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■:
Lembrança
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do Marechal Mascarenhas
Rubem llntjm
R.I., em Bombiana. A chegada e a A essa altura nossa tropa estava
T> edem - me para dar um de- recebendo cigarro americano e co
polmento pessoal sobre o Ma saída foram debaixo de fogo, e o
capitão Fêlix nos explicou que os meçava a desprezar os que vi
rechal Mascarenhas de Moraes, o nham do Brasil. Muita gente de
comandante da FEB, neste ano soldados brasileiros lutavam co
mo parte de uma ‘‘task force” a- testava o “Liberty” porque era
que marca o centenário de seu forte; pior do que ele só o “Yolan-
nascimento. Ponderei que minhas merlcana que tentara Inutilmente
relações com ele foram estri tomar Monte Castelo. da”, cujo maço tinha a figura de
tamente formais; era trinta anos uma mulher loura, que os Itali
Agora o objetivo era o mesmo. anos chamavam de Bionda Catti-
mais velho do que eu, e já o conhe O fato de haverem convocado na
cí general. Homem reservado e véspera os correspondentes indi va, loura ruim.
sisudo, de pouco falar, dava a im cava que os homens do Estado-Ma Por volta do meio-dia o gene-, ^
pressão de ser um militar compe ior brasileiro esperavam vencer, e ral já me havia íllado^Volto cigar- ;
tente e rigoroso. Sobre seus om seria uma vitória de comando bra ros, que, aliás,ele mal fumava.
bros caiu uma tarefa delicada e sileiro. Iam ser empregados .dois Estava nervoso, de cara fechada.
dificílima, que aceitou sem hesi batalhões, o lízeda do Io R. I . e o Dois dias antes leu soube isso de
tar, e cumpriu bem. Cândido, do 11°, ambos debutantes pois) ele tivera uma áspera dis
Recordarei um dia em que esti e (diziam - me francamente, ali cussão com o general Crittenberg,
vemos lado a lado durante algu mesmo, os seus homens) mal trei comandante do IV Grupo, a que
mas horas, e foi o de 29 de no nados e multo cansados. pertencia a nossa divisão, sobre
vembro de 1944. Na véspera o co os combates dos dias 24 e 25 da tal
Apesar disto comecei a ficar “task force”; agora, porém, a
mando da FEB convocara os cor otimista quando a batalha co responsabilidade era toda nossa.
respondentes de guerra para uma meçou e fui para o posto de ob Os soldados, em sua grande ma
reunião no QG Avançado, em Por- servação do general Masca ioria, portaram - se multo bem, e
reta Terme. Era a primeira vez renhas. Era uma trincheira bem recuaram em ordem para suas
que fazia isso, e havia um certo ar cavada. Nete^se-que-não-estava posições, mas as baixas eram pe
de solenidade. Foi - nos dito então edl $comandOjMqq!Ç cabia ao gene sadas: 24 mortos e 153 feridos.
que a FEB ia desfechar um ata ral Zenóbio, comandante da Infan Descreví a batalha em vinte e
que no dia seguinte. O chefe da 3' taria. O telefone e o rádio funcio uma páginas à máquina, batidas
Secção (Operações), Cel. Castelo navam. “Leblon 5” — chamava - penosamente em cinco vias na mi
Branco, o que um dia seria presi se a todo momento em código;
dente, mostrou - nos. no mapa, o nha portátil, noite adentro, à luz
Leblon era o bairro em que eu de uma vela, os dedos duros de
plano de ataque. O comando per morava no Rio e, Deus sabe por
guntava quantos correspondentes frio; soube que meu relato foi apro
quê, essa coincidência me fez vado com pequenos cortes pela
queriam assistir ao cortibate e bem. O general Mascarenhas ti
quantos preferiam ficar no QG. censura militar, mas não chegou
nha à máo uma carta militar; ao jornal: um daqueles debtlôídes
Todos, menos eu. optaram por fi com um binóculo ele Identificava
car no QG, onde tinham meios de da censura do DIP nâo gostou, e
as posições: “Aquela casinha bran Jogou tudo fora.
transmitir prontamente as notíci ca ê Vitelino, a outra lá em cima.
as que lá chegassem. Eu era o Nâo sei bem o tempo que passei
logo à esquerda, já no Monte Cas ao lado do general, enquanto gra
único sem franquia telegráfica. telo, éFornelo”.
Segui para a linha de frente nadas rebentavam junto ao nosso
O Monte Castelo! Nada que cha P. O. que o inimigo, evidentemen
aquela noite mesmo. Foi uma vi masse atenção, entre aquelas te, Já localizara. Foram mais de
agem penosa, feita naturalmente eminências do Belvedere, Gorgo- três horas de tensão. Ouvi seus
na escuridão a subir sem cessar lesco, La Torrada; uma lombada diálogos com o coronel Castelo
uma estrada cheia de lama. Os ho que parecia suave, e por Isso mes Branco e outros oficiais, pedindo
mens que deviam atacar no dia mo, porque podia servir de chave Informações ou dando ordens; ele
seguinte iam a pé, silenciosos e a outros avanços, o Inimigo forti falava com firmeza, mas em lin
lentos, atolando as botas na lama ficara bem e defendia com unhas guagem estritamente funcional.
e escorregando de vez em quando. e dentes; para os brasileiros, em A derrota seguinte, a 12 de de
Era tão penoso que muitos gasta breve, uma obsessão sinistra. zembro, (quando os corresponden
ram 7 horas para fazer 17 km, e tes foram proibidos, nâo sei por
chegaram exaustos às bases de A principio tudo parecia bem, e
onde deveríam partir para o ata o fato de haver um pelotão de quê, de Ir à frente), abalou - o de
que logo pela manhã. carros de combate americano jun tal modo que pensou em deixar o
to ao Batalhão Uzeda era ani comando e voltar para o Brasil;
Lembro - me de ter dormido, eu mador. Por algum motivo eles foi dissuadido pelo general Cor
próprio cansadíssimo e faminto, nâo avançaram mais de cem me deiro de Farias.
no chão, numa sala onde a noite tros, e o batalhão teve muitas E foi bom que ficasse. Com o
inteira chegavam e saíam homens baixas. Um capitão foi ferido na Estado-Maior dividido, os inevitá
de botas enlameadas. Con cabeça ^outro^negou—se-arata- veis desentendimentos (ou dlficels
versando com eles pela manhã eu ç&t um tenente teve crise ner/o- entendimentos) com o Comando
soube que era a primeira vez que sa. O batalhão do major Cànd do Aliado, a displicência com que o
iam entrar em combate. Confesso conquistou vários pontos,' mas te Elo atendia aos pedidos da FEB,
que senti um aperto no coração e ve de recuar para não ficar com o os ciúmes e prevenções da reta
um mau pressentimento. flanco esquerdo desguarnecido. guarda e as durezas da guerra, só
Poucos dias antes — a 25 de no Creio que foi por volta das 10 um homem da respeitabilidade,
vembro — eu andara por ali com horas que o general me pediu um da energia e da paciência do gene
alguns colegas. Fomos levar um cigarro. Dei - lhe um “Liberty ral Mascarenhas — um homem
correspondente Inglês, Buckley, a Ovais”; ele perguntou se eu íáo com sua autoridade — podería le
conhecer a frente. Estivemos no tinha outro, e acabou fumando var a campanha até o fim, como
P. O. do Batalhão Silvlno, do 6o aquele rçiesmo. ele o fez, com êxito.
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residente Giovanni Gronchi, quem lhe fala é um cro nosso carro de ooos. E' o que aquela pobre gente tem para
eu digo seja aceito por alguns milhares de brasileiros — uns velha chora e banha os ovos com suas lágrimas, implorando /
25 mil — que foram ao seu belo país há (14 anos atrás. que aceitemos. Começamos a rir; outra mulher aparece com
A Itália não estava feliz; era aquela ",serva Itália, di do- mais ooos e ainda outra, que traz uma garrafa de lambrusco
lore ostello, nave sanza nocchiere in gran tempesta", e ela — e ovos. Outra ainda traz uma garrafa de conhaque, um
nos,pareceu "somigliante a quella inferma, che non può tro pedaço de queijo reggiano grana dolce — e ovos, ovos, ovos ’ A
var posa in su le piume, ma con dar volta suo dolore scher- Velhas e jovens choram, riem, beijam-nos a cara, as mãos. I <
ma", se me dá licença para citar um poeta que honra a sua — Liberatoril
Toscana e a nossa Humanidade. Foi éle, Dante Alighieri, Explico que não somos libertadores de ninguém, e de /i
um bom companheiro e guia naqueles tempos melancólicos modo algum. Somos repórteres, homens desarmados, e tudo ll
que fomos passar em sua terra, onde ficaram, e lá estão ainda, o que sabemos o fazemos é tomar notas. Não somos solda*J*®
sob a planura verde de Pistóia, uns quinhentos camaradas dos... E' inútil. Para tôda essa gente somos heróis perfeitos
'
nossos. e acabados. O lambrusco jorra nos copos, obrigam-nos a
Dividida pelo ódio, pisada pelas botas dè soldados de beber, todos querem beber em honra do 'Brasil. Se formos
tôda parte do mundo, a sua Itália, presidente Giovanni topar todos os brindes, nós, heróis, acabaremos bêbados. Esta
Gronchi, sofria tôda a sordidez moral e material da guerra. mos em serviço, precisamos tocar o jipe.
Mas na praça já se formou uma verdadeira multidão.
Vimos acontecer o que acontece em todo país arruinado e
vencido. Mas guardamos, todos nós, algumas imagens me
lhores; eu guardo muitas.
Nosso jipe é cercado outra vez. No'meio dos vivas e dos bei
jos um homem me faz uma consulta grave. E' o chefe'local
1
do Comitê de Libertação Nacional. Quer saber'se pode assu-
mir provisoriamente o governo da cidade. Explicamos que
Contarei um caso que aconteceu a mim e a outro repór nada temos a ver com isso, mas o homem insiste, a multidão
ter, Raul Brandão, e ao nosso "chauffeur", o gaúcho Machado, o aclama. Insisto em dizer que somos apenas repórteres; a
em S. Ilário D’Enza — mais ou menos igual aos que aconte tropa não tarda; alguns tanques americanos já estão em Mon-
ceram em outras aldeias, quando resolvemos, no fim da tecchio.
guerra, deixar a tropa para trás e avançar alegremente — três A notícia desperta vivas aos Estados Unidos e ao Brasil.
homens desarmados — no rastro de alemão que fugia. Faz-se um silêncio. O homem pode ou não pode assumir
Chegamos às primeiras casas. Mando parar o jipe e faço o governo local?
algumas perguntas. Um pequeno grupo de pessoas nos olha Brandão abstém-se. Eu não resisto: de pé, dentro do jipe,
com hostilidade e o homem que é o único a dizer alguma nomeio solenemente o sindaco de S. Ilário D'Enza. Eu, que
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coisa responde evasivamente a tudo o que pergunto. Afinal, nunca nomeei ninguém para lugar algum. Com uma única
repara que somos aliados — e começa, ali também, a gritaria autoridade, presidente Giovanni Gronchi, a mesma que o
alegre. As mulheres saem correndo para suas casas e voltam senhor exerce neste momento sôbre milhões de brásileiros: a
com vinho e ovos. Já atrás ganháramos ovos. Agora enchem autoridade do coração.
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RUBEM BRAGA
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OS CORRESPONDENTES •
Algumas lembranças do
Rubem Braga e Joel Silveira,
correspondentes
brasileiros na II* Guerra:
Qual o papel dos brasileiros na IIa Gran mes de inverno levados do Brasil revela
i de Guerra? Como se portaram eles na Italia? vam-se pouco menos que imprestáveis;
C' Para responder a primeira pergunta sabia-se de discussões de chefes brasileiros
e bom lembrar que os Aliados mobilizaram entre si c com os americanos, c muitos ofi
na guerra cerca de 40 milhões de homens, ciais não escondiam criticas aos comandos.
$ i c que a Força Expedicionária Brasileira Havia até sambas de protesto.
somara 25.334 homens. Quando chegaram noticias da poderosa
Vj contra-ofensiva dos alemães nas Ardenas,
Quanto a segunda pergunta, direi que
.-3 I os brasileiros se portaram tão bem quanto correu o boato de que eles iriam atacar tam
- possível, e melhor do que seria licito esperar. bém na Itália. Era verdade. Eles atacaram.
* Não o fizeram no setor onde estávamos, mas í!
3 E acrescentarei que. na minha opinião, ti-
urram sorte. sim- naquele cm que estivéramos, na Gar-
fagnana: puseram em debandada a 92° Di
<3 Estou' pensando na segunda quinzena visão Americana (negros), retomaram Barga,
de dezembro de 1944. Hitler havia sido balido e por um momento fizeram temer pela sorte-
! ^ duramente a leste e a oeste, e já havia perdi de Pisa c Livomo; foram detidos pelos india
do ate a Bélgica e Alsácia quando lança uma nos da 8o Divisão; afinal, não era um ataque
contra-ofensiva nas Ardenas. desbaratando, em força.
logo de saida. três divisões de Infantaria,
e uma divisão blindada dos americanos. A
Que teria acontecido se os alemães es-
colhessem para o ataque a frente sob nossa
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essa altura na frente italiana o 5o e o S° responsabilidade? Seria impossível impedi-los
Exércitos aliados estavam imobilizados, de de scccionar a frente cm algum ponto da
i pois de vários ataques imiteis contra os ale estrada 64, c também ameaçar gravemente
mães. e diante de um inverno rigoroso. nossa linha de suprimentos. Uma parte de
I A FEB fazia parte do 5o Exército ame nossa tropa correria o risco de ficar aprisio
ricano. e unha suas forças dispostas ao longo nada, e a outra teria de bater em retirada
I de 15 quilômetros, na estrada 64. no vale célere na direção de Pistoia: um desastre.
íu Nunca tive acesso aos documentos secretos
j | do rio Reno (um Reno italiano) em posições
Cl > quase sempre devassadas pelo inimigo encas do Estado Maior, mas sei que o seu plano •
Qc telado nas alturas dos Alpeninos. Nossos de defesa, na previsão de um ataque, não
homens sofriam o efeito 'psicológico de cinco contemplava nada muito melhor do que isso.
TC revezes Io) o duro contra-ataque alemão
nú frente de Barga. no vale do rio Sercchio.
0 que quero dizer é que foi uma impru
dência um pais do tamanho do Brasil entrar
K a 31 de outubro, pondo um fim triste a rápida em uma guerra com uma pequena força
e feliz campanha do Destacamento comanda tática, sujeita a todas as contigéncias, se
\) do pelo general Zenóbio; 2oi o insucesso considerarmos que o Alto Comando não po
do primeiro ataque contra Monte Castelo, dería prejudicar sua estratégia, se fosse
em 24 e 25 de novembro, feito jtcla Task o caso, liara não ferir o orgulho nacional
Force 45. americana, com o reforço de um de um aliado tão parcamente representado.
batalhão do 6° RI e do Io Esquadrão de Re É por isso que acho que tivemos sorte —
conhecimento: 3o) o malogro do novo ataque a sorte que os portugueses não tiveram na
a Monte Castelo, em 29 de novembro, reali Ia Grande Guerra.
QL zado pelas nossas tropas: 4ui a retração, com Fora disso, digo com franqueza: levando
, pânico, de um batalhão do 11° RI, nu noite em conta a .má seleção fisica c mental e o
• de 1 para 2 de dezembro, logo depois de mau preparo técnico c psicológico da tropa,
entrar em linha; 5°) fracasso, com muitas e a sabotagem que partia do próprio Ministé
perdas, de nosso ataque de 12 de dezembro, rio da Guerra, acho que, em sua maioria,
unida contra o Castelo. os nossos homens — os profissionais e ri
C/s hospitais estavam cheios de feri massa d os .>rarinhas — se comportaram
dos, doentes e acidentados; os unifor- bem, ás 'V.r.s nulag rosam ente bem.
> Brasil, Quarta-Feira, 7-4-65, Cad. B — 7 ]‘ Sim, abrindo caminho nó peque i
no grupo, e, com um ar de louca, i ;
pergunta se eu sou mesmo aliado,
“vero, vero?”. Seus olhos estão
cheios de luz e empoçados de
RUBEM água. Ela ergue os dois braços,
BRAGA põe devagar as mãos nos meus
ombros, e suas mãos tremem,
quer falar, e soluça”.
O VETERANO Cheios de ovos, queijos, vi
nhos, abraços e beijos, là vamos
BRANDÃO nós a dar a boa nova de aldeia
em aldeia até que, em uma curva
de estrada esbarramos. • • com
Lá se foi o Brandão.
Raul de Castro Brandão fun um destacamento alemão. Se na
cionou na Europa, em 1917, como quele dia de abril me dissessem
correspondente de g u e r r a do que Raul Brandão só iria morrer i
Correio da Manhã. Quando veio em um outro abril 20 anos de
a outra Grande Guerra êle era - pois, eu acharia incrível. Diante i
Secretário do jornal, e não pas-
da coluna alemã nosso motoris
sou a nenhum repórter a missão
de ir à Itália acompanhando a ta, Machado, a uma ordem de
FEB: foi êle mesmo em 1944. Já Brandão, saiu pela estrada e dis
era, a essa altura, um homem de parou para a direita, entre árvo
! cinqüenta e tantos anos, gordo, e res. Um pouco mais adiante,
com uma tendência a pegar qual vendo uma vala de irrigação, teve
quer gripe num raio de meia lé i
gua; pois enfrentou os desconfor- ' ! de frear. O jipe caiu com Macha
tos e as peripécias da guerra com do e Brandão, que ia na boléia,
o mesmo ânimo que nós — Egídio enquanto eu e um guerrilheiro,
Squeff, de O Globo, Joel Silveira, Nartiro, que íamos atrás, éramos
dos Associados, e eu, do Diário Ca lançados alguns metros além da
rioca, então ainda, de certo mo
do, três alegres rapazes da im vala, em um campo de trigo.
prensa. .. “Tre americani kayut!” foi a in
Claro que volta e meia pro- formação que os alemães deram
curávamos aborrecer um pouco o a nosso respeito, depois de dispa
Veterano (pseudônimo que êle rarem algumas rajadas de me
usava em seu jornal), zombando tralhadoras, a uns camponeses
de sua benévola rabugice. Inven-
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távamos ordens absurdas do Co italianos que acorreram. Eu tam
mando em relação aos correspon bém, quando voltei de meu des
dentes, só para ouvi-lo dizer: “co maio, e não vi Brandão em parte
migo não, eu não estou mais em alguma, embora chamasse por
idade dessas coisas, não vim aqui êle logo que vi a coluna alemã se
para isso...” Na verdade topava
qualquer coisa, e na primavera afastar, não tive dúvida. Disse
de 45, quando os alemães fugiam aos camponeses que fôssem lá em
ao longo da Via Emília, topou co baixo na vala “tirar o corpo de
migo uma aventura de rapazo- um homem”. Estava certo de que
las: deixar para trás nossas tro Brandão morrera. Conto em meu
pas e meter os peitos. O resulta
do foi que entramos pelas fluidas livro:
linhas inimigas, e tivemos de re “Entramos na casa dos italia
troceder para não cair prisionei nos e arrumamos uma mesa para
i ros. Nosso jipe meteu-se por pe
quenas estradas e caminhos, pas colocar Brandão. Êle chegou car
í
sando por aldeolas de campone- regado, e também com a cara
ses. cheia de sangue — metera a tes
A gente chegava, e tudo pa ta no pára-brisa e sentia terrível
recia deserto. Depois aparecia ti dor em uma perna. Gemia um
midamente uma velha qualquer pouco, mas estava calmo e lú
que, ao ver que éramos aliados, cido.” i
começava a gritar de alegria, e K Calmo e lúcido, me contam,
surgia , gente de todo lado. êle morreu agora, em um dia de
Conto em meu livro: .“são fa abril tão belo como. aquêle de
ces rosadas que avançam para nossa aventura na Itália há 20
nós, trêmulas de emoção, rindo anos, o bom veterano Raul de
entre lágrimas, vozes estrangula Castro Brandão.
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das de prazer. Uma jovem de
tranças alouradas se aproxima de
Quinta-feira, 8-5-75 —OESTADODESJjÁÜtC^
8-JORNAL DA TARDE
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8/43:Patton, Eisenhower e Montgomery^naSicília.
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OS CORRESPONDENTES A ALEMANHA
Algumas lembranças de HAVIA PERDIDO MUITO.
Rubem Braga e Joel Silveira,
correspondentes : m ERA O COMEÇO.
brasileiros na IIa Guerra:
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6 pelo Tratado de Versalhes perdeu uma
Por Rubem B
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de Guerra? Como se portaram eles na Itália?
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mes de inverno levados do Brasil revela
vam-se pouco menos que imprestáveis; A a àmm* modificada de um dia para outro. A perda
desse terruorio
território significou ~a privação de
1
X importantes recursos (carvão, ferro e outros) i
e bom lembrar que os Aliados mobilizaram sabia-se de discussões de chefes brasileiros
na guerra cerca de 40 milhões de homens, entre si e com os americanos, e muitos ofi e fontes de abastecimento (principalmente
e que a Força Expedicionária Brasileira ciais não escondiam críticas aos comandos. —
-mi MM' com a perda das colônias). 0 Tratado impôs
somava 25.334 homens. Havia até sambas de protesto. '• A ainda pesadas retribuições de guerra, proibiu
Quanto a segunda pergunta, direi Quando chegaram notícias da poderosa o rearmamento da Alemanha, criou uma
os brasileiros se portaram tão bem que contra-ofensiva dos alemães nas Ardenas, permanente zona desmilitarizada nas duas
possível, e melhor do quanto correu o boato de que eles iriam atacar tam mi margens do Reno e instalou pelo período
E acrescentarei que seria licito esperar
que. na minha opinião, ti-
bém na Itália. Era verdade. Eles atacaram.
Não o fizeram no setor onde estávamos, mas m m de 15 anos um exército de ocupação em solo
veram sorte.
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sim naquele em que estivéramos, na Gar- alemão.
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, na segunda, qumrena fagnana:
„isáo Americana
puseram,negrosK
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de dezembro de 1944. Htller havia sido bando e ,(m momento fizeram lemer ela so” c. Em 1939 a situação política e econômica
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duramente a leste ca oeste, e ja havia perdi-
do ate a Bélgica e Alsacia guando lança uma
de Pisa c Uvonw: foram detidos pelos índia■
„os da go Divisão; afjnal não era Um ataque do país era grave: havia um governo
A Alemanha,
e muito descontentamento,
contra-ofensiva nas Ardenas. desbaratando, em força i mesmo reconhecendo a perda da Alsácia-
logo de saída, três divisões de Infantarig Que teria acontecido se os alemães es- V
Lorena como definitiva, não queria deixar
e uma dwtsao blindada dos americanos. A colhessem para o ataque a frente sob nossa F.
essa altura na frente italiana o 5 e o 8 responsabilidade? Seria impossível impedi-los
por mais tempo sua fronteira ocidental prati
Exércitos afiados estavam imobilizados. de- de seccio„ar a frenle em algum /30ní0 da •r" i-
Í « camente indefesa. O retorno às fronteiras
;>o_/s de yanos ataques imiteis contra os ale• estrada 64. e também ameaçar gravemente * de antes de 1919 — recuperar Dantizg, reunir
maes. e diante de um inverno rigoroso. nossa linha de suprimentos. Uma parte de Silésia e desfazer o Corredor polonês —
atornou-se
vvi rapidamente o objetivo da política
A FEB fazia parte do 5o Exército ame- nossa tro\>a correría o risco de ficar aprisio-
"5 ■x exterior de Hitler, como primeiro passo para
ricano. e linha suas forças dispostas ao longo
de 15 quilômetros, na estrada 64, no vale
nada, e a outra teria de bater em retirada
célere na direção de Pistoia: um desastre, VI! &n uma expansão maior. “Um hábil conquistador
do rio Reno (um Reno italiano) em posições Nunca tive acesso aos documentos secretos 0 imporá sempre que possível as suas exi- |
quase sempre devassadas pelo inimigo encas- do Estado Maior, mas sei que o seu plano
d. 1 gèncias ao conquistado por meio de fatos \
telado nas alturas dos Alpeninos. Nossos de defesa, na previsão de um ataque, não consumados” — explica Hitler no seu livro
homens sofriam o efeito psicológico de cinco contemplava nada muito melhor do que isso. autobiográfico “Mein Kampf”. Foi assim que, j i
revezes:
na frente Io) o duro contra-ataque alemão 0 que quero dizer é que foi uma impru- ■r».
em março de 1936, rompendo o Tratado de
de Barga, no vale do rio Sercchio. dência um país do tamanho do Brasil entrar
a 31 de outubro, pondo um fim triste a rápida em uma guerra com uma pequena força Locarno, invadiu a zona desmilitarizada da
e feliz campanha do Destacamento comanda- tática, sujeita a todas as contigências, se Renània. No ano seguinte a Itália aderiu :
do pelo general Zenóbio; 2°i o insucesso
do primeiro ataque contra Monte Castelo,
considerarmos que o Alto Comando não po
deria prejudicar sua estratégia, se fosse m
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ao pacto “anti-komintern” assinado entre
o Japão e a Alemanha. Em 1938 Hitler anexa
em 24 e 25 de novembro, feito pela Task
Force 45, americana, com o reforço de um
batalhão do 6o RI e do Io Esquadrão de Re-
conhecimento: 3o) o malogro do novo ataque
a Monte Castelo, em 29 de novembro, reali
o caso, para não ferir o orgulho nacional
de um aliado tão parcamente representado,
E por isso que acho que tivemos sorte —
a sorte que os portugueses não tiveram na
Ia Grande Guerra.
m Áustria, e a intervenção alemã na Espanha
atoma proporções cada vez maiores. Pelo
Acordo de Munique de setembro de 1938,
a Alemanha toma posse dos quatro distritos
zado pelas nossas tropas: 4°) a retração, com Fora disso, digo com franqueza: levando dos Sudetos, que pertenciam à Checoslo-
pânico, de um batalhão do 11° RI, na noite em conta a má seleção física e mental e o váquia. Torna-se assim o mais poderoso pais
de 1 para 2 de dezembro, logo depois de mau preparo técnico e psicológico da tropa, da Europa, derrubando todo o sistema de
entrar em linha; 5o) fracasso, com muitas e a sabotagem que partia do próprio Ministè-
perdas, de nosso ataque de 12 de dezembro. rio da Guerra, acho que, em segurança européia baseado no equilíbrio
ainda contra o Castelo. os nossos homens — das potências, o respeito às minorias e às
Qs hospitais estavam cheios de feri•
sua maioria, f :v nacionalidades, e aos tratados e sistemas
massa dos >racinhas os profissionais e a
\ aos, doentes e acidentados; os unifor- bem. às — se comportaram
• e:es m lagrosamente bem. m regionais de auto-proteção assinados à som
bra da Sociedade das Nações como o Tratado
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Eram 25 334 homens os integrantes da Força Expedicionária
Brasileira que, em 1944, combateram na Itália contra o nazi-
fascismo. Nas diferentes fases da campanha, tiveram pela fren
te treze divisões inimigas. Fizeram 20 573 prisioneiros, 3 173
pracinhas foram feridos, 451 morreram. Testemunhando os
principais momentos da luta estava o correspondente de guer
ra Rubem Braga. Agora, 25 anos depois, êle voltou à Itália,
como enviado especial de REALIDADE, percorrendo nova
mente os campos de batalha e os lugares por onde a FEB pas
sou e onde ainda é lembrada com carinho pela gente que aju
dou a libertar. Nas páginas que se seguem está a crônica dessa
] jornada ao passado, aos tempos de sofrimento e coragem dos
BRASILEIROS
NA GUERRA RUBEM BRAGA
Fotos de Luigi Mamprin