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SÃO PAULO
2012
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SÃO PAULO
2012
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Agradecimentos
À minha terapeuta Adriana Ranzatti, que me ajudou a atravessar minha jornada pela
minha própria masculinidade, dando voz aos meus complexos masculinos que
deram luz a esse trabalho e que me fizeram crescer como homem.
À minha família: meu pai Zeus e meu irmão Apolo, sem os quais não pude me
diferenciar como Hermes, minha mãe e minha irmã, pelo amor e cuidado durante
toda minha vida.
À minha segunda família, meus amigos, sem os quais não teria sobrevivido ao
mundo selvagem da barbárie.
Aos meus amigos e colegas da PUC, que tiveram que me suportar durante esses
cinco anos.
Aos deuses gregos, pela tamanha energia que despenderam para essa mera
produção acadêmica.
Por fim, agradeço à Carl Gustav Jung, mestre de inestimável obra, que iluminou o
mundo e permanecerá iluminando enquanto eu estiver vivo e puder dar continuidade
aos seus estudos sobre as profundezas da psiquê.
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RESUMO
Esse trabalho tem como objetivo o estudo da crise da masculinidade do homem nos
tempos atuais. Através de diversos autores, todos fundamentados na Psicologia
Analítica, buscamos a compreensão da queda do patriarcado, da estrutura psíquica
do homem e de como o homem atual está vivenciando esse momento histórico.
Através dos estudos de Carl Gustav Jung e de diversos outros autores da psicologia
analítica, pudemos conhecer os diferentes arquétipos ligados à masculinidade. Com
os arquétipos de oito deuses gregos, apresentado por Jean Shinoda Bolen,
aprendemos que o homem não é apenas um, e que não podemos fazer
generalizações. São várias as maneiras de vivência da queda do patriarcado, e a
masculinidade que estimula a repressão do feminino não é a única. O homem é
muito mais do que o patriarcado arcaico pregou durante os últimos dois milênios.
ABSTRACT
SUMÁRIO
Introdução .................................................................................................................. 1
Método .................................................................................................................... 3
Bibliografia............................................................................................................... 30
1
Introdução
Os homens ainda têm que se libertar das prisões escravizantes dos arquétipos
primais, mas matar ou brutalizar não é mais o jeito apropriado. Nós temos que
aprender uma língua diferente, uma nova iconografia, e diferentes metáforas de
liberização. (...)
Como liberar sem destruir, como libertar sem criar horror e devastação? Esse é o
grande problema interno e externo da nossa cultura, e enquanto não arranjarmos
respostas não podemos alegar estarmos num mundo pós-patriarcal. (tradução nossa)
(TACEY, p. 197, 1997)
Objetivos Específicos:
Método
Porém, essa não é uma definição estruturante. Para Jung, “Não há homem
algum tão exclusivamente masculino que não possua algo em si feminino” (em O Eu
e o Inconsciente, 2008, p. 65, pp. 297). Dessa forma, Jung acredita que todo homem
tem potências femininas dentro de si, bem como a mulher tem potenciais masculinos
dentro de si.
Na teoria do inconsciente de Jung, ele utiliza o arquétipo de Anima para
referir-se às potencialidades contrassexuais do homem. Assim, no homem, Jung
define: “[Assim] Como anima corresponde ao Eros materno, o animus corresponde
ao Logos paterno” (em Aion, p.12, pp. 29, 2008). Aqui, Eros e Logos representariam
as imagens arquetípicas de características unicamente maternas e paternas,
respectivamente.
Longe de mim querer dar uma definição por demais específica desses conceitos
intuitivos. Uso os termos “Eros” e “Logos” como meios nocionais que auxiliam a
descrever o fato de que o consciente da mulher é caracterizado mais pela vinculação
ao Eros do que pelo caráter diferenciador e cognitivo do Logos. No homem, o Eros
que é a função de relacionamento, via de regra aparece menos desenvolvido do que
Logos. Na mulher, pelo contrário, o Eros é expressão de sua natureza real, enquanto
que o Logos muitas vezes constitui um incidente deplorável. (JUNG em Aion, 2008,
p.12, pp. 29).
Por certo é possível que haja também muitos homens que argumentem de maneira
bem feminina, naqueles casos, por exemplo, em que são predominantemente
possuídos pela anima, razão pela qual se transmudam no animus da sua anima.
(JUNG em Aion, 2008, p. 13, pp. 29)
“Uma das formas mais básicas nas quais vivenciamos o conflito universal dos
opostos em nós mesmos e no nosso encontro com os outros é a polaridade
masculino-feminino. Ela se coloca, portanto em primeiro lugar entre nossos
problemas psicológicos. Pode haver um sentido vago e subjacente de unidade, do
que falam os místicos, mas, no que diz respeito à nossa realidade diária, nós
vivenciamos em termos de dualidade e conflito: consciente-inconsciente, luz-sombra,
espírito-natureza, positivo-negativo e, neste caso, masculino-feminino.” (WHITMONT,
2002, p. 153)
(...) o princípio Yin é representado como receptivo, dócil, retraído, úmido, escuro,
concreto, envolvente, continente (caverna e cavidade), doador de forma e gerador,
centrípeto, iniciador; Não é o espírito, mas natureza, o mundo da formação, o ventre
escuro da natureza que dá à luz no simbolismo da Terra e da Lua, da escuridão e do
espaço; é negativo, indiferenciado e coletivo. (WHITMONT, 2002, pg 154)
Pai
Sábio Herói
o
Filho
2.2.1 O Pai
2.2.2 O Filho
2.2.3 O Herói
O Herói, assim como o Pai, é orientado por valores coletivos. Ele luta,
guerreia e briga, como os grandes heróis da Mitologia. Ele luta pelo avanço ou pela
defesa desses valores. Ele não sabe governar nem preservar aquilo que conquista;
ele protege e destrói. Ele conquista o mundo, mas não sabe o que fazer com ele. Ele
não necessariamente se apropria dos valores que defende, mas se esforça durante
a vida inteira para defendê-los. Ele se sacrifica pelos outros, mas também sacrifica
os outros pelo bem daquilo que defende. Ele abandona tudo para defender o que
quer que seja que ele esteja defendendo. É o guerreiro ou soldado. Aquiles,
Hércules e Siegfried podem ser figuras mitológicas que o representam.
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2.2.4 O Sábio
O Sábio não briga, não comanda. Ele é o oráculo, aquele que centraliza
conhecimento e saber. Ele é mais orientado para uma idéia do que para uma pessoa
física, específica. Ele ouve, recebe, percebe; Ele lembra figuras como Moisés, o
próprio Oráculo (como idéia) ou o personagem Elrond, do livro O Senhor dos Anéis.
Elrond é Sábio. Apesar de a Terra Média estar em guerra, ele não se envolve
diretamente. Ajuda aqueles que pedem conselhos, e faz analises as situações com
clareza e sabedoria (Whitmont, p. 163, 2002).
suas pernas, com um sistema ao das rodas medievais de tortura; se fossem maiores,
eram simplesmente esquartejados para se ajustar a tamanho. (BOLEN, 1989, p. 20)
para ser criado em segredo por Métis, Titã e Deusa da Sabedoria. Zeus, com a
ajuda de Métis, derrota os titãs, destrona Cronos e o faz cuspir seus filhos. Assim
seus irmãos Hades, Poseidon, Hera, Héstia e Deméter “nascem”. Zeus “tira na sorte”
as partes do mundo com seus dois irmãos (visto que, segundo as leis gregas, as
mulheres não têm direito a posses – o que nos remete novamente às novidades da
queda desse poder de Zeus trouxeram para o mundo). Hades fica com o submundo,
Poseidon com o mar e a Zeus coube o céu; A terra seria a princípio compartilhada,
mas a ela Zeus expande seus domínios.
“Violência gera violência já pela terceira vez consecutiva” (BOLEN, 1989, p.
43). Também, pela terceira vez consecutiva, o feminino é reprimido e tem seus
desejos não ouvidos. Essa estrutura familiar se reflete muito na nossa estrutura
patriarcal. Uma disputa de poder entre filhos e pais e uma repressão do feminino. A
obrigação do filho de dar seqüência à profecia e tomar o poder em mãos, ou mesmo
se submeter a uma figura de poder, seja ela o pai ou o irmão.
Porém, não é só Zeus que sobrevive; Zeus salva seus dois irmãos, que
representaram figuras arquetípicas importantes na vinculação emocional dos
homens. Formam-se os três pilares do arquétipo do Pai, introduzido no capítulo
anterior.
Podemos entender o símbolo da família grega como uma metáfora à família
em construção. O Pai mutila e mata seus filhos, os filhos mutilam e matam seus
pais, todos reprimem e abusam do feminino, e, por fim, Zeus enquadra cada um em
seu devido papel social, obrigando a todos a seguir os desejos do Pater.
própria profundeza psíquica o seu reino. Exilado do mundo externo, nas profundezas
psíquicas, Hades reina no seu próprio mundo e, apesar de ser visto como um
estranho, é rico como uma cornucópia, que é um dos seus principais símbolos.
Tal como os três arquétipos pais, os cinco arquétipos do filho tem suas
características e personalidades descritas por Bolen de maneira a conseguirmos
visualizar cada um dos Deuses no homem moderno. Hermes, o mensageiro, que é
extrovertido e serelepe, conquista a todos com sua lábia e prega troças e trapaças
aos desavisados. Apolo, o filho prodígio, é aquele que prometeu espalhar a voz de
Zeus (seu pai) por todo o mundo. Certeiro com seu arco, organizado e pensador
como um bom filho do patriarcado. Ares, o guerreiro robusto, brigão, emotivo,
estratego, é a sombra do patriarcado: a guerra que é tão odiada mas ao mesmo
tempo tão presente na história da sociedade. Hefesto, artesão criativo, também
rejeitado, introvertido e introspectivo, mas, ao invés de brigar, usa suas emoções na
sua criatividade. E por fim Dionísio, cuidado por Zeus e criado por entre mulheres e
ninfas, um homem mais feminino, festejador, amado e adorado, é a criança especial,
emotiva e sensível.
Cap. 4. Discussão
O masculino pregado por Zeus tem como uma das referências básicas a
supremacia do homem sobre a mulher. Assim, o crescimento do feminino ameaça
esse masculino, que viverá em militância contra esse gênero crescente e tentará
manter a ordem patriarcal do mundo, custe o que custar. Esse crescimento do
feminino é o que evidenciamos no primeiro capítulo como um dos indícios da queda
do patriarcado.
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Dessa maneira, podemos entender que o homem que passou pelo Leito do
Procrusto e já teve suas diferentes possibilidades de masculinidade podadas e
reprimidas, incorpora as exigências masculinas de Zeus, sendo ele um homem Zeus
ou não. Ele fará um esforço sobrehumano para reprimir suas emoções, e fugirá de
qualquer contato com as mesmas, para que o Pater Zeus o aceite.
Por mais que esse homem Zeus queira defender o patriarcado com unhas e
dentes, vemos que ele não vive esse patriarcado de maneira saudável. Não só
apenas porque ele sofre as mesmas punições que os outros homens, ao tentar sair
das normas desse Pater, mas também porque ele passará a vida inteira buscando
tornar-se o Pater. Vemos sinais de sintomas que nos dão indícios de que o homem
Zeus está sofrendo há muito tempo; comparado com as mulheres, índices maiores
de alcoolismo e adição à drogas, violência, além de altos números em doenças
psicossomáticas (MORAES, 2009).
Porém, o estudo dos arquétipos dos deuses nos permite encontrar que há
outros tipos diferentes de masculinidade e que elas reagem diferentemente à queda
do patriarcado. Diferenciei em outras duas maneiras de reação: a reação opositora
ao patriarcado e a reação independente.
Ao contrário de todos os outros homens, o homem Hades (que conseguiu
atravessar o Leito do Procrusto sem muitos danos) não irá reagir à queda do
patriarcado. Sua masculinidade é introvertida e seu crescimento psíquico está muito
distante da sociedade. Sua relação com o masculino e o feminino se dá
independente do que acontece na sociedade. Assim, vemos homens que não se
afetam por essas questões sociais, e nunca se afetarão. O homem Hades que antes
se manteve distante, manter-se-á distante, a não ser que se faça necessário a
utilização de outros arquétipos durante a sua vida. Só então ele irá se defrontar com
o patriarcado em queda e com um mundo cada dia diferente.
Sendo assim, sobram os arquétipos que terão uma reação opositora ao
patriarcado. Esses outros arquétipos irão, de maneiras diferentes, apoiar a queda do
patriarcado, pois a decadência do patriarcado permitirá a todos novas liberdades.
Hermes tem tudo para ser líder, como pai de Hermafrodito, aquele que defenderá a
libertação do feminino e do masculino. Hermes tem sua masculinidade desvinculada
desse atrito entre o feminino e o masculino. É também guia dos mundos, guiará o
homem e a sua masculinidade para sua liberdade, tal como guiou Perséfone fora do
mundo de Hades.
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Considerações Finais
Não. Esse homem ideal é fruto de uma masculinidade virtual, que foi
projetada e modelada desde a Grécia Antiga. Ela, porém, nunca foi conquistada pelo
homem. Essa masculinidade é incompleta e, a cada dia que passa, se demonstra
mais e mais frágil, pois se baseia em um mundo que nunca existiu. A masculinidade
foi colocada no trono e lá permaneceu tanto tempo e exigiu tanto esforço dos
homens (e mulheres) que só agora foi desvelada sua realidade: O homem é frágil, e
humano. Tão frágil quanto se pensava que eram as mulheres.
O Yang masculino nunca estará completo enquanto não aceitar o Yin. Há
muito a se descobrir sobre a masculinidade e a feminilidade nos homens e nas
mulheres, pois, durante esses últimos milênios, o homem tem se esforçado muito
para permanecer no poder em busca de manter essa masculinidade incompleta,
renegando suas fraquezas. Não só renega sua parte feminina, mas muito de sua
personalidade é reprimida por uma masculinidade idealizada em preceitos de Zeus
Patriarcal.
A revolução feminista deu um primeiro empurrão e o patriarcado começou a
cair, e o todo poderoso Zeus começou a perceber-se ameaçado. Como um rei com
muitos inimigos, os homens vivem uma vida de luta pela defesa de sua
masculinidade, pelo medo de ter seu poder colocado em cheque. O medo e o
cansaço de ter que defender sua masculinidade custe o que custar, seja brigando
num bar, seja elaborando um discurso político, seja ofendendo a masculinidade
alheia. Uns aos outros, os homens se derrubam do trono diariamente, com suas
brincadeirinhas homofóbicas e machismos ofensivos. O homem rasteja de cansaço,
e aos poucos percebe que seu inimigo é ele próprio. Já diria Thomas Hobbes: homo
hominis lúpus (o homem é o lobo do homem).
Na contra parte, a mulher, que viveu todos esses séculos oprimida, hoje se
aproveita da liberdade e da força conquistada. Os problemas das mulheres não
acabaram, mas a revolução pela sua liberdade já se deu há algum tempo, e hoje ela
lapida o machismo e o patriarcado. Elas pularam muitos obstáculos e começaram a
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correr tão rápido quanto se acreditava que os homens corriam. Um último obstáculo,
porém, se demonstra impossível de pular sozinha: como as mulheres conseguiriam
pular um obstáculo pelos homens?
Esse último obstáculo não é da mulher. É aqui que o homem deve pegar o
bastão na mão e dar continuidade à corrida. A continuidade da revolução feminista
agora é masculina. A mulher já esgueirou sua feminilidade para dentro do
patriarcado e já ganhou muitas liberdades. E o homem? Ganhou liberdades?
É preciso que o homem busque suas liberdades. Os ventos nunca foram tão
favoráveis à queda do patriarcado. Os deuses não tem mais tanta força quanto
tinham antes, e surgem novos deuses para tomar o espaço. O homem moderno se
renova, e deve lutar pelos seus direitos de igualdade e de liberdade.
(Figura 2: Tao)
Essa imagem representa o começo do mundo, onde ainda nada teve princípio – é
também a condição a ser alcançada pela atitude da sabedoria superior. (Carl Gustav
Jung, XVIII, p. 111, pp. 262, 2008)
30
Bibliografia
JUNG, Carl. Gustav. Aion: Estudo Sobre o Simbolismo do Si-mesmo. Volume IX/1
Rio de Janeiro: Vozes, 2008.
TACEY, David J.. Remaking Men: Jung, Spitiruality and Social Change. London:
Routledge, 1997.