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Análise da mobilidade sustentável de um campus universitário

Uma Leitura baseada na aplicação da Sintaxe Espacial

EIRADO, Ricardo Stashnell Kosloski ¹


Universidade de Brasília, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
ricardo.eirado@aluno.unb.br

GURGEL, Ana Paula Campos ¹


Universidade de Brasília, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
anapaulagurgel@unb.br

Estudos Especiais em Projeto e Planejamento I


Universidade de Brasília
Fevereiro de 2023

Resumo

O presente artigo parte da investigação da mobilidade sustentável sob o enfoque da


morfologia urbana para abordar a hipótese de que a análise configuracional pode auxiliar na
compreensão das dinâmicas de movimentação em campus universitários, tanto com relação à
metrópole quanto em relação a seus fluxos internos. Aborda o problema a partir da revisão de
literatura sobre a relação entre morfologia urbana e mobilidade sustentável para aproximar para
a sustentabilidade da mobilidade nos conjuntos universitários. Aplica, por meio de estudo de
caso, análises axial e de visibilidade baseadas na teoria da logica social do espaço no principal
campus da universidade de Brasília como instrumento para auxílio no planejamento de sua
infraestrutura viária e de mobilidade. Aplica também simulação multiagente para correlacionar a
integração obtida por cálculo de visibilidade (VGA) com a dinâmica de movimentação pelo
campus. As análises mostraram adequação da rede carroçável com as atividades desenvolvidas
na região e desintegração e descontinuidade na rede destinada a ciclistas e pedestres, que
possuem centros de integração em localidades distintas da rede carroçável. Apontamentos foram
de que a análise axial e de visibilidade têm potencial para antecipar e espacializar padrões de
caminhabilidade em campus universitário. Elucidou-se a necessidade para a manutenção das
características bucólicas da região mesmo com edições posteriores de infraestrutura viária.

Palavras-Chave: Mobilidade Sustentável. Morfologia Urbana, Sintaxe Espacial, Campus


universitários, Brasília.

Introdução

No campo do urbanismo, emergem os trabalhos que abordam a forma e espaço como


elementos que afetam o desempenho da dinâmica urbana que são relacionados à
sustentabilidade, já que a forma urbana, uma vez posta, não continua ativamente exercendo
consumo de recursos e degradando o ambiente, mas influencia no consumo e na degradação
(Newman & Kenworthy, 1989; Bezerra e Gentil, 2013). No estudo da mobilidade urbana, tal
relevância pode ser observada a partir de trabalhos recentes que propõem índices para avaliação
da eficiência indicando que propriedades do uso, da geometria e da configuração1 do espaço

1
Configuração pode ser entendida como o aspecto proveniente da relação entre as porções da forma.
influenciam sua eficiência. (Nechet, 2012; Costa, 2007; Frank et al., 2005; Dobesova & Krivka,
2002; ITDP, 2017).
Para Medeiros (2013) São mais recorrentes as abordagens morfológicas sobre mobilidade
acerca da articulação dos elementos urbanos (edificações, vias e caminhos e quarteirões) em
cidades inteiras ou pelo menos distritos, conquanto o interesse por se compreender a relação
forma-configuração em sub-regiões da cidade é ciência que se encontra em desenvolvimento e
há relevância em se estudar a mobilidade em regiões menores, como complexos edificados da
cidade quando propõem certa intensificação em sua direção dos fluxos que afetam a dinâmica
global, exemplos são os centros financeiros, industriais e institucionais, por sua forte
convergência populacional em cidades com estas atividades como foco. O presente papel se
debruça a conhecer o cenário nacional do estudo da mobilidade urbana com foco em
sustentabilidade em campus universitários, que segundo Balsas (2003), geralmente constituem
polos geradores de viagens na cidade, causando impactos significativos em sua estrutura de
movimentação partindo do contexto da análise morfológica, em especial, a da configuração
urbana, por razão da escassez de trabalhos com este enfoque nos centros universitários
brasileiros e para responder como a análise configuracional pode auxiliar a entender as
dinâmicas de movimentação entre o campus e a cidade e intra-campus. A razão de tal
questionamento é pela presente necessidade em se complementar o estudo da mobilidade em
conjuntos universitários com dados de configuração para apoiar o desenvolvimento de índices
holísticos desta temática, haja vista que a maior parte destes instrumentos considera apenas
questões sociais, de infraestrutura viária e modos de transporte. (Dias, 2014; Gentil, 2015)
O objetivo geral é, portanto, a partir do conhecimento da relação morfologia e mobilidade
analisar o desempenho da mobilidade urbana em um campus universitário, em seus fluxos
internos e na relação com a cidade por meio da configuração espacial. Os objetivos específicos
são: a. realizar revisão bibliográfica sobre os atributos morfológicos mais relacionados à
sustentabilidade da mobilidade urbana e caminhabilidade, o cenário de estudos de mobilidade e
de configuração em centros universitários, a disponibilidade e adequação das ferramentas
aplicáveis para a medição de atributos configuracionais e b. proceder estudo empírico sobre um
campus universitário para se verificar a relação dos parâmetros configuracionais analisados com
emergências sobre a sustentabilidade da mobilidade da cidade para o campus e dentro do
campus, em sua dinâmica própria.
Quanto à metodologia, o trabalho consiste numa pesquisa aplicada, que adota a revisão
bibliográfica para confrontar o problema de mobilidade passível de ser abordado pela
configuração via teoria social do espaço (Hillier & Hanson, 1984) em campus universitários a
partir de consulta em trabalhos relevantes indexados pelo buscador Google Acadêmico com
menos de dez anos de publicação. A revisão precede a aplicação por meio de estudo de caso
em um campus universitário escolhido a partir do ineditismo do estudo e possíveis contribuições
ao planejamento de sua infraestrutura viária e de mobilidade. O exercício utilizará de recursos
telematizados e softwares livres para o fornecimento de dados primários a serem confrontados
buscando relações com a facilidade de deslocamento, a caminhabilidade e a predisposição da
malha para adoção de meios ativos de deslocamento.
A partir deste bloco o trabalho se divide na Revisão de Literatura, em que se discute as a
palavras-chaves fundamentais à compreensão do problema, seguida por um bloco detalhando a
metodologia utilizada, resultando na confecção de quadro acerca do processo de sua aplicação.
Por último os resultados são expostos e os achados são discutidos no último bloco do artigo junto
às considerações finais.

1. Revisão de Literatura - Morfologia urbana e mobilidade sustentável

O presente trabalho adota o conceito desenhado pela OECD (1997) de mobilidade sustentável
como o deslocamento de bens e pessoas num regime de consumo e degradação igual ou inferior
ao que o sistema pode promover. Quanto a forma urbana, segundo Holanda et al. (2000), é
“qualquer espaço em que nos encontremos, que é fisicamente delimitado, a ponto de
estruturamos sua noção a partir da consciência das relações topológicas e perspectivas entre
nosso corpo e as superfícies que realizam a demarcação do espaço que estamos”. A morfologia
urbana nasce como ciência descritiva designada a estudar a relação entre o ambiente construído
e a paisagem natural segundo Schutter (1899) e que, para Conzen (1960), foi popularizada a
partir da segunda metade do século XX com os avanços tecnológicos que permitiram novos
meios de sentir e visualizar a cidade tanto em seus aspectos geométricos como topológicos.
A análise morfológica inicia com os estudos descritivos, mas avança pelo campo da
configuração a partir de teorias e ferramentas que buscam avaliar a interação entre as partes
compositivas da malha urbana, frequentemente quanto à rede viária. A teoria da lógica social do
espaço desenvolvida por Hillier & Hanson (1984) têm demonstrado eficácia em antever cenários
a partir da configuração urbana. Nesta ciência são recentes os estudos que procuram vincular
forma e espaço urbanos à mobilidade sustentável e que ganharam força a partir do debate entre
os modelos de cidade que desempenhariam melhor esta função, o que atualmente tende às
qualidades dos modelos de cidades de compactas (Bezerra e Gentil, 2013) Segundo as autoras
os meios urbanos compactos tem alta densidade edificada, baixa extensão de espaços vazios,
malha urbana contínua e conectada e quanto aos usos, há diversidade e coexistência espacial
de múltiplas funções reduzindo a distância média de deslocamentos. Estes atributos são também
apoiados por Gomes (2009), Neuman (2005) e Costa (2007). Já as áreas consideradas dispersas
são para os autores aquelas caracterizadas pelo desenvolvimento descontínuo e linear que
consome vastas áreas de baixa densidade e com uso do solo restrito, influenciando sobre o
movimento pendular dos deslocamentos, reforçando o caráter de ‘cidades-dormitórios’, como é
o caso de metrópoles como Brasília. Ewing (1997) frisa que cidades que assumiram expansão
urbana com progressivas ampliações de seu perímetro ante a consolidação interna desenharam
sua trama para uma condição dispersa e descontínua, que além de gerar problemas ambientais
gera problemas de mobilidade (Silva e Romero, 2011). É bom frisar, densidades muito altas
também oferecem desafios ao desenvolvimento sustentável, notadamente quanto à degradação
e contaminação do solo e do ar, a complexidade infraestrutural e para a mobilidade, maiores
dificuldades relativas à segurança no trânsito a enfrentar do que em modelos dispersos de cidade
(Gentil, 2015).
A tabela 1 traz uma relação de características da forma que favorecem a mobilidade
sustentável segundo publicações recentes em suas propriedades:

a. Funcionais, que decorrem do padrão e distribuição das atividades em relação a


ocupação;
b. Geométricas, inerentes da forma que constitui o tecido urbano, tais como a densidade e
compacidade da massa construída e a extensão e desenho das vias e;
c. Configuracionais, que são propriedades emergentes da relação entre as partes
constituintes do sistema urbano e que nesta análise referem-se à relação entre os eixos
viários e caminhos de pedestres e ciclistas.

Tabela 1: Atributos da forma e ocupação urbana que contribuem para a mobilidade sustentável segundo publicações
recentes.
Uso Geometria Configuração
Quarteirões curtos (<200m)

Alta possibilidade de rotas


Desconcentração de usos

Atributos
da forma
Alta conectividade

Alta inteligibilidade
Alta compacidade

Alta integração

Alta visibilidade
Usos Mistos

Autores

Gentil (2015) x x x x x x x
Barros (2014) x x x x
Dias (2014) x x x x x
Bezerra (2013) x x x x x
Nechet (2013) x x x
Silva e Romero (2011) x x x x x x
Fonte: Elaborado pelo autor

Para Silva e Romero (2011), quanto aos usos, a diversidade e dispersão podem ser
eficientes para a redução de distâncias e tempos de deslocamentos e influenciarem a população
à adoção de transportes ativos. A densidade alta também influencia na redução de consumo de
combustível per capta e no menor custo de infraestrutura viária e consumo de terras com esta
finalidade, fatores associados a sustentabilidade socioeconômica e físico-ambiental (Newman e
Kenworthy, 1999; Bezerra, 2013). No que se refere à configuração, em termos globais, sistemas
com alta integração e conectividade de suas malhas viárias tendem à maior sustentabilidade da
mobilidade por disporem de rede viária mais acessível e com maiores possibilidades de
caminhos do que sistemas com valores considerados baixos destes atributos, estas
características contribuem para a eficiência do escoamento do trânsito (Medeiros, 2013).

2.1 Caminhabilidade

Ozelim (2022) ao avaliar 192 indicadores internacionais diversos de caminhabilidade


constatou que mais de 70% estão relacionados a forma urbana, apesar de que é recorrente que
índices para aferição do grau de sustentabilidade da mobilidade considerem atributos
mensuráveis pela sintaxe apesar de não a incluírem no processo, o que geralmente é feito de
modo qualitativo e descritivo (Gentil, 2015, Marques Bracarense e Sousa, 2015). A tabela 2
mostra que a visibilidade e a existência de barreiras ao deslocamento são componentes que
influenciam sobre o grau de apreensão do espaço, valores considerados altos destes atributos
favoreceriam a caminhabilidade e adoção de transportes ativos (Lynch, 1960; Barros, 2014).

Tabela 2: Atributos da forma e ocupação relacionados a caminhabilidade


Uso Geometria Configuração

Quarteirões curtos (<200m)


Atributos
redução de barreiras

Possibilidade de rotas
da forma

Conectividade

Inteligibilidade

Visibilidade
Usos Mistos

integração
Autores

Worls Resousrce Institute


x x x x x x x
(2015)
Design-Oriented Traffic
Development – DOTS x x x x
(2017)
Barros (2014) x x x x x x
Ozelim (2020) x x x x x
Silva e Romero (2011) x x x x x
Fonte: Elaborado pelo autor

Piezsy, Przestrzeni e Todzi (2020) afirmam forte relação entre índices de integração, e
conectividade com a dinâmica de movimentação peatonal, espaços que favorecem e limitam a
caminhabilidade são criados, por estímulo de seus usos e sua forma de orientação. (Hillier et
al., 1993; Kamruzzaman, 2018; Turner e Penn, 2002). Os autores encontraram forte correlação
entre valores de integração axial com as regiões mais percorridas pelos pedestres através da
simulação multiagente2.

2.2 Mobilidade e morfologia em Campus Universitários

Os campus universitários podem ser interpretados como locais vinculados ao ensino e


pesquisa, de formação de tomadores de decisão e frequentemente sua estrutura física e social
é associada com exemplos de boas práticas em diversos aspectos, e que certamente não exclui
a mobilidade, uma oportunidade para que se desenvolva de modo sustentável como exemplo
para a cidade (Tolley, 1996; Meireles, 2014; Vale et al., 2018). Silva e Tan (2018) abordaram a
mobilidade sustentável em campus através do estabelecimento de um índice criado por Oliveira
(2015), sendo que são recorrentes os trabalham que buscam a aferição de fenômenos
contemplados por índices para avaliação holística da mobilidade apesar de pouco comuns os
que tratam da configuração urbana diretamente. O trabalho se baseou em transferir um índice
originalmente criado para cidades para um contexto reduzido. É possível observar que assim
como a maioria das análises focadas em mobilidade, o trabalho de Silva e Tan se baseou em
questões de infraestrutura viária e transportes.

2
Simulação multiagente se refere a partículas programadas com dada função, no caso
do estudo foram programadas como pedestres e atividades corriqueiras pela região
simulada.
A Tabela 3 elenca os parâmetros considerados pelo índice IMScamp, destacando em
vermelho aqueles que poderiam ser avaliados través da sintaxe espacial.

Tabela 3: Atributos considerados pelo IMScamp (Oliveira, 2015)

Fonte: Silva e Tan (2018)

O grau de acessibilidade de um sistema em seu potencial geométrico pode ser medido pela
sintaxe espacial através do atributo integração global, enquanto outras variáveis como
visibilidade e conectividade permitem a obtenção de percepções sobre o desempenho da
mobilidade das infraestruturas viárias e sua adequação ao meio de transporte dominante.
Estudos que abarcam a configuração de campus universitários têm aparecido em aplicações
diversas, em especial à estruturação social e de segurança (Barata, 2019), medição do
desempenho morfológico ( Oliveira et. Al, 2020), grau de orientação (Mano e Braga, 2018), estes
encontraram que no cenário de campus com baixa compacidade, a tendência da
caminhabilidade parece ser seguir por rotas indefinidas que convergem para as áreas mais
integradas e divergem para as áreas mais conectadas.

3. Estudo empírico de mobilidade em campus universitário

Há notícias de análises que tangenciam a seara da morfologia e mobilidade para campus


dos estados de Rio de Janeiro e São Paulo, Minas Gerais e Florianópolis. Para o Distrito Federal,
avanços nessa direção seriam complementares aos estudos recentes sobre a configuração dos
campi da Universidade de Brasília. Seu conjunto mais tradicional, o campus Darcy Ribeiro passa
por processo de revisão de seu plano diretor, portanto novas informações configuracionais
podem ser apreciadas por seus eixos de pesquisa tanto pela descrição do desempenho
morfológico quanto para a mobilidade sustentável, dados em que o estudo em tela pretende
contribuir.
O campus da universidade de Brasília é implantando seguindo o projeto original para o
plano piloto de Brasília, em uma de suas quatro escalas, a Bucólica (Iphan, 2018). A localização
no contexto da cidade prevê que a característica de atividades na região seja relacionada à baixa
densidade de ocupação, alto índice de vegetação e fomento às atividades ao ar livre, com contato
com o ambiente natural preservado, portanto mesmo que a literatura defenda a compactação e
densificação para eficiência da sustentabilidade da mobilidade, o caso do campus analisado
resguarda limitações impressas por suas diretrizes, mantidas com parte integrante do
tombamento do conjunto urbanístico da cidade.

4. Método

O primeiro passo para o estudo empírico foi a identificação dos atributos morfológicos
mais mencionados pela literatura consultada para as duas escalas propostas de análises –
a. Escala ‘Macro’: Sintaxe espacial, análise axial, relação do campus com a cidade
b. Escala ‘Micro’: Sintaxe espacial, análises axial e de visibilidade, dinâmica interna do
campus
Foi selecionado o campus Darcy Ribeiro da universidade pelos critérios mencionados e
os atributos investigados por meio da sintaxe foram definidos: a compacidade, a integração
global e regional, a conectividade e a visibilidade; e os elementos investigados a partir da
descrição morfológica foram a categoria de atividades exercidas em cada edificação do conjunto
e a verificação da existência ou não de barreiras para a circulação.
Foi conduzida a modelagem de eixos para o cálculo sintático da região em que o campus
é situado o considerando como parte da cidade e como sistema isolado, da sua rede cicloviária
e peatonal através de desenho com técnica adequada ao desenho de eixos e seus cruzamentos
em software para processamento geográfico de informações (QGIS) utilizando como base
imagens fornecidas pela Digital Globe e o cálculo sintático foi realizado pelo plugin
Depthmap_X_Net. Na segunda escala de análise os estudos de caminhabilidade foram
realizados a partir da confecção de mapas de visibilidade (VGA), Isovistas e simulações
multiagentes; realizadas a partir da transcrição de mapa do campus extraído de ferramenta GIS.
Os mapas de visibilidade e isovistas foram usados para se aferir a área desobstruída e, portanto,
potenciais para favorecer a caminhabilidade. Como barreiras foram consideradas as edificações,
cercas e muros e transições abruptas de nível como os arrimos. A planta resultante foi trabalhada
no software DepthMap 0.80 para o cálculo das variáveis integração e conectividade no mapa
VGA, Gate counts e tráfego de agentes em simulação de 5 horas de tráfego pelo campus nos. A
Figura 1 resume o processo de análise desenvolvido até a obtenção dos resultados.

Figura 1: Processo de análise

Fonte: Elaborado pelo autor

5. Resultados

O primeiro passo para o estudo empírico foi a identificação dos atributos morfológicos
mais mencionados pela literatura consultada para as duas escalas propostas de análises como
mostram os diagramas da figura 2.

Figura 2: Atributos analisados

Fonte: Elaborado pelo autor

Partindo da escala da cidade, a universidade se situa em uma região com valores médios
de integração mais baixos do que o centro da cidade e seus eixos viários principais Norte e sul
e Leste Oeste, o que pode ser visto a partir da representação gráfica, que ilustra em cores mais
quentes os valores mais altos do atributo. Isto significa que apesar da grande população
universitária – cerca de 70 mil pessoas – o campus desempenha papel local em relação aos
fluxos potenciais da cidade, participando pouco da rede regional (Figura 3). O segundo diagrama
da figura 3 mostra uma nova conexão que pode ser feita entre a universidade e um bairro de
Brasília, como uma nova saída para sua porção norte. Mantém-se a escala bucólica no campus
enquanto se mantém as características funcionais e configuracionais da região, ao passo que se
a universidade passa a ser articuladora de fluxos regionais, um aumento do tráfego viário pode
ser esperado enquanto se especula que a característica local do trânsito na universidade pode
ser modificada, potencialmente afetando a caminhabilidade e gerando dificuldades em termos
de segurança para meios ativos. Ao verificar esta possibilidade, foi observado um acréscimo no
atributo integração global médio sobre os eixos da universidade, o que é interessante para
antever cenários de maior potencial geométrico de demanda de fluxos na região.
Figura 3: Análise Axial de Brasília

Fonte: Elaborado pelo autor

O segundo diagrama é resultado da simulação de integração global recalculada


considerando a presença de uma nova ponte para escoamento de fluxos reginais, com trânsito
pelo interior do campus, solução prevista no plano diretor da cidade e que atualmente passa por
consulta e que pode entrar em conflito com a segurança da movimentação no campus por meios
ativos, dificultando a sustentabilidade da mobilidade.
Prosseguimos com o estudo do campus como sistema isolado para compreender sua
dinâmica interna, na figura 4 a modelagem de eixos revela que a universidade tem comprimentos
de eixo considerado altos, e de segmentos considerados baixos em relação à metrópole e
capitais brasileiras (Medeiros e Holanda, 2010). O fato significa relativa linearidade dos eixos e
alta vascularidade do sistema, o que apoia a ideia de quarteirões curtos como componente
favorável a mobilidade (Jacobs, 1962) e linearidade como fator favorável à orientação do
pedestre (Lynch, 1960). A compacidade é baixa em relação à média de Brasília, mas sua
manutenção é importante para a manutenção da escala bucólica e densidade de vegetação que
caracterizam o lugar, favorecendo o acontecimento de percursos aprazíveis ao caminhar, no
contexto bioclimático.
Figura 4: Cômputo de eixos e compacidade do campus

Fonte: Elaborado pelo autor

O primeiro diagrama da figura 5 apresenta uma comparação gráfica entre a atividade


principal desempenhada em cada edificação do campus e o valor de integração global. Ao passo
que a atividade desenvolvida em dado local constitui a motivação para o deslocamento, o atributo
integração global pode medir o potencial de acessibilidade da rede, ou seja os locais mais
percorridos. A atividade de ensino e pesquisa é circundada pelos eixos com maiores valores de
integração e a manutenção desta característica pode influenciar na encontrabilidade e vitalidade
do espaço por estimular a co-presença ao redor de áreas mais utilizadas pela comunidade
acadêmica. A porção residencial do conjunto remanesceu nas adjacências de regiões com
menores valores de Integração. Ao comparar o primeiro e terceiro diagrama das figuras é
possível observar pela varável integração os pontos de convergência e pela variável
conectividade os pontos de divergência de fluxos, que se encontram na porção Leste do campus
e oferecem um conjunto mais vascularizado, com maior possibilidade de rotas. Dois grandes
estacionamentos são dispostos no centro do sistema, nas adjacências das regiões mais
integradas, apesar de serem espaços inertes.
A figura 6 expõe os mesmos atributos analisados para a rede ciclo-viária, que foi
modelada considerando as ciclovias e trilhas percorridas por ciclistas. É possível observar
grande descontinuidade e pouca cobertura da área do conjunto universitário, O centro de
integração das ciclovias – no extremo sul do conjunto - não coincide com o centro da rede
carroçável – aproximadamente no centro geométrico do sistema. Tal relação indica necessidade
de incrementos na rede ciclo-viária e principalmente a necessidade de aumento da rede ao redor
do Instituto Central de Ciências – ICC. Ao final da análise axial a figura 6 exibe a rede peatonal,
que tem a mesma situação de descontinuidade observada na rede ciclo-viária, também há
localidades de interrupção abrupta dos caminhos ou ligação de caçadas diretamente em
ciclovias, solução que feita com a devida segurança pode aumentar a sustentabilidade da
mobilidade a partir da coexistência de modos ativos e graus parecidos de integração entre as
redes peatonais, carroçáveis e ciclo-viária, fato que não ocorre no caso observado. Ainda,
existem calçadas em partes no campus isoladas da rede principal, portanto não representadas
na análise axial. As descontinuidades ocorrem com maior frequência nas proximidades do
Hospital veterinário, Finatec, Colina, centro de convenções e almoxarifado geral.
Figura 5: Integração global e regional e conectividade no Campus

Fonte: Elaborado pelo autor


Figura 6: Integração global e regional na rede cicloviária do Campus

Fonte: Elaborado pelo autor

A figura 8 expõe os diagramas produzidos pela análise de visibilidade, o primeiro diagrama


mostra relativa proporcionalidade entre os campos desobstruídos para a caminhabilidade,
destacam-se a presença de edificações muradas nas porções centrai e Sul, o que diminui a
visibilidade prejudicando a caminhabilidade. Da análise de VGA no atributo integração se
encontrou correlação espacial com a simulação multiagente indicando que este atributo pode ser
eficaz na antecipação de cenários de fluxos peatonais dominantes.
Figura 7: Integração global e regional e conectividade na rede peatonal do campus

Fonte: Elaborado pelo autor

A figura 8 expõe os diagramas produzidos pela análise de visibilidade, o primeiro


diagrama mostra relativa proporcionalidade entre os campos desobstruídos para
caminhabilidade, destacam-se a presença de edificações muradas nas porções central e Sul, o
que diminui a visibilidade prejudicando a caminhabilidade.
Figura 8: Análises de visibilidade

Fonte: Elaborado pelo autor


Figura 9: Simulação baseada em agentes

Fonte: Elaborado pelo autor

Discussão

A modelagem axial de trilhas considera caminhos deixados pelos usuários em trânsitos


marcados no espaço não pavimentado, mas há certas regiões em que as opções e trânsitos
peatonais podem ser tão diversos que meios apoiados por imagens de satélite se fazem
insuficientes para um mapeamento preciso de rotas em grandes campos abertos ou áreas de
estacionamento, requerendo para um mapeamento holístico dos percursos de pedestres,
observações feitas com outros tipos de instrumento.
Demonstrou-se que a avenida principal da Unb recebe fluxos apropriados à dinâmica do
campus, não sendo apropriada a novas dinâmicas como a construção de nova ponte por mudar
a escala local (bucólica).
A análise de visibilidade demonstra forte relação com os espaços institucionais do
campus apesar de que barreiras como muros e construções sem passagens poderiam ser
diminuídas para uma maior permeabilidade.

Referências

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