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A B C da Carestia

Autor RODOLFO COELHO CAVALCANTE


Março de 1947 - Salvador Bahia
ABC da Carestia
Rodolfo Coelho Cavalcante
U A
Um povo que vive como Açucar três cruzeiros
Um rebanho desgarrado O kilo, sem se falar
É este do nosso século No peso que eles nos vendem
Senhor de ti afastado
Espalhado por toda terra Quem quiser vá reclamar
Guerras, rumores de guerra Arroz é quatro cruzeiros
Está tudo consumado! Coitado dos brasileiros
Do câmbio negro sem par!
V
Valha-nos Senhor! Da fome!
Do homem sem coração! B
Da vida pecaminosa! Bacalhau não tem tabela
Do ardil do Tubarão! Vende lá como quiser
Do Câmbio Negro da vida! De dezoite a vinte e cinco
Só tua luz é guarida,
Da nossa tribulação! Come ele quem poder
O pobre vive chorando
X O rico sempre zombando
Xarque desapareceu Isto mesmo é que ele quer!
Para o pobre meu leitor.
Y C
Yayá pegue o rozário Carne de boi e toucinho
Peça virgem por favor E mais outros mantimentos
Nos livre da fome e da peste. O rico só quer a carne
Paga até dez e quinhentos
Z O pobre cheio de remorsos
Zefiro brando e celeste
Acenda a chama do amor. O jeito é comer os ossos
Pagando, seis e duzentos!

FIM 3
D S
Diária de qualquer hotel Senhor! Senhor! Apelo
É vinte, trinta em diante Teu amor infinito
Seja ele um pobrezinho Abençoe todo pobre
Que cave a vida ambulante Que vive coitado, aflito
Ou seja um capitalista “Oprimidos e cansados”
A tabela está na vista Milhares de flagelados
Não quiser vá adiante! Sem Moisés por este “Egito”!

E T
Elevadores e bondes Tú que destes a Moisés
Da rainha Circular A mais santa região
Passa-se mais de uma hora Destes a Davi a coragem
Para um veículo pegar Destes a força a Sansão
E assim o brasileiro A vergindade a Maria
Se sujeita ao estrangeiro Dai aos pobres da Bahia
Sem direito à reclamar! TETO, ALIMENTAÇÃO!

F T
O Feijão é seis cruzeiros Tú que destes a Salomão
Em qualquer mercearia Riqueza e inteligência
Farinha de dois cruzeiros Daniel, fidelidade
Mais aumenta dia à dia A Jesus, onipotência
Da forma que a coisa vai Responde Senhor: Eu faço...
O pobre na rua cai Que o povo do Corta Braço
De fome aqui na Bahia! Não fiquem sem residência!

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P G
Porque tantas exigências Galinha é vinte cruzeiro
Peço, sejam caridosos Muitas vezes é magra e choca
“Dá ao pobre, empresta a Deus” O pão agora é do bom
A alma do virtuosos Não é mais de tapioca
É o símbolo do cristão Mais sempre vem premiado
Abrande seu coração Com arame enferrujado
Olhe para o Poderoso! Agulha, prego e minhoca!

Q H
Quantos não vivem leitores Hora triste amargurada
Sem roupa, sem lar, sem pão! Quando se vai almoçar
A Carestia é geral A tarde da mesma forma
Sofre a população Para um veículo pegar
É falta de humanidade A marinete nem diga
Vemos a calamidade Até uma pobre formiga
Por falta de compaixão! Não tem aonde ficar!

R I
Resto o povo do Estica Indigentes pelas ruas
Corta Braço, pode crer Publicamente mendingam
A justiça ver de perto Outros morrem nos abrigos
Para o “caso resolver” Os ricos passam não ligam
Deus! Só tua dulcissíma dondade Tenho visto numerosos
Dá paz a humanidade Famintos tuberculosos
Minorando o seu sofrer! Mentira? Ninguém nos digam!

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J M
Jamais vimos meus leitores Moradores do Estica
Aqui dentro da Bahia Corta Braço e o Japão
Como em todo interior Fizeram suas casinhas
Tão horrível carestia Para não viverem em vão
Os pobres vivem coitados Estão sujeitos perderem
“Oprimidos e cansados” Pois a burguesia querem
Tudo sobe, dia à dia! Levarem os pobres em questão!

K N
Kerozene não devia No Corta Braço faz gosto
Custar o preço que custa A gente de perto ver
Pois na terra do petróleo Casebres edificados
Terra sacrossanta augusta Tudo em ordem podem crer
Não devia meus leitores Até escola já tem
Se entregar aos exploradores Oh! Ricos vedes também
Que nos rouba assim com Que o pobre também é ser!
trusta!
O
L Oh! Senhor “donos” da terra!
Leite para nós não falta Lhe peço de coração
Porém puro até duvido Tenha pena destes pobres
Só se for a vacaria Acabe com esta questão
Já de espírito prevenido Faça um acordo qualquer
Do contrário são lesado Estes pobres tem mulher
Tudo enfim nosso mercado Tem filhos para a Nação!
Esta todo corrompido!

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