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Muriaé – MG
2005
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Examinador
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Orientador
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Professor coordenador
Muriaé – MG
2005
DEDICATÓRIA
Dedico aos meus pais, meus professores
“ lá!
O
Muito bom dia para você que está com a gente curtindo esta que é a melhor
programação de Muriaé, deste mês de dezembro de 2005.
Eu sou Ludmilla Yara e estou aqui com uma missão mais do que especial: vim
para agradecer. Ao professor Josias Nascimento que me mostrou que muito mais
que notícia devemos levar cidadania às pessoas. Agradecer ao professor Rogério
Cerqueira, que me ensinou que ser jornalista é muito mais que noticiar, é levar ao
público informação de qualidade. E também ao professor Marcel Angelo que
incentivou minha carreira, nas horas em que as barreiras mostravam que quanto
maior o desafio, melhor o resultado. Agradeço aos demais professores e
funcionários da Faminas e a todos os meus amigos que mantiveram este
equipamento em funcionamento durante todo esse tempo.
Obrigada à minha irmã de coração Mila, que transcreveu tantas horas de
entrevistas deste trabalho, e à Ana Paula, pela troca de experiência nas pesquisas
de campo. Abraço carinhoso aos meus colegas de classe, aos profissionais das
emissoras pesquisadas e a você que de qualquer lugar da cidade, do estado, do
país, se ligou, participou, colocou música na minha vida. O curso chegou ao fim,
mas eu garanto a todos: a gente não está encerrando a programação não!
É apenas o fim de mais um programa. Mas tenho certeza que vamos nos encontrar
em muitas outras sintonias por aí.
Não saia daí porque ainda tem muita coisa boa por vir. Beijo grande, muitíssimo
obrigada pela companhia e até um próximo programa”
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao professor Fernando Lamas que me ajudou na reflexão crítica da história do rádio e
também colaborou na revisão deste trabalho.
gradeço ao meu irmão Leonardo, pela troca de informações tecnológicas e que tantas vezes
A
colocou meu computador para funcionar.
o amigo Paulo de Souza, produtor, que gravou a programação da Rádio Muriaé e ajudou nas
A
informações sobre os programas.
Agradeço à Anderson Ribeiro, pela gravação do programa Júlio Soares, da Rádio Atividade.
os amigos da 6ª Promotoria de Defesa do Cidadão, Mila Lima e Roberto Diaseao
A
promotor José Gustavo Guimarães da Silva, pelos esclarecimentos prestados e pela
ajuda na pesquisa com as Leis e a Constituição.
Ao amigo Rodrigo Dias pela recepção e ajuda na pesquisa em Juiz de Fora.
Ao amigo Euler Luz pela edição de parte dos registros dos programas. Valeu!
gradeço aos radialistas Paulo Roberto Barros, Evil Mendonça, José Carlos Alves, Júlio Soares,
A
Carlos Santos, Marcelo Pacífico e à jornalista Ana Luísa Damasceno pelas entrevistas
concedidas.
os locutores e funcionários das rádios pesquisadas, pela troca de informações, e amizade que
A
sempre acrescentaram muito no meu crescimento profissional.
E aos ouvintes, que fazem parte deste universo anônimo e heterogêneo que é o mundo do rádio.
“I magine: Um rádio que ao invés de nos entorpecera capacidade de ouvir sons,
os fortalecesse a imaginação e a criatividade; ao invés de nos manipular para
n
aceitar um trabalho mais rápido e um consumo maior, nos inspirasse a inventar;
ao invés de nos sobrecarregar com informação irrelevante que nos fatiga, nos
revigorasse a sensibilidade acústica; ao invés de nos conduzir a ignorar
pensamentos e o que nos rodeia, nos estimulasse a ouvir; ao invés de transmitir
sempre as mesmas coisas não se repetisse, ao invés de nos silenciar, nos
encorajasse a cantar e falar, para fazer do rádio um pouco de nós mesmos; ao
invés de meramente transmitir para nós, ouvíssemos através dele.”
Hildegarde Weterkamp
UMÁRIO
S
RESUMO..................................................................................................8
INTRODUÇÃO.........................................................................................9
1. O RÁDIO NO BRASIL ........................................................... ..........12
1. OS NOVOS RUMOS DO RÁDIO COM A CHEGADA DA
TELEVISÃO...........................................................................................1
6
2. A TRANSFORMAÇÃO DO RÁDIO...............................................17
3. O RÁDIO NA ZONA DA MATA MINEIRA.....................................18
2 . A CIDADANIA E O DIREITO À INFORMAÇÃO ..............................20
2.1 O RÁDIO E A CIDADANIA...............................................................21
3. A INFORMAÇÃO COMO AGENTE MULTIPLICADOR DA
CIDADANIA...........................................................................................23
3.1 PARTICIPAÇÃO DO OUVINTE......................................................27
3.2 INFLUÊNCIA RADIOFÔNICA DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS..30
4. O DISCURSO RADIOFÔNICO – O CONSULTÓRIO NO AR...........33
5. A PROGRAMAÇÃO..........................................................................35
5.1 A PARTICIPAÇÃO POLÍTICA NA PROMOÇÃO DA CIDADANIA...42 5.2
EDUCAÇÃO EM ONDAS MÉDIAS..................................................45
6. AÇÕES DAS EMISSORAS CONJUNTAS COM A COMUNIDADE.49
CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................51
REFERÊNCIAS......................................................................................53
ANEXOS................................................................................................55
RESUMO
ste trabalho pretende analisar a linguagem radiofônica relacionada à cidadania,
E
através de uma análise dos programas das rádios em Amplitude Modulada (AM) de
Muriaé.Seránecessáriodiscorrersobreaprogramaçãoecomoaproduçãoradiofônica
trabalha o discurso de construção da cidadania.
INTRODUÇÃO
urante o tempo em que trabalhei na Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Muriaé senti a
D
importância da proximidade que o rádio tem com os ouvintes. Este meio de comunicação utiliza
cada segundo com a prestação de um serviço que interessa à comunidade, seja denúncia de falta
de vagas em Postos de Saúde ou a necessidade de apenas ouvir um conselho.
Era preciso que uma resposta chegasse às emissoras todas as vezes em que era citado o nome da
Prefeitura ou do Departamento Municipal de Saneamento Urbano (Demsur). Assim, as rádios
eram muitas vezes usadas como um extensão da assessoria.
Nesse tempo também tive minha primeira experiência profissional em rádio que veio com a
oportunidade de estágio na Rádio Muriaé, durante um ano e meio. Apesar de estagiar somente
durante o sábado à tarde, fiquei surpresa com o fluxo de informações. O ouvinte não é apenas
aquele que ouve: ele liga, escreve, pede soluções. Havia muita coisa na cidade por fazer! E
comparando os dois lados – Assessoria de Comunicação e Rádio – vi que minha participação
poderia ser maior: com o rádio sempre ligado na sala da Assessoria buscava continuamente
encontrar uma solução para o que os locutores falavam: era rua sem calçar, falta de um
medicamento no posto de saúde, a água que parou de cair, entre outros elementos que às vezes
nem eram de competência da Prefeitura, mas como sabíamos de um caminho para a solução,
contribuíamos com informações.
E assim interessei tanto por este tema, em um mundo tão globalizado, o rádio continua a ser o
“tambor tribal”, como já disse o canadense Marshall McLuhan. Este trabalho pretende analisar
como o maior veículo de comunicação de massa - elemento de reflexão crítica - contribui para a
construção da cidadania, na aplicação das políticas sociais. O desejo é também saber que poder é
esse que faz do rádio uma união de pessoas, serviços e desejos e promover uma discussão crítica
sobre como os comunicadores aplicam esse poderoso veículo. Durante este trabalho vamos
analisar a utilização desta mídia como instrumento de transformação social e da comunicação
como um direito humano. Para tanto, uma extensa pesquisa foi realizada, utilizando a
bibliografia existente, entrevistas, observação e registro dos programas radiofônicos.
Como objeto de estudo foi realizada pesquisas nas duas emissoras de rádio AM em Muriaé.
Analisou-se programação, conteúdo, história e entrevistas foram feitas com os principais
comunicadores das estações Rádio Atividade e Rádio Muriaé e também com alguns ouvintes das
programações. Para fazer uma análise comparativa também foram estudadas duas rádios de Juiz
de Fora – Rádio Solar e Rádio Panorama FM, respectivamente a mais antiga emissora da cidade
e a mais nova - que trabalha o conteúdo de AM em FM. O objetivo foi comparar o conteúdo
radiofônico das estações de Muriaé, que é a segunda cidade da Zona da Mata de Minas Gerais,
em termos de desenvolvimento, com a primeira – Juiz de Fora. Observando que a população de
Juiz de Fora é bem maior que a de Muriaé (Juiz de Fora – 501.153, Muriaé 98.850)1, e isso
significa também maior fluxo de informações em Juiz de Fora, é oportuno reconhecer que
Muriaé tem programação bastante semelhante em qualidade de conteúdo.
As emissoras muriaeenses podem ser consideradas bem gerenciadas do ponto de vista
jornalístico e atendem as expectativas dos ouvintes, segundo mostra pesquisa de opinião
r ealizada pela Rádio Muriaé, em 2005, que é também uma comparação entre a duas emissoras de
AM muriaeense.2
Este trabalho inicia-se como uma visão histórica do rádio desde sua implantação no
Brasil, até a surgimento das estações derádiosnaZonadaMatamineira,abordando
as diversas transformações que o meio de comunicação passou.
No segundo capítulo aborda-se a questão da cidadania e do direito do cidadão à
informação–umareflexãocríticasobreosdeveresedireitosdoEstadoàcidadaniano
que diz respeito à vida em sociedade.
Ocapítulo3éumestudosobrecomoainformaçãoatuacomoagentemultiplicadorda
cidadania,ainfluênciadaprestaçãodeserviçoseaparticipaçãodoouvintecomopeça
fundamental para o sucesso do meio de comunicação e fator de integração entre
veículo e comunidade.
No quarto capítulo os quadros de ajuda pessoal é otemaabordado–jáquetratade
uma das maiores audiências deumaemissoramuriaeense.Masdestaca-seoquadro
não somente pela sua audiência, mas pela inclusãoquefazaotratardequestõesde
relações interpessoais dos ouvintes.
A programação é analisada na capítulo 5 ao mostrar também a participação dos
programas radiofônicos governamentais na construçãodacidadania.Nestecapítuloé
tratado também a utilização do veículo como instrumento capaz de resgatar uma
educação deficitária, que aqui não é usado como instrumento didático formal, mas
usadocomomeiodelevareducaçãoàscomunidades,principalmenteasmaiscarentes
de recursos socioeconômicos.
No último capítulo, as ações das emissoras conjuntas com acomunidadeentramem
discussão, já que é uma ferramenta vitoriosa na união de objetivos altruístas para a
comunidade na área abrangida pela estação.
Em todos os capítulos analisou-se questões inerentes ao radiojornalismo no
aprofundamento do objetivo maior deste estudo – o rádio na construção da cidadania.
1. O RÁDIO NO BRASIL
“Todos os lares espalhados pelo imenso territóriodo Brasil receberão, livremente, o conforto moral a ciência e da
a rte; a paz será realidade definitiva entre as nações. Tudo isso há de ser o milagre das ondas misteriosas que
transportam no espaço, silenciosamente, as harmonias.”
Edgard Roquette-Pinto
s cientistas James Clerck Maxwell, Heinrich Rudolf Hertz, Guglielmo Marconi, Lee De Forest,
O
Reginald Aubrey Fessenden são os responsáveis pelo desenvolvimento do invento que é
conhecido hoje como rádio. Em cada ponto do planeta, os cientistas fizeram inúmeros estudos,
testes e experimentaram as várias formas de fazer o som se propagar pelo espaço.
No Brasil, o padre gaúcho Roberto Landell de Moura começou as primeiras experiências de
Radiodifusão no país. Todos eles, cada um com sua contribuição, deu origem ao rádio como é
hoje. Mas esses inventores não tinham a menor idéia da mais importante função do rádio.
rádio foi produto de uma série de avanços: a descoberta das ondas eletromagnéticas
O
no ‘éter’, feita por James Clerk na Escócia e por Heinrich Hertz na Alemanha, durante a
segunda metade do século XIX; a inovação dos métodos de carregar essas ondas com
mensagens codificadas – “telégrafo sem fio”- aprimorados por Guglielmo Marconi na
Itália, no final do século; o desenvolvimento de técnicas para transformar a fala humana
em tais códigos, e depois novamente em fala – “telefonia sem fio” – por Lee De Forest
e Reginald Fessenden nos Estados Unidos, no início do século XX. Essas invenções
possuíram um certo número de aplicações planejadas: os navios passaram a se
comunicar com a terra firme, os aviões de combate e os soldados, com suas bases, e os
operadores de rádio amador puderam comunicar entre si. Entretanto, a utilização mais
significativa que foi dada ao rádio não foi aparentemente prevista por seus inventores.
(STEPHENS, 1988, p. 612-613)
radiodifusão brasileira começou com uma ambição muito generosa para o desenvolvimento do
A
país. O rádio no Brasil nasceu ao mesmo tempo de seu surgimento no mundo e tem um marco
que representa o começo da cidadania através das ondas médias. A primeira comunicação
radiofônica oficial foi em 7 de setembro de 1922, durante a exposição do Centenário da
Independência, no Rio de Janeiro, quando aconteceram algumas transmissões para o pavilhão
onde se realizou a festa e para alguns agraciados ouvintes. Foram providenciados 80 receptores
de rádio, todos importados, e assim a sociedade carioca pôde ouvir o discurso do presidente
Epitácio Pessoa e trechos deO Guarani, de CarlosGomes, apresentado do Teatro Municipal,
onde foi instalado um dos aparelhos de transmissão. (FERRARETTO, 2000, p. 93-94)
Existem documentos, porém, que provam que a Rádio Clube de Pernambuco, fundada em Recife
por Oscar Moreira Pinto, foi a primeira a realizar uma transmissão radiofônica no Brasil, no dia 6
de abril de 1919, com um transmissor importado da França. Mas, oficialmente tudo começou na
capital federal daquele tempo.
O marco significativo para a história da radiodifusão brasileira foi a inauguração, em 20 de abril
de 1923, da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, primeira emissora brasileira, organizada sob a
liderança do grande entusiasta do rádio, o antropólogo Edgard Roquette-Pinto, que criou a
emissora com a meta de levar cultura e informação à população. Até os anos 1920, revistas e
jornais eram os principais meios de comunicação que existiam no país. No entanto, o rádio
começou muito elitista, o aparelho era custoso, de preço inacessível à maioria da população e por
isso só os mais abastados financeiramente tinham acesso ao veículo de comunicação. Ainda em
1 923, foi ao ar a Rádio Clube do Brasil, no Rio de Janeiro e a Rádio Clube Paranaense, em
Curitiba. Em 1924 foi inaugurada a primeira emissora de São Paulo, a Rádio Educadora Paulista,
mais tarde Rádio Gazeta.
o início ouvia-se ópera, com discos emprestados pelos próprios ouvintes, recitais de
N
poesia, palestras culturais etc, sempre uma programação muito “seleta”, apesar de
Roquette-Pinto estar convencido, desde o início, de que o rádio se transformaria num
meio de comunicação de massa. (ORTRIWANO, 1985, p.14)
com o passar dos anos mais emissoras surgiram e a programação erudita mudou. O rádio
E
tornou-se mais popular para atender às necessidades que os ouvintes tinham: informação,
prestação de serviços que auxiliassem o dia-a-dia do cidadão. É por volta de 1925 que surgem as
primeiras tentativas de se fazer jornalismo no rádio.
A Rádio Sociedade do Rio de Janeiro passa a emitir oJornal da Manhã, apresentado por
Roquette-Pinto, que comentava as notícias e as interpretava no contexto histórico, além de fazer
um resumo da situação social da época e preconizava as tendências e os desdobramentos dos
acontecimentos. Havia também o Jornal do Meio-dia, o Jornal da Tarde e o Jornal da Noite, que
tinham em seu conteúdo informações sobre agronomia, esportes, e seções feminina, doméstica e
infantil. (FEDERICO, 1982, p.38).
Mas as informações jornalísticas ainda eram poucas e o sentido de veículo de comunicação de
massa que o rádio tem hoje era diferente, a programação refletia a preferência da elite da época:
óperas e conferências (algumas até em idioma estrangeiro, em função da corrente migratória)
foram as principais atrações do rádio durante toda a década de 20 do século passado.
As emissoras aos poucos cresceram, oficial ou experimentalmente, e se disseminaram pelo Brasil
as Rádios Sociedades, Clubes, Educadoras e Culturais. Era o divertimento para a minoria
privilegiada da população, que popularizou-se lentamente nos anos 1920. Na época eram
proibidas anúncios publicitários pagos e a margem de lucro das emissoras era subsidiada por
doações de entidades públicas e privadas e, por mensalidades pagas por quem possuísse
aparelhos receptores. Mas no final da década de 1920, alguns astutos empreendedores e
comerciantes, animados pelas fábricas de aparelhos de rádio, começaram uma verdadeira
campanha no sentido de divulgar o novo meio de comunicação para maior número possível de
pessoas e, assim difundir no rádio seus produtos e serviços. A partir de 1930, o rádio encontrou
sua melhor parceira, que permitiu um grande arranque e que o fez nunca mais parar de crescer: a
propaganda, apoiada pelo então presidente da República.
om a revolução de 1930, o novo presidente da República, Getúlio Vargas, incentiva o
C
crescimento industrial como saída para os problemas econômicos. Está nascendo um
Brasil mais urbano e moderno. O rádio começa a se estruturar, não mais como
novidade, mas sim se constituindo em um veículo de comunicação que, ao buscar o
lucro, volta-se para obtenção constante de anunciantes e de público. (FERRARETTO,
2000, p. 102)
m 1º de março de 1932, o governo estabelece a veiculação da publicidade pelas
E
emissorasderádiocomoDecreton.º21.111,queregulamentavaoDecreton.º20.047,
demaiode1931,quedefiniaaposiçãodogovernoFederalnaradiodifusãobrasileira.
Odecretodefiniuaparceladestinadaàveiculaçãodepropaganda,quepoderiaocupar
10% da programação, com o tempo, este percentual aumentaria para 20%, hoje é
fixado em 25%.3
Assim os empresários do setor captariam recursos para servirem de lucro e
investimento nas emissoras. O patrocínio e a propaganda avulsa, naformadetextos
lidospeloslocutoreseosjingles,foramafontedeondeorádiobuscouosrecursosque
permitiram aumentar o número de emissoras e qualidade de programação. O rádio
tornou-se realmente popular.
Com o grande número de mensagens publicitárias, o que era erudito, educativo e
culturaltransforma-seempopular,aparelhodediversãoelazer,principalmenteporque
com considerável parte da população analfabeta,oveículofoiatraindoaatençãodas
camadas sociais mais carentes, que se divertiam com a programação musical e
humorística. A programação e a linguagem utilizadas pelos locutores criam um laço
afetivo entre locutor e ouvinte. A força da propaganda no rádio fez com que os
proprietáriosdeemissorassepreocupassemcomaaudiênciaemdivulgarosprodutos
anunciados.
Neste momento o presidente da República, Getúlio Vargas, sente no veículo de
comunicação a possibilidade de propagar seus ideais. Desde que assumiu a
presidência com a Revolução de 1930, já mantinha a radiodifusão entre as áreas de
controledireto.DuranteoGolpeMilitar,de1937a1945,conhecidocomoEstadoNovo,
Getúlio usou o rádio para fazer propaganda da sua ideologia política.
OprogramaAVozdoBrasil,naépocachamadodeHoradoBrasil,foicriadoem1937
paraserodivulgadoroficialdogoverno,principalmentedosdiscursospresidenciaisde
Getúlio.Transmitidodesegundaasexta-feira,nohoráriode18h45às19h30emcadeia
nacional de rádio, o programa logo se tornou de transmissão obrigatória. Nos anos
1930,oúltimoblocodoprogramaeradedicadoàtransmissãodesucessosdemúsica
popularbrasileira.Aparticipaçãodeartistasdeprestígionoprogramafoiumamaneira
que Getúlio encontrou para estar sempre presente junto aos ouvintes brasileiros.
UmdosperíodosmaisencantadoresdorádionoBrasilaconteceunadécadade1940e
início de 1950. A Época de Ouro do rádio revelou muitos talentos da cena artística.
Programas musicais, de auditório,humorísticos,radionovelasejornalísticosinvadiram
os lares de milhares de brasileiros definitivamente encantados pela magia sonora do
rádio.Nosanos40,emissorascomerciais,comoaRecorddeSãoPaulo,aGaúchade
Porto Alegre, a Tabajara de João Pessoa, a Difusora de Maceió, a Tupi e a Mayrink
Veiga do Rio de Janeiro, também tinham grande audiência. Nos musicais, a Rádio
Nacional consagrou cantores como Francisco Alves (o Rei da Voz), Orlando Silva (o
Cantor das Multidões), Cauby Peixoto (o Rei do Rádio),CarméliaAlves(aRainhado
Baião), Ademilde Fonseca
(a Rainha do Chorinho) e Emilinha Borba (a Favorita da Marinha), que durante anos
disputou com Marlene e Dalva de Oliveira a honra de ser coroada Rainha do Rádio.
Neste momento nasce a afirmação do radiojornalismo, no que o “Repórter Esso”,
criado em 1941, foi o maior expoente.
onsideradaasuaépocadeouro,caracterizadaporumaprogramaçãovoltada
C
ao entretenimento, predominando programas de auditório, radionovelas e
humorísticos. A cobertura esportiva também ocupa o seu espaço. O
radiojornalismo, por sua vez, ganhaforçaàmedidaqueopaísseenvolvena
Segunda Guerra Mundial. Oveículoadquire,destaforma,audiênciamassiva,
tornando-se, no início dos anos 50, principalmente por meio da Nacional, a
primeiraexpressãodasindústriasculturaisdoBrasil.(FERRARETTO,2000,p.
112-113)
utros gêneros de programação radiofônica, como o humor, o radioteatro, a
O
radionovela, o esporte, os programas de auditório e o próprio jornalismo, acabaram
absorvendo muito das características desse novo tipo delinguagem,maiscoloquiale
diretoiniciandoumprocessodeprofissionalizaçãoque,juntocomadisseminaçãodos
aparelhos receptores e o interesse dos anunciantes, transformou o rádio no mais
popular meio de comunicação.
A partir da segunda metade da década de 1930, até meadosdosanos1940,orádio
viveu,noBrasil,operíododeconsolidação.Aexpansãodeemissorasportodoopaíse
o aumento do número nos principais centros urbanos contribuíram para que um
contingente de pessoas passassem a trabalhar na nova atividade profissional. Os
anunciantesaumentaramjuntocomonúmerodeaparelhosreceptoreseodeouvintes.
O rádio adquiriu os contornos finais da confirmação de veículo de comunicação de
massa. Embora logo surgisse uma concorrente.
.2 A transformação do rádio
1
No começo dos anos 1970 uma nova revolução acontece no rádio: a Freqüência
Modulada (FM) abre um novo campo para a expansão do meio, a partir da pioneira
experiênciadaDifusoraFM,emSãoPaulo.Asmodificaçõesnaprogramaçãodorádio,
quejáestavamemcurso,sãoaceleradasesetornamaindamaisradicais;oaumento
da concorrência da televisão e das revistas e, o fenômeno da FM obrigam o rádio a
criar alternativas de programação.
eguindoatendênciaverificadaapósofinaldorádioespetáculo,asestações
S
de amplitude modulada concentram-se no jornalismo, nas coberturas
esportivas e na prestação de serviços à população. Este último aspecto,por
vezes, materializa-se em programas popularescos centrados nafiguradeum
comunicadorquesimulaumcompanheirismoparaoouvinte,enquantoexplora
de modo sensacionalista situações do cotidiano. Nas FMs, predomina a
música. (FERRARETTO, 2000, p. 155)
m 1977, em Muriaé, um jovem apresentador já fazia sucesso, com este tipo de
E
programa.JúlioSoares,naturaldeManhumirim,crianaRádioMuriaéumprogramade
variedades no estilo música-esporte-notícia.
A década de 1980, viveu, talvez, a grande expansão da mídia radiofônica em sua
história, no Brasil. O domínio cada vezmaiordamelhorlinguagemdorádio,produziu
programas mais atrativos e cumpridores de sua função. O rádio começava a se
estruturar em associações e redes, para maximizar investimentos, compartilhar
experiências, e crescer de importância.
A partir de 1980, o rádio já não lança mais astros e estrelas, nãoelegerainhasnem
levaaosouvintesodelíriodefãs,queantigamentelotavamosauditóriosparaverseus
astros. Ultimamente se destaca na prestação de serviços, informante das notícias e
companheirodedonas-de-casa,taxistas,secretárias,eumainfinidadedeprofissionais
que querem informação precisa e imediata, além daqueles que o querem para
compartilhar a solidão. E se o rádio cumpre a função social sonhada por
Roquette-Pinto, este momento consolida a iniciativa acadêmica.
cidadania significa algo mais do que a garantia plena de direitos, é também o
A
cumprimento dos deveres. O exercício da cidadania, entendida como a participação
efetiva nas decisões sociais e políticas de uma sociedade, muitas vezes sofre a
intervençãopelafaltadeinformaçãoeconhecimentosobreosfatosdacomunidadeem
ue o cidadão está inserido. Como célula integrante desta sociedade e para a
q
emancipação deste indivíduo, o essencial é a comunicação, para mostrar além de
idéias e opiniões, praticar a socialização e absorver informações.
OdireitoàinformaçãoestágarantidonaConstituiçãodaRepúblicaFederativadoBrasil
de 1988, no inciso XIV do artigo 5º. “É assegurado a todos o acessoàinformaçãoe
resguardadoosigilodafonte,quandonecessárioaoexercícioprofissional”5, deacordo
com a Lei de Imprensa n. 5.250, de 9 de fevereiro 1967.
MaséingênuoacreditarqueapenasodireitogarantidoporLeipossibilitaoacessoàs
informações. Para se construir uma sociedade verdadeiramente democrática onde
todos os cidadãospossamseexpressarlivrementeeasdiferençassejamrespeitadas
–éprecisoreconheceracomunicaçãocomoumdireitoindissolúveleaparticipaçãodo
cidadãocomoumvaloralienáveldademocracia.Acomunicaçãoéumespaçopúblico
aberto para o debate e relacionamento entre os indivíduos que compõem a sociedade.
As diferenças de classe ainda limitam os atributos políticos doscidadãos.Estudiosos
da história, e mesmo pesquisadores da atualidade acreditam que esta questão é a
principal fonte dos limites à prática efetiva da cidadania na contemporaneidade.
Aprecáriaformaçãoeducacional,emuitasvezesaprópriafaltadeacessoaosbancos
escolares, principalmente num país em desenvolvimento como o Brasil, prejudica o
crescimento plenodocidadão.Oscidadãosdasclassesmaispobresdoestratosocial
não têm, em sua totalidade, garantido os direitos básicos à vida, como alimentação,
moradia, educação, saúde, lazer, trabalho, entre outros. Osanseiosdessapopulação
economicamentemenosfavorecidadevemserouvidospelosveículosdecomunicação
de massa que têm por função social dar oportunidade e informar essa camada da
população.GermánReyBeltrán,nolivroTelevisãopública:doconsumidoraocidadão
diz que “cada vez mais a sociedade civil se expressa através das mídias. Uma
expressão que, longe de diminuir, tem tendência a crescer e, talvez, se qualificar”
(BELTRÁN, 1992, p. 107).
Os meiosdecomunicaçãoapresentamcontextoseexperiênciasquedemonstramsua
representatividade para o exercício da cidadania. Além de entreter e divertir, o papel
dosmeioséprimeiramenteinformareformar,sejaatravésdeprogramasdedebatese
entrevistas, informativos jornalísticos e até programas didáticos que fortaleçam essa
função.Odireitoàinformaçãodeveserpráticaepreocupaçãoconstantedasociedade
e do Estado.
o entanto, frente às adversidades políticas, os cidadãos ficam à mercê do que
N
deveriam ter direito: saúde, educação e condições mínimas de exercer o que
entende-se por cidadania. O rádio temcumprido,muitasvezes,opapeldoEstadona
formação de valores que construam uma base sólida para a vivência integral do ser
humano.
Nesse sentido, Ludmilla Gusman diz em seu livro “Do ouvinte para o ouvinte. Rádio
Muriaé:60anosdehistória”que“comoinstrumentodeidentificaçãoedeenvolvimento
social, o rádio lutou por continuar sendo divulgador de informações, mas ao mesmo
tempo tornar-se um meio de comunicação do povo, valorizando as questões do
interesse da população que sempre depositou nele a sua credibilidade” (GUSMAN,
2004, p. 41).
Assim, verifica-se que o rádio tem papel significante na construção da cidadania,
enquanto dialoga com os ouvintes as situações do cotidiano em que a comunidade
estáenvolvida.Ainiciativaacadêmicapretendemostrarcomooveículofaz(eàsvezes
deixa de fazer) este papel.
3. A INFORMAÇÃO COMO AGENTE MULTIPLICADOR
DA CIDADANIA
“A cultura é o canal pelo qual expressamos sentimentosindividuais e coletivos, a forma pela qual damos
s ignificado às ações cotidianas. É também, o retrato pelo qual uma sociedade delineia sua identidade, planeja sua
existência e se projeta em relação ao futuro.”
Elisete Zanlorenzi
informação, através do rádio, produz uma interação social que se converte numa
A
ondaqueatravessaoareseconcretizanasrelaçõessociais.Permitediálogoscoma
sociedade e identidade com osouvintes.Orádio,porseucaráterlocalediáriocoma
comunidade permite uma melhorpenetraçãodainformação,queserepercuteatravés
deresultadosquesãonotoriamenteestimuladospeloscomunicadores.Éoqueafirma
também em entrevista (Vide anexo 11) Ana Luísa Damasceno, diretoradejornalismo
da Rádio Solar de Juiz de Fora (MG). Ela diz que uma reportagem bemelaboradae
completa, por mais que informe, ainda não tem o mesmo efeito que o apresentador
falarnoprogramadaimportânciadecertasatitudesqueocidadãodeveter.“Seeufizer
uma reportagem maravilhosa, cheia de dados, com sonoras, sobre a campanha de
vacinação, não vai dar o mesmo efeito do que se os apresentadores Canalli ou o
Marcelo Juliane disserem : “Ó,gentetemquevacinar,senãovaidarparalisianoseu
filho”,porcausadessaquestãodaproximidade.”Eessaproximidadetemcrescidocom
uma força maior que as tradicionais instituições da sociedade.
O crescimento e a abrangência dos Meios de Comunicação e a
informação estão, claramente, desbancando e relativizando o
controle exercido por outras instituições, como a escola, as
igrejas, a família, etc. A comunicação está forjando os novos
professores,osnovossábios,osnovosmestresdaverdadeeda
moralidade.Aspesquisassempremaisconfirmamaforçamorale
políticadessesmeiosquenãoagemtantopelacompetência,mas
pela empatia. (GUARESCHI, 2000, p.10)
omo agente multiplicador da cidadania, a informação através do rádio têmexercido
C
papelfundamental,aoinserirocidadão,quemuitasvezesteveumaeducaçãoprecária
ouatétotalfaltadeformaçãoeducacional.OanalfabetismonoBrasilchegaà12,4%da
população, o que corresponde à 14,9 milhões de adultos que não sabem ler e
escrever6 oquetornanítidoofatodequeamensagemradiofônicatemcaráterpeculiar,
já que atinge a população marginalizada econômica e culturalmente. Além disso, o
rádio é o veículo que melhor pode atender às múltiplasexigênciasdeumpúblicotão
v ariado e diverso.
Paraexemplodopapelcitado,destaca-seaimportânciadesedefenderosdireitosdos
cidadãos.Em11desetembrode1990,instituídopelaLein°8.078,surgeoCódigode
Defesa do Consumidor, cuja vigência, iniciadaemmarçode1993,consolida-secomo
uma das mais avançadas legislações do gênero em todo o mundo. Em 12 anos de
vigência do Código, publicações e estações de rádio dedicam colunas e quadros na
programação para dedicar ao assunto, tão solicitado por leitores e ouvintes e, tão
interessantescomofontedepautasparajornalistas.NaprogramaçãodaRádioMuriaé,
o quadro Direito do Consumidor, dentro do programa Evil Mendonça, dedica 15
minutos, nas quartas-feiras,paraesclarecerdúvidasdosouvintes,comapresençade
um advogado da seção local da Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor
(Procon).
Percebe-se, neste caso, a importância do rádio como canal para que a população
exercitesuacidadania,eentãosaibaseusdireitosedeveresenquantoconsumidores.
De outro lado contribui para que empresas tomem posturas maissériasetornem-se,
do pontodevistaadministrativoesocial,empresas-cidadãserespondamascríticasà
opiniãopública.Comissoasorganizaçõestornaram-semaiságeisnaprestaçãodeste
serviçoaosconsumidoresecriaramsetoresdentrodasempresascomoosServiçosde
Atendimento do Cliente.
No processo de universalização da cidadania, o rádio assume papel relevante. Trabalha com
enunciados sedutores, combinando textos, improvisos do apresentador do programa e efeitos
sonoros, que formam a mensagem. O rádio emite uma programação com forte aspecto intimista,
diferente da formalidade apresentada num telejornal, por exemplo. Isso produz no receptor uma
sensação de proximidade, fazendo com que ele assimile com mais hospitalidade o que lhe é
pedido e sugerido.
É o que faz Evil Mendonça, apresentador do Programa Evil Mendonça, da Rádio Muriaé. “Hoje
o cidadão só tem dever e não sabe dos direitos que têm, então eu acho que o veículo, que é o meu
papel hoje como comunicador, é o papel do rádio, da televisão, é criar situação para que as
pessoas discutam seus direitos e gere opiniões pessoais e brigue por esses direitos”, afirma o
apresentador durante entrevista (vide anexo 12). Esse ano o comunicador também se elegeu
vereador em Muriaé.
Asrelaçõessociais,oscomportamentos,asatitudes,osfenômenospolíticossãoitens
que fazem parte do mundo docidadão,econtribuemparasuaposiçãonasociedade.
Geralmente o ouvinte da programação derádioAM,éaquelequeescutaeouvecom
atenção tudo que é dito. Faz lembrar a personagem Macabéia,
de A Hora da Estrela, de Clarice Lispector, que gasta suas horas ouvindo a "Rádio
Relógio”.
Informações,notíciasecomentáriosemitidospodeminfluenciaroreceptoredirecionar
seu posicionamento sobre diversos assuntos, um deles cidadania. Carlos Santos,
apresentador do programa “Show do Carlos Santos”, da Rádio Atividade,acreditana
mudançaqueainformaçãopodegerarnaspessoas.“Aorientaçãodolocutortemque
ser também profissional, porque é também alguém que quando emite a sua opinião
estátambémàsvezesinterferindolánacabecinhadapessoaqueestádooutrolado”.
Ementrevista(videanexo13)eleaindafaladaresponsabilidadequeéprecisotercom
o que se fala pelo rádio: “então você tem que tomar muito cuidado naquiloquevocê
stá falando, mas acima de tudo falar com cautela e saber que você pode estar
e
transformando pessoas do outro lado, mudando comportamentos, então acho que o
rádio é fundamental nesse papel de construção da cidadania”.
Entre as variadas formas de levar informação aos ouvintes, a programação das
emissoras estudadas neste trabalho oferecem quadros sobre orientação médica,
psicológica e jurídica, economia popular, ofertas de empregos, serviços de utilidade
pública, notícias policiais, debates e entrevistas, além de conversas sobre problemas
cotidianos da cidade, com exigências às autoridadespolíticaslocaisparaaresolução
de problemas e melhoria da qualidade de vida.
JoséCarlosAlves,repórterhá20anosdaRádioMuriaédizquenessecasoaresposta
é imediata. “Os órgãos públicos nunca deixam para depois, sempre procuram saber,
até mesmo quando a gente recebe a reclamação, que você chega e vai levar ao
conhecimentodaqueleórgão,dapessoaresponsável,elajáestásabendo,porqueestá
acompanhando a rádio” (vide anexo 14).
EvilMendonça,apresentadordoprogramacarro-chefedaRádioMuriaé(ProgramaEvil
Mendonça),ponderaquenemsempreéassim.“Sevocêjogarumtemanoar,norádio
e não exigir ou nãoconvidar,ounãopediralguémquevenhaatéàrádiodiscutircom
vocêoassunto,vocênãotemrespostadasautoridades.Eujogoàsvezesumtemano
ar de interesse da comunidade e não consigoarrancarsequerumaligaçãotelefônica
de nenhuma autoridade para falar no ar”. São opiniões diferentes porém não
controversas, porque observa-se que quando há um trabalho de reportagem, os
reclamados dão uma resposta mais imediata à rádio, porém quando é um assunto
delicado, um problema social estrutural e não conjuntural (que pode ser resolvido
imediatamente), os órgãos competentes (com suas devidas exceções) não tomam
posição perante a sociedade através da comunicação radiofônica. Por isso a
comunidade deve sempre ser ouvida.
“É preciso refletir sobre a conveniência ou não das fontes oficiais. Muitas vezes a
verdade dos fatos só será obtida ouvindo a comunidade.” (PORCHAT, 1989, p. 29)
Arapidezcomqueasnotíciaseasinformaçõessãodifundidas,característicadorádio,
levaàutilizaçãodomeioparaadivulgaçãodeinformaçõesondeocidadãoconsciente,
eprincipalmenteonão-conscientedesuasfunçõeseobrigaçõessociaissaibaoqueé
preciso saber. Como exemplo, os alertas sobre a dengue.
Carlos Santos ressalta que uma pessoa ouve e passa para o outro, e assim o rádio
cumpre a função de informar até mesmo a quem não ouve. “Todos os anos nós
trabalhamosinformando:Vocêqueestáaí,nasuacasa...Àsvezesapessoanãotem
acessoàTVejornais,maselatemoseuradinho(...)aíchegaláainformação:precisa
tomar cuidado, manter o quintal limpinho, tirar pneus e garrafas. Chegando na casa
dela, vaichegarnacasadovizinho(...)eelaavisaparaovizinho:‘olhavocêtambém
temquedeixaroseuquintallimpinho,senãoomosquitochegaaqui’.Edessamaneira
a notícia pelo rádio faz surgir novos comunicadores que atuam na comunidade, na
divulgação daquela informação através do rádio”.
A força e o poder do rádio surpreendem a todo momento. A
informação repercute de forma instantânea, direta e
indiretamente.Umouve,falaparaooutroetodosacompanhamo
fato, num alcance espantoso. A consciência disto éfundamental
asatividadesdojornalismo.Consciênciadacapacidadequetem
n
de atingir todas as faixas do público, de mobilizar e agitar a
cidade; de unir e politizar a população (PORCHAT, 1989, p.35).
poiadopelodiscursoradiofônico,queéobjetivo,claroeconciso,comfimdeprender
A
a atenção do público e ganhar tempo, a comunicação para a cidadania tem força
inerente ao meio. O conteúdo voltado para o cidadão preenche um vazio de
conhecimento que a população tem e que deve ser um dos papéis principais do
Estado, através da Educação. Como agente multiplicador da cidadania, ainformação
devolve ao povo a chance de participar de algo construtivo, por meio de atitudes,
conexão com os políticos, solidariedade e divulgação de idéias novas. Os temas
abordados pelos comunicadores podem levar o cidadão a se conscientizar e assim
apresentartambémadiscussãodosproblemasdacomunidade.Radialistaseouvintes
podemofereceraoPoderPúblicomaisdoqueumasimplescrítica,mastambémpropor
soluções para a real participação popular.
3.1 Participação do ouvinte
“A radiodifusão poderia ser o maior meio de comunicaçãojá imaginado na vida pública, um imenso sistema de
c analização. Isto é, seria, se fosse capaz não apenas de emitir, mas também de receber. Em outras palavras, se
conseguisse que o ouvinte não apenas escutasse, mas também falasse, que não permanecesse ilhado, mas
relacionado.”
Bertold Brecht
rádiocontaapenascomaaudição,porissoprocurausarumalinguagematraenteao
O
público. Gisela Ortriwano destaca, no livro “A informação no Rádio – os grupos de
poder e determinação dos conteúdos”,oprivilégiodorádioporpossuircaracterísticas
próprias que possibilitam ao ouvinte identificar-se e participar do seu funcionamento.
Comafacilidadeeoalcancedasondasderádio,asvibraçõesauditivaspodematingir
os mais diferentes pontos do planeta. Dentro do carro, no hospital, pelo celular, nas
casas, nas fazendas e até no espaço sideral a penetração do rádio é comprovada.
Com essas características esse meio de comunicação seduz as diversas camadas sociais, mas
principalmente aquelas que têm menores condições financeiras, que buscam no rádio um canal
para a prática da cidadania.
rechoanalisadodoProgramaEvilMendonçailustraestainteratividadecomoouvinte.
T
NoquadroSecretáriaEletrônicaoouvinteligaeosistemagravaasmensagens,desde
agradecimentos, congratulações de aniversários, pedidos de objetos perdidos até
reclamações sobre faltademédicoseruasqueprecisamdereparosnocalçamentoe
segurança policial. O interessante é que também é uma forma de comunicação para
quem se encontra em lugares mais distantes, como a zonaruralequenãopossuem
telefoneoucorreiopróximos,eàsvezesnemenergiaelétrica,equeremdarumrecado
para quem sabe que escuta o programa.
Apesardetantatecnologia,orádioaindasimbolizaumaponteentrepessoasecidade,
àqueles que não têm outro modo de se comunicar com parentes e amigos. A
funcionária públicaSolangeBarbosa,de45anos,ouverádiocercadeduashoraspor
dia.PrefereaRádioMuriaéporcausadoprogramadopadreMarceloRossi.“Aproveito
muito as informações e participo das campanhas quando posso”. Ela acredita que o
rádio ajuda o cidadão em todos os sentidos. “Acho interessante aqueles recados,
quando a pessoa mora em fazendas afastadas, ou em distritos, e liga para a rádio,
pedindoparafalarqueesperaalgumparente,dáumrecado.Ébomporquedáacesso
e é um modo de ajudaraquemestálonge,entãoorádioestáemtodolugar,istoéo
mais bacana!” (vide anexo 19).
Quem participa do quadro Secretária Eletrônica ainda concorre a prêmios de
patrocinadoresdoprograma.Otrechoobservadomostraareclamaçãodeumaouvinte
que mora em uma comunidade rural:
uvinte: “Bom dia Evil Mendonça, aqui quem fala é Adriangela, nós da
O
comunidadedeSãoDomingosqueremosfazerumareclamaçãosobreamédica
queatendenopostodesaúdedeSãoDomingos.Quemnosatendeéadoutora
Advânia Marge. Evil, nós estamos sem médico já faz um mês, nós temos
édico uma vez por semana. Evil, já que a doutora Advânia Marge não pode
m
vim, colocaoutromédiconolugardela,porquesemmédiconósnãopodemos
ficar, nós moramos na roça, como que ficaanossasituação?Evil,obrigadoe
um bom dia pra você”
Apresentador (Evil): “É né, Adriangela, um abraço pro pessoal de São
Domingos. Poxa, aí é roça né, é interior, e ela está reclamando que adoutora
Advânia Marge não atende no posto de lá há mais de um mês. O que está
acontecendo aí no posto de São Domingos? Olha, o Adriangela vamos
encaminharimediatamenteessasuacolocaçãoparaquemédedireitoevamos
ver quem pode resolver esteproblema,estábomquerida!Umabraçoavocêe
podetercertezaquenãovaidemorarmuito!Vouencaminharhojeaindaparao
pessoal!”7
vocação regional do rádio o torna forte e socialmente relevante, mesmo com a sedução dos
A
novos meios digitais. O que constitui seu contexto local de comunicação é o diálogo com a
comunidade, que é quem essencialmente dá a diretriz para o desejo de notícias das emissoras. O
ouvinte é o pauteiro, a audiência é a responsável pelo conteúdo da programação. É preciso, no
entanto, que mesmo sendo rádios comerciais, reforcem o caráter de utilidade pública do veículo e
resgatem o papel cultural por ele já exercido. O meio também necessita explorar as
possibilidades oferecidas pelo rádio como abrangência e mobilização do público para estimular a
cidadania.
Pelo exemplo percebe-se o que a população necessita. Os pedidos que chegam nas estações
variam de solicitação para internação hospitalar, pedidos de medicamentos, móveis até prótese
dentária e óculos. A responsabilidade não é da emissora, porém ela serve como mediadora destes
pedidos, já que na maioria das vezes, o ouvinte a vê como única ponte para solucionar seus
problemas.
Em entrevista (vide anexo 15), o diretor de Jornalismo da Rádio Panorama FM, de Juiz de Fora
(MG), Marcelo Pacífico, diz que acredita que isso acontece pela força do rádio e também pela
credibilidade e confiança que leva à essas pessoas. “Os ouvintes encaram o rádio mesmo como
um porta-voz, é aquele que está representando a comunidade, representando aquela cidade e eles
acham que a gente falando a atendimento será mais rápido. É a credibilidade do rádio e eles têm
essa confiança na gente”.
O ouvinte tem em seu universo gostos, preferências e anseios. Procura no rádio um
canal para ter as necessidades atendidas já que este lhe confere um forte aspecto
comunitário. Muitos ouvintes já tem participação cativa nos programas populares e
costumamligarnãosóparareclamar,mastambémparainformarsobreeventoslocais,
como porexemplo,aeleiçãoparapresidentedasassociaçõesdebairros.Oouvinteé
quemmuitasvezesfazapauta.Éelequemliga,reclama,agradece,narraoproblema
de sua comunidade, mas, a participação do ouvinte não deve ser limitada a
simplesmenteserouvido.Antesdeserumouvinte,oreclamanteéumcontribuinte,um
cidadão de Muriaé e espera do veículo e de quem o ouve um retorno e credibilidade.
Em síntese, vê-se a responsabilidade que o meio rádio possui, quando ocorre o
estabelecimento de uma identidade comunicativa entre emissor da mensagem
radiofônica e receptor.
.2 Influência da prestação de serviços
3
Uma das principais obrigações do veículo rádio como parte da concessão de
transmissão, é a prestação de serviços à população. Possivelmente, trata-se da
característica que mais o diferencia das demais mídias. De acordo com Chantler e
Harris (1992, p. 11) “essa prestação de serviços nãoésimplesmentefalardotrânsito
oudaraprevisãodotempo.Éprincipalmenteapresentarfatoseidéiasquecontribuam
para prática cotidianadacidadania.”Esteéummotivoquelevaorádioapermanecer
atéhojeemmeioatantasrevoluçõestecnológicas.Aliando-seàsmudançasmidiáticas,
o rádio não perdeu a função de ser o porta-voz de uma comunidade.
Maria Coimbra Eliseu, 65 anos, dona de casa, às 6 horas da manhã já está com o aparelho de
rádio ligado e afirma que a rádio ajuda em todos os pontos, “pelo rádio a gente sabe das notícias,
o que acontece nos outros bairros da cidade, a reportagem dos bairros é muito interessante, pois
assim fico sabendo de tudo o que acontece na minha cidade.” (vide anexo 19). A ouvinte sabe o
que quer ouvir e os emissores da informação radiofônica sabem o que ela precisa. Quando este
laço de confiança é bem definido consolida-se a interatividade entre transmissor e receptor. A
confiança na transmissão radiofônica produz uma expectativa natural nos ouvintes, que sempre
esperam a notícia para ter certeza do fato e conduzirem seus atos no dia-a-dia.
Foi avantagemdeatingiroouvintenomomentoexatoemqueo
fato acontece que deu ao rádio o privilégio de prestar serviços.
Ficou para trás o veículo que dependia de um e outroelemento
responsáveis pela audiência. Consolidou-se um novo rádio – o
rádio dependente de toda uma equipe – que conquistou
definitivamente um lugar de honra na comunicação social
(PORCHAT, 1989, p.18).
essa “prestação de serviço” ao público, à cidade, deve ser exercido com muito
E
cuidado,combomsenso,paranãoimporaoouvinte,oqueseachaqueeledeveouvir,
mas com a mesma sensibilidade para saber identificar e veicular aquilo que pode
auxiliar as pessoas a exercerem melhor sua cidadania.
Notíciassobreascondiçõesdasestradasedotempo,aumentodopreçodogásouda
energia, como cadastrar a criança na escola, qual o dia do pagamento do benefício
social, como cadastrar documentos, são matérias do cotidiano que o cidadão espera
ser noticiado pelo rádio. Mas há outrasinformaçõestambémqueeleprecisasabere,
pela falta de condição financeira ou de escolaridade, não pode ter, e procura obter
através da radiofonia.
Um exemplo é o quadro “A justiça ao seu alcance” do Programa Júlio Soares,
transmitido sempre às quartas-feiras na Rádio Atividade. São dez minutos que se
ocupamdequestõesqueconstituememrespostasquelevamàpopulaçãoanoçãode
uma área de pouco conhecimento do homem comum, oDireito.Easperguntasmais
constantes são a respeito de direito defamíliaeaçõestrabalhistas,questõesbásicas
para o prosseguimento da vida em sociedade.
Ao ser perguntado em entrevista (vide anexo 16) se essa característica de serviços ao cidadão
tornaria as pessoas mais dependentes do rádio, Júlio Soares, comunicador há 28 anos em Muriaé,
diz que essa influência do rádio é boa para ambas as partes. “Para nós é bom, porque você passa
a ter credibilidade, para eles(os ouvintes)também,porque às vezes eles têm medo de chegar
p erto do prefeito e falar alguma coisa, têm medo de falar com o delegado, com um policial, e
com a gente eles não têm, nós somos parte da família, nós entramos na casa deles todo dia e toda
hora!”
Para tanto, os comunicadores devem refletir continuamente e com cuidado sobre seu trabalho. O
diálogo franco com a comunidade, que expresse e tenha uma relação de interatividade com o
público é o canal de prestação de serviços à sociedade.
Aprimeiraaplicaçãopráticadorádio–naépocaradiotelegrafia–
foi a comunicação entre navios e terra. Ainda sem voz, a
transmissão feita pelas ondas sonoras significaram rapidez e
eficiêncianosalvamentodevidasepropriedadesnomar.Istofaz
quase um século. Hoje o rádio moderno, tecnicamente
sofisticado, companhia do indivíduo em qualquer situação, tem
quesertambémgrandeprestadordeserviços.(PORCHAT,1989,
p.15-16)
m dos mais populares quadros de rádio AM são as conversascomterapeutas,que
U
falam sobre a alma humana. Famosos por ajudar não somente um ouvinte, mas a
muitos que têm vergonha de se expor, os quadros geram polêmicas, mas, travam
discussões que auxiliam a divulgação e solução de problemas familiares docidadão.
Além disso, é um trabalho social importante porque é educativo, informativo e
transformadorparaaquelaspessoasquenãotemacessoaumconsultóriopsicológico
que pode ser muito caro e às vezes inatingívelnoserviçodesaúdepública.Pode-se
dizer que é um formato bem aceito.
Como exemplo, a análise feita é do quadro “Pesquisa do Dia”, do Programa Evil
Mendonça da Rádio Muriaé. A produção conta com aparticipaçãodeumapsicóloga,
MargaridaVargas,conhecidadopúblicocomopseudônimodeGoza,doapresentador
do programa Evil Mendonça e dos ouvintes, que ligam para a emissora e participam
com relatos sobre o tema apresentado. A atração é precedida de uma pesquisa,
coloca-se uma pergunta, que em geral se relaciona com a realidade da cidade e da
vida social das pessoas, e os ouvintes ligam e emitem a opinião sobre temas
pertinentes eatuais.Apsicólogainteragecomosouvintes,analisandoosrelatoseno
aconselhamento, de forma simples para ser entendido e compreendido por todos os
ouvintes. De acordo com o observado, o quadro incentiva a reflexão, motiva o
envolvimento, educa, informa, democratiza conhecimentos e promoveacomunicação
entre as pessoas.
Mais à frente observa-sequeoouvintedeumquadrodedebatesocupaumaposição
privilegiada, ou seja, a emissão desuavozparaaanálisedapsicólogadoquadrodo
programa radiofônico, o locutor e os milhares de ouvintes,constróemumalinguagem
que cria identificação com outros ouvintes.
Este ouvinte que está em casa, no trabalho, ou em qualquer outro lugar, e que no
momentodatransmissãoseassemelhacomorelatodaqueleouvintequeligouparaa
rádio, pode identificar-se com ele. Observe um trecho do quadro analisado:
uvinte participante do quadro: (...) até deumcachorrinhodotamanhodeum
O
rato eu tenho medo (...)9
uandoapenasumouvintetemcoragemdedizerquetemmedodeumcachorrinhodo
Q
tamanho de um rato, aquele ouvinte que participa indiretamente, (em pleno sentido
denotativo,apenasouve)eseassemelhacomessacondição,atribuimaisatençãoao
que é dito no rádio e cria a identificação. Este ouvinte acaba se tornando porta-voz
destas camadas populares. Neste caso percebe-se a função social desse veículo de
comunicaçãonoexercíciocomunitário,quecumpreopapeldeconstrutordacidadania,
proporcionando não somente à uma pessoa conhecimento sobre um determinado
assunto, mas muitas outras, em suas casas, encontrem a solução deproblemasque
isolados não resolveriam.
Neste quadro a psicóloga procura entender o que conta o ouvinte participante. A
profissional percebe a necessidade da pessoa e, assim, emite um diagnóstico – um
conselho.Procuranãoimporregras,normasenemcondutasesimofereceamaneira
sobreaqualoouvintedeveagirparaasoluçãodoproblemaapresentado.Éomodode
ação educativa que oferece o veículo rádio, e que faz parte de sua função social.
A partir da observação realizada, pode-se verificar que o programa apresenta
informações relacionadas ao cotidiano e à atualidade: assuntos de telenovelas
associando problemas dadramaturgiacomarealidade,comodepressão,fobiasocial,
alcoolismo e drogas. Oquadroenfatizatambémsobrerelacionamentofamiliar,saúde,
violência, justiça, entre outros. É a capacidade que esteprogramapossuidetraduzir,
demaneiracompreensível,asexperiênciasvividaspelasdiversasclassessociais.Mas
a necessidade ou o interesse está fundamentado na experiência do cotidiano das
classes populares, ondeassituaçõessãocomuns,masmuitasvezesnãomerecema
devida atenção governamental.
Pelaanálise,ésentidoosucessoqueoquadrodoprogramaobtémperanteumpúblico
queé,aomesmotempo,objetoesujeito.Oquadrotrabalhaapromoçãodacidadania,
da igualdade e do bem-estar comunitário, envolvendo apresentador, psicólogo, e
ouvintes.Oambienteradiofônico,quetemnaturezainterativa,torna-seporsuaprópria
função, agente multiplicador de conhecimento e cidadania.
5. A PROGRAMAÇÃO
“ A atividade radiofônica é participação popular eum processo facilitador da
autopromoção humana.”
PERUZZO
programação é o conjunto organizado das transmissões de uma emissora,
A
constituindo-se no fator básico de diferenciação de uma rádio em relação à outra.
Quem objetiva um certo posicionamento no mercado pode adotar, conforme a
necessidade, um tipo ou outro de planejamento das suas emissões.(FERRARETTO,
2000, p.59). A programação das emissoras de Muriaé possuem a formadeMosaico,
conforme definição de Ferraretto no livroRádio: oveículo, a história e a técnica:
onstituindo-se em um conjunto eclético de programas,
C
extremamente variados e diferenciados, a programação em
mosaico é comum em emissoras de mercado menos
desenvolvidos.Há,decertomodo,nestecaso,umasegmentação
de horários. Em geral, entre 6 e 8h, ocorrem emissões para um
público bem genérico com informações para quem está
acordando, entremeadas, com freqüência, por músicas. Na
seqüência, entram programas jornalísticos abordando os
principaisfatosdomunicípioedaregião,voltadosaosformadores
locais de opinião. Parte da manhã ou da tarde, no entanto, é
preenchida com comunicadores popularescos com a emissora
procurando atingir, deste modo, as classes C e D. Além disto,a
programação pode incluir transmissões esportivas locais.
(FERRARETO, 2000, p.59-60)
as o essencial é que a programação seja atraente e com substância de conteúdos. Nas emissoras
M
de Muriaé estudadas neste trabalho, os programas de maior audiência, e que ocupam o horário
nobre de emissão radiofônica, de 8 às 13 horas, têm características semelhantes de acordo com a
definição de Ferraretto:
Radiorrevista ou programa de variedades: Na realidade, a
radiorrevista ou programa de variedades reúne aspectos
informativos e de entretenimento. Engloba da prestação de
serviços à execução de músicas, passando por temas
diversificadoscomonotíciaspoliciaissensacionalistas,horóscopo
ouentrevistascomatoreseatrizesdetelenovelas.Nasemissoras
dedicadas ao jornalismo, pode aparecer na forma de espaços
voltados à cultura e ao lazer, intercalados, algumas vezes, com
orientações nas áreas deMedicinaoudeDireito.(FERRARETO,
2000, p.57)
s programas analisados para este capítulo, por tratar da questão da cidadania no horário nobre
O
(Programa Júlio Soares e Programa Evil Mendonça) poderão ilustrar a questão da construção da
cidadania no rádio.
O Programa Júlio Soares vai ao ar pela Rádio Atividade desde janeiro de 2003. Antes o
apresentador produzia um programa na Rádio Muriaé. A troca de estação provocou algumas
mudanças no programa do popular comunicador, mas o básico é mantido – o conteúdo do
programa tem como meta a informação, a prestação de serviço e a credibilidade com o ouvinte.
Os elementos fundamentais são quadros de interesse da população e trazem a marca de
descontração do comunicador. O programa é transmitido de segunda a sexta-feira, no horário de
9 às 13 horas.
O programa inicia com a leitura de um conto com sentido moral. A abertura é composta por
manchetes das notícias nacionais e locais, com informações sobre as condições do tempo, das
estradas e dos movimentos nos hospitais. Intercaladas por diversas publicidades, há a inserção de
informações sobre documentos encontrados, vagas no Sistema Nacional de Emprego (SINE),
oportunidades e negócios, sobre vendas de objetos por pessoas, que não constituem comércio,
as divulgam negócios de forma isolada, e também a agenda cultural.
m
Um quadro que chama atenção é“Opovocomapalavra”.Oouvinteligaedeixaseu
recado, pode ser mensagens de felicitações, recados, pedidos e reclamações. O
apresentadorafirmaqueoquadroémuitopopulareprocuraintermediaropúblicoeas
autoridades nas questões mais polêmicas: “Quando há uma reclamação de ouvinte
nesse quadro do O Povo com aPalavra,eulevoaoconhecimentodoórgãoatingido,
eugostodeprimeiroouvirosdoislados,(...)eunãogostodefazerimprensamarrom,
eunãogostodefazeressetipodesacanagemcomninguém,então,quandotiveruma
coisa que atinge a secretaria de obras: ‘O h, tem um problema assim assim, tão
reclamandoaqui,oquefazpraresolverisso?’Entãoeucolocoosecretárioexplicando
depois e coloco o ouvinte primeiro fazendo a reclamação.”
O comunicador diz a que a responsabilidade da produção do programa é também
saber se o problema foi resolvido, mastemquecontarcomacolaboraçãodoouvinte
que pode atuar como um fiscal para defender seus direitos. “Eu pergunto no ar:
‘Q uantosdiasmaisoumenospraresolver?’“Ah,quinzediasresolveisso.”(respondeo
representante do órgão público no ar) ‘Ouvinte você ouviu aí, se não resolver você
volta a reclamar conosco.”
O programa de quatro horas de duração é um misto de entretenimento e informação. Os quadros
deHoróscopoeBabados e Boatos(fofocas do mundoartístico) constituem grande audiência ao
lado de informações que preenchem a maior parte do programa:
Grade do Noticiário
N
● otícias da Redação (8h30, 9h30, 10h30 e 11h30);
● Momento Esportivo (8h30 e 10h30);
● Noticiário: Notícias nas horas cheias, com quatro minutos de duração (8h, 9h,
10h, 11h, 11h55, e 13h).
inâmica e ritmo direcionam o Programa Evil Mendonça, no ar pela Rádio Muriaé
D
desde janeiro de 2003. Oapresentadortrabalhaemrádiohá17anosejápassoupor
estações como a América e a Manchete do Rio de Janeiro.
Oprogramainiciaàs8hecomareformulaçãoqueaconteceupelos62anosdaRádio
Muriaé, vai até às 13h. Durante cinco horas o programa visa fornecer ao ouvinteum
misto de informações e serviços à população. O comunicador assume a postura de
amigodoouvinteeesteaspectodecumplicidadetorna-semaispresentenorádioAM.
Segundo definição da emissora, o programa é “Jornalismo, brincadeiras, secretária
eletrônica e o quadro “ombro amigo”,queajudaaspessoascarentesdacidade.Ena
pesquisa do dia a presença ao vivo de convidados respondendo as perguntas dos
ouvintes.”
O programa começa com um texto reflexivo. Segue com as manchetes do noticiário nacional e
local, e chamada para as notícias policiais. Em seguida o apresentador destaca os quadros do
programa e abre os microfones para os repórteres noticiarem a previsão da meteorologia para a
cidade e para o estado de Minas Gerais, além das notícias sobre o movimento das estradas e dos
hospitais. Na seqüência, a chamada para oShow dosbairros, quadro onde o repórter vai a um
bairro da cidade conversar com o morador sorteado para ganhar brindes do patrocinador da
atração.
O diálogo entre o locutor e o ouvinte é intercalado por pequenos quadros: dicas de saúde, lazer,
prestação de serviços, entre outros mais relevantes como o chamado para participar de uma ação
social. Em um programa observado, o comunicador convoca os ouvintes a participarem da
mobilização em favor da volta de mais recursos financeiros para a saúde pública em Muriaé. O
interessante é realmente mobilizar comunidade para uma manifestação que é importante para
todos os moradores da cidade. É uma campanha também que atua em conjunto com várias outras
organizações e reforça o que Maria Elisa Porchat diz no livro Manual de Radiojornalismo da
Jovem Pan: “Os programas são o contexto para a rotatividade das informações, acrescentado o
registro do momento que a cidade está vivendo. A programação também acompanha o dia do
cidadão em movimento” (PORCHAT, 1989, p.20).
Às 8h55 começa o Ombro amigo, um dos quadros de maior apelo popular. Evil
Mendonçalêacartadesolicitaçãodosouvintes,quevariadesdepedidosderemédios
até berços e fogões, entre outros. Por meio de sorteio, as cartas são lidas e o
apresentadorpedeaosouvinteseàquempossaajudaraquelapessoa.Apesardenão
averregistrosquantitativosdonúmerodepedidosquesãoefetivamenteatendidos,a
h
produção conta que a ajuda vem de todo a parte.
“O interessante dissoéqueémuitacarênciaetempessoasque
são solidárias, é impressionante o número de pessoas que
ouvem, sempre tem aquele que se propõe a doar, vai muito da
condução do locutor, passa que a pessoa está realmente
precisando,umtratamentodesaúdefora,recursoparaviagem.A
gente tem caso aqui, uma situação que o médico disse: “Pode
mandar pracá,queeufaçoessacirurgia,eucuidodisso,euvou
ajudar, eu vou operar, faço questão”(VIDE ANEXO 17)
sta afirmação, feita em entrevista (vide anexo 17), é de Paulo Roberto Barros, diretor da Rádio
E
Muriaé e radialista há mais de 42 anos. Ele acredita ainda que o rádio deve contribuir não só na
ajuda, mas principalmente na informação séria: “Estar a serviço da população, prestando serviço,
uma informação correta, um trabalho jornalístico independente, mostrando ser autêntico nessa
informação, acho que a gente poderá construir uma cidadania.” Enquanto as duas rádios de Juiz
de Fora (Panorama e Solar) têm programas mais específicos para a área de assistencialismo, em
Muriaé os próprios apresentadores fazem esse papel estimulando a doação de móveis e
utensílios, além de serviços para as pessoas carentes que pedem ajuda às rádios.
A partir das 9h05 começa o Momento de Fé, com o Padre Marcelo Rossi, transmitido direto de
São Paulo em rede para várias emissoras do país. Até às 10h leva oração e informações da Igreja
Católica.
Apósonoticiáriodas10horas,entranoaroquadroShowdosBairros,comorepórter
Marcelo Luís. O ouvinte participa de uma promoção e o nome é sorteado.
O repórter vai ao bairro, e se o morador possuir o cupom do supermercado
patrocinador ganha vários brindes. O repórter conversa com o morador e suafamília
sobre as condições do bairro, e no estúdio, Evil Mendonça também conversa com o
morador, que pode elogiar, pedir e reclamar sobre a comunidade. Este quadro é
também uma prestação de serviços promovida pelo programa, através do patrocinador.
O quadro não atende apenas o ouvinte sorteado. Segundo o repórter: “Algumas
pessoasaoveremocarrodereportagempedemparafalaralgumacoisaaproveitando
que a gente está no bairro”.
No programa observado o repórter esteve na Rua Independência, Centro da cidade.
O trecho reproduzido abaixo retrata como é o quadro:
epórter: “Tem uma casa perto do 341 que o barranco está caindo e se cair,
R
meu amigo, vai fazer um estrago, brincadeira, entãooórgãoresponsávelcom
urgência dá uma passada aqui e tenta resolver este problema,eumamelhora
aqui no calçamento para os moradores aqui da Rua Independência.”10
epois de conversar com a ouvinte sobre a reclamação, acontece a entrega dos
D
brindes. Verifica-se que publicidade e jornalismo se misturam de forma dinâmica e
interativa com ouvinte-repórter-apresentador.
s quartas-feiras, às 10h30, o programa exibe um quadro em que o morador liga para a rádio e
À
conversa com o presidente da associação de bairros, conduzido pelo apresentador Evil
Mendonça. Há menos de um mês no ar, mostra o conjunto de interatividade, um canal aberto
entre ouvinte, representante da comunidade e veículo de comunicação. A conversa informal é
sobre os anseios dos moradores em relação ao bairro, além de agradecimentos às obras
alcançadas.
Às 11h10 é a vez do Plantão de Polícia. “A partir deste momento os microfones
verdades da Rádio Muriaé entram em ação no combate ao crime e a favor davida”.
Comestavinhetacomeçaoquadroquetambémtemaudiênciacativanohorário.Entre
os destaques, o repórter relata as principais ocorrências das últimas 24 horas coma
participação de um delegado (Dr. Genir), que comenta e diz quais as medidas as
vítimas devem adotar e o que pode acontecer com os criminosos e suspeitos.
O convidado também faz comparações e procura sempre analisar o fato e dá
recomendações à comunidade para uma melhor segurança do bairro. Semprecomo
bordão “E agora Dr. Genir?”, o repórter pergunta ao convidado o que pode suceder
depoisdedeterminadaocorrência.Oqueaconteceéqueàsvezesháumabrincadeira
entre o repórter, o apresentador e o convidado, principalmente quando a ocorrência
temalgodesurpreendente.Oquadrotemmuitosucesso,noentantoemdeterminadas
situações cai no ridículo e pré-julga os acusados. Mas, mesmo com papel
sensacionalista, tem demonstrado a função social de noticiar sobre a segurança da
cidade.
O noticiáriopolicialbaseiaorádiopopularescoesensacionalista.
Não deve, no entanto,servistocompreconceito.Éapenasmais
uma área de cobertura. (...) o mais rotineiro fato policial é
dramatizado, acentuando o seu lado macabro com toques de
sentimentalismo exagerado. A isenção dá lugar um
posicionamento paternalista e, não raro, policialesco, em que a
adjetivaçãocampeia.Exploraacuriosidade,aaventura,oconflito,
o sexo, o suspense, o dinheiro, a vida e a morte...”
(FERRARETTO, 2000, p.257)
s 11h30 tem início o quadro Vida e Saúde, informativo da Secretaria Municipal de
À
Saúde. No dia analisado, o quadro transmitiu uma entrevista com o secretário
municipal de Saúde, Marcos Guarino, que falou de vários itens a respeito da saúde
públicadeMuriaé.Oquadroémaisumapropagandadasecretariadoqueinformação
sobre a saúde do cidadão. Mas há um trecho que informa sobre o consumo de leite
vendido a varejo e sem fiscalização.
ntrevistado (Marcos Guarino): É importante que o leite consumido seja
E
pasteurizado,(...)esseleitequeévendidoagranel,narua,emlatõesnãoébom
(...) mesmo fervendo o leite você não mata todas as bactérias. Muitasvezesa
genteestápegandocriançascomdiarréiadevidoaoconsumodesteleite,então
éumalerta,éilegalavendadesteleite,avigilânciasanitáriatemtentadoentrar
emcontatocomesseprodutores.(...)Éimportantequetodapessoatemqueter
em mente que o leite tem que ser pasteurizado, tanto de sacolinha ou de
aixinha, ele tem que ser pasteurizado.
c
Apresentador(PauloRoberto):Mas,doutorMarcos,nãoseriaaíumaproibição,
uma rigidez, uma fiscalização, até mesmo uma punição com multaparacoibir
este tipo de comercialização?
Entrevistado (Marcos Guarino): A vigilância sanitária já está atenta a este
problema, e eu acreditoqueacabavirandoumproblemadesaúdepública,(...)
agora é muito importante a conscientização da pessoa, porque se não tiver
quemcompre,vocênãovaiternenhummercadoparaessapessoa,quevaiser
obrigada a entregar seu leite numa cooperativa que vai pasteurizar para que
esse leite seja adequado.”11
A informação, pautada em pesquisa e dita por um especialista, exerce nos ouvintes
umainfluênciamuitoforte.Notrechoanalisadopercebe-sequeosecretáriodeSaúde,
além de médico, é quemdáadicaparaoouvinte,quepodetambémseralguémque
lida diretamente com a saúde da família. É importante ver que a informação para a
cidadania deve ser oferecida por órgãos públicos e nesse caso usa a ferramenta do
veículo de comunicação rádio para atingir as várias classes sociais.
Nosmomentosfinaisdoprogramaentramnotícias,reportagensemuitadescontração.
O programa conta ainda com quadros como o Classificados no Ar, Fatos e Boatos,
PapodeBola,Troca-troca,BolsadeEmpregoseumamúsica.Destaquetambémpara
o VermelhinhodaMuriaé,unidademóvelquecobretodaacidadeemtemporealcom
informações extraordinárias.
O rádio tem como um de seus princípios básicos ser ferramenta de desenvolvimento do ouvinte,
com ações-cidadãs, com serviço de qualidade e acima de tudo com uma programação que dê
valor e respeite o ouvinte. Os grandes nomes que edificaram este veículo sempre o utilizaram
com fins dignos – formar e informar – que não podem ser esquecidos, já que o rádio é um dos
meios de comunicação mais competentes para a concretização da cidadania.
este trecho percebe-se a efetiva comunicação entre o legislativo e o povo, que unidos
N
lutarão por uma causa em comum, a manifestação popular através do rádio que divulga
e apóia este ato.
administração jamais maneja interesses, poderes ou direitos pessoais seus,
A
surge o dever da absoluta transparência. “Todo poder emana do povo e em seu
nome será exercido (CF, art. 1º, parágrafo 1º). É óbvio, então que o povo, titular
do poder, tem direito de conhecer tudo o que concerne à Administração, de
controlar passo a passo o exercício do poder (SUNDFELD, 1995, p.54 apud
MORAES, 2002P. 785).
preciso, portanto, que o povo, o cidadão muriaeense, também seja fiscal no que diz
É
respeito aos programas radiofônicos dos poderes Legislativo e Executivo, para que o
espaço, que é pago com o dinheiro do contribuinte, também seja um espaço para a
cidadania e a divulgação do uso dos recursos públicos do município.
O Executivo municipal também mantém um programa jornalístico no meio radiofônico.
Pela Rádio Atividade, oVisão Administrativa, é transmitidoàs sextas-feiras, das 7h45
às 8h. Na Rádio Muriaé é irradiado no mesmo dia e horário.
O conteúdo do programa é idêntico, pois é feito por um estúdio que o produz de acordo
com roteiro da Assessoria de Comunicação da Prefeitura.
O programa é um informativo institucional, etrazinformaçãodeorientação,comopor
exemplo, a campanha de vacinação contra a poliomielite. O repórter entrevista um
médicoquedizaimportânciadospaislevaremosfilhosparaavacinação.Hátambém
o quadro Espaço Rural, com as informações para o homem do campo. No dia
analisado a notícia foi sobre a distribuição de mudas e sementes para osprodutores
ruraiscadastradosnoprogramaMinassemfome.OsecretáriomunicipaldeAgricultura
explicou sobre o projeto e como o produtor deve proceder.
Oprogramade15minutoséummistodepropagandainstitucionaleinformaçãoparao
cidadão, desta maneira contribui para que a população saiba o que acontece na
cidade. São notícias básicas para o cidadão que informam também o porquê de
determinadas obras e ações da administração municipal. De certa maneira é
pretensiosojáquemostrasomenteoqueháde“melhor”nagestãoatual,mastambém
insere o cidadão nas ações da administração, e cumpre a orientação constitucional.
ara manter vivo o sonho de Roquette-Pinto, o rádio comercial tem tentado também ser
P
ferramenta de ensino, através de programas que levam educação pelas ondas hertzianas. Embora
as emissoras educativas cumpram de maneira mais objetiva este papel, as emissoras comerciais
podem dedicar parte da programação a quadros ou programas que pretendam formar o ouvinte,
ampliando seus horizontes culturais e educativos, e assim, cumprir mais uma vez, sua função
social.
Com o parâmetro de que o veículo deveria ser instrumento de inclusão social,
Roquette-Pinto definia o papel do rádio para a educação:
Orádioéojornaldequemnãosabeler,éomestredequemnão
podeiràescola,éodivertimentogratuitodopobre,éoanimador
denovasesperanças;oconsoladordoenfermo;oguiadossãos,
desdequeorealizemcomespíritoaltruístaeelevado.(TAVARES,
1997, p.8)
ssavontademodificadorafortaleceuemcomunicadoreseeducadoresqueencontram
E
no rádio um instrumento de perspectiva educativa, trabalhando em conjunto com o
sistema tradicional de ensino.
Em 1923, quando Roquette-Pinto fundou a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, primeira
emissora do país, a programação envolvia palestras científicas e literárias e chegou a receber em
seu estúdio palestra do físico alemão Albert Einstein. Nos anos 1930, a primeira emissora oficial
do país é doada ao Ministério da Educação e, em 1936 passa a ter o nome de Rádio MEC. O
professor Roquette-Pinto cede a emissora com a condição de que a programação ficasse restrita a
programas educativos.
Durante as décadas de 1940 e 1950, incentivados com a idéia de Roquette-Pinto, surge o
programa Universidade no Ar, criado em 1941 pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Mais
tarde, surgem os cursos básicos dos Sistema de Rádio Educativo Nacional (Siren), irradiados de
1957 a 1963. Na década de 1960, o Movimento de Educação de Base cria escolas radiofônicas
que combinavam alfabetização com conscientização para promover mudança de atitudes, com a
participação de locutores animadores. A experiência inovadora deu um salto de qualidade no
sistema educativo por rádio.
Em outubro de 1970 o governo federal cria o Projeto Minerva, um programa de 30 minutos com
segmento informativo-cultural e educativo, de transmissão obrigatória por todas as emissoras do
país. A produção era regionalizada, concentrada no eixo Sul-Sudeste e com distribuição
centralizada. Ferraretto destaca que “com resultados discutíveis ao longo de seus quase 20 anos,
o projeto Minerva saiu do ar no dia 16 de outubro de 1989.” (FERRARETTO, 2000, p. 162).
Desde então, iniciativas são feitas com o objetivo de utilizar o rádio como instrumento
pedagógico. Organizações não-governamentais, como sindicatos, Igreja Católica e universidades
têm produzidos programas que destacam diversos temas, com o objetivo de formar e informar o
cidadão, sempre numa combinação de linguagem inclusiva à conteúdos educativos. Em Muriaé a
programação das rádios comerciais ainda dedicam pouco da grade a projetos desse segmento.
Na grade da Rádio Atividade, observa-se que não existe nenhum programa específico à
educação. A educação é voltada para a cidadania e acontece durante os quadros do Programa
Júlio Soares, mas não de maneira direcionada a determinados públicos, mas sim multidirecional,
s em especificidade a determinado assunto.
As rádios juizforanas observadas nesse trabalho também não oferecem programas com
conteúdos específicos para a educação. A Rádio Panorama FM, apesar de muito eclética, não
tem produto radiofônico específico para a área. Na Rádio Solar também não há programas
exclusivos. O que pode ser entendido como educação em ondas médias, é distribuído durante a
programação, através de programas como o Chamada Geral, um noticiário em formato de
revista, com comentários e entrevistas.
Na grade de programação da Rádio Muriaé, o programaViva a Vidada Pastoral da Criança, um
Organismo de Ação Social da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), ilustra a
cidadania exercida através da educação.
O programa está no ar na emissora desde 2000. De caráter independente, é de produzido pelo
próprio estúdio de gravação da central Pastoral da Criança, transmitido em mais de 2400
emissoras do país. Sempre aos domingos, no horário de 8h45, o programa tem 15 minutos de
duração e traz notícias sobre a saúde e educação da criança, sempre focada nos preceitos cristãos,
mas com linguagem aberta para todos os ouvintes. Com dois apresentadores (Mário e Angela), o
programa oferece um serviço de discussão de idéias e de mobilização da sociedade, chamando os
ouvintes a participarem de ações pró-ativas para a melhoria da qualidade de vida das crianças nas
comunidades em que estão inseridas. Na abertura, utiliza um jingle onde fala “um programa com
dicas e informações sobre saúde, educação e cidadania”.Em cada programa é tratado um tema e
tem entrevistas com especialistas sobre os diversos assuntos. A seguir um trecho do programa
ilustra a afirmação:
“ Mário (apresentador): E agora quem está chegandopara conversar com a gente aqui no
estúdio é a Nélia Nunes Vasconcelos, que é coordenadora da Pastoral da Criança de Santo
Amaro, Bahia. Nélia, como os líderes ajudam os pais a promover e acompanhar melhor o
desenvolvimento das crianças?”
“ Nélia (entrevistada): Nós líderes, estamos sempremostrando que toda criança precisa de
muito amor e atenção, elas precisam de cuidados com sua saúde, alimentação e devem
participar de atividade que toda criança de sua idade gosta de fazer”14
O programa consegue propiciar uma construção diferenciada do conhecimento e da cidadania
das crianças, através dos adultos, pais e responsáveis, que ouvem o programaViva a Vida. Há um
esforço conscientizador e mobilizador muito forte.
Outro programa interessante éA voz dos trabalhadores,transmitido aos domingos, às 8h30 pela
Rádio Muriaé. A atração não é necessariamente educativa, mas se mostra participativa no âmbito
dos movimentos sociais. Oferece informações para o camponês, como cursos da Contag
(Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), documentação e eventos do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais e das comunidades de base do meio rural. O apresentador,
além de informar, explica a importância sobre as notícias relativas ao trabalhador rural. A
linguagem é peculiar e se assemelha àquela usada em rádios comunitárias, já que o roteiro e a
apresentação são produzidos por um membro do Sindicato, Reinaldo Barberine, feita com uma
linguagem direta ao público-alvo do programa. Assim promove a participação efetiva na
dinâmica social.
Programas como estes em rádios comerciais é o ponto inicial de uma cultura mais
cidadã, onde vemos inseridas parcelas de contribuição para uma sociedade mais
responsável, e que juntas formarão uma comunidade igualitária e justa.
conceito de educação está naorigemdorádio.Asprogramaçõesdeveriamdedicar
O
mais um pouco de seu espaço voltado para questões de cidadania, saúde,
meio-ambiente e educação e, assim, promover o cidadão brasileiro.
mdosexemplosdesucessonacidadefoiumacampanhafeitapelaRádioMuriaé.A
U
emissora associou o recolhimento de alimentos a cupons para sorteio de prêmios.
Paulo Roberto explica que foi interessante para quem ajudou, para a rádio e para a
comunidade. ‘Nós fizemos campanha com a Igreja Católica, foram três anos
consecutivosdealimentos,queaspessoastrocavamporcupomparaconcorrerauma
premiação grande de eletrodomésticos. Só na rádio nós arrecadamos sete toneladas
de alimentos, a Igreja do Centro foram 12, a da Barra foram seis, a do Porto quatro”.
Na Rádio Atividade as campanhas também fazem parte da política editorial da
empresa. Mas atua como contribuição às entidade filantrópicas como Lions Club,
Rotary Club, Maçonaria, Casa das Meninas, Lar Ozanam (Assistência aos idosos).A
ajuda acontece na divulgação massiva da campanha que essas entidades mantêm.
“Nóssempreapoiamos,todosquefazemcampanha,contamconosconadivulgaçãoe
comanossaparticipaçãonascampanhas.Jáfizemostambém,campanhadeagasalho
aqui, várias vezes, de alimento, partindo da emissora”, afirma Júlio Soares.
Pensamosnoquesignificasersolidárioenasolidariedadequeo
rádio desperta entre os ouvintes, sobretudo a mobilização que
provoca nas grandes tragédias. Mas ser solidário, sentir com é
muito mais do que ter pena de. Asolidariedadedequeestamos
falando, além desentircomooutro,procurafazê-loperceber,no
momento do sofrimento, que ele é sujeito da história, do seu
processo. A ajuda do outro, neste sentido, não o deixasentir-se
objeto de favores, mas sujeito do seu próprio crescimento.
(CORAZZA, apud BARROS, FERNANDES, p. 168).
s campanhas estimulam a sociedade e podem ser o ponto de partida para a
A
discussãodospontosaindafracosdaorganizaçãosocial,jáque,namaioriadasvezes,
atendem de forma emergencial aos problemas enfrentados e vivenciados pela
populaçãonocotidiano.Apropostaétambémservircomoreflexão,porqueconstituem
a resposta da enorme capacidade persuasiva do rádiocomoinstrumentosocializador
do cidadão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
titudes positivas podem levar a um crescimento da sociedade. E o rádio é um
A
poderoso veículo para a concretizaçãodessesonhocoletivoparaqueacomunicação
seja um direito humano respeitado.
O rádio na construção da cidadania faz a voz da comunidade, que batalha por uma
sociedademaisforteeconscientizada.Comumalinguagempróxima,íntimaepopular
deveunirgovernanteseoscidadãosparaaedificaçãonãosódeumasociedademais
justa, mas também do ser humano como parte desta coletividade.
Opodermobilizadordorádioéacapacidadedesero“tambortribaldaaldeiaglobal”é
a possibilidade do resgate de um mundo mais unido, embora as fronteiras da
democracia ainda não tenha sido totalmente exterminadas.
Nesse trabalho percebe-se que o ouvinte procura a rádio, não somente porque não tem seus
anseios e necessidades atendidas, mas ele quer tornar também pública a denúncia e assim ser
ouvido pelos órgãos competentes. O cidadão, o ouvinte, quer ser ouvido também. Nos outros
meios de comunicação, os fatos da sociedade são contados pelo jornalista, no rádio o caminho é
menor e o ouvinte pode se tornar o repórter de seu próprio caso.
Com todos os cuidados com a utilização desse meio de comunicação e com alguns reparos que se
fazem, sem dúvida, necessários, o rádio é ainda - e diante das novas tecnologias - o melhor
instrumento para se chegar a uma população que não tem acesso à educação convencional, e
pode, diante disso ser canal conscientizador e também criar contextos de experiências
democráticas, como os exemplos dos quadros dos programas analisados, que levam cidadania e
diálogo a muitos ouvintes. Essas inovações tecnológicas proporcionarão ao rádio novo fôlego,
permitindo a fidelidade ao meio que tende a melhorar em termos de qualidade técnica. No
entanto, seu conteúdo deve ser cada vez melhor, mas sempre na busca para realizar o que desde
seu surgimento tem feito, aliar informação de qualidade à imediatismo, dinâmica à interatividade
com o ouvinte e, sempre oferecer aos indivíduos acesso à cidadania.
Em alguns momentos, pode-se perceberqueosinteressesdealgunsproprietáriosde
veículosdecomunicaçãoémuitomaiordoquepromoveracidadaniaeasolidariedade.
Essediscursocamuflaascontradições,oquesepretende,muitasvezes,éaumentara
audiência e conseqüentemente, aumentar os lucros em anúncios publicitários.Estaé
maoutrapautaabertaparaanálisedosmotivospordetrásdetaisproduções.Orádio
u
deveria ter o dever de tão somente ser o mediador de uma articulação social e não
puramente de interesses financeiros.
Ser observador dos meios de comunicação também é um dever docidadão.Elenão
podeseragredidopelosexcessosdamídia,éopapeldelecomocidadãofiscalizareé
também dos jornalistas, que podem atuar como vigilantes dos abusos do poder. É a
lutadaesperançaporumfuturocommenosviolênciaerepressão,comjustiçaepaz,e
que também através da radiodifusão procura um modo de construir uma sociedade
mais democrática.
A concretização desse sonho exige, entretanto, um esforçocoletivo.Dessaforma,há
necessidade de preencher as carências vindas das desigualdades sociais, além da
apreciação crítica da sociedade com relação ao desinteresse do poder público em
áreas vitais, como saúde e educação, por exemplo, e do próprio sentimento do
significado antigo de cidadania, como guardiã e fonte de direitos. Deste modo, seria
proporcionada uma qualidade de vida merecida por todos os seres humanos sem
restrições.
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