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CENTRO
DE ESTUDOS

PALAS AmENA

Av. Cristovão Colombo,2149


sala 315-Floresta
PORTO ALEGRE
RS

UmCentro
de Estudos
Filosóficos
para crnem busca
viver lilosoficamente.
CURSOS CONFERÊNCIAS
CICLOS CULTURAIS CON
CERTOS BIBLIOTECA FIL
MESEXPOSIÇOESCORAL
Rua Leôncio de Carvalho, 99, Paraiso, S P
- fone: 288.7356
EDITORIAL

TMOT. divindade .glocia, • t,'vez o


m.;~ misterioso • menoa compr •• n-
dido do. deus •• do antigo "J(em", to
./mbolo da .abedoria e aa autorldede, Aos Apocalípticos
E o 8xriba silencioso que, com sua cs-
Nca de Ibis.• pen4 ti. tabulet •. '-01.-
Ire 0$ pensamentos. pa/avr •••.• tos
dos humens. que mais tera« •• r'o pe-
seao« na balança da Justiça. PI,t.o diz Senhores, chega! Já cansaram! Mil previsões sobre a destruição,
que THO T foi o criador dos númeroa,
da Qeometria 8 das 18tr8S. A cruz (Teu. aniquilamento e extinção deste planeta pairam sobre as nossas cabe-
no fgito) que/evlJ em .sua m'o ••o slm-
bolo da vida eterna, emblema da sabe- ~as. Descrições minuciosas a respeito das condições em que chega-
doria divina.
remos a esse "último dia" preenchem folhas, quadros, filmes, arma-
'EDITORES zenando arquivos próprios do mais requintado espírito mórbido.
Associação PALAS ATHENA do Brasil
lia [)iskin Que não vivemos no melhor dos mundos é óbvio; entretanto,
Basflio Pawlowicz tampouco vivemos no pior deles. Hoje a escravatura é árvore seca
Primo Augusto Gerbelli que ninguém está disposto a alimentar, e sua lembrança causa repú-
PRODUÇÃO dio até ao mais simples dos mortais.
Sérgio Marques; Carla Teso; João A religião deixou de ser o narcotizante para as vicissitudes da
Fernimdes Filho vida ou o prêmio de um paraíso que compense as agruras terrenas.
EQUIPE THOT A ciência está abandonando suas escuras bitolas e caminha a
Emílio Moufarrige Jr; Lucia Brandã'o passos largos em busca de um encontro com algo que a justifique an-
Saft; Lucia Benfatti; David Cohen; te os olhos de uma realidade maior e, conseqüentemente, mais espi-
Marina Moraes; Lucy Blumental; Mara
ritual.
Novello; Fatima Flores Jardim; Rosa
lndátillorTherezlnha Slqueira Campos; -Os homens 'se revoltam e lutam por ampliar os horizontes da
Zildo Trajano de Lucena; José Caruso justiça na mais diversas áreas da ação humana; e os jovens não mais
Filho; George Barcat; Renata de Césare
pactuam com ideologias de um pseudo-petriotismo onde a ambição
FOTOLlTO CAPA vestia suas melhores roupas.
Polychrom Poder-se-á dizer que isto acontece em muito poucos lugares
do planeta. Mas acontece e isto é o importante! Uma nova percep-
COMPOSiÇÃO E IMPRESSÃO
Gráfica PALAS ATHENA ção do mundo está em avanço; uma consciência renascida num cam-
Fone: 297-6288 po de profundas dores engatinha e vai abrindo espaços cada vez mais
Não publicamos matérias redacionais significativos.
pagas. Permitida reprodução, citando A despeito dos apocalípticos constroem-se templos, bibliote-
origem. Os números atrasados são ven-
didos ao preço do último número pu- cas, teatros, universidades; erguem-se grupos humanistas que vão so-
blicado, Assinatura anual :Cr$6.000,ob mando seus esforços e ideais num abraço interdisciplinar de culturas,
- cheq\lll em nome da Associaçâo
PALAS ATHENA do 8rasil; rua Leôn· religiões, filosofias, ciências e artes.
cio' de Carvalho, 99 - CEP 04003 - A intolerância de credos é uma sombra que empalidece conde-
Paraíso - São Paulo - SP. Telefone:
288.7356. A responsabilidade pelos ar- nada, como todo espectro, a fugir da luz. A hipocrisia dos muitos,
tigos assinados cabe aos autores. Matrí- usurpadora dos bons costumes, vai perdendo seus galantes e fiéis
cula n. 2046/Registro no DCDP do
Departarnento de Pol ícia Federei sob amigos ante a ascensão de uma liberdade ainda jovem, por isso mes-
n. 1586 P 209/73. mo, inquieta e revoltosa.
Não! Não estamos no melhor dos mundos. Mas é o único que
NOSSA CAPA: Árvore "sephirotal" temos, e se a nossa máxima for pensar em construir, sentir no cons-
dos cabalistas medievais, composta por
dez círculos ligados por vinte e dois truir, falar de construir, sonha; construindo, talvez não nos sobre
canais, relacionados estes às vinte e muito tempo para estarmos matutando sobre esse "último dia", pois
duas letras do alfabeto hebraico.
Segundo OS cabalistas, esta árvore é a ele terá fugido espantado ante tamanho poder de construção! E a
chave que guarda os mistérios da Vida despeito dos apocalípticos, ainda há tempo ...
e da Criação; também é chamada o
"caminho da Sabedoria". Desenho do
livro "Edipus Aegyptiacus" de Kircher. Lia Diskin

INDICE
Editorial 1 A Cor e sua Função Simbólica em algumas Culturas
Os Mensageiros do Destino Yolanda Lhullier dos Santos 23
Nissin Cohen 2 René Füllop Miller - Posição Filosófica
Respeito pelo Passado, Compromisso pelo Futuro Fé e Razão - Ivone Pletsch 29
Zildo Trajano de Lucena 7 O Universalismo em Ashoka
O Poder do Mantra na Meditaçio Liliana Garcia Daris 31
Swami Tilak 9 O homem e seus Símbolos Iniciáticos -
Atualidades 17 O Homem e o Tempo - Basflio Pawlowicz 36
À Guisa de uma Introdução ao Estudo da Kabbala Poesias de Amado Nervo 39
Ignácio da Silva Telles 19 Página dos Leitores 40

I
I THOT 1

l-------..;,,;;; -'--------"'rJ
Os Mensageiros
do Destino
Estes grisalhos cabelos em minha cabeça surgidos
São mensageiros-da-Morte a mim aparecidos.
(Mahâdeva Jâtaka N°. 9, i.73)

1- Introdução

Recentemente, quando atravessávamos de carro focalizada em objetivos intelectuais e culturais, que


a cidadezinha de Cunha, deparamos com uma figura passam a ser questionáveis a partir do momento em
extraordinária e das mais impressionantes de que te- que estes adquirem pretensamente a tônica de espú-
mos lembrança em nossa vida. Era um ancião, certa- rias atividades espirituais; de outro lado, existem os
mente um centenário; tinha um rosto descomunal- riscos inerentes às genuínas atividades espirituais •
mente alongado e deformado: a bochecha de uma que, se não vigiadas e controladas constantemente,
face estava repuxada e recobria parcialmente a ou- podem facilmente descarrilar (Veja sobre este assun-
tra, com o que o nariz comprido tinha estranha to a excelente análise do ex-Lama Chogyam Trung-
forma curvilínea; uma pequena fenda, deslocada do pa: "Spiritual Materialism", Shambhala Press).
centro, fazia a vez da boca; duas escuras órbitas en- Omisso quanto aos verdadeiros deveres que lhe
cravadas como que no centro de uma fronte altiva cabe cumprir tanto em relação a si quanto em rela-
que carecia de qualquer indício de sobrancelhas; es- ção aos outros, negligente umas vezes, indolente ou-
cassos cabelos esbranquecidos. Era de baixa estatu- tras, leva o homem uma existência à qual tenta im-
ra e magro; tinha uma das pernas pregadas à frente primir uma fingi da característica de eternidade. En-
da outra, o que fazia com que ele andasse devagar quanto tudo parece correr favoravelmente, o ho-
e penosamente. Era uma aparição inesquecível e to- mem fica insensível ao verdadeiro processo vital e
cante, que mexeu com todo o nosso ser: acabávamos inconsciente do papel que nele deveria desempe-
de avistar o primeiro mensageiro de Yama, o rei da nhar. Na sua cegueira não enxerga ou, quando vê,
Impermanência e Morte. não reconhece os avisos prévios que o "destino" lhe
Premido pelos instintos naturais, herança de sua antepõe para alertá-lo e prevení-Io. Quando, porém,
espécie; submetido a um contínuo processo de con- algo parece sair errado, ou a hora "fatal" parece es-
dicionamento, desde o berço, por seus semelhantes e tar próxima, o homem é tomado de pavor e, não
pelo ambiente circundante; obsecado por visões de- raro, entra em pânico. Nessa hora, para ele aterra-
turpadas do mundo e dos fenômenos, originárias de dora, ele lança às vezes mão de todo tipo de artifí-
fatores mentais insalutares e inábeis: age o homem cio tentando ludibriar o destino e compactuar com a
no sentido de adquirir para si condições mínimas de morte, no que, para sua desgraça, é auxiliado por al-
segurança consideradas por ele imprescindíveis à sua gumas religiões que lhe acenam com a possibilidade
sobrevivência. Paralelamente, impelido pelos seus de salvação à última hora, independentemente do
desejos insaciáveis, persegue ele, ansioso e angustia- tipo de vida que ele tenha levado anteriormente.
do, miríades de objetivos que lhe garantirão, assim Não obstante, a sabedoria popular, já de há muito,
ele acre dita, a tão almejada felicidade; e isto ele faz formulou a Verdade num adágio de alcance univer-
qual macaco a pular de galho em galho.à cata de fru- sal, pelo qual "de acordo com o que semeares, assim
tas que nunca o satisfazem. mesmo colherás". Esta maneira de encarar as ações
Ao contrário do que muitos poderiam pensar, e suas retribuições faz parte também do autêntico
todos os homens, em maior ou menor grau, estão ensinamento bíblíco, conforme se pode atestar em
afetos a tal fenômeno; tampouco deve-se pensar inúmeros trechos, tais como Jo 4-8, Pr 11-18, 2q Ep.
estar o homem inclinado apenas aos prazeres sen- Corintios 9-6, Ga 6-7, etc. Diz o texto budista
suais e materiais. Isto porque, de um lado, o homem "Dhammapada" que esteja o homem onde estiver,
é acossado também por desejos cuja satisfação está ele não escapará da morte; tampouco deixará ele de

2 THOT
colher os frutos das suas ações (carrna), seja nesta vi- genário, ou centenário, do tipo decrépito, arqueado
da, seja nas vindouras. qual empena de telhado, encurvado, apoiado num
Desde a antiguidade, este assunto cativou a ima- bastão, trêmulo enquanto anda, adoentado, de ju-
ginação dos sábios, escritores e outros. Historica- ventude passada, com dentes quebrados, de cabelos
mente, o primeiro a tratar do tema foi o Buda. Pre- grisalhos, ou cortados, ou calvo, de rosto enrugado e
tendemos, inicialmente, apresentar um dos seus dis- corpo coberto de nódoas?"
cursos (Sutra) a este respeito para, em seguida, men- E ele assim responde: "Eu vi, senhor".
cionar resumidamente alguns outros paralelos oci- Então, bikshus, o rei Yama destarte lhe diz:
dentais. "Oh, homem! A ti isto não ocorreu, como inteligen-
Encontramos no Cânone Pâli duas versões de te e de idade bastante madura que és: "Eu também
um mesmo discurso ou, o que é mais provável, dois estou deveras sujeito à velhice, não ultrapassei a ve-
discursos proferidos em diferentes ocasiões. A di- lhice. Ora vamos! que eu faça o bem no corpo, na
ferença entre os dois discursos decorre do número fala e na mente?"
de avisos prévios, isto é, dos mensageiros: num, es- Ele assim responde: "Não, senhor, eu não fui
tes são três e, no outro, são cinco. Os mensageiros capaz. Fui negligente, senhor."
aqui são claramente símbolos para diferentes situa- Então, bikshus, o rei Yama destarte lhe diz:
ções humanas, conforme veremos adiante. Será apre- "Oh, homem! Foi devido à negligência que tu não
sentada a versão mais curta que foi traduzida do tex- fizeste o bem em ação, palavra e pensamento. Eis
to original em Pâli publicado pela "Pali Text Socie- que, ó homem, conforme tenha sido tua negligência,
ty" de Londres. assim mesmo eles te farão. Ora, esta tua má ação
não foi cometida pela mãe, não foi cometida pelo
11. O Texto pai, não foi cometida pelo irmão, nem foi cometida
pela irmã, tampouco foi cometida pelos amigos e co-
OS MENSAGEIROS DE DEVA legas, não foi cometida por parentes ou compatrio-
(Devadüta-Vagga, Anguttara-Nikaya, i.138) tas, nem foi cometida por devas, tampouco foi co-
metida por ascetas ou brâmanes. Mas sim por ti só
1. Bikshus , 2 três são os mensageiros de deva. foi perpetrada esta má ação, e justamente tu hás de
Quais três? experimentar-lhe os frutos."
Aqui, bikshus, uma certa pessoa leva uma vi-
da de má conduta no corpo, leva uma vida de má 2. Então, bikshus, tendo o rei Yama o exami-
conduta na fala, leva uma vida de má conduta na nado, o perquirido e com ele entabulado conversa
mente. Tendo levado uma vida de má conduta em no tocante ao primeiro mensageiro de deva, exami-
ação, tendo levado uma vida de má conduta em pa- na-o, perquire-o e com ele entabula conversa no to-
lavra, tendo levado uma vida de má conduta em pen- cante ao segundo mensageiro de deva: "Eh, homem!
samento, com a desagregação do corpo após a mor- Tu não viste o segundo mensageiro de deva manifes-
te, ele surge no estado de perdição, na rota da misé- to entre os seres humanos?"
ria, na ruína, no Purgatório) Então, bikshus, os E ele assim responde: "Não o vi, senhor."
guardiões do Purgatório agarrando-o pelos braços de Então, Bikshus, o rei Yama destarte lhe diz:
todos os lados, apresentam-no ao rei Yama: "Oh, homem! Não viste tu entre os seres humanos
"Este homem, ó majestade, foi irreverente à uma mulher ou um homem, adoentado, aflito, gra-
mãe, irreverente ao pai, irreverente aos ascetas, irre- vemente enfermo, atolado nos seus próprios excre-
verente aos brâmanes, e não foi honrador dos digna- mentos e urina, e sendo levantado por uns e posto
tários do clã. Que sua majestade lhe inflija uma pu- na cama por outros?"
nição". E ele assim responde: "Eu vi, senhor."
Então, bikshus, o rei Yama examina-o, perqui-
Então, bikshus, o rei Yama destarte lhe diz:
re-o e com ele entabula conversa no tocante ao pri-
"Oh, homem! A ti isto não te ocorreu, como inte-
meiro mensageiro de deva: "Eh, homem! Tu não vis-
ligente e de idade bastante madura que és: "Eu tarn-
te o primeiro mensageiro de deva manifesto entre os
bém estou deveras sujeito à doença, não ultrapassei
seres humanos?"
a doença. Ora vamos! que eu faça o bem no corpo,
E ele assim responde: "Não o vi, senhor".
na fala e na mente?"
Então, bikshus, o rei Yama destarte lhe diz:
"Oh, homem! Não viste tu entre os seres humanos Ele assim responde: "Não, senhor, eu não fui
uma mulher ou um homem, octogenário, ou nona- capaz. Fui negligen te senhor".

THOT 3
Então, bikshus, o rei Yama destarte lhe diz: Então, bikshus, os guardiões do Purgatório in-
"Oh, homem! Foi devido à negligência que tu não fligem-lhe as punições (aqui são descritos seis tipos
fizeste o bem em ação, palavra e pensamento. Eis diferentes de castigos aos quais ele é submetido;
que, ó homem, conforme tenha sido tua negligên- após cada um deles repete-se o seguinte: lá ele expe-
cia, assim mesmo eles te farão. Ora, esta tua má rimenta sensações dolorosas, pungentes, violentas e
ação não foi cometida pela mãe, não foi cometida amargas, mas ele não finda seu tempo enquanto esta
pelo pai, não foi cometida pelo irmão nem foi co- má ação não é exaurida.)4
metida pela irmã, tampouco foi cometida pelos ami- Então, bikshus, os guardiões do Purgatório ati-
gos e colegas, não foi cometida por parentes ou ram-no ao Grande Purgatório.
compatriotas, nem foi cometida por devas, tampou-
co foi cometida por ascetas ou brâmanes, Mas sim
por ti só foi perpetrada esta má ação, e justamente
"Falta de aviso prévio
tu hás de experimentar-lhe os frutos.
não é escusa para o caso da Morte;
3. Então, bikshus, o rei Yama tendo-o examina- porquanto
do, o perquirido e com ele entabulado conversa, no cada momento da
tocante ao segundo mensageiro de deva, examina-o,
nossa vida é,
perquire-o e com ele entabula conversa no tocante
ao terceiro mensageiro de deva: "Eh, homem! Tu ou deveria ser, um
não viste o terceiro mensageiro de deva manifesto tempo de
entre os seres humanos?" preparação para
E ele assim responde: "Não o vi, senhor".
ela."
Então, bikshus, o rei Yama destarte lhe diz:
"Oh, homem! Não viste tu entre os seres humanos
uma mulher ou um homem, morto há um dia ou
morto há dois dias ou morto há três dias, intumesci- 5. Aconteceu, outrora, ó bikshus, e ao rei
do, com coloração azul-preta e apodrecido?" Yama ocorreu-lhe isto: ''Parece-me, meu caro, que
E ele assim responde: "Eu vi, senhor". aqueles que no mundo cometem más ações, esses
Então, bikshus, o rei Yama destarte lhe diz: são afetos às múltiplas retribuições do carma como
"Oh, homem! A ti isto não te ocorreu, como inteli- estas. Oh! Oxalá venha eu a adquirir existência hu-
gente e de idade bastante madura que és: "Eu tam- mana, e que um Tathagata S surja no mundo, um
bém estou deveras sujeito à morte, não ultrapassei a Consumado, perfeitamente iluminado, e que eu en-
morte. Ora vamos! que eu faça o bem no corpo, na tão possa me sentar junto dele, e que o Afortuna-
fala e na mente?" d06 venha a me ensinar o Darma 7, e que eu venha a
Ele assim responde: "Não, senhor, eu não fui entender o Darma do Afortunado!"
capaz. Fui negligente, senhor." Agora, bikshus, isto que eu assim relato, não o
Então, bikshus , o rei Yama destarte lhe diz: ouvi de qualquer outro asceta ou brâmane ; todavia,
"Oh, homem! Foi devido à negligência que tu não bikshus, aquilo que só por mim próprio foi conheci-
fizeste o bem em ação, palavra e pensamento. Eis do, por mim próprio foi visto, por mim próprio foi
que, 6 homem, conforme tenha sido tua negligência, descoberto, justamente isto eu declaro.
assim mesmo eles te farão. Ora, esta tua má ação
não foi cometida pela mãe, não foi cometida pelo 6. Prevenidos pelos mensageiros-de-deva, os que
pai, não foi cometida pelo irmão nem foi cometida são negligentes ainda jovens
pela irmã, tampouco foi cometida pelos amigos e co- Eles chegados à ignóbil condição humana,
legas, não foi cometida por parentes ou compatrio- por longo tempo se afligem.
tas, nem foi cometida por devas, tampouco foi co- Mas aqueles que aqui sendo retos, pelos men-
metida por ascetas ou brâmanes. Mas sim por ti só sageiros-de-deva
foi perpetrada esta má ação, e justamente tu hás de Prevenidos não são em qualquer tempo negli-
experimentar-lhe os frutos." gentes no Nobre Darma,
No apego ao medo vendo e a origem do nas-
4. Então, bikshus, o rei Yama tendo-o examina- cimento e morte,
do, perquirido e com ele travado conversa, queda-se Desapegados, eles libertam-se com a destrui-
em silêncio. ção do nascimento e morte.

4 THOT
Estes, tendo segurança obtido, felizes, neste que são justamente castigados ou deveriam tornar-se
mesmo mundo alcançado o nirvâna? melhores e disso tirar proveito, ou eles deveriam ser-
completo, vir de exemplo aos seus semelhantes para que pudes-
Transcendendo todo medo e ódio, sobrepu- sem ver o que eles sofrem e temerem e se tornarem
jaram todo sofrimento. 8 melhores. Os que melhoram são aqueles cujos peca-
dos são curáveis ; e eles são melhorados, assim como
Ill. Paralelos Ocidentais ocorre neste mundo tanto quanto no outro, pela
dor e sofrimento; porque não há outro caminho no
1. Aproximadamente um século após Buda, qual eles possam ser libertados da sua maldade. Os
Platão retoma este tema como desfecho do seu diá- casos que Sócrates cita como os piores exemplos
logo Gorgias. Depois de uma acirrada e, por vezes, para Plutão punir são os dos tiranos, potentados, ho-
áspera discussão acerca de retórica, política e políti- mens públicos, políticos, etc!
cos, O mal e o bem, a virtude e outros, Sócrates sen-
tencia dizendo que "Ir ao mundo de baixo tendo al- Convém transcrever suas últimas palavras: "Si-
guém sua alma cheia de injustiça é o último e o pior gam-me então; e eu vos conduzirei aonde sereis feli-
dos males." Então propõe ele contar uma estória e, zes em vida e após a morte ... E nunca se importem
embora seus interlocutores estivessem talvez dispos- se alguém vos desprezar como sendo tolos, e vos in-
tos a encará-Ia apenas como uma fábula, ele acredita sultar; deixem-no golpear-vos, e que sejais tomados
tratar-se de uma verdadeira estória porque, como de bom humor e ânimo ... porque vós nunca tereis
afirma, tencionava só falar a verdade (compare isto qualquer dano na prática da virtude, se fordes uma
com as palavras de Buda no fim do parágrafo 5 do pessoa realmente boa e autêntica. Quando tivermos
Sutra). praticado juntos a virtude, nós nos dedicaremos à
A estória que conta e que diz tê-Ia recebido do política, se isto parecer desejável, ou aconselhare-
poeta órfico Homero, é carregada de fortes matizes mos acerca de qualquer outra coisa que pareça boa
místicos. Zeus, Posêidon e Plutão teriam dividido o para nós, porque então seremos em melhor grau ca-
império herdado de seu pai. Existia outrora uma lei pazes para julgar. Na nossa atual condição não deve-
no tocante ao destino humano, que ainda persistia ríamos assumir ares, porque mesmo sobre os mais
nos Céus - de que aquele que tinha vivido toda a importantes assuntos nós estam os constantemente
sua vida em justiça e santidade iria, quando morto, mudando nosso pensamento; a tal ponto estúpidos
às ilhas Abençoadas, e lá viveria em perfeita felici- somos! Retomemos, portanto, o argumento como
dade e fora do alcance de qualquer mal; mas aqueles nosso guia, que nos revelou que o melhor caminho
que tinham vivido em injustiça e impiedade iriam à de vida é praticar a justiça e toda e qualquer virtude
casa da vigança e punição chamada Tartarus (esta em vida e morte ... " (Georgias, pp. 522-527).
sob o domínio de Plutão = Yama).
Inicialmente, o julgamento era feito no próprio
dia em que o homem estava destinado a morrer; os
juízes estavam vivos e os homens também, e a conse-
o
qüência era que os julgamentos não eram bem da-
"O Rabi Bunarn estava
dos. Então Plutão e as autoridades das Ilhas vieram
à presença de Zeus e informaram-no de que as almas
à morte,
estavam sendo encaminhadas aos lugares errados. e sua mulher desfazia em
Sócrates prossegue contando como e por que razões pranto. Disse-lhe
estavam ocorrendo injustiças nos julgamentos, como
então:
os poderosos e ricos escapavam da má sorte ajuda-
Por que choras?
dos por falsas testemunhas e outros fatores, e como
e por que os juízes falhavam nos seus vereditos. A minha vida inteira
Zeus, que já estava ciente de tudo, manda mudar os foi
regulamentos, passando os julgamentos para após
apenas para que
as mortes e em condições mais objetivas; ao mesmo
tempo, ordena a Prometeu retirar dos mortais o po- eu
der que até então tinham de ter conhecimento pré- aprendesse a morrer!"
vio da morte.
As punições, diz Sócrates, têm duplo efeito: os

THOT 5
I
2. E curioso notar o fato de o tema específico ca mais moderna, é o conto de NC?177 "Os Mensa-
de aviso prévio do destino ou "mensageiros" não geiros da Morte", da coleção completa de contos de
fazer parte da famosa coleção de Jâtakas, nem da autoria dos irmãos Grimm. Como que a contrabalan-
literatura árabe do tipo "Kalilah e Dimnah" que çar o tema sério e, para alguns, lúgubre, o conto está
serviu como um veículo eficaz por meio do qual recheado de momentos de humor e ironia. Narra a
muitas estórias folclóricas da antiga Ín'clia penetra- estória que uma vez, numa auto-estrada, a Morte de-
ram na Europa. Tampouco faz ele parte -da literatura safiou um gigante. Na longa e violenta luta que se se-
dos poetas fabulistas da Grécia e Roma. O'apareci- guiu, a mão do gigante ficou por cima deixando a
mento deste tema no Continente se deve, portanto, Morte estatelada à beira da estrada, alquebrada e fra-
ou a uma influência oriental processada por canais ca a ponto de não poder se levantar. Então, pensou
desconhecidos, ou a um surgimento original e es- ela amargamente com seus botões, o que aconteceria
pontâneo como muitas vezes sói acontecer na His- agora se ela permanecesse deitada assim a um canto;
tória. Seja como for, os irmãos Grimm diziam ter si- ninguém mais morreria agora no mundo, e neste as
do este tema conhecido desde, pelo menos, o Século pessoas proliferariam de tal maneira que não haveria
XIII. Este aparece em impressão, pelo que nos é da- mais lugar enm para uma pessoa ficar de pé ao lado
do saber, inicialmente em alguns fabulários em la- da outra. No entanto, pouco depois, um jovem ale-
tim, creditados a Esopo, e publicados no século XV- gre e saudável passa nas cercanias e lhe oferece so-
XVI. Num destes, organizado por Abstemius (Vene- corro. Uma vez recuperada, a Morte se identifica e
za, 1519), há uma fábula, a de número 149, denomi- embora sua lei fosse inexorável e ela não fizesse ne-
nada "De sene Mortem differe volente" (O Velho nhuma exceção, para mostrar sua gratidão promete
que desejava postergar a Morte), na qual se conta co- ao jovem que não lhe cairá em cima inesperadamen-
mo a Morte apresenta-se a um homem senil e convi- te, mas que lhe enviará seus mensageiros antes como
da-o a acompanhá-lo. Este se desculpa dizendo que aviso prévio. O jovem considera isto um ganho e lhe
o outro mundo era uma jornada grande demais para agradece, Então dedica-se ele a viver uma vida ale-
que pudesse empreendê-Ia apenas com base num gre, de prazeres e irresponsável. Mas juventude e saú-
aviso prévio tão curto e súbito, e solicitou mais tem- de não são para durar eternamente; cedo vieram as
po para terminar seus afazeres. Quando ele se sur- doenças e as tristezas, que o atormen taram de dia e
preende ao saber da Morte, de que já tinha recebido lhe retiraram a paz à noite, O consolo dele era que
inúmeros avisos, esta menciona-lhe as inúmeras mor- não morreria, já que os mensageiros da Morte ainda
tes processadas diariamente de todas as maneiras não tinham se manifestado. Assim que se sentiu me-
diante de seus olhos, em pessoas de todos os tipos, lhor de saúde, deu-se mais uma vez àquela vida ale-
idades e graus; e pergun ta se isto não é um memento gre e descompromissada. Então, um dia, alguém ba-
(motivo) suficiente para fazê-lo pensar da sua pró- teu de leve no seu ombro e, ao virar-se, achou-se
pria? A fábula termina com a moral; "Falta de aviso cara a cara com a própria Morte. Esta disse-lhe para
prévio não é escusa para o caso da Morte; porquan to seguí-lo, que a hora de sua partida deste mundo ha-
cada momento da nossa vida é, ou deveria ser, um via chegado. O diálogo que se segue é parecido às
tempo de preparação para ela". (Veja o episódio do outras estórias, com a Morte dando-lhe exemplos de
místico que encerra este artigo). mensageiros, a começar pelas suas próprias doenças
Estórias parecidas aparecem ainda em outros fa- e outros indícios, e terminando por perguntar se
bulários como a de número 484 organizado por além de tudo, o seu irmão Sono não lhe teria lem-
Joach. Camerarius (1564); a 99 em "Mythologia brado isto a cada noite? Se de noite ele não dormia
Aesopica" de Neveletus (1610); a 23 em "Fabulae qual morto? O homem teve então que ceder ao seu
Aesopiae" de F. J. Desbillons (1768), e muitas ou- destino e foi-se embora com a Morte.
tras publicadas em diversos países nas principais lín- Para remate deste artigo nada melhor do que
guas européias. Um fabulista moral como La Fon- recontar um episódio de' um místico judeu que
taine não iria deixar escapar este assunto; a sua fábu- ilustra bem qual é a atitude de um verdadeiro reli-
la "La Mort et le Mourant" (A Morte e o mortal), gioso face a este fenômeno natural.
NC?1 do Livro 8 da coleção completa, é semelhante "O Rabbi Bunam estava à morte, e sua mulher
à fábula acima. Este tema foi ainda assunto de ser- se desfazia em pranto. Disse-lhe então: Por que cho-
mões, discursos e artigos proferidos e escritos por ras? A minha vida inteira foi apenas para que eu '
religiosos, educadores e escritores ao longo dos sé- aprendesse a morrer!"
culos.
O último exemplo que mencionaremos, da épo- Nissin Cohen

6 THOT
NOTAS:

1. Literalmente "o radiante". Os devas, aos quais o Yama lorosa, não implica uma eterna danação. Tal forma dolo-
pertence também, são entes que habitam esferas sobre- rosa de existência é a conseqüência legal dos maus atose
humanas. Embora muitos os assemelhem aos "deuses" findará quando a força causal que a condiciona, é exau-
latinos e assim o traduzam, deve-se ter em mente que os rida. Então, as boas causas do passado poderão ter uma
devas estão sujeitos às mesmas leis da Natureza que os oportunidade de operar e condicionar um renascimento
homens: não têm ascendência sobre estes, não lhe são vi- mais feliz.
síveis geralmente e sua existência é efêmera, embora es- 5. Literalmente "o assim-ido ou vindo", um dos apelidos
ta se conte aos milhares de anos; estão, ademais, sujeitos de Buda.
ao renascimento. Muitos consideram que as aludidas es- 6. Outro apelido de Buda.
feras sobre-humanas são correspondências de estados 7. Darma tem muitas acepções. Aqui ele significa o Ensina-
psicológicos especiais. Sobre isto veja maiores detalhes mento, Doutrina, Lei. Tanto o Darma (pãli Dhamma)
nos artigos: "A Roda da Vida", Thot, Nq 23, p. 26, quanto deva e nirvâna são palavras que já constam dos
1981. dicionários brasileiros da língua portuguesa.
2. Monge-mendicante budista. 8. Estes versos são, por alguns estudiosos, considerados co-
3. Sobre o Purgatório (pãli nirayai, outra esfera de existên- mo um acréscimo feito por parte dos compiladores.
cia, veja o artigo aludido na nota 1 acima. 9. Libertação final, lluminação.
4. No Budismo, a vida numa tal esfera de existência tão do-

RESPEITO PELO PASSADO,


COMPROMISSO
·COM O FUTURO
Vive o homem, nestes últimos cem anos, mo- naturais, e percebeu a morte como absolutamente
mentos difíceis e conflitivos caracterizados pelos ineludível, e também se viu diante de imprevisíveis
sentimentos de angústia e solidão. Não nos referi- contingências na vida, sem que isso lhe provocasse
mos à angústia atribuída a tantas e tão variadas cau- a angústia tal qual a vemos hoje. Entretanto, o que
sas por filósofos e psicanalistas; tampouco à solidão nem sempre encontramos em outras épocas, e que é
de quem se sente só em meio a mais de quatro bi- característica do mundo de hoje, é a absoluta falta
-lhões de contemporâneos, aos quais não considera de sentido para a existência, a ausência de justifica-
como irmãos, e sim como inimigos, em surda luta ção para as dores e alegrias, os êxitos e fracassos, tão
pela sobrevivência. A angústia não é provocada ape- próprios da condição humana. E, na medida em que
nas pela falta de garantia de realização das possibili- não sabe por quê e para quê vive, o homem atual
dades que se apresentam ao homem, como queria também não sabe como viver; é incapaz de traçar
Kierkegaard; nem pela aceitação da morte como norrrias e linhas de conduta adequadas aos desígnios
possibilidade incondicionada e· insuperável, como de sua. natureza. E vive à deriva, errante, inquieto,
queria Heidegger; menos ainda pelo sentimento de sem uma escala de valores definida, e, por tudo isso,
impotência, aludido por Freud. Porque em outras é- angustiado.
pocas, em todas as épocas, o homem também se sen- Falamos também de solidão. Queríamos refe-
tiu impotente diante de certos fatos e de certas leis rir-nos à solidão de não sentir-se unido, intimarnen- .

THOT 7
te ligado ao homem do passado, que tão grande le- em débito para com os grandes homens e as grandes
gado nos deixou, e ao homem do futuro, que ainda civilizações do passado, acreditamos isentar-nos de
tem tanto por realizar. Pelo contrário, no século XX nossas responsabilidades para com os povos do futu-
sentimo-nos solitários em nosso presente, prisionei- ro. É como se não tivéssemos a obrigação de deixar
ros de escassos setenta anos de vida biológica; intuí- para as próximas gerações um mundo ecologica-
mos, de certa forma, um sentido de imortalidade, mente equilibrado, uma ciência voltada mais para a
mas sem dar-nos conta de que essa imortalidade con- construção do que para a destruição, uma educação
siste exatamente em nossos laços com o passado e voltada mais para o robustecimento moral e espiri-
com o futuro. Daí a importância de se estudar a his- tual do que para a formação de homens-máquina;
tória. Não apenas com o propósito de copiar os acer- enfim, é como se não tivéssemos a obrigação de dar
tos ou evitar os erros já cometidos, o que não deixa primazia às grandes realizações do espírito - a arte,
de ser muito; mas procurando encarar a história, na a filosofia, a religião, a política - em relação às ine-
expressão de César Cantu, como fonte máxima de gavelmente grandes conquistas materiais.
inspiração para as grandes conquistas morais, e de Ao homem do século XX está fazendo falta
satisfação às necessidades do verdadeiro, do bom e um sério e criterioso estudo da história; está fazendo
do belo, inerentes ao ser humano. falta um posicionamento verdadeiramente filosófico
No entanto, no que respeita à história, é carac- diante da história, para que lhe possa surgir no peito
terístico das épocas decadentes - e, sem dúvida, vi- o reconfortante sentimento da filantropia - palavra
vemos numa época decadente - o assumir-se uma tão pouco utilizada ultimamente, ou utilizada ape-
entre essas duas posturas, ou ambas: I a ) enfatizar os nas em seu sentido patemalista, relacionado à cons-
9.gpêCtOg mesquinhos ê mórbidos dentro da história, trução de asilos para anciãos ou creches para crian-
como forma inconsciente de justificar a própria mes- ças abandonadas. Não queremos dizer que isto não
quinhez e morbidade; 2'-') esquecer, diminuir, ou di- seja necessário; pelo contrário, é uma das formas
retamente renegar os laços com o passado, como mais efetivas de liberar-nos do egoísmo, para que
forma inconsciente de liberar-se de todo com- nos surja, em seu lugar, a generosidade, nobre senti-
promisso para com o futuro. No primeiro caso, mento que é apanágio dos jovens e dos fortes. Mas é
menosprezamos a tremenda força de compulsão que aludimos à filantropía em seu sentido mais am-
ética e mística de Jesus Cristo ou de Santa Teresa plo, de amor ao Homem, com maiúscula, o homem
d' Ávila, para enfatizarmos a pretensa "frustração imortal. E verdadeiro filantropo é aquele que traba-
sexual" de Santa Teresa ou os "amores secretos" lha, com todas as suas forças, em prol desse Homem;
do Cristo (amores físicos, obviamente, já que o é o que envida todos os esforços para transformar-se
nosso barbarismo não nos permite conceber outra nesse Homem. Para isso, é mister que vejamos na
coisa); deixamos de lado a sublimidade da grande história não apenas uma sucessão cronológica de
pirâmide egípcia ou a grandeza do Império Roma- fatos e personagens, mas antes o desenrolar de um
no, e voltamos nossas vistas para os escravos que fio de experiências do qual fizemos, fazemos e fare-
construíram uma e sustentaram o outro (sic). mos parte irremediavelmente, e através do qual se
vai manifestando a força, a vontade, a lei de uma
Com isso, sentimo-nos em paz perante nossa cons- potência suprema que, em última instância, reside
ciência, não obstante a inacreditável decadência no interior do próprio ser humano.
moral de que somos co-autores e o inaceitável es- Essa atitude de integrar-se ao vasto panorama
cravagismo reinante em ambos os blocos político- da história ralvez permitisse ao homem de hoje liber-
econômicos que polarizam a sociedade atual. Agi- tar-se de sua angústia e solidão. Como poderia sen-
ganta-se ainda, em nossas mentes, uma tendência à tir-se solitário quem se sentisse arraigadamente uni-
análise crítica do conhecimento histórico, insuflan- do ao homens de todos os tempos, do passado e do
do-nos de dúvidas acerca da veracidade de alguns fa- futuro? Como poderia sentir-se angustiado quem re-
tos ou da exatidão de alguns outros; e, no entanto, conhecesse, humildemente, que as suas pequenas
não percebemos a síntese laboriosa de experiências dores e alegrias, seus pequenos êxitos e fracassos
que se expressam nesses mesmos fatos independen- são uma fração, ínfima mas necessária, de uma gran-
temente de sua maior ou menor exatidão, capazes de obra? Enquanto não nos dispomos a participar,
de nos impelir às grandes realizações e à busca dos conscientemente, na realização dessa grande obra,
mais altos e nobres valores estéticos, éticos e mís- que linda oportunidade estamos desperdiçandol
ticos.
No segundo caso, deixando de reconhecer-nos Zildo Trajano de Lucena

8 THOT
O PODER
DOMANTRA lIIft#

NA MEDITAÇAO
Palestra proferida pelo Swami Tilak em 11-07-83 no
auditório da Associação Palas Athena.

Respeitáveis mães e irmãos, me sinto muito estruturas, nada mais. A civilização verdadeira, a cul-
emocionado pela presença de vocês esta noite, para tura verdadeira não está na estrutura.
pensar nas coisas espirituais. Não sei se felizmen te Em certa universidade da India, eu disse aos
ou infelizmente, não temos lugares bastantes para estudantes: "Por favor, não confundam sua existên-
acomodar a todos, mas se falta o lugar físico, nós cia com seu modo de vestir-se, com a aparência, por-
temos que mostrar o lugar em nosso coração. E es- que a cultura e a civilização não são o modo de tra-
tou seguro de que, neste momento, nenhum dos jar-se. Se a vestimenta fosse civilização, nós podería-
presentes está preocupado com o lugar, e sim es- mos "civilizar" qualquer animal em um instante, po-
tão todos demonstrando um amor verdadeiro para deríamos vestir um burro com as vestimentas mais
com a espiritualidade. Exista ou não o lugar físico, maravilhosas e dizer-lhe: Sim, senhor, você é muito
uma pessoa sempre consegue lugar no coração e po- civilizado! "
de oferecer também um lugar para os outros em seu Na época em que vivemos ignora-se esta verda-
coração. Porque o coração é infinito, pode conter ~ de. Sempre confundimos o propósito da civilização
todos. Então, abramos agora o nosso coração e tra- com a aparência exterior. Existem também os que
temos de buscar a realidade, a verdade, pelo conhe- dão importância somente às palavras, aos pensamen-
cimento, pela realização. tos, nada mais.
Há três tipos de sociedade no mundo. Primei- Neste momento, estamos buscando o tantra,
ro, um tipo de sociedade que dá muita importância que significa "constituição". Por exemplo, aqui há
à estrutura. Em sânscrito, que é o idioma sagrado da um gravador; o gravador tem a matéria, a forma e a
India, a palavra que designa "estrutura" é yantra; estrutura. Mas existe a constituição, as leis da ciên-
quando nós damos muita importância à estrutura, cia que formatn toda a constituição interna. Então,
estamos pensando no yantra. Depois, há sociedades não é somente a matéria ou a forma que se chama
que são tantra prahat. Tantra significa "constitui- "gravador". Este gravador tem uma constituição in-
ção" e a constituição é diferente da estrutura, po- terna, a qual depende de leis eternas.
demos dizer que é a mente da estrutura. Por fim, a Quando a estrutura não está ligada à constitui-
sociedade mantra prahat, isto é, a sociedade que dá ção interna não tem nenhum valor. Do mesmo mo-
mais importância ao mantra. Mantra significa "de- do, quando a aparência de uma cultura não está rela-
terminação", sankalpa. Então, o centro de qualquer cionada com os pensamentos internos, essa cultura
constituição é a determinação. Já no princípio nós não tem nenhum valor. Quando existe uma separa-
determinamos o fim, o objetivo. ós temos, neste ção entre a aparência exterior e o pensamento inter-
momento, um sentido muito profundo de que esta- no, imediatamente essa civilização começa a des-
mos construindo algo. Então esta determinação, truir-se. Vocês sabem que se manifestou na Roma
em sânscrito, se denomina sankalpa. A estrutura po- antiga esse mesmo problema: os romanos deram
de ser destruída, a constituição pode ser perturbada, muita importância às coisas exteriores e se esquece-
mas a determinação continua. Então, a estrutura so- ram das coisas essenciais. A partir daí a civilização
cial, a estrutura individual que se forma pelas manei- romana desintegrou-se completamente.
ras, pelos modos de vestir-se (porque, às vezes, ao Fazendo uma alegoria,.podemos dizer que a
dizer: "Esta pessoa é civilizada", queremos significar estrutura, ou yantra, é como a casca, a constituição
que esta pessoa pede vestir-se, pode comer, tem mo- é como a polpa, e o mantra, a determinação, é como
dos de comer, vestir e falar), tudo isto são somente a semente. Quando a semente não está adequada-

mOT 9
livre, pode fazer qualquer coisa. Pode correr aonde
quiser!" Como um átomo, que tem liberdade de
misturar-se neste ou naquele lugar, andar por este ou
por aquele lugar, porque o átomo está seguro de sua
existência. O átomo aparentemente é muito liberal,
mas internamente é muito firme.
A atitude liberal é sempre expressão de firme-
za interna, somente quem não se sente firme é que
se faz fanático. Os que estão seguros de si não têm
medo. Por isso, no Veda, que é a escritura mais sa-
grada da India, há um hino que diz que não devemos
ter medo do conhecido, tampouco do desconhecido'
nem dos amigos, nem dos inimigos. Então, aquele
que pratica mantra e realiza mantra se livra de todo
medo. O mantra é explicado como uma coisa que
nos libera de todos os problemas, porque está for-
mando o núcleo de nossa personalidade de tal ma-
neira que ela não pode pertubar-se ou destruir-se em
nenhum momento.
mente protegida, a fruta tende a destruir-se' assim I
Agora vou mostrar o porquê ou o como (em
todos os aspectos evidentes): a princípio nós temos
ocorre também numa sociedade, bem como em re-
lação ao indivíduo. Cada indivíduo tem sua "casca" , de compreender que todo o universo é somente vi-
sa"l"
u po pa e sua " semente " - sua determinação. bração, vibração, nada mais ... Os físicos já sabem
Na realidade, os pensadores hindus chegaram a que o elétron, próton e o nêutron representam ape-
essa conclusão há milhares de anos, dando origem à nas estados diferentes de vibração. Quando percebe-
ciência do mantra, para formar toda a personalida- mos as vibrações através dos olhos, neste momento a
de. Eles não se preocuparam tanto com a aparência vibração é luz; quando percebemos as mesmas vibra-
exterior, tarnpouco com os pensamentos; concen- ções através dos ouvidos, aqui temos o som. O som e
traram-se no sankalpa. Cada pessoa tem de formar a a luz não são duas coisas, são somente duas formas
sua determinação. Embora integrando a sociedade, de percepção de uma mesma coisa. Ao vermos e ou-
está sempre estabeleci da em sua semente, fixada em virmos, na realidade estamos fazendo a mesma coisa.
si mesma como um átomo. O átomo se junta a outro Todos os sentidos indiretamente experimentam' a
e forma moléculas, mas sempre mantém sua especi- mesma coisa em níveis diversos, nada mais. Quando
ficidade (individualidade). O átomo não pode des- estamos seguros desta verdade, nos damos conta de
truir-se; nós podemos formar um composto, outro que todos os sentidos estão percebendo a mesma
composto, podemos misturar compostos, mas cada coisa, em todas as percepções existe a mesma verda-
átomo permanece o mesmo. Nós podemos queimar de. E por meio de qualquer dos sentidos vamos che-
uma mesa, mas os átomos que a compõem não se gar ao mesmo ponto. Até a mente, que é a soberana
destrõem; podemos dissolver um pedaço de gelo e dos sentidos, está baseada nas vibrações.
Qual é a diferença entre meu amigo Krishna e
convertê-lo em água, mas os átomos de hidrogênio e
eu, entre Cristo e eu? E qual é a diferença entre um
oxigênio mantêm sua natureza. Ou seja, a mudança
externa não afeta o átomo. Assim os grandes pensa- homem e um animal? Somente a diferença de vibra-
dores hinduístas conceberam a "semente" da pes- ção, nada mais. A base é a mesma, a verdade é a
soa. mesma, as vibrações é que são diferentes.
Podemos dizer que cada pessoa tem seu átomo
Às vezes me perguntam: "Ó Swami, tantas cul- de personalidade interna, que se chama ego - em
turas e civilizações antigas se destruíram, por que se sânscrito, ahamkara. Esse átomo se forma a partir
mantêm a cultura e a civilização hindus? Qual é o se- de três atributos, três qualidades, ou, em sânscrito,
gredo?" A resposta é que os pensadores hinduístas três gunas. Guna significa "qualidades" que não ve-
não se preocuparam com a casca ou com a polpa mos em uma pessoa. Na realidade, o que vemos? Al-
tanto quanto com a semente. E depois de formar a guém pode dizer que uma mesa, ou qualquer coisa
semente, depois de criar o mantra, tantra e yantra, sólida, é uma coisa dura; na realidade, não podemos
eles deram toda a liberdade ao homem: "Você está separar a qualidade "dura" da mesa. Podemos dizer

10 THOT
de tranqüilizar-se", isto significa: "Amigo meu, você
não tem que sentar-se, tem que tranqüilizar-se".
Tranqüilidade é uma coisa, inatividade é outra. Ina-
tividade é a morte, e tranqüilidade é o autocontrole.
Quem quiser pode ter Aquele que tem controle não está morto, e aquele
o seu comércio em qualquer ramo, que está morto não é tranqüilo.
mas, não no
Então temos de buscar a fonte da tranqüilida-
campo espiritual.
de. E o mantra está levando-nos a esse ponto, mais e
A espiritualidade não tem mais perto da tranqüilidade. Em cada pessoa atuam
nada as três gunas - satwa, rajas e tamas - e nenhuma
a ver com o dinheiro, é algo muito pessoa pode ignorá-Ias, porque não existe nenhuma
personalidade sem essas três gunas. Como se cria a
diferente. Quando se
diferença de personalidade entre duas pessoas? So-
quer dormir, mente a diferença de combinação e permutação des-
não se compra o sono com ses três atributos é que cria as diferenças das perso-
dólares. nalidades. Por exemplo: entre um átomo de oxigê-
nio e outro de hidrogênio, qual é a diferença? So-
mente o número de prótons e elétrons., nada mais.
A natureza do elétron e do próton é a mesma, mas
o número cria a diferença. Então temos de aprender
que esta mesa é amarela, mas não podemos separar- um pouco de numerologia ... Pitágoras dizia que
lhe a qualidade "amarela". Então, todas as qualida- tudo era número, então vocês podem ver, é preciso
des que existem são somente vibrações, milhares de pensar nos números. Que é o átomo? Tão-somente
vibrações. Provavelmente os estudantes de Física po- o número de elétrons, prótons e nêutrons. Que é
dem compreender melhor, pois agora a Física afirma uma pintura? Somente a mistura das cores básicas,
que não existe nenhuma cor, somente diferenças nas que são três: amarelo, vermelho e azul. A combina-
freqüência das vibrações. Não tenho de explicar ção e permutação das três cores produzem efeitos
muito porque vocês devem estudar Física; não sou de milhões de cores. Uma cor tem um pouco de
eu um físico, tenho muito pouco conhecimento, so- amarelo mais que a outra, um átomo tem um pouco
mente estou indicando que na realidade não existe mais de elétrons que o outro, e imediatamente a
nenhuma cor, apenas nossa Iimitação e nossa capa- "personalidade" de um elemento difere da de outro
cidade de perceber que é a velocidade ou a freqüên- pelo número ~e partículas no átomo. Assim tam-
cia da vibração que cria o sentido da cor. Então, to- bém, um pouco de tranqüilidade no "núcleo" da
das as coisas são vibrações, as experiências são tam- pessoa lhe muda a personalidade imediatamente.
bém vibrações, nada mais. Amigos meus, é uma coisa maravilhosa: quan-
Que é vibração? É somente uma onda: no pon- do uma pessoa pratica o mantra ou medita profun-
to mais inferior nós sentimos um tipo de qualidade; damente, não somente sua mente está mudando,
sentimos outra no ponto de inflexão; e ainda outra mas até o corpo muda. Vocês podem observar uma
no ponto mais superior. Então, as qualidades não pessoa antes e depois de meditar e vão encontrar
existem na matéria, existem apenas em função da uma grande diferença. Porque a tranqüilidade inter-
amplitude da vibração. Em sânscrito, satwa signifi- na afeta os pensamentos, e estes afetam toda a estru-
ca "tranqüilidade", o momento em que a atividade tura física. Quando praticamos um mantra, pode-se
está para começar mas ainda não começa; tem a po- pensar que estamos perdendo tempo; não, nós esta-
tência, mas não tem manifestação ainda. Quando mos nos reformando. Por isso dizemos que cada pes-
a atividade se faz presente, temos então rajas. A soa tem de escolher seu mantra, ou seu guru tem de
ausência de atividade é designada tamas. Tranqüili- escolher-lhe um mantra particular. Não estou dizen-
dade, atividade, inatividade. do que o guru é uma pessoa extraordinária; mas,
Por favor, tratem de não confundir traqüilida- como um médico diagnostica o problema de um
de com inatividade, que é o problema mais grave do paciente e trata de escolher um medicamento para
mundo ocidental. Quando uma pessoa pergunta: "O esse enfermo, assim o guru pode ajudar. Mas o guru
que eu tenho de fazer?", e eu respondo: "Você tem não pode praticar no lugar do discípulo.

THOT 11
A gente quer, agente busca um caminho mais mas somente enquanto não estejamos preparados.
fácil, mais rápido. "Swarni, não pode mostrar-me Por exemplo: temos um receptor de rádio - enquan-
um mantra mais rápido?". Amigos meus, não existe to não sintonizamos uma estação particular, ela é
rápido. Não temos "mantra expresso". É ·tudo uma uma coisa secreta; mas quando o aparelho está sin-
questão de trabalho, de esforço, e esforço depende tonizado adequadamente, o que nos parecia secreto
de dedicação. Não podemos dizer que o mantra que se manifesta automaticamente, se faz saber. Então,
uma pessoa compra por cem dólares é mais efetivo quando se diz que um mantra é para uma pessoa em
que outro de cinqüenta, porque os mantras não se particular, as pessoas acreditam que os gurus têm
vendem e não se compram - nesse sentido o mantra um grande poder; na verdade, o que tem de haver é
é sagrado! E aqueles que compram e vendem man- a capacidade ou não de captar. Cada um tem de pre-
tras não sabem nada sobre o seu significado e não parar-se ...
têm nenhuma relação com a espiritualidade - são Eu sempre tenho problemas neste sentido.
apenas comerciantes. Minhas palavras podem ser du- Certa vez, estando em Sidney, na Austrália, assistin-
ras, mas é que não quero confundir as pessoas. do a uma Convenção de Voga, uma "mãe" aproxi-
Quem quiser pode ter o seu comércio em qualquer mou-se e disse:
ramo, mas, por favor, não no campo espiritual. A - Swarni, eu quero um mantra.
espiritualidade é a espiritualidade, não tem nada que - "Mãe", eu não dou. Por que você está preo-
ver com o dinheiro, é algo muito diferente. Quando cupada?
se quer dormir, não se compra o sono com dólares. - Ah, eu quero, você tem de me dar. •
"Eu quero dormir profundamente; então, por favor, O problema é que muitas pessoas estavam
tome cem dólares para que eu durma". Não pode, dando mantras a troco de dinheiro; e ela pensou que
o mantra do Swarni, já que eu não cobrava, era me-
lhor. Eu repeti:
- "Mãe", eu não lhe dou; por que você conti-
nua insistindo?
Há um livro de ficção
Então, um pouco frustrada, ela me disse: Ó
em que diz que no Tibet existem Swami, agora eu sei: seu guru não lhe permitiu por-
cirurgiões que você não está preparado ...
Eu lhe respondi: Obrigado, "mãe", sem dúvida
que podem operar o
eu não estou preparado, não estou preparado ...
terceiro olho, e imediatamente "o homem
Estou somente afirmando que as coisas sagra-
está realizado" ... das são sagradas, não são nada de secreto, apenas
Se a realização fosse tão não estamos preparados. Aquele que está querendo
barata, comprar um mantra não está preparado; quem pen-
sa que é bastante pagar algum dinheiro para obter
Cristo não teria tido a necessidade
um mantra, e depois vai liberar-se num momento ...
de fazer nenhuma está enganado! É necessário trabalhar, é necessário
prática, praticar.
bem como o Senhor Buda. As pessoas dizem: ''No Tibet existe uma ope-
ração para "abrir o terceiro olho". Porque elas espe-
ram que outros lhes abram o terceiro olho. Mas o
certo é que elas terão de praticar muito, de dedicar-
este é o problema; dólares não entram no sono. As- se totalmente, porque o terceiro olho não é um
sim, em Deus e na alma não entra o dinheiro. Por is- olho físico que se pode abrir ou fechar. Ele significa
so os grandes sábios da India nunca davam mantras. que a nossa consciência se liberou da dualidade, por-
Apenas diziam: "Você tem que preparar-se. Você que nós temos nesse momento o conceito da duali-
pode ser rei ou qualquer outra pessoa, não importa, dade. Temos dois olhos e cada olho trata de ver as
porque não está ainda preparado. A preparação in- coisas de diferentes maneiras. Por isso existe a duali-
terna para o mantra é mais necessária que o dinhei- dade, e quando nos concentramos, pouco a pouco, e
ro e as coisas" . a vista que vê a dualidade começa a ver a não-duali-
Neste sentido, o mantra é sagrado, não é segre- dade, nesse momento nós dizemos que o terceiro
do. Algumas pessoas dizem que o mantra é secreto, olho está aberto. Não é nenhuma coisa física. A dua-

12 THOT
lidade tem que desaparecer completamente, antes de
se abrir o terceiro olho. Mas as pessoas não querem
tentar porque isso requer muito trabalho, elas têm
que meditar, têm que conquistar os sentidos, e têm
que desapegar-se de tudo; e disso as pessoas não gos-
tam. Quando nós temos interesse
Alguém escreveu um livro de ficção em que verdadeiro e praticamos apropriadamente,
afirma que no Tibet existem cirurgiões que podem o êxito é definitivo.
operar o terceiro olho, e imediatamente "o homem
Por isso, a princípio nós temos
está realizado" ... Se a realização fosse tão barata,
Cristo não teria tido a necessidade de fazer nenhuma que lutar, para depois
prática, bem como o Senhor Buda. Somente teriam desfrutar.
que ter ido ao Tibet e operar seu terceiro olho ... Sem luta não há nenhum
Há um ditado: "Ninguém pode entrar no pa-
desfrute no mundo.
raíso sem morrer".
Nós temos que morrer, não vai outra pessoa
morrer por nós para fazer-nos entrar no paraíso!
Assim, aqueles que querem entrar no campo espiri-
tual têm que praticar, não existe nenhuma solução
muito barata ou muito simples: te. uma anedota sobre os devotos que nada compre-
Os caminhos são muitos e o fim é o mesmo. E endem do mantra . Certo dia, em visita ao instituto
em qualquer caminho existem .os mesmos proble- de um amigo. estavam tocando um disco e escutan-
mas; os mesmos problemas e o mesmo trabalho. Di- do com grande atenção. Eu perguntei: - "Que estão
zem: "A devoção é fácil". Como é fácil"! Só quem fazendo?'
não sabe nada sobre a devoção é que acredita que a - 6 Swami. há uma música tão maravilhosa!
devoção é muito fácil! ibrações maravilhosas!
- Mas é que eu sou Karma Yogue . ovamente, eu perguntei: Vocês sabem o que
- Você, que faz? Que sabe do Karma Yoga') é "esta música?
Porque você tem apego às suas coisas, à sua ação. vo- ão. não. só que é maravilhosa.
cê pensa que Karma Yoga é muito fácil e que é só Amigos meus. é uma canção de cinema!
continuar a fazer o que se está fazendo!
Que significa Karma Yoga? Não existe Karma Por isso, captar as vibrações sem sen tir o seu-
na ação! Existe na atitude acerca do Karma! Quan- tido forma o corpo do mantra. Por isso. ouça mais
do eu não quero ter nenhum fruto da minha ação, vezes; é bom não se preocupar, no princípio, com o
neste momento eu sou Karma Yogue . Mas quantas sentido do mantra, Repita, repita, repita. Repetiu-
pessoas têm esta atitude? Não têm, amigos meus' do, repetindo, e repetindo, formam-se os canais ela
Então, qualquer tipo de Yoga é muito difícil, muito men te. e produz-se mesmo um gosto por esta vibra-
difícil! O homem tem que mudar sua atitude perfei- ção. Então, quando uma pessoa está cantando cons-
tamente. Por isso eu disse que quando praticamos o tantemente OM TAT SAT, OM. OM,OM. não com-
mantra, imediatamente se reforma nossa personali- preende nada sobre o que é este OM. mas nesse mo-
dade. Por isso qualquer livro, qualquer escrito espi- mento se cria o gosto. Como eu disse sobre a canção
ritual, diz que o mantra reforma a personalidade da da anedota, sem compreender eles gostavam; quan-
pessoa. E, como já disse, não só a mente muda, mas to a este mantra, a situação é a me.sma.
até a existência física se transforma. E quando o guru , o mestre, vê que seus discí-
Por isso nós temos o mantra; cada mantra tem pulos agora sentem um gosto, uma inclinação pelo
o seu corpo, sua mente, sua alma. Por exemplo, há mantra, nesse momento diz: "6., filho meu, o senti-
um mantra: OM TAT SAT. Então, as palavras por si do do mantra é: ... " Então, quando se ensina o
mesmas têm uma vibração; definitivamente, têm! sentido, imediatamente o sentido fica ligado ao
OM TAT SAT significa: "Aquele é a verdade". Mui- mantra. E, às vezes, as pesso-as querem o sentido.
to bem! E quando alguém não compreende nada do mas não se lhes pode dar.
mantra, não compreende nenhum sentido, nesse mo- Por exemplo, eu dou um mantra e a pessoa
mento também está criando vibrações ... trata de investigar se eu dei ou não esse mantra a ou-
Há uma história muito engraçada, um inciden- tra pessoa. E quando chega a saber que outra pessoa

THOT 13
também tem esse mantra fica muito desiludida: tar, durante várias noites, estou seguro de que voce
"Óh, eu pensava que o meu mantra era especial " não vai dormir ... Não vai dormir porque nesse mo-
Porque cada pessoa está buscando um privilégio . mento tem interesse. Você ainda não tem interesse
Se outra pessoa tem ou não tem, isso não importa. em meditar, seu interesse está em outro lugar. Por
O importante é que é o seu mantra e você tem que isso nós temos que criar o interesse verdadeiro.
praticá-lo. Não importa que outras pessoas também Quando nós temos interesse verdadeiro e praticamos
estejam respirando o mesmo ar; o mais importante é apropriadamente, o êxito é defmitivo. Por isso, a
que você o está respirando! Nesse sentido, é certo princípio nós temos que lutar, para depois desfrutar.
que o mantra é quase como o ar. Às vezes se pensa Sem luta não há nenhum desfrute no mundo.
que, em virtude de cada pessoa ter seu mantra, en- A princípio, em qualquer campo, nós temos
tão cada uma delas deve ter um mantra particular. dificuldades. Por exemplo: uma pessoa quer fazer-
Isso não tem sentido! O sentido é que cada pessoa se músico. Muito bem! Mas quando começa a prati-
respire, segundo sua necessidade, do mesmo ar; as- car tem problemas, certamente! Para fazer-se um
sim, um discípulo, um praticante, um aspirante, tem músico verdadeiro, o homem tem que trabalhar. Es-
que assimilar o mantra em sua personalidade, tem cutar música é uma coisa e fazer-se músico é outra.
Qualquer pessoa pode comprar um bilhete para um
que ligar as vibrações de seu mantra com a vibração
concerto e pode gozar a música, a canção de um mú-
interna. Nesse momento, a personalidade da pessoa
sico, mas nesse momento não sabe que para cantar
começa a se formar segundo o mantra.
tão bem, tão maravilhosamente, o músico teve que
Eu estava dizendo que nós temos de repetir, dedicar toda a vida; esteve lutando, lutando, traba-
compreender, e depois temos de formar a consciên- lhando, praticando ...
cia sem esforço. Isso é a alma do mantra. Quando Uma pessoa está dando uma conferência. Al-
nossa consciência não necessita de nenhuma repeti- guém pode pensar: "Ah, isto é muito fácil ... " Pare-
ção, simplesmente está repleta do sentido, como ce fácil, mas para criar idéias uma pessoa tem que
uma mãe que se lembra do filho sem fazer nenhum praticar toda a vida, toda a vida ... É o resultado da
esforço; como um noivo se lembra de sua noiva sem prática de toda uma vida que faz uma pessoa perfei-
nenhum esforço. Assim, quando um praticante do ta; de outra maneira não é possível.
mantra se lembra do sentido do mantra sem fazer Dizem que havia um nobre na França, que ti-
nenhum esforço, nesse momento não tem que se nha uma espada com um pequeno problema; neces-
sentar nem ficar a repetir o mantra. Tampouco tem sitava ser endireitada. Então, buscou uma pessoa
que tentar permanecer todo o tempo em meditação, que pudesse fazer isto.
porque a consciência está formada, e a consciência - Eu posso fazer o conserto, mas neste caso
formada, na realidade, forma toda a personalidade, e você tem que pagar cinco mil francos.
o homem não pode agir neste momento contra o es- - Muito bem, concordou o nobre, pois para
pírito do mantra. Não pode, não pode ... h tanta a ele a espada era uma coisa muito valiosa.
profundidade, que necessitamos de muito tempo,. Então, o perito pôs a espada sobre a cabeça e
pois não é resposta de um dia ou outro. Necessita- imediatamente a endireitou. E o nobre disse:
mos de muito tempo! - Ora, para tão pouco trabalho eu tenho que
Se me argumentam: "Não, Swami, eu não te- pagar tanto? Como?! Você apenas fez um leve movi-
nho tempo!" respondo que cada um tem de buscar men to e nada mais ...
tempo, porque não está fazendo um favor para Deus Ao que foi respondido:
ou para o Swami, ou para outro: é sua necessidade! - . Muito bem, você não quer? Então, enquan-
E quando sente necessidade tem que satisfazê-Ia. to entortava a espada, completou: - Pois bem, leve-
Não é possível dizer não, que deve despreocupar-se. a.
- Então o nobre imaginou que ele seria suficien-
Tem que buscar! Você busca ou não busca uma hora
para comer? Busca ou não busca tempo para dor- temente hábil e que poderia endireitá-Ia. Em casa,
mir? pôs a espada sobre a cabeça e tentou endireitá-Ia, e,
imediatamente, teve um problema: perdeu o seu na-
- "Mas, Swami, quando medito eu começo a riz!
dormir ... " h a diferença entre um perito e uma pessoa
- Então precisa ir ao médico, eu digo. Se eu comum. Por isso, nós temos que praticar, praticar,
puser um montão de dinheiro, de notas, e disser que praticar para chegar à perfeição. A perfeição que es-
você irá conseguir tantas notas quantas puder con- tá em DÓS mesmos, devemos manifestá-Ia pela práti-

14 THOT
ca. Isto é muito necessário. Por isso nós temos que "má". Então, A - V - MÁ. E quando se pronun-
repetir o mantra mais e mais; e mais e mais temos cia "AV", imediatamente se cria o ditongo de "O".
que fazê-lo; mil vezes, cem mil vezes! Temos que "A" representa a criação; "V" representa a conti-
criar condições. E, ao fim, o mantra significa a mes- nuação, e ''MÁ'' representa a dissolução. Todo o
ma coisa; nada mais que a realização do ser. universo está seguindo o mesmo processo, como ex-

o OM é o melhor mantra do universo, e não pliquei, no sentido de uma onda.


existe outro igual. E muita gente diz que este man-
tra é danoso, pois há muitas escolas que acreditam Qualquer vibração, qualquer personalidade,
que este mantra é prejudicial. Mas não é. O que qualquer criação ou coisa criada está seguindo o
acontece é que há pessoas que não querem desape- mesmo processo:
gar-se completamente, e então têm problemas com
o OM. Porque a tendência do OM é criar o desapego I
I
perfeito. Por isso, quando um jovem quer se fazer , I

,,
I

um renunciante, um santo, quem primeiro tem pro- A


blemas com ele são seus pais ... porque nós quere- A MÁ
mos adorar aos santos, mas fora de casa, não em O "MÁ" imediatamente se transforma outra
nossa casa. vez no "A". Não há nenhuma diferença entre "MÁ"
Então, OM nada tem para se tomar prejudi- e "A". "A" é o nascimento, o "V" é a vida e "MÁ"
cial. Vou explicá-lo antes de terminar esta conferên- é a morte; e o que é a morte é o nascimento. Então,
cia: OM tem três letras, que são A - V -M. Onde a vida continua; quando temos a compreensão disto,
vocês dizem "eme" eu tenho de dizer "má"; "eme" não temos que nos preocupar com o demais.
é somente um nome, a essência da letra "M" é Por isso, muitos espiritualistas não faJam rnui-

THOT 15
to sobre toda a onda, não falam sobre reencarnação, Podemos pensar nas coisas grandes e nas pe-
renascimento, somente falam sobre isto: quenas, e todas estarão seguindo o mesmo processo.
Nós estamos morrendo e nascendo todos os dias,
U

r>:
portanto todo o universo morre como o homem
morre. Assim, quando o universo morre, nesse mo-
mento todos os seres enfrentam uma catástrofe. Es-
A MA ta e o fim do mundo, como chamamos, é somente
E quem compreende isto, compreende tudo, uma extensão da morte, nada mais. E o que é a mor-
não tem problema. Porque os problemas estão em te? B a troca, a mudança, nada mais.
qualquer vida; nesta, na anterior ou na posterior, são
Ponha os dedos no seu pulso e sinta o que se
os mesmos. Aqui ou no paraíso o problema é o mes-
passa: pulsa e não pulsa, pulsa e não pulsa ... Pulsar
mo.
é nascer, e não pulsar é a morte; pulsa e não pulsa,
Quando as pessoas me dizem que querem ir ao
pulsa e não pulsa, todo o tempo! Todo o segredo do
paraíso, pergunto: "para que?
universo está presente numa pulsação. Não necessi-
- Mas tenho que ir ao paraíso!
tamos de muitas escrituras, tampouco de livros para
- Espere um pouco, por favor! Porque todos'
saber isto; pulsar é a vida e não pulsar é a morte.
os problemas que você tem aqui foram criados no
E quando nós temos vida e morte simultanea-
paraíso mesmo ... Onde estavam Adão e Eva? No
mente, temos de buscar o ponto onde ambas se jun-
paraíso! E nossos problemas simplesmente foram
tam: é a consciência verdadeira, a consciência ...
iniciados no paraíso.
Seguindo a respiração, seguindo a pulsação, seguin-
Então, o paraíso não vai resolver problemas,
do a atividade do coração, seguindo a atividade men-
nós mesmos é que os temos de resolver! E só depois
tal, nós temos o ponto onde transcendemos toda a
poderemos entrar no paraíso. Aqueles que estão
vibração. Esta é a alma do mantra: transcender a to-
querendo entrar no paraíso para resolver seus pro-
das as vibrações. Não devemos ficar satisfeitos com
blemas, estou seguro de que vão se desiludir. ão
as vibrações, temos que transcendê-Ias. De outra ma-
existe nenhum lugar, desde a terra até o paraíso, que
neira nós somos os escravos das vibrações. E quan-
possa resolver nossos problemas. Nós temos que
do as transcendemos, nesse momento somos donos
resolver nossos problemas, para depois ir a qualquer
I das vibrações. Amigos meus, temos que fazê-lo, e
lugar.
neste caso temos que repetir o OM, e repetir, e re-
Uma "mãe", do México, certa vez me escreveu
petir ...
uma carta dizendo: "Swarni, eu tenho muitos pro-
Uma pessoa me escreveu uma carta dizendo:
bl~mas aqui, então eu quero seguir-lhe". Eu lhe res-
"Swarni, eu fico repetindo o OM até que chega
pondi: "Mãe, por favor, resolva seus problemas no
um momento em que não posso mais repetir, en-
México e depois pode seguir-me ... porque os pro-
tão é maravilhoso". Quando, repetindo e repetindo
blemas são como o fogo; se você tem fogo em sua
o mantra, você chega ao ponto onde não suporta
bolsa, pode ir a qualquer lugar, mas o fogo vai acom-
mais repetir, mas sua consciência está repleta do sen-
panhar-lhe ... "
tido do mantra, aí você está no ponto de realizar a
Então, temos que resolver nossos problemas
verdade desse sentido. Porque repetir não é o fim,
onde estamos; a mudança de lugar não é nenhuma
o objetivo. Repetindo, nós temos que chegar ao
solução.
ponto onde já não repetimos mas mantemos a cons-
Por isso, "A" - "U" - "MÁ", criação, con-
ciência: é o coração sem a pulsação.
tinuação e dissolução ... este processo está em tu-
do: no átomo e em todo o universo. Por exemplo:
nós temos as células e estas células morrem. A cada Por isso se ouve dizer que uma pessoa pode
sete anos, dizem, elas se renovam, morrendo e nas- viver sem que o coração pulse. Há muitos que, quan-
cendo como o homem nasceu e morreu. Então, do o coração para, não morrem. Amigos meus, te-
quando o homem morre, o que se passa? Para as cé- mos que chegar a esse ponto; é um trabalho ~uito
lulas é a catástrofe, porque todas as células têm que profundo, sem dúvida, que temos de realizar. E co-
morrer nesse momento. De outra maneira, elas con- mo eu estive dizendo sobre as ondas: as ondas mu-
tinuariam nascendo e morrendo. Então, na morte dam, mas a água sempre permanece.
existe outra morte, no nascimento existe outro nas-
cimento, e nascimento e nascimento, não sabemos
quantos.

16 THOT
ATUALIDADES
Diante da beleza e importância filosófica da Gustav Jung, a cargo do Sr. Christophe Eich, que
obra "A Conferência dos Pássaros" do poeta Farid além de psicoterapeuta e professor do Instituto
Uddin Attar, sentimo-nos impelidos a marcar neste C. C. Jung de Zurique, é astrólogo.
pequeno espaço o trabalho do grupo teatral AVIS As preleções do Prof. Eich foram movidas
RARA AVIS CARA que, com muito idealismo, pre- pelo propósito de apresentar aos que se interessam
senteou o público paulista com a encenação da pe- em conhecer a natureza humana, os novos horizon-
ça homônima - traduzi da, adaptada e dirigida por tes que se abrem para o método terapêutico conce-
Jamil Dias. bido pelo singular gênio de Jung.
A obra, poema persa do século XII, narra o De maneira bastante clara e agradável, o con-
encontro de pássaros de todo o mundo, os quais, in- ferencista alcançou seus objetivos abordando em
satisfeitos com suas vidas, resolvem ir em busca de suas aulas - fartamente recheadas com narrações de
Simorg, o rei dos. pássaros, a fim de encontrar um terapias por ele comandadas - o já clássico tema da
significado para as suas existências. Anhuma encon- importância da análise dos sonhos; alguns aspectos
tra-se entre eles e, emocionada por tal decisão, mos- do relacionamento do "Eu" de cada qual com suas
tra aos demais o sinal que traz no peito - testemu- sombras; de como a prática artística e a interpreta-
nho de sua entrada no caminho do espírito e do co- ção junguiana dos mitos - sendo estes "fenômenos
nhecimento do bem e do mal. Amedrontados ante psíquicos que revelam a própria natureza da psiquê",
o desconhecido, os pássaros vacilam e buscam justi- citado em "Jung - Vida e Obra" de Nise da Silveira,
ficativas às suas desistências, mas são arrebatados pe- José Alvaro Editor - podem ser utilizadas eficiente-
los contos ilustra tivos de Anhuma. mente no tratamento psicoterapêutico e, finalmen-
B necessário passar por sete vales para se che- te, a pedidos dos ouvintes discorreu sobre o auxílio
gar ao Simorg: o vale da busca, do amor, do conhe- que a Psicologia pode encontrar na Astrologia.
cimento, do nada, da unidade, do espanto, da morte Entretanto, julgamos válido destacar algumas
e, ao final desta jornada, os pássaros encontram uma de suas frases, que grosso modo, delineiam o escopo
nova vida na luz de Simorg e descobrem que Simorg de suas conferências:
é, na realidade, eles mesmos. "A sombra é função da luz num objeto. A
O texto foi adaptado a partir do trabalho de sombra é função da consciência no ego".
Jean Paul Carriére e do grupo sufí de Peter Brook "Todos tendemos a algo, temos um ideal
que, em 1979, encenou-o em Avignon, França. de caminharmos em direção à perfeição, de sermos
Jamil iniciou, então, pesquisas e estudos da obra de bons, etc. Isto implica num sistema de valores po-
Jung e outras obras de cunho espiritualista para uma sitivos que criam os valores negativos, que por sua
maior compreensão do simbolismo deste poema vez geram as sombras, e estas, precisam ser integra-
persa. A montagem durou 7 meses e na sua trilha so- das numa personalidade madura, pois cada um de
nora constam músicas medievais e tibetanas, entre nós guarda dentro de si algo inconfessável, e fazê-Io
outras. é sumamente doloroso e humilhante. B muitíssimo
O grupo AVIS RARA, que esteve até dezem- importante aceitar a realidade. Não aceitá-Ia, causa-
bro último no Studio São Pedra, retomará em fins nos sérios problemas e tensões; não podemos mudar
de fevereiro. o mundo, só a nós mesmos, agindo sobre nós; afinal,
Firmamos aqui nosso reconhecimento pelos somos a matéria prima"
esforços dispendidos pelo grupo, principalmente aos "Tomar consciência- é a verdadeira meta da
que estiveram presentes desde o início da montagem humanidade" .
pois, segundo Marco Antonio Dabus, empresário "São os mal adaptados os que estão em con-
do grupo, a história da montagem é â própria via- flito consigo mesmos. O método junguiano consis-
gem dos pássaros; poucos chegaram ao final ... mui- te em ajudar o paciente a encontrar sozinho seu ca-
tos ficaram no caminho! minho e realizar-se a partir de si-mesmo."
"A individuação muitas vezes vai de encontro
ao coletivo; isso exige do indivíduo grandes esfor-
ços e, muitas vezes, grandes sacrifícios."
O Instituto "Sedes Sapíentiae" (R. Ministro "O que importa na indivíduação é a integrida-
de Godói, 1484, São Paulo) promoveu no último de, é dar-se plenamente à vida, ir até o fundo de suas
mês de Agosto, quatro conferências sobre Carl possibilidades" .

THOT 17
"A individuação supõe uma grande exigência Sem dúvida, um das polarização que mais tem
de si-mesmo, não se deve esperar soluções de fora". intrigado aos homens é a que existe entre o espírito
"Todos sonhamos com a felicidade, porém e a matéria. O senso comum já há muito se acostu-
quando a alcançamos quanto tempo dura? Quantos mou a assim dividir o mundo. De modo geral, a par-
lograram a felicidade permanente?" tir do século XVII, a compreensão do que é espírito
"Jung sublinhava a dignidade de nossa cons- ficou por conta dos místicos, e da matéria se encar-
ciência. Freud, ao contrário, dava maior importância regaram os cientistas - os filósofos migravam ora
ao inconscien te." para um lado, ora para outro. Entretanto, existem
"O afã de J ung era unir o racional e o irracio- fortes indícios de que a era de análise, de disjunção,
nal, o científico com o esotérico" está com seus dias contados e de que estamos nos
"Estou convencido que a parapsicologia de primórdios de uma era de síntese, de conjunção.
hoje será a psicologia de amanhã." Sem embargo, milhares de cientistas de renome e
"A astrologia mostra a interação do homem várias universidades distribuídas pelo mundo, se em-
COm O cosmo; é o único setor do conhecimento que penham seriamente em descobrir qual é, afinal, a
une o mundo material, físico, quantitativo, com o conexão que existe entre o espírito e a matéria, o
mundo interior, psíquico, qualitativo." normal e o paranormal, a física e a parapsicologia.
"O horóscopo é uma espécie de campo ener- O físico francês Jean E. Charon é um destes
gético; não podemos nos deixar impressionar pelas pioneiros, e sua teoria da Relatividade Complexa, na
vibrações; somente recebê-Ias conscientemente para qual chega a propor uma representação matemática
podermos manejar bem tais energias." do espírito, vem estimulando novas pesquisas sobre
"Os astros sempre nos ensinam algo novo que assunto tão palpitante e delicado. No Brasil, a
não havíamos previsto" UNICAMP saiu à frente das demais universidades do
"Existe o problema da linguagem entre astró- país. Por iniciativa de professores dos institutos de
logo e psicólogo, psicólogo e paciente. O melhor física, matemática, biologia e da faculdade de medi-
meio de encontrar a linguagem pessoal de alguém cina, realizou em seu campus, em 30 de setembro
é através de seus sonhos." passado, o "I Simpósio de Espiritualidade e Psicoff-
O fim, o latente, o intuitivamente conhecido, sica", que contou com 300 participantes. É interes-
deixou cair seus véus diante daqueles que pouco co- sante ressaltar que este número foi estabelecido pe-
nheciam a obra de Jung - que ousou ser eclética los organizadores do encontro, e que a quantidade
numa época em que a especialização era buscada por de interessados foi muito maior que os lugares dis-
quase todos - e ficou mais forte nossa esperança de poníveis. Os temas das conferências foram "Psico-
que não está longe o dia em que nossas universi- física e Parapsicologia", ''Mente e Matéria" e "Os
dades lhe darão o carinho que ela merece. O mesmo Caminhos da Espiritualidade". Além delas, aconte-
carinho que Hermann Hesse manifestou ao presen- ceram debates e apresentações sobre a vida extrater-
tear o pensador suíço em seu 800 aniversário com restre, acupuntura, astrologia, aparelho Kirlian, as
estas palavras: pirâmides, a pesquisa em parafísica na Universidade
"Inclina-se a alma e se levanta Rose-Croix (EUA), transmutações biológicas e ra-
Respirando eternidade diestesia.
Dos fios partidos tecendo Finalizamos transcrevendo as últimas palavras
Nova e suntuosa veste divina." do livro "As Razões da Coincidência" de Arthur
Koestler (Editora Nova Fronteira): "As limitações
de nosso comportamento biológico podem nos con-
denar a olhar a eternidade apenas pelo buraco da fe-
chadura, como abelhudos. Pelo menos tentamos de-
sentupir a fechadura que impede a nossa pobre e li-
Dentre as inúmeras leis que governam o uni- mi tada visão".
verso uma se sobressai: a lei das polaridades. A cons-
ciência que temos das coisas sempre está polarizada,
aponta Jung. Durante o dia só vemos o dia, quando
é noite, só a ela percebemos (o exemplo é do Prof.
Eich). Apenas o tempo pode nos fazer compreender
a totalidade das coisas.

18 THOT
"
A GUISA DE
UMA INTRODUÇAO-
AO ESTUDO DA KABBALA
Palestra proferida por Ignácio da Silva Com o nome de Kabbala se designa um movimen-
Telles em 9 de outubro de 1.982, no to cultural hebraico que se terá iniciado em meados
auditório da Associação Palas Athena. do II século d.C., com o advento do Rabbi Simeon
bar Yohai e que, em seguida, se desenvolveu ao lon-
Reconheço que me propor a dizer alguma coisa go dos séculos medievais, sobretudo na Espanha e
sobre a Kabbala numa só palestra, ou mesmo em no sul da França, e que continua, e certamente con-
várias, seja um atrevimento. Atrevimento, sem dúvi- tinuará, a se desenvolver enquanto brilhar no ser hu-
da, não só por significar de minha parte uma grande mano o anseio por "novos céus e uma nova ter-
falta de modéstia, como também pelo fato de que ra"(l).
as palavras foram criadas para exprimirem idéias re- Entretanto, com outros nomes e outras formas, e
ferentes a realidades existentes dentro dos limites em outros ciclos culturais, esse movimento intelec-
de sua paisagem materna, isto é, na esfera de reali- tual vem nascendo ao longo de milênios, brotando
dades conceituáveis. Quando induzidas a trazer pa- de fontes as mais diversas, desvendando a perene in-
ra as planuras do conceituável alguns aspectos de quietude humana à busca sempre da mesma verdade.
realidades mais verdadeiras, daquelas que existem Nesta dissertação nos atemos ao ciclo cultural he-
além do pensável nos infinitos mundos fora da "ca- braico. Sua origem neste ciclo, cerca de 1.800 anos
verna de Pia tão" , eis que se contorcem e se deba- antes de receber o nome de Kabbala, se deu com a
tem e por fim se perdem, descoloridas e contrafei- emergência de Moysés, aquele mesmo que levou o
tas, completamente alheias ao forte pulsar da ver- povo hebraico do Egito à busca da Terra Prometida.
dade que se intencionava transmitir. Foi lá pelos meados do segundo milênio antes de
E claro, vocês o sabem, há o caso da palavra com Cristo, logo após o povo hicso haver sido expulso
sopro de poesia. Não me refiro a qualquer poema, das terras do Nilo.
pois há muita coisa escrita com a forma e o nome de Moysés, como se sabe, era dotado de uma excep-
poema, porém sem o menor vislumbre de poesia. cional cultura, pois havia estudado 40 anos nos tem-
Refiro-me às palavras com o sopro de verdadeira plos do Egito, "chegando a tomar-se segundo nos re-
poesia. Reparem, meus amigos, como estas surgem lata Fabre d'Olivet, grão-sacerdote do templo de
envoltas, digamos assim, em uma caixa de ressonân- Isis. Em seguida, por mais outros 40 anos, viveu em
cia, que amplifica, ilumina, transfigura a sua signifi- Mediam, região imantada, ao sul da península do
cação, como que atirando-a na direção daquelas rea- Sinai, numa comunidade de magos do oriente. Sob
lidades mais verdadeiras. Não chegam até elas, mas a orientação destes, pôde cultivar sensibilidades su-
já muito fazem apontando na sua direção. A transfi- tis que lhe permitiam entender a intimidade de coi-
guração do sentido dessas palavras nós não a encon- sas da natureza - o movimento e o brilho dos as-
tramos nos dicionários, mas, se tivermos ouvidos pa- tros, o canto dos ventos nas árvores, a germinação
ra ouvir, nós a recebemos, captando a sua mensagem das sementes, a procriação dos animais, a linguagem
em regiões profundas de nosso entendimento. das flores, o vôo e o canto dos pássaros, o zumbido
A Kabbala pertence a essa faixa de realidades dos insetos, o ruído das chuvas, das ondas e das
mais verdadeiras, que só a poesia ou uma obra de cascatas, a natureza qualitativa dos números, todo
arte teria possibilidades de abordar. Portanto, para esse conjunto de aspectos do mundo que, aos pou-
início de conversa, desde já lhes peço que ao fim cos, lhe fez apurar os ouvidos para ouvir, em certas
desta palestra não suponham que por meio dela fi- ocasiões, o nome verdadeiro das coisas ... Foi de-
caram sabendo alguma coisa sobre esse tema. Em pois desses 40 anos de imensa atividade contem-
verdade, meus amigos, meus irmãos, permitam-me plativa, que muito a contragosto obedeceu a deter-
que desde já lhes previna, em verdade, por meio des- minações do Senhor, que o mandava retomar ao
ta palestra bem pouco, ou nada, ficarão sabendo. Egito. Ali, com grandes trabalhos, conseguiu final-

TI-lOT 19
mente arrancar seu povo para fora da Terra da Servi- sina que "o mundo é cimentado pelo Nome de 72
dão e partiu com ele em demanda do país onde cor- letras, Nome este que é a síntese de todos os nomes
rem arroios de mel e de leite. E então foram mais 40 sagrados ... Esse Nome, em verdade, é a reunião de
anos de caminhadas, agora com seu povo, em andan- 72 palavras ... designando cada uma um atributo
ças pela aridez dos desertos. divino" (3). São estes apenas alguns poucos exem-
Ao longo desses anos, e depois de ter subido o plos, oriundos de ciclos culturais diversos, em que se
Sinai, a Montanha, isto é, simbolicamente também vê o emprego do número 72 com designações gravi-
a sua montanha interior, escreveu o Pentateuco, os tando em torno da conotação acima referida.
cinco primeiros livros do Antigo Testamento. Muito Ora, ao longo dos anos, na penosa caminhada pe-
se tem discutido se foi ele mesmo que os escreveu, lo deserto, Moysés formou o grupo de 72 anciães,
ou não. Pouco importa. Os livros estão aí. Se foi ele ao qual transmitiu, de viva voz, a sua mais alta men-
ou muitos por ele, o certo é que foi sua cultura, foi sagem. A comunicação oral, especialmente para as-
sua inspiração, foi sua persistência, foi o resultado suntos esotéricos, sempre foi tida como a mais ex-
de todos os trabalhos ao longo de sua vida, que per- pressiva forma de ensinamento, em grande parte
mitiu que se escrevesse o Pentateuco. porque faz valer a natureza sonora das palavras. As
Mas eis que, à medida que os anos passavam, mais vibrações do som da voz humana podem às vezes pe-
e mais foi ele se apercebendo de que muito do que netrar em profundas regiões de nosso ser e são capa- J
ele tinha de mais profundo para transmitir não deve- zes de despertar arquétipos adormecidos e fazê-Ios
ria de forma nenhuma ser posto por escrito, não su- aflorar, de certa forma, à nossa consciência, produ-
cedesse a qualquer tempo caírem esses livros em zindo uma atmosfera interior da grande e silenciosa
mãos de pessoas pouco ou mal formadas, que have- sabedoria. Não é sem razão que na Ordem de São
riam certamente de interpretar os textos de manei- Bento, até os dias atuais, ainda se cultiva o canto
ra grosseira e totalmente incorreta, pondo em risco gregoriano, e também não é sem razão que os hindus
a pureza da mensagem mais alta e, além do mais, a cantam, de viva voz, os seus mantras, e que também
própria unidade do povo eleito. o sábio Maomé ordenou que o Corão sempre fosse
Acontece que Moysés havia gradualmente forma- recitado de viva voz.
do entre os israelitas um grupo chamado de anciãos, Ao grupo dos 72 anciães, Moysés transmitiu a sua
com a evidente conotação de sábios. Excluindo da mensagem, a qual, daí por diante, deveria sempre ser
contagem o próprio Moysés e Aarão, seu irmão, transmitida por via oral, e sempre só para aqueles
aquele que por ele falava ao povo, eram 70 os an- que haviam sido cultivados nas mais sutis sensibilida-
ciãos de Israel, aos quais Moysés ainda juntou adab des intelectuais. Dessa maneira, durante séculos, for-
e Abiu, perfazendo, ao todo, o número 72.2 . mou-se a corrente ininterrupta, recebendo e transmi-
Ora, 72, esse múltiplo de 9 números (2, 3, 6, 8, tindo a mensagem secreta.
9, 12, 18,24 e 36), esse quinário do Zodíaco (360 : Essa "corrente da Tradição" (Shaletshel et ha
5 = 72), é um número que em muitos ciclos cultu- quabbalah), de fundamental importância para a for-
rais tem representado sempre o número de pessoas, mação do judaísmo e para seu desenvolvimento, era
ou de coisas, incumbidas de transmitirem uma altís- comparada à escada que Jacob teria visto em seu so-
sima mensagem espiritual. Por exemplo, 72 é o nú- nho juntando a Terra ao Céu, e capaz de realizar a
mero dos Livros da Bíblia, segundo a tradição cató- unidade da criação retomada ao Criador.
lica, somando-se os livros do Antigo Testamento Mas eis que, em fins do VII século antes de Cristo
com os do Novo. 72 foram os sábios que no século e inícios do VI a.C., a cidade de Jerusalém foi to-
III antes de Cristo traduziram para o grego o Antigo mada três vezes por abucodonosor, rei dos cal-
Testamento. 72 é o número de discípulos que Jesus deus, e saqueada na terceira vez, em 586 a.C., haven-
enviou, dois a dois, a levarem a Boa Nova a outros do sido arrasado o Templo. Os judeus foram levados
povos. 72 é o número dos componentes do Siné- cativos para a Babilõnia, e no cativeiro ficaram 70
drio dos judeus, constituído no ano 141 a.C., deno- anos, até que o imperador Ciro, da Pérsia, havendo
minado Sanhedrin, como continuação da Velha Tra- vencido em guerra aos caldeus, permitiu que retor-
dição dos 72 anciães. 72 é o número de artigos do nassem a sua terra. Mas, enquanto permaneceram na
Regulamento da Ordem dos Templários, que prova- Babilõnia, enorme foi sua aflição naquelas planuras
velmente terá sido escrito por São Bernardo de de Senaar (4), sofrendo tudo o que significava estar
Clairvaux, no século XII. 72 são as cordas do Sen- no exílio em cidade que, desde sua fundação, indica-
tur, o psalterion da Pérsia, sendo 3 cordas para cada va ser a cidade da confusão, a cidade da Torre de
nota. E o Zohar, Livro fundamental da Kabbala, en- Babei, pois Nemrod, seu fundador, traindo a sua

20 THOT
missão de "legislador primordial", assim como indi- - tratava-se simplesmente de pôr no papel as nor-
ca a raiz N - M de seu nome, tomara-se poderoso na mas não escritas, o que os juristas, desde os tempos
terra e "robusto caçador diante do Senhor" (5). da antiga Roma, chamam de Direito Consuetudiná-
O salmo 136 (6), como grito da alma, sugere-nos rio. Entre os judeus, assim como em todos os povos
o seu sofrimento: "À beira dos rios da Babilônia, ali do mundo, imensa é a quantidade de práticas dita-
nos sentamos, e lembrando-nos de Sião, nos pomos das pelos usos e costumes que se institucionalizam e
a chorar. As cítaras, agora silentes, nós as pendura- que se tornam tão impositivas quanto as normas do
mos nos salgueiros à nossa volta. Eis que nossos cap- direito escrito. O conjunto delas, mais do que o das
tores pedem-nos que cantemos cânticos de Sião" leis escritas, exprimem de maneira espontânea o ca-
Pedem, insistem, exigem ... mas como, de fato, po- ráter e a personalidade de cada povo. Naqueles tem-
deriam eles, judeus, cantar cânticos de Sião numa pos de graves tribulações para os judeus, perseguidos
terra de servidão? "Se me esquecer de ti, Jerusalém, como estavam sendo pelos romanos, e mais uma vez
ao esquecimento seja entregue a minha direita. Fi- sendo expulsos de sua terra, achou-se que codificar
que pregada a minha língua às minhas fauces, se eu as normas não escritas serviria de valioso instrumen-
não me lembrar de ti, se não me propuser Jerusalém to para que o povo judaico conservasse sua própria
acima de todas as minhas alegrias" (6). Ora, não que- fisionomia e não se deixasse diluir em meio a outros
rer cantar é uma demonstração não apenas de nos- povos.
talgia da Pátria Perdida, tanto no sentido literal co-
As normas não escritas eram denominadas hala-
mo também no sentido simbólico e místico, mas
kot, torah shebe-al-peh, a "lei oral", ao passo que as
também de tristeza por verem bruxolear, nas tribu-
normas escritas do Pentateuco se chamavam torah
lações do quotidiano, o amor pelos mandamentos
shebi-kethabh, a "lei escrita".
do Senhor, e a fidelidade na prática de inúmeros ri-
tuais, usos e costumes de sua sagrada Tradição. Em Tanto as escritas como as não escritas consti-
verdade, até a língua hebraica foi rapidamente sen- tuiam a Torah. Pela raiz do vocábulo Torah, Y-R-H,
do alterada, chegando quase a um completo esqueci- sabe-se que essa palavra significa, antes de mais nada,
mento. Terrível deve ter sido a aflição dos 72 com, "ensino"; ou talvez, melhor que ensino, "ensina-
ponentes do Sanhedrin, por não terem condições pa- mento". A Torah, em seu conjunto, contém a reve-
ra ir formando novos iniciados para a perpetuação lação feita por Deus a Moysés, no alto do Monte
do conhecimento da mensagem secreta. Foi pelo sé- Sinai, segundo nos relata o Pentateuco.
culo IV ou V antes de Cristo que Esdras (ou Ezra), o A tarefa de compilar e codificar, tanto aquelas
grande profeta, diante da perspectiva de ver perder- normas referentes à organização política e social, co-
se para sempre o ensinamento mais caro de Moysés, mo as de cunho religioso, foi iniciada pelo grande sá-
assumiu a responsabilidade de tentar pôr essa mensa- bio Rabbi Akiba, o qual, nos comentários que escre-
gem por escrito. Correr o risco de vê-Ia mal interpre- veu, introduziu um novo método de interpretação
tada parecia-lhe óbivio ser um mal menor do que vê- de textos bíblicos, que permitiu a adaptação das leis
Ia desaparecer completamente da memória de seu do Pentateuco às circunstâncias históricas de seu
povo. tempo. Mas foi somente em inícios do Terceiro Sé-
Esdras apenas iniciou a redação desse aspecto da culo que o Rabbi Judah ha-Nasi, o Príncipe, conse-
Religião judaica. Inúmeros outros, depois dele, os guiu dar por terminada a redação.
"sopherim", os escribas, num longo e pertinaz tra- A esta compilação de halakot se deu o nome de
balho, continuaram a tarefa. Eis que, depois da des- Mishna. Ora, a palavra Mishna (sh-n-h), pela sua ori-
truição de Jerusalém pelos romanos, no ano 70 d.C., gem etimol6gica, significa "apreender qualquer coisa
os sábios judeus reunidos inicialmente em Jabneh, por meio da constante repetição". Portanto, embora
atualmente Jamnia, e mais tarde, de 135 d.C. em se referindo à redação de antigas normas não escri-
diante, em Usha, na Galiléia, procurando responder tas, a sua etimologia nos autoriza a acreditar que o
ao desafio constituído pela segunda diáspora, inten- método de ensinamento, pelo menos no que se refe-
sificaram os trabalhos de redação do aspecto não re ao grupo iniciático, ainda continuava a ser o da
escrito de sua religião. Mas agora, positivamente, a transmissão oral, a fim de poder fazer valer, como
mentalidade de alguns dos "sopherim" já se havia foi dito acima, toda a comunicação do inconceituá-
tornado bem diferen te daquela que inicialmen te ins- vel pela natureza sonora da palavra. E assim de fato
pirara os antigos profetas e juízes de Israel. Para es- deve ter sido, porque a Mishna, muito além do que
tes, agora denominados, depois da destruição do se- apenas racionalmente se poderia admitir, tomou-se
gundo Templo, de Tannaim, que significava mestres o documento principal da literatura rabínica antiga.

THOT 21
Logo em seguida, os sábios sentiram-se na obriga- "ato de receber, de acolher". Em se tratando de Tra-
ção de expor e comentar a Mishna, a fim de evitar dição, por mais importante que seja o ato de trans-
interpretações incorretas. Estes sábios foram deno- mitir, igualmente necessário e meritório é o ato de
minados "amoraim", os explicadores. O resultado receber. Toda Tradição implica nessa dupla ativida-
deste trabalho constituiu a Guemara. A palavra GUI!- de: transmitir e receber. Para transmitir é preciso
mara (g-rn-r) significa "terminar". que se tenha o que transmitir e que se conheça co-
Produziram-se duas Guemaras: uma feita na Pa- mo transmitir. Para receber é preciso que se esteja à
lestina, escrita no clialeto aramaico do ocidente, com altura para entender, cem vivência, a mensagem
abundância de palavras gregas e latinas; outra, em transmitida.
Babilônia, feita por descendentes de judeus que ali A Kabbala oferece-nos algumas chaves para en-
permaneceram raclicados desde os tempos do cativei- tendermos a mensagem de Moysés. Mas, possuir as
ro. Esta Guemara foi escrita no dialeto aramaico do chaves, apenas possuí-Ias, por mais curiosas e inte-
oriente, e encontra-se carregada de expressões da ressantes que sejam, de nada nos valerá. Precisamos
língua persa. saber esvaziar-nos de todos os juízos, de todas as
Desvendar até que ponto a redação da Mishna e formas de lógica, de todos os esquemas e métodos
das duas Guemaras foi impregnada pelo espírito da científicos, assim como fazemos quando nos dispo-
antiga mensagem secreta de Moysés é tema que ain- mos a ouvir um concerto de grande música, ou
da continua desafiando o estudo e a meditação dos quando nos sentamos frente de um quadro para,
â

grandes mestres judeus. O certo é que, desde que a em silêncio, o ficar vendo, e aos poucos fazer esse
Mishna e a Guemara foram tidas como terminadas, ver se abrir para o contemplar. "Vacate et videte".
e mesmo antes - como nos atesta, por exemplo, a Só assim é que teremos condições de usar as chaves
criação da Escola de Yabné, em inícios do século que a Kabbala nos ofereceu. Só assim é que pode-
II d.C., fundada com o especial objetivo de "salvar" remos mergulhar, com todas as insondáveis forças
o pensamento e o espírito do judaísmo (7) - apare- do coração, no espírito da mensagem do Sinai. Só
ceram sábios místicos, descontentes com o que al- assim é que a estaremos entendendo com vivência.
guns deles consideravam o excessivo racionalismo da
maioria dos "sopherim", e dos "tannaim" e dos CONTINUA NO PRÓXIMO NÚMERO
"amorim", e de sua preocupação quase exclusiva em
atender aos problemas de seu tempo. Por mais que
naqueles dramáticos tempos fossem esses problemas
de suma gravidade para a própria perseverança do
judaísmo, jamais se deveria colocá-los acima da
questão fundamental, que era a permanente vivência 1- II Pedro, 3, 13.
da sabedoria transmitida por Moysés. Reduzir a pro-
2- Ex.24,1 ... 9.
blemática judaica à visão empírica da realidade de
uma época poderia fazer atenuar o interesse pela 3- Francis Warrain - "La Théodicée de Ia Kabbale", ed.
doutrina perene contida na velha mensagem. Les Editions Vega, Paris, 1.949, pg. 115.
Entre esses críticos emergiu a figura marcante do
Rabbi Simeon bar Yohai, no II século da Era Cristã. 4- Gênesis X, 10.
Ele dizia: "Nós vivemos na superfície da realidade, e
5- Gênesis X, 9. A expressão "caçador", tanto na Bíblia
não sabemos como atingir o coração ... Pois o se- como nas histórias mitológicas de inúmeras civilizações,
gredo reside no coração daquilo do qual apenas ve- sempre significa "aquele que tem confusão no espúito".
mos a aparência". E, em outro texto: "O conhecido Caçador é aquele que mata as coisas do mundo; se mata-
é apenas o aspecto aparente do desconhecido, pois as é porque não as ama. Se não as ama é claro que não as
compreende. Se não as compreende é porque se encon-
nada no mundo se encontra solto, isolado de seu tra mergulhado em confusão.
contexto universal. Nada neste mundo tem um fim
em si mesmo tê r; estamos inseridos num universo de 6- Em certas edições da Bfblia este salmo está com o nú-
patamares; tudo que há em qualquer deles há tam- mero 137.
bém em todos os outros".
7- Ver Renée de Tryon Montalembert et Kurt Hruby , "La
A partir do Rab bi Simeon bar Yohai, o resultado
Cabbale et Ia Tradition Judaique", ed. Culture, Art, Loi-
dos trabalhos visando fazer reviver a mensagem se- sir, Paris, 1.979.
creta de Moysés foi denominado Kabbala. A palavra
Kabbala vem do verbo hebraico Q-B-L, e significa 8- Cf. Zohar, III, 128.

22 THOT
A COR
e a sua Função Simbólica
em algumas Culturas
Evidentemente não cabe ~ Simbólica, dentro povos da Antiguidade como pontos-chaves deste ti-
do seu campo específíco de estudo, a análise exaus- po de comunicação, mas sim.iremos destacar e ana-
tiva da luz como o faz a Física e a Ótica, porém ela lisar a influência que as cores tiveram na criação de
deve direcionar o seu foco de interesse quanto à uma simbologia,e como foram usadas dentro deste
significação que as cores receberam, e recebem, nas específico processo de comunicação não-verbal.
diversas culturas. Verifica-se que, na elaboração das Nem todas as cores tiveram o mesmo destaque,assim
tradições dos diversos povos, onde o intuito é pro- como o seu uso não procedeu de uma única origem,
curar explicar o mundo do sobrenatural, as cores mas foram estruturadas e organizadas tendo em vista
foram usadas dentro de uma codificação específica. a veiculação de uma mensagem. Desta forma foi
Entretanto, como grande parte deste código se per- uma certa cor, e não qualquer uma ao acaso, que
deu ou se transformou, alguns elementos se torna- permitiu o trânsito de um código simbólico de um
ram irreconhecíveis, enquanto outros se mantiveram objeto, determinando sua decodificação no contex-
atuantes. to. Em quase todas as antigas culturas, especialmen-
Observa-se que a cor, aditiva de um outro ele- te nas pré-colornbianas, foi utilizado este tipo de vei-
mento concreto, seja ele um objeto, o corpo huma- culação de maneira mais ou menos usual e, em al-
no ou um fenômeno da natureza, pertenceu a uma guns casos, chegam até a época atual, como se obser-
categoria sui-generis de valores, cuja organização se va entre as culturas indígenas. Certas cores foram,
manteve presa às particularidades da comunicação posteriormente, consideradas sagradas, atributos
simbólica. Mitos e tabus se utilizaram destes especí- particulares de certas divindades, gerando sérios
ficos códigos, transportando suas conotações em equívocos no processo da significação,já que este ti-
certos objetos e cerimônias, cuja visualização permi- po de estrutura, em sua origem, sempre possui um
tia uma precisa memorização do elemento teórico caráter comunicativo que pouco se adapta aos con-
referido. Desde as épocas mais remotas as cores fo- ceitos de santidade e divindade, criados posterior-
ram utilizadas com a finalidade de permitir uma co- mente.
municação direta, efetiva, visando dar um significa- Através de uma montagem colorida e na ma-
do como o que é expresso por palavras, apesar de es- nutenção de alguns códigos simbólicos, como se
tar hoje mais cingida ao campo da comunicação reli- observa em algumas culturas, é possível se recons-
giosa e artística, apesar de ser muito amplo o seu truir, mesmo que parcialmente, alguns aspectos do
campo de ação. passado e reatar o "elo de comunicação", que de ou-
O problema da cor se originou no momento tra forma estaria totalmente perdido. Justamente é
em que surgiu no homem a idéia de salvaguardar o elemento visual que se encontra na base deste es-
uma informação e, por isso.liga-se à ampla variedade pecífico tipo de comunicação, cuja organização e
dos rituais agrários,já que este processo de manuten- elaboração espacial é bem precisa, que vai permitir
ção informativa se originou, também, desta mesma que sejam considerados como verdadeiros textos os
conotação. Não vamos nos estender no relaciona- rituais e cerimônias. A mensagem contida valoriza,
mento dos ritos férteis como a passagem dos equinó- por sua vez, a cor que lhe é pertinente e a força ex-
cios no firmamento, do retomo dos solstícios ou da pressiva, contida nestes mesmos objetos, transmite
alternância das constelações consideradas por alguns a mensagem através da cor. Suas imagens, de conteú-

THOT 23
dos pré-estabelecidos, veiculam a informação de com uma precisa veiculação de determinada mensa-
forma irnutável.rnesmo quando tenha sido perdida gem que, por sua vez, se movimentou através dos
a significação original. Assim como não se pode usar parâmetros representados por duas cores básicas: o
uma cor qualquer para expressar uma comunicação preto e o branco. De diversas maneiras foi encarada
definida, não é qualquer objeto ou desenho, tam- a simbologia destas duas cores entre os povos ameri-
bém arbitrário, que virá a ser o suporte de uma in- canos, como também em alguns da Antiguidade e
formação. Objetos de forma arredondada e colorida, do Oriente.
indo desde o ponto usado na pintura corporal até o
De forma especial o branco é ligado ao proble-
formato de panelas e objetos utilizados em certos ri- ma da marginalização dos ingressantes nos rituais de
tuais e cerímõnías.podem ser considerados símbolos
passagem. Não que ela signifique pureza mas, pelo
ou objetos sagrados no contexto mágico-religioso de
seu conceito de vazio que caracteriza estes tipos de
uma cultura. A colocação de uma cor num espaço
cerimônias, e permite a veiculação necessária à mu-
visual delimitado, ou em certos objetos, possui uma
dança do iniciado que se dará durante as passagens
simbologia especial que tende sempre a valorizar
do ritual. Atualmente se encontra mais ligada aos
uma parte deste objeto e cujo conteúdo é, por sua
valores sociais e morais que foram lhe atribuído,
vez, bem preciso. Somente certas cores podem ser posteriormente, por influência de outras culturas, e
colocadas em determinadas partes do corpo humano
são poucas as tribos que ainda a mantém no seu sen-
tido original.
Tanto o branco como o preto possibilitam a
permissibilidade de veiculação na estrutura de alguns
rituais de passagem. A escolha de uma ou outra co-
notação desta cor deriva da seqüência codificada pe-
la cerimônia que a utiliza. Se a codificação é relati-
va a um discurso divino, usar-se o preto e, quando o
discurso é humano ou relativo ao mundo material,
usa-se o branco. Relaciona-se assim a todos os pro-
blemas vitais nas inúmeras formas destes vários ti-
pos de comunicação não-verbal. Por isto em algumas
culturas recebe uma conotação direcional corno se
vê ao apontar a direção leste, nos quatro pontos car-
deais. Em alguns grupos indígenas das Américas as
Tortual de enfeite dos Kamayurá
duas cores foram, e o são, utilizadas nos seus valores
simbólicos originais, o que demonstra a perfeita uti-
lização dos seus canais e de sua linguagem não ver-
- neste caso tomado como suporte - e podem ser bal - perfeita e eficiente técnica de salvaguarda
consideradas como atributos informativos de obje- informativa - . Em outras culturas porém o preto
tos usados em rituais. Este simbolismo sempre se adquiriu a conotação dada a cor branca, invertendo-
deu num movimento binário sendo, e não raras ve- se a ordem e vindo a significar negatividade e vazio,
zes, um símbolo, enquanto em outros momentos é originando-se uma confusão nos códigos utilizados.
somente um índice. No primeiro caso ela possui um A fertilidade do preto, como suas várias possibilida-
conteúdo próprio, dotado de um significado que vei- des, foi usado por povos nas Américas, da África e
cula uma informação única, relativa àquela determi- pelos árabes.
nada cor. Quando é índice serve, ao contrário, como
mero suporte, como reforço de uma comunicação
que transita veiculada por outro elemento, inserido
num contexto mais amplo. Como o próprio termo
diz, em alguns casos especiais, a cor é índice da men- o vermelho é símbolo do que se poderia
sagem contida em outras partes do discurso simbóli- cognominar SOLAR e se encontra ligado ao
co. Desta forma parece ficar claro que nem todas as conceito de SABEDORIA, próximo ao
cores tiveram a mesma importância, nem a sua uti- de CONHECIMENTO, de qualquer tipo e com
lização deriva de uma única e mesma origem mas, todas as ilações que lhe podem ser derivadas.
pelo fato de pertencerem ao domínio da comunica-
ção, foram estruturadas, organizadas e utilizadas

24 THOT
~ falso considerar-se o preto como atributo de
veiculação demoníaca, enquanto o branco se aplica- o azul foi considerado como
ria aos elementos santificados; o que se dá é o con- símbolo da VERDADE, da SERENIDADE,
trário: pinta-se de preto qualquer objeto indicado
da PAZ ESPIRITUAL.
nos rituais e cerimônias, assim como certas regiões
do corpo humano, desde que possam potencializar Cor do pensamento elevado, trás
elementos relativos à divindade. O branco, por sua consigo a pronfundidade,
vez, teve a mesma fínalídade pois é referente ao permitindo uma penetração no mais
mundo humano. Eis a diferença que gera esta duali-
longínqüo e
dade de opção: a variedade dos elementos informati-
vos, assim como o grau de potencialização desejada muitas vezes trouxe
está ligado à parte do corpo humano onde vai ser confusão ao ser inserida em
usada, bem como a preferência dada a um determi- outros contextos culturais.
nado objeto que será escolhido para tal função. Por
isto o preto é de significação importante na decodi- comunicação não-verbal, utilizando esta cor para a
ficação destes tipos de códigos, pertencentes às cul- pintura corporal e para a decoração de objetos, to-
turas indígenas, vindo a se tornar uma verdadeira das as vezes que o cerimonial se ligava ao rito da
cor de veiculação, adquirindo o significado de per- fertilidade. Mas, por outro lado, se vê que a cor
missibilidade, já que seu simbolismo é obstaculizar o branca é determinante da idéia de manutenção de
trânsito de outras comunicações possíveis e permi- uma informação e foi usada, ao longo dos tempos,
tindo, assim, somente a passagem de uma única, re- tanto como índice. como símbolo, na tentativa de
lativo ao objeto ou cerimônia ao qual se destina. In- manter registra das outras informações. É o que se
terpretado em sentido negativo gerou dúvidas quan- observa com a cor vermelha.que não apresenta dúvi-
to ao exato conhecimento do seu significado. Liga- das quanto à sua conotação. Ligada à idéia de passa-
do a um dos mais importantes mitos do continente gem, de energia, de vitalidade é uma cor fosca que
americano.é encontrado com a mesma força expres- não adquire valor espiritual e que nunca será utili-
siva em algumas regiões da África Ocidental, e vem zada em seqüências cerimoniais relativas à divindade,
a ser responsável pelos elementos gráficos geométri- ao menos que tenha perdido a mensagem orígínal,o
cos: o triângulo e o losângo, usados na decoração de que trás, às vezes, confusão. O vermelho é símbolo
certos objetos e na pintura corporal. do que se poderia cognominar solar e se encontra
Desde as épocas mais remotas,o desenho do ligado ao conceito de sabedoria, próximo ao de
losângo representou os Gêmeos, cuja mitologia apa- conhecimento, de qualquer tipo e com todas as ila-
rece em várias modalidades, porém algumas já cor- ções que lhe podem ser derivadas. Mais ela escurece
rompidas, como do sol e lua, noite e dia, etc. Sua di- em sua tonalidade,.mais o seu significado simbólico
visão triangular está mais ligada ao problema do se torna negativo, chegando a alcançar, dependendo
tempo. Os mitos na Antiguidade não tiveram exclu- do objeto do contexto do discurso a ser mantido,
sivamente uma conotação simbólica mas foram, uma significação quase oposta. Com a tonalidade
também, verdadeiros sistemas de datação cronológi- marrom há um preciso significado e aparece quase
ca. No campo da comunicação ritualística,qualquer sempre, como índice, em oposição ao significado
que seja a versão usada para a seqüência informativa contido em outro elemento, cujo exemplo é a loca-
esteve sempre presente a cor branca. Quando a ceri- lização numa parte do corpo pintado,que indica o
mônia realizada está completamente desligada deste que deve ser comunicado. Por exemplo: pintar o de-
seu aspecto codificado originalmente, significa que dão do pé esquerdo ou a rótula do joelho direito
foi manipulada e se deu uma distorção da mensa- com a cor marrom em certas cerimônias significa, em
gem, havendo quase sempre uma perda. Estes ri- primeiro lugar, tratar-se de um ritual que comunica
tuais, que se baseavam no enterro de gotas de esper- avareza, falta ou necessidade de se corrigir esta pri-
ma humano e de grãos de milho, tendo substituído, vação. No caso da rótula trata-se de um ritual basea-
posteriormente, a presença do sêmen masculino por do sobre a privação do poder material ou impossibi-
contas brancas ou por objetos de formato arredon- lidade na realização de determinados poderes. O mar-
dado e, através de um processo de abstração, ao rom é raramente utilizado nos rituais de passagem
simples uso da cor branca, ainda são feitos nos dias (nascimento, puberdade, morte). Já o mesmo não
atuais. Não é de estranhar, portanto, que determina- acontece Com o azul, quase sempre presente, por ser
dos povos americanos tenham mantido este tipo de a cor especial do elemento divino e não de todas as .

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divindades ou de todos os elementos espirituais que, zes trouxe confusão ao ser inserida em outros con-
em certos casos, necessitam do amarelo. O azul pode textos culturais. Observa-se em algumas culturas in-
ser definido como uma cor aberta, uma vez que é dígenas uma íntima conexão de todos os aspectos
apta a veicular uma série imensa de informações e do mundo da natureza, corpo ou substância, numa
pode, também, ser utilizada como índice, ou seja, associação indestrutível que possibilita a decodifica-
como suporte e não como símbolo em si mesma. É ção de uma mensagem, quando a cor é usada com
mais um veículo que permite o trânsito da mensa- uma precípua finalidade para salvaguarda de uma
gem contida em outros elementos e que quer ser mensagem. O uso indevido da cor gerou confusões
evidenciada, do que a mensagem em si. Em geral que trouxeram consigo a impossibilidade de uma
é imprescindível em todos os rituais, assim como é perfeita decodificação da mensagem e, quase sem-
usada em certas partes do corpo, quando a mensa- pre, a sua perda. Inúmeras vezes foi deslocada a in-
gem se refere a elementos religiosos ou espirituais. formação,
Desta forma jamais seria pintado de azul o braço ou A conotação simbólica das cores em culturas
o ombro direito.mas sempre o ombro esquerdo, es- indígenas americanas e principalmente quando fo-
pecialmente um pouco acima do cotovelo.para real- ram utilizadas como um dialeto, dentro do contexto
çar o conteúdo espiritual desta parte já que certas da comunicação é da maior importância. No caso
regiões, assim como determinados objetos, adqui- das tribos do Alto Xingu aparece em seus rituais e
rem valores imateriais quando pintados de azul. cerimônias o uso específico de certas cores e quase
Em certos casos.alcança o conceito de sobrenatural sempre tiveram, como ponto de partida, os rituais
e outras vezes.quando colocado no joelho direito, agrários e o movimento estrelar. Em algumas tribos
no braço ou no ombro direito, no ouvido (parte in- observa-se o uso da cor verde ligado à Constelação
ferior do lóbulo), o significado próximo ao nosso das Pleiades. Atribuída a este importante grupo es-
de soberania. Em alguns objetos de uso ritualístico trelar que abrange a América Central e parte da
como: colares, a pintura corporal.utilizados em cer- América do Sul, ela tem uma importância singular
tas cerimônias e acompanhando todos os rituais que dentro do contexto comunicativo não verbal. Liga-
se visualizaram anteriormente através da cor verde do ao signo zodiacal do Aquário sempre simbolizou
- cor da iniciação - que foi transportar no azul o o elemento líquido em seus variados aspectos e não
que foi a sua primeira corporificação simbólica, ou se pode esquecer que muitas tribos veneram este ele-
seja: o orgasmo sexual. mento em suas variadas modalidades. O verde pre-
sente é a cor da produtividade, no sentido mais am-
plo, que vai desde o conceito de fertilidade terrestre
até o da criação humana. Sempre simbolizou o mais
importante elemento de salvaguarda informativa,
tendo se valido do eficiente veículo deste código: o
Em algumas tribos, o uso da cor verde esperma humano, cuja conotação celeste está na
constelação das Pleiades. Foi reproduzido, visual-
representa a PRODUTIVIDADE, no mente, por outro símbolo bastante encontrado nas
Américas: o losângo, ligado à simbologia dos Gê-
sentido mais amplo, que vai desde o conceito meos. Eis aí porque qualquer um destes elementos
poderá se utilizar da cor verde para o trânsito deste
de FERTILIDADE TERRESTRE até o da específico gênero informativo. A importância desta
cor nas Américas, e também em certas regiões da
CRIAçÃO HUMANA. África, não significa, de forma alguma, a anulação
das outras cores.pois o uso de uma só no contexto
cultural de um povo não vem atestar o depereci-
mento ou ausência de outra ou outras cores pois na
ampla gama simbólica várias são as possibilidades de
suas várias utilizações. No caso da cor verde, com a
multiplicidade de seus tons, se movimenta sempre
O azul foi considerado como símbolo da ver- a volta de um específico conceito e com possibilida-
dade, da serenidade, da paz espiritual. Cor do pensa- de de ligações que vão, desde uma possível idéia de
mento elevado, trás consigo a profundidade, permi- vital,até o conceito de hábil. Próximo deste seu deri-
tindo uma penetração no mais longíquo e muitas ve vado da idéia de possível, o verde, dependendo da

26 THOT
pretativa, porém, como o vermelho, sua utilização
entre alguns povos, principalmente os chamados
"primitivos'[. é bem específica e mdícadora de uma
mensagem ou parte de um discurso simbólico, unida
sintaticamente ao contexto do qual faz parte.e, ou-
tras vezes, é um símbolo em si mesma. .
O amarelo é a luz solar, a íluminação,e atinge
o sentido de dispersão. Entre povos asiáticos aparece
com o sentido de iluminação, sabedoria.
Entre as tribos do Alto Xingu, em vários ri-
tuais analisados, observa-se que há o uso de uma cor
determinada para função comunicativa do ritual.
Uma cor ligada à determinados rituais da fertilidade,
por exemplo, ao ter sofrido manuseios vários rece-
bendo interpretações,chega a desvirtuar-se quanto à
sua conotação original. No campo da comunicação
não verbal se pode observar que, qualquer que seja a
versão usada para a sua seqüência comunicativa,sem-
Preparo para o Quarup: pintura corporal
pre se encontra presente a cor branca. No caso da
cerimônia estar totalmente desligada do seu aspecto
forma de sua utilização nestas culturas, participa ritualístico originário, esta cor estava trocada por
da idéia de flexibilidade quando se encontra em re- outra, dando-se assim uma distorção da mensagem
lação a elementos materiais ou de aquiescência, ao e, muitas vezes, como já se chamou atenção, sua
se referir aos seres sobrenaturais. É a cor da adapta- própria perda. Os ritos da fertilidade se baseiam, na
bilidade, na infinidade de suas formas que, devido sua essência, no enterro das gotas de esperma huma-
à sua natureza, simbólica intrínseca, pode ser muito no e de grãos de milho tendo, posteriormente, trans-
influenciada pelo contexto do elemento narrativo formado a presença do sêmen masculino em contas
no qual se encontra inserido. O uso do tembetá que brancas ou em outros casos chegando por um pro-
chamou a atenção dos cronistas como Jean de Léry, cesso abstrativo, à própria e pura cor branca. Não é
André Thevet, Simão de Vasconcelos, durante o sé- de estranhar, portanto, que se encontre em alguns
culo XVI,ao observarem o seu uso entre os índios rituais mantidos no Alto Xingu a utilização do bran-
moradores do litoral, ligava-se ao conceito de possi- co para a pintura do corpo e mesmo para a decora-
bilidade e auto-suficiência dos chefes. As pedras ção de certos objetos, todas as vezes que esta cerimô-
verdes foram, por sua vez, motivo de interpretações nia se encontre ligada aos rituais da fertilidade.
várias por parte dos estudiosos. O verde é, sem dúvi-
da alguma, a cor específica do continente america-
no; figuração colorida da constelação das Pleiades.e
tem um carácter sagrado. Simbolizada também Pelas
aves, pelo formato ou pelas plumas abundantes, en-
o
Todos os códigos de salvaguarda
contra-se em alguns mitos assim como em alguns
informativa não verbal,
códigos gráficos. Utilizou-se também brincos na
orelha esquerda e/ou direita, tanto na América co- originadas dos ritos da fertilidade,
mo na afríca estendendo o seu uso ao continente participam fundamentalmente de uma cor
europeu.porém com uma simbologia diferente. sempre presente,
O verde recebeu várias conotações simbólicas:
desde que não tenha sido
cor da natureza da criação, do renascimento e, tam-
bém, da vida. Assim,a vegetação é verde.mas tam- perdida
bém pode ter um sentido negativo: a morte, a livi- a mensagem, e esta cor é a branca.
dez. Desta forma é ela a transmissão e ponte entre o
negro (ser mineral) e o vermelho (vida animal), entre
vida animal e decomposição, morte. Indica o deses-
pero, a loucura.sendo muito ampla a sua gama inter-

THOT . 27
No caso do Quarup - ritual religioso em ho-
menagem aos mortos e que revive a lenda da cria-
ção - são utilizadas duas cores fundamentais para
a pintura corporal dos participantes: o preto e o
vermelho. Têm ambas um significado dentro do con-
texto no qual se encontram inseridas, distanciando-
se da conotação que normalmente lhe são atribuí-
das. São usadas como símbolo e como índice. O pre-
to, retirado do carvão, aparece na pintura corporal.
Seu símbolo original foi o de energia, força solar.
Usado em. todas as mensagens relativas à matriz,
órgão feminino gerador, produtividade e, com este
sentido, perdura até os dias de hoje. O vermelho, ob-
tido do urucu, tem uma tonalidade vibrante e é usa-
do na pintura corporal com prolixidade. Nesta ceri-
mônia tem uma função meramente indicativa, é uti-
lizada como denominador comum de todos os ele-
mentos ligados ao problema da vitalidade.
Pintura corporal usada no Jawari

No J awari - cerimônia kamiurá do Alto Xin- Verifica-se que o uso da cor, tanto como sím-
gu - volta a ser usado o vermelho, o preto e o bran- bolo e/ou como índice, justamente devido à coriota-
co. O preto.corno símbolo.esta repleto de significa- ção simbólica que adquire em certos casos, constitui
dos e elementos comunicativos indicando energia, um indicador de decodificação da mensagem salva-
porém sob um enfoque todo especial, neste caso: guardada. Nota-se que ainda se mantém, em alguns
sêmen ou matriz. O vermelho continua com a sua rituais e cerimônias, em toda a sua pureza,o que nos
função indicadora. O branco, retirado das areias dos possibilita a decodificação da mensagem transmiti-
rios e de terras esbranquiçadas, é índice. Ressalta a da.
sua permissibilidade, isto é, a veiculação para o trân- Podemos sintetizar afirmando:
sito do elemento principal que poderia ser alterado - Todos os códigos de salvaguarda informati-
com o uso de qualquer outra cor, sendo a conotação va não verbal, originados dos ritos da fertilidade,
portanto alterada. participam fundamentalmente de uma cor sempre
presente, desde que não tenha sido perdida a mensa-
gem, e esta cor é a branca.
- As cores de apoio utilizadas nos rituais
e objetos que se tornaram informações destes códi-
gos específicos, como caso dos rituais das tribos do
Alto Xingu, não foram escolhidas ao acaso,mas pos-
suem uma conotação cujo referencial é o elemento
divino - característico desta região - .
- Este elemento divino é sempre sistematizado
em códigos mitológicos que se utilizam de uma de-
terminada cor e de rituais e objetos cuja finalidade é
a manutenção e a veiculação de um tipo específico
de informação.
- Cores específicas foram, conseqüentemen-
te, utilizadas por outros povos e nem sempre foram
codificadas verbalmente mas não deixam de perten-
cer ao campo da comunicação não verbal. Possuem
uma conotação simbólica precisa e podem ser passí-
veis de decodificação, o que fizemos neste presente
Guerreiros preparados para a Cerimônia do Jawari estudo.

Yolanda Lhullier dos Santos

28 THOT
RENÉ FÜLLOP MILLER
Posição filosófica Fé e Razão

Nasceu em 1891, na região Banat da Hungria, menos lineares, porque os grandes momentos em
mais tarde cedida à Romênia. Seu pai era um emi- que se criou algo de novo não foram momentos de
grante alsaciano, sua mãe originária da Servia. A am- lógica; estes momentos vêm do inconsciente, à mo-
plitude de seus backgrounds está em harmonia com da de poesia".
a versatilidade de seu gênio. Como jornalista, editor Cabe aqui a lembrança de Paulo Claudel de
e escritor criador, ele residiu em Viena, Paris, Buda- que "a poesia é criação divina, dá testemunho de
peste, Moscou, Londres, Los Angeles, Nova Iorque e Deus, pois em sua pureza, como a prece, é um e
muitos outros lugares. Firmou seu nome de escritor mesmo anseio da alma humana".
com a obra "The Mind and Face of Bolchevism" e Rene Füllop Miller em sua "nota ao leitor mo-
as biografias de Lenin, Gandhi, Tolstoi, Dostoevski demo", que serve de introdução ao seu livro "Os
e do Papa Leão XIII. Escreveu, também, livros sobre Santos que Abalaram o Mundo", faz a colocação de
o teatro russo e americano, e sobre ciência médica que uma filosofia superficial inclina o pensamento
como, por exemplo, seu recente best-seller "O do homem para o ateísmo; mas uma fílosofía pro-
Triunfo sobre a Dor", e muitos outros assuntos de funda conduz as mentes humanas à religião.
importância histórica e cultural. Nos Estados Uni- Os grandes filósofos precursores do raciona-
dos, ele é mais conhecido como o autor de "Raspu- lismo do séc. XVIII, diz ele, eram bastante humildes
tin, the Holy Devil" e ''The Power and Secret of the para reconhecerem os limites da experiência percep-
Jesuits". Em seus livros ele revela uma compreensão tiva. Curvavam-se, reverentes, diante das coisas para
apaixonada, quase mística, das experiências e pro- além da esfera da investigação racional. Pedro Bayle,
blemas religiosos, aliada a um conhecimento claro que com sua filosofia cética forneceu as bases do ra-
e científico de todas as face tas da psicologia huma- cionalismo esclarecido, admitia francamente que a
na. razão basta, quando muito, para revelar erros e não
O homem em referência foi discípulo dos fa- para descobrir verdades.
mosos psiquiatras Babinski, Forel e Freud. Subme- Entrementes, as ciências empíricas na sua bus-
teu-se de livre e espontânea vontade ao treinamento ca das leis naturais fizeram, uma após outra, assom-
mental e espiritual dos "Exercícios" de Inácio de brosas descobertas induzindo a razão, consequente-
Loyola, e viveu como um eremita na curiosa repúbli- mente, a tirar a falaciosa conclusão de que somente
ca de monges na ilha grega de Aatos, da qual retor- ela possui a chave do verdadeiro conhecimento.
nou ao mundo como pouquíssimos. outros fizeram, Com crescente liberdade e ousadia foi proclamada
para continuar sua carreira de grande escritor abor- a teoria de que para a ciência nada poderia haver de
dando tópicos de eterno interesse humano. sobrenatural e incompreensível e de que, pelo con-
trário, cada fenômeno, cada ocorrência, poderia
POSIÇÃO FILOSÓFICA, FÉ E RAZÃO ser explicado por meio de causas naturais jacentes
inteiramente dentro dos limites da investigação em-
O poeta é o turgimão do homem, diz José Or- pírica.
tega y Gasset. Padecemos de mudez no nosso secre- Cada vez que uma nova lei da natureza era
to falar interno, em nosso solilóquio. Não sabemos descoberta e formulada a humilde modéstia, que ti-
dizer a nós mesmos as palavras com as quais nos en- nha até então caracterizado os antecessores do em-
tenderíamos. O poeta é nosso intérprete, daí a im- pirismo, tomava-se mais fraca enquanto que a arro-
pressão de' que nos plagia. Nosso falar é o falar de gância e confiança na razão humana continuavam a
outras bocas, que em nós encontra ressonância. crescer.
Para enfatizar o pensamento de René Füllõp Kant, destinado a tomar-se um dos mais seve-
Miller, faço uso do dizer de uma crônica de Patrícia ros críticos da razão, chega à conclusão, em sua
Bins: "Os verdadeiramente conscientes, os que cul- "Crítica da Razão Pura", da impossibilidade da
tivam a reverência pela vida, sabem que devemos apreensão da metafísica como ciência; mas, se é im-
integrar a ciência, o progresso, nosso modus vivendi, possível como conhecimento científico, especulati-
com outras formas de criatividade menos lógicas, vo, teorético, não quer dizer que seja impossível em

THOT 29
absoluto. A causa primeira, Deus, a alma, não se ex- imobiliza o objeto de estudo", diz Bergson; trata-se
plicam com a objetividade com que se explica uma de uma pausa e não do tempo que flui, de algo "vi-
máquina, o que não invalida sua existência e nossa tal", com velocidade presentes e acelerações presen-
possibilidade de participação nessa realidade, para tes. No macrocosmo, a concepção do universo como
além de toda intelectualização. Kant consegue de- mecanismo de relógio figura hoje como ferro-velho e
monstrar que as teses e as antíteses convivem juntas; pensamento fora de uso.
o lógico e o ilógico. Junto com a razão devemos dar René Descartes, o primeiro a proclamar a su-
lugar à força que chamamos o acaso, o imprevisível; premacia universal da razão, o pensador que postu-
os historiadores sen tem horror ao acaso, irrita-lhes e lou a dúvida como começo da busca humana da ver-
ofende-lhes o juízo. O acaso é a potência inimiga da dade, (a dúvida uma imperfeição, a certeza uma per-
razão, o enfant terrible , que zomba e ri da razão; feição) e procura explicar em termos mecânicos os
que, exibindo-se cinicamente, ofende o pudor da movimentos das estrelas e a pulsação do coração hu-
ciência. O historiador do futuro, é claro, terá que mano e do animal, estava preparado para reconhecer
achar no real, como um de seus ingredientes, o aca- Deus como a mais firme e perfeita realidade, como a
so; e terá que prestar-lhe atenção, sublinhar-lhe a causa primeira de todos os fenômenos. Blaise Pascal
existência, como faz com as restantes forças da natu- a quem as matemáticas e a física devem a descoberta
reza; terá, ainda, que reabilitar o acaso de sua pejo- de princípios de fundamental importância, combi-
rativa qualificação de irracionalidade, apenas porque nou seu conhecimento com sua fé nas leis de Deus.
foge ao limite de nosso pensar, e engolir sem escrú- O mesmo acontecia com Leibniz, cabeça enciclopé-
pulos e sem melindres aquilo que escapa às nossas li- dica, autoridade científica indiscutida. E até mesmo
mitações. Voltaire, o grande livre pensador do séc. XVIII, es-
Os cientistas chegaram à conclusão, diz René creveu como derradeira confissão: "Morro adorando
Füllõp MilIer, de que o que havia sido interpretado a Deus."
como leis da natureza, não era nada mais que o cál- O físico Ernest Mach exprimiu suas dúvidas
culo das probabilidades. Este cálculo das probabili- quanto à aplicação da razão no domínio da ciência
dades, com suas médias estatísticas, aplicava-se so- natural e escreveu: "Quando pensamos ter logrado
mente a enormes números de exemplos, a inumerá- êxito na compreensão dum processo, o que aconte-
veis repetições de um mesmo processo. No domínio ceu de fato foi ligarmos incompreensibilidades des-
do infinitamente pequeno, no mundo dos átomos e conhecidas e incompreensibilidades conhecidas".
elétrons, porém, estes grandes números não mais fo- A religião e a ciência são duas formas podero-
ram encontrados. Aqui prevalecia o poder que cha- sas que influenciam a força de nossas intuições reli-
mamos acaso, um destino microscópico que zomba giosas e a força de nosso impulso para a observação
do cálculo da razão. De modo que se tornou de todo acurada e a dedução lógica. Há verdades mais amplas
discútivel se as forças humanas do conhecimento e perspectivas mais belas na reconciliação dessas
não enfrentam aqui barreiras intransponíveis ... duas tendências do espírito humano. Onde? Numa
Quanto mais avançava a biologia mais impossível religião mais profunda e numa ciência mais sutil.
achavam os biologistas reduzir a vida a uma fórmu- A religião, lembra René F. Miller, se relaciona
la racional, até mesmo a das plantas mais minúscu- com os valores que trazem à nossa consciência aque-
las. Eram obrigados a constatar que o "Newton da le lado permanente pelo qual nos podemos interes-
folha de erva" ainda não aparecera ... e não apare- sar, dotando o momento transitório com a significa-
cerá ... ção do permanente. Sem a visão religiosa a vida hu-
mana é apenas um clarão de prazeres ocasionais,
E então, pouco mais de um século e um quar- uma bagatela de experiências passageiras ...
to depois que se estabelecu a ditadura da razão, com Vamos restituir à pessoa humana o seu direito
o objetivo do domínio universal outra revolução ex- à fé, a simplicidade e a crença de que não é um jo-
plodia: nova tendência filosófica liderada por Emílio guete de forças cegas do destino, mas que é um ser
Boutroux e Henri Bergson, que começou a minar a livre e está destinado a viver sobre a terra até que o
regra absoluta do racionalismo e a lutar pela validez germe da perfeição divina que nele existe possa flo-
das verdades metafísicas. O materialismo anti-rneta- rescer.
físico perdia terreno quanto mais atrevidamente ten-
tava atacar os problemas da vida, para deduzir de Ivone Pletsch
mortas leis mecânicas os fenômenos vivos. "A ciên-
cia tem uma atitude artificial para a sua atuação,

30 THOT
o Universalismo
em Ashoka
1. INTRODUÇÃO

No continente ocidental a idéia de universalismo A Ashoka só restava uma região por conquistar:
sociológico começa a tomar forma nos começos do Kalinga, a atual Orisa, que finalmente caiu sob seu
século XX dentro da Escola de Viena, com Othmar domínio. Foi uma guerra realmente cruenta e, se-
Spam, Heinrich e seus discípulos. Porém, na busca gundo as próprias palavras do imperador, "Cen to e
de fontes mais antigas podemos remontar ao século cinqüenta mil pessoas foram deportadas, cem mil
IV a.C., no sub-continente indiano. Ashoka, o gran- sofreram morte violenta e um número várias vezes
de imperador, grande por seus dotes de político, superior a este pereceu" (1 ).
guerreiro, estadista, religioso, místico e sobretudo Até este período de sua vida podemos ver que,
por sua grandeza como ser humano, propendia à como herança, se entrega a Ashoka um império mui-
união de todos os homens. to vasto, quase toda a península, exceto a zona de
Esta idéia, tratou de impô-Ia dentro das possibili- Kalinga que era de importância vital para o império,
dades e conceitos de sua época. Conceitos que, a por ser a passagem obrigatória em direção ao leste.
nosso ver, foram realmente muito evoluídos para Também continua pondo em prática as regras do
seu tempo. Arthasastra, alma mater, de uma política expansio-
No grande território que constitui a India, e ao nista quanto a conquistas territoriais e centralização
correr de sua história, podemos encontrar grande do poder, sem deixar de lado todas as suas legisla-
diversidade de grupos étnicos, religiosos, Iingüísti- ções quanto aos impostos, sistema de espionagem
cos, de costumes e de seitas. para segurança do império e antecedentes do que foi
Como resultado de tanta diversificação o poder com os anos a geopolítica, como também relações e
se encontra dividido, dada sua realidade política e intercâmbio de embaixadores com os demais esta-
social. Pequenos reinos combatiam freqüentemente dos.
entre si para consolidar suas hegemonias. Como se pode avaliar até a conquista de Kalinga,
Ashoka não deixa de ser um imperador guerreiro
2. OS MURAIS com afãs de conquista territorial. É logo e paulatina-
mente depois de dita batalha, e de sua conversão ao
Com o advento da dinastia Maurya ao fim do budismo, que começa a desenvolver uma idéia pes-
século IV a.C., o quadro político se simplifica e o soal que o colocaria em um dos lugares mais impor-
poder se centralizará. Chandragupta Maurya, co- tantes da história.'
nhecido pelos gregos como Sandrocottos, sobe ao É interessante destacar que a religião imperante
trono dos Nandas por volta do ano 321 a.C. Levou na época era o hinduísmo, com grande profusão de
a cabo uma política expansionista conquistando to- ritos e sacrifícios. Também se dividia a sociedade
da a zona selêucida ao noroeste, atualmente Afega- nas clássicas quatro castas, que por sua vez tinham
nistão, e também controlou toda a planície do Indo numerosas sub-castas. Já o primeiro Maurya havia
ao Ganges. deixado a religião ortodoxa para se converter ao jai-
Bindusara é o segundo imperador e consegue sub- nismo que surge contemporaneamente com o budis-
jugar a zona do Decan. mo, religião assumida por Ashoka.
Ashoka recebe o império com um poder real uni- Tanto o budismo como o jainismo deixam de la-
ficado. do a divisão da sociedade em castas, para considerar
Segundo as crônicas, que divergem entre si, co- todos os homens iguais. Porém seria simplificar a
meçou seu reinado por volta do ano 272 a.C. questão fazer uma análise do pon to de vista pura-
O Arthasastra, tratado político que se atribui a mente religioso. Porque o budismo da época de
Kautilya, que foi ministro de Chandragupta, foi a Ashoka não era somente uma crença religiosa, mas
chave da estratégia que se desenvolveria para a unifi- um movimento social e intelectual.
cação do império, tanto no âmbito militar, como no A nova crença abraçada por Ashoka não impediu
administrativo, político e social. que se estabelecesse uma distinção entre sua fé pes-
Esse tratado continuou em plena vigência duran- soal e o apoio que oferecia ao budismo, por um la-
te o reinado do terceiro imperador. do, e por outro sua atuação como imperador man-

THOT 31
tendo-se imparcial com todas as religiões.
Isto se observa ao estudar seus éditos. Em uns se
dirige como imperador a seu povo, enquanto que em
outros se manifestam claramente seus direcionamen-
tos à sangha (ordem monástica fundada pelo Buda).

3. DHAMMA (lei, norma, verdade, o ensinamento


do próprio Buda)

Talvez o mais notável em Ashoka tenha sido uma


nova idéia no social e no político. É a idéia do
Dhamma, que tinha um significado muito amplo, se-
gundo o contexto em que se a empregasse - Lei
Universal ou Justiça, assim como Ordem Social ou
Religiosa.
É esta idéia de Dhamma que faz de Ashoka um
rei que se projeta mais além de seu tempo, dando a Fragmento de um édito de Ashoka
sua política um sen tido social.
A teoria do Dhamma dentro da India Mauryana
não era só o resultado de atos de piedade religiosa,
mas sim expressava uma atitude de responsabilidade 4. ÉDITOS
social.
Anteriormente se interpretava o Dhamma de Para dar a conhecer a doutrina gravaram-se os
Ashoka como um sinônimo de budismo; por conse- éditos em pedras e colunas construídas para esse
guinte, deduziam que no ânimo do imperador so- fim.
mente havia o desejo de converter o budismo na re- Essa idéia foi tomada das zonas norte-ocidentais
ligião do Estado, e da difusão de dita fé. que anteriormente haviam formado parte do impé-
O Dhamma estava projetado para criar uma cons- rio aquemênida, e que conservavam influências artís-
ciência, na sociedade, de responsabilidade partilha- ticas persas, já que os capi téis das colunas de Ashoka
da, do respeito mútuo de uma pessoa para outra. tinham uma notável semelhança com os de Persépo-
Era uma forma de reconhecer a dignidade de todos lis, mandados construir por Dario, assim como tam-
os homens, que eram chamados filhos do imperador. bém a redação inicial; por exemplo, Dario encabeça-
Foi o começo de uma sociedade estruturada sobre a va suas frases: "Assim diz o Rei Dario ... " e Asho-
base do respeito da individualidade na sociedade, ka: "O Rei, o amado dos Deuses, Puyadasse, fala as-
que tinha sua correspondência na concepção filosó- sim ... "(2)
fica da unidade na multiplicidade. "Todavia o conteúdo era muito diferente; os de
Dario glorificavam o imperador, narravam suas faça-
3.1 AHIMSA nhas e conquistas, e enumeravam os povos e tribos
que estavam sob seu domínio. Os de Ashoka faziam
A não violência [ahimsa} era outro princípio conhecer sua nova política e davam as instruções
fundamental do Dhamma. Isto implicava numa re- que deviam cumprir o povo e os ministros de seu
núncia às guerras expansionistas e à violência; porém governo."
não só à violência contra o ser humano como con- "Estes éditos tinham muitos toques pessoais, e as
tra qualquer forma de vida. inscrições foram provavelmente redigidas pelo mes-
Não obstante, aceitava que havia ocasiões em que mo imperador." (3)
a legítima defesa era necessária; por exemplo, em ca- É interessante ressaltar que estes éditos estavam
so de invasão do território por parte de outros po- redigidos em dialetos indianos médios, adaptados à
vos. linguagem popular. Por exemplo, nas regiões vizi-
Podemos analisar que a reforma no governo de nhas a Peshawar, a noroeste, estão em esci:ita Kera-
Ashoka tinha um sentido humanista dentro de seu rosthi, que deriva da escrita aramaica utilizada no
próprio reino. Aspirava à expansão de sua doutrina Irã; em Kandhar, no extremo ocidente do império,
nos territórios vizinhos, como um exemplo de gover- as inscrições. estão em grego e em aramaico, e em
no, até ser aceita por todo o mundo. outras zonas da India, em escrita brâmane.

32 THOT
A escrita culta da época era o sânscrito, que só têm que ocupar-se dos fiéis da Lei, os
estava ao alcance dos brâmanes ou classes superio- Superintendentes da Lei ... "
res, porém completamente desconhecida pelo povo. Outro detalhe importante a salientar é que os Su-
Isto nos dá outra pauta de que as intenções do go- perintendentes devem ocupar-se do bem estar de to-
verno de Ashoka eram dirigidas ao povo todo, já das as seitas. Pelo que podemos afirmar que seu inte-
que sua preocupação era que, segundo a região, as resse não estava focalizado em um grupo específico
inscrições deviam ser feitas no idioma que o povo de fiéis, mas em todo o povo.
falava, para sua melhor compreensão e difusão. Outro édito que também põe em evidência o ob-
Também teve a inquietação de que seus escritos jetivo universalista de Ashoka é o VI sobre pedra.
fossem assentados nas zonas de fronteiras com os "Porque eu não me satisfaço com o
reinos vizinhos. As relações com eles eram fluentes trabalho e a conclusão dos assuntos.
e amistosas, desenvolvendo uma grande atividade Porque eu considero que meu dever é
diplomática. o bem de todo o mundo. Então o prin-
cípio disto, é trabalhar e tratar bem os
s. UNIVERSALISMO assuntos. Porque não há atividade su-
perior a fazer o bem do mundo inteiro.
No Édito V sobre pedra, Ashoka fala das boas e E todo o esforço que eu faça é para li-
más ações, e que tanto a conduta dele como a de berar uma dívida com respeito às cria-
seus sucessores devem corresponder à prática da Lei. turas; aqui abaixo eu trabalho por sua
Explica a criação do cargo de superintendente da felicidade e no outro mundo eu quero
Lei, e especifica quais devem ser suas funções. Ade- que elas ganhem o céu.
mais, indica as regiões nas quais eles devem trabalhar Fiz gravar este texto da Lei para
e, como veremos, não se limita ao continente india- que ele dure muito tempo e para que
no, mas se projeta a seus vizinhos. meus filhos, netos e bisnetos se confor-
"O Rei amigo dos deuses e de olhar mem para o bem do mundo inteiro.
amigo fala assim: uma boa ação é uma Porém é difícil sem um grande esfor-
coisa difícil. Quanto a mim, tenho fei- ço."
to muitas boas ações. E meus filhos, Três vezes, de forma bem explícita, este texto de-
netos, e toda aquela que seja minha monstra o interesse de Ashoka para que a Lei seja
posteridade até o fim do mundo, se posta em vigência em todo o universo.
eles seguirem meu exemplo, farão O Édito XIII sobre pedra é talvez um dos mais
igualmente boas ações. Porém, o que extensos e exemplificadores de todo o seu pensa-
descuidar de algum detalhe obrará mal, mento. Mostra seu arrependimento pelo desastre
porque o pecado é coisa fácil. que causou em Kalinga e enumera os mortos e de-
Em tempos passados não existiam portados. Porém afirma que não são as batalhas que
os "Superintendentes da Lei". Eu, de- asseguram a vitória de um rei, senão a paz. É a prá-
pois de treze anos de minha consagra- tica da Lei que deve expandir-se através cte seus en-
ção, criei os Superintendentes da Lei. viados e ganhã-los para a prática da Lei.
Eles devem ocupar-se de todas as Sei- " ... O benefício que se obtém é
tas para a instauração da Lei, para seu uma vitória universal."
progresso e para o bem e felicidade dos Achamos que este parágrafo é muito claro e pre-
fiéis da Lei entre os Gregos, Carnboja- ciso quanto ao pensamento que queremos sublinhar.
nos, Gandharianos, Rustika, Petimika
e outros ocidentais." ''Todos os homens
Cremos que o parágrafo anterior é claro quanto
são meus filhos. Como para
ao desejo de Ashoka de expandir sua idéia, sobre a
prática da Lei, e finaliza este édito reafirmando o meus filhos,
anteriormente exposto e rubricando sua intenção de eu desejo a eles todo bem
que esta Lei seja difundida universalmente. e felicidade neste
"No que concerne ao domínio da
mundo e no outro. l! isto que
Lei, o estabelecimento da Lei, a admi-
nistração de caridade em todas as eu desejo
partes ( em mim mesmo) para todos os
sobre a terra homens."

THOT 33
Nos Edítos Separados de Kalinga, no n\> 11, diri- messa firme, terei em mira a felicidade
gindo-se a Tosali e a Samapa, fala assim:
' Sob a ordem do amigo dos deu-
seus. A Tosali,
J das pessoas. Porque tendes o poder pa-
ra dar-lhes confiança, bem e felicidade,
neste mundo e no outro. Fazendo as-
o sim, fã-los-ãs ganhar o céu e liberareis
[ O Amigo dos deuses fala assim a minha dívida de obrigação ... "
Samapa, O édito continua indicando em que lapso de
príncipe, e os Superintendentes porta- tempo deve ler-se o mesmo.
dores das ordens reais devem ouvir as- O importante é ressaltar que no texto anterior o
sim: imperador assume a todos os homens como seus fi-
O que julgo bom, eu desejo obtê-lo lhos. Também deseja que os estados limítrofes adi-
por minha ação e levã-lo adiante com ram à prática de sua Lei sem nenhum tipo de inquie-
método. O que eu considero como o tação; que só deseja o bem deles neste mundo e no
melhor método nesta matéria são mi- outro.
nhas instruções a vocês. O Edito VII sobre coluna, sem ser tão manifesto,
Todos os homens são meus filhos. reitera a idéia de que todos os homens devem con-
Como para meus filhos, eu desejo a formar-se à prática do Dhamma,
eles todo bem e felicidade neste mun- ". . . O progresso da Lei entre os
do e no outro. É isto que eu desejo pa- homens tem sido obtido de duas ma-
ra todos os homens. neiras somente: pelas regras da Lei e
Se meus vizinhos independentes se pela meditação ... "
perguntam o que eu desejo, tudo o que Dá dois métodos pelos quais o progresso humano
eu desejo é que se dêem conta de foi realizado; pela prática da Lei e pela meditação. O

que (O rei J quer


texto continua acentuando que é especialmente pela
meditação que o Ser humano pode alcançar seu ob-
o amigo dos deuses jetivo, ou seja, a prática da Lei.
que eles não tenham apreensão sobre "Agora mesmo eu fiz estabelecer es-
este assunto; que eles tenham confian- ta regra da Lei: proibição de matar tais
ça nele; que eles tenham felicidade e e tais seres vivos; outras regras têm si-
nenhum mal. Eles devem se dar conta do estabelecidas por mim; porém, é pe-
de que o rei suportará pacientemente la meditação que se obtém o maior
deles tudo o que seja possível suportar progresso da Lei, em vista da conserva-
e que por minha causa eles devem pra- ção dos seres e a abstenção da matança
ticar a Lei e vencer neste mundo e no dos animais.
outro. Eu fiz isto para que dure (o progres-
Com este objetivo é que eu vos dou so da Lei) entre meus filhos e meus ne-
minhas instruções indicando-vos como tos, tanto como a lua e o sol e que se
deveis livrar-vos da dívida que tendes dê a isto o consentimento. Porque con-
comigo, e fazendo-vos conhecer minha sentindo nisto se ganha este mundo e o
vontade sobre isto que é minha resolu- outro."
ção e minha firme promessa. Atuando
assim, a obra deve ampliar-se; eles de-
vem estar certos . . . deste modo eles . 6. CONCLUSÃO
poderão se dar conta de

que (O rei '1 é


Os éditos que anteriormente transcrevemos, e
analisamos, são aqueles nos quais se reflete mais ex-
o amigo dos deuses) plicitamente o desejo de Ashoka de conseguir a uni-
como um pai para eles, e que ele os ficação de todos os homens.
ama como a si mesmo; eles são como Porém, em um estudo de todos os seus éditos,
filhos (dO rei ) podemos ver Que essa idéia é o elo condutor e cen-
do amado dos deuses tral.
Dando estas instruções e fazendo co- Na breve análise que fizemos da idéia de Dham-
nhecer minha vontade a respeito do 11Ul e ahimsa encontramos as bases ou colunas que
que é minha resolução e minha pro- ,Jundamentam seu universalismo.

34 THOT
Ashoka pretendia, em sua idéia universalista, que
cada grupo social ou étnico mantivesse suas carac-
terísticas próprias e que estas fossem respeitadas pe-
los demais homens.
"Porém o Amado dos deuses não
considera que as prendas da honra se-
jam tão importantes como o progresso
essencial de todas as Seitas. Sua base é
o controle da língua própria, de modo
que não se exalte a própria seita ou se
denigra a de outra pessoa em ocasiões
pouco oportunas ... Em toda a oca-
sião se deve honrar a seita de outro ho-
mem porque, ao proceder assim, se au-
men ta a influência da própria seita e se
beneficia a do outro; enquan to que,
procedendo de outra forma, diminui-se
a influência da própria seita e se preju-
dica a do ou tro ... portan to, a concór-
dia deve ser recomendada a fim de que
esses homens possam ouvir os princí-
pios que outro susten ta." (5)
Capitel de Ashoka Falamos que este édito é suficientemente explíci-
Se a idéia filosófica de Dhamma significa Lei to no que se refere à tolerância e respeito para ou-
Universal ou Justiça, por extensão, trasladada à tros costumes ou seitas.
sociedade indiana, equivale à Ordem Social. Ashoka Em nosso entender, os elementos do universalis-
amplia ainda mais este fim dando-lhe uma conota- mo manifestam-se claramente através de todo o pen-
ção de responsabilidade social. samento de Ashoka.
"O Dhamma estava destinado a formar uma ati- ão deixamos de admirar o grande empenho que
vidade espiritual na qual a responsabilidade social, o pôs em uma doutrina que tem um substrato profun-
comportamento de uma pessoa para outra, se con- do de unidade, tratando de harmonizar as diferenças
siderava de grande importância. Era um pedido para in trínsecas da Sociedade Mauryana. para buscar a li-
reconhecer a dignidade do homem, para desenvolver nha diretriz em uma política que aspirava a elevar o
a tendência do espírito humanista nas atividades da nível de seu povo em diferen tes aspectos e. em espe-
sociedade." (4) cial, a hierarquizar o ser humano.
Se analisamos como se combina a idéia de Dham- Aspirou a que suas idéias fossem aceitas pelos
ma com seus diferentes significados, podemos ima- continuadores, tanto de seu império, como pelos
giná-Io como círculos concêntricos. O primeiro e governantes dos povos vizinhos, pensando que seria
menor seria o equivalente à Responsabilidade Social; uma conquista para a humanidade. Em outras pala-
o círculo que o rodeia, Ordem Social; e o terceiro e vras: dentro do mundo conhecido naquele momen-
maior, Lei Universal. Assim, desde o comportamen- to, pode se considerar a doutrina de Ashoka como o
to que implica uma Responsabilidade Social, se con- primeiro intento de universalismo.
seguiria a Ordem Social, que estaria em harmonia
Liliana Garcia Daris
dentro de uma Lei Universal.
Por outro lado, a idéia de ahimsa está incluída
(1) Thapar, Romila. "História de Ia lndia ", México, 1969,
dentro do Dhamma, Para levar a cabo este equilí- pg.86.
brio Social, deve se desterrar a violência que atenta
contra a base mesma da Sociedade. (2) Thapar, Romila. "Ashoka and decline of the Mauryas",
Como vemos, o pensamento de Ashoka é coeren- pg.251.
te em todo o momento e trata de implementar, pas-
(3) Basham, A. L. "The wonder that was Indía", pg. 53.
so a passo, sua idéia para a consecução de seus fins.
Não cremos que as fórmulas: "O bem de todo o (4) Thapar, Romila. "História de Ia lndia", pg. 104.
mundo", "O mundo inteiro", "Sobre a terra", se-
jam meras expressões, mas seu preciso significado. (5) XII Edito em Pedra.

THOT 35
o Homem
e seus Símbolos
In iciáticos
O HOMEM e o TEMPLO
o Homem e seus símbolos iniciáticos.

Assim como o esqueleto de um animal pré-


histórico nos induz a pensar sobre a centelha vital
que um dia o animou, sobre a ferocidade ou mansi-
dão, sobre sua pele e músculos e mil outras incóg-
nitas que não se esgotam na medida de nossa obser-
vação; assim a história nos apresenta esqueletos in-
completos do passado, colunas partidas, templos Coroa dupla do Alto e Baixo Egito
destruídos, documentos fragmentados que, como os
No Egito representavam esta fase pela dupla
ossos do nosso exemplo, embranquecem calcinan-
coroa do Alto e do Baixo Egito; e, ainda com maior
do-se a cada dia. clareza, através do gancho e o látego. Estes dois ele-
Reconstruir a aparência física de uma civiliza-
mentos indicam forças opostas, de atração uma, de
ção é tarefa ímproba, porém reconstruir os símbolos
repulsa a outra; o processo da vida interpreta-se co-
religiosos que permitiram a solidariedade espiritual
mo efeito da interpenetração destes princípios opos-
de um grupo humano é impossível sem a experiên-
tos que caracterizam a dimensão humana. Entretan-
cia íntima de intuições sacralizadas.
to, quando esses elementos (o gancho e o látego)
Cada vez que um arqueólogo descobre vestí-
aparecem cruzados nas mãos dos iniciados faraós,
gios da presença do homem em qualquer parte do
simbolizam um estado de consciência harmoniza-
planeta, encontra assim mesmo os espectros dos
da; a dualidade é conquistada pela unicidade, o
deuses que animaram seus sonhos de eternidade.
movimento, pelo equilíbrio estável, a guerra, pela
Mircea Eliade diz: "Quando nasce o sagrado,
paz.
o mundo começa a existir, não com um acima e um
O segundo momento está representado pelo
abaixo, mas como um modo ontológico. Espaço e
laço de Toeris, a deusa protetora dos nascimentos.
tempo tornam-se uma totalidade".
O nó desse laço une definitivamente os opostos pa-
O primeiro passo para a grande descoberta
ra deixarem de existir como tais, dando assim lu-
do sagrado está simbolizado por um traço que une
gar ao terceiro símbolo, que é o Ank. Esta cruz,
o céu e a terra; entretanto, o símbolo estaria ina-
chamada ansata, tem a mesma significação que as
cabado sem a presença de uma outra linha, esta vez
chaves de São Pedro para a simbologia cristã. Isto
horizontal, que demarca o horizonte visível, a mo-
é, é a chave que abre as portas do céu, do espírito,
mentânea realidade psicológica.
da virginal essência de todas as coisas.
Inicia-se, assim, a quarta etapa, onde o candi-
dato é representado navegando no rio Nilo, sobre
uma barca de papiro, e armado com um arpão. Ele
sabe, agora, quem são os inimigos da liberação, da
luz, e os enfrentará. É importante esclarecer que
estes inimigos ou divindades do mal são seus pró-
prios pensamentos, suas próprias projeções e fanta-
sias, que estão simbolizados por Sebek, o crocodi-
lo , emblema da morte e da transformação. Repeti-
Coroa do Baixo Egito Coroa do Alto Egito

36 THOT
cimento espiritual, a consciência cósmica iniciando
o vôo de retorno para se fundir em Amon-Rá. O
candidato tomará aqui a barca dos imortais e per-
correrá o espaço repetindo as litanias: "Eu sou o
hoje, eu sou o ontem, eu sou o amanhã".

o Homem e o Templo

As etapas da iniciação egípcia estão represen-


tadas no percurso que todo candidato faz a partir
do mundo profano até ingressar no Sanctum sancto-
rum.
TAOERIS OSIRIS O início pressupõe uma busca. Antes de che-
gar ao templo, o aspirante encontrará nas margens
do Caminho as esfinges, que anunciam com sua esta-
rã, então, as sagradas palavras: "Sebek ur Sebek", bilidade a proximidade do sagrado, do espiritual, A
eterna sentença das esfinges: "Decifra-me ou devo-
isto é, "Só a morte vence a morte". Morrendo para
ro-te" é a mesma que repetem silenciosamente todas
a vida mundana, desapegando-se das imagens ter-
as coisas da vida, que nos rodeiam; tudo exige ser
restres e procurando as celestes, alcançará o Oudjat,
desvendado, tudo nos desafia a rasgar os véus da
o olho da visão justa, o agente da justiça.
Este olho, que no céu se expressa como a es- aparência e penetrar no âmago, no coração, onde a
trela Shoter (Sírio) e na terra como o homem verti- Verdade e a Realidade habitam desde o início dos
tempos,
calizado, simboliza a quinta etapa, onde Horus apa-
rece vitorioso após a luta com Seth. Nesta batalha Ultrapassado este caminho flanqueado por
Horus perdeu seu olho lunar, que lhe impedia de ver enigmas, o candidato chega ao grande portal do mu-
o mundo espiritual, e conquistou o Oudjat. ro que protege o templo, Este portal, ou Pilono ,
separa o mundo exterior do mundo interior, o pro-
fano, do sagrado, e está ornamentado com obeliscos
ou mastros com auriflamas; os primeiros são símbo-
los do poder de fixar as energias do sol, e as flârnu-
Ias o de propagar estas energias no recinto do
templo.
Transposto este portal, o candidato enfrenta
corredores com colunas em que estão gravadas ce-
nas do templo e da vida do templo. Estes corredores
ao ar livre formam um grande pátio, que representa
o lugar do sentimento, onde o candidato vive a por-
ção de céu que lhe corresponde por devoção.
Imediatamente está a sala hipóstila que, tam-
bém repleta de colunas, simboliza o mundo mental
concreto, o bosque das idéias que floresceram.
A seguir entra-se num recinto que tem, como
SETH HORUS
único ornamento, uma barca solar, expressão mate-
rializada de um sonho que alguma vez desabrochará,
e receptáculo da faísca do mistério.
A sexta etapa é aquela em que o homem reali-
za sua própria síntese, e está representada por Djed, Finalmente, aparece o homem-pássaro, um ho-
o pilar da estabilidade, através do qual circulará a mem com asas, ou uma andorinha com cabeça hu-
energia do espírito nutrindo o superior e o inferior, mana, simbolizando o deus interno que já despertou
recriando assim o eixo vertical da primeira etapa, e atingiu a parte mais interna do templo, aparente-
porém num plano mais elevado, e abrindo o cami- mente a menos importante, 'onde aparece gravada
nho para o sétimo e último passo, cujo símbolo é a imagem de um personagem totalmente vestido
Quepher, o escaravelho alado, que indica o renas- de branco, em atitude de adoração. Neste último

THOT 37
espaços. É o mistério da metamorfose para passar
da árida pedra à consciência luminosa.
Dentre os escritos atribuídos a Hermes Trime-
gisto encontramos este que, pela sua beleza e pro-
fundidade, acreditamos justo transcrever:

Oh! Alma cega!


Colhe a tocha dos mistérios
E na noite terrestre
Descobrirás teu duplo luminoso,
Tua alma celeste.

Segue o guia divino


E que Ele seja teu gênio
Porque Ele tem a chave de tuas existências
Passadas e Futuras.

A venida de esfinges Escutai dentro de vós mesmos


E mirai no infinito
degrau da longa caminhada, a entrada da luz ilumina Do Espaço e do Tempo.
o recinto inteiro, símbolo da mais excelsa espiritua-
lidade, pois é a luz do espírito que faz com que as Ali se escuta o canto dos Astros,
coisas se tornem visíveis; o personagem vestido de A voz dos Números,
branco representa o homem divinizado. A harmonia das Esferas.
Assim, de maneira simples, os egípcios expli-
cavam o que o homem deve chegar a ser. A diferen- Cada Sol
ça entre o templo e o homem é que o templo re- E um pensamento de Deus, e cada planeta
presenta dentro do espaço e num único tempo o que Uma forma deste pensamento.
o homem deve desenvolver no tempo e em vários
Conhecei o pensamento divino, oh! Almas!
E a razão pela qual desceis
E subis penosamente
O caminho dos céus.

O que fazem os Astros?


O que dizem os Números?
O que desenham as Esferas?

Oh! Almas perdidas ou salvas!

Dizem,
Cantam,
Desenham vossos destinos.

Caminhante, olha os deuses, deixa que te abra-


cem; escuta o vento que canta entre as pedras milena-
res, ele te contará uma história sobre a luz que aguar-
da tua descoberta!

Basílio Pawlowicz

Templo de Hatshepsut

38 THOT
NADA ESTÁ LONGE DE TI

Nada está longe de ti.


As distâncias!
Que importam as distâncias?
Bem sabes que as distâncias só existem para teu corpo.
Tua alma se encontra perto de todas as coisas.
Mais ainda: tua alma está na essência mesma de todas as coisas.
Sem teu corpo, nem a luz, com seus trezentos mil quilômetros de
velocidade por segundo, igualaria o vôo do teu pensamento.
Se olhares bem, tudo se encontra a teu alcance.
Não há estrela a que não possas chamar tua.
Move teu pensamento com liberdade absoluta. Acostuma-o a altos
vôos progressivos. Tenta o recorde da altura ...
Deixa-o ir e vir através do Universo.
Cada dia te darás mais conta da aparência e da mentira da tua jaula.
Com a noção da tua liberdade imensa, aumentarás teu desejo de
posses eternas.
E há, por certo, uma posse que se te oferece a cada instante e
que não tem limites: a posse de Deus.
Aceita-a.

DENTRO DE TI ESTÁ O SEGREDO

Busca dentro de ti a solução de todos os problemas, até daqueles


que creias mais exteriores e materiais.
Dentro de ti está sempre o segredo; dentro de ti estão todos
os segredos.
Também para te abrir caminho na selva virgem, também
para levantar um muro, também para estender uma ponte,
hás de buscar antes, em ti, o segredo.
Dentro de ti há, estendidas já, todas as pontes.
Estão cortados dentro de ti as brenhas e cipós que fecham
os caminhos.
Todas as arquiteturas estão já erguidas dentro de ti.
Pergunta ao arquiteto escondido: ele te dará suas fórmulas.
Antes de sair à busca do machado de melhor corte, da
picareta mais sólida, da pá mais resistente, entra em teu
interior e pertunta ...
E saberás o essencial de todos os problemas e se te ensinará
a melhor de todas as fórmulas e se te dará a mais sólida
de todas as ferramentas.
E acertarás constantemente, pois que dentro de ti levas a
luz misteriosa de todos os segredos.

Amado Nervo

I THOT 39
I ~I
l
Página dos Leitores

CORRESPONDENCIA
do consta nos editais do concurso, o trabalho que
Prezado Editor: seja premiado em 1Q lugar será publicado ná íntegra
nesta revista, possivelmente no número 34, que se-
No último número editado, o 32, em cuja guramente receberá. Gratos pelo seu interesse, in-
capa aparecem três divindades indianas, constam à formamos que a entrega de prêmios se realizará em
página 1 as explicações de só duas: Ganesha e cerimônia pública aqui na sede da Associação, às
Sarasvati. Poderiam dizer-me quem é a terceira? 20:00 hs. do dia 31 de março próximo, oportunida-
Receba minhas felicitações por tão interessan- de em que o aguardamos.
te e incomum publicação.
THOT: Dado o grande número de cartas que
A. L. - Niterói - RJ recebemos solicitando exemplares atrasados desta
publicação, passamos a indicar os números que ain-
THOT: De fato, por um erro involuntário omi- da existem à disposição dos interessados: 7, 8, 11,
timos a explicação de Lakshmi, a terceira divindade. 12, 13, e 16 a 32. Os mesmos podem ser solicitados
Ela é a consorte de Vishnu e, portanto, o símbolo por carta ou pessoalmente, à Rua Leôncio de Carva-
do feminino por excelência. Freqüentemente apare- lho, 99 - Paraíso - CEP 04003 - São Paulo - tele-
ce sob o nome de Sri, e na magnífica epopéia do fone 288-7356.
Ramayana é considerada a deusa do Amor, da Be-
leza e da Prosperidade. Entretanto, em outros textos THOT: Desejamos agradecer a todos os que
tradicionais, é a Senhora da Fortuna, que garantia o nos enviaram votos de um feliz 1984, que retribuí-
êxito e a continuidade do poder; por causa disto mos, esperando que todos nos reencontremos sem-
era invocada por reis e estadistas. Esperando contar pre amando a Verdade, a Beleza e a Retidão.
com a sua compreensão e a de todos os leitores, Ademar E. de Mello; Adolpho Cyriaco Nunes de Souza;
agradecemos sua carta, que nos permitiu reparar a Aloisio Costa; Assis Jaime Oliveira; Atmacharya Ashrarna;
omissão cometida. Autêntica Equipamentos e Máquinas Ltda.; Banco Noroes·
te; Beatriz de Luca Ito; Beba e Máximo Mohadeb; Bibliote-
ca Karl A. Boedecker; Blanca Nagose; Carlos Ferreira;
Senhores: Correcta Engenharia e Construção Ltda.; D. Isidoro O. S.
B.; Daniel Poit; Denise Ramos; Diaulas Riedel; E. Sforzin e
Cia.; Editora Fundo Educativo Brasileiro; Eico Suzuki;
Li e recortei no OESP a notícia sobre o Con- Eleonora Romano Aires; Elizal;>eth e Renaldo Spaolonzi;
. curso Nacional "Importância e Significado do Pen- Faculdade Anhembi Morumbi; Faculdade e Conservatório
samento de Ortega y Gasset". Não tive tempo para Marcelo Tupinambá; Fernando Taulois da Costa; Fundação
Bienal de São Paulo; Global Editora; Grupo Rajarãm;
participar do concurso. Tudo o que li sobre Ortega Hemus Editora; Henrique Pinto; Henry I. Sobel; Indústria
foi nos dois suplementos de jornais: Cultura (OESP). de Papel e Celulose de Salto S. A.; Instituto Goethe; Irene e
e Gazeta (Jornal de Brasílía). Silvio Alexandre; Jandira Waters; Jagdish C. Jain; Jnana
Mandirom; Jornal de São Paulo Zona Zul; José Antonio
Venho solicitar uma cópia do trabalho vence- Machado Filla; José Luiz Archanjo; Kabengele Munanga;
dor, quando este for publicado. Deixo-lhes meu Kalpana Sharma; Karin Schindler; Kiyoko Hiramatsu; Liete
endereço e agradeço antecipadamente sua atenção. de Freitas Alvarenga; Mansour Challita; Maria das Graças
von Zastrow; Maria de Lourdes Pereira; Maria de Lourdes
Polido,; Maria e José Hermógenes de Andrade; Maria Merce-
J. F. M. - São Paulo - SP des Terren; Maria Thereza Masson; Marilda e Jaime Treiger;
Marisa Mortari; Neyde Villaça Mortari; Núcleo de Voga
Ganesha; Orlando Rodante Filho; Papelaria Dux Ltda.;
THOT~ Lamentamos que não tenha tido possi- Roberto Ceron; Roseleine Baptista: Satyananda Ashram;
Siderúrgica Fi-EI S. A.; Shopping News; Sociedade de Obras
bilidade de participar deste concurso; entretanto, es-
Religiosas de Monteiro Lobato; Sociedade Teos6fica no
timamos que haverá outros concursos literãrío-fílo- Brasil; Teresa de Barros Velloso; Thalysia Kleinert; Tintas
sóficos promovidos por esta publicação e a Associa- Supercor Ltda.; Tonyan Khaliyhabby; Unia'o das Comuni-
dades Lusíadas: Vania Maria Neves;Wilson Ferraz.

r------~--------------,
ção Palas Athena, aos quais possa concorrer. Segun-

Para receber uma assinatura anual da revista cultural THOT (seis 'números), envie
I cheque nominal no valor de Cr$ 6.000,00, para Associação Palas Athena do Brasil, jun- I
to com seu nome e endereço completos. .,.'"
I Rua Leôncio de Carvalho, 99 - Para(so ••••••••••••••
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04003 - São Paulo - SP. ••••••• ~\\.~ 't.,......•
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para o' .

INTRODUCÃO AO
PENS~ME'NTO
FILOSOFICO
tTICA: aspectos ético-filosóficos do Bramanismo e Bu-
dismo (leitura comentada de Bhagavad Gita, A
Voz do Silêncio e Dhammapada); o pensamento
ético de Aristóteles, Plotino, Kant e Bertrand Rus-
seI; a ética crista.
FILOSOFIA DA HISr6RIA: introdução ao caráter geral da História; fundamen-
tos teoréticos; ciclos e ritmos históricos; História e
Mitologia; teorias históricas de Clcero e PIatão.
S6Clo-poLlrICA: análise comparativa de indivlduo, sociedade e es-
tado, na visao clássica e moderna; a moral como
fundamento do direito social e do dever polltico:
estado liberal e estado dirigido.

IDADE MfNIMA: 18 ANOS INFORMAÇOES:


AULAS UMA VEZ POR SEMANA . RUÁ LEONCIO DE CARVALHO, 99
DURAÇÃO: 22 AULAS A
• PARAfso - SÃO PAULO
INIcIO TODOS OS MESES ~ An\~ SP. FONE: 288.7356.
Graças a Deus,
tudo" "pode
ser aperfeiçoado .,
nesta vida ..

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