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João A. M. Gondim
1 de dezembro de 2021
ii
Sumário
3 Transformada de Laplace 79
3.1 Definição e primeiras propriedades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
3.1.1 Transformada de Laplace Inversa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
3.2 Problemas de Valor Inicial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
3.3 Função degrau unitário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
3.4 Funções de impulso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
3.5 A convolução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96
iii
iv SUMÁRIO
Uma equação diferencial consiste de uma equação, cuja incógnita é uma função y(x), envolvendo
derivadas de y (e, opcionalmente, x e y). Por exemplo,
y0 = x
As funções que satisfazem essa equação, de acordo com o Teorema Fundamental do Cálculo, possuem a
forma
x2
y(x) = + C,
2
onde C é uma constante real. Dizemos que a expressão acima é a solução geral da equação (para cada
valor de C temos uma função que satisfaz a equação, ou seja, uma solução).
Um outro exemplo é a equação
y0 = y
Nesse caso, não é tão simples determinar a solução geral quanto no exemplo anterior, mas sabemos que
uma função que, ao ser derivada, resulta em si mesma é a exponencial y(x) = ex . Mais geralmente, a solução
geral é
y(x) = Kex ,
onde K ∈ R. A derivada y 0 não precisa aparecer na equação, mas alguma derivada precisa. Por exemplo,
no caso de
y 00 = −y,
podemos ver que duas soluções são y1 (x) = sen x e y2 (x) = cos x. Além disso, veremos ao longo do curso
que a solução geral é
y(x) = λ1 sen x + λ2 cos x,
onde λ1 e λ2 são reais. Finalmente, equações como
∂y ∂2y
α2 =
∂t ∂x2
envolvem derivadas parciais, por isso dizemos que trata-se de uma equação diferencial parcial, ou sim-
plesmente EDP. Quando não há derivadas parciais, como nos demais exemplos, dizemos que a equação é
uma equação diferencial ordinária, ou EDO, que será o assunto principal destas notas.
A ordem de uma EDO é a maior ordem de derivada que aparece na equação. Por exemplo, y 0 = y é de
primeira ordem, enquanto y 00 = −y é de segunda ordem. O primeiro capı́tulo deste curso abordará as EDOs
de primeira ordem. Nem toda EDO pode ser resolvida analiticamente, isto é, em geral não conseguimos
determinar a solução geral de uma equação qualquer. Veremos cinco casos em que isto é possı́vel nas
próximas seções.
1
2 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
y 0 = f (x)g(y), (1.2.1)
ou seja, y 0 é igual ao produto de uma função que depende apenas de x por uma que depende apenas de
y. Para resolver uma equação deste tipo, escrevemos y 0 como dy/dx e separamos as variáveis dividindo por
g(y) e “multiplicando” por dx. Assim, a equação passa à forma
1
dy = f (x)dx, (1.2.2)
g(y)
ou seja, separamos asvariáveis (de um lado a única variável é y, enquanto do outro, é x). Agora, basta
integrar os dois lados.
Por que isso dá certo? Afinal, multiplicar por dx não é algo formalmente correto... De fato, é correto
escrever a equação na forma
1 dy
= f (x).
g(y) dx
Agora, suponha que G(y) e F (x) são, respectivamente, primitivas de 1/g(y) e de f (x). Isso significa que
dG(y) 1
= e F 0 (x) = f (x)
dy g(y)
Lembrando que y é uma função de x, a Regra da Cadeia nos permite derivar G(y) em função de x:
dG(y) dG(y) dy 1 dy
= = = f (x)
dx dy dx g(y) dx
por conta da forma em que escrevemos a EDO. Assim, G(y) e F (x) possuem mesma derivada em relação a
x, logo existe uma constante C tal que
G(y) = F (x) + C
Observe que Z Z
1
dy = G(y) + C1 e f (x)dx = F (x) + C2 ,
g(y)
portanto quando integramos os dois lados da equação (1.2.2) obtemos
G(y) + C1 = F (x) + C2 ,
que é exatamente o mesmo que G(y) = F (x) + C com C = C2 − C1 , como vimos no parágrafo anterior. Isso
mostra que é válido “multiplicar” por dx (apesar de haver Teoremas importantes por trás deste truque).
Vejamos alguns exemplos.
Exemplo 1.2.1. Resolva a equação y 0 = y.
Solução. Já sabemos como deve ser a solução geral neste caso, mas vamos resolver a equação usando o
processo acima. Temos
dy
y0 = y ⇒ =y
dx
dy
⇒ = dx
y
Z Z
dy
⇒ = dx
y
⇒ ln |y| = x + C
1.2. EDO SEPARÁVEL 3
Se pararmos neste ponto, dizemos que a soluçção geral está na forma implı́cita (onde C é uma constante),
pois y não está isolado. Ainda podemos melhorar a expressão final, escrevendo
|y| = ex+C = ex eC
Como eC também é uma constante, vamos escrever λ = eC , de modo que |y| = λex . Daı́, y(x) = ±λex , mas
como λ é constante, ±λ também é, e escrevemos K = ±λ. Assim, a solução geral, em forma explı́cita, é
y(x) = Kex
Algumas observações precisam ser feitas. Primeiramente, em cada etapa costumamos atualizar o valor
da constante. Como ficam muitas constantes diferentes, em geral chamamos todas elas pelo mesmo “nome”.
Assim, quando chegamos a |y| = eC ex , irı́amos escrever |y| = Cex , onde esta nova constante C não é a
mesma da equação anterior, nem estamos criando uma equação C = eC . A partir do próximo exemplo
usaremos uma mesma letra para a constante em todas as etapas do problema.
Note também que, pela forma que resolvemos, K não pode ser zero. Isso decorre de termos dividido por
y na resolução, logo y não poderia ser zero, o que forneceria λ = 0. No entanto, y ≡ 0 (significa y constante,
igual a zero) também é solução da EDO! Soluções constantes, como essa, são chamadas de soluções de
equilı́brio. Essa solução entra na solução geral se liberarmos λ = 0, mas nem sempre é possı́vel incluir a
solução de equilı́brio na fórmula geral, portanto é importante começar sempre procurando por tais soluções.
Como encontrar soluções de equilı́brio? Bem, se y ≡ K é solução, temos y 0 = 0, logo a EDO fica
0 = f (x)g(K)
para todo x. Para que isso ocorra, K tem que ser uma raiz da parte da EDO que depende apenas de y.
Uma outra forma de pensar é ver se dividimos por alguma função de y nos cálculos. No exemplo acima,
dividimos por y, portanto y não pode ser zero, e y ≡ 0 é solução. Se tivéssemos dividido por y − 1, então y
não poderia ser igual a 1, logo y ≡ 1 que seria a solução constante procurada.
Observe ainda que a EDO tem infinitas soluções. Em outras situações, temos uma condição inicial
y(x0 ) = y0 e um Problema de Valor Inicial, ou simplesmente PVI (também chamado de Problema de
Cauchy)
y0
= f (x, y)
y(x0 ) = y0
Nesse caso, queremos a solução da EDO que cumpre a condição inicial, o que consiste em determinar o valor
exato da constante que aparece na solução geral.
Para compreender problemas de valor inicial, imagine um corpo em queda livre. Como a aceleração é
igual à segunda derivada da posição S(t), então podemos modelar o problema como uma EDO de segunda
ordem
S 00 = g,
onde g é a aceleração da gravidade. Integrando duas vezes, obtemos a solução geral
gt2
S(t) = S0 + V0 t + ,
2
com duas constantes S0 e V0 que correspondem à posição e à velocidade iniciais, respectivamente (S(0) e
S 0 (0)). Há infinitas soluções para esse problema, mas quando fixamos as condições iniciais, há exatamente
uma solução para a equação. Nos exemplos que resolveremos inicialmente, todo PVI terá uma única solução,
mas isso nem sempre ocorre. Esses casos mais estranhos serão analisados posteriormente.
x2
Exemplo 1.2.2. Resolva a equação y 0 =
y
4 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
Solução. Primeiramente, note que f (x) = x2 e g(y) = 1/y. Como não existe nenhuma constante K tal que
g(K) = 0, não há nenhuma solução de equilı́brio. Também poderı́amos concluir isso notando que, ao separar
as variáveis, vamos multiplicar por y, e não dividir, como no Exemplo anterior. Temos, então
x2 dy x2
y0 = ⇒ =
y dx y
⇒ ydy = x2 dx
Z Z
⇒ ydy = x2 dx
y2 x3
⇒ = +C
2 3
é a solução (implı́cita) da EDO. Note que não é possı́vel isolar y e ficar com somente um resultado, pois
terı́amos r r
2x3 2x3
y(x) = + C ou y(x) = − +C
3 3
2x
Exemplo 1.2.3. Resolva o PVI y 0 = , y(0) = −2.
y + x2 y
Solução. Observe que a equação pode ser reescrita como
2x 2x 1
y0 = 2
=
y(1 + x ) 1 + x2 y
Assim, novamente não existem soluções de equilı́brio (pois vamos multiplicar por y e não dividir). Separando
as variáveis, temos
2x 1 dy 2x 1
y0 = 2
⇒ =
1+x y dx 1 + x2 y
2xdx
⇒ ydy =
Z 1 +Z x2
2xdx
⇒ ydy = (u = 1 + x2 , du = 2xdx)
1 + x2
2 Z
y du
⇒ =
2 u
y2
⇒ = ln |u| + C
2
y2
⇒ = ln(1 + x2 ) + C
2
é a solução (implı́cita) da equação. Como temos um PVI, devemos impor a condição inicial substituindo
x = 0 e y = −2, logo
4
= ln(1 + 02 ) + C ⇒ C = 2
2
Daı́,
y2
= ln(1 + x2 ) + 2 ⇒ y 2 = 2 ln(1 + x2 ) + 4
2
é a solução implı́cita. Tirando a raiz quadrada e lembrando que y(0) = −2, o sinal tem que ser negativo,
logo
p
y(x) = − 2 ln(1 + x2 ) + 4
1.2. EDO SEPARÁVEL 5
y−1
Exemplo 1.2.4. Resolva a equação y 0 =
x+3
Solução. Como f (x) = 1/(x + 3) e g(y) = y − 1, então g(1) = 0, logo y ≡ 1 é uma solução de equilı́brio.
Resolvendo, vemos que
y−1 dy y−1
y0 = ⇒ =
x+3 dx x+3
dy dx
⇒ =
y−1 x+3
Z Z
dy dx
⇒ =
y−1 x+3
⇒ ln |y − 1| = ln |x + 3| + C
⇒ |y − 1| = eln |x+3|+C = eln |x+3| eC = |x + 3|eC
⇒ |y − 1| = C|x + 3| (Mesmo nome para a constante)
y−1
⇒ =C
x+3
y−1
⇒ = ±C = C (Mesmo nome para a constante)
x+3
⇒ y − 1 = C(x + 3)
⇒ y(x) = 1 + C(x + 3)
ln |y − 1| = ln |x + 3| + ln K
Essa abordagem é válida, pois como a imagem de um logaritmo é igual a R, a constante C que aparecia
originalmente sempre é igual ao logaritmo de um único número (positivo) K. Isso é útil pois, como todas as
funções são logaritmos, podemos usar suas propriedades para acelerar a simplificação. De fato,
Note que colocar os módulos nos logaritmos não é fundamental aqui, pois eles sempre são eliminados ao
trocarmos ±C por C. Assim, usaremos sempre ln x como primitiva de 1/x de agoras em diante.
y
Exemplo 1.2.5. Resolva a EDO y 0 = .
x2 + x
Solução. Neste exemplo, g(y) = y, logo y ≡ 0 é solução de equilı́brio pois g(0) = 0. Vamos separar as
6 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
Kx
⇒ y(x) =
x+1
1 A B A(x + 1) + Bx
= + =
x(x + 1) x x+1 x(x + 1)
Assim,
1 = A(x + 1) + Bx
Substituindo x = 0, obtemos A = 1, e fazendo x = −1, obtemos B = −1, logo
1 1 1
= − ,
x(x + 1) x x+1
como usamos acima.
Note que a equação é uma combinação linear de y e y 0 , com coeficientes sendo funções de x. Em geral, uma
EDO de ordem n é linear quando puder ser escrita como uma combinação linear de y e das n primeiras
derivadas de y.
Para resolver uma equação deste tipo, começamos dividindo por a(x) para que o coeficiente de y 0 seja
igual a 1. Ficamos com
y 0 + p(x)y = q(x),
onde p(x) = b(x)/a(x) e q(x) = c(x)/a(x). A ideia do método é multiplicar a equação por uma função
µ(x) que faça com que o lado esquerdo da equação torne-se a derivada de um produto. Como estamos
multiplicando por µ(x) que vai nos permitir integrar a EDO (ou seja, resolvê-la), dizemos que µ(x) é um
fator integrante para a equação. A equação torna-se
µy 0 + µp(x)y = µq(x)
Como a regra do produto diz que (f g)0 = f 0 g + f g 0 , o que desejamos ocorre se tivermos
µ0 = µp(x)
1.3. EDO LINEAR DE PRIMEIRA ORDEM 7
Note que essa equação é separável, portanto já sabemos como resolvê-la. Separando as variáveis e integrando,
obtemos
Z Z
dµ dµ
= µp(x) ⇒ = p(x)dx
dx µ
Z
⇒ ln µ = p(x)dx
R
p(x)dx
⇒ µ(x) = e
Observe que não é necessário colocar constantes de integração nos cálculos acima, pois não queremos
determinar todas as possı́veis funções µ(x), apenas uma que nos permita simplificar a equação. Para finalizar,
com essa escolha de µ(x) a EDO pode ser escrita como
(µy)0 = µq,
então basta integrar dos dois lados (lembrando que uma primitiva de (µy)0 é µy pelo Teorema Fundamental
do Cálculo) e isolar y(x).
ou seja,
(e5x y)0 = 3e5x .
Integrando os dois lados e usando o Teorema Fundamental do Cálculo, obtemos
3e5x
Z
e5x y = 3e5x dx = + C,
5
logo
3
y(x) = + Ce−5x
5
é a solução geral.
Solução. Nesse caso, temos p(x) = 1 e q(x) = sen x. Daı́, um fator integrante é
R
1dx
µ(x) = e = ex
ex y 0 + ex y = ex sen x,
Daı́,
ex (sen x − cos x)
Z
ex y = ex sen xdx = + C,
2
logo
sen x − cos x
y(x) = + Ce−x
2
Dessa forma,
ex (sen x − cos x)
Z Z
x x x
2 e sen xdx = −e cos x + e sen x ⇒ ex sen xdx = +C
2
dy y
Exemplo 1.3.3. Resolva a equação x − = x, onde x > 0.
dx x + 1
Solução. Primeiramente, precisamos dividir tudo por x. Ficamos com
y
y0 − = 1,
x(x + 1)
1
logo p(x) = − e q(x) = 1. Com isso, um fator integrante é
x(x + 1)
dx
R
µ(x) = e − x(x+1)
−1 A B A(x + 1) + B
= + = ,
x(x + 1) x x+1 x(x + 1)
logo
−1 = A(x + 1) + Bx
Fazendo x = 0 obtemos A = −1, e fazendo x = −1 obtemos B = 1. Daı́,
Z Z
dx 1 1 x+1
− = − + dx = − ln x + ln(x + 1) = ln
x(x + 1) x x+1 x
1.3. EDO LINEAR DE PRIMEIRA ORDEM 9
(lembre que, aqui, não precisamos da constante por estarmos calculando um fator integrante). Daı́,
x+1
µ(x) = eln((x+1)/x) =
x
Agora, multiplicamos a EDO por µ(x), o que fornece
x+1 0 1 x+1
y − 2y = ,
x x x
é a solução geral.
2
Exemplo 1.3.4. Resolva a equação y 0 + y = sen(t3 ), com t > 0.
t
Solução. Para esta equação, p(t) = 2/t e q(t) = sen(t3 ). Assim, um fator integrante é
2 2
R
µ(t) = e t dt = e2 ln t = eln(t )
= t2
t2 y 0 + 2ty = t2 sen(t3 ),
ou seja,
(t2 y)0 = t2 sen(t3 )
Integrando os dois lados da equação, vemos que
Z
t y = t2 sen(t3 )dt
2
(Substituição: u = t3 , du = 3t2 dt)
Z
sen u
= du
3
cos u
=− +C
3
cos(t3 )
=− +C
3
De fato,
Z Z
sen x
tg xdx = dx (Substituição: u = cos x, du = − sen xdx)
cos x
Z
du
= −
u
= − ln u + C
= ln(u−1 ) + C
1
= ln +C
cos x
= ln(sec x) + C
Lembramos mais uma vez que não precisamos colocar a constante no cálculo do fator integrante. Daı́,
multiplicando por µ(x), obtemos
sec xy 0 + sec x tg xy = 1,
ou seja,
(sec xy)0 = 1
Integrando e isolando y(x), concluı́mos que
Z
sec xy = dx ⇒ sec xy = x + C
y
⇒ =x+C
cos x
⇒ y(x) = (x + C) cos x
π = (0 + C) cos 0 ⇒ C = π
é um fator integrante. Agora multiplicamos a EDO por µ(x), fazendo-a tomar a forma
x4 y 0 + 4x3 y = xe−x ,
1.3. EDO LINEAR DE PRIMEIRA ORDEM 11
= −xe−x − e−x + C
x+1 C
y(x) = − + 4
x4 ex x
ou seja,
2 2
(ex y)0 = xex .
Integrando, vemos que
Z
2 2
ex y = xex dx (Substituição: u = x2 , du = 2xdx)
eu
Z
= du
2
eu
= +C
2
2
ex
= + C,
2
logo
1 2
y(x) = + Ce−x
2
Com efeito,
Z Z
cos x
cotg xdx = dx (Substituição: u = sen x, du = cos x)
sen x
Z
du
=
u
= ln u + C
= ln(sen x) + C
Mais uma vez, não é necessário colocar a constante no cálculo do fator integrante. Multiplicando por
µ(x), a equação torna-se
sen(x)y 0 + cos(x)y = 2x,
que equivale a
(sen(x)y)0 = 2x
Integrando esta última equação, obtemos
Z
sen(x)y = 2xdx = x2 + C,
portanto
x2 + C
y(x) =
sen x
é a solução geral desta EDO.
Dizemos que uma EDO está em forma diferencial se estiver escrita como
P dx + Qdy = 0,
fx = 2x + y 2
fy = 2xy
f (x, y) = x2 + xy 2 + C(y)
2xy
= fx = + C 0 (y) ⇒ C 0 (y) = 0 ⇒ C(y) = K
2xy
Escolhendo K = 0 (podemos fazer isso pois queremos um potencial e não todos), uma função potencial
é
f (x, y) = x2 + xy 2 ,
14 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
x2 + xy 2 = C
com C ∈ R.
3x 0
Exemplo 1.4.4. Resolva a EDO 2y + y + 3(ln(xy) + 1) = 0 para y > 0.
y
∂P 3 ∂Q
= = ,
∂y y ∂x
Agora, derivamos com relação a x para comparar com a primeira equação. Temos
3 ln(x) +
3 ln(y)
+ 3 = fx = + C 0 (x) ⇒ 3 ln(x) + 3 = C 0 (x)
3 ln(y)
Note que, uma integração por partes com u = ln(x) e dv = dx (logo du = dx/x e v = x) fornece
Z Z
dx
ln(x) = x ln(x) − x
x
= x ln(x) − x + K
e então
f (x, y) = y 2 + 3x ln(x) + 3x ln(y) = y 2 + 3x ln(xy)
é uma função potencial. As soluções, portanto, são dadas (implicitamente) por
y 2 + 3x ln(xy) = C
com C ∈ R.
1.4. EDO EXATA 15
∂(µP ) ∂(µQ)
= ,
∂y ∂x
µy P + µPy = µx Q + µQx
Essa equação é uma EDP, e é bastante difı́cil de resolver no caso geral. Vamos fazer uma simplificação: o
fator integrante µ vai depender, apenas, de uma variável.
dµ
Caso 1 µ = µ(x) (isto é, µ só depende de x). Temos µy = 0 e µx = , logo a EDP passa a ser
dx
dµ dµ Py − Qx
µPy = Q + µQx ⇒ =µ
dx dx Q
Py − Qx
O lado esquerdo desta equação depende apenas de x, mas o termo pode depender de x e de y. Para
Q
Py − Qx
que esse método funcione, a equação acima precisa fazer sentido, logo tem que depender apenas de
Q
x! Se isso acontecer, então essa é uma EDO separável, logo pode ser resolvida e conseguiremos determinar
qual é o fator integrante.
dµ
Caso 2 µ = µ(y) (ou seja, µ só depende de y. Nesse caso, µy = e µx = 0. A EDP torna-se
dy
dµ dµ Qx − Py
P + µPy = µQx ⇒ =µ
dy dy P
Qx − Py
Como antes, vamos precisar que dependa somente de y para que esta equação (que novamente seria
P
separável) faça sentido.
Py − Qx Py − Qx Py − Qx
Resumindo, antes de resolver, calcule e . Se for uma função apenas de x,
Q P Q
Py − Qx
então vamos usar um fator integrante µ = µ(x), e se depender apenas de y, então o fator integrante
P
é da forma µ = µ(y). Escrevemos o numerador como Py − Qx em ambos os casos para evitar que seja
Py − Qx
necessário memorizar quando é Py − Qx e quando é Qx − Py . Podemos fazer isso, pois se depende
Q
Qx − Py
só de y, então o mesmo vale para , já que a única diferença entre essas funções é o sinal.
P
Observe ainda que as divisões são cruzadas: quando dividimos por Q (que multiplica dy), a função tem
que depender apenas de x, e quando dividimos por P (que multiplica dx), a função deve depender somente
de y.
16 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
Py = 3x + 2y 6= 2x + y = Qx ,
⇒ µ(x) = x
fx = 3x2 y + xy 2
fy = x3 + x2 y
Integrando a primeira equação com respeito a x, chegamos a
x2 y 2
f (x, y) = x3 y + + C(y),
2
e derivando com respeito a y e comparando com a segunda equação, temos
x3 +
x2
y = fy = x3 + y + C 0 (y) ⇒ C 0 (y) = 0 ⇒ C(y) = K
x2
x2 y 2
f (x, y) = x3 y +
2
1.4. EDO EXATA 17
x2 y 2
x3 y + =C
2
com C ∈ R.
∂P ∂Q
= 3x2 + 2y 6= 6x2 + 3y = ,
∂y ∂x
portanto a equação não é exata. Entretanto, note que
depende somente de y, de modo que podemos buscar um fator integrante da forma µ = µ(y). Multiplicando
por µ(y), obtemos
(µP )dx + (µQ)dy = 0,
logo para essa equação ser exata é necessário que
dµ dµ Qx − Py µ
(µP )y = (µQ)x ⇒ P + µPy = µQx ⇒ =µ =
dy dy P y
Daı́, Z Z
dµ dy
= ⇒ ln µ = ln y ⇒ µ(y) = y
µ y
é o fator integrante (mais uma vez, não precisamos de constantes de integração nesta etapa).
Multiplicando por µ(y) = y, obtemos a nova EDO
Como
∂P ∂Q
= 6x2 y + 3y 2 = ,
∂y ∂x
a EDO realmente é exata. Para determinar sua solução geral, precisamos determinar f (x, y) tal que
fx = 3x2 y 2 + y 3
fy = 2x3 y + 3xy 2
f (x, y) = x3 y 2 + xy 3 + C(y),
3
2xy +
3xy
2
= fy = 3
2xy +
3xy
2
+ C 0 (y) ⇒ C 0 (y) = 0 ⇒ C(y) = K
18 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
f (x, y) = x3 y 2 + xy 3
x3 y 2 + xy 3 = C
com C ∈ R
0 y
y =f
x
Isto significa que y 0 tem que ser expressa como uma função da razão y/x. Por exemplo, são EDOs homogêneas
as equações:
y
• y0 = ;
x
y x y 1
• y0 = + = + ;
x y x y/x
2x − y 2 − (y/x)
• y0 = = .
x + 3y 1 + 3(y/x)
Como y 0 escreve-se como função de y/x, o método de resolução consiste em mudar a variável para
y
v=
x
Para substituir na EDO, precisamos também relacionar y 0 e v 0 (a variável dependente passa a ser v ao invés
de y). Como y = xv, a Regra do Produto nos diz que
y 0 = v + xv 0
f (v) − v
v + xv 0 = f (v) ⇒ v 0 = ,
x
que é uma EDO separável. Assim, basta resolver essa equação e desfazer a substituição v = y/x, retornando
ás variáveis originais.
dy y 2 + 2xy
Exemplo 1.5.1. Resolva a EDO = .
dx x2
1.5. EDO HOMOGÊNEA 19
Multiplicando numerador e denominador do lado esquerdo desta última igualdade por x, ficamos com
y
= Kx ⇒ y = Kxy + Kx2
y+x
⇒ y − Kxy = Kx2
⇒ y(1 − Kx) = Kx2
Kx2
⇒ y(x) =
1 − Kx
é a solução geral da EDO. Observe que, na EDO separável, existiam duas soluções de equilı́brio: v ≡ 0 e
v ≡ −1. Como v = y/x, essas soluções correspondem a y ≡ 0 (que pode ser obtida na solução geral fazendo
K = 0) e y(x) = −x, mas não existe valor da constante K que faça com que esta segunda solução ocorra na
solução geral. De fato, se
Kx2
= −x,
1 − Kx
2 2
terı́amos Kx = −x +
Kx , e como K foi cancelado (lembre-se que K é o que queremos calcular aqui), essa
igualdade nunca é satisfeita.
v + xv 0 = 1 + 3v + v 2 ,
ou seja,
1 + 2v + v 2 (1 + v)2
v0 = = ,
x x
que é separável. Separando as variáveis e integrando, segue que (usando a substituição u = 1 + v, logo
du = dv na primeira integral)
Z Z Z Z
dv dx du dx
= ⇒ =
(1 + v)2 x u2 x
1
⇒ − = ln x + ln K
u
1
⇒− = ln(Kx)
1+v
1
⇒− = ln(Kx)
1 + y/x
é a solução geral desta EDO. Além disso, v ≡ −1 é solução de equilı́brio da EDO separável, que corresponde
à solução y(x) = −x da EDO original, a qual não está inclusa na solução geral que deduzimos!
−4 − (y/x)2
y0 = ,
y/x
−4 − v 2 4 − v2 −4 − 2v 2
v + xv 0 = ⇒ xv 0 = −v =
v v v
2
2 2 + v
⇒ v0 = −
x v
1.5. EDO HOMOGÊNEA 21
Na primeira integral faremos a substituição u = 2 + v 2 , de modo que du = 2vdv. Daı́, vemos que
Z Z
du dx 1
= −2 ⇒ ln u = −2 ln(Kx)
2u x 2
⇒ ln(2 + v 2 ) = −4 ln(Kx) = ln(Kx−4 )
K
⇒ 2 + v2 = 4
x
y2 K
⇒2+ 2 = 4
x x
Multiplicando os dois lados desta última equação por x4 , chegamos à solução geral
2x4 + x2 y 2 = K
Como a EDO separável não possuı́a soluções de equilı́brio, de fato todas as soluções estão contidas nesta
fórmula.
Agora, resolvemos o PVI. Substituindo x = 2 e y = 7 na solução geral, obtemos K = 228, portanto a
solução que satisfaz a condição inicial desejada é
2x4 + x2 y 2 = 228
dy 2y − x
Exemplo 1.5.4. Resolva a EDO = .
dx 2x − y
Solução. Se dividirmos numerador e denominador por x, a EDO torna-se
y 0 2(y/x) − 1
,
= 2 − (y/x)
2v − 1 2v − 1
v + xv 0 = ⇒ xv 0 = −v
2−v 2−v
2
0 1 v −1
⇒v =
x 2−v
2 − v = A(v − 1) + B(v + 1)
Assim, substituindo v = 1, temos 1 = 2B, logo B = 1/2, e fazendo v = −1, ficamos com 3 = −2A, logo
A = −3/2. Daı́,
Z Z
3 1 1 1 dx 3 1
− + dv = ⇒ − ln(v + 1) + ln(v − 1) = ln(Kx)
2v+1 2v−1 x 2 2
⇒ −3 ln(v + 1) + ln(v − 1) = 2 ln(Kx)
⇒ − ln(v + 1)3 + ln(v + 1) = ln(Kx2 )
v−1
⇒ ln = ln(Kx2 )
(v + 1)3
v−1
⇒ = Kx2
(v + 1)3
Note que 2 ln(Kx) = ln(Kx)2 = ln(K 2 x2 ), que escrevemos como ln(Kx2 ) pois K 2 também é constante.
Como v = y/x, temos
y−x
y/x − 1
= Kx2 ⇒ x
(y+x)3
= Kx2
(y/x + 1)3
x3
3
y−x x
⇒ 3
= K x2
(y + x)
x
⇒ y − x = K(y + x)3
é a solução geral da EDO. Além disso, v ≡ −1 e v ≡ 1 são soluções de equilı́brio da EDO separável, logo
y(x) = −x e y(x) = x também são soluções da EDO original, mas apenas a segunda está incluı́da na solução
geral (quando K = 0).
dy 2y − x + 5
Exemplo 1.5.5. Resolva a EDO = .
dx 2x − y − 4
Solução. Neste caso, a EDO não é homogênea, pois
2y/x − 1 + 5/x
y0 = ,
2 − y/x − 4/x
logo y 0 não escreve-se como função da razão y/x. Por outro lado, se as constantes 5 e −4 não estivessem
presentes, a EDO seria homogênea, conforme vimos no Exemplo anterior. Dessa forma, vamos trocar as
variáveis x e y por w e z fazendo
x = w+a
,
y = z+b
onde a, b ∈ R, de modo que, nessas novas variáveis, esses termos constantes não existam. Temos dx = dw e
dy = dz, logo dy/dx = dz/dw, portanto
dz 2(z + b) − (w + a) + 5 2z − w + (5 − a + 2b)
= =
dw 2(w + a) − (z + b) − 4 2w − z + (−4 + 2a − b)
1.6. EDO DE BERNOULLI 23
Como vimos, para que a nova equação seja homogênea, basta que
5 − a + 2b = 0
−4 + 2a − b = 0
Resolvendo este sistema, encontramos a = 1 e b = −2, o que significa que mudando as variáveis para
w = x − 1 e z = y + 2, obtemos a EDO homogênea
dz 2z − w
= .
dw 2w − z
Observe que esta é a mesma equação do Exemplo anterior (apenas os nomes das variáveis foram alterados),
logo podemos aproveitar as contas já feitas e obter a solução geral
z − w = K(z + w)3
com K ∈ R, além de z(w) = −w. Desfazendo a mudança de variáveis para retornar às variáveis x e y e
simplificando, concluı́mos que a solução geral da EDO original é
y − x + 3 = K(y + x + 1)3 ,
além de y(x) = −x − 1.
Dizemos que uma EDO de primeira ordem é uma equação de Bernoulli se puder ser escrita na forma
y 0 + p(x)y = q(x)y n ,
onde n ∈ R. Se n = 0 ou n = 1, já vimos como resolver essa equação. De fato, para n = 0, a EDO é
y 0 + p(x)y = q(x),
y 0 = (q(x) − p(x))y,
ou seja, trata-se de uma EDO separável. Nosso objetivo será resolver o caso geral, em que n 6= 0 e n 6= 1.
Vamos começar dividindo a equação inteira por y n . Note que isso faz com que y ≡ 0 seja uma candidata
a solução de equilı́brio, e devemos verificar se, de fato, isso ocorre. A equação fica na forma
v 0 = (1 − n)y −n y 0
(note que, como a derivada é com respeito a x, temos que derivar y implicitamente, por isso y 0 apareceu
multiplicando). Dessa forma, após a substituição a EDO é transformada em
v0
+ p(x)v = q(x),
1−n
24 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
Assim, basta resolver essa EDO usando o método do fator integrante e retornar às variáveis originais para
determinar a solução da equação.
y −2 y 0 + y −1 = ex .
−v 0 + v = ex ,
ou seja,
v 0 − v = −ex ,
uma EDO linear, cujo fator integrante é
R
µ(x) = e (−1)dx
= e−x
Como v = y −1 , temos
1
= (−x + C)ex ,
y
ou ainda,
e−x
y(x) = ,
−x + C
que é a solução geral da EDO. Além disso, como dividimos por y 2 no começo da resolução, y ≡ 0 é uma
solução de equilı́brio, que não está contida na solução geral.
2 −2 1
y −3 y 0 + y = 2
x x
Se v = y −2 , então v 0 = −2y −3 y 0 , logo
v0 2 1
− + v= 2
2 x x
1.6. EDO DE BERNOULLI 25
4 2
v0 − v=− 2
x x
Um fator integrante para esta equação é
−4
R
µ(x) = e (−4dx/x)
= e−4 ln x = eln(x )
= x−4
Agora temos que multiplicar a EDO por µ(x), o que resulta hein
1 2
2
= + Cx4
y 5x
3
Exemplo 1.6.3. Resolva a equação y 0 − y = x4 y 1/3 .
x
Solução. Vamos dividir a EDO por y 1/3 (isso indica que y ≡ 0 é solução de equilı́brio) , obtendo
3 2/3
y −1/3 y 0 − y = x4
x
2 −1/3 0
Precisamos mudar a variável para v = y 2/3 , de modo que v 0 = y y , logo
3
3v 0 3
− v = x4
2 x
Se multiplicarmos os dois lados da equação por 2/3, obtemos a EDO linear
2 2x4
v0 − v=
x 3
Um fator integrante para esta equação é
−
R
µ(x) = e (−2dx/x)
= e−2 ln x = eln(x 2)
= x−2
2 2
x−2 v 0 − 2x−3 v = x ,
3
ou seja,
2 2
(x−2 v)0 = x
3
26 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
Nas últimas duas aulas temos trabalhado um par de tipos de EDOs que, após uma mudança de variável,
transformam-se em tipos mais simples. Nesta seção, veremos outros exemplos de equações que simplificam-se
após alguma substituição, mas que não recebem nenhum nome especial como “equações homogêneas” ou
“equações de Bernoulli”.
1.7. OUTRAS SUBSTITUIÇÕES 27
⇒ y(x) = tg(x + C) − x − 2
é a solução geral. Como dividimos por 1 + v 2 na EDO separável e esse termo nunca se anula, não há soluções
de equilı́brio.
2
⇒ x + ey = Kex /2
2
⇒ ey = Kex /2
−x
2
⇒ y(x) = ln(Kex /2
− x)
é a solução geral. Além disso, a divisão por v na EDO separável indica que v ≡ 0 é solução de equilı́brio,
mas então uma solução é dada (implicitamente) por x + ey = 0. Isolando y, temos y(x) = ln(−x), que faz
parte da solução geral acima no caso K = 0.
π
Exemplo 1.7.3. Resolva o PVI y 0 = sec(2x2 + y − 1) − 4x, y(0) = +1
4
Solução. Seja v = 2x2 + y − 1. Assim, v 0 = 4x + y 0 , logo
1
v 0 − 4x = sec v − 4x ⇒ v 0 = sec v = ,
cos v
que é uma EDO separável. Com isso,
Z Z
cos vdv = dx ⇒ sen v = x + C
⇒ sen(2x2 + y − 1) = x + C
π
é a solução geral (implı́cita) da equação. Para o PVI, faça x = 0 e y =
+ 1, de modo que
4
√
π π 2
sen 0 + + 1 − 1 = 0 + C ⇒ C = sen =
4 4 2
28 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
A solução do PVI é
√
2
sen(2x2 + y − 1) = x +
2
Em todos os problemas de valor inicial que resolvemos até aqui, a solução era única. Dizı́amos sempre
que tı́nhamos que calcular o valor da constante de integração usando a condição inicial, mas em alguns casos
não é bem assim. Vejamos o seguinte exemplo.
√
Exemplo 1.8.1. Resolva o PVI y 0 = 2 y, y(0) = 0.
Solução. Como a EDO é separável, temos
dy √ dy
= 2 y ⇒ √ = dx
dx 2 y
Z Z
dy
⇒ √ = dx
2 2
√
⇒ y =x+C
é a solução geral. Além disso, y ≡ 0 é uma solução de equilı́brio. Impondo a condição inicial, se x = 0 e
√
y = 0, obtemos C = 0, logo y = x (ou y = x2 ) é solução. Por outro lado, y ≡ 0 também é solução deste
PVI. Assim, a solução não é única!.
O seguinte Teorema fornece condições para que a solução de um PVI exista e seja única:
Teorema 1.8.1 (Teorema de Existência e Unicidade). Considere o PVI
y 0 = f (x, y)
y(x0 ) = y0
(i) Se f é contı́nua no ponto (x0 , y0 ), então existe solução para o PVI (mas não necessariamente será
única);
∂f
(ii) Se, além disso, também for contı́nua em (x0 , y0 ), então essa solução é única.
∂y
Voltando ao exemplo anterior, temos
√
f (x, y) = 2 y
√
Essa função é contı́nua para todo y ≥ 0, logo a solução do PVI y 0 = 2 y, y(x0 ) = y0 existe sempre que
y0 ≥ 0. Por outro lado,
∂f 1
=√
∂y y
∂f
é contı́nua apenas para y > 0. Como, no exemplo, x0 = 0 e y0 = 0, vemos que não é contı́nua em (x0 , y0 ),
∂y
portanto não há nenhum problema em haver duas soluções!
Exemplo 1.8.2. Analise a existência e a unicidade de soluções para o PVI y 2 + x2 y 0 = 0, y(x0 ) = y0 .
y2
Solução. Aqui, temos y 0 = − , logo
x2
y2
f (x, y) = −
x2
Com isso, concluı́mos que
1.8. TEOREMA DE EXISTÊNCIA E UNICIDADE 29
• f é contı́nua se x 6= 0.
∂f 2y
• = − 2 também é contı́nua se x 6= 0.
∂y x
Pelo Teorema de Existência e Unicidade, se x0 6= 0, a solução do PVI sempre existe e é única! E se
x0 = 0? Nesse caso, o Teorema não diz nada, portanto temos que resolver a EDO, que é separável:
y2
Z Z
dy dy dx
=− 2 ⇒− =
dx x y2 x2
1 1 −1 + Cx
⇒ =− +C =
y x x
x
⇒ y(x) =
Cx − 1
Como vimos ao longo do curso, as soluções de EDOs sempre são curvas em R2 . Como essas curvas são
obtidas integrando a equação, costumamos chamá-las de curvas integrais. Vamos supor que a solução do
PVI
y 0 = f (x, y)
y(x0 ) = y0
seja sempre única. Nessas condições, duas curvas integrais desta EDO podem se cruzar?
Note que uma solução do PVI é uma curva integral que passa pelo ponto (x0 , y0 ). Assim, se duas
curvas integrais passam por um mesmo ponto, então nesse ponto o PVI tem mais de uma solução, o que
não é possı́vel. Isso significa que duas curvas integrais nunca podem se cruzar quando a solução for única.
Usaremos isso no exemplo a seguir.
Exemplo 1.8.3. Considere o PVI
y0
= y(y − 1)
y(0) = y0
(a) Mostre que esse PVI tem solução única paras todo y0 ∈ R.
(b) Se y = y(x) é a solução do PVI, calcule lim y(x) se:
x→∞
(i) y0 > 1,
(ii) 0 < y0 < 1,
(iii) y0 < 0
sem resolver a EDO.
∂f
Solução. Para o item (a), observe que f (x, y) = y 2 − y e = 2y − 1 são contı́nuas em todo o R2 . Pelo
∂y
Teorema de Existência e Unicidade, o PVI sempre tem solução única. Assim, como y ≡ 0 e y ≡ 1 são
soluções de equilı́brio, qualquer outra solução não pode cruzar com essas duas! Dessa forma,
(i) se y0 > 1, então y(x) > 1 para todo x;
30 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
(c) Finalmente, se y < 0, então y 0 = y(y − 1) > 0, portanto y(x) é crescente. Como não pode cruzar y ≡ 0,
novamente temos lim y(x) = 0.
x→∞
Nessas condições, dizemos que y ≡ 0 é um equilı́brio estável, pois se perturbarmos um pouco a solução,
ela retorna para zero, ao passo que y ≡ 1 é um equilı́brio instável, já que as soluções perturbadas se afastam
dela.
Solução. Para verificar se y = sen x é solução, devemos substituir essa função na EDO e mostrar que os
dois lados dão iguais. De fato,
2 cos x
y 0 = (sen x)0 = cos x e = cos x,
sen2 x + cos2 x +1
| {z }
1
também é contı́nua em todo o R2 . Daı́, o Teorema de Existência e Unicidade diz que a solução do PVI
y 0 = f (x, y)
y(x0 ) = y0
y 0 = f (x, y)
y(0) = y0
pelo item (a). Como sen(π/2) = 1, se existisse alguma solução y2 (x) tal que y2 (0) = 0 e y2 (π/2) = 0, então
esse último PVI teria y1 e y2 como soluções, mas isso é impossı́vel pelo item (b).
v + xv 0 = v(1 + ln(v 2 )
= v + v ln(v 2 )
= v + 2v ln v,
logo
dv
x = 2v ln v,
dx
que é uma EDO separável. Daı́,
Z Z Z Z
dv 2dx du dx
= ⇒ =2 (Substituição u = ln v, du = dv/v)
v ln v x u x
⇒ ln u = 2 ln x + ln K = ln(Kx2 )
⇒ u = Kx2
⇒ ln v = Kx2
2
⇒ v = eKx
y 2
⇒ = eKx
x
2
⇒ y(x) = xeKx
é a solução geral da EDO. Além disso, v ≡ 1 é solução de equilı́brio da EDO separável, o que gera a solução
y(x) = x para a EDO original, a qual já aparece na solução geral quando K = 0.
ou seja,
2 2
(e−x y)0 = xe−x
Vamos integrar de ambos os lados, usando a substituição u = −x2 , logo du = −2xdx na integral, do lado
direito, de modo que
2 eu du eu
e−x y = − ⇒− +C
2 2
2
2 e−x
⇒ e−x y = − +C
2
1 2
⇒ y(x) = − + Cex
2
Como temos um problema de valor inicial, fazemos x = 0 e y = 1 na solução geral acima para obter
C = 3/2, portanto a solução deste PVI é
2
−1 + 3ex
y(x) =
2
2ye5x
5x
Exemplo 1.9.3. Resolva a EDO 3 sen y + 5ye + dx + (x cos y + e5x )dy = 0.
x
2ye5x
Solução. Sejam P (x, y) = 3 sen y + 5ye5x + e Q(x, y) = x cos y + e5x . Como
x
∂P 2e5x ∂Q
= 3 cos y + 5e5x + 6= cos y + 5ex = ,
∂y x ∂x
depende somente de x, portanto existe um fator integrante µ = µ(x) que transforma a equação em uma
EDO exata. Multiplicando a EDO original por µ(x), temos
⇒ µ(x) = x2
A nova EDO é
(3x2 sen y + 5x2 ye5x + 2xye5x )dx + (x3 cos y + x2 e5x )dy = 0
1.9. MAIS EXEMPLOS RESOLVIDOS 33
Temos que determinar uma função potencial f (x, y), isto é, f tem que satisfazer
fy = x3 cos y + x2 e5x
3x2 sen y + 2xye5x + 5x2 ye5x + C 0 (x) = 3x2 sen y + 2xye5x + 5x2 ye5x
⇒ C 0 (x) = 0
⇒ C(x) = K
onde C ∈ R.
∂P ∂Q
= −2xy = ,
∂y ∂x
logo a EDO é exata. Temos que determinar uma função potencial f (x, y), que satisfaz
fx = cos x sen x − xy 2
fy = y(1 − x2 )
y2 y2 x2 y 2
f (x, y) = (1 − x2 ) + C(x) = − + C(x)
2 2 2
34 CAPÍTULO 1. EDOS DE PRIMEIRA ORDEM
u2 sen2 x
Z
⇒ C(x) = udu = +K = +K
2 2
sen2 x y 2
f (x, y) = + (1 − x2 )
2 2
e a solução geral é
sen2 x y 2
+ (1 − x2 ) = C ,
2 2
com C ∈ R.
fx = 2xy 2 + 3x2
fy = 2x2 y
f (x, y) = x2 y 2 + C(x)
1.9. MAIS EXEMPLOS RESOLVIDOS 35
Agora, derivamos a expressão acima com relação a x para comparar com a primeira equação. Temos
f (x, y) = x2 y 2 + x3
com C ∈ R.
x4 y 0 + 4x3 y = x2 − 1,
isto é,
(x4 y)0 = x6 − x4
Daı́,
x7 x5 x3 x C
x4 y = − + C ⇒ y(x) = − + 4
7 5 7 5 x
é a solução geral.
1 −9x5 + 4
=
y3 5x6
Seja P (t) uma população que evolui ao longo do tempo a partir de uma população inicial P (0) = P0 .
Vamos supor que a taxa de variação da população em cada instante t é proporcional à população nesse
mesmo instante, isto é,
dP
= KP
dt
Essa EDO é separável, logo
Z Z
dP
= Kdt ⇒ ln P = Kt + C
P
⇒ P (t) = P0 eKt
Por isso, dizemos que esse modelo é de crescimento exponencial, também conhecido como modelo
malthusiano. Note que isso faz algum sentido se existirem poucos indivı́duos na população, mas se esse
número aumentar, eles começarão a competir entre si por recursos, portanto o crescimento iria ser desacele-
rado. Para levar isso em conta na construção do modelo, observe que o número de encontros possı́veis entre
indivı́duos é P (P − 1), portanto poderı́amos considerar agora a equação
dP
= KP − P (P − 1) = KP − P 2 + P = (K + 1)P − P 2
dt
1.10. APLICAÇÕES DE EDO 37
dP
= P (λ − P ) ,
dt
chamado de modelo logı́stico. Como essa EDO também é separável, poderı́amos resolvê-la (usando frações
parciais), mas vamos aplicar o que estudamos na última aula para inferir o que ocorre quando t → ∞ sem
resolver a equação:
Assim, temos que λ é um equilı́brio estável, enquanto 0 é um equilı́brio instável. O modelo já é mais
realista que o anterior (quanto mais realista quisermos que o modelo seja, mais complicada a equação terá
que ser).
Exemplo 1.10.1. Uma solução de salmoura flui a uma vazão constante de 8 `/min para um tanque que,
no inı́cio, mantinha 100 ` de uma solução em que foi dissolvido 0, 5 kg de sal. A solução dentro do tanque é
mantida bem agitada e sai na mesma vazão. Se a concentração de sal na solução que entra é de 0, 05 kg/`,
determine a massa de sal no tanque após t minutos.
Solução. Seja x(t) a massa de sal (em kg) no tanque após t minutos. Do enunciado, vemos que x(0) = 0, 5.
Podemos escrever a equação para a taxa de variação de x(t) como
dx
= (entrada) − (saı́da)
dt
dx 2x dx 2
= 0, 4 − = 10 − 2x25 ⇒ = − (x − 5) ,
dt 25 dt 25
⇒ x(t) = 5 + Ce−2t/25
x(t) = 5 − 4, 5e−2t/25
Exemplo 1.10.2. O que muda, no Exemplo anterior, se a vazão de saı́da for 10 `/min?
Solução. Agora, o volume do tanque diminui 2 ` por minuto. Assim, a taxa de saı́da é
` x kg 5x
10 = kg/min
min 100 − 2t ` 50 − t
5 R
que é uma equação linear. Se p(t) = , então um fator integrante é µ(t) = e p(t)dt . Se u = 50 − t, então
50 − t
du = −dt, e então
Z Z
dt du
p(t)dt = 5 = −5 = −5 ln u = −5 ln(50 − t) = ln(50 − t)−5
50 − t u
Daı́,
−5 1
µ(t) = eln(50−t) ⇒ µ(t) =
(50 − t)5
Dessa forma,
50 − t
x(t) = + C(50 − t)5
10
5
t t
x(t) = 5 − − 4, 5 1 −
4 50
Note que x(50) = 0, pois após 50 minutos o tanque esvaziou, logo a massa de sal nele será igual a zero.
1.10.3 Epidemiologia
Uma epidemia ocorre em uma população, que fica dividida em três categoriais:
• indivı́duos suscetı́veis, denotados pela letra S (aqueles que podem contrair a doença;
• indivı́duos infectados, representados pela letra I;
• indivı́duos recuperados, denotados pela letra R.
Vamos admitir que indivı́duos recuperados adquirem imunidade permanente à doença, não voltando a
tornarem-se suscetı́veis. Por considerar apenas estas três categorias, o modelo que vamos descrever a seguir
é chamado de SIR, mas poderı́amos modificá-lo. Por exemplo, se a doença possuir um perı́odo de encubação
em que o doente está infectado mas ainda não transmite a doença, podemos considerar uma nova categoria de
indivı́duos denotada por E, os expostos, e ter um modelo SEIR. Outra possibilidade seria de a imunidade
não ser permanente, de modo que, após algum tempo, indivı́duos recuperados voltam a ser suscetı́veis,
resultando num modelo SIRS, por exemplo.
Vamos admitir também que há nascimento e mortes na população, a taxas µN e µM , respectivamente, e
que a transmissão da doença e da imunidade não ocorrem de forma vertical (isto é, da mãe para a filha pela
gravidez), portanto todos os indivı́duos nascem suscetı́veis. Se N = S + I + R é a população total, então a
taxa de variação de suscetı́veis se dá por
Dada uma famı́lia de curvas, vamos determinar sua famı́lia de trajetórias ortogonais. Isso é muito
comum em Engenharia e Fı́sica, por exemplo, as superfı́cies equipotenciais são a famı́lia ortogonal das linhas
do campo elétrico. A ideia é lembrar que duas curvas são ortogonais em um ponto se as retas tangentes
forem ortogonais neste ponto. Além disso, duas retas y = m1 x + n1 e y = m2 x + n2 são ortogonais se
m1 m2 = −1
Você pode testar se, de fato, a solução geral desta EDO é y = Cx3 . Essa EDO fornece uma fórmula para
o coeficiente angular da reta tangente à curva da famı́lia que passa pelo ponto (x, y). Vamos usar isso para
determinar a EDO que deve ser satisfeita pelas trajetórias ortogonais, pois se y 0 é o coeficiente angular às
tangentes a essa nova famı́lia de curvas, então
3y 0
y = −1,
x
logo a EDO satisfeita pela famı́lia ortogonal é
x
y0 = −
3y
1.10. APLICAÇÕES DE EDO 41
Basicamente, o que fizemos foi inverter e mudar o sinal do y 0 da primeira EDO que deduzimos.
Essa equação é separável, logo
3y 2 x2
Z Z
3ydy = − xdx ⇒ = − + K ⇒ x2 + 3y 2 = K
2 2
Solução. Como vimos acima, começamos derivando essa famı́lia para encontrar a EDO que a tem como
solução geral. Neste caso, derivamos implicitamente, chegando a
y
y + xy 0 = 0 ⇒ y 0 = −
x
Note que a constante C já foi eliminada na derivação. Agora, para determinar a EDO cuja solução geral
é a famı́lia ortogonal, invertemos e mudamos o sinal deste y 0 , ou seja, a EDO que devemos resolver é
x
y0 =
y
y2 x2
Z Z
ydy = xdx ⇒ = + K ⇒ y 2 − x2 = K
2 2
Uma EDO de segunda ordem é dita linear se puder ser escrita como uma combinação linear de y, y 0 e
00
y , isto é,
a(x)y 00 + b(x)y 0 + c(x)y = d(x)
Se Y (x) = λ1 y1 (x) + λ2 y2 (x), então Y 0 (x) = λ1 y10 (x) + λ2 y20 (x) e Y 00 (x) = λ1 y100 (x) + λ2 y200 (x). Assim,
a(x)Y 00 + b(x)Y 0 + c(x)Y = a(x)(λ1 y100 + λ2 y200 ) + b(x)(λ1 y10 + λ2 y20 ) + c(x)(λ1 y1 + λ2 y2 )
= λ1 (a(x)y100 + b(x)y10 + c(x)y1 ) +λ2 (a(x)y200 + b(x)y20 + c(x)y2 )
| {z } | {z }
0 0
= 0,
43
44 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Em particular, se y1 é solução e λ ∈ R, então λy1 é solução, e se y1 e y2 são soluções, então y1 +y2 também
é solução. Isso significa que o conjunto das soluções de uma EDO linear de segunda ordem homogênea é um
espaço vetorial, e nosso objetivo será provar que sua dimensão é igual a 2. Para isso, usaremos uma nova
versão do Teorema de Existência e Unicidade, que mais uma vez terá sua demonstração omitida.
Teorema 2.1.2 (Existência e Unicidade). Sejam p(x), q(x) e r(x) funções contı́nuas no intervalo [a, b].
Dados x0 ∈ [a, b] e y0 , y00 ∈ R, o PVI
00
y + p(x)y 0 + q(x)y = r(x)
y(x0 ) = y0
y 0 (x0 ) = y00
Note que as incógnitas desse sistema são λ1 , λ2 e λ3 , e para que {y1 , y2 , y3 } seja LI, o sistem deve ter solução
única λ1 = λ2 = λ3 = 0, o que ocorre se, e somente se, o determinante de sua matriz dos coeficientes for
diferente de zero. Esse determinante é chamado de Wronskiano das funções y1 , y2 , y3 e é denotado por
W (y1 , y2 , y3 ). Em geral,
y1 y2 ··· yn
y10 y20 ··· yn0
W (y1 , . . . , yn ) = .. .. .. ..
. . . .
(n−1) (n−1) (n−1)
y1 y2 ··· yn
Dessa forma, {y1 , . . . , yn } é LI se, e somente se, W (y1 , . . . , yn ) 6= 0. Vejamos alguns exemplos.
Exemplo 2.1.2. Mostre que y1 = cos x e y2 = sen x são linearmente independentes.
Solução. Temos
cos x sen x
W (y1 , y2 ) = = cos2 x + sen2 x = 1 6= 0,
− sen x cos x
portanto são LI.
Solução. Temos
ex sen x
W (y1 , y2 ) = = ex cos x − ex sen x = ex (cos x − sen x) 6= 0,
ex cos x
Note que o Wronskiano é uma função, logo as funções são LD somente quando o resultado do determinante
é zero (a função nula). No caso acima, para x = π/4 o Wronskiano do Exemplo anterior se anula, mas como
o resultado não é constante e igual a zero, ainda assim as funções são LI.
Agora já temos as ferramentas necessárias para provar que a dimensão do espaç vetorial das soluções é
igual a 2. Faremos isso mostrando que um conjunto de duas soluções LI também é gerador para este espaço,
portanto é uma base.
y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = 0
onde λ1 , λ2 ∈ R.
Demonstração. Já sabemos que combinações lineares de y1 e y2 são soluções da EDO, mas queremos mostrar
que toda solução é dessa forma. Seja Φ uma solução qualquer da EDO. Como {y1 , y2 } é LI, sabemos que
W (y1 , y2 ) 6= 0, portanto existe pelo menos um ponto em que o Wronskiano não se anula. Assim, suponha
que x0 ∈ R é tal que
W (y1 , y2 )(x0 ) 6= 0
e considere o PVI 00
y + p(x)y 0 + q(x)y = 0
y(x0 ) = Φ(x0 )
y 0 (x0 ) = Φ0 (x0 )
É claro que Φ é uma solução desse PVI. Vejamos que também é possı́vel escolher λ1 e λ2 de modo que
y = λ1 y1 + λ2 y2 também seja solução deste mesmo PVI. Para que isso ocorra, precisamos que
λ1 y1 (x0 ) + λ2 y2 (x0 ) = Φ(x0 )
λ1 y10 (x0 ) + λ2 y20 (x0 ) = Φ0 (x0 )
A matriz dos coeficientes desse sistema tem determinante igual a W (y1 , y2 )(x0 ), que é diferente de zero,
por hipótese. Assim, o sistema tem solução única, a qual será denotada por (λ∗1 , λ∗2 ). Com isso, Φ(x) e
λ∗1 y1 (x) + λ∗2 y2 (x) são soluções de um mesmo PVI. Pelo Teorema de Existência e Unicidade, elas têm que
ser iguais, ou seja, Φ (uma solução qualquer da EDO) é combinação linear de y1 e y2 .
com λ1 , λ2 ∈ R.
46 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Considere a EDO
ay 00 + by 0 + cy = 0,
onde a, b, c ∈ R e a 6= 0. Como ainda não sabemos nada sobre possı́veis soluções para essa equação, teremos
que fazer alguma suposição. A ideia é notar que, como a, b e c são números, para que uma combinação
linear de y, y 0 e y 00 dê igual a zero, então y não pode ser muito diferente de suas derivadas. Por isso, vamos
supor que
y(x) = erx
A equação acima é chamada de equação caracterı́stica. Assim, acabamos de ver que erx é solução da
EDO
ay 00 + by 0 + cy = 0
quando r é uma raiz da sua equação caracterı́stica. Como trata-se de uma equação quadrática, o número
de raı́zes reais desta equação depende do sinal do discriminante ∆ = b2 − 4ac.
Caso 1 Se ∆ > 0, então a equação caracterı́stica tem duas raı́zes reais distintas, que podem ser
calculadas pela fórmula quadrática
√ √
−b + ∆ −b − ∆
r1 = e r2 =
2a 2a
Segue que y1 (x) = er1 x e y2 (x) = er2 x são soluções da EDO. Como
e r1 x e r2 x
W (y1 , y2 ) = = (r2 − r1 )e(r1 +r2 )x 6= 0,
r1 er1 x r2 er2 x
y(x) = λ1 ex + λ2 e−9x
Falta resolver o PVI. Como y 0 (x) = λ1 ex − 9λ2 e−9x , as condições iniciais fornecem o sistema
eλ1 + e−9 λ2
= 1
eλ1 − 9e−9 λ2 = 0
2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 47
9 e9
λ1 = e λ2 = ,
10e 10
logo a solução do PVI é
9 x e9 −9x
e + e
10e 10
Na subseção anterior, começamos a estudar as soluções de equações de segunda ordem lineares homogêneas
com coeficientes constantes
ay 00 + by 0 + cy = 0
Vimos que y(x) = erx é solução quando r é raiz da equação caracterı́stica
ar2 + br + c = 0
Já analisamos o caso em que ∆ = b2 − 4ac > 0, ou seja, quando a equação caracterı́stica possui duas raı́zes
reais distintas, e agora estudaremos os dois casos restantes.
Caso 2 Vamos supor que ∆ = b2 − 4ac = 0. Nesse caso, a equação caracterı́stica só tem a raiz
b
r=− ,
2a
portanto apenas conhecemos a solução y1 (x) = erx . Precisamos determinar uma segunda solução y2 (x) tal
que {y1 , y2 } seja linearmente independente.
Para isso, usaremos o método da redução de ordem, que, em geral, funciona da seguinte forma:
suponha que y1 (x) é solução de
a(x)y 00 + b(x)y 0 + c(x)y = 0
Vamos procurar outra solução na forma
Esta equação ainda é de segunda ordem na variável v, mas como v não aparece, somente v 0 e v 00 , podemos
interpretá-la como uma equação de primeira ordem na variável v 0 ! Dessa forma, se fizermos a mudança de
variável z = v 0 , a EDO torna-se
ou seja,
2a(x)y10 + b(x)y1
z 0 = −z ,
a(x)y1
2 3/2
Com isso, v 0 = t1/2 , logo v =t . Já vimos que se y(x) é solução de uma EDO homogênea, então λy(x)
3
também é solução para todo λ ∈ R, então podemos multiplicar v por 3/2 e usar v(t) = t3/2 (efetivamente,
podemos desprezar constantes multiplicativas e constantes de integração), de modo que
x2 (v 00 x + 2v 0 ) + 2x(v 0 x + v) − 2vx = 0
⇒ x3 v 00 + (2x2 + 2x2 )v 0 + −
(2x 2x)v
=0
3 00 2 0
⇒ x v + 4x v = 0 (Faça z = v 0 )
⇒ x3 z 0 + 4x2 z = 0
Z Z
dz dz dx
⇒ x3 = −4x2 z ⇒ = −4
dx z x
⇒ ln z = −4 ln x = ln(x−4 ) ⇒ z = x−4
x−3
Daı́, v 0 = x−4 , logo v = −. Como no Exemplo anterior, podemos desconsiderar a constante multipli-
3
−3
cativa e usar v = x , portanto
y2 = x−3 x = x−2
é a segunda solução. Finalmente, como
x x−2
W (x, x−2 ) = = −2x−2 − x−2 = −3x2 6= 0,
1 −2x−3
o que mostra que as duas soluções são LI. Assim, a solução geral é
y(x) = λ1 x + λ2 x−2
com λ1 , λ2 ∈ R.
Voltemos à equação
ay 00 + by 0 + cy = 0
b
quando a equação caracterı́stica só tem uma raiz real. Como vimos, essa raiz é r = − , logo y1 (x) = erx
2a
é solução. Pelo método da redução de ordem, uma segunda solução deve ter a forma y2 = verx . Com isso,
y20 = v 0 erx + rverx e y200 = v 00 erx + 2rverx + r2 verx
Se y2 é solução, então
a(v 00 erx + 2rv 0 erx + r2 verx ) + b(v 0 erx + rverx ) + cverx = 0 (Divida por erx )
⇒ a(v 00 + 2rv 0 + r2 v) + b(v 0 + rv) + cv = 0
⇒ av 00 + (2ra + b) v 0 + (ar2 + br + c) v = 0 ⇒ av 00 = 0 ⇒ v 00 = 0
| {z } | {z }
0 0
⇒ v = C1 x + C2
50 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Acima, usamos que r é raiz da equação caracterı́stica, o que garante que ar2 + br + c = 0, e como seu
b
valor é r = − , segue que 2ra + b = 0. Vamos escolher C1 = 1 e C2 = 0, de modo que v = x , portanto
2a
a segunda solução é y2 = xerx . Como
erx xerx
W (erx , xerx ) = = e2rx + rxe2rx − rxe2rx = e2rx 6= 0,
rerx e rx
+ rxerx
o que garante que essas soluções são LI, portanto a solução geral para esse caso é
Temos
y 0 (x) = −2λ1 e−2x + λ2 e−2x − 2λ2 xe−2x ,
portanto as condições iniciais fornecem o sistema de equações
λ1 e2 − λ2 e2
= 2
−2λ1 e + λ2 e2 + 2λ2 e2
2
= 1
Esse sistema tem como solução λ1 = 7e−2 e λ2 = 5e−2 , portanto a solução do PVI é
Nos dois casos anteriores, as raı́zes da equação caracterı́stica eram números reais, mas ainda há o caso
em que elas são imaginárias. Estudar essa possibilidade é o objetivo desta subseção.
Caso 3 Suponha que ∆ = b2 − 4ac < 0 e escreva ∆ = −|∆|. Agora, a equação caracterı́stica não possui
raı́zes reais, mas possui as raı́zes complexas
√ p p √
−b ± ∆ −b ± −|∆| −b ± |∆| −1
r= = =
2a 2a 2a
p
√ b |∆|
Como i = −1, se chamamos α = − eβ= , as raı́zes são
2a 2a
r1 = α + βi e r2 = α − βi
2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 51
Assim, eix = cos x + i sen x , chamada de fórmula de Euler. Uma curiosidade desta fórmula ocorre
quando substitı́mos x = π, o que resulta em eiπ = −1, ou ainda eiπ + 1 = 0 , uma das mais belas equações,
uma vez que relaciona as cinco principais constantes da Matemática, os números 0, 1, π, e e i.
Trocando x por βx na fórmula de Euler, encontramos
logo
Na segunda equação acima usamos que cos(−θ) = cos(θ) e que sen(−θ) = − sen(θ) (isto é, cos x é função
par e sen x é função ı́mpar). Como a soma de soluções e o produto de uma solução por um escalar ainda são
soluções, somando as soluções acima (para cancelar a parte imaginária) e multiplicando por 1/2, vemos que
y1 = eαx cos(βx)
é uma solução real, e subtraindo a segunda solução da primeira (para cancelar a parte real) e multiplicando
por 1/2i, vemos que
y2 = eαx sen(βx)
p
|∆|
Observe que β = é diferente de zero (já que ∆ 6= 0). Assim, a solução geral é
2a
2.1.4 Exemplos
r2 − 5r + 6 = 0,
e a solução geral é
λ1 e−5 + λ2 e
= 3
5λ1 e−5 − λ2 e = 9
Somando essas equações, obtemos 6λ1 e−5 = 12, logo λ1 = 2e5 , e então, pela primeira equação.
r2 − 4r + 4 = 0,
r2 + 2r + 2 = 0
Para resolver o PVI, comecemos calculando a derivada da solução geral acima, que é
y 0 (x) = −λ1 e−x cos(x) − λ1 e−x sen(x) − λ2 e−x sen(x) + λ2 e−x cos(x)
Como y(0) = 2, segue que λ1 = 2, e como y 0 (0) = 1, temos −2 + λ2 = 1, logo λ2 = 3. Com isso, concluı́mos
que a solução do PVI é
y(x) = e−x (2 cos(x) + 3 sen(x))
r2 + r = 0 ⇒ r(r + 1) = 0,
y(x) = λ1 + λ2 e−x
Como
y 0 (x) = −λ2 e−x ,
temos que y 0 (0) = 1 implica −λ2 = 1, logo λ2 = −1, e como y(0) = 2, temos λ1 + λ2 = 2, portanto
λ1 = 2 − λ2 = 2 + 1 = 3. A solução do PVI é
y(x) = 3 − e−x
r2 − r + 7 = 0,
Para que lim y(x) = 0, precisamos que lim e3kx = 0, o que ocorre se, e somente se, k < 0 . Nesse
x→∞ x→∞
3kx
caso, o termo xe também tende a zero quando k tende a infinito (trata-se de uma indeterminação do tipo
0 · ∞, portanto uma aplicação da regra de L’Hospital confirma esta afirmação).
Z Z
2−t 1−u
Z
dz
= dt = du (u = t − 1, t = u + 1, du = dt)
z t−1 u
Z Z
dz 1
⇒ = − 1 du
z u
⇒ ln z = ln u − u
u t−1
⇒ z = eln u−u = u
= t−1 = (t − 1)e1−t = e(t − 1)e−t
e e
2.1. EDO LINEAR DE SEGUNDA ORDEM 57
Z
v= (t − 1)e−t dt (Por partes: u = t − 1, dv = e−t dt → du = dt, v = −e−t )
Z
= −(t − 1)e−t + e−t dt
= −te−t +
e−t
−e−t
= −te−t
y2 = te−t et ⇒ y2 = t
Daı́, como
et t
W (et , t) = = et − tet = et (1 − t) 6= 0,
et 1
vemos que {et , t} é um conjunto fundamental de soluções, logo a solução geral da EDO é
y(t) = λ1 et + λ2 t
ty 00 − (1 + t)y 0 + y = 0
sabendo que y1 = et é uma solução e resolva o PVI dado pela equação com condições iniciais y(−1) = 1,
y 00 (−1) = 0.
Solução. Novamente usamos o método da redução de ordem para calcular uma solução da forma y2 = vet .
Daı́, temos
y20 = v 0 et + vet e y200 = v 00 et + 2v 0 et + vet ,
de modo que, substituindo na equação, encontramos
tz 0 + (t − 1)z = 0 ⇒ tz 0 = (1 − t)z,
Z
1−t
Z
dz
= dt
z t
⇒ ln z = ln t − t
t
⇒ z= t
Z e
⇒ v= te−t dt
58 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Faremos uma integração por partes com u = t e dv = e−t dt, logo du = dt, v = −e−t , e
Z
v = −te−t + e−t dt
= −te−t − e−t
= (−t − 1)e−t = −(t + 1)e−t
Como
et t+1
W (et , t + 1) = = et − tet − et = −tet 6= 0,
et 1
vemos que {et , t + 1} é um conjunto fundamental de soluções, portanto a solução geral da EDO é
y(t) = λ1 et + λ2 (t + 1)
y 0 (t) = λ1 et + λ2 ,
a condição inicial y 0 (−1) = 0 mostra que ee−1 + λ2 = 0, logo λ2 = −1. A solução do PVI é
y(t) = et+1 − (t + 1)
ax2 y 00 + bxy 0 + cy = 0 ,
onde a, b e c são constantes (com a 6= 0). Vamos supor ainda que x > 0.
A ideia para resolver este tipo de equação é procurar soluções da forma
y(x) = xm ,
onde m ∈ R. Daı́, y 0 (x) = mxm−1 e y 00 (x) = m(m − 1)xm−2 , então podemos substituir na EDO, obtendo
am2 + (b − a)m + c = 0
Chamamos a equação acima de equação caracterı́stica, da mesma forma que fizemos no caso da
equação com coeficientes constantes (cuidado, pois as equações caracterı́sticas são diferentes para cada tipo
de equação). Concluı́mos que y(x) = xm é solução quando m é raiz da equação caracterı́stica, de modo que,
como antes, o formato da solução geral dependerá do número de raı́zes que essa equação possuir, ou seja, do
sinal do discriminante
∆ = (b − a)2 − 4ac
Caso 1 Se ∆ > 0, então a equação caracterı́stica tem duas raı́zes reais distintas m1 e m2 , logo y1 = xm1
e y2 = xm2 são soluções. Como
xm 1 xm 2
W (y1 , y2 ) =
m1 xm1 −1 m2 xm2 −1
= m2 xm1 +m2 −1 − m1 xm1 +m2 −1
= (m2 − m1 )xm1 +m2 −1 6= 0
pois m1 6= m2 e x > 0, vemos que essas soluções são LI, portanto a solução geral é
Caso 2 Se ∆ = 0, então a equação caracterı́stica só tem uma raiz real, que é
a−b
m=
2a
Com isso, apenas conhecemos a solução y1 = xm . Para determinar outra solução, vamos usar o método
da redução de ordem, supondo que y2 = vxm é solução. Temos
O termo que multiplica xm v é igual a am2 + (b − a)m + c, portanto vale 0 pois m é raiz da equação
a−b
caracterı́stica. Por sua vez, como m = , temos que 2am = a − b, logo o termo que multiplica xm+1 v 0 é
2a
igual a a − b + b = a. A equação reduz-se a
axm+2 v 00 + axm+1 v 0 = 0
xv 00 + v 0 = 0
60 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Vamos mudar a variável para z = v 0 , logo a equação passa a ser xz 0 + z = 0, que é de primeira ordem
separável. Separando as variáveis, vemos que:
Z Z
dz dz dx
x = −z ⇒ =−
dx z x
⇒ ln z = − ln x = ln(x−1 )
1
⇒z=
x
1
Com isso, v 0 = , logo v = ln x, de modo que
x
y2 = (ln x)xm
xm (ln x)xm
W (y1 , y2 ) =
mxm−1 x m−1
+ m(ln x)xm−1
= x2m−1 + ( (2m−1 (2m−1
(( ( (
((
m(ln
(( x)x −(m(ln
(( x)x
= x2m−1 6= 0,
Caso 3 Agora, suponha que ∆ < 0 e escreva ∆ = −|∆|. Nesse caso, a equação caracterı́stica tem duas
raı́zes complexas conjugadas p
−b ± |∆|i
m= = α ± βi,
2a
p
b |∆|
onde α = − eβ= . Com isso, conhecemos as soluções complexas
2a 2a
z1 = xα+βi e z2 = xα−βi ,
ou seja,
z1 = xα xβi e z2 = xα xβi
Precisamos entender o que significa xβi . Lembre-se que podemos escrever
βi
xβi = eln x = e(β ln x)i
logo
z1 = xα cos(β ln x) + ixα sen(β ln x)
2.2. EQUAÇÕES DE CAUCHY-EULER 61
Analogamente,
x−βi = e−(β ln x)i = cos(β ln x) − i sen(β ln x)
(pois cos x é função par e sen x é função ı́mpar), logo
Daı́, fazendo z1 + z2 e multiplicando por 1/2, obtemos a primeira solução real y1 = xα cos(β ln x) , e
fazendo z1 − z2 e multiplicando por 1/(2i), obtemos a segunda solução real y2 = xα sen(β ln x) (lembre-se
que combinações lineares de soluções também são soluções). Finalmente, como
xα cos(β ln x) xα sen(β ln x)
W (y1 , y2 ) = α−1 α−1 α−1
αx cos(β ln x) − βx sen(β ln x) αx sen(β ln x) + βxα−1 cos(β ln x)
(( ( (
= αx2α−1
( (cos(β
((ln (x)(( sen(β ln x) + βx2α−1 cos2 (β ln x)
( (
((((
− αx2α−1 cos(β
( ( ln
(x)(( sen(β ln x) + βx2α−1 sen2 (β ln x)
( (((
= βx2α−1 (cos2 (β ln x) + sen2 (β ln x))
| {z }
1
2α−1
= βx 6= 0
p
|∆|
pois β = 6= 0 e x > 0, logo concluı́mos que y1 e y2 são LI. Daı́, a solução geral é
2a
1
y(x) = x2 −
x2
A função f (x) será chamada de parte não homogênea da equação. A teoria será fundamentada pela
seguinte propriedade:
Teorema 2.3.1. Suponha que Y1 e Y2 são soluções da EDO não homogênea acima. Então Y1 − Y2 é uma
solução da equação homogênea associada
y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = 0
Demonstração. Com efeito, se Y = Y1 − Y2 , então Y 0 = Y10 − Y20 e Y 00 = Y100 − Y200 . Quando substituı́mos na
EDO homogênea associada, obtemos
logo Y é solução.
64 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Uma consequência importante deste Teorema é a seguinte. Suponha que Yp é uma solução particular da
equação não homogênea e que {y1 , y2 } é um conjunto LI de soluções da EDO homogênea associada. Se Y é
uma solução qualquer da EDO não homogênea, então Y − Yp é solução da EDO homogênea associada, logo
é combinação linear de y1 e y2 . Podemos escrever
Y − Yp = λ1 y1 + λ2 y2 ,
ou seja, a solução geral da EDO não homogênea pode ser expressa como
Y = λ1 y1 + λ2 y2 + Yp
onde yh é a solução geral da EDO homogênea associada e Yp é uma solução particular da equação não
homogênea. Nosso trabalho passa a ser determinar uma solução particular, e para isso, estudaremos dois
métodos: o método dos coeficientes a determinar e o método da variação dos parâmetros.
Vamos supor uma forma para a solução particular envolvendo coeficientes e obter um sistema linear cujas
incógnitas serão exatamente esses coeficientes. Este método funciona apenas quando os coeficientes da EDO
forem constantes, isto é, só consideraremos aqui equações da forma
ay 00 + by 0 + cy = f (x)
Em todos os Exemplos a seguir vamos apenas calcular uma solução particular. Colocamos sempre a
equação
y 00 − 5y 0 + 6y = f (x),
cuja EDO homogênea associada tem equação caracterı́stica r2 − 5r + 6 = 0. O discriminante é ∆ = 1 e as
raı́zes são r1 = 2 e r2 = 3, portanto a solução geral da equação homog]ênea associada será
yh = λ1 e2x + λ2 e3x
Y = λ1 e2x + λ2 e3x + Yp ,
onde Yp é a solução particular calculada no problema correspondente. Faremos isso para não perdermos
tempo calculando soluções de equações homogêneas, uma vez que já o fizemos bastante em aulas anteriores.
Solução. Vamos supor que Yp = Ax + B, um polinômio de mesmo grau que f (x) = 5x + 1. Temos Yp0 = A
e Yp00 = 0, logo Yp ser solução significa que, substituindo na EDO, temos
5x 31
Yp = +
6 36
Da primeira equação, vemos que A = 1/6, logo 6B = 10A = 5/3 pela segunda equação, logo B = 5/18.
Pela terceira, 6C = −2A + 5B = −2/6 + 25/18 = 19/18, ou seja, C = 19/108. Concluı́mos que a solução
particular é
x2 5x 19
Yp = + +
6 18 108
0 − 5 · 0 + 6A = 12 ⇒ A = 2
Dessa forma, se f (x) for uma função polinomial, vamos procurar por Yp como um polinômio de mesmo
grau que f (x). Vejamos outros casos.
Exemplo 2.3.4. Ache uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = 5e4x .
Solução. Seguindo a lógica dos exemplos anteriores, devemos supor que a solução particular tem o mesmo
formato que a parte não homogênea, portanto uma candidata é Yp = Ae4x . Assim, Yp0 = 4Ae4x e Yp00 =
16Ae4x . Substituindo na EDO, temos
Solução. Vamos supor que Yp = Ae5x , logo Yp0 = 5Ae5x e Yp00 = 25Ae5x . Daı́, a EDO fornece
Os dois exemplos anteriores ilustram que se f (x) for uma função exponencial, então nossa tentativa para
determinar uma solução particular também deve ser uma exponencial. Ressaltamos que supor que a solução
particular é da mesma forma que a parte não homogênea nem sempre funciona. Em geral, os casos em que
esse argumento dá certo são exatamente os que vamos estudar, o que mostra uma limitação do método (além
de só valer para equações com coeficientes constantes). Por outro lado, quando o método funciona, as contas
costumam ser mais simples, pois basta resolver um sistema de equações lineares.
Solução. Nossas contas anteriores indicam que devemos considerar Yp = A sen(2x). Se fizermos isso, teremos
Yp0 = 2A cos(2x) e Yp00 = −4A sen(2x). Assim, quando substituı́mos na equação, obtemos
−4A sen(2x) − 10A cos(2x) + 6A sen(2x) = 8 sen(2x) ⇒ 2A sen(2x) − 10A cos(2x) = 8 sen(2x)
Isso nos fornece as equações 2A = 8 e −10A = 0 (obtidas comparando os coeficientes de seno e cosseno dos
dois lados), que são obviamente incompatı́veis.
O problema está em termos duas equações devido ao seno e ao cosseno, mas apenas uma incógnita.
Vamos, então, supor que a solução particular é da forma Yp = A sen(2x) + B cos(2x), logo Yp0 = 2A cos(2x) −
2B sen(2x) e Yp00 = −4A sen(2x) − 4B cos(2x). Dessa forma, quando substituı́mos na equação vemos que
−4A sen(2x) − 4B cos(2x) − 10A cos(2x) + 10B sen(2x) + 6A sen(2x) + 6B cos(2x) = 8 sen(2x)
Pela segunda equação, B = 5A, logo A + 25A = 4 pela primeira equação. Segue que A = 2/13, e então
B = 5A = 10/13. A solução particular é
2 10
Yp = sen(2x) + cos(2x)
13 13
Solução. Pelo Exemplo acima, devemos tentar Yp = A cos(3x) + B sen(3x), logo Yp0 = −3A sen(3x) +
3B cos(3x) e Yp00 = −9A cos(3x) − 9B sen(3x). Assim, substituindo na equação, temos
−9A cos(3x) − 9B sen(3x) + 15A sen(3x) − 15B cos(3x) + 6A cos(3x) + 6B sen(3x) = −2 cos(3x)
Obtemos o sistema
−3A − 15B = −2
15A − 3B = 0
Pela segunda equação, B = 5A, logo −3A−75A = −2 pela primeira equação, portanto A = 1/39 e B = 5/39.
A solução particular é
1 5
Yp = cos(3x) + sen(3x)
39 39
Solução. Novamente, vamos supor que Yp = A sen(2x) + B cos(2x). Aproveitando as contas do Exemplo
2.3.6, chegaremos a
O sistema resultante é
2A + 10B = 5
−10A + 2B = −2
Multiplicando a primeira equação por 5 e somando com a segunda, obtemos 52B = 23, logo B = 23/52,
portanto 2A = 5 − 230/52 = 30/52, ou seja, A = 15/52. A solução particular é
15 23
Yp = sen(2x) + cos(2x)
52 52
Dessa forma, concluı́mos que se f (x) for uma combinação linear de seno e cosseno de mesmo ângulo,
então Yp também é. Esses são todos os tipos de partes não homogêneas que podem ser abordados usando
o método dos coeficientes a determinar. O que podemos fazer além disso é combinar esses tipos, como o
Teorema a seguir mostra.
Teorema 2.3.2 (Princı́pio da superposição). Para determinar uma solução particular Yp de y 00 + p(x)y 0 +
q(x)y = f1 (x) + f2 (x), determine soluções particulares Yp1 e Yp2 de y 00 + p(x)y 0 + q(x)y = f1 (x) e y 00 +
p(x)y 0 + q(x)y = f2 (x), respectivamente. Então Yp = Yp1 + Yp2 .
como querı́amos.
y 00 − 5y 0 + 6y = x
68 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Como vimos, devemos supor que Yp = Ax + B, logo Yp0 = A e Yp00 = 0. Substituindo nesta primeira EDO,
temos
0 − 5A + 6(Ax + B) = x ⇒ 6Ax + (−5A + 6B) = x,
o que fornece o sistema
6A = 1
−5A + 6B = 0
A solução, claramente, é A = 1/6 e B = 5/36, logo a solução particular para essa primeira parte é
x 5
Yp = +
6 36
Agora, temos que resolver a equação
y 00 − 5y 0 + 6y = ex
Procuramos por uma solução particular da forma Yp = Aex , logo Yp0 = Yp00 = Aex também. Substituindo,
chegamos a
Aex − 5Aex + 6Aex = ex ⇒ 2Aex = ex ,
ou seja, A = 1/2 e a solução particular desta parte é
ex
Yp =
2
De acordo com o Princı́pio da superposição, uma solução particular da equação original é a soma destas duas
soluções particulares parciais, portanto
x 5 ex
Yp = + +
6 36 2
Na parte não homogênea, além de somar os tipos de funções que estudamos, também podemos multiplicá-
los. Para determinar a solução particular quando a parte não homogênea é um produto f1 (x)f2 (x) vamos
multiplicar as soluções particulares correspondentes e escrever os produtos de coeficientes que aparecerem
como um novo coeficiente. Os exemplos a seguir esclarecerão o procedimento.
Exemplo 2.3.10. Ache uma solução particular para y 00 − 5y 0 + 6y = xex .
Solução. A solução particular correspondente ao fator x é Ax + B, enquanto a que corresponde ao fator ex
é Cex . Multiplicando, obtemos (Ax + B)Cex = (ACx + BC)ex . Como AC e BC também são constantes,
podemos tratar cada um como um novo coeficiente e escrever a solução particular como
Yp = (Ax + B)ex
Daı́, Yp0 = Aex + (Ax + B)ex e Yp00 = Aex + Aex + (Ax + B)ex , e então, substituindo na EDO, vemos que
2Aex + (Ax + B)ex − 5Aex − 5(Ax + B)ex + 6(Ax + B)ex = xex
Cancelando a exponencial e organizando o lado esquerdo, obtemos
(−3A + 2B) + 2Ax = x
O sistema linear resultante é
2A = 1
,
−3A + 2B = 0
cuja solução é A = 1/2 e B = 3/4. Assim, a solução particular é
x 3 x
Yp = + e
2 4
2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 69
Solução. A solução particular oriunda da exponencial é Ae−x e a que vem do seno é B sen(2x) + C cos(2x).
Multiplicando, obtemos Ae−x (B sen(2x) + C cos(2x)) = e−x (AB sen(2x) + AC cos(2x)). Como AB e AC
são constantes, vamos tratá-los como os coeficientes da solução particular e escrevê-la como
−x 2 7
Yp = e sen(2x) + cos(2x)
65 130
70 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Com isso,
Yp0 = e−x ((−A + 2B) cos(2x) + (−2A − B) sen(2x)) e Yp00 = e−x ((−3A − 4B) cos(2x) + (4A − 3B) sen(2x))
Exemplo 2.3.13. Determine a forma da solução particular prevista pelo método dos coeficientes a deter-
minar para y 00 − 4y 0 + 4y = xex sen x.
Solução. Como vimos, devemos multiplicar as soluções particulares correspondentes a cada fator do produto
xex sen x, o que resulta em
(Ax + B)Ce−x (D cos x + E sen x) = ex (ACDx + BCD) cos x + (ACEx + BCE) sen x
Como ACD, BCD, ACE e BCE são constantes, vamos escrever a solução particular como
yh = λ1 e4x + λ2 e2x
2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 71
Isso mostra que Ae2x não pode ser solução da EDO não homogênea original, uma vez que já é uma
solução da EDO homogênea associada. Para corrigirmos esse problema, vamos multiplicar o Yp original por
x (como fazemos quando a equação caracterı́stica possui raı́zes repetidas). Dessa forma, vamos supor que
Yp = Axe2x ,
logo Yp0 = Ae2x + 2Axe2x e Yp00 = 4Ae2x + 4Axe2x . Substituindo, vemos que
4Ae2x + 2x
− 6Ae2x − 2x 2x
= 4e2x ⇒ −2Ae2x = 4e2x ,
4Axe
12Axe +
8Axe
Yp = −2xe2x
O exemplo anterior mostra que, em determinadas situações, o formato padrão da solução particular
pode não funcionar. Isso ocorre quando este formato assemelha-se a alguma solução da equação homogênea
associada, e a correção é feita multiplicando a solução particular original por x.
Solução. É interessante começar resolvendo a equação homogênea associada, para determinar se precisare-
mos modificar a solução particular padrão. A equação caracterı́stica é r2 + 4 = 0, cujas raı́zes são r = ±2i,
logo a solução geral é
yh = λ1 cos(2x) + λ2 sen(2x)
A solução particular padrão Yp = A cos(2x) + B sen(2x) não servirá, já que essa é exatamente a forma
da solução geral da EDO homogênea associada. Precisamos, portanto, considerar
Yp = Ax cos(2x) + Bx sen(2x)
Com isso, Yp0 = (2Bx+A) cos(2x)+(−2Ax+B) sen(2x) e Yp00 = (−4Ax+4B) cos(2x)+(−4Bx−4A) sen(2x).
Dessa forma, quando substituı́mos essas expressões na equação, obtemos
(−4Ax + 4B) cos(2x) + (−4Bx − 4A) sen(2x) + 4Ax cos(2x) + 4Bx sen(2x) = 5 sen(2x)
5
Yp = − x cos(2x)
4
Solução. A equação caracterı́stica da EDO homogênea associada é r2 − 6r + 9 = 0, que tem como única
raiz r = 3. Daı́,
yh = λ1 e3x + λ2 xe3x
é a sua solução geral. A tentativa padrão de solução particular seria Yp = Ae3x , mas isso já é solução para
a EDO homogênea. Se multiplicarmos por x, obtemos Yp = Axe3x , que ainda é solução da homogênea,
portanto temos que multiplicar novamente por x e supor que a solução particular é
Yp = Ax2 e3x
72 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Com isso, Yp0 = 2Axe3x + 3Ax2 e3x e Yp00 = 2Ae3x + 12Axe3x + 9Ax2 e3x , portanto, substituindo na EDO,
temos
2Ae3x + 3x XX2 3x 3x − 18Ax2 eX
3x XX2 3x
eX = e3x
XXX
12Axe + 9Ax X eX −
12Axe X + 9Ax X
1
⇒ 2Ae3x = e3x ⇒ A =
2
Assim, a solução particular é
1 2 3x
Yp = x e
2
Exemplo 2.3.17. Determine a forma da solução particular prevista pelo método dos coeficientes a deter-
minar para y 00 − 3y 0 + 2y = 2xex .
Solução. Começamos determinando a solução geral da equação homog]ênea associada. A equação carac-
terı́stica é r2 − 3r + 2 = 0, cujas raı́zes são r1 = 2 e r1 = 1, logo temos
yh = λ1 e2x + λ2 ex
Deverı́amos ter Yp = (Ax + B)ex = Axex + Bex . Como Bex já aparece em yh , não teremos sucesso com
essa solução particular. De fato, Yp0 = Aex + (Ax + B)ex e Yp00 = 2Aex + (Ax + B)ex , portanto se Yp fosse
solução da EDO não homogênea, terı́amos
2Aex +
Axe
x
+H x
BeH − 3Aex −
3Axe
x
−X
3Be
X
X x
+
2Axe
x
+X
2Be
X
X x
= 2xex
o que não faz sentido pois um lado é constante e o outro não é. Assim, teremos que multiplicar nossa solução
particular por x sempre que alguma parte dela já aparecer em yh . Dessa forma, a forma correta para Yp
será
(Ax2 + Bx)ex
Exemplo 2.3.18. Determine o formato da solução particular previsto pelo método dos coeficientes a deter-
minar para y 00 − 6y 0 + 13y = x2 e3x cos(2x).
Solução. A equação homogênea associada tem equação caracterı́stica r2 − 6r + 13 = 0, cujas raı́zes são
r = 3 ± 2i. Assim,
yh = λ1 e3x cos(2x) + λ2 e3x sen(2x)
mas o termo Ce3x cos(2x) + F e3x sen(2x) já aparece em yh . Assim, devemos multiplicar o Yp antigo por x,
obtendo
Yp = (Ax3 + Bx2 + Cx)e3 x cos(2x) + (Dx3 + Ex2 + F x)e3x sen(2x)
2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 73
O método dos coeficientes a determinar não é o único que é utilizado para determinar uma solução
particular para uma EDO linear de segunda ordem. Uma outra forma de calcular esta solução é o método
da variação dos parâmetros. Uma vantagem deste método é que ele não funciona apenas para equações
com coeficientes constantes, nem apenas para uma classe restrita de funções na parte não homogênea. Por
outro lado, os cálculos envolvem integrais o que pode trazer outras complicações.
Suponha que desejamos resolver a EDO
Se {y1 (x), y2 (x)} é um conjunto de soluções linearmente independentes da equação homogênea associada,
então sabemos que a solução geral dessa equação homogênea é
Note que trocamos as constantes λ1 e λ2 por funções u(x) e v(x), ou seja, fizemos os parâmetros constantes
variarem. Daı́ o nome do método.
Vejamos que condições essas funções devem satisfazer. Começamos derivando yp , obtendo
(u0 y10 + uy100 + v 0 y20 + vy200 ) + p(x)(uy10 + vy20 ) + q(x)(uy1 + vy2 ) = f (x).
que tem como incógnitas u0 e v 0 , enquanto y1 , y2 e f (x) são funções conhecidas previamente. Esse sistema
tem solução única se o determinante de sua matriz dos coeficientes for diferente de zero. Note que este
determinante é
y1 y2
,
y10 y20
que é o Wronskiano de y1 e y2 . Como essas funções são linearmente independentes, este determinante é
diferente de zero, o que garante que o método sempre funciona, mesmo com a simplificação (2.3.2), pelo
menos em teoria.
74 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Para obter u0 e v 0 a partir do sistema acima, usamos a Regra de Cramer, que fornece
0 y2 y1 0
f (x) y20 y10 f (x)
u0 = e v0 = ,
y1 y2 y1 y2
y10 y20 y10 y20
isto é,
y2 f (x) y1 f (x)
u0 = − e v0 = .
W (y1 , y2 ) W (y1 , y2 )
Finalmente, obtemos u e v integrando as expressões acima, de modo que
Z Z
y2 (x)f (x) y1 (x)f (x)
u(x) = − dx e v(x) = dx .
W (y1 , y2 ) W (y1 , y2 )
Não recomendamos que o leitor memorize essas duas últimas fórmulas. Nossa recomendação é que sempre
se parta do sistema de equações (2.3.4), pois pode haver uma simplificação nele que não ficaria evidente com
as fórmulas integrais. Vejamos alguns exemplos.
Exemplo 2.3.19. Encontre a solução geral da EDO
y 00 + y = tg(x),
Multiplicando a primeira equação por sen(x), a segunda por cos(x) e somando-as, obtemos
portanto
u(x) = − cos(x) .
Agora, multiplicamos a primeira equação por cos(x), a segunda por − sen(x) e as somamos para obter
Finalmente, temos
Solução. Novamente começamos pela equação homogênea associada y 00 +y 0 = 0, cuja equação caracterı́stica
r2 + r = 0 tem raı́zes 0 e −1. Assim, a solução desta EDO homogênea é
yh = λ1 + λ2 e−x ,
yp = u(x) + v(x)e−x .
Assim, temos
ex
v0 = − ,
ex + 1
portanto uma integração com a substituição t = ex + 1 (logo, dt = ex dx) mostra que
Z
dt 1
v(x) = − = − ln |t| = − ln(ex + 1) = ln(ex + 1)−1 ⇒ v(x) = ln .
t ex + 1
1 A B At + B(t − 1)
= + = .
(t − 1)t t−1 t (t − 1)t
Daı́,
1 = At + B(t − 1),
portanto a substituição t = 0 mostra que B = −1, enquanto a substituição t = 1 mostra que A = 1, ou seja,
ex
t−1
Z
dt dt
u(x) = − = ln |t − 1| − ln |t| = ln ⇒ u(x) = ln .
t−1 t t ex + 1
76 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
Dessa forma,
ex
1
yp = ln x
+ ln e−x ,
e +1 ex + 1
e a solução geral da EDO não homogênea é y = yh + yp , isto é,
ex
1
y(x) = λ1 + λ2 e−x + ln x
+ ln e−x .
e +1 ex + 1
yp = ux + vex .
Por outro lado, substituindo a expressão para u0 na primeira equação do sistema e isolando v 0 , vemos que
v 0 = 5xe−x .
Agora, integramos por partes. Como u e v já estão sendo usadas com outras finalidades, usaremos t = 5x e
ds = e−x , logo dt = 5 e s = −e−x . Com isso,
Z
v(x) = −5xe−x + 5 e−x dx = −5xe−x − 5e−x ⇒ v(x) = −5(x + 1)e−x .
Assim,
yp = (−5x)x − 5(x + 1)e−x ex = −5x2 − 5(x + 1)
2.3. EQUAÇÕES LINEARES DE SEGUNDA ORDEM NÃO HOMOGÊNEAS 77
y 00 + 9y = sec2 (3x).
Solução. A equação homogênea associada tem equação caracterı́stica r2 + 9 = 0, que tem 3i e −3i como
raı́zes. Assim, a solução geral desta EDO homogênea é
yh = λ1 cos(3x) + λ2 sen(3x).
yp = u cos(3x) + v sen(3x).
u0 cos(3x) + v 0 sen(3x)
= 0
.
−3u0 sen(3x) + 3v 0 cos(3x) = sec2 (3x)
Agora, multiplicamos a primeira equação por 3 sen(3x), a segunda por cos(3x) e as somamos. Após
realizar as simplificações, o resultado é
Z
sec(3x) 1
3v 0 (sen2 (3x) + cos2 (3x)) = sec2 (3x) cos(3x) ⇒ v 0 = ⇒ v(x) = sec(3x)dx.
3 3
A substituição t = 3x, com dt = 3dx, transforma a última equação acima em
Z
1 1 1
v(x) = sec(t)dt = ln | sec(t) + tg(t)| ⇒ v(x) = ln | sec(3x) + tg(3x)| .
9 9 9
v 0 sen(3x) sen(3x)
u0 = − =− .
cos(3x) 3 cos2 (3x)
e a solução geral, y = yh + yp , é
1 1
y(x) = λ1 cos(3x) + λ2 sen(3x) − + sen(3x) ln | sec(3x) + tg(3x)| .
9 9
78 CAPÍTULO 2. EDOS DE SEGUNDA ORDEM
e−5t
y 00 + 10y 0 + 25y = .
t2
Solução. Dessa vez, a equação homogênea associada tem equação caracterı́stica r2 + 10r + 25 = 0, cuja
única raiz é 5. Assim, a solução desta EDO homogênea é
yh = λ1 e−5t + λ2 te−5t .
yp = ue−5t + vte−5t .
u0 e−5t + v 0 te−5t
= 0
0 −5t e−5t .
−5u e + v 0 (e−5t − 5te−5t ) = t2
Para simplificar, multiplicamos as duas equações por e5t . Assim, ficamos com
u0 + v 0 t
= 0
.
−5u + v 0 (1 − 5t) = t12
0
Agora, multiplique a primeira equação por 5 e some-a com a segunda. Isso resulta em
1 1
v0 = ⇒ v(t) = − .
t2 t
1 1
u0 = −v 0 t = − t = − ⇒ u(t) = − ln |t| .
t2 t
A expressão acima já é uma resposta perfeitamente aceitável para este problema, mas observe que po-
demos agrupar os termos λ1 e−5t e −e−5t , escrevendo-os como (λ1 − 1)e−5t . Como λ1 − 1 também é uma
constante, não há nenhum problema em excluir o termo −e−5t da solução particular. Em outras palavras, se
alguma parte da solução particular gerada pelo método de variação dos parâmetros já for solução da equação
homogênea associada, então esta parte pode ser desprezada. Finalmente, escrevemos a resposta do Exemplo
como
y(t) = λ1 e−5t + λ2 te−5t − ln |t|e−5t .
Capı́tulo 3
Transformada de Laplace
Neste Capı́tulo vamos estudar uma ferramenta que simplifica algumas equações diferenciais ordinárias,
pois transforma problemas de valor inicial em equações algébricas, que são mais simples de se resolver. Essa
ferramenta é a transformada de Laplace.
Suponha que f é uma função definida para t ≥ 0. A transformada de Laplace de f , que chamaremos
de L {f (t)} ou de F (s), é definida como
Z ∞
L {f (t)} = F (s) = e−st f (t)dt,
0
Dizemos que a integral converge quando o limite existe. Caso contrário, ela diverge.
Diremos que uma função f é contı́nua por partes no intervalo [α, β] quando pudermos particionar esse
intervalo em uma quantidade finita de pontos
de modo que f é contı́nua em cada subintervalo (ti−1 , ti ), i = 1, . . . , n, e os limites laterais de f nos extremos
desses subintervalos sempre existem.
O gráfico tı́pico de uma função contı́nua por partes é como o da Figura 3.1.1. Essa Figura ilustra bem
esse conceito: observe que o gráfico da função é formado por várias partes menores onde ela é contı́nua. Além
disso, nos extremos de cada uma das partes, a descontinuidade tem que ser de tipo salto. Uma propriedade
Z β
importante é que, se f é contı́nua por partes em [α, β], então a integral f (x)dx existe. De fato, basta
α
somar as integrais em cada uma das partes.
Podemos garantir que a transformada de Laplace de f existe se f satisfizer algumas condições especiais,
como as enunciadas no Teorema a seguir, importante do ponto de vista teórico: ele mostra que, se f
for da ordem de uma exponencial (ou seja, se f for controlada por uma função exponencial) para todo t
suficientemente grande, então a transformada de Laplace de f existe.
79
80 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE
Figura 3.1.1: Gráfico de uma função contı́nua por partes definida no intervalo [1, 5].
Teorema 3.1.1. Suponha que f seja contı́nua por partes no intervalo [0, A] para todo A > 0 e que
|f (t)| ≤ Keat
Para demonstrar esse Teorema, precisamos de um critério de convergência para integrais impróprias, que
é similar ao que estudamos sobre séries infinitas em Cálculo 3.
Critério de Comparação: Se f é contı́nua por partes para t ≥ a e |f (t)| ≤ g(t) quando t ≥ M para
Z ∞ Z ∞
alguma constante positiva M e se g(t)dt converge, então f (t)dt também converge. Por outro lado,
Z ∞ M Z ∞ a
A primeira dessas integrais existe, pois f é contı́nua por partes em [0, M ]. Para a segunda integral, se t ≥ M ,
temos
e−st f (t) ≤ Ke−st eat = Ke(a−s)t .
Z ∞
Pelo Critério da Comparação, essa integral existe se e(a−s)t dt convergir. Note que
M
Z ∞ Z x t=x
1 (a−s)t 1
e(a−s)t dt = lim e(a−s)t dt = lim e = lim e(a−s)x − e(a−s)M .
M x→∞ M x→∞ a − s a − s x→∞
t=M
Z ∞
Esse limite existe se a − s < 0 e diverge caso contrário. Logo, e−st f (t)dt converge se a − s < 0, ou
M
seja, se s > a, como querı́amos. Vejamos, agora, alguns exemplos.
Observe que também deduzimos o domı́nio da transformada, pois a sua variável, que é s, está definida
apenas para s > 0.
Os dois exemplos anteriores estão relacionados, visto que 1 = e0 , portanto deverı́amos poder calcular a
transformada de Laplace de 1 substituindo a por zero na transformada de eat , o que realmente funciona.
1 s2 ∞ −st 1 s2
Z
F (s) = − 2 e sen(bt)dt = − 2 F (s).
b b 0 b b
Logo,
s2 s2 + b2
1 1 b
F (s) 1 + 2 = ⇒ F (s) = ⇒ F (s) = 2
b b b2 b s + b2
se s > b.
Essa última integral imprópria é exatamente a transformada de Laplace de sen(bt). Substituindo o valor
obtido acima, encontramos, então,
s b s
L {cos(bt)} = ⇒ L {cos(bt)} = 2 .
b s2 + b2 s + b2
Nos dois exemplos anteriores houve uma etapa em que precisamos calcular
Em ambos os casos, temos uma função que tende a zero (a exponencial) multiplicada por uma função
limitada. Uma aplicação simples do Teorema do Confronto mostra que esses dois limites são iguais a zero.
Suponha agora que f1 e f2 sejam duas funções cujas transformadas de Laplace existem para s > a1 e
s > a2 , respectivamente. Então, para s maior que o máximo entre a1 e a2 , temos
Z ∞ Z ∞ Z ∞
L {c1 f1 (t) + c2 f2 (t)} = e−st [c1 f1 (t) + c2 f2 (t)] dt = c1 e−st f1 (t)dt + c2 e−st f2 (t)dt,
0 0 0
isto é,
L {c1 f1 (t) + c2 f2 (t)} = c1 L {f1 (t)} + c2 L {f2 (t)} .
Isso mostra que a transformada de Laplace é um operador linear. Esse fato é muito útil e será
bastante usado mais adiante.
5 12
L {f (t)} = 5L {e−2t } − 3L {sen(4t)} = − 2 .
s + 2 s + 16
A transformada da exponencial está definida para s > −2, enquanto a transformada do seno está definida
para s > 4, logo ambas estão definidas para s > 4, que é o domı́nio da transformada de f (t).
Analisemos os dois termos acima separadamente. O primeiro termo é igual a zero quando t = 0, e quando
t = x aparece o limite
lim e−sx x,
x→∞
que é uma indeterminação do tipo 0 · ∞ se s > 0. Uma aplicação da Regra de L’Hospital mostra que esse
limite é igual a zero.
3.1. DEFINIÇÃO E PRIMEIRAS PROPRIEDADES 83
Por outro lado, o segundo termo é igual a 1/s vezes transformada de Laplace de 1, a qual vale 1/s. Dessa
forma, ficamos com
1
L {t} =
s2
Solução. Como no Exemplo anterior, começamos integrando por partes, de modo que
Z ∞ −st 2 x
2 x −st
Z
e t
L {t2 } = e−st t2 dt = lim − + e tdt .
0 x→∞ s 0 s 0
Mais uma vez, temos dois termos. O primeiro deles é igual a zero, assim como antes, desde que s > 0
(basta inverter a exponencial e aplicar a Regra de L’Hospital duas vezes quando t = x). Já o segundo é igual
a 2/s vezes a transformada de Laplace de t, que vale 1/s2 . Substituindo, chegamos a
2
L {t2 } = ,
s3
O que os últimos dois exemplos indicam é que podemos calcular L {tn } a partir de L {tn−1 }. Vejamos
mais um exemplo para, então, inferir qual a fórmula geral para a transformada de tn .
Como antes, se s > 0, então o primeiro termo é igual a zero, enquanto o segundo é igual a 3/s vezes a
transformada de Laplace de t2 . Daı́,
6
L {t3 } =
s4
se s > 0.
Agora o padrão está mais claro. O numerador envolve um fatorial, de modo que
n!
L {tn } =
sn+1
1
1 s>0
s
n!
tn s>0
sn+1
1
eat s>a
s−a
b
sen(bt) s>b
s2 + b2
s
cos(bt) s>b
s2 + b2
Basta notar, agora, que a última integral em (3.1.1) pode ser obtida da integral em (3.1.1) trocando s
por s − a, o que mostra que essa integral é o mesmo que F (s − a), como querı́amos.
Assim, ao multiplicarmos uma função f (t) por uma exponencial eat , então para calcular a transformada
de Laplace resultante basta substituir s por s − a na transformada de Laplace de f (t). As fórmulas a seguir
são, então, consequências imediatas do Teorema anterior.
b s−a
L {eat sen(bt)} = L {eat cos(bt)} =
(s − a)2 + b2 (s − a)2 + b2
n!
L {eat tn } =
(s − a)( n + 1)
Consideraremos agora o problema inverso, isto é, dada uma transformada de Laplace, determinar qual
função que a gerou. Em termos matemáticos, conhecida a função F (s), queremos encontrar sua transformada
de Laplace inversa L −1 {F (s)}. Vejamos alguns exemplos.
3
Exemplo 3.1.9. Determine L −1 {F (s)} se F (s) = .
s2 +4
3.1. DEFINIÇÃO E PRIMEIRAS PROPRIEDADES 85
Solução. Consultando a Tabela 3.1, vemos que o denominador s2 + 4 = s2 + 22 indica que trata-se de um
seno ou de um cosseno, com b = 2. Como no numerador há apenas uma constante, teremos um seno. Como
2
L {sen(2t)} = ,
s2 + 22
3 3
L { sen(2t)} = 2 ,
2 s +4
portanto
3
L −1 {F (s)} = sen(2t) .
2
4
Exemplo 3.1.10. Determine L −1 {F (s)} se F (s) = .
(s − 1)3
Solução. A Tabela 3.1 mostra que o único caso em que pode haver um expoente 3 no denominador é se
tivermos a transformada de t2 . No entanto, o denominador desta transformada seria s3 , logo para aparecer
(s − 1)3 devemos usar o Teorema 3.1.2 e multiplicar por uma exponencial eat .
Para determinar o valor de a, lembre-se que multiplicar por eat faz com que s seja trocado por s − a.
Como queremos trocar s por s − 1, isso indica que a = 1. Até aqui, sabemos que
2
L {et t2 } = .
(s − 1)3
2
Exemplo 3.1.11. Determine L −1 {F (s)} se F (s) = .
s2 + 3s − 4
Solução. Dessa vez, o denominador não possui nenhum dos formatos da Tabela 3.1, então vamos tentar
escrevê-lo de um modo mais simples. Observe que suas raı́zes são s = 1 e s = −4, logo
2 2
= .
s2 + 3s − 4 (s − 1)(s + 4)
2 1 2 1 2 2
F (s) = · − · = L {et } − L {e−4t }.
5 s−1 5 s+4 5 5
2s + 3
Exemplo 3.1.12. Determine L −1 {F (s)} se F (s) = .
s2 + 2s + 5
86 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE
Solução. Novamente, não há nenhuma transformada na Tabela 3.1 que tenha um denominador semelhante
a esse. Assim como no Exemplo anterior, tentaremos reescrever esse denominador de uma outra forma.
Como ele não possui raı́zes reais, nossa estratégia será completar o quadrado. Observe que
2s + 3
F (s) = .
(s + 1)2 + 22
Como há uma soma de quadrados no denominador, começamos a perceber que esse denominador está
relacionado a um seno ou a um cosseno com b = 2. Além disso, temos s + 1 no lugar de s, portanto também
houve multiplicação por e−t .
Bem, há s no numerador, portanto começamos manipulando a transformada de e−t cos(2t), que é
s+1
. Daı́, temos
(s + 1)2 + 22
2(s + 1) + 1 s+1 1
F (s) = 2 2
=2· 2 2
+ .
(s + 1) + 2 (s + 1) + 2 (s + 1)2 + 22
A segunda fração do lado direito da expressão acima está relacionada à transformada de e−t sen(2t), já
que, agora, não há mais s no numerador. No entanto, o numerador deveria ser 2. Mais uma manipulação e
chegamos a
s+1 1 2 1
F (s) = 2 + · = 2L {e−t cos(2t)} + L {e−t sen(2t)}.
(s + 1)2 + 22 2 (s + 1)2 + 22 2
1
L −1 {F (s)} = 2e−t cos(2t) + e−t sen(2t) .
2
Nesta Seção nós vamos usar a transformada de Laplace para resolver alguns problemas de valor inicial.
A técnica que usaremos é dada no seguinte Teorema:
Teorema 3.2.1. Suponha que f seja contı́nua e que f 0 seja contı́nua por partes em qualquer intervalo
0 ≤ t ≤ A. Suponha, além disso, que existam constantes K, a e M tais que |f (t)| ≤ Keat para t ≥ M .
Então L {f 0 (t)} existe para s > a e, além disso,
De fato, podemos generalizar esse Teorema para calcular L {f (n) (t)}. Temos
pela fórmula de integração por partes. A integral remanescente na última expressão é a transformada de
Laplace de f (t), portanto basta analisar o outro termo, que é o mesmo que
Nesse ponto, a outra hipótese do Teorema aparece. Se x ≥ M , então |f (x)| ≤ Keat , logo
Se s > a, então a exponencial no lado direito da desigualdade acima tende a zero quando x tende a infinito.
Pelo Teorema do Confronto,
lim e−sx f (x) = 0.
x→∞
Daı́,
L {f 0 (t)} = −f (0) + sL {f (t)},
como querı́amos. Assim, a hipótese da desigualdade com uma exponencial foi crucial para a demonstração
do Teorema, mas não se preocupe pois todas as funções que estudamos nesse curso satisfazem essa condição.
Usaremos esse resultado como uma outra forma de resolver problemas de valor inicial para equações dife-
renciais lineares, como veremos nos próximos exemplos.
Solução. Começamos aplicando a transformada de Laplace a ambos os lados da equação. Ficamos com
L y 00 + y = L {sen(2t)}.
Dessa forma,
2
s2 L {y} − 2s − 1 + L {y} =
s2 +4
88 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE
2s3 + s2 + 8s + 6
L {y} = .
(s2 + 4)(s2 + 1)
Para resolver o problema, precisamos determinar quem é a transformada de Laplace inversa da função
acima. A saı́da é usar frações parciais. Temos
2s3 + s2 + 8s + 6 As + B Cs + D
2 2
= 2 + 2 .
(s + 4)(s + 1) s +4 s +1
Resolvendo um sistema linear (Faça as contas!) concluı́mos que A = 0, B = −2/3, C = 2 e D = 5/3, isto
é,
2 1 2s + 5/3 1 2 s 5 1
L {y} = − · 2 + 2 =− · 2 +2· 2 + · 2 .
3 s +4 s +1 3 s +4 s +1 3 s +1
Pela linearidade e pela Tabela de transformadas, confluı́mos (finalmente), que
1 5
y(t) = − sen(2t) + 2 cos(t) + sen(t) .
3 3
Solução. Mais uma vez, começamos aplicando a transformada dos dois lados da equação e usando a linea-
ridade para obter
L {y (4) − {L}{y} = 0.
Pela fórmula do último Teorema, essa equação torna-se
s2
s4 L {y} − s2 − L {y} = 0 ⇒ (s4 − 1)L {y} = s2 ⇒ L {y} = .
s4−1
Simplificando, temos
s2 s2
L {y} = = .
(s2 + 1)(s2 − 1) (s2 + 1)(s + 1)(s − 1)
Novamente recorremos às frações parciais para determinar quem é y. Dessa vez, as frações são
s2 As + B C D
= 2 + + .
(s2 + 1)(s + 1)(s − 1) s +1 s+1 s−1
Deixamos a cargo do leitor verificar que A = 0, B = 1/2, C = −1/4 e D = 1/4. Dessa forma,
1 1 1 1 1 1
L {y} = · − · + .
2 s2 + 1 4 s + 1 4 s − 1
Com isso, podemos aplicar as transformadas inversas da Tabela e a linearidade para concluir que
1 1 1
y(t) = sen(t) − e−t + et .
2 4 4
3.3. FUNÇÃO DEGRAU UNITÁRIO 89
Apesar de a transformada de Laplace ser uma ferramenta muito útil para resolver problemas de valor
inicial como os anteriores, já conhecı́amos métodos para fazer isso que não precisavam estudar esse novo
conceito. A importância, de fato, da transformada é que ela nos permite resolver problemas em que a
parte não-homogênea é descontı́nua ou é uma função de impulso. Começamos considerando o caso de
descontinuidades na parte não-homogênea estudando a função degrau unitário, definida por
0, t<c
uc (t) = ,
1, t≥c
onde c ≥ 0. O gráfico de uc (t) está exposto na Figura 3.3.1. Um outro nome para uc (t) que se encontra
na literatura é função de Heaviside. O degrau também pode ser decrescente: basta considerar a função
y = 1 − uc (t).
Exemplo 3.3.1. Esboce o gráfico de y = h(t), onde h(t) = uπ (t) − u2π (t), t ≥ 0.
Solução. Temos que
0, 0 ≤ t < π
h(t) = 1, π ≤ t < 2π .
0, t ≥ 2π
Chamaremos funções com um gráfico como esse de função janela. Note que a janela nos pontos c1 e c2 ,
com c1 < c2 , é dada por uc1 (t) − uc2 (t).
Calcular a transformada de Laplace de uc (t) é simples. Basta ver que
∞ ∞
e−cs
Z Z
L {uc (t)} = e−st uc (t)dt = e−st dt = ,
0 c s
O Teorema a seguir relaciona as transformadas de f (t) e de sua translação uc (t)f (t − c). Lembre-se que
multiplicar f (t) por uma exponencial causava uma translação em F (s). Agora, vemos que uma multiplicação
por expoencial em F (s) também causa uma translação em f (t).
Teorema 3.3.1. Se F (s) = L {f (t)} existe para s > a ≥ 0 e se c é uma constante positiva, então
Como a última integral acima nada mais é que a própria transformada de Laplace de f (t) (t foi trocado por
u na integral), a demonstração está finalizada.
ou seja, f (t) = sen(t) + uπ/4 (t) cos(t − π/4). Pela linearidade da transformada, segue que
1 s 1 + se−πs/4
= 2
+ e−πs/4 2 = .
s +1 s +1 s2 + 1
1 − e−2s
F (s) = .
s2
Solução. Temos
1 1
F (s) = 2
− e−2s 2 .
s s
Sabemos que
L −1 {1/s2 } = t.
Pelo Teorema anterior, a multiplicação por um fator e−2s indica que foi feita uma translação de c = 2 na
função cuja transformada é 1/s2 . Logo,
e
L −1 {F (s)} = t + u2 (t)(t − 2) .
Os últimos dois Exemplos ilustram duas formas de aplicar o Teorema 3.3.1. Quando aplicamos a transfor-
mada de Laplace em uma função que envolve uc (t)f (t − c), basta calcular a transformada de f (t) (sem o c) e
multiplicá-la por e−cs . Por outro lado, quando queremos a transformada inversa de e−cs F (s), determinamos
a função f (t), transformada inversa de F (s), trocamos t por t − c e multiplicamos pelo degrau uc (t).
2e−2s
L {f (t)} = e−2s L {t2 } = .
s3
t2 − 2t + 2 = (t − 1)2 + 1,
logo
0, 0≤t<1
= u1 (t) (t − 1)2 + 1 .
f (t) = 2
(t − 1) + 1, t ≥ 1
Note que a função que está sendo transladada agora é t2 + 1 (basta trocar t − 1 por t na última expressão
acima). Dessa forma,
2 1
L {f (t)} = e −s
L {t + 1} = e
2 −s
L {t } + L {1} = e−s
2
3
+ .
s s
Solução. Já vimos que uma função janela em π e 2π, isto é, que vale 0 para x entre 0 e π e de 2π em diante
mas vale 1 entre π e 2π, é dada por uπ (t) − u2π (t). Com isso, f (t) pode ser obtida multiplicando a função
janela por t − π, isto é,
f (t) = uπ (t)(t − π) − u2π (t)(t − π).
O termo com uπ já está no formato adequado, mas o termo com u2π ainda não, visto que a função que
multiplica o degrau deve ser dada em termos de t − 2π. Para resolver este problema, basta reescrever f (t)
como
f (t) = uπ (t)(t − π) − u2π (t) ((t − 2π) + π) = uπ (t)(t − π) − u2π (t)(t − 2π) − πu2π (t).
Daı́,
e−πs e−2πs πe−2πs
L {f (t)} = − − .
s2 s2 s
2(s − 1)e−2s
F (s) = .
s2 − 2s + 2
Solução. Completando o quadrado, temos
2(s − 1)
· e−2s .
(s − 1)2 + 1
A fração do lado esquerdo é a transformada de Laplace de 2et cos(t). Como multiplicamos por e−2s , houve
uma translação de c = 2. Logo, temos que
Podemos combinar o que estudamos nesta Seção e na anterior para resolver problemas de valor inicial
com equações diferenciais lineares em que a parte não-homogênea é descontı́nua, como no Exemplo a seguir.
3.4. FUNÇÕES DE IMPULSO 93
Solução. Já sabemos que g(t) = u5 (t) − u20 (t). Aplicando a transformada de Laplace dos dois lados da
equação e usando a linearidade, obtemos
Daı́,
−5s
+ 2L {y} = e − e−20s
2 s2 L {y} − s − y 0 (0)
y(0)
+ sL {y} −
y(0) ,
s
portanto
e−5s − e−20s
L {y} = .
s(2s2 + s + 2)
Deixamos como exercı́cio para o leitor mostrar, usando frações parciais, que
1 1/2 s + 1/2
= − 2 .
s(2s2 + s + 2) s 2s + s + 2
Com isso,
1/2 1 s + 1/2
L {y} = e −5s −20s
−e − · 2
s 2 s + s/2 + 1
−5s −20s
1/2 1 (s + 1/4) + 1/4
= e −e − ·
s 2 (s + 1/4)2 + 15/16
( " √ ! √ !#)
1 1 −t/4 15t 1 15t
−5s −20s
L − √ e−t/4 sen
= e −e − e cos
2 2 4 15 4
| {z }
h(t)
Seja g(t) uma função que no intervalo (t0 − , t0 + ) assume valores “grandes” e que fora desse intervalo,
se anula. Vamos imaginar que g(t) trata-se de uma força que é aplicada em um objeto por um curto intervalo
de tempo. Assim, o impulso de g é dado por
Z ∞
I() = g(t)dt.
−∞
94 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE
qualquer que seja o valor de , desde que 6= 0. Assim, o impulso de δ é sempre igual a 1 para qualquer
intervalo de tempo considerado. Dizemos que δ é uma função de impulso unitário.
Vamos agora fazer com que a função δ atue em intervalos cada vez mais curtos, ou seja, vamos fazer
→ 0. Assim,
lim δ (t) = 0 (t 6= 0),
→0
já que esse valor não depende de . Essas duas informações nos permitem definir uma “função” de impulso
unitário δ satisfazendo
Z ∞
δ(t) = 0 se t 6= 0 e δ(t)dt = 1.
−∞
Essa função δ é denominada delta de Dirac. Observe que se Rt0 6= 0, o delta de Dirac centrado em t0 , isto é,
∞
δ(t − t0 ), é definido pelas condiçoes δ(t − t0 ) = 0 se t 6= t0 e −∞ δ(t − t0 )dt = 1.
Para calcular a transformada de Laplace de δ(t − t0 ), usaremos o fato de que ela é definida como o limite
de δ (t − t0 ) quando → 0, de modo que
Vamos supor, primeiramente, que t0 > 0. Como → 0, então podemos assumir que t0 − > 0. Além disso,
δ (t − t0 ) 6= 0 apenas para t ∈ (t − t0 , t + t0 ). Logo,
Z ∞
L {δ(t − t0 )} = lim L {δ (t − t0 )} = lim e−st δ (t − t0 )dt
→0 →0 0
Z t0 + Z t0 +
1
= lim e−st δ (t − t0 )dt = lim e−st · dt
→0 t −
0
→0 t −
0
2
Z t0 + −st t0 +
1 1 1 1 e
= lim e−st = lim −
2 →0 t0 − 2 →0 s t0 −
1 e−s(t0 +) − e−s(t0 − 1 e−st0 e−s − e−st0 es
=− lim = − lim
2s →0 2s →0
1 −st0 es − e−s
= e lim .
2s →0
Pela Regra de L’Hospital, ficamos com
ou seja,
1 1 2
(s2 + 4)L {y} = e−s ⇒ L {y} = e−s · = · e−s · 2 .
s2 +4 2 s +4
De acordo com a tabela de transformadas, a última fração acima corresponde à transformada de sen(2t).
Como há multiplicação por uma exponencial, ocorrerá uma translação na transformada inversa, na qual
trocaremos t por t − 1, isto é,
1 −s 1
L {y} − · e L {sen(2t)} = L {u1 (t) sen [2(t − 1)]},
2 2
de modo que
1
y(t) = u1 (t) sen [2(t − 1)] .
2
No Exemplo a seguir será útil usar as transformadas de Laplace do seno e do cosseno hiperbólicos. Por
exemplo, lembramos que
ebt + e−bt
cosh(bt) = .
2
Com isso,
1 1 1 1 1 2s s
L {cosh(bt)} = L {ebt } + L {e−bt } = + = = .
2 2 s−b s+b 2 s2 − b2 s2 − b2
Analogamente, como
ebt − e−bt
senh(bt) = ,
2
temos
1 1 1 1 1 2b b
L {senh(bt)} = L {ebt } − L {e−bt } = − = = .
2 2 s−b s+b 2 s2 − b2 s2 − b2
Note como as fórmulas são semelhantes às do cosseno e seno usuais, mas nos denominadores um sinal de +
foi trocado por um de −, como era de se esperar já que para as funções hiperbólicas vale cosh2 (x)−senh2 (x) =
1.
L {y} = L {20u3 (t) senh(t − 3) + cosh(t)} ∴ y(t) = 20u3 (t) senh(t − 3) + cosh(t) .
3.5 A convolução
Sejam f (t) e g(t) funções tais que F (s) = L {f (t)} e G(s) = L {g(t)}. Como podemos expressar F (s)G(s)
em termos de f e g? Infelizmente, o produto das transformadas não é igual à transformada do produto,
mas ainda podemos conseguir algo. Sabemos que
Z ∞ Z ∞
F (s)G(s) = L {f (t)}L {g(t)} = e−sx f (x)dx e−sy g(y)dy.
0 0
Como as variáveis de integração em cada integral são distintas, podemos escrever esse produto como uma
integral dupla, ou seja,
Z ∞Z ∞ Z ∞ Z ∞
−sx −sy −s(x+y)
F (s)G(s) = e e f (x)g(y)dxdy = g(y) e f (x)dx dy.
0 0 0 0
A região de integração, no plano ty, desta integral iterada corresponde a um setor infinito como o da Figura
3.5.1.
Z ∞
e−st ∞t0 f (t − y)g(y)dy dt .
F (s)G(s) =
0
3.5. A CONVOLUÇÃO 97
A função que aparece entre colchetes na expressão acima é chamada de convolução de f e g e é denotada
por f ? g. Dessa forma, temos
Z t
f ? g(t) = f (t − y)g(y)dy .
0
Após algumas integrais por partes (que ficam como exercı́cio para o leitor), chegamos a
isto é,
t2 ? sen(t) = −t2 cos(t) + t2 − 2t(sen(t) − t cos(t)) − t2 sen(t) + 2 sen(t) − 2t cos(t).
Organizando essa última expressão, concluı́mos que
(1) f ? g = g ? f .
(2) f ? (g + h) = (f ? g) + h.
(3) (f ? g) ? h = f (g ? h).
(4) f ? 0 = 0.
Será que a convolução do exemplo anterior seria mais simples pela segunda integral? Deixamos esta veri-
ficação como mais um exercı́cio para o leitor.
Exemplo 3.5.2. Resolva o PVI
Solução. Como não sabemos nada sobre a função g(t), deixaremos a resposta em termos de uma convolução.
Comecemos como habitualmente, aplicando a transformada de ambos os lados e usando a linearidade. Fi-
camos com
L {y 00 } + 4L {y 0 } + 4L {y} = L {g(t)}.
Daı́,
s2 L {y} − s − y 0 (0)
y(0) + 4(sL {y} −
+ 4L {y} = L {g(t)},
y(0))
ou seja,
1
(s2 + 4s + 4)L {y} = L {g(t)} ⇒ (s + 2)2 L {y} = L {g(t)} ⇒ L {y} = L {g(t)} · .
(s + 2)2
Como
1
= L {te−2t },
(s + 2)2
segue que
L {y} = L {g(t)}L {te−2t } = L {g(t) ? (te−2t )}.
Com isso, podemos escrever
Z t
y(t) = g(t) ? (te−2t ) ou y(t) = g(t − y)ye−2y dy .
0
O Exemplo a seguir também poderia ser resolvido usando frações parciais (resolva-o assim também e
compare as resoluções). Mostramos uma resolução alternativa que usa a convolução.
Exemplo 3.5.3. Calcule L −1 {F (s)} se
s
F (s) =
(s + 1)(s2 + 4)
usando convolução.
Solução. Já sabemos que
1 s
= L {e−t } e 2 = L {cos(2t)}.
s+1 s +4
Dessa forma,
F (s) = L {e−t }L {cos(2t)} = L {e−t ? cos(2t)}.
Se calcularmos esta convolução teremos a nossa resposta. Observe que
Z t Z t Z t
e−t ? cos(2t) = e−(t−y) cos(2y)dy = e−t ey cos(2y)dy = e−t ey cos(2y).
0 0 0
Essa integral pode ser resolvida por duas integrações por partes. De fato, verifique que
ey (cos(2y) + 2 sen(2y))
Z
ey cos(2y)dy = .
5
Daı́,
t
e−t ey (cos(2y) + 2 sen(2y) e−t t
L −1 {F (s)} =
= e (cos(2t) + 2 sen(2t)) − 1 .
5 0 5
Assim,
cos(2t) + 2 sen(2t) − e−t
L −1 {F (s)} = .
5
3.5. A CONVOLUÇÃO 99
Solução. Basta observar que f (t) = e−t ? sen(2t). Onde deveria haver y na integral há x, mas isso não
é problema (a substituição y = x na integral não altera em nada o seu formato, só o nome da variável de
integração). Com isso,
1 2
L {f (t)} = L {e−t ? sen(2t)} = L {e−t }L {sen(2t)} = · 2 ,
s+1 s +4
isto é,
2
L {f (t)} = .
(s + 1)(s2 + 4)
100 CAPÍTULO 3. TRANSFORMADA DE LAPLACE
Capı́tulo 4
O problema de representar uma função como uma série infinita é bastante recorrente. Por exemplo,
sabemos que podemos representar uma função f (x) como série de potências usando as séries de Taylor. Sob
certas condições, temos que
X∞
f (x) = an (x − x0 )n ,
n=0
onde os coeficientes são dados em termos da função f como
f (n) (x0 )
an = .
n!
Nosso objetivo agora será representar uma função periódica como uma série de senos e cossenos.
Dada uma função periódica f , com perı́odo 2L, sua série de Fourier será definida como
∞
a0 X nπx nπx
SF (f )(x) = + an cos + bn sen .
2 n=1
L L
Convém relembrar o conceito de função periódica: diremos que f é periódica se existir T ∈ R (chamado
de perı́odo de f ) tal que f (x + T ) = f (x) para todo x. Também costumamos dizer que f é T -periódica. O
menor perı́odo positivo é o perı́odo fundamental de f . Por exemplo, f (x) = sen(x) tem perı́odo fundamental
2π
igual a 2π, enquanto g(x) = sen(ax) tem perı́odo fundamental igual a .
|a|
101
102 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS
nπx nπx
A segunda relação é a mais simples de ser demonstrada, pois cos é uma função par e sen ,
L L
portanto seu produto configura uma função ı́mpar que, integrada em um intervalo simétrico em relação à
origem, fornece zero como resultado.
Os cálculos para as outras duas relações são bem parecidos. A ideia é transformar o produto de cossenos
ou senos em soma ou subtração. Sabemos que
cos(A + B) = cos(A) cos(B) − sen(A) sen(B) e cos(A − B) = cos(A) cos(B) + sen(A) sen(B).
Com essas identidades encontramos o que queremos. Por exemplo,
cos(A + B) + cos(A − B)
cos(A) cos(B) = .
2
Assim, podemos resolver a integral no caso m 6= n fazendo
"Z #
L L Z L
(n − m)πx
Z nπx mπx 1 (n + m)πx
cos cos dx = cos dx + cos dx
−L L L 2 −L L −L L
L
1 L (n + m)πx L (n − m)πx
= sen + sen = 0,
2 (n + m)π L (n − m)π L −L
pois ao substituirmos x por ±L sempre obtemos senos de múltiplos inteiros de π, que valem zero.
Obviamente, o caso n = m não pode ser resolvido desta forma pois um dos denominadores se tornaria
igual a zero. A integral original se torna
Z L nπx Z L
2 1 2nπx
cos dx = 1 + cos dx
−L L 2 −L L
L
1 L 2nπx 1
= x+ sen = · 2L = L.
2 2nπ L −L 2
Novamente, a parte do seno dá zero pelo mesmo motivo da integração anterior. Note ainda que usamos a
identidade
1 + cos(2x)
cos2 (x) = .
2
A fórmula envolvendo o produto de senos pode ser demonstrada de forma análoga ao que acabamos de fazer
e fica como exercı́cio para o leitor.
Agora, usaremos as identidades acima para determinar os coeficientes de Fourier de uma função f 2L-
periódica. Suponha que vale a igualdade
∞
a0 X nπx nπx
f (x) = + an cos + bn sen
2 n=1
L L
e que podemos integrar termo a termo uma série desse tipo (de fato, podemos, mas a justificativa deste fato
foge aos propósitos destas notas). Dessa forma, integrando os dois lados da igualdade acima de −L a L,
obtemos
∞
Z L !
a0 L
Z X Z L nπx Z L nπx
f (x)dx = dx + an cos dx + bn sen dx .
−L 2 −L n=1 −L L −L L
A primeira integral dentro do somatório vale zero, e motivo já está ficando repetitivo: ao integrarmos e
substituirmos x por L e −L, obteremos senos em múltiplos inteiros de π, os quais valem zero. Lembre-se
desse fato pois será importante nos exemplos. A segunda integral dentro do somatório também vale zero
uma vez que o integrando é uma função ı́mpar, integrada de −L a L. Assim,
Z L Z L
a0 a0 1
f (x)dx = x|L
−L = · 2L ∴ a0 = f (x)dx .
−L 2 2 L −L
4.1. CÁLCULO DOS COEFICIENTES DE FOURIER 103
mπx
Para determinar os an ’s, vamos multiplicar a igualdade entre f e sua série de Fourier por cos ,
L
onde m é um natural fixado. Assim, após integrar de −L a L, obtemos
Z L mπx Z L
a0 mπx
f (x) cos dx = cosdx
−L L 2 −L L
∞
" Z #
X L nπx mπx Z L nπx mπx
+ an cos cos dx + bn sen cos dx
n=1 −L L L −L L L
A primeira integral do lado direito vale zero, como vimos anteriormente. A terceira também vale zero,
de acordo com a identidade (2). Pela fórmula (1), a segunda integral vale 0 se n 6= m e vale L se n = m.
Então, o único termo que sobra na direita é am L. Daı́, temos
Z L
1 mπx
am = f (x) cos dx .
L −L L
Deixamos como exercı́cio para o leitor repetir os passos acima, com as adaptações necessárias, para concluir
que
1 L
Z mπx
bm = f (x) sen dx .
L −L L
2 Z 2
2 nπx 2 nπx
an = · x · sen − sen dx
nπ 2 nπ 0 2
| {z }0
0
4 nπx 2 4
= 2 2 cos = 2 2 (cos(nπ) − 1)
n π 2 0 n π
(
4 0, n par
n
= 2 2 ((−1) − 1) = 8 .
n π − 2 2 , n ı́mpar
n π
Observe que o termo destacado como zero tem esse valor por conta do argumento repetitivo dos múltiplos
inteiros de π. Fazendo n = 2k −1 para obtermos apenas os termos ı́mpares, concluı́mos que a série de Fourier
de f é
∞
8 X 1 nπx
SF (f )(x) = 1 − cos .
π2 (2k − 1)2 2
k=1
Ainda sobre a serie de Fourier acima, suponha que f (x) = SF (f )(x) (na próxima seção veremos quando
e onde isso ocorre) e faça x = 0. Então,
∞
8 X 1
0 = f (0) = 1 − .
π2 (2k − 1)2
k=1
∞
X 1 1 1 1 1 π2
= 1 + + + + + · · · = .
(2k − 1)2 9 25 49 81 8
k=1
De agora em diante, poderemos usar séries de Fourier para calcular a soma de algumas séries numéricas
convergentes.
4.2. O TEOREMA DE FOURIER 105
Na Seção anterior, vimos que a série de Fourier de uma função f , com perı́odo 2L, é
∞
a0 X nπx nπx
SF (f )(x) = + an cos + bn sen ,
2 n=1
L L
onde Z L Z L Z L
1 1 nπx 1 nπx
a0 = f (x)dx, an = f (x) cos dx, bn = f (x) sen dx.
L −L L −L L L −L L
Nesta seção vamos determinar quando e onde uma função f 2L-perı́odica é igual à sua série de Fourier.
Teorema 4.2.1 (Teorema de Fourier). Seja f uma função 2L-periódica tal que f e f 0 sejam contı́nuas por
partes para −L ≤ x ≤ L. Então a série de Fourier de f converge para f nos pontos onde f for contı́nua e
f (x+ ) + f (x− )
para onde for descontı́nua. As notações f (x+ ) e f (x− ) indicam os limites laterais direito e
2
esquerdo de f em x, respectivamente.
Vejamos um par de exemplos para ilustrar possı́veis aplicações deste Teorema.
Exemplo 4.2.1. Seja f : R → R uma função periódica de perı́odo 2π que no intervalo [−π, π] é dada por
f (x) = x2 /4.
(a) Encontre a série de Fourier de f .
(b) Esboce o gráfico da série de Fourier de f no intervalo [−π, 3π].
∞
X (−1)n+1
(c) Use o item (a) e o Teorema de Fourier para calcular a soma da série .
n=1
n2
pois o produto de uma função par por uma função ı́mpar é uma função ı́mpar, cuja integral em [−π, π] vale
zero. Além disso,
π
1 π x2 dx 1 x3 π2
Z
a0 = = ⇒ a0 = ,
π −π 4 4π 3 π 6
e !
π π
x2 x2 sen(nx) 2 π
Z Z
1 1
an = cos(nx)dx = − x sen(nx)dx
π π 4 π n −π n −π
! !
π Z π π π
1 x cos(nx) cos(nx) 1 x cos(nx) sen(nx)
=− − + dx = − − + 2
2nπ n −π −π n 2nπ n −π n π
1 1 cos(nπ) (−1)n
= (π cos(nπ) − (−π) cos(−nπ)) = 2 (cos(nπ) + cos(−nπ)) = = .
2n2 π 2n n2 n2
∞
π 2 X (−1)n
SF (f )(x) = + cos(nx) .
12 n=1 n2
106 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS
Figura 4.2.1: Gráfico da série de Fourier da função f do Exemplo 4.2.1, que coincide com o gráfico de f
Para esboçar o gráfico da série de Fourier de f , observe que essa função é contı́nua em toda a reta, logo
f é igual à soma de sua série de Fourier, de acordo com o Teorema de Fourier. Assim, podemos construir o
gráfico da série, que está exposto na Figura 4.2.1.
∞
X (−1)n+1
Finamente, para calcular a soma da série , fazemos x = 0 em
n=1
n2
∞
π 2 X (−1)n
f (x) = + cos(nx),
12 n=1 n2
que é uma igualdade válida pois sabemos que a série converge para a função em todo x real. Obtemos
∞ ∞ ∞
π 2 X (−1)n X (−1)n π2 X (−1)n+1 π2
0= + 2
⇒ − 2
= ⇒ 2
= .
12 n=1 n n=1
n 12 n=1
n 12
∞
X (−1)n+1
No curso de Cálculo 3 nós vimos que uma série como é convergente. Para isso, podemos
n=1
n2
usar o Teste da Série Alternada, por exemplo. No entanto, na maioria dos casos não éramos capazes de dizer
qual o valor da soma da série, e o exemplo acima mostra que séries de Fourier podem ser usadas para isso,
como já havı́amos começado a verificar na Seção anterior. Vejamos outro exemplo:
Exemplo 4.2.2. Considere a função periódica de perı́odo 4 que no intervalo (−2, 2] é dada por
x + 1, −2 < x ≤ −1
f (x) = 1 − x2 , −1 ≤ x ≤ 1 .
x − 1, 1 < x ≤ 2
Vemos, assim, que f é contı́nua em todos os pontos do intervalo, com exceção de −2 e 2. Pelo Teorema
de Fourier, a série de Fourier de f converge para f nos pontos em que f é contı́nua e para a média aritmética
entre os limites laterais de f onde é descontı́nua. Tanto em −2 quanto em 2, a média entre os limites laterais
vale 0. Portanto, o gráfico da série é o exposto na Figura 4.2.3.
Observe, pela simetria no gráfico de f , que a primeira e a terceira integrais acima após o último sinal de
igualdade se cancelam. Resta apenas
1 1 1
x3
Z Z
1 1 1 2
a0 = (1 − x2 )dx = ·2 (1 − x2 )dx = x− =1− = .
2 −1 2 0 3 0 3 3
Note que usamos o fato de que a função 1 − x2 é par, portanto sua integral no intervalo [−1, 1] é o dobro da
sua integral no intervalo [0, 1].
Daı́, a série de Fourier de f é
∞
1 X nπx nπx
SF (f )(x) = + an cos + bn sen .
3 n=1 2 2
Como f é contı́nua em x = 0, temos que SF (f )(0) = f (0) = 1, pelo Teorema de Fourier, portanto
∞ ∞ ∞
1 X 1 X X 2
+ (an cos 0 + bn sen 0) = 1 ⇒ + an = 1 ⇒ an = .
3 n=1 3 n=1 n=1
3
108 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS
Exemplo 4.2.3. Seja f : R → R uma função periódica de perı́odo 2π que no intervalo (−π, π] é dada por
0, −π < x ≤ 0
f (x) = .
x2 , 0 ≤ x ≤ π
Dessa vez, a função é descontı́nua apenas nos pontos −3π, −π, π e 3π. Pelo Teorema de Fourier, a série
converge para f (x) nos pontos onde f é contı́nua, e converge para a média aritmética entre os limites laterais
de f onde não o for. No nosso caso, a média entre os limites laterais nesses quatro pontos vale π 2 /2. Assim,
podemos esboçar o gráfico da série de Fourier de f como na Figura 4.2.5.
L π π
1 x3 π2
Z Z
1 1
a0 = f (x)dx = x2 dx = · = .
L −L π 0 π 3 0 3
π π π
2(−1)n
Z
2 x cos(nx) 1 2 π cos(nπ) 1 sen(nx)
an = − − + cos(nx)dx =− − + · = .
nπ n 0 n 0 nπ n n n 0 n2
∞
π 2 X 2(−1)n π(−1)n+1 2 [(−1)n − 1]
SF (f )(x) = + cos(nx) + + sen(nx) .
6 n=1
n2 n πn3
π2
Finalmente, pelo Teorema de Fourier, sabemos que SF (f )(π) = , mas como sen(nπ) = 0 para todo n
2
e cos(nπ) = (−1)n , a série torna-se
∞ ∞ ∞
π 2 X 2(−1)n (−1)n X 1 π2 π2 π2 X 1 π2
SF (f )(π) = + ⇒ 2 = − = ⇒ = .
6 n=1
n2 n=1
n2 2 6 3 n=1
n2 6
A identidade de Parseval consiste em uma fórmula que envolve os quadrados dos coeficientes de Fourier.
Sua demonstração foge aos objetivos destas notas, mas seu enunciado está apresentado a seguir, seguido de
uma aplicação em um exemplo.
Teorema 4.2.2 (Identidade de Parseval). Se f (x) tem série de Fourier
∞
a0 X nπx nπx
+ an cos + bn sen ,
2 n=1
L L
110 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS
então
L ∞
a20 X 2
Z
1
|f (x)|2 dx = + (an + b2n ) .
L −L 2 n=1
Exemplo 4.2.4. Considere a função f (x) = 1 − |x| para −1 < x ≤ 1 e definida fora desse intervalo como
∞
X
periódica de perı́odo 2. Na notação usual dos coeficientes de Fourier, calcule a2n .
n=1
Além disso,
1 1 1 1
x2
Z Z Z
2
|1 − |x||2 dx = (1 − 2|x| + x2 )dx = 2 (1 − 2x + x2 )dx = 2 x − x2 + = ,
−1 −1 0 3 0 3
onde usamos o fato de que a função 1 − 2|x| + x2 é par e que |x| = x no intervalo [0, 1]. Pela identidade de
Parseval,
∞ ∞
2 1 X 2 X 1
= + an ⇒ a2n = .
3 2 n=1 n=1
6
Suponha que f é uma função par e periódica de perı́odo 2L. Os coeficientes de sua série de Fourier são
1 L 1 L 1 L
Z Z Z
nπx nπx
a0 = f (x)dx, an = f (x) cos dx e bn = f (x) sen dx.
L −L L −L L L −L L
nπx nπx
Como f é par, temos que f (x) cos é par e f (x) sen é ı́mpar. Daı́,
L L
2 L 2 L
Z Z
nπx
a0 = f (x)dx, an = f (x) cos dx e bn = 0.
L 0 L 0 L
Logo, a série de Fourier de uma função par é
∞
a0 X nπx
+ an cos ,
2 n=1
L
2 L
Z
nπx
bn = f (x) sen dx.
L 0 L
Logo, a série de Fourier de uma função ı́mpar é
∞
X nπx
bn sen ,
n=1
L
4.4. PROBLEMA DA CONDUÇÃO DO CALOR 111
Exemplo 4.3.1. Represente a função f (x) = 1 − x, definida em [0, 1], como uma série de cossenos.
Solução. Vamos considerar a extensão par de f , com perı́odo 2. Como vimos, a série de Fourier é
∞
a0 X
+ an cos(nπx),
2 n=1
onde 1
L 1
x2
Z Z
2 2
a0 = f (x)dx = (1 − x)dx = 2 x − = 1 ,
L 0 1 0 2 0
e Z 1
2
an = f (x) cos(nπx)dx = 2 (1 − x) cos(nπx)dx.
1 0
4
que vale 0 quando n é par e vale quando n é ı́mpar. Dessa forma, a série de cossenos de f é
n2 π 2
1 4 X 1
+ · cos(nπx) .
2 π2 n2
n ı́mpar
Considere uma barra homogênea de comprimento L. Suponha que o calor flui apenas ao longo do eixo
da barra. É possı́vel mostrar que, se u(x, t) é a distribuição de temperaturas no ponto x ∈ [0, L] no instante
t, então u satisfaz a equação
α2 uxx = ut .
definida no intervalo [0, L]. Para determinar qual é a função u(x, t) precisamos resolver o problema de valores
iniciais e de contorno 2
α uxx = ut , 0 < x < l, t > 0
u(0, t) = u(L, t) = 0, t > 0 .
u(x, 0) = f (x), 0 < x < L
Faremos isso usando o Método de Separação de Variáveis, que consiste em supor que a solução
u(x, t) é da forma
u(x, t) = X(x)T (t) ,
isto é, o produto de uma função que depende só de x por outra que depende somente de t. Assim, temos
uxx = X 00 T e ut = XT 0 , de modo que a equação do calor pode ser reescrita como α2 X 00 T = XT 0 , ou seja,
X 00 1 T0
= 2· .
X α T
Na última igualdade, o lado esquerdo depende apenas de x, enquanto o lado direito depende apenas de t.
Como x e t são variáveis independentes uma da outra, a única possibilidade para que essa equação seja
verdadeira é que os dois lados sejam iguais a uma constante, a qual chamaremos de λ. Assim,
X 00 1 T0
= 2· =λ
X α T
nos fornece duas equações diferenciais ordinárias
X 00 − λX = 0 e T 0 − λα2 T = 0 .
O método já se mostra útil, pois converteu uma equação diferencial parcial em duas EDOs, as quais já
sabemos resolver.
No começo do problema fizemos a imposição u(0, t) = u(L, t) = 0 para todo t > 0. Vejamos como essas
condições se expressam em termos das funções X e T . Note que 0 = u(0, t) = X(0)T (t). Logo, X(0) = 0
ou T (t) = 0 para todo t. Se T (t) = 0, terı́amos u(x, t) = 0 sempre, uma situação que não é nem um
pouco interessante. Impomos, então, X(0) = 0. Pela mesma razão, impomos também X(L) = 0. Com isso,
precisamos resolver a EDO X 00 − λX = 0 sujeita às condições de fronteira X(0) = X(L) = 0, porém nada
sabemos, ainda, sobre a constante λ. Por conta disso, precisamos analisar cada possibilidade acerca do sinal
de λ separadamente.
Se λ > 0, escrevemos λ = µ2 . A equação fica X 00 − µ2 X = 0, cuja equação caracterı́stica é r2 − µ2 = 0,
que tem r = ±µ como raı́zes. A solução é
e
X(L) = C1 sen(µL) = 0.
Para termos soluções não nulas, precisamos ter sen(µL) = 0, logo µL = nπ, isto é,
nπ n2 π 2
µ= e λ=− .
L L2
n2 π 2 α 2
T0 + T = 0,
L2
que é uma equação de variáveis separáveis de solução
2 2 2
n π α
Tn (t) = exp − t .
L2
Como u(x, t) = X(x)T (t), então para cada n ∈ N obtemos uma solução fundamental
n2 π 2 α 2
nπx
un (x, t) = Xn (x)Tn (t) = sen exp − t .
L L2
Como anteriormente, a solução geral será dada pelas combinações lineares das soluções fundamentais. A
diferença é que aqui temos uma quantidade infinita de soluções fundamentais, de modo que a solução geral
é uma série infinita
∞ 2 2 2
X n π α nπx
u(x, t) = cn exp − t sen .
n=1
L2 L
Para terminar, falta apenas determinar os coeficientes. Aplicando a condição inicial u(x, 0) = f (x),
obtemos
X∞ nπx
f (x) = cn sen .
n=1
L
Desse, os cn ’s são os coeficientes da série de Fourier de senos de f (x) (isto é, os coeficientes de Fourier de
sua extensão ı́mpar). Portanto,
2 L
Z nπx
cn = f (x) sen dx .
L 0 L
Exemplo 4.4.1. Uma barra com comprimento π e difusividade térmica α2 = 1 é isolada lateralmente de
modo que o calor só pode fluir ao longo do eixo. Se suas extremidades são mantidas à temperatura fixa
T = 0, determine a distribuição de temperatura ao longo do tempo, sabendo que a distribuição inicial de
temperaturas é descrita pela função f (x) = x, 0 < x < π.
114 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS
∞
X
u(x, t) = cn exp(−n2 t) sen(nx) ,
n=1
pois L = π e α2 = 1. Os coeficientes cn são os mesmos da série de Fourier de senos de f (x) = x, isto é,
2 π
Z
cn = x sen(nx)dx.
π 0
Fazendo u = x e dv = sen(nx)dx, temos du = dx e v = − cos(nx)/n. Pela fórmula de integração por partes,
π π
1 π
Z
2 x cos(nx) 2 x cos(nx) sen(nx) 2 π cos(nπ)
cn = − + cos(nx)dx = − + = − .
π n 0 n 0 π n n2 0 π n
Daı́,
2(−1)n 2(−1)n+1
cn = − = .
n n
Portanto, a solução é
∞
X (−1)n+1 exp(−n2 t) sen(nx)
u(x, t) = 2 .
n=1
n
Acabamos de resolver o problema homogêneo do calor, isto é, com as extremidades da barra mantidas
à temperatura fixa de 0◦ C. Vamos mostrar agora que, se as extremidades forem mantidas a temperaturas
diferentes de zero, podemos reduzir esse novo problema ao anterior usando um pouco de Fı́sica. Formalmente,
o que queremos fazer é resolver o problema
2
α uxx = ut , 0 < x < L, t > 0
u(0, t) = T1 , u(L, t) = T2 , t > 0 .
u(x, 0) = f (x) = x, 0 < x < L
Fisicamente, sabemos que, quando t → ∞¡ a distribuição de temperaturas na barra vai atingir um estado
estacionário v(x), referente ao equilı́brio térmico, que não varia com o tempo. Como v(x) é uma distribuição
de temperaturas na barra, ele deve satisfazer a equação do calor, portanto α2 v 00 = vt = 0, ou seja, v 00 = 0,
portanto
v(x) = C1 x + C2 .
Como v(x) também deve satisfazer as condições de fronteira, vemos que v(0) = T1 , logo C2 = T1 ,
T2 − T1
enquanto T2 = v(L) = c1 L + T1 , ou seja, C1 = . Desse modo, a distribuição estacionária é
L
T2 − T1
v(x) = x + T1 .
L
4.4. PROBLEMA DA CONDUÇÃO DO CALOR 115
Agora, vamos supor que a solução do problema não homogêneo pode ser escrita na forma
u(x, t) = v(x) + w(x, t).
Precisamos determinar qual é a função w. Primeiramente, note que
uxx = v 00 + wxx = wxx e ut = vt + wt = wt ,
logo w satisfaz a equação do calor, já que u a satisfaz. Note também que
T1 = u(0, t) = v(0) + w(0, t) = T1 + w(0, t)
e
T2 = u(L, t) = v(L) + w(L, t) = T2 + w(L, t),
ou seja,
w(0, t) = w(L, t) = 0.
Finalmente,
f (x) = u(x, 0) = v(x) = w(x, 0) ⇒ w(x, 0) = f (x) − v(x).
O que acabamos de mostrar foi que w(x, t) é a solução de um problema homogêneo do calor, que é dado
por 2
α wxx = wt , 0 < x < L, t > 0
w(0, t) = w(L, t) = 0, t > 0 .
w(x, 0) = f (x) − v(x), 0 < x < L
T2 − T1
Assim, para resolver o problema não homogêneo, encontramos a distribuição estacionária v(x) = x+
L
T1 e escrevemos u(x, t) = v(x) + w(x, t), onde w(x, t) é solução do problema homogêneo associado acima.
Repare que o que vimos acima funciona quase da mesma forma que as equações diferenciais ordinárias linea-
res de segunda ordem: a solução do problema não homogêneo corresponde à soma de uma solução particular
desse problema (o estado estacionário) com a solução de um problema homogêneo associado.
Exemplo 4.4.2. Resolva o problema
uxx = ut , 0 < x < π, t > 0
u(0, t) = 2π, u(π, t) = π, t > 0 .
u(x, 0) = 2π, 0 < x < L
portanto a solução é
∞
X (−1)n+1 exp(−n2 t) sen(nx)
u(x, t) = −x + 2π + 2 .
n=1
n
116 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS
Se não há fluxo de calor em uma das extremidades, a condição de fronteira satisfeita nesse ponto é ux = 0,
pois, no ponto, não há troca de calor com o ambiente: nem entra calor nem perde-se calor. Assim, se a barra
possui as duas extremidades isoladas, temos o problema
2
α uxx = ut , 0 < x < L, t > 0
ux (0, t) = ux (L, t) = 0, t > 0 .
u(x, 0) = f (x), 0 < x < L
Para obter a solução, usamos novamente o método de separação de variáveis. Começamos supondo que
a solução é da forma
u(x, t) = X(x)T (t).
Logo, α2 X 00 T = XT 0 , ou seja,
X 00 1 T0
= 2 .
X α T
Novamente, isso só é possı́vel se ambos os lados forem iguais a uma constante λ. Isso nos fornece as equações
X 00 − λX = 0 e T 0 − λα2 T = 0.
Das condições de fronteira, obtemos
e
0 = ux (L, t) = X 0 (L)T (t) ⇒ X 0 (L) = 0.
Agora, resolvemos a EDO envolvendo a função X(x) com essas condições de fronteira, separando em casos
de acordo com o sinal de λ.
Se λ > 0, escrevemos λ = µ2 . A equação fica X 00 − µ2 X = 0, com equação caracterı́stica r2 − µ2 = 0,
que tem raı́zes r = ±µ. A solução é
X(x) = C1 eµx + C2 e−µx .
Daı́, temos
X 0 (x) = µC1 eµx − µC2 e−µx ,
logo X 0 (0) = µC1 − µC2 = 0 e X 0 (L) = µC1 eµL − µC2 e−µL = 0. Como uma equação não é múltipla da
outra, a única possibilidade é C1 = C2 = 0, o que nos fornece apenas soluções nulas.
Se λ = 0, a equação fica X 00 = 0, logo X(x) = C1 x + C2 . Daı́, X 0 (x) = C1 , portanto X 0 (0) = X 0 (L) =
C1 = 0. Resta apenas X(x) = C2 , que pode ser uma solução não nula. Para que fique no formato das
c0
séries de Fourier, vamos escrever X0 (x) = como a primeira solução fundamental obtida por separação de
2
variáveis.
Finalmente, se λ < 0, escrevemos λ = −µ2 . A EDO é X 00 + µ2 X = 0, cuja equação caracterı́stica é
r + µ2 = 0, com raı́zes r = ±µi. A solução é
2
Daı́,
X 0 (x) = µC1 cos(µx) − µC2 sen(µx),
logo X 0 (0) = µC1 = 0, ou seja, C1 = 0. Além disso, X 0 (L) = −µC2 sen(µL) = 0, o que produz soluções não
nulas se sen(µL) = 0, isto é, se µL = nπ. Daı́,
nπ n2 π 2
µ= e λ=− .
L L2
Agora, resolvemos a EDO relativa à função T (t) usando o valor calculado para λ. Esta equação é
n2 π 2 α2
T0 + T = 0,
L2
4.5. EQUAÇÃO DA ONDA 117
No caso λ = 0, a equação para T (t) fica T 0 = 0, logo T (t) = K e obtemos, removendo a constante K e
c0
deixando apenas o fator 1, T0 (t) = 1 e X0 (x) = . Com isso, as soluções fundamentais são
2
2 2 2
c0 n π α nπx
u0 (x, t) = e un (x, t) = Xn (x)Tn (t) = exp − t cos .
2 L2 L
A solução geral u(x, t) é obtida pelas combinações lineares das soluções fundamentais (note que já temos
uma constante em u0 ). Assim, temos
∞ 2 2 2
c0 X n π α nπx
u(x, t) = + cn exp − t cos .
2 n=1
L2 L
Para determinar os coeficientes, usamos a condição inicial u(x, 0) = f (x). Logo, temos
∞
c0 X nπx
+ cn cos = f (x),
2 n=1
L
ou seja, os coeficientes são os mesmos da série de Fourier de cossenos de f (tecnicamente, os de sua extensão
par), que são dados por
Z L Z L
2 2 nπx
c0 = f (x)dx e cn = f (x) cos dx .
L 0 L 0 L
Nesta seção nós vamos considerar o movimento de uma corda na qual uma onda se propaga com velocidade
a. Vamos supor que a corda tem comprimento L e que suas extremidades estão fixas a uma altura igual a
0. Além disso, digamos que a posição inicial da corda é dada por uma função f (x), 0 ≤ x ≤ L, e que sua
velocidade transversal inicial é g(x), 0 ≤ x ≤ L. Para termos compatibilidade entre nossas suposições, note
que precisamos ter f (0) = f (L) = 0 (pois as extremidades são mantidas à altura 0) e g(0) = g(L) = 0 (já
que as extremidades estão paradas).
É possı́vel mostrar que a posição u(x, t) de um ponto da corda no instante t satisfaz a equação da onda
Logo, o problema da onda em uma corda pode ser representado matematicamente como
2
a uxx = utt , 0 < x < L, t > 0
u(0, t) = u(L, t) = 0, t > 0
.
u(x, 0) = f (x), 0 < x < L
ut (x, 0) = g(x), 0 < x < L
118 CAPÍTULO 4. SÉRIES DE FOURIER E EQUAÇÕES DIFERENCIAIS PARCIAIS
Estudaremos o caso g(x) ≡ 0, ou seja, em que a corda parte do repouso, sem velocidade inicial. Assim,
o problema proposto é 2
a uxx = utt , 0 < x < L, t > 0
u(0, t) = u(L, t) = 0, t > 0
.
u(x, 0) = f (x), 0 < x < L
ut (x, 0) = 0, 0 < x < L
Novamente, usaremos o método de separação de variáveis. Suponha que u(x, t) = X(x)T (t). Logo,
a2 X 00 T = XT 00 , e então
X 00 1 T 00
= 2 .
X a T
Essa equação só pode ser satisfeita se ambos os lados forem iguais a uma constante λ ∈ R. Obtemos as
equações
X 00 − λX = 0 e T 00 − λa2 T = 0.
Note que 0 = u(0, t) = X(0)T (t) implica X(0) = 0. Analogamente, X(L) = 0. Isso indica que devemos
analisar a equação X 00 − λX = 0 sujeita às condições de contorno X(0) = X(L) = 0. Esse é o mesmo
problema que resolvemos anteriormente quando estudamos a equação do calor. Aproveitamos os cálculos já
feitos e escrevemos as soluções fundamentais como
nπx
Xn (x) = sen ,
L
onde λ = −n2 π 2 /L2 .
De posse desse valor de λ, resolvemos a equação envolvendo a função T , que torna-se
n2 π 2 a2
T 00 + T = 0.
L2
A equação caracterı́stica é
n2 π 2 a 2
r2 + = 0,
L2
nπa
logo r = ± i. A solução é
L
nπat nπat
T (t) = K1 sen + K2 cos .
L L
Para simplificar, escrevamos
T (t) = K1 sen(αt) + K2 cos(αt)
por enquanto. Sabemos que ut (x, 0) = 0, mas ut (x, t) = X(x)T 0 (t), logo X(x)T 0 (0) = 0, ou seja, T 0 (0) = 0.
Assim,
T 0 (t) = αK1 cos(αt) − αK2 sen(αt) ⇒ T 0 (0) = αK1 = 0.
Como α = nπa/L, vemos que α 6= 0, portanto K1 = 0 e as soluções fundamentais são
nπat
Tn (t) = cos .
L
Desse modo, as soluções fundamentais do problema da onda possuem a forma
nπx
nπat
un (x, t) = sen cos ,
L L
onde n é um inteiro positivo, e a solução geral é obtida pelo princı́pio da superposição tomando combinações
lineares dessas funções, ou seja,
∞ nπx
X nπat
u(x, t) = cn sen cos .
n=1
L L
4.5. EQUAÇÃO DA ONDA 119
portanto os coeficientes são mesmos da série de Fourier de senos de f (x) (isto é, de sua extensão ı́mpar
2L-periódica), dados por
2 L
Z nπx
cn = f (x) sen dx .
L 0 L
Solução. Trata-se de um problema de uma onda que se desloca em uma corda de comprimento L = 1 e
com velocidade a = 1. Sabemos que a solução é da forma
∞
X
u(x, t) = cn sen(nπx) cos(nπt)
n=1
e temos
∞
X
cn sen(nπx) = u(x, 0) = 2 sen(3πx) − sen(5πx).
n=1
Por comparação, os únicos coeficientes não nulos da série são c3 = 2 e c5 = −1, portanto a série tem apenas
dois termos, na prática, e a solução do problema é