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Folha de rosto
Aprovaçã o
Dedicaçã o
Pá gina de conteú do
Prefá cio da ediçã o em inglê s
Prefá cio à segunda ediçã o
Introduçã o
1. Maneiras e Costumes da Vestfá lia no inı́cio do sé culo atual
2. Batismo e Infâ ncia de Anne Catherine
3. Anne Catherine é conduzida pelo caminho das visõ es
4. Treinamento e Educaçã o Precoce
5. Anne Catherine faz sua primeira comunhã o
6. Armadilhas do Espı́rito Maligno
7. Suas comunicaçõ es com seu anjo
8. A Vocaçã o de Anne Catherine ao Estado Religioso. Ela está preparada
para isso por direçã o especial
9. Anne Catherine de seu dé cimo sé timo ao vigé simo ano em Coesfeld
10. A tentativa de Anne Catherine de aprender o ó rgã o. Trê s Anos na
Casa do Coro-Lı́der.
11. Anne Catherine recebe a coroa de espinhos. Sua entrada entre os
agostinianos de Dü lmen.
12. Noviciado de Ana Catarina
13. Anne Catherine faz seus votos, 13 de novembro de 1803
14. Sofrimentos Corporais
15. Extase e Oraçã o da Irmã Emmerich
16. Supressã o do Convento. Irmã Emmerich Recebe os Estigmas
17. Investigaçã o Eclesiá stica. Relató rio de Dean Rensing
18. Primeira Visita do Vigá rio Geral a Dü lmen
19. Medidas Adotadas pelo Vigá rio Geral
20. As feridas da irmã Emmerich sã o enfaixadas
21. Segunda Visita do Vigá rio Geral a Dü lmen
22. Visitas. Testemunho de um mé dico protestante
23. Ultimos dias da Semana Santa. festa da pá scoa
24. Dean Rensing e Dr. Krauthausen icam impacientes
25. Testemunho de Dean Rensing
26. Da Pá scoa ao Pentecostes, 1813
27. Quarta Visita do Vigá rio Geral a Dü lmen
28. Testemunho de Dean Overberg, Dean Rensing e Dr. Wesener sobre
os estigmas
29. A Vigilâ ncia de Dez Dias. Fim da Investigaçã o Eclesiá stica.
30. Ultima visita do Vigá rio-Geral a Dü lmen. Ele deseja remover a irmã
Emmerich para Darfeld.
31. A Vida da Irmã Emmerich apó s a Investigaçã o. Seus arredores. O
abade Lambert. Sua irmã Gertrudes.
32. Dr. William Wesener. Mesmerismo.
33. Tentativas de remover a irmã Emmerich para Mü nster. Morte de sua
mã e idosa
34. Clemente Brentano. A in luê ncia da irmã Emmerich em sua vida
espiritual
35. O Retorno do Peregrino. Rumores de uma nova investigaçã o
36. A irmã Emmerich é presa. Seu Pressentimento deste Evento. Seus
resultados
37. Medidas do Vigá rio Geral
38. O Cativeiro
39. Encerramento do Ano Eclesiá stico
40. Efeitos milagrosos das crostas que caı́ram dos estigmas da irmã
Emmerich. 28 de dezembro de 1818
41. Advento e Natal, 1819. Viagens em Visã o a uma Cidade Judaica na
Abissı́nia e à Montanha dos Profetas, via Tibete. Trabalhos para
Crianças Pobres. Sofrimentos Mı́sticos
UMA COLEÇAO DE ARTE CLASSICA
Breve Vida de Cristo
Capa
Metade da pá gina de tı́tulo
Mapa
Folha de rosto
Pá gina de direitos autorais
Conteú do
Introdutó rio
A con iguraçã o
Nascimento de Jesus
Infâ ncia em Nazaré
Joã o Batista
Jesus inicia seu ministé rio
Viagem à Galilé ia
O Reino e os Apó stolos
Manifestaçõ es do Poder Divino
Falando em Pará bolas
Aumentando a popularidade
Morte de Joã o Batista
Milagres dos pã es
O pã o da vida
Pedro a Rocha
Formaçã o dos Doze
Visita a Jerusalé m
Confronto com os fariseus
Ministé rio Judeu
A Declaraçã o Suprema
Ressurreiçã o de Lá zaro
Ultimos dias missioná rios
Banquete em Betâ nia
Domingo de Ramos
Segunda Puri icaçã o do Templo
Dia de perguntas
Judas, o Traidor
A ú ltima Ceia
Prisã o e julgamento
Morte no Calvá rio
Ressuscitou e ainda vive
Sã o Benedito
Contracapa
Clá ssicos do bronzeado
Torne-se um missioná rio Tan!
Compartilhe a fé com livros Tan!
Livros bronzeados
UMA APROVAÇAO
O primeiro volume da obra intitulada “Vida e Revelaçõ es de Anne
Catherine Emmerich”, do Pe. moral e, como parece propı́cio à fé e à
piedade, alegremente lhe damos a aprovaçã o solicitada pelo autor.
PEDRO JOSE,
Bispo de Limburgo
Limburgo, 26 de setembro de 1867
Livros TAN
Uma impressã o da Saint Benedict Press, LLC
Charlotte, Carolina do Norte
2012
D EDICAÇAO
Ao Imaculado Coração da Virgem Maria, Mãe de Deus, Rainha do Céu e
da Terra, Senhora do Santíssimo Rosário, Auxílio dos Cristãos e Refúgio
da Raça Humana.
CONTEUDO _
Prefá cio da ediçã o em inglê s
Prefá cio à segunda ediçã o
Introduçã o
1. Maneiras e Costumes da Vestfá lia no inı́cio do sé culo atual
2. Batismo e Infâ ncia de Anne Catherine
3. Anne Catherine é conduzida pelo caminho das visõ es
4. Treinamento e Educaçã o Precoce
5. Anne Catherine faz sua primeira comunhã o
6. Armadilhas do Espı́rito Maligno
7. Suas comunicaçõ es com seu anjo
8. A Vocaçã o de Anne Catherine ao Estado Religioso. Ela está preparada
para isso por direçã o especial
9. Anne Catherine de seu dé cimo sé timo ao vigé simo ano em Coesfeld
10. A tentativa de Anne Catherine de aprender o ó rgã o. Trê s Anos na
Casa do Coro-Lı́der.
11. Anne Catherine recebe a coroa de espinhos. Sua entrada entre os
agostinianos de Dü lmen.
12. Noviciado de Ana Catarina
13. Anne Catherine faz seus votos, 13 de novembro de 1803
14. Sofrimentos Corporais
15. Extase e Oraçã o da Irmã Emmerich
16. Supressã o do Convento. Irmã Emmerich Recebe os Estigmas
17. Investigaçã o Eclesiá stica. Relató rio de Dean Rensing
18. Primeira Visita do Vigá rio Geral a Dü lmen
19. Medidas Adotadas pelo Vigá rio Geral
20. As feridas da irmã Emmerich sã o enfaixadas
21. Segunda Visita do Vigá rio Geral a Dü lmen
22. Visitas. Testemunho de um mé dico protestante
23. Ultimos dias da Semana Santa. festa da pá scoa
24. Dean Rensing e Dr. Krauthausen icam impacientes
25. Testemunho de Dean Rensing
26. Da Pá scoa ao Pentecostes, 1813
27. Quarta Visita do Vigá rio Geral a Dü lmen
28. Testemunho de Dean Overberg, Dean Rensing e Dr. Wesener sobre
os estigmas
29. A Vigilâ ncia de Dez Dias. Fim da Investigaçã o Eclesiá stica.
30. Ultima visita do Vigá rio-Geral a Dü lmen. Ele deseja remover a irmã
Emmerich para Darfeld.
31. A Vida da Irmã Emmerich apó s a Investigaçã o. Seus arredores. O
abade Lambert. Sua irmã Gertrudes.
32. Dr. William Wesener. Mesmerismo.
33. Tentativas de remover a irmã Emmerich para Mü nster. Morte de sua
mã e idosa
34. Clemente Brentano. A in luê ncia da irmã Emmerich em sua vida
espiritual
35. O Retorno do Peregrino. Rumores de uma nova investigaçã o
36. A irmã Emmerich é presa. Seu Pressentimento deste Evento. Seus
resultados
37. Medidas do Vigá rio Geral
38. O Cativeiro
39. Encerramento do Ano Eclesiá stico
40. Efeitos milagrosos das crostas que caı́ram dos estigmas da irmã
Emmerich. 28 de dezembro de 1818
41. Advento e Natal, 1819. Viagens em Visã o a uma Cidade Judaica na
Abissı́nia e à Montanha dos Profetas, via Tibete. Trabalhos para
Crianças Pobres. Sofrimentos Mı́sticos
Uma coleção de obras de arte clássicas
Uma Breve Vida de Cristo
Introdutó rio
A con iguraçã o
Nascimento de Jesus
Infâ ncia em Nazaré
Joã o Batista
Jesus inicia seu ministé rio
Viagem à Galilé ia
O Reino e os Apó stolos
Manifestaçõ es do Poder Divino
Falando em Pará bolas
Aumentando a popularidade
Morte de Joã o Batista
Milagres dos pã es
O pã o da vida
Pedro a Rocha
Formaçã o dos Doze
Visita a Jerusalé m
Confronto com os fariseus
Ministé rio Judeu
A Declaraçã o Suprema
Ressurreiçã o de Lá zaro
Ultimos dias missioná rios
Banquete em Betâ nia
Domingo de Ramos
Segunda Puri icaçã o do Templo
Dia de perguntas
Judas, o Traidor
A ú ltima Ceia
Prisã o e julgamento
Morte no Calvá rio
Ressuscitou e ainda vive
P REFACIO A EDIÇAO EM INGLES
A VIDA de Anne Catherine Emmerich já é bem conhecida por
milhares na Alemanha, Itá lia e França. Sua publicaçã o nesses paı́ses
foi saudada por nú meros que lucraram com sua leitura. Nã o será
T pouca recomendaçã o a seu favor a irmar que Sua Santidade, Pio IX
de abençoada memó ria, ordenou que a traduçã o italiana fosse feita a
partir de provas avançadas do alemã o. O francê s, també m, como nos
conta o Canon de Cazalè s em seu prefá cio, foi tirado das provas
originais fornecidas pelo pró prio autor, o Rev. Carl Erhard Schmö ger,
C.SS.R.
A presente traduçã o da ediçã o de 1870 foi realizada na convicçã o de
que a obra se destina a edi icar os leitores ingleses nã o menos do que
os de outras nacionalidades. Nó s també m fomos movidos pela
persuasã o de que seria agradá vel ao Deus Todo-Poderoso publicar as
maravilhas de Suas obras em almas escolhidas; pois se é bom esconder
o segredo do rei, també m é honroso confessar as obras do Altı́ssimo. (
Tobias 12:7).
Os discı́pulos do Anticristo nunca se cansam de publicar livro apó s
livro, cada um mais pernicioso que o anterior, com o objetivo de
perverter a mente e corromper os coraçõ es de milhõ es; eles empregam
todos os esforços, todos os estratagemas para espalhar por meio da
imprensa e de todas as formas possı́veis o veneno mortal do Inferno.
Os ilhos da Santa Igreja, aqueles que tê m o poder de contrariar esses
desı́gnios diabó licos pela publicaçã o e circulaçã o de bons livros, devem
permanecer ociosos? Se eles se imaginarem exonerados de esforços
adicionais em direçã o contrá ria pela mera declaraçã o de lamentaçõ es
inú teis enquanto, ao mesmo tempo, eles vê em aquela maré do mal
ganhando força renovada enquanto varre levando consigo inú meras
almas para a ruı́na? Pode-se fazer muito para conter a torrente, para
evitar o perigo antes que seja tarde demais?
Nã o podemos, ao mesmo tempo, oferecer um antı́doto para os efeitos
mortais de grande parte de nossa literatura atual, suprir as
necessidades espirituais e satisfazer os variados gostos de muitas
almas famintas de alimento fresco e mais adequado?
Muito já foi feito na literatura cató lica inglesa, tanto em defesa dos
princı́pios cató licos quanto para expor ao pú blico a vida de numerosos
santos e servos de Deus. Mas ainda há muito a ser feito, e isso deve ser
feito com o cuidado e a consciê ncia que um objeto tã o nobre merece.
Assim como todo livro ruim tende a enganar a mente e corromper o
coraçã o de seu leitor, todo bom livro é um companheiro querido, um
professor iel, cujas liçõ es sã o muitas vezes mais reveladoras sobre a
vida interior do que os sermõ es mais eloqü entes.
Deverı́amos ter hoje um Santo Iná cio de Loyola se ele, ao convalescer
depois de sua ferida em Pompeluna, tivesse recebido romances como
entretenimento em vez de lendas dos santos? Onde estaria nossa
grande Santa Teresa se ela continuasse sua leitura secreta daqueles
romances perigosos que ela encontrou na casa paterna? Se fô ssemos
chamados a lamentar a ruı́na espiritual de tantos de nossos jovens, se
eles nã o tivessem absorvido princı́pios de in idelidade e licenciosidade
das pá ginas daquelas publicaçõ es miserá veis cujo ú nico objetivo é
retratar o vı́cio em suas cores mais vivas e difundir transmitiu por toda
a terra? Pais cató licos fervorosos, boas escolas cató licas, padres zelosos,
sã o de fato ricas bê nçã os para nossa juventude cató lica; mas se um livro
perigoso cair nas mã os de uma criança, os esforços de pais, professores
e padres logo serã o frustrados.
Que a presente obra, A Vida [ e Revelações ] de Anne Catherine Emmerich
, seja aberta no futuro, como tem feito em o passado, fonte de graças
multiplicadas aos seus leitores! Que sua leitura os prepare para outro
mais intimamente ligado a ele; a saber, a “Vida de Nosso Senhor Jesus
Cristo e Sua Santı́ssima Mã e”, compilada a partir das revelaçõ es feitas a
este santo religioso!
Se alguns de nossos leitores acham difı́cil dar cré dito aos favores
extraordiná rios conferidos a esta privilegiada esposa de Cristo,
lembrem-se de que sã o fatos nã o encontrados na vida cotidiana,
portanto, fatos para cuja contemplaçã o a mente deve ser gradualmente
treinada quanto a qualquer outro assunto de pensamento e re lexã o.
Que eles entendam que o braço do Senhor não é encurtado : que Aquele
que concedeu tantos favores extraordiná rios a Seus servos, tanto da
Antiga como da Nova Lei, tem o mesmo poder, a mesma liberdade para
mostrar em nossos dias para o benefı́cio da humanidade Seus dons
maravilhosos naqueles a quem Ele selecionou e preparou para eles.
Para aqueles de nossos leitores que podem sentir interesse na opiniã o
dos teó logos sobre a presente biogra ia, podemos fornecer evidê ncias
que nã o devem ser levianamente deixadas de lado.
Mesmo em sua vida, depois de ter sido submetida ao teste de um
exame mais rı́gido, teó logos só lidos aprovaram o estado sobrenatural
de Anne Catherine Emmerich; depois de sua morte, teó logos só lidos
escreveram e examinaram sua vida, e autoridades eclesiá sticas ilustres
colocaram seu selo de aprovaçã o sobre ela. Entre a primeira classe,
podemos citar Mons. Clemens Auguste, Conde von Droste-Vischering,
Coadjutor-Bispo de Mü nster, mais tarde Arcebispo de Colô nia, que
sofreu tanto, até dois anos de prisã o, por defender e defender os
direitos da Igreja contra as invasõ es do governo. Mencionamos o
renomado Bispo Michael Sailer, de Ratisbona, e seu coadjutor, o santo
Bispo Wittman, 1 um dos maiores prelados de nossa é poca. Algumas
horas antes da morte deste ú ltimo, como lemos no Lebensbild de
Schmöger , ele exortou seriamente o Peregrino (Brentano) a publicar
seus manuscritos relacionados ao servo de Deus. “O meu amado
amigo”, disse ele, “trabalhe ielmente, trabalhe ielmente pela honra de
Jesus Cristo! Vá com coragem!” Assim falou o bispo moribundo ao
abençoar Brentano, e felicitou-o aos ouvidos de todos por ter anotado
as visõ es de Anne Catherine, cuja publicaçã o ele o instou em sua
primeira entrevista. Tampouco devemos omitir o extraordiná rio
confessor de Irmã Emmerich, o piedoso e erudito Dean Overberg, por
um tempo Diretor do Seminá rio de Mü nster. Frequentemente
encontraremos seu nome nas pá ginas seguintes. Aos nomes ilustres
anteriores podem ser adicionados os do Conde von Stolberg e Joseph
Goerres que, embora nã o nas ileiras do sacerdó cio, se destacaram
tanto no aprendizado teoló gico e no bom julgamento que suas palavras
foram recebidas como orá culos em seu tempo.
Todos esses ilustres homens conheceram pessoalmente Anne Catherine
Emmerich e, como inú meras outras testemunhas de sua vida, a
declararam uma verdadeira esposa de Cristo, uma alma eleita dotada
de graças e privilé gios extraordiná rios.
Passemos agora à segunda classe de testemunhas, aos bons teó logos
que escreveram e examinaram sua vida em um perı́odo posterior. As
anotaçõ es feitas por Clement Brentano à beira do leito do ê xtase
durante sua estada de seis anos em Dü lmen, foram, por ocasiã o de sua
morte, legadas como um precioso legado a Christian Brentano, seu
irmã o. Este os entregou ao abade Haneberg, mais tarde bispo de Spires,
com o entendimento de que em algum dia futuro deveriam ser
organizados e publicados. Mas o piedoso abade, sincero admirador da
irmã Emmerich e plenamente consciente do tesouro que possuı́a, nã o
encontrou tempo para a realizaçã o de tã o grande obra; viz., a
publicaçã o da Vida de Cristo com a da pró pria venerá vel Irmã .
Deus Todo-Poderoso chamou outro para assumir a tarefa, um
eminentemente competente, que uniu o aprendizado profundo com a
piedade só lida. Este homem era o Rev. Carl Erhard Schmö ger, C.SS.R.,
que em 1850 entrou na Congregaçã o do Santı́ssimo Redentor como um
sacerdote secular de erudiçã o mais do que comum. Seus superiores
logo descobriram seus talentos extraordiná rios e seu amor incomum
pelo estudo da teologia. Ele foi, consequentemente, engajado por anos
como professor em seus diferentes ramos, dogmá tico, hermenê utico e
exegé tico, alé m do qual ele por algum tempo ensinou iloso ia. Como ele
estava constantemente enriquecendo sua mente pela leitura dos Santos
Padres, seu olho aguçado podia detectar de relance a menor imprecisã o
em qualquer autor que respeitasse a fé ou tradiçã o cató lica. Esta foi
uma excelente preparaçã o para a missã o providencial posterior do
Padre Schmö ger.
Alegremente e com nobre generosidade, o abade Haneberg entregou os
manuscritos de Brentano a tal homem, a quem ele considerava tã o
quali icado para o trabalho, e por quem aquele rico tesouro da
misericó rdia de Deus deveria ser aberto aos ié is. Enquanto isso, a
Divina Providê ncia favoreceu o empreendimento. O padre Schmö ger
teve acesso a muitos documentos relativos aos julgamentos civis e
eclesiá sticos aos quais a Irmã Emmerich foi submetida, e isso lhe
permitiu dar uma imagem ainda mais correta de sua vida interior e
exterior. A tarefa foi iniciada em obediê ncia ao comando dos
Superiores. Encorajado por homens como o abade Haneberg e o
reverendo Frederic Windischmann, vigá rio-geral de Munique, e
apoiado pelas oraçõ es de muitas almas piedosas, o padre Schmö ger
continuou e só o realizou apó s anos de trabalho á rduo e muitas vezes
interrompido; pois durante a ú ltima parte de sua vida, ele ocupou o
cargo de Provincial de sua Congregaçã o na Baviera. Embora ele mesmo
um teó logo de renome, ele nunca deixou de apresentar o resultado de
suas pesquisas cuidadosas a outros teó logos e autoridades em cujo
conhecimento e solidez ele podia con iar com segurança. E assim a Vida
de Anne Catherine Emmerich foi publicada pela primeira vez em 1870,
com a aprovaçã o do Bispo de Limbourg e a permissã o do Superior do
Padre Schmö ger, o General dos Redentoristas em Roma.
O fato de que nenhuma voz se levantou contra suas obras apó s sua
publicaçã o pela imprensa cató lica; o fato de que seus livros chegaram
sem ser molestados à s casas de milhares, como havia feito a Dolorosa
Paixão , as únicas compilações das revelações de Irmã Emmerich
publicadas durante a vida de Brentano; o fato de que a Vida do
Estigmatisado foi imediatamente traduzida para o francê s e o italiano
com a aprovaçã o dos Bispos ortodoxos; o fato de que na Alemanha uma
segunda ediçã o da dita Vida logo se seguiu à primeira, e que novas
exigê ncias agora tornam necessá ria uma terceira – esses fatos podem,
pensamos, ser aceitos como provas su icientes da bê nçã o de Deus sobre
a obra.
Mas quando grandes homens como Dom Gué ranger, abade de Solesmes,
e muito reverendo F. Windischmann de Munique, cujos nomes sã o
conhecidos em todo o mundo cató lico, falam nos mais altos termos,
temos espaço para temer nã o estar em harmonia com os cató licos fé e
ensinamento, se lhe emprestarmos nosso dinheiro de louvor? Dom
Gué ranger (cuja palavra, como nos diz o Rev. Frederic Windischmann,
tem mais peso para ele do que a de mil outros) expressa sua convicçã o
de que Anne Catherine Emmerich tinha uma missã o de Deus e que ela
cumpriu ielmente a mesma; caso contrá rio, Deus nunca teria
prodigalizado tã o abundante e tã o extraordiná rio favores sobre ela.
Coube a ela trazer à mente da naçã o alemã o Evangelho em seus
detalhes mais minuciosos, justamente no momento em que a Divindade
de Cristo e as verdades do Evangelho eram mais vigorosamente
negadas pelos assim chamados iló sofos da é poca. E aqui o erudito
abade exprime o seu espanto pela forma como ela cumpriu a sua
missã o. Que uma camponesa pobre e inculta no coraçã o da Europa
descreva em seus mı́nimos detalhes os vá rios personagens e lı́nguas,
costumes e costumes de paı́ses diferentes e distantes; que ela faça tudo
isso com perfeita precisã o com respeito à s variadas circunstâ ncias de
geogra ia, topogra ia e arqueologia de tempos passados, certamente é
su iciente para surpreender até mesmo os mais prudentes e instruı́dos.
O Rev. F. Windischmann, ele pró prio um amigo caloroso do Padre
Schmö ger, considera algo muito maravilhoso que em todas as
descriçõ es da Irmã Emmerich das vá rias circunstâ ncias e situaçõ es em
que a Sagrada Pessoa de Nosso Senhor aparece; isto é , nas refeiçõ es,
nas festas de casamento, nas viagens, etc., nã o encontramos o menor
vestı́gio de algo indigno Dele. Tudo e tudo que Ele faz ou diz é animado
por uma certa nobreza indicativa de Sua Divina Personalidade. Isso, ele
conclui, Anne Catherine nunca poderia ter feito se seu trabalho fosse
uma mera invençã o humana.
Esses fatos parecem prova su iciente para estabelecer a veracidade das
revelaçõ es da irmã Emmerich. Mas ainda temos alguns outros para
apresentar.
O Rev. Alban Stolz, professor do Seminá rio de Freiburg, e famoso autor
alemã o, menciona na descriçã o de sua viagem a Jerusalé m que um
certo franciscano, padre Wolfgang de Jerusalé m, lhe disse que durante
seis anos ele havia feito as declaraçõ es de Anne Catherine Emmerich
respeitando a Terra Santa, como dado na Dolorosa Paixão de Brentano ,
um ponto de estudo especial. O resultado de suas observaçõ es foi que
eles estã o perfeitamente corretos em todos os seus detalhes. Rev. Stolz
nos diz na mesma pá gina que um professor Hug, um homem conhecido
por nã o ser muito cré dulo no sujeito de visõ es ou revelaçõ es, um dia
expressou a seus alunos sua surpresa que as declaraçõ es da freira de
Dü lmen concordassem tã o exatamente com as do historiador judeu
Josefo. 2
O Rev. Anton Urbas, pá roco e cô nego da Catedral de Laybach, Austria,
publicou um livro em 1884, intitulado “ Die Reiche der Heiligen Drei
Könige ”. Ele menciona no prefá cio que havia lido Vida, Visõ es e
Revelaçõ es, de Anne Catherine Emmerich, por um tempo considerá vel,
sem conseguir harmonizar muitos pontos que ali encontrou. Algumas
coisas lhe pareciam muito bonitas, ú teis e corretas; mas outros eram
difı́ceis de aceitar. Em vez de denunciar o todo como o sonho piedoso
de uma boa freira, ele se propô s a estudar a geogra ia da Asia em todos
os seus detalhes. Enquanto estudava, comparava suas pesquisas com as
declaraçõ es de AC Emmerich. O resultado de sua investigaçã o sé ria e
honesta foi que ele reconheceu publicamente a Irmã Emmerich como a
geó grafa, topó grafa e arqueó loga mais correta do mundo, e que suas
primeiras di iculdades foram atribuı́das antes a uma falta de
conhecimento de sua parte. do que a qualquer falha da irmã
maravilhosamente iluminada.
Sã o Paulo escreve aos Corı́ntios ( 1 Coríntios 1:28-29), “Deus escolheu
as coisas loucas deste mundo para confundir as sá bias, e as coisas
fracas deste mundo Deus escolheu para confundir as Forte . . . que
nenhuma carne se glorie diante dele”. Essas palavras aqui nã o sã o
literalmente veri icadas?
O cô nego Urbas diz ainda: “As obras da Irmã Emmerich sã o uma mina
rica. Algumas poucas observaçõ es muitas vezes lançam muita luz sobre
certos assuntos. Como sinais de encruzilhada, eles indicam o caminho
certo. Seu poder de mover e vivi icar a alma é especialmente notá vel.
Aqui, como em nenhum outro livro fora das Sagradas Escrituras,
encontramos palavras de vida eterna”.
Mas chegando mais perto de casa, poderı́amos citar muitos ilustres
eclesiá sticos como irmes defensores da Irmã Emmerich e de suas
revelaçõ es. Limitamo-nos a dois cuja posiçã o na hierarquia sagrada
confere maior peso à sua autoridade; a saber, o santo John N. Neumann,
Quarto Bispo de Filadé l ia, e o recentemente falecido Bispo Toebbe, de
Covington, KY. Que o primeiro favoreceu suas obras pode ser visto por
uma referê ncia à sua Vida. Nela lemos que, entre outros, livros que ele
importou da Europa nos primeiros dias de seu ministé rio, ele pediu
particularmente os de AC Emmerich; este ú ltimo, o bispo Toebbe,
mostrou seu apreço pelo mesmo ao aprovar com entusiasmo a nova
ediçã o da “Vida de Jesus”, compilada a partir de suas revelaçõ es. 3
Mas, como alguns crı́ticos podem objetar que mesmo grandes teó logos
podem ser enganados em tais assuntos, devemos nos abster de
argumentos pró prios em sua defesa, remetendo nossos leitores à s
regras do Papa Bento XIV, que Roma segue na canonizaçã o de tais
almas. como foram favorecidos na vida com visõ es e revelaçõ es. Pela
aplicaçã o dessas regras (que podem ser encontradas no prefá cio do
autor) qualquer cató lico imparcial pode julgar se tais visõ es e
revelaçõ es sã o de Deus ou nã o.
Se a vida de Anne Catherine Emmerich pode ser testada por essas
regras, podemos concluir com segurança que seus dons extraordiná rios
foram realmente de Deus; pois o que é considerado pelo Santo Padre e
seus Cardeais uma garantia su iciente da verdade no processo de
canonizaçã o, deve ser su iciente també m para satisfazer as indagaçõ es
do crı́tico mais severo. Que o leitor estude sem preconceitos a Vida
desta alma favorecida, que aplique a ela as regras acima mencionadas, e
somente entã o que ele forme seu julgamento da mesma.
Em conclusã o, pedimos licença para a irmar que a traduçã o da presente
obra foi realizada com o ú nico objetivo de estender o reino de Jesus
Cristo nos coraçõ es e promover a vinda de Seu reino sobre a terra.
Nosso objetivo tem sido reproduzir cuidadosa e conscientemente a
partir do original cada palavra que saı́sse dos lá bios do estigmatizado;
enquanto, para agradar ao gosto dos leitores ingleses, o assunto que o
acompanha foi um pouco condensado, embora nã o em detrimento do
signi icado do autor. Como o original, foi submetido ao julgamento de
pessoas competentes e revisto minuciosamente por um teó logo
competente.
fevereiro de 1885
P REFACIO A SEGUNDA EDIÇAO _
NE dos sinais esperançosos de nossos tempos, apesar de um espı́rito
de palavra e sensualismo polido, é o crescente interesse que está se
manifestando no estudo da vida dos mı́sticos. E uma evidê ncia de até
O que ponto a Igreja de Deus tirou a sociedade da escó ria do
materialismo, quando seus grandes heró is e heroı́nas da virtude,
cujos coraçõ es estavam tã o apaixonadamente e sem reservas em
coisas que nã o sã o desta terra, e nunca apelando para nada alé m de
os mais elevados e nobres de seus semelhantes, estã o recebendo um
reconhecimento tã o sincero e tã o profundo. Tampouco esse
reconhecimento se limita aos ilhos da “famı́lia da fé ”. A literatura
“mı́stica” da Igreja Cató lica é lida por um grande nú mero de nã o-
cató licos que estã o empenhados em uma busca sincera da verdade. O
escritor tem em mente o testemunho de mais de um devoto convertido,
que deve o primeiro alvorecer da Luz à leitura da vida de um santo. E
isso é apenas natural. A mistura das perfeiçõ es potenciais do Cé u com
as experiê ncias reais da terra, tã o impressionantemente ilustradas na
vida dos santos, traz a mente bem-intencionada a um contato tã o
pró ximo com o sobrenatural, que todas as preocupaçõ es mundanas
parecem pequenas e pá lidas. A á rvore é julgada por seus frutos, e a
conclusã o é que uma igreja que pode produzir tais caracteres exaltados
deve ter dentro de si a divindade do Evangelho e a verdade como foi
revelada por Jesus Cristo.
Considerando esses fatos, é com alegria e edi icaçã o que saudamos esta
segunda ediçã o em inglê s da vida de Anne Catherine Emmerich. Seu
nome já é bem conhecido de todo o mundo cató lico. Quando o registro
das maravilhosas visõ es que lhe foram concedidas apareceu pela
primeira vez, provocou muita crı́tica adversa. Mas o tempo, que é o
ú nico grande teste de autenticidade, fez com que essa crı́tica adversa
desaparecesse e desse lugar à mais alta aprovaçã o. Uma evidê ncia
ilustre deste fato é mostrada pela seguinte carta de um cô nego da
Catedral de Loybach, Baviera: “No começo eu nã o acreditei nas
declaraçõ es de Catherine Emmerich. Eu me perguntava como o bispo
de Limbourg poderia aprovar a publicaçã o de tal livro. Fui trabalhar
para descobrir todas as falsidades que ela estava contando e, para
minha surpresa, descobri que, à luz da tradiçã o, geogra ia, topogra ia e
histó ria, Anne Catherine Emmerich sabia mais do que todos os nossos
chamados sá bios. Depois da Sagrada Escritura, nã o há livro que
contenha tantas palavras de verdade e vida eternas do que as
revelaçõ es de AC Emmerich.”
A isso devemos acrescentar o testemunho do eminente teó logo, Dr.
Rohling, que escreve em um Apê ndice à sua Medulla Theologiae
Moralis: Anne Catherine Emmerich, e eu os recomendo sinceramente.
Desejo mencionar em particular suas visõ es sobre a Vida e Paixã o de
Nosso Senhor, pois estou convencido de que todo sacerdote que as
estuda estará tã o in lamado de zelo pelas almas e desejo de sua pró pria
salvaçã o, que será impossı́vel para ele estar perdido. Lá ele encontrará
Nosso Senhor retratado em cores tã o vivas, e terá uma percepçã o tã o
clara de Sua bondade, que renunciará alegremente a todos os prazeres
mundanos e participará diariamente de uma nova efusã o do Espı́rito
Santo de Deus, tornando-se cada vez mais apto para mover os coraçõ es
dos mundanos e levá -los à penitê ncia”.
Uma leitura atenta da Vida de Catherine Emmerich faz apreciar estas
impressionantes palavras do Dr. Rohling. Suas visõ es trazem à mente
uma percepçã o tã o vı́vida da missã o e da Paixã o de Nosso Redentor
que, quando o leitor termina seu estudo delas, sente-se consciente de
ter sofrido uma in luê ncia incomum, e é movido a expressar seus
sentimentos na exclamaçã o dos dois que encontraram o Salvador no
caminho para Emaú s: “Nã o ardia em nó s o nosso coraçã o enquanto Ele
falava no caminho e nos abria as Escrituras?”
Aprender a vida de Nosso Divino Senhor é o principal estudo de todo
cristã o. Catherine Emmerich é uma ajuda notá vel para o cumprimento
deste dever. Foi um pensamento louvá vel do tradutor colocar esta obra
à disposiçã o dos leitores ingleses, pois tudo o que tende a levar a alma a
uma uniã o ı́ntima com o Salvador é de supremo valor. Lemos nos
Evangelhos que uma mulher enferma uma vez pressionou a multidã o,
tocou a orla do manto do Mestre, e pelo poder de sua fé foi
imediatamente curada. O discı́pulo leal, que ainda se aproxima o
su iciente para tocá -lo em espı́rito e extrair a virtude inspiradora que
Ele oferece, nã o é espiritualmente completo? Esta é a missã o de
Catherine Emmerich - trazer almas em contato com Cristo. E em um dia
como o nosso, quando tantos coraçõ es estã o esfriando e um espı́rito de
irreligiã o parece dominar as mentes de multidõ es, quem negará que a
missã o de Anne Catherine Emmerich é uma bê nçã o para o mundo?
Todos os admiradores desta grande serva de Deus receberam com o
coraçã o agradecido a abençoada notı́cia de que o processo de sua
beati icaçã o havia realmente começado em Roma. Oramos para que nã o
esteja longe o dia em que a Igreja inscreverá seu nome na lista de
santos. Uma coisa é certa: podemos arriscar com segurança a opiniã o
de que a in luê ncia que ela teve sobre a histó ria da Igreja no sé culo XIX
aumentará com o passar dos anos e continuará até que o tempo nã o
exista mais. Apesar de tudo o que os odiadores da religiã o cristã
possam dizer – e eles estã o dizendo muitas blasfê mias – a memó ria de
Jesus e de Sua Paixã o perdurará até o im. Ah, quã o pouco sonhou
Pilatos, enquanto o conduzia para fora, sangrando da degradaçã o do
lagelo, e disse à multidã o: “Eis o homem!” – quã o pouco a multidã o
enfurecida sonhou que a voz daquele sofredor silencioso emocionaria o
mundo para sempre, e a imagem Dele cruci icado derreteria o coraçã o
de toda a posteridade. Animado por um espı́rito muito diferente
daquele que enchia a alma do Pilatos ambicioso e mundano, Anne
Catherine Emmerich clama a nó s: “Eis o Cordeiro de Deus que tira o
pecado do mundo!”
Esta obra, sem dú vida, de vez em quando, encontrará zombarias semi-
ocultas e advertê ncias cı́nicas daqueles que nã o podem apreciar seus
mé ritos. Mas é reconfortante saber que tal crı́tica de modo algum
diminuirá seu efeito sobre as almas eleitas que buscam encorajamento
e iluminaçã o em uma vida de oraçã o. E Ele que, enquanto na terra,
soprou tal divindade e ternura, tal magnanimidade inesgotá vel de
piedade e amor para com todos os homens; que de Seu trono no Cé u
está agora disposto a dar a pé rola de grande valor comprada com Seu
Precioso Sangue ao ilho mais baixo da humanidade; que na agonia da
morte na Cruz do Calvá rio ansiava pelo malfeitor quebrado ao Seu lado
com a promessa do Paraı́so, nã o deixará de abençoar e iluminar todos
os que, em um espı́rito justo, estudam a vida e as revelaçõ es de Anne
Catherine Emmerich.
Uma palavra, em conclusã o, sobre o trabalho do tradutor. Ela conseguiu
produzir um trabalho que parece ter sido escrito originalmente em
inglê s. Pode-se dizer que ela literalmente colocou seu coraçã o nisso.
Está entre as produçõ es mais valiosas da imprensa cató lica, e ningué m
a lerá sem lucro.
TAD
Festa de Santa Mô nica, 1903.
I NTRODUÇAO
O autor da presente biogra ia publicou há oito anos o ú ltimo volume
da “Vida de Nosso Divino Salvador”, compilado a partir das visõ es de
Anne Catherine Emmerich. Ele se propô s a publicar, como
T suplemento ao mesmo, a vida do servo de Deus extraı́da das fontes
mais autê nticas; mas os deveres de seu ministé rio, a doença e as
di iculdades inerentes ao pró prio empreendimento retardaram sua
publicaçã o até o presente.
Se Clemente Brentano, 1 que residia em Dü lmen desde o outono de
1818 até a primavera de 1824, anotando diariamente suas
observaçõ es, recuou da tarefa de compilar esta vida, tã o simples no
exterior, tã o pouco calculada para tocar os sentidos, e ainda assim tã o
rica, tã o maravilhosa em sua signi icaçã o interior , o escritor destas
linhas pode certamente acreditar que tem direito à indulgê ncia de seus
leitores por retê -la por tanto tempo. Ele considerou o esboço da vida da
Irmã Emmerich pre ixado à primeira ediçã o de A Dolorosa Paixão ,
publicada por Clement Brentano, em 1833, su iciente, até que seu
amigo Dr. o Inqué rito Eclesiá stico de 1813”, e també m o acompanhou a
Dü lmen, Coesfeld e Flamske, para coletar entre seus poucos
contemporâ neos sobreviventes algumas circunstâ ncias de sua vida,
que levaram ao presente trabalho. A gratidã o exige a mençã o do
falecido Herr Aulike, Conselheiro Privado de Berlim, que gentilmente
encaminhou ao autor os avisos dados ao pú blico em intervalos desde o
ano de 1813 até o de sua morte, 1824. O cavalheiro acima mencionado
a olhava com profunda veneraçã o e aguardava ansiosamente a
publicaçã o de sua biogra ia, que, no entanto, nã o viveu para ver.
Devido ao registro consciencioso dos Atos da Investigaçã o, totalmente
desconhecidos de Clemente Brentano, o autor pô de sustentar esta
histó ria em testemunho tã o importante que nenhum mais conclusivo
pode ser encontrado na vida de qualquer santo favorecido por graças
semelhantes, enquanto os ricos materiais que eles oferecem dã o uma
compreensã o mais clara da missã o da irmã Emmerich. Neles vemos um
fato cujo signi icado é universalmente reconhecido pela Igreja, um fato
conhecido e apreciado em todas as é pocas; a saber, que Deus Todo-
Poderoso sempre escolhe certas almas que, isoladas do mundo ou em
meio à pressa da vida secular, servem como instrumentos de
sofrimento e combate para a Igreja. A vida e os sofrimentos de tais
escolhidos sã o muitas vezes muito diferentes: por exemplo, Lidwina de
Schiedam, ou nossa pró pria Domenica Lazzari aparecem como vı́timas
no corpo, como as primeiras virgens-má rtires; enquanto outros, como
Madalena di Pazzi, ou Columba di Rieti, combatem e sofrem
espiritualmente pela Igreja; embora, visto que sua vida é um sacrifı́cio
perpé tuo, um curso de perseverança ininterrupta em perfeito
abandono à vontade de Deus, eles se assemelham muito. Expiam as
faltas cometidas no seio da Igreja e reparam os males que ela padece de
seus pró prios ilhos, ou expiam a culpa real, fazendo penitê ncia pelos
culpados. Pela oraçã o, ou melhor, por um dom extraordiná rio que
converte a oraçã o em açã o, eles evitam perigos iminentes do Sumo
Pontı́ ice e do clero; eles obtê m conversã o pelos pecadores; um
aumento de fé para os fracos; zelo e intrepidez pelos pastores; e, por
ú ltimo, lutam por almas que correm o risco de se perderem por
negligê ncia de outros, principalmente daqueles a quem foi con iada a
sua orientaçã o espiritual. Alé m deste dever de oraçã o e expiaçã o, há ,
aliá s, a tarefa militante, a ser assumida por algumas almas
privilegiadas, e que consiste em abraçar efectivamente perigos
corporais e espirituais, doenças, tentaçõ es e má s inclinaçõ es. Aqui nã o
é mais simples sofrimento ou sacrifı́cio, cujos frutos sã o colhidos por
outros; mas trata-se de expor-se, real e pessoalmente, a todos os
perigos que ameaçam o pró ximo, de tomar sobre si a doença ou a
tentaçã o exigindo do substituto uma luta real, cujos frutos da vitó ria
devem ser transferidos para outro. . Um dos exemplos mais sublimes de
tal tarefa é encontrado em Judite confrontando Holofernes e seu
exé rcito para impedir a profanaçã o do Santuá rio e o opró brio do povo
escolhido de Deus. Pode parecer, talvez, que a oraçã o deva ser o ú nico
ou, pelo menos, o principal dever dessas vı́timas; mas isso nã o é
exclusivamente o caso, pois o martı́rio da penitê ncia sofrido pelos
inocentes é precisamente o que dá à oraçã o sua e icá cia e atrai sobre a
Igreja as mais ricas bê nçã os. A tarefa expiató ria nunca está separada da
de combate, e ambas unidas à oraçã o encontram-se em grau
extraordiná rio na vida da Irmã Emmerich que, desde a infâ ncia, foi
preparada para sua missã o, suas comunicaçõ es com seu anjo, sua
intuiçã o percepçã o do invisı́vel, e o dom da contemplaçã o concedido em
seu nascimento contribuindo para isso.
Trê s grandes males ameaçavam a Igreja na é poca em que ela vivia: a
profanaçã o das coisas sagradas, a disseminaçã o de falsas doutrinas e a
corrupçã o da moral, para enfrentar o que com as armas da oraçã o e da
expiaçã o era a missã o da Irmã Emmerich, lutar em defesa da Igreja
entregue, por assim dizer, à vontade de seus inimigos. Isso irá , em
grande medida, animar o leitor piedoso a uma con iança renovada em
Deus quando ele encontrar nesta biogra ia tantas provas de Sua
proteçã o misericordiosa sobre Sua Igreja durante esses tempos difı́ceis,
e contemplar o instrumento empregado para esse im na pessoa de a
pobre pastorinha de Flamske. Essa foi a consideraçã o que encorajou a
autora a retomar sua tarefa muitas vezes interrompida e a nã o poupar
esforços no estudo de sua vida, comparando diligentemente para isso
os fatos nela contidos com aqueles apresentados nas biogra ias de
outros igualmente favorecidos pelo Cé u.
Aqueles que estã o familiarizados com as regras estabelecidas por
Bento XIV e as grandes autoridades teoló gicas à s quais ele
constantemente se refere em sua obra “ De Servorum Dei Beati icatione
”, compreenderã o a ansiedade do autor em elaborar uma histó ria como
a que está sendo considerada e concordarã o com ele ao declarar a vida
da irmã Emmerich um exemplo impressionante das virtudes exigidas
pela Igreja como provas da verdade onde quer que haja questã o do
sobrenatural. 2
Para poder se pronunciar com prudê ncia sobre uma questã o tã o
delicada, deve-se levar em consideraçã o, por um lado, a virtude da
pessoa examinada e, por outro, sua maneira de se comportar dentro e
fora da visã o; para este ú ltimo ponto, Bento XIV, com os mais ilustres
doutores e teó logos, estabeleceu doze marcas que merecem atençã o
especial:
1) A pessoa em questã o já desejou visõ es; ou, pelo contrá rio, ela
implorou a Deus a graça de ser conduzida da maneira comum? Ela
recebeu tais visõ es apenas no espı́rito de obediê ncia? “Desejar tais
favores”, diz Sã o Vicente Ferrer, “seria nutrir um orgulho secreto ou
uma curiosidade repreensı́vel; seria um sinal de fé fraca e imperfeita”.
2) Ela recebeu de seu confessor uma ordem para comunicar suas visõ es
a pessoas santas e iluminadas?
3) Ela sempre demonstrou obediê ncia absoluta aos seus guias
espirituais? Ela, por causa de suas visõ es, progrediu rapidamente no
amor de Deus e na humildade?
4) Ela conferiu voluntariamente com pessoas nã o inclinadas a creditá -
la, ou que a tentaram e a contradisseram?
5) Ela habitualmente experimenta paz e tranquilidade de consciê ncia?
Seu coraçã o está sempre in lamado com zelo ardente pela perfeiçã o?
6) Seus diretores espirituais alguma vez foram obrigados a censurá -la
por imperfeiçõ es?
7) Ela recebeu de Deus a promessa de ouvir todas as suas petiçõ es
lı́citas e razoá veis? Ela por suas oraçõ es obteve grandes favores dEle?
8) Aqueles que vivem com ela, supondo que sua pró pria perversidade
nã o seja obstá culo à sua in luê ncia virtuosa, foram incitados à piedade e
ao amor de Deus?
9) Suas visõ es foram concedidas a ela apó s fervorosa oraçã o ou Santa
Comunhã o? Eles despertaram nela o desejo de sofrer para a gló ria de
Deus?
10) Ela cruci icou sua carne? Ela se alegrou em provaçõ es e
contradiçõ es?
11) Ela adorou o retiro? Ela fugiu da sociedade das criaturas? Ela está
despojada de todo apego natural?
12) Ela preservou a serenidade da alma tanto em circunstâ ncias
adversas quanto em circunstâ ncias pró speras? Finalmente, os teó logos
eruditos nã o encontraram nada em suas visõ es contrá rio à s regras da
fé , ou que possa parecer repreensı́vel, visto sob qualquer luz?
Esses doze pontos estabelecidos por Bento XIV, frutos da experiê ncia
dos santı́ssimos e esclarecidos Doutores, fornecem regras seguras e
infalı́veis em tais casos; e quanto mais uma alma dotada do dom da
visã o se conforma com isso, mais motivos existem, segundo o santo
pontı́ ice, para aceitar seu testemunho e visõ es como verdadeiros e
reais. Agora, sem dú vida, o leitor nã o icará menos satisfeito do que nó s
em traçar a correspondê ncia perfeita e verdadeiramente surpreendente
entre essas regras e toda a vida da Irmã Emmerich. Ele concordará
conosco ao declarar que para encontrar essas diferentes caracterı́sticas
unidas no mesmo grau em qualquer alma, ele seria obrigado a
pesquisar a vida dos santos mais ilustres da Igreja. Em primeiro lugar, a
irmã Emmerich nunca desejou tais favores. Implicaram sobre ela tantas
provaçõ es e contradiçõ es que ela freqü entemente conjurava Deus para
livrá -la deles. Mais uma vez, a idade em que ela os recebeu pela
primeira vez nã o nos permite supor que ela poderia tê -los desejado,
pois quando ela começou a falar deles, foi com a simplicidade de uma
criança que ignora o signi icado preciso do que diz. Em segundo lugar,
ela poderia ser induzida a comunicar suas visõ es apenas pelas
instâ ncias reiteradas de seu guia angelical, e somente nos ú ltimos dez
anos de sua vida ela encontrou algué m disposto a ouvi-las. Em terceiro
lugar, como seus confessores suspeitavam de suas visõ es e se
preocupavam nem mesmo em examiná -las, ela fez tudo ao seu alcance
para escondê -las, abafá -las, por assim dizer, em seu pró prio peito. A
luta daı́ surgida com o seu guia invisı́vel, que nã o deixou de a exortar a
revelá -los apesar da aversã o do seu confessor, causou-lhe um
sofrimento indescritı́vel. Ainda assim, ela continuou a se dirigir aos
mesmos diretores de quem, no entanto, ela nã o esperava nada alé m de
severas rejeiçõ es e amargas humilhaçõ es. Ela deixou a Deus o cuidado
de iluminá -los em Seu pró prio tempo sobre a origem e o cará ter de seus
dons sobrenaturais; e rejeitou, quanto ao seu estado, tudo o que
pudesse modi icar ou melhorar sua dolorosa situaçã o, testemunhando
apenas caridade, paciê ncia e doçura para com os autores de suas
provaçõ es.
Passando por cima dos outros pontos, vamos nos limitar a dar uma
olhada no dé cimo segundo e ú ltimo: a saber, a conformidade das visõ es
da irmã Emmerich com os ensinamentos da fé – uma circunstâ ncia da
maior importâ ncia nas visõ es contendo revelaçõ es.
Bento XIV aqui apoia sua opiniã o principalmente em Suá rez, que
estabelece como princı́pio incontestá vel que, no estudo das revelaçõ es,
deve-se considerar principalmente se elas estã o em perfeita
conformidade com as regras da Fé e da sã moral, rejeitando como
ilusó rias e diabó licas toda pretensa revelaçã o em contradiçã o com a
Sagrada Escritura, a tradiçã o, os decretos dos Concı́lios e os
ensinamentos unâ nimes dos Padres e teó logos. Mesmo aquelas
revelaçõ es que, sem contrariar a Fé , contê m contradiçõ es evidentes e
servem apenas para satisfazer a vã curiosidade, que parecem ser o
resultado de uma atividade puramente humana, ou que, en im, se
opõ em à sabedoria de Deus ou a qualquer outro de Seus atributos
divinos, devem ser suspeitadas.
E aqui o ilustre pontı́ ice pergunta o que se deve pensar das revelaçõ es
que contê m declaraçõ es aparentemente opostas à opiniã o comum dos
Padres e teó logos, revelaçõ es que em algum ponto particular dã o
detalhes bastante novos, ou que a irmam como certo o que ainda nã o
foi pronunciado pela Igreja? Apoiando-se na mais só lida autoridade, ele
responde que esse motivo é su iciente para nã o rejeitar sem mais
exames revelaçõ es nas quais tais coisas sã o encontradas; pois, em
primeiro lugar, um fato que à primeira vista parece contrá rio à opiniã o
comum pode, se submetido a um exame sé rio e consciencioso, evocar
em seu favor uma autoridade de peso e excelentes razõ es intrı́nsecas
para acreditar; em segundo lugar, uma revelaçã o nã o deve ser
condenada como falsa apenas por causa de suas circunstâ ncias
contidas na Vida de Nosso Senhor, ou na de Sua Mã e Santı́ssima, das
quais nenhuma mençã o é feita nas Sagradas Escrituras, na tradiçã o, ou
nos Santos Padres. ; terceiro, uma revelaçã o pode, sem militar contra a
decisã o da Igreja, dos Padres e dos teó logos, explicar um ponto nã o
explicado por eles ou dar a conhecer algum detalhe sobre o qual eles
silenciam; quarto, colocaria limites arbitrá rios ao poder onipotente de
Deus supor que Ele nã o pode revelar a um particular um ponto que,
ainda nã o pronunciado pela Igreja, ainda é assunto de contrové rsia.
Se o leitor desejar aplicar as regras anteriores à s revelaçõ es contidas
nesta obra, 3 ele nã o encontrará nele absolutamente nada que fere os
princı́pios da fé cristã ; pelo contrá rio, ele icará plenamente satisfeito
de que existem poucos livros que permitem à alma penetrar tã o
facilmente nos misté rios de nossa santa religiã o, ou que comunicam
tã o rapidamente mesmo para as mentes comuns o conhecimento
dessa arte das artes que, segundo o autor da Imitação , consiste na
meditaçã o da Vida de Nosso Senhor Jesus Cristo, In vita Jesu Christi
meditari . 4
Como impostores e hipó critas sã o freqü entemente encontrados em
nossos dias que se vangloriam de destinatá rios favorecidos de favores
especiais do Cé u, e que ocasionalmente ganham cré dito com alguns, o
autor deu ielmente e em detalhes as investigaçõ es feitas no caso da
irmã Emmerich como ele as encontrou em os documentos originais.
O amigo de Clement Brentano, Edward Steinle, pintou o retrato do qual
foi tirada a gravura pre ixada a este volume. Seus modelos eram os
desenhos esboçados pelo pró prio Brentano em vá rios perı́odos de sua
estada em Dü lmen. Aqueles que conheceram melhor a irmã Emmerich
testemunham sua idelidade.
Em conclusã o, o autor declara sua submissã o sem reservas aos
decretos do Papa Urbano VIII de 13 de março de 1625 e 5 de junho de
1634, pelo que reivindica o que há de extraordiná rio neste livro, mas
uma origem puramente humana.
P. S CHMOGER , C.SS.R.
C ONVENTO DE G ARS, NO I NN , B AVARIA
setembro de 1867
Capítulo 1
MANEIRAS E ALFANDEGAS DE W ESTPHALIA NO INICIO DO
SECULO PRESENTE _ _ _
O registro de batismo de SE, St. James, Coesfeld, conté m o seguinte
registro: “Em 8 de setembro de 1774, foi batizada Anne Catherine,
ilha de Bernard Emmerich e Anne Hillers, sua esposa. Padrinhos,
T Henry Hü ning e Anne Catherine Heynick, né e Mertins.” O dia do
batismo da pequena Anne Catherine foi també m o do seu
nascimento. Ela foi a quinta de nove ilhos, seis ilhos e trê s ilhas.
Gerard, o irmã o mais novo, nunca se casou. Ele ainda vivia em
setembro de 1859, quando o autor visitou a pequena aldeia de Flamske,
perto de Coesfeld, berço do sujeito desta biogra ia. Gerard tinha pouco a
dizer de sua irmã , exceto que ela era de uma disposiçã o notavelmente
doce, que ela tinha sofrido ao longo da vida, e que ele tinha ido vê -la
muitas vezes em Dü lmen depois que ela se tornou religiosa. “Ela foi tã o
gentil e carinhosa conosco”, acrescentou, “que foi um grande prazer
para sua famı́lia visitá -la”.
O venerá vel pastor da igreja de St. James, Rev. F. Hilswitte, també m
estava vivo e lembrou-se de ter visto Anne Catherine pela ú ltima vez em
1812. Ele testemunhou sua reputaçã o de piedade, mas os detalhes de
sua vida eram desconhecidos para ele. “O perı́odo em que ela viveu”,
observou ele, “nã o foi capaz de compreender ou apreciar um caso como
o dela, e poucos, mesmo entre o clero, se interessaram por ela;
consequentemente, ela foi esquecida mais rapidamente em sua terra
natal do que em qualquer outro lugar. Dentro cidades distantes ela era
mais conhecida atravé s do bispo Wittmann e Clement Brentano. Este
ú ltimo, depois de suas visitas a Dü lmen, despertou o interesse do
pú blico por ela pelo relato das maravilhas que havia visto.”
Muito antes de sua morte, a irmã Emmerich havia pronunciado as
seguintes palavras: “O que o Peregrino 1 respiga, ele levará , muito,
muito longe, pois nã o há disposiçã o para usá -lo aqui; mas dará frutos
em outras terras, de onde seus efeitos retornarã o e serã o sentidos até
aqui”.
A humilde morada em que ela nasceu ainda estava de pé , em 1859, nas
mesmas condiçõ es em que Clement Brentano a encontrara quarenta
anos antes. Era uma pequena casa de fazenda, ou melhor, um celeiro em
que homem e animal viviam paci icamente juntos. A porta carcomida
abria-se para uma pequena sala cujo ú nico piso era o chã o bem pisado;
esta era a sala comum da famı́lia. A esquerda havia espaços cortados da
sala principal por divisó rias de tá buas toscas e juncados de feno e grã os
espalhados pelo gado; estes eram os apartamentos de dormir. A
chaminé , tosca e primitiva, consistia numa laje de pedra ou chapa de
ferro cimentada no solo; nele brilhava o fogo, e acima dele pendia a
chaleira de uma barra de ferro. A fumaça, depois de depositar sua
fuligem nas vigas á speras e nas cadeiras e mesas sujas, obra de
geraçõ es anteriores, escapava como podia por qualquer fresta no teto
ou nas paredes. O resto da habitaçã o foi entregue à s vacas, que foram
separadas de seus donos apenas por algumas estacas incadas no chã o.
Em um perı́odo posterior, uma pequena adiçã o de dois quartos foi
anexada ao edifı́cio principal. Diante desta humilde morada havia
alguns carvalhos envelhecidos, sob cuja sombra a linda menina de
quem escrevemos muitas vezes brincava com seus companheiros de
aldeia.
Clement Brentano visitou o local de nascimento da Irmã Emmerich
durante sua vida. E os seguintes sã o dele impressõ es dos costumes
daquele perı́odo no paı́s de Mü nster:
“Fui trê s lé guas de Dü lmen ao povoado de Flamske, para visitar a antiga
casa de Anne Catherine, entã o ocupada por seu irmã o mais velho
Bernard e sua famı́lia. Dü lmen pertence à paró quia de St. James,
Coesfeld, cidade a cerca de meia lé gua de distâ ncia. Ansiava por ver o
lugar de seu nascimento, o berço de sua infâ ncia. Achei um celeiro
velho, com paredes de barro e telhado de palha coberto de musgo. A
porta frá gil estava convidativamente aberta, e entrei e me encontrei em
uma nuvem de fumaça atravé s da qual mal podia distinguir um passo à
frente. Um olhar de surpresa de Bernard Emmerich e sua esposa
saudou minha entrada sem cerimô nia. Mas quando me apresentei como
portador de mensagens e elogios de sua irmã , eles me receberam muito
cordialmente, e os pequeninos, tı́midos no inı́cio, se aproximaram a um
sinal do pai e beijaram suas mã ozinhas em boas-vindas. Nã o vi outra
sala alé m daquela em que entrara, cujo canto estava parcialmente
dividido. Nela havia um tear grosseiro pertencente a um dos irmã os.
Vá rios baú s velhos enegrecidos pela fumaça se abriram quando se abriu
a nova visã o de camas de palha mobiliadas com travesseiros de penas.
Em frente a esta sala estava o espetá culo ainda mais novo das vacas
atrá s de suas pilhas.
“Os mó veis eram escassos o su iciente. Utensı́lios de cozinha
adornavam as paredes e das vigas pendiam palha, feno e estopa preta
de fuligem. Aqui nesta atmosfera sombria, nesta desordem e pobreza,
nasceu e foi criada aquela criança favorecida, tã o pura, tã o iluminada,
tã o extraordinariamente rica em dons intelectuais; ali estava sua
inocê ncia batismal preservada imaculada. Lembrou-me o presé pio de
Nosso Salvador em Belé m. De um bloco de madeira diante da porta, que
servia de mesa, comi uma fatia de pã o integral e bebi uma caneca de
leite enquanto conversava com Bernard Emmerich, cuja genuı́na
piedade transparecia em suas palavras, sendo sua expressã o favorita:
ajuda!'
“Um velho quadro descolorido de Nossa Senhora pairava sobre o local
em que Anne Catherine costumava descansar. Com a licença do
proprietá rio substituı́-o por outro, e levei-o comigo juntamente com
algumas bolotas dos velhos carvalhos diante da porta como recordaçã o
da minha visita. Ao se despedir dessa boa gente, eles me disseram que
eu era o primeiro a se interessar tanto pelo local de nascimento de sua
irmã . Dali caminhei meia lé gua até Coesfeld, para visitar a igreja na
qual ela havia recebido as marcas da Coroa de Espinhos. Foi aqui, na
igreja paroquial de S. Tiago, que recebeu o santo Baptismo, a 8 de
Setembro de 1774, dia em que, festa da Natividade de Maria, era
també m o do seu nascimento. 2 Minha visita a esta bela igreja antiga
me encheu das mais doces impressõ es. De lá fui ver o velho pá roco,
padre Hartbaum, que ainda achei bastante vigoroso, apesar de sua
idade. Ele nã o parecia apreciar plenamente sua ex-paroquiana e
expressou surpresa com o interesse manifestado por ela. Ele me
pareceu um daqueles que de bom grado ver as coisas permanecerem
sempre as mesmas, que se preocupam em nã o se desviar de sua rotina
diá ria, cujo horizonte nã o se estende alé m do alcance de sua pró pria
visã o intelectual.
“Visitei em seguida St. Lambert's, a principal igreja, onde está
preservado o cruci ixo milagroso, conhecido como o 'Cruci ixo de
Coesfeld', diante do qual, quando criança, Irmã Emmerich costumava
passar longas horas em fervorosa oraçã o, recebendo em troca
abundantes graças. E bifurcada como aquela que, mais tarde, foi
impressa em seu pró prio peito. A tradiçã o diz que foi trazido da
Palestina no sé culo VIII. Foi aqui que a Irmã Emmerich recebeu o
Sacramento da Con irmaçã o. Depois fui à igreja jesuı́ta na qual, aos
vinte e quatro anos, provavelmente em 1798, a Coroa de Espinhos foi
colocada em sua testa por seu Esposo Celestial, enquanto ela rezava
perto do meio-dia diante de um cruci ixo no só tã o do ó rgã o.
Entristeceu-me pensar que esta bela igreja tinha caı́do parcialmente
nas mã os dos protestantes desde a residê ncia do Conde von Salm aqui.
A chamada mesa de comunhã o icava diante daquele altar de cujo
taberná culo havia saı́do a apariçã o do Salvador a Ana Catarina; a festa
da Reforma, esse triunfo da apostasia, é aqui anunciada anualmente do
pú lpito; e o grande e antigo ó rgã o, junto ao qual ela rezava no momento
do favor milagroso, foi substituı́do por um de fabricaçã o mais recente.
Atualmente, a igreja é usada por cató licos e protestantes, e me disseram
que a condessa von Salm, como se fosse a ú nica amante, tentou privar
os primeiros do direito de adorar nela. Arrogava-se també m o privilé gio
de alojar o seu povo nos capuchinhos, cujo mosteiro nã o ica longe, e
queixava-se em voz alta do aborrecimento que lhe causava o som dos
sinos da manhã chamando os ié is para a Santa Missa. dois mil, é um
dos mais devocionais que já vi. Todo o interior está em perfeita
harmonia, a talha do altar, a grade da comunhã o, e os mó veis mais
elegantes e elaborados. Alguns podem desejar um pouco mais elevado,
mas esse é seu ú nico defeito. O belo piso parece coberto por um rico
tapete. Assim que passar inteiramente para as mã os dos protestantes,
eles destruirã o seus altares ricamente esculpidos como sugestivos
demais, talvez, da honra que outrora foi prestada ao Deus da Eucaristia.
“Coesfeld era a Jerusalé m da pequena Anne Catherine. Aqui ela visitava
diariamente seu Deus no Santı́ssimo Sacramento. Para lá ela
amorosamente se voltava enquanto trabalhava nos campos, cuidando
de seus rebanhos ou orando à noite ao ar livre; e de Coesfeld foi que os
sinos do pequeno convento das Annonciades bateram em seu ouvido,
despertando em sua alma um desejo ardente pela vida enclausurada.
Este mesmo convento encontra-se agora desmantelado e deserto.
“Durante vá rios anos, Irmã Emmerich viveu em Coesfeld com um
piedoso fabricante de mâ ntuas, e por mais trê s na famı́lia de um
mestre de coro com o objetivo de aprender a tocar ó rgã o, esperando
assim facilitar sua entrada em algum convento; inalmente, foi de
Coesfeld que ela foi realizar seu projeto piedoso. Nã o é de estranhar,
portanto, que ela se interessou vivamente pela pequena cidade e que
estava profundamente a lita com a decadê ncia da piedade cató lica,
mesmo entre seu clero, devido à in luê ncia protestante e à difusã o do
chamado iluminismo da é poca. A piedade e a moral ainda prevalecem,
no entanto, em todo o paı́s de Mü nster, preservadas entre os jovens
menos pela educaçã o que recebem do que pelo uso frequente dos
Sacramentos. As Sagradas Escrituras nã o sã o, de fato, encontradas em
todas as famı́lias, nem as citaçõ es delas sã o comuns, mas a prá tica de
suas sagradas liçõ es é claramente visı́vel. A instruçã o para as pessoas
adaptadas à s necessidades da é poca começou com a geraçã o atual, os
professores homens e mulheres foram formados na escola de Dean
Overberg, 3 que em toda parte é honrado como um santo e o pai comum
de todos. Seus louvores sã o ouvidos por todos os lados e seu zelo e
simplicidade derramam uma bê nçã o sobre todos os seus
empreendimentos; no entanto, ningué m ousa a irmar que seus
esforços os tornaram mais piedosos e ié is do que seus antepassados.
Embora a irmã Emmerich tivesse a maior veneraçã o por ele, ainda
assim ela frequentemente declarava sua opiniã o, corroborada por suas
visõ es, de que os pobres e velhos mestres-escolas da aldeia, à s vezes
obrigados a seguir també m o ofı́cio de alfaiate para obter um sustento
su iciente, recebiam ajudas mais abundantes de Deus. como
instrutores piedosos da juventude do que seus colaboradores
modernos, in lados por exames bem-sucedidos. Cada obra produz seu
pró prio fruto. Quando o professor se acomoda em seu trabalho, quando
encontra nele uma certa grati icaçã o pessoal, ele consome, por assim
dizer, a melhor parte da bê nçã o que lhe foi concedida para sua tarefa. E
o que acontece hoje em dia quando os professores dizem: 'Ensinamos
bem'; alunos, 'Aprendemos bem'; e os pais se gloriam no talento e na
educaçã o de seus ilhos, enquanto em todos os é engendrada uma
busca por um espetá culo vazio. Nosso povo, de fato, lê e escreve muito
melhor do que seus antepassados; mas com a sua melhoria o diabo
diariamente semeia a má semente no caminho que brota para sufocar
a piedade e a virtude. Estou convencido de que a verdadeira fonte da
moralidade e piedade que ainda se vê entre o povo de Mü nster reside
mais em sua irme adesã o à s tradiçõ es de fé e aos costumes de seus
antepassados religiosos, no grande respeito pelo padre e sua bê nçã o ,
na sua idelidade aos Sacramentos, do que na rá pida difusã o da
educaçã o moderna. Certa manhã , bem cedo, ao passar por uma cerca
viva, ouvi a voz de uma criança. Aproximei-me suavemente e espiando
vi uma garotinha esfarrapada de cerca de sete anos conduzindo um
bando de gansos à sua frente, uma vara de salgueiro na mã o. Com um
acento inimitá vel de piedade e inocê ncia, ela exclamou: 'Bom dia,
querido Senhor Deus! Louvado seja Jesus Cristo! Bom Pai, que estais no
cé u! Ave Maria cheia de graça! Eu quero ser bom! Eu quero ser piedoso!
Queridos santos do paraı́so, queridos anjos, quero ser bom! Tenho um
belo pedaço de pã o para comer, e agradeço-lhe por isso. O olhe por
mim! Nã o deixe meus gansos correrem para o trigo! Que nenhum bad
boy jogue uma pedra e mate um! Cuide de mim, pois quero ser uma boa
menina, querido Pai do cé u!' Sem dú vida, a pequena inocente compô s
sua oraçã o a partir de algumas antigas tradiçõ es familiares, mas nossas
professoras modernas di icilmente a tolerariam. Quando penso na
escassa educaçã o, na rusticidade de muitos do clero; quando vejo tã o
pouca atençã o dada à ordem e limpeza em muitos dos edifı́cios
sagrados, mesmo no que pertence diretamente ao serviço do altar;
quando me lembro do fato de que todas as pessoas falam o baixo-
alemã o, enquanto os sermõ es e as instruçõ es tê m sido proferidas há
anos na lı́ngua da alta Alemanha; e quando, no entanto, percebo
diariamente a pureza, a piedade, o bom senso mesmo do mais humilde
dessas pessoas, sua aptidã o para as verdades da religiã o, sou obrigado
a exclamar que a graça de Nosso Senhor é mais ativa em seu viver
membros do que verbalmente ou por escrito. Ele mora com força
criadora nos Sacramentos divinos, perpetuados de geraçã o em geraçã o
pelo poder maravilhoso ligado à consagraçã o sacerdotal. A pró pria
Igreja está lá com sua bê nçã o, sua in luê ncia salutar, sua autoridade e
seus milagres. Ela existe desde todas as é pocas e continuará existindo
até o im, pois ela é obra do pró prio Deus, e todos os que crê em em
Jesus e em Sua Igreja compartilham de seus dons sublimes.
“A populaçã o deste distrito está espalhada por uma vasta extensã o do
paı́s, fato que muito contribui para a preservaçã o da moralidade, bem
como do cará ter nacional; pois as pessoas nã o se atraem mutuamente
para pecar como acontece nas cidades populosas. Cada famı́lia, da qual
o gado sempre faz parte, tem uma casa rodeada de cachos de carvalhos
que a protegem das tempestades e amplos campos cercados por sebes
ou taludes. Distante cerca de um quarto de lé gua, outra herdade
semelhante em seus arredores, embora talvez de maior ou menor
tamanho. Um certo nú mero destas quintas constitui uma aldeia, e
vá rias aldeias, uma freguesia. Charmosos aglomerados de á rvores,
sebes verdejantes, recantos sombreados estã o espalhados por toda
parte. Caminhando de casa em casa pelos verdes prados, nã o pude
conter a exclamaçã o: Que cenas doces para os anos inocentes da
infâ ncia! Que recantos solitá rios! Que belos arbustos e bagas deliciosas!
A casa dos camponeses e, de fato, a da pequena nobreza també m, em
algum grau, apresenta um cará ter totalmente patriarcal. Centra-se, por
assim dizer, em torno do fogo, onde se encontram os melhores arranjos
da casa. A porta externa abre diretamente para a cozinha, que serve
també m como sala de estar da famı́lia, na qual se passa a maior parte
de sua vida. As camas ocupam reentrâ ncias nas paredes, cujas portas
sã o mantidas fechadas durante o dia. As vezes, na pró pria cozinha, mas
mais frequentemente em uma á rea contı́gua, sã o vistos à direita e à
esquerda as vacas e os cavalos em um andar té rreo, alguns metros
abaixo do edifı́cio principal, com suas manjedouras no mesmo nı́vel; em
alimentar suas cabeças muitas vezes se projetam alé m das estacas de
seu recinto para a sala da famı́lia. Um ferro mó vel ou calha de madeira
conduz a á gua da bomba para a enorme chaleira sobre o fogo, na qual a
comida é preparada. Em uma casa, vi uma criança dando voltas e mais
voltas em um buraco aberto em uma extremidade de uma tá bua, sendo
a outra presa a um poste por uma haste transversal — um arranjo
primitivo para evitar que a criança caı́sse no fogo. Na outra
extremidade do apartamento, fechado por um portã o, há um grande
espaço aberto no qual o trigo é debulhado ou o linho chocado; em cima
sã o armazenados feno, palha e grã os. A boa esposa pode cuidar de seus
deveres culiná rios na lareira e, ao mesmo tempo, ter uma visã o de todo
o estabelecimento.
“As vidraças estreitas sã o adornadas com imagens de eventos de outros
tempos, imagens de santos, de herá ldica e outros artefatos. As
'Instruçõ es Familiares' de Gof ine, o Catecismo de Overberg e um
volume de histó ria sagrada sã o exibidos com vantagem em uma
prateleira de madeira ou cuidadosamente guardados em um baú com
as roupas de domingo, à s quais sã o adicionadas algumas maçã s
maduras para o por causa de seu doce perfume. A cabana é guardada
externamente por velhos carvalhos imponentes, atravé s de cujos galhos
os ventos de inverno assobiam sem serem ouvidos pelos ocupantes
piedosos e ingê nuos, que estã o sempre prontos para oferecer
hospitalidade ao viajante estranho.
“Um grau do que se poderia chamar de elegâ ncia é perceptı́vel nos
arranjos domé sticos dos ricos. No verã o, um enorme buquê substitui o
fogo ardente na lareira, e pequenos pratos de porcelana sã o colocados
ao redor como um ornamento adicional. Entre os pobres tudo é mais
claro e simples, mas estampado com o selo da vida domé stica e dos
costumes locais. Uma caracterı́stica em suas casas, que está
desaparecendo gradualmente, é a ausê ncia de uma chaminé . Em tempo
chuvoso, a fumaça enche a habitaçã o como um vapor denso.”
Tal é o relato de Clement Brentano sobre sua visita a Flamske e
arredores.
Capítulo 2
B APTISMO E INFANCIA DE A NNE C ATHERINE
A ilhinha de ERNARD Emmerich poderia dizer como Santa
Hildegarde: “Desde a aurora da existê ncia, quando Deus me
despertou no ventre de minha mã e, soprando em mim o sopro da
B vida, Ele infundiu em minha alma o dom da contemplaçã o. Antes que
meu corpo com seus nervos e ibras se entrelaçasse, minha alma
desfrutava de visõ es ininterruptas” – pois ela també m havia sido
dotada de dons tã o sublimes que desde a infâ ncia ela teve o uso de
suas faculdades intelectuais. Poucas horas depois de seu nascimento,
ela foi levada a Coesfeld para receber o santo batismo na Igreja de St.
James, e as vá rias impressõ es feitas sobre ela pelas pessoas e objetos
encontrados no caminho nunca desapareceram de sua mente. Alé m do
dom da graça santi icante e das virtudes teologais, a luz da profecia foi
tã o abundantemente infundida em sua alma pelo Batismo que só
encontrou precedente no calendá rio da Igreja em um nú mero muito
pequeno de almas privilegiadas. Perto do im de sua vida, ela aludiu a
isso com as seguintes palavras:
“Nasci no dia 8 de setembro e hoje (8 de setembro de 1821) sendo o
aniversá rio do meu nascimento, tive uma visã o do mesmo, como
també m do meu Batismo. Produziu em mim uma sensaçã o muito
singular. Senti-me um bebê recé m-nascido nos braços de minha
madrinha indo a Coesfeld para ser batizado, e iquei confuso ao me ver
tã o pequeno, tã o fraco e ao mesmo tempo tã o velho! Todas as
impressõ es que eu tinha experimentado quando criança, eu agora
sentia novamente, mas misturada com algo da inteligê ncia da minha
idade atual. Eu me senti tı́mido e envergonhado. As trê s velhas
presentes, assim como a enfermeira, me desagradavam. Minha mã e
inspirou sentimentos muito diferentes, e de bom grado peguei seu seio.
Eu estava plenamente consciente de tudo o que se passava ao meu
redor. Vi a velha casa de fazenda em que morá vamos com todos os seus
pertences, e alguns anos depois pude reconhecer as mudanças que
haviam sido feitas nela. Vi como as vá rias cerimô nias do Batismo
enriqueceram minha alma com as graças que simbolizavam, e meus
olhos e meu coraçã o foram milagrosamente iluminados e tocados. A
Mã e de Deus estava presente com o Menino Jesus, a quem fui
desposada com um anel. Vi també m meu anjo-guardiã o e minhas santas
padroeiras Santos. Ana e Catarina.
“Tudo o que é sagrado, tudo o que é abençoado, tudo o que pertence à
Igreja, era tã o perfeitamente inteligı́vel para mim entã o como agora, e
eu vi coisas maravilhosas da essê ncia da Igreja. Senti a presença de
Deus no Santı́ssimo Sacramento. Vi as relı́quias brilhando de luz e
reconheci os santos que pairavam sobre elas. Eu vi todos os meus
antepassados de volta ao primeiro que recebeu o Batismo; e, em uma
sé rie de imagens simbó licas, contemplei os perigos que me ameaçavam
ao longo da vida. Durante todo o tempo tive impressõ es muito
singulares dos meus padrinhos, dos meus parentes presentes e
sobretudo daquelas trê s velhas que sempre me foram um pouco
repulsivas. Vi como meus ancestrais se rami icaram em diferentes
paı́ses. O primeiro batizado viveu no sé timo ou oitavo sé culo. Ele
construiu uma igreja. Vá rios outros se tornaram religiosos, e houve dois
que receberam os estigmas, mas viveram e morreram desconhecidos
para o mundo. Entre eles estava um certo eremita, que já ocupou uma
posiçã o elevada e teve vá rios ilhos. Ele se retirou para a solidã o e viveu
a vida de um santo.
“No caminho de volta para casa pelo cemité rio, tive uma percepçã o viva
do estado das almas cujos corpos jaziam lá , e iquei cheio de veneraçã o
por algumas que brilhavam com grande brilho.”
Assim como outras crianças experimentam calor e frio, dor, fome e
sede, assim també m esta criança abençoada percebeu as relaçõ es e
in luê ncias da ordem superior em que o santo O batismo a havia
admitido; isto é , a Igreja, a Comunhã o dos Santos, o Corpo mı́stico de
Jesus. Tudo foi realizado por ela da maneira mais perfeita e, apoiando-
se nos braços da enfermeira, mergulhou as mã ozinhas na pia de á gua
benta para apropriar-se de seus efeitos bené icos. Sua dignidade de
ilha da Igreja era tã o palpá vel para ela quanto a existê ncia de seus
pró prios membros e, antes que pudesse articular, compreendeu o
signi icado das festas e dos costumes e prá ticas piedosas que
regulavam a vida de seus bons pais, tudo o que ela observou até onde a
fraqueza da infâ ncia permitia. Sua compreensã o foi desenvolvida, sua
vida misteriosa regulada por seu anjo, que a ensinou a servir ao Deus
trino pela prá tica das virtudes infundidas, fé , esperança e caridade. Os
primeiros movimentos de sua alma foram dirigidos ao seu Criador, que
tomou posse total de seu coraçã o antes que qualquer bem criado
pudesse reivindicá -lo. No esplendor da inocê ncia batismal, ela
pertencia à quele Esposo que havia escolhido seu coraçã o para se
conformar ao Seu em pureza, caridade e sofrimento. O Espı́rito Santo
animou todos os poderes de sua alma e dirigiu suas elevaçõ es
arrebatadoras ao alto. No segundo ano, quando conseguiu pronunciar
algumas palavras, iniciou a prá tica da oraçã o vocal com todo o fervor de
quem há muito acostumada ao exercı́cio. Seu piedoso pai aguardava
ansiosamente o momento em que sua ilhinha pronunciaria suas
primeiras palavras e, graças à sua vigilâ ncia, eram as das petiçõ es do
Pai Nosso. Mesmo nos ú ltimos anos de sua vida, ela recordou com
gratidã o esse fato.
“Meu pai”, disse ela, “se esforçou muito comigo para me ensinar como
fazer minhas oraçõ es e fazer o sinal da cruz. Ele me colocava de joelhos,
fechava minha mã o e me ensinava primeiro o pequeno sinal da cruz,
depois, abrindo-o, ele me guiava para fazer o grande sinal. Quando eu
era jovem demais para dizer mais da metade do Pai Nosso , costumava
repetir o pouco que sabia vá rias vezes, até achar que tinha dito o
equivalente a toda a oraçã o”.
A esta luz interior pertence a virtude angé lica, a santa pureza, que foi
concedida à pequena Ana Catarina no Batismo. e cujos efeitos foram
mostrados mesmo no seio de sua mã e. Ela nunca foi ouvida a chorar,
nunca foi vista com um humor irritá vel, mas como Maria Bagnesi de
Florença, ou Colomba di Rieti, ela sempre foi gentil e amá vel. Seus pais
encontraram seu deleite e consolo em sua afetuosa menininha, que
logo se tornou a queridinha dos camponeses de coraçã o simples entre
os quais sua sorte foi lançada. Os amigos de Santa Catarina de Siena
costumavam competir uns com os outros pela posse dela quando
criança, pois a visã o dela encantou todos os coraçõ es; e Maria Bagnesi
era uma criança tã o atraente que, quando foi levada para ver suas
irmã s no convento, as religiosas nã o suportaram deixá -la deixá -las. Foi
o mesmo com a pobre camponesa de Flamske; ela era a alegria de
todos ao seu redor. O brilho de pureza que irradiava em toda a sua
pessoa emprestava um encanto irresistı́vel a cada olhar, a cada
movimento, a cada palavra da criança tı́mida. A medida que avançava
em idade, revestiu-a de um cará ter sagrado que, desconhecido para ela,
exercia uma in luê ncia santi icadora sobre todos os que entravam em
contato com ela. Quando mais tarde ela entrou na parte mais dolorosa
de sua tarefa de sofrimento expiató rio, essa pureza de alma brilhou
exteriormente à medida que suas dores aumentavam; e quanto mais se
aproximava do im de sua missã o, mais sensı́vel se tornava o
misterioso poder que emanava dela. Quando seus estigmas foram
submetidos à investigaçã o, os eclesiá sticos e mé dicos envolvidos nisso
prestaram esse mesmo testemunho; e a impressã o mais forte recebida
pelo Conde Frederic Leopold von Stolberg 1 em seu primeiro visita a
ela, foi a de sua inocê ncia angelical.
Um resultado dessa pureza foi que Anne Catherine conservou até a
morte a simplicidade ingê nua de uma criança humilde e inocente que
nada sabe de si mesma ou do mundo, porque sua vida estava
totalmente absorvida em Deus. Essa simplicidade era tã o agradá vel a
Ele que nos é mostrada como o im das maravilhosas operaçõ es da
graça operadas em sua alma. Seu Esposo Divino sempre a tratou como
uma criança e, em Sua sabedoria, ordenou que, na plena luz do
conhecimento sobrenatural que inundava sua alma, ela sempre fosse a
aluna dó cil. Com o heroı́smo que suspirava continuamente apó s novas
lutas, ela evidenciava a mais atraente timidez; em uma palavra, sua
grande e á rdua missã o na vida a encontrou - em sua realizaçã o como
em seu inı́cio - uma criança encolhida e ingê nua. Com os olhos ainda
lacrimejantes, ela recuperaria num instante a alegria daquela é poca que
nã o conhece a dor porque nã o conhece o pecado, assim que um raio de
consolaçã o mitigasse os tormentos que como ondas furiosas se
desencadeavam contra ela. Esses raios de sol eram muitas vezes
imagens de sua pró pria infâ ncia apresentadas à sua alma pelo Deus de
toda bondade. Entã o ela voltou a ser uma criancinha, uma pequena
camponesa na casa de seu pai, alegre e amorosa. Ela extraiu da visã o
nova energia e fortaleza para avançar no caminho da Cruz, a cada passo
mais ı́ngreme e acidentado.
Embora o dom da pureza tenha sido concedido a Ana Catarina no
batismo, ainda assim ela teve que comprar sua posse por morti icaçã o e
penitê ncia; e, como sua preservaçã o e aumento exigiam uma luta
implacá vel contra o eu, a prá tica do sofrimento paciente era o exercı́cio
que ela estava destinada a realizar ainda no primeiro ano de sua vida.
“Lembro-me”, disse ela, “de uma forte queda que sofri no meu primeiro
ano. Minha mã e tinha ido a Coesfeld para a Igreja; mas sentindo que
algo havia acontecido comigo, ela voltou com grande pressa e
ansiedade. Um dos meus membros teve que ser esticado e enfaixado
com tanta força que icou bastante encolhido. Fiquei muito tempo sem
conseguir andar. Nã o era até o terceiro ano que iquei curado”.
A recordaçã o deste acidente, bem como algumas das consequê ncias do
mesmo, Anne Catherine preservou toda a sua vida, o que prova o quã o
perfeito deve ter sido o seu desenvolvimento mental no momento em
que aconteceu. Guiada como ela foi por seu anjo-guardiã o, podemos
presumir que era com ela como com Maria Bagnesi a quem ela se
assemelhava em muitos detalhes. També m Maria, ainda uma criança
tenra, começou sua tarefa de sofrimento suportando os desejos da
fome. Con iada a uma enfermeira sem princı́pios, que nã o lhe dava nem
leite nem outro alimento, a pobre criança era muitas vezes vista
pegando com seus dedos minú sculos as migalhas escassas que caı́am
no chã o. Ela entã o lançou as bases para aquela vida de maravilhosa
morti icaçã o e sofrimento que a tornou, como nossa pró pria criança,
uma fonte de bê nçã o para inú meras almas.
Assim que foi capaz de recusar uma grati icaçã o, impor uma penitê ncia
ou obter uma vitó ria sobre si mesma, Ana Catarina começou a se
exercitar tanto quanto sua idade permitia, seguindo a direçã o infalı́vel
de seu anjo com surpreendente prudê ncia. e constâ ncia. Ela pendurou
em um canto um quadro da Virgem e do Menino Jesus, e colocou diante
dele um bloco de madeira para um altar. Sobre ela depositava as
ninharias que lhe davam de vez em quando, aquelas pequenas coisas
que fazem as crianças tã o felizes. Ela acreditava irmemente que esses
pequenos sacrifı́cios eram muito agradá veis ao Santo Menino e
renunciou com alegria em Seu favor a todos os presentes que recebeu.
Ela o fez tã o simples e silenciosamente que, nã o vendo nada a observar
nessas açõ es aparentemente infantis, ningué m jamais interferiu em
seus pequenos arranjos. Como suas oferendas frequentemente
desapareciam, ela tinha a feliz certeza de que o Menino Jesus as havia,
de fato, tomado para si. Quanto mais seu sacrifı́cio lhe custava, maior
era sua alegria nessas ocasiõ es; pois com todos os seus maravilhosos
dons de graça, ela ainda era uma criança capaz, como outras de sua
idade, de ser tentada com frutas, bolos, etc. Flores, quadros, itas,
coroas, ané is, brinquedos e coisas de valor em os olhos de uma criança,
tudo tinha que seja imolado para o santo arrebatamento de seu
coraçã o.
Por tais prá ticas de morti icaçã o sua pureza de alma aumentou tanto
que, em seu terceiro ano, ela ofereceu a Deus esta oraçã o fervorosa:
“Ah! querido Senhor, deixe-me morrer agora, pois quando as crianças
crescem, elas te ofendem com grandes pecados!”
E ela saiu da casa de seu pai, ela exclamou sinceramente:
“Antes, deixe-me cair morto neste limiar do que viver para ofender meu
Deus!”
Quando ela cresceu e começou a se relacionar com crianças de sua
idade, ela lhes deu, pelo amor de Deus, tudo o que podia dispor; e, se ela
mostrasse preferê ncia, era pelos mais pobres. Ela pró pria ilha de pais
necessitados, ela era generosa em seus dons. Ela nã o havia completado
o quarto ano quando estava acostumada a se negar nas refeiçõ es,
pegando o pior de tudo e comendo com tanta parcimô nia que sua
famı́lia se perguntava como ela vivia.
“Dou isto a Ti, ó Deus”, disse ela em seu coraçã o, “para que Tu possas
reparti-lo entre aquelas pobres almas que mais precisam dele”.
Os pobres, os sofredores, apoderaram-se tã o fortemente de seus afetos
que suas primeiras dores na vida surgiram de sua grande compaixã o
por eles. Se ela ouviu falar de algum infortú nio, ela icou tã o
emocionada que caiu como algué m prestes a desmaiar. As perguntas
ansiosas de seus pais sobre a causa de sua estranha emoçã o a
trouxeram de volta a si mesma; mas o desejo de socorrer o pró ximo
tornou-se tã o ardente que ela se ofereceu a Deus, implorando-Lhe
fervorosamente que lhe impusesse as misé rias dos outros. Se um
mendigo passava, ela corria atrá s dele, gritando: “Espere, espere, vou
correr para casa e pegar um pedaço de pã o para você ”. E sua boa mã e
nunca lhe recusou uma esmola para os pobres. Ela até doou suas
pró prias roupas. Certa vez, ela implorou com tanta seriedade que
obteve permissã o para entregar sua ú nica roupa de baixo restante a
uma criança pobre.
Ela nã o podia ver uma criança chorando ou doente sem implorar para
sofrer em seu lugar, e sua petiçã o sempre foi ouvida; ela suportou a dor,
e viu o pequeno sofredor aliviado. Sua oraçã o nessas ocasiõ es era
assim: “Se um pobre mendigo nã o pede, ele nã o recebe. E tu, ó meu
bom Deus, nã o ajudas aquele que nã o reza e ainda nã o quer sofrer!
Veja, eu clamo a Ti por aqueles que nã o fazem isso por si mesmos!”
Se ela sabia de uma criança que cometeu faltas, ela orava por isso; e
para garantir ser ouvida, ela se impô s alguma puniçã o. Anos depois,
quando lhe perguntaram como é que em tã o tenra idade pensara em
tais coisas, ela respondeu:
“Nã o posso dizer quem me ensinou. A pena o motivou. Sempre senti
que somos um só corpo em Jesus Cristo, e a dor do meu pró ximo é tã o
sensı́vel para mim como se estivesse em um de meus pró prios dedos.
Sempre pedi o sofrimento dos outros. Eu sabia que Deus nunca envia
a liçã o sem um desı́gnio; deve haver alguma dı́vida a ser paga por ela. E
se essas a liçõ es à s vezes pesam tanto sobre nó s, é porque, como
raciocinei comigo mesmo, ningué m está disposto a ajudar o pobre
sofredor a pagar sua dı́vida. Entã o eu implorei para ser autorizado a
fazê -lo. Eu costumava pedir ao Menino Jesus que me ajudasse e logo
consegui o que queria”.
“Lembro-me”, disse ela em outra ocasiã o, “que minha mã e tinha
erisipela no rosto. Ela estava deitada na cama, com o rosto todo
inchado. Eu estava sozinho com ela e muito angustiado ao vê -la em tal
estado. Ajoelhei-me em um canto e rezei com todo o meu coraçã o.
Entã o amarrei um pedaço de linho em volta de sua cabeça e rezei
novamente. Logo senti uma dor de dente intensa e meu rosto começou
a inchar. Quando meu pai e meus irmã os voltaram para casa,
encontraram minha mã e inteiramente aliviada, e eu també m logo
melhorei.”
“Alguns anos depois, voltei a suportar dores intolerá veis. Meus pais
estavam ambos muito doentes. Ajoelhei-me ao lado da cama deles perto
do tear e invoquei o Deus Todo-Poderoso; entã o vi minhas mã os unidas
sobre eles e ainda orando, fui impelido a impô -los sobre eles para que
fossem curados”.
Se ela ouvia o pecado mencionado ou o via cometido, ela começava a
chorar. Quando questionada por seus pais, ela poderia dar nenhuma
razã o satisfató ria para sua dor; consequentemente, ela foi muitas vezes
repreendida por seu comportamento irresponsá vel. Isso, no entanto,
nã o esfriou o ardor de seu coraçã o amoroso; ela ainda continuou a
rezar e fazer penitê ncia por seu querido pró ximo. Um dia, em seu
quarto ano, ela estava ao lado do berço de uma criança doente, sua mã e
ao seu lado. O pai, em um acesso de raiva bê bada, atirou na esposa um
machado que teria fendido o crâ nio da criança, se Anne Catherine nã o
tivesse habilmente interceptado o golpe, o machado roçando sua
pró pria cabeça ao atingir o berço. A criança foi salva, e as terrı́veis
consequê ncias do ato furioso prevenidas.
Em outra ocasiã o, Anne Catherine viu algumas crianças violando a
modé stia em seus esportes. Ela foi picada até o sabugo e se jogou entre
as urtigas, implorando a Deus que aceitasse aquele ato em expiaçã o.
Ela se compadeceu profundamente dos judeus.
“Quando eu era uma garotinha”, ela disse, “meu pai muitas vezes me
levava com ele para Coesfeld para fazer suas compras na loja de um
judeu. O pobre homem sempre me encheu de compaixã o. O
pensamento dessa raça endurecida, tã o obstinada em rejeitar a
salvaçã o, muitas vezes trouxe lá grimas aos meus olhos. Ah! quanto eles
sã o dignos de pena! Eles nã o tê m idé ia dos judeus sagrados dos tempos
antigos, como eu vejo. Os judeus de hoje sã o descendentes dos fariseus.
Sua misé ria e cegueira sempre me entristeceram; no entanto, muitas
vezes tenho notado que se pode falar muito bem com eles de Deus.
Pobres, pobres judeus! Eles uma vez tiveram entre eles o germe vivo da
salvaçã o, mas nã o reconheceram o fruto; eles o rejeitaram, e agora nem
mesmo o buscam”.
Mas a mais surpreendente de todas as morti icaçõ es de Anne Catherine
foi a prá tica da oraçã o noturna, iniciada na infâ ncia e nunca mais
omitida. Ela começou a partir de seu quarto ano a reduzir suas horas de
sono para devotá -las à oraçã o. Quando a famı́lia foi enterrada no sono,
ela se levantou de sua pequena cama e orou com seu anjo duas ou trê s
horas consecutivas, à s vezes até de manhã . Ela adorava rezar ao ar livre.
Quando o tempo permitido, ela costumava escapar para uma pequena
colina em frente à casa. Ali ela se sentiu mais pró xima de Deus, e ali se
ajoelhou em oraçã o, com os braços estendidos, os olhos voltados para a
igreja em Coesfeld. Nã o podemos supor que a criança teria
empreendido tal prá tica a nã o ser por inspiraçã o de seu anjo guardiã o e
de acordo com os desı́gnios de Deus Todo-Poderoso que, desejando ser
glori icado pela oraçã o de uma criatura tã o pura, concedeu-lhe a força
necessá ria. Nã o devemos, no entanto, imaginar que, em razã o dos
auxı́lios especiais da graça concedidos a ela, a prá tica fosse fá cil e, por
assim dizer, auto-sustentá vel. De jeito nenhum! Foi bem ao contrá rio. E
uma caracterı́stica peculiar de tais almas serem obrigadas a adquirir
pouco a pouco a perfeiçã o a que sã o chamadas, por uma cooperaçã o iel
com a graça e uma luta perpé tua contra a fraqueza da natureza. Em
virtude desta lei, Deus Todo-Poderoso permitiu que este ú ltimo
diariamente reivindicasse seus direitos sobre Anne Catherine; seu
corpo delicado exigia imperiosamente o repouso indispensá vel ao
crescimento e à força. Mas a menina heroica obedeceu prontamente ao
chamado do anjo para a oraçã o, apesar do encolhimento involuntá rio
da natureza, apesar das lá grimas quentes que escorriam de seus olhos.
Ela até teve a coragem de inventar meios para facilitar seu despertar a
qualquer hora da noite. Ela nã o encontrou nada mais e iciente do que
as lascas a iadas e cordas duras espalhadas em sua cama
propositalmente para deixá -la desconfortá vel, alé m do que ela amarrou
sua cintura com laços trançados por ela mesma. Foi de um aumento de
sofrimento voluntá rio que ela extraiu aquela força que a natureza nã o
podia fornecer. Deus recompensou seus esforços generosos. Aos
poucos, ela chegou a um estado em que pô de negar descanso ao seu
corpo cansado e, até o ú ltimo momento de sua vida, serviu ao seu
Senhor, de dia e de noite, sem descanso ou intervalo.
Muitos icarã o, talvez, mais surpresos com o fato de uma criança ser
capaz de prolongar sua oraçã o duas ou trê s horas consecutivas, na
tenra idade de quatro anos, do que mesmo com seu poder de privar-se
do sono. Eles vã o perguntar: “O que, entã o, foi o assunto desta oraçã o
prolongada?” O assunto era tã o variado quanto os objetos pelos quais
Deus desejava que as petiçõ es da criança fossem oferecidas. Ela foi
mostrada em uma visã o todos os dias a tarefa a ser cumprida pela
oraçã o. Em uma sé rie de quadros ela viu as misé rias corporais e
espirituais que ela deveria evitar. Ela viu os doentes impacientes, os
cativos desanimados, os moribundos despreparados; ela viu viajantes
vagando ou naufragando; ela viu seus semelhantes em a liçã o e
desespero, tremendo à beira do abismo; e, alé m disso, ela viu que Deus
Todo-Poderoso em Sua misericó rdia estava pronto para dar-lhes a seu
pedido ajuda, consolo, salvaçã o. Ela entendeu que, se negligenciasse a
penitê ncia e a sú plica, essas almas em tã o grande necessidade
pereceriam por falta de assistê ncia. Seu anjo a sustentou em sua oraçã o,
e seu amor ardente pelo pró ximo a tornou tã o con iante, tã o eloquente,
tã o perseverante em suas petiçõ es que as horas pareciam mais curtas
do que longas.
Com a eclosã o da Revoluçã o Francesa, suas visõ es tornaram-se
especialmente variadas e assustadoras. Ela foi levada em espı́rito para a
prisã o de Maria Antonieta, Rainha da França, e disse para implorar
força e consolo para ela. A impressã o que ela guardou dessa visita foi
tã o forte que ela relatou à sua famı́lia a angú stia da rainha e implorou a
todos que rezassem pela infeliz dama. Mas seus amigos, como se
poderia supor, nã o conseguiam entendê -la. Eles pensaram que ela
estava sonhando e lhe disseram claramente que uma pessoa que
pudesse estar em dois lugares diferentes ao mesmo tempo ou que
pudesse ver tudo o que está acontecendo à distâ ncia nã o poderia ser
outra senã o uma bruxa. Anne Catherine icou tã o chocada com essa
informaçã o que correu para a Con issã o para recuperar a paz de
espı́rito. Ela també m assistiu a muitas execuçõ es – ajudou e consolou as
pobres vı́timas com suas oraçõ es. Assim esteve presente na execuçã o
do desafortunado monarca Luı́s XVI.
“Quando vi o rei e muitas outras vı́timas nobres encontrando a morte
com tanta calma e resignaçã o, disse a mim mesmo. Ah! é bom que
sejam tirados do meio de tais abominaçõ es. Mas quando eu mencionei
o que tinha visto para meus pais, eles pensaram que eu tinha perdido
meus sentidos. Muitas vezes me ajoelhei e com lá grimas implorei a
Deus que salvasse tal ou tal pessoa. Vi entã o que os perigos, iminentes
ou ainda remotos, podem ser evitados pela oraçã o da fé ”.
Alguns anos depois, quando Anne Catherine foi chamada a prestar a
Dean Overberg, seu diretor, um relato da oraçã o de sua infâ ncia, ela
disse:
“Sempre rezei menos por mim do que pelos outros, para que nã o
pecassem, nã o se perdessem. Nã o havia nada que eu nã o pedisse a
Deus, e quanto mais eu obtinha, mais eu pedia. Eu nunca tive o
su iciente. Eu disse a mim mesmo com con iança: Todas as coisas
pertencem a Deus, e nada Lhe agrada tanto quanto me ver implorar por
algo com todo o meu coraçã o”.
Dean Overberg nos diz que pureza de coraçã o essa criança maravilhosa
alcançou por tais prá ticas. Ele diz: “Desde seu sexto ano, Anne
Catherine nã o conheceu outras alegrias alé m daquelas que ela
encontrou em Deus, nenhuma outra tristeza alé m daquelas que
perfuravam seu coraçã o ao pensar que Ele era ultrajado pelos homens.
Quando ela começou a praticar a morti icaçã o dos sentidos, o amor de
Deus se acendeu em seu coraçã o com tanta intensidade que ela muitas
vezes gritava no meio de sua oraçã o: 'Se nã o houvesse cé u, purgató rio,
inferno, eu ainda amaria A ti, ó meu Deus, de todo o meu coraçã o e
alma!' ”
Os pobres sofredores do Purgató rio compartilhavam em grande parte
de suas esmolas espirituais, e muitas vezes apareciam para ela,
alegando sua piedade. Mesmo no inverno, ela se levantava à noite e saı́a
na neve para rezar com os braços estendidos por seu alı́vio, até
congelar e endurecer de frio. As vezes ela se ajoelhava sobre um bloco
triangular de madeira cuja ponta a iada cortava profundamente seus
joelhos; ou, ainda, ela forçou seu caminho atravé s de urtigas para
disciplinar sua carne inocente, para que a penitê ncia pudesse dar
e icá cia à sua oraçã o. Em troca de sua caridade, muitas vezes ela tinha o
consolo de receber os agradecimentos das almas que havia entregue.
“Quando eu era criança”, diz ela, “fui levada por uma pessoa
desconhecida para um lugar que parecia ser Purgató rio. Vi multidõ es
de almas em tormentos excruciantes que imploravam fervorosamente
por oraçõ es. Achei que estava em um abismo profundo. Eu vi um
grande e amplo espaço, assustador, lamentá vel de se ver. Nela estavam
as pobres almas, silenciosas e a litas, mas nã o sem alegria e esperança
na misericó rdia de Deus. Nã o vi fogo, mas senti que as almas estavam
atormentadas pelos mais intensos sofrimentos interiores.”
“Enquanto orava por eles, muitas vezes ouvia vozes ao meu redor,
dizendo: 'Obrigado! obrigada!' Certa vez, a caminho da igreja, perdi
uma bolsinha que minha mã e me deu. Eu estava muito preocupado com
meu descuido, e esqueci naquela noite de oferecer meus costumeiros
sufrá gios para as almas queridas. Eu tive que ir ao galpã o buscar lenha
e, enquanto caminhava, uma igura branca coberta de manchas pretas
apareceu diante de mim, dizendo: 'Você está me esquecendo!' Fiquei
muito assustado e comecei logo a fazer algumas oraçõ es. No dia
seguinte, orei muito e encontrei minha bolsa na neve.
“Quando cresci, costumava ir muito cedo de manhã para ouvir a missa
em Coesfeld. Escolhi sempre um caminho solitá rio, para rezar sem
distraçã o pelas almas sofredoras. Quando ainda estava escuro, eu
costumava vê -los lutuando diante de mim dois a dois, como faı́scas de
fogo em uma chama baça. O caminho estava iluminado diante de mim e
eu me alegrei com a presença deles, pois eu os conhecia e os amava.
Muitas vezes eles vinham à noite para pedir ajuda em suas dores.”
Capítulo 3
A NNE C ATHERINE E L IDA PELO CAMINHO DAS VISOES _ _
_
QUANDO a pequena Anne Catherine começou a falar, as maravilhas
reveladas pela luz infundida em sua alma logo se tornaram
conhecidas por todos ao redor. A recreaçã o favorita de seu pai,
C sentado ao lado do fogo depois de seu dia de labuta, era pegar sua
ilhinha no colo e ouvir as coisas maravilhosas que ela contava a seu
pedido. “Anna Kathrinchen”, ele dizia, “agora aqui estamos! agora me
diga uma coisa!” 1 Entã o ela lhe descrevia as imagens que lhe eram
mostradas do Antigo Testamento, até que o bom homem exclamava,
com lá grimas nos olhos: “Mas, ilho, onde você conseguiu tudo isso?” 2
E o pequenino respondia com sinceridade: “Pai, é tudo verdade! Foi
assim que eu vi!” Ao que o pai atô nito icava em silê ncio e se abstinha
de fazer mais perguntas.
Nenhum momento especial foi escolhido para a revelaçã o dessas
imagens diante dos olhos de sua alma - todas as horas do dia, todas as
ocupaçõ es eram as mesmas. Anne Catherine achava que todos tinham
visõ es, assim como ela mesma; consequentemente, ela costumava falar
deles com bastante liberdade. Mas quando seus amiguinhos a
contradiziam ou a ridicularizavam sobre o assunto, ela icava pensativa
e silenciosa. Certa vez aconteceu que um eremita, que queria
impressionar seus ouvintes com a crença de que havia estado em Roma
e Jerusalé m, falou do Lugares Santos, mas de uma maneira totalmente
incorreta. Anne Catherine, que estava ouvindo silenciosamente ao lado
de seus pais, nã o pô de conter sua indignaçã o por muito tempo. Ela
ousadamente culpou o homem com falsidade, descrevendo ela mesma
os Lugares Santos como se estivesse perfeitamente familiarizada com
eles, até que seus pais veri icaram sua vivacidade e ela icou em
silê ncio.
Anne Catherine foi para a escola da aldeia ensinada por um velho
camponê s. Um dia ela descreveu a Ressurreiçã o de Nosso Senhor como
ela tinha visto em visã o, pela qual ela recebeu uma severa repreensã o e
uma liminar para nunca mais ceder a tais imaginaçõ es. Este tratamento
selou os lá bios da criança assustada, que desde entã o se absteve de
comunicar o que se passava em seu interior. Suas visõ es, no entanto,
nã o foram interrompidas. As verdades e os misté rios da santa fé , unidos
em grandes quadros histó ricos, passaram em nú mero ainda maior
diante dos olhos de sua alma; onde quer que ela estivesse, eles
formavam o assunto de sua contemplaçã o.
Os Doze Artigos do Credo Apostó lico foram apresentados a ela durante
o curso do ano eclesiá stico. Ela contemplou a criaçã o do Cé u, a queda
dos anjos, a criaçã o da terra e do Paraı́so; ela contemplou Adã o e Eva e
sua queda. Em sucessivas visõ es, ela acompanhou, atravé s dos tempos e
geraçõ es, o desenvolvimento dos santos misté rios da Encarnaçã o e da
Redençã o. As cenas da Histó ria Sagrada e os personagens do Antigo
Testamento eram mais conhecidos por ela do que os de sua pró pria
vida; e aqueles santos que, por sua relaçã o com a Sagrada Humanidade
de Jesus Cristo, parecem mais intimamente ligados com os ié is, foram
mostrados em visã o como se comunicando diretamente com ela. Entre
eles estavam as sagradas famı́lias de Joachim e Anne, de Zachary e
Elizabeth, com quem mantinha as relaçõ es mais familiares e afetuosas.
Com eles ela celebrou as festas do tempo da Promessa, fez
peregrinaçõ es a Jerusalé m e outros lugares santos, suspirava pela vinda
do Salvador, saudava Seu advento e O adorava em Seu nascimento.
O Templo de Jerusalé m, 3 o esplendor e a magni icê ncia do culto ali
oferecido ao Altı́ssimo, a Arca da Aliança e tudo o que ela continha, os
misté rios do Santo dos Santos, compreendidos por tã o poucos, o canto
dos salmos, as numerosas cerimô nias e observâ ncias do Old Law, todos
eram perfeitamente familiares para ela, mesmo em seus mı́nimos
detalhes. Ela compreendia, igualmente, os piedosos costumes e
tradiçõ es dos ié is israelitas no cumprimento da lei e no governo de
sua famı́lia.
Essas contemplaçõ es nã o eram para ela um espetá culo em vã o; ela
realmente viveu entre as cenas e se associou aos atores de mil anos
atrá s. Nisso ela se parecia com Santa Catarina de Sena, que també m
havia sido preparada por visõ es para o importante papel que ela
deveria desempenhar na histó ria da Igreja. Sua abstraçã o da alma das
coisas desta vida, seu recolhimento em Deus eram tã o grandes que
mesmo quando cercada pelo tumulto do mundo, no meio de papas e
prı́ncipes, ela era tã o inacessı́vel a qualquer distraçã o como se estivesse
no santuá rio de sua pró pria cela. Ela adquirira esse poder na escola dos
penitentes da Tebaida, a quem contemplou por muitos anos de uma
maneira tã o real que com eles tecia cestos e esteiras, cantava salmos,
jejuava, fazia penitê ncias, observava silê ncio; em uma palavra, praticou
com eles aquelas morti icaçõ es que a elevaram à perfeita uniã o com
Deus. Sã o Paulo, Santo Antô nio, Sã o Pacomius, Sã o Hilarion, foram seus
modelos e professores. Ela se comunicava tã o intimamente com eles
quanto Anne Catherine com Sã o Joaquim, Santa Ana e seus santos
predecessores.
Embora Ana Catarina celebrasse em espı́rito as festas da Lei Antiga
como se fossem realmente contemporâ neas a elas, ela era, ao mesmo
tempo, ilha de nossa santa fé cató lica; porque nestas iguras e
misté rios profé ticos contemplou o seu cumprimento, vendo neles tanto
a sua celebraçã o real como os acontecimentos histó ricos que lhes
deram origem. A sua maravilhosa intuiçã o abarcava todo o plano da
Redençã o. Essas foram as visõ es de seus primeiros anos; foram
sucedidos por outros, nã o menos abrangentes, sobre a vida de nosso
Santo Redentor. Esta ordem estava em conformidade com a tarefa
imposta a ela. Ela foi chamada a sofrer pela Fé numa é poca em que os
homens, em sua insensata malı́cia, questionavam até a possibilidade da
Revelaçã o Divina, negavam o misté rio da Encarnaçã o e da Redençã o e
blasfemavam dos profetas, dos Apó stolos e dos santos com diabó lica
raiva; uma é poca em que os inimigos de Deus ganhavam diariamente
novos recrutas, mesmo nas ileiras do sacerdó cio. Foi nessa é poca
terrı́vel que Deus deu a Ana Catarina um conhecimento completo e
claro das verdades da religiã o. Ele a chamou para dar testemunho do
cumprimento de Seus decretos eternos, e a pureza e o amor ardente de
seu coraçã o O indenizaram em algum grau pelos ultrajes oferecidos à
Sua misericó rdia.
Nosso pró prio Salvador se dignou ser seu guia atravé s do imenso
cı́rculo de visõ es que lhe foi concedido, e comunicou-lhe a luz para
compreender Seus misté rios ocultos. Com Ele ela visitou os lugares
santi icados por Sua presença, e aprendeu de Seus pró prios lá bios os
misté rios ali encenados para a salvaçã o da humanidade caı́da. Sua
assistê ncia infalı́vel deu-lhe forças para sustentar a in inita variedade
de suas visõ es e manter sua vida interior e contemplativa em harmonia
com o exterior. Durante dias inteiros ela icou perdida em
contemplaçã o, sua alma perfeitamente abstraı́da das coisas dos
sentidos; mas, apesar disso, os deveres impostos a ela por seus pais
foram cumpridos com tanta presteza e cuidado, como se ela nã o tivesse
pensado alé m. Era apropriado que nenhum assunto exterior
perturbasse sua contemplaçã o; portanto, Deus concedeu-lhe a
maravilhosa aptidã o para o trabalho manual e os deveres domé sticos.
Assim que abria um livro, podia ler seu conteú do; qualquer trabalho
que ela empreendesse, seja em casa ou no campo, era
instantaneamente bem-sucedido; parecia que seu pró prio toque
transmitia uma bê nçã o até mesmo a coisas inanimadas. Seus amigos
estavam tã o acostumados a que ela participasse dos trabalhos mais
penosos e os realizasse bem, que respeitavam seu recolhimento interior
e nunca a intrometiam com perguntas inquisitivas.
A tarefa embaraçosa de prestar contas de suas visõ es ainda nã o havia
sido imposta a Anne Catherine; ela ainda nã o havia sido chamada a
con inar no estreito compasso da linguagem humana as riquezas
espirituais que lhe eram prodigalizadas. Ela mesma podia contemplá -
los apenas pela luz profé tica derramada sobre sua alma; ela nã o os via
sob uma forma capaz de ser vestida de palavras. Embora a dor e o
sofrimento fossem seus companheiros constantes, ainda assim nã o
podiam perturbar a profunda paz e a lembrança em que seus dias
passavam. Nos anos seguintes, ela muitas vezes suspirava pelo silê ncio
e solidã o de sua infâ ncia. Ela costumava dizer: “Quando eu era uma
garotinha, eu estava continuamente absorta em Deus. Desempenhei
todos os meus deveres sem interferir nessa abstraçã o. Eu estava
sempre em contemplaçã o. Trabalhando com meus pais nos campos, ou
envolvido em qualquer outro trabalho, fui, por assim dizer, elevado
acima da terra. As coisas exteriores eram como um sonho confuso e
doloroso, dentro de tudo havia luz e verdade celestiais.”
Nosso Senhor se dignou ser seu mestre nã o só nas regiõ es de
contemplaçã o, mas també m na prá tica da piedade. Ele brincou com ela
como uma criancinha para que pudesse levá -la passo a passo à
perfeiçã o, à mais alta conformidade consigo mesmo. As vezes Ele
aparecia para ela como uma criança de sua idade, uma cruz sobre Seus
ombros. Ele icava de pé e olhava para ela em silê ncio até que ela, por
sua vez, pegasse um pesado tronco de madeira e o carregasse atrá s dele
o mais longe que pudesse, orando o tempo todo; ou ainda, ela O viu em
lá grimas pelo tratamento que Ele sofreu de crianças desobedientes, e
com essa visã o, ela se jogou entre as urtigas para consolá -lo com sua
pró pria penitê ncia. Quando ela fazia a Via Sacra, Ele costumava colocar
Sua pró pria cruz sobre os ombros dela. Quando ela mantinha as vacas
nos campos, o que ela fazia com apenas cinco anos de idade, Ele veio
até ela sob a aparê ncia de uma criança procurando seus pequenos
companheiros, ansiosos para compartilhar seus esportes e trabalhos.
Ele desejava, assim, ensiná -la por palavra e exemplo a voltar todas as
suas açõ es para Deus. Ele a dotou de inteligê ncia para agir somente
para Sua gló ria, e a ensinou a santi icar até mesmo seus pequenos
divertimentos.
Em conexã o com este assunto, ela costumava relatar alguns pequenos
incidentes muito agradá veis.
“Quando eu era criança”, ela disse, “o Garotinho costumava vir trabalhar
comigo. Aos seis anos, iz exatamente o que faço agora. Eu sabia,
embora nã o possa dizer como, que em breve teria um irmã ozinho e
queria fazer algo para minha mã e para a criança; mas eu nã o sabia
costurar. O Garotinho veio em meu auxı́lio e me mostrou como fazer
uma touca e outras coisas necessá rias para as crianças. Minha mã e
icou surpresa com minhas tentativas bem-sucedidas e fez uso dos
artigos com prazer.”
“Quando comecei a cuidar das vacas, o Garotinho costumava me
encontrar nos campos e arrumava as coisas de modo que minhas vacas
cuidavam bem de si mesmas. Entã o conversá vamos juntos sobre todo
tipo de coisas sagradas, que querı́amos servir a Deus e amar o Menino
Jesus, e que Deus vê todas as coisas. Esses encontros aconteciam com
frequê ncia, e nada me parecia impossı́vel quando estava com Ele.
Costurá vamos, confeccionamos gorros e meias para crianças pobres.
Eu podia fazer o que quisesse e tinha tudo o que era necessá rio para o
meu trabalho. Ocasionalmente algumas das freiras da 'Anunciaçã o da
Santı́ssima Virgem' 4 se juntaram a nó s. Havia uma coisa que me
intrigava: sempre pensei que eu mesmo estava conseguindo tudo,
enquanto na realidade era o Garotinho que estava fazendo tudo.”
A bê nçã o que emanava de tal relaçã o foi comunicada por Anne
Catherine a todos com quem ela entrou em contato; mas era
principalmente entre as crianças de sua idade que ela praticava os
ensinamentos que recebera. Falou-lhes com tanto encanto da presença
de Deus, do Menino Jesus e do seu anjo-guardiã o, que os pequeninos
ouviram com prazer. Quando ela foi com eles recolher restolho ao longo
das estradas, ela os organizou em procissã o, lembrando-os de seus
santos anjos que també m estavam presentes.
“Devemos”, disse ela, “imitar os bem-aventurados no cé u. Nã o devemos
fazer nada de mal por nó s mesmos e, quando pudermos, devemos
impedir que outros o façam. Se, por exemplo, nos deparamos com
armadilhas ou redes colocadas por meninos ociosos para pegar lebres
ou pá ssaros, devemos removê -los, para que esses pequenos furtos
possam ser evitados. Devemos começar, pouco a pouco, a levar uma
nova vida, uma vida do Cé u na terra”.
Se ela brincava na areia com outras crianças, suas mã os habilidosas a
empilhavam imitando os Lugares Santos de Jerusalé m, como ela tinha
visto em suas visõ es. Ela depois disse em alusã o a isso: “Se eu tivesse
algué m para me ajudar, poderia ter feito modelos da maioria das
estradas e lugares da Terra Santa. Eles estavam sempre diante dos
meus olhos; nenhuma localidade me era mais conhecida. Ao brincar
com meus companheiros na areia ú mida, eu costumava construir um
Monte Calvá rio, fazer um jardim e cavar um sepulcro nele; entã o formei
um riacho com uma ponte sobre ele e casas de cada lado. Lembro-me
de como juntei as casas quadradas e cortei com uma lasca aberturas de
aparê ncia estranha para as janelas. Uma vez eu estava prestes a fazer
iguras para representar nosso Salvador, a Mã e Santı́ssima ao pé da
Cruz, e os dois ladrõ es, mas desisti da ideia por ser irreverente. Um dia,
duas crianças e eu está vamos brincando nos campos. Querı́amos uma
cruz para a capelinha de barro que construı́mos, para rezar diante dela,
mas nã o sabı́amos onde conseguir 1. Por im, gritei: 'Eu sei, eu sei!
Vamos fazer um de madeira e depois pressioná -lo no barro macio até
deixar uma marca profunda. Posso arranjar uma velha tampa de
estanho que temos em casa. Vamos derretê -lo, despejá -lo na marca e,
quando esfriar, teremos uma bela cruz. Corri até a casa para pegar a
tampa e fogo para derreter. Mas quando está vamos prontos para
começar nosso trabalho, minha mã e apareceu e eu fui punido.”
Sã o Joã o Batista també m compartilhava dos divertimentos inocentes de
Ana Catarina, aparecendo-lhe como uma criança tal como era quando
morava no deserto sob a guarda dos anjos, criaturas irracionais seus
ú nicos companheiros. Quando ela saı́a com as vacas, costumava chamá -
lo: “Vem, Joã ozinho! Eu quero o pequeno John em sua pele de carneiro”,
e ele veio imediatamente para fazer companhia à criança. Sua vida no
deserto foi mostrada a ela em visõ es detalhadas, e ele a ensinou a
imitar aquela pureza e simplicidade inefá veis que o tornaram tã o
agradá vel a Deus. Enquanto celebrava com ele as maravilhas de seu
nascimento, ela foi conduzida à casa paterna e apresentada ao amplo
cı́rculo de seus parentes. Ela os conhecia bem; ela se sentia mais em
casa entre eles do que na casa de seu pai.
Até que ponto essa relaçã o misteriosa com os personagens da Histó ria
Sagrada estava entrelaçada com a vida externa da criança, podemos
depreender de suas pró prias palavras. Quando, pouco antes de sua
morte, ela relatou suas visõ es sobre a vida de Nosso Senhor, ela deu o
seguinte relato do que se passava dentro dela a respeito delas:
“A cada Advento, desde a minha infâ ncia, acompanhei Sã o José e a
Santı́ssima Virgem de Nazaré a Belé m. A solicitude que senti pela santa
Mã e de Deus e a minha participaçã o em todas as di iculdades da viagem
foram tã o reais para mim como qualquer outro incidente da minha
vida. Interessei-me muito mais por tudo isso, fui mais afetado por isso
do que poderia ser por qualquer coisa que pudesse acontecer comigo;
pois Maria era a Mã e de meu Senhor e meu Deus; ela carregou em seu
ventre a minha salvaçã o. As festas da Igreja eram para me nã o apenas
comemoraçõ es simples ou assuntos de consideraçã o atenta; minha
alma realmente participava deles, como se os misté rios que eles
celebravam estivessem sob meus olhos. Eu os vi, eu os senti, como se
estivessem presentes diante de mim.”
Uma intuiçã o tã o viva nã o poderia icar adormecida em sua alma; sua
in luê ncia marcava cada açã o dela. Cheia de terno amor por Maria, ela
fez com avidez infantil tudo o que teria feito se realmente tivesse vivido
com a Sagrada Famı́lia; por exemplo, se ela viu Maria e José viajando
para Belé m, ela se uniu a eles em espı́rito; se ela saı́a para rezar à noite,
esperava Maria no caminho e se privava de comida para ter algo a
oferecer aos santos viajantes cansados da longa jornada. Ela descansou
na terra nua, para que sua pequena cama icasse livre para a Mã e de
Deus; correu para a estrada ao seu encontro, ou a esperou em oraçã o
debaixo de uma á rvore, porque sabia que Maria descansaria à sua
sombra. Na vé spera de Natal ela teve uma percepçã o tã o distinta da
chegada da Santı́ssima Virgem na gruta de Belé m, que acendeu um fogo
para aquecê -la e permitir que ela preparasse alguma comida. Tudo o
que ela tinha de dispor, ela mantinha em prontidã o para oferecer à Mã e
Divina.
“Deus Todo-Poderoso”, disse ela um dia, “deve ter icado satisfeito com
esta boa vontade de uma criança, pois, desde minha infâ ncia até o
presente, Ele me mostrou todos os anos durante o Advento todas as
circunstâ ncias de Sua vinda, e sempre do mesmo jeito. Estou sempre
sentado em um cantinho de onde posso ver tudo. Quando criança eu
era livre e irrestrito com Ele; mas, quando me tornei religioso, era
muito mais tı́mido e reservado. A meu pedido, a Santı́ssima Virgem
muitas vezes colocou o Menino Jesus em meus braços”.
Essas relaçõ es ternas e ı́ntimas com Deus e seus santos despertaram no
coraçã o da criança um desejo, ou melhor, uma sede insaciá vel de pureza
e penitê ncia que só o sofrimento poderia aliviar. As visõ es que nutriram
sua alma maravilhosamente aumentaram sua percepçã o
requintadamente delicada de tudo o que é puro e santo, e a encheram
de horror ao pecado e tudo que leva a isso. Esse instinto era um guia
infalı́vel no qual ela podia con iar tã o infalivelmente quanto em seu
anjo-guardiã o. Cresceu em delicadeza e poder na proporçã o de sua
idelidade em seguir o impulso do Espı́rito Santo, exortando-a a vigiar
escrupulosamente seus sentidos e consciê ncia em virtude das
abundantes graças que enriqueceram sua alma. Antes que a corrupçã o
do mundo pudesse manchar sua visã o, seus olhos contemplaram em
visã o os esplendores da graça santi icante e da inocê ncia existentes no
paraı́so. Ela conhecia o valor in inito dos mé ritos do Redentor, que se
dignou a restaurar o homem caı́do à sua pureza imaculada, antes
mesmo que ele estivesse consciente dos perigos que ameaçavam sua
alma. Seu amor pela pureza era como um fogo consumidor; destruiu
tudo o que pudesse manchar sua alma antes que tivesse o poder de
tocá -la. Seu diretor, Dean Overberg, presta o seguinte testemunho:
“Anne Catherine nunca experimentou um movimento de sensualidade,
nunca teve que se acusar de um pensamento contra a pureza sagrada.
Quando questionada sobre esta perfeita isençã o de toda tentaçã o ao
vı́cio oposto, ela respondeu em obediê ncia que lhe fora mostrado em
uma visã o que sua natureza a teria inclinado a isso; mas que, devido à
sua morti icaçã o precoce, seus esforços para reprimir seus desejos e
superar todas as outras inclinaçõ es viciosas, ela havia erradicado essas
má s propensõ es antes mesmo que elas se izessem sentir.
Esse instinto infalı́vel se manifestou em sua infâ ncia de maneira
singularmente tocante, como pode ser observado na seguinte
comunicaçã o feita ao relatar suas visõ es do paraı́so:
“Lembro que quando eu tinha cerca de quatro anos, meus pais me
levaram um dia à igreja, onde eu tinha certeza de que veria Deus e
conheceria pessoas muito diferentes de todas as que eu conhecia. Achei
que seriam muito mais bonitas, na verdade bastante resplandecentes.
Olhei ao redor da igreja quando entrei, mas nã o vi nada do que eu havia
imaginado para mim mesma. 'O padre lá no altar', disse a mim mesmo,
'pode, talvez, seja Deus, mas onde está a Santı́ssima Virgem Maria?' Eu
també m esperava que toda a corte celestial estivesse presente; mas
infelizmente! Fiquei decepcionado. Depois de um tempo, vi duas
mulheres de aparê ncia piedosa, que usavam contas e pareciam mais
devotas que suas vizinhas. Achei que talvez fossem aqueles que eu
procurava; mas nã o, eles nã o eram. Eu costumava pensar que Mary
usava uma tú nica branca, um manto azul-celeste e um vé u branco. Eu
tinha tido antes disso a visã o do paraı́so, entã o eu agora olhei atravé s
da igreja para Adã o e Eva, esperando vê -los tã o bonitos quanto eram
antes de sua queda; mas també m desapontado com isso, disse a mim
mesmo: 'Espere até que você tenha se confessado, entã o você vai
encontrá -los.' Mas infelizmente! mesmo assim nã o os encontrei. Eu vi
uma famı́lia nobre e piedosa na igreja, as ilhas todas de branco. Senti
que eles chegaram um pouco mais perto daqueles que eu procurava, e
concebi um grande respeito por eles. Mesmo assim nã o iquei satisfeito.
Senti que o que eu tinha visto tã o bonito agora estava manchado e
deformado. Fiquei tã o tomado por esses pensamentos que esqueci de
comer. Muitas vezes ouvi meus pais dizerem: 'Qual é o problema com a
criança? O que aconteceu com a pequena Anne Catherine? As vezes,
també m, eu reclamava com Deus Todo-Poderoso que Ele havia feito tal
ou tal coisa. Eu nã o conseguia entender como Ele, que é todo poderoso,
pô de permitir que o pecado entrasse no mundo; e a duraçã o in inita
dos tormentos do Inferno me pareceu incompatı́vel com Seu atributo de
misericó rdia. Entã o fui instruı́do em visõ es sobre a in inita bondade e
justiça de Deus, e logo me convenci de que, se as coisas estivessem de
acordo com minhas idé ias, elas seriam muito miserá veis”.
Depois do que vimos até agora da pequena Ana Catarina, podemos
legitimamente aplicar a ela as palavras do Prof. Sebastiã o de Perouse,
ao falar do Beato Columba di Rieti:
“Esta criança nasceu para uma vida elevada acima dos sentidos; ela
devia ser liquefeita no fogo da caridade, in lamada pelo amor de Deus e
do pró ximo. Ela estava tã o bem fundamentada em sua santa vocaçã o
que nã o podia ser desconcertada pelas insinuaçõ es do maligno,
perturbada por soberba, nem atacado pelo aguilhã o da carne”. E como,
de fato, poderia a alma de Anne Catherine receber tal iluminaçã o,
habitando em um corpo que nã o era tã o puro quanto um lı́rio, em um
corpo que nã o conhecia outra lei senã o aquela que a sujeitava
inteiramente a Deus?
Capítulo 4
TREINAMENTO E EDUCAÇAO PRECOCE _ _
O conhecimento mais pró ximo dos pais trê s vezes felizes a cujos
cuidados Deus Todo-Poderoso con iou um tesouro tã o precioso,
oferece uma nova prova da maravilhosa vigilâ ncia da Divina
UMA Providê ncia em organizar até os menores detalhes relacionados
com Seus escolhidos, para que todas as coisas possam
concorrer no cumprimento da missã o que lhes foi atribuı́da.
Ana Catarina foi ilha de almas verdadeiramente piedosas que,
contentes com a sua pobreza porque ela foi consagrada a Deus,
encontraram nas bê nçã os celestiais derramadas sobre elas uma rica
indenizaçã o pela falta de bens materiais. Toda a sua vida apresentou à
menina um modelo perfeito de fé cristã , e ela recebeu, graças à sua doce
irmeza, a educaçã o mais adequada à sua alta vocaçã o. A casa de seu pai
era uma escola de piedade para seus ilhos; mesmo em seus ú ltimos
anos, Anne Catherine recordava com gratidã o os conselhos dados por
seus bons pais e os há bitos piedosos e regulares para os quais eles a
haviam treinado. Ela adorava falar deles. Toda a sua vida pode ser
escrita a partir das palavras de seu ilho.
“Meu pai era muito piedoso e ı́ntegro, de temperamento sé rio, mas de
modo algum taciturno ou inclinado à tristeza. Sua pobreza o obrigou ao
trabalho á rduo, mas ele nã o foi movido pelo amor ao ganho. Ele tinha
uma con iança infantil em Deus e realizava sua labuta diá ria como um
servo iel, sem ansiedade ou cobiça. Sua conversa estava cheia de
prové rbios bonitos e caseiros, intercalados com expressõ es simples e
piedosas. Um dia ele nos contou a histó ria de um grande homem
chamado Hun, que viajou por todo o mundo. Naquela noite eu sonhei
que via esse grande homem vagando pela terra e surgindo com uma
imensa pá terra boa e ruim. Como meu pai també m era muito
trabalhoso, ele me ensinou a trabalhar muito mesmo na minha infâ ncia.
Verã o e inverno, eu tinha que sair para os campos antes do amanhecer
para pegar um cavalo feroz que chutava e mordia e costumava fugir de
meu pai. A criatura cruel costumava me deixar pegá -lo; na verdade, ele
mesmo à s vezes vinha me encontrar. Eu costumava subir em uma pedra
ou monte, subir nas costas dele e voltar para casa em triunfo. Se ele
tivesse a noçã o de virar a cabeça para morder, eu lhe daria uma
pancada no nariz, o que o fazia trotar silenciosamente como antes. Eu
costumava transportar estrume e produzir com ele. Nã o consigo
entender agora como consegui administrá -lo.
“Muitas vezes ı́amos para os campos antes do amanhecer. No momento
do nascer do sol, meu pai costumava descobrir a cabeça e fazer algumas
oraçõ es; entã o ele me falava do grande Deus que fez Seu sol nascer tã o
gloriosamente acima de nó s. Ele costumava dizer que era uma coisa
vergonhosa icar na cama enquanto o sol se elevava no cé u, pois isso
leva à ruı́na de famı́lias, paı́ses e naçõ es inteiras. Uma vez eu respondi:
'Sim, mas isso nã o signi ica eu, pois o sol nã o pode chegar perto da
minha caminha!' e ele respondeu: 'Mesmo que você nã o possa ver o sol
nascente, ele vê você — ele brilha em todos os lugares.' Pensei muito
nessas palavras.
“Em outra ocasiã o, ele me disse: 'Veja, ningué m ainda pisou no orvalho!
Nó s somos os primeiros e, se orarmos com devoçã o, atrairemos
bê nçã os sobre a terra. E bom caminhar sobre o orvalho da manhã antes
que algué m o tenha tocado. Há uma bê nçã o sobre ela, entã o,
inteiramente nova. Nenhum pecado foi cometido nos campos, nenhuma
palavra ruim foi dita. Quando o orvalho foi pisado, parece que o frescor
e a beleza da manhã voaram.'
“Embora muito pequeno e delicado, sempre tive que trabalhar muito,
seja em casa ou no campo com meus irmã os e irmã s. Uma vez tive que
carregar uma carroça com cerca de vinte sacas de milho. Eu iz isso sem
parar para descansar, e mais rá pido do que um menino forte poderia ter
feito. Da mesma forma que eu costumava colher e ceifar.
“As vezes eu conduzia o cavalo para o meu pai, à s vezes eu castigava o
chã o. Fiz todo tipo de trabalho de campo. Ocasionalmente, quando
pará vamos um momento para descansar, meu pai exclamava: 'Ah! que
sorte! Veja! Podemos ver em frente para Coesfeld. Aı́ está a igreja!
Podemos adorar Nosso Senhor no Santı́ssimo Sacramento. Ele nos
observa e abençoa nosso trabalho.' Quando o sino tocava para a missa,
ele tirava o chapé u e fazia uma pequena oraçã o. Entã o ele dizia: 'Agora
devemos seguir a Santa Missa', e ainda continuando seu trabalho, ele
pronunciava algumas palavras de vez em quando, como: 'Agora o padre
está no Gloria, agora no Sanctus - devemos dizer tal ou tal oraçã o e
fazer o sinal da cruz', e à s vezes ele cantava um verso das Sagradas
Escrituras, ou assobiava uma melodia. Enquanto eu me angustiava, ele
dizia: 'Eles dã o muito valor aos milagres, e ainda assim vivemos apenas
por milagres e pela pura bondade de Deus. Veja o grã o de trigo no chã o!
Lá ica e envia um longo caule que o reproduz cem vezes. Nã o é um
grande milagre?
“Nas tardes de domingo, ensaiava para nó s o sermã o da manhã ,
comentando-o da maneira mais edi icante, e terminava lendo em voz
alta uma explicaçã o do Evangelho.”
A mã e de Anne Catherine era igualmente boa e piedosa. Em vinte e um
anos de vida de casada, ela deu à luz nove ilhos, o primeiro em 1766, o
ú ltimo em 1787. Ela era uma esposa feliz, contente e iel. Sua vida de
incessantes cuidados e labutas havia estampado seu semblante com
uma expressã o bastante grave, sem, no entanto, amargar seu coraçã o;
que era gentil e gentil com todos. A luta incessante para obter uma
manutençã o adequada nunca trouxe uma reclamaçã o aos lá bios dela;
pelo contrá rio, em espı́rito de oraçã o, ela considerava a necessidade de
trabalhar como um favor do Cé u, e pensava apenas em ser aos olhos de
Deus uma aeromoça iel. Nos anos seguintes, Anne Catherine assim
falou dela:
“Foi minha mã e quem me deu minhas primeiras aulas de catecismo.
Suas exclamaçõ es favoritas eram: ' Senhor, dê-me paciência , e entã o
bata com força!' — 'Senhor, que Tua vontade, nã o a minha, seja feita!'
Eu nunca os esqueci. Quando brincava com meus jovens companheiros,
minha mã e costumava dizer: 'Se as crianças brincam juntas
inocentemente, os anjos se juntam a elas; à s vezes até o Menino Jesus
vem també m.' Eu considerava isso literalmente verdade, e isso nã o me
surpreendeu nem um pouco. Costumo lançar um olhar inquisitivo para
o cé u para ver se eles estavam vindo. As vezes eu os imaginava
presentes, embora nã o pudé ssemos vê -los. Para que nã o deixassem de
vir, sempre jogamos jogos inocentes. Minha mã e me ensinou a andar
por ú ltimo e a fazer minhas oraçõ es no caminho quando eu saı́a com
outras crianças para a igreja ou outro lugar. Ela disse que ao fazer isso
eu nã o ouviria nem veria nada de ruim. Quando iz o sinal da cruz na
testa, nos lá bios e no peito, disse a mim mesmo que essas cruzes eram
as chaves para trancar meu coraçã o contra tudo o que era prejudicial, e
que somente o Menino Jesus deveria segurá -las. Tudo vai bem quando
Ele está encarregado deles.”
Anne Catherine nã o viu nada em toda a vida de seus pais que nã o
estivesse de acordo com os mandamentos de Deus e da Igreja. As ú nicas
alegrias que aliviavam seus trabalhos eram as que encontravam na
celebraçã o de suas festas. Essas almas simples eram adequadas para tal
felicidade; pois nunca seu trabalho foi tã o urgente, sua fadiga tã o
grande, a ponto de impedir que izessem qualquer sacrifı́cio pelo bem
do pró ximo. Bernard Emmerich, depois de seu longo dia de trabalho,
nunca deixou de lembrar seus pequeninos, quando a noite se
aproximava, de orar pelos viajantes, pelos pobres soldados, por seus
semelhantes em apuros, ele pró prio fazendo oraçõ es particulares por
tais intençõ es. Durante os trê s dias de Carnaval, a mã e acostumava os
ilhos a prostrar-se e com os braços estendidos a dizer quatro vezes o
Pai Nosso , para evitar todos os ataques à inocê ncia naqueles dias:
“Filhos”, dizia-lhes, “ você nã o o entende, mas eu o conheço bem.
Rezar!"
O seguinte incidente mostra como Deus abençoou as palavras e o
exemplo desses bons pais:
“Quando é ramos muito pequenos, meu irmã o mais velho e eu
dormı́amos no mesmo quarto. Ele era muito piedoso, e muitas vezes
rezá vamos juntos, ajoelhados ao lado de nossas caminhas, com os
braços estendidos em forma de cruz. Muitas vezes eu via a sala toda
iluminada. As vezes, depois de um longo tempo ajoelhado em oraçã o, de
repente fui puxado com violê ncia por alguma força invisı́vel, e uma voz
gritou: 'Vá para a cama! Ir para a cama!' Isso costumava assustar muito
meu irmã o, mas seu ú nico efeito sobre mim era me fazer orar por mais
tempo. Meu pró prio irmã o nã o escapou desses ataques do maligno que
muitas vezes tentava incomodá -lo durante suas oraçõ es. Meus pais uma
vez o encontraram ajoelhado com os braços estendidos, perfeitamente
rı́gido com o frio.”
Como essas boas pessoas eram humildes demais para considerar a
prá tica incessante de seus deveres cristã os como algo extraordiná rio,
també m os fenô menos que testemunharam em seus ilhos nã o
despertaram neles sentimentos de orgulho. Eles contemplaram com
emoçã o agradecida os dons de graça com os quais ela foi dotada; mas
eles esconderam sua admiraçã o e continuaram a tratá -la como
tratavam seus outros ilhos. A mã e repreendeu sua pequena Anne
Catherine tã o severamente por suas faltas quanto seus irmã os e irmã s,
e, mesmo em sua infâ ncia, ela nã o estava isenta de sua participaçã o nos
deveres familiares. Ela foi assim mantida em feliz ignorâ ncia de si
mesma. Sua simplicidade e humildade nunca foram ameaçadas por
elogios, admiraçã o ou curiosidade indiscreta. Sua rica vida interior
permaneceu oculta e desconhecida, expandindo-se com beleza cada vez
maior sob a conduta de seu anjo-guardiã o, que regulava todos os seus
sentimentos, pensamentos e palavras, e restringia sua natureza ardente
pela prá tica constante da obediê ncia.
Seus pais, é verdade, sentiam por essa criança uma afeiçã o mais do que
comum, mas era contrá rio à sua natureza manifestá -la por meio de
marcas ou carı́cias exteriores. Era quase uma necessidade para Bernard
Emmerich ter seu vitorioso e discreto menina perto dele quando ele
trabalhava nos campos. Suas observaçõ es infantis, suas respostas à s
perguntas dele, todo o seu comportamento eram tã o agradá veis para
ele que ele nã o podia suportar tê -la ausente de seu lado. Sua mã e estava
muito ocupada com o cuidado de seus ilhos mais novos para dar tanta
atençã o a Anne Catherine quanto a seu marido. A disposiçã o alegre do
pai havia sido herdada pela criança, que alegrava sua labuta diá ria com
sua esportividade inocente. Ela era naturalmente alegre, como era de se
esperar de algué m admitido a uma relaçã o tã o familiar com Deus e Seus
santos. Sua testa era alta e bem formada, e a luz doce de seus olhos
castanhos claros derramava um ar de serenidade sobre todo o seu
semblante. Seu cabelo escuro estava jogado para trá s em tranças ou
enrolados em volta da cabeça, e sua voz prateada e vivacidade de
expressã o revelavam a inteligê ncia de sua mente. Ela falava com
facilidade e luê ncia de coisas que pareciam misteriosas e ininteligı́veis
para seus ouvintes; mas sua reserva modesta e humilde logo dissipou a
impressã o produzida por esses lampejos inesperados de dons
superiores. Ela era tã o doce, tã o gentil, sua â nsia de servir aos outros
era tã o encantadora que jovens e velhos se reuniam com a pequena
Anne Catherine para receber assistê ncia e conselhos. Embora ignorasse
seus altos dons, ningué m podia deixar de amá -la. Esses simples
camponeses sabiam bem que nã o havia sacrifı́cio que ela nã o izesse
para o bem deles, e estavam tã o acostumados à s bê nçã os que dela
emanavam quanto ao perfume do alecrim em seus pró prios jardins.
“Quando eu era criança”, disse ela, “os vizinhos costumavam vir até mim
para tratar suas feridas, porque eu tentava fazê -lo com cuidado e
delicadeza. Eu era há bil em tais coisas. Quando eu via um abscesso,
dizia para mim mesma: 'Se você apertar, vai piorar; o assunto deve, no
entanto, sair de alguma forma.' Entã o eu chupei suavemente e logo
curou. Ningué m me ensinou isso. Foi o desejo de me tornar ú til que me
levou a fazê -lo. No inı́cio, senti nojo, mas isso só me fez superar a mim
mesmo, pois nojo nã o é compaixã o. Quando superei prontamente o
sentimento, encheu-se de terna alegria. Pensei em Nosso Senhor que
fez o mesmo por toda a humanidade”.
As vezes, sua cor mudava de um vermelho vivo para uma palidez lı́vida,
seus olhos cintilantes icavam subitamente turvos, sua simples alegria
era trocada por gravidade, e um tom de tristeza inexplicá vel percorria
seu semblante – ela mal era reconhecı́vel. Seus pais se questionaram
ansiosamente: “Qual é o problema com a criança?” A causa dessa
mudança repentina estava na triste visã o das misé rias da humanidade
que se apresentavam em sua mente. Como ela nã o podia ouvir o nome
de Deus ou de um santo sem cair em contemplaçã o, també m nã o podia
mencionar em sua presença qualquer acidente ou infortú nio, sem que
sua alma fosse irresistivelmente levada à cena do sofrimento pelo
desejo de aliviá -lo no momento. qualquer custo. Seus amigos, como se
pode supor, nã o podiam explicar sua conduta singular, e a inquietaçã o
de sua mã e logo deu lugar ao desprazer ao ver o langor da criança
desaparecer tã o rapidamente quanto havia chegado. Ela atribuiu essas
mudanças inexplicá veis ao capricho, e considerou as reprovaçõ es e
puniçõ es o melhor remé dio a aplicar a elas; por isso, à s vezes castigava
severamente a menina quando esta, oprimida pelos sofrimentos
interiores, mal conseguia icar de pé . Mas o tratamento imerecido foi
recebido com tanta paciê ncia e submissã o, a criança ainda era tã o
brilhante e amorosa, que o pai e a mã e se entreolharam com espanto,
dizendo: “Que criança estranha! Nada parece intimidá -la. O que será
dela!” Nã o foram apenas as advertê ncias do anjo que in luenciaram
Anne Catherine a suportar esse tratamento severo por amor de Deus,
foi sua pró pria convicçã o de que ela merecia todos os tipos de puniçã o.
“Na minha infâ ncia”, diz ela, “eu era irritá vel e caprichosa, e muitas
vezes fui punida por isso. Foi difı́cil para mim reprimir meu humor
caprichoso. Meus pais muitas vezes me culpavam e nunca me
elogiavam; e, como costumava ouvir outros pais elogiando seus ilhos,
comecei a me considerar a pior criança do mundo. O que me inquietou
mais era o medo de ser um objeto de aversã o aos olhos de Deus
també m. Mas um dia vi algumas crianças muito desrespeitosas para
com seus pais e, embora magoado com a visã o, senti-me um pouco
tranquilizado, como pensei que ainda poderia esperar, pois nunca
poderia fazer uma coisa tã o ruim quanto isso.
Anne Catherine encontrou a maior di iculdade em reprimir sua
vivacidade, esmagar a vontade pró pria e submeter-se inteiramente à
dos outros. O seu coraçã o terno, a sua sensibilidade requintada, sempre
atenta a mil coisas que outros passariam despercebidas, o seu zelo
ardente pela gló ria de Deus e pela salvaçã o do pró ximo, obrigaram-na a
repetidos esforços para adquirir mansidã o fundada no esquecimento
de si e obediê ncia tã o perfeita que os primeiros movimentos de
resistê ncia foram sufocados em seu nascimento. Sua alma corajosa
ganhou, no entanto, e sua idelidade foi tã o livremente recompensada
que ela poderia dizer em anos posteriores:
“A obediê ncia era minha força, meu consolo. Graças à obediê ncia, pude
orar com a mente pacı́ ica e alegre. Eu podia comungar com Deus – meu
coraçã o estava livre.”
Ela nã o só se considerava a menor e a ú ltima das criaturas, como
també m se sentia assim e regulava toda a sua conduta por essa
convicçã o interior. Seu anjo nã o tolerava nenhuma imperfeiçã o; ele
punia cada falta com reprimendas e penitê ncias. Em seu quinto ano, ela
um dia viu atravé s de uma cerca-jardim uma maçã debaixo de uma
á rvore e sentiu um desejo infantil de comê -la. Mal foi concebido o
pensamento quando sua contriçã o por essa cobiça foi tã o grande que
ela se impô s como penitê ncia nunca mais tocar uma maçã , uma
resoluçã o à qual ela sempre aderiu ielmente. Em outra ocasiã o, sentiu
uma leve aversã o por uma mulher que havia falado depreciativamente
de seus pais, e resolveu nã o cumprimentá -la na pró xima vez que a
encontrasse. Essa resoluçã o ela agiu, embora nã o sem um esforço. No
momento seguinte, ela estava tã o arrependida que instantaneamente se
virou e pediu perdã o por sua grosseria. Quando ela começou a se
aproximar do Sacramento da Penitê ncia, sua consciê ncia delicada nã o
lhe deu paz apó s faltas desse tipo até que ela se acusou amargamente
delas ao seu confessor e recebeu penitê ncia e absolviçã o.
Para que esses primeiros sofrimentos interiores e sua vida penitencial
nã o banissem de seu coraçã o a inocente alegria da infâ ncia, Deus em
sua bondade a indenizou amplamente pela alegria que ela derivava da
contemplaçã o ininterrupta da grandeza e magni icê ncia da criaçã o e
por seu constante intercâ mbio com criaturas irracionais. Quando estava
sozinha na loresta ou nos campos, ela chamava os pá ssaros, cantava
com eles os louvores de seu Criador e os acariciava enquanto eles
pousavam familiarmente em seu ombro. Se ela encontrasse um ninho,
ela espiava com o coraçã o batendo e falava as palavras mais doces para
os pequeninos. Ela sabia onde as primeiras lores desabrochavam e as
reuniu para tecer em guirlandas para o Menino Jesus e Sua Mã e. Mas
seu olho, iluminado pela graça, via muito alé m dos sentidos. Outras
crianças se divertem com livros ilustrados. Eles se deleitam mais com
lores e animais pintados do que com as cores brilhantes da natureza
animada. Mas, para Anne Catherine, as pró prias criaturas eram os
quadros nos quais ela admirava exultante a sabedoria e a bondade do
Criador. Ela conhecia sua natureza e propriedades variadas, como ela
sugere em seu relato de suas visõ es de Sã o Joã o Batista:
“O que John aprendeu no deserto de lores e animais nunca me
surpreendeu; pois, quando eu mesmo era criança, cada folha, cada
lorzinha, era um livro que eu podia ler. Percebi a beleza e o signi icado
da cor e da forma; mas quando falei disso, meus ouvintes apenas riram
de mim. Pude me divertir com tudo que encontrei nos campos. Eu
entendia tudo, podia até ver as lores e os animais. Oh, como tudo era
encantador! Tive febre quando jovem, o que, no entanto, nã o impediu
que eu continuasse. Meus pais pensaram que eu ia morrer, mas uma
linda Criança veio e me mostrou algumas ervas que me curariam se eu
as comesse. Ele me disse també m para chupar o suco doce da lor de
trepadeira. Eu iz as duas coisas, e logo iquei bastante Nó s vamos.
Sempre gostei muito de lores de camomila. Há algo agradá vel para
mim em seu pró prio nome. Mesmo na minha infâ ncia eu os reunia e os
mantinha à disposiçã o para os pobres doentes que vinham a mim em
suas doenças. Eu costumava pensar em todos os tipos de remé dios
simples para eles.”
A beleza da sagrada disciplina da Igreja també m lhe foi manifestada,
como provarã o as seguintes linhas:
“O som dos sinos abençoados sempre foi para mim como um raio de
bê nçã o que bane in luê ncias prejudiciais onde quer que chegue. Acho
que esses sons aterrorizam Sataná s. Quando eu costumava rezar à noite
nos campos, muitas vezes eu sentia e, de fato, via espı́ritos malignos ao
meu redor; mas, assim que os sinos de Coesfeld soaram para as
Matinas, eles fugiram. Eu costumava pensar que, quando as vozes do
clero eram ouvidas a grande distâ ncia, como nos primeiros tempos da
Igreja, nã o havia necessidade de sinos; mas que agora essas lı́nguas
descaradas eram necessá rias. Todas as coisas devem servir ao Senhor
Jesus, promover nossa salvaçã o e nos proteger contra o inimigo de
nossa alma. Deus concedeu Sua bê nçã o a Seus ministros para que,
emanando deles, possa penetrar em todas as coisas e torná -los
subservientes à Sua gló ria. Mas quando o Espı́rito de Deus se afasta dos
sacerdotes e somente os sinos difundem Sua bê nçã o e põ em o maligno
em fuga, é como uma á rvore que parece lorescer. Ela recebe nutriçã o
atravé s de sua casca, mas o cerne está podre e seco. O toque dos sinos
abençoados me parece essencialmente mais sagrado, mais alegre, mais
animador e muito mais doce do que todos os outros sons, que sã o em
comparaçã o monó tonos e confusos; mesmo a mú sica de um ó rgã o de
igreja ica muito aqué m em plenitude e riqueza.”
A linguagem da Igreja causou-lhe uma impressã o ainda mais viva. As
oraçõ es latinas da missa e todas as cerimô nias do serviço divino eram
tã o inteligı́veis para ela quanto sua lı́ngua materna, e demorou muito
para que ela descobrisse que nem todos os ié is as entendiam tã o bem
quanto ela.
“Nunca tive consciê ncia de nenhuma diferença”, disse ela, “entre minha
pró pria lı́ngua e aquela usada pela Santa Igreja. Compreendi nã o
apenas as palavras, mas até as vá rias cerimô nias em si.”
Ela tinha uma percepçã o tã o aguçada do poder e da in luê ncia bené ica
da bê nçã o sacerdotal, que podia dizer quando um padre estava
passando pela casa. Ela se sentiu involuntariamente atraı́da para correr
e receber sua bê nçã o. Se ela estava cuidando das vacas no momento, ela
rapidamente as recomendava ao seu anjo-guardiã o e partia em busca
do padre.
Levava sempre ao pescoço, numa bolsinha, o Evangelho de Sã o Joã o.
Sobre este ponto ela diz:
“O Evangelho de Sã o Joã o sempre foi para mim uma fonte de luz e força,
um verdadeiro escudo. Quando amedrontado ou em perigo, costumava
dizer com con iança: E o Verbo se fez carne e habitou entre nós . Eu
nunca consegui entender como alguns padres podem chamar essas
palavras de ininteligı́veis, e ainda assim eu realmente os ouvi dizer
isso.”
Como Ana Catarina estava viva para o que quer que tivesse recebido a
bençã o da Santa Igreja, ela foi, pelo contrá rio, tomada de horror pela
aproximaçã o de qualquer coisa má ou amaldiçoada. Ela foi
imediatamente impelida à oraçã o e penitê ncia em tais ocasiõ es. Ela
relata o seguinte incidente de sua juventude:
“A uma curta distâ ncia da nossa casa, no meio de um campo fé rtil, havia
um pequeno pedaço de terra onde nada cresceria. Quando eu era
criança, nunca o cruzava sem estremecer. Eu costumava me sentir
empurrado por algum poder invisı́vel, e à s vezes eu era até derrubado.
Certa vez, vi duas sombras negras vagando e notei que os cavalos
icaram inquietos com a aproximaçã o deles. Senti que havia algo de
sinistro no local e tentei obter informaçõ es a respeito. Histó rias
assustadoras foram contadas sobre ele, e muitos ingiram ter visto
coisas estranhas ali; mas tudo isso era falso. Finalmente meu pai me
disse que na é poca das Guerras dos 'Sete Anos', um soldado
hanoveriano havia condenado por um tribunal militar e executado
naquele local. O pobre homem era inocente; dois inimigos foram os
autores de seu infortú nio. Eu nã o ouvi isso até depois da minha
primeira comunhã o. Fui à noite rezar ali com os braços estendidos. A
primeira vez que tive que me forçar, iquei com tanto medo; na segunda
vez um fantasma horrı́vel me apareceu na forma de um cachorro. Ele
estava nas minhas costas descansando a cabeça no meu ombro. Se eu
virasse minha cabeça, eu poderia ver seu focinho e olhos lamejantes.
Eu estava aterrorizado, mas tentei esconder meu medo. Eu disse em
meu coraçã o: 'Senhor, quando Tu estavas em agonia no Monte das
Oliveiras, Tu oraste por mais tempo! Tu é s por mim!' O espı́rito maligno
nã o poderia me prejudicar. Comecei a rezar e a horrı́vel igura
desapareceu. Em outra ocasiã o, enquanto orava no mesmo lugar, fui
erguido violentamente como se estivesse prestes a ser lançado na vala
ali perto. Renovei minha con iança em Deus e exclamei: 'Sataná s, você
nã o pode me ferir!' Ele cessou seus ataques, e eu continuei com minhas
oraçõ es. Nunca mais vi as duas sombras, e a partir desse momento tudo
pareceu quieto.
“Muitas vezes senti repugnâ ncia por lugares onde antes havia
sepulturas pagã s, embora nunca tivesse ouvido nada sobre eles. A uma
curta distâ ncia de casa havia um monte de areia no meio de um prado.
Nunca gostei de manter minhas vacas lá , pois sempre via um vapor
preto e feio, como a fumaça de trapos fumegantes, rastejando sobre o
chã o. Uma estranha obscuridade pairava sobre o local, e iguras
sombrias, envoltas em escuridã o, moviam-se aqui e ali e, por im,
desapareciam no subsolo. Eu costumava dizer a mim mesmo, criança
que eu era: 'E bom que a grama grossa esteja acima de você , pois isso
evita que você nos machuque!' Quando as casas sã o construı́das sobre
esses lugares, uma maldiçã o emana dos ossos pagã os que repousam
abaixo delas, se seus ocupantes nã o levarem vidas santi icadas pela
bê nçã o da Igreja e assim neutralizarem seus efeitos funestos. Se por
acaso izerem uso de meios supersticiosos condenados pela Igreja para
se livrar da maldiçã o, entrarã o, embora talvez sem saber, em
comunicaçã o com os poderes das trevas, que entã o adquirem nova
força. E difı́cil para mim entender isso. Eu o vejo realmente, com meus
olhos corporais, mas meus ouvintes só podem vê -lo em pensamento. E
muito mais difı́cil para mim compreender como é que tantas pessoas
nã o vê em diferença entre o santo e o profano, o crente e o incré dulo, o
puro e o impuro. Eles vê em apenas a aparê ncia externa. Eles nã o se
preocupam em saber se é lı́cito comer certas coisas ou nã o, se podem
transformá -las em lucro ou nã o; mas eu vejo, eu me sinto bem
diferente. O que é santo, o que é abençoado, vejo tudo luminoso,
difundindo luz e bê nçã o; enquanto o que é profano, o que é
amaldiçoado, vejo espalhar trevas e corrupçã o. Vejo a luz ou as trevas
brotando como coisas corpó reas do bem ou do mal, cada uma
produzindo seus pró prios frutos. Certa vez, a caminho de Dü lmen,
passei pela ermida perto do bosque onde morava o camponê s H____.
Antes que se estenda uma charneca. Ao me aproximar com meu
companheiro, vi subir dele um vapor que me encheu de horror e
desgosto. No meio da charneca, vá rias dessas correntes surgiram e
lutuaram em ondas sobre o solo, mas nã o pude ver fogo. Apontei para
o meu companheiro, dizendo: 'Que fumaça é essa aı́? Nã o vejo fogo. Mas
ela nã o conseguia ver nada. Ela parecia surpresa com minha pergunta;
ela pensou que algo estava acontecendo comigo. Nã o disse mais nada,
embora ainda visse o vapor e sentisse meu terror aumentar. Ao nos
aproximarmos do local, vi distintamente um vapor semelhante subindo
do lado oposto. Entã o compreendi que os ossos profanos estavam
enterrados ali, e tive uma visã o rá pida das prá ticas abominá veis e
idó latras que antigamente eram praticadas no local.”
capítulo 5
A NNE C ATHERINE F AZ A PRIMEIRA COMUNHAO _ _ _
Por volta do sé timo ano de sua idade, Anne Catherine foi com as
outras crianças da escola fazer sua primeira Con issã o para a
qual ela se preparara com muito empenho. Sua contriçã o foi tã o
UMA grande que, a caminho de Coesfeld, suas forças se esgotaram e
seus pequenos companheiros tiveram que carregá -la até a
igreja. Sua consciê ncia estava sobrecarregada nã o apenas por
algumas transgressõ es infantis há muito expiadas, mas també m
por suas visõ es ininterruptas, pelas quais ela havia sido tã o
frequentemente repreendida como por “imaginaçõ es e sonhos”. Como
sua mã e a advertia incessantemente contra fantasias vã s e superstiçõ es,
sua ansiedade sobre o assunto era proporcionalmente grande, e ela
colocava esses “devaneios” clara e totalmente diante de seu confessor
para receber seus conselhos e orientaçõ es. Aqui vamos fazer uma pausa
para admirar os desı́gnios de Deus Todo-Poderoso. Tendo dado a Ana
Catarina o dom da contemplaçã o para o bem dos ié is, Ele agora quis
submeter este dom à decisã o de colocá -lo sob a tutela da Igreja.
Enquanto examinava sua consciê ncia antes da con issã o, Anne
Catherine temia acima de tudo que o amor-pró prio ou a falsa vergonha
a levassem a esconder ou atenuar seus pecados. Para se encorajar, ela
repetia muitas vezes estas palavras: “O que o diabo tomou, ele pode
icar. Se ele tirou a vergonha antes do pecado, ele pode mantê -la agora.
Nã o vou voltar atrá s antes da Con issã o.”
Ela temia o amor-pró prio mais do que o pró prio demô nio, pois tinha
visto em visã o que Adã o nã o teria caı́do tanto. baixo, se ele nã o tivesse
lançado a culpa em Eva que, por sua vez, a jogou na serpente;
consequentemente, ela acusou-se com intensa tristeza, considerando
suas ofensas como mortais e nã o querendo aceitar qualquer atenuaçã o
dos lá bios de seu confessor. Certa vez ela brigou com um companheiro
de brincadeiras e respondeu a outro com um discurso sarcá stico, cujas
faltas ela considerou mortais, já que o mestre-escola havia dito a seus
alunos que Deus nos ordenava, se atingidos em uma face, virar a outra.
Dean Overberg a irma que foi seu maior prazer poder testemunhar sua
afeiçã o a algué m que a ofendeu. Ela confessou seus chamados pecados
mortais, portanto, com sincera contriçã o, tremendo para que o padre
nã o recusasse sua absolviçã o. O Pai disse para consolá -la: “Minha ilha,
você ainda nã o é capaz de pecar mortalmente”, entã o ela começou a
chorar e teve que ser retirada do confessioná rio. Seus pais lhe deram
sete pence para comprar pã o branco, como as crianças costumavam
fazer depois da con issã o; mas ela deu a todos em esmolas para que
Deus perdoasse seu pecado. Seus pais sempre lhe permitiam a mesma
quantia e com o mesmo propó sito quando ela ia se confessar. Ela
costumava fazer a pequena compra, mas nã o para si mesma; ela levou
tudo para casa para aqueles pais queridos. Em outra ocasiã o, ela estava
muito perturbada ao se aproximar do tribunal de penitê ncia. Ela tinha
ouvido sua mã e conversando com um de seus amigos sobre uma certa
pessoa falecida cuja alma, ela disse, nã o estava em repouso. Esta notı́cia
a tocou com pena. Ela pensava constantemente na pobre alma inquieta
e quase involuntariamente buscou outros intercessores para ela. Um
dia ela estava a ponto de comunicar o que tinha ouvido. Ela começou: “A
pobre mulher nã o tem . . .”, quando ela icou tã o aterrorizada que nã o
conseguiu pronunciar outra palavra. Surgiu de repente o pensamento
de que ela seria incapaz de reparar esse pecado de detraçã o, que nã o
poderia pedir perdã o aos mortos, e nã o poderia ter paz até que
confessasse sua inadvertê ncia. Esse susto nã o era um escrú pulo
exagerado, mas o efeito de uma grande pureza de consciê ncia. O
seguinte fato testemunhará isso:
“Quando ela começou a ler”, diz seu pai, “ela adorava sentar no chã o
perto do fogo e, juntando as brasas, lia seu livro de oraçõ es à luz delas.
Certa vez eu estava consertando um banco para um vizinho e usando
para isso um pedaço de madeira nova. Anne Catherine recolheu as
aparas para o fogo, mas apenas as da madeira nova. Perguntei-lhe por
que ela nã o pegou a madeira velha també m. Ela respondeu: 'Só pego o
novo, porque as ichas velhas que caem da bancada nã o sã o nossas'.
Fiquei impressionado com suas palavras e, virando-me para sua mã e,
disse: 'Ela é , de fato, uma criança muito singular!' ”
Quando seus pais se retiraram para dormir e o fogo ardia na lareira, a
menininha à s vezes caçava as pontas de velas para ler seu livro de
oraçõ es. Ela nã o viu nenhum mal nisso na é poca, mas ela confessou
mais tarde com verdadeira contriçã o, e nunca mais fez uso da menor
coisa sem permissã o.
Anne Catherine estava em seu dé cimo segundo ano quando fez sua
primeira comunhã o. Desde o dia do seu Batismo, sentiu-se fortemente
atraı́da pelo Santı́ssimo Sacramento. Quando diante Dele, sua alegria
brilhou exteriormente. Ela nunca entrou na igreja sem seu anjo-
guardiã o que lhe ensinou por seu pró prio exemplo a homenagem
devida ao Deus eucarı́stico. O pró prio Nosso Senhor lhe deu a conhecer
em visã o a grandeza e magni icê ncia de Seus misté rios. Isso a inspirou
com tanta reverê ncia pelo sacerdó cio que nenhuma dignidade lhe
parecia compará vel a ele. Veremos mais adiante que nã o houve ofensas
expiadas mais rigorosamente por ela do que as cometidas pelos
ministros do altar. Ajoelhada na igreja, ela nã o ousava olhar nem para a
direita nem para a esquerda; seu coraçã o e seus olhos estavam ixos no
Santı́ssimo Sacramento. O silê ncio do lugar santo era igualado apenas
pela profunda lembrança de sua alma. Ela falava com Jesus na
Eucaristia com con iança e fervor, e nos dias de festa cantava para Ele
os hinos da liturgia; mas como ela nã o podia ir à igreja quantas vezes
ela desejasse, nem quando permanecesse o quanto ela desejasse, ela se
voltava quase involuntariamente em sua oraçã o noturna na direçã o do
taberná culo mais pró ximo.
Mesmo em sua infâ ncia ela sabia como fazer uma comunhã o espiritual;
mas quando chegou a hora de realmente receber a Sagrada Eucaristia,
ela pensou que nunca poderia fazer o su iciente. Seus desejos foram
igualados apenas por seus esforços para preparar a pobre casa de sua
alma para a vinda de seu Hó spede Celestial. Ela revisou sua curta vida
vá rias vezes em sua ansiedade de parecer pura aos olhos de seu Deus.
Temia agora ainda mais do que na primeira Con issã o, ter alguma
mancha na alma, e atormentava-se com o pensamento de nã o ter
confessado tã o plena e sinceramente como deveria. Ela se considerava a
pior criança do mundo e implorou fervorosamente a seus pais que a
ajudassem a examinar sua consciê ncia, dizendo:
“Nã o quero nenhum segredo, nenhuma dobra em meu coraçã o. Pudesse
eu discernir a mais leve ocultaçã o em um anjo, nã o hesitaria em
declarar que ele tratou com o maligno que espreita nos recantos dos
coraçõ es”. Ela manteve os olhos fechados indo à igreja no dia de sua
comunhã o, para que nã o visse nada que perturbasse o recolhimento de
sua alma, e repetidamente se oferecia como sacrifı́cio pela salvaçã o dos
outros. Dean Overberg diz sobre este ponto: “Anne Catherine nã o pediu
muitas coisas em sua Primeira Comunhã o. Ela implorou a Nosso Senhor
que a izesse uma boa criança, como Ele mesmo desejava vê -la, e ela se
dedicou a Ele inteira e sem reservas”.
Podemos julgar a seriedade da criança e o prazer de Deus na mesma
pelos efeitos surpreendentes que a Sagrada Eucaristia produziu em seu
coraçã o. Ela estava toda em chamas com o amor de seu Deus.
Impulsionou-a com tanta força que ela começou naquela tenra idade
uma vida de morti icaçã o e renú ncia, como a regra mais rigorosa nunca
prescrita a um penitente no claustro ou a um monge no deserto. Se nã o
tivé ssemos outro testemunho alé m do de Dean Overberg sobre o efeito
de sua Primeira Comunhã o, por si só seria su iciente para provar algo
verdadeiramente extraordiná rio na inspiraçã o, na energia heró ica e no
amor ardente desta criança, que, em seus doze anos, sem direçã o, sob a
bendita in luê ncia do Divino Sacramento, pô de impor a si mesma uma
renú ncia tã o completa, poderia perseverar nele tã o inabalavelmente
quanto Anne Catherine. Ela fechou seus sentidos contra tudo que
pudesse seduzi-la de Deus. Só Ele que se dignou a entrar em seu
coraçã o, só Ele deve possuir e governá -lo. Dean Overberg disse:
“Desde o dia de sua Primeira Comunhã o, seus esforços para morti icar e
renunciar a si mesmo tornaram-se ainda mais perseverantes do que
antes. Ela estava convencida da verdade de que sem morti icaçã o é
impossı́vel entregar-se inteiramente a Deus. Seu amor havia lhe
ensinado isso. Ela costumava dizer: 'O amor à s criaturas impele os
homens a grandes e difı́ceis empreendimentos. Por que, entã o, o amor
de Jesus nã o deveria nos levar ao mesmo?' Ela morti icou os olhos,
afastando-os de objetos curiosos ou belos; na igreja, especialmente, ela
os mantinha sob contençã o contı́nua, dirigindo a si mesma estas
palavras: 'Nã o olhe ao redor. Isso o distrairia, ou seria, talvez, uma
grati icaçã o demais. E por que você saciar sua visã o? Contenha-o pelo
amor de Deus.' Se surgisse uma ocasiã o de ouvir algo estranho ou
divertido, ela diria: 'Nã o, nã o tenho ouvidos para isso. Vou icar surdo
para isso, pelo amor de Deus.'
“Ela morti icou sua lı́ngua, impondo-lhe silê ncio quando queria falar.
Ela nã o comeu nada que agradasse ao seu gosto. Quando seus pais
notaram isso, eles atribuı́ram isso ao capricho e insistiram para que ela
comesse. Ela morti icava os pé s quando se inclinava a ir onde o dever
nã o a chamava. 'Nã o', ela disse, 'eu nã o vou lá . Será melhor icar longe
pelo amor de Deus. Se eu fosse, poderia ter motivos para me
arrepender. Era costume dela fazer a longa Via Sacra em Coesfeld
descalça. Ela recusou a si mesma muitos pequenos prazeres que
poderia ter desfrutado inocentemente. Disciplinava o corpo com
urtigas, usava cintos penitenciais, dormia numa cruz de madeira, ou
numa espé cie de armaçã o formada por duas longas vigas com duas
peças transversais mais curtas.”
Depois da Sagrada Comunhã o, a menina teve uma visã o em que assistia
aos Sagrados Misté rios nas Catacumbas em companhia de Santa Cecı́lia.
“Ajoelhei-me”, disse ela, “em um salã o subterrâ neo que parecia ser
recortado em uma montanha. Muitas pessoas estavam ajoelhadas no
chã o nu. Flambeaux foram presos à parede, e havia dois sobre o altar de
pedra que tinha um taberná culo, també m de pedra, e uma porta. Um
padre estava rezando missa, todas as pessoas respondendo. No inal,
ele pegou um cá lice do taberná culo. Parecia madeira, e dela distribuiu o
Santı́ssimo Sacramento ao povo, que o recebeu em pequenos panos de
linho branco, cuidadosamente estendidos sobre o peito. Entã o todos se
dispersaram.”
Essa visã o era uma promessa de que Deus a ouvira e aceitara o
sacrifı́cio de todo o seu ser. Sua pureza de coraçã o e austeridade de vida
a tornavam digna de igurar na sagrada coorte dos primeiros cristã os
que haviam tirado do Santı́ssimo Sacramento sua força em meio aos
tormentos. Sua pró pria vida seria um martı́rio perpé tuo e ela també m
deveria extrair força e coragem da mesma fonte divina. Como Santa
Cecı́lia, ela sofreria pela Fé em um tempo de perseguiçã o, sem sangue, é
verdade, mas nã o menos perigoso para a Igreja. Ela també m, com
heroı́smo nã o inferior ao das virgens-má rtires, deveria confessar seu
Redentor negado e abandonado pela multidã o.
Dean Overberg nos conta que a menina dividiu o tempo entre suas
comunhõ es em duas partes: preparaçã o e açã o de graças. Ela implorou
aos santos que juntassem suas oraçõ es à s dela e conjurou o Deus Todo-
Poderoso, por Seu amor por Jesus e Maria, para preparar seu coraçã o
para Seu Filho bem-amado. Na manhã de sua segunda comunhã o,
ocorreu um pequeno incidente que parecia indicar sua pró pria
comunicaçã o ı́ntima com o Santı́ssimo Sacramento e as graças
recebidas dele para si e para os outros. Ela deveria partir com a mã e
antes do amanhecer para Coesfeld. Suas melhores roupas foram
cuidadosamente guardadas no baú da famı́lia. Quando ela foi buscá -los,
encontrou-o cheio de pã es brancos e inos, tã o numerosos que nã o
podia contá -los sem tirá -los. No inı́cio, ela pensou que sua mã e os havia
colocado lá para experimentá -la. Ela mal teve tempo de recolocá -los
quando sua mã e, impaciente com a demora, veio atrá s dela e a apressou
com tanta pressa que ela esqueceu seu lenço. Ela nã o sentiu falta até
alguma distâ ncia de casa. Ela nã o ousou voltar para buscá -la, mas
correu atrá s de sua mã e, com medo o tempo todo de ser descoberta, e
orando fervorosamente a Deus para ajudá -la a sair de sua di iculdade.
Por im chegaram a uma enlameada travessia e, assim que a mã e se
virou para ajudá -la, a criança sentiu um lenço colocado por mã os
invisı́veis em volta do pescoço. Anne Catherine icou tã o agitada com
esta rá pida resposta à sua oraçã o que mal pô de seguir sua mã e, que a
repreendeu um pouco por sua estranha conduta. Ao chegar à igreja,
confessou em lá grimas a curiosidade que a levara a tirar os pã es da
arca. Seu desejo pela Sagrada Comunhã o tornou-se como uma chama;
seu peito e sua lı́ngua pareciam estar em chamas. Em sua humildade,
ela encarou isso como um castigo para sua curiosidade, e o pensamento
quase a privou de consciê ncia. Para obter algum alı́vio, ela tocou a
lı́ngua com uma pequena imagem das Cinco Chagas. Quando se
aproximou da Santa Mesa, viu distintamente a Sagrada Hó stia voar em
sua direçã o sob uma forma luminosa e entrar em seu peito, enquanto,
no mesmo momento, o sacerdote colocava outra Hó stia em sua lı́ngua.
Novamente o fogo divino queimou mais intensamente do que antes, e
ela tentou esfriar a boca seca ao voltar para casa, pressionando suas
luvas frias. No local em que recebera milagrosamente o lenço, sua
antiga inquietaçã o voltou ao notar pela primeira vez que era muito
mais bonito que o seu: “Tem franja!” ela gritou em apreensã o. “O que
minha mã e vai dizer!” Quando ela chegou em casa, ela o tirou tremendo
e o colocou em sua cama; mas, ao voltar-se para olhá -lo novamente, ele
se foi! Ela foi muito aliviada por ter escapado aos olhos de sua mã e.
Os pã ezinhos, visı́veis apenas para Ana Catarina, simbolizavam os ricos
presentes que ela receberia como recompensa por sua fervorosa
preparaçã o para a Sagrada Comunhã o e que ela distribuiria como
alimento espiritual aos necessitados. Eles estavam escondidos sob sua
roupa como um sinal de que ela era ela mesma para multiplicá -los e
distribuı́-los. A maior parte deu aos mais necessitados, à s almas
sofredoras do Purgató rio, por quem ofereceu todas as suas açõ es; em
troca, eles testemunharam sua gratidã o por meio de oraçõ es e
assistê ncia. Era a eles que devia o lenço tã o oportunamente
presenteado.
Seu confessor nessa é poca era um venerá vel velho jesuı́ta de Coesfeld,
padre Weidner. Ela diz:
“Meu confessor era o padre Weidner que morava com suas duas irmã s
em Coesfeld. Eu costumava ir à primeira missa aos domingos e depois
cuidar da comida, para que o resto da famı́lia pudesse ir à igreja. O café
nã o era tã o comum na é poca; e, quando eu tinha um par de stivers,
costumava ir depois da missa matinal à s irmã s do padre Weidner,
moças piedosas que vendiam café . Eu gostava de ir lá , o velho senhor e
suas irmã s eram tã o bons e gentis. Quando meus pais voltaram da
igreja e encontraram o café pronto para eles, icaram muito satisfeitos.”
Capítulo 6
S NARES DO ESPIRITO MAL _
Assim que Anne Catherine se tornou su icientemente forte para
resistir aos ataques abertos de Sataná s, Deus Todo-Poderoso
permitiu que ela fosse atormentada por ele. Mas o maligno
UMA tentou em vã o afastá -la do caminho da perfeiçã o pelo qual ela
caminhava com tanta coragem. Ela desprezava sua astú cia, sua
malı́cia e seu poder. Quanto mais humilde ela se tornava, mais
difı́cil era para ela compreender como ele podia intimidar uma
alma. Seus primeiros ataques foram dirigidos contra a vida dela. Ela
mesma nos diz:
“Quando criança, minha vida esteve repetidamente em perigo, mas com
a ajuda de Deus sempre fui salvo. Eu sabia muito bem que esses perigos
nã o eram acidentais; Eu sabia que eles vieram do espı́rito maligno. Eles
geralmente aconteciam quando eu nã o estava pensando na presença de
Deus, ou quando eu tinha cometido alguma falta por negligê ncia. Eu
nunca poderia atribuı́-los ao acaso. Deus sempre nos protege se nã o nos
afastarmos dEle. Seu anjo está sempre ao nosso lado, mas devemos nos
tornar dignos de Seu cuidado. Como crianças agradecidas, nunca
devemos deixá -Lo. Devemos implorar constantemente Sua ajuda, pois
nosso inimigo está à espreita para nos destruir. Quando eu tinha apenas
alguns anos, meus pais saı́ram um dia e me deixaram em casa sozinha,
minha mã e me cobrando para icar em casa e cuidar da casa. Logo
entrou uma velha que, por algum motivo ou outro, queria se livrar de
mim por um tempo. "Corra", disse ela; 'corra e pegue algumas peras da
minha á rvore! Corra rá pido antes que sua mã e volte! Cedi à tentaçã o,
esqueci as ordens de minha mã e e corri para o jardim da velha com
tanta pressa que tropecei em um arado meio escondido no feno e,
batendo meu peito violentamente contra ele, caı́ inconsciente no chã o.
Minha mã e me encontrou nesse estado, e me trouxe com uma correçã o
inteligente. Eu senti os efeitos desse acidente por muito tempo. Mais
tarde me foi mostrado que o diabo havia feito uso da velha para me
tentar à desobediê ncia atravé s da gula e que, ao ceder à tentaçã o, eu
havia colocado minha vida em perigo. Isso me deu horror pelo ú ltimo
vı́cio, e vi como é necessá rio que o homem negue a si mesmo”.
Quando Anne Catherine começou suas vigı́lias noturnas, os ataques do
espı́rito maligno tornaram-se mais ousados e frequentes. Ele tentou
afugentá -la de suas oraçõ es com barulhos e apariçõ es terrı́veis, até
mesmo com golpes. Muitas vezes ela sentia mã os geladas agarrando-a
pelos pé s, jogando-a no chã o ou levantando-a no ar; mas, embora
aterrorizada, a criança nunca perdeu o semblante. Ela continuou sua
oraçã o com fervor redobrado até que Sataná s foi forçado a se retirar.
Ela até voltou ao local em que foi maltratada, dizendo: “Miserá vel
desgraçada! nã o me afugentará s. Tu nã o tens poder sobre mim! nã o
impedirá s minha oraçã o!”
Esses ataques eram renovados sempre que ela rezava pelas almas do
Purgató rio ou fazia penitê ncias. Mas como ela sempre foi instruı́da
sobre como resistir ao inimigo, e as almas queridas eram muitas vezes
visı́veis agradecendo-lhe pelo alı́vio que ela lhes deu, eles serviram
apenas para animar sua coragem e incentivá -la a novos esforços.
As vezes ela ia à noite rezar diante de um cruci ixo rú stico que icava no
meio da aldeia. A estrada era atravessada por um atalho estreito onde
muitas vezes se deparava com ela uma fera horrı́vel como um cachorro
com uma cabeça enorme. No inı́cio, ela costumava recuar alguns passos,
horrorizada; mas rapidamente reunindo coragem, ela dizia para si
mesma: “Por que fugir diante do inimigo?” Entã o, com o sinal da cruz,
ela empurraria corajosamente o monstro. Mas ela estremeceu
violentamente, seu cabelo icou em pé , e ela voou em vez de andar pela
estrada que levava a o cruci ixo, o bruto correndo ao seu lado, à s vezes
até esbarrando nela. No entanto, ela rapidamente superou seu medo e
caminhou bravamente por seu inimigo que, incapaz de suportar sua
pró pria derrota, logo fugiu.
Como o diabo nã o podia forçá -la por apariçõ es a desistir da penitê ncia,
ele instigou um miserá vel a atacá -la perto do cruci ixo; mas, auxiliada
por seu anjo, ela corajosamente se defendeu e obrigou-o a se aposentar.
Devido à proteçã o do anjo, ela foi libertada de inú meros perigos. Uma
vez o espı́rito maligno tentou jogá -la escada abaixo; novamente ele a
empurrou em uma vala profunda, mergulhando-a repetidamente no
fundo para afogá -la. Mas seu anjo a puxou para fora e a colocou à beira
sã e salva. Esses ataques tê m um signi icado profundo que talvez nã o
seja compreendido à primeira vista. Descobrimos neles nã o apenas a
raiva e a malı́cia do Inferno visando a destruiçã o do instrumento
escolhido por Deus, mas també m uma parte essencial da missã o que
lhe foi atribuı́da. Isso era, de fato, atrair sobre si a fú ria do Inferno,
expor-se a seus assaltos, e assim afastá -los de certas outras almas cujos
pecados os tornavam impotentes para resistir. Ela tomou o lugar
daqueles que sofreram castigo; ela sofria por aqueles que se expunham
ao perigo de se perder; e ela pagou a dı́vida deles com seus pró prios
combates. Assim como ela tomou sobre si as doenças corporais de seu
vizinho para livrá -lo delas, assim també m ela suportou para ele os
ataques do demô nio, sustentou a luta em seu lugar e obteve para ele a
vitó ria. Ela nã o só tomou o lugar dos membros da Igreja, mas també m
guardou os tesouros que haviam sido con iados aos seus pastores, e
que agora estavam expostos à fú ria do Inferno. Seus exercı́cios
dolorosos, suas vigı́lias, etc., nã o dependiam de sua pró pria vontade;
todos foram regulados por seu anjo, por instruçõ es recebidas em visã o.
A sua pró pria escolha nã o a leva a fazer a longa Via Sacra à noite, ou a
rezar nos campos abertos – tudo faz parte da tarefa que lhe foi
designada. Sua realizaçã o exige que ela deve percorrer a estrada
solitá ria que leva ao centro da aldeia para expiar a negligê ncia de um
pastor preguiçoso que dorme enquanto o lobo invade o redil; ela deve
lutar com o animal voraz e impedir que ele devore o rebanho. Ela é
arremessada de uma escada ou jogada em uma vala? E para uma alma
em pecado mortal que ela arrebata do demô nio no momento em que
ele se julga seguro de sua presa. Se visõ es assustadoras e fantasmas
enchem sua alma de horror, eles sã o os terrores dos quais ela livra os
moribundos, para que eles possam se preparar em paz para a hora da
morte.
Esses ataques de Sataná s eram redobrados sempre que as oraçõ es dela
confundiam os esforços de sua malı́cia ou desconcertavam seus planos.
“Uma vez”, ela disse, “eu estava indo para a igreja no escuro quando um
grande cachorro passou por mim. Estendi a mã o e recebi um golpe tã o
violento no rosto que cambaleei. Meu rosto e minha mã o incharam na
igreja e ambos icaram cobertos de bolhas. Quando cheguei em casa,
estava irreconhecı́vel. Fui curado tomando banho com á gua batismal.
No caminho para a igreja havia uma cerca viva sobre a qual tive de
escalar. Quando cheguei cedo no dia de Sã o Francisco, senti uma grande
igura negra me puxando para trá s. Lutei e consegui cruzar. Eu nã o
estava assustado. Ele, o demô nio, costumava se posicionar no meio da
estrada para me forçar a desviar, mas nunca conseguiu.”
O diabo agora procurava deixá -la perplexa com ataques mais astutos e
sutis. A morti icaçã o de seus primeiros anos, que havia adquirido para
ela tanta força para resistir, era odiosa para ele. Ele tentou seduzi-la a
um pouco de auto-indulgê ncia, mas ela só redobrou suas austeridades
assim que descobriu o artifı́cio. Entã o, tomando o caminho oposto, ele a
incitou a levar suas penitê ncias ao excesso; mas ela, com o conselho de
seu diretor, imediatamente os moderou.
Veremos mais adiante que, embora Sataná s nunca tenha desistido de
atormentar Anne Catherine de todas as maneiras concebı́veis, ele nunca
conseguiu excitar nela o menor movimento contrá rio à pureza perfeita.
Ele nã o ousou apresentar essa tentaçã o a uma alma dotada do dom da
profecia e con iada à tutela visı́vel de seu anjo. O dela era, de fato, um
caminho de tristezas, mas nenhum aguilhã o de concupiscê ncia deveria
surgir em seu caminho. Ele, é verdade, à s vezes colocava objetos
impuros diante de sua imaginaçã o, mas nunca conseguia levá -la a
lançar um olhar sobre eles. Ele, de fato, instigou seus escravos
perversos a tentarem violê ncia contra a jovem virgem; mas, com a
coragem de uma leoa, ela derrubou os desgraçados no chã o. “Meu
Senhor e meu Deus nã o me abandona!” ela disse. “Ele é mais forte que o
inimigo!” Essa con iança na proteçã o divina era seu escudo, o escudo
que repelia cada ataque.
Capítulo 7
H ER COMUNICAÇOES COM H ER A NGEL
A relaçã o familiar que existiu entre Anne Catherine e seu anjo-
guardiã o, sempre visı́vel para ela, é apenas uma repetiçã o do que
todas as almas que foram elevadas à alta contemplaçã o desfrutam. O
T dom da intuiçã o sobrenatural é para o homem um fardo tã o pesado,
está exposto a tantos riscos em sua posse, exige tã o grande pureza de
alma que, para usá -lo corretamente, é necessá ria uma assistê ncia
especial. Ele deve seguir um guia nas esferas ilimitadas reveladas aos
olhos da contemplaçã o. Desde seu nascimento, todo homem, sem
exceçã o, é assistido por um anjo que o vigia, que o orienta no bom uso
das graças que lhe sã o atribuı́das pelos decretos eternos do Todo-
Poderoso; para que, assim fazendo, ele se torne um ilho da fé e no inal
alcance a bem-aventurança celestial. A capacidade da alma de lucrar
com a in luê ncia angé lica aumenta com sua pró pria pureza e perfeiçã o.
Mas nada o aproxima mais de seu anjo, ou o torna mais merecedor de
comunicaçã o com ele do que o esplendor imaculado da inocê ncia
batismal. Este foi o encanto superior e indescritı́vel de Ana Catarina que
fez com que o espı́rito celeste, embora pertencendo aos mais altos
escalõ es da hierarquia celeste, considerasse seu dever de iluminá -la e
conduzi-la como uma missã o bem adequada à sua alta dignidade. Uma
criança ainda em anos e experiê ncia, ela estava, no entanto, madura
para a compreensã o das verdades eternas e pronta para se tornar a
depositá ria dos segredos divinos.
O primeiro cuidado do anjo foi instruir seu encarregado na Fé Cató lica,
por intuiçã o e imagens simbó licas. Ela adquiriu assim uma visã o
incomparavelmente mais clara, um conhecimento mais profundo de
seus misté rios do que o ensinamento e a re lexã o humanos poderiam
conceder. A luz da fé foi acrescentada a prá tica do amor de Deus que a
manteve em constante uniã o com Ele. Tornou-se, por assim dizer, uma
necessidade para ela buscar a Deus em todas as coisas, remeter tudo a
Ele, ver tudo nEle. Ele foi o primeiro bem que atraiu sua alma, e Ele a
possuiu tã o inteiramente que nenhuma criatura poderia separá -la Dele.
O esplendor que emana do anjo a envolveu desde o primeiro momento
de sua existê ncia, constituiu a pró pria atmosfera que ela respirava, e
escondeu dela aquelas seduçõ es que absorvem e dissipam os afetos do
homem. Sua alma con irmada na caridade considerava as criaturas, mas
em Deus. Cada olhar do anjo era um raio de luz, um sopro que atiçava a
chama do amor divino, um impulso para Deus. Todos os poderes, todos
os movimentos de sua alma eram tã o bem regulados que nenhuma
onda de paixã o poderia perturbar sua paz. Ela suportou calmamente os
mais intensos sofrimentos corporais, e sua alma, apesar da aguda
sensibilidade de sua natureza solidá ria e da timidez conseqü ente da
infâ ncia, era dotada de uma energia tã o grande que ela podia superar
instantaneamente o terror ou a dor. A vigilâ ncia ciumenta do anjo nã o
sofreu nela o menor apego a qualquer coisa terrena.
Ela sentiu que todo o seu ser estava aberto ao seu olhar, que ele
penetrava nas profundezas do seu coraçã o; portanto, ela observava
incessantemente para manter o espelho de sua alma imaculado. Ela foi
durante toda a sua vida uma ilha de maravilhosa simplicidade e
franqueza. Sua ingenuidade bastaria para provar a origem de seus dons
extraordiná rios, pois mesmo o dom da contemplaçã o vale menos do
que aquele espı́rito de humildade que escondeu as riquezas que lhe
foram transmitidas. Ela nunca sonhou com seus altos privilé gios, o
pensamento de si mesmo a enchia de confusã o e inquietaçã o. Tal
avaliaçã o de si mesmo nã o pode proceder nem da natureza nem do
maligno, mas apenas de um alto grau de graça e idelidade
extraordiná ria.
A direçã o do anjo havia sido dada a Anne Catherine como um talento
que ela deveria aumentar pelo bom uso que fazia dele. Quanto mais ela
se esforçava para se tornar digna de tã o grande favor, quanto mais luz
abundante ela recebia, mais irme e mais pró ximo icava o vı́nculo que a
unia ao seu anjo protetor. Agora, esse vı́nculo nã o poderia ser outro
senã o a obediê ncia que brota do amor de Deus; pois nã o há nenhum
superior, nenhum mais meritó rio. E, na verdade, o mesmo que une o
pró prio anjo a Deus. Desde seus primeiros anos, Anne Catherine foi
exercitada em perfeita abnegaçã o de sua pró pria vontade no sacrifı́cio
de todo poder da alma e do corpo a Deus. Foi assim que ela se ofereceu
perpetuamente pelos outros. Deus aceitou sua oferta e assim regulou
sua vida atravé s do ministé rio de seu anjo, que cada açã o, mesmo nos
mı́nimos detalhes, tornou-se um ato meritó rio de obediê ncia para ela.
Ela abandonou sua vontade ao seu anjo para que ele a governasse, seu
entendimento para que ele a iluminasse, seu coraçã o para que ele a
guardasse somente para Deus, pura e livre de todo apego terreno. Dó cil
à s suas instruçõ es interiores, ela se recusava a dormir e a se alimentar,
castigava severamente seu corpo e pedia apenas pelas dores e doenças
dos outros. Sua perseverança em tal curso atraiu sobre ela as bê nçã os
do Cé u, que a indenizou ricamente por todas as privaçõ es decorrentes
disso.
Por causa de sua grande caridade para com o pró ximo, ela agia como
substituta para aqueles que nã o podiam suportar seus sofrimentos e
ajudava outros que pediam misericó rdia. Foi o anjo que a conduziu
onde ela era mais necessá ria. Como a chama levada pela brisa primeiro
para um lado e depois para o outro, sua alma amorosa seguiu o
chamado do anjo quando ele a levou para as moradas da misé ria e do
pecado. Guiada por ele, ela estava sempre pronta a socorrer os
necessitados, a ir aonde quer que o impulso irresistı́vel da piedade a
impelisse, pois a compaixã o nã o conhece tempo nem espaço; nenhum
limite pode prender os desejos da alma. Como uma chama subindo no
alto, iluminando todas as coisas distantes e pró ximas, sua caridade
penetrou em todo o corpo da Igreja, levando ajuda e socorro onde quer
que seu anjo a conduzisse. Ela disse uma vez, falando sobre este
assunto:
“O anjo me chama e eu o sigo para vá rios lugares; Muitas vezes viajo
com ele. Ele me leva entre pessoas que conheço bem ou pouco, e
novamente entre outras que sã o totalmente estranhas para mim.
Atravessamos o mar tã o rá pido quanto o pensamento viaja. Eu posso
ver longe, muito longe! Foi ele quem me levou até a Rainha da França (
Marie Antonieta ) em sua prisã o. Quando ele vem me levar em uma
viagem, geralmente vejo primeiro um lampejo de luz, depois sua forma
luminosa aparece de repente diante de mim como um lash de uma
lanterna aberta no escuro. Enquanto viajamos na escuridã o, uma luz
fraca lutua sobre nosso caminho. Passamos por paı́ses familiares para
regiõ es distantes. As vezes, nosso caminho passa por estradas; à s vezes
atravé s de desertos, montanhas, rios e mares. Viajo sempre a pé e
muitas vezes tenho que escalar montanhas escarpadas. Meus joelhos
doem de fadiga e meus pé s descalços queimam. Meu guia à s vezes está
à minha frente, à s vezes ao meu lado. Eu nunca vejo seus pé s se
moverem. Ele é silencioso, faz poucos movimentos, mas à s vezes
acompanha suas respostas curtas com um gesto da mã o ou uma
inclinaçã o da cabeça. O quã o brilhante e transparente ele é ! Ele é grave,
mas muito gentil. Seu cabelo é liso, luido e brilhante. Sua cabeça está
descoberta, e seu manto longo e deslumbrantemente branco como o de
um sacerdote. Dirijo-me a ele livremente, mas nunca consigo olhá -lo de
frente. Eu me inclino diante dele. Ele me dá todos os tipos de sinais.
Nunca lhe faço muitas perguntas; a satisfaçã o que tenho em estar perto
dele me impede. Ele é sempre muito breve em suas palavras. Eu o vejo
també m em meus momentos de vigı́lia. Quando rezo pelos outros e ele
nã o está perto, chamo-o para ir ao anjo daqueles por quem estou
orando. Costumo dizer-lhe quando está perto de mim: 'Agora vou icar
aqui, mas vá para tal ou tal lugar onde sua ajuda é necessá ria', e eu o
vejo indo. Quando chego a á guas largas e nã o sei atravessar, de repente
me encontro do outro lado, e olho para trá s maravilhado. Muitas vezes
voamos acima das cidades. Saı́ da igreja dos jesuı́tas em Coesfeld tarde
noite de inverno em uma forte tempestade de neve e chuva para voltar
para casa sobre os campos de Flamske. Fiquei com medo e comecei a
clamar a Deus. De repente, vi uma luz como uma chama acesa diante de
mim. Tomou a forma do meu guia em seu manto. O chã o sob meus pé s
icou seco, limpou acima de mim, nem chuva nem neve caı́ram sobre
mim, e cheguei em casa nem mesmo molhado.”
As comunicaçõ es de Ana Catarina com as almas do Purgató rio també m
foram realizadas por meio de seu anjo que a levou para aquela prisã o
de misericó rdia para que ela pudesse refrescar os queridos cativos com
os frutos de sua penitê ncia.
“Eu estava com meu guia”, diz ela, “entre as pobres almas do Purgató rio.
Vi sua desolaçã o, sua incapacidade de se ajudar e a pouca ajuda que
recebem dos vivos. Ah, sua misé ria é inexprimı́vel! Enquanto
contemplava seu estado, vi que uma montanha me separava de meu
guia. Suspirei por ele como um faminto, quase desmaiei de desejo. Eu o
vi do lado oposto, mas nã o consegui alcançá -lo. Ele me disse: 'Veja,
como você suspira por socorro! As pobres almas estã o sempre no
estado em que você está agora!' Ele muitas vezes me levava para rezar
diante de cavernas e prisõ es. Eu me prostrei, chorei, meus braços
estendidos e clamei a Deus por misericó rdia. Meu anjo me encorajou a
oferecer todos os tipos de privaçõ es para as pobres almas. Eles nã o
podem ajudar a si mesmos, sã o cruelmente negligenciados. Muitas
vezes o enviei aos anjos de certas pessoas em sofrimento, para inspirá -
los a sofrer suas dores por eles. Eles sã o instantaneamente aliviados
por tais oferendas; eles se tornam tã o alegres, tã o gratos! Sempre que
faço algo por eles, eles oram por mim. Tenho pavor de ver as riquezas
que a Igreja oferece em tanta abundâ ncia negligenciadas, dissipadas,
tã o levianamente estimadas, enquanto as pobres almas de inham por
elas”.
Desde a mais tenra infâ ncia, Anne Catherine sempre implorou a Deus
que a protegesse do pecado, que a tratasse como um pai amoroso trata
seu ilhinho, que a ensinasse a conhecer e cumprir Sua santa Vontade. E
Deus Todo-Poderoso misericordiosamente ouviu sua oraçã o. Ele a
guardou e a iluminou por meio do ministé rio de seu anjo em sua longa
jornada atravé s de uma vida de labuta e sofrimento. Ele mostrou a ela
tudo o que estava reservado para ela em imagens simbó licas, para que
ela estivesse pronta para qualquer emergê ncia. Ele a preparou para os
sofrimentos, para que ela pedisse forças para abraçá -los. Cada
incidente, cada encontro que estava para acontecer, seja com ela ou com
aqueles ligados a ela, foi mostrado a ela com antecedê ncia. Ela recebeu
instruçõ es precisas sobre seu comportamento em relaçã o a todos com
quem entrava em contato, se deveria tratá -los com franqueza ou
reserva. O anjo até prescreveu, à s vezes, as palavras que ela deveria
usar.
Ela vivia em dois mundos: no externo, visı́vel aos sentidos, e no invisı́vel
e oculto. Ela agiu em ambos e para o bem de ambos. A imensa tarefa
que lhe foi imposta por Deus Todo-Poderoso, exigia que ela cumprisse
perfeitamente todos os deveres da vida comum, em meio a di iculdades
e sofrimentos su icientes por si mesmos para preencher toda uma vida;
e a isso se somava a sua açã o interior para o bem da Igreja universal. Os
sofrimentos do cristianismo, os perigos que ameaçavam a fé , as feridas
sofridas, a usurpaçã o sacrı́lega dos bens da Igreja, a profanaçã o das
coisas sagradas - tudo foi colocado diante dela, e ela foi tã o absorvida
pelos trabalhos resultantes disso, que dias e semanas se passaram
neste estado de abstraçã o espiritual. Ela manteve, entretanto, o
controle total sobre seus sentidos e faculdades, para que pudesse
cumprir os deveres da vida cotidiana naquele mundo do qual estava
cada vez mais afastada. Como ela poderia satisfazer suas exigê ncias,
como aqueles com quem ela vivia poderiam suportá -la, se o anjo nã o
tivesse vigiado essa vida dupla, se ele nã o a tivesse ajudado de tal
maneira que tudo o que ela fez recebeu uma bençã o, ele nã o tinha, em
suma, harmonizado essas operaçõ es diversi icadas?
Embora ainda jovem demais para cair sob a direçã o dos pastores do
rebanho de Deus, seu anjo era seu ú nico guia. Mas quando ela começou
a se aproximar dos Sacramentos, o respeito e a submissã o que ela
prestava ao anjo tornaram-se entã o o regra de sua comunicaçã o com o
sacerdote, o pró prio anjo dando-lhe o exemplo, submetendo sua
pró pria direçã o à do ministro de Deus. Ele agora era, por assim dizer,
apenas o tesoureiro e dispensador dos dons concedidos a seu aluno
para o benefı́cio dos ié is. Enquanto a Igreja, na pessoa de seus
sacerdotes, assumia a orientaçã o de Ana Catarina, ela mesma devia
realizar sua salvaçã o por meios comuns a todos os ié is. Os dons
maravilhosos de Deus nã o deveriam constituir o im de sua vida, mas
apenas um meio de cumprir sua missã o de sofrimento expiató rio para a
Igreja; conseqü entemente, esses dons deveriam cair sob o julgamento e
decisã o de seus superiores eclesiá sticos. O imenso poder do sacerdó cio
é inegavelmente provado, pois vemos o pró prio anjo se curvando à s
decisõ es da autoridade legal. Foi o anjo que lhe transmitiu a palavra de
obediê ncia de seu confessor ou superiores quando, transportada em
espı́rito para outros mundos, ela jazia como uma morta, totalmente
insensı́vel a todas as impressõ es externas. Uma palavra de qualquer um
era su iciente nesses momentos para trazê -la de volta à consciê ncia
instantaneamente.
Certa vez ela disse: “Quando em contemplaçã o, ou no cumprimento de
algum trabalho espiritual, muitas vezes sou repentinamente chamada a
este mundo de trevas por um poder sagrado e irresistı́vel. Ouço a
palavra 'obediência', como se pronunciada de longe. E um som triste
para mim nesses momentos, mas a obediê ncia é a raiz viva da á rvore da
contemplaçã o”.
No entanto, a voz do confessor nã o poderia tê -la alcançado senã o pelo
anjo que considerava a prá tica da obediê ncia mais meritó ria para seu
encargo do que os mais altos vô os de contemplaçã o. Embora sua ordem
inesperada e peremptó ria tenha perfurado sua alma como uma lecha,
ele nunca demorou para trazê -la de volta à consciê ncia com a palavra
de seus superiores.
Veremos, mais adiante, a direçã o do sacerdote oposta em muitos casos
à do anjo; mas nunca veremos o menor desvio da ordem prescrita por
Deus para a preservaçã o da fé em sua pureza - uma ordem por que
nenhuma vocaçã o, nenhum privilé gio pode isentar uma alma da
submissã o aos superiores. Nenhuma graça, nenhum grau de santidade
supera em dignidade e grandeza intrı́nsecas o cará ter sacerdotal. Entre
Deus, o Cabeça invisı́vel da Igreja, e os ié is nã o existe outro mediador
senã o o sacerdote; portanto, os tesouros de misericó rdia concedidos à
Igreja nas pessoas de Seus escolhidos devem cair sob a supervisã o do
sacerdó cio, devem ser recebidos por eles em con iança para as
necessidades dos ié is em geral. Assim foi com Anne Catherine
Emmerich. Seu anjo nã o omitiu nada para torná -la uma fonte de bê nçã o
para a Igreja. Essa bê nçã o deveria ser difundida apenas pelo ministro
de Deus e, de acordo com o uso feito desse poder, deveria ser seu fruto.
Capítulo 8
A V OCAÇAO DE A
NNE C ATHERINE AO ESTADO RELIGIOSO . _ _ _ ELA E
PREPARADA POR D IRECTO ESPECIAL . _ _ _
ELE desejo de viver somente para Deus foi aumentando no coraçã o
da maravilhosa criancinha. Ela sonhava apenas com o estado que
certamente a levaria à sua realizaçã o. Durante muito tempo, pensou
T em deixar secretamente sua casa para procurar em alguma terra
distante um lugar onde pudesse, sem que todos soubessem, levar
uma vida de penitê ncia. Seus pais, seus irmã os e irmã s eram os
ú nicos objetos que compartilhavam seu amor com Deus; no entanto,
ela se considerava carente de idelidade enquanto permanecesse em
seu lugar natal. Seu projeto era impraticá vel para algué m em sua
posiçã o; mas quanto maiores os obstá culos que se apresentavam, mais
ela suspirava pela vida contemplativa. O pensamento disso a perseguia
constantemente, formava o im supremo de todas as suas aspiraçõ es
juvenis. Ela era incapaz de controlar sua emoçã o ao ver um há bito
religioso, embora di icilmente ousasse esperar a felicidade de se vestir
de maneira semelhante.
Deus Todo-Poderoso, que a inspirou com esse desejo ardente, Se dignou
a guiá -la até o termo desejado. Se considerarmos o cará ter intrı́nseco e
as circunstâ ncias exteriores desta direçã o em conexã o com a situaçã o
em que a Igreja se encontrava na é poca, nã o deixaremos de descobrir
nela algo muito notá vel. Nele encontraremos os misteriosos caminhos
pelos quais Deus Todo-Poderoso ajuda a igreja em suas provaçõ es, e
uma prova consoladora e encorajadora de que os milagres de Seu Todo-
Poderoso poder nunca lhe faltam, mesmo quando seus pró prios
membros se aliam a seus inimigos para sua destruiçã o. Quando Ana
Catarina foi chamada para o estado religioso ali para exercer a mais
exaltada in luê ncia, aconteceram acontecimentos que izeram tamanha
devastaçã o na vinha da Igreja que ela nã o pô de, como uma Santa
Colette, restaurar a disciplina conventual nem estabelecer novas
comunidades. Restava-lhe apenas a tarefa muito mais á rdua de servir a
Deus como instrumento de expiaçã o, como fez Lidwina de Schiedam em
uma é poca igualmente desastrosa. Ela deveria satisfazer pelos pecados
dos outros, tomar sobre si as feridas do corpo da Igreja e, assim, aplicar
um remé dio.
Deus dirigiu a criança de acordo com sua imensa tarefa. Ele
condescendeu em cortejá -la como sua noiva, e assim prepará -la para a
mais alta perfeiçã o. A Igreja considera cada alma que faz os votos
triplos de religiã o como contraindo assim um noivado espiritual com
Deus; mas a extraordiná ria vocaçã o desta criança, os mú ltiplos favores
que lhe foram concedidos, a sua admirá vel idelidade à graça, sã o
provas de que a sua dignidade era inigualá vel, de que foi especialmente
escolhida para reparar os inú meros ultrajes oferecidos à Celestial
Esposa das almas. Deus em Sua liberalidade sempre reserva uma
superabundâ ncia de favores espirituais para Seus eleitos; mas, quando
Suas graças sã o desprezadas ou desperdiçadas, a justiça exige sua
retirada. Isso se seguiria como uma consequê ncia necessá ria, se Ele em
Sua misericó rdia nã o preparasse algumas almas nas quais armazenar
esses tesouros desprezados até tempos mais favorá veis. Agora, Deus
quer que esta guarda de Suas graças seja meritó ria; conseqü entemente,
Ele quali ica seu guardiã o para adquirir pelo trabalho e sofrimento
mais do que é su iciente para quitar as dı́vidas contraı́das pela
leviandade, preguiça, in idelidade ou malı́cia de outros. Esses
instrumentos da misericó rdia de Deus nunca faltaram à Igreja em
nenhuma é poca; e sã o tanto mais necessá rios para ela quanto o zelo de
seu sacerdó cio, os mediadores entre Deus e Seu povo, enfraquece. A
Igreja nunca foi tã o oprimida, o lagelo da incredulidade nunca
produziu devastaçõ es tã o grandes, os inimigos da Fé e suas
maquinaçõ es para sua destruiçã o nunca encontraram tã o pouca
resistê ncia como no perı́odo em que Deus Todo-Poderoso escolheu Ana
Catarina para Sua noivo. Pobre, fraco e humilde criança! Ela foi
chamada para a guerra contra inimigos poderosos. Deus colocou em
suas mã os as armas com as quais Ele mesmo, em Sua santı́ssima
Humanidade, havia conquistado o Inferno, e a exercitou naquele modo
de combate que assegura a vitó ria. Nó s a vemos conduzida, nã o pelo
caminho da prudê ncia e clarividê ncia humana, mas por aquele marcado
pela sabedoria impenetrá vel da Divina Providê ncia.
Ela estava em seu quinto ou sexto ano quando recebeu seu primeiro
chamado para o estado religioso. Ela diz sobre o assunto:
“Eu era apenas uma criança pequena e costumava cuidar das vacas, um
dever muito incô modo e cansativo. Um dia me ocorreu o pensamento,
como de fato acontecera muitas vezes antes, de deixar minha casa e as
vacas e ir servir a Deus em algum lugar solitá rio onde ningué m me
conhecesse. Tive uma visã o em que fui a Jerusalé m, onde encontrei uma
religiosa na qual depois reconheci Santa Joana de Valois. Ela parecia
muito sé ria. Ao lado dela estava um adorá vel garotinho mais ou menos
do meu tamanho. St. Jane nã o o segurou pela mã o, e eu sabia por isso
que ele nã o era seu ilho. Ela me perguntou o que estava acontecendo
comigo, e quando eu disse a ela, ela me confortou, dizendo: 'Nã o
importa! Olha esse garotinho! Você gostaria dele para sua esposa? Eu
disse sim!' Entã o ela me disse para nã o desanimar, mas para esperar até
que o menino viesse me buscar, assegurando-me que eu seria um
religioso, embora parecesse bastante imprová vel na é poca. Ela me disse
que eu certamente deveria entrar no claustro, pois nada é impossı́vel
para meus noivos. Entã o voltei a mim e levei as vacas para casa. A partir
daquele momento, ansiei pelo cumprimento de sua promessa. Tive essa
visã o ao meio-dia. Essas coisas nunca me perturbaram. Achei que todo
mundo tinha. Eu nunca soube qualquer diferença entre eles e real
relaçõ es com as criaturas.”
Algum tempo depois aconteceu outro incidente que a encorajou a fazer
um voto de entrar na religiã o. Ela mesma relata: “Meu pai havia
prometido dar a cada ano um bezerro à s freiras da Anunciaçã o de
Coesfeld, e quando ele ia cumprir seu voto ele costumava me levar com
ele. As freiras costumavam brincar comigo, me girando na volta, me
dando presentinhos e me perguntando se eu nã o queria icar com elas.
Eu sempre respondia: 'Sim', e nunca quis deixá -los. Entã o eles diziam:
'Da pró xima vez nó s vamos icar com você ! Pró xima vez!' Jovem como
eu era, criei uma afeiçã o por esta casa em que a Regra ainda era
rigorosamente observada e, sempre que ouvia seus sinos, costumava
me unir à s boas freiras em oraçã o. Desta forma, vivi em estreita uniã o
com eles.
“Uma vez, por volta das duas horas, em um dia abafado de verã o, saı́
com as vacas. O cé u escureceu, o trovã o rolou, uma tempestade estava
pró xima. As vacas estavam inquietas por causa do calor e das moscas, e
eu estava muito ansioso para saber como manejá -las, pois eram cerca
de quarenta e elas nã o me deram pouca di iculdade em correr para o
bosque. Pertenciam a toda a aldeia. Quantas vacas cada camponê s
possuı́a, tantos dias ele era obrigado a pastoreá -las. Quando eu estava
encarregado deles, sempre passava meu tempo em oraçã o. Eu
costumava ir a Jerusalé m e Belé m. Eu estava mais familiarizado com
esses lugares do que com minha pró pria casa. No dia em questã o,
quando a tempestade estourou, refugiei-me sob alguns zimbros que
icavam atrá s de uma colina de areia. Comecei a orar e tive uma visã o.
Um religioso idoso, vestido com o há bito dos Annonciades, apareceu e
começou a falar comigo. Ela me disse que limitar a honra que
prestamos à Mã e de Deus a adornar suas está tuas, a carregá -las em
procissã o e a dirigir-lhe belas palavras, nã o é verdadeiramente honrá -
la. Devemos imitar suas virtudes, sua humildade, sua caridade, sua
pureza. Disse també m que, na tempestade ou em qualquer outro
momento de perigo, nã o há maior segurança do que voar para as
Chagas de Jesus; que ela mesma teve profunda devoçã o a essas
Sagradas Chagas; que ela tinha recebido a impressã o dolorosa deles,
mas sem que ningué m soubesse. Ela me disse que sempre usava no
peito um pano de cabelo cravejado de cinco pregos e uma corrente na
cintura, mas que tais prá ticas deveriam ser mantidas em segredo. Falou
també m da sua particular devoçã o à Anunciaçã o da Santı́ssima Virgem.
Foi-lhe revelado que Maria desde a sua tenra infâ ncia suspirava pela
vinda do Messias, desejando para si apenas a honra de servir à Mã e de
Deus. Entã o ela me disse que tinha visto a saudaçã o do Arcanjo, e eu
descrevi para ela como eu tinha testemunhado isso. Logo nos sentimos
à vontade um com o outro, pois ambos tinham visto as mesmas coisas.
“Eram cerca de quatro horas quando voltei a mim mesmo; o sino dos
Annonciades tocava para rezar, a tempestade havia passado e encontrei
minhas vacas reunidas em silê ncio. Eu nem estava molhada da chuva.
Foi entã o que iz o voto de me tornar religioso. A princı́pio, pensei nos
Annonciades; mas, re letindo melhor, concluı́ que seria melhor icar
completamente separado de minha famı́lia. Eu mantive minha
resoluçã o em segredo. Descobri mais tarde que a religiosa com quem
conversei era St. Jane. Ela foi forçada a se casar. Muitas vezes a vi em
minhas viagens a Jerusalé m e Belé m. Ela costumava ir comigo, assim
como St. Frances e St. Louisa.
A partir deste momento, Anne Catherine estava irmemente decidida a
entrar em um convento. Ela nã o via nenhuma possibilidade humana de
cumprir seu voto, muito menos ela tinha alguma ideia de onde ela iria
se candidatar para ser admitida; mas forte na lembrança do que lhe
fora prometido, ela estava certa de que Deus aperfeiçoaria nela o que
Ele havia começado, que Ele mesmo seria seu guia. Ela tentou, à sua
maneira, começar imediatamente a vida de uma religiosa na medida em
que as circunstâ ncias permitissem. Ela considerava seus pais e
professores como seus superiores e os obedecia pontualmente. A
morti icaçã o, a renú ncia e a aposentadoria prescritas pelo regras
conventuais, ela observou tã o perfeitamente quanto pô de.
Uma de suas companheiras, Elizabeth Wollers, depô s perante a
autoridade eclesiá stica, em 4 de abril de 1813:
“Conheço Anne Catherine Emmerich desde a infâ ncia. Está vamos muito
juntos; na verdade, vivemos por um tempo sob o mesmo teto. Seus pais
eram rı́gidos, mas nã o duros. Era de boa ı́ndole, muito afeiçoada à
famı́lia, prudente e bastante reservada. Mesmo quando pequena queria
ser freira, sempre tendo atraçã o pela piedade, nã o se importando com
companhias ou diversõ es. Ela geralmente os deixava e ia à igreja. Era
recolhida, poupadora de palavras, ativa, laboriosa, cordial e afá vel para
com todos. Suas maneiras vencedoras muitas vezes ganhavam seus
pequenos presentes. Ela era de bom coraçã o, mas à s vezes um pouco
rá pida e impetuosa, o que lhe dava motivos para se arrepender. Ela nã o
era meticulosa com seu vestido, embora fosse muito limpa e arrumada.”
Em seu dé cimo segundo ano, ela entrou para o serviço na famı́lia de um
de seus parentes també m chamado Emmerich. Sua esposa fez o
seguinte depoimento, 18 de abril de 1813:
“Quando Anne Catherine tinha doze ou treze anos, ela veio à minha casa
e criou as vacas. Ela era gentil e respeitosa com todos; nenhuma falha
foi encontrada com ela; nossa relaçã o era sempre agradá vel. Ela nunca
foi a nenhuma assemblé ia de prazer. Ela preferia ir à igreja. Ela era
conscienciosa, trabalhadora e piedosa; ela falava bem de todos; ela era
indiferente à s coisas deste mundo. Ao lado de sua pessoa, ela usava
uma roupa de lã á spera. Ela costumava jejuar continuamente dizendo
que nã o tinha apetite. Quando eu a aconselhava a desistir da ideia de
ser freira, pois teria que sacri icar tudo para isso, ela costumava dizer:
'Nã o fale assim comigo ou vamos brigar. Devo ser religioso, estou
decidido a sê -lo!' ”
Anne Catherine conheceu nesta nova casa alguns camponeses
abastados, uma circunstâ ncia muito agradá vel para seus pais, que
esperavam que, sendo jogado mais com os outros, ela gradualmente
tornam-se menos silenciosos e reservados. Eles nã o conseguiam
entender tamanha aversã o ao mundo em uma criança tã o jovem e
temiam, alé m disso, que sua vida aposentada prejudicasse suas
perspectivas futuras. Mas quanto mais Anne Catherine via o mundo,
mais aumentava seu desgosto por ele. Ela estava sempre em
contemplaçã o, mesmo no meio daquelas ocupaçõ es exteriores que
sabia desempenhar com tanta habilidade. Quando trabalhava nos
campos, se a conversa se voltasse para Deus, ela pronunciava algumas
palavras curtas; caso contrá rio, calava-se realizando sua parte no
trabalho de parto de forma rá pida, calma e sistemá tica. Se ela fosse
abordada de repente, ou ela nã o ouvia nada ou, como quem acorda de
um sonho, itando seu interlocutor com olhos cuja expressã o fazia até
mesmo seus companheiros simpló rios suspeitarem que eles nã o
estavam voltados para coisas sensatas, ela deu uma resposta
irrelevante para o assunto. Mas sua ingenuidade cativante, sua cordial
disposiçã o de agradar, logo dissipou a impressã o produzida por seus
modos.
Depois de trê s anos passados na famı́lia de seu parente, ela foi colocada
com uma costureira, sua mã e pensando que isso se adequaria melhor à
sua constituiçã o delicada do que o trabalho duro. Antes de começar seu
aprendizado, no entanto, ela voltou para casa por um tempo para
ajudar na colheita. Ocorreu um incidente nessa é poca que levou à
divulgaçã o de seu projeto há muito acalentado para entrar no claustro.
Estavam todos trabalhando no campo uma tarde quando o sino dos
Annonciades tocou para as Vé speras. Anne Catherine o ouvira muitas
vezes antes, mas desta vez o som comoveu tanto sua alma que quase
perdeu a consciê ncia. Era como se uma voz lhe chamasse: “Vá para o
convento! Vá a qualquer custo!” Ela nã o pô de continuar seu trabalho e
teve que ser levada para casa.
“A partir deste momento”, ela conta, “começou a icar doente. Eu tinha
vô mitos frequentes e estava muito triste. Enquanto eu andava lâ nguido
e triste, minha mã e implorou ansiosamente que eu lhe contasse a causa.
Entã o contei a ela meu desejo de entrar para um convento. Ela icou
muito aborrecida e me perguntou como eu poderia pensar em tal coisa
em minha pobreza e estado de saú de. Ela colocou o caso diante de meu
pai, que imediatamente se juntou a ela para tentar me dissuadir do
pensamento. Disseram que essa vida seria muito dolorosa para mim,
pois uma pobre camponesa só seria desprezada pelos outros religiosos.
Mas eu respondi: 'Deus é rico, embora eu nã o tenha nada. Ele fornecerá .
A recusa de meus pais me entristeceu tanto que adoeci e fui obrigado a
icar de cama.
“Um dia, por volta do meio-dia, o sol brilhava pela janelinha do meu
quarto, quando vi um homem santo com duas religiosas se
aproximarem de minha cama. Eles estavam deslumbrantes com a luz.
Eles me apresentaram um livro grande como um missal e disseram: 'Se
você puder estudar este livro, verá o que pertence a um religioso.'
Respondi: 'Vou ler logo', e peguei o livro no colo. Era latim, mas
compreendi cada palavra e li com avidez. Eles deixaram comigo e
desapareceram. As folhas eram de pergaminho, escritas em letras
vermelhas e douradas. Havia algumas fotos dos primeiros santos nele.
Estava encadernado em amarelo e nã o tinha fechos. Levei-o comigo
para o convento e li-o com atençã o. Quando eu lia um pouco, era
sempre tirado de mim. Um dia estava sobre a mesa quando vá rias das
Irmã s entraram e tentaram tirá -lo com elas, mas nã o conseguiram tirá -
lo do lugar. Mais de uma vez me foi dito: 'Tu ainda tens tantas folhas
para ler'. Anos depois, quando fui arrebatado em espı́rito para a
Montanha dos Profetas, vi este mesmo livro entre muitos outros
escritos profé ticos de todos os tempos e lugares. Foi-me mostrado
como a parte que eu deveria ter nesses tesouros. Outras coisas que
recebi em vá rias ocasiõ es e que guardei por muito tempo també m
foram preservadas aqui. Atualmente, 20 de dezembro de 1819, ainda
tenho cinco folhas para ler; mas devo ter tempo livre para isso, para
que eu possa deixar seu conteú do depois de mim. 1
Este livro misterioso nã o era meramente simbó lico, era um livro real,
um volume de profecias. Fazia parte, como será visto mais adiante, do
tesouro de escritos sagrados preservados sobre o que Anne Catherine
chama de “Montanha dos Profetas”. Esses escritos sã o transmitidos
milagrosamente à queles que, pela infusã o da luz profé tica, tornaram-se
capazes de lê -los. O livro em questã o tratou da essê ncia e signi icado do
estado religioso, sua posiçã o na Igreja e sua missã o em todas as é pocas;
ensinou també m à queles a quem foi dada tal vocaçã o que serviço eles
poderiam prestar à Igreja em seu pró prio tempo. O que Anne Catherine
leu neste livro foi depois revelado a ela em uma sé rie de fotos. Quando
ela recitava um salmo, o Magni icat, o Benedictus, o Evangelho de Sã o
Joã o, uma oraçã o da liturgia ou a Ladainha da Santı́ssima Virgem, as
palavras se desdobravam, por assim dizer, como o ová rio que conté m a
semente, e sua histó ria e signi icado foram apresentados à sua
contemplaçã o. Foi o mesmo com este livro. Nele ela aprendeu que o
objetivo principal da vida religiosa é a uniã o com o Noivo Celestial, e
nesta visã o geral ela percebia distintamente seu pró prio dever com os
meios, os obstá culos, os trabalhos, dores e morti icaçõ es que
promoveriam sua realizaçã o. Tudo isso ela viu nã o só no que se referia
à sua pró pria santi icaçã o, mas també m no que dizia respeito à situaçã o
e à s necessidades de toda a Igreja. Ela nã o havia recebido a graça da
vocaçã o religiosa apenas para si mesma. Ela deveria ser, por assim
dizer, um tesouro para esta graça com todos os favores ligados a ela,
para que ela pudesse preservá -la para a Igreja em um momento em que
a vinha do Senhor estava sendo devastada; portanto, tudo o que ela
aprendeu no livro profé tico, e tudo o que ela fez de acordo com seus
ensinamentos, trazia o selo de expiaçã o e satisfaçã o pelas falhas dos
outros. Seus trabalhos espirituais eram realizados menos para ela
mesma do que para o pró ximo; foram uma colheita, uma conquista,
cujos frutos e despojos foram para o bem de toda a Igreja.
Quanto mais de perto Anne Catherine estudava esse livro misterioso,
mais extensas se tornavam suas visõ es, mais elas in luenciavam toda a
sua vida interior e exterior. Ela viu a harmonia dos quadros
apresentados à sua alma, seja entre si, seja com a pró pria missã o; ela
viu que eles abraçavam em sua totalidade a histó ria de uma alma que
busca seu Esposo Celestial. Ela suspira por Ele, ela tende para Ele, ela
prepara tudo o que é necessá rio para seus esponsais; mas ela está
continuamente atrasada e perplexa pela perda ou destruiçã o de muitos
artigos necessá rios, e pelos esforços maliciosos de outros para frustrá -
la e aborrecê -la. De tempos em tempos, eventos iminentes eram
mostrados a ela em imagens simbó licas, que nunca deixavam de ser
realizadas. Ela foi advertida dos obstá culos causados por suas pró prias
falhas e por sua condescendê ncia excessiva para com os outros; mas
essa presciê ncia nunca removeu as di iculdades de seu caminho. Isso,
de fato, a fortaleceu e a iluminou, mas a vitó ria ainda seria conquistada
por muitas lutas á rduas.
Os trabalhos de visã o de Anne Catherine referiam-se aos ornamentos
nupciais de uma donzela prometida a um consorte real. Tudo o que
uma mã e cuidadosa e criteriosa faria para preparar seu ilho para tal
prometido, foi precisamente o que ela fez em suas visõ es. Ela preparou
todas as coisas como na vida comum e ordiná ria, mas com um
signi icado muito mais elevado e resultados totalmente diferentes. Ela
preparou o solo, semeou a semente, arrancou as ervas daninhas, colheu
o linho, encharcou, eclodiu, iou e teceu; por ú ltimo, branqueou o linho
destinado à noiva. Em seguida, ela cortou, confeccionou e bordou as
numerosas peças de acordo com seus variados signi icados. Esses
trabalhos espirituais eram tı́picos do cansaço, da morti icaçã o e das
vitó rias pessoais de sua vida diá ria. Cada ponto simbolizava alguma dor
suportada pacientemente que aumentava seus mé ritos e a ajudava a
chegar ao im. Um ato imperfeito de virtude aparecia em sua visã o
como uma costura defeituosa ou um bordado que precisava ser retirado
e refeito. A cada ato de impaciê ncia ou avidez, as menores falhas
apareciam em seu trabalho, como defeitos que deviam ser reparados ou
removidos por redobrado esforço. Ano apó s ano, esses trabalhos
avançavam desde o mais simples artigo de vestuá rio até o manto festivo
da noiva. Cada peça foi inalizada fora por algum sacrifı́cio e
cuidadosamente guardado até o momento do casamento. A visã o
relativa a este im tornou-se a cada dia mais extensa. Todas as
circunstâ ncias e in luê ncias que pesavam sobre a Igreja nesta é poca
foram retratadas. Todas as pessoas em todo o mundo, sejam
eclesiá sticas ou seculares, que se opuseram ou apoiaram os interesses
da Igreja, foram mostradas mais claramente com suas petiçõ es nã o
respondidas, seus empreendimentos malsucedidos e suas esperanças
frustradas.
Os trabalhos espirituais de Anne Catherine misturavam-se simples e
naturalmente com sua vida exterior; uma nunca interferiu na outra, e
ela mesma nã o tinha consciê ncia de nenhuma diferença entre as duas
açõ es. Eles eram apenas um e o mesmo para ela, uma vez que visõ es e
intençõ es semelhantes governavam ambos, e ambos eram direcionados
para o mesmo im. Seu trabalho espiritual precedeu suas açõ es
exteriores como a oraçã o de um cristã o piedoso. Ele oferece suas obras
a Deus para Sua maior gló ria e a aquisiçã o de alguma virtude. Como ele
está acostumado a renovar sua intençã o ao longo do dia, a fortalecer-se
em suas boas disposiçõ es e desı́gnios, assim també m era uma e a
mesma coisa para Ana Catarina obedecer sua patroa ou seus pais e
seguir as instruçõ es recebidas. na visã o. Uma vez que ela explicou, da
seguinte forma:
“Nã o consigo entender como essas visõ es estã o conectadas com minhas
açõ es; mas é de acordo com eles que ou executo pontualmente, ou
cuidadosamente evito tudo o que ocorre no curso da vida cotidiana.
Este fato sempre foi muito claro para mim, embora nunca tenha
conhecido ningué m que pudesse compreendê -lo. Acredito que o mesmo
acontece com todo aquele que trabalha zelosamente para alcançar a
perfeiçã o. Ele nã o vê a orientaçã o do Deus Todo-Poderoso em seu
pró prio respeito, embora outro iluminado do alto possa fazê -lo. Isso eu
tenho experimentado muitas vezes no caso de outros. Mas, embora a
alma nã o veja a direçã o divina, ainda assim ela nã o a segue enquanto
obedece à s inspiraçõ es de Deus que lhe sã o conhecidas pela oraçã o,
pelos confessores, pelos superiores e pelos eventos comuns da vida.
Para qualquer lado que eu olhe, vejo que humanamente falando minha
entrada em um convento é impossı́vel; mas, em minhas visõ es, sou
sempre e certamente conduzido a isso. Recebo uma segurança interior
que me enche de con iança de que Deus, que é todo-poderoso, me
conduzirá até o im de meus desejos”.
Quando Anne Catherine se recuperou de sua doença, ela procurou uma
fabricante de mâ ntuas de Coesfeld, Elizabeth Krabbe, sua boa mã e
esperando ansiosamente que esse contato com pessoas de todas as
classes a distraı́sse um pouco e a afastasse de seu desejo da vida
conventual. . Mas Deus ordenou que esse mesmo perı́odo de cerca de
dois anos fosse o mais tranquilo de sua vida. Ela nã o precisava começar
aprendendo. Da mesma forma que anteriormente se desincumbira
dignamente de todos os seus deveres sem prejuı́zo da contemplaçã o,
agora seus dedos habilidosos manejavam a agulha, sua mente se
voltava para outras coisas. Ela podia realizar as tarefas mais difı́ceis
sem a menor aplicaçã o mental, seus dedos se movendo mecanicamente.
A princı́pio ela se sentou à mesa de trabalho com inquietaçã o, sabendo
bem que seria impossı́vel resistir à s visõ es que tã o repentinamente a
sobrevieram; ela estava atormentada pelo medo de atrair a atençã o de
seus companheiros. Ela implorou a ajuda de Deus, e sua oraçã o foi
ouvida. O anjo a inspirou com as respostas apropriadas quando
inesperadamente endereçada, e cuidou de seus dedos para evitar que
seu trabalho caı́sse. Ela logo se tornou tã o habilidosa em seu ofı́cio que,
até o im de sua vida, pô de consagrar suas noites de sofrimento nã o
apenas à oraçã o e ao trabalho puramente espiritual, mas també m à
costura para crianças pobres e doentes, sem aplicar nem a mente nem
os olhos a ela. o trabalho.
Podemos facilmente acreditar que os duros trabalhos de campo de seus
dias de juventude, exigindo, como o izeram, maior esforço fı́sico,
tornaram muito mais fá cil para ela resistir a uma profunda absorçã o na
visã o do que quando sentada calmamente em uma mesa empregada em
coisas que custam pouco. esforço ou atençã o. Toda a sua alma estava
agora arrebatada em suas contemplaçõ es. Agarraram-se a ela com mais
veemê ncia do que as cenas da Histó ria Sagrada, já que o assunto era
quase sempre sua pró pria vida. e a tarefa que ela deveria cumprir. Deus
lhe mostrou as grandes coisas que Ele opera em uma alma chamada à
vida religiosa, e a graça necessá ria a uma criatura fraca e inconstante
para chegar ao seu im sublime, apesar das falhas e in idelidades. Cheia
de gratidã o, ela louvou a comovente generosidade de Deus, que
prodigaliza seus dons inestimá veis sobre certas almas escolhidas, e
maior se tornou sua tristeza pela triste situaçã o da Igreja, na qual o
estado religioso com seus votos sagrados parecia morrer rapidamente.
Tudo isso lhe foi mostrado para animá -la à oraçã o, ao sofrimento e ao
sacrifı́cio pela preservaçã o dessas graças à Igreja; para despertá -la a um
maior ardor no seguimento da pró pria vocaçã o e oferecer-se como
vı́tima perpé tua para expiar a ingratidã o e o desprezo com que foi
tratada em toda parte.
O Salvador mostrou-lhe tudo o que havia feito e sofrido para conferir à
Sua Igreja a jó ia do estado religioso. Ele a colocou sob o patrocı́nio e
cuidado especial de Sua Mã e purı́ssima; e, para realçar a gló ria daquela
Mã e, delegara-lhe o privilé gio de plantar as diversas Ordens na vinha da
Igreja e de as reformar quando necessá rio. Foi a Maria que Ana Catarina
apresentou uma a uma as roupas nupciais enquanto as terminava, para
receber sua aprovaçã o ou correçã o. Quando nos lembramos do costume
de Anne Catherine de se disciplinar com espinhos e urtigas, mesmo em
seu quarto ano, quando viu criancinhas ofenderem a Deus, talvez
possamos formar uma pequena idé ia daquele amor que agora a levou a
indenizá -lo pela in idelidade de seus cô njuges in ié is. . Esse desejo
aumentava à medida que ela entendia mais claramente a alta dignidade
dos votos religiosos. Quando re letia sobre o mé rito e a perfeiçã o
comunicados pelos votos à s açõ es mais insigni icantes, ansiava pelo
privilé gio de fazê -las. Ela considerou uma vida inteira de trabalho e
sofrimento insu icientes para comprar um favor tã o alto; portanto, a
absoluta impossibilidade de realizar imediatamente seu desejo nã o
tinha poder para intimidar sua nobre alma, embora sua força fı́sica
cedesse sob a pressã o constante. de sofrimento interior, e ela icou tã o
doente que foi forçada a desistir de seu aprendizado.
Sua amante, a fabricante de mâ ntuas, depô s o seguinte perante a
autoridade eclesiá stica, em 14 de abril de 1813:
“Conheci Anne Catherine Emmerich quando ela tinha apenas doze anos.
Ela morava com seu parente, Zeller Emmerich, em Flamske, paró quia
de St. James, Coesfeld. Foi dessa situaçã o que ela veio a mim aos quinze
anos para aprender a fazer mâ ntua. Ela icou comigo apenas cerca de
dois anos, pois adoeceu, e antes de se recuperar completamente foi
para Coesfeld, onde permaneceu.
“Enquanto estava em minha casa, ela se comportou da maneira mais
exemplar. Ela era muito trabalhadora, silenciosa e reservada, sempre
pronta para fazer o que lhe mandavam. Ela icava comigo apenas nos
dias ú teis, domingos e dias santos sendo passado em casa. Nunca vi
nenhum defeito nela, a nã o ser, talvez, que ela fosse um pouco exigente
em seu vestido.
Quando Dean Overberg, em 21 de abril de 1813, perguntou a Anne
Catherine se era verdade que em sua juventude ela tinha sido exigente
com seu vestido, ela respondeu:
“E verdade que sempre quis estar bem e bem vestido, embora nã o para
agradar as criaturas; foi para Deus. Minha mã e muitas vezes nã o
conseguia me satisfazer nesse ponto. As vezes eu ia até a á gua ou diante
de um espelho para arrumar meu vestido. Estar vestido decentemente e
bem é bom para a alma. Quando eu ia muito cedo para a Sagrada
Comunhã o, costumava me vestir com tanto cuidado como se fosse dia
claro; mas foi para Deus, e nã o para o mundo”.
Capítulo 9
A NNE C ATHERINE DO DEZESSETE A 20 ANOS EM C
OESFELD . _ _ _ _
Até o presente, Deus Todo-Poderoso havia dirigido Anne
Catherine por meios extraordiná rios para o estado religioso.
Agora ela deveria seguir o caminho comum, para superar
você aquelas di iculdades contra as quais todos os assim chamados
tê m mais ou menos que lutar. Enquanto sua alma estava imersa
na contemplaçã o da suprema excelê ncia e dignidade daquele
estado, seu desejo de abraçá -lo só era igualado pela tristeza ao
ver sua lamentá vel decadê ncia e os esforços de seus inimigos para
destruı́-lo. Suas provaçõ es interiores consistiam, em sua maior parte,
em suas dolorosas tentativas de controlar seu desejo ardente e sua
ignorâ ncia sobre como poderia triunfar sobre obstá culos
aparentemente intransponı́veis. Deus quis que ela experimentasse a
fraqueza de uma alma lançada sobre seus pró prios recursos, que ela
provasse sua idelidade em meio à s trevas, aridez e contradiçõ es.
Aos dezessete anos começou um novo perı́odo em sua direçã o, que
durou até seus vinte anos. Ela residia em Coesfeld, trabalhando em seu
ofı́cio de fabricaçã o de mâ ntua, esperando por estrita economia juntar
uma quantia su iciente para obter sua admissã o em um convento. Mas
esse plano nunca foi realizado. Seus pequenos ganhos semanais eram
muitas vezes liquidados no pró prio dia em que eram recebidos, pois
tudo o que ela ganhava pertencia aos pobres. O seu desejo de entrar
para um convento, embora verdadeiramente intenso, nã o igualava o seu
amor pelos necessitados de quem nunca hesitou em espoliar-se. Um dia
ela conheceu um velho mulher em trapos. Sem pensar, ela tirou uma de
suas roupas (a ú nica do tipo que ela possuı́a) para vestir o mendigo.
Quanto mais dolorosa a privaçã o em favor de seu vizinho, mais
prontamente ela a abraçou, esperando com isso recuperar o fervor que
temia ter perdido durante sua estada em Coesfeld. As consolaçõ es que
uma vez experimentara em suas devoçõ es foram retiradas, e ela
imaginou ter esfriado no amor de Deus. Esse pensamento a
atormentava muito, especialmente quando ela descobriu que suas
prá ticas habituais de piedade se tornaram difı́ceis e dolorosas. Ela
atribuiu isso à sua pró pria in idelidade e se considerou totalmente
inapta para a vocaçã o religiosa. Nenhuma penitê ncia, pensou ela,
poderia expiar suas faltas e, apesar de sua repugnâ ncia, ela multiplicou
suas austeridades e devoçõ es. Na Con issã o ela nã o podia acusar-se da
menor negligê ncia ou consentir em sua sú bita antipatia pelas coisas
espirituais, mas seu sentimento de culpa era tã o grande que ela nã o
ousava aproximar-se da Santa Mesa com a frequê ncia de costume, uma
ordem positiva de seu confessor sendo necessá rio para superar seu
medo. Assim ela lutou por trê s anos, quando Deus novamente inundou
sua mente com luz, seu coraçã o com paz e alegria.
Sua famı́lia nessa é poca a incomodava de muitas maneiras em seus
esforços para desviá -la de entrar em um convento. A fabricante de
mâ ntuas, em cujo estabelecimento ela trabalhava, formou por ela tal
afeiçã o que vá rias vezes ela se ofereceu para icar solteira e
compartilhar tudo o que possuı́a com ela se ela apenas prometesse
nunca deixá -la, se ela levasse com ela uma vida inteiramente dedicado
ao serviço de Deus. Nunca embaraçou sua jovem operá ria por
curiosidade indiscreta, nem a conteve em nada. Ela icou satisfeita
quando outras jovens vieram pedir seu conselho em suas prá ticas de
piedade, esperando que Anne Catherine olhasse mais favoravelmente
para sua proposta quando visse nela uma oportunidade de fazer o bem.
Mas este ú ltimo nã o podia ser conquistado. Ela recusou suas ofertas
benevolentes com argumentos tã o doces e persuasivos que o bom
entendimento existente entre eles nunca foi ferido.
Era mais difı́cil resistir aos pais que imaginavam que ela perderia o
desejo da vida religiosa se conseguissem convencê -la a participar das
diversõ es mundanas. Anne Catherine sempre achou difı́cil recusar
qualquer coisa ao vizinho, e como ela poderia repelir continuamente
aqueles bons pais quando eles a incitavam a ir a um baile ou a outro
lugar com seus irmã os e irmã s? Por duas vezes ela deu um
consentimento relutante esperando por esta concessã o para se
proteger de mais protestos sobre o assunto. Ela diz:
“Uma vez meu irmã o mais velho insistiu que eu fosse com ele a um
baile. Eu recusei. Ele se apaixonou e saiu de casa. Mas ele logo voltou
chorando amargamente e se ajoelhou na presença de nossos pais para
pedir perdã o. Nunca discordamos antes nem depois.
“Mas um dia, quando permiti que me persuadissem a ir a tal
assemblé ia, iquei tã o triste que quase me desesperei. Meu coraçã o
estava longe da cena gay. Sofri o tormento do Inferno, e fui tã o
fortemente incitado a deixar o lugar que mal consegui me controlar.
Permaneci apenas por medo de atrair atençã o. Por im, pensei ter
ouvido meu Esposo Divino me chamando e fugi de casa. Olhei em volta,
e ali O vi parado debaixo de uma á rvore, triste e descontente, Seu rosto
pá lido e ensanguentado. Ele me disse: 'Como você é in iel! Você se
esqueceu de mim? Como me trataste! Nã o Me reconheces?' Entã o
implorei perdã o. Ele me disse o que eu deveria fazer para evitar o
pecado; isto é , ajoelhar-se e orar com os braços estendidos e ir onde
minha presença impediria sua comissã o.
“Em outra ocasiã o, fui, embora com relutâ ncia, ao mesmo tipo de
reuniã o. Mas novamente fui atraı́do por um poder irresistı́vel e fugi
apesar dos meus companheiros que tentaram me deter. Achei que a
terra iria me engolir. Senti como se fosse morrer de tristeza. Mal havia
passado o portã o da cidade, quando uma majestosa senhora apareceu
diante de mim e em tom severo me dirigiu assim: 'O que você fez? Que
conduta é essa? Tu foste prometida a meu Filho, mas tu nã o mereces
mais essa honra!' Entã o o Jovem se aproximou, pá lido e des igurado.
Suas censuras feriram meu coraçã o, quando re leti em que companhia
estive enquanto Ele me esperava, triste e sofredor. Achei que deveria
morrer. Implorei a Sua Mã e que intercedesse por mim e prometi nunca
mais ceder. Ela assim o fez, fui perdoado e resolvi nunca mais me deixar
seduzir por esses lugares. Depois de me acompanharem um pouco, eles
desapareceram. Eu estava bem acordado, com plena consciê ncia. Eles
tinham falado comigo como pessoas comuns. Voltei para casa
soluçando, triste até a morte. No dia seguinte, meus amigos me
censuraram por tê -los deixado, mas nunca mais me pressionaram para
assistir a tais diversõ es. Mais ou menos na mesma é poca, um pequeno
livro caiu nas mã os de meu pai no qual ele leu que os pais estã o errados
em obrigar seus ilhos a ir a esses lugares. Ele icou tã o perturbado que
derramou lá grimas, dizendo: 'Deus sabe que minha intençã o foi boa!'
Eu o consolei.” A oposiçã o de seus pais, poré m, nã o cessou; na verdade,
tornou-se apenas o mais obstinado. A primeira vista, parece estranho
que esses pobres camponeses, que nã o podiam ter esperança de ver
sua ilha ocupando outra posiçã o na vida alé m de uma posiçã o muito
humilde, se opusessem tã o fortemente a que ela se tornasse religiosa;
mas quando re letimos o tesouro que ela era para eles, nã o podemos
mais nos surpreender. Ela era sua alegria e consolo. Eles recorreram a
ela em todas as dú vidas. Sua sabedoria e inteligê ncia os guiavam em
todas as emergê ncias, eles nã o podiam prescindir dela. Tudo o que ela
empreendeu recebeu uma bê nçã o; nada funcionava tã o bem quando
seu ilho favorito estava ausente, e havia algo tã o atraente nela que eles
nã o suportavam icar separados dela por muito tempo. Ela estava
atenta aos seus desejos, ela procurou grati icar todos os seus desejos.
Eles a viam como o suporte de sua velhice. Embora ela estivesse há
alguns anos sob o teto paterno, a distâ ncia era tã o curta que as relaçõ es
diá rias nã o foram interrompidas; mas o claustro, uma vez que entrasse,
os privaria completamente de sua presença. Eles a conheciam muito
bem para nã o se sentirem con iantes de que, mesmo estando em uma
comunidade relaxada, ela viveria como uma religiosa perfeita,
observando escrupulosamente sua Regra. Eles teriam icado mais
satisfeitos em descobrir nela uma inclinaçã o para o estado de casado,
pois isso nã o impediria sua comunicaçã o frequente com ela. Eles
també m temiam que sua pobreza se tornasse motivo de reprovaçã o
para seu ilho na condiçã o miserá vel a que os conventos foram entã o
reduzidos. Acionados por essas consideraçõ es, imploraram-lhe com
lá grimas, censuras e sú plicas que abandonasse um desı́gnio que
representavam como efeito de capricho e presunçã o, ou como desejo de
escapar de uma vida de pobreza no mundo. Seu coraçã o afetuoso foi
esmagado por tais argumentos, e muitas vezes ela nã o sabia o que
responder. Seu ú nico recurso era a oraçã o, da qual extraı́a a força e a luz
necessá rias para realizar sua resoluçã o.
“Meus pais”, disse ela a Dean Overberg, “falavam de casamento, pelo
qual eu sentia a maior repugnâ ncia. As vezes eu pensava que meu
desgosto por ela vinha do medo dos deveres que ela impõ e. 'Se for da
vontade de Deus que eu me case', disse a mim mesmo, 'devo estar
disposto a suportar o fardo.' Entã o eu implorei a Deus para tirar de mim
esse sentimento de antipatia, se fosse da Sua vontade que eu me
conformasse com os desejos de meus pais. Mas minha saudade do
convento só aumentou.
“Eu expus meu problema diante do meu pastor e do meu confessor, e
implorei o conselho deles. Ambos me disseram que se nã o houvesse
outras crianças para cuidar de meus pais, eu nã o deveria entrar na
religiã o contra a vontade deles; mas que, como eles tinham vá rios ilhos
e ilhas, eu estava livre para seguir minha vocaçã o. Entã o eu perseverei
na minha resoluçã o.”
Era um fato muito notá vel que, embora Ana Catarina tivesse tantas
vezes recebido em visã o um chamado positivo para o estado religioso,
ainda assim ela teve que recorrer aos meios comuns para uma
con irmaçã o do que havia sido extraordinariamente comunicado. Como
os obstá culos nã o desapareceram milagrosamente, pois tiveram que ser
superados por seus pró prios esforços, tampouco sua iluminaçã o
sobrenatural a dispensou da obrigaçã o de provar sua vocaçã o pelos
mé todos usuais. Ela foi chamada à religiã o para o bem da Igreja, ela
deveria servir de modelo para todos nela, deveria mostrar em um
tempo em que o estado religioso estava em absoluta decadê ncia, que
idelidade pode praticar uma alma que tem escolheu Deus para seu
esposo. Para isso foi enviada aos representantes de Deus, o sacerdó cio
da Santa Igreja. Como os ié is comuns, sua vida deveria ser regulada por
seu julgamento e decisã o, e assim, aberta a todos, ela deveria alcançar o
im que Deus lhe havia designado. Essa submissã o à orientaçã o e
disciplina da Igreja foi precisamente o teste mais seguro da verdade de
tudo o que havia de extraordiná rio nela. Encontraremos em sua vida
numerosos fatos que comprovam que as graças que lhe foram
concedidas foram todas destinadas a serem colocadas sob a orientaçã o
de Superiores eclesiá sticos para receber deles seu selo de
autenticidade.
Ela estava em seu dé cimo oitavo ano quando recebeu o Sacramento da
Con irmaçã o das mã os de Gaspard Max von Droste-Vischering, entã o
bispo sufragâ neo de Mü nster. Esta cerimô nia sagrada foi realizada
durante o perı́odo de sua desolaçã o interior; por isso, o chamado para
receber o Sacramento era para ela como uma voz do cé u. Ela se
preparou para isso com muito cuidado, con iando em sua e icá cia, para
recuperar a força e a alegria espirituais pelas quais ela pensava ter se
esforçado inutilmente durante o ano passado. Em sua Primeira
Comunhã o, ela implorou para ser uma criança boa e dó cil; agora pedia
idelidade e amor para sofrer até a morte por Deus e pelo pró ximo. Mais
uma vez ela sentiu crescer em sua alma seu antigo desejo de se enterrar
em alguma terra distante para servir a Deus desconhecido e sozinho.
Um dia, enquanto conversava com uma amiga ı́ntima, ela disse que um
verdadeiro imitador de Jesus Cristo deveria gostar que os santos
abandonassem todas as coisas por Ele. Essas palavras causaram uma
impressã o tã o profunda em seu ouvinte que ela declarou sua prontidã o
para seguir onde quer que fosse, imitando aqueles servos. de Deus.
Anne Catherine aceitou a oferta com alegria e juntos planejaram sua
fuga para a solidã o; mas logo descobriram que seu projeto piedoso nã o
era viá vel.
O seguinte é o pró prio relato de Anne Catherine de sua con irmaçã o:
“Fui a Coesfeld com as crianças da nossa paró quia para con irmar.
Enquanto eu estava na porta da igreja com meus companheiros
esperando minha vez, tive um sentimento muito vivo da cerimô nia
sagrada acontecendo lá dentro. Eu vi aqueles que saı́ram depois de
receber a Con irmaçã o interiormente mudados, mas em vá rios graus.
Eles traziam uma marca exterior. Quando entrei, o bispo me pareceu
todo luminoso, um bando de espı́ritos celestiais ao seu redor. O crisma
resplandecia e a fronte do con irmado resplandecia de luz. Quando ele
me ungiu, um dardo de fogo disparou da minha testa ao meu coraçã o, e
eu senti a força que emanava do sagrado crisma. Muitas vezes vi o bispo
sufragâ neo depois, mas di icilmente o teria conhecido.”
Podemos julgar os efeitos deste Sacramento na alma de Anne Catherine
pelas suas pró prias palavras. Ela declara que a partir desse momento
ela teve que suportar apariçõ es assustadoras e castigos de agentes
invisı́veis pelas faltas dos outros. Essa expiaçã o era muitas vezes
realizada em circunstâ ncias aparentemente acidentais: por exemplo, à s
vezes ela era derrubada, ferida, machucada ou escaldada pelo
constrangimento de um companheiro; ou, novamente, ela foi
subitamente acometida por alguma doença inexplicá vel que todos
ridicularizavam. Ela suportou suas brincadeiras com doçura paciente,
ela suportou silenciosamente contradiçõ es, culpas, palavras duras e
acusaçõ es injustas. Naturalmente apressada, a luta interior para
controlar seus sentimentos, perdoar seus perseguidores e, ao mesmo
tempo, suportar o castigo devido a eles, era grande. No Sacramento da
Con irmaçã o recebeu a força para cumprir a sua missã o. Veremos mais
tarde quã o rá pido foi seu progresso na perfeiçã o.
As molé stias corporais que desde essa é poca a atacavam sem cessar,
traziam o cunho caracterı́stico da expiaçã o sob as mais variadas formas.
Eles tinham uma referê ncia especial, conhecida somente por Deus, à s
ofensas pelas quais expiavam. Quanto mais iel Ana Catarina era à
direçã o dada em sua grande visã o, tanto mais digna era de manter
diante de Deus o lugar da Esposa por excelência , a Igreja; mas pela
impressã o dos Sagrados Estigmas de Jesus Cristo, sua qualidade de
representante alcançou perfeita assimilaçã o com seu Amado.
Como aos olhos de Deus ela ocupava o lugar da Santa Igreja, ela deveria
suportar as mesmas feridas, incorrer nos mesmos perigos, sofrer as
mesmas perseguiçõ es que ameaçavam todo o corpo ou seus membros
individualmente. Aos quatro anos, ela havia interceptado o machado
assassino lançado contra o bebê adormecido; agora, como substituta,
ela deveria suportar qualquer ameaça ao papa, eclesiá sticos ou outros
personagens in luentes, cujo bem-estar de alguma forma afetasse o da
Igreja. Ela expiou as doenças espirituais de tais membros por
sofrimentos indescritı́veis; e ela expiava com paciê ncia aqueles cuja
in idelidade, negligê ncia ou imoralidade teriam atraı́do sobre a Igreja
os castigos da Justiça Divina se nã o fossem aplacadas por tal oferta.
Em Ana Catarina foi operada a mesma mudança maravilhosa que nos
Apó stolos no dia de Pentecostes quando, como ensina o catecismo,
“Eles estavam tã o cheios do poder do Espı́rito Santo que se
consideravam felizes por serem julgados dignos de sofrer açoites,
prisã o e até a morte pelo nome de Jesus Cristo”. Um dia ela revelou o
segredo de sua força com as seguintes palavras:
“Depois da minha con irmaçã o, nã o pude deixar de pedir para suportar
o castigo de todos os pecados.”
Que idé ia elevada da santidade e justiça de Deus, que reverê ncia pelo
Preciosı́ssimo Sangue, que horror ao pecado, que compaixã o pelos
pecadores, deve ter encontrado um lugar naquele coraçã o que vivia
apenas para expiar as faltas de seu pró ximo!
Seu amor pela penitê ncia sempre aumentou. Seus dias eram passados
em trabalho de parto, suas noites em oraçã o e exercı́cios penitenciais. A
partir de sua infâ ncia, embora escondendo o má ximo possı́vel de sua
famı́lia, ela estava acostumada com o mesmo; mesmo agora a
humildade a impedia de revelar todas essas prá ticas ao seu confessor.
Sua senhora, a fabricante de mâ ntuas, entretanto, o havia informado
disso. Quando ele questionou Anne Catherine sobre o assunto, ela icou
confusa; ela reconheceu tudo e depois seguiu o conselho dele com toda
a exatidã o. Ele novamente declarou a ela que ela foi chamada ao estado
religioso. Quando ela expressou seu medo de nã o ser recebida em
nenhum convento sem dote, ele lembrou-lhe o poder e a bondade de
Deus e prometeu se interessar por ela com os agostinianos de Borken.
Ele assim o fez, e logo lhe anunciou a boa notı́cia de que ela poderia se
apresentar à superiora da comunidade de Borken, que estava disposta a
admiti-la por recomendaçã o dele. A Superiora, é verdade, recebeu-a
muito amavelmente; mas Anne Catherine foi subitamente dominada
pela angú stia mental, as lá grimas sufocaram sua expressã o. A visã o
sobrenaturalmente revelada a ela do estado espiritual da comunidade,
o Fundador da Ordem e mesmo sua santa Regra sendo quase
totalmente desconhecida dos religiosos, a dominou. A Superiora,
surpresa, perguntou a causa de suas lá grimas, ao que Anne Catherine
respondeu com sinceridade, mas evasivamente: “Eu choro por minha
falta de veneraçã o por Santo Agostinho. Eu nã o sou digno de me tornar
um agostiniano!” Ela se despediu, dizendo que iria re letir sobre o
assunto; mas ela nunca poderia resolver voltar.
Dean Overberg fala assim de suas morti icaçõ es neste momento:
“Anne Catherine praticou mais austeridades no mundo do que depois
de entrar no convento. Ela nã o sabia na é poca que para tais coisas a
licença de seu confessor era necessá ria. Ela usava correntes e cordas e
uma roupa de baixo rú stica que ela mesma fez com o material mais
grosseiro que pô de encontrar.”
Entre suas outras penitê ncias estava a Via Sacra, erguida nos con ins de
Coesfeld. Demorou em pelo menos duas horas, parando apenas alguns
momentos em cada estaçã o, para realizar esta devoçã o, pois estavam a
uma grande distâ ncia entre si, separados por bosques de abetos
intermediá rios. Seu trabalho de parto começou ao amanhecer e durou
até tarde da noite; consequentemente, era apenas à noite que ela
conseguia fazer esse exercı́cio. Ela começava um pouco depois da meia-
noite e, quando os portõ es da cidade estavam fechados, ela tinha que
escalar o muro quebrado. Ela era naturalmente tı́mida e sua vida de
aposentada a tornava ainda mais tı́mida. Esta expediçã o noturna foi
para ela um empreendimento formidá vel, mas ela nunca deixou de
realizá -la a pedido das almas do Purgató rio, ou por ordem recebida em
visã o. Nenhuma inclemê ncia do tempo poderia impedi-la. Ela à s vezes
era acompanhada por um amigo que compartilhava seus sentimentos
piedosos.
“Uma vez”, diz ela, “eu fui com meu amigo, por volta das trê s horas da
manhã , fazer a Via Sacra, e tivemos que escalar o muro quebrado. Ao
voltar, paramos um pouco fora da igreja para rezar, quando vi a cruz
com todas as oferendas de prata suspensas sair de seu lugar e se
aproximar de nó s. Eu o vi clara e distintamente; minha companheira
nã o viu, mas ouviu o tilintar dos objetos de prata. Depois disso, eu
costumava ir atrá s do altar principal para orar diante do cruci ixo
milagroso ali, e muitas vezes via a igura do Salvador inclinada para
mim. Isso me causou uma impressã o estranha.”
Em uma ocasiã o, ela realizou essa devoçã o para pedir paz em uma certa
casa.
“O ó dio existente entre marido e mulher em Coesfeld”, diz ela, “me
a ligiu muito. Muitas vezes rezei pelos pobres. Na Sexta-feira Santa,
depois de sair do Santo Sepulcro, por volta das nove horas da noite, iz a
Via Sacra para eles. O espı́rito maligno em forma humana me atacou e
tentou me estrangular, mas clamei a Deus com todo o meu coraçã o e o
inimigo fugiu. Depois disso, o marido tratou a esposa com menos
severidade.”
Ela muitas vezes experimentou oposiçã o semelhante do demô nio. Ela
diz:
“Senti grande compaixã o por uma pobre menina que havia sido
enganada por um jovem, que depois se recusou a torná -la sua esposa.
Este grande pecado contra Deus me entristeceu até a morte. Fiz um
pequeno plano com dois companheiros para fazer na noite de Pá scoa
cinquenta e duas voltas ao cemité rio de Coesfeld para as almas do
Purgató rio, implorando-lhes que ajudassem a pobre menina. O tempo
estava ruim, a noite escura. Andamos descalços, eu entre meus dois
companheiros. Enquanto orá vamos fervorosamente, o maligno na
forma de um jovem avançou sobre mim e me arremessou vá rias vezes
de um lado para o outro. Mas continuei orando com mais fervor, pois
sabia que a oraçã o é odiosa para o demô nio. Nã o sei se meus amigos
viram o que iz, mas ambos gritaram de terror. Quando terminamos
nossas rodadas, está vamos tã o exaustos que nã o podı́amos ir mais
longe. Quando voltamos para casa, a mesma apariçã o me jogou de
cabeça em um poço de bronze de seis metros de profundidade. Meus
companheiros, pensando que eu certamente estava morto, gritaram
novamente, mas eu caı́ muito suavemente. Gritei para eles: 'Aqui estou!'
e, no mesmo instante, nã o sei como, fui tirado do poço e colocado no
chã o. Começamos nossas oraçõ es mais uma vez, e agora continuamos
sem ser molestados. Na terça-feira de Pá scoa, a moça veio cheia de
alegria para me dizer que o jovem havia consentido em se casar com
ela. Ele fez isso com efeito. Ambos ainda estã o vivos (1818).
“Outra vez, quando um amigo e eu está vamos atravessando um campo
antes do amanhecer para orar, Sataná s sob a aparê ncia de um enorme
cachorro preto veio saltitando em nossa direçã o por um pequeno
caminho que tivemos que atravessar. Ele queria impedir que
avançá ssemos mais. Cada vez que eu fazia o sinal da cruz, ele recuava
um pouco e icava parado. Ele manteve isso durante quinze minutos.
Meu amigo estava tremendo de medo. Ela me pegou e tentou me
segurar. Por im, avancei com ousadia, dizendo: 'Iremos em Nome de
Jesus! Fomos enviados por Deus e o que vamos fazer é para Deus! Se
você fosse de Deus, você nã o tentaria nos impedir. Siga o seu caminho,
nó s seguiremos o nosso!' Com essas palavras, o monstro desapareceu.
Quando meu amigo se recuperou seu susto, ela exclamou: 'Ah! por que
você nã o falou assim no começo?' Respondi: 'Tem razã o, mas nã o
pensei nisso.' Seguimos entã o em paz.
“Em outra ocasiã o, eu estava orando fervorosamente diante do
Santı́ssimo Sacramento, quando o maligno se jogou tã o violentamente
ao meu lado no banco ajoelhado que ele rachou como se tivesse se
partido. Calafrios passaram por mim, eu estava tã o assustado; mas
continuei orando, e ele logo me deixou”.
Por trê s longos anos, como já foi dito, Anne Catherine suportou
pacientemente a secura espiritual. Ao im desse tempo o sol da
consolaçã o brilhou novamente sobre sua alma e sua comunicaçã o
ı́ntima com o Esposo Celestial nunca mais foi interrompida. Sem esse
apoio, ela nã o teria conseguido cumprir a terrı́vel tarefa expiató ria de
sua vida. O os misteriosos caminhos da Divina Providê ncia! Anne
Catherine agora contempla seu Redentor quase constantemente! Ela é
iluminada, fortalecida, consolada por Ele, a Cabeça invisı́vel da Igreja!
Ela recebe dele a promessa de ajuda - mas, ao mesmo tempo, todos os
seus esforços para entrar em um convento sã o inú teis! Durante trê s
anos ela trabalhou para conseguir uma quantia para um dote, e ao inal
desse tempo ela se encontra tã o pobre quanto antes, pois seu Noivo
Celestial lhe enviou tantas ocasiõ es para aliviar as necessidades de seu
pró ximo, que ela poderia nã o guarde nada para suas pró prias
necessidades. Mas um obstá culo ainda mais sé rio está no caminho, bem
calculado para esmagar suas esperanças, que é sua contı́nua doença.
Ela viu, de fato, em suas visõ es, o que ela teve que sofrer e por que ela
sofreu; mas o conhecimento dessas causas ocultas era uma pobre
compensaçã o para uma vida de sacrifı́cio diá rio, para uma doença tã o
real, tã o sensı́vel que exauriu suas energias vitais. Ela podia agora com
di iculdade realizar seus deveres habituais; e quando, depois de sua
tentativa frustrada em Borken, ela implorou ao seu confessor que
falasse por ela aos trapistinos, de Darfeld, sua resposta foi que ele nã o
podia encorajar algué m tã o fraco e doente como ela a entrar em uma
Ordem tã o severa. Ao ver sua a liçã o com esta declaraçã o, ele a
consolou com prometendo convidá -la a entrar entre as Clarissas, em
Mü nster. Esses religiosos deram uma resposta favorá vel ao seu pedido,
e Anne Catherine foi apresentar sua petiçã o pessoalmente. Mas
informaram-lhe que, como o seu convento era pobre e ela nã o podia
trazer dote, só a admitiriam com a condiçã o de que aprendesse a tocar
ó rgã o, tornando-se assim ú til à comunidade. Ela concordou com isso,
mas sua crescente debilidade fez com que ela voltasse para casa um
pouco antes de começar seu novo estudo.
O amigo que a acompanhou a Mü nster nesta ocasiã o, fez o seguinte
depoimento perante a autoridade eclesiá stica, em 8 de abril de 1813:
“Meu nome é Gertrude Ahaus, de Hammern, paró quia de Billerbeck.
Conheço Anne Catherine Emmerich há quatorze anos. Conheci-a em
Coesfeld e é ramos muito ı́ntimos. Ela me falou de seu desejo de ser
freira, e eu a acompanhei à s Clarissas de Mü nster, em cuja comunidade
eu tinha dois parentes. Seu desejo era tã o grande que, quando lhe
apresentei que essas casas logo seriam suprimidas em todos os lugares,
ela respondeu que se pudesse entrar em uma, embora com a certeza de
ser enforcada oito dias depois, ainda icaria muito feliz em fazê -lo. A
Ordem mais severa era sua atraçã o. Nunca vi nenhum defeito nela; ela
era piedosa e correta. Eu tinha a maior con iança nela. Nossas
conversas eram sempre sobre piedade, e ela me instruı́a em muitas
coisas sobre os deveres de um cristã o, relatando traços da vida dos
santos religiosos, Santa Matilde, Santa Catarina, Santa Gertrudes, Santa
Clara, etc.
“Ela se comunicava aos domingos e festas. Quando ela trabalhava em
nossa casa, ela costumava se ajoelhar em oraçã o todas as noites. Ela
tinha uma devoçã o particular à s Cinco Chagas de Jesus e à s trê s sobre
Seu ombro, das quais Ele sofreu mais do que todas as outras.
“Ela usava uma roupa vermelha ao lado de sua pessoa. As sextas-feiras
ela jejuava até o meio-dia, e se pudesse passar despercebida, nã o tomou
nada à noite. Muitas vezes ia à noite fazer a Via Sacra e passava os
domingos e dias santos em oraçã o.
“A paciê ncia dela foi maravilhosa. Se eu estava doente, ela me consolava
lembrando-me dos sofrimentos de Cristo. Alguns diziam que era por
orgulho que ela queria ser freira. Mas Anne Catherine respondeu que
estava satisfeita por ser assim mencionada, pois seu inocente Salvador
també m havia sido caluniado. Ela era atraente, gentil com todos e muito
diligente. Ela sempre trabalhou duro em nossa casa, e sua conversa me
fez muito bem. Ela foi tã o generosa que deu tudo o que tinha. Ela foi
franca e sincera em suas palavras, embora com a maioria das pessoas
ela falasse pouco.”
Daremos aqui alguns outros depoimentos feitos pelos primeiros
companheiros de Anne Catherine sobre o perı́odo que constitui o
assunto do capı́tulo seguinte. Eles foram feitos diante dos Superiores
Eclesiá sticos em 1813, quando os detalhes de sua vida foram coletados.
Sua simplicidade e veracidade nã o apenas comprovam a maravilhosa
bê nçã o que dela emana, mas també m apresentam uma imagem
impressionante e iel dela. Daremos primeiro a de seu irmã o mais
velho, tirada em 11 de abril de 1813:
“Anne Catherine Emmerich é minha irmã e eu sou a mais velha das
crianças sobreviventes. Ela viveu alguns anos fora da famı́lia, mas
apenas a uma curta distâ ncia, de modo que a vı́amos com frequê ncia.
Sempre me dei bem com ela, embora sua disposiçã o fosse como a
minha um pouco precipitada; mas seus esforços sinceros para corrigir
esse defeito logo foram perfeitamente bem-sucedidos. Nã o era vaidosa,
embora gostasse de estar bem vestida. Ela mantinha distâ ncia de festas
e diversõ es de todos os tipos, e sempre foi respeitosa e afetuosa com
nossos pais.
“Ela falava pouco sobre coisas mundanas, mas sempre icava feliz em
poder instruir os outros sobre pontos de fé e moral. Ela repetia muitas
vezes os sermõ es que ouvira ou a vida dos santos, e tentava por todos
os meios nos fazer amar a virtude. Ela era tã o bondosa que deu tudo
que ela ganhou. Ela nunca nos permitiu falar dos defeitos de nossos
vizinhos, mas muitas vezes nos deu boas advertê ncias a esse respeito.
Quando algué m encontrava defeitos nela, ela dizia que era tudo
verdade; e, quando lhe perguntá vamos como podia suportar tã o
docemente tais injú rias, ela costumava responder: 'E só isso que devo
fazer. Você pode fazer o mesmo se tentar. Muito do seu tempo era
dedicado à oraçã o. Muito tempo depois que a famı́lia se aposentou, ela
ainda estava lendo ou orando de joelhos, com os braços estendidos, e
mesmo quando trabalhava ela orava.
“Jejuava com frequê ncia, sobretudo nos dias consagrados à Sagrada
Paixã o. Quando imploramos que ela comesse por causa de sua saú de
fraca, ela respondeu que nã o era necessá rio. Ela morti icou-se em todos
os sentidos, e vestia ao lado dela uma tú nica de material á spero. Ela
cobriu sua cama com batatas fritas ou cardos para fazer penitê ncia
enquanto dormia.”
7 de abril de 1813, Clara Soentgen depô s:
“Anne Catherine se distinguiu tanto entre as outras crianças da escola
que o mestre costumava dizer a seus pais que nã o havia nenhuma
pergunta que ele pudesse fazer a ela que ela nã o pudesse responder,
embora ela frequentasse regularmente apenas quatro meses. Ela
costumava estudar nos momentos de lazer e enquanto cuidava das
vacas. Quando as outras crianças estavam brincando, ela se sentava
sozinha com um livro.
“Quando icou mais velha, teve que compartilhar os trabalhos mais
difı́ceis; e mesmo assim, embora exausta depois do dia, muitas vezes
passava metade da noite lendo livros piedosos depois que seus pais se
aposentaram. As vezes eles tinham que mandá -la para a cama.
Costumava instruir as moças entre as quais trabalhava como costureira
contando-lhes as belas coisas que havia lido. Ela era procurada por
muitos, mas principalmente pelos jovens que lhe con iavam seus
segredos e lhe pediam conselhos. Nas tardes de domingo ela costumava
persuadi-los, especialmente quando sabia que estavam se desviando
um pouco do caminho certo, a fazer a Via Sacra com ela, rezando as
oraçõ es em voz alta. Ela muitas vezes se levantava à noite, saı́a de casa
descalça e fazia a Via Sacra. Quando o portã o da cidade estava fechado,
ela costumava escalar o muro. As vezes ela caiu, mas ela nunca recebeu
nenhum ferimento. O domingo era seu dia alegre, o dia em que ela
podia se confessar e se comunicar. Quando vá rias festas se seguiram,
seu confessor permitiu que ela recebesse a Sagrada Comunhã o em cada
uma. Ela jejuou nos ú ltimos trê s dias da Semana Santa, sem tocar em
nada até o jantar no domingo de Pá scoa. Mas mesmo em jejum, ela
realizou o trabalho de parto mais cansativo.”
Anne Gertrude Schwering, St. Lambert's, alé m de Coesfeld, deposta, 16
de abril de 1813:
“Sou ı́ntimo de Anne Catherine Emmerich há cerca de quinze anos e
sempre vi em sua grande virtude. Ela era muito piedosa, sua conversa
sempre girando em torno das Sagradas Escrituras, da vida dos santos
ou das verdades da fé . Ela nunca falou dos defeitos dos outros ou das
coisas mundanas. Ela era assı́dua em seu trabalho e se ajoelhava todas
as noites em oraçã o. Ela era indulgente com todos, generosa até onde
seus meios permitiam, e nunca reclamou. Nunca vi nenhum defeito
nela.”
Mary Feldmann, St. James's, distrito de Flamske, alé m de Coesfeld,
deposto da seguinte forma, 11 de abril de 1813:
“Aos quatorze anos, fui a Anne Catherine para aprender a costurar, e
tı́nhamos relaçõ es tã o ı́ntimas quanto a diferença de idade permitia. Eu
estava com ela por mais de dois anos e eu a amava muito porque ela era
muito boa. Ela me ensinou tã o pacientemente, apesar da minha
estupidez. Avaliei sua piedade pelas numerosas oraçõ es que
pronunciava durante o dia e por seus modos calmos e retraı́dos. Ela já
estava acordada e orando quando acordei de manhã , e à noite quando
adormeci ela ainda estava de joelhos, com os braços estendidos em
forma de cruz. Muitas vezes via pedacinhos de madeira atravessados na
cama dela. Ela costumava falar frequentemente dos Ofı́cios da Igreja e
me instruir em minha fé . Ela nunca falava sobre seu vizinho e sempre
me dizia para nunca dizer nada de caridoso de ningué m e retribuir o
bem com o mal. Ela deu tudo o que tinha aos pobres. Ela raramente
tinha dinheiro, já que tudo ia tã o rá pido quanto era ganho. Ela nunca
participou de assemblé ias e só saiu a negó cios.”
Capítulo 10
A TENTATIVA DE A NNE C ATHERINE PARA APRENDER O
ORGAO . TRES ANOS NA CASA DO COR - LIDER . _ _
QUANDO Anne Catherine recuperou forças su icientes para retomar
suas ocupaçõ es, fez todos os esforços para ganhar o su iciente para
cobrir as primeiras despesas que seu projeto de aprender o ó rgã o
C implicaria. A agulha nã o saı́a de seus dedos durante o dia, e à noite
ela dobrava a roca para poder levar pelo menos um pouco de roupa
para o convento. Deus abençoou seus esforços. No decorrer de um
ano, ela gastou vinte tá leres (cerca de 15 dó lares) ganhos por sua
costura e um bom suprimento de linho ino. Isso lhe pareceu uma soma
tã o grande que ela nã o ousaria guardá -la para outro propó sito que nã o
o de ingressar na religiã o. Seus pais, entretanto, renovaram suas
sú plicas para dissuadi-la de deixá -los, sua mã e lhe dizendo em lá grimas
que, estando quase constantemente doente, ela nã o podia esperar
cumprir os numerosos e dolorosos deveres a que sua pobreza a
exporia.
“Minha querida mã e”, ela responderia, “mesmo que as coisas aconteçam
como você diz, mesmo que eu tenha que trabalhar como você prevê ,
ainda assim escaparei dos perigos do mundo”.
Mas a boa mulher nã o compreendia tal raciocı́nio, pois seu ilho já
estava tã o distante do mundo que ela mal podia imaginar uma
separaçã o mais completa possı́vel. Ela nã o cessou, portanto, suas
sú plicas sinceras; mas sua ilha respondeu com tanta doçura, ternura e
irmeza, que a pobre mã e nã o teve palavras de retorno. Ela desistiu de
se opor seriamente a ela quando a viu instalada na famı́lia do organista
Soentgen, em Coesfeld.
Uma testemunha muito importante que encontraremos muitas vezes no
decorrer de nossa narrativa, o Dr. Wesener, de Dü lmen, nos diz o
seguinte sobre este ponto:
“Atendi a mã e idosa de Anne Catherine em sua ú ltima doença. Ela me
dizia muitas vezes com lá grimas que, mesmo na infâ ncia, percebera
algo extraordiná rio em sua ilha e sempre a amara com particular
afeiçã o. Foi uma grande a liçã o para ela que Ana Catarina, a mais velha
de suas ilhas, que deveria ter sido o consolo de sua velhice, desejasse
tã o ardentemente entrar para um convento. — Essa foi — disse ela — a
ú nica dor que ela me causou. Nã o posso dizer o mesmo dos meus
outros ilhos!' Quando Anne Catherine tinha dezoito anos, ela foi pedida
em casamento por um jovem, ilho de pais em circunstâ ncias fá ceis.
Eles desejavam muito o consentimento de Anne Catherine, pois
conheciam seu valor e habilidade, apesar de sua saú de delicada. 'Mas',
disse sua mã e, 'eu nã o poderia me separar dela entã o. A saú de de seu
pai era ruim e dois de meus outros ilhos me causavam muita
ansiedade. Eu nã o a pressionei naquela ocasiã o. Alguns anos depois,
uma proposta ainda mais elegı́vel foi feita a ela, e seu pai e eu
está vamos muito desejosos de que ela aceitasse. Pareceu-nos altamente
vantajoso. Mas ela se opô s tã o veementemente que tivemos que ceder,
assegurando-lhe, no entanto, que nunca lhe devı́amos dar nada para
entrar em um convento. Ela havia colocado alguns pedaços de linho,
pensando que isso facilitaria seu desenho; mas ela foi recusada em
todos os lugares por ser muito delicada. Entã o ela conseguiu uma
situaçã o no organista Soentgen's de Coesfeld para aprender o ó rgã o,
esperando que tal realizaçã o lhe abrisse a porta de um convento. Logo,
poré m, ela viu seu erro, pois encontrou nesta famı́lia tanta pobreza e
angú stia que sacri icou seu pouco tudo para aliviá -los. Ela deu a eles
seu linho, sete ou oito peças no valor de cerca de vinte e quatro dó lares.
Depois de algum tempo morando com eles, Clara, ilha do organista,
també m começou a pensar em ser freira.” Vamos ouvir as pró prias
observaçõ es de Anne Catherine sobre o assunto:
“Quanto ao aprendizado do ó rgã o”, disse ela a Dean Overberg, “nã o
havia dú vida de tal coisa. Eu era o servo da famı́lia. Eu nã o aprendi
nada. Mal havia entrado na casa, vi sua misé ria, e procurei apenas
aliviá -la. Cuidei da casa, iz todo o trabalho, gastei tudo que tinha
economizado e nunca aprendi a tocar”.
Ela poderia, no entanto, ter aprendido mais facilmente. Seu ouvido era
tã o delicado, sua apreciaçã o da harmonia musical tã o aguçada e seus
dedos tã o há beis que ela nã o conseguia encontrar nada difı́cil. As vezes
ela dizia:
“Quando ouvia o canto ou os tons de um ó rgã o, nada me comovia tanto
quanto a consonâ ncia das diferentes notas. Que encanto, gritei, é a
perfeita harmonia! Já que as criaturas inanimadas se harmonizam tã o
docemente, por que nem todos os coraçõ es fazem o mesmo! Ah, quã o
doce seria este mundo se fosse assim!”
Mas Deus desejou iniciar Seu servo escolhido em harmonia de uma
ordem mais elevada do que a do mundo musical, em perfeita
conformidade com Sua pró pria santı́ssima vontade. Ela agora deveria
andar por caminhos muito diferentes daqueles pelos quais seu coraçã o
suspirava. Seu plano, tã o cuidadosamente amadurecido, tã o bem
executado, provou ser um fracasso no que diz respeito ao estudo da
mú sica. A ideia, como vimos, foi abandonada antes mesmo de ser
colocada em execuçã o.
“Ah! Aprendi naquela casa o que é a fome!” ela disse uma vez. “Muitas
vezes icá vamos oito dias juntos sem pã o! Os pobres nã o conseguiam
con iança nem por sete centavos. Eu nã o aprendi nada, eu era o servo.
Tudo o que eu tinha foi, e pensei que deveria morrer de fome. Eu dei
minha ú ltima camisa. Minha boa mã e teve pena da minha condiçã o. Ela
me trouxe ovos, manteiga, pã o e leite que nos ajudaram a viver. Um dia
ela me disse: 'Você me deu uma grande ansiedade, mas você ainda é
meu ilho! Parte meu coraçã o ver seu lugar vago em casa, mas você
ainda é meu ilho! Eu respondi: 'Que Deus a recompense, querida mã e!
Nã o tenho mais nada, mas é Sua vontade que eu ajude essas pobres
pessoas. Ele irá fornecer. Eu dei tudo a Ele, Ele sabe como ajudar a
todos nó s!' Entã o minha boa mã e nã o disse mais nada.”
Na Ordem mais austera, Ana Catarina nã o teria praticado a pobreza
com tanto rigor como na famı́lia Soentgen. Quanto mais ela aliviava
seus desejos, quanto mais ela se afastava do im em vista, mais sua
esperança de chegar lá era desapontada e esmagada. Ela gastou suas
pequenas economias, serviu sem salá rio, estava em absoluta
necessidade; e, no entanto, tudo levou a nada. Nenhuma tentativa foi
feita para lhe ensinar nada; mas sua con iança em Deus permaneceu
inabalá vel.
Falando desse perı́odo, ela diz: “Eu costumava dizer a mim mesma:
'Como posso entrar em um convento agora? Nã o tenho nada, tudo
funciona contra mim!' Entã o me voltava para Deus e dizia: 'Nã o sei o
que fazer! Tu ordenaste tudo! Só você pode me libertar disso!' ”
Foi entã o mostrado a ela em uma visã o o rico aumento que seus
ornamentos nupciais haviam recebido de todas essas provaçõ es e
esforços malsucedidos. Ela viu os frutos de sua auto-vitó ria, paciê ncia e
devoçã o forjados em roupas de rara beleza; ela os via diariamente
enriquecidos por sua renú ncia e caridade; e foi-lhe dito que suas
oraçõ es e lá grimas, suas lutas e privaçõ es, emitiam sons mais
agradá veis a Deus do que os acordes mais harmoniosos do ó rgã o. Mas
estava de acordo com a dignidade de seu noivo que ela devesse alcançar
a uniã o nupcial por tais meios? Nessa é poca, nã o se prestava atençã o
nos conventos aos sinais de uma vocaçã o sobrenatural. As vantagens
mundanas, as qualidades externas, as consideraçõ es pessoais decidiam
tudo, daı́ que os verdadeiros religiosos raramente fossem encontrados.
Foi esta mesma indignidade ao Esposo Divino que Anne Catherine foi
chamada a expiar. Ela teve que abrir para si mesma da maneira mais
dolorosa e humilhante o acesso a uma comunidade religiosa em
expiaçã o pelo menosprezo da vocaçã o religiosa.
O organista Soentgen icou grato pela caridade desinteressada e
dedicaçã o de Anne Catherine, e prometeu fazer tudo ao seu alcance
para promover seus projetos. Ele tinha uma ilha da mesma idade, um
mú sico habilidoso, que seria recebido em qualquer lugar. Resolveu,
portanto, permitir que ela entrasse naquele convento apenas no qual
Ana Catarina també m seria recebida, e sua solicitude pelo bem-estar de
sua ilha deu força à sua resoluçã o. Ele costumava dizer a Anne
Catherine: “Minha Clara nã o entrará em um convento sem você . Os
conventos nã o sã o tã o rı́gidos agora como costumavam ser; mas se você
estiver com Clara, você a manterá à altura de seu dever.
As duas jovens candidataram-se a vá rias casas religiosas, mas em vã o.
Alguns recusaram por falta de dote, alguns receberiam Clara sozinha.
Foi o caso dos agostinianos de Dü lmen que precisavam de um
organista. Mas o Sr. Soentgen foi iel à sua palavra. Ele nã o permitiria
que sua ilha entrasse sem Anne Catherine; entã o, inalmente, os
religiosos consentiram em recebê -la també m.
7 de abril de 1813, Clara Soentgen depô s, como segue, a pedido do
Vigá rio-Geral, Clement Auguste von Droste-Vischering: 1
“Anne Catherine Emmerich morou conosco quase trê s anos, e percebi
nas refeiçõ es que ela sempre pegava o que era mais indiferente. Ela
usava uma roupa de lã grosseira ao lado de seu corpo e por baixo um
cinto á spero, torcido e atado, que ela amarrou com tanta força em volta
da cintura que a carne icou in lamada e inchada. Quando seu confessor
ouviu falar, ele a proibiu de usá -lo. Ela me disse que depois que a
obediê ncia a privou desse cinturã o, icou impressa na pele uma marca
como uma faixa vermelha. Ela costumava sair sozinha à noite para rezar
e ao voltar eu notei sua pele toda rasgada como se por um sarça. Ao ser
questionada, ela foi forçada a reconhecer que havia se disciplinado com
urtigas. Ela me disse uma vez que uma enorme fera negra muitas vezes
se precipitava sobre ela para assustá -la de sua oraçã o; mas ela nã o deu
atençã o a ele. Entã o ele pendurava a cabeça sobre o ombro dela, olhava
em seu rosto com olhos ardentes e desaparecia. A mesma apariçã o
apareceu para ela uma manhã a caminho de casa depois da Sagrada
Comunhã o”.
Com relaçã o a este incidente e outros da mesma natureza, daremos as
pró prias palavras de Anne Catherine:
“Enquanto estava no Soentgen, mantive meu velho há bito de rezar à
noite ao ar livre. Como sempre, Sataná s tentou me assustar com
barulhos horrı́veis; mas, como eu rezava com mais fervor, ele
costumava vir atrá s de mim sob a forma de uma fera hedionda, um
cachorro enorme, e descansava a cabeça em meu ombro. Mantive a
calma, pela graça de Deus. Nã o me mexi da minha posiçã o, mas disse:
'Deus é mais poderoso do que tu! Eu sou Dele, estou aqui por causa
Dele. Você nã o pode me fazer nenhum mal!' Nã o senti mais medo e o
demô nio desapareceu. Muitas vezes ele me agarrou pelo braço e tentou
me arrastar para fora da cama, mas eu resisti com a oraçã o e o sinal da
cruz. Certa vez, quando eu estava doente, ele me atacou furiosamente,
abrindo suas mandı́bulas de fogo para mim como se estivesse prestes a
me estrangular ou me despedaçar. Fiz o sinal da cruz e estendi a mã o
corajosamente para ele: 'Morda isso!' Eu disse, e ele desapareceu
instantaneamente.
“Uma noite, Clara e eu está vamos orando pelas pobres almas. Eu disse:
'Vamos dizer alguns Pais Nossos para sua mã e, caso ela precise deles.'
Fizemos isso com seriedade. Depois de cada Pater , eu dizia: 'Outro,
outro!' Continuando assim, a porta se abriu e uma grande luz entrou.
Vá rios golpes foram desferidos na mesa, o que assustou a nó s dois,
principalmente a Clara. Quando o Sr. Soentgen voltou para casa,
contamos a ele sobre a circunstâ ncia, e ele derramou muitas lá grimas.
“Muitas vezes”, continua Clara em seu depoimento, “depois de
terminarmos nossas oraçõ es, nunca antes, um travesseiro costumava
ser pressionado sobre nossos rostos, como se para nos sufocar, e
repetidos golpes eram desferidos com o punho no travesseiro de Anne
Catherine . As vezes impaciente com esse aborrecimento, ela passava as
mã os no travesseiro, mas nã o descobria nada. Assim que ela se
acomodou para dormir, o barulho recomeçou. Isso foi muitas vezes
mantido até a meia-noite. As vezes ela se levantava e corria para o
jardim para ver se conseguia descobrir alguma pista do barulho, mas
em vã o. Aconteceu nã o só em nossa casa, mas també m no convento
onde, a princı́pio, ocupei a mesma cela com ela.
“Depois de nos retirarmos para descansar, rezá vamos pelas almas do
Purgató rio e uma vez, ao terminar nossas devoçõ es, uma luz brilhante
pairou perto de nossas camas. 'Ver! Vejo! a luz brilhante!' exclamou
Anne Catherine para mim alegremente. Mas eu estava com medo, eu
nã o iria olhar.”
O reverendo James Reckers, professor da Escola Latina de Coesfeld, foi
o confessor de Anne Catherine. Ele depô s, da seguinte forma:
“Eu fui por cerca de nove meses, pouco antes de sua entrada no
convento, o confessor de Anne Catherine Emmerich. As vezes, ela vinha
a mim fora da Con issã o para pedir meu conselho a respeito de sua
vocaçã o. Ela me pareceu uma pessoa de grande simplicidade, retidã o e
bondade de coraçã o. Nã o conheço nada desfavorá vel dela, exceto que
sua caridade para com os pobres à s vezes a levava a comprar o que nã o
podia pagar imediatamente. Devo dizer em seu louvor que, quando
possı́vel, ela assistia todas as manhã s no Santo Sacrifı́cio, confessava e
comunicava aos domingos e festas, e que ela era considerada uma
pessoa muito boa e piedosa. Em vá rias ocasiõ es, quando suas
esperanças de ser admitida em um convento foram frustradas, ela
mostrou uma submissã o invariá vel e edi icante à vontade de Deus”.
Capítulo 11
A NNE C ATHERINE RECEBE A COROA DE ESPINHOS . _ H ER
ENTRADA ENTRE OS A UGUSTINIANOS DE D ULMEN .
QUANDO Anne Catherine completou seu traje nupcial pela prá tica da
mais abjeta pobreza e abnegaçã o, o pró prio Noivo Celestial
acrescentou a ela a ú ltima e mais preciosa joia, a Coroa que Ele
C mesmo havia usado na terra. Um dia, por volta do meio-dia, durante
o ú ltimo ano de sua residê ncia na famı́lia Soentgen, ela estava
ajoelhada perto do ó rgã o da Igreja dos Jesuı́tas, em Coesfeld. Clara
estava ao seu lado. Imersa em contemplaçã o, ela viu a porta do
taberná culo aberta e seu Divino Noivo sair dela sob a forma de um
jovem radiante. Em Sua mã o esquerda Ele segurava uma guirlanda, em
Sua direita uma Coroa de Espinhos, que Ele graciosamente presenteou
à escolha dela. Ela escolheu a coroa de espinhos. Entã o Jesus o colocou
levemente na testa dela; e ela, levantando as duas mã os, apertou-a com
irmeza. A partir desse instante, ela experimentou dores inexprimı́veis
em sua cabeça. A apariçã o desapareceu, e Anne Catherine acordou de
seu ê xtase ao ouvir o clique das chaves do sacristã o quando ele fechou a
igreja. Seu companheiro estava totalmente inconsciente do que havia
acontecido. Eles voltaram para casa. Anne Catherine, sofrendo dores
agudas na testa e nas tê mporas, perguntou a Clara se ela podia ver
alguma coisa. Este ú ltimo respondeu negativamente. Mas no dia
seguinte, a testa e as tê mporas estavam muito in lamadas, embora
ainda nã o houvesse aparê ncia de sangue. Isso começou a luir apenas
no convento, onde ela tentou cuidadosamente escondê -lo de seus
companheiros.
Como Santa Teresa em seus momentos de vigı́lia se via adornada com
as jó ias, o anel e o cinto, recebidos em visã o, també m nos dias
dedicados à Sagrada Paixã o a Coroa de Espinhos era visı́vel a Ana
Catarina. Ela o descreveu como composto por trê s ramos diferentes: o
primeiro era de lores brancas com estames amarelos; a segunda como
a primeira, mas com folhas maiores; a terceira era como a eglantine
selvagem, ou silva-doce. No fervor de sua oraçã o, muitas vezes ela o
pressionava sobre a cabeça, e cada vez sentia os espinhos penetrando
mais profundamente. As feridas começaram a sangrar no convento e, à s
vezes, as perfuraçõ es vermelhas eram visı́veis atravé s das bandagens
encharcadas. Os religiosos acharam que eram manchas de mofo no
linho e nã o pediram explicaçã o. Uma ú nica vez uma Irmã a
surpreendeu limpando o sangue de suas tê mporas, mas ela prometeu
segredo.
Aproximava-se o momento de Anne Catherine atingir o tã o desejado
im. As circunstâ ncias que a acompanhavam eram, aos olhos de Deus, o
im mais adequado aos seus esforços perseverantes e laboriosos, uma
prova da idelidade com que o Esposo esperara pela noiva. Alguns dias
antes de se despedir do mundo, ela foi pela ú ltima vez a Flamske para
se despedir de seus pais. Agradeceu-lhes com lá grimas a afeiçã o para
com ela e pediu-lhes perdã o e ao resto da famı́lia pela dor que lhes deu
ao seguir a sua vocaçã o. Sua mã e respondeu apenas com lá grimas. Seu
pai, geralmente tã o indulgente, icou bastante emocionado com a
perspectiva de perder o ilho. Quando ela humildemente pediu um
pouco de dinheiro para a viagem, ele respondeu amargamente: “Se você
fosse enterrado amanhã , eu custearia de bom grado as despesas de seu
funeral; mas você nã o obterá nada de mim para ir ao convento”.
Em prantos, pobre, despojada de tudo, mas interiormente alegre,
deixou Flamske para seguir o chamado de Deus. No dia seguinte, ela e
Clara partiriam para Dü lmen, a algumas lé guas de Coesfeld. Mas, no
ú ltimo momento, novas di iculdades surgiram. O organista Soentgen
precisava de dez dó lares e ele só poderia obter o empré stimo dessa
quantia com a condiçã o de que Anne Catherine fosse sua garantia. Ele
explicou seu embaraço para ela e nã o cessou suas importunaçõ es até
que ela, con iando na Divina Providê ncia, deu sua assinatura para a
quantia exigida. Ela nã o tinha dinheiro e apenas o que era
absolutamente necessá rio em termos de roupas. Esta, com sua escassa
roupa de cama, estava guardada em um baú de madeira no qual sua
mã e havia secretamente colocado um pedaço de linho para seu amado
ilho. Quando esta o descobriu, nã o o guardou, mas deu-o a Clara
Soentgen em agradecimento pela sua admissã o no convento. Este ato
generoso foi ricamente recompensado. O misterioso livro de profecias
foi devolvido a ela, e ela o levou consigo para Dü lmen.
Nunca, desde a sua fundaçã o, entrara neste convento uma donzela tã o
pobre de bens terrenos, tã o rica de tesouros espirituais. Ela
humildemente implorou à Reverenda Madre que a recebesse como a
ú ltima e menos importante da casa e a empregasse em qualquer coisa
que ela achasse adequada; mas seus modos gentis e retraı́dos nã o
podiam acalmar o descontentamento geral ao receber um sú dito tã o
pobre e, alé m disso, com problemas de saú de. O pró prio fato de ela
pedir tal favor provava, como se pensava, sua audá cia. Agnetenberg, o
convento agostiniano de Dü lmen, fundado em meados do sé culo XV, 1
recebeu seu primeiro religioso do convento de Marienthal, Mü nster.
Permaneceu até o momento de sua supressã o, sob a direçã o espiritual
dos Câ nones Agostinianos de Frenswegen, e até o im estava sob os
Câ nones de Thalheim, perto de Paderborn. Sempre estivera em
circunstâ ncias muito corretas e, durante a Guerra dos Sete Anos, estava
em grande a liçã o. A comunidade teria sido forçada a se dispersar, nã o
fosse pelas esmolas do povo de Dü lmen. Suas circunstâ ncias nã o
melhoraram com o tempo. O convento nunca mais foi capaz de suprir
as necessidades de seus internos, ou restaurar a vida comunitá ria em
sua perfeiçã o. Os religiosos sustentavam-se individualmente, uns com
o dote, outros com o trabalho. Aqueles que nã o tinham esses recursos,
ou que nã o receberam ajuda de estranhos, se saı́ram mal o su iciente.
Sob a direçã o espiritual existente no momento da entrada de Anne
Catherine, o convento de Agnetenberg teve o mesmo destino que a
maioria dos claustros femininos pobres em todo o paı́s de Mü nster
naquele perı́odo. A Regra deixou de ser pontualmente observada, na
verdade, foi quase esquecida. O claustro, outrora tã o rigorosamente
fechado, estava agora aberto a todos os visitantes sem distinçã o; a paz e
o silê ncio de uma casa religiosa já nã o reinavam. As Irmã s viviam como
pessoas que o acaso uniu, cada uma da melhor maneira possı́vel, e nã o
como membros de uma comunidade religiosa estritamente vinculada
por votos e regras a uma vida de perfeiçã o. O costume e a necessidade
ainda mantinham certa ordem e regularidade; mas era apenas o há bito
e nã o o espı́rito de religiã o que distinguia os internos de seus
companheiros cristã os no mundo. Ana Catarina foi introduzida por
Deus Todo-Poderoso no meio desse relaxamento para que ela pudesse
atingir a mais alta perfeiçã o religiosa; mas esse ambiente desfavorá vel
nã o seria mais um obstá culo para esse im do que as tentativas
infrutı́feras que ela havia feito até entã o para efetuar sua entrada. Sua
missã o expiató ria tinha esta caracterı́stica peculiar: tudo o que poderia
ser para outro uma ocasiã o de pecado e condenaçã o, tornou-se para ela
um meio de provar sua idelidade a Deus. A decadê ncia da disciplina
conventual, o afrouxamento do vı́nculo de obediê ncia, a ausê ncia de
direçã o esclarecida, em uma palavra, todas as misé rias das
comunidades desse perı́odo, misé rias que as obrigavam à sentença de
repressã o universal, tornaram-se para Anne Catherine tã o muitos
meios de alcançar a perfeiçã o; eles apenas despertaram seu zelo no
serviço de seu Deus.
Passamos agora para uma nova pá gina em seu livro profé tico. A visã o
dos esponsais familiares a ela desde seus dezesseis anos e por cuja
direçã o ela trabalhou em seu dote espiritual, assume um novo cará ter.
Ela se vê na casa do Noivo ou, como costumava dizer, na Casa Nupcial, e
ali també m foi retirado o seu traje nupcial. Ela entrou no convento com
uma bolsa vazia e um guarda-roupa escasso, e sua pobreza, embora
cara a Deus, atraiu sobre ela o desprezo das freiras em geral, que mal
sabiam que exatamente com esse tratamento estavam abrindo para a
pobre camponesa a porta da câ mara interna do Esposo. Ela nã o vive
mais nas imagens simbó licas que até entã o a guiavam, mas realmente
em uma casa de Deus, uma casa religiosa, no meio da qual Ele mesmo
habita no Santı́ssimo Sacramento. Do taberná culo Ele chama os
religiosos para servi-lo de dia e de noite, no santo ofı́cio e cerimô nias da
Igreja; daı́ Ele regula pelas constituiçõ es moná sticas nã o apenas suas
vá rias prá ticas de piedade e morti icaçã o, mas també m suas ocupaçõ es
diá rias. Ele anota cada passo, cada olhar, cada gesto, em uma palavra,
toda a sua vida, sobre os quais Ele estampa o selo da consagraçã o ao
Seu serviço. Ana Catarina viu tudo isso mais claramente. Quanto mais
elevada sua estima da incompará vel dignidade de tal vida, mais sensı́vel
ela era a cada infraçã o da Regra, cada indicaçã o de indiferença,
indolê ncia ou palavreado; e em proporçã o correspondente ela se
considerava indigna de tã o grande dignidade. Nã o se entregou a
nenhuma igura de linguagem quando, em sua entrada, pediu à
Superiora que fosse tratada como a ú ltima e a menor de todas. Veremos
que, com a permissã o de Deus Todo-Poderoso, sua petiçã o foi
plenamente atendida.
Capítulo 12
N OVITIADO DE A NNE C ATHERINE
NNE passou seus primeiros meses no convento como
postulante no traje secular, ela e Clara Soentgen ocupando a
mesma cela. Ela nã o tinha segurança de poder permanecer na
UMA comunidade, mas Deus lhe deu durante esse tempo força
su iciente para se tornar ú til. Ela ganhava, alé m disso, com sua
agulha, o su iciente para suprir suas poucas necessidades e
custear as despesas de sua recepçã o ao há bito. Ela escapou
assim de ser mandada embora sob o pretexto de inutilidade e, em 13 de
novembro de 1802, foi vestida com o há bito da Ordem e formalmente
admitida ao noviciado. A pior cela da casa foi atribuı́da a ela. Tinha duas
cadeiras, uma sem encosto, a outra sem assento; o peitoril da janela
servia de mesa.
“Mas”, ela declarou anos depois, “aquela pobre cela me pareceu tã o bem
mobiliada, tã o grandiosa, que era para mim um paraı́so perfeito!”
Podemos facilmente imaginar qual seria o treinamento espiritual dos
noviços em uma comunidade em que os exercı́cios empregados em
tempos mais felizes para esse im caı́ram em desuso. Anne Catherine
suspirava pela humilhaçã o e obediê ncia prescritas pela Regra, mas nã o
havia quem as impusesse. Ela sabia que a humildade que brota da
obediê ncia é in initamente mais e icaz e meritó ria do que a penitê ncia
autoimposta. Mas tais ocasiõ es de merecimento nunca teriam sido dela
se seu Divino Noivo nã o tivesse intervindo como Mestre para conduzir
Seu discı́pulo à mais alta perfeiçã o, e isso Ele fez precisamente por
essas mesmas circunstâ ncias. que parecia tã o desfavorá vel ao
progresso espiritual. Tudo deveria ser um meio para atingir esse im e,
na mesma medida, um meio para promover a gló ria de Deus e o bem de
Sua Igreja. Uma mestra prudente, experiente na vida espiritual, logo
teria descoberto a sublime vocaçã o de sua noviça e a teria orientado de
acordo com ela, nã o tolerando nela nenhuma imperfeiçã o, nenhum
defeito. Anne Catherine era naturalmente apressada. Ela tinha um
senso agudo de injustiça e se ressentiu disso; mas para a morti icaçã o
dessas disposiçõ es ela nã o poderia alcançar sem a devida direçã o. Deus
Todo-Poderoso, no entanto, forneceu as ocasiõ es para a auto-vitó ria
nesses mesmos pontos. Desde o inı́cio de seu noviciado, Ele permitiu
que ela fosse injustamente suspeita, acusada, repreendida e
penitenciada, tudo o que ela suportou sem murmurar, desculpar ou
responder.
Citaremos um exemplo entre muitos desse tipo. O convento possuı́a
apenas uma pequena renda de suas terras; e para aumentar seus
fundos, alojou por uma quantia insigni icante algumas pobres freiras
francesas, emigradas, e um velho senhor, irmã o da superiora. As freiras,
sabendo por acaso que o velho cavalheiro pagava menos do que elas,
icaram insatisfeitas e acusaram a superiora de injustiça. Entã o surgiu a
questã o de como as freiras obtiveram essa informaçã o. Nenhuma Irmã ,
é claro, se reconheceu culpada, e assim a culpa recaiu sobre a infeliz
noviça, que era conhecida por ter um vivo interesse pelos religiosos
indigentes banidos por causa de sua pro issã o. Anne Catherine podia
dizer com toda a sinceridade que nã o sabia o que cada uma das partes
pagava e, consequentemente, nã o tinha nada a revelar sobre o assunto.
Mas isso era de pouca importâ ncia na estimativa de seus acusadores.
Foi repreendida pela Superiora em pleno Capı́tulo e sofreu a penitê ncia
imposta. Imediatamente surgiram fortes queixas na comunidade contra
a ingratidã o irritante, como a chamavam, dessa miserá vel camponesa. A
vı́tima inocente de todo esse clamor teve que suportar nã o apenas
suspeitas injustas e puniçõ es severas, mas també m a amargura de ter
sido, embora involuntariamente, a causa de tal falta de caridade. Nã o
havia ningué m na casa a quem ela pudesse descarregar o coraçã o,
ningué m para derramar em sua ferida uma gota de consolo. Ela
superou seus sentimentos até o ponto nã o apenas para perdoar aqueles
que a ofenderam, mas també m para agradecer a Deus pelo que ela
tentou considerar como um castigo merecido. O esforço, no entanto, era
muito desgastante para suas delicadas sensibilidades. Ela icou
gravemente doente e se recuperou, mas lentamente.
Por volta do Natal de 1802, ela sentiu no coraçã o dores agudas que a
impediam de cumprir seus deveres costumeiros. Em vã o ela lutou
contra seus sofrimentos, eles apenas aumentaram; era como se ela
estivesse sendo perfurada por lechas a iadas e ela fosse, inalmente,
obrigada a icar com sua cama. Em sua humildade, ela nã o ousou
reconhecer nem para si mesma nem para os outros a verdadeira causa
de sua doença, embora soubesse disso por uma visã o que lhe foi
concedida na hora de se vestir. O signi icado da cerimô nia, bem como
de cada artigo do traje religioso, foi mostrado a ela. Em consequê ncia,
ela o recebeu com profundo respeito e gratidã o. Santo Agostinho,
patrono da Ordem, mostrara-lhe o coraçã o ardendo de amor, vestira-a
com o há bito, aceitara-a como ilha, prometera-lhe uma assistê ncia
especial. Diante dessa visã o, um fogo tã o grande se acendeu em seu
peito que ela se sentiu mais unida à comunidade do que aos seus
pró prios parentes de sangue. O signi icado do vestido religioso tornou-
se entã o tã o real para ela quanto o pró prio vestido. Ela estava
realmente consciente da uniã o espiritual estabelecida entre ela e o
resto da irmandade. Era como uma corrente luindo por todo o corpo,
mas sempre retornando a si mesma como à sua fonte. Seu coraçã o se
tornou, por assim dizer, o centro espiritual da comunidade. Dela foi a
terrı́vel missã o de suportar as feridas in ligidas ao Coraçã o do Esposo
pelos pecados e imperfeiçõ es de seus membros. Ela podia avançar, mas
lentamente dessa maneira, pois o amor nã o a tornava insensı́vel à dor e
ao sofrimento, e toda infraçã o de votos ou regras perfuraram seu
coraçã o como um dardo em chamas.
Ningué m entendia seu estado. O mé dico do convento foi chamado. Ele
declarou que seus sofrimentos eram puramente fı́sicos. Foi a primeira
vez em sua vida que ela foi submetida a tratamento mé dico. Em sua
pró pria casa, certas ervas simples, de cujas virtudes ela mesma possuı́a
o conhecimento, e um pouco de repouso rapidamente curavam:
ningué m pensava em recorrer à medicina. Agora era muito diferente. A
Regra impunha como dever declarar-se doente e receber os cuidados
do mé dico designado. Embora sabendo que sua doença era puramente
espiritual, para ser aliviada apenas por meios espirituais, ainda assim,
como uma noviça obediente, ela nã o podia recusar nenhum remé dio
oferecido a ela. Ela silenciosamente se permitiu ser tratada, feliz por ter
uma ocasiã o para praticar a obediê ncia.
Para que sua submissã o fosse ainda mais perfeita, Deus Todo-Poderoso
permitiu que o espı́rito maligno armasse todos os tipos de armadilhas
para ela. Ele apareceu como um anjo de luz e exortou-a a retornar ao
mundo. Seria pecaminoso, raciocinou ele, desejar mais tempo para
suportar um fardo acima de suas forças, e ele imaginou para ela o que
ela teria que suportar das Irmã s, etc. terminou seu discurso astuto.
Mais uma vez ele procurou despertar seu ressentimento e fazê -la
murmurar contra os superiores, ou tentou inspirá -la com tanto medo
deles que a forçou a deixar o convento. Uma noite ele a jogou em uma
agonia de terror. Pareceu-lhe que a superiora e a mestra de noviças
entraram subitamente em sua cela, repreenderam-na em termos
desmedidos, declararam-na absolutamente indigna de sua santa
vocaçã o e terminaram dizendo que ela deveria ser expulsa da
comunidade. Anne Catherine recebeu suas repreensõ es em silê ncio,
reconheceu sua indignidade e implorou que fossem pacientes com ela.
Entã o as freiras furiosas deixaram sua cela, abusando dela enquanto
iam. A pobre noviça chorou e rezou até de manhã , quando mandou
chamar seu confessor, contou-lhe o que havia acontecido durante a
noite e perguntou-lhe o que deve fazer para apaziguar a Superiora. Mas,
ao ser indagado, icou provado que nem a Superiora nem qualquer
outra Irmã havia entrado em sua cela na hora especi icada. O confessor
viu nisso um ataque do maligno, e a noviça agradeceu a Deus pelo
profundo sentimento de indignidade pelo qual havia vencido o
tentador.
Depois de algumas semanas, as visitas do mé dico foram interrompidas.
A comunidade pensou que ela estava curada; mas, na realidade, nã o foi
assim. Ela estava tã o fraca e enferma que novamente o clamor se
levantou contra o peso do convento pela pro issã o de tal membro.
“Mande-a embora imediatamente”, eles disseram; “nã o incorra na
obrigaçã o de mantê -la completamente.” Esses sussurros, embora talvez
do outro lado do pré dio, foram ouvidos pela pobre invá lida como se
fossem falados em sua cela. Todas as pequenas tramas, todos os
pensamentos de suas Irmã s contra ela, perfuravam sua alma como
faı́scas de fogo, como lanças incandescentes, ferindo-a profundamente.
O dom de ler coraçõ es que ela possuı́a desde a infâ ncia, mas que nunca
lhe causara dor entre os camponeses simples, que todos a amavam e
reverenciavam, tornou-se para ela uma fonte de sofrimento primoroso.
Tudo isso estava de acordo com os desı́gnios de Deus. Ele quis que
somente pela perfeiçã o da virtude, ela superasse os obstá culos que ela
deveria encontrar em sua tarefa de expiaçã o. Ela viu as paixõ es de suas
irmã s, na medida em que teve que lutar contra elas por sua pró pria
oraçã o e morti icaçã o; e por humildade, paciê ncia e caridade ela teve
que desarmar aqueles que se opunham a ela fazendo os votos
religiosos. Se lhe escapava uma palavra de reclamaçã o, um sinal de
insatisfaçã o, ela pedia perdã o em lá grimas com expressõ es de tristeza
tã o comoventes que as Irmã s se tornavam mais bondosas para com ela.
Entã o ela corria diante do Santı́ssimo Sacramento e implorava forças
para cumprir seus deveres. Ela redobrou seus esforços para se tornar
ú til e acalmou a angú stia de seu coraçã o com estas palavras:
“Perseverarei, mesmo que seja martirizada!”
Numa certa sexta-feira de fevereiro de 1803, enquanto rezava sozinha
diante do Santı́ssimo Sacramento, de repente apareceu diante dela uma
cruz de vinte centı́metros de comprimento, na qual pendia uma imagem
do Salvador coberto de sangue.
“Eu estava,” ela diz, “muito agitada por esta apariçã o. Eu corei e tremi,
pois vi tudo ao meu redor e o cruci ixo ensanguentado diante de mim.
Nã o foi uma visã o, eu vi com meus olhos corporais. Entã o me ocorreu o
pensamento de que por esta apariçã o Deus estava me preparando para
sofrimentos extraordiná rios. Estremeci! - mas a visã o lamentá vel de
meu Jesus ensanguentado baniu minha repugnâ ncia, e senti-me forte
para aceitar até mesmo as dores mais terrı́veis, se Nosso Senhor me
desse paciê ncia para suportá -las.
A apresentaçã o foi logo percebida. O dom das lá grimas foi concedido a
ela para que chorasse os ultrajes oferecidos a seu Divino Noivo e
encontrasse nele uma fonte frutı́fera de humilhaçã o. Sempre que algo
era apresentado à sua visã o corporal ou mental que exigia tristeza
sobrenatural, era impossı́vel para ela conter as lá grimas. Quando ela
considerou os sofrimentos e tribulaçõ es da Igreja, quando viu os
Sacramentos conferidos ou recebidos indignamente, seu coraçã o icou
tã o ferido que torrentes de lá grimas amargas correram de seus olhos.
Se ela via cegueira espiritual, falsa piedade velando má s disposiçõ es,
graça desprezada ou obstinadamente resistida, as verdades da fé postas
de lado, suas lá grimas luı́am involuntariamente, banhando suas
bochechas, seu pescoço, seu peito quase desconhecido para ela. Na
capela, na Santa Comunhã o, nas refeiçõ es, no trabalho, nos exercı́cios
comunitá rios, suas lá grimas jorravam para extremo desgosto dos
religiosos. Durante a Missa e a Santa Comunhã o, todos os olhos estavam
voltados para ela. Este foi todo o aviso que ela recebeu, a princı́pio; mas,
como suas lá grimas se tornaram mais abundantes, ela foi posta de lado
e repreendida por seu comportamento singular. Ela prometeu de
joelhos corrigir; mas logo, talvez no dia seguinte, observou-se que
durante a missa até o banco ajoelhado estava molhado de lá grimas,
uma nova prova, pois se pensava que a noviça ainda estava se
entregando ao amor-pró prio ferido. Novamente ela foi repreendida,
novamente ela foi penitenciada; mas sua humildade e submissã o eram
tã o que a Superiora foi obrigada a reconhecer as lá grimas da pobre
noviça como uma morti icaçã o maior para si mesma do que para os
outros. Eles foram, no inal, atribuı́dos à fraqueza constitucional e nã o
ao descontentamento ou capricho. Quanto a Anne Catherine, longe de
considerá -las sobrenaturais, examinava ansiosamente se nã o
procediam de alguma aversã o secreta à s Irmã s. Ela nã o ousou decidir
por si mesma e revelou seus medos ao seu confessor, que a acalmou
com a certeza de que eles nã o vinham do ó dio, mas da compaixã o.
Ela esperava que o tempo atenuasse a intensidade de seus sentimentos
e que suas lá grimas parassem de luir. Mas este nã o foi o caso; eles
aumentaram mais do que diminuı́ram. Na sua angú stia, ela recorreu aos
outros confessores designados para os religiosos, mas de todos recebeu
a mesma resposta.
Dean Overberg diz sobre este ponto:
“Anne Catherine amou tã o ternamente suas irmã s na religiã o que ela
teria derramado seu sangue por elas individualmente de bom grado.
Ela sabia que vá rios estavam contra ela, mas ela fez tudo ao seu alcance
para agradá -los e se regozijou quando algué m pediu sua ajuda. Ela
esperava com bondade conquistá -los para seu dever.
“Deus permitiu que ela nã o fosse apreciada pelas Superioras e Irmã s
que viam em tudo o que ela fazia ou hipocrisia, lisonja ou orgulho, e nã o
deixaram de censurá -la abertamente. A princı́pio ela tentou se
justi icar; mas depois ela simplesmente respondeu que iria corrigir. Ela
chorou pela deplorá vel misé ria espiritual dos religiosos; pois seja em
exercı́cios de piedade ou outros deveres conventuais, estava sempre
diante de seus olhos.
“As lá grimas que ela derramou durante o Santo Sacrifı́cio foram
particularmente desagradá veis para as freiras, e elas realizaram
pequenos conselhos sussurrados sobre o meio mais e icaz de curá -la do
que chamavam de preguiça e capricho. Tudo isso aumentava sua
desolaçã o, pois ela sabia claramente o que se passava em seus
pensamentos mais ı́ntimos.
“Ela me garantiu que sabia tudo o que foi dito ou planejado contra ela.
'Vi entã o ainda mais claramente do que agora', disse ela (22 de abril de
1813), 'o que se passava nas almas, e à s vezes eu as deixava ver que eu
sabia. Depois quiseram saber como cheguei ao conhecimento, mas nã o
me atrevi a contar, e logo imaginaram que algué m havia me contado.
Perguntei ao meu confessor o que deveria fazer. Ele me disse para dizer
que eu tinha falado disso na Con issã o e nã o dar nenhuma explicaçã o
sobre o assunto.”
Em outra ocasiã o, ela novamente aludiu ao seu dom de lá grimas:
“Eu teria dado minha vida de boa vontade por minha irmã religiosa e,
portanto, minhas lá grimas nã o puderam ser contidas quando as vi tã o
irritadas contra mim. Quem nã o choraria ao se ver uma pedra de
tropeço na casa da paz, entre os escolhidos de Deus? Chorei a pobreza,
a misé ria, a cegueira daqueles cujos coraçõ es duros de inharam entre
as superabundantes graças de nosso Santo Redentor”.
Quando, em 1813, os Superiores Eclesiá sticos exigiram o testemunho
da comunidade de Agnetenberg sobre Anne Catherine, a Superiora, a
Mestra de Noviças e cinco dos outros religiosos depostos por
unanimidade da seguinte forma:
“Anne Catherine era afá vel e cordial, muito fá cil de lidar, humilde,
condescendente e extremamente prevenı́vel. Na doença, ela era
admirá vel, sempre resignada à vontade de Deus. Ela perdoou rá pida e
alegremente todas as ofensas contra ela, sempre pediu perdã o se ela
mesma estava em falta, nunca guardou má vontade e sempre foi a
primeira a ceder.
E Clara Soentgen disse a Dean Overberg:
“Anne Catherine nunca foi tã o feliz como ao servir as Irmã s. Eles podem
pedir o que quiserem, ela nunca recusou; ela lhes deu de bom grado até
o que ela mais precisava. Se ela tinha uma preferê ncia, era apenas por
aqueles que ela sabia que nã o gostavam dela.”
Dean Rensing de Dü lmen deposto, 24 de abril de 1813:
“Disseram-me que Anne Catherine prestou grandes serviços a uma das
Irmã s durante uma doença, e Perguntei a ela por que ela fez isso. Ela
respondeu: 'A Irmã tinha feridas nos pé s e os servos nã o gostavam de
atendê -la porque era difı́cil de agradar. Achei que era uma obra de
misericó rdia e implorei a ela que me deixasse lavar suas bandagens
manchadas de sangue. Ela també m estava com coceira, e eu arrumava a
cama dela, pois os criados tinham medo de pegar a doença dela. Mas
con iei em Deus e Ele me preservou disso. Eu sabia que aquela irmã
caprichosa nã o me agradeceria quando ela icasse boa, que ela iria me
tratar novamente como um hipó crita como ela tinha feito muitas vezes
antes. Mas eu disse a mim mesmo: 'Terei tanto mais mé rito diante de
Deus', e assim continuei, lavando suas roupas, arrumando sua cama e
cuidando dela da melhor maneira possı́vel”.
Ana Catarina compreendia tã o perfeitamente o signi icado dos votos
religiosos, ansiava tã o ardentemente por praticar a obediê ncia em
todas as coisas, que o fato de nã o ser exercida nela pelos mandamentos
dos Superiores foi uma prova muito dolorosa para ela. Ela muitas vezes
implorou à Reverenda Madre que a mandasse em virtude da obediê ncia
para que ela pudesse praticar seu voto. Mas tais pedidos foram vistos
como singulares, efeitos de escrú pulos, e ela nã o recebeu outra
resposta da fraca e indulgente Superiora senã o: “ Você conhece seu
dever ”, e assim ela foi deixada a si mesma. Essa falta de treinamento
a ligiu o noviço até as lá grimas. Parecia-lhe que a bê nçã o ligada ao
estado religioso nã o era para ela, pois nã o lhe era permitida a
obediê ncia cega aos Superiores, tã o agradá vel ao seu Divino Noivo.
Em 1813, a Superiora depô s assim:
“A irmã Emmerich cumpriu com alegria e avidez as injunçõ es de
obediê ncia, especialmente quando impostas a ela individualmente.”
A Noviça-Mestre diz:
“Ela praticou a obediê ncia perfeitamente. Seu ú nico arrependimento foi
que a Reverenda Madre nã o lhe deu ordens.
Se as ocasiõ es de praticar a obediê ncia eram em grande parte carentes,
ela procurava suprir a perda com sua submissã o interior e atençã o
incansá vel para regular todas as suas açõ es. acordo com o espı́rito e a
letra da Regra. Ela nã o viveria na religiã o na mera prá tica das
observâ ncias ainda existentes; ela pretendia moldar toda a sua vida
interior e exterior por seu princı́pio animador. Com essa visã o ela fez
um estudo cuidadoso, e tã o grande era seu respeito por ela que ela só
leu de joelhos. As vezes, enquanto estava assim ocupada, a luz pela qual
ela estava lendo se apagava de repente e o livro era fechado por um
poder invisı́vel. Ela sabia muito bem por quem isso foi afetado, entã o,
calmamente reacendendo sua vela, ela começou a trabalhar com mais
seriedade do que antes. Esses ataques do demô nio tornaram-se mais
sensatos e violentos, e a indenizaram amplamente pela falta de outros
julgamentos. Se ele a maltratava por estudar seriamente sua Regra, ela
a aplicava com mais assiduidade; se ele provocasse uma tempestade
contra ela na comunidade, isso só lhe daria uma ocasiã o para praticar a
obediê ncia cega e humilde, como provará o seguinte incidente:
Um rico mercador de Amsterdã inscreveu sua ilha como pensionista no
convento. Quando estava prestes a voltar para casa, a jovem ofereceu
um lorim a cada uma das freiras. Mas a Ana Catarina, por quem tinha
um carinho especial, deu dois, que a boa noviça entregou
imediatamente à sua superiora. Alguns dias depois, toda a casa estava
em guerra. Anne Catherine foi citada perante o Capı́tulo, acusada de ter
recebido cinco tá leres do jovem holandê s, de dar apenas dois à
Reverenda Madre e de ter entregue os outros trê s ao organista
Soentgen, que acabara de fazer uma visita à sua ilha. . Eles apelaram
para sua consciê ncia, e Anne Catherine declarou com sinceridade tudo
o que havia acontecido. As freiras redobraram as acusaçõ es, mas ela
negou irmemente ter recebido cinco tá leres. Entã o a sentença foi
proferida sobre o pobre noviço. Ela foi condenada a pedir perdã o de
joelhos a cada Irmã . Ela aceitou de bom grado a penitê ncia imerecida,
implorando a Deus que conceda que suas Irmã s perdoassem nã o
apenas essa falta imaginá ria, mas tudo o que viam nela de desagrado.
Alguns meses depois que a ilha do mercador voltou, e o noviço pediu à
superiora que investigasse o caso. Mas ela recebeu como resposta para
nã o pensar mais no que estava agora esquecido. Ela obedeceu e colheu
todos os benefı́cios da humilhaçã o.
Vemos por essa circunstâ ncia como esses religiosos imperfeitos eram
propensos a nã o gostar e suspeitar de seu companheiro inocente, e
també m com que rapidez a tempestade foi acalmada mesmo quando
estava no auge. O comportamento de noviço produziu impressõ es tã o
variadas sobre eles que di icilmente podemos nos perguntar que, em
sua inexperiê ncia, sua obtusidade para tudo alé m de sua existê ncia
cotidiana, à s vezes se extraviaram. E, embora a doçura e paciê ncia de
Anne Catherine sob tais provaçõ es, sua seriedade em pedir perdã o, nã o
poderia deixar de suavizar até mesmo as mais exasperadas, mas novas
suspeitas, novas acusaçõ es logo surgiram contra ela. Havia na riqueza
de sua vida sobrenatural, nos variados e maravilhosos dons que lhe
eram conferidos, em uma palavra, em todo o seu ser algo marcante
demais para permanecer oculto, ou para permitir que ela trilhasse os
caminhos batidos da vida comum como os outros. religioso. Por maior
que fosse a simplicidade e modé stia de seu porte, brilhava sobre ela
algo tã o sagrado, tã o elevado, que todos eram forçados a sentir, embora
nã o reconhecessem sua superioridade; consequentemente, eles a
consideravam singular, cansativa e desagradá vel.
Anne Catherine foi atraı́da para o Santı́ssimo Sacramento por uma força
irresistı́vel. Quando algum recado a levou pela igreja, ela caiu como se
estivesse paralisada ao pé do altar. Ela estava sempre em um estado de
contemplaçã o e sofrimento interior que, apesar de todos os esforços de
sua parte, nã o podia ser totalmente escondido. Para todos ao seu redor,
ela era simplesmente um misté rio, para alguns, insuportá vel.
Clara Soentgen depô s sobre este ponto da seguinte forma:
“Anne Catherine fez o possı́vel para esconder a atraçã o que a impelia a
uma devoçã o extraordiná ria; mas nada poderia me escapar, eu a
conhecia tã o bem. Muitas vezes a encontrei na capela ajoelhada ou
prostrada diante do Santı́ssimo Sacramento. Ela era tã o fortemente
atraı́da pela contemplaçã o que, mesmo na companhia de outras
pessoas, eu podia ver que ela era bastante distraı́da. Ela era muito dada
à morti icaçã o corporal. A mesa, eu percebia que ela levava o pior de
tudo, deixando intocados os pratos delicados, ou passando a sua parte
para o vizinho, especialmente se este tivesse alguma má vontade para
com ela, e ela icava tã o feliz quando uma chance se apresentava fazer
isso, que iquei maravilhado”.
A Noviça-Mestre diz:
“Vá rias vezes durante o noviciado de Anne Catherine, tirei pedacinhos
de madeira de sua cama. Ela os havia colocado ali para tornar seu
descanso desconfortá vel, pois era muito dada à morti icaçã o corporal.
As vezes eu era obrigado a fazê -la sair da capela à s dez horas no
inverno e mandá -la para a cama; caso contrá rio, ela teria permanecido
muito tempo.”
Em vá rias ocasiõ es, a pró pria Anne Catherine falou de seus primeiros
dias no convento. Clement Brentano, que recolheu cuidadosamente
todas as suas comunicaçõ es e as reduziu à escrita, dá -nos o seguinte:
“Desde o inı́cio do meu noviciado, suportei incrı́veis sofrimentos
interiores. As vezes meu coraçã o era cercado por rosas e entã o
subitamente transpassado por espinhos, pontas a iadas e dardos, que
surgiam de minha percepçã o muito mais clara do que agora cada
pensamento, palavra ou açã o prejudicial contra mim. Nenhum com
quem convivi, nenhum religioso, nenhum confessor, tinha a menor idé ia
do estado de minha alma ou do modo particular pelo qual fui
conduzido. Eu vivia inteiramente em outro mundo do qual nada podia
dar a conhecer. Mas, como em algumas ocasiõ es, por qualquer direçã o
interior, as coisas pareciam em mim nã o conformes com a vida
cotidiana, tornei-me motivo de tentaçã o para muitos, objeto de
suspeitas injuriosas, depreciaçõ es e comentá rios desagradá veis. Essas
opiniõ es e discursos morti icantes entraram em minha alma como
lechas a iadas. Fui atacado por todos os lados, meu coraçã o foi
perfurado com mil feridas. Exteriormente eu estava sereno e cordial,
como se ignorasse o tratamento cruel deles; e, a inal, eu realmente nã o
sabia muito de fora, pois o sofrimento estava todo dentro. Foi-me
mostrado para exercer minha obediê ncia, caridade e humildade.
Quando falhei nessas virtudes, fui castigado interiormente. Minha alma
me pareceu transparente; e, quando um novo sofrimento me assaltava,
eu o via em minha alma sob a aparê ncia de dardos in lamados, manchas
vermelhas e in lamadas, que só a paciê ncia poderia remover.
“Minha condiçã o no convento era tã o singular, tã o perfeitamente
abstraı́da das coisas externas, que meus companheiros di icilmente
podem ser culpados por me tratarem. Eles nã o podiam me entender,
me olhavam com descon iança e suspeita; no entanto, Deus escondeu
deles muitos fatos que os teriam deixado ainda mais perplexos. Quanto
ao resto, apesar dessas provaçõ es, nunca fui tã o rico interiormente,
nunca tã o perfeitamente feliz como entã o, pois estava em paz com Deus
e com os homens. Quando trabalhava no jardim, os pá ssaros pousavam
na minha cabeça e nos meus ombros e louvá vamos a Deus juntos.
“Meu anjo sempre esteve ao meu lado. Embora o espı́rito maligno se
enfurecesse ao meu redor, embora ele me insultasse no silê ncio da
minha cela e procurasse me aterrorizar com barulhos assustadores, ele
nunca poderia me prejudicar; Eu sempre icava aliviado em boa hora.
“Muitas vezes pensei que tinha o Menino Jesus em meus braços por
horas a io; ou, quando estava com as Irmã s, sentia-O ao meu lado e
icava perfeitamente feliz. Vi tantas coisas que despertavam
sentimentos de alegria ou dor, mas nã o tinha ningué m a quem pudesse
transmiti-las, e meus pró prios esforços para esconder essas emoçõ es
repentinas e violentas me faziam mudar de cor com frequê ncia. Entã o
as Irmã s disseram que eu parecia uma apaixonada. Eles estavam, de
fato, certos, pois eu nunca poderia amar o meu Noivo o su iciente, e
quando Seus amigos falavam bem Dele ou daqueles queridos a Ele, meu
coraçã o batia de alegria.”
Capítulo 13
A NNE C ATHERINE FAZ SEUS VOTOS , 13 DE NOVEMBRO DE
1803
O ano do noviciado estava chegando ao im, mas a comunidade ainda
nã o havia decidido admitir a noviça à sua santa pro issã o. A Noviça-
Mestre poderia, com toda a verdade, prestar o seguinte testemunho
T de seu encargo: “Observo em sua constante submissã o à vontade de
Deus, mas ela está frequentemente em lá grimas. Ela nã o vai dizer por
quê , porque nã o se atreve; caso contrá rio, nã o vejo nada nela que
mereça censura.”
Este testemunho a seu favor, no entanto, nã o satisfez a comunidade.
Quando o Capı́tulo deliberou se ela deveria ser mandada embora ou
autorizada a permanecer, nenhuma outra razã o poderia ser atribuı́da
para sua demissã o senã o que ela logo se tornaria incapaz de trabalhar,
um fardo para a casa; no entanto, a Reverenda Madre foi forçada a
reconhecer que a noviça era muito inteligente, que possuı́a habilidade e
aptidã o, e que certamente seria de grande utilidade; uma declaraçã o
que arrancou de seus oponentes a con issã o de que ela sempre se
comportou como uma boa religiosa e que, a inal, nã o havia motivo
su iciente para mandá -la para casa.
Retirados esses obstá culos e marcado o dia da cerimô nia, uma nova
di iculdade surgiu por parte da pró pria noviça. Ela ainda nã o havia
resgatado a garantia dada ao organista Soentgen por dez tá leres e tinha
boas razõ es para temer ser responsabilizada pela dı́vida. Ela explicou
seu embaraço à Reverenda Madre, que se candidatou ao senhor em
questã o. Mas ele declarou sua incapacidade de liberar Anne Catherine
de sua obrigaçã o, pois nã o conseguiu quitar sua dı́vida. A comunidade
resolveu nã o permitir que a noviça izesse seus votos até que ela se
libertasse de seu noivado. O que deveria ser feito agora? Anne
Catherine voltou-se para Deus. Daremos suas pró prias palavras sobre
este assunto:
“Eu nã o tinha um ú nico centavo. Candidatei-me à minha famı́lia, mas
ningué m me ajudou, nem mesmo meu irmã o Bernard. Todos me
recriminaram como se eu tivesse cometido um crime ao passar
segurança. Mas a dı́vida teve que ser cancelada antes que eu pudesse
fazer meus votos. Clamei a Deus por ajuda e, por im, um homem
caridoso me deu os dez tá leres. Meu irmã o costumava chorar mais
tarde por causa de sua dureza de coraçã o para comigo.
“Removido com alegria esse obstá culo e quase concluı́dos os
preparativos para a pro issã o, surgiu outra di iculdade. A Reverenda
Madre disse a mim e a Clara que ainda precisá vamos de algo que
terı́amos de enviar a Mü nster, com uma despesa de trê s tá leres cada. Eu
nã o tinha dinheiro, e onde eu poderia conseguir algum? Na minha
angú stia, fui ao Abbé Lambert, que gentilmente me deu duas coroas.
Retornei alegremente à minha cela onde, para minha grande alegria,
encontrei seis tá leres sobre a mesa, corri com as duas coroas para
minha amiga que, como eu, nã o tinha nada e nã o sabia onde conseguir
seus trê s tá leres.
“Trê s anos depois, eu estava novamente precisando de dinheiro. Cada
Irmã tinha que providenciar seu pró prio café da manhã , e eu nã o tinha
nada na hora para conseguir o meu. Um dia, entrei na minha cela, que
estava trancada, e encontrei dois tá leres no parapeito da janela. Levei-
os à Superiora, que me permitiu guardá -los.
“Oito dias antes da festa da Apresentaçã o da Santı́ssima Virgem de
1803, no mesmo dia em que um ano antes de Clara Soentgen e eu
havı́amos tomado o há bito, izemos nossa pro issã o de agostinianos no
convento de Agnetenberg, Dü lmen, e de naquele dia fomos consagrados
esposos de Jesus Cristo sob a Regra de Santo Agostinho. Eu estava no
meu vigé simo oitavo ano. Depois da minha pro issã o, meus pais se
reconciliaram com o fato de eu ser religioso, e meu pai e meu irmã o
vieram me ver e me trouxeram duas peças de linho”.
O abade John Martin Lambert, que agora encontramos pela primeira
vez, ex-vigá rio na paró quia de Demuin, diocese de Amiens, foi como
muitos outros bons padres forçados a deixar seu paı́s ao se recusar a
prestar o famoso juramento da Constituiçã o . Com recomendaçõ es do
arcebispo de Tours e do bispo de Amiens, ele foi em 1794 para Mü nster,
obteve as faculdades do vigá rio-geral von Fü rstenberg e foi nomeado
confessor com uma pequena mesada da casa do duque von Croy, que
residia em Dü lmen . No convento de Agnetenberg, que tinha confessor
pró prio, o abade exercia també m o cargo de capelã o, cargo que conferia
ao possuidor o direito de alojamento no recinto do convento. Quando a
irmã Emmerich icou encarregada da sacristia, ela o conheceu; sua
piedade e profundo recolhimento na celebraçã o da Santa Missa a
impressionaram favoravelmente e ela concebeu grande con iança nele.
O tratamento pouco fraterno que recebeu das companheiras a a ligiu
muito e, nã o conseguindo se fazer entender pelo confessor ordiná rio,
resolveu abrir o coraçã o ao abade e pedir-lhe conselhos e ajuda. Mas,
como o bom padre sabia pouco alemã o, suas comunicaçõ es eram, a
princı́pio, necessariamente muito restritas. No entanto, o sacerdote
piedoso e esclarecido logo adquiriu uma visã o do estado de seu
penitente, e por isso sentiu-se obrigado a ajudar na medida do possı́vel
uma alma tã o favorecida por Deus. Ele obrigou o confessor a permitir
que ela se comunicasse com mais frequê ncia, até mesmo para ordenar
quando por humildade ela desejasse se abster. E foi ele que ao
amanhecer do dia se preparou para administrar a ela a Adorá vel
Eucaristia quando seu desejo do Maná Celestial a fez quase desmaiar.
Embora muito pobre, ele estava sempre disposto a ajudá -la quando sua
angú stia seu consentimento em aceitar uma esmola dele, e por seu lado
ela o honrou como seu maior benfeitor terreno. Mais tarde a veremos
devolver, na medida do possı́vel, sua invariá vel bondade.
Podemos facilmente conceber os sentimentos de Anne Catherine ao
pronunciar ao pé do altar os votos solenes a que ela aspirava há tanto
tempo. O mesmo zelo, o mesmo desejo com que dezesseis anos antes se
preparara para a Primeira Comunhã o, marcaram sua preparaçã o para
esta ocasiã o solene. Multiplicadas oraçõ es e penitê ncias, provaçõ es e
ansiedades esgotaram suas forças nos dias imediatamente anteriores à
pro issã o; no entanto, no pró prio dia alegre, ela parecia dotada de um
novo vigor. A alegria de sua alma se manifestava em seu exterior; ela
era, por assim dizer, toda luminosa. Ela compreendeu o real signi icado
da cerimô nia, percebeu o signi icado das provaçõ es que haviam
assolado seu caminho desde seu primeiro chamado ao estado religioso,
e seu coraçã o transbordou de gratidã o por tudo o que Deus havia
operado nela e por ela até aquele momento. momento. Ela se viu
vestida com as vestes festivas e ornamentos nupciais sobre os quais
durante anos ela trabalhou incansavelmente de acordo com as
instruçõ es dadas em suas grandes visõ es; cada passo, cada auto-vitó ria,
cada suspiro, era ali representado como uma pedra preciosa ou um
requintado bordado. Agora ela viu como todas essas provaçõ es foram
necessá rias para prepará -la para as nú pcias nas quais seu Divino Noivo
assistiu visivelmente com os Santos da Ordem de Santo Agostinho.
Como no Batismo ela se viu desposada com o Menino Jesus por Sua
Santa Mã e, agora foi pela Rainha das Virgens que ela foi apresentada ao
seu Noivo. Enquanto seus lá bios pronunciavam as palavras da santa
pro issã o, ela via sua solene consagraçã o a Deus rati icada de duas
maneiras. A Igreja Militante a recebeu e o Esposo Celestial dignou-se a
aceitá -la das mã os da Mã e Igreja, selando Sua aceitaçã o, concedendo-
lhe Seus mais magnı́ icos dons. Ela viu a posiçã o exaltada no Igreja à
qual os votos a elevaram; apreciou muito as abundantes graças que lhe
foram concedidas e a dignidade com que sua qualidade de esposa a
investiu, uma dignidade que ela sempre considerou em si mesma com
respeito. Aconteceu com ela a mesma coisa que com um piedoso
candidato à s Ordens Sacras. No momento da sua Ordenaçã o, a sua
pró pria alma tornou-se-lhe visı́vel em todo o esplendor que lhe foi
comunicado pela marca indelé vel do sacerdó cio. Anne Catherine sentiu
de que maneira ela passou a pertencer à Igreja, e atravé s da Igreja ao
seu Esposo Celestial; como dom consagrado, foi oferecida a Deus de
corpo e alma. Como Columba di Rieti, Lidwina de Schiedam e a Beata
Colette, ela compreendeu o signi icado espiritual de seus diferentes
membros, como esposa de Deus, e també m sua relaçã o simbó lica com o
corpo da Igreja.
Nenhum detento de Agnetenberg tinha a menor suspeita dessas
maravilhas, mas Deus quis que este dia de nú pcias espirituais fosse
para todos um dia de alegria e paz. Anne Catherine, embora em
lá grimas de felicidade que nã o foram contidas, exerceu uma in luê ncia
alegre sobre todas as suas Irmã s; e seus reiterados agradecimentos por
admiti-la irrevogavelmente entre eles izeram com que até os mais
obstinados sorrissem para ela por pelo menos um dia. Uma refeiçã o
aguardava os convidados no refeitó rio do convento, para o qual seus
amados pais foram convidados depois da Missa Solene. orem
fervorosamente para que Deus lhes conceda a graça de fazer o sacrifı́cio
que Ele exigiu deles. Sua oraçã o foi inalmente ouvida. Eles icaram tã o
profundamente comovidos com a visã o de seu ilho neste dia, o dia de
seus esponsais, que, unidos em seu sacrifı́cio, eles a entregaram a Deus
de todo o coraçã o. Eles testemunharam sua alegria de tantas maneiras e
demonstraram tanto carinho por ela que, até o im de sua vida, a
lembrança dessa solenidade foi sempre uma das mais doces.
O ano de 1803 abriu mais desastrosamente para a Igreja Cató lica Igreja
na Alemanha. Sem dú vida, teria sido totalmente aniquilado se seu
fundador e defensor nã o fosse o pró prio Deus. Como outrora Ele havia
permitido a destruiçã o de Sua santa cidade e templo como puniçã o pela
in idelidade e apostasia de Seu povo, agora os poderosos inimigos da
Igreja deveriam ser para ela os instrumentos para separar os bons dos
maus grã os. Enquanto esta sentença estava sendo executada, enquanto
durava a “abominaçã o da desolaçã o”, o Senhor escondeu as coisas
sagradas de Sua Igreja, como os sacerdotes do Templo o fogo sagrado,
até que o crime fosse expiado, pudesse ser aceso com maior brilho do
que antes . Os poços em que o fogo sagrado da Igreja Cristã era
preservado eram almas santas, poucas em nú mero neste perı́odo. Eles
esconderam sob as á guas da tribulaçã o aqueles tesouros que formavam
antigamente o deleite e ornamento da Noiva de Cristo; tesouros que
agora foram abandonados por seus guardiõ es, saqueados e dissipados
por aqueles que deveriam tê -los guardado e defendido. Anne Catherine
compartilhou essa tarefa com um pequeno nú mero de servos ié is. O
Senhor aproveitou o fogo dos sofrimentos e o martelo da penitê ncia
para fazer dela um vaso puro, forte e su icientemente espaçoso para
receber as incomensurá veis riquezas da Igreja até o tempo de sua
restauraçã o.
Qual era agora a vida que esperava a irmã Emmerich no convento? A
impressã o favorá vel do dia festivo logo se apagou do coraçã o de suas
irmã s, e a pobre menina voltou a ser o que sempre foi, a intrusa
indesejada entre elas. Deus Todo-Poderoso tinha, por assim dizer,
conseguido sua entrada neste convento pela força; e desde o inı́cio
contraı́ra aos olhos dos religiosos, por sua pobreza e doença, uma
dı́vida que jamais poderia pagar. O há bito lhe fora dado em meio à
insatisfaçã o, e agora ela havia feito seus votos quase apesar da oposiçã o
geral. Um vaso de eleiçã o, instrumento escolhido de Deus, ela será para
sempre uma pedra de tropeço, um objeto de aversã o à queles por quem
nutria uma afeiçã o tã o calorosa. Isso ela sabia e sentia a cada momento,
devido ao seu dom de ler coraçõ es, e assim ela foi tratada em sua
pró pria pessoa precisamente como o pró prio estado religioso foi
tratado naquela é poca por muitos de seus membros. Alé m disso, ela
nã o tinha a menor esperança de poder restaurar a disciplina estrita dos
tempos anteriores, treinando jovens membros ativos para ela; pois,
depois de sua entrada, o noviciado foi fechado para sempre. Ela foi a
ú ltima a fazer a pro issã o religiosa no convento de Agnetenberg, e sabia
tanto pelo aspecto polı́tico da é poca quanto por suas pró prias visõ es,
que essa famı́lia espiritual em breve seria dissolvida para nunca mais se
reunir. Quã o admirá veis sã o os caminhos de Deus! Quã o contrá rios aos
do mundo! Quã o diferentes sã o os meios que Ele emprega daqueles dos
homens! Anne Catherine combinou, em uma visã o humana,
quali icaçõ es eminentemente adequadas para prestar os mais altos
serviços à Igreja; mas Deus nã o exige dela nenhuma marca
deslumbrante de lealdade. Sofrimentos incalculá veis, anos de
obscuridade e humilhaçã o, eram os ú nicos remé dios que ela deveria
aplicar à s feridas profundas de Sua Esposa na terra. Quanto mais
avançava em sua missã o, maiores se tornavam seus sofrimentos.
Di icilmente poderı́amos suportar o espantoso espetá culo se sua doce e
infantil simplicidade nã o viesse como um clarã o do Paraı́so para
iluminar o mar escuro de dores que levava sua barca tempestuosa até o
porto de descanso.
Capítulo 14
SOFRIMENTOS CORPORAIS _ _
me entreguei ao meu Esposo Celestial e Ele cumpriu a Sua
vontade em mim. Sofrer em repouso sempre me pareceu o
estado mais invejá vel deste mundo, mas ao qual nunca cheguei.”
"EU Nestas palavras, Irmã Emmerich resumiu o misté rio de toda a
sua vida, tanto no convento como fora dele, pois os sofrimentos
nunca lhe faltavam. Recebeu-os com gratidã o das mã os de Deus,
acolheu-os como um dom precioso, mas nunca teve descanso no
sofrimento, nunca lhe caiu uma vida tranquila e oculta. Ela deveria
chegar à perfeita conformidade com seu Esposo. Ele consumou Sua
missã o em meio a contradiçõ es, tribulaçõ es e perseguiçõ es – Sua serva
nã o deveria cumprir a dela de outra forma. Desde a infâ ncia ela sofrera
pelos outros; mas agora esses sofrimentos assumiam um cará ter mais
elevado, mais extenso. As feridas do corpo da Igreja, ou seja, a queda de
dioceses inteiras, a obstinaçã o e negligê ncia dos eclesiá sticos, o estado
deplorá vel da sociedade - tudo foi colocado sobre ela para ser expiado
por vá rios e multiplicados sofrimentos. Suas enfermidades resultaram
de feridas espirituais acarretadas ao rebanho de Cristo pelos pecados
de seus pró prios membros. Nisto ela pode ser comparada à Beata
Lidwina de Schiedam, que junto com Cristina de Saint-Trond (Christina
mirabilis) é , talvez, o mais maravilhoso instrumento de expiaçã o já
utilizado por Deus Todo-Poderoso para o bem da Igreja. Uma olhada
em sua vida nos dará uma visã o clara da missã o da irmã Emmerich. 1
Lidwina, ilha de um pobre vigia de Schiedam, nasceu algumas semanas
antes da morte de Santa Catarina de Sena e, por um privilé gio especial,
dedicou à Mã e de Deus para receber de sua força para continuar a
missã o de sofrimento por a Igreja que lhe foi legada pelo Santo.
Catarina foi levantada por Deus no sé culo XIV, como Santa Hildegarde
no sé culo XII, para ajudar o cristianismo pelo espı́rito de profecia. Sua
vida contava apenas trinta e trê s anos; pois seu coraçã o, dilacerado pelo
amor divino, nã o podia mais suportar a visã o das infelizes divisõ es na
Igreja causadas pela eleiçã o de um antipapa contrá rio a Urbano VI. Um
cisma irrompeu dois anos antes de sua morte, e Santa Catarina recuou
de nenhum sacrifı́cio para restaurar a paz e a unidade, mesmo
implorando a Deus Todo-Poderoso que permitisse que a raiva do
inferno fosse desencadeada contra sua pró pria pessoa e nã o contra o
chefe da Igreja. Sua oraçã o foi ouvida. Durante os ú ltimos trê s meses de
sua vida, de 19 de janeiro de 1380, Sexagesima, até 30 de abril, quinto
domingo depois da Pá scoa, o Inferno a fez de fato sua vı́tima, como
havia feito antigamente Santa Hildegarde que por trê s anos
consecutivos lutou com o infernal coortes para o bem da Igreja. No
Domingo de Ramos de 1380, poucas semanas antes da morte de Santa
Catarina, Lidwina, herdeira de seus sofrimentos e lutas, nasceu na
Holanda. Desde o berço ela foi uma pequena vı́tima de dor, sendo a
intolerá vel agonia da pedra sua porçã o; no entanto, apesar de sua saú de
precá ria, ela era tã o bonita e apresentava uma aparê ncia tã o robusta
que sua mã o foi pedida em casamento aos doze anos de idade. Mas
muito antes ela havia consagrado sua virgindade a Deus por voto; e
agora, para livrar-se de pretendentes, ela implorou a Ele que a privasse
de sua beleza, uma oraçã o que agradou ao Autor de toda beleza. Em seu
dé cimo quinto ano, ela adoeceu. Em sua recuperaçã o, ela estava tã o
des igurada que nã o era mais um objeto de atraçã o. Desta forma, ela foi
preparada para ser um vaso de sofrimentos, e as misé rias que naquele
perı́odo a ligiam a Igreja foram colocadas sobre ela. Enquanto patinava
no gelo, um companheiro se chocou contra ela. Lidwina caiu e quebrou
uma costela do lado direito. Formou-se um abscesso interno que
nenhum remé dio poderia aliviar e do qual ela sofreu dores horrı́veis.
Cerca de um ano apó s este acidente, seu pai aproximou-se de sua cama
um dia para acalmá -la e confortá -la, quando em um paroxismo de
agonia ela se jogou em seus braços. O movimento sú bito quebrou o
abscesso, o sangue jorrou violentamente de sua boca e nariz, e ela
estava em perigo iminente de sufocar. A partir deste momento ela
piorou; a supuraçã o do abscesso a impedia de se alimentar e se ela se
forçava a comer, seu estô mago se recusava a reter a comida. A sede
ardente a consumia e quando ela se arrastou para fora da cama para
engolir um gole de á gua, foi apenas para jogá -lo fora imediatamente.
Nada a aliviava; e, o que era ainda mais deplorá vel, ela foi por anos
privada de consolo e direçã o espiritual. Uma vez por ano, na Pá scoa, ela
era levada à igreja para receber a Sagrada Comunhã o, e isso era tudo.
As vezes, parecia-lhe que nã o poderia suportar por mais tempo seu
estado de sofrimento e abandono; mas a doença, mesmo como a dela,
nã o conseguia esmagar de uma só vez sua jovialidade juvenil e ela era
muitas vezes tomada por um desejo ardente de ser curada. Um
quartinho miserá vel no té rreo, mais parecido com uma caverna do que
com um apartamento, foi o que lhe foi atribuı́do, e as vozes alegres dos
jovens ao passarem pela janela estreita intensi icaram seus
sentimentos de total abandono. Passaram-se trê s ou quatro anos, e
entã o Deus lhe enviou um santo confessor e diretor na pessoa de John
Pot, que lhe ensinou a meditar na dolorosa Paixã o de Cristo, exercı́cio
de cujo exercı́cio ela extraiu fortaleza e resignaçã o. Ela foi dó cil e iel à s
suas instruçõ es, mas o alı́vio perfeito veio à sua alma desolada somente
quando o dom das lá grimas lhe foi concedido, o que aconteceu um dia
depois da Sagrada Comunhã o. Por quatorze dias suas lá grimas luı́a
constante e incontrolavelmente sobre sua antiga impaciê ncia e tepidez
enquanto, ao mesmo tempo, sua alma era inundada de consolo. A partir
desse momento, ela progrediu tanto na oraçã o que todas as horas do
dia e da noite a encontravam absorta na contemplaçã o, e ela regulava o
tempo com tanta precisã o por sua pró pria advertê ncia interior, como
pelo som de um reló gio. No oitavo ano de doença, ela poderia dizer:
“Nã o sou eu que sofro; é meu Senhor Jesus que sofre em mim!” e ela
continuamente se oferecia como vı́tima de expiaçã o. Certa vez, no
domingo da Quinquagé sima, ela pediu uma dor especial para expiar os
pecados cometidos durante o Carnaval; entã o ela foi atacada por dores
em seus membros tã o excruciantes que ela nã o ousava mais fazer tais
petiçõ es. Mais uma vez ela se ofereceu como vı́tima para evitar a praga
de sua cidade natal, e instantaneamente duas feridas pestilentas
apareceram em sua garganta e peito; ela implorou por um terço em
honra da Santı́ssima Trindade, e outro apareceu em seu joelho.
Logo todo o desmembramento e devastaçã o da Igreja foram lançados
sobre ela. A trı́plice destruiçã o feita na é poca do grande cisma pela
liberdade de opiniã o, imoralidade e heresia, foi representada nela por
enxames de vermes esverdeados que se geraram em sua espinha,
atacaram seus rins e devoraram a parte inferior de seu corpo, em que
izeram trê s grandes buracos. Cerca de duzentos desses vermes, com
uma polegada de comprimento, eram gerados diariamente. Para se
proteger em algum grau, Lidwina os alimentava com uma mistura de
mel e farinha, ou com gordura de capã o espalhada em linho e colocada
sobre as feridas. Isso ela teve que pedir como uma esmola; e, se nã o
fosse fresco, os vermes a atacavam. Como a in idelidade, a heresia e o
cisma brotam do orgulho do intelecto e dos pecados contra o sexto
mandamento, esse triplo mal teve que ser expiado de maneira aná loga
em sua natureza, isto é , putrefaçã o e vermes.
O que restou das outras partes internas de seu corpo apó s a açã o do
abscesso purulento, foi, por vontade da pró pria Lidwina, enterrado e a
cavidade do abdome preenchida com lã . Ela foi atendida pelo mé dico da
Duquesa Margarita da Holanda. A agonia que ela suportou com a pedra,
apesar da decomposiçã o de seus ó rgã os, chegou à s vezes a tal grau de
intensidade que a tirou da consciê ncia. Esse sofrimento era uma
expiaçã o da abominaçã o do concubinato mesmo entre os clé rigos. Seus
rins e fı́gado apodreceram; tumores purulentos se formaram em seus
seios, por causa do leite do escâ ndalo dado a multidõ es de crianças, em
vez do alimento da pura doutrina; e, pela contenda e discó rdia que
reinava entre os teó logos cristã os, Lidwina suportou a mais agonizante
dor de dente, que muitas vezes era tã o violenta que afetava sua razã o. A
excitaçã o doentia que agitava o corpo da Igreja foi expiada por uma
febre terçã que, como uma rajada fulminante, secou seus ossos ou a
sacudiu com calafrios.
Por im, como o cristianismo por quarenta anos foi dividido entre papas
e antipapas, també m o corpo de Lidwina foi literalmente separado em
duas partes. Seus ombros tiveram que ser enfaixados para evitar que
caı́ssem. Uma fenda se estendia verticalmente pela testa até o meio do
nariz; seus lá bios e queixo estavam na mesma condiçã o; e o sangue à s
vezes escorria tã o abundantemente deles que a impedia de falar.
Como o Papa nã o podia mais guardar todo o rebanho, Lidwina perdeu o
uso do olho direito, e o esquerdo estava tã o fraco que nã o suportava a
luz. O fogo da revolta paralisou o poder do Soberano Pontı́ ice — e o
braço direito de Lidwina foi atacado pelo fogo de Santo Antô nio; e os
nervos repousam sobre os ossos sem carne como as cordas de um
violã o, o pró prio braço sendo preso ao corpo apenas por um tendã o.
Com o uso apenas de sua mã o esquerda, ela icou de costas, indefesa e
imó vel, e por sete anos consecutivos ela nã o pô de ser movida para nã o
cair literalmente em pedaços. Seu corpo, privado de sono e nutriçã o, era
como uma á rvore carcomida sustentada apenas pela casca; e, no
entanto, diariamente luı́a de sua boca, nariz, olhos, ouvidos, de todos
os poros de seu corpo uma quantidade tã o grande de sangue e outras
luidos que dois homens nã o conseguiriam levar no espaço de um mê s.
Lidwina bem sabia de onde vinha esse substituto para a seiva vital que
havia secado inteiramente em seu corpo, pois uma vez questionada
sobre sua origem, ela respondeu: “Diga-me de onde a videira tira sua
rica seiva que no inverno parece estar toda seca ?” Ela sentiu-se um
ramo vivo da videira verdadeira, cujas bê nçã os luem para o chã o
quando nã o encontram nenhum membro para recebê -las. Lidwina
expiava esse desperdı́cio com o sangue que escorria de todos os poros e
que dia apó s dia era milagrosamente reabastecido. O maravilhoso vaso
de seu corpo, apesar de sua corrupçã o e vermes, exalava um odor muito
doce. Tornou-se inalmente uma vı́tima tã o agradá vel aos olhos de
Nosso Senhor que Ele imprimiu nela o selo de Seus Sagrados Estigmas.
Durante trinta e trê s anos, Lidwina apresentou este espantoso
espetá culo de sofrimento, totalmente em contradiçã o com as leis da
natureza, e que nenhuma experiê ncia natural poderia explicar. Quando
respondida a perguntas como estas: “Como você pode viver sem
pulmõ es, fı́gado ou intestinos, e quase consumido por vermes?” – ela
respondia calmamente: “Deus e minha consciê ncia testemunham que
perdi aos poucos o que Ele uma vez deu. Eu. Você pode muito bem
acreditar que essa perda foi difı́cil de suportar, mas só Deus sabe o que,
na plenitude de Seu poder onipotente, Ele fez em mim para substituir
essa perda.”
O piedoso bió grafo de Lidwina, Francis Brugmann, Provincial das
Minorias, lança luz sobre esses fatos inexplicá veis quando diz que Deus,
preservando milagrosamente o corpo devastado de sua esposa, quis
manifestar a todos os tempos os meios pelos quais Ele preserva
diariamente a graça de Redençã o aos homens que perseguem a Igreja,
sua fé e seus misté rios, como os vermes, a febre e a maté ria pú trida
consumiram o corpo da Beata Lidwina.
Para que fosse evidente para todos que Lidwina carregava em sua
pró pria pessoa as feridas de toda a Igreja, Deus a restaurou ao seu
estado perfeito algum tempo antes de sua morte. Quando o
Cristianismo novamente reconheceu uma Cabeça, a tarefa de Lidwina
foi realizado, e ela recebeu mais uma vez tudo o que ela havia
sacri icado pelos interesses da Igreja.
Podemos agora perguntar muito legalmente como a vida poderia ser
prolongada em um corpo inteiramente destituı́do de ó rgã os vitais, e
encontramos Lidwina em vá rias ocasiõ es aludindo a um alimento
sobrenatural. Seu bió grafo diz: “A curiosidade impelia multidõ es a
visitar a piedosa virgem, algumas movidas por intençõ es louvá veis,
outras vindo apenas para condenar e blasfemar. Todos viram, de fato,
apenas uma imagem da morte; no entanto, o primeiro viu també m
neste vaso mutilado o bá lsamo da santi icaçã o; nesta imagem
des igurada o Senhor que opera maravilhas; nesta aparê ncia de morte o
Autor da vida, o mais adorá vel entre os ilhos dos homens. Se Lidwina
perguntasse com espanto o que a febre poderia apoderar-se dela, já que
ela nã o se alimentava, ela responderia: “Você está surpreso que a febre
encontre algo para se alimentar em mim – e eu, eu me pergunto, eu me
pergunto se nã o me torne como um barril em um mê s! Você julga pela
cruz que me vê carregando, mas nã o conhece a unçã o ligada a ela, nã o
pode ver o interior”.
Quando as pessoas santas expressavam sua surpresa ao vê -la viva em
tal estado, dizendo: “Você nã o poderia viver se Deus em Sua
misericó rdia nã o o preservasse” – ela respondia: “Sim, reconheço que
recebo, embora seja indigno dele, um sustento que Deus derrama sobre
mim de tempos em tempos. Pobre ilhote que sou, nã o poderia viver em
tal corpo, se algumas migalhas da mesa de meu Mestre nã o caı́ssem
sobre mim; mas nã o cabe ao cachorrinho dizer que migalhas recebe.”
As vezes, mulheres indiscretas a atormentavam com perguntas sobre a
realidade de ela nã o se alimentar; entã o ela respondia docemente: “Se
você nã o consegue entender, mas nã o se junte ao nú mero dos
incré dulos, nã o despreze as maravilhosas operaçõ es de Deus. Foi ele
quem apoiou Maria Madalena em sua solidã o e Maria do Egito no
deserto. Nã o há dú vida sobre o que você pensa de mim, mas nã o roube
a gló ria de Deus.”
Lidwina nã o signi icava meramente a unçã o comunicada pelos dons e
frutos do Espı́rito Santo. Ela aludiu mais particularmente ao alı́vio
recebido do Paraı́so terrestre, que a revigorou de uma maneira
totalmente milagrosa. Os Padres dizem-nos que o Paraı́so ainda existe
em toda a sua primeira beleza intocada pelas á guas do Dilú vio. Aqui
Enoque e Elias foram transportados para aguardar a vinda do
anticristo, momento em que reaparecerã o na terra para anunciar aos
judeus a Palavra da Salvaçã o. Santa Hildegarde diz: “Enoque e Elias
estã o no Paraı́so, onde nã o precisam de alimento corporal; e, da mesma
maneira, uma alma arrebatada na contemplaçã o de Deus nã o tem
necessidade enquanto estiver naquele estado daquelas coisas de que
os mortais fazem uso. 2
O Paraı́so terrestre nã o foi criado para espı́ritos puros, mas para o
homem composto de alma e corpo; conseqü entemente, é provido de
tudo o que é necessá rio nã o apenas para seu sustento, mas també m
para sua proteção contra a doença e a morte, em virtude do estado de
justiça original em que ele foi criado. As criaturas desta magnı́ ica
morada, seus animais e plantas, pertencem a uma ordem superior, tã o
elevada acima daquelas da terra quanto o corpo de Adã o antes de seu
pecado era superior à sua posteridade caı́da. E como o corpo de Adã o
era um corpo real de carne e sangue, nã o puro espı́rito, també m o
Paraı́so nã o é uma regiã o celestial ou puramente espiritual, mas um
lugar material conectado com a natureza humana e com a pró pria terra.
Esta relaçã o entre a terra e o Paraı́so é claramente indicada nas
Sagradas Escrituras. O maná do deserto revelou aos ilhos da Lei Antiga
o alimento preparado para o homem durante sua peregrinaçã o terrena.
Santa Hildegarde diz sobre este assunto em seu Scivias , Lib. I., visio II.:
“Quando Adã o e Eva foram expulsos do Paraı́so, um muro de luz se
ergueu ao redor dele, e o Poder Divino apagou dele todas as marcas de
seu pecado. Foi forti icada, por assim dizer, por esta grande luz para
que nenhum inimigo poderia alcançá -lo; mas por meio disso Deus
també m testi icou que a transgressã o ocorrida no Paraı́so deveria com
o tempo ser apagada por Sua misericó rdia. O paraı́so ainda existe, uma
regiã o de alegria, lorescendo em toda sua beleza imaculada e dando
abundante fecundidade à terra esté ril. Assim como a alma comunica
vida e força ao corpo que habita, a terra recebe do Paraı́so sua
vitalidade suprema; as trevas e corrupçã o do pecado, que envolvem
este mundo miserá vel, nã o podem controlar inteiramente sua
in luê ncia bené ica”.
O vı́nculo espiritual do homem com o Paraı́so é a graça da Redençã o,
que nã o apenas lhe restaurou os altos dons possuı́dos por Adã o
naquela morada, mas també m lhe conferiu beleza, dignidade e valor
superiores que emanam do Precioso Sangue de Cristo. Em virtude da
inocê ncia batismal, Deus em todas as é pocas concede a certas almas
escolhidas muitos daqueles privilé gios que Adã o recebeu em virtude da
justiça original. O batismo confere certo direito a esses dons
extraordiná rios, pois sua inocê ncia é superior à do Paraı́so. Santa
Hildegarde escreveu ao Capı́tulo da Catedral de Mayence: “Deus, que
pela luz da verdade conduz os seus eleitos à bem-aventurança, se
agradou em vá rias é pocas de renovar o espı́rito de fé entre eles pelo
dom da profecia; por sua iluminaçã o eles podem, em certa medida,
recuperar aquela felicidade possuı́da por Adã o antes de sua queda.”
Nã o é de surpreender, portanto, que nã o apenas os favores espirituais,
mas també m materiais do Paraı́so sejam concedidos aos escolhidos de
Deus como recompensa por sua idelidade; mas tais dons sã o
merecidos por sofrimentos e privaçõ es.
O homem, mesmo vivendo na carne, é conduzido ao Paraı́so e seus
frutos lhe sã o trazidos pela dor e abnegaçã o, e pelas boas obras
realizadas pelas almas no esplendor da inocê ncia imaculada. O caminho
para essas alturas é a abnegaçã o absoluta, aberta apenas para aqueles
que foram, por assim dizer, espiritualizados no fogo da a liçã o.
Nenhuma faculdade natural extraordiná ria, nenhuma doença
misteriosa, nenhum desarranjo entre as funçõ es da alma e do corpo,
apenas pureza e fortaleza heró ica cabem ao homem, embora ainda um
exilado na terra, para entrar no Paraı́so terrestre.
Recompensas e puniçõ es sã o concedidas por Deus Todo-Poderoso de
acordo com a natureza e importâ ncia das boas ou má s obras; e assim,
para cada dor, cada tristeza, para cada privaçã o suportada na terra,
loresce no Paraı́so uma produçã o correspondente que, como lor ou
fruto, como alimento ou bebida, como consolo ou alı́vio, é comunicada
à s almas de acordo com sua necessidade especial. , e isso nã o apenas
espiritualmente, mas real e substancialmente. Este é o maravilhoso
reparador de sua vida corporal, isso explica sua milagrosa vitalidade.
Está relacionado com Lidwina 3 que uma vez uma mulher muito
virtuosa, mas presa da mais profunda melancolia, veio implorar sua
ajuda. Lidwina recebeu-a com palavras amá veis e prometeu-lhe alı́vio.
Alguns dias depois, a pobre sofredora foi admitida com a pró pria
Lidwina no Paraı́so terrestre, um favor obtido pelas oraçõ es de
Lidwina; mas apesar das maravilhas que via por todos os lados, a pobre
mulher nã o deixou de lamentar e chorar. Entã o Lidwina a conduziu a
uma certa localidade que parecia servir de depó sito de todo o mundo;
ali havia perfumes, especiarias curativas e ervas curativas, e ali a pobre
sofredora foi inalmente curada e tã o inundada de consolos celestes
que, por vá rios dias depois, ela nã o pô de suportar nem o cheiro de
comida. Como recompensa por sua docilidade aos conselhos e
orientaçõ es de Lidwina, sua melancolia desapareceu completamente.
Na vida de Santa Colette, 4 contemporâ nea da bem-aventurada Lidwina,
conta-se que durante toda a Quaresma ela se absteve de comida, exceto
talvez algumas migalhas de pã o. Em certo dia de Pá scoa Deus lhe
enviou do Paraı́so uma ave parecida com uma galinha, cujos ovos lhe
bastou por muito tempo e, como ela precisava de um pouco de
recreaçã o em meio a seus grandes trabalhos (ela reformou as
Clarissas) ali foi enviada do Paraı́so em recompensa por sua pureza
incompará vel, um pequeno animal encantador, deslumbrantemente
branco e perfeitamente manso quando com ela. Ele se apresentava na
porta ou janela de sua cela, como se quisesse entrar e, em pouco tempo,
desaparecia tã o misteriosamente quanto havia surgido. Sua irmã
religiosa o olhava com intenso interesse e curiosidade, mas nunca
conseguia pegá -lo; pois, se por acaso a encontrassem na cela de Colette
ou em qualquer lugar do convento, ela desaparecia instantaneamente. 5
Colette nutria a mais profunda reverê ncia pelas relı́quias sagradas e,
acima de tudo, pela Cruz sobre a qual o Salvador morreu, e como ela
ansiava ardentemente por um pedacinho dela, seu desejo foi
milagrosamente satisfeito. Uma pequena cruz de ouro, nã o feita à mã o
pelo homem, mas uma produçã o natural, contendo uma partı́cula da
Verdadeira Cruz, foi trazida para ela do jardim do Paraı́so, e Colette
sempre a carregou consigo. Mais uma vez, enquanto ela estava um dia
conferenciando com seu confessor sobre a reforma de sua Ordem, um
cinturã o de brancura deslumbrante desceu de cima e pousou em seu
braço.
Lidwina muitas vezes reconhecia que, sem a ajuda do consolo divino,
ela teria afundado sob seu acú mulo de sofrimento. Suas forças se
renovavam diariamente naquelas horas de ê xtase que a transportavam
para o pró prio Cé u ou para o Paraı́so terrestre, e a doçura que entã o
experimentava tornava a amargura de suas dores nã o apenas
suportá vel, mas até deliciosa. Seu anjo da guarda, sempre visı́vel para
ela, era seu condutor nessas jornadas espirituais. Antes de partir, ele
costumava levá -la à igreja paroquial a uma imagem da Mã e de Deus, de
onde, apó s uma breve oraçã o, eles se ergueram rapidamente sobre a
terra em direçã o leste até chegarem ao Jardim. A primeira vez que
Lidwina fez esta viagem aé rea, teve medo de entrar pelos belos portõ es.
Foi apenas quando o anjo lhe garantiu que seus pé s nã o machucariam o
tapete lorido que se estendia diante dela que ela se aventurou,
segurando enquanto a mã o de seu guardiã o que ia antes e gentilmente
a puxava atrá s dele. Quando, à s vezes, ela parava em hesitante
admiraçã o pela altura e exuberâ ncia das lores que pareciam nã o mais
permitir uma passagem, o anjo a ergueu levemente sobre a barreira
perfumada.
Os prados banhados de luz, inacessı́veis ao frio ou ao calor,
ultrapassavam os poderes de descriçã o de Lidwina. Ela comeu as frutas
deliciosas oferecidas por seu anjo e inalou seu perfume delicioso; e
quando voltou para seu pequeno quarto, sua famı́lia nã o ousou se
aproximar dela pelo respeito que sua aparê ncia inspirava. Ela foi
totalmente embalsamada com a gló ria de outro mundo. Seu corpo
emaciado brilhou com luz; perfumes diferentes dos da terra respiravam
em torno de seu pobre sofá ; a mã o segurada pelo anjo em sua alegre
expediçã o exalava um odor peculiarmente delicioso, e uma sensaçã o
era experimentada por quem se aproximava dela, tal como é produzida
por especiarias aromá ticas. Em uma ocasiã o, a luz que a cercava era tã o
brilhante que seu sobrinho, pensando que ela estava em chamas, fugiu
aterrorizado.
Lidwina mantinha perto da cama um talo de câ nhamo seco, leve mas
irme, com o qual podia abrir com a mã o esquerda e fechar a cortina
para deixar entrar ar na testa febril. Um incê ndio irrompeu em
Schiedam na noite de 22 de julho, e na confusã o esta vara foi perdida. A
pobre Lidwina foi a sofredora, pois agora nã o conseguia obter nem
mesmo o pequeno alı́vio de uma lufada de ar fresco. Seu anjo lhe
prometeu ajuda e, em pouco tempo, ela sentiu algo colocado
suavemente sobre a colcha de sua cama. Era uma vara de cerca de um
metro e meio de comprimento. Mas em vã o ela tentou levantá -lo, sua
pobre mã o recusou seu peso e, rindo, exclamou: 'Ah! sim, agora, de fato,
eu tenho uma vara!' Na manhã seguinte, ela implorou ao seu confessor
que a talhasse para ela e assim a tornasse mais leve. Ele o fez ou, pelo
menos, tentou fazê -lo; mas, mesmo com uma faca a iada, ele mal
conseguia cortar algumas lascas, que exalavam uma fragrâ ncia tã o
deliciosa que ele nã o ousava talhar mais a madeira preciosa. Ele levou
para Lidwina, perguntando onde ela conseguiu, mas ela responder
apenas que ela pensou que seu anjo tinha trazido para ela. Em 8 de
agosto, festa de Sã o Cirı́aco, sendo novamente conduzido ao Paraı́so, o
anjo apontou-lhe um cedro perto da entrada e mostrou-lhe o galho do
qual ele havia quebrado um galho para ela. Ele a repreendeu por nã o
honrar su icientemente o precioso dom, que possuı́a o poder de
expulsar espı́ritos malignos. A Lidwina manteve este ramo durante
muito tempo. Perdeu sua fragrâ ncia apenas em uma mã o manchada
pelo pecado. Em outra visita ao Paraı́so, em 6 de dezembro do mesmo
ano, ela foi alimentada com uma tamareira carregada de magnı́ icos
frutos cujas pedras brilhavam como cristais. Mencionaremos apenas
mais uma das dá divas trazidas do Paraı́so para consolar e fortalecer o
paciente que sofre.
“Um dia ela foi arrebatada pelos coros dos bem-aventurados e a Mã e de
Deus dirigiu-se a ela com as seguintes palavras: 'Minha ilha, por que
você nã o coloca uma coroa e se junta a esses espı́ritos gloriosos?' ao
que Lidwina respondeu simplesmente: 'Vim com o meu anjo; Devo
fazer o que ele me diz. Entã o Maria lhe deu uma linda coroa com
instruçõ es para que ela mesma a guardasse por sete horas e depois a
entregasse ao seu confessor, que a penduraria no altar de Nossa
Senhora na igreja paroquial de Schiedam, de onde seria removida mais
tarde. Quando Lidwina voltou à terra, ela se lembrou de tudo o que
havia acontecido; mas ela nã o sonhava em interpretá -lo literalmente
até sentir a coroa de lindas lores em sua cabeça. Decorridas as sete
horas, ela mandou chamar o confessor de madrugada, deu-lhe a coroa,
que foi pendurada no santuá rio de Nossa Senhora segundo a ordem, de
onde desapareceu antes do pleno dia.”
Apó s esta digressã o, mais aparente do que real, voltamos à Irmã
Emmerich, cujos sofrimentos eram da mesma natureza e signi icado
que os de Lidwina. Alé m de seus tormentos interiores, ela suportou
uma sucessã o de molé stias crué is de formas mais variadas e sintomas
opostos, pois expiava tanto por toda a Igreja quanto por seus membros
individualmente. Deus aceitou o sacrifı́cio de todo o seu ser, e cada
parte de seu corpo ofereceu seu tributo de expiaçã o, a ordem natural
das coisas sendo inteiramente invertida em seu corpo. consideraçã o –
doença e dor tornando-se saú de e força para ela enquanto ela estava
consumida no fogo da tribulaçã o. Seu corpo era, por assim dizer, o
cadinho no qual o Mé dico das almas preparava remé dios curativos para
Seu povo, enquanto sua alma estava vivamente viva para terror, tristeza,
angú stia, secura, desolaçã o, para todas aquelas impressõ es fulminantes
que as paixõ es de um homem pode causar outro, ou pelo qual a malı́cia
diabó lica pode assaltar suas vı́timas. Ela estava sobrecarregada com os
medos dos moribundos, a corrupçã o da moral, com as consequê ncias
da ira, vingança, gula, curiosidade; com eles lutou, sobre eles obteve a
vitó ria, cujos frutos renunciou em favor dos pobres pecadores. Mas
essas dores nã o eram nada para a angú stia que ela suportou ao ver a
degradaçã o sem precedentes do sacerdó cio. O maligno conseguiu
introduzir muitos de seus pró prios servos nas Ordens Sagradas,
homens perdidos na Fé , membros de sociedades secretas que, com o
selo indelé vel da Ordenaçã o em sua alma, nã o recuaram dos crimes
mais negros contra Cristo e Seu Vigá rio na terra. . Nã o houve ataque à
Igreja, seus direitos, seu culto, sua doutrina e seus sacramentos, que
nã o fosse inspirado por um Judas dentre os seus. O Salvador sentiu a
traiçã o de Seu Apó stolo mais profundamente do que todos os Seus
outros sofrimentos; e, do mesmo modo, as feridas mais agudas no
corpo da Igreja sã o sempre de algué m revestido da dignidade
sacerdotal. Os ataques ı́mpios dos hereges nã o exigiram uma expiaçã o
tã o dolorosa quanto os crimes dos sacerdotes caı́dos, e os ú ltimos
foram seguidos por consequê ncias muito mais terrı́veis do que os
primeiros.
Se os sofrimentos corporais de Anne Catherine nã o pareciam tã o
violentos, tã o assustadores como os de Lidwina, nã o eram menos
dolorosos. As vezes ela os via como se fossem suportados por outro,
quando gritava de compaixã o: “Ah! Vejo uma pobre freira cujo coraçã o
está despedaçado! Ela deve pertencer ao nosso tempo, mas ela sofre
mais do que eu! Nã o devo reclamar!”
Como o sangue lui de e para o coraçã o, entã o a Irmã As dores de
Emmerich, surgindo nessa fonte, espalharam-se por toda a sua pessoa e
voltaram ao ponto de partida, como que para reunir forças renovadas
para continuar seu trabalho de expiaçã o. O coraçã o é a sede do amor. E
no coraçã o que o Espı́rito Santo é derramado para formar aquele
vı́nculo sagrado que une todos os membros da Igreja em um só corpo.
Nunca o amor foi tã o exaltado como neste perı́odo em que tanto o amor
quanto a fé estavam quase mortos, quando a prá tica da piedade cristã e
a observâ ncia dos preceitos evangé licos pareciam ter desaparecido
totalmente. Foi nessa é poca que a seita mais funesta e hipó crita que já
se ergueu varreu como uma torrente devastadora a vinha da Igreja – a
maliciosa seita do jansenismo com suas chamadas luzes. Ajudado e
encorajado pelas sociedades secretas, cujos discı́pulos mais zelosos
estavam sentados mesmo nos concı́lios eclesiá sticos, procurou em seu
ó dio cego à Santı́ssima Virgem e ao Soberano Pontı́ ice, separar
irremediavelmente seus ilhos ié is do coraçã o da Igreja pela
introduçã o daqueles elementos heterodoxos que, sob o manto do “amor
e da reforma”, atacaram os pró prios princı́pios da fé e aboliram essas
prá ticas devotas, esses costumes piedosos por cuja extinçã o as feridas
mais fatais foram in ligidas ao cristianismo. Todas as coisas se
combinaram para promover a causa dessa seita diabó lica: a Igreja foi
oprimida pelo poder secular, suas propriedades saqueadas, bispados
vagos, Ordens religiosas suprimidas e o Papa agrilhoado por Napoleã o,
a quem Irmã Emmerich muitas vezes via em suas visõ es como um
opressor do poder. a Igreja.
“Certa vez”, disse ela, “quando rezava diante do Santı́ssimo Sacramento
pelas necessidades da Igreja, fui transportada para um grande e
magnı́ ico templo, onde vi o Papa, o Vigá rio de Jesus Cristo, ungindo um
rei, um homenzinho amarelo de aspecto sinistro. Foi uma grande
solenidade, mas me encheu de tristeza e desâ nimo. Senti que o Papa
deveria ter se recusado irmemente a realizar a cerimô nia. Eu vi o mal
que este homem faria ao Santo Padre e de que terrı́vel derramamento
de sangue ele seria a causa. Falei com o abade Lambert dessa visã o e
dos medos que ela despertou em meu coraçã o, mas ele a tratou com
leviandade. Quando, no entanto, ouvimos a notı́cia da coroaçã o de
Napoleã o, por Pio VII, ele disse: 'Irmã , devemos rezar e icar em
silê ncio.' ”
Tal foi a é poca em que Ana Catarina suportou as dores da Igreja que lhe
foram impostas, nã o como uma doença inde inida, mas segundo uma
certa ordem, como tarefas que cabia a ela cumprir perfeitamente uma
apó s a outra. Eles lhe foram mostrados separadamente sob formas
simbó licas para que sua aceitaçã o pudesse ser para ela um ato
meritó rio de amor; ela era chamada para trabalhar diariamente na
vinha, enquanto o pai da famı́lia enviava os trabalhadores para lá , mas
raramente. Ela recebeu a ordem em visã o e a executou sem interferir na
rotina regular da vida diá ria, estando perfeitamente atenta ao
signi icado oculto de seus sofrimentos e sua ligaçã o com a Igreja; mas
sua vida exterior contrastava tã o rudemente com a interior que muitas
vezes era mais dolorosa para ela do que o peso dos sofrimentos
espirituais que a oprimiam. E, no entanto, o primeiro era o
complemento necessá rio do ú ltimo; fazia parte da tarefa atribuı́da que
só poderia ser considerada plenamente cumprida na medida em que
fosse cumprida em meio a contradiçõ es e interrupçõ es exteriores. Foi
na paciê ncia paciente de tribulaçõ es de fora e tristeza de dentro que
seu mé rito estava. Este foi o perfume que ela exalou para Deus em um
odor de doçura. Se fecharmos os olhos à economia da Divina
Providê ncia na conduçã o das almas, toda a sua existê ncia se torna para
nó s um enigma inexplicá vel, um fato sem sentido. Muitos se
emocionaram ao ver sua pureza de alma, sua inteligê ncia sobrenatural
superior, que, ao mesmo tempo, se ofenderam com sua pobreza e
humildade. Ficaram escandalizados com seu entorno, com a multidã o
de pobres que a cercava, com sua condiçã o desamparada e abandonada.
Eles nã o entendiam que a vı́tima nã o deveria se sair melhor do que a
Igreja cujas feridas ela carregava, a Igreja jogada de um lado para o
outro nas ondas da perseguiçã o.
Ela nã o teria sido capaz de apoiar os julgamentos de sua santa Mã e nã o
participou també m de sua vida sobrenatural. Peregrina na terra e, ao
mesmo tempo, companheira dos bem-aventurados no cé u, a Igreja luta
sob a pressã o das tribulaçõ es presentes, levando no seio a salvaçã o dos
sé culos. Lamentando a partida de seu Divino Esposo para o Pai, une-se
diariamente a Ele pela uniã o mais ı́ntima; e assim també m Anne
Catherine, enquanto chorava com aquela santa Mã e, levantou-se com
ela pela contemplaçã o acima das vicissitudes do tempo e dos limites do
espaço. O ciclo das festas estava sempre presente para ela, sempre
desvelado e instintivamente vivo, e ela entrou perfeitamente na
celebraçã o diá ria dos misté rios da fé e das verdades da religiã o, que
eram mais inteligı́veis aos olhos de sua mente do que o exterior. mundo
ao de seu corpo. Recebeu de seu Divino Esposo com as tarefas
reguladas de acordo com o calendá rio eclesiá stico, a força de alma
necessá ria para cumpri-las corajosamente. Enquanto em visã o, ela foi
capaz de entender a conexã o entre seus vá rios sofrimentos e sua tarefa
de expiaçã o; mas, em seu estado de vigı́lia, ela nã o conseguia explicá -lo
de forma inteligı́vel. Ela nã o se atreveu a mencionar o assunto diante do
mé dico ou de suas irmã s, pois eles a teriam considerado delirante, se
nã o totalmente demente; conseqü entemente ela se submeteu
silenciosamente a todas as prescriçõ es, a todas as tentativas da ciê ncia
para curar aqueles sofrimentos que ela sabia serem o pró prio objeto de
sua existê ncia.
“Tanto dentro como fora do convento”, ela comentou certa vez, “sofri
intensamente com os meios empregados para minha cura e muitas
vezes corria perigo de morte por remé dios muito violentos. Eu sabia o
efeito que teriam, mas aceitei-os em obediê ncia. Se por esquecimento
nã o consegui fazê -lo, meus assistentes pensaram que iz de propó sito e
que minha doença era ingida. Os remé dios eram caros. Um frasco que
custava muito caro à s vezes estava apenas meio vazio quando outro era
pedido, e tudo era debitado na minha conta, eu tinha que pagar por
tudo. Nã o consigo entender de onde tirei tanto dinheiro. E verdade que
costurei bastante, mas usei para dar toda a renda ao convento que no
inal pagou metade das minhas despesas. Muitas vezes eu era tã o
miserá vel que nã o conseguia me prestar nenhum serviço; mas se
minhas Irmã s me esqueceram, Deus me ajudou. Um dia eu estava
prostrado de fraqueza e banhado em suor, quando duas religiosas
apareceram, arrumaram minha cama e me recolocaram gentilmente
para meu grande alı́vio. Pouco depois, a Reverenda Madre entrou com
uma Irmã e me perguntou com espanto quem havia arrumado minha
cama tã o confortavelmente. Achei que eles mesmos tinham feito isso e
agradeci a gentileza; mas asseguraram-me que nem eles nem qualquer
outra Irmã tinham entrado na minha cela, e consideraram tudo como
um sonho o que lhes contei sobre as duas religiosas; no entanto, minha
cama tinha sido feita, e eu me senti melhor. Descobri depois que as duas
boas freiras, que muitas vezes me prestaram serviços gentis e
consoladores, eram almas abençoadas que um dia viveram em nosso
convento”.
Clara Soentgen depô s ao acima exposto perante a autoridade
eclesiá stica:
“A irmã Emmerich estava muito doente e certa manhã fui à cela dela
para ver como ela estava. Perguntei quem tinha arrumado sua cama tã o
cedo, ou se ela teve forças para fazer isso sozinha. Ela respondeu que a
Reverenda Madre e eu havı́amos nos reunido para vê -la e que havı́amos
arrumado sua cama com muito capricho e rapidez. Agora, nenhum de
nó s ainda estava na cela dela.
“Em outro momento”, diz Anne Catherine, “enquanto estava no mesmo
estado, fui novamente levantada suavemente da minha cama e colocada
no meio da cela por dois religiosos. No mesmo momento, uma das
Irmã s entrou de repente. Vendo-me deitada sem apoio no ar, ela soltou
um grito agudo que me assustou tanto que eu caı́ pesadamente no chã o.
Isso gerou muita conversa entre as Irmã s, e uma das velhas religiosas
me atormentou por muito tempo com perguntas sobre como eu poderia
icar assim no ar, mas nã o pude lhe dar explicaçã o. Eu nã o prestei
atençã o a essas coisas, todas elas pareciam perfeitamente naturais para
mim.” Vemos pelo exposto que tudo o que era necessá rio para seu
sustento era fornecido por seu Esposo do Jardim do Eden, cujos
produtos possuem o poder de dissipar a dor e a tristeza. Anne
Catherine comunicou esses segredos antes de sua morte, seja por
ordem de seu guia ou de seu confessor. Eles sã o, sem dú vida, curtos e
incompletos, embora su icientes para provar que ela recebeu favores
divinos semelhantes aos de Lidwina.
“Os ú nicos remé dios que me deram algum alı́vio”, disse ela, “foram
sobrenaturais. O mé dico só aumentou meu langor, mas tive que tomá -
los e pagar caro por eles també m. Mas Deus sempre me deu o dinheiro,
assim como tudo o que eu precisava no convento, e també m recebi
muito pela casa. Depois que o deixei, as mesmas coisas aconteciam
muitas vezes comigo e, uma vez, recebi uma quantia bastante grande,
da qual usei. Mencionei isso ao reitor Rensing, que me disse que da
pró xima vez que isso acontecesse eu deveria mostrar o dinheiro; mas a
partir desse dia nã o tenho mais.
“Durante a segunda investigaçã o, dei à enfermeira dois tá leres para ir
em peregrinaçã o a Telgten por minha intençã o e obter duas missas pelo
mesmo. A criada da casa emprestou-me o dinheiro e pouco depois
encontrei dois tá leres deitados na minha cama. Perguntei-me o que
signi icava e iz a enfermeira me mostrar o dinheiro que eu lhe dera.
Reconheci-o imediatamente e me senti convencido de que Deus havia
repetido o favor que muitas vezes recebi no passado para que eu
pudesse pagar minha dı́vida com a menina.
“Remé dios sobrenaturais muitas vezes me foram dados por meu anjo,
por Maria, ou pelos santos queridos e até por meu pró prio prometido.
As vezes eles estavam na forma de lı́quidos em frascos brilhantes, ou
lores, ervas ou pequenos pedaços de comida. Na cabeceira da minha
cama havia uma prateleira de madeira na qual eu costumava encontrar
esses remé dios maravilhosos durante minhas visõ es, ou mesmo em
meus momentos de vigı́lia. As vezes eu encontrava pequenos buquê s de
ervas de rara beleza e deliciosa fragrâ ncia deitadas na minha cama ou
colocadas na minha mã o quando eu acordava da visã o; e ao beliscar as
tenras folhas jovens eu sabia o que fazer delas. Sua fragrâ ncia à s vezes
era su iciente para me fortalecer; e à s vezes eu os comia ou bebia a
á gua em que estavam mergulhados. Depois de tal nutriçã o, eu estava
novamente pronto para minha tarefa.
“També m recebi fotos, está tuas e pedras de apariçõ es com instruçõ es
de como usá -las; eles eram colocados em minha mã o ou colocados em
meu peito, e sempre me aliviavam. Alguns eu guardei por muito tempo
e usei para curar os outros, seja eu mesmo aplicando-os ou dando-os
aos necessitados; mas nunca disse onde consegui. Eles eram todos
reais, mas nã o posso explicar como foi. Esses incidentes realmente
aconteceram, e eu usei os remé dios em homenagem Aquele cuja
bondade os havia enviado para mim.
“Durante o noviciado, estava um dia ajoelhado diante do Santı́ssimo
Sacramento, com os braços estendidos, quando senti algo escorregar
em minha mã o. Era um lindo retrato de Santa Catarina pintado em
pergaminho. Guardei-o muito tempo e depois dei-o a uma boa menina
que me pediu uma lembrança. Ela tinha um grande desejo de se tornar
religiosa, mas morreu antes de realizar seu desı́gnio. A pequena foto foi
colocada a seu pedido no peito da pobre criança enquanto ela estava
deitada em seu caixã o.
“Certa vez meu Companheiro Celestial me deu uma pedra polida e
transparente em forma de coraçã o e maior que um tá ler, na qual havia,
como se ali formado pela natureza, uma imagem de Maria com o
Menino Jesus em vermelho, azul e dourado. A imagem era
primorosamente bela; a simples visã o dele me curou, pois eu estava
doente na é poca. Fiz uma bolsinha de couro para ela e a usei por muito
tempo quando, por im, ela foi tirada de mim pelo mesmo poder que a
havia concedido. Mais uma vez, minha noiva colocou em meu dedo um
anel no qual havia uma pedra preciosa com uma imagem de Sua Mã e
Santı́ssima gravada nela. Eu guardei isso també m por um tempo,
quando Ele mesmo o retirou do meu dedo.
“Recebi um presente semelhante do santo patrono da minha Ordem.
Era perto da hora da Santa Comunhã o. Ningué m sonhava que eu
pudesse me levantar, mas pensei ter ouvido eles me chamarem.
Arrastei-me até o coro e recebi o Santı́ssimo Sacramento com os outros.
De volta à minha cela, caı́ no chã o desmaiando. Nã o sei como nem por
quem, mas fui deitada como de há bito na cama. Entã o Santo Agostinho
apareceu e me deu uma pedra cintilante em forma de feijã o, da qual
surgiu um coraçã o carmesim encimado por uma pequena cruz.
Disseram-me que o coraçã o se tornaria tã o transparente quanto a
pedra. Quando acordei para a consciê ncia, encontrei-o na minha mã o.
Coloquei no meu copo, bebi a á gua e iquei curado. Depois de um tempo
foi tirado de mim.
“Houve outro presente que me foi permitido reter por sete meses
durante uma doença grave. A enfermaria me trazia comida todos os
dias, mas eu nã o podia tocá -la. Eu nã o podia comer nenhum tipo de
alimento e as Irmã s se perguntavam como eu vivia. Eu tinha, poré m,
recebido outro tipo de alimento da Mã e de Deus. Ela me apareceu em
visã o e quando acordei encontrei em minha mã o uma grande
quantidade de brancura deslumbrante, mais espessa e suave que as do
altar, com uma imagem de Maria e alguns caracteres escritos impressos
nela. Fui tomado de profundo respeito, como diante de relı́quias ou
coisas sagradas. Era perfumado e, à noite, luminoso. Guardei-o comigo,
escondido na minha cama, e todos os dias durante sete meses comi um
pedacinho dele, o que me deu força. Entã o desapareceu para minha
grande inquietaçã o, pois temia ter perdido esse maná celestial por
minha pró pria culpa. Tinha um sabor doce, mas nã o como o Santı́ssimo
Sacramento.
“Uma noite, eu estava ajoelhado diante da mesa da minha cela, rezando
para a Santı́ssima Virgem, quando uma mulher resplandecente de luz
entrou pela porta fechada, avançou para o outro lado da mesa e se
ajoelhou diante de mim como se quisesse rezar. Fiquei com medo, mas
continuei orando. Entã o ela colocou diante de mim uma está tua da Mã e
de Deus, cerca de uma mã o alta e deslumbrantemente branca, e colocou
a mã o aberta sobre a mesa por um momento atrá s da está tua. Eu recuei
com medo, quando ela gentilmente empurrou a está tua em minha
direçã o. Venerei-o interiormente e a apariçã o desapareceu deixando a
pequena imagem, uma mã e de pé com seu ilho nos braços. Era
primorosamente bonito e, eu acho, feito de mar im. Carreguei-o comigo
muito respeitosamente por muito tempo, quando fui instruı́do
interiormente a entregá -lo a um padre estranho de quem foi retirado na
hora da morte.
“Certa vez, Maria me deu uma lor maravilhosa que se expandiu na
á gua. Quando fechado parecia um botã o de rosa, mas quando aberto
exibia folhas de cores delicadas que guardavam relaçã o com os
diferentes efeitos espirituais que produziria em mim. Seu cheiro era
delicioso. Por mais de um mê s bebi a á gua em que estava mergulhada.
Por im, eu estava me perguntando o que deveria fazer com esta lor
saudá vel para que nã o fosse profanada, quando me disseram em visã o
para mandar fazer uma nova coroa para a Mã e de Deus em nossa capela
e colocar o botã o nela. . Eu disse ao confessor e à superiora, que me
ordenou que guardasse meu dinheiro e esperasse um pouco. Mas
novamente me foi ordenado em visã o que nã o demorasse a fazer a
coroa, em consequê ncia da qual meu confessor deu permissã o. Foi feito
nas Clares, em Mü nster, e eu mesmo coloquei a lor. Como as Irmã s nã o
eram muito cuidadosas com os ornamentos, eu mesma cuidei da coroa.
A lorzinha estava nela até a supressã o do convento, quando
desapareceu e me foi mostrado em visã o onde ela havia sido tirada.
“Meu guia uma vez me deu um pequeno frasco de bá lsamo
esbranquiçado como ó leo espesso. Usei-o numa ferida que recebera de
um cesto de linho molhado, e com ele curei muitos doentes. O frasco era
em forma de pê ra com um gargalo longo e estreito, mais ou menos do
tamanho de um frasco de remé dio, perfeitamente claro e transparente.
Eu o guardei por algum tempo na minha prensa. Mais uma vez, me
deram alguns bocados de comida doce que usei e també m dei alguns
aos pobres para curar suas doenças. A Superiora o encontrou um dia e
me repreendeu por nã o dizer como eu o tinha conseguido.”
Em outubro de 1805, a Irmã Emmerich foi designada para ajudar uma
das Irmã s a carregar a roupa da lavanderia até o depó sito de secagem.
Ela icou acima no alçapã o para receber a cesta ascendente. A Irmã
abaixo afrouxou a corda no momento em que a Irmã Emmerich estava
prestes a balançar a carga no chã o. O anjo agarrou a corda e a salvou de
cair com o peso, grande demais para sua força, sobre a Irmã abaixo. O
esforço que a irmã Emmerich fez a jogou no chã o, a cesta de linho
caindo pesadamente em seu quadril esquerdo, esmagando o osso em
vá rios lugares e in ligindo outros ferimentos que certamente teriam
sido atendidos com resultados fatais, se Deus milagrosamente nã o
tivesse preservado sua vida. Logo icou evidente que esse acidente
estava destinado por Deus a desempenhar um papel tã o importante na
vida da irmã Emmerich quanto a queda de Lidwina no gelo em sua
dolorosa carreira. Aumentava seus sofrimentos expiató rios e
proporcionava-lhe contı́nuas e dolorosas humilhaçõ es. Tornou-se agora
muito difı́cil para ela tocar o sino do convento, seu dever na qualidade
de assistente-sacristã o, e à s vezes ela nã o conseguia fazê -lo,
circunstâ ncia que lhe rendeu a acusaçã o de orgulho e preguiça. Mas, na
verdade, foi uma verdadeira privaçã o para ela nã o poder tocar a
campainha; pois ela fez uma oraçã o tã o fervorosa que, enquanto assim
ocupada, ela parecia esquecer suas dores crué is.
“Ao tocar o sino abençoado”, disse ela, “eu estava cheia de alegria, como
se estivesse espalhando sua bê nçã o e chamando todos os que a ouviam
para louvar a Deus. Uni minhas oraçõ es a cada golpe para dissipar todo
o mal de seus coraçõ es e excitá -los a glori icar o querido Deus. Eu
adoraria tocar muito mais do que o tempo prescrito.
A furiosa incredulidade desta é poca havia proibido o uso de sinos de
igreja – e quem nã o vê na terna devoçã o desta pobre freira em meio à s
suas dores uma expiaçã o a Deus por uma violê ncia tã o ignó bil?
Ela podia agora apenas com grande di iculdade, e à s vezes nem mesmo,
realizar seus deveres costumeiros de lavar e passar a roupa da igreja e
de trabalhar no jardim. Só Deus sabia os esforços que ela tinha que
fazer; mas o seguinte fato mostra como seu zelo foi recompensado. Um
dia, um ferro quente caiu de sua mã o em uma das alvas. Com uma
invocaçã o por Deus, ela a pegou e colocou no chã o onde fez um buraco,
mas nem a alva nem sua mã o icaram feridas. Aquelas pobres mã os dela
estavam tã o emaciadas por seus constantes sofrimentos que uma vez
ela comentou:
“Sofri muito com minhas mã os enquanto estava no convento. Se eu os
segurasse contra o sol, os raios os perfuravam como lechas, eles eram
tã o inos.”
A cozedura do pã o do altar també m lhe era muito cansativa, devido ao
peso dos ferros. Ela considerava isso um dever sagrado, a ser cumprido
com oraçã o e respeito. Certa vez, faltavam novos an itriõ es, e a irmã
Emmerich estava deitada em sua pobre cama doente e muito triste por
nã o poder fazê -los. Ela pô s-se a rezar, levantou-se da cama, arrastou-se
para a capela e ali implorou forças a Nosso Senhor para preparar as
hó stias. De repente, ela foi banhada em suor e, de fato, lhe foi dada força
para o trabalho em que seu anjo a ajudava; mas mal acabou quando ela
adoeceu como antes, e só com di iculdade recuperou sua cela.
Apó s o acidente do linho, ela icou de cama até janeiro de 1806. Na
primavera ela teve fortes dores de estô mago que causaram vô mitos
freqü entes de sangue. Mesmo no trabalho, suas hemorragias eram tã o
copiosas que as Irmã s temiam que fossem fatais. Mas, inalmente,
vendo-a se recuperar rapidamente de tais ataques e també m de seus
desmaios, para que ela pudesse retornar em breve à s suas funçõ es, eles
chegaram à conclusã o de que nã o eram muito graves, e por isso ela
recebeu muito pouco atençã o em sua doença. Raramente pensavam
nela quando estava doente demais para estar entre eles, e no inverno
acontecia muitas vezes que a palha de sua pobre cama congelava na
parede ú mida de sua cela, ou que, consumida pela febre, ela suspirava
em vã o por um tempo. boca de á gua. Uma pessoa de bom coraçã o em
Dü lmen ouviu falar de sua condiçã o angustiante e comunicou ao duque
von Croy, que imediatamente mandou montar uma enfermaria no
convento, forneceu-lhe um fogã o e mandou a irmã Emmerich para lá .
Em 1813, o mé dico fez o seguinte depoimento:
“Os cuidados dispensados pelos religiosos à irmã Emmerich em sua
doença nem sempre foram os que deveriam ter sido. Encontrei-a uma
vez depois de uma profusa transpiraçã o, tremendo de frio na cama. Ela
nã o tinha troca de roupa de cama, seu vestido e roupas de cama
estavam congelados. As Irmã s queixavam-se das despesas de suas
freqü entes crises de doença e, com seus murmú rios, à s vezes voltavam
contra ela a Reverenda Madre, a enfermaria e outras Irmã s, embora
estas ú ltimas em geral fossem favorá veis a ela.
“No inı́cio de março de 1810, ela foi acometida de uma violenta febre
nervosa. Ela sofreu cruelmente durante esta doença pesada, mais de
dois meses dos quais ela passou em uma cela fria. Suores profusos,
desmaios, convulsõ es e dores violentas se sucederam com mais ou
menos frequê ncia o tempo todo.”
Quando Irmã Emmerich foi chamada por suas Superioras para prestar
contas de como ela havia sido cuidada no convento, ela falou o seguinte:
“O que me impressionou na minha entrada no convento foi o pouco
cuidado dispensado aos doentes. Nã o havia sequer uma enfermaria
para recebê -los. O duque von Croy, ao saber que os doentes deviam
permanecer na cela sem fogo no inverno, interessou-se em preparar-
lhes um quarto adequado e deu-lhe um fogã o. Em dois ataques fui
cuidado pela irmã Soentgen quando ela estava livre de suas aulas de
mú sica, e quando isso impediu, a irmã Neuhaus gentilmente me
atendeu. Enquanto essas duas Irmã s me estenderam sua caridade, nã o
tive do que reclamar; mas sua atençã o para mim atraiu sobre eles a
desaprovaçã o de alguns outros que nã o foram tã o bondosos comigo.
Entã o a irmã E foi nomeada enfermeira. Ela estava cheia de caprichos e
negligenciou seu dever. Quando ela poderia ter me atendido, ela
preferia estar em sua cela. Ela costumava me deixar tanto tempo de
manhã sem se importar com meus desejos que eu tremia de frio em
minhas roupas de dormir encharcadas de suor; nã o podendo atender a
mim mesmo, sofri sede e muitos outros incô modos dolorosos. As vezes
eu contava à Reverenda Madre nã o apenas a conduta da irmã E, mas
també m a falta de coisas necessá rias. Meu confessor me disse para
fazer isso; mas nã o adiantou muito, pois a Reverenda Madre nã o se
importava muito comigo. As vezes ela ouvia com paciê ncia, e
novamente me dizia que o convento era pobre demais para conseguir o
que era necessá rio para os doentes, e que eu nunca estava satisfeito.
Devo dizer, poré m, em sua justi icativa, que ela nunca me achou tã o
doente quanto realmente estava. Acrescentarei, també m, que ela cuidou
mais dos doentes do que seus predecessores, como testemunharam os
religiosos idosos; e, por isso, teve de suportar o descontentamento de
muitos”.
A enfermeira mencionada acima era aquela a quem a irmã Emmerich
havia prestado os serviços mais amorosos quando atacada por uma
doença repugnante e evitada por todos, por causa de seu
temperamento contraditó rio. Foi uma oportunidade bem-vinda para a
irmã Emmerich retribuir bondade por negligê ncia e apoiar novas
provaçõ es da freira rabugenta.
A ú nica coisa que ela desejava quando conseguia sair da cama era um
pouco de chá ou café fraco. Ela diz em seu depoimento perante Dean
Rensing:
“Muitas vezes eu passava vá rias noites consecutivas sem dormir. Muito
raramente eu dormia profundamente, meu descanso era geralmente
um cochilo leve, muitas vezes interrompido; consequentemente, e
especialmente quando eu tinha suores noturnos pesados, eu estava tã o
fraco e doente de manhã que nã o conseguia me levantar para as
matinas. Mas, assim que tomei um café e ouvi a missa, pude cumprir
meus deveres. As Irmã s nã o entenderam isso; eles disseram que minha
doença foi toda ingida, ou pelo menos muito exagerada.”
Era costume que cada religiosa oferecesse seu pró prio café da manhã .
Mas como a pobre Irmã Emmerich nã o tinha café nem dinheiro, ela
levava sua cafeteira para a cozinha todas as manhã s e recolhia a terra
jogada fora pelas outras Irmã s, da qual ela fazia sua pró pria xı́cara. que
ela bebia sem açú car. Clara Soentgen, que nos dá esses detalhes, à s
vezes compassivamente compartilhava seu café da manhã com ela, mas
nã o com frequê ncia; pois, como ela nos diz ingenuamente, ela se deixou
in luenciar demais pelas observaçõ es das Irmã s. A assistê ncia,
inalmente, veio de outro bairro. Um dia, quando a irmã Emmerich
voltou do coro para sua cela, que ela havia deixado trancada, ela
encontrou dois tá leres no parapeito da janela. Levou-os imediatamente
à Superiora, que lhe permitiu comprar com eles uma pequena
quantidade de café , que lhe durou muito tempo.
Clara Soentgen, em seu depoimento de 1813, dá o seguinte exemplo da
mesma natureza:
“Sempre observei em Anne Catherine Emmerich a maior satisfaçã o
quando ela tinha o poder de dar algo aos pobres. Tanto antes como
depois de sua entrada no convento, ela deu tudo o que tinha. Perguntei-
lhe uma vez por que ela nã o supria suas pró prias necessidades. 'Ah!' ela
respondeu: 'Eu sempre recebo muito mais do que dou!' e, de fato,
muitas vezes veri iquei, para meu espanto, que o que ela dizia era
verdade.
“Certa manhã ela nã o tomou café da manhã nem dinheiro. Ela trancou a
porta da cela, como sempre, e foi até o coro; ao voltar, encontrou algum
dinheiro no parapeito da janela, com o qual icou tã o espantada que
veio correndo me contar e eu tive que voltar com ela para ver. Isso
aconteceu mais de uma vez. Ela nã o tinha maior alegria do que prestar
serviço de caridade ao pró ximo. Algué m poderia pedir-lhe qualquer
coisa que ela tivesse; ela dava de bom grado até os artigos mais
necessá rios e, acima de tudo, era gentil com aqueles que pouco se
importavam com ela.”
Certo ano, em seu dia de festa, um amigo deu-lhe um quilo de café .
Durante um ano inteiro ela o usou para o café da manhã sem diminuir o
pouco estoque, uma circunstâ ncia que alegrou seu coraçã o. Mas sendo
atacada por uma longa doença durante a qual ela recebeu remé dios
sobrenaturais, este alimento terreno foi retirado.
“Um dia”, ela nos conta, “o velho Conde von Galen insistiu ao tomar duas
moedas de ouro para dar aos pobres em seu nome. Troquei-os e
mandei fazer roupas e sapatos que distribuı́ aos necessitados. Deus
abençoou o dinheiro, pois assim que todos os pedaços pequenos se
foram, encontrei os dois grandes novamente no meu bolso. Eu
imediatamente os troquei e os usei como antes. Isso durou um ano, e
assim pude ajudar muitas pessoas pobres. A assistê ncia milagrosa
cessou durante uma doença, dois meses da qual iquei imó vel e a maior
parte do tempo inconsciente. Este era geralmente o caso de tais favores;
pois, como outros tinham livre acesso à minha cela, Deus retirou o que
poderia ter sido um assunto de escâ ndalo para eles.
Por uma dispensa especial da Divina Providê ncia, todas as classes de
pessoas procuraram a assistê ncia de Irmã Emmerich durante sua
permanê ncia no convento, recebendo dela a maior simpatia e alı́vio os
mais abandonados. Embora fossem mais frequentemente os pobres que
pediam ajuda à freira doente, as suas Irmã s de religiã o també m sabiam
com que caridade seriam recebidas sempre que se dispusessem a dar-
lhe a conhecer as suas necessidades. O excesso de seus pró prios
sofrimentos parecia apenas aumentar sua terna simpatia pelos outros;
a perspectiva de fazer uma gentileza para com seu vizinho parecia dar
novo vigor e energia ao seu corpo debilitado; e ela que recebia tã o
pouco cuidado e atençã o, nã o podia colocar limites em seu zelo se
houvesse questõ es de aliviar o outro. Ela possuı́a uma percepçã o rá pida
de quais remé dios aplicar; suas oraçõ es e o toque de sua mã o gentil
atraı́ram uma bê nçã o sobre aqueles para quem ela prescreveu. Ela era
tã o paciente, tã o serena, tã o engenhosa em dar alı́vio mesmo tratando
com os impacientes e irritá veis, que eles perdiam de vista que ela
mesma nã o era um instante sem sofrimento intenso. Sua bondade era
irresistı́vel, e ela sabia tã o bem como superar os caprichos e
preconceitos dos doentes que o mé dico muitas vezes mandava chamá -
la quando sua pró pria persuasã o se mostrava ine icaz.
Entre os pensionistas estava uma garota de mente fraca chamada K,
natural de M, que tinha um abscesso nas costas do pescoço dela.
Quando o mé dico estava aplicando um curativo, ela escapou de suas
mã os e se recusou a permitir que ele izesse qualquer coisa por ela. A
superiora chamou a irmã Emmerich, cuja presença produziu um efeito
má gico sobre a criança, que prontamente tirou de sua mã o o remé dio
prescrito e permitiu que sua ferida fosse curada. Quando o abscesso se
rompeu, a irmã Emmerich o chupou suavemente e logo se curou sem
deixar cicatriz.
Uma criada tinha um abscesso debaixo do braço. Ela foi até a cabeceira
da irmã Emmerich uma noite, implorando pelo amor de Deus para
aliviá -la. O mesmo serviço de caridade foi prestado a ela e ela foi
curada.
Havia uma jovem de Amsterdã na casa como pensionista. Ela tinha um
temperamento insuportá vel que explodia em todas as ocasiõ es. Irmã
Emmerich foi a ú nica que conseguiu acalmá -la, até ganhou seus afetos,
para espanto de todos.
Falando de um caso semelhante, ela diz:
“O mé dico do convento foi um pouco abrupto; um dia ele repreendeu
profundamente uma pobre mulher, porque ela se esqueceu de lhe
mostrar o dedo que estava muito dolorido. A in lamaçã o se estendia até
o braço que estava perfeitamente preto. Quando ele disse que teria que
amputá -lo, a pobre criatura veio correndo até mim, pá lida de medo,
implorando que eu a ajudasse. Comecei a orar quando, de repente, a
maneira correta de tratá -la surgiu em minha mente. Falei disso com a
Reverenda Madre, que me permitiu vestir o braço no quarto do abade
Lambert. Cozinhei sá lvia, mirra e algumas ervas de Nossa Senhora em
vinho e á gua; a isso acrescentei algumas gotas de á gua benta e iz um
cataplasma que amarrei no braço da mulher. Certamente foi o pró prio
Deus quem inspirou o remé dio, pois na manhã seguinte o inchaço havia
desaparecido completamente, embora o dedo estivesse muito dolorido.
Fiz com que ela o banhasse em lixı́via e ó leo. Quando se abriu, extraı́
dele um grande espinho e logo sarou”.
Sobre a natureza da compaixã o que sentia pelos doentes e pobres, ela
diz:
“Nunca posso chorar por uma pessoa que morre resignada, nem por
uma criança que sofre pacientemente; pois o sofrimento paciente é o
estado mais invejá vel do homem. Nossa compaixã o raramente é
totalmente pura; é mais frequentemente misturado com um certo
sentimento de brandura e egoı́smo que brota do horror que nó s
mesmos sentimos pelo sofrimento, por tudo o que pode ferir o eu.
Somente a compaixã o de nosso Senhor é pura, perfeitamente pura, e
nenhuma compaixã o humana possui essa qualidade a menos que esteja
unida à Sua. Só tenho pena dos pecadores, das pobres almas cegas ou
das almas desesperadas. Mas infelizmente! Muitas vezes tenho muita
pena de mim mesmo!”
Os seguintes fatos mostrarã o a bê nçã o ligada à s suas oraçõ es e esforços
em favor dos enfermos:
“Uma pobre camponesa que conheço”, disse ela, “sempre teve encontros
muito dolorosos e perigosos. Ela me amava e me contou suas
provaçõ es. Orei por ela com fervor. Uma faixa de pergaminho com
caracteres escritos foi dada a mim sobrenaturalmente, e me disseram
que a mulher deveria usá -la em sua pessoa. Ela fez isso e foi entregue
sem dor. Ao morrer, ela pediu que a banda fosse enterrada com ela. Tais
pedidos sã o habituais entre nossos camponeses.
“Antes havia uma grande mortalidade entre o gado. Os camponeses
tiveram que levá -los a um determinado local para tratamento, mas
muitos deles morreram. Uma pobre mã e de famı́lia veio até mim em
lá grimas, implorando oraçõ es por ela e pelos outros sofredores. Entã o
tive uma visã o dos está bulos pertencentes a essas pessoas. Vi tanto os
animais sadios quanto os afetados pela cinomose, como també m a
causa do mal e o efeito da oraçã o sobre ele. Vi que muitos foram
atacados como castigo de Deus, por conta do orgulho e da falsa
segurança de seus donos que nã o reconheciam que Deus pode dar e
tirar, e que sua perda era um castigo por seus pecados. Entã o eu
implorei a Deus Todo-Poderoso que tomasse algum outro meio de
trazê -los para o caminho certo. Alguns desses animais foram afetados
pela maldiçã o de pessoas invejosas; eles pertenciam principalmente a
homens que deixaram de dar graças a Deus por Seus benefı́cios e
implorar Sua bê nçã o sobre Seus pró prios dons. O gado parecia-me
envolto em escuridã o, por onde passavam de um lado para o outro
iguras de aparê ncia sinistra. As bê nçã os nã o apenas atraem a graça de
Deus, mas també m dissipam a in luê ncia maligna de uma maldiçã o. O
gado salvo pela oraçã o parecia separado dos demais por algo luminoso.
Vi um vapor negro escapando daqueles que foram curados e uma luz
tê nue pairando sobre outros abençoados de longe pela oraçã o. O lagelo
foi subitamente preso e o gado pertencente à mã e da famı́lia escapou
intocado”.
A saú de debilitada de Anne Catherine a impedia de exercer qualquer
cargo no convento; ela sempre foi ajudada primeiro a uma, depois a
outra Irmã . Ela nunca teve autoridade sobre ningué m, mas como diz
Clara Soentgen: “Ela era a serva de todos, mas uma serva que amava sua
condiçã o humilde. Ela tinha o bem geral no coraçã o, prestou um grande
serviço à comunidade e sempre foi muito laboriosa. Com relaçã o à s
servas e aos trabalhadores, ela nã o era apenas gentil e discreta, mas
també m lhes dava bons conselhos e instruçõ es.”
A Reverenda Madre, em 1813, també m depô s:
“Em qualquer obediê ncia imposta, Anne Catherine sempre dava
satisfaçã o. Quando cuidava do jardim e dos anexos, trabalhava com
zelo, todos a elogiavam. Ela era gentil com os servos (como testemunha
sua Senhora), embora exigisse de seus deveres. Ela era compassiva com
os pobres e estava acostumada a fazer boné s para crianças pobres com
as coisas da velha igreja”.
Capítulo 15
E CSTASIAS E ORAÇAO DA IRMA E MMERICH
ENTRE todas as suas privaçõ es, nenhuma foi tã o dolorosa para
a irmã Emmerich quanto a falta de direçã o espiritual adequada.
Nã o tinha ningué m com quem pudesse conversar sobre seu
UMA interior, ningué m para ajudá -la a carregar o fardo que a pesava.
“Dia e noite”, diz ela, “implorava a Deus que me enviasse um
padre a quem eu pudesse abrir meu interior, pois muitas vezes
eu temia ser iludida pelo espı́rito maligno. Esse pavor me fez
duvidar de tudo, até do que estava diante dos meus olhos, meus
sofrimentos, meus consolos, minha pró pria existê ncia. O abade
Lambert tentou me acalmar; mas, como ele sabia pouco alemã o, eu nã o
conseguia fazê -lo entender claramente, e meu problema sempre
voltava. Tudo o que acontecia no meu interior e ao meu redor eu achava
perfeitamente incompreensı́vel, uma camponesa ignorante que eu era!
Embora fosse a experiê ncia da minha vida, nunca antes me perturbou.
Os ú ltimos quatro anos de convento foram passados em contemplaçã o
quase ininterrupta e multiplicaram-se os incidentes decorrentes deste
estado. Eu nã o poderia prestar contas deles à queles que ignoravam tais
coisas, eles as considerariam simplesmente impossı́veis. Enquanto
neste estado, enquanto eu estava orando sozinho na igreja um dia, ouvi
distintamente esta pergunta: 'Eu nã o sou su iciente para você ?' As
palavras me impressionaram profundamente.”
Nã o é de admirar que Anne Catherine tenha deixado assim a si mesma
atormentada pela dú vida e pela ansiedade. O dom da contemplaçã o lhe
fora conferido para a promoçã o de sua missã o expiató ria e,
conseqü entemente, implicava sobre seus sofrimentos mentais que,
como suas dores fı́sicas, correspondiam ao estado da Igreja na é poca.
Sua alma ganhou força e amadureceu em sua infâ ncia pelas ricas
contemplaçõ es que lhe foram apresentadas, contemplaçõ es que
abarcaram toda a histó ria da Redençã o; agora, se assim podemos
expressar, o lado escuro de suas visõ es deveria ser colocado diante dela,
ou seja, o desdobramento do misté rio da iniqü idade, o combate do
inimigo contra a Igreja. Ela deve agora lutar contra a malı́cia e astú cia
do maligno que desliza na vinha enquanto o mestre dorme e semeia a
má semente; ela deve destruı́-lo antes que ele surja e, vestida com a
armadura espiritual de pureza, humildade e con iança em Deus, ela
deve lutar com o inimigo em seus ataques ao sacerdó cio sagrado. Em
tais encontros nã o é a luz da contemplaçã o, mas a fé forte e viva que
assegura a vitó ria. O pai da mentira pode, de fato, lançá -la em agonia
mental, mas nã o pode abalar sua fé . Anne Catherine nunca desejara
visõ es e favores extraordiná rios e, quando os recebeu pela primeira
vez, nã o sabia que eram extraordiná rios, nem sonhava que fossem
peculiares a ela; mas assim que a verdade lhe ocorreu, seu principal
cuidado foi submetê -los à decisã o de seu diretor. Nã o suas visõ es, mas
sua fé formavam a regra de sua conduta; preferia ter sofrido mil mortes
a violar seus santos ensinamentos, e quando o tentador a colocou em
dú vida e medo quanto à origem de seus favores sobrenaturais, foi por
atos dessa virtude que ela o colocou em fuga. Em seus ataques rudes e
repetidos, Anne Catherine foi privada da assistê ncia espiritual dos
ministros da Igreja. Nisso ela se assemelhava à pró pria Igreja cujas
sedes episcopais estavam vazias, cujos rebanhos vagavam sem pastores
para conter os estragos cada vez maiores da heresia e cujos doutores
nã o mais levantavam voz contra a torrente de males que se
derramavam sobre ela por todos os lados.
Nã o podemos com indiferença contemplar no meio desta desolaçã o a
pobre freira de Dü lmen, desdobrando-se como um lor milagrosa uma
beleza igual a qualquer pertencente a é pocas anteriores. Quando S.
Teresa e Madalena di Pazzi adornavam a Igreja, a Ordem de Santo
Iná cio estava em sua primeira loraçã o. Ele foi se espalhando
rapidamente por toda a Igreja, à qual deu mais santos e eruditos do que
qualquer instituto religioso desde o tempo de Sã o Francisco e Sã o
Domingos. Quando S. Catarina de Siena, Lidwina e Colette
embalsamaram sua vinha com a fragrâ ncia de suas virtudes, a Igreja
de inhava, é verdade, em um estado muito angustiante; mas ao lado
desses santos surgiram em todos os paı́ses almas santas e eruditas. Mas
nenhum perı́odo foi mais desolador do que aquele em que o dono da
vinha derramou sobre a pequena pastora de Flamske a plenitude de
suas graças. Deus dá Seus dons somente sob a condiçã o de cooperaçã o
iel; se isso faltar, eles sã o retirados e concedidos a outros que farã o um
melhor uso deles. Assim Ele age para com a massa dos ié is. Em
nenhum momento o poder e a misericó rdia de Deus sã o diminuı́dos;
mas, quando os vasos estã o querendo receber as riquezas
superabundantes de Seus dons, Ele mostra as maravilhas de Seu amor
em algumas almas ié is, à s quais concede, alé m de sua pró pria parte, as
graças menosprezadas por outros. E por isso que os privilé gios e
sofrimentos de Anne Catherine tê m algo de extraordiná rio e
imponente. Os ê xtases de Santa Madalena di Pazzi aconteciam em uma
comunidade enclausurada onde tais coisas eram vistas com respeito
nã o sem mistura de medo. Sendo mestra de noviças, ela estava cercada
por suas jovens alunas, que se deleitavam em falar de Deus ou de seus
santos, para que pudessem contemplar sua mestra arrebatada em
ê xtase. Mas os arrebatamentos da irmã Emmerich muitas vezes a
apoderaram-se dela no meio de companheiros que a olhavam com
inquietaçã o por isso mesmo, e para quem ela era tã o insuportá vel
quanto a Igreja à grosseira in idelidade do perı́odo, porque ela ousava
ainda celebrar a grandeza e magni icê ncia de Deus em Seus santos.
“Muitas vezes fui incapaz de resistir ao impulso divino e caı́
inconsciente diante de meus companheiros. eu estava no coro um dia,
embora nã o cantando com o resto, quando iquei rı́gido, e as freiras
acontecendo para me empurrar, caı́ no chã o. Enquanto me levavam para
fora, vi uma freira andando no ponto mais alto do telhado, onde
ningué m podia ir, e me disseram que era Madalena di Pazzi, que trazia
as marcas das feridas de Nosso Senhor. Novamente a vi correndo pela
grade do coro, subindo no altar ou agarrando a mã o do padre. Seus
vô os perigosos me izeram re letir sobre mim mesmo, e tomei todas as
precauçõ es para nã o ceder a esses estados. Minhas irmã s nã o
entendiam nada disso e, a princı́pio, me censuraram severamente por
permanecer na capela prostrado, de braços estendidos. Mas como nã o
pude evitar esses arrebatamentos, tentei esconder-me deles num canto.
Apesar de meus esforços, no entanto, fui arrebatado por mim mesmo,
à s vezes em um lugar, à s vezes em outro. Fiquei prostrado, rı́gido e
imó vel, ou ajoelhei-me com os braços estendidos. O capelã o muitas
vezes me encontrava nesse estado. Sempre desejei ver Santa Teresa,
porque ouvi dizer que ela havia sofrido muito com seus confessores. O
favor me foi concedido. Eu a vi vá rias vezes, doente e fraca, escrevendo
em uma mesa ou na cama. Achei que havia uma amizade ı́ntima entre
ela e Magdalen di Pazzi. Foi-me revelado que Madalena desde a infâ ncia
era agradá vel a Deus, por causa de sua simplicidade e amor ardente.
“Nos meus deveres de sacristã o, muitas vezes fui erguido de repente, e
iquei nos pontos mais altos da igreja, nas janelas, nas esculturas e nas
cornijas, limpando e espanando onde humanamente ningué m podia ir.
Nã o me assustei quando me senti assim erguido e suspenso no ar, pois
sempre estivera acostumado à ajuda do meu anjo. As vezes, ao acordar,
encontrava-me sentado num grande armá rio onde guardavam coisas da
sacristia; à s vezes eu estava em um canto perto do altar onde nenhuma
alma podia me ver, e nã o consigo entender como me espremi nele sem
rasgar meu há bito. Mas, à s vezes, ao acordar, encontrava-me sentado na
viga mais alta do telhado. Isso geralmente acontecia quando eu me
escondia para chorar. Muitas vezes vi Magdalen di Pazzi montando-se
assim e correndo sobre as vigas, os andaimes e os altares.”
Dean Overberg depô s:
“Anne Catherine costumava ter ê xtases no convento, especialmente
durante os ú ltimos quatro anos de sua existê ncia. Em todos os lugares,
no claustro, no jardim, na igreja e em sua cela, ela costumava afundar
no chã o. Eles vinham principalmente quando ela estava sozinha,
embora ela tivesse um leve ê xtase no refeitó rio; mas ela costumava
implorar a Deus para nã o enviá -los para ela lá . Pareceu-lhe que o ê xtase
durou apenas um momento, mas depois descobriu que era muito mais
longo.
“Perguntei se ela sabia distinguir entre desmaios comuns e ê xtases. Ela
respondeu: 'Em desmaios de fraqueza, estou muito, muito doente como
se estivesse prestes a morrer; mas no outro estado, nã o sei que tenho
um corpo. Muitas vezes estou muito alegre, ou novamente triste.
Alegro-me na misericó rdia de Deus para com os pecadores,
conduzindo-os amorosamente de volta a Ele; ou lamento pelos pecados
da humanidade, ico triste ao ver Deus tã o horrivelmente ofendido.
“'Na minha meditaçã o olhei para o cé u e lá vi Deus. Quando em
desolaçã o, eu parecia estar andando em um caminho de apenas um
dedo de largura, de ambos os lados, abismos profundos e escuros;
acima de mim tudo era lorido e belo, e um jovem resplandecente me
conduziu pela mã o pelo caminho perigoso. Eu costumava ouvir nessa
é poca a voz de Deus me dizendo: “Minha graça te basta!” — e as
palavras eram doces para minha alma.' ”
Freqü entemente durante seus ê xtases, Irmã Emmerich recebeu de seu
anjo uma ordem para trazer as Irmã s de volta à estrita observâ ncia da
Regra. Entã o, ainda em ê xtase e derramando lá grimas abundantes, ela
aparecia no meio deles e citava as Regras sobre o silê ncio, a obediê ncia,
a pobreza, o Ofı́cio Divino, a clausura e outras mais frequentemente
infringidas; ou ainda, ela se lançava aos pé s de uma Irmã em cujo
coraçã o ela via aversã o ou mesmo ó dio absoluto, e implorava que ela
perdoasse, fosse caridosa, ajudando-a a resistir à tentaçã o e apontar a
culpa de alimentar tais sentimentos. Os religiosos geralmente cediam à s
suas persuasõ es e abriam-lhe o seu interior, implorando-lhe conselhos
e oraçõ es para corrigir. Se, no entanto, eles achavam o primeiro muito
difı́cil de seguir, eles se entregavam a ataques de mesquinhez e
descon iança e, portanto, levantavam novas suspeitas naquelas almas
fracas. Eles imaginavam que a irmã Emmerich tinha agora em mente
suas falhas e imperfeiçõ es enquanto, na realidade, ela recebia
comunicaçõ es como as que lhe eram dadas em visã o. Ela guardou sua
con iança como um depó sito sagrado com o ú nico objetivo de render
gló ria a Deus e assistê ncia à s almas necessitadas.
“Muitas vezes acontecia”, disse ela, “que enquanto fazia meu trabalho
ou, talvez, deitada na cama doente, eu estava em espı́rito entre minhas
Irmã s. Eu via e ouvia tudo o que eles faziam e diziam, e à s vezes me
encontrava na igreja diante do Santı́ssimo Sacramento, embora sem sair
da minha cela. Nã o sei explicar como foi. A primeira vez que isso
aconteceu eu pensei que era um sonho. Eu estava no meu dé cimo
quinto ano e ausente de casa. Fui instado a orar por uma jovem tonta
para que ela nã o fosse desencaminhada. Uma noite eu vi uma
armadilha armada para ela. Em agonia, corri para o quarto dela e pus
em fuga um criado da casa que encontrei à sua porta. Quando entrei na
câ mara, ela estava em estado de consternaçã o. Agora, eu realmente nã o
tinha saı́do da minha cama, e pensei que era tudo um sonho. Na manhã
seguinte, poré m, a menina nã o conseguiu me olhar no rosto e depois
me contou tudo e me agradeceu vá rias vezes, dizendo que eu a havia
libertado do tentador, que havia entrado em seu quarto e a salvado do
pecado. Entã o, de fato, considerei a circunstâ ncia como algo mais do
que um sonho. Tais coisas muitas vezes ocorreram em um perı́odo
posterior. Uma mulher, que eu nunca tinha visto, veio a mim muito
emocionada, agradeceu-me com muitas lá grimas e contou sua queda e
conversã o. Eu a reconheci como algué m por quem me disseram em
visã o para orar.
“Nem sempre foi apenas em espı́rito, como nos casos acima, que fui
enviado para ajudar as pobres almas tentadas. eu costumava ir
realmente no corpo també m. As servas do convento dormiam nas
dependê ncias. Certa vez, quando estava muito doente, vi à noite duas
pessoas conversando aparentemente sobre assuntos piedosos, mas
seus coraçõ es estavam cheios de maus pensamentos. Levantei-me no
escuro, mas apesar de ver claramente o caminho, atravessei o claustro
para separá -los. Quando me viram chegando, fugiram assustados e
depois mostraram-se mal-humorados para comigo. Quando voltei,
acordei. Eu estava apenas na metade da escada que levava ao convento,
e voltei para minha cela com grande di iculdade, pois estava muito
fraco.
“Em outra ocasiã o, uma das Irmã s pensou ter me visto junto ao fogo da
cozinha levando algo em uma vasilha para comer em particular e,
novamente, colhendo frutas no jardim para o mesmo propó sito. Ela
correu imediatamente para contar à Superiora; mas, quando eles
vieram para inquiri-lo, encontraram-me de cama enfermo até a morte.
Esses incidentes tornaram meu estado muito embaraçoso, e os
religiosos nã o sabiam o que pensar de mim”.
Desde a entrada de Irmã Emmerich no convento, nenhum sofrimento
lhe parecia su icientemente grande para superar o privilé gio supremo
de habitar sob o mesmo teto com o Santı́ssimo Sacramento, de passar a
maior parte de seu dia diante dele. Quando trabalhava em sua cela ou
em outro lugar, ela involuntariamente se voltava para a igreja, pois o
sentimento da presença real e viva de seu Senhor nunca estava ausente
de seu coraçã o. Nada poderia se opor a uma barreira à s suas
comunhõ es amorosas. O simples pensamento da Santı́ssima Eucaristia
a pô s em ê xtase e, se nã o fosse impedida pelos mandamentos de
obediê ncia, ela se viu prostrada nos degraus do altar, embora
corporalmente à distâ ncia. Em tudo o que sua Regra exigia dela, ela
descobriu algo referente ao Santı́ssimo Sacramento e ela foi, portanto,
tã o iel ao menor quanto ao maior dever. O encargo da sacristia ela
considerava essencialmente sagrado, para ser atendido a qualquer
custo de sofrimento fı́sico, pois era serviço do Rei dos reis, privilé gio
dos anjos. pode muito bem invejar. Verdadeiramente e em todos os
momentos ela se voltou para Jesus no altar como uma lor ao sol; todos
os seus pensamentos e afeiçõ es eram Dele, todos enviavam a Ele o doce
odor do amor e do sacrifı́cio. Seus sofrimentos pelo Santı́ssimo
Sacramento foram grandes como seu amor, pois nenhum pecado
clamava mais alto ao Cé u, nenhum tinha maior necessidade de expiaçã o
do que aqueles dirigidos contra a fé na Presença Real. Foi nesse
perı́odo, como já observamos, que o jansenismo visava banir o
sacrifı́cio incruento do altar e a veneraçã o de Maria, a Mã e de Deus.
Essas abominaçõ es encheram sua alma de angú stia ao se ajoelhar
diante do altar e compartilhar com o Coraçã o de Jesus a dor ocasionada
por tais ultrajes. A nenhum outro Ele poderia recorrer, visto que Seus
inimigos mais crué is estavam entre aqueles cujo cará ter sacerdotal lhes
dava poder ilimitado sobre essa promessa de Seu amor pelo homem.
Seu ardor a levou à noite à igreja para se ajoelhar no frio diante de suas
portas fechadas, derramando lá grimas de amor e desejo até que a luz
do dia lhe deu entrada, pois seu ú nico alı́vio foi encontrado na presença
de seu Salvador. Seus sofrimentos foram tã o variados quanto os
pecados daquele perı́odo contra o Santı́ssimo Sacramento, e ela fez
penitê ncia por cada afronta que Lhe oferecia, desde a tepidez e
indiferença dos ié is em receber a Sagrada Comunhã o até os insultos
sacrı́legos de Seus maiores inimigos. Ela teria afundado sob o peso
dessa terrı́vel missã o, se Deus nã o tivesse apagado suas impressõ es de
sua alma e a inundado, à s vezes, de consolo. Quanto mais viva era a sua
intuiçã o da grandeza e magni icê ncia deste grande Sacramento, tanto
mais ardente se tornava a sua devoçã o a Ele, tanto maior a sua
veneraçã o. Sua reverê ncia por Ela, unida ao profundo sentimento de
sua pró pria indignidade, à s vezes a enchia de tanto medo que só a
obediê ncia poderia fazê -la aproximar-se da Santa Mesa. Acreditava-se
responsá vel, por causa de suas pró prias imperfeiçõ es, pelas numerosas
infraçõ es da caridade e da Regra cometidas pelas Irmã s, e esse medo a
impedia de se aproximar da Sagrada Comunhã o com a frequê ncia que
poderia.
Dean Overberg disse:
“Seu confessor queria que ela se comunicasse com mais frequê ncia do
que os outros religiosos, e ela obedeceu por algum tempo; mas, desde a
Puri icaçã o até Pentecostes, ela se absteve por respeito humano, porque
foi acusada de falsa santidade e todos os tipos de comentá rios foram
feitos sobre o assunto. Alé m disso, ela se considerava incapaz de se
comunicar com tanta frequê ncia e caiu em um estado de tristeza. Por
im, ela reconheceu sua falta e retomou seu costume de comunhã o
frequente, embora por dois anos ela tenha que expiar sua
desobediê ncia neste ponto, todo o consolo sendo retirado dela.
“No inal deste tempo, sua paz de alma retornou; e tã o grande era o seu
desejo pela Sagrada Eucaristia que nã o podia esperar pela hora
habitual. Seu confessor providenciou para que ela recebesse antes que
a comunidade surgisse em dias nã o marcados para que todos
comunicassem que, sendo menos comentada, a circunstâ ncia poderia
gerar menos conversa. De manhã cedo batia à porta do abade Lambert,
que gentilmente foi à igreja e lhe deu a Sagrada Comunhã o. Mas à s
vezes ela se apresentava antes da hora marcada, e em uma ocasiã o,
mesmo pouco depois da meia-noite, tã o grande era sua saudade da
Sagrada Eucaristia. Toda a sua alma estava em chamas, e ela foi
impelida tã o violentamente para a igreja que sentiu como se seus
membros estivessem sendo arrancados de seu corpo. O abade nã o
icou, como se poderia supor, muito satisfeito ao ouvi-la bater à sua
porta à quela hora; mas ao ver o estado em que ela estava, ele foi e deu-
lhe a Sagrada Comunhã o.
“Ela assistia à missa com intensa devoçã o. Quando a celebrante
começou: 'In nomine Patris ', etc., ela contemplou Jesus no Monte das
Oliveiras, e implorou aos ié is a graça de assistir devotamente ao Santo
Sacrifı́cio e aos sacerdotes a de oferecê -lo de maneira agradá vel a Deus.
; por ú ltimo, ela implorou a Nosso Senhor que lançasse sobre todos um
olhar tã o gracioso como Ele uma vez lançou sobre Sã o Pedro.
“No Glória , ela louvou a Deus em uniã o com a Igreja Triunfante e a
Igreja Militante, dando graças pela renovaçã o diá ria do Santo Sacrifı́cio,
e implorando a Deus que ilumine todos os homens e console as pobres
almas do Purgató rio.
“No Evangelho , ela pediu a todos os ié is a graça de praticar
plenamente os ensinamentos evangé licos.
“No ofertório , ela apresentou a Deus o pã o e o vinho com o sacerdote,
rezando para que fossem transformados no Corpo e Sangue de Jesus
Cristo, e sussurrou em seu coraçã o que se aproximava o momento do
advento do Salvador. .
“No Sanctus , ela convocou o mundo inteiro para louvar a Deus com ela.
“Na Consagração , ela ofereceu o Salvador ao Pai pelo mundo inteiro,
principalmente pela conversã o dos pecadores, pelo alı́vio das almas do
Purgató rio, pelos moribundos e por suas Irmã s na religiã o. Ela
imaginou o altar cercado neste momento por uma multidã o de anjos
adoradores que nã o ousavam erguer os olhos para a Hó stia Sagrada. Ela
disse a si mesma que, embora pudesse ser muito ousada da parte dela,
nã o podia se privar do consolo de contemplar seu Senhor.
“Muitas vezes ela via uma luz brilhante em torno da Hó stia Sagrada e na
Hó stia uma cruz de cor escura, nunca branca. Se fosse branco, ela nã o
poderia distingui-lo. Nã o parecia ser maior do que a Hó stia, mas esta
era muitas vezes maior do que o normal.
“Da Elevação ao Agnus Dei , ela orou pelas almas do Purgató rio,
apresentando Jesus na Cruz ao Pai para que Ele pudesse realizar o que
ela nã o conseguiu. Neste momento, muitas vezes ela foi arrebatada de
si mesma e, de fato, à s vezes ela caiu em ê xtase mesmo antes da
Consagraçã o.
“Na Comunhão , ela re letiu sobre Cristo colocado no tú mulo e implorou
a Deus Todo-Poderoso para aniquilar em nó s o velho homem e nos
vestir com o novo.
“Se na missa ou em qualquer outro serviço ela ouvia a mú sica, ela
exclamava: 'Ah, como é doce a harmonia! Criaturas inanimadas
concordam tã o perfeitamente, por que os coraçõ es dos homens nã o
deveriam faça o mesmo! Como isso seria encantador!' — e o
pensamento a fez derramar lá grimas.
“Certa vez, durante a Missa da meia-noite de Natal, ela viu o Menino
Jesus sobre o Cá lice, e o que lhe pareceu estranho foi que o celebrante
parecia segurar o Menino pelos pé s, mas ela viu també m o Cá lice.
Muitas vezes ela via um Menino na Hó stia, mas Ele era muito pequeno.
“Quando era sacristã , ocupou por algum tempo um lugar no coro do
qual nã o podia ver o altar, tendo entregado o seu a uma irmã que se
atormentava de escrú pulos quando ouvia missa sem gozar daquela
consolaçã o. Um dia, enquanto ela estava olhando para tocar o sino da
Elevaçã o, ela viu o Menino Jesus sobre o Cá lice — Oh, que lindo! Ela se
achava no cé u. Ela estava prestes a saltar pela grade para alcançar o
Menino quando de repente se recompô s, exclamou: 'Meu Deus! o que
eu vou fazer!' Ela conseguiu conter-se, mas esqueceu de tocar a
campainha, uma omissã o frequente dela que lhe rendeu muitas
reprimendas.
Clara Soentgen diz: “Quando a Irmã Emmerich recebeu a Sagrada
Comunhã o, sua força corporal aumentou. Ela adorava, sobretudo,
comunicar-se na quinta-feira em honra do Santı́ssimo Sacramento; mas,
como isso dava risco de comentar, ela obteve permissã o de seu
confessor para se comunicar em segredo. As vezes ela ia receber um
pouco depois da meia-noite, à s vezes à s trê s ou quatro horas da manhã ,
seu desejo ardente impossibilitava que ela esperasse mais.
“Uma vez perguntei por que ela usava seu melhor há bito à s quintas-
feiras, e ela respondeu que era em homenagem ao Santı́ssimo
Sacramento. Raramente fazia uso de um livro antes ou depois da
Comunhã o.
A pró pria Irmã Emmerich fala assim: “Muitas vezes vi sangue luir da
cruz na Sagrada Hó stia; Eu vi distintamente. As vezes Nosso Senhor, em
forma de Menino, aparecia como um relâ mpago na Sagrada Hó stia. No
momento da comunicaçã o, eu costumava ver meu Salvador como um
noivo de pé ao meu lado e, quando eu o recebi, ele desapareceu,
deixando-me cheia da doce sensaçã o de sua presença. Ele permeia toda
a alma do comungante assim como o açú car se dissolve na á gua, e a
uniã o entre a alma e Jesus é sempre proporcional ao desejo da alma de
recebê -lo”.
Dean Overberg dá o seguinte relato de sua oraçã o: “Antes de entrar na
religiã o, Anne Catherine rezou pelos pecadores e pelas almas do
Purgató rio. No convento rezava també m pelos companheiros,
raramente por suas pró prias necessidades. Salvo as prescritas pela
Regra, ela fazia poucas oraçõ es vocais, mas fazia uso de ejaculaçõ es
freqü entes. Ela falava com Deus como uma criança com seu pai e
geralmente obtinha o que pedia.
“Sua comunhã o com Deus nã o cessou nem de dia nem de noite, mesmo
à mesa nã o foi interrompida. Ela muitas vezes nã o tinha consciê ncia do
que era dito ali, e se as Irmã s faziam comentá rios sobre ela nessas
ocasiõ es, ela raramente percebia.
“O abade Lambert perguntou-lhe um dia no inal de uma das refeiçõ es:
'Como você pode ouvir tã o silenciosamente o que se passa à mesa?'
quando ela respondeu que nã o tinha ouvido nada do que foi dito.
“Tinha, em certa é poca, o há bito de disputar com Deus em dois pontos:
que Ele nã o converteu todos os grandes pecadores, e que puniu os
impenitentes com dores eternas. Ela lhe disse que nã o conseguia
entender como Ele poderia agir assim, tã o contrá rio à Sua natureza, que
é a pró pria bondade, pois seria fá cil para Ele converter os pecadores,
pois todos estã o em Suas mã os. Ela o lembrou de tudo o que Ele e Seu
Filho haviam feito por eles; do ú ltimo ter derramado Seu Sangue e dado
Sua vida por eles na Cruz; de Suas pró prias palavras e promessas de
misericó rdia contidas nas Escrituras. Ela perguntou a Ele com santa
ousadia, como Ele poderia esperar que os homens cumprissem sua
palavra, se Ele nã o cumprisse a Sua?”
“O abade Lambert, a quem ela contou esta disputa, disse-lhe: 'Baixinho!
você vai longe demais!' e ela logo viu que Deus está certo; pois, se Ele
converteu todos os pecadores ou se as dores do Inferno nã o durasse
para sempre, o homem esqueceria que existe um Deus.
“Ela tinha grande con iança na Mã e de Deus a quem ela se voltava
sempre que tinha cometido uma falta, dizendo: 'O Mã e do meu Salvador,
tu é s duplamente minha Mã e! Teu Filho te deu por mã e quando disse a
Joã o: “ Eis aí tua Mãe! ” e entã o, novamente, eu sou a esposa de teu
Filho. Tenho sido desobediente a Ele, tenho vergonha de comparecer
perante Ele. Oh, tenha pena de mim! Coraçã o de mã e é sempre tã o bom!
Peça a Ele que me perdoe, Ele nã o pode recusar você .' ”
“Um dia, pouco antes da supressã o do convento, quando em vã o buscou
consolo entre suas irmã s, ela correu chorando para a igreja e prostrou-
se em agonia diante do Santı́ssimo Sacramento pedindo perdã o, pois
estava sobrecarregada pelo pensamento de que ela sozinho era a causa
de todo o mal na casa. 'O Deus, eu sou o ilho pró digo!' ela chorou; 'Eu
desperdicei minha herança, nã o sou digno de ser chamado de Teu ilho!
Tenha pena de mim! Peço-o por minha dulcı́ssima Mã e, que també m é
Tua Mã e!' - entã o a voz de Deus soou em sua alma pedindo-lhe que
icasse em paz, que Sua graça lhe bastaria, e que ela nã o deveria mais
buscar consolo nas criaturas .
“Muitas vezes, ao implorar com fervor algum favor e fazer grandes
promessas a Nosso Senhor, ela ouvia estas palavras: 'Como podes
prometer grandes coisas, quando os pequeninos sã o tã o difı́ceis para
ti!' ”
O seguinte é o depoimento de Dean Rensing:
“Irmã Emmerich fez as oraçõ es prescritas com os religiosos e algumas
outras oraçõ es vocais; mas quando ela orava interiormente, ela pedia a
Deus e no fundo de seu coraçã o pedia para ser ouvida favoravelmente.
Ela acrescentou um Pai Nosso ou alguma outra oraçã o curta, muitas
vezes chegando ao ponto de disputar o ponto com o Todo-Poderoso.
“Ela amava mais a oraçã o mental do que a oraçã o vocal. Ela se
perguntou: 'O que você deveria ser, e o que você é ?' e entã o ela
continuou até que sua meditaçã o foi muito prolongada, sem saber como
ela havia passado de um ponto a outro.”
Clara Soentgen diz: “Irmã Emmerich me disse que da Ascensã o ao
Pentecostes, seu estado de contemplaçã o foi ininterrupto. Ela viu os
discı́pulos reunidos orando pela vinda do Espı́rito Santo, e ela mesma
estava presente com eles. Isso tinha acontecido com ela antes mesmo
de sua entrada na religiã o. Durante os dez dias de preparaçã o, ela
costumava receber a Sagrada Comunhã o vá rias vezes. Sentei-me ao
lado dela à mesa no convento, e ela estava tã o absorta nessa hora que
eu costumava lembrá -la de comer.”
Ana Catarina nos diz:
“Nã o posso usar as oraçõ es da Igreja traduzidas para o alemã o. Acho-os
insı́pidos e cansativos, embora em latim sejam completos e inteligı́veis;
no entanto, nã o posso me limitar a nenhuma forma de discurso. Eu
sempre icava feliz quando tı́nhamos que cantar hinos e respostas em
latim; a festa era entã o mais real para mim, eu via tudo o que cantava.
Quando cantá vamos a Ladainha da Santı́ssima Virgem em latim, eu
costumava ver uma apó s a outra de uma maneira maravilhosa todas as
iguras simbó licas de Maria. Parecia que eu pronunciava as imagens. A
princı́pio, isso me assustou, mas logo descobri o grande favor que era,
pois excitava minha devoçã o. Eu vi as fotos mais maravilhosas!”
Capítulo 16
S UPPRESSAO DO C ONVENTO . S ISTER E MMERICH RECEBE
OS S TIGMATA .
N 3 de dezembro de 1811, Agnetenberg foi suprimido e a igreja
fechada. Embora a irmã Emmerich tivesse previsto há muito tempo
esse acontecimento tã o doloroso para evitar que ela se oferecesse a
O Deus para sofrer tudo, ela foi tã o afetada por isso que pensou que
nunca seria capaz de abandonar cenas tã o queridas para ela. A
separaçã o de sua alma de seu corpo teria sido menos angustiante do
que deixar o local sagrado em que ela havia feito seus votos
sagrados.
“Fiquei tã o doente”, diz ela, “que eles pensaram que eu certamente
deveria morrer. Entã o a Mã e de Deus apareceu para mim e disse: 'Tu
nã o morrerá s! Ainda haverá muita conversa sobre ti, mas nã o temas!
Aconteça o que acontecer, tu receberá s ajuda!' Mais tarde ouvi em todas
as minhas doenças uma voz sussurrando para mim: 'Tua tarefa ainda
nã o está terminada!' ”
As religiosas deixaram o convento uma a uma, mas a irmã Emmerich
permaneceu até a primavera seguinte, tã o doente que nã o conseguia
sair da cama. Em sua cela fria e ú mida, as cenas dolorosas decorrentes
da aversã o das Irmã s por ela nunca encontraram seu caminho. Ela jazia
sozinha, abandonada a si mesma e aos seus sofrimentos. Mas as
pombas e os pardais pulavam no parapeito da janela e os camundongos
corriam familiarmente sobre a colcha de sua cama, brincando sem
medo ao lado dela e ouvindo suas recriminaçõ es quando os repreendia
por destruir os ovos das pombas. Se o abade Lambert e uma velha serva
nã o lhe tivessem, por pena, prestado os serviços mais necessá rios,
triste o su iciente teria sido sua condiçã o. As Irmã s estavam muito
ocupadas com seus pró prios assuntos para pensar nela; e ainda assim
eles mal a perderam de vista quando esqueceram seu preconceito
contra ela, bem como sua causa. A pergunta feita pela autoridade
eclesiá stica: “Como foi que Irmã Emmerich nã o foi amada no convento
e por que ela foi tã o perseguida?” nã o tiveram outra resposta senã o a
da noviça: “E verdade, ela nã o era muito amada, mas nã o sei por quê ”.
Só a Reverenda Madre tentou atribuir uma razã o: “Parece-me que esta
foi a causa: muitas das Irmã s estavam com ciú mes do interesse
particular que o Abade Lambert tinha por ela, e alguns pensavam que
sua saú de precá ria a tornava um fardo para a famı́lia. comunidade."
O abade Lambert, ele pró prio invá lido e exilado, sem uma alma na terra
de quem esperar simpatia na velhice, permaneceu iel à irmã Emmerich
em sua angú stia. O que ele tinha visto nela nos ú ltimos dez anos, ele
manteve ielmente escondido em seu pró prio peito. Ele era o ú nico a
quem ela havia revelado a maneira maravilhosa pela qual agradou ao
Cé u conduzi-la, o ú nico que tinha a menor idé ia de sua alta missã o.
Sentiu-se chamado a guardar com todas as suas forças a sua pessoa,
bem como o misté rio da sua vida, considerando-a como instrumento
escolhido, tesouro precioso, do qual devia prestar contas a Deus, pois
só a ele tinha sido dado a conhecer o seu valor. Quando ela nã o pô de
mais permanecer no convento, ele a acompanhou até a casa de uma
viú va chamada Roters, em Dü lmen. Ela ainda estava tã o doente que,
depois de se arrastar penosamente pelas ruas com a ajuda do velho
criado, mal conseguiu chegar ao quartinho da frente no andar té rreo
que agora substituiu a cela tranquila cuja pobreza religiosa a
transformou em um cé u sobre a terra.
“Fiquei tã o nervosa e assustada”, disse ela, “quando tive que deixar o
convento, que pensei que todas as pedras da rua estavam prestes a se
levantar contra mim”.
Mal chegara ao seu miserá vel alojamento, por onde ressoavam os
passos dos transeuntes e que os curiosos podiam olhar livremente, pois
estava quase no nı́vel da calçada, quando ela caiu em um profundo
desmaio. Como uma lor arrancada de seu lar no topo da montanha e
pisada em uma estrada poeirenta, ela parecia prestes a murchar.
Embora a estrita observâ ncia da Regra tenha caı́do em decadê ncia, o
claustro havia sido para Ana Catarina um local consagrado, um lugar
santi icado pela oraçã o e penitê ncia de seus primeiros ocupantes nos
dias de fervor e disciplina religiosa, e onde ela mesma havia visando o
perfeito cumprimento de cada dever. Ela havia, por assim dizer, se
identi icado com os exercı́cios conventuais ainda mantidos apesar das
incursõ es da decadê ncia. O Ofı́cio Divino e outros deveres religiosos
eram quase essenciais para sua vida, uma doença cuja carê ncia nada
mais poderia suprir; mas, sobretudo, a proximidade do Santı́ssimo
Sacramento, casa de Deus sempre aberta a ela, aparecia como condiçã o
necessá ria para sua permanê ncia na terra, para o cumprimento de sua
tarefa expiató ria. Tudo isso foi agora arrancado de suas mã os. Do santo
asilo em que sua vida havia passado nos ú ltimos nove anos em perfeita
reclusã o, ela foi lançada, por assim dizer, indefesa e sem amigos, na via
pú blica para começar a ú ltima e mais dolorosa etapa de sua missã o.
Que, pouco antes da Quaresma de 1812, uma pobre freira doente fosse
conduzida pelas ruas da obscura cidade de Dü lmen, foi um evento de
pouca importâ ncia, sem dú vida, aos olhos do mundo. E, no entanto,
essa circunstâ ncia aparentemente insigni icante estava em estrita
conformidade com os desı́gnios da Divina Providê ncia. Sobre esta
pobre religiosa, desgastada pelo sofrimento e pela penitê ncia,
desprezada e perseguida por causa da sua pro issã o, foram acumuladas
todas as tribulaçõ es da Igreja neste tempo desprezada e maltratada
como nunca desde a sua fundaçã o. Mas como o pró prio Deus-Homem,
“Raiz de uma terra sedenta”, 1 “desprezado e o mais abjeto dos
homens”, “o homem de dores, ferido por nossas iniqü idades, moı́do por
nossos pecados”, quis operar nossa redençã o, e nã o impedir que a
palavra da Cruz se torne “para os judeus uma pedra de tropeço, loucura
para os gentios”; assim em todos os tempos Ele libertou Sua Igreja
escolhendo “as coisas loucas do mundo para confundir as sá bias, as
fracas para confundir as fortes, as coisas mesquinhas do mundo e as
desprezı́veis, e as coisas que nã o sã o, para destruir as coisas que sã o.” 2
Para realizar este im, incompreensı́vel para os homens, sublime aos
olhos dos bem-aventurados, para obter por seus meios a libertaçã o de
sua Igreja, Deus agora tira sua esposa do retiro oculto em que ela havia
adquirido aquela força que supera todas as forças e sabedoria do
homem.
Muitos religiosos de ambos os sexos deixaram seu claustro sem
arrependimento para retornar à quele mundo do qual seus votos
sagrados nunca os separaram totalmente; em todos os lugares se
encontravam monges e sacerdotes indignos empregados pelos grandes
do mundo para espalhar nos coraçõ es dos aspirantes ao sacerdó cio o
veneno do erro e da revolta contra a hierarquia e as tradiçõ es sagradas
da Igreja. A santidade e dignidade do cará ter sacerdotal, as graças e
privilé gios a ele inerentes, foram desprezados e negados mesmo por
aqueles que estavam vestidos com ele; e os inimigos declarados do
nome cristã o nã o eram os ú nicos que esperavam com con iança a
rá pida destruiçã o da Igreja. Isso explica o estado a que a pobre vı́tima
de expiaçã o está agora reduzida, porque ela é expulsa, desprotegida e
proscrita. E a Igreja e seu Esposo Celestial que sofrem e choram na
pessoa da pequena freira indefesa de Dü lmen.
A irmã Emmerich piorou rapidamente. Todos pensavam que seu im
estava pró ximo, e sua ex-Mestre de Noviços mandou chamar o padre
Limberg, um padre dominicano que, desde a supressã o de seu convento
em Mü nster, residia em Dü lmen, para ouvir a con issã o do enfermo.
Daremos suas pró prias palavras sobre as impressõ es entã o recebidas:
“Durante a Quaresma de 1812, minha tia, que havia sido a noviça da
irmã Emmerich, mandou me chamar para ouvir sua con issã o. A
princı́pio recusei, pois é necessá ria uma permissã o especial para ouvir
um religioso; mas, quando me asseguraram que essa restriçã o nã o
estava mais em vigor, fui. Ela estava tã o fraca que nã o conseguia falar, e
eu tive que questioná -la sobre sua consciê ncia. Achei que ela estava
morrendo e demorei para nã o dar a ela todos os Ultimos Ritos; mas ela
se reanimou, e eu me tornei desde entã o seu confessor em vez do padre
Chrysanthe, um agostiniano, recentemente falecido. Ela usava um
cinturã o de arame de latã o e um cilı́cio em forma de escapulá rio, que eu
a iz deixar de lado.
“Eu sabia muito pouco da irmã Emmerich antes disso, tendo a visto
apenas ocasionalmente. Muitas vezes rezava missa na capela do
convento e gostava de fazê -lo; tudo ali era tã o legal. Conheci assim o
capelã o, o abade Lambert. Irmã Emmerich era sacristã , e eu costumava
vê -la indo e vindo. Sua saú de parecia tã o miserá vel que pensei que ela
morreria em breve. Muitas vezes eu dizia a mim mesmo ao vê -la: 'O
quê ! aquela pobre alma ainda viva!' ”
Irmã Emmerich manteve seu leito durante toda a Quaresma, sua alma a
maior parte do tempo em um estado de abstraçã o que era atribuı́do à
debilidade excessiva.
Na festa da Pá scoa foi, embora nã o sem grande esforço, à igreja
paroquial para receber a Sagrada Comunhã o, e continuou a fazê -lo até 2
de novembro de 1812, depois do qual nunca mais se levantou do leito
de dor. Em setembro, ela fez uma peregrinaçã o a um lugar chamado
“Hermitage”, nos arredores de Dü lmen, onde um agostiniano havia
morado e perto do qual havia uma pequena capela. Ela foi na esperança
de receber algum alı́vio para seus terrı́veis sofrimentos. Ela mal havia
chegado ao local quando caiu em ê xtase, tornando-se rı́gida e imó vel
como uma está tua. A jovem que a acompanhava foi tomada de susto e
chamou uma mulher por socorro; eles pensaram que ela havia
desmaiado e a trataram de acordo. Ao fazê -lo, descobriram em seu
peito uma cruz sangrenta que ela havia recebido na festa anterior de
Santo Agostinho, 28 de agosto, mas que ela mesma nunca tinha visto.
Quando ela acordou de seu ê xtase, ela estava tã o fraca que as duas
mulheres tiveram que ajudá -la a voltar para casa.
Em 29 de dezembro de 1812, a ilha da viú va Roters encontrou Anne
Catherine novamente em ê xtase, com os braços estendidos e o sangue
jorrando das palmas das mã os. A garota achou que era o efeito de um
acidente e chamou sua atençã o para isso quando ela voltou a
consciê ncia, mas a irmã Emmerich pediu sinceramente que ela nã o
falasse sobre isso. Em 31 de dezembro, quando o padre Limberg
recebeu sua Sagrada Comunhã o, ele viu pela primeira vez as marcas de
sangue nas costas de suas mã os.
“Eu dei a conhecer”, ele escreve em seu relató rio, “ao abade Lambert
que residia na mesma casa. Ele foi imediatamente ao quarto da irmã
Emmerich e, vendo o sangue ainda escorrendo, ele se dirigiu a ela:
'Irmã , você nã o deve se considerar uma Catarina de Sena!' Mas
enquanto as feridas sangravam até a noite, ele me disse no dia seguinte:
'Padre, ningué m deve saber disso! Deixe-o descansar entre nó s, caso
contrá rio, dará origem a conversas e aborrecimentos!' ”
O padre Limberg estava plenamente convencido da necessidade de tal
procedimento. Ele pensou mais em tratar o caso como de pouca
importâ ncia do que em buscar qualquer relaçã o entre ele e outras
coisas maravilhosas que ele sabia sobre a enferma, nem a questionou
sobre o assunto. A pró pria irmã Emmerich regozijou-se porque os dois
padres nã o prosseguiram com o caso e procurou esconder de todos os
olhos seus novos e crué is sofrimentos. O padre Limberg na é poca nã o
reduziu suas observaçõ es à escrita; mas em seu ordo ele fez as
seguintes entradas curtas:
“6 de janeiro, festa dos reis, vi pela primeira vez os estigmas nas palmas
de suas mã os.”
“11 de janeiro – ela se sentou em uma poltrona por volta das seis horas.
Ela estava em ê xtase por uma hora e meia.”
“15 de janeiro – ela se comunicou hoje. Das sete à s nove, rı́gido e imó vel
em ê xtase.”
“28 de janeiro – Desde o dia 15, ela está em ê xtase mais ou menos
prolongado. Hoje, vi as marcas das feridas nas solas dos pé s.
“Suas mã os e pé s sangram todas as sextas-feiras e a cruz dupla no peito
à s quartas-feiras. Desde que a existê ncia dessas feridas chegou ao meu
conhecimento, ela nã o comeu nada.
“Seu estado permaneceu secreto até 28 de fevereiro de 1813, quando
Clara Soentgen percebeu e me falou sobre isso.”
Como a Irmã Emmerich nunca mencionou seus estigmas, mas, pelo
contrá rio, os escondeu com ansiedade, podemos obter mais detalhes
sobre o assunto apenas no inqué rito o icial ao qual ela foi submetida e
em consequê ncia do qual seu estado logo foi noticiado no exterior.
Capítulo 17
INVESTIGAÇAO ECLESIASTICA . _ _ RELATORIO DE D EAN R
ENSING .
NCE Clara Soentgen havia penetrado no segredo da irmã Emmerich,
a notı́cia se espalhou por toda parte. Em meados de março de 1813,
era o assunto da cidade. Seu caso foi discutido livremente até
O mesmo na cervejaria pú blica e, como era de se esperar, logo chegou
aos ouvidos dos superiores eclesiá sticos de Mü nster. 1
Entre aqueles que participaram da discussã o mencionada acima
estava o Dr. William Wesener de Dü lmen, que agora pela primeira
vez ouviu falar dessas coisas, e que viu em todo o caso apenas a mais
grosseira superstiçã o; no entanto, resolveu visitar o enfermo para que
pudesse ser mais bem quali icado para julgar. Ele havia perdido a fé
enquanto estudava na Universidade; mas ele era um homem de uma
disposiçã o tã o correta e benevolente que a simples visã o do paciente
produzia nele uma impressã o profunda. Ele nã o sabia como explicar os
fatos singulares que testemunhou, mas, con iando em sua rara
ingenuidade, esperava descobrir em breve sua verdadeira causa.
Depois de algumas visitas, ele ofereceu seus serviços pro issionais, que
foram aceitos de boa vontade. 2 Apó s observaçã o atenta, chegou à
conclusã o de que todas as suspeitas de fraude deveria ser descartado,
embora houvesse, de fato, alguns fatos alé m de sua compreensã o que
nã o podiam ser negados nem ocultados. Ele consultou Dean Rensing, o
pá roco, o padre Limberg, e um mé dico chamado Krauthausen, sobre as
medidas a serem tomadas para instituir um procedimento a respeito
dos fenô menos. Enquanto esses senhores discutiam na residê ncia do
pastor o melhor meio de adotar, Deus Todo-Poderoso voltou a atençã o
da irmã Emmerich para eles, a im de prepará -la para o que viria a
seguir. O abade Lambert conversava com ela quando, de repente,
interrompendo-o, ela exclamou: “O que vai acontecer comigo? Eles
estã o realizando um conselho na Reitoria para me submeter a um
exame. Se nã o me engano, vejo meu confessor lá ”.
Pouco depois dessas palavras, Dean Rensing entrou no quarto dela e
anunciou que eles haviam decidido fazer uma investigaçã o. Na verdade,
ocorreu em 22 de março de 1813. Foi elaborado um relató rio do qual
daremos uma passagem: “No dorso de ambas as mã os há crostas de
sangue seco sob cada uma das quais há uma ferida, e nas palmas estã o
crostas menores semelhantes. A mesma coisa pode ser vista na parte
superior dos pé s e no meio das solas. As feridas sã o sensı́veis ao toque,
as do pé direito tinham acabado de sangrar. No lado direito, sobre a
quarta costela de baixo, há uma ferida de cerca de sete centı́metros de
comprimento que, diz-se, sangra ocasionalmente, e no esterno há
marcas redondas formando uma cruz bifurcada. Um pouco mais abaixo
está uma cruz comum formada por linhas, de meia polegada de
comprimento, que parecem arranhõ es. Na parte superior da testa
existem inú meras marcas como as picadas de uma agulha que correm
ao longo da tê mpora de volta ao cabelo. Em seu ichá rio de linho vimos
manchas de sangue.”
Apó s este exame, a irmã Emmerich disse ao reitor Rensing: “Ainda nã o
acabou. Alguns cavalheiros estã o vindo de Mü nster para examinar meu
caso. Um é um personagem distinto, que se parece com o bispo que me
con irmou em Coesfeld, e há outro homem bastante mais velho, com
alguns cabelos grisalhos.
Suas palavras foram con irmadas, pois no dia 28 de março (quarto
domingo da Quaresma) o Vigá rio Geral de Mü nster, Clement Auguste
von Droste-Vischering, entã o celebrado como Arcebispo de Colô nia,
chegou a Dü lmen acompanhado pelo venerá vel Deã o Overberg e um
conselheiro mé dico, Dr. von Druffel. Eles vieram com a intençã o de
examinar rigorosamente o caso da irmã Emmerich. No dia 25 de março,
o reitor Rensing dirigiu ao vigá rio-geral um relató rio o icial sobre o
caso do invá lido e encaminhou o depoimento do mé dico. Correu da
seguinte forma:
“Nobre Barã o,
“Muito Reverendı́ssimo Vigá rio Geral:
“Com o coraçã o profundamente tocado e cheio de sentimentos
religiosos, anuncio a você , como ao meu superior eclesiá stico, um fato
bem calculado para provar que Deus, sempre admirá vel em seus santos,
ainda opera neles mesmo em nossos dias de in idelidade, maravilhas
que mostram claramente o poder de nossa santa religiã o, que levam os
mais frı́volos a re letir, os mais incré dulos a se desviarem de seus erros.
O Senhor ainda escolhe os fracos para confundir os fortes, ainda revela
aos Seus pequeninos segredos escondidos dos grandes. Mantive até o
presente o caso em segredo, sendo assim solicitado, e també m pela
deferê ncia que julguei devida à alma favorecida. Eu temia, també m, os
aborrecimentos decorrentes de sua divulgaçã o. Mas agora que Deus
permitiu que o assunto fosse, por assim dizer, proclamado dos telhados,
considero meu dever fazer um relató rio o icial disso para você . Nã o vou
mais esconder o segredo do Rei.
“Anne Catherine Emmerich, irmã -coro do convento agostiniano
chamado Agnetenberg, agora suprimido, é a escolhida de Deus de quem
se questiona, e Clara Soentgen é a mestra deste lugar. Ela tomou o
há bito religioso no mesmo dia que Irmã Emmerich e com seus pais esta
residiu pouco antes de entrar no convento. Irmã Soentgen testemunha
que desde sua juventude Anne Catherine era extremamente piedosa,
praticando o conformismo à vontade de Deus à imitaçã o do nosso
Salvador Cruci icado. Ela esteve doente quase todos os dez anos de sua
vida conventual, de cama por semanas a io, e sofreu muito com o
desprezo dos outros religiosos que a consideravam uma visioná ria. Seu
tratamento nã o era, de fato, muito caridoso. Eles nã o gostavam dela
porque ela recebia a Sagrada Comunhã o vá rias vezes por semana,
falava com entusiasmo da felicidade que há no sofrimento, fazia muitas
boas obras de supererrogaçã o e assim se distinguia demais deles. As
vezes, també m, eles tinham motivos para suspeitar de visõ es e
revelaçõ es. Seu estado de debilidade continuou desde a supressã o de
seu convento. Ela está con inada à cama há alguns meses e nos ú ltimos
dois nã o tomou nenhum remé dio e nenhum outro alimento alé m de um
pouco de á gua fria com a qual por algum tempo foram misturadas
algumas gotas de vinho; mas nas ú ltimas trê s ou quatro semanas ela
dispensou o vinho. Se ela toma uma terça ou mesmo uma quarta parte
de vinho em á gua, para esconder o fato de que vive exclusivamente
dela, ela imediatamente a rejeita. Seus suores noturnos sã o tã o pesados
que sua roupa de cama está perfeitamente saturada. Ela é uma
testemunha viva da verdade das Sagradas Escrituras: 'Nã o só de pã o
vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca do Senhor'. Todas as
noites ela cai em um desmaio, ou melhor, em um ê xtase sagrado, que
dura dez horas ou mais, altura em que ela ica rı́gida e imó vel em
qualquer posiçã o que possa ter estado, seu rosto fresco e rosado como
o de uma criança. Se a colcha ou mesmo um travesseiro for erguido à
sua frente e furtivamente, se posso usar a expressã o, e um padre lhe dá
sua bê nçã o, ela imediatamente levanta a mã o, que até entã o estava
imó vel como a de uma está tua, e faz o Sinal da Cruz. Ela revelou ao seu
confessor, o padre Limberg, e també m a mim depois desses ê xtases,
segredos que ela poderia ter conhecido apenas sobrenaturalmente. Mas
o que a distingue ainda mais como a favorita especial do Cé u é a coroa
sangrenta em torno de sua testa, os estigmas de suas mã os, pé s e lado, e
as cruzes no peito dela. Essas feridas muitas vezes sangram, algumas à s
quartas-feiras, outras à s sextas-feiras, e tã o abundantemente que gotas
pesadas de sangue caem no chã o. Esse fenô meno gera muita conversa e
crı́tica; portanto, contratei os mé dicos deste lugar para fazer um exame
preliminar para que eu pudesse elaborar um relató rio. Esses
cavalheiros icaram muito afetados pelo que viram. O resultado de sua
investigaçã o está contido em uma declaraçã o assinada por eles, pelo
padre Limberg, pelo abade Lambert, um padre francê s, que reside na
mesma casa que o invá lido, e por mim.
“Desempenhei este dever como devo ao meu Superior Eclesiá stico de
fornecer as devidas informaçõ es em tã o singular ocorrê ncia, e peço que
me informem sobre o caminho a seguir, especialmente no caso de
falecimento desta notá vel pessoa. Ela teme muito a publicidade e
particularmente a intervençã o da autoridade civil. Espero que sua
in luê ncia seja capaz de evitar tal aborrecimento. Se Vossa Excelê ncia
desejar convencer-se da veracidade desta declaraçã o e do cará ter
sobrenatural de certas circunstâ ncias concomitantes, que julgo
prudente nã o colocar no papel, rogo-lhe que venha a Dü lmen com Dean
Overberg e honre minha casa com sua presença augusta.
“Eu preferiria fazer este relató rio pessoalmente; mas a doença de
alguns de meus paroquianos, instruçõ es catequé ticas para a Primeira
Comunhã o e outros assuntos me impedem de fazê -lo no momento.
Vossa Excelê ncia certamente me dispensará .
1 . O conde von Stolberg era famoso em sua é poca pela nobreza de sua
famı́lia, a alta posiçã o que ocupou sob o governo, seus grandes talentos
e aprendizado e suas inú meras produçõ es literá rias. Em 1800, estando
entã o em seu cinquentená rio, ele renunciou a todos os seus cargos de
honra, renunciou ao protestantismo e tornou-se com quase todos os
membros de sua famı́lia um cató lico fervoroso. Ele foi um nobre
campeã o da Fé na Alemanha e, com alguns outros de sua marca, deu
novo impulso à vida cató lica em todo o paı́s. Ele morreu em 1819. Entre
suas obras mais notá veis estã o as seguintes: Uma Traduçã o das Obras
de Santo Agostinho; A Verdadeira Religiã o; As Prá ticas da Igreja
Cató lica; Histó ria da Religiã o de Jesus Cristo (em 15 volumes); Histó ria
de Alfredo, o Grande; e Meditaçõ es sobre as Sagradas Escrituras.
(Herdeiro).
Capítulo 3
1 . Isaías 53:2-5.
2 . 1 Coríntios 1:27 .
Capítulo 17
1 . Como o venerá vel velho Abbé sofreu muito neste caso, achamos
apropriado dar aqui as seguintes cartas do Reitor Overberg ao Dr.
Wesener. Eles testemunham a caridade e solicitude com que o Deã o, o
sacerdote mais venerado do paı́s de Mü nster, se interessou pela Irmã
Emmerich e seu pequeno cı́rculo.
EU. “6 de setembro de 1818.
“Tenha a gentileza de me informar o quanto antes: 1) Quanto o abade
Lambert ainda deve ao farmacê utico; 2) Se a nossa querida Irmã ou o
Abade já pagou alguma coisa, e quanto; 3) Se a nossa Irmã ainda deve
alguma coisa ao farmacê utico, e quanto. Tentarei ajudá -los a quitar sua
dı́vida, pelo menos em parte. Saude cordialmente nossa querida Irmã
por mim, e assegure-lhe que escreverei em breve, DV, embora eu pre ira
ir vê -la, se Deus quiser me conceder o uso de meus membros. Eu icaria
muito satisfeito se você gentilmente me emprestasse novamente por
alguns meses seu diá rio do invá lido. Nã o escrevo ao abade sobre o
boticá rio, mas sobre o outro assunto. A posiçã o para escrever nã o
combina com meus membros, é muito cansativa; portanto, devo ser
breve. Que Deus esteja conosco!”
II. “13 de setembro de 1818.
“Tenho a honra de lhe enviar nã o apenas o 8º Thlr. 23 gr. da conta do
boticá rio, mas també m o que é devido pelos remé dios do abade, 25
Thlr. També m podemos contar entre os remé dios, o vinho ainda
necessá rio ou, pelo menos, muito desejá vel durante a convalescença.
Que a nossa Irmã empregue o que sobrar depois de pagar ao boticá rio
na compra de vinho ou qualquer outra coisa de que possa precisar, ou
vinho para o Abade até que ele possa voltar à sua cerveja. Nenhuma
pessoa doente ou pobre sofreu por eu lhe enviar esta soma, mas que ela
se lembre do doador em suas oraçõ es. Nã o sou eu. Vou nomeá -lo em
algum momento - e, no entanto, nã o há razã o para que você e ela nã o o
conheçam. E o prı́ncipe-bispo de Hildesheim a quem escrevi sobre o
projeto. Deixo a seu crité rio e de nossa irmã informar ao abade que há
algo reservado para lhe fornecer vinho. Se agradar a Deus curar meus
membros para que eu possa empreender uma viagem a Dü lmen, terei o
prazer de rever todos os meus queridos amigos. Que Deus esteja
conosco!
“PS Nenhum dinheiro deve ser devolvido, mesmo que nã o deva ser
gasto em vinho para o abade.”
Capítulo 38
1 . Relı́quias.
2 . O tribunal secreto mencionado acima.
3 . “Eu vejo, por causa desta escrita,” ela disse, “meus inimigos lutando;
eles se separam, eles estã o insatisfeitos. O Landrath está sozinho.”
4 . Essas almas apareceram para a Irmã Emmerich em um lugar para o
qual ela havia sido transportada em espı́rito. Ela poderia ajudá -los, pois
ainda estava viva. Peso e medida tiveram que ser observados, pois a
satisfaçã o deve ser proporcional à dı́vida. Dar a uma alma mais do que o
necessá rio é tirar de outra. Irmã Emmerich participa dos mé ritos dos
santos má rtires que adquiriram durante sua carreira mortal.
Capítulo 40
Copyright © 1974 por TAN Books, um selo da Saint Benedict Press, LLC.
Originalmente publicado por Fathers Rumble and Carty, Radio Replies Press, Inc., St. Paul, Minn.,
EUA
Completo e inacabado.
ISBN: 978-0-89555-096-5
Livros TAN
Uma impressã o da Saint Benedict Press, LLC
Charlotte, Carolina do Norte
2012
CONTEUDO _
Introdutó rio
A con iguraçã o
Nascimento de Jesus
Infâ ncia em Nazaré
Joã o Batista
Jesus inicia seu ministé rio
Viagem à Galilé ia
O Reino e os Apó stolos
Manifestaçõ es do Poder Divino
Falando em Pará bolas
Aumentando a popularidade
Morte de Joã o Batista
Milagres dos pã es
O pã o da vida
Pedro a Rocha
Formaçã o dos Doze
Visita a Jerusalé m
Confronto com os fariseus
Ministé rio Judeu
A Declaraçã o Suprema
Ressurreiçã o de Lá zaro
Ultimos dias missioná rios
Banquete em Betâ nia
Domingo de Ramos
Segunda Puri icaçã o do Templo
Dia de perguntas
Judas, o Traidor
A ú ltima Ceia
Prisã o e julgamento
Morte no Calvá rio
Ressuscitou e ainda vive
INTRODUÇÃO
Jesus Cristo, cujo primeiro nome signi ica “Salvador” e cujo segundo
nome signi ica “Ungido” ou “Consagrado”, nasceu, nã o quando nosso
calendá rio diz que Ele nasceu, mas cerca de seis anos antes.
Nosso calendá rio atual foi elaborado por Dionı́sio Exiguus no sé culo 6
dC, e agora sabemos que ele estava cerca de seis anos atrasado em seus
cá lculos.
O erro de Dionı́sio, é claro, nada tem a ver com o fato histó rico do
nascimento de Nosso Senhor. Signi ica apenas que o que pensá vamos
como, digamos, 1950 AD, era realmente mais como 1956 AD
Para os fatos reais sobre Cristo, dependemos principalmente dos
quatro evangelhos. Estes, no entanto, foram submetidos a um exame
exaustivo, como nenhum outro documento teve que passar, e sua
autenticidade como documentos está fora de disputa razoá vel.
Os autores estavam em condiçõ es de escrever uma histó ria
completamente boa. Se os documentos se referissem a um homem
comum, e tratassem apenas de declaraçõ es e eventos comuns, ningué m
sonharia em duvidar de sua con iabilidade.
E o que eles contê m que os incré dulos declaram incrı́vel; e isso,
somente quando os evangelhos mencionam coisas alé m do alcance da
experiê ncia humana normal. Quando tratam de tudo o que pertence à
esfera ordiná ria e natural, a pesquisa mostrou que sã o a pró pria
exatidã o, seja em relaçã o a pessoas, lugares ou coisas.
E puro preconceito contra qualquer revelaçã o religiosa de Deus, e
sobretudo contra a possibilidade de con irmar tal revelaçã o por meio
de milagres, que leva os homens a considerarem os evangelistas ou
como tendo perdido o juı́zo, ou como positivamente desonestos,
sempre que registrado como fato real qualquer coisa que tenha sabor
do sobrenatural ou milagroso. Esses incré dulos nã o abordaram os
evangelhos com mentes abertas, apesar de se gabarem de terem feito
exatamente isso.
Nã o há espaço neste pequeno livro para discutir sua posiçã o. Nem há
necessidade de fazê -lo. Será su iciente apresentar brevemente a vida de
Cristo conforme descrita nos evangelhos, necessariamente omitindo
muito para ins de condensaçã o, mas tendo o cuidado de que tudo o que
é dito permaneça estritamente iel aos fatos bá sicos registrados em
nossas fontes incontestá veis.
A CONFIGURAÇÃO
Jesus nasceu na pequena cidade de Belé m, na Palestina, um pequeno
paı́s de apenas 150 milhas de comprimento e de 50 a 80 milhas de
largura, na costa leste extrema do Mar Mediterrâ neo. A Palestina,
portanto, é apenas cerca de metade do tamanho do Estado de Indiana,
na Amé rica.
Leva o nome dos ilisteus, um povo pagã o que se estabeleceu na costa
deste paı́s mais ou menos na mesma é poca em que os hebreus ou povo
de Israel conquistaram a terra da montanha cerca de 1300 anos antes
do nascimento de Jesus.
Na é poca de Seu nascimento, o povo de Israel, chamado de judeus em
homenagem à principal tribo de Judá , havia sido conquistado pelos
romanos. E verdade que eles tinham um rei chamado Herodes, o
Grande; mas ele havia sido nomeado por Roma e estava sujeito ao
imperador romano.
Herodes, o grande, morreu em 4 aC, cerca de dois anos apó s o
nascimento de Jesus.
Entã o os romanos dividiram a Palestina em quatro partes. Um dos
ilhos de Herodes, Arquelau, deveria governar a Judé ia e Samaria, no
sul; outro, Philip, recebeu Iturea no Norte; um terceiro ilho, Herodes
Antipas, governou a Galilé ia no Centro-Oeste e a Peré ia no Sudeste;
enquanto Roma governava diretamente Decá polis, uma á rea a leste do
Jordã o.
Quando Jesus era um menino de cerca de doze anos, Arquelau foi
deposto pelos romanos por ser muito despó tico, e governadores
romanos foram nomeados para governar a Judé ia e Samaria.
Um desses governadores foi Pô ncio Pilatos, que esteve no comando de
26 d.C. até 36 d.C.
Foi sob Pô ncio Pilatos que Jesus deveria morrer.
Os judeus eram um povo religioso. Todas as naçõ es ao seu redor eram
pagã s, mas adoravam o ú nico Deus verdadeiro, observando
cuidadosamente as leis dadas a eles por Moisé s. O principal centro de
sua adoraçã o era o grande Templo em Jerusalé m, a capital da Judé ia.
Nas diferentes aldeias havia sinagogas ou locais de encontro para
oraçã o e leitura das Escrituras; mas o sacrifı́cio só podia ser oferecido a
Deus no ú nico Templo de Jerusalé m. Por causa disso, em grandes
festivais religiosos, milhares de judeus a luı́am para lá de todas as
partes da Palestina, e até mesmo de outros paı́ses de alé m-mar.
Entre os judeus havia vá rios partidos, dois dos quais sã o
frequentemente mencionados nos evangelhos, os fariseus e os
saduceus.
Os fariseus, ou “separados”, a irmavam observar a Lei mosaica
perfeitamente, muito melhor do que o restante dos judeus. Mas
enquanto eles eram mais exatos externamente, a maioria deles eram
orgulhosos e muito duros e nã o caridosos para com os outros. Nem
todos eram assim, é claro. Havia alguns homens realmente bons,
sinceros e santos entre eles.
Os Saduceus, ou “Descendentes de Sadoc” (“Sadoc” signi ica “Justiça”),
pertenciam à s classes mais ricas. Eles eram muito mundanos e, embora
nã o negassem que a Lei de Moisé s deveria ser observada, nã o eram
muito rı́gidos quanto a isso. Muitos deles negavam a existê ncia de uma
vida futura e outros ensinamentos ortodoxos. A maioria dos sacerdotes
judeus pertencia a esses saduceus.
Os judeus, em geral, nã o estavam muito contentes sob o domı́nio dos
romanos; e como sua religiã o os ensinou a olhar para frente em direçã o
a um Messias ou Salvador enviado por Deus, a maioria deles esperava
que Ele fosse um grande lı́der polı́tico e militar que derrotaria os
romanos e se tornaria a maior naçã o do mundo.
Tal era o cená rio na Palestina quando Jesus nasceu em Belé m.
NASCIMENTO DE JESUS
A maioria das biogra ias de pessoas começa com um relato de seu
nascimento e, talvez, de sua histó ria familiar. Mas enquanto a vida de
Jesus como nascido neste mundo começou em Belé m, nã o se pode dizer
que Ele começou a existir pessoalmente somente entã o. Antes da
Encarnaçã o, Ele sempre viveu no Cé u; e seria impossı́vel voltar ao inı́cio
de Sua vida ali, pois Ele é o Filho Eterno de Deus. Ser eterno é nã o ter
princı́pio algum! Mas esse aspecto de Sua vida nos levaria alé m da
histó ria registrada como o mundo a conhece.
O evangelho de Sã o Joã o, no entanto, nos diz que um dia Ele fez este
mundo, e de fato todo o universo, eras antes de Ele mesmo entrar nele;
e quando Ele veio ao nosso meio como Homem para nos redimir e nos
salvar, Ele nos disse que ainda pertencia ao Cé u; e sempre Ele falou
disso como só poderia falar quem está perfeitamente familiarizado com
tudo lá . Encontraremos muitas dessas declaraçõ es no curso de Sua vida
na terra dentro da estrutura da histó ria, o aspecto de Sua vida com o
qual este livro se ocupa.
Já dissemos que Herodes, o Grande, morreu no ano 4 aC, de acordo com
nosso calendá rio atual. Agora, cerca de trê s anos antes disso, vivia em
Nazaré , uma pequena cidade nas colinas da Galilé ia, uma jovem judia
chamada Maria. Na mesma cidade morava um carpinteiro chamado
José , a quem ela estava noiva, e a quem ela logo se ligaria nas
cerimô nias inais de casamento. Tanto Maria quanto José pertenciam à
tribo de Judá e eram descendentes do rei Davi, embora estivessem em
condiçõ es precá rias, assim como tantos outros da linhagem de Davi.
Um dia, enquanto Maria estava sozinha em oraçã o, Deus enviou-lhe o
anjo Gabriel com a tremenda notı́cia de que a grande esperança de
Israel inalmente se cumpriria e que ela seria a Mã e do Messias. “Salve,
cheia de graça, o Senhor é contigo”, disse o anjo, aparecendo diante
dela. “O Espı́rito Santo descerá sobre você s, e o poder do Altı́ssimo os
cobrirá com a sua sombra. Portanto, o Santo que de ti nascer será
chamado Filho de Deus”.
Maria respondeu: “Eis a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua
palavra”. E naquele momento Jesus foi milagrosamente concebido em
seu ventre. O Filho Divino, eternamente gerado do Divino Pai Celestial
sem mã e, deveria nascer em uma natureza humana de uma Mã e
humana sem a intervençã o de nenhum pai terreno.
Isso seria incrı́vel se fosse uma questã o de qualquer pessoa comum.
Mas Jesus, o Filho de Maria, nã o era uma pessoa comum. O estudo de
Seu cará ter e de Sua carreira subsequente neste mundo é su iciente
para mostrar isso, e que uma entrada milagrosa neste mundo é a coisa
mais adequada e natural a se esperar em Seu caso.
Nem temos apenas a palavra de Maria para o fato da concepçã o
milagrosa de Jesus. A verdade sobre isso foi revelada
independentemente a Joseph. “José , ilho de Davi”, disse-lhe també m
um anjo, “nã o temas receber Maria como tua esposa, pois foi pelo poder
do Espı́rito Santo que ela concebeu este ilho.
Assim, as formalidades do casamento foram cumpridas; e quando
chegou a hora dela. José levando-a para Belé m, ela deu à luz ali, na
aldeia conhecida como a cidade de Davi. Eles tinham ido para lá em
obediê ncia a um decreto de Cé sar Augusto, o imperador romano,
ordenando que todos se apresentassem naquele momento em suas
cidades natais para ins de censo.
A noti icaçã o divina da vinda do Messias já havia sido dada a Isabel,
prima de Maria; e agora que Ele tinha vindo, o fato foi revelado a um
pequeno grupo de pastores nas colinas pró ximas. Anjos apareceram a
eles, trazendo-lhes a notı́cia de que “hoje vos nasceu o Salvador”, e os
deliciando com seu adorá vel câ ntico de louvor e consolaçã o: “Gló ria a
Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade. ” Escusado
será dizer que os pastores foram imediatamente com grande alegria
visitá -lo.
Magi, ou sá bios do Oriente, també m vieram, sob orientaçã o celestial;
mas a chegada deles alarmou o velho rei Herodes, o Grande, que estava
meio louco com suspeitas de possı́veis rivais em seus ú ltimos dias
perturbados. Por precauçã o, ele ordenou o assassinato de todas as
crianças do sexo masculino com menos de dois anos de idade em Belé m
e arredores. Mas José havia sido divinamente avisado para levar o
Menino e sua Mã e ao Egito, a im de escapar da matança.
INFÂNCIA NA NAZARETE
Apó s a morte de Herodes em 4 aC, a pequena famı́lia retornou. Joseph
pretendia se estabelecer em Belé m; mas como o brutal Arquelau, um
dos ilhos de Herodes, havia sido nomeado governador da Judé ia, achou
mais sá bio voltar para Nazaré , na Galilé ia, que estava sob o controle de
outro ilho de Herodes, Herodes Antipas.
Em Nazaré , Jesus foi criado como uma criança judia piedosa e Ele era a
ú nica criança. Os chamados “irmã os e irmã s” nos evangelhos eram, no
má ximo, primos. Era costume entre os judeus chamar quaisquer
parentes dentro da mesma tribo de “irmã os”.
A partir dos seis ou sete anos, as crianças frequentavam a sinagoga
local onde aprendiam sua religiã o e outras maté rias comuns, leitura,
escrita e aritmé tica simples. Jesus tornou-se profundamente versado
tanto nas tradiçõ es judaicas quanto nas Escrituras. Em Seus discursos
posteriores, encontram-se citaçõ es de muitos livros do Antigo
Testamento. Devido à presença de tantos gentios na Galilé ia, Ele quase
certamente teria aprendido a falar grego; mas as idé ias ilosó icas e
religiosas gregas nã o contribuı́ram de forma alguma para Sua educaçã o.
Nã o há vestı́gios deles em Suas declaraçõ es posteriores.
Da pura bondade e virtude que reinavam naquela pequena casa de
Nazaré , nã o há necessidade de falar. Lá , Sã o Lucas nos diz: “Jesus
crescia em sabedoria e graça com Deus e os homens”.
Apenas um incidente nos é dado a respeito da infâ ncia de Jesus em
Nazaré . Todos os anos, José e Maria costumavam fazer a viagem de
oitenta milhas a Jerusalé m para a Festa da Pá scoa, uma grande festa
religiosa como a nossa Pá scoa, celebrando o “ê xodo” ou a libertaçã o dos
judeus por Moisé s da escravidã o no Egito por volta de 1300 aC
As crianças podiam assistir à s cerimô nias a partir dos doze anos; e nos
é dito que naquela idade Jesus foi com José e Maria a Jerusalé m para a
festa. Lá Ele se separou deles na imensa multidã o, e eles O procuraram
por trê s dias antes de encontrá -Lo no Templo discutindo religiã o com
os mestres judeus, a quem Ele havia surpreendido ao manifestar uma
compreensã o das Escrituras muito maior do que era natural para
qualquer um. menino de doze anos. E ainda mais caracteristicamente
sobrenatural, se alguma coisa, foi a maneira pela qual Ele falou com Sua
Mã e quando ela O encontrou.
Ela exclamou: “Meu ilho, por que você se comportou assim, causando a
seu pai e a mim tanta ansiedade em procurá -lo?” Ao que Ele respondeu:
“Que necessidade você teve de me procurar? Você nã o sabia que eu
deveria estar na casa de meu Pai?” Como o Filho Eterno de Deus que
veio a este mundo, Ele enfatizou que Seu dever para com Seu Pai
celestial estava acima de todas as lealdades menores; e essas primeiras
palavras registradas de Jesus eram uma declaraçã o velada de Sua
Divindade, cujas implicaçõ es nem mesmo José e Maria haviam
compreendido completamente.
Ele imediatamente desceu a Nazaré com eles, no entanto, e foi sujeito a
eles.
Dos dezoito anos seguintes, nada nos é dito, exceto que Ele seguiu o
ofı́cio de José , de modo que foi mencionado como “o carpinteiro, ilho
de Maria”. Em algum momento durante esses dezoito anos José morreu
e Jesus trabalhou, dando um pouco para prover o futuro de Sua Mã e
contra o tempo em que Ele mesmo teria que deixá -la.
JOÃO BATISTA
Quando Jesus tinha cerca de trinta anos, no 15º ano do reinado do
imperador romano, Tibé rio Cé sar, um profeta que vivia como um
eremita no deserto chegou ao rio Jordã o algumas milhas a leste de
Jerusalé m e ao norte do Mar Morto. . Ali começou a pregar ao povo,
batizando nas á guas do rio todos os que converteu.
Ele era conhecido como Joã o Batista, ilho de Zacarias e de Isabel,
parente de Maria, e, portanto, era parente do pró prio Jesus.
Nã o sabemos nada de Joã o entre seu nascimento e seu sú bito
aparecimento nas margens do Jordã o. Seu pai, no entanto, havia lhe
contado sobre a revelaçã o em seu nascimento de que ele deveria
preparar o caminho do Senhor.
Naquela é poca, havia grande excitaçã o entre os judeus. Todos estavam
falando sobre o Messias prometido; e, embora os lı́deres nã o tomassem
conhecimento de John, as pessoas comuns icaram profundamente
impressionadas com ele. Multidõ es cada vez maiores se aglomeravam
para ouvi-lo, e ele fez o má ximo para trazê -los a um arrependimento
sincero de seus pecados. Ele exigia humildade em vez de orgulho,
bondade genuı́na em vez de conversa vazia sobre isso; e nã o poupou a
hipocrisia dos escribas e fariseus.
Constantemente ele tinha que responder a perguntas que as pessoas
faziam sobre si mesmo. Ele era o profeta? Ele era o Cristo, o Messias?
Ele era o Grande, prometido antigamente? Mas para todos eles John
disse que nã o, ele nã o era. Ele se descreveu como apenas uma voz
clamando no deserto. O Messias estava para vir, e muito em breve. Ele,
Joã o, era apenas um pobre mensageiro, preparando o caminho para ele.
VIAGEM À GALILÉIA
Trê s dias depois, Jesus partiu para a Galileia, levando consigo os seus
novos discı́pulos, todos galileus.
No caminho, chegaram à aldeia de Caná . Eles chegaram a tempo para
uma festa de casamento para a qual Ele e Seus discı́pulos haviam sido
convidados; e ali encontrou Sua Mã e, que també m fora convidada, e que
viera de Nazaré , a quatro milhas de distâ ncia, para estar presente.
Foi ali, a pedido de Sua Mã e, que Ele realizou Seu primeiro milagre,
depois de declarar que ainda nã o havia chegado o momento de tais
manifestaçõ es de Seu poder divino. Mas o vinho acabou, e Sua Mã e
estava preocupada com o constrangimento que isso seria para seus
an itriõ es. Para agradar Sua Mã e, entã o, e poupá -los do embaraço, Ele
transformou a á gua em um suprimento abundante de vinho. Apenas
uma semana atrá s, Ele se recusou a transformar pedras em pã o. Aqui,
poré m, nã o se tratava de satisfazer Sua pró pria fome, mas de suprir as
necessidades dos outros.
De Caná Ele foi para Cafarnaum, entã o uma pró spera vila nas margens
do lago da Galilé ia.
Cafarnaum se tornaria o centro de Sua obra na Galilé ia, mas desta vez
Ele nã o icou muito tempo. Quase uma semana depois Ele estava em
Jerusalé m, tendo viajado oitenta milhas para estar presente na Cidade
Santa para a festa da Pá scoa.
Ali, indignado com a profanaçã o do Templo pelo comé rcio que
acontecia dentro de seu recinto, Ele deu a primeira demonstraçã o de
Sua autoridade profé tica em pú blico, açoitando os mercadores e todos
os animais para fora do local com um chicote e derrubando o mesas dos
cambistas. “Está escrito: Minha Casa é uma Casa de Oraçã o”, disse Ele,
“mas você a transformou em um covil de ladrõ es”.
Os escribas e fariseus e sacerdotes icaram muito zangados com isso e
se aglomeraram em volta Dele, exigindo que direito Ele tinha de agir
dessa maneira. Ele nã o fez nenhum milagre entã o para justi icar Sua
autoridade divina, mas apenas disse: “Destrua este templo, e em trê s
dias eu o levantarei novamente”. Ele estava se referindo ao templo de
Seu corpo, sabendo que eventualmente eles O matariam, mas que no
terceiro dia depois disso Ele ressuscitaria dos mortos. Por enquanto, no
entanto, Ele os deixou para descobrir por si mesmos.
Um dos fariseus, membro do Siné drio ou Conselho dos Judeus, um
homem chamado Nicodemos, icou profundamente impressionado com
a majestade e o poder de Jesus. Entã o ele veio a Ele à noite, temendo
fazê -lo abertamente, querendo saber exatamente que novo
ensinamento Ele tinha para dar.
Jesus explicou-lhe que o reino messiâ nico nã o deveria ter poder polı́tico
e mundano. Era para ser um governo de Deus dentro das almas elevado
a um plano de vida mais alto do que qualquer pai terreno poderia dar.
Esta nova vida exigiria um novo nascimento pela á gua e pelo Espı́rito
Santo. Jesus falou aqui do novo, maior e sacramental rito do batismo
que Joã o Batista disse que superaria em muito o seu pró prio e seria
pró prio do Messias.
A pró pria ideia de tal renascimento batismal estava muito alé m de
Nicodemos e ele admitiu francamente. Jesus, portanto, disse a ele: “Se
você nã o pode entender que o Espı́rito de Deus é necessá rio para dar
uma vida espiritual, como você pode entender misté rios celestiais
ainda mais profundos? Mas pelo menos acredite em Mim quando eu lhe
contar sobre eles. Estou falando do que sei, pois vim do cé u, assim
como ainda estou no cé u. Nenhum outro homem na terra pode falar
deles por experiê ncia pessoal, pois nenhum homem foi ao cé u e voltou
para poder fazê -lo”. E Ele continuou: “Deus amou o mundo de tal
maneira que deu Seu Filho unigê nito; e ele deve ser levantado como
Moisé s levantou a serpente no deserto, para que todos os que olham
para ele sejam salvos”.
Nicodemos foi embora pensativo e profundamente comovido; e nã o
havia dú vida de que eventualmente ele també m se tornaria um
discı́pulo. De fato, foi ele quem, apó s a cruci icaçã o, ajudou José de
Arimaté ia a providenciar um sepultamento honroso para o corpo de
Cristo, e ele tem sido reverenciado pela Igreja atravé s dos tempos como
Sã o Nicodemos.
A hostilidade amarga dos escribas e fariseus em geral, no entanto,
deixou bem claro que a mensagem de Jesus nã o tinha chance de
aceitaçã o em Jerusalé m; mas pelo menos havia se oferecido à s
autoridades judaicas ali como o Messias. Agora Ele se retirou da Cidade
Santa, dedicando-se a pregar e curar os enfermos entre os camponeses
da Judé ia.
Depois de alguns meses, veio a triste notı́cia de que Joã o Batista havia
sido lançado na prisã o por Herodes Antipas, que se irritou com a
denú ncia de Joã o sobre sua imoralidade. Isso signi icou o im da missã o
do Precursor, e Jesus imediatamente começou com seriedade Sua
pró pria grande obra de vida.
Levando consigo os discı́pulos, partiu para a Galilé ia, passando no
caminho por Samaria.
Ele pregou a chegada real do Reino de Deus, exortando as pessoas a se
arrependerem de seus pecados e aceitarem as boas novas ou o
evangelho que lhes é oferecido do cé u.
Geralmente em Seus discursos Ele silenciava sobre Sua pró pria
messianidade por causa da prevalê ncia de tantas idé ias erradas sobre a
vinda de um lı́der polı́tico para fazer dos judeus a maior naçã o da terra.
Para os samaritanos, no entanto, que nã o foram tã o profundamente
afetados por essas noçõ es como os judeus, Ele falou claramente. Assim,
no poço de Jacó , Ele respondeu: “Eu sou Ele” à mulher de Samaria que
havia mencionado o Messias que Deus havia prometido enviar. Em
outros lugares, Ele se chamava, como regra, o “Filho do Homem”; mas
Ele sempre falou como profeta e mestre de maravilhosa autoridade,
demonstrada igualmente em Suas palavras e obras.
Em sua jornada pela Galilé ia, parou em Caná , onde havia realizado o
milagre da á gua transformada em vinho, e enquanto estava lá , um dos
o iciais do rei Herodes veio a ele de Cafarnaum, a vinte milhas de
distâ ncia, implorando-lhe que viesse e salvasse seu ilho moribundo. .
Jesus disse-lhe simplesmente para nã o se preocupar porque o menino
estava curado. A caminho de casa, recebido por servos que correram
para lhe dar a boa notı́cia de que o menino havia se recuperado
repentinamente, o o icial perguntou quando, apenas para ser
informado de que era exatamente à s 13h, exatamente o horá rio em que
Jesus havia falado com ele. . Ele e toda a sua famı́lia, portanto,
acreditavam nas reivindicaçõ es de Jesus.
O REINO E OS APÓSTOLOS
Sã o Lucas nos diz que Jesus, tendo “voltado no poder do Espı́rito para a
Galilé ia, sua fama se espalhou por todo o paı́s. E ensinava nas suas
sinagogas e por todos era engrandecido. E chegou a Nazaré , onde fora
criado”.
Aqui particularmente foi veri icada a declaraçã o no evangelho de Sã o
Joã o de que “Ele veio para os seus, e os seus nã o o receberam”. Sua
a irmaçã o na sinagoga de Nazaré de ser Aquele cujo advento havia sido
predito pelo profeta Isaı́as foi rejeitada com a observaçã o desdenhosa
de que Ele era apenas o ilho de José , o carpinteiro; e exclamando
tristemente que “nenhum profeta é aceito em seu pró prio paı́s”, Ele
desceu a Cafarnaum à beira do lago, tornando aquela cidade sede para
Seu ministé rio galileu.
No primeiro sá bado apó s Sua chegada a Cafarnaum, Ele falou na
sinagoga e teve uma recepçã o muito diferente daquela que Lhe foi dada
em Nazaré . O povo estava entusiasmado com Seus ensinamentos,
sentindo uma autoridade divina em Suas palavras muito alé m de
qualquer coisa que tivessem experimentado nas dos escribas e fariseus.
Alé m disso, no inal de seu discurso, Jesus com uma palavra expulsou o
espı́rito maligno de um homem possuı́do para que as pessoas,
maravilhadas, espalhassem por toda parte a histó ria do incidente.
Saindo da sinagoga para a casa de Pedro e André , lá encontrou a mã e da
esposa de Pedro doente com febre, mas logo a curou e ela preparou
uma refeiçã o para todos eles.
Naquela noite, multidõ es de pessoas doentes foram trazidas a Ele e Ele
curou suas doenças, trabalhando até tarde da noite; ainda assim,
cansado como devia estar, Ele se levantou antes do amanhecer e foi
para um lugar solitá rio nas colinas para orar, um há bito seu durante
toda a vida.
De Cafarnaum Ele fez muitas viagens de pregaçã o pela Galilé ia, obtendo
sucesso cada vez maior.
Ele veio, poré m, para estabelecer um Reino, como Ele mesmo havia
declarado, dizendo: “Devo pregar o Reino de Deus, pois para isso sou
enviado”. Embora este Reino nã o fosse do mundo, era para ser neste
mundo e durar até o im dos tempos, muito depois que Ele pró prio
tivesse retornado ao Cé u de onde Ele veio. Para a fundaçã o deste Reino
Ele deveria escolher entre Seus discı́pulos doze homens que Ele
treinaria pessoalmente antes de enviá -los para continuar Sua obra.
Uma noite, portanto, em preparaçã o para isso, Ele foi sozinho para as
montanhas e orou durante toda a noite. Na manhã seguinte, Ele reuniu
Seus discı́pulos e escolheu os doze, conferindo-lhes o tı́tulo de
Apó stolos.
Os escolhidos foram Simã o Pedro; André ; James; John; Philip; Natanael,
també m conhecido como Bartolomeu; Mateus; Tomá s; Tiago, ilho de
Alfeu; Simã o Zelotes; Jude, o irmã o de James; e Judas Iscariotes, que
eventualmente O trairia.
Este foi um dos maiores eventos da histó ria, o inı́cio da Igreja como o
Reino de Deus na terra. E foi seguido por uma das declaraçõ es mais
importantes que já saı́ram de lá bios humanos. Pois imediatamente
depois, com Seus apó stolos recé m-escolhidos sobre Ele, Ele deu ao
povo o grande discurso conhecido como o “Sermã o da Montanha”.
Assim, Jesus, que veio, como disse, nã o para destruir a Lei e os Profetas,
mas para inaugurar seu perfeito cumprimento, lançou os fundamentos
do “Reino de Deus” ou do “Reino dos Cé us” (Ele falou disso em ambos
os maneiras) que Ele chamou de Sua Igreja.
FALANDO EM PARÁBOLAS
Com os Doze, Jesus viajou pelas cidades e vilas da Galilé ia, pregando
por toda parte o Reino de Deus.
Grande parte de Seus ensinamentos Ele deu na forma de pará bolas ou
histó rias, de acordo com os costumes judaicos da é poca. E todos os
tipos de assuntos foram tratados dessa maneira.
Nã o é possı́vel discutir detalhadamente todas as pará bolas neste
pequeno livro, nem tratá -las na ordem em que foram dadas. Podemos
apenas tocar brevemente em alguns dos muitos aspectos de Seu ensino
dado em diferentes momentos por esse meio, referindo os leitores aos
pró prios evangelhos para um estudo mais extenso deles.
Na pará bola do “Semeador e da Semente” ( Marcos 4:1-20), Ele advertiu
Seus ouvintes que, se Seu ensino nã o despertasse nenhuma resposta
dentro deles, a culpa estaria em suas pró prias má s disposiçõ es.
De tais má s disposiçõ es devem arrepender-se, con iantes de que Deus,
de Sua parte, os acolherá com in inita misericó rdia. Um “Pastor em
busca de uma ovelha perdida”, uma “Mulher em busca de uma moeda
perdida”, um “Pai” regozijando-se com o retorno de um “Filho Pró digo”
( Lucas 15:1-32), sã o apenas imagens fracas da atitude de Deus para
com as almas. arrependendo-se dos pecados que os separam dEle.
Pense, Ele implorou, no que está em jogo. Nã o é menos que o “Reino
dos Cé us”, para o qual nenhum sacrifı́cio é grande demais; assim como
um homem venderá tudo para comprar um “Campo contendo um
Tesouro enterrado”, ou um comerciante para ganhar uma “Pé rola de
Grande Valor”. ( Mateus 13:44-46).
Esse Reino dos Cé us é trazido ao seu alcance por Sua Igreja, pequena
agora como uma “semente de mostarda”, mas para crescer em uma
á rvore imensa e espalhada que oferece abrigo para todos os que
buscam descanso nele. ( Mateus 13:31-32). Surgirã o escâ ndalos, sim;
pois a Igreja estará em um mundo como um “Campo semeado com Bom
Grã o”, mas que os inimigos irã o semear com “berbigã o ou joio”. Será
como uma “rede segurando bons e maus peixes”. ( Mateus 13:24-50).
No entanto, nã o há nada de errado com a “Net”, e a Igreja é de fato o
Reino dos Cé us na terra.
Infelizmente, poré m, Jesus advertiu os judeus de que seus lı́deres
o iciais e sua naçã o como um todo rejeitariam a graça oferecida a eles,
pois os “convidados” davam todos os tipos de desculpas para se
recusarem a participar da “Grande Ceia”. ( Lucas 14:17-24). Eles
acabariam por matá -lo, pois os “lavradores ı́mpios” da vinha
planejavam matar o pró prio ilho do proprietá rio. ( Marcos 12:1-12).
Daqueles que vê m ao Reino, apesar dessa rejeiçã o nacional, muito será
esperado.
Eles devem ser os inimigos do pecado, certi icando-se de que estã o
vestidos com o “Vestuá rio nupcial” da graça divina. ( Mateus 22:11-14).
Como o “fermento” transforma o pã o, essa graça transformará suas
almas. ( Lucas 13:21).
Mas eles devem cooperar generosamente com esta graça, fazendo bom
uso de todos os “Talentos” que Deus lhes deu. ( Mateus 25:14-30).
Acima de tudo, a caridade será exigida deles; perdoar os outros, em vez
de se comportar como o “Servo Inclemente” ( Mateus 18:23-35); aliviar
as necessidades dos pobres, nã o imitando a atitude do egoı́sta “Rico”
para com “Lá zaro, o Mendigo” ( Lc 16,19-31); ser um “Bom Samaritano”
para todos os a litos, de qualquer tipo que seja. ( Lucas 10:25-37).
Tampouco deve ser dado qualquer quarto ao orgulho do “fariseu” que
se considerava um modelo de virtude em comparaçã o com o “pú blico”. (
Lucas 18:9-14).
Certamente eles deveriam ser tã o zelosos na preparaçã o para seu
destino eterno quanto o “mordomo injusto” ao olhar para seu futuro
meramente temporal ( Lucas 18:1-8), e em tomar todo cuidado para
evitar o destino que atingiu o “Rico Louco”. .” ( Lucas 12:13-21).
Deve-se sempre ter em mente o fato de que certamente haverá um Juı́zo
Final, quando os bons e os ı́mpios serã o divididos como as “ovelhas e os
bodes” ( Mateus 25:31-46); e que é essencial nã o ser encontrado entã o
como as “Virgens Tolas” que foram pegas de surpresa apenas para nã o
encontrar ó leo em suas lâ mpadas. ( Mateus 25:1-13).
AUMENTANDO A POPULARIDADE
Por quase um ano Jesus vinha ensinando, poderoso em palavras e
obras, por toda a Galilé ia, Sua popularidade aumentando diariamente.
Mais e mais difundida tornou-se a convicçã o de que Ele era de fato um
grande profeta, e talvez até o Messias. Mas as pessoas logo aprenderiam
que Ele de initivamente nã o era o tipo de Messias que eles esperavam.
O quanto Ele estava trabalhando neste momento pode ser deduzido dos
seguintes incidentes tı́picos.
Um dia, perto de Cafarnaum, Ele estava explicando Sua doutrina e
persuadindo o povo quase desde a luz do dia até o anoitecer; e, ao cair
da tarde, vendo quã o grande se tornara a multidã o cada vez maior,
pediu aos discı́pulos que O levassem de barco atravé s do lago.
Durante a viagem, uma forte tempestade surgiu de repente, as ondas
ameaçando inundar o pequeno navio, e os discı́pulos icaram
completamente assustados. Jesus, cansado, estava dormindo na popa
do navio, entã o eles o acordaram, dizendo: “Mestre, nã o é para ti que
pereçamos?” Jesus respondeu: “Por que você está com medo? Sua fé
ainda é tã o fraca?” Entã o Ele ordenou que o vento parasse e o mar
icasse quieto, ambos obedecendo imediatamente, de modo que uma
grande calmaria prevaleceu imediatamente. Apesar de todos os
milagres anteriores que eles testemunharam, os discı́pulos mal podiam
acreditar em seus sentidos e disseram uns aos outros: “Quem Ele pode
ser? Até os ventos e o mar lhe obedecem!”
Ao raiar do dia chegaram à margem oposta do lago, no que era
conhecido à s vezes como o paı́s dos gerasenos, à s vezes como o dos
gadarenos. Perto de onde eles desembarcaram havia um velho
cemité rio, e imediatamente um pobre luná tico possuı́do por demô nios
correu em direçã o a eles de entre as tumbas. Endireitando-se para
Jesus, prostrou-se aos Seus pé s, clamando: “Por que me atrapalhas,
Jesus, Filho do Deus Altı́ssimo? Eu imploro que nã o me atormente.” O
pobre homem nã o era responsá vel pelo que estava dizendo. Os
demô nios o impeliam a falar como falava; e Jesus os expulsou do
homem para uma manada de porcos que pastavam na encosta da
montanha. Estes, cheios de frenesi, atiraram-se encosta abaixo no mar e
se afogaram.
Os homens que estavam cuidando dos animais correram para contar
aos outros o que havia acontecido, e logo muitos dos camponeses do
distrito vieram e imploraram a Jesus que deixasse suas costas; eles
estavam com tanto medo do que Ele poderia fazer em seguida!
Para os discı́pulos, no entanto, a liçã o foi de grande signi icado. Agindo
como só Deus poderia fazer, Ele operou milagres como nunca se ouviu
falar “desde o princı́pio do mundo”, provando Seu domı́nio sobre toda a
criaçã o, nã o apenas sobre coisas inanimadas, nã o apenas sobre os
mundos vegetativo e animal, mas sobre aqueles espı́ritos malignos
també m de cujo poder Ele veio para libertar a humanidade.
Voltando ao barco, eles atravessaram o Lago mais uma vez. Era plena
luz do dia e, como o povo de Cafarnaum podia facilmente vê -los
chegando, uma grande multidã o se reuniu para recebê -los.
Entre aqueles que esperavam ansiosamente para ver Jesus e conversar
com Ele estava um funcioná rio da sinagoga chamado Jairo. Assim que
Jesus desembarcou, portanto, ele implorou que Ele viesse e curasse sua
ilha moribunda. Jesus partiu com ele para a casa, as pessoas se
aglomerando ao redor deles.
Uma mulher na multidã o, sofrendo de uma doença de doze anos,
aproximou-se dele, tocou a orla de Sua veste e foi instantaneamente
curada. Divinamente consciente disso, Jesus proclamou para o bem de
todos os presentes o fato de sua cura e que era seu grande espı́rito de fé
que lhe havia conquistado tã o maravilhoso favor. Era uma fé que Ele
estava pedindo a todos eles.
Houve algum atraso, e antes que chegassem à casa de Jairo, um servo
veio dizer que sua ilha havia morrido e que agora era inú til Jesus ir
mais longe. Mas Jesus consolou o pobre pai, disse-lhe que ainda
acreditasse irmemente, e que tudo icaria bem.
Na casa, Ele permitiu que apenas Pedro, Tiago e Joã o, junto com o pai e
a mã e, entrassem com Ele no quarto da menina morta. Na presença
deles, Ele simplesmente pegou a mã o dela e disse: “Talitha cumi”.
(“Menina, levante-se.”) Entã o ele pediu aos pais que providenciassem
para que ela comesse alguma coisa, acrescentando que eles nã o
deveriam divulgar a notı́cia do que Ele havia feito. A excitaçã o da
multidã o entusiasmada do lado de fora poderia facilmente dar origem a
acusaçõ es contra Ele de causar um tumulto. Tais acusaçõ es viriam em
breve!
Assim, Jesus se entregou a todos que precisavam Dele, e nã o apenas
pregou o evangelho de Seu novo Reino espiritual, con irmando Sua
missã o por meio de sinais e milagres em aldeia apó s aldeia em todo o
paı́s, mas també m deu autoridade e poder a Seus apó stolos, enviando-
os em dois para fazer o mesmo.
PEDRO A ROCHA
Jesus e os Apó stolos, tendo deixado o territó rio de Herodes Antipas,
passaram alguns meses viajando pela Fenı́cia e Decá polis, chegando
inalmente a Cesaré ia de Filipe, em uma das nascentes do Jordã o, alé m
da fronteira norte da Galilé ia. Ali aconteceu um evento da maior
importâ ncia para Sua Igreja.
O pró prio nome “Cesarea” e “Philippi” indicava o domı́nio de Roma e da
Gré cia. Eram sı́mbolos excluindo todos os sonhos de um reino nacional
judaico. E ali, naquele lugar deprimente em relaçã o à s esperanças
judaicas de supremacia polı́tica, Jesus fez uma pergunta direta aos doze
sobre Si mesmo. “O que”, Ele lhes perguntou, “as pessoas pensam de
Mim?”
Todos começaram a falar ao mesmo tempo. “Alguns dizem que você é
Joã o Batista, volte à vida novamente; outros dizem que nã o, mas que Tu
é s Elias ou Jeremias”.
“E você mesmo, o que acha?”
Pedro falou instantaneamente: “Tu é s o Cristo, o Messias, o Filho do
Deus vivo”.
Era uma declaraçã o clara de sua divindade entre todas as areias
movediças de opiniõ es vagas.
“Se você sabe disso”, disse Jesus a ele, “nã o é porque você pensou nisso
por si mesmo, mas porque meu Pai no cé u revelou a você . E agora, por
minha vez, digo-vos: Tu é s Pedro, a rocha, como te chamei quando
mudei o teu nome de Simã o; e sobre esta pedra edi icarei a Minha
Igreja. As forças do mal nunca prevalecerã o contra ela. E eu te darei as
chaves do Reino dos Cé us”.
Nã o era su iciente, poré m, que os doze conhecessem o fato de que Ele
era o Messias. Eles ainda tinham muito a aprender sobre a natureza de
Sua missã o. Entã o Jesus continuou explicando a eles que Ele deveria
subir a Jerusalé m, para ser ali rejeitado, torturado e morto por Seu
pró prio povo; que somente assim Ele poderia redimi-los; mas que no
terceiro dia Ele ressuscitaria.
O choque desta declaraçã o foi tã o grande que as ú ltimas palavras foram
completamente esquecidas; e Pedro, incapaz de se reconciliar com tal
tratamento de Seu adorado Mestre, exclamou impulsivamente: “Deus
me livre. Nada disso deve acontecer com você .”
Mas Jesus lhe disse que tentar impedi-lo seria fazer o papel de Sataná s.
“Você quer que Eu”, disse Ele, “desvie da mesma coisa que vim fazer
neste mundo! Você está pensando como os homens pensam, e nã o
vendo as coisas como Deus as vê . Nã o é auto-interesse, mas auto-
sacrifı́cio é exigido de Mim. E se algué m quiser vir apó s mim, ele
també m deve negar a si mesmo, tomar sua cruz e seguir-me”.
VISITA A JERUSALÉM
Assim as instruçõ es continuaram, entre os vá rios deveres do ministé rio,
até que em outubro daquele ano a Festa dos Taberná culos, uma espé cie
de Festa da Colheita, estava pró xima. Muitos estavam acostumados a
subir a Jerusalé m para as festividades, e Jesus decidiu ir també m.
Depois Ele pretendia trabalhar na Judé ia e nã o na Galilé ia.
Depois de Sua jornada pela Fenı́cia e Decá polis, Ele havia retornado
para uma breve estadia em Cafarnaum. Partindo dali pela estrada em
direçã o a Nazaré , Ele chegou à s alturas de Magdala e parou naquele
ponto de vista para dar uma ú ltima olhada no Mar da Galilé ia e nas
cidades ao longo de sua costa norte. Triste de coraçã o, Ele censurou as
cidades por sua resistê ncia à graça divina, dizendo: “Ai de você ,
Corozain; ai de ti, Betsaida; ai de ti, Cafarnaum. Se os milagres feitos em
você tivessem sido feitos em Tiro e Sidom, eles teriam se arrependido.
Se eles tivessem sido feitos mesmo em Sodoma, aquele lugar teria sido
poupado. No dia do julgamento será mais fá cil com essas cidades
perversas do que com você s”. Entã o ele se virou e voltou seu rosto
resolutamente para Jerusalé m.
Sua viagem o levou atravé s de Samaria, e em uma aldeia, para a qual
Tiago e Joã o tinham ido na frente para preparar alojamento, foi-lhes
recusada a hospitalidade com o fundamento de que o grupo estava
viajando para a Jerusalé m tã o odiada pelos samaritanos. Os dois
apó stolos voltaram a Jesus cheios de indignaçã o e quiseram lançar fogo
sobre a cidade, como Elias havia feito contra os aldeõ es insolentes. Mas
Jesus os repreendeu discretamente, dizendo-lhes que certamente ainda
nã o tinham o espı́rito certo. Uma coisa era Ele mesmo declarar qual
seria o justo julgamento de Deus sobre as cidades da Galilé ia que
haviam recusado a graça divina; mas nã o cabia a eles invocar desastres
sobre os aldeõ es que simplesmente haviam recusado hospitalidade a
estranhos. Pacientemente, portanto, Ele foi com eles para outra aldeia.
Chegando nas proximidades de Jerusalé m, Jesus icou na pequena
cidade de Betâ nia, a apenas cerca de trê s quilô metros da Cidade Santa.
Sã o Joã o diz simplesmente, em seu evangelho: “Jesus amava Marta, e
sua irmã Maria e Lá zaro”. Eram amigos em cuja casa Ele era sempre
bem-vindo; e aquela casa que Ele frequentemente visitava durante Seu
ministé rio na Judé ia.
MINISTÉRIO JUDEU
Saindo de Jerusalé m, Ele foi para casa com Seus amigos em Betâ nia.
Durante uma breve estada lá , Ele pregou para as pessoas do campo ao
redor, e os visitantes de Jerusalé m que estavam presentes.
Ele disse ao povo que Ele era a porta para o verdadeiro aprisco.
Somente por Ele poderiam entrar no caminho que conduz à salvaçã o.
Ainda mais, Ele era o Bom Pastor que estava preparado para dar Sua
vida por Suas ovelhas. De fato, Ele faria isso, e voluntariamente; embora
depois Ele ressuscitasse dos mortos.
Suas palavras foram levadas de volta a Jerusalé m, onde causaram muita
discussã o; e as opiniõ es a respeito dele estavam mais divididas do que
nunca.
Ele agora foi mais longe e, durante os dois meses seguintes, ensinou em
vá rias aldeias do interior da Judé ia e da Peré ia. Ele també m escolheu e
enviou setenta e dois discı́pulos para ajudar na obra.
As doutrinas ensinadas diziam respeito ao Reino de Deus em geral, mas
mais especi icamente à paternidade de Deus, à necessidade da oraçã o,
ao cumprimento generoso dos deveres, à obrigaçã o da caridade
fraterna e ao juı́zo inal em que a recompensa da felicidade eterna ou o
castigo da misé ria eterna será a sorte de cada homem de acordo com
seus merecimentos.
Quando os discı́pulos voltaram a Ele cheios de entusiasmo e com
relatos do grande sucesso que havia acompanhado seus trabalhos, Ele
disse: “Bem-aventurados os olhos que vê em o que vedes, e os ouvidos
que ouvem o que ouvistes”.
A este perı́odo pertence a expressã o de Seu pró prio grande amor pelos
homens, quando Ele pronunciou estas palavras memorá veis: “Vinde a
Mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e Eu vos aliviarei.
Tomem sobre você s o meu jugo e aprendam de mim, pois sou manso e
humilde de coraçã o; e encontrareis descanso para vossas almas. Porque
o meu jugo é suave e o meu fardo leve”.
Por tudo isso, també m Ele manifestou Seu constante espı́rito de
comunhã o com o Pai celestial que tanto amava, entregando-Se a uma
oraçã o tã o prolongada e fervorosa que Seus Apó stolos, observando-O,
sentiram que nunca souberam o que realmente é orar. Entã o eles
pediram a Ele que os ensinasse també m a orar.
Foi em resposta a este pedido que Ele lhes ensinou a oraçã o, tã o
sublime quanto simples: “Pai nosso, que está s nos cé us, santi icado seja
o teu nome, venha a nó s o teu reino, seja feita a tua vontade assim na
terra como no cé u. . O pã o nosso de cada dia nos dai hoje; e perdoa-nos
as nossas ofensas, assim como nó s perdoamos a quem nos tem
ofendido. E nã o nos deixes cair em tentaçã o, mas livra-nos do mal”.
A DECLARAÇÃO SUPREMA
No mê s de dezembro seguinte, Jesus voltou a Jerusalé m para a Festa da
Dedicaçã o, que comemorava a libertaçã o do Templo em 165 dC da
profanaçã o a que Antı́oco Epifâ nio havia sido submetido cerca de cinco
anos antes. Antı́oco era um tirano que tentou acabar com o judaı́smo e
impor ao povo seu pró prio paganismo grego.
Chegando pouco antes da festa, Jesus icou mais uma vez com Seus
amigos Lá zaro, Marta e Maria, em Betâ nia, duas milhas fora da cidade.
Entã o, no pró prio dia da festa, Ele foi fazer Sua visita ao Templo.
Assim que Ele apareceu ali, as pessoas imediatamente se reuniram ao
Seu redor. Mas os fariseus també m estavam lá ; e eles estavam
determinados a forçá -lo a dizer abertamente se Ele alegava ou nã o ser o
Messias prometido. Entã o eles lançaram o desa io para Ele: “Por quanto
tempo você vai nos manter em suspense? Se você é o Messias, diga isso
diretamente.”
Jesus respondeu que nã o importa o que Ele dissesse, eles nã o
acreditariam nele, mas que os milagres que Ele operara em nome de
Seu Pai eram evidê ncia su iciente de Sua missã o divina. Entã o ele
acrescentou as palavras momentosas: “Eu e o Pai somos um.”
As implicaçõ es disso eram muito claras, e imediatamente os fariseus
pegaram pedras do pá tio para apedrejá -lo.
Mas Jesus, por sua vez, os desa iou, dizendo que Ele havia feito muitas
boas obras que somente Deus poderia fazer. “Por qual das minhas boas
obras”, perguntou ele, “você me apedreja?”
“Nã o por quaisquer boas obras”, gritaram eles, “mas por blasfê mia,
porque, sendo homem, você se faz Deus”.
Deixando cair as pedras, eles correram em direçã o a Ele, com a intençã o
de prendê -lo; mas mais uma vez Ele escapou deles, perdendo-se na
multidã o que se agitava, deixou o pá tio do Templo e a pró pria
Jerusalé m, partindo imediatamente, nã o de volta para Betâ nia, mas
para o outro lado do Jordã o, a cerca de trinta quilô metros de distâ ncia,
perto do local. onde Joã o Batista havia começado sua missã o.
Mas Ele chorou, dizendo: “Jerusalé m, Jerusalé m. Matas os profetas e
apedrejas os que te sã o enviados. Quantas vezes eu teria reunido seus
ilhos como a galinha seus pintinhos sob sua asa, e você nã o!
LEVANTAMENTO DE LÁZARO
Os trê s meses seguintes Jesus passou na Peré ia, ensinando, fazendo o
bem sempre e fazendo muitos convertidos.
Os fariseus, no entanto, constantemente perseguiam Seus passos; e um
dia um grupo deles lhe disse para sair da Peré ia porque Herodes
Antipas, que era governador da Peré ia e també m da Galilé ia, estava
planejando matá -lo.
Nenhum pensamento de Seu bem-estar fez com que os fariseus o
advertissem. Cheios de inveja e ó dio, eles pensaram que a ameaça
poderia pelo menos pô r im à Sua obra atual, impelindo-O a ir para
outro lugar.
Mas Ele simplesmente respondeu a eles: “Vã o e digam à quela raposa
que continuarei Meu trabalho até a hora de ir a Jerusalé m. Se um
profeta deve perecer, só pode ser naquela cidade. No entanto, quando
eu for lá , serei recebido com o grito de boas-vindas: Bem-aventurado
aquele que vem em nome do Senhor”.
Finalmente veio um chamado de caridade que Ele nã o podia recusar.
Mensageiros vieram de Marta e Maria em Betâ nia para dizer que seu
irmã o Lá zaro estava gravemente doente. A mensagem enviada pelas
irmã s foi meramente: “Senhor, aquele a quem Tu amas está doente”.
Eles sabiam que nã o precisavam dizer mais nada.
Mas Jesus estava bem ciente de que, enquanto os mensageiros estavam
fazendo sua viagem de vinte milhas, Lá zaro havia morrido; e Ele
deliberadamente permitiu que mais dois dias se passassem antes de
dizer aos Seus Apó stolos: “Vamos novamente para a Judé ia”. Eles o
lembraram dos planos para matá -lo ali; mas foi em vã o, e vendo Sua
determinaçã o de ir, Tomé disse aos outros: “Vamos nó s també m, e
morramos com Ele”.
Lá zaro já estava há quatro dias na sepultura quando eles se
aproximaram de Betâ nia, e Marta, sabendo de Sua vinda, foi ao seu
encontro com as palavras chorosas: “Senhor, se estivesses aqui, meu
irmã o nã o teria morrido”. Sua irmã Maria veio també m, quando lhe
disseram que Jesus estava perguntando por ela, e disse praticamente as
mesmas palavras. As duas irmã s provavelmente haviam dito
repetidamente uma à outra que se Jesus estivesse lá , Ele nunca teria
deixado seu irmã o morrer.
A seu pedido, eles o levaram para a caverna onde Lá zaro foi sepultado,
e Ele disse aos homens presentes que removessem a pedra que cobria a
entrada. Entã o, depois de uma oraçã o a Seu Pai, Ele ordenou a Lá zaro
que voltasse à vida e saı́sse da sepultura. Lá zaro o fez imediatamente,
para imensa excitaçã o de todos os que testemunharam e a conversã o da
maioria deles. Nã o, poré m, de todos. Alguns correram para Jerusalé m e
informaram os fariseus, que imediatamente exigiram uma reuniã o do
Siné drio ou Conselho Supremo dos Judeus.
A reuniã o do Siné drio foi realizada na casa de Caifá s, o Sumo Sacerdote
daquele ano. Todos concordaram que algo tinha que ser feito. Se Jesus
tivesse permissã o para continuar com con irmaçõ es tã o
impressionantes de seus ensinamentos, todos acabariam acreditando
nele. Os romanos podem até intervir e reduzi-los à escravidã o absoluta,
tirando todos os seus privilé gios atuais.
A discussã o continuou até que Caifá s encerrou-a dizendo: “Só há uma
coisa a fazer. E melhor que Ele morra do que pereça toda a naçã o”.
Jesus estava condenado. Mas eles nã o podiam colocar as mã os sobre Ele
por enquanto. Ele havia saı́do de Betâ nia e ido para o deserto algumas
milhas ao norte, perto de Efraim. O Siné drio podia apenas fazer seus
planos para Sua morte, ordenando que qualquer um que soubesse onde
Ele poderia ser encontrado deveria informá -los imediatamente.
BANQUETE EM BETHANY
Eram apenas cerca de 30 quilô metros até Betâ nia de Jericó , e quando
Jesus chegou à pequena cidade na tarde de sexta-feira, apenas seis dias
antes da Pá scoa, Ele foi bem recebido por todos. Apenas um mê s atrá s,
Ele ressuscitou Lá zaro, tã o conhecido e popular entre todos, dos
mortos.
Um cidadã o rico chamado Simã o até ofereceu um banquete para Ele e
seus apó stolos, convidando Lá zaro, Marta e Maria a estarem presentes
també m.
Durante a noite, na presença de todo o grupo, Maria expressou sua
reverê ncia, amor e gratidã o derramando sobre a cabeça e os pé s de
Jesus um perfume muito caro e refrescante. Isso a ligiu muito Judas,
que protestou contra tal desperdı́cio, dizendo que o precioso unguento
poderia ter sido vendido por cerca de cinquenta ou sessenta dó lares, e
o dinheiro dado aos pobres. Mas Jesus a defendeu. “Os pobres você
sempre tem com você ”, disse Ele, “mas nã o Eu mesmo. Ela se saiu bem,
preparando Meu corpo de antemã o para o enterro. E eu lhes digo que
onde quer que o evangelho seja pregado no mundo, o que ela fez será
lembrado em sua memó ria”.
Judas, no entanto, estava tudo menos apaziguado; Sentira repulsa pelo
que vira. A perda do dinheiro irritou. Os pensamentos de vender o
precioso unguento começaram a dar lugar em sua mente aos
pensamentos de vender algo in initamente mais precioso, o pró prio
Jesus.
Durante esses dias, Jerusalé m fervilhava de excitaçã o. Caravanas de
peregrinos chegavam todos os dias de todos os lugares para a Pá scoa.
Nas encostas ao redor das colinas foram armadas tendas, e diariamente
a multidã o delas ia para a Cidade Santa. Muitos galileus estavam entre
eles. Toda a conversa era sobre Jesus, e acima de tudo sobre o milagre
que Ele havia realizado um mê s atrá s, a ressurreiçã o de Lá zaro dentre
os mortos. Pessoas, indo e vindo, aglomeravam-se nos trê s quilô metros
de estrada entre Jerusalé m e Betâ nia. Muitos deles queriam ver Lá zaro
com seus pró prios olhos.
DOMINGO DE RAMOS
Foi em meio a toda essa agitaçã o que Jesus veio na sexta-feira de sua
chegada a Betâ nia, e decidiu ir a Jerusalé m depois do sá bado, no
primeiro dia da semana. Mas, ao contrá rio das visitas anteriores, esta
deveria assumir a forma de uma entrada pú blica na Cidade. Ele,
portanto, enviou dois de Seus discı́pulos a uma aldeia pró xima para
trazer de volta um potro de jumenta que Ele disse que encontrariam
amarrado lá , e que o dono os deixaria com prazer.
A notı́cia de que Ele estava vindo dessa maneira se espalhou
rapidamente, até mesmo para a pró pria Jerusalé m; e enquanto Ele
subia a encosta em direçã o à cidade, o povo veio ao encontro do
milagreiro de Nazaré , agitando palmas e gritando: “Bem-vindo. Hosana
ao Filho de Davi. Bendito aquele que vem em nome do Senhor. Hosana
nas alturas!"
Foi em vã o que sacerdotes e fariseus irados mandaram o povo parar,
perguntando o que eles queriam dizer com isso. “Este é Jesus, o Profeta,
de Nazaré da Galilé ia”, disseram eles, e continuaram com suas
demonstraçõ es de alegria. Os fariseus entã o se voltaram para Jesus. "E
para você parar com tudo isso", disseram eles. “Faça-os cessar.” “Se eu
izesse isso”, Ele respondeu, “as pró prias pedras clamariam”.
Quando uma curva repentina na estrada trouxe a cidade à vista, Jesus
foi à s lá grimas. Aqui estava Ele, aceitando publicamente o papel do
Messias, mas sabendo que dentro de poucos dias Ele seria rejeitado
enfaticamente. “Se você soubesse”, disse Ele, em voz baixa, “as coisas
que sã o para a sua paz. Mas agora eles estã o escondidos de você . Nã o
icará em ti pedra sobre pedra, porque nã o conheceste o tempo da tua
visitaçã o”.
Entrando na cidade fervilhante, Ele visitou o Templo para se entregar à
oraçã o. Mas os sacerdotes e fariseus disseram uns aos outros com raiva:
“Nã o conseguimos nada. O mundo inteiro parece ter ido atrá s dele.”
Eles, portanto, realizaram outra reuniã o para considerar o pró ximo
passo que deveriam fazer.
Nenhum outro desenvolvimento ocorreu naquele dia em Jerusalé m; e,
tendo olhado em volta para o que viu ali, Jesus voltou à tarde para
Betâ nia. Era pouco mais de meia hora de caminhada.
DIA DE PERGUNTAS
Os Sumos Sacerdotes e outros tiveram tempo para pensar sobre as
coisas, e quando Ele começou a ensinar novamente no Templo, eles o
interromperam, exigindo saber com que autoridade Ele assumiu tais
deveres.
Ele respondeu com outra pergunta. “De quem Joã o Batista recebeu sua
autoridade?” Eles foram reduzidos ao silê ncio. Pois se eles dissessem
que Joã o Batista nã o tinha autoridade, teriam irritado as pessoas que o
consideravam um profeta de Deus. Se, por outro lado, eles dissessem de
Deus, a resposta teria sido: “Entã o por que você nã o lhe obedeceu?”
Aproveitando-se de sua frustraçã o, Jesus entã o pregou as pará bolas dos
“Dois Filhos” ( Mateus 21:28-32); dos “lavradores ı́mpios” ( Lucas 20:9-
18); e da “Festa de Bodas”. ( Mateus 22:1-14). Todas as trê s pará bolas
predisseram a rejeiçã o de Deus aos judeus como Seu povo escolhido, e a
concessã o de sua herança aos gentios.
Enfurecidos com isso, os fariseus procuraram colocá -lo em problemas
com as autoridades romanas, perguntando se era ou nã o lı́cito pagar
tributo a Cé sar? Eles nã o ganharam nada com isso, pois Ele respondeu
simplesmente: “Dai a Cé sar o que é de Cé sar, e a Deus o que é de Deus”.
Os saduceus, entã o, izeram uma pergunta capciosa sobre o casamento
no cé u, que Jesus sumariamente rejeitou ao dizer que no cé u nã o há
casamento nem doaçã o em casamento, condiçõ es que sã o bem
diferentes das da terra.
Os fariseus entã o tentaram novamente perguntando qual é o maior
mandamento? Jesus respondeu que o primeiro é amar a Deus, e que o
segundo é amar o pró ximo - um amor que eles certamente nã o estavam
manifestando entã o!
Depois disso nã o houve mais perguntas, mas Jesus passou a advertir o
povo contra a hipocrisia dos escribas e fariseus. Estes tomaram Suas
palavras como uma declaraçã o de guerra aberta; e Jesus sabia que havia
virtualmente pronunciado Sua pró pria sentença de morte.
Quando Ele estava saindo do Templo, para nunca mais entrar nele, Ele
viu uma pobre viú va colocar duas moedas em uma caixa de coleta para
a manutençã o do Templo. Quã o pequena uma oferta que era pode ser
realizada pelo fato de que oito á caros seriam iguais a um ú nico centavo!
No entanto, Jesus elogiou sua oferta sacri icial, dizendo que ela merecia
mais do que todos os outros porque ela havia dado tudo o que tinha.
Um pouco mais tarde, poré m, Ele predisse a Seus Apó stolos a ruı́na
total do Templo, apesar de suas vastas pedras e estrutura só lida.
Indo para casa em Betâ nia, Ele interrompeu a viagem indo para o
Monte das Oliveiras, levando consigo Seus apó stolos Pedro, Tiago e
Joã o, a quem falou longamente sobre o Juı́zo Final.
JUDAS, O TRAIDOR
No dia seguinte, quarta-feira, Jesus passou um retiro com Seus
apó stolos, possivelmente em Betâ nia, provavelmente nas colinas
pró ximas. Estas foram as ú ltimas horas de preparaçã o espiritual, e
durante elas Ele lhes disse claramente mais uma vez: “Faltam apenas
dois dias para a Pá scoa. Entã o serei entregue para ser cruci icado”.
Um apó stolo, no entanto, estava faltando por algumas horas naquele
dia. Ele tinha ido sozinho para Jerusalé m, onde o Siné drio estava
realizando uma reuniã o pela manhã , tentando decidir o que fazer com
Jesus. Os membros estavam preocupados com o nú mero de Seus
amigos que vieram do interior. Mas, para seu deleite, Judas veio até eles,
perguntando o que eles lhe dariam se ele os informasse onde poderiam
encontrar Jesus longe das multidõ es habituais. Eles concordaram em
dar-lhe trinta moedas de prata, possivelmente equivalentes a quinze e
vinte dó lares em nosso dinheiro. Deve ter parecido uma pechincha
muito ruim, mas ainda assim Judas aceitou. Ele icou enojado com a
maneira como Jesus falhou repetidamente em se a irmar como o
Messias-Rei das aspiraçõ es nacionalistas judaicas quando as
oportunidades se apresentaram.
A ÚLTIMA CEIA
Na quinta-feira, Jesus enviou Pedro e Joã o à cidade para providenciar o
uso de um cená culo na casa de um amigo, onde Ele pudesse celebrar a
ceia da Pá scoa com Seus apó stolos naquela noite; e no devido tempo
todos vieram à casa, inclusive Judas.
Antes de começar a refeiçã o, tendo em mente as muitas vezes em que
os Apó stolos discutiram sobre “quem seria o maior”, deu-lhes uma
suprema liçã o de humildade, cingindo-se com uma toalha e depois,
tomando uma tigela de á gua, ajoelhando-se como um escravo
domé stico para lavar os pé s.
Depois disso, Ele prosseguiu com a ceia, durante a qual os advertiu que
um deles estava prestes a traı́-lo. Judas foi embora, para dizer aos
guardas do Templo que estivessem prontos para o momento em que ele
os noti icasse. Seria em breve. Jesus estava jantando com Seus
Apó stolos na casa de um amigo, disse-lhes. Eles seriam capazes de
prendê -lo sem qualquer perturbaçã o pú blica depois que ele deixasse o
local.
Quando Judas se foi - como parece mais prová vel - Jesus passou a
cumprir a promessa que havia feito um ano antes de dar Sua carne para
comer e Seu sangue para beber. Tomando o pã o, Ele disse: “Tome e
coma. Este é o Meu corpo que é dado por você . Faça isso em
comemoraçã o a Mim.” Entã o, tomando vinho: “Este é o meu sangue da
Nova Aliança, que será derramado por muitos para remissã o dos
pecados”.
Assim Ele deu o sinal de Seu pró prio Sacerdó cio de acordo com a ordem
de Melquisedeque, que havia oferecido sacrifı́cio em pã o e vinho; e
també m fez os Apó stolos sacerdotes de acordo com essa mesma ordem.
Assim, també m, Ele deixou para Sua Igreja o Sacrifı́cio da Missa, do qual
Sã o Paulo escreveria mais tarde: “Todas as vezes que comerdes este pã o
e beberdes o cá lice, mostrareis a morte do Senhor até que Ele venha. .” (
1 Coríntios 11:26).
Depois disso, Jesus falou por algumas horas com Seus Apó stolos, até
quase meia-noite, confortando-os, prometendo-lhes o Espı́rito Santo
para sua obra futura, dizendo-lhes que se uniriam a Ele como ramos
vivos se unem a uma videira, e concluindo com uma oraçã o sacerdotal
pela unidade de Sua Igreja, imprimindo neles os maravilhosos
relacionamentos de Si mesmo com Seu Pai, e deles mesmos com Ele.
Seguiu-se um hino de açã o de graças, depois Ele saiu de casa com Seus
apó stolos e partiu com eles de Jerusalé m pela estrada de Betâ nia até
seu favorito Monte das Oliveiras. Lá Ele foi para um jardim chamado
Getsê mani, onde Ele foi separado dos Apó stolos, com exceçã o de Pedro,
Tiago e Joã o, que Ele levou consigo. A estes trê s foi permitido
testemunhar, enquanto Ele se ajoelhava em oraçã o, algo da tristeza com
que Ele foi a ligido pelo peso dos pecados do mundo, cujo fardo lhe
forçou um suor de sangue.
PRISÃO E JULGAMENTO
Foi no jardim do Getsê mani que Judas, vindo com os guardas do
Templo, O encontrou.
Os apó stolos fugiram.
Jesus, preso, foi levado primeiro a Aná s, um ex-Sumo Sacerdote, que
nã o tinha autoridade, mas que queria interrogá -lo para pensar na
melhor acusaçã o a fazer contra Ele. Aná s entã o o enviou a seu genro,
Caifá s, o sumo sacerdote na verdade, que já havia decidido que era
melhor que Jesus morresse do que toda a naçã o perecesse.
Era agora luz do dia, na manhã de sexta-feira. O Siné drio se reuniu
rapidamente. Muitos informantes pro issionais foram chamados para
depor perante o tribunal judaico, mas suas acusaçõ es eram tã o
con litantes e tã o palpavelmente falsas que Caifá s as pô s de lado e
tomou as coisas em suas mã os.
Ele fez uma pergunta direta a Jesus, ordenando-Lhe em nome do Deus
Vivo que dissesse se Ele a irmava ou nã o ser o Cristo, o Filho de Deus.
Jesus respondeu que sim, e que um dia eles o veriam voltando nas
nuvens do cé u. Ficou claro que Ele estava se declarando igual a Deus, e
Caifá s voltou-se para seus companheiros do Siné drio. "Todos você s já
ouviram essa blasfê mia", disse ele. “Nã o há necessidade de outras
provas. O que você diz?" Todos concordaram que a sentença de morte
deveria ser pronunciada.
Durante esses procedimentos, dois dos Apó stolos, Pedro e Joã o, tiveram
coragem su iciente para ir ao pá tio da casa do Sumo Sacerdote; mas ali,
quando reconhecido, Pedro icou apavorado e trê s vezes negou, mesmo
com juramento, que conhecia Jesus. O canto de um galo trouxe para ele
a previsã o de Jesus de que ele faria isso; e, saindo, chorou
amargamente. Por enquanto nã o se lembrava, embora o tenha feito
mais tarde, que mesmo ao prever sua queda, Jesus també m havia dito:
“Roguei por você , Simã o, para que sua fé nã o desfaleça; e depois de sua
conversã o, será para você fortalecer seus irmã os”.
O Siné drio, proibido pelas autoridades romanas de in ligir eles mesmos
a pena de morte, levou Jesus a Pilatos, governador da Judé ia, acusando-
o de aconselhar as pessoas a nã o pagar impostos a Cé sar, de se
proclamar rei e de incitar o povo à rebeliã o. .
Pilatos nã o acreditou neles; tentou escapar da condenaçã o de Jesus
enviando-o a Herodes Antipas, governador da Galilé ia, que estava entã o
em Jerusalé m; e, quando esse expediente falhou, juntamente com todas
as medidas persuasivas para aplacar os judeus, entregou-O a eles para
ser cruci icado.
Antes, poré m, lavou as mã os na presença deles, declarando-se “inocente
do sangue deste justo”. Em um frenesi de triunfo, a turba, incitada pelos
sacerdotes judeus, gritou: “Seu sangue caia sobre nó s e sobre nossos
ilhos”.
Entã o eles izeram Jesus carregar Sua pró pria cruz ao Calvá rio.
MORTE NO CALVÁRIO
Pregado na cruz, Jesus suportou por trê s horas as torturas
ignominiosas e agonizantes da cruci icaçã o, com um cartaz acima de
sua cabeça, para a morti icaçã o dos judeus, mas insistiu por Pilatos,
proclamando-o como “Jesus de Nazaré , o Rei dos judeus .”
Sete de Suas declaraçõ es da cruz foram preservadas para nó s. Ele orou
pelo perdã o de Seus perseguidores; prometeu o paraı́so ao ladrã o
arrependido que, junto com outro criminoso, foi cruci icado ao lado
dele; con iou Sua Mã e aos cuidados de Sã o Joã o; expressou Sua pró pria
angú stia mental e corporal no clamor: “Deus meu, Deus meu, por que
me desamparaste” e nas palavras: “Tenho sede”; e entã o, depois de
declarar que tudo havia sido “realizado”, Sua declaraçã o inal, forte e
con iante: “Pai, em Tuas mã os entrego Meu espı́rito”.
Entã o, à s 15h, naquela tarde de sexta-feira, Jesus morreu.
A pró pria natureza pagou o tributo que Seu pró prio povo recusou. O sol
escureceu, enquanto a terra tremeu, rasgando o Vé u do Templo e
abrindo os tú mulos. Os judeus icaram apavorados e fugiram, batendo
no peito. Até mesmo o centuriã o romano exclamou: “Na verdade, este
homem era o Filho de Deus.”
Os sumos sacerdotes nã o estavam menos aterrorizados com essas
coisas do que os outros, mas estavam obcecados por outro medo maior.
Jesus havia dito que ressuscitaria no terceiro dia. Eles nã o acreditavam
que fosse possı́vel; mas eles estavam determinados a tomar precauçõ es
contra qualquer remoçã o de Seu corpo por Seus discı́pulos, com a
subsequente a irmaçã o de que a profecia havia sido cumprida.
Ao pô r do sol, o sá bado começaria. Eles devem ter tudo feito até entã o.
A seu pedido, os soldados romanos apressaram a morte dos dois
ladrõ es quebrando-lhes as pernas; mas quando foram a Jesus, já O
encontraram morto. Ainda assim, para ter certeza, um soldado en iou
uma lança em Seu lado. Os corpos foram retirados e Pilatos deu
permissã o a José de Arimaté ia para dar sepultura honrosa ao de Jesus.
Uma concessã o que ele fez aos sacerdotes judeus. Eles poderiam selar a
pedra na entrada da abó bada e fazer com que os guardas romanos
icassem de guarda até depois do terceiro dia, evitando qualquer
interferê ncia nela.
RESSUSCITOU E VIVER AINDA
Qualquer biogra ia comum aqui chegaria ao im. Impressionados pela
bondade, coragem magnı́ ica e devoçã o altruı́sta de uma vida como a
descrita, as pessoas podem pensar que o im foi de pura tragé dia; ainda
assim, seria o im de mais um grande homem que desempenhou seu
papel no palco da histó ria humana.
No caso de Jesus, poré m, as coisas sã o muito diferentes.
Pouco antes do amanhecer do terceiro dia, domingo, um terremoto
deslocou a pedra da entrada do tú mulo em que ele havia sido
sepultado; e os soldados romanos de guarda icaram aterrorizados nã o
só com isso, mas com a apariçã o de um anjo, luminosamente brilhante.
Eles caı́ram no chã o inconscientes e quando reviveram, fugiram.
O deslocamento da pedra nã o foi para permitir que Jesus saı́sse do
sepulcro. Ele já havia ressuscitado quando isso aconteceu. Mas Maria
Madalena e as outras mulheres que vieram pouco antes do nascer do
sol puderam ver que o tú mulo estava vazio. O anjo, ainda ali, os
convidou a fazê -lo. “Vede o lugar onde o Senhor foi posto”, disse-lhes.
“Ele nã o está aqui, pois ressuscitou, como disse. Vá depressa e conte aos
Seus discı́pulos”.
Era verdade. Os discı́pulos, no entanto, demoraram a acreditar. Mas
durante os pró ximos quarenta dias, em vá rios momentos e em
diferentes lugares, Jesus apareceu a eles, individualmente e em grupos.
Ele continuou instruindo-os, explicando a dois deles, no caminho de
Emaú s, como tudo o que Moisé s e os profetas haviam predito sobre o
Messias havia se cumprido Nele.
Aparecendo no meio deles, quando estavam reunidos em Jerusalé m,
concedeu-lhes o poder de perdoar pecados, soprando sobre eles e
dizendo: “Recebei o Espı́rito Santo. A quem perdoas os pecados, sã o-
lhes perdoados”.
Em outra ocasiã o, na Galilé ia, Ele con irmou Pedro em seu ofı́cio como
chefe supremo da Igreja na terra, depois de exigir dele uma trı́plice
pro issã o de amor como reparaçã o pela trı́plice negaçã o. A ele Jesus
con iou o cuidado de cordeiros e ovelhas, todo o rebanho; e prometeu-
lhe a coroa do martı́rio no inal.
Apropriadamente també m na Galilé ia, onde Ele os chamou pela
primeira vez como Apó stolos, Ele lhes deu Sua grande comissã o,
dizendo: “Todo o poder me foi dado no cé u e na terra. Indo, portanto,
ensinai todas as naçõ es, batizando-as em nome do Pai e do Filho e do
Espı́rito Santo, ensinando-as a observar todas as coisas que vos
ordenei; e eis que estou convosco todos os dias até o im do mundo”.
Sua ú ltima apariçã o para eles aconteceu pouco depois em Jerusalé m.
Naquela entrevista inal, tendo dado a eles mais instruçõ es sobre Sua
Igreja como o Reino de Deus neste mundo, Ele lhes disse para
permanecerem na cidade até que o Espı́rito Santo descesse sobre eles
como Ele havia prometido. Depois disso, eles deveriam começar seu
apostolado de pregar o evangelho em todo o mundo, até os con ins da
terra.
Agora havia chegado a hora de Ele retornar ao Cé u de onde Ele veio.
Acompanhado por todos eles, partiu no caminho para Betâ nia e o
Monte das Oliveiras. Quando eles subiram a montanha, Ele os abençoou
e, ao fazê -lo, começou a subir acima e alé m deste mundo. Por alguns
momentos apenas eles O viram partir. Entã o uma nuvem de repente se
formou sob Ele, cortando-O de seu olhar.
Enquanto eles continuavam olhando para cima, dois homens vestidos
de branco apareceram para eles e lhes disseram que Jesus inalmente
havia saı́do deles, mas que Ele voltaria algum dia, assim como eles O
viram partir. Estranhamente, eles nã o sentiram nenhum traço de
tristeza por Sua partida, mas voltaram para Jerusalé m com grande
alegria, para perseverar em oraçã o e esperar até serem dotados de
poder do alto.
Nove dias depois, no domingo de Pentecostes, o prometido Espı́rito
Santo desceu sobre eles. Pedro, chefe dos apó stolos, pregou o primeiro
sermã o naquele mesmo dia em Jerusalé m, e cerca de trê s mil almas
foram recebidas na Igreja.
E essa Igreja - a Igreja Cató lica - que está no mundo todos os dias desde
entã o, e ainda está conosco, o testemunho vivo que remonta aos
tempos, nos torna um com aqueles que ouviram Jesus falar e viram as
coisas que Ele fez ; e nã o mais do que eles podem duvidar da realidade
das experiê ncias que foram suas.
Para nó s, como para Sã o Pedro, Jesus é “o Cristo, o Filho do Deus vivo”.
Dele, com Sã o Joã o, nã o temos escolha senã o dizer: “No princı́pio era o
Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. E o Verbo se fez
carne e habitou entre nó s; e vimos a sua gló ria, como a gló ria do
unigê nito do Pai, cheia de graça e de verdade”.
IMPRENSA DE SÃO BENTO
A Saint Benedict Press, fundada em 2006, é a empresa-mã e de uma
variedade de selos, incluindo TAN Books, Catholic Courses, Benedict
Bibles, Benedict Books e Labora Books. O nome da empresa
homenageia a in luê ncia orientadora da Regra de Sã o Bento e dos
monges beneditinos da Abadia de Belmont, Carolina do Norte, a uma
curta distâ ncia da sede da empresa em Charlotte, Carolina do Norte.
A Saint Benedict Press é agora uma empresa multimé dia. Sua missã o é
publicar e distribuir produtos que re litam a tradiçã o intelectual
cató lica e apresentar esses produtos de maneira atraente e acessı́vel.
TAN • LIVROS
A TAN Books foi fundada em 1967, em resposta ao rá pido declı́nio da fé
e da moral na sociedade e na Igreja. Desde a sua fundaçã o, a TAN Books
está comprometida com a preservaçã o e promoçã o das tradiçõ es
espirituais, teoló gicas e litú rgicas da Igreja Cató lica. Em 2008, a TAN
Books foi adquirida pela Saint Benedict Press. Desde entã o, a TAN
experimentou crescimento e diversi icaçã o positivos, cumprindo sua
missã o para uma nova geraçã o de leitores.
https://tanbooks.benedictpress.com/index.php/Booklets
TAN · LIVROS
A TAN Books foi fundada em 1967 para preservar as tradiçõ es
espirituais, intelectuais e litú rgicas da Igreja Cató lica. Em um momento
crı́tico da histó ria, o TAN manteve vivos os grandes clá ssicos da Fé e
atraiu muitos para a Igreja. Em 2008 a TAN foi adquirida pela Saint
Benedict Press. Hoje a TAN continua sua missã o para uma nova geraçã o
de leitores.
Desde seus primeiros dias, a TAN publicou uma sé rie de folhetos que
ensinam e defendem a Fé . Por meio de parcerias com organizaçõ es,
apostolados e pessoas missioná rias, foram distribuı́dos mais de 10
milhõ es de folhetos TAN.
Mais recentemente, a TAN expandiu sua publicaçã o com o lançamento
de calendá rios cató licos e planejadores diá rios – bem como Bı́blias,
icçã o e produtos multimı́dia por meio de suas marcas irmã s Catholic
Courses ( catholiccourses.com ) e Saint Benedict Press (
saintbenedictpress.com ).
Hoje, a TAN publica mais de 500 tı́tulos nas á reas de teologia, oraçã o,
devoçõ es, doutrina, histó ria da Igreja e vida dos santos. Os livros TAN
sã o publicados em vá rios idiomas e encontrados em todo o mundo em
escolas, paró quias, livrarias e residê ncias.
Para um catálogo gratuito, visite-nos online em
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