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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS


DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE ESTRUTURAS

NOTAS DE AULA DA DISCIPLINA SET 5926


INTRODUÇÃO À MECÂNICA DA FRATURA

PROFESSOR EDSON DENNER LEONEL


PRÓ-REITORIA
DE
PÓS-GRADUAÇÃO

FORMULÁRIO PARA APRESENTAÇÃO DE DISCIPLINAS


SIGLA DA DISCIPLINA: SET- 5926 SIGLA DO DEP.: SET

NOME DA DISCIPLINA: INTRODUÇÃO À MECÂNICA DA FRATURA

ÁREA: ENGENHARIA DE ESTRUTURAS

Nº DA ÁREA: 3010200-6
VALIDADE INICIAL (Ano/Semestre): 2012/1 º
Nº DE CRÉDITOS: 12 Aulas Teóricas: 03
Aulas Práticas :
Seminários e Outros: 01
Horas de Estudo: 08
DURAÇÃO EM SEMANAS: 12

DOCENTE RESPONSÁVEL: NOME E NÚMERO USP


01 Edson Denner Leonel. Nº FUNCIONAL: 5188851
02 Sérgio Persival Baroncini Proença. Nº FUNCIONAL: 80205

Caso o docente já seja credenciado na área, indicar a data da aprovação do mesmo


pelo CoPGr:
CUSTOS REAIS DA DISCIPLINA: R$0,0
(Apresentar, se pertinente, orçamento previsto para o exercício, em folha anexa)

PROGRAMA

OBJETIVOS
Fornecer aos alunos da disciplina subsídios para a aplicação de teorias mais realistas para a
modelagem do comportamento de materiais considerando, particularmente, os regimes de
ruptura. Estudar de forma analítica e computacional as solicitações decorrentes do processo de
fratura, as condições para a formação e propagação de fissuras bem como a estabilidade do
sólido fissurado e a ruptura estrutural. Analisar componentes estruturais sob o enfoque da
segurança estrutural e da tolerância ao dano. Apoiar as atividades de pesquisa da Área de
Engenharia de Estruturas no campo da Mecânica dos Materiais e das Estruturas.

JUSTIFICATIVA
A utilização de teorias que permitem a modelagem mais realista do comportamento dos
materiais é de vital importância para o desenvolvimento de estruturas seguras e eficientes,
constituindo-se uma área de grande interesse e intensa atividade de pesquisa por parte da
comunidade científica. As atividades de pesquisa neste domínio tem levado ao
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desenvolvimento de modelos mais representativos para a resposta mecânica de materiais


considerando-se diferentes regimes de solicitação. Entre os modelos de maior interesse estão
aqueles que permitem a simulação do processo de ruptura de sólidos que se fundamentam na
teoria da Mecânica da Fratura.
Inevitáveis do ponto de vista prático, as estruturas fissuradas devem ser avaliadas quanto à
segurança e à vida útil, especialmente sob os enfoques da preservação e conservação que
constituem as perspectivas do mundo moderno. Desta forma, o estudo dos conceitos da
Mecânica da Fratura torna-se necessário, uma vez que as técnicas que deles decorrem
destacam-se como importantes ferramentas para a avaliação da tolerância ao dano, quer
diretamente, em estruturas que se encontram em serviço, quer em complementação às
metodologias tradicionalmente utilizadas nas atividades de projeto estrutural.

CONTEÚDO(EMENTA)
1 Descrição de problemas de engenharia estrutural aos quais a mecânica da fratura é
aplicável.
2 Mecanismos físicos de deformação e ruptura com ênfase na danificação. Manifestações
do dano em diferentes escalas.
3 Características comuns ao comportamento mecânico de diferentes materiais: deformação
permanente, caráter unilateral da abertura de fissuras, anisotropia induzida por processos
dissipativos.
4 Funções complexas de tensão. Dedução dos campos de deslocamento e tensão na região
à frente da ponta da fissura.
5 Balanço energético devido ao processo de propagação da fissura. Modos de fratura e
taxas críticas de liberação de energia.
6 Fatores de intensidade de tensão e tenacidade a fratura. A zona de processos inelásticos e
as limitações de aplicabilidade da mecânica do fratura elástico linear.
7 Cálculo dos fatores de intensidade de tensão e taxas críticas de liberação de energia.
Integral J e método da correlação de deslocamento.
8 Processo de fratura em modo misto. Teorias de interação de modos e direção de
propagação.
9 Métodos computacionais na mecânica da fratura.
10 Mecânica da fratura não-linear: Fraturamento elastoplástico e coesivo.
11 Mecânica da fratura não-linear: Fraturamento considerando localização e amolecimento.
Estudo da fratura em concretos, cerâmicas e rochas.
12 Propagação de fissuras decorrente de efeitos de fadiga.

BIBLIOGRAFIA
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Proença,S.P.B. (2008) Introdução às Mecânicas do Dano e da Fratura. Notas de aula Pós-


Graduação em Engenharia de Estruturas.

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Fracture Mechanics to Concrete, Rock and Other Quasi-Brittle Materials, John Wiley & Sons,
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Suresh, S. (2003) Fatigue of Materials – Cambridge University Press, 2nd Ed., UK.

Unger, D. J. (1995) Analytical Fracture Mechanics, Dover Publications Inc, New York.

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO
Trabalho de curso e listas de exercícios semanais.

NÚMERO MÍNIMO DE ALUNOS


O curso será ministrado se houver pelo menos 01 aluno matriculado.
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 1

1. – Introdução

1.1 – Apresentação

O texto que será apresentado faz parte do conjunto de notas de aula da disciplina
SET - 5926 cujo título é “Introdução à Mecânica da Fratura”. Esta disciplina é ofertada
no curso de pós-graduação do Departamento de Engenharia de Estruturas da Escola de
Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, SET/EESC/USP. Nessas notas
de aula serão apresentados conceitos fundamentais para a compreensão dos fenômenos
tratados e explicados pela teoria da mecânica da fratura. O autor pretende que essas
notas de aula sejam periodicamente revisadas, objetivando torná-las cada vez mais
completas e de fácil entendimento. Dessa forma, sugere-se que os conhecimentos
discutidos em sala de aula e apresentados nessas notas sejam complementados nas
referências fornecidas na ementa do curso e citadas ao longo do texto.

1.2 – Motivação

Antes de iniciar o estudo e discussão sobre os temas dessa disciplina, deve-se


colocar a seguinte questão: o que motivou o desenvolvimento da mecânica da fratura?
A partir da revolução industrial, diversos equipamentos e máquinas foram
desenvolvidos para a confecção de bens e manufaturas cada vez melhor elaborados.
Destacam-se nesse período o desenvolvimento da máquina a vapor no sec. XVII,
embarcações a vapor, locomotivas e motor a explosão no sec. XIX. À medida que a
sociedade demandava produtos mais sofisticados e completos surgia também a
necessidade do desenvolvimento de equipamentos que tornassem possível sua
produção.
Com o surgimento de manufaturas cada vez mais arrojadas, ocorreram diversas
falhas estruturais relacionadas a estas. Diversos acidentes envolvendo ferrovias,

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 2

elevadores, caldeiras, entre outros, eram noticiados semanalmente (se não diariamente)
naquela época. A busca por explicações para as possíveis causas desses acidentes foi a
motivação inicial para o desenvolvimento da mecânica da fratura. Atualmente, os
conceitos propostos pela mecânica da fratura tornaram-se importantes e robustos para o
entendimento, a prevenção e a explicação de diversos tipos de falhas estruturais.
Portanto, a compreensão desta teoria e de suas ferramentas é de grande importância para
os engenheiros estruturais, os quais trabalham com a prevenção da falha estrutural todo
o tempo.

1.3 – Notas Históricas e Curiosidades

Com o intuito de ilustrar a dimensão dos problemas estruturais enfrentados no


passado, serão listados alguns acidentes de grande repercussão, onde o conhecimento
das teorias da mecânica da fratura poderia ter sido utilizado para evitá-los.
 O primeiro vôo de longa duração teve de ser postergados em duas semanas
devido à quebra de um dos rotores da aeronave.
 No sec. XX, mais de 24 pontes colapsaram. Dentre elas destacam-se a ponte
soldada sobre o canal de Hasselt na Bélgica em 1938 e a King´s bridge localizada em
Melbourne, Austrália, em 1962.
 Desde a segunda guerra, mais de 200 aviões civis apresentaram falhas fatais
devido à ação de fissuras que cresceram por fadiga. A Fig. (1.1) ilustra um acidente
aéreo causado por propagação de fissuras em regime de fadiga. Três aviões comerciais
“Comet” falharam em menos de um ano de serviço, causando grandes perdas humanas.
 Diversas fissuras foram identificadas em estruturas de usinas nucleares. Esse
tipo de problema pode gerar vazamento de material radioativo causando danos
ambientais enormes. Na Fig. (1.2) é mostrada uma macro fissura originada pela ação de
um terremoto no Japão.
 Dos 2500 navios “Liberty” produzidos para a II guerra mundial, 145 partiram-se
ao meio ainda nas docas e 700 apresentaram danos que impossibilitaram sua utilização.
No final de 1958, apenas nos EUA, 319 acidentes envolvendo embarcações foram
noticiados. Outros acidentes ocorreram também na Dinamarca, Suécia e Reino Unido.
Dos 28 navios que partiram-se ao meio no período de 1942-1965, apenas 6 foram
construídos na Europa, Fig. (1.3).

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 3

 Durante o procedimento de inspeção em uma aeronave comercial,


aproximadamente 35000 fissuras podem ser encontradas. Esse elevado número de
fissuras justifica o desenvolvimento de técnicas e métodos de análise estrutural mais
robustos e precisos para que procedimentos de inspeção e manutenção sejam
eficientemente efetuados.
 A plataforma semi-submersa “Alexandre L. Kielland” falhou em 27 de Março de
1980 no mar do norte da Europa, sendo registradas 123 mortes. A causa da falha, após
perícia, foi a fratura devido a fadiga em um de seus braços de apoio.
 Diversas falhas estruturais foram observadas em tanques de armazenamento de
produtos nas repúblicas soviéticas durante a década de 70. Grande parte desses
acidentes ocorreu devido ao choque de temperaturas, ambientais baixas e altas dos
produtos armazenados. Normalmente, os tanques eram utilizados para armazenamento
de produtos químicos aplicados à produção de fertilizantes. Além dos danos materiais
causados pelo vazamento dos produtos, geralmente ácidos, o dano ambiental resultante
deve ser também enfatizado. Na Fig. (1.4) é apresentado um tanque onde a falha
estrutural descrita acima foi observada.
É importante destacar que devido às melhorias na tecnologia dos materiais, nos
métodos de análise, compreensão dos problemas mecânicos e também aos coeficientes
de segurança, as falhas estruturais decorrentes da ação de fissuras foram reduzidas
sensivelmente. Porém, deve-se enfatizar que essas falhas ainda não são nulas!

Figura 1.1 Falha devido ao crescimento de fissuras em fadiga na indústria aeronáutica.

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Figura 1.2 Macro fissura na usina nuclear de Fukushima, Japão 2010.

Figura 1.3 Falha devido ao crescimento de fissuras no navio Schenectady (Janeiro de 1943).

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Figura 1.4 Falha em tanque de armazenamento em Cherepovets (Dezembro de 1977).

1.4 – Conceitos Iniciais

Em muitos dos problemas da engenharia de estruturas, os conceitos e as


ferramentas fornecidos pela mecânica da fratura podem não ser idealmente aplicáveis.
Porém, esta teoria fornece respostas consistentes para diversos problemas que outras
teorias não abordam. A aplicação dos recursos propostos pela mecânica da fratura
certamente reduzirá o risco de uma falha estrutural em decorrência da ação de fissuras.
Isso ocorre pelo fato da análise e a modelagem de corpos sujeitos a um estado de
degradação mecânica inicial ser mais realisticamente tratado por meio dessa teoria. Para
a compreensão dos conceitos da mecânica da fratura, algumas definições iniciais devem
ser apresentadas.
Fissura: O termo fissura é utilizado para designar uma região onde há uma
descontinuidade no material. Essa descontinuidade física gera, por consequência,
descontinuidades nos campos de deslocamento e tensão. Portanto, sua abordagem
requer atenção especial a esses aspectos.
Zona de Processos Inelásticos: Essa região é muitas vezes referenciada na
literatura apenas como zona de processo. Trata-se de uma porção material posicionada à

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SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 6

frente da ponta da fissura onde ocorrem processos inelásticos e dissipação de energia. A


correta modelagem e interpretação dos fenômenos que ocorrem nessa região estão
diretamente ligadas à representação do comportamento mecânico do elemento
considerado. Quando a zona de processo tem dimensões pequenas comparadas às
dimensões do corpo, a fratura pode ser analisada usando a teoria da mecânica da fratura
elástico linear. Do contrário, o processo de fratura deve ser analisado via mecânica da
fratura não linear.

Figura 1.5 Fissura de zona de processo.

Coalescência: É o processo mecânico segundo o qual microfissuras se unem e


dão origem a uma, ou mais, macrofissuras, as quais são responsáveis pelo colapso do
corpo. Em uma estrutura, o processo de colapso e falha por fratura ocorre devido à
coalescência, já que todo material apresenta, em maior ou em menor escala, um grau de
micro danificação ou micro fissuração inicial.
Fratura: Denomina-se fratura o colapso de um corpo ocasionado pela ação de
uma ou mais fissuras. Em alguns textos científicos, o termo mecânica do fraturamento
pode ser também encontrado. Essa designação é feita em alusão ao termo inglês
“cracking”. Porém, no contexto dessas notas de aula, o termo fraturamento será
empregado para referenciar os fenômenos associados ao processo de colapso estrutural

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 7

devido à ação de fissuras e mecânica da fratura para designar as teorias que governam o
fraturamento. A fratura pode ser enquadrada em seis tipos: Frágil (materiais frágeis),
Dúctil (materiais dúcteis), Quase-Frágil (materiais quase frágeis), Dinâmico, Assistido
pelo meio (devido à ação da corrosão ou agentes físico-químicos) e Transição dúctil-
frágil (associada, por exemplo, a mudanças de temperatura).
Fadiga: Carregamentos cíclicos atuantes em elementos estruturais induzem o
surgimento de campos de tensões que são também cíclicos. De acordo com a amplitude
da variação dessas tensões, o material que compõe o elemento estrutural pode sofrer os
efeitos relacionados ao fenômeno de fadiga. A oscilação das tensões faz com que a
resistência do material seja reduzida à medida que os ciclos de carregamento são
aplicados. Como o próprio nome do fenômeno indica, o material tende se “cansar”
nessas situações. A degradação do material causada pela ação de carregamentos cíclicos
é conhecida como fadiga. Apesar dessa simples definição, os fenômenos associados à
fadiga são consideravelmente complexos.
Quando fissuras estão presentes em estruturas submetidas à fadiga, o
crescimento desta ocorrerá ao longo do tempo. Além disso, esse crescimento ocorrerá
em níveis de tensão muito inferiores àqueles que causariam a fratura do corpo na
condição de carregamento direto. A compreensão deste fenômeno é de grande
importância, principalmente nas indústrias aeronáutica, automotiva e naval, onde as
estruturas estão submetidas a carregamentos oscilatórios durante toda sua vida útil.

1.5 – Representação do Processo de Ruptura de um Sólido

No domínio da engenharia de estruturas, diversos são os problemas onde a


previsão e a modelagem do colapso estrutural tem destacada importância. Diante desta
demanda, surge a seguinte questão: Quais são as ferramentas mais robustas e precisas
para a representação do processo de colapso de um corpo?
A resposta para esta pergunta não é única e depende do comportamento
estrutural (mecânico) do material que compõe o sólido em análise. Atribui-se a
Leonardo da Vinci e a Galileo os primeiros estudos objetivando o entendimento da
ruptura de corpos. Neste item serão discutidas, de forma sucinta, três grandes teorias
que são capazes de representar, com considerável precisão, o processo de falha
estrutural: teoria da plasticidade, mecânica do dano e mecânica da fratura.

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A teoria da plasticidade tem sido largamente utilizada para a representação do


comportamento estrutural de materiais dúcteis, especialmente metais. Com base nessa
teoria, utiliza-se um critério de resistência para a determinação dos limites entre os
regimes elástico e elastoplástico. Além disso, tornam-se ainda necessárias: a definição
de uma regra de encruamento, que governa a mudança das propriedades do material
durante o fluxo plástico, e de uma regra de fluxo, a qual fornece a relação incremental
entre tensões e deformações na etapa plástica. Por meio da teoria da plasticidade
assume-se a hipótese de continuidade do material, sendo seus parâmetros de rigidez
corrigidos à medida que as deformações plásticas evoluem. Dessa forma, a
representação da falha causada por descontinuidades não é consistentemente tratada. A
modelagem da falha por meio desta teoria é utilizada em programas comerciais como
ANSYS e ABAQUS e utilizada por engenheiros em detrimento de teorias mais
elaboradas.
Na mecânica do dano, descontinuidades materiais micro e meso podem ser
tratadas com eficiência por meio de um critério de dano. Nesse caso, o sólido ainda é
tratado assumindo-se a hipótese de continuidade. Porém, a consideração de perda de
rigidez, ao contrário da teoria da plasticidade, é mais consistentemente considerada por
meio de parâmetros de dano. Por meio desta teoria, as microfissuras, distribuídas
continuamente e de forma aleatória ao longo do sólido, são tratadas de forma contínua,
sendo as propriedades mecânicas do material alteradas em função do grau de
degradação mecânica presente. A fissura discreta pode ser entendida como resultado de
uma localização de micro defeitos.
Via mecânica da fratura, a degradação mecânica de um dado material pode ser
representada por meio da consideração discreta das danificações (fissuras) presentes no
meio contínuo. O crescimento e a evolução da degradação são simulados através da
propagação das fissuras, as quais podem inclusive apresentar coalescência.
Considerando a mecânica da fratura, os fenômenos que causam redução na rigidez do
material são representados de forma discreta, sendo que sua evolução resulta na
representação da redução da rigidez do elemento estrutural.
Para complementar a discussão apresentada anteriormente, é importante também
considerar os efeitos da escala escolhida para a análise. Com relação à escala dos
problemas analisados tem-se:
Micro escala: Para a análise em micro escala, a degradação do material ocorre
devido à ação da concentração de tensão sobre a vizinhança de micro defeitos

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(microfissuras), ou micro vazios. Nesse nível de observação, ocorre a quebra da ligação


entre os componentes do material e as micro degradações crescem. Considerando
metais, a degradação em micro escala pode ser analisada através do deslocamento
relativo entre os cristais que formam o metal. Já em concretos, esta mesma análise pode
ser efetuada na zona de transição existente entre matriz e agregado.
Meso escala: Na meso escala, um volume representativo de material observa o
crescimento das microfissuras ou micro vazios, os quais, por coalescência iniciam uma
região de fragilidade e por consequência uma fissura. Em metais, esse nível de
observação pode ser atribuído ao deslocamento relativo de um bloco formado por um
conjunto de cristais do metal. Já em concretos, a perda da coesão entre argamassa e
agregado enquadra-se nesse nível de observação.
As duas escalas apresentadas anteriormente podem ser consistentemente
analisadas através da teoria da plasticidade e mecânica do dano. Apesar de a degradação
mecânica ocorrer e pequenas descontinuidades surgirem, a hipótese de continuidade do
meio pode ainda ser assumida.
Macro escala: Analisa-se a degradação do material por meio do crescimento de
uma ou mais fissuras geradas da coalescência dos micro defeitos. Os problemas desse
estágio de observação são consistentemente tratados através da mecânica da fratura, já
que são defeitos discretos.
Deve-se destacar que a diferenciação entre micro, meso e macro escalas,
apresentada anteriormente, depende da escala escolhida para as análises, ou seja, da
escala escolhida para a mensuração dos defeitos e suas consequências. Sendo assim, é
possível aplicar a mecânica da fratura nas análises em micro e meso escalas, desde que
as consequências analisadas sejam também mensuradas em micro e meso escalas. Deve-
se destacar que nas teorias da plasticidade e dano a observação acima não é válida, ou
seja, a modelagem de fenômenos macro com tais teorias não são consistentemente
tratados, devido à hipótese de continuidade do meio não ser válida.
Defeitos de micro escala estão associados, por exemplo, a quebra da ligação
atômica entre os átomos que formam o material. Quando várias ligações atômicas
localmente concentradas são quebradas, ocorre o deslocamento de um conjunto regular
organizado de átomos, comumente denominado cristal. Quando um conjunto de cristais
começa a deslocar-se diferencialmente até a formação de uma fissura discreta, tem-se
caracterizado o domínio meso escala. O movimento dos cristais une as zonas de
fragilidade do material até a localização da degradação formar uma fissura. A partir do

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surgimento de uma degradação mecânica discreta, a análise deve ser conduzida pela
mecânica da fratura. Porém, as zonas de fragilidade em micro e meso escalas podem ser
também simuladas via mecânica da fratura. Basta que estas descontinuidades atômicas e
dos cristais sejam analisadas de forma discreta. Assim, os efeitos em micro e meso
escalas podem ser mensurados e a união dos campos de fragilidade das ligações
atômicas e da ligação entre cristais podem ser mensuradas via análise de coalescência.
Devido à natureza complexa do fenômeno de fratura, o tratamento dos
problemas micro, meso e macro ainda não são efetuados assumindo-se hipóteses únicas.
Enquanto na abordagem em nível atômico o estudo da fratura ocorre usando-se os
conceitos da mecânica quântica, na modelagem dos problemas macro assumem-se as
hipóteses da mecânica dos sólidos e da termodinâmica clássica. Assim, o campo de
pesquisas no domínio da mecânica da fratura é ainda muito amplo, principalmente no
desenvolvimento de hipóteses únicas que abranjam todos os níveis de análise e
simulação.
Em resumo:
Micro Escala: É a escala utilizada para o estudo dos mecanismos de deformação
e dano.
Meso Escala: É a escala na qual as equações constitutivas da análise mecânica
são escritas.
Macro Escala: É a escala da engenharia de estruturas.

1.6 – O Surgimento do Estudo da Mecânica da Fratura

Inúmeros acidentes foram noticiados durante o século XX envolvendo falhas


estruturais. Embora projetados conforme as regras de resistência vigentes no período,
diversos navios, aeronaves, usinas entre outros falharam causando grandes prejuízos
financeiros e perdas de vidas humanas.
Muitos estudos dedicados à determinação das causas destas falhas não obtiveram
sucesso. Até que, em 1903, cientistas e engenheiros efetuaram inúmeros testes no navio
militar Woolf (destroyer), objetivando identificar as causas que davam início ao
processo de falha estrutural em navios. A referida embarcação foi então testada sob
diversas condições de carregamento. Em todos os testes realizados, nenhum
equipamento detectou tensões superiores a 90 MPa, sendo a resistência do aço que

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formava o casco do navio variável entre 390 e 440 MPa. Nestes testes nenhuma falha
estrutural foi observada. Porém, os pesquisadores concluíram que outros navios haviam
falhado com fatores de segurança iguais aos estudados no Woof. Então como explicar
tais falhas?
Depois de vários testes, os pesquisadores observaram que o processo de
fraturamento tinha início em locais onde estavam presentes entalhes geométricos e/ou
furos de ligações. Na verificação dos projetos, os pesquisadores descobriram que nas
regiões de furos, os projetistas assumiram a hipótese de uniformidade de tensão. Assim,
a tensão normal nessas regiões era calculada dividindo-se a força aplicada pela área da
seção transversal do elemento estrutural, descontando as áreas dos furos. Como
consequência, um importante fenômeno era desprezado, a “CONCENTRAÇÃO DE
TENSÃO”.
Em 1898, o engenheiro alemão KIRSCH resolveu, de forma analítica, o
problema de uma chapa tracionada com um furo circular e observou um considerável
aumento das tensões normais nas regiões das bordas do furo. Para essa situação, a
tensão máxima atuante é 3 vezes maior que a tensão aplicada! Até aquele momento,
portanto, os métodos de análise subestimavam essas concentrações de tensão. Mais
tarde, KOSOLOV-INGLIS, em 1913, resolveram o mesmo problema considerando um
furo elíptico. A concentração de tensão para esse caso é ainda mais severa, conforme
mostrado na Fig. (1.6). Anos depois, em 1921, GRIFFITH atribuiu a grande
discrepância entre as resistências teórica e experimental de vidros à concentração de
tensão existente nas micro fissuras presentes no material. Na sequência, ele também
formulou o problema da fratura em regime frágil com base em critérios energéticos.

Figura 1.6 Concentração de tensão. Soluções para furo circular e elíptico.

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 12

A mecânica da fratura foi introduzida como disciplina em 1950, por George R


Irwin, engenheiro que trabalhava no Naval Research Laboratory. Essa teoria foi
inicialmente desenvolvida considerando-se o comportamento elástico dos corpos,
originando a mecânica da fratura elástico linear (MFEL). Após inúmeros
desenvolvimentos e cooperações, as teorias da mecânica da fratura não linear (MFNL)
foram desenvolvidas e hoje são aplicadas na solução de diversos problemas da
engenharia estrutural. Apesar dos grandes avanços observados até o presente momento,
esse campo da mecânica dos sólidos permanece ainda em constante desenvolvimento,
sendo uma área de pesquisa em grande evidência.
No item seguinte, segue um texto no formato “script” que pode ser utilizado na
análise dos problemas de placa perfurada, furo circular e elíptico, através do programa
comercial ANSYS. Segure-se que o leitor o aplique na solução desses problemas e
entenda a distribuição de tensão e suas variações em decorrência da introdução do furo.
Deve-se enfatizar que à medida que um dos raios da elipse (b) tende a zero, o furo tende
a se tornar uma fissura e a tensão na ponta da fissura tende a crescer sem limites.

1.7 – Script para Construção de Exemplo via ANSYS

/NOPR
/PMETH,OFF,0
KEYW,PR_SET,1
KEYW,PR_STRUC,1
KEYW,PR_THERM,0
KEYW,PR_FLUID,0
KEYW,PR_MULTI,0
/GO
!*
/COM,
/COM,Preferences for GUI filtering have been set to display:
/COM, Structural
!*
/PREP7
!*
ET,1,PLANE82
!*
!*
*ask,E,Modulo de Elasticidade,100
*ask,Ni,Coeficiente de Poisson,0.3
!*
!*
MPTEMP,,,,,,,,
MPTEMP,1,0
MPDATA,EX,1,,E
MPDATA,PRXY,1,,Ni
!*
!*

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 13

*ask,L,Largura da Chapa,4
*ask,H,Altura da Chapa,2
*ask,Dx,Diametro ao longo de X,0.5
*ask,Dy,Diametro ao longo de y,1.0
!*
!*
RECTNG,0,L,0,H,
CYL4,0,0,Dy/2
!*
!*
FLST,2,1,5,ORDE,1
FITEM,2,2
ARSCALE,P51X, , ,Dx/Dy,1,1, ,1,1
!*
!*
ASBA, 1, 2
!*
!*
ESIZE,(3.1415*Dy/45),
MSHKEY,0
CM,_Y,AREA
ASEL, , , , 3
CM,_Y1,AREA
CHKMSH,'AREA'
CMSEL,S,_Y
!*
AMESH,_Y1
!*
CMDELE,_Y
CMDELE,_Y1
CMDELE,_Y2
!*
/AUTO, 1
/REP
!*
FINISH
/SOL
FLST,2,1,4,ORDE,1
FITEM,2,10
!*
/GO
DL,P51X, ,UX,
FLST,2,1,4,ORDE,1
FITEM,2,9
!*
/GO
DL,P51X, ,UY,
FLST,2,1,4,ORDE,1
FITEM,2,2
/GO
!*
!*
*ask,P,Valor da Pressao Aplicada,10
!*
!*
SFL,P51X,PRES,-P,
/STATUS,SOLU
SOLVE
FINISH
/POST1
!*

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 14

!*
/EFACET,1
PLNSOL, S,X, 0,1.0

1.8 – Revisão da Teoria da Elasticidade

A teoria da elasticidade fornece subsídios analíticos para a análise mecânica de


sólidos deformáveis. A dependência entre carregamentos externos e deformabilidade
estrutural é de fundamental importância para a compreensão do comportamento
mecânico dos sólidos deformáveis, e para a determinação de cenários nos quais a falha
estrutural é observada.
Neste item serão apresentadas algumas relações de interesse da teoria da
elasticidade que serão de grande utilidade na determinação de expressões importantes
da mecânica da fratura. Para as equações que serão apresentadas, assume-se que:
 As tensões são diretamente proporcionais às deformações. Portanto, assume-se a
validade da lei de Hooke generalizada.
 Os materiais considerados são isótropos e homogêneos, ou seja, tem
propriedades mecânicas iguais em qualquer ponto do sólido. Além disso, essas
propriedades são iguais ao longo de todas as direções consideradas.
 Num ciclo de carregamento e descarregamento a perda de energia é nula.
 O material é resiliente, ou seja, tem capacidade de se deformar em regime
elástico e recuperar sua forma original após o descarregamento sem deformação
residual.
 As condições de contorno do problema atuam no contorno do sólido. Parte estará
submetida a condições de restrição em deslocamento (Dirichlet) e a parte complementar
a condições de restrição em forças (Newmann).

1.8.1 – Equações de Equilíbrio

O estado de tensão em um ponto, de um corpo em equilíbrio, pode ser ilustrado


representando o ponto estudado por um elemento de dimensões infinitesimais, conforme
apresenta a Fig. (1.7). Nesta figura estão apresentadas as componentes de tensão
considerando o sistema de coordenadas cartesianas.

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 15

Figura 1.7 Estado de tensão. Planos inclinados com forças de superfície.

O estado de tensão é caracterizado se conhecidas as nove componentes de


tensão, sendo seis componentes cisalhantes e três normais. Estas componentes de tensão
não são todas independentes. Considerando o equilíbrio no elemento infinitesimal em
termos de momentos pode-se verificar que:
 ij   ji (1.1)

sendo:  ij as tensões internas ao corpo.

Efetuando agora o equilíbrio em termos de forças, é possível encontrar a


equação de equilíbrio do corpo, que pode ser representada indicialmente por:
 ij , j  bi  0 (1.2)

em que: bi são os valores das forças de corpo presentes atuantes na direção i e  ij, j as

derivadas da tensão ij em relação a direção j.


O equilíbrio deve também ser satisfeito na superfície do corpo. Dessa forma, o
estado de tensão, adjacente à superfície do corpo considerado, deve ser decomposto na
direção do contorno de forma a igualar-se às forças de superfície atuantes. A Fig. (1.7)
apresenta as forças de superfície atuantes sobre um plano inclinado em um elemento de
dimensões infinitesimais. Indicialmente, esta relação de equilíbrio pode ser representada
como:
Pi   ij j (1.3)

onde: Pi são as forças de superfície e  j os cossenos diretores da normal ao contorno.

1.8.2 – Relações Constitutivas

Em elasticidade linear clássica, há uma única relação envolvendo tensões e


deformações que é denominada lei de Hooke generalizada. Por meio dessa lei,
representada por um tensor de quarta ordem, cada componente de tensão é linearmente
Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 16

relacionada com todas as componentes de deformação do ponto em estudo. Esta relação


é também válida no sentido inverso, ou seja, as componentes de deformação são
linearmente relacionadas às componentes de tensão via tensor inverso das propriedades
constitutivas. A lei de Hooke generalizada pode ser representada de forma geral como:
   [ Dc ]  (1.4)

onde:  Dc  é o tensor de quarta ordem contendo as propriedades constitutivas do

material,   o tensor de segunda ordem das tensões internas ao corpo e   o tensor de

segunda ordem das deformações do corpo.


Para materiais anisotrópicos, o tensor constitutivo contém 81 termos
independentes, os quais são função somente da direção dos eixos de referência.
Contando com a simetria dos tensores de tensão e deformação (  ij   ji e  ij   ji ), o

número de termos independentes do tensor constitutivo diminui para 36. Este número
pode ainda ser reduzido assumindo-se a validade do teorema de Maxwell, o qual
estabelece condições de conservação de energia. Assim, por meio deste teorema, o
trabalho de  x sobre  x causada por  y é igual ao trabalho de  y sobre  y causado por

 x , por exemplo. Quando esta hipótese é assumida, o tensor constitutivo torna-se


simétrico, com 21 coeficientes desconhecidos. Quando os 21 coeficientes são
independentes, diz-se que o material apresenta o maior índice de anisotropia possível.
Porém, o material pode apresentar simetria segundo três eixos ortogonais. Nessa
situação, tem-se os conhecidos materiais ortótropos, cujas constantes elásticas
independentes são 9. Finalmente, assumindo que o material é isótropo, ou seja,
apresenta comportamento mecânico igual ao longo de qualquer direção, é possível
descrever o tensor Dc somente através do módulo de elasticidade longitudinal, E, e do

coeficiente de Poisson,  .
A lei de Hooke generalizada, para materiais isotrópicos, pode ser escrita de
forma concisa, indicialmente, conforme apresenta a Eq. (1.5).
E   
 ij   (1  2 )  ij  kk   ij  (1.5)
1  
sendo:  ij a função delta de Kroenecker e  ij as deformações do corpo.

De forma inversa as deformações podem ser relacionadas às tensões por:


1 
 ij   ij   kk  ij (1.6)
E E

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 17

1.8.3 – Relações Deformação-Deslocamento

A Fig. (1.8) ilustra as configurações deformada e indeformada de um corpo


sujeito a um regime de pequenas deformações. Tomando a vizinhança de um ponto P,
antes da deformação, verifica-se que este ponto desloca-se para o ponto P’, após a ação
do carregamento, sendo o deslocamento dado pela subtração dos vetores posição R’e R.
Nessa situação, a deformação pode ser obtida considerando a variação dos
deslocamentos ao longo de uma direção de interesse. Assim, as deformações estão
diretamente relacionadas aos gradientes dos deslocamentos.
No âmbito do regime de pequenas deformações, as componentes do estado de
deformação em um corpo podem ser descritas empregando a simplificação da descrição
via deformações infinitesimais. Por meio desta simplificação, as deformações podem ser
obtidas de acordo com a Eq. (1.7).

 ij 
1
2
 ui, j  u j ,i  (1.7)

em que: ui , j são as derivada do deslocamento da direção i em relação a direção j.

Figura 1.8 Estados deformado e indeformado para corpo em regime de pequenas deformações.
Determinação dos deslocamentos e das deformações em modelos 2D.

Tratando-se de regimes de grandes deformações, a descrição do estado de


deformação deve ser realizada empregando os recursos da deformação finita. Por meio
desta descrição, as deformações não são linearmente relacionadas ao gradiente dos
deslocamentos. A não linearidade da relação entre deformação e deslocamento se faz
pela inserção de um produto diferencial como apresenta a Eq. (1.8).

 ij 
1
2
 ui, j u j ,i  u j ,iui, j  (1.8)

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 18

1.8.4 – Condições de Compatibilidade de Deformações

A relação deformação-deslocamento, apresentada na Eq. (1.7), representa um


sistema composto por três componentes de deslocamentos e seis de deformação. De
forma a resolver problemas empregando o caminho inverso ao sugerido por essa
relação, ou seja, obter um campo de deslocamentos para um dado estado de deformação,
torna-se necessário o emprego de equações de compatibilidade, escritas em termos de
deformação. A teoria cinemática de corpos deformáveis prevê que a compatibilidade
deve ser efetuada através da relação Eq. (1.9).
 ij ,kl   kl ,ij   ik , jl   jl ,ik  0 (1.9)

1.8.5 – Equacionamento dos Problemas Elásticos

O equacionamento de problemas elásticos é necessário para a determinação de


tensões, deformações e deslocamentos em corpos sujeitos a esforços externos e a
condições de restrição aos deslocamentos. Para a determinação das grandezas
mencionadas acima, fazem-se necessários o emprego das relações: constitutiva,
deformação-deslocamento e de equilíbrio. Além disso, as grandezas determinadas
devem obedecer às condições de contorno impostas, assim como as condições de
compatibilidade. No total do equacionamento resultam 15 equações para a obtenção de
15 variáveis desconhecidas, as quais podem ser enunciadas: 6 tensões, 6 deformações e
3 deslocamentos.
Dependendo das condições de contorno impostas, as equações podem ser
manipuladas de forma a tornar a resolução mais conveniente. No caso do problema
estudado apresentar somente forças de superfície aplicadas, é desejável que as equações
sejam escritas em termos de tensões. Caso contrário, se estiverem presentes condições
de contorno em termos de deslocamentos impostos, é mais vantajoso resolver o sistema
de equações em termos de deslocamentos.

1.8.6 – Simplificação do Problema 3-D para Estados Planos

O equacionamento de problemas elásticos pode muitas vezes ser simplificado


dependendo da geometria do corpo a ser analisado bem como das condições de
contorno aplicadas. A transformação de problemas tridimensionais em problemas

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 19

bidimensionais dá origem aos problemas ditos planos, os quais podem ser divididos em
planos de tensão e planos de deformação.
Um problema é dito ser plano de deformação quando os vetores de
deslocamento dos pontos pertencentes ao corpo em questão são paralelos entre si. Isso
resulta que todos os pontos originalmente pertencentes a um plano, antes de o corpo ser
deformado, permanecem nesse mesmo plano após a atuação das ações externas. Nessa
classe de problemas enquadram-se, normalmente, problemas cuja geometria do corpo
analisado apresenta uma de suas dimensões muito superior às demais como em
barragens, tubulações e estruturas de contenção. Nesses casos citados, o plano sob o
qual estarão contidos os pontos é um plano normal a maior dimensão do corpo.
Admitindo por simplicidade que o plano que contém os deslocamentos do corpo
seja o xy, tem-se que as deformações presentes nesses tipos de problema são:
 x ,  y ,  xy . O estado de tensão é representado pelas seguintes componentes

 x , y , z , xy , sendo que  z é função das tensões  x e  y .


Já os problemas de estado plano de tensão são caracterizados pela distribuição
essencialmente plana de tensões no corpo. Nesta classe de problemas podem ser citadas
estruturas cuja geometria apresente uma de suas dimensões muito menor que as demais
como vigas-parede, chapas e paredes. Nestes casos, o carregamento é considerado como
composto por forças aplicadas de forma paralela ao plano formado pelas duas maiores
dimensões do corpo, sendo ainda distribuídas uniformemente ao longo da direção da
menor dimensão (espessura).
Considerando que o plano formado pelas duas maiores dimensões do corpo seja
o xy, o estado de tensão do corpo pode ser representado pelas seguintes componentes:
 x , y , xy . Já o estado de deformação é caracterizado pelas componentes:

 x ,  y ,  z ,  xy . Nessa situação  z é função das deformações  x ,  y .

1.8.7 – Tensões Principais

O estado de tensão em um ponto é definido por seis componentes orientadas


segundo um sistema de coordenadas de referência. Muitas vezes é de interesse na
análise o conhecimento do estado de tensão em relação a outro sistema de coordenadas.
O processo de transformação do estado de tensão no ponto de um sistema de referência

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 20

para outro é simples, bastando, para tanto, o conhecimento dos ângulos de inclinação
entre os sistemas de referência anterior e atual.
Apesar de ser simples, o processo de transformação do estado de tensão de um
sistema de referência a outro é de grande interesse em engenharia, para a determinação
de planos onde as tensões experimentam valores máximos e mínimos. Em especial, a
obtenção do estado de tensão em direções particulares onde as tensões cisalhantes sejam
nulas é de grande interesse. Em um problema tridimensional existem três planos
perpendiculares entre si onde essa condição é atendida, ou seja, as tensões cisalhantes
são nulas observando-se somente a presença de tensões normais. Essas tensões são
chamadas de tensões principais e, os eixos que as contém, de eixos principais de
tensões.
Assim, o vetor de tensão  P  é dito principal se a seguinte relação é verificada:

     
^
P
(1.10)

^ 
onde  é um escalar denominado valor principal e   é o versor da normal particular
 

que define uma direção principal.


Considerando a Eq. (1.3) pode-se escrever:
^  ^ 
        (1.11)
   
Ou em termos de componentes:
 ^   ^  ^ ^
  ij  j  ei    i  ei   ij  j   i (1.12)
   

 ij   ij  j  0
^ ^ ^
 ij  j   j  ij  (1.13)

Ou ainda, a última expressão da Eq. (1.13) pode ser reescrita como:


^
  x     xy  xz  1 
   ^  0 
 ij  ij  j  0  y   
^
   yx  yz  2   0  (1.14)
    
  zx

 zy  z    ^3  0
 
A condição para que o sistema homogêneo apresente solução diferente da trivial,
^ 
ou seja,   = 0 , é que o determinante da matriz de seus coeficientes se anule. Dessa
 

imposição resulta o seguinte polinômio cúbico em  :


 3  I1   2  I 2    I 3  0 (1.15)

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 21

As raízes do polinômio da Eq. (1.15) são as tensões principais. Nessa equação,


I1 , I 2 e I 3 são os invariantes do tensor de tensões, assim denominados, pois possuem o
mesmo valor independente do referencial adotado. Os invariantes são definidos como:
I1   x   y   z

I 2   x y   y z   x z   2xy   2yz   2zx (1.16)

I 3   x y z  2 xy xz yz   x 2yz   y 2xz   z 2xy

1.8.8 – Deformações Principais

Comportamento análogo ao das tensões pode ser observado também nas


deformações. Isto é, existem direções onde não são observadas deformações
distorcionais, ocorrendo somente deformações normais no corpo. Essas direções são
chamadas de principais e as deformações normais nessas direções são conhecidas como
deformações principais.
Para se encontrar as deformações principais deve-se, como na Eq. (1.14),
considerar que:

  x     xy  xz  1 
     0 
  yx

 y     yz   2   0 
   
(1.17)
  zx

 zy  z    3  0
 
O cálculo do determinante resulta, portanto, uma equação cúbica:
3  I12  I 2   I 3  0 (1.18)

As raízes do polinômio da Eq. (1.18) fornecem as deformações principais, onde


os invariantes do estado de deformação são definidos como:
I1   x   y   z

I 2   x  y   y  z   x  z   2xy   2yz   2zx (1.19)

I 3   x  y  z  2 xy  xz  yz   x  2yz   y  2xz   z  2xy

1.8.9 – Funções de Airy

Para a solução do problema elástico plano utilizando o equacionamento


apresentado, necessita-se ainda de uma função de tensão que exprima o tensor de

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 22

tensões de forma consistente, ou seja, satisfazendo as equações que governam o


problema e as condições de contorno.
Para tal fim, AIRY propôs uma função   x, y  , que leva seu nome, cujas
derivadas segundas, na ausência de forças de volume, relacionam-se com o estado de
tensão da seguinte maneira:
 2  2  2
x  y   xy   (1.20)
y 2 x 2 xy

Considerando a modelagem do problema plano apresentada anteriormente,


desprezando-se as forças de volume, tem-se:
   
 2  2 
  x   y  0  (1.21)
 x y 

Substituindo a Eq. (1.20) na Eq. (1.21) tem-se:


 4 2 4  4
  0 (1.22)
x 4 x 2 y 2 y 4

Que de forma compacta pode ser reescrita como:

 
 4   2  2  0 (1.23)

Portanto, a função   x, y  , que soluciona analiticamente o problema elástico,


deve satisfazer à equação bi-harmônica, atendendo simultaneamente às condições de
contorno.   x, y  recebe o nome de função de tensão de Airy. Para maiores detalhes
sobre este item, o autor sugere que o leitor consulte o livro Theory of Elasticity do
pesquisador Timoshenko.

1.9 – Referências Complementares

AIRY, G.B. (1863). On the strains in the interior of beams, Phil. Trans. Royal Society,
153, London pp. 49-79.
CHOU, P.C ; PAGANO, N.J. (1992). Elasticity: tensor, dyadic, and engineering
approaches, Dover Publications, 290p.
GRIFFITH, A.A. (1921). The phenomena of rupture and flows in solids, Phil. Trans.
Royal Society, Series A, vol. 221, pp. 163-198.
INGLIS, C.E. (1913). Stress in a plate due to the presence of cracks and sharp corners,
Trans. Inst. Naval Architects, vol. 55, pp. 219-230.

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 23

IRWIN, G.R. (1957). Analysis of Stress and Strain near the end of a crack traversing a
plate, Journal of Applied Mechanics, Trans. ASME, V.24, 361-364.
KIRCH, G. (1898). Verein Deutscher Ingenieure.
TIMOSHENKO, S.P. (1980). Teoria da Elasticidade, Guanabara Dois, RJ, 545p.
SANFORD, R.J. (2003). Principles of Fracture Mechanics, Prentice Hall, 404p.

Capítulo 1 – Introdução___________________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 24

2. – Funções Complexas de Tensão

2.1 – Introdução

Os problemas de elasticidade plana contendo concentradores de tensão foram


discutidos inicialmente na literatura por Kirch e Inglis. Considerando a modelagem
mecânica de corpos fissurados, uma possível solução seria assumir a fissura como uma
linha descontínua, cujas faces pertencem ao contorno do corpo. Consequentemente, a
distância entre as faces da fissura seria nula e as tensões em sua extremidade tenderiam
ao infinito. Para visualizar esse problema, basta considerar a chapa tracionada com furo
elíptico apresentada no capítulo anterior. À medida que o raio inferior da elipse tende a
zero, esta degenera-se para a descontinuidade descrita anteriormente. Esses tipos de
problema, onde uma ou mais grandezas não apresentam valor finito, são denominados
de problemas singulares.
A mecânica da fratura analítica utiliza soluções singulares para a representação
do comportamento mecânico elástico de corpos deformáveis contendo fissuras. Porém,
a intensidade infinita das tensões na extremidade da fissura, resultado da aplicação de
um carregamento finito, é inconsistente com a visão do engenheiro de estruturas,
profissional este que sabe que os materiais possuem resistência finita. Essa
inconsistência é prevista pela teoria da mecânica da fratura e contornada excluindo-se
da análise uma pequena região ao redor da ponta da fissura. Justifica-se esse
procedimento devido aos processos inelásticos altamente localizados no entorno da
ponta da fissura, que governam o comportamento mecânico dessa região. Deve-se
destacar que, como são inelásticos e envolvem dissipação de energia, esses processos
estão além do alcance da aplicabilidade da teoria da elasticidade. Na análise da fratura
de materiais dúcteis, essa região será mensurada e governada pela tensão de escoamento
do material.

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 25

Com relação à aplicação de funções de tensão para a solução de problemas


singulares, deve-se destacar WILLIAMS (1952), o qual foi o primeiro a realizar tal feito
em 1952. Williams resolveu o problema de um prisma tracionado, cujas tensões
atuantes em uma de suas extremidades eram singulares, por meio da determinação de
uma função de tensão de Airy escrita em coordenadas polares. Porém, ele descobriu que
a utilização desse tipo de função de tensão não é adequada para a análise de problemas
singulares gerais. A solução geral para os problemas singulares passa pela utilização de
funções de tensão de origem complexa.

2.2 – Fundamentos Matemáticos

2.2.1 – Regra da Cadeia para Funções Compostas

Segundo os conceitos apresentados no cálculo diferencial, sabe-se que se


y  f  u  e u  g  x  e que ambas as derivadas dy du e du dx existem, então a

função composta definida por y  f  g  x   tem sua derivada dada por:

f ' u  g '  x   f '  g  x  g '  x 


dy dy du
  (2.1)
dx du dx
Consequentemente, a derivada segunda fica dada como:
d2y
 
 f ''  g  x   g '  x   f '  g  x   g ''  x 
2
2
(2.2)
dx

2.2.2 – Partes Real e Imaginária de Funções Complexas

Na teoria que trata de funções reais, uma função f  x, y  é interpretada como

sendo real e definida sobre um dado domínio segundo as variáveis x e y. Da mesma


maneira, pode-se definir uma função Z no contexto complexo, isto é, uma função que
possua parcelas real e imaginária de uma variável complexa  . As funções complexas
possuem propriedades únicas que as fazem particularmente importantes para aplicações
em problemas da teoria da elasticidade.
Assumindo que Z   seja uma função complexa de uma única variável, então

esta pode ser escrita como:


Z    Re Z    i Im Z   (2.3)

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 26

Assumindo que  possa ser definida na forma   x  iy , então a equação


anterior pode ser reescrita como:
Z  x  iy     x, y   i  x, y  (2.4)

Portanto, as parcelas real e imaginária da função complexa Z   são funções

reais. Entretanto,   x, y  e   x, y  podem não ser independentes. Como exemplo,

pode-se desejar identificar as parcelas real e imaginária da função Z    Sen   ,

sendo   x  iy . Com base na definição da variável  , pode-se reescrever a função

complexa Z   como:

Z    Sen    Sen  x  iy  (2.5)

A partir dos conceitos básicos da trigonometria, sabe-se que a seguinte


identidade trigonométrica é válida Sen  a  b   Sen  a  Cos  b   Cos  a  Sen  b  .

Assim, pode-se reescrever a Eq.(2.5) da seguinte forma:


Sen  x  iy   Sen  x  Cos  iy   Cos  x  Sen  iy  (2.6)

A teoria do cálculo diferencial mostra que as seguintes relações, envolvendo


núcleos complexos, são válidas:
eic  e ic eic  e ic
Sen  c   Cos  c  
2i 2
e  ec
c
e  e c
c
Senh  c   Cosh  c   (2.7)
2 2
Sen  ic   iSenh  c  Cos  ic   Cosh  c 
Portanto, a Eq.(2.6) pode ser assim reescrita:
Sen  x  iy   Sen  x  Cosh  y   iCos  x  Senh  y  (2.8)

Então, da equação anterior, as seguintes partes podem ser identificadas: Real


Sen  x  Cosh  y  e Imaginária Cos  x  Senh  y  .

2.2.3 – Funções Complexas Analíticas

Existe uma classe especial de funções de variáveis complexas que necessitam de


atenção especial no estudo da mecânica da fratura. Essa classe contempla as funções
complexas denominadas funções complexas analíticas. Uma função complexa Z   é

dita ser analítica sobre um dado domínio se, sobre este domínio, esta função possuir

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 27

derivada única em cada ponto. Esta propriedade é análoga ao conceito de continuidade


na teoria de funções de variáveis reais.
Os pontos isolados no qual estas funções não são analíticas são denominados de
pontos singulares. Assim, a teoria das funções analíticas permanece válida desde que as
funções analíticas não sejam avaliadas nesses pontos. No entanto, para a compreensão
dos problemas relacionados à mecânica da fratura, é interessante estudar o que ocorre
com as funções analíticas na vizinhança de pontos singulares.
Para iniciar o estudo das funções complexas analíticas e definir os requisitos
necessários que uma função complexa deve atender para ser analítica, deve-se
considerar a seguinte função:
Z    Re Z    i Im Z   (2.9)

sendo  definido como:   x  iy .

Inicialmente, devem ser analisadas as derivadas da função Z   em relação às

variáveis x e y. Utilizando a regra da cadeia tem-se:


Z   Z    Z  
   Z' (2.10)
x  x x
Z   Z    Z  
   iZ ' (2.11)
y  y y
Sabendo que a função complexa é a apresentada na Eq. (2.9), a aplicação da
regra da cadeia conduz a:
Z    Re Z    Im Z  
 i (2.12)
x x x
Z    Re Z    Im Z  
 i (2.13)
y y y
Como deseja-se que o valor da derivada seja único independentemente da
direção que se adote, a seguinte condição deve ser atendida, a qual é definida com base
nas Eq.(2.10) e Eq.(2.11):
Z   Z  
i  (2.14)
x y
Portanto:
 Re Z    Im Z    Re Z    Im Z  
i   i (2.15)
x x y y
Igualando as partes reais e imaginárias, as seguintes condições são obtidas:

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 28

 Re Z    Im Z  
 (2.16)
y x
 Im Z    Re Z  
 (2.17)
y x
As condições expressas pelas Eq. (2.16) e Eq. (2.17) são denominadas de
Condições de Cauchy-Riemann, as quais, segundo a teoria matemática de variáveis
complexas, provam ser condições necessárias e suficientes para que uma função
complexa qualquer seja também uma função analítica. Além disso, essas relações serão
convenientes para transformar operações diferenciais existentes na teoria da
elasticidade, descritas em variáveis reais, em sua parte complementar em termos da
variável complexa  .
As funções complexas analíticas possuem outra propriedade que será de extrema
utilidade nos desenvolvimentos relacionados às funções de tensão de Airy para a análise
de tensões, deformações e deslocamentos em problemas elásticos. Essa propriedade é
mostrada diferenciando-se a Eq. (2.16) em relação à y e a Eq. (2.17) em relação à x. Em
seguida, subtraem-se as equações resultantes, obtendo a seguinte resposta:
 2 2 
 2   Re Z    0   2 Re Z    0 (2.18)
 x y 2 
Deve-se enfatizar que esse resultado somente é possível pelo fato da função
complexa atender a propriedade de derivada única em relação às direções x e y.
Resultado semelhante é obtido se a ordem das diferenciações é invertida. Assim,
diferenciando a Eq. (2.16) em relação à x e a Eq. (2.17) em relação à y e adicionando os
termos resultantes obtém-se:
 2 2 
 2  2 
Im Z    0   2 Im Z    0 (2.19)
 x y 
Os resultados apresentados nas Eq. (2.18) e Eq. (2.19) conduzem a uma
importante conclusão. Se uma função complexa for analítica, então suas parcelas real e
imaginária são funções harmônicas. Consequentemente, funções harmônicas são
soluções particulares da equação bi-harmônica, a qual governa os problemas de
elasticidade plana. Portanto, funções complexas analíticas podem ser utilizadas para a
modelagem de problemas elásticos planos.

2.2.4 – Exemplo

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 29

O objetivo desse exemplo é demonstrar que a função trigonométrica complexa


mostrada na Eq.(2.8) é analítica. Para tal fim, devem ser determinadas as derivadas das
parcelas real e imaginária da referida função em relação às variáveis x e y. Utilizando as
definições apresentadas na Eq. (2.7) tem-se:
Z    Sen  x  iy   Sen  x  Cosh  y   iCos  x  Senh  y 
 eix  e ix  e y  e y   eix  e ix  e y  e y  (2.20)
Z        i   
 2i  2   2  2 
Dessa forma:
 Re Z    eix  e ix   e y  e y 
  
y  2i   2 
 Re Z    ieix  ie ix   e y  e y   eix  e ix   e y  e y 
    
x  2i  2   2  2 
(2.21)
 Im Z    eix  e ix   e y  e y 
  
y  2  2 
 Im Z    ieix  ie ix   e y  e y 
  
x  2  2 
Verificando a condição apresentada na Eq. (2.16) obtém-se:
 Re Z    Im Z  

y x
(2.22)
 eix  e  ix   e y  e  y   ieix  ie  ix   e y  e  y 
        OK !
 2i   2   2  2 
Finalmente, verificando a condição apresentada na Eq. (2.17) tem-se:
 Im Z    Re Z  

y x
(2.23)
 eix  e  ix   e y  e  y   eix  e  ix   e y  e  y 
     OK !
 2  2   2  2 
Portanto, como a função considerada atende às condições expressas nas Eq.
(2.16) e Eq. (2.17), conclui-se que a função complexa considerada é também analítica.

2.3 – Funções Complexas de Tensão de Westergaard

A utilização de funções de variáveis complexas na formulação do problema


elástico plano apresenta algumas vantagens. Dentre elas, a principal refere-se ao fato
das funções complexas analíticas satisfazerem, por definição, a equação bi-harmônica.

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 30

O desenvolvimento de procedimentos de análise e funções de tensão para a


determinação e modelagem do comportamento mecânico de corpos envolvendo
descontinuidades é atribuído, principalmente, a dois pesquisadores: Muskhelishvili e
Westergaard. Os desenvolvimentos propostos por Muskhelishvili, embora consistentes,
avançaram em ritmo mais lento devido ao elevado trabalho matemático associado à
metodologia. Já os procedimentos propostos por Westergaard, WESTERGAARD
(1939), embora apresentem algumas simplificações, tornaram-se a base da mecânica da
fratura analítica.
Para a solução, no contexto da elasticidade plana, do problema de um corpo de
dimensões infinitas, sujeito a presença de uma fissura com faces localizadas sob a
mesma posição geométrica, com forças aplicadas em seu contorno externo remoto
(problema conhecido na literatura como problema de Griffith), Westergaard propôs, em
1939, a seguinte função de variáveis complexas:
__
__ __
    Re Z    y Im Z   (2.24)

sendo  definido como   x  iy e as funções Z, as quais são funções complexas


analíticas, são dadas por:
__
__ __
__  Z    Z   Z  
Z Z Z'  (2.25)
  
A demonstração sobre a veracidade da Eq. (2.25) será omitida nesse texto por
simplicidade. Porém, essa prova está apresentada na página 15 de PAPADOPOULOS
(1993). Sabendo que as tensões para o caso elástico plano são definidas segundo a Eq.
(1.20), as expressões gerais das tensões, considerando o caso de funções complexas,
poderão então ser obtidas. Para tal fim, a Eq. (2.24) deve ser diferenciada (utilizando a
regra da cadeia) em relação à x e à y. Assim:
 __

  y Im Z   
__
__
    Re Z         Re Z   y Im Z  (2.26)
 
__
    
x x x x
 __

  y Im Z   
__
__
    Re Z  
    
y y y
(2.27)
__
__ __
    Re Z   __  Im Z  
  Im Z    y
y y y

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 31

A função de tensão complexa considerada, Z, é analítica, então, as condições de


Cauchy-Riemann são atendidas. Assim, utilizando as Eq. (2.16) e Eq.(2.17) obtém-se:
__ __ __
__ __ __
 Re Z    Im Z    Re Z   __
    Im Z   (2.28)
y x y
__ __ __
 Im Z    Re Z    Im Z  
   Re Z   (2.29)
y x y
A partir das Eq. (2.28) e Eq. (2.29), pode-se reescrever a Eq. (2.27) como:
  
 y Re Z   (2.30)
y
As derivadas de segunda ordem podem ser determinadas utilizando os resultados
apresentados nas Eq.(2.26) e Eq.(2.30). Assim:

  y Im Z   
__
 2    Re Z    2  
    Re Z    y Im Z '   (2.31)
x 2 x x x 2
 2     y Re Z     2    Re Z  
   Re Z    y (2.32)
y 2
y y 2
y
Como a função complexa é analítica, as condições de Cauchy-Riemann devem
ser atendidas. Dessa forma, utilizando a condição apresentada na Eq.(2.16) obtém-se:
 Re Z    Im Z    Re Z  
    Im Z '   (2.33)
y x y
Assim, a Eq.(2.32) pode ser reescrita como:
 2  
 Re Z    y Im Z '   (2.34)
y 2

Ainda no tocante as derivadas segundas da função de tensão, deve-se também


obter a expressão da derivada segunda cruzada, ou seja, da derivada em relação à x da
Eq. (2.30). Portanto:
 2     y Re Z     2  
   y Re Z '   (2.35)
y x x y x
Com base nas Eq.(2.31), Eq. (2.34) e Eq. (2.35) e nas expressões que relacionam
as tensões às derivadas da função de tensão, conforme apresentado na Eq. (1.20), pode-
se escrever o campo de tensões, de forma geral, para as funções de tensão do tipo
Westergaard da seguinte maneira:

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 32

 2  
 xx   Re Z    y Im Z '  
y 2
 2  
 yy   Re Z    y Im Z '   (2.36)
x2

 2  
 xy     y Re Z '  
xy
Para a análise dos diversos problemas envolvendo fissuras, o analista deve
propor uma função Z   que atenda às condições de contorno envolvidas no problema.

Consequentemente, para cada tipo de problema estudado, uma função de tensão deve
ser proposta. Essas funções são propostas, muitas vezes, por meio de tentativa e erro e
sua correta inferência depende de certa experiência do analista. Para os casos gerais
encontrados na engenharia de estruturas, a melhor opção para a análise de corpos
fissurados é através da utilização de algum método numérico.

2.4 – Problema Fundamental de Griffith

O problema fundamental de Griffith refere-se a uma estrutura plana (chapa) com


dimensões infinitas onde uma fissura é posicionada em seu centro. No contorno infinito
da chapa, é aplicada uma força de superfície remota   , conforme indica a Fig. (2.1).

Figura 2.1 Problema fundamental de Griffith.

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 33

Para o problema de Griffith as seguintes condições de contorno deverão ser


verificadas para a escolha da função de tensão adequada:
a)  y  0 a  x  a e y 0

b)  y    x  

c)  y   x  a

d)  y deve ser composta pela parcela real de Z  

Deseja-se que a parcela real da função Z   apresente a seguinte forma:

 y    (2.37)

sendo que  assume as seguintes configurações: tende a unidade quando x   e


tende a infinito quando x   a .
Diversas funções de tensão podem ser testadas para a solução desse problema.
Porém, será escolhida uma função de tensão do tipo Westergaard, como apresentado na
Eq.(2.38).
  
Z     Z    (2.38)
a 2
 2  a2
1
2
sendo   x  iy . A partir da análise da expressão apresentada pela Eq. (2.38), verifica-
se que esta atende às condições de contorno necessárias do problema fundamental de
Griffith. Quando o ponto analisado aproxima-se da extremidade da fissura, ou seja,
quando   a a função tende a ser singular. Por outro lado, quando analisam-se pontos
distantes da ponta da fissura,    , a função tende a ser igual à força de superfície

remota aplicada,   . Quanto aos quesitos a e d, constata-se que esses são


complementares. Quando os pontos analisados estão concentrados no intervalo
 a  x  a e y  0 , a função de tensão considerada não apresenta parte real,
satisfazendo, portanto, essas duas condições.
Objetivando melhor tratar o problema, é conveniente efetuar uma mudança no
sistema de coordenadas. Define-se a distância, r, a partir da extremidade da fissura,
como mostrado na Fig. (2.2) sendo y  0 , da seguinte maneira:
r  a (2.39)

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 34

Figura 2.2 Sistema de coordenadas na ponta da fissura.

Com base na definição mostrada na Eq. (2.39), pode-se reescrever a função de


tensão para o novo sistema de coordenadas da seguinte forma:
 r  a
Z    (2.40)
r 2  2ra
Deve-se notar que, para este sistema de coordenadas, à medida que o ponto
analisado aproxima-se da extremidade da fissura, ou seja, quando r  0 , constata-se a
presença de uma singularidade. Além disso, verifica-se que essa singularidade é da
ordem de 1 r.
Para um ponto qualquer do corpo ( y não precisa ser necessariamente igual à
zero), a Eq. (2.39) pode ser reescrita como:
  a (2.41)

sendo  uma distância generalizada a partir da ponta da fissura. Assim, a Eq. (2.38)
pode ser reescrita como:
    a      a 
Z     Z    (2.42)
  a 
2
a 2    2a 

A partir da equação anterior, pode-se definir a primeira derivada da função de


tensão, a qual é dada por:
  a 2
Z   
'
(2.43)
  2a 
3 3
 2 2

Assumindo-se a hipótese de análise de tensões apenas em regiões muito


próximas à ponta da fissura (apenas onde surgem as concentrações de tensão), ou seja,
  0 , pode-se reescrever as Eq. (2.42) e Eq.(2.43) da seguinte maneira:

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 35

 a   a 2
Z    e Z '    (2.44)
2a  2a 
3 3
 2 2

Utilizando a definição da variável  dada na Eq. (2.38), a variável  pode ser


assim reescrita, em função das variáveis x e y:
_
  x  iy  a     x  a   iy    x  iy (2.45)

A Eq.(2.45) pode ainda ser reescrita utilizando-se o sistema de coordenadas


polares. Nesse tipo de sistema de coordenadas, as variáveis x e y são definidas em
função de variáveis r e  como:
x  r cos   e y  r sen   (2.46)

Portanto:
  r cos    ir sen   (2.47)

Utilizando as relações apresentadas na Eq. (2.7), pode-se reescrever  de uma


maneira mais compacta como:
  rei (2.48)

Com base no resultado apresentado na Eq. (2.48), a função de tensão e sua


derivada primeira tomam a seguinte forma, respectivamente:
 i
 a   ae 2
Z     Z    (2.49)
2arei 2ar
3i
  a 2   a 2 e 2
Z   
'
3i
 Z   '
(2.50)
 2a   2ra 
3 3 3
2 2
r 2e 2

Baseando-se ainda nas relações apresentadas na Eq. (2.7), pode exprimir os


termos exponenciais presentes nas duas ultimas equações em função das funções
trigonométricas seno e cosseno. Assim:
ei  cos    isen   e e i  cos    isen   (2.51)

Portanto, considerando os dados apresentados na Eq.(2.51), os resultados


apresentados pelas Eq.(2.49) e Eq.(2.50) podem ser reescritos de forma mais
conveniente como:
        3   3 
  a cos    isen      a 2 cos    isen  
 2   2     2   2 
Z    Z '    (2.52)
 2ar  2
3
2ar

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 36

Assim, a parcela real de Z   e a parcela imaginária de Z '   podem ser

facilmente identificadas, resultado em, respectivamente:


 a    a2  3 
Re Z    cos   Im Z '    sen   (2.53)
2  2ar   2 
3
2ar 2

Com base nos resultados apresentados pela última equação, pode-se agora
definir a expressão da tensão normal atuante ao longo do eixo y . Conforme mostrado
na Eq. (2.36), a tensão  y é dada por:

 y  Re Z    y Im Z '   (2.54)

Por meio dos valores mostrados na Eq. (2.53), a tensão  y pode ser escrita

como:
 a    a  3 
y  cos    rsen    3 sen   (2.55)
2r 2  2r  2  2 
Para a determinação da expressão final da tensão normal  y , deve-se considerar

a seguinte identidade trigonométrica:


   
sen    2sen   cos   (2.56)
2 2
Utilizando esse último resultado, a expressão para a tensão na direção  y toma a

seguinte forma final:


a      3  
 y   cos   1  sen   sen    (2.57)
2r  2  2  2 
Utilizando a mesma metodologia aplicada anteriormente, podem ser também
determinadas as expressões para as tensões  x e  xy . Utilizando as Eq. (2.36) e Eq.

(2.52), mostra-se que:


a      3 
 x   cos   1  sen   sen  
2r  2  2  2 
(2.58)
a    3   
 xy    sen   cos   cos  
2r 2  2  2
De forma a obter expressões mais convenientes, o termo  pode ser
introduzido nas Eq. (2.57) e Eq.(2.58). Portanto, o estado de tensão para a região
próxima à extremidade da fissura, para o problema fundamental de Griffith, é assim
definido:

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 37

a      3 
 x   cos   1  sen   sen  
2 r  2  2  2 
a      3  
 y   cos   1  sen   sen    (2.59)
2 r  2  2  2 
a    3   
 xy    sen   cos   cos  
2 r 2  2  2
Portanto, para o problema fundamental de Griffith, o estado de tensão na região
próxima a extremidade da fissura é determinado utilizando-se a Eq. (2.59). Deve-se
enfatizar que as expressões apresentadas na Eq. (2.59) são válidas apenas na região
próxima à extremidade da fissura, já que a hipótese   a foi assumida na

determinação da Eq. (2.44).


Conforme indicado na Eq.(2.59), esse conjunto de equações tende a
singularidade quanto r  0 . Além disso, as expressões das tensões são o resultado do

produto de uma função geométrica da posição,  1  f  , e de um fator,


  
 2 r 

   a , o qual é uma simples função da tensão remota aplicada e do comprimento da

fissura. O fator    a determina a magnitude (intensidade) das tensões elásticas


atuantes na região próxima à ponta da fissura. Esse termo é denominado, para o modo I
de fratura, de Fator de Intensidade de Tensão (FIT), cujo símbolo é K I .
O FIT pode ser entendido como um fator que associa o campo de tensões à
frente da extremidade da fissura com a singularidade de tensões. Quando K I alcança
um valor crítico, denominado tenacidade do material, a fissura pode propagar-se de
forma estável ou instável. Portanto, o FIT mede a capacidade do material de resistir ao
avanço da fissura. Para os casos em que a propagação é observada, tem-se K I  K IC . O

termo K IC é usualmente designado na literatura como tenacidade à fratura do material, o


qual é uma propriedade do material.
Para encerrar a discussão sobre o problema fundamental de Griffith, uma
análise sobre os campos de deformação e deslocamento pode ser também efetuada.
Assumindo, inicialmente, que o corpo em análise encontra-se em estado plano de
deformação, a seguinte relação pode ser escrita, conforme apresentado no capítulo
anterior:

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 38

 x    y   z    
1 1
x   x  1   2  x   1     y  (2.60)
E E 
Sabendo que a deformação normal ao longo da direção x é definida como

 x  u x , para o regime de pequenos deslocamentos. Então, o deslocamento do corpo

nessa direção pode ser obtido por meio da seguinte relação:

u
1 

E   
1   2  x   1     y  dx (2.61)

Integrando os termos acima, levando em consideração a Eq.(2.36), obtém-se:


 1  
   y Im Z  
_
u   1  2  Re Z (2.62)
 E  
Para o deslocamento ao longo da direção y o procedimento é semelhante. Para
essa direção sabe-se que:

y 
1
E
 y    x   z    y 
1
E
 
1   2  y   1     x  (2.63)

Assumindo-se a hipótese de pequenos deslocamentos, a deformação normal ao

longo do eixo y é definida como  y  v , conforme apresentado no capítulo anterior.


y
Assim, o deslocamento v pode ser obtido por meio da seguinte relação:

v
1 
E  
 
1   2  y   1     x  dy (2.64)

Integrando a equação anterior, considerando as definições apresentadas na Eq.


(2.36) para as tensões, tem-se:
 1   _

v   2 1    Im Z    y Re Z    (2.65)
 E  
Para o problema estudado, a função de tensão é a apresentada nas Eq. (2.52).
Assim, as Eq. (2.62) e Eq. (2.65) podem ser reescritas como:
KI r     
u  2 1    cos    2  2  cos 2    (2.66)
E 2  2   2 

KI r     
v  2 1    sen    2  2  cos 2    (2.67)
E 2  2   2 
Considerando agora a análise em estado plano de tensão, o procedimento
apresentado anteriormente pode ser também aplicado. Nesse caso, a tensão  z é nula.
Efetuando as manipulações matemáticas necessárias, mostra-se que o campo de
deslocamento é dado pelas seguintes relações:

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 39

KI r       
u2 cos   1  sen 2     cos 2    (2.68)
E 2  2  2  2 

KI r       
v2 sen   1  sen 2     cos 2    (2.69)
E 2  2  2  2 

2.5 – Relações Úteis Decorrentes do Problema de Griffith

Conforme apresentado no item anterior, a partir da definição de uma função de


tensão complexa analítica, dada por Westergaard, foi possível a obtenção dos campos de
tensões e deslocamentos para o problema fundamental de Griffith. Para complementar o
estudo deste problema, podem ser determinadas as tensões principais (estado de tensão
principal na ponta da fissura) com base nas expressões apresentadas na Eq. (2.59).
Utilizando os conceitos apresentados nos cursos de teoria da elasticidade e mecânica
dos sólidos sabe-se que:

x  y   y  x 
2

 1,2       xy
2
(2.70)
2  2 
Portanto, utilizando as equações apresentadas na Eq. (2.59), pode-se escrever as
tensões principais como:
KI      KI     
1  cos   1  sen    2  cos   1  sen    (2.71)
2 r  2   2  2 r  2   2 
Se o problema for analisando considerando estado plano de tensão, a terceira
tensão principal é nula,  3  0 . Por outro lado, se o problema é analisado assumindo-se
estado plano de deformação, a terceira tensão principal pode ser determinada por meio
das equações apresentadas no capítulo anterior, já que nessa situação  z é nula. Assim,
se estado plano de deformação é considerado tem-se:
2 K I  
3  cos   (2.72)
2 r 2

2.6 – Modos de Solicitação à Fratura

Antes de prosseguir com o estudo de corpos fissurados é conveniente definir os


modos de solicitação a fratura possíveis em um corpo qualquer. Esses modos definem a

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 40

maneira pela qual as faces da fissura deslocam-se sob a ação de um dado carregamento.
Na Fig. (2.3) estão apresentados os modos básicos de solicitação à fratura para corpos
tridimensionais. Na verdade, existem infinitos modos de solicitação à fratura possíveis.
No entanto, todos estes podem ser obtidos combinando-se os modos básicos mostrados
nessa figura. Deve-se enfatizar que para problemas planos, apenas os modos de
solicitação I e II estão presentes. Conforme indicado na Fig. (2.3) os modos básicos de
solicitação à fratura podem ser assim descritos:
Modo I, Modo de Abertura (opening): Nesse modo de fratura, as faces da fissura
separam-se simetricamente relativamente ao plano formado por elas antes da ocorrência
da deformação. Portanto, após a deformação as faces da fissura permanecem simétricas
com relação aos planos xy e xz.
Modo II, Modo de Deslizamento (sliding): Esse modo caracteriza-se pelo fato
das faces da fissura apresentarem anti-simetria com relação ao plano xz e simetria com
relação ao plano xy após a ocorrência da deformação. As faces da fissura separam-se
em direções opostas, porém sob o mesmo plano.
Modo III, Modo de Rasgamento (tearing): As faces da fissura nesse modo
separam-se de forma anti-simétrica com relação aos planos formados pelos eixos xy e
xz. A separação entre as faces da fissura ocorre de forma transversalmente oposta.

Figura 2.3 Modos básicos de solicitação à fratura.

2.7 – Análise de Problemas que Envolvem Modos de Fratura II e III

Até o momento foi estudado o problema fundamental de Griffith, o qual envolve


uma estrutura de dimensões infinitas remotamente carregada e uma fissura solicitada em
modo I. Utilizando procedimentos análogos aos já apresentados previamente neste

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 41

capítulo, problemas envolvendo os modos de solicitação à fratura II e III podem ser


também tratados.
Para a análise de problemas de fratura pura em modo II, deve-se, inicialmente,
definir uma função de tensão complexa, a qual deve ser também analítica.
Semelhantemente ao discutido para o problema em modo I, Westergaard propôs a
seguinte função de tensão para o tratamento deste problema:
__
     y Re Z   (2.73)

Impondo as condições de Cauchy-Riemann sobre a equação acima e usando as


relações de dependência entre o campo de tensões e as derivadas da função de tensão,
Eq.(1.20), podem ser definidas expressões para as tensões no caso plano. As derivadas,
em relação às direções x e y, da função mostrada na Eq.(2.73) são assim definidas:
 __
  __ 
   y Re Z      Re Z   
          y 
   
x x x x (2.74)
  
  y Re Z  
x
 __

   y Re Z    __
         
   
__ Re Z
  Re Z    y
y y y y
(2.75)
Considerando que a função de tensão complexa Z é analítica, as condições de
Cauchy-Riemann são atendidas. Portanto, com base no apresentado na Eq. (2.16) pode-
se escrever que:
__ __ __
 Re Z    Im Z    Re Z  
    Im Z   (2.76)
y x y
A partir da Eq. (2.76), pode-se reescrever a Eq. (2.75) como:
   __
  Re Z    y Im Z   (2.77)
y
As derivadas de segunda ordem são calculadas utilizando os resultados
apresentados nas Eq.(2.74) e Eq.(2.77). Assim:
 2      y Re Z     2  
    y Re Z '   (2.78)
x 2
x x 2

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 42

 __

   Re Z   
        y Im Z   
2

  
y 2
y y
(2.79)
 __ 
  Re Z   
   
2
  Im Z   y  Im Z  
   
y 2
y y
Como a função complexa é analítica, as condições de Cauchy-Riemann devem
ser atendidas. Dessa forma, utilizando as condições apresentadas nas Eq.(2.16) e
Eq.(2.17) obtém-se:
__ __ __
 Re Z    Im Z    Re Z  
    Im Z   (2.80)
y x y
 Im Z    Re Z    Im Z  
   Re Z '   (2.81)
y x y
Assim, considerando os resultados apresentados nas duas últimas equações,
pode-se reescrever a Eq.(2.79) como:
 2  
 2 Im Z    y Re Z '   (2.82)
y 2

Deve-se também determinar a expressão da derivada segunda cruzada da função


de tensão, ou seja, da derivada em relação à x da Eq. (2.77). Assim:
 __

    
    y Im Z   
   
2  Re Z
  
y x x x (2.83)
   
2

  Re Z    y Im Z '  
y x
Com base nos resultados apresentados nas Eq.(2.78), Eq. (2.82) e Eq. (2.83) e
nas expressões que relacionam as tensões às derivadas da função de tensão, conforme
apresentado na Eq. (1.20), pode-se escrever o campo de tensões, de forma geral, para as
funções de tensão do tipo Westergaard da seguinte forma:
 2  
 xx   2 Im Z    y Re Z '  
y 2

   
2

 yy    y Re Z '   (2.84)
x 2

 2  
 xy    Re Z    y Im Z '  
xy

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 43

Como mostrado na Eq. (2.84), o campo de tensões depende da definição de uma


função Z   , a qual deve ser proposta segundo o problema estudado. Esta função deve

ser proposta levando-se em consideração as condições de contorno apresentadas pelo


problema. De forma a aplicar o equacionamento desenvolvido, será estudado o
problema mostrado na Fig. (2.4). Trata-se da estrutura discutida no problema
fundamental de Griffith, porém, solicitada por forças cisalhantes remotas em seu
contorno infinito.

Figura 2.4 Problema chapa infinita com fissura central solicitada em modo II.

Para este problema, as seguintes condições de contorno devem ser atendidas:


a)  y  i xy  0 a  x  a e y  0

b)  x   y  0 x 2  y 2  

c)  xy    x 2  y 2  

A solução do problema apresentado na Fig. (2.4) passa pela utilização de uma


função de tensão de Westergaard. Para o problema em estudo, a seguinte função Z  

pode ser utilizada:


i 
Z     i  (2.85)
 2  a2

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 44

Seguindo a metodologia utilizada no item 2.4 e o conjunto de relações


apresentado na Eq. (2.84), obtém-se o estado de tensão para a região próxima a
extremidade da fissura. Efetuando as manipulações matemáticas necessárias, as
seguintes equações são obtidas:
   a      3  
 xx  sen    2  cos   cos   
2 r  2  2  2 
  a      3 
 yy  sen   cos   cos   (2.86)
2 r 2 2  2 
  a      3  
 xy  cos   1  sen   sen   
2 r  2  2  2 
Caso o problema analisado seja plano de deformação, a tensão ao longo da
direção z é obtida utilizando os conceitos da mecânica dos sólidos,  z    x   y  . Se

o problema for plano de tensão, tem-se  z  0 . De forma semelhante o problema de

solicitação em modo I, pode-se definir que K II     a .


O campo de deslocamentos pode também ser obtido para o problema estudado.
Considerando que as deformações estão diretamente ligadas às derivadas dos
deslocamentos e que as deformações estão conectadas às tensões por meio da lei de
Hooke generalizada, pode-se escrever as expressões dos deslocamentos u e v em função
das tensões apresentadas na Eq.(2.84). Assim:
 1 __
2u  Re Z    y Im Z  
2
(2.87)
 1 __
2 v  Im Z    y Re Z  
2
onde  é o módulo de elasticidade transversal e    3  4  se o problema for estado

plano de deformação e    3    1    se o problema for estado plano de tensão.

Substituindo as parcelas real e imaginária da função Z   , bem como suas

derivadas, pode-se reescrever esta última equação da seguinte maneira:

  a  r      
u  sen    2  2  cos 2    
  2  2   2  
(2.88)
 a  r      
v   cos    1  2  sen 2    
  2  2   2  
As duas expressões obtidas anteriormente são válidas se a condição de estado
plano de deformação for assumida. Caso contrário, se a condição de estado plano de
Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 45

tensão for considerada, deve-se substituir o coeficiente de Poisson,  , por um valor

aparente dado por  .


1   
Com base nas expressões que descrevem o estado de tensão para o problema
analisado, Eq.(2.86), pode-se determinar o estado de tensão principal atuante na região
próxima à extremidade da fissura. Utilizando os conceitos contidos na teoria da
elasticidade e mecânica dos sólidos obtêm-se as expressões mostradas na Eq.(2.89):

K II  10  6cos  2    
1    sen   
2 r  4  2  

(2.89)
K  10  6cos  2    
 2   II   sen   
2 r  4  2  

Se o problema analisado for do tipo plano de tensão, a terceira tensão principal é
nula,  3  0 . Porém, se o problema é analisado assumindo-se estado plano de
deformação, a terceira tensão principal deve ser determinada utilizando as equações
apresentadas no capítulo anterior, já que nessa condição  z  0 . Assim, se estado plano
de deformação é considerado tem-se:
2 K II  
3   sen   (2.90)
2 r 2
Deve-se ressaltar que as expressões obtidas em Eq. (2.86) e em Eq. (2.88) são
válidas apenas na vizinhança da extremidade da fissura. Assim como na análise do
problema de fratura em modo I, uma hipótese relacionada à distância em relação à
extremidade da fissura foi assumida para a função Z   ao longo dos

desenvolvimentos.
Considerando análises estruturais envolvendo corpos fissurados solicitados à
fratura em modo III, o procedimento para o tratamento analítico é muito semelhante ao
utilizado para corpos solicitados em modo I (discutido em detalhes no item 2.4) e modo
II (apresentado anteriormente). De forma concisa, o procedimento envolve,
inicialmente, a definição de uma função de tensão complexa para o problema, a qual
deve ser também analítica. Em seguida, devem ser impostas as condições de Cauchy-
Riemann à função de tensão, além de utilizar as relações entre as derivadas da função de
tensão e o campo de tensão, dados pela teoria da elasticidade. Assim, é possível
exprimir a relação entre o campo de tensões e a função analítica de tensão. Para cada

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 46

problema particular envolvendo solicitação em modo III, deve-se propor uma função
Z   que atenda às condições de contorno observadas no problema. Finalmente, com

base no campo de tensão, as deformações e deslocamentos podem ser obtidos utilizando


a relação entre deformação e deslocamento e a lei de Hooke generalizada.
Para os problemas de fratura envolvendo modo III, Westergaard propôs a
seguinte função de tensão:
1
    Im Z   (2.91)

Utilizando os conceitos da teoria da elasticidade, as tensões envolvidas no
problema podem ser expressas em função de    da seguinte forma:

     
 xz   e  yz   (2.92)
x y
Assim, impondo as condições de Cauchy-Riemann, a Eq. (2.92) pode ser
reescrita como:
 xz  Im Z '  
(2.93)
 yz  Re Z '  
Para cada problema envolvendo solicitação à fratura em modo III, deve-se
propor uma função Z   que atenda às condições de contorno observadas. De forma a

estudar um problema particular de fratura em modo III, e aplicar o equacionamento


desenvolvido, será analisado o problema mostrado na Fig. (2.5). Trata-se de uma
estrutura de dimensões infinitas onde observa-se a presença de uma fissura em seu
centro. O carregamento aplicado é composto por duas forças cisalhantes atuando na
direção perpendicular ao plano da estrutura.
Para o problema apresentado na Fig. (2.5), as seguintes condições de contorno
devem ser atendidas:
a)  yz  0 a  x  a e y  0

b)  xz  0 x 2  y 2  

c)  yz    x 2  y 2  

Com base nas condições de contorno a serem atendidas, pode-se resolver o


problema utilizando uma função de tensão de Westergaard. Para o problema em análise,
a seguinte função pode ser adotada:

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 47

 
Z '    (2.94)
 2  a2

Figura 2.5 Problema chapa infinita com fissura central solicitada em modo III.

Utilizando o resultado apresentado na Eq. (2.93) e a função Z   adotada

anteriormente, pode-se determinar o campo de tensões para o problema. Através de


manipulações matemáticas convenientes obtém-se:

   a  
 xz  sen  
2 r 2
(2.95)
  a  
 yz   cos  
2 r 2
Utilizando a lei de Hooke generalizada, pode-se determinar o campo de
deslocamentos da estrutura, o qual é composto apenas pelo deslocamento perpendicular
ao plano da estrutura. Efetuando este procedimento obtém-se:
2   a r  
w sen   (2.96)
 2 2
Assim como nos problemas estudados de solicitação à fratura nos modos I e II,
as expressões obtidas para fratura em modo III são válidas apenas na região próxima à
extremidade da fissura. A hipótese de pequena distância em relação à ponta da fissura
foi assumida na determinação da Eq. (2.94). Essa hipótese permite simplificar

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 48

consideravelmente a função de tensão Z   e assim reduzir significativamente as

manipulações matemáticas envolvidas na análise.

2.8 – Solução Completa do Campo de Tensão

Conforme discutido anteriormente, o fator de intensidade de tensão é o


parâmetro que descreve e governa o estado de tensão atuante à frente da extremidade da
fissura. Quando as equações obtidas neste capítulo são analisadas para pontos distantes
da extremidade da fissura, observa-se que os termos que compõem o campo de tensão
tendem a zero, o que não traduz a verdade. Esta constatação decorre das simplificações
introduzidas na dedução das equações, as quais assumiam apenas que os pontos
analisados estariam próximos à extremidade da fissura.
Para análises envolvendo pontos distantes da ponta da fissura, o estado de tensão
pode ser descrito utilizando-se uma expansão em série demonstrada por WILLIAMS
(1957). Essa expansão envolve termos de alta ordem da distância e assim, a tensão pode
ser corretamente descrita quão maiores forem os termos considerados. A expansão de
Williams para as tensões é a apresentada na equação seguinte:
1
 ij  r ,   Ar f ij    Bg ij    Cr 2 hij    Driij   ...
1
2
(2.97)

sendo fij , gij , hij , iij funções angulares da posição e os termos A, B, C, D parâmetros

relacionados ao carregamento externo. Para o problema fundamental de Griffith,


KI
solicitação em modo I, tem-se que A  . Com base nesta expansão, observa-se
2
que quando os pontos analisados aproximam-se da ponta da fissura, todos os termos da
série tenderão a zero, com exceção do primeiro deles. Quando a distância considerada é
nula o primeiro termo é singular e os demais nulos. Deve-se enfatizar que o processo de
fratura inicia-se na ponta da fissura e não em outro ponto qualquer do corpo. Assim, a
consideração apenas do primeiro termo da série é plenamente justificada para as
análises da mecânica da fratura.
Portanto, a expansão em série apresentada na Eq. (2.97) pode ser particularizada
para o problema fundamental de Griffith. Considerando-se apenas o primeiro termo da
série, as tensões podem ser representadas como:
KI
 ij  r ,    f ij    T  ij (2.98)
2 r

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 49

A matriz T contém os termos de ordem superior da expansão em série, podendo


ser utilizados também para particularizações da solução de Griffith. Expandindo os
termos da equação anterior considerando o problema fundamental de Griffith tem-se:
 xx  xy  KI  f xx   f xy    T 0 
    
f yy     0 T 
(2.99)
 xy  yy  2 r  f yx  
sendo KI e T dados por:

K I   y  a
(2.100)
T   x   y

A matriz T pode ser também manipulada para descrever o comportamento de


uma chapa tracionada uniaxialmente. Para este problema particular  x é nulo. Assim,

as correções necessárias sobre o problema original podem ser contidas na matriz T, de


forma a tornar possível a análise de problemas derivados.

2.9 – Referências Complementares

BROEK, D. (1986). Elementary engineering fracture mechanics, Kluwer Academic


Publ. Dordrecht.
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Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 50

WILLIAMS, M.L. (1957). On the stress distribution at the base of a stationary crack,
Journal Applied Mechanics, vol. 24, pp. 109-114.

Capítulo 2 – Funções Complexas de Tensão ______________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 51

3. – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura

3.1 – Introdução

A criação de novas superfícies de fissura, e consequente separação do material, é


causada pela ruptura das ligações atômicas dos componentes materiais em decorrência
da elevada concentração de tensão observada no corpo, em decorrência da presença de
fissuras. Objetivando analisar as condições de estabilidade ao crescimento das fissuras e
sua propagação, Griffith formulou esse problema por meio de um balanço de energia.
Griffith postulou que uma condição necessária para o crescimento da fissura, ou criação
de novas superfícies de fissura, decorre da transferência de energia potencial elástica do
corpo para a formação de novas faces de fissura. Dessa forma, quando o corpo não é
capaz de absorver a energia fornecida pelo carregamento externo, ocorre a transferência
de energia potencial elástica para energia de superfície, a qual é responsável pelo
surgimento de novas faces da fissura.
Quando a energia de superfície do material e o tamanho da fissura são
conhecidos, o critério baseado em energia pode prever a intensidade mínima do
carregamento externo que provoca a fratura do corpo. Por meio de seu balanço de
energia, Griffith resolveu o paradoxo de Inglis, o qual previa tensões infinitas na
extremidade da fissura independentemente da intensidade do carregamento aplicado.
Conforme as equações mostradas no capítulo anterior, um corpo fissurado não era capaz
de sustentar sua integridade sob a ação de qualquer intensidade de carregamento
externo.

3.2 – Balanço de Energia de Griffith

O fenômeno da fratura envolve o crescimento das descontinuidades (fissuras)


pré-existentes no sólido. Dessa forma, nesse processo, novas superfícies para as fissuras

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 52

são criadas à medida que a propagação ocorre, caracterizando um processo não


conservativo de energia. Portanto, a realização de um balanço de energia, ou seja, a
procura pelo ponto a partir do qual a variação de energia total em relação ao
comprimento da fissura é nula, foi a solução encontrada por Griffith para a modelagem
do crescimento das fissuras, conforme ilustra a Fig. (3.1).

Figura 3.1 Evolução da energia com o aumento do comprimento da fissura.

Empregando a primeira lei da termodinâmica, lei da conservação de energia, é


possível explicitar as parcelas de energia que compõem o sistema corpo
fissurado/carregamento externo. Segundo esta lei, verifica-se que a energia fornecida
pelos carregamentos externos atuantes (variação do trabalho associado a estes), somado
à energia térmica aplicada ao corpo é igual a variação das energias potencial interna e
cinética, além da energia dissipada pelo corpo com o aumento das superfícies da fissura.
Essa igualdade de energia é apresentada na Eq. (3.1), ressaltando que o ponto sobre
cada uma das variáveis denota variação no tempo, ou seja, representa o valor da
grandeza em um determinado instante.
. . . . .
W  Q  Y  O Z (3.1)
.
em que: W é a energia fornecida pelos carregamentos externos, a qual é determinada
. . .
segundo a variação do trabalho, W   Pk uk dT    bk uk d  , sendo  a densidade do
T 

material,  T é o somatório dos contornos onde atuam as forças de superfície e  é o


.
domínio do corpo. Q representa a energia térmica fornecida ao sistema.
. . .
Q  q k k dq    hu d  , sendo q o vetor de condução de calor por unidade de
q 

superfície, hu são as fontes unitárias por unidade de massa e  q indica as superfícies

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 53

.
sob as quais estão aplicados os carregamentos térmicos. Y é a energia potencial interna.
. d   .
Y    d   ,  é a densidade de energia interna por unidade de massa. O é a
dt   

d  1 . .  d  
dA  ,  é a energia necessária
. .
energia cinética. O     uk uk d   e Z 
dt   2  dt   
A 
para a formação de novas superfícies (unitárias) da fissura.
Em muitos problemas de engenharia, dentre os quais enquadram-se aqueles
discutidos nesta disciplina, pode-se admitir que a propagação das fissuras ocorre de
.
forma quase estática. Nessa condição, os campos de velocidades de deslocamento, u k ,
.
desenvolvidos no corpo são pequenos e assim a variação da energia cinética, O , que é
proporcional ao quadrado dessa grandeza, pode ser desprezada (deve-se destacar que
essa parcela não pode ser omitida em problemas envolvendo campos dinâmicos).
.
Pode-se também desprezar a parcela de energia referente às ações térmicas, Q ,
assumindo que a propagação das fissuras ocorre em condições adiabáticas. Deve-se
enfatizar que a fratura provocada por ações térmicas não encontra-se entre os objetivos
desse curso. De acordo com as condições descritas anteriormente pode-se reescrever o
balanço de energia apresentado na Eq. (3.1) da seguinte forma:
. . .
W Y Z (3.2)
Nos problemas da mecânica da fratura onde a Eq. (3.2) é válida, as mudanças
nas parcelas de energia que ocorrem ao longo do tempo são causadas por variações no
comprimento das fissuras. Dessa forma, as condições que conduzem à situação de
mínima energia do corpo podem ser determinadas diferenciando os termos apresentados
na Eq.(3.2) em relação ao comprimento da fissura, a. Por meio desse procedimento
determinam-se as condições segundo as quais ocorrerá o crescimento das fissuras.
Portanto:
W Y Z
  (3.3)
a a a
Realizando uma breve análise dos termos presentes na Eq. (3.3), constata-se que
W a representa a variação de energia, em relação ao comprimento da fissura,

decorrente do trabalho do carregamento externo aplicado. Já a parcela Y a


contabiliza a variação da energia potencial elástica do corpo em relação ao comprimento

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 54

da fissura. Assim, verifica-se que o balanço dos termos contidos no primeiro membro da
Eq. (3.3) representa a quantidade de energia disponível no sistema para a criação de
novas superfícies de fissura.
Já o segundo membro da Eq. (3.3) contém a parcela de energia de superfície
elástica da fissura, ou seja, a energia necessária para a formação de novas superfícies
para a fissura. Este termo pode ser também denominado resistência, R, já que a fissura
não cresce se a energia disponível no sistema não for suficiente para a criação de novas
superfícies de fissura. Consequentemente, a fissura não cresce se o balanço de energia
contido no primeiro membro da Eq. (3.3) for menor que a energia de superfície
apresentada no segundo membro. De forma semelhante, denominam-se os termos do
primeiro membro da Eq. (3.3) como taxa de liberação de energia, G, uma vez que o
balanço desses indica a quantidade de energia que é liberada para o crescimento das
fissuras. Assim:
Z
R (3.4)
a

G W  Y  (3.5)
a
A Eq. (3.3), e sua representação por meio das parcelas apresentadas nas Eq.(3.4)
e Eq.(3.5), representa um critério para a verificação da estabilidade ao crescimento das
fissuras. Portanto, a fissura não crescerá se a seguinte condição for atendida:
RG (3.6)
Assim, a propagação das fissuras será observada quando a taxa de liberação de
energia, G, atingir um valor crítico, igual a R, que é uma propriedade do material.

3.3 – Aplicação do Balanço de Energia

O balanço de energia apresentado no item anterior pode ser aplicado à análise de


um problema clássico da mecânica da fratura. Trata-se do problema de uma chapa de
dimensões infinitas contendo uma fissura posicionada em seu centro. Nessa estrutura, o
carregamento é composto por uma força trativa uniforme aplicada ao longo do contorno
estrutural paralelo a direção de orientação das faces da fissura, conforme indicado na
Fig. (3.2).

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 55

Figura 3.2 Chapa tracionada com fissura central.

Para a análise energética deste problema, o termo referente à energia potencial


interna da estrutura será decomposto em parcelas referentes à estrutura não fissurada e à
introdução da fissura no corpo íntegro, como apresenta a Fig. (3.3). Assim, para a
estrutura considerada, a seguinte relação pode ser utilizada para exprimir a energia total
do corpo:
U  U 0  U a  U  F (3.7)

sendo: U 0 a energia elástica do corpo considerando a estrutura não fissurada, U a a

parcela da energia elástica decorrente da introdução da fissura no corpo, U  é a energia

de superfície necessária para a criação de novas faces de fissura e F a parcela de energia


decorrente da variação do trabalho dos carregamentos externos.
O termo U 0 é uma constante e não depende do comprimento da fissura, já que

este refere-se à energia interna do corpo não fissurado. A parcela U a indica a energia

que deve ser retirada do corpo íntegro em decorrência da presença da fissura. Sabe-se
que a energia elástica pode ser obtida integrando o produto força e deslocamento, ou
seja, variação de trabalho, ao longo do trecho considerado. Portanto, a parcela U a pode

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 56

ser determinada se os deslocamentos dos pontos ao longo das faces da fissura forem
adequadamente descritos. Estes deslocamentos podem ser determinados utilizando os
procedimentos descritos no capítulo anterior.

Figura 3.3 Decomposição da parcela da energia interna.

Por meio das funções de tensão de Westergaard, a expressão que descreve os


deslocamentos dos pontos localizados sobre as faces da fissura pode ser obtida. Essa
expressão é mostrada em EWALDS & WANHILL (1984) (em sua página 36) e
apresentada abaixo:
2 P
v a2  x2 (3.8)
E
A Eq.(3.8) foi deduzida considerando o sistema de coordenadas apresentado na
Fig. (3.4). Nessa figura é mostrado também o sentido do deslocamento v considerado
para os pontos da face da fissura.

Figura 3.4 Sistema de coordenadas para o deslocamento v.

Com base no apresentado anteriormente, a parcela de energia U a é determinada


por meio da seguinte expressão:
a a
P 2v
U a  2  dx  U a  2  P vdx (3.9)
0
2 0

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 57

onde: P é a força de superfície necessária para provocar o deslocamento total 2v entre


os pontos simetricamente posicionados nas faces da fissura (abertura das faces da
fissura). O fator 2 que surge no denominador da primeira integral apresentada nesta
equação decorre do fato da expressão relacionar apenas a energia referente a uma
metade da fissura (parte positiva ou negativa do eixo x). A consideração da parcela de
energia decorrente da outra metade da fissura é efetuada por meio do fator 2 que
multiplica a primeira integral desta equação.
Assumindo-se que a análise é efetuada em estado plano de tensão, a energia U a

pode ser obtida somando-se a contribuição Pv ao longo de todo o contorno da fissura.


Assim:
a
2 P  P2 a 2
U a  2 P a 2  x 2 dx  Ua  (3.10)
0
E E
Se o problema for analisado assumindo-se a condição de estado plano de
deformação, o deslocamento v deve ser multiplicado pelo fator 1   2  . Portanto, para

problemas em estado plano de deformação, a parcela de energia U a é dada por:

 P2 a 2
U a  1   2  (3.11)
E
Deve-se destacar que a parcela U a resulta um valor negativo de energia, pelo
fato desta variável refletir a introdução da fissura em um corpo íntegro ou sem fissura.
Assim, esse termo representa a inserção de uma descontinuidade, que decorre de um
processo de dissipação de energia.
O termo referente à energia de superfície, U  , é dado pelo produto da energia de

superfície elástica do material,  e , e a área da superfície da fissura. Para o caso plano,


essa parcela de energia é dada por:
U   2  2a e  (3.12)

sendo que o multiplicador 2, fora dos parêntesis, deve-se ao fato da fissura apresentar
duas faces. Assim, a Eq. (3.12) fornece a parcela de energia de superfície total.
Assumindo que a chapa analisada apresente dimensões infinitas, o trabalho
realizado pelas forças externas será constante, uma vez que o deslocamento observado
ao longo do contorno infinito será uniforme e constante. Portanto, F não dependerá do
comprimento da fissura.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 58

Assim, com base nos desenvolvimentos efetuados e no resultado mostrado na


Eq. (3.3), a condição de instabilidade para o crescimento da fissura, assumindo-se o
caso plano de tensão, é dada pela seguinte equação:

    P2 a 2   
 F  U       4a e  (3.13)
a   E   a
0

Eliminando os termos constantes em relação ao comprimento da fissura e


derivando as funções que dependem desta variável, obtém-se a seguinte relação:
 P2 a
 2 e (3.14)
E
Que na condição de instabilidade pode ser manipulada e reescrita como:
2 E e
GR  P a  (3.15)

A Eq.(3.15) mostra que a condição de instabilidade ao crescimento da fissura,
para o problema analisado considerando materiais frágeis, é governada pelo produto da
força remota aplicada pela raiz quadrada do comprimento da fissura. Além disso, esta
condição depende de dois parâmetros materiais, como mostrado no segundo membro da
equação, os quais resultam um valor característico do material. Consequentemente, a
propagação da fissura ocorre somente quando o produto P a atingir esse valor
característico dependente das propriedades do material. Deve-se ainda mencionar que o
resultado apresentado nesta análise foi verificado experimentalmente por Griffith em
chapas de vidro, as quais foram ensaiadas considerando uma grande amplitude para o
intervalo do comprimento da fissura.
Além disso, outra interessante interpretação pode ser efetuada com base na
análise da Eq. (3.14). Com o objetivo de estudar a influência das parcelas de energia U a

e U  no processo de fraturamento, pode-se representar, de forma esquemática, sua

dependência em relação ao comprimento da fissura, a. Essa representação é mostrada na


Fig. (3.5), onde apresenta-se também a dependência entre a derivada da energia total em
relação ao comprimento da fissura. Com base nesta figura, constata-se que para
pequenos valores de comprimento da fissura, a energia de superfície possui, em módulo,
valor superior à redução de energia elástica decorrente da introdução da fissura. Isso
pode ser também verificado nas Eq.(3.11) e Eq.(3.12), onde observa-se dependência
linear de U  em relação ao comprimento da fissura enquanto que para U a essa

dependência é quadrática.
Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 59

Figura 3.5 Evolução de energia segundo o comprimento da fissura.

Com base na ilustração apresentada na Fig. (3.5), observa-se que, para um dado
carregamento, haverá um comprimento de fissura específico que tornará nula a energia
total do sistema. Nessa situação, constata-se que U a  U  , a qual é a condição limite

para a observação da instabilidade. Para essa situação, verifica-se que a derivada da


energia total anula-se, caracterizando um ponto de inflexão de energia. Quando
U a  U  (situação possível apenas teoricamente) tem-se caracterizada a condição de

instabilidade. Portanto, quando a liberação de energia elástica devido a um incremento


potencial no comprimento da fissura, da, superar a demanda de energia de superfície
para o mesmo incremento, a introdução da fissura provocará a condição de propagação
instável.
Matematicamente, esse resultado pode ser visualizado com o auxílio da
Eq.(3.14). A partir de um determinado valor para o comprimento da fissura, U a será

sempre superior, em módulo, a U  . Esse resultado ilustra, inclusive, a razão pela qual

em aplicações práticas o engenheiro estrutural limita o comprimento das fissuras a um


valor máximo.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 60

3.4 – Variação de Energia nas Condições de Força ou Deslocamento


Prescritos

A abordagem da condição de estabilidade ao crescimento das fissuras por meio


de um balanço de energia possibilita a realização de uma interessante interpretação nas
análises de corpos onde as ações externas aplicadas sejam compostas ou por forças
aplicadas ou por deslocamentos prescritos. Para tanto, deve-se considerar um corpo de
geometria qualquer, com espessura t , contendo uma fissura em seu domínio. Nessa
situação, a taxa de liberação de energia, por unidade de comprimento, pode ser assim
escrita:
1  1 
G  F U0 Ua   G  F Ua  (3.16)
t a t a
A variação de U 0 em relação ao comprimento da fissura é nula, uma vez que
essa parcela de energia considera o corpo na condição sem fissura. A Eq.(3.16) pode ser
analisada considerando que o carregamento externo atuante seja composto ou por forças
prescritas ou por deslocamentos impostos, ou ambos. A parcela de energia U a pode ser
reescrita utilizando o teorema de Clayperon (a energia é dada pela área sob a curva
força x deslocamento, P x u , de um material de comportamento mecânico elástico
linear). Assim:
1   1 
G  F  Pu  (3.17)
t a  2 
A variação da energia decorrente da inserção da fissura em relação ao
comprimento da fissura, deve ser analisada de forma isolada. Dessa forma:
U a 1   1  U a 1  P u 
  Pu     uP  (3.18)
a t a  2  a 2t  a a 
A Eq.(3.18) pode ser reescrita empregando-se os conceitos de flexibilidade e
rigidez. Sabe-se que:
1
u  CP ; P  Su ; C (3.19)
S
onde C representa a flexibilidade e S a rigidez do corpo. Então:
U a 1  P CP 
  CP  P  (3.20)
a 2t  a a 
Explicitando os termos da equação anterior obtém-se:

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 61

U a 1  P C P  U a P 2 C u P
  CP  P 2  PC     (3.21)
a 2t  a a a  a 2t a t a
Para os corpos submetidos a forças constantes em seu contorno, ao longo do
tempo, portanto independentes do comprimento da fissura, verifica-se que o último
termo do segundo membro da Eq.(3.21) anula-se. Dessa forma, para essa condição, a
parcela da variação de energia decorrente da inserção da fissura em relação ao seu
comprimento será dada por:
U a P 2 C
 (3.22)
a 2t a
Por outro lado, se a ação externa aplicada se tratar de um deslocamento não nulo
prescrito independente do comprimento da fissura, A Eq.(3.21) toma a seguinte forma:
u  1 
 
U a P 2 C u C U a P 2 C u  1 u 
     u C   (3.23)
a 2t a t a a 2t a t  a C a 
 
Aplicando a regra da cadeia ao termo que contém a derivada do inverso da
flexibilidade obtém-se:
1

U a P 2 C u 2 C C U a P 2 C C 2 P 2 1 C
    
a 2t a t C a a 2t a t C a (3.24)
U a P C
2

a 2t a
Considerando os resultados apresentados nas Eq.(3.22) e Eq.(3.24), observa-se
que para os casos de força prescrita e deslocamento imposto, ambos de forma isolada, o
módulo da energia disponível para o crescimento das fissuras é o mesmo. Além disso,
essa variação possui caráter global, uma vez que envolve a variação da flexibilidade,
que é também uma variável global. Verifica-se também, por meio da Eq.(3.21), que
quando a variação do carregamento é negativa (no caso do deslocamento prescrito, por
U a
exemplo), a variação diminui. Isso indica que nessas situações a energia
a
disponível para o crescimento das fissuras diminui à medida que o alívio de
carregamento é observado. Portanto, pode-se observar a propagação estável das fissuras
nessa condição. Por outro lado, na condição de força prescrita, a energia disponível para
o crescimento das fissuras não diminui, indicando que sempre haverá energia disponível
para o crescimento das fissuras, conduzindo à condição de crescimento instável.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 62

3.5 – O Fator de Intensidade de Tensão

Apesar da eficácia do processo de balanço de energia na determinação da


condição de estabilidade ao crescimento das fissuras, verifica-se que sua obtenção é
uma árdua tarefa. Além disso, o termo G, referente a energia disponível para o
crescimento das fissuras, reflete o estado energético global da estrutura. Assim, esse
processo torna-se ineficaz e custoso quando é necessária a avaliação do comportamento
isolado das fissuras, que é de fato um estudo local. De forma a contornar este entrave,
IRWIN (1957) propôs que o estado energético da estrutura pode ser estudado
empregando uma grandeza especial denominada Fator de Intensidade de Tensão, K.
Por meio do parâmetro K é possível realizar a correta avaliação dos campos de tensão à
frente da extremidade da fissura e assim saber a evolução do seu comportamento.
Os conceitos desenvolvidos pela mecânica da fratura elástico linear aplicam-se
com muita fidelidade a materiais do tipo frágeis. Porém, Orowan mostrou, em seus
estudos experimentais, que para materiais de uso corrente na engenharia, como os aços
(mesmo os aços de baixo teor de carbono), a falha por fratura ocorre produzindo uma
significativa deformação plástica ao longo das superfícies de fratura. Essa deformação
plástica é gerada durante o processo de fraturamento, sendo localizada na região
próxima à da propagação da fissura.
Durante o processo de fratura desses corpos, pode-se assumir que a deformação
plástica está confinada em uma estreita camada posicionada ao longo do caminho de
crescimento da fissura (como em um modelo do tipo coesivo). Então, para essa situação
tem-se que o trabalho plástico realizado é proporcional a área das faces da fissura. Esse
trabalho é descrito pela variável  p , sendo denominado de trabalho da superfície

plástica.
Utilizando o resultado apresentado na Eq. (3.15), o qual descreve a condição de
instabilidade para o problema de Griffith, e a constatação da presença de deformações
plásticas nos corpos durante a falha por fratura, pode-se estender a condição de
instabilidade de forma a considerar a influência das deformações plásticas, ou seja,
reescrever a condição de instabilidade para a inclusão de materiais de comportamento
elastoplástico. Nesse caso, a energia de superfície passa a ser composta por uma parcela
elástica e outra plástica. Assim, assumindo-se a hipótese de estado plano de tensão
pode-se escrever que:

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 63

2E  e   p 
P  (3.25)
a
Se a condição de estado plano de deformação for verificada, a equação acima
pode ser reescrita como:

2E  e   p 
P 
1     a
2
(3.26)

Segundo as análises experimentais de Orowan,  p é cerca de 1000 vezes maior

que  e . Portanto, para aplicações práticas, o termo  e pode ser desprezado sem perda
significativa de representatividade.
A extensão da teoria de Griffith proposta por Orowan foi em seguida
generalizada por IRWIN (1957), o qual uniu todas as fontes de solicitação ao
crescimento da fissura em um único termo denominado de taxa de liberação de energia,
G. Segundo o formalismo proposto por Irwin, o critério de Griffith pode ser reescrito
como:
EG
P se Estado Plano de Tensão
a
(3.27)
EG
P se Estado Plano de Deformação
1     a
2

Segundo Irwin, G é uma propriedade do material e pode ser determinada por


meio de ensaios experimentais específicos. Com base nesta generalização, o critério de
fratura de Orowan-Irwin compõe a base da teoria de falha, baseada em energia, para
todos os materiais que falham por fratura de maneira parcialmente frágil.
De forma a complementar este estudo, as equações determinadas anteriormente
podem ser aplicadas ao problema fundamental de Griffith. Para esse problema tem-se:
K  a (3.28)

Assim, conforme discutido previamente neste capítulo, a condição de


instabilidade ocorre quando:
Kc   c  a (3.29)

sendo K c o valor crítico para o fator de intensidade de tensão e  c o valor crítico da


tensão remota aplicada. Igualando as tensões críticas das Eq.(3.27) e Eq. (3.29), obtém-
se a seguinte expressão:

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 64

K c2  EGc se Estado Plano de Tensão


EGc (3.30)
K c2  se Estado Plano de Deformação
1   2 
Portanto, com base na Eq.(3.30), observa-se que a energia global da estrutura
pode ser relacionada a um parâmetro local da fissura. Consequentemente, a
determinação do fator de intensidade de tensão refletirá o estado energético da estrutura.
Embora o resultado apresentado na Eq.(3.30) decorra da análise do problema
fundamental de Griffith, a relação entre G e K pode ser generalizada para qualquer
geometria ou configuração de fissura. Para tal fim, deve-se expressar o balanço de
energia para cada situação particular de maneira a envolver, nos termos de energia, a
relação entre o fator de intensidade de tensão e o carregamento aplicado.
Quando outros modos de solicitação à fratura estão envolvidos no problema,
pode-se utilizar o princípio da superposição dos efeitos para a obtenção da relação G-K.
Para o caso geral 3D pode-se escrever que:
G  GI  GII  GIII (3.31)

Assumindo que a estrutura atenda às condições de estado plano de tensão, a


relação G-K pode ser escrita como:

1 2 K III2 
G   K I  K II 
2
 (3.32)
E 1    
Por outro lado, se forem as condições de estado plano de deformação as que
governam o corpo, a equação acima toma a seguinte forma:

1     2 K III2 
2

G  K I  K II 
2
 (3.33)
E  1    
Deve-se enfatizar que além de ser um parâmetro local, o fator de intensidade de
tensão crítico, Kc, é também uma propriedade do material. Portanto, assim como a
variável G, a determinação de Kc pode ser efetuada por meio de análises experimentais,
considerando diversos tipos de materiais bem como diferentes geometrias.

3.6 – Métodos para a Extração dos Fatores de Intensidade de Tensão

Existem diversos métodos para a determinação dos fatores de intensidade de


tensão. Serão apresentados quatro desses métodos, os quais são robustos o suficiente

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 65

para a análise dos problemas de mecânica da fratura correntemente encontrados no


domínio da engenharia de estruturas.

3.6.1 – Técnica de Correlação de Deslocamentos

A extração dos fatores de intensidade de tensão por meio da técnica de


correlação de deslocamento é efetuada mediante o correlacionamento dos
deslocamentos, determinados analiticamente, experimentalmente ou numericamente nos
pontos físicos localizados na extremidade da fissura, com soluções analíticas.
Por meio das funções de tensão de Westergaard é possível obter as equações que
descrevem os campos de deslocamento na região próxima à extremidade da fissura de
um problema onde o carregamento é remotamente aplicado. Essas equações estão
apresentadas nas Eq. (3.34) e Eq. (3.35).
KI r      K r     
u cos     1  2 sin 2     II sin     1  2 cos 2    (3.34)
2 2  2   2  2 2  2   2 

KI r      K r     
v sin     1  2 cos 2     II cos     1  2 sin 2    (3.35)
2 2  2   2  2 2  2   2 

em que:  é o módulo de elasticidade transversal,  é igual a 3  4 se estado plano de


deformação e  3    1    se estado plano de tensão.  é ângulo de inclinação do ponto
considerado em relação a extremidade da fissura. r é a distância do ponto considerado a
extremidade da fissura. u é o deslocamento paralelo às faces da fissura e v o
deslocamento perpendicular às faces da fissura.
As expressões para a extração dos fatores de intensidade de tensão são obtidas
avaliando-se as Eq. (3.34) e Eq. (3.35) para ângulos iguais a  e   , ou seja, sobre as
faces da fissura, como mostrado na Fig.(3.6).

Faces da
Fissura

Figura 3.6 Avaliação das equações de deslocamentos sobre as faces da fissura.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 66

As expressões resultantes dessa operação devem ser subtraídas de forma a se


obter equações que definam os fatores de intensidade de tensão em função da diferença
entre os deslocamentos das faces da fissura. Efetuando esta operação são obtidas as Eq.
(3.36) e Eq. (3.37), as quais referenciam os fatores de intensidade de tensão à diferença
entre os deslocamentos paralelo e perpendicular ao plano da fissura.

2 
KI  COD (3.36)
r   1

2 
K II  CSD (3.37)
r   1
sendo: COD “Crack Opening Displacement” a diferença entre os deslocamentos
perpendiculares ao plano da fissura e CSD “Crack Sliding Displacement” a diferença
entre os deslocamentos paralelos ao plano da fissura. A Fig. (3.7) ilustra mais
claramente os termos COD e CSD e seu cálculo em pontos localizados sobre as faces da
fissura.

Figura 3.7 Análise das diferenças entre os deslocamentos perpendiculares e paralelos ao plano da fissura.

3.6.2 – Método da Extensão da Fissura Virtual

Por meio desse método, a taxa de liberação de energia é avaliada considerando


uma extensão virtual no comprimento da fissura, a qual se refletirá na redução da
rigidez do corpo em análise. Esse método foi proposto por PARKS (1974) e permite a
determinação da taxa de liberação total de energia, parcela esta que é composta pela
taxa de liberação de energia decorrente de cada um dos modos de solicitação à fratura.
A energia potencial total de um corpo pode ser expressa como:
1
  uT Su  up (3.38)
2
Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 67

sendo p e u os vetores que contém as forças externas atuantes e os deslocamentos do


corpo, respectivamente. S representa a rigidez do corpo. A taxa de liberação de energia,
para um incremento virtual no comprimento da fissura, é obtida efetuando-se a derivada
dos termos constantes na Eq.(3.38) em relação ao comprimento da fissura. Dessa forma:
 1 T S T p u T
G  u u u   Su  up  (3.39)
a 2 a a a
Assumindo que as forças aplicadas sejam conservativas (constantes em relação
ao crescimento da fissura) e que o material possua comportamento mecânico elástico
linear, apenas o primeiro termo da equação anterior é não nulo. Portanto:
1 S
G  uT u (3.40)
2 a
A Eq.(3.40) pode ser resolvida utilizando o método das diferenças finitas. Por
meio desse método, a variação na rigidez é dada por:
S Sa a  Sa
 (3.41)
a a
Deve-se ressaltar que os únicos parâmetros de rigidez que sofrerão alteração
serão aqueles localizados na região onde ocorrerá a extensão virtual no comprimento da
fissura. Caso um método numérico seja utilizado para tal fim, apenas as matrizes
algébricas do método na região afetada pelo incremento virtual deverão ser
consideradas para o cálculo da Eq.(3.41).

3.6.3 – Método da Integral de Fechamento de Fissura Modificado

O método da integral de fechamento de fissura modificado é baseado na


metodologia proposta por Irwin, que relaciona a taxa de liberação de energia aos
campos de tensão e deslocamento na região próxima à ponta da fissura, e em uma
integral de fechamento da fissura. Neste método admite-se que, em modo I de
solicitação à fratura, quando uma fissura tem seu comprimento aumentado de a para
a  a , sendo a infinitesimal Fig. (3.8), o deslocamento da abertura da nova ponta de
fissura será aproximadamente igual ao deslocamento da extremidade da fissura original.
Então, o trabalho necessário para aumentar o comprimento da fissura de a para a  a
é o mesmo necessário para fechá-la de a  a para a . Baseado nisso, Irwin obteve as
seguintes expressões:

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 68

a
1
GI  lim
a 0 2a  v  r   r  dr
0
y (3.42)

a
1
GII  lim
a 0 2a  u  r    r  dr
0
xy (3.43)

Figura 3.8 Extensão da fissura e fechamento.

Nas duas equações anteriores, a indica o acréscimo virtual no comprimento da


fissura,  y e  xy representam as distribuições das tensões normal e de cisalhamento à

frente da ponta da fissura e v  r  e u  r  são os deslocamentos de abertura da fissura a

uma distância r, atrás da nova extremidade. Na forma original, os resultados são obtidos
por meio de duas análises: uma com o comprimento da fissura igual a a e outra com
comprimento igual a a  a .
Se um método numérico for utilizado para a solução das Eq.(3.42) e Eq.(3.43),
os valores dos deslocamentos e das tensões são também determinados numericamente.
Em muitas aplicações, expressões particularizadas podem ser aplicadas aos elementos
que encontram-se na região da ponta da fissura. Tais expressões são mais fáceis de
serem calculadas em comparação com as expressões consistentes.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 69

3.6.4 – Integral J

A integral J trata de uma forma alternativa o balanço de energia geral mostrado


na Eq. (3.1) e no caso particular da Eq. (3.7). Esta integral é válida desde que o material
seja elástico, não necessariamente linear. A integral J pode ser avaliada por meio de
uma integral de linha que independe do caminho escolhido para a integração, conforme
RICE (1968).
Para melhor compreender o significado e obtenção da integral J, deve-se
considerar que J está diretamente ligado à variação da energia potencial da estrutura,
U p . Assim, pode-se definir que:

dU p
J G  (3.44)
da
Para a determinação das parcelas que compõem a energia potencial, e
consequentemente o termo J, deve-se considerar um corpo plano, inicialmente
fissurado, o qual possui um contorno  e área de superfície A . Nesse corpo atuam
forças de superfície ao longo de uma parte de seu contorno,  0 , sendo  0   , as quais
realizam uma quantidade de trabalho F . Os deslocamentos dos pontos localizados
sobre o contorno  0 são representados pelo vetor u .

Para a análise energética, denomina-se U I a energia total contida no corpo antes

da atuação das forças de superfície. Deve-se notar que U I tem significado semelhante a

U 0 discutido previamente neste capítulo. A diferença entre essas parcelas de energia

encontra-se no fato de U I descrever a energia do corpo já fissurado. Portanto, U I


representa a energia contida no corpo fissurado devido a todo e qualquer carregamento
previamente aplicado.
Como consequência da aplicação das forças de superfície ao longo do contorno
 0 , duas situações podem ocorrer:
1) A fissura não propaga. Nesse caso, a energia potencial é dada por:
U P1  U I  F (3.45)

2) Ocorre a propagação da fissura. Nessa situação, a mudança de energia está


relacionada ao incremento no comprimento da fissura. Portanto, os termos
referentes ao crescimento da fissura devem ser incluídos na análise. Assim:
F  U a  U  (3.46)

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 70

Consequentemente, a energia potencial fica assim definida:


U P 2  U I  U a (3.47)

Deve-se notar que a variação da energia de superfície U  é uma parcela de

energia irreversível utilizada durante o processo de crescimento da fissura. Portanto,


essa parcela não é adicionada à energia potencial. A partir dos resultados das Eq.(3.45)
e Eq.(3.47), verifica-se que a variação da energia potencial, U P , devido ao

crescimento da fissura, a , é dada por:


U P  U P 2  U P1 (3.48)

Analisando o caso limite quando a tende a zero, a variação tende a ser


diferencial, ou seja, a  da . Assim:
dU P  dU a  dF (3.49)

Deve-se enfatizar que a Eq.(3.49) será sempre negativa, uma vez que dF
fornece tanto dU a quanto dU  . Integrando a Eq.(3.49) obtém-se:

 dU

P   dU a   dF
 
 U P  U a  F  constante (3.50)

onde  representa o domínio do corpo. A constante de integração que surge na equação


anterior, em decorrência do processo de integração, é o próprio termo U I , ou seja, a
energia potencial é composta pela energia do corpo antes da aplicação das forças
externas e pelas parcelas referentes ao crescimento da fissura. Portanto:
UP  Ua  F UI (3.51)

Conforme discutido nos tópicos anteriores deste capítulo, as parcelas U a e

U I compõem a energia de deformação contida no corpo. Utilizando os conceitos


energéticos da mecânica dos sólidos, sabe-se que a energia de deformação pode ser
representada por:
U a  U I   WE dxdy (3.52)
A

 ij

sendo W a densidade de energia de deformação dada por WE    ij d  ij . O trabalho das


0

forças externas, segundo os conceitos da análise de estruturas, é dado por:


F   Tud  (3.53)

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 71

onde T é o vetor das forças de superfície, sendo dado por Ti   ij j . Substituindo os

resultados das duas últimas equações na Eq. (3.51) obtém-se:


U P   WE dxdy   Tud  (3.54)
A 

Assumindo que as forças de superfície aplicadas no corpo sejam constantes (não


mudam de intensidade, direção e sentido), pode-se escrever que:
dU P WE u
  dxdy   T d (3.55)
da A
a 
a
A Eq.(3.55) representa a variação da energia potencial com relação a um
incremento unitário no comprimento da fissura. Esta equação pode ser modificada
adotando-se um sistema de referência conveniente. Como o problema tratado envolve
fissuras, pode-se considerar que a origem do sistema de coordenadas encontra-se
posicionado na extremidade da fissura. Além disso, assume-se que o ordenada x é
paralelo ao comprimento da fissura e a ordenada y perpendicular às faces da fissura.

Consequentemente, o contorno da fissura, da , torna-se igual a  dx e as variações 


a

iguais a   , pois localizam-se na região negativa de x. Assim, pode-se reescrever a


x
Eq. (3.55) como:
dU P WE u
   dxdy   T d (3.56)
da A
x 
x
A Eq.(3.56) pode ser manipulada utilizando-se o teorema de Green. Segundo
esse teorema, sabe-se que:
 C B 
  x  y  dxdy   Bdx  Cdy
A 
(3.57)

sendo C e B funções contínuas no espaço analisado. A equação acima pode ser


convenientemente separada segundo os termos B e C. Assim:
C B
 x dxdy   C  x, y  dy
A 
e  y dxdy    B  x, y  dx
A 
(3.58)

Com base no resultado apresentado nas Eq.(3.57) e Eq.(3.58), pode-se reescrever


a Eq. (3.56) de forma a eliminar o termo da integral dupla de WE . Então, pode-se
escrever que:
dU P u
   WE dy   T d (3.59)
da  
x

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 72

A partir da definição apresentada na Eq.(3.44) pode-se definir a expressão da


integral J da seguinte forma:
ui
J   WE dy   Ti d (3.60)
 
x
Como J está diretamente ligado à energia, ou seja, G  J , a integral J relaciona-
se diretamente aos fatores de intensidade de tensão. Como mostrado anteriormente, a
relação entre J e K é dada por, considerando apenas casos planos:
K 2  EJ se Estado Plano de Tensão
EJ (3.61)
K2  se Estado Plano de Deformação
1   2 
Como J mede uma quantidade de energia, seu valor é correntemente expresso
em unidades de energia comprimento , ou seja, Joules m 2 ou alternativamente em
N m.
Uma propriedade interessante da integral J é que seu valor independe do
caminho considerado para o cálculo, conforme ilustra a figura abaixo. Para demonstrar
essa propriedade pode-se reescrever a Eq.(3.60) utilizando o teorema de Green para
transformar a primeira integral de contorno em uma integral de área e a equação de
equilíbrio de Cauchy para transformar a força de superfície em variação das tensões.
Assim:
WE   ui 
J  dxdy    ij
x j  x 
dxdy (3.62)
x
 
A A

I II

Figura 3.9 Integral J ao longo do caminho ABCDEF e na direção reversa.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 73

A parcela I, ilustrada na Eq.(3.62), pode ser reescrita utilizando a regra da


cadeia. Por meio dessa regra, o termo da energia interna pode ser definido como:
WE WE  ij WE  ij
    ij (3.63)
x  ij x x x
Utilizando a relação entre deformação e deslocamento, apresentada no capítulo
1, pode-se reescrever a Eq.(3.63) e o termo I da Eq.(3.62) como:
   u x    1  u x u y    u y  
I    xx   2 xy x  2  y  x     yy   dxdy 
A  x  x     x  y  
(3.64)
  2u x   2u x  2u y   2u y 
I    xx   xy   2    yy dxdy
x 2 
A   xy x  xy 

Analisando agora o termo II da Eq.(3.62), este pode ser explicitado como:


   u u y    u x u y  
II      xx x   yx     xy   yy  dxdy 
A  x  x x  y  x x  
   u    u    u    u  
II      xx x     yx y     xy x     yy y  dxdy 
A x  x  x  x  y  x  y  x  
  xx u x  2u  yx u y  2u y 
   xx 2x    yx 
 x x x x x x 2 
II    dxdy  (3.65)
A   xy u x  2u x  yy u y  2u y 
  xy    yy
 y x xy y x xy 
 u x   xx  xy  u y   xy  yy   2u x 
         
     y x 2
xx
 x  x y  x  x  
II    dxdy 
A  2u y   2u y  2u x  
 yy xy   xy  x 2  xy  
   
Utilizando as equações de equilíbrio apresentadas no capítulo 1, assumindo a
ausência de forças de volume, o resultado apresentado na Eq.(3.65) se resume a:
  2u x  2u y   2u y  2u x  
II    xx   yy   xy  2   dxdy (3.66)
x 2 xy  x xy  
A  
Assim, sabendo que J  I  II , observa-se que independentemente do caminho
que se adote para sua avaliação, o valor de J será sempre constante, como desejava-se
mostrar. Porém, conforme mostrado, o resultado de J é nulo. Assim, o autor gostaria que
o leitor explicasse o motivo pelo qual essa integral não se anula quando uma fissura está
presente.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 74

3.7 – Teorias de Interação de Modos de Solicitação à Fratura

O processo de fraturamento provoca no corpo considerado uma progressiva


perda de rigidez, a qual, em casos extremos, provoca seu colapso em virtude do
crescimento e coalescência das fissuras. Por meio do estudo da mecânica da fratura é
possível a definição de critérios, objetivando determinar a direção da propagação da
fissura, assim como a carga crítica de fratura.
Muitos são os critérios propostos para tal objetivo, dentre os quais podem ser
destacados os critérios da máxima tensão circunferencial, máxima taxa de liberação de
energia (critério G) e mínima densidade de energia de deformação (critério S). A seguir
será efetuada uma breve descrição destes critérios sendo que maiores detalhes sobre o
assunto poderão ser consultados nas referências deste capítulo.

3.7.1 – Critério da Máxima Tensão Circunferencial

O critério da máxima tensão circunferencial foi proposto por ERDOGAN e SIH


(1963) e define que a fissura irá crescer perpendicularmente à direção de atuação da
máxima tensão circunferencial atuante na extremidade da fissura.
Para a determinação da formulação que permite o cálculo do ângulo de
propagação é necessária, inicialmente, a obtenção das relações que exprimam o estado
de tensão na região próxima à extremidade da fissura em coordenadas polares.
Considerando o sistema de coordenadas como apresentado na Fig. (3.10), e empregando
as funções de tensão de Westergaard, é possível determinar estas expressões as quais
podem ser escritas como:
1     3 
   cos    K I cos 2    K II sen    (3.67)
2 r  2  2 2 
 
cos    K I sen    K II  3cos    1 
1
 r  (3.68)
2 2 r 2
1      3   
 rr  cos    K I 1  sen 2     K II sen    2 K II tan    (3.69)
2 r  2    2  2  2 
sendo que:   é a tensão circunferencial,  rr a tensão radial,  r a tensão de

cisalhamento, K I e K II os fatores de intensidade de tensão para os modos I e II,


respectivamente.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 75

r  rr

r


x
Extremidade da
Fissura

Figura 3.10 Sistema de coordenadas para a determinação das expressões de tensão na ponta da fissura.

Para a determinação do ângulo de propagação, a tensão circunferencial,   ,


deve ser máxima e consequentemente uma tensão principal. De acordo com os
conceitos da mecânica dos sólidos, para que essa situação ocorra a tensão de
cisalhamento deve ser nula. Assim, para determinar a direção de propagação da fissura,
 p , deve-se fazer  r  0 . Por meio dessa condição é possível obter que:

 
K I sen  p   K II 3cos  p   1  0 (3.70)

Empregando identidades trigonométricas é possível reescrever a relação acima


de maneira mais conveniente como:

 p  1  K I 
2
 KI 
tan        8  (3.71)
 2  4  K II  K II  

Por meio da resolução da Eq. (3.71) são obtidos dois ângulos, sendo que o
ângulo a ser considerado como o de propagação é aquele que maximiza o valor da
tensão circunferencial, Eq. (3.67).
Esta teoria também prevê a determinação do valor do fator de intensidade de
tensão considerando os diferentes modos de solicitação à fratura. Essa grandeza é
denominada na literatura de fator de intensidade de tensão efetivo ou equivalente e para
a sua determinação deve-se reescrever a Eq.(3.67) de forma mais conveniente. Assim:
    3 
  2 r  cos    K I cos 2    K II sen    (3.72)
2   2  
2 
Comparando o primeiro membro da Eq. (3.72) com a Eq. (3.28) é possível
verificar que esse membro é equivalente ao fator de intensidade de tensão. Dessa forma,

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 76

pode-se definir o fator de intensidade de tensão equivalente, o qual deverá ser


comparado à tenacidade à fratura do material para a verificação da estabilidade à
propagação da fissura, por meio da seguinte relação:
p  p  p 
K Eq  K I cos3    3K II cos 2   sin   (3.73)
 2   2   2 
A denominação fator de intensidade de tensão equivalente é atribuída por ser
essa variável uma combinação dos fatores de intensidade de tensão para os modos I e II.

3.7.2 – Critério da Máxima Taxa de Liberação de Energia Potencial

O critério da máxima taxa de liberação de energia potencial se baseia na energia


potencial que é liberada durante o processo de fraturamento. Para propagações
colineares (que não mudam de direção) em regime elástico linear, a taxa de liberação de
energia é igual a soma das energias liberadas para os modos I e II de solicitação à
fratura. Assim:
G  GI  GII (3.74)

sendo: G I a taxa de liberação de energia para modo I puro e GII a taxa de liberação de
energia para modo II puro.
Da teoria da mecânica da fratura, a taxa de liberação de energia potencial está
relacionada aos fatores de intensidade de tensão por meio das seguintes relações:
 1 2
GI  KI (3.75)
8
 1 2
GII  K II (3.76)
8
sendo que o termo  deve levar em consideração o coeficiente de Poisson equivalente
para os estados planos, ou seja,   3  4 se estado plano de deformação e
   3    1    se estado plano de tensão.
No entanto, nem sempre a propagação das fissuras ocorre de forma colinear,
como no fraturamento em modo misto. Nessa situação, a propagação da fissura ocorre
em uma direção arbitrária. No trabalho de HUSSAIN, PU & UNDERWOOD (1974) foi
sugerido que o crescimento da fissura ocorre na direção que provoca a máxima taxa de
liberação de energia de fratura. Assim, esses autores estabeleceram uma equação,
utilizando uma função de mapeamento com variáveis complexas, onde  define uma

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 77

direção radial com respeito à ponta da fissura corrente. Utilizando a técnica proposta,
HUSSAIN PU & UNDERWOOD (1974) obtiveram a seguinte expressão:
 1 2
G     K I    K II2    (3.77)
8
Dessa forma, o ângulo de propagação é obtido a partir da maximização da
variável G   na Eq. (3.757). Assim como a taxa de liberação de energia, nesta

expressão os fatores de intensidade de tensões K I e K II também foram definidos como

funções de , conforme indicado nas duas equações seguintes.



 1  2
  
4  3
 K I cos    2 K II sin   
K I ( )      (3.78)
 3  cos 2     1     
   

 1  2
  
4  1
 K II cos    2 K I sin   
K II ( )      (3.79)
 3  cos 2     1     
   

A análise do conjunto de parâmetros que conduz à maximização da Eq.(3.77)


pode ser efetuada utilizando-se qualquer algoritmo de otimização (como exemplo o
Golden Section). Além deste critério prever que a fissura propaga na direção de máxima
taxa de liberação de energia potencial, verifica-se que a taxa de liberação de energia
para essa direção está diretamente ligada ao fator de intensidade de tensão. Assim, a
fissura irá propagar se a condição dada pela Eq. (3.80) não for atendida:
 1 2
G  p   K IC (3.80)
8
Portanto, a Eq. (3.80) associa a taxa de liberação de energia ao fator de
intensidade de tensão. Assim, após a determinação da taxa de liberação de energia
máxima, determina-se o fator de intensidade de tensão equivalente que será comparado
à tenacidade à fratura do material para verificação da condição de estabilidade ao
crescimento da fissura.

3.7.3 – Critério da Mínima Densidade de Energia de Deformação

Neste critério, proposto por SIH (1974), a direção da propagação da fissura é


determinada pelo valor da densidade de energia de deformação, SE, nas proximidades da
fissura, a qual deve ser mínima. A energia de deformação é definida como a energia
armazenada no sistema devido às mudanças no estado de deformação. Para corpos
elásticos lineares essa energia pode ser escrita como:

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 78

1
Energia Deformação    ij  ij d  (3.81)

2
A densidade de energia de deformação, portanto pode ser definida como:
d d  1  1
 Energia Deformação      ij ij d     ij ij (3.82)
d d   2  2
Utilizando a lei de Hooke generalizada, mostrada no capítulo 1, juntamente com
as equações que relacionam os fatores de intensidade de tensão às tensões na
extremidade da fissura é possível obter a expressão para a determinação da densidade de
energia, como mostra a Eq. (3.83).
S E    a11 K I2  2a12 K I K II  a22 K II2 (3.83)

Nessa expressão anterior, os termos aij são dados por:

1  cos      cos    


1
a11  (3.84)
16  

1
a12   2 cos      1 
16 
(3.85)

  1 1  cos     1  cos     3cos    1 


1
a22  (3.86)
16  

O ângulo de propagação é aquele que minimiza o termo S E   da Eq. (3.83).

Por meio desse critério, define-se que a fissura irá propagar na direção em que a
densidade de energia de deformação for mínima. Além disso, a estabilidade para o
crescimento das fissuras é efetuada por meio da seguinte relação, a qual relaciona a
densidade de energia ao fator de intensidade de tensão:
 1 2
S E  p   K Eq (3.87)
8
Por meio desse critério verifica-se que a fissura irá propagar quando a densidade
de energia de deformação atingir um valor crítico, o qual conduz a situação em que
K Eq  K IC .

3.7.4 – Curvas de Interação

As três teorias de interação de modos de solicitação à fratura descritas


anteriormente para a determinação da direção de propagação das fissuras e da
estabilidade ao crescimento podem ser representadas através de curvas de interação. O
lugar geométrico da fratura em modo misto para os três critérios pode ser visualizado

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 79

por meio da Fig. (3.11). De acordo com as teorias de interação, uma fissura irá propagar
quando os fatores de intensidade de tensão, para os modos I e II, atingirem valores que
ultrapassam as respectivas curvas de interação.

Figura 3.11 Diagrama de interação de modos. Situação de ruptura.

3.8 – Obtenção da Tenacidade Experimentalmente

Existem diversos métodos experimentais disponíveis para a avaliação da


tenacidade à fratura. Dentre eles destacam-se os métodos óticos como fotoelasticidade,
Moiré e interferômetro. Nesses métodos, os campos de deformação e tensão são
mapeados por meio da reflexão de uma luz projetada sobre o corpo de prova. Esses
métodos são recentes e conduzem a excelentes resultados.
Porém, a tenacidade pode ser também obtida por meio da variação da
flexibilidade do corpo de prova à medida que a fissura cresce, como apresentado na
seção 3.4. Nesse contexto, diagramas que relacionem a dependência entre a carga
aplicada e o deslocamento do corpo de prova devem ser construídos considerando
diferentes valores para o comprimento inicial da fissura. A fissura, nesse caso também
denominada entalhe inicial, podem ser estendidas artificialmente ou por meio de um
processo de fadiga. A flexibilidade será dada pela razão v , para os diversos valores
P
do comprimento da fissura, como indica o diagrama mostrado na Fig. (3.12).
Se a variação da flexibilidade em relação ao comprimento da fissura for
determinada por meio de diagramas semelhantes ao apresentado na Fig. (3.12), a
tenacidade à fratura poderá ser obtida empregando os resultados apresentados nas
Eq.(3.22) e Eq.(3.30). Assim:

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 80

P 2 C
K c2  E se Estado Plano de Tensão
2t a
(3.88)
E P 2 C
K c2  se Estado Plano de Deformação
1   2  2t a

Figura 3.12 Diagrama de interação de modos. Situação de ruptura.

3.9 – Referências Complementares

ERDOGAN, F.; SIH, G.C. (1963). On then crack extension in plates under plane
loading and transverse shear, J. Basic Engineering, V.85, 519-527.
EWALDS, H.L.; WANHILL, R.J.H. (1984). Fracture Mechanics, Victoria, Australia;
Delft, The Netherlands : Edward Arnold: Delftse Uitgevers.
GDOUTOS, E,E. (1990). Fracture Mechanics Criteria and Applications. Kluwer
Academic Publishers.
HUSSAIN, M.A.; PU, S.U.; UNDERWOOD, J. (1974). Strain Energy release rate for a
crack under combined mode I and II, ASTM STP, V. 560, 2-28.
PARKS, D.M. (1974). Stiffness derivative finite element technique for determination of
crack tip stress intensity factors, Int. Journal of Fracture Mechanics, 10, 487-502.
RICE, J.R. (1968). A path independent integral and the approximate analysis of strain
concentration by notches and cracks, Journal of Applied Mechanics, n. 35, 379-386.
SIH,G.C. (1974). Strain energy density factor applied to mixed mode crack problems,
Int. Journal Fracture Mechanics, V. 10, 305-321.

Capítulo 3 – Termodinâmica do Processo de Propagação da Fissura______________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 81

4. – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis

4.1 – Introdução

A zona de processos inelásticos é uma zona situada à frente da extremidade da


fissura onde ocorrem os processos de dissipação de energia, os quais resultam na
degradação mecânica do material resultando na propagação da fissura. Para materiais de
comportamento mecânico frágil, os campos de tensão e deslocamento na região próxima
à extremidade da fissura podem ser mensurados utilizando funções complexas de
tensão. Por meio dessa abordagem, verifica-se que essas grandezas são singulares
exatamente sobre a ponta da fissura. Assim, a verificação sobre a estabilidade
(instabilidade) com relação à propagação da fissura é feita, nesses materiais, por meio
da determinação dos fatores de intensidade de tensão, os quais refletem a energia
disponível para o crescimento das fissuras. Deve-se enfatizar que para regiões distantes
da ponta da fissura, as tensões e os deslocamentos, assim como as grandezas que
resultam destes, são determinados corretamente utilizando os termos de alta ordem da
série de Williams.
Porém, o que ocorre quando a estrutura analisada é composta por material de
comportamento dúctil? Nessa situação, como deve ser modelada a zona de processo?
Nos materiais dúcteis, quando o estado de tensão na região próxima à extremidade da
fissura supera a resistência elástica do material, observa-se a presença de deformações
irreversíveis no corpo. Consequentemente, verifica-se a presença da plastificação do
material. Dentro da zona onde a plastificação é observada, as soluções analíticas
determinadas com base nas funções de Westergaard não tem validade, uma vez que as
premissas elásticas não são respeitadas.
No entanto, as soluções analíticas apresentadas anteriormente podem ser
empregadas para a análise de corpos compostos por materiais dúcteis. Nesse caso, as
respostas obtidas serão mais representativas à medida que a condição de plastificação

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 82

em pequena escala for atendida, isto é, à medida que a zona de processo do material for
suficientemente pequena comparativamente às demais dimensões significativas da
estrutura fissurada ou à extensão da própria fissura.

4.2 – Extensão da Zona Plástica

A extensão da zona de processo em materiais dúcteis pode ser inicialmente


estimada com base nas soluções determinadas a partir das funções complexas de tensão.
Considerando, por exemplo, o problema fundamental de Griffith apresentado no
capítulo 2, sabe-se que as tensões normais orientadas ao longo do eixo y são dadas por:

  a      3  
 yy  cos   1  sen   sen    (4.1)
2 r  2  2  2 
Assumindo a avaliação de  yy seja efetuada para pontos localizados ao longo da

posição y  0 , a expressão acima se simplifica como:

  a
 yy  (4.2)
2 r
Assumindo que o material apresente comportamento elastoplástico perfeito, isto
é com encruamento nulo, governado por sua tensão de escoamento f y , então a extensão

da zona de processo pode ser inicialmente estimada através da seguinte relação:


2 2
 a   a a  
fy    ry      ry     (4.3)
 f 2  f y 
2 r  y  2
Alternativamente, a Eq. (4.3) pode também ser escrita como, sabendo que
KI     a :
2
1  KI 
ry    (4.4)
2  fy 
Considerando que a extensão da zona plástica, rp , determinada nas Eq. (4.3) e

Eq. (4.4) delimita uma zona plástica circular (primeira aproximação), obtém-se a
distribuição das tensões  yy mostrada na Fig. (4.1). Por meio dessa figura, observa-se

que as forças originadas da integração das tensões elásticas sobre a zona plástica, área
hachurada, são desprezadas na primeira aproximação da zona plástica mostrada nas Eq.
(4.3) e Eq. (4.4). Na realidade, estas forças provocarão uma extensão maior da zona

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 83

plástica em relação aos resultados apresentados nessas equações. Portanto, as Eq. (4.1) e
Eq. (4.2) subestimam a extensão da zona plástica. Para a determinação da extensão da
zona plástica, quatro abordagens são normalmente utilizadas:
1) Determinação da zona plástica por meio da hipótese de forma pré-concebida.
Abordagem de Irwin.
2) Modelos coesivos, propostos por Barenblatt e Dugdale.
3) Utilização de critérios de resistência.
4) Análise do problema via métodos numéricos como método dos elementos finitos ou
método dos elementos de contorno.

Figura 4.1 Distribuição das tensões  yy , primeira aproximação.

Na sequência deste capítulo serão discutidos brevemente as diferentes


abordagens citadas acima.

4.2.1 – Tratamento da Zona Plástica devido a Irwin

A análise da extensão da zona plástica devido a Irwin leva em consideração a


redistribuição das tensões em decorrência do limite, em relação aos valores das tensões,
imposto pela tensão de escoamento do material. Apesar disso, essa abordagem apresenta
algumas simplificações como:
a) A zona plástica é modelada assumindo-se uma forma circular.
b) Apenas os pontos ao longo de y=0 são analisados.
c) O material é considerado como elastoplástico perfeito. Assim, a tensão normal na
zona plástica nunca será superior à tensão de escoamento.

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 84

Segundo estudos de Irwin, apud MEGUID (1989) e EWALDS e WANHILL


(1984), a presença da zona plástica faz com que a fissura comporte-se, em termos
mecânicos, como se seu comprimento fosse maior do que realmente o é.
Consequentemente, os deslocamentos observados na estrutura serão maiores em
decorrência da redução da rigidez introduzida pela zona plástica.
Portanto, para a abordagem de Irwin, a fissura é modelada como apresentado na
Fig. (4.2), considerando o problema fundamental de Griffith discutido anteriormente.

Figura 4.2 Distribuição das tensões  yy , abordagem de Irwin.

Assim, devido à presença da zona plástica, a fissura passa a comportar-se como


uma fissura fictícia, cujo comprimento é maior que o da fissura real. Considerando a
fissura fictícia, seu comprimento é dado por um valor efetivo, composto pela
sobreposição do valor fictício, an , ao valor da fissura real, a . Assim:

aeff  a  an (4.5)

O comprimento fictício an é incorporado de forma a levar em consideração a


redistribuição das tensões na zona de processo, as quais não podem ser maiores que a
tensão de escoamento do material. Portanto, utilizando o resultado apresentado na
Eq.(4.3), o comprimento ry pode ser escrito em função do comprimento efetivo da

fissura como:

 a  an     
2

ry    (4.6)
2  fy 
A região delimitada por an surge em função da redistribuição das tensões
atuantes na região hachurada (A) ilustrada na Fig. (4.2). Assim, para o problema
analisado, pode ser efetuada uma compensação de forças, a qual é formulada
assumindo-se a condição de equilíbrio do corpo, podendo ser expresso como:

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 85

ry
    a  an 
f y an   dr  f y ry (4.7)
0 2 r
Integrando a equação anterior obtém-se:
ry
  a  an 
f y  an  ry   
1
r 2
dr 
0 2
(4.8)
2   a  an 
f y  an  ry   ry
2
Manipulando algebricamente a última expressão tem-se:
2
 
 a  ry   2  a  an  ry
2
  (4.9)
n  f
 y 
Substituindo o resultado da Eq.(4.6) na Eq.(4.9) obtém-se:

 a  ry   4ry2  a  ry   2ry
2
n  n  an  ry (4.10)

Portanto, segundo a modelagem de Irwin, a zona plástica apresenta extensão


duas vezes maior que a determinada por meio da primeira aproximação. Além disso,
deve-se destacar que a extremidade da fissura fictícia encontra-se no localizada no
centro da zona circular plástica, uma vez que an  ry , como mostrado na Eq.(4.10).

A Fig. (4.2) ilustra a configuração da zona plástica para a abordagem de Irwin.


Como mostrado nessa figura, deve-se notar que o comportamento mecânico elástico
linear é observado para os pontos fora da zona plástica, ou do círculo de diâmetro 2ry ,

localizado à frente da ponta da fissura real. Assim, como a extensão da zona plástica
está diretamente ligada ao valor do fator de intensidade de tensão, K, como indicado nas
Eq.(4.4) e Eq.(4.10), os conhecimentos da mecânica da fratura elástico linear podem ser
aplicados aos casos onde o comportamento mecânico elastoplástico é observado à frente
da ponta da fissura. Obviamente que quão menor for a extensão da zona plástica, melhor
será a aproximação fornecida pela teoria linear.
Para mensurar essa aproximação, pode-se considerar o critério de energia de
Griffith modificado por Irwin e apresentado na Eq. (3.27), o qual prescreve que a fissura
irá propagar se:
EGc
  se Estado Plano de Tensão (4.11)
a
Pode-se reescrever a Eq.(4.11) considerando o comprimento da fissura fictícia,
ou seja, a  an , que é igual a a  ry . Assim:

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 86

 2
Gc 
E
a  r 
y (4.12)

Substituindo a expressão que descreve a dimensão ry , Eq.(4.4), na Eq.(4.12)

tem-se:

 2  
2
1  KI 
Gc  a    (4.13)
E  2  fy  
 
Sabendo que o fator de intensidade de tensão para o problema estudado é dado

por K I      a  ry  , então a Eq. (4.13) pode ser convenientemente manipulada

resultando a seguinte expressão:


 
 
 a 
2
1 
Gc    2
(4.14)
E  1   
1  2  f

 
  y  
Como a taxa de liberação de energia está associada ao fator de intensidade de
tensão por meio da Eq. (3.30), verifica-se que a Eq.(4.14) pode ser reescrita como:
 
 
 1 
K Ic2   2 a  2 
(4.15)
 1    
1  2  f  
  y  
A Eq.(4.15) pode ser utilizada para verificar o erro fornecido pela aproximação
elástica quando existe a presença de uma zona plástica. Esse resultado pode ser

visualizado na Fig. (4.3) onde ilustra-se a dependência entre K I e a razão


 para os
fy

casos elástico e elastoplástico, assim como o erro (ou diferença) apresentado por ambas
as hipóteses. Para a consideração do caso elástico, basta assumir que a razão
 tende a zero, ou seja, que a tensão de escoamento é muito maior se comparada à
fy

tensão remota aplicada. Verifica-se que à medida que a relação


 aumenta, o erro
fy

cresce rapidamente sendo igual a 6,9% para


  0,5 e 29,64% para
  0,9 .
fy fy

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 87

Para finalizar a discussão sobre a modelagem da zona plástica devido a Irwin,


pode ser determinado o valor da abertura das faces da fissura para o problema
fundamental de Griffith. Como mostrado no item 3.3, Fig. (3.4), a expressão obtida, a
partir da função de tensão de Westergaard, para a determinação dos deslocamentos das
faces da fissura é a seguinte:
2 
v a2  x2 se Estado Plano de Tensão (4.16)
E

Figura 4.3 Comparação aproximações elástica e elastoplástica.

Para mensurar a abertura entre as faces da fissura, essa equação deve ser
multiplicada por 2. Assim:
4 
 COD  a2  x2 (4.17)
E
Assumindo o caso elástico linear, o valor de  COD é nulo para o ponto localizado
sobre a extremidade da fissura. Entretanto, para o caso elastoplástico, a fissura deve ser
analisada considerando seu comprimento fictício. Assim, para o caso elastoplástico, a
Eq.(4.17) pode ser reescrita como:
4 
a  r 
2
 COD  y  x2 (4.18)
E
Avaliando a equação anterior para a ponta da fissura fictícia, e desprezando o
termo de alta ordem de ry , tem-se:

4  4 
 COD  a 2  2ary  ry2  a 2   COD  2ary (4.19)
E E
Considerando a Eq.(4.4), a qual relaciona ry ao fato de intensidade de tensão,

pode-se reescrever a Eq. (4.19) da seguinte forma:


2
4 1  KI 
 COD   2a   (4.20)
E 2  fy 
Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 88

Lembrando que para o caso elástico K I     a , a Eq.(4.20) pode ser


convenientemente reescrita como:
2
4 K I2 1  KI  4 KI
2

 COD   2 2     COD  (4.21)


E   2  fy   Ef y

O resultado anterior é uma aproximação para o deslocamento relativo das faces


da fissura,  COD . Essa aproximação, que será mais precisa quão menor for o

comprimento ry , será comparada ao resultado que será apresentado no item seguinte, o

qual trata da abordagem de Dugdale.

4.2.2 – Tratamento da Zona Plástica devido a Dugdale

DUGDALE (1960) propôs um modelo alternativo ao apresentado por Irwin para


a modelagem da zona plástica. Segundo o modelo de Dugdale, assume-se que todas as
deformações plásticas presentes no corpo estão contidas em uma região estreita
posicionada à frente da ponta da fissura. Nesse modelo, a zona plástica é representada
por uma fissura de comprimento equivalente, assim como a abordagem de Irwin, sendo
a rigidez da zona plástica representada por tensões que tendem a fechar as faces da
fissura. Esse modelo, assim como os elementos que o compõem, estão apresentados na
Fig. (4.4).

Figura 4.4 Elementos do modelo de Dugdale.

Deve-se ressaltar que a abordagem de Dugdale inspirou o trabalho de


BARENBLATT (1962), o qual idealizou modelo semelhante. Porém, Barenblatt não
Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 89

atribuiu uma lei de variação para as tensões que representam a rigidez da zona plástica,
como o fez Dugdale.
A análise do problema via abordagem de Dugdale pode ser entendida aplicando
o princípio da superposição dos efeitos, como mostra a Fig. (4.5), para o problema
fundamental de Griffith. No modelo de Dugdale, o material é considerado como
elastoplástico perfeito, consequentemente as tensões atuantes no sentido de fechar as
faces da fissura fictícia são iguais à tensão de escoamento do material.

Figura 4.5 Superposição dos efeitos, modelo de Dugdale, no problema de Griffith.

A abordagem do problema pode ser efetuada por meio da aplicação de funções


de tensão para cada um dos problemas mostrados na Fig. (4.5). Deve-se destacar que os
problemas de interesse a serem analisados são os b e c, já que o problema a não envolve
singularidades de tensão.
Como mostrado anteriormente no capítulo 2, o problema de uma chapa de
dimensões infinitas, uniformemente tracionada, com uma fissura central de
comprimento 2c, problema b, pode ser resolvido utilizando a seguinte função de tensão
de Westergaard.
 
Z    (4.22)
 2  c 2 
Já no problema c, as condições de carregamento podem ser descritas por meio de
uma integral envolvendo uma função de tensão elástica, a qual descreve as forças de
superfície que atuam sobre a fissura fictícia, isto é, no intervalo a  x  c . Esta

integral é apresentada por GERBERICH (1964) sendo igual a:


Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 90

c
f y c 2   2
Z    2 d (4.23)
a   2  c 2  2   2 
Integrando a Eq.(4.23) obtém-se:

2 fy   a  a  2  c2 
Z     arccos    arccotg   (4.24)
   2  c2 c   c2  a2 
  
Aplicando o princípio da superposição dos efeitos, a função de tensão que
descreve o comportamento dos problemas b e c é obtida somando-se as Eq.(4.22) e
Eq.(4.24). Assim:

  2 fy   a  2 fy  a  2  c2 
Z     arccos    arccotg   (4.25)
 2
 c2    2  c2 c    c2  a2



No modelo de Dugdale, devido à presença da zona plástica, observa-se a
ausência de singularidade de tensões sobre o ponto localizado na extremidade da
fissura. Nesse ponto, a tensão atuante deve ser, no máximo, igual à tensão de
escoamento do material. Com base nessa condição de contorno imposta pelo modelo de
Dugdale, os dois primeiros termos da Eq. (4.25), que são singulares para a extremidade
da fissura fictícia, ou seja   c , devem anular-se mutuamente. Assim:

  2 fy  a   a
 arccos    0   arccos   (4.26)
 2
c 2
   c2
c
2 2 fy c

Manipulando o último termo da Eq.(4.26) obtém-se:

a a   
  cos    (4.27)
c a  2 fy
 
Para prosseguir a análise, deve-se expandir o termo do cosseno em série. Para
isso, pode ser utilizada a série de McLaurin, a qual prevê que:

 1 x 2 n
n

cos  x    (4.28)
n  0  2n  !

Aplicando esta expansão em série ao termo do cosseno da Eq.(4.27) tem-se:


2 4 6
   1    1    1    
cos  
 2f   1             ... (4.29)
 y  2  2 fy  24  2 f y  720  2 f y 
Com base na expansão em série mostrada acima, verifica-se que os termos de
alta ordem da série apresentam pouca influência sobre o valor do cosseno considerado.

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 91

Apenas para ilustrar esse fato, considerando


  0,5 o terceiro termo da série
fy

equivale a apenas 5% do valor do segundo termo. Portanto, apenas os dois primeiros


termos da série acima serão considerados. Substituindo esses termos na Eq. (4.27) tem-
se:
2
a 1     2 2
 1     a a 
a    
a 2  2 f y  8 f y2
(4.30)
 2 2
 
a   
8 f y2

Lembrando que o fator de intensidade de tensão pode ser escrito como


K I     a para o problema estudado, pode-se reescrever a última equação como:
2
  KI 
   (4.31)
8  f y 

Deve-se enfatizar que o termo acima representa a extensão da zona plástica


prevista pelo modelo de Dugdale. Pode-se inevitavelmente, comparar a extensão da
zona plástica de Dugdale à prevista por Irwin. Assim:
2 2
1K  K 
Irwin   I     0,3183  I  (4.32)
  f y 
 f
 y 
2 2
  KI  K 
Dugdale        0,3927  I  (4.33)
8  f y   fy
 
Com base nas duas últimas equações, verifica-se que a extensão da zona plástica
dada pela abordagem de Dugdale é maior que a obtida por Irwin. Esse resultado é de
certa forma esperado uma vez que o modelo de Dugdale concentra todas as
deformações plásticas em uma faixa estreita de pontos à frente da extremidade da
fissura. Consequentemente, uma fissura fictícia de maior comprimento é necessária para
comportar as deformações plásticas e simular a zona de processos inelásticos.
Voltando a função de tensão apresentada na Eq.(4.25), constata-se que esta
resume-se apenas a seu último termo, com base na consideração de ausência de
singularidade de tensão no problema. Assim, a Eq.(4.25) pode ser reescrita como:

2 fy  a  2  c2 
Z    arccotg   (4.34)
   c2  a2 
 

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 92

Com base na função de tensão apresentada na Eq. (4.34) podem ser obtidos os
valores dos campos de tensão e deslocamento para o problema analisado. Essa inclusive
é uma das vantagens da abordagem de Dugdale, ou seja, a determinação das grandezas
de interesse dentro e fora da zona plástica. Apenas para ilustrar esse fato, pode-se
determinar a tensão normal y atuante sobre a extremidade da fissura fictícia, ou seja, em
  c . Nesse ponto, observa-se um valor nulo para o operador arccotg. Da análise

trigonométrica sabe-se que arccotg  0    . Como no ponto considerado a parte


2
imaginária da função é nula, sabe-se, da Eq.(2.34), que:
 yy  Re Z   (4.35)

Consequentemente, para o ponto considerado a tensão atuante será:


2 fy 2 fy 
 yy  arccotg  0    yy    yy  f y (4.36)
  2
O resultado da última equação é concordante com as condições de contorno
previstas no modelo, ou seja, tensão máxima igual à tensão de escoamento do material.
Outro parâmetro de interesse que pode ser determinado a partir da função de
tensão apresentada na Eq. (4.34) é o deslocamento das faces da fissura. Essa grandeza
permite a determinação do deslocamento relativo das faces da fissura ou o  COD . Para
tal finalidade, pode ser utilizada a Eq.(2.65), a qual está escrita para problemas em
estado plano de deformação. Como o problema tratado é um problema de estado plano
de tensão, a Eq.(2.65) toma a seguinte forma, alterando convenientemente o coeficiente
de Poison.
1
   y 1    Re Z  

v  2 Im Z (4.37)
E 
Considerando o sistema de coordenadas adotado, verifica-se que os
deslocamentos de interesse estão localizados em y = 0. Portanto, a expressão anterior
pode ser reescrita como:
2 
v Im Z   (4.38)
E
A solução da última equação pode ser obtida usando-se a teoria dos números
complexos onde o termo arccotg é associado a identidades hiperbólicas, como mostrado
na Eq.(2.7). Essa demonstração será omitida nesse texto, porém poderá ser consultada
em BUDERKIN & STONE (1966). Segundo esta referência, a parte imaginária da
função pode ser escrita como:

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 93

 2 fy   c2   2  a c2   2 
Im Z     arccotgh  2  a   arccotgh   (4.39)
   c  a2   c2  a2 
    
Portanto, o deslocamento v é dado por:

4 fy   c2   2  a c2   2 
v arccotgh  2  a   arccotgh   (4.40)
E   c  a2   c2  a2 
    
O valor de  COD é obtido quando a expressão acima é multiplicada por 2, para
levar em conta o deslocamento relativo das duas faces da fissura, e avaliada no limite
quando   a . Efetuando essas operações, que serão aqui omitidas por conveniência,
obtém-se:
8 f ya   c 
 COD  ln sec    (4.41)
 E   a 
Utilizando o resultado apresentado na Eq.(4.27), a última equação pode ser
reescrita como:

8 fya    
 COD  ln sec     (4.42)
 E   2 f y  
A equação anterior pode ser expandida em série assumindo ainda que a relação
 seja muito menor que a unidade, como é o caso da mecânica da fratura onde
fy

existe a presença de concentração de tensão. Assim:

8 f a  1    
2 4
1   
 COD  y         ... (4.43)
 E  2  2 f y  12  2 f y  
 
Desprezando os termos de alta ordem da Eq.(4.43) obtém-se:
 2 a K I2
 COD  
  COD  (4.44)
Ef y Ef y
O valor obtido acima pode ser comparado ao determinado através da abordagem
de Irwin. Assim:
2
4 KI
Irwin  COD  (4.45)
 Ef y

K I2
Dugdale  COD  (4.46)
Ef y

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 94

Segundo os resultados apresentados pelas duas equações anteriores, verifica-se


uma pequena diferença entre os valores de deslocamento relativo entre as faces da
fissure previstos por meio das abordagens de Irwin e Dugdale. As duas abordagens
diferem-se por um fator igual a 1,273.

4.2.3 – Tratamento da Zona Plástica via Critérios de Resistência

As duas abordagens discutidas anteriormente, embora consistentes, assumem,


como ponto de partida, uma forma geométrica inicial para a configuração da zona
plástica. Apesar disso, os modelos de Irwin e Dugdale são de grande importância para a
compreensão de abordagens mais gerais, que não fazem aproximações sobre a forma
geométrica da zona plástica. Nessa última categoria de modelos podem ser enquadrados
aqueles que empregam critérios de resistência, como os de Von Mises e Tresca. A partir
do uso desses critérios é possível o estabelecimento do limite (contorno) entre as regiões
elástica e plástica considerando o estado de tensão atuante na região próxima à ponta da
fissura.
A abordagem via critérios de resistência que será apresentada nessas notas
assume, entretanto, duas importantes simplificações. A primeira está relacionada ao
regime de encruamento do material, o qual é considerado como elastoplástico perfeito.
A segunda, e talvez mais importante, refere-se à não consideração da redistribuição das
tensões no corpo em decorrência das deformações plásticas. O problema que será
discutido nesse item, assim como nos anteriores, é o problema fundamental de Griffith.
Sabe-se, da teoria da plasticidade, que o critério de Von Mises é dado por:

 1   2     2   3    3   1   2 f y2
2 2 2
(4.47)

Com base no estado de tensão atuante em um dado ponto, a Eq.(4.47) pode ser
utilizada para a verificação sobre a plastificação ou não do mesmo. Sabe-se que quando
o primeiro membro da Eq.(4.47) apresenta valor inferior ao do segundo membro, o
ponto analisado encontra-se em regime elástico. Quando existe uma igualdade entre os
valores dos dois membros da equação, o ponto analisado encontra-se sobre a superfície
de escoamento. O caso em que o primeiro membro retorna um valor superior ao do
segundo retrata um estado impossível de tensões. Conforme apresentado no item 2.5, as
expressões das tensões principais para o problema analisado são as seguintes:

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 95

   
1  sen   
 1  KI    2 
   cos   
 2 2 r  2    
1  sen   
  2  (4.48)
 0 

 3  2 K I
se EPT 
  
cos   se EPD 
 2 r 2 
Substituindo as expressões apresentadas na Eq.(4.48) na equação do critério de
Von Mises, Eq.(4.47), obtém-se, após o uso de identidades trigonométricas, os seguintes
resultados:
K I2  3 
1  2 sen    cos     2 f y
2 2
se EPT (4.49)
2 ry

K I2  3 
sen 2    1  2  1  cos      2 f y2
2
 se EPD (4.50)
2 ry  2 
Escrevendo as duas últimas equações em função da dimensão da zona plástica,
ry , obtém-se:
2
1 K  1 3 1 
ry     I    sen    cos   
2
se EPT (4.51)
2  fy  2 4 2 

3 1  2  
2
 KI  2

ry   
1
2
   sen   
2
1  cos     se EPD (4.52)
 fy   4 2 
As Eq.(4.51) e Eq.(4.52) podem ainda ser normalizadas pelo valor de ry

apresentado na Eq.(4.4), referente à primeira aproximação da zona plástica. Assim:


 1 3 1 
  sen 2    cos   
ry   2 4 2 se EPT
  (4.53)
3 1  2  
2
ry se EPD
 sen   
4
2

2
1  cos    

Deve-se ressaltar que para o ângulo   0 , o problema analisado via estado
plano de tensão retorna um valor, para a dimensão da zona plástica, exatamente igual
àquele previsto pela Eq.(4.4). Além disso, a dimensão da zona plástica no problema em
estado plano de deformação é consideravelmente menor que no problema em estado
ry  
plano de tensão. A variação da razão com relação ao ângulo é mostrada na Fig.
ry

(4.6). Esse resultado ilustra a maior tendência de falhas frágeis nos problemas em estado

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 96

plano de deformação, uma vez que sob a condição de confinamento, o material torna-se
pouco deformável plasticamente. Na Fig. (4.7) as equações apresentadas na Eq.(4.53)
são representadas em termos de curvas.

Figura 4.6 Configuração geométrica da zona plástica para estados planos de tensão e deformação
considerando   0,33 .

Figura 4.7 Variação adimensional da zona plástica em relação ao ângulo  considerando   0,33 .

Análise semelhante pode ser efetuada para o problema de uma chapa infinita
com uma fissura central solicitada em modo II. Esse problema foi analisado
analiticamente no capítulo 2 e as expressões que descrevem a variação das tensões
principais na região próxima à ponta da fissura foram apresentadas na Eq.(2.89).
Substituindo as expressões apresentadas na Eq.(2.89) na equação do critério de Von
Mises, Eq.(4.47), obtém-se:

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 97

K II2  9 
7  cos    2 sen     2 f y
2 2
se EPT (4.54)
2 ry

K II2  
6  1  2  1  cos     2 sen     2 f y
2 9 2 2
se EPD (4.55)
2 ry
Escrevendo as Eq.(4.54) e Eq.(4.55) em função da dimensão da zona plástica,
ry , tem-se:
2
1  K II  7 1 9 
ry        cos    sen   
2
se EPT (4.56)
2  fy  2 2 4 
2
 K II   1 
3  2 1  2  1  cos     4 sen    se
1 9
ry   
2
 
2
EPD (4.57)
2  fy 
Finalmente, as duas equações anteriores podem ser normalizadas pelo valor do
raio plástico dado pela primeira abordagem. De forma semelhante à Eq.(4.4) para o
2
1  K II 
modo II sabe-se que ry    . Assim:
2  fy 
 7 1 9 
 cos    sen 2  
ry    2 2 4  se EPT
  (4.58)
ry 3  1 1  2 2 1  cos     9 sen 2    se EPD
 2 4 
A geometria da zona plástica para esse problema, considerando as condições
plana de tensão e deformação, está apresentada na Fig. (4.8). Observa-se que a extensão
da zona plástica, assim como no problema de solicitação em modo I, é menor para o
caso plano de deformação. Isso é explicado pela presença do confinamento no problema
plano de deformação, o qual restringe a capacidade de deformação plástica do material.
Na Fig. (4.9), as Eq.(4.58) são representadas por meio de curvas.

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 98

Figura 4.8 Configuração geométrica da zona plástica para estados planos de tensão e deformação no
problema de solicitação à fratura em modo II considerando   0,33 .

4,5
4
3,5
3
rp()/ry

2,5
2
1,5
1
0,5
0
0 60 120 180 240 300 360
Ângulo 

Estado Plano de Tensão Estado Plano de Deformação

Figura 4.9 Variação adimensional da zona plástica em relação ao ângulo  considerando   0,33 .

4.2.4 – Tratamento da Zona Plástica via Aplicação de Métodos Numéricos

Outra abordagem de interesse é aquela que aplica um método numérico na


análise de problemas de corpos fissurados considerando o comportamento mecânico
elastoplástico na extremidade da fissura. Devido à presença da não linearidade física no
domínio do corpo, o método dos elementos finitos torna-se um método numérico
eficiente, robusto e aplicável à análise desse tipo de problema.
Por meio dessa abordagem, o problema é resolvido considerando técnicas
numéricas que envolvem análise não linear de estruturas. Assim, a análise numérica é
efetuada aplicando as ações externas de forma incremental (load steps) sendo que em

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 99

cada passo de carga as deformações plásticas são determinadas ao longo da extensão do


corpo. A convergência de cada passo é determinada por meio da verificação da variação
do vetor deslocamento ou da norma do vetor de forças desequilibradas.
Consequentemente, o equilíbrio da estrutura é obtido levando-se em consideração a
redistribuição de tensões decorrente da presença das deformações plásticas. Portanto,
sua extensão será melhor determinada quão melhores forem representadas as condições
de contorno e as propriedades mecânicas do material. As análises numéricas permitem a
consideração e tratamento de problemas mais complexos. Assim, essa abordagem tem
larga aplicação em problemas práticos.
Apenas para ilustrar sua aplicação em um problema da mecânica da fratura
elastoplástica, o problema fundamental de Griffith foi analisado por meio do programa
ANSYS, com o objetivo de determinar a configuração geométrica da zona plástica à
frente da ponta da fissura. O material foi considerado elastoplástico perfeito, regido pelo
critério de Von Mises, com tensão de escoamento igual a 120 MPa. O problema foi
analisado assumindo-se estrutura plana, sendo as condições de estado plano de tensão
(EPT) e estado plano de deformação (EPD) consideradas. A estrutura foi solicitada por
duas intensidades de força de superfície, as quais são iguais a 80 kN/m ( 0, 666 f y ) e 100

kN/m ( 0,833 f y ).

De forma a simular uma estrutura de dimensões infinitas, uma placa quadrada de


lado igual a 16 m foi construída, sendo a fissura central considerada com comprimento
igual a 20 cm. Devido à simetria da geometria e das condições de contorno, apenas ¼ da
estrutura foi modelada. Nas Fig. (4.10), Fig. (4.11), Fig. (4.12) e Fig. (4.13) estão
apresentados os diagramas que ilustram a variação da deformação normal plástica, na
chapa, ao longo do eixo y, para as condições descritas anteriormente. Com base nessas
figuras constata-se que a extensão da zona plástica em EPD é menor que em EPT. Esse
resultado se verifica especialmente quando a força de superfície aplicada aproxima-se
do valor da tensão de escoamento do material. Além disso, o valor da deformação
plástica em EPT é consideravelmente maior que em EPD. Os resultados mostrados nas
quatro a seguir confirmam as conclusões fornecidas pelas abordagens analíticas
descritas anteriormente.

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 100

Figura 4.10 Deformação Plástica y. EPT 80 kN/m. Figura 4.11 Deformação Plástica y. EPD 80 kN/m.

Figura 4.12 Deformação Plástica y. EPT 100 kN/m. Figura 4.13 Deformação Plástica y. EPD 100 kN/m.

4.3 – Efeito do Confinamento na Extensão da Zona Plástica

Como mostrado nos itens anteriores, a extensão e configuração geométrica da


zona plástica é fortemente influenciada pelo estado plano do problema, plano de tensão
ou de deformação. As Fig. (4.6) e Fig. (4.8) representam bem esta influência. Dessa
forma, torna-se importante analisar o que ocorre com a extremidade da fissura no caso
de um problema tridimensional, onde os pontos localizados ao longo da linha que define
a extremidade da fissura estarão submetidos ao efeito do confinamento. Para estudar
esse efeito pode-se considerar, por simplicidade, o problema de Griffith em sua forma
tridimensional, ou seja, um sólido de dimensões infinitas com uma fissura solicitada em
modo I. Conforme apresentado no capítulo 2, verifica-se que a ponta da fissura estará
submetida a, pelo menos, um estado biaxial de tensões. Para o problema em questão, a
fissura pode ser ilustrada como apresentado na Fig. (4.14).
À medida que os pontos analisados movem-se do centro da fissura para a sua
extremidade, esses pontos movem-se de um estado triaxial de tensões para um estado

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 101

biaxial de tensões. Esse efeito ocorre devido ao confinamento existente no centro da


fissura, o qual aproxima essa região a um estado plano de deformação.
Consequentemente, a tensão de confinamento pode ser determinada em função das
tensões principais atuantes no plano perpendicular à extremidade da fissura. Assim,
nessa região, a zona plástica apresentará dimensões menores. A tensão de confinamento
diminui à medida que o ponto analisado afasta-se do centro da fissura. Nas bordas
externas da fissura, observa-se um estado plano de tensão, já que nenhuma força externa
atua nessa região com o objetivo de confiná-la.

Figura 4.14 Transição EPD/EPT para fissura tridimensional.

Sabe-se que o fator de intensidade de tensão crítico do material ou tenacidade,


K IC , dependerá, entre outros parâmetros, do volume de material capaz de deformar-se
plasticamente antes da fratura, MEGUID (1989). Quão maior for a capacidade do
material de deformar-se plasticamente, maior será sua capacidade de dispensar o
excedente de energia externa em deformação plástica. Assim, nesses casos, a fratura
ocorrerá em nível de carregamento externo maior.
Consequentemente, K IC irá variar de acordo com a espessura do elemento

considerado. A variação de K IC com a espessura do corpo, para um problema de


solicitação em modo I, é ilustrada na Fig. (4.15). Se o elemento considerado é pouco
espesso e o grau de restrição às deformações plásticas atuantes na ponta da fissura é
baixo, constata-se que as condições de EPT são atendidas. Por outro lado, quando o
elemento considerado é espesso e as condições de EPD prevalecerem, as deformações
plásticas serão consideravelmente reduzidas, se comparadas ao caso EPT. Para essa
última condição, a tenacidade do material é consideravelmente reduzida. Porém, como

Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 102

mostrado na Fig. (4.15), existe um valor para a espessura do corpo a partir do qual não
observa-se redução no valor da tenacidade à fratura. Nessa situação, as condições de
EPD prevalecerão, sendo que a tenacidade à fratura em EPD deve ser adotada como
resistência ao crescimento das fissuras para aplicações práticas.

Figura 4.15 Transição EPD/EPT.

4.4 – Referências Complementares

BARENBLATT, G. I. (1962). The mathematical theory of equilibrium cracks in brittle


fracture. In: Advances in Applied Mechanics, V. 7, 55-129.
BUDERKIN, F. M.; STONE, D. E. W. (1966). The crack Opening Displacement
Approach to Fracture Mechanics in Yielding, Journal of Strain Analysis, V.1, 145-153.
DUGDALE, D.S. (1960). Yelding of steel sheets containing slits. Journal of Mechanics
and Physics of Solids, V.8, 100-104.
EWALDS, H.L.; WANHILL, R.J.H. (1984). Fracture Mechanics, Victoria, Australia;
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Capítulo 4 – Mecânica da Fratura Aplicada a Materiais Dúcteis_________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 103

5. – Mecânica da Fratura Aplicada ao Concreto

5.1 – O Concreto Estrutural

O concreto é um dos materiais de maior utilização no campo da engenharia civil,


tanto pelo custo associado quanto pelo fácil acesso. Além disso, o concreto não requer
mão de obra especializada (ao contrário do aço) o que permite sua utilização, inclusive,
em regiões de menores recursos econômico e humano.
Apesar de sua larga utilização, o concreto apresenta comportamento mecânico
substancialmente complexo, em consequência de sua não homogeneidade. Dessa forma,
fatores como ruptura frágil, diferentes respostas mecânicas às tensões de tração e
compressão e relação tensão-deformação não linear encontram explicação em sua
intrincada estrutura interna.

5.1.1 – O Concreto

O concreto é o material estrutural mais empregado em edificações e um dos


materiais mais utilizados no mundo. O consumo de concreto só é menor que o da água
no planeta, sendo aproximadamente de seis bilhões de toneladas/ano, MEHTA e
MONTEIRO (1994). Esse elevado consumo pode ser atribuído a algumas propriedades
do concreto que o tornam mais adequado em diversas aplicações:

 Resistência à água: Os elementos de concreto apresentam bom comportamento


quando submetidos à ação da água. Essa propriedade o faz adequado como
material constituinte de barragens, tanques e condutos de água como pode ser
observado no Brasil e em grande parte do mundo. Se corretamente executado a
durabilidade dessas estruturas pode ser considerável como se observa em condutos
de água na Itália e em reservatórios na Grécia.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 104

 Facilidade de adequação de formas: O concreto fresco apresenta uma consistência


plástica que o permite fluir por formas de geometria complexa. Pode-se constatar
essa propriedade em inúmeras estátuas e monumentos dispersos pelo mundo.
 Economicamente acessível: Dos materiais estruturais, o concreto é o que apresenta
menor custo além de ser o mais facilmente disponível no canteiro. Segundo
estudos realizados por MEHTA e MONTEIRO (1994) estima-se que o preço por
quilograma de concreto pode chegar a R$ 0,06 em algumas regiões. Além disso,
grande quantidade de resíduos industriais pode ser reciclada no concreto,
tornando-o ainda adequado do ponto de vista de conservação de recursos naturais.

Apesar de todas essas vantagens em relação ao emprego do concreto, o


conhecimento de suas propriedades físicas e de seu comportamento mecânico sob várias
combinações de tensões ainda merecem atenção especial dos pesquisadores. O concreto
pode ser definido como um material composto, consistindo de uma matriz de
aglomerante sobre a qual estão dispersas partículas de agregados. Sua estrutura
altamente não homogênea faz com que o concreto apresente características marcantes
como ruptura frágil, relação tensão-deformação não linear, diferentes reações e
comportamentos a tensões de tração e compressão e efeitos dependentes do tempo. Esse
comportamento característico do concreto é largamente influenciado pela zona de
transição presente em sua microestrutura interna.
A zona de transição localiza-se ao redor dos agregados graúdos, formando uma
região interfacial entre o agregado graúdo e a pasta de cimento. Essa zona é geralmente
menos resistente que os demais constituintes do concreto, exercendo, portanto,
influência sensível no comportamento mecânico do concreto.
A formação da zona de transição deve-se a exsudação interna, ou seja, pela
formação de uma película de água ao redor dos agregados graúdos, decorrente dos
processos de adensamento. Isso faz com que a relação água/cimento seja mais elevada
nas proximidades dos agregados graúdos. O fato desta região apresentar fator
água/cimento mais elevado a torna suscetível a formação de produtos de hidratação
relativamente grandes, destacando-se a Etringita e a Portlandita, fazendo com que essa
região seja mais porosa do que a matriz aglomerante. Além da porosidade, a orientação
em planos de clivagem da Portlandita torna a zona de transição consideravelmente
menos resistente.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 105

5.1.2 – Comportamento do Concreto à Compressão Uniaxial

A resistência do concreto é fortemente influenciada pelo processo de fissuração,


tanto na zona de transição quanto na matriz aglomerante. Um diagrama tensão-
deformação uniaxial típico de um ensaio de compressão, apresentado na Fig. (5.1),
ilustra essa dependência.

Figura 5.1 Diagrama tensão x deformação típico compressão uniaxial do concreto CHEN & HAN (1988).

Para carregamentos que geram tensões até 30% da resistência à compressão


uniaxial, f c' , observa-se um comportamento praticamente elástico-linear, já que as
tensões nessa faixa não afetam significantemente as microfissuras presentes na zona de
transição. Para tensões no intervalo entre 30% a 50% de f c' , começa a ocorrer à extensão

das descontinuidades (fissuras) presentes na zona de transição, devido à concentração de


tensões na extremidade das fissuras. Diz-se que esse trecho apresenta propagação
estável de fissuras, pois mantido o carregamento constante não ocorre propagação das
fissuras.
No intervalo de carregamento entre 50% a 75% de f c' , inicia-se a extensão das
microfissuras presentes na matriz aglomerante e, aliada à rápida propagação das fissuras
da zona de transição, tende a tornar o sistema instável. A propagação das fissuras no
concreto torna-se instável para carregamentos superiores a 75% f c' . Nesse intervalo
ocorre a conexão entre as fissuras da zona de transição e da matriz aglomerante e
rapidamente observa-se o colapso da peça.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 106

5.1.3 – Comportamento do Concreto à Tração Uniaxial

O comportamento mecânico do concreto à tração uniaxial apresenta algumas


semelhanças em relação ao observado na compressão uniaxial, o que pode ser
constatado em um diagrama tensão-deformação típico de um ensaio de tração, como
mostra a Fig. (5.2). Para níveis de tensão inferiores a 60% da resistência à tração
uniaxial, ft ' , os efeitos da propagação das fissuras podem ser desprezados, sendo esse

limite considerado como elástico. Para tensões no intervalo de 60% a 75% de ft ' inicia-

se a extensão das fissuras tanto na zona de transição quanto na matriz de argamassa.


Acima de 75% de ft ' , observa-se o início do ramo descendente da curva, causado pela
conexão das fissuras da zona de transição e da matriz aglomerante. Esse intervalo de
carregamento é muito curto devido à rápida propagação das fissuras no elemento
tracionado.

Figura 5.2 Diagrama tensão x deformação típico a tração uniaxial do concreto CHEN & HAN (1988).

Observa-se, por meio dos diagramas das Fig. (5.1) e Fig. (5.2), que o intervalo
estável de propagação das fissuras é menor na tração. Esse fenômeno ocorre pelo fato
da energia necessária para a extensão das fissuras à tração ser consideravelmente menor
que à compressão. Isso pode ser utilizado para explicar o comportamento frágil
observado na ruptura à tração e também o certo grau de ductilidade constatado na
ruptura à compressão. Além disso, a menor energia necessária para extensão das
fissuras na tração é o principal motivo para a resistência do concreto à tração ser
significantemente menor quando comparada à resistência à compressão.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 107

5.1.4 – Comportamento do Concreto Sujeito a Carregamentos Cíclicos

Em relação a carregamentos cíclicos, pode-se verificar que elementos de


concreto submetidos a esse tipo de carregamento não apresentam degradação mecânica
significativa se as tensões não superarem 50% de f c' . Para carregamentos cíclicos com

tensões no intervalo de 50% a 75% de f c' , constata-se uma degradação progressiva da

rigidez (módulo de elasticidade e resistência) que pode ser atribuída ao contínuo


processo de fissuração tanto na zona de transição quanto na matriz aglomerante. Um
diagrama tensão-deformação do concreto em ensaios cíclicos pode ser observado na
Fig. (5.3).
Conforme apresenta esta figura, verifica-se que aumentando o número de ciclos
de carregamento e descarregamento, as curvas de descarregamento apresentam não
linearidades e uma curva característica de histerese é formada no recarregamento. Para
níveis de tensão superiores a 75% de f c' o comportamento é semelhante, porém a não
linearidade das curvas carga e descarga torna-se mais acentuadas.

Figura 5.3 Diagrama tensão x deformação típico carregamento cíclico MEHTA & MONTEIRO (1994).

5.1.5 – Comportamento do Concreto sob Estados de Tensões Multiaxiais

O comportamento mecânico do concreto quando sujeito a estados de tensão


biaxiais e multiaxiais difere substancialmente do observado nos estados uniaxiais. Nos
estados de tensão biaxiais e multiaxiais, quando estão envolvidas tensões de
compressão, surgem tensões que provocam confinamento no material, o que acaba por
aumentar a capacidade resistente além da ductilidade do elemento estrutural. A Fig.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 108

(5.4) apresenta uma envoltória típica de peças de concreto expostas a carregamentos


biaxiais.
Conforme apresentado por CARRAZEDO (2002), para tensões de compressão
iguais em duas direções, o ganho em resistência do material pode alcançar 16%. O
aumento máximo de resistência pode chegar a 27%, quando a relação entre as tensões
principais 1 e 2 é próxima de 0,50.

Figura 5.4 Diagrama da envoltória de ruptura em estados biaxiais de tensão.

Quando uma peça de concreto está submetida a um estado de compressão-


tração, a resistência à compressão apresenta queda praticamente linear à medida que se
aumentam as tensões de tração. Para o estado biaxial de tração constata-se que a
resistência do concreto à tração mantém-se praticamente igual à apresentada em um
ensaio uniaxial.
No tocante a estados multiaxiais de tensões, ainda não há um conjunto de
ensaios padrão que comprovem o comportamento mecânico do concreto quando sujeito
a esse tipo de solicitação. Mesmo entre os pesquisadores do concreto, ainda não existe
um consenso sobre qual a forma de ruptura do concreto quando sujeito a estados
multiaxiais de tensão. Muitos pesquisadores da área de modelagem numérica de
estruturas de concreto armado têm representado o comportamento do concreto
considerando critérios elastoplásticos. Os resultados observados através dessa
consideração são satisfatórios como apresentado em LEONEL et.al.(2003) apesar do
elevado custo computacional.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 109

5.2 – Mecanismo de Propagação das Fissuras

Sabe-se que durante o processo de fratura surge, à frente da extremidade da


fissura, uma zona onde ocorrem processos inelásticos, sendo esta zona denominada
zona de processos inelásticos. De acordo com o comportamento mecânico do material a
zona de processo apresenta diferentes características. Para materiais dúcteis esta zona
apresenta dimensões grandes se comparadas ao comprimento da fissura, além de ser
governada pela tensão de escoamento do material. Já para materiais frágeis a área de
abrangência da zona de processo é pequena em relação ao comprimento da fissura
analisada.
Existem também os materiais quase frágeis, em que a zona de processos
inelásticos apresenta comportamento, em termos de dimensão, intermediário entre os
observados nos materiais dúcteis e frágeis. Nesses materiais, as dimensões da zona de
processo são grandes em relação ao comprimento da fissura, ao contrário dos materiais
frágeis, e a resistência coesiva das partículas à frente da fissura é bem menor se
comparada à dos materiais dúcteis. Esse comportamento pode ser explicado, em parte,
pela presença de micro descontinuidades, que são na verdade micro fissuras, vazios e
poros do material, localizados à frente da extremidade da fissura. Estes, devido à
concentração de tensão existente, provocam a perda de rigidez progressiva do material.
O crescimento das micro descontinuidades acaba por gerar interconexões (coalescência)
entre elas, o que delimita a direção da propagação bem como os incrementos de
comprimento da fissura principal. O processo de coalescência induz o surgimento de
uma zona de fragilidade, a qual conduzirá o corpo ao colapso. A Fig. (5.5) ilustra a
presença das micro descontinuidades na zona de processo bem como a sua coalescência.

Figura 5.5 Representação do processo de coalescência das fissuras e conexão das micro descontinuidades.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 110

A zona de processos inelásticos caracteriza-se também por dissipar grande


quantidade de energia. A energia absorvida é empregada na degradação mecânica do
material e assim a fissura pode propagar-se mesmo sob tensões inferiores à tensão
última. A presença do amolecimento, observada nas curvas tensão x deformação
uniaxial à compressão e à tração de concretos, como mostrado anteriormente, é
atribuída aos mecanismos de dissipação de energia existentes na zona de processo.
No tocante ao concreto, além da zona de processo, outros fatores devem ser
também levados em conta para a análise de seu fraturamento. Inicialmente, a presença
de vazios e de agregados graúdos à frente da extremidade da fissura deve ser
considerada. A mudança brusca de rigidez provocada por estes dois fatores altera o
regime de propagação da fissura, influenciando substancialmente o seu comportamento.
Outro fator de grande interesse na análise é o intertravamento dos agregados, o qual
torna o elemento estrutural em questão mais rígido, já que permite a transferência de
tensões por atrito, entre as faces da fissura, mesmo com a fissura configurada. Estes
fenômenos podem ser visualizados por meio das ilustrações apresentadas na Fig. (5.6).

Figura 5.6 Fenômenos que influenciam a direção de crescimento das fissuras em materiais quase-frágeis.

Devido à presença da zona de processos inelásticos, a fissura apresenta, à frente


de sua extremidade, uma região de rigidez inferior à do restante do corpo. Em um
material quase frágil, as tensões resistentes atuantes na zona de processo apresentam um
perfil semelhante ao mostrado na Fig. (5.7). Assim, ao final da zona de processo, a
tensão resistente é igual à resistência à tração do material. Além disso, à medida que o
ponto analisado aproxima-se da extremidade da fissura real, ou do início da zona de
processo, a resistência diminui.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 111

Figura 5.7 Representação das tensões residuais na zona de processo de materiais quase frágeis.

Com base nos conceitos apresentados anteriormente, verifica-se que a taxa de


energia total liberada devido ao carregamento aplicado, a qual é utilizada para a
verificação da estabilidade ao crescimento da fissura, é composta por dois mecanismos
de dissipação. O primeiro deles refere-se à energia consumida durante o fraturamento na
criação de novas superfícies para a fissura. Essa parcela, U  , é semelhante à utilizada

no balanço de energia de problemas da fratura elástico linear. Já a segunda, corresponde


à energia necessária para superar a resistência residual do material na zona de processo,
de forma a tornar esta zona livre de tensões e assim propagar a fissura. Concisamente,
esse balanço de energia pode ser assim representado:
Gq  G Ic  G (5.1)

em que: Gq é a taxa total de liberação de energia, G Ic representa a energia necessária

para a formação de novas superfícies de fissura e G a energia para a superação da

resistência residual da zona coesiva. O termo G pode ser determinado por meio da
COD
seguinte integral: G     COD  dCOD , a qual envolve a variação do trabalho das
0

tensões na zona de processo, , com relação à abertura normal das faces da fissura,
COD.
A partir da Eq. (5.1) pode-se descrever a propagação de fissuras em materiais
quase frágeis ou então realizar aproximações sobre o mecanismo de dissipação de
energia, de forma a se obter diferentes modelos para previsão da propagação de fissuras.
Com base nessas aproximações, os modelos da mecânica da fratura não linear de

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 112

materiais quase frágeis podem ser classificados como de fissura fictícia e fissura elástica
equivalente.
Considerando o modelo de fissura fictícia, assume-se que a energia necessária
para a criação de novas superfícies é pequena se comparada à energia necessária para
separá-las. Consequentemente, pode-se assumir que G Ic = 0. Nesse campo destacam-se

os trabalhos pioneiros de HILLERBORG et. al. (1976) e BAZANT & OH (1983).


Os modelos de fissura elástica equivalente prescrevem que a zona de processo,
nos materiais quase frágeis, pode ser descrita pelo critério de energia de Griffith. Assim,
o termo G é considerado desprezível quando comparado a GIc . Dessa forma, nesse
modelo a fissura é governada por um critério da mecânica da fratura elástico linear e o
comprimento efetivo da fissura é basicamente o que diferencia os diversos modelos
propostos. Dentre esses modelos destacam-se os de JENQ & SHAH (1985), BAZANT
& KAZEMI (1990) e NALLATHAMBI & KARIHALOO (1986). Nos modelos de
fissura elástica equivalente, o comprimento da fissura, incluindo a zona de processo, é
obtido, por exemplo, através de parâmetros relacionados ao deslocamento como o
CMOD (crack mouth opening displacement). Pode-se relacionar este parâmetro, através
de soluções analíticas ou numéricas com o auxílio de regressões, ao comprimento da
fissura.
PLANAS & ELICES (1990) apud SHAH et al. (1995) compararam resultados
numéricos empregando os modelos de fissura fictícia e fissura elástica equivalente. A
comparação entre os modelos permite concluir que, determinando adequadamente as
propriedades de fratura do material, os dois conjuntos de modelos são capazes de
representar, com considerável precisão, estruturas cujas dimensões sejam as de
utilização corrente em laboratório. Segundo os autores, entretanto, esses modelos,
podem apresentar diferenças quando aplicados a estruturas de concreto cujas dimensões
sejam consideravelmente maiores que aquelas comumente utilizadas em laboratório.
Esses autores argumentam que uma razão para essa diferença pode ser atribuída a forma
muitas vezes não consistente para a definição do efeito de escala nos modelos.
A resistência do concreto, segundo NALLATHAMBI e KARIHALOO (1986),
diminui com o aumento do tamanho da estrutura. Porém, esta redução na resistência não
é mais observada a partir de um determinado tamanho do elemento estrutural. A
explicação para esse fato pode ser dada seguindo os conceitos apresentados no item 4.3.
Este efeito de escala observado na resistência do concreto pode ser explicado pelo

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 113

tamanho da zona de processos inelásticos. Quando uma estrutura de concreto é


submetida a um carregamento, o processo de fraturamento é governado pelas parcelas
de energia mostradas na Eq.(5.1). Para estruturas de grandes dimensões, G apresenta

valor pequeno em comparação com GIc . Assim, nessas estruturas, o processo de fratura

tenderá a ser frágil e, portanto, critérios elásticos lineares poderão ser aplicados.

5.3 – Modelos de Fissura Fictícia. Fratura Coesiva

Sabe-se que a mecânica da fratura elástico linear tem sido uma valiosa
ferramenta para resolução de problemas de fratura quando a zona de processos
inelásticos à frente da extremidade da fissura apresenta dimensões desprezíveis se
comparada às dimensões da fissura ou mesmo a outras dimensões significativas do
corpo. No entanto, a dimensão da zona de processo presente em materiais dúcteis e
quase frágeis não segue a configuração apresentada nos materiais frágeis, sendo
consideravelmente maior. Isso faz com que sejam necessárias modificações na teoria
original de forma a esta conseguir representar esses fenômenos.
A proposição dessas modificações deu origem aos modelos de fissura fictícia, os
quais assumem que a fissura física ou real e sua zona de processo são representadas por
meio de uma fissura maior de comprimento fictício a. Nesse modelo, a rigidez residual
da zona de processo é representada por uma tensão  (w) , denominada tensão coesiva,
cujo valor é igual à resistência à tração do material, ft , ao final da zona de processo. A

tensão coesiva tende a fechar as faces da fissura, sendo, normalmente, uma função do
deslocamento da abertura da fissura, w. Além disso, conforme o ponto analisado
aproxima-se da extremidade da fissura real, ou do início da zona de processo, as tensões
coesivas diminuem.
Conforme discutido no capítulo 4, os primeiros modelos coesivos foram
propostos por DUGDALE (1960) e BARENBLATT (1962), os quais aplicam-se,
principalmente, a materiais dúcteis. Segundo esse modelo, a fissura real é substituída
por uma fissura denominada efetiva cujo comprimento é maior que o da fissura real,
devido ao acréscimo em seu comprimento decorrente da presença da zona de processo.
A extensão no comprimento da fissura, da, estará sujeita a tensões coesivas atuando no
sentido de fechar as extremidades da fissura. O comprimento da é tal que as tensões
singulares na extremidade da fissura desaparecem e assim o fator de intensidade de

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 114

tensão torna-se igual a zero. As tensões coesivas dependem da abertura das faces da
fissura, w. Quando esta abertura atinge um valor considerado crítico, as tensões coesivas
cessam e a fissura real cresce.
A primeira teoria da mecânica da fratura não linear aplicada a materiais quase
frágeis foi proposta por HILLERBORG et. al (1976). Neste trabalho foi incluído o
amolecimento à tração na zona de processo por meio de uma fissura fictícia à frente da
fissura pré-existente, cujas faces estão sujeitas a tensões coesivas. O termo fictício é
empregado para ressaltar que essa parte da fissura não é descontínua, ou seja, com total
separação das faces como em uma fissura com força de superfície nula. A Fig. (5.8)
ilustra a atuação das tensões coesivas na fissura do modelo de HILLERBORG et. al.
(1976), devendo-se destacar, neste modelo, o fato da tensão coesiva não ser constante ao
longo da zona coesiva.

Figura 5.8 Distribuição de tensões coesivas no modelo de HILLERBORG et. al. (1976).

Essa tensão coesiva aumenta de zero, em um ponto referenciado a abertura


crítica da fissura wc, até seu valor pleno, igual à resistência à tração do material na
extremidade da fissura fictícia. Outro fator de destaque é que nesse modelo a dimensão
da zona de processo pode não ser pequena em comparação com o comprimento da
microfissura pré-existente, assim como no modelo para materiais elastoplásticos.
A energia de fratura, necessária para a representação do processo de
amolecimento do concreto à tração, pode ser obtida por meio da relação tensão
deslocamento na zona de amolecimento. A área sob a curva de amolecimento a tração,
como apresenta a Fig. (5.9), exprime o valor da energia liberada durante o processo de
fissuração nessa região.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 115

Figura 5.9 Diagrama tensão x abertura da fissura. Determinação da liberação de energia critica.

A área do diagrama acima pode ser obtida por meio das seguintes integrais:
0 wc
Gf   w( )d    (w)dw
f 't 0
(5.2)

em que: G f energia necessária para a ruptura do corpo, w abertura da fissura e  ( w) é a

tensão coesiva.

5.4 – Modelagem da Zona de Processo com Modelos de Fissura Fictícia

O modelo de fissura fictícia é uma importante ferramenta na modelagem


numérica da zona de processo em materiais dúcteis e quase frágeis. Esse modelo é
baseado nas seguintes hipóteses:
1) A zona de processo desenvolve-se quando a máxima tensão principal atuante
na ponta da fissura fictícia alcançar a resistência à tração teórica do material.
2) A fissura cresce perpendicularmente a direção de atuação da máxima tensão
principal.
3) A zona de processo é parcialmente danificada durante o crescimento da
fissura, porém esta é ainda capaz de transferir esforços, os quais são dependentes da
abertura das faces da fissura.
4) As propriedades do material fora da zona de processo permanecem com
características elásticas.
Quando a tensão principal de tração atuante na ponta da fissura fictícia exceder a
resistência à tração do material, a fissura fictícia cresce conforme a hipótese 2. Por outro
lado, se a abertura normal das faces da fissura alcançar um valor limite, a fissura
coesiva torna-se fissura física, com superfícies livres de tensões coesivas.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 116

A intensidade das forças coesivas pode ser relacionada ao valor da abertura das
faces da fissura, U , por meio de leis constitutivas. Existem diversas leis para tal fim e
serão aqui destacadas as três relações mais utilizadas na modelagem numérica da fratura
de materiais quase frágeis. A primeira, e mais empregada, trata da lei linear apresentada
na Fig. (5.10). Nessa lei constitutiva as forças coesivas são associadas a U através de
uma relação linear.

ft

Ucr U

Figura 5.10 Lei coesiva linear.

Essa relação é a ilustrada pela Eq. (5.3), a qual incorpora as situações onde U é
maior que a abertura crítica.
  E se    c
 U 
  U   ft 1   se 0  U  U cr (5.3)
 U cr 
  U   0 se U  U cr

Outra relação amplamente empregada é lei bi-linear, representada graficamente


na Fig. (5.11). Com essa lei constitutiva as forças coesivas são associadas a U por
meio de duas retas com inclinações diferentes entre si.

ft

f t''

u'' u'c Ucr U

Figura 5.11 Lei coesiva bi-linear

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 117

Considerando essa lei, as tensões coesivas são obtidas como apresentado na Eq.
(5.4).
  E se    c
 ft  ft '' 
  U   ft    U se 0  U  u ''
 u 
''

(5.4)
f '' U  u '' 
  U   '' t  f t ''  1  ''  se u ''  U  U cr
u  U cr  u  U cr 
  U   0 se U  U cr

As variáveis ft '' , u '' e U cr são discutidas no trabalho de PETERSSON (1981),


sendo iguais a:
ft
f t '' 
3
0,8G f
u ''  (5.5)
ft
3, 6G f
U cr 
ft
Por fim, é possível ainda modelar a rigidez residual da zona coesiva
considerando uma relação exponencial. Essa lei é apresentada na Fig. (5.12), sendo as
equações que a governam expressas pela Eq. (5.6).
  E se    c

ft
U
(5.6)
  U   f t e se U  0
Gf

ft

U

Figura 5.12 Lei coesiva exponencial.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 118

5.5 – Procedimentos Numéricos para a Propagação da Fissura

Neste item serão discutidos alguns procedimentos numéricos para a realização


da análise da propagação de fissuras em materiais quase frágeis. Para esta análise devem
ser definidas metodologias para o cálculo do ângulo de propagação da fissura, do estado
de tensão na extremidade da fissura e também o comprimento de propagação.

5.5.1 – Cálculo do Estado de Tensão na Extremidade da Fissura

Por meio do modelo de fissura fictícia, utilizado na modelagem do


comportamento mecânico da zona de processo de materiais quase frágeis, a estabilidade
ao crescimento da fissura é verificada mediante a comparação entre o estado de tensão
atuante na extremidade da fissura e um estado de tensão admissível previsto por um
critério de ruptura. Geralmente emprega-se o critério de ruptura de Rankine, ou seja, a
fissura propaga se a maior tensão principal for de maior magnitude que a resistência do
material.
Para a determinação do estado de tensão atuante na extremidade da fissura pode
ser empregado um processo de extrapolação polinomial, o qual será descrito a seguir.
Inicialmente são distribuídos pontos internos ao domínio, localizados à frente da
extremidade da fissura, conforme o padrão apresentado na Fig. (5.13). O número de
semi-círculos, assim como o número de pontos internos em cada um deles podem ser
escolhidos conforme a precisão desejada na análise.
Após a determinação do estado de tensão em cada um desses pontos internos o
processo de extrapolação polinomial é efetuado. Sobre cada posição radial dada
determina-se um polinômio, o qual descreverá o comportamento das tensões ao longo
da dada posição radial. O grau do polinômio é escolhido de acordo com o número de
pontos internos presente em cada uma das posições radiais destacadas na Fig. (5.13).
Assim, sendo n o número de pontos internos ao longo de cada posição radial o grau do
polinômio interpolador será n-1.
As grandezas do processo de interpolação serão os valores das tensões, as quais
poderão ser normais x, y ou cisalhante xy, e a distância em relação à ponta da fissura.
Consequentemente, será obtido um polinômio que correlacionará o valor da tensão à
distância em relação à extremidade da fissura. Sendo m o número de posições radiais,
presentes na extremidade da fissura, são realizadas m interpolações polinomiais com a

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 119

obtenção de m valores do estado de tensão na extremidade da fissura. O estado de


tensão na ponta da fissura é obtido após a execução de uma média aritmética simples
entre os m estados de tensão obtidos das interpolações.

Pontos
Internos
Posições
Ponta da Radiais
Fissura

ial
enc
l r
dia fe
Ra un
ri c
C

Figura 5.13 Distribuição dos pontos internos à frente da ponta da fissura.

O processo de interpolação será brevemente descrito a seguir. Pretende-se obter


um polinômio que relacione o valor do estado de tensão à distância em relação à ponta
da fissura. Dessa forma, esse polinômio poderá ser assim escrito:
F ( )  a0  a1r  a2 r 2  ...  an r n (5.7)

sendo: F ( ) função polinomial que determina a tensão desejada, r a distância em


relação a extremidade da fissura e a0 ...an termos constantes do polinômio.
Para a obtenção dos termos constantes do polinômio, basta que seja resolvido o
seguinte sistema matricial:
1 r0 r02  r0n   a0   0 
    
1 r1 r12  r1n   a1   1 
1 r2 r22  r2n   a2    2  (5.8)
    
          
1 rn2  rnn   an   n 
 rn
Como o ponto de interesse na análise é a extremidade da fissura, a distância a ser
considerada é zero e assim o único fator de interesse na análise é o termo livre do
polinômio, a0, o qual representará o estado de tensão na ponta da fissura.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 120

5.5.2 – Cálculo do Ângulo de Propagação da Fissura

Um parâmetro de grande importância na análise de propagação de fissuras é o


ângulo de crescimento das mesmas. Conforme descrito no capítulo 3, pode-se utilizar a
teoria da máxima tensão circunferencial, segundo a qual define-se que a fissura irá
crescer perpendicularmente a direção de atuação da máxima tensão principal de tração.
Para tanto, deve ser utilizado o estado de tensão atuante na extremidade da fissura e em
seguida a direção pode ser obtida empregando a seguinte relação:

1  2 xy 
p  ArcTan   (5.9)
2   x  y
 
Esse procedimento é empregado com sucesso no trabalho de SALEH (1997) e
LEONEL e VENTURINI (2010).

5.5.3 – Incremento no Comprimento da Fissura

Quando o estado de tensão atuante na extremidade da fissura supera o previsto


pelo critério de ruptura ocorre a propagação da fissura. No entanto, a magnitude do
incremento no comprimento da fissura deve obedecer à lei não linear adotada para a
representação das tensões coesivas. Assim, deve ser encontrado o ponto, na direção
definida pela Eq. (5.9), em que o estado de tensão seja igual, ou pelo menos próximo
dentro de certa tolerância, ao previsto pelo critério de ruptura. Quando esse ponto é
encontrado, determina-se a “nova” ponta da fissura coesiva. Podem ser utilizados, para
tal fim, algoritmos de otimização, como o Golden Section ou mesmo o método da
bissecção. Em um programa computacional, estes incrementos no comprimento das
fissuras devem ser determinados automaticamente. Além disso, esse procedimento é
consistente uma vez que obedece a uma lei coesiva escolhida.

5.5.4 – Procedimento Iterativo para a Determinação da Configuração de


Equilíbrio

Após determinados o estado de tensão na ponta da fissura, o ângulo de


propagação e o incremento no comprimento da fissura pode-se agora partir para o
processo incremental iterativo que conduzirá à determinação da configuração de
equilíbrio da estrutura. Este procedimento visa a determinação do conjunto de valores
de w e  para o qual a estrutura encontra o equilíbrio. Será aqui brevemente descrito o

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 121

procedimento utilizado para a análise da propagação de fissuras em materiais quase


frágeis, empregando o modelo de fissura fictícia, utilizando a técnica do operador
constante. Nesse modelo, o equilíbrio é obtido por meio da reaplicação da diferença
entre as tensões atuantes reais e as tensões máximas previstas pelo critério coesivo. As
matrizes que multiplicam as grandezas conhecidas e desconhecidas no contorno e no
domínio não mudam durante o processo iterativo, o que dá origem a denominação
operador constante.
Nesse tipo de análise os seguintes passos devem ser seguidos:
1) Aplica-se um incremento no carregamento aplicado.
2) Calcula-se o estado de tensão na ponta da fissura, o ângulo de propagação e
também o incremento no comprimento da fissura.
3) Calcula-se a tensão verdadeira por meio da lei coesiva adotada.
4) A diferença entre a tensão atuante e a tensão verdadeira deve ser reaplicada
na estrutura de forma a obtenção do equilíbrio.
5) Verifica-se a convergência por meio do cálculo das normas de deslocamento
ou força: U i  U i 1  Tolerância ou Pi  Pi 1  Tolerância .

6) Se a norma para convergência é atendida aplica-se um novo incremento de


carga. Caso contrário deve-se repetir os passos 3 a 6.
Constata-se que esse procedimento é bastante simples e conduz a bons
resultados, apesar de requerer um elevado número de iterações na busca pelo equilíbrio.

5.6 – Modelo de Banda de Fissuração de Bazant e Oh (1983)

Nesse modelo coesivo, a zona de processos inelásticos é modelada por uma


banda de microfissuras uniformemente distribuídas em uma largura fixa igual a hc ,
como mostra a Fig. (5.14). Assume-se, nesse modelo, que a largura da banda seja
proporcional ao diâmetro máximo do agregado graúdo utilizado. A propagação estável
da fissura é simulada pela microfissuração progressiva dentro desta banda, a qual é
descrita pela relação tensão x deformação mostrada na Fig. (5.15). A energia de fratura,
G f , para esse modelo é definida como o produto da área sob a curva tensão x

deformação, mostrada na Fig. (5.15), pela largura hc da banda de fissuração. Dessa


forma:

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 122

 E  ft 2
G f  hc 1   (5.10)
 ET  2 E
onde ET representa o módulo pós pico e ft a resistência à tração do material.

Figura 5.14 Banda de microfissuração.

Figura 5.15 Relação tensão x deformação para o material contido dentro da banda de microfissuração.

5.7 – Modelo de Dois Parâmetros de Jenq e Shah (1985)

JENQ e SHAH (1985) propuseram um modelo para a representação do


comportamento à fratura de corpos formados por materiais quase frágeis. Esse modelo
depende de dois parâmetros, sendo baseado na resposta elástica à fratura de uma
estrutura. Dessa forma, como este modelo baseia-se em condições da mecânica da
fratura elástico linear, seu objetivo trata da determinação do fator de intensidade de
tensão crítico, K Ics , do deslocamento crítico da abertura normal das faces da fissura,

CTODc , e do deslocamento crítico da abertura normal das faces da fissura na entrada do

entalhe, CMODc . K Ics é calculado na extremidade da fissura efetiva para a carga de

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 123

pico aplicada. Já CTODc é determinada tomando-se como referência a largura e


profundidade do entalhe inicial e a extensão efetiva da fissura para a carga de pico.
O diagrama carga x deslocamento, para um ensaio de flexão em três pontos
padrão necessário para o levantamento de tais parâmetros, para o ponto de aplicação da
carga apresenta três fases distintas, como mostra a Fig. (5.16).

Figura 5.16 Fases do diagrama P x CMOD.

Na fase I observa-se o desenvolvimento de um ramo ascendente


aproximadamente linear onde a microfissuração do concreto é desprezível. Já na fase II,
com o aumento do nível das tensões, a microfissuração passa a ter maior relevância,
aumentando significantemente o tamanho da zona de processos inelásticos. Nesta fase o
crescimento ainda ocorre de forma estável. Finalmente, na fase III, após atingir a carga
crítica, os valores do fator de intensidade de tensão e da abertura normal das faces da
fissura tornam-se críticos e se não houver descarregamento a fissura propaga de forma
instável até o colapso.
No modelo de Jenq e Shah, assume-se a presença de uma zona coesiva à frente
da extremidade da fissura. Porém, esse modelo foi desenvolvido devido à dificuldade
em se determinar a extensão da zona coesiva em carregamentos de pico em uma
estrutura real.
A determinação dos parâmetros K Ics e CTODc é efetuada por meio de um ensaio

de flexão em três pontos com crack mounth opening displacement, CMOD , controlado.
Para separar as respostas elástica e inelástica do CMOD , como apresentado na Fig.
(5.17), o corpo de prova deve ser carregado até sua capacidade máxima e, em seguida,
deve-se aplicar um ciclo de descarregamento-carregamento, levando a diferentes valores
de flexibilidade C, como indicado na Fig. (5.18).
Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 124

O valor medido para o CMODec (parcela elástica da abertura crítica da entrada

do entalhe) assim como a tensão máxima  c são introduzidos nas formulações da


mecânica da fratura elástico linear para a determinação do fator de intensidade de tensão
crítico, K Ics , e do comprimento crítico ac da fissura elástica equivalente. Aplicando este
equacionamento, o qual é baseado nas funções de tensão complexas de Westergaard,
obtém-se:
a 
K Ics   c  ac g1  c  (5.11)
b
4 c ac  ac 
CMODce  g2   (5.12)
E b
sendo b a altura da viga e as funções geométricas g1 e g 2 podem ser encontradas em
livros texto sobre mecânica da fratura elástico linear.

Figura 5.17 Respostas elástica e inelástica à fratura.

Figura 5.18 Ciclo de carregamento e descarregamento.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 125

A parcela elástica da abertura crítica CTODec da ponta da fissura é determinada


pela seguinte expressão:
a a 
CMODce  CMODce g3  c , 0  (5.13)
b b
onde a0 é o comprimento da fissura inicial e a função geométrica g3 pode ser
encontrada em livros texto sobre mecânica da fratura elástico linear.
Para uma viga submetida a um ensaio de flexão em três pontos contendo um
entalhe central, como mostrado na Fig. (5.19), as funções g1 , g 2 e g3 , para S  4b são
dadas por:

g1   

1,99   1    2,15  3,93  2, 7 2  (5.14)
 1  2 1   
3
2

0, 66
g 2    0, 76  2, 28  3,87 2  2, 04 3  (5.15)
1   
2

 
1
g3    1     1, 081  1,149     2 
2 2
(5.16)

3PS a x
sendo   2
, e  .
2b t b a

Figura 5.19 Ensaio de flexão em três pontos.

Baseados em observações experimentais, JOHN e SHAH (1989) propuseram as


seguintes equações empíricas para K Ics , CTODec e E em função da resistência a

compressão do concreto, f c :

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 126

K Ics  0, 06  f c 
0,75
(5.17)

CTODce  0, 00602  f c 
0,13
(5.18)

E  4785  f c 
0,50
(5.19)

onde K Ics é dado em MPa m , CTODec em mm e E e f c em MPa .


O modelo de dois parâmetros tem sido utilizado, por exemplo, na simulação do
efeito de escala na resistência à tração na flexão e para a previsão da capacidade
resistente ao cisalhamento de vigas sem armadura de cisalhamento.

5.8 – Modelo de Fissuras Distribuídas

A modelagem do crescimento de fissuras em materiais quase frágeis pode ser


também efetuada por meio do modelo de fissuras distribuídas (smeared crack model).
Nesse modelo, que está disponível em alguns programas comerciais como DIANA e
ANSYS, os efeitos do fraturamento coesivo são considerados assumindo-se a presença
de microfissuras uniformemente distribuídas em uma dada região do corpo em análise.
A presença dessas descontinuidades induz a redução da rigidez da região considerada.
Portanto, nesse modelo simula-se apenas a influência mecânica das fissuras e não sua
presença propriamente dita.
À medida que o nível de tensão decorrente do carregamento externo aumenta, as
zonas mais solicitadas do corpo tornam-se progressivamente ortotrópica, como indica a
Fig.(5.20), uma vez que a rigidez do material ao longo da direção perpendicular de
atuação da máxima tensão principal vai sendo progressivamente reduzida, até alcançar
seu valor mínimo igual à zero, quando a zona coesiva torna-se fissura real. Como os
efeitos da fissura localizada são distribuídos em uma região, esse modelo é similar ao
modelo de banda de fissuração proposto por BAZANT e OH (1983), sendo a largura da
banda, hc , igual à da região considerada. Se um modelo numérico for considerado,
como um baseado no método dos elementos finitos, a largura da região será igual à
largura do elemento finito utilizado. Portanto, é de se esperar que os resultados sejam
significantemente influenciados pelo tamanho e orientação da malha.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 127

Figura 5.20 Ensaio de flexão em três pontos.

Para as porções materiais que não são mais elásticas, ou seja, para as porções
materiais que pertencem à zona de processos inelásticos, o comportamento mecânico
em termos de tensão x deformação segue o ilustrado na Fig. (5.15).
Na abordagem distribuída, tanto o modelo de fissura fixa (fixed crack model)
como o de fissura rotacional (rotating crack model) podem ser empregados. No modelo
de fissura fixa, quando a tensão principal de tração atinge a resistência à tração do
material, uma fissura se forma perpendicularmente à direção de atuação da tensão
principal de tração e ao mesmo tempo a lei tensão deformação isotrópica é substituída
por uma lei ortotrópica. A direção da fissura é fixa para todo o processo de
fraturamento. Por outro lado, no modelo de fissura rotacional, a direção da fissura pode
ser modificada durante o processo de fratura. Nesta abordagem, as direções da máxima
tensão principal e da normal à fissura são alinhadas desde o início da fissuração. A
variação contínua da direção do eixo de tensão principal induz à variação da direção da
fissura. Isso significa que as direções principais dos tensores de tensão e de deformação
coincidem durante todo o processo de fratura.

5.9 – Referências Complementares

BARENBLATT, G. I. (1962). The mathematical theory of equilibrium cracks in brittle


fracture. In: Advances in Applied Mechanics, V. 7, 55-129.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


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BAZANT, Z.P; KAZEMI,M.T. (1990). Determination of Fracture Energy, Process
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concrete, International Journal of Fracture, V. 44, 111-131.
BAZANT, Z. P.; OH, B.H. (1983). Crack band theory for fracture of concrete,
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BAZANT, Z.P; LI, Y. N. (1997). Cohesive crack model with rate-dependent opening
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Dissertação (Mestrado), Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São
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Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


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Applications of Fracture Mechanics to Concrete, Rock and other quasi-Brittle
Materials, John Wiley & Sons, Inc.

Capítulo 5 – Mecânica da Fratura aplicada ao Concreto_______________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 130

6. – Fadiga dos Materiais

6.1 – Aspectos Históricos

A palavra fadiga é originária do vocábulo latim fatígáre que significa cansar.


Apesar de comumente associada ao estado físico e mental de seres humanos, esse termo
é largamente aceito e empregado no vocabulário de engenharia para designar dano e
ruína em materiais sujeitos ao regime de cargas cíclicas. A fadiga pode ser definida
como o conjunto de processos necessários para a mudança das propriedades internas de
materiais, devido a aplicações repetidas de tensões e deformações, em especial às
mudanças que causam fissuração e ruína.
O primeiro estudo relacionado à fadiga em metais foi desenvolvido por
ALBERT (1838), o qual conduziu testes em correntes utilizadas em minas. Depois deste
trabalho, o interesse no estudo da fadiga dos materiais cresceu. No entanto, este deveu-
se principalmente ao grande aumento do uso de materiais metálicos, particularmente em
ferrovias e estruturas de pontes. A primeira pesquisa detalhada sobre fadiga em metais
iniciou-se, segundo SMITH (1910), em 1842 após um catastrófico acidente ferroviário
próximo a Versailles, França, que culminou com a perda de diversas vidas. A causa do
acidente foi atribuída à falha, por fadiga, do eixo frontal de uma locomotiva. RANKINE
(1843) soube perceber uma importante característica em estruturas que apresentam
entalhes e concentradores de tensão. Essas estruturas são mais sensíveis à ação da
fadiga, ou seja, nesses tipos de estruturas, falhas ocorrem após um número de ciclos de
carga menor que em estruturas que não apresentam tal característica.
Pesquisas em fratura e fadiga foram conduzidas por BRAITHWAITE (1854), o
qual empregou o termo fadiga exclusivamente para denotar a fissuração em metais sob a
ação de cargas cíclicas. Entretanto, a introdução do termo fadiga para designar
fissuração e ruína em estruturas é creditada a PONCELET (1839), o qual estudou a
falha em ligações metálicas.

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 131

WÖHLER (1860) caracterizou o comportamento de materiais em solicitação


cíclica por meio de curvas do tipo “-N”, relacionando tensão máxima ao número de
ciclos para ruptura. GERBER (1874) pesquisou metodologias para o desenvolvimento
de projetos considerando os efeitos da fadiga. Suas contribuições incluem uma
metodologia para o cálculo da vida útil em estruturas sujeitas a diferentes níveis de
tensões cíclicas. O fato da possibilidade do limite elástico, em metais sujeitos a
carregamentos cíclicos, ser diferente do observado em estados monotônicos de
carregamento foi introduzida por BAUSCHINGER (1886). Além de confirmar alguns
resultados de WÖHLER (1860), seu trabalho identifica a ocorrência de ciclos de
amolecimento e encruamento nos carregamentos reversos. BASQUIM (1910) propôs
leis empíricas para a caracterização de curvas “-N” de metais. Seu trabalho mostrou
que curvas em escala log x log, de tensão por número de ciclos, resultam em uma
relação linear para estados de tensão próximos à resistência do material.
A partir de 1920, o campo da fadiga envolveu um maior número de
pesquisadores e também de linhas de atuação. Nesse período podem ser destacados
McADAM (1926) que estudou fadiga sob corrosão em metais. Modelos de acumulação
de dano para ruína sob fadiga foi alvo das pesquisas de PALMGREN (1924). Os efeitos
de entalhes e concentradores de tensão em carregamentos monotônico e cíclicos foram
estudados por NEUBER (1946), enquanto fadiga sob carregamentos variáveis foi
tratado por LANGER (1937). Teorias estatísticas e resistência de materiais foram alvo
dos estudos de WEIBULL (1939).
Em corpos envolvendo fissuras, a teoria da mecânica da fratura pode ser
aplicada com grande sucesso na representação da configuração da falha da estrutura e
também na previsão da vida útil estrutural. Por meio dessa teoria, verifica-se que a
magnitude da singularidade de tensão à frente da ponta da fissura, mensurada através do
fator de intensidade de tensão equivalente, pode ser utilizada para a previsão do
crescimento da fissura ao longo do tempo. Nesse contexto, PARIS & ERDOGAN
(1963) foram os primeiros a sugerir que o incremento no comprimento da fissura por

ciclo de carregamento, da , poderia ser relacionado à amplitude de variação do fator


dN
de intensidade de tensão, K .
Houve também o interesse no estudo de processos em que K poderia apresentar
valor variável durante a história do avanço da ponta da fissura. Nesse campo destaca-se
ELBER (1970), que mostrou que as faces da fissura, sob regime de fadiga, podem

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 132

fechar-se mesmo antes da retirada total do carregamento atuante, devido a presença de


uma região plástica próxima a ponta da fissura. Esse resultado implica que a taxa de
crescimento das fissuras pode não mais ser determinada pelo valor nominal de K , mas
sim por meio de um valor efetivo, o qual é avaliado segundo a rugosidade das faces das
fissuras presentes no corpo em análise.
A grande maioria dos trabalhos e pesquisas em fadiga reporta-se a materiais
metálicos. No entanto grande interesse também tem surgido no estudo de fadiga em
materiais não metálicos e compostos, os quais apresentam grande potencialidade de
aplicação nas áreas mecânica, térmica e ambiental. Nesse campo podem ser destacados
os trabalhos de ROEBBEN et. al (1996) e CARPINTERI et. al. (2006). Destacam-se
também os trabalhos de SURESH (2004) e SAXENA (1998), os quais apresentam
diversos resultados experimentais e várias leis de crescimento de fissuras em fadiga,
além de abordar diversos aspectos referentes à ciência dos materiais para a explicação
do fenômeno da fadiga.
Verifica-se que, assim como os demais tópicos da mecânica da fratura, existem
diversos desenvolvimentos que podem ainda surgir no campo da fadiga dos materiais
com o avanço das ferramentas numéricas e dos dispositivos mecânicos para análises
experimentais. Portanto, sugere-se ao leitor também consultar trabalhos recentes
relacionados à fadiga em bases internacionais como o Web of Science, objetivando
complementar o histórico apresentado neste item.

6.2 – A Fadiga

De todos os fenômenos que são tratados no domínio da mecânica da fratura, a


fadiga é reconhecidamente um dos mais importantes. A fadiga pode ocorrer mesmo em
componentes estruturais submetidos a solicitações bastante inferiores ao limite de
resistência do metal ou outros materiais, isto é, na região elástica. Isso é consequência
da aplicação de esforços alternados, que produzem fissuras, em geral na superfície,
devido à concentração de tensões.
Estima-se que mais de 80% das falhas frágeis em estruturas envolva, em alguma
parte deste processo, o crescimento estável de fissuras devido ao efeito da fadiga.
Embora nos dias atuais este fenômeno seja cada vez mais estudado e controlado, no
passado, as falhas por fadiga eram frequentes. Naquela época, o processo de produção

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 133

dos materiais não era tão bem controlado quanto hoje, o que permitia a construção de
manufaturas com descontinuidades internas iniciais de dimensões não desprezíveis.
Assim, essas descontinuidades (fissuras) cresciam ao longo do tempo, sob a ação de
carregamentos inferiores ao limite previsto em projeto, causando a falha da estrutura.
Outro fator de grande importância, que deve ser mencionado, no
desenvolvimento do campo da fadiga foi o surgimento e aplicação de soldas para a
concepção de estruturas formadas por diversos componentes como pontes e aviões.
Devido ao processo térmico necessário neste procedimento, existe a fragilização do
material próximo ao contorno da solda. Nessa região, a ação térmica induz a degradação
do material com o surgimento de fissuras, as quais crescem sob a ação dos
carregamentos gerando falha por fadiga. Diversas falhas no passado, principalmente em
estruturas offshore e pontes, são atribuídas à aplicação da solda.
As falhas decorrentes da fadiga são normalmente catastróficas. Isso se deve ao
fato das fissuras existentes no corpo crescerem sob a ação de carregamentos cíclicos
muito inferiores à capacidade portante da estrutura. Assim, não é observada a presença
de deformações permanentes ou mesmo de grandes deslocamentos nos elementos
estruturais, indicando uma possível falha. Em outras palavras, a estrutura não apresenta
um indício ou aviso claro de que está próxima à falha.
No domínio da fadiga, emprega-se o termo “vida útil” para referenciar o número
de ciclos de carregamento ao qual uma estrutura pode ser submetida antes da ocorrência
de sua falha ou ao número de ciclos para o qual a estrutura foi projetada à fadiga. Em
geral, a vida útil de uma estrutura pode ser divida de acordo com a evolução do
processo de degradação mecânica ao qual esta é sujeita, sob a ação dos carregamentos.
Existem diferentes níveis e intensidades de danos causados por fadiga em componentes
estruturais. Micro descontinuidades internas, inerentes à estrutura dos materiais, podem
crescer e nuclear uma fissura de maiores dimensões. Esta então propaga-se até a
ocorrência da falha. De uma maneira simples, a evolução da intensidade da degradação
mecânica sob o regime de fadiga pode ser classificada nos seguintes estágios.
1) Mudanças e rearranjos micro estruturais causados pelo carregamento geram
nucleações. Essas nucleações são o resultado da união das micro
descontinuidades internas.
2) Criação de fissuras microscópicas.
3) Crescimento e coalescência de microfissuras e formação de fissuras
dominantes que poderão, eventualmente, conduzir a falha.

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 134

4) Propagação estável das macrofissuras.


5) Instabilidade estrutural e fratura da estrutura.
A formação de fissuras corresponde ao período de nucleação, o qual depende de
vários fatores, tais como: carregamento, propriedades do material, acabamento da
superfície, dentre outros. O surgimento das fissuras no problema da fadiga deve-se ao
carregamento oscilatório aplicado a estrutura, o qual provoca no corpo uma acomodação
dos cristais de material que o compõem. Assim, sob a ação do carregamento, ocorre o
escorregamento das bandas de cristais que compõem o sólido, fazendo com que estas
organizem-se de tal maneira que suas descontinuidades internas aflorem na superfície
do corpo. O efeito da acomodação do material sob o efeito do carregamento é bem
conhecido dos engenheiros de estruturas no tratamento da deformação lenta do
concreto.
Após o surgimento das fissuras, estas crescem de maneira estável ao longo do
tempo. Essa etapa da vida útil da estrutura é conhecida como fase de propagação.
Enquanto a fase de nucleação é governada pelo escorregamento das bandas de cristais, e
consequentemente pelas tensões de cisalhamento nessa interface, na fase de propagação
as tensões normais apresentam maior importância, uma vez que serão estas que irão
fazer com que as faces da fissura se abram. A fase de propagação termina quando as
fissuras atingem um comprimento grande o bastante, denominado comprimento crítico,
onde o processo de fadiga dá lugar à propagação instável e consequentemente à fratura
do corpo.
A comunidade científica envolvida no estudo e compreensão dos fenômenos
relacionados à fadiga normalmente separam este problema em duas classes: Fadiga de
Baixo Ciclo e Fadiga de Alto Ciclo. Na primeira classe, enquadram-se os problemas
onde estão presentes altos níveis de tensão, frequentemente maiores que o limite
elástico do material, e pequena vida útil estrutural, em geral menos que 1000 ciclos de
carga. Embora tenha aplicação na indústria de conformação de metais, a fadiga de baixo
ciclo é pouco utilizada em projetos de engenharia pelo fato de, neste problema, a
estrutura estar submetida a um estado de tensão próximo à sua ruptura. A fadiga de
baixo ciclo é governada pela deformação total presente no corpo e não pela tensão.
Por outro lado, a fadiga de alto ciclo envolve carregamentos que induzem no
material tensões que estão consideravelmente abaixo de seu limite elástico.
Consequentemente, a estrutura apresenta uma vida útil longa, tendo inclusive a
possibilidade de ser infinita (se comparada à vida de um ser humano). Na fadiga de alto

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 135

ciclo, o processo de degradação mecânica devido aos carregamentos cíclicos pode ser
mensurado por meio da variação da amplitude das tensões aplicadas. Devido ao baixo
nível de tensão atuante para esta classe de fadiga, conclui-se que a zona plástica
existente na ponta da fissura será pequena. Consequentemente, os conceitos
apresentados pela mecânica da fratura elástico linear poderão ser aplicados. Assim, a
amplitude de variação das tensões pode ser traduzida pela amplitude de variação dos
fatores de intensidade de tensão. A fadiga de alto ciclo apresenta enorme aplicação no
campo da engenharia de estruturas e será, na sequência, discutida.

6.3 – Taxa de Crescimento das Fissuras em Fadiga

Quando uma fissura com comprimento inicial a0, propaga de um incremento


a , devido à ação de um número de ciclos de carregamento N , a taxa de propagação
da fissura pode ser caracterizada pela razão a N . Quando essa taxa é avaliada no
limite em que as variações tendem a zero, a taxa discreta passa a ser diferencial, ou seja,
esta razão torna-se da dN . A taxa de propagação da fissura por fadiga indica o quanto a
fissura cresce por ciclo de carregamento, sendo definida como a inclinação da curva que
relaciona o tamanho da fissura ao número de ciclos de carregamento conforme
apresenta a Fig. (6.1).
Comprimento da fissura, a

da
dN

Número de Ciclos, N
Figura 6.1 Variação do comprimento da fissura ao longo do número de ciclos

Ao se aplicar um carregamento cíclico de amplitude constante, é usual definir a


variação de tensões,  , e a razão de tensões, R, como:
   max   min (6.1)

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 136

 min
R (6.2)
 max
sendo  max a tensão máxima atuante durante um ciclo de carregamento e  min a tensão
mínima observada durante um ciclo de carregamento. No caso dos problemas
envolvendo descontinuidades discretas, como aqueles tratados pela mecânica da fratura,
a taxa de propagação de fissura por fadiga é controlada pela variação do fator de
intensidade de tensão, a qual é definida como:
K  K max  K min (6.3)

onde K max representa o valor máximo do fator de intensidade de tensão durante um

ciclo de carregamento e K min o valor mínimo do fator de intensidade de tensão durante

um ciclo de carregamento. A Fig. (6.2) ilustra a variação dos fatores de intensidade de


tensão durante os ciclos de carregamento constante.

Figura 6.2 Definição de K max , K min e K

Como a tensão e o fator de intensidade de tensão possuem uma relação direta,


pode-se reescrever a Eq. (6.2) em função de K max e K min da seguinte forma.

K min
R (6.4)
K max
A propagação da fissura por fadiga pode ser caracterizada por meio de uma
curva, em geral de forma sigmoidal quando desenhada em escala logarítmica, que
relaciona a taxa de propagação da fissura e a variação do fator de intensidade de tensão
atuante na estrutura. Essa curva clássica é apresentada na Fig. (6.3), a qual pode ser
dividida em três regiões distintas: iniciação, propagação estável e propagação instável.
Em níveis baixos de variação dos fatores de intensidade de tensão, região I, a fissura
propaga rapidamente. Isso ocorre pelo fato das fissuras, nessa fase, apresentarem
pequeno comprimento e, além disso, estarem mergulhadas em uma região

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 137

mecanicamente degradada pelo processo de fabricação do material. Devido ao rápido


crescimento das fissuras nesta região, sua contribuição para a vida útil estrutural é
normalmente desprezada. Nesta região, pode-se definir um valor específico da variação
dos fatores de intensidade de tensão como limiar de propagação, K th . Esse valor pode

ser interpretado como sendo o valor da variação do fator de intensidade de tensão


abaixo do qual não ocorre propagação da fissura ou a taxa de propagação da fissura é
tão pequena que possa ser desprezada. Normalmente, seu valor é definido como a
variação do fator de intensidade de tensão que provoca um crescimento da fissura
menor ou igual a 1010 m ciclo .

Figura 6.3 Curva da taxa de crescimento das fissuras da/dN .

Segundo BARSOM (1987), K th assume os seguintes valores:

K th  6, 4 1  0,85R  MPa R  0,1


m
K th  7, 04 1  0,85R  Ksi R  0,1
in
(6.5)
K th  5,5 Ksi R  0,1
in
K th  6, 0 MPa R  0,1
m
Na região II, crescimento estável, a curva sigmoidal é praticamente linear e a
fissura propaga de maneira estável. Em geral, a maior parcela do número de ciclos de
propagação da fissura durante a vida útil da estrutura está associada a essa região da
curva. Em outras palavras, é nessa região que a estrutura passa a maior parte de sua vida
útil. É na região II que estão baseados a grande maioria dos modelos de análises e

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 138

previsão da vida útil estrutural. Finalmente, na região III, as taxas de propagação de


fissura são extremamente altas e K max tende a um valor próximo a K Ic , denominado de
tenacidade à fratura, que corresponde ao valor do fator de intensidade de tensão no qual
ocorre fratura, ou seja, propagação instável da fissura. Em muitas situações, quando a
estrutura alcança a região III, o problema deixa de ser de fadiga e passa a ser de fratura.
Portanto, o tempo necessário para o crescimento da fissura nessa região é normalmente
desprezado para a avaliação da vida útil da estrutura, já que a fissura cresce muito
rapidamente nessa região.

6.4 – Taxa de Crescimento das Fissuras em Fadiga

Um grande número de critérios para a previsão da propagação de fissuras sob o


regime de fadiga tem sido proposto na literatura. Esses critérios preveem expressões,
principalmente baseadas em dados experimentais, relacionando a taxa de crescimento
da fissura por ciclo, da dN , com variáveis do problema tais como carregamento,
comprimento da fissura, geometria e propriedades do material. Essas leis, que são
baseadas nos princípios da mecânica da fratura, são utilizadas para a modelagem do
crescimento de fissuras em regime de fadiga de alto ciclo, uma vez que nesse tipo de
fadiga as tensões induzidas pelos carregamentos atuantes são pequenas se comparadas
ao limite elástico do material. Assim, a zona inelástica localizada à frente da ponta da
fissura possui pequenas dimensões, podendo ser desprezada. Consequentemente a
mecânica da fratura elástico linear pode ser aplicada.
Ao contrário das relações apresentadas nos capítulos anteriores, as quais eram
baseadas em princípios consistentes da elasticidade e da termodinâmica, o
equacionamento correntemente utilizado para a modelagem da propagação da fissura
em regime de fadiga é obtido com base em observações experimentais do
comportamento mecânico dos materiais e das estruturas. Consequentemente, estão
sujeitos às incertezas relacionadas aos métodos de ensaio e observação. No entanto,
essas relações exprimem, mesmo que com certa imprecisão, o comportamento do
material nesse domínio. Portanto, essas relações são melhores do que nada.
Um critério largamente utilizado é o apresentado em PARIS et. al (1961) e
PARIS & ERDOGAN (1963). Esse critério descreve coerentemente apenas a
propagação das fissuras na região II e é usualmente referenciado na literatura como “Lei

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 139

de Paris”. A relação entre a taxa de crescimento da fissura e a variação dos fatores de


intensidade de tensão para essa lei é dada por:
da
 C K n (6.6)
dN
em que C e n são constantes do material e representam os coeficientes linear e angular
do trecho reto da curva da Fig. (6.3), respectivamente. Observa-se, com base nos
diversos ensaios experimentais, que o valor de n encontra-se no intervalo 2  n  4 .
Apesar de ser um critério muito utilizado, a “Lei de Paris” não é adequada para a
representação do processo de crescimento de fissuras quando as variações do fator de
intensidade de tensão, K , são muito elevadas, região III, ou muito baixas, região I.
Nesses casos, essa lei superestima a vida útil da estrutura. Além disso, essa lei não leva
em conta a influência do fator R. Como mostrado na Fig. (6.3), a qual é baseada em
dados experimentais, a taxa de carga/descarga tem influência direta na taxa de
crescimento da fissura. Para que esse critério seja utilizado e conduza a bons resultados,
os parâmetros C e n devem calibrados convenientemente, por meio de processos de
regressão, para levar em consideração a influência de R e de outros parâmetros que não
estão representados na Eq.(6.6).
FORMAN et al. (1967) propuseram outro critério para o crescimento da fissura
em regime de fadiga, o qual é derivado da lei de Paris. Nesse critério, os pesquisadores
incluíram uma singularidade para a representação da taxa de crescimento da fissura na
região III. O critério de Forman é representado na Eq.(6.7).

C  K 
n
da
 (6.7)
dN 1  R  K Ic  K
Nota-se que o critério de FORMAN et al. (1967) é uma modificação da “lei de
Paris” pela introdução do termo 1  R  K c  K no denominador. Verifica-se que quão
maior for a variação entre os fatores de intensidade de tensão no ciclo de carga, menor
será o denominador da Eq. (6.7) e assim maior será a taxa de crescimento da fissura.
Para o caso limite em que K max é igual a K c , tenacidade do material, o denominador é
igual a zero e observa-se um valor singular nessa equação. Nessa situação, a propagação
da fissura não ocorre devido à fadiga, mas sim pela violação do fator de intensidade de
tensão crítico do material em análise, ou seja, ocorre a fratura. Este critério é muito
popular sendo utilizado em diversos programas comerciais de análise de estruturas.

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 140

Embora menos utilizadas, existem outras leis disponíveis na literatura para a


modelagem do crescimento de fissuras em fadiga. Destacam-se duas outras leis, as quais
são devidas a DONAHUE et al.(1972) e ERDOGAN & RATWANI (1970). A primeira
delas visa à incorporação dos efeitos da região I na vida útil da estrutura. Este critério,
de DONAHUE et al.(1972), é baseado na seguinte relação:
da m
 K c  K  1  R  K th 

(6.8)
dN  
sendo m e  parâmetros característicos do material.
Há ainda um critério para propagação de fissuras em regime de fadiga proposto
por ERDOGAN & RATWANI (1970). Este critério visa representar todas as regiões da
fadiga, sendo representado pela relação:

da C 1     K  K th 
m n

 (6.9)
dN K c  1    K
onde C , n e m são parâmetros do material, da geometria e das condições de
K max  K min
carregamento, respectivamente.  é dado pela seguinte relação,   .
K max  K min
A propagação das fissuras em regime de fadiga é extremamente dependente das
condições de agressividade do ambiente no qual a estrutura está inserida. Assim,
fenômenos como corrosão, umidade, entre outros, devem ser considerados na avaliação
da vida útil da estrutura. Nessa situação, as leis apresentadas acima podem ser ainda
utilizadas. Porém, parâmetros efetivos, que levem em consideração o efeito do meio
ambiente, devem ser obtidos segundo a lei escolhida para a representação da fadiga.
Apenas, como exemplo, se a lei de Paris for escolhida, os parâmetros C e n devem
apresentar uma lei de variação no tempo para considerar a aceleração (ou desaceleração)
imposta pelas condições ambientais.

6.5 – Filosofias de Projeto Considerando Fadiga

A partir dos anos 50, a ocorrência de vários acidentes, com causas associadas à
fadiga, revelou que um critério de projeto consistindo apenas de análises estáticas, sem
a consideração de efeitos dependentes do tempo, não era suficiente para garantir a
integridade mecânica de alguns tipos de estruturas. Assim, metodologias de projeto

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 141

incluindo os efeitos da fadiga foram então desenvolvidas. Essas metodologias podem


ser agrupadas em três grandes conjuntos:
1) Safe life: abordagem focada na iniciação de fissuras.
2) Fail safe: filosofia de projeto baseada em estruturas redundantes.
3) Retirement for cause: projeto baseado na análise da tolerância ao dano.
Essas abordagens são aplicadas principalmente nas indústrias aeronáuticas,
automobilística e naval, as quais apresentam estruturas que são mais susceptíveis aos
efeitos de fadiga.

6.5.1 – Safe Life

Na abordagem safe life de projetos à fadiga, a estrutura é analisada, ou testada


em laboratório, nas condições de carregamento típicas a que estará sujeita em serviço,
Como resultado dessa análise, uma vida útil, correspondendo a um número de ciclos de
carregamento, é estimada para a estrutura. A vida útil é determinada tão logo uma
fissura de comprimento detectável seja encontrada na estrutura.
Geralmente, nessa previsão de vida útil é aplicado um fator de segurança para
levar em conta as incertezas envolvidas no processo, tais como: mudanças inesperadas
de condições de carregamento, erros na estimativa do carregamento, dispersão dos
resultados experimentais, possível variação das propriedades dos materiais, dentre
outros. A previsão da vida útil de uma estrutura projetada com esta filosofia é feita por
meio dos métodos de iniciação de fissuras.
Ao final da vida útil estimada, a estrutura é retirada de serviço, mesmo que
nenhuma fissura ou falha tenha sido detectada durante o tempo de serviço e mesmo que
a estrutura ainda tenha considerável vida residual. Nessa metodologia, impõe-se um
limite inferior para a vida útil da estrutura, já que o período de propagação é ignorado.
Escolhendo-se uma margem de segurança alta, espera-se obter uma previsão de
vida que garanta a integridade estrutural, mesmo que essa abordagem conservativa leve
a perdas de desempenho e aumento de custo. Entretanto, podem ocorrer falhas em
decorrência da propagação de fissuras na estrutura, fato esse que não é considerado
nessa filosofia de análise, durante o tempo de serviço. Assim, nessa abordagem o foco
da análise de fadiga é a prevenção da iniciação de trincas por fadiga. Materiais
compósitos, frequentemente utilizados na indústria aeronáutica para a composição de
elementos estruturais de grande responsabilidade, são projetados segundo esta filosofia.

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 142

6.5.2 – Fail Safe

O objetivo da filosofia fail safe é projetar estruturas redundantes de tal forma


que se um elemento estrutural falhar devido aos efeitos de fadiga, os elementos
estruturais remanescentes possuirão capacidade mecânica suficiente para suportar
cargas adicionais oriundas do elemento danificado, até que a falha seja detectada por
meio de inspeções periódicas de manutenção. Essa filosofia de projeto é largamente
empregada em usinas nucleares uma vez que a falha nessas estruturas pode ocasionar o
vazamento de material radioativo.

6.5.3 – Retirement for Cause: Tolerância ao Dano

A abordagem de um projeto de estruturas considerando os efeitos da fadiga com


tolerância ao dano apresenta vantagens econômicas e também de segurança em relação
às duas metodologias citadas anteriormente. O projeto de estruturas utilizando o
conceito de tolerância ao dano é baseado no princípio de que a estrutura deve ser capaz
de suportar carregamentos usuais de dimensionamento até a detecção e reparo de
componentes com fissuras originadas por fadiga ou por danos acidentais ocorridos em
serviço. Assim, o objetivo principal desta filosofia é detectar fissuras nos elementos
estruturais principais antes que a propagação da fissura leve ao colapso desse elemento
estrutural e, consequentemente, da estrutura. Um elemento estrutural principal é aquele
cuja falha pode resultar na perda da estrutura. Em geral são realizadas análises de:
1) resistência residual para verificar a integridade estrutural, ou seja, a
capacidade da estrutura suportar cargas quando um ou mais componentes
estruturais estão parcialmente degradados mecanicamente.
2) propagação da fissura visando obter o número de ciclos que leva à falha do
elemento estrutural.
O comprimento estável máximo da fissura, para um nível específico de
carregamento, é o objetivo principal da análise de resistência residual. A interação entre
elementos estruturais intactos ou com fissuras gera redistribuição de tensões e, em geral,
a falha da estrutura pode ocorrer por escoamento da seção remanescente do componente
estrutural ou por ter sido alcançado o comprimento crítico da fissura, o qual leva à
propagação instável da fissura.

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 143

Entretanto, a informação sobre o comprimento crítico da fissura tem pouca


importância caso não se consiga prever com quantos ciclos, ou mesmo em quanto
tempo, a fissura atinja essa dimensão. Logo, o segundo objetivo da análise de tolerância
ao dano é a determinação da curva de propagação da fissura na estrutura, como
mostrado na Fig. (6.4). Geralmente, sob a ação do carregamento de serviço a fissura
propaga por fadiga a uma taxa de propagação cada vez maior.
A partir de um comprimento inicial a0, a fissura propaga até af. Baseado na curva
de propagação, Fig (6.4), obtém-se o número de ciclos Nf de operação segura da
estrutura, ou seja, o Nf que conduz ao comprimento crítico. Sendo a0 o comprimento de
um defeito inicial, então a estrutura deve ser reparada ou substituída quando esta atingir
o número de ciclos NF. Em geral, a0 é baseado no tamanho mínimo de fissura que pode
ser detectado em um ensaio não destrutivo. Como não se pode permitir que a fissura
atinja o comprimento crítico, esta deve ser detectada antes que a estrutura seja
submetida ao número de ciclos NF. Como a fissura não pode ser detectada para
comprimentos inferiores a a0, as inspeções devem ocorrer entre N0 e NF.
Com a abordagem de tolerância ao dano para projeto à fadiga, é indispensável a
realização de inspeções periódicas na estrutura para detecção de fissuras, ou até mesmo
acompanhar a taxa de propagação da fissura a fim de possibilitar a avaliação da
necessidade de reparos ou substituição de componentes. Entre os métodos mais
empregados para inspeção podem ser citados o visual, com líquido penetrante, ultra som
e o raio X.
Comprimento da fissura, a

Vida total de propagação

af

Intervalo de Inspeção

aO

NO Nf
Número de Ciclos, N
Figura 6.4 Curva típica de propagação de fissuras em função do número de ciclos de carga atuante.

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 144

A previsão do número de ciclos decorridos na propagação da fissura envolve a


utilização de curvas empíricas da taxa de propagação da fissura e de conceitos da
mecânica da fratura elástico linear. Para analisar a propagação da fissura é necessária a
determinação do comprimento inicial da fissura, o carregamento aplicado, as
propriedades de fratura e a curva de propagação do material.
Ao contrário da filosofia safe life, em que componentes estruturais são
substituídos se estiverem ou não danificados após certo período de serviço, na
abordagem de tolerância ao dano, os componentes são substituídos somente se uma
fissura com comprimento crítico é encontrada durante uma inspeção.
Portanto, a análise de tolerância ao dano consiste basicamente de três partes:
1) Determinação da curva de resistência residual para a obtenção do tamanho
crítico da fissura.
2) Determinação do número de ciclos necessários para a fissura atingir o
comprimento crítico
3) Especificação do intervalo de inspeção.

6.6 – Crack Closure Effect

A introdução do conceito de “crack closure” ocorreu no trabalho de ELBER


(1970). Nesse trabalho, o autor demonstrou sua grande capacidade na compreensão do
processo de crescimento de fissuras em carregamentos cíclicos explicando um efeito até
então ainda não bem entendido. Suas observações podem ser apresentadas com o
auxílio da Fig. (6.5). Esta figura mostra um padrão de abertura e fechamento de uma
fissura durante um ciclo de carregamento e descarregamento. Nesse ciclo, o fator de
intensidade de tensão varia de zero a um valor máximo maior que zero.

Figura 6.5 Análise do efeito de crack closure. SURESH (2004).

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 145

Com base na intuição de engenheiro, é natural aceitar que quando a estrutura


está descarregada as faces da fissura estarão fechadas. Quando atua em uma estrutura
um dado carregamento, as fissuras abrem-se e depois da retirada do carregamento as
faces da fissura voltam a sua posição inicial, ou seja, fecham-se. Essa ideia é intuitiva,
uma vez que na fadiga os carregamentos atuantes são baixos, levando o analista a
pensar de forma elástica sobre o comportamento estrutural. Porém, quando analisa-se a
fadiga de baixo ciclo por meio da metodologia apresentada anteriormente, a qual é
aplicável à fadiga de alto ciclo, deve-se levar em consideração os efeitos inelásticos
existentes na zona de processo.
Na fadiga de baixo ciclo, durante o processo de carga e descarga ocorre, na
frente da ponta da fissura, a degradação não desprezível da rigidez do material. Devido
a esse comportamento as faces da fissura podem fechar-se antes mesmo da retirada total
do carregamento. Durante o restante da fase de descarregamento as faces da fissura
fecham-se, mas na ponta da fissura a solicitação de fadiga não mais ocorre. De forma
similar, quando ocorre o recarregamento, apenas uma parte da amplitude total do fator
de intensidade de tensão influenciará nos deslocamentos de abertura das faces da
fissura. A amplitude do fator de intensidade de tensão que governa o crescimento das
fissuras é apresentada pelos trechos AB e DA na Fig. (6.5) e não pelo trecho AC. Deve-
se destacar que esse efeito é importante em materiais que apresentam comportamento
elastoplástico e a amplitude dos carregamentos aplicados que induzem tensões na
estrutura próximas à tensão de escoamento do material. Em materiais de comportamento
frágil e para carregamentos de baixa amplitude esse efeito pode ser desprezado.
ELBER (1970) expressou matematicamente esse efeito por meio de uma
variação efetiva no valor do fator de intensidade de tensão. Dessa forma, nas Eq. (6.6),
Eq. (6.7), Eq. (6.8) e Eq. (6.9) o termo K deve ser substituído por outro
denominado K eff que mensurará a variação efetiva do fator de intensidade de tensão

que provoca solicitação na ponta da fissura. Na Fig. (6.6) estão apresentados os


resultados de ELBER (1970) para K eff em dois carregamentos distintos. Verifica-se que

para um carregamento com R igual a zero, K eff é igual a 50% da amplitude total. Já

para um carregamento onde R é igual a 0,5 constata-se que K eff é aproximadamente

igual a 70% da amplitude de variação do fator de intensidade de tensão.

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 146

Figura 6.6 Comportamento de K eff em dois carregamentos distintos SURESH (2004).

6.7 – Avaliação da Vida Útil Estrutural

Considerando que K aumenta com o comprimento da fissura, durante


carregamentos com amplitude constante, e considerando que da dN depende de K ,
pode-se concluir que a taxa de crescimento não será constante, mas aumenta com o
comprimento da fissura. Este comportamento da taxa da dN obriga o uso de
procedimentos numéricos para a integração das Eq. (6.6), Eq. (6.7), Eq. (6.8) e Eq.
(6.9), entre outras, de forma a se estimar a vida útil e o crescimento da fissura.
A taxa de crescimento da fissura da dN é dada como função de diversos fatores
podendo ser escrita de forma geral como:
da
 f  K , K th , R, K Ic  (6.10)
dN
O número de ciclos para o crescimento da fissura pode ser calculado resolvendo
esta equação para dN . Integrando ambos os membros da Eq. (6.10) tem-se:
Nf af
da
 dN  N
Ni
f  N i  N if   f  K , K
ai th , R, K Ic 
(6.11)

Esta integral fornece o número de ciclos necessários para a fissura crescer de um


comprimento inicial ai , correspondente a N i , até um comprimento final a f ,

correspondente a N f . A variação do número de ciclos é dada por N if . Esta integral

pode ser avaliada analiticamente ou numericamente, desde que a amplitude de variação


do fator de intensidade de tensões seja conhecida.
Assim, o procedimento para a análise do comportamento do crescimento das
fissuras submetidas à fadiga pode ser sistematizado como:

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 147

1) Através de uma adequada inspeção no elemento estrutural com fissuras,


determinar o comprimento inicial, a0 , da fissura presente, e estimar o
número de ciclos necessário para iniciá-la.
2) Escolher o modelo empírico conveniente para a determinação da estimativa
da vida à fadiga. Sugere-se que o modelo de Paris seja adotado, por ser
simples e conduzir a resultados precisos.
3) Assumir um incremento a para o crescimento de cada fissura em cada
passo.
4) Determinar a amplitude de variação dos fatores de intensidade de tensão.
Pode-se utilizar a integral J ou a técnica de correlação de deslocamentos para
tal finalidade.
5) Escolher uma teoria de interação de modos de fraturamento para a
determinação da direção de propagação das fissuras em cada passo e do fator
de intensidade de tensão equivalente.
6) Integrar a lei de Paris para determinar o número de ciclos necessário para
cada fissura atingir um comprimento crítico.
O número de ciclos total, NTotal , é dado pela soma do número de ciclos

estimados para a nucleação da fissura, N Inicial , e o número de ciclos da propagação da

fissura, N Propagação . Assim:

NTotal  N Inicial  N Propagação (6.12)

Vale ressaltar que o procedimento descrito acima é baseado em uma propagação


fundamentalmente de modo I. Isso porque os modelos empíricos descritos na literatura
estão baseados apenas nesse modo de abertura. No entanto, pode-se estender a análise
quando modos mistos de propagação estão presentes. Isso só tem validade porque é
permitido que as fissuras propaguem-se mudando de direção. Como consequência da
mudança de orientação das fissuras, a ordem de grandeza do fator de intensidade de
tensão para modo II será bem menor do que para o modo I, isto é, quando é permitido
que as fissuras mudem de direção, o seu comportamento pode ser considerado como
fundamentalmente de modo I, o que justifica o uso desses modelos empíricos.
A transição das regiões II e III pode ser considerada por meio de duas simples
verificações. Primeiro, deve-se considerar o fato de K MAX ser maior que K Ic . Caso essa
situação ocorra, a análise é interrompida, pois o problema passa a ser de fratura e não

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 148

mais de fadiga. Além disso, deve-se verificar também se a taxa de crescimento das
fissuras por ciclo, da dN , é maior que 0,1 mm ciclo (esse valor é recomendado em
PIMENTA et. al. (2001)). Em caso afirmativo a análise também é interrompida, pois,
assim no caso anterior, o problema passa a ser de fratura e não mais de fadiga.
Por fim, ainda deve-se verificar a amplitude de variação do fator de intensidade
de tensão, K . Caso essa grandeza seja inferior a Kth deve-se considerar que o
carregamento aplicado não provoca o crescimento das fissuras.

6.6 – Consideração de Incertezas na Detecção de Fissuras

Por meio de inspeções periódicas não destrutivas, procedimentos de manutenção e


reparação estruturais conduzem ao bom funcionamento da estrutura, permitindo que esta
desempenhe suas funções com um nível de segurança desejado. Porém, na prática as
inspeções estão sujeitas a incertezas. Métodos de inspeção e detecção de fissuras podem ser
caracterizados por uma curva denominada “Probability of Detection” ou simplesmente
curva POD. Esta curva descreve a probabilidade de detecção de uma descontinuidade
(fissura) em função do tamanho do mesmo, POD  a  . Além disso, ela reflete o fato que,

quão maior o tamanho da fissura, maior a probabilidade de detecção. Um tipo de curva


POD bastante comum é a exponencial, a qual pode ser matematicamente expressa como:

POD  a   1  e
 q pod a
(6.13)

sendo o comprimento da fissura dado em mm. O parâmetro q pod assume valores maiores

que zero e caracteriza a qualidade do método de inspeção escolhido. Esta expressão pode
ser interpretada como a distribuição exponencial de probabilidades para o tamanho

detectável, e 1 pode ser interpretado como o tamanho médio da fissura detectável.


q pod

Portanto, quanto maior o valor de q pod , menor o tamanho médio detectável da fissura, e

maior a qualidade do método de inspeção representado.


Outro modelo para a curva POD é o chamado “Log-Odds-Log scale model”, o qual
é definido por:
 pod
 pod a
POD  a    pod
(6.14)
1   pod a

onde os parâmetros  pod e  pod caracterizam a técnica de inspeção e o comprimento da


fissura dado em mm. Na ausência de dados, as variáveis  pod e  pod assumem os valores

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 149

  pod   pod
 pod  0,3 mm e  pod  3, 0 ;  pod  0, 085 mm e  pod  3, 0 ;
  pod
 pod  0, 035 mm e  pod  3, 0 ; considerando que os procedimentos de inspeção são
mais eficientes à medida que  pod aumenta.
Para uma dada técnica de inspeção, descrita por sua curva POD, os dois possíveis
resultados de uma inspeção são: não detecção de um defeito, que pode existir; e detecção de
um defeito e medição do seu tamanho. Entretanto, as medições obtidas podem também
apresentar incertezas, fazendo com que o tamanho do defeito após medição seja descrito por
uma distribuição de probabilidades ao invés de se tratar de um valor determinístico.

6.7 – Rainflow Counting Method

O fenômeno da fadiga ocorre em estruturas submetidas a carregamentos cíclicos.


Previamente neste capítulo foi discutida a dependência entre a taxa de crescimento das
fissuras por ciclo de carregamento e a variação do fator de intensidade de tensão
assumindo-se a atuação de um carregamento constante e uniforme ao longo do tempo.
Porém, pode-se perguntar o que ocorre quando o carregamento aplicado não apresenta
esse comportamento, ou seja, não é constante e uniforme ao longo do tempo? Nessa
situação, a vida útil pode ser estimada empregando-se o Rainflow Counting Method
(RCM), o qual é uma metodologia de transformação de séries de carregamentos
irregulares em regulares e de reconstrução de resíduos em séries de maiores de
carregamentos.
A fadiga com amplitude de carregamento constante ocorre, geralmente, em
peças de máquinas rotativas, tais como eixos e engrenagens. Entretanto, outros tipos de
estruturas como navios, aeronaves e pontes estão sempre submetidos a carregamentos
variáveis tanto em amplitude, quanto em frequência. A análise da fadiga em materiais
submetidos a esses tipos de carregamento torna-se complexa e os estudos são
geralmente realizados simplificando-se a solicitação real, para que este passe a ser
representada por várias combinações de carregamentos constantes.
Os carregamentos que delimitam um ciclo fechado (carga e descarga) são
cíclicos inelásticos, o seu formato é denominado “loop” de histerese, como mostra a
Fig. (6.7). A largura total desse loop é dada por uma variação da deformação,  , e a
sua altura é dada por uma variação de tensão,  . Verifica-se então a existência de
deformações elásticas e inelásticas, onde a soma dessas duas parcelas equivale ao valor
de deformação total. Um ciclo fechado é definido por pontos mais altos ou mais baixos,

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 150

isto é, pelo par de máximos e mínimos locais em uma função de tensão. Se um material
for deformado ciclicamente entre dois limites ocorrem alguns fenômenos que podem
variar de acordo com a natureza do material:
 Endurecimento cíclico;
 Amaciamento cíclico;
 Permanecer estável;
 Amolecimento;
 Endurecimento.

Figura 6.7 Loop de histerese.

Existe ainda um agravante nos carregamentos de amplitudes variáveis, pois os


mesmos podem apresentar irregularidades nos ciclos. Nesses casos, a contagem do
número de ciclos para cada nível de tensão deve ser realizada pelo RCM.
O RCM é literalmente traduzido como “fluxo de chuva”, por esse motivo é
também conhecido como Método de Contagem de Ciclo Fluxo de Chuva. Este método
tem sido largamente empregado em análises de fadiga, já que por meio de sua
metodologia é possível efetuar a contagem do número de ciclos, ou meios ciclos, de
acordo com a resposta de tensão-deformação do material. Os ciclos registrados que não
fecham um ciclo de histerese são denominados loops virtuais de histerese. Porém, estes
podem ser fechados de acordo com a sequência dos carregamentos aplicados.
A contagem dos ciclos, em uma sequência de deformações ao longo do tempo,
inicia-se com a propagação virtual de “quedas/fluxos de chuva” em cada um dos picos
(máximos) e vales (mínimos). A metodologia consiste em associar o comportamento
destes mínimos e máximos com o escoamento de gotas de chuva, de forma similar ao
observado no escoamento das águas de um telhado.

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 151

Permite-se que o fluxo escoe no “telhado” e caia na próxima inclinação, com a


exceção de que haja um vale oposto mais negativo do que o inicial, situação em que este
é interrompido. A contagem do meio ciclo é efetuada considerando-se que as
terminações de fluxo ocorram quando uma gota alcança o final do histórico de tensões
sem ser interrompido por nenhum outro pico, ou quando o fluxo se funde com outro
fluxo oriundo de um pico mais à frente ou quando o fluxo flui no sentido oposto de um
pico de maior valor.
Considerando a ilustração apresentada na Fig. (6.8), o escoamento se inicia no
vale n° 1 e termina no vale oposto n° 9, pois este é mais negativo que o vale n° 1. Assim
um meio ciclo é contado entre o vale n° 1 e o pico n° 8. Analogamente, se o fluxo se
iniciar em um pico, ele deve ser terminado quando houver um pico oposto mais positivo
do que o pico inicial. O fluxo que se inicia no pico n° 2 termina no pico n° 4 oposto.
Dessa maneira, define-se meio ciclo entre o pico n° 2 e o vale n° 3.
O fluxo também deve ser interrompido se existir outro fluxo proveniente de um
ponto anterior. Como o fluxo iniciado no pico n° 2 e finalizado antes do pico n° 3. Com
todos os fluxos finalizados, devem-se combinar os eventos para a formação dos ciclos
completos.

Figura 6.8 Semelhança entre variação da tensão nos ciclos de carga e escoamento de água em telhado.

Assumindo a hipótese de que uma estrutura esteja submetida a um carregamento


que cause o perfil de deformação ao longo do tempo apresentado na Fig. (6.9), observa-
se que no gráfico tensão x deformação mostrado na Fig. (6.10), o ponto A é o que
apresenta maior magnitude para a série representada. Todos os carregamentos seguintes

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 152

ao ponto A, percorrem a curva de histerese. Assim o primeiro passo é partir do ponto A


para o ponto B. Após o ponto B, a deformação é reduzida até o ponto C, seguindo a
trajetória do loop de histerese. Acontece então um recarregamento onde o valor de B é
atingido novamente antes de alcançar o valor do ponto D. Após o ponto B ser atingido,
a trajetória é retomada seguindo o percurso A-B. O trecho C-D foi um ciclo realizado no
meio processo, os valores nesse ciclo podem ser descartados, como se o intervalo C-D
não existisse. Essa fase é conhecida como memória do material, pois o material
“relembra” o seu estado de deformação anterior. O intervalo E-G também passa por esse
processo.

Figura 6.9 Perfil da variação da deformação ao longo dos ciclos de carga e descarga.

Figura 6.10 Variação das deformações e tensões ao longo do perfil de solicitação mostrado na Fig. (6.9).

Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________


SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 153

Segundo AMZALLAG e GEREY (1994), os loops de histereses podem ser


analisados através do princípio dos ciclos de extração. A Fig. (6.11) exemplifica uma
aplicação do princípio.

Figura 6.11 Princípio do ciclo de extração

Na Fig. (6.11), S representa a tensão e o ciclo aparece com um loop em tensão x


deformação. Esta figura mostra as duas possibilidades da existência do ciclo. Três séries
consecutivas são determinadas: ∆S1=│S2 - S1│, ∆S2=│S3 – S2│e ∆S3=│S4 – S3│. Se
∆S2 ≤ ∆S1 e ∆S2 ≤ ∆S3 então:
 O ciclo representado pelos extremos S2 e S3 é extraído;
 Os pontos S2 e S3 são descartados;
 Os pontos restantes são conectados aos outros.
Essa sequência é repetida até se chegar ao último ponto da série. Os pontos
restantes são chamados de resíduo, os quais podem ser armazenados e servem para o
cálculo do número de ciclos. O resíduo é tratado de duas maneiras. Na primeira, o
mesmo é decomposto em ciclos para determinação da vida útil de estruturas em regime
de fadiga. Na segunda este é armazenado para a reconstrução da sequência.
De forma mais ampla, a decomposição do resíduo em ciclos adota, no final
processo, (eliminação dos loops de histereses) a soma com ele mesmo, isto é [resíduo] +
[resíduo] = [resíduo] + {ciclos}
No entanto, atenção especial deve ser dada no momento de se unir as séries de
resíduos, dependendo os valores iniciais e finais apresentados. A tabela 6.1 contém os
Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 154

dados de um exemplo para a soma do resíduo, e as Fig. (6.12), Fig. (6.13) e Fig. (6.14)
apresentam a série inicial, o resíduo e a soma do resíduo, respectivamente.
Tabela 6.1 Sequencia da aplicação

Figura 6.12 Série original Figura 6.13 Resíduo final

Figura 6.14 Duplicação do resíduo

Na reconstrução de sequências de carregamentos, o resíduo é armazenado. A


reconstrução é baseada no principio que uma nova sequência deve apresentar os
mesmos resultados da sequência anterior. Dois carregamentos podem ser considerados
equivalentes, em termos de igualdade dos fluxos de decomposição, mesmo se seus
respectivos picos não acontecerem na mesma ordem. O mais interessante da
reconstrução da sequência é fornecer o carregamento no qual alguns ciclos podem ser
omitidos ou truncados. O procedimento de reconstrução é exatamente o oposto do ciclo
de extração. O ciclo é inserido em uma sequência onde existam pontos que na utilização
de outro método para contagem gerem os mesmos resultados. Em outras palavras, ciclo
Capítulo 6 – Fadiga dos Materiais_____________________________________________
SET 5926 - Introdução à Mecânica da Fratura 155

é inserido em pontos específicos presentes no resíduo. A Fig. (6.15) mostra uma


possível reconstituição de carregamentos.

Figura 6.15 Exemplo de reconstrução de série de carregamentos

Quando ciclos são introduzidos em uma reconstrução, novas possibilidades


podem aparecer para a inserção de novos ciclos e carregamentos, entretanto, outras
possibilidades podem desaparecer. É importante lembrar que existem regras específicas
para a inserção de ciclos em séries, porém, aqui não serão abordadas, pois não se trata
do objetivo geral de discussão do RCM.

6.8 – Referências Complementares

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