanho Limousin Criado em solo
granítico quase desprovido de elementos fosfocálcicos, o rebanho
Limousin produzia bois robustos, apreciados para o trabalho, mas de
pequeno porte. Os agricultores decidiram melhorar as pastagens com
adubação de cálcio e fosfatos e também, com irrigação, o que permitiu
o cultivo de raízes e a extensão das pastagens. A raça “Limousin”,
recebendo forragens mais abundantes e mais nutritivas, transformou-
se rapidamente: registrou-se, simultaneamente, o desenvolvimento
rápido do esqueleto, o aumento da massa muscular e uma notável
precocidade.
Outro exemplo típico da influência da alimentação sobre o
“fenótipo” dos animais é o do cavalo bolonhês. Esses autores referem
que VISEUR registrou a presença de dois tipos nesta raça, desde o
século 17: “o bolonhês grande e o pequeno, reversíveis de um tipo para
o outro. Isto ocorre quando sua descendência vive alternadamente
sobre os planaltos, as colinas férteis e no vale, ou nas encostas mais
ou menos áridas”.
Da mesma forma, os fracassos das importações de gado Limousin
na Argélia, durante a colonização, seria explicável pela natureza di-
ferente da alimentação.
Estes diversos exemplos acentuam a importância da alimentação
dos rebanhos sobre sua constituição. Não há por que se espantar que
ela possa também repercutir sobre sua saúde.

*
“Evolução e Nutrição”. (N. da T.)

298
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

O principal do que sabemos dessas relações é o produto, sobre-


tudo das carências, pelo menos onde puderam ser formalmente
estabelecidas. É esta questão que nos propomos examinar a seguir.

2. Carências e estado sanitário dos rebanhos


Como observa PERIGAUD (1970), as carências dos alimentos
em oligoelementos podem provocar fenômenos de ordem patológica
nos animais. É o exemplo clássico da miopatia provocada pela carência
de selênio. O mesmo autor ainda se refere: “Os sintomas das outras
carências são múltiplos e ‘não específicos’. Seguidamente, constata-
se apenas a infertilidade, mas a maioria dos sintomas são característi-
cos de deficiência em energia, nitrogênio, fósforo, ou de más condições na
criação”.
É surpreendente se encontrar a mesma dificuldade que já encon-
tramos, nas plantas, para caracterizar os sintomas desta ou daquela
carência em oligoelementos. Tanto nos animais como nos vegetais,
parece que todas as carências repercutem sobre o conjunto do meta-
bolismo do indivíduo, com toda a gama de seqüelas que isto traz ao
funcionamento normal do organismo. Aliás, daí as dificuldades
observadas por VAGO (1956) “para explicar os numerosos estados
patológicos, baseando-se apenas na unidade “doença”.
Por agora, tentaremos esclarecer a natureza das relações entre a
alimentação com uma pastagem obtida através de um determinado
tipo de fertilização e o estado sanitário de rebanho que a consome.

3. Relações entre alimentação e doença


Primeiro se tentou abordar e até resolver este árduo problema
através de análises. Ou seja, analisaram-se os fenos para confrontar os
resultados com as análises dos tecidos de animais que correspondessem
a um estado sanitário conhecido. A priori, se arriscava a um fracasso,
especialmente com os oligoelementos.
Pela análise dos fenos procurava-se determinar:

299
F R A N C I S C H A B O U S S O U

– de uma parte, o início da carência;


– de outra, o início da toxicidade.
Quanto à análise dos tecidos animais, que deveria complementar a
do feno, é um método válido em determinados casos, como na pesquisa
de selênio, mas que fracassa na maioria das vezes. PERIGAUD (1970)
observa que “a análise individual não tem nenhum significado e se trabalha
apenas sobre valores médios”.
Por outro lado, é difícil imaginar como a confrontação desses dois
tipos de análise poderia dar informações úteis quanto às necessida-
des dos animais. Buscando determinar estas exigências nutricionais
através de análises puramente minerais e freqüentemente relativas a
um único elemento, tangencia-se os conteúdos, por não se conhecer
o assunto com a devida profundidade. Os pesquisadores envolvidos
com este delicado tema parecem estar bem conscientes disto.
Admitindo que se pudesse identificar as carências, se perceberia
que nem todas são “primárias”, isto é, diretamente ligadas à insufi-
ciência de um elemento na ração. Algumas são “secundárias’ isto é,
induzidas pela presença de um outro fator alimentar que interfere na
utilização metabólica do alimento ingerido (PERIGAUD, 1970).
À maioria dos observadores não escapou esta importante noção das
relações que unem o solo, a planta e a saúde do animal que dela se nutre.
PERIGAUD (op. cit.) observa, a respeito dos oligoelementos: “A pobre-
za do solo em oligoelemento disponível repercute sobre a composição dos
vegetais que nele se desenvolvem e daí sobre o animal que deles se nutre.
Determinados tipos de solo produzem forragens cujo teor em alguns
oligoelementos é freqüentemente inferior ao limite de carência definido pelo
animal”.
Como os dados obtidos pelo método de análise do feno não
conduziam a um diagnóstico preciso, passou-se a testes terapêuticos,
isto é, substituiu-se o pelo sintético método analítico .
Com efeito, o início de carência foi determinado pelo processo de
análise de feno, temos direito de questionar até onde ele é válido.

300
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Primeiro, o elemento em questão deve ser considerado sob o ponto


de vista de seu papel na fisiologia da planta, especialmente, como pen-
samos ter demonstrado a importância, na elaboração das proteínas, con-
sideradas como um fator de qualidade na alimentação de vertebrados.
Ora, nenhum oligoelemento, como já vimos, age sozinho sobre
o metabolismo da planta, mas sim num contexto fisiológico em que
outros macro ou microelementos intervêm, igualmente, e em função
dos métodos culturais usados.
Examinemos, por exemplo, o caso do cobre, cuja carência é geral.
PERIGAUD (op. cit.) observa que “a concentração bruta do solo em
cobre parece não ser suficiente”. Ela diz que:
– um solo carente em cobre (na Normandia), cultivado intensi-
vamente com azevém, produz uma forragem com 0,7 ppm de cobre;
– sobre o mesmo solo, os campos nativos, com baixo rendimen-
to alcançam 7,3 ppm;
– enfim, em “solos normais”, a cultura superintensiva não tem mais
que 3 a 5 ppm de cobre, isto é, menos que a pastagem extensiva em solo
pobre.
Assim, PERIGAUD questiona:
“Em que medida o aumento considerável da produção através de
plantas selecionadas, da aceleração dos ritmos de corte, das técnicas
de fertilização,* da irrigação etc... tem repercussões sobre a concentra-
ção de oligoelementos nas forragens?”.
A esta questão, podemos, talvez, aportar um início de resposta. E,
em seguida, para explicar estas disparidades na concentração de cobre
nas forragens, segundo os três casos mencionados, seria necessário sa-
ber no que consistem as diferenças entre os métodos de cultivo.
Quando PERIGAUD qualifica os cultivos de intensivos ou mes-
mo “superintensivos”, isto não corresponderia a um emprego exagera-
do de adubos solúveis, como é o mais comum? Ou até à utilização de

*
Grifado por Chaboussou (N. do R.)

301
F R A N C I S C H A B O U S S O U

herbicidas? (Para, como alguns preconizam, selecionar as espécies


forrageiras interessantes).
Por enquanto, retenhamos apenas a provável utilização de adubos
químicos solúveis. Já vimos, antes, que os adubos nitrogenados solúveis
– e, às vezes, os adubos potássicos, podem apresentar um efeito con-
trário sobre a colonização da rizosfera pelas bactérias (com diferenças
nas repercussões segundo a categoria de bactérias) (TROLLDENIER,
1970). Especificamente, a nutrição potássica das leguminosas afeta a
fixação de nitrogênio pelo Rhizobium leguminosarum (KOCH e
MENGEL, 1972).
Ainda nas leguminosas, os aportes elevados de adubos potássicos
aumentam o teor dos aminoácidos solúveis na planta. Em outras pala-
vras, eles inibem a proteossíntese e diminuem, portanto, o valor
nutritivo da forragem.
BETAEGHE e COTTENIE mostraram, numa longa experiên-
cia de trinta e seis anos, que a fertilização com os adubos aplicados nas
parcelas NPK praticamente provoca o desaparecimento do cálcio. Os
autores constatam que isto leva a uma diminuição significativa do pH
e da produção.
Ora, vimos, no sexto capítulo, que o papel do cálcio é fundamen-
tal na proteossíntese, devido a suas relações privilegiadas com os
microrganismos e a matéria orgânica. O cálcio, associado à matéria
orgânica, aumenta a fixação de nitrogênio. Ele também mobiliza os
oligoelementos. Assim se explica que seu desaparecimento possa
provocar o bloqueio dos oligoelementos e, portanto, em cadeia, o dos
elementos nutritivos assimiláveis, num processo resumido no esque-
ma da fig. 35.
PERIGAUD (1970) constatou que o excesso de adubos nitrogenados
pode provocar hipocupremias e queda de fertilidade do rebanho. PERIGAUD
e DEMARQUILLY observam que, “na Bretanha, os casos de baixa fer-
tilidade das vacas aparecem nos solos pobres em cobre, nas explorações
onde as doses empregadas de nitrogênio ultrapassam 100 kg/ha”.

302
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

PERIGAUD e DEMARQUILLY salientam, em contrapartida,


que os agricultores que não utilizam nitrogênio em suas pastagens
têm um rebanho com fecundidade superior a dos outros. É que a
carência em cobre pode influenciar a diversidade da flora e a compo-
sição mineral das plantas.
Assim, a quantidade de capim Timothy* no feno pode ser dobra-
da e a do trevo vermelho aumentada de 5 a 12 vezes, pelo aporte de
cobre ao solo (COÏC e TENDILLE, 1971). PERIGAIJD (1970) es-
pecifica que “em solo muito pobre, estas espécies, adubadas com
macroelementos com dosagens elevadas, são muito carentes em cobre”.
Definitivamente, todos estes fenômenos têm por origem as repercus-
sões nefastas dos adubos solúveis sobre os microrganismos do solo. Em
particular, o cobre é mais assimilável graças ao desenvolvimento
bacteriano, como referem COÏC e TENDILLE (1971). A carência
ocorre com a destruição das bactérias.
Como se sabe, o cobre interfere no teor de proteínas altamente
digestíveis da matéria verde. Este fenômeno implica que um pasto
jovem, rico em cobre, pode vir a provocar deficiência deste elemen-
to (PERIGAUD e DEMARQUILLY, 1975).
Esta constatação levanta diversas questões. Que critérios definiram
esta carência? Quais são os sintomas apresentados pelo animal? Sua
origem é realmente uma deficiência em cobre, ou estaríamos na pre-
sença de uma carência nutricional mais complexa como, por exemplo,
uma carência de proteínas? Neste caso, o cobre contido no pasto jovem
poderia estar acima do ótimo de concentração nutritiva e, com este teor,
influenciaria, desfavoravelmente, o processo de proteossíntese.
Como já observamos, geralmente os sintomas da maioria das
carências são “múltiplos e não específicos”, “secundários”, e não “pri-
mários”.

*
Phaleum protense. ( N. do R.)

303
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Assim, a tetania do pasto, que pode ser provocada por excesso de


adubos nitrogenados ou potássicos, seria, proveniente da diminuição da
digestibilidade do magnésio sob influência de um excesso de K ou N.
Contudo, PERIGAUD e DEMARQUILLY (1975) indicam que esta
doença “parece ser mais um problema de metabolismo de origem endócrina
do que conseqüência do nível de digestibilidade do magnésio do pasto”.
Esta observação aproxima-se à de COPPENET, a propósito dos
efeitos complexos da adubação, que envolve diversos fatores difíceis
de dissociar. Esse autor observava: “o estágio da exploração e o ciclo
são mais importantes sobre a concentração de fósforo no azevém do
que o teor de fósforo no solo e da adubação fosfatada”.
Só resta dizer que é no nível da composição bioquímica da plan-
ta que se deve buscar a causa das repercussões sobre a saúde do reba-
nho que a consome. Resumindo, o que foi evidenciado quanto às
repercussões da adubação sobre a qualidade do grão de trigo, pode
ser transposto, com grande aproximação, para a qualidade da forra-
gem e a saúde do rebanho.
A respeito da flora das pastagens; fixemos que:
– pela existência de seus nódulos de Rhizobium, as leguminosas
enriquecem o solo em nitrogênio orgânico, benéfico para o crescimento
e a qualidade da planta;
– as leguminosas mobilizam também o cálcio e provocam uma bai-
xa relação Si/Ca;
– o cálcio, nas suas relações (ainda obscuras) com a matéria orgâni-
ca e os microorganismos do solo, aumenta a fixação do nitrogênio e favo-
rece a assimilação dos micronutrientes;
– ao contrário, os adubos nitrogenados e potássicos solúveis, prova-
velmente por seus efeitos tóxicos sobre as bactérias, como Rhizobium, acar-
retam o desaparecimento das leguminosas e, conseqüentemente, também
do cálcio assimilável e dos oligoelementos como o cobre.
Assim, pela via nutricional, resultam problemas mais ou menos
graves na saúde do rebanho, provavelmente oriundos, em última

304
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

análise, de uma deficiência da forragem em proteínas e oligoele-


mentos (fig. 35).
Assim, não seria surpreendente constatar, em relação à saúde dos
animais e, mesmo, a do homem, repercussões sobre sua saúde e seu
potencial biótico, podendo encontrar resultados, diametralmente
opostos, pela realização de técnicas culturais que, a despeito de seu
empirismo, produzem na planta um estímulo à proteossíntese, ao
contrário do esperado.
Veremos agora os resultados dos métodos usados pelo que se
convencionou chamar de “agricultura biológica ou ecológica”.

3. AGRICULTURA BIOLÓGICA E A SAÚDE DOS


VERTEBRADOS

A) os critérios de qualidade ou valor nutritivo da alimentação


A alimentação ideal seria a que, além de assegurar um bom cres-
cimento, favorecesse, simultaneamente: a fecundidade, a fertilidade,
a resistência às doenças e, enfim, a maior longevidade possível.
O problema, que não é pequeno, consiste em determinar os
caracteres bioquímicos do alimento que corresponderiam, para cada
espécie animal, às normas de uma alimentação ideal. Diversas fórmu-
las foram propostas, sem que nenhuma pudesse obter adesão unâni-
me. Contudo, em relação aos vertebrados - como aludimos antes - se
está de acordo em reconhecer como critérios positivos a existência de
altas concentrações em proteínas e, também, em determinados
aminoácidos e em vitaminas. Veremos a demonstração disso, com os
resultados de SCHUPHAN, que serão apresentados mais adiante.
Referente aos animais, uma série de observações seguras e fatos
que se assemelham entre si fornecem uma base sólida para determi-
nar o bom estado sanitário de um rebanho. Outro bom indicador,
mais imediatista, é a conta paga pelos criadores aos veterinários!... é
o que faremos com os resultados alcançados pelos agrobiologistas.

305
F R A N C I S C H A B O U S S O U

B) Os resultados da “agricultura biológica”


BRUGGER (1975), que parece caracterizar bem uma posição
bastante corrente, escreve: “A pretensão da agricultura ‘biológica’ de ser
a única que produz alimentos de qualidade irrepreensível e de valor
superior, do ponto de vista biológico, deve ser refutada com vigor”.
O mesmo autor insiste: “por razões de ordem jurídica e objeti-
va, determinados limites deveriam ser impostos à propaganda em
favor dos produtos biológicos”.
Entretanto, se nosso autor, – que está perfeitamente em seu di-
reito – contesta a superioridade dos produtos da agricultura bioló-
gica, em relação aos da agricultura “clássica” ou “química”, ele não
apresenta nenhuma prova e fica no estágio da afirmação. Por isso,
baseados em fatos e na qualidade das colheitas, vamos analisar obje-
tivamente os resultados obtidos pela agricultura biológica e identi-
ficar, se realmente não apresentam alguma superioridade em relação
à agricultura “química”. E, aqui, deixando de lado a questão de resí-
duos de agrotóxicos (os agrobiologistas salientam a sua ausência em
seus produtos), para enfocarmos o ponto de vista do valor nutritivo
das plantas assim cultivadas.
Para sermos o mais objetivos possível vamos recorrer, não direta-
mente aos agrobiologistas, mas a um pesquisador oficialmente encar-
regado de apreciar os resultados das explorações agrobiológicas.
A saúde do rebanho nas explorações agrobiológicas será o primeiro
ponto enfocado.
Quando o CORDES (Comitê d e Organização de Pesquisas sobre
o Desenvolvimento Econômico e Social), organismo do “Comissariado
Geral de Planejamento”, nos deu a honra de perguntar nossa opinião
sobre a pesquisa de Yves LE PAPE, resumida no relatório A agricultu-
ra biológica afirmamos que:
“O mínimo que se pode dizer desse trabalho é que nos parece
escrupuloso, imparcial e, na medida em que é humanamente possí-
vel, objetivo”. E, podemos, mesmo, acrescentar: “Sem dúvida, ele não

306
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

provoca um impacto considerável nos diversos meios agrícolas, sejam


estes favoráveis, ou não, às concepções da agricultura biológica”.
Foi excesso de otimismo. Na realidade – e, ao contrário do que
sugerimos - este interessante relatório, segundo nosso conhecimen-
to, não foi objeto de nenhuma discussão oficial. Contudo, como os
fatos aí relatados continuam os mesmos, necessariamente terão que
ser considerados num futuro mais ou menos próximo.
Um primeiro fato nos chamou a atenção na leitura desse relató-
rio: a unanimidade das repercussões benéficas sobre a saúde das plan-
tas, animais e do próprio homem produzidas pelo emprego das
técnicas da agricultura biológica. Tal convergência não é apenas fru-
to do acaso.
A respeito da saúde dos animais, o relatório observa que a
reconversão das explorações de “agricultura química” para “agricul-
tura biológica” deu-se essencialmente em razão do estado sanitário do
rebanho.
O relatório precisa que:
– 68% dos agricultores são motivados pelas numerosas doenças
do rebanho, que haviam tido na agricultura “química”;
– 18% destes apresentavam problemas de saúde em sua própria
família.
O relatório precisa que, depois da conversão, o estado sanitário
melhorou nitidamente. Citamos: “75% [dos agrobiologistas] regis-
traram uma importante diminuição dos custos veterinários. A nos-
so conhecimento, nenhum caso de febre aftosa foi registrado na
Bretanha, nos agricultores biológicos, apesar dessa doença ter ataca-
do, gravemente, nessa região, na primavera desse ano. Por outro lado,
no Finistère, onde a vacina não é obrigatória, não foi registrado ne-
nhum caso de febre aftosa. Como explicar fatos tão surpreendentes?”.
Vemos uma só resposta a esta questão: a superioridade da quali-
dade da alimentação obtida elaborada graças às técnicas da agricul-
tura biológica.

307
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Isto nos leva a questionar os elementos que atualmente dispomos


como critérios bioquímicos válidos para identificar a qualidade dos
produtos vegetais, em função dos diferentes modos de cultivo. A este
respeito, habitualmente se faz referência aos trabalhos de SCHUPHAN
(1974), que se estenderam por doze anos.

Os trabalhos de SCHUPHAN
Em resumo, os trabalhos de SCHUPHAN comparam diversos
tipos de adubação, em culturas como espinafre, repolho crespo, batata
e cenoura. São consideradas a fertilização clássica NPK, utilizada iso-
ladamente e associada ao esterco, só esterco e, enfim, compostagem
biodinâmica.
Foram feitos três tipos de constatações:
– evolução da composição mineral do solo;
– composição das colheitas em diversos constituintes orgânicos
e minerais;
– repercussões sobre a saúde de bebês alimentados com produ-
tos obtidos desses diferentes tipos de fertilização.
No que se refere às transformações constatadas no solo, SCHUPHAN
registra:
1. A função reguladora do húmus na nutrição das plantas.
2. Sobre turfa, com o composto biodinâmico, concentrações extrema-
mente elevadas em K2O, O2, Na, P 2O5, Ca e Mn.
SCHUPHAN justifica este segundo ponto pelas quantidades
elevadas de elementos fornecidos a cada ano, e também pelo nível
relativamente moderado das colheitas.
Contudo, pelo que se sabe dos fenômenos ditos “de troca” e de
“mineralização”, provocados pela fertilização orgânica, é questionável
se são apenas estes os processos em questão. Vimos que, ao longo do
capítulo sexto, a matéria orgânica estimula a proteossíntese, princi-
palmente quando previamente fermentada. Veremos, adiante, uma
demonstração suplementar.

308
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

A respeito dos oligoelementos, a concentração de ferro aumenta com


dois tipos de adubação orgânica: esterco e composto biodinâmico.
Além disto, com o composto biodinâmico, as concentrações do solo,
em magnésio, são mais elevadas do que com os outros tratamentos.
A respeito da composição da planta, indicamos sumariamente os
seguintes resultados:
Com a adubação orgânica:
a) constata-se, se de um lado, a elevação das concentrações de ele-
mentos minerais (exceto sódio), bem como a redução da presença de
compostos indesejáveis, como nitrogênio nítrico e aminoácidos livres,
que são produtos nefastos para a alimentação dos vertebrados, inclu-
ído o homem;
b) por outro lado, como a adubação puramente química aumenta o
teor de água nos tecidos, com a aplicação de esterco, aumenta-se o teor de
matéria seca em 96%, se comparado ao tratamento químico com NPK;
c) a concentração de vitamina C (ou ácido ascórbico), seu teor,
sempre comparado ao tratamento NPK, aumentou em 78% com o
esterco e 64% com o composto biodinâmico;
d) em resumo, estes resultados provam que a fertilização orgânica
estimula a proteossíntese, tanto nas hortaliças estudadas, como nos
cereais, forragens e árvores frutíferas, como vimos antes.
Do ponto de vista dietético, o fato mais significativo reside na
propriedade da fertilização orgânica de aumentar o teor de aminoácidos
sulfurados (metionina e cistina) nas proteínas. Estes são os mais impor-
tantes para a nutrição do homem e dos animais.
Inversamente, os adubos nitrogenados solúveis, principalmente
quando usados em grandes quantidades, provocam, por exemplo, em
espinafre, reduções consideráveis na concentração de metionina nas pro-
teínas.
Acreditamos ser útil citar SCHUPHAN integralmente: “Os
dados do quadro 6 indicam uniformemente baixas concentrações em
aminoácidos livres devido à fertilização orgânica, tanto com ‘esterco’

309
F R A N C I S C H A B O U S S O U

quanto com ‘composto biodinâmico’. Mostram também altas concentra-


ções com a associação ‘esterco’ mais NPK e apenas NPK, devido à concen-
tração de nitrogênio do adubo mineral usado”.
Aproveitemos para ressaltar os efeitos nefastos dos adubos
nitrogenados solúveis, que já comentamos nesta obra, em relação à resis-
tência da planta e da qualidade do trigo ou forragens. Este tipo de adu-
bo, por diversas razões já citadas, inibe a proteossíntese. Não é
necessário buscar outras razões para todos os seus inconvenientes.
As experiências de SCHUPHAN, relativas ao valor nutricional dos
produtos vegetais para bebês, referiram-se, apenas, à comparação do
consumo das hortaliças obtidas com esterco e associação esterco mais
NPK. Os resultados foram claramente superiores com os produtos
oriundos do último modo de adubação. E, aqui, em seguida, a opi-
nião dos pediatras: “os teores mais elevados em constituintes não calóricos:
vitaminas, minerais e oligoelementos”.
Citemos resumidamente os resultados globais obtidos com ester-
co e composto biodinâmico. Comparado com fertilização apenas de
NPK, são os seguintes os percentuais de aumento:

– determinação sobre batata e espinafre, separados:


análise da batata:
• matéria seca + 23%
• % proteína + 18%
• ácido ascórbico + 28%
• açúcares totais + 19%
• metionina + 23%
análise do espinafre:
•K +18%
•Ca+10%
•P +19%
•Fe +77%

310
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Enfim, os constituintes nefastos ou indesejáveis, normalmente prove-


nientes de um metabolismo imperfeito, mostram consideráveis regressões,
devido ao estímulo da fertilização orgânica, se comparada ao tratamen-
to NPK:
• regressão dos nitratos 93%
• regressão dos aminoácidos livres 42%
• regressão do sódio 12%
Assim, os trabalhos de SCHUPHAN parecem concordar com os
resultados empíricos obtidos pelos agrobiologistas e, que têm a pre-
tensão de fornecer produtos com maior valor nutricional do que os
da agricultura “clássica” ou “química”.
Esse maior valor nutricional, parece se explicar pela natureza de
seus métodos, quais sejam:
– o cultivo de leguminosas que enriquecem o solo em nitrogênio
orgânico e cálcio;
– os aportes moderados de correções de cálcio-magnésio;
– a escolha de adubos insolúveis (pó de rocha);
– a utilização privilegiada de estercos e compostos fermentados
e ricos em oligoelementos e substâncias de crescimento;
– o não-uso de adubos solúveis que apresentam toxicidade em
relação às bactérias úteis e ameaçam a vida e a fertilidade do solo;
– enfim, a recusa aos agrotóxicos sintéticos, inclusive herbicidas,
suscetíveis, de poluir, não apenas os produtos com resíduos, mas
também sensibilizam as plantas a doenças e alteram a qualidade da
colheita, por inibição da proteossíntese.
É, efetivamente, um conjunto de disposições que só pode resul-
tar no aumento do processo da proteossíntese e, portanto, do valor
nutricional das culturas. Essas diversas técnicas parecem explicar, por
seus efeitos sobre a elaboração das proteínas, os resultados de que se
orgulham os agrobiologistas: técnicas brandas e pouco onerosas,
resistência das plantas às pragas e doenças, superioridade do valor
nutricional das colheitas que levam a uma excelente saúde do reba-

311
F R A N C I S C H A B O U S S O U

nho e até do homem.


Assim, se encontraria fechado o ciclo que, através da planta, vai
do solo ao homem e aos animais domésticos, e que é a característica
e objeto da agricultura. Ainda restam grandes progressos a serem
alcançados, principalmente sobre a abertura de espírito, mas parece
que uma via mais racional está disponível. Pensamos ser útil expres-
sar em grandes linhas nossas conclusões gerais.

Fig. 35. Esquema da cadeia das repercussões dos adubos solúveis


em relação à qualidade das forragens e da saúde do rebanho.

312
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314
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CAPÍTULO I

CONSIDERAÇÕES GERAIS

1. SOBRE A NATUREZA DAS RELAÇÕES HOSPEDEIRO-


PARASITA
Recentemente foi observado que: “A maioria de nossos conheci-
mentos sobre as relações hospedeiro-parasita das doenças das plan-
tas ainda se restringe aos processos descritivos. A transposição desses
conhecimentos para relações bioquímicas e fisiológicas precisas, como
as que possibilitam o progresso da medicina, constitui o trabalho
mais importante a ser realizado”. *
Foi o que tentamos nesta obra, procurando responder a um de-
terminado número de indagações.
Assim, a respeito das repercussões dos agrotóxicos, que representam
o volume maior de nossos trabalhos, questionamos:
1. Por que diversos agrotóxicos provocam multiplicações de
ácaros, pulgões, lepidópteros etc?

315
F R A N C I S C H A B O U S S O U

2. Por que os ditiocarbamatos acarretam o desenvolvimento de


Oidium e Botrytis nas plantas tratadas?
3. Por que diversos produtos notoriamente não fungicidas apre-
sentam ação antifúngica?
4. Por que a causa da ação da calda bordalesa e do enxofre em
relação a numerosas doenças fúngicas ainda não foi explicado?
Sobre as incidências nefastas ou benéficas da fertilização, pergun-
tamos:
5. Por que os adubos nitrogenados solúveis são unanimemente
reconhecidos por sensibilizarem as plantas em relação a doenças e
pragas?
6. Por que, inversamente, o potássio e uma fertilização equilibra-
da conferem à planta resistência a estas mesmas pragas e doenças?
Sobre o clima e os fatores ambientais:
7. Por que uma queda de temperatura sensibiliza a planta às do-
enças fúngicas?
8. Por que, ao contrário, temperaturas mais altas e fotoperíodo
longo as tornam mais resistentes?
Sobre determinadas práticas culturais:
9. Por que, em determinados casos, a enxertia sensibiliza o enxer-
to a ataques de ácaros ou doenças e, em outros casos, provoca efeito
contrário?
10. Por que, na maioria dos casos, o trabalho do solo estimula a
resistência?
Enfim, a respeito do metabolismo da planta – que, em última
análise, é o ponto principal:
11. Por que folhas muito jovens ou folhas maduras são resisten-
tes, enquanto folhas de idade intermediária ou folhas velhas são, ao
contrário, suscetíveis?
12. Enfim, por que as folhas são mais sensíveis no momento da
floração?
A esta série de questões – cuja lista poderia ser alongada – con-

316
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

seguimos dar uma única resposta: a resistência está associada, posi-


tivamente, ao nível de proteossíntese nos tecidos. Isto significa que
nossa teoria da trofobiose tem chance de dar um passo adiante na
explicação destes fenômenos. Ou seja, fazer avançar os meios a serem
desenvolvidos para proteger a planta.
Julgamos necessário voltar a falar sobre os riscos dos agrotóxicos,
ainda usados sem se levar em consideração sua ação indireta sobre a
resistência da planta.

2. EXPLICAÇÃO DAS REPERCUSSÕES DOS FUNGICIDAS


Se, na medicina, o registro de medicamentos considerados efica-
zes é dado após testes em animais, os médicos devem reconhecer, ho-
nestamente, que ignoram quase completamente a maneira como os
produtos agem. Acreditamos válido recordar, através de uma citação do
Dr. LEPRINCE, que SEZARY estimava que os produtos não seriam
específicos em relação aos germes patogênicos, mas que exerceriam uma
ação indireta no organismo, aumentando sua “vitalidade”. Ou, em
outras palavras, modificando favoravelmente “o terreno”, noção cara a
Claude BERNARD e, cada vez mais, levada em consideração.
É esta a ênfase dada por nossa teoria da trofobiose, que preten-
de, além disto, definir o terreno como “meio nutricional” em relação
ao parasita.
Portanto, a eficácia de um “fungicida” qualquer resultaria de uma
ação antinutricional em relação ao parasita em questão, simplesmente
por um efeito favorável à proteossíntese.
Assim se explicaria a ação antifúngica, em relação a certas doen-
ças, de produtos não fungicidas como os arsenicais para o controle da
sarna, do Parathion contra a ferrugem coroada do azevém, do Carbaryl
em relação a Alternaria do algodoeiro etc.
Cabe a mesma explicação para os efeitos pró-fúngicos dos
ditiocarbamatos e pró-ácaros de diversos agrotóxicos, inseticidas e
fungicidas.

317
F R A N C I S C H A B O U S S O U

Também estaria explicado o modo de ação antifúngica de produ-


tos clássicos como o enxofre ou a calda bordalesa, que há muito tempo
comprovam sua utilidade.
Enfim, também se teria a explicação da ineficácia freqüente de
produtos registrados como “fungicidas”, que falham quando utiliza-
dos e cuja eficácia é formalmente colocada em dúvida por pesquisa-
dores experientes.
As falhas são tantas, que se permite definir como “fungicida”
qualquer produto não necessariamente tóxico em relação ao patógeno
em questão, mas que, através de um efeito não-intencional, porém
benéfico, sobre a estimulação da resistência da planta tratada, pode
ter ação antifúngica, em uma determinada dose, sobre um determinado
tipo de folha e num determinado período do ciclo fisiológico. Isto
ocorre através de um efeito de ordem antinutricional em relação ao
parasita.
Assim, são os efeitos não intencionais dos produtos sobre a fisio-
logia da planta que podem provocar graves repercussões sobre sua
suscetibilidade, bem como o desencadeamento das doenças.
É este ponto importante que gostaríamos de retornar nas conclu-
sões gerais.

3. GRAVIDADE DAS REPERCUSSÕES DOS


AGROTÓXICOS SOBRE A PLANTA
O quarto capítulo desta obra tem por objetivo as repercussões
dos agrotóxicos sobre a fisiologia da planta. Como vimos, elas se
explicam em função de nossa teoria da trofobiose, tanto pela ação
eficaz dos produtos, quanto nos casos freqüentes de ineficiência e
o desencadeamento de novas afecções, que analisamos no quinto ca-
pítulo.
A este respeito levantamos o caso – tão inquietante do ponto de
vista agronômico – das doenças viróticas, em recrudescimento nos
últimos anos.

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P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

Achamos útil, para entender a eventual causa deste grave proble-


ma fazermos uma aproximação com o que ocorre nos insetos, segundo
trabalhos de VAGO. Diremos brevemente que, nosso eminente co-
lega demonstrou que, nos insetos pode haver desencadeamento de
doenças viróticas, mesmo havendo controle para impedir o contato
de vírus com os insetos. O desencadeamento ocorre por má nutrição
ou ingestão de produtos químicos como, por exemplo, o fluoreto de sódio,
em doses baixas.
Pelo que conhecemos das repercussões dos agrotóxicos (especialmente
herbicidas) sobre a fisiologia da planta e sua má nutrição, que pode ser
decorrente dos efeitos tóxicos sobre os microrganismos do solo, po-
demos nos perguntar se as primeiras repercussões nefastas desses
produtos não seriam as de favorecer a elaboração dos vírus.
Muitos agrotóxicos, especialmente os herbicidas, inibem a
proteossíntese. Além disto, os agrotóxicos, como “toda uma série de
tratamentos químicos e físicos (aquecimento, irradiação ultravioleta,
ultra-som, ação leve de ácidos e bases etc.)”,* possivelmente, “modi-
fiquem a estrutura e as propriedades de uma proteína sem separar ne-
nhum dos aminoácidos que a constituem”.
Efetivamente, diversos herbicidas como o 2-4D, Ionoxyl, Chlorpropham,
e Propanil, perturbam a transmissão do código genético do RNA e inibem
a síntese de proteínas. Foi demonstrado que:
a) os herbicidas e inseticidas provocam profundas modificações
no metabolismo do nitrogênio;
b) pode haver alteração do caráter das proteínas, no que se refere
à sua composição em aminoácidos (SELL et alii., 1949).
Nestas condições, é de se espantar com a atual disseminação das
doenças viróticas, especialmente nos cereais? Extensão que poderia ter
por origem, não apenas os efeitos dos herbicidas sobre o cereal, mas

*
“As doenças das plantas: modos de desenvolvimento e métodos de controle”.
Collectif. Traduzido do inglês (Publicação INRA).

319
F R A N C I S C H A B O U S S O U

também as incidências da má nutrição, pela ação tóxica dos herbicidas


e adubos nitrogenados solúveis sobre os microorganismos do solo, como já
foi demonstrado.

CONCLUSÕES
AS RAZÕES DAS ATUAIS DIFICULDADES DE
CONTROLE DE PRAGAS E DOENÇAS
As considerações precedentes, que constituem um extremo resu-
mo deste trabalho, talvez permitam compreender as razões das difi-
culdades atuais de controle das doenças e pragas. Salta aos olhos que
elas são provenientes da insuficiência, para não dizer inexistência, de
trabalhos referentes às relações planta-parasita.
Ora, a este respeito, propomos uma teoria, a da trofobiose. Que seja
posta a prova! Assim, com base no conjunto dos fatos expostos neste
trabalho e em concordância com as concepções de certos fitopatologistas
como DUFRÉNOY, será possível verificar se ela é eficaz.
Em segundo lugar, é hora dos fitofarmacêuticos fazerem sua
autocrítica e, até, sua “mea culpa”. Como elo de ligação entre fabricantes
de agrotóxicos e usuários, é grande sua responsabilidade. Até agora,
os fitofarmacêuticos consideraram mais os casos notórios de
fitotoxicidade ou queimaduras, para excluir um agrotóxico da lista de
produtos registrados, do que sua repercussão sobre a fisiologia e,
portanto – repetimos – sobre a resistência das plantas.
A fitiatria está, atualmente, no mesmo ponto que estaria a me-
dicina, se negligenciasse as eventuais repercussões de um antibióti-
co ou cortisona, no organismo de um paciente!
Esta atitude é particularmente condenável, em relação aos
herbicidas: recentemente, num simpósio quase oficial, realizado na
França, não houve uma só comunicação referente às repercussões
desses produtos sobre os microrganismos e a vida do solo!
Por isso as dificuldades de se encontrar soluções viáveis no con-
trole de pragas e doenças. Um fracasso do controle químico exige outra

320
P L A N T A S D O E N T E S P E L O U S O D E A G R O T Ó X I C O S

intervenção com agrotóxico, tão grande é a crença na destruição –


contudo muito problemática – do agente patogênico através de
envenenamento químico! Isto apenas torna o problema mais grave:
é necessário compreender que, se por este método visamos o parasita, é
à planta que atingimos a cada golpe.
Daí esta sucessão de doenças, verdadeiramente, “iatrogênicas”, a
começar pelas doenças viróticas, se a alteração do metabolismo celu-
lar, provocada pelos efeitos cumulativos dos diversos agrotóxicos,
realmente tiver como primeiro resultado a formação de, pelo menos,
a multiplicação dos vírus.
Por isso o desencorajamento e amargura dos fitopatologistas
pesquisadores, responsáveis por encontrar meios para controlar esta
proliferação de doenças, que se queixam de ser relegados ao papel de
“bombeiros de plantão”.
Só vemos um meio para eles saírem desta posição subalterna:
mudarem de objetivo. Ou seja, procurar evitar o estímulo da sensi-
bilidade da planta ao invés de buscar simplesmente a destruição do
parasita.
Esta nova perspectiva supõe o questionamento dos fatores genéticos
como único meio de se obter esta resistência, bem como levar em con-
sideração todos os fatores ambientais capazes de agir neste sentido. Se
deverá considerar, principalmente, a adubação e as pulverizações foliares
nutritivas, sob a perspectiva de uma correção de carências e subcarências,
segundo um primeiro esquema sugerido no sétimo capítulo.
Quanto aos entomologistas, esperamos que este trabalho contribua
para fazê-los refletir que o potencial biótico de todo o animal está
estreitamente ligado ao valor nutricional do alimento disponível. Isto
ocorre, especialmente, com as espécies fitófagas que eles devem com-
bater. E que, para a praga, esta “qualidade” do vegetal é função, não
apenas da variedade botânica ou da espécie da planta, mas também
da maneira como ela foi “condicionada” pelos tratos culturais, como
trabalho do solo, adubação e... tratamentos com quaisquer agrotóxicos.

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Assim, nossos colegas deveriam ser levados a rever a concepção do


equilíbrio das espécies e da limitação das pragas apenas pelo proces-
so da predação e do parasitismo. Esta revisão provavelmente será
dolorosa para alguns, pois questiona toda uma técnica sobre a qual muito
se investiu: queremos falar do controle biológico.*
Estamos absolutamente conscientes da revolução que nossas
concepções trazem à área de fitiatria, bem como dos interesses que
elas podem lesar. Certamente, a evolução será mais lenta e mais di-
fícil de ser alcançada no nível intelectual. Todavia, se ela já ocorreu
com agricultores que sofreram as graves dificuldades evocadas, por
que também não ocorreria no espírito dos pesquisadores? Para o bem
da agricultura, esperamos que esta evolução ocorra o mais rapidamen-
te possível. Ficaremos felizes se nossa obra puder contribuir para isto.

Última observação, para terminar:


Poderíamos ter apresentado mais argumentos para nossa tese,
pelo estudo de diversos outros pontos aos quais rapidamente fizemos
alusão, especialmente, como:
– as repercussões da enxertia sobre a suscetibilidade do enxerto a
ácaros e doenças, sobre as quais constituímos um dossiê bastante
importante;
– sobre os experimentos de controle com antibióticos e substâncias de
crescimento, cujo sucesso é tributário da nutrição da planta e, confir-
mando a regra geral, do nível de proteossíntese;
– enfim, sobre as relações entre a natureza da adubação e a
suscetibilidade da planta a doenças viróticas, a respeito do que coleci-
onamos numerosas referências.
Contudo, a eles renunciamos, para não ampliar ainda mais esta
obra. Talvez examinaremos estas questões em outro trabalho, volta-

*
Marianne LEVY, 1955, Les protéines, Coll.. “Que Sais-Je”.

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do às soluções práticas de proteção da planta, com base em resulta-


dos obtidos através de técnicas inspiradas em nossa concepção da
trofobiose e, aos quais, já fizemos alusão brevemente.

Bordeaux-Balizac: junho-agosto 1980.

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