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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES - CCHLA


DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL - DECOM
COMUNICAÇÃO SOCIAL - AUDIOVISUAL

RELATÓRIO DE PRODUÇÃO
DOCUMENTÁRIO: “CIDADE DESCOBERTA”

Vivian Moura de Souza

Natal, 2023
VIVIAN MOURA DE SOUZA

RELATÓRIO DE PRODUÇÃO
DOCUMENTÁRIO: “CIDADE DESCOBERTA”

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao


Departamento de Comunicação Social da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte como
requisito para a obtenção do título de Bacharel em
Comunicação Social - Audiovisual.

Orientador: Professor Dr. Rodrigo Almeida Ferreira.

Natal, 2023

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VIVIAN MOURA DE SOUZA

RELATÓRIO DE PRODUÇÃO
DOCUMENTÁRIO: “CIDADE DESCOBERTA”

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao


departamento de Comunicação Social da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
para a obtenção do título de bacharel em
Comunicação Social – Audiovisual.

Aprovado em: ______ de _________________


de __________.

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________________
Prof. Dr. Rodrigo Almeida
Universidade Federal do Rio Grande do Norte

__________________________________________________
Dra. Michelle Ferret Badiali
Universidade Federal do Rio Grande do Norte

__________________________________________________
Prof. Dr. Ruy Alkmim Rocha Filho
Universidade Federal do Rio Grande do Norte

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências
Humanas, Letras e Artes - CCHLA

Souza, Vivian Moura de.


Relatório de produção : documentário "Cidade Descoberta" /
Vivian Moura de Souza. - Natal, 2023.
34 f.: il.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) - Centro de


Ciências Humanas, Letras e Artes, Departamento de Comunicação,
Comunicação Social - Audiovisual, Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, Natal, 2023.
Orientador: Prof. Dr. Rodrigo Almeida Ferreira.

1. Documentário - Relatório. 2. Direito à cidade - Relatório.


3. Skate feminino - Relatório. 4. Curta metragem - Relatório. 5.
Audiovisual - Relatório. I. Ferreira, Rodrigo Almeida. II.
Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 791.229.2(047)

Elaborado por Raphael Lorenzo Lopes Ramos Fagundes - CRB-15 912

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AGRADECIMENTOS

Aos Orixás e aos meus guias pelo Axé que me mantém firme.
Aos meus mais velhos, avó e avô, que não tiveram a oportunidade de aprender a ler e
escrever, mas abriram caminhos para que suas filhas fossem alfabetizadas.
À minha mãe Fátima, que não teve a oportunidade de fazer ensino médio, mas abriu todos os
caminhos para que eu chegasse até aqui.
Sou a primeira da família a graduar, mas sem a minha ancestralidade nada seria.

À minha parceira de criação Julia Donati, que compartilhou comigo as delícias e perrengues
desse projeto.
Aos meus professores do Decom que trouxeram humanização e olhar atento dentro da
academia.
Ao meu orientador, Rodrigo, por toda a paciência e compreensão durante esse longo processo
de orientação.

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RESUMO

Esse trabalho corresponde ao relatório de produção do curta documentário Cidade


Descoberta, dirigido por Vivian Moura e Julia Donati, um filme que traz a poesia das ruas e a
vivência na cidade através da experiência de duas skatistas, Julia e Vivian, desde o processo
de captação de recursos através de edital à distribuição do produto em festivais pelo território
brasileiro.

Palavras-chave: curta, documentário, skate feminino, direito à cidade, audiovisual.

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ABSTRACT

This work corresponds to the production report of the short documentary Cidade Descoberta,
directed by Vivian Moura and Julia Donati, a film that brings the poetry of the streets and the
experience in the city through the experience of two skaters, Julia and Vivian, from the
capture process of resources through public notice for the distribution of the product in
festivals throughout the Brazilian territory.

Keywords: short film, documentary, female skateboarding, right to the city, audiovisual.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Crianças do coletivo de skate feminino potiguar Respeita as Minas………………12


Figura 2: That One Day (2016)................................................................................................13
Figura 3: Rema e Grita (2018)..................................................................................................13
Figura 4: Fotografia still Cidade Descoberta (Vivian).............................................................18
Figura 5: Fotografia still Cidade Descoberta (Julia).................................................................19
Figura 6: Fotografia still Cidade Descoberta (Luciana)...........................................................20
Figura 7: Fotografia still Cidade Descoberta………………………………………………....21
Figura 8: Fotografia still Cidade Descoberta (Vivian e Julia)..................................................22
Figura 9: Cartaz feito por Julia Donati para estreia presencial de Cidade Descoberta……….24
Figura 10: Cartaz divulgação…………………………………………………………………26

Figura 11: Cartaz divulgação…………………………………………………………………27

Figura 12: Cartaz divulgação…………………………………………………………………28

Figura 13: Festival MOV (2021)..............................................................................................29

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.……………………………………………………………………...10
2. MULHERES NA CENA DE SKATE…………………...…………………………...12
3. DOCUMENTÁRIO EM PRIMEIRA PESSOA……………….……………………..16
4. OBJETIVOS………………………………………………………………………….17
5. PRÉ-PRODUÇÃO……………………………………………………………………17
5.1. EDITAL………………………………………………………………………17
5.2. ROTEIRO…………………………………………………………………….19
6. PRODUÇÃO…………………………………………………………………………19
6.1. EQUIPAMENTOS……………………………………………………………24
7. PÓS-PRODUÇÃO……………………………………………………………………25
7.1. TRILHA SONORA…………………………………………………………..26
8. DISTRIBUIÇÃO E FESTIVAIS……………………………………………………..26
8.1. CARTAZES…………………………………………………………………..27
9. CRONOGRAMA…………………………………………………………………….31
10. CONSIDERAÇÕES FINAIS………………………………………………………...32
11. REFERÊNCIAS……………………………………………………………………...33
12. ANEXO…………………………………………..…………………………………..34

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1. INTRODUÇÃO

Com o avanço da lógica de privatização dos espaços de lazer da cidade, os ambientes


públicos de Natal estão se tornando cada vez mais sucateados, hostis e, naturalmente, caindo
em desuso. Esse fator acelera a desigualdade social e traz à tona o questionamento sobre
quais são as pessoas que têm direito a se divertir dentro da cidade, visto que é necessário
pagar para usufruir das atividades de descanso e, além disso, fazer parte de um grupo que não
esteja socialmente vulnerável em questão de segurança pública, como mulheres, pessoas
negras e a população LGBTQIAPN+. Temos que nos perguntar: para quem a cidade é
pensada e construída? A quem a cidade atende e a quem ela exclui? Quem delega as políticas
públicas de urbanização de Natal? Qual Plano Diretor¹ foi instaurado recentemente?
De acordo com o Documento Temático 11 da Conferência Habitat III (Espaço
Público) (ONU, 2015) “o total de taxas de criminalidade registradas no mundo cresceu em
torno de 30% e estima-se que cerca de 15% desses crimes têm um componente do desenho e
da gestão do espaço público. Isso resultou em um crescimento de comunidades fechadas,
seladas por muros e instalações de segurança sofisticadas, que surgiram em quase todas as
cidades da América Latina. Ao longo dos últimos 30 anos, os espaços públicos estão se
tornando altamente comercializados e estão sendo substituídos por edifícios privados ou
semi-públicos. A comercialização divide a sociedade e acaba por separar as pessoas em
diferentes classes sociais”. Dessa forma, a cidadania básica só é alcançada, tomando como
parâmetro o poder de compra e consumo.
A partir disso, conclui-se que ocupar os espaços públicos da cidade além de uma
necessidade, torna-se também um ato político. Marcelo Cafrune afirma que:

As cidades brasileiras passaram a vivenciar manifestações por direitos que


têm sido protagonizadas por atores que possuem uma forma de organização
mais difusa do que os protestos e manifestações tradicionais, dentre os quais
se destacam: os comitês populares da copa; as jornadas de junho; o
movimento Ocupe Estelita; e os rolezinhos nos shoppings. Essas expressões
de luta urbana são representativas do período e compartilham entre si a
perspectiva do direito à cidade como direito de viver, usar e produzir o
espaço urbano. (CAFRUNE, 2016, p. 196)

______________________________
¹ De acordo com os artigos 39º e 40º do Estatuto da Cidade, o plano diretor é “o instrumento básico da
política de desenvolvimento e expansão urbana”.

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Cidade Descoberta² é um filme que parte de experiências de mulheres na cidade de Natal
proporcionadas através do skate, enquanto permeia a vontade de ocupar os espaços públicos
de uma maneira menos convencional, com olhar mais atento, mais afetivo aos detalhes da
cidade, utilizando assim o meio urbano como uma ferramenta de diversão.

Além disso, trata-se também de segurança pública nas ruas da cidade, de como
transitar em meio às pessoas e através do skate que nos proporciona a sensação de estarmos
mais protegidas. Janes Jacobs conceituou esse fenômeno de “balé das calçadas” e ao
explicá-lo, a autora diz:

Sob a aparente desordem da cidade tradicional, existe, nos lugares em que


ela funciona a contento, uma ordem surpreendente que garante a manutenção
da segurança e a liberdade. É uma ordem complexa. Sua essência é a
complexidade do uso das calçadas, que traz consigo uma sucessão
permanente de olhos. Essa ordem compõe-se de movimento e mudança, e,
embora se trate de vida, não de arte, podemos chamá-la, na fantasia, de
forma artística da cidade e compará-la à dança – não a uma dança mecânica,
com os figurantes erguendo a perna ao mesmo tempo, rodopiando em
sincronia, curvando-se juntos, mas a um balé complexo, em que cada
indivíduo e os grupos têm todos papéis distintos, que por milagre se
reforçam mutuamente e compõem um todo ordenado. O balé da boa calçada
urbana nunca se repete em outro lugar, e em qualquer lugar está sempre
repleto de novas improvisações. (JACOBS, 1961, pág. 43).

O skate trazido em Cidade Descoberta não se trata do skate olímpico, do esporte de


alta performance e de quantas pessoas você pode superar com manobras elaboradas. Pelo
contrário, trata-se de um skate despreocupado, com intenção de sentir a brisa no rosto
tranquilamente, de compartilhar experiências com as pessoas conhecidas que dividem a
sessão com você e cruzar o caminho com pessoas desconhecidas sem esperar algo do que
pode surgir disso, o skate de Cidade Descoberta é sobre estar aberta ao encontro e ao acaso.

No próximo capítulo abordarei o tema das mulheres na cena do skate, comentando


sobre coletivos femininos e filmes, em seguida sobre documentário em primeira pessoa e
depois sobre os processos de feitura de Cidade Descoberta até sua distribuição.

____________________________
² Link para acesso ao filme: https://vimeo.com/508073414

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2 . MULHERES NA CENA DE SKATE

Em 2020, a partir da necessidade de articulação entre si, as mulheres do skate em


Natal e cidades adjacentes, criaram o coletivo ‘Respeita as Minas’. Basta apenas um encontro
do grupo para perceber as questões de gênero que atravessam as integrantes. O número de
crianças (que não necessariamente estão praticando skate) chega a ser metade do número de
adultos presentes numa sessão se, obviamente, todos os adultos ali presentes forem mulheres.
A partir disso percebe-se o senso de coletividade que é despertado no grupo, todas viram
olhos atentos às crianças, principalmente enquanto a mãe está no drop ou tentando alguma
manobra. A disparidade entre maternidade e paternidade, que é evidente na sociedade de
modo geral, reflete-se também na cena do skate, visto que, o número de crianças no espaço é
bem menor quando não há mulheres na pista.
Outra questão que é cotidiana no coletivo é sobre a permissão por parte dos familiares
de algumas integrantes do grupo para sair de casa e ir para as ruas. Que muitas vezes é negada
sob o argumento de que a rua é mais perigosa para as mulheres. De fato. Em entrevista para o
jornal New York Times, funcionários do Bryant Park, em Nova Iorque, concluíram que a
melhor maneira de indicar a segurança do parque, era medir a quantidade de mulheres que o
frequentavam. No final dos anos 1970, a porcentagem de homens no parque era de 70 a 80%,
o que indicava que as mulheres não se sentiam seguras ali.
Para Connell (1995) falar das estruturas das relações de gênero significa enfatizar algo
além das interações entre homens e mulheres, significa o reconhecimento do gênero
como uma estrutura ampla, que engloba a economia, o estado, a família, entre outras

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instâncias. E pode ser justamente no skate que encontra-se o exercício de liberdade feminina
que é estruturalmente podada às mulheres.
A cena do skate é historicamente ocupada em sua maioria por homens, aspecto que
vem tomando novos contornos com a presença de mais mulheres que o praticam. O registro
documental de mulheres skatistas incentiva outras mulheres que têm interesse em andar de
skate. Afinal, se um indivíduo é socializado num sistema patriarcal o qual insiste em
reproduzir discursos de que ele não é capaz de algo por uma determinada característica social,
como gênero, esse indivíduo provavelmente tomará esse discurso como uma verdade. Por
isso, é necessário desconstruir esse imaginário coletivo tóxico, e uma das ferramentas
utilizada por esse filme é a representatividade das mulheres no skate, em busca de reconstruir
uma nova subjetividade.
Esse projeto parte também de minhas experiências pessoais, embora ande de skate
desde os 13 anos de idade e consuma conteúdo audiovisual voltado ao skate desde então, foi
por volta dos 19 anos que me senti realmente representada neste lugar através do filme That
One Day (Crystal Moselle, 2016). A obra trata o cenário do skate feminino de Nova Iorque e
traz questões de gênero como machismo na cena, assim como a articulação e empoderamento
entre as mulheres. Ao ver outra pessoa vivendo o mesmo problema que eu vivia, e a mesma
dor que eu sentia, caí no choro, percebi então que não estava só. Lembro de estar com mais
três homens durante o filme, e enquanto eu estava aos prantos, eles comentavam sobre o filme
ser ruim por não ter manobras muito elaboradas. Alguns anos mais tarde, em 2019, outro
filme que se tornou inspiração sobre skate feminino foi Rema e Grita, produzido por Luiza
Giácomo durante a comemoração de 2 anos do coletivo Britney's Crew.

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Figura 1: Crianças do coletivo de skate feminino potiguar Respeita as Minas

Figura 2: That One Day (2016)

14
Figura 3: Rema e Grita (2018)

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3. DOCUMENTÁRIO EM PRIMEIRA PESSOA

O gênero documentário foi adotado para o desenvolvimento da obra pela escolha de


registrar de maneira espontânea e não-ficcional nossas vivências com o skate na cidade.
Embora ainda trata-se de uma representação da realidade e não da realidade em si, por haver
câmeras, direcionamentos, escolhas de planos, edição e etc. Por isso, o registro documental
realizado no filme não trata-se de uma observação imparcial da realidade, muito pelo
contrário, Cidade Descoberta é uma obra documental completamente parcial e subjetiva.
Para guiar a narrativa do filme, utilizamos perguntas a respeito do tema, uma
ferramenta comum do documentário. As respostas às perguntas, narradas através de nossas
próprias vozes (Quando você começou a andar de skate? Como o skate chegou até você? O
que é skate para você?) introduziram o espectador ao nosso universo. De acordo com Nichols,
a entrevista representa uma das formas mais comuns de encontro entre o cineasta e o tema
(Nichols, 2005, p.159).
O curta é protagonizado pelas próprias diretoras, tornando a obra um documentário em
primeira pessoa, para Roberta Veiga, neste tipo de documentário “o sujeito a experimenta
como constituinte da condição de cineasta e personagem de si.” (2016, p. 45) Apesar de o
tema geral do filme ser sobre mulheres que andam de skate na cidade de Natal, não queremos
impor que todas as mulheres aqui vivam o skate da mesma maneira que nós, com o mesmo
nível técnico, com o mesmo olhar, com o mesmo corpo. Embora façamos parte de um mesmo
grupo minoritário, existem particularidades em cada uma de nós, que destacamos e
celebramos. É esse olhar subjetivo sobre o tema, que torna Cidade Descoberta uma obra
autorreferencial. Para Nichols, “a característica referencial do documentário, que atesta sua
função de janela aberta para o mundo, dá lugar a uma característica expressiva, que afirma a
perspectiva extremamente situada, concreta e nitidamente pessoal de sujeitos específicos,
incluído o cineasta” (2005, p.170).

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4. OBJETIVOS

O objetivo geral do projeto foi de criar um curta-documental sobre skate feminino na


cena de Natal de maneira pessoal.
Os objetivos específicos foram mostrar o skate como uma ferramenta de ocupação dos
espaços públicos, abordando na prática o direito à cidade. Além disso, também trazer à tona o
recorte de gênero tanto dentro da cena do skate como na segurança pública.

5. PRÉ-PRODUÇÃO

Já era da minha vontade e de Julia Donati produzirmos um curta juntas. Eu graduanda


em Audiovisual e ela artista visual e pós-graduanda em Documentário, nós duas nos
encontrávamos para andar de skate enquanto almejávamos filmar algo sobre nossas vivências
naqueles espaços. Em 2020, após a publicação do edital Poti Cultural do Sesc RN, eu escrevi
o roteiro, o projeto e, depois de pronto, perguntei para Julia se ela aceitava ser filmada por
mim enquanto andava de skate e desenhava nos espaços públicos da Cidade de Natal. Julia
aceitou a proposta e pouco depois o projeto foi aprovado.
No primeiro tratamento do roteiro, o filme chamava-se Ela Vai Também, pois
inicialmente o projeto foi pensado e justificado dentro do recorte de gênero no universo do
skate, referindo-se que, além dos homens, “ela” também vai andar de skate. Durante o
período de produção, o título foi substituído por Cidade Descoberta, embora o recorte de
gênero ainda estivesse fortemente presente, visto que o filme foi completamente produzido
por mulheres, nas gravações o nosso olhar estava muito mais atento à cidade do que a nós
mesmas, de maneira que nos sentimos descobrindo pela primeira vez uma cidade que já
conhecíamos há anos.

5.1 EDITAL

A escrita do roteiro e do projeto para o edital foi simples, realizada em apenas um dia,
por não se tratar de um edital muito complexo. O edital se dividiu em: título, apresentação,
justificativa, objetivos, release e metodologia.
O envio do projeto foi no dia 20 de Outubro de 2020 e o início da pré-produção,
juntamente com o Sesc, foi dia 23 de Novembro do mesmo ano. O prazo estabelecido para

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todo o processo, da pré-produção até a pós-produção, foi de 30 dias. Por se tratar de um
orçamento baixo e um prazo curto, o roteiro do filme foi extremamente simples, visando a
execução do produto dentro das possibilidades proporcionadas.
O orçamento do edital, dentro da categoria Audiovisual, foi de R$1.000. Contudo, há
um desconto de 16% (5% ISS e 11% INSS) para pessoa física, que foi o meu caso,
totalizando R$840,00. Devido ao baixíssimo orçamento, nós duas decidimos dividir o valor
por 2 e a partir dali cada uma custeava seu deslocamento e alimentação. Além disso, o
orçamento só foi depositado após a entrega do produto.
A divisão da equipe foi também extremamente simples, eu filmaria e editaria o filme e
Julia seria a personagem.

5.2 ROTEIRO

O roteiro inicial foi curto e simples, baseado apenas em duas locações diferentes: a
Praça do Disco Voador e o Presépio de Natal. O roteiro foi pensado em enfatizar espaços
públicos que inicialmente não foram projetados ou pensados para a prática do skate pelo
poder público, mas que foi ocupado pela cena local e ali construído obstáculos pelos próprios
skatistas, tornando-se os principais pólos da prática na cidade. A ênfase tratava-se da
interação da personagem com o lugar, contudo, após aprovação do projeto no edital, ainda no
período de pré-produção, a primeira locação fechou para reforma, com isso, foi necessário
uma readequação no roteiro, já que os espaços escolhidos eram fundamentalmente importante
para a realização do filme. Com isso, trocou-se a Praça do Disco Voador pelas ruas dos
bairros de Nova Parnamirim e da Cidade Alta, incluindo o mirante da Igreja do Rosário
Nossa Senhora dos Pretos e a Pedra do Rosário.

6. PRODUÇÃO

Durante uma passagem por São Paulo em 2019, tive a oportunidade de andar de skate
com as meninas do coletivo de skate feminino Britneys Crew. A cidade estava sediando o
Street League Skateboarding, o que reuniu garotas skatistas de diversos lugares do mundo.
Nesse período pude me conectar com algumas meninas do coletivo que, no ano seguinte,
vieram para a minha casa em Natal, coincidentemente durante as duas últimas diárias do

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filme, e assim participaram em uma parte das gravações. Luciana Barreto e Sabrina Duarte
operaram câmera em alguns momentos nas locações da Via Costeira e Cidade Alta.
Enquanto estávamos no processo de produção, eu e Julia continuamos conversando e
mantendo aberto o diálogo sobre a construção do filme de acordo com as experiências que
estávamos vivendo naquele momento com o skate dentro da cidade. Um dos pontos que nós
abordamos nesses diálogos foi o direito à cidade. Para David Harvey, o direito à cidade é o
direito de transformá-las em algo radicalmente diferente: o de participar dos processos de
transformação das cidades que normalmente são construídas segundo os interesses do capital
em detrimento das pessoas. A luta pelo direito à cidade é uma luta contra o capital. E para
nós, através do skate, conseguimos vivenciar e (re)descobrir uma nova cidade, a mesma
cidade que moramos durante a vida inteira agora ganha um novo olhar, um novo sentido, vira
um parque de diversões em lugares cotidianos e solo fértil para a criatividade.
A partir desse processo e desses insights, o filme que inicialmente foi pensado em Ela
Vai Também por se tratar de um recorte de gênero dentro de uma prática majoritariamente
masculina, torna-se então Cidade Descoberta. Na primeira diária de gravação, Julia me
filmou andando de skate na locação, a partir de momentos descontraídos como esse,
decidimos que Julia não seria mais apenas um personagem, mas também videomaker e
diretora do filme. E eu, não apenas mais diretora e videomaker, mas também personagem.
Cidade Descoberta é um filme em aberto que se reinventa durante sua feitura.
As diárias de gravações foram divididas em 4, cada dia em uma locação diferente. A
primeira foi pelas ruas do bairro de Nova Parnamirim, em que foi basicamente um teste com a
action cam, somente eu e Julia, uma filmando a outra enquanto andávamos de skate pelo
bairro. Na segunda diária fomos, também somente eu e Julia, para o presépio de Natal, lugar
arquitetado por Oscar Niemeyer e que com o passar dos anos foi completamente ocupado
pela cena do skate, obstáculos foram construídos pelos próprios skatistas no local e
diariamente é possível encontrar pessoas praticando ali. Na terceira diária, as meninas de São
Paulo já haviam chegado em Natal, então participaram da filmagem na Via Costeira e, na
última diária, no Bairro da Cidade Alta.
Com a mudança no roteiro e nas personagens, adotamos um estilo de filmagem livre,
algo sem ações pré definidas.
Queríamos de fato registrar as nossas vivências espontaneamente, como acontece
quando estamos juntas andando de skate sem a presença de uma câmera.

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Figura 4: Fotografia still Cidade Descoberta

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Figura 5: Fotografia still Cidade Descoberta

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Figura 6: Fotografia still Cidade Descoberta

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Figura 7: Fotografia still Cidade Descoberta

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Figura 8: Fotografia still Cidade Descoberta

6.1 EQUIPAMENTOS

Ainda sem equipamento próprio durante o período das gravações, pedi a um amigo,
Arthuri, sua câmera emprestada, uma Canon T3i com lente do kit, 18-55mm. Além disso,
Henrique Harrop (Lee Boards) me emprestou um estabilizador de mão escorpião, comumente
utilizado em gravações de vídeos de skate. Gravamos toda a primeira diária, no Presépio de
Natal, com a câmera de Arthuri. Ao chegar em casa e decupar o material, percebemos que
havia um fungo no sensor da câmera, que inclusive aparece no início do filme. Com isso,
decidimos utilizar a câmera de Julia, uma Canon T5, também com lente 18-55mm. Além das
duas câmeras principais, também utilizamos duas câmeras auxiliares, uma action cam,
também de Julia, e uma handcam trazida por Luciana. As imagens gravadas pela handcam
aparecem no momento em que Julia narra sua poesia, aos 4 minutos e 3 segundos.
Para a narração, utilizamos o gravador do meu celular (Galaxy J7) com microfone do
fone de ouvido.

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7. PÓS-PRODUÇÃO

Durante o processo de pós-produção, realizado em dois dias, Julia sentiu necessidade


de inserir uma narração num formato parecido com entrevista, utilizando perguntas guias
como “o que é o skate para você” e “como e quando você começou a andar de skate”. Os
poemas que são apresentados durante o filme já estavam escritos, então nos juntamos para
gravar as vozes, que foram gravadas em nossos celulares. Após as gravações dos áudios, que
foram feitas no quintal da minha casa, Julia montou o filme com base nessas gravações. O
software utilizado durante todo o processo de pós foi o Adobe Premiere, tanto para montagem
quanto para coloração do filme. Ao falar sobre essa parte de edição, Julia definiu como uma
grande junção do que foi gravado espontaneamente durante os dias de produção e que o prazo
de entrega para o edital pesou muito no processo criativo, trazendo um resultado inferior ao
que ainda poderia vir a ser explorado, assim como também para as filmagens. Além disso,
Julia também disse que o computador dela não funcionava bem, não suportava o Premiere
com excelência, travava constantemente e para assistir o filme enquanto o editava, foi
necessário abrir o projeto em outra máquina inúmeras vezes.
Na dinâmica da montagem, após as imagens e músicas aceleradas, Julia trouxe uma
pausa como um respiro do ritmo frenético, que remete exatamente à maneira como
enxergamos a cidade, devagar em meio a correria.

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7.1 TRILHA SONORA

A proposta dentro do projeto enviado para o edital do Sesc foi de que dentro da trilha
sonora, houvesse compositoras mulheres do Rio Grande do Norte. Com isso, solicitamos ao
projeto Blue&Red (Brisa Fernandes e Elisa Bacche) duas músicas para composição da trilha
sonora do filme. As músicas escolhidas por Julia foram Mãe Natureza e Tribal Seeds. Além
de compor parte da trilha sonora do filme, no dia da primeira exibição presencial no Embarco
Cultural, Brisa discotecou no evento com seu projeto solo, B-Waves.

Figura 9: Cartaz feito por Julia Donati para estreia presencial de Cidade Descoberta

8. DISTRIBUIÇÃO

A primeira exibição do Cidade Descoberta foi no canal do YouTube do próprio Sesc


RN, onde o filme encontra-se disponível para acesso. Após a estreia, foi realizado um bate

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papo³ com a direção do filme. Durante a conversa nós falamos sobre todo o processo de
construção da obra, desafios e possíveis futuros projetos.
Quando começamos a pensar em exibir o filme em festivais, o Movimento Cidade no
Espírito Santo (que se denomina como Movimento Cultural de causa criativa urbana)
(https://www.instagram.com/p/CRZsaUBLZcE/)
(https://www.instagram.com/p/CRUsJovDoWR/) foi o festival que nós mais desejávamos
participar, por ter uma proposta muito parecida a do nosso filme e por enxergarmos a
importância de ocupar os espaços públicos de maneira parecida. E deu certo. Fomos para a
mostra competitiva do Movimento Cidade no Espírito Santo em 2021. Nós ficamos
extremamente felizes em compor a programação junto de outros artistas que nós admiramos
como Luedji Luna e Marina Sena.
No mesmo ano, Julia inscreveu o filme para a Mostra de Cinema de Gostoso, em São
Miguel do Gostoso, no Rio Grande do Norte. Recebemos um feedback maravilhoso da
curadoria, que nos explicou que devido à pandemia, a Mostra de Gostoso teve a programação
reduzida, mas parte da equipe de curadoria do festival também era da curadoria do Festival de
Brasília do Cinema Brasileiro, o mais antigo do gênero no país, e então fomos convidadas a
compor o catálogo do Festivalzinho, a mostra dentro do festival voltada ao público juvenil. O
festival foi online e foi promovido um debate com estudantes da rede pública de Manaus,
onde falei sobre o processo de produção do filme e respondi perguntas curiosas dos
adolescentes.

8.1 CARTAZES
Após aprovação no primeiro Festival, Julia, que também é ilustradora e designer, deu
início ao processo de feitura dos cartazes do filme. As artes foram criadas a partir das
fotografias still feitas durante as filmagens. O conceito que pensamos inicialmente era de que
a fonte dos cartazes fosse algo descontraído, não muito rígido, que ilustrasse a linguagem e
ritmo do filme. Com isso, nenhuma fonte já criada que nós conhecíamos e pesquisamos
encaixou nessa ideia, então Julia desenhou a fonte para o filme num Ipad através do programa
procreate e desenvolveu os cartazes no Photoshop.

____________________________
³ Link para acesso ao bate papo: https://www.youtube.com/live/_T2ub84ERtI?feature=share

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Figura 10: Cartaz divulgação

28
Figura 11: Cartaz divulgação

29
Figura 12: Cartaz divulgação

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Figura 13: Festival MOV (2021)

9. CRONOGRAMA

ATIVIDADE Outubro Novembro Dezembro Janeiro Dezembro Fev/Junho Junho


(2020) (2020) (2020) (2021) 2021 (2023) (2023)

PRÉ-PRODUÇ X X
ÃO

FILMAGEM X
EDIÇÃO X
ESTREIA X
ONLINE

ESTREIA X
PRESENCIAL

ESCRITA X
RELATÓRIO

DEFESA X
BANCA

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10. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o isolamento social, todo o meu trabalho passou a ser remoto. 8 horas por dia
diante do computador e o resto entre as paredes da casa. Eu, diagnosticada até então com
bipolaridade, ainda não fazia uso de medicações. Conseguia fazer a manutenção da minha
saúde mental com exercícios, ciclo social, banho de sol, etc. Durante esse período tranquei o
curso por dois semestres, para aliviar a minha carga de trabalho. Após assumir novamente a
faculdade, não demorou muito para que meus sintomas depressivos e ansiosos tomassem
conta da minha saúde. Precisei ser afastada do trabalho com diagnóstico de burnout, uma
internação e medicamentos que nunca imaginei precisar tomar um dia. Todo esse processo me
levou a uma demora na entrega deste relatório, custando os anos de 2021 e 2022. O que me
fez pensar sobre a métrica do tempo e não conseguir ver uma balança equilibrada quando se
compara o tempo de produtividade acadêmica de um estudante que não necessita trabalhar
enquanto estuda e o estudante que tem uma jornada de 8 horas por dia, para então poder
dedicar-se à graduação.
Entender que cada pessoa em cada classe social e contexto familiar tem um tempo
diferente na corrida da produtividade me fez tirar um pouco o peso que sobrecarregava ainda
mais essa mochila. Mas não basta entender isso sozinha, o sistema não depende só de mim,
não sou eu quem dita as regras do jogo. Por isso é tão importante ter pessoas que sabem que
estão lidando com pessoas, e de maneira humanizada, dentro dessa engrenagem esmagadora.
A compreensão do meu orientador Rodrigo foi fundamental para que eu conseguisse concluir
esse ciclo da minha vida dentro de um tempo respeitoso e saudável.
Além disso, poder andar de skate, poder estar entre mulheres, poder viver a cidade da
maneira que realmente faz sentido para mim são alicerces que me trazem à manutenção dessa
saúde mental, que comentei ter sido perdida com o isolamento social. O que desejo agora é
que cada vez mais mulheres tenham direito à sua própria liberdade na rua, no esporte que
desejar fazer, na cidade que desejar viver, sem medo e sem amarras. Axé.

32
9. REFERÊNCIAS

RAVO, Nick. Bryant Park Journal; After 3 Years, Park Awaits a Wary Public. The New York
Times, Nova Iorque, 13/06/1991. Seção B, página 3. Disponível em:
https://www.nytimes.com/1991/06/13/nyregion/bryant-park-journal-after-3-years-a-park-awai
ts-a-wary-public.html?unlocked_article_code=BCxAOVPzI1Wn2rkl5NcwOvF3cO0zMEOtju
J7YHPpRBYDjBk9bUHyqu1WLK1UD42H58u-kPbEt8z005fzcW7KxK4QokysWlvFp0RB
HJ7sKbG36gVguHwHqIuEycxSOdjiC3OGJHNNm4tHi1cFGvVZDgGNfXHdYMtKEOG3IJ
meKx-iDuYRWcvCum5a0IKwIq8CiQ-Vk5lYqOTEM1MTiv6Tc6Oq3JyEAYdCxNcNsfO__a
bmZ5nrqoLf-YHsPN2bgHd0kptlaa113BDDUllPdzf5feONJi3j5er9g5uzagRew_jywe1DXlLz
qn_nyOEKc8DpHPMCRnPtrc1avQXPpZHdiRIB0Fd2nlvQQ8dP2y4PWQgBlBQ1AXt0-Pq6
j3sFqnNfu7QqNB-1Bos&smid=tel-share. Acesso em: 20 jun. 2023.

NICHOLS, BILL. Introdução ao documentário. Campinas: Papirus, 2005.

Cafrune, Marcelo. O direito à cidade no Brasil: construção teórica, reivindicação e exercício


de direitos. Bauru, jan./jun., 2016. Disponível em:
<https://www3.faac.unesp.br/ridh/index.php/ridh/article/download/325/169>. Acesso em: 22
jun. 2023.

JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades / Jane Jacobs. – 2 ed. – São Paulo: Editora
WMF Martins Fontes, 2014.

CONNELL, R. W. 1995. Masculinities: Knowledge, power and social change. Berkeley/Los


Angeles: University of California Press.

VEIGA, Roberta. Autobiografia “não-autorizada”: por uma experiência limiar no


documentário na primeira pessoa. Belo Horizonte, mar., 2016. Disponível em:
<https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/37971/2/robertaAutobiografiaNao.pdf>. Acesso
em: 29 jun. 2023.

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ANEXO I. ROTEIRO

ELA VAI TAMBÉM


De Vivian Moura

SINOPSE
Algo inédito está acontecendo na Cidade do Sol, a cena de
skate feminino de Natal ganha um volume numeroso. Diversas
mulheres estão se juntando, respeitando as normas de
biossegurança, para praticar o skate. No meio delas há Julia,
uma pintora e skatista que transpira arte em todas as suas
experiências, inclusive na forma como vê a cidade.

Cena 1 - EXT - Praça do Disco Voador - Dia

Julia chega para andar de skate na Praça, cumprimenta algumas


meninas ali presentes que também estão praticando. Ela faz
algumas manobras, mas a diversão e o contato com a praça é
muito mais importante do que qualquer outra coisa.
Ela para pra descansar, observa o mundo ao seu redor, as
pessoas, as árvores, os pássaros e então tira o seu caderno da
mochila para desenhar.

Cena 2 - EXT - Presépio de Natal (papódromo) - Dia

Julia observa a obra arquitetônica de Oscar Niemeyer e começa


a interagir com ela através do skate, sorri e se diverte
praticando o esporte num plano fotográfico aberto, onde Julia
está andando de skate no chão e ao fundo, enorme, está a obra
de Niemeyer. Então ela se senta e começa a escrever uma poesia
sobre a sua interação com a cidade, no áudio (em voz off)
ouve-se julia recitá-la:

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“Incessante e ao mesmo tempo efêmera, a vida na cidade não
para. Enquanto também não se repete. Cenas que acontecem todos
os dias e ainda assim nunca são as mesmas. Caminhos se cruzam
no sinal aberto, e mantém seguro quem precisa correr só. Afeto
no trajeto.”

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