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psicossomática e sistêmica
All the contents of this work, except where otherwise noted, is licensed
under a Creative Commons Attribution 4.0 International license.
Capa
Rafael Chimicatti
Projeto gráfico
Vítor Massola Gonzales Lopes
Editoração eletrônica
Guilherme José Garbuio Martinez
Apoio
Fapesp
ISBN – 978-85-7600-402-8
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônicos ou mecânicos, incluindo fotocópia e
gravação) ou arquivada em qualquer sistema de banco de dados sem permissão escrita do
titular do direito autoral.
“Existe uma canção que precisa ser cantada
em nossa cultura: a canção dos ritmos dos re-
lacionamentos, das pessoas enriquecendo-se e
expandindo-se mutuamente. O ruído e o tu-
multo da vida cotidiana muitas vezes abafam o
som das harmonias que tornam possível a vida
compartilhada – as melodias da mútua acomo-
dação e apoio cimentam a interação humana.”
(Salvador Minuchin)
Agradecimentos
Referências 189
1. Introdução: em busca da
compreensão humana
1.1 Apresentação
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
1 Mrazek e Klinnert (1996), Mrazek (2003), Klinnert, Kaugars, Strand e Silveira (2008), Nagano et
al. (2010), Peçanha e Lacharité (2007).
2 Madrid (2006).
3 Rockenbach-Peçanha (1993).
4 Boszormenyi-Nagy e Framo (1980), Bowen (1984), Molinari, Taverna, Gasca e Constantino
(1994), Seywert (1990), Shapiro (1991).
5 Minuchin, Rosman e Baker (1978).
6 Frey (1995), Gustafsson (1987), Gustafsson, Kjellman e Bjorksten (2002), Onnis (1989).
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A criança com asma e sua família
7 Fiese (2008), Gustafsson, Kjellman e Bjorksten (2002), Klinnert, Kaugars, Strand e Silveira
(2008), Molinari, Taverna, Gasca e Constantino (1994), Nagano et al. (2010).
8 Cabral et al. ([2002] 2010), Fritz, Spirito e Yeung (1994), Klinnert, Mrazek e Mrazek (1994),
Mrazek (2004), Mrazek e Klinnert (1996), Mrazek, Klinnert, Mrazek e Macey (1991), Peçanha e
Lacharité (2007).
9 Wood et al. (2008).
10 Pérez-Ramos (1990).
11 Eiser (1990).
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22 Fiese (2008).
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2. O que dizem livros e artigos
sobre o tema
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2.1.1 Epidemiologia
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crianças também sofrem por se sentirem diferentes das demais e por te-
merem um ataque de asma, conforme referido em revisões de estudos.34
A prevalência mundial da asma pediátrica (número de indivíduos
acometidos) varia desde 36% (Reino Unido) até 1,6% (Indonésia), com
uma média em torno de 9%. No Brasil, a média estimada é de 13%,35 sen-
do que nosso país é o 8o no mundo em prevalência de asma. Aproxima-
damente 20% dos brasileiros têm ou já tiveram alguma manifestação da
doença, sendo que 25% destes apresentam a forma moderada ou grave,
que pode levar à morte se não diagnosticada e tratada corretamente.36
Um fato importante é que a incidência (número de casos novos/
ano) tem aumentado consideravelmente nos últimos anos, inclusive no
Brasil, e sua causa ainda permanece bastante desconhecida. Cerca de
10% da população mundial já apresentou algum episódio asmático,37
com predomínio dos casos de asma leve (60%), seguido do tipo modera-
do (25% a 30%), e, por último, a enfermidade de tipo grave (5% a 10%).
A morbidade da asma vem crescendo em várias partes do mundo,
notadamente na Nova Zelândia, na Alemanha, no Reino Unido e nos
Estados Unidos. Tal fato, potencialmente grave, gera discussões que bus-
cam entender o aumento nas taxas de prevalência, morbidade e mortali-
dade registradas, no mundo ocidental, desde a década de 1960. Um dado
importante é a inadequada percepção da intensidade do broncoespasmo
por parte de muitos pacientes, seja na crise aguda, seja no período entre
as crises. Alguns pacientes apresentam uma forte sensação da obstru-
ção brônquica, o que pode levar ao uso excessivo de medicamentos; por
outro lado, há pessoas incapazes de perceber tal obstrução antes que ela
atinja níveis críticos. Em geral, os últimos pacientes são subtratados, fi-
cando em potencial risco de morte.38
Em relação à mortalidade por asma, ela tende a ser baixa, osci-
lando de 1,5 a 9/100.000 em todas as faixas etárias onde há registro da
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39 Id. ibid.
40 Crespo et al. (2011).
41 Garro (2011).
42 Casagrande et al. ([2008] 2010).
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último fato foi discutido como uma limitação dessas crianças no sen-
tido de encontrar satisfação no funcionamento independente, confor-
me postulado de Mahler.71 Consideradas em conjunto, essas evidências
corroboraram as afirmações da teoria psicossomática72 de que as mães
de crianças com asma podem apresentar dificuldade para integrar pes-
soas ou situações vivenciadas como estranhas nos cuidados ao seu filho,
com repercussões no desenvolvimento deste.
Por outro lado, pesquisas que examinam o papel do pai na asma
pediátrica são raras, embora assertivas teóricas e clínicas tenham indi-
cado sua posição marginal em função da forte aliança entre mãe e filho
nesses casos.73 Entre os raros trabalhos que investigaram as atitudes pa-
ternais educativas, no contexto da dinâmica familiar temos o de Boven-
siepen, Oesterreich, Wilhem e Arndt,74 que comparou 68 crianças com
asma e seus pais a outras 118 que não apresentavam problemas de saúde,
e seus respectivos pais. Os instrumentos de pesquisa foram o Inventá-
rio de Personalidade de Freiburg e um questionário multidimensional
concernente à percepção da criança quanto às atitudes educativas do pai
e da mãe. As análises indicaram diferenças somente nas atitudes pater-
nas. O papel do pai de criança com asma caracterizou-se pela evitação
de conflitos, forçando a harmonia familiar. Esse papel, combinado com
uma diferenciação de gênero insuficiente, teve um importante impacto
na dinâmica da família, particularmente ao se combinar com a posição
central assumida pela criança com asma nesse contexto. Discutiremos
tal centralidade no âmbito dos resultados clínicos e sistêmicos de nossa
pesquisa sobre a família de uma criança com asma.
Em síntese, as dificuldades das crianças asmáticas em vivenciar
conflitos que reativam situações de separação ou perda remetem ao
processo de separação-individuação descrito por Mahler.75 Entre essas
crianças, o processo em questão tende a se desenvolver com dificuldades.
Segundo a teoria psicossomática,76 tais sequelas representariam zonas de
71 Mahler (1979).
72 Debray (1996, 2001, 2008), Kreisler, Fain e Soulé (1974).
73 Kreisler (1992), Madrid (2006).
74 Bovensiepen, Oesterreich, Wilhem e Arndt (1980).
75 Mahler (1979).
76 Marty (1991, 1993).
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77 Peçanha (1996).
78 Salomão Junior et al. ([2008] 2014).
79 Hamlett, Pellegrini e Katz (1992).
80 Nagano et al. (2010).
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81 Fiese (2008).
82 Onnis (1989).
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83 Frey (1995).
84 King’s (1981, 1990 apud Frey, 1995).
85 Frey (1995).
86 Gustafsson (1987).
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tema. Esse autor mostrou que famílias com um(a) filho(a) asmático(a)
apresentavam distúrbios significativos na coesão familiar, quando com-
paradas àquelas com um integrante portador de diabetes “mellitus”. En-
tretanto, não houve diferença na interação das famílias com crianças
diabéticas ao serem confrontadas com o grupo de famílias sem proble-
mas de saúde entre seus filhos, sugerindo que não bastava uma doença
ser crônica para afetar negativamente os padrões de interação familiar.
O autor prosseguiu seus estudos,87 reafirmando a importância das tran-
sações familiares no desenvolvimento e gravidade da asma pediátrica.
Em estudo prospectivo com 82 crianças, aos 18 meses de idade, famílias
participaram de um teste familiar em que a habilidade para se ajustar as
demandas da situação (adaptabilidade) e o equilíbrio entre a proximi-
dade emocional e a distância (coesão) foram filmados e analisados por
juízes independentes em termos de funcionamento familiar funcional
ou não. A maioria superou a asma com a idade de 3 anos, mas nos casos
em que a enfermidade persistia, a associação da enfermidade com uma
família disfuncional foi altamente significativa (p = 0.01). Os padrões de
interação incluíram expressão de emoção e reação às necessidades dos
outros. Houve alternância entre total desinteresse e grande envolvimento
(p = 0.02), falta de suporte e rejeição do suporte ofertado (p = 0.01), um
grande número de decisões individuais sem considerar os outros mem-
bros (p = 0.04) e falta de limites nas “fronteiras geracionais” (p = 0.04).
Além disso, as crianças asmáticas apresentaram mais sinais de estresse
emocional do que as crianças sadias (p = 0.02). Esse estudo controlado
mostrou a importância dos fatores psicossociais e a necessidade de medi-
das que trabalhem as interações familiares e as conexões sociais, pois estas
podem influenciar o curso da enfermidade.
Em um trabalho muito citado, devido ao seu impacto na comu-
nidade científica quanto ao peso dos fatores emocionais no desencade-
amento da asma, Klinnert, Mrazek e Mrazek88 examinaram a qualidade
da relação conjugal no período pré-natal de 150 bebês com risco genético
para a asma, identificado pela linhagem materna e pela presença dessa
enfermidade nas mães. Os dados provenientes de entrevista com os pais
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foram avaliados por meio de uma escala clínica de cinco pontos. Foi en-
contrada uma forte associação entre as dificuldades conjugais no perío-
do pré-natal e problemas de comportamento entre as crianças com asma
quando tinham dois anos de idade. Essa pesquisa reiterou que não bastava
uma doença ser crônica para afetar negativamente a interação no núcleo
familiar, pois, nesse caso, fatores disfuncionais preexistiam ao nascimen-
to da criança. Na continuidade desse estudo de caráter longitudinal, os
autores89 investigaram a importância de estressores familiares e cuidados
paternais no aparecimento da crise asmática. Das 74 crianças cujos pais
evidenciaram uma paternagem adequada e um bom ajustamento entre
mãe e filho, apenas 3 dessas crianças desenvolveram asma aos 2 anos de
idade. Os resultados indicaram que fatores psicológicos como cuidados
paternais de risco eram importantes preditores da expressão da doença
na criança. A combinação desse fator de risco e estresse familiar contri-
buía para a gênese da enfermidade de uma forma que os autores con-
sideraram não simplesmente aditiva, mas multiplicativa. Os achados de
tais trabalhos continuam sendo um marco no estudo da asma pediátrica
ao evidenciar a relevância dos fatores emocionais na gênese e no desen-
volvimento dessa enfermidade,90 sendo apoiados por outras investigações
sobre a qualidade interativa existente entre essas famílias.91
Entre os estudos revisados, Onnis92 utilizou um método que mais
se aproxima do nosso estudo com famílias. Esse autor analisou as mo-
dalidades interativas no contexto de um grupo de 10 famílias com uma
criança com asma grave, na idade de 6 a 13 anos. Para essa caracteriza-
ção, o autor considerou o diagnóstico pediátrico e os fracos resultados
obtidos com o tratamento farmacológico. Esse grupo foi comparado a
outro, também de 10 famílias com uma criança na mesma idade daquelas
do grupo experimental, mas sem situação de doença psicossomática ou
psiquiátrica em qualquer um de seus membros. Os resultados mostraram
a presença, no grupo com uma criança com asma, de modelos interativos
típicos, repetitivos e fortemente disfuncionais que confirmaram as carac-
89 Id. (1994).
90 Mrazek e Klinnert (1996).
91 Peçanha e Lacharité (2007).
92 Onnis (1989).
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98 Garro (2011).
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der pelo sistema público de saúde uma clientela exclusiva de pacientes com
somatizações. Além disso, por meio de seu Centro de Ensino e Formação
em Psicossomática (Centre d’Enseignement et de Formation en Psychoso-
matique (CEFP)) continua a formar psicoterapeutas em psicossomática e
a oportunizar uma sensibilização à psicossomática para os clínicos interes-
sados na abordagem psicanalítica dos pacientes somatizadores.
Situado o contexto deste trabalho, lembramos que a psicossomá-
tica, “concepção doutrinal e patogênica que aceita e inclui os fatores psí-
quicos e conflitivos no determinismo ou no desenvolvimento das doen-
ças físicas”,103 é tão antiga quanto à própria medicina. Seu desenvolvimen-
to segue os paradigmas de cada época e de seus principais autores, desde
Hipócrates e Platão, num movimento que se inclina ora sobre a pessoa
doente, ora sobre a doença em si mesma. Dessa forma surgiram concep-
ções que seguem diferentes linhas filosóficas: humanismo, globalismo,
monismo, vitalismo, entre outras, opondo-se ao organicismo, ao mecani-
cismo e ao dualismo. Os autores do IPSO Pierre Marty seguem a vertente
monista e o princípio evolucionista, com grande influência de Darwin e
John Jackson. Para eles, a palavra psicossomática agrupa dois termos, sem
traço de união entre eles, a fim de conotar a unidade fundamental entre
o psíquico e o corpo. Entretanto, Dejours, também membro dessa Esco-
la, critica o monismo psicossomático e propõe um “dualismo imanente”.
Ou seja, a ordem psicológica não independe da ordem biológica, mas as
relações entre elas não seriam sincréticas, e sim de “subversão”. Esta seria
operada pela ordem psíquica da sexualidade – “nova ordem construída
a partir da antiga ordem biológica” –, que não simboliza o biológico. A
simbolização parte daquilo que foi separado para construir novos laços, e
isso ocorre no território dominado pela ordem psicológica.104
No geral, a perspectiva psicossomática em questão considera os
movimentos da psique, do soma e das relações entre ambos nos sujei-
tos portadores de doença somática. Também se interessa em estudar as
relações dinâmicas e, em geral, harmoniosas do psíquico e do somá-
tico nos indivíduos sadios, bem como as “variações de normalidade”
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Causalidade endógena
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2.2.4.2 Mentalização
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logia, são as características dos pais que devem reter a atenção do tera-
peuta, pois a preocupação deve ser de observar se existe para a criança
um espaço para pensar. Vale registar que, além dessa contribuição de
Debray, outros autores do IPSO, como Donabédian, Kreisler e Szwec,
vêm acrescentando nova compreensão quanto ao comportamento e à
psicodinâmica infantil. Por economia psicossomática Debray143 enten-
de todas as regulações que envolvem: o corpo em nível somático, do
humor e da motricidade (postura, sistema de atividades); o caráter e o
comportamento; a expressão psíquica ou mental, apreendida segundo
o duplo modelo proposto pela metapsicologia freudiana com referência
à primeira tópica (inconsciente, pré-consciente, consciente) e à segun-
da tópica (id, ego, superego). Essas premissas possibilitam compreen-
der que a mentalização é uma noção complexa que se refere a algumas
características fundamentais do sistema pré-consciente,144 permitindo
apreciar três de suas qualidades fundamentais: a) a consistência do con-
junto das representações; b) a fluidez das ligações entre as representa-
ções; e c) a permanência de seu funcionamento. Face ao caráter abstrato
dessa definição, Debray sugere que a mentalização é a capacidade de
tolerar, de negociar e de elaborar a angústia intrapsíquica, a depressão
e os conflitos intrapsíquicos e interpessoais, sendo variável em cada in-
divíduo e segundo os diferentes momentos de sua vida. O interesse dos
psicossomaticistas por essa capacidade humana reside na constatação
de que o “trabalho psíquico protege o corpo contra um eventual movi-
mento de desorganização somática”,145 sendo ainda “um fator de reorga-
nização quando a somatização é efetivamente vivida”.146
A mentalização não diz respeito a uma noção simples e unívo-
ca, mas inclui a dimensão do desenvolvimento temporal da atividade
de pensar. Tal dimensão temporal – do desenvolvimento da vida e dos
diferentes modos de funcionamento psíquico no tempo – é colocada
em primeiro plano pela psicossomática pelo conceito-chave de “irregu-
laridade do funcionamento psíquico”. Distinta da descontinuidade psí-
quica descrita por Freud, ela aparece em certos sujeitos que apresentam
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Este se inicia por uma fase de depressão essencial, que indica a fragilidade
do instinto de vida (termo preferido por Marty pelo seu caráter evolu-
cionista), seguindo-se de uma desorganização do aparelho mental evi-
denciada pelo pensamento operatório.156 “Nenhum patamar regressivo
de densidade suficiente cessa essa desorganização, o que lhe confere um
aspecto progressivo (…). Sobrevêm enfim as desorganizações de funções
somáticas cada vez mais arcaicas no plano evolutivo, cada vez mais fun-
damentais no plano vital. O processo pode, deste modo, se desenvolver
até a destruição dos equilíbrios primários da vida individual”.157
Examinar a psicossomática, que se interessa pela compreensão da
economia ou do dinamismo de forças psíquicas e orgânicas, remete ne-
cessariamente à teoria de Pierre Marty. Esta vem sendo concebida como
o primeiro corpus teórico que definiu uma ordem psicossomática.158 A
obra daquele autor, A investigação psicossomática, de 1963, em colabora-
ção com M’Uzan e David, continha, em potencial, o referencial clínico
da atualidade. Ela destacava a importância da investigação para que se
pudesse estudar melhor uma série de funcionamentos psíquicos até en-
tão desconhecidos do campo analítico. Adotando o fio condutor das pes-
quisas freudianas, a psicossomática se pôs à procura de um saber adap-
tado ao seu objeto e, assim, delimitou posteriormente suas diferenças
em relação à psicanálise.159 Em trabalhos recentes, a questão da mentali-
zação, conjuntamente com a noção de causalidade circular e integrada,
reunindo assim os dois planos da expressão do psíquico e do somático,
continua a ocupar um lugar de destaque para esses pensadores.160
Contudo, a despeito dos progressos feitos pela psicossomática no
campo da pesquisa, da teoria e do tratamento de pacientes com proble-
mas orgânicos, permanecem muitas indagações incitando a pesquisa e
a discussão entre os investigadores. Constitui exemplo dessa inquieta-
ção um número exclusivo da Revue Française de Psychosomatique, de
2009, colocando a psicossomática em questão, bem como convite feito
a Dejours para se pronunciar em relação à psicossomática. Dessa inter-
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sua escola de Palo Alto, pois aí se funda a Teoria Familiar Sistêmica (TFS).
A TFS surgiu nos Estados Unidos na década de 1950, favorecida pelo ce-
nário intelectual do pós-guerra que levou muitos profissionais e cientistas
de diversas áreas a deixar a Europa. Entre eles, estão importantes psicana-
listas que formaram a base da TFS.
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muitos lugares e saberes, que veio a ser o grande mentor da Teoria Fa-
miliar Sistêmica (TFS). Nasceu na Inglaterra e era filho do biólogo inglês
William Bateson, que cunhou o termo genético. Servindo-se de desco-
bertas da antropologia, cibernética e ecologia, Bateson elaborou princí-
pios simples e relevantes, inaugurando uma epistemologia biológica ao
afirmar que toda vida mental está ligada a um corpo físico. Sua visão
de mundo responde aos problemas da atualidade ao mostrar que nosso
olhar sobre as coisas é uma distorção mantida pela linguagem e que uma
visão correta deve considerar a interpretação dos sujeitos e se fundar nas
relações dinâmicas que fazem a beleza da natureza (1991/1996). Denun-
ciou o caráter “substancialista” das teorias psiquiátricas, retomando a
expressão de Alfred Korzybski (fundador da semântica geral) de que o
mapa não é o território.169
Bateson começou a se interessar pelo fenômeno da comunicação
no início da década de 1930, quando constatou, mediante observações
dos Iatmul, na Nova-Guiné, que a maneira como os indivíduos se com-
portavam dependia das reações dos que os cercavam. No final da década
de 1940, Bateson chegou a São Francisco e, em 1952, obteve financia-
mento para a pesquisa “O estudo do papel dos paradoxos da abstração na
comunicação”. Para realizá-la, no hospital dos veteranos de guerra (Ve-
terans Administration Hospital), Bateson reuniu uma equipe de jovens
pesquisadores formada pelo engenheiro químico John Weakland (1919-
1995), o estudante de comunicação Jay Haley (1923-2007), o psiquiatra
William Fry e, posteriormente, convidou o médico psiquiatra e psicana-
lista Donald (Don) De Avila Jackson (1920-1968), a partir de sua apre-
sentação sobre “homeostase” no funcionamento familiar, nesse hospital,
em 1954. Nesse trabalho, a família foi definida como um sistema home-
ostático, ou seja, como uma unidade que mantém seu equilíbrio interno
graças aos mecanismos de autorregulação para os quais contribuem tan-
to os indivíduos saudáveis como aqueles que apresentam enfermidades.
Mais tarde, a publicação da pesquisa liderada por Bateson acabou
se constituindo num notável estudo sobre a esquizofrenia. Houve um
prolongamento da mesma, notadamente com o estudo dos paradoxos
na comunicação, e a consequente fundação do Mental Research Institute
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(MRI), em Palo Alto, por D. Jackson em 1959. Dessa forma, Palo Alto,
na Califórnia, passou a abrigar dois grupos: um de pesquisa e o outro
de tratamento de famílias. A pesquisa da comunicação, dirigida por Ba-
teson, identificou o “duplo vínculo”, padrão comunicacional de famílias
com membro esquizofrênico, caracterizado por mensagem contraditória
em que o receptor fica incapacitado de se metacomunicar, não havendo
comunicação sobre a comunicação. Por esse trabalho, Bateson recebeu o
prêmio Frieda Fromm-Reichmann, que é concedido no âmbito dos estu-
dos sobre esquizofrenia. Nos anos que se seguiram, Bateson e sua esposa
Margaret Mead tornaram-se pioneiros no uso da fotografia em estudos
de campo antropológico.
Posteriormente, a Escola de Palo Alto passou por uma crise im-
portante, caracterizada pela perda de três membros fundadores. Isso in-
cluiu a morte prematura de D. Jackson e mudança de pesquisadores para
outros locais, formando novos centros de tratamento familiar. Foi assim
que, a partir de uma mesma fonte comum, surgiram as variações da TFS,
notadamente da terapia de família sistêmica, como a Terapia Estratégica,
a Estrutural, entre outras. Dessa forma, muitos terapeutas de família pas-
saram a utilizar a TS (teoria sistêmica) como fundamento de sua prática,
em diferentes países, embora a terapia familiar já estivesse no contexto da
época, notadamente na Europa.
Após esse passeio pela história da sistêmica, voltemos à TS.
Esta permite conceitualizar e integrar fenômenos diversos como sis-
tema biológico (organismo, sistema neuroendócrino), sistema psíqui-
co (consciência, esquemas afetivos e cognitivos), sistema social (fa-
mília, relação psicólogo-cliente, instituição psiquiátrica) etc. A busca
por princípios universais aplicáveis aos sistemas em geral resultou em
três propriedades que estariam presentes particularmente nos sistemas
abertos: totalidade, relação e equifinalidade. Dessa forma, um sistema
caracteriza-se essencialmente pela interdependência dinâmica de seus
elementos. Ele é considerado em seu todo, não sendo redutível à soma
de suas partes. Quanto às finalidades, importam não apenas aquelas
que são oficiais, por exemplo, visar o bem-estar das crianças, mas tam-
bém as finalidades individuais de cada membro do sistema familiar que
podem ser diferentes entre si e mesmo incompatíveis com a finalidade
do sistema família. Disfunções e sintomas podem aparecer quando as
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3. Como entender crianças e
famílias
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• Idade: 7 a 8 anos;
• Possuírem pelo menos um(a) irmão(ã);
• Alunos do 1o grau escolar, sem reprovação;
• Diagnosticados como portadores do quadro asmático;
• Desenvolvimento psicológico, mental e físico saudáveis,
sem interferência de outras doenças ou sequelas significa-
tivas no seu processo evolutivo;
• Moradia permanente com a família biológica, na cidade
sede da pesquisa;
• Escolaridade das mães (2o ou 3o grau).
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e das próprias crianças. Grande parte das crianças com asma estava na
primeira série, enquanto as crianças do grupo controle estavam, em sua
maioria, na segunda série. O menor número de filhos também ocorreu
no grupo experimental, e as idades dos sujeitos foi igualmente menor.
Essas variações, apesar de não significativas, foram consideradas na aná-
lise clínica dos dados.
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1. Dados pessoais
a) Criança
Nome, idade, sexo, escolaridade, localização na constelação familiar.
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b) Família
Nome, idade, ocupação, nível de instrução dos pais.
Número, idade, sexo dos filhos.
Outras pessoas que moram com a família e grau de parentesco, se
houver.
Tipo de moradia, bairro e cidade.
3. Distúrbios do comportamento
a) Alimentação
Náuseas, inapetência, dependência, descumprimento de horários,
superalimentação, lentidão, omissão de boas maneiras (comer com as
mãos, sujar-se, derrubar alimento). Recusa e seletividade de alimentos.
Idade da criança, periodicidade e atitude dos familiares.
b) Sono
Interrupções, inadequação do sono ao período habitual (horários
de sesta, noite); sono agitado, com ranger de dentes, gritos, prantos, falas,
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4. Contexto psicoeducativo
a) Limites educativos
Restrições quanto às variações térmicas (andar descalço, tomar
sol, sair em dias de chuva, evitar vento e sereno); ao vestuário (roupas
leves e abertas); à alimentação (chocolates, gelados, refrigerantes); às ati-
vidades recreativas (jogos ao ar livre, distante dos pais, corridas e brin-
cadeiras agitadas); às exigências escolares e ao cumprimento da rotina.
b) Concessões educativas
Concessões quanto ao cumprimento da rotina (deitar ou levantar
mais tarde que as demais crianças, dormir no quarto dos pais, alimentar-
-se basicamente do que gosta); presentes (mais brinquedos e roupas do
que as demais crianças; ausência de castigos (ao não cumprimento dis-
ciplinar, à rotina)).
c) Atitude dos pais frente à asma da criança (ou outra doença crônica
no grupo de crianças sem asma); comentários, sentimentos de piedade,
manifestação intensa de carinho.
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A criança com asma e sua família
f) Influências intergeracionais
Participação e influência de elementos da família estendida (avós,
tios, primos); identificação da criança com outros membros da família ou
membros de outras gerações portadores de asma ou doenças importantes.
80
Dóris Lieth Nunes Peçanha
81
A criança com asma e sua família
livremente dos lápis. Mas depois que desenhou e/ou pintou o desejado,
diga: “Muito bem, espero que esteja satisfeito(a) com seu desenho; por
favor, faça agora o desenho de uma família colorida”, fornecendo-lhe
uma nova folha em branco e guardando a produção espontânea. Aliás, a
produção gráfica espontânea, na experiência desta autora, pode consti-
tuir um excelente meio de abordagem e conhecimento inicial da criança.
A partir dos dados obtidos no DCF, analisamos a percepção da
criança sobre a interação dos membros de seu lar no que concerne aos
seguintes aspectos: comunicação, normas, papéis, liderança, conflitos,
agressividade, afeição, individuação, integração, assim como foram exa-
minadas as mudanças que a criança desejaria introduzir ou não no sis-
tema familiar. O interesse por este meio compreensivo residiu em ser
uma técnica projetiva centralizada na família, contexto privilegiado deste
estudo, acrescido de sua potencialidade para estudos sistêmicos sobre o
tema, sendo que este último aspecto constitui a contribuição inovadora
desta pesquisa. A seguir, apresentamos o Protocolo de Observação (1)
e o Questionário (2), ou inquérito feito à criança. Ambos os protocolos
foram adaptados para os fins desta pesquisa. Desenvolvemos ainda um
terceiro protocolo de Avaliação Sistêmica do Desenho em Cores da Fa-
mília (3), que foi concebido especialmente para este estudo, integrando
as contribuições de muitos autores, em especial de Campos e Kolck.209 O
interesse deste último protocolo reside na possibilidade comparativa das
mesmas dimensões familiares estudadas tanto por meio do DCF quanto
da EFE. Destacamos entre essas dimensões: comunicação, normas, pa-
péis, conflitos, agressividade e integração. O tipo de resposta dado ao
questionário é fundamental para a pontuação da dimensão em estudo,
sendo que o aspecto gráfico serve de suporte, corroborando ou não a
verbalização da criança. Utilizamos variáveis dicotômicas, sempre que
possível, a fim de facilitar a análise e fornecer um quadro geral dos re-
sultados dos grupos, sendo que aspectos mais sutis, ou seja, graduações
entre a presença de problemas e a ausência dos mesmos em uma variável,
foram contemplados na análise individual de cada caso.
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
1) Protocolo de observação
Iniciais: Idade: D.N.: Sexo:
Escolaridade: Data de aplicação:
Pai: (um nome) Mãe: (um nome)
Genetograma com idades:
--------------------------------------------------------------------------------
FIG. CRIANÇA PAI MÃE IRMÃO IR. IR. OUTROS
--------------------------------------------------------------------------------
TRI*
--------------------------------------------------------------------------------
TRT*
--------------------------------------------------------------------------------
ORDEM
--------------------------------------------------------------------------------
R/C*
--------------------------------------------------------------------------------
(* TRI = tempo de reação inicial; TRT = tempo de reação total; R/C = retoca,
complementa o desenho).
Observações: falante, insegura, cooperativa, inibida, espontânea, outros.
2) Questionário
Após a criança realizar o desenho mediante instruções como esta
(“Faça o desenho colorido de uma família, como você quiser, o melhor
que você puder, com estes lápis que estão aqui”), ela será convidada a
responder as questões a seguir:
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A criança com asma e sua família
4. Tem alguém demais nesta família? Se a resposta for sim, pergunte: quem?
5. Como eles se dão?
6. O que eles estão fazendo agora? (apontando para toda a família).
7. Eles têm horários para comer, estudar, brincar ou dormir?
8. Qual deles você gosta mais? (Se a figura escolhida for identificada com
o próprio sujeito, será denominada “Figura Ego”.). Por quê?
9. Se a criança não tiver se incluído no desenho da família, pergunte: Se
você estivesse nesta família, quem seria você? (Figura Ego).
10. Qual a parte do corpo desta figura que foi mais difícil desenhar?
(apontando para a Figura Ego).
11. O que os outros pensam dele(a)? (apontando para a Figura Ego). Por
quê?
12. Os irmãos (se tiver desenhado) gostam dela?
13. Se ele(a) (apontando para a Figura Ego) tivesse alguma coisa impor-
tante para dizer, para quem contaria?
14. De qual deles(as) você gosta menos? Por quê?
15. De quem este papai gosta mais? (indicando a figura correspondente).
16. De quem ele gosta menos?
17. De quem esta mamãe gosta mais? (indicando a figura correspondente).
18. De quem ela gosta menos?
19. O que este papai faz quando uma das crianças faz tudo certinho?
20. O que este papai faz quando uma das crianças faz alguma coisa errada?
21. O que esta mamãe faz quando uma das crianças faz tudo certinho?
22. O que esta mamãe faz quando uma das crianças faz alguma coisa
errada?
23. Quando o papai e a mamãe estão em casa e as crianças querem sair
para brincar, para quem elas pedem?
24. Quando esta família quer passear, como eles decidem aonde ir e
quem escolhe o lugar?
25. Se nem todos concordarem nessa ou em outras coisas, o que eles fa-
zem para resolver a questão?
26. Diga o que você mais gostaria de mudar nesta família.
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
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A criança com asma e sua família
5. Conflitos (2a, 5a, 15a, 17a, e 24a e, secundariamente, na 10a, 11a, 13a e 25a)
1. Presentes e sem busca de solução
Desenho: omissão de figuras essenciais na família ou da figura ego.
Omissões ou rasuras de partes essenciais do corpo ou do rosto da figura
ego. Vários ensaios. “Autolocalização”. Borrões. T. R. prolongado. Colo-
cação estranha da(s) figura(s) (por exemplo, separadas em diferentes filas
e divididas por linha).
Questionário: a resposta a uma das questões acima indica que os
conflitos não são resolvidos (por exemplo: 24a questão – “Não sei, não
fazem nada” ou “ficam em casa” quando há divergência quanto ao lugar
escolhido para passear).
2. Sem problemas no enfrentamento dos conflitos.
7. Afeição
a) Figura preferida (8a questão)
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
b) Figura rejeitada pelo sistema familiar – pais e/ou irmãos (11a, 12a,
16a e 18a questão)
Desenho: figura(s) colorida(s) em cor rejeitada. Figura(s) pobre(s)
ou efetuada(s) com descuido.
1. Criança
2. Irmão(s)
3. Pai
4. Mãe
5. Múltiplas rejeições
6. Sem rejeições
7. Outros
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Papéis: Funções de cada membro a partir das posições que ocupam nos
subsistemas conjugal, parental, fraterno e filial.
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Continuação…
Tarefas da EFE
Dimensões e fatores TOTAL MÉDIA
1 2 3 4 5 6
28. Artificial
Individuação
29. Sem identidade pessoal
30. Sem respeito às divergências
31. Desvalorizada
32. Dificultada
Integração
33. Sem identidade grupal
34. Sem coesão
35. Com autoestima baixa
36. Não gratificante
Nota: as colunas em cor clara indicam as tarefas selecionadas para cada dimensão.
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
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A criança com asma e sua família
Fábula 1 – Passarinho
Na fábula 1, a maioria dos autores classifica a resposta da crian-
ça em termos de dependência ou independência.232 Essas autoras pro-
põem a análise do processo de separação-individuação, evidenciando,
no seu sistema de categorização de respostas, conceitos de passivo e ativo
(também nas fábulas 2, 3 e 6) quanto ao tipo de ação, e de solução in-
dependente, entre outras, no exame do enredo da fábula do Passarinho.
Contudo, a situação de perigo apresentada e a necessidade do filhote, que
já sabe voar, ou seja, ele é capaz de fazer alguma coisa para reduzir essa
tensão, alude diretamente à noção de apego desenvolvido por Bowlby.233
Portanto, ao invés de usar termos carregados de diversos sentidos, inclu-
sive negativos, como os de dependência e passividade, as respostas foram
analisadas em função do apego, mantendo-se o termo independência
para as ações em que os sujeitos mostravam-se capazes de cuidar de si
mesmos e que não explicitavam uma figura de apego. A categoria “apego”
predominou sobre a “independência”. Por exemplo, houve respostas em
que as crianças relatavam um enredo indicativo de sua capacidade para
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
Fábula 2 – Aniversário
Os autores, em geral, concebem como pressuposto psicodinâmico
a ser avaliado, na fábula 2, variáveis relativas à “cena primária”. Evita-se
esse termo por se entender, apoiando Cunha e Nunes,234 que esta fábula
suscita uma reação mais ampla frente à relação afetivo-sexual dos pais,
servindo para esclarecer os vínculos com as figuras parentais.235 As res-
postas das crianças à pesquisa conduziram ao estabelecimento de cate-
gorias que, no seu conteúdo, assemelham-se às de Tardivo.236 Porém, as
respostas mais arcaicas examinadas por essa autora sob a rubrica “reação
de agressividade e hostilidade diante da cena primária” e subdividida em
dois itens são aqui propostas numa única categoria que inclui ainda os
sentimentos de desgosto e inveja frente à relação dos pais.237 Portanto, as
categorias obtidas situam-se numa continuidade com referência ao papel
estruturante da relação dos pais sobre o psiquismo infantil,238 indo desde
a sua ausência, passando por reações arcaicas, até a aceitação mais realis-
ta da presença do casal.
Fábula 3 – Cordeirinho
Com base nas respostas obtidas, entende-se que a fábula 3 possi-
bilita o exame da reação da criança à figura materna ou fraterna, numa
situação de rivalidade com esta última. Em relação às verbalizações que
indicam aceitação da situação proposta pela fábula, a resposta “vai comer
capim” é considerada normal por Düss e Peixoto239 e popular por Cunha
e Nunes.240 Entretanto, estas autoras chamam a atenção para o fato de que
essa resposta pode estar atendendo simplesmente às expectativas sociais
e não ser um indicador de desenvolvimento afetivo adequado à idade,
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A criança com asma e sua família
Fábula 4 – Enterro
As respostas dos sujeitos à fábula 4, como em outros estudos,
conduziram à categorização em termos da pessoa escolhida242 e da cau-
sa de sua morte.243 Esta última autora, entretanto, apresenta categorias
interpretativas. Por exemplo, “relação com a figura paterna – desejos
destrutivos”.244 Evita-se esse caráter buscando-se a apreensão do conteú-
do tal como expresso pelos sujeitos individualmente, aproximando-se das
formulações de Cunha e Nunes.245 Portanto, considerando-se as caracte-
rísticas desta fábula, que solicita uma resposta concreta, mantém-se como
categoria o que foi dito pela criança.
Devido à grande variabilidade de respostas à fábula 4, aceitou-se
a sugestão de Ducros,246 no sentido de se investigar “por que” a pessoa
morreu. Verificou-se, assim, se a verbalização podia ser incluída nas “res-
postas normais” propostas por Düss.247
Fábula 5 – Medo
Em relação à fábula 5, Düss248 salienta a necessidade de se distin-
guir entre medos normais e neuróticos. No último caso, as respostas da
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Fábula 6 – Elefante
Na fábula 6, a maioria dos autores analisa o complexo de castra-
ção ou a ansiedade de castração.255 As últimas autoras propõem o exa-
254
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Fábula 8 – Passeio
A maioria dos autores utiliza essa fábula para investigar questões
ligadas ao “complexo de Édipo”, sendo que Cunha e Nunes268 preferem o
termo “conflito edípico” porque este designa vários conflitos caracterís-
ticos do referido complexo. A fábula 8 é, segundo Cunha e Oliveira,269
muito importante para o esclarecimento sobre vínculos com as figuras
parentais, de nível edípico ou pré-edípico. Apoiando o trabalho dessas
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A criança com asma e sua família
Fábula 9 – Notícia
Entre os principais estudiosos das fábulas, observa-se unanimida-
de quanto ao fato de a fábula 9 servir para a investigação de desejos, sen-
do que vários deles propõem-na também para examinar medos. Cunha
e Nunes271 salientam seu sentido catártico, tendo em vista a mobilização
emocional que as três fábulas anteriores podem suscitar. Considerando-
-se a variedade de respostas dadas neste trabalho, optou-se por agrupá-
-las em função da natureza da “notícia”. Destacaram-se, inicialmente, as
situações em que a criança sentia-se tão ansiosa com a fábula que sua
reação ofuscava ou impedia que ela precisasse a natureza dessa notícia.
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4. Com a palavra, crianças e
famílias
4.1 Pais
280 Mrazek, Klinnert, Mrazek e Macey (1991), Klinnert et al. (2001), Klinnert, Kaugars, Strand e
Silveira (2008), Mrazek (2004).
281 Madrid (2006), Peçanha (1993), Peçanha e Piccinini (1994), Peçanha (1996).
282 Rockenbach-Peçanha (1993).
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80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
Aliment. Sono Enurese Linguag. Medos Ansied. Escolar. Manip. Relac.
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60%
40%
20%
0%
Comunic. Normas Papéis Conflitos Agressiv. Individua. Integra.
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atenção foi a escolha do pai como figura preferida pela metade das crian-
ças com asma. A Tabela 5 mostra o detalhamento dessa variável.
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A criança com asma e sua família
com asma (40%) indicaram que o tronco foi a parte do corpo mais difícil
de executar, o que pareceu coerente com o sofrimento produzido pela
asma nessa região do corpo. Já no grupo controle, tal dificuldade foi
localizada na cabeça. Esse resultado também é muito coerente com o
sofrimento psíquico que, segundo Gernet e Dejours,291 pode ser conse-
quente à doença, não estando em sua gênese. Interessante o fato de que
a parte do corpo mais difícil para as crianças sem problemas de saúde
foi a cabeça. Estaria isso associado ao maior trabalho psíquico (pensar)
nessas crianças, seguindo o postulado da Escola de Paris?
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Tabela 11 Continuação…
Experimental Controle
Fábula 3 – Cordeirinho
No % No %
4. Conformismo 2 20% 1 10%
5. Aceitação 10 10% 4 40%
Total 10 100% 10 100%
Tabela 12 Distribuição das respostas dos grupos à fábula 4 quanto à pessoa que
morreu (N = 20; experimental = 10; controle = 10).
Experimental Controle
Fábula 4 – Enterro Pessoa escolhida
N o
% No
%
1. Pai 4 40% – –
2. Mãe 1 10% 1 10%
3. Avô 1 10% 3 30%
4. Avó 0 0% 2 20%
5. Pessoa estranha 4 40% 4 40%
Total 10 100% 10 100%
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Tabela 13 Continuação…
Experimental Controle
Fábula 4 – Enterro Causa da morte
No % No %
4. Sem resposta 4 40% 1 10%
Total 10 100% 10 100%
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Tabela 16 Continuação…
Experimental Controle
Fábula 7 – Objeto fabricado
No % No %
4. Doação por afeto 3 30% 6 60%
5. Total 10 100% 10 100%
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Tabela 20 Continuação…
Grupo Variável G.L. Média D.P. T P
Experimental Agressividade 10 3.550 0.963 –3.71 0.004
Controle 4.725 0.275
Experimental Afeição 10 3.665 0.854 –4.27 0.001
Controle 4.863 0.239
Experimental Individuação 09 3.33 1.02 –4.49 0.001
Controle 4.803 0.204
Experimental Integração 10 3.577 0.948 –3.77 0.003
Controle 4.752 0.274
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A criança com asma e sua família
Síntese
As dificuldades de desenvolvimento de “A” são marcantes, sobre-
tudo na adaptação a situações novas, o que contribuiu para a manifesta-
ção da asma. A ansiedade aparece muito elevada, sendo que o mundo ex-
terior é percebido de forma ameaçadora. Tais sentimentos são reforçados
pela insegurança dos pais e a oscilação entre superproteção e repressão.
Por sua vez, “A”, com suas crises, atitudes de birra, rivalidade e destru-
tividade, também reforça os comportamentos disfuncionais da família,
tendo-se, assim, um círculo de transações disfuncionais. A atmosfera
familiar caracteriza-se pela ansiedade, pouca espontaneidade e falta de
diferenciação entre os sistemas conjugal e filial.
Por outro lado, “L” apresenta um desenvolvimento saudável, sem
sintomas manifestos na área comportamental. A família cumpre adequa-
damente seus papéis e existe uma atmosfera positiva de afeto e tolerância
que facilita a individuação de seus membros. Os conflitos vividos pela
situação edípica são adequadamente manejados, a riqueza de contatos
com a realidade exterior e a fácil expressão do afeto aparecem como cata-
lisadores eficientes da ansiedade, que se manifesta em níveis compatíveis
com seu estágio de desenvolvimento.
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uma faca (P), ele tinha que trabalhar como escravo, então ele ficava des-
cascando batatas com as facas… cortou a veia, vazou muito sangue e ele
morreu”. Frente às mudanças, sua reação é de muita ansiedade (“Ela se as-
sustou… saiu gritando que o elefantinho dela tinha crescido demais…” –
fábula 6), enquanto “R” sofre com as mesmas, mas consegue enfrentá-las,
direcionando-se à elaboração dos conflitos edípicos e à sua individuação
como elemento do sexo feminino (“Cresceu e pode ter crescido cabelinho
nele e ele pode ter três filhinhos (P), triste” – fábula 6).
Síntese
No primeiro caso, a asma reeditada a cada aniversário parece ser
uma forma de revivenciar o trauma do nascimento, feito sob os protestos
da mãe. A primeira crise ocorreu em torno de um ano, seguindo-se a um
período de dificuldades para experienciar mudanças, embora a mãe não
faça relações entre doença e emoções. A mudança de residência é ainda
mais catastrófica para a saúde da criança. No segundo caso, experiên-
cia semelhante também causa problemas de saúde, mas transitórios. A
sensibilidade dos pais para ajudar esta criança é notória, como também
a disponibilidade desta para funcionar de forma afetiva e cooperadora.
Ambos os contextos caracterizam-se por transações que também ocor-
rem de forma afetiva, com comunicações claras, porém, na primeira fa-
mília, os subsistemas conjugal e filial são mal diferenciados, e os pais têm
dificuldade para cumprir adequadamente seus papéis. A segunda família
caracteriza-se pela funcionalidade de todo o sistema, com fronteiras ge-
racionais bem precisas. A relação entre a frateria, no primeiro caso, é de
rivalidade; no segundo, de afeto e de colaboração. Os conflitos encober-
tos fazem parte da dinâmica familiar de “B”, talvez isso tenha colaborado
para sua escassa expressão de problemas no DCF. Porém, no TF, em que
o controle das respostas torna-se mais difícil, a emergência da ansiedade
e as dificuldades com as figuras paternais ficam evidentes, revelando um
funcionamento egoico aquém de sua idade, caracterizado pela negação
de relações triangulares, pela dificuldade de socialização e pelo retorno
da agressão contra o próprio corpo. No segundo caso, a ansiedade en-
controu certa expressão somática e comportamental na primeira infân-
cia, mas as relações positivas com a família e com seus pares, bem como
a riqueza de sua vida imaginativa, conduziram-na à superação dessas
139
A criança com asma e sua família
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
riado, “C” fala alto, transpira, empalidece e “dá lições de moral” (sic), “P”
fica irritado, mas escuta os conselhos dos pais.
No contexto familiar de “C”, os limites são dados pela mãe; ele é
o preferido pelo pai, que o superprotege. No caso de “P”, os limites são
dados pelos pais. As divergências do casal quanto às práticas educativas
existem nas duas famílias. Na primeira, dizem respeito à permissividade
do pai e sua grande ansiedade pela asma de “C”. No caso de “P”, a mãe
critica a atitude paterna tolerante com eventuais episódios explosivos,
sendo que ela, às vezes, adota um estilo autoritário. No DCF, “C” percebe
sua família como disfuncional em todos os aspectos avaliados, ao passo
que o segundo menino evidencia um clima de harmonia e os membros
são percebidos como reciprocamente amorosos, com destaque para a
relação do casal. Na EFE, a família de “C” mostrou-se inibida na comu-
nicação e na manifestação de afeto; os filhos, tímidos, eram chamados a
falar pelos pais, a coalizão pai-filho foi notória e confirmada nos demais
instrumentos. Todas as atividades sociais são feitas em conjunto, sendo
“inconcebível” (sic), para o pai, momentos só para ele.
No Teste das Fábulas, “C” foi lacônico, lento, apresentou vários
indicadores de somatização e dificuldade para lidar com uma terceira
figura na relação (fábula 2 – choque). A morte apareceu como elemento
muito ansiogênico (fábula 4 – choque, pai indicado como morto; fábula
6 – elefante doente; fábula 9, notícia de doença do pai. Afetivamente,
expressou voracidade (fábula 3), sentimentos de perseguição (fábula 5,
acrescida de autorreferência, e fábula 10) e ambivalência (fábula 7). Por
outro lado, “P” apresentou respostas condizentes com sua idade, popu-
lares em sua maioria; ansiedade enfrentada adequadamente (fábula 6),
afetividade (fábula 7), aceitação de relações triangulares (fábula 3, fábula
8), embora com culpa edípica. Talvez por isso, tempo de reação longo na
fábula 2 e resposta que evidencia o trabalho psíquico como defesa frente
à ansiedade: “Ah, porque ela queria pensar e todo mundo estava falando,
ela vai no fundo do quintal, ela ficou lá, pensando o que ela queria pensar
(…) (P) Ah! Ai, meu Deus, e agora, não sei”.
Síntese
As dificuldades de desenvolvimento de “C” parecem iniciar-se, logo
ao nascer, com a separação da mãe, que, por sua vez, vivia um processo
141
A criança com asma e sua família
142
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vômitos; por duas vezes, tentou pôr fogo na toalha da mesa; dificuldade
para adormecer e rituais; fala infantilizada, medo “somente de bêbado na
rua” (sic). Ambas são consideradas ansiosas frente às frustrações, sendo
que “F” faz birra e “P” chora. Na escola, “F” apresenta resistência para
assistir às aulas, fraco rendimento e dependência da mãe para cumprir
as tarefas, enquanto “P” tem bom aproveitamento escolar. O sono de “P”
é, às vezes, perturbado por sonhos maus, tem ainda medo de trovão e
cachorro. O relacionamento de “F” com a irmã caracteriza-se por ciúme
e rivalidade, no caso de “P”, além das brigas, existe proteção mútua.
No DCF, as figuras de “F” são extremamente pequenas, na borda
inferior do papel, e ela se coloca entre os pais; já as de “P” são bem dese-
nhadas, sugerem coesão familiar e identificação positiva com si mesma.
A primeira família apresenta disfunções importantes: liderança autori-
tária centralizada na mãe; pai omisso (não compareceu a nenhuma en-
trevista), rejeita “F” e superprotege a filha menor. Ambas são tímidas,
principalmente “F”. No caso de “P”, os papéis estão mais bem definidos,
os pais assumem a educação dos filhos sem preferência entre eles. Afe-
to positivo e sistema conjugal bem diferenciado. Divergências toleradas;
crianças, incentivadas à independência, expressam-se de forma espon-
tânea e segura, enquanto na família de “F” predomina o desrespeito à
individualidade.
Na dimensão intrapsíquica, “F” apresenta níveis muito elevados
de ansiedade que chegam a prejudicar a logicidade de seu pensamento,
expressa confusão e ambivalência (fábula 2). As defesas falham, o recurso
é o corpo ou a morte (fábula 1 – choque, TR: 23’’, “ele vai cair e morrer”).
Figuras paternas sentidas como perseguidoras (fábula 5 – TR: 1’, “De lobo
mau e… de monstro, a mãe chega, ele se assusta e fica com medo. (P):
Porque talvez… a mãe dele bate. O pai dele vem, ele fez xixi na cama, ele
fica com medo e o pai dele bate”). A mãe impõe muitas restrições (fábula
9), contudo há espaço para afeto (fábula 7) e apoio (fábula 10). Negação
da relação dos pais (fábula 2, choque, contaminação), com indefinição de
seus papéis (fábula 8). Apego ao pai, mas a rejeição deste intensifica seus
conflitos (fábula 4 – o pai morre, pneumonia), que são deslocados para a
escola (fábula 10, contaminação da fábula 5 e fábula 9).
Por outro lado, nas fábulas de “P”, os medos se confirmam (fábula
5 – choque). Na área afetiva, ambivalente (fábula 7) com a mãe, busca a
143
A criança com asma e sua família
satisfação dos próprios desejos. Várias respostas populares, porém sua so-
ciabilidade, em parte, baseia-se na aceitação da realidade (fábula 8), e, em
parte, trata-se de conformismo às normas (fábula 3), sentindo-se ansiosa
em função da pressão de seus impulsos egocêntricos (fábula 2). Contudo,
o teste teve para ela seu efeito catártico: “Ufa, só foi um sonho” (fábula 10).
Síntese
Ambas famílias não apresentam eventos particulares em seu ci-
clo vital, contudo a estrutura e a dinâmica de cada uma se encarregou
de dificultar (“F”) ou de proteger o desenvolvimento de suas crianças
(“P”). No caso com asma, as práticas educativas maternas oscilam entre
superproteção e punição severa, enquanto o pai rejeita a menina. Na fa-
mília de “P”, papéis e normas definidos; o afeto circula entre todos com
clara definição das relações conjugais e filiais. “F” apresenta baixa au-
toestima, timidez excessiva e dependência da figura materna, enquanto
“P” mostra-se segura e independente. As dificuldades escolares de “F”
associam-se à problemática familiar, bem como sua rivalidade com a
irmã. “F” apresenta vários distúrbios de comportamento, incrementando
as transações disfuncionais na família, enquanto os de “P” dizem respeito
a ansiedade e medos, que são, em geral, adequadamente manejados pelos
pais. No primeiro caso, há diversos indicadores de patologia no funcio-
namento, enquanto “P” encontra-se em fase de resolução de conflitos no
desenvolvimento (egocentrismo, baixa tolerância a certas frustrações),
mas sua conduta é, em geral, bem adaptada à realidade. Enfim, tem-se
uma família que dificulta sobremaneira a individuação da criança com
asma, vivendo um círculo de transações negativamente reforçadoras,
ao passo que a outra se caracteriza pela funcionalidade do sistema, com
consequências positivas na promoção da saúde entre seus elementos.
144
Dóris Lieth Nunes Peçanha
145
A criança com asma e sua família
Síntese
Ambos casos apresentam grandes semelhanças tanto ao nível das
crianças quanto do contexto familiar. Os dois meninos encontram-se en-
volvidos com tarefas evolutivas ligadas à situação edípica, entretanto “Y”
apresenta um melhor encaminhamento das mesmas mediante o vínculo
mais positivo com a mãe e a melhor percepção de situações triádicas.
A problemática edípica, ainda não superada pelos dois meninos, parece
interagir, de forma recíproca, com certa fragilidade no sistema conjugal,
que incrementa a ansiedade dessas crianças – dificuldade com mudanças,
no caso da criança com asma, e sentimentos de castração e de persegui-
ção, experimentados por “Y”. Esses aspectos fazem parte da dinâmica das
transações recíprocas criança x família. Assim, a dificuldade com mu-
dança de “F” reforça-se, numa circularidade de processo interativo, com
as resistências e ansiedades da família para mudar. Da mesma forma, os
sentimentos persecutórios de “Y” são reforçados pela liderança autoritá-
ria da família e pela omissão nas normas, que permitem, por exemplo,
que ele durma com sua mãe. Seus distúrbios de sono coincidem com essa
permissão. Contudo, a diferença nos contextos familiares parece residir
no número e intensidade de disfunções presentes naquele que inclui a
criança com asma, destacando-se conflitos e agressividade encobertos,
com prejuízos na individuação de “F”. Em relação às crianças, ambas
vivenciam situações ansiogênicas, porém “F”, frente às mudanças, ten-
de à somatização por meio da asma; além disso, seu contexto familiar,
que nega a agressividade, reforça a ação de voltá-la contra ele mesmo.
Em contraste com essa utilização do corpo como método para enfren-
tar a ansiedade, “Y” recorre a defesas mais mentalizadas (projeção) em
que a ação de pensar aparece claramente “pensa muito, pensa que não
consegue fazer uma pipa” (fábula 5). Os distúrbios de comportamento
surgem como indicadores de manifestação de sofrimento emocional, no
primeiro caso, enquanto, no segundo, a conduta serve, principalmente,
para efetivar transações positivas com o ambiente, com enriquecimento
da personalidade (criatividade, aprendizagem, amizade).
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
147
A criança com asma e sua família
uma família com membros diferenciados, onde o afeto circula entre to-
dos. Cada integrante é desenhado com lápis de diferente cor, sendo que
ele não utiliza o preto, cor rejeitada. No caso de “M”, as brigas não são
aceitas, o pai prefere e superprotege esse menino, enquanto sua irmã liga-
-se à mãe. No DCF, os integrantes dessa família são pouco diferenciados
entre si e as rejeições ficam expressas. Os pais de “M” não dispõem de
tempo para si mesmos, enquanto os de “B” manifestam uma relação forte
entre o casal, percebida e aceita pelos filhos, que, por exemplo, costumam
perguntar: “Vocês não vão ao baile?” (sic).
Na EFE, a família de “M” evidencia disfuncionalidade, salientan-
do-se evitação de conflitos, coalizões, negação da agressividade, subsis-
temas indiferenciados e individuação dificultada entre seus membros.
Na família de “B”, ocorre certa dificuldade na comunicação materna, na
primeira tarefa, expressa por meio de frase inconclusa. Em determinado
momento, o pai fala pelo filho, mas, em geral, predomina a escuta e o in-
centivo para que cada pessoa se expresse a seu modo. “B” também ajuda
sua irmã a falar de forma mais precisa, o que é bem aceito por ela. As
inter-relações no grupo surgem de forma gratificante, com afeto espon-
taneamente expresso, e as normas são claras.
Na dimensão intrapsíquica, salienta-se a dificuldade de “M” para
viver novas etapas do desenvolvimento, sendo que a primeira crise de
asma foi desencadeada, em parte, por uma situação de mudança. Revela
imaturidade nas relações interpessoais, exemplificada, entre outros as-
pectos, por resposta narcisista no Teste das Fábulas (fábula 7) e tendência
a estabelecer relações duais. Sua dificuldade para viver situações novas,
em especial aquelas que envolvem uma terceira pessoa, encontram reci-
procidade na estrutura e na dinâmica familiar, que tende a se fechar em
si mesma. “M” apresenta indicadores de somatização e grande ansiedade,
sobretudo no Teste das Fábulas, procurando negar que a entrevistadora
fosse uma pessoa estranha para ele. Há evidências de desejar maior auto-
afirmação, enfrentando, nesse terreno, a oposição paterna. Contudo, “M”
não explicita no DCF nenhum desejo de mudança em sua família. Quan-
to a “B”, no grupo controle, mostra-se tranquilo, cooperativo e apresenta
um nível evolutivo compatível com sua idade, embora, por vezes, sua
sociabilidade seja decorrente das imposições sociais, evidenciando, em
nível mais profundo, no Fábulas, sentimento de perda da situação pri-
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
vilegiada inicial junto à mãe (fábula 3 – “a mãe falou para ele ir comer
capim, ele tem que ir comer, não é? (P) Ah, muito mal, porque ele gosta
de tomar o leite que ele queria”). Apesar de suas respostas adaptativas,
os sentimentos depressivos também aparecem na fábula 6 (“Ah, eu acho
que ele [elefantinho] ficou muito deprimido porque não tinha ninguém
para ficar com ele”).
Síntese
A constelação familiar é praticamente a mesma nos dois casos,
sendo que cada menino apresenta a mesma diferença de idade em re-
lação à irmã. Além disso, suas mães têm idêntico grau de escolaridade e
profissão. Contudo, as diferenças são marcantes na dinâmica dessas fa-
mílias. No caso da criança com asma, encontram-se muitas disfunções,
particularmente a negação de conflitos, da agressividade e a pressão para
manter a família fechada em si mesma, sendo que a doença de “M” pare-
ce servir para manter o difícil equilíbrio familiar. Por outro lado, a famí-
lia de “B” também viveu situação de doença com esse menino, porém o
fez sem excessiva ansiedade, costumando promover o desenvolvimento e
a individuação de seus membros. É possível, no entanto, que essa hospi-
talização ainda recente colabore para os sentimentos de solidão expres-
sos por “B” no Fábulas. Em geral, destaca-se a imaturidade de “M” e o
elevado nível de ansiedade, recorrendo a muitas defesas, além daquelas
expressas pela via somática. “B”, ao contrário, mostra-se tranquilo, sua
adaptação social é muito boa, apesar de manter por longo tempo uma
satisfação regressiva, como o uso da mamadeira. Há fortes indicadores
de se encontrar na situação edípica, identificado com o pai, mas manifes-
tando ciúme da mãe e da irmã. Esses aspectos não são expressos por “M”,
que ainda está envolvido com relações do tipo simbiótico, encontrando
reciprocidade na dinâmica de sua família, que se inclina a coalizões en-
tre seus membros com subsistemas mal diferenciados. O menor grau de
desenvolvimento da criança com asma também pode ser explicado, em
parte, por ser um ano mais novo e apresentar escolaridade menor do que
seu par no grupo controle.
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A criança com asma e sua família
150
Dóris Lieth Nunes Peçanha
inadequada (sic)). Note-se que “R” falou algumas vezes sobre já ter co-
nhecido a entrevistadora, fato inverídico. Por outro lado, a família de “G”
mostrou-se funcional em todos os aspectos, salientando-se papéis defi-
nidos, liderança democrática, afeição expressa de forma adequada; em
síntese, individuação e saúde mental promovidas entre seus membros.
No Teste das Fábulas, ambos apresentam várias respostas seme-
lhantes, entretanto sempre houve acréscimos que as diferenciavam, indi-
cando imaturidade em “R” (fábula 2, sentimento de exclusão, “R” acres-
centa tema oral; fábula 3 – “comer capim”, acrescenta “mãe tem leite, não
quer dar” (sic); fábula 9 – notícia de gravidez, “R” choque, ansiedade
intensa, “mãe esconde a notícia”, sic); enredos adaptativos, identifica-
ção com o pai e superação dos conflitos edípicos em “G”. “R” mostra-
-se, ainda, ambivalente com mudança e crescimento pessoal por temer o
abandono materno (fábula 6). Seu protocolo destaca-se pela intensidade
dos indicadores de ansiedade, predomínio de choque, confusão e am-
bivalência na expressão dos sentimentos, tentativas inúteis de censurá-
-los, tentativas de controlar a entrevistadora e a aplicação da testagem,
hiperatividade e hiperatenção a detalhes do teste, questionando-os. Já
em “G”, tem-se atitude calma e cooperadora, percepção e bom manejo
de situações triangulares, fortes recursos egoicos, mecanismos de defesa
eficientes: deslocamento (fábula 6), projeção e reparação (fabula 8).
Síntese
Ambas famílias experimentaram problema de doença, porém a
primeira mantém padrões de relacionamento ansioso, superproteção
aos filhos e ausência de limites, enquanto a segunda enfrenta de forma
positiva a ansiedade, inserindo adequadamente sua prole na vida real.
Os dois meninos sofreram com a chegada de um irmão, “R” vivenciou
o fato como abandono materno (fábula 2) e reagiu adoecendo – asma.
“G” apresentou leve regressão, logo superada com a ajuda do ambien-
te familiar. Hoje, o primeiro compensa sua agressividade ao irmão com
preocupação excessiva em relação a este; o segundo manifesta real acei-
tação (fábula 3) e afeto pelo irmão. Os dois apresentam medos, em “R”
associam-se à ansiedade generalizada, em “G” à vivência com doença que
ocorreu no período pré-escolar, juntamente com distúrbios no sono. Os
conflitos de “R” ligam-se à etapa oral do desenvolvimento, com fortes
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A criança com asma e sua família
152
Dóris Lieth Nunes Peçanha
Síntese
Ambas crianças apresentam um desenvolvimento geral adequado
à sua idade. Contudo, a criança com asma encontra-se num nível evolu-
tivo um pouco inferior ao de seu par no grupo controle, suas respostas
tendem a ser menos adaptativas. Além disso, seus mecanismos de defesas
frente à ansiedade mostram-se menos efetivos (fábula 5. “I”: – ladrão
mata pai e mãe. /“V”: – criança fica quietinha para ladrão não perceber),
a preocupação com a morte é recorrente, não conseguindo deslocá-la
para fora do núcleo familiar (“I” fábula 4 – pai. /“V” – bisavô) e a frus-
tração oral (fábula 2) aparece compensada na superalimentação. Tais as-
pectos psicodinâmicos em “I” indicam a potencialidade para a utilização
do corpo como forma de defesa. Além disso, mudanças tendem a ser
153
A criança com asma e sua família
vivenciadas como negativas por “I” e sua asma coincide com o nasci-
mento do irmão. A superproteção ao mesmo pode ser uma forma de
compensar sua agressividade. Contudo, trata-se de hipóteses psicodinâ-
micas, pois a escassez de dados fornecidos pela mãe impede assertivas
mais pontuais. A mesma funciona com a utilização de muita repressão,
o que poderia estar colaborando para que a criança com asma expresse
seus conflitos através do corpo e tenda a rejeitar manifestações de afeto.
Essas dificuldades de “I” encontram-se em relação recíproca com cer-
ta artificialidade e resistência da família para expressar afeição entre
seus membros, bem como para trabalhar com conflitos. Tem-se, ainda,
liderança autoritária do pai e certa indiferenciação nos papéis fami-
liares. Quanto a seu par (“V”), destaca-se igualmente dificuldade para
aceitar o nascimento dos irmãos, com expressão através da conduta, e,
atualmente, o medo de perder o afeto dos pais é simbolizado na figura
do ladrão. Porém, a funcionalidade do sistema familiar transmite-lhe a
tranquilidade de que seus problemas podem ser, e vêm sendo, supera-
dos. Assim, em geral, o mesmo mostra-se bem adaptado ao ambiente
familiar e social, vivenciando relações enriquecedoras para o seu pro-
cesso de individuação.
154
Dóris Lieth Nunes Peçanha
155
A criança com asma e sua família
Síntese
Apesar de terem praticamente a mesma idade, escolaridade e
constelação familiar, a criança com asma se encontra num nível evolu-
tivo muito inferior ao de seu par no grupo controle. Além disso, sua an-
siedade é muito grande e seus mecanismos de defesa mostram-se pouco
efetivos frente a ela. Face às ameaças fantasiadas de desintegração cor-
poral (morte), a asma parece constituir-se numa defesa capaz de manter
certa integração entre o corpo e o psíquico. Por outro lado, a criança
sem problema de saúde apresenta um processo ótimo de desenvolvimen-
to, com superação positiva de todas as etapas vivenciadas até então. As
transações criança x família caracterizam-se pela reciprocidade de senti-
mentos: no primeiro caso, salienta-se a rejeição mútua entre pai e filho e
a rivalidade entre irmãos; no segundo, o afeto e cuidado recíprocos entre
todos os membros da família, sendo que a individualidade de cada um é
respeitada e incentivada.
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
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A criança com asma e sua família
ele e matar”), sendo que esse tipo de resposta não aparece no protocolo
de “C”. Na criança com asma predomina o narcisismo e a imaturidade
nas relações interpessoais (fábula 3 – “não dá leite para nenhum”; fábula
7 – “o menino ganha de aniversário”, com consequente dificuldade para
crescer e vivenciar processos de mudança em sua personalidade (fábula
6 – “assustado com a tromba comprida”)). Associa-se a isso a dificuldade
para trabalhar com situações triangulares (fábula 8 – pai, bravo, castiga;
mãe, não referida). Situação contrária aparece em “C”, cujas respostas são
predominantemente adaptativas. Esta criança evidencia boa resolução
da problemática edípica mediante mecanismos de reparação (fábula 8:
“(…) vai explicar para o pai, daí o pai dele entende, daí eles vão almoçar
juntos”; fábula 2 “ele foi brincar um pouco com um amigo dele e depois
convidou para ir na festa dos pais dele”) e satisfação com mudanças no
curso de seu desenvolvimento (“ele cresceu (…) achou muito bom por-
que agora ele já sabe se cuidar”).
Síntese
O encobrimento de conflitos na família da criança com asma (por
exemplo, nenhuma associação com o surgimento das crises) dificulta
uma apreensão psicodinâmica de sua personalidade. Entretanto, seus
distúrbios de comportamento evidenciam padrões imaturos de funcio-
namento quando comparada com a criança sem problemas de saúde. Os
dois meninos tiveram dificuldade para se inserir num contexto social
mais amplo (creche), o primeiro foi forçado a fazê-lo, enquanto o segun-
do, respeitado em suas necessidades, foi preparado para esse momento.
A partir daí, segue-se uma trajetória de pseudoadaptação em “L”, enquan-
to a sociabilidade de “C” se processa em bases genuínas de transações
reciprocamente afetivas com o ambiente familiar. A criança com asma
parece manter seu equilíbrio graças à utilização de sintomas (sucção
do polegar, enurese, fala infantilizada) e defesas regressivas, podendo
levantar-se a hipótese de que a asma sirva ao objetivo de gratificar suas
necessidades de dependência infantil. Seus distúrbios não se constituem
em motivo de queixa, parecendo que as transações imaturas de “L” com
seus pais encontram reciprocidade naquelas que estes dirigem à criança.
Neste sentido, há evidências de que a asma de “L” também seja útil à
necessidade familiar de encobrir conflitos. Assim, os papéis indiferen-
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
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A criança com asma e sua família
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
uma grande afinidade com o filho. A mãe diz que seu marido e M “estão
sempre colados”, por esse motivo a menina fica sempre a seu lado, “por-
que não tem outra opção” (sic).
Na escola, M conversa durante as aulas, por essa razão ele se enga-
na quando copia as lições. A mãe verifica todos os dias suas tarefas e faz
com que ele realize todos os deveres escolares. Ele não pratica esporte,
nem gosta de brincadeiras agitadas, preferindo jogos eletrônicos.
Os pais descrevem o filho como inteligente, ativo e independente,
mas referem “medo de sua independência” (sic). Contudo, o pai diz que
sua mulher é muito dependente e não quer que M se pareça com ela.
M tem ciúme do pai e quer sempre estar “colado” (sic) ao lado dele. Ele
“adora” deitar-se na cama dos pais, no meio do casal, e às vezes passa
a noite com eles. Isso não ocorre com maior frequência porque a mãe
impede tal situação, desaprovando-a. As atividades sociais da família são
sempre feitas em conjunto. Os pais insistem que são muito unidos e que
não existem atitudes agressivas entre eles.
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A criança com asma e sua família
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
Continuação…
Tarefas
Categorias Total Média
1 2 3 4 5 6
Normas
5. Implícitas 2 4 6 3
6. Incoerentes 2 4 6 3
7. Rígidas 3 2 5 2,5
8. Autocráticas ou permissivas 2 2 4 2
Papéis
9. Indefinidos 2 4 6 3
10. Indiferenciados 2 2 4 2
11. Rígidos 1 2 3 1,5
12. Inadequados 2 4 6 3
Liderança
13. Indiferenciada 2 4 6 3
14. Autocrática 2 2 4 2
15. Permissiva 2 4 6 3
16. Inadequada 3 3 6 3
Conflitos
17. Encobertos 1 1 2 1
18. Desvalorizados 1 2 3 1,5
19. Sem busca de solução 2 2 4 2
20. Sem direção adequada 3 4 7 3,5
Agressividade
21. Encoberta 2 2 4 2
22. Destrutiva 3 2 6 3
23. Inadequada 4 4 8 4
24. Recusada 4 2 6 3
Afeição
25. Encoberta 3 2 6 3
26. Recusada 2 2 4 2
27. Inadequada 4 2 6 3
28. Artificial 4 3 7 3,5
Individuação
29. Sem identidade pessoal 2 1 3 1,5
30. Sem respeito às divergências 3 1 4 2
163
A criança com asma e sua família
Continuação…
Tarefas
Categorias Total Média
1 2 3 4 5 6
31. Desvalorizada 2 1 3 1,5
32. Dificultada 2 1 3 1,5
Integração
33. Sem identidade grupal 2 4 6 3
34. Sem coesão 1 4 5 2,5
35. Com autoestima baixa 2 4 6 3
36. Não gratificante 2 4 6 3
164
Dóris Lieth Nunes Peçanha
ahn, ahn, eu tento eu, daí eu peço para alguém tentar, aí que eu peço prá
ele, se ninguém conseguir, eu peço”. P solicita resposta de F, que abaixa
a cabeça e sorri. P: “eu sei o que ela ia dizer”. F aponta para M, “você”. M
refere que P chamaria a ele mesmo. P faz longo discurso confirmando
que ele resolve o problema de todos, “sou a cordinha da descarga, mas eu
gosto de ser ativo”. P retoma o fato de C não referi-lo: “eu estranho muito
a resposta”. M relata que ultimamente C anda ligado a esse amigo. P pare-
ce concordar mediante frase confusa, sem completar o sentido.
T3 – Cada membro é solicitado a dizer o que mais gosta em si
mesmo.
P discursa sobre o quanto se preocupa com as pessoas e “nunca
comigo”. M concorda. Quanto a si, refere sua paciência. C interrompe,
“a paciência dela é do tamanho de uma formiga”. P lhe pergunta: “quem
então é paciente?”. C aponta para ele, P demonstra satisfação. M explica-
-se muito e diz que não se trata da paciência de educar, mas de analisar as
pessoas e tirar conclusões. F baixa a cabeça. P e M falam por ela, dizendo
que ela não tem consciência do que se trata. Novamente, P diz que sabe
a resposta da filha.
T4 – Perguntamos como é um dia de feriado na família.
De imediato, C relata visitas aos avós e primos. Quando os pais são
interrogados sobre como é um feriado para eles, M diz que C resumiu
tudo. Nesse instante, C começa a soluçar, as atenções de P e M convergem
para ele, que é levado para tomar água. A questão é retomada com o ca-
sal, que evidencia dificuldade para falar de atividades próprias. Enfim, M
diz que não conseguem sair sem as crianças, segue-se longo discurso dos
pais sobre a união da família e de quanto gostam de estar todos juntos.
P diz que não gosta de dar trabalho para os outros. M encerra a questão
dizendo: “é principalmente porque a gente gosta de estar todos juntos”.
T5 – Questão dirigida a cada um dos integrantes do grupo: – Su-
pondo que qualquer um de vocês está discutindo com outro membro
da família, alguém bate à porta, e quando aquele se dirige para atender,
recebe um empurrão da pessoa com quem discutia. O que você faria?
P surpreende-se com a situação apresentada “é estranho… um em-
purrão”. C: “entre nós, nunca vai acontecer isso”. P justifica as atitudes de
C, “leva tudo no peito, correria, mas é sem querer. Não é por querer que
você bate na sua irmã, não é filho?”. M interrompe rapidamente: “Não
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A criança com asma e sua família
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
F3 – “Ah, ele vai… assim… hum…, ah, ele vai comer capim, capim dos
bosques, porque mesmo ele sabendo comer capim, ele ainda não é adulto
que nem a mãe para comer aquele capim, aquele da fazenda, que pega
barata, essas coisas… Então ele vai para uma montanha, assim, que lá não
tem formiga, essas coisas… Elas não conseguem, se elas fizerem no alto
do morro para descer, elas escorregam tudo, e não dá para voltar, certo?
(P) Ah, se sente… assim, sozinho, sem aquele leitinho gostoso. Assim.”
F4 – “Ah… é Ayrton Senna. Pelo menos isso é uma verdade. (P) Eu sei.
O Ayrton Senna… ainda uma verdade, ainda eu gostei desse verso, então
eu acho que é isso mesmo. É, é uma verdade, ele morreu mesmo. (P) O
Ayrton Senna… Eu não sei o nome da mulher dele, vamos inventar um
nome? Zilda e… ele vai dar um filho tá? Sérgio, certo? (P) Ficou chatea-
da… assim… sem ter aquele carinho que o pai tinha, isso.”
F5 – “Ah… formiga. Uma formiga; aquela que saiu por ali [observação:
não havia formiga]. Pronto; uma formiga. (P) Ah, ela estava descalça,
então a formiga pica, dói muito, né, tem que passar álcool, dói, né?… e é
pior do que injeção, muito pior. Às vezes, chega até a inflamar o pé; pode
estourar uma veia, se a veia tiver perto; isso. (P) Se sente… ah… tem que
correr rápido para procurar o chinelo, procura o sapato, só isso. Ela tem
que… fica muito assustada, então ela sai correndo.”
F6 – “Ele cresceu muito, ele estava achando muito diferente. (P) As-
sim, normal, mas muda que ele ficou assustado… de um dia para o
outro, ele foi… do tamanho de, entendeu? É, dois dias de viagem e
pronto. (P) Ele cuida desse elefante, ele continua gostando do mesmo
jeito que ele gostava quando ele era pequenininho. Ah, mas tem uma
coisa: o elefante não pode ter crescido muito porque tem uns elefantes
que eles não crescem mais do que isso aqui, olha! Esse elefantinho aqui
é da mesma cara que eu conheço… Só.”
F7 – “Pega os materiais e faz outro, igual, do mesmo jeito e dá para a mãe.
(P) Ah, normal, é mesma coisa, é o mesmo. O que muda? Nada. Ele só fez
outro, prá ele não ter que dar esse e fazer outro para ele. (P) Porque esse é
o primeiro. O primeiro fica para ele, o segundo para a mãe.”
F8 – “Porque ele… assim… a mãe esqueceu de avisar ele, o filho também
não avisou, não deixaram bilhete, nada. Então ele ficou bravo, né, que
às vezes ele queria fazer algum compromisso que precisava deles, então
167
A criança com asma e sua família
ficou bravo. Tá bravo, isso. (P) Ah… termina assim: ele fica longe do pai,
o pai vai para um lugar e ele vai para outro.”
F9 – “Daqui um mês será seu aniversário, nós precisamos comprar as coi-
sas antes que o seu aniversário chegue. Precisamos comprar hoje senão
não vai dar tempo, amanhã a mamãe está cheia de compromisso. (P) Óti-
mo, pelo menos ela pode passear um pouquinho voltando da escola.”
F10 – “Ah, que ela tinha virado um cascão, e ela estava no país das tornei-
ras, então ela ficava correndo daqui para lá, porque é o país das torneiras,
só tem água. Ele tinha que correr das torneiras porque o cascão não gosta
de água. Ela sonhou por um período muito grande. Então ela acordou es-
pantada. (P) Viu que ele virou cascão, essas coisas. Ele se sentiu assim…
tem que viver num mundo onde ela tem que ficar correndo para não cair
água nela.”
d) Síntese do caso
Trata-se de uma família que procurou dar a ideia de que tudo esta-
va bem, havendo vigilância e pressão para que todos confirmassem essa
harmonia. As discordâncias de M eram feitas com dificuldade (gaguei-
ra, confundia os pronomes – ele e nós em vez de eu, não completava o
sentido das frases). Sua tentativa de investir afeto numa relação externa
à família (amigo) não era aceita, sobretudo pelo pai, que forçava a ma-
nutenção de um vínculo simbiótico com o mesmo. A irmã mostrava-
-se tímida e sempre que solicitada protegia-se, procurando esconder-se
atrás da mãe. Os demais falavam por ela e o pai mostrava-se onisciente
de seu pensamento. Mesmo assim, ela expressava alguma coisa de for-
ma quase monossilábica. Era a única do grupo a aceitar a hipótese de
uma mudança (EFE) sem a mobilização excessiva de defesas manifesta-
das pelos demais. A tarefa relacionada à agressividade, seguida da tarefa
sobre a mudança (EFE), foi a que mais mobilizou a família. As reações
agressivas eram ativamente negadas por pai, mãe e filho. Entretanto, esse
sentimento forçava sua expressão pela referência (quase involuntária)
às brigas entre as crianças. Novas defesas eram mobilizadas (as brigas
minimizadas, justificadas), sobretudo a racionalização, mas acabavam se
mostrando pouco eficientes. O vínculo entre o casal aparecia fragilizado,
mediado em especial pela presença do filho. A asma deste parecia servir
à manutenção do equilíbrio da família. Por exemplo, os pais evitavam fa-
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
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A criança com asma e sua família
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Dóris Lieth Nunes Peçanha
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5. Discussão e sugestões
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A criança com asma e sua família
CRIANÇA
FRATERIA
308 Minuchin e Fishman (1990), Minuchin e Nichols (1995), Onnis (1989), Onnis et al. (1994),
Seywert (1990).
309 Minuchin e Fishman (1990), Molinari, Taverna, Gasca e Constantino (1994).
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6. Novos inícios integrativos
Sob esse título, fica um convite para continuar o debate por cami-
nhos ainda inexplorados relativamente às teorias que fundamentam esta
obra. Na busca da compreensão do ser humano, não existem conclusões
definitivas, mas uma abertura para pensar a complexidade e desenvolver
uma “ciência com consciência”.327
Do ponto de vista das teorias que fundamentam esta obra, psicos-
somática e sistêmica, suas contribuições são consideráveis e requerem
ainda muito estudo. A Escola iniciada por P. Marty (psicossomática) con-
tinua em desenvolvimento. A iniciativa do colega A. Blanquer328 consti-
tui uma busca para compreender a “sensibilidade daquele autor relativa-
mente ao evolucionismo, um dos dois pilares da ‘revolução’ psicossomá-
tica, sendo o segundo a psicanálise”. Salientamos que as possibilidades
de diálogo epistemológico entre psicossomática e sistêmica constituem
todo um trabalho a ser realizado. De nossa parte, apresentamos uma pes-
quisa clínica que integra tais abordagens, mas a dialética epistemológica
entre essas perspectivas que incluem a evolução em seus pressupostos
resta como possibilidade investigativa a ser aprofundada.
Acreditamos que a inter e a transdisciplinaridade constituirão a
marca do conhecimento deste século, ultrapassando definitivamente o pa-
radigma cartesiano. Dessa forma, haverá lugar para um maior diálogo en-
tre evolucionismo e psicossomática e entre esta e a perspectiva sistêmica.
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Este livro foi impresso em março de 2015 pela Gráfica Compacta em São Carlos/SP.