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Equações Diferenciais Ordinárias,

Transformada de Laplace e Séries de Fourier

João A. M. Gondim

1 de dezembro de 2021
ii
Sumário

1 EDOs de Primeira Ordem 1


1.1 Equações diferenciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.2 EDO separável . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.3 EDO linear de primeira ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.4 EDO exata . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.4.1 Fatores integrantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
1.5 EDO homogênea . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
1.6 EDO de Bernoulli . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
1.7 Outras substituições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
1.8 Teorema de Existência e Unicidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
1.9 Mais exemplos resolvidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
1.10 Aplicações de EDO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
1.10.1 Dinâmica populacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
1.10.2 Problemas de misturas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
1.10.3 Epidemiologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
1.10.4 Trajetórias ortogonais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40

2 EDOs de Segunda Ordem 43


2.1 EDO linear de segunda ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
2.1.1 EDO linear de segunda ordem homogênea com coeficientes constantes . . . . . . . . . 46
2.1.2 O método da redução de ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
2.1.3 Raı́zes complexas na equação caracterı́stica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
2.1.4 Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
2.2 Equações de Cauchy-Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
2.3 Equações lineares de segunda ordem não homogêneas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
2.3.1 Método dos coeficientes a determinar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
2.3.2 Método da variação dos parâmetros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73

3 Transformada de Laplace 79
3.1 Definição e primeiras propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
3.1.1 Transformada de Laplace Inversa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
3.2 Problemas de Valor Inicial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
3.3 Função degrau unitário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
3.4 Funções de impulso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
3.5 A convolução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96

4 Séries de Fourier e Equações Diferenciais Parciais 101


4.1 Cálculo dos coeficientes de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
4.2 O Teorema de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105
4.2.1 Identidade de Parseval . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
4.3 Extensões periódicas de uma função . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110
4.4 Problema da condução do calor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
4.4.1 Problema não homogêneo do calor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114

iii
iv SUMÁRIO

4.4.2 Barra com extremidades isoladas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116


4.5 Equação da onda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117
Capı́tulo 1

EDOs de Primeira Ordem

1.1 Equações diferenciais

Uma equação diferencial consiste de uma equação, cuja incógnita é uma função y(x), envolvendo
derivadas de y (e, opcionalmente, x e y). Por exemplo,

y0 = x

As funções que satisfazem essa equação, de acordo com o Teorema Fundamental do Cálculo, possuem a
forma
x2
y(x) = + C,
2
onde C é uma constante real. Dizemos que a expressão acima é a solução geral da equação (para cada
valor de C temos uma função que satisfaz a equação, ou seja, uma solução).
Um outro exemplo é a equação
y0 = y
Nesse caso, não é tão simples determinar a solução geral quanto no exemplo anterior, mas sabemos que
uma função que, ao ser derivada, resulta em si mesma é a exponencial y(x) = ex . Mais geralmente, a solução
geral é
y(x) = Kex ,
onde K ∈ R. A derivada y 0 não precisa aparecer na equação, mas alguma derivada precisa. Por exemplo,
no caso de
y 00 = −y,
podemos ver que duas soluções são y1 (x) = sen x e y2 (x) = cos x. Além disso, veremos ao longo do curso
que a solução geral é
y(x) = λ1 sen x + λ2 cos x,
onde λ1 e λ2 são reais. Finalmente, equações como
∂y ∂2y
α2 =
∂t ∂x2
envolvem derivadas parciais, por isso dizemos que trata-se de uma equação diferencial parcial, ou sim-
plesmente EDP. Quando não há derivadas parciais, como nos demais exemplos, dizemos que a equação é
uma equação diferencial ordinária, ou EDO, que será o assunto principal destas notas.
A ordem de uma EDO é a maior ordem de derivada que aparece na equação. Por exemplo, y 0 = y é de
primeira ordem, enquanto y 00 = −y é de segunda ordem. O primeiro capı́tulo deste curso abordará as EDOs
de primeira ordem. Nem toda EDO pode ser resolvida analiticamente, isto é, em geral não conseguimos
determinar a solução geral de uma equação qualquer. Veremos cinco casos em que isto é possı́vel nas
próximas seções.

1
2 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

1.2 EDO separável

Dizemos que uma EDO é separável quando ela possui a forma

y 0 = f (x)g(y), (1.2.1)

ou seja, y 0 é igual ao produto de uma função que depende apenas de x por uma que depende apenas de
y. Para resolver uma equação deste tipo, escrevemos y 0 como dy/dx e separamos as variáveis dividindo por
g(y) e “multiplicando” por dx. Assim, a equação passa à forma
1
dy = f (x)dx, (1.2.2)
g(y)
ou seja, separamos asvariáveis (de um lado a única variável é y, enquanto do outro, é x). Agora, basta
integrar os dois lados.
Por que isso dá certo? Afinal, multiplicar por dx não é algo formalmente correto... De fato, é correto
escrever a equação na forma
1 dy
= f (x).
g(y) dx
Agora, suponha que G(y) e F (x) são, respectivamente, primitivas de 1/g(y) e de f (x). Isso significa que
dG(y) 1
= e F 0 (x) = f (x)
dy g(y)
Lembrando que y é uma função de x, a Regra da Cadeia nos permite derivar G(y) em função de x:
dG(y) dG(y) dy 1 dy
= = = f (x)
dx dy dx g(y) dx
por conta da forma em que escrevemos a EDO. Assim, G(y) e F (x) possuem mesma derivada em relação a
x, logo existe uma constante C tal que
G(y) = F (x) + C
Observe que Z Z
1
dy = G(y) + C1 e f (x)dx = F (x) + C2 ,
g(y)
portanto quando integramos os dois lados da equação (1.2.2) obtemos

G(y) + C1 = F (x) + C2 ,

que é exatamente o mesmo que G(y) = F (x) + C com C = C2 − C1 , como vimos no parágrafo anterior. Isso
mostra que é válido “multiplicar” por dx (apesar de haver Teoremas importantes por trás deste truque).
Vejamos alguns exemplos.
Exemplo 1.2.1. Resolva a equação y 0 = y.
Solução. Já sabemos como deve ser a solução geral neste caso, mas vamos resolver a equação usando o
processo acima. Temos
dy
y0 = y ⇒ =y
dx
dy
⇒ = dx
y
Z Z
dy
⇒ = dx
y
⇒ ln |y| = x + C
1.2. EDO SEPARÁVEL 3

Se pararmos neste ponto, dizemos que a soluçção geral está na forma implı́cita (onde C é uma constante),
pois y não está isolado. Ainda podemos melhorar a expressão final, escrevendo

|y| = ex+C = ex eC

Como eC também é uma constante, vamos escrever λ = eC , de modo que |y| = λex . Daı́, y(x) = ±λex , mas
como λ é constante, ±λ também é, e escrevemos K = ±λ. Assim, a solução geral, em forma explı́cita, é

y(x) = Kex

Algumas observações precisam ser feitas. Primeiramente, em cada etapa costumamos atualizar o valor
da constante. Como ficam muitas constantes diferentes, em geral chamamos todas elas pelo mesmo “nome”.
Assim, quando chegamos a |y| = eC ex , irı́amos escrever |y| = Cex , onde esta nova constante C não é a
mesma da equação anterior, nem estamos criando uma equação C = eC . A partir do próximo exemplo
usaremos uma mesma letra para a constante em todas as etapas do problema.
Note também que, pela forma que resolvemos, K não pode ser zero. Isso decorre de termos dividido por
y na resolução, logo y não poderia ser zero, o que forneceria λ = 0. No entanto, y ≡ 0 (significa y constante,
igual a zero) também é solução da EDO! Soluções constantes, como essa, são chamadas de soluções de
equilı́brio. Essa solução entra na solução geral se liberarmos λ = 0, mas nem sempre é possı́vel incluir a
solução de equilı́brio na fórmula geral, portanto é importante começar sempre procurando por tais soluções.
Como encontrar soluções de equilı́brio? Bem, se y ≡ K é solução, temos y 0 = 0, logo a EDO fica

0 = f (x)g(K)

para todo x. Para que isso ocorra, K tem que ser uma raiz da parte da EDO que depende apenas de y.
Uma outra forma de pensar é ver se dividimos por alguma função de y nos cálculos. No exemplo acima,
dividimos por y, portanto y não pode ser zero, e y ≡ 0 é solução. Se tivéssemos dividido por y − 1, então y
não poderia ser igual a 1, logo y ≡ 1 que seria a solução constante procurada.
Observe ainda que a EDO tem infinitas soluções. Em outras situações, temos uma condição inicial
y(x0 ) = y0 e um Problema de Valor Inicial, ou simplesmente PVI (também chamado de Problema de
Cauchy)
y0

= f (x, y)
y(x0 ) = y0
Nesse caso, queremos a solução da EDO que cumpre a condição inicial, o que consiste em determinar o valor
exato da constante que aparece na solução geral.
Para compreender problemas de valor inicial, imagine um corpo em queda livre. Como a aceleração é
igual à segunda derivada da posição S(t), então podemos modelar o problema como uma EDO de segunda
ordem
S 00 = g,
onde g é a aceleração da gravidade. Integrando duas vezes, obtemos a solução geral

gt2
S(t) = S0 + V0 t + ,
2
com duas constantes S0 e V0 que correspondem à posição e à velocidade iniciais, respectivamente (S(0) e
S 0 (0)). Há infinitas soluções para esse problema, mas quando fixamos as condições iniciais, há exatamente
uma solução para a equação. Nos exemplos que resolveremos inicialmente, todo PVI terá uma única solução,
mas isso nem sempre ocorre. Esses casos mais estranhos serão analisados posteriormente.

x2
Exemplo 1.2.2. Resolva a equação y 0 =
y
4 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Solução. Primeiramente, note que f (x) = x2 e g(y) = 1/y. Como não existe nenhuma constante K tal que
g(K) = 0, não há nenhuma solução de equilı́brio. Também poderı́amos concluir isso notando que, ao separar
as variáveis, vamos multiplicar por y, e não dividir, como no Exemplo anterior. Temos, então
x2 dy x2
y0 = ⇒ =
y dx y
⇒ ydy = x2 dx
Z Z
⇒ ydy = x2 dx

y2 x3
⇒ = +C
2 3

é a solução (implı́cita) da EDO. Note que não é possı́vel isolar y e ficar com somente um resultado, pois
terı́amos r r
2x3 2x3
y(x) = + C ou y(x) = − +C
3 3

2x
Exemplo 1.2.3. Resolva o PVI y 0 = , y(0) = −2.
y + x2 y
Solução. Observe que a equação pode ser reescrita como
2x 2x 1
y0 = 2
=
y(1 + x ) 1 + x2 y
Assim, novamente não existem soluções de equilı́brio (pois vamos multiplicar por y e não dividir). Separando
as variáveis, temos
2x 1 dy 2x 1
y0 = 2
⇒ =
1+x y dx 1 + x2 y
2xdx
⇒ ydy =
Z 1 +Z x2
2xdx
⇒ ydy = (u = 1 + x2 , du = 2xdx)
1 + x2
2 Z
y du
⇒ =
2 u
y2
⇒ = ln |u| + C
2
y2
⇒ = ln(1 + x2 ) + C
2

é a solução (implı́cita) da equação. Como temos um PVI, devemos impor a condição inicial substituindo
x = 0 e y = −2, logo
4
= ln(1 + 02 ) + C ⇒ C = 2
2
Daı́,
y2
= ln(1 + x2 ) + 2 ⇒ y 2 = 2 ln(1 + x2 ) + 4
2
é a solução implı́cita. Tirando a raiz quadrada e lembrando que y(0) = −2, o sinal tem que ser negativo,
logo
p
y(x) = − 2 ln(1 + x2 ) + 4
1.2. EDO SEPARÁVEL 5

é a solução explı́cita do PVI.

y−1
Exemplo 1.2.4. Resolva a equação y 0 =
x+3

Solução. Como f (x) = 1/(x + 3) e g(y) = y − 1, então g(1) = 0, logo y ≡ 1 é uma solução de equilı́brio.
Resolvendo, vemos que

y−1 dy y−1
y0 = ⇒ =
x+3 dx x+3
dy dx
⇒ =
y−1 x+3
Z Z
dy dx
⇒ =
y−1 x+3
⇒ ln |y − 1| = ln |x + 3| + C
⇒ |y − 1| = eln |x+3|+C = eln |x+3| eC = |x + 3|eC
⇒ |y − 1| = C|x + 3| (Mesmo nome para a constante)
y−1
⇒ =C
x+3
y−1
⇒ = ±C = C (Mesmo nome para a constante)
x+3
⇒ y − 1 = C(x + 3)

⇒ y(x) = 1 + C(x + 3)

é a solução geral da EDO.


A quarta linha da da resolução acima também poderia ter sido escrita como

ln |y − 1| = ln |x + 3| + ln K

Essa abordagem é válida, pois como a imagem de um logaritmo é igual a R, a constante C que aparecia
originalmente sempre é igual ao logaritmo de um único número (positivo) K. Isso é útil pois, como todas as
funções são logaritmos, podemos usar suas propriedades para acelerar a simplificação. De fato,

ln |y − 1| = ln |x + 3| + ln K = ln(K|x + 3|) ⇒ |y − 1| = K|x + 3|

pela injetividade da função logaritmo (se logc a = logc b, então a = b).


Além disso, veja que a solução de equilı́brio y ≡ 1 faz parte da solução geral, pois é obtida quando C = 0.

Note que colocar os módulos nos logaritmos não é fundamental aqui, pois eles sempre são eliminados ao
trocarmos ±C por C. Assim, usaremos sempre ln x como primitiva de 1/x de agoras em diante.

y
Exemplo 1.2.5. Resolva a EDO y 0 = .
x2 + x

Solução. Neste exemplo, g(y) = y, logo y ≡ 0 é solução de equilı́brio pois g(0) = 0. Vamos separar as
6 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

variáveis para resolver a equação:


y dy y
y0 = ⇒ = 2
x2 + x dx x +x
dy dx
⇒ =
y x(x + 1)
Z Z  
dy 1 1
⇒ = − dx (Frações parciais explicadas a seguir)
y x x+1
 
Kx
⇒ ln y = ln x − ln(x + 1) + ln K = ln
x+1

Kx
⇒ y(x) =
x+1

é a solução geral da equação.


Para as frações parciais necessárias na terceira linha da resolução acima, temos

1 A B A(x + 1) + Bx
= + =
x(x + 1) x x+1 x(x + 1)

Assim,
1 = A(x + 1) + Bx
Substituindo x = 0, obtemos A = 1, e fazendo x = −1, obtemos B = −1, logo
1 1 1
= − ,
x(x + 1) x x+1
como usamos acima.

1.3 EDO linear de primeira ordem

Uma EDO de primeira ordem é linear se tiver a forma

a(x)y 0 + b(x)y = c(x)

Note que a equação é uma combinação linear de y e y 0 , com coeficientes sendo funções de x. Em geral, uma
EDO de ordem n é linear quando puder ser escrita como uma combinação linear de y e das n primeiras
derivadas de y.
Para resolver uma equação deste tipo, começamos dividindo por a(x) para que o coeficiente de y 0 seja
igual a 1. Ficamos com
y 0 + p(x)y = q(x),
onde p(x) = b(x)/a(x) e q(x) = c(x)/a(x). A ideia do método é multiplicar a equação por uma função
µ(x) que faça com que o lado esquerdo da equação torne-se a derivada de um produto. Como estamos
multiplicando por µ(x) que vai nos permitir integrar a EDO (ou seja, resolvê-la), dizemos que µ(x) é um
fator integrante para a equação. A equação torna-se

µy 0 + µp(x)y = µq(x)

Como a regra do produto diz que (f g)0 = f 0 g + f g 0 , o que desejamos ocorre se tivermos

µ0 = µp(x)
1.3. EDO LINEAR DE PRIMEIRA ORDEM 7

Note que essa equação é separável, portanto já sabemos como resolvê-la. Separando as variáveis e integrando,
obtemos
Z Z
dµ dµ
= µp(x) ⇒ = p(x)dx
dx µ
Z
⇒ ln µ = p(x)dx
R
p(x)dx
⇒ µ(x) = e

Observe que não é necessário colocar constantes de integração nos cálculos acima, pois não queremos
determinar todas as possı́veis funções µ(x), apenas uma que nos permita simplificar a equação. Para finalizar,
com essa escolha de µ(x) a EDO pode ser escrita como

(µy)0 = µq,

então basta integrar dos dois lados (lembrando que uma primitiva de (µy)0 é µy pelo Teorema Fundamental
do Cálculo) e isolar y(x).

Exemplo 1.3.1. Resolva a equação y 0 + 5y = 3.

Solução. Temos p(x) = 5 e q(x) = 3. Assim,


R
5dx
µ(x) = e = e5x

é um fator integrante. Multiplicando a EDO por µ(x), obtemos

e5x y 0 + 5e5x y = 3e5x ,

ou seja,
(e5x y)0 = 3e5x .
Integrando os dois lados e usando o Teorema Fundamental do Cálculo, obtemos

3e5x
Z
e5x y = 3e5x dx = + C,
5
logo
3
y(x) = + Ce−5x
5

é a solução geral.

Exemplo 1.3.2. Resolva o PVI y 0 + y = sen x, y(0) = 1.

Solução. Nesse caso, temos p(x) = 1 e q(x) = sen x. Daı́, um fator integrante é
R
1dx
µ(x) = e = ex

Multiplicando a equação por µ(x), obtemos

ex y 0 + ex y = ex sen x,

que é o mesmo que


(ex y)0 = ex sen x
8 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Daı́,
ex (sen x − cos x)
Z
ex y = ex sen xdx = + C,
2
logo
sen x − cos x
y(x) = + Ce−x
2

é a solução geral da EDO.


Como temos um PVI, vamos substituir x = 0 e y = 1 para calcular o valor da constante C. Temos
0−1 3
1= + Ce0 ⇒ C =
2 2
A solução do PVI é
sen x − cos x 3 −x
y(x) = + e
2 2

Para deixar todos os detalhes feitos, vamos resolver também a integral


Z Z
ex sen xdx = −ex cos x + ex cos xdx (Por partes u = ex , dv = sen xdx)
Z
= −ex cos x + ex sen x − ex sen xdx (Por partes u = ex , dv = cos xdx)

Dessa forma,

ex (sen x − cos x)
Z Z
x x x
2 e sen xdx = −e cos x + e sen x ⇒ ex sen xdx = +C
2

dy y
Exemplo 1.3.3. Resolva a equação x − = x, onde x > 0.
dx x + 1
Solução. Primeiramente, precisamos dividir tudo por x. Ficamos com
y
y0 − = 1,
x(x + 1)

1
logo p(x) = − e q(x) = 1. Com isso, um fator integrante é
x(x + 1)

dx
R
µ(x) = e − x(x+1)

Usando frações parciais, temos

−1 A B A(x + 1) + B
= + = ,
x(x + 1) x x+1 x(x + 1)

logo
−1 = A(x + 1) + Bx
Fazendo x = 0 obtemos A = −1, e fazendo x = −1 obtemos B = 1. Daı́,
Z   Z    
dx 1 1 x+1
− = − + dx = − ln x + ln(x + 1) = ln
x(x + 1) x x+1 x
1.3. EDO LINEAR DE PRIMEIRA ORDEM 9

(lembre que, aqui, não precisamos da constante por estarmos calculando um fator integrante). Daı́,
x+1
µ(x) = eln((x+1)/x) =
x
Agora, multiplicamos a EDO por µ(x), o que fornece
 
x+1 0 1 x+1
y − 2y = ,
x x x

que equivale a "  #0


x+1 1
y =1+
x x
Por integração, chegamos a  
x+1
y = x + ln x + K,
x
logo
x2 + x ln x + Kx
y(x) =
x+1

é a solução geral.

2
Exemplo 1.3.4. Resolva a equação y 0 + y = sen(t3 ), com t > 0.
t
Solução. Para esta equação, p(t) = 2/t e q(t) = sen(t3 ). Assim, um fator integrante é
2 2
R
µ(t) = e t dt = e2 ln t = eln(t )
= t2

Multiplicando a equação pelo fator integrante, chegamos a

t2 y 0 + 2ty = t2 sen(t3 ),

ou seja,
(t2 y)0 = t2 sen(t3 )
Integrando os dois lados da equação, vemos que
Z
t y = t2 sen(t3 )dt
2
(Substituição: u = t3 , du = 3t2 dt)
Z
sen u
= du
3
cos u
=− +C
3
cos(t3 )
=− +C
3

Daı́, a solução geral é


cos(t3 )
y(t) = − + Ct−2
3t2

Exemplo 1.3.5. Resolva o PVI y 0 + (tg x)y = cos x, y(0) = π.


10 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Solução. Dessa vez, p(x) = tg x e q(x) = cos x. Assim, um fator integrante é


R
tg xdx
µ(x) = e = eln(sec x) = sec x

De fato,
Z Z
sen x
tg xdx = dx (Substituição: u = cos x, du = − sen xdx)
cos x
Z  
du
= −
u
= − ln u + C
= ln(u−1 ) + C
 
1
= ln +C
cos x
= ln(sec x) + C

Lembramos mais uma vez que não precisamos colocar a constante no cálculo do fator integrante. Daı́,
multiplicando por µ(x), obtemos
sec xy 0 + sec x tg xy = 1,
ou seja,
(sec xy)0 = 1
Integrando e isolando y(x), concluı́mos que
Z
sec xy = dx ⇒ sec xy = x + C
y
⇒ =x+C
cos x
⇒ y(x) = (x + C) cos x

Agora, temos que aplicar a condição inicial x = 0, y = π, logo

π = (0 + C) cos 0 ⇒ C = π

Daı́, a solução do PVI é


y(x) = (x + π) cos x

Exemplo 1.3.6. Resolva a EDO x3 y 0 + 4x2 y = e−x


Solução. Começamos dividindo tudo por x3 . A equação torna-se
4
y0 + y = x−3 e−x
x
Temos p(x) = 4/x e q(x) = x−3 e−x , logo
4
R
4dx/x
µ(x) = e = e4 ln x = eln x = x4

é um fator integrante. Agora multiplicamos a EDO por µ(x), fazendo-a tomar a forma

x4 y 0 + 4x3 y = xe−x ,
1.3. EDO LINEAR DE PRIMEIRA ORDEM 11

que é o mesmo que


(x4 y)0 = xe−x
Integrando os dois lados desta última equação, obtemos
Z
x4 y = xe−x dx(Por partes: u = x, dv = e−x dx)
Z
= −xe + e−x dx
−x

= −xe−x − e−x + C

Isolando y(x), vemos que a solução geral é

x+1 C
y(x) = − + 4
x4 ex x

Exemplo 1.3.7. Resolva a EDO y 0 + 2xy = x.


Solução. Nesse caso, temos p(x) = 2x e q(x) = x. Com isso,
2
R
2xdx
µ(x) = e = ex

é um fator integrante. Após multiplicação por µ(x), a equação torna-se


2 2 2
ex y 0 + 2xex y = xex ,

ou seja,
2 2
(ex y)0 = xex .
Integrando, vemos que
Z
2 2
ex y = xex dx (Substituição: u = x2 , du = 2xdx)
eu
Z
= du
2
eu
= +C
2
2
ex
= + C,
2

logo
1 2
y(x) = + Ce−x
2

é a solução geral da EDO.

Exemplo 1.3.8. Resolva a equação y 0 + y cotg x = 2x cossec x.


Solução. Aqui, temos p(x) = cotg x e q(x) = 2x cossec x, logo um fator integrante é
R
cotg xdx
µ(x) = e = eln(sen x) = sen x
12 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Com efeito,
Z Z
cos x
cotg xdx = dx (Substituição: u = sen x, du = cos x)
sen x
Z
du
=
u
= ln u + C
= ln(sen x) + C

Mais uma vez, não é necessário colocar a constante no cálculo do fator integrante. Multiplicando por
µ(x), a equação torna-se
sen(x)y 0 + cos(x)y = 2x,
que equivale a
(sen(x)y)0 = 2x
Integrando esta última equação, obtemos
Z
sen(x)y = 2xdx = x2 + C,

portanto
x2 + C
y(x) =
sen x
é a solução geral desta EDO.

1.4 EDO exata

Dizemos que uma EDO está em forma diferencial se estiver escrita como

P dx + Qdy = 0,

onde P (x, y) e Q(x, y) são funções.


Exemplo 1.4.1. Passe a equação xy 0 − 3xy = y para a forma diferencial.
dy
Solução. Basta trocar y 0 por e “multiplique” por dx:
dx
dy
x = 3xy + y ⇒ xdy = (3xy + y)dx
dx
⇒ (3xy + y)dx − xdy = 0

Dessa forma, P (x, y) = 3xy + y e Q(x, y) = −x.

Uma EDO em forma diferencial


P dx + Qdy = 0
é exata se
∂P ∂Q
=
∂y ∂x
1.4. EDO EXATA 13

Em Cálculo 3, quando o campo


F~ (x, y) = (P (x, y), Q(x, y))
satisfazia
∂P ∂Q
=
∂y ∂x
e as funções P e Q estavam definidas em uma região aberta e simplesmente conexa de R2 , podı́amos afirmar
que F~ era conservativo. Isso sempre ocorrerá em nossos exemplos, logo sempre vai existir uma função
potencial, ou seja, uma função f (x, y) tal que
∂f ∂f
=P e =Q
∂x ∂y
As soluçõe de uma EDO exata são dadas, implicitamente, pelas curvas de nı́vel da função potencial, isto
é, possuem a forma
f (x, y) = C

De fato, derivando os dois lados em relação a x e usando a Regra da Cadeia, obtemos


∂f ∂f dy
f (x, y) = C ⇔ + = 0 ⇔ P dx + Qdy = 0
∂x
|{z} ∂y dx
|{z}
P Q

Exemplo 1.4.2. A EDO (3xy + y)dx − dy = 0 do Exemplo anterior é exata?


Solução. Já vimos que P (x, y) = (3x + 1)y e Q(x, y) = −x, logo
∂P ∂Q
= 3x + 1 6= −1 = ,
∂y ∂x
logo a EDO não é exata.

Exemplo 1.4.3. Resolva a EDO 2x + y 2 + 2xyy 0 = 0.


Solução. Na forma diferencial, a equação escreve-se como

(2x + y 2 )dx + 2xydy = 0

Assim, P (x, y) = 2x + y 2 e Q(x, y) = 2xy, logo


∂P ∂Q
= 2y = ,
∂y ∂x
o que garante que a EDO é exata. Precisamos, então, determinar f (x, y) tal que

fx = 2x + y 2

fy = 2xy

Se integrarmos a primeira equação com respeito a x, chegamos a

f (x, y) = x2 + xy 2 + C(y)

Agora, vamos derivar com respeito a y e comparar com a segunda equação:

2xy
 = fx =  + C 0 (y) ⇒ C 0 (y) = 0 ⇒ C(y) = K
2xy

Escolhendo K = 0 (podemos fazer isso pois queremos um potencial e não todos), uma função potencial

f (x, y) = x2 + xy 2 ,
14 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

logo a solução geral (implı́cita) da EDO é

x2 + xy 2 = C

com C ∈ R.

 
3x 0
Exemplo 1.4.4. Resolva a EDO 2y + y + 3(ln(xy) + 1) = 0 para y > 0.
y

Solução. Na forma diferencial, a equação pode ser escrita como


 
3x
(3 ln(xy) + 3)dx + 2y + dy = 0,
y

logo P (x, y) = 3 ln(xy) + 3 e Q(x, y) = 2y + 3x/y. Com isso,

∂P 3 ∂Q
= = ,
∂y y ∂x

o que garante que a EDO é exata.


Precisamos calcular f (x, y) tal que

fx = 3 ln(xy) + 3
fy = 2y + 3x
y

Começamos integrando a segunda equação com respeito a y, obtendo

f (x, y) = y 2 + 3x ln(y) + C(x)

Agora, derivamos com relação a x para comparar com a primeira equação. Temos

3 ln(x) + 
3 ln(y)
 + 3 = fx =   + C 0 (x) ⇒ 3 ln(x) + 3 = C 0 (x)
3 ln(y)

Note que, uma integração por partes com u = ln(x) e dv = dx (logo du = dx/x e v = x) fornece
Z Z
dx
ln(x) = x ln(x) − x
x
= x ln(x) − x + K

Assim, escolhendo K = 0, temos

C(x) = 3(x ln(x) − x) + 3x = 3x ln(x),

e então
f (x, y) = y 2 + 3x ln(x) + 3x ln(y) = y 2 + 3x ln(xy)
é uma função potencial. As soluções, portanto, são dadas (implicitamente) por

y 2 + 3x ln(xy) = C

com C ∈ R.
1.4. EDO EXATA 15

1.4.1 Fatores integrantes

Vamos multiplicar uma EDO


P dx + Qdy = 0
que não seja exata por µ(x, y) de modo que a nova EDO

(µP )dx + (µQ)dy = 0

seja exata. Para que isso ocorra, devemos ter

∂(µP ) ∂(µQ)
= ,
∂y ∂x

que, pela Regra do Produto (note que µ é função de x e de y), equivale a

µy P + µPy = µx Q + µQx

Essa equação é uma EDP, e é bastante difı́cil de resolver no caso geral. Vamos fazer uma simplificação: o
fator integrante µ vai depender, apenas, de uma variável.


Caso 1 µ = µ(x) (isto é, µ só depende de x). Temos µy = 0 e µx = , logo a EDP passa a ser
dx
 
dµ dµ Py − Qx
µPy = Q + µQx ⇒ =µ
dx dx Q

Py − Qx
O lado esquerdo desta equação depende apenas de x, mas o termo pode depender de x e de y. Para
Q
Py − Qx
que esse método funcione, a equação acima precisa fazer sentido, logo tem que depender apenas de
Q
x! Se isso acontecer, então essa é uma EDO separável, logo pode ser resolvida e conseguiremos determinar
qual é o fator integrante.


Caso 2 µ = µ(y) (ou seja, µ só depende de y. Nesse caso, µy = e µx = 0. A EDP torna-se
dy


dµ dµ Qx − Py
P + µPy = µQx ⇒ =µ
dy dy P

Qx − Py
Como antes, vamos precisar que dependa somente de y para que esta equação (que novamente seria
P
separável) faça sentido.
Py − Qx Py − Qx Py − Qx
Resumindo, antes de resolver, calcule e . Se for uma função apenas de x,
Q P Q
Py − Qx
então vamos usar um fator integrante µ = µ(x), e se depender apenas de y, então o fator integrante
P
é da forma µ = µ(y). Escrevemos o numerador como Py − Qx em ambos os casos para evitar que seja
Py − Qx
necessário memorizar quando é Py − Qx e quando é Qx − Py . Podemos fazer isso, pois se depende
Q
Qx − Py
só de y, então o mesmo vale para , já que a única diferença entre essas funções é o sinal.
P
Observe ainda que as divisões são cruzadas: quando dividimos por Q (que multiplica dy), a função tem
que depender apenas de x, e quando dividimos por P (que multiplica dx), a função deve depender somente
de y.
16 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Exemplo 1.4.5. Determine um fator integrante que transforme a EDO

(3xy + y 2 )dx + (x2 + xy)dy = 0

em uma EDO exata e resolva a equação resultante.


Solução. Temos P (x, y) = 3xy + y 2 e Q(x, y) = x2 + xy, logo

Py = 3x + 2y 6= 2x + y = Qx ,

ou seja, a EDO original não é exata. Por outro lado,


Py − Qx x+y x+y 1
= 2 = = ,
Q x + xy x(x + y) x
que depende apenas de x. Isso mostra que podemos usar um fator integrante da forma µ = µ(x). Multipli-
cando por µ(x), temos
(µP )dx + (µQ)dy = 0
Para que essa equação seja exata, tem-se
 
0 dµ Py − Qx µ
(µP )y = (µQ)x ⇒ µPy = µ Q + µQx ⇒ =µ =
dx Q x
Resolvendo esta EDO separável (lembre que não precisamos colocar as constantes de integração aqui),
concluı́mos que
Z Z
dµ µ dµ dx
= ⇒ =
dx x µ x
⇒ ln µ = ln x

⇒ µ(x) = x

é um fator integrante. A nova EDO, após multiplicação por µ(x) = x, é

(3x2 y + xy 2 )dx + (x3 + x2 y)dy = 0

Dessa vez, temos P (x, y) = 3x2 y + xy 2 e Q(x, y) = x3 + x2 y, portanto


∂P ∂Q
= 3x2 + 2xy = ,
∂y ∂x
mostrando que realmente produzimos uma EDO exata. Para resolvê-la, devemos encontrar f (x, y) tal que

fx = 3x2 y + xy 2

fy = x3 + x2 y
Integrando a primeira equação com respeito a x, chegamos a
x2 y 2
f (x, y) = x3 y + + C(y),
2
e derivando com respeito a y e comparando com a segunda equação, temos

x3 + 
x2
y = fy = x3 +  y + C 0 (y) ⇒ C 0 (y) = 0 ⇒ C(y) = K
x2

Escolhendo K = 0, calculamos o potencial

x2 y 2
f (x, y) = x3 y +
2
1.4. EDO EXATA 17

e as soluções são dadas implicitamente por

x2 y 2
x3 y + =C
2

com C ∈ R.

Exemplo 1.4.6. Determine um fator integrante que transforme a EDO

(3x2 y + y 2 )dx + (2x3 + 3xy)dy = 0

em uma EDO exata e resolva a equação resultante.

Solução. Temos, inicialmente, P (x, y) = 3x2 y + y 2 e Q(x, y) = 2x3 + 3xy, logo

∂P ∂Q
= 3x2 + 2y 6= 6x2 + 3y = ,
∂y ∂x
portanto a equação não é exata. Entretanto, note que

Py − Qx 3x2 + 2y − 6x2 − 3y −3x2 − y 1


= 2 2
= 2
=−
P 3x y + y y(3x + y y

depende somente de y, de modo que podemos buscar um fator integrante da forma µ = µ(y). Multiplicando
por µ(y), obtemos
(µP )dx + (µQ)dy = 0,
logo para essa equação ser exata é necessário que
 
dµ dµ Qx − Py µ
(µP )y = (µQ)x ⇒ P + µPy = µQx ⇒ =µ =
dy dy P y

Daı́, Z Z
dµ dy
= ⇒ ln µ = ln y ⇒ µ(y) = y
µ y
é o fator integrante (mais uma vez, não precisamos de constantes de integração nesta etapa).
Multiplicando por µ(y) = y, obtemos a nova EDO

(3x2 y 2 + y 3 ) dx + (2x3 y + 3xy 2 ) dy = 0


| {z } | {z }
P Q

Como
∂P ∂Q
= 6x2 y + 3y 2 = ,
∂y ∂x
a EDO realmente é exata. Para determinar sua solução geral, precisamos determinar f (x, y) tal que

fx = 3x2 y 2 + y 3

fy = 2x3 y + 3xy 2

Integrando a primeira equação em relação a x, ficamos com

f (x, y) = x3 y 2 + xy 3 + C(y),

e derivando em relação a y e comparando com a segunda equação, concluı́mos que


3
2xy +
3xy

 2
= fy =  3
2xy +
3xy

 2
+ C 0 (y) ⇒ C 0 (y) = 0 ⇒ C(y) = K
18 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Escolha K = 0, de modo que uma função potencial é

f (x, y) = x3 y 2 + xy 3

e a solução geral da EDO é

x3 y 2 + xy 3 = C

com C ∈ R

1.5 EDO homogênea

Dizemos que uma EDO é homogênea se puder ser escrita na forma

 
0 y
y =f
x

Isto significa que y 0 tem que ser expressa como uma função da razão y/x. Por exemplo, são EDOs homogêneas
as equações:
y
• y0 = ;
x
y x y 1
• y0 = + = + ;
x y x y/x

2x − y 2 − (y/x)
• y0 = = .
x + 3y 1 + 3(y/x)

Como y 0 escreve-se como função de y/x, o método de resolução consiste em mudar a variável para

y
v=
x

Para substituir na EDO, precisamos também relacionar y 0 e v 0 (a variável dependente passa a ser v ao invés
de y). Como y = xv, a Regra do Produto nos diz que

y 0 = v + xv 0

Fazendo estas substituições na EDO, chegamos a

f (v) − v
v + xv 0 = f (v) ⇒ v 0 = ,
x

que é uma EDO separável. Assim, basta resolver essa equação e desfazer a substituição v = y/x, retornando
ás variáveis originais.

dy y 2 + 2xy
Exemplo 1.5.1. Resolva a EDO = .
dx x2
1.5. EDO HOMOGÊNEA 19

Solução. A equação pode ser escrita como


 2  
0 y y
y = +2
x x
Assim, temos uma equação homogênea. Fazendo v = y/x e y 0 = v + xv 0 , a EDO torna-se
dv v2 + v
v + xv 0 = v 2 + 2v ⇒ = ,
dx x
que é separável. Separando as variáveis e integrando, ficamos com
Z Z
dv dx
=
v(v + 1) x
Para a primeira integral, o método das frações parciais nos permite escrever
Z  
1 1 dx
− dv = ⇒ ln v − ln(v + 1) = ln x + ln K
v v+1 x
 
v
⇒ ln = ln(Kx)
v+1
v
⇒ = Kx
v+1
y/x
⇒ = Kx
y/x + 1

Multiplicando numerador e denominador do lado esquerdo desta última igualdade por x, ficamos com
y
= Kx ⇒ y = Kxy + Kx2
y+x
⇒ y − Kxy = Kx2
⇒ y(1 − Kx) = Kx2

Kx2
⇒ y(x) =
1 − Kx

é a solução geral da EDO. Observe que, na EDO separável, existiam duas soluções de equilı́brio: v ≡ 0 e
v ≡ −1. Como v = y/x, essas soluções correspondem a y ≡ 0 (que pode ser obtida na solução geral fazendo
K = 0) e y(x) = −x, mas não existe valor da constante K que faça com que esta segunda solução ocorra na
solução geral. De fato, se
Kx2
= −x,
1 − Kx
2 2
terı́amos  Kx = −x + 
Kx , e como K foi cancelado (lembre-se que K é o que queremos calcular aqui), essa
igualdade nunca é satisfeita.

Exemplo 1.5.2. Resolva a equação (x2 + 3xy + y 2 )dx − x2 dy = 0.


Solução. Começamos isolando y 0 . Temos
dy
(x2 + 3xy + y 2 )dx − x2 dy = 0 ⇒ x2 + 3xy + y 2 = x2
dx
   2
y y
⇒ y0 = 1 + 3 +
x x
20 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Usando a substituição v = y/x, temos y 0 = v + xv 0 , logo a equação torna-se

v + xv 0 = 1 + 3v + v 2 ,

ou seja,
1 + 2v + v 2 (1 + v)2
v0 = = ,
x x
que é separável. Separando as variáveis e integrando, segue que (usando a substituição u = 1 + v, logo
du = dv na primeira integral)

Z Z Z Z
dv dx du dx
= ⇒ =
(1 + v)2 x u2 x
1
⇒ − = ln x + ln K
u
1
⇒− = ln(Kx)
1+v
1
⇒− = ln(Kx)
1 + y/x

Multiplicando numerador e denominador do lado esquerdo da última igualdade, tem-se que


x
− = ln(Kx) ⇒ −x = (x + y) ln(Kx)
x+y
−x − x ln(Kx)
⇒y=
ln(Kx)
x
⇒ y(x) = −x −
ln(Kx)

é a solução geral desta EDO. Além disso, v ≡ −1 é solução de equilı́brio da EDO separável, que corresponde
à solução y(x) = −x da EDO original, a qual não está inclusa na solução geral que deduzimos!

Exemplo 1.5.3. Resolva o PVI xyy 0 + 4x2 + y 2 = 0, y(2) = 7.

Solução. Isolando y 0 , temos


−4x2 − y 2
y0 = ,
xy
e após dividirmos numerador e denominador por x2 obtemos

−4 − (y/x)2
y0 = ,
y/x

uma EDO separável. Fazendo v = y/x e y 0 = v + xv 0 , obtemos

−4 − v 2 4 − v2 −4 − 2v 2
v + xv 0 = ⇒ xv 0 = −v =
v v v
2
 
2 2 + v
⇒ v0 = −
x v
1.5. EDO HOMOGÊNEA 21

Separando as variáveis e integrando, temos


Z
vdv 2dx
=− .
2 + v2 x

Na primeira integral faremos a substituição u = 2 + v 2 , de modo que du = 2vdv. Daı́, vemos que

Z Z
du dx 1
= −2 ⇒ ln u = −2 ln(Kx)
2u x 2
⇒ ln(2 + v 2 ) = −4 ln(Kx) = ln(Kx−4 )
K
⇒ 2 + v2 = 4
x
y2 K
⇒2+ 2 = 4
x x

Multiplicando os dois lados desta última equação por x4 , chegamos à solução geral

2x4 + x2 y 2 = K

Como a EDO separável não possuı́a soluções de equilı́brio, de fato todas as soluções estão contidas nesta
fórmula.
Agora, resolvemos o PVI. Substituindo x = 2 e y = 7 na solução geral, obtemos K = 228, portanto a
solução que satisfaz a condição inicial desejada é

2x4 + x2 y 2 = 228

dy 2y − x
Exemplo 1.5.4. Resolva a EDO = .
dx 2x − y
Solução. Se dividirmos numerador e denominador por x, a EDO torna-se

y 0 2(y/x) − 1
,
= 2 − (y/x)

que é homogênea. Assim, fazemos v = y/x e y 0 = v + xv 0 para obter

2v − 1 2v − 1
v + xv 0 = ⇒ xv 0 = −v
2−v 2−v
 2 
0 1 v −1
⇒v =
x 2−v

Separando as variáveis, temos


2−v
Z Z
dx
dv =
(v + 1)(v − 1) x
A integral da esquerda pode ser simplificada usando frações parciais:

2−v A B A(v − 1) + B(v + 1)


= + =
(v + 1)(v − 1) v+1 v−1 (v + 1)(v − 1)
22 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Igualando os numeradores, obtemos

2 − v = A(v − 1) + B(v + 1)

Assim, substituindo v = 1, temos 1 = 2B, logo B = 1/2, e fazendo v = −1, ficamos com 3 = −2A, logo
A = −3/2. Daı́,

Z   Z
3 1 1 1 dx 3 1
− + dv = ⇒ − ln(v + 1) + ln(v − 1) = ln(Kx)
2v+1 2v−1 x 2 2
⇒ −3 ln(v + 1) + ln(v − 1) = 2 ln(Kx)
⇒ − ln(v + 1)3 + ln(v + 1) = ln(Kx2 )
 
v−1
⇒ ln = ln(Kx2 )
(v + 1)3
v−1
⇒ = Kx2
(v + 1)3

Note que 2 ln(Kx) = ln(Kx)2 = ln(K 2 x2 ), que escrevemos como ln(Kx2 ) pois K 2 também é constante.
Como v = y/x, temos

y−x
y/x − 1
= Kx2 ⇒ x
(y+x)3
= Kx2
(y/x + 1)3
x3
3
y−x  x
⇒ 3
= K x2
 (y + x)
x

⇒ y − x = K(y + x)3

é a solução geral da EDO. Além disso, v ≡ −1 e v ≡ 1 são soluções de equilı́brio da EDO separável, logo
y(x) = −x e y(x) = x também são soluções da EDO original, mas apenas a segunda está incluı́da na solução
geral (quando K = 0).

dy 2y − x + 5
Exemplo 1.5.5. Resolva a EDO = .
dx 2x − y − 4
Solução. Neste caso, a EDO não é homogênea, pois

2y/x − 1 + 5/x
y0 = ,
2 − y/x − 4/x

logo y 0 não escreve-se como função da razão y/x. Por outro lado, se as constantes 5 e −4 não estivessem
presentes, a EDO seria homogênea, conforme vimos no Exemplo anterior. Dessa forma, vamos trocar as
variáveis x e y por w e z fazendo 
x = w+a
,
y = z+b
onde a, b ∈ R, de modo que, nessas novas variáveis, esses termos constantes não existam. Temos dx = dw e
dy = dz, logo dy/dx = dz/dw, portanto

dz 2(z + b) − (w + a) + 5 2z − w + (5 − a + 2b)
= =
dw 2(w + a) − (z + b) − 4 2w − z + (−4 + 2a − b)
1.6. EDO DE BERNOULLI 23

Como vimos, para que a nova equação seja homogênea, basta que

5 − a + 2b = 0
−4 + 2a − b = 0

Resolvendo este sistema, encontramos a = 1 e b = −2, o que significa que mudando as variáveis para
w = x − 1 e z = y + 2, obtemos a EDO homogênea
dz 2z − w
= .
dw 2w − z
Observe que esta é a mesma equação do Exemplo anterior (apenas os nomes das variáveis foram alterados),
logo podemos aproveitar as contas já feitas e obter a solução geral

z − w = K(z + w)3

com K ∈ R, além de z(w) = −w. Desfazendo a mudança de variáveis para retornar às variáveis x e y e
simplificando, concluı́mos que a solução geral da EDO original é

y − x + 3 = K(y + x + 1)3 ,

além de y(x) = −x − 1.

1.6 EDO de Bernoulli

Dizemos que uma EDO de primeira ordem é uma equação de Bernoulli se puder ser escrita na forma

y 0 + p(x)y = q(x)y n ,

onde n ∈ R. Se n = 0 ou n = 1, já vimos como resolver essa equação. De fato, para n = 0, a EDO é

y 0 + p(x)y = q(x),

que é linear, e se n = 1, podemos escrever a equação como

y 0 = (q(x) − p(x))y,

ou seja, trata-se de uma EDO separável. Nosso objetivo será resolver o caso geral, em que n 6= 0 e n 6= 1.
Vamos começar dividindo a equação inteira por y n . Note que isso faz com que y ≡ 0 seja uma candidata
a solução de equilı́brio, e devemos verificar se, de fato, isso ocorre. A equação fica na forma

y −n y 0 + p(x)y 1−n = q(x)

Se trocarmos a variável para v = y 1−n , então

v 0 = (1 − n)y −n y 0

(note que, como a derivada é com respeito a x, temos que derivar y implicitamente, por isso y 0 apareceu
multiplicando). Dessa forma, após a substituição a EDO é transformada em

v0
+ p(x)v = q(x),
1−n
24 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

ou seja, na EDO linear


v 0 + (1 − n)p(x)v = (1 − n)q(x)

Assim, basta resolver essa EDO usando o método do fator integrante e retornar às variáveis originais para
determinar a solução da equação.

Exemplo 1.6.1. Resolva a EDO y 0 + y = ex y 2

Solução. Dividindo a equação por y 2 , ficamos com

y −2 y 0 + y −1 = ex .

Temos que fazer a substituição v = y −1 , logo v 0 = −y −2 y 0 , de modo que

−v 0 + v = ex ,

ou seja,
v 0 − v = −ex ,
uma EDO linear, cujo fator integrante é
R
µ(x) = e (−1)dx
= e−x

Multiplicando a equação inteira por µ(x), obtemos

e−x v 0 − e−x v = −1 ⇒ (e−x v)0 = −1

Integrando ambos os lados desta última igualdade, vemos que

e−x v = −x + C ⇒ v = (−x + C)ex

Como v = y −1 , temos
1
= (−x + C)ex ,
y
ou ainda,
e−x
y(x) = ,
−x + C

que é a solução geral da EDO. Além disso, como dividimos por y 2 no começo da resolução, y ≡ 0 é uma
solução de equilı́brio, que não está contida na solução geral.

Exemplo 1.6.2. Resolva a equação x2 y 0 + 2xy − y 3 = 0.

Solução. Primeiramente, dividimos tudo por x2 , chegando a


2 1
y0 + y = 2 y2 ,
x x
que é uma equação de Bernoulli. Agora, dividimos toda a equação por y 3 (o que fará com que y ≡ 0 seja
solução de equilı́brio). A EDO torna-se

2 −2 1
y −3 y 0 + y = 2
x x
Se v = y −2 , então v 0 = −2y −3 y 0 , logo
v0 2 1
− + v= 2
2 x x
1.6. EDO DE BERNOULLI 25

Multiplicando por −2, obtemos a EDO linear

4 2
v0 − v=− 2
x x
Um fator integrante para esta equação é
−4
R
µ(x) = e (−4dx/x)
= e−4 ln x = eln(x )
= x−4

Agora temos que multiplicar a EDO por µ(x), o que resulta hein

x−4 v 0 − 4x−5 v = −2x−6 ,

que é o mesmo que


(x−4 v)0 = −2x−6
Por integração, obtemos
2 −5
x−4 v = x + C,
5
então trocando v por y −2 e multiplicando tudo por x4 , encontramos a solução geral

1 2
2
= + Cx4
y 5x

na forma implı́cita, além da solução de equilı́brio y ≡ 0.

3
Exemplo 1.6.3. Resolva a equação y 0 − y = x4 y 1/3 .
x
Solução. Vamos dividir a EDO por y 1/3 (isso indica que y ≡ 0 é solução de equilı́brio) , obtendo

3 2/3
y −1/3 y 0 − y = x4
x
2 −1/3 0
Precisamos mudar a variável para v = y 2/3 , de modo que v 0 = y y , logo
3
3v 0 3
− v = x4
2 x
Se multiplicarmos os dois lados da equação por 2/3, obtemos a EDO linear

2 2x4
v0 − v=
x 3
Um fator integrante para esta equação é

R
µ(x) = e (−2dx/x)
= e−2 ln x = eln(x 2)
= x−2

Daı́, após multiplicação pelo fator integrante, a EDO torna-se

2 2
x−2 v 0 − 2x−3 v = x ,
3
ou seja,
2 2
(x−2 v)0 = x
3
26 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Agora, integramos os dois lados, o que nos fornece


2x3
x−2 v = +C (Multiplique por x2 )
9
2x5
⇒v = + Cx2 (Substitua v = y 2/3 )
9
2x5
⇒ y 2/3 = + Cx2
9

Além da solução geral acima, temos também y ≡ 0 como solução de equilı́brio.

Exemplo 1.6.4. Resolva a EDO y 0 = y + e−3x y 4 .


Solução. Após dividir os dois lados por y 4 (logo, y ≡ 0 será uma solução de equilı́brio) e arrumar a equação,
ela fica na forma
y −4 y 0 − y −3 = e−3x
Temos que mudar a variável para v = y −3 , logo v 0 = −3y −4 y 0 , de modo que
v0
− − v = e−3x
3
Ao multiplicarmos por −3, chegamos à EDO linear
v 0 + 3v = −3e−3x ,
que tem como fator integrante R
3dx
µ(x) = e = e3x
Agora, multiplique toda a equação por µ, o que nos dá
e3x v 0 + 3e3x v = −3,
isto é
(e3x v)0 = −3
Assim,
−3x + C
e3x v = −3x + C ⇒ v =
e3x
1 C − 3x
⇒ 3 =
y e3x
e3x
⇒ y3 =
C − 3x
ex
⇒ y(x) = √
3
C − 3x

é a solução geral, além da solução constante y ≡ 0.

1.7 Outras substituições

Nas últimas duas aulas temos trabalhado um par de tipos de EDOs que, após uma mudança de variável,
transformam-se em tipos mais simples. Nesta seção, veremos outros exemplos de equações que simplificam-se
após alguma substituição, mas que não recebem nenhum nome especial como “equações homogêneas” ou
“equações de Bernoulli”.
1.7. OUTRAS SUBSTITUIÇÕES 27

Exemplo 1.7.1. Resolva a EDO y 0 = (x + y + 2)2 .


Solução. Vamos fazer a substituição v = x + y + 2, logo v 0 = 1 + y 0 . Assim, a nova EDO é
v0 − 1 = v2 ⇒ v0 = 1 + v2 ,
que é separável. Separando as variáveis e integrando, temos
Z Z
dv
= dx ⇒ arctg v = x + C
1 + v2
⇒ v = tg(x + C)
⇒ x + y + 2 = tg(x + C)

⇒ y(x) = tg(x + C) − x − 2

é a solução geral. Como dividimos por 1 + v 2 na EDO separável e esse termo nunca se anula, não há soluções
de equilı́brio.

Exemplo 1.7.2. Resolva a equação ey y 0 = x(x + ey ) − 1.


Solução. Se v = x + ey , então v 0 = 1 + ey y 0 (lembre-se que temos que derivar implicitamente com respeito
a x). Assim, obtemos a nova EDO
v 0 − 1 = xv − 1 ⇒ v 0 = xv,
que é separável. Daı́,
x2
Z Z
dv
= xdx ⇒ ln v = +C
v 2
2 2 2
⇒ v = ex /2+C
= ex /2 C
e = Kex /2

2
⇒ x + ey = Kex /2

2
⇒ ey = Kex /2
−x
2
⇒ y(x) = ln(Kex /2
− x)

é a solução geral. Além disso, a divisão por v na EDO separável indica que v ≡ 0 é solução de equilı́brio,
mas então uma solução é dada (implicitamente) por x + ey = 0. Isolando y, temos y(x) = ln(−x), que faz
parte da solução geral acima no caso K = 0.

π
Exemplo 1.7.3. Resolva o PVI y 0 = sec(2x2 + y − 1) − 4x, y(0) = +1
4
Solução. Seja v = 2x2 + y − 1. Assim, v 0 = 4x + y 0 , logo
1
v 0 − 4x = sec v − 4x ⇒ v 0 = sec v = ,
cos v
que é uma EDO separável. Com isso,
Z Z
cos vdv = dx ⇒ sen v = x + C

⇒ sen(2x2 + y − 1) = x + C

π
é a solução geral (implı́cita) da equação. Para o PVI, faça x = 0 e y =
+ 1, de modo que
4
    √
π π 2
sen 0 + + 1 − 1 = 0 + C ⇒ C = sen =
4 4 2
28 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

A solução do PVI é

2
sen(2x2 + y − 1) = x +
2

1.8 Teorema de Existência e Unicidade

Em todos os problemas de valor inicial que resolvemos até aqui, a solução era única. Dizı́amos sempre
que tı́nhamos que calcular o valor da constante de integração usando a condição inicial, mas em alguns casos
não é bem assim. Vejamos o seguinte exemplo.

Exemplo 1.8.1. Resolva o PVI y 0 = 2 y, y(0) = 0.
Solução. Como a EDO é separável, temos
dy √ dy
= 2 y ⇒ √ = dx
dx 2 y
Z Z
dy
⇒ √ = dx
2 2

⇒ y =x+C

é a solução geral. Além disso, y ≡ 0 é uma solução de equilı́brio. Impondo a condição inicial, se x = 0 e

y = 0, obtemos C = 0, logo y = x (ou y = x2 ) é solução. Por outro lado, y ≡ 0 também é solução deste
PVI. Assim, a solução não é única!.

O seguinte Teorema fornece condições para que a solução de um PVI exista e seja única:
Teorema 1.8.1 (Teorema de Existência e Unicidade). Considere o PVI
y 0 = f (x, y)

y(x0 ) = y0

(i) Se f é contı́nua no ponto (x0 , y0 ), então existe solução para o PVI (mas não necessariamente será
única);
∂f
(ii) Se, além disso, também for contı́nua em (x0 , y0 ), então essa solução é única.
∂y
Voltando ao exemplo anterior, temos

f (x, y) = 2 y

Essa função é contı́nua para todo y ≥ 0, logo a solução do PVI y 0 = 2 y, y(x0 ) = y0 existe sempre que
y0 ≥ 0. Por outro lado,
∂f 1
=√
∂y y
∂f
é contı́nua apenas para y > 0. Como, no exemplo, x0 = 0 e y0 = 0, vemos que não é contı́nua em (x0 , y0 ),
∂y
portanto não há nenhum problema em haver duas soluções!
Exemplo 1.8.2. Analise a existência e a unicidade de soluções para o PVI y 2 + x2 y 0 = 0, y(x0 ) = y0 .
y2
Solução. Aqui, temos y 0 = − , logo
x2
y2
f (x, y) = −
x2
Com isso, concluı́mos que
1.8. TEOREMA DE EXISTÊNCIA E UNICIDADE 29

• f é contı́nua se x 6= 0.
∂f 2y
• = − 2 também é contı́nua se x 6= 0.
∂y x
Pelo Teorema de Existência e Unicidade, se x0 6= 0, a solução do PVI sempre existe e é única! E se
x0 = 0? Nesse caso, o Teorema não diz nada, portanto temos que resolver a EDO, que é separável:

y2
Z Z
dy dy dx
=− 2 ⇒− =
dx x y2 x2
1 1 −1 + Cx
⇒ =− +C =
y x x
x
⇒ y(x) =
Cx − 1

é a solução geral. Observe, ainda, que y ≡ 0 é solução de equilı́brio.


Como y(0) = 0 para qualquer valor da constante C, vemos que o PVI não tem nenhuma solução se
y0 6= 0! No entanto, toda solução contida na solução geral satisfaz o PVI se y0 = 0, e o mesmo vale para a
solução de equilı́brio! Resumindo, temos
• x0 6= 0 → solução única.

y0 6= 0 → nenhuma solução
• x0 = 0 e .
y0 = 0 → infinitas soluções

Como vimos ao longo do curso, as soluções de EDOs sempre são curvas em R2 . Como essas curvas são
obtidas integrando a equação, costumamos chamá-las de curvas integrais. Vamos supor que a solução do
PVI
y 0 = f (x, y)


y(x0 ) = y0
seja sempre única. Nessas condições, duas curvas integrais desta EDO podem se cruzar?
Note que uma solução do PVI é uma curva integral que passa pelo ponto (x0 , y0 ). Assim, se duas
curvas integrais passam por um mesmo ponto, então nesse ponto o PVI tem mais de uma solução, o que
não é possı́vel. Isso significa que duas curvas integrais nunca podem se cruzar quando a solução for única.
Usaremos isso no exemplo a seguir.
Exemplo 1.8.3. Considere o PVI
y0

= y(y − 1)
y(0) = y0

(a) Mostre que esse PVI tem solução única paras todo y0 ∈ R.
(b) Se y = y(x) é a solução do PVI, calcule lim y(x) se:
x→∞

(i) y0 > 1,
(ii) 0 < y0 < 1,
(iii) y0 < 0
sem resolver a EDO.
∂f
Solução. Para o item (a), observe que f (x, y) = y 2 − y e = 2y − 1 são contı́nuas em todo o R2 . Pelo
∂y
Teorema de Existência e Unicidade, o PVI sempre tem solução única. Assim, como y ≡ 0 e y ≡ 1 são
soluções de equilı́brio, qualquer outra solução não pode cruzar com essas duas! Dessa forma,
(i) se y0 > 1, então y(x) > 1 para todo x;
30 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

(ii) se 0 < y0 < 1, então 0 < y(x) < 1 para todo x;


(iii) se y0 < 0, então y(x) < 0 para todo x.
Assim, o R2 foi dividido em três regiões invariantes: uma solução que começa em uma dessas regiões,
permanece nesta mesma região. Observe, ainda, que:
(a) Se y > 1, então y 0 = y(y − 1) > 0, logo y(x) é sempre crescente! Com isso, lim y(x) = ∞.
x→∞
0
(b) Se 0 < y < 1, então y = y(y − 1) < 0, logo y(x) é decrescente. Como a solução não pode cruzar y ≡ 0,
então lim y(x) = 0.
x→∞

(c) Finalmente, se y < 0, então y 0 = y(y − 1) > 0, portanto y(x) é crescente. Como não pode cruzar y ≡ 0,
novamente temos lim y(x) = 0.
x→∞

Nessas condições, dizemos que y ≡ 0 é um equilı́brio estável, pois se perturbarmos um pouco a solução,
ela retorna para zero, ao passo que y ≡ 1 é um equilı́brio instável, já que as soluções perturbadas se afastam
dela.

Chamamos de análise qualitativa o processo de deduzir informações sobre o comportamento das


soluções de uma EDO, sem resolver a equação, como fizemos no último exemplo. O procedimento usual,
de resolver a equação e determinar as soluções, chama-se análise quantitativa. Infelizmente, o conjunto
das equações para as quais se conhece um método de resolução é muito pequeno, e em geral não é possı́vel
calcular a solução geral. Assim, a análise qualitativa das soluções é importantı́ssima para estudar os diversos
tipos de problemas do mundo real que envolvem EDOs.
Exemplo 1.8.4. Considere a EDO
2 cos x
y0 =
y 2 + cos2 x + 1
(a) Mostre que y = sen x é solução.
(b) Determine os pontos (x0 , y0 ) onde vale o Teorema de Existência e Unicidade.
(c) Existe alguma solução y = y(x) da solução que satisfaz y(0) = 0 e y(π/2) = 0?

Solução. Para verificar se y = sen x é solução, devemos substituir essa função na EDO e mostrar que os
dois lados dão iguais. De fato,
2 cos x
y 0 = (sen x)0 = cos x e = cos x,
sen2 x + cos2 x +1
| {z }
1

como querı́amos. Para o item (b), temos


2 cos x
f (x, y) = ,
y2 + cos2 x + 1

que é contı́nua em todos os pontos do R2 . Além disso,


∂f −4y cos x
= 2
∂y (y + cos2 x + 1)2

também é contı́nua em todo o R2 . Daı́, o Teorema de Existência e Unicidade diz que a solução do PVI

y 0 = f (x, y)


y(x0 ) = y0

sempre existe e é única.


1.9. MAIS EXEMPLOS RESOLVIDOS 31

Para o item (c), note que y1 = sen x é solução do PVI

y 0 = f (x, y)

y(0) = y0

pelo item (a). Como sen(π/2) = 1, se existisse alguma solução y2 (x) tal que y2 (0) = 0 e y2 (π/2) = 0, então
esse último PVI teria y1 e y2 como soluções, mas isso é impossı́vel pelo item (b).

1.9 Mais exemplos resolvidos

Exemplo 1.9.1. Resolva a EDO xy 0 = y(1 + ln(y 2 ) − ln(x2 )


Solução. Note que a EDO pode ser escrita na forma
  2 
0 y y
y = 1 + ln ,
x x2
ou seja, trata-se de uma equação homogênea. Se fizermos v = y/x, então y = xv e y 0 = v + xv 0 . Substituindo
na equação, temos

v + xv 0 = v(1 + ln(v 2 )
= v + v ln(v 2 )
= v + 2v ln v,

logo
dv
x = 2v ln v,
dx
que é uma EDO separável. Daı́,
Z Z Z Z
dv 2dx du dx
= ⇒ =2 (Substituição u = ln v, du = dv/v)
v ln v x u x
⇒ ln u = 2 ln x + ln K = ln(Kx2 )
⇒ u = Kx2
⇒ ln v = Kx2
2
⇒ v = eKx
y 2
⇒ = eKx
x
2
⇒ y(x) = xeKx

é a solução geral da EDO. Além disso, v ≡ 1 é solução de equilı́brio da EDO separável, o que gera a solução
y(x) = x para a EDO original, a qual já aparece na solução geral quando K = 0.

Exemplo 1.9.2. Resolva o PVI y 0 − 2xy = x, y(0) = 1.


Solução. A EDO é claramente linear. Um fator integrante é
2
R
µ(x) = e−2 xdx
= e−x

Após multiplicação por µ(x), a equação passa a ser


2 2 2
e−x y 0 − 2xe−x y = xe−x ,
32 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

ou seja,
2 2
(e−x y)0 = xe−x
Vamos integrar de ambos os lados, usando a substituição u = −x2 , logo du = −2xdx na integral, do lado
direito, de modo que

2 eu du eu
e−x y = − ⇒− +C
2 2
2
2 e−x
⇒ e−x y = − +C
2
1 2
⇒ y(x) = − + Cex
2

Como temos um problema de valor inicial, fazemos x = 0 e y = 1 na solução geral acima para obter
C = 3/2, portanto a solução deste PVI é

2
−1 + 3ex
y(x) =
2

2ye5x
 
5x
Exemplo 1.9.3. Resolva a EDO 3 sen y + 5ye + dx + (x cos y + e5x )dy = 0.
x

2ye5x
Solução. Sejam P (x, y) = 3 sen y + 5ye5x + e Q(x, y) = x cos y + e5x . Como
x
∂P 2e5x ∂Q
= 3 cos y + 5e5x + 6= cos y + 5ex = ,
∂y x ∂x

a equação não é exata. No entanto,


2x cos y+2e5x
Py − Qx x 2
= 5x
=
Q x cos y + e x

depende somente de x, portanto existe um fator integrante µ = µ(x) que transforma a equação em uma
EDO exata. Multiplicando a EDO original por µ(x), temos

(µP )dx + (µQ)dy = 0,

que tem que ser exata, logo

(µP )y = (µQ)x ⇒ µPy = µ0 Q + µQx


 
0 Py − Qx 2µ
⇒µ =µ =
Q x
Z Z
dµ 2dx
⇒ =
µ x
⇒ ln µ = 2 ln x = ln(x2 )

⇒ µ(x) = x2

A nova EDO é
(3x2 sen y + 5x2 ye5x + 2xye5x )dx + (x3 cos y + x2 e5x )dy = 0
1.9. MAIS EXEMPLOS RESOLVIDOS 33

Temos que determinar uma função potencial f (x, y), isto é, f tem que satisfazer

fx = 3x2 sen y + 5x2 ye5x + 2xye5x




fy = x3 cos y + x2 e5x

Começamos integrando a segunda equação com respeito a y:

f (x, y) = x3 sen y + x2 ye5x + C(x)

Agora, vamos derivar com respeito a x e comparar com a primeira equação:

3x2 sen y + 2xye5x + 5x2 ye5x + C 0 (x) = 3x2 sen y + 2xye5x + 5x2 ye5x
⇒ C 0 (x) = 0
⇒ C(x) = K

Assim, podemos escolher K = 0 e concluir que uma função potencial é

f (x, y) = x3 sen y + x2 ye5x

e que a solução geral da equação é


x3 sen y + x2 ye5x = C ,

onde C ∈ R.

Exemplo 1.9.4. Resolva a equação y 0 = y 2 (ex + e−x ).


Solução. Desta vez, a EDO é claramente separável. Assim, temos
Z Z
dy 1
= (ex + e−x )dx ⇒ − = ex − e−x + C
y2 y
1 1 e2x − 1 + Cex
⇒ − = ex − x + C =
x e ex
ex
⇒ y(x) =
1− e2x− Cex

é a solução geral, além da solução de equilı́brio y ≡ 0.

Exemplo 1.9.5. Resolva a EDO (cos x sen x − xy 2 )dx + y(1 − x2 )dy = 0.


Solução. Se P (x, y) = cos x sen x − xy 2 e Q(x, y) = y(1 − x2 ), então

∂P ∂Q
= −2xy = ,
∂y ∂x

logo a EDO é exata. Temos que determinar uma função potencial f (x, y), que satisfaz

fx = cos x sen x − xy 2

fy = y(1 − x2 )

Se integrarmos a segunda equação com respeito a y, temos

y2 y2 x2 y 2
f (x, y) = (1 − x2 ) + C(x) = − + C(x)
2 2 2
34 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Agora, derivamos esta expressão e comparamos com a primeira equação, obtendo

− xy 2 + C 0 (x) = cos x sen x − xy 2


⇒ C 0 (x) = cos x sen x
Z
⇒ C(x) = cos x sen xdx (Substituição u = sen x, du = cos xdx)

u2 sen2 x
Z
⇒ C(x) = udu = +K = +K
2 2

Vamos escolher K = 0, ou seja, um potencial é

sen2 x y 2
f (x, y) = + (1 − x2 )
2 2

e a solução geral é
sen2 x y 2
+ (1 − x2 ) = C ,
2 2

com C ∈ R.

Exemplo 1.9.6. Resolva a EDO (2y 2 + 3x)dx + 2xydy = 0.


Solução. Se P (x, y) = 2y 2 + 3x e Q(x, y) = 2xy, então
∂P ∂Q
= 4y 6= 2y = ,
∂y ∂x
portanto esta equação não é exata, mas
Py − Qx 2y 1
= =
Q 2xy x
depende somente de x, logo existe um fator integrante µ = µ(x) que transforma a EDO em exata.
Conforme vimos no Exemplo 1.9.3, este fator integrante pode ser obtido resolvendo a EDO
 
dµ Py − Qx µ
=µ =
dx Q x

Separando as variáveis e integrando, vemos que


Z Z
dµ dx
= ⇒ ln µ = ln x ⇒ µ(x) = x
µ x
Agora multiplicamos a EDO original por µ(x), o que produz a equação exata

(2xy 2 + 3x2 )dx + 2x2 ydy = 0

Vamos determinar um potencial f (x, y), que satisfaz

fx = 2xy 2 + 3x2

fy = 2x2 y

Integre a segunda equação com respeito a y, para obter

f (x, y) = x2 y 2 + C(x)
1.9. MAIS EXEMPLOS RESOLVIDOS 35

Agora, derivamos a expressão acima com relação a x para comparar com a primeira equação. Temos

2xy 2 + C 0 (x) = 2xy 2 + 3x2


⇒ C 0 (x) = 3x2
⇒ C(x) = x3 + K

Escolha K = 0, logo uma função potencial é

f (x, y) = x2 y 2 + x3

e as soluções da equação têm a forma


x2 y 2 + x3 = C ,

com C ∈ R.

Exemplo 1.9.7. Resolva a equação xy 0 + 4y = x3 − x.


Solução. Primeiramente, divida toda a equação por x. Obtemos
4
y0 + y = x2 − 1,
x
logo a EDO é linear. Um fator integrante é
dx 4
R
µ(x) = e4 x = e4 ln x = eln(x )
= x4

Quando multiplicamos a EDO pelo fator integrante, encontramos

x4 y 0 + 4x3 y = x2 − 1,

isto é,
(x4 y)0 = x6 − x4
Daı́,
x7 x5 x3 x C
x4 y = − + C ⇒ y(x) = − + 4
7 5 7 5 x
é a solução geral.

Exemplo 1.9.8. Resolva o PVI x2 y 0 − 2xy = 3y 4 , y(1) = −1.


Solução. Comecemos dividindo a equação por x2 , o que nos dá
2 3
y0 − y = 2 y4 ,
x x
ou seja, trata-se de uma EDO de Bernoulli. Assim, dividimos tudo por y 4 e mudamos a variável para
v = y −3 , logo v 0 = −3y −4 y 0 . Isso faz com que a equação torne-se
2 −3 3 v0 2 3
y −4 y 0 − y = 2 ⇒− − v= 2
x x 3 x x
Se multiplicarmos por −3, chegamos à EDO linear
6 9
v0 + v=− 2
x x
36 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Um fator integrante para esta EDO é


dx 6
R
µ(x) = e6 x = e6 ln x = eln(x )
= x6

Agora, vamos multiplicar a EDO por µ(x) para obter

(x6 v 0 + 6x5 v = −9x4 ⇒ (x6 v)0 = −9x4

Por integração, concluı́mos que


9x5 9 C −9x5 + C
x6 v = − +C ⇒v =− + 6 =
5 5x x 5x6
Finalmente, retornamos à variável y desfazendo a substituição v = y −3 , e chegamos à solução geral
(implı́cita)
1 −9x5 + C
= ,
y3 5x6

além da solução de equilı́brio y ≡ 0.


Para resolver o PVI, substitua x = 1 e y = −1 na solução geral, logo
−9 + C
−1 = ⇒ −5 = −9 + C ⇒ C = 4,
5
logo a solução que satisfaz essa condição inicial é

1 −9x5 + 4
=
y3 5x6

1.10 Aplicações de EDO


1.10.1 Dinâmica populacional

Seja P (t) uma população que evolui ao longo do tempo a partir de uma população inicial P (0) = P0 .
Vamos supor que a taxa de variação da população em cada instante t é proporcional à população nesse
mesmo instante, isto é,
dP
= KP
dt
Essa EDO é separável, logo
Z Z
dP
= Kdt ⇒ ln P = Kt + C
P

⇒ P (t) = P0 eKt

Por isso, dizemos que esse modelo é de crescimento exponencial, também conhecido como modelo
malthusiano. Note que isso faz algum sentido se existirem poucos indivı́duos na população, mas se esse
número aumentar, eles começarão a competir entre si por recursos, portanto o crescimento iria ser desacele-
rado. Para levar isso em conta na construção do modelo, observe que o número de encontros possı́veis entre
indivı́duos é P (P − 1), portanto poderı́amos considerar agora a equação
dP
= KP − P (P − 1) = KP − P 2 + P = (K + 1)P − P 2
dt
1.10. APLICAÇÕES DE EDO 37

Chamando λ = K + 1 e colocando P em evidência, chegamos a

dP
= P (λ − P ) ,
dt

chamado de modelo logı́stico. Como essa EDO também é separável, poderı́amos resolvê-la (usando frações
parciais), mas vamos aplicar o que estudamos na última aula para inferir o que ocorre quando t → ∞ sem
resolver a equação:

(I) Os equilı́brios são P ≡ 0 e P ≡ λ.


(II) A função f (t, P ) = P (λ − P ) é contı́nua em todo o plano, e o mesmo ocorre com sua derivada
∂f
= λ − 2P , portanto o Teorema de Existência e Unicidade garante que a solução de qualquer PVI
∂P
sempre é única, de modo que curvas integrais distintas nunca podem se cruzar.
(III) Isso divide o primeiro quadrante em duas regiões invariantes, a região P > λ (região 1) e a região
0 < P < λ (região 2). Pelo que vimos acima, na região 1 temos P (t) > λ para todo t > 0, logo
dP
= P (λ − P ) < 0,
dt
t→∞
portanto P (t) é decrescente. Concluı́mos que P (t) −−−→ λ. Já na região 2, temos 0 < P (t) < λ para
todo t > 0, logo
dP
= P (λ − P ) > 0,
dt
t→∞
de modo que P (t) é sempre crescente. Concluı́mos que também vale P (t) −−−→ λ neste caso.

Assim, temos que λ é um equilı́brio estável, enquanto 0 é um equilı́brio instável. O modelo já é mais
realista que o anterior (quanto mais realista quisermos que o modelo seja, mais complicada a equação terá
que ser).

1.10.2 Problemas de misturas

Exemplo 1.10.1. Uma solução de salmoura flui a uma vazão constante de 8 `/min para um tanque que,
no inı́cio, mantinha 100 ` de uma solução em que foi dissolvido 0, 5 kg de sal. A solução dentro do tanque é
mantida bem agitada e sai na mesma vazão. Se a concentração de sal na solução que entra é de 0, 05 kg/`,
determine a massa de sal no tanque após t minutos.
Solução. Seja x(t) a massa de sal (em kg) no tanque após t minutos. Do enunciado, vemos que x(0) = 0, 5.
Podemos escrever a equação para a taxa de variação de x(t) como

dx
= (entrada) − (saı́da)
dt

A taxa de entrada pode ser calculada multiplicando a vazão pela concentração:


  
` kg
8 0, 05 = 0, 4 kg/min
min `
x
Para a taxa de saı́da, a vazão continua sendo de 8 `/min, enquanto a concentração agora é 100 (lembre que
concentração é massa sobre volume), já que como as vazões de entrada e saı́da são iguais, o volume do tanque
é sempre constante e igual a 100 `, o volume inicial. Assim, a taxa de saı́da é
  
` x kg 2x
8 = kg/min
min 100 ` 25
38 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

Com isso, a EDO que precisamos resolver é

dx 2x dx 2
= 0, 4 − = 10 − 2x25 ⇒ = − (x − 5) ,
dt 25 dt 25

que é separável, portanto


Z
dx 2 2t
=− dt ⇒ ln(x − 5) = − +C
x−5 25 25
⇒ x − 5 = Ce−2t/25

⇒ x(t) = 5 + Ce−2t/25

Como x(0) = 0, 5, temos


0, 5 = 5 + Ce0 ⇒ C = −4, 5,
ou seja, a resposta do problema é

x(t) = 5 − 4, 5e−2t/25

Exemplo 1.10.2. O que muda, no Exemplo anterior, se a vazão de saı́da for 10 `/min?

Solução. Agora, o volume do tanque diminui 2 ` por minuto. Assim, a taxa de saı́da é
  
` x kg 5x
10 = kg/min
min 100 − 2t ` 50 − t

A EDO passa a ser


dx 5x
= 0, 4 − ,
dt 50 − t
ou seja,
5 2
x0 + x= ,
50 − t 5

5 R
que é uma equação linear. Se p(t) = , então um fator integrante é µ(t) = e p(t)dt . Se u = 50 − t, então
50 − t
du = −dt, e então
Z Z
dt du
p(t)dt = 5 = −5 = −5 ln u = −5 ln(50 − t) = ln(50 − t)−5
50 − t u

Daı́,
−5 1
µ(t) = eln(50−t) ⇒ µ(t) =
(50 − t)5

Após multiplicação por µ(t), obtemos a equação


" #0
x0 5x 2 1 x 2 1
+ = ⇒ =
(50 − t)5 (50 − t)6 5 (50 − t)5 (50 − t)5 5 (50 − t)5
1.10. APLICAÇÕES DE EDO 39

Por integração (e na integral do lado direito fazendo u = 50 − t, du = −dt novamente) temos


Z
x 2 dt
=
(50 − t)5 5 (50 − t)5
Z
2 du
=−
5 u5
1
= +C
10u4
1
= +C
10(50 − t)4

Dessa forma,
50 − t
x(t) = + C(50 − t)5
10

Se t = 0 e x = 0, 5, então vemos que 0, 5 = 5 + 505 C, logo


4, 5
C=− ,
505
logo
50 − t 4, 5
x(t) = − 5 (50 − t)5
10 50
A resposta do problema pode ser escrita como

 5
t t
x(t) = 5 − − 4, 5 1 −
4 50

Note que x(50) = 0, pois após 50 minutos o tanque esvaziou, logo a massa de sal nele será igual a zero.

1.10.3 Epidemiologia

Uma epidemia ocorre em uma população, que fica dividida em três categoriais:
• indivı́duos suscetı́veis, denotados pela letra S (aqueles que podem contrair a doença;
• indivı́duos infectados, representados pela letra I;
• indivı́duos recuperados, denotados pela letra R.
Vamos admitir que indivı́duos recuperados adquirem imunidade permanente à doença, não voltando a
tornarem-se suscetı́veis. Por considerar apenas estas três categorias, o modelo que vamos descrever a seguir
é chamado de SIR, mas poderı́amos modificá-lo. Por exemplo, se a doença possuir um perı́odo de encubação
em que o doente está infectado mas ainda não transmite a doença, podemos considerar uma nova categoria de
indivı́duos denotada por E, os expostos, e ter um modelo SEIR. Outra possibilidade seria de a imunidade
não ser permanente, de modo que, após algum tempo, indivı́duos recuperados voltam a ser suscetı́veis,
resultando num modelo SIRS, por exemplo.
Vamos admitir também que há nascimento e mortes na população, a taxas µN e µM , respectivamente, e
que a transmissão da doença e da imunidade não ocorrem de forma vertical (isto é, da mãe para a filha pela
gravidez), portanto todos os indivı́duos nascem suscetı́veis. Se N = S + I + R é a população total, então a
taxa de variação de suscetı́veis se dá por

• nascimentos, que vamos supor que ocorrem a um crescimento exponencial, ou seja, µN N ;


40 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM

• mortes, para as quais suporemos decrescimento exponencial −µM S;


• infecções. Supondo que a doença é de contato direto, como o número total de encontros entre indivı́duos
suscetı́veis e infectados é SI, considerando uma taxa de contágio k, então temos um decrescimento de
−kSI (a ideia é a mesma do modelo logı́stico estudado acima).
Por sua vez, a taxa de variação de infectados se dá por
• contágio, aumentando kSI (o que diminui na taxa de variação de S aumenta na de I);
• mortes, por decrescimento exponencial −µM I;
• recuperação, admitindo um modelo de decrescimento exponencial −γI para passagem de indivı́duos
da categoria I para a R.
Finalmente, a taxa de variação de recuperados só depende
• da recuperação γI (que diminuiu em I e aumenta em R);
• de mortes, por decrescimento exponencial −µM R.
Juntando essas informações, obtemos o sistema de EDOs
 0
 S = −kSI + µN N − µM S
I0 = kSI − γI − µM I
 0
R = γI − µM R
Infelizmente, sistemas de EDOs não serão objeto de estudo deste curso, mas o Exemplo acima ilustra
como equações diferenciais são utilizadas nas mais diversas áreas.

1.10.4 Trajetórias ortogonais

Dada uma famı́lia de curvas, vamos determinar sua famı́lia de trajetórias ortogonais. Isso é muito
comum em Engenharia e Fı́sica, por exemplo, as superfı́cies equipotenciais são a famı́lia ortogonal das linhas
do campo elétrico. A ideia é lembrar que duas curvas são ortogonais em um ponto se as retas tangentes
forem ortogonais neste ponto. Além disso, duas retas y = m1 x + n1 e y = m2 x + n2 são ortogonais se

m1 m2 = −1

Exemplo 1.10.3. Determine a famı́lia de curvas ortogonais à famı́lia de curvas y = Cx3 .


Solução. Começamos derivando a equação y = Cx3 . O objetivo é determinar a EDO cuja solução geral é
exatamente essa famı́lia de curvas. Temos y 0 = 3Cx2 . Como C = y/x3 , substituı́mos isso na equação para
obter
3y
y0 =
x

Você pode testar se, de fato, a solução geral desta EDO é y = Cx3 . Essa EDO fornece uma fórmula para
o coeficiente angular da reta tangente à curva da famı́lia que passa pelo ponto (x, y). Vamos usar isso para
determinar a EDO que deve ser satisfeita pelas trajetórias ortogonais, pois se y 0 é o coeficiente angular às
tangentes a essa nova famı́lia de curvas, então
3y 0
y = −1,
x
logo a EDO satisfeita pela famı́lia ortogonal é

x
y0 = −
3y
1.10. APLICAÇÕES DE EDO 41

Basicamente, o que fizemos foi inverter e mudar o sinal do y 0 da primeira EDO que deduzimos.
Essa equação é separável, logo

3y 2 x2
Z Z
3ydy = − xdx ⇒ = − + K ⇒ x2 + 3y 2 = K
2 2

é a famı́lia ortogonal (uma famı́lia de elipses).

Exemplo 1.10.4. Determine a famı́lia de curvas ortogonais à famı́lia xy = C.

Solução. Como vimos acima, começamos derivando essa famı́lia para encontrar a EDO que a tem como
solução geral. Neste caso, derivamos implicitamente, chegando a

y
y + xy 0 = 0 ⇒ y 0 = −
x

Note que a constante C já foi eliminada na derivação. Agora, para determinar a EDO cuja solução geral
é a famı́lia ortogonal, invertemos e mudamos o sinal deste y 0 , ou seja, a EDO que devemos resolver é

x
y0 =
y

Essa equação é separável, logo

y2 x2
Z Z
ydy = xdx ⇒ = + K ⇒ y 2 − x2 = K
2 2

é a famı́lia de trajetórias ortogonais (uma famı́lia de hipérboles).


42 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
Capı́tulo 2

EDOs de Segunda Ordem

2.1 EDO linear de segunda ordem

Uma EDO de segunda ordem é dita linear se puder ser escrita como uma combinação linear de y, y 0 e
00
y , isto é,
a(x)y 00 + b(x)y 0 + c(x)y = d(x)

As funções a(x), b(x), c(x) e d(x) são os coeficientes da equação.


Exemplo 2.1.1. (a) Na equação y 00 −y = 0, temos que y1 (x) = ex e y2 (x) = e−x são soluções particulares.
(b) Já na EDO y 00 + y = 0, duas soluções particulares são y1 = cos x e y2 = sen x.
ax2
(c) Se a é uma constante, então a EDO y 00 = a, então y 0 = ax + b (por integração) e y(x) = 2 + bx + c
é a solução geral (por mais uma integração).
Nesta aula vamos entender melhor a estrutura das soluções de uma EDO linear de segunda ordem
homogênea, ou seja, quando d(x) ≡ 0 (note que agora o termo “homogênea” tem um significado distinto
do que tinha na primeira parte do curso). Começamos com a seguinte proposição:
Proposição 2.1.1. Se y1 (x) e y2 (x) são soluções de

a(x)y 00 + b(x)y 0 + c(x)y = 0

e λ1 , λ2 ∈ R, então λ1 y1 (x) + λ2 y2 (x) também é solução.


Demonstração. Como y1 e y2 são soluções, sabemos que

a(x)y100 + b(x)y10 + c(x)y1 = 0 e a(x)y200 + b(x)y20 + c(x)y2 = 0

Se Y (x) = λ1 y1 (x) + λ2 y2 (x), então Y 0 (x) = λ1 y10 (x) + λ2 y20 (x) e Y 00 (x) = λ1 y100 (x) + λ2 y200 (x). Assim,

a(x)Y 00 + b(x)Y 0 + c(x)Y = a(x)(λ1 y100 + λ2 y200 ) + b(x)(λ1 y10 + λ2 y20 ) + c(x)(λ1 y1 + λ2 y2 )
= λ1 (a(x)y100 + b(x)y10 + c(x)y1 ) +λ2 (a(x)y200 + b(x)y20 + c(x)y2 )
| {z } | {z }
0 0
= 0,

logo Y (x) é solução.

43
44 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Em particular, se y1 é solução e λ ∈ R, então λy1 é solução, e se y1 e y2 são soluções, então y1 +y2 também
é solução. Isso significa que o conjunto das soluções de uma EDO linear de segunda ordem homogênea é um
espaço vetorial, e nosso objetivo será provar que sua dimensão é igual a 2. Para isso, usaremos uma nova
versão do Teorema de Existência e Unicidade, que mais uma vez terá sua demonstração omitida.
Teorema 2.1.2 (Existência e Unicidade). Sejam p(x), q(x) e r(x) funções contı́nuas no intervalo [a, b].
Dados x0 ∈ [a, b] e y0 , y00 ∈ R, o PVI
 00
 y + p(x)y 0 + q(x)y = r(x)
y(x0 ) = y0
y 0 (x0 ) = y00

tem uma única solução definida em [a, b].


Também precisaremos de um critério para independência linear de funções. Lembramos que, se V é
um espaço vetorial, dizemos que o conjunto {v1 , . . . , vn }, formado por elementos de V , é linearmente
independente (ou, simplesmente, LI) se a única combinação linear nula desses vetores for a trivial. Assim,
a única possibilidade de se ter
a1 v1 + a2 v2 + · · · + an vn = 0
é se a1 = a2 = · · · = an = 0. Caso contrário, dizemos que o conjunto é linearmente dependente (ou LD).
No nosso caso, para verificar se um conjunto de funções {y1 , y2 , . . . , yn } é LI, devemos mostrar que a
equação
λ1 y1 + λ2 y2 + · · · + λn yn = 0
só é satisfeita se λ1 = λ2 = · · · = λn = 0. Para simplificar, vamos considerar n = 3. Quando derivamos a
equação acima duas vezes, chegamos ao sistema

 λ1 y1 + λ2 y2 + λ3 y3 = 0
λ1 y10 + λ2 y20 + λ3 y30 = 0
λ1 y100 + λ2 y200 + λ3 y300 = 0

Note que as incógnitas desse sistema são λ1 , λ2 e λ3 , e para que {y1 , y2 , y3 } seja LI, o sistem deve ter solução
única λ1 = λ2 = λ3 = 0, o que ocorre se, e somente se, o determinante de sua matriz dos coeficientes for
diferente de zero. Esse determinante é chamado de Wronskiano das funções y1 , y2 , y3 e é denotado por
W (y1 , y2 , y3 ). Em geral,

y1 y2 ··· yn
y10 y20 ··· yn0
W (y1 , . . . , yn ) = .. .. .. ..
. . . .
(n−1) (n−1) (n−1)
y1 y2 ··· yn

Dessa forma, {y1 , . . . , yn } é LI se, e somente se, W (y1 , . . . , yn ) 6= 0. Vejamos alguns exemplos.
Exemplo 2.1.2. Mostre que y1 = cos x e y2 = sen x são linearmente independentes.
Solução. Temos
cos x sen x
W (y1 , y2 ) = = cos2 x + sen2 x = 1 6= 0,
− sen x cos x
portanto são LI.

Exemplo 2.1.3. Mostre que y1 = ex e y2 = e−x são linearmente independentes.


Solução. Note que
ex e−x
W (y1 , y2 ) = = −ex e−x − ex e−x = −2 6= 0,
ex −e−x
logo são LI.
2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 45

Exemplo 2.1.4. Mostre que y1 = ex e y2 = sen x são linearmente independentes.

Solução. Temos

ex sen x
W (y1 , y2 ) = = ex cos x − ex sen x = ex (cos x − sen x) 6= 0,
ex cos x

portanto são LI.

Note que o Wronskiano é uma função, logo as funções são LD somente quando o resultado do determinante
é zero (a função nula). No caso acima, para x = π/4 o Wronskiano do Exemplo anterior se anula, mas como
o resultado não é constante e igual a zero, ainda assim as funções são LI.
Agora já temos as ferramentas necessárias para provar que a dimensão do espaç vetorial das soluções é
igual a 2. Faremos isso mostrando que um conjunto de duas soluções LI também é gerador para este espaço,
portanto é uma base.

Teorema 2.1.3. Se y1 e y2 são soluções LI da EDO

y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = 0

então qualquer outra solução é da forma

y(x) = λ1 y1 (x) + λ2 y2 (x),

onde λ1 , λ2 ∈ R.

Demonstração. Já sabemos que combinações lineares de y1 e y2 são soluções da EDO, mas queremos mostrar
que toda solução é dessa forma. Seja Φ uma solução qualquer da EDO. Como {y1 , y2 } é LI, sabemos que
W (y1 , y2 ) 6= 0, portanto existe pelo menos um ponto em que o Wronskiano não se anula. Assim, suponha
que x0 ∈ R é tal que
W (y1 , y2 )(x0 ) 6= 0
e considere o PVI  00
 y + p(x)y 0 + q(x)y = 0
y(x0 ) = Φ(x0 )
y 0 (x0 ) = Φ0 (x0 )

É claro que Φ é uma solução desse PVI. Vejamos que também é possı́vel escolher λ1 e λ2 de modo que
y = λ1 y1 + λ2 y2 também seja solução deste mesmo PVI. Para que isso ocorra, precisamos que

λ1 y1 (x0 ) + λ2 y2 (x0 ) = Φ(x0 )
λ1 y10 (x0 ) + λ2 y20 (x0 ) = Φ0 (x0 )

A matriz dos coeficientes desse sistema tem determinante igual a W (y1 , y2 )(x0 ), que é diferente de zero,
por hipótese. Assim, o sistema tem solução única, a qual será denotada por (λ∗1 , λ∗2 ). Com isso, Φ(x) e
λ∗1 y1 (x) + λ∗2 y2 (x) são soluções de um mesmo PVI. Pelo Teorema de Existência e Unicidade, elas têm que
ser iguais, ou seja, Φ (uma solução qualquer da EDO) é combinação linear de y1 e y2 .

Como consequéncia do Teorema anterior, se {y1 , y2 } é um conjunto linearmente independente de soluções


(também chamado de conjunto fundamental de soluções) de uma EDO linear de segunda ordem ho-
mogênea, então sua solução geral será

y(x) = λ1 y1 (x) + λ2 y2 (x)

com λ1 , λ2 ∈ R.
46 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

2.1.1 EDO linear de segunda ordem homogênea com coeficientes constantes

Considere a EDO
ay 00 + by 0 + cy = 0,
onde a, b, c ∈ R e a 6= 0. Como ainda não sabemos nada sobre possı́veis soluções para essa equação, teremos
que fazer alguma suposição. A ideia é notar que, como a, b e c são números, para que uma combinação
linear de y, y 0 e y 00 dê igual a zero, então y não pode ser muito diferente de suas derivadas. Por isso, vamos
supor que
y(x) = erx

é solução desta equação. Como y 0 = rerx e y 00 = r2 erx , isto significa que

ar2 erx + brerx + cerx = 0 ⇒ erx (ar2 + br + c) = 0

Como erx 6= 0, segue que


ar2 + br + c = 0

A equação acima é chamada de equação caracterı́stica. Assim, acabamos de ver que erx é solução da
EDO
ay 00 + by 0 + cy = 0
quando r é uma raiz da sua equação caracterı́stica. Como trata-se de uma equação quadrática, o número
de raı́zes reais desta equação depende do sinal do discriminante ∆ = b2 − 4ac.

Caso 1 Se ∆ > 0, então a equação caracterı́stica tem duas raı́zes reais distintas, que podem ser
calculadas pela fórmula quadrática
√ √
−b + ∆ −b − ∆
r1 = e r2 =
2a 2a
Segue que y1 (x) = er1 x e y2 (x) = er2 x são soluções da EDO. Como

e r1 x e r2 x
W (y1 , y2 ) = = (r2 − r1 )e(r1 +r2 )x 6= 0,
r1 er1 x r2 er2 x

vemos que estas soluções são LI, portanto a solução geral é

y(x) = λ1 er1 x + λ2 er2 x

Exemplo 2.1.5. Resolva o PVI y 00 + 8y 0 − 9y = 0, y(1) = 1, y 0 (1) = 0.

Solução. A equação caracterı́stica é r2 +8r −9 = 0, cujo discriminante é ∆ = 82 −4·1·(−9) = 64+36 = 100.


Assim, as raı́zes são
−8 + 10 −8 − 10
r1 = = 1 e r2 = = −9
2 2
Como vimos, a solução geral da EDO é

y(x) = λ1 ex + λ2 e−9x

Falta resolver o PVI. Como y 0 (x) = λ1 ex − 9λ2 e−9x , as condições iniciais fornecem o sistema

eλ1 + e−9 λ2

= 1
eλ1 − 9e−9 λ2 = 0
2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 47

Após alguns cálculos simples, vemos que

9 e9
λ1 = e λ2 = ,
10e 10
logo a solução do PVI é
9 x e9 −9x
e + e
10e 10

2.1.2 O método da redução de ordem

Na subseção anterior, começamos a estudar as soluções de equações de segunda ordem lineares homogêneas
com coeficientes constantes
ay 00 + by 0 + cy = 0
Vimos que y(x) = erx é solução quando r é raiz da equação caracterı́stica

ar2 + br + c = 0

Já analisamos o caso em que ∆ = b2 − 4ac > 0, ou seja, quando a equação caracterı́stica possui duas raı́zes
reais distintas, e agora estudaremos os dois casos restantes.

Caso 2 Vamos supor que ∆ = b2 − 4ac = 0. Nesse caso, a equação caracterı́stica só tem a raiz

b
r=− ,
2a

portanto apenas conhecemos a solução y1 (x) = erx . Precisamos determinar uma segunda solução y2 (x) tal
que {y1 , y2 } seja linearmente independente.
Para isso, usaremos o método da redução de ordem, que, em geral, funciona da seguinte forma:
suponha que y1 (x) é solução de
a(x)y 00 + b(x)y 0 + c(x)y = 0
Vamos procurar outra solução na forma

y2 (x) = v(x)y1 (x)

Com isso, temos


y20 = v 0 y1 + vy10 e y200 = v 00 y1 + 2v 0 y10 + vy100 ,
pela regra do produto. Se y2 é solução, então podemos substitui-la na EDO e obter

a(x)(v 00 y1 + 2v 0 y10 + vy100 ) + b(x)(v 0 y1 + vy1 ) + c(x)vy1 = 0,

o que pode ser reescrito como

(a(x)y1 )v 00 + (2a(x)y10 + b(x)y1 )v 0 + (a(x)y100 + b(x)y10 + c(x)y1 )v = 0

Note que, como y1 é solução da equação, então sabemos que

a(x)y100 + b(x)y10 + c(x)y1 = 0,

logo temos simplesmente


(a(x)y1 )v 00 + (2a(x)y10 + b(x)y1 )v 0 = 0
48 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Esta equação ainda é de segunda ordem na variável v, mas como v não aparece, somente v 0 e v 00 , podemos
interpretá-la como uma equação de primeira ordem na variável v 0 ! Dessa forma, se fizermos a mudança de
variável z = v 0 , a EDO torna-se

(a(x)y1 )z 0 + (2a(x)y10 + b(x)y1 )z = 0,

ou seja,
2a(x)y10 + b(x)y1
 
z 0 = −z ,
a(x)y1

que é uma EDO de primeira ordem separável.


Assim, conseguimos reduzir a ordem da EDO, o que justifica o nome do método, e basta resolver a EDO
separável acima e calcular v(x) por integração. Em seguida, deve-se verificar que y1 e y2 = vy1 são realmente
LI. Vejamos alguns Exemplos.

Exemplo 2.1.6. Dado que y1 (t) = t−1 é solução de

2t2 y 00 + 3ty 0 − y = 0 (t > 0),

determine uma segunda solução linearmente independente.

Solução. Vamos procurar por uma solução


y2 = vt−1
Com isso,
y20 = v 0 t−1 − vt−2 e y200 = v 00 t−1 − 2v 0 t−2 + 2vt−3
Quando substituı́mos na equação, obtemos

2t2 (v 00 t−1 − 2v 0 t−2 + 2vt−3 + 3t(v 0 t−1 − vt−2 ) − vt−1 = 0


(
⇒ 2tv 00 + (−4 + 3)v 0 + ( −1 ((
(− 3t−1 t−1 )v = 0
(− ((
(4t(
⇒ 2tv 00 − v 0 = 0 (Faça z = v 0 )
⇒ 2tz 0 − z = 0
Z Z
dz dz 1 dt
⇒ 2t =z⇒ =
dt z 2 t
1
⇒ ln z = ln t = ln(t1/2 ) ⇒ z = t1/2
2

2 3/2
Com isso, v 0 = t1/2 , logo v =t . Já vimos que se y(x) é solução de uma EDO homogênea, então λy(x)
3
também é solução para todo λ ∈ R, então podemos multiplicar v por 3/2 e usar v(t) = t3/2 (efetivamente,
podemos desprezar constantes multiplicativas e constantes de integração), de modo que

y2 = t3/2 t−1 = t1/2

é a segunda solução. Além disso,

t−1 t1/2 1 −3/2 3


W (t−1 , t1/2 ) = = t + t−3/2 = t−3/2 6= 0,
−t−2 1 −1/2
2t 2 2

logo as duas soluções são, de fato, LI, como querı́amos.


2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 49

Exemplo 2.1.7. Dado que y = x é uma solução de


x2 y 00 + 2xy 0 − 2y = 0 (x > 0),
encontre a solução geral dessa equação.
Solução. Pelo método da redução de ordem, vamos procurar por uma segunda solução da forma y2 = vx,
portanto
y20 = v 0 x + v e y200 = v 00 x + 2v 0
Como y2 é solução, temos

x2 (v 00 x + 2v 0 ) + 2x(v 0 x + v) − 2vx = 0
⇒ x3 v 00 + (2x2 + 2x2 )v 0 +  −

(2x 2x)v
 =0
3 00 2 0
⇒ x v + 4x v = 0 (Faça z = v 0 )
⇒ x3 z 0 + 4x2 z = 0
Z Z
dz dz dx
⇒ x3 = −4x2 z ⇒ = −4
dx z x

⇒ ln z = −4 ln x = ln(x−4 ) ⇒ z = x−4

x−3
Daı́, v 0 = x−4 , logo v = −. Como no Exemplo anterior, podemos desconsiderar a constante multipli-
3
−3
cativa e usar v = x , portanto
y2 = x−3 x = x−2
é a segunda solução. Finalmente, como
x x−2
W (x, x−2 ) = = −2x−2 − x−2 = −3x2 6= 0,
1 −2x−3
o que mostra que as duas soluções são LI. Assim, a solução geral é

y(x) = λ1 x + λ2 x−2

com λ1 , λ2 ∈ R.

Voltemos à equação
ay 00 + by 0 + cy = 0
b
quando a equação caracterı́stica só tem uma raiz real. Como vimos, essa raiz é r = − , logo y1 (x) = erx
2a
é solução. Pelo método da redução de ordem, uma segunda solução deve ter a forma y2 = verx . Com isso,
y20 = v 0 erx + rverx e y200 = v 00 erx + 2rverx + r2 verx
Se y2 é solução, então

a(v 00 erx + 2rv 0 erx + r2 verx ) + b(v 0 erx + rverx ) + cverx = 0 (Divida por erx )
⇒ a(v 00 + 2rv 0 + r2 v) + b(v 0 + rv) + cv = 0
⇒ av 00 + (2ra + b) v 0 + (ar2 + br + c) v = 0 ⇒ av 00 = 0 ⇒ v 00 = 0
| {z } | {z }
0 0
⇒ v = C1 x + C2
50 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Acima, usamos que r é raiz da equação caracterı́stica, o que garante que ar2 + br + c = 0, e como seu
b
valor é r = − , segue que 2ra + b = 0. Vamos escolher C1 = 1 e C2 = 0, de modo que v = x , portanto
2a
a segunda solução é y2 = xerx . Como

erx xerx
W (erx , xerx ) = = e2rx + rxe2rx − rxe2rx = e2rx 6= 0,
rerx e rx
+ rxerx
o que garante que essas soluções são LI, portanto a solução geral para esse caso é

y(x) = λ1 erx + λ2 xerx

Exemplo 2.1.8. Resolva o PVI y 00 + 4y 0 + 4y = 0, y(−1) = 2, y 0 (−1) = 1.


Solução. A equação caracterı́stica é r2 + 4r + 4 = 0, com discriminante ∆ = 42 − 4 · 1 · 4 = 0, logo a única
raiz é √
−4 ± 0
r= = −2
2
A solução geral é
y(x) = λ1 e−2x + λ2 xe−2x

Temos
y 0 (x) = −2λ1 e−2x + λ2 e−2x − 2λ2 xe−2x ,
portanto as condições iniciais fornecem o sistema de equações
λ1 e2 − λ2 e2

= 2
−2λ1 e + λ2 e2 + 2λ2 e2
2
= 1

Se dividirmos as duas equações por e2 , obtemos


= 2e−2

λ1 − λ2
−2λ1 + 3λ2 = e−2

Esse sistema tem como solução λ1 = 7e−2 e λ2 = 5e−2 , portanto a solução do PVI é

y(x) = 7e−2 e−2x + 5e−2 xe−2x ⇒ y(x) = 7e−2x−2 + 5xe−2x−2

2.1.3 Raı́zes complexas na equação caracterı́stica

Nos dois casos anteriores, as raı́zes da equação caracterı́stica eram números reais, mas ainda há o caso
em que elas são imaginárias. Estudar essa possibilidade é o objetivo desta subseção.
Caso 3 Suponha que ∆ = b2 − 4ac < 0 e escreva ∆ = −|∆|. Agora, a equação caracterı́stica não possui
raı́zes reais, mas possui as raı́zes complexas
√ p p √
−b ± ∆ −b ± −|∆| −b ± |∆| −1
r= = =
2a 2a 2a
p
√ b |∆|
Como i = −1, se chamamos α = − eβ= , as raı́zes são
2a 2a
r1 = α + βi e r2 = α − βi
2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 51

Isso significa que


e(α+βi)x e eα−βi)x
são soluções complexas da EDO, mas precisamos de soluções reais!
Note que e(α+βi)x = eαx+βix = eαx eβix , portanto precisamos entender o que significa uma exponencial
com expoente imaginário. Para obter uma resposta, lembramos que as séris de MacLaurin de ex , cos x e
∞ ∞ ∞
X xn X (−1)n x2n X (−1)n x2n+1
sen x são, respectivamente, , e . Observe também que i2 = −1, i3 = −i,
n=0
n! n=0
(2n)! n=0
(2n + 1)!
i4 = 1, i5 = i, e assim por diante. Dessa forma,

(ix)2 (ix)3 (ix)4 (ix)5 (ix)6 (ix)7


eix = 1 + ix + + + + + + + ···
2! 3! 4! 5! 6! 7!
x2 x3 x4 x5 x6 x7
= 1 + ix − −i + +i − − i + ···
2! 3! 4!  5!  6! 7!
x2 x4 x6 x3 x5 x7
 
= 1− + − + · · · +i x − + − + ···
2! 4! 6! 3! 5! 7!
| {z } | {z }
cos x sen x

Assim, eix = cos x + i sen x , chamada de fórmula de Euler. Uma curiosidade desta fórmula ocorre

quando substitı́mos x = π, o que resulta em eiπ = −1, ou ainda eiπ + 1 = 0 , uma das mais belas equações,
uma vez que relaciona as cinco principais constantes da Matemática, os números 0, 1, π, e e i.
Trocando x por βx na fórmula de Euler, encontramos

eβix = cos(βx) + i sen(βx) ,

logo

e(α+βi)x = eαx cos(βx) + ieαx sen(βx)


e(α−βi)x = eαx cos(βx) − ieαx sen(βx)

Na segunda equação acima usamos que cos(−θ) = cos(θ) e que sen(−θ) = − sen(θ) (isto é, cos x é função
par e sen x é função ı́mpar). Como a soma de soluções e o produto de uma solução por um escalar ainda são
soluções, somando as soluções acima (para cancelar a parte imaginária) e multiplicando por 1/2, vemos que

y1 = eαx cos(βx)

é uma solução real, e subtraindo a segunda solução da primeira (para cancelar a parte real) e multiplicando
por 1/2i, vemos que
y2 = eαx sen(βx)

também é solução real!


Para finalizar, precisamos mostrar que o conjunto de soluções reais

{eαx cos(βx), eαx sen(βx)}

é linearmente independente. Isso é garantido pois


52 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

eαx cos(βx) eαx sen(βx)


W (y1 , y2 ) =
αe cos(βx) − βe sen(βx) αe sen(βx) + βeαx cos(βx)
αx αx αx

2αx ((( (((


= αe( ( cos(βx)
( ((( sen(βx) + βe2αx cos2 (βx) − αe(
2αx
(cos(βx)
( ((( sen(βx) + βe2αx sen2 (βx)
( (
= βe2αx (cos2 (βx) + sen2 (βx))
= βe2αx 6= 0

p
|∆|
Observe que β = é diferente de zero (já que ∆ 6= 0). Assim, a solução geral é
2a

y(x) = λ1 eαx cos(βx) + λ2 eαx sen(βx)

2.1.4 Exemplos

Exemplo 2.1.9. Resolva a EDO y 00 + 6y 0 + 9y = 0.


Solução. A equação caracterı́stica é
r2 + 6r + 9 = 0,
cujo discriminante é ∆ = 0. Daı́, a única raiz é

−6 ± 0
r= = −3
2
Segue que a solução geral é
y(x) = λ1 e−3x + λ2 xe−3x

Exemplo 2.1.10. Resolva a EDO y 00 − y 0 − 2y = 0.


Solução. A equação caracterı́stica é
r2 − r − 2 = 0,
com discriminante ∆ = 9. As raı́zes são
√ √
1+ 9 1− 9
r1 = = 2 e r2 = = −1,
2 2
portanto a solução geral é
y(x) = λ1 e2x + λ2 e−x

Exemplo 2.1.11. Resolva a EDO y 00 − 5y 0 + 6y = 0.


Solução. Nesse caso, a equação caracterı́stica é

r2 − 5r + 6 = 0,

que tem como discriminante ∆ = 1. Daı́, as raı́zes são


√ √
5+ 1 5− 1
r1 = = 3 e r2 = =2
2 2
2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 53

e a solução geral é

y(x) = λ1 e3x + λ2 e2x

Exemplo 2.1.12. Resolva o PVI y 00 − 4y 0 − 5y = 0, y(−1) = 3, y 0 (−1) = 9.

Solução. A equação caracterı́stica é


r2 − 4r − 5 = 0,
com discriminante ∆ = 36. Assim, as raı́zes são
√ √
4 + 36 4 − 36
r1 = = 5 e r2 = = −1,
2 2
de modo que a solução geral é

y(x) = λ1 e5x + λ2 e−x

Para resolver o problema de valor inicial, primeiramente precisamos calcular y 0 , que é

y 0 (x) = 5λ1 e5x − λ2 e−x

As condições iniciais fornecem o sistema de equações

λ1 e−5 + λ2 e

= 3
5λ1 e−5 − λ2 e = 9

Somando essas equações, obtemos 6λ1 e−5 = 12, logo λ1 = 2e5 , e então, pela primeira equação.

2e5 e−5 + λ2 e = 3 ⇒ λ2 = e−1

Com isso, a solução do PVI é

y(x) = 2e5 e5x + e−1 e−x ⇒ y(x) = 2e5(1+x) + e−(1+x)

Exemplo 2.1.13. Resolva a EDO y 00 − y 0 − 11y = 0.

Solução. A equação caracterı́stica é


r2 − r − 11 = 0,
logo seu discriminante é ∆ = 45. As raı́zes são
√ √ √ √
1 + 45 1+3 5 1 − 45 1−3 5
r1 = = e r2 = = ,
2 2 2 2
portanto a solução geral é
√  √ 
1+3 5 1−3 5
x x
y(x) = λ1 e 2 + λ2 e 2

Exemplo 2.1.14. Resolva a EDO y 00 − 4y 0 + 4y = 0.


54 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Solução. Nesse caso, a equação caracterı́stica é

r2 − 4r + 4 = 0,

com discriminante ∆ = 0. A única raiz real é



4± 0
r= = 2,
2
logo a solução geral é
y(x) = λ1 e2x + λ2 xe2x

Exemplo 2.1.15. Resolva a EDO y 00 + 4y 0 + 8y = 0.


Solução. A equação caracterı́stica é
r2 + 4r + 8 = 0,
logo o discriminante é ∆ = −16. Daı́, as raı́zes complexas são
√ p
−4 ± −16 −4 ± 16(−1) −4 ± 4i
r= = = = −2 ± 2i,
2 2 2
ou seja, temos α = −2 e β = 2. Assim, a solução geral é

y(x) = λ1 e−2x cos(2x) + λ2 e−2x sen(2x)

Exemplo 2.1.16. Resolva a EDO y 00 + 10y 0 + 41y = 0.


Solução. A equação caracterı́stica é
r2 + 10r + 41 = 0,
com discriminante ∆ = −64. As raı́zes complexas são

−10 ± −64 −10 ± 8i
r= = = −5 ± 4i,
2 2
ou seja,, temos α = −5 e β = 4. Segue que a solução geral é

y(x) = λ1 e−5x cos(4x) + λ2 e−5x sen(4x)

Exemplo 2.1.17. Resolva o PVI y 00 + 2y 0 + 2y = 0, y(0) = 2, y 0 (0) = 1.


Solução. Nesse caso, a equação caracterı́stica é

r2 + 2r + 2 = 0

e seu discriminante vale ∆ = −4. Daı́, as raı́zes complexas são



−2 ± −4 −2 ± 2i
r= = = −1 ± i,
2 2
portanto temos α = −1 e β = 1. Dessa forma, a solução geral é

y(x) = λ1 e−x cos(x) + λ2 e−x sen(x)


2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 55

Para resolver o PVI, comecemos calculando a derivada da solução geral acima, que é

y 0 (x) = −λ1 e−x cos(x) − λ1 e−x sen(x) − λ2 e−x sen(x) + λ2 e−x cos(x)

Como y(0) = 2, segue que λ1 = 2, e como y 0 (0) = 1, temos −2 + λ2 = 1, logo λ2 = 3. Com isso, concluı́mos
que a solução do PVI é
y(x) = e−x (2 cos(x) + 3 sen(x))

Exemplo 2.1.18. Resolva o PVI y 00 + y 0 = 0, y(0) = 2, y 0 (0) = 1.


Solução. A equação caracterı́stica é

r2 + r = 0 ⇒ r(r + 1) = 0,

cujas raı́zes são r1 = 0 e r2 = −1. Daı́, a solução geral é

y(x) = λ1 + λ2 e−x

Como
y 0 (x) = −λ2 e−x ,
temos que y 0 (0) = 1 implica −λ2 = 1, logo λ2 = −1, e como y(0) = 2, temos λ1 + λ2 = 2, portanto
λ1 = 2 − λ2 = 2 + 1 = 3. A solução do PVI é

y(x) = 3 − e−x

Exemplo 2.1.19. Resolva a EDO y 00 + y = 0.


Solução. A equação caracterı́stica é r2 + 1 = 0, logo r2 = −1, ou seja, r = ±i. Segue que α = 0, β = 1, e a
solução geral é
y(x) = λ1 cos(x) + λ2 sen(x)

Exemplo 2.1.20. Resolva a EDO y 00 − y 0 + 7y = 0.


Solução. Nesse caso, a equação caracterı́stica é

r2 − r + 7 = 0,

cujo discriminante é ∆ = −27. Assim, as raı́zes complexas são


√ √
1 ± 27 1 3 3
r= = ±i ,
2 2 2

1 3 3
logo α = e β = . Desse modo, a solução geral é
2 2
 √   √ 
x/2 3 3x x/2 3 3x
y(x) = λ1 e cos + λ2 e sen
2 2
56 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Exemplo 2.1.21. Considere a EDO


y 00 − 6ky 0 + 9k 2 y = 0,
onde k é uma constante. Escreva a solução geral e obtenha os valores de k para os quais todas as soluções
satisfaçam lim y(x) = 0.
x→∞

Solução. A equação caracterı́stica é


r2 − 6kr + 9k 2 = 0,
logo seu discriminante vale
∆ = (−6k)2 − 4 · 1 · 9k 2 = 0
e a única raiz real é √
6k ± 0
r= = 3k
2
A solução geral é
y(x) = λ1 e3kx + λ2 xe3kx

Para que lim y(x) = 0, precisamos que lim e3kx = 0, o que ocorre se, e somente se, k < 0 . Nesse
x→∞ x→∞
3kx
caso, o termo xe também tende a zero quando k tende a infinito (trata-se de uma indeterminação do tipo
0 · ∞, portanto uma aplicação da regra de L’Hospital confirma esta afirmação).

Exemplo 2.1.22. Encontre a solução geral da EDO


(t − 1)y 00 − ty 0 + y = 0 (t > 1)
t
sabendo que y1 (t) = e é solução.
Solução. Devemos aplicar o método da redução de ordem para determinar uma segunda solução da forma
y2 = vet . Temos
y20 = v 0 et + vet e y200 = v 00 et + 2v 0 et + vet ,
portanto, substituindo na EDO, obtemos
(t − 1)et (v 00 + 2v 0 + v) − tet (v 0 + v) + vet = 0
Cancelando a exponencial e rearrumando a equação, obtemos
(t − 1)v 00 + (2t − 2 − t)v 0 + (
(
−(1−
(
(t ( (t(
+ 1)v = 0,
ou seja,
(t − 1)v 00 + (t − 2)v 0 = 0
Vamos mudar a variável para z = v 0 , transformando a equação em
 
2−t
(t − 1)z 0 + (t − 2)z = 0 ⇒ z 0 = z,
t−1
uma EDO separável. Com isso,

Z   Z  
2−t 1−u
Z
dz
= dt = du (u = t − 1, t = u + 1, du = dt)
z t−1 u
Z Z  
dz 1
⇒ = − 1 du
z u
⇒ ln z = ln u − u
u t−1
⇒ z = eln u−u = u
= t−1 = (t − 1)e1−t = e(t − 1)e−t
e e
2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 57

Lembre-se que podemos desprezar a constante multiplicativa e então calcular

Z
v= (t − 1)e−t dt (Por partes: u = t − 1, dv = e−t dt → du = dt, v = −e−t )
Z
= −(t − 1)e−t + e−t dt

= −te−t + 
e−t
−e−t
 = −te−t

Mais uma vez, desprezamos a constante multiplicativa e usamos v = te−t , portanto

y2 = te−t et ⇒ y2 = t

Daı́, como
et t
W (et , t) = = et − tet = et (1 − t) 6= 0,
et 1
vemos que {et , t} é um conjunto fundamental de soluções, logo a solução geral da EDO é

y(t) = λ1 et + λ2 t

Exemplo 2.1.23. Obtenha a solução geral da EDO

ty 00 − (1 + t)y 0 + y = 0

sabendo que y1 = et é uma solução e resolva o PVI dado pela equação com condições iniciais y(−1) = 1,
y 00 (−1) = 0.
Solução. Novamente usamos o método da redução de ordem para calcular uma solução da forma y2 = vet .
Daı́, temos
y20 = v 0 et + vet e y200 = v 00 et + 2v 0 et + vet ,
de modo que, substituindo na equação, encontramos

tet (v 00 + 2v 0 + v) − (1 + t)et (v 0 + v) + vet = 0

Após dividir os dois lados por et e rearrumar os termos, ficamos com

tv 00 + (2t − 1 − t)v 0 + ( + 1)v = 0 ⇒ tv 00 + (t − 1)v 0 = 0


(
−(1−
(
(t ( (t(

Se trocarmos a variável para z = v 0 , vemos que

tz 0 + (t − 1)z = 0 ⇒ tz 0 = (1 − t)z,

que é separável. Daı́,

Z  
1−t
Z
dz
= dt
z t
⇒ ln z = ln t − t
t
⇒ z= t
Z e
⇒ v= te−t dt
58 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Faremos uma integração por partes com u = t e dv = e−t dt, logo du = dt, v = −e−t , e

Z
v = −te−t + e−t dt

= −te−t − e−t
= (−t − 1)e−t = −(t + 1)e−t

Como no Exemplo anterior, desprezamos a constante multiplicativa −1 e usamos v = (t + 1)e−t . Com


isso,
y2 = (t + 1)e−t et ⇒ y2 = t + 1

Como
et t+1
W (et , t + 1) = = et − tet − et = −tet 6= 0,
et 1
vemos que {et , t + 1} é um conjunto fundamental de soluções, portanto a solução geral da EDO é

y(t) = λ1 et + λ2 (t + 1)

Finalmente, resolvemos o PVI. Como y(−1) = 1, temos λ1 e−1 = 1, logo λ1 = e, e como

y 0 (t) = λ1 et + λ2 ,

a condição inicial y 0 (−1) = 0 mostra que ee−1 + λ2 = 0, logo λ2 = −1. A solução do PVI é

y(t) = et+1 − (t + 1)

2.2 Equações de Cauchy-Euler

Uma equação é de Cauchy-Euler se for da forma

ax2 y 00 + bxy 0 + cy = 0 ,

onde a, b e c são constantes (com a 6= 0). Vamos supor ainda que x > 0.
A ideia para resolver este tipo de equação é procurar soluções da forma

y(x) = xm ,

onde m ∈ R. Daı́, y 0 (x) = mxm−1 e y 00 (x) = m(m − 1)xm−2 , então podemos substituir na EDO, obtendo

ax2 m(m − 1)xm−2 + bxmxm−1 + cxm = 0


⇒ a(m2 − m)xm + bmxm + cxm = 0
⇒ xm (am2 + (b − a)m + c) = 0
2.2. EQUAÇÕES DE CAUCHY-EULER 59

Como x > 0, essa última igualdade é satisfeita se, e somente se

am2 + (b − a)m + c = 0

Chamamos a equação acima de equação caracterı́stica, da mesma forma que fizemos no caso da
equação com coeficientes constantes (cuidado, pois as equações caracterı́sticas são diferentes para cada tipo
de equação). Concluı́mos que y(x) = xm é solução quando m é raiz da equação caracterı́stica, de modo que,
como antes, o formato da solução geral dependerá do número de raı́zes que essa equação possuir, ou seja, do
sinal do discriminante
∆ = (b − a)2 − 4ac

Caso 1 Se ∆ > 0, então a equação caracterı́stica tem duas raı́zes reais distintas m1 e m2 , logo y1 = xm1
e y2 = xm2 são soluções. Como

xm 1 xm 2
W (y1 , y2 ) =
m1 xm1 −1 m2 xm2 −1
= m2 xm1 +m2 −1 − m1 xm1 +m2 −1
= (m2 − m1 )xm1 +m2 −1 6= 0

pois m1 6= m2 e x > 0, vemos que essas soluções são LI, portanto a solução geral é

y(x) = λ1 xm1 + λ2 xm2

Caso 2 Se ∆ = 0, então a equação caracterı́stica só tem uma raiz real, que é

a−b
m=
2a

Com isso, apenas conhecemos a solução y1 = xm . Para determinar outra solução, vamos usar o método
da redução de ordem, supondo que y2 = vxm é solução. Temos

y20 = v 0 xm + vmxm−1 e y200 = v 00 xm + 2v 0 mxm−1 + vm(m − 1)xm−2

Substituindo na EDO, obtemos

ax2 (v 00 xm + 2v 0 mxm−1 + vm(m − 1)xm−2 ) + bx(v 0 xm + vmxm−1 ) + cvxm = 0


⇒ axm+2 v 00 + (2am + b)xm+1 v 0 + (am(m − 1) + bm + c)xm v = 0

O termo que multiplica xm v é igual a am2 + (b − a)m + c, portanto vale 0 pois m é raiz da equação
a−b
caracterı́stica. Por sua vez, como m = , temos que 2am = a − b, logo o termo que multiplica xm+1 v 0 é
2a
igual a a − b + b = a. A equação reduz-se a

axm+2 v 00 + axm+1 v 0 = 0

Daı́, dividindo tudo por a e por xm+1 , chegamos a

xv 00 + v 0 = 0
60 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Vamos mudar a variável para z = v 0 , logo a equação passa a ser xz 0 + z = 0, que é de primeira ordem
separável. Separando as variáveis, vemos que:

Z Z
dz dz dx
x = −z ⇒ =−
dx z x
⇒ ln z = − ln x = ln(x−1 )
1
⇒z=
x

1
Com isso, v 0 = , logo v = ln x, de modo que
x

y2 = (ln x)xm

é a segunda solução. Como

xm (ln x)xm
W (y1 , y2 ) =
mxm−1 x m−1
+ m(ln x)xm−1
= x2m−1 + ( (2m−1 (2m−1
(( ( (
((
m(ln
(( x)x −(m(ln
(( x)x
= x2m−1 6= 0,

vemos que {y1 , y2 } é linearmente independente, portanto a solução geral é

y(x) = λ1 xm + λ2 (ln x)xm

Caso 3 Agora, suponha que ∆ < 0 e escreva ∆ = −|∆|. Nesse caso, a equação caracterı́stica tem duas
raı́zes complexas conjugadas p
−b ± |∆|i
m= = α ± βi,
2a
p
b |∆|
onde α = − eβ= . Com isso, conhecemos as soluções complexas
2a 2a
z1 = xα+βi e z2 = xα−βi ,

ou seja,
z1 = xα xβi e z2 = xα xβi
Precisamos entender o que significa xβi . Lembre-se que podemos escrever
βi
xβi = eln x = e(β ln x)i

Pela fórmula de Euler,


eix = cos x + i sen x,
o que significa que, se trocarmos x por β ln x, obtemos

e(β ln x)i = cos(β ln x) + i sen(β ln x),

logo
z1 = xα cos(β ln x) + ixα sen(β ln x)
2.2. EQUAÇÕES DE CAUCHY-EULER 61

Analogamente,
x−βi = e−(β ln x)i = cos(β ln x) − i sen(β ln x)
(pois cos x é função par e sen x é função ı́mpar), logo

z2 = xα cos(β ln x) − ixα sen(β ln x)

Daı́, fazendo z1 + z2 e multiplicando por 1/2, obtemos a primeira solução real y1 = xα cos(β ln x) , e

fazendo z1 − z2 e multiplicando por 1/(2i), obtemos a segunda solução real y2 = xα sen(β ln x) (lembre-se
que combinações lineares de soluções também são soluções). Finalmente, como

xα cos(β ln x) xα sen(β ln x)
W (y1 , y2 ) = α−1 α−1 α−1
αx cos(β ln x) − βx sen(β ln x) αx sen(β ln x) + βxα−1 cos(β ln x)
(( ( (
= αx2α−1
( (cos(β
((ln (x)(( sen(β ln x) + βx2α−1 cos2 (β ln x)
( (
((((
− αx2α−1 cos(β
( ( ln
(x)(( sen(β ln x) + βx2α−1 sen2 (β ln x)
( (((
= βx2α−1 (cos2 (β ln x) + sen2 (β ln x))
| {z }
1
2α−1
= βx 6= 0

p
|∆|
pois β = 6= 0 e x > 0, logo concluı́mos que y1 e y2 são LI. Daı́, a solução geral é
2a

y(x) = λ1 xα cos(β ln x) + λ2 xα sen(β ln x)

Exemplo 2.2.1. Resolva a EDO x2 y 00 + 2xy 0 − 6y = 0.

Solução. Como a = 1, b = 2 e c = −6, a equação caracterı́stica é m2 + m − 6 = 0. Seu discriminante é


∆ = 25, portanto as raı́zes são
√ √
−1 + 25 −1 − 25
m1 = = 2 e m2 = = −3
2 2
A solução geral é
y(x) = λ1 x2 + λ2 x−3

Exemplo 2.2.2. Resolva a equação x2 y 00 + 7xy 0 − 7y = 0.

Solução. Agora, temos a = 1, b = 7 e c = −7, logo a equação caracterı́stica é m2 + 6m − 7 = 0. O


discriminante vale ∆ = 64, portanto as raı́zes são
√ √
−6 + 64 −6 − 64
m1 = = 1 e m2 = = −7
2 2
Segue que a solução geral é
y(x) = λ1 x + λ2 x−7
62 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Exemplo 2.2.3. Resolva a equação 9x2 y 00 + 15xy 0 + y = 0.


Solução. Nesse caso, a = 9, b = 15 e c = 1, logo a equação caracterı́stica é 9m2 + 6m + 1 = 0, com
discriminante ∆ = 0. A única raiz real é

−6 ± 0 1
m= =− ,
18 3
de modo que a solução geral é
y(x) = λ1 x−1/3 + λ2 (ln x)x−1/3

Exemplo 2.2.4. Resolva a EDO x2 y 00 − 3xy 0 + 4y = 0.


Solução. Temos a = 1, b = −3 e c = 4, portanto a equação caracterı́stica é m2 − 4m + 4 = 0. Seu
discriminante é ∆ = 0, logo a raiz real é √
4± 0
m= = 2,
2
e a solução geral é
y(x) = λ1 x2 + λ2 (ln x)x2

Exemplo 2.2.5. Resolva a EDO x2 y 00 − 4xy 0 + 4y = 0.


Solução. Temos a = 1, b = −4 e c = 4, logo a equação caracterı́stica é m2 − 5m + 4 = 0, cujo discriminante
é ∆ = 9. As raı́zes são √ √
5+ 9 5− 9
m1 = = 4 e m2 = =1
2 2
e a solução geral é
y(x) = λ1 x4 + λ2 x

Exemplo 2.2.6. Resolva a equação x2 y 00 + 7xy 0 + 5y = 0.


Solução. Nesse caso, a = 1, b = 7 e c = 5, logo a equação caracterı́stica é m2 +6m+5 = 0. Seu discriminante
é ∆ = 16, de modo que as raı́zes são
√ √
−6 + 16 −6 − 16
m1 = = −1 e m2 = = −5,
2 2
portanto a solução geral é
y(x) = λ1 x−1 + λ2 x−5

Exemplo 2.2.7. Resolva a equação x2 y 00 − 3xy 0 + 8y = 0.


Solução. Temos a = 1, b = −3 e c = 8, portanto a equação caracterı́stica é m2 − 4m + 8 = 0. Note que
∆ = −16, portanto as raı́zes complexas são dadas por

4 ± −16 4 ± 4i
m= = = 2 ± 2i
2 2
Vemos que α = 2 e β = 2, logo a solução geral é

y(x) = λ1 x2 cos(2 ln x) + λ2 x2 sen(2 ln x)


2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 63

Exemplo 2.2.8. Resolva a EDO x2 y 00 − 5xy 0 + 13y = 0.


Solução. Como a = 1, b = −5 e c = 13, a equação caracterı́stica é m2 − 6m + 13 = 0, cujo discriminante é
∆ = −16. Assim, as raı́zes complexas são dadas por

6 ± −16 6 ± 4i
m= = = 3 ± 2i,
2 2
ou seja, α = 3 e β = 2. Com isso, concluı́mos que a solução geral é

y(x) = λ1 x3 cos(2 ln x) + λ2 x3 sen(2 ln x)

Exemplo 2.2.9. Resolva o PVI x2 y 00 + xy 0 − 4y = 0, y(1) = 0, y 0 (1) = 4.


Solução. Temos a = 1, b = 1 e c = −4, logo a equação caracterı́stica é m2 − 4 = 0, cujas raı́zes são m1 = 2
e m2 = −2. A solução geral é
y(x) = λ1 x2 + λ2 x−2

Para o resolver o PVI, começamos derivando a solução geral, o que resulta em


y 0 (x) = 2λ1 x − 2λ2 x−3
A condição inicial y(1) = 0 fornece a equação λ1 +λ2 = 0, enquanto a condição y 0 (1) = 4 fornece 2λ1 −2λ2 = 4,
que é o mesmo que λ1 − λ2 = 2. Somando as duas equações, obtemos 2λ1 = 2, logo λ1 = 1, e usando a
primeira equação, λ2 = −λ1 = −1. Assim, a solução do PVI é

1
y(x) = x2 −
x2

2.3 Equações lineares de segunda ordem não homogêneas

Nosso objetivo agora será estudar as equações da forma

y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = f (x)

A função f (x) será chamada de parte não homogênea da equação. A teoria será fundamentada pela
seguinte propriedade:
Teorema 2.3.1. Suponha que Y1 e Y2 são soluções da EDO não homogênea acima. Então Y1 − Y2 é uma
solução da equação homogênea associada
y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = 0
Demonstração. Com efeito, se Y = Y1 − Y2 , então Y 0 = Y10 − Y20 e Y 00 = Y100 − Y200 . Quando substituı́mos na
EDO homogênea associada, obtemos

Y 00 + p(x)Y 0 + q(x)Y = (Y100 − Y200 ) + p(x)(Y10 − Y20 ) + q(x)(Y1 − Y2 )


= (Y100 + p(x)Y10 + q(x)Y1 ) − (Y200 + p(x)Y20 + q(x)Y2 )
= f (x) − f (x) = 0,

logo Y é solução.
64 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Uma consequência importante deste Teorema é a seguinte. Suponha que Yp é uma solução particular da
equação não homogênea e que {y1 , y2 } é um conjunto LI de soluções da EDO homogênea associada. Se Y é
uma solução qualquer da EDO não homogênea, então Y − Yp é solução da EDO homogênea associada, logo
é combinação linear de y1 e y2 . Podemos escrever

Y − Yp = λ1 y1 + λ2 y2 ,

ou seja, a solução geral da EDO não homogênea pode ser expressa como

Y = λ1 y1 + λ2 y2 + Yp

Em outras palavras, a solução geral é


Y = yh + Yp ,

onde yh é a solução geral da EDO homogênea associada e Yp é uma solução particular da equação não
homogênea. Nosso trabalho passa a ser determinar uma solução particular, e para isso, estudaremos dois
métodos: o método dos coeficientes a determinar e o método da variação dos parâmetros.

2.3.1 Método dos coeficientes a determinar

Vamos supor uma forma para a solução particular envolvendo coeficientes e obter um sistema linear cujas
incógnitas serão exatamente esses coeficientes. Este método funciona apenas quando os coeficientes da EDO
forem constantes, isto é, só consideraremos aqui equações da forma

ay 00 + by 0 + cy = f (x)

Em todos os Exemplos a seguir vamos apenas calcular uma solução particular. Colocamos sempre a
equação
y 00 − 5y 0 + 6y = f (x),
cuja EDO homogênea associada tem equação caracterı́stica r2 − 5r + 6 = 0. O discriminante é ∆ = 1 e as
raı́zes são r1 = 2 e r2 = 3, portanto a solução geral da equação homog]ênea associada será

yh = λ1 e2x + λ2 e3x

Em todos os Exemplos, a solução geral será dada por

Y = λ1 e2x + λ2 e3x + Yp ,

onde Yp é a solução particular calculada no problema correspondente. Faremos isso para não perdermos
tempo calculando soluções de equações homogêneas, uma vez que já o fizemos bastante em aulas anteriores.

Exemplo 2.3.1. Obtenha uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = 5x + 1.

Solução. Vamos supor que Yp = Ax + B, um polinômio de mesmo grau que f (x) = 5x + 1. Temos Yp0 = A
e Yp00 = 0, logo Yp ser solução significa que, substituindo na EDO, temos

0 − 5A + 6(Ax + B) = 5x + 1 ⇒ 6Ax + (−5A + 6B) = 5x + 1

Agora, igualamos os coeficientes correspondentes de ambos os lados, chegando ao sistema linear



6A = 5
−5A + 6B = 1
2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 65

Claramente, a solução do sistema é A = 5/6 e B = 31/36, logo a solução particular é

5x 31
Yp = +
6 36

Exemplo 2.3.2. Determine uma solução particular para a EDO y 00 − 5y 0 + 6y = x2 .


Solução. Seguindo a solução do Exemplo anterior, devemos procurar por uma solução particular com o
mesmo formato que a parte não homogênea, ou seja, um polinômio do segundo grau. Se Yp = Ax2 + Bx + C,
então Yp0 = 2Ax + B e Yp00 = 2A. Substituindo na equação, temos

2A − 5(2Ax + B) + 6(Ax2 + Bx + C) = x2 ⇒ 6Ax2 + (−10A + 6B)x + (2A − 5B + 6C) = x2

Comparando coeficientes, chegamos ao sistema



 6A = 1
−10A + 6B = 0
2A − 5B + 6C = 0

Da primeira equação, vemos que A = 1/6, logo 6B = 10A = 5/3 pela segunda equação, logo B = 5/18.
Pela terceira, 6C = −2A + 5B = −2/6 + 25/18 = 19/18, ou seja, C = 19/108. Concluı́mos que a solução
particular é
x2 5x 19
Yp = + +
6 18 108

Exemplo 2.3.3. Encontre uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = 12.


Solução. A parte não homogênea é um polinômio constante, portando vamos supor que Yp = A, uma
constante também. Assim, Yp0 = Yp00 = 0, portanto, substituindo na EDO, vamos obter

0 − 5 · 0 + 6A = 12 ⇒ A = 2

Assim, a solução particular é


Yp = 2

Dessa forma, se f (x) for uma função polinomial, vamos procurar por Yp como um polinômio de mesmo
grau que f (x). Vejamos outros casos.
Exemplo 2.3.4. Ache uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = 5e4x .
Solução. Seguindo a lógica dos exemplos anteriores, devemos supor que a solução particular tem o mesmo
formato que a parte não homogênea, portanto uma candidata é Yp = Ae4x . Assim, Yp0 = 4Ae4x e Yp00 =
16Ae4x . Substituindo na EDO, temos

16Ae4x − 20Ae4x + 6Ae4x = 5e4x ⇒ 2A


e4x e4x
 = 5

Assim, A = 5/2, portanto


5 4x
Yp = e
2
66 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Exemplo 2.3.5. Determine uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = 10e5x .

Solução. Vamos supor que Yp = Ae5x , logo Yp0 = 5Ae5x e Yp00 = 25Ae5x . Daı́, a EDO fornece

25Ae5x − 25Ae5x + 6Ae5x = 10e5x ⇒ 6A


e5x e5x
 = 10,

logo A = 10/6 = 5/3 e


5 5x
Yp = e
3

Os dois exemplos anteriores ilustram que se f (x) for uma função exponencial, então nossa tentativa para
determinar uma solução particular também deve ser uma exponencial. Ressaltamos que supor que a solução
particular é da mesma forma que a parte não homogênea nem sempre funciona. Em geral, os casos em que
esse argumento dá certo são exatamente os que vamos estudar, o que mostra uma limitação do método (além
de só valer para equações com coeficientes constantes). Por outro lado, quando o método funciona, as contas
costumam ser mais simples, pois basta resolver um sistema de equações lineares.

Exemplo 2.3.6. Calcule uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = 8 sen(2x).

Solução. Nossas contas anteriores indicam que devemos considerar Yp = A sen(2x). Se fizermos isso, teremos
Yp0 = 2A cos(2x) e Yp00 = −4A sen(2x). Assim, quando substituı́mos na equação, obtemos

−4A sen(2x) − 10A cos(2x) + 6A sen(2x) = 8 sen(2x) ⇒ 2A sen(2x) − 10A cos(2x) = 8 sen(2x)

Isso nos fornece as equações 2A = 8 e −10A = 0 (obtidas comparando os coeficientes de seno e cosseno dos
dois lados), que são obviamente incompatı́veis.
O problema está em termos duas equações devido ao seno e ao cosseno, mas apenas uma incógnita.
Vamos, então, supor que a solução particular é da forma Yp = A sen(2x) + B cos(2x), logo Yp0 = 2A cos(2x) −
2B sen(2x) e Yp00 = −4A sen(2x) − 4B cos(2x). Dessa forma, quando substituı́mos na equação vemos que

−4A sen(2x) − 4B cos(2x) − 10A cos(2x) + 10B sen(2x) + 6A sen(2x) + 6B cos(2x) = 8 sen(2x)

⇒ (2A + 10B) sen(2x) + (−10A + 2B) cos(2x) = 8 sen(2x)


Igualando os coeficientes correspondentes, chegamos ao sistema

2A + 10B = 8
−10A + 2B = 0

Pela segunda equação, B = 5A, logo A + 25A = 4 pela primeira equação. Segue que A = 2/13, e então
B = 5A = 10/13. A solução particular é

2 10
Yp = sen(2x) + cos(2x)
13 13

Exemplo 2.3.7. Calcule uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = −2 cos(3x).

Solução. Pelo Exemplo acima, devemos tentar Yp = A cos(3x) + B sen(3x), logo Yp0 = −3A sen(3x) +
3B cos(3x) e Yp00 = −9A cos(3x) − 9B sen(3x). Assim, substituindo na equação, temos

−9A cos(3x) − 9B sen(3x) + 15A sen(3x) − 15B cos(3x) + 6A cos(3x) + 6B sen(3x) = −2 cos(3x)

⇒ (−3A − 15B) cos(3x) + (15A − 3B) sen(3x) = −2 cos(3x)


2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 67

Obtemos o sistema 
−3A − 15B = −2
15A − 3B = 0
Pela segunda equação, B = 5A, logo −3A−75A = −2 pela primeira equação, portanto A = 1/39 e B = 5/39.
A solução particular é
1 5
Yp = cos(3x) + sen(3x)
39 39

Exemplo 2.3.8. Encontre uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = 5 sen(2x) − 2 cos(2x).

Solução. Novamente, vamos supor que Yp = A sen(2x) + B cos(2x). Aproveitando as contas do Exemplo
2.3.6, chegaremos a

(2A + 10B) sen(2x) + (−10A + 2B) cos(2x) = 5 sen(2x) − 2 cos(2x)

O sistema resultante é 
2A + 10B = 5
−10A + 2B = −2
Multiplicando a primeira equação por 5 e somando com a segunda, obtemos 52B = 23, logo B = 23/52,
portanto 2A = 5 − 230/52 = 30/52, ou seja, A = 15/52. A solução particular é

15 23
Yp = sen(2x) + cos(2x)
52 52

Dessa forma, concluı́mos que se f (x) for uma combinação linear de seno e cosseno de mesmo ângulo,
então Yp também é. Esses são todos os tipos de partes não homogêneas que podem ser abordados usando
o método dos coeficientes a determinar. O que podemos fazer além disso é combinar esses tipos, como o
Teorema a seguir mostra.

Teorema 2.3.2 (Princı́pio da superposição). Para determinar uma solução particular Yp de y 00 + p(x)y 0 +
q(x)y = f1 (x) + f2 (x), determine soluções particulares Yp1 e Yp2 de y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = f1 (x) e y 00 +
p(x)y 0 + q(x)y = f2 (x), respectivamente. Então Yp = Yp1 + Yp2 .

Demonstração. De fato, substituindo, temos

Yp00 + p(x)Yp0 + q(x)Yp = (Yp001 + Yp002 ) + p(x)(Yp01 + Yp02 ) + q(x)(Yp1 + Yp2 )


= (Yp001 + p(x)Yp01 + q(x)Yp1 ) + (Yp002 + p(x)Yp02 + q(x)Yp2 )
= f1 (x) + f2 (x),

como querı́amos.

Exemplo 2.3.9. Ache uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = x + ex .

Solução. Primeiramente, vamos determinar uma solução particular de

y 00 − 5y 0 + 6y = x
68 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Como vimos, devemos supor que Yp = Ax + B, logo Yp0 = A e Yp00 = 0. Substituindo nesta primeira EDO,
temos
0 − 5A + 6(Ax + B) = x ⇒ 6Ax + (−5A + 6B) = x,
o que fornece o sistema 
6A = 1
−5A + 6B = 0
A solução, claramente, é A = 1/6 e B = 5/36, logo a solução particular para essa primeira parte é
x 5
Yp = +
6 36
Agora, temos que resolver a equação
y 00 − 5y 0 + 6y = ex
Procuramos por uma solução particular da forma Yp = Aex , logo Yp0 = Yp00 = Aex também. Substituindo,
chegamos a
Aex − 5Aex + 6Aex = ex ⇒ 2Aex = ex ,
ou seja, A = 1/2 e a solução particular desta parte é
ex
Yp =
2
De acordo com o Princı́pio da superposição, uma solução particular da equação original é a soma destas duas
soluções particulares parciais, portanto

x 5 ex
Yp = + +
6 36 2

é a resposta final do problema.

Na parte não homogênea, além de somar os tipos de funções que estudamos, também podemos multiplicá-
los. Para determinar a solução particular quando a parte não homogênea é um produto f1 (x)f2 (x) vamos
multiplicar as soluções particulares correspondentes e escrever os produtos de coeficientes que aparecerem
como um novo coeficiente. Os exemplos a seguir esclarecerão o procedimento.
Exemplo 2.3.10. Ache uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = xex .
Solução. A solução particular correspondente ao fator x é Ax + B, enquanto a que corresponde ao fator ex
é Cex . Multiplicando, obtemos (Ax + B)Cex = (ACx + BC)ex . Como AC e BC também são constantes,
podemos tratar cada um como um novo coeficiente e escrever a solução particular como
Yp = (Ax + B)ex
Daı́, Yp0 = Aex + (Ax + B)ex e Yp00 = Aex + Aex + (Ax + B)ex , e então, substituindo na EDO, vemos que
2Aex + (Ax + B)ex − 5Aex − 5(Ax + B)ex + 6(Ax + B)ex = xex
Cancelando a exponencial e organizando o lado esquerdo, obtemos
(−3A + 2B) + 2Ax = x
O sistema linear resultante é 
2A = 1
,
−3A + 2B = 0
cuja solução é A = 1/2 e B = 3/4. Assim, a solução particular é
 
x 3 x
Yp = + e
2 4
2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 69

Exemplo 2.3.11. Calcule uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = e−x sen(2x).

Solução. A solução particular oriunda da exponencial é Ae−x e a que vem do seno é B sen(2x) + C cos(2x).
Multiplicando, obtemos Ae−x (B sen(2x) + C cos(2x)) = e−x (AB sen(2x) + AC cos(2x)). Como AB e AC
são constantes, vamos tratá-los como os coeficientes da solução particular e escrevê-la como

Yp = e−x (A sen(2x) + B cos(2x))

Isso significa que

Yp0 = −ex (A sen(2x) + B cos(2x)) + e−x (2A cos(2x) − 2B sen(2x))


= e−x ((−A − 2B) sen(2x) + (2A − B) cos(2x))

Yp00 = −e−x ((−A − 2B) sen(2x) + (2A − B) cos(2x))


+ e−x ((−2A − 4B) cos(2x) + (−4A + 2B) sen(2x))
= e−x ((−3A + 4B) sen(2x) + (−4A − 3B) cos(2x))

Quando substituı́mos tudo isso na EDO, chegamos a

e−x ((−3A + 4B) sen(2x) + (−4A − 3B) cos(2x))


+ e−x ((5A + 10B) sen(2x) + (−10A + 5B) cos(2x))
+ e−x (6A sen(2x) + 6B cos(2x)
= e−x sen(2x)

Cancelando as exponenciais e organizando, temos

(8A + 14B) sen(2x) + (−14A + 8B) cos(2x) = sen(2x),

o que resulta no sistema 


8A + 14B = 1
−14A + 8B = 0
7A
Na segunda equação, temos B = , logo
4
49A 65A 2
8A + =1⇒ =1⇒A=
2 2 65
Com isso,
7 2 7
B= · =
4 65 130
e a solução particular desejada é

 
−x 2 7
Yp = e sen(2x) + cos(2x)
65 130
70 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Exemplo 2.3.12. Determine uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = e−x cos(2x).


Solução. O termo e−x indica uma solução particular da forma Ae−x , enquanto o fator cos(2x) indica
B cos(2x) + C sen(2x). Multiplicando estes termos, chegamos a

Ae−x (B cos(2x) + C sen(2x)) = e−x (AB cos(2x) + AC sen(2x))

Como AB e AC são constantes, podemos escrever, simplesmente,

Yp = e−x (A cos(2x) + B sen(2x))

Com isso,

Yp0 = e−x ((−A + 2B) cos(2x) + (−2A − B) sen(2x)) e Yp00 = e−x ((−3A − 4B) cos(2x) + (4A − 3B) sen(2x))

Agora, substituı́mos na EDO. Após uma simplificação, chegamos a

e−x ((8A − 14B) cos(2x) + (14A + 8B) sen(2x)) = e−x cos(2x)

Podemos cancelar a exponencial e igualar os coeficientes correspondentes, o que resulta no sistema



8A − 14B = 1
14A + 8B = 0

A solução deste sistema é


2 7
A= eB=− ,
65 130
portanto a solução particular é
 
2 7
e−x cos(2x) − sen(2x)
65 130

Exemplo 2.3.13. Determine a forma da solução particular prevista pelo método dos coeficientes a deter-
minar para y 00 − 4y 0 + 4y = xex sen x.
Solução. Como vimos, devemos multiplicar as soluções particulares correspondentes a cada fator do produto
xex sen x, o que resulta em

(Ax + B)Ce−x (D cos x + E sen x) = ex (ACDx + BCD) cos x + (ACEx + BCE) sen x


Como ACD, BCD, ACE e BCE são constantes, vamos escrever a solução particular como

Yp = ex (Ax + B) cos x + (Cx + D) sen x




Exemplo 2.3.14. Calcule uma solução particular para y 00 − 6y 0 + 8y = 4e2x .


Solução. Devemos supor que Yp = Ae2x , conforme vimos anteriormente. Daı́, Yp0 = 2Ae2x e Yp00 = 4Ae2x .
Substituindo na EDO, obtemos

4Ae2x − 12Ae2x + 8Ae2x = 4e2x ⇒ 0 = 4e2x ,

o que é impossı́vel. O que está errado?


Para investigarmos melhor o problema, vamos analisar a equação homogênea associada. Sua equação
caracterı́stica é r2 − 6r + 8 = 0, cujas raı́zes são r = 4 e r = 2. Assim, a solução geral desta EDO é

yh = λ1 e4x + λ2 e2x
2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 71

Isso mostra que Ae2x não pode ser solução da EDO não homogênea original, uma vez que já é uma
solução da EDO homogênea associada. Para corrigirmos esse problema, vamos multiplicar o Yp original por
x (como fazemos quando a equação caracterı́stica possui raı́zes repetidas). Dessa forma, vamos supor que

Yp = Axe2x ,

logo Yp0 = Ae2x + 2Axe2x e Yp00 = 4Ae2x + 4Axe2x . Substituindo, vemos que

4Ae2x +  2x
− 6Ae2x −  2x 2x
= 4e2x ⇒ −2Ae2x = 4e2x ,
  
4Axe
 12Axe +
8Axe


logo A = −2. Assim, a solução particular é

Yp = −2xe2x

O exemplo anterior mostra que, em determinadas situações, o formato padrão da solução particular
pode não funcionar. Isso ocorre quando este formato assemelha-se a alguma solução da equação homogênea
associada, e a correção é feita multiplicando a solução particular original por x.

Exemplo 2.3.15. Ache uma solução particular para y 00 + 4y = 5 sen(2x).

Solução. É interessante começar resolvendo a equação homogênea associada, para determinar se precisare-
mos modificar a solução particular padrão. A equação caracterı́stica é r2 + 4 = 0, cujas raı́zes são r = ±2i,
logo a solução geral é
yh = λ1 cos(2x) + λ2 sen(2x)
A solução particular padrão Yp = A cos(2x) + B sen(2x) não servirá, já que essa é exatamente a forma
da solução geral da EDO homogênea associada. Precisamos, portanto, considerar

Yp = Ax cos(2x) + Bx sen(2x)

Com isso, Yp0 = (2Bx+A) cos(2x)+(−2Ax+B) sen(2x) e Yp00 = (−4Ax+4B) cos(2x)+(−4Bx−4A) sen(2x).
Dessa forma, quando substituı́mos essas expressões na equação, obtemos

(−4Ax + 4B) cos(2x) + (−4Bx − 4A) sen(2x) + 4Ax cos(2x) + 4Bx sen(2x) = 5 sen(2x)

⇒ 4B cos(2x) − 4A sen(2x) = 5 sen(2x),


5
logo B = 0 e A = − . A solução particular é
4

5
Yp = − x cos(2x)
4

Exemplo 2.3.16. Calcule uma solução particular para y 00 − 6y 0 + 9y = e3x

Solução. A equação caracterı́stica da EDO homogênea associada é r2 − 6r + 9 = 0, que tem como única
raiz r = 3. Daı́,
yh = λ1 e3x + λ2 xe3x
é a sua solução geral. A tentativa padrão de solução particular seria Yp = Ae3x , mas isso já é solução para
a EDO homogênea. Se multiplicarmos por x, obtemos Yp = Axe3x , que ainda é solução da homogênea,
portanto temos que multiplicar novamente por x e supor que a solução particular é

Yp = Ax2 e3x
72 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Com isso, Yp0 = 2Axe3x + 3Ax2 e3x e Yp00 = 2Ae3x + 12Axe3x + 9Ax2 e3x , portanto, substituindo na EDO,
temos
2Ae3x +  3x XX2 3x 3x − 18Ax2 eX
3x XX2 3x
eX = e3x
 XXX
12Axe + 9Ax X eX − 
12Axe X + 9Ax X
1
⇒ 2Ae3x = e3x ⇒ A =
2
Assim, a solução particular é
1 2 3x
Yp = x e
2

Exemplo 2.3.17. Determine a forma da solução particular prevista pelo método dos coeficientes a deter-
minar para y 00 − 3y 0 + 2y = 2xex .

Solução. Começamos determinando a solução geral da equação homog]ênea associada. A equação carac-
terı́stica é r2 − 3r + 2 = 0, cujas raı́zes são r1 = 2 e r1 = 1, logo temos

yh = λ1 e2x + λ2 ex

Deverı́amos ter Yp = (Ax + B)ex = Axex + Bex . Como Bex já aparece em yh , não teremos sucesso com
essa solução particular. De fato, Yp0 = Aex + (Ax + B)ex e Yp00 = 2Aex + (Ax + B)ex , portanto se Yp fosse
solução da EDO não homogênea, terı́amos

2Aex + 
Axe

 x
+H x
BeH − 3Aex − 
3Axe
 x
−X
3Be
X
X x
+
2Axe
 x
+X
2Be
X
X x
= 2xex

⇒ −Aex = 2xex ⇒ −A = 2x,

o que não faz sentido pois um lado é constante e o outro não é. Assim, teremos que multiplicar nossa solução
particular por x sempre que alguma parte dela já aparecer em yh . Dessa forma, a forma correta para Yp
será
(Ax2 + Bx)ex

Exemplo 2.3.18. Determine o formato da solução particular previsto pelo método dos coeficientes a deter-
minar para y 00 − 6y 0 + 13y = x2 e3x cos(2x).

Solução. A equação homogênea associada tem equação caracterı́stica r2 − 6r + 13 = 0, cujas raı́zes são
r = 3 ± 2i. Assim,
yh = λ1 e3x cos(2x) + λ2 e3x sen(2x)

A solução particular padrão seria

Yp = (Ax2 + Bx + C)e3x cos(2x) + (Dx2 + Ex + F )e3x sen(2x) ,




mas o termo Ce3x cos(2x) + F e3x sen(2x) já aparece em yh . Assim, devemos multiplicar o Yp antigo por x,
obtendo
Yp = (Ax3 + Bx2 + Cx)e3 x cos(2x) + (Dx3 + Ex2 + F x)e3x sen(2x)

2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 73

2.3.2 Método da variação dos parâmetros

O método dos coeficientes a determinar não é o único que é utilizado para determinar uma solução
particular para uma EDO linear de segunda ordem. Uma outra forma de calcular esta solução é o método
da variação dos parâmetros. Uma vantagem deste método é que ele não funciona apenas para equações
com coeficientes constantes, nem apenas para uma classe restrita de funções na parte não homogênea. Por
outro lado, os cálculos envolvem integrais o que pode trazer outras complicações.
Suponha que desejamos resolver a EDO

y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = f (x). (2.3.1)

Se {y1 (x), y2 (x)} é um conjunto de soluções linearmente independentes da equação homogênea associada,
então sabemos que a solução geral dessa equação homogênea é

yh (x) = λ1 y1 (x) + λ2 y2 (x).

O método consiste em procurar por uma solução particular da forma

yp (x) = u(x)y1 (x) + v(x)y2 (x).

Note que trocamos as constantes λ1 e λ2 por funções u(x) e v(x), ou seja, fizemos os parâmetros constantes
variarem. Daı́ o nome do método.
Vejamos que condições essas funções devem satisfazer. Começamos derivando yp , obtendo

yp0 = u0 y1 + uy10 + v 0 y2 + vy20 = (u0 y1 + v 0 y2 ) + (uy10 + vy20 ).

Para simplificar, faremos a imposição


u0 y1 + v 0 y2 = 0. (2.3.2)
Mais à frente veremos que essa simplificação não restringe nosso problema. Com isso, ficamos com
yp0 = uy10 + vy20 . Dessa forma,
yp00 = u0 y1 + uy100 + v 0 y20 + vy200 .
Agora, substituı́mos yp , yp0 e yp00 em (2.3.1), o que nos fornece

(u0 y10 + uy100 + v 0 y20 + vy200 ) + p(x)(uy10 + vy20 ) + q(x)(uy1 + vy2 ) = f (x).

⇒ u (y100 + p(x)y10 + q(x)y1 ) + v (y200 + p(x)y20 + q(x)y2 ) + u0 y10 + v 0 y20 = f (x).


Como y1 e y2 são soluções da equação homogênea associada, sabemos que os dois termos entre parênteses
na expressão acima são iguais a zero. Daı́, a última equação reduz-se a

u0 y10 + v 0 y20 = f (x). (2.3.3)

As equações (2.3.2) e (2.3.3) formam o sistema


 0
u y1 + v 0 y2 = 0
, (2.3.4)
u0 y10 + v 0 y20 = f (x)

que tem como incógnitas u0 e v 0 , enquanto y1 , y2 e f (x) são funções conhecidas previamente. Esse sistema
tem solução única se o determinante de sua matriz dos coeficientes for diferente de zero. Note que este
determinante é
y1 y2
,
y10 y20
que é o Wronskiano de y1 e y2 . Como essas funções são linearmente independentes, este determinante é
diferente de zero, o que garante que o método sempre funciona, mesmo com a simplificação (2.3.2), pelo
menos em teoria.
74 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Para obter u0 e v 0 a partir do sistema acima, usamos a Regra de Cramer, que fornece

0 y2 y1 0
f (x) y20 y10 f (x)
u0 = e v0 = ,
y1 y2 y1 y2
y10 y20 y10 y20

isto é,
y2 f (x) y1 f (x)
u0 = − e v0 = .
W (y1 , y2 ) W (y1 , y2 )
Finalmente, obtemos u e v integrando as expressões acima, de modo que
Z Z
y2 (x)f (x) y1 (x)f (x)
u(x) = − dx e v(x) = dx .
W (y1 , y2 ) W (y1 , y2 )

Não recomendamos que o leitor memorize essas duas últimas fórmulas. Nossa recomendação é que sempre
se parta do sistema de equações (2.3.4), pois pode haver uma simplificação nele que não ficaria evidente com
as fórmulas integrais. Vejamos alguns exemplos.
Exemplo 2.3.19. Encontre a solução geral da EDO

y 00 + y = tg(x),

onde −π/2 < x < π/2.


Solução. Começamos determinando a solução geral da equação homogênea associada y 00 +y = 0. A equação
caracterı́stica é r2 + 1 = 0, portanto as raı́zes são i e −i, de modo que a solução geral da EDO homogênea
associada é
yh (x) = λ1 sen(x) + λ2 cos(x).
Pelo método da variação dos parâmetros, devemos procurar por yp da forma

yp (x) = u(x) sen(x) + v(x) cos(x).

De acordo com o sistema, (2.3.4), u0 e v 0 satisfazem


 0
u sen(x) + v 0 cos(x) = 0
.
u0 cos(x) − v 0 sen(x) = tg(x)

Multiplicando a primeira equação por sen(x), a segunda por cos(x) e somando-as, obtemos

u0 sen( x) + u0 cos2 (x) = tg(x) cos(x) ⇒ u0 = sen(x),

portanto
u(x) = − cos(x) .

Agora, multiplicamos a primeira equação por cos(x), a segunda por − sen(x) e as somamos para obter

sen2 (x) cos2 (x) − 1


v 0 cos2 (x) + v 0 sen2 (x) = − tg(x) sen(x) ⇒ v 0 = − = = cos(x) − sec(x).
cos(x) cos(x)
Assim, vemos que
v(x) = sen(x) − ln | sec(x) + tg(x)| .

Finalmente, temos

yp = − cos(x) sen(x) + (sen(x) − ln | sec(x) + tg(x)|) cos(x) = − ln | sec(x) + tg(x)| cos(x),


2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 75

portanto a solução geral é y = yh + yp , isto é,

y(x) = λ1 sen(x) + λ2 cos(x) − ln | sec(x) + tg(x)| cos(x) .

Exemplo 2.3.20. Determine a solução geral da EDO


1
y 00 + y 0 = .
ex + 1

Solução. Novamente começamos pela equação homogênea associada y 00 +y 0 = 0, cuja equação caracterı́stica
r2 + r = 0 tem raı́zes 0 e −1. Assim, a solução desta EDO homogênea é

yh = λ1 + λ2 e−x ,

isto é, y1 = 1 e y2 = e−x .


De acordo com o método da variação dos parâmetros, devemos procurar uma solução particular da forma

yp = u(x) + v(x)e−x .

O sistema (2.3.4) nos fornece


u0 + v 0 e−x

= 0
.
−v 0 e−x = 1
ex +1

Assim, temos
ex
v0 = − ,
ex + 1
portanto uma integração com a substituição t = ex + 1 (logo, dt = ex dx) mostra que

Z  
dt 1
v(x) = − = − ln |t| = − ln(ex + 1) = ln(ex + 1)−1 ⇒ v(x) = ln .
t ex + 1

Substituindo a expressão para v 0 na primeira equação do sistema, vemos que


1
u0 = .
ex +1
Novamente, usaremos a substituição t = ex + 1, de modo que ex = t − 1 e dt = ex dx = (t − 1)dx. Daı́,
Z Z
dx dt
u(x) = = .
ex + 1 (t − 1)t

Para simplificar esta última integral, usamos frações parciais. Primeiramente,

1 A B At + B(t − 1)
= + = .
(t − 1)t t−1 t (t − 1)t

Daı́,
1 = At + B(t − 1),
portanto a substituição t = 0 mostra que B = −1, enquanto a substituição t = 1 mostra que A = 1, ou seja,

ex
 
t−1
Z
dt dt
u(x) = − = ln |t − 1| − ln |t| = ln ⇒ u(x) = ln .
t−1 t t ex + 1
76 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Dessa forma,
ex
   
1
yp = ln x
+ ln e−x ,
e +1 ex + 1
e a solução geral da EDO não homogênea é y = yh + yp , isto é,

ex
   
1
y(x) = λ1 + λ2 e−x + ln x
+ ln e−x .
e +1 ex + 1

Exemplo 2.3.21. Considere a equação


x 1
y 00 − y0 + y = 5x − 5,
x−1 x−1
definida para x > 1. Prove que y1 = x e y2 = ex são soluções da equação homogênea associada. Use isso
para determinar a solução geral da equação acima.
Solução. Para mostrar que y1 e y2 são soluções da equação homogênea associada, basta notar que
x 1
(x)00 − (x)0 + x=0
x−1 x−1
e que
x 1 x [(x − 1) − x + 1]ex
(ex )00 − (ex )0 + e = = 0.
x−1 x−1 x−1
Além disso,
x ex
W (x, ex ) = = xex − ex = (x − 1)ex 6= 0
1 ex
pois x > 1, o que mostra que {x, ex } é linearmente independente, ou seja, a solução geral da EDO homogênea
associada é
yh = λ1 x + λ2 ex .
Procuramos uma solução particular da forma

yp = ux + vex .

De acordo com o sistema (2.3.4), temos que resolver o sistema


 0
u x + v 0 ex = 0
.
u0 + v 0 ex = 5x − 5

Se fizermos a primeira equação menos a segunda, obteremos

u0 (x − 1) = −5x + 5 = −5(x − 1) ⇒ u0 = −5 ⇒ u(x) = −5x .

Por outro lado, substituindo a expressão para u0 na primeira equação do sistema e isolando v 0 , vemos que

v 0 = 5xe−x .

Agora, integramos por partes. Como u e v já estão sendo usadas com outras finalidades, usaremos t = 5x e
ds = e−x , logo dt = 5 e s = −e−x . Com isso,
Z
v(x) = −5xe−x + 5 e−x dx = −5xe−x − 5e−x ⇒ v(x) = −5(x + 1)e−x .

Assim,
yp = (−5x)x − 5(x + 1)e−x ex = −5x2 − 5(x + 1)
2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 77

e a solução geral da EDO é dada por y = yh + yp , isto é,

y(x) = λ1 x + λ2 ex − 5x2 − 5(x + 1) .

Exemplo 2.3.22. Determine a solução geral da equação

y 00 + 9y = sec2 (3x).

Solução. A equação homogênea associada tem equação caracterı́stica r2 + 9 = 0, que tem 3i e −3i como
raı́zes. Assim, a solução geral desta EDO homogênea é

yh = λ1 cos(3x) + λ2 sen(3x).

Devemos procurar uma solução particular da forma

yp = u cos(3x) + v sen(3x).

As funções u e v satisfazem o sistema

u0 cos(3x) + v 0 sen(3x)

= 0
.
−3u0 sen(3x) + 3v 0 cos(3x) = sec2 (3x)

Agora, multiplicamos a primeira equação por 3 sen(3x), a segunda por cos(3x) e as somamos. Após
realizar as simplificações, o resultado é
Z
sec(3x) 1
3v 0 (sen2 (3x) + cos2 (3x)) = sec2 (3x) cos(3x) ⇒ v 0 = ⇒ v(x) = sec(3x)dx.
3 3
A substituição t = 3x, com dt = 3dx, transforma a última equação acima em
Z
1 1 1
v(x) = sec(t)dt = ln | sec(t) + tg(t)| ⇒ v(x) = ln | sec(3x) + tg(3x)| .
9 9 9

Para determinar u0 , substituı́mos a expressão para v 0 na primeira equação do sistema, obtendo

v 0 sen(3x) sen(3x)
u0 = − =− .
cos(3x) 3 cos2 (3x)

A substituição s = cos(3x), com ds = −3 sen(3x)dx, faz com que tenhamos


Z
1 ds 1 1
u(x) = 2
= − ⇒ u(x) = − .
9 s 9s 9 cos(3x)

Dessa forma, a solução particular é


1 1 1 1
yp = − cos(3x) + sen(3x) ln | sec(3x) + tg(3x)| = − + sen(3x) ln | sec(3x) + tg(3x)|
9 cos(3x) 9 9 9

e a solução geral, y = yh + yp , é

1 1
y(x) = λ1 cos(3x) + λ2 sen(3x) − + sen(3x) ln | sec(3x) + tg(3x)| .
9 9
78 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM

Exemplo 2.3.23. Determine a solução geral da equação

e−5t
y 00 + 10y 0 + 25y = .
t2
Solução. Dessa vez, a equação homogênea associada tem equação caracterı́stica r2 + 10r + 25 = 0, cuja
única raiz é 5. Assim, a solução desta EDO homogênea é

yh = λ1 e−5t + λ2 te−5t .

Dessa forma, a solução particular procurada será da forma

yp = ue−5t + vte−5t .

De acordo com o sistema (2.3.4), u0 e v 0 satisfazem

u0 e−5t + v 0 te−5t

= 0
0 −5t e−5t .
−5u e + v 0 (e−5t − 5te−5t ) = t2

Para simplificar, multiplicamos as duas equações por e5t . Assim, ficamos com

u0 + v 0 t

= 0
.
−5u + v 0 (1 − 5t) = t12
0

Agora, multiplique a primeira equação por 5 e some-a com a segunda. Isso resulta em

1 1
v0 = ⇒ v(t) = − .
t2 t

Pela primeira equação do sistema, podemos isolar u0 , escrevendo

1 1
u0 = −v 0 t = − t = − ⇒ u(t) = − ln |t| .
t2 t

Isso significa que a solução particular é


1
yp = − ln |t|e−5t − te−5t = − ln |t|e−5t − e−5t ,
t
e a solução geral, então, seria y = yh + yp , isto é,

y(t) = λ1 e−5t + λ2 te−5t − ln |t|e−5t − e−5t

A expressão acima já é uma resposta perfeitamente aceitável para este problema, mas observe que po-
demos agrupar os termos λ1 e−5t e −e−5t , escrevendo-os como (λ1 − 1)e−5t . Como λ1 − 1 também é uma
constante, não há nenhum problema em excluir o termo −e−5t da solução particular. Em outras palavras, se
alguma parte da solução particular gerada pelo método de variação dos parâmetros já for solução da equação
homogênea associada, então esta parte pode ser desprezada. Finalmente, escrevemos a resposta do Exemplo
como
y(t) = λ1 e−5t + λ2 te−5t − ln |t|e−5t .
Capı́tulo 3

Transformada de Laplace

Neste Capı́tulo vamos estudar uma ferramenta que simplifica algumas equações diferenciais ordinárias,
pois transforma problemas de valor inicial em equações algébricas, que são mais simples de se resolver. Essa
ferramenta é a transformada de Laplace.

3.1 Definição e primeiras propriedades

Suponha que f é uma função definida para t ≥ 0. A transformada de Laplace de f , que chamaremos
de L {f (t)} ou de F (s), é definida como
Z ∞
L {f (t)} = F (s) = e−st f (t)dt,
0

sempre que essa integral imprópria convergir.


Convém lembrar que essa integral imprópria é calculada fazendo
Z ∞ Z x
e−st f (t)dt = lim e−st f (t)dt.
0 x→∞ 0

Dizemos que a integral converge quando o limite existe. Caso contrário, ela diverge.
Diremos que uma função f é contı́nua por partes no intervalo [α, β] quando pudermos particionar esse
intervalo em uma quantidade finita de pontos

α = t0 < t1 < . . . < tn=1 < tn = β

de modo que f é contı́nua em cada subintervalo (ti−1 , ti ), i = 1, . . . , n, e os limites laterais de f nos extremos
desses subintervalos sempre existem.
O gráfico tı́pico de uma função contı́nua por partes é como o da Figura 3.1.1. Essa Figura ilustra bem
esse conceito: observe que o gráfico da função é formado por várias partes menores onde ela é contı́nua. Além
disso, nos extremos de cada uma das partes, a descontinuidade tem que ser de tipo salto. Uma propriedade
Z β
importante é que, se f é contı́nua por partes em [α, β], então a integral f (x)dx existe. De fato, basta
α
somar as integrais em cada uma das partes.
Podemos garantir que a transformada de Laplace de f existe se f satisfizer algumas condições especiais,
como as enunciadas no Teorema a seguir, importante do ponto de vista teórico: ele mostra que, se f
for da ordem de uma exponencial (ou seja, se f for controlada por uma função exponencial) para todo t
suficientemente grande, então a transformada de Laplace de f existe.

79
80 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Figura 3.1.1: Gráfico de uma função contı́nua por partes definida no intervalo [1, 5].

Teorema 3.1.1. Suponha que f seja contı́nua por partes no intervalo [0, A] para todo A > 0 e que

|f (t)| ≤ Keat

quando t ≥ M , onde a, K e M são constantes reais, com K e M necessariamente positivas. Então, a


transformada de Laplace L {f (t)} = F (s) existe para s > a.

Para demonstrar esse Teorema, precisamos de um critério de convergência para integrais impróprias, que
é similar ao que estudamos sobre séries infinitas em Cálculo 3.

Critério de Comparação: Se f é contı́nua por partes para t ≥ a e |f (t)| ≤ g(t) quando t ≥ M para
Z ∞ Z ∞
alguma constante positiva M e se g(t)dt converge, então f (t)dt também converge. Por outro lado,
Z ∞ M Z ∞ a

se f (t) ≥ g(t) ≥ 0 e se g(t)dt diverge, então f (t)dt diverge.


M a
Z ∞
Agora, demonstramos o Teorema. Precisamos mostrar que e−st f (t)dt converge se s > a. Vamos
0
separar a integral imprópria em duas partes, escrevendo-a como
Z ∞ Z M Z ∞
e−st f (t)dt = e−st f (t)dt + e−st f (t)dt.
0 0 M

A primeira dessas integrais existe, pois f é contı́nua por partes em [0, M ]. Para a segunda integral, se t ≥ M ,
temos
e−st f (t) ≤ Ke−st eat = Ke(a−s)t .
Z ∞
Pelo Critério da Comparação, essa integral existe se e(a−s)t dt convergir. Note que
M

Z ∞ Z x t=x
1 (a−s)t 1  
e(a−s)t dt = lim e(a−s)t dt = lim e = lim e(a−s)x − e(a−s)M .
M x→∞ M x→∞ a − s a − s x→∞
t=M
Z ∞
Esse limite existe se a − s < 0 e diverge caso contrário. Logo, e−st f (t)dt converge se a − s < 0, ou
M
seja, se s > a, como querı́amos. Vejamos, agora, alguns exemplos.

Exemplo 3.1.1. Calcule L {f (t)} se f (t) = 1, t ≥ 0.


3.1. DEFINIÇÃO E PRIMEIRAS PROPRIEDADES 81

Solução. Basta fazer


Z ∞
1 1
L {f (t)} = e−st dt = lim esx − e0 =

0 s x→∞ s

se s > 0, pois o limite só existe nesse caso.

Observe que também deduzimos o domı́nio da transformada, pois a sua variável, que é s, está definida
apenas para s > 0.

Exemplo 3.1.2. Calcule F (s) se f (t) = eat , t ≥ 0.

Solução. Dessa vez, temos


Z ∞ Z ∞
−st at 1   1
F (s) = e e dt = e(a−s)t dt = lim e(a−s)x − e0 =
0 0 a − s x→∞ s−a

se s > a, pois apenas nesse caso o limite existe.

Os dois exemplos anteriores estão relacionados, visto que 1 = e0 , portanto deverı́amos poder calcular a
transformada de Laplace de 1 substituindo a por zero na transformada de eat , o que realmente funciona.

Exemplo 3.1.3. Obtenha F (s) se f (t) = sen(bt), t ≥ 0.

Solução. Comecemos fazendo


Z ∞ Z x
F (s) = e−st sen(bt)dt = lim e−st sen(bt)dt.
0 x→∞ 0

Uma integração por partes fornece


 −st x Z x  Z x
e cos(bt) s 1 s
F (s) = lim − − e−st cos(bt)dt = − lim e−st cos(bt)dt.
x→∞ b 0 b 0 b b x→∞ 0

Agora, integramos por partes novamente para obter

1 s2 ∞ −st 1 s2
Z
F (s) = − 2 e sen(bt)dt = − 2 F (s).
b b 0 b b

Logo,
s2 s2 + b2
   
1 1 b
F (s) 1 + 2 = ⇒ F (s) = ⇒ F (s) = 2
b b b2 b s + b2

se s > b.

Exemplo 3.1.4. Calcule F (s) se f (t) = cos(bt), t ≥ 0.

Solução. Vamos aproveitar os cálculos do Exemplo anterior. Primeiramente, note que


Z ∞ Z x
−st
F (s) = e cos(bt)dt = lim e−st cos(bt)dt.
0 x→∞ 0

Novamente integramos por partes, o que resulta em


x
s x −st s ∞ −st
 −st Z  Z
e sen(bt)
F (s) = lim + e sen(bt)dt = e sen(bt)dt.
x→∞ b 0 b 0 b 0
82 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Essa última integral imprópria é exatamente a transformada de Laplace de sen(bt). Substituindo o valor
obtido acima, encontramos, então,

s b s
L {cos(bt)} = ⇒ L {cos(bt)} = 2 .
b s2 + b2 s + b2

Nos dois exemplos anteriores houve uma etapa em que precisamos calcular

lim e−sx cos(bx)dt e lim e−sx sen(bx)dt.


x→∞ x→∞

Em ambos os casos, temos uma função que tende a zero (a exponencial) multiplicada por uma função
limitada. Uma aplicação simples do Teorema do Confronto mostra que esses dois limites são iguais a zero.
Suponha agora que f1 e f2 sejam duas funções cujas transformadas de Laplace existem para s > a1 e
s > a2 , respectivamente. Então, para s maior que o máximo entre a1 e a2 , temos
Z ∞ Z ∞ Z ∞
L {c1 f1 (t) + c2 f2 (t)} = e−st [c1 f1 (t) + c2 f2 (t)] dt = c1 e−st f1 (t)dt + c2 e−st f2 (t)dt,
0 0 0

isto é,
L {c1 f1 (t) + c2 f2 (t)} = c1 L {f1 (t)} + c2 L {f2 (t)} .

Isso mostra que a transformada de Laplace é um operador linear. Esse fato é muito útil e será
bastante usado mais adiante.

Exemplo 3.1.5. Calcule L {f (t)} se f (t) = 5e−2t − 3 sen(4t), t ≥ 0.

Solução. Vamos usar a linearidade da transformada. Temos

5 12
L {f (t)} = 5L {e−2t } − 3L {sen(4t)} = − 2 .
s + 2 s + 16

A transformada da exponencial está definida para s > −2, enquanto a transformada do seno está definida
para s > 4, logo ambas estão definidas para s > 4, que é o domı́nio da transformada de f (t).

Continuemos com o cálculo de mais algumas transformadas importantes.

Exemplo 3.1.6. Calcule L {t}, t ≥ 0.

Solução. Começamos com Z ∞ Z x


L {t} = e −st
tdt = lim e−st tdt.
0 x→∞ 0

Integrando por partes, obtemos


x x
e−st t
 Z 
1
L {t} = lim − + e −st
dt .
x→∞ s 0 s 0

Analisemos os dois termos acima separadamente. O primeiro termo é igual a zero quando t = 0, e quando
t = x aparece o limite
lim e−sx x,
x→∞

que é uma indeterminação do tipo 0 · ∞ se s > 0. Uma aplicação da Regra de L’Hospital mostra que esse
limite é igual a zero.
3.1. DEFINIÇÃO E PRIMEIRAS PROPRIEDADES 83

Por outro lado, o segundo termo é igual a 1/s vezes transformada de Laplace de 1, a qual vale 1/s. Dessa
forma, ficamos com
1
L {t} =
s2

desde que s > 0, para que a integral imprópria seja convergente.

Exemplo 3.1.7. Calcule L {t2 }, t ≥ 0.

Solução. Como no Exemplo anterior, começamos integrando por partes, de modo que
Z ∞  −st 2 x
2 x −st
Z 
e t
L {t2 } = e−st t2 dt = lim − + e tdt .
0 x→∞ s 0 s 0

Mais uma vez, temos dois termos. O primeiro deles é igual a zero, assim como antes, desde que s > 0
(basta inverter a exponencial e aplicar a Regra de L’Hospital duas vezes quando t = x). Já o segundo é igual
a 2/s vezes a transformada de Laplace de t, que vale 1/s2 . Substituindo, chegamos a

2
L {t2 } = ,
s3

definida para s > 0.

O que os últimos dois exemplos indicam é que podemos calcular L {tn } a partir de L {tn−1 }. Vejamos
mais um exemplo para, então, inferir qual a fórmula geral para a transformada de tn .

Exemplo 3.1.8. Calcule L {t3 }, t ≥ 0.

Solução. Repetindo os cálculos anteriores, ficamos com


 −st 3 x
3 x −st 2
Z 
e t
L {t3 } = lim − + e t dt .
x→∞ s 0 s 0

Como antes, se s > 0, então o primeiro termo é igual a zero, enquanto o segundo é igual a 3/s vezes a
transformada de Laplace de t2 . Daı́,
6
L {t3 } =
s4

se s > 0.

Agora o padrão está mais claro. O numerador envolve um fatorial, de modo que

n!
L {tn } =
sn+1

se s > 0. Reunimos todas as fórmulas calculadas até aqui na Tabela 3.1.


Uma importante propriedade das transformadas de Laplace aparece quando multiplicamos uma função
por uma exponencial. Mais especificamente, se conhecermos a transformada de Laplace de uma certa função
f (t), então o Teorema a seguir mostra como obter a transformada de Laplace de g(t) = eat f (t).

Teorema 3.1.2. Se L {f (t)} = F (s), então L {eat f (t)} = F (s − a).


84 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Tabela 3.1: Transformadas de Laplace de algumas funções elementares.

f (t) F (s) Domı́nio

1
1 s>0
s
n!
tn s>0
sn+1
1
eat s>a
s−a

b
sen(bt) s>b
s2 + b2
s
cos(bt) s>b
s2 + b2

Demonstração. Vamos usar a definição da transformada. Sabemos que


Z ∞
F (s) = e−st f (t)dt. (3.1.1)
0

Além disso, note que


Z ∞ Z ∞
L {e f (t)} =
at
e −st at
e f (t)dt = e−(s−a)t f (t)dt. (3.1.2)
0 0

Basta notar, agora, que a última integral em (3.1.1) pode ser obtida da integral em (3.1.1) trocando s
por s − a, o que mostra que essa integral é o mesmo que F (s − a), como querı́amos.

Assim, ao multiplicarmos uma função f (t) por uma exponencial eat , então para calcular a transformada
de Laplace resultante basta substituir s por s − a na transformada de Laplace de f (t). As fórmulas a seguir
são, então, consequências imediatas do Teorema anterior.

b s−a
L {eat sen(bt)} = L {eat cos(bt)} =
(s − a)2 + b2 (s − a)2 + b2

n!
L {eat tn } =
(s − a)( n + 1)

3.1.1 Transformada de Laplace Inversa

Consideraremos agora o problema inverso, isto é, dada uma transformada de Laplace, determinar qual
função que a gerou. Em termos matemáticos, conhecida a função F (s), queremos encontrar sua transformada
de Laplace inversa L −1 {F (s)}. Vejamos alguns exemplos.

3
Exemplo 3.1.9. Determine L −1 {F (s)} se F (s) = .
s2 +4
3.1. DEFINIÇÃO E PRIMEIRAS PROPRIEDADES 85

Solução. Consultando a Tabela 3.1, vemos que o denominador s2 + 4 = s2 + 22 indica que trata-se de um
seno ou de um cosseno, com b = 2. Como no numerador há apenas uma constante, teremos um seno. Como

2
L {sen(2t)} = ,
s2 + 22

a linearidade da transformada mostra que

3 3
L { sen(2t)} = 2 ,
2 s +4
portanto
3
L −1 {F (s)} = sen(2t) .
2

4
Exemplo 3.1.10. Determine L −1 {F (s)} se F (s) = .
(s − 1)3

Solução. A Tabela 3.1 mostra que o único caso em que pode haver um expoente 3 no denominador é se
tivermos a transformada de t2 . No entanto, o denominador desta transformada seria s3 , logo para aparecer
(s − 1)3 devemos usar o Teorema 3.1.2 e multiplicar por uma exponencial eat .
Para determinar o valor de a, lembre-se que multiplicar por eat faz com que s seja trocado por s − a.
Como queremos trocar s por s − 1, isso indica que a = 1. Até aqui, sabemos que

2
L {et t2 } = .
(s − 1)3

Pela linearidade, então,


4
L {2et t2 } = ⇒ L −1 {F (s)} = 2et t2 .
(s − 1)3

2
Exemplo 3.1.11. Determine L −1 {F (s)} se F (s) = .
s2 + 3s − 4
Solução. Dessa vez, o denominador não possui nenhum dos formatos da Tabela 3.1, então vamos tentar
escrevê-lo de um modo mais simples. Observe que suas raı́zes são s = 1 e s = −4, logo

2 2
= .
s2 + 3s − 4 (s − 1)(s + 4)

Usamos frações parciais para escrever (faça as contas!)

2 1 2 1 2 2
F (s) = · − · = L {et } − L {e−4t }.
5 s−1 5 s+4 5 5

Pela linearidade, segue que


2 t 2 −4t
L −1 {F (s)} = e − e .
5 5

2s + 3
Exemplo 3.1.12. Determine L −1 {F (s)} se F (s) = .
s2 + 2s + 5
86 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Solução. Novamente, não há nenhuma transformada na Tabela 3.1 que tenha um denominador semelhante
a esse. Assim como no Exemplo anterior, tentaremos reescrever esse denominador de uma outra forma.
Como ele não possui raı́zes reais, nossa estratégia será completar o quadrado. Observe que
2s + 3
F (s) = .
(s + 1)2 + 22

Como há uma soma de quadrados no denominador, começamos a perceber que esse denominador está
relacionado a um seno ou a um cosseno com b = 2. Além disso, temos s + 1 no lugar de s, portanto também
houve multiplicação por e−t .
Bem, há s no numerador, portanto começamos manipulando a transformada de e−t cos(2t), que é
s+1
. Daı́, temos
(s + 1)2 + 22

2(s + 1) + 1 s+1 1
F (s) = 2 2
=2· 2 2
+ .
(s + 1) + 2 (s + 1) + 2 (s + 1)2 + 22

A segunda fração do lado direito da expressão acima está relacionada à transformada de e−t sen(2t), já
que, agora, não há mais s no numerador. No entanto, o numerador deveria ser 2. Mais uma manipulação e
chegamos a
s+1 1 2 1
F (s) = 2 + · = 2L {e−t cos(2t)} + L {e−t sen(2t)}.
(s + 1)2 + 22 2 (s + 1)2 + 22 2

Pela linearidade, concluı́mos que

1
L −1 {F (s)} = 2e−t cos(2t) + e−t sen(2t) .
2

Finalizamos a Seção resumindo os últimos exemplos. Se a transformada apresentar um denominador


dado por uma função quadrática, comece procurando suas raı́zes. Se existirem duas raı́zes reais distintas, a
estratégia para determinar a transformada inversa será usar frações parciais e transformadas de exponenciais.
Caso não existam raı́zes reais, então completamos o quadrado e tentamos relacionar a expressão com as
transformadas de senos e cossenos, multiplicados por exponenciais. E se houver apenas uma raiz real?
Nesse caso, o denominador terá a forma (s − a)2 , portanto basta manipular a expressão para que apareça a
transformada de eat t.

3.2 Problemas de Valor Inicial

Nesta Seção nós vamos usar a transformada de Laplace para resolver alguns problemas de valor inicial.
A técnica que usaremos é dada no seguinte Teorema:
Teorema 3.2.1. Suponha que f seja contı́nua e que f 0 seja contı́nua por partes em qualquer intervalo
0 ≤ t ≤ A. Suponha, além disso, que existam constantes K, a e M tais que |f (t)| ≤ Keat para t ≥ M .
Então L {f 0 (t)} existe para s > a e, além disso,

L {f 0 (t)} = sL {f (t)} − f (0) .

De fato, podemos generalizar esse Teorema para calcular L {f (n) (t)}. Temos

L {f (n) (t)} = sn L {f (t)} − sn−1 f (0) − . . . − sf (n−2) (0) − f (n−1) (0) .


3.2. PROBLEMAS DE VALOR INICIAL 87

Para referência futura, a fórmula acima para os casos n = 2, n = 3 e n = 4 torna-se

L {y 00 } = s2 L {y} − sy(0) − y 0 (0).

L {y 000 } = s3 L {y} − s2 y(0) − sy 0 (0) − y 00 (0).


L {y (4) } = s4 L {y} − s3 y(0) − s2 y 0 (0) − sy 00 (0) − y 000 (0).
Note que o expoente de s diminui da esquerda para a direita, enquanto o número de derivadas na condição
inicial aumenta. Vejamos como justificar esse Teorema para o caso da transformada de Laplace da primeira
derivada de f . Temos Z ∞
L {f 0 (t)} = e−st f 0 (t)dt,
0

logo se fizermos u = e−st e dv = f 0 (t)dt, então du = −se−st , v = f (t) e


Z ∞
L {f 0 (t)} = e−st f (t)|∞
0 + s e−st f (t)dt
0

pela fórmula de integração por partes. A integral remanescente na última expressão é a transformada de
Laplace de f (t), portanto basta analisar o outro termo, que é o mesmo que

lim e−sx f (x) − f (0).


x→∞

Nesse ponto, a outra hipótese do Teorema aparece. Se x ≥ M , então |f (x)| ≤ Keat , logo

0 ≤ |e−sx f (x)| ≤ Ke(a−s)x .

Se s > a, então a exponencial no lado direito da desigualdade acima tende a zero quando x tende a infinito.
Pelo Teorema do Confronto,
lim e−sx f (x) = 0.
x→∞

Daı́,
L {f 0 (t)} = −f (0) + sL {f (t)},
como querı́amos. Assim, a hipótese da desigualdade com uma exponencial foi crucial para a demonstração
do Teorema, mas não se preocupe pois todas as funções que estudamos nesse curso satisfazem essa condição.
Usaremos esse resultado como uma outra forma de resolver problemas de valor inicial para equações dife-
renciais lineares, como veremos nos próximos exemplos.

Exemplo 3.2.1. Resolva o PVI

y 00 + y = sen(2t), y(0) = 2, y 0 (0) = 1.

Solução. Começamos aplicando a transformada de Laplace a ambos os lados da equação. Ficamos com

L y 00 + y = L {sen(2t)}.

Pela linearidade e por nossa Tabela de transformadas da Seção anterior, temos


2
L {y 00 } + L {y} = .
s2 + 4
Agora, o Teorema que acabamos de ver indica que

L {y 00 } = s2 L {y} − sy(0) − y 0 (0) = s2 L {y} − 2s − 1.

Dessa forma,
2
s2 L {y} − 2s − 1 + L {y} =
s2 +4
88 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

o que, após algumas simplificações, resulta em

2s3 + s2 + 8s + 6
L {y} = .
(s2 + 4)(s2 + 1)
Para resolver o problema, precisamos determinar quem é a transformada de Laplace inversa da função
acima. A saı́da é usar frações parciais. Temos

2s3 + s2 + 8s + 6 As + B Cs + D
2 2
= 2 + 2 .
(s + 4)(s + 1) s +4 s +1

Resolvendo um sistema linear (Faça as contas!) concluı́mos que A = 0, B = −2/3, C = 2 e D = 5/3, isto
é,
2 1 2s + 5/3 1 2 s 5 1
L {y} = − · 2 + 2 =− · 2 +2· 2 + · 2 .
3 s +4 s +1 3 s +4 s +1 3 s +1
Pela linearidade e pela Tabela de transformadas, confluı́mos (finalmente), que

1 5
y(t) = − sen(2t) + 2 cos(t) + sen(t) .
3 3

Exemplo 3.2.2. Resolva o PVI

y (4) − y = 0, y(0) = y 00 (0) = y 000 (0) = 0, y 0 (0) = 1.

Solução. Mais uma vez, começamos aplicando a transformada dos dois lados da equação e usando a linea-
ridade para obter
L {y (4) − {L}{y} = 0.
Pela fórmula do último Teorema, essa equação torna-se

s4 L {y} − s3 y(0) − s2 y 0 (0) − sy 00 (0) − y 000 (0) − L {y} = 0.

Aplicando as condições iniciais, segue que

s2
s4 L {y} − s2 − L {y} = 0 ⇒ (s4 − 1)L {y} = s2 ⇒ L {y} = .
s4−1
Simplificando, temos
s2 s2
L {y} = = .
(s2 + 1)(s2 − 1) (s2 + 1)(s + 1)(s − 1)
Novamente recorremos às frações parciais para determinar quem é y. Dessa vez, as frações são

s2 As + B C D
= 2 + + .
(s2 + 1)(s + 1)(s − 1) s +1 s+1 s−1

Deixamos a cargo do leitor verificar que A = 0, B = 1/2, C = −1/4 e D = 1/4. Dessa forma,
1 1 1 1 1 1
L {y} = · − · + .
2 s2 + 1 4 s + 1 4 s − 1
Com isso, podemos aplicar as transformadas inversas da Tabela e a linearidade para concluir que

1 1 1
y(t) = sen(t) − e−t + et .
2 4 4
3.3. FUNÇÃO DEGRAU UNITÁRIO 89

3.3 Função degrau unitário

Apesar de a transformada de Laplace ser uma ferramenta muito útil para resolver problemas de valor
inicial como os anteriores, já conhecı́amos métodos para fazer isso que não precisavam estudar esse novo
conceito. A importância, de fato, da transformada é que ela nos permite resolver problemas em que a
parte não-homogênea é descontı́nua ou é uma função de impulso. Começamos considerando o caso de
descontinuidades na parte não-homogênea estudando a função degrau unitário, definida por

0, t<c
uc (t) = ,
1, t≥c

onde c ≥ 0. O gráfico de uc (t) está exposto na Figura 3.3.1. Um outro nome para uc (t) que se encontra
na literatura é função de Heaviside. O degrau também pode ser decrescente: basta considerar a função
y = 1 − uc (t).

Figura 3.3.1: Gráfico da função degrau unitário.

Exemplo 3.3.1. Esboce o gráfico de y = h(t), onde h(t) = uπ (t) − u2π (t), t ≥ 0.
Solução. Temos que 
 0, 0 ≤ t < π
h(t) = 1, π ≤ t < 2π .
0, t ≥ 2π

Logo, o gráfico é como o da Figura 3.3.2.

Figura 3.3.2: Gráfico da função degrau unitário.


90 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Chamaremos funções com um gráfico como esse de função janela. Note que a janela nos pontos c1 e c2 ,
com c1 < c2 , é dada por uc1 (t) − uc2 (t).
Calcular a transformada de Laplace de uc (t) é simples. Basta ver que

∞ ∞
e−cs
Z Z
L {uc (t)} = e−st uc (t)dt = e−st dt = ,
0 c s

desde que s > 0.


O resultado mais importante sobre funções degrau diz respeito a translações. Muitas vezes, vamos
considerar a translação por uma distância c no sentido positivo de t de uma certa função f (t), ou seja, a
função 
0, t<c
g(t) = .
f (t − c), t ≥ c
Note que também podemos escrever
g(t) = uc (t)f (t − c) .

O Teorema a seguir relaciona as transformadas de f (t) e de sua translação uc (t)f (t − c). Lembre-se que
multiplicar f (t) por uma exponencial causava uma translação em F (s). Agora, vemos que uma multiplicação
por expoencial em F (s) também causa uma translação em f (t).

Teorema 3.3.1. Se F (s) = L {f (t)} existe para s > a ≥ 0 e se c é uma constante positiva, então

L {uc (t)f (t − c)} = e−cs F (s)

para s > a. Reciprocamete, se f (t) = L −1 {F (s)}, então

uc (t)f (t − c) = L −1 {e−cs F (s)} .

Demonstração. Pela definição, sabemos que


Z ∞ Z ∞
L {uc (t)f (t − c)} = −st
e uc (t)f (t − c)dt = e−st f (t − c).
0 c

Com a mudança de variável u = t − c obtemos


Z ∞ Z ∞
L {uc (t)f (t − c)} = e−su−cs f (u)du = e−cs e−su f (u)du.
0 0

Como a última integral acima nada mais é que a própria transformada de Laplace de f (t) (t foi trocado por
u na integral), a demonstração está finalizada.

Exemplo 3.3.2. Encontre L {f (t)} se



sen(t), 0 ≤ t < π/4
f (t) = .
sen(t) + cos(t − π/4), t ≥ π/4

Solução. Note que podemos escrever


 
0, 0 ≤ t < π/4 0, 0 ≤ t < π/4
f (t) = sen(t) + = sen(t) + cos(t − π/4) ,
cos(t − π/4), t ≥ π/4 1, t ≥ π/4
3.3. FUNÇÃO DEGRAU UNITÁRIO 91

ou seja, f (t) = sen(t) + uπ/4 (t) cos(t − π/4). Pela linearidade da transformada, segue que

L {f (t)} = L {sen(t)} + L {uπ/4 (t) cos(t − π/4)}

1 s 1 + se−πs/4
= 2
+ e−πs/4 2 = .
s +1 s +1 s2 + 1

Exemplo 3.3.3. Encontre a transformada inversa de

1 − e−2s
F (s) = .
s2
Solução. Temos
1 1
F (s) = 2
− e−2s 2 .
s s
Sabemos que
L −1 {1/s2 } = t.
Pelo Teorema anterior, a multiplicação por um fator e−2s indica que foi feita uma translação de c = 2 na
função cuja transformada é 1/s2 . Logo,

L −1 {e−2s /s2 } = u2 (t)(t − 2),

e
L −1 {F (s)} = t + u2 (t)(t − 2) .

Os últimos dois Exemplos ilustram duas formas de aplicar o Teorema 3.3.1. Quando aplicamos a transfor-
mada de Laplace em uma função que envolve uc (t)f (t − c), basta calcular a transformada de f (t) (sem o c) e
multiplicá-la por e−cs . Por outro lado, quando queremos a transformada inversa de e−cs F (s), determinamos
a função f (t), transformada inversa de F (s), trocamos t por t − c e multiplicamos pelo degrau uc (t).

Exemplo 3.3.4. Determine L {f (t)} se



0, 0≤t<2
f (t) = .
(t − 2)2 , t ≥ 2

Solução. Observe que podemos escrever



0, 0≤t<2
f (t) = (t − 2)2 = u2 (t)(t − 2)2 ,
1, t≥2

logo transladamos a função t2 de c = 2. Daı́,

2e−2s
L {f (t)} = e−2s L {t2 } = .
s3

Exemplo 3.3.5. Determine L {f (t)} se



0, 0≤t<1
f (t) = .
t2 − 2t + 2, t ≥ 1
92 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Solução. Aqui temos c = 1. Completando o quadrado, vemos que

t2 − 2t + 2 = (t − 1)2 + 1,

logo 
0, 0≤t<1
= u1 (t) (t − 1)2 + 1 .
 
f (t) = 2
(t − 1) + 1, t ≥ 1
Note que a função que está sendo transladada agora é t2 + 1 (basta trocar t − 1 por t na última expressão
acima). Dessa forma,

 
2 1
L {f (t)} = e −s
L {t + 1} = e
2 −s
L {t } + L {1} = e−s
2

3
+ .
s s

Exemplo 3.3.6. Determine L {f (t)} se



 0, 0≤t<π
f (t) = t − π, π ≤ t < 2π .
0, t ≥ 2π

Solução. Já vimos que uma função janela em π e 2π, isto é, que vale 0 para x entre 0 e π e de 2π em diante
mas vale 1 entre π e 2π, é dada por uπ (t) − u2π (t). Com isso, f (t) pode ser obtida multiplicando a função
janela por t − π, isto é,
f (t) = uπ (t)(t − π) − u2π (t)(t − π).
O termo com uπ já está no formato adequado, mas o termo com u2π ainda não, visto que a função que
multiplica o degrau deve ser dada em termos de t − 2π. Para resolver este problema, basta reescrever f (t)
como
f (t) = uπ (t)(t − π) − u2π (t) ((t − 2π) + π) = uπ (t)(t − π) − u2π (t)(t − 2π) − πu2π (t).
Daı́,
e−πs e−2πs πe−2πs
L {f (t)} = − − .
s2 s2 s

Exemplo 3.3.7. Determine L −1 {F (s)} se

2(s − 1)e−2s
F (s) = .
s2 − 2s + 2
Solução. Completando o quadrado, temos

2(s − 1)
· e−2s .
(s − 1)2 + 1

A fração do lado esquerdo é a transformada de Laplace de 2et cos(t). Como multiplicamos por e−2s , houve
uma translação de c = 2. Logo, temos que

L {F (s)} = 2u2 (t)et−2 cos(t − 2) .

Podemos combinar o que estudamos nesta Seção e na anterior para resolver problemas de valor inicial
com equações diferenciais lineares em que a parte não-homogênea é descontı́nua, como no Exemplo a seguir.
3.4. FUNÇÕES DE IMPULSO 93

Exemplo 3.3.8. Resolva o PVI


2y 00 + y 0 + 2y = g(t),
onde 
 0, 0 ≤ t < 5
g(t) = 1, 5 ≤ t < 20 , y(0) = y 0 (0) = 0.
0, t ≥ 20

Solução. Já sabemos que g(t) = u5 (t) − u20 (t). Aplicando a transformada de Laplace dos dois lados da
equação e usando a linearidade, obtemos

2L {y 00 } + L {y 0 } + 2L {y} = L {u5 (t)} − L {u20 (t)}.

Daı́,
−5s
 + 2L {y} = e − e−20s
2 s2 L {y} − s  − y 0 (0)
y(0) 
 + sL {y} − 
y(0) ,
s
portanto
e−5s − e−20s
L {y} = .
s(2s2 + s + 2)
Deixamos como exercı́cio para o leitor mostrar, usando frações parciais, que

1 1/2 s + 1/2
= − 2 .
s(2s2 + s + 2) s 2s + s + 2

Com isso,
 
1/2 1 s + 1/2
L {y} = e −5s −20s

−e − · 2
s 2 s + s/2 + 1
 
−5s −20s
 1/2 1 (s + 1/4) + 1/4
= e −e − ·
s 2 (s + 1/4)2 + 15/16
( " √ ! √ !#)
1 1 −t/4 15t 1 15t
−5s −20s
L − √ e−t/4 sen

= e −e − e cos
2 2 4 15 4
| {z }
h(t)

= e−5s L {h(t)} − e−20s {h(t)}


= L {u5 (t)h(t − 5) − u20 (t)h(t − 20)}.

A função h(t) acima foi introduzida para simplificar a notação. Assim,

y(t) = u5 (t)h(t − 5) − u20 (t)h(t − 20) .

3.4 Funções de impulso

Seja g(t) uma função que no intervalo (t0 − , t0 + ) assume valores “grandes” e que fora desse intervalo,
se anula. Vamos imaginar que g(t) trata-se de uma força que é aplicada em um objeto por um curto intervalo
de tempo. Assim, o impulso de g é dado por

Z ∞
I() = g(t)dt.
−∞
94 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Exemplo 3.4.1. Considere 


1/2, t ∈ (−, )
g(t) = δ (t) =
0, t∈/ (−, )
Observe que o impulso de δ é
Z ∞ Z 
1 1
I() = δ (t)dt = dt = · t| = 1 ,
−∞ − 2 2 −

qualquer que seja o valor de , desde que  6= 0. Assim, o impulso de δ é sempre igual a 1 para qualquer
intervalo de tempo considerado. Dizemos que δ é uma função de impulso unitário.
Vamos agora fazer com que a função δ atue em intervalos cada vez mais curtos, ou seja, vamos fazer
 → 0. Assim,
lim δ (t) = 0 (t 6= 0),
→0

já que estamos fazendo  → 0, e


lim I() = 1,
→0

já que esse valor não depende de . Essas duas informações nos permitem definir uma “função” de impulso
unitário δ satisfazendo
Z ∞
δ(t) = 0 se t 6= 0 e δ(t)dt = 1.
−∞

Essa função δ é denominada delta de Dirac. Observe que se Rt0 6= 0, o delta de Dirac centrado em t0 , isto é,

δ(t − t0 ), é definido pelas condiçoes δ(t − t0 ) = 0 se t 6= t0 e −∞ δ(t − t0 )dt = 1.
Para calcular a transformada de Laplace de δ(t − t0 ), usaremos o fato de que ela é definida como o limite
de δ (t − t0 ) quando  → 0, de modo que

L {δ(t − t0 )} = lim L {δ (t − t0 )}.


→0

Vamos supor, primeiramente, que t0 > 0. Como  → 0, então podemos assumir que t0 −  > 0. Além disso,
δ (t − t0 ) 6= 0 apenas para t ∈ (t − t0 , t + t0 ). Logo,
Z ∞
L {δ(t − t0 )} = lim L {δ (t − t0 )} = lim e−st δ (t − t0 )dt
→0 →0 0
Z t0 + Z t0 +
1
= lim e−st δ (t − t0 )dt = lim e−st · dt
→0 t −
0
→0 t −
0
2
Z t0 +  −st t0 +
1 1 1 1 e
= lim e−st = lim −
2 →0  t0 − 2 →0  s t0 −
1 e−s(t0 +) − e−s(t0 − 1 e−st0 e−s − e−st0 es
=− lim = − lim
2s →0  2s →0 
1 −st0 es − e−s
= e lim .
2s →0 
Pela Regra de L’Hospital, ficamos com

e−st0 ses + se−s e−st0


L {δ(t − t0 )} = lim = · 2s ∴ L {δ(t − t0 )} = e−st0 .
2s →0 1 2s

Podemos estender esse resultado para t0 = 0 fazendo t0 → 0 na fórmula acima, obtendo

L {δ(t)} = lim e−st0 = 1 .


→0

Vamos combinar todos os últimos conteúdos estudados nos próximos exemplos.


3.4. FUNÇÕES DE IMPULSO 95

Exemplo 3.4.2. Resolva o PVI

y 00 + 4y = δ(t − 1), y(0) = y 0 (0) = 0.

Solução. Aplicando a transformada de ambos os lados e usando a linearidade, transformamos a equação


em
L {y 00 } + 4L {y} = L {δ(t − 1)}.
Daı́,
s2 L {y} − s  − y 0 (0)
y(0) −s
 + 4L {y} = e ,


ou seja,
1 1 2
(s2 + 4)L {y} = e−s ⇒ L {y} = e−s · = · e−s · 2 .
s2 +4 2 s +4
De acordo com a tabela de transformadas, a última fração acima corresponde à transformada de sen(2t).
Como há multiplicação por uma exponencial, ocorrerá uma translação na transformada inversa, na qual
trocaremos t por t − 1, isto é,
1 −s 1
L {y} − · e L {sen(2t)} = L {u1 (t) sen [2(t − 1)]},
2 2
de modo que
1
y(t) = u1 (t) sen [2(t − 1)] .
2

No Exemplo a seguir será útil usar as transformadas de Laplace do seno e do cosseno hiperbólicos. Por
exemplo, lembramos que
ebt + e−bt
cosh(bt) = .
2
Com isso,
 
1  1 1 1 1 2s s
L {cosh(bt)} = L {ebt } + L {e−bt } = + = = .
2 2 s−b s+b 2 s2 − b2 s2 − b2

Analogamente, como
ebt − e−bt
senh(bt) = ,
2
temos
 
1  1 1 1 1 2b b
L {senh(bt)} = L {ebt } − L {e−bt } = − = = .
2 2 s−b s+b 2 s2 − b2 s2 − b2

Note como as fórmulas são semelhantes às do cosseno e seno usuais, mas nos denominadores um sinal de +
foi trocado por um de −, como era de se esperar já que para as funções hiperbólicas vale cosh2 (x)−senh2 (x) =
1.

Exemplo 3.4.3. Resolva o PVI

y 00 − y = 20δ(t − 3), y(0) = 1, y 0 (0) = 0.

Solução. Seguindo nosso caminho habitual, ficaremos com

L {y 00 } − L {y} = 20L {δ(t − 3)} ⇒ s2 L {y} − s y(0) −  − L {y} = 20e−3s .


y 0 (0)

|{z}
1
96 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Com isso, temos


1 s
(s2 + 1)L {y} = 20e−3s + s ⇒ L {y} = 20e−3s + = 20e−3s L {senh(t)} + L {cosh(t)},
s2 − 1 s2 − 1
de modo que

L {y} = L {20u3 (t) senh(t − 3) + cosh(t)} ∴ y(t) = 20u3 (t) senh(t − 3) + cosh(t) .

3.5 A convolução

Sejam f (t) e g(t) funções tais que F (s) = L {f (t)} e G(s) = L {g(t)}. Como podemos expressar F (s)G(s)
em termos de f e g? Infelizmente, o produto das transformadas não é igual à transformada do produto,
mas ainda podemos conseguir algo. Sabemos que
Z ∞ Z ∞
F (s)G(s) = L {f (t)}L {g(t)} = e−sx f (x)dx e−sy g(y)dy.
0 0

Como as variáveis de integração em cada integral são distintas, podemos escrever esse produto como uma
integral dupla, ou seja,
Z ∞Z ∞ Z ∞ Z ∞ 
−sx −sy −s(x+y)
F (s)G(s) = e e f (x)g(y)dxdy = g(y) e f (x)dx dy.
0 0 0 0

Vamos mudar a variável na integral de dentro para t = x + y, logo dt = dx e


Z ∞ Z ∞ 
−st
F (s)G(s) = g(y) e f (t − y)dt dy.
0 y

A região de integração, no plano ty, desta integral iterada corresponde a um setor infinito como o da Figura
3.5.1.

Figura 3.5.1: A região de integração da integral iterada.

Trocando a ordem de integração, note que y vai de 0 a t enquanto t vai de 0 a ∞. Daı́,

Z ∞
e−st ∞t0 f (t − y)g(y)dy dt .
 
F (s)G(s) =
0
3.5. A CONVOLUÇÃO 97

A função que aparece entre colchetes na expressão acima é chamada de convolução de f e g e é denotada
por f ? g. Dessa forma, temos
Z t
f ? g(t) = f (t − y)g(y)dy .
0

Pelo que vimos acima,


L {f (t)}L {g(t)} = L {f ? g(t)} .

Exemplo 3.5.1. Use a convolução para determinar L −1 {F (s)} se


1
F (s) = .
s3 (s2 + 1)
Solução. Sabemos que
1 1 1 2 1 1
F (s) = · = · 3· 2 = L {t2 }L {sen(t)} = L {t2 ? sen(t)}.
s3 s2 + 1 2 s s +1 2
Vamos, então, calcular a convolução acima. Temos
Z t Z t
t2 ? sen(t) = (t − y)2 sen(y)dy = (t2 − 2ty + y 2 ) sen(y)dy
0 0
Z t Z t Z t
= t2 sen(y)dy − 2t y sen(y)dy + y 2 sen(y)dy.
0 0 0

Após algumas integrais por partes (que ficam como exercı́cio para o leitor), chegamos a

t2 ? sen(t) = −t2 cos(y)|t0 − 2t(sen(y) − y cos(y))t0 − y 2 sen(y)|t0 + 2(sen(y) − y cos(y))t0 ,

isto é,
t2 ? sen(t) = −t2 cos(t) + t2 − 2t(sen(t) − t cos(t)) − t2 sen(t) + 2 sen(t) − 2t cos(t).
Organizando essa última expressão, concluı́mos que

L −1 {F (s)} = t2 + t2 cos(t) − t2 sen(t) − 2t cos(t) − 2t sen(t) + 2 sen(t) .

Algumas propriedades da convolução, as quais não demonstraremos, estão indicadas abaixo.

(1) f ? g = g ? f .
(2) f ? (g + h) = (f ? g) + h.
(3) (f ? g) ? h = f (g ? h).
(4) f ? 0 = 0.

Note que a primeira propriedade acima diz que


Z t Z t
f (t − y)g(y)dy = f (y)g(t − y)dy.
0 0

Será que a convolução do exemplo anterior seria mais simples pela segunda integral? Deixamos esta veri-
ficação como mais um exercı́cio para o leitor.
Exemplo 3.5.2. Resolva o PVI

y 00 + 4y 0 + 4y = g(t), y(0) = y 0 (0) = 0.


98 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE

Solução. Como não sabemos nada sobre a função g(t), deixaremos a resposta em termos de uma convolução.
Comecemos como habitualmente, aplicando a transformada de ambos os lados e usando a linearidade. Fi-
camos com
L {y 00 } + 4L {y 0 } + 4L {y} = L {g(t)}.
Daı́,
s2 L {y} − s  − y 0 (0)
y(0)  + 4(sL {y} − 
  + 4L {y} = L {g(t)},
y(0))
ou seja,
1
(s2 + 4s + 4)L {y} = L {g(t)} ⇒ (s + 2)2 L {y} = L {g(t)} ⇒ L {y} = L {g(t)} · .
(s + 2)2
Como
1
= L {te−2t },
(s + 2)2
segue que
L {y} = L {g(t)}L {te−2t } = L {g(t) ? (te−2t )}.
Com isso, podemos escrever

Z t
y(t) = g(t) ? (te−2t ) ou y(t) = g(t − y)ye−2y dy .
0

O Exemplo a seguir também poderia ser resolvido usando frações parciais (resolva-o assim também e
compare as resoluções). Mostramos uma resolução alternativa que usa a convolução.
Exemplo 3.5.3. Calcule L −1 {F (s)} se
s
F (s) =
(s + 1)(s2 + 4)
usando convolução.
Solução. Já sabemos que
1 s
= L {e−t } e 2 = L {cos(2t)}.
s+1 s +4
Dessa forma,
F (s) = L {e−t }L {cos(2t)} = L {e−t ? cos(2t)}.
Se calcularmos esta convolução teremos a nossa resposta. Observe que
Z t Z t Z t
e−t ? cos(2t) = e−(t−y) cos(2y)dy = e−t ey cos(2y)dy = e−t ey cos(2y).
0 0 0

Essa integral pode ser resolvida por duas integrações por partes. De fato, verifique que
ey (cos(2y) + 2 sen(2y))
Z
ey cos(2y)dy = .
5
Daı́,
t
e−t ey (cos(2y) + 2 sen(2y) e−t t
L −1 {F (s)} =

= e (cos(2t) + 2 sen(2t)) − 1 .
5 0 5
Assim,
cos(2t) + 2 sen(2t) − e−t
L −1 {F (s)} = .
5
3.5. A CONVOLUÇÃO 99

Exemplo 3.5.4. Determine L {f (t)} se


Z t
f (t) = e−(t−x) sen(2x)dx.
0

Solução. Basta observar que f (t) = e−t ? sen(2t). Onde deveria haver y na integral há x, mas isso não
é problema (a substituição y = x na integral não altera em nada o seu formato, só o nome da variável de
integração). Com isso,
1 2
L {f (t)} = L {e−t ? sen(2t)} = L {e−t }L {sen(2t)} = · 2 ,
s+1 s +4
isto é,
2
L {f (t)} = .
(s + 1)(s2 + 4)
100 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE
Capı́tulo 4

Séries de Fourier e Equações


Diferenciais Parciais

O problema de representar uma função como uma série infinita é bastante recorrente. Por exemplo,
sabemos que podemos representar uma função f (x) como série de potências usando as séries de Taylor. Sob
certas condições, temos que
X∞
f (x) = an (x − x0 )n ,
n=0
onde os coeficientes são dados em termos da função f como
f (n) (x0 )
an = .
n!
Nosso objetivo agora será representar uma função periódica como uma série de senos e cossenos.
Dada uma função periódica f , com perı́odo 2L, sua série de Fourier será definida como


a0 X   nπx   nπx 
SF (f )(x) = + an cos + bn sen .
2 n=1
L L

Convém relembrar o conceito de função periódica: diremos que f é periódica se existir T ∈ R (chamado
de perı́odo de f ) tal que f (x + T ) = f (x) para todo x. Também costumamos dizer que f é T -periódica. O
menor perı́odo positivo é o perı́odo fundamental de f . Por exemplo, f (x) = sen(x) tem perı́odo fundamental

igual a 2π, enquanto g(x) = sen(ax) tem perı́odo fundamental igual a .
|a|

4.1 Cálculo dos coeficientes de Fourier

Desejamos obter fórmulas para os coeficientes a0 , an e bn da série de Fourier de f (também conhecidos


como coeficientes de Fourier de f ). Para isso, usaremos as seguintes identidades:
Z L  nπx   mπx  
0, se n 6= m
(1) cos cos dx =
−L L L L, se n = m
Z L  nπx   mπx 
(2) cos sen dx = 0 para todos m, n ∈ N.
−L L L
Z L  nπx   mπx  
0, se n 6= m
(3) sen sen dx =
−L L L L, se n = m

101
102 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS
 nπx   nπx 
A segunda relação é a mais simples de ser demonstrada, pois cos é uma função par e sen ,
L L
portanto seu produto configura uma função ı́mpar que, integrada em um intervalo simétrico em relação à
origem, fornece zero como resultado.
Os cálculos para as outras duas relações são bem parecidos. A ideia é transformar o produto de cossenos
ou senos em soma ou subtração. Sabemos que
cos(A + B) = cos(A) cos(B) − sen(A) sen(B) e cos(A − B) = cos(A) cos(B) + sen(A) sen(B).
Com essas identidades encontramos o que queremos. Por exemplo,
cos(A + B) + cos(A − B)
cos(A) cos(B) = .
2
Assim, podemos resolver a integral no caso m 6= n fazendo

"Z  #
L L   Z L 
(n − m)πx
Z  nπx   mπx  1 (n + m)πx
cos cos dx = cos dx + cos dx
−L L L 2 −L L −L L
    L
1 L (n + m)πx L (n − m)πx
= sen + sen = 0,
2 (n + m)π L (n − m)π L −L

pois ao substituirmos x por ±L sempre obtemos senos de múltiplos inteiros de π, que valem zero.
Obviamente, o caso n = m não pode ser resolvido desta forma pois um dos denominadores se tornaria
igual a zero. A integral original se torna

Z L  nπx  Z L   
2 1 2nπx
cos dx = 1 + cos dx
−L L 2 −L L
  L
1 L 2nπx 1
= x+ sen = · 2L = L.
2 2nπ L −L 2
Novamente, a parte do seno dá zero pelo mesmo motivo da integração anterior. Note ainda que usamos a
identidade
1 + cos(2x)
cos2 (x) = .
2
A fórmula envolvendo o produto de senos pode ser demonstrada de forma análoga ao que acabamos de fazer
e fica como exercı́cio para o leitor.
Agora, usaremos as identidades acima para determinar os coeficientes de Fourier de uma função f 2L-
periódica. Suponha que vale a igualdade

a0 X   nπx   nπx 
f (x) = + an cos + bn sen
2 n=1
L L

e que podemos integrar termo a termo uma série desse tipo (de fato, podemos, mas a justificativa deste fato
foge aos propósitos destas notas). Dessa forma, integrando os dois lados da igualdade acima de −L a L,
obtemos

Z L !
a0 L
Z X Z L  nπx  Z L  nπx 
f (x)dx = dx + an cos dx + bn sen dx .
−L 2 −L n=1 −L L −L L
A primeira integral dentro do somatório vale zero, e motivo já está ficando repetitivo: ao integrarmos e
substituirmos x por L e −L, obteremos senos em múltiplos inteiros de π, os quais valem zero. Lembre-se
desse fato pois será importante nos exemplos. A segunda integral dentro do somatório também vale zero
uma vez que o integrando é uma função ı́mpar, integrada de −L a L. Assim,
Z L Z L
a0 a0 1
f (x)dx = x|L
−L = · 2L ∴ a0 = f (x)dx .
−L 2 2 L −L
4.1. CÁLCULO DOS COEFICIENTES DE FOURIER 103
 mπx 
Para determinar os an ’s, vamos multiplicar a igualdade entre f e sua série de Fourier por cos ,
L
onde m é um natural fixado. Assim, após integrar de −L a L, obtemos

Z L  mπx  Z L
a0  mπx 
f (x) cos dx = cosdx
−L L 2 −L L

" Z #
X L  nπx   mπx  Z L  nπx   mπx 
+ an cos cos dx + bn sen cos dx
n=1 −L L L −L L L

A primeira integral do lado direito vale zero, como vimos anteriormente. A terceira também vale zero,
de acordo com a identidade (2). Pela fórmula (1), a segunda integral vale 0 se n 6= m e vale L se n = m.
Então, o único termo que sobra na direita é am L. Daı́, temos
Z L
1  mπx 
am = f (x) cos dx .
L −L L

Deixamos como exercı́cio para o leitor repetir os passos acima, com as adaptações necessárias, para concluir
que
1 L
Z  mπx 
bm = f (x) sen dx .
L −L L

Resumindo, os coeficientes de Fourier de f são dados por


1 L 1 L L
Z Z  nπx  Z
1  mπx 
a0 = f (x)dx, an = f (x) cos dx, bn = f (x) sen dx.
L −L L −L L L −L L
Exemplo 4.1.1. Encontre os coeficientes de Fourier de

−x, se − 2 ≤ x < 0
f (x) = ,
x, se 0 ≤ x < 2
com f (x + 4) = f (x) para todo x.
Solução. Primeiramente, note que 2L = 4, logo L = 2. Assim,
1 2
Z
a0 = f (x)dx.
2 −2
Podemos separar a integral em duas partes e calculá-la, mas é mais fácil obter a área abaixo de seu gráfico,
ilustrado na Figura 4.1.1. Essa área é a soma das áreas dos dois triângulos sombreados, ou seja, vale 4,
portanto a0 = 2 .
O cálculo dos bn ’s é simples:
Z 2
1  nπx 
bn = f (x) sen dx = 0,
2 −2 2
pois o integrando é uma função ı́mpar (já que f é par e o seno é ı́mpar) e o intervalo de integração é simétrico
em torno da origem. Só falta calcular os an ’s, onde teremos algum trabalho:
1 2
Z  nπx  Z 2  nπx 
an = f (x) sen dx = f (x) sen dx,
2 −2 2 0 2
já que o integrando é uma função par e o intervalo de integração é simétrico em relação à origem (note que
dobramos a integral e tomamos apenas metade do intervalo de integração). Daı́,
Z 2  nπx 
an = x cos dx.
0 2
104 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS

Figura 4.1.1: Gráfico da função f do Exemplo 4.1.1.

Integrando por partes, obtemos

2 Z 2
2  nπx  2  nπx 
an = · x · sen − sen dx
nπ 2 nπ 0 2
| {z }0
0
4  nπx 2 4
= 2 2 cos = 2 2 (cos(nπ) − 1)
n π 2 0 n π
(
4 0, n par
n
= 2 2 ((−1) − 1) = 8 .
n π − 2 2 , n ı́mpar
n π

Observe que o termo destacado como zero tem esse valor por conta do argumento repetitivo dos múltiplos
inteiros de π. Fazendo n = 2k −1 para obtermos apenas os termos ı́mpares, concluı́mos que a série de Fourier
de f é

8 X 1  nπx 
SF (f )(x) = 1 − cos .
π2 (2k − 1)2 2
k=1

Ainda sobre a serie de Fourier acima, suponha que f (x) = SF (f )(x) (na próxima seção veremos quando
e onde isso ocorre) e faça x = 0. Então,

8 X 1
0 = f (0) = 1 − .
π2 (2k − 1)2
k=1

Daı́, uma reorganização da equação acima nos permite concluir que


X 1 1 1 1 1 π2
= 1 + + + + + · · · = .
(2k − 1)2 9 25 49 81 8
k=1

De agora em diante, poderemos usar séries de Fourier para calcular a soma de algumas séries numéricas
convergentes.
4.2. O TEOREMA DE FOURIER 105

4.2 O Teorema de Fourier

Na Seção anterior, vimos que a série de Fourier de uma função f , com perı́odo 2L, é

a0 X  nπx nπx 
SF (f )(x) = + an cos + bn sen ,
2 n=1
L L

onde Z L Z L Z L
1 1 nπx 1 nπx
a0 = f (x)dx, an = f (x) cos dx, bn = f (x) sen dx.
L −L L −L L L −L L
Nesta seção vamos determinar quando e onde uma função f 2L-perı́odica é igual à sua série de Fourier.
Teorema 4.2.1 (Teorema de Fourier). Seja f uma função 2L-periódica tal que f e f 0 sejam contı́nuas por
partes para −L ≤ x ≤ L. Então a série de Fourier de f converge para f nos pontos onde f for contı́nua e
f (x+ ) + f (x− )
para onde for descontı́nua. As notações f (x+ ) e f (x− ) indicam os limites laterais direito e
2
esquerdo de f em x, respectivamente.
Vejamos um par de exemplos para ilustrar possı́veis aplicações deste Teorema.
Exemplo 4.2.1. Seja f : R → R uma função periódica de perı́odo 2π que no intervalo [−π, π] é dada por
f (x) = x2 /4.
(a) Encontre a série de Fourier de f .
(b) Esboce o gráfico da série de Fourier de f no intervalo [−π, 3π].

X (−1)n+1
(c) Use o item (a) e o Teorema de Fourier para calcular a soma da série .
n=1
n2

Solução. Observe que f é uma função par. Daı́,


1 π
Z
bn = f (x) sen(nx)dx = 0,
π −π

pois o produto de uma função par por uma função ı́mpar é uma função ı́mpar, cuja integral em [−π, π] vale
zero. Além disso,
π
1 π x2 dx 1 x3 π2
Z
a0 = = ⇒ a0 = ,
π −π 4 4π 3 π 6
e !
π π
x2 x2 sen(nx) 2 π
Z Z
1 1 
an = cos(nx)dx =  − x sen(nx)dx
π π 4 π  n −π n −π

! !
π Z π π π
1 x cos(nx) cos(nx) 1 x cos(nx) sen(nx)

=− − + dx = − − + 2
2nπ n −π −π n 2nπ n −π n π

1 1 cos(nπ) (−1)n
= (π cos(nπ) − (−π) cos(−nπ)) = 2 (cos(nπ) + cos(−nπ)) = = .
2n2 π 2n n2 n2

Com isso, a série de Fourier de f é


π 2 X (−1)n
SF (f )(x) = + cos(nx) .
12 n=1 n2
106 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS

Figura 4.2.1: Gráfico da série de Fourier da função f do Exemplo 4.2.1, que coincide com o gráfico de f

Para esboçar o gráfico da série de Fourier de f , observe que essa função é contı́nua em toda a reta, logo
f é igual à soma de sua série de Fourier, de acordo com o Teorema de Fourier. Assim, podemos construir o
gráfico da série, que está exposto na Figura 4.2.1.

X (−1)n+1
Finamente, para calcular a soma da série , fazemos x = 0 em
n=1
n2

π 2 X (−1)n
f (x) = + cos(nx),
12 n=1 n2

que é uma igualdade válida pois sabemos que a série converge para a função em todo x real. Obtemos

∞ ∞ ∞
π 2 X (−1)n X (−1)n π2 X (−1)n+1 π2
0= + 2
⇒ − 2
= ⇒ 2
= .
12 n=1 n n=1
n 12 n=1
n 12


X (−1)n+1
No curso de Cálculo 3 nós vimos que uma série como é convergente. Para isso, podemos
n=1
n2
usar o Teste da Série Alternada, por exemplo. No entanto, na maioria dos casos não éramos capazes de dizer
qual o valor da soma da série, e o exemplo acima mostra que séries de Fourier podem ser usadas para isso,
como já havı́amos começado a verificar na Seção anterior. Vejamos outro exemplo:
Exemplo 4.2.2. Considere a função periódica de perı́odo 4 que no intervalo (−2, 2] é dada por

 x + 1, −2 < x ≤ −1
f (x) = 1 − x2 , −1 ≤ x ≤ 1 .
x − 1, 1 < x ≤ 2

(a) Esboce o gráfico de f no intervalo [−3, 5].


(b) Esboce o gráfico da série de Fourier de f em [−3, 5].
(c) Calcule o coeficiente a0 da série.

X
(d) Calcule a soma da série an .
n=1
4.2. O TEOREMA DE FOURIER 107

Solução. O gráfico da função f , no intervalo indicado, está exposto na Figura 4.2.2.

Figura 4.2.2: Gráfico da função f do Exemplo 4.2.2.

Vemos, assim, que f é contı́nua em todos os pontos do intervalo, com exceção de −2 e 2. Pelo Teorema
de Fourier, a série de Fourier de f converge para f nos pontos em que f é contı́nua e para a média aritmética
entre os limites laterais de f onde é descontı́nua. Tanto em −2 quanto em 2, a média entre os limites laterais
vale 0. Portanto, o gráfico da série é o exposto na Figura 4.2.3.

Figura 4.2.3: Gráfico da série de Fourier da função f do Exemplo 4.2.2.

Para calcular o coeficiente a0 , temos


Z −1
1 L 1 2
Z Z Z 1 Z 2 
1 2
a0 = f (x)dx = f (x)dx = (x + 1)dx + (1 − x )dx + (x − 1)dx .
L −L 2 −2 2 −2 −1 1

Observe, pela simetria no gráfico de f , que a primeira e a terceira integrais acima após o último sinal de
igualdade se cancelam. Resta apenas
1 1 1
x3
Z Z 
1 1 1 2
a0 = (1 − x2 )dx = ·2 (1 − x2 )dx = x− =1− = .
2 −1 2 0 3 0 3 3

Note que usamos o fato de que a função 1 − x2 é par, portanto sua integral no intervalo [−1, 1] é o dobro da
sua integral no intervalo [0, 1].
Daı́, a série de Fourier de f é

1 X nπx nπx 
SF (f )(x) = + an cos + bn sen .
3 n=1 2 2

Como f é contı́nua em x = 0, temos que SF (f )(0) = f (0) = 1, pelo Teorema de Fourier, portanto

∞ ∞ ∞
1 X 1 X X 2
+ (an cos 0 + bn sen 0) = 1 ⇒ + an = 1 ⇒ an = .
3 n=1 3 n=1 n=1
3
108 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS

Exemplo 4.2.3. Seja f : R → R uma função periódica de perı́odo 2π que no intervalo (−π, π] é dada por

0, −π < x ≤ 0
f (x) = .
x2 , 0 ≤ x ≤ π

(a) Esboce o gráfico de f no intervalo [−3π, 4π].


(b) Esboce o gráfico da série de Fourier de f em [−3π, 4π].
(c) Calcule a série de Fourier de f .

X 1
(d) Calcule a soma da série .
n=1
n2

Solução. O gráfico de f (x) está ilustrado na Figura 4.2.4.

Figura 4.2.4: Gráfico da função f do Exemplo 4.2.3.

Dessa vez, a função é descontı́nua apenas nos pontos −3π, −π, π e 3π. Pelo Teorema de Fourier, a série
converge para f (x) nos pontos onde f é contı́nua, e converge para a média aritmética entre os limites laterais
de f onde não o for. No nosso caso, a média entre os limites laterais nesses quatro pontos vale π 2 /2. Assim,
podemos esboçar o gráfico da série de Fourier de f como na Figura 4.2.5.

Figura 4.2.5: Gráfico da série de Fourier da função f do Exemplo 4.2.3.

Vejamos os coeficientes de Fourier. Temos

L π π
1 x3 π2
Z Z
1 1
a0 = f (x)dx = x2 dx = · = .
L −L π 0 π 3 0 3

Para an , precisaremos integrar por partes duas vezes:


Z L Z π
1 nπx 1
an = f (x) cos dx = x2 cos(nx)dx.
L −L L π 0
4.2. O TEOREMA DE FOURIER 109

Fazemos u = x2 e dv = cos(nx)dx, logo du = 2xdx e v = sen(nx)/n, de modo que


!
π Z π
1 x2 sen(nx)
 2
an =  − x sen(nx)dx .
π n 0 n 0

Agora, fazemos u = x e dv = sen(nx)dx, logo du = dx e v = − cos(nx)/n. Com isso,

π π π
2(−1)n
 Z  
2 x cos(nx) 1 2 π cos(nπ) 1 sen(nx)

an = − − + cos(nx)dx =− − + ·  = .
nπ n 0 n 0 nπ n n  n 0 n2

Para bn , novamente integramos duas vezes por partes:


1 π 2
Z
bn = x sen(nx)dx.
π 0

Faremos u = x2 e dv = sen(nx)dx, logo du = 2xdx e v = − cos(nx)/n, portanto


π
2 π
 2 Z 
1 x cos(nx)
bn = − + x cos(nx)dx .
π n 0 n 0

Agora, faremos u = x e dv = cos(nx)dx, de modo que du = dx, v = sen(nx)/n, e


!!
π Z π π
π 2 cos(nπ) π 2 (−1)n

1 2 x sen(nx) 1 1 2 cos(nx)
bn = − +   − sen(nx)dx = − + 2·
π n n n 0 n 0 π n n n 0

π 2 (−1)n π(−1)n+1 2 [(−1)n − 1]


 
1 2
= − + 3 (cos(nπ) − 1) = + .
π n n n πn3

Dessa forma, a série de Fourier de f é

∞ 
π 2 X 2(−1)n π(−1)n+1 2 [(−1)n − 1]
  
SF (f )(x) = + cos(nx) + + sen(nx) .
6 n=1
n2 n πn3

π2
Finalmente, pelo Teorema de Fourier, sabemos que SF (f )(π) = , mas como sen(nπ) = 0 para todo n
2
e cos(nπ) = (−1)n , a série torna-se

∞ ∞ ∞
π 2 X 2(−1)n (−1)n X 1 π2 π2 π2 X 1 π2
SF (f )(π) = + ⇒ 2 = − = ⇒ = .
6 n=1
n2 n=1
n2 2 6 3 n=1
n2 6

4.2.1 Identidade de Parseval

A identidade de Parseval consiste em uma fórmula que envolve os quadrados dos coeficientes de Fourier.
Sua demonstração foge aos objetivos destas notas, mas seu enunciado está apresentado a seguir, seguido de
uma aplicação em um exemplo.
Teorema 4.2.2 (Identidade de Parseval). Se f (x) tem série de Fourier

a0 X nπx nπx
+ an cos + bn sen ,
2 n=1
L L
110 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS

então
L ∞
a20 X 2
Z
1
|f (x)|2 dx = + (an + b2n ) .
L −L 2 n=1

Exemplo 4.2.4. Considere a função f (x) = 1 − |x| para −1 < x ≤ 1 e definida fora desse intervalo como

X
periódica de perı́odo 2. Na notação usual dos coeficientes de Fourier, calcule a2n .
n=1

Solução. Como f é par, temos bn = 0 e


1 1 1
x2
Z Z 
2
a0 = (1 − |x|)dx = 2 (1 − x)dx = 2 x − = 1.
1 0 0 2 0

Além disso,
1 1 1 1
x2
Z Z Z 
2
|1 − |x||2 dx = (1 − 2|x| + x2 )dx = 2 (1 − 2x + x2 )dx = 2 x − x2 + = ,
−1 −1 0 3 0 3

onde usamos o fato de que a função 1 − 2|x| + x2 é par e que |x| = x no intervalo [0, 1]. Pela identidade de
Parseval,
∞ ∞
2 1 X 2 X 1
= + an ⇒ a2n = .
3 2 n=1 n=1
6

4.3 Extensões periódicas de uma função

Suponha que f é uma função par e periódica de perı́odo 2L. Os coeficientes de sua série de Fourier são

1 L 1 L 1 L
Z Z Z
nπx nπx
a0 = f (x)dx, an = f (x) cos dx e bn = f (x) sen dx.
L −L L −L L L −L L
nπx nπx
Como f é par, temos que f (x) cos é par e f (x) sen é ı́mpar. Daı́,
L L
2 L 2 L
Z Z
nπx
a0 = f (x)dx, an = f (x) cos dx e bn = 0.
L 0 L 0 L
Logo, a série de Fourier de uma função par é

a0 X nπx
+ an cos ,
2 n=1
L

uma série de cossenos.


Analogamente, se f é uma função ı́mpar 2L-periódica, mostra-se que a0 = an = 0 e

2 L
Z
nπx
bn = f (x) sen dx.
L 0 L
Logo, a série de Fourier de uma função ı́mpar é

X nπx
bn sen ,
n=1
L
4.4. PROBLEMA DA CONDUÇÃO DO CALOR 111

uma série de senos.


Em várias situações que estudaremos adiante encontraremos funções definidas apenas no intervalo [0, L],
mas ainda assim vamos querer calcular uma série de Fourier para tal função. A saı́da será definir uma extensão
da função em toda a reta, de uma maneira apropriada. Se f : [0, L] → R, vamos escolher arbitrariamente
os valores de f em (−L, 0). Agora que temos uma nova função (que, por abuso de notação, também
chamaremos de f ) definida em (−L, L], definimos seus valores nos outros pontos de modo que ela seja uma
função 2L-periódica. Agora podemos calcular a série de Fourier de f .
Há infinitas formas de se completar a função no intervalo (−L, 0), como mencionamos acima. Duas
formas importantes são as extensões par e ı́mpar de f . Para obtê-las, basta definir f neste intervalo de
modo que f (−x) = f (x) para todo x ∈ (−L, L) (no caso de uma extensão par) ou f (−x) = −f (x) para
todo x ∈ (−L, L) (para o caso de uma extensão ı́mpar). Como vimos na página anterior, essas extensões nos
permitem representar f como série de cossenos ou de senos, respectivamente.

Exemplo 4.3.1. Represente a função f (x) = 1 − x, definida em [0, 1], como uma série de cossenos.

Solução. Vamos considerar a extensão par de f , com perı́odo 2. Como vimos, a série de Fourier é

a0 X
+ an cos(nπx),
2 n=1

onde 1
L 1
x2
Z Z 
2 2
a0 = f (x)dx = (1 − x)dx = 2 x − = 1 ,
L 0 1 0 2 0
e Z 1
2
an = f (x) cos(nπx)dx = 2 (1 − x) cos(nπx)dx.
1 0

Integrando por partes com u = 1 − x e dv = cos(nπx), temos du = −dx e v = sen(nπx)/(nπ). Daı́,


1 Z 1
2 [(−1)n − 1]
 
(1 − x) sen(nπx)

  1 2
an = 2  + sen(nπx)dx = − 2 2 cos(nπx)10 = − ,
   nπ 0 nπ 0 n π n2 π 2

4
que vale 0 quando n é par e vale quando n é ı́mpar. Dessa forma, a série de cossenos de f é
n2 π 2

1 4 X 1
+ · cos(nπx) .
2 π2 n2
n ı́mpar

4.4 Problema da condução do calor

Considere uma barra homogênea de comprimento L. Suponha que o calor flui apenas ao longo do eixo
da barra. É possı́vel mostrar que, se u(x, t) é a distribuição de temperaturas no ponto x ∈ [0, L] no instante
t, então u satisfaz a equação
α2 uxx = ut .

Essa equação é chamada de equação do calor, e a constante α2 é o coeficiente de difusividade térmica


da barra, que depende do material do qual ela é feita.
Suponha que as extremidades da barra são mantidas à temperatura fixa de 0◦ C (chamamos essas in-
formações de condições de contorno e que a distribuição inicial de temperaturas é dada pela função f (x),
112 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS

definida no intervalo [0, L]. Para determinar qual é a função u(x, t) precisamos resolver o problema de valores
iniciais e de contorno  2
 α uxx = ut , 0 < x < l, t > 0
u(0, t) = u(L, t) = 0, t > 0 .
u(x, 0) = f (x), 0 < x < L

Faremos isso usando o Método de Separação de Variáveis, que consiste em supor que a solução
u(x, t) é da forma
u(x, t) = X(x)T (t) ,

isto é, o produto de uma função que depende só de x por outra que depende somente de t. Assim, temos
uxx = X 00 T e ut = XT 0 , de modo que a equação do calor pode ser reescrita como α2 X 00 T = XT 0 , ou seja,

X 00 1 T0
= 2· .
X α T

Na última igualdade, o lado esquerdo depende apenas de x, enquanto o lado direito depende apenas de t.
Como x e t são variáveis independentes uma da outra, a única possibilidade para que essa equação seja
verdadeira é que os dois lados sejam iguais a uma constante, a qual chamaremos de λ. Assim,
X 00 1 T0
= 2· =λ
X α T
nos fornece duas equações diferenciais ordinárias

X 00 − λX = 0 e T 0 − λα2 T = 0 .

O método já se mostra útil, pois converteu uma equação diferencial parcial em duas EDOs, as quais já
sabemos resolver.
No começo do problema fizemos a imposição u(0, t) = u(L, t) = 0 para todo t > 0. Vejamos como essas
condições se expressam em termos das funções X e T . Note que 0 = u(0, t) = X(0)T (t). Logo, X(0) = 0
ou T (t) = 0 para todo t. Se T (t) = 0, terı́amos u(x, t) = 0 sempre, uma situação que não é nem um
pouco interessante. Impomos, então, X(0) = 0. Pela mesma razão, impomos também X(L) = 0. Com isso,
precisamos resolver a EDO X 00 − λX = 0 sujeita às condições de fronteira X(0) = X(L) = 0, porém nada
sabemos, ainda, sobre a constante λ. Por conta disso, precisamos analisar cada possibilidade acerca do sinal
de λ separadamente.
Se λ > 0, escrevemos λ = µ2 . A equação fica X 00 − µ2 X = 0, cuja equação caracterı́stica é r2 − µ2 = 0,
que tem r = ±µ como raı́zes. A solução é

X(x) = C1 eµx + C2 e−µx .

Agora aplicamos as condições de fronteira

X(0) = C1 + C2 = 0 e X(L) = C1 eµL + C2 e−muL = 0.

Desse modo, temos o sistema 


C1 + C2 = 0
.
C1 eµL + C2 e−µL = 0
COmo o determinante desse sistema homogêneo é claramente diferente de zero, concluı́mos que a única
solução é C1 = C2 = 0, logo X(x) = 0 e u(x, t) = 0, o que não convém.
Agora, se λ = 0, a equação fica X 00 = 0, logo X(x) = C1 x + C2 . Como X(0) = C2 = 0 e X(L) =
C1 L + C2 = 0, concluı́mos que C1 = C2 = 0 e novamente obtemos apenas soluções nulas.
Finalmente, no caso λ < 0, escrevemos λ = −µ2 . A EDO fica X 00 + µ2 X = 0, cuja equação caracterı́stica
é r + µ2 = 0, que tem r = ±µi como raı́zes. A solução é
2

X(x) = C1 sen(µx) + C2 cos(µx).


4.4. PROBLEMA DA CONDUÇÃO DO CALOR 113

Com as condições iniciais, temos

X(0) = C1 sen 0 + C2 cos 0 = C2 = 0

e
X(L) = C1 sen(µL) = 0.
Para termos soluções não nulas, precisamos ter sen(µL) = 0, logo µL = nπ, isto é,

nπ n2 π 2
µ= e λ=− .
L L2

Para cada n obtemos uma função  nπx 


Xn (x) = sen
L
que é solução da equação.
Com isso, voltamos para resolver a equação envolvendo T com o valor encontrado para λ. Temos

n2 π 2 α 2
T0 + T = 0,
L2
que é uma equação de variáveis separáveis de solução

 2 2 2 
n π α
Tn (t) = exp − t .
L2

Como u(x, t) = X(x)T (t), então para cada n ∈ N obtemos uma solução fundamental

n2 π 2 α 2
 nπx   
un (x, t) = Xn (x)Tn (t) = sen exp − t .
L L2

Como anteriormente, a solução geral será dada pelas combinações lineares das soluções fundamentais. A
diferença é que aqui temos uma quantidade infinita de soluções fundamentais, de modo que a solução geral
é uma série infinita
∞  2 2 2 
X n π α  nπx 
u(x, t) = cn exp − t sen .
n=1
L2 L

Para terminar, falta apenas determinar os coeficientes. Aplicando a condição inicial u(x, 0) = f (x),
obtemos
X∞  nπx 
f (x) = cn sen .
n=1
L

Desse, os cn ’s são os coeficientes da série de Fourier de senos de f (x) (isto é, os coeficientes de Fourier de
sua extensão ı́mpar). Portanto,

2 L
Z  nπx 
cn = f (x) sen dx .
L 0 L

Exemplo 4.4.1. Uma barra com comprimento π e difusividade térmica α2 = 1 é isolada lateralmente de
modo que o calor só pode fluir ao longo do eixo. Se suas extremidades são mantidas à temperatura fixa
T = 0, determine a distribuição de temperatura ao longo do tempo, sabendo que a distribuição inicial de
temperaturas é descrita pela função f (x) = x, 0 < x < π.
114 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS

Solução. O problema pode ser escrito como



 uxx = ut , 0 < x < π, t > 0
u(0, t) = u(π, t) = 0, t > 0 .
u(x, 0) = f (x) = x, 0 < x < π

Sabemos que a solução tem a forma


X
u(x, t) = cn exp(−n2 t) sen(nx) ,
n=1

pois L = π e α2 = 1. Os coeficientes cn são os mesmos da série de Fourier de senos de f (x) = x, isto é,
2 π
Z
cn = x sen(nx)dx.
π 0
Fazendo u = x e dv = sen(nx)dx, temos du = dx e v = − cos(nx)/n. Pela fórmula de integração por partes,
π π
1 π
 Z    
2 x cos(nx) 2 x cos(nx) sen(nx) 2 π cos(nπ)
cn = − + cos(nx)dx = − + = − .
π n 0 n 0 π n n2 0 π n
Daı́,
2(−1)n 2(−1)n+1
cn = − = .
n n
Portanto, a solução é

X (−1)n+1 exp(−n2 t) sen(nx)
u(x, t) = 2 .
n=1
n

4.4.1 Problema não homogêneo do calor

Acabamos de resolver o problema homogêneo do calor, isto é, com as extremidades da barra mantidas
à temperatura fixa de 0◦ C. Vamos mostrar agora que, se as extremidades forem mantidas a temperaturas
diferentes de zero, podemos reduzir esse novo problema ao anterior usando um pouco de Fı́sica. Formalmente,
o que queremos fazer é resolver o problema
 2
 α uxx = ut , 0 < x < L, t > 0
u(0, t) = T1 , u(L, t) = T2 , t > 0 .
u(x, 0) = f (x) = x, 0 < x < L

Fisicamente, sabemos que, quando t → ∞¡ a distribuição de temperaturas na barra vai atingir um estado
estacionário v(x), referente ao equilı́brio térmico, que não varia com o tempo. Como v(x) é uma distribuição
de temperaturas na barra, ele deve satisfazer a equação do calor, portanto α2 v 00 = vt = 0, ou seja, v 00 = 0,
portanto
v(x) = C1 x + C2 .

Como v(x) também deve satisfazer as condições de fronteira, vemos que v(0) = T1 , logo C2 = T1 ,
T2 − T1
enquanto T2 = v(L) = c1 L + T1 , ou seja, C1 = . Desse modo, a distribuição estacionária é
L
 
T2 − T1
v(x) = x + T1 .
L
4.4. PROBLEMA DA CONDUÇÃO DO CALOR 115

Agora, vamos supor que a solução do problema não homogêneo pode ser escrita na forma
u(x, t) = v(x) + w(x, t).
Precisamos determinar qual é a função w. Primeiramente, note que
uxx = v 00 + wxx = wxx e ut = vt + wt = wt ,
logo w satisfaz a equação do calor, já que u a satisfaz. Note também que
T1 = u(0, t) = v(0) + w(0, t) = T1 + w(0, t)
e
T2 = u(L, t) = v(L) + w(L, t) = T2 + w(L, t),
ou seja,
w(0, t) = w(L, t) = 0.
Finalmente,
f (x) = u(x, 0) = v(x) = w(x, 0) ⇒ w(x, 0) = f (x) − v(x).
O que acabamos de mostrar foi que w(x, t) é a solução de um problema homogêneo do calor, que é dado
por  2
 α wxx = wt , 0 < x < L, t > 0
w(0, t) = w(L, t) = 0, t > 0 .
w(x, 0) = f (x) − v(x), 0 < x < L

 
T2 − T1
Assim, para resolver o problema não homogêneo, encontramos a distribuição estacionária v(x) = x+
L
T1 e escrevemos u(x, t) = v(x) + w(x, t), onde w(x, t) é solução do problema homogêneo associado acima.
Repare que o que vimos acima funciona quase da mesma forma que as equações diferenciais ordinárias linea-
res de segunda ordem: a solução do problema não homogêneo corresponde à soma de uma solução particular
desse problema (o estado estacionário) com a solução de um problema homogêneo associado.
Exemplo 4.4.2. Resolva o problema

 uxx = ut , 0 < x < π, t > 0
u(0, t) = 2π, u(π, t) = π, t > 0 .
u(x, 0) = 2π, 0 < x < L

Solução. A distribuição estacionária é


 
π − 2π
v(x) = x + 2π = −x + 2π .
π
A solução é da forma u(x, t) = v(x) = w(x, t), onde w(x, t) é solução do problema homogêneo associado

 wxx = wt , 0 < x < π, t > 0
w(0, t) = w(π, t) = 0, t > 0 .
w(x, 0) = 2π − (−x + 2π) = x, 0 < x < L

Esse problema é o mesmo que resolvemos no Exemplo anterior, cuja solução é



X (−1)n+1 exp(−n2 t) sen(nx)
w(x, t) = 2 ,
n=1
n

portanto a solução é

X (−1)n+1 exp(−n2 t) sen(nx)
u(x, t) = −x + 2π + 2 .
n=1
n
116 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS

4.4.2 Barra com extremidades isoladas

Se não há fluxo de calor em uma das extremidades, a condição de fronteira satisfeita nesse ponto é ux = 0,
pois, no ponto, não há troca de calor com o ambiente: nem entra calor nem perde-se calor. Assim, se a barra
possui as duas extremidades isoladas, temos o problema
 2
 α uxx = ut , 0 < x < L, t > 0
ux (0, t) = ux (L, t) = 0, t > 0 .
u(x, 0) = f (x), 0 < x < L

Para obter a solução, usamos novamente o método de separação de variáveis. Começamos supondo que
a solução é da forma
u(x, t) = X(x)T (t).
Logo, α2 X 00 T = XT 0 , ou seja,
X 00 1 T0
= 2 .
X α T
Novamente, isso só é possı́vel se ambos os lados forem iguais a uma constante λ. Isso nos fornece as equações
X 00 − λX = 0 e T 0 − λα2 T = 0.
Das condições de fronteira, obtemos

0 = ux (0, t) = X 0 (0)T (t) ⇒ X 0 (0) = 0,

e
0 = ux (L, t) = X 0 (L)T (t) ⇒ X 0 (L) = 0.
Agora, resolvemos a EDO envolvendo a função X(x) com essas condições de fronteira, separando em casos
de acordo com o sinal de λ.
Se λ > 0, escrevemos λ = µ2 . A equação fica X 00 − µ2 X = 0, com equação caracterı́stica r2 − µ2 = 0,
que tem raı́zes r = ±µ. A solução é
X(x) = C1 eµx + C2 e−µx .
Daı́, temos
X 0 (x) = µC1 eµx − µC2 e−µx ,
logo X 0 (0) = µC1 − µC2 = 0 e X 0 (L) = µC1 eµL − µC2 e−µL = 0. Como uma equação não é múltipla da
outra, a única possibilidade é C1 = C2 = 0, o que nos fornece apenas soluções nulas.
Se λ = 0, a equação fica X 00 = 0, logo X(x) = C1 x + C2 . Daı́, X 0 (x) = C1 , portanto X 0 (0) = X 0 (L) =
C1 = 0. Resta apenas X(x) = C2 , que pode ser uma solução não nula. Para que fique no formato das
c0
séries de Fourier, vamos escrever X0 (x) = como a primeira solução fundamental obtida por separação de
2
variáveis.
Finalmente, se λ < 0, escrevemos λ = −µ2 . A EDO é X 00 + µ2 X = 0, cuja equação caracterı́stica é
r + µ2 = 0, com raı́zes r = ±µi. A solução é
2

X(x) = C1 sen(µx) + C2 cos(µx).

Daı́,
X 0 (x) = µC1 cos(µx) − µC2 sen(µx),
logo X 0 (0) = µC1 = 0, ou seja, C1 = 0. Além disso, X 0 (L) = −µC2 sen(µL) = 0, o que produz soluções não
nulas se sen(µL) = 0, isto é, se µL = nπ. Daı́,

nπ n2 π 2
µ= e λ=− .
L L2
Agora, resolvemos a EDO relativa à função T (t) usando o valor calculado para λ. Esta equação é

n2 π 2 α2
T0 + T = 0,
L2
4.5. EQUAÇÃO DA ONDA 117

uma EDO separável de solução


n2 π 2 α 2
 
T (t) = K exp − t .
L2
Daı́, para cada inteiro positivo n,
 nπx   2 2 2 
n π α
Xn (x) = cos(µx) = cos e Tn (t) = exp − t .
L L2

No caso λ = 0, a equação para T (t) fica T 0 = 0, logo T (t) = K e obtemos, removendo a constante K e
c0
deixando apenas o fator 1, T0 (t) = 1 e X0 (x) = . Com isso, as soluções fundamentais são
2
 2 2 2 
c0 n π α  nπx 
u0 (x, t) = e un (x, t) = Xn (x)Tn (t) = exp − t cos .
2 L2 L

A solução geral u(x, t) é obtida pelas combinações lineares das soluções fundamentais (note que já temos
uma constante em u0 ). Assim, temos

∞  2 2 2 
c0 X n π α  nπx 
u(x, t) = + cn exp − t cos .
2 n=1
L2 L

Para determinar os coeficientes, usamos a condição inicial u(x, 0) = f (x). Logo, temos

c0 X  nπx 
+ cn cos = f (x),
2 n=1
L

ou seja, os coeficientes são os mesmos da série de Fourier de cossenos de f (tecnicamente, os de sua extensão
par), que são dados por

Z L Z L
2 2  nπx 
c0 = f (x)dx e cn = f (x) cos dx .
L 0 L 0 L

4.5 Equação da onda

Nesta seção nós vamos considerar o movimento de uma corda na qual uma onda se propaga com velocidade
a. Vamos supor que a corda tem comprimento L e que suas extremidades estão fixas a uma altura igual a
0. Além disso, digamos que a posição inicial da corda é dada por uma função f (x), 0 ≤ x ≤ L, e que sua
velocidade transversal inicial é g(x), 0 ≤ x ≤ L. Para termos compatibilidade entre nossas suposições, note
que precisamos ter f (0) = f (L) = 0 (pois as extremidades são mantidas à altura 0) e g(0) = g(L) = 0 (já
que as extremidades estão paradas).
É possı́vel mostrar que a posição u(x, t) de um ponto da corda no instante t satisfaz a equação da onda

a2 uxx = utt , 0 < x < L, t > 0.

Logo, o problema da onda em uma corda pode ser representado matematicamente como
 2

 a uxx = utt , 0 < x < L, t > 0
u(0, t) = u(L, t) = 0, t > 0

.

 u(x, 0) = f (x), 0 < x < L
ut (x, 0) = g(x), 0 < x < L

118 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS

Estudaremos o caso g(x) ≡ 0, ou seja, em que a corda parte do repouso, sem velocidade inicial. Assim,
o problema proposto é  2
 a uxx = utt , 0 < x < L, t > 0

u(0, t) = u(L, t) = 0, t > 0

.

 u(x, 0) = f (x), 0 < x < L
ut (x, 0) = 0, 0 < x < L

Novamente, usaremos o método de separação de variáveis. Suponha que u(x, t) = X(x)T (t). Logo,
a2 X 00 T = XT 00 , e então
X 00 1 T 00
= 2 .
X a T
Essa equação só pode ser satisfeita se ambos os lados forem iguais a uma constante λ ∈ R. Obtemos as
equações
X 00 − λX = 0 e T 00 − λa2 T = 0.
Note que 0 = u(0, t) = X(0)T (t) implica X(0) = 0. Analogamente, X(L) = 0. Isso indica que devemos
analisar a equação X 00 − λX = 0 sujeita às condições de contorno X(0) = X(L) = 0. Esse é o mesmo
problema que resolvemos anteriormente quando estudamos a equação do calor. Aproveitamos os cálculos já
feitos e escrevemos as soluções fundamentais como
 nπx 
Xn (x) = sen ,
L
onde λ = −n2 π 2 /L2 .
De posse desse valor de λ, resolvemos a equação envolvendo a função T , que torna-se
n2 π 2 a2
T 00 + T = 0.
L2
A equação caracterı́stica é
n2 π 2 a 2
r2 + = 0,
L2
nπa
logo r = ± i. A solução é
L
   
nπat nπat
T (t) = K1 sen + K2 cos .
L L
Para simplificar, escrevamos
T (t) = K1 sen(αt) + K2 cos(αt)
por enquanto. Sabemos que ut (x, 0) = 0, mas ut (x, t) = X(x)T 0 (t), logo X(x)T 0 (0) = 0, ou seja, T 0 (0) = 0.
Assim,
T 0 (t) = αK1 cos(αt) − αK2 sen(αt) ⇒ T 0 (0) = αK1 = 0.
Como α = nπa/L, vemos que α 6= 0, portanto K1 = 0 e as soluções fundamentais são
 
nπat
Tn (t) = cos .
L
Desse modo, as soluções fundamentais do problema da onda possuem a forma

 nπx   
nπat
un (x, t) = sen cos ,
L L

onde n é um inteiro positivo, e a solução geral é obtida pelo princı́pio da superposição tomando combinações
lineares dessas funções, ou seja,

∞  nπx   
X nπat
u(x, t) = cn sen cos .
n=1
L L
4.5. EQUAÇÃO DA ONDA 119

Para determinar os coeficientes, basta fazer t = 0. Obtemos



X  nπx 
u(x, 0) = cn sen = f (x),
n=1
L

portanto os coeficientes são mesmos da série de Fourier de senos de f (x) (isto é, de sua extensão ı́mpar
2L-periódica), dados por
2 L
Z  nπx 
cn = f (x) sen dx .
L 0 L

Exemplo 4.5.1. Resolva o problema de valor inicial e de contorno dado por




 uxx = utt . 0 < x < 1, t > 0
u(0, t) = u(1, t) = 0, t > 0

.

 u(x, 0) = 2 sen(3πx) − sen(5πx)
ut (x, 0) = 0

Solução. Trata-se de um problema de uma onda que se desloca em uma corda de comprimento L = 1 e
com velocidade a = 1. Sabemos que a solução é da forma

X
u(x, t) = cn sen(nπx) cos(nπt)
n=1

e temos

X
cn sen(nπx) = u(x, 0) = 2 sen(3πx) − sen(5πx).
n=1

Por comparação, os únicos coeficientes não nulos da série são c3 = 2 e c5 = −1, portanto a série tem apenas
dois termos, na prática, e a solução do problema é

u(x, t) = 2 sen(3πx) cos(3πt) − sen(5πx) cos(5πt) .

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