Você está na página 1de 18

casa

GUCCI

Casa Gucci.indd 1 30/09/21 15:25


Casa Gucci.indd 2 30/09/21 15:25
Sara Gay Forden

casa
GUCCI
Tradução
Gloria Cunha

Casa Gucci.indd 3 30/09/21 15:25


Título original: The House of Gucci – A Sensational Story of Murder, Madness, Glamour and Greed.
Copyright © 2001, 2000 Sara Gay Forden.
Copyright da edição brasileria © 2008, 2021 Editora Pensamento-Cultrix Ltda.
Tradução autorizada da edição americana publicada pela HarperCollins.
2a edição 2021.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou usada de
qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópias, grava-
ções ou sistema de armazenamento em banco de dados, sem permissão por escrito, exceto
nos casos de trechos curtos citados em resenhas críticas ou artigos de revistas.
A Editora Seoman não se responsabiliza por eventuais mudanças ocorridas nos endereços
convencionais ou eletrônicos citados neste livro.

Editor: Adilson Silva Ramachandra


Gerente editorial: Roseli de S. Ferraz
Gerente produção editorial: Indiara Faria Kayo
Editoração eletrônica: Join Bureau
Revisão: Vivian Miwa Matsushita

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Forden, Sara Gay


Casa Gucci /Sara Gay Forden; tradução Gloria Cunha. 2a ed. São Paulo: Editora Pensamento
Cultrix , 2021.

Título otiginal: The house of Gucci: a sensational story of murder, madness, glamour and greed.
ISBN 978-65-87143-11-8

Gucci (Firma) História 2. Gucci, Maurizio, 1948-1995 3. Homens de negócios Biografia


Itália 4. Processos (homicídio) Itália 5. Vestuário Comércio Itália I. Título.

21-60566 CDD-364.1523092
Índices para catálogo sistemático:
Homens de negócios: Assassinatos: Investigação: Criminologia: Biografia 364.1523092
Maria Alice Ferreira – Bibliotecária – CRB-8/7964

Seoman é um selo editorial da Pensamento-Cultrix Ltda.


Direitos de tradução para a língua portuguesa adquiridos com exclusividade pela
EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA.,
que se reserva a propriedade literária desta tradução.
Rua Dr. Mário Vicente, 368 – 04270-000 – São Paulo, SP
Telefone: (11) 2066-9000
http://www.editoracultrix.com.br
E-mail: atendimento@editoracultrix.com.br
Foi feito o depósito legal.

Casa Gucci.indd 4 30/09/21 15:25


PARA JULIA

Casa Gucci.indd 5 30/09/21 15:25


Casa Gucci.indd 6 30/09/21 15:25
Agradecimentos

M
uitas pessoas dividiram comigo suas experiências nas empresas
e na família Gucci. Isso tem grande valor para mim, porque
essa ligação com os Gucci inevitavelmente provoca emoções
profundas e impressões duradouras. Agradeço a importantes fontes que
contribuíram para este livro, incluindo o CEO da Gucci, Domenico De
Sole, e o diretor de criação, Tom Ford, que concederam inúmeras entre-
vistas entre 1998 e 2000. A antiga diretora de criação Dawn Mello tam-
bém gastou horas comigo entre Nova York, Milão e Paris, descrevendo
seu trabalho ao lado de Maurizio Gucci. Andrea Morante ofereceu-me
abundantes informações e compreensão valiosa da personalidade dos en-
volvidos. O presidente do grupo Investcorp, Nemir Kirdar, recontou sua
comovente história, como afiançou a visão de Maurizio a respeito da Gucci
e como dolorosamente percebeu que toda a esperança de realizar aquele
sonho juntos tinha se desvanecido. O ex-executivo do grupo Investicorp,
Bill Flanz, também me ofereceu sua própria experiência, além de tempo
e contatos, ajudando-me a encontrar uma grande quantidade de pessoas
no exterior, que também contribuíram com suas próprias dimensões desta
história. Rick Swanson, ex-funcionário do Investicorp e atualmente na
Gucci, pintou-me retratos vívidos das experiências de Maurizio Gucci no
Investicorp, misturando narrações preciosas entre fatos reais e números.

Casa Gucci.indd 7 30/09/21 15:25


8 S ar a Gay Fo r d en

O diretor financeiro da Gucci, Robert Singer, descreveu a aventura de


tornar a empresa pública. Dentre os antigos executivos do Investicorp que
auxiliaram neste livro, estão: Paul Dimitruk, Bob Glaser, Elias Hallak,
Johannes Huth e Sencar Toker. Agradeço também a Larry Kessler, Jo
Crossland e seu pessoal.
Em Florença, foi valiosa a contribuição da historiadora de moda,
Aurora Fiorentini, que fez uma diligente pesquisa para juntar as partes do
arquivo Gucci. Fiorentini dividiu comigo suas descobertas – desde do-
cumentos oficiais desenterrados de arquivos governamentais até histórias
coletadas uma a uma de antigos clientes ou relatos de artesões locais. As
assessorias de imprensa Gucci do mundo todo, sob a supervisão de Giulia
Masla, auxiliaram-me eficientemente com materiais impressos e foto-
gráficos e coordenaram uma assustadora série de entrevistas. Claudio
Degl’Innocenti dividiu sua visão pessoal a respeito da produção da Gucci,
enquanto Dante Ferrari auxiliou-me a voltar aos tempos antigos. Muitos
outros cujos nomes não aparecem nas páginas deste livro também conta-
ram suas experiências ímpares.
Roberto Gucci merece agradecimentos particulares por sua contribui-
ção inestimável – muito embora exista uma grande parte da história de
Gucci que ele preferiria esquecer. Giorgio Gucci abasteceu-me com mate-
rial impresso sobre os negócios da família e a respeito de seu pai, Aldo,
enquanto a filha de Paolo Gucci, Patrizia, auxiliou-me respondendo a
algumas das minhas dúvidas.
Embora as autoridades penitenciárias tenham negado meus pedidos
para entrevistar Patrizia Reggiani Martinelli na prisão San Vittori, em
Milão, ela se correspondeu comigo de sua cela, enquanto sua mãe incan-
savelmente respondeu às minhas perguntas. Paola Franchi também me
convidou para ir a sua casa diversas vezes, ocasiões em que se recordou
dos anos passados com Maurizio.
Algumas das mais inestimáveis reminiscências vieram da leal assistente
de Maurizio, Liliana Colombo, e do motorista dele, Luigi Pirovano, pes-
soas importantes que se tornaram uma espécie de família protetora para ele.

Casa Gucci.indd 8 30/09/21 15:25


CAS A GU CCI 9

O advogado de Maurizio, Fabio Franchini, forneceu registros precisos que


me ajudaram a conhecer um homem apaixonado e vulnerável, de quem
ele aprendeu a gostar e que tentou ajudar. Severin Wunderman contou-
-me várias horas de histórias, o que me capacitou para construir o perfil
de Maurizio, de Aldo e de outros. Logan Bentley Lessona, o primeiro
relações-públicas de Aldo Gucci, abriu suas memórias e arquivos. Enrica
Pirri dividiu suas ricas lembranças de seus mais de vinte anos passados com
a família Gucci, com quem mantém ainda laços profundos.
Respeitando a investigação e o julgamento de Patrizia Reggiani, o antigo
chefe de polícia criminal, Fillipo Ninni, o promotor público, Carlo Noce-
rino, Giancarlo Tagliatti e o juiz Renato Lodovici Samek auxiliaram-me a
traçar a história e a compreender a complexidade do sistema judicial italiano
enquanto meu amigo e colega Damiano Iovino se tornou um inestimável e
espirituoso colega de bancada durante as longas horas de depoimento.
Nenhuma dessas experiências teria se transformado em livro sem a
colaboração de minha agente, Ellen Levine, e de minha editora, Betty
Kelly, duas pessoas marcantes que perceberam o fascínio da história de
Gucci. O interesse delas e o apoio que ofereceram foram incalculáveis.
Quero agradecer a meus pais, David Forden e Sally Carson, pelo seu
constante encorajamento e pelos aconselhamentos editoriais de minha
mãe. Minha consideração também por meu marido, Camillo Franchi Scar-
celli, que me impulsionou a dar o salto e me deu apoio no esforço de
escrever este livro. Nossa filha, Julia, aprendeu a aceitar meu compro-
misso com paciência.
Meu bom amigo Alessandro Grassi me ofereceu um adequado escri-
tório em casa para trabalhar.
Devo agradecimentos especiais a amigos e colegas do mundo todo que
me acolheram em minhas viagens a diversas cidades: em Nova York,
Eileen Daspin e Marina Luri; em Londres, Anne e Guy Collins, Constance
Klein, Karen Joyce e Marco Franchini; em Paris, Janet Ozzard, Gregory
Viscusi e Penny Horner. Agradeço ainda a Teri Agins, Lisa Anderson,
Stefano e LeeAnn Bortolussi, Frank Brooks, Aurelia Forden e Thomas

Casa Gucci.indd 9 30/09/21 15:25


10 S ar a Gay Fo r d en

Moran pela ajuda e encorajamento ao longo do caminho e também às


minhas assistentes, Chiara Barbieri e Marzia Tisio, que transcreveram
pilhas de fitas de entrevistas. Em Roma, o chefe da Associated Press,
Dennis Redmont, e a senadora Francesca Scopeelliti fizeram tudo o que
puderam para que eu tivesse uma entrevista com Patrizia Reggiani. Em
Paris, Marie-France Pochna ofereceu-me brilhantes insights a respeito de
dois homens de negócios franceses: Bernard Arnault e François Pinault.
Meus agradecimentos ainda a Patrick McCarthy e a Fairchild Publications,
meus antigos empregadores, por me deixarem ausentar para escrever o
livro, e em particular a Melissa Comito e Gloria Spriggs, pela agradável e
rápida pesquisa fotográfica. Finalmente, agradeço a alguns mentores ines-
quecíveis dos tempos de Mount Holyoke College, onde compreendi que
escrever poderia ser um meio de vida: Caroline Collette, Richard Johnson,
Mark Kramer e Mary Young.

Casa Gucci.indd 10 30/09/21 15:25


Sumário

A morte ..................................................................... 13
A dinastia Gucci............................................................ 19
Gucci americaniza-se ...................................................... 45
Rebeldia juvenil ............................................................ 67
Rivalidades de família ..................................................... 93
Paolo contra-ataca ......................................................... 117
Perdas e ganhos ............................................................ 133
Maurizio assume o controle .............................................. 147
Mudança de sócios ......................................................... 183
Americanos ................................................................. 215
Um dia no tribunal ........................................................ 229
Divórcio ..................................................................... 255
Uma montanha de dívidas ................................................ 277
Vida de luxo ................................................................ 311
Paradeisos ................................................................... 329
Reviravolta .................................................................. 345
Prisões ....................................................................... 377
Julgamento ................................................................. 397
Tomando o controle ....................................................... 425
Epílogo ...................................................................... 465
Posfácio...................................................................... 481
Fotos ......................................................................... 495

Casa Gucci.indd 11 30/09/21 15:25


Casa Gucci.indd 12
Guccio Gucci 1881 – 1953
m. Aida Calvelli

Ugo 1899 – 1973 Grimalda 1903 – 199? Enzo Aldo 1905 – 1990 Vasco 1907 – 1974 Rodolfo 1912 – 1983
(filho de Aida) m. Giovanni Vitali 1904 – 1913 m. Olwen Price m. Bruna Palumbo m. Maria m. Alessandra Winklehaussen

Patrícia

Giorgio 1928 Paolo 1931 – 1995 Roberto 1932 Maurizio 1948 – 1995
m. Orietta Mariotti m. Maria Pia m. Yvonne Moshetto m. Fenny Puddefoot m. Drusilla Caffarelli m. Patrizia Reggiani

Alessandro Guccio Gemma Alessandra Allegra


1953 1955 1983 1976 1981

Elizabetta Patrizia
1952 1954

Cosimo Filippo Uberto Maria-Olympia Domitilla Francesco


1956 1957 1960 1963 1964 1967

30/09/21 15:25
A morte

À
s 8h30 da segunda-feira, 27 de março de 1995, Giuseppe Onorato
estava varrendo as folhas caídas na porta da entrada do edifício
onde trabalhava. Havia chegado às 8 horas, como costumava fazer
todos os dias da semana, e aberto as duas enormes portas de madeira do
prédio da Via Palestro, 20. A construção de quatro andares e estilo renas-
centista abrigava residências e escritórios e ficava num dos bairros mais
elegantes de Milão. Do outro lado da rua, em meio a altos cedros e ála-
mos, estendia-se o gramado bem cortado e os caminhos sinuosos do Giar-
dini Pubblici, um oásis de folhagem e serenidade em uma cidade brumosa
e apressada.
Durante todo o fim de semana, um vento quente havia soprado na
cidade, levando embora a sempre presente camada de neblina e derru-
bando as últimas folhas secas das árvores. Onorato tinha encontrado a
entrada coberta de folhas naquela manhã e apressou-se em varrê-las antes
que as pessoas começassem a entrar e sair do prédio. O treinamento mili-
tar havia dado a ele um forte senso de ordem e obrigação, embora tivesse
destruído sua vivacidade. Com 51 anos, ele estava sempre bem-vestido e
impecavelmente elegante: bigode branco perfeitamente aparado e os cabe-
los remanescentes cortados rentes à cabeça. Era um siciliano da cidade
de Casteldaccia, que viera para o norte como muitos outros à procura de

Casa Gucci.indd 13 30/09/21 15:25


14 S ar a Gay Fo r d en

trabalho e de vida nova. Após a aposentadoria do exército, em 1980,


depois de quatorze anos como oficial não comissionado, decidiu estabele-
cer-se em Milão, onde trabalhou por vários anos em diversos serviços
ocasionais. Assumiu o posto de porteiro na Via Palestro em 1989, indo e
vindo de lambreta do apartamento onde morava com a esposa na parte
noroeste da cidade. Um homem gentil, de claros olhos azuis e sorriso doce
e tímido, Onorato conservava a entrada imaculada. Os seis degraus de
granito vermelho muito polido que ficavam imediatamente após a pesada
entrada, as portas de vidro faiscantes no alto da escada e o chão brilhante
de pedra do foyer refletiam seus esforços. No fundo do foyer, Onorato tinha
um cubículo envidraçado e de madeira, com mesa e cadeira, mas rara-
mente se sentava lá, preferindo manter-se ocupado com seus afazeres.
Nunca se sentira à vontade em Milão, cidade que havia lhe oferecido pouco
mais que trabalho. Ele percebia a tendência ao preconceito que muitos
italianos do norte tinham com os meridionali, ou italianos do sul, o que o
irritava facilmente. Não respondia e obedecia aos superiores, como havia
aprendido no exército, mas se recusava a abaixar a cabeça.
“Sou tão digno como qualquer outro homem”, pensava, “mesmo que
seja rico ou de família importante.”
Onorato levantou os olhos enquanto varria e notou um homem do
outro lado da rua, que já tinha visto pela manhã, assim que abriu as portas.
Estava parado próximo a um carro verde estacionado a 45 graus de frente
ao Giardini Pubblici, longe do edifício. Os carros costumavam ficar esta-
cionados no meio-fio da Via Palestro, uma das poucas ruas no centro de
Milão com estacionamento livre. Era cedo ainda e aquele era o único carro
estacionado ali. A placa do automóvel chamou a atenção porque estava
muito baixa e quase tocava o chão. Onorato queria saber que tipo de tra-
balho o homem teria àquela hora da manhã. Barbeado e bem-vestido,
usava um sobretudo marrom-claro e olhava insistentemente para baixo,
em direção à Corso Venezia, como se esperasse alguém. Onorato passou
a mão distraidamente em sua careca e percebeu com certa inveja que o
homem tinha uma cabeleira ondulada, escura e farta.

Casa Gucci.indd 14 30/09/21 15:25


CAS A GU CCI 15

Desde que uma bomba havia sido colocada naquela rua em julho de
1993, Onorato vivia alerta. Com um barulho que balançou a cidade, um
carro com dinamite explodiu, matando cinco pessoas e destruindo o Padi-
glione d’Arte Contemporanea, o museu de arte moderna, que ruiu em
escombros de cimento, vigas de aço e pó. Na mesma noite, outra bomba
explodiu em Roma, danificando a San Giorgio Velabro, igreja do centro
histórico da cidade. As explosões foram depois relacionadas a outra, que
aconteceu em Florença, na Via dei Giorgofili e que também tinha matado
cinco pessoas, ferido trinta e destruído dúzias de peças de arte, guardadas
num prédio próximo. Mais tarde, descobriu-se o envolvimento de um
chefe da máfia siciliana, Salvatore “Toto” Riina, preso no começo daquele
ano pelo assassinato do mais importante promotor da máfia italiana, Gio-
vanni Falconi. Riina havia ordenado o bombardeio em alguns dos mais
preciosos monumentos culturais italianos em retaliação à sua captura. Foi
condenado por todos os delitos e cumpre dupla pena de prisão perpétua.
A Digos, polícia política italiana com missão específica de combater atos
terroristas, entrevistou todos os portinai, ou porteiros, nas vizinhanças da
Via Palestro. Onorato informou que havia visto um trailer suspeito esta-
cionado próximo a um dos portões do parque naquele dia. Depois desse
fato, ele registrava tudo o que fosse estranho em um bloco de papel, que
ficava no seu cubículo.
“Nós somos os olhos e ouvidos da vizinhança”, explicava para um
colega do exército que sempre aparecia para um café. “Sabemos quem
entra e quem sai; observar é parte da nossa missão.”
Onorato se virou e empurrou a porta da direita para varrer as últimas
folhas atrás dela. De lá, pôde ouvir passos rápidos na escada e uma voz
familiar dizendo “Buongiorno!”.
Voltou-se e viu Maurizio Gucci, que tinha escritórios no primeiro
andar, subindo vigorosamente os degraus da entrada com sua habitual
energia, balançando seu casaco de lã de camelo.
“Buongiorno, Dottore”, respondeu com um sorriso e um aceno de mão.
Onorato sabia que Maurizio Gucci era membro da famosa família Gucci

Casa Gucci.indd 15 30/09/21 15:25


16 S ar a Gay Fo r d en

de Florença, fundadora da luxuosa empresa de mesmo nome. Na Itália, o


nome Gucci sempre esteve associado a elegância e estilo. Os italianos
sempre se orgulharam de sua criatividade e tradição. Gucci, assim como
Ferragamo e Bulgari, simbolizava qualidade e arte. A Itália havia produzido
alguns dos maiores estilistas do mundo, como Giorgio Armani e Gianni
Versace, mas Gucci era um nome que remontava a gerações, antes que os
estilistas tivessem nascido.
Maurizio Gucci tinha sido o último da família a dirigir as empresas,
antes que fossem vendidas, havia dois anos, para sócios financeiros, que
naquela primavera tinham começado a estudar um plano para tornar a
Gucci popular. Maurizio, sem mais envolvimento com os negócios da
família, abriu escritório próprio na Via Palermo na primavera de 1994.
Gucci morava na outra esquina, num palácio majestoso da Corso Vene-
zia e caminhava para o trabalho toda manhã, geralmente chegando entre
8h e 8h30. Em alguns dias, entrava com sua própria chave, antes que o
porteiro abrisse as pesadas portas de madeira.
Onorato tinha grande curiosidade de saber como era ser Gucci, rico,
atraente, com uma namorada alta, magra e loira. Ela o havia ajudado a deco-
rar seu escritório lá em cima, com antiguidades chinesas, sofás e poltronas
elegantemente estofadas, tapeçarias ricamente coloridas e pinturas valiosas.
Vinha com frequência para almoçar com Gucci, vestindo um Chanel, com
seus cabelos longos e loiros perfeitamente arrumados. Para Onorato, eles
pareciam um casal perfeito com uma vida também perfeita.
Quando Maurizio Gucci chegou ao topo da escada em direção ao foyer,
Onorato viu o homem de cabelos escuros entrar pela porta. Num instante,
entendeu que ele estava esperando por Gucci e quis saber por que havia
parado no começo da escada, onde o grande capacho de cerdas marrons
acabava e começava a passadeira de tecido cinza, presa aos degraus por
uma barra de metal. Gucci não havia notado que o homem parara logo
atrás, já que não tinha sido chamado por ele.
Como Onorato testemunhou, o homem abriu o sobretudo com uma
das mãos e com a outra puxou uma arma. Esticou seu braço em direção

Casa Gucci.indd 16 30/09/21 15:25


CAS A GU CCI 17

às costas de Gucci e começou a atirar. A pouco mais de um metro dali,


Onorato permaneceu imóvel com a vassoura na mão. Chocado, ele se
sentiu incapaz de coibir o homem.
O porteiro ouviu três estampidos rápidos e silenciosos e, sem ação,
assistiu a tudo com horror. Ele viu a primeira bala entrar pelo casaco de lã
de camelo no lado direito do quadril. O segundo atingiu o ombro esquerdo
de Gucci. Onorato notou como o casaco tremeu a cada vez que as balas
entravam no tecido. “Não é igual às pessoas baleadas nos filmes”, pensou.
O rosto de Gucci tinha uma expressão perplexa, atordoada. Ele olhou
para o atirador, sem reconhecê-lo, e então olhou adiante, na direção de
Onorato, como se perguntasse: “O que está acontecendo? Por quê? Por
que isso está acontecendo comigo?”.
Uma terceira bala atingiu de raspão o seu braço direito.
Gucci gemeu e caiu, e seu agressor deu um último tiro fatal no lado
direito da têmpora, virando-se em seguida para partir e parando apenas
rapidamente sob o olhar de Onorato, que o fitava aterrorizado. Onorato
viu as sobrancelhas do homem se erguerem com surpresa, como se não
esperasse que ele estivesse presente.
A mão empunhando a arma ainda estava estendida e agora apontava
diretamente para ele. Onorato olhou para ela e percebeu que tinha um
silenciador cobrindo o cano. Então olhou para a mão que a segurava, com
dedos bem-feitos e unhas manicuradas.
Por um instante, que pareceu uma eternidade, Onorato olhou nos
olhos daquele homem, ouvindo, em seguida, sua própria voz:
“Nãããão”, gritou, encolhendo-se para trás, levantando a mão esquerda
como se dissesse: “Eu não tenho nada a ver com isso!”.
O homem então atirou mais duas vezes e correu porta afora. Ono-
rato ouviu um som metálico e percebeu que era das balas rolando no
chão de granito.
“Inacreditável”, ele se pegou pensando, “não sinto nenhuma dor! Eu
não sabia que não dói quando a gente é baleado.” Tinha curiosidade de
saber se Gucci sentia alguma dor.

Casa Gucci.indd 17 30/09/21 15:25

Você também pode gostar