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Todas às quintas, e para além delas

Costumo começar pelo começo, mas como começar pelo começo quando se trata do fim? Bom, talvez o fim
seja um começo, um recomeço. Ao pensar sobre o fim, penso sobre o princípio, para que exista o fim, precisa
existir algo que configure esse final, e a princípio pra mim, não havia esperança, um sentimento que me
levasse a olhar pro futuro. O futuro era inalcançável e abstrato, bastava chamá-lo de horizonte, que eu jamais
iria alcançá-lo. Ele estava tão longe, que já tinha ficado pra trás de mim. Quase como uma entidade, a qual eu
tinha medo, muito medo. À medida que eu imaginava o futuro, era algo pra fora, estranhado de si, que não se
relacionava com o presente material. Como é imaginar e desejar algo, sem ter um presente para partir?! Bom,
isso mudou. Hoje consigo imaginar e desejar um futuro possível a partir de um presente possível. E esse
presente é aqui! Aqui, está a sala com todos os corpos dentro, corpos cheios de vida, cheios de potência e
inimagináveis universos com as demais regras, leis e perspectivas dentro deles. Corpos que se aplaudem! Que
celebram! Que dão uns aos outros aquilo que todo mundo merece, ser aplaudido pelo menos uma vez na vida!
Por conseguir, por cruzar a linha, por chegar vivo ao fim do dia.

Corpos que em uma fração de tempo, na história do cosmos, puderam coexistir juntos, em um universo
comum, em um universo possível. Em uma sala qualquer, em uma quinta qualquer, e para além delas, em um
planeta qualquer, numa galáxia qualquer. Ainda estamos aqui? Muito bem... aqui estão os corpos que
respiram juntos, que através de suas vias respiratórias compartilham um mesmo ar. Ar esse que no relógio da
história, pode ter data e hora pra acabar. Corpos que trocam ares que nunca foram nossos, mas que passam
até nós, que são encontrados por nós, e depois vão embora... Compor outras coisas, outras histórias, em
outras direções.

Então isso aqui é um curso aprendiz, mas é tão mais do que isso... Pra mim, parte da minha descoberta, parte
do meu amor, que me trouxe autoestima, autoconfiança, amor próprio... que se esbanja no amor pelo outro,
pelo diferente, para aquele que eu possa despejá-lo, mesmo que não queira receber, dar ao outro aquilo que
não se tem, desejando que aquilo que falta em você, não falte no outro, porque você sabe muito bem a dor
que a falta te faz. Mas mesmo assim, se despem do seu, para que o outro possa ter.

Por um instante, numa fração temporal, que em algum momento será esquecida no passado, permitam-me
contar uma pequena história:

Essa história tem três personagens... o Ancião, o Entusiasta, e o Humano, que somos nós, e que também tanto
o Ancião quanto o Entusiasta se desmontam em específicos momentos de suas performances e personas para
ocupar o mesmo espaço que todos nós, de humanidade, de igualdade, sem hierarquia, sem autoridade. Um
espaço onde não se fala para, mas se fala com.

O Ancião não aparece muitas vezes, é como o Mestre dos Magos, da Caverna do Dragão, não aparece o tempo
todo, mas toda vez que aparece, sempre tem algo marcante e significativo para dizer. É perfeito exatamente
como está, é magnífico, é cuidadoso, é empático, respeitoso, é como um pai deveria ser, mas para além de
toda paternidade, é também um ser humano, com suas questões, com seus sofrimentos. Carrega fardos, como
todos nós... é humano, como todos nós... é acolhedor, mas será que é acolhido tal como acolhe?

Independentemente de tudo, ele sempre volta, é o Mestre dos Magos, é o nosso mestre, muito obrigado,
Joaquim!

Já o entusiasta, por sua vez, tá presente o tempo todo (menos no WhatsApp), é ansioso, enérgico, caloroso,
cheio de coisa pra jogar, e que em um ato desastroso, derruba tudo, se perde, mas junta todas elas
novamente, e em vez de jogar, coloca... com cuidado, com amor, com sabedoria, faz de novo e faz melhor...
pra derrubar de novo, talvez, mas faz de novo! É o entusiasmo em pessoa, é humano como todos nós, está em
estágios como todos nós, e assim como uma rosa, que talvez ele há de se lembrar do meu primeiro dia aqui: a
rosa, é uma rosa, do momento em que é uma semente até o momento em que morre, em todo tempo, ela
contém todo seu potencial, está em constante transformação, mas em cada um dos estágios, é perfeita,
exatamente como está. Meu entusiasta. Ele é vibrante pelos seus aprendizes, acredita verdadeiramente em

Com amor, Davi.


seus aprendizes, é um entusiasta de todos eles. E também é filho do Ancião, que em momentos únicos, pude
perceber a beleza que recai o abraço do pai que lhe falta. Ele é filho, tem vida, mas também tem sofrimento, é
humano. Ele é filho, mas ele também pode ser pai. Muito obrigado, Hugo!

E por fim, e nem por isso menos importante, os humanos, que todos nós que somos... observadores e
provedores, de tudo que foi colocado pra fora nessa história, e ouvido, e recebido e consentido. E eu como
narrador e como um dos observadores, pude perceber, quantos humanos quebrados residem aqui,
machucados e feridos pela mesma sociedade sistemática que me feriu também. Tantas inseguranças, tantos
medos, tantos conflitos, tanto ódio ao próprio corpo, a própria alma, que me fizeram olhar pra mim, e
perceber, que o som do tiroteio, é só as pessoas tentando viver um pouco mais, e falhando... Que a mesma
sociedade que marcou meu corpo, marcou também os corpos que residem aqui! Quanto peso que não é nosso
sendo carregado por nós mesmos, quanto peso nosso, dado ao outro, pra que ele carregue sozinho. Tudo isso,
me fez perceber, que a cura não é individual... ou todo mundo se liberta junto, ou permaneceremos
condenados... ou todo mundo se cura juntos, ou continuaremos feridos.

Quanto sofrimento! Quanta exaustão!

Mas existe um lugar onde nossa alma cansada se recupera, um lugar onde os gatinhos miam novamente, as
estrelas brilham, as rosas desabrocham, toda emoção contida é liberada.

Um lugar, onde seu pai, é só o seu pai, até que um de vocês dois se esqueça disso. Como nossa coluna, já não
se lembra que um dia teve asas.

Um lugar onde nosso corpo é livre, afinal, a parte mais bonita do seu corpo, é pra onde ele tá indo. E acredita,
quando você acordar, você vai sentir saudades desse sonho.

Tenho falado sobre o princípio, acho que agora posso finalmente aceitar, e falar sobre o fim, por fim, tudo isso
é resultado do que produzimos e construímos até aqui, sobre tudo que nos debruçamos e discutimos, e
principalmente, sobre o que deixamos aqui, marcado, pros próximos que virão, e que tomara que sintam e
vivenciem parte do que eu senti, porque poderão encontrar aqui, um sentido na vida, assim como eu
encontrei. E o sentido da vida, é difícil dizer, ou pode ser muito simples, a palavra talvez nos conte, sentido,
sentir... através dos cinco sentidos que nos foram dados. A visão, a audição, o olfato, o paladar, o tato.

Se você ouvir com atenção, o silêncio sopra a verdade no seu ouvido, se você tocar com cuidado, a física das
coisas te dá contorno sobre seu próprio corpo, o cheiro te faz lembrar que isso é um mundo vivo, o paladar te
permite experimentar o gosto mais íntimo da matéria, e a visão, faz possível você ver de onde todos os outros
sentidos estão vindo.

Eu vejo vocês! Eu sinto vocês! É o que eu tenho feito, todas às quintas!

O passado é fixo, não vai mudar. O futuro é grande, não nos pertence. Mas eu sei que aqui estão os corpos
que passaram até mim, e que foram encontrados, todas as risadas, alegrias, fúrias e tristezas subjaz aqui. Esse
lugar é o presente, nossa casa, é no presente. E aqui mora uma lição, esse lugar esconde um segredo. E com
essas palavras notareis:

Se em algum momento a gente se perder, foi porque primeiro a gente se encontrou. E a chave no nosso
coração, pode abrir as portas das memórias perdidas no tempo. E encontrar, quantas vezes for possível, o que
um dia sempre esteve lá. Encontrar... o que um dia, sempre esteve aqui.

Muito obrigado por fazerem parte da minha história!

Todas às quintas, e para além delas, em nossas memórias.

Com amor, Davi.

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