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| ALLAN KARDEC
Relutação ao Livro dos
Espiritos, seguida dos |

| Dislates de Léon Denis


| e das

Cincadas de Flammarion
POR

JUSTINO MENDES |
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| SEGUNDA EDIÇÃO j |

| RA
1921
A. CAMPOS s EDITOR

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NO YOUTUBE NT]
Relutação ao Livro dos
Espiritos, seguida dos
Dislates de Léon Denis
e das
Cincadas de Flammari
on
POR
JUSTINO MENDES
CCC

SEGUNDA EDIÇÃO

a |

1921 |
A. CAMPOS :: EDITOR
LIVRARIA CATHOLICA
“SÃO PAULO
OCIDOÇ
MEDEIID EC DOCDOCDO CIO CIDO am
QMEDOCDO

OBRAS DE JUSTINO MENDES


é venda na
Livraria Catholica Editora
Caixa Postal No. 1089 — SÃO PAULO

Ben Josias, o Banilido, romance |


dos tempos de Jesus Christo . 3$000
Só no Mundo, romance da epocha
dos Hollandezes na Bahia . 2$000 |
Lagrimas e Sorrisos, romance . 2$500
Dez Contos, romance sertanejo |
contra o espiritismo
É Cinco breves Sermões: Resurrei-
À
ção, Assumpção, Perfeição Di-
vina, S. Sebastião, os Martyres 1$500
| Sermões avulsas: O Amor Divino,
|
O Acaso, A Fé. Cada, opusculo $500
Lyra das Selvas, collecção de
poesias
Rudimentos de Philosophia . . 1$000
Renan e a sua «Vida de Jesus”
$500
Por
sou q
Catu
hole
ico? . .... $30
Tolices de Allan Rardec, refuta-
São do espiritismo . .... 24000
Approvação
Innumeras são as publicações que nestes
ultimos tempos se teêm feito, para refutar e
combater os erros, os absurdos e as contradic:
ções da infernal seita do espiritismo; seita tão
antiga, como antiga é a humanidade, pois que
as apparições, as manifestações, as revelações,
os ensinamentos e tudo quanto de maravilhoso
o hodierno espiritismo apresenta, não passa da
execução do plano de batalha que no Eden ini-
ciou o genio do mal contra o homem. |
Era mister não só com o bisturi da logica
dissecar esse cadaver, precisava-se de uma pu-
blicação, que não somente desmascarasse o que
de ridiculo ha no espiritismo, mas tambem me-
diante os principios philosophicos e theologicos,
e a genuina interpretação dos textos das SS. Es-
cripturas, que os mestres da impia sexta inter-
pretam a seu falante, refutasse tão monstruo-.
sos absurdos e tão falsas interpretações.
Incumbiu-se dessa benefica tarefa um :il-
lustre sacerdote desta Nossa Diocese na pre-
sente publicação — Tolices de Allan Kardec—
“sob o pseudonymo de Justino Mendes. |
Dando-lhe mil parabens por ter levado a
bom termo o seu magnifico trabalho, muito
folgamos em approval-o, permittindo que o dé
á publicidade pela imprensa,
Uberaba, 31 de Março de 1920.

+ Eduardo, Bispo de Uberaba.


Ms Trabalhos contra O Epil
á venda na |

Livraria Catholica Editora


Caixa Postal No. 1089 i—: SÃO PAULO

Es priano e Maçonaria, pelo Padre Bento


S. J. Vade-mecum de allicaz anti-
J. Rodriguos, |
doto anti-spirita e anti-maçonico. O melhor trabalho
que temos em portuguez, contra essas perniciosas
seitas. Vol. in 40, papel assetinado, 400 paginas.
Brochado 5$000, Encadernado 7$000
Catecismo anti-Espirita, ou: por outra. O
obstinado espirita amarrado ao pelourinho. Modesta |
tentativa do Padre Bento J. Rodrigues, S. ).
Vol. in 8.0, 400 paginas. Brochado 3$000, Encader- :
nado 5$000
Ao Rei dos Morcegos, pelo Padre Zefe-
rino de Abreu. — Nova edição augmentada |
d'este interessante trabalho contra as explorações
diabolicas do espiritismo. Vol. in 4.0 de 130 paginas,
com illustrações 55000
Espiritismo (O). Um maravilhoso que não é
divino, por D. Francisco de Cunha e Silva.
Opusculo de 135 paginas º -1$500
Espiritismo (O), por A. Jeanniard du Dot.
Este volume demonstra peremptoriamente a realidade
dos factos espiritas e o seu caracter extra-natural,
presenta com toda evidencia que o regente unico
as manifestações espiritos é o demonio. Opusculo
de 95 paginas 1$000
Espiritismo (O). Verdades que convem saber
pelo Dr. Clementino Contente. Opusculo de 100
| pagmas 1$000
| Espiritismo (0). Pastoral collecti .
pado do Norte. Opusculo de 102 nela ni ice
Diversos folhetos e avulsos para
contra o Espiritismo. Boys descualoa em Da
para propaganda. Pedidos a A. CAMPOS, S. PAULO
ac iii
PERRRM E
DO
O

|
O grande argumento
Amaveis leitores, por ventura falaram já
algumas vezes com as almas?
Oh, por favor, não:se formalizem! Não é
caso d'isso. Sim, entendo: acham que é uma
loucura, e querem Oizer que não estão para
«graças, etc. etc.
Pois fiquem sabendo que já houve quem
imprimisse um livro inteirinho com os mirifi-
cos dialogos que affirma terem sido travados
com as almas. Elle mesmo é quem o diz. No
frontispicio de seu livro, lê-se bem claro este
titulo impagavel: O LIVRO DOS ESPIRITOS se-
gundo o ensino dado por espiritos superiores.
— Ora esta!.. Sim snr.!.. E quem Seria es-
se doido? |
— Vou dizer-lh'o, leitores. E' o illmo:*snr.
Allan Kardec, O principal compilador da QOdou-
trina espirita depois do seu apparecimento, e
o mais conspicuo representante da seita.
Este homem, sem vontade, de certo, de
quebrar a cabeça a estudar o problema reli-
gioso, no qual pelo visto, elle pouco pescava,
achou muito mais simples intfervistar as almas,
"do outro mundo, como hoje se diz, e fazel-as
escarrar tudo timtim por timtim, sem precisar.
elle mesmo de grandes estudos nem estafan-
6 TOLICES DE ALLAM KARDEC
a

tes matutações. Era um pouquinho mais com-


modo; não acham?
— Pois sim. (Nas seriam mesmo as almas
que conversaram com o homem?
— Ora, então? Os senhores ousariam Ou-
vidar? Não está alli escripto com todas as let-
tras: segundo o ensino dado por espiritos?
— Sim.:. mas... é que...
— Ai ai, temos duvida! Vamos lá; fóra com
ella!
— E' que os espiritos não teêm corpo, não
téem cara... -
— Pois Kardec tem cara para os apresen-
tar...
— E como pó0e elle conhecel-os?
— Conhece-os. E' até intimo d'elles.
— Mas quem é que garante a personali-
dade desses senhores espiritos? |
— Quem garante? Ah! isso agora é que
eu não sei. Perguntem-no ao sr. Allan Kardec.
Elle que se deliciou longamente nas palestras
com os seus amigos os espiritos, deve saber
o que diz; e os senhores são quatro vezes
mais incredulos do que S. Thomé, se não o acre.
ditam sob palavra. Olhem: Santo Agostinho,
está as ordens do nosso autor. E' as vezes
que quizer, sem receio de incommodar. Platão
e Socrates, são os seus criadinhos familiares-
é só dar dois trincos com os dedos e elles ahi
estão, como cachorrinhos bem ensinados. O
grande Fénelon não tem mais que fazer lá no
outro mundo do que vir dar palestra ao nos-
£0 presado Allan Kardec. Emfim, toda a cas-
ta de sabios do além está sempre á disposi-
ção do nosso preclaro autor... Está-me a pal-
pitar que os senhores querem duvidar... Se=
TOLICES DE ALLAN KARDEC
— am o mm
7

nhor! pois quando os leitores charfam os seus


gatinhos, elles não acodem logo miando? Pois
é a mesma coisa!
Antes, porém, de nos servir as prosas fia-
das dos espiritos, o autor nos apresenta, nu-
ma longa Introducção de 60 paginas, as suas
proprias idéas. E' o principio do repasto; uma
terrina bem cheia afim de preparar o estoma-
go a digerir o resto (que acreditem, leitores,
ás vezes é bem indigesto). E, nessa parte do
livro, pretende estabelecer as bases do espiri-
tismo, que é no que veem a dar os taes en-
sinamentos do outro mundo.
“Queiram os benevolos leitores acompa-
mhar-me um pouco nos exames 0Oos pontos
principaes: dessa Introducção e do espiritismo
em geral. Prometto não ser muito massante.
E para começar:
Um dos pontos fundamentaes do espiritis-
mo é que as almas dos mortos se vêem com-
municar comnosco, falando ou escrevendo, por
meio de pessõas privilegiadas, chamadas me-
diums.
Ora bem: um ponto furfdamental da reli-
gião que se preze, que pretenda ser a verda-
deira, deve ser firme, inabalavel, inconstrata-
vel. D'alli é que se devem tirar todas as con-
sequencias; e se esse esteio não está bem fir-
me, toda a construcção vacilla e cáe. .
E' justamente o que se dá no espiritismo,
queira ou não queira o sr. Allan Kardec. Ve-
jamos, senão:
— Como é que sabe, sr. Kardec, que o es-
pirito que se lhe communica é a alma de seu
bisavô, e não a de Chico Pedro ou outro es:
pirito qualquer?
8 e
TOLICES DE ALLAN KARDEC as
a us o uid
us gg mi o A o e o dis o o a a + —-. ..— e - es. mas

— Porque elle o diz.


— Bonita prova! Não sabia que bastava
que eu Oissesse: Sou o rel da Ingraterra —
para todos me acreditarem sob palavra. Sendo
assim é muito facil obter credito. Um gatuno,
occulto atraz de uma porta, de gazúa em pu-
nho, á pergunta: — Quem é você? — póde res-
ponôder muito ancho: — Sou um homem de bem,
um honesto cidadão. — Só com isto deve ser
acreditado. Francamente, não sabia!
Mas Kardec não embucha por tão pouco.
— Alto lá — nos diz elle. — Alto lá. Sei que
ha espiritos sérios e espiritos zombeteiros. E.
é verdade que estes ultimos podem enganar:
impellem-nos para o mal, acham prazer ao
ver-nos succumbir e identificarmo-nos com el-
les (pg. XXV); muitas vezes adoptam nomes
venerados para melhor nos levarem ao erro.
Mas é preciso notar que a distincção entre os.
bons e máus espiritos é muito facil (pg. XXVI).
— Bh, ah! leitores! Vejam como o caso se
complica! Então, por confissão dos proprios.
espiritas, ha espiritos bons e maus, e é pre-
ciso Oistinguil-os? Muito bem. Mas se aqui no
mundo é tão custoso saber se quem nos fala
nos ôOiz a verdade ou nos está pregando lóro-
tas, quanto mais no outro! Aqui ainda vemos
a cara, O gésto do sujeifo; coisas que podem
nos abrir os olhos e fazer alguma luz. E alli?
O espirito não tem cara. Serve-se da cara e
do gésto do medium, quasi sempre bem trans»
tornado: quer dizer que tanto mais facilmente
nos pode impingir gato por lebre. Não, não
snr. Kardec. Este negocio não está bom. Que-.
remos coisa mais clara!
TOLICES DE ALLAN KARDEC 9
— - is e— ma + mem .— e

— Pois ahi vae, nos responde o inclito


coryvpheu do espiritismo. Disse-vos que a dis-
fincção entre os bons e maus espiritos é mui-
to facil; e provo-o. A linguagem d'aquelles é
constantemente digna, nobre, respirando a mais
elevada moral e isentas de baixas paixões (pg.
XXVD,
Ah! Eis aqui o grande argumento do es-
piritismo! E' pela linguagem que devemos co-
nhecer se o espirito é bom ou máu ou zom-
deteiro. Tudo depende da nobreza e dignida-
de de expressão; tudo depende de respirar a
mais elevada moral e santidade ou não.
— Mas, meu caro Kardec, permitta-me uma
pequena observação, permitte? — Você não tem
ouvido fallar em gatunos que se vestem de-
centemente; mais, que vestem do melhor e do
mais fino, e travam relações com a melhor so-
cieõade devido ás suas bellas maneiras, ao
seu trato fino, á sua linguagem digna e nobre?
As infelizes victimas não dão pelo engano.
Pois se a linguagem é tão moral, tão digna,
tão elevada, de sentimentos tão puros! Dei-
xam-se ir áquella amizade tão agradavel, tão
nobre e tão ambicionada. Só veem a desco-
brir o engano quando, uma noite, acham a sua
casa arrembada e os bons cobrinhos e joias—
sumidos para sempre.
— Ora, oral... Com que me vem a sahir
voce!
— €' para lhe provar, meu caro Kardec,
que só a linguagem nobre e digna e moral
não prova nada.
— Mag no seu caso ha um interesse para
o ladrão em furtar: as joias e o dinheiro alheio.
10 TOLICES DE ALLAN KARDEC
ms o sm mm nam os 0 a a a
e ss a. a usas o a pi a CI O 6A

Mas os espiritos,.. que é que nos viriam &


furtar ?
— Muita coisa, meu caro Allan! E a mais
preciosa de todas: a verdadeira religião.
— Hein?
— Sim. Com as suas artimanhas, os taes:
espiritos pódem furtar-nos a verdade, que é
a coisa mais preciosa que nós temos. Podem
nos precipitar no erro, o que é um facto dig-
nissimo de lastima; sobretudo quando essa
verdade nos foi dada por Deus, e esse erro
se ergue contra o que Deus ensina.
Mas vamos a outro exemplo, pois o pon-
to merece mais detida attenção. Por força ce
nosso chefe espirita, se não vivia noutro mun-
do, devia ter ouvido fallar em assassinos, que-
se fingem os maiores amigos da victima desi-
gnada ao seu punhal. As suas palavras são
nobres, dignas; a sua dedicação parece não-
ter limites, a sua amizade mostra ser toda sin-
cera e devotada. E no entanto, meu caro Kar-.
dec, à hora opportuna, zás! lá vem a catas-
trophe. Uma punhalada traiçoeira ou um tiro pe-
las costas termina a farça bem representada.
Era tudo fingimento, tudo mentira, tudo puris-
simo engano... E nós acrditaremos em lin-
quagens nobres e dignas de espiritos que po-
dem ser nossos maiores inimigos? Ah, meu
bom tio Allan! olhe que isso não é prudente!
Olhe queé aventurar demais! Palavras são
palavras, e nós queremos argumentos, os quaes,
posto que tambem sejam de palavras, ao me-
nos tendem a nos provar alguma coisa.
Mas parece-me ouvir o bom Allan repli-
car-me com um sorriso nos .labios:
TOLICES DE ALLAN KARDEC 11
-—. O O o
o O
us do

— Voce tem medo que um espirito o as-


sassine?
— E porque não, meu caro? Confesso-lhe:
tenho mais medo do espirito que do facinora.
Porque se este mata O corpo, o espirito pode
matar a alma.
— Como?
— Afastando-a de Deus pela mentira. Fa-
zendo-a seguir um trilho condemnado por
Deus.
Vemos pois, leitores, que a tal linguagem
nobre e digna que o sr. Allan Kardec nos a-
presenta como um pratc limpo e delicado, não
passa de uma vasilha suspeita e com um man-
jar leve demais e, apesar d€ tudo, intragavel.
Não passa, não sr.— Só porque um espirito
me vem dizer: «eu sou Santo Agostinho», não
vou logo tirando o chapéo. Ainda que me ve-
nha com a linguagem mais nobre, mais digna
e mais moral que seja possivel! Não chega.
O ladrão tambem vem com linguagem nobre;
o assassino tambem usa palavras moraes, e
nem por isso deixam de ser — um, ladrão, e
outro, assassino.

ção
1
Caridade e Santos
Allan Kardec confessa que é difficil reco-
nhecer a identidade dos espiritos que se ma-
nifestam. Está alli á pagina XLII da Introduc-
ção ao Livro dos Espiritos: E', com effeito,
uma verificação bastante Oifficilde fazer (a da
identidade dos espiritos), diz elle.
E, no entanto, apesar dessa Difficuldade
confessada, quer que lhes acceitemos as toli-
ces sem nos incommodarmos com o mais!...
Ora, vejam só isto: Porem, que importa que
seja elle ou não o espirito de Fénelon? Uma
vez que só nos ensine o bem e nos fale como
o faria Fénelon, é um bom espirito (pagina
KLIV).
Por todas as columnas do firmamento! Que
nos importa? Importa-nos tudo, meu amigo;
tudo e mais alguma coisa. Porque, — se é Fé-
nelon que nos apparece espirita depois da
morte, quer dizer que elle se enganou aqui
no mundo, onde foi sempre firme e acenôra-
do catholico, e agora, no frigir dos ovos, vem
cantar a palinodia, passando-se para O espi-
ritismo com armas e bagagens. € não é —quer
dizer que O espirito pretende acobertar-se com
o seu nome de homem celebre para nos im-
pingir tolices.
TOLICES DE ALLAN KARDEC 13

Como é, pois, que não nos importa? Im-


porta-nos tanto como aos espiritas O vir O sr.
Allan Kardec depois de morto dizer que virou
casaca, que agora já não é mais espirita, mas
fregolinou-se em catholico. Elles acham isso
impossivel, não é? Pois nós tambem; e mais
ainda quando se trata de Fénelon ou Santo
Agostinho, que foram um poucochinho dilfe-
rentes e, tanto em sciencia como em virtude,
estavam um poucochinho acima de qualquer
Allan Kardec.
Pouco atraz Kardec examina as diversas
opiniões que ha contra o espiritismo, e refu-
ta-as todas. Aquillo é faca a cortar ramos sem
dó nem piedade. Cahe o materialismo para
um lado, a irradiação para outro, o magnetis-
mo para outro ainda, etc., etc.
O engraçado, porem, é que, justamente ao
chegar á explicação verdadeira, sae-se com
esta: Não a julgamos merecedora de exame
serio (pag. RKKIX).
Sim, senhor! Nas outras explicações, que
não têem grande valor, extende-se a refutar e
a raciocinar e a matutar, e quando chega á
verdadeira:
— Isto? Não merece exame serio!— Bello
modo de se desembaraçar das Difficuldades!
Tomo nota!
Sua Exa. pois, o sr. Allan Kardec não
quer que sejam absolutamente os máus espi-
ritos os autores das bellas revelações do es-
piritismo.
Pois olhe, mestre, nós tambem não somos
tão simples que digamos que as revelações do
espiritismo sejam sempre provenientes delles.
(Muitas vezes, cremos piamente, não passam
4 TOLICES DE ALLAN KARDEC
- —— a
—— e e e a om “ce Aço
— emo o o

de tolices dos proprios mediums allucinados.


Outras vezes tambem não desprezamos a ou-
tra opinião de que haja nos seus phenomenos
magnetismo ou somnambulismo. € nisto esta-
mos de accordo com você quando escreveu:
Não iremos contestar o poder do somnambu-
lismo, do qual temos visto prodigios e have-
mos estudado todas as phases, num periodo
de mais de trinta annos; convimos que, com
effeito, muitas manifestações espiritas pódem
explicar-se por este modo (pag. LIII). |
Concordamos, porém, ao mesmo tempo
que, quado o medium se põe a discorrer so-
bre alta philosophia ou medicina, sendo ape-
nas um pobre remendão, quando falla ou es-
creve alguma lingua que elle nunca ouviu nem
sequer no gramophone, concordamos, digo,
que as revelações nesse caso são devidas a
uma intelligencia extranha. Até aqui estamos
de conformidade.
Mas, chegados a este ponto, entramos em
franco desaccordo. =
— São as alma — dizem
s os espiritas.
— São Os espiritos 'máus — dizemos nós.
E elles, tendo confessado que ha nisso
intelligencias extranhas, extranham e «não jul-
gam merecedora de exame serio” a explicação
pelas intelligencias dos máus espiritos!
E porque não podem ser elles?
Nós sabemos que Jesus Christo, Filho de
Deus, veiu ensinar-nos a verdadeira Religião,
os meios de salvarmos as nossas almas. Quan-
do, pois, os espiritos nos vêem ensinar outra
religião, opposta á de Jesus Christo, será tão
absolutamente impossivel que esses espiritos
TOLICES DE ALLAN KARDEC 15
sejam Os inimigos de Jesus Christo, os espi-
ritos que a Biblia chama demonios?
Mas, aqui os espiritas se espinham todos,
como os temos ouvido muitas vezes.
-— Não, senhor. Está muito enganado! O
espiritismo segue á risca os preceitos de Je-
sus Christo. O espiritismo é que é o verda-
deiro christianismo! Nós é que ensinamos a
verdadeira caridade de Jesus Christo!
— Ah! Sim? Pois não sabia! Nunca pen-
sei que o espiritismo tivesse o monopolio da
caridade! Com que, então, a nossa nada vale?
Esses asvlos e hospitaes que nós temos, es-
sas Irmans, que se intitulam de caridade, por-
que sacrificam todos os prazeres da vida e
sacrificam as suas proprias pessoas afim de
se dedicarem exclusivamente á pratica dessa
virtude, tudo isso não tem valor? Que topete!
Essas Conferencias de: S. Vicente, tão espalha-
das pelo mundo todo, que não ha cidade, não
ha quasi freguesia onde não existam, para
soccorrer com um auxilio semanal as familias
necessitadas, isso não será caridade? Qual!
isso para os espiritas não vale dois caracóes!
E esses missionarios, esses dominicanos, sa-
lesianos e outros, que vão viver no meio dos
indios ou negros, longe de todo o conforto das
ciõades e do progresso, só para levar-lhes luz
e instrucção, para lhes ensinar o caminho do
céo e o trilho da civilisação? De certo. que
isto não é caridade, uma vez que os espiritas
o desconhecem...
Mas, um S. Vicente de Paulo, o prototy-
po da caridade, o Santo que mais caridade fez
no mundo, o fundador de hospijaes, asvlos,
escolas, recolhimentos sem numero, o homem
6. TOLICES DE ALLAN KARDEC

cuja acção caridosa se prolonga até nossos


Oias nas instituições de caridade que deixou
plantadas e que até hoje fructificam? A delle
não seria caridade?
E Dom Bosco, que soccorreu a tantos mi-
lhares de meninos abandonados, que fundou
tantas escolas para os pobres orphãos, desam-
parados de todos?
E S. Pedro Claver, que se dedicou todo
aos infelizes escravos da Africa, vivendo só
para elles, só a consolar dores, a ajudar nos
trabalhos, a chorar com os afíflictos?
E S. João da Matta, S. Philippe Neri, S.
Romualdo, S. Paulo da Cruz, etc. etc. etc.?
Mas, que é que pensam, meus caros ca-
tholicos? Julgam que os espiritas se confun-
dem com tão pouco? Estão muito enganados.
Esses Sant —odis
zem elles — eram espiritas!
Por todas as bombas do mundo inteiro!
Esta, sim, que é de cabo de esquadra! Esta é
uma Oaqueilas que não passam por uma por-
ta! Os nossos Santos eram espiritas?
— Sim, senhor — respondem os Kardequia-
nos. Elles foram os verdadeiros espiritas; de-
monstraram-n'o com as suas virtudes. E depois,
elles não vêem seguindo ás nossas sessões
instruir-nos e aconselhar-nos?
E' de se ficar de bocca aberta! E nós que
cuidavamos que os Santos eram coisa muita
nossa, que ninguem nos podia tirar, que eram
a nossa gloria e uma das provas da nossa
Religião!
Estavamos enganados, meus caros; Os es-
pirifas o affirmam. Os Santos e todas as pes-
soas virtuosas são espiritas!...
— Ora essa!
TOLICES DE ALLAN KARDEC 17
<— + ——— e ———. e — e. ca . —
o 1TO Ia 0 4 em = ço 1 e a 1

— Sim, senhores. €' um facto. Pois não


vêem como foram até ensinar o sr. Kardec
( pag. LXIV)? Não vêem como são incansaveis
frequentadores das sessões? Alli são frequen-
tes Santo Agostinho, São Vicente, S. João, São...
Comtudo, venham cá, meus caros espiri-
tas. Mas se elles nunca se lembraram, em vi-
da, dessa crença tão contraria á catholica; se
elles sempre defenderam a sua Religião de
todos os ataques que os inimigos, de todas
as seitas, lhe dirigiam! Mas não sabem que
Santo Agostinho era Bispo e, por conseguinte
dizia Missa e confessava? !gnoram acaso que
S. Vicente era Padre, e, por conseguinte dizia
Missa e confessava e se confessava tambem?
Onde está a Missa e a Confissão dos espiritas ?
Não lembram que esses Santos commun-
Gavam? que acreditavam que Nosso Senhor
está realmente presente na sagrada Hostia? E
onde está a Communhão dos espiritas? E não
sabem que os espiritas esclarecidos não acre-
ditam que Jesus Christo era Deus? Pois, San-
to Agostinho e São Vicente adoravam e estre-
meciam a Jesus, amavam-no realmente com
todas as veras, amavam-no com toda a alma,
com todas as forças, com todo o coração, cos
mo seu Deus e seu tudo... |
Então como é que os Santos eram espi-
ritas? Que folice vem a ser esta? Desenga-
nem-se, meus caros espiritas, os Santos acre.
ditavam na Confissão, na Missa, na Commu.-
nhão, nas penas eternas, na divindade de Je-
Sus, fodas coisas que fazem arrepiar os espi-
ritas. Ainda mais: Os Santos não se deixavam
levar pela idéa da reincarnação, e esse é 0 ponto
capital do espiritismo. Por conseguinte, vontade
18 TOLICES DE ALLAN KARDEC

teem OS senhores de que elles sejam da sua seita.


(Das fiquem com a vontade, que o mais... é pêtal
— Mas se elles vêem sempre ás sessões!
Se se mostram espiritas dos mais ardentes nas
suas palavras!
— Sim? Agora depois de mortos? Pois
gabo-lhes a credulidade. Isso não faz mais do
que corroborar o que dissemos acima. Não
São as almas que se manifestam aos mediums,
ainda quando vêem com os. melhores concei-
tos. À prova é que vêem mentindo. Falam
muito em caridade, muito em oração, mas vê.
em-se pavoneando com o nome de Santo Aqgos-
tinho, de S. Vicente, que nunca foi o dellas.
Mentem por conseguinte, apezar de toda a ap-
parencia de virtude que alardeiam!
E depois escutem. Acham mesmo possi-
vel que Deus deixasse esses grandes Santos
em erro? Esses seus amigos intimos, para os
quaes fez tantos milagres, Deus não os teria
esclarecido, não os teria avisado de que an-
davam errados? Deixava-os numa crença fal-
sa, e ainda ajudando essa crença falsa com
os seus milagres —e teria aberto os olhos a-
gora a estes senhores mediums que não va-
lem a sola dos chinellos de um Santo Agos-
tinho ou de um São Vicente de Paulo? Os
grandes Santos não mereceram de Deus que
os esclarecesse e tirasse do erro, e merece-
ram-no esses mediumzinhos carregados de im:
perfeições, de vícios e até de maldades?
Qual, meus caros espiritas! tenham pacien-
cia! Vejam que não póde ser! Os Santos são
nossos, muito nossos, são nossissimos; pois
sempre foram em vida, e sempre serão lá no
céo, catholicos, apostolicos, romanos!
[11

O demonio moral
Voltando á vacca fria, acho que está pro-
vado que o espiritismo não é absolutamente
a mesma religião dos Santos nem a de Jesus
Christo. Ha demasiados pontos de divergencia
entre uma e outra. Não será demais recordar
mais uma vez a Confissão, a Communhão, a
Missa, a Divindade de Jesus Christo, a nega-
ção da reincarnação, etc., etc.
| EF” logico, pois, deduzir que os espiritos
que comparecem nas sessões, o que querem é
impugnar a Religião de Jesus Christo. Porque
é pois, que não podem ser os demonios, os
inimigos de Christo, os adversarios da ver-
dade? |.
- Mas, attenção, leitores. Aqui nos sae o
impagavel Allan Kardec com este achado: «Se
assim fosse, seria preciso convir que o demo-
nio é ás vezes bem sabio, muito razoavel e
socretudo bastante moral, ou então admittir a
existencia de bons diabos (pg. XL).
Olá, mestre Kardec, que idéa você faz dos
diabos? Parece que para você os diabos não
passam de... uns pobres diabos: e essa é uma
idéa dos diabos! Pois você não sabe que elles
são anjos decahidos? que são seres dotados |
de grande intelligencia, muito superiores a nós,
pobres mortaes? que não perderam essa intel-
TOLICES DE ALLAN KARDEC |
20 te
-——
a a

o ad
-—
- e — e — -—

a queda? Você
ligencia, natural a elles, com não nos ad-
não sabe que nós absolutamente
miramos quando vocês nos contam que um
e al fa ia te im pr ov is ou um di sc ur so so bre
pobr ma is hM
me di ci na , qu e fez pa sm ar os me di co s
lustres? Meu caro Kardec, você está mostrando
ignorancia, dando a conhecer que não está in-
formado acerca do conceito que nós formamos
do Jdiabo. o
Mas já ouço o sr. Kardec me sahir a cam-
“po com outra:
"* — Se os demonios são tão sabios, tão in-
telligentes, como é que apparecem tantos er-
ros e fantas manifestações tolas Ourante as
sessões?
— Por isso mesmo, meu bom Kardec. Para
que não digam que são elles. E' para melhor
engasopar a você s!
— Com tudo, note bem, mui-
tas vezes o demonio não julga necessario ir
em pessõa dizer tolices. Em certos casos, bem
frequentes aliás, deixa que o medium muito na-
turalmente as diga da sua propria cachola al-
lucinada. Tolices por tolices, tanto valem as
dos capetas como as dos mediuns; não acha?
Maso sr. Kardec ainda caçõa dizendo que,.
se é o diabo, elle se mostra bastante moral.
ao que já respondemos mais acima.
E'
Você queria, sem duvida, que elle se apresen-
tasse sempre como quem é, com toda a sua
feiura, respirando odio á humanidade, mos-
trando o seu desejo de que todos pereçamos.
sem remedio, não é assim, sr. Kardec?
- Mas bem vê, meu caro mestre, que assim
ninguem o seguiria. São bem poucos os lou-
tos que se atrevem a ligar-se claramente ao
DE ALLAN
cuido, Apa cus tar
KARDEC

21
ia e e e pç a a e us a e ca — o
.— . e

diabo contra Deus. Os outros têem medo... E


até você mesmo o teria...
Então o capeta, que não é de hontem, la-
va-se, penteia-se, escova-se, isto é, dá-se um
verniz de moral... uns toques de virtude ....
umas tintas de santidade até...
— Mas para que, santo Deus! para que!
— Para que?— Para enganar os tolos, meu
carissimo Kardec! E' para isso que elle vem
falando muito em caridade, em amor do pro-
ximo — mas
, não fala em obediencia aos ensi-
namentos de Jesus Christo. Extende-se em
bons conselhos, —mas longe da religião deter-
minada por Deus. Mostra-se muito moral,—
comtanto que a gente se afaste dos preceitos
e doutrinas de Jesus. Eis como o espirito do
mal póde aconselhar o bem: unicamente com
o intento de que o fim seja máu. E' o mesmo
que faz o ladrão ou o assassino. Finge-se bom
amigo, desinteressado, devotado, — comianto
que: possa, no fim, roubar ou matar a seu
salvo.
— E' crivel, por — prosegue
ém o autor,—
que, Deus só permitta que o espirito do mal
se manifeste para perder-nos, sem nos dar em
| DSO os conselhos dos bons espiritos?
ag, a
E' muito crível, meu bom Kardec, porque
os conselhos, não digo já dos bons espiritos,
mas dos optimos espiritos, Elle nol-os tem
dado e continúa a dar-nol-nos seguidamente
no mundo. Porventura não temos os conselhos
verdadeiros dos Santos? (Os verdadeiros, e
não os falsificados que o espiritismo nos quer
impingir) Acaso não temos os conselhos do
proprio Jesus Christo no Evangelho e na reli-
gião que Elle nos deixou? Como é, pois, que
'22 TOLICES DE ALLAN KARDEC
e,

você mette os pés pelas mãos, seu Kardec, e


quer allegar que Deus nos deixa sem os con-
selhos dos bons espiritos? Você queria espi-
ritos melhores que os dos Santos e o de Nos-
so Senhor? Só se fosse o seu.
Não, Kardec, olhe: nós temos verdadeira-
mente os conselhos dos bons espiritos, só-
mente com a OQOifferença que não são os con-
selhos que voces pretendem que elles vêem
dar agora depois de mortos, occultando-se atraz
do medium como quem precisa esconder o ra-
bo. São os conselhos que elles deram em vida,
emquanto assombravam o mundo com as suas
penitencias e as suas virtudes, emquanto toda
a gente os via e apalpava sem perigo de to-
mar gato por lebre.
Mas o nosso bom doutor ainda acha uma
corda para o seu arco. Escutem. «Desde que
as manifestações existem, não pódem ser se-
não com a permissão de Deus; e coma “crer
que elle, sem mostrar piedade, só consintã o
mal com exclusão do bem?” (pag. XL)
Então você/'meu bom doutor, não entende
como é que Deus póde permittir que os demo-
nios se lhes manifestem. Vamos ver se sou
capaz de lhe abrir um pouquinho a intelligen-
cia. Olhe. Quando um pae admoesta, ensina,
dirige com paciencia um filho discolo e des-
obediente, e este teima em seguir a sua pro-
pria cachola, sem querer incommodar-se com
o pae nem com o que elle diz, e exclama: Ao
diabo o velho com suas ERbag ces: — Q pae mui-
tas vezes não abandona o filho tão insolente,
não deixa que elle siga o seu capricho, no fim
do qual se encontra a sua perdição? |
Pois é o mesmo caso, meu caro doutor.
e a e e 1 e a O
TOLICES DE ALLAN KARDEC
—— —
1 e o
us
23
Deus amorosamente nos deu a sua reve-
lação, mandou-nos seu proprio Filho 4 ensi-
nar-nos, deixou que este Filho morresse por
nós; quereria que fizesse mais do que isto?
Temos, pois, o caminho da salvação indi-
cado expressamente por Deus. Levantam-se
agora uns homens teimosos, rebeldes a essa
revelação, que se obstinam a não reconhecel-a,
mas querem seguir a dos demonios, só porque
esta lhes dá no gofto e é mais commoda, não
tem confissão nem Missa, e promette a trein-
carmnação. Que querem que Deus faça? Que-
rem que venha arrancal-os a pulso do máu
trilho que seguem? E' muito pretenõder, meu
caro mestre! Concedam a Deus tambem um
pouquinho de energia! Não queiram fazel-o
um vôvô bonacheirão que a tudo sorri, e faz
côro com as risadas dos netos, que lhe dão
tapinhas e lhe puxam pelos cabellos, como
quer Victor Hugo (!)!
— Não! póõe dizer-lhe a Magestade Su-
prema. Dei-vos a minha Religião. Indiquei-vos
o caminho que tendes a seguir. Dei-vos milha-
res de Santos que o seguiram com perfeição,
dando um exemplo luminoso ao mundo inteiro.
E vós quereis seguir ao demonio? Só porque
vós entendeis que assim deve ser. Eu devo
curvar-me a vosso capricho? Só porque vós
entendeis de desprezar a minha revelação, hei
de vos cônsentir a audacia? SÓ porque vós
quereis uns preceitos mais commodos, Eu hei
de voltar atraz com os meus, deixando-vos
plena liberdade?

) V. L'Art d'être grand-pêre, e a ibéa de Deus que


elle fórma nas suas ouiras obras.
24 “TOLICES DE ALLAN KARDEC
. — e e e oe
-- o —— —
ss
——
mm
e e.

"Respondam, meus caros espiritas, respon-


dam ad Deus de Majestade, se é que se atre-
vem! Mas attentem que Elle, em sua grande
benignidade, ainda lhes Oiz:
— Sem deixar de ser immenso em dOigni-
dade e justiça, sou tambem immenso em bon-
dade e misericordia. Filhos transviados! ainda
estaes em tempo. Volvei' aos braços da minha
longanimidade! Abanôdonae os vossos erros e
segui o que Eu vos ordenei. E aqui tendões os
meus braços amorosos para vos acolher, para
vos acarinhar e para *vos trazer á minha glo-
ria eterna e sem par!
ESEZRNS ZEN mem in
e eee e e meme mm

IV
Quantos loucos faz o espiritismo!
Allan Kardec extranha-nos a allegação fre-
quente da loucura que, volta e meia, apparece
no espiritismo. Não quereria que se falasse
nisso. Mas que lhe havemos de fazer? A ver-
dade impõe-se.
Quem ha ahi que não tenha ouvido con-
tar algum caso de miolos transtornados por
causa d0 negregado espiritismo? E' coisa tão
commum como carne de vacca. Os jornaes (não
falo só dos catholicos, notem bem) até os jor-
naes impios e hostis á Religião trazem segui-
do algum facto desses. |
Pois bem, o que é um facto tão patente e
tão conhecido, Allan Kardec, o mestre do es-
piritismo, affecta ignoral-o. Será boa fé? Póde
ser, mas se é não parece. '
Querem saber como é que elle fala? Es-
cutem só: |
Não deixam de tirar consequencia desfa-
voravel do facto de haverem perdido a razão
alguns dos que se votaram a estes estudos (do
espiritismo), (pag. XLIX).
Mas que é isso, caro mestre? Alguns?
Terei ouvido bem? Você diz alguns? Parece-
me que está mal informado. Alguns, quando
os casos se contam a centenas? Alguns, quan-
do os medicos estão de accordo em apontar
26 TOLICES DE ALLAN KARDEC
o < |—

em,

como uma das grandes causas da loucura o


espiritismo?
Ora escute, Allan Kardec.
A Ordem, jornal de Bandeiras, nos Aço-
res, referia ha pouco tempo que Emilio Lama-
ze, de 25 annos, residente á rua do Grenier-
Saint-Lazare, em Paris, com a mania do espi-
ritismo, começou a ficar maluco. A sua aspi-
ração era falar sempre com os espiritos e, na
officina, falava com as taboas, com as mesas
e cadeiras. Ora, mette-se-lhe na cabeça falar
com o espirito duma pessoa da familia, e as-
sim resolveu matar uma irmã, madame Lhar-
monier, estabelecida com uma taberna á rua
Rambuteau, para depois lhe conversar com “a
alma. Entrando pois como um furacão no es-
tabelecimento da irman, dispara sobre ella
quatro tiros de revolver, nenhum dos quaes
felizmente lhe acertou; mas a pobre mulher
cahiu por terra com o susto, e Lamaze, sup-
pondo tel-a matado, sahiu com a mesma pre-
cipitação e foi para casa, onde logo se dispoz
a entrar em conversa com o espirito da morta.
Sentado. pois junto a uma mesa «pé de gallo»,
Lamaze gritava:
— Espirito de minha irman, estás ahi? —
À polícia que chegava, ouvindo essas palavras,
e não se decidindo o doido a abrir a porta,
tentou arrombal-a. Lamaze, furioso, disparou
dois tiros contra a porta. Afinal quando viu
que a porta era arrombada, disparou o ultimo
tiro na cabeça, ferindo-se gravemente.
— Ora! dirá Rardec ou alguem por elle.
Isso ter-se-ia dado em Paris. Mas Paris é muito
longe; não é facil a verificação. Hum!
TOLICES DE ALLAN KARDEC.
— — e 1 et 2 e a e ad
*
4
Tte e o o a me
27
Am + te 0 0 rs em 2-0 pega em mbsãa

— Não ha hum nem meio hum, meus.


bons espiritas; os srs. querem que deixemos a
Europa de lado e nos occupemos do Brasil?
Pois seja. Leiam este pedacinho que é do
Jornal do Commercio de 10 de Março de 1914:
«Suicidou-se hontem em S. Paulo, um ho-
mem de conducta exemplar, sem vicios, sem
difficuldades de vida, que nenhum motivo ti-
nha para o acto de desespero. Esse moço de
25 annos... foi mais uma das victimas da in-
tensa curiosidade pelos phenomenos immate-
riaes. Fôra um dia um pouco a contra-gosto a
uma sessão de espiritismo. Voltou outra vez.
pórque não tinha em que empregar um mo-
mento de folga. E ficou preso áquella fascina-
ção, e entrou a impressionar-se com o que ou-
via e com as meditações a que se entregava,
acabando no tiro de carabina com que sup-
primiu a indomavel tempestade em que o seu
cerebro naufragou.»
Então, que dizem a isto? Isto não é de-
Paris; é de S. Paulo; e é muito facil de veri-
ficar-se. Mas já sei, os srs. querem mais: um
facto só não chega. Pois ahi vae mais. *
A Gazeta de Noticias de 8 de Novembro
de 1913 dá por extenso a narração que vamos-
resumir. ?
Quem quizer conhecer todos os pormeno-
res só tem a procurar esse numero em qual-
quer bibliotheca publica ou mesmo na respe-
ctiva Redacção, x
- No Rio de Janeiro, João da Silva Lucas,
com toda a sua familia, doze ig ao todo,..
enlouqueceram devido ás praticas do espiritis-
mo. O infeliz João já ha tempos começára a
faltar aos seus deveres, perdendo empregos-.
28 TOLICES DE ALLAN KARDEC

por não desempenhal-os bem, chegando até ás


mais humildes condições... Uma preta velha
vaticinou-lhe á mulher que teria uma menina
a qual seria a «Redemptora» ou «Filha da Luz».
A mulher deu realmente á luz uma menina.
Essa menina com doze annos, em 1912 attra-
hiu curiosos na delegacia, pelas suas palavras
propheticas e suas attitudes anormaes.
- A loucura começou a manfestar-se um
Ola em que a familia dum visinho, a do sr.
Nobrega, foi insultada escandalosamente pela
menina e depois por toda a familia do sr. Lu-
cas, sem que para isso houvesse a menor ra-
zão. Julgaram-n'os embriagados.
Na noite seguinte ouviram cantos, rezas,
etc.: era uma sessão espirita.
Passados poucos dias começou a ouvir-se
grande desordem entre elles: gritos lancinan-
tes, cantoria, rezas, batuques %demorados, etc.
Isso começava ao cahir da noite e prolongava-
se até á meia noite, quando não ia além.
A autoridade, chamada, teve que arrombar
a porta. Quadro espantoso! As mulheres mo-
viam-se como que atordoadas. Às crianças pa-
reciam allucinadas. Ajoelhavam-se, arrastavam-
se pelo chão. Os homens tinham as feições
apavorantes, o olhar congestionado. Pergun-
tando-se ao dono da casa porque não abrira
a porta, disse:
“ -— Esta porta não podia ser aberta senão
daqui a tres dias. Um espirito enviado de
«Ubamba» veiu Ddizer-nos que a maldade lá
estava.
Eis, caro Kardec, um facto bem Impressio-
nan te! , E' lo uc ur a re al me nt e ca us ad a pel o es -
o TOLICES DE ALLAN KARDEC 29
am * um -

e ci qm
.—s us

piritismo. Mas você que mais sem duvida, e


a seara infelizmente é farta,
A Cidade de Campinas, a 3 de Agosto de
1906, diz:
<O joven Benedicto Guedes tem apresen-
tado signaes de perturbação mental, occasio-
nados pelo espiritismo, em virtude de suas
proprias palavras; porquanto este moço rela-
tou-nos que. assistindo a uma sessão espirita,
notou que 9 esirito de seu pae nelle se ha-
via encarnsão: porco depois sentiu que outro
espirito szhido de um suino se tinha apode-
rado delle, iazendo-o considerar-se verdadeiro
porco, o que o levou a despir-se e deitar-se
na lama, facto este veridico, pois o infeliz mo-
ço foi visto coberto de lama quando o retira-
ram do campo da antiga chacara do Barão de
Itapura!»
Pobre moço! Vamos adiante, porém, e con-
temos mais um caso:
O Movimento, de 19 de Abril de 1914, nar-
ra que Henrique Leger, que na occasião de-
monstrava estar sofirendo das faculdades men-
taes, muma manhã do anno de 1911, na casa
ne 17 Oda rua Riachuelo, onde residia, estupi-
damente assassinou com uma facada em pleno
peito, sua esposa Maria Leger.
Preso e apresentado ao dr. Franklin Gal-
vão, no momento delegado do 13.0 districto,
allegou que o seu procedimento, inspirado no
espiritismo, era o resultado de ordens recebi-
das durante o somno, ouvindo em sonhos que
deveria sacrificar gua mulher, que lhe não era
fiel, devendo matar-se em seguida. No tribunal
reconheceu-se a sua irresponsabilidade por se
achar fóra de si e em estado de completa pri-
30 TOLICES DE ALLAN KARDEC
—-
-—

vação de intelligencia no acto de cormnmetter o


crime, e conseguiu a sua absolvição.
Vá ajuntando, caro Kardec, colleccione e
vamos a outra.
A Cidade de Campinas, de 19 de Abril de
1914, dá o seguinte telegramma:
<«Jundiahy, 18. — Suicidou-se hoje nesta ci-'
dade, enforcando-se, o sr. Christiano Alves, di-
rector da banda de musica <«Drasileira”. O in-
feliz estava com as faculdades mentaes altera-
das, devido á pratica do espiritismo.»
. Bcho que chega de factos, não é, meu bom
Kardec? Ou você quer mais? Não seria nada
Oifficil encher um volume, com os que tão se-
guidamente apparecem nos jornaes. Não quero
porém insistir, narrando os factos mais recen-
tes de Isidra Maria Bernardino, em Floriano-
polis; Armando Gomes, em Campos; Anna dos
Santos, no Rio; João Baptista Queiroz, em
Descalvado; Hilda, filha de Sebastião Cardoso
de Moura, em Bello Horizonte; a familia de
Guarabira etc. etc. Pois se temos coisa me-
lhor! Se temos a opinião de medicos especia-
listas em alienação mental! O tio Allan não
Qirá que essa opinião não mereça todo res-
peito. Escute, meu caro mestre.
O dr. Marce! Viollet... Conhece o dr. Mar-
cel Viollet, Kardec? Pois olhe, é um especia-
lista de molestias nervosas e medico dos asy-
los de alienados de Paris. E tem mais uma
qualidade importante para o caso: não é nada
catholico. Este doutor, pois, que é uma sum-
midade lá das Orópicas, escreveu um livro:
O Espiritismo em suas relações com a lou-
cura. E nesse livro, á pag. 38, elle diz assim;
TOLICES DE ALLAN KARDEC 3)
- —-—.

<O ESPIRITISMO CONSTITUE UM OPTIMO


CALDO DE CULTURA, PARA TODOS OS
ERROS, PARA TODA ESPECIE DE DES-
EQUILIBRIO E PARA TODA ESPECIE DE
LOUCURA».
E extenõde-se a analysar bem por miudo
toda especie de loucura causada pelo espiri-
tismo.
Mas a velha Oropa está muito longe... Fi-
«quemos aqui mais perto. Fiquemos no Brasil,
onde tambem ha summidades medicas, cuja
opinião merece ser não menos respeitada e
acatada.
- Em Uberaba, a 20 de Julho de 1914, 0 dr.
João Teixeira Alvares dirigiu a diversos medi-
“cos de grande nomeada, carta com a seguinte
- pergunta: | º
<BASEADO NAS SUAS OBSERVAÇÕES,
QUE IDEIA FAZ V. S. DO ESPIRITISMO
COMO FACTOR DA LOUCURA E OUTRAS
PERTURBAÇÕES NERVOSAS?>» |.
Quer saber as respostas que recebeu, meu
bom Kardec?
O dr. Juliano Moreira, director do Hospi-
cio de Alienados do Rio de Janeiro, (por con-
seguinte bem competente) respondeu:
«TENHO VISTO MUITOS CASOS DE
PERTURBAÇÕES NERVOSAS E MENTAES
EVIDENTEMENTE DESPERTADAS POR
SESSÕES ESPIRITAS».
Que diz a isto, meu caro mestre? Quererá
ainda sustentar que alguns têem perdido a
razão com o espiritismo? Mas prosigamos.
O Or. Joaquim Dutra, director do Asvlo de
Alienados de Barbacena, outro competente, por
- conseguinte, respondeu:
32
e.
E]
rt e e ps a
TOLICES DE ALLAN KARDEC
a a o e a o e, bad

«AS PRATICAS ESPIRITAS ESTÃO IN-


CLUIDAS... INFLUINDO DIRECTAMENTE,
PELAS PERTURBAÇÕES EMOTIVAS, COM
UM COEFFICIENTE AVOLUMADO PARA A
POPULAÇÃO DOS MANICOMIOS».
Veja lá, Allan Kardec, com um coefficiente
avolumado. Não sou eu quem o diz; é uma
Summidade medica, O director do Hospicio de
Barbacena.
Qnde ficam então os seus alguns, hein?
Mas continuemos.
O or. Austregesilo, professor de molestias
nervosas da Faculdade de Medicina do Rio de,
Janeiro, respondeu: os
«O ESPIRITISMO E NO RIO DE JANEI-
RO UMA DAS CAUSAS PREDISPONENTES
MAIS COMMUNS DA LOUCURA».
O dr. Franco da Rocha, director do Hos-
pício de Alienados de Juquery, respondeu re-
portando-se ao que já escrevera na pag. 32 do
seu «Esboço de Psychiatria Forense», onde diz:
<A proposito das reuniões espiritas, num
trabalho recente escreveram Solier e Boissier:
«EM BENEFICIO DA PROPHVLAXKIA, SE-
RIA DE CONVENIENCIA DIVULGAR OS
ACCIDENTES»CAUSADOS PELA FREQUEN-
CIA NAS SESSÕES ESPIRITAS. CHARCOT,
FOREL, VIGOROUX, HENNEBERG E OU.
TROS, PUBLICARAM EXEMPLOS DE PES-
SOAS, SOBRETUDO MOÇAS, ANTERIOR:
MENTE SANS, QUE SE TORNARAM HYVS-
TERO-EPILEPTICAS, EM CONSEQUENCIA
DE TEREM TOMADO PARTE NAS SCENAS
DE EVOCAÇÃO DE ESPIRITOS,» (!)
aER (1) O Esptritismo pelo Dr, João Teixeira Alvares.
TOLICES DE ALLAN KARDEC 33

Eis ahi pois o que dizem os comp


etentes.
Deixemos por conseguinte Kard
apenas em alguns casos, que agor ec falar
a sabemos
qual é a verdade. Não se tapa o sol com uma
peneira, não sr.
“Ora bem: firmada esta estaca, estabe
devidamente este ponto, tiremos-lhe lecido
a conse-
quencia. Será possivel que Deus tenha
tuido uma religião que faz endoidecer a sti-
in
gen-
te? Tenham paciencia, eu não o creio. De
us,
a summa intelligencia, querer uma religião que
de si, em virtude da sua constituição, faz per-
der O juizo aos seus sequazes!... Qual! Isso é
historia! A multidão de factos de loucura pro-
va pelo contrario que tal religião não póde ser
de Deus. Para mim essa loucura frequente é
como que o carimbo do capeta. E' como se
este dissesse: <Esta religião é muito boa, mui-
to sensata, mas... para ninguem se illudir, ahi
vae o meu carimbo.» E zás:;: um endoidece
aqui, outro perde o juizo acolá, este assassina
a mandado dos espiritos, aquelle numa sessão
arma um forrobodó dos meus peccados. Tudo
coisas que muito divertem ao capeta.
Não, meu bom Kardec. Isto me convence
cada vez mais que a sua religião nunca foi de
Deus. Não posso crer, não: não me entra na
idéa de geito nenhum que Deus haja estabe-
lecido uma religião que por sua natureza leve
tanta gente para o hospício. |
Deus é bom, Deus é sabio, Deus é intel-
ligencia summa, e o hospício é mau, mata a
sabedoria, acaba com a intelligencia.
A religião de Deus deve esclarecer o en-
tendimento e não apagal-o como se apaga
uma vela de sebo fumarenta e baça.
34 TOLICES DE ALLAN KARDEC
te,

Por conseguinte: para o povo sensato, não


ha precisão de outros argumentos. Basta este:
Essa religião, em virtude de suas praticas, faz
endoidecer? — Tenham paciencia; será tudo O
que quizerem, mas não é de Deus. .

a
NS VAZIA VA
mtas

V
Uma lacuna preenchida
O nosso Kardec termina a sua Introduc-
ção com um achado estupendo. Diz elle que
alguns astronomos acharam lacunas não justi-
ficadas entre os astros e, levados por ellas,
julgaram que devia existir algum astro inter-
mediario. E o certo é que acabaram por des-
cobrir o astro que lhes faltava.
Até aqui nada de novo. E' facto sabido.
Mas o bonito é que Kardec tambem quiz
mostrar-se astronomo de uma nova especie, e
tambem quiz descobrir qualquer coisa de in-
termediario. E então nos sáe com esta:
«Mas entre o homem e Deus que immen-.
sa lacuna se depara !... Qual a philosophia
que haja preenchido essa lacuna? O espiritis-
mo nol-a mostra povoada pelos seres das dOi-
versas ordens do mundo invisivel, e esses se-
res não são outros senão os espiritos dos ho-
mens chegados aos Oifferentes gráus da esca-
la que conduz á perfeição: então tudo se liga,
pre e na desde o alpha até ao omega,
P9- »
Bumba! Esta é tambem das de cabo de
esquadra! Então os espiritos dos homens en-
chem a lacuna entre os humanos e Deus! Os
pobres mortaes capazes de façanha tão gran-
de! Confesso que fiquei desorientado | Acto
36, TOLICES DE ALLAN KARDEC
continuo corri a ver se este doido admitte um
Deus infinito ou não, porque o delle, neste
trecho, parece ser muito pequeno. E achei qu
e
Sim; que tambem elle crê num Deus infinito,
sem limites. Vejamos o que diz á pag. 4:
A razão vos diz que Deus deve possuir
essas perfeições (eternidade... immutabilidade,
omnipotencia, justiça, bondade, etc.) no gráu
supremo, porque, se lhe faltasse uma só, ou
que existindo, não fosse infinita, elle deixaria
de ser superior a tudo e por consequencia não
seria Deus!
Logo, Deus é infinito, sem limites.
Mas, meu caro Kardec, venha cá. Você
acha que o homem, por mais que se enfeite,
por mais que se engrandeça, por mais que se
aperfeiçõe, possa chegar a comparar-se com
Deus ?
Não, meu caro Kardec. Ô homem sempre
será homem, isto é, creatura, limitada, e Deus
sempre será Deus, isto é, Creador, e Infinito
em sua essencia. Como é pois que você pre-
tende encher a lacuna entre Deus e o homem ?
E' como querer ir em balão %'aqui á lua. Você
sóbe, sóbe, emquanto tiver ar; mas depois
acaba o ar e vem só ether, e por mais que
você queira, o balão não avança: falta-lhe o
essencial, falta-lhe o ar. E a lua sempre lhe
ficará a uma distancia enorme.
E' assim no nosso caso. Você eleve o
homem quanto quizer, faça-o grande, faça-o
sabio, faça-o santo; estes predicados, por maio-
res que sejam, sempre terão um limite; ao
passo que Deus é sem limites, pela sua mes.
ma explicação. Sempre Deus ficará a uma dis-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 37
Teo
na

tancla em que não soíffra absolutamente com-


paração.
Vê, pois, meu caro mestre, que você deu
uma cincada medonha. Abaixou Deus até o ho-
mem ou elevou o homem até Deus; ambas
coisas que o bom senso não admitte nem ja-
mais poderá admittir.

ço
SAS SA SNPA
VI
Tolices diversas
Comecemos agora a autopsia do corpo
mesmo d%o LIVRO DOS ESPÍRITOS, obra
considerada pelos espiritas como o que ha de
melhor no genero, e que tem entre elles uma
cotação enorme. Acharemos alli coisas do arco
da velha. |
Mas Kardec não quer a responsabilidade
do que escreve, notem bem. Que diabo! as as-
neiras, é preciso um bóde expiatorio qualquer
sobre o qual atiral-as. E qual será este bóde
expiatorio? Admiremia agudeza de Kardec!
Não é com as costas de qualquer pé rapado
“que elle se escuda, Não, srs. Elle nos atira ás
ventas com os nomes mais illustres; como
quem diz: Querem duvidar? Querem argumen-
tar ? Avancem, se têem coragem. Não é -com-
migo que se têm que medir, não. E com Santo
Agostinho, com Socrates, Platão, Fénelon, São
joão Evangelista, etc. etc. E' a elles, a esses
genios, a essas grandes capacidades que devo
as minhas revelações. Estes grandes homens
fôram os que me disseram: <«Occupa-te com
zelo e perseverança no trabalho que empre-
hendeste com nosso concurso, porque esse tra-
balho é nosso (V. pg. LKIV).
Eis ahi, pois, leitores. Que podemos fazer
ao vermos contra nós essa pleiade de celebri-
TOLICES DE ALLAMN KARDEC 39

dades ? E' pôrmos muito caladamente a viola


no sacco, arrumarmos a nossa trouxa e irmos
sahindo de barriga.
Mas qual! Criemos um pouco de coragem
e enfrentemos o inimigo. Muitas vezes o diabo
não é tão feio como o pintam. E nós... fica-
remos pasmos de ver tamanhas asneiras sa-
hidas de mentes tão illustres!
Loco á primeira pagina o incomparavel
Allan Kardec nos sáe com uma preciosa des-
coberta. Escutem e pasmem! <Tudo quanto é
desconhecido é infinito” diz um espirito cita-
do pelo autor. E' a definição: que elle nos dá.
Comprehenderam bem? Quer dizer que
um rio lá do centro da Africa, que nos é des-
conhecido, é infinito; que as asneiras que O
sr. Kardec ideava, uma vez que nos sejam
desconhecidas, são infinitas. Seque-se d'essa
peregrina proposição: «tudo quanto é desco-
nhecido é infinito». Mas, meu caro doutor
Kardec! Avise esse pobre espirito que olhe
bem o que diz. Aconselhe que vá ouvir algu-
ma prelecçãozinha de philosophia. Digo mal,
que abra um diccionario apenas e veja o que
se entende por infinito. Parece que lá no ou-
tro mundo não ha Qdiccionarios nem philoso-
phias. E' preciso que os espiritas fundem uma
bibliotheca para esse povo. Ou pelo menos
peçam ao espirito de Caldas Aulete que repita
a esse espirito adiantado, superior (como vem
designado no titulo do livro — e sem o autor
corar!!) o que aquelle escreveu no seu dOic-
cionario, a saber: «INFINITO, que não é fini-
to, que não tem limites nem medidas... illimi-
tado.» E' o primeiro significado; por conse-
quinte, o sentido proprio do vocabulo. Vê, pois,
40

o um a as
a
q go me mm
ts e e
- — e
TOLICES DE ALLAN KARDEC
e e
o
+ e rumos

bom Kardec que você se deixou engasopar pe-


lo collega. Não é essa que você dá a defini-
ção do infinito. E se quer convencer-se mais,
folheie algum tratado de philosophia e verá.
| Mas prosigamos na nossa pesquiza de as-
neiras.
À pagina 5 temos outra idéa nova. E es-
ta não é do espirito, é do proprio Allan Kar-
dec, pois está em tyvpo miudo:
«Deus é omnipotente, visto ser unico».
Oh, oh! Até agora entendiamos que Deus
era omnipotente porque podia tudo. Era mais
um erro em que laboravamos! Felizmente aqui
vem o nosso grande autor illucidar-nos e ti-
rar-nos da ignorancia. Deus é omnipotente, não
porque póde tudo, mas porque é unico. Por
conseguinte, se no mundo não existisse mais
do que o sr. Allan Kardec com sua sciencia
maravilhosa, seria omnipotente.
E' claro. Seria o unico!
Deus nos acuda, com a sciencia tão pro-
funda do nosso preclaro autor!
Rardec, porém, não se contenta com essas
tolices. Elle aprecia tambem uma contradicção-
zinha de vez em quando. E' para variar. Não
podemos querer-lhe mal por isso.
<A materia existe de toda a eternidade como
Deus, ou foi por elle creada em algum tempo ?»
pergunta elle á pag 8, vigesima primeira pergunta.
E a resposta que se segue é esta: «Só
Deus o sabe”. Logo, apesar do que escreve
em seguida, confessa ignorancia sobre o ponto.
Entretanto, talvez pesaroso d'essa ignoran-
cia, á pg. 15, n.º 87, torna a perguntar: «O uni-
verso foi creado ou existe de toda a eternida-
de como Deus?» E responde; «Sem duvida
TOLICES DE ALLAN KARDEC 41

que elle não poderia fazer-se a si mesmo, e


se existisse de toda a eternidade, como Deus,
não seria obra de Deus”. Eis a contradicção.
Então, seu mestre, uma hora não sabe, ou-
tra hora define?
Se Oiz que o universo foi creado por
Deus, não pó0e affirmar-nos, como faz, que.
ignoramos se a materia foi creada por Deus;
não acha?
Você dirá que ha diversas opiniões entre
os espiritos. Mas não, não se frata aqui de
opiniões. Aqui temos é duas affirmações cate-
goricas: Ignoramos e sabemos. Ou uma ou
outra. Isso de vir um espirito Oizer que sa-
bemos e outro affirmar que ignoramos, não é
de gente séria.
E lembre-se, Kardec, do que você mesmo
escreveu no Evangelho segundo o Espiritismo,
cap. Il da Introducção: <Os espiritos verdadei-
ramente sabios, se não crêem estar bastante
illustrados sobre uma questão, não a resolvem
jamais d'uma maneira absoluta; declaram que
só a tratam do seu ponto de vista, e aconse-
lham elles mesmos que se espere a confir-=
mação.» )
Vamos, mestre, confesse que esteve co-
chilando quando escreveu aquillo, ou então
que o seu espirito de Santo Agostinho naquella
hora tinha mais o que pensar do que vir dar-
lhe uma resposta. Mas... agora que me lem-
bra — não prometteram aquelles grandes espi-
ritos rever juntos o trabalho todo? Alli está á
pag. LXII:
«Antes porém de dal-o á publicidade, re-
vel-o-hemos juntos afim de verificarmos todos
42 TOLICES DE ALLAN KARDEC
—=———

os pormenores.” Que diacho! Então elles viram


e reviram, e a asneira lhes escapou por entre
os dedos? Que espiga, hein, mestre? Esses
espiritos deviam era procurar outro officio. E
dizer que eram os espiritos de Santo Agostinho,
Socrates, Platão, Fénelon! Eu pelo menos fico
pasmo!

TER
VII
Outras
Passemos por alto a opinião, que os srs.
espiritas dão como provada, de que toda a
materia é formada de um só elemento primiti-
vo (pg. 11. n.º 30). Não a contestamos. Ape-
nas nos permittimos observar que isso, para
nós humanos, não está ainda provado. Não
passa de uma opinião, que tem a sua plausi-
bilidade, não ha duvida, mas que um verda-
deiro pensador não pode desde já affirmar tão
resolutamente como coisa indiscutivel. |
Mas Kardec quer acreditar sem mais nem
menos nos seus espiritos... Deixemol-o lá. Es-
se ponto do elemento unico não faz mal .a
ninguem: é tal qual a cautela e o caldo dé
gallinha. |
"* Por conseguinte, deixemol-o passar.
O mesmo vale quanto á pergunta de se
os astros são habitados; pergunta a que elle
responõe com um arrogante sim (V. pg. 18. no
55). Nós, mais modestos, não dizemos nem
sim nem não; contentamo-nos com à duvida, pelo
menos emquanto não nol-o provam com verda-
deiros argumentos,

Umas palavras do bom Allan que não pu-


de arranjar geito de me convencerem, sã
seguinte o as
s:
“= TOLICES D€ ALLAN KARDEC

Morsós disse que o diluvio universal teve


logar no anno de 1650 A. C. ao passo que a
gevlogia mostra o grande cataclysmo dando-se
anteriormente ao apparecimento do homem, vis-
to que até hoje não foram encontrados, nas ca-
madas primitivas. vestigios da sua presença
nem da dos animaes da mesma categoria, no
ponto de vista physico (pa. 21).
Em primeiro logar, hoje já se encontra-
ram ossos de pessoas e animaes antetiluvia-
nos; por conseguinte, este arrazoado do nos-
so autor nada prova. Lembremos apenas os
craneos de Neanôerthal e de Cro-Magnon, o
bos primigenius, o cervus megaceros, etc.
Em segundo logar, diz que Moysés falou
no anno do diluvio? Onde, meu caro doutor?
faz favor de me dizer? Indique o texto, va-
mos! — Qual! meu bom Allan, você está so-
nhando. Movysés nunca se lembrou disso. Moy-
sés nunca affirmou que o diluvio foi no anno
1650 A. €. Isto foi imaginação sua. Ou, quem
sabe, se você julgou ouvir o espirito delle nu-
ma nova revelação? Mas olhe que nós nos
apegamos á primeira; que essa ultima nos é
muito suspeita.
Em terceiro logar devia saber que, quan-
to á chronologia, ha divergencia entre os ma-
nuscriptos mais antigos da Biblia; divergencia
devido a descuidos dos copistas, visto os al-
garismos serem lettras e estas confundirem-se
facilmente umas com as outras. Logo, ainda
que Movysés désse a data do diluvio, não sa-
beriamos mais qual teria sido essa data. Por-
tanto, caro mestre, quanto a chronologia, acre-
dite você o que quizer; até mesmo se lhe a-
prouver, que o ôDiluvio foi tras-ante-hontem;
TOLICES DE ALLAN KARDEC 45

em nada isso nos incommoda. Comtudo, olhe,


se você quizer discutir pontos de chronologia,
não tem mais que descobrir que numeros fo-
ram os que os sagrados escriptores escreve-
ram. Descubra-os, mestre, e depois então fa-
laremos. Mas nunca diga que Moysés dá pa-
ra 4 diluvio o anno de 1650, porque isso é
uma solemnissima mentira.
* ak
x

Interessantes estas palavras do grande


homem: «Que é feito do principio vital dos
seres organicos por occasião da morte destes?
O principio vital volta á massa” (pg. 25 n.º
70). E o mesmo Kardec explica assim pouco'
abaixo: «Pela morte do ser organico, os ele-
mentos que o formavam soffrem novas com-
binações para construirem outros seres, . os
quaes tiram da fonte universal o principio da
vida e da actividade absorvendo-o e assimilan-
do-o, para o restituirem a essa fonte quando
cessarem de viver. «Qual é a fonte da intelhi-.
gencia? A intelligencia universal» (pg. 27 n.72).
Mas deixemos essas idéas bizarras que
em nada nos molestam. Não temos a preten-
ção de discutir tudo n'esse livro desopilante,
Contentar-nos-hemos com as tolices principaes.
porque senão teriamos que escrever um ca-
lhamaço. ..

Um achado de arromba tambem é o de


que «Deus sendo eterno, deve haver creado
incessantemente (pg. 39, n. 78). E explica-o com
o n..80: <A creação dos espiritos é perma-
nente, ou só se effectuou na origem dos tem
46 TOLICES DE ALLAN KARDEC

pos? E' permanente, visto como Deus nunca


cessou de crear>
Esta sahida do nosso Kardec faz levar a
mão ao queixo e ficar com a vista abstracta.
Deus então está sempre creando ?... Deus en-
tão não pode um momento deixar de crear?
Não querem dar a Deus um momento de des-
canço? E que tal! Estaria bem arranjado o
nosso bom Deus se não fosse quem é, e se
cansasse como nós, pobres mortaes!
Com que então, caro Kardec, Deus não
pode deixar de estar sempre creando? Mas
porque? Explique-me o motivo! Será para
não ficar ocioso? (Porque de facto, Rardec
não dá argumento algum: affirma e prompto).
O unico argumento que você pode dar é O
seguinte, citado tambem por Flammarion na
sua obra Os mundos imaginarios: Deus é acto
puro visto não poder constar de acto e po-
tencia sob pena de ser limitado; ora, se é a-
cto puro não pode estar inactivo um momen-
to; logo deve estar creando incessantemente,
febrilmente, com phrenesi. — Eu, porem, tomo
a liberdade de responder-lhe com outro racio-
cinio; escute: Deus tem o poder de cas-
tigar; é ou não é, mestre? Ora bem, este
poder não pode nunca estar em potencia, se-
não Deus já não seria acto puro (conforme
esse argumento). Logo Deus deve estar sem-
pre castigando, incessantemente, febrilmente,
ainda que ninguem o merecesse, só por cau-
sa da sua essencial...
Que be ll a co nc lu sã o re su lt a de ss e ra ci oc i-
nio, hein , me st re ? Vo cê , em su a ca pa ci da de
philosophica devia subir... subi r... até entes-
47
DE ALLAN KARDEC
TOLICES

u ma c a b e ç a d a n o
l a t ã o , e a l l i d a r
tar com P a t i r a ss e d e , c a t r a m b i a s
r e g o q u e O
grande g o i s s e v o c ê i i
e . P
para todo o sempr ilosophia € força 0€
t o d o s o s m e s t r e s , e m p h
raciocinio! >
por esse arg ume nto , Deu s 0e-
Ainda mais,
ve agir sempre com todo o Seu poder, por que
em pote ncia a uma acçã o maio r.
aliás estaria
Ora bem, num só momento Deus pod e crear
, pode crea r dois , tres, dez, mil. ..
um espirito
Diga pois , mest re, quan tos acha que Deu s de
facto cria a cada mom ent o? Uma vez que vo-
cê o obriga a crear de continuo para que a
sua potencia creadora não fique inactiva, pelo
mesmo motivo nenhuma energia dessa potencia
póde ficar inactiva; e então teremos como con-
clusão que Deus deve crear, a cada instanti-
nho,o maior numero de seres que lhe seja
possivel. Ora se você me diz que Deus cria
cem mil espiritos a cada instante, eu lhe re-
plico: Deus pelo menos. pode crear cem mil e
um. Se você me falla em dez milhões, eu lhe
observo que com a mesma facilidade Elle po-
de crear dez milhões e um. Vê pois, bom Al
lan, “Q que esse ar gumento nos leva dia
demasiado
longe e por conseguinte não presta para naôd
Escute,
Escu te, Rarde c, c, OO poder creador de Deusne
Rarde
é infinito: deve, porem ., ser limi tad :
os pelo seu livre arbitrio soberano. E
t 1 . O nos effei-

- & não
prrecisãe 0 e h uma de Elle estar sempre ha
crean-
p ra estar em acto, porque esse poder
creador identifica-se com a essenci
esta, , emquant emquanto intelligencia, está nciasem divina, e
acto, comprehendendo incessante a em
menade,
i o e, emquanto vont
aerfeiinções mm ininfindand su
te asam as
tam ente essa mesma
inferrupptam | aMan-
essencia. in-
48 TOLICES DE ALLAN KARDEC
mam

finitamente digna de ser amada. Alem disso o


acto de crear é eterno e infinito na essencia
de Deus; o efíeito é que se manifesta no tem-
po e apparece limitado conforme a vontade
eterna de Deus. Logo, podemos supprimir es-
sa creação incessante que não tem razão ne-
nhuma de ser. |

PASS
(ESA NR

VII
Os espiritas são materialistas!!
Leitores, até aqui todos julgavamos que a
alma era espirito, que materia era coisa com-
pletamente diversa, que a materia constava de
partes integrantes e a alma não. Ma — louv
s a-
do seja o genio de Allan Kardec! O nosso er-
ro era dos mais crassos. A nossa ignorancia
era supina. Louvores a Deus, pois que o gran-
de homem nos elucida! — Immaterial não é o
termo proprio, diz elle, incorporal seria mais
exacto; pois bem, ôdeveis comprehender que
sendo o espirito uma creação deve ser algu-
ma coisã; é materia quintessenciada, mas sem
analogia para vós, e tão etherea que vos es-
capa aos sentidos (pg. 30, n. 82)
Paremos um pouco, leitores, que isto aqui
não vae d'um folego, não senhores. E' muita
asneira condensada em tão pequeno nume-
ro de palavras. Precisamos andar devagar por-
que se acompanhamos o sr. Kardec nos seus
saltos acrobaticos, corremos risco de quebrar-
mos O pescoço.
Como vemos, para Allan Rardec, materia e
corpo são coisas distinctas; pois diz: immate-
rial não é o termo proprio, incorporal seria
mais exato.
Mas venha cá, meu bom mestre, diga-me
que é corpo? Abramos um compendio de Phy-
50 TOLICES DE ALLAN KARDEC

sica, Langlebert por exemplo, e ahi leremos a


primeira pagina: «Chama-se corpo qualquer
quantidade limitada de materia!» — Oh, oh, mes-
tre, que é isto! Então você nunca tinha aber-
to uma physica? Como é que mette assim os
pés pelas mãos? Máu, máu, mestre! Conven-
ca-se: corpo é materia; e por conseguinte vo-
cê não devia fazer esta Oistincção entre im-
material e incorporal. Ou quererá dizer que
tambem esta asneira é de Santo Agostinho?
Segundo reparo acho naquellas palavras
sendo o espirito uma creação deve ser algu-
ma coisa. |
Interessante! Logo, segundo o preclaro
Allan Kardec, o immaterial, o espirito verda-
deiro não existe. Não seria alguma coisa! Eu
pasmo! | "
ada
E esta gente pretende que a religião 0 el-
les é a mesma religião nossa! Faz uma ba-
rafunda medonha, vira de pernas para o ar os
nossos primeiros principios, e depois preten-
de que fica sendo a mesma coisa! Deus nos
acuda! À |
Conclusão. Para os espiritas verdadeiros,
para os espiritas que seguem o inclito Allan
Kardec, não ha espiritos; tudo é materia; quin-
fessenciada se quizerem, mas é materia. Logo,
Roe os ESPIRITAS são MATERIALIS-
Eis uma transformação á vista, que mui-
to lembra as de Frégolli.
E nós que prrusads que os espiritas
eram ESPIRITAS! Que logro, hein? Não é u-
ma suspeita nossa, não: nem é a opinião de
um espiritazinho qualquer. E' o proprio Allan
Kardec que, desembaraçando-se de todo pejo,
TOLICES DE ALLAN KARDEC 51

arremette com a fronte para os astros, € pro-


clama que o espirito não existe, que é mate-
ria porque deve ser alguma coisa!
Christãos, christãos, abram os olhos! Os
senhores têem tanto horror aos materialistas,
e deixam-se materialisar por um Allan Kar-
dec! Abram os olhos, e não se deixem levar
pelo espiritismo que como acabamos de ver,
não passa de um materialismo disfarçado!...
Mas, oh meu estupendo Allan Kardec! e
Deus? Uma vez que o espirito deve ser ma-
teria para ser alguma coisa, Deus tambem de-
verá ser materia. Isto é claro como tinta de
escrever!
Logo o espiritismo tem um Deus material,
um Deus imperfeito, um Deus que nunca po-
de ser Deus!
E isto você diz que é ensinado por Santo
Agostinho? Isto é o que lhes préga Fénelon?
Isto é o resultado da grande intelligencia de
Platão! Está solto, meu caro Kardec! Isto é,
mas é muito seu. Que nenhum-d'aquelles gran-
des homens proclamava uma asneira d'esse
calibre. Você está é calumniando essa gente
toda. Tome cuidado, hein? Olhe que ahi no
outro mundo elles lhe fazem as contas.

rage
1X
Filhos de Deus?
O espiritismo, bem como outras seitas que
entram pela religião catholica como villão por'
casa do sogro, se apossaram da bella idéa de
que somos filhos de Deus, e fazem desta idéa
mal entendida, um cavallo de batalha; com el-
la querem fazer jus á benevolencia divina, sem
se importarem com as exigencias da sua jus-
tiça.
«Somos filhos de Deus! — dizem elles á
bocca cheia — Deus é nosso Pae: estejamos
pois tranquillos e socegados, que grande mal
não nos pode provir ô'Elle, por mais que pin-
temos, por mais perversos que sejamos!»
Pois sim, façam conta com isso! E' o ca-
so de Oizer-lhes como o outro: .
— Fiem-se na Virgem e não corram: ve-
rão o tombo que levam! .
Assim, pois, nos vem tambem o nosso
Kardec a pagina 30, n. 77, com estas palavras;
Somos filhos de Deus por sermos obra delle,
E a pg. 45, n. 116, com mais estas: Todos os
espiritos chegarão a ser perfeitos...; um pae
justo e misericordioso não pode banir eterna-
mente seus filhos.
Somos filhos de Deus por sermos obra
9'Elle? Extranha proposição!— Que, tio Kar-
dec! Só porque somos obra de Deus, somos
seus filhos?
TOLICES DE ALLAN KARDEC 53

Se vamos a isso, as minhas botinas tam-


bem são filhas do sapateiro que as fez: são
obra delle! A casa, a mesa, o livro são ou-
tros tantos filhos do pedreiro, do marcineiro
e do livreiro. E você olhe, tome cuidado com
o seu chapéo, veja que é filho legitimo do
chapeleiro alli defronte. Não vá fazer alguma
que desgoste o pae, porque então temol-a tra-
vada. Ainda mais: por esse principio (que O
bom Deus nos releve tirarmos as consequen-
cias do principio de Kardec) as pedras e os
cães tambem seriam filhos de Deus. Até os
mosquitos gosariam dessa prerogativa, e você,
Kardec, não poderia matar um desses insectos,
só por causa duma innocente ferroada!
Qual, Kardec! a sua asserção prova de-
mais. Não basta sermos obra de Deus para
sermos seus filhos. À considerarmos só esse
facto, não passamos de creaturas suas. E de
creaturas a filhos vae um abysmo, meu caro.
Quer saber porque somos filhos de Deus?
E' porque Elle nos adopta por taes. Somos fi-
lhos adoptivos, meu bom Kardec, e não filhos
reaes e verdadeiros. E isto mesmo é apenas
emquanto não vos voltamos contra Elle; por-
que á hora que o affrontarmos com a deso-
bediencia, á hora em que, esquecidos do be-
neficio da adopção, lhe atirarmos á face os
nossos peccados, Deus deixará de considerar-
nos filhos, e com toda a razão. Os que des-
prezam a sublimidade d'essa adopção, que é
inteiramente gratuita, merecem punição, por se
mostrarem muito ingratos e bem indignos do
amor ôdivino. Pelo menos emquanto não se ar-
rependem, emquanto não imploram a miseri-
cordia divina, não são contemplados por Deus
54. TOLICES DE ALLAN KARDEC

como filhos; perderam o direito á bella graça


de adopção. Comtudo, a bondade de Deus, a
sua misericordia infinita, se patenteiam na fa-
cilidade com que perdôõa e torna a conceder o
direito de filho a quem se dirige a Elle, com
amor e arrependimento no coração.
. Não acha, meu bom Kardec, que isto é
mais digno dum Deus magestoso e grande e
soberano, do que essa sua pretenção de que
Deus deva aguentar todas as patifarias que
vocês queiram fazer-lhe, sem protestar, sem
queixar-se, sem erguer um dedo para castigar
devidamente?
Não, convença-se, bom tio Kardec; você
por ex.spodia ser considerado filho de Deus,
era só querer, porque Elle é muito bom e não
faz accepção de pessoas. Mas uma vez que
você se revolta contra, Elle, uma vez que vo-
cê prefere as caraminholas que lhe andam pe-
la cabeça ás verdades que Elle se dignou re-
velar-nos, Deus, indignado, não póde mais
olhal-o como filho, emquanto você não se ar-
repenõe e obtem o perdão de suas faltas. Ar-
rependa-se, e então verá quanto é bom e ca-
rinhoso esse Pae adoptivo, que só espera que
o peccador se lhe lance nos braços para per-
doar-lhe e cumulal-o de bens.
*
% &%

Gosto de apanhar o sr. Kardec numa con-


tradicçãozinha! Não é por nada. E' só para
abrir os olhos aos que vão atraz delle, jul-
gando que acompanham um dos luzeiros da
humanidade, quando o coitado nem uma mi-
sera lanterninha era, e se revolvia misera-
mente nas trevas como qualquer outro.
TOLICES DE ALLAN KARDEC 55

-Abramos o seu livro á pg. 77, n. 191. Al-


li, no texto miudo, lemos o seguinte: ...com a
differença de nunca ter fim essa vida (a do
espirito ) visto que não teve começo.
Perceberam; meus carissimos leitores? O
nosso espirito não teve começo. Por conse-
guinte, o nosso espirito é eterno como Deus, e não
foi creado. Se querem ler mais uma vez, leiam, e
esftreguem bem os olhos para se convencerem de
que realmente o homem escreveu esse QOislate.
Entretanto, saltemos atraz algumas folhas
e vamos á pg.30, n. 78. Que vemos alli? Si os
espiritos não houvessem tido principio seriam
eguaes a Deus, no entanto que são creação sua.
Mas, com seiscentas brécas a un? tempo,
Kardec! Fale franco uma vez na vida: o es-
pirito é creado ou não é creado? Lá adiante
você disse que a sua vida não teve começo,
e aqui nos sáe com o principio da mesma! Eh
lá, mestre! eu quero saber a quantas anda-
mos! Ou você dá começo aos espiritos ou en-
tão lhes supprime a creação. Nada de ajuntar
coisas que se excluem, que se antipathisam, que
se olham 0€ travez!. :
Xe

Allan Kardec faz uma idéa exquisita d0s


demonios. Elle nos attribue crenças com que
nós jamais sonhamos, e então se encarniça a
combatel-as de lança em riste. E' um novo D
Quixote a endireitar tuertos que nunca existiram,
a não ser na sua pobre cachola adoentada.
— Vejam á pag. 49, n 181, onde elle per-
gunta, referindo-se aos demonios:
Deus seria justo e bom se creasse seres
infelizes, eternamente votados ao mal?
E, pouco adiante, no texto miudo:
56 TOLICES DE ALLAN KARDEC

Deus não podia crear seres prepostos ao


mal por sua natureza.
(Nas, meu optimo sr. Kardec, onde é que
você desenterrou esse achado tão peregrino ?
Quem é que diz que Deus creou os demonios
prepostos ao mal por sua natureza, faz favor
de me dizer? Terá o topete de affirmar que
nós, os catholicos, dizemos semelhante asnei-
ra? E' o queeu digo. Você metteu-se a escre-
ver e a combater o catholicismo sem o estu-
dar primeiro, e, consequentemente, como nãc
podia deixar de ser, disparatou esnlendidamen-
te. Não é a primeira vez, e tambem não será
a ultima, como o leitor terá occasiãv de ver.
Leiá, bonissimo Kardec, leia algum trata-
do da nossa religião, algum pequeno catecis-
mo até, verá que isto não lhe faz mal algum.
Ahi verá que nós absolutamente não forma-
mos essa idéa absurda do demonio, que vo-
cê nos quer attribuir. Deus não creou os de-
monios prepostos ao mal por sua natureza.
Deus os creou bons, anjos, innocentes, intelli-
gentes, para que comprehendessem os seus
deveres. Elles por orgulho revoltaram-se con-
tra Deus, e então foi que Deus os condemnou.
Não acha que isto sda um poucochinho diffe-
rente do que você nos quer assacar? Ah, mes-
tre, mestre! E' preciso não cochilar quando se
quer jogar uma pedra no adversario.
Por conseguinte, os demonios não são
- por sua natureza prepostos ao mal, como quer
Kardec. E uma vez que não o são, a idéa que
os espiritas formam dos espiritos máus e zom»
beteiros concorda quasi em tudo com a nos-
sa dos demonios. Querem ver? Abram o livro
á pg. 128, n. 281:
TOLICES DE ALLAN KARDEC 57

Porque é que os espiritos inferiores se


comprazem em nos arrastar ao mal? Por des-
peito de não terem merecido um logar entre
os bons. Eº seu desejo impedir, quanto possi-
vel, que os espiritos ainda inexperientes alcan-
cem o bem supremo; querem que os outros
soffram o que elles soffrem.
N. 465: Com isso diminuem os seus sof-
frimentos ? Não, mas fazem-no por inveja
da felicidade alheia. .
N. 466: Se fordes inclinado ao homici-
dio, tereis uma chusma de espiritos que ali-
mentem esse pensamento | |
N. 102: Praticam o mal por gosto, o mais
das vezes sem motivo, e por odio ao bem.
Não é justamente o que nós ensinamos
ácerca dos demonios? E' apenas questão de
nomes. Elles chamam-lhes espiritos inferiores,
atrazados, imperfeitos, — nós chamamos-lhes
demonios, diabos ou capetas. No mais, quan-
to ás suas qualidades, coincidem perfeitamen-
te como os angulos de triangulos semelhantes.
Nenhum espirito tem por missão fazer o
mal: quando o faz é por sua propria vontade...
Deus póde deixal-os proceder assim para os
experimentar, mas não lh'o ordena; está em
vosso arbitrio repellil-os (n. 470.) Sómente a
fraqueza, a negligencia e o orgulho do homem
dão força aos espiritos máus (n. 498).
Continuamos, ainda nisso tudo, a concor-
dar com o nosso bom Kardec. São os nossos
demonios escriptos e escarrados, Logo, pelas
proprias palavras do nosso corypheu, a idéa
que nós formamos dos demonios não é tão
absurda como elle quereria dizer, não acham?
A punição no espiritismo
Certa porção da humanidade, julgam os
leitores que deseja a religião verdadeira? Pu-
ro engano. Procura é a religião mais com-
moda. E' myope. E assim. á distancia, confunde
a verdade com a commodidade.
Pobres tolos! Julgam que, no dia das con-
tas, bastará dizer a Deus, choramingando:
— Bh, não sabia! — para Deus lhes dar um
tapinha na face e os mandar dormir!
Pois o espiritismo é uma d'essas religiões
que tal povo procura. E' uma religião commo-
da, indulgente, ideal. |
Escutem só. Segundo essa magnifica reli-
gião não ha grande castigo para as culpas: a
penalidade que ella impõe é ficar a alma es-
tacionaria, voltar á vida, recomeçar a existen-
cia. Quer dizer: Castigo de ter sido devasso—
tornar a sel-o em nova existencia. Castigo do
assassino
— novas occasiões de tornar a ma-
tar. Castigo da vingança — reviver situações
que a possam reconduzir... €' o similia simí-
libus dos medicos, ao que parece.
Ora, qual é o homem vicioso que não
goste de tornar a viver a mesma vida de vi-
cios e paixões desregradas? Qual o jogador
que não goste de voltar ao mundo para tor-
nar a jogar e tornar a furtar no jogo com Sã-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 59

aç ão su a e lu cr o ma ni fe st o ? Qu al o la dr ão
tisf
qu e nã o ve ja co nv en ie nc ia em re co me ça r os
seus fu rt os co m os qu ae s po ud e le va r um a
vida regalada a custa do alheio?
Mas vejamos o que diz O nosso autor. A-
bram lá o tal LIVRO DOS ESPIRITOS á pg.
46 n. 118. Que diz alli? Os espiritos podem
degenerar? Não, (o espirito) póde ficar esta-
cionario, mas não retrograda. Agora á pg. 73
n. 178. Os espititos pódem ir,viver corporal-
mente em mundos inferiores áquelle em que
iá viveram?... Isso não poderá tambem ter
logar por expiação? R. Os espiritos pódem fi-
car estacionarios, mas não retrogradam;, en-
tão a sua punição está em não avançarem e
em terem de recomeçar as existencias mal em-
pregadas, no meio conveniente á sua natureza.
Tomem nota: a punição está em não avançarem.
A' pg. 347, n. 872 vemos tambem o se-
quinte: Se sáe vencedor dessa lucta, eleva-se;
se baqueia, fica sendo o que era, nem peior
nem melhor: é uma provação a recomeçar, €
isto pôde durar longo tempo.
Do n. 258 diz ainda: Tanto lhe é permit-
tido seguir o caminho do bem como do mal!
Se succumbe... Deus em sua bondade, lhe dei-
xa a liberdade de recomeçar o que não execu-
tou como devia.
| Que bom, hein? Não é o que eu dizia?
E' recomeçar. E' um castigo esplendido. Os
legisladores todos são uns tolos. Deviam des-
'barretar-se, curvar-se até o chão e eclipsar-se
diante do preclaro Allan Kardec. Este sim que
mettia os lycurgos todos num chinello!
| Vejam que coisa bonita! Um fazendeiro
faz trabalhar yum anno inteiro seus pobres
60 TOLICES DE ALLAN KARDEC
aire dear mem

camaradas na fazenda. Depois de tanto suor


derramado, depois de tanto mourejar de sol
a sol — nega-lhes o pagamento! E' dos pec-
cados que bradam aos céos. E' dos que pe-
dem o castigo a gritos. Pois olhem, para os
espiritas, isto não é nada: Deus em sua bon-
dade, por toda punição, deixa a esse fazen-
deiro a liberdade de recomeçar o que não exe-
cufou como devia!... |
Nero fez despedaçar por cães gente en-
rolada em pelles de animaes, queimou outros
com pez, passeiando de carro á luz dessas
tochas humanas. Nero envenenou o irmão,
mandou matar a mãe, a mulher e milhares
de outras pessoas e ainda pôz fogo a Roma,
deixando sem tecto infinidade de pobres. .
Qual terá sido a punição de Nero? Oh,
não se assustem! Nero não ficou com isso nem
melhor nem peior.A sua punição consistiu em
não avançar e em ter de recomeçar a exis-
fencia mal empregada, no meio conveniente á
sua natureza !...
Oh, que bella religião! Isto é sublime, is-
to é magnifico, isto é estupendo!!
Porém mais uma vez se nos manifesta
aqui o genio de Allan-Kardec, fazendo ver o
branco preto e o preto branco. Mais uma vez
elle se mostra insigne em exhibir uma bella
contradicção. Vimos que das suas proprias
palavras se infere que a punição é recomeçar
a pandega, visto que o espirito não degenera,
não recúa, a sua punição é não avançar. E
eis que no entanto lá vem no n. 265 dizendo:
Não haverá outros (espiritos) que façam
essa escolha por sympathia e desejo de vive-
rem num meio conforme aos seus gostos ou,
TOLICES DE ALLAN KARDEC 61

para poderem entregar-se materialmente ás


suas propensões? R. Ha alguns... Cedo ou tar-
de, porém comprehendem que a saciedade das
paixões brutaes tem para elles consequencias
deploraveis, que soffrerão durante um tempo
por elles supposto eterno.
Ah, então... tem consequencias deploraveis?
E soffrerão?... Logo, ha punição. Logo, o es-
pirito degenera. Logo não é só recomeçar,
mas é voltar atraz no merecimento, pois des-
mereceu para com Deus, tornou-se peior, me-
receu castigo!! Mas, mestre, que diacho de
barafunda é esta? Você no Oia que escreveu
isto parece que andava lá pelo mundo da
lua. Emfim, vá lá; póde bem ser que o cul-
pado fosse Santo Agostinho, muito occupado tal-
vez no reino do. Além, ou, quem sabe, distrahido
com coisas mais urgentes do que as suas tolices.
Mas notem, leitores; a contradicção não
apparece uma vez só. Vem a ser uma especie
de enfeite que Kardec entrelaçou no seu com-
plicado systema theologico. Escutem. No n.
535 observa: Entretanto ha pessoas que não
pedem nem agradecem (a Deus) e a quem
tudo sae bem... Sim (responde) mas esperaeo
fim, elles pagarão bem caro essa felicidade
passageira que não merecem. E non. 373:
Os maiores genios pódem ter muito o que
expiar; dahi se origina muitas vezes para el-
les uma existencia inferior á que já tiveram
e uma causa de soffrimentos. No n. 550: Pelo
Seu amor aos prazeres materiaes (o homem)
colloca-se na dependencia dos espiritos impu-
ros, o que constitue entre estes e elle um pa-
cto tacito, que o conduz á perdição mas que
lhe é sempre facil romper.
62 TOLICES DE ALLAN KARDEC

Logo o nosso preclaro mestre admitte


tambem que o mal moral leva á perdição, aôd-
mitte que póde haver uma existencia inferior.
E como é então que o espirito não retrograda ?
pergunto eu. Como é que é só recomeçar? Non
capisco niente, meu caro. Você é sublime demais.
Não me é possivel chegara tamanhas alturas,
acompanhando o seu genio que se expande e
se Oilata pelo excelso reino da Contradicção.
Se Oiz queo espirito não póde retroga-
dar, então ou é castigado sem o merecer, pois
como Oiz, não retrogradou (apezar da punição in-
fligida,) ou então admitte que retrogradou, porque
mereceu o castigo e consequentemente tornou-se
peior. De todos os modos temos contradicção.
E mais uma contradicção temos ainda no
n. 168: Em cada nova existencia o espirito
adianta um passo na senda do progresso. —
Mas como, mestre, se o homem se tornou
culpado? como, se desceu a uma existencia
inferior? como, se tem que soffrer castigo, o
que não é nenhum passo na senda do pro-
gresso? — Não, mestre, pelas suas proprias
palavras, o espirito culpado recuou em vez de
ir para diante, teve que soffrer a punição, o
que não deixou de o atrazar. Recuou para
a culpa, recuou no merecimento, recuou para
um estado peior, recuou na recompensa que
lhe ficou mais longe; e recuou emfim, o pro-
prio Allan Kardec na sua logica e no concei-
to de Pensador a que injustamente aspi
“Fo que é ra va.
| |
Eres
XI
Provas. Espiritos ignorantes. Por-
que não recordamos.
.«. Admiremos estes trechos do Livro dos
Espiritos: «Porque é que Deus deu a uns as
riquezas e o poder, e a outros a miseria? Pa-
ra experimentar a cada um de modo Oifferen-
te. Demais, como sabeis, essas provas são es-
colhidas pelos proprios espiritos que muitas
vezes não as vencem». (N. 814). «Uns prefe-
rem vida de miseria e privações para tenta-
rem supportal-a com coragem; outros que-
rem experimentar as tentações da fortuna e
do poder, muito mais perigosas... outros fi-
nalmente, vão procurar occasião de triumpha-
rem collocando-se em contacto com o vicio e
luctando contra elle.» (N. 264).
Resulta daqui que os espiritos é que es-
colhem a fortuna ou a miseria, o contacto do
vicio ou a aura da virtude.
Kardec parece pensar que os espiritos
são muito bestas. Quem é que deixa de es-
colher a fortuna nessas condições? Olhe,
Kardec, acho que até você mesmo, antes que
a miseria, quereria para si as bellas tentações
da fortuna. E creio mais que o seu Deus, o
qual (diga-se de passagem) é um pouco diffe-
64
SE ee
TOLICES DE ALLAN KARDEC.
ES pa ac — cad eita

rente do nosso, ha de muitas vezes abanar a


cabeça descontente por ver que multidão de
espiritos prefere repetir a existencia de gozos
a ir-se metter nas calças pardas da miseria.
Confirma o que dizemos o n 815: Qual
das duas provas é mais arriscada para o ho-
mem: a da desgraça ou a da fortuna? Tanto
o é uma como a outra. Ah Kardec, Kardec!
Quem não vê que, em egualdade de condic-
ções, e visto tanto valer seis como meia QOu-
zia, todos escolheriam as provas da riqueza
de prefesenria ás da miseria? Não é preciso .
lá rxuito tino para prever isso. E' uma cousa
que salta aos olhos. R
de a
- Observação impagavel é esta da pg. 36,
n. 100: Entre os espiritos, como entre os ho-
mens, ha muitos ignorantes, e por isso nunca
estaremos assaz precavidos contra a tenden-
- cia que nos leva a crer que todos elles de-
vam saber tudo, pelo facto de serem espiri-.
tos. Eu exclamo: ah! á espera de que Kardec
me saia com outra para então exclamar: oh!
Pois, meu caro amigo, se ha tantos espi-
ritos ignorantes, como você mesmo Qiz, de
que modo podemos acreditar no que elles
contam? A meu ver, é uma imprudencia im-
perdoavel. Sabe lá, seu Kardec, se até esses
que vêem cow: phrases altisonantes e campa-
nudas, não são outros tantos bestas que nem
sabem o que 0Oizem? A quantos basbaques
aqui no mundo, certos pedantes que apenas
têem umas tintas de sciencia mal Ddigerida,
não fazem arregalar os olhos e respeitar-lhes
"O preparo que, no pensar d'aquelles, é uma
cousa por ahi além! Impõe-se só porque o.
TOLICES DE ALLAN KARDEC 65

que dizem toca uma esphera que áquelles é


vedada, visto como nem essas mesmas desla-
vadas tintas elles possuem.
Assim tambem os espiritos, desde que es-
tejam na mesma altura de conhecimentos que
os espiritas a quem se manifestam, podem
perfeitamente ignorar tudo o que elles vêem
definir, falem elles muito embora de papada
segura entre os dedos, e de olhar fito e con-
centrado. E ao passo que elles lhes enfiam
pelos ouvidos um rosario de mentiras, os es-
piritas logo a desbarretarem-se diante d'elles,
a admirar-lhes a alfa philosophia, a espichar
o beiço uns para os outros com cada olho do
tamanho de uma cebola!
Não está bem á vista a possibilidade d'um
logro collossal? Na hypothese dos espiritas, o
orgulho, a propria sciencia que já levam d'es-
te mundo, a velhacaria que não Ocixaram em
herança a ninguem, tornam tudo isso bem pos-
sivel. | |
Consequencia: São muito temerarios os
srs. espiritas em seguir os dictames de quem
quer que seja que lhes vem falar do outro mun-
do. Discorrem sobre cousas que não pode-
mos verificar? Hum! Apparêntam uma gran-
de santidade ? Duas vezes hum! A mostra
de santidade não exclue a hypocrisia, cousas
ur já neste mundo se compatibilisam muito
em.
Qual! Eu quero ser mais cauto. Uma
vez que o proprio Allan Kardec me abre os
olhos, me previne que ha muita ignorancia e
engano no além, desconfio de todos os es-
piritos. Não é com sua pretendida stiencia
indveriguavel que elles me enrolam: nem é
66 TOLICES DE ALLAN KARDEC

com conselhos faceis e baratos que me deixo


engasopar. 4
ne 3 ,

Uma objecção a que os espiritas se tor-


cem, gemem mas não respondem de geit— oé
a de que o ser reincarnado devia recordar tu-
do o que se tivesse dado com elle em ante-
riores existencias. E nós o affirmamos por dois
motivos: primeiro porque parece uma injustiça
da parte de Deus fazer expiar culpas de que
não ha lembrança; segundo porque a alma
"espirito como é, devia conservar sem difficul-
dade a recordação daquillo que já conhecia,
independentemente do corpo, antes de passar
para elle.
Entretanto no n. 180 diz Allan Kardec:
<A infelligencia não se perde, mas nem sem-
pre o espirito dispõe dos mesmos. meios para
manifestal-a: depende isso da sua superiori-
dade e do estado do corpo que tomar».
Agora no n. 237: «Quando se está no mun-
do dos espiritos, a alma tem ainda as perce-
pções que possuia nesta vida? Sim, e outras
que então não possuia, porque o corpo era
como que um véo que as obscurecia.À intel-
ligencia é um affributo do espirito, mas ma-
nifesta-se mais livremente. quando este está
liberto de obstaculos».
E on. 379: «O espirito que anima o cor-
po duma creança é tão desenvolvido como o
dum adulto? Póde sel-o ainda mais, st hou-
ver alcançado maior progresso; e a imperfei-
ção dos orgãos que o impede Os se mani-
festar* |
Mas eu queria que os espiritas me Dis-
sessem uma cousa, Quando o homem ja está
TOLICES DE ALLAN KARDEC | — .——— utmu us mam ue
67
adulto, com os orgãos todos desenvolvidos,
qual é o impedimento para o espirito mani-
festar ou mesmo penetrar-se do que sabe de
outras existencias? Que.é que não o deixa
ter consciencia do que Sabia e tornará a sa-
ber quando desincarnado? À imperfeição dos
Orgãos não é, porque suppomos os orgãos
perfeitos. E os proprios espiritas não dizem
que na adolescencia apparecem as más pro-
pensões, e que estas não são do corpo sim
do espirito? (V. n. 385). |
E não dizem que a repulsão instinctiva
que experimentamos, á primeira vista, por
certas pessoas, é antipathia entre espiritos
que se advinham e se reconhecem (n. 389)?
E não dizem mais que, quando o ser incar-
nado já possuia um bom gráu de sciencia ou
arte, êssa sciencia, esses conhecimentos re-
apparecem no estudo, aprendendo elle como
que por intuição e sem esforço (n. 219)?
Porque é então que em outras cousas só,
apesar de muito menor QOifficuldade, não ap-
parece memoria alguma? Porque, observem
bem que é muito mais difficil recordar as ma-
thematicas, a philosophia, a musica, que se
conheciam noutra incarnação, do que a pro-
pria vida quotidiana, os proprios feitos bons
ou maus, Os crimes ou as virtudes que se
praticaram,
Accresce que os espiritos (como querem
os kardequianos) estão continuamente mani-
festando o que sabem pelo corpo dos outros.
nas sessões. Não Ddifficuldade em fazer dizer
ao medium tudo o que lhes dá na telha: nar-
ram acontecimentos antigos, dão conselhos,
“fazem revelações, etc. etc, Porque é então que
68 TOLICES DE ALLAN KARDEC
[a

só mediante o proprio corpo, apesar de bem


desenvolvido, embora seja elle de um medium
não pode manifestar o que sabem de ha muitos
annos? — Mysteriol, Mysterio profundissimo!
A hypothese dos snrs. espiritas é inexplicavel.
(Mas qual mysterio, qual nada! E' simples-
mente porque a reincarnação é uma grandissima
peta. Senão, assim como os espiritos não téem
difficuldade em vir falar as estopinhas por
meio dos mediums, tambem a alma não teria
difficuldade alguma em manifestar os seus co-
nhecimentos pelo proprio corpo que lhe está
muito mais chegado.
Ê % &

Bem sabe Kardec que achamos impossi-


vel que Deus neste mundo esteja castigando
faltas de que não rios deixa recordação.
Castigar sem que o réo saiba porque, pa-
rece brutalidade e não Satisfaz nem o nosso
proprio sentimento de justiça humana, quanto
mais o da justiça divina!
Mas Kardec não quer assim. Kardec quer
" que Deus queira a nossa punição sem nós sa-
bermcs porque somos punidos. Eá vem elle
dizendo no n. 393; Em cada nova existencia
o homem tem mais intelligencia e melhor pó-
de distinguir o bem do mal. Onde estaria o
merito no caso em que elle se lembrasse de to-
do o seu passado ?
Oh! por todas as bombas da conflagração!
Esta sô passa pela mente d um Allan Kardec!
"Onde o merecimento? Mas nisso mesmo, mes-
tre carissimol Em acceitar a expiação com pa-
ciencia!
- Então você acha que não ha merito. na
expiação no caso em que o réo se lembra do
TOLICES DE ALLAN KARDEC 69

passado? Bona viagge! Santo Agostinho en:


tão, visto os autos, fez uma grande asneira
em penitenciar-se no mundo pela anterior vi-
da peccaminosa? Pois de certo elle se lem-
brava da sua vida passada. Santa (Maria Ma-
gdalena pela mesma forma, de certo perdeu o
tempo quando se arrependeu e começou
uma vida de privações e de sacrifícios com o
fim de satisfazer a Justiça divina pelas faltas
" passadas. Pois ella não via que se lembrava
de todo o seu passado? Oh pobre Santa! De-
via primeiro ter perguntado ao snr. Kardec,
e elle lhe diria caridosamente e com a me-
sura mais cortez deste mundo: — Onde, mi-
nha senhora, onde o merito, visto que se lem-
bra de todo o seu passado? E
Oh grande Allan Kardec! Até “os nossos
grandes Santos têem que aprender com elle! -
Até o proprio Santo Agostinho, que os espi-
ritas querem á fina-força que seja delles, até
Santo Agostinho tem que abaixar a cabeç a
ante o genio nunca visto de Allan- Kardec!
Que torça a orelha tambem elle e se confesse
bem inferior ao talento do nosso autor! Va-
mos: é simples e rudimentar justiçal |
E nós, nós tambem quando quizermos
mortificar-nos um poiico, privando-nos de al-
guma cousa licita, tom o fim de desaggravar
um tanto a Divina Justiça, não caiamos em
tal! Guardemos a penitencia para quando não
nos lembrarmos de mais nada...
Assim o preceitua o bom do Allan Rar
dec. Nenhum merito teremos emquanto nos
lembrarmos do nosso passado!
Esqueçamos e depois então faremos pe-
tencia condigna!!!
SST
CRISES SMILE.

XI
O Evangelho
O nosso autor, bem como os demais es-
piritas, querem basear-se em dois textos para
affirmar que o proprio Evangelho admitte a
reincarnação. O primeiro destes textos é o
seguinte do Evangelho de S. Matheus: “De-.
claro-vos porém, que Elias já veiu, mas elles
"não o conheceram e o fizeram sofírer como -
quizeram. Assim farão morrer o Filho do ho-
- mem. Então os dOiscipulos comprehenderam
que era de João Baptista que Jesus lhes fa-
ara. E SR Ú
— D'estas palavras de Nosso Senhor, que-
rem os espiritas entender que S. João era
Elias reincarfado. Elles não recordam que já
o Archanjo S. Gabriel dissera a S Zacharias,
ao annunciar-lhe o futuro nascimento de S.
' João: “Converterá muitos dos filhos de Israel
"ao Senhor Deus dos mesmos e elle o prece-
" Derá no espirilo e virtude de Elias (Luc. I, 17).
Quando dizemos: “Este homem tem o es-
pirito de S. Paulo” queremos oÓOizer que tem
as qualidades de S. Paulo; que o ornam as
virtudes que ornavam a S. Paulo.
= Ainda hoje se diz tambem: “Este homem
“é um Napoleão, um Cicero; é Raphael redi-
vivo” Quem pretenderá affirmar querermos di-
zer.com'essas expressões, que o tal homem
seja Napoleão reincarnado, ou que possuz à
TOLICES DE ALLAN KARDEC nn

alma de Cicero ou de Raphael num novo cor-


po? Só quem já tem os preconceitos espiritas
é que seria capaz d'isso.
Demais consideremos os pontos de con-
tacto entre Elias e S. João: Assim como Elias
Se apresenta corajosamente ante o rei Achab,
exprobanõdo-lhe a morte de Naboth cuja vi-
nha aquelle cobiçava, do mesmo modo S. João:
vae imperterrito ao rei Herodes e exproba-lhe a
sua união incestuosa com a mulher do irmão. .
Eis O significado das palavras do Anjo, do
Evangelista e do proprio Nosso Senhor! .
' Outro ponto de contacto é que, assim co-.
mo Elias no fim do mundo está destinado a
annunciar a segunda vinda de Nosso Senhor,
"3. João annunciou a primeira. Para ella prepa- .
rou v povo mediante os seus ensinamentos e
conselhos de penitencia. |
Terceira approximação temol-a no zelo de
ambos: de Elias, diante dos sacerdotes de
Daal e os Israelitas apostatas; de S. João,
diante dos phariseus e sadduceus aos quaes
ameaça com a colera divina se não fizerem
" dignos fructgs de penitencia.
Eis pois porque motivo se affirma que S.
João tem o espirito e a virtude de Elias. Co-
- mo é então que querem entender essas pala-
ras num sentido tão Ddiflerente?
- E, se é como vocês dizem, meu caro Kar-
dec, como é que os primeiros christãos não o
enterideram assim? Como é que elles labuta-
ram em trevas quanto a este ponto tão im-
portante, não me dirá? Uma vez que Nosso
Senhor tivesse proclamado tão altamente co-
"mo vocês proténdem, a doutrina da reincarna-
ção, a antiguidade foda e os Apostolos é Mar-
72 TOLICES DE ALLAN KARDEC o

tyvres deviam prégar e repetir sempre que mor-


remos, mas temos que reincarnar. Entretanto,
bom Kardec, nem uma palavra disso. Pelo
con tra rio até S. Pa ul o, que dev ia sab er O que
dizia, affirma categoricamente em face do mun-
-
do inteiro e sem ser desmentido por nin
quem: “Está determinado ao homem morrzo. er
uma vez só e depois d'isso segue-se o jui | ”
(Hebr. 9,27).
S. Clemente papa, segundo successor de
S. Pedro, na sua segunda carta aos Corinthios,
diz assim: “Se o vaso, antes de prompto, se
deforma ou se quebra, o oleiro o refaz; mas
uma vez posto no forno, o defeito é irrepara-
vel. Assim será comnosco. Emquanto estamos
neste mundo, podemos purificar-nos pela con-
fissão e pela penitencia .das faltas commetti-
das nesta carne fragil, e por um arrependimen-
to sincero, obter a nossa salvação da miseri-
cordia de Deus. Mas sahindo deste mundo,
nem a confissão nem a penitencia já são pos-
siveis (cap. VIII.”
Se S. Clemente crêsse na reincarnação não
podia dizer que o defeito era irreparavel, nem
que, sahindo deste mundo, a penitencia se
tornava impossivel. Ro
Devia dizer que o defeito era muito repa-
ravel noutra incarnação e que a penitencia se-
a. VÊ,
ria muito possivel em segunda existenciva
Kardec, que S. Clemente não acreôita nã
sua reincarnação.
c AB Epistola de S. Barnabé, do primeiro se-
culo, diz: “O Senhor dignou-s e morrer para
nos obter por seu sangue a remissão dos nos-
.” O esc rip tor chr ist ão não admit-
sos peccados
Tia pois reincamação nem espiritismo; por-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 73
ao parem ao me eg ma

quanto este não quer que Jesus tenha remido


peccados com seu sangue; e se houvesse de
facto reincarnação, Jesus Christo não morre-
ria por nós para nos obter remissão dos nos-
sos peccados. Realmente séria bem Oispensa-
savel o sacrificio de Jesus -Christo. para esse
fim. O autor da Epistola portanto não cria em
reincarnação nenhuma,
Hermas, louvado por Santo Irineu em seus
escriptos, portanto contemporaneo ou anterior
a esse Santo, numa comparação diz assim na.
sua obra O Pastor: “As pedras que caem no:
fogo e se inflammam, são os infelizes que se
separam para sempre do Deus vivo.” Ora como
se separariam para sempre se houvesse reincar-
nação? Segue-se que nem Hermas era espirita.
(Mas que admiração se já o Evangelho “era
«contrario a essa crença? Do máu rico, não ôOiz
Nosso Senhor que teria outra vida para reco-
meçar, ou para emendar a sua conducta pas-
sada; nem lhe dá uma pequena esperança em
suas palavras; mas diz que foi sepultado no
inferno e que não era possivel nem Lazaro
ir alli allivial-o. grs dis
Da mesma, forma nega-lhe que o espirito
de Lazaro se vá communicar aos cinco irmãos
do rico, cousa que, segundo o espiritismo, se-
ria a mais simples e natural...
E' que Nosso Senhor não tinha nada de
espirita. É
Falando do dia do juizo univêrsal, em
que todas as nações serão congregadas dian-
te 9'Elle para serem julgadas, não diz Jesus.
que haveria novas existencias para melhorarem,
mas sim que irão os máus para o supplicio eterno,
“e Os justos para a vida eterna (Math, 25, 46).
TOLICES DE ALLAN KARDEC
74 cm mm = —
—Acm sem
— a
——

=——

Olhe lá, meu carissimo Rardec, que é que em


valem as sua s int erp ret açõ es per egr ina s
face de tudo isto. Nós nos apegamos ao que
diz o Evangelho, á crença geral dos primeiros
christãos e ás palavras tão claras de 5. Paulo,o
qual devia saber muito bem onde tinha o nariz.
Segundo texto basico para os espiritas
são as palavras de Christo a Nicodemos: Em
verdade em verdade te digo que se o homem não
nascer de novo não póde ver o reino de Deus”.
Mas elles deveriam ler o texto até o fim,
pois o proprio Nicodemos quiz maior explica-
ção e obteve-a de Nosso Senhor: “Nicode-
mos lhe disse: Como pode um “homem nas-
cer, sendo velho? por ventura póde tornar
ao ventre de sua mãe e nascer outra vez?
Respcndeu-lhe Jesus: Em verdade em verdade te
digo, que quem não renascer da agua e do Espi-
ro Santo não póde entrar no reino de Deus. O
que é nascido da carne, é carne; e o que é nascido
do espirito, é espirito.” (João IH, 3—7).
Ouviu, Kardec? Reparou que é preciso
renascer da agua e do
d o Espirito Santo?
mo é que na sua reincarnação o homem nas- E co-

do Espirito
acho e que,
eE s E agua Santo? Não perce-
no seu caso, não ha preci-
nr agua nenhuma, nem de Espirito San-
primeiro um novo nascimento igualzinho ao
rito já 0, com a unica differença de um espi-
já antigo estar no logar do outo novo
ó meira vez; não acha?
tras palavras que CIUES explicam estas ou-
que é nasci ' isto diz e m seguidida
a:: “O
a = espirito ar é carne e o que é
to Allan! Essa to”?
palavras de Nosso
ando
dd
TOLICES DE ALLAN KARDEC 75.
cemttm o.

Senhor sempre foram entendidas do baptismo


e não é você com as suas artimanhas que
4

nos fará vêr preto o que é branco, nem bran-


co o queé preto. O homem renasce da agua
e do Espirito Santo, porque, com a:agua do
baptismo e a acção do Esnpirito Santo, elle
transforma-se, nobilita-se, fica sendo filho de
Deus e herdeiro do Céo, emquanto não re-
nunciar a essas admiraveis prerogativas. E'
realmente um renascimento da agua e do Es-
pirito Santo. E nesse sentido sim, póde-se en-
tender o mais que Nosso Senhor accrescenta:
“O que nasceu da carne é carne, e o que é
nascido do espirito, é epirito”. Quer dizer: O
nacimento carnalé uma cousa material, sem
grande importancia para a'vida espiritual na qual
apenas ifilue como condição, sem merecimanto
da pessoa; mas este renascimento do Espirito
"Santo, é uma cousa espiritual, nobre e impcrian-
tissima que não se compara com os acontecimen-
tos materiaes que prendem 03 nossos sentidos.
- Vê, pois, caro Rarõdec, que você e os seus
sequazes andaram ás tontas na interpretação
desses textos sagrados. Deviam attender mais
ás palavras do Evangelho e tambem á inter-
pretação legitima Dos primeiros tempos do
christianismo. Não acha que essa interpreta-
ção tem muitissimo maior valor do que a sua?
Pois estude, examine, e verá que os primei.
ros christãos sempre entenderam isso tudo
do baptismo: este é que elles prégavam lar-
gamente; este é que os Apostolos por toda
parte espalhavam em obediencia ao preceito
de Jesus: “Ide, ensinae todas as nações, ba-
- ptizando em notne do Padre e do Filho e do
Espirito Santo.” ((That, KMVIII, 10).
eee
eim aa re

XII
Sciencia
Os espiritas (notem bem, quando dizemos
os espiritas, entendemos grande parte, porque
aquillo, uma vez que & religião sem autoridade
para a fiscalisar, vira anarchia: cada qual enche
O sacco com o que quer); mas,- como ia dOi-
zendo, os espiritas em geral crêem piamente
que Deus exige dos homens não só a pratica
do bem como até o Saber; não só a virtude
como tambem a sciencia.
— Ora essa! A sciencia tambem?
— - Sim, senhores, a sciencia tambem: de que
se admiram? |
Mas queé que tem o paletot com as cal-
cas? Que é que tem o: merecimento com a
sciencia, que nem sempre depende de nós?
Qual é a reli gião que ja. énsinou semelhante
cousa? (1)
— Ah, meus caros! Allan Kardec é quem
o Oiz.
iz. Vejam o que elle escreve no n. 192: «O
espir
: ito tem que avançar em sciencia e mora-
lidade; se só progredir em um
sentido é pre.
ciso progredir no outro». p |
— Mas
at ainda se dissesse ——- nani sciencia da
É.
es ni saber o que são as virtudes
4 as praticar, ou a sciencia que

Rem vê bem Direto" da qu ee Aa Rrbe


| (1) Como Se verá, a a : |
=
TOLICES DE ALLAN KARDEC 77
mem metem cpa =
“Me

trata de Deus, a theologia ou o catecismo, —


vá lá, até certo ponto podia-se concordar.
. — Que esperança, meus amigos! Kardec
exige tudo. Escutem: <Q espirito que exerceu
uma arte na existencia em que o conhecestes,
póde ter exercido outra em anterior existencia .
pois é necessario que elle saiba tudo para ser
perfeito (n. 566)» <Nenhum conhecimento é in-
util; todos contribuem mais ou menos para à
seu adiantamento, porque o espirito perfeito
“Oeve saber tudo (n. 898).» «Deus que é justo,
não poderia dar a uns a sciencia sem trabalho,
quando outros só a adquirem com muito custo.
(n. 561).»
-Valha-me Nossa Senhora! Estamos per-
di00s! Não se entraino Céo sem carta de pre-
paratoriós! Pobre humanidade! Corre a matri-
cular-te nalgum gymnasio equiparado! E não
fe contentes com os examezinhos communs,
não. E”. preciso saber tudo! Ai de ti se não
sabes arithmetica, geographia, grammatica, his-
tforia, francez, algebra, geometria, phvysica,
chimica, historia natural... Santos e Santas do
Céo, isto é um hofror! E”o homem ainda não
se contenta com os preparatorios: elle exige
tudo. Tudo, meu Deus! Então será precisa
tambem a astronomia com seus calculos tão
complicados, o calculo infinitesimal, a philoso-
phia com seus problemas tão abstractos: ha
de ser preciso formar-se em medicina, em di-
reito e em engenharia... Isto será um cataclys-
mo social! Mas é tudo, snrs., tudo! Então é
preciso ainda saber quantos habitantes teve |
uma cidade em cada epoca de sua existencia,
ha de ser preciso saber resolver todos os pro-
blemas de algebra e geometria de F.I”C. sem
78 TOLICES DE ALLAN KARDEC
e,
qa ão

r os propostos em ôdiversos exames,


ae! EECISO conservar na idéa as taboas
de logarithmos de Lalanõde, Callet e Dupuis...
Qual! O homem não está regulando. Diz
elle que Deus não é capaz de infligir grandes
supplicios aos homens e inventa este que pede
meças aos tormentos de Nero e Domiciano.
Bem se vê que o digno Allan Kardec nunca
prestou exame em sua vida. Aliás teria mais
dó da pobre humanidade. |
E depois não se contenta Rardec com 'as
sciencias, fala ainda fas artes. .Se é que elle
entende as bellas artes (porque, se fala em
proiissões, a asneira é ainda maior), não sei
porque o espirito precisará saber pintar, es-
culpir, edificar palacios que para elle de nada,
servem, e até saber dançar!.: Com certeza sa-
ber fazer piruetas c om arte deve ser um grande
adiantamento para o espirito!
- O homem por conseguinte deve adquirir
sciencia sem desp a
rezar as artes. |
Mas senhor! Pergunto eu: Como qu
Kardec, que um er, sn”.
tempo nem para:

º blia é tudo; e não ad-.


vertem que ha muito | 7
emnnas mem o A! . eis a mundo e nas
Sreec não menciona d' Biblia,
est udo . Es ta mo s mas exige
lavradores, largue arranjados! Vamos lá,
snr
Mm as suas occupações e po- s..
nham-se a est
mais para“e € apê mathematicas. paçAdiantarão
9 importa que leve o diabo
cla Es o voa a negocios, Abquiram scien:.
“leve 0 bodes “eUS exige, e o mais que o
TOLICES DE ALLAN EKARDEC
===
79
Ai, Kardec, Kardec! Receio que os homens
pensem que você endoideceu ou pelo menos
está meio sexta-feira.
Aqui, entre nós, não achã que a doutrina
catholica é um pouco mais razoavel? Se Deus
exigisse sciencia como exige moralidade, devia
a todos dar os meios necessarios para adqui-
ril-a. Ora nós vemos a cada «passo pessoas
intelligentes sem meios para estudar, emquanto
muitas das que têem esses meios carecem de
talento, quando não lhes falta vontade.
Não, Deus não exige sciencia nenhuma, a
não ser o Simples conhecimento dos pontos
principaes da Religião, pontos que se trans-
mittem com toda a facilidade de paes a filhos
sem.grande precisão de escolas nem de estu-.
dos. Qs conhecimentos necessarios á felicidade |
do homem na outra vida tel-os-hemos, se. ser-
virmos a Deus, na visão da propria Divindade,
autora de tudo quanto existe. De modo que
não ficaremos privados de conhecimentos por
não podermos dedicar-nos a“estiãos. E ésses
conhecimentos não os deveremos a estudos
horripilantes e intérminos nas diversas incar-
nações, mas devel-os-hemios:á "bondade de
Deus em cuja essencia veremos tudo o que pode
constituir a felicidadeda - nossa intelligencia,

e
PENAS ENOS ESTO WC E

rs
a
me

XIV
Livre arbitrio, O hottentote..
«Os seus merecimentos (de vossos ante-
passados) não recahem sobre vós sinão quan-
do vos esforçais por seguir os bons exemplos
que vos deram, é unicamente neste caso que
a vossa lembrança lhes pode ser, não só agra-
davel como tambem util» (n. 206).
4x
Ah não, Kardec, isso não! Tenha pacien-
cia. Em que a nossa boa conducta poderá in-
fluir para a felicidade dos nossos antepassa-
dos? Depois d'elles mortos e enterrados, que
nós nos comportemos bem ou pintemos o bo-
de, isso não :pó0€ alterar-lhes no mais mini-
mo a condição. Elles já tiveram que respon-
der a Deus pelo exemplo que nos deram, isso»
sim; pelos ensinos que noS ministraram, pela
'sendá em qué nos encaminharam: isso é ver»
dade. Mas agora, O nós-seguirmos ou não os»
seus exemplos e ensinos não depende mais
delles e por conseguinte cessa a responsabi-
lidade e consequentemente tambem o mere- .
“cimento. | ;
Você queria então que a nossa boa con-
ducta actual.fosse util a nossos avós? Deus
não seria-justo se assim fosse. Porque faria
depender a utilidade para os mesmos de uma
cousa que não está na mão d'elles. Está ven-
do, Kardec do meu coração, que aquelle util,
*— =
TOLICES DE ALLAN KARDEC
EST
81
aquelfa palavrinha traiçoeira, foi mais um co-
chilo seu, ou, Se quizer, dos seus espiritos.
. *
O tio Allan tem cada uma que não se
sabe de onde as tira. Não é que, depois de
falar muito emt merecimentos, e por conseguin-
te em livre arbitrio, nos vem negar tudo isso
com o maior sangue frio ?
Chega a ameaçar dizendo que até a feli-
cidade se paga com revezes. No n.º 258 QOiz
assim: «Dando ào espirito a liberdade da es-
colha, deixa-lhe toda a responsabilidade dos
seus actos e consequencias. Nada lhe embara-
ça o futuro; tanto lhe é permittido seguir o
caminho do bem como do mal» .
E depois: <A razão não vos diz que se-
ria injusto privar para sempre da-felicidade
eterna aquelles de que não dependeu o torna-
rem-se melhores? . .. podem ter encontrado
obstaculos ao seu melhoramento independen-
tes da sua vontade (n. 171).» Segundo estas
palavras já não depende de nós o tormarmo-
nos melhores. Consequencia: não temos livre
arbitrio.
«Podem ter encontrado obstaculos inde-
pendentes da sua vontade.» Bless me! Parece
que o homem está treslendo! Mas quem é que
responsabilisou nunca o homem por obstacu-
los independentes da sua vontade ?
A quem você ouviu dizer que Deus priva
da felicidade eterna aquelles de quem não de-
pendeu tornarem-se melhores ? São cousas que
teem todos os visos de gerem inventadas por
você, Nós os catholicos pelo menos não dize-
mos semelhantes disparates. Ou você ouviu
já algum sahir-se com essa?
82 TOLICES
E
DE KARDEC
ALLAN= ten tene
mer r
Oa

Nós affirmamos alto e bom som que de-


pende de nós o tornarmo-nos melhores, “por-
que o contrario seria dizer que não temos
vontade livre, o que é uma tolice do tamanho
do Pão de Assucar. E dizemos mais que se em
algum caso particular encontramos <«obstacu-
los ao nosso melhoramento, independentes da
vontade», isto é, que impeçam o livre arbitrio,
essa falta de melhoramento não nos será im-
putada; não somos responsaveis por isso, uma
vez que são «independentes da nossa vontade.”
Isto é o que nós dizemos.
Você, Kardec, ás vezes me dá assim uns
ares de D. Quixote a combater moinhos de
vento !
*
* *
A" pagina 95, n. 222. pergunta o nosso
+

mestre “incomparavel: «Si tomardes um pe-


queno hottentote, ainda na primeira infancia,
e o educardes em nossas academias mais afa-
madas, poderieis algum Oia fazer delle um
Laplace ôóu um. Newton?» Qrã ora! Pois se
nem de você, Kardec, grande e gordo como
deve ter sido, se faria um .2edo de Laplace
ou Newton, Como quer pretender que se faça
de um pobre hottentote?
Comtudo não queremos affirmar em abso-
luto essa impossibilidáge, como parece fazer
Kardec. Não. Assim como casualmente, de um
branco: intelligente e estudioso pode sahir um
Laplace, tambem casualmente, d'um hottentote
inteligente é estudioso, pode sahir um New-
ton. Não vemos impossibilidade absoluta, e sim
apenas impossibilidade relativa.
- & Pag. 97 prosegue Allan: «Dirão sem:
duvida, que o hottentote é de raça inferior;
Tg
TOLICES DE ALLAN KARDEC 83
mas peérguntaremos si o hottentote & qu não
um homem. Sio é, qual o motivo porque Deus
o privou, a elle e:á sua raça, dos privilegios:
que concedeu á raça caucasica 7» :
O motivo, meu caro Kardec, é justamente”
que a sciencia, a muita intelligencia, o grande
adiantamento não importam grandemente para
o que Deus exige de nós aqui na terra. Bas-
ta que esse hottentote pratique o bem, cum-
pra a lei de Deus, e elle alcançará na outra
vida uma gloria que muitos civilisados não al-
cançam, unicamente por orgulho e desobedien-
cia a Deus.
O motivo é que a sciencia, o adiantamen-
to, não é exigido por Deus, nem o pode ser,
visto que não depende de-nós. Não se exi-
gem cousas que exce
a ca
dpaa
cim
dade do sel-
vagem. E' exigida a virtude, o agir conforme
os dictames da consciencia, cousa que está ao
alcance e na comprehensão de cada um, - até
mesmo do bugre e do hottentoté.
Es
» +

O n. 400 pergunta: <O espirito incarnado


permanece de boa vontade no seu envoltorio
corporal? R. E' o mesmo-que perguntar se o
prisoneiro permanece de. boa vontade no car-
cere. O espirito incarnado anceia sem, cessar
pela liberdade, e quanto mais grosseiro é o
seu envoltorio, mais deseja abandonal-o.
Ora, eis uma cousa que ninguem sabia!
Ninguem, ninguem, ninguem! Eu pergunto:es-
te seu Kardec terá vindo de Angola Ou dos
-
corno s da lua ? Não é preciso menos Q'isso
Para fer o topete de affirmar hante semel cou-
- Sa. Mostre-me, seu Allan, tiradas as pouquis-
84 TOLICES DE ALLAN KARDEC
retina —do
= na mm ana
—s DD]

simas excepções, dos» suicidas, pouquissimas


em relação á humanidade, quaes os espiritos
que não permanecem de boa vontade no cor-
po. Mostre-me quantos homens ha que anceiam
sem cessar pela liberdade da alma separan-
do-a do: corpo. Noutras palavras: mostre-me
quantos homens estão assim afílictos por
morrer! o
Qual, Kard da e
mic
nha alma! você mere:
cia era palmatoria, mas palmatoria a valer!

2
XV
Al differença é poucal A hypocrisia
Diz-nos o impagavel Allan Kardec 4 pag.
99, n. 222, em tirada cujo enthusiasmo é um
tanto aguado pelas torturas da verdade: «Mos-
traremos que a religião (catholica) está talvez
menos afastada d'ella (da doutrina da reincar-
nação) do que se pensa.»
E que tal! Não é que o dr. Allan quasi
alfirma que não ha differença essencial entre
o catholicismo e o espiritismo? Ardou pelo
beiço duma pulga! |
Sim, snr.! Então nós quasi que somos es-
piritas| Muito obrigados pela noticia, mas per-
mitta que duvidemos.
Olhe, não queremos ser relogio de repe-
tição. Por isso, se alguem quizer convencer-se
de que realmente o catholicismo. e o espiritis-
mo são tão parecidos como um pvo e um es-
pelo, releia o capitulo Il destas Tolices. que
vamos ventilando. Por ora eu digo como o ou-
tro: Deixal-os falal.os; depois elles convence-
rão-se-hão-se... |
Mas «a theoria da reincarnação é emi-
nentemente moral é racional, e o.que é moral
e racional não pode ser contrario a uma re:
ligião que proclama Deus, a bondade e a ra-
-Zão por excellencia (pag. 98).» | o.
Moral e racional? Será, não digo que não.
Mas o que é moral não pode ser contrario a
86 TOLICES DE ALLAN' KARDEC - a

uma religião que proclama Deus, a bondade e


a razão por excellencia ? E' o mesmo que di-
zer que o que é moral e racional tem que ser
verdade a muque.
Ora. meu bom Allan, escute um boccadi-
nho. Concordará que não deixa de ser emi-
nentemente moral e racional que uma viuva,
que muito amou a seu marido, não se torne a
casar. Negará isso ? Ou vê em tal facto algu-
ma cousa contraria á moral e á razão? Mas
succede, meu bom Rarõdec, que a tal mulher
em questão não está pelos autos e casa-se
“Segunda vez. Quererá negar-lhe o direito de
o fazer? Ou julgará que isso é contrario á
moral ou á razão? Eu acho que será moral e
racional o casar-se, sem deixar de O ser o não
casar-se. Por conseguinte, caro dr, convença-
se: ha cousas que são moraes e racionaes e
que no emtanto não são reaes. Olhe, até ri-
ma! Quer dizer que até a versificação está-se
rindo da sua.logica, aguda como um prego!
Tambem não duvidará de que seja emi-
nentemente moral e racional um filho maior
morar com.o-pae. Mas que acontece? O tal
filho não quer. Elle tem lá a sua idéa, e en-
tende que lhe convem mais morar só, uma vez
que o pae nada tenha em contrario e o filho.
“Se comporte como deve. Achará isso immoral
ou irracional, meu prezadissimo Rardec? Lo-
go, mais uma vez você vê a verdade do ver-
so: E' moral e racional, mas não é real: pois
nem tudo o “que, ideado, tem boas qualidades,
deve por força existir. Conclusão, bom doutor,
afunde um pouco mais o nariz na logica,
não que
lhe'fará mal nenhum. coa
Continua o prezado mestre com éste aran*.
TOLICES DE ALLAN KARDEC 87
= emma nado

zel1: «Que seria da religião si, contra a opi-


nião universal e o testemunho da sciencia,
ella se tivesse obstinado contra a evidencia,
e repellisse do seu seio aquelles que não cres-
sem no movimento do sol ao redor da terra
e nos seis dias da creação? Que credito me-
receria, de que autoridade gozaria entre os
povos cultos uma religião fundada sobre os
erros manifestos, apresentados como artigo
de fé?»
Ah, mestre, mestre! Aqui você mostra uma
pontinha de ironia contra nós,hein? A um
poço de logica, como você se tem mostrado,
póde-se perdoar alguma cousa.
Mas o que não podemos perdoar-lhe é a
enorme inverõade que você tem o topete de
apresentar, a saber, que o movimento do sol
em redor da terra e os QOias de vinte e quatro
horas na creação, foram apresentados pela
Egreja como artigos de fé. Quem foi que. lhe
pregou semelhante carapetão ? E você, tão la-
dino, foi engulir uma peta d'essa idade? |.
Pois fique sabendo, mestre, que a Egteja
nunca deliniu tal cousa: que sempre deixou a
seus fieis a liberdade de pensarem a respeito
como quizessem. |
Tanto é verdade que, muito antes de Ga-
lileu, houve catholicos- illustres que, sem nin-
guem os accusar de heresia, ensinaram que
era a ferra que se movia em redor do sol, €
não vice-versa, | E
Pegue em algum tratado de historia, e
Rardec, e verá que Galileu começou à pr
no movimento da terra em 1610, ao passo É
já Nicoláu de Cusa, fallecidg em 1453, € sum
pernico, faliecido em 1543, ensinaram à m
88 TOLICES DE ALLAN KARDEC
a pa mama

missima cousa sem ninguem se incommodar


com isso. E note que Copernico ensinou em
plena Roma. Se fosse artigo de fé, como vo-
cê afiirma, mestre, acha mesmo que nenhum
padre, nenhum bispo, nenhum papa se ergue-
ria logo a protestar contra esse ensino? Acha
mesmo que deixariam publicar essas asserções
ficando muito caladinhos no seu canto e sem
erguerem a voz contra o que pretendia alterar
os seus artigos de fé?
Qual, bom Kardec, a verdadeé esta: Nunca
foram artigos de fé. Você é que tomou a nu-
vem por Juno; nada mais.
Se Galileu foi chamado á ordem, foi por
querer metter-se a theologo. Que se limitasse
a expôr suas idéas como os outros, sem ata-
car a Biblia, e ninguem se lembraria de o
accusar. . |
O mesmo quanto aos seis dias da creação,
Saiba, querido mestre, que já Santo Agostinho.
Origenes, Clemente de Alexanôria, que foram
do terceiro seculo, ensinaram que os dias da
créação não eram dias n9 sentido ordinario
da palavra: Sto. Athanasio foi da mesma opinião.
Pois todos elles viam que os nossos dias pre-
suppõem o sol, e na Biblia, como você poderá
verificar facilmente, só se fala em sol no quarto
dia. Ou você acha que Movsés quereria inven-
tar uma nova especie de dias como os nossos
e para 03 quaes não fosse preciso sol algum?
Vê pois, Kardec do meu cora ão, que
nunca toi artigo de€ fé q ue os dias da ; Creaçã
E o
fossem eguaes aos que nós chamamos dias.
Não passa de imaginação sua,
Até os Santos, que são os mais dignos
representantes da nossa religião, tiveram opi-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 89

nião diversa, sem nunca serem reprehendidos


por essas idéas, e sendo até canonisados.
Logo esse ponto não era arti
fé, como
você pretende. go de
Você quer saber o que é realment j
de fé, Kardec? Escute. Artigo de fé é à Din
dade de Christo; artigo de fé é a existencia
da Santissima Trindade; artigo de fé é à pre-
sença de Jesus na sagrada Eucharistia, o per-
dão dos peccados na confissão, o santo sacri-
ficio da Missa... Esses sim que são para nós
artigos de fé, convença-se, bom Kardec; e não
essas coisinhas de que se falla incidentemente
e que não têem grande ligação com os pontos
capitaes da religião. Tenha-o entendido, mestre,
e vamos a outra.
* »
de

A verdade é uma, diz-nos a sã philoso-


phia. Por conseguinte deve haver uma só re-
ligião verdadeira. Não é possivel que duas
religiões, que affirmam cousas contradictorias,
sejam ambas verdadeiras. Este papel ou é
branco ou não é branco; uma porta ou está
aberta ou está fechado; Jesus Christo ou é
Deus ou não é Deus; a confissão ou é neces-
saria ou não é: ou ha - penas eternas ou não.
Tudo isso ser verdade e ao mesmo tempo
não ser verdade é impossivel. Logo no mundo
só ha uma religião verdadeira; só uma d'ellas
está com a verdade, as outras forçosamente
estão no erro. E a obrigação de todo homem
bem intencionado, e que em logar de estopa
tenha miolos na cabeça, é procurar esse reli-
gião verdadeira e adoptal-a, desprezando reso-
lutamente as outras.
«90 TOLICES DE ALLAN KARDEC
— ces mam ape meo eee .. .— a mm o co o - und

Ora bem: que nos diz o snr. Allan Kardec?


Escutem:. E' censuravel seguir uma religião
em que se não crê do fundo d'alma, quando
isso se faz pelo respeito humano e para não
escandalizar os que pensam Oifferentemente ?
R. A intenção, nisso como em muitas outras
coisas, é a regra. Aquelle que só tem em vista
pena as crenças dos outros não faz mal...”
n. 655).
Ahi, seu Chico! Que bella maxima ! E nós
que reputavamos isso uma hypocrisia? Crer
uma cousa e fazer outra, para 6 nosso Allan
não é cousa de monta. E' uma bagatela!
Mas tambem quero ver agora depois 9'is-
So O espirita que ainda queira, como certos
incréos, assacar á Companhia de Jesus a ma-
xima de que o fim justifica os meios! Os Je-
suitas, note-se, nunca tiveram esse lemma; que
é pessimo e santificaria todas as maldades,
todos os crimes, todos os absurdos. E no en-
tanto eis que. o nosso Kardec não desdenha
de sobrecarregar-se com esse fardo. <A inten-
ção, nisso como em muitas outras cousas, é
a tegra”. Sim senhor!
Mas, voltando ao que iamos dizendo, se-
gundo a aífirmativa de Kardec, seguir uma re-
ligião por fingimento não é cousa má, com-
tanto que seja para respeitar as crenças dos
outros.
Que tapa nos Martyvres do Christianismo,
hein? Que tolice que elles foram fazer!
Dar a
vida pela verdade! Soffrer tamanhos tormentos
pela religião! Só para não serem conniventes
com O erro, para não seguirem uma religião
falsa!Ah, se naquelle tempo vivese Allan eg
dec! Que serviço inestimavel não lhes
Prestaria|
TOLICES DE ALLAN KARDEC 91
— e — anda

— Grandissimos tolos! lhes diria elle com


os ded0s em pinha diante dos queixos. Que é
que vocês estão pensando! Ilão ha precisão
nenhuma de morrerem! Offereçam incenso aos
deuses que eu, eu os absolvo. Voces o que
são é uns bobos do calibre do Cofeovado! E'
só ter em vista respeitar a crença dos outros
e o negocio está arranjado. Quem é que dá à
vida assim sem precisão?
E os martyres, coitadinhos, parece-me es-
tar a vel-os, de queixo cahido, entreolhando-
se envergonhados, convencidos já de serem os
Maiores tolos que 0 céo cobria, e maravilhados
perante a enorme envergadura do genio de
Allan Kardec. |
Pobres Santos! Pobres Martvyres!
* é a

«Será atacar a liberdade de consciencia


combater as crenças que perturbam a socie-
dade? R.. Podeis reprimir os actos, mas a
crença intima é inaccessivel (n. 850). «Deve-
mos, em respeito á liberdade de consciencia,
deixar propagar oOouítrinas perniciosas...? R.
Ensinae a exemplo de Jesus" pela doçura e
persuasão, e não pela força... (851)»
E' muito bom o conselho, prima pela mo-
deração, é um modelo de bom senso. Mas to-
memos um exemplo, Para não falarmos nos
mormons, lembremos os anarchistas. O anar-
chismo revolucionario vae-se esgueirando na
sociedade. Os resultados já se sabem: pertur-
bação da ordem, revolução, o mundo de pernas
para o ar, soffrimento de povo todo, sujeito
a alguns cabecilhas que se dizem amigos do
povo e que querem a melhor parte (porque
92 TOLICES DE ALLAN KARDEC
gen
e
e,ceig

sendo seriam ou tolos ou sem arte). Você


acha mesmo que a autoridade não deva em:
pregar a força, bom mestre? Que deva deixar
correr tudo á-revelia? Deixar que préguem as
suas doutrinas sem incommodar a ninguem?
Deixar que revirem a sociedade a seu tatante,
fazendo fermentar as más paixões que existem
no povo? E depois assistir ás barricadas, á
guilhotina, aos processos summarios, aos as-
sassinatos em massa?
Sim, tem razão. São cousas de lamber os
dedos. Realmente vale a pena a autoridade
ficar de braços cruzados para depois presenciar
essas bellas scenas!
XVI
Ressurreição
Esta agora não é do Livro dos Espiritos':
é do «Evangelho segundo o Espiritismo» que
é outro repositorio de bellezas do mesmo Al-
lan Kardec. Mas tem aqui perfeito cabimento.
<A reincarnação formava parte dos dogmas
popuniod-agh o nome de RESURREIÇÃO (cap.
IV, 4)».
Esta asserção faz cahir das nuvens, faz fi-
car desapontado, de bocca aberta, de
queixo
cahido, bobo, tolhido, abstracto.
A resurreição, tão falada no antigo como
no novo testamento, não seria mais
do que a
reincarnação dos espiritas!... Se assim
era caso de se levantar uma pyramiõde fo ss e
Kardec, a Al la n
autor da descoberta.
Mas elle julgará que somos bobos, ou
a nossa razão é um bolinho de fubá que
engole inteirinho e sem fazer caretas?
qu e ell e
que elle ignora que nós tambem sabe Parece
mos ler.
À resurreição de Lazaro pelo menos
que elle não confundirá com acho
reincarnação: a
do filho da viuva de Naim, a da
tambem pouco se parecem com filha de Jairo
Porque se Nosso Senhor fosse re incarnações.
carnação como a crêem os es esperar a rein.
iri
esperar mais de quinze ou vin tas, teria que
se formar o novo corpo da te annos para
nova incarnação e
chegar ao estado adulto, esta
do em que aquel-
las pessoas resuscitaram.
94 TOLICES DE ALLAN KARDEC
a

Eis como os judeus julgavam que resur-


reição era reincarnação!...
Quando os judeus diziam, como attestam
os apostolos, que Jesus era S. João Baptista,
tambem era impossivel que falassem em rein-
carnação. Os motivos são os mesmos. Falavam
portanto em verdadeira resurreição.
Quando Jesus annuncia que depois detres
dias resurgirá, os judeus tambem não cogita-
ram em reincarnação, visto que, com meõdo,
mandaram pôr guardas no sepulchro, nem nun-
ca pensaram que Jesus reapparecesse como
menino.
No antigo Testamento Eliseu resuscita o
filho da Sunamitis, Elias resuscita o filho da
viuva de Sarephta; e quer-me pareçer que em
nenhum d'esses casos os judeus confundiam
resurreição com reincarnação.
O contacto da sepultura de Eliseu dá
vida a um defunto, e tambem neste caso dis-
tingue-se bem resurreição de reincarnação.
Como é pois que Kardec nos vem com a
sua peregrina descoberta?
Não ha duvida, foi isto. Elle leu muita
cousa de resurreição na Biblia: precisava al-
gum argumento que provasse a reincarnação;
num relampago de genio, egualou as duas cou-
sas, e... identificou O ovo com O espeto.
Eis como uma pessoa se torna celebre!

CTA O
XVII
Sonhos — Escriptores
N. 401: <A alma ea durante o som-
no, como o corpo? R. Não; o espirito nunca
está inactivo. Durante o somno affrouxam-se
os laços que o ligam ao corpo, e como este
não tem então necessidade da alma, percorre
o espaço e entra em relação mais directa com
os outros espiritos.»
N. 402: <O somno faculta aos espiritos
incarnados o melo de estarem sempre em com-
municação com o mundo espiritual; e é o que
faz os espiritos superiores consentirem sem
grande repulsa em incarnar-se entre nós...»
<A incoherencia de certos sonhos explica
se pela recordação imperfeita e incompleta
dos factos e scenas que foram presentes em
sonhos.» (402).
N. 414: «O facto de irdes ver, durante o
somno, amigos; parentes, conhecidos, pessoas
que vos podem: ser uteis, é tão frequente, que
Se realiza quasi todas as noites.»
Eis uma explicação interessante dos so-
nhos. Não ha duvida, em Rardec perdeu-se
um grande tomico! |
Quando nos deitamos, cuidamos que va-
mos descançar? Historias! Vamos é palestrar
com os espiritos no espaço: Julgamos que o
nosso sonho foi extravagante? IJada d'isso. E'
que não nos lembramos de tudo — Mas se
96 TOLICES DE ALLAN KARDEC

a recordação é tão clara! Se me lembro de


tudo tão exactamente! — Que teima, gente!
Kardec diz que não, e você tem coragem pa-
ra desmentil-o? E' muito topete! E' porque
não se lembra, e acabou-se!
E afinal, não é que tinham razão essas
velhinhas que em cada sonho querem ver gran-
des significados? Não é que até os jogadores
de bicho têem razão com os seus palpites?
Se Kardec nos affirma que nos sonhos “en-
tramos em relação mais directa com"os Outros
espiritos”, bem que elles nos podem adiantar
qualquer cousa nesse sentido. E' assim mes-
mo: os extremos se tocam. O grande enio
de Allan Kardec se toca com a simplicidade
das velhinhas e dos jogadores de bicho!
Mas occorre-me um reparo. Affirma-nos
Kardec que “o facto de irmos ver, durante o
somno, amigos, parentes, conhecidos... é tão
frequente, que se realiza quasi todas as noi-
tes.” (414). Segue-se que no sonho de quasi
todas as noites vamos ver amigos, parentes e
conhecidos. Mas eu hontem sonhei, e com u-
ma nitidez a toda prova, que um amigo meu
me dava cinco contos de réis assim sem mais
nem menos, puro effeito do. seu. bom coração
E hoje... ai desengano cruel!... Encontro-me
com elle, e o ladrão nega-me redondamente
os meus cinco contos, rindo-se de mim ainda
por cima! Seria que elle não se lembrasse
mais da dadiva? Indaguel delle, quiz avivar-
lhe a memoria... (Comprehende-se, não é?
Tratava-se de cinco contecos!)... mas não
houve meio.
Até me certificou que o sonho delle foi
todo Differente. Sonhou a noite inteira com
TOLICES DE ALLAN KARDEC 97
Como:

e... A

banhos de mar. (Suores frios com certeza, em


vista d0 perigo que advinhava, de ficar sem
os cinco pacotes!). |
O certo é que não houve meio de rece-
ber O que me tinha dado... |
Qual, Rardec da minha alma!-Quer-me
parecer que aqui você cincou mais uma vez!
Se 0 meu sonho fosse real, aquelle com que
eu sonhasse deveria sonhar a mesma cousa
que eu; é logico. E então eu poderia inter-
pellar o amigo ou conhecido, fallando-lhe
sobre o sonho, e elle não poderia manifestar
ignorancia: pois pelo menos recordar-se-ia
d'alguma cousa. | o
Você já viu coincidir algum sonho seu
com o dos amigos? Pois nem eu.
' Creia-me, Ailan Kardec: sonhos são so-
nhos. Tráume sind Schâume (1), como dizem
os allemães, e os melhores em geral não va-
lem uma pitada de rapé.
*
= *

N. 577: «Um espirito julga que seria bom


escrever um livro, que elle proprio escreveria
se estivesse incarnado; busca então o escriptor
mais apto para comprehender e executar o seu
pensamento, dá-lhg a idéa e ôirige-o na exe-
cução.»
Com effeito! Eis -como se inventa a pol-
vora! ne A
- Mas assim, bom Kardec, é a cousa mais |
facil deste mundo fazer progredir a humani-
dade, ao menos em sclencia, que vocês dizem.
ser tão necessaria. E nada absolutamente cus-
(1) Sonhos são espumas.
98 TOLICES DE ALLAN KARDEC
— ua

taria a esses bemôditos espiritos vir explicar-


nos qual a constituição da materia, rectificar
as theorias scientificas, Indicar o remedio pa-
ra a tuberculose, qual o que curaria a mor-
phéa, etc. |
Está visto portanto que esses srs. espiri-
tos do outro mundo não têem nada de altruis-
tas, pois que não fazem progredir o mun
só porque não querem.
Sabem isso tudo, far-nos-iam um bem in-
calculavel, e nem têem entranhas para se com-
padecerem de nós.
E de máus.
Mas ha mais. Esta theoria do sr. Kardec
vem desfazer muito orgulho, legitimo e illegi-
timo. |
Um pobre homem julga ter expremido o
seu talento, coando-o em seguida num livro
que lhe custou annos de aturado labor. Pois
sabemos agora que o homem está muito en-
ganado. O livro não é delle. E' dum espirito,
pois que foi o espirito que “lhe deu a idéa e
O dirigiu na execução”.
Por menos do que isto se tem enforcado
muita gente. Imaginemos o coitado do preten-
dido autor em presença do seu pretendido
livro, ao ser informado de ' semelhante cousa!
Que desillusão, que desespero! Não será le-
gitima a sua furia contra: esse espirito velha-
co que lhe vem disputar os louros, os quaes
lhe pareciam delle e muito d'elle? o
— Espirito duma figal poderia elle gritar:
lhe nos queixos. Espirito moleque, espirito ga-
tunol Quem te chamou aqui ou quem te en-
commendou sermão, não me Ddirás? Se que-
nas escrever um livro, espirito digno da: for-
TOLICES DE ALLAN e es
KARDEC
nda 1 a a a a a
99
o. ——— ua uu sm 1 q aa
pato cem culimam 44 a —
o ut uu mm a o DcO

ca sessenta vezes! se querias escrever um li-


vro, voltasses ao mundo, diabo! incarnasses-
te outra vez, infame! e visses quanto custa O
trabalho aturado O'um pobre escriptor! Isso
são modos? Isso é proposito? Vir fazer-me
trabalhar dia e noite, fazer-me branquear a ca-
beça com o serviço, e depois de tudo prom-
pto, Oizer que é tudo teu?
"Realmente, caro Rardec, isso não parece
justo, tenha paciencia! O escriptor em ques-
tão tinha todo o direito de pregar quatro ta-
befes no tal espirito intromettido.

a
ISA SAS)
XVIII
Egualdade inicial de todos
Uma das bases em que se querem fundar
os espiritas, uma das pedras fundamentaes
do edificio da sua crença, é a pretenção de
que Deus nos deve ter creado a todos eguaes
,
Não querem absolutamente conceder
Deus o direito de nos collocar em condiç a
Oifferentes no mundo. Todos devemo ões
s ter o
mesmo ponto de partida em identica si
Egualdade para todos. E O soci tuação.
mundo espiritual. Kardec, Denis, al is mo no
assim os ares de Carlos Marx ou et c. dão-se
— Porque Rropotkine.
senão, dizem elles, Deus não
ria justo. se-
E d9'ahi concluem que, vista a desegual-
dade neste
mundo, vista a Oifferença en
tre
judiciosos e, nescios, já houve
outras existencias nas quaes
estado de co m e r e c emos este
usas.
Versarios vemos, prezados
Precisa andar com m leitores, que Deus
uito geito para não ser
Não póde discrepar um a
pice no seu sy S-
eta Injust
Sigo De crear, A minima differença traria com-
iça. Por conseguinte o bom Deus
adeee
us minandar
has en Com os sete sentidos; senão,
commendas!
TOLICES DE ALLAN KARDEC 101

Nós lhes responderiamos com os anjos,


que Deus creou melhores do que nós,
espiritos, etc. Mas elles já têem a replic
pu ro s
a na
ponta da lingua. Qual anjos nem meios anjo
s!
Nunca houve tal cousal Os chamados
anjos
não são mais do que homens já puri
ficados
das suas culpas!
E nós, perante essa affirmativa. categori-
ta, que remedio senão pôrmos a viola
no
sacco ? |
Provas? Isso é cousa muito Oispensavel.
À não ser talvez este trecho de Allan Kardec
que tem uns longes de argumento: «Deus, que
é justo, não poderia dar a uns a sciencia sem
trabalho, quando outros só a adquirem com
muito custo (n. 561).» E este de Léon Denis:
<Essa identidade de todos, nas origens como
nos fins..., nos mostra os principios eternos
de justiça... (Depois da Morte, cap. XXIV).»
Insistiriamos dizendo que, a ser assim,
Deus, uma vez que se lembrou de crear de
um certo geito, estaria amarrado para todo
sempre. Nunca mais poderia crear seres intelli-
gentes em condições differentes: seria injusto.
€ elles nos tornariam que isso em nada
absolutamente os assusta, que é o que a justi-
Sa exige. Egualdade, liberdade, fraternidade!
E, no mais, viva a republica!
Mas é que não é liberdade nenhuma pa.
ra Deus! E' que Deus fica tolhido por toda
a eternidade! No
— Bh, Elle que tenha paciencia.' Nós,
espiritas, não lhe concedemos o Direito de
variar! e
Por conseguinte, conforme o espiritismo,
o bom Deus nunca poude crear anjos... Se-
102 TOLICES DE ALLAN KARDEC

injustiça... e o mundo inteiro recla-


ti E Deus nunca poderá crear intelli-
gencias que não sejam de homens... Ah, seria
um abuso de poder...! Quem o mandou co-
meçar assim? Agora não ha remedio. O es-
piritismo não lhe consente Oivergencia...
Pobre espiritismo, que pretende atar as
mãos a Deus!
Não obstante vejamos se será mesmo as-
sim, e se não descobrimos contradicção nes-
sas pretensões espiritas.
«Deus, sendo eterno, diz Allan Kardec,
deve haver creado incessantemente, mas quando
e como cada um de nós foi feito, ninguem o
sabe (n. 78).»
Concluimos daqui naturalmente que uns
são creados antes e outros depois. E' claro
"como a sol ao meio dia,
Mas, aqui te quero, meu bom Allan! Is
não será uma injustiça da parte d0 bo to
A m Deus?

gualdade! Uns antes, outros depois!


do céo ! Mas Santos
então, uns acabam antes as suas
provações e outros acabam-nas
sequentemente os primeiros vã depois, e con-
a felicidade et o gosar antes
erna, só porque foram creados
com antecedencia. Ora isto já
ferença, meu tio Rardec! é uma boa dif-
uem é que não quereria ser creado
“+ Para começar an-
dade, e ainda a mais cedo a gosar a felici-
felicidade et
Ah, Rardec,
PrOPrio systema, conven eo
pel
TOLICES DE ALLAN KARDEC 103

Por conseguinte esse principio que vocês


querem estabelecer, para d'ahi deduzir a ne-
cessidade da reincarnação, não vale uma pita-
da de rapé. |
* % s

No n. 926 nos diz Allan Kardec: «Deus


permitte ás vezes que o mão prospere, mas a
sua felicidade não é para invejar, pois terá de
a pagar com lagrimas amargas.»
Ai ai, Rardec! Aqui ha dente de coelho!
Se é como você diz, se Deus permitte ás ve-
zes que o máu prospere, é porque muitas ou-
tras não deixa o máu prosperar. E eis aqui
outra differença. Eis outra injustiça (se me é |
licito tirar as consequencias dos seus mirifi-
cos principios).
Aqui entre nós, “Kardec, não acha que es-
sas lagrimas amargas que depois virão, pelos
seus principios deveriam ser evitadas por
Deus? Uma vez que Deus é obrigado a não
fazer Oifferença em egualdade de condições,
não deve peiorar a situação desses pobres
maus, visto que outros máus foram mais fe-
izes.
E depois, porque o máu ha de prosperar
para depois chorar lagrimas amargas? O mi-
sero máu deve protestar lá na outra vida: —
Não, snr., eu não devia prosperar, porque
com isso só consegui ter que pagar a minha
prosperidade com lagrimas amargas. A justiça
era não prosperar, para não augmentar a pu-
nição futura.
Qual, Kardec! Está-me a palpitar que vo-
cês fazem Deus bem mais injusto do que af-
firmam de nós!
104 TOLICES DE ALLAN KARDEC

— Mas os catholicos não dizem tambem


que os máus prosperam e depois serão cas-
tigados ? o
— Dizemos que os máus prosperam ás
vezes. Mas não que pagarão essa prosperida-
de com lagrimas amargas.
Dizemos que serão punidos pelos seus
peccados, mas não pela sua prosperidade. De
uma cousa a outra vae um mundo!
+ *
«Porque razão, na sociedade, a influencia
dos máus vence tantas vezes a dos bons? R.
Pela fraqueza dos bons! os máus são intri-
gantes e audaciosos e os bons são fimidos;
quando estes quizerem, formarão a parte mais
forte? (n. 932). | o ua
Ai ai! Então quando os bons quizerem
serão mais fortes que os máus e-não soflre-
rão da parte d'elles? Logo esses sofrimentos
actuaes causados pelos máus, não vêem da
parte de Deus. Dependem Oá vontade dos
bons; por conseguinte não são punição força-
da. Uns os sofírem agora, outros não os sof-
frerão. Ha portanto differença entre os bons
de um tempo e os de outro. Porque mais
adiante, os,bons unir-se-hão para não sofire-
rem dos máus; mas por ora, é preciso aguen-
tarem...
E Deus cofisente essa differença? E Deus
não intervem nessa irregularidade? Caro Kar-
dec, mais uma vez convencer-se-ha de que,
pelo seu systema, você mesmo accusa Deus
de injustiça! R
+ q
«Então, si não existissem na terra pessoas
de má vida, o espirito não encontraria nella

TOLICES DE ALLAN KARDEC 105
:
po eme e=a

o meio necessario para certas provas? R. Será


isso mofivo de queixa?... Fazei por bem de-
pressa achar-se a terra nessas condições» (n. 260).
Segue-se d'estes trechos que os ultimos
máus passarão bem. Elles não encontra ão o
melo necessario para certas provas. Os ou-
tros aguentaram, mes elles estão livres e quites.
Parabens aos ultimos máus. Mas... e a
justiça de Deus, onde é que fica? Vocês di-
zem que não pode haver desegualdadel!...
E
» ke

Vamos agora a um ponto bem interessan-


te do espiritismo de Allan Rardec: ponto tão
engraçado que poucos serão os que cheguem-
a imaginal-o. E esse ponto nos dará mais
uma prova de que, apezar de todos os pro-
testos do espiritismo, essa Crença, uma vez
que a desegualdade de condições é injustiça
em Deus, como elles dizem, affirma e susten-
ta que o nosso bom Deus é injusto.
Apreciem esta série de bellezas:
«Donde tiram os animaes o principio in-
telligente que constitue a especie particular da
alma de que são dotados? R. Do elemento in-
telligente universal. — A intelligencia do ho-
mem e dos animaes emanam então de um
principio unico? R. Sem duvida alguma; mas
no homem essa intelligencia recebeu uma ela-
boração, que a eleva acima d'aquella que ani-
ma o bruto” (606). |
«Visto que os animaes têem uma intelli-
gencia que lhes dá certa liberdade de acção,
ha nelles algum principio independente da ma”
teria? R Sim, e que sobrevive. — Esse prin:
cípio é uma alma semelhante á do homem?
106 TOLICES DE ALLAN KARDEC
——

R. Tambem é uma alma, si assim lhe quizer-


des chamar; depende do sentido que se ligar
a essa palavra; mas é inferior á do homem.
Ha entre a alma dos animaes e a do homem
tanta distancia como entre a alma do homem
e Deus (!)» (597).
«Si a alma do animal sobrevive ao corpo,
depois da morte está no estado errante, como
a do homem? R. Está numa especie de erra-
ticidade, visto tomo está ligada a um corpo,
mas não é um espirito errante... O espirito
do animal é classificado depois da morte pelos
espiritos incumbidos ó'iisso e é utilisado quasi
immediatamente; não tem occasião de entrar
em relação com outras criaturas» (600).
<Os animaes seguem uma lei progressiva.
como os homens? R. Sim, e é por isso que
nos mundos superiores, onde os homens são
muito adiantados, os animaes o são tambem...
todavia são sempre inferiores e sujeitos ao ho-
mem; são para elle servidores intelligentes> (601).
«Nos mundos superiores os animaes co-
nhecem Deus? R. Não; o homem é um deus
para elles, como outr'ora os espiritos foram
deuses para os homens” (6083).
“resulta d'ahi que Deus creou seres in-
felligentes perpetuamente votados à inferiori-
dade 5 que parece em desaccordo com a uni-
das na os ea ia que se nota em to-
Maduro pda: - Tudo se encandeia na
za por laços que não podeis ainda per-
ceber, e as coisas mais dissemelhantes
* parencia têem pontos de contacto que em ap-
o ho mem,
a
(604 a estado actual, fámas comprehender

«Onde realiza o espirito essa primeira


TOLICES DE ALLAN KARDEC — a » trago
107
ue

phase? R. Em uma série de existencias que


precedem o periodo a que chamaes humant-
dade. — A alma parece assim ter sido o prin-
cipio intelligente dos seres inferiores da crea-
ção. R. Não dissemos que em a natureza tudo
se encandeia e tende para a unidade? E' nesses
seres, que estaes longe de conhecer a todos,
que o principio intelligente se elabora, se in-
dividualiza pouco a pouco, se ensaia na vida,
como dissemos. E' de algum modo trabalho
preparaforio como o da germinação, depois do
qual o principio intelligente soffre uma trans-
formação e torna-se espirito (607).»
Temos pois d'esses textos todos: Que a
intelligencia do homem e dos animaes ema-
nam ôd'um principio unico. Por conseguinte são
eguaes: a Oifferença é apenas uma elabora-
ção que a alma do homem recebeu a mais,
emquanto a dos animaes fitou chuchando no
dedo. Mas essa alma animal sobrevive-lhes, e
é quasi immediatamente utilisada pelos espi-
ritos incumbidos disso. Já estão á espera.
Vem a alma d'um Fiel ou d'um Sultão... zás! é
logo jogãda para outro éorpo cachorral, antes
que se lembre de pensar. Concepcão gigante!
Isto é que é sciencia; o mais é historia!
€ essas almas de animaes progridem co-
mo os homens. Mas lhe são sempre inferiores,
prosegue Kardec.
Segue-se que o burro nem sempre será
tão burro como actualmente. Ha de ser preci-
so mudar-lhe o nome.
Mas, uma vez que progridem, como é que
não chegam a ter a intelligencia do homem?
Pelo menos deviam chegar ao ponto actual
dos homens mais atrazados, € dahi para dian-
108 TOLICES DE ALLAN KARDEC
Team E— TESE See me

te é um pulo. São intelligencias, na phrase do


preclaro mestre, saem do mesmo principio que
as do homem, progridem até... e no entanto
estão sempre a immensa Distancia deste no
estado actual de intelligencial Que entenda
quem puder! |
O ponto principal porém a que queria
chegar é que Deus faz differença entre duas
intelligencias dando a uma a elaboração ne-
cessaria para vir a ser intelligencia de gente,
e negando-a a outra que fica sendo intelligen-
cia de cachorro. E' o proprio Allan Kardec
que o confessa. |
Portanto (sempre pelo principio espirita) ,
Deus seria injusto mais uma vez.
Qual, espiritas da minha alma! Escutem
um conselho. Dêem a Deus a liberdade de
fazer o que Elle entende! Acreditem que Elle
sabe bem melhor do que os srs. o que faz. E
não venham dizer que Deus não poude crear
os anjos porque seria injusto para com os
homens; nem venham com a pretenção de
que o ponto de partida dos homens deva ser
igual para todos, sobr pena de Deus ser in-
justo. Injusto são os srs. com taes pretenções;
e eu lhes applico as proprias palavras de Al-
lan Kardec: Como ousaes pedir contas a Deus
dos seus actos? Podeis penetrar-lhe os desi-
gnios? (n. 123). |
Quanto ao mais, faço minhas tambem as se-
guintes palavras do mesmo Kardec, que vêem
eua a pello: ,

eus não nos péde a nossa permissão


Al Os consulta os gostos (222). E como
carnação é com estes dizeres; 'ou a rein-
o é um facto ou não é”, nós tambem
" TOLICES DE ALLAN KARDEC J09
——— —

lhe rebatemos: Ou a nossa religião é um fa-


cto ou não é. Como Deus não nos consulta
Os gostos, OS srs. podem se torcer á vontade,
que com isso não mudarão o estado das cou-
sas. Não é por Kardec querer entender as
cousas a seu modo, que Deus vae lhe fazer
a vontade.
"Resumido pois, O principio espirita, base
de toda a sua religião, é o seguinte: — Deus
não póde fazer Oifferença entre os seres intel-
ligentes que crea (1). e |
Ora esse principio é o que ha de mais
falso. Porque mesmo Deixando de parte as
outras tolices de Allan Kardec, sempre uns
são creados antes e outros depois; o que é
uma oOifferença bem grande (uns gozam. antes
a felicidade dos espiritos adiantados, emquan-
to outros, sem culpa alguma, têem que espe-
rar pra depois.
Haveria um meio de querer conciliar tu-
do. Era Oizer: — Kardec errou, está visto.
Deus creou todas as intelligencias no mesmo
instante.
Mas nem assim se evitam as àdifficulda-
des. Porque sempre se seguiria que Deus,
por toda a eternidade, nunca: mais poderia
crear outras intelligencias. Estaria prohibido
para todo o sempre de crear espiritos para
não ser injusto.
(1) Se vemos dliferença no mundo, dizem elles, é
porque essas intelligencias o mereceram: Deus as creou
iguaes.

a
XIX
Deveremos fazer o mal?-—A hora
da morte
Porém, temos uma consequencia a tirar
dos mirificos principios espiritas.
Esta vida é uma expiação, dizem elles. O
que soffremos é justo; foi merecido por nós,
ainda que seja noutras incarnações.
Muito bem. Então quando um homem máu
persegue o seu semelhante, quando um ladrão
furta, quando o capanga mata, é sempre ins-
trumento da justiça divina. Deus não póde dei-
xar exceder o . que a pessoa mereceu;
pois
que, se O solirimento passasse o mal comm
et-
00, pelos dizeres espiritas, Deus seria
to; fa in jus-
ria diff erença entre as suas creaturas in-
telligentes, q
Pois bem, carissimos espiritas,
due se matarmos, se roubarmos, segue-se
E apo se torturar-
proximo, na fazemos nada de
“nas porque elle o mereceu mal.
carnações! noutras in-
—- Hum?!
OS seus dizeres, Deus não
none seo injustiça; Deus não póde per-
ualdade no

- Eos
Porque foi merecida, cimo asa
niah i?
nenhum em matar,D'ahqui e reé suum
lta ue não ha mal
a rod e fur-
as
TOLICES DE ALLAN KARDEC AM

far, que ha merecimento em martyrisar os outros...


Ai larilo-lé-la-rá...
— E não é só isso. Deduz-se ainda que
está-se praticando um bem quando todo o
mundo pensa que se está a fazer mal aos
outros.
— Tru-lurulurá-luré...
— Sim, snrs. Quando um sujeito dá um
tapa a outro, este devia tirar o chapéo até o
chão e dizer áquelle: — Mil vezes agradecido;
eternamente grato! — O outro ajudou a pagar
o que devia.
Quando um amigo atraiçoa outro, rouba-o,
deixa-o na miseria, — devia ser abraçado por
este com lagrimas de gratiõão. Não lhe podia
fazer um bem maior. E depois, elle já tinha
mesmo de passar por essa... Estava escripto...
Elle o tinha merecido na outra incarnação....
Logo, prezado snrs. espiritas, pelas suas
doutrinas, podemos e devemos praticar o mal.
Quanto mais mal fizermos aos outros, maior
será o beneficio que elles recebem. Quanto
mais o proximo pagar das suas culpas, tanto
mais nos agradecerá. E sobretudo quando vir-
mos que um conteco de réis do nosso proxi-
mo nos está fazendo mesmo tanta falta... E
tanto mais quando a sua conôducta nos estiver
amolando o seu tanto... Que mal haverá em
supprimil-o do numero dos vivos? Dir-lhe-
hemos simplesmente: —Vae, parte para o outro
mundo, que é puro beneficio teu! Pagas assim
as DOividas passadas, e nós praticamos uma
obra de misericordia. E para coroar tudo, ain-
da ficamos livres de til...
E não digam jamais que nós os catholicos
temos a mesa cousa, Porque nós dizemos que
112
—me —
sn + — e
TOLICES DE ALLAN KARDEC
- = ss e us e e ma td a o O o a
di
O
ed
Mi 1

O soffrimento sem resignação e sem o estado


de graça, não vai muito lá das pernas, ao
passo que os srs. affirmam que, até sem saber
d'elles, purgam-se peccados.
Além disso nós admittimos um Deus so-
berano e livre que, desde que dê a cada um
O que merece, não falta á justiça; sem termos
a pretenção de obrigal-o a fazer egualõade
absoluta entre as suas creaturas intelligentes.
Logo, pela nossa religião, fazendo mal aos
outros, expomo-nos a fazer soffrer um inno-
cente; pela dos snrs., só fazemos soffrer a quem
o mereceu. |
Pela nossa religião, fazer mal será sempre
fazer mal; pela dos .snrs., deve ser até acto
meritorio. E os homens deviam lançar-se- uns
contra os ouiros como tigres, para maior gau-
dio e beneficio de todos.
* x
Diz Kardec: «Assim, qualquer que seja o
perigo que nos ameace, si a hora não for che-
gada não morreremos? R. Não, não morrereis
e disso tendes milhares de exemplos; mas
quando a hora de partir tiver chegado, nada
poderá deter-vos (n. 853).» «Da infallibilidade
da hora da morte segue-se que todas as pre-
cauções tomadas para evital.a são inuteis? R.
Não, pois as precauções que tomaes vos são
suggeridas com o fim de evitar a morte que
vos ameaça (n. 854).»
Leitores, francamente, não entendo. Isto
deve ser de Platão. E' sublime como o firma-
mento, profundo como um abysmo e transcen-
dente como a intelligencia do mestre!
Não morreremos senão quando fôr chega-
da a hora marcada. Muito ba, E' a idéa cnh
TOLICES DE ALLAN KARDEC 113

rada que o povo tem, mas que não o impede


de evitar OS tumultos, quando chovem balas,
ae de fugir do rio cheio, quando não sabe
nadar.
- Mas agora «as precauções que tomaes vos
São Suggeridas
com o fim de evitar a morte
que vos ameaça»... Então, conforme estas
timas palavras, a morte depende de tom ul-
ar as
precauções suggeridas, ou não. Nem um cégo
deixará de vêr isso.
Temos pois duas cousas contradictorias :
a morte depende da hora, e não depende
da
hora, mas das precauções. — Eh lá, Kardec|
Que diacho disto é aquillo? ora você já
nãa
dá-se ? Qual das duas proposições é a ver-
dadeira? Eu por mim acho que, se a morte
depende das precauções. depende da nossa
vontade, a qual pode tomal-as ou deixar de
tomal-as apesar de suggeridas; logo não de-
pende da hora. .
Outras vezes dependerá da comprehensão
dessa suggestão, que tambem póde ser erra-
da; logo, mais uma vez não depende da hora.
Quando digo que Kardec se baba todo
por uma contradicção!.. São gostos, meus a-
migos. Outros se lambe por um doce, elle por
um Oisparate...
Resumindo direi: Estou n'um perigo; lem-
bram-me (ou são-me suggeridos) diversos
meios de evitar a desgraça. Mas, ou porque
quero morrer mesmo (a vontade é livre), ou
por negligencia, não me sirvo desses meios.
Morro por conseguinte. Logo, não é por ter
chegado a hora, que morro; Kardec que te-
nha paciencia. E' porque não empreguei os
meios necessarios.
114 TOLICES DE ALLAN KARDEC

& s
Tenho visto muitos espiritas inchados e
gangentos com a presença de Santo Agosti-
nho nas suas sessões. Até o nosso Kardec
teima e escreve que é elle; que é Santo Agos-
tinho, e mais S. João Evangelista, e mais 5.
Vicente de Paulo, e ainda S. Luiz, que lhe
vêem ensinar cousas tão de espavento como
as que temos visto.
E no entanto, no n. 505, que é que lemos?
Attenção, bondosos leitores; ponderem bem
estas palavras: <Os espiritos protectores que
apresentam nomes conhecidos são sempre os
de pessoas que tiveram esses nomes? R. Não;
mas espiritos que lhes são sympathicos e que,
muitas vezes, vêm mandados por elles. Como
precisaes de nomes, elles adoptam um que vos
inspira confiança.
Bona viagge! Então em que fica o Santo
Agostinho dos nossos amigos? Em que ficam
S. João, S. Luiz e S. Vicente? Talvez, sim,
talvez que sejam elles. Mas talvez que seja
um substituto. .
E' o que eu tambem penso. Santo Agos-
tinho.e os outros Santos téem mais que fa-
zer do que vir dar prosa ao snr. Allan Rar-
dec e mais espiritas!
São outros, são; podem ficar soceg ados,
porque são outros mesmo. Para nós não ha
duvida nenhuma,

e
EEE o -— —

XX
Allegorias
<A palavra de Jesus era muitas vezes
allegorica e em parabolas visto como falava
segundo os tempos e logares. Hoje é preciso
que a verdade seja intelligivel para todos....
A nossa missão é abrir os olhos da humani-
dade para confundir os orgulhosos e demas-
carar os hypocritas, os que affectam exterio-
res de virtude e religião escondendo torpezas.
O ensino' dos espiritos deve ser claro e sem
equivocos, a fim de ninguem poder pretextar
ignorancia, e para todos poderem julgal.o e
aprecial-o com a propria razão (n. 627).»
Arre! Que tiradinha contra nós! Nossa
Senhora nos valha! |
“Era muitas vezes allegorica”... Sim senho-
res! Com isto nas mãos pode-se alijar muita
cousa que não convem. |
Ha no ensino de Jesus alguma cousa que
não faça conta? Oh! não nos assustemos! Era
allegorico, era epenas um symbolo!
Jesus manda os apostolos prégar por to-
da a parte. “Ide pelo mundo todo, prégai o
Evangelho a toda a creatura. Quem crer e fôr
baptizado será salvo: mas quem não crer se-
rá condemnado (Marc. 16, 16)”. Julgam que
Nosso Senhor falava sério ao proferir essas
palavras? Qual historias! Era allegoria!
Jesus affirma peremptoriamente: “Aquel-
les a quem perdoardes os peccados serão
116 TOLICES DE ALLAN KARDEC
“mem

perdoados e a quem os retiverdes ser-lhes-


hão retidos”.? (João. 20, 23) Oral Era simples
allegoria, nada mais!
Quando Nosso Senhor muda o pão em
seu corpo dizendo: “Tomae e comei, este é O
meu corpo... fazei isto em memoria de mim”,
os srs. entendem que Elle instituia a Fucha-
ristia? Qual o que, gente! Pura allegoria!
Vejam que achado! que systema mais com-
modo! Com duas palavras"apenas se pulveri-
sa tudo 6 que não nos quadra. |
Era allegoria! E a essa simples affirmati-
va, tombam desamparadamente os Sacramen-
tos para um lado: eram todos allegorias; os
preceitos mais rigorosos perdem toda a sua
força e murcham miseramente a outro canto:
eram simples parabolas! T
Quando não nos convêem, é jogarmos-lhes
a allegoria por cimia, e prompto. Quem ha que
não queira ser espirita? Só pela commodida-
de vale a pena, não ha duvida nenhuma!
Mas vejamos ainda o que segue. <A pala-
vra de Jesus era muitas vezes allegorica e em
parabolas, visto como falava segundo os tem-
pos e logares»,
Ah, sim? Então aquillo de Jesus dizer que
quem não crer será condemnado, era segun-
do os tempos e logares? Bonito! Então na-
quelle tempo eram condemnados, e hoje não?
E quando Jesus declarou: Aquelles a
quem perdoardes os peccados serão perdoados,
isso era só para aquelles tempos e logares?
E quando Nosso Senhor diz: Quem qui=
zer vir após mim tome a sua cruz e
(Math. 16, 24), era para aquelle tempo, sio gate
-me
m-
Po-em que amarravam cachorros com lingui-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 117

ça?.. Hoje... hoje temos a doutrina de Allan


Rardec que ensina que a punição dos pecca-
dos não é mais do que ficar estacionario e
não retrogradar.
De modo que temos mais uma desculpa
para tudo o que quizermos rejeitar da doutri-
na de Christo.
Não nos devemos importar muito com o
que Christo disse. Aquillo era para aquelle
tempo! Hoje é outra cousa. “Hoje, diz KRar-
dec, é preciso que a verdade seja intelligivel
para todos...”
€ naquelle tempo não era, não? Oh, no-
vidade! oh aqudeza de logica!
Sim, tem razão, porque aquelles preceitos
de Christo, aquellas parabolas que Elle dava
como exemplo ao-povo, eram tão inintelligi-
veis!... Com certeza o bom Allan terá ficado
banzeiro diante de algumas d'ellas por uns
bons quinze dias! Terá ficada a olhal-as como
boi para palacio! E Nosso Senhor a dal-as
ao povo sem instrucção! Ora, Nosso Senhor
que ideia! E que Elle não se lembrou de con-
sultar Allan Kardec.
Mas, Rardec do meu coração, diga qual é
a parabola que é tão Qifficil de comprehen-
der; será por ventura a do filho proôigo,a da
boa semente, a do grão de mostarda, a do bom
pastor, a do devedor sem caridade...?
Mas são todas cousas ao alcance de qual-
quer camponio! Sabe para quem é que não
eram claras e não serviam, Kardec? Era para
aquelles como você que nellas só queriam ver
allegorias, aquelles que affirmavam que eram
cousas para outros tempos e outros logares.
Sim, para esses eram difficeis de entender. E
118 TOLICES
mundo cure sm O
DE
- <q a
ALLAN KARDEC.
q aci — so “a
-—-
—-—.
-
— e... a.
nas
a
a -— e c—
a a a a e A a q
«ao

para esses é que Jesus dizia: Quem tem ou-


vidos de ouvir, ouça.
“a nossa missão é abrir os olhos da hu-
manidade para confundir os orgulhosos e des-
mascarar os hypocritas, os que affectam exterio-
res de virtude e religião escondendo torpezas”.
Ah! Então antes não era preciso abrir os
olhos á humanidade, confundir os orgulhosos
e desmascarar os hypocritas? Realmente en-
tão os srs. têem razão, os tempos estão bem
mudados.
“O ensino dos espiritos deve ser claro e
sem equivocos, afim de ninguem poder pre-
textar ignorancia e para todos poderem jul-
gal-o e aprecial-o com a propria razão”. Ah
sim; é cousa que o ensino de Christo não
precisava ser. E' claro. Elle não precisava ser
comprehendido. Isto é só para os espiritos!!
Mas vejamos um a a. Vejamos se o
. cous
ensino dos espiritos será tão claro assim e
sem equivocos. |
De certo a revelação dos espiritos nas
sessões é cousa clarissima. A sua personali-
dade, que deve garantir a revelação dos mes-
mos é cousa muito clara! Ah, ah, ah! Quizera
por aqui tres linhas de homericas risadas!
Sim, é clarissima a revelação dos espiri-
tos, quando nem sequer temos a certeza de
quaes serão esses senhores espiritos. Quando
tanto podem ser as almas como os espiritos
- máus! E' realmente sem equivoco!
Ah, Kardec! você é sempre o mesmo:
granõe, sublime, inegualavel! Logo o funda-
mento de todo o espiritismo é o que ha de
menos claro e mais cheio de equivocos! e vo-
cê vem falar em clarezas!!
TOLICES DE ALLAN KARDEC
119

o em rec
nada das pretendidas reincarnações.
muito claro e inequivoco, não ha duvida! Fal- ANO
ta só O porque.
Mais um ponto claro é a reincarnação.
nos afiançada pelos espiritos: ora ess F'
ritos podem es espi-
ser zombeteiros ou fingidos, como
os proprios espiritas confessam: logo, temos
toda a certeza da reincarnação. Ah, é claro
como agua. Mais clareza só na noite escura.
Ponto claro e inequivoco é tambem pre-
cisarmos para o outro mundo, juntamente.
com a virtude, adquirirmos sciencia. E” “mais
uma claridade, mais um sol de luze de certeza.
Claro e inequivoco é outrosim que Deus
deve estar sempre creando. A necessidade de
uma creação febril, incessante, é clarissima,
sim, senhores.
Mais uma é que Deus deva forçosamen-
te estabelecer egualdade absoluta entre os
espíritos todos no principio, sob pena de in-
justiça. .
Outra ainda é que os sonhos são reali-
dades da vida do espirito. E' tão evidente
que não pode haver duvida. Se aquelle com
que eu sonhei, não sonhou commigo, é por-
que... porque... ora porque é assim mesmo.
Ah sim: tudo isto são cousas claras e
inequivocas. E estas clarezas e equi
nes é que vêem substituir O ensina de Chris-
O, tão obscuro e tão equivoco a
LóUMOrES Deus! Hymnos de acção =
graças! Se não fosse Allan Kardec nunca aos
Vinhariamos semelhante cousa!
Este Kardec é um prodigio!
XXI
Aproveitar do mal. — Amor à Deus.
<Aquelle que não faz o mal, mas se hou-
ver aproveitado do mal feito por outrem, tem
o mesmo grau de culpabilidade? R. E' como
se o fizesse; aproveital-o é participar delle
(n. 640).»
Oh! O rigorismo do nosso mestre é terri-
vel aqui. “EF' como se o fizesse!” Mas, caro
tio, escute um caso.
Um ladrão, não direi um ladrão honrado,
mas desses que nunca pensaram em ser as-
sassinos; esse ladrão encontra na estrada um
homem assassinado. |
E' uma desgraça. Elle não commetteria o
crime, não seria capaz de semelhante cousa.
Mas... uma vez que tem essa sorte, aproveita-
a: furta as joias e o relogio do morto.
"Faz mal, bem o sei. Não serei eu quem
defenda o ladrão quanto ao acto do roubo.
Mas f-o fo não quer dizer bananeira. E o
que me parece clamorosa injustiça é dizer-se
que o ladrão tem o mesmo grau de culpabili-
dade que o assassino. Isto sim é demais.
E é um espirito que O vem, segredar a Al-
lan Kardec! E Rardec é tão duro de molleira
que sem mais nem menos, lhe acceita os di-
zeres!... Quer dizer que — tanto raciocina um
como outro...
Não, Rardec, acredite-me. Pense um pou-
quinho e verá que o ladrão tem a culpabili-
- —
“TOLICES DE ALLAN KAR
EESTI o e e ati gm
121

dade do furto, mas nunca a do assassinato.


Elle apenas aproveita a occasião dessa des-
graça para exercer o seu officio. Faz mal, sim
Sr. mas nunca tanto como se assassinasse
para furtar. Tenha-o entendido.
* *
<A duração dos soffrimentos do espirito
pode ser eterna? R. Sem duvida que, se elle
fosse eternamente mau, isto é, se nunca se
arrependesse nem melhorasse, soffreria eter-
namente (n. 1006).» |
Eis como Allan Rardec dá razão ao fal-
leciõo Monsenhor Miguel Martins. Este cos-
tumava propôr o seguinte dilemma: Ou ha
vontade livre ou não. Se a vontade não é li-
vre, não temos nada a discutir, pois não pó-
de haver castigo. Se a vontade é livre, o es-
pirito poderá ser sempre máu, não arrepen-
der-se nem melhorar, e assim teremos penas
eternas. E estabelecia assim que, pela pro-
pria crença espirita, pode haver penas eternas.
Tinha razão Monsenhor, pois Kardec diz
que a vontade é livre, pode endurecer-se no
mal, sobretudo dando largas ás más paixões,
e por conseguinte sofirerá eternamente como
o proprio Rardec reconhece.
y *

Ha uma cousa que procurei, como Dio-


genes com a lanterna, no livro de Allan Kar-
dec, e infelizmente não poude bradar o eure-
ka de Archimeõdes:
Algum incitamento ao amor a Deus.
Tudo alli é amor ao proximo, caridade,
fraternidade; mas amor ao Ente mais ôdigno
de ser amado, ah, d'isso nem palavra. O que
122 TOLICES DE ALLAN KARDEC
Tee

é a principal cousa na nossa religião, o que


constitue o primeiro mandamento, o que era
o-cuidado mais ardente dos Santos todos, is-
so para O espiritismo vale pouco. Quasi que
aqui se lobriga a ponta do rabo do autor da
seita.
Vejam o n. 647: «Toda a lei de Deus se
encerra na maxima do amor do proximo en-
sinada por Jesus? R. Certamente.» |
Oh vós que tanto vos gabais de Santo
Agostinho! Lêde, lêoe a sua vida, e vereis
que amor ardente que lhe pulsava no peito
pelo nosso bom Deus! Lêde as suas Confis-
sões, e vereis que amor a Deus respiram to-
das aquellas paginas, todas aquellas linhas!
E agora, nas sessões, elle perdeu todo esse
grande amor ? Mudaria Santo Agostinho ? Qual,
christãos, é que não é elle, eis tudo!
Lêde a historia de S. Vicente de Paulo!
Que affecto immenso para com Deus! Aquillo
é que era amor! |
Lêde a biographia de S. Luiz, de S. Pe-
Oro Claver, de S. Leonardo, emfim de qual-
quer Santo, e vereis que a principal virtude
nelles todos era o amor, 0 amor immenso pa-
ra com Deus,
E agora corremos todo o livro de Allan
Rardec, e não achamos um dedo desse bello
sentimento) Extranho! Esquisito! Singular!

RCA
| XXII
Divergencias do espiritismo
Kardec faz um esforço herculeo
zer crer que o espiritismo está para fa-
em via de for-
mar uma ôOoufrina só, sem Olverg
encias.
E, como os papalvos são ca
pazes de o
acreditar, é nosso dever apresent
ar as cousas
como realmente são, em que pese
ao bom do
tio Allan.
São estas as palavras delle: «Os adver-
sarios do espiritismo não deixaram de
apro-
veitar como arma contra elle o facto de ha
ve
algumas divergencias de opinião acerca de ce r
r-
fos pontos da doutrina... Mas hoje já tres quar
-
tas partes d'esses systemas cahiram diante de
um estudo mais aprofundado... A unidade já
está feita sobre a maior parte dos pontos con-
testados... Notae que os princípios fundamen-
íaes são em toda a parte os mesmos... Se, en-
tre os adeptos do espiritismo, alguns
ha
divergem de opinião a respeito de alguns que
tos da theoria, pon-
todos estão de accordo quanto
aos pontos fundamentaes. (Conclusão 1X).»
€ lendo-se o final da obra, parece com-
Prehender-se que elle quer que esses tão fa-
lados pontos fundamentaes se reduzam ao
Preceito de fazer o bem!! “Os outros pontos
São secundarios... o antagonismo só poderia
existir entre aquelles que quizessem O ni
* aquelles que fizessem ou quizessem o mal.
124 TOLICES DE ALLAN KARDEC o

Ka rd ec ! Se to da a no ss a ce r-
Ora o bom do va mo s ar-
teza foss e es sa so br e re li gi ão , es ta
ranjados! n c o r dam
En tã o só p o r q u e os es pi ri ta s c o
se de ve p r a t i c a r
,O be m, ha u n i d a d e
em que'
esse
no espiritismo? E' cousa muito vaga. D'
it o po di a- se di ze r qu e ha u n i d a d e em to da s
ge
gi õe s, vi st o qu e to da s a d m i t t e m De us .
as reli
Além disso, pela grande logica de Allan
Kardec, podiamos ser tambem budhistas, vis-
to que, apesar de mil outros pontos dispara-
tados e tolos, o budhismo tambem ordena
fazer o bem. Podiamos ser idolatras de cons-
ciencia bem tranquilla, comtanto que praticas-
semos a caridade, pois que, pela explicação
que dá na mesma passagem, o bem a que
Kardec allude é a caridade sómente.
Ah Kardec, mais uma vez fulgura aqui a
sua logica sem rival!
Deixando porém esse ponto de lado, diz
Kardec que a unidade no espiritismo está já
feita? Hum! -Não me parece!
Ou será unidade a divergencia nos pon-
tos mais importantes e principaes?
Escute, Kardec. Com certeza não sabe
(pois que é posterior ao seu tempo) que em
1889 se reuniu um congresso espirita interna-
cional em Paris. Pois bem, nesse congresso
que Léon Denis eleva ás nuvens, propôz-se
a discussão, uma ninharia, uma bagatella, a
base de todo o espiritismo kardequiano: a
pluralidade das existencias.
Os leitores julgarão naturalme nte que a-
o a uma unanimidade de DEUS por
É além e que fôra cousa inteiramente super-
ua tratar de semelhante assumpto, visto ser
TOLICES DE ALLAN KARDEC 125

um ponto basico do espiritismo... Pois estão


muito enganados!
* Originou-se tal balburdia, tal conflicto de
opiniões que chegaram ao ponto de pedir que
não se discutisse tal assumpto em -publico!...
(Compte rendu pg. 55).
Eis a unidade já feita do sr. Kardec! Fis
como é verdade o que elle affirma, que “os
principios fundamentaes são em toda parte
os mesmos”!
Sim, vão atraz de A. Kardec, e verão a
onde os leva!
Dasta acrescentar que em 1899 os espiri-
tas espiritualistas, a cuja testa estava Pierat,
excediam de dois milhões (Bizouarô, Rapports
de Fhomme V. VI, 567). E os espiritas espiri-
tualistas são justamente os que não admittem
a reincarnação.
Sim, é verdade, a unidade no espiritismo,
esta quasi feita... Se quasi matasse cavallo!...
A 25 de fevereiro de 1919 a Razão do
Rio, salientando as differenças do espiritismo
do Redemptor e da Federação Espirita, escre-
via o seguinte a favor do Redemptor: «O es-
piritismo Racional fundou o Redemptor em
1912, por não querer a Federação ser séria e
teimar em ser uma intrujona, uma fabrica de
fanaticos, que loucos são... (Os espiritos su-
periores) estão fóra deste planeta onde impe-
ram os espiritos obsessoõdes, que por ignoran-
cia e por culpa de Rardec e seus adeptos,
aqui se têem quedado com grave prejuizo pa-
ra a humanidade, para os praticantes do tal
espiritismo rotulado de kardecista...
O Redemptor combate o fanatismo, os
falsos Evangelhos, o trato com os espiritos,
126 TOLICES DE ALLAN RARDEC

especialmente com os que se acham na at-


mosphera da Terra, perturbados e ignorantes
do mundo que lhes é proprio, porque é esse
trato a causa da loucura e outras enfermida-
des, cujo trato, cuja attracção é aconselhado
(?) por Kardec, que para mais facilmente en-
louquecer a humanidade e arruinar lares, a-
conselha as sessões em familia e outras...”
Eis Kardec combatido por uma inteira as-
sociação espirita no Rio de Janeiro! o
A America do Norte é o berço do espiri-
tismo. Entretanto como confessa o Compte
rendu do congresso internacional espirita de
1889, pg. 55 e 56, a maioria alli abandona as
theorias de Allan Rardec. Por conseguinte,
para elles, o grande Allan Kardec é um here-
ge, e os espiritos seus informantes, não pas-
sam de mystificadores,
Gougenet de Monsseaux na suã obra “La
Magie au XIX siecle” apresenta-nos demonios
comparecendo ás suas sessões. E não se jul-
que que são apenas espiritos de homens máus,
não. Apresenta-nos verdadeiros demonios que
em tudo estão de accordo com a crença ca-
tholica. O mesmo se diga de Dupotet e seus
sequazes.
Ora nós sabemos que, para Kardec, não
ha taes demonios; elle quer que não sejam
mais do que espiritos desincarnados que se
esforçam por induzir os homens ao mal.
Vemos pois que realmente ha grande uni-
dade no espiritismo!... Tem razão Kardec!..
.
. É se nos pontos principaes ha taes opi-
nó desencontradas, que será do mais?
res, pobres espiritas, Po-
que nem sabem onde
estão mettidos|
TOLICES DE ALLAN KARDEC 12
—— e -
— — .—. us «tu sms, o ea a
s - qui
a cama
uu e

Concluirei destacando as seguintes palavras


de Léon Denis que bem contradizem as de
Kardec: «Verdade é que, se examinarmos de
perto o estado do espiritismo, notaremos em
seu seio.. causas de divisão, de rivalidades de
opiniões e de dissidencias. Em vez da união
e da harmonia, encontram-se muitas vezes an-
tagonismos e lutas intestinas... Ao contacto
das fraquezas humanas qualquer ensino torna-
se a origem de disputas e de conflictos. (De-
pois da morte, cap. KXVII).»
E' isso mesmo: quando falta uma autori-
dade divinamente constituida para dirigir as in-
telligencias no que nos é revelado, não pode
deixar de haver mil sentenças, sem que o ho-
mem tenha um quia certo para vir ao conhe-
cimento da verdade.
RRRRRIRRA
XXIII
Lourdes
Eis pois respondidas as principaes tolices
de Allan Kardec. o
Para terminar porem, apresentarei um
grande argumento contra o espiritismo; os mi-
lagres de LOURDES.
Para quem ainda o ignore, direi que em
Lourdes, dão-se os mais estupendos milagres,
as curas mais maravilhosas, curas que deixam
os medicos de bocca aberta. Vou escolher um
dentre os numerosos casos que se têem dado
e se dã0 seguidamente no grande santuario de
Nossa Senhora.
| No dia 20 de Maio de 1907, Affonso Al-
liaume, criado, morador em Falaise (Calvados,
França), com 26 annos de idade, indo condu-
zir um touro para o campo, ainda no pateo
da casa, foi investido pelas costas pelo animal
que o atirou violentamente ao chão. Logo
em
seguida o touro lançou-se novamente sobre
le el-
e fincando-lhe o chifre no ventre, ergueu-o
ao ar e atirou o pobre homem para traz.
liaume, posto que gravemente ferido, teve Al-
da ain-
sufficiente presença de espirito para atiçar
o seu cão contra o touro. Foi o que lhe valeu.
O fiel animal saltou á cabeça do touro
terrou-lhe os e en-
dentes no pescoco
tempo ao pobre criado para
ainda que segurando os intest A d a gio pm
quasi metro e meio, lhe sahiam in os ve, em
fóra a ferida.
SST
retas ==
TOLICES DE ALLAN KARDEC
O.
ilus
aa sr sriinta sd Tem
mm amas
129
Affonso Alliaume foi tratado no hospital.
Um anno depois, impossibilitado de tra-
balhar, exigia do patrão, perante os tribunaes,
uma indemnisação por perdas e damnos.
| O tribunal, ordenando exame juridico de
mais Oois medicos no dia 29 de Junho de
1908, condemnava em Agosto o patrão a pa-
gar 7.000 francos de indemnisação, em vista
do resultado do exame que fôra o seguinte:
1) Alliaume tem tres dedos da mão direita
paralyticos e revirados para dentro, e paralysa-
da uma parte do braço, e isto de modo incu-
ravel.
2) Alliaume tem no baixo ventre uma fe-
riõa purulenta cuja abertura é do tamanho
duma moeda de dois francos.
3) Alliaume sofíre de frequentes vomitos
e perturbações intestinaes, acceitando-lhe o es-
tomago somente leite e ovos crús. O seu peso
diminuiu 46 libras, de modo que, pesando an-
tes 75 kilos, pesa agora só 52.
“Tres semanas depois desta decisão do
tribunal houve a peregrinação nacional a Lo-'
urõdes, e Alliaume tomou parte nella.
No caminho quiz elle comer uns biscoi-
tos, e com isso sentiu-se tão mal que uma
irmã de caridade se viu obrigada a não sahir
de ao lado delle.
A 22 de Agosto às 5 horas da manhã, o
medico do hospital de Lourdes ligou-lhe a
ferida do ventre, a qual continuava a suppurar.
Cinco vezes o enfermo se banhou na fonte
milagrosa, mas sem resultado algum.
Durante a procissão com o SS. Sacramen-
to, porém, de repente se lhe desprenderam os
braços que trazia cruzados, e o braço doente
130 TOLICES DE AILLAN KARDEC
—— 00 DO a ea
Da

Dt

começou a agitar-se para todos os lados, e


com tal violencia que o pobre homem gritou
que se lhe destroncara o hombro.
— Não, Oisse-lhe um companheiro: você
está curado!
De facto os tres dedos fechados tinham-
se aberto, tornando-se flexiveis como os sãos.
No exame medico que se seguiu não se
achou mais ferida nenhuma no ventre; no lo-
gar della estava uma cicatriz fechada ! Os pan.
nos, ainda cheios de pús, foram subtituidos
por outros, e estes permaneceram completa-
mente limpos. O braço paralysado movia-se
perfeitamente, e o estomago começou a traba-
lhar como o de um são. |
Alliaume estava curado!
Mas o bonito é que o patrão 9'elle ao sa-
ber da cura, pôz logo embargos á execução
judiciaria da indemnisação de 7.000 francos:
e com razão.
E por isso a 25 de Novembro de 1908 o
tribunal de Caen deu a seguinte sentença:
Em primeiro logar o tribunal declara jus-
ta a primeira sentença, pois que o requerente
era então verdadeiramente incuravel. Em se-
gundo logar setenceia que a indemnisação de
7.000 francos seja abaixada a 3000, conside-
rando que depois da primeira sentença em
Agosto, Alliaume foi repentinamente curado e
que o braço e os dedos recobraram a sua
acti vidade, e que a ferida QO re
cessando fechou,
toda suppuração. nd

sado das perdas sofír


id as desde o dia do de-
Sastre até o da sua cura e não ma
is para O
TOLICES DE ALLAN KARDEC 131

futuro, pois que agora já não se acha impos-


sibilitado de trabalhar.
Temos pois duas sentenças authenticas de
um tribunal: uma reconhecendo que o enfer-
mo era incuravel, outra confessando que a cu-
ra fôra repentina e completa.
Eis ahi o caso. Como esse porém ha mui-
tissimos outros. Os relatorios dos milagres pro-
vados enchem duzentos volumes dos Annaes
da Gruta conservados em Lourdes. E esses
casos são todos de curas estupendas e sobre-
naturaes, verificadas por medicos de nomeada.
Bastará escrever a algumas das pessoas que
figuram nelles para ter-se á confirmação do
facto.
Que concinsão tirar. daqui?
Uma muitos simples. Se Iossa Senhora
deixa de fazer esses milagres no espiritismo
para Os vir fazer no seio da religião catholi-
ca, segue-se que é esta a religião ôd'ella, esta
a que ella approva, esta a que o Filho della
deixou na terra para salvação das almas, e
nenhuma outra.
Segue-se que o espiritismo não é a reli-
gião verdadeira, porque se o fosse, Nossa
Senhora tinha obrigação de abandonar os ca-
tholicos para não favorecer com milagres o
erro, para não confirmar os povos no que não
fosse a religião de seu Filho, E ella seria obri-
gada a fazer esses proôdigios no seio do es-
piritismo, obrigando assim todos os que pro-
curassem a verdade sinceramente, a seguirem
essa religião.
Nossa Senhora não o faz? Abandona o
espiritismo pelo catholicismo? E' porque este
é a religião verdadeira, É porque este contem
132 TOLICES DE ALLAN KARDEC =

os ensinamentos de seu Filho, é porque este


é o depositario da verdadeira Fé e o encarre-
gado de debellar sempre o erro e a mentira.
Viva pois a religião de Maria Santissima!
Viva a religião dos milagres de Lourdes!
DISLATES
DE

LÉON DENIS
NTE N ENTE MENTE NON

Introducção
Expostas as principaes tolices do sr. AÍ-
lan Rardec, parece-nos util mostrar que tam-
bem os outros corypheus do espiritismo an-
daram á matroca com as suas asserções.
Disparataram um pouco menos, é verdade,
mas é porque é odifficil achar dois Allan KRar-
decs. Podia-se dizer, parodiando Ramalho Or-
tigão, que o mundo é pequeno demais para
conter dois homens que disparatem como Al-
lan Kardec; que se tal segundo homem exis-
tisse, as gerações o teriam presentido durante
os ultimos seculos, pelas convulsões geólogi-
cas do globo, violentamente abalado pela tra-
balhosa gestação do prodigio
Mas, em todo caso, é preciso confessar
que tambem os outros Oisparataram, e bas-
tante. E nem poôdia deixar de ser, visto que os
pontos principaes do espiritismo se prestam á
galhofa.
Léon Denis, apesar duma linguagem me-
lhor, não deixa de apresentar certos pontos
que forçam o riso e desopilam o baço. Tem
contra si simplesmente o estyvlo de não dQize-
rem asneiras desse tamanho em linguagem
mais apurada. Flammarion, apesar de bom as-
tronomo, torna-se desfructavel quando nos vem
com certas crenças espiritas. E ambos são,
depois de Allan Rardec, as duas mais grossas
columnas do edificio espirita.
136 TOLICES DE ALLAN KARDEC
aqui! diria alguem com OS
— Ah Samsão
seus botões.
Mas que! Não é preciso nenhum Samsão
para derribar templos erguidos ao erro. Este
de sm as ca ra ; de si me sm o, va i mo s-
por si se em -
pé de ar gi ll a, qu e nã o re si st e ao
trando o
bate robusto da verdade. an a-
Bast ar á fa ze r co mo at é aq ui , is to é,
as pr op ri as pa la vr as de ss es au to re s: e
lysa r
as , so b o es ca lp el lo da lo gi ca , re sa lt ará
nell
sm as ca ra do O er ro , co rr id o de se ve r ex po s-
de
to á claridade do dia; elle que apenas sahira
armado de uma triste lanterninha emprestada...

a
E PELES

|
As religiões antigas
Léon Denis, no seu livro Depois da Morte,
aparou a penna e elevou o estylo, e num sur-
to de valentia, pretendeu provar a legitimidade”
do espiritismo. |
Se a emphase e a pretensão bastassem
para crear verdades, o espiritismo teria acha-
do o seu patrono. Além d'essas cousas porem,
requer-se mais alguma, para Oar certeza; re-
quer-se uma ninharia, uma nuga, um nada:
requer-se apenas a verdade.
E a verdade reergue o collo invicta, como
a labareda “que lambe o malho que a fez sur-
gir, quando a logica se vê attingida pelos gol-
pes incertos do camartello do erro.
A verdade espezinhada apparece e avulta
por entre os pés que phreneticos, a pretendem
calcar.
Mas ai que Oo povo ignaro se deixa seduzir!
Léon Denis toca poblemas que requerem
estudos serios e tenazes; questões que põem
em contribuição historia e theologia; e o po-
bre povo, deslumbrado com esse fogo de vis-
tas, entende que aquelle clarão é o da verda-
de, quando é apenas a phosphoreçencia mise-
ra do erro.
Léon Denis tem tido voga, porque apparenta
um certo preparo; e o povo, sobretudo aquelle
que não se esteia em solidas ldéas religiosas,
138 TOLICES DE ALLAN KARDEC

admira e acata muita cousa que não entende.


Começa o sr. Denis querendo estabelecer
um grande principio: o de que em fodas as
religiões ha uma só base, uma só doutrina,
a qual é a verdadeira; e essa doutrina não é
nem mais nem menos do que a reincarnação
das almas e a evocação dos mortos. |
E com isso pretende fixar o ponto de que
todas as religiões têem um fundo verdadeiro
e se concretizam, em ultima analyse, no espi-
ritismo. «Adquiriu-se a prova de que todos os
ensinos religiosos do passado se ligam, por-
que, em sua base, se encontra uma só e mes-
ma doutrina, transmittida de idade em idade,
a uma serie ininterrupta de sabios e pensa-
dores.» (Depois da Morte, cap. 1) ('). O smr.
Denis porém não considerou que, pondo de
lado o materialismo atheu que a bem poucos
sorri, só ha duas crenças possiveis: ou uma
vida só ou diversas reincarnações. Não ha mais.
Entre essas duas é que o mundo todo teve
que escolher. Ou uma existencia seguida im-
mediatamente do premio ou castigo, ou diver-
sas existencias purificadoras.
Que admira pois que muitos tenham es-
colhido essa crença que é mais commoda e
mais agradavel aos homens?
Só esse facto, portanto; nada prova.
Era como se dissessemos que devia haver
muitos deuses porque quasi todas as religiões
antigas admittiam mais de uma divindade. Te-
riamos o mesmo caso e, pelo argumento de
() Não citamos a pagina porque seria inutil, visto
haver diversas edições. Não obstante, não será difficil a
qualquer pessoa verificar as citações, que são sempre
feitas ao pé da letra.
TOLICES DE ALLAN KARDEC 139
— ce DO — —

Léon Denis, deviamos ser polytheistas: por-


que (excluido o atheismo, que é apenas de
individuos e não de povos) não ha meio ter-
mo: ou se crê que ha um só Deus, ou se
deve crer que ha mais de um. São apenas duas
opiniões á escolha.
Tambem quanto á materia do universo te-
mos apenas duas opiniões em face uma da
outra. Ou essa materia é eterna, ou então foi
creada.
Logo não é nada de admirar que religiões
antigas affirmem que o mundo é eterno. Nem
por isso nós seremos obrigados a acompa-
nhal-os nessa opinião, só por ser d'elles.
Ou cruzes ou cunhos! E” claro que uma
grande parte ha de ser pelas cruzes e outra
grande parte pelos cunhos. Só por este facto,
ninguem tem certeza de que caiam cruzes, co-
mo ninguem tem certeza de que caiam cunhos.
Vê o nosso bom Léon Denis que, quando
não ha mais que duas alternativas a escolher,
nenhum snob póde se maravilhar de que mui-
tos hajam escolhido uma d'ellas.
Comtudo, é preciso dizer-se: essa crença
na reincarnação não era tambem tão geral na
antiguidade como quer o nosso autor. Elle cita
em seu abono o brahmanismo, o buddhismo,
a religião do Egypfo, a dos druidas, e parece
insinuar que era geral essa crença entre gre-
gos e romanos (cousa com que não concor-
damos).
Porém, deixando" de lado assyrios, babvlo-
nios e phenícios, dos quaes nada sabemos so-
bre esse ponto, o proprio Léon Denis no se-
guinte capitulo nos informa que a egreja do
sul da India e o grão sacerdote de Cevlão en-
E S D E A L L A N K A R DEC
140 TOLIC aA
—— a mu meato ui e

õ a da i n d i v i d u a l i d a d e e
cinam o nirvana, a perno na da , c o u s a s que se
nto do ser
o esvaime à lua com
com à reincarnação como
parecem no
o Pão de Assucar.
apezar de religião vasta-
O mahometismo, c o m m u n g a nes-
ta m be m nã o
mente espalhada, em qu e pe se ao snr.
sa idéa da reinca rn aç ão ,
De ni s. o
L éon
, o P o v o cu ja re li gi ão ta nto se
Os judeus o aômit-
an ti gu id ad e, t a m b e m nã
salientou na u n d o sa be.
tiam tal co us a, c om o todo O m
idem, idem. Se-
A religião de Zoroastro, per-
gundo os persas zarathustrianos, a alma
ce no ca da ve r tr es di as . Ao qu arto era
mane
ad a e de po is co nd uz id a á po nt e Ci nv at que,
julg
ci ma do in íe rn o, le va va ao pa raiz o. Se a
por
ma fô ra co nd em na da , ca hi a no ab ys mo , ia
al
ser escrava de Angro-mainyus; no caso con-
trario passava a ponte e no paraizo indicavam-
lhe o logar em que devia ficar até a resurrei-
ção dos corpos. Ora em tudo isso nada ve-
mos de reincarnação.
E na China, nem Lao-Tseu, nem Kung-Fu-
Tseu (Confucio) falaram em semelhante rein-
carnação.
Gregos e romanos tambem não tinham ge-
ralmente essa crença; e se alguns philophos
admittiam a metempsychose, outros e o povo
aômittiam os Campos Elvseos e o Tartaro
a.
ssim, por ex. diz Socrates, citado por
Platão: «Os impios que desprezaram as leis
mp oo são precipitados no Tartaro, para nunca
BA irem delle e para sofírerem ahi tormentos
orriveis e eternos». Vê o bom Denis que, por
TOLICES DE ALLAN KARDEC 141

mais que elle queira, isto não se parece nada


com a reincarnação.
Virgilio, apesar de citado por Denis em
favor da sua opinião, descreve-nos o inferno
com o colorido vigoroso dos seus versos, e
falando de Theseu, um dos condemnados, ser-
ve-se das palavras: «fixado eternamente no
inferno.» Será isso por ventura tambem rein-
carnação?
De Aristoteles nem se sabe se admittia
alma immortal ou mortal. Zenon de Citium,
fundador do estoicismo, até nega. a existencia
da alma. Logo, nem um nem outro é partida-
rio da reincarnação. Epicuro ensina que a al-
ma é composta de atomos-e é mortal. Por.
conseguinte não. acceita a reincarnação.
Pyrrho e os scepticços duvidam de tudo.
Platão tambem, que- Deus. nos apresenta
como fautor da reincarnação, depois de dizer
que as almas que não são inteiramente crimi-
nosas nem absolutamente innocentes, sofirerão
penas proporcionadas até se purificarem, con-
tinúa assim: «Quanto aos vis scelerados, cul-
pados dos ultimos crimes, e por essa razão
tornados incuraveis, servem de exemplo aos
outros (Gorg. LSKXI),
Origenes cita estas palavras de Celso: «Os
christãos têem razão em pensar que os que
vivem santamente serão recompensados: de-
pois da morte e que os maus sofirerão sup-
plicios eternos. Este modo de pensar lhe é
commum com o mundo inteiro (Contra Celsum,
lib. VIII),
E note, Léon Denis, que tambem Celso
era romano.
KARDEC
142 TOLICES DÊ ALLAN o. ea
-— — — ama
a e
ee — — .-— —es ums e e

o mr
——— sum es —
— e
«ar e ne q

tã o ge ra l es sa do ut ri na da
Não foi pois
pr et en de m ce rt os es pi ri ta s.
reincarnação como
na an ti gu id ad e se ac ha um po uc o espa
E se
lhada. é pela simples razão de que, cipadara, qu em
não tem a revelação Olvina que de entre
opiniões tão sómente, não ha grande
duas
escolha.
Qu e im po rt a qu e In di a, Eg yp to e dr ui da s
admittam a re in ca rn aç ão , se a nã o ad mi tt em
judeus, mahometanos, persas € chins ?
O argumento de Léon Denis não passa
pois, como disse, de um fogo de vistas. Des-
lumbra a principio, chega a abalar e a espan-
tar. Mas, examinado um pouco mais a junôo,
atira-se o livro com um sorriso de compaixão
exclamando: Ora, o homem quer sopa!
Além do mais, era muito natural que uma
opinião se extendesse de um povo a outro
mediante a convivencia. De modo que era
muitas vezes a mesma doutrina que ia fazendo
proselytos só pelo facto de chegar ao conhe-
cimento dos outros; e não a verdade que se
impunha, como parece pretender Léon Denis.
| Passando agora ao facto da evocação dos
espiritos praticada em muitas religiões antigas,
como Oiz o snr. Denis, nada temos em contra-
rio. Assim como os espiritas pretendem fazel-o
hoje, os antigos com o mesmo direito, tinham
E pr pretaraão: Isso porém nada prova.
pita Ar nós não negamos o facto da evoca-
NERD O ana NUR sejam os espiritos
emquanto não nol- presentam; pelo menos
Bhi é qu e O pr ov am . Ma s pr ov ar ?. ..
» COMO Oiz Herculano, certo ani-
ma
eols toMerceDaMceort
SaÀ parte do corpo que eueo
TOLICES DE ALLAN KARDEC 143
oa —— —
=" 2=2"=

Fala tambem o nosso Denis um pouquinho


na moral, segundo elle egual e optima tam-
bem na antiguidade: «promulgaram a lei mo-
ral, immutavel, sempre e por toda parte se-
melhante a si mesma”. (Cap. 1).
Pelo amor de Deus, elle que não venha
comparar todas as moraes pagãs com a moral
de Jesus Christo! Que se lembre dos indios
divididos em castas, e levando ao extremo li-
mite o desprezo pelas castas inferiores! Que
se lembre da moral dos Egypcios empregando
milhares de escravos a trabalhar sob o azor-
rague para ergquerem as famosas pyramides!
Que se lembre da moral dos gregos os quaes .
em Sparta até ensinavam a furtar comtanto
que o furto não fosse descoberto! Que se
lembre das orgias dos Romanos e da Qdureza
dos mesmos quando, no meio dum festim,
lhes cahia aos pés um gladiador moribunôdo,
e elles dando-lhe com a ponta do pé excla-
mavam: Afasta-te, animal, que me sujas a
funica!
E essas moraes, essas caridades Denis
quer comparar com a moral e a caridade de
Christo? Já é!
Mas elle arranja ainda uma desculpa: diz
que os discipulos não souberam guardar inta-
cta a herança dos mestres... que os seus en-
sinos ficaram desfigurados por alterações suc-
cessivas... |
Pois, ainda assim, a Olfferença é grande.
Que lembre a prohibição de Jesus, em mate-
rias peccaminosas, até do pensamento volun-
tario; que recorde a sublime caridade: para
com o proximo que maravilhava até os pagãos,
nos primeiros seculos do christianismo, e de
144 TOLICES DE ALLAN KARDEC - —
o
uu us ao
—— — — wa

que até hoje dão exemplo religiosos e réligio-


sas que se sacrificaram em missões longin-
quas e santas casas d€ misericordia. Que não
esqueça o amor profundo que Jesus pede se
tenha a Deus, amor que em sua grande pu-
jança, produziu os martyres e os santos da
nova lei. E verá então quanto excede a moral
de Christo à moral pagã!
Que se o budhismo dá uns preceitos de
abnegação sem olhar a recompensa, motivo
pelo qual Léon Denis pretende sobre-pôl-o ao
christianismo,—que nos apresente os seus se-
quazes; mas sequazes que possa oppôr aos
martyres do christianismo, aos santos, heróes
de todas as virtudes, aos entes consumidos de
amor ao proximo, que se votam a acudir á
humanidade nas brenhas habitadas por selva-
gens e no fundo dos nossos hospitaes!
Sim, que os compare, e depois então ve-
nha o snr. Denis falar em «moral immutavel,
sempre e por toda parte semelhante a si
mesma»!

CRE
— ——
eme
aa me

[1
Essenios e gnosticos
Léon Denis quereria: muito que Jesus fos-
se essenio, porque descobriu ou pretendeu
descobrir que os essenios criam nas vidas suc-
cessivas das almas.
E pretende estabelecer que ôOelles Jesus
recebeu essa crença e que ella faz parte do
seu ensino.
Já demonstramos que Christo não prégava
a reincarnação, mas sim a vida eterna depois
da presente existencia de provação. O melhor
argumento, depois das proprias palavras de
Christo, é o ensino em vigor nos primeiros
tempos do christianismo; e este ensino, con-
forme provamos pelas palavras de S. Paulo,
9. Clemente, S. Barnabé e Hermas, escriptores
do primeiro seculo, nada tinha de espirita e
nem cogitava de reincarnação. (V. Cap. XII da
la parte.) - |
Além disso, já em outros pontos ha muita
divergencia entre o ensino dos essenios e o de
Christo. Não são tão parecidos como quer Denis.
Lembremos o culto que q tributa-
vam ao sol e que os levava á creancice d€
não quererem offender-lhe os raios com as
impurezas do proprio corpo. Jesus nada orde-
na com relação ao snr. sol, nem os apostolos
adoptavam o uso da pásinha de que os esse-
nios tanta questão faziam.
146 TOLICES DE ALLAN KARDEC
o —— e o — =

À caridade dos essenios tambem se diffe-


renciava, e não pouco, da de Jesus. Leia, De-
nis leia os historiadores e verá que aquelles
deixavam até morrer á fome os adeptos que
se tinham afastado da sua communidade. E
esta é a Ooutrina de Christo? Esta é a cari-
dade que Elle prégava? Seria muito de admi-
rar que Jesus fosse buscar a sua caridade
perfeita a essa fonte tão pobre e deliciente!
Não, fesus não deve nada aos essenios.
A sua doutrina se destaca: beila e fulgurante
de todas as Ooutrinas anteriores, pois que
nessas todas se Oivisam as sombras do erro
e as fraquezas da intelligencia não sustentada
pelo braço de Deus!
x
% He
Tambem se obstina Denis a affirmar que
os primeiros christãos evocavam as almas e
acreditavam na reincarnação. |
Baseia-se quanto ao primeiro ponto em que
«quasi todos os philosophos de Alexanôria,
Philon Ammonius Saccas, Plotino, Porphyro,
Arnobio se dizem inspirados por genios supe-
riores? (Cap. VÔ. '
Ora isso nada prova, porquanto, dado
mesmo que todos elles fossem christãos, não
nos dá elle argumento algum de que esses
taes genios superiores, se de facto existiam,
eram almas desincarnadas.
E quanto a algum exemplo de bons chris-
tãos, que elle cita tambem, respondemos que
nunca nós negamos poder Deus permittir a
vinda dum anjo ou dum santo para assitir
ou para ensinar um bom christão, a quem Deus
queira favorecer com essa graça. O que nega-
"mos é que, geralmente falando, não seja pre-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 147
e e a a a,
——— e

ciso mais do que invocar almas para estas


jndistinctamente apparecerem ão nosso capri-
cho e talante.
Quanto á crença dos gnosticos na reincar-
nação, tambem esta nada prova, porque Denis
deve saber que os gnosticos eram hereges, que
se apartavam da crença geral dos christãos, e
“formavam lá seus castellos no ar sem quere-
rem attender á legitima autoridade que Jesus
estabelecera com o fim de todos saberem on-
de estava a verdade.
Que leia Denis aquellas mirificas theogo-
nias de Menandro, Saturnino, Basiliões, Va-
lentim et reliqua, para ver que bellos dispara-
tes e que estapafurdias idéas elles queriam
impingir á humanidade. E esses seriam os que
tinham as verdadeiras idéas do christianismo?
Está solto, Denis!
Que percorra as paginas em que se nar-
ram os vícios e excessos a que se entregavam
os gnóstices em consequencia dos seus syste-
mas de doutrina, e elle então queira que os
espiritas os tenham por paes na crença reli-
giosa, que nós, os catholicos, de bom grado
lhos dei xam os. Não , não era m nos sos . Era m
hereges, meu caro, e como taes foram separa-
dos da egreja a qual elles queriam contaminar
com as suas doutrinas bizarras e com os seus
pessimos costumes.
é
& 4

Quanto aos escriptores que Denis cita,


provar-nos que 08 primeiros christãos
para que
eram espiritas, reportamo-nos ás citações
no cap. KIl da t:2 parte; citações, já
fizemos
não digo dos primeiros, mas d08 primeirissi-
TOLICES DE ALLAN KARDEC
148

pois são dos escriptores mais


mos christãos.
antigos do christianismo. aços
E ai nd a ma is : Se o es pi ri ti sm o é ve rd a-
co mo é qu e te mo s ma rt yr es ? Es se s tr ez e
deiro,
milh õe s de pr im ei ro s ch ri st ão s qu e de ra m a
vi da pe la re li gi ão , te l- o- iam fe it o, Se fo ss em
espiritas?
Nunca, meu bonissimo Denis!
E' sabido que elles deram a vida, em pri-
meiro logar porque sabiam ser preceito TIgO-
rosissimo de Christo que o confessassem pe-
rante o mundo; e por. conseguinte que seria
desobediencia muito grave deixar de o fazer
por medo. Em segundo logar deram a vida
como prova para o mundo inteiro da sua fir-
me convicção da verdade do ensino de Christo.
E em terceiro logar deram a vida por Jesus
como a maior prova que podiam dar do amor
que tinham ao Filho de Deus.
Ora, seu Denis, você e os espiritas negam
que Christo fosse filho de Deus, Deus como
seu Pae. Nessa hypothese portanto, Elle não
tinha nada que mandar.
€ Se não passava de um espirito elevado,
Eile não tinha poder para vir mudar as leis
da natureza que preceitúam o amor á vida, e
muifo menos para mandar que se derramasse
O sangue e se morresse por simples amor a
Elle. Teria exorbitado, meu caro Denis, e co-
mo simples espirito elevado, não podia pre-
tender tanto. |
|. Demais, se a religião de Christo era o es-
A como os snrs. têem a coragem de
re ua precisão havia de tanta gente
tão E p provar uma cousa tão simples,
| usceptivel de ser demonstrada sem san-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 149
— uu

que? Era só apontar para as mesas dançantes,


para os mediums allucinados, para as mani-
festações que vocês dizem ser das almas.
E depois, na hypothese espirita, não bas-
tava deixar os homens pagãos e entregues a
si proprios? (Com as reincarnações, não me-
lhorariam natural e fatalmente sem tantas his-
torias? o.
E, se acaso nos disserem que a morte
dos martyres era necessaria para implantar o
espiritismo, porque — diga, porque, meu caro
Denis, você e Allan Kardec mais outros cam-
peões do espiritismo, — não vão lá para o meio
dos bugres e selvagens dar a vida, para elles
acreditarem nas conversas dos espiritos. |
E por ultimo, porque é que, podendo mi-
lhares d'aquelles christãos evitar a tortura, po-
dendo evitar a morte vergonhosa e terrivel, só
com offerecer incenso-aos idolos, porque, digo,
não o fizeram se eram espiritas? São os -es-
piritas que dizem com Léon Denis que <o ini-
ciado sabia unir-se a todos e orar com todos.
-Flonrava Brahma na India, Osiris em Mem-
phis, Jupiter na Olympia, como pallidas ima-
gens da Potencia Suprema.» (Cap. 1).
Não, Denis do coração, se os primeiros
christãos fossem espiritas, nunca teriamos tre-
ze milhões de martyres! Porque seria uma to-
lice da parte d'elles, porque exorbitaria do po-
der de Jesus, porque, emfim, seria cousa bem
dispensavel, vista a candidez do espiritismo
que se amolda a todas, as opiniões.
Notinha traiçoeira “na sua apparencia
Sonsa e velhaca, é a do cap. VI, que diz as-
sim; «No texto grego dos Evangelhos, encon-
150 TOLICES DE ALLAN KARDEC a e
1 —— e e a E
— mt — emi
——e—
——— mm am

tra-se quasi sempre isolada a palavra «espi-


rito». S. Jeronymo foi o primeiro que a ella
accrescentou <«Santo”,
O bom do Denis entende que a aíffirma-
tiva delle é o mesmo que a martellada em
cheio na cabeça de prego. Elle fallou, tem que
ser assim mesmo.
Mas o bom do homem devia saber que
nós somos um tanto incredulos, e por conse-
guinte queremos provas e não simples affirma-
ções. O seu prego está muito frouxo, Denis.
Olhe, você conhece os manuscriptos mais
antigos do Evangelho? Pois por ahi é que.
devia começar. Cite-nos a versão italica que é
de 150 depois de Christo ou a Peschito que é do
mesmo tempo. Se alli não estiver a palavra
«Santo» então sim poderá falar grosso. Cite-
nos os codices mais antigos, ainda que seja O
vaticano ou O sinaitico, os quaes são textos
gregos. Mas assim... só porque vpcê o diz, ha-
vemos de curvar-nos até o chão perante a sua
sciencia? Sabemos quanto ella vale!
GOSSMATSNNANSS Ama ae
enem
ema
O ts Ui om mi

[
Doutrina de Jesus
Léon Denis affirma-nos, com um desplante
digno de Voltaire: «A verdadeira religião... só
julga os dogmas por sua influencia sobre o
aperfeiçoamento da sociedade» (cap. 1).
Ah! eu pensava que se deviam julgar os
dogmas pela verdade .que encerravam e pelas
provas a favor d'essa verdade. Pois não, snrs.;
é pela influencia sobre o aperfeiçoamento das
sociedades; Denis é quem o diz.
Homem, pensando bem, as querras tam-
bem aperfeiçoam muitas vezes a sociedade,
porque a tornam mais poderosa com as con-
quistas, eliminam-lhe muitos elementos maus,
fazem voltar os povos para Deus, etc. etc.
Logo, pelo principio de Denis, o dogma.
que affirmasse: A querra é um bem desejavel
— seria bom, seria optimo até: teria influencia
sobre o aperfeiçoamento das sociedades... Lou-
vado seja Léon Denis!
% *
Quer-nos provar ainda Léon Denis que a
doutrina de Jesus é differente da nossa. Não,
o homem não é para graças! E' por isso que
elle affirma no capitulo VI que o christianismo
soffreu transformações nas suas doutrinas. Se-
não tambem como teria q topete de asseverar
que o espiritismo é a doutrina de Jesus? Para
dar razão aos espiritas, só dizendo mesmo
DE ALLAN KARDEC
152" TOLICES
me

não é a religião de
que O catholicismo já .
Christo. s à s u a p r e t e n s ã o?
E como provará Deni c o u s a s d€ c a b o
t e m
Attenção, leitores, que elle s
de esquadra. Denis affirma p. ex. queo Jeexsu te -
as m a n i f e s t a çõ e s d o cu lt
«desapprova 50 , ci ta a re -
rior». (cap. VI). P a r a p r o va r 15
o q u e El le p a s s a ao s s a c e r d o t e s OS
prehensã
quaes, a pr et ex to de l o n g a s pr ec es , d e v o r a v a m
s v i u v a s e d0 S o r p h ã o s . Q u e r e m
os bens da
prova melhor? qu iz se r
Podem re s p o n d e r - l h e q u e J e s u s
z a d o po r S. Jo ão ; — D e n i s lá se i n c o m -
bapti
d a c o m is so ? P o d e m ci ta r- lh e a o r d e m de
mo
p o s t o l o s p a r a q u e b a p t i z a s s e m a
Jesus ags a e
to d o s ;— D e n i s ri -s e de ta l. P o d e m l e m b r a r - l h
que Jesus comeu o cordeiro paschal como era
preceituado na lei, que fez orações publicas,
como quando resuscitou a Lazaro, que frequen-
tou o templo, que entrou em triumpho em Je-
rusalem, que consagrou o pão e o vinho e man-
dou aos apostolos que fizessem o mesmc; —
tudo isso para Denis não vale uma noz partida.
Digam-lhe que a reprehensão era contra
os abusos que, seja onde fôr, são sempre
dignos de reprehensão: — elle de nada quer
saber...
Tambem senão como poderia affirmar que
espiritismo e doutrina de Jesus são a mesma
cousa?
a; Diz ainda Denis: «Aos devotos, que acirea-,
e N R D e pe lo j e j u m e pela a b s t i n e n c
ha no o que entra pela bocca que man -
! E omem, mas o que della sahe”. (ib.)
densa sie UA quer elle dizer que Jesus
a o jejum e a abstinencia, E é O
DE ALLAN KARDEC 153
TOLICES
e
-

ta mb em Al la n Ka rd ec , di ze nd o
que affirma é me ri to -
que só o qu e ap ro ve it a ao s ou tr os
rio (n. 721). le m-
Mas esse s bo ns ho me ns nã o qu er em
pr op ri o Je su s je ju ou an te s do se u
brar que o um a ve z
Nã o se i pa ra qu e O fa ri a,
baptismo. Os es pi ri -
que condemnava es sa pr at ic a, co mo
m. .. Ta mb em de vi am re co rd ar qu e
tas pretende Es ta
si ão Je su s di ss e ao s ap os to lo s:
certa occa di an te O
classe de demoni os só se ex pu ls a me
je ju m e a or aç ão . (M at h. &V I1 ,2 0) .
nt in úa De ni s' di ze nd o: «J es us co nd em na va
Co
ce rô do ci o, re co mm en da nd o ao s se us di sc ipu-
o sa ».
lh er ne nh um ch ef e, ne nh um me st re
los não esco
Ah! ah! ah! Léon Denis! Então Jesus não
nd ou qu e os ap os to lo s en si na ss em a to da s
ma
as nações, baptizando em nome do Paôre, do
Filho e do Es pi ri to Sa nt o? Nã o er a o me sm o
que fazel-os todos mestres para transmittirem
a religião de Christo aos povos, e sacerdotes
para baptizar os mesmos? Você está treslendo,
você que tambem tem pretensões a mestre
(p'ra lá!) |
Considere um pouquinho, Denis, e verá
que o que Jesus reprova é à jactancia, O or-
gulho em quem ensina, e não o proprio sacer-
docio. Senão você tambem será forçado a aí-
firmar que Jesus prohibiu chamar-se pai a quem
quer que seja na terra; porque na mesma oc-
casião em que Elle diz «não queirais ser cha-
mados mestres», prosegue assim: «ea ninguem
sobre a terra queirais chamar pae vosso:
porque um só é vosso Pae, o que está nos
céos» (Math. 23, 8 e 9).
nin Loga, ou não se póde mais chamar pai esa-
guem no mundo (o que afianço que os
DE ALLAM KARDEC
154 TOLICES MA

— -

u e n t ã o p o d e m o s t a m -
ã o o b s e r v a m ) o
piritas n m e s t r e s e s a c e r d o t e s ,
bem c h a m a r a o u t r o s
o r g u l h o o u j a c t a n c i a .
uma vez que não haja p r a t i c a d o b e m e
«O Christo só impõe à e c l a r o L é o n
i n d a O p r
da fraternidade», diz a
Denis. |
se u a b o n o as pa la vr as de Je -
E cita em
e vo ss o pr ox im o co mo a vó s me s»
sus: «Ama e
mos, e sêde pe rf ei to s as si m co mo vo ss o Pa
celest e é pe rf ei to . Ei s to da a lei e os pr o-
phetas.» |
Sim, bem que os espiritas querem que só
na pr at ic a da fraternidade co ns is ta a re li gi ão ,
porque noutra pratica do bem difficilmente el-
les concordam. Mas que lhe havemos de fa-
zer? Deus não se contenta com tão pouco! E
termos paciencia, meus amigos, e submettermo-
nos á sua santissima vontade.
Notem bem as palavras de Jesus: <«Sêéde
perfeitos assim como vosso Pae celeste é per-
feito». E observem que no inferior, é perfeição
reconhecer o seu logar, obedecer a quem de
direito e seguir tudo o que Deus determinou.
Logo não é só a pratica da fraternidade, mas
sim observar todos os preceitos de Deus.
Entendam assim essa pratica do bem, e
estaremos de accordo,

“LU S
IV
Só acceitam o que lhes convem
Querem ver os leitores que modo esplen-
dido tem o snr. Denis de fazer todos concor-
darem com a sua opinião? E' simplesmente
declarar que tudo o que diverge della é ficção
e se afasta da verdade. Prompto! EF' a cousa
mais simples deste mundo! Só o que elle en-
sina é a verdade!
—- — E as provas?
— Para que? Pois um mestre da enver-
gadura de Léon Denis não vale todas as pro-
vas do universo? |
Escutem o que elle diz: «No Brahmanis-
mo, como em todas as religiões antigas, cum-
pre distinguir quas coisas.— Uma é o culto e
o ensino vulgar, repletos de ficções que capti-
vam o povo e auxiliam a conduzil-o pelas
vias da submissão. A essa ordem de idéas li-
ga-se o dogma da metempsychose ou renas- .
cimento das almas culpadas em corpos de
animaes, insectos ou plantas, espantalho des-
tinado a atemorisar os fracos, systema habil
imitado pelo Catholicismo, quando concebeu os
mythos de Satanaz, do inferno e dos suppli-
cios eternos. A outra é o ensino secreto...
Cap. 11».
Eis ahi, meus amigos. A cousa é simples.
O espiritismo admitte a reincarnação, mas não
quer admiitir que a alma passe para o corpo
TOLICES DE ALLAN KARDEC
156

de um animal? Nada mais facil. As religiões


antigas eram muito boas, eram espiritas, mauz s...
este po nt o. .. er a fi cç ão , er a so pa ra co nd ir
o povo por via de submissão. (Eu queria qu e
me dissessem, quem afiança ao povo que ou-
tras cousas no espiritismo não tendem tambem
a conduzil-o pelas vias da submissão!)
No cap. V. Denis confirma o mesmo: En-
tretanto (a deutrina dos druidas) parece ter-se
afastado da verdade em certo ponto: foi quan-
do estabeleceu que a alma culpada perseve-
rando no mal, póde perder o fructo de seus
trabalhos e recahir nos graus inferiores da
vida.»
E' por conseguinte a tal cousa. Faz conta?
E' verdade, é verdadissima, não pode Deixar
de ser verdade. — Não faz conta? Ah! Parece
que se afastaram da verdade, é uma ficção,
é para conduzir os povos pelas vias da sub
missão...
E' preciso o olhar de aguia de Léon De-
nis para distinguir estas cousas! Que querem?
Nem todos temos vocação para genios!...
D'ahi é que póde elle sahir-se com esta:
«Os traductores e interpretes do Evangelho
alteraram, através dos seculos, a sua forma e
corromperam o seu sentido. Apesar das alte-
rações, é facil reconstituir esse ensino a quem
se liberta da superstição da letra para ver as
cousas pela razão e pelo espirito. (Cap. VI)»
Meus caros, não se espantem: é a cousa
mais simples que o céo cobre. E' apenas que
certas ocousas do Ev
Evan
ange
gelh
lho não convêem aos
Por conseguinteo remedio é fac
aciil: sãsão tre-
chos alterados... não se assustem col:m el les..:
TOLICES DE ALLAN KARDEC 157
SAMA ICS IEA CT JEI IT So a TAI E

E é facil reconstitulr-lhes o ensino...


Este Léon Denis merecia uma medalha!
Não, deixem estar que quem inventa um
meio como esse de se desembaraçar de gran-
des Dilficuldades, merece mais do que uma
medalha... com todo o socego acho que po-
dem conferir-lhe uma estatua.
€' brinquedo? Olhem só: Jesus diz: —
A'quelles a quem perdoarões os peccados ser-
lhes-hão perdoados e áquelles a quem os re-
tiverõdes ser-lhes-hão retidos! Isto não agrada?
Homem, não se faz caso! E' uma alteração
que fizeram no Evangelho!
Jesus fala em demonios? Qual demonios
nada! Os christãos é que alinhavaram os de-
monios no Evangelho!
Jesus fala em fogo eterno? Nada gente!
E' alteração! Deve ler-se o fogo terno.
Assim tambem podiamos dizer quanto ao
codigo penal em pontos que nos não conve-
nham (pelo menos emquanto não os virmos
executar): — Isto? Não se incommodem! Aqui
ha alteração no texto! Deixem-se de historias!
Afinal isto é só para atemorisar!
Sim, fiem-se! | .
E depois, mais uma pequena consideração.
Eu, parece-me, tenho tanto direito como o
snr. Denis de julgar o que é alteração e o que
não é. (Pelas provas queelle dál...) .
Assim pois, não me convem o preceito d0
<amai a vossos inimigos»? Homem! Já que
vocês dizem que houve tantas alterações, bem
pode ter havido mais essa! Vou vingar-me
d'aquelle maroto que me anda a aperrear.
Não me serve O «ama a teu proximo co-
mo a ti mesmo» ? Supprima-se: é alteração!
158 TOLICES DE ALLAN KARDEC

Eis como assim se deita tudo por terra e


só fica de pé o que a mim mais ao sr. Denis
convem.
Eta nós, gente! já não chega uma estatua.
Eu reclamo duas: uma para mim tambem!

%
V
— Effeitos do Christianis=
Perispirito
mo na ordem social
Léon Denis quer a fina força que S. Pau-
lo tenha falado no corpo fluidico, no preten-
dido perispirito dos kardequianos. E cita-nos
para prova a primeira Epistola ao Corinthios,
cap. AV.
Quem só lê o sr. Denis, julga que tem
toda a razão: tão bem sabe elle mexer com
os pausinhos, puxando a braza para a sua
sardinha. (Nas eu peço aos leitores que leiam
esse capitulo de S. Paulo, e então verão que
Denis não passa de um habil pelotiqueiro que
enrola tudo e faz ver o que não existe.
S. Paulo fala na resurreição de Christo;
prova-a pelas apparições, nas quaes Jesus se
mostrou com o seu corpo, mas glorioso, e não
sujeito é corrupção como quando vivia no
mundo.
S. Paulo diz pois que o nosso corpo re-
suscitado será.mudado e glorificado por Deus
como o de Christo, e Denis quer que a pes-
soa tome outro corpo fluidico a que chama
perispirito! Se dissesse que o mesmo corpo
ficará fluidico, vá lá, poderiamos transigir. Mas
lembremos que a doutrina espirita é que O
corpo desapparece dissolvido nos seus com-
ponentes, permanecendo porém um corpo no
vo: o perispirito. Ora não é isto o que diz 9»
160 TOLICES DE ALLAN KARDEC:
———

Paulo. Leiam as palavras do Santo e conven-


cer-se-hão: Todos resuscitaremos, mas
nem
todos mudaremos. E' preciso que isto que te-
mos de corruptivel vista a incorrupção,
e o
que temos de mortal vista a immortalidade>»
(I Cor. XV. 51-53).
Não fala pois S. Paulo em outro corpo
novo, mas neste mesmo mudado, transformado
num corpo glorioso e sem as imperfeições do
actual.
Léon Denis andou á matroca interpretan-
do a seu talante as palavras do Santo.
=
<Não nos devemos admirar que, depois de
vinte seculos de incubação ... (as noções do
christianismo) comecem apenas a produzir seus
effeitos na ordem social (Cap. VD»
Com effeito! Este Denis é 9uma penetra-
ção de vistas espantosa! E nós que nunca
nhamos visto isso? Só agora começam ti-
a
Ouzir seus effeitos na ordem social !... pro-
Sim snr.! Viva o sr. Denis que fez
preciosa descoberta! Já nos merecia tão
uma
fatua, agora nos merece... um monumento es-
!
Mas diga, Denis, você estava no seu
quando escreveu isso, ou andava juizo
collega Kardec, lá pelos cornos da com o seu
lua?
Só agora ?... E aquella caridade tão fal.
lada, dos primeiros christãos, aquella
dos martyres, aquella vida firmeza
illibada que fez
Pouco a pouco adoptar o christianismo
Perio d0s cesares, tudo isso não no im-
da ordem social, não? eram effeitos
À suavisação dos costumes dos
baros e su povos bar-
a Conversão tambem não foram ef.
feitos da ordem social?
TOLICES DE ALLAN KARDEC 16)

As formosas treguas de Deus, tão uteis á


humanidade na edade media e tão necessarias
aos agricultores nos tempos de guerra, não se-
riam tambem effeitos da nossa religião na or-
dem social ?
Os hospitaes para fratar de doentes, os
monges de S. Bernardo que acodem aos vian-
dantes transviados nos gelos dos Alpes, e
aquellas escolas que os frades mantinham,
quando os nobres que dominavam a socieda-
de faziam gala de sua ignorancia — tudo isso
não são effeitos da religião na ordem social?
Ai, pobre Léon Denis, que acho que era
cego! O homem não enxergava, não. O que
todo mundo via, ainda firmando muito a vista,
para elle não existia!

e *

Em seguida o bom do Léon Denis inves-


te contra a egreja catholica, dizendo: <«Desna-
turou as doutrinas do Evangelho». (E' claro;
como Denis quereria que fosse só usar um
pouco de caridade para ter direito á felicidade
eterna, tudo o -mais é desnaturado); «modifi-
cando os textos da Biblia» (como elle se con-
tentava com os que lhe faziam conta, tudo o
mais foi modificado) <«inimizando-se com à
sciencia» (se a sciencia em questão fosse co-
mo a de Léon Denis, havia razão para isso).
E continúa: «A Igreja infallivel enganou-
se, tanto na sua concepção physica do Uni-
verso, como na sua idéa moral da vida hu-
mana. A Terra não é o corpo central mais
importante do universo, nem a vida presente
é o unico theatro das nossas lutas e dos nos-
sos progressos”.
162 TOLICES DE ALLAN KARDEC — +

Em primeiro logar a Egreja não se incom-


moda muito com concepções physicas do Uni-
verso, fique sabendo, meu Léon Denis. A Egre-
ja tem por missão implantar e vigiar a fée a
moral, mas nunca pretendeu ensinar physica
nem chimica nem matematicas, meu bom De-
nis. Nessas cousas e noutras mais, deixa ple-
na liberdade e não se intromette no que não
lhe foi incumbido. Vocês é que querem Dizer
que é ella quem ensina os erros, para depois
investirem valentemente contra-a mesma. Não,
meu caro; lembre-se que o systema geocen-
trico era a crença de todo o mundo, crença
logica, vistas as apparencias; e que não com-
petia á egreja vir desilludir a sra. sciencia.
Recordo-lhe, bom Denis, como recorõdei ao
seu amigo Kardec, que essa crença nunca foi
artigo de fé. Note bem: Se Galileu foi chama-
do á ordem foi porque affirmava com orgulho
que a Sagrada Escriptura estava errada, quan-
do ella falava conforme a opinião corrente dos
povos. Não queria capacitar;se de que Deus
não tinha obrigação de vir revelar certos ne-
gocios que não teem nada com a salvação eter-
na das almas.
Quanto á idea moral da vida humana, vo-
cê imita a Galileu, asseverando que a egreja
se enganou porque a vida presente não é o
unico theatro das nossas lutas e dos nossos
progressos. Olhe, Denis, você me prove isso,
que então lhe chamarei sabio. (Mas por em-
quanto...

ATITDNOs
Vi
A religião deve progredir?
“A Egreja... como que: petrificada em seus
dogmas, se immobilisa, emquanto em torno de
si tudo caminha e avança... Nada escapa á lei
do progresso, e as religiões são como tudo o mais.
Puderam corresponder ás necessidades de uma
epoca e de um estado social atrazados, porém
chega o tempo em que, encerradas em suas for-
mulas como n'um circulo de ferro devem resi-
onar-se a morrer. (Depois da Morte, cap. VD.,
| Sim? Pois é das de cabo de esquadra! Es-
ta proposição eleva o homem á plana de um
grande sabio ou então... de um grande tolo.
“Denis quer dizer que o que servia 500
annos atraz, hoje já está rançoso e não presta
mais: hoje é preciso progredir para cousa melhor.
Assim, Jesus era Deus em todo o passa-
do da religião christã. Hoje isso já esta bati-
do; vamos mudar, vamos progredir um pou-
cochinho: Jesus não seja mais Deus.
Bonito progres so! Mas Oiga-nos , Denis. À
verdade qual era? Que Jesus era Deus ou
não era? Se não era, então não diga que
que
essa trença correspondia ás necessidades duma
epoca, porque o erro, a mentira, não corres-
pondem a necessidade de epoca nenhuma.
E não diga então que a religião progride.
que a religião estava errada e que
Diga sim
é que os homens acertar am com a ver-
agora
164 TOLICES DE ALLAN KARDEC

dade. Ponha tudo em pratos limpos e não nos


venha com historias.
Do mesmo modo, ou a confissão é ne-
cessaria ou não. Não nos venha contar que
foi necessaria para outros tempos, que isso é
tolice. Ou é ordenada por Deus ou não o é.
D'aqui não ha fugir. Se é ordenada por Deus,
tanto foi necessaria como é necessaria. Se não
o foi, então a religião estava errada em mais
esse ponto. E não é a religião que progride;
é o conhecimento da verdade.
E assim em tudo o mais. Meu caro Denis,
pão pão, queijo queijo. Não diga que a reli-
qião progrediu porque, na sua hypothese, a
religião seria destruida. Quem teria progredido
teria sidoo conhecimento da verdade.
Mas como-nem esse progrediu, visto que
você não nos prova que nossas crenças são
erradas, nem coisissima nenhuma, segue-se que
você não fez mais do que proferir tolices.
E Denis não se contenta menos que com
reduzir a nossa religião á expressão mais sim-
ples. Querem ver? «Chegará occasião em que
o Catholicismo, seus dogmas e praticas, mais
não serão do que vagas reminiscencias... E tres
cousas substituirão do seu ensino, por serem
a expressão da verdade eterna: a unidade de
Deus, a immortalidade da alma, e a fraterni-
dade humana (ibid.)”
E' só e mais
ais nada. E' a penas reduzir a
verdadeira religião a pó de traque. Esse es-
plenáian edificio elevado sobre o sangue do
rucificado, esse monumento que conta vinte
seculo s de existencia... um sopro de Léon
enis... e ruiu por terra!
o NOLICES DE ALLAN KARDEC 165
es Fº Usando 7 ga - ME a

E no logar della ahi nos põe elle uma


religião vaga, etherea, impalpavel, na qual ca-
bem todas as patifarias e todas as tranquiber-
nias possiveis!
Coitado de Leon Denis! Que vá, que vá
elle progredindo á vontade na terra dos QOis-
parates, que nisso só elle mesmo é que tem
que ver; — mas, emquanto não nos prova con-
vincentemente que a nossa religião estava er-
rada, elle... que se musque e nos deixe em paz.
KR *
Léon Denis é um panõego! Agora nos
vem com a aíffirmação categorica de que «os
primeiros christãos acreditavam na preexis-
tencia e sobrevivencia da alma em outros cor-
pos (cap. VI)».
Sim, sr.: vale por um attestado de espiri-
tas a todos os primeiros christãos, sem excep-
tuar os martyres. Léon Denis não anda com
meias medidas. Elle é espirita? Quer que to-
dos o sejam, sem perdoar nem aos primeiros
christãos.
E querem saber qual é a prova que nos
dá em assumpto tão importante? Está con-
tida nas palavras que seguem immediatamente:
“como já vimos a proposito das perguntas
feitas a Jesus sobre João Baptista e Elias, e
tambem da que os apostolos fizeram relativa-
mente ao cego de nascença, que parecia ter
attrahido esta punição por peccados commet-
tidos antes de nascer... Os christãos entrega-
vam-se ás evocações e communicavam-se com
os espiritos dos mortos. Encontram-se nos Actos
dos Apostolos numerosas indicações sobre este
ponto. (Actos, cap. VIII, 26; cap. XI, 27 e 28;
cap. XVI, 6 e 7: cap. XXI, 4)”.
166 TOLICES DE ALLAN CARDEK
— —— — us me e e o -
..—

Ah ah ah! Dá vontade de chamar todos


os heróes de Homero para que venham ro-
dear o desfructavel Léon Denis e dar aquel-
las suas risadas interminaveis, sonoras e gos-
tosas, que tan'o bem fazem ao baço, ou como
o povo QOiz, á passarinha.
Querem saber o que dizem os textos que
elle apenas indica? São a apparição d um anjo
a Philippe e as inspirações do Espirito Santo
aos apostolos e outros santos.
E eis como se fala grosso!
Então porque um anjo apparece a um
santo, isso prova que é uma alma desincar-
nada que lhe appareceu? E' levar o disparate
longe demais. Com muito maior razão dizemos
nós que o que isso prova é que existem os
anjos, que os snrs. feimam em negar.
Os snrs. por conseguinte não fazem mais
do que torcer o sentido das palavras para con-
seguirem o que desejam. E' a tal cousa. Que-
rem puxar a brasa para a Suá sardinha.
E porque o Espirito Santo dirige com suas
luzes mais sensíveis os séus eleitos, esse Es-
pirito Santo, que nós conhecemos e adoramos
como Deus, não passa para os snrs. duma
alma desincarnada como qualquer outra?
Tenha paciencia, Denis, isto é fazer dizer
a S. Lucas o que nunca lhe passou pela mente.
Os primeiros christãos é qual criam isso?
Você é que assim desejaria que fosse. Mas o
que Os primeiros christãos acreditavam é que
um anjo verdadeiramente appareceu a Philippe
e que Deus inspirara claramente os seus santos.
Tire essas teias de aranha que lhe empanam
o cerebro, Denis, e você tambem reconhecerá
a verdade, que é bem clara, graças a Deus.
o Cu =
TOLICES
. ee
DE ALLAN
e. me - — ==
KARDE
mus « aca
167
+. — =
- Ra o o me - ss + — e e.
“ --— a

Quanto a Elias e João Baptista, já res-


ponõdemos á objecção que nos fazem (U. cap.
XII da 1.2 parte desta obra).
Resta-nos o cego de nascença. As pala-
vras do Evangelho são as seguintes: «E per-
guntaram-lhe os discipulos: (Mestre, quem pec-
cou, este ou os pais, para ter nascido cego?»
(João, IX, 2.)
Só com isto aíffirma Léon Denis que, os
primeiros christãos acreditavam na preexisten-
cia da alma em outros corpos. Coitado!
Pois os discipulos que tantas perguntas
faziam ao Mestre, não podiam interrogal-o sem
terem essa crença anterior? Porque não? Per-
guntam sobre o. casamento no outro mundo,
perguntam sobre quem seria o maior no rei-
no dos Céos, perguntam porque não poderam
expellir um demonio mais rebeide— e porque
não podem perguntar se o cego ou os pais
teriam peccado para merecer aquelle estado?
Caro Denis, não queira ver em tudo a sua
idéa fixa, De uma simples pergunta a um Mes-
tre como Jesus não queira deduzir uma cren-
<a geral entre os discipulos do mesmo. Tenha
paciencia, A prova que você dá não chega pa-
ra tanto.
(Mas ha mais. A resposta de Jesus é um
golpe de morte no espiritismo. € aqui sobre-
tudo ao bom Denis sahiu o tiro pela culatra.
Jesus diz: «Não peccou nem este nem os
pais, mas acontece isto para que se manifestem
nelle as obras de Deus (João, IX, 3)».
Hein, Denis ? Os espiritas, como você mes-
mo, como Allan Kardec, querem que todos se-
jamos eguaes no principio e que nada soffra-
mos sem que o tenhamos merecido nesta ou
168 TOLICES DE ALLAN KARDEC

noutra incarnação. Pois aqui têem um desmen-


tido solemne nas palavras de Christo. o
Você mesmo, Denis, affirma que «essa iden-
tidade de todos nas origens como nos fins...
tudo isso nos mostra os principios eternos da
justiça... (cap. KKIV). E Allan Kardec diz:
«A todos faz partir dum mesmo ponto e não
dota a uns mais que a outros» (Evang. seg. o
Esp. III, 12).
Pois aquelle cego de nascença não esta-
va em condições eguaes ás dos outros, em
paridade de merecimentos. Elle era cego sem
o merecer.
E' Jesus quem o diz: «Não peccou nem
este nem os pais, mas acontece isso para que
se manifestem 'nelle as obras de Deus».
Logo, ou confessem uma vez para sem-
pre que a sua doutrina não é, nem nunca foi,
a de Jesus, ou então abandonem esse ponto
da egualdade de todos no principio, que é
uma das bases do espiritismo!
Jesus nega a pedra fundamental da rein-
carnação. |
E reincarnação, pouco mais resta
tirada a itism
do pobre espir o!
Ea
. * 4 |
Cita ainda Denis em seu abono as pala-
de ri Ep. IV, 1:3 «Não acrediteis
ui
são de Deusor, espirito
p mas vêde se os espiritos
oitado| Elle parece ignorar que os apos-
a ncriata nas apparições de anjos enviados
nifestaval € nos demonios que tambem se ma-
tão o para perverter as almas. Era cousa
aparição vt! Nunca ouviu falar, Denis, na
OS anjos aos pastores no nasci-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 169

mento de Christo, na annunciação a Maria, na


fuga para o Egypto sollicitada por um anjo,
etc. etc. ? E nunca reparou nas innumeras ve-
zes que os Evangelhos falam no demonio ? Por
conseguinte os taes espiritos em que fala sem-
pre o Evangelho, são anjos e demonios. E
não venha você agora inverter tudo e fazer,
de anjos e demonios, almas desincarnadas. Às
Sagradas Escripturás estão cheias d'esses fac-
tos e só os cegos ou os embirrados como
Léon Denis, podem vir teimar que eram as
almas dos mortos.
Tinha muita razão pois S. João em avisar
que se precavessem contra os demonios; que
olhassem bem se eram espiritos enviados por
Deus ou se eram espiritos de demonios. Tudo
isso apenas prova os nossos principios e a ver-
dade das nossas crenças.

a
Eee
VII
Apparições — Pantheismo — Bens
não conquistados
Denis tem um modo todo especidl de ati-
rar poeira aos olhos; dos incautos. Torce os
factos, puxa-os com a torquez Oda sua teima
até chegarem ao ponto que deseja, e assim
prova muita cousa.
<S. Gregorio, diz elle, recebe os symbolos:
da fé do espirito de S. João» (cap. VI). Já an-
tes falara muito nas vozes que Santa Joanna
à Arc ouvia, revelando-lhe o que devia fazer
(cap.V). — Emfim elle quer que todas as ap-
parições de santos e anjos não sejam. mais
do que communicações espiritas.
Mas será só querer? Não, isso é só pa-
ra os fanaticos. Esses vão acreditando sem
examinar; magister Oixit, e acabou-se. Mas.
quem tem um pouco de miolo na molleira re-.
flecte e vê que é tolice de Denis.
Note bem, Léon Denis, que nós nunca ne-
gamos que possa apparecer alguma alma, es-
pecialmente de santos, em caso particular, por
permissão de Deus e para algum fim util.
Neste ponto, a differença que ha entrenós
e os espiritas é justamente admittirem estes
que é só evocar para ahi estarem as almas á
nossa Oisposição, ao passo que nós dizemos
que isso fia mais fino; que não é só chamar,
TOLICES DE ALLAN KARDEC 171

mas em poucos casos apenas se verifica, e só


quando Deus quer, para algum fim razoavel
Agora ahi vem o sr. Denis e outros, e do
facto das apparições, que estão nesse caso e
que admittimos, querem deduzir... que nós
somos espiritas!!!
Esses homens terão perdido o juizo? Só
porque, de accordo com a nossa religião, di-
zemos que ha algumas apparições, elles acham
que isso é o mesmo que dizer: fazendo a evo-
cação, as almas nos apparecem e falam ?
Elles não vêem que, no primeiro caso, são
alguns factos particulares e no segundo esta-
belece-se como que uma regra geral?
Olhem que não é pequena a differença. E'
o mesmo que, do facto de haver alguns ho-
doentes numa cidade, affirmar-se que
mens
quasi todos os homens da cidade estão doen-
tes. Não estava má a deducção !
parece
e *

Léon Denis, como Allan Kardec,


vi u a ph il os op hi a po r um oc ul o. So bretu-
que De us e
s pr ob le ma s ac er ca de
do nos grande la s pa re -
da nd o co m a ca be ça pe
da alma, vae
des que faz dó.
Ouçam esta tirada: çã o, es-
nã o é ma is es sa cr ea
«O universo m as reli-
da do na da de qu e fa la
sa obra tira o an im ado de
giões. E' um or ga ni sm o im me ns
As si m co mo o no ss o co rp o
“uma vida eterna. ad e ce nt ra l qu e go -
é dirigido por um a vo nt
os se us ac to s e re gula os seus movti-
ve rn a ra ve z da s mo-
s m o mo do qu e, at
mentos, do me im os vi ve r em
rn e no s se nt
dificações da ca qu e c h a m a m o s At-
uma unidade permanên te
a s s i m t a m b e m o u nir
,
ma, Consciencia, O Eu
172 TOLICES DE ALLAN KARDEC o

o, debaixo de suas formas cambiantes, va-


a multiplas, se reflecte, se conhece, se
possue em uma Unidade viva, em uma razão
consciente que é Deus. O Ser supremo não
existe fóra do mundo, porque este é sua par-
te integrante e essencial» (P. II. cap. 1X).
Evidentemente o mestre quer dizer que
Deus vem a ser a alma do universo — que o
universo tem uma razão consciente, e essa ra-
zão é Deus. — e que Deus faz parte integran-
te e essencial do universo. o
Segue-se — que tudo é Deus; que o uni-
verso é uma parte material de Deus: e que
nós mesmo somos, não direi uns deusinhos.
(ainda que podia Ddizel-o uma vez que temos
personalidade Ddistincta) mas pelo menos uns
pedaços de Deus. |.
E este grande lógico vem-nos dizer depois,
poucas paginas adeante, que o pantheismo é
«um escolho em que esbarram numerosos SVs-
temas”. Mas, Denis do meu coração, é um es-
colho em que você tambem esbarrou! E' um
escolho em que tambem você marrou com
!
cabeça E” um escolho que lhe entrou pela a
ma dentro fazendo-lhe crescer tubaras al-
no lo-
gar do cerebro! |
Pantheismo quer dizer tudo Deus;
to no pantheismo eleatico, e tan-
como no pan-
“om de Spinosa, como no de Fichte e Schel-
EE qual eneoo tudo com a essencia divina,
O você faz. Logo você não foi ca-
escolho, mas foi dar

e: «Visto pela in-


Spirito e materia”.
TOLICES DE ALLAN KARDEC 173
o

Mas, ainda deixando de lado a argumen-


tação estrictamente philosophica, diga-me uma
cousa, Denis: Você acha mesmo que tudo o
que existe faça parte de Deus? Você acha que
essa lama podre dos marneis seja uma porção
da Olvindade? Você acha mesmo que tudo
quanto ha de peior no universo pertença á
essencia de Deus? Você julga mesmo que
essas almas perversas e crueis que monstruo-
samente avultam do seio da humanidade, se-
jam nada menos que Deus? Você acredita
que tudo quanto ha de torpe, tudo quanto ha
de abjecto e horripilante, seja parte integrante
de Deus?
Ah pantheista,; que rebaixas Deus até esse
ponto! !
Ah, infeliz doutrina que faz de Deus tudo
que ha de mau, de repugnante, de horroroso!
E ergue o collo Denis, exclamando ainda,
como quem afinal deu a Cesar o que era de
Cesar: «Já não ha esse Deus exterior ao
mundo physico, ja não ha mais essa creação
do nada de que falam as religiões!» Pobre
Léon Denis! Deus então que lhe agradeça
esses bellos attributos que você lhe quer im-
pingir!
Temos por conseguinte que tambem o ho-
mem, conforme o autor, é uma parte de Deus;
e Denis affirma que o universo está na mesma
relação para com Deus que o nosso corpo
para com a nossa alma. Mas pergunto eu:
Porque então é que Deus nos faz sofirer?
Que graça achará Deus em ver sofírer uma
parte de si mesmo? Eu queria ver se o bom
do Denis gostaria de ver a sua carne tortu-
rada, mordida por uma torquez, ou seu pé es-
174 TOLICES DE ALLAN KARDEC
e e e e
— — me —
ço o e
a
e. e -

um a pe dr a qu e lh e ca hi ss e em
magado por ca st i-
E De us se di ve rt ir ia en tã o em
cima. e não
si pr op ri o pe la s fa lt as de qu
gar-se a a um
e da r co nt as a ni ng ue m? Se ri
tem qu
gosto bem exquisito! no
Sim, snrs., o pantheismo de Denis é um
philómeno. ,
* *

No cap. IX da 2.2 parle, acha ainda Denis


que Deus não teria feito bem se creasse as
almas perfeitas, para assim lhes poupar as vi-
cissitudes e os males da vida terrestre”, porque
assim “a vida e a actividade universaes, a va-
riedade, o trabalho, o progresso não mais te-
riam um fito, e o mundo ficaria preso em sua
immovel perfeição.”
Bonito! Então diga-me, seu Denis, se
Deus é perfeito ou não é. E Diga-me ainda
se Deus está preso em sua immovel perfei-
ção” ou não está. E se é assim, se Deus é
perfeito, com as suas affirmações, você faz
Deus inferior a nós; porque nós emfim evolu-
“o temos um fito a nossos trabalhos, etc. e
e Daio id o sua immovel perfeição...
nen r enis, em que cipoal se foi

uçJoeãMeoainda coninda: «A magnifica evo


dade
ade à es atr ave z dos tem pos , a acti vi-
o Absoludasto,almnão
as e é dos mun
prefer i d ” elevando-se para
sipeido & ploino? erive a um repouso inn-
esse :
car-se na asa Deus faz muito mal em fi-
imperfeitia sua perfeição natural, - DevDevi i a fazer-se
E O para poder fugir à esse repouso in-
Sipido e et sir
eterno (na opinião O d O0 nosso mestre,
aa TOLICES DE ALLAN KARDEC 175

“notem bem — que nós admittimos um Deus


acto puro, e não em repouso insipido e eterno).
Devia Deus tornar-se p. ex. um Léon Denis,
para vir escrever lorotas, e divertir-se um
pouco. Como é que o bom Deus não se lem-
bra Ouma cousa tão facil! Ah, é que Elle
não ii o Snr. Léon Denis. E' forte
pena
“Mas Denis acha preferivel a actividade, a '
variedade, O trabalho deste mundo a um re-
pouso absoluto... Muito bem. Examinemos um
pouco essa actividade, essa variedade e vere-
mos cousas de espantar.
Entre essas preferibilidades achamos um
“flagello como a secca do Ceará... Ah, real-
mente, uma secca assim é bem preferivel a
um repouso absoluto na eternidade!
Uma epidemia como a grippe hespanhola...
meu Deus! quem não a prefere? Perqgun-
ftem-no ás mães que perderam os filhos, aos
maridos que perderam as esposas, ás familias,
que ficaram sem arrimo... E' preferivel sem
duvida. ?
A guerra tambem está incluida entre essas
actividades que Denis acha preferiveis. E não
é um bem a guerra? Ora! E' melhor que um
doce!
A actividade, a variedade, o trabalho do
mundo incluem ainda todas as angustias que
sa passam na vida, todas as torturas das en-
fermidades, todas as sevicias dos crimes. Pois
tudo isso é preferivel, na sensata opinião de
Léon Denis, ao repouso absoluto d'uma felici-
dade eterna!!!
Já tive occasião de pedir uma estatua para
o homem. Mas eu me reporto... Creio que
176 TOLICES DE ALLAN KARDEC
ua es aus - — —
——
a

uma só não chega. Demos-lhe tres, que bem


as merece!
——ee

Prosegue ainda o bom mestre dizendo:


Um bem que não se tem merecido nem con-
quistado, será mesmo um bem? E no cap. SI.
“O bem adquirido sem esforço não tem nenhum
valor.”
De facto, considerando bem, as fortunas
que os ricos deixam aos filhos, não são bens,
não snr. Denis tem razão. Não foram con-
quistadas nem merecidas... Que grande homem!
“A saude que uma criança goza não pode
ser um bem, claro está; não foi conquistada
nem merecida... A felicidade do proprio Deus
não é um bem porque sempre foi perfeito e
não a conquistou nem mereceu... Que talento
superior!
"E se um homem tivesse todo o poder, toda
a riqueza, toda a sciencia, sem ter trabalhado
para isso, só por um dom de Deus, esse ho-
mem não possuiria bem nenhum, tudo isso
seriam males e nada mais. E” cousa tão clara!
Ah! Denis é um portento!

Ja
eos
ESSASVASS
VIII
Duas logicas—Materia e espirito
Começa Léon Denis a Parte Terceira di-
zendo com toda a impafia: <Expuzemos, nas
paginas precedentes, os principios essenciaes
da philosophia das existencias successivas.
Apoiados sobre a mais rigorosa logica... re-
solvem numerosos problemas até aqui não
explicados.
Sim snres. nós não o vimos? E' uma lo-
gica cotuba!
Basta. Não façamos commentarios.
Apenas accrescentemos aqui o elogio que
Denis faz á logica rigorosa de Allan Kardec
no cap. XX: «Allan Kardec, como escriptor,
mostrou-se de uma clareza perfeita e de uma
logica rigorosa».
E' natural. São duas logicas eguaes!
*
x E

Denis, no cap. KIX, nos prova a realidade


das ma ni fe st aç õe s es pi ri tas, va le nd o- se d0 tes -
l-
temunho dos sabios que o estudaram, € ver
ficaram essas manifestações. .
E' um capitulo perdido para nós. Não
negamos os factos. O que queremos porém
qu e es sa s ma ni fe st aç õe s sã o
que nos prove é
realmente das pessoas evocadas.
178 TOLICES DE ALLAN KARDEC
—o — O a uu.
-— — ——

Só o testemunho dos mesmos espiritos


porém não é sufficiente. V. o 1. cap. destas
Tolices.
3
te me
O nosso autor pretende resolver todos os
altos problemas philosophicos. E' um dos
mais Oiíficeis, a acção da alma espiritual no
corpo material, está... resolvido no espiritismo.
Elle, Denis, é quem o diz:
«Essas difficuldades encontram solução
nas experiencias do espiritismo (cap. XKD».
— E como, preclaro mestre?
— Pela admissão de um intermediario: o
perispirito.
Sim. snr. o homem descobriu a polvora!—
(Mas ha uma pequena difficuldade ainda. Esse
perispirito é materia ou espirito ?
— Bh... oh... sim... é materia e espirito ao
mesmo tempo... |
—- (Com seiscentas brecas, mestre! Isto
parece um contrasenso.' Olhe bem. A diffi-
culdade a solver é que a materia e o espirito
são de natureza tão contraria que não se com-
prehende como um pode agir sobre o outro.
Agora ahi vem você e pretende solucionar a
Oifficuldade só porque arranja um ser a quem
chama materia e espirito a um tempo. Não
acha que isto é uma temeridade? |
Como é que você me explica então a ac-
ção das partes desse perispirito uma sobre a:
outra?
Esse ser hybrido, esse corpo e espirito a
um tempo, reune, toma sobre si a mesma dif.
ficuldade que tinhamos quando considerava-
mos só corpo e alma sem intermediario ne-
nhum, não acha?
TOLICES DE ALLAN KARDEC 179

De modo que você, em vez de solucionar


a difficuldade, como pomposamente diz, mu-
dou-a apenas de casa. Não móra mais n'esta
rua, mas está alli na outra.
Não, Denis; o seu perispirito nada explica.
Elle mesmo - carece d'uma explicação e não
pequena. |
Diga-me, Denis, exponha-me como é que
a part e do corp o trab alha , age na part e espi -
rito; e se não é capa z de expl icar isto, entã o
deixe esta r a alm a com o corp o simp lesm ente ,
não prec isam de um inte rmed iari o
os quaes
que absolutamente nada adianta.
CAUSE MAISNMANS O.
Si
SD

IX
Ensino dos espiritos
A' pag. 248 (P. IV, cap. XKIX) nos diz
Léon Denis: <E' o que exporemos nesta parte
de nossa obra, inspirando-nos em trabalhos
anteriores e em innumeraveis communicações
de espiritos..> E prosegue: «Esse demons-
trativo não será pois o resultado de uma theo-
ria da imaginação... porém, sim, o fructo das
instrucções dadas pelos espiritos”.
Eis pois o nosso Léon Denis, como Allan
Kardec, como todo espirita, cahindo na asneira
de acreditar nos espiritos sem saber quem el-
les são. Credulidade incrivel! Não querem
crer no que Deus se dignou revelar-nos, pelo
motivo de que não lhes convem, e querem
acreditar nos espiritos, que nem sabem quem
são.
Em philosophia, nós não cremos nem em
S. Thomás nem em Santo Agostinho, apesar de
genios. Nem Platão nem Aristoteles nos se-
duzem com os seus nomes ilustres. Temos.
o aphorismo: Tanto valem quanto provam.
E agora, em materia cem vezes mais impor-
tante, acreditaremos em espiritos, só pelas suas
affirmações? Não, caros espiritas. Que lhes
prove essa gente o que diz, e não venha só
com palavras! Exijam d'elles argumentos de-
logica, e não só affirmações baratas! Então:
sim será outro cantar. Mas até lá...
TOLICES DE ALLAN KARDEC 181

O grande fundamento pois do espiritismo


é a revelação dos espiritos; é o que esse povo
de pretendidas larvas vem impingir. E dizem
que lhes devemos tanto credito como aos mor-
taes nesta vida. E elles lá, com tacto superior,
separam alhos de bugalhos, catam o que é certo,
deixando o que é falso; peneiram as palavras
dos espiritos melhores, jogando fóra o farelo
dos espiritos zombeteiros.
E' necessaria alguma perspicacia para Ois-
tinguir a natureza dos espiritos e conhecer, nas
nossas relações com elles, a parte que se deve
conservar ou regeitar. Jesus disse conhece-se
a arvore pelo seu fructo” A linguagem e as
instrucções dos espiritos elevados são sempre
impregnadas de dignidade, de sabedoria e de
caridade, visam o progresso moral do homem,
e desprendem-se de tudo o que é material. As
communicações dos espiritos atrazados pec-
cam pelas qualidades contrarias; abundam em
contradicções e tratam geralmente de assum-
ptos vulgares sem alcance moral”. (Cap. AX&VII,
pag. 295.)
E' repetir-lhe pois o que já se disse na pri-
meira parte 9'este trabalho, cap. I. Sim, pois
não! Custa muito dizer quatro palavras im-
pregnadas de dignidade, de sabedoria e de ca-
riõade! Um ladrão refinado custa muito a fin-
gir-se digno e caridoso! Os seductores ou as-
sassinos custam muito a mostrar-se honestos,
affectuosos e moraes! Está muito solto, seu
Léon Denis! E as tolices que temos mostrado
no grande livro de Allan Kardec mostram-nos
quanto nos devemos fiar nos pretendidos en-
sinos desse povo de espiritos superiores (1)
182 TOLICES DE ALLAN KARDEC
——— es

Demais, nessa supposição, um espirito que


não soubesse mais do que nós sabemos aqui
no misero mundo sablunar, podia nos impin-
gir as mais mirabolantes petas ácerca das ver-
dades mais importantes; porque intelligencia,
tinha pelo menos a que nós temos; vontade
de fazer mal, ou pelo menos de basofiar sem
nada saber — era só conservar a que tinha
no mundo. E então eis-nos expostos ás ca-
raminholas de espiritos intelligentes e máus.
(«Devorados pela inveja e pelo odio, muitos
procuram os homens fracos, e inclinados ao
mal... Apegam-se a elles e insufflam-lhes fu-
nestas aspirações”. Denis, Depois da Morte, cap.
RRRVI). |
Não sei porque os: espiritas querem á fina:
força que os maus espiritos não sejam intelli-
gentes. Querem que se atraiçoem pela falta
de Oignidade, sabedoria e caridade. Que to-
lice! Se fosse assim nem aqui no mundo
haveria actores que prestassem. E no outro
agora onde, na hypothese d'elles, não ha mais
a fazer do que escolher as palavras?
Imaginem um homem mau e intelligente,
que deva ficar occulto atraz duma parede sem
ninguem o ver, e falar quando e como muito
bem lhe parecer.
Quanta peta esse homem não podia pre-
gar impunemente, com o maior desplante, sem
o menor acanhamento! E seria acreditado!
Era só encontrar espiritas pela frente, esses
que querem acreditar em palavras impregnadas
de dignidade, sabedoria a caridade!

EM ENGNR 9
Esquecimento-Mediums-Astros
habitados, etc,
Diz Léon Denis; «Nosso envoltorio flui-
dico reflecte e guarda, como em um registro,
todos os factos da nossa existencia. Esse re-
gistro está fechado durante a vida, porque a
carne é a espessa capa que nos occulta o seu
conteúdo (cap. KKK».
E' dizer, com Kardec, que Deus nos cas-
tiga no mundo sem nós sabermos porque.
Esquecemos as nossas culpas. Soffremos em
punição, mas não sabemos em punição de que.
Repetimos pois a Léon Denis que isso
não parece justiça. Repetimos a elle que, se o
espirito communica aosmediums tanta babosei-
ra, podia tambem communicar-se ao proprio
corpo, lembrando-lhes o passado.
Repetimos que, se na infancia ha plausi-
bilidade para essa ignorancia devido aos or-
gãos em formação, não a ha mais no estado
adulto, depois do desenvolvimento dos orgãos.
A alma. alli: o corpo prompto e perfeito:
a memoria á espera... e nada de enxergar um
ao outro! E' cegueira demais!
* x

<O seu numero (dos mediums) augmen-


tará com o progresso moral e a Odiffusão da
184 TOLICES DE ALLAN KARDEC

verdade. Pode-se prever que um Oia, a grande


maioria dos entes humanos será apta para
receber directamente os ensinos d'esses seres
invisiveis cuja. existencia dinda hontem ne-
gava (cap. KKXII).
Ah! Todos seremos mediums? Muito obri-
gados. Mas veja o que diz a medicina a res-
peito. o
Na mesma carta em que o Dr. João Tei-
xeira Alvares inquiria acerca do espiritismo
como factor da loucura, havia mais uma pe-
quena pergunta: — O medium, principalmente
o vidente, póde ser considerado um typo nor-
mal?
E eis o que responderam as summidades
medicas do Brasil.
O Dr. Franco da Rocha. director do Hos-
picio de Juquery, exprimiu-se assim: <O me-
dium vidente... é quasi sempre um desequili-
brado... Eu pelo menos nunca vi um medium
que fosse um individuo normal.
Depois O'isto, o diabo queira ser medium!
| Or. Juliano Moreira, director do Hospi-
cio do Rio, responde: «Até hoje ainda não
five a fortuna de ver um medium principal-
mente dos chamados videntes, que não fosse
nevropatha:. |
O Or. Homem de Mello diz: <O medium
é um typo anormal, um degenerado; pouco
importa que o seja superior (na classificação
de Magaam) á vista de faculdades intellectuaes
que fascinam»”.
— O Dr. A. Austregesilo, professor de mo-
lestias nervosas no Rio, responde tambem:
<Os mediums devem ser considerados indivi-
duos nevropathas proximos da hysteria».
TOLICES DE ALLAN KARDEC 185.
e—a o — o e es
ana qe — — — —e—e — ei
- + a
.-—

Ai de nós, por conseguinte! De que es-


tamos ameaçados na opinião de Léon Denis!
De ver augmentar o numero dos nevropathas
dos anormaes, dos desequilibrados.,. Que Deus
nos acuda! R
: *+ *
<A sciencia moderna, de accordo com o
ensino dos espiritos, mostrando-nos o universo
semeado de innumeraveis mundos habitados...
(cap. XXXII)».
Oh sciencia maravilhosa a deste Léon
Denis! Já penetrou até alli! Leitores, por fa-
vor, descubram-se; o homem é uma maravilha!
A sciencia moderna (a delle) lhe mostrou
o universo semeado de mundos habitados!
A gente fica bôba de ver tanto topete!
Onde, quando, como é que a sciencia mo-
derna mostrou isso? Se parece que essa
cente nem sabe o que é a sciencia! Qualquer
caraminhola que se lhes metta na cabeça, uma
vez que lhes seja affirmada pelos snrs. espi-
ritos, prompto! sobe á altura de sciencia!
E ha tolos que engolem tolices d'estas!
O que a sciencia diz é apenas que pode
haver mundos habitados, visto haver mundos
em condições muito chegadas ás nossas: diz
que pode haver habitantes tambem de natu-
reza differente da nossa e accomodada ás con-
dições d'esses mundos.
E' cousa aliás que até sem grande sclen-
cia qualquer idiota comprehenõe.
D'ahi porém a dizer: Ha mundos habita-
dos, vae um abysmo. e haver é pod
Meu caro Denis, entre um
o Gu an ab ar a, o Hi ma la va , O At la n-
um ha, cabe
tico e mil outras cousitas mais.
186 TOLNCES DE ALLAN KARDEC

+
» x»

<A punição do espirito máu continúa, não


só na vida espiritual, mas ainda nas encarna-
ções successivas que o levam à mundos infe-
riores (cap. KKXKVI)>.
Ah, gostei de ver! Eis aqui Léon Denis
affirmando alto e bom som, que a punição leva
os espiritos a mundos inferiores.
Entretanto os leitores lembram ainda as
palavras de Allan Kardec? «Qs espiritos podem
ir viver corporalmente em mundos inferiores
áquelle em que já viveram? R. Os espiritos pó-
dem ficar estacionarios, mas não retrogradam;
então a sua punição está em não avançarem e
em terem de recomeçar as existencias mal em-
pregadas, no meio conveniente á sua natureza
(L. dos Esp. n. 178)”.
Eis aqui pois dois espiritos superiores (2)
um contra o outro. O de Denis mette os dedos
na abertura do sobretudo e affirma com des-
plante que a punição leva os espiritos a mun-
dos inferiores. O de Kardec enfia os pollega-
res nas cavas do collete, e com uma baforada
de fumo do seu charuto, nega-o redonda-
mente)...
E os espiritas vão atraz d'elles!... E en-
tendem que elles não os enganam!... E en-
tendem que poõem discernir entre as revela-
ções dos diversos espiritos!
Estão bem arranjados!
* Xe
“Nas camadas inferiores da creação, a al-
ma ainda não se conhece. Só o instincto, es-
pecie de fatalidade, a conduz, e só nos typos
superiores da animalidade é que. apparecem,
como o despontar da aurora, os primeiros ru-
TOLICES DE ALLAN KARDEC
————
187

dimentos das faculdades do homem. Entrando


na humanidade, à alma se O
berdade moral” (cap. RL.) eaipaReas Papa dE
Portanto o nosso digno Léon Denis ac-
ceita a crença de que os animaes se vão tor-
nando gente, e que a nossa alma já pode ter
sido de um camello, de um chimpanzé ou de
um hippopotamo.
| Agradecemos a attenção. Lembramos po-
rém que, nesse caso, uma vez que as facul-
dades espirituaes estão já na materia, e do
seio della é que se vão manifestando, não ha
precisão de Deus. A materia eterna teria em
si tudo, e nós poderiamos procurar o mesmo
progresso indefinido, sem um Deus que vi-
giasse as nossas acções.
Simplifiquemos, amigos, simplifiquemos!
Seja-se camello á vontade, mas, nesse caso,
não insurjam contra os atheus!

Tambem Léon Denis quer que a sciencia


se deva adquirir juntamente com a virtude:
“As incarnações (da alma humana) se succeõem
na escala dos mundos até que tenham adqui-
rido os tres bens immorredouros, alvo de seus
CU trabalhos:o criterio, a scigncia e o amor”
ibid).
Acompanha portanto as pégadas de Kar-
dec e quer nos impingir a enorme estopada:
de estudar, de estudar sempre, de estudar sem.
lenitivo nem descanso. | |
Pois que vá estudando, que muito lhe
faltaa elle tambem.

eee
[["—
ESET
XI
Um é equal a dois.—(omo se
completa o Evangelho
Passemos agora a um ponto engraçado
do livro de Léon Denis.
Parece que elle entende que cada um de
nós é dois; que estamos no caso dos beba-
dos que vêem tudo dobrado; e que finalmente
quasi que tem razão o cafageste quando diz
ufano e cheio de si: Comigo é nove!
A' pag. 313 exclâma: «Respeitemos os idio-
fas, os enfermos, os loucos! N'esses sepulchros
de carne um espirito vela, soffre, e, em sua
personalidade intima, tem consciencia de sua
miseria, de sua abjecção» (cap. XLI).
Logo ha uma personalidade intima, diffe-
rente da normal, e essa tem consciencia do
seu estado, ao passo que a normal não a tem.
Agora á pag. 369: «Vós que sois despre-
zados por causa da vossa ignorancia e das
vossas faculdades acanhadas, sabei que entre
vós se acham espiritos eminentes, que aban-
donaram por algum tempo as suas faculdad
es
brilhantes, aptidões e talentos, e quizeram
carnar-se como ignorantes para se hum en-
rem» (cap. 1). ilha:
| Ora estes ignorantes não têem conscien
0essas taes faculdades brilhantes, cia
consciencia de aptidões e talentos não têem
nenhuns.
TOLICES DE ALLAN KARDEC
o
189

Temos pois duas pessoas em cada mortal E


no snr. Léon Denis por conseguinte, conforme
a A
sua crença, a ha duas pessoas distinctas e um
só Léon Denis verdadeiro...
| Sim, snr. Amplificando o mesmo princi-
pio, nós que julgavamos ser um, somos dois.
Nós que iulgavamos estar sós comnosco, te-
mos sempre um intruso no nosso ser, um in-
tromettido que ninguem chamou a se immis-
cuir no que fazemos, e que faz sem ninguem
o autorisar no que fazemos, e que o faz sem
ninguem o autorisar a isso. € alguem que
não ficasse satisfeito com a tal historia era
bem capaz de quebrar a cara a esse outro
elle, cuja imprudencia e sem ceremonia lhe ir-
rifasse os nervos.
Mas, venha cá, seu Denis. Uma vez que
um é egual a dois, diga-me uma cousa: Qual
dos dois é que é responsavel pelos actos do
homem? O espirito que está alli occulto com
uma consciencia que . ninguem percebe, ou o
perispirito, como vocês dizem? (Porque o
corpo não tem consciencia. alguma). Ou vo-
cês dirão que o mesmo espirito tem conscien-
cia intima e não tem consciencia normal a-
ctual? Confesso que isto é sublime demais.
Não é qualquer bestunto que o comprehenõde.
Um mesmo espirito, e ter consciencia e ao
mesmo tempo não a ter; saber o que pretende
e ao mesmo tempo ignorar que existe ainda
essa personalidade, — são cousas que se har-
monisam perfeitamente, mas só na torre de
Babel.
Comtudo, sim, agora comprehendo. O que
elle quer dizer na sua é que a alma perde a
sua consciencia na união com o corpo mate-
190 TOLICES DE ALLAN KARDEC
e u- uu 4 o mm

rial. Mas, então, pergunto eu, porque? Pois,


se o espirito se manifesta tão bem pelos me-
dlums sem achar embaraços, porque não se
manifestaria pelo seu proprio corpo que lhe é
mais natural? Porque, se os orgãos estão to-
dos bem desenvolvidos? Dirão que lhes falta
qualquer cousa, ainda que seja a faculdade
mediumnica. Mas esses mesmos que hoje são
mediums porque não recordam o que foram?
Porque não apresentam essa segunda perso-
nalidade dos mesmos? Não ha estorvo ne-
nhum? São mediums, teêm os orgãos desen-
volvidos, não lhes falta nada. E entretanto
não se enxerga nem a ponta da orelha dessa
segunda personalidade, cuja existencia nos af-
fiançam Léon Denis e Allan Kardec.
Ao menos esses mediums deviam recor-
dar as suas existencias passadas, o que fize-
ram e O que pintaram, conforme essa opinião
velles. Devia-lhes voltar a segunda conscien-
cia, deviam recordar tudo o que aprenderam
noutras incarnações; essas cousinhas que 0s
espiritas dizem que até apparecem sem esforço,
como uma recordação, quando se estuda. E
no entanto nada! tres vezes nada!
Qual, leitores! Essas diversas consciencias
têem visos de ser uma peta monumental. Con-
tentemo-nos com sermos um só. Parece pelo
menos mais logico, mais sensato e não estã
sujeito a tantos e tão inexplicaveis mysterios!
“o Es

<O espiritismo vem restabelecer em sua


primitiva pureza, explicar, completar à dou-
trina do Evangelho» (cap. RRKVII).
«O espiritismo nos dá a chave do Evan-
gelho e explica o seu sentido obscuro ou oc:
TOLICES DE ALLAN KARDEC 191

culto. Mais ainda; traz-nos a moral superior,


a moral definitiva» (P. V. XLII.
-Sim, de facto, negar os pontos principaes
do Evangelho, adulterar as passagens que não
falam como lhes convem, deve, sim, deve ser
o mesmo que explicar, completar, restabelecer
em sua primitiva pureza...
O erro é nosso em não entendermos as
cousas.
Assim quando Jesus Christo, além de declarar
altamente diante do Summo Sacerdote que é o Fi-
lho de Deus, ainda nos affirma: Eu e meu Pae so-
mos um... Que? Pensam que dizia que era Deus
como seu Pae celesstial? Erro palmar! O espiritis-
mo nos diz que Jesus Christo não era Deus.
Querem melhor explicação do que essa ?
— Mas então que quer isso de Eu e meu
Pae somos um?
— Que querem que lhes diga? Pergun-
tem-no ao snr. Léon Denis.
E quando Jesus Christo diz: «Se não co-
merdes a minha carne e não beberdes o meu
sangue não tereis a vida em vós (João VI, 54)»
— e em confirmação d'essas palavras mais
tarde toma o pão e diz: «Tomae e-comei, isto
é meu corpo» — julgam acaso que instituia a
sagrada Eucharistia? |
Que engano! Jesus não instituiu cousa
alguma. O espiritismo o diz.
-— Mas então o que querem Oizer essas
palavras de Christo?
— Olhem, eu procurei até no «Evangelho
segundo o espiritismo», onde O Sr. Rardec
ajusta tud o a seu mod o de pen sar e dá as
tintas para que tudo se amolde ás crenças
192 TOLICES DE ALLAN KARDEC
aaa

espiritas. Pois julgam que achei explicação a


essas palavras? Nem cheta!
Como tambem não achei explicação a es-
tas: «Aquelles a quem perdoarões os peccados
serão perdoados”.
São modos de explicar, meus caros, são
modos de completar a doutrina do Evangelho.
— Oh, oh! Omittindo?
— Sim snres. Omittindo completa-se. Não
sabiam ?
LATIN MANNANSN Ce
em

Xu
Aggravos - Formulas =Obscurantismo
«(Uma alma elevada) comprehende que
os aggravos humanos são provenientes da
ignorancia, e por isso não se considera ultra-
jada nem tem resentimentos (cap. KLVIHD».
E' um magro consolo! Se nos dissesse,
como dizemos nós, que com isso agradamos
muito a Deus, que por amor a Deus é que
devemos perdoar, mostrariam um pouco mais
de racionalidade. Mas assim? Dizer que os
agaravos são provenientes da ignorancia? Está
solto
Então quando um patrão suga o suor d0
operario e não lhe quer pagar os tristes dois
ou tres mil réis diarios que este tanto custou
a ganhar, isso é ignorancia?
O tal homem merece que o lesado «não
se considere ultrajado nem tenha resentimen-
tos» ?
Quando outro mata cynica e barbaramente
o seu semelhante, seja por odio, seja por cu-
biça, devemos dizer que é ignorancia?
Sim, não ha ultraje! Não merece que haja
resentimentos!... Ora, deixe-me rir!
Não, Denis, venha cá. Não é o procedi-
mento do nosso semelhante que é innocente
e que não contem ultrage.
A consideração do que Deus ordena é
que nos deve fazer acceitar O sacrificio. E a
194 TOLICES a
DE ALLAN KARDEC
e e ii A am e
——— -. — ——e——mm
-— —— o —. -—-
— —— -

vista de um De us cr uc if ic ad o po r nó s qu e no s
ga , é ell a qu e no s dá fo rç a pa ra su pp or ta r
obri o
es do no ss o pr ox im o, vis to qu e no ss
os ultraj
me re ce mu it o ma is do qu e iss o. |
bom Deus
Estas sim que são considerações que obri-
gam a aturar até desaforos. Mas — que seja
Que a victima não se deva con-
ionorancia?
siderar ultrajada e por isso não deva ter re-
sentimento ?... Está solto, está muito solto, seu
Denis! .
x +

Acho graça no seu Léon Denis. Dogma-


tiza de cadeira, proscreve, condemna, e, pouco
depois, aconselha a mesma cousa ou cousa
peior.
Vejam isto. No cap. LI pag. 383, diz elle:
«(Ao orarmos) evitemos as fórmulas banaes
usadas em certos meios».
Naturalmente entende as orações com-
muns que se usam no catholicismo; e quer
que se evitem como cousa que nada de bom
confeimm.
Entretanto, á pag. 384 sae-se com esta:
<E se na nossa incapacidade para exprimir os
sentimentos, é absolutamente necessario um
texto, uma formula, digamos ...» E segue-se
uma prece, dictada com o auxilio de uma mesa,
no dizer delle, por Jeronymo de Praga!
"Santos e Santas do Céo! Que topete! A
principio não quer «formulas banaes>», e com
ei Dea, vem sei uma formula que for-
uso continuado. ornar anal se se fizer d'ella

a End absolutamente que façamos uso


quer1 nosdevemos
sus Christo, » €e Quer ao proprio
impingir... a prece
Je
de
TOLICES DE ALLAN KARDEC 195

Jeronymo de Praga!!! O homem precisava


de ir... plantar batatas. Seguiria uma formula
banal tambem, não digo que não, mas ao me-
nos eta de utilidade e não de asneira.
Quando se trata de bater na pobre egreja
catholica estes doidos não olham a meios.
Tudo lhes serve. E dahi vem que pullulam
as tolices e abundam os disparates.
se x

«O homem honesto faz o bem pelo bem,


sem procurar approvação nem recompensa”
(cap. XLIII). Ra
Ah, muifo bem! Então quem faz o bem com
vistas á recompensa muito natural e muito justa, já
não é honesto. Hum! Isto tem dente de coelho.
Mas que é que tem que o homem probo
faça uma esmola com vistas a ser recompen-
sado por Deus? Quem é que morre se uma
pessoa se sacrifica visando o agrado de Deus
e a consequente protecção da Divindade?
Mas é um dos pontos em que os autores
espiritas muito batem. Kardec Oiz: <O homem
penetrado do sentimento de caridade e amor
do proximo faz o bem por amor do bem, sem
esperança de recompensa» (n. 918).
Parece pois que é inteiramente prohibido
pela doutrina espirita fazer o bem com vistas
á recompensa. |
E no entretanto, (não ha duvida, a con-
tradicção deve ser um petisco!) entretanto, no
cap. LV., nos diz Léon Denis: «Todo homem
comprehenderá que, trabalhando em beneficio
sorte dos humildes, dos pequenos, dos des-
oa
trabalhará para si proprio, pois lhe
herdados, pro-
será preciso voltar á terra, e haverá nove
de s so br e de z de re na sc er po br e» .
habili da
TOLICES DE ALLAN KARDEC
io,
ta
ra
ma a

em é que entende isto ? Então a gora


A vá fazer o bem com o fim de melho-
aê de sorte. E então onde ficam as palavras
vo mesmo Léon Denis já citadas, e as outras
aro Allan Kardec?
'» ão sei. Elles lá o lêem, lá o entendam.
Eu por mim não vejo nisso mais do que uma
cadis
deliica ssaima
disim |e mimosisissima contradicçÇão.
* *

“Convem lembrar que o catholicismo aco-


lheu do mesmo modo todas as grandes desco-
bertas, todos os progressos consideraveis que
assignalam os factos da historia. Raras são as
conquistas scientificas que não tenham sido
julgadas como obras diabolicas (Cap KKKVII)
Ahi, seu Mané! Quem lê isto dirá que
de facto o catholicismo deve ser um grande
inimigo das sciencias e do progresso. Léon
Denis é quem o diz, e infeliz de quem não
Oiz como o petiz...
Já vejo, só com essa tirada de Denis, muito
catholico agachado, escondido debaixo do quarda
chuva, espreitando, com medo de ser taxado
de amigo do atrazo e da ignorancia...
Pois é brinquedo uma accusação d'essas?
São cousas de arrepiar couro e cabello; são
cousas de cahir das nuvens e quebrar uma
perna ainda por cima na queda.
touro Masá unha.
qual! Nada à e desmaios! Peguemos o
Então diz Denis Que raras são as con-
quistas scientificas que não tenham sido jul-
gadas como obras diabolicas ? am
| Uma das maiores conquistas scientificas
da a da electricidad
Volta e Galvani são e dynamica.
nomes que li
fulga-
TOLICES DE ALLAN KARDEC 197

rão como estrellas no firmamento scientifico,


forçando o nosso acatamento. Pois quer-me
parecer que o invento d'esses grandes homens
nunca foi julgado pelos catholicos como obra
diabolica. Que diz, hein, Denis ?
A imprensa foi uma das descobertas que
mais revolucionaram o mundo, servindo im-
menso á sciencia e ás condições sociaes. Jul-
gará pois Léon Denis que Gutenberg foi tido
pelo catholicismo por um grande diabo ?...
Porém, em que pese ao snr. Denis, não
me consta.
Ignorará elle que os precursores de Gu-
tenberg e da imprensa foram nada menos que
os frades, Os quaes se consagravam á ardua
“tarefa de copiar os manuscriptos antigos, vo-
lumes e mais volumes, apenas com o fim de
conservarem e espalharem as conquistas que
a sciencia realizara até aquelle seu tempo?
Nesse caso tambem os snres. frades seriam
considerados pelos catholicos, não digo já co-
mo diabos, mas pelo menos como um exercito
de diabinhos, o que, francamente, Denis, não
me consta, não me consta, tenha paciencia.
Para as grandes navegações 005 seculos
XV e XVI muito contri buiu a invenç ão da
bussola. Léon Denis não me contradirá, creio
eu. Entretanto o catholicismo terá julgado a
bussola como obra diabolica? Muito pelo con-
trario: até quem se diz ter inventado a bus-
sola, é Flavio Gioja, dominicano.
Como já dissemos, Copernico e João de
ensina ram, muito antes de Galile u, a ro-
Cusa
tação da terra e sua transl ação em torno do
sol. O catholicismo se lhes oppôz, julgando-os
feiticeiros? Não me consta, não me consta.
TOLICES DE ALLAN KARDEC
198

Pelo contrari o Copernico continuou ensinando


em plena Roi na sem ser adinaia ) João de
jnuou a ser caroea ra.
IE acaoiá é grande parte nas desco-
bertas modernas e no progresso das sciencias.
Pelas palavras de Léon Denis, devia portanto
ser considerado invento diabolico pelos catho.
licos. Pois francamente não me consta tal
cousa, não me consta. .
O telegrapho realmente não deixa de parecer
uma cousa bem diabolica. Lembremos a com-
paração do roceiro a um collega: E um grande
cão com a cabeça no Rio eo rabo em S.
Paulo. Pisa-se-lhe no rabo em S. Paulo, e
elle grita lá no Rio. Comtudo apesar dos pe-
sares, não me consta que o catholicismo te-
nha julgado esse invento obra diabolica.
O monge Guido de Arezzo inventou a
clave, a escala musical: o dominicano Spina
inventou os oculos; o cardeal Regio Montano
o systema metrico; o benedictino Ponce o prin-
cipio da instrucção aos surdos-mudos: o je-
suita Luna a instrucção aos cegos * O frade
Cosme O lithotomo; Roentgen, Padre Secchi,
Curie são nomes que a sciencia acata
Féncia com razão. a reve-
Pois não sei de nenhum
delles que o catholicismo considerasse como
tendo pacto com o diabo.
paia o on rd Denis, você enxergou de-
paciencia, » rec FECONSIdEre
nsidere edoU
um um logro.
pouco, porque Tenha
Sol não se ta ac — 0
nhor. (1) Pa com uma peneira, não se
e

(1) Aqui é à egrei


ntiseja
capitulo é aos ScleCgr accusa
tas a que da enis: noutro
elle a roge r todas
TOLICES DE ALLAN KARDEC 199

as idéas novas, particularmente as mais fecundas, têem


sido escarnecidas, vilipendiadas em seu apparecimento,
regeitadas como utopias. As descobertas do vapor e
da electricidade, e mesmo o estabelecimento de estradas
de ferro, foram, por muito tempo, qualificadas de men-
tiras e de chimeras. A Academia de (Medicina de Pa-
ris regeitava, a principio, a tfheoria de Harvey sobre a
circulação do sangue, como repellia mais tarde o ma-
gnetismo. Com que zombarias os sabios não saudaram
as descobertas de Boucher de Perthos. Todos os que
têem querido libertar a humanidade da sua ignorancia...
todos esses viram erquer-se diante de si um calvario.
Watt, Fulton e,Papin foram injuriados; Salomão de Caus
ficou encarcerado entre loucos». (Cap. XKV). Quererá
elle confundir os scientistas com a egreja?
Cincadas de
Flammarion
CINCADAS DE FLAMMARION
Merece-nos um pouco mais de respeito
Camillo Flammarion, na sua qualidade de as-
tronomo de nomeada.
Tambem não arguiremos com elle sobre
pontos que pertençam á verdadeira sciencia
da astronomia. |
No mais porém, é um simples mortal co-
mo os cutros; e como espirita então, não
poude libertar-se das peças que avultam em
Allan Kardec e Léon Denis.
Flammarion é habil astronomo e pessimo
theologo. |
No prdemos examinar senão as suas Nar-
rações do Infinito, e por isso vae esta parte
mais resumida. Não duvidamos porém que
em outras obras, sobretudo na segunda parte
de Deus na Natureza, repita todos os pontos
já refutados em Allan Kardec e Léon Denis.
E' deixal-o. Que disparate tambemá von-
tade, na certeza de que não faz nada original.

as
E2
SZ> 527S5 SE 7SE

Alguns mezes ou alguns annos?


Comecemos por um texto do nosso astro-
nomo que causa verdadeiro pasmo. Extranha-
mos realmente que da sua penna tenham sa-
hido taes palavras. o
«Em alguns mezes, «diz elle», o corpo hu-
mano é inteiramente renovado, e nem no san-
que, nem na carne, nem no cerebro, nem nos
ossos, encontra-se mais um atomo d'aquelles
que constituiam o corpo alguns mezes antes».
(pao. 7). E, duas paginas. adiante, confirma o
mesmo dizendo: «(A alma) não se muda den-
tro de um mez ou dois como o corpo”.
E' para se duvidar do preparo do grande
astronomo! Realmente!
Denis tambem admitte a mesma cousa (Ve-
mos, por essa e por outras, que ha solidarie-
dade entre elles: o que um diz é piamente
acreditado pelos outros sem mais provas):
<O nosso corpo inteiro renova-se em alguns
mezes> (Dep. da Morte, cap. VII).
| Maravilhados corremos a abrir uma histo-
ria natural (F..T. D.); pois essa idéa, ema-
nada dum sabio, não estava de accordo com
as que do estudo de preparatorios conservava-
mos; e alli é pag. 60, vimos que geralmente
é de sete em sete annos que as differentes
partes d0 corpo humano se acham inteiramente
renovadas.
TOLICES DE ALLAN KARDEC 205:

Consultamos além d'isso medicos illustres


e a resposta foi, como não podia deixar de
ser, que não basta «um ou dois mezes» para se
renovar tudo no organismo humano; que não
é tempo sufficiente. sobretudo para os ossos.
Que Flammarion nos desculpe: mas pa-
rece uma cincada.
[1
Médo á luz
<A chegada do sol sobre o hemispherio
augmenta os espiritos» (Ult. pag. da 1.2 Nar-
ração.)
Podemos pois classifical-os na categoria
dos morcegos.
-* Tambem vemos que quasi todas as ses-
sões espiritas se realizam á noite. E' um
facto symptomatico. Parece que os espiritos
têem medo á luz do sol. Porque será?
São tão adiantados, estão tão acima da
materia, têem sentiõos t'o aperfeiçoados, e
“têem medo da luz!!! Não entendo. Eu jul-
garia que elles estavam em tanta luz no ou-
tro mundo que a nossa misera luz solar abso-
lutamente não os podia incommodar. E eis
que Flammarion nos informa que a chegada
do sol afugenta os espiritos!
Abaixemos a cabeça e façamos um acto
de fé. De outro geito não vae não.

HI
Lembranças da ordem material
“Nuaerens. — Um marido (no outro mun-
do) seguirá com interesse a vida inteira de sua
206 TOLICES DE ALLAN KARDEC
companheira, e no caso em que alguma par-
ticularidade inesperada se mostrasse, poderia
examinar com vagar as circumstancias que lhe
fossem sensiveis... Poderia ainda se sua com-
panheira desincarnada residisse em algumas
regiões visinhas, chamal-a para observar em
commum estes factos retrospectivos. Nenhuma
negação poderia ser admittida diante do fla-
grante testemunho... Talvez os espiritos dêem-
se entre si ao espectaculo de alguns factos in-
timos?
Lumem. — No céo, ó meu terrestre amigo,
apreciam-se pouco estas lembranças da ordem
material... (32. Narr. pg, 151)”.
Flammarion o affirma, mas não sei por-
que. Eu julgo pelo contrario que, se fosse real
o svstema espirita, muitos espiritos se engal-
finhariam lá no outro mundo; moer-se-iam a
soccos e pontapés, visto não haver alli armas
de fogo nem punhaes. Em primeiro logar são
espiritos materiaes, em qe pese á logica e
ao bom senso (V. cap. VIII da 1.2 parte d'este
trabalho). Em segundo logar estão vendo as
cousas como se passaram. E não ha cousa
que mais irrite do que ver a malicia dum su-
jeito a tramar contra alguem nas trevas. Em
terceiro logar conservam odio, inveja, etc. («De-
vorados pela inveja e pelo odio» L. Denis,
Depois da morte, cap, SXXVI).
Acho pois que não falta nada. Em boa
paz do snr. Flammarion portanto, não creio,
baseiado em palavras dos proprios mestres
do espiritismo, que no outro mundo se apre-
ciem pouco as lembranças da ordem material.
O odio e a inveja indicam ao contrario que
TOLICES DE ALLAN KARDEC 207

bem se lembram elles e bem que se importam


com as lembranças materiaes.
IV
Os gemeos
Outra! Temos outra de Flamma-
Camillo
rion! |
Diz elle na quarta Narração: «Dois gemeos,
vivendo a dez leguas um do outro, em conodi-
ções muito Oifferentes, soffrem ao mesmo tem-
po a mesma doença, ou se um d'elles se fati-
ga por demais, o outro experimenta um incom-
modo que não procurára”.
Será verdade? Já vimos isso, más foi só
num romance de Alexandre Dumas. Na vida
real é todo o contrario. Conhecemos cinco ca-
sos de irmãos gemeos, e nunca, por nunca
ser, se deu o facto que afiança Flammarion. Al-
gum dos leitores terá conhecimento de algum
caso que lhe dê razão ? .
Tambem consultamos medicos; e elles a
uma voz nos affirmaram que é uma tolice.
Quem sabe se o Camillo nos tinha por be-
ocios ?
V
Equaldade
Na 4.2 Narração, cap. |. diz-nos Flamma-
rion:
me ni no tra z na sc en do fa cu ld ad es dif -
“Cada n-
ferentes, predisposições especiaes, dissemelha
o pó-
ças innatas, aliás incontestadas, que nã
ex pl ic ar -s e di an te do es pi ri to ph il os op hi co
dem
208 TOLICES DE ALLAN KARDEC
O

e diante da Justiça eterna senão


por trabalhos
anteriormente realisados por almas
livres”,
Eis o nosso Camillo affirmando que te
predisposições especiaes que são remini mos
scen-
cias de outra vidas, ao passo que nada
recor-
damos de cousas mais faceis de recordar, como
seja o que fizemos nessas vidas, sobretudo se
nalgumas dellas houve factos graves como as-
sassinatos, soffrimentos, querras.
|. Segundo elle, como segundo todos os es-
piritas, lembramos certas cousas mais difficeis
de recordar; e o que devia ser o objecto mais
offerecido ao nosso pensamento e recordação
fica no esquecimento.
| Além disso o nosso espirito, como elles
dizem, depois da morte vae-se manifestar a
pessoas extranhas, e o faz sem grandes Ddiffi-
culõades. Porque pois, se eu sou medium,
supponhamos, a minha alma aqui em vida não
póde manifestar o que sabe (aquillo de que
na sua personalidade intima tem consciencia,
como diz Léon Denis); os seus conhecimentos,
as suas recordações, a sua sciencia ? O meu cor-
po está tão desenvolvido como o de um me-
dium e a minha alma está mais ligada, mais
presente ao corpo e faculdades corporaes do
que aos do medium.
Mas voltemos ás palavras de Flammarion:
«Não po de m exp lic ar- se dia nte do esp iri to phi -
losophico e diante da Justiça eterna senão
ho s an te ri or me nt e re al is ad os por al-
por trabal
mas livres”.
ta mb em Fl am ma ri on aff irm a que
Logo te ll i-
be rd ad e de cr ea r se re s in
m
Deus não tem li ha t a m bem
iç õe s Od lv er sa s. Ac
gentes em cond
TOLICES DE ALLAN KARDEC 209
EE" =

elle, como Allan Kardec, como Léon Denis,


que seria uma injustiça da parte de Deus.
-. Lembrar-lhe-hei pois que sempre haverá
injustiça então, porque uns são creados antes
outros depois.
Além disso segue-se, como já expuz nou-
tro logar, que os espiritas não deixam a Deus
a liberdade de crear intelligencias a não ser
intelligencias de homens e em condições peio-
res que as nossas actuaes.
A' hora que Deus quizesse dar o ser a
um anjo, a um ente superior, erguer-se-ia diante
delle Flammarion, acolvtado por Léon Denis
e Allan Rardec, e lhe diria de braço erguido:
Alto lá; não pode. Egualdade e fraternidade!
Uma vez que se lembrou de crear-nos a nós
tão imperfeitos e sujeitos a tantas calamidades,
tambem não póde crear seres em melhores
condições sob pena de injustiça. Nós somos
socialistas espirituaes e não podemos consen-
tir tal cousa!
E eis o nosso bom Deus com as mãos
atadas! Nunca mais por toda a eternidade po-
derá crear intelligencias Oifferentes, seres su-
periores a nós!

VI
Que razão!
“Para que servea propria natureza e por-
que o universo existe? A todas estas questões
o espirito observador não póde dar senão uma
só resposta: E' necessario que todos os des-
finos se cumpram” (4. Narr. 11).
210 e
e
TOLICES DE ALLAN KARDEC
Emmudeça tudo perante tal profundidade
de vistas! Cesse tudo quanto a musa antiga
canta! Eis a ultima razão de tudo!
À ser assim, com o mesmo Direito pode-
mos dizer: Qual a razão de tantas asneiras
que se vêem impressas por esse mundo de
Deus? — EF' porque é preciso que todos os
destinos se cumpram. Eis o que explica tudo.
Mas quem é que causa essa necessidade?
Quem é que faz esse destino?
Flammarion é profundo como a noite es-
cura. Mas... é isso mesmo... E' preciso que os
destinos se cumpram... e o d'elle é não expli-
car nada!

VII
Astros
«Flammarion tambem nos quer impingir
como um facto provado a existencia humana
em outros astros. Vejam o que elle affirma:
“A optica moderna e o calculo transcendente
que nos fazem d'alguma sorte tocar com o dedo
os outros mundos, suas estações e seus dias,
fazem-nos assistir ás variações da natureza
viva em sua superficie; todos estes elementos
hão permittido á astronomia contemporanea
fundar esta doutrina da existencia humana nos
outros astros sobre uma base solida e impere-
civel” (1a. pg. do cap. Il da 4a Narr.)
Como são faceis os snrs. espiritas em ad-
mittir uma cousa que lhes convem!
Agora, é preciso dizer, admira muito mais
num Flammarion. Tinhamos o direito de sup-
pôr que este pelo menos se avantajaria aos
outros em QOialectica. Mas infelizmente parece
TOLICES DE ALLAN KARDEC 211
ad

que gastou tudo o que tinha noutros assum-


ptos, de modo que para este nada lhe sobrou.
Repetimos pois a Flammarion que certeza
é uma cousa e probabilidade é outra muito
differente. Que, por tudo quanto tem de mais
caro, não confunda essas duas cousas. Que,
por causa das condições semelhantes de outros
planetas, não podemos Dizer que «está fun-
dada sobre uma base solida e imperecivel> a
existencia humana noutros astros. Isso equi-
valeria a Oizer que dois livros, uma vez que
sejam eguaes em volume e em formato, de-
vem conter a mesma coisa. Qualquer ignorante
comprehende que podem ser dois exemplares
da mesma obra, não ha duvida; mas que tam-
bem podem muito bem ser obras differentes.
Só o volume e formato não provam nada. À
egualdade de condições nos dá probabilidade,
mas nunca nos dará certeza.

ME
ESSES
aa e e
y

PARA FINALISAR
Pódem surgir, no estudo da religião, du-
vidas sobre alguns pontos menos bem preci-
sados de revelação.
Deus não quiz dar-nos evidencia absoluta,
comquanto não deixasse de nos dar certeza.
As almas fracas, que mal rastejam no
campo da religião, deixam-se levar ás vezes
por essas pequenas duvidas e naufragam mi-
seramente na fé.
A estas pois vimos dizer que temos uma
estrella polar para a qual devem convergir
nossas vistas quando a duvida quizer afas-
tar-nos do caminho da verdade: essa estrella
lar é LOURDES.
" lá o dissemos: os milagres de Lourões
provam a verdade da nossa religião, porquanto
Maria Santissima, siga-se a hypothese que se
seguir, nunca havia de querer, como tam E
nunca havia de poder, contar a hair
exc a
E os milagres de Lourdes, feitosfosse ra
religião catholica, se esta er ne
na
riam do maior peso, da o força P
conservar e endurecer N e tai
Não, a Virgem Maria, Santissimã a
tissima como é, faria esses o Desse modo
dos fóra da Religião catholica, pa 40 Se formar
indicar o caminho da verdade
connivente com o erro.
Entretanto não o faz.
214 TOLICES DE ALLAN KARDEC o

Porque? o.
Porque ella quer que esses proôigios se-
jam como que o sello da verdade. Maria San-
tissima como que põe o seu carimbo na ver-
dadeira religião.
Que importa pois uma pequena duvida,
supponhamos sobre um mysterio revelado?
Que a alma assim agitada olhe para Lourdes
e reconhecerá a verdade.
Que importa uma pequena duvida sobre
a interpretação de um texto obscuro da Biblia?
Que se olhe para a estrella polar, e o barco,
desviado pelas ondas, tomará de novo o rumo
da verdade. |
Lourdes é a espada das indecisões.
Lourdes é o pharol que esclarece as men-
es.

sete

Nihil obstat
3. Paulo, 9 Abril 1921
Con. Dr, Martins Ladeira
" CENSOR

uma + ——— 1. + — um o

Imprimatur,
S. Paulo, 9 Abril 1921
Mons. Dr. Emilio
Teixeir a
Vigario Geral
INDICE
Approvação . pag.

Tolices de Allan Hardes

LR O grande argumento. pag.

SU AA a CO CIA da U
HH. Caridade e Santos

mm
iu

O IO 10 0 00 NAD
HI. O demonio moral.
IV. Quantos loucos faz O espiritismo |

ooo
V. Uma lacuna preenchida
VI. Tolices diversas: .
VII. Outras. .
VIII. Os espiritas são materialistas!
IX. Filho de Deus? . ... E=
K. À punição no: espiritismo . ô
KI. Pro—v a
Esp s
iri tos ap
Porque não recordamos.
MW

o 4do
O NouU
Xi. O Evangelho. .. ; y

KIlI. Sciencia ... É SE is d A


“o”

XIV. Livre arbitrio. O hottentote. .


XV. A differença é PERA, A o
crisia . . ER 85
Yv

XVI. Resurreição . . . 93
vw

XVII. Sonhos — Escriptores .. 95


4

XVill. Egualdade inicial de todos .. 100


XIX. Deveremos fazer o mal! A hora
Re MERO é ig Ear q HO
RA

XX. Allegorias . 115


120
E O

XXI, Aproveitar do mal. "Amora Deus


RXII. Divergentias no espiritismo. 123
XXIII. Lourdes . . cc cvs. 128

Dislates de Léon Denis

Introducção pag. 135


Às religiões antigas. 137
Essenios e gnosticos . 145
Doutrina de Jesus 151
IV. Só acceitam o que lhes convem. pag. 155
U. Perispirito. Effeitos do christia-
nismo na ordem social . 159
VI. A religião deve progredir? . . 163
Vil. Apparições. Pantheismo. Dêns
não conquistados . . 170
VIII. Duas logicas. Materia e espirito . 177
IX. Ensino dos espiritos . . .... 180
x. Esquecimento. Mediums. Astros
habitados, etc. +... cc... 183
Xt. Um éeguala dois. Como se com-
pleta o Evangelho . . ..... 188
Xtl. Aggravos. Formulas. Obscuran-
tismo . ; 193

Cincadas de Flammarion

1. Alguns mezes ou alguns annos ? pas. 204


It. Medo dá lWZ, as vs ss 209
vw
IH. Lembranças da ordem material o 4
voy
205
IV. Os gemeos 207
V. Fqualdade . 207
VI. Que razão! . 209
VII. Astros . 210

Para finalisar 213

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