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Capítulo I – O Sonho

Só mais um pouco! Está quase! Preciso de mais corda. SIM! Estou a


conseguir! SIM!!
Vrrmmm... Vrrmmm... Vrrmmm...
Já eram sete da manhã, hora de eu acordar, eu odeio quando o
despertador interrompe os meus sonhos, principalmente quando estava
prestes a ser a primeira mulher a pisar na superfície da Lua.
Nessa manhã eu fiz a minha rotina normal, tomei banho, escovei os
dentes, vesti uma sweater verde com umas calças de ganga da mesma
cor, e uns ténis pretos. Saí para a escola, mas no caminho eu não parava
de pensar em como acabaria o meu sonho. Teria eu conseguido? A corda
rompia? Teria eu acordado independentemente do despertador? Acho
que nunca vou saber.
No meu sonho eu era astronauta, mas do sítio de onde eu venho é quase
impossível para uma mulher arranjar um trabalho como esse, ou, um
trabalho de todo. Existe muita descriminação e estamos constantemente
em guerra.
Eu vivo num planeta chamado Kepler 22b, que orbita uma Anã Branca e
é o primeiro planeta do sistema estelar. O planeta onde vivo situa-se na
galáxia Andrómeda, mas eu adoraria conhecer a galáxia vizinha, a Via
Láctea.
O meu nome é Lia, tenho 17 anos e ando no 11ºano. Eu tenho olhos
castanhos esverdiados, um tom de pele castanho muito claro, cabelo aos
caracóis, e uso óculos. Para ser sincera, não me consigo lembrar de uma
época em que eu não utilizava óculos, até porque sem eles, fico
praticamente cega, vejo tudo borrado como se houvesse um nevoeiro
dentro dos meus próprios olhos. Será que posso usar óculos na máscara
de astronauta? O que será que acontece se eu tirar a máscara para ver
melhor? Enfim, não vale a pena divagar. De que me serve saber se eu
nunca vou vestir o fato?!
A minha tia Dulce dizia sempre que eu devia seguir os meus sonhos,
mesmo que sejam pouco prováveis de acontecer, como ser astronauta
num mundo de caos. Ela dizia que se eu seguisse os meus sonhos, teria
sempre uma razão para continuar a viver. Eu acho que essa filosofia de
vida não se aplica a um local onde é preciso fazer uma fila com mais de
1km para ir buscar água a um poço, ou, onde são necessários três políticos
corruptos, que estão no poder à 40 anos, dizerem-nos o que fazer.
Literalmente. O que podemos e não podemos fazer, o que podemos e não
podemos dizer, o que podemos e não podemos comprar, o que podemos
e não podemos ver, o que podemos e não podemos ouvir. Eles controlam-
nos como se fossemos robôs.
É claro que nem tudo é mau neste planeta, existem pessoas e lugares
fantásticos, o único problema é que a viagem é demasiado cara para uma
adolescente de dezassete anos como eu poder pagar. Principalmente,
quando se vive num orfanato.
Capítulo II – A Órfã

Eu vim viver para o orfanato de St. Joseph à sete anos atrás, logo a seguir
à morte do meu pai. Ele era alto, quase com 1,80m, tinha olhos castanhos,
cabelo um pouco encaraculado e um tom de pele escuro. Ele estava
sempre a usar camisolas com desenhos de estrelas e planetas, exceto
quando vestia o equipamento da tropa. Eu odiava aquele equipamento,
significava que ele ia para a guerra, e poderia não voltar. Em grande parte
foi o meu pai que criou a paixão que eu tenho pelo Universo. Ele
compartilhava o mesmo sonho que eu, ser astronauta. Quando eu era
pequena, o meu pai contava-me histórias sobre o Universo, outros
planetas, luas, estrelas, eu gostaria de ser astronauta para poder honrá-lo.
Eu disse que não gostava do equipamento da tropa, e tinha razão em
fazê-lo. Durante anos a paz reinou no nosso planeta, ou pelo menos era
assim nas histórias do meu pai. Tudo começu quando eu tinha 10 anos,
em 2073. As duas maiores potências mundiais entraram em conflito, e
uma grande guerra começou, uma guerra tão grande que dura até hoje.
Pelo que eu estudei nas aulas de história, este planeta já passou por várias
guerras, mas esta, esta é diferente, os soldados têm armas mais
poderosas, e o governo utiliza armas nucleares para bombardiar outros
países. Depois das explosões, os países deixam de existir, passam a ser
uma memória na mente dos que se lembram da sua existência, as cidades
tornam-se cidades fantasmas, apenas um resto do que elas uma vez
foram, locais que antes tinham problemas de sobrepopulação são agora
regiões desertas. Eu ainda me lembro do dia em que o meu pai foi
chamado para participar na guerra, dia 27 de janeiro de 2073. Um chefe
de guerra foi pessoalmente à nossa casa para se certificar que o meu pai
iria. As suas palavras foram exatamente : “boa noite tenente Arthur
Monroe, creio que esteja a par da situação em que nos encontramos. O
senhor foi o nosso melhor soldado por diversos anos, por isso vim aqui
pessoalmente dizer-lhe que foi mais uma vez recrutado para defender o
nosso pais. Tem 24 horas para se despedir da sua familia e reunir-se na
nossa base”. A partir desse dia nunca mais vi o meu pai.
Durante o próximo par de meses eu vivi apenas com a minha mãe, ela é
de estatura média, tem olhos verdes e cabelo castanho e oleoso, um tom
de pele claro e uma voz muito suave. Desde o dia que o meu pai partiu
que eu e a minha mãe não conseguía-mos pensar noutra coisa senão
como estaria o pai. Estaria ele bem? Estaria vivo? Estaria...morto? Mas foi
só no dia 19 de março que obtivemos notícias, e que sinceramente, acho
que preferia não as ter obtido. “Ele foi declarado morto” , foi o que o
chefe de guerra disse. O corpo nunca foi encontrado, calcularam que
estivesse numa vala comum ou simplesmento junto dos milhares de
soldados que dão a vida no campo de batalha. Quando a minha mãe
soube da notícia ela não aguentou. Deixou de trabalhar, de pagar as
contas, começou a beber álcool, até que chegou ao extremo, foi-se
embora. Abandonou-me. Deixou uma criaça de 10 anos sozinha, na rua.
Depois da morte da tia Dulce no ano anterior, os meus pais eram a única
família que me restava. Os dois partiram, e eu estava sozinha, assustada,
perdida, à mercê do mundo, à mercê da morte. Naquele dia eu pensei que
iria morrer, mas a minha única sorte, ou azar, ainda não sei bem, foi uma
senhora idosa que reparou em mim e perguntou sobre a minha situação,
depois de saber tudo o que se passou ela pegou em mim e levou-me para
onde eu estou hoje, St. Joseph.

Capítulo III – O orfanato


Quando cheguei ao orfanato de St. Joseph eu estava novamente sozinha
e perdida, não conhecia ninguém e todos me olhavam de lado, no
entanto, não apenas eu, mas todos pareciam tristes. Sem brandir um
sorriso durante semanas, as crianças têm comportamentos exemplares,
fazem todas as tarefas escolares, raramente erram um cálculo na aula de
matemática, e quando erram, sabem que têm uma punição à espera. Em
St. Joseph os professores, funcionários e educadores batem nas crianças
quando fazem algo incorreto, não se preocupam com a nossa saúde ou
bem estar, tratam-nos como soldados, apenas nos dão comida e um teto
até fazermos 18 anos e dár-mos a nossa vaga a outra criança infeliz,
somos como porcos criados para o matadouro.
St. Joseph está dividido em duas partes, a dos rapazes e a das raparigas.
Nós conseguimos ver por uma grade o quão intensivo é o treino militar
que dão aos rapazes, parece o inferno, eles gritam, alguns até choram,
uns rezam a Deus em busca de uma esperança à muito perdida. Mas
existe um, um que nunca gritou, que nunca chorou, que nunca rezou, um
que aprendeu a aceitar o seu destino. O nome dele é Peter Smith e eu
consigo ver nos seus olhos que ele sabe a verdade, sabe que quando sair
deste lugar vai ser obrigado a ir para o exército, eventualmente ir para o
campo de batalha e acabar morto como todos os outros, ele sabe que a
sua vida está escrita e não existe nada que ele possa fazer para mudar
esse facto. Ele aprendeu a aceitar. Ao conviver com ele nas horas de
almoço eu aprendi a aceitar também, mas o que nós não sabíamos é que
os nossos destinos estavam prestes a mudar. E mais uma vez se iriam
cruzar.

Capítulo IV – A Mudança

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