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Abstract: The tourism which is practiced in the State of Amazonas (Brazil) is an international tourism.
The great majority of the touristic infra-structure belongs to regional political oligarchies and to foreign
undertakers/corporations that aim at immediate gain and capital accumulation, regarding the traditional
populations (natives and river-bank inhabitants) as cheap labour, excluding them of all and any process
of planning and/or management of the (eco)touristic activities. This research analyses the forms of inser-
tion of the traditional populations in the existing ecotouristic activities and their perceptions about these
activities. It also discusses the conceptions of ecotourism, native ecotourism, native tourism, ethnic tour-
ism and ethnotourism and points out the proceeding for the planning of ecotourism in Amazonas.
†
• Ivani Ferreira de Faria e doutoranda pelo Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo/USP. Tema
da pesquisa Identidade e Turismo: subsídios para o planejamento do Turismo Indígena em São Gabriel da
Cachoeira/AM, financiada pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas/FAPEAM. E-mail:
ivigeo@ufam.edu.br
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Brasil” (PPG7), que inclui o “Subprograma turismo), pouca informação obtivemos sobre
projetos Demonstrativos”, no qual estão sua inserção nos Estados amazônicos.
localizados o PDA e o PDPI (Projetos De acordo com Cruz (2003), esses
Demonstrativos dos Povos Indígenas). programas se completam na medida em que
O processo de elaboração do PDA teve um cria a materialidade requerida por um
inicio em agosto de 1992, com a primeira uso turístico dos lugares e o outro trata de
“missão” do Banco Mundial, sendo aspectos intangíveis da atividade (como é o
concluído no inicio de 1995, quando o caso de sua gestão); ambos são
“Projeto” foi aprovado e os tramites fundamentais para o desenvolvimento de
administrativos, terminados. O PDA apóia um turismo organizado. As maiorias das
financeiramente iniciativas ou experiências já realizadas ou em curso são
experimentos (projetos) comunitários de sustentadas financeiramente por agências
proteção das áreas de florestas tropicais na de cooperação internacional, privadas e
Amazônia e na Mata Atlântica e públicas e internamente esses recursos
ecossistemas associados, e ações destinadas provem de instâncias governamentais como
a recuperação e ao manejo de espécies da o PDA, FNMA (Fundo Nacional do Meio
fauna e flora dessas regiões. Fruto da Ambiente) e o PDPI no âmbito do PPG7.
pressão das entidades não-governamentais A estratégia do desenvolvimento
e movimentos sociais e ambientalistas que regional via pólos adotada pelo
atuam nessas regiões foi concebido de PROECOTUR, que promove a concentração
acordo com uma das características mais espacial de estruturas e de fluxos de
marcantes do novo discurso visitantes aparece não apenas como uma
desenvolvimentista e opção do planejamento físico-territorial do
etnodesenvolvimentista: a de estar voltado turismo; ela é a opção política, orientadora
para a valorização da participação e para o de um planejamento espacialmente
apoio as iniciativas das comunidades locais segregador de turistas e de residentes
e suas organizações (associações, (ibid.).
cooperativas, sindicatos) e das ONG´s Em relação aos povos indígenas o
(Verdum, 2002:93). governo federal criou o PDPI em 1999,
O Plano de Desenvolvimento da vinculado ao PDA, com sede em
Amazônia, tem na sua essência a visão que Manaus/AM, quase como uma extensão dos
“o ecodesenvolvimento com alta tecnologia e propósitos do PDA. Se o PDA tem como
elevada qualidade de vida, sintetiza o objetivo apoiar iniciativas das populações
modelo de sociedade que se quer ver locais e de ONG´s (organizações não
implantado na Amazônia” (SUDAM, governamentais) em geral, fortalecer a
1993:.5). Este programa tem entre suas capacidade desses grupos para elaborar e
diretrizes mais importantes, promover o gerenciar projetos de desenvolvimento
crescimento econômico regional, assegurar (sustentável) local e gerar e divulgar
a conservação do meio ambiente, estimular conhecimento a partir dessa s experiências,
o desenvolvimento científico e tecnológico, o no caso do PDPI esses objetivos surgem
Proecotur, o Prodetur e mais recentemente relacionados a um publico especifico, os
o PNMT. povos indígenas, acrescidos da preocupação
Programa Nacional de Municipalização com a proteção dos territórios demarcados e
do Turismo (PNMT), iniciado no Governo dos recursos naturais neles existentes e
Fernando Henrique Cardoso, mas que foi com a superação de algumas falhas do
extinto por não ter conseguido alcançar instrumental conceitual e operacional no
seus objetivos que tinha por objetivo “mecanismo PDA”, como por exemplo no
capacitar municípios para a gestão local do acompanhamento da execução de projetos e
turismo e o Programa de Desenvolvimento na assessoria complementar, quando
do Ecoturismo para a Amazônia Legal necessária.
(PROECOTUR), visa criar infra-estruturas Os esforços para a criação do PDPI
básicas e turísticas para a implementação propriamente dito tiveram inicio em 1997,
de pólos ecoturísticos em todos os estados como parte dos preparativos para a reunião
da região. A respeito do PRODETUR dos do PPG7 realizada no fim daquele ano.
(Programa de Desenvolvimento do As negociações e arranjos institucionais se
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estenderam até meados de 1999, quase que Cachoeira, na região do Alto Rio Negro,
exclusivamente no âmbito governamental e surgiu da necessidade de manter os
intergovernamental, envolvendo o governo domínios da coroa portuguesa a salvo dos
brasileiro (PDA e PPTAL), as agencias interesses espanhóis na região ocupada por
governamentais alemãs KFW e GTZ e o várias nações indígenas, quando da invasão
Banco Mundial. Como subsídios às dos europeus, no século XVII, na Amazônia.
discussões estabelecidas ao longo desse Os primeiros povoamentos europeus estão
período, foram realizados estudos associados à presença de sertanistas e
relacionados à promoção e a assistência a religiosos, com objetivos econômicos,
saúde indígena, sobre capacitação e político-militares e religiosos para a região.
educação formal indígena, direito indígena, Com este intuito, uma expedição para
participação indígena e políticas públicas, policiamento e fortificação foi enviada ao
economia indígena em contextos alto rio Negro, em 1761.
interétnicos e desempenho dos projetos A cidade de São Gabriel da Cachoeira
indígenas no PDA (Verdum, 2002: 100). possuiu, durante a sua história, quatro
Nessa perspectiva o PDPI, apresenta-se nomes: São Gabriel da Cachoeira, São
com um aliado na implantação de projetos Gabriel do Rio Negro, São Gabriel e
com novas tecnologias sociais e econômicas Uaupes.
em terras indígenas, com base no A população total do município de São
planejamento participativo e comunitário Gabriel da Cachoeira é de 29.951
no qual o ecoturismo pode ser uma habitantes (IBGE, 2000), embora a
alternativa. prefeitura faça uma estimativa atual de
45.000 habitantes. 95% da população são
O Olhar da comunidade sobre o ecoturismo representados por 23 povos indígenas,
distribuídas em 427 aldeias. Registra-se a
No Pólo de Ecoturismo do Estado do presença de militares devido à presença de
Amazonas os municípios que têm uma das bases do projeto SIVAM (Sistema
potencialidade para o ecoturismo indígena de Vigilância da Amazônia) e do 5º
são: São Gabriel da Cachoeira, denominado Batalhão de Infantaria de Selva/5º BIS, por
como o município mais indígena do se tratar de zona de fronteira e área de
Amazonas com 95% da população indígena, segurança nacional.
23 nações e 22 línguas diferentes de três Floresta e rio representam dois aspectos
famílias Tukano, Aruak e Maku; Santa importantes na territorialidade das
Izabel do Rio Negro e Barcelos, com a diversas nações indígenas dessa região. É o
presença da cultura Yanomami com ritos território de nações que pertencem a três
que a distingue das demais; e Presidente famílias lingüísticas distintas, Tukano
Figueiredo, com a cultura dos Waimiri- Oriental, Aruak e Maku cuja ocupação é
Atroari, com seus mitos e história específica reconhecida historicamente desde tempos
que podem representar um novo caminho imemoriais (Faria,1997).
para o ecoturismo no Estado. Entretanto, No município a população rural conta
nenhum estudo foi realizado com os povos com 17.586 habitantes e a população
desses municípios sobre a implantação e urbana com 12.365 hab, com um equilíbrio
viabilização do ecoturismo em suas Terras entre a população feminina e masculina.
e esta pesquisa limitou-se a investigar o As terras indígenas representam 80% do
que os indígenas e caboclos ribeirinhos vem território de São Gabriel da Cachoeira e,
se inserindo no turismo praticado e o que grande parte da população indígena, ainda
pensam sobre a atividade turística. fala o nheengatu ou língua geral - uma
Presidente Figueiredo alem o potencial herança do tempo dos jesuítas que, na
para o ecoturismo indígena, figura no tentativa de uniformizar a comunicação
cenário regional como a “Terra das com as tribos em todo o país, instituíram o
Cachoeiras” e Silves aparece como tupi-guarani como língua mãe.
município potencial para o ecoturismo Em São Gabriel da Cachoeira a
comunitário. Federação das Organizações Indígenas do
São Gabriel da Cachoeira Rio Negro – FOIRN é a principal
O município de São Gabriel da organização atuante nas questões
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independente da prefeitura local de modo a bairros no meio urbano com 3.363 hab,
dar continuidade às atividades mesmo nos justificando a maior presença da população
períodos de transição eleitoral, e finalmente no meio rural.
que todos os atores sociais ligados ao No município a organização comunitária
ecoturismo possam se unir em prol da é bem desenvolvida. Atuam com lideranças
efetivação das diretrizes e estratégias do comunitárias principalmente das rurais,
programa (Plano de Desenvolvimento do pois no meio urbano, não existem
Pólo de Ecoturismo do Amazonas). associações de bairro.
O Parque Nacional do Jaú, Parque A ASPAC (Associação de Silves para
Estadual do Aracá, a APA de Mariuá, Ilhas preservação Ambiental e cultural), é uma
e em seguida as parias constituem os organização não governamental brasileira,
principais atrativos. É de se ressaltar, sem fins lucrativos, formada por
também, que os atrativos culturais como o comunidades de ribeirinhos e seus
festival do peixe ornamental é importante, membros, residentes nos lagos em entorno
porém o perfil do turista que freqüenta este da ilha de Silves, fundada em 1981 com a
evento está mais para o de massa do que preocupação de defender os lagos da pesca
ecoturista e que as comunidades indígenas, predatória. Hoje, a ASPAC trabalha com as
principalmente a Yanomami são atrativos comunidades tradicionais da região de
tão significativos quanto os atrativos Silves no desenvolvimento do Ecoturismo
naturais existentes na área. para que os recursos e benefícios advindos
Outro fator importante a ser desta atividade possam ser revertidos para
considerado é a presença no Parque do a proteção de seus lagos de pesca. Vários
Jaú, de 150 famílias de caboclos ribeirinhos projetos são implementados por ela como de
com aproximadamente, 800 a 900 capacitação de monitores e fiscais
habitantes que vem realizando cursos de ambientais, oficinas de educação
capacitação e formação de fiscais ambiental, projeto de permacultura que
ambientais voluntários como forma de atingem 5 comunidades com a previsão de
incluir a comunidade na vida do parque. chegar as 12 até 2003.
Esse trabalho desenvolvido pela Fundação Os principais projetos são executados
Vitória Amazônia em parceria com o pela ASPAC em parceria com o WWF,
IBAMA, significando que nesse atrativo, IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio
pode-se desenvolver atividades Ambiente e Recursos Naturais
verdadeiramente ecoturísticas. Renováveis), INPA (Instituto Nacional de
Silves Pesquisa Amazônica) e CPT-Regional
Silves é um dos povoados mais antigo do (Comissão da Pastoral da Terra).
Amazonas, talvez o primeiro núcleo Entre eles está a Pausada Ecológica
europeu criado no Estado do Amazonas que Aldeia dos Lagos, construída como parte do
teve seu inicio com a fundação da Missão de projeto “Silves: um projeto de ecoturismo
Índios chamada Aldeia de Saracá, da comunitário na Amazônia brasileira”,
Ordem das Mercês em 1660 que executado pela ASPAC com apoio técnico do
concentrava índios Barururus, Caboquenas WWF e financiado pelo governo da Áustria
e Guanavenas. e WWF. O objetivo é viabilizar o primeiro
A população de Silves é constituída, na empreendimento comunitário de
sua maioria por caboclos descendentes dos ecoturismo da Amazônia, com renda
primeiros habitantes, os indígenas, mas utilizada em benefício da conservação do
que não reconhecem mais suas origens e sistema de lagos de pesca da região e para
por descendentes de portugueses, espanhóis a melhoria da vida dos ribeirinhos. Foram
e nordestinos que chegaram durante o definidos três tipos de área de pesca: lagos
apogeu da borracha no início do século XX. para procriação (santuários de proteção
De acordo com o IBGE (2000), o total), lagos de manutenção (permitida a
município conta com 7.785 habitantes, pesca artesanal) e lagos de exploração
divididos em 4.179 homens e 3.606 pesqueira, permitindo a pesca comercial.
mulheres com densidade demográfica de O projeto denominado “Conservação dos
3,78 hab/km2. Existem 26 comunidades Recursos Hídricos” atua em três vertentes:
rurais com cerca de 4.422 habitantes e 04 uma de preservação dos lagos, outra ligada
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