CAPTURA

EDIÇÃO 451 • MAIO 2023

DE CARBONO
A tecnologia para
tirar CO2 da atmosfera e
guardar no subsolo já existe.
Mas funciona mesmo? P. 32

R$ 25,00
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P. 48 P. 44 P. 38 P. 54
uma breve um raio x a chegada da suméria ao
história da balança do fentanil leblon: a saga
da bunda. comercial. ao tráfico. dos bares.
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CARTA AO LEITOR
Off label
A ESCOLA ONDE CURSEI o ensino
médio tinha um gramado. E no
meio do gramado tinha um chorão.
A árvore nos fornecia alívio térmi-
co, com sua sombra, e estético tam-
bém. Quando você senta debaixo de
um salgueiro-chorão, vê um mata-
gal bruxuleante de cabeça para bai-
xo, formado pelas folhas esguias
que descem lá de cima. Mágico.
E a real é que esse tipo de árvore
traz outros alívios também. A casca
do tronco dela !nciona como anal-
gésico. Não se trata de uma desco-
berta recente. A Suméria,
civilização que inventou a escrita
por volta de 3.500 a.C., deixou re-
gistros do uso de casca de chorão
para acalmar a dor. Egípcios, chine-
ses e gregos antigos também deixa-
ram suas receitas para o uso
medicinal da planta.
O princípio ativo ali só seria des-
coberto em 1828. Foi quando o far-
macêutico alemão Johann Buchner
encontrou um composto peculiar
na casca: cristais amarelos que ele
batizou como “salicina” (numa deri-
vação de “Salix”, o gênero do
salgueiro-chorão).
Farmacêuticos do século 19 apro-
veitaram para criar um analgésico
melhor com base nos cristais. Pro-
duziram, então, o ácido salicílico –
mais forte, mas que trazia o
inconveniente de irritar o estômago.
A Bayer daria um tapa extra. Essa
farmacêutica alemã desenvolveu
uma versão mais amiga do trato
gastrointestinal: o ácido acetilsalicí-
lico. E em 1899 ele chegaria às pra-
teleiras com seu nome comercial:
“Aspirina”. Nascia ali o remédio
mais vendido da história.
Quase um século depois, com a
pesquisa científica a todo vapor, vi-
ria outra descoberta: a Aspirina não
era útil apenas contra a dor. Ela
também tinha a propriedade de pre-
venir doenças cardiovasculares,
pois evita a formação de coágulos
na corrente sanguínea (“afina o san-
gue”, em linguagem popular).
EDITORIAL
Nisso, um remédio cujas raízes re-
montam ao início da civilização ga-
nhava outro uso. Quem passa por
uma situação parecida hoje é um me-
dicamento desenvolvido há poucos
anos, pela farmacêutica dinamarque-
sa Novo Nordisk: a semaglutida.
O Ozempic, nome comercial do
primeiro remédio à base desse prin-
cípio ativo, foi aprovado em 2017 nos
EUA (e em 2018 no Brasil) para o
controle de diabetes tipo 2. Mas não
demorou para que um efeito coadju-
vante ali chamasse a atenção: a perda
de peso. Nisso, médicos passaram a
receitar Ozempic a quem não tem
as
diabetes, como um remédio antiobe-
sidade mesmo, de forma off label – ou
t
seja, para uma !nção fora da bula. E
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o tratamento virou febre.
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Mais recentemente, a Novo Nor-
disk emplacou outro remédio à base
lR
de semaglutida – agora voltado dire-
tamente para quem quer perder peso:
o Wegovy (já aprovado pela Anvisa
si
para este fim e que chega ao Brasil no
a
segundo semestre).
Br
A partir da página 20, o editor Bruno
Gara"oni e o repórter Tiago Cordeiro
mostram com riqueza de detalhes co-
mo a semagutida !nciona e quais são
as pedras no caminho para quem se
trata com ela. Todo medicamento, afi-
nal, traz seus riscos. E o papel do jor-
nalismo científico é explicá-los de
forma clara, sóbria. Boa leitura.
Alexandre Versignassi
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CARDÁPIO MAIO DE 2023

20 Capa
OZEMPIC
A semaglutida, seu princípio ativo, se
mostrou eficaz no combate à obesidade.
Mas ainda são necessários novos estudos
para avaliar melhor os riscos que ela traz.

32 Cap#ra de carbono
Sugar CO2 da atmosfera e aprisionar no
solo. Essa tecnologia já existe e está em
operação. Veja se ela é mesmo viável.

38 O perigo do fentanil
Nos EUA, o uso recreativo do opioide mata
uma pessoa a cada 7 minutos. Entenda os
riscos que a droga pode trazer ao Brasil.

44 Dólar en!a, dólar sai

Infográfico: os maiores parceiros do
Brasil em exportações e importações.
as

48 A supremacia do bumbum
t
is

A dupla de nádegas dos humanos surgiu há

dois milhões de anos, com o Homo erectus
ev

– e foi essencial para a nossa evolução.

lR

Uma breve 54 Desce mais uma rodada

história da Tavernas, pubs, botecos... Os bares são
si

bunda P.48 tão antigos quanto a civilização. Veja

como eles evoluíram ao longo da história.
a
Br

12 floresta iDosa 65 manual

Para resolver problema am- Como aproveitar
ESSENCIAL biental, cientistas aceleram o
envelhecimento de árvores.
número
incrível ORÁCULO o máximo da sua air fryer.

6 uma imagem... 60 here comes the sun

Uma plantação de manje- Quais os riscos de olhar direto
ricão na Holanda. O país para o Sol por muito tempo?
é pioneiro em métodos
agrícolas sustentáveis.

16 paga nóis
Os roteiristas de Hollywood
estão em greve. Veja como a
última paralisação, 15 anos
8 ... uma opinião atrás, afetou a indústria.
Inteligência 61 pá pum
ar%ficial: é hora 18 tvs oleD 63 só acreDito venDo
de regulamentar? Novo modelo da LG usa 64 pensanDo bem...
microlentes para melho-
rar o brilho da tela.
2 64 lost in translation
MILIGRAMAS
DE FENTANIL

SUPERNOVAS 12 enquanto isso... BASTAM PARA

10 pra Dentro Da cabeça 14 3 notícias sobre

MATAR UMA
PESSOA . A DRO-
GA É 50 VEZES
ÚLTIMA PÁGINA
Nanoplásticos podem pe- 16 pérolas Do streaming MAIS POTENTE 64 there goes the sun 66 maratona infinita
netrar a camada de células QUE A HEROÍNA . Quem inventou os A quantidade de conteúdo
que protege o cérebro. 19 você DeciDe p.38 óculos escuros? em cada streaming no Brasil.

Capa | Foto Eduardo Dulla

ESSENCIAL UMA IMAGEM...

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Foto Pierre crom / getty images

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maio 2023 super 7

 ESSENCIAL ...UMA OPINIÃO

na página anterior: Um campo interno de plantas de manjericão crescendo sob

luzes personalizadas para esse tipo de cultivo em Amsterdã. O mercado global de
tecnologias agrícolas automatizadas foi avaliado em US$ 10,71 bilhões em 2022. O
setor agrícola na Holanda é predominantemente mecanizado e informatizado. Por
conta disso, apenas 2% da força de trabalho do país opera no área.

Inteligência Cresce o

ar&ficial:
movimento na
as
direção de impor
t

restrições ao
is

desenvolvimento
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das IAs,

é hora de
“antes que seja
lR

tarde demais". A
intenção é nobre,
si

mas a história
a

regulamentar?
mostra que ela
Br

faz pouco sentido.

POR ALEXANDRE CARVALHO

O
O WRITERS GUILD OF AMERICA WEST (WGA), que é o sindicato dos
roteiristas de Hollywood, convocou uma greve de seus profissionais
no dia 2 de maio. Acontece de vez em quando: a úl!ma !nha rolado
em 2007, deixando um monte de séries e programas de TV na mão
(veja mais na pág. 16). Só que agora a pauta de reivindicações tem
uma novidade que, há seis meses, soaria como ficção científica: os
roteiristas querem garan!as con"a#ais de que não serão subs!#ídos
por sistemas de inteligência ar!ficial.
O WGA diz o seguinte: “IA não pode escrever ou reescrever material”
e “não pode ser usada como conteúdo de origem [para um roteiro]”.
Parece exagero, mas não é. Tanto que o ou"o lado, a en!dade que
representa os estúdios e os canais de s"eaming, rejeitou essa demanda.
Não quis descartar a possibilidade. Faz sen!do.
Os sistemas modernos de IA vinham sendo desenvolvidos por
várias companhias longe dos olhos do público. Até que uma delas, a

8 super maio 2023

OpenAI, decidiu abrir o seu para quem
quisesse testar, em novembro do ano pas-
sado. Era o ChatGPT. E o resto é história.
Porque foi um salto quân!co. Bots
de conversação sempre pareceram inte-
ligentes como uma porta. Ele não. Peça
um longo ar!go sobre Direito Pa"imo-
nial, e o ChatGPT escreverá algo iné-
dito, talvez bom o bastante para en"ar
numa tese de mes"ado. Peça um script
de seriado sobre um corretor da bolsa
que precisa lidar com um divórcio e
uma crise econômica global ao mesmo
tempo e… Testamos aqui:
“Tí#lo: Mercado em Queda"
Episódio 1: “Desafios na bola"
O agitado salão de negociação está
repleto de corretores gritando, telas pis-
cando com os preços das ações e o caos
geral desse ambiente. En"e a mul!dão
está Pedro Almeida (40 anos), um expe-
riente corretor da bolsa conhecido pela
habilidade para lidar com alta pressão.
Pedro volta para casa, visivelmente
es"essado. Ele encon"a sua esposa, Lu-
ciana Almeida, no sofá, com expressão
aba!da. “Pedro, precisamos conversar.
Não aguento mais (...)"
Ok. Não é exatamente um Breaking
a
Bad. Mas, vindo de um sistema que
Br
simplesmente recombina palavras sem
“saber" o que cada uma significa, im-
pressiona. Isso acontece porque a coi-
sa usa algoritmos de deep learning. Ele
imita o cérebro humano, aprendendo
sozinho a par!r de todo o conteúdo já
produzido pela humanidade.
O sistema avalia quais palavras cos#-
mam aparecer próximas umas das ou"as
em determinados contextos, e as recom-
bina na forma de conteúdo inédito. Não
é tão diferente daquilo que um cérebro
humano faz – bebês aprendem a falar
usando um mecanismo análogo.
Conforme a capacidade desses sis-
temas for aumentando, a qualidade da
en"ega também sobe. Daí em diante, as
consequências seriam imprevisíveis.
O perigo real
“Podemos em breve nos ver em longas
discussões online sobre aborto, mudança
climá!ca ou a invasão russa da Ucrânia
com en!dades que pensamos ser huma-
nas, mas na verdade são IA”, afirmou
Yuval Noah Harari, autor de Sapiens. “O
“Devemos automatizar todos os
trabalhos, incluindo os satisfatórios?",
pergunta a carta aberta que diversas
figuras-chave assinaram.
problema é que é totalmente inú!l gastar
tempo tentando mudar as opiniões de
um bot, enquanto a IA pode aprimorar
suas mensagens com tanta precisão que
terá uma boa chance de nos influenciar.”
Esse é um ponto perigoso. Pense na
polí!ca. Até ou"o dia, o tempo de horário
eleitoral gra#ito era a grande arma de in-
fluência para vencer eleições. Isso acabou.
Hoje são as redes sociais que mandam.
as
E nas eleições de 2026? Os sistemas
de IA talvez estejam tão inseridos na
t
nossa vida quanto a Scarle$ Johansson
is
do filme Her (2013) – ali, ela é a voz de
ev
um sistema operacional inteligente, pelo
qual o protagonista (Joaquin Phoenix)
lR
se apaixona. Caso a empresa por "ás de
uma IA “amiga" no %#ro próximo quei-
ra eleger um presidente da República, ela
si
terá chances razoáveis se programá-la
com um viés favorável ao seu candidato
preferido. Uma boa IA pode ser capaz
de simular uma relação de afeto com o
usuário, afinal. E damos mais ouvidos
aos nossos entes queridos do que a qual-
quer forma de propaganda.
O sucesso do ChatGPT criou uma
corrida do ouro en"e as big techs. To-
das, em uníssono, passaram a inves!r
bilhões de dólares no desenvolvimento
de sistemas mais potentes de IA. E isso
acendeu uma luz vermelha.
Em março, uma carta aberta, assina-
da por acadêmicos e nomes-chave da
tecnologia (gente como Steve Wozniak
e Elon Musk), pediu a paralisação ime-
diata, por pelo menos seis meses, dessa
corrida. E que a pausa seja usada para
a implementação de protocolos de se-
gurança para design e desenvolvimento
avançados de IA.
O texto ques!ona: “Devemos auto-
ma!zar todos os "abalhos, incluindo
os sa!sfatórios? Devemos desenvolver
mentes não humanas que em algum
momento nos superem em número, se-
jam mais inteligentes e nos subs!#am?
Devemos arriscar perder o con"ole de
nossa civilização?”
A dificuldade de atender a esse pedido,
porém, está no quanto ainda não sabemos
do potencial da IA. O que exatamente é
preciso tornar mais seguro? Quando a
carta fala em “arriscar perder o con"ole
de nossa civilização”, não explica como
isso ocorreria. Simplesmente porque se
"ata de um chute no escuro.
A parte da perda dos empregos é
mais sólida. Ela simplesmente acon-
tece sempre que chega uma tecnologia
que substitua a capacidade humana
com maior eficiência – que o digam
os artesãos ingleses que se rebelaram
con"a a Revolução Indus"ial no século
18, queimando máquinas de tecelagem.
A história, por ou"o lado, mos"a que
esse !po de evolução cons"ói riqueza.
Na década de 1990, era preciso ser re-
la!vamente rico para ter um computador
em casa. Hoje, 118 milhões de brasilei-
ros são usuários de smartphones, cada
um com poder de computação ordens
de grandeza superior ao dos melhores
computadores do final do século 20.
Podemos não saber qual será o %#ro
do mercado de "abalho numa realidade
em que sistemas de IA se encarreguem
de mais tarefas. Mas faz parte do jogo: os
artesãos britânicos também não sabiam,
mas o fato é que seus descendentes vivem
hoje melhor do que eles.
A regulamentação mais sensata que
pode exis!r não deve ser no desenvol-
vimento da inteligência ar!ficial, e sim
no mau uso dela. Quem explorá-las para
manipular eleições ou coisa que o valha
deve ser punido com o rigor da lei. Ponto.
Colocar freios no desenvolvimento
tecnológico é um esforço em vão desde
a invenção da roda. Enquanto a IA não
pensar sozinha em planos de extermínio
que, por ora, só existem na ficção cien-
tífica, essa roda deve con!nuar girando
para a frente. S
maio 2023 super 9
 SUPERNOVAS
ILUSTRAÇÕES FELIPE DEL RIO & TIAGO ARAUJO DESIGN CAROLINE ARANHA E JULIANA KRAUSS
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Nanoplás!cos podem pene"ar no cérebro
O CÉREBRO É ENVOLTO pela barreira hematoen-
cefálica, uma camada de células que bloqueia a
entrada da maioria das moléculas. É uma defesa
muito poderosa, sem igual no organismo. Alguns
vírus, como o HIV, são capazes de atravessar
essa muralha, mas isso é raro (só ocorre em
casos avançados de Aids, na chamada “demência
associada ao HIV"). Mas um novo estudo mos-
trou que a barreira também pode ser per+rada
por algo onipresente: o plástico. Cientistas da
Universidade de Viena, na Áustria, alimentaram
10 super maio 2023
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ratos de laboratório com nanofragmentos de
poliestireno (isopor), de no máximo 0,01 milíme-
tro1. Duas horas mais tarde, os animais foram
submetidos a autópsia – e constatou-se que o
plástico já havia se alojado em seus cérebros.
Uma ressalva: os fragmentos usados no estudo
são bem menores do que os microplásticos, de
até 5 milímetros, que poluem a água e o ar do
planeta. Segundo os pesquisadores, será pre-
ciso fazer mais estudos para entender se esses
também apresentam risco. (Bruno Gara!oni)
A
sn. EDIÇÃO BRUNO GARATTONI

32
é a quantiDaDe
de núcleos do pro-
cessador Loongson
LS3D5000, desenha-
do e fabricado na
China – e principal
esperança do país
para alcançar a
autossuficiência
em CPUs (uma das
pouquíssimas tec-
nologias em que ele
ainda está atrasado).
Cada núcleo do novo
chip, que se destina a
servidores, trabalha
as
a 2 GHz. A perfor-
mance dele, segundo
t

números divulgados
is

pela Loongson,
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equivale à de CPUs
ocidentais lançadas
lR

cinco anos atrás. (BG) B

si

Japão PEIXES CONSEGUEM DETECTAR SINAIS DE MEDO

a
Br

terá seguro Eles fazem isso usando a ocitocina – que, em humanos, tem um efeito bem diferente.

contra bullying COM APENAS 5 CM , o peixe-zebra vive nos Ele começou a nadar agitadamente, como se
rios da Índia – e também é cul!vado em vá- es!vesse sendo ameaçado. Mas o incrível veio
o proDuto, que será rias partes do mundo para servir como animal em seguida. Os cien!stas gravaram a cena,
ofertado no país pela ornamental, em aquários. Ele tem um cérebro e exibiram o vídeo para mais dois aquários.
seguradora Tokio Ma- minúsculo, com 100 mil neurônios (as formi- O primeiro !nha peixes-zebra comuns. O ou-
rine, fornecerá uma gas têm 250 mil, e as abelhas 1 milhão). Mas "o, uma versão gene!camente alterada para
indenização de até também é capaz de pelo menos uma emoção: não produzir ocitocina (o mesmo hormônio
US$ 1.500 se a crian- o medo. Isso foi comprovado por cien!stas de presente em humanos). Ao ver o vídeo, os
ça sofrer bullying qua"o países, que submeteram peixes-zebra peixes normais assumiram um comporta-
grave na escola. Esse a uma série de testes2. Primeiro eles cole- mento assustado – mas os ou"os, que não
dinheiro poderá ser taram um feromônio chamado schreckstoff, produziam ocitocina, ficaram indiferentes.
usado para pagar um que esses animais secretam quando estão Ou seja, ela estava envolvida na !ansmissão do
psicólogo e, caso os feridos. Aí despejaram uma quan!dade bem medo. Em humanos, a ocitocina tem o efeito
pais decidam mudar pequena num aquário com um peixe-zebra. oposto: gera a sensação de afeto. (BG)
o filho de escola,
cobrir despesas com
a compra de novos
uniformes e material
didático. O Japão re- “Não toleramos nenhum !po de abuso animal",
gistra em média 600
mil casos de bullying Declarou a empresa americana hellofresh, que se viu envolvida num escândalo internacional. O leite de
por ano (sendo 80% coco que ela vende, importado da Tailândia, supostamente é produzido usando o trabalho de macacos – que
deles no ensino são treinados para colher os cocos. É tão absurdo que chega a parecer fake news, mas não é: o governo
fundamental). (BG) tailandês anunciou a criação de um programa de fiscalização para combater o uso de trabalho símio. (BG)
ilustrações A Felipe Del Rio. B Tiago Araujo. fonte 1 Micro- and Nanoplastics Breach the Blood–Brain Barrier (BBB): Biomolecular Corona’s Role
Revealed. V Kopatz e outros, 2023.2 Evolutionarily conserved role of oxytocin in social fear contagion in zebrafish. I Akinrinade e outros, 2023.
maio 2023 super 11
 sn.
O cantor britânico
Ed Sheeran ameaçou
encerrar a carreira
caso fosse condenado
por plágio.
ENQUANTO
ISSO...
Texto Luisa Costa
Ilustração Caroline Aranha
Um projeto analisou os genomas
de 240 mamíferos, para enten-
der melhor a evolução desses
animais – e dos humanos A.
Arqueólogos podem ter
encontrado os primeiros restos
mortais dos tartessos, um povo
ibérico que desapareceu
há 2,5 mil anos B.
Um estudo sugeriu que o
X. truncata, um sapo brasilei-
ro, é o primeiro exemplo de
anfíbio polinizador: que espa-
lha pólen entre as plantas C.
A sonda espacial Hope, dos
Emirados Árabes, capturou
as imagens mais precisas
da menor lua de Marte,
Deimos, até hoje.
fontes A Zoonomia Project.
B CSIC (Espanha). C Universidade Federal
de Mato Grosso do Sul.
12 super maio 2023
CIENTISTAS ENVELHECEM ÁRVORES DE PROPÓSITO
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Método promete corrigir problema ambiental na Europa; veja por que.
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QUANDO UMA ÁRVORE fica muito velha,
ela começa a apodrecer: fungos vão co-
lR
mendo a madeira, e formando cavida-
des no centro do tronco. É um processo
natural e importante para o equilíbrio
si
ecológico – estima-se que, em todo o
a
mundo, milhares de espécies de pás-
Br
saros, mamíferos e insetos dependam
dele (porque se alimentam da madeira
decomposta ou de larvas presentes nela).
Mas, segundo cientistas europeus, os
troncos podres estão em falta. Árvores
centenárias estão morrendo, e ainda não
há plantas velhas em quantidade sufi-
ciente para alimentar os fungos. Uma
possível solução para o problema seria
envelhecer artificialmente espécimes
novas. A Super conversou com Lynne
Boddy, micologista da Universidade de
Cardiff (Reino Unido), que está desen-
volvendo essa técnica.
Como é feito o envelhecimento ar,fi-
cial de uma árvore?
Primeiro, é preciso descobrir quais es-
pécies de !ngos realmente crescem nos
!oncos das árvores velhas. Aqueles que
causam o apodrecimento do !onco, pro-
duzindo um bom habitat para [o surgimen-
to de] ou!os organismos, são cul!vados
em laboratório, em blocos de madeira. Aí
nós fazemos buracos nos "oncos de ár-
vores novas, e encaixamos esses blocos
colonizados [por !ngos] neles. É o que
chamamos de inoculação.
Como vocês escolhem as árvores?
Árvores antigas não devem ser inocu-
ladas, porque a madeira de seus troncos
centrais já começou a se deteriorar, e
seria errado interromper as comunidades
[de fungos] que se estabeleceram natu-
ralmente nelas. As árvores adequadas
para o processo são aquelas que ainda
não estão totalmente amadurecidas.
A idade ideal [para a inoculação] varia
entre as espécies, assim como a vida de-
las: os carvalhos costumam viver mil
anos, por exemplo, mas a bétula vive
de 125 a 150. Nós já inoculamos faias
[árvores que vivem de 200 a 300 anos]
com 50 a 60 anos de idade.
Há provas de que a técnica funciona?
Vamos levar de 20 a 30 anos para saber
com certeza. No entanto, após três anos
[dos primeiros testes], parece que conse-
guimos formar colônias de fungos no
centro das árvores que inoculamos. Além
disso, outras espécies de fungo coloniza-
ram naturalmente os buracos que fize-
mos. E exames de ultrassom mostraram
que a densidade da madeira das árvores
inoculadas está mudando – e que a de-
composição [do tronco] está começando.
(Luisa Costa e Bruno Garattoni)
 Governo dos EUA já deve US$ 31 #ilhões
Dívida é maior do que o PIB desde 2014; 25% dela é devida a ou#os países, inclusive o Brasil*.

RELAÇÃO DÍVIDA/PIB EVOLUÇÃO DA DÍVIDA, EM DÓLARES EVOLUÇÃO DA DÍVIDA, EM % DO PIB

123,6%
35 TRILHÕES 140%

30 TRI 120%

25 TRI 100%
US$ 25,4 trilhões
US$ 31,4 trilhões

20 TRI 80%

15 TRI 60%

10 TRI 40%

5 TRI 20%

0 0%
as
1922

1942

1962

1982

2002

2022

1950

1960

1970

1980

1990

2000

2010

2020
DÍVIDA PIB DOS EUA
t
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PARA QUEM O GOVERNO DEVE: para outros países*: US$ 7,7 trilhões
ev

1 canaDá:
lR

para americanos: japão: china:

US$ 254 bilhões
US$ 23,3 trilhões US$ 1,1 US$ 859
trilhão bilhões
si

2 ínDia:
US$ 232 bilhões
a
Br

3 brasil:
US$ 214 bilhões
US$ 668
uniDo:

bilhões
reino

1 2
4 frança:
US$ 183,9 bilhões
3 4 5 6 7
5 arábia sauDita:
US$ 111 bilhões
outros:
US$ 1,9 trilhão 6 coreia Do sul:
US$ 105 bilhões

7 alemanha:
US$ 91 bilhões

*Boa parte das reservas internacionais de cada país, ou seja, os dólares que ele tem,
está aplicada em títulos da dívida americana. fonte US Treasury.

69
horas por semana passaria a ser o limite de trabalho na Coreia do Sul, segundo novas
regras propostas pelo governo do país. Mas a repercussão foi ruim, e as autoridades
recuaram: ficou mantida a norma atual, que prevê um máximo de 52 horas por semana
(sendo 40h normais e 12 extras, com remuneração adicional). Esse limite foi instituído
em 2017, após uma onda de casos de gwarosa – morte por excesso de trabalho – na
Coreia. No Brasil, o máximo permitido pela legislação são 56h semanais (sendo 44 horas
normais e 12h extras). (BG)

Ilustração Tiago Araujo.

maio 2023 super 13
 sn.

3 NOTÍCIAS SOBRE
Anorexia
está
A camada de ozônio ligada
Ela está se recuperando. Mas seu arqui-inimigo continua por aí. a micró-
bios
Cientistas
dinamarqueses
analisaram a
flora intestinal
de 77 mulheres
que sofrem de
anorexia nervosa,
distúrbio que
impede a pessoa
as
de se alimentar
adequadamente, e
t

outras 70 que não

is

têm a doença6.
ev

Nas pacientes
com anorexia (o
lR

estudo só analisou
mulheres porque
elas correspon-
si

1. 2. 3. dem a 95% dos

a

casos da doença),
Br

Buraco deve fechar em
pouco mais de 20 anos
A estimativa é da ONU, que
publicou uma análise sobre
a recuperação da camada de
ozônio3. O buraco do Ártico
será o primeiro a se recuperar
totalmente, em 2045 – o da
Antárctica levará mais tempo,
até 2066. As regiões polares
são as mais afetadas porque
têm nuvens muito frias e
estáveis, que acabam concen-
trando os gases destruidores
da camada de ozônio. (BG)
havia níveis
Emissão de CFCs Gás contamina o ar anormais de várias
tem volta misteriosa de cidades nos EUA espécies de bac-
Os clorofluorcarbonos, usados A camada de ozônio protege a téria. Em seguida,
em geladeiras e aparelhos de Terra dos raios do Sol. Mas ela os pesquisadores
ar-condicionado, foram banidos fica longe de nós, na estratosfe- reproduziram
em 2010 – porque, ao escapar ra; se inalado, o ozônio é tóxico.
para a atmosfera, esses gases E as cidades de Los Angeles e essa distorção em
destroem a camada de ozônio. Long Beach, na Califórnia, são ratos de laborató-
Mas um novo estudo4 revela as mais afetadas por isso: lá rio – que tiveram
que, apesar dessa proibição, os o "ozônio de baixa altitude" a microbiota
níveis de CFCs aumentaram na alcança níveis prejudiciais modificada, e
última década. A tese é que eles durante 177 dias por ano5. Ele
estejam sendo gerados aciden- é formado pela recombinação desenvolveram
talmente durante a produção de gases poluentes emitidos sintomas típicos
industrial de outros gases. (BG) por carros e fábricas. (BG) da anorexia. (BG)
Fonte Forbes 2023 World Billionaires List

Número De Quanto Os 5 mais ricos

Ul!a-ricos bilionários eles têm,
no munDo somaDos 1. Bernard Arnault* 2. Elon Musk 3. Jeff Bezos 4. Larry 5. Warren
perderam Ellison** Buffett***
2.668 2.640 US$ US$ 211 BI US$ 180 BI
meio 12,7 TRI US$
12,2 TRI
US$ 114 BI US$ 107 BI US$ 106 BI
!ilhão +US$ 53 BI
+US$ 1 BI
E 28 deles
deixaram de
ser bilionários. -US$ 39 BI -US$ 57 BI -US$ 12 BI
2022 2023 Fortuna Variação
*Dono da Louis Vuitton e outras marcas de luxo. **Dono da empresa de software Oracle. ***Megainvestidor.
14 super maio 2023
 NÃO É BEM
ASSIM...
Notícias que
bombaram por
aí – mas não
são verdade

A NOTÍCIA
Pipoca de mi-
croondas contém
"substâncias
eternas"
t as

O QUE ELA DIZIA

is

A pipoca está contami-

nada por PFAS (poliflu-
ev

oroalquis), uma família

de compostos químicos
lR

extremamente estáveis,
que não se decompõem
– e vão se acumulando
POPULAÇÃO GLOBAL PODE CAIR PARA 6 BILHÕES
si

no organismo. Foi o que

constatou um estudo
a

Redução ocorreria até o final deste século – e ajudaria a conter aquecimento global. que analisou quatro
Br

marcas de pipoca
vendidas nos EUA8.
A ESTIMATIVA É do Clube de Roma, uma 2050. A partir daí, a redução nas taxas de
associação que inclui mais de 100 cientis- natalidade fará com que ela comece a cair,
A VERDADE
tas, diplomatas e políticos de vários países podendo chegar a 6 bilhões em 2100 (a Os PFAS são usados
– e ficou famosa, nos anos 1970, ao publicar mesma quantidade de gente que o mundo como antiaderentes,
Os Limites do Crescimento, um livro que pre- tinha em 1999). Essa redução, diz o docu- para evitar que o
via o esgotamento dos recursos naturais mento, deverá ajudar a frear o aquecimento saco de pipoca grude
e o declínio das sociedades, em meados global. Mas o estudo também afirma que a no milho. O estudo
constatou a presença
do século 21, devido à superpopulação do superpopulação do mundo não é a principal deles nas embalagens,
mundo. Agora, o grupo elaborou um no- causa das mudanças climáticas – e sim o mas não na pipoca
vo estudo7 em que enxerga um cenário uso intensivo de combustíveis fósseis e em si – que não foi
oposto, bem mais otimista: afirma que a recursos naturais pelos 10% mais ricos da testada. Portanto,
população global deve alcançar o pico em população global. (BG) não é possível afirmar
que haja risco à saúde.
Ou que, se existir, ele
seja maior que o de
cozinhar alimentos
Reino Unido estuda proibir anúncios de "bet" em panelas com
revestimento antiade-
rente – que também
O PARLAMENTO INGLÊS está debatendo a proibição total das propagandas dos sites e aplicativos contêm PFAS, e
de apostas esportivas, um setor que chegou recentemente ao Brasil – onde tem promovido uma liberam fragmentos
avalanche publicitária na TV, na internet e nas camisas dos times de futebol. No Reino Unido as dele. Um estudo feito
em 2007 pelo governo
empresas de bet já são proibidas, desde o ano passado, de usar celebridades e atletas em suas
americano constatou
propagandas. Mais da metade da população britânica apoia o banimento total dos anúncios delas que 98% das pessoas
– que Holanda e Bélgica já impuseram. As apostas esportivas são consideradas um problema social tinham PFAS no
na Europa, pois alimentam o vício em jogos de azar. (BG) sangue9. (BG)

ilustrações Tiago Araujo. fontes 3 Scientific assessment of ozone depletion. UN Environment Programme, 2022. 4 Global increase of ozone-depleting chlorofluorocarbons from 2010 to
2020. LM Western e outros, 2023. 5 State of the Air. American Lung Association, 2023. 6 The gut microbiota contributes to the pathogenesis of anorexia nervosa in humans and mice. O
Pedersen e outros, 2023. 7 People and Planet 21st-century sustainable population scenarios and possible living standards within planetary boundaries. The Club of Rome/Earth4All, 2023. 8 maio 2023 super 15
Toxic hazards in microwave popcorn. IPEN, 2023. 9 Polyfluoroalkyl Chemicals in the U.S. Population: Data from the National Health and Nutrition Examination Survey. A Calafat e outros, 2007.
 sn. PLAYLIST
Sem
palavras
1. O motivo
P arte da renda de um
roteirista nos EUA vem
de residuals – um dinheiro
extra que é pago sempre que
há uma reprise de filme ou
episódio de série em que ele
colaborou. Em 2007, a prin-
cipal pauta do sindicato
era o crescente consumo
de DVDs – alegavam que
o repasse da grana desse
mercado aos escritores era
injusta (a discussão, hoje, é
o streaming).
2. Para tudo
60 programas de TV foram
afetados, além de deze-
nas de filmes – mesmo durante
as filmagens, é comum haver
Br
reescritas de roteiro, algo que a
greve também brecou. Os talk
shows diários foram os primeiros
a parar. Algumas semanas depois,
voltaram – sem roteiristas. O jeito
foi improvisar: num dos casos mais
famosos, o apresentador conan
o'brien testou por quanto tempo
ele conseguia manter um anel
girando em cima da mesa.
PÉROLAS DO
STREAMING
16 super maio 2023
Mais de 11 mil roteiristas entraram em greve nos EUA em maio,
exigindo melhores salários e condições de !abalho. Não é a primeira
vez: relembre como a úl!ma paralisação, em 2007, afetou Hollywood.
Texto Rafael Battaglia • Design Cristielle Luise e Caroline Aranha
as
t
is
ev
lR
3. Altos e baixos
N aquele ano, séries de TV
foram encurtadas: The
si
Office teve 19 episódios contra os
a
24 habituais (o ator Steve Carell,
em apoio à greve, recusou-se a
gravar mesmo os capítulos com
roteiro finalizado). E alguns pro-
gramas saíram mais prejudicados
do que outros. Heroes recebeu
elogios quando estreou, em 2006.
A greve deixou a 2a temporada
com apenas 11 episódios, e as
alterações na história afastaram
o público. A série acabou can-
celada dois anos depois.
filme
Bardo (2022)
Netflix
Silverio Gama faz documen-
tários sobre as mazelas de seu
país, o México. Os EUA querem
usar Silverio com objetivos
geopolíticos e decidem comprar
sua cooperação, dando a ele um
prêmio de jornalismo. Ele vai
aceitar. Mas, ao mesmo tempo,
não vai. Filme escrito e dirigido
por Alejandro Iñárritu, autor de
Birdman e Amores Perros. (BG)
5. Sem prêmio
A greve durou 100 dias
e acabou em fevereiro
de 2008. Por causa dela, não
houve cerimônia do globo
de ouro – o prêmio, que
costuma ser entregue em
janeiro, é todo roteirizado.
A paralisação envolveu 38
mil trabalhadores e teve
um impacto de US$ 2 bilhões
na economia de Los Angeles,
onde fica Hollywood. E olha
que ela nem foi a maior greve
da categoria: em 1988, os ro-
teiristas pararam por 153 dias.
4. Os fãs
agradecem
A temporada inaugural de
Breaking Bad teria 9 episó-
dios; com a greve, foram 7. Parece
pouco, mas foi o suficiente para
que o criador da série, Vince
Gilligan, revisse alguns pontos
da história. Originalmente, o
personagem hank (dean
norris) morreria no último
capítulo da temporada, e Skyler
(Anna Gunn) descobriria que seu
marido, Walter (Bryan Cranston),
produzia drogas – algo que só
aconteceu mais para frente.
filme
Inspire, Expire
(2018)
Netflix
A islandesa Lara está na pior: não
consegue nem pagar o aluguel.
Mas arruma emprego trabalhan-
do como oficial da imigração. Já
no primeiro dia ela barra uma
mulher, a africana Adja, que viaja-
va com passaporte falso e é presa.
A partir daí, os caminhos das
duas se cruzam de formas
surpreendentes. (BG)
imagens Reprodução/Divulgação.
 EDIÇÃO BRUNO GARATTONI

“O que
alimentava
a imprudên-
cia de
Charles era
o pânico",
conta a jornalista
americana Tina Brown
O OUTRO Um SimCity ao contrário neste livro sobre os es-
cândalos da família real

LADO DAS
CRUZADAS
1096. o sultão Kilij Ars-
lan I é informado de que
um bando de ocidentais
em vez De criar ciDaDes do zero, o objetivo deste game é restaurar luga-
res degradados pela ação humana. Você constrói usinas de energia limpa,
recolhe lixo dos oceanos, refloresta áreas desmatadas, salva espécies amea-
britânica – das estripu-
lias sexuais do então
príncipe Charles, que não
çadas de extinção – sem gastar mais do que cada sociedade arrecada. (BG)
Terra Nil. Versão mobile grátis, no app do Netflix. Para PC, R$ 74 (Steam).
aceitava se casar com
Diana, ao envolvimento
do príncipe Andrew
as
com um esquema de
tráfico de mulheres. O
t

ruma em direção a Cons- livro é resultado de uma

is

tantinopla. Ele tem só 17 investigação histórica

rigorosa, com mais de
ev

anos, e ainda não sabe

o que aquelas pessoas, 120 entrevistas. (BG)
lR

que os turcos chamam Os Arquivos do Palácio.

de franj ("francês"), pre- R$ 69.
tendem. Não será bom.
si

Neste livro, o libanês

Amin Maalouf parte de
a

registros milenares para

ASSIM CAMINHA A HUMANIDADE O prazer
Br

mostrar as Cruzadas
sob a perspectiva dos
atacados. Uma história em 2018, a proDutora japonesa Enhance reinventou um clássico. Tetris
Effect, versão modernizada do jogo soviético de encaixar peças, rapida-
em uma
cheia de momentos
inacreditáveis – como
o cerco à cidade síria de
mente se tornou um hit. Seu novo game é totalmente diferente (você
comanda um cachorro, que ajuda uma multidão de pessoas a atravessar
molécula
Trípoli, que durou mais cenários 3D), mas a essência é parecida, baseada no raciocínio espacial. C 8 H 1 1 N O 2 . E ss a é a
de 2 mil dias. (BG) Pode ser jogado na TV ou com capacete de realidade virtual. (BG) fórmula da 3,4-dihidro-
xi-feniletanamina – mais
As Cruzadas Vistas Humanity. Para PlayStation e Windows (Steam). US$ 30. Grátis para
conhecida como dopami-
pelos Árabes. R$ 60. assinantes do serviço PlayStation Plus.
na. É o neurotransmissor
do desejo e da recompen-
sa, que o cérebro libera
quando fazemos coisas
filme Documentário prazerosas – e também
Sharper (2023) S#ll: Ainda sou antes, para nos induzir a
Apple TV+ Michael J. Fox buscá-las. Neste livro, o
Madeline (Julianne Moore) (2023) psiquiatra Daniel Liber-
é casada com um ricaço e Apple TV+ man e o escritor Michael
leva uma vida ótima. Exceto
Em 1991, ele tinha acabado
Long investigam esses e
por Max, seu filho de outro outros efeitos dela: que
de estrelar a trilogia De Volta
casamento, que só dá dor também é o motor da
para o Futuro. Estava com
de cabeça: vive enchendo a criatividade, mas, em
tudo. Mas aí foi diagnosticado
cara e arrumando confusão.
com Parkinson, e começou a excesso, pode causar
O marido de Madeline tenta
luta contra a doença. A coisa esquizofrenia. (BG)
resolver o problema – só que
foi piorando, e mudou sua vida
ela, e o filho, não são o que Dopamina: a Molécula
de várias formas. Que, agora,
aparentam. (BG)
ele mostra neste doc. (BG) do Desejo. R$ 48.

maio 2023 super 17

 sn. TECH

A evolução As televisões desse tipo sempre tiveram cores

e contraste imbatíveis, mas seu brilho ficava aquém

do OLED das LCDs. Uma nova tecnologia promete mudar isso.

Texto Bruno Garattoni • Design Cristielle Luise

AS LENTES
Cada pixel é coberto
por até 5.000
delas, que têm
aproximadamente 2
micrômetros (0,002
milímetros) de altura
– e guiam a luz emitida
pela camada OLED.
t as
is
ev
lR
si

Luz Luz
a
Br

Placa de vidro Placa de vidro

Subpixels Resina
Microlentes
Resina
Subpixels
Filme protetor
Filme protetor
Cátodo (polo positivo) Cátodo
Camada orgânica (OLED)
Camada orgânica (OLED)
Ânodo (polo negativo)
Ânodo
Substrato de silício Substrato de silício

OLED CONVENCIONAL OLED COM MLA

EM 2022 a Samsung finalmente começou a produzir
televisões de OLED, e com algo a mais. Elas (que ainda
não são vendidas no Brasil) têm uma camada de “pontos
quânticos”: cristais feitos de materiais como cádmio e
índio, que emitem luz e aumentam o brilho da tela. Agora
sua arquirrival LG, que domina o mercado de telas OLED,
apresentou a resposta: a tecnologia Micro Lens Array,
ou MLA, com lentes que recobrem a tela e também
prometem deixá-la bem mais brilhante – segundo a LG,
as televisões com o novo sistema conseguem superar
2.000 nits de luminosidade. Isso é o dobro das OLEDs
comuns, e um nível só atingido pelas melhores telas de
cristal líquido (que, por outro lado, têm menos contraste).
Nas televisões OLED tradicionais, parte da luz é perdida
ao atravessar as camadas da tela: alguns raios batem nos
cantos dos pixels, e não conseguem sair [veja no infográfico].
A tecnologia MLA promete resolver isso, pois suas lentes
guiam os raios luminosos. Ela está presente nas novas
televisões da linha OLED Evo C3 e G3 – nas quais é iden-
tificada com o nome de Brightness Booster. Os modelos
estão sendo lançados nos EUA, com preços entre US$ 1.899
(C3 de 55 polegadas) e US$ 6.499 (G3 de 83 polegadas).

18 SUPER MAIO 2023 Fotos Reprodução/Divulgação

 EDIÇÃO BRUNO GARATTONI

350 quilômetros VOCÊ DECIDE

ESSE É O ALCANCE da bicicleta elétrica Fuell
Flluid-2S, que tem um novo patamar de Os projetos mais
autonomia (os modelos comuns ficam em interessantes
torno de 50 km). Seu segredo está nas baterias (e surpreendentes)
– são duas, com capacidade combinada de do mundo do
2.000 watts-hora, alojadas dentro do quadro. crowdfunding
A bike tem câmbio automático de 7 marchas,
velocidade máxima de 48 km/h e um app
antifurto, que permite localizá-la via GPS. Como
nada é perfeito, ela é cara (US$ 5.995) e pesa 39
kg. O modelo Flluid-3 (US$ 3.699) pesa menos,
35 kg, e tem autonomia de 180 km.

Colmeia artificial
as
indiegogo.com
Projeto HIIVE – better for
t
is

bees
O que é Uma colmeia feita de
ev

pano. Ela protege as abelhas

do frio e do calor, simulando a
lR

temperatura de um tronco de
árvore, e facilita a colheita do
mel: basta soltar o comparti-
si

O toca-discos vertical mento superior, sem correr o

a

risco de picadas. Também mo-

Br

O BLACK WHEEL, da marca holandesa Miniot, parece desafiar a física: nitora a umidade e quantidade
onde estão seu braço e agulha, e como conseguem tocar em pé? Eles de abelhas dentro da colmeia
ficam ocultos, atrás do disco de vinil, e são do tipo linear: o movimento (essas informações aparecem
do braço, que tem apenas 5 cm, é controlado por um motor elétrico no seu smartphone).

PULSEIRA (o sistema também mantém a agulha pressionada contra o disco).

O resultado visual é muito bonito – e o Miniot vem um com LP
transparente, para que você veja seus segredos. O aparelho (que deve
Quanto já arrecadou
US$ 190 mil
Chance de rolar bbb

DISCRETA ser conectado a um amplificador e caixas de som) custa 3.799 euros.

Lentes renovadas
A BELLABEAT IVY (US$ 249)

NO ESCURO,
kickstarter.com
parece só uma bijuteria, sem
funções eletrônicas. Mas re- Projeto ReO2
gistra o quanto você andou O que é Um gadget que
durante o dia e analisa a
qualidade do seu sono: ela
consegue fazer isso porque
MAS EM CORES promete limpar e restaurar
lentes de contato. Você co-
loca as lentes nele (com uma
tem sensores de movimento A ARLO ULTRA 2 (US$ 800 o kit com duas) solução de cloreto de sódio
e um sensor óptico, que cap- parece só mais uma câmera de vigilância: 0,9%, vendida em qualquer
ta os batimentos cardíacos é sem fio, tem resolução 4K e zoom farmácia) e espera 10 minutos.
e o ritmo respiratório. As digital de 12x. Mas conta com truques O dispositivo usa uma técnica
informações aparecem interessantes, como som bidirecional chamada eletroforese: aplica
num aplicativo – que tam- (além de ouvir o local, também dá para corrente elétrica de baixa
bém acompanha o ciclo falar com quem estiver lá), carregamento intensidade sobre as lentes,
menstrual, informando por energia solar (com uma plaquinha soltando as microimpurezas
quando ele irá mudar de externa, de US$ 60) e visão noturna colo- que estiverem grudadas nelas.
fase. A pulseira usa uma ba- rida – ao detectar movimento, a câmera Quanto já arrecadou
teria recarregável, que dura aciona um LED iluminador, que permite US$ 55 mil
uma semana. gravar com as cores normais. Chance bbb

MAIO 2023 SUPER 19

 CAPA

O ro la do d o
o u t IC
P
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M
t

E
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a
Gar Des
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Br u Rio
ex to Del
T p e
i
Fel
ão
s t raç
Ilu

Criado para tratar a diabetes, ele virou

moda para outra coisa: emagrecer.
As vendas dispararam. Mas a euforia
esconde dois pontos críticos: ele precisa
ser tomado pelo resto da vida (ou a pessoa
engorda de novo), e os medicamentos
desse tipo têm uma questão mal
resolvida envolvendo o risco de câncer.

20 super maio 2023

 tas
is
ev
lR
si
a
Br

maio 2023 super 21

 “
“TODO MUNDO ESTÁ TÃO BONITO.
Eu olho esta sala, e não posso deixar
de me perguntar: o Ozempic é certo para
mim?”, disse o comediante e apresen-
tador Jimmy Kimmel no monólogo de
aber!ra do Oscar 2023. Foi uma piadi-
nha: ele usou uma frase "adicional nas
propagandas da indús"ia farmacêu!-
ca nos EUA (“pergunte ao seu médico
se o remédio tal é certo para você”). O
Ozempic virou mania em Hollywood,
e Kimmel quis cu"car os ar!stas pre-
sentes – vários dos quais talvez usem
lR
si

is
ev
tas
a

o medicamento. Nos últimos meses,

Br

celebridades de diversos naipes, do

empresário Elon Musk à cantora Jojo
Todynho, admi!ram recorrer ao Ozem-
pic, desenvolvido con#a a diabetes !po
2, para perseguir ou#o obje!vo: perder
peso (um efeito secundário da droga).
Em 2022, a farmacêu!ca dinamarque-
sa Novo Nordisk fa"rou US$ 8,5 bilhões
com o Ozempic, que mesmo custando
caro (por volta de R$ 1.000 mensais)
ficou em falta nas farmácias dos EUA e
do Brasil. O TikTok está cheio de vídeos
de pessoas mos#ando o corpo antes e
depois do remédio, que já rendeu até o
primeiro meme nas redes sociais – o
chamado “rosto de Ozempic”, em que
as pessoas ficam com a cara chupada
devido ao rápido emagrecimento.
Em junho de 2021, o fabricante obte-
ve aprovação da FDA e da Anvisa para
lançar ou#o produto, o Wegovy, com
o mesmo princípio a!vo do Ozempic,
a semaglu!da – a diferença é que ele
tem doses mais altas, e é especificamente
indicado para combater obesidade ou
sobrepeso. Já está no mercado americano,

22 super maio 2023

 tem que tomar a semaglu"da pelo resto
da vida, ou engordará de novo. E essa
droga, assim como ou#as de ação si-
o ozempic
milar, tem uma relação mal resolvida O corpo produz duas ondas dele,
e outros com o perigo de câncer – tanto que sua 15 e 30 minutos após a refeição. Mas
remédios bula #az uma advertência sobre o risco o GLP-1 dura pouco. Sua “meia-vida”
similares do surgimento de !mores na "reoide. é de apenas 120 segundos, ou seja, dois mi-
reproduzem nutos depois que ele é liberado, metade já
a ação de
um hormô-
5 mil vezes mais tempo se decompôs (o processo con"nua até que,
nio – por Os hormônios estão en#e as coisas mais em 30 minutos, 99% já sumiu). Isso acon-
isso, eles fascinantes do corpo humano: mesmo tece porque, logo depois de soltar o GLP-1,
são conhe- presentes em concen#ações ínfimas, da o organismo também libera a arqui-
cidos como ordem dos picogramas (#ilionésimos de inimiga dele: a dipep"dil pep"dase-4,
“análogos
de GLP-1”.
grama), eles con#olam várias funções do uma enzima que quebra as moléculas
organismo. E o GLP-1, ou “peptídeo se- desse hormônio. O Ozempic e similares
melhante ao glucagon-1”, é um dos mais são versões ar"ficiais do GLP-1, com uma
incríveis. Quando você come alguma coi- diferença: suas moléculas foram altera-
e deve chegar ao Brasil no sa, os pedaços da comida vão descendo das em laboratório, e por isso resistem à
segundo semestre. As até cair no intes"no. Assim que isso acon- ação da enzima des#uidora. Ao con#ário
ações da Novo Nordisk tece, o corpo começa a liberar GLP-1, que do GLP-1 na!ral, a versão sinté"ca du-
dobraram de valor nos a!a sobre vários órgãos (ele tem esse ra muito: a “meia-vida” da semaglu"da
úl!mos dois anos, e ago- nome porque sua molécula é parecida (princípio a"vo do Ozempic) é de sete dias
as
ra os concorrentes tentam com a de ou#o hormônio, o glucagon, 1
. Ou seja, ela age no organismo 5 mil
pegar carona nessa onda: embora sua função seja diferente). vezes mais tempo que o hormônio na!ral.
t

Pfizer e Novartis estão O GLP-1 manda o pâncreas aumentar A semaglu"da não foi o primeiro
is

desenvolvendo drogas a produção de insulina – porque você GLP-1 ar"ficial a chegar ao mercado:
ev

do !po, e a Eli Lilly pre- acabou de comer, e o nível de glicose no antes vieram dois ou#os, a exena"da e a
tende começar a vender seu sangue vai aumentar. Diz para o es- liraglu"da [veja quadro na pág. 27]. A di-
lR

o Mounjaro (!rzepa!da), tômago segurar um pouco os alimentos ferença é que a semaglu"da é a primeira
seu produto an!diabetes, que ainda es"verem den#o dele, pois isso droga de longa duração, que só precisa
como emagrecedor. Até o gera a sensação de saciedade. Também ser aplicada uma vez por semana. Essa
si

final da década, as novas pene#a no cérebro e vai até o hipotálamo, classe de remédios (conhecidos como
a

drogas an!obesidade de- onde se conecta a receptores específicos “análogos” ou “agonistas” de GLP-1) é
Br

vem alcançar US$ 54 bi- e desliga os sinais de fome. Resumindo: ú"l con#a a diabetes porque eles au-
lhões de fa!ramento anu- esse hormônio ajusta o corpo para a di- mentam consistentemente a produção

54
al, segundo es"ma"va do gestão, e faz você parar de comer. de insulina no organismo. O emagreci-
banco americano Morgan mento é só um efeito secundário. Cos-
Stanley. Elas são a respos- !ma ser intenso. Es!dos com o Wego-
ta da indús#ia farmacêu- vy – a versão “mais forte” do Ozempic,
"ca para o engordamento indicada para obesidade – mos#aram
do mundo, que já alcançou uma redução média de 14,9% no peso
proporções alarmantes: corporal após um ano e meio de uso
nos EUA, 42% dos adul- do remédio (con#a 2,4% das pessoas
tos são obesos e 30% estão que tomaram placebo). É bastante coisa:
acima do peso (no Brasil, numa pessoa de 70 kg, por exemplo, dá
20% são obesos e 57% 10,5 kg a menos na balança. Os testes
têm sobrepeso). clínicos do Mounjaro ("rzepa"da), do
Mas a euforia em torno laboratório Lilly, apontaram um efeito
do Ozempic esconde dois similar, com perda de 14,7% do peso
pontos críticos. Geral- corporal em um ano e meio.
mente as reportagens so- Esse é o efeito máximo de cada remé-
bre o remédio informam bilhões de dólares deverá ser o dio; o peso se estabiliza nesse patamar,
que ele pode causar diar- faturamento anual dos novos e não cai mais. Aí você pode parar de
reia e enjoo, e não deve remédios antiobesidade a partir tomar o medicamento, e só dar uma ma-
ser usado sem orientação neirada na alimentação para manter o
médica, mas param por aí. de 2030. Eles têm mercado: nos novo corpinho, certo? Errado. Um es!do
Só que há questões mais EUA, 72% das pessoas estão publicado por cien"stas dos EUA, do
importantes. A pessoa acima do peso (no Brasil, 77%). Japão e de vários países europeus acom-
panhou 327 adultos que haviam usado a

fontes 1 Semaglutide, a glucagon like peptide-1 receptor agonist with cardiovascular benefits for management of type 2 diabetes. M Mahapatra e outros, 2022.
maio 2023 super 23
Como o Ozempic funciona
Sua substância ativa, a semaglutida, imita
a ação de um hormônio natural – mas em
uma escala radicalmente artificial.

1. O hormônio natural 2. O que ele faz

Quando você come alguma coisa, e
os pedaços de alimento começam
a chegar ao intestino, o corpo libe-
ra um hormônio chamado GLP-1
(“peptídeo semelhante ao gluca-
gon-1”, em inglês). Essa substân-
cia cai na corrente sanguínea e se
espalha pelo organismo.
O GLP-1 age sobre vários órgãos
ao mesmo tempo, com efeitos
bem diferentes em cada um. Mas
todos são partes de um mesmo
objetivo: reconfigurar o organis-
mo para fazer a digestão e frear o
seu apetite (afinal, você acabou
de comer).

cérebro: as moléculas de GLP-1

conseguem penetrar nele e agem
sobre o hipotálamo, fazendo com
que você pare de sentir fome.
as
Fígado: desacelera a produção de
glicose, e também recaptura um
t

pouco da que já estava circulando

is

no sangue.
ev

Pâncreas: aumenta a produção de

insulina (para compensar o aumento
lR

do nível de glicose no sangue que

ocorre após as refeições).
si

Estômago: desacelera a passagem

a

dos alimentos, que ficam retidos por

Br

mais tempo. Isso envia sinais de sa-

ciedade para o cérebro.

3. O remédio
A semaglutida age de forma similar ao GLP-1. Mas há uma diferença. O
hormônio natural atua por poucos minutos: ele é rapidamente decomposto
por uma enzima do organismo, a DPP-4. Já a molécula da semaglutida é
resistente a essa enzima, e por isso dura muito mais – sua meia-vida (tempo
que o corpo leva para eliminar 50% dela) é de uma semana.
Estrutura molecular
GLP-1 Semaglutida
H A E G T F T S D V S S Y L H Aib E G T F T S D V S S Y L
E E
G G
Q Q
G R G K V L W A I F E K A A G R G K V L W A I F E K A A

O
Aminoácidos HN O O N
O
O NH
O O H O
OH
HN
O O OH

4. O resultado
O medicamento aumenta a produção de insulina e reduz o nível de glicose
no sangue, tratando a diabetes (para a qual foi desenvolvido). Porém, como
também reduz o apetite, leva ao emagrecimento. O fabricante lançou um
remédio com mais semaglutida, o Wegovy, para isso [veja quadro na pág. 28].

fonte Semaglutide, a glucagon like peptide-1 receptor agonist with cardiovascular benefits for
management of type 2 diabetes. M Mahapatra e outros, 2022.
 58%
semaglu!da durante um abaixo do nome do re-
ano e meio. Enquanto médio, é a chamada “black
eles estavam tomando o box warning”: um retân-
remédio, perderam em gulo preto com advertên-
média 17,3% do peso. Até cias em negrito dentro,
mais que o esperado. Mas, exigido pela FDA em me-
assim que pararam, volta- dicamentos que envolvam
ram a engordar: após um risco de morte. Nos "ês
ano sem a semaglutida, casos, o texto é pra!ca-
já tinham recuperado mente idêntico: afirma
11,6% da massa corporal que a substância “causa
2
. Dois terços do que câncer das células C da foi o aumento na incidência de
!nham emagrecido. E as !reoide em ratos”, e que câncer de tireoide em pessoas que
pessoas só foram moni- “a relevância [disso] em usaram a semaglutida, apontou um
toradas nos primeiros 12 humanos não foi deter- estudo francês. Mas essa questão é
meses sem o remédio. minada”. Finaliza dizendo
Se o acompanhamento que a droga é con"aindi- mais complexa do que parece.
tivesse continuado por cada em pessoas com his-
mais tempo, o ganho de tórico familiar de câncer Ratos, macacos e gente
peso teria sido maior (na de !reoide ou “neoplasia O GLP-1 a!a sobre o pâncreas, o fígado
reta final do estudo, os endócrina primária !po e o cérebro, mas não só: ou"os órgãos
as
voluntários seguiam en- 2” (uma mutação gené!ca também têm receptores desse hormônio.
gordando, ainda que não que predispõe a esse !po Ele age na língua, onde parece regular
t

no ritmo explosivo dos de #mor). a sensibilidade a sabores doces 3 , e na

is

primeiros meses). Essas advertências !reoide – mais precisamente nas células

ev

O Ozempic e seus si- constam da bula profis- parafoliculares, ou células C (que têm
milares são remédios de sional, destinada a mé- esse nome porque sua função é produzir
lR

uso contínuo. Isso não é dicos. Nos EUA, as bulas calcitonina, um hormônio que con"ola
necessariamente um pro- para os pacientes são a quan!dade de cálcio no sangue).
blema – muitos medica- ainda mais diretas – a do Lembra que o GLP-1 sintético fica
si

mentos, como os que "a- Ozempic, por exemplo, um tempão agindo no organismo, mui-
a

tam hipertensão e coleste- orienta a pessoa a falar to mais do que o na#ral? Então: se você
Br

rol, também precisam ser com o médico se apa- injetá-lo em ratos, as células da !reoide
tomados “para sempre”. recer “um calombo ou deles serão ex"emamente es!muladas.
Ocorre que, ao con"ário inchaço no pescoço, voz Isso acaba gerando mutações, e #mo-
deles, os análogos de GLP- arranhada, dificuldade em res. Esse mecanismo foi demons"ado 4
1 têm um risco relevan- engolir ou falta de fôlego”, pela primeira vez com a liraglu!da, em
te. Na bula americana do pois “podem ser sintomas 2010, e também acontece com os ou"os
Ozempic, do Wegovy e do de câncer na !reoide”. Em “análogos de GLP-1” – é por isso que eles
Mounjaro, a primeira seguida, traz uma frase "azem as advertências na bula.
coisa que aparece, logo que chama a atenção pe- Mas o mesmo es#do que descobriu
lo tom indefinido: “Não o efeito em ratos testou a liraglu!da em
é sabido se Ozempic irá macacos, que receberam doses altíssi-
em ratos, a
causar #mores de !reoi- mas da droga (60 vezes mais que a usada
semaglutida de, ou um !po de câncer em humanos) durante 20 meses. E os
comprovada- chamado carcinoma me- primatas não desenvolveram câncer. O
mente causa dular de !reoide (MTC) es#do também observou os níveis de
câncer. em em humanos”. calcitonina em pacientes que usavam
humanos,
o risco é
Você deve estar pen- o remédio – se eles es!vessem aumen-
considerado sando: como assim “não tados, seria um sinal de problemas na
menor, mas é sabido” se causa câncer !reoide. Mas não estavam. Nos anos
não pode ser ou não? Como o remédio seguintes, ou"os "abalhos científicos
descartado foi aprovado mesmo com acompanharam pessoas que usaram
– e a bula
adverte a
essa incerteza? Por que o medicamentos do !po. E não detecta-
respeito. problema é na !reoide? ram aumento na incidência de #mores
E qual é o real nível de 5
. “Os seres humanos têm muito menos
risco? Vamos lá. células C do que os ratos, e as células C

fontes 2 Weight regain and cardiometabolic effects after withdrawal of semaglutide: The STEP 1 trial extension. J
Wilding e outros, 2022. 3 Glucagon-like peptide-1, a matter of taste? M Jensterle e outros, 2021. 4 Glucagon-Like
Peptide-1 Receptor Agonists Activate Rodent Thyroid C-Cells Causing Calcitonin Release and C-Cell Proliferation. L Knudsen
e outros, 2010. 5 A meta-analysis of serious adverse events reported with exenatide and liraglutide: Acute pancreatitis maio 2023 super 25
and cancer. C Alves e outros, 2012. 6 TikTok’s Fave Weight Loss Drugs: Link to Thyroid Cancer? R Pessah-Pollack, 2023.
 11%
de peso corporal foi o quanto as
pessoas engordaram, em média,
um ano após parar de tomar a
semaglutida. Isso é 2/3 do que elas
tinham emagrecido com o remédio.
humanas têm uma expressão muito bai-
xa do receptor GLP-1”, explica a médica
Rachel Pessah-Pollack, pesquisadora da
as
Universidade de Nova York e especialista
em !reoide, em um ar!go sobre o tema
t

6
. Em pessoas, os remédios análogos de
is

GLP-1 aparentemente não têm o poder

ev

de sobrecarregar a !reoide. “Os !mo-

res em roedores são causados por um
lR

mecanismo específico, e não podem ser

ex"apolados para humanos”, afirma a mé-
dica Cynthia Valério, da Sociedade Bra-
si

sileira de Endocrinologia e Metabologia

a

(SBEM). “Nos es!dos com a semaglu#da,

Br

em cerca de 25 mil pacientes, não #vemos

correlação, nem aumento de incidência, de
câncer de pâncreas ou #reoide”, diz Erika
de Souza, gerente médica de obesidade da
Novo Nordisk. “Nos programas clínicos
de fase 3 da semaglu#da, com exposições
de até dois anos, nenhum caso de carci-
noma medular da #reoide foi observado
em mais de 7.800 par#cipantes. Portanto
[...] a relevância dos !mores de células
C de roedores em seres humanos é con-
siderada baixa”, afirma o parecer técnico
da Anvisa sobre o Wegovy 7 .
Se é assim, por que as bulas têm as ad-
vertências que têm? É que, paralelamente
a todos esses es!dos, também há ou"os
– que apontaram, sim, relação en"e as
drogas GLP-1 e maior incidência de cân-
cer em pessoas. O primeiro foi publicado
em 2011 por cien#stas da Universidade da
Califórnia 8 , e mos"ou risco aumentado
de !mores de pâncreas e #reoide. Isso
não foi confirmado por ou"os es!dos,
realizados nos anos seguintes. Até que,
em ou!bro de 2022, a dúvida voltou. Um
grupo de cien#stas chineses mergulhou
fontes 7 Parecer Público de Avaliação do Medicamento: Wegovy. Anvisa, 2023. Disponível em bit.ly/3LKrczD 8 Pancreatitis, Pancreatic,
and Thyroid Cancer With Glucagon-Like Peptide-1–Based Therapies. M Elashoff e outros, 2011. 9 GLP-1 receptor agonist-associated tumor
26 super maio 2023 adverse events: A real-world study from 2004 to 2021 based on FAERS. R Li e outros, 2022.
 GLP-1 por um a !ês anos
foi associado ao aumento
de risco de todos os !pos
Os concorrentes
no Adverse Event Report de câncer de !reoide”. A A semaglutida não foi a primeira droga
System, banco de dados incidência desses !mo- antidiabetes a imitar o hormônio GLP-1.
em que a FDA regis- res foi 58% maior; consi-
tra problemas causados derando apenas o câncer Os remédios desse tipo existem há quase
por medicamentos. Eles medular de !reoide (um 20 anos – e a controvérsia também.
olharam os regis!os en- sub!po causado pelas cé-
tre 2004 e 2021, e che- lulas C, aquelas mesmas
garam a duas conclusões que são afetadas pelos re- 2005
exenatida
meio conflitantes 9 : médios emagrecedores), Amylin Pharmaceutics (hoje
os medicamentos “não 78% maior. pertencente à AstraZeneca) 2010
provocaram um aumento Então quer dizer que Foi o primeiro “análogo de Liraglutida
Novo Nordisk
desproporcional nos casos esses medicamentos de- GLP-1”, e um sucesso ins-
É injetável, como a exenati-
tantâneo – nos primeiros
de !mor”, mas, ao mesmo vem ser evitados a todo da, mas “só” precisa ser apli-
três anos, vendeu mais de
tempo, “sinais significa!- custo, então? Também não. US$ 700 milhões. Também cada 1 vez por dia (a ante-
vos foram encontrados Porque o es!do francês inaugurou a controvérsia cessora, duas). O fabricante
foi acusado de não informar
entre os agonistas de tem um porém. Em vez de em torno desse tipo de
remédio: em 2008, após adequadamente os médicos
GLP-1 e certos !mores, montar dois grupos com quanto ao risco de câncer
a morte de pacientes, a
incluindo cânceres de a mesma quantidade de FDA (a Anvisa dos EUA) de tireoide, e multado em
!reoide e pâncreas”. Por indivíduos (um tomando exigiu mudanças na bu- US$ 58 milhões pelo gover-
as
essa aparente con!adição os remédios e o ou!o não) la alertando para o risco no dos EUA.
(e por ter saído no Fron!ers e acompanhá-los ao longo de pancreatite.
t

in Pharmacology, um peri- do tempo, os cien!stas fi-

is

ódico pouco importante), zeram algo diferente. Pe- 2012

ev

o !abalho não repercu!u. garam 2.500 pessoas que Semaglutida

Mas aí, em fevereiro usavam os medicamentos Novo Nordisk 2014
Primeira droga de aplica- Dulaglutida
lR

deste ano, veio ou!o es- GLP-1 e !veram câncer de

ção semanal. É o princípio Eli Lilly
!do – com muito mais tireoide, e compararam ativo de Ozempic, Wegovy Aplicação semanal. Já
força. Ele saiu na Diabetes com outras 45 mil (em
si

e Rybelsus [veja quadro chegou ao mercado com

Care, a revista científica faixas etárias e condições na pág. 28]. Em 2021, re- a bula alertando sobre
a

da Associação Americana de saúde similares) que cebeu aprovação da FDA os riscos de pancreatite e
Br

para tratamento de obe- câncer de tireoide.

de Diabetes, e foi elabo- não desenvolveram esse
sidade e sobrepeso (não
rado por pesquisadores !po de !mor. Esse !po apenas diabetes).
de duas universidades de es!do, que se chama
francesas 10 . Eles anali- “caso-con!ole”, serve pa-
saram os dados de 47 mil ra medir a diferença en!e
pacientes, que tomaram dois grupos – mas não 2016
lixisenatida
exena!da ou liraglu!da permite calcular o risco Sanofi
por algum período en!e absoluto, ou seja, real. Tem de ser aplicada diaria-
2006 e 2018. Conclusão: Qual é o risco real? mente. Mas o fabricante fez
“o uso dos agonistas de Em média, há 3 casos de do limão uma limonada:
2021 lançou uma versão combi-
câncer da !reoide a cada tirzepatida nando lixisenatida e insuli-
100 mil homens, e 10 a Eli Lilly
na (que muitos diabéticos
O estudo Além de reproduzir o efeito
cada 100 mil mulheres precisam injetar todo dia).
que mediu o do hormônio GLP-1, tam-
11
. Então um aumento bém se conecta aos recepto-
reganho de
peso pós- desse número, mesmo se res de GIP (peptídeo inibidor
-Ozempic du- for percen!almente alto gástrico). Aplicação sema- 2026
rou 12 meses. (como os 58% do es!do nal. A bula adverte sobre o Semaglutida genérica
Se ele fosse risco de câncer de tireoide.
francês), pode acabar ten- A patente da molécula es-
mais longo, do um efeito pequeno na tá terminando, e o Ozem-
o efeito pic poderá ter uma versão
seria ainda sociedade como um todo. genérica no Brasil em 2026.
maior – pois Mas o risco individual O caso está na Justiça (o No-
os pacientes não é desprezível: en!e vo Nordisk alega que o re-
seguiam as mulheres, que são mais gistro do remédio demorou
engordando. afetadas pelo câncer de !- muitos anos, e gostaria de
ser compensado por isso).
reoide, ele é o sexto !po
mais comum de !mor 12 , fonte An overview of GLP-1 agonists and recent cardiovascular
outcomes trials. K Sheahan e outros, 2020.
fontes: ¹⁰ GLP-1 Receptor Agonists and the Risk of Thyroid Cancer. J Bezin e outros, 2022. ¹¹ The epidemiological
landscape of thyroid cancer worldwide: GLOBOCAN estimates for incidence and mortality rates in 2020. M Pizzato
e outros, 2022. ¹² Estimativa 2023: Incidência de câncer no Brasil. Instituto Nacional do Câncer (INCA), 2022. maio 2023 super 27

respondendo por 3,9% dos casos (quase
empatado com o câncer de pulmão, 4%).
Por outro lado, a obesidade em si
também eleva o risco de vários !pos
de câncer e ou"as doenças. Ela mata,
por causas diretas ou indiretas, 4 mi-
lhões de pessoas por ano no mundo,
segundo es!ma!va da OMS. Logo, os
medicamentos an!obesidade podem
salvar vidas. Os autores do estudo
francês não recomendam abandonar
os remédios GLP-1 – só dizem que os
médicos “devem estar cientes do risco
potencial”, e “monitorar cuidadosamente
os pacientes”.
Conclusão: não dá para afirmar que
o Ozempic e similares sejam perigosos,
mas também não é possível cravar que
não há o menor problema. Tanto que as
bulas "azem as advertências, e o fabri-
cante está fazendo mais dois es#dos
com a semaglu!da: um sobre #mores
de pâncreas, que ficará pronto em de-
zembro de 2024, e ou"o sobre câncer
de !reoide, que vai até 2035. “Como
se "ata de eventos raros, precisamos
de um grande número de casos e de
longo período de acompanhamento em
pacientes”, diz Souza, da Novo Nordisk.
a
A informação sobre risco de câncer, na
Br
bula do Ozempic, é um ponto delicado.
Nos Estados Unidos, tanto a bula para
médicos quanto a dos pacientes são bem
claras quanto a esse risco. No Brasil, a
coisa é um pouco diferente: a bula do
paciente não informa que a semaglu!da
causa #mores em ratos. Ela só diz, sem
maiores detalhes, que você deve avisar o
médico se já teve algum caso de câncer
de !reoide na família. E essa ins"ução
aparece no meio de ou"as orientações,
sem nenhum destaque. Por que a dife-
rença? Ques!onada pela Super, a Anvi-
sa respondeu o seguinte: “A bula para
o paciente é um documento resumido,
com termos mais acessíveis e diretos. Já
a bula para o profissional de saúde é um
documento mais completo, com conte-
údo detalhado tecnicamente. Con#do,
ambos os modelos estão disponíveis pa-
ra consulta pública”. Em ou"os países,
como Canadá e Reino Unido, a bula do
paciente também não "az a informação
sobre câncer em ratos.
No Reino Unido, aliás, a Novo Nordisk
se envolveu em "ês polêmicas recentes.
28 super maio 2023
Uma molécula,
três remédios
Eles são produzidos pelo
mesmo laboratório e têm a
mesma substância ativa, a
semaglutida. Mas as doses,
os usos – e os resultados –
são diferentes.
1. Ozempic
A semaglutida foi inventada
em 2012, mas só chegou ao
mercado dos EUA em 2017
(no Brasil, 2018). É uma in-
jeção subcutânea que o pró-
prio paciente aplica, usando
uma caneta (com uma agu-
lha bem pequena, inferior
a 1 cm). A dose começa em
as
0,25 mg/semana, durante o
primeiro mês, e depois pode
t
ser aumentada para 0,5 mg.
is
ev
2. Wegovy
lR
Também é uma injeção de
semaglutida, com a caneta.
Mas a dose é muito maior: 2,4
si
mg por semana. Foi aprovado
nos EUA em 2021 para tratar
sobrepeso (pessoas com Índi-
ce de Massa Corpórea acima
27) ou obesidade (pacientes
com IMC a partir de 30). Já
obteve permissão da Anvisa,
e deve ser lançado no Brasil
no segundo semestre.
3. Rybelsus
É uma versão oral, aprovada
para tratar diabetes – obesi-
dade não. Embora contenha
alta dose de semaglutida
(existem comprimidos de três,
sete e 14 mg, e o paciente to-
ma um por dia), menos de 1%
dela se torna biodisponível, ou
seja, é efetivamente absorvida
pelo organismo (na semaglu-
tida injetável, são 89%).
fonte Assessment report: Rybelsus (international non-
-proprietary name: semaglutide). European Medicines
Agency (EMA), 2020.
fontes: ¹³ Novo Nordisk is suspended from ABPI membership. ABPI, 2023. ¹⁴ RCGP statement on partnership with Novo Nordisk.
RCGP, 2023. ¹⁵ ‘Orchestrated PR campaign’: how skinny jab drug firm sought to shape obesity debate. The Guardian, 12/2/2023.

o fabricante
do ozempic
foi punido
pela asso-
ciação da
indústria
farmacêuti-
ca britânica.
motivo:
estava fa-
zendo pro-
paganda
disfarçada
do remédio.
Em março, a associação da
indústria farmacêutica
britânica (ABPI) decidiu
puni-la com dois anos de
suspensão 13 , alegando que
as
ela violou o código de con-
duta do setor, pra!cando
t
ações que podem “reduzir
is
a confiança na indús!ia”.
ev
Mo!vo: a Novo Nordisk
estaria oferecendo cur-
lR
sos para farmacêuticos,
no Linkedin, que na
verdade eram propagan-
si
da disfarçada dos seus
a
remédios an!obesidade.
Br
Após a revelação do caso,
a associação britânica de
clínicos-gerais (RCGP),
que reúne 54 mil médicos,
anunciou que iria encer-
rar sua “parceria” com o
laboratório, e devolver
as doações que recebera
dele 14 . O jornal inglês
Guardian descobriu que,
en!e 2019 e 2021, a Novo
Nordisk forneceu 75% do
orçamento da European
Associa!on for the S!dy
of Obesity (EASO), grupo
de médicos e pesquisado-
res que em tese é, ou de-
veria ser, independente 15 .
Esse tipo de conflito de
interesses é comum na
indús!ia farmacêu!ca – e
pode afetar a imparcialida-
de dos médicos.
A obesidade não é, como se acreditou
durante décadas, uma mera questão de
“força de vontade”: ela também envolve
fatores que independem do con!ole da
pessoa (mais sobre eles daqui a pouco).
Então os avanços farmacológicos são
bem-vindos. Mas é preciso tomar cuida-
do com eles. No começo dos anos 1990, a
combinação de fenfluramina e fentermi-
na, que ficou conhecida como fen-phen,
passou a ser amplamente receitada para
!atar a obesidade. Esses remédios !ra-
vam o ape!te, e as pessoas emagreciam.
Alguns anos depois, descobriu-se que a
fenfluramina causava danos cardíacos
graves – e em 1997 ela teve a produção
encerrada pelo fabricante, o laboratório
Wyeth (que teve de pagar indenizações
bilionárias na Jus!ça dos EUA).
Isso não significa que vá acontecer
algo similar com os análogos de GLP-1.
Eles já estão no mercado há uma década,
sem causar grandes problemas (embora
tenham sido tomados por muito menos
gente do que agora, com a popularização
do uso para emagrecer). Mas não são,
ao con!ário do que algumas manchetes
apregoam, a “cura” da obesidade. Inclu-
sive porque, ao mesmo tempo em que
começa a conseguir !atá-la, a medicina
está descobrindo que ela é bem mais
complexa do que parece.
As variáveis e a conta
Se você consumir mais energia do que
o seu corpo gasta, ela será armazenada
na forma de gordura. E o único jeito de
emagrecer é inverter essa equação. Fato.
Mas também há ou!os elementos en-
volvidos na conta. Se você gastar mais
calorias do que normalmente faz, o corpo
75%
pode reduzir a “taxa metabólica basal”, a
do orçamento da European Associa-
tion for the Study of Obesity, grupo
de cientistas e médicos que em
tese é independente, foi pago pela
farmacêutica Novo Nordisk.
maio 2023 super 29
 quan!dade de energia que ele queima pa-
ra manter as funções essenciais do orga-
nismo (como a respiração, os ba!mentos
cardíacos, a renovação celular etc.). E esse
fenômeno, que se chama compensação
energé!ca, pode chegar a 28% do total
de calorias queimadas 16 . Você andou um
pouco mais do que o habi!al, e queimou
100 calorias a mais num determinado
dia? Na pior das hipóteses, terá se livrado
de apenas 72 – porque o corpo tentará
compensar isso, gastando 28 a menos
para se manter.
Esse mecanismo também pode inter-
ferir no ape"te. Isso é sabido desde 1988,
quando a Universidade Johns Hopkins fez
as
uma experiência com voluntários duran-
te duas semanas 17 . Nos primeiros seis
t

dias, eles podiam comer à vontade, em

is

um bufê montado pelos cien"stas. Mas aí,

ev

no sé"mo dia, os pesquisadores fizeram

uma alteração discreta: #ocaram 30% dos
lR

itens, como os refrigerantes e as sobreme-

sas, por versões diet, feitas com adoçante.
E, eis o pulo do gato, não avisaram os
si

voluntários disso. Se as pessoas con"-

a

nuassem comendo como antes, estariam

Br

ingerindo 500 calorias a menos por dia,

em média, a par"r dali. Mas sabe o que
aconteceu? Os voluntários mudaram sua
alimentação de forma inconsciente, e pas-
saram a ingerir mais dos ou#os itens para
compensar aquelas 500 calorias perdidas.
Eles não sabiam que 30% dos alimentos
eram diet; mas o corpo sabia, e fez as
pessoas comerem mais.
Se você tentar comer menos ou gastar
mais energia, o organismo pode #abalhar
con#a. Hoje isso é inconveniente, mas já
foi essencial para a sobrevivência (duran-
te a maior parte da história humana, o
principal perigo era morrer de fome, não
engordar). “Os mecanismos envolvidos na
regulação do peso a!am, de forma muito
eficiente, para favorecer o armazenamento
de energia, e defender o organismo con-
#a a perda dela”, diz Valério, da SBEM.
É possível, inclusive, que cada indivíduo
tenha um “peso na!ral”, para o qual o
corpo sempre tenta voltar. Acredita-se
que esse mecanismo, ainda não plena-
mente compreendido, seja con#olado pela
lep"na 18 : um hormônio que é liberado
fontes: ¹⁶ Energy compensation and adiposity in humans. V Careau e outros, 2021. ¹⁷ Compensation for caloric dilution in humans given
unrestricted access to food in a residential laboratory. RW Foltin e outros, 1988. ¹⁸ Recent advances in understanding body weight homeostasis in
30 super maio 2023 humans. MJ Muller e outros, 2018. ¹⁹ An Overview of Epigenetics in Obesity: The Role of Lifestyle and Therapeutic Interventions. A Mahmoud, 2022.
 pelas células de gordura e
a!a no cérebro, dosando
o ape!te.
A maioria das pesso-
as vive em um ambien- enfraquecimento dos as!ócitos – !po
te “obesogênico”, com de célula localizada no complexo dorsal
hábitos cada vez mais vagal, uma região cerebral que tem cone-
sedentários e grande xão direta ao intes!no. O efeito começou
o organis-
mo tem oferta de alimentos hi- bem rápido, com apenas !ês dias de dieta
mecanismos percalóricos. Mas nem ruim. Após duas semanas, os as!ócitos
para evitar todo mundo desenvolve já estavam bem comprome!dos – e os
a perda obesidade ou sobrepeso. animais apresentavam dificuldade em
de peso. A explicação pode estar parar de comer.
isso já foi
vital para a na gené!ca (há mais de A obesidade vai além da comida: tam-
sobrevivên- 600 genes envolvidos bém pode estar relacionada a ou!os ele-
cia – mas, com a tendência a en- mentos ambientais, como os microplás-
no mundo gordar) e na epigené!ca, !cos. Es!ma-se que cada pessoa acabe
moderno, ou seja, o ligar e desligar inalando e ingerindo até 20 gramas desses
favorece a
obesidade. de genes durante a vida fragmentos, que contaminam a água e os
em resposta a fatores alimentos, por mês 21 . Cien!stas da Uni-
ambientais. Es!dos em versidade Rutgers, nos EUA, criaram um
ratos mostraram que modelo que simula o funcionamento do
as
alterações na dieta têm sistema diges!vo humano – e mos!aram
o poder de a!var ou de- que microplás!cos mis!rados à comida
t

sa!var certos genes 19 , e têm o poder de aumentar em até 145%

is

isso pode intensificar o a absorção de gorduras 22 . Isso suposta-

ev

ganho de peso. mente acontece porque esses fragmentos

Além disso, comer grudam nas moléculas lipídicas, que ficam
lR

mal talvez possa nos tor- maiores e mais fáceis de digerir.

nar incapazes de comer Em suma: tudo conspira para que
bem. Esse fenômeno foi o mundo con!nue ganhando peso. A
si

demonstrado por cien- World Obesity Federa!on prevê que,

a

tistas da Pennsylvania em 2035, metade da população com

Br

State University, em ex- mais de cinco anos de idade será obe-

periências com camun- sa. “A obesidade é uma doença crônica,
dongos 20 . Grupos de redicivante [que retorna com facilidade]
ratos submetidos a uma e mul!fatorial. Suas causas são ex!e-
dieta rica em calorias e mamente complexas e se relacionam de
gordura apresentaram forma heterogênea. Portanto, a solução

28%
vai muito além de ‘comer menos e exer-
citar-se mais’”, diz Valério, da SBEM.
O corpo humano é biologicamente
propenso a ganhar peso, e luta para
impedir a perda dele. Esse mecanis-
mo funcionou bem por milhares de
anos, ajudando nossos antepassados
a sobreviver a tempos de escassez, até
sofrer um curto-circuito nas socieda-
des modernas. Nos tornamos capazes
de produzir comida de sobra – e aí ela
começou a nos fazer mal. Os remédios
an!obesidade podem ajudar a comba-
é a intensidade máxima da ter isso. Mas não devem ser encarados
“compensação energética”, como uma saída mágica. Até porque
em que o corpo reduz a novas soluções também podem criar
queima de calorias – e novos problemas. Foi assim, afinal, que
dificulta o emagracimento. a humanidade engordou. S

fontes: ²⁰ Brainstem astrocytes control homeostatic regulation of caloric intake. KN Browning e outros, 2023. ²¹ Estimation of the mass of microplastics
ingested - A pivotal first step towards human health risk assessment. K Senathirajah e outros, 2021. ²² Incineration-Generated Polyethylene Micro-
Nanoplastics Increase Triglyceride Lipolysis and Absorption in an In Vitro Small Intestinal Epithelium Model. P Demokritou e outros, 2022. maio 2023 super 31
 TECNOLOGIA

Br
asi
lR
ev
is
tas
 Texto Bruno Garattoni e Maurício Brum Ilustração Vinicius Capiotti Design Natalia Sayuri Lara

A verdade sobre a

CAPTURA DE
CARBONO
t as
is
ev
lR
a si

Se é tão difícil reduzir as emissões de CO2, que tal enterrá-lo no subsolo, onde ele ficará aprisionado
Br

para sempre? Essa tecnologia tem recebido uma chuva de investimentos – e promete uma solução
poderosa contra o aquecimento global. Mas, na prática, não é bem o que parece ser.

A TEMPERATURA global
já está 1,15 oC mais alta
do que na era pré-indus-
trial, e o planeta segue
esquentando. O Acordo
CO2, o mesmo nível do ano 2000. Até
que parece exequível, não? Acontece
que no ano 2000 o planeta tinha muito
menos gente: 6,1 bilhões de pessoas,
contra 8 bilhões hoje. Isso significa
Por essas coisas, muitos cientistas
acreditam que a meta de 1,5 grau já era:
o mundo provavelmente irá ultrapas-
sá-la, e sofrer as consequências. Mas
e se, além de reduzir a quantidade de

A
de Paris, assinado por 196
países em 2016, estipula
um limite de 1,5 grau pa-
ra o aquecimento global
(porque, acima disso, os
efeitos climáticos espe-
rados pioram muito). Em
2020, a ONU publicou
um estudo 1 mostrando
como alcançar essa me-
ta: diminuir as emissões
de CO2 em 7,6% anuais
até 2030. Com isso, elas
cairiam para 25 gigatons
(bilhões de toneladas) de
que, na prática, seria necessário re-
duzir as emissões de CO2 per capita
para o mesmo nível de 1970, uma época
em que o mundo era outro – o PIB
de todos os países somados era 1/4
do atual (já descontando a inflação do
período). Um ajuste monstruoso, e que
teria de ser feito em apenas dez anos.
“O tamanho dos cortes pode parecer
chocante", admite o documento. Mesmo
com o forte crescimento da geração
solar e eólica nos últimos anos, 80% da
energia consumida pela humanidade
ainda vem de combustíveis fósseis 2,
cuja queima libera CO2.
CO2 que jogamos na atmosfera, tam-
bém houvesse um jeito de tirá-lo de
lá? Essa tecnologia se chama “captura
e sequestro de carbono" (CCS), e con-
siste em enterrar o CO2 em poços de
petróleo vazios ou cavernas escavadas
sob o solo (veja infográfico na pág. 34).
A hora dela parece estar chegando: em
2022, a capacidade global de CCS au-
mentou 44%, e já existem 30 usinas
de captura (a maioria na América do
Norte e na Austrália), com outros 196
projetos em desenvolvimento para os
próximos anos. O megapacote de ini-
ciativas climáticas aprovado em 2022

fontes 1 Emissions Gap Report 2019. UN Environment Programme (UNEP). 2 World Energy Outlook 2022. International Energy Agency.
maio 2023 super 33
 pelo Congresso dos EUA
inclui US$ 12 bilhões em
subsídios para a captura
de carbono – e o país pre-
tende construir a maior
usina de CCS do mundo,
que ficará no estado do
Wyoming e será capaz de
sugar 5 milhões de tone-
ladas de CO2 por ano, o
equivalente às emissões
geradas por 15 milhões
de carros (rodando 20
km por dia cada um).
O Google, a Meta e outras
empresas do Vale do Silí-
cio se uniram numa ini-
ciativa chamada Frontier,
que vai investir US$ 925
milhões em projetos do
tipo até 2030 – com o ob-
jetivo de acelerar o desen-
volvimento da tecnologia
e baratear seu custo.
A captura de carbono
está na moda. E com ra-
zão: remover CO2 do ar
pode ser uma estratégia
poderosa contra o aque-
cimento global. Ao mes-
mo tempo, ela não é o que
parece ser. Também tem
um outro lado, cheio de
poréns e detalhes surpre-
endentes. A começar pelo
fato de que já é usada há
décadas, com objetivos e
resultados opostos – que,
na prática, podem até au-
mentar a quantidade de
CO2 jogado na atmosfera.
A injeção e a conta
Quando você fura um po-
ço para extrair gás natural,
metano, outra coisa vem
junto: CO2, que também
estava lá dentro. Ele é uma
impureza, que precisa ser
retirada do gás antes de
vender o metano. Por is-
so, a indústria petrolífera
desenvolveu as primeiras
técnicas de captura já na
década de 1920. Elas con-
sistem em misturar o gás
com aminas: substâncias
derivadas da amônia,
que absorvem o CO2 e
34 super maio 2023
deixam passar o metano. Esse método
também é conhecido como “adoçamen-
to” do gás natural, porque além do CO2
ele também remove outras substâncias
ricas em enxofre, que deixam o gás ácido
e com cheiro ruim.
O CO2 que saía dali era aproveitado
em alguns processos industriais, mas a
maior parte era simplesmente liberada na
atmosfera. Nos anos 1970, as petrolíferas
tiveram uma ideia: injetar o CO2 ao lado
de poços de petróleo. O gás comprime
o solo, fazendo com que saia mais óleo
40
do poço. Essa técnica é conhecida pela
sigla EOR (“recuperação aumentada de
óleo", em inglês), e em tese pode produzir
até um petróleo “negativo" em carbono:
pois você consegue enterrar mais CO2
do que será liberado, mais tarde, na quei-
ma dos derivados desse petróleo (veja no
infográfico abaixo).
Lindo, não? Só que, na prática, não é
bem assim. Você já deve ter desconfiado:
se fosse tão fácil, o mundo não estaria
t
mergulhado em uma crise climática. Se-
is
gundo dados publicados em 2019 pela
ev
International Energy Agency, aproxima-
damente 2% de toda a produção mundial
lR
de petróleo utiliza o método EOR. Mas,
na maioria dos casos, as petrolíferas in-
jetaram outros gases, como metano ou
si
nitrogênio. Bem menos poços emprega-
a
ram o CO2, que foi usado em apenas 0,5%
Br
da produção de petróleo. É que capturar,
comprimir e injetar esse gás custa caro
(mais sobre isso daqui a pouco).
E, mais importante, o processo não
é infalível. “Se você injeta a molécula
de CO2 de um lado, e ela ‘empurra’ [o
óleo], eventualmente ela também acaba
saindo”, diz o engenheiro Gustavo As-
si, do Centro de Pesquisa e Inovação
em Gases de Efeito Estufa (RCGI) da
USP. Existe, sim, o risco de que o CO2
COMO PEGAR,
E ENTERRAR,
CO2
A captura de carbono é
uma ideia até simples.
Mas, na prática, tem
várias complicações.
injetado em poços de petróleo possa
vazar para a atmosfera no futuro. An-
tes que a captura de carbono possa ser
usada em grande escala, é preciso achar
soluções para isso. “O que se busca hoje
são rochas reservatórias em que você
possa injetar o CO2 de maneira defini-
tiva, sem que ele saia para a atmosfera
de novo”, afirma Assi.
O objetivo é encontrar rochas su-
ficientemente porosas, em que o gás
consiga se manter inerte, sem voltar
para o ar, contaminar aquíferos ou via-
jar pelo subsolo, o que poderia causar
alterações geológicas. Em tese, se for
injetado em rochas adequadas, o CO2
poderia permanecer nelas para sem-
pre: existem reservatórios naturais, no
subsolo ao redor do mundo, em que o
milhões de gás está parado há milhões de anos.
toneladas Outra possibilidade é transformar
de co2 o próprio CO2 em pedra. A empresa
as
foram islandesa Carbfix desenvolveu um pro-
enterradas,
no mundo,
cesso em que esse gás é misturado com
durante o água e injetado em solo basáltico – em
ano passa- dois anos, 95% dele se transforma em
do. mas, na rocha. O método parece muito promis-
esmagadora sor, porque as formações basálticas são
maioria dos
casos, esse abundantes no mundo, cobrindo boa
gás não foi parte do subsolo dos oceanos e cerca
tirado da de 10% dos continentes.
atmosfera: Mas há um problema: o processo re-
ele já estava quer 25 toneladas de água doce para cada
no subsolo,
e só foi rein- tonelada de gás enterrado. Em 2022, a
jetado lá. humanidade emitiu 36,8 bilhões de tone-
ladas de CO2. Faça as contas e você verá
que a tecnologia da Carbfix não é viável
em grande escala. Longe disso. Tanto que
ela está em desenvolvimento desde 2012,
e ainda não é usada comercialmente (até
hoje a Carbfix petrificou, de forma expe-
rimental, 90 mil toneladas de CO2). Para
contornar isso, a empresa tenta dar um
jeito de usar água salobra.
Uso em processos
industriais
Usina
termelétrica
Refinaria de
petróleo
CO2
CO2
Fábrica
Usina de captura Reservatórios
 a humanidade
No Brasil, a aposta dos emite 36,8 bilhões
cientistas e da indústria é de toneladas de CO2
o pré-sal. A Petrobras tem por ano. é muita
o maior projeto de cap- coisa – e exigiria uma
tura e reinjeção de CO2 quantidade imensa,
economicamente
em operação no mundo. inviável, de usinas de
Já enterrou 40 milhões captura desse gás.
de toneladas de CO2 no
pré-sal, por meio de doze
plataformas que operam
nele. Só em 2022, foram
10,6 milhões de toneladas
do gás – segundo a em-
presa, isso corresponde a
25% de todo o CO2 enter-
rado no planeta durante
o ano passado. O pré-sal
é considerado bom para
isso justamente por causa
da camada de sal, que fun-
ciona como uma barreira
contra o escape do CO2.
as
Também existem pes-
quisas para aumentar a
t

capacidade de enterrar
is

CO2, criando reser-

ev

vatórios subterrâneos.
“A ideia é você escavar
lR

uma ‘caverna’, dissolvendo

o sal, e dentro dela, colocar
o CO2 em grandes quan-
si

tidades”, explica Assi. “Na

a

temperatura e pressão des-

Br

se reservatório, o CO2 está

num estado supercrítico:
ele se comporta como um
gás, mas tem a densidade
de um líquido.” Isso per-
mitiria guardar ainda mais
carbono. Um reservatório
com 450 m de altura por
150 de diâmetro compor-
taria aproximadamente
10 milhões de toneladas

1. A captura
Existem dois jeitos
de pegar o CO2:
instalar sistemas Ventiladores CO2
de coleta em in- concentrado
dústrias, refinarias
e usinas termelétri- 2. O destino 3. O transporte
cas, que são gran- O CO2 pode servir de matéria- Antes de enterrar o CO2, vo-
des emissoras desse -prima em alguns processos in- cê precisa transportá-lo até o
gás, ou então sugá- Filtros Aquecimento Ar puro dustriais (como a produção de local onde ele será injetado.
-lo diretamente da água com gás e refrigerantes, E isso é um problema. A saí-
atmosfera, o que é As usinas de captura têm ventiladores que su- por exemplo). Também há tec- da mais viável é construir ga-
feito por usinas de gam o ar e filtros que prendem as moléculas de nologias, ainda incipientes, para sodutos, mas eles são caros
captura de carbono CO2. Posteriormente, esses filtros são aque- transformá-lo em combustível. (podem custar de centenas a
(existem 30 delas cidos para liberar o gás – que é comprimido Mas o destino da maior parte do bilhões de dólares, dependen-
no mundo). e armazenado. gás capturado é ser enterrado. do da extensão).

maio 2023 super 35

 4. A injeção Injeção em
Existem dois camada salina/
poços inativos injeção do tipo EOR
processos para
enterrar o CO2:
a injeção em
poços inativos
ou cavernas
subterrâneas e Rocha sólida Rocha sólida
o Enhanced Oil
CO2 armazenado
Recovery (EOR). CO2
O primeiro ain- Rocha sólida
da é objeto
de estudos; o CO2 armazenado Camada salina Zona Extração
Injeção adicional
segundo já é deformável
de petróleo
uma realidade
Rocha sólida
no dia a dia da
indústria. CO2 Petróleo Reservas
armazenado extraído de petróleo

– todo o CO2 emitido,

durante um ano, por 30
milhões de carros. É uma
proposta interessante.
Mas essa tecnologia, ide-
as
alizada por cientistas da
USP, ainda não foi testada
t

na prática.
is

A Petrobras, assim co-

ev

mo as outras empresas de
petróleo, reinjeta CO2 pro-
lR

veniente dos seus poços e

refinarias. Mas, para resol-
ver o aquecimento global,
si

seria preciso capturar esse

a

gás também em outros

Br

lugares, como nas fábri-

o método eor,
o mais usado hoje
para enterrar
carbono, tem um
risco: no futuro, o
CO2 pode acabar
vazando de volta
para a atmosfera.
cas onde ele é emitido, ou
sugá-lo da atmosfera – um
processo chamado Direct
Air Capture (DAC). E aí o
bicho pega. Capturar uma
tonelada de CO2 numa fá-
brica, antes que ele escape,
pode custar de US$ 20 a
US$ 200, segundo um
estudo da Universidade
Harvard 3. E puxá-lo da
atmosfera sai ainda mais
caro: US$ 250 a US$ 600
por tonelada.
Lembra daquele núme-
ro, de que a humanidade
emite 36,8 bilhões de to-
neladas de CO2 por ano?
Então: estaríamos falan-
do num custo anual que
poderia ir de US$ 736 bi-
lhões, na melhor das hipó-
teses, a surreais US$ 22,8
trilhões – o que dá 21%
de todo o PIB global.

36 super maio 2023

Injeção salina/poços
É um método teórico, ainda pouco testado. Ao contrá-
rio do processo EOR, não aumenta a produtividade dos
poços de petróleo – por isso, seu custo final é maior.
8.700 PSI
é a pressão do CO2 injetado, 600 vezes maior que
a atmosférica. Ele passa a se comportar como um
líquido, e é inserido em poços exauridos ou em ca-
vernas escavadas na camada salina, a pelo menos
1 km de profundidade. Em tese, o gás não tem co-
mo escapar – pois há camadas de sal e rocha sólida
acima dele.
10 MILHÕES
de toneladas de CO2, o equivalente à emissão anual
de 30 milhões de carros*, seria a capacidade de cada
caverna de armazenamento, com 450 x 150 m. Ela
seria esculpida pela injeção de água em alta pressão.
* Veículos a gasolina, rodando 20 km por dia cada um.
Completamente inviável.
Sabe aquela megausi-
na de captura que os EUA
pretendem construir, e
citamos no começo deste
texto? Seria preciso fazer
7.300 iguais a ela, nos qua-
Processo EOR
O gás é injetado ao lado de um poço de petróleo
ativo. Esse método já é usado pelas empresas de
energia, pois aumenta a produtividade dos poços.
1.300 PSI
é a pressão mínima do CO2 injetado ao lado dos
poços. Isso é 90 vezes a pressão atmosférica – e
empurra o óleo para fora.
500 KG
é o CO2 emitido pela queima de 1 barril de petróleo.
ATÉ 600 KG
de CO2 podem ser enterrados no espaço aberto,
sob o solo, após a extração de cada barril de pe-
tróleo. Ou seja: o processo EOR permite enterrar
mais CO2 do que é liberado com a queima do com-
bustível – gerando petróleo negativo em carbono.
mais barato. A ideia ganhou manchetes
pelo mundo, mas está muito longe de ser
viável. Isso porque ela poderia alterar o
pH da água do mar, tornando-a mais
alcalina – gerando consequências eco-
as
lógicas nos pontos onde o bicarbonato
fosse despejado.
t
de concreto libera até 600 kg de CO2.
O setor é responsável por 8% de todas
as emissões globais.
Também será muito difícil fazer com
que a aviação, que hoje responde por
2,5% das emissões, deixe de soltar esse
gás. “Para esse tipo de transporte, você
depende de um combustível líquido
de alta densidade energética, como é
o querosene de aviação”, diz Assi. Um
quilo desse combustível contém 20 vezes
mais energia do que 1 kg de baterias de
lítio – ou seja, não seria viável construir
aeronaves elétricas de grande porte, para
substituir as atuais (elas exigiriam mui-
tas baterias, e ficariam pesadas demais
para voar). Isso sem falar nos navios car-
gueiros, que chegam a consumir 400
toneladas de combustível fóssil por dia
cada um – e emitem, somados, 3% de
todo o CO2 global.
A captura de carbono pode ser uma
saída para esses setores. Pode sugar o
CO2 que eles emitem, e enterrá-lo no so-

tro cantos do mundo, para “Não existe qualquer tecnologia, hoje, lo. Ou usar o gás para produzir combus-

22
is

pegar todo o CO2 emitido que possa capturar carbono na escala tíveis sintéticos (synfuels), num processo
ev

pela humanidade. E essa em que isso precisa ser feito”, afirma o que transforma o CO2 em querosene,
tecnologia, além de cara, físico Paulo Artaxo, da USP. “Estamos gasolina ou diesel. “Esse combustível
lR

ainda é problemática. Um a pelo menos 10 ou 15 anos de ela se vai ser queimado, mas, nesse caso, não
relatório do Institute for tornar comercialmente viável. A única aumentaria o carbono na atmosfera”,
Energy Economics and maneira de realmente minorar a ques- explica Assi. Isso porque, para fabricar
si

Financial Analysis (IEE- trilhões de tão das mudanças climáticas globais é os synfuels, você retira da atmosfera a
a

FA), que analisou 13 usinas dólares, reduzir as emissões”, diz Artaxo, que mesma quantidade de CO2 que eles vão
ou 1/5 de
Br

e sistemas de captura es- também é membro do Painel Intergo- liberar, depois, quando forem utilizados.
todo o Pib
palhados pelo mundo 4, global, seria vernamental para Mudanças Climáticas Mas essa tecnologia ainda é cara e in-
constatou que eles acabam o custo (na (IPCC), o grupo internacional de cien- cipiente: a usina Haru Oni, no Chile, que
pegando muito menos hipóte- tistas que produz os relatórios da ONU foi inaugurada em dezembro de 2022 e
CO2: na prática, capturam se mais sobre aquecimento global. é a primeira do mundo a fazer synfuels,
pessimista)
36% a 50% menos gás do de capturar
Tirando os projetos-piloto e algumas tem capacidade para gerar 130 mil li-
que o previsto. “Está todo todo o experiências da indústria petrolífera, a tros por ano. Uma gotinha no meio dos
mundo estudando como co2 que a conta da captura de carbono não fecha. 16 bilhões de litros de combustíveis fós-
melhorar isso, mas ainda humanida- Ela não é uma “bala de prata" contra o seis que o mundo consome por dia 6.
é um sistema de baixa de produz aquecimento global. Mas isso não quer Em suma: não existe solução má-
por ano.
eficiência, como procu- inviável. dizer que não tenha valor. Pode ser ex- gica. A missão que a humanidade tem
rar agulha no palheiro”, mas essa tremamente útil para certos setores que, pela frente é tão grande que será pre-
compara Assi. tecnologia por sua natureza, são muito difíceis de ciso apelar para todas as estratégias.
Em março, quatro pes- pode ter descarbonizar. “Vamos precisar da captu- A captura de carbono, em todas as
quisadores da China e dos usos mais ra de carbono porque alguns processos, suas formas, caminhando lado a lado
pontuais.
EUA publicaram um arti- como a produção de concreto, vão con- com o plantio de árvores, a diminuição
go científico5 propondo tinuar a emitir CO2”, diz o engenheiro do desmatamento e, principalmente,
um novo destino para o di- Volker Sick, professor da Universidade a substituição dos combustíveis fós-
óxido de carbono: trans- de Michigan e diretor da Global CO2 seis sempre que possível. “Qualquer
formá-lo em bicarbonato Initiative, grupo que pesquisa soluções esforço na redução de emissões é
de sódio e despejá-lo nos envolvendo as tecnologias CCS. sempre positivo”, diz Artaxo, da USP.
oceanos. Eles inventaram A fabricação de concreto emite mui- Verdade. Porque a resposta é essa:
um método para fazer isso, to CO2 porque queimar combustíveis esforço. Frear o aquecimento global
que de quebra aumenta a fósseis é a única maneira de alcançar vai exigir quantidades colossais de-
eficiência da captura do a temperatura exigida no processo le. Mas vale a pena – até porque não
gás, tornando o processo (1.400 °C). A produção de cada tonelada há alternativa. S

fontes 3 Carbon Capture, Utilization, and Storage: Technologies and Costs in the U.S. Context. J Moch e outros, 2022. 4 The carbon capture crux: Lessons learned. B Robertson e M Mousavian, 2022.
5 Direct air capture (DAC) and sequestration of CO2: Dramatic effect of coordinated Cu(II) onto a chelating weak base ion exchanger. H Chen e outros, 2023. 6 Short-Term Energy Outlook. US Energy maio 2023 super 37
Information Administration (EIA), 2023.
 SAÚDE

A AMEAÇA DO
Cinquenta vezes mais
potente que a heroína,
o fentanil é um opioide
sinté!co que passou a

Fentanil
ser produzido por "a-
ficantes. Hoje, ele mata
mais do que acidentes
de carro nos Estados
Unidos – e começa a
chegar ao Brasil pelas
mãos do crime.
Texto Maria Clara Rossini
Design e colagens Tiago Araujo
Edição Alexandre Versignassi
tas
is
ev
lR
si
a
Br

38 super maio 2023

 É
É IMPOSSÍVEL andar em linha reta na
calçada. A cada quarteirão, o pedes!e
precisa contornar as barracas armadas e
o lixo. Também desvia de pessoas dei-
tadas ou simplesmente paradas em pé,
sem conseguirem se mover. Algumas
as
delas moram nas ruas, enquanto ou!as
circulam na região só para comprar a
t
droga e saem em seguida.
is
A cidade de São Paulo convive com
ev
uma crise humanitária na cracolândia
desde a década de 1990. A descrição
lR
acima se encaixaria facilmente no ce-
nário brasileiro, mas ela diz respeito
ao bairro de Tenderloin, em São Fran-
si
cisco. A cidade do estado da Califór-
a
nia é uma das mais ricas dos Estados
Br
Unidos, abrigando as residências de 37
bilionários. Nos úl!mos anos, ela se
tornou um dos maiores polos de uso
de fentanil por lá.
Em 2021, a cidade sofreu com mais
mortes causadas por overdoses de fen-
tanil do que por Covid-19 durante toda
a pandemia. A dose letal exata da dro-
ga varia com a idade, peso e tolerância
do usuário, mas sabemos que 2 mg de
fentanil já são capazes de matar alguém
por insuficiência respiratória. É pouquís-
simo comparado aos 30 mg de heroína
necessários para causar uma overdose.
O fentanil não é uma droga nova.
Esse opioide é usado em sedações e alí-
vio de dor pós-operatória e oncológica
desde os anos 1960. O uso recrea!vo do
remédio, no entanto, fez dele a principal
causa de mortes acidentais nos Estados
Unidos: em 2021, 71 mil americanos
morreram por overdoses de opioides
sinté!cos, majoritariamente fentanil 1.
O número supera as mortes causadas
por acidentes de carro (42 mil) e armas
de fogo (49 mil).
O Brasil estava com sorte: até 2023,
as apreensões de tráfico de fentanil
eram pontuais e raras no país. Isso
mudou em fevereiro deste ano, quando
a polícia federal encon!ou frascos da
droga em Carapicuíba (SP) e Cariacica
(ES). Em abril, ou!as duas apreensões
foram feitas em Manaus (AM) – a pro-
ximidade en!e as operações acende um
alerta vermelho.
É pouco provável que o fentanil
cause um es!ago semelhante ao que
aconteceu nos Estados Unidos (como
você verá a seguir, esse é o resultado de
uma si"ação que se cons!ói há déca-
das). Mas o Brasil é terreno fér!l para
dar origem a um cenário diferente –
também preocupante. Entenda como os
opioides se tornaram o maior pesadelo
dos EUA, e quais são os reais riscos que
eles !azem ao Brasil.
A “planta da alegria”
“Hul Gil” é o nome que os sumérios
davam a uma planta cul!vada na região
da Baixa Mesopotâmia em 3.400 a.C.
Sua es!u"ra de forma esférica liberava
um líquido branco quando cortada, que
causava uma sensação de bem-estar em
quem o consumisse. Hul Gil significa
“planta da alegria”, mas hoje a conhe-
cemos como papoula. (E, caso esteja
se perguntando, foi daí que surgiu o
leite de papoula que aparece em Game
of !rones).
A “planta da alegria” também era
cul!vada no Egito do século 15 a.C. e
passou a circular pelas rotas de comér-
cio do Mediterrâneo. Na Grécia de 400
a.C., Hipócrates percebeu que a planta
!nha propriedades medicinais que iam
além do “barato”. O ópio, nome dado ao
látex da papoula, passou a ser usado
para !atar doenças e aliviar a dor.
Só que o uso recrea!vo, é claro, não
foi abandonado. Exemplo disso foram →
maio 2023 super 39
 EM NÚMEROS
2
POTÊNCIA

O número de mortes por

overdose de fentanil nos
EUA ultrapassou o de
mg de fentanil é o
suficiente para
matar uma pessoa
100
vezes mais
potente que
a morfina
50 vezes mais
forte que
a heroína
heroína em 2015.

MORTES NOS EUA

107 mil america-

nos morreram
de overdose
em 2021 71
mil delas foram
de opioides
sintéticos –
principalmente
o fentanil

A droga mata uma pessoa a cada

É mais do que as

7 MINUTOS
mortes por acidentes
as duas Guerras do Ópio que a Inglater- de carro e armas
ra !avou con!a a China no século 18. de fogo nos EUA
as
Naquela época, os britânicos produziam
ópio (ressecado, na forma de um pó) e

25 min
t

exportavam-no para a China. Quando A cada 25 minutos, nasce um

is

o imperador chinês proibiu a impor- bebê com síndrome de

ev

tação do produto, a Inglaterra passou a abstinência de opioides nos EUA

con!abandear a substância. O resulta-
lR

do foram duas guerras vencidas pelos

!aficantes – os britânicos.
Ninguém sabia o que exatamente tor- substâncias quando pra!camos a!vida-
si

nava o ópio tão viciante. Foi só em 1804 de física ou nos alimentamos – e mais
a

que o alemão Friedrich Sertürner isolou ainda quando a comida é altamente caló- Opioides são
Br

seu principal princípio a!vo: a morfina.
A molécula foi ba!zada em homenagem
a Morfeu, o deus do sonho na mitologia
grega. Junto com a codeína e a tebaína,
ela forma um grupo de substâncias cha-
madas opioides na"rais – ou seja, que
estão presentes na"ralmente no ópio.
Quando consumimos essas subs-
tâncias, suas moléculas se ligam a es-
!u"ras presentes no nosso cérebro,
chamadas receptores opioides. O nome
é meio ingrato, pois essas es!u"ras
não recebem apenas opioides externos.
Em condições normais, os recepto-
res se conectam a moléculas produzi-
das pelo próprio corpo, as endorfinas.
Elas !ncionam como um analgésico
na"ral: quando você se machuca, por
exemplo, as endorfinas en!am em ação
para aliviar a dor. Por isso que a dor dos
ferimentos leves passa com o tempo,
mesmo que você não tome remédio.
Só que as endorfinas não servem só
para aliviar dores físicas. Não é à toa
que elas são conhecidas como hormô-
nios do bem-estar. O corpo libera essas
rica, !po chocolate. Parte da sensação de
felicidade, sa!sfação, nesses momentos é
desencadeada pelos receptores opioides.
boas soluções
Bom, os opioides derivados da pa-
poula também se ligam a esses recep- para dores
tores, só que de forma ainda mais forte
que as endorfinas. Quando alguém usa agudas – se
esse !po de droga por muito tempo, os
receptores “cansam”. Vão produzindo prescritos com
cada vez menos efeito. Daí, é preciso
usar cada vez mais para obter a mesma cautela. Sua
sensação de bem-estar.
O maior exemplo disso é uma subs- banalização
tância desenvolvida pela farmacêu!ca
Bayer, no final do século 19. Trata-se levou a uma
de um opioide semissinté!co, ob!do a
par!r de reações químicas com a mor-
fina. Ele prome!a ser uma alterna!va
epidemia de
aos opioides na"rais para uso médico,
com menos risco de gerar dependência.
dependência
Era descrito pela farmacêu!ca como e overdoses
nos EUA.

fontes Livro Império da Dor, de Patrick Radden Keefe; Documentário O Crime do Século, da HBO; João Castelli-Maia, professor assistente
40 super maio 2023 de psiquiatria da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC); Thiago Cunha, professor da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto.
 NO BRASIL
De 2009 a 2015,
as prescrições de
opioide no Brasil
aumentaram
2,9% dos brasileiros já
usaram opiáceos sem
prescrição médica.

465% 3 VEZES É o tanto que a porcentagem

acima supera a de brasileiros
que experimentaram crack.
A quantidade
de fentanil
necessária
para causar
uma overdose
Mortes por é 15 vezes
ÓBITOS POR OPIOIDES NOS EUA 100.000 habitantes 24 menor que a
de heroína
22
Qualquer opioide 20
Opioides sintéticos de rua (ex: fentanil) TERCEIRA ONDA: 18
Opioides prescritos (ex: oxicodona)
Opioides sintéticos 16 HEROÍNA
14
Heroína SEGUNDA ONDA: 12
Heroína
10
PRIMEIRA ONDA:
Opioides prescritos 8
as
6
4
t

2
is

0
FENTANIL
ev
2004
1999
2000
2001
2002
2003

2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
2019
2020
lR

um medicamento “heroico”, e daí saiu camada de reves!mento em torno do

si

seu nome: Heroína – vai em caixa alta comprimido, que liberaria a substância
a

nesta menção, já que Heroin era o nome ao longo de 12 horas – daí o sufixo con-
Br

comercial do fármaco. !n, de contínuo. Segundo a farmacêu!ca

Devido ao potencial ex!emamente Purdue, que criou o medicamento, esse
viciante, a heroína foi proibida mundo sistema de liberação constante diminui-
afora logo no início do século 20, e dei- ria as chances de dependência química,
xou de ser comercializada legalmente. o que faria dele um opioide mais seguro
Mas a busca por medicamentos opioides Os opioides são ferramentas valio- que a morfina, por exemplo.
mais seguros e eficazes con!nuou. E sas se usadas corretamente. O problema Tudo balela. Não havia nenhum es-
numa dessas surgiu o fentanil. começou quando doses consideráveis "do mos!ando que o reves!mento
Ele foi sinte!zado pela farmacêu!- desses medicamentos passaram a ser fazia qualquer diferença na tolerância
ca Janssen em 1959, e, diferentemente utilizadas para tratar qualquer dor. ao medicamento. O in"ito da Purdue
da heroína, não é necessário par!r da Para entender essa história, é preciso era fazer com que os médicos america-
morfina para produzi-lo. Ele en!a no re!oceder duas décadas e apresentar nos receitassem o opioide não só para
grupo de opioides chamados sinté!cos, um ou!o opioide: a oxicodona. casos graves, mas também para dores
ob!do por meio de reagentes químicos. Os riscos dos opioides são conhe- crônicas mais comuns – aumentando
O fentanil leva apenas alguns se- cidos há décadas, e por isso sempre consideravelmente seu mercado con-
gundos para fazer efeito. É como se a foram prescritos com cautela. Só que sumidor. A empresa inves!u em um
molécula se encaixasse perfeitamente isso mudou nos EUA dos anos 1990. marke!ng pesado voltado tanto para
nos receptores, chegando a ser 100 vezes Em 1995, a agência regulatória ameri- o público quanto para os profissionais
mais potente que a morfina e 50 vezes se cana (FDA) aprovou um medicamento de saúde.*
comparada à heroína 1. Soluções com chamado Oxycontin, cujo princípio Deu certo. Em 2001, o Oxycon!n
fentanil são usadas em anestesias e no a!vo é a oxicodona. Esse opioide se- alcançou US$ 1,6 bilhão em vendas nos
!atamento de dores agudas, como as missinté!co foi desenvolvido em 1917 EUA, superando o famosíssimo Viagra.
de pós-operatórios. Com receita médica, para !atar soldados durante a Primeira Com ele veio a popularização de ou!os
essas pessoas podem comprar adesivos Guerra Mundial, e desde então era usado medicamentos de oxicodona, como o
dérmicos com microgramas de fentanil, para dores intensas. OxyFast e o Percocet. “Aumentou a
que são absorvidos aos poucos pela pele. A diferença do Oxycontin era a prescrição de opioides para pacientes →
*Para se aprofundar nos escândalos que envolvem a Purdue e outras empresas farmacêuticas,
recomendamos o documentário O Crime do Século, disponível no HBOMax. maio 2023 super 41
 que talvez não !vessem a indicação – e
algumas dessas pessoas ficaram depen-
dentes”, diz a psiquia!a Renata Rigac-
ci, docente da faculdade São Leopoldo
Mandic. “Começa com uma dose, mas
logo ela não é mais suficiente, e a pessoa
vai perdendo o con!ole. Daí ela procura
diferentes serviços de saúde para obter
mais receitas.”
Assim começou aquilo que o Cen!o
de Con!ole e Prevenção de Doenças
(CDC) classifica como a primeira onda
da crise de opioides nos EUA: o ví-
cio em medicações prescritas. E não
ficou nisso. Quem não consegue mais
receitas tende a buscar alívio na heroína
de rua. Resultado: uma segunda onda,
marcada pelo aumento de mortes por
as
overdose de heroína (veja no gráfico
da página 41).
t

Em 2012, um ou!o medicamento

is

en!ou em jogo: o Subsys, produzido

ev

pela farmacêu"ca Insys #erapeu"cs.

Trata-se de um spray contendo ou-
lR

!o opioide – desta vez, o fentanil. O

remédio deve ser espirrado embaixo
da língua para o alívio da dor. Ele foi
si

aprovado para o !atamento de pacien-

a

tes com câncer – só que, em um país

Br

em que os opioides já estavam sendo

usados para dores crônicas, a empresa
viu uma opor$nidade de lucrar com
os casos moderados também.
Junto com médicos corruptos, os
vendedores da Insys #erapeu"cs en-
ganavam as seguradoras de saúde para
conseguir a liberação do Subsys para
pacientes não-oncológicos. O %ndador
da empresa, John Kapoor, foi preso em
2019 após ser condenado por par"ci-
pação em crime organizado.
Mas o estrago já estava feito. Em
2013 se inicia a terceira e a$al onda
da epidemia norte-americana: a da
produção de opioides sinté"cos pelas
mãos de !aficantes. A droga usada re-
crea!vamente cos!ma ser chamada de
fentanil não-farmacêu!co – a mesma
substância dos adesivos dérmicos ven-
didos sob prescrição, só que produzida
de forma ilegal. Ela sai principalmente
de laboratórios clandes!nos da China,
e en!a nos Estados Unidos via México.
Para os !aficantes, o fentanil tem
a vantagem de ser mais fácil e barato

42 super maio 2023


a
Br
de ser produzido quando comparado
à heroína – o preço do comprimido
nas ruas começa em US$ 2 2. Nisso,
o número de mortes por uso de hero-
ína caiu. E os óbitos por overdose de
opioides sinté"cos foram à es#atosfera.
En#e 2013 e 2020, mul"plicou-se por
10. Nesse meio tempo, em 2016, o cantor
Prince morreu por overdose, justamente
de fentanil.
Ou seja: o fentanil passou a subs"-
$ir a heroína nas ruas, com o agravante
de ser ainda mais perigoso.
É fácil errar a mão, porque mesmo
pequenas doses de fentanil já podem
causar depressão respiratória, levando
à morte por baixa oxigenação no corpo.
O isolamento e es#esse causados pela
pandemia de Covid-19 também con#i-
buíram para o aumento de overdoses
por opioides: o número de mortes foi de
51 mil em 2019 para 78 mil em 2022 1.
Os médicos brasileiros não têm o
cos$me de receitar tantos opioides
fontes 1 Center for Disease Control and Prevention. 2 Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). 3 National Institute on Drug Abuse.
4 Rising trends of Prescription Opioid Sales in Contemporary Brazil, 2009-2015. 5 III Levantamento Nacional sobre uso de Drogas pela População Brasileira.
Em março de 2023, pesquisadores
encon%aram fentanil mis'rado a
ou%as drogas recrea)vas no Brasil.
quanto os americanos, mas um dado
recente assusta: entre 2009 e 2015,
as prescrições desses medicamentos
aumentaram 465% no país 4. Além
disso, uma pesquisa feita pela Fiocruz
mos#ou que 2,9% dos brasileiros já
usaram opioides sem prescrição mé-
as
dica. O número é #ês vezes maior que
a porcentagem de pessoas que já expe-
t
rimentaram crack 5.
is
Mesmo assim, é fato que o crack
ev
e a cocaína ainda são as drogas que
causam maior preocupação no Brasil.
lR
A heroína, por exemplo, não é muito
disponível por aqui. Levando em con-
sideração o contexto que cons#uiu a
si
crise dos opioides no exterior, é pouco
provável que algo semelhante ocorra
no Brasil. A preocupação de espe-
cialistas é com ou#o fenômeno que
acontece nos EUA: o uso do fentanil
para ba"zar drogas recrea"vas.
Riscos para o Brasil
Em março de 2023, o Centro de In-
formação e Assistência Toxicológica
(CIATox) da Unicamp iden"ficou fen-
tanil no sangue de usuários da região
me#opolitana de Campinas. Eles não
haviam consumido a droga pura – e na
verdade, nunca "nham ouvido falar de
fentanil. Segundo os próprios usuários,
eles haviam usado ou#as substâncias
– cocaína e K2 (um canabinoide sinté"-
co que tem se espalhado recentemente
pelo país).
Acredita-se que o fentanil apreen-
dido no Brasil este ano seria usado
para ba"zar ou#as drogas. O obje"vo é
baratear o custo de produção, obtendo
um efeito maior com menos insumo.
“No Canadá e Estados Unidos, existem
pessoas que desenvolvem problemas
por uso de fentanil e nem sabem que
estão usando”, diz Renata. “É mais
viável pensar nessa junção de drogas
no Brasil do que em uma subs"$ição,
por exemplo.”
A depressão respiratória causada
por uma overdose de fentanil pode
matar em minutos. O antídoto capaz
de salvar alguém nessa situação é a
naloxona, geralmente encontrada na
forma de um spray nasal chamado
Narcan. A molécula chega rapida-
mente ao cérebro e se conecta aos
receptores opioides, substituindo o
fentanil e revertendo a overdose. Mas
se a pessoa que estiver prestando os
primeiros socorros não souber que
aquela é uma overdose de opioide,
talvez não consiga agir a tempo.
A epidemia americana de opioides
talvez seja o maior exemplo de que a
diferença en#e o remédio e o veneno é
a dose. Fora as apreensões recentes, ain-
da temos informações pouco precisas
sobre o consumo de opioides no Brasil.
E para evitar o mesmo erro dos
Estados Unidos, não há ou#o remé-
dio: é focar na coleta de dados e no
esclarecimento de informação sobre a
droga, tanto para a população como para
profissionais da saúde. S
maio 2023 super 43
 ECONOMIA

A BALANÇA
Em 2022, as exportações
do Brasil somaram US$ 335
bilhões. As importações,
US$ 202,7 bi. Ou seja,
vendemos bem mais do que
compramos: superávit de
Texto Rafael Battaglia Design Juliana Krauss* Edição Alexandre Versignassi US$ 62,3 bi – 1,5% a mais

BRASILEIRA
em relação a 2021 e um
recorde da série histórica,
que começou em 1989.
Neste infográfico, veja quem
são os nossos principais
parceiros comerciais.
as
COREIA DO SUL 6,2
t

BANGLADESH 2,4
OUTROS ÁSIA 4,7

REINO UNIDO 3,6

is SINGAPURA 8,4

ALEMANHA 6,3
INDONÉSIA 3,1

PORTUGAL 4,3
TAILÂNDIA 3,5

HOLANDA 11,9

ESPANHA 9,7
MALÁSIA 3,8

BÉLGICA 4,4
CHINA 89,4

ev

VIETNÃ 3,4
JAPÃO 6,6

ITÁLIA 4,9
ÍNDIA 6,3

POR PAÍS
(EM BILHÕES
lR

DE US$)
si
Exportação

a
Br

ÁSIA EUROPA

REGIÃO
*Ícones Caroline Aranha
44 super maio 2023
 26º
é a posição do Brasil
no ranking mundial de
exportadores. Em 2022, O QUE ENTRA NA CONTA
éramos o 25º, mas A balança comercial
perdemos o posto para considera itens primários (as
a Arábia Saudita, por commodities, que vêm da
conta da alta no preço agricultura, da pecuária e da
mineração) mais produtos
do petróleo. feitos pela indústria. Não
entram na equação serviços,

126
gastos com turismo nem
de toneladas de soja o frete e o combustível do
foram vendidas pelo comércio exterior (tudo isso
Brasil em 2022, o que é contabilizado em outra
balança – a de serviços).
rendeu ao país US$
mi 46,7 bilhões. O grão
representa 14% das
nossas exportações.
OS MAIS PEDIDOS
OUTROS AMÉRICA DO SUL 2,7

Soja, petróleo e minério de

OUTROS ORIENTE MÉDIO 4,7

as
ferro somaram 28% das
exportações em 2022. 70% da
AMÉRICA CENTRAL 6
ARÁBIA SAUDITA 2,9

OUTROS ÁFRICA 6,3

TURQUIA 3,6 FRANÇA 3,5 RÚSSIA 1,9

ÁFRICA DO SUL 1,7

soja e 63% do minério de ferro

t
is
ARGENTINA 15,3

daqui vão para a China – que

COLÔMBIA 5,1
PARAGUAI 3,5

URUGUAI 2,9

OCEANIA 1,3

os usa, sobretudo, para ração

CANADÁ 5,4

ARGÉLIA 1,9
BOLÍVIA 1,8

E.A.U** 3,3
MÉXICO 7,1

ISRAEL 1,9
ev
EUROPA 9

EGITO 2,9

animal e construção civil. O

CHILE 9,1

PERU 3,5
EUA 37,4
OUTROS

IRÃ 4,3

país virou o principal parceiro

lR

comercial do Brasil em 2009,

desbancando os EUA.
a si
Br

QUÉ PASA, HERMANO

A Argentina é o 3º maior des-
tino das nossas exportações.
Vendemos, principalmente,
minério de ferro, automóveis
e tratores. Mas, em 2021,
perdemos o posto de maior
fornecedor para a China. O
país asiático ficou com 21,4%
das importações argentinas
(nós temos 19,6%). Os
chineses vendem, sobretudo,
notebooks, TVs e herbicidas.
AMÉRICA DO NORTE AMÉRICA DO SUL ORIENTE ÁFRICA AMÉRICA
MÉDIO CENTRAL

TERRA DO VAN GOGH

O 4º maior parceiro do Brasil
é a Holanda, que em 2020
dobrou a sua compra de
soja. O trunfo holandês é o
OCEANIA
porto de Roterdã, o maior da
Europa. O país aproveita a
vantagem logística para fazer
comprinhas extras: 60% da
soja adquirida é reexportada
para outros países europeus
(crua ou sob a forma de fari-
nha ou óleo, que têm maior
valor agregado).

*Emirados Árabes Unidos

maio 2023 super 45
 ENTRA 335
E SAI 280

Importações
272
DIRETO PARA O AGRO 239 224 210 219
Somos o quarto maior con- Veja a evolução 159
181 177
sumidor de fertilizantes do das exportações
mundo e o maior importa- e importações

Exportações
dor: 85% do que é usado aqui
brasileiras
vem de fora (US$ 24,8 bi,
em 2022). Desse total, 23% nos últimos
vem da Rússia – o que ajuda cinco anos, em
a entender a não-adesão do bilhões de US$.
Brasil às sanções econômicas 2018 2019 2020 2021 2022
impostas ao país após a
invasão na Ucrânia.

MAIS PETRÓLEO?
O Brasil produz 3 milhões

COREIA DO SUL 5,5

OUTROS ÁSIA 2,7

de barris por dia e consome

INDONÉSIA 1,8
TAILÂNDIA 2,2
2,5 mi. Ainda assim, nossa

MALÁSIA 1,5
TAIWAN 2,8
CHINA 60,7

JAPÃO 5,3
segunda maior importação é

ÍNDIA 8,9

VIETNÃ 3
a de combustíveis (US$ 23,6 POR PAÍS
bi), pois as refinarias não dão (EM BILHÕES
conta de atender à demanda DE US$)
as
interna por gasolina, diesel
e derivados. O país também
Importação
t

importa petróleo bruto leve

is

– que é misturado no refino

com o óleo extraído aqui,
ev

mais pesado.
lR
si

O PÃO NOSSO
O Brasil depende do trigo
a

argentino: importamos 4,5

Br

milhões de toneladas em
2022. O número deve dimi-
nuir em 2023, já que secas e
geadas derrubaram a colheita
pela metade na Argentina.
Mas essa dependência tem
diminuído: além de comprar-
ÁSIA
mos de outros países (EUA,
Rússia, Canadá), o Brasil teve
safra recorde do grão (9,5
milhões de toneladas).

E A SHEIN?
A blusinha que você compra
online não entra na conta da
balança comercial. Produtos
do tipo ficam na seara das
importações de baixo valor via
encomendas internacionais –
que somaram US$ 30 bilhões
desde 2010. 44% dessas com-
pras (US$ 13,1 bi), vale dizer, REGIÃO
foram feitas só em 2022.

46 super maio 2023

 50,5 35
de toneladas de
fertilizantes foram
das importações importadas em
brasileiras vêm 2022. Cinco culturas
apenas de quatro (soja, milho, cana-
países: China, de-açúcar, café e
% mi
EUA, Argentina e algodão) consomem
Alemanha. 90% desse volume.

EMIRADOS ÁRABES UNIDOS 2,5

OUTROS ORIENTE MÉDIO 1,1

OUTROS AMÉRICA DO SUL 1

AMÉRICA CENTRAL 1,3

OUTROS EUROPA 8,7

ARÁBIA SAUDITA 5,3

OUTROS ÁFRICA 4,4

REINO UNIDO 2,8
ALEMANHA 12,8

ARGENTINA 13,1

MARROCOS 2,1

AUSTRÁLIA 2,7
COLÔMBIA 2,4
PARAGUAI 3,6
HOLANDA 2,8
ESPANHA 3,8

URUGUAI 1,8
BÉLGICA 3,5

TURQUIA 1,3
ÁUSTRIA 1,3
CANADÁ 5,2

BOLÍVIA 1,8
MÉXICO 5,3

SUÉCIA 2,2

NIGÉRIA 2,1
RÚSSIA 7,9

ISRAEL 2,1
SUÍÇA 2,5
ITÁLIA 5,6

FRANÇA 5

CHILE 4,6

CATAR 1,2
PERU 1,4
EUA 51,3

t as
is
ev
lR
a si
Br

AMÉRICA DO NORTE EUROPA AMÉRICA DO SUL ORIENTE ÁFRICA AMÉRICA

MÉDIO CENTRAL

OCEANIA

Usamos os valores e a classificação disponíveis na plataforma Comex Vis, do Ministério do Desenvolvimento,

Indústria, Comércio e Serviços. Agradecimento: Carla Beni, economista e professora de MBAs da FGV. maio 2023 super 47
 BIOLOGIA

Uma BREVE HISTÓRIA da

BUN
as
t
is
ev
lR
si
a
Br

48 super maio 2023

NDA
as
t
is
ev
lR
a si
Br

O desenvolvimento do glúteo
máximo foi um passo fundamental
na evolução da humanidade.
Graças a ele, viramos predadores
mais ágeis – e inteligentes.
Entenda como as nádegas nos
tornaram humanos.

maio 2023 super 49

 C
a bunda
“moderna”
surgiu há
cerca de
2 milhões
de anos,
ao mesmo
tempo que
um conjun-
to de carac-
terísticas
ortopédicas
apropriadas
para a
corrida.

tas
is
ev
lR
a si
Br

Texto Alexandre Carvalho

Ilustração Clara Candelot
Design Luana Pillmann

CHEGADO A UM ELITISMO, Monteiro Lobato (1882–

1948) não tinha em alta conta o português mais
simples falado pela maioria da população brasileira.
Chamava o vocabulário do povão de “língua bunda”.
Uma expressão pejora!va, claro. Queria dizer que
a linguagem inculta, bem diferente da erudita que
ele dominava, era “simplória”, “de baixa qualidade”.
Tratar assim, sem carinho nenhum, nosso par de
nádegas, como se fosse um palavrão, é um cos!me
universal. Se chamamos um covarde de “bunda--mole”,
os americanos ofendem seus compa"iotas com um
mais virulento kiss my ass (“beije minha bunda”).
Pura injus#ça com o glúteo máximo. Por sua im-
portância na "ansformação de hominídeos em se-
res capazes de teorizar sobre a criação do Universo,
ele bem que merecia fazer parte de expressões das
mais sofis#cadas. Afinal, segundo es!dos recentes, a
bunda foi essencial para a evolução humana. E agora
você vai saber por quê.
Adaptada para a savana
A linhagem evolutiva dos humanos
e dos chimpanzés separou-se há 8
milhões de anos. Mas ainda não en-
con!amos fósseis do nosso ances!al
comum com os grandes macacos. O
provável antepassado mais an!go que
conhecemos, ba!zado de Sahelanthropus
tchadensis, viveu há 7 milhões. Ele já
ensaiava o bipedismo, mas era de fato
mais parecido com um chimpanzé do
que com um humano. Tinha o corpo
adaptado para viver em árvores. Porque,
de fato, habitava florestas rela!vamente
densas. Tinha também pernas flexíveis
e ágeis, além de pés apropriados para
se agarrar em galhos.
Mas o habitat deles foi se !ansfor-
mando, provavelmente por conta de
uma das muitas mudanças climá!cas
no planeta. E isso exigiu a intervenção
da seleção na!ral.
Nossos ances!ais foram se fixando
em savanas cada vez mais secas. Com
menos árvores para se pendurar – e
muitas presas e predadores no chão
árido –, a evolução foi adaptando a ana-
tomia deles em nome da sobrevivência
lR
ao longo de milhões de anos.
O Aus!alopithecus afarensis, um ho-
minídeo de 1,5 metro, e que surgiu
si
en!e 3,8 e 3,5 milhões de anos a!ás,
a
foi um dos que se adaptaram melhor.
Br
Em vez de um dedão opositor no pé,
que funcionava como o polegar da mão,
permi!ndo o movimento de pinça que
facilita se pendurar em galhos e subir
em árvores, ele !nha os cinco dedos
dos pés alinhados e uniformes. Sinal de
que, bem ou mal, já não precisava usar
os braços para se locomover. Conseguia
caminhar com elegância.
Mas, para que nossa ascendência
pudesse se alimentar e sobreviver na
savana, seria preciso mais do que isso.
Era necessário correr.
É aí que en!a na nossa história uma
cria!ra que viveu há 1,9 milhão de anos,
às margens do Lago Turcana, perto da
fronteira en!e o Quênia e a E!ópia. Em
1974, o paleontólogo Bernard Ngeneo
descobriu o fóssil de um hominídeo –
ou melhor, o fóssil de parte do quadril
dele, ba!zado de KNM-ER 3228. Ngeneo
ainda não sabia, mas !nha encon!ado a
chave para si!ar a bunda no processo
de evolução dos seres humanos.
Demorou até 1990 para que ou!o
pesquisador desse ao KNM-ER 3228 a
importância merecida. Daniel Lieber-
man, chefe do Departamento de Biolo-
gia Evolu!va de Harvard, debruçou-se
sobre aquele fóssil para concluir que
ele abrigava uma bunda de respeito,
bem maior que as dos ances!ais mais
an!gos, que viviam nas árvores.
Essa constatação veio ao encon!o de
uma hipótese de Lieberman: a de que
o bipedismo não surgiu apenas para
que andássemos eretos e !véssemos as
mãos livres para manusear ferramentas
e armas; essa habilidade foi desenvolvi-
da para que pudéssemos correr.
Mas para que correr se qualquer qua-
drúpede veloz nos deixaria comendo
poeira na savana? Porque, embora não
tenhamos a velocidade de um antílope,
somos melhores maratonistas. E isso
faz toda a diferença quando a questão é
ter fôlego para, na hora da caça, alcançar
animais muito rápidos, mas que não
as
mantêm o ritmo por muito tempo. A
capacidade para correr também foi um
t
diferencial para chegar aos restos de um
is
bicho parcialmente devorado antes que
ev
essa carne !vesse tempo de es!agar (ou
antes de ou!os carniceiros).
Num experimento de Lieberman que
O HOMO envolvia porcos !otando numa estei-
ra, um colega seu, Dennis Bramble,
ERECTUS FOI observou que as cabeças dos suínos
ficavam balançando para lá e para cá
O PRIMEIRO
durante o exercício, e isso os impedia
de correr direito. Concluiu que era uma
HOMINÍDEO consequência de os porcos não terem
o “ligamento nucal”. Esse cordão vai da
COM UMA parte posterior do crânio até o ligamen-
to supraespinhoso, localizado nas costas
BUNDA DE e que conecta as pontas das vértebras.
Essa pequena engrenagem na nuca
VERDADE. deixa a cabeça estável enquanto o corpo
se movimenta em alta velocidade. Gran-
E POR ISSO des corredores do mundo animal, como
cavalos, leopardos e cachorros, têm esse
MESMO FOI O ligamento. Chimpanzés e gorilas não.
Mas o ser humano, veja só, tem. Ou seja,
PRIMEIRO COM embora nem todo mundo seja um Usain
UM CÉREBRO Bolt, evoluímos para correr.
Examinando fósseis do Museu de
GRANDE. História Natural de Harvard, então,
esses pesquisadores descobriram que
o ligamento nucal surgiu com o Homo
erec"s, de 2 milhões de anos a!ás e jus-
tamente o primeiro exemplar do gênero
Homo, o nosso, com caracterís!cas mais
humanas do que simiescas.
O ligamento nucal chegou junto
com ou!as caracterís!cas anatômicas
maio 2023 super 51
 perfeitas para que esses hominídeos
pudessem correr bem: dedos mais
curtos nos pés, que podiam dobrar
e flexionar quando se lançavam para
a frente; pés arqueados e tendões de
aquiles longos, que agem como molas
e amortecedores; joelhos capazes de
suportar o peso das pisadas duras de
uma cria!ra em alta velocidade. E não
menos importante: o erec!s também
foi a primeira espécie do nosso gênero
a ter uma bunda proeminente.
Se o ligamento nucal segura a cabeça
no lugar enquanto corremos, é o "aseiro
que equilibra o resto do corpo. “A bunda
é uma adaptação essencial para a capaci-
dade humana de correr com estabilidade,
por longas distâncias, sem se machucar”,
explica Heather Radke, autora de Butts
– a Backstory (“Bundas – Uma História
de Fundo”, sem edição no Brasil).
Os músculos da bunda (que se con-
"aem quando corremos) formam um
aparato complexo de estabilização do
corpo humano. Enquanto o equivalente
deles nos chimpanzés apenas permitem
que esses animais projetem suas pernas
para a frente, nos humanos eles funcio-
nam endireitando o "onco enquanto os
membros se movem rapidamente. Além
de nos manter eretos durante o "ote,
o glúteo máximo con"ola o balanço
a
da perna no ar, a flexão do quadril no
Br
impacto do pé quando encosta no chão
(também nos desacelera um pouco nes-
sa hora) e estende a coxa a cada passada.
Quanto mais rápido você correr,
maior será o envolvimento dos glú-
teos. Mas, para nossos ances"ais nas
savanas, mais importante que a velo-
cidade era o alcance na corrida que
essa estabilidade proporciona. Maior
estabilidade significa menos esforço,
então somos tecnicamente capazes de
correr por horas. Diferentemente dos
grandes velocistas do Reino Animal.
Cavalos e ou"os quadrúpedes não
conseguem respirar com eficiência em
suas disparadas, só quando se movem
devagar. Sua velocidade máxima, então,
não combina com grandes distâncias.
Antílopes não têm a capacidade de mo-
dular sua tempera!ra no pique para fu-
gir de um leão faminto. Humanos, "o-
tando em baixa velocidade, sim. Então,
quando os animais se cansavam, nossos
ances"ais conseguiam chegar aonde eles
es!vessem para matá-los. Ou eram ca-
pazes de alcançar rapidamente os restos
52 super maio 2023
do banquete de um animal maior.
Mais comida, mais nu"ientes, maior
desenvolvimento do cérebro. Não é à
toa, portanto, que o Homo erec!s, além
de ter sido o primeiro de nossos an-
ces"ais a correr longas distâncias –
graças ao equilíbrio proporcionado
por suas bundas –, foi o primeiro a
ter um cérebro grande, já equivalente
a 70% do nosso.
Homem versus cavalo
Parece contraintuitivo que hominí-
deos, correndo devagar, alcançassem
animais mais rápidos? Uma evidência
dessa possibilidade existe ainda hoje,
numa dessas compe!ções exó!cas que
nós, humanos, gostamos de promover:
a corrida de homens con"a cavalos.
Em junho do ano passado, o corredor
britânico Ricky Lightfoot venceu uma
prova (de longa distância, mais apro-
as
priada para o es!lo maratonista) con"a
cavalos realizada no País de Gales.
t
Um grupo de 1.200 corredores com-
is
pe!u con"a 60 cavalos e cavaleiros no
ev
evento, que aconteceu ao longo de coli-
nas escarpadas e terreno lamacento do
lR
interior galês. A vitória foi por pouco.
PESSOAS Ricky, um bombeiro de 37 anos, com-
pletou os 35 quilôme"os em duas horas,
si
SÃO CAPAZES 24 minutos e 23 segundos. Um segundo
antes que o cavalo Lane House Boy.
DE VENCER
Essa es"anha compe!ção foi criada na
década de 1980, depois que duas pessoas,
CAVALOS EM já animadas em um pub local, apostaram
se um homem poderia derrotar um ca-
CORRIDAS DE valo em uma corrida de longa distância.
Demorou, mas ficou provado que sim.
LONGA DISTÂN- Em 2004, o atleta Huw Lobb, então com
27 anos, se tornaria o primeiro huma-
CIA - UMA no a deixar os cavalos para "ás nessa
maratona interespécies.
EVIDÊNCIA DA
Mil e uma u!lidades
IMPORTÂNCIA Aliás, a bunda não nos deu só a cor-
rida no processo evolu!vo. Um ou"o
DAS NÁDEGAS grupo de cien!stas, liderado por Jamie
Bartlett, da Universidade do Colorado,
PARA NOSSOS aponta para mais um superpoder do
ANTEPAS- par de nádegas: sua faceta mul!função.
Bartlett diz que o glúteo máximo é
-SADOS. “semelhante a um canivete suíço”. Ele
concorda com a hipótese de que esse
músculo se desenvolveu para que a"a-
vessássemos longas distâncias correndo
em marcha lenta. Mas adiciona ou"a
afirmação: a de que, ao nos dar agilidade
para agachar, levantar, fazer escaladas e
 a gordura
armazenada
nos glúteos
pode ter
sido funda-
mental para
que as mães
de nossos
ancestrais
tivessem um
leite ma-
terno mais
nutritivo em
períodos de
escassez.

até manter o corpo em posição para arremessar pedras

e paus, fez com que !véssemos mais desenvol!ra
para nos livrar de predadores.

Armazém de calorias
as
Até agora falamos do papel do glúteo máximo na
evolução dos hominídeos. Mas a bunda também é
t

feita de gordura. E a adiposidade tem sua par"cipação

is

na odisseia humana – principalmente para mulheres

ev

grávidas ou amamentando.
A gestação de um bebê exige que a mulher consuma,
lR

aproximadamente, 300 calorias a mais que o seu nor-

mal por dia. A amamentação também demanda mais
combustível para gastar. Hoje, qualquer mercadinho
si

próximo resolve essa necessidade.

a

Mas, há milhões de anos, quando o alimento era

Br

escasso e even!al, as lactantes muitas vezes preci-

savam contar com o que havia de gordura no corpo
para alimentar seus bebês – pelo menos com o míni-
mo necessário para a sobrevivência. Não é por acaso
que as mulheres têm mais gordura espalhada pelo
corpo que os homens – que contam com mais mús-
culos. Nesse “espalhamento”, a bunda foi privilegiada
pela evolução – assim como as coxas. Mas por que
essas partes?
Porque elas estão distantes de órgãos vitais do orga-
nismo, como o coração e o pulmão – partes que podem
adoecer se es"verem cercadas de tecido adiposo. “Há
evidências de que mulheres com bundas e coxas maio-
res têm leite materno mais gorduroso, uma vantagem
evolu"va para ajudar seus bebês a se desenvolver”,
explica Heather Radke. “Principalmente em lugares
sem acesso imediato a gordura significa"va.”
E aí voltamos à essência deste texto: até a gordura
da bunda das mães foi importante para que os bebês
do passado crescessem com mais nu#ientes. Um
fator imprescindível para que "vessem cérebros
maiores e mais capazes. A combinação dessa gor-
dura com os músculos dos glúteos abriu, em grande
parte, o caminho para o surgimento do Homo sapiens,
há 300 mil anos. Em ou#as palavras, a bunda nos
tornou humanos. S
 HISTÓRIA

DA TAVERNA AO BOTECO:
a evolução dos

BARES
tas
is
ev
lR
si
a
Br

54 SUPER MAIO 2023

 ev
is
t

As popinas romanas. O pub medieval. Os saloons

as

americanos. Desde que a humanidade passou a produzir

álcool, criamos lugares para beber em conjunto. Veja o que
lR

mudou (e o que não mudou) de lá pra cá.

si

U
UM GRUPO DE ARQUEÓLOGOS esca-
vou algo peculiar no Iraque em feve-
reiro. Escondida sob 50 centíme!os de
areia, estava uma es!u!ra com sete
cômodos e um pá!o aberto. Por ali, ha-
via bancos de pedra espalhados e uma
grande cozinha com forno e zeer – um
tataravô das geladeiras, feito de barro,
que ajudava a resfriar alimentos.
Havia também potes com resquícios
de cerveja – a bebida favorita dos su-
mérios, primeira civilização a habitar a
Mesopotâmia, 6,5 mil anos a!ás. Esse
lugar é datado de 2.700 a.C. – até segun-
da ordem, !ata-se do bar mais an!go
de que se tem notícia.
A descoberta aconteceu no sítio
arqueológico de Lagash, uma anti-
ga cidade-estado suméria que ficava
a

perto do encontro dos rios Tigre e

Br

Eufrates. Ela chegou a abrigar 50 mil

Texto Rafael Battaglia
habitantes e foi um importante centro
Edição Alexandre Versignassi religioso e comercial.
Design e colagens Luana Pillmann Lagash era um polo de fabricação de
cerâmica – os pesquisadores acreditam
que o estabelecimento atendia os !a-
balhadores desse ramo, que talvez se
reunissem lá para petiscar tâmaras,
peixe seco – e beber.
A produção em massa de bebidas
alcoólicas é tão an!ga quanto a civi-
lização. Uma teoria discu!da desde
os anos 1950 defende, inclusive, que
o plan!o de grãos começou não para
fazer pão – e sim cerveja. “Havia muita
comida espalhada pela terra. Nós de-
senvolvemos a agricul!ra porque que-
ríamos tomar uma”, escreve o britânico
Mark Forsyth, um autor especializado
em divulgação científica, no livro Uma
Breve História da Bebedeira.
O bar sumério, claro, não se chamava
“bar” – esse termo só surgiu nos Es-
tados Unidos do século 19. Tampouco
“taverna”, uma palavra que veio do la!m

MAIO 2023 SUPER 55

 (idioma que só seria criado 2 mil anos
depois). Na língua suméria, um estabe-
lecimento do !po era chamado de ec-
dam. De qualquer forma, ele guarda
semelhanças com seus sucessores – do
pub medieval ao boteco do happy hour.
Vamos ver como um ec-dam funcionava.
Mingau de cevada
A Suméria seria o paraíso dos fãs de
cerveja artesanal. A bebida poderia ser
feita com cevada, castanhas ou levar
um toque de mel. Tinham as leves, as
mais escuras e as encorpadas com vinho,
mais caras. Mas era preciso sorte: cada
estabelecimento produzia a sua própria
cerveja, ali mesmo – e o cardápio do
dia poderia incluir só um !po ou ou!o.
As tavernas ficavam na praça cen!al
da cidade, mas grandes cen!os urbanos
(como Ur, que chegou a ter 65 mil ha-
bitantes) !nham inúmeras delas. Todas
mais ou menos do mesmo jeitão: uma
cons!ução baixa feita de !jolos e barro,
com um interior escuro, !do indica que
com cheiro forte e repleto de moscas
(cortesia dos barris de fermentação).
a
Esses lugares pertenciam a mulheres.
Br
A fabricação de cerveja era vista como
uma tarefa domés!ca, e a responsabili-
dade de tocar o bar também era delas.
Todos os clientes bebiam de canudinho.
É que a breja da época estava mais para
um mingau borbulhante de grãos. O
canudo era a forma de evitar as partes
sólidas que ficavam boiando.
Era um reduto de diversão masculi-
na. De acordo com regis!os sumérios,
as pessoas faziam apostas de quem be-
bia mais e se encon!avam com pros!-
!tas, que cos!mavam ficar na porta
(o sexo acontecia ao ar livre mesmo).
E jogavam conversa fora. A piada de
boteco mais an!ga é suméria: “Um ca-
chorro en!a no bar e diz: ‘não consigo
ver nada. Vou abrir essa porta’”. Pois
é: não dá para entender. Talvez seja
referência a algum “meme” da época –
quando arqueólogos do fu!ro encon-
!arem menções à Carreta Furacão em
regis!os do século 21, provavelmente
não vão sacar qual era a graça….
Apesar do clima descontraído, ha-
via regras no ec-dam. O Código de
56 SUPER MAIO 2023
Hamurábi, primeiro conjunto de leis
da história, escrito por ou!o povo da
Mesopotâmia, os babilônios, faz !ês
menções a esse !po de estabelecimento.
A proprietária que tentasse passar a per-
na em algum cliente na hora de cobrar
pelas cervejas seria condenada à morte.
Se o bar servisse como ponto de reunião
para quem conspira con!a o governo, ela
seria executada – por cumplicidade. E
se uma sacerdo!sa fosse vista lá den!o,
adivinhe? Morta também.
Tavernas e rolês caseiros
A Grécia An!ga também !nha lugares
para comprar birita, claro – acredita-se
que estabelecimentos do !po surgiram
as
em cen!os comerciais en!e os sécu-
los 5 a.C. e 4 a.C. por lá. Um kapeleio
t
atendia a população local e viajantes
is
em busca de bebida e comida (frutas,
ev
legumes, pinhões).
Mas os hábitos eram diferentes. Pa-
lR
ra começar, o vinho era unanimidade.
Os gregos consideravam cerveja uma
bebida inferior – eles não entendiam
si
como faraós egípcios, por exemplo, po-
diam gostar daquele mingau alcoólico,
consumido pelos escravos.
Não que a bebida deles fosse muito
melhor, diga-se. O vinho era diluído em
água e, às vezes, adicionavam-se mel e
especiarias. Esse arremedo de coquetel
era uma forma de atenuar o gosto do
goró: sem técnicas eficazes de vedação,
o etanol do vinho grego oxidava rapida-
mente e virava ácido acé!co – vinagre.
Mas há poucos regis!os de kapeleios.
Talvez porque a elite grega gostasse mes-
mo de beber em casa. E !nham um ri!al
para isso: o simpósio (do verbo sympo-
tein; “beber junto”). Ele acontecia depois
do jantar no andron (“sala dos homens”;
mulheres não podiam par!cipar), uma
sala circular com sofás e o chão levemen-
te inclinado para o cen!o, para facilitar
o escoamento na hora da limpeza.
Havia um líder do evento, o sim-
posiarca. Ele escolhia desde o !po de
vinho ao nível do rolê: se as pessoas vol-
tariam para suas casas depois ou se ele
terminaria na rua, com todos gritando
e correndo. Ele também determinava a
pauta da festa, ou seja, se os convidados
passariam a noite jogando kottabos (uma espécie de
!ro ao alvo) ou discu!ndo polí!ca, filosofia, sen!-
mentos – a obra O Banquete, de Platão, descreve um
simpósio cujo tema era o amor.
De volta às tavernas. Com os romanos, um pouco
mais tarde, elas se espalharam pelo Mediterrâneo
conforme as fronteiras do império se expandiam.
No começo, eram simples (taberna, em la!m, ori-
ginalmente significava “cabana”, “barraca”). Com o
tempo, muitas se tornaram luxuosas e ganharam papel
cen"al na economia urbana. Vendiam comida, vinho,
joias e serviam como en"epostos para dis"ibuição
de grãos. Dava para encon"ar tavernas em mercados,
nos edifícios residenciais e nos fóruns. (as calorias da cerveja, afinal, também são
Mas não eram só elas. Os estabelecimentos mais calorias). Era também a primeira opção
próximos de um bar para valer eram as “popinas”. para se hidratar: água potável era coisa
Em torno de um balcão em formato de “L” ou “U”, as rara, e o álcool oferecia algum nível de
classes baixas se reuniam para socializar, beber vinho proteção con"a infecções.
e comer. No cardápio, azeitonas, pães e ensopados A produção era rotineira, já que a
servidos rapidamente, es!lo fast-food. cerveja estragava depois de dois ou
A elite romana despreza as popinas, vistas como "ês dias. Quem fizesse além da conta
an"os de crime e violência. Rolavam jogos de azar, vendia o excedente: bastava sinalizar
as
e havia pin#ras espalhadas de gente apostando com com o barril do lado de fora da casa,
dados. Era algo proibido (mas, a exemplo das bibocas um bastão com um arbusto em cima
t

de hoje que ainda possuem caça-níqueis, ninguém pa- da porta – e aguardar a clientela.
is

recia ligar muito). Um poeta do século 2 d.C. descreveu Quem também passou a fazer bebi-
ev

o público ca!vo: “ladrões, assassinos, marinheiros, da nessa época foram os monastérios.

carrascos e fabricantes de caixões”. Não por alcoolismo dos monges, mas
lR

Parece mesmo o lugar ideal para tomar uma. porque era do comércio de vinho que
essas comunidades religiosas !ravam
Pubs e estalagens seu sustento.
si

O cos#me de beber fora se perdeu nos primeiros séculos Ao longo dos anos, eles aperfeiçoa-
a

da Idade Média. Em uma sociedade agrícola e descen- ram a fabricação de bebidas alcoólicas.
Br

"alizada, as pessoas fabricavam cerveja em casa. Não A par!r do século 9, monastérios da

por lazer: a bebida fazia parte da dieta dos camponeses Alemanha passaram a adicionar lúpulo
no processo da cerveja. A planta confe-
ria o sabor amargo que hoje é caracte-

DESDE A ANTIGUI- rís!co da bebida – e, o mais importante,

estendia a sua data de validade. Guarde
essa informação.

DADE, ERAM AS
A par!r do século 11, o renascimen-
to comercial (e, consequentemente, das
cidades) "ouxe de volta estabelecimen-
tos de comes e bebes – sobre#do, para

MULHERES QUE atender ao volume crescente de via-

jantes. Primeiro, vieram as estalagens:
hotéis caros para nobres e comerciantes.

FAZIAM CERVEJA
Elas contavam com estábulo, lavanderia
e pá!os internos. Reuniões e até jul-
gamentos poderiam acontecer por ali.
Com o tempo, as casas que antes ven-

E COMANDAVAM diam o excedente de cerveja começaram

a se especializar no negócio. A popula-
rização do lúpulo possibilitou estoques.

OS BARES.
Em vez de oferecer breja do lado de
fora passaram a receber clientes den"o
das residências. É daí que, na Inglaterra,
surge o termo pub, abreviação de public
house, “casa pública”.

MAIO 2023 SUPER 57


Os pubs !nham um bastão de madei-
ra na en"ada. Eles man!nham bancos
do lado de fora e as portas abertas – uma
exigência das autoridades para inspe-
cionar o que rolava ali.
O interior não !nha nada de glamuro-
so. Em muitos casos, era apenas a cozinha
de alguém, com cadeiras espalhadas, la-
reira acesa e barris de cerveja no fundo.
Em um pub renascen!sta, dava para jogar,
apostar, ter um encon"o, ouvir as notícias
– e, claro, beber. O consumo padrão era
de "ês canecões (tankards) de madeira.
Com o passar dos anos, “pub” passou
a ser sinônimo de qualquer estabele-
cimento aberto ao público. Em 1577,
uma pesquisa na Inglaterra e no País
de Gales contabilizou 16.162 deles, en"e
cervejarias, tavernas e estalagens – um
para cada 187 habitantes.
Era uma vez no Oeste
a
Ao longo da maior parte da história, a
Br
humanidade só conhecia bebidas fer-
mentadas, com no máximo 15% de teor
alcoólico. A des!lação moderna mudou
isso. Ela começou no século 14, quan-
do alquimistas purificavam álcool em
busca do “elixir da vida”. Até o século
16, a fabricação de álcool mais puro era
res"ita a fins medicinais – mas não
demorou para que esses líquidos (ge-
ralmente infusionados com especiarias)
en"assem para o cardápio de bebidas.
No século 17, Holanda e França !-
veram problemas com o consumo
desenfreado de des!lados. Na virada
para o século 18, o gin (que, em alguns
casos, chegava a 80% de teor alcoólico)
causou uma crise de saúde pública na
Inglaterra. Para comparar: os gins de
hoje, ainda pesados, têm 50%.
Para além do consumo in loco, os
destilados viraram os queridinhos dos
viajantes. A bebida não apodrecia e,
claro, entregava mais álcool num vo-
lume muito menor. Esse foi um fato
importante para algo que aconteceu
do outro lado do Atlântico: a ocupação
58 SUPER MAIO 2023
do meio-oeste dos Estados Unidos.
Até a metade do século 19, o território habitado dos
EUA se resumia à costa leste do país. Em 1848, des-
cobriu-se ouro na Califórnia. Em 1862, o presidente
Abraham Lincoln baixou uma lei de dis"ibuição de
terras no oeste para quem es!vesse disposto a ficar,
pelo menos, cinco anos, por lá. Muita gente topou – e
a bebida foi junto.
Os primeiros bares do meio-oeste americano não
passavam de tendas com barris de uísque de baixa qua-
lidade mais latas de os"a e de sardinhas em conserva
"azidas da costa leste. Conforme as cidades cresciam,
novas des!larias e bares abriram. A compe!ção fez a
qualidade da bebida aumentar – e a dos bares também.
Com US$ 60 mil em dinheiro de hoje, você podia
cons"uir um saloon decente. O nome vem de “salon”,
que em francês significava uma reunião de pessoas
(a escolha foi, provavelmente, para soar requintado).
Eram cons"uções de esquina feitas de madeira, com
uma grande placa (os mais humildes !nham uma fren-
te falsa que dava a impressão de haver dois andares,
quando na verdade só havia um).
as
Ao con"ário do que se vê nos filmes, as portas de
vaivém na en"ada eram raras – afinal, elas seriam
t
inúteis para barrar o frio. Como nos pubs ingleses,
is
atendentes "abalhavam a"ás de um balcão (em in-
ev
glês, “bar”; no sen!do de uma “barra” onde servem as
coisas – é daí que vem o termo). O chão era de areia
lR
com um "ilho de latão, e havia penicos espalhados
para cuspir tabaco.
Bebia-se, basicamente, uísque de milho (o prefe-
si
rido era o moonshine, uma variante artesanal com
até 80% de álcool). A "adição mandava pedir duas
doses assim que se chegasse ao saloon – uma para
beber, ou"a para oferecer a alguém. Não fazer isso
OS PRIMEIROS
BARES SERVIAM
VINHO E CERVEJA.
AS BEBIDAS DESTI-
LADAS SURGIRAM
NO SÉCULO 16.
 (ou pior: não aceitar a dose que te de- utensílios. Incentivadas pela Coroa,
ram) era uma ofensa grave. as tavernas comercializavam vinho
Os saloons !nham uma reputação pés- e aguardente de uva. Mas a cachaça,
sima. Em 1854, por exemplo, o romance inicialmente consumida apenas por
Dez Noites em um Bar e o que Eu Vi lá, de escravos, logo ganhou destaque.
Timothy Shay Arthur, espalhou a visão A cerveja só en"ou na jogada mais
de que eles eram lugares que levavam os tarde. Ela chegou ao Brasil no século 17,
homens à violência e à pobreza, por conta quando os holandeses instalaram uma
do alcoolismo. No final do século, a Liga colônia em Pernambuco. A par!r de
An!-Saloon (formada, majoritariamente, 1808, com a chegada da Família Real,
por mulheres do meio-oeste) lutou pelo o Brasil passou a importar a bebida da
fim desses espaços. A pressão civil foi Europa. Mas a popularização só veio
uma das principais responsáveis pela cria-mesmo na segunda metade do século
ção da Lei Seca, que proibiu o comércio 19, quando imigrantes alemães deram
de bebidas nos EUA de 1920 a 1933. um boom na produção local. O hábito
Os saloons fecharam. Mas o consu- se consolidou de vez a par!r de 1888,
mo de álcool seguiu. Bares escondidos com a aber#ra de duas grandes cer-
proliferaram nas grandes cidades, onde vejarias: a Brahma, no Rio de Janeiro,
era mais fácil operar abaixo do radar e a Antarc!ca, em São Paulo.
(na maior parte das vezes, era apenas o Na virada para o século 20, cafés
as
apartamento de alguém). E as mulheres, e restaurantes se popularizaram nos
que antes não frequentavam os saloons, grandes cen"os urbanos. Inspirados
t

foram bem recebidas. pela cultura europeia, eram lugares

is

A bebida, porém, era péssima. Muitas sofis!cados, frequentados pela elite.

ev

eram feitas a par!r de álcool indus"ial Mas os bares con!nuaram como refú-
roubado. O jeito, então, foi inventar drin-
gio das classes baixas. Muitos, inclusive,
lR

ques para mascarar o gosto. Foi nessa épo-passaram a acompanhar o horário dos
ca que se difundiu o uso de ingredientes "abalhadores, abrindo de manhã para
como água tônica, gengibre e Coca-Cola. servir café, comida – e, para os mais
si

perdidos na vida, uma cachacinha.

a

E no Brasil? Mas, afinal, quando passamos a cha-

Br

As tavernas surgiram por aqui logo nos má-los de “boteco”? O termo vem de
primeiros anos do Brasil Colônia. Eram “botequim”, diminutivo de “botica”.
precárias, com pouca mobília e reple- As bo!cas eram as antecessoras das
tas de cobras, mosquitos e morcegos. farmácias – por lá, des!lava-se álcool
Não raro, as pessoas !nham de comer para a produção de tônicos e remédios.
agachadas no chão. Mesmo assim, rece- A palavra derivou do grego apothéke
biam todo !po de público. Afinal, elas (“depósito”, “casa de bebidas”), que tam-
ajudavam a garan!r a instalação dos bém inspirou “adega”. Con#do, não se
colonos, servindo de posto de abaste- sabe ao certo quando a palavra “boteco”
Texto Rafael Battaglia
cimento e para fechar acordos com os caiu na boca do povo.
povos indígenas. Ilustração XXXX XXXX Essa é só mais uma lacuna da histó-
As tavernas acompanharam a ex-
Design Luana ria. “Infelizmente, há muita coisa não
Pillmann
pansão do Brasil con!nente aden"o. documentada no Brasil”, diz João Luiz
“Assim como as igrejas, elas estão na Maximo da Silva, professor de História
raiz da fundação das cidades brasi- da Alimentação no Senac. “Por mui-
leiras”, diz Lucas Brunozi Avelar, do to tempo, achou-se que era inú!l se
Laboratório de Es#dos Históricos das debruçar sobre esse !po de assunto.”
Drogas e da Alimentação da USP. Uma pena. É justamente das coisas
Nas tavernas, as pessoas se a#aliza- banais da vida que aprendemos mais
vam sobre os acontecimentos da colô- sobre nossos antepassados – e sobre
nia, discu!am polí!ca e organizavam nós mesmos. “Tavernas, bares e ou"os
eventos. “Elas eram as fábricas da vida elementos do co!diano têm muita po-
social da classe "abalhadora”, ressalta tência para revelar aspectos da huma-
Avelar, autor de uma tese sobre o tema. nidade”, diz Avelar. Então desce mais
E o que se vendia lá? De tudo um uma rodada, garçom, porque ainda há
pouco: comida, ferramentas, pequenos muito o que descobrir. S

MAIO 2023 SUPER 59

 ORÁCULO ILUSTRAÇÕES LUISA FANTINEL DESIGN LUANA PILLMANN
93,4
MILHÕES de pessoas terão
glaucoma (perda de células
da retina que enviam impulsos
nervosos ao cérebro) em 2030. 1

ast
is
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lR
a si
Br

O QUE PODE TEM CHANCE de rolar uma tragédia: você pode perder

ACONTECER
a visão. Mas há danos intermediários que, embora não
cheguem à cegueira, também vão trazer prejuízos aos
olhos. A radiação ultravioleta do Sol pode arruinar
tanto a córnea (a camada transparente que direciona

COM MEUS OLHOS

a luz para a pupila – a bolinha escura no meio do olho
por onde a luz entra) quanto o cristalino (a parte que
regula o foco) e a retina (onde estão nossas células re-
ceptoras de luz). Fotoceratite é quando há queimaduras

SE EU OLHAR
na córnea. O resultado é dor e uma sensibilidade à luz.
A maioria das pessoas consegue se curar, mas essa
recuperação talvez demore algo em torno de um ano
para acontecer. Um prejuízo mais grave é a retinopatia

MUITO TEMPO solar. É quando a luz ultravioleta deixa um buraco na

retina. Isso cria um pequeno ponto cego na visão cen-
tral. Como a retina não possui receptores de dor, você
pode levar até alguns dias para perceber que algo está

PARA O SOL? estranho: a visão fica embaçada ou aparecem manchas

(amarelas ou escuras). Esse dano na retina pode levar
até à perda completa da visão. 2

60 SUPER MAIO 2023

 EDIÇÃO ALEXANDRE CARVALHO

Como se forma um oásis?

LAGOS SE FORMAM quando uma fonte de água subterrânea (aquífero)
aflora na superfície. Esse fenômeno pode acontecer em qualquer bioma,
mas só causa estranhamento quando ocorre em regiões áridas. É só aí
que o lago ganha o nome de oásis. Nesse caso, os aquíferos armazenam
a água da chuva que cai nos arredores do deserto – digamos, uma cadeia
de montanhas. O líquido penetra as rochas e se espalha no subterrâneo,
“viajando” até regiões mais secas. Por isso é possível encontrar fontes de
água doce mesmo que praticamente não chova na região. Mas como os
aquíferos veem a luz do dia? Eles podem aflorar naturalmente (quando
há uma depressão no relevo) ou com intervenção humana: dá para cavar
poços artesianos de modo que a água chegue à superfície, sem a necessi-
dade de bombeá-la. Como os ventos da região podem poluir a água com
areia, é comum criar uma barreira física plantando palmeiras ao redor
do lago. Daí aquele cenário típico de desenho animado. 3 as
PÁ PUM De onde vêm os bebês recém-nascidos que aparecem no cinema e na TV?
@jussteil, via Instagram
t
is

PODE SER DE UMA AGÊNCIA de atores especia- autorização do Juizado da Infância e Juventude.
ev

lizada em crianças. Pode ser de uma fábrica de Tendo esse documento, a criança pode ser filiada
bonecos. A não ser que seja necessário um take a uma agência mediante um contrato assinado
lR

Qual brasileiro ganhou próximo do neném, que mostre detalhes de seu por seus pais e, então, receber convites para apa-
mais Grammy Awards? rosto ou coisa do tipo, o mais normal é optar por recer em novelas, filmes e peças publicitárias. Por
bonecos. E não é qualquer Baby Alive que você vê aqui, só bebês com mais de dois meses podem
si

O compositor e violo-
nista Laurindo Almeida numa loja de brinquedos: existem profissionais aparecer em cena. Nos EUA, não há essa restri-
a

(1917–1995) foi quem especializados em criar bonecos realistas que vão ção. Isso não quer dizer que os bebês cumpram
Br

mais chegou lá: 5 vezes, aparecer em cena. Uma terceira opção é recorrer
todas na década de 1960. à computação gráfica (CGI) para exibir as crianças
digitalmente. Foi assim com os bebês bizarros do
TEM A VER último capítulo da novela Travessia e com o icôni-
co bebê de Crepúsculo. Mas, claro, crianças reais
a mesma carga horária dos demais atores. Na
Califórnia, nenéns com menos de 6 meses não
podem passar mais de 20 minutos por dia gra-
vando. E a exigência aumenta para aqueles com
menos de um mês: a atuação depende que um

385
MIL bebês nascem todos
os dias. E essa média deve
também participam das gravações. No Brasil,
embora, por lei, menores de 14 anos não possam
trabalhar, a participação dos atores bebês pode
ser liberada desde que os pais consigam uma
pediatra confirme que eles tenham passado por
uma gravidez completa, tiveram peso normal ao
nascer e são fisicamente capazes de suportar o
estresse de uma filmagem. 4

permanecer estável pelas

próximas cinco décadas, O USO DESSE TIPO DE SOFÁ sem encosto, tão emblemático da psicanáli-
Como Freud adotou
segundo a ONU. 5 se, não nasceu da mente de Sigmund Freud. Uma paciente dele, madame
o divã em suas
OUTRO DADO sessões de terapia? Benvenisti, deu-lhe o móvel de presente em Viena. Mas pensando nela
RELEVANTE SEM mesma. Disse que, se era para ter sua cabeça analisada, precisava estar
NENHUMA LIGAÇÃO numa posição confortável. A peça era modesta, de cor bege, e por isso
Freud decidiu cobri-la com tapetes persas e almofadas de veludo. Mas,

385
MIL empreendedores indi-
em pouco tempo, o austríaco concluiu que o divã era essencial para suas
sessões. Deitado de costas para o analista, sem olhar para as expressões
de Freud, o paciente ficava mais relaxado. Isso evitava que se sentisse
julgado ao falar sobre tudo o que lhe viesse à mente. E é justamente
nessa fala sem amarras, a “associação livre”, que está a matéria-prima
viduais atuam em Moscou,
das reflexões e direcionamentos do analista. O divã original existe ainda:
30% deles dedicados ao
comércio. 6
está em exposição em Londres, no Museu Freud. 7

Reportagem Alexandre Versignassi, Alexandre Carvalho, Leonardo Caparroz, Luisa Costa, Maria Clara Rossini e Rafael Battaglia. Fontes 1 Organização
Mundial da Saúde. 2 Muriel Schornack, optometrista da clínica Mayo, nos Estados Unidos. 3 LabOasis Foundation; National Geographic; Gerson
Cardoso, do instituto de geociências da UFRJ. 4 Dorberto Carvalho, presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos de Espetáculos e Diversões do
Estado de São Paulo (SATED-SP). 5 theworldcounts.com. 6 Prefeitura de Moscou. 7 Livro Freud Sem Traumas, de Alexandre Carvalho.
MAIO 2023 SUPER 61
 ORÁCULO
Como um câncer en!a em estado de metástase?
O CÂNCER TEM UMA MÓRBIDA SEMELHANÇA
a
com a própria essência dos nossos genes: seu
Br
objetivo é se espalhar. Os genes “desejam” se
multiplicar pelo mundo, e o fazem nos dando
o ímpeto de produzir filhos; o câncer quer
conquistar o nosso corpo. A doença surge
quando células “defeituosas”, com mutações
em seu DNA, se multiplicam a tal ponto que
formam um tumor – um tecido estranho ao
organismo que pode corromper funções vitais.
A metástase acontece quando as células can-
cerígenas se desprendem do tumor principal e
entram na corrente sanguínea ou no sistema
linfático. É assim que viajam para longe do
tumor original e se instalam em outras partes,
PERGUNTE
AO ORÁCULO
Escreva para
alexandre.santos@abril.com.br
mencionando sua cidade e
estado – ou mande a pergunta
via direct no Instagram.
62 SUPER MAIO 2023
ANIMAIS BEBEM ÁLCOOL?
SIM, AS FRUTAS E NÉCTARES da dieta de muitos animais também são
uma fonte de álcool em potencial: o etanol é um produto, junto ao
dióxido de carbono, da fermentação natural (ou seja, o de leveduras
“comendo” açúcares e liberando esses compostos como resultado da
digestão). O resultado pode levar a concentrações surpreendentes
de álcool, de até 8,1% em frutas (equivalente à graduação alcoólica
das cervejas IPA mais fortes) e de 3,1% em néctares. Tanto que alguns
animais desenvolveram a capacidade de quebrar o etanol rapidamente
em seu organismo para evitar a embriaguez. Pesquisadores do Canadá
verificaram isso em um estudo de 2020. Eles investigaram a presença,
em 85 mamíferos, do gene ADH7, cujo papel é codificar uma enzima
chamada álcool desidrogenase, que ajuda justamente a processar o
etanol no organismo. Sequências do gene apareceram em 79 dos mamí-
feros pesquisados – principalmente naqueles que consomem (adivinhe)
frutas e néctar. Mas outros animais vão além de tolerar o etanol. Eles
parecem gostar mesmo da coisa. Experimentos mostraram que um
as
em cada cinco macacos da espécie Cercopithecus aethiops preferia um
coquetel de álcool misturado com água e açúcar a só água com açúcar. 1
t
is
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lR
LISTA
si
Quais novelas da
formando novos tumores. Não que seja tão
Globo ficaram
simples. Quando uma célula cancerígena se
mais tempo
desprende do tumor principal, na maioria das
vezes ela morre no meio do caminho. Para no ar?
formar uma metástase, tem de se espremer
e sobreviver ao estresse das forças que agem
sobre o sistema circulatório e escapar da TRAVESSIA teve 179 capítulos.
detecção das células imunes. Infelizmente, Pantanal, 167. Isso não é nada
perto das antigas 3:
muitas delas conseguem chegar lá. Tanto que
90% dos casos de morte por câncer estão A GRANDE MENTIRA
relacionados a metástases. Embora o câncer 1 (1968-1969):
possa se espalhar para quase todas as partes 341 capítulos
do corpo, certos órgãos são mais propensos
a desenvolver tumores secundários: fígado, IRMÃOS CORAGEM
pulmão, cérebro e ossos. 2 2 (1970-1971):
328 capítulos
O HOMEM QUE DEVE
3 MORRER (1971-1972):
NÚMERO INCRÍVEL 258 capítulos
R$ 50
BILHÕES é o custo anual dos acidentes de
trânsito no Brasil. Essa é a soma da perda de
4
SELVA DE PEDRA
(1972-1973):
243 capítulos
BARRIGA DE ALUGUEL
produção pelos mortos e feridos, danos à (1990-1991):
propriedade e gastos médico-hospitalares. 4. 243 capítulos
 SÓ ACREDITO Qual a diferença O QUE CARACTERIZA um cappuccino é
a grossa camada de espuma de leite que

VENDO en!e um cappuccino vai por cima da bebida – sem ela, você
tem apenas café com leite mesmo. Essa
espuma pode ser feita batendo o leite com
e um café com leite? um mixer, o que adiciona bolhas de ar ao
líquido. Confira abaixo os diversos tipos de
preparos de café.

CAPPUCCINO CAFÉ LATTE CAFÉ AU LAIT CAFÉ AMERICANO

1 parte de espresso 1 parte de espresso 1 parte de espresso 1 parte de espresso
1 parte de leite 3 partes de leite 2 partes de leite 2 partes de água
1 parte de espuma finalizado com espuma
t as
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CORTADO MACCHIATO MOCHA AFFOGATO

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1 parte de espresso 1 parte de espresso 1 parte de espresso 1 parte de espresso

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1 parte de leite finalizado com espuma 1 parte de leite 1 bola de sorvete

1 parte de espuma
a

1 parte de chocolate quente

Br
Fonte Enciclopédia Britannica; Café du monde

CAFÉ IRLANDÊS FRAPPÉ

2 partes de café 1 parte de café
1 parte de whisky irlandês gelo
1 parte de creme de leite batido leite (opcional)

Por que os filmes têm duas horas de duração, geralmente? HAJA BEXIGA

NO COMEÇO DO SÉCULO 20, quase todos os filmes duravam até 15

minutos. É o que cabia em um rolo de filme, que tinha 305 metros de
comprimento e pesava 2,3 quilos. Naquela época, uma associação de
produtoras da costa leste dos EUA determinou que os filmes fossem
curtos para reduzir custos. O divisor de águas foi Quo Vadis (1913), 85 horas: A Cura para a 21h5min: The Innocen- 3h58min: …E o Vento
de Enrico Guazzoni, um épico sobre a Roma do imperador Nero. O Insônia (1987) é o filme ce (2019) é um retrato Levou (1939) é o vence-
filme tinha duas horas e usou locações reais, dublês para as cenas de experimental mais de Bangladesh durante dor do Oscar de Melhor
ação e mais de 5 mil figurantes. Fez tanto sucesso que inspirou outros longo já feito. Consiste a Guerra de Indepen- Filme com maior dura-
num artista recitando dência. Foi o filme mais ção. Na sequência vem
cineastas a fazer filmes mais longos. Então, nas décadas seguintes, a um poema de mais de longo a ser exibido Lawrence da Arábia
duração de duas horas se tornou o formato padrão. 5 4 mil páginas. comercialmente. (1962), com 2h47min.

Fontes 1 Genetic evidence of widespread variation in ethanol metabolism among mammals: revisiting the ‘myth’ of natural intoxication; Chronic intake
of fermented floral nectar by wild treeshrews; Voluntary alcohol consumption in vervet monkeys: Individual, sex, and age differences. 2 Estudo “Twelve
unanswered questions in cancer inspired by the life and work of Leland Chung: if this is true, what does it imply”?”. 3 Lucas Martins Néia, roteirista e
pesquisador da história da telenovela; Memória Globo. 4 Ipea. 5 Why movies went from 15 minutes to 2 hours (Vox). MAIO 2023 SUPER 63
 ORÁCULO

Por que há dois dias da semana

em que não !abalhamos?
SE VOCÊ TEM DOIS DIAS para descansar na semana, agra-
deça à cultura judaico-cristã. O imperador Constantino
oficializou a semana de sete dias no calendário romano no
ano 321 d.C. – e, recém-convertido ao catolicismo, decretou
qual seria o dia de descanso e oração: o dia do Sol, reba-
tizado para dies Dominica (“dia do Senhor”). Daí o nome
“domingo”. Beleza, domingo é dia de ficar em casa e cultuar
a Deus. Mas as pessoas faziam isso mesmo? Você já deve
imaginar. Na Inglaterra do século 19,muitos trabalhadores
saíam das fábricas no final da tarde do sábado para curtir
a noite e o domingo com bebidas e festas. Na segunda-
feira, é claro, estavam destruídos. Virou uma moda que os
trabalhadores faltassem ao trabalho no primeiro dia da
semana. Então alguns patrões concordavam em oferecer
metade do sábado de folga, desde que os empregados ga-

QUEM INVENTOU OS
rantissem que estariam no batente na segunda. Já nos EUA,
as
algumas empresas passaram a oferecer o sábado inteiro
de descanso para acomodar os trabalhadores judeus, que
t
is

dedicam esse dia à religião. Outras começaram a ver o final

ÓCULOS ESCUROS? de semana como uma oportunidade de estimular o turismo

ev

e as compras. No início do século 20, então, os dois dias de

folga se estabeleceram ao redor do mundo. 2
lR

OS PRIMEIROS ÓCULOS ESCUROS SURGIRAM na China do século 12, e

não pareciam nada com os estilosos Ray-Ban modelo aviador que Tom
si

Cruise usa em Top Gun. As molduras primitivas, sem hastes, ampa-

ravam placas escurecidas, de quartzo defumado. Esses óculos eram
a

usados pelos juízes chineses, que, graças às lentes escuras, conseguiam

LOST IN
Br

que os acusados de um crime não percebessem as expressões daqueles

que os julgavam. Já em 1752, James Ayscough, um inventor inglês de
instrumentos científicos, criou lentes coloridas. Ele acreditava que o
vidro branco dos óculos convencionais gerava um brilho que danifi-
cava os olhos. Ainda que não houvesse evidência disso, os modelos
que ele criou, com hastes paralelas dobradiças, representaram um
avanço na direção dos óculos de hoje. Porém os tipos modernos se
popularizariam mesmo só nas primeiras décadas do século 20. Em
1929, o empreendedor americano Sam Foster foi sofisticando o design
das peças e conseguiu que seus modelos conquistassem o mercado
americano. Mas e a proteção contra a radiação solar? Essa evolução
veio em 1936, quando surgiram os filtros para raios UV, inventados
por Edwin H. Land, fundador da Polaroid. 1
TRANSLATION
Origem China
Soltar !maça pelos
sete orifícios.
Os chineses estendem para sete os buracos que, como um
vulcão, expressam um estado furioso diante de alguma con-
trariedade. Aqui no Brasil, temos a expressão “soltar fogo
pelas ventas”. As ventas são as nossas duas narinas. Então,
no quesito “ira”, o mandarim bate o português por 7x2.

Sim. O que as pessoas chamam

PENSANDO O !abalho hoje de “emprego” seria o atendi-
!az dignidade? mento a uma necessidade genuína
BEM... e contribui para o bem. A tradição
Filósofos de platônica, em grande parte, vê o
ontem opinam em trabalho não como uma mudança
assuntos de hoje do ambiente externo, mas como
por Alexandre Carvalho uma transformação de si mesmo. O
PL ATÃO trabalho existiria, principalmente,
428 a.C.–348 a.C. para moldar o caráter.

64 SUPER MAIO 2023

 MANUAL Como aproveitar
por Rafael
Battaglia
o máximo da sua air fryer
1 - A REGRA GERAL
Air fryers não são frita-
deiras, e sim fornos de
*Sugestão de preparo, assim como as demais receitas do manual. Cada air fryer possui a própria regulagem – vá testando até encontrar os tempos ideais da sua.
convecção: o ar quente
circula e confere a alguns
alimentos a crocância de
algo fritinho – sem a parte
do óleo. Para alcançar
um bom resultado, não
encha a assadeira: com
pequenas porções por vez
(e espaçadas entre si), o
ar circula melhor e assa
uniformemente. Como
num forno.
3 - BRÓCOLIS
As air fryers conseguem
ev
assar e dourar legumes
rapidamente. Para fazer
brócolis, tempere-os com
lR
sal, pimenta, alho e um
toque de shoyu (que vai
si
ajudar na caramelização).
Asse a 190 °C por 9 minutos.
a
Se a parte de cima ficou cro-
Fonte: Maurício Lopes, professor de gastronomia do Mackenzie
Br
cante e os caules, macios
(cheque com um garfo), é
sinal de que estão prontos.
PARA SABER MAIS Domine a máquina
Você vai encontrar receitas de arroz, lasanha Use a sua air fryer para ressuscitar comida
e até pudim na air fryer. Hum… Melhor não. requentada ou murcha, como as batatas
Guarde essas para fornos e fogões conven- fritas que chegaram do delivery ou a pizza
cionais: por precisarem de refratários, elas do dia anterior (nesse caso, jogue algumas
impedem que o ar circule adequadamente gotas d’água na massa antes de assar, para
dentro do aparelho. que ela fique crocante).
Sim. O status de ser alguém de-
penderia, nas sociedades modernas,
do reconhecimento público de habi-
lidades e realizações. O trabalho, aí,
não é só satisfação das próprias ne-
cessidades individuais e imediatas,
mas a expressão de um valor maior:
nele se forma a consciência pessoal
HEGEL e social, se manifesta a faceta públi-
1770–1831 ca e universal do ser humano.
Fontes 1 glasseshistory.com. 2 Britannica; The Atlantic; Carlos Eduardo Ambiel, professor de Direito e Processo do Trabalho na FAAP.
2 - BATATAS FRITAS
Coloque-as numa tigela
com água gelada por
meia hora para tirar o
excesso de amido – o que
as deixará mais crocantes.
Depois são duas etapas
na air fryer. Na primeira,
tempere com sal e asse
a 175 °C por 10 minutos*,
virando-as na metade.
Deixe esfriar num reci-
piente com papel toalha.
Por fim, cozinhe a 200
°C por mais 10 minutos.
tas
4 - FRANGO (E SALMÃO)
is
Pedaços de frango (asi-
nhas, coxas e sobrecoxas)
e algumas postas de peixe
(como salmão) ficam cro-
cantes por fora e macios
por dentro. Tempere a
gosto e asse com a pele
para cima. Asinhas podem
levar até 20 minutos, a
200 °C. Já uma posta de
salmão de 180 g, 10 minu-
tos (virando na metade).
Para limpar a air fryer, use o lado macio
da esponja e detergente neutro. Se quiser,
finalize com um pano de microfibra seco.
Se houver muita gordura no recipiente,
cubra-o com água quente (e um pouco
do detergente) e deixe agir por 15 minutos.
Não. O trabalho seria a forma que
a sociedade encontrou para alienar o
indivíduo. Em vez de realizar a pessoa,
passa a escravizá-la. “Quanto mais
poderoso é o trabalho, menos poder
tem o trabalhador.” A labuta ainda
teria o efeito colateral de mudar sua
autopercepção (geralmente para
MARX pior): o empregado passa a medir-se
1818–1883 pelo que possui, não por quem ele é.
MAIO 2023 SUPER 65
 ÚLTIMA PÁGINA DESCULPA QUALQUER COISA E ATÉ LOGO

Aperta o play Em junho de 2022, a Ancine coletou dados sobre o conteúdo disponível em cada serviço de
s!eaming naquele momento (uma informação que eles não cos"mam divulgar), e mos!ou
num relatório agora em 2023. Veja aqui.* Infográfico Natalia Lara e Maria Clara Rossini

3.051
48.768 Filmes Séries
10.822
3.337

EPIS
ÓDI
10.326
652
520 140 OS
244
TEM
675
POR
13.453
ADA
232

88

S
213

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703
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377
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5. LMES
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2.6

396

2.321

62.955
490

7.570

*.Fonte: www.gov.br/ancine/pt-br/oca/publicacoes/arquivos.pdf/informe-vod-pos-revisao-28-fev-2023.pdf
66 SUPER MAIO 2023

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