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SÃO PAULO
2023
ÍNDICE PARCIAL
NULIDADE
CRITÉRIOS DE AFERIÇÃO
CRITÉRIOS DE AFERIÇÃO
ADÁGIO
NULIDADE
Isso pois - e não faltam exemplos à História para se demonstrar2 - o Estado se coloca
como ferramenta formidável para a violação dos mais basilares valores fundamentais da
vida humana – que, justamente, foram consolidados como tal após serem,
sistematicamente, nos mais diversos cenários, períodos e modos, rebaixados.
1
RANIERI, Nina. Teoria do Estado: do Estado de Direito ao Estado Democrático de Direito. 1. Ed.
São Paulo: Manole, 2013.
2
Veja-se, como bem destacado pelos estudos que orbitam a Justiça de Transição, as violações praticadas
no Cone-Sul no bojo das ditaduras militares do século XX. Nesse sentido, BETHEL, Leslie. História da
América Latina. A América Latina Após 1930: Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil, 2018
3
GLOECKNER, Ricardo. Uma Nova Teoria das Nulidades: Processo Penal e Instrumentalidade
Constitucional. 2010. 637 f. Tese (Doutorado em Direito), Faculdade de Direito, Universidade Federal do
Paraná, Curitiba, 2010, p. 14
À essa característica da processualística penal, atribui a doutrina sua faceta
denominada como instrumentalidade,4 não enquanto legitimador acrítico do poder
punitivo per si, mas de balizas que garantem respeito aos seus preceitos fundamentais
postos.
Assim, uma análise sobre referido instituto deve perpassar, necessariamente, pela
abordagem dos sistemas de formas processuais. Nesse viés, Gloeckner os agrupa em
quatro grandes modelos: (i) o sistema formular; (ii) o sistema judicial; (iii) sistema de
taxatividade; e, enfim, (iv) o sistema do prejuízo.6
O processo das ações da lei é todo oral, quer diante do magistrado (in iure),
quer do juiz popular (apud iudicem). Caracteriza-se, principalmente, pela
rigidez do formalismo a ser observado pelos litigantes a ponto de alguém – o
4
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 1° volume. 32 edição. São Paulo: Saraiva Jus,
2010.
5
ZACLIS, Daniel. A regra do prejuízo e as nulidades processuais: construção de um modelo racional
de aplicação do "pas de nullité sans grief" no âmbito do processo penal brasileiro. 2015. Dissertação
(Mestrado em Direito Processual) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015.
6
GLOECKNER, Ricardo. Uma Nova Teoria das Nulidades: Processo Penal e Instrumentalidade
Constitucional. 2010. 637 f. Tese (Doutorado em Direito), Faculdade de Direito, Universidade Federal do
Paraná, Curitiba, 2010, p. 240 - 241
exemplo é de Gaio 4 – perder a demanda pelo fato de haver empregado em
juízo a palavra uitis (videira), em vez do termo arbor (árvore), como
preceituava a Lei das XII Tábuas com relação à actio de arboribus succisis
(ação relativa a árvores cortadas), e isso apesar de, no caso concreto, as
árvores abatidas terem sido justamente videiras.7
(iv) Por fim, a última categoria representa ponto mediano entre os modelos judicial
e da taxatividade. É na vigência do prejuízo que, enfim, é consolidado o adágio do pas de
nullité sans grief, que preconiza que, ainda que se verifique a amorfia de ato praticado ao
curso do processo, o intérprete apenas deve reconhecer sua nulidade (com a incidência
das consequências jurídicas de referida arguição) se for verificado no caso concreto
efetivo prejuízo à parte.
7
MOREIRA ALVES. Direito Romano. 18ª ed. São Paulo: Editora Forense, 2016, p. 233
8
DEROUSSIN, David. Pas de nullité sans texte. Éléments pour une archéologie d’une directive. Revue
des contrats 1. Mar., 2018.
2. O PREJUÍZO NA HISTÓRIA: BREVE DIGRESSÃO SOBRE OS ANTECEDENTES QUE
Luís XIV, com o fulcro de resguardar ainda mais poderio de mando, editou a
Ordonnance Civile de 1667, que operou como verdadeiro código civil à época. Às
nulidades, era destinada a função de limitação da discricionariedade jurisdicional e, por
consequência, a aplicação literal daquilo que, originalmente, foi previsto pela coroa.
9
ZACLIS, Daniel. A regra do prejuízo e as nulidades processuais: construção de um modelo racional
de aplicação do "pas de nullité sans grief" no âmbito do processo penal brasileiro. 2015. Dissertação
(Mestrado em Direito Processual) - Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015
responsáveis pelo exercício majoritário da função jurisdicional no Ancient Régime eram,
em verdade, Parlamentos Regionais instalados pela Coroa.10
Portanto, mesmo que não se alinhasse para uma tendência unitária, uma primeira
aproximação do conceito de prejuízo no ordenamento francês adveio de uma construção
pretoriana. Todavia, a despeito de representar marco relevante para a evolução aqui
apresentada, a consolidação do adágio apenas se verificou após sua positivação, ocorrida
em período posterior: na edição do Código Napoleônico, mais de um século após a
Ordonnance de Luís XIV.
10
Inclusive, não era incomum a criação pelos monarcas de novos Parlamentos aparelhados com lealistas
ao governo, em resposta à eventuais insubordinações de demais já instalados. Nesse sentido, MIQUEL,
Pierre, Las Guerres de Relgion, 1980.
11
PÁDUA, Thiago Aguiar de.; CHAVES JUNIOR, A. ; PAULA, L. C. A Regra do Prejuízo: A Não
Recepção Constitucional do Art. 563 do Código de Processo Penal (Pas de Nullité Sans Grief). Revista
Brasileira de Ciências Criminais, v. 186, p. 163-189, 2021.
seu ministro das Finanças, Jacque Necker, por Luís XVI, então monarca-regente. A crise
governamental se agravou para além dos muros de Versalhes e atingiu com singular
precisão setores já insatisfeitos da população que, após o estopim, realizaram campanhas
de armamento para a tomada dos principais pontos de sustentação do regime.
A ordem do dia era alinhar o esbulho do antigo ordenamento para com os pujantes
preceitos da ilustração, o que, por óbvio, acarretou consequências para com o mundo
jurídico. Conforme ensina Facchini Neto:
12
FACCHINI NETO, Eugênio . O bicentenário da morte de Napoleão Bonaparte e seu principal legado
jurídico: o Código Civil francês e a proteção dos direitos da burguesia. RJLB - REVISTA JURÍDICA
LUSO-BRASILEIRA , v. 5, p. 757-816, 2021, p. 766.
Todas essas rupturas, entretanto, não lograram êxito sem sofrerem forte resistência,
tanto de ordem interna (toda a sorte de grupos armados, como revolucionários,
reacionários, restauradores etc), quanto externa (as sete coalisões europeias, fundadas
com o exclusivo fim de abafar as consequências do movimento francês, boicotes
econômicos e afins).
Bem por isso, não é estranho encontrar, em certas linhas da doutrina, a inclusão do
novel sistema de nulidades – e, por derradeiro, o prejuízo - como ferramental de limitação
ao poder, como estava sendo propagado em certas áreas pelos revolucionários.13 O adágio
do prejuízo, nesta interpretação, representaria, tal como o posicionamento do Parlamento
de Tolouse, um balizador ao poderio estatal, a partir da diminuição da discricionariedade
na interpretação da amorfia dos procedimentos.
13
Nesse sentido, DEROUSSIN, David. Pas de nullité sans texte. Éléments pour une archéologie d’une
directive. Revue des contrats 1. Mar., 2018.
celeumas jurídicas, mas sim a resolução de quem estaria autorizado a dar a última palavra
sobre o que é ou não válido e, por consequência, o que possui ou não força de lei.
14
O mesmo designo foi verificado na elaboração do próprio Código de Processo Penal da República.
Conforme disposto em sua exposição de motivos, “De par com a necessidade de coordenação sistemática
das regras do processo penal num Código único para todo o Brasil, impunha‑se o seu ajustamento ao
objetivo de maior eficiência e energia da ação repressiva do Estado contra os que delinquem. As nossas
vigentes leis de processo penal asseguram aos réus, ainda que colhidos em flagrante ou confundidos pela
evidencia das provas, um tão extenso catálogo de garantias e favores, que a repressão se torna,
necessariamente, defeituosa e retardatária, decorrendo daí um indireto estímulo à expansão da
criminalidade. Urge que seja abolida a injustificável primazia do interesse do indivíduo sobre o da tutela
social.”
15
TENÓRIO, Oscar. Napoleão e o Código Civil. Centro de Estudos Politicos do Tribunal Regional
Eleitoral, 14 de novembro de 1969
16
BINDER, Alberto. Descumprimento das Formas Processuais. 1ª ed. Rio de Janeiro: Editora Lumens
Iuris, 2003
Qual seja sua real razão de ser, fato é que o sistema de nulidades francês, incluso o
prejuízo, se disseminou para toda a Europa e, por derradeiro, influiu nos mais diversos
sistemas jurídicos do globo, como o pátrio.
O atento leitor, entretanto, deve à essa altura ter se deparado com a incontornável
questão: quais são exatamente os contornos do conceito de prejuízo?
A resposta para essa questão não se mostrou estanque. Isso pois, como também se
mostra notável na presente marcha, a noção de prejuízo foi originalmente desenvolvida
por uma normativa de direito material privado, ainda a naus de distanciamento da
processualística penal.
Por essa razão, antes que se passe até mesmo para a elementar análise do contexto
histórico em que estava envolta a edição do Código Napoleônico, uma breve digressão
sobre seus contornos iniciais, conforme proposto pelo próprio Código Napoleônico, se
mostra indispensável.
A lógica historicamente elencada era a de que, mesmo nos casos em que fosse
verificado eventual trespasse à formalidade prevista pela legislação, a inobservância da
solenidade apenas seria cominada com a declaração de nulidade caso a parte arguente
demonstrasse efetivo prejuízo para sua demanda.
“Perdura, ainda hoje, como uma lição perfeita a justicação oferecida, num
livro clássico, por Solon (Theorie sur la nullité des conventions, 1835),
registrando ter semelhante regra se originado em vista da necessidade de
acabar com os processos escandalosos em que o devedor remisso ou o
demandista de má fé, sem terem sofrido prejuízo algum nas garantias que a lei
lhe assegura, arguém simples omissão de fórma, indiferente à efetivação de
tais garantias, com o intüito de remover temporàriamente o cumprimento de
obrigação incontrastável”17
17
FILHO, Eduardo Espinola. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado. Volume V. Comentários
Aos Arts. 503/573. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editor Borsoi, 1965, p. 437
É dizer, o prejuízo era até então entendido em seu mais literal sentido: o de perda
econômica. A regulação se voltava, em última análise, para lides tratadas dentro da seara
civil, de modo a evitar que demandas desvinculadas de dano patrimonial fossem bem-
sucedidas, usando-se como pretexto eventual trespasse de forma prevista pela legislação.
O pas de nullité sans grief, portanto, não apenas foi criado pensando-se em
aplicação voltada à faceta do direito material, mas se encontrava plenamente inserido
dentro de sua lógica e principiologia, da proteção da autonomia da vontade e da livre
pactuação.
Por essa razão, seu auferimento inicial passava por exame com substancial nível de
objetividade: bastava que a parte, dentro da lógica de distribuição de cargas probatórias
inerente à esfera civil, demonstrasse a despesa à ela imposta pela amorfia, de modo a
buscar ressarcimento.
A primeira delas diz respeito à forma como o próprio processo em si era visto à
época. A autonomia científica da esfera processual não é dos mais antigos conceitos. Em
verdade, um desvencilhamento mais energético para com a seara material remonta a
períodos mais ulteriores.
Por essa razão, conforme destaca Gloeckner, os franceses (em linhas gerais)
atribuíam ao processo a condição sui generis de um “quase-contrato”, conforme também
previsto pela seara material. O entendimento era que os laços processuais emergiam da
vontade unilateral do indivíduo, que, por meio de suas ações, possibilitava a criação de
diversos tipos de vínculos com diferentes sujeitos, mediante a prática de determinados
atos jurídicos.18
Em segundo lugar, Paschoal também ressalta uma certa influência geográfica para
a transmutação da sistemática das nulidades materiais à processualística. À época, o tema
já se encontrava pormenorizado com fôlego na seara material, mas ainda dava seus
primeiros passos no campo processual. 19
Por conta disso, e também pelos temas usualmente serem disciplinados juntos,
houve um primeiro movimento natural de importação dos conceitos do mundo material
para o campo processual, em que, eventualmente, também fora incluído o adágio do
prejuízo.
As transposições feitas, entretanto, parecem não ter sido operadas sem traumas. Se
o conceito de prejuízo era suficientemente bem delimitado para o campo privado,
apresentou abrangência em demasia para a esfera processual, conforme será exposto em
tópico apartado.
18
GLOECKNER, Ricardo. Uma Nova Teoria das Nulidades: Processo Penal e Instrumentalidade
Constitucional. 2010. 637 f. Tese (Doutorado em Direito), Faculdade de Direito, Universidade Federal do
Paraná, Curitiba, 2010
19
PASCHOAL, Jorge Coutinho. O Prejuízo na Teoria das Nulidades Processuais Penais e Sua Análise
Jurisprudencial Nos Tribunais Superiores. 2014. Dissertação (Mestrado em Direito Processual) -
Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014,
20
Cita-se, por exemplo, os Códigos de Processo Civil e Criminal do Estado do Paraná, reunidos em um
único volume.
competente entre as heranças consuetudinária e romanista do Direito, apresentava
notáveis avanços e inovações em relação ao então dominante regime feudal, bem como
possuía profundidade e detalhamento em relação aos temas regulamentados etc.21
Visto que para os adversários inteligentes da França era evidente que tinham
sido derrotados pela superioridade de um novo sistema político, ou pelo menos
por seu próprio fracasso em adotar reformas semelhantes, as guerras
produziram mudanças não só através da conquista francesa mas também
através da reação contra ela; em alguns casos — como na Espanha — por
ambos os meios. Os colaboradores de Napoleão, os afrancesados, de um lado,
e, do outro, os líderes liberais da junta antifrancesa de Cádiz imaginavam
essencialmente o mesmo tipo de Espanha, modernizada de acordo com os
preceitos das reformas revolucionárias francesas, e o que uns deixaram de
alcançar, os outros tentaram.22
Após, também encontrou território fértil nas Américas, que estavam perpassando
pelos seus processos internos de independência. Com eles, também advinha a necessidade
da criação de um novo direito, desvencilhado das suas metrópoles originais,
predominantemente absolutistas. Por essa razão, duplicatas do Código Napoleônico se
21
GRIMALDI, Michel. L’Exportation du Code Civil. Disponível em: https://revue-pouvoirs.fr/wp-
content/uploads/pdfs_articles/107Pouvoirs_p80-96_Exportation_code_civil.pdf
22
HOBSBAWN, Eric J. A era das revoluções: Europa 1789 -1848. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991, p.
23
FACCHINI NETO, Eugênio . O bicentenário da morte de Napoleão Bonaparte e seu principal legado
jurídico: o Código Civil francês e a proteção dos direitos da burguesia. RJLB - REVISTA JURÍDICA
LUSO-BRASILEIRA , v. 5, p. 757-816, 2021
espalharam pelas ordenações “da Argentina, Paraguai, México, Peru, Venezuela e Bolívia,
onde foi por duas vezes promulgado.”24
O ordenamento brasileiro não restou incólume. Entretanto, sua maior afetação não
se deu no campo material – escopo originário do prejuízo –, mas sim na processualística
pátria.
Como fora explicitado, o Código Napoleônico teve grande influência dentro dos
países latino-americanos, que não só compartilhavam do sistema do civil law em
detrimento do movimento de colonização, mas que, também, por estarem se
desvencilhando de suas metrópoles, demandavam a criação de um direito novo, afastado
do esbulho absolutista imposto até então.
A expansão do escopo do adágio do pas de nullité sans grief para o processo penal,
entretanto, não foi tão imediato. A começar, o Código de Processo Criminal do Império
dedicava parcelas extremamente rudimentares às “formalidades substanciais” e
24
SOUZA, Sylvio Capanema de. O Código Napoleão e sua influência no Direito Brasileiro. Revista da
EMERJ , Rio de Janeiro, v. 7, nº 26, p. 36-51, set. 2004, p. 39
25
PEREIRA, Caio Mario. Instituições de Direito Civil. São Paulo: Editora Forense, 2020.
“formalidades acidentais”, de modo que o novel desenvolvimento das teorias da nulidade
restou parcialmente alheio ao ordenamento imperial.26
26
PÁDUA, Thiago Aguiar de. ; CHAVES JUNIOR, A. ; PAULA, L. C. A Regra do Prejuízo: A Não
Recepção Constitucional do Art. 563 do Código de Processo Penal (Pas de Nullité Sans Grief). Revista
Brasileira de Ciências Criminais, v. 186, p. 163-189, 2021.
27
Art 34: Compete privativamente ao Congresso Nacional:
23º) Legislar sobre o direito civil, comercial e criminal da República e o processual da Justiça Federal;
28
CHAVES JUNIOR, A. ; PAULA, Leonardo Costa de ; PADUA, T. A. . O prejuízo da 'regra do
prejuízo': a não recepção constitucional do art. 563 do Código de Processo Penal (pas de nullité sans
grief). Revista Brasileira de Ciências Criminais, v. 182, p. 163-190, 2021.
29
No mesmo sentido, o artigo 56 do Código de Processo Criminal do Estado de São Paulo:
Art. 56 _. A nullidade não pode ser pronunciada contra aquelle em cuja garantia tiver sido instituída a
formalidade omittida. § único - Outrosim, não pode ser pronunciada quando não houver prejuízo da parte,
que a alega, ou quando a falta tiver sido supprida, antes da allegação.
Com a nova Constituição de 1937 e a crescente tendência unitária do Estado Novo,
entretanto, a legislatura processual penal se aglutinou novamente como competência
privativa da União. Todavia, a influência do prejuízo, já dispersa por uma série de entes
federativos, também foi incorporada às novas normativas federais. Antes da própria
edição do Código de 1941, cita-se, por exemplo, o Decreto-Lei nº 167/38, que
regulamentou o júri em território nacional:
Por fim, adveio o Código de Processo Penal de 1941 e seu Título I do Livro III, que
consolidou a influência da doutrina francesa das nulidades em território nacional. O
prejuízo, in casu, é explicitamente previsto, com escopo transcendente à toda a
processualística penal:
Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para
a defesa.
Referida remissão se faz imprescindível, pois apenas com a exata compreensão dos
contornos dados ao prejuízo pelas suas searas originárias é possível firmar um olhar
crítico em relação ao instituto na processualística penal. Afinal de contas, a aplicação é
realizada de maneira idêntica? Existem singularidades em alguma das áreas? Quando do
nascimento do adágio, como se manifestaram os tribunais e a doutrina?
30
Entendidos os contornos antecessores, a análise para com o prejuízo na ótica
processualística penal se torna mais refinada e, por consequência, é possibilitada uma
identificação de eventuais incompatibilidades de maneira mais precisa.
CRITÉRIOS DE AFERIÇÃO
Feito o estudo do adágio em seu campo inicial, se fará uma análise similar dos
contornos do prejuízo para a processualística civil. Primeiro, será desenvolvida, com
maior profundidade, as razões da transposição da seara material para o campo em
comento. Após, será investigado se eventual deslocamento alterou os contornos
originalmente traçados pelo direito privado para o conceito de prejuízo e o uso do adágio
para a processualística civil.
ADÁGIO
BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2015
DA SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros
Editora., 2014
DE OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 19. ed. São Paulo: Atlas
Editora, 2015
DEROUSSIN, David. Pas de nullité sans texte. Éléments pour une archéologie d’une
directive. Revue des contrats 1. Mar., 2018.
HOBSBAWN, Eric J. A era das revoluções: Europa 1789 -1848. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1991.
LOPES-JR., Aury. Direito Processual Penal. 17ª ed. São Paulo: Saraiva Jus, 2020
MOREIRA ALVES. Direito Romano. 18ª ed. São Paulo: Editora Forense, 2016, p. 233
BETHEL, Leslie. História da América Latina. A América Latina Após 1930: Argentina,
Uruguai, Paraguai e Brasil. 1ª ed, São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2018